A defesa de que os currículos precisam de uma base comum em nível nacional
não é recente no Brasil, remontando aos anos 1980, talvez antes, se assumirmos uma definição mais ampla do termo. Assim, em 1996 a LDB consolidou uma demanda já existente para cada sistema de ensino, cada escola e com conteúdo geral e especifico a depender da região e das necessidades LDB: “Estabelecer, em colaboração com os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, competências e diretrizes para a educação infantil, o ensino fundamental e o ensino médio, que nortearão os currículos e seus conteúdos mínimos, de modo a assegurar formação básica comum” figurava entre as competências da União pelo artigo 2o da LDB (Brasil, 1996). CNE Atribuições: “deliberar sobre as diretrizes curriculares propostas pelo Ministério da Educação e do Desporto” (Brasil, 1995, artigo 9o). Parâmetros Curriculares base nacional Em 1997, a versão final dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN’s), revista após consulta à comunidade acadêmica, foi encaminhada pelo MEC ao CNE com a pretensão de que fosse ratificada como diretrizes curriculares nacionais. Muitas críticas: 1999 – O CNE decidiu qual seja elaborar diretrizes curriculares mais gerais e manter os PCN como alternativa curricular não obrigatória. Diretrizes Curriculares Nacionais Em 2011, foram aprovadas as Diretrizes Curriculares Nacionais, dessa vez de implantação obrigatória. O documento contempla os princípios, fundamentos e procedimentos que devem orientar as práticas em toda a Educação Básica, ressaltando a organização e a articulação dos sistemas de ensino e também as práticas pedagógicas dos docentes. Conjuntura educacional da década de 90 Ambiente cultural, político e ideológico Influenciou todo o debate tanto dos parâmetros nacionais como também da necessidade das Diretrizes e também dos Base nacional curricular. Neoliberalismo e pós modernidade. – contradições, influencia a concepção de currículo, tanto do ponto de vista dos conteúdos como da concepção de formação e de atuação profissional. Qualidade questão complexa, teórico política e ideológica. UNESCO Alguns elementos que operam no campo do que é qualidade: Qualidade total. Qualidade socialmente referenciada. Qualidade social – coloca no mesmo grupo sujeitos muito diferentes, desfoca o conteúdo da crítica e da historicidade do conteúdo e seu papel ideológico princípios por exemplo da “sustentabilidade”. (Unesco) Um currículo necessita garantir conhecimentos COGNITIVOS e SOCIOEMOCIONAIS. O relatório Delors (UNESCO, 1996) é um dos documentos marcantes de discurso educacional, em resposta aos novos desafios e sugere um sistema de ensino fundado em quatro pilares: Pilares 1-Aprender a SER Depende diretamente dos outros três: A Educação deve ter como finalidade o desenvolvimento total do indivíduo “espírito e corpo, sensibilidade, sentido estético, responsabilidade pessoal, espiritualidade”. Competência Soco emocional 2- Aprender a CONVIVER Atua no campo das atitudes e valores. Se aposta na educação como veículo de paz, tolerância e compreensão. Competência Soco emocional 3-Aprender a CONHECER Aquisição dos “instrumentos do conhecimento”. Competência Cognitiva 4-Aprender a FAZER Estreitamente ligada à questão da formação profissional. Competência Cognitiva Base Nacional Comum -Inicialmente o objetivo era o intercambio Os blocos econômicos que se desenhavam em regiões da América Latina (e que já davam resultados na Europa) também produziam demandas por padronizações curriculares com vistas à facilitação do trânsito entre os diferentes países. O plano trienal para o setor educação do Mercosul, datado de 1992, explicitava, entre seus objetivos, “a compatibilização e harmonização dos sistemas educativos” dos países participantes. Nos planos posteriores, as ações se concentraram nos níveis técnico, de graduação e pós-graduação — de modo a criar mecanismos para facilitar o exercício profissional nos diferentes países Redes políticas – Ball (2014) Apresenta um mapeamento extensivo de redes de políticas que articulam diferentes organizações, “publicas” e indo de instituições filantrópicas a grandes conglomerados de negócios educacionais em nível internacional. Os mapas das redes de políticas apresentados por Ball (2014) são inacreditáveis, articulando experiências educacionais locais como manifestações de um movimento global marcado pela celebração de princípios de mercado em resposta à chamada ineficiência do setor público. Atuação em rede e concepção de qualidade Como as múltiplas redes de demandas em torno, por exemplo, da ideia de qualidade se interconectam e como captar o movimento e a contingência das interconexões? No caso das BCNN, como entender o que os deslizamentos entre demandas públicas, privadas, filantrópicas produzem em termos dos sentidos para uma educação de qualidade? QUALIDADE DA EDUCAÇÃO E A BNCC: HEGEMONIA DE NOVAS FORMAS DE SOCIABILIDADE Grupos políticos distintos se constituem, nos processos de significar tanto a qualidade da educação quanto a suposta crise do sistema. As diferentes demandas vão sendo colocadas como equivalentes na luta por uma educação de qualidade, mas não são unitárias, são até contraditórias, mas no processo elas são constituídas e hegemonizadas. Agentes “públicos” envolvidos nas políticas em curso: MEC, CNE, CONSED, UNDIME. Chamado grupo de especialistas. Parceiros privados, na forma de fundações ou não, começavam a se fazer, não apenas presentes — o que não seria de estranhar no mundo contemporâneo —, mas insidiosamente presentes.
Grupo Lemann- Base Nacional
O documento final, intitulado Saindo da Inércia? Boletim da Educação no Brasil: 2009, mapeou os resultados quantitativos da educação no país. Recomendações entre as quais a) Criar e implementar padrões curriculares: os padrões educacionais devem existir pelo menos no nível dos estados e municípios. É importante que eles sejam efetivamente implementados em cada escola, uma vez que os padrões servem como guia para os professores darem aulas, como referência para que os programas de formação docente efetivamente preparem os profissionais para a prática de sala de aula, como balizamento para as avaliações de desempenho e como garantia da equidade entre o que é oferecido aos alunos de diferentes extratos sociais. (PREAL e Lemann, 2009, p.46). O Núcleo Comum Americano A Fundação Khan, presente na reunião extraordinária da UNDIME, é uma organização privada sem fins lucrativos que, segundo Ravitch (2013) e tem recebido vultosas somas para elaboração de aulas-modelo para a implementação do Núcleo Comum. O Núcleo Comum americano é um conjunto de indicadores para avaliação, produzido por um grupo privado e, hoje, implementado pela ampla maioria dos Estados, implementação esta incitada por uma série de financiamentos. A sua própria definição explicita que se trata apenas de padrões de avaliação: O Núcleo Comum é um conjunto de padrões de alta qualidade acadêmica em matemática e língua inglesa e literatura. Esses objetivos de ensino mapeiam o que um aluno deve saber e ser capaz de fazer ao fim de cada ano. Os padrões foram criados para assegurar que todos os alunos terminem o ensino médio com as habilidades e os conhecimentos necessários para serem bem sucedidos no ensino superior, na carreira e na vida, independente do lugar onde vivem Público e Privado formando uma rede de políticas publicas Esses agentes privados constituem uma rede de parceiros. De UNDIME, CONSED e CNE, estes por sua vez parceiros privilegiados do MEC na definição da BNCC, ajuda a produzir sentidos para qualidade da educação, vinculando-os à centralização curricular. Essa rede não apenas significa que os atores privados estão participando do debate educacional, mas que estão criando novas formas de governamentabilidade. Estamos frente a uma desestatização, na medida em que tais atores “estão investidos no edu- business e no desenvolvimento de soluções sócio- empresariais e de mercado para os problemas educacionais” Encontros promovidos pela UNDIME e os parceiros privados Maio de 2014. Por ocasião do 6o Fórum Nacional Extraordinário da entidade, a temática da base comum nacional foi enfocada pela primeira vez, segundo sua presidente. Na ocasião, falou a favor da proposta de base nacional, a pesquisadora Elvira Souza Lima, autora do primeiro volume da coletânea “Indagações Curriculares”, resultado do programa Currículo em Movimento. Antes desse evento nacional, em março de 2014, o fórum estadual da UNDIME/SP teve a construção da base comum nacional como um de seus temas. O evento, foi organizado pela Fundação Lemann, uma das colaboradoras constantes da UNDIME/SP 16. Nesta ocasião, falou também a pesquisadora Paula Louzano. Da programação, constava, ainda, workshop sobre uso da tecnologia na educação, realizado pela Khan AcademySeminário intitulado :3o Seminário Internacional do Centro Lemann para o Empreendedorismo e Inovação na Educação Brasileira, realizado em agosto de 2014, onde o professor David Plank (já presente em edições anteriores) proferiu a palestra Uma Base Nacional Comum: o potencial e os desafios, em que discutiu a implementação do Núcleo Comum (Common Core) na Califórnia. A fala do professor Plank foi centrada na medida de resultados: “sem saber o que os alunos devem aprender, é difícil medir se o ensino está melhorando ou não", na sua apresentação, o pesquisador ressaltou a necessidade de elaboração de materiais para a utilização dos padrões curriculares19. O Dr. Plank é diretor executivo da Policy Analysis for California Education (PACE), baseada nas Universidade de Stanford, Califórnia Berkeley e Southern California, com financiamento da Bill and Melinda Gates Foundation. Os que defendem uma educação democrática e inclusiva. Apenas para citar um exemplo, a Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão tornou-se um agente público importante e passou a produzir uma série de intervenções no sentido de garantir direitos de “grupos excluídos”, atuando nas políticas curriculares e, principalmente, na formação de professores. Isso está incomodando principalmente no debate sobre história. Estamos na disputa, mas para isso temos que dar a nossa opinião, inclusive sobre o processo (afinal quem se ouve e quem participa) Os movimentos sociais e o movimento docente e dos trabalhadores em educação Os movimentos sociais e os trabalhadores em educação organizados seguiram favoráveis à centralização curricular como forma de garantir a qualidade [social] da educação, mas criticam a vinculação do currículo a indicadores de qualidade quantitativos e que não levem em conta a complexidade do fenômeno educacional- defendem um sistema de avaliação da educação básica e mudanças estruturais na realidade educacional brasileira. Vínculo entre concepção de avalição e BCNN Se retornamos ao caso brasileiro, fica claro que o vínculo entre a BCNN e avaliação não pode ser negligenciado. Com uma concepção de avalição que discordamos. Os agentes políticos públicos no interior dessa rede têm apontado nessa direção. Um dos indicadores desse vínculo é a participação efetiva do INEP, responsável pela avaliação, nos debates. O presidente do INEP, sugere que “a descrição dos objetivos da educação contida nos documentos legais não é suficientemente explícita para informar os currículos das escolas” , defendendo que a base comum se “transformaria numa matriz de especificação das avaliações nacionais” Base Nacional Comum O documento preliminar a Base Nacional Comum está organizado em quatro áreas de conhecimento: linguagens, matemática Ciências sociais e Ciências da natureza. Temas integradores: consumo e educação financeira; ética; direitos humanos e cidadania; sustentabilidade; tecnologias digitais e culturas africanas e indígenas. Especificidades regionais e culturais –especificidades locais e articulação entre a parte comum e diversificada do currículo. Na área de linguagens – fica a critério qual linguagem vai privilegiar em cada ano – decisão dos sistemas e/ou escolas Currículos pelo mundo A elaboração de uma base nacional comum para subsidio dos currículos das unidades escolares e para a orientação da prática docente não é uma especificidade do Brasil. A Inglaterra tem um documento dessa natureza desde 1988; A Finlândia, desde 1998, Portugal, desde 2001, para citar apenas alguns. Experiências como a dos Estados Unidos da América também têm sido observadas atentamente; tendo em vista as semelhanças em relação à grande dimensão territorial e à complexidade política entre os dois países. Conclusão A vinculação de qualidade e Base Curricular Nacional Curricular Comum não se dá de forma direta. Qualidade e conceito multifacetado e muito mais complexo. Definições ideológicas de qualidade entendem o Base nacional comum de forma diferenciadas. Existe uma inversão sendo construída pelos interesses privados e seus parceiros públicos: Base Nacional dá referência para aferição – a avalição é consequência do processo educativo e não o determinante (eles sabem disso) mas os Ides, Pisa etc. São fontes de lucros e de parcerias que interessa os agentes da rede. As Bases foram construídas pressupondo a interação entre professores e interdisciplinaridade – não temos dedicação exclusiva, não temos espaços de construção de conhecimento Inter- disciplinas e não temos a possibilidade de envolvimento dos alunos no processo de significação curricular, nem do currículo fixo, nem do currículo flexível – o que é uma necessidade intrínseca. As relações de trabalho na rede pública e privada. Mudanças na formação de professores – que deverão fazer reformas curriculares. Grande debate em curso. Devemos participar – exigindo coerência, nos distinguindo da rede, sendo sujeitos do debate tanto da essência como das especificidades de áreas de conhecimento. Exigir maior tempo para o debate. Exigir que a aprovação de um currículo de base nacional venha a deliberação da exigência e tempo concreto para o trabalho interdisciplinar e trabalho fora da sala de aula para o envolvimento dos alunos na construção do currículo especifico e comum, senão ela não será significativo. Dar a nossa opinião sobre o processo e sobre o conteúdo. Referências Bibliográficas Brasil. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão. Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica. Conselho Nacional da Educação. Câmara Nacional de Educação Básica. Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais da Educação Básica / Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Diretoria de Currículos e Educação Integral. 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BARROSO, João. Da política baseada no conhecimento às práticas
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