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O direito não é apenas um sentido a compreender, é para além disso e antes de mais
uma validade (uma axiológica normatividade) que só se pode atingir e asssumir pelos
seus constitutivos fundamentos (também axiológico-normativos). A realização concreta
do direito não se cumpre apenas por uma compreensão significante da sua normatividade,
convoca uma problemático-concreta decisão normativo-judicativamente fundada – não
se trata aí de um tão-só correcto compreender, mas de um justo decidir, de (...) concreta 1
justeza problemático-normativa.
(CASTANHEIRA NEVES, A. O actual problema metodológico da interpretação jurídi-
ca. Revista de Legislação e de Jurisprudência. Coimbra: Coimbra Editora, n. 3919-3920. p. 292).
RESUMO
*
Pós-graduada e Mestre em Ciências Jurídico-filosóficas pela Faculdade de Direito da Universida-
de de Coimbra (FDUC). Aluna especial do programa de pós-graduação stricto sensu da Faculda-
de de Direito da Universidade de São Paulo (FDUSP). Professora de Filosofia Geral e do Direito
da Faculdade de Direito do Sul de Minas (FDSM).
ABSTRACT
This paper aims at introducing to the reader a normative-methodological
conception of legal interpretation that comprehends the interpretation and
application of rules of law as inseparable moments in law realization. Under
such perspective, the concrete case is more than just a starting point for
legal interpretation, but it is actually the methodological prius from which
problematic-concrete legal issues emerge, and to which the most correct
answer must be searched, mobilizing the legal system.
Keywords: legal interpretation – legal methodology – jurisprudentialism – law
realization.
1. QUESTÕES INTRODUTÓRIAS
O tema da interpretação jurídica nunca me pareceu tão interessante, estimu-
lante..., na verdade só agora começo a perceber sua real importância e a grande
relevância que seu estudo convoca. Devo confessar que nunca havia seriamente
pensado sobre ele, acreditando-o acabado e acerca do qual não restavam muitas
coisas a se dizer. Confesso ainda que, por vezes, me foi extremamente difícil vi-
sualizar certas colocações e raciocínios, tão arraigada-contaminada de certeza era
essa minha compreensão.
Mas de que forma será que o caso confere significação à norma? A norma
2 não é uma proposição normativa dotada previamente de significado, de sentido?
Em face da qual nada se acrescenta, mas, sim, se retira, mediante um exercício
cognitivo de apreensão, desse significado pré-dado para, então, posteriormente,
aplicá-lo ao caso concreto? Não é a norma uma proposição normativa que expressa
uma vontade?
A norma é uma proposição normativa dotada de um sentido. Essa resposta
genérica satisfaz tanto uma concepção manifestamente positivista quanto a concep-
ção jurisprudencialista – objeto deste estudo. Mas qual será esse sentido? A busca
por tal resposta é uma busca jurisprudencialista? Em que medida o caso-problema
é importante para a interpretação jurídica, perspectivada como um momento da
concretização do direito?
Antes de iniciar este trabalho, entendia eu a interpretação jurídica como um
momento apartado da aplicação do direito. O objeto da interpretação jurídica era
exclusivamente a lei, ainda que não restritivamente encerrada em sua literalida-
de, mas em consonância com as demais normas positivas que compreenderiam
conjuntamente o sistema jurídico. Era na perspectiva desse sistema que se deveria
buscar a significação da norma para, então, posteriormente, aplicá-la ao caso
concreto.
Quanto ao caso jurídico, este era, claramente, um elemento do qual se ex-
trairiam as questões juridicamente problemáticas (os chamados fatos jurídicos) e
1
CASTANHEIRA NEVES, A. Metodologia jurídica. Problemas fundamentais. Stvdia Ivridica, 1.
Coimbra: Coimbra Editora, Universidade de Coimbra, Boletim da Faculdade de Direito, 1993.
p. 143.
por esse espírito que algumas linhas de um escrito de Saramago – leitura breve
entrecortada por outras mais urgentes – me chegaram à consciência como algo
mais do que um sussurro... um alento encorajador!
Comecemos pelo princípio (...) nunca foi a ponta nítida e precisa de uma
linha, o princípio é um processo lentíssimo, demorado, que exige tempo e
paciência para se perceber em que direcção quer ir, que tateia o caminho
como um cego, o princípio é só o princípio2.
2
SARAMAGO, J. Ensaio sobre a cegueira. São Paulo: Companhia das Letras, 1995. p. 71.
3
CASTANHEIRA NEVES, A. Metodologia jurídica, p. 83.
4
CASTANHEIRA NEVES, A. Metodologia jurídica, p. 83-84.
5
CASTANHEIRA NEVES, A. Metodologia jurídica, p. 83.
6
BRONZE, F. J. Lições de introdução ao direito. 2. ed. Coimbra: Coimbra Editora, 2002. p. 818.
7
CASTANHEIRA NEVES, A. Metodologia jurídica, p. 84.
8
CASTANHEIRA NEVES, A. Metodologia jurídica, p. 84.
9
Para uma análise aprofundada da matéria, ver: CASTANHEIRA NEVES, A. Metodologia jurídi-
ca, p. 85-97.
Tanto o corpus iuris civilis quanto o corpus iuris canonicis eram perspectivados
pelo pensamento jurídico como textos de autoridade, ou seja, textos que encer-
ravam em sua literalidade toda a verdade. Eram, comparativamente, “tal como a
bíblia para a teologia”11,12:
10
CASTANHEIRA NEVES, A. Metodologia jurídica, p. 86.
11
CASTANHEIRA NEVES, A. Metodologia jurídica, p. 86.
12
“Apesar da sua relação dialética, o direito romano e o direito canônico são dois direitos gene-
ticamente distintos. No século XII, se o direito romano surge como um direito-sistema de ca-
racterísticas monolíticas, o direito canônico estende-se continuamente. No entanto, este direito
que nos séculos XIII e XIV se aproximará do figurino daquele, surge sempre ao lado do direito
romano com valor de universalidade” (MARQUES, M. R. Codificação e paradigmas da moderni-
dade. Coimbra: Almedina, 2003. p. 56).
13
CASTANHEIRA NEVES, A. Metodologia jurídica, p. 86.
14
CASTANHEIRA NEVES, A. Metodologia jurídica, p. 86.
15
CASTANHEIRA NEVES, A. Metodologia jurídica, p. 86-87.
16
Dois dos princípios centrais da lógica aristotélica são: lei da não-contradição e lei do terceiro
excluído. Segundo a lei da não-contradição, uma proposição não pode ser verdadeira e falsa ao
mesmo tempo, e segundo a lei do terceiro excluído, uma afirmação da forma P e não-P é verda-
deira (CASTANHEIRA NEVES, A. Metodologia jurídica, p. 87).
17
CASTANHEIRA NEVES, A. Metodologia jurídica, p. 87.
18
Sobre as recepções do direito romano e a evolução do pensamento sistemático, ver: CANARIS,
C. W. Pensamento sistemático e conceito de sistema na ciência do direito. Tradução de A. Menezes
Cordeiro. 3. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2002. p. LXXIV et seq.
19
“Os jurisprudentes humanistas aceitaram o Direito romano, tal como podiam conhecê-lo, como
elemento pré-dado: constituía uma base histórico-cultural de toda a elaboração posterior. In-
tentaram, no entanto, dar-lhe uma ordem exterior” (CANARIS, C. W. Pensamento sistemático e
conceito de sistema na ciência do direito, p. LXXVII).
20
“A tentativa é empírica, mas surge eficaz: o Direito assume, pela primeira vez, uma or-
denação ou, nesse sentido, um sistema externo: é a primeira sistemática ou sistemática pe-
riférica” (CANARIS, C. W. Pensamento sistemático e conceito de sistema na ciência do direito,
p. LXXVII).
21
CANARIS, C. W. Pensamento sistemático e conceito de sistema na ciência do direito, p. LXXVII.
22
CANARIS, C. W. Pensamento sistemático e conceito de sistema na ciência do direito, p. LXXX.
23
“Nestas condições, seria possível elaborar um esquema jurídico inverso do da sistemática peri-
férica: em vez de assentar em elementos pré-elaborados a intentar a sua ordenação, escolher-se-
iam uns quantos princípios nucleares; destes, por dedução, seria depois retirada toda a sequência.
Houve uma significativa confluência metodológica de fracções aparentemente diversas, num cla-
ro sinal dos tempos” (CANARIS, C. W. Pensamento sistemático e conceito de sistema na ciência do
direito, p. LXXIX).
24
MARQUES, M. R. Codificação e paradigmas da modernidade, p. 81-82.
25
CASTANHEIRA NEVES, A. Metodologia jurídica, p. 95-96.
26
Acerca dos elementos da interpretação propostos por Savigny, ver: SAVIGNY, F. C. von. Metodo-
logia jurídica. Tradução de Hebe A. M. Caletti Marenco. Campinas: Edicamp, 2001. p. 9-22.
27
“Elemento este que, se começou por ser minimizado pela tendência mais marcadamente exegéti-
co-positivística da teoria tradicional (assim tanto na École de l´exegèse como em Savigny), viria,
porém, a adquirir uma crescente importância e a determinar mesmo a evolução dessa teoria, de
tal modo que ela por este elemento (...) se foi a si mesma superando” (CASTANHEIRA NEVES,
A. Metodologia jurídica, p. 103-106).
28
CASTANHEIRA NEVES, A. Metodologia jurídica, p. 88.
29
CASTANHEIRA NEVES, A. Metodologia jurídica, p. 88.
30
CASTANHEIRA NEVES, A. Metodologia jurídica, p. 88.
No entanto, há que se salientar que essa concepção não tratava o texto com
indiferença ou preconizava o predomínio da “vontade do legislador” em sacri-
fício do texto. Ela não pretendia a sobreposição da vontade do legislador, mas a
busca dessa vontade por meio do texto. Assim, “esta Escola assentava-se em dois
princípios: ‘o culto do texto da lei’ e ‘a predominância da intenção do legislador
na interpretação do texto da lei’”32.
Segundo a orientação objetivista, o texto da lei é um corpus significativo
jurídico, capaz de encarnar e exprimir sua intencionalidade normativa. Dessa
forma, para Castanheira Neves33, “a interpretação se deverá orientar para o sentido
objetivamente assimilado pelo próprio texto da lei, para o sentido autonomamente
(i. é, com abstracção ou desligado do seu autor real)”.
De acordo, ainda, com o mesmo autor, o objetivismo, diferentemente do
subjetivismo,
31
CASTANHEIRA NEVES, A. Metodologia jurídica, p. 88.
32
CASTANHEIRA NEVES, A. Metodologia jurídica, p. 98.
33
CASTANHEIRA NEVES, A. Metodologia jurídica, p. 100.
aceita da hermenêutica geral (...) a idéia de que a lei pode ser juridica-
mente mais sábia do que a intenção do seu autor ou de que o intérprete
a poderá compreender melhor do que a entendeu o próprio legislador
– é que a lei vai ser referida, na sua interpretação actual, a hipóteses que
o legislador não teve em mente e nessa actualidade reflecte contextos
significantes distintos e mais evoluídos do que aquele que esteve na
sua origem34.
34
CASTANHEIRA NEVES, A. Metodologia jurídica, p. 100.
35
CASTANHEIRA NEVES, A. Metodologia jurídica, p. 100.
36
Atualmente há um predomínio de “‘teorias mistas’, ‘gradualistas’ ou de síntese” porque “se as
coordenadas culturais gerais e filosófico-jurídicas próprias do objetivismo (...) superaram his-
toricamente aquelas outras coordenadas que se implicavam no subjetivismo, e se os objetivos
práticos sobretudo acentuados por aquele primeiro igualmente se têm por irrenunciáveis, não
deixa, todavia, de acentuar-se também, por imperativo constitucional, a indispensável vincula-
ção do intérprete às prescritas intenções legais e às decisórias opções do poder legislativo” (CAS-
TANHEIRA NEVES, A. Metodologia jurídica, p. 101).
37
“O objecto e o problema da metodologia jurídica deixaram de identificar-se pela interpretação
em sentido estrito – tal como acontecia no positivismo jurídico – e os termos antes na concreta
realização do direito. E isto significa: a realização da intenção axiológico-normativa do direito
enquanto tal, em termos normativamente adequados ao problema jurídico concreto (ao seu mé-
rito problemático-juridicamente concreto)” (CASTANHEIRA NEVES, A. Metodologia jurídica,
p. 372-343).
38
CASTANHEIRA NEVES, A. Metodologia jurídica, p. 83.
39
“E isto significa, por um lado, que o critério normativo que a fonte jurídica interpretanda ofereça
só pode oferecê-lo pela mediação da interpretação – ‘a norma será tal como interpretada’ (ASCA-
RELLI) –; por outro lado, que a interpretação, ao propor-se referir a fonte-norma interpretanda
às concretas exigências ou ao mérito concreto do problema jurídico a resolver, para que possa ser
um critério adequado da sua solução, traduzir-se-á sempre numa constitutiva ‘concretização’”
(CASTANHEIRA NEVES, A. Metodologia jurídica, p. 83).
40
A teoria tradicional separava como momentos metodológicos distintos interpretação, aplicação
e integração. Não obstante se possam distinguir esses momentos em abstrato, eles são meto-
dologicamente integrados em concreto. “Todos eles participam, sem solução de continuidade,
num mesmo unitário e decisivamente determinante objetivo problemático normativo: a correcta
(materialmente adequada e normativamente justa) realização do direito – através dos critérios
que ofereça, enquanto e no grau em que os ofereça, o pressuposto direito positivo” (CASTA-
NHEIRA NEVES, A. Metodologia jurídica, p. 371).
4.1.1.1 Princípios
No estrato dos princípios encontramos os princípios normativo-jurídicos
13
positivos, transpositivos e suprapositivos44.
Os princípios transpositivos incluem as cláusulas gerais mais relevantes, e os
suprapositivos manifestam a regulativa validade fundamentante do sistema ou a
subjetividade em um sentido ontológico45.
Há que se sublinhar que princípios jurídicos não são normas de direito; são
fundamentos do sistema jurídico46, o que nos conduz à conclusão de que os prin-
cípios jurídicos não podem ser convocados como critérios prático-concretos de
solução para o caso. Para Castanheira Neves somente as normas legais
41
“Daí que o sistema jurídico não seja um dado (pressuposto) e sim uma tarefa (objetivo), já que
há-de assimilar uma sempre nova experiência problemática e assumir numa totalização con-
gruente as novas intenções normativas de que, através da experiência, o direito se vai enrique-
cendo” (CASTANHEIRA NEVES, A. Metodologia jurídica, p. 158).
42
“É uma unidade de totalização normativa que se analisa em quatro elementos – os elementos
constitutivos da sua normatividade, organizados em quatro estratos distintos e entre si relacio-
nados num todo integrante” (CASTANHEIRA NEVES, A. Metodologia jurídica, p. 155).
43
CASTANHEIRA NEVES, A. Metodologia jurídica, p. 155-157.
44
CASTANHEIRA NEVES, A. Metodologia jurídica, p. 155.
45
CASTANHEIRA NEVES, A. Metodologia jurídica, p. 155-157.
46
CASTANHEIRA NEVES, A. Metodologia jurídica, p. 143.
4.1.1.2 Normas
As normas compõem o segundo estrato do sistema. São prescrições que ob-
jetivam uma “opção político-estratégica e de um vinculante valor normativo que
provém das já aludidas legitimidade e autoridade político-jurídicas”48.
Há entre as normas e os princípios uma relação de possibilidade, e não de
necessidade. Assim,
4.1.1.3 Jurisprudência
O terceiro estrato é ocupado pela jurisprudência,
47
CASTANHEIRA NEVES, A. Metodologia jurídica, p. 143.
48
CASTANHEIRA NEVES, A. Metodologia jurídica, p. 155.
49
“A relação entre a validade e o direito positivo não é (...) uma relação de necessidade, mas só uma
relação de possibilidade: o direito positivo não se deduz da validade normativa, não é perante ela
um resultado necessário, embora se tenha de mostrar fundado pela validade normativa e deve ser
possível perante ela” (CASTANHEIRA NEVES, A. Metodologia jurídica, p. 156).
50
CASTANHEIRA NEVES, A. Metodologia jurídica, p. 156.
51
“Pelo que de novo há de distinguir entre fundamento (validade normativa) e justificação (político-
social ou teleológico-estratégica)” (CASTANHEIRA NEVES, A. Metodologia jurídica, p. 156).
52
CASTANHEIRA NEVES, A. Metodologia jurídica, p. 157.
4.1.2 O problema
De acordo com Castanheira Neves
53
CASTANHEIRA NEVES, A. Metodologia jurídica, p. 157.
54
CASTANHEIRA NEVES, A. Metodologia jurídica, p. 157.
55
CASTANHEIRA NEVES, A. Metodologia jurídica, p. 157.
56
“O problema, por seu lado, traduz a intencionalidade problemática dos casos decidendos (...)
para cuja solução se exigem os concretos juízos decisórios que mobilizarão, como seu funda-
mento e o seu critério racionalmente materiais, a normatividade do sistema (...) mas solução que
também só será concludentemente correcta, bem sabemos, se for normativamente adequada à
concreta problematicidade dos mesmos casos – se lograr relativamente a estes uma pragmática
justeza decisória” (CASTANHEIRA NEVES, A. Metodologia jurídica, p. 155.)
57
CASTANHEIRA NEVES, A. Metodologia jurídica, p. 157.
58
CASTANHEIRA NEVES, A. Metodologia jurídica, p. 157.
59
CASTANHEIRA NEVES, A. Metodologia jurídica, p. 158.
60
“As intenções (valorações, princípios e critérios normativos) anteriores subsistem, mas agora
relativizados às novas intenções (com as suas também outras valorações, princípios e critérios
normativos), entretanto constituídas, de modo que se põe a exigência de ‘ordenar’ as novas com
as antigas – ainda que abstratamente antinómicas –: o mesmo é dizer, a exigência de as integrar
num todo congruente” (CASTANHEIRA NEVES, A. Metodologia jurídica, p. 158).
61
CASTANHEIRA NEVES, A. Metodologia jurídica, p. 158.
É por isso que se pode dizer que o problema e sua intencionalidade proble-
mática, por meio da interpelação interrogante que dirige ao sistema, em busca
da adequada resposta prático-normativa, vai constitutivamente promovendo a
superação desse sistema previamente constituído e do seu sentido62. Essa inter-
rogação, porém, nem sempre vai resultar no encontro de um critério normativo
adequado para as especificidades problemáticas do caso-problema. Quando o
problema interroga o sistema sem resposta,
62
“O surgir de novos problemas é correlativo do enriquecimento do contexto intencional, ainda
que indecisa e indeterminadamente assumido ou apenas pré-compreendido – no modo justa-
mente problemático (o ‘saber de não saber’) –, e que, por outro lado, há-de culminar na consti-
tuição de novas intenções-soluções integradas, i. é, na superação do problema pelo sistema (por
um novo sentido do sistema)” (CASTANHEIRA NEVES, A. Metodologia jurídica, p. 158).
63
CASTANHEIRA NEVES, A. Metodologia jurídica, p. 158.
64
“A natureza da eqüidade é, então, ser rectificadora do defeito da lei, defeito que resulta da sua
característica universal” (ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. Tradução de Antônio C. Caeiro. Lis-
boa: Quetzal Editores, 2004. p. 130).
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao iniciarmos o estudo da interpretação, esse tema vastíssimo que encerra
em si toda a complexidade de um devir histórico e que nesse nosso percurso eleito
culminou em uma interpretação de orientação jurisprudencialista, inequívoca
era a certeza de que alguma coisa acabaria por ser alterada, um conceito, uma
perspectiva... 19
Mas, mais do que isso, reconheço ao finalizar essas breves páginas que toda
uma concepção do direito resultou alterada. Um direito que antes se revelava
desnudo, pouco provocante, um sistema de significação constituída e fechada e
que agora se revela irremediável e necessariamente conectado a uma dimensão
problemática da praxis que o constitui e o concretiza.
O caso é o prius metodológico, autônomo, singular e irrepetível, que impõe
à experiência da realização normativa uma dimensão única, para o qual não se
pretende oferecer uma resposta dogmaticamente pronta e acabada, mas a partir dele
interrogar o sistema em busca de um critério prático-normativo de resolução para
o caso concreto. Finalmente, a resolução do caso-problema, para além da óbvia e
imediata necessidade de se colocar justo fim a uma situação fática problemática,
pode ser, em última análise, o catalisador, o agens transformador e reconstituinte
do sistema de normatividade pressuposto.
Certamente, antecipo, com conhecimento de causa, àqueles que insistiram
na leitura até o fim restarão muitas dúvidas. Foi dessa mesma forma que tal pers-
pectiva me atingiu provocativamente; sua riqueza e complexidade demandarão,
inequivocamente, outros excursos comprometidos. Nada mais natural, pois é
65
CASTANHEIRA NEVES, A. Metodologia jurídica, p. 159.
REFERÊNCIAS
ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. Tradução de Antônio C. Caeiro. Lisboa: Quetzal Edi-
tores, 2004.
AROSO LINHARES, J. M. Jurisprudencialismo. Sumário das Aulas. Ed. do Autor, [s/d].
BRONZE, F. J. Lições de introdução ao direito. 2. ed. Coimbra: Coimbra Editora, 2002.
CANARIS, C. W. Pensamento sistemático e conceito de sistema na ciência do direito. Tradução
de A. Menezes Cordeiro. 3. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2002.
CASTANHEIRA NEVES, A. Interpretação jurídica. In: Digesta: escritos acerca do direito,
do pensamento jurídico, da sua metodologia e outros. Coimbra: Coimbra Editora, 1995.
v. 2.
______. Metodologia jurídica. Problemas fundamentais. Stvdia Ivridica, 1. Coimbra: Coim-
bra Editora, Universidade de Coimbra, Boletim da Faculdade de Direito, 1993.
______. O actual problema metodológico da interpretação jurídica. Revista de Legislação e
de jurisprudência. Coimbra: Coimbra Editora, n. 3919-3920 .
20
CURI, I. G. Virada de Copérnico: reflexões em torno do pensamento de A. Castanheira
Neves. Boletim da Faculdade de Direito. Coimbra: Universidade de Coimbra, v. LXXXI,
2005 (separata).
LARENZ, K. Metodologia da ciência do direito. Tradução de José Lamego. 4. ed. Lisboa:
Fundação Calouste Gulbenkian, 2005.
MARQUES, M. R. Codificação e paradigmas da modernidade. Coimbra: Almedina, 2003.
RENÉ, D. Os grandes sistemas do direito contemporâneo. Tradução de Hermínio A. Carvalho.
São Paulo: Martins Fontes, 1998.
SARAMAGO, J. Ensaio sobre a cegueira. São Paulo: Companhia das Letras, 1995. 310 p.
SAVIGNY, F. C. von. Metodologia jurídica. Tradução de Hebe A. M. Caletti Marenco.
Campinas: Edicamp, 2001.
66
CURI, I. G. Virada de Copérnico: reflexões em torno do pensamento de A. Castanheira Neves.
Boletim da Faculdade de Direito. Coimbra: Universidade de Coimbra, v. LXXXI, 2005. p. 849.
67
CURI, I. G. Virada de Copérnico, p. 849.