Beruflich Dokumente
Kultur Dokumente
ARNALDO TONI
So u sa das C hagas
1 VI LU SAO
NO DISCURSO
da Auto-Ajuda
e o Sintoma Social
Editora Í!M!JÍ!¡
través d este livro o au tor propõe
um a reflexão crítica sobre a p rod ução d iscu rsiva
de au to-aju da. Ele faz um a a n á lise d esse
d iscu rso m ed ian te o exam e d o s tex to s escritos
d e várias obras do género; p ro b lem a tiza
su a a r tic u la ç ã o n o s o c ia l; se u s e f e it o s
e co n se q u ên cia s para as relações h um anas.
O estu d o realizado n o s p erm ite p ensar sobre
a lg u m a s d e t e r m i n a ç õ e s p s í q u i c a s q u e
co n d u zem o su jeito, p elas form ações im aginárias
e m ed ia n te sua crença , na d ireção da p rom essa
que ap on ta para um ideal impossível. E xam ina-se
ta m b é m a a r t ic u la ç ã o d e s s a p r o d u ç ã o
d is c u r s iv a c o m o d is c u r s o d o m in a n t e
da so c ie d a d e co n te m p o r â n e a , p ro cu ra n d o
c o m p r e e n d e r q u a l s e r ia s e u s e n t i d o
no m o m e n to em q ue se relaciona com algum as
id eo lo g ia s d o s d ias atuais. A partir d e en tão,
d iscu te-se a au to-aju da co m o um sin to m a
social.
issn ss-zqas-szs-s
9 788574 290782
Editora ÜNiJÍÜ
A
JL J L m a í d o To n i S o u s a
das Chagas nasceu a 25 de no
vembro de 1962, em Santa María
(RS). E psicólogo, formado pela
UNIJUI. Mestrando em Psicología
Social e Institucional, na UFRGS.
Trabalha com a equipe de enfer
magem no serviço de psiquiatria
do HUSM - UFSM, desde 1983,
onde trabalhou com pacientes
psicóticos internados: foi membro
da e q u ip e m u lt id is c ip l in a r
da u n id a d e de d e p e n d e n te s
q u ím ic o s ; f o i c o o r d e n a d o r
de grupos de alcoolistas e toxicó-
manos e atualmente desenvolve
atividades no ambulatorio de emer
gencia psiquiátrica. Foi produtor
e apresentador do programa “Nosso
M undo M e n ta l”, pela Rádio
Universidade, da UFSM, e autor
de diversos artigos em jornais
e anais de congressos: “O Uso
de Drogas e a Sociedade de Con
sum o”, “Auto-Ajuda: o Sujeito
e a Psicanálise”, “A Ilusão da Auto-
Ajuda”, “Crime , Justiça e Cons
ciên cia”, “Tensões Intelectuais
entre Psicanálise e Psicologia”, entre
outros.
Q
ue razões podem levar
m ilh a r e s d e p e s s o a s
no mundo todo a consumirem livros
de auto-ajuda? Que sentido o ho
mem contem porâneo encontra
nos conteúdos desses manuais para
conduzir-se na vida? Por que razões
as pessoas identificam-se com idéias
propostas pelos referidos autores?
Que fatores socioculturais suscitam
sua adesão ao referido discurso?
Que relações estruturais constituem
a valorização das promessas e receitas
contidas nas referidas literaturas?
Essas são algumas das indagações
pertinentes que se procura discutir
e de alguma forma esclarecer através
deste livro.
n •)i
da Auto-Ajuda
e o Sintoma Social
Editora UNIJUÍ
Ijuí - Rio Grande do Sul - Brasil
1999
© 1999, Editora UNIJUÍ
Rua do Comércio, 1364
Caixa Postal 560
98700-000 - Ijuí - RS
- Brasil -
Fone: (055) 332-7100, Ramais 217 e 612
F ax:(055) 332-9100
editora@main.unijui.tche.br
Catalogação na Fonte
Biblioteca Central UNIJUÍ
APRESENTAÇÃO................................................................................. 15
C A P ÍT U L O I
O INDIVIDUALISMO E A AUTO-AJUDA
NA CULTURA MODERNA................................................................. 19
Das Sociedades Tradicionais à Independência
e à Autonomia Individual................................................................. 22
A "Libertação" do Homem e a Salvação
pelas Forças Interiores.......................................................................24
A Liberdade como Sensação de Autonomia Individual................... 27
A Auto-Ajuda e a Desintegração dos Referenciais
Coletivos e Certa Necessidade de Orientação................................. 31
C A P ÍT U L O II
AS CONFIGURAÇÕES DE AUTO-AJUDA
E AS RELAÇÕES SOCIAIS PELA ÉTICA DO CONSUMO ............... 35
Os Manuais de Auto-Ajuda e o Caráter
Manipulativo do C onsum o..............................................................38
A Liberdade Capitalista Traduzida pela Competição
e pelo Consumo 40
A Auto-Ajuda e a Tendencia de Julgar
o Homem pelos Objetos.................................................................... 44
A Manipulação Comunicativa e o Homem
como Utilidade e M eio...................................................................... 48
A Ética do Consumo, a Solene Diligencia aos Objetos
e a Instabilidade das Relações Sociais............................................ 53
C A P ÍT U L O III
C A P ÍT U L O IV
13
f/Aimaído Totti Sousa das Chagas
Mario Fleig**
14
presentacão
A literatura de auto-ajuda tem seus primeiros indícios em
meados do século XIX, entretanto, encontra seu apogeu em tempos
atuais. O referido fenômeno tem provocado opiniões conflitantes,
nos últimos tempos. É exaltado por uns e abominado por outros.
Esse gênero de publicação literária conquistou grande parte do mer
cado editorial brasileiro e vem garantindo posições invejáveis entre
os best-sellers, em quase todos os países do mundo.
Os temas preferidos dos escritores de livros de auto-ajuda re
almente são sedutores e fascinantes, ao menos pela forma que são
proferidos, isto é, falam daquilo que os indivíduos desejam alcançar
no decorrer da vida. As fórmulas apresentadas através dos conteú
dos da referida literatura, de um modo geral, são espetaculares,
impositivas, totalitárias e miraculosas.
Os temas são os mais variados: Como Fazer Amigos e Influen
ciar Pessoas; Como Conseguir Tudo o que Você Quer da Vida; O Sucesso
Não Ocorre por Acaso; O Poder Infinito da Sua Mente; Como Alcançar a
Realização Plena; 0 Poder do Pensamento Positivo; 0 Poder do Subcons
ciente; Se os Outros Puderam Você Também Pode; A Mágica de Pensar
Grande e tantos outros.
De frente à exaltação do discurso da auto-ajuda, na atualida
de, e pelo número expressivo de seguidores que crêem nesses pensa
mentos e se orientam na vida por tais proposições, surge o interesse
por um a investigação exploratória através da pesquisa.
15
//A rmaído Toni Sousa das Chagas
16
ilusão no discurso da auto-ajuda e o sintoma social
17
f/^ ,r n a ld o 1'oni Sousa das Chagas
18
O individualism o
e a A uto-Ajuda
na Cultura M oderna
17 ilusão no discurso da auto-ajuda e o sintoma social
21
maído Toni Sousa das Chagas
22
ilusão no discurso da auto-ajuda e o sintoma social
23
f/Amaído Toni Sousa das Chagas
A “Libertação” do Homem
e a Salvação pelas Forças Interiores
As transformações sociais e culturais das sociedades moder
nas e pós-modernas, associadas ao progresso do mundo técnico ra
cional, como mencionou Stuar Hall (1998), no seu mais recente
trabalho2, abalaram os quadros de referência com que os indivíduos
se estabilizavam no mundo social. Ele afirma que as velhas identi
dades que já estabilizaram o mundo social, hoje, estão em declínio e
que novas identidades surgem, deixando o indivíduo moderno cada
vez mais fragmentado. O homem apresentava um a identidade bem-
definida e localizada no mundo social e cultural, porém,
24
ilusão no discurso da auto-ajuda e o sintoma social
25
f/^ r n a ld o Toni Sousa das Chagas
26
n ilusão no iliscurso da auto-ajuda e o sintoma social
27
//Aimaído Toni Sousa das Chagas
28
fji. ilusño no discurso ila auto-ajiula e o síntoma social
29
¡/Amaído Toni Sousa das Chagas
30
ilusão no discurso da auto-ajuda e o sintoma social
A Auto-Ajuda, a Desintegração
dos Referenciais Coletivos
e Certa Necessidade de Orientação
A literatura de auto-ajuda, conhecida como psicologia popu
lar, é usada, nos dias atuais, fundamentalmente, como auxílio e
guiã de incentivo e orientação para a vida de muitas pessoas. Bauman,
com razão, afirma que os homens e as mulheres pós-modernos ne
cessitam do "alquimista" que possua poder suficiente para trans
form ar a incerteza de base, em preciosa auto-segurança. Nas entre
31
/ / A rn a ld o Toni Sousa das Chagas
32
Ti. ilusão no discurso da auto-ajuda e o síntoma social
33
ff\rnaldo Toni Sousa das Chagas
34
As Configurações
de Auto-Ajuda
e as Relações Sociais
pela Ética do Consumo
ilusão no discurso chi auto-njuda e o sintoma social
37
//Amaído Toni Sousa das Chagas
38
ilusão no discurso da auto-ajuda e o sintoma social
39
f f A rn a ld o Toni Sousa das Chagas
40
ilusão no discurso da auto-ajuda e o sintoma social
41
//A rmldo Toni Soma ilus Chagas
42
fü. ilusão no discurso cia auto-ajiula e o sintoma social
43
//A nwltlo Toni Sousa das Chagas
44
\ ilusão no discurso chi auto-ajiula e o sintoma social
45
f/^ r n a ld o Ttmi Sousa das Chagas
a maioria das pessoas nos julga pela conta corrente que temos
nos bancos, pelo carro e roupa que usamos, pelo restaurante
que freqüentamos, quem quer que sejamos [muitos manuais
de auto-ajuda reforçam a condição de que] se a pessoa tem
dinheiro, é bem recebida em todos os lares e casas comerciais e
as oportunidades não lhe faltarão. Todas as atenções lhes são
prestadas; é um príncipe e, com o tal, tem direito às melhores
coisas da terra (Fernandes, 1985, p. 123).
46
} ilusão no discurso da auto-ajuda e o sintoma social
47
!/A maído Toni Sousa das Chagas
A Manipulação Comunicativa
e o Homem como Utilidade
e Meio
São inúmeros os livros de auto-ajuda, no mercado editorial,
que, de forma exagerada, cultivam a competição, o consumo, e re
forçam o individualismo. Pela manipulação comunicativa, de um
modo ou de outro, enfraquecem os laços sociais e acabam produzindo
o deslocamento da vida comunitária para a vida individual. À medi
da que, cada vez mais, torna-se intrincada a convivencia social,
aumenta, entre os homens de hoje, a insegurança para estabelecer
trocas ou fechar negocios. A confiança que se atribuía ao caráter à
"moral", parece mesmo insuficiente, na relação com os amigos, com
os colegas de trabalho, com os familiares, entre os políticos partidá
rios, nos meios de comunicações... Portanto, não subsistindo uma
"prescrição cultural" na sociedade contemporânea, mais ou menos
modelar e segura, que caracterize confiança pela "conduta moral e
pela ética" nas relações entre os homens, resta, para muitos, en
quanto indivíduos, tom ar conhecimento e seguir as prescrições dos
manuais de auto-ajuda, por exemplo, de como fazer amigos e influen
ciar pessoas, como edificar o futuro, como enriquecer, como conseguir o
que você quer dos outros sem fazer força, como persuadir falando, como
interessar as pessoas, como fazer as pessoas gostarem de você mediata
mente, como obter cooperação, como criticar e não ser odiado, como ven
der qualquer coisa a qualquer um, como assegurar um futuro maravilho
so, como progredir no emprego etc.
48
f l ilusão no discurso da auto-ajuda e o sintoma social
49
¡/Amaído Toni Soma das Chagas
50
ilusão no discurso da auto-ajuda e o sintoma social
51
//Amaído Toni Sousa das Chagas
52
ilusão no discurso ilti auto-ajiula e o sintoma social
✓
A Etica do Consumo, a Solene Diligência
aos Objetos e a Instabilidade
das Relações Sociais
Pelo mundo da abundância e do consumo, os objetos e seus
valores multiplicaram-se. Todos os homens são convocados, cada
vez mais, a trocar, constantemente, objetos e consumi-los como
um a necessidade fundamental a ser satisfeita. É evidente que esse
fato não ocorre apenas para suprir as necessidades essenciais de
sobrevivência do homem, mas por tantas outras coisas que as ima
gens de marketing, por sua vez, prestam solenes diligências e por
onde são, perfeitamente, acumuladas, de modo associativo, ao juízo
de todos os homens consumistas.
53
//A r n a ld o limi Sousa das Chagas
54
m ilusão no discurso da auto-ajuda e o sintoma social
55
//A>maído Toni Sousa das Chagas
56
ilusão no discurso da auto-ajuda e o sintoma social
57
nmhlo Toni Sousa das Chagas
de médico cardiologista, ele diz que ela já não lhe faz falta, urna vez
que, em vez de cuidar do coração, ele cuida da mente das pessoas.
"Hoje, com uma dezena de livros, atinjo mais pessoas e causo mais
impacto", diz Ribeiro. Um dos sonhos audaciosos desse escritor de
livros de auto-ajuda é o de inaugurar no Brasil a primeira Universi
dade da Mente. Disse, também, que vai ser a primeira vez em que os
estrangeiros virão ao Brasil para aprender (auto-ajuda) e não para
ensinar. Para tanto, não vai pedir dinheiro a ninguém, nem mesmo
ao governo, mas vai arcar com todas as despesas.
Outro escritor brasileiro, Hermes Fernandes, faz, em um de
seus livros, Edifique Seu Futuro, uma ligeira leitura da sociedade con
temporânea, para dizer que existem pessoas ambiciosas, esforça
das, criativas, que lutam, com ardor e persistentemente, por prestí
gio pessoal e social, por bens de raiz e duráveis, conforto material e
domínio econômico. Por outro lado, segundo o autor, existem, nessa
ordem hierárquica, aquelas pessoas que pertencem à segunda clas
se, a classe "B". Esses indivíduos são aqueles que se conformam e
"dizem amém ao estreito horizonte de um salário minguado; sem
bens, sem meios, habitam apartamentos espremidos, respiram ares
de dificuldades". Essa classe apenas vive. Suas aspirações são, em
alto grau, limitadas. Nessa ordem, segundo a visão de Fernandes,
existem também as pessoas da classe "C", ou pobre, os milhões de
miseráveis que povoam o planeta. Assim, categoricamente, ele afir
ma que "essas pessoas não aspiram nem poder, nem fama, [diz que
elas] não aspiram altos padrões de vida, que se entregam a confor
mação de não dispor da fartura e conforto, que não conhecem a
importância que existe no aproveitamento do tempo; que a pregui
ça, desânimo e a descrença são suas constantes companheiras"
(1983, p. 8). Esse autor, de forma semelhante a muitos outros, espe
cializou-se em escrever livros de auto-ajuda sobre a riqueza, mais
especificamente, sobre os meios usados para enriquecer-se e desfru
tar de uma vida feliz, saudável e de sucesso. Entretanto, como tanto
outros autores que tratam do assunto, ensina como usar a comuni
cação e a apresentação pessoal para influenciar as pessoas; descreve
idéias intuitivas sobre as relações humanas, especialmente no que
58
ilusão no discurso da auto-ajuda e o sintoma social
59
ff ^ r n a ld o Toni Sousa das Chagas
60
f//k apítulo III
A Auto-Ajuda e a Ilusão
Promovida pelo Discurso
Sedutor e Fascinante
3 ilusão no discurso da auto-ajuda e o sintoma social
63
f/J \rn a ld o liini Sousa das Chagas
64
m n ilusão no discurso da auto-ajuda e o sintoma social
65
//Amaído Toni Sonsa das Chagas
66
ílusao no discurso da auto-ajuda e o síntoma social
67
//Amaído Toni Sousa das Chagas
68
2ilusão no discurso da auto-ajuda e o síntoma social
5 Lauro Trevisan reside em Santa Maria, cidade do interior do Rio Grande do Sul.
É sacerdote da Igreja Católica Apostólica Romana e pertence à Sociedade do
Apostolado Católico. Esse autor tornou-se conhecido internacionalmente atra
vés de seu livro O Poder Infinito da Sua Mente, lançado em 1980 pela Editora da
Mente, de sua propriedade. Esse livro tornou-se um best-seller e vendeu, até hoje,
com suas 310 edições, mais de 770 mil exemplares (dados encontrados na Internet
através de sua home-page (www.infoway.com.br/laurotrevisanl em dezembro
de 1998 e também nos catálogos de preços da Editora e Livraria da Mente).
69
rnahlo Toni Sousa das Chagas
70
I ilusão no discurso da auto-aluda e o sintoma social
71
maído Toni Sousa das Chagas
72
ilusão no discurso da auto-ojuda c o sintoma social
6 Pelo propósito desse trabalho preferimos não entrar (a fundo) no terreno espe
cífico dos conceitos sobre modernidade e pós-modernidade, os quais são motivo
de muitas discussões e controvérsias. Preferimos apenas afirmar, em linhas
gerais e desde já, que a modernidade, sendo entendida como Nova Era (a partir
do rompimento completo com o mundo antigo), significou tempo de progresso
sem precedentes para a humanidade. Sua grande narrativa anunciou, além de
outras coisas, a conquista da autonomia e liberdade individual sob a orientação da
razão. Com relação à pós-modernidade, trata-se de considerá-la como ruptura,
ou, pelo menos, como enfraquecimento substancial - como bem nos lembra Barry
Smart (1993) - das convicções, valores e objetivos do iluminismo que informaram o
projeto da modernidade, ou ainda, como nos lembra Guiddens (1991), trata-se
de um novo e diferente tipo de ordem social, cuja trajetória está-nos tirando das
insituições da modernidade.
73
rnaldo Toni Sousa das Chagas
A Realização Imaginária
pelo Discurso Fascinante
O sujeito influenciado ou sugestionado pelos efeitos dos con
teúdos fascinantes dos textos das referidas literaturas dedicam-se a
um ideal de realização imaginária (e imediata) pela força de padrões
morais, que passam a ser elevados. Portanto, encontraram um sen
tido no júbilo da autonomia imaginária. Os líderes da auto-ajuda,
por sua vez, oferecem formas de significação que permitem ao su
jeito apropriar-se "dessa imagem idealizada de realização". Confor
me Lacan,
74
fü ilusão no discurso da auto-ajuda e o sintoma social
75
maído Toni Sousa das Chagas
76
¡n ilusão no discurso da auto-ajuda e o sintoma social
77
f / ^ m a l d o Toni Soma das Chagas
78
11 ilusão no discurso da auto-ajuda e o sintoma social
79
apítulo IV
As Proposições da
Auto-Ajuda como Ilusão:
uma Abordagem
Psicanalítica das Ilusões
ilusíw no discurso da auto-ajuda e o sintoma social
83
rnaldo Toni Sousa das Chagas
As Proposições da Auto-Ajuda
e a Promessa que Não se Cumpre
As promessas encontradas no conteúdo dos textos da litera
tura de auto-ajuda baseiam-se, sobretudo, "no princípio de que você
tem no seu interior todos os recursos necessários para obter o su
cesso, a concretização de seus objetivos, felicidade e qualquer outra
coisa necessária para desfrutar de um a vida completa" (Adans apud
Rüdiger, 1996, p. 11).
O que se verifica, outrossim, é a existência de uma espécie de
especialização dessas literaturas:
no mercado americano [por exemplo] estão à disposição livros
para cada tipo de situação: desde os deprimidos passando por
quem recentemente sofreu uma separação, obesos insatisfei
tos, quem perdeu um filho, quem teve suicidas na família,
para quem tem AIDS, ou para quem convive com aidéticos,
enfim para qualquer dos reveses do destino há sempre uma
obra para orientar com o sair-se melhor. (Corso, 1994, p. 7)
84
t l ilusão no discurso da auto-ajuda e o sintoma social
85
//Amaído Toni Sousa das Chagas
86
} ilusão no discurso da auto-ajuda e o síntoma social
87
maído Toni Sousa das Chagas
88
ilusão no discurso da auto-ajuda e o sintoma social
89
rnaldo Toni Sousa das Chagas
Freud está correto em afirmar que "a crença como ilusão se estabe
lece mediante um a realização de desejo que constitui fator proe
minente em sua motivação" então, o conteúdo desses livros (como
tantos outros) traz importantes colaborações para o tema aqui
problematizado.
Trevisan tenta provar, pelas suas afirmações, que a fé e a
crença movem montanhas e que até mesmo milagres podem acon
tecer. Ele encontra sustentação para fazer tais afirmações, sobretu
do, nas parábolas da Bíblia, através das afirmações de Jesus Cristo
e, ainda, nos relatos (registrados nos livros) de alguns de seus se
guidores. É desse modo, basicamente, que tenta dar conta daquilo
que prega. Outrossim, Trevisan costuma dizer que somos limitados
apenas pela mente, pois se um a pessoa for capaz de romper com
essa limitação, certamente, ela alcançará tudo quanto deseja da vida.
0 autor continua a declarar repetidamente, em seus livros, baseado
na afirmação de Cristo, de que "tudo o que pedirdes, seja o que for
que desejardes, [conseguireis]", ou, ainda, "pedi, e dar-se-vos-á",
que qualquer pessoa poderá alcançar qualquer objetivo na vida e que
é possível a cura de qualquer doença. Por fim, faz a seguinte per
gunta: "pode haver afirmação mais límpidamente clara do que esta?"
(1980, p. 17).
É bem provável que muitos indivíduos possam continuar acre
ditando cada vez mais nos ensinamentos dos referidos livros. No
entanto, essa condição somente será possível se o sujeito for capaz
de "transcender" a realidade do m undo externo, ou dizendo de outro
modo, a reflexão crítica do pensamento. Ora, se o sujeito nega a
realidade a ele apresentada, já que ela provoca mal-estar e angústia,
nesse caso, é bem provável que o faça pelo caminho da ilusão, seja
ele apresentado como uma escapatória ou como um a saída possível
para negá-la ou superá-la.
Que as provas da realidade não têm valor na ilusão, parece
ser, por assim dizer, um a referência habitual e comum na vida des
sas pessoas. A crença em alguns fenômenos, por mais estranhos
que possam parecer, vem demonstrar, de alguma forma, a força do
desejo que motiva o sujeito para certas realizações e, sem dúvida,
quanto mais intenso for a necessidade de realizá-lo, mais vulnerá
vel o sujeito se torna ao "assujeitamento".
90
fü. ilusão no discurso da auto-ajuda e o sintoma social
91
f/Á .n u ü i\o Toni Sousa das Chagas
tudo aquilo que você deseja na vida pode ser alcançado através
do poder cósmico latente em seu cérebro [...] este poder cósm i
co é a maior de todas as forças do mundo [...]. Muito já se
escreveu sobre os poderes da mente, mas neste livro está explí
citamente exposto o modo de usar esse poder para transfor
mar inteiramente sua vida (... ] À medida em que você for apren
dendo, neste livro, os processos e as técnicas simples de estabe
lecer contato com esse poder cósmico e passar a aplicá-lo em
sua vida, começará a progredir e a subir na vida, aproximan
do-se de Deus, etc. (1968, p. 5, 6)
92
} ilusão no discurso da auto-ajuda e o sintoma social
93
f//k apítulo V
O Discurso da Auto-Ajuda
como Promessa Moderna
de uma Realização Impossível
\ ilusão no discurso da auto-ajuda e o sintoma social
Trevisan diz que "a coisa que mais espanta as pessoas é ouvi
rem que elas têm o poder de alcançar tudo que desejam" (1980, p.
28). Segundo o referido autor, "a vida não é imprevisível, nem
incontrolável e nem irrealizável, porque existe, esparso pelo mundo
[portanto ela proporciona] tudo o que o ser hum ano deseja para en
trar em estado de felicidade e de plenificação." (1980, p 21). Entre
tanto, o sujeito deve-se preparar, educar-se, autoconhecer-se e, so
bretudo, acreditar que "existe mágica em se pensar de maneira posi
tiva" (Schwartz, 1995, p. 9). Tais autores procuram demonstrar que
existem instrumentos que levam seus leitores, quem quer que seja,
ao caminho do êxito. Esses instrumentos, que alguns dos autores
indicam, são os ensinamentos que os livros de auto-ajuda contêm.
97
f/J\rm ld o Toni Sousa das Chagas
98
1 ilusao_.no discurso da auto-ajuda e o síntoma social
A Inscrição da Auto-Ajuda
no Discurso Dominante
e o Sintoma Social
Valendo-se do que foi exposto até o momento, é possível fa
zer um a análise crítica através da psicanálise, no que diz respeito à
produção discursiva (FD) de auto-ajuda, sua emergência na cultura
moderna ocidental e o ápice desse fenômeno literário na sociedade
contemporânea. Na mesma medida, será possível, também, anali
sar e discutir o que a estrutura dos sistemas de auto-ajuda respon
dem ao homem contemporâneo no que se refere aos inúmeros efei
tos e conseqüências para sua subjetividade e, por conseguinte, para
sua conduta social. Sendo assim, verifica-se a importância de levar
99
¡/Amaído Toni Sousa das Chagas
100
} ilusão no discurso da auto-ajada e o sintoma social
A Impossibilidade da Completude
pela Proibição do Incesto
Tratando-se do texto de Freud, escrito em 1913, Totem e Tabu,
encontra-se a hipótese de um a "horda primeva" (de Charles Darwin.
Ele faz referências a um estado primitivo de sociedade, de organiza
ção de grupo.) O autor utiliza essa hipótese para elaborar questões
que dizem respeito aos desejos incestuosos. Assim, é dito que exis
tiu na "horda primeva", um pai forte que tinha poder e mantinha
controle sobre todos os seus filhos. Esse chefe da horda guardava
todas as fêmeas para si e, pelo ciúme, expulsava seus filhos quando
esses cresciam. Porém,
101
ff x n a là o Totti Soasa das Chaga
102
fü. ilusão no discurso da auto-ajuda e o sintoma social
103
f/j\r n a ld o Toni Sousa das Chagas
104
fj. ilusão no discurso da auto-ajuila e o sintoma social
105
//jfjn a là o Tcmi Sousa das Chagas
A Manipulação Comunicativa
e a Crise das Relações Humanas
O sujeito, diante das orientações dos manuais de auto-ajuda,
a qualquer preço, procura sobreviver ao mal-estar do indivíduo m o
derno. Ele vive intensamente, buscando prestígio e reconhecimento
ao te n ta r sair-se bem, pelas patéticas técnicas e sugestões
miraculosas. As influências subjetivas, referentes às asserções do
discurso dos mestres da auto-ajuda (seja através do estímulo à aqui
sição de objetos, pela "manipulação comunicativa", pelo controle de
situações em geral), produzem efeitos e conseqüências imprevisíveis
aos indivíduos, de modo especial, se fosse levar a termo e específi
camente as questões éticas e morais referentes às relações humanas
que se manifestam na sociedade contemporânea.
No livro Como Fazer Amigos e Influenciar Pessoas, Carnegie, ela
borando títulos atraentes, ensina como o indivíduo pode sair-se bem
experimentando suas técnicas de "relações humanas". Esse autor
traz sugestões precisas sobre como isso pode ser feito. Assim, a
propósito, faz suas declarações:
faça isso e será recebido em toda parte, seis maneiras de fazer
com que as pessoas gostem de você, um meio simples de
causar um boa impressão, com o fazer com que as pessoas
gostem de você imediatamente, com o conquistar as pessoas
para seu modo de pensar, um apelo de que todos gostam, o
cinema faz isto. A televisão também. Porque você não faz o
mesmo? (1995, p. 22)
106
ilusão no discurso da nuto-ajuda e o sintoma social
O Discurso da Auto-Ajuda
e o Sintoma Social
Em Psicanálise e Sintoma Social, encontra-se um texto de
Jaqueline Künzel que trata do marketing como o avesso da Psicaná
lise. À mesma medida a autora indaga sobre o sintoma social. As
sim, valendo-se de alguns dados dessa abordagem, verifica-se a se
melhança do discurso do marketing com o discurso da auto-ajuda e,
além disso, o que essas produções discursivas respondem ao ho
mem contemporâneo. Por conseguinte, para um melhor esclareci
mento, faz-se necessário algumas discussões a respeito.
Como no marketing, o discurso da auto-ajuda traz, em sua
ética, a promessa de completude. Esse discurso apresenta-se como o
"avesso da psicanálise", ou seja: "é da mesma ordem do discurso
religioso, onde privilegia o SI, o lugar do todo, onde se tenta preen
cher a falta. A psicanálise vem justamente trabalhar com essa falta,
vem m ostrar que ela existe, que está em todos os sujeitos" (Künzel,
1993, p. 110).
Com base no que foi exposto acima e valendo-se da afirma
ção de que o neurótico busca incessantemente e durante toda a sua
vida se defender da castração, de sua falta, pode-se dizer que o neu
rótico adere ao discurso da auto-ajuda como receita para livrar-se
107
f/A y m ü d o Ton i Sousa das Chagas
108
I ilusão no discurso da auto-ajuda e o sintoma social
109
onsiderações
m Finais
111
f/Amaído Toni Soma das Chagas
112
ilusão no discurso da auto-ajuda e o sintoma social
113
fA,maído Toni Sousa das Chagas
114
n ilusão no discurso da auto-ajuda c o sintoma social
115
f/A>maído Toni Soasa das Chagas
116
eferências
Bibliográficas
117
//A rnaldo Toni Sousa das Chagas
118
ilusão no discurso da auto-ajuda c o sintonia social
GIRAR D, Joe. Como vender qualquer coisa a qualquer um. 5. ed. Rio de
Janeiro: Record, 1981.
GUIDDENS. Anthony. As conseqüências da modernidade. São Paulo:
UNESR 1991.
HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. 2.ed. Rio de
Janeiro : DP&A, 1998.
HENCKEL, Marciela. D' Um a Outro: historicidade e gozo. In: FLEIG,
Mário et alii. Psicanálise e sintoma social. Porto Alegre : Unisinos,
1993. p. 39-46.
KANT, I. Fundamentação da metafísica dos costumes. São Paulo : Ed.
Nacional, 1964
KENNEDY, Hall. A arte defazer amigos e ser popular: como convencer
pessoas. Rio de Janeiro : Tecnoprint S.A., [198-].
KUNZEL, Jaqueline. Marketing, o avesso da psicanálise: um sintoma
social ? In: FLEIG, Mário et alii. Psicanálise e sintoma social.
Porto Alegre : Unisinos, 1993, p. 109-118.
119
//Amaído Toni Soma das Chagas
120
n ilusão no discurso da auto-ajuda e o sintoma social
121
//Amoldo Toni Soma das Chagas
122
üilusão no discurso da auto-ajuda e o sintoma social
123
Editora ÜNiJÍH
Rua do Com ércio, 1364 • Caixa Postal 560
98700-000 - Ijuí - R S - Brasil
Fone: (0 5 5 ) 332-7100, Ram ais 217 e 612
Fax: (055) 332-9100
editora@main.unijui.tche.br
P E D I D O S
UNILlVIttiS
DISTRIBUIDORA UNIVERSITARIA DE LIVROS