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DIREITO AMBIENTAL

ILUSTRAÇÃO

Santiago Mourão

RESUMO
Atenta para a destruição do meio ambien-

A CONTRIBUIÇÃO
te, fato real e agravado a cada dia no con-
texto mundial. Afirma que o Direito Penal
torna-se instrumento de combate a essa
destruição desenfreada, tendo em vista que

DA LEI DOS CRIMES as esferas civil e administrativa têm sido in-


suficientes para preencher essa lacuna.
Devido ao princípio da intervenção míni-

AMBIENTAIS NA
ma, defende a convocação do Direito Pe-
nal somente para os casos estritamente
necessários.
Traça breve histórico da inclusão das leis

DEFESA DO MEIO ambientais no Brasil, afirmando constituir a


Lei n. 9.605, de 1998 (Lei dos crimes
ambientais), importante renovação

*
AMBIENTE
legislativa nesse contexto.
Comenta sobre a responsabilidade penal
da pessoa jurídica e cita abrangente juris-
prudência a respeito do crime ambiental.
Vladimir Passos de Freitas
PALAVRAS-CHAVE
Direito Ambiental; Direito Penal; Lei n.
9.605/98; Lei dos crimes ambientais; meio
ambiente; tipo penal – ambiental, aberto;
* Conferência proferida no “VIII Congresso de Direito Ambiental”, realizado pelo Centro princípio da intervenção mínima; princípio
de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal e pela Seção Judiciária de Rondônia,
nos dias 11 e 12 de maio de 200 6, no auditório da Ordem dos Advogados do Brasil,
da insignificância; pessoa jurídica – respon-
seccional de Rondônia – RO. sabilidade penal.
Revista CEJ, Brasília, n. 33, p. 5-15, abr./jun. 2006
1 INTRODUÇÃO revelarem inoperantes. Nesse mesmo sentido concluíram os ma-
A questão ambiental vem-se agravando dia a dia. As previ- gistrados argentinos e uruguaios reunidos em seminário internacio-
sões outrora assustadoras, como a que previa falta de água no nal realizado em 24 e 25 de abril de 2004, em Colônia Suíça,
planeta no ano 2025, tornam-se otimistas. Os meios de comu- Uruguai, conforme Cláusula n. 16, que diz: La aplicación del
nicação fornecem, cada vez com maior intensidade, notícias Derecho Penal debe constituirse como ultima ratio frente a
alarmantes. Reportagem sobre a floresta amazônica informa: um conflicto de caráter ambiental.
Em um ano, menos 1,3 bi de árvores. Cientistas estimam que, No entanto, a avaliação da necessidade do Direito Ambiental
entre 2003 e 2004, foram afetados na Amazônia 46,5 milhões Penal deve ser feita com os olhos postos na realidade. Ele, certa-
de aves e 1,5 milhão de primatas1. A Amazônia, reserva mun- mente, não é necessário em países desenvolvidos, com boa distri-
dial de água potável, vive uma de suas piores secas dos últi- buição de renda e órgãos administrativos bem estruturados, como
mos 50 anos2. Os criminosos, contudo, seguem nas suas ativi- na Finlândia, por exemplo, considerado o país menos corrupto do
dades, com tranqüilidade, mesmo presa quadrilha que forjava mundo. Em outras palavras, a realidade local dita a prevalência da
certificado para madeira ilegal3. Os problemas são internacio- tutela do Direito. Nos Estados Unidos, ela se dá mais na esfera
nais. Segundo informação, amianto mata 3 mil por ano na administrativa, onde a ação da Environmental Police Agency –
França4 e tudo se dá porque o clima reage. Retirada de bar- EPA é efetiva e poucos casos são levados ao Poder Judiciário. Na
reiras naturais ampliou destruição nos EUA5. Argentina, a legislação civil é adotada com firmeza pelos tribunais
e assume o papel principal na proteção do meio ambiente. O Uru-
(...) a preservação é um dever a ser cumprido guai, com pouco mais do que 3 milhões de habitantes, resolve seus
com o máximo empenho e seriedade. Não problemas com ênfase na atuação administrativa, baseada na Lei
n. 17.283, de 28/11/2000.
apenas para esta, mas principalmente para as No Brasil a situação é peculiar. O País possui 8.511.926 km2 e
futuras gerações. aproximadamente 170.000.000 de habitantes. Faz-se necessária a
tutela penal do meio ambiente, há muito prestigiada. No XII Con-
Em meio a essa grave situação, segue o homem na luta gresso Internacional de Direito Penal, realizado em Varsóvia
pela preservação ambiental, que, em última análise, nada mais é em 1975, foi aprovada resolução no sentido de tratar como delitos
do que a luta pela própria sobrevivência da espécie. Neste mis- contra a humanidade, e submetê-las a grave repressão as agressões
ter o Direito não podia ficar alheio, sabido que, atualmente, ao meio ambiente. Em nosso país, seguindo essa diretriz, a Constitui-
6 todos os conflitos acabam sendo levados ao Poder Judiciário. O ção Federal de 1988, no art. 225, § 3º, menciona a proteção penal do
fenômeno não é brasileiro. Como bem observa o professor meio ambiente e estabelece que as condutas e atividades con-
argentino Roberto Omar Berizonce6, es notorio que en las mo- sideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infrato-
dernas sociedades de fines de este siglo mientras se constata res, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais.
en las encuestas de opinión la ineficiencia del sistema judicial y Essa imposição justifica-se na medida em que o Estado confere
el desprestigio de la magistratura, paradójicamente el proteção a valores fundamentais, como o meio ambiente. Portanto, o
ciudadano común recurre cada vez más ante el Poder Judicial Direito Penal mínimo não deve ser aplicado em tema de infrações
en la búsqueda de soluciones no solo para sus conflictos ambientais no Brasil, onde os danos são de conseqüências graves e
individuales sino también como gestor de los intereses públicos nem sempre conhecidas, e a preservação é um dever a ser cumprido
generales, a conciencia de que, en muchos casos los otros com o máximo empenho e seriedade. Não apenas para esta, mas
“poderes políticos” son incapaces de brindárselas, o las principalmente para as futuras gerações.
transfieren directa o implícitamente a los jueces.
Diante desse quadro preocupante, o Direito Penal tem 2 O TIPO PENAL AMBIENTAL
sido um instrumento útil e importante na tutela do meio ambiente. Reclamam os penalistas dos tipos penais ambientais. Afir-
Com efeito, recorre-se a ele sempre que a repressão administra- mam que, por vezes, eles realmente são por demais abertos e em
tiva e civil se mostram insatisfatórias para combater as suces- muito se recorre à norma penal em branco. Todavia, isso acontece
sivas agressões ao meio ambiente. Fortes ventos sopram no porque as descrições de fatos delituosos são o resultado de obser-
sentido de que o Direito Penal seja de liberação e descrimina- vações de especialistas de outras áreas do conhecimento. Os cien-
lização, com a observância do princípio da intervenção mínima. tistas e os técnicos sabem o que é importante para a preservação
A repressão à conduta transgressora deve ser feita por via admi- de um ambiente sadio. Na verdade, os professores conhecem as
nistrativa, em que as sanções seriam mais eficientes e aplicadas conseqüências do desprezo às seculares regras da natureza, como
com maior brevidade, ou pela via civil, na qual a reparação também os técnicos dos órgãos ambientais, que efetivamente
pode ser completa. Ao Direito Penal deveria ficar reservado o acompanham os resultados de uma política ambiental mal
que for mais grave e nocivo à sociedade. conduzida. Portanto, biólogos, engenheiros florestais, geólogos,
Esta é a lição de Cezar Roberto Bitencourt, ao observar químicos, oceanógrafos e outros profissionais acabam definindo
que o princípio da intervenção mínima, também conhecido condutas elevadas à categoria de crimes ambientais. E isso nem
como ultima ratio, orienta e limita o poder incriminador do sempre é feito com a técnica necessária.
Estado, preconizando que a criminalização de uma conduta
só se legitima se constituir meio necessário para a proteção 2.1 NORMA PENAL EM BRANCO
de determinado bem jurídico7. Isso significa que o Direito Pe- Nos crimes contra o meio ambiente, a detalhada e exausti-
nal só deve atuar quando os demais ramos do Direito se va descrição do comportamento do agente mostra-se, na maio-
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ria das vezes, bastante difícil ou quase se o saudoso penalista aos crimes condutas de perigo até abstrato que,
impossível. Com certa freqüência, é ne- culposos, aos comissivos por omissão e não-recomendável em matéria crimi-
cessário que a lei faça remissão a disposi- àqueles em que se faz referência à ilicitude nal, mostra-se necessária na proteção
ções externas, a normas e a conceitos com o emprego de expressões como do meio ambiente12.
técnicos. A norma penal compõe-se de “indevidamente”, “sem justa causa”, “sem
preceito e da respectiva sanção, que au- permissão legal”. E conclui: Nos casos 4 PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA
torizam a sua aplicação sem a necessida- de tipos abertos, a ilicitude deve ser O doutrinador brasileiro que deu
de de normas complementares. Algumas, estabelecida pelo juiz, verificando se hou- maior destaque a esse princípio foi Fran-
entretanto, para serem aplicadas, neces- ve a transgressão das normas que a cisco de Assis Toledo: segundo o princí-
sitam de complementação de outra dis- incriminação pressupõe10. pio da insignificância, que se revela por
posição normativa. É o que a ciência pe- inteiro pela sua própria denominação,
nal denomina de “norma penal em bran- 2.3 ELEMENTO NORMATIVO DO TIPO o Direito Penal, por sua natureza frag-
co”. Essa complementação, que não ofen- A Lei n. 9.605/98, em vários de seus mentária, só vai até onde seja necessá-
de o princípio da reserva legal, pode ser dispositivos penais (arts. 29, 30, 44, 45, rio para a proteção do bem jurídico.
realizada de três maneiras: por disposi- 46, parágrafo único, 51, 52, 55, 56, 60, Não deve ocupar-se de bagatelas13. No
ção prevista na mesma lei; por disposi- 63 e 64), traz o elemento normativo do entanto, em matéria de meio ambiente,
ção contida em outra lei; por disposição tipo. Para Magalhães Noronha, em nem sempre é fácil distinguir o que é e
emanada de outro poder, ou seja, de um comentários ao Código Penal, os elemen- o que não é significativo. Por exemplo,
ato administrativo. tos normativos dizem respeito à antiju- a morte de uma arara azul não pode
Segundo Luis Rodríguez Ramos, há ridicidade e são designados por expres- ser considerada irrelevante, pois se tra-
condutas que não se podem descrever sões como “indevidamente” (os arts. 151, ta de espécie em extinção. Assim, o ma-
sem acudir a esta técnica, dada sua com- 192, I, e 196,VII, arts. 192 e 196 foram gistrado, para rejeitar uma denúncia ou
plexidade (no meio ambiente, por exem- revogados pela Lei n. 9.279/1996), “sem absolver o acusado, deverá explicitar por
plo, o conceito conexo de contamina- justa causa” (arts. 153, 154 e 244), “sem que a infração não tem importância. E
ção só pode ser determinado mediante consentimento de quem de direito” (art. mais, não se pode esquecer que o art.
uma remissão a outras normas)8. Por 164), “sem licença da autoridade com- 37 da Lei n. 9.605/98 afirma não ser
tal razão, nos crimes ambientais a norma petente” (art. 166), “fraudulentamente” crime a morte de animal para saciar a
penal em branco é necessária. (art. 177), e mais alguns11. O elemento fome, para proteger lavouras, pomares 7
normativo do tipo pode ser encontrado e rebanhos ou por ser nocivo o animal,
2.2 TIPO PENAL ABERTO nas expressões “sem licença”, “sem auto- exigindo estas últimas modalidades au-
Por força do princípio da legalida- rização”, “sem permissão”, “em desacor- torização do órgão ambiental compe-
de ou da reserva legal (CP, art. 1º), a do com a determinação legal obtida” e tente. Ainda: as penas previstas na Lei n.
norma penal deve descrever por com- outras assemelhadas. 9.605/98 são leves e admitem transa-
pleto as características do fato, a fim de ção ou suspensão do processo (Lei n.
que o agente possa defender-se. Em 3 CRIMES DE DANO E DE PERIGO 9.099/95, arts. 76 e 89). Sobre o tema,
matéria de Direito Penal Ambiental, isso Embora um dos princípios mais re- vale citar o precedente adiante:
nem sempre é possível. As condutas le- levantes do Direito Ambiental seja o da PROCESSUAL PENAL. CRIME
sivas ao meio ambiente não permitem, prevenção, até a entrada em vigor da AMBIENTAL. PRINCÍPIO DA INSIGNIFI-
na maioria das vezes, uma descrição Lei n. 9.605/98, a maior parte dos cri- CÂNCIA. INAPLICABILIDADE. FLORESTA
direta e objetiva. Não é possível querer mes ambientais estava incluída na espé- NACIONAL DE BRASÍLIA. ANÁLISE DA
no crime ambiental a simplicidade exis- cie de crimes de dano, quais sejam, INEXISTÊNCIA DE NORMA LEGAL
tente nos delitos comuns. Por exemplo, aqueles que só se consumam com a efe- TRANSFORMANDO A ÁREA INVADIDA
o homicídio tem a descrição mais clara tiva lesão do bem jurídico. No passado, EM UNIDADE DE CONSERVAÇÃO SUB-
possível: matar alguém. Mas isso jamais os crimes e contravenções achavam-se METIDA AO JUÍZO A QUO. SUPRESSÃO
será possível em um crime de poluição, em diplomas específicos (v.g., Código DE INSTÂNCIA. 1. A ocupação ainda que
cujas formas são múltiplas e se modifi- Florestal) e não se faziam estudos pro- de pequena área da Floresta Nacional
cam permanentemente. fundos sobre a questão ambiental. En- de Brasília não pode ser considerada
Discorrendo sobre o tipo penal aber- tretanto, como é evidente, a proteção isoladamente, mas sim no contexto ge-
to, esclarece Heleno Cláudio Fragoso penal ambiental melhor se adapta à fi- ral, pois a soma de pequenas áreas pode
existirem tipos em que não aparece ex- gura do crime de perigo, consumado ter uma repercussão prejudicial ao meio
pressa, por completo, a norma que o com a simples possibilidade de dano. ambiente. 2. Inviável a aplicação do
agente transgride com seu comporta- São oportunas as palavras de Eládio princípio da insignificância em matéria
mento, de tal maneira que não se con- Lecey, ao afirmar que mais importante ambiental, pois a biota, conjunto de se-
tém no tipo a descrição completa do do que punir é prevenir danos ao meio res animais e vegetais de uma região,
comportamento delituoso, que depen- ambiente. Pela expressividade do dano pode se revelar extremamente diver-
de da transgressão de normas especiais coletivo em matéria ambiental, impõe- sificada, ainda que em nível local. 3. Li-
que o tipo pressupõe9. São os denomina- se reprimir para que não ocorra o mitando-se a decisão recorrida a rejei-
dos “tipos abertos”. Dentre eles, reporta- dano. Por isso, a tipificação de muitas tar a denúncia com base no princípio
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da insignificância, sem tratar das normas legais que transfor- CÓDIGO FLORESTAL – LEI N. 4.771/65. CORTE DE ÁRVORES EM
maram a área invadida em unidade de conservação, configu- FLORESTA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE SEM AUTORIZAÇÃO.
ra-se supressão de instância a análise do referido tema por Agente que, sem autorização de autoridade competente, abate
ocasião do julgamento deste recurso em sentido estrito. 4. árvores localizadas próximo à margem do córrego, no interior
Recurso em sentido estrito provido14. de propriedade, para comercializar a madeira. Apelo improvido.
Sentença confirmada.
5 CRIMES E CONTRAVENÇÕES PENAIS
ANTES DA LEI N. 9.605/98 6 A LEI N. 9.605/98 – NOVOS TEMPOS
No Brasil, excluindo-se as Ordenações do Reino e a legisla- Na década de 1990, a legislação do meio ambiente já se
ção do Império, foi o Código Florestal de 1934 (Decreto n. achava quase completa. O Brasil contava com a pioneira Lei da
23.793/34) quem fez a primeira previsão de crimes e contra- Política Nacional do Meio Ambiente (Lei n. 6.938/81), com o
venções. Mais tarde, o Código Penal de 1940 dispôs sobre cri- regramento da ação cvil pública (Lei n. 7.437/85), com a Consti-
mes relacionados com a proteção da saúde e que, indiretamen- tuição Federal de 1988 a tratar de forma exemplar a questão
te, protegiam o meio ambiente (v.g., corrupção ou poluição de ambiental (art. 225 e outros) e legislação avulsa de grande rele-
água potável, art. 271). Posteriormente, o novo Código Florestal vância (v.g., Lei n. 7.802/89, agrotóxicos). Faltava, porém, a tutela
(Lei n. 4.771/65) e a Lei de Proteção à Fauna (Lei n. 5.197/67) penal do meio ambiente, complemento indispensável para a ampla
estabeleceram condutas contravencionais. Após a Constituição efetividade. Criada uma comissão de juristas pelo Ministério da
de 1988, sobrevieram tipos penais na Lei dos Agrotóxicos (Lei n. Justiça, encaminhou-se projeto de lei ao Poder Legislativo e, em
7.802/89) e na que introduziu o crime de poluição sob qual- breve prazo, foi aprovado. Daí a vigência da Lei dos Crimes
quer forma (Lei n. 7.804/89). Todavia, aí, o enfoque era setorial, Ambientais – Lei n. 9.605, de 12/02/1998. Sob forte polêmica,
direcionado para aspectos individualizados. criticada por muitos, ela alterou as práticas brasileiras no cuidado
Assim, até então frágil a consciência ecológica e dispersas ao meio ambiente. Para melhor, sem dúvida.
as normas penais em vários diplomas, em regra não muito
conhecidos, o resultado era a existência de poucos preceden- 7 RESPONSABILIDADE PENAL DA PESSOA JURÍDICA
tes. Na verdade, a maior parte deles era oriunda do Tribunal A Constituição Federal de 1988, no art. 225, § 3°, estabeleceu
de Alçada Criminal de São Paulo. O fato se explica pela atua- que as condutas e atividades lesivas ao meio ambiente sujeitarão os
ção firme da Polícia Florestal paulista. Referido órgão promo- infratores, pessoas físicas e jurídicas, às sanções penais e administra-
8 via autuações e comunicava ao Ministério Público. Desse tivas, independentemente da obrigação de reparar os danos causa-
modo, foram sendo propostas ações penais, a maioria absolu- dos. No art. 3° da Lei n. 9.605/98, o legislador especificou essa
ta por contravenções florestais ou à fauna. E a competência responsabilidade penal da pessoa jurídica. Assim, temos no Brasil
para julgar os recursos era da Corte de Alçada que, assim, foi previsão constitucional e legal. Impossível, pois, cogitar de eventual
firmando jurisprudência15. inconstitucionalidade, como ofensa a outros princípios previstos
explícita ou implicitamente na Carta Magna. Se a própria Constitui-
Se a própria Constituição admite expressamente ção admite expressamente a sanção penal à pessoa jurídica, é inviável
a sanção penal à pessoa jurídica, é inviável interpretar a lei como inconstitucional, porque ofenderia outra
norma que não é específica sobre o assunto.
interpretar a lei como inconstitucional, porque
A responsabilidade penal da pessoa jurídica é adotada em
ofenderia outra norma que não é específica muitos países nos crimes contra a ordem econômica e o meio
sobre o assunto. ambiente. Nos países que seguem o sistema da common law, tal
responsabilidade é aceita sem restrições: Inglaterra, Estados Unidos,
Contudo, as penas eram pequenas (3 meses a 1 ano de Canadá, Nova Zelândia e Austrália. Nos países da chamada “família
prisão simples ou multa), e a maioria dos processos prescrevia romano-germânica”, surge forte movimento em tal sentido:
ou originava uma sanção branda. Bom exemplo disso é um Venezuela, França e Colômbia são alguns exemplos.
julgado do Tribunal de Alçada do Rio Grande do Sul16. Prolatado O art. 3° da Lei n. 9.605/98 exige que a infração tenha sido
em tempos mais recentes – década de 1990 – e de maior cometida por decisão do representante legal ou contratual, ou de
conscientização, o acórdão foi bem fundamentado, e o caso seu órgão colegiado, no interesse ou benefício de sua entidade. O
decidido em tempo hábil, de modo a evitar a prescrição. Elogiável, Ministério Público, sempre que possível, deverá instruir a denúncia
portanto. Todavia, a pena, por força da legislação da época, era com cópia do contrato social ou documento análogo, a fim de
incompatível com a gravidade dos fatos. Tratava-se de cidadão informar ao juízo sobre a finalidade da empresa e quem a repre-
que, sem autorização do orgão competente, abateu mais de 300 senta. Já a prova de que o ato foi praticado no interesse ou bene-
árvores que se achavam à beira de um córrego, portanto, mata fício da sociedade deverá ser feita pela pessoa jurídica, pois, eviden-
ciliar. Entre elas, nada menos que 203 pinheiros araucária, árvo- temente, a vantagem é presumida pela simples prática do fato
re que leva cerca de 30 anos para tornar-se adulta. No entanto, delituoso. Por exemplo, se uma empresa de pesca age em
a reprimenda penal ficou em 50 salários mínimos, algo muito desconformidade com as disposições regulamentares, presume-se
aquém da gravidade do dano ambiental. Tudo porque os juízes que o faz em seu benefício, a fim de que seus lucros sejam maiores.
estavam atrelados a uma legislação antiga e inadequada, qual A ela, portanto, cabe provar o contrário.
seja, o Código Florestal de 1965. Eis a ementa do julgado: DELI- No que toca à ação penal, o ideal seria que a Lei n. 9.605/
TO CONTRA A PRESERVAÇÃO PERMANENTE DE FLORESTAS. 98 tivesse estabelecido regras processuais específicas para as
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pessoas jurídicas. A omissão legislativa foi do estrito, reformou decisão do juiz de fruto de decisão de seu representante
lamentável, mas nem por isso há qual- primeiro grau e recebeu denúncia con- legal ou contratual, ou de seu órgão
quer inconstitucionalidade ou ilegalida- tra pessoa jurídica em caso de crime de colegiado, ainda que esta decisão te-
de no fato de a ação penal seguir o rito poluição de rio19. No entanto, a mesma nha sido informal ou implícita. 3. Os
do Código de Processo Penal. Não há Corte estadual já havia decidido em sen- consórcios são mera união de pessoas
nulidade sem prejuízo, e a utilização de tido oposto20. jurídicas e, por não terem personalida-
regras processuais do estatuto próprio é O Tribunal Regional Federal da 4ª Re- de jurídica, não respondem por crimes
a via adequada. O importante é possibili- gião proferiu a primeira decisão ambientais praticados por suas com-
tar à pessoa jurídica denunciada o exer- condenatória da América Latina envolven- ponentes, seus representantes ou em-
cício da ampla defesa, uma garantia cons- do pessoa jurídica: pregados. 4. É inepta a denúncia que
titucional. Portanto, dada a denúncia, a CRIME CONTRA O MEIO AMBIEN- de forma genérica e sem especificar a
citação far-se-á na pessoa do represen- TE. EXTRAÇÃO DE PRODUTO MINERAL ação ou omissão de cada denunciado,
tante legal da empresa, cujo nome e qua- SEM AUTORIZAÇÃO. DEGRADAÇÃO DA três pessoas jurídicas e oito pessoas fí-
lificação deverão estar na peça inicial. O FLORA NATIVA. ARTS. 48 E 55 DA LEI N. sicas, atribui-lhes a prática de crimes
interrogatório deverá ser feito na pessoa 9.605/98. CONDUTAS TÍPICAS. RESPON- ambientais sem levar em conta se o
do presidente da companhia ou de quem SABILIDADE PENAL DA PESSOA JURÍDI- Departamento Nacional de Produção
ele indicar. A colheita da prova testemu- CA. CABIMENTO. NULIDADES. INOCOR- Mineral deu ou não autorização para
nhal ou pericial, bem como a apresenta- RÊNCIA. PROVA. MATERIALIDADE E AU- os acusados explorarem recursos mi-
ção de alegações finais, terão tratamento TORIA. SENTENÇA MANTIDA. 1. Segundo nerais e sem especificar que tipo de uni-
idêntico ao dado às pessoas naturais. Em entendimento doutrinário e juris- dade de conservação foi atingida, de
suma, não se vê maior dificuldade na fal- prudencial predominante, a Constituição que forma, e a serviço de que pessoa
ta de regras processuais específicas. Federal (art. 225, § 3°), bem como a Lei jurídica agiram22.
As penas impostas às pessoas jurídi- n. 9.605/98 (art. 3°), inovaram o PENAL. CRIME AMBIENTAL. CAU-
cas não acompanham cada tipo penal. ordenamento penal pátrio, tornando SAR POLUIÇÃO AO MEIO AMBIENTE
Elas se acham nos arts. 21 a 24 da Lei n. possível a responsabilização criminal da MEDIANTE O LANÇAMENTO DE ESGO-
9.605/98, excluída a pena corporal. Na pessoa jurídica. 2. Nos termos do art. 563 TO EM ARROIO. MATERIALIDADE E AU-
Lei dos Crimes Ambientais, será raríssimo do Código de Processo Penal, nenhum TORIA. Suficiente para configuração
alguém cumprir pena de prisão, pois as ato será declarado nulo, se dele não re- da materialidade e autoria do art. 54, 9
condenações inferiores a quatro anos sultar prejuízo à defesa (pas de nullité caput, § 4º, incs. IV e V, da Lei n. 9.605/
admitem substituição por penas restriti- sans grief). 3. Na hipótese em tela, restou 98 a prova de que dejetos oriundos da
vas de direitos (art. 7°, I). Portanto, no evidenciada a prática de extrair minerais atividade de um hotel administrado
caso das pessoas jurídicas, as sanções sem autorização do DNPM, nem licença pelo acusado eram lançados em ar-
serão a multa, a pena restritiva de direi- ambiental da Fatma, impedindo a rege- roio fluvial apresentando índices de
tos ou a prestação de serviços à coletivi- neração da vegetação nativa do local. 4. coliformes fecais acima do permitido
dade. Vejamos como os tribunais brasi- Apelo desprovido21. em Resolução do Conama23.
leiros se posicionam diante do novo tema. No mesmo Tribunal outras relevantes PROCESSO PENAL. CRIME
O extinto Tribunal de Alçada Crimi- decisões foram proferidas: AMBIENTAL. ARTS. 40 E 48 DA LEI N.
nal de São Paulo registrou dois importan- CONSTITUCIONAL. MANDADO 9.605/98. PESSOA JURÍDICA. RESPON-
tes precedentes envolvendo ações penais DE SEGURANÇA. PROCESSO PENAL SABILIDADE PENAL. PARTE PASSIVA LE-
contra pessoa jurídica, ambas trancadas. AMBIENTAL. AMPLA DEFESA. DENÚN- GÍTIMA. INÉPCIA DA DENÚNCIA. ART.
No primeiro, cuja via processual foi o CIA INEPTA. CONSTITUIÇÃO FEDERAL, 41, CPP. JUSTA CAUSA PARA AÇÃO PE-
mandado de segurança, decidiu o ART. 5°, INC. LV. CPP, ART. 41. LEI N. NAL. ART. 43, CPP. MATÉRIA DE FATO.
TACRIM17 que o art. 3º da Lei n. 9.605/98, 9.605/1998, ARTS. 40 E 55, TENTATIVA EXAME EM SEDE DE MANDADO DE SE-
ao determinar que a infração seja cometi- DE EXTRAÇÃO DE RECURSOS NATU- GURANÇA. IMPOSSIBILIDADE. 1. A res-
da por decisão de seu representante legal RAIS. DANO À UNIDADE DE CONSER- ponsabilidade penal das pessoas jurí-
ou contratual, exige dolo específico, ou VAÇÃO. 1. Estando a responsabilidade dicas está prevista no art. 225, § 3º, da
seja, deve reclamar um particular escopo penal das pessoas jurídicas prevista no CF bem como no art. 3º da Lei n. 9.605/
ou motivo. No segundo, valeu-se o art. 225, § 3°, da Constituição Federal 98. Assim, podem figurar no pólo pas-
impetrante do habeas corpus, via que nos e no art. 3° da Lei n. 9.605/1998, sivo de ação penal pela prática de cri-
parece inadequada ao caso, tendo decidi- descabe criar interpretações destinadas me ambiental, por ação ou omissão de-
do o mesmo tribunal18 que, tendo a ré, a reconhecer como inconstitucional o corrente de decisão de seu represen-
denunciada por infração ao art. 60 da Lei que a Constituição criou, pois é veda- tante legal ou contratual. 2. Em sede
n. 9.605/1998, celebrado compromisso do ao juiz substituir-se à vontade do de mandado de segurança, só cabe o
com o órgão ambiental, seguindo o dis- constituinte e do legislador, ainda que trancamento da ação penal por au-
posto na Medida Provisória n. 1.710/1998, dela possa discordar. 2. As pessoas ju- sência de justa causa em situações es-
não havia justa causa para a ação penal. rídicas podem ser processadas por cri- peciais, ou seja, quando a negativa de
O Tribunal de Justiça de Santa me ambiental, todavia, a denúncia deve autoria é evidente ou quando o fato
Catarina, examinando recurso em senti- mencionar que ação ou omissão foi narrado não constitui crime, ao menos
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em tese, ou mesmo em situações em que não é necessária a não apenas de punição das condutas lesivas ao meio ambiente,
instrução criminal para tal percepção24. mas como forma mesmo de prevenção geral e especial. IV. A impu-
O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul já teve ocasião de tação penal às pessoas jurídicas encontra barreiras na suposta
apreciar recurso em sentido estrito em que pessoa jurídica era incapacidade de praticarem uma ação de relevância penal, de
acusada de crime ambiental e assim decidiu: serem culpáveis e de sofrerem penalidades. V. Se a pessoa jurídica
tem existência própria no ordenamento jurídico e pratica atos no
No que toca à ação penal, o ideal seria que meio social através da atuação de seus administradores, poderá vir
a Lei n. 9.605/98 tivesse estabelecido regras a praticar condutas típicas e, portanto, ser passível de
responsabilização penal. VI. A culpabilidade, no conceito moderno,
processuais específicas para as pessoas jurídicas. é a responsabilidade social, e a culpabilidade da pessoa jurídica,
A omissão legislativa foi lamentável (...) neste contexto, limita-se à vontade do seu administrador ao agir em
seu nome e proveito. VII. A pessoa jurídica só pode ser responsabili-
PENAL – PROCESSO PENAL – RESPONSABILIDADE PENAL zada quando houver intervenção de uma pessoa física, que atua
DA PESSOA JURÍDICA – CRIME AMBIENTAL – IMPOSSIBILIDADE em nome e em benefício do ente moral. VIII. De qualquer modo, a
JURÍDICA DO PEDIDO – RECURSO IMPROVIDO. Falta justa pessoa jurídica deve ser beneficiária direta ou indiretamente pela
causa à ação penal proposta contra pessoa jurídica a quem é conduta praticada por decisão do seu representante legal ou
atribuída prática de crime ambiental definido na Lei n. 9.605/ contratual ou de seu órgão colegiado. IX. A atuação do colegiado
98. Para sujeitar a pessoa jurídica à medida penal prevista nos em nome e proveito da pessoa jurídica é a própria vontade da
arts. 21 a 24 da Lei n. 9.605/98, é preciso que o representante empresa. A co-participação prevê que todos os envolvidos no even-
legal ou estatutário da empresa questionada tenha sido acusa- to delituoso serão responsabilizados na medida se sua culpabilida-
do do cometimento de crime ambiental, a ação penal julgada de. X. A Lei Ambiental previu para as pessoas jurídicas penas autôno-
procedente e estabelecida a relação causal prevista em seu art. mas de multas, de prestação de serviços à comunidade, restritivas
3°. Rejeição da denúncia que desatende tal exigência mantida25. de direitos, liquidação forçada e desconsideração da pessoa jurídi-
O Superior Tribunal de Justiça, em um primeiro momen- ca, todas adaptadas à sua natureza jurídica. XI. Não há ofensa ao
to, posicionou-se, por meio da sua 5ª Turma, contra a respon- princípio constitucional de que “nenhuma pena passará da pessoa
sabilidade penal da pessoal jurídica, conforme se vê do prece- do condenado...”, pois é incontroversa a existência de duas pessoas
dente adiante: distintas: uma física – que de qualquer forma contribui para a
10 PENAL E PROCESSUAL PENAL. RECURSO ESPECIAL. CRIMES prática do delito – e uma jurídica, cada qual recebendo a punição
CONTRA O MEIO AMBIENTE. DENÚNCIA. INÉPCIA. RESPONSABILI- de forma individualizada, decorrente de sua atividade lesiva. XII. A
DADE PENAL DA PESSOA JURÍDICA. RESPONSABILIDADE OBJETI- denúncia oferecida contra a pessoa jurídica de direito privado deve
VA. Na dogmática penal, a responsabilidade se fundamenta em ser acolhida, diante de sua legitimidade para figurar no pólo pas-
ações atribuídas às pessoas físicas. Dessarte a prática de uma infra- sivo da relação processual-penal. XIII. Recurso provido, nos termos
ção penal pressupõe necessariamente uma conduta humana. Logo, do voto do Relator27.
a imputação penal a pessoas jurídicas, frise-se, carecedoras de ca- A 6ª Turma da Corte Superior, em julgamento mais recen-
pacidade de ação, bem como de culpabilidade, é inviável em razão te, trancou ação penal movida contra pessoa jurídica, sob o
da impossibilidade de praticarem um injusto penal. (Precedentes do fundamento de que ela só pode ser responsabilizada junto com
Pretório Excelso e desta Corte). Recurso desprovido26. a pessoa física responsável:
Todavia, meses mais tarde a mesma Turma assumiu posi- RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA.
ção favorável à criminalização dos entes corporativos: DIR EITO PROC ESSUAL PENAL. CRI ME AM BI ENTAL.
CRIMINAL. CRIME AMBIENTAL PRATICADO POR PESSOA JU- RESPONSABILIZAÇÃO DA PESSOA JURÍDICA. POSSIBILIDADE.
RÍDICA. RESPONSABILIZAÇÃO PENAL DO ENTE COLETIVO. POSSI- TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. INÉPCIA DA DENÚNCIA.
BILIDADE. PREVISÃO CONSTITUCIONAL REGULAMENTADA POR OCORRÊNCIA. 1. Admitida a responsabilização penal da pes-
LEI FEDERAL. OPÇÃO POLÍTICA DO LEGISLADOR. FORMA DE PRE- soa jurídica, por força de sua previsão constitucional, requisita
VENÇÃO DE DANOS AO MEIO AMBIENTE. CAPACIDADE DE AÇÃO. a actio poenalis, para a sua possibilidade, a imputação simul-
EXISTÊNCIA JURÍDICA. ATUAÇÃO DOS ADMINISTRADORES EM tânea da pessoa moral e da pessoa física que, mediata ou
NOME E PROVEITO DA PESSOA JURÍDICA. CULPABILIDADE COMO imediatamente, no exercício de sua qualidade ou atribuição
RESPONSABILIDADE SOCIAL. CO-RESPONSABILIDADE. PENAS conferida pelo estatuto social, pratique o fato-crime, atenden-
ADAPTADAS À NATUREZA JURÍDICA DO ENTE COLETIVO. RECUR- do-se, assim, ao princípio do nullum crimen sine actio humana.
SO PROVIDO. I. Hipótese em que pessoa jurídica de direito privado, 2. Excluída a imputação aos dirigentes responsáveis pelas con-
juntamente com dois administradores, foi denunciada por crime dutas incriminadas, o trancamento da ação penal, relativa-
ambiental, consubstanciado em causar poluição em leito de um rio, mente à pessoa jurídica, é de rigor. 3. Recurso provido. Ordem
através de lançamento de resíduos, tais como, graxas, óleo, lodo, de habeas corpus concedida de ofício28.
areia e produtos químicos, resultantes da atividade do estabeleci-
mento comercial. II. A Lei Ambiental, regulamentando preceito cons- 8 JURISPRUDÊNCIA DOS CRIMES AMBIENTAIS NA LEI
titucional, passou a prever, de forma inequívoca, a possibilidade de N. 9.605/98
penalização criminal das pessoas jurídicas por danos ao meio am-
biente. III. A responsabilização penal da pessoa jurídica pela prática 8.1 FAUNA
de delitos ambientais advém de uma escolha política, como forma CRIME AMBIENTAL. CAÇA E VENDA DE ANIMAIS SILVES-
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TRES. CONDENAÇÃO MANTIDA. A prova desferimento do tiro que atingiu a lebre. NHA DO ARVOREDO. AUTORIA E
deitada nos autos deixa estreme de dúvi- Relatos das testemunhas aptos a integrar MATERIALIDADE COMPROVADAS. Tendo
das a caça e comercialização de animais um contexto probatório firme e seguro a o agente sido flagrado em barco dentro
silvestres, inclusive ameaçados de amparar o édito condenatório, sobretudo de local proibido para pesca Reserva Bio-
extinção. A alegação de consumo pró- quando não há indicativo concreto de que lógica do Arvoredo, no Estado de Santa
prio não socorre ao recorrente, sobretu- tivessem qualquer interesse em prejudicar Catarina, com três quilos de pescado, con-
do considerando a quantidade de aves o réu, imputando-lhe falsamente a prática figurada está a prática delituosa prevista
apreendidas. Ainda, a falta de provas do delito. O uso da arma ou sua manu- no art. 34 da Lei n. 9.605/9832.
quanto ao fato de ter sido o acusado tenção no interior da residência ou em PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. AR-
presenteado com as carcaças de veado dependência desta, não torna atípica a TIGO 34, CAPUT, E INC. II DA LEI N.
e jacu, animais considerados em extinção, conduta, porquanto imprescindível por lei 9605/98. PRELIMINARES. COMPETÊN-
transmuda a presunção decorrente da o certificado de registro e a autorização CIA DA JUSTIÇA FEDERAL. NULIDADE.
apreensão em certeza, escorando a da autoridade competente para portar a DEVIDO PROCESSO LEGAL. AMPLA DE-
majorante do art. 29, § 4º, inc. I, da Lei n. arma. Inteligência dos arts. 4º e 6º da Lei FESA. SUSPENSÃO CONDICIONAL DO
9.605/98. Condenação mantida29. n. 9.437/97. O tão-só fato de as armas PROCESSO. TRANSAÇÃO PENAL. PEIXES
APELAÇÃO CRIME. PORTE ILEGAL DE estarem desmuniciadas, no momento da AMEAÇADOS DE EXTINÇÃO. IRRELE-
ARMA. ART. 10, CAPUT, DA LEI N. 9.437/ apreensão, não tem o condão de VÂNCIA. INDIVIDUALIZAÇÃO DA PENA.
97. CRIME CONTRA A FAUNA. ART. 29, descaracterizar o crime previsto no art. 10 AMPLO EFEITO DEVOLUTIVO DA APE-
CAPUT, DA LEI N. 9.605/98. CONCURSO da Lei n. 9.437/97, uma vez que o LAÇÃO. PRELIMINARES REJEITADAS.
MATERIAL. – PRELIMINAR. COMPETÊNCIA. municiamento não constitui elemento in- APELAÇÃO IMPROVIDA. REDUÇÃO DA
TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Denunciado o ape- tegrante do tipo penal em tela. Crime de PENA DE OFÍCIO. 1. Delito ocorrido em
lante pela prática do delito previsto no art. perigo abstrato e de mera conduta em rio federal (rio Sapucaí), consoante o
10, caput, da Lei n. 9.437/97, em concurso que a situação de perigo é presumida, in- Ofício n. 403 do IBAMA, o que determi-
material com o crime ambiental tipificado dependentemente da intenção do agente. na a competência da Justiça Federal,
no art. 29, caput, da Lei n. 9.605/98, cuja Condenação mantida. Continuidade nos termos do art. 109 da CF. 2. Afasta-
soma das penas máximas abstratamente delitiva. Afastamento. Crime único. Tendo da a preliminar de nulidade do feito
previstas ultrapassa o patamar de 2 anos, a apreensão das duas armas e da muni- por inobservância dos princípios do de-
a competência para apreciação da ape- ção, em poder do acusado, ocorrido no vido processo legal e da ampla defesa, 11
lação é desta Corte e não das Turmas mesmo contexto fático, lesando apenas por falta de intimação para a realiza-
Recursais. Prefacial afastada. Juntada de uma vez o bem jurídico tutelado, seguran- ção dos interrogatórios. Apelantes ci-
documentos após a fase instrutória. Possi- ça pública, resta caracterizado um único tados para os interrogatórios, que não
bilidade. No âmbito do processo penal, crime de porte ilegal de arma, impondo- ocorreram por ausência do advogado
ressalvados os casos expressamente pre- se, portanto, o afastamento da continui- de defesa e do réu José Ricardo. 3. A
vistos em lei, é facultada às partes a apre- dade delitiva e do acréscimo de pena cor- proposta de suspensão condicional do
sentação de documentos, em qualquer respondente. Redimensionamento da pena. processo é faculdade do Parquet Fe-
fase do processo, ainda que posteriormente Corporal definitivada em 1 ano e 6 anos deral justifica-se a retirada após nova
à sentença. Inteligência dos arts. 231 e 400 de detenção. Preliminar rejeitada. Apela- análise dos autos, que concluiu pela
do CPP. Indeferimento do pleito de ção parcialmente provida30. ausência dos requisitos do art. 89 da
desentranhamento dos documentos jun- Lei n. 9.099/95, em razão do concurso
tados pela defesa, com as razões recursais. 8.2 PESCA formal de infrações penais. Súmula 243
Mérito condenatório. Manutenção. PENAL. CRIME AMBIENTAL CON- do Superior Tribunal de Justiça. 4. Não
Suficiência probatória a ensejar a conde- TRA A FAUNA MARINHA. PESCA EM LO- restou caracterizado o prejuízo a acar-
nação do réu pelos delitos tipificados no CAL PROIBIDO. BAÍA DO NORTE. ESTA- retar a alegada nulidade do feito. Os
art. 10, caput, da Lei n. 9.437/97 e art. 29, DO DE SANTA CATARINA. PORTARIA 051/ réus foram intimados para compare-
caput, da Lei n. 9.605/98. Materialidade e 83 E ART. 34 DA LEI N. 9.605/98. AUTO- cer à audiência, cientes da possibilida-
autoria inequivocamente demonstradas RIA E MATERIALIDADE COMPROVADOS. de da suspensão condicional do pro-
pelas provas carreadas ao feito. Validade Quem pesca em período no qual a pes- cesso e também desta não ocorrer, por
do ato de apreensão, realizado por poli- ca seja proibida ou em lugares interdi- várias razões, inclusive a não-aceita-
ciais militares. A imprestabilidade do ates- tados pelo órgão competente comete o ção das condições pelos próprios réus.
tado que dá conta da espécie de animal delito previsto no art. 34 da Lei n. 9.605/ 5. Autoria e materialidade delitiva de-
apreendido, caracterizada pela ausência 98. Hipótese em que o agente, contra- monstrada nos autos. 6. A Lei Am-
de portaria de nomeação, restou suprida riando as disposições contidas na Por- biental prevê a transação penal para
por outros elementos de provas produzi- taria n. 051/83, do Estado de Santa os delitos de menor potencial ofensivo,
dos, em especial, pela prova oral encartada, Catarina, efetuou pesca de arrasto em todavia, o crime praticado pelos ape-
que não deixa dúvidas de que o animal local proibido (Baía do Norte)31. lantes prevê a pena máxima de três
abatido tratava-se de animal silvestre. Réu PENAL. CRIME AMBIENTAL. ART. 34 anos. Além disso, o juízo a quo, ao fixar
que admitiu o transporte das espingardas DA LEI N. 9.605/98. PESCA EM LOCAL a pena, substituiu a pena privativa de
e da munição apreendidas, bem como o PROIBIDO. RESERVA BIOLÓGICA MARI- liberdade por restritiva de direitos, o
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que torna inócua a aplicação do art. 27 da Lei n. 9.605/98. ção. 3. Apelo improvido37.
7. É irrelevante a alegação de que os peixes capturados são PROCESSO PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME DE
comuns e não aqueles ameaçados de extinção, pois o tipo DANO À UNIDADE DE CONSERVAÇÃO. PRESENÇA DE REBA-
penal proíbe a pesca no período da piracema e não NHO BOVINO EM PARQUE NACIONAL APÓS A VIGÊNCIA DA
condiciona a proibição a determinadas espécies. 8. Um dos LEI N. 9.605/98. CONFIGURAÇÃO DO CRIME DEFINIDO NO
apelantes confessou a pesca com tarrafa em local proibido e ART. 40 DA LEI N. 9.605/98. 1. Comprovada a manutenção,
detalhou a divisão de tarefas, fato relevante para a decisão por parte dos réus, de rebanho bovino dentro do Parque
condenatória. Redução da pena – base de ofício. Os demais Nacional do Araguaia, após a edição da Lei n. 9.605/98,
apelantes tiveram a pena fixada no mínimo legal. 9. Prelimi- ocasionando dano direto e indireto à unidade de conserva-
nares rejeitadas e apelação a que se dá provimento33. ção, não há de se falar na atipicidade de sua conduta. 2.
PENAL. CRIME AMBIENTAL. ART. 34, CAPUT, PARÁGRAFO Presentes, na espécie, os elementos de autoria e de
ÚNICO, II, DA LEI N. 9.605/98. AUSÊNCIA DE PROVA DA SITUAÇÃO materialidade a permitir o enquadramento da conduta dos
DE PERIGO AO ECOSSISTEMA. CRIME FORMAL. DESNECESSIDADE agentes no tipo penal previsto no art. 40 da Lei n. 9.605/98.
DE EXAME PERICIAL. AUTORIA COMPROVADA. ERRO DE PROIBI- 3. Apelação improvida38.
ÇÃO NÃO CONFIGURADO. APELAÇÃO MINISTERIAL. CRIME AMBIENTAL. ART. 41 DA
1. O delito previsto no art. 34, caput, parágrafo único, II, LEI N. 9.605/98. PROVIMENTO. A ação delituosa consiste em
da Lei n. 9.605/98 caracteriza crime formal, em virtude da provocar incêndio em mata ou floresta, ou seja, extensão de
definição legal da conduta “pescar” como “todo ato tenden- terra onde se agrupam árvores39.
te” a retirar, extrair, coletar, apanhar, apreender ou captu- DIREITO FISCAL E AMBIENTAL. CORTE DE ARAUCÁRIAS
rar espécies dos grupos de peixes, crustáceos etc. Não se QUE ENSEJOU MULTA INSCRITA EM DÍVIDA ATIVA. PRÉVIA
exige, portanto, a produção do resultado para a sua consu- ADVERTÊNCIA ANTES DA APLICAÇÃO DA MULTA. DESNECES-
mação, bastando apenas a realização da conduta descrita SIDADE. ART. 45 DA LEI N. 9.605/98 E ART. 31 DO DECRETO
no tipo do art. 36 da Lei n. 9.605/98. 2. A confissão do N. 3.179/99. SUBSTITUIÇÃO DA MULTA PELA REPARAÇÃO DO
acusado, roborada por depoimentos de testemunhas, é DANO CAUSADO AO MEIO AMBIENTE. DESCABIMENTO. ART.
satisfatória para a comprovação da autoria do delito. 3. 225, § 3º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL E ART. 14, § 1º, DA LEI
Para configurar o erro de proibição, é necessário que o N. 6.938/81. I. A gravidade do dano causado pelo apelante
agente suponha, por erro, que seu comportamento é lícito. configura crime ambiental, não havendo, neste caso, a
12 4. Apelação do réu desprovida34. benesse de uma prévia advertência à multa aplicada. Art. 45
da Lei n. 9.605/98 e art. 31 do Decreto n. 3.179/99. II. Não
8.3 FLORA há como cogitar a substituição do pagamento da multa
PENAL. CRIME AMBIENTAL. PARQUE INDÍGENA DO ARAGUAIA. pecuniária pela reparação dos danos causados ao meio
ILHA DO BANANAL. OCUPAÇÃO POR CRIADORES DE GADO. ambiente, forte nos arts. 225, § 3º, da CF, e 14, § 1º, da Lei n.
1. A ocupação periódica de terras do Parque Indígena 6.938/81. Apelo improvido40.
do Araguaia, na Ilha do Bananal/TO, por criadores de gado, APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME AMBIENTAL. LEI N. 9.605/
segundo o ciclo das águas, não configura o crime do art. 39 98. TRANSPORTE DE PALMITOS. 1. Pela dicção do art. 46,
da Lei n. 9.605/98 (“Destruir ou danificar floresta considera- parágrafo único da Lei n. 9.605/98, o simples fato de trans-
da de preservação permanente...”), a menos que a denúncia portar os palmitos já constitui prática de ilícito penal. 2.
descreva todas as elementares do tipo. 2. Tendo a ocupação Inescusável, à luz do disposto no art. 21 do CP, a alegação
sido discutida em ação cível, com o reconhecimento da boa- do réu de que não sabia acerca da legislação que protege a
fé na atividade dos criadores de gado, inclusive com o direito cultura do palmito, embora comercializasse o produto há
à indenização por benfeitorias, tal conduta não pode, sem a vinte anos. 3. Negado provimento ao recurso41.
quebra da noção de sistema jurídico, ser considerada como APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO ADMINISTRATIVO E PROCES-
invasão, com a intenção de ocupá-las, de terras da União SUAL. TERRAPLANAGEM E ESTOQUE DE ÁREAS RURAIS. DANO
(art. 20, Lei n. 4.947/66). 3. Improvimento do recurso em AMBIENTAL CONCRETIZADO. INEXISTÊNCIA DE AUTORIZA-
sentido estrito35. ÇÃO. MULTA E APREENSÃO DE TRATOR. PROCEDÊNCIA NA
CRIME AMBIENTAL. CORTE DE ÁRVORES. Comete o deli- ORIGEM. APREENSÃO ADMINISTRATIVA. POSSIBILIDADE.
to do art. 39 da Lei n. 9605/98 o agente que corta árvores, IMPROVIMENTO EM GRAU RECURSAL. SENTENÇA QUE SE
sem autorização da autoridade competente, em floresta con- MANTÉM. 1. Nos termos do que prevê o art. 35 da Lei n.
siderada de preservação permanente. Apelo desprovido36. 4.771/65 (Código Florestal), assim como o artigo 25 da Lei
PENAL. PROCESSUAL PENAL. CRIME AMBIENTAL – FLO- n. 9.605/98, é possível apreensão administrativa como medi-
RA. ART. 40 DA LEI N. 9.605/98. AUTORIA E MATERIALIDADE da preventiva pela prática de crime ambiental, como meca-
DEMONSTRADAS. SENTENÇA CONDENATÓRIA MANTIDA. 1. nismo para coibir a ação dos que desrespeitam o meio am-
Demonstrado pelo conjunto probatório que o agente cau- biente. 2. Apresenta-se inviável a anulação da apreensão do
sou dano ao Parque Nacional do Araguaia, Unidade de Con- veículo sem o desate da ação penal correspondente, porque
servação Ambiental, a manutenção da r. sentença a apreensão do instrumento usado na prática do crime
condenatória é medida que se impõe. 2. Não é necessária a ambiental está intimamente ligada àquele resultado. Apela-
presença física do autor mediato no local do delito. Pode o ção não-provida42.
mesmo se valer de outras pessoas para a prática da infra- PENAL. CRIME CONTRA O MEIO AMBIENTE. ARTIGOS 50 E

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60 DA LEI N. 9.605/98. DRAGAGEM DE a possibilidade de aplicação do art. 77 par de inexistente a chancela da autori-
CANAL EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO do mesmo Codex. No caso, consideran- dade dita competente, a atividade de-
AMBIENTAL. OBRA DE INTERESSE PÚBLI- do que o recorrido foi condenado à senvolvida desatendeu as normas legais
CO. OBTENÇÃO DE LICENÇA. REGULARI- pena de detenção de 6 meses, substitui- e regulamentares pertinentes. Por fim, a
ZAÇÃO DA ATIVIDADE. AUSÊNCIA DE JUS- se a pena privativa de liberdade por uma ausência dos originais de documentos é
TA CAUSA. REJEIÇÃO DA DENÚNCIA. 1. restritiva de direitos, a saber, por presta- circunstância irrelevante, sobretudo
Na hipótese em tela, restou demonstrado ção de serviços à comunidade, em insti- quando lavrados por repartição públi-
que, mediante requerimento da comuni- tuição a ser definida pelo Juízo da Exe- ca, que gozam da presunção de veraci-
dade, o prefeito municipal autorizou a cução Penal, mantendo-se a pena de dade, em detrimento do rigorismo for-
dragagem do leito de um canal, a fim de multa aplicada, com fulcro no art. 58 mal. Note-se, ainda, que no caso os ori-
possibilitar aos pescadores locais acesso à do CP. IV – Recurso conhecido e parcial- ginais foram juntados quando da fase
Baía de Guaratuba, dificultado pelo mente provido44. recursal, reforçando a validade da pro-
assoreamento do curso d’água. 2. va. Apelo provido47.
Concomitantemente ao início das obras, 8.4 POLUIÇÃO PENAL. EXTRAÇÃO DE RECURSO MI-
restou requerida ao Instituto Ambiental do POLUIÇÃO SONORA. CRIME NERAL SEM AUTORIZAÇÃO. ARGILA. ART.
Paraná a expedição de licença, a qual só AMBIENTAL. O art. 54, caput, da Lei n. 9605/ 2º DA LEI N. 8.176/91 E ART. 55 DA LEI N.
foi expedida alguns meses depois, devido 98 diz respeito às condutas lesivas ao meio 9.605/98. CONCURSO FORMAL.
aos trâmites burocráticos. 3. Nesse con- ambiente, não guardando qualquer rela- INEXISTÊNCIA. CONFLITO APARENTE DE
texto, além da operação de dragagem ter ção com a poluição sonora. Negado provi- NORMAS. CONFIGURADO. SOLUÇÃO
sido motivada por relevante interesse so- mento ao apelo ministerial45. DADA PELA DOUTRINA. 1. O conflito apa-
cial, em face da situação de urgência da CRIME AMBIENTAL. POLUIÇÃO DEVE rente se instala quando, havendo duas ou
comunidade que sobrevive da pesca, cer- SER DE TAL ORDEM QUE CAUSE DANOS mais normas incriminadoras e um fato
to é que o denunciado protocolou pedido OU PONHA EM RISCO A SAÚDE HUMA- único, o agente, mediante uma única ação
de autorização e logrou obter a respecti- NA, OU PROVOQUE MORTANDADE DE ou omissão, ofende (aparentemente) tais
va licença ambiental, regularizando as ati- ANIMAIS OU DESTRUIÇÃO SIGNIFICATI- normas (na hipótese, uma norma previs-
vidades, ainda que posteriormente à VA DA FLORA. SUSPENSÃO CONDICIO- ta em lei ambiental e outra na lei que trata
lavratura do auto de infração. 4. Denún- NAL DO PROCESSO. IMPOSSIBILIDADE. dos crimes contra a ordem econômica).
cia que se rejeita, por mostrar-se evidencia- PRINCÍPIO DA ABSORÇÃO. INAPLI- No conflito aparente de normas há uni- 13
da a ausência de justa causa para a ins- CABILIDADE. 1. Poluição em apoucada dade do fato e pluralidade de normas. A
tauração da persecutio criminis in judicio43. quantidade e causada por matéria orgâ- ofensa ao mundo naturalístico ocorre
I – PENAL. CRIME AMBIENTAL E nica, distante de fontes de rios ou manan- uma única vez. 2. Praticando o agente a
PORTE DE ARMA. II – IMPUTAÇÃO AO ciais de água, facilmente reabsorvível pela lavra clandestina de argila (Lei n. 9.605/
TIPO OBJETIVO E PRINCÍPIO DA ESPE- própria natureza não é passível de puni- 98, art. 55), não lhe pode ser imputado,
CIALIDADE. III – SUBSTITUIÇÃO DA ção. 2. Impossibilidade de aplicação da também, o crime previsto no art. 2º da Lei
PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE. APLI- suspensão prevista no art. 89 da Lei n. n. 8.176/91 (explorar matéria-prima per-
CAÇÃO ANTERIOR AO SURSIS. IV – AB- 9099/95, por estar o acusado, na época, tencente à União Federal sem autoriza-
SOLVIÇÃO MANTIDA. I – As armas, no respondendo a outro processo criminal. ção legal ou em desacordo com as obri-
contexto, assumem a condição de ins- 3. Inaplicável o princípio da absorção do gações impostas pelo título autorizativo).
trumentos próprios para caça, integran- delito do art. 60 em relação ao delito pre- 3. Havendo concurso aparente de nor-
do o tipo penal especial, dadas as ca- visto no art. 54, ambos da Lei n. 9.605/98, mas, deve o juiz valer-se do princípio da
racterísticas. A conduta de portar ar- porque a licença do órgão ambiental é especialização e proceder à subsunção
mas, naquelas circunstâncias, não se requisito para o funcionamento de ativi- adequada, aplicando apenas um dos pre-
amolda ao tipo do art. 10 da Lei n. dade potencialmente poluidora. Negado ceitos legais, qual seja, o que melhor se
9.437/97, mas sim àquele que está des- provimento ao apelo defensivo46. ajusta à conduta praticada, sob pena de
crito de forma especial no art. 52 da Lei CRIME AMBIENTAL. POLUIÇÃO. bis in idem. 4. Para que esteja caracteriza-
n. 9.605/97. II – Ainda que se dê por FUNCIONAMENTO DE ESTABELECIMEN- do o concurso formal, é necessário que a
superada a tese da simples imputação TO IRREGULAR E EM DESACORDO COM conduta comissiva ou omissiva produza
ao tipo penal, com base na subsunção AS REGRAS LEGAIS E REGULAMENTARES. mais de um resultado naturalístico, simul-
da conduta a ele, não se pode olvidar Induvidosa, no caso, a natureza taneamente. 5. Recurso não-provido48.
que a própria doutrina faz menção a poluidora da atividade desenvolvida
que, por ser de rigor mais técnico, o prin- pelo acusado, a ensejar o decreto conde- 8.5 ORDENAMENTO URBANO E
cípio da especialidade é o que melhor natório pelo crime de poluição. Ainda, o PATRIMÔNIO CULTURAL
soluciona os casos de conflito aparente delito ecológico em análise é de perigo, PENAL. CRIME AMBIENTAL. ART.
de normas, o que também poderia ser- sendo irrelevante a existência de efetivo 62, I, DA LEI N. 9.605/98. OBRA EM
vir de argumento para o caso ora em dano à saúde humana, senão para fins SÍTIO ARQUEOLÓGICO. MATERIA-
julgamento. III – Somente se a substitui- de exasperamento de pena. Igual modo, LIDADE E AUTORIA DEFINIDAS. ERRO
ção da pena, nos termos do art. 44 do procede a acusação concernente ao tipo DE TIPO NÃO-COMPROVADO. DOLO
CP, não for possível, é que se deve aferir do art. 60 da Lei n. 9.605/98, porque, a EVENTUAL. I. A realização de obra so-
Revista CEJ, Brasília, n. 33, p. 5-15, abr./jun. 2006
bre importante sítio arqueológico na região de Imbituba-SC Ambiental, n. 32, p. 305.
constitui crime ambiental de sérias proporções, principal- 22 BRASIL. TRF-4ª Região, 7ª T., AMS n. 2002.04.01.054936-2/SC, rel.
Des. Federal Vladimir Freitas, j. 25/02/2003.
mente pelo fato de que o réu é morador da área e, por força
23 BRASIL. TRF-4ª Região, 8ª Turma, ACR n. 2000.72.04.001531-8/SC,
de sua função, na qualidade de “Diretor Técnico” da empre-
Rel. Des. Fed. Luiz Fernando Wowk Penteado, j. 23/02/2005.
sa de engenharia, não tomou o devido cuidado ao escavar 24 BRASIL. TRF-4ª Região, 7ª Turma, MS n. 2005.04.01.006368-5/SC,
área com fragmentos arqueológicos facilmente identificáveis. Rel. Des. Fed. Tadaaqui Hirose, j. 10/5/2005.
II. Descabida a tese defensiva de ocorrência de erro de tipo 25 BRASIL. TJ-RS, 4ª Câmara Criminal, RESE n. 70003995768, rel. Des.
porquanto o réu, no mínimo, agiu com dolo eventual, não Vladimir Giacomuzzi, j. 31/10/2002.
apresentando prova concreta em favor de seus argumentos. 26 BRASIL. STJ, 5ª Turma, REsp. n. 622.724/SC, Rel. Min. Félix Fischer, j. 18/11/2004.
III. Apelação não-provida49. 27 BRASIL. STJ, 5ª Turma, REsp. n. 564.960/SC, Rel. Min. Gilson Dipp, j.
2/6/2005.
28 BRASIL. STJ, 6ª Turma, ROMS n. 16.696/PR, Rel. Min. Hamilton
9 CONCLUSÃO
Carvalhido, j. 9/2/2006.
A Lei n. 9.605/98 veio completar o arcabouço legislativo de 29 BRASIL.TJ-RS, 4ª Câmara Criminal, AC n. 70010305761, Rel. Des. José
proteção ao meio ambiente. Sua eficácia deve ser reconhecida não Eugênio Tedesco, j. 17/03/2005.
apenas a partir dos precedentes dos tribunais federais e estaduais, 30 BRASIL. TJ-RS, 8ª Câmara Criminal, AC n. 70010753903, j. Rel. Des.
mas sim tendo em vista a existência do enorme número de acordos Fabianne Breton Baisch, j. 15/6/2005.
entre o Ministério Público e os poluidores, feitos diariamente nas 31 BRASIL. TRF-4ª Região 8ª Turma, ACR n. 2003.72.00.007324-2/SC,
Rel. Des. Fed. Paulo Afonso Brum Vaz, j. 18/05/2005.
comarcas existentes nos 26 estados brasileiros e no Distrito Federal.
32 BRASIL. TRF-4ª Região, 8ª Turma, ACR n. 2000.72.00.004576-2/SC,
Cumpre, agora, torná-la mais efetiva, adequá-la às exigências dos
Rel. Des. Fed. Paulo Afonso Brum Vaz, j. 20/4/2005.
tempos contemporâneos, por meio de reformas legislativas ou in- 33 BRASIL. TRF-3ª Região, 1ª Turma, ACR n. 2001.61.13.000417-5/SP, Rel.
terpretações mais atentas à proteção constitucional prevista no art. Des. Fed. Vesna Kolmar, j. 28/9/2004.
225 da Carta Magna. 34 BRASIL. TRF-3ª Região, 5ª Turma, ACR n. 1999.61.02.002568-0 /SP,
Rel. Des. Fed. André Nekatschalow, j. 7/3/2005.
35 BRASIL. TRF-1ª Região, 3ª Turma, RCCR n. 2001.43.00.001396/TO,
REFERÊNCIAS Rel. Des. Fed. Olindo Menezes, 29/9/2004.
36 BRASIL. TJ-RS, 4ª Câmara Criminal, AC n. 70010452936, Rel. Des.
1 Vida. O Estado de S. Paulo, São Paulo, 28 out. 2005. Cad. A, p. 20.
José Eugênio Tedesco, j. 17/3/2005.
2 Folha de S. Paulo, São Paulo, 30 out. 2005. p. 4.
37 BRASIL. TRF-1ª Região, 4ª Turma, ACR n. 1998.43.00.001901-7/TO,
14 3 O Estado de S. Paulo, São Paulo, 27 out. 2005. Cad. A, p. 13.
Rel. Des. Fed. Hilton Queiroz, j. 8/3/2005.
4 O Estado de S. Paulo, São Paulo, 27 out. 2005. Cad. A, p. 18.
38 BRASIL. TRF-1ª Região, 4ª Turma, ACR n. 1998.43.00.001898-1/TO,
5 Zero Hora, Porto Alegre, 29 set. 2005. Ambiente, p. 1.
Rel. Juiz Fed. convocado Marcus Vinícius Reis Bastos.
6 BERIZONCE, Roberto Omar. El juez y la magistratura. Buenos Aires:
39 BRASIL. TJ-RS, 4ª Câmara Criminal, AC n. 70011894052, Rel. Des.
Culzoni-Rubinzal, 1999. p. 57.
Gaspar Marques Batista, j. 7/7/2005.
7 BITENCOURT, Cezar Ribeiro. Juizados especiais criminais e alter-
40 BRASIL. TJ-RS, 21ª Câmara Cível, AC n. 70009625997, Rel. Des.
nativas à pena de prisão. Porto Alegre: Livraria do Advogado,
Francisco José Moesch, j. 7/12/2004.
1996. p. 37-38.
41 BRASIL. TRF-2ª Região,1ª Turma, ACR n. 1999.51.09.700292-0/RJ, Rel.
8 RAMOS, Luiz Rodríguez. Compendio de Derecho Penal. Madrid:
Juíza Fed. convocada Liliane Roriz, j. 29/3/2005.
Trivium, 1986. p. 39.
42 BRASIL. TJ-RS, 4ª Câmara Cível, AC n. 70011117132, Rel. Des. Wellington
9 FRAGOSO, Heleno Cláudio. Lições de direito penal. São Paulo:
Pacheco Barros, j. 8/6/2005.
Bushatsky, 1958. v. 1, p. 183.
43 BRASIL. TRF-4ª Região, 4ª Turma, INQ n. 2004.04.01.029151-3/PR,
10 Idem, p. 184.
Rel. Des. Fed. Néfi Cordeiro, j. 31/3/2005.
11 NORONHA, E. Magalhães. Direito Penal. São Paulo: Saraiva, 1968. v. 1, p. 96.
44 BRASIL. TRF-2ª Região, 1ª Turma Esp., ACR n. 2001.51.07.000690-0/
12 LECEY, Eládio. A proteção do meio ambiente e a responsabilidade
RJ, Rel. Des. Fed. Abel Gomes, j. 6/4/2005.
penal da pessoa jurídica. In: FREITAS, Vladimir Passos de (Org.).
45 BRASIL. TJ-RS, 4ª Câmara Criminal, ACR n. 70009367632, Rel. Lúcia
Direito Ambiental em evolução. Curitiba: Juruá, 1998. p. 38.
de Fátima Cerveira, j. 16/6/2005.
13 TOLEDO, Francisco de Assis. Princípios básicos de Direito Penal. São
46 BRASIL. TJ-RS, 4ª Câmara Criminal, ACR n. 70009315300, Rel. Lúcia
Paulo: Saraiva, 1982. p. 133.
de Fátima Cerveira, j. 5/5/2005.
14 BRASIL. TRF-1ª R., 3ª Turma, RCCR n. 2004.34.00.021930-6/DF, Rel.
47 BRASIL. TJ-RS, 4ª Câmara Criminal, ACR n. 70010057800, Rel. Des.
Des. Fed. Tourinho Neto, j. 17/5/2005.
José Eugênio Tedesco, j. 10/3/2005.
15 BRASIL. TACRIM-SP. Exemplo de precedentes na Revista dos Tribu-
48 BRASIL. TRF-1ª Região, 3ª Turma, ACR n. 2001.33.00.013279-4/BA,
nais 411/268, 487/339, 499/343, 521/402, 526/372, 580/353 etc.
Rel. Des. Fed. Tourinho Neto, j. 17/5/2005.
16 BRASIL. TA-RS. ACR. n. 292052222, Com. Antonio Prado, 2ª Câmara
49 BRASIL. TRF-4ª Região, 8ª Turma, ACR n. 2003.04.01.043133-1/SC,
Criminal, Rel. Juiz Souza Leal, j. 3/9/1992.
Rel. Des. Fed. Fernando Penteado, j. 22/9/2004.
17 BRASIL. TACRIM-SP, 3ª Câmara, Mandado de Segurança n. 349.440/
8, Rel. Juiz Fábio Gouvêa, j. 1/2/2000.
18 BRASIL. TACRIM-SP, 3ª Câmara, HC n. 351.992/2, Rel. Juiz Ciro Cam-
pos, j. 15/2/2000. REFERÊNCIAS COMPLEMENTARES
19 BRASIL. TJ-SC, 1ª Câmara Criminal. RCR. n. 00.020968-6, São Miguel MARQUES, José Frederico. Curso de Direito Penal. São Paulo: Saraiva,
do Oeste, Rel. Des. Sólon d’Eça Neves, j. 13/3/2001. 1956. v. 2.
20 BRASIL. TJ-SC, 2ª Câmara Criminal. Rec. n. 004656-6, Descanso, Rel. RIVEST, Robert L ; THOMAS, Marie-Andrée. La loi sur la qualité de
l’environnement et sa réglementation annotées. Québec (Province):
Des. Torres Marques, j. 12/9/2000.
Yvon Blais, 1995.
21 BRASIL. TRF-4ª Região, 8ª T., ACR. n. 2001.72.04.002225-0/SC, rel. SERRANOS, Carlos Lemes. Os delitos contra os recursos naturais e o
Des. Federal Pinheiro de Castro, j. 6/8/2003, Revista de Direito meio ambiente. Derecho Penal Administrativo. Madrid: Comares, 1997.

Revista CEJ, Brasília, n. 33, p. 5-15, abr./jun. 2006


ABSTRACT
The author draws attention to the destruction of the
environment, a real and aggravated fact in the world context
nowadays. He states that Criminal Law has become an instrument
in the fight against such wild destruction, since the civil and
administrative scopes have been insufficient to fill up such void.
Due to the principle of minimum intervention, he defends the
execution of Criminal Law in strictly necessary cases only.
He presents a brief history of the environmental laws in Brazil,
affirming that the Law n. 9,605 of 1988 – Environmental Crimes
Law – is an important legislative renovation within this context.
He comments on criminal liability of the legal entity and
quotes a broad jurisprudence concerning environmental crime.

KEYWORDS
Environmental Law; Criminal Law; Law n. 9,605/98;
Environmental Crimes Law; environment; principle of
minimum intervention; principle of insignificance; legal entity
– criminal liability.

15

Vladimir Passos de Freitas é desembargador federal aposentado


do Tribunal Regional Federal da 4ª Região e professor de Direito
Ambiental na PUC/RS.
Revista CEJ, Brasília, n. 33, p. 5-15, abr./jun. 2006

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