Sie sind auf Seite 1von 364

Л» /V

/л ^7iÄ
w-1t~A~
i \t
h- 1.
"
и
\\\ V» <
*
RM A S84^
CASTIDADE:
Tratado efpiritual , ,
EM QUE POR MO DO PR ATICO SE
enfináoos meyos, & diligencias convenientes
para ad qinrir, conferv ar, & defender efta
Angelica Virtude:
OFFERECl(DOiE(DEcDICAT>u>f
à Soberana Vir2em das Fireens

MARIA
S À N T IS S I M A SENHORA NOSSA "
P ELO PADRE

MANGEL BERNÁRDEZ,
Da Congregafao do Oratorio.

LI S ТЩ^,й,1Си
NaOfficina de MIGUEL DE S^fröES,
Impreilor de Sua Matitibide.
Gom todanslict^iti ч?€г(ьаг!ли О" Priyiltgio iï£il , Anno Sç \6<f&
Гj * '? ,1 <

? ■ Т - .■ . * г-
■ "■ î» ï'■. ■.--- », 3

\ .-.. 1 If..- . ■ - ' > -«- л-

• ■ ■ ■'.< •■' "V '. 'i л

\ i 1

..

■\\}t\
. *,-
A' VIRGEM SINGULAR,

MARIA
SANTÍSSIMA SENHORA NOSSA

\ Ul. Dedicatória.
Senhora^
que dignamentepofiuii (alfgre-
' fépor tfio os Ceos, & a terra) 9
••-. f: • . , • . • throno tmmedtaio às (rés Di-vi*
nas ^Pefíoas , como Filha primogénita dó
Padre, M*e verdadeira do yert>Q,Efpof<t
efeotíaida do EJpinto Santo, & Rainha
joberana de todas as crtatwas. A quem
fehade chegarjarajair bemlogrddo,efte
•meudejejode ajudar os próximosafir ca-
fJe nío á Í/es , ê Mãe ca.ftiffi.inei; a Vfa
Mãg da. Divina Grafe)" tçttakanio " por
ofiafrágil natureza , para &
. torvarfoderoja contra /eus inimigos? Que
Jornbra haode bujcar as diligencias^ q fer-
' tendemfazer a carne femelhante ao effi-
'•nto , fenÃo a daquella Senhora , a quem v
E/birito Santo fezfombra? Lembramos,
vpreció/fíima <Donzélla MARIA, mais
lirftpa, frcandida qite as -Bombas lava
das com leite , que refidentjunto das cor
re ntes plenijfimas ; quero di&er t mais pu
ra , & íwiocente do que os Anjos , quelo-
graoaviftadeDeos; lewbraivos , digo,
que nWrnentepJíes Virgem ifenão que
vofía rnefrna virgindade , foy também
virgem -, ifto he, itwCa,fingidary&fih--
taria, & com a. qual nenhuma outra
virgindade prefume fazer parelha.^ E$o
for muitas razoens(_permittime numerar
-alguma* , para honra v<)fíay&-confolaçZo
minha. r. Porquefoftes Virgem, & Mae
juntamente: JNec primam fimilem vi-
ía eft , nec habcrele^uencem > gandia
Marns habens cum Yirgmiratis horvo-
re. r.prque vofiofiirijfimo corpofey cm±
cebido ejtandò ligado o tomes daconcu-
Santijjimos faes ',
Joa
J»achim,& Лппа.у. porqvoßa virgin-
dade foy profetizada , f'ymbolizaáa , ó*
promettida^mutosfiados antes ñas Pivi\
nas Efilfituras^ 4: porque l'a; foßes a
primeiratntre todas as mulheresy que ar-
voraftesofranco eflandarte da virgin-'
dade , ratificada com voto , para trazer
torn voßo exemplo as bodas do Rey dos
Ceos numerojos efquadroens de (¡pojas
fuas : Adducentur tLegi virgmes poil
eam. y. porque conctbeßes pelo ouvido,
dando fe ao celeßial Taranimfo , aquelle
Senhor , que he Palavra de Déos merea -
da 6: porque voßavirgwdade ficou ja-
grada com o tranjito do mefrno parto: Qui
macris int'gritarem non minute, » led
facravit. 7: porque foy occulta (quan
do affim importava ) ate aos invejofos,
& observadores olhos do demoniot. ¿t dif-
/arcada com os defpojónos , & convicio
do feliciffino Patriarca S loftph %:porq
foßs yirgem, nao so nocorpo, mas tam
ban na alma -, nao a tocando , пет por hit
inflante a original corrupçao , пет a mini
ma culpa aElual ç:porq пет imagens con
tra a pureza Jiibirao a гергфшаф щ
зги * îij têt]»,.
terfo efpeWo de voßafantaßa. i o -.porque
fojies Virgem crida de fe Divina, aínda
finies depaJJ'ardes deßa mortal vida-.poes
nojymbolo que osfagrades Apoßolos com-
fuferao antes de monerdes , fe exprime ,
& profeffa , que Chrifio nafceo de Al A-
R l À ärgern, i v.porque voßa virgin-
dade ní com a morte je immiäou -, poes
voffo intaBo corpo nao conheceo as leys da
corrupcao na fepultura , & agora no em-
pyreo affim permanece reveflido na reful
gente eflola de claridade. 1 1: porque fois
virgemfecunda , que gérais virgens com
voßo amparo , & interceffло : & viven -
do na terrageraveis cafios com voßa pre-
fenca , & modeßia. Eij-aqui, о Virgem
ßngular , algumas prerogativas de voßa
admiravel virgindade , ou rayos , que
diff'unde о Sol de voßa pureza, ¿reo ra-
zäo Vos corólo por Virgem das Virgens ,
Cr MaedosCaftos. Bern he logo , que a
voßo patrocinio tenhao recurfo todos os
que necesitarnos participar deßa efpiri-
fuatfiliacao -, tanto mais certos de confè-
guilla , quanta [abemos s que Vos mefina
nos convidáis[¡a recebella, : Tranfitead
¡j." me
meotnnes, quíconcupifcitis mç , 8cá
generationibus roeis adimplemmi. Se
para efafim abençoardes o meu trabalho,
fem duvida [era. proveitofo. Se nejíe ar-
copuzxrdes voJSa poderofa míojobre a
minha débil ,fahir* direita & roimftèa
feita,que fira os coraçoens jarando -w. ' A
graça de Deospor vofía m*o me entregou
efias poucasfomentes, quefayo a ejpathar
no catnpo ai Igreja : da me/ma graça
pela mefat mio ha de vir a virtude, ó*
influxo, que nelle asfomente, fecunde ,
& multiplique emgen>ro[os , & abun
dantes frutos. Porque não fomente (bis
chea aígraça,como fos anunciou o Aitjo-,
fenaoque trasbordaHes em graça , como
dtffèvofíy devoto S. Bernardo lenchejtes
para fos, & trasbordais para nos outras:
Plena íibi, fuperplena nobis.
«ctfwrtv*^»
^^^^^ JJO

n-à.'") vfây
r.t.'q.' ig

c.-n *Í»'j
AOLEYTOR
T» 1
.Benévolo.
ao da obra , ç> bumafa-
tiifaçao neccjjaria.
U A N D O algum inc.endio
fé ateou cm cafa , acodem
muitos,, huns por obrigação,
outros por Ca ridade , a pro
curar fe apague, ou ao. menos não la
vre pela vizinhança: & tem ali feu prcf-
timo a diligencia do mais defprezivel
fervo, ou daado vozes,ou trazêdo agua,
ou ajudando a falvaros moveis. Cafa
de Deos he a*(via Igreja: fopo o vicio da
carne ; ver o ^ tem lavrado (fendo ^ o
menos hc o <| fé pôde ver), caufa grade,
horror3 caufa entra nhavel laftima Co-
mo
mo fc area na carne ,'& efta náodiftin-
gue en tre na çoens, eíta dos, cualidades,
iexoï, condiçoens, & officios: hegeraí
oeíhago, porqie hecômumoinimigo.
Demptis {.arvulis (dliïc S. Remigio )
propter hue titium fa<, ci falfaitttlr : Ex
ceptos os mininos , po¡ cos foo, рог a«
mor o.efle vicio jos ç)i;e fe faj^äo.
Direm >s p >es . que o Senhor da ca-
famo cuida dclla ? P^r cerco nao def-
prei'.a as almas deixando-as perecer
quem morreo naCruz abrazado cm in-
cendi )s ds caridade , porque nao pere-
ceflé. Prevençoens, &remedios nos dei-
xou , muiros , promptos., & efficaze«.
Porèm eíta he outra mayor laftima ^
que cegos nos com o famo efpc(T> dj
meímj fogo , ou ná o atinamos com el
les, ou näo influimos cm os applicar . fe
já nao he » q como o incendio he delei-
to(o à mefiiia carne , folgamos de ar
der ,.& impelíanos a outros , que ardáo
com.nofco. ; -. .; ¡. ..
Conliderando nefta miferia ( que
vai a parar na ultima-, & eterna de oir-
troíógo inextinguivel. ) enuei cm de-
"'■* fejos,
ddeí<x , & logo em determina çao de
acodirao incendio, ainda que fervode
pojca induftria , & animo covarde.
Dareiao menos vozcsaos outros , que
fe falvem do perigo. Nefte Tratado
{pratico , fuccinto , & claro , para que
aprove'ite a muit ís ) fe apontáo os me-
yoSy &d.ligencias para evitar , ou re*
mediar, os danos da luxuria , & ad
quirir , ¿kconfervar as riquezas da Ca*
ítidade. Se tratafïe a materia > vafta ,
& eruditamente ( como fuá dignida»
de merecía ) menos ferviria ao meuïn*
tentó.
Bern prevej > , que as dtas razoens
de el ayo, ¿y pratico , podem em alguns
p »ntosoffcnder a alguns lcytores. Po*
rem tenhäo paciencia > & concedäo-
me perdäo : vifto fer di&amc raciona-
v,el, que quando duas virtudes fc nâo po
dem exercitar no rncfmo tempo } deve
prefcrirfca maisnobre. Que tem que
ver com a nobreza da Caridade a da
Mo Jeftia, & Dccencia?Aquclla he Sol ,
eftas fâo eilrclks : aquella ouro , cftas
metaes inferiores •' aquella he Rainhi ,
г.. Si &
& as mais virtudes Damas. Ajudemos
a falvar do incendio o proximo , mas
que feja com menos alguma compoftu-
ra ,ou fuá nos coneeitos que forma, ou
nofla ñas palavras que proferimos. Nos
livros , pulpitos , & cadeiras , & pode
ferquetambememalguns confefliona-
rios, as vezes nao fe dá doutrina táo par
ticular , como a ne cefíidade de huns, &
a ignorancia de outros pede; fe n äo co
mo a decencia acón felha; nao culpo o
eftilo d )s outros: peço que os outros nao
culpem por hora o meu.
Levo paraiíío Padrinhos de rcfpeito
eferevendo cm femelhantc aííumpto.
Digo com Pedro Blefenfe: Тигре repu- jrafít
t-ts de tarn turpi materia lequi ; fed tur- ¿t Con-
pior eft Infemus. Sifxdus eftfermajtedius fef.Sd~
eflputrefeere in peccato^Numquid aitdebis cram,
faceré , O ego illud dicere nun audebo ? /»*
Tefiis in c#lo Deus etiamconfeius in excel- mee^
fis , quod ^elo&* fitio faiutem ari'mœ t*œy
& totл htecexl.ortJtio frocedit ex medul'íis
anima: 5 & adipecharitatts : Reputas pop
coufa ¿torpe eferever de materia táó
torpe: porem mais torpe, & horrenda
- he
he o Inferno. Se fao fcyas as palavras ,
mais fcyo he apodreceres no pecca*
do-He poífivel que tu não temes o com«
metello,& eu temerei o declarallo ?
jDeqs. no Ceo me he teftemunha , qire
& zelo } ,& fede de tua falvação me obri
ga., & toda eíla exortação procede ,de
•eiitranhas de caridade.
Digo com S, Hinemaro Bifpo de
^ , -Rens: Nemo-nos execrei impuduos. delia-
Oí>H\- -r,.'. / '.
ctilode^!>J mon tmpHdtcitus, quas veneranda AH-
JDnw-- W erubcfcendo refugiunt , ftrmoàn mtesi
ríoLi- <]ni* t imore Chrifti, quem in ]e (ocutum
ríunj , faiffe 1'erÃcitcr dixít Pdultis , iater alia de
& 'ltff talUnti dilpatávit. Nemo etiam debet ex(t-
oeifgie. Cerj-,An audi-Hi ttirpitudmes infirmitáfkm
, . ([tia.svenena.tA diabólica maltgnitatis caU
li-dtt^Lsj humana infligitfrJgilitMt j fctens
fé , fecundam ^poflolum àrcundatum effe
ittfirmititte , & conflierm fé ipfttm , He
forte & ipfe terttctur : Ninçuc nos elíra-
nhe> & abomine cimo pouco houe-
ftos, P3r filla'-m>s de matéria, que
rcpulfão os ouvidos vergonh3Íos : pois
ham S. Paalo ,em quem fallava Chri-
fto,. coma «lie meíniD diííe cpm ver-
dade,
dâdc , pôr ãhior Teu tratou também dl
femelhante aííuirpto. Do me firto m'o
do ninguém deve efcandalizar-fe ou*
vindo as abominacoensda fraqueza hu
mana inftigaita pela veaenoía malig
nidade do demónio: antes lhe convém
lembrarfe ( como amoefta o Apofto-
4o) de que he capaz das mefmas mi fc.1-
rias , & que deve olhar para Impara,
não vir a cair ncilas. r %
Digo com S. Agoftinho ( ou qiftái
quer que heo Author dos Scrmrens W
'' Confutidcr iro £p/íb-

rare. Sed & fi tAcutvo } mws


fi litx: p tcMVero
igitur pr<
loí(juia& tosftib ice oferaritio» e
átts. Emeaddtr 'gitar vitarn^ & emenda
do verba : (juie/Citf agerç ferverfé a <&" eg.o
fpiíe^cArh, mal* Vc/tra i-oins improperare',:
Huem razão da minha dignidade Epiír
CiSpal mtf envergonho de tailar , me pe
jo de explicar femelhantes coufas.Masq
farcúq fé me calo5encorro cm culpa dt-
ame de D cosj& fc me não calo,não cfca •
ã parei
parei da detraceão de vofías línguas ?
Dcterminomc em pregar com mayor
liberdidejà <| vós com mayor liberdade
vosnaó pejaisdecommetteros pecca—
dos. Emendai vos a vofla vida v que- ea
emendarei a minha lingua.-ccffai de pro*-
cedcr maljquc cuçefíarei, de vos lan
çar em roftro vofíos máos procedinaenr
tos.
E fc alguém, refpon^e, que cfíes
Padres não-cfcreverão cm vulgar , a J-
virta,quc não fatisfaz pJcnarrenrcá
força deitas authordades. Porem ei f-
aqui da anos outros dons, que efcr everão
na fuá língua materna, corrmua ao pá-
-Yò. HumheS. Epifanioj a, qual diz :
H*>tjí -Kwsfvfltan magnam hauc fiteítm 5 G?*
i í. magnam iftam tethalem operationem fi-
non .
fn rtúm y*bi defixravero prudeHtibvs Intsc
lítpfum, Velnt fttíenm interitús^ titnmem
af horrorL m indvc&m 5 ad l «• uí. non fvlum
•'Vlfvnt , fedetiam lapidibusimprtantobíi-
ynumitttimje^ enttm , ac bajilifcui» t»
frofundo harathro iatiUstem 3 «f nç (tppro-
isfui attdeét : Não pof•
fo
fo pá flar cm 61 encio cfta geral m onan-
dade,cfta grande & cótagiofa pcftilcn-
cia. Porque pode fcr , que reconhecen
do os prudentes o precipício , fc prcfun-
diifimo poçj da perdicác» , conccbão te
mor , & horror que os obrigue , não
fómente a evitar a mina própria , trás
cambem a apedrejar eftamalicioía fcr-
pente,ou balilifco;qi-c dentro fccícon»
de cnroícado^ para quea ningucm fe
atreva a checar de perro.
OourrohcS.joão Chryfcfiorrc,qtie
havédo inliliido cm manifc ílar as abo-
minaçoens da Iuxuria5 para alfentar me
lhor a i eprcheníão delias 5 atode à nuf-
fa objecção, dizendo: H<tc fdifhtjutitjjftt!
«pertius cptAm far/it, nemomt ivprtbàt* jy.",
dat. Xolo ffiim átundi gráiitAtt ortiare i, ^
ovMionem^ .W grates ,C^ \.vntftcsac-trf t*r.iu
Attditoreí.Pro: ttrea Pwfi.etsf ^w
b buiitjmodiverbo farCKtit ^ i-clentes Iu-
détortaiexfandere íiLidnnm } C
ferantiítm : fed fos ejvot^e l*ngwt
,
JMedictts enim volens exfànderé [utreditie
tiun eo ffe£i*t3»i nadas wnfervet manus *
fe¿ Ht ill» liieret àptttrèdineWmguem ЮС?
reprehenda, fi fallei mais claro do que
parece convem. Porque mais quero fa->
zer graves, & honeftos os meus ouvin-
tes,do que honefto, & grave о meufer-
mâo. Nem osmefmos Proteus fe abf-
tiveráo de femelhanres termos afimde
jarretar aïenfuaLdide» & iatemperan-
ça dopoyo Judaico : antes o carregaó ,
& fèrem fem reparo, mais as claras do
que nos agora fîzémos E о medico
que farja о inchaço,ou abre apoftéma,
ou arranca o cancro, nao attende а со-
fcrvar Umpas as mâosifenaoaaeixar
faó,&limpo o enfermo.
E finalmente ,' fe о Ley tor river пек
ceííidade,& dezejode ieaproveitarvra->
¿o defculparà benignamente ■ porq ne->
ftecafotrazdifpoficaö /emellüte á for«
ma,que o livro perrende introduzirlhe.E
huma fó alma, que Jucre para Déos o
jioflotrarbalho, ainda que foííe cemdo-
brado» ferá fuperabundante, & precio-
fo fruto ¿elle. - »л-»«- •»■'*

fide*.;
TA«
T 'А В О A
DAS PERGUNTAS,OU CAPI-
tulos defte Tratado.
ÍPerg.l. f~\U E coufahc Cafiidadei & quaesfío ó
V^ actos, &graos deßavirtude? pag.Ij
II. Quantas differеЩм ha de Cafltdade ? p^
Ш; Com в razoens /t•moverá hitapeffoa, a amar eß*
virtude , dr ahrrceer os victos contrarios ? Р.б.
IV. Quaes ¡do os meyosefficaz.es far* afcaçar eßa vir.
tnde> & expugnaros vicios contrarios} p.io.
Como fe franca , он роет por abra o meyo c¡H»
dij/emosdedevofaocoaPïrgemS.JV! pXi.
VI. Como rezaremos o Rozarto da Senhora , de Jortí a
nos aproveitepara o dito intento} Р.г8.
VIL Como fepoem em praxe o remedio que ácima apun
tamos de fugir das occafioens , &perigos? p. ír
VIII. Ci тоfepoem empraxe o remedio defugir da всю.
ßdade} р^
IX. С ото fe ¡ оет em praxe o remedio da frequence
dos Sacramentos , para extinguir os vicios d*
finfualidade ? P- 5 ¿ .
X. Qnefrequencia emcommungarttrá apejfoa, que
ufa d<ße remediopara a Caßidade ? p.64.
XI. Como fe poem empraxe o remedio dojijum , & af.
pereza de vida? p. ¿*
ХЛ. Como fepoem empraxe o remedio de refiflir logo ал
principie da tentafSo ?t í*7&
•t €om
.'•
Ccmófepoemempraxe erexetioda humildade
para defenfii do animo cajio? p ft/j.,
?tee ctttja háfxerciett de Oração menta/,c-r como
T q > -fi pratica ejfe mejs ncima apontado t para a
* Cafttdade^ ,:,*•, p oo.
XV. Que cotefahe andar em prcfença deDeos,& co-
* tf. , - • inoferve *fte remédiopara a Ctftidude íp. i ot .
, OCVt J^iw exemplos dos que cultivarão a Cajhdade, pó-
.4-.'! dera, kum conjiderar , para maisfé «jfeicotr a
»!•'• ;s- ejíaviítude í p.llO.
. XVU.Deij/íie exemplosfodera hum tirar o fruto de if-
-^"- i. tormento nfyrefente matéria? p. itl.
.• XVJH. 5íy?;W conveniente mejo,para atalhar as reinei-'
'<. '•<• dentiasdafenfHaltdadeifítiier-uotedeCaJlida-
de , ottfgeitarfe aojugo do Matrimonio^ p. i yi.
XIX. ComokavemospcdiraDeos Noffo Senhor o -dom
. ci f . , </íí Caftldadeí p. i .TÍ-.
- XX. Com»fé hadeportar apefíba , ^ r/?<í f»; c»f}ume de
." ;: peccado imrnundo contra a natitre^A ? p. 1 6z.
• XXI. Porque raaão he conveniente não muâi. r de confeí-
for femjnfta canfa^particularmente em cajos de
uv^ reincidência nopeccado ? p. 1 8 I .
"""~ Qftè aifiz.osfervirao aos co-ticubinarioi^ para dei-
yaremfeu máo ejladot cif nau tornarem a. fé tm-
plicafúctle í1 p. j o i .
. Com ejc ofíderacoes poderá hií entrar cm temor de
Dfos & abfter-fe do peccado deadt<Iterio^.y.G%.
. Como fe portara hãa mulher cafadit , pa.ra não
-p. 22.1.
uc conf^eracoenijerviraa, parasite aj
W '
fts , &freirÁticosft tntrem do tt-ltar de Das ,
tá" deixemfuaprojMH converfácao í p. 117.
,£ff* qfarma hade dirigirfeusprqfedimtntos tyjt*
R^Kgiofa êjdffèja tvitfr eftasconverfoçoéjíp.ífó.
XXVil. /V ondefé conhecerá [è o amcr cftitapèffoA tèift
a oxtra,heefpiritnal, ottfenfttalt P-1^-
XXVIU. Com q confideracocnsféperftutdtrá hama péfjs*
a aêfter-fe depalavras torpes ? p. 157.^
XXIX. Se hf cotra a, Caftidade ouvir cotoedias? p. 162.
XX.X;Sf o qdefejafer Cafto devi fugir de Irvros amato-
rios,pinturas oífcenas , mujtcas lafcivas, citei*
rãs deítciofos,faraós, & bailes%em q entrao mu-
Ihérct*. p-1/0.'
XXXl.Senof"refpalhadodf o/bos,& muyfitcilemfal-
íar, pode correrpertgo a Caftidade* p. 18 5.
.Sf hè couja pouco conformt a, Caftidade Àfa*
gar animais í* p. 187.
XXXIII. Qtfe remédios haverá par* ÍMO padecer illtt-
. . foens venéreas nofturnas' p. 189.
XXXÍV. Comefé deveportar hít Cvnfejfor , que deseja
^ - não manchar a Caftidade- i— p. xy^j,,
XXX 7. Se o Confeffor.de mulheres devç fer breve, &
algútanfo afyere com eltas f p. 2 08.
XKXVl..Da$4: procede qa-pejjoa conteplativ* nu Qsta^
'- 1^0,0 fmta movimentos impuros vá parteii
rior, & òomofe ha de haver tifjflle. cafo fp.
XXXVII. Comofe hade havçr apejfoa', y - tendo feç
algum annos os exercícios efpiritttaes , (y eftu-
do -daperfeição , cahiomÁerAVtlmtWt offtft-
A CafiidadH V í«V* 9.
LICENÇAS,
T>*Cwgrega$&o,
O Padre Franciíco Pedrofo Pi epoíico da Congre
gação do Oratório deita Cidade de Lisboa, dou
licença ao P.Manpd Bernardez Sacerdo;e da mcfma
Çõgregaçáo,pava que polia ir)anda,r imprirnir hum li
vro, q cópoz inticulado:^í)jw^í dÃÇífildade^c. o qual
foi vifto,.& approvado por pelídas douta^ 4eftaCó-
gregaçãoyem té do que palTei a prefente firmada com
o meu nome , & fello do rncu officio, Lisboa Con-
j-egaçáodo Oratório, * i. de Outubro de 169$.
.\l ,-, -r n t r
FramtfcaPedrafo,

&o Santo Qfficfo.


. Paárè Meftré Franciíco de Santa Maria Qnali-
js_/ ficador dp Safito OrKcio veja ó Livro de que
cita petição trata , & informe com féu " -v"
boa í 4. de Outubro de i ( '

t. C, Mon,\. Frt'Gotiçiilo do
J L LU*
ILLUSTRISSIMo» E REVERENÜI.SIMOSENHOR.
VI com igual gofio , & diligencia o Livro intitu
lado : Armés da Cajiidadt , quecompoz, & quer
imprimir о M, R. P. Manoel Bernárdez da muito
exemplar , &veneravel Congrçgaçao do Oratorio de
Lisbo a , & em haver faido daquella cala ( verdadei-
ramante do Efpirito Santo )trazia ja a fua approva«
çao , poes todas as obras délia fáo chéyas de eipirito,
de fervor, de zelo,& íépre dignas deadmiracáo,nú«
ca de cenfura. Efta íingulafmete náó so,náo tem cou-
fa que ofrenda as verdades da noífa Santa Fe, ou a pu -
reza dos bons coftu mes,mas he hum efticaz antidoto,
& prefencifiimo remediocontra a corrupçao dos cor
flumes, nalcida daquelles vicios que tanto enfra*
queeem a mcima Fè, nos que lhe rendent a liberdadf
fazendo-fe eferavos do appetite. О Author os аг*
gue, & convence com tanca viveza, & efiieacia , comí
táo fortes, & poderoíbs argumentos, com; exempk»
táo ettupendos , & саэ raros , que , ou os viciólos fe
háo de perfuadir á emenda, ou bao de fazer elles
mefmos mayor a fua condenacáo. O eftilo ( fobre
argumento em que fe devem ponderar $ & medir
muito as palavras ) he cao caíto , táo candido , táo
puro , que fáo aqui igualmente admiraveis as Armas
lidCdßtddde , &c л Ca¡i¡ciuie das arm.ts. He em fim efte
livro (como todos osfdd Anchor ) digniífimo da luz
publica, & da veneracáo , & apr eco univerfa'.
Efte he o meu parecer ,fa!vot &c. Lisboa S. Eloy ,
7. de Novembra de 1 698.
FráiKtfa de Sítiul\fUr'tj.
".: * OPA
O Padré Meftre Frey Alvaro Pimertteí'Qyalifica-
Jor do Santa Officio veja a livro déqó<*e-ftat>e-"'
ticáo trata , & informe com feu parecer. Lis¿oa y.
dje^ovembfQdeidpS.^'.i-i-. /i .А ЛА o-át ... .
éaftr.e. (Toyo{._ Ь\п\. Z.C.'Me»/*.. Fr.Gottçalo do Crata.
•.r.".;¡"*.".; .'--! £ £{ /.' ■ r-> ( Q." ■';*•- ~ лТ! ......
JtLUSTRISSIMO , E REVERENDÍSIMO SENHOR.
REvi o Livroiritimlaciaví>vw.»í ¿j C^tt^L.heom- ■
pollo peto M. R. P. Mfínoe! B.rnaiídczjda'Co-
gregacáó do Oratorio, & netlc láo mai£<kini3ïivqs,
que achei parabexemplo , Sea hniracáoytloíüjoé- os
qué pode nefta cen-fura comprehended âp^nnà. Sa
digo que jà ^hojep©Je qualquer praça efpin.iu.jl con-
ffeléraríe fegtœa^vendo-fe braíLc.da com í/lmtxs tío
£pí„eí9 & cbmítábinexpugnav&sreparos , aílira pa
iera rçfiftencia näs invafoens da rafcivia , como pa
ra с retiro nos continuos alF*Icos<ia desordenada in* i
cüéntinencia, ; inimigp táo forte que акесогва de-
fprderntriunfa.Ecomo elle Author náaisexlefereve
a exctlkndk-àa/Cdfiiddde -, fcnáo que tarabem en*
fíf»a as armas com q»e a concupilcencia fe vencet
da licáo dette livro f¿ fegeirà com infallibilidade ñas
almas , o. amor delta vntude, & o triunfarem da in
continencia cómo táo nociva i & canto mayor deve
fera eiHmaçào que fe fizer defte livro., quanto he
ínayoro ?.perto em que asalmas fe acháo ñas liber
tades dtftc tempo , & na mu ltidáo de vicios que я
experiencia publica, & os coraçoens dos timoratos
^amentáo; & fufpofto que efte Author nefte livro
: > 5? Щ n**
rao dîz cou Га que nlo fejamuito ajufrada com' os
¿ici: mes da Fè , & Uèustottumes jwftam :nte pede
por Ci t i sfaçâo do ùu trabalho o permitirfe-lhea
impfcfTáo d_l!e para_confeguirncfte mundo dfnfr0
que cfpera Ла conveïfiodas aimas , & da ext irpaçâo
da lafcivia; jà que nieu P. S. AgoUinho lhe promet
te no outro peîozellocomqueefcrcveodefta virtii-
de a Deos Sen Ьогпо(Го por premio '.РглтЩ
•v'irtms eñe ipfe , qui virrufem deâit, ti qtit^e ^•CÍT,t'
ipfam , quo melius, & malus nihil bofßt eße , ?jj cap*
promißr. Efts lie o meu parecer. Lisboa no ~
Convento de N.Senhora da Graca4.de Dezembro

Vr.tAbAvo Pimente!. ■ » -L

Vlibsasinformacoens. pode-fe imprimir o ü


vrodeqefta peticáo trata, &depoes de im-
preíío tornará para fe conferir, & dar licença para
correr, & f;m ella nao correrá. Lisboa o. de Dezem.
bro de i6p8.
Сфв, Téyos. Din\, /.<". №n\. Fr.GonçalodoCra+t.

Do Ordinario.
V lilas as informacoe's, pode-fe imprimir o livro
de que efta peticáo traca , Qç depo'es de impref-
ío tornara para fe lhe dar licença para correr. Lif-
bo4 *з . de Dezembro. de 1698, . \

r í>. "Pedro Bifpf de Boma,


4 v Ss*
DoPap, . : 1

QUe fe pofla imprimir, villas as licenças do Sart~


to Officio, & Ordinario , & depoes de imper
io , tornara á mefa para fe conferir , & taxar &ftra
ido nao correrá, Lisboa i j¿ de Janeiro' de 1 699^

Bfixasi ТЛлгсЬло. Ölhtira, Coßs,

EStá conforme corn b feu origimj. ^Lisboa


Santo Eloyi 3 1, de Agoíto de 1 609.
Francisco ai Santa Maria.
VIfto eftar conforme com feu original , pódc
correr. Lisboa it de Setembrö de 1699.
Tojos. Diniz.. Carnciro, Fr. G.

POie Correr. Lisboa, г. de Setembrö de


1699.
Tr. P. Bijpode Bona.

TAxäoeftelivroem dofce vintens. Lisboa j".


de Setembrö de 1699.
Moxas, Olivejra. Cofia.-' ■ ..

¡#1
TRA-
TRATADO
DA VIRTUDE

CASTIDADE»
PERGUNTA í.
.
m coufa he Cafltdade -, dr qvaesfab õi
affos , &gràoS defla virtude*
ESPQNDE-SE3que he hua viítucte
moral ( efpccie da Temperança )
pela qual nos abítemos dos de lei
tes impuros da carne. Santo Am-
' brolio lhe chama : Inteireza izen-s
.
Cypriano: Enterro da fubftancia humana:
Punas kttmati* ftibftann* ; porque a peíloa ca
íra parece mona , ou que já fé enterroiu San
to Ifidoro llie ciwma : Fruto de fuavidade , Sc
% Tratad»
fermozura dos Santos incontaminada , catíe
veiroíuave doeípirito, & faude do corpo ï
Cajiitas enitn fruttus fuayitatis efl , СГ pulch/í-
tudo invioiata San&omm : caflitas fe>yitus men-'
tis eß,&fanitas corporis. Orígenes entre va-*
rios elogios defta virtude, lhe attribue os fe»
guintes títulos: Caßitos e H anima; yic~tma , & ;,
çtrports prxda ; ubertas ejoriafum , & ßerilitas
ann'nurn; prónuba janBitofts ,","& tepudium
turpitud'nis ; finçtriutts indicium y &. aboutie
fcAndalопт : A Caftidade he húa batalha ,
erujque a alma he a vencedora , & о corpo e
pjifioneiro : a Caftidade traz comiîgo fertiliV
aaüe de glorias , efterilidade de peccados ; he
rrradrïfi'hadafantidade , & repudio da tot pe-»
za ; indice de fin ceTidadé,& dtftruiçaôjçle.ef-
cándalos. A cfta virtude acompanlu.,& ferve
% Pudicicia ,cujo ofíicio he compor o afpecto ¿
lingua, máos, palTos , & mais movimcntos do
coi po , de forte que nada páífem dos limites
dahoneftidade >& decencia.
Os aétos , & graos delta virtude fe podem
reduzir aosii.gu.ntes cuto. i. Abfter de to
do o con en Incarnai , & illicito. a. Abfter
tarnLem do congreiTo licito :v.g. paraos ca
fados le darem mais à Oracáo , com mutuo
çortf-ntimu-to. 3. Refiftirryosdeftjosmaos
comía efta virtude ,ncgando-!hts tctalm^n-
ье o coi-Linimento. 4. Nao fe deter tm
p^nfamtntos impuros, exptilindo-os logo iя
r- . ima»
Va •virtüde da Cäßidade. ij '■
ithaginacäocu memoria. 5. Reprimir for-i
ttmente as rebel lióes , ou movimentos ds
came i & negar-fe as viñas, on quatfquer ou-*
trasocc&fiotESjqueosforru.ntàOi 6. Náotef
ftftntimuitosdacarr.e,ncm aballos do efpi-»
fito ^quando íetratáo materias do vicio сои-»
trai 10 : v< g. ouvindo cenfifíoens, cu curando»
males , ou eftudando Theologia moral tiod
pontos que re'fpeitaó as ditas materias: mas
paíTarJ>or eftas cou fas, cerno fe folie outras de
différente genero, conhecendo-as so por actoa
do- etiteíidimento , & nao por figuras da fan-
teña. 7. Neiii era fonhos íentir illufóCs
cauíadas de fantafias impuras* 8. Carecef.
Écmbern daquelles movimentos , que coftu»
ináo originarfe de outras caufas naturaes,8S
|*¿eccm athe as enarcas*
Elle ultimo grao dizjoaó СяШаиб, que
foucos o alcancía: 3¡í refere , que o Abbadc
Sereno ,Taráo efckfecido no excrciciode to
das as virtudes , irftou müito em pedir л
Déos noíío Sefihor o dorn' da perfeita Cafti-
dade: porque íLppofto que jà tinha a interior^
sao fe eontentava com menos , que carece!
»the dos naturaes movimentos exteriores, a
que eftáo fogeitos os meninos Jnfiftindopoeai
»efta demanda com oraçao incançavél, & fer-
ventes !agrymas,!he appareceo em fofthos hS
Anjo : о quai abrindolhe о ventre ( Como as
vtzes faz€mosABatomiftas,3cCiîurgiocns ?•--
* í A;ij tm»
4«- v~ Tratado
ritos para algumaoperaçao ncceflaria «За fuá
arte) lhe arrancou das entranhàs huma como
alporcade carne encendida, & a lançou fóra:
&tornando а сброг em feus devidos lugares as
entranhas , Ihe dilTe: Eis aqui eftaó feparados
de ti os incentivos da tua carne : fabe que te
he concedido o dorn da perfeka Caftidade »
que fielmente pedifte.

:
PERGUNTA II. i

Quantas differencas ha de Caflidade ?


REfponde-fe que ha huma Caftidade con«,
jugal , a qual reprime , & peleja ío con«»
tfa os deleites da carne illicitos; & outra nao
conjugal, que reprime tambem os quepodiáo
fcx lícitos : & efta ou he perpetua , & ie cha-:
ma PirgJHaddt'y ou temporaria, & fe chama Ce-»
libddo nos, que nao cazáo, & fuppoíloque al-
gum dia ]vccaíTem, vivem jàem continencia;
ou i^'/m^nos que roráo cazados. Santo Anfel-
rno referido porAIapide fobre aquella fenten«
ça do livro daSabedoría ;. O1 quampulchraeß
Cifu^etieratio cum claritäte : conta que hum
An jo differerçoû pelos.Agumtesfymbolos a
nobieza da virgin dade3 & a do celibado,&
caftidade conjugal, dizendo: Qjie a primeira
era cairo, a ftgunda pi ata, a terceira cobre : a
v
Юа vtrttide da Caßidade. f
primeira opulencia, a fegunda medioeridade ,
a tereeira pobrera: a virgindade paz, o celiba
to redempcáo, o matrimonio cativeiro: a vir-
gindade So!, o celibado tocha , o matrimonio
trevas : avirgindade dia, o celibado aurora
o matrimonio noute: á virgindade Rainha,
o celibado dona , o matrimonio ancilla.
Note-fe porèm, que eftes títulos, ou appeí-
Kdos menos dignos, que fe attribuem à cafti-
dade con jugalJie fó comparativamente as ou
tras daas differenças mais nobres defta virtu-
de : fem derogar porèm em que he verdadei-
ro Sacramento inftituido por Chrifto, para &~.
gnificaçao da ma conjunçao myftjca com a
Tgreja Efpofa fua , & para remedio da con-
çupifçencia , & meyo dà propagaçâo licita, df
genero humano , de cuja malta tira Déos oS
eícblhidos , que háo de reinar com elle eter
namente. Pelo que errou Saturnino difeipu-
lo do impio Simáo Mago , errou Marciáo
outro Hereíiarca femelhante , erràrâo os Ma-
niqueos ,Prifeilianiftas , & Encratitas em di-
zer que os cazamentos eraó illicites , & obra
inventada pelo demonio : & erraraó Luthero,
& Calvino em dizer , que паб obftante fer li
cito o matrimonio , toda via nao era Sacra
mento, nem conferia graça fanctificante,mais
do que a pode conferir (diz impiamente Caí-
vino)oofriciode lavrador,ou tozalor,ouça-
çatçiro. Mas que importa que ifto digalwrm
Д ¿ij ' Ca.1,1
6 ,\ Tratado
Cafvíno, fé lium Saó Paulo lhe chama Sá*
cramento grande: Sacrãmetum hac m^num fflí,
ProuveraaDcos que muitos Sacerdotes roífent,
como muitos cazados. Q^iem duvida, que náa
he repreheníivel comer hum do feu , & que a
he roubar o alheyo < Qnem ignora , que me-,
Jhor he prometer eu pouco, dando o que p'o-«
,meti : doque negar o que prometi , havendo
prorftetfdo^uitoí" Aconjuncção do matrirno-»
fiín teve por Author a Deos , & começou no
Paraiíb ; as outras tem por terceiro o dialxi^
.&acabãono inferno,

PERGUNTA III.
Çemquerazoensfe moverá hama pefioj
efta virtude, &a aborre"
, fer os yicio$ contrários? -
Eíponde-fe apontando alguma?.' l,, é
. exemplo de Chrifto Senhor NoíTo , quç
^tcoiheo Mae Virgem , & para que perma-
neceire virgem , fendo juntamente Mae ,
'quiz fer concebido doEipwito.Santo, Efco-p
flieo também Ayo , & Pae putativo virgem,
.queioy o feliçiflirno Patriarca Saõ Jozeph : &
Pfecuríbr virgem , & difcipulos caftos ; &
.j}the: o/O) nafcimento ( como alguns obfervà-»
p o.§ol em %no 4e Virgerr»,
DavirtHdedaCdßidade". y
^finalmente canto amoii efta virtude ; que
paiecendo em outras muitas materias varias
tentacóes , acalumnias; neftanáo confen-
tio que o demonio o tentalíe , ném q feus ad-
verfarios oufaíTem a lhe oppor acculacáo a!-'
guma : antes a fagrada Hiftoria Evangélica
nos adverte , que quando feus difcipulos o
acháráo tratando com a Samaritana , fe ad-
m raraó de quefallava com mulher; porèrrr
que nenhu delies fe atreveo aperguntarlhe
aq fallava сб c\la¡M¡rab<tntur qu'a cum mulle
re loquebdtur : nemo tarnen dixit quid qu.tris ,
éíiít quldloqueriscum tal E tanto aquella ad-
miràçaô,como efte filencio, & encolhimento
eftaö inculcando o aleo cone nto, que da pu
reza do Senhor tinháo formado, ainda fó соя-
fiderado como puro hörnern. Como fe diííef-
fsm: Couza nova , & eftranha he efta -, porem
myfterio encerra , &razáodeve haver, qua
nets ignoramos.
: í: Que pela íingular prerogativa da virgin-
ida'de entrou Sao Joaó em o valimento, &
amor efpecial de Chrifto: ella lhe adquirió o
ineftimavel favor de permitirlhe rcclinaíTe a
eabeça fibre feu divino peito: ella o adop¿au
por filho da Rainha dos Anjo;,5c Mac do mef-
ino Déos, di¿endo-lh: o Senhor dtfde a Cruz:
Mulher eis ahiten filho : &paraoDifcipulo:'
Eis ahi tua Мае : Vt hxyeà'tartm yhzjn'is Ш*
mini Vïrgmem Tdatrem Filius VirgaJujci-fierH
i -J Aiiij (dif
8 'Tratada
invita ( diffe Sa<5,Hieronymo. ) Efte fer fubftituidtf
S. Ъ1аг jbaó em lugar de JESUS por boca do mefmo
#//*. JESUS, para Filho de МАЩА Santiffima , he
hum favor tap infigne , hum premio taó ma-»
gnificojliuma excellencia taó alta ; que nun»
ca podé fer dignamente ponderada : porque
coníhtae ao Difcipulo amado ern hum* hie*
rarquia, onde hepreçifp fe toque com duas
dignidades infinitas , quaes fao a de Máe de
Déos , & a da Humanidade deificada de Chri- ■.
fio. Aoccafiaódetantobem foya Caftidade
de Joaó , como fentem os Santos Padres. . v
. 3 : a Caftidade faz os homens femelhantes .
a Anjos como frequentemente dizem os San- .
tos Paires. Porque fendo os Anjos puros Ef-
piritos fem compofiáoc , nem miftûra de ma
teria, tambem o hörnern cafto de tal forte vi-
Ve pelas leys do Efpirito, como fe carecerá de
фгрэ. Por onde exclamou S. Efrem , dizenr
do : Q ditofa Caftidade máe do verdadeiib
amor, & principio da vida Angelica/ Tu es a
que purificas o coracáo , & com alegre fem-
blante communicas , & diffundes tua fuavida-?;
de : Tu es huma maravjlhofa virtudc que
transformas os homens em Anjos , & a ma
teria terrena , & corrnptivel , em celeftial, &
incorruptivel ( Eprofügue dando-lhe outros
encomios ) : Tu es quieto , & feguro porto ,
mide fe acha a verdadeira paz ■ , & o rocheda
ímmovel,quenáocontraftáa as tempeftades:.
Da virtude daCaftidade. ç
ftt És-a efpiritual carroça , que fublimas atlic
os Ceos em corpo & almaaquemvaidencroj
,& fagrada nuvem ,q levantas ao alto aquel-
le q ati fé acolhe, Tn deftcrras as triftczas do
animo, & o confolas; tu reprimes a rebelliáo
das paixoes,& as ordenas^tu foíTegas as pertur
bações furiofas , & introduzes na alma fere-
Bídadefuave; & como fragrãte roza formoíiífi-
»a plantada no jardim da alma, a efla,& jun-
tamcnte ao corpo illuftras , & enobreces ,
& toda aqueíla morada enches de fuaviíTima
fragrância. Athe aqui efte Santo. Mas efta
comparação dos caftos com os Anjos , ainda
em certo modo tranícende a fer vemagem.
Porque íè nos Anjos a pureza he mais feliz,
nos homens he mais admirável : àquelles cõ-
pete por natureza , a eftes por beneficio da
graça, precedendo mui feridas batalhas, SC.
gloriofqs triunfos da carne. ^An^flkitm ç/0-
riam dçquirere ( di(Te Chryfoftomo ) m.tutf
tftj qnà.m bdbete: ejje ./inçelum ftticitÀtis f/Z, vir»
ginem efte yh-t»fis. VtYginitas enim boc obtinet
"vtrikus, (]«odh*bet ^Angelus ex nMUYA.
4: Qije n^ío fomente faó os caftr>s feme*
lhantes aos Anjos ; fé não também ao rnelmo
Deos. Aflim falíáocommummente os Santos
Padres. Saõ Bafilio [Preciofo benefício, gran
de mercê , & íingular dom he o da Caftidade:
pões faz ao homem mui fcmelhante a Dcbs
fia incorrupçaõ]. Saójoaõ Çlimaco:[]A Cafti-
, » " dade
to Tratade '
dade faz ao homem mui familiar a Dew,- Ж
femelhante a elle quanto he poffivel que ад
fejY]. Saö Hieronymo diz, que Chrifto Senk*
Noiionos deu o magnifico dorn da vifgi-nd**
de, pelo quai entramos ao conforcio da Divi
na Natureza; G -and!a nobis, & prêt¡ofa virgin
mtit'is promifjadonayit , ut pet banc efficiamuf
■Divin* confortes Katura. Б Sao Pedro Chry*
¿ologo diz , que o horaí vencedor das pai-»
xôes da carne tranfcende os Ceos , & die-*
ga voando ao mefmo rhrono da Diviadade г
Hamo , dum cayti'is exuperat pdffiones, tranjcendit
Cesium , & ad ipfam Deitatis peryelat federn;
Com ifto concorda o agudo reparo, que fez
Çaetano fobre hum texto do I. livro dosReis,
onde fediz,queEi-Rey Saul entregoii fua fi-
lha Michol mulher de David a Phaki filho de
Lais : Sau! aittcm dedit M'cbol filiam fmmuxo-*
rem Da-yidíhalti filio Lais. Porèm defpoes nq
Hv'ro fegundo , quando fe trata de como
Michol foy reftituida a David, ja eile mcfmo
hörnern fe nao chama fbalti , mas fhdttel. A
razáo deíie acrefontamento do nome diz
Caetano, que foy, porque E/ he hum dos ¡no-
.mes proprios de Déos na lingua hebraica : S¿
romo Phalti fe tinhahavido com Michol ca
itamente como hum mero deyofitario, fenii
Jhe tocar ; por iíToaorecebella foy fomente
JPhalti , mas aoentregalla foy Plwltiel ; iftö
h¿ , Phalti divino,.ou endiofadp. Porque os ca-»
»:..j ítos
Virtudt da Caßidade. i4
Jfostem muito de Déos, que fem muito de
JDeos nao poderiáo 1er caítos. l\\e Appelldtnseß
Thalti in i . libro, fjuanJo Sxul (ledit ei M'cbol
in uxorem: modo AUtem арреИл'яг 9h.tltiel ; itA
JjuodddAttctum e-ßnomirti ejus mm en Dei J I : e.1
XAtione ijnia nunquxm aenovit 7rl'cbol , intuitu
-Dei yeo íjttoJfciebdteffe uxorem Л.п»'У. Grande
por certo he efta excellencia daCaftidade.Por-
jque fe os homes eftiralo em tanto aparentar-
ib , ou tocar em fangue com grandes Prince- ,
■pes , & Reis : quanto mais devem eftimar
»quelle dom, pelo quai participáo a natureza>
& nome do mefmo Deos ?
-5 : Oye a Caftidade bem guardada táberri
becerto genero de Martyrio : Habet & pudi-fy'ß*
t¡tÍAfe>v.iram.trtyritim (инт ( dilíe.Saó Hiero- ¿аПе*
*ymo.) Е о eípiritua'.Gerfaó equiparando as metr'4r:
batalhas do outro breve martyrio com as ¿x"em*
Caftidade guardada muitos annos,affirmaque
eftas fáo fem du vida mais terriveis, & diffr4
cultofas. Eíb he o marfim rubicundo , a que
о Efpirito Santo compara os Nafarethnos ,
havendo-os comparado primeiro à brancu- —,
ra da neve , & leite : fnkh -iores uive, nitidlo~
resldHe^yubiuuni'iofes ebo>e anti/jao. Porque ó '*
marfim ( vulgar hieroglifico da Caftidade )
Îluando novo he alvo , com a antiguidadè
e torna verm elho. E tal he à Caftidade dos
•Hafarenos , ou dedicados a Dios , que du
rando muito, fe vefte de cor de rqmyrio,pon-
que
ri Tratade
que fe parece muito com elle. Nem faltáo
para ette martyrio tyrannos , que fáo o
Mundo com os leus eícandalos , o demonio
çom as lúas embofcadas, & a carne com a fuá
concupifcencia , inimigo tanto peior , quanto
mais domeftico. Pelo que dilTe Santo Agofti-
nho, Й em toda a guerra dos Soldados deChri-
fto, fó os combates da Caítidade eraó rijos,&
fortes, onde a pdeja he quotidiana, & a vito-
ría rara : ínter omnia Chrijiianorum certamina fo-
De be- l¿ durafunt prallл Caßitatis , ubi quotidiana />««■
Tteflate gniíy ¿¡г уаул victoria.
titulier, 6: Qje os caftos te eípecial premio accidctal
Cap,z. noReino do Ceo.Côfb daquillo de Ifaias: H<tc
jf- dich Dominus ¡Eumchis '. Dabo eis in domo тел ,
¿ s '. & In murit meis locum , & nomen melius л filiis
; * &ßliabus; nomen fempiternum dabo eis , <\uod ni
, peribit:lño dizoScnhor aos caftos: Darlhes-
hei na minha Cidade, & caza lugar , & nome
aventajado aos mais; darlhes-hei hum nome
fempiterno,que n áo perecerá jamais. E Sao
Hieronymo diffe: Jlrduum eß im Caßitatis ^eà
maiorafunr premia: Mui ingremes , & cofta ar
riba faó as veredas da Caftidade , mas tambe
«. ■< o galardáohe txctffivo. Concorda ifto coma
vifaó , que teve oPadreLedefma daCompa-
nhia de JESUS, ao qual defefperado de poder
confervar efte thefouro táo preciofo em barro
taó quebradillo, appareceo a Virgem das Vir-
.gens acompanluda de Santa Catharina Mar
tyr,
t)a virtude da Caftidâàe. 13
ly-f j & SantaCatharina de Sena (chias bel-
liffimas rozas , tfta branca j aquella de
Alexandria:) & o animou pormetendo-lhe
feu auxilio : & na defpedida cantarão aquel-
Ias Santas efte verfo; Dhin* rts eflCaftitas: di-
yina fed fant premia.) (]a<t continenti dat Deus,
j: Qye a Caftidade tem particular cohe-
tencia , &. vifinhanca cçm a fabedoria: como
pelo contrario a eftulticia dizern osTheologos
com Sante Thomas fer filha da luxuria. A-
^uelle lugat de Saõ Pedro, onde nos exhorta a
fer avizados, & prudentes : Eftote ita^ue pruJe-
tes: verte o Cyriaco que fejamos caftos : Fftore 4*7» i
itaaue cafii : como fé o mefrho fora obfervar;
as leis da pureza, queembolfar os thefouros
da fabedoria. Porque , comodiíTe Saõ Grego-
rio Njíleno , o animo cafto he á maneira de
hum efpelhç terço , que recebe com maior
abundância os raios do Sol da Divina fabedo
ria :ifuaicus
.-.
animas inflar nitidiffimi
, n- f • • , '
(/>ecalj olon-- L'u);

,-, ,
ff ubermscíeltjtis]itfientiit Ince completar. i>ao .,. g. .
Çregork>Nazianzeí)o,porexcellenciaoTheo. í!*;
logo , eftando hum dia applicado á lição dos ' "^*
livros fagrados, vio de rtptnte duas doiilellas
fermofiíTimas : & defdenhandofe delias, per
guntou efquivoqutm eráo.Somos(refpondè-
raõ abracando-o) duas Irmãs muito amadas ,
a Sabedoria} & Caftidade : & nos mandou
Ptos que te fizeíTemos companhia, porque em
«oração achamos a{ tárfivd morâdê. Ditas
cíks
f4 Ttrntaâô
eftas palavras defappareceo aquella vifaó mf*
fteriofa, Tambem a experiencia nos enlina*
quenas Univeríídades , & Collegiosaquelles
íogeitos que guardáo mais continencia ( ле*
ten's paribus ) dáo mellior conta de fi nos feus
çftudos: & pdo contrario tanto que os vi
cios da carne prevakcem, logo entra a acedia,
& fe perde a applicaçâo^ & curiofîdade das le--'
craç,& feefptrdiça о tempo, & concebe ai
enirno taotas,& tâo difparatadas fancaiîas , &
cuidados, & maldades-, que nao flea cem a-"
i*.* ■ ~. ' quelle foiïego, que Ariiioteles dilTe fer r ecef-
» ; . iario para crelcer na fabedoria : lAn'm* qu'if*-
fcencjo[ap/r.
8 : Que os amantes da Caftidade fao fa-'
. Vorecidos , & amp;, rades deDeos com efpe-'
eial protccçaô fuaj bem como, Joleph roy*
mais favorecido de feu Рае Jacob do que os*
cutros Ii macs-, & quai о filho ; tites de eman-
f ,. cipado, vive à conta, & direeçao de feu paeé
Muitos exemples ha defta verdade : tocare
mos aqui alguns brevemente. Theofila leva
da pelos verdugos aoprouibiilo (que era аса-*
• га publica das muHieres exportas) orou a De os
com grande confiança duendo í Men JESUS ,
amor meu , luz minha, & nuu t fp:rito , vede
efta pobrezmba, que eità com vcfco delpofa-
da,náo a entreguéis hsbeftas feras ; nao def-
pedacem os fam;nios lobos a voffaovelhinha;
guaacUieipoioaefpcfa ; dtftndei a pureza
J vos
Da virtude da Caflidorâe. 'tf.
vós q fois o aúthor cia purezajfto dito fé poz a
ler em hum livro dos Evangelhos , que trazia
no ftyo. Entrava hum moco lafcivoj cnchia-
fede pavor, calwa morto aos pés da Santa^
Outro vendo a detença determinavafe a en
trar, Sífuccedialheo mefmo. Defte modo fo-
ráo entrando , já não por lafcivia , fenáo pot
curioíidade : & virão hum Anjo de admirável
iragefiade que a defendia: huns fugirão, ouw
tros mon èraó , outros fé converterão.
Santo Euiebio Martyr Bifpo de Verricelli j
ainda qnando menino nunca beijou fuá pro-<
pria mãe: todas as mais acçoens concordarão
com efta pureza. Bufcando-o huma mulher
impudica,para lhe fazer violencia,toda a nou-»
te audou em bufca da fuá cama , & fabendp
muito bem aonde eftava, nuf.ca podeattinai;
com cila.
As Santas Virgens Ágape , & Chionia fo-
ráo prelas pelo Prefeito Licinio em hú apo-;
ftnto q fervia de guardar a louça,&apartlho»
da cozinha. O qual arrebatado da fúria do ap-1
pctite cai nal entroy para Uies fazer força.Ma*
ordenou, ou psrmktio Dtos, que lê cegalfe de
modo , que abraçava, & beijava as caldeira?,
grelhas, & panellas , difcorrendo de hj,ima
pata outra paite como louco .- & fahindo dali
com a cara tifnada , & os vertidos immurdos,
os de fuá cafa o /uígàraó por louco , & como-'
a tal lhe atiiavão cera o cjue tklmó nas máos«
iб Tratado
Tornando depóes em fi , determiñoü vingar*'
fedaquella (como lhe chamava ) arte mági
ca, a cuja (.fricada atribuía o fucceflo: & man
itou vir à íua prefcnça asVirgens, para que os
verdugos as defpiíTem ¿& feus impuros olhos
fe iaciafíem. Porèm Os venidos das Santas fe
Ihes pegaiáo como a propria pelle aös covpos
de modo, que naö foy poffivel appareeer par
te algúa délies. -.• ,
Mui^dmiravel, & propria doprefente in
tento hea hiítoria,que efereve Saô Hierony-
mo de Maleo monge ,- que fendo cativo por
hum bárbaro Ismaelita ,• juntamente corrí
ontra mulher Omita ¿ & cafada, efte os; quií
eafar para alîegunirfe mais da fidelidade , S¿
permanencia de ambos cm feu ferviço. Por
medo da morte y houveráo de difEmular fin-
gindo viver como cafados, & contertando en
tre fi viver ío como irmáos, là no campo , on
de guardaváo os gados de feu fenhor; E nao
cbííantealiberdade,quealí lhes concedía, a
oecafiaójcíle nunca a tocou, ou vio deípidá¿
Delpoes por occafiáo de hum formigueiro ,
que vio, fe excitou a fer diligente, & pruden
te no que lhe tocavaj Traçou com a mulhet
ftígirem : matou duas cabras do fatö; da car-'
ne fez provimefitQ para o caminho ; nos ced
ros feitos odres, palíáráo hum rió, que fe atra-
Vwífava. Havendocaminhadoa toda a preda
toes diss, olliandp para traz virao dous воп
лей*
"Da virtvde da Çaïïidade. jj
jnens em dromedarios , quç Ihes vinháo no
alcance. Dando-fe por perdidos encráoem 1щ*
macova; & tenvndo folie de alguma fera*
ali efeondida } por nao encontrar çqm a пдег
xe qimndo a fugiáo , deixaó*fe fear em пшф
canto logo à entrada. Pelas pegadas dà cora
elles o amo , apeafe , arranca a efpada , man»
da ao criado que entrees voies defperta Ш&
•leoa, que dentro fe alojava» corre erqbraveçi"»
da , & afoga ao criado, vendo-oos fugitivos,
ínas fem o faber о amo.Efte indignado da tar«
dança , cuida que lhefazem. refifter.çia qs dç
dentro: entra Gradando, fahe outra ves a fera»
:&x>mata. E logo vendo que о feu соли e.r^
fabido , fae para fóra com hum leaôzinho no$
dentés , & deixa a cava. Entáo os dous fugb»
fivos dando graças a Déos pelos havçr livradp
de táo manifeftos rifeos , & achaado os dro.«
medarios сот о mais nccelTario para a jorna*
da , a fizeráo muko a feu ialvo, Qye mais çla-»
ros (îpaes pode haver da efptcial protecçao>
com que о Author da purefa ampara os q\iç
fe lb.es dedicáo? ■-,;■_..
ç:{ Sc por hora feja a ukima : ) colhe-iè a
dignidade , & excelencia da Caftidade das
coufas a quena fagradaEfcrkura, & nos Sa» "" •
tos Padres, he. comparada. Comparafe à fra*
grancia qa? fenpioo Patriarca Ifaac nq*veíli. <stmf!
dosdefvii filho Jacob. Porque o cerpoheco- ¿y
rao veftido da poffaajroa :& deftç vcftidp he f* j
В Ьрщ
i% Tratado
bom cheiro efta virtude.Comparafe à acuee-i
'ña entre eípinhos : porque aflim como eítes
fervem deadefende-rdamáo atrevida, affirr»
os recatos, '& retiros faó os que aiíeguráo, Se
conferváoo delicado, &mimofodtíta virtu-
de : ou porque fe différencia , & aventaja hura
caíto entre os que o nao iaó , quanto entre os
efpinhos huma acucsna. Compara-fe à carca
de Mdyfes , ardendo, & nao fe confumindo :
*alheóefplrito na carne , fem parricipar da
•came: vifaó grande digna de admiracóes. Por
Onde a huta fervo de Déos, tentadiffimo, nías
■erh JSm vencedor neftas batalhas, acclamàrao
os derhôtiibs ,difißdo , aindaque contra fuá
Vóhtade: Vencerte , vencerte ; porque eftive-
fíehomeyo da's lavaredas, & nao ardeíte.
«Corrípata- fe;ás ábelhas , que geráo fem со-
■riiltátó de fexo, & foà obra he cera, & mel ;
Iftólíe, Ыг , &'fuavidade : huma , & outra fe
adía nefta viftude: luz para o conhecimento :
ê <jmtn рЫеЬгл tfl cttfla generan в cum clariute:
& fuävidade para a condieáo.
Compatafeao ungüento preciófo com que
fe uñgiou öaftä, & vaíeyofa |uditíi,quando fa-
Judith, |1J0 a-äeftröcat a cabeça do foberbo'Holofer-
lo'3' пег. Gdmparafe àpaimeira, a'fpera ho tron-
'co "pelas mortmeaçoens, doce hos frutos pela
*•£• paz j'&límpeza do corpo , & daeönfeiencia.
J\'1Z -Coai^árafé ao thefouro de nevé , que difle
Déos fajando com Job: thefouro cm razao
«lo
Da virtude da Cafliàaât. i9
<3o feu grande valor , pelo qual diíTe o Ecrle, Ecc'í.
íiaftico, que não havia ponderação baftante itf.io
{rara encarecer a dignidade da alma continen-»
te:&thefourode neve, em razão de fuá b,ran-«
cura, & frieza. Outros muitos fãoos fymboJ
los deita virtude , & os títulos , Si elogios,
comque os Santos Padres a exaltáo , que fé
quifdTemos expender , feria necefiario com
por volume grande , contra o que intçoU-
mov '-
Quem quiferpoes entrar neftes thefourof
da nevejdeterminefe generofamente a appli»
car( mediante a graça divina) as induítrias, .^.
& meyos para ilTo neceíTarios. Entenda, que
fé de ferir às rtpugnancias da própria nature-
za, & eftiver aguardando , que efta aceite go*
ftofamente a empreza , jamais fahirà com
ella. O caminho da virtude he cofta arriba:
quem não quizer canfarfe,não fubirà :
quem não íubir,naÕ poder à alcançala^' !»
laborAt pró -v'mute( ditfe Kempis ) n
го Tratado

- PERGUNTA IV-
■ г. . . i ч .:■'
...
<%tíaesfao os meyos efficaces, para alean-,
"\ far eßa virtude , ¿r expugnar os
'¿i , , vicios contrarios ?
REfponde-fe que os feguintes.
i Ser devoto dá Virgem MARIA
Senhora NolTa. -, ; .• r..; • <
x, Pedir inflantemente efte dom a Déos
^JoíTo Senhor.
. , 3 Fugir das occafioens , & perigos*- / -
- /4 Apartarfe de más CQjnpanhias. j,'-.'
. 5 Fugir da ocipüdade , occupando-fe ho*
neflamente.
6 Frequentar os Sacram&osda Penitencia,
& Cómunhaó fagrada. ¡ ■, • .
, 7 lejum, & afpereza de vida.
-o 8 Conhecer as tenjacoens , & refiftirlheí
logo ao principio.
9 Continuar com hum fó ConfeíTor , re-
çorrendo a elle tanro que lia neceffidade.
i o Darfe ao exercicio da Oracaó mental
1 1 Coníidcrar os exemplos dos caítos , &
eícaí metí' r ñas defgraças dos que o nao fováo.
i г Andar na prefcnça de Déos,
1 3 Sogcitai íe a algum voto ntfta materia
{cito cçfm diicriçïé.
Sogei
*Da virtude da Cajlidade. ^i
.14 Sogeitarfe ao jugo do Santo mâtrirrio-''
nio, quando a prudência aílim o diótar.
Q^em perfeverar neftas diligencias, náo
defrríayando com as recidivas , nem acovar-
dando-feàs difficuldades contrarias, fem du
vida alguma alcançará de Deos efte dom pre-
ciofiffimo , & da tormenta das tentacoens'fai-
rà ao alegre porto da paz , & tranquillidade

PERGUNTA V.
Comoje pratica, oupoent por obra o weyo^
que difíemos da devoção com
gem Senhora Nofiai
REfponde-re qire primeiramente deve hu •
corroborar, & avivar a fé no patrocínio
cia Virgem Senhora Moita ;poré[ quanto mais '
íe confiar delle, mais perÇftirà em o pedir, &
mais facilmente oconíeguirà. A efte fimlea
e3t;mp!os, c'e que achará muitos no C!eloe/{rel~ '
l*â-> do Padre Alo/a , &no Vittrocimodc U
Vir^en do Padre Andrade, & cm outros mui
tos livros. Aponto aqui de palíagem hú par
delle-. ' ' ^
..Em háa terra AZ Lombardia, certa dcfhftèl
]a beata,das q!Te chimãoreclufas^)itvindo'di- -
2er,quc fair.i ao mundo novaracnte a í agrada '
do> Ptègadores/JaCcjava maitíovtr *"•
11 Tratado
& tratar alguns ReUgioíqs della, para formar
Cö-Ceito daquelle inrtituto.Revolvendo com-
figo eft¿ pcnfamtnto , a vieraó bufcar, dous
Fi'hos da dita Ordern, que andaváo pregando
por aquellas partes, & tvavàraô coraellacon-
Veííacaó efpirituaí. Defpedidoselles,,ñcoua
beata ( quedei'ia ter efpirito pichólo, &.ob-
fervativo ) reparando. em que eráo muy mo
cos, & g:milom;ns : Sí cenfurava os Prela
dos ,qu&tal IiC-nça- cop-GederaóVcrtí a4ver»
tir, & cautelar os* perigorda Caftidade1, que
Corre fóva dos muros da claufura. Porèrrj
aquella no ite lhe appareceo a Virgem Saiitif-
örttiSenbo'a Noíía , moftrando-ie ofiiendida
do feu receyo , & lhe diffe: Que ellatinha al-
Cariçadod: feuprerioío Filho,que aquelles
RJigiofos o folfcm: ver1adeiia4Tiente ainda
no ftieyo df>s peyores fecular« , & entre, ц$
chamas fe preíervalfemilleíb?. E logo abría-
di» o manto» lhe moftrouamparadös- debako
dellemuytos Retigiofos dasdita Ordern ., en,-
l*e os quaes eftaváo aqwelles dousPrègadores»
Como fe a Senhora difiera: ve tu fe eftáo
bem defendidos , & acaílcltados -, Ve feKpode-
réópsnerJEarca dentr^as bacas,.&^síí*os da
fen tua belade. /
Outrocafo mais- admîravel traz Cefario,dc
que fe moftra , como o favor defta foberana
Virg:m das Virgen-s , rebate poderofamente,
& poem em vergonhoía fúgida os inimigos v
». ?1 que
Vv virtufa da Caftidade.
com fuás fugeftoens nos inftigao a fer
iranfgrelTores da Caílidade. PaíTou aflim. Na
Cidade de Bona,Bifpado de Colónia, lui m Sa
cerdote por nome Pedro, Vigário de huma
Igreja , amanheceo repemiiiamtnte enforca
do na porta do feuapofento. Aleides concu
bina tua ( que femclhante fim tem ícmcllú"
te tratoj* atemorizada com tão horrenda mor
te , reformou tão errada vida: : & para afigu
rar a converfão, remir ciou o feculo , & to-i
mou o habito em certo Moíleiro. yc colei:o,
Hum dia eftando a húa janella do dormitório,
vio que de dentro de hvi poço , que ficava ao
pé do muro do. mefmo edifício , fahia hunv
mancebo , o qual pondo, hnm pé fobre o bo
cal íby voltando o outro pç! a parede acima ,
& fubio à janella , onde eíltndendp a máot
pertendeo pegar lhe da cabe ca, & arrebata l Ia.
E! Ia eftremccid^ , deu hum alto grito , & ca-
hio para traz defmayada. Acodiráo ao cla
mor outras Freiras que a- levarão à canu a
Çc lhe miniftràraó alguns cfficios de caridade
com que tornou em (u Mas apenas a deixàráoi
só , quando aquelk moco ( que era o demó
nio ) tornou a apparecerlhe, & cprrjeçcu a fq-»
licitall^ cara palavras a,matprias. E como r áq
confcntitfe na inftigacão dkVolica , o cfpirn
t» immundo porfiav^ dizendo : Ftrmofa.
Alcides não refpon;das ião efquiva , qonfcn-
te, nciique,,te djgp ; qne eu «c daijei rnaviJo
B iiij Uon-
*$ trvtaâo
honrado, rico, & de boa condição : para qílfl
te inatas antes de ttmpo com jejuns , deíve*!
Jbs, & penitencias heíte lagar pobre ,eftrei-
rttój •& dcfaccommòdadoíVoltaíe para o fecu*
Jo , & goza das uélic as , que o Creaddr í&i
Ç^rao homem ! nada te poderá faltar j fé me
tjú '^cres foi- amigo* Reipondeo aquel Ia ver*
tlade:ra peni:en:e: Pe^ame de te haver fegmV
côti.os aiinos:apartate já agora,qnúrca mais
íohfchtir«:í contigo. Então O demónio fé af-
fcòil com tal torça contra a parede do apofen-
to, cjiiereíaltanio delia algiía parte da \m->
fiitindicia , ficou pegada aos vertidos de Alei-,
dês; & era hum vifro hegfo toais que o pez ,'
6í tão fctidô,c}ue ie tião podia tolerar» Dali
^oV -diante não ceifavá de a infeftar com re
petidas npphrçoeris já de dia , já de honte.Al-'
fãas Freiras lhe aconfelhàraõ tivxlTe fempre
mão agtia benta rpara o afugetítáf : outras,
^ile inccnfiilíe a cclía corh luifn thuribtilo»
EiKs } Sc outros remédios provou : porém cora
fáuco eiféitò 5 porque o irnmundo efpíríto'
íedià hum pouco j Si em cOntmchtè voltava. '
Até que outra Rdigiofa pròveftâ ern anhos,
Si vSrtiid.-s lhe ehfínoti j que tanto que. o de-«"
íftohio fé diegãííe j lhe arrcméffafTe' na car^
ÍSWfftà ,/íV 'TAjí \I jí , pronunciada efn vôX'
ítaràj 3c a't,i» Aflim ò fez corrt táo feliz fuceÍJ
1^ >, -que Ô ihirriigo 'de toda a £urt2â, Si méftre
lie toda a. lóiiilria f toraò lhe diatrioiihú San
to
.
Da virtude daCaßidade. 25
to Pontífice ) tanto que ouvioo íbberano no-
fhe de M A R I A, fugio como fe huma íetta o
trafpaffàra> ou alburn redemoirdio o arreba
tare : пет daquelle dia por diante fe atreveo
a chegar de peno, E Aleides ufando mais
animofamente daquelle arremelTaÔ penetra-
te, via j & otivia o inimigo fem temor algurrí:
ate que depoe.^ feita huma confilTaó gérai, fi-
cou livre de todo.
Feita efta primeira diligencia de confortar
afèdo patrocinio daVirgem , as obras com
que hum pode cultivar a fuadtvocaó, fao as
feguintesjou outras fcmelhantes,que os livras
eípirituaes >ou CoofeíTofes diícietos aponta-
rem.
i: Errt todas as feftividades daVirgem ,
que faó Coneeiçaô , Natividade , Prefenta-
cáo , Defpoforio , Anfiunciaçaô , Vifítacaó ,
Éxpeftacáo, Natal, Purificacáo , Prazeres ,
NeveS , Aflumpeáo , Notfa Senhora do Rofa-
rio , ÑoíTa Senhora do Carino , confeife-íe ,
& commimgue emhohradefta Senhora rom'
a mayor dilpoírcáo , que Ihe for poffivel»
z: Todos os Sabbados jejue; &oquédef-
falca nofuíiento proprio, de para o dé algtí
pobre.
" 3 : Tenha ho feu apofento alguma íma-
gem , ou eftampa da Senhcra ; & pe 'a rha-
fchá ao levantaríe , & à поте яо recolherfe ,
ou entre dia em varias occafioens , a adoré
com
г6 Tratada
com devoçaô , pedindolhe a bencáo como л
íua Мае , & Senhora , & faudandoa com a
Ave MARIA, ou com aquellas palavras
■dohymnoEccletiaftieo: Virgo fimulms inter
omnes mm , nos culpis folates , mites foc, & сл-
fios : on com outras femelhantes.
4 ; Todas as vezes que nomear ou ouvit
onome dulciffimo de MARIA, defcubra,
& incline reverente a cabeça.
5- : Inculque a quantospudcr a devoçaô da
Virgem , & recorva a feu amparo em todos
íeus trabalhos , tentaçoens , & neceffidades ;
poique nifto lhe tributa grande gloria.
6 : Tudo о que feus próximos lhe pedirem
cm nome defta Senhora , conceda fácil , &
alegre,fendo licito , & honefto : porque aílim
tambem a "Virgem acodirà promp;a a feus
rogos , quando a invoque nas neceffidades
proprias.
7 : Cada dia em hora certa , qtianto poíla
fer, diga ( fe he pelToa de mais capacidade )
em ¡ouvor do nome da Senhora cincoPfalmos,
que comecáo pelas cinco letras de que elle fc
ТгЛоло çompoem , & faó os feguintes; o Cántico M*-
reSata gvißcctk: .Ad Dominum cum tribul^rerclamävt:
'lk°~ l\eti'b'.(e ferro ttto'. In conyertendo Dominus : ЛЛ
vus na te levxvJ asjtlos.meos. Dz San Joiîio Monge no
Bene- Mofteyro de Sa6 Bertino fe efereve que ufava
Aittina cfta d?voçacV E quanto agradaiTe à Virgem
Ltfitd- manireftou D;os pelo feguinte prodigio. N0
*<<• anno
Da virtude da Caftidade. 2f
atino de 1 1 63. o acharão os Monges morto
na fuá cella , todo cercado de admirável luz,
& tinha cinco rozas de celcílial fragrância,
duas que lhe rtafciãodas mãos , duas dos ou-
vidp",:3£húa daboca,&em todas as folhas delles
eltava efcrito com letras de ouro o dulciflirno
r.omede MARIA.
8 : Quando vir alguma Imagem da Senho
ra da Piedade , ou Soledade, rtpare hum pou
co na agudiffima efpada de dor que traípalfou
o piadoíiflimo coração da Senhora vendo pa
decer a ftu Filho tão cruel, & afrontofa mor-
. te ; & compadeçafe da Virgem. Porque im-
poflivel fera , que eila íê não compadeça tá-
bem de ílias miferias efpirituaes,fendo a ma-
yor de todas o peccado mortal , & eftado de
condenação eterna. A Santa Brigida toy re
velado , que hum peccador de vida tão fen-
fiial , 8c eftragada , que tinha feito entrega de
ília alma ao demónio por cédula firmada com
íèu íãngue , & em felTentaanros fé não havia
confelfado , nem feito obra alguma de Cliri-
ftão , excepto o entevnecerf; , & magoar-fc
das penas da Senhora ao pé da Cru/,: ella com
padecida também de fui laftimofo eftadoj lhe
alcançou de Dsos no ultimo i';a de fuá vida
hum movimento de verdadeira contriçlo , cá
que fé confeíToa quatro vezes ; & recebido o
fagrado Viatico , partio deita vida para o Pur
gatório. Eaind-aque femelhantes valentia?
da
*8 Tratad»
da Mifericordia Divina , nos nao devem me4*
ter em prefnncäo, para largar as rèdeas ao vi
cio , Sc fiar temerariamente ñas notas dé-
voçoetis: todavía comprováo como he pode*
rofoo favor da Virgsm, para remedio dos
percadores, que a ella tem re curio. ■ • • . . ■*' ->

PERGUNTA VI. ; ,
Coma rezaremos o Rosario da Senhora
deforte que nos aproveite ?
REfponde-fe : Faltava ainda por apontar
efta principal devocáo ou culto da Vir-
gem Senara NolTa , celebre em toda a Igreja
Catholica, 8c comprovado rom innumeraveis
etfcúos milagrofos. Antes que.ponharaos o
modo de o rezar, fera be advertir os feguintes
pontos, ■,'•'"»•' - ' -
i . Primciramente determine o devote
hora pr ; fixa , em que cada dia pague efta vaf-
ialagem , ou tributo à Rainha doCeo : nao a
mudando fácilmente, Sc fem urgente eau*
fa : porque a deftraicáo de todas as Coufas co-
ftuma começar por alguma mudança, oual-
teracáoextrinfeca-, & tanto que o' demonio
confeguedenoj-, que juguemos com elle os
cantinhos paffando de hum paraoutro ( como
faztm os muchachos;) räais redo , ou mais
.■'*■ tarde
Va virtude da Caflidade. г?
tarde, nos ha de collier no meyo, & privarnos
de todos. f
. г, Biiíque lugar cerco , Sc w mais quieto^
& recolhido que puder.para rezar com attend
cao. Se nao pode fer na cafa proprj a , feja nj*
j(greja, que ainda he mais propria Cala de
Oracáo : Domas mea âomus Orarionis eft. E fe-. ЯЩЩ
nao pode falür cadadiaà Igrcj a,& tem gran- г1*1 J
de inquietacáo em cafa en razáo da familia ,
& occupaçoens , furte efte breve tempo ao ib*
no , recolhendo-fe mais tarde , ou levantan-»
do-fe mais cedo: (que affim faz para cGufas de
muyto menos importancia, ou talvez para of-t
fender a Depsjtk. o feu AnjoCuftodio fará de
boamente o officio de defpertador,fe lhe encer»
medar q o acorde atal,outal hora: com tanto
povèm que acordando-o, obedeça fielmente.
3. Se atentacáo do fono o apertar na ho-
ra da reza, levante-fe em pè , & a cada Glom
rid futrí , &c. com que fe remata cada my«
íterio do terco/аса genufkxáo, ou proftracáo}
porque a diverfidade defies movimentos afu->
genta a foítmolenciá. Benza-fe a miudo; por
que o demonio ccítuma infeftar com efU
perfeguicáo os que oráo.-. Pique-fe com hum
alfinete,o\i tome huns pös de wbaco , on uze
de qualquer outra mduítria,quc lhe cnímar,o
defejo eiheazdeorar : & porfiando vencerá»
4. S; nao vir logoodefejadofrutodo feu
çrabalho, ob eft? fe. lhe rtpreietar muy euftp-
fd,
3o Tratado
ío , advitta bcm que na perfcvcrança eftà a
virtude da boa obra -, & he táo necelTaria pa
ra Icgrarmos o bom éxito de nolïos intentos
cm qualquer outre emprego; que fem ella
Bao haveria eftudos , ne m Univerfidades ,
fiem edificios , nem navegaçao , nem agricul
tura, mm livro's,nem coula äiguma de que
fe compoem a vida civil , & política ; porque
todos os feus mini fterios depende de ir*fflren-
cia continuada. Advirtatambem , que fern
cooperar da fia pane , nao quesera Dcos aju-'
dallo: & que quem nao f; canea pela virtude,'
nunca chegarà a confegnlr a fuá poffe , & л
goftar fuadoÇnra: & que a muitos maiores
pezos de trabalho fe fogeitáo os -home ns , por
levar hum officio , ou fahir com huma demá-
da, ou a juntar fazenda , ou fervir a E!-Rejr
lia auta ,ou na campanha; & tudo aturáo cora
o fentido no proveito , ou honra , que váo
bufear. Quanto mais fe deve logo foiVer hS
trabalho táo leve a troco de huma vir.üde ,
fem a qualanatureza fragil nao pode n.fiftir
a fais pvoptios eftimúlos , & aos combates
doinimigo ,.& vira a fedeíp^nharnocoftu-
Iríe do p¿ceadp ,& na condenaçâoetema.
5. Por qiranto o Exerckante nao faberà
ta' vezamotftarfe com eítas ou outras feme-
Iharités räzritm; & о dt frión ¡ó Ihc armará
*nil trhpafrás'para o divertir da'íua dévocáo;
impere* muito'fcTitirt'gaffe'à-tiireeÇuo ,'&çai*
í"1 dad*
Da virtude da Caßidade. 31
¿ado de algum Padre efperitual exprimenta-
¿o , a quem de conta clara do feu mal , & do
feu bem , & pela defte Sacerdote correrá о ex-
hortalloà períeverancaj& encaminhallonas
difficuldades , que occorrerem. Porque deve a
peffoa affentar comfigo firmemente , que o fa
vor da Virgem Ihe importa emtodo o cafo ,
& que о terà certiffimo , fe a invocar cada dia
pormeyo defta devoçâo, que confta ferlhç
muy agradavel.
Suppoftas as íbbreditas advertencias , ai
modo de rezar о terçoheofeguince. Primei-
ramente faça ado de contriçâo, ou fe esfor
cé a fazello conforme Ihe for poffivel na pre-
lentc difpoiiçâo de efpirito em que fe acha.
Logo benza-fe dizendo : Deus ;*» adjpforium
tneum intense , Domint ad adjuvandum tue fe*
flina. Gloria Patri, & Filio , & Sphifui Sán
elo : Sicut erat in principio , & nunc <ff femper,
<f infeculafjculorum Jímen. Logo pare hum
potico, & recordé mentalmente oprimeiro
dos quinze Myfterios , que abaixo váo apun
tados , repagando pela memoria ftimmaria-
mente o que fabe da hiftoria delle. Efta deté"ça
pode fer mais breve , ou larga , conforme ti-
ver tempo,ou deVocáo.Depois pèça com atfe-
¿to à Virgem Senhora NclTa , que pelo gozo ,
dor , ou gloria daquelle tal paífo ,011 Myftcrio
( conforme forera os Myfterios , que naquel-
le dia toma para meditar ) Ihc alcance dé fea
preciofa
%г Tratado
preciofoFilhoo dorn da Caftidade , & gratín
para nunca mais cahir em peccado mortal.
Segue-fe a reza vocal , dizendo hum Padre N.
& dez Ave MARIAS, & no fim deiks GU?
.rWPMri > 8cc,.8c temçompridocomaprimeir
ra decada do terco. Domefmomodo corre
rá as outras quatre, variando s6os myfterios ,
&meditacóes.delles.Por remate de tudo dirá
huma Salve Rainha : & pedirá graça para со-
t inuar nos feguintes dias. No entro dia pe
gue dos fegñdos cinco myfterios;3çno fegujnte
dos últimos cinco, quefazem por todos, os
quinze , de .que eonfta o Rozario. Depoes
torne a pegar outra vez dos primeiros , & af.
fim ande em roda. O tempo , que eoftunjíi
gaftar efta devocáo, rezando.de vagar,8c comj
applicacaó (quede outromodo , nao lhe lu-
ziràmuitootrabalho,febemfempre terà al-«-
gum fruto ) pelo menos he rn^ya hora, Eftej»
certo quempcrfeverar , que nao pallará œui-.
to tempo , que fe nao veja mudado interior
mente : & experimentará eípecial protecça<5
divina , em lhe deíviar occaíióes perigofas , 5$
mitigar os cítimulos da carne , & fugeftoes do
demonio vkntiráocoracáoymais aborrecido
da vida fenfual, & ;;fí¿icoadp aos bes eternos;
com tanto que por íua livre vcntade > & de
propoiisofe nao va metçr nos laços do mi-'
migo, defprezarvo tudo. Mas aínda nv-íle ca
fo fempre por repetidas , que fejáo as vecahi*
« i ..jj>¡ das
2)¿ virttide da Câitidaâe. 3i
flas lhe convem continuar a íuadevocio dd
modo, que pudcr, fazendo-fe para iífo vio»
Jencia. (,.■..'
Os quinze myftcrios doRofkrio daVirg«?
fáo os feguintes.Cinco gczofos: a faber. 1 .Co
mo aVirgem foi annunciada pelo Arcanje
Sao Gabriel, por Máe de Déos, 2. Como vi*
fitoua fuá prima Santa Ifabel , & efta conhe-
ceo o bendito fruto,que levava em feu purif-
fimo ventre^ 3 é Como nafceo da Scnhora ft>
cando ella Virgem, o Menino Déos na lapi-
tihadeBe'èm. 4. Como o Menino Déos foi
, circumcidado ao outavó dia , & lhe foi impo*
fto o íoberano nome de J E S U S. 5 . Como íe
perdeo da Senhora ^ & ella oachou ao tercei-
!» dia difputando entre os Doutores*
Cinco dolorofos: a faber» 1 . Como ChriV
fto noffo bem orou no monte Olivete , fuou
fangue » & foi prezo. 2. Como foi amarra
do i columna,& acontado cruelmente. 3 .Co
mo foi coroado de efpiiihos , & efcarnecido,
& reprovado do feu povo, & pofpofto a Bar
rabás. 4. Como levou a Cruz as coilas, & fe
encomrou com fuá Máe Santiflimà , trafpaf-
fando-fe amlx)S os coraçoens hum com a pe
na do oiitro. 5 . Como foi crucificado, & diíís
as fete palavras , & cfpirou,,
Cinco g'oriofos : a faber* i. Como o Sí*
nhor reíufcitou gloriólo , ¿5c triunfante ao
terceiro dia,& vifitot* fuá Máe Santiffifila cn-
C chendoa
34 Tratado
chendo-a de pra¿eres. ¿. Como deípoes dé
haver apparecido varias vezesaos Diicipulos,
& converfado com elles, paffados quarenta
¿ias fubio ao Ceo à vifta de todes. 3 . Como
«nviou о Elpirito Santo , eftando os difcipu-
4os juntos com a Senhora no Cenáculo , & os
enchco de feus dons. 4. Como a Senhora paf-
fou deftavida com traníitofeliciflimo,achan-
do-fe prefentes a elle os fagrados Aportólo::
& fuá bendita alma iubio aaCeo. 5 . & ul-
■timo:Como a Senhora refufcitou, & unido feu
efpiritobema /¿turado com feu virginal cor-
po , foi alTum \3l ao Empyreo, & ahi coroada
por Rainha de todas as creaturas.
A meditaç io de cada hum defies myfterios
(q he a principal parte defta devocáo ) nao he
necesario , que ie forme fempre pelas mef-
mas palavras formaes, & pelas meímascir-
cunftancias de cada palio; fe näo livremente
conforme o efpirito de cada hum Ihe diciar.
Porèm fea peíloapor muito rude nao fouber
meditar .pode valerfe das meditacóes dos di
tos quinze myfterios , que andáo na cartilha
do Padre Meiere Ignacio : & quando no fim
decada huma forma a peticáo, faca fempre a
do dorn da Caftidade, que he o que fe preten
de alcanzar.

PER
фа virtvàe da Caßidaät. 3f

PERGUNTAVIÎ.
Como ß poem em praxe 6 remedio qué
fe, ácima aponíamos , defügir as occa-
fioens, &pertgos>
"tS Efpohde-fc que obfervando as fcgumtéS
XV. regras ,ou outras fcmelhantes¿
й ti Niíiguem fe fie de fi, por muy provecía
q fe:a em annos , Se virtudes.- a nofla carne he
inuy traydora : temerfe dejlahe affegurarfe j
asíegufarfe lie cahir. O grande Padre S. Ago-
ftinho diíle : Contra lihidinis ¡Вит лрргеЬем- Sentit
de fttgam , fiy'ts obtlnere y'iRonam : Contra o * 5 °*
impeto da luxuria^ lance a fugir quem quizer ^ temi
vencen Defte remedio ufou felizmente о ca- Р°Щ
fto Jozeph : largou a capa, tomou a fúgida, al-¡
cançou a victoria: fem capa ficou mais gtntil-
nomern, ôccorrendopareceomais fizudo¿ &
modefto : ein corpo falvou a alma , fe parara i
Bao fei onde pararía. Bern fabia S. Paulo as
deftfezas de lutar contra os vicios : mas con
tra efte da luxuria nao nos enfmou outra iti-
duftria mais opporuma, que a fúgida : Fit&tê
Íorn'cationenii Amefma nos apontou o Rea!
Mofeta, quando agradece a Deos haverlhé
dado pès de Cervo^ & bracos de bronze : Qui pf. 1 74
perfectt pedes meos ianquam ceryorum;J>ofuißiut $4t Щ
CiJ éxHmi%*
$6 Tratado
arcum <<rciim brtchi* me*. Se para os braços lhe
fervia fortaleza de btonze : de que lhe fervia
para os pés a ligeireza de Cervo;1 Davi-.i havia
^e tugir, ou havia de lutarí" Húa, & outra con-
fa ; porque ambas fáo neceffarias na efpirituál
imlicia. Ha tentações que fé vencem fazendo
roftro ao inimigo, & avançando a e!le: & ha
tentaçoens, que fé vencem largandolheo cã-
!po. Deitas he a da carne: & para eftas fão ne-
ceíTarios.os pés de Cervo , fé para as outras os
braças de bronze. Não nos prefumamos de
bronze em combates que refpdtão o noíTo
barro. Qualquer homem he eltatua , não fo-
nhada , mas verdadeira ; não fó quan
to aos pés , mas toda ella de barro : &
qualquer occaíiáo pôde fer a pedra fem mãos,
que lhe moftre fuaprefunção temerária, com
uia ruina laftimofa. O P. Laines da Compa
nhia, Varão eminente em virtudes , que por
ellas fuccedeo ao Patriarca S. Ignacio no ge-
neralato, achando-ie alfaltado com huma oc
caíiáo repentina, & atraiçoada, levou da efpa-
da doefpirito ,que he a palavra de Deos , &
reprehendeo tão acrememe aquella mulher,
q a deixou confufa, &arrepenàida.Porèm de
pões o mefmo vencedor reconhecia, & con-
feífava, que melhor faria em haver tugido :
porque em fim o braço, ainda que meta o ef-
ciic?o Para receber o golpe » alguma couía fica
relentado r&*os fés não iw falvão do pccca-
Фа viftttde dáCaflidade. \f
So , mas tambem do perigo.
i. Se a peffoa vive em a !gua amifade , оц
correfpondencia torpe , importa ( & oh quan
ta importa/ ) que logo logo a expulfe : & nao
soque a cxpuife de qualqi'er mcdo-, fenáo
quam lenge puder de fi , & que corte todos os
(ios, por onde depoes pode torrar a tecerfe :
Caufam , quam home pen tus non abfcituiit , rnrfus
impllcAWr in ел : (diíia hum Padre doErmo) :
A occaíiáo que a peffoa nao corta , & arranca
totalmente , lude tornar a implicarle nella.
Efempre asrecaidas fáo peyores,que ¿s doen-
ç as. E advirta , que fe nao fie nem da idade
íer decrepita, nem do parenteíco fer chega-
do, nem do apofento fer remoto, nem da
nece(Tidade,que tern dotal fogeito, ftr urgen
te, nem do agradecimento, que deve a leus
bons termos,parecer precifo, nem finalmente
de outro qualquer titulo ou pretexto hone-
fto. Fuja,&quam longe puder, fuja: Tughe
femïcationem.tujà como de ar ptftilente: cor-
telhe o paflo,como a incerdio : crea que a
fragilidade humana , & a aftucia diabólica ,
he maior do que ponderacáo alguma pode de
clarar. Para qhe aprender na defgraça pro~
pria, fe pode efcarmencarna alheaíOucao (e-
guinte cafo que refere o P.Chrilováo da Vei-
ga da Companhia de J E S U S, & , fuccedeo
neftes noíTos tempos.
Húmercador de SeviJha pa'Tava as Indias
Ciii fa
3$ Trntado
Ye¿d. Vax3 augmentar cabedaes; & fe embarcQü
Çafos juntamente com huma fuá amiga. PaíTados
rtros alguns días de viagem bonançofa , fobreveyo
ihr,t. humatempeftade que os poz em grande rifco.
*Mu6. Clamaváo todos ao Ceo pedindo mifericor-
dia, & muyto mais os dous amancebados pro
pondo emenda. Porèm aplacada a tormenta,
& apportando a Manila';, continuaráo romo de
pntes o feu pecçado, Offereceo-fe fegunda
occaíiáo de embarcarfe , & levou tambem có-
figo a mefma companhia. Levantoufe outra
mayor tempeftade,com que a Nao violeta
mente encalhada em huns penhafeos fe fez
pcdaços, perecendo quaí] todos os paflageiros.
Fluctuando o mercador entre as ondas offer е-»
ceolheDios humataboa, de que fe pegou -, ¿V
a mnlher veyo tambem a encontralla , & fe
pegou da outr4 parte della. ДН conhecendor
fe a maldicoaváo ■ a íua vidagaftada em or-
fenfa de Deos,renegaváo dé gofios táo arrifçaC
do?; alieráoos clamores, os propoñtos, &
refolucoens de nunca maispecçar. Paífoufe a
noute , amanheceo o dia íereno , & q mar
queto , Se elles junto к terra: fáhiráo , dé«
rao graças a Tleos, renovaráó propofitos , &
partirán por terra p£íraMani!a,Qué nâq différa,
que efte honcm fe haviade meter Cartuxo ,
&que щ. mulher fe haviade retirara chorar
fkixs peççados em hnma çovaî Nada dilfo fize-
fáq; ícngqq^e tornaráo ao peccadoj éomo fe
Virtuàe da Caßidade. 35$
tal пЗо fucedèra. DeosN. S. que río quer a
morte do peccador , fenáo que fe converta ,
& viva , tornou a avifar ao mercador com hu
ma doença , de que em breve o defconfiái áo
os Medicos ; começou a defefperar dando-Ге
por condenado : chamaráo os de caía hú Con-
feflor. Efte o animou dizendo, que fe lançaf-
fe fóraa mulher , elle tomava por fuá conta
a fuá falvacáo. .Se nifto confifte ( dilTe oen-
fermo ) va tora : prouvera a Déos , q nunca a
ouvelfe conhccido. Feita efta diligencia, con-
feííoufe: & a melhoria da alma fe communi-
cou ao corpo de forte que fahio de perigo. E
logo Ihe pareceo demafíada a prelTa que Ihe.
deráo , & diife : Ov lá, chamen) a fulana que
anegue aquí. Veyo dando qucixas do feu deC.
prefo. Elle fe difculpou com a impertinen
cia do ConfeíTor: & para confolar a queixofa,
Ihe pegou de huma m áo , & a chegou á boca
& no mefmo ponto efpirou, & entregou fuá
alma a fatanàs,para arder no inferno em quá-
to Déos for D-'os, ■.. • ■ ¿
Defte , & de outros muytos exemplos , que
ha na mefma materia , fe moftra quanta he.
a fragilidade humana poíta naoccafíáo: & q.
nem avifos, nem caftigos , nem Sacramentos,
nem exhortaçoens baftáo para fazer. que а pob
vorafe nao agenda, fe fe, sá.oafaftado fogo,^
J. Nao frequence grades, ne -locutorios' dft
Freír as -, fe jáo eu náo-fejáp virtuofas, & re^
Ciiij foitna
■^o Tratada" '
formadas-, <\ do melhor vinho fe faz o melho?
vinagre; & náó ha paixáo, q mais fácilmente
traça , & degenere, do que o amor,cí>mecado
por eípirittiáí, & ac abando cm fenfual : fejáo
ou nao fejáo parentas jque o demonio co
mo aftuto lógico ehfina {como difia meu P.
S. FelippeNeri) a fazer efta precifáo: Mu-
lher,& náoparenta. Qnanto mais, que as
çonhecidas on dependences, que fe ajuntáo na
meírna grade , podemnáoter virtudc, nem
parenteico. Pelas entranhas de J E S U Chri-t
fío rogo a quem efte avifo for neceíTario, qu e
íe relolva a deixar por leu amor correfpôden-
cias com its ftias Efpofas. Vilhetes, lencos,pa-»
ftühas , cagóüias,' ramalhetes,doces, laminas,
nîuficàs', verfos , primores, finezas ,& outras
mil impertinencias deíke genero , faiba, & te-
«ha bem entendido que aínda prefeindindo do
peccadoque daqui fe póde,& coftuma feguir,
ílo mero mundo, carne, & diabo -, & que Ihe
«áo reiultarà daqui fenáo,que pagar no pur
gatorio, ou no inferno.
; * '4, Durroa so,quanto for poffivel ao /eu
cftado ,& caía : & fe he рае de familias , or
dene que feus filhos , & fervos , que jà paflao
de doze , ou quatorze annos, tenháo camas
apartadasiAindatëmo que eftaïdade he muí-
fa'ípórquiíi malicia ho]e anda-muy anticipa
is lee'ftVííb ifnpor^4 mais do qdefe cuida-'
P9f CansQj nlo'rccíe por' efta caufa defacomi
Va virtude da Cafiidadè. 41
tnodar outras coufas, & fazcr as defpefas
que forem neceffarias; porque o caro Ihe fa-
hirà barato , de o barato caro: & por evitar of-
fenfas de Déos, & eftrago dos coihimes dos fi-
Ifaos , Ç2.0 bem empregadas quaesquer dili
gencias.
5 .Nao faca romanas longe em companhia
de outra familia, onde ha promifeuamente
peffoas de hum , & outro fexo. Forçofamcn-
te ha de haver alimefa mais abaftada & ale
gre , aeçoens de mais confiança ¿5c carinho,
apofentos ou hoípicios , que nao admittem as
repartiçoens acauteladas : haverà tambem
{ellas, inílrumentos, cantos joviaes , & de
gaí/iofa , &c. Tudo iíto fío cocegas do vicio
que íblapadamcnte pretende introdufir o de
monio : tudo fáo diípoíicoens , q enxugáo a
lenha , para prender mais fácilmente o fogo.
E nada diíío agrada ao Sato, a quem fe dedi
ca a romaria : & os meírnos que a fazcm, bem
conhecem, que o feu intento principal he co-
mermais, & folgar mais.
6. Fuja de concuríbs,turbas , & apertoens
ñas Igrejas a titulo de algum Jubileo , Nove
na, Ou :avario folemne,ou de algú Fregador ce
lebre dos que admiráo , 2c recreáo entendi-
mentos. Porque fuccedem ali coufas, qnc fiía
mefma errormidade prohibe explicar , & em
que os Hereges tem tanto fundamento para
íe ejeendalizar da femorta de muytos Catho-
Г- !v:os.
4.2 . Tratada
lieos, com poiico para calumniar a Igreja Rcm
mana, inferindodaqui nao fer verdadeirà a
noíTa Religiáo. Para lograr os frutos, que o
eípintopode ter nalgreja em fèraelhantes oc-
cafioens, bafta ir em hora mais efcuià, & buf-
car pofto mais remoto de viftas arrifeadas : &
alihaja-íedomoio que convem à fantidade
7>fa!. do lugar: Damum titAm decet [anciituJe Domine*
92..$. 1- Se tem irmans , nao íe facilite
com ellas em brincos de máos : & faca por
efeufarofeu minifterio ou ajuda em aeçoes
immediatas à pelToa , de que nao aponía
mos exemplos; porque a difencáo diflin güira
cm particular o que for cautela honefta , do
que paflar a impertinencia affedtada. Forera
iító de catarem a cabeça, em nenhñ cafo fe
admitta; que he muy efeorregadio o coraçâo #
& penfamento humano.
8. Fazendo jornadas, logo ao entrama
eftalagern tomepoíTe por parte da virtude,&
modeííia dando-fe a conhecer em algumas ac-
çoens.ou palavraspor hörnern timorato. He
coníeiho eífce de varoes efpkituaes , & experi-
mëtados. Procure tábem apoféto fechado; porcj
ali as ferventes nao coftumáo fer imitadoras
de hua S. Catharina de Sena ; & andáo a coda
das bol fas , & da Caftidade dos hoípedes.
9. Do pateo das comedias que diremos ?
Querem ateimar os íius parroquianos , nao
haver nellas perigo:& parecelhes que o pro?
váo,
'.4¡*

Da vittude da Caßidadf. 4.3


vSo, & convencem com füa propria experien
cia. Que muyto, fe he gente q nao eftuda no
conhecimento proprio, ícicncia a que osSS.
ehamáo difficultofiflimaç' Nao he eíieo único
engaño, cora que o demonio os traz demen
tados, em caftigo de q amáo mais as trevas do
q a luz,Por ventnra que quandn aigu délies
vai confeílarfe , & he perguntado fe confen-
tio ali em máos perfamencos, titubea , & nao
fabe diftinguir que coufa he o tal confenti-
mento, & he neceíTario ao ConfcíTor dar mui-
tas voltas . para lho explicar por via deftaou
daquella comparacáo. Poes que crédito dare
mos a efta teftemunha acerca dos danos de
fuá mefma confeiencia ? Outras peiîoas , he
vprdasLe as nao abala o que vera , & ouveni
no tablado: mas a caufa pode íer peyor aínda
q o effeito, fe o houveiTe.-Sf he ferem de conf
eiencia que por outra parte fe farta de cjuan-
tos peccados lhe parece , & affim náe fente
entáo tome. Para que ha o diabo de eípantar
com novos peccados a caca , fe atcm encami-
nhado por outra via para a coya do inferno^
|£u foube de hq peccador,q fazia materiade ja«
ftancia do poder abfterfe de peccadoe ftádo
apàr da occafiáo delîe,qofo!icitava:&por ou
tra parte a fua vida era eftragada no mefmo
vicio. Faz o demonio as vezes com a alma o q
о gato com o rato; que o deixa efeapar das
nnhas , & dar fuâs fugidinha,s , para brincar
. ' *" njais
44 Tratado
mais com elle , & depoes comello. He 6am-
bem de advertir , quenas comedias, ainda
no cafo,que nao haja deleitacáo morofa, nem
defejo mió confentido,criafe todavía a!i hura
efpirito esencialmente mundano ■> iftohe,
divtrcido das coufas futuras, & eternas , 3c
eftimador das prefentes , & caducas , que he
a difpolîçâo geral para todos os vicios , Se ge-
ral impedimento , para toda a coufa de devo-
cao , compunecáo , Sípiedade. Na cafa onde
íe taz pólvora nao lhe chega o fogo: mas ali
toma a ultima difpoficáo para que depoes ca-
bindolhe qualquer faiíca , caufe horrivets
eftragos. Freguefes do pateo, guardaivos dél
ie .- porque ainda dado que ali nao toméis íb~
gr , Se certo que ali vos refluíais em polvo! a,

PERGÚNTA VIII.
Como fe poem em praxe o remedio de fu-
gir da ociofidadeï

Efpondefe, como ñas pergútas paitadas,


R q a primeira diligencia he convencer o
tnttndimento ,& acballo no conceito da ne-
Tcclt. ce.ffidade defte meyo. Sp~vo malévolo ( diz o
3 3 • Efpirito S. pe lo Ecclefíaftíco ) tortura, & cfye-
3-0.& Jexmífjg Jlltim ¡n орегапопещ, nevacet; muí-,
)t<¡ften. tjmi en;m ¡„¿¡¡¡¡он» aocuir otiefitas. In opera con*
" jiitue
DavirtudedaCaßidade. jtf
fittHt eum; fic ertim condecet ¡Hupt: Aoroim fer-
vodalhetrabalho,&caftigo; porque a ocio-
fídade enfinnu muyta malicia : aflinalhe tare-
fa em que fe occupe ; porque afíim lhe con-
vem. Queroim fervoheefte, fenáo o nodo
corpo î He neceffario logo darlhe que traban
Ihar , & nao permittirlhe os días, nem as ho-
ras baldias, porque nao crie malicia. i
Qyando a fagrada Hiftoiia nos refere я
David miferavelmente cabido em adulterio 4
pouco antes o tinha pintado ocioío.Era o tem
po em que feus exerckos andaváo na campa-
rha,&ellef: ficàra na Corte. Levantouíedo
Jeito à hora fexta , & foife a palïear , & e(pà-
recer a vifta ш hum eirado de palacioreylàqui
o ocio. Vio defronte a Bethfabee lavando- Ц
fe ; cobiçou , pcccou : & ey fahi a luxuria. Táo
fjguidos, & connexos andäo eftes dous vicios.
Por ¡(To cora razáo Theofrafto perguntado ,
que coufa era amor profano , refpondeor
Лп!пи -vacant!s , & otîofi morbus : He huma
infirmidade da alma ociofi. A meima defini-
cáo lhe deu Diogenes, dizendo , que amar lie
negocio dos qeftáot m ce jo. E S. Lourenço *</ • ,
Juftiniano о deckra muy b;m corn о fimil da -, ', q
agua encharcada , que por näo ter raovimen- ■ *
\i corrrmpe , cna vanos in- '
fíelos peçonhentos, &fevos. Affim o noflb '* V
efpiritofaltando-lhehonefto exeicicio, brota
em vkiofidades , & géra peeçados.
Hefte
tratado
Nefte conhecimento , & defehgano eílávã
hum cetto Padre do ermo , que perguntado
Pelo Abbade Pamenio , que faria para não ca-»
iir nas fugeftoens dó diabo; & paixão da car
ne j que furiolamente o arrâftavão j refpon-
-deo: Já lerieys o que David diííe de fi, que ma*
•tara huril Leãdj & afogara hurii Urlío. O Ltão
hè" ira, o Úrffo luxuria , & íê aquella dtvemos
extinguir com a manfidão do efpirito , ella
jdevemos íúffdcar , ou opprimir com a conti
nuação dó trabalíiOí
Defta doutrina 'poderemos eiitender » íi
éftarà , ou não futfõcado efte ÚrlTo nos que
jogãotpda anoute ^ dormem toda a manhã ^
paíTeãotoda a tarde : nos que fé ajuntão a
cpnverfar, & não ha fumor publico , ou par
ticular , nem procedimento de vifmho , ou
conhecido , que não venha a terreiro , jugan-
do com elle a pelota .- nos que gaftão bom hu
mor ( como elles dizem ) em gracejos , &
chanças , & ditos , & todas as mais efpecies
de ftalnla<jri;o , que c >ndena , & reprehende
S. Paulo : nos que não ha feíta,nem reprefen-
5» 4» tacão, nem touros , nem armação , nem cit*
trada de Princepe fecular , ou Ècclefíaftico ,
de q não fejáo olheiros^ Item nos régulos, que
não tem mais que fazer, que as ícberbar toda
a fuá terra , & murmilrar ^ Si dar novas , &
quando mais trabalhão , jugar. Item em du
ma certa etyecie de aleijados que ha } & Ião os
qu
Юа Virtude da Caßidade. 47
«ue tudo querem fazer por máo alhea , athe ,
fe fora praticavel ,0 maftigar о quecomem,
como fe efcreve qu¿ fazia certa Duqueza, que
lhe daváoo comer jà delido , para nao traba-.
ihar mais que em o engulir ; & depoes mor-
тео tào corrupta de bichos , que ninguem íe
atrevia a chegaríe a fervilla, pelo infoporta-
vel cheiro que lançava. Neftes , & outros fe-
melhantes íogeitos como nao hade produfíra
carne es frutos de fuá fragilidade , & malicia?
Sao terra por lavrar: como fe nao ha de cobrir
de ortigas , & efpinhos ? Sáocafa vafia : como
tiáo viraó habitar nella fete demonios dos íe-
te vicios capitaesfAinda no eftado da nature-
za inteira , & fá , quiz Déos que o hornera
trabalhaffe: Vojnit tum in paradifo volupwh, ut Genef,
ef>er<tretur,& cttfi»dirct Шит: quanto mais ne- i. 1 5.
ceífario fera que trabalhe no eftado da natu-
neza jà corrupta , & lapfa ?
Importa logo que a pefloa, que deftja ven-*
cer aJtentaçoens da carne, nao Ihes conceda
campo largo , & plano , onde os feus efqua-
droens fe formem,& onde fuá alma fique def-
córtinada aos tiro da inimiga artilhana.
Bern difle o Aportólo, que náoquizeíTemos
dar lugar ao diabo : Koütc locum dare dia- ^r ~я
loio. O ociofo dá lugar a quantas malda- 27.
deselle quizsr introdufír emnofla alma. Se
o di abe acemete athe aos occupados , Se
táo fainamente occupados , como he no Al-
48 Tratado
tar difendoMifla ,no confeffionar:o curanAi
almas ; & nr> meyo das mefmas lanças procu
ra fazer lugar ás (uas iugeftoens , & aifentar a
cadeira da fua peftilencia : que fera fe nos
mefmos lhe dermos lugar ¿. Poes : Holit; locum
dare diabolo : Nao quebramos fazer lug ir ao
diabo.
Proponhamos agora, alguns ufos partícula-«
Tzs defta doutrina emordem a defender a Caí»
ftidade.
1 4 Húa vez acordada a pelfoa pela manhá¿
& fatisfeita do fono, nao fe deixe ficar jazen-
jdo, falvopcdeaffim a difpoíícáodafaude,ou
outra caufa racionave'* Cama, &corpofäe
muy cafados, & acode hum pelo outro con
tra o efpirito.No travilfeiro daquelles cafados
virgensS. Eleazaro, &S. Delfina foy viña
cftar affentado Chrifto S¿ N. porque elle que
os unira pelo vinculo do Matrimoniólos fepa-
rara ( fem feparar o thoro ) pelo divorcio da
perfeicáo evangélica , & amor à virgindad e>
Mas no traviíTeiro de humapeíToa moca, &
íolteira ,& mais deípojada das armas eípiri-
tuaes de oracáo , & penitencia , do que aínda
dos vertidos do corpo , bem íe pode temer
efteja aíTentado facanàs, efperando a occa«
íláo de Ibe atirar com penfamentos màos ,
que fácilmente podem parar era obras pe-
yores.
¿. Qj¿em for capaz de eftudo da fágrada
EG.
Da v irtude âa Cajlidade.
, aqui tem occupaçâo honcfta, útil,
& ceteitoia. } esn que empregar as horas, ne-i
gandoas apenfamenuos , & palavras vans ,8c
çiaUciõfasi S* Mieronymp, pata afugentar de
iuemacoens, applicouíe ao eíhido da língua
Hebraica , para ler o Texto fagrado : & diflc í
í/tm* fcitntiam fcflpturtrum , <-7" CÂmis W//4 o»/Í
AWAlis : Tem u mor à fcitncia das efcrkuns,
& não o terás aos vícios da carne.
3. Os pães de famílias zelem, & velem
que feus fubditos empreguem bem as horas v
defotte que antes lhes fpbre a tarefa,do que o
tempo :porque Otiaji tollas, pcr!trcCnpiclinis tr-
c.us. \Temos que os jornaleiros cpmmúmenté
^ao levao ao CpnfeíTor grande carga no fexto
Mandamento. De que pocede ifto , íehão de
quê occupados os íentidos , & cançados os
membros, hão dão lugar atentarão.?.
4i As mulheres cozáo, b arderá,- fíefnjq he
ex:cupacão,queoÉfpiritoSanto louva na Mi*
trona mCigne:Di*tti t)ns apprcbenderuMfufatm ;
I!ons tempos em que ifto fazláo as Prihcezas ^ i i i â
de Portugal j como fé lê da beata Joanna fo
líia del-Rey Dom AtTonfo Ciyinto : & na co;--
reade apertar areca tinha efta fentcnçade
Chriíío S.- N. Aprende! de nii j que (ou trunfo ,
& humilde de éorxftoi Crierfi a fens filhos, & os
enfínem a terner a Deos : cuidem dos mini-
fierios particulares , & miúdos de /tia càfa :
•rezem , orem, leyáo livros, ante^ pios,- &
Ô
fco 'tratado x~
▼Agares, do que difcretos , & eruditos •, qn'e
fiáo he necerTario que fayáo letradas , fenáó"
humildes, & devotas Mais lHes aprôveita, 86
convem o recolhimento , 8¿ occupaçao , do
que a demaííada frequentaçâo das Igrejas pe-r
lafemana. ■*' :
5. Os cavalheros , que feportáoaley da
nobreza, & nem profelíáo letras, nem de préT"
íente feguem as armas , nem aífiílem na au
la do Principé, podem ( cadaqualrefpe&i-
Vamcnte)occüpar as horas nos feguintes exer-
cicios. Leyáo livros honeftos -■ «orno Cróni
cas , & Varoens illuftres, ou vidas de Santos ,
& a fagrada Bib! ia. De 1-Rey D. Affoi fo o Sa
bio, efereve Panormitano , que a paíTou toda
com (eus cemmentarios quatorze vezes-, 8c
affim quaiî a tinha toda de memoria. Apren
dió algum'alingua das mais geraes na Euro
pa, como íao Italiana , &Franceza; ouapar-
feiçoem-fe na Latina- ou toquem tambem пя
Grega ,& Hebraica; oucáo Sermoens,&Pra-
■ ticas efpirituaes, onde fe fazem era ordern ao
bemdas almas. Tenháo hora determinada
em que prove)áo as coufas concernentes à fuá
cafa , & familia, & boa eduçaçao della. Ha-
ja íeus días, óu horas para a caca , q exercita
as forças. ,'& diverte os cuidados -, & para o
«xercicio da cavallaria em ambas as fellas,
que muytos Fidalços ignoráo vergonhofa me
te, porque Cz coítumaráo á cómodidade dos
fe-
Davirtude da Caßidadel 5\
fijes , ca!e jas , & liteiras, & na occaíláo que
.€ >ríerece inexcüfave!, entáo querem ade«
ítrarfe de repente. Sejáa eftudioíos da arte da
p Atura, que occupa muyto os fentidos , ab»
ícrahin do-os de cuidadas menos honeftos , SC
juntamente recrea ; porque o pintor tem h5s
Jonges de Creador, em quanto pela fuá mío,
& idea dà aquelle fer exterior , & umbrátil ,
as coufas que pinta. Outra boa parte do tem
po pode levar a curioíidade das flores no jar-
dim ,bufcando , plantando, & cultivando as
rvarias,& exquifitas efpecies del las que o Cree*
dor fez; para q da fiva variedade, utilidade, Se
fermofura formaflemos degraos , por onde íu»
bira conhecello, & amallo. A Poefia, q tam*
b:m he hfi genero de pintura,& culcivo de pu«
tras flores, îeva niais innocentemente as ho*
ras, do queojogo, &pafleyo, & pateo das
comedias : com tanto que fe ja de aliumptos ,
quando náq divinos , & fagrados , ao menos
decentes ,& modeítos ; & nao ridicularias ,
& lafeivias , & lances amatorios , & momos
fatyricos , que commumraente fe ufaó.

- > '..■' .'

Dij рея;
5* >:-; • Traía<k\' "I
o- ,. ?.•-.•:•>-. r- . *,( . ;;' . > ••,
: PERGUNTA
'Conto fefòem em praxe ofCmedib dàjrfi
i quencia dos, SaçrçffleyiQS , pafÁjtx*:.
' \•
. . ,j ., ,
. Efptaide-fe procedendo . eomo nos rfti
.fraedios paliados , que primeiramente fer
caaipeUoaiVtvo conceito d» importância der
«e;para que aflim fé determine a applicallot
Asràzòenscommuas.ao Sacrameto da ILuch<ir
riftÍ4,Sc da Penitencia, que perfuadem fuá
-utilidade para vencéj- a incontinencia,pódcnl
/eteftas;; i. Qpe femptg..rque o fielípeel^ç
romo deve, & fem ficção, eftes Sartamentos,
içcelieou a primeira graça fantificante , ou
augmentos delia : & efta graça , por fer parr
ticipacáo da natureza de De os, he a que; emer
da , & fará as corrupcoens da natureza huraa^
Ha. i. Porque a operação do demonioquan-
do tenta , fempre he efcureçendo a alma , pa
ra a enganar : por iflo S. Gregorio Naziarize-
no lhe chamou Efcuridáo cerrada , Caligo den-
Jtfsimit; &PedroB!efenfe3 Ncffí/er, efpirito
que traz corfigo a noute; & Chrifto S. N. lhe
chamou abfolutamente Trevas : H<rc eft ber*
\eftrj > & pote/iái tenthrarwn. E pelo contra
ria naquelles .Sacramentos recebe a alma
muyta
Юл virtuáe da Caßidadel 5$
tooytáiuz para diícernir o Gem do mal , Sc
aprender quanto lhe importa abracar aqucU
Je, & reprovar efte .Importa logo,que o Tolda
do de Chriftovifta eftas armas de li:z,parade-
ftruir aquellas fórob'ras da íugeftáo diabólica.
3. Porque quanto o hörnern faz da fuá par
te mais diligencias por fe chegar a Déos , ta
to Déos fe chega mais aille, ampaTando-o, & " ' W
defendendo-o ; ronforme aquillo do Apoftolo
Santiago : ApfYop'mquafe £>?», &. «f>proptnqud-> L*c. 4^
bit -Vobis : & o quç o Senhor diffe peloProfe- 8,
¿a Zackarias : Cotrviïtïntînl ла тс , tí* conyer* - t ,
ЫглЛ -»os : Voltaivos para mi , & eu me j ¿*-J
voltkrei para vos, Б hum dos mais poderofos *,
rnsyos, para nos unirmos a Déos, fáo os Sacra-
rnetos,poes para ilfo foráo inftituidos por nof-
ío mediador JESU-Chrifto, & da fuá par
te nos trazem communicacáo de fuá graca, Si
dons, & parcicipacáo dos leus merecimentos,
& da noiîa excitáo , & corroboraos Fè , Bfpe-
rança, &Caridade,que todas fáo■ virtudes:
que toca m em Déos. »
• As razoens,,q particularmente perfuademr.
o ufo da fagrada Eskb*r¡lt¡a¿ pode m fer eftas.
1. Que o fegundo Adáo baixou a reparar o?
•danos do primeíro. Poes como a concupif«.
"rencia nos veyo peía carne de. Adáo , comen-»
do efte do pomo Vedado ; fem' du vida óreme*
dio nos hada vir pela participadlo da carne de
; Chrifto '. &:f¿ o mat-entroif 'рэг-hâm bocado
D iij vene-
w venenofo i Ъ bem nos ha 4c vir f*>r outro bo*
** ""* cado (?.\\xúhro.Cbii¡Uis vos- (diffç Julio Firmi-
rert, eo , Varâo confular, contemporáneo de Con-
t b>*" ftantino MíMO ) epulis (»¡srevocat ad lucent ,
Р .. & gravi, veneno patres artas ¡& torpentiamem*
, ' bra vivifiait, CMeßic'ihe renovate homintm per-
£ m dttum, ut cjuidqaid in nobis mortuttm eft, div'mis
®7''9 beneficijs renafcatur, 2, Porque a fagrada.Ço-
raunháo tern maravilhofa virtude para extin-
.< ■' ' güir as tentaç xns , & perturbaçoens do ani
mo, 8fesrorçar o efpirito contra ellas. Ne*
r . ftefentido ewlieáo os Expofitores fagrados
fUhn afilio do Pfalrâifta : Varaßt inconfpecia meo
e¿ < menfain ¡tdvérftts eos cjui tribulpitmel Prepara«1
ftesSenlwrhurna mcfa à mjnha vifta contra
.,/ os inimigos que me atribuláo, ES, Cyriljq
- / *^* diiTe expresamente •' Seda', çmn in n^bisma*
net CbtijfKSyjtvuntem memo- arum legem, pteta»
'* rem arraborai- , perturbâttones atpimi extinguí* i
Qjtando Chrifto habita em nos aplaca a furio*
fa ley de nolTos membres, corrobora a piedade,
& extingue as perturbaçoés da alma» E a expe
riencia mouVa,q affim como hum corpo fraco,
& extenuado da forne^ qualquer impulfo de
fera o poltra : a(fim a alma que nao chega à
fljcfa Euchariftiea , qualquer paixáo a arraítra,
H vence. % .Pqrcj fe o ouvir Mi(Ta?ou aínda o di»
«ér fomente .' Verb am cavo factum efl , bafta
уъщ afugentar de nos os dçmonios , & enfra-
tyjcíeí iuaslor^a? ( çoxpo de ajguns exemplos
►. .:. con-r
Dvv'irtuàedaCafiidadt. " 75
confia); quanto mellior iêrà paaa o intento о
j-eceber dentro de nos efte mefmo Verbo fei-
to çarne , & elTa carne unida ao Verbo?
Rcferirei em confirmaçâo da fobredita dou- chroit,
trina hum cafo que fuccedeo na Cidade de ¿as
Evx>ra pelo anno de 1 610. Como ceno Reli- 1^(сл\т
giofo de N.Senhora dos Remedios da Ordern ces
dos Carmelitas defeakos íoffe mokftamen- 7„w, ?
te tentado de Satanás com huma im- Цуг.д
portuna tentacaó carnal , & táo vehemente CApt <
que abrafandolhe nao só o efpirito , fenáoo я#8.
çorpo , tinha por milagre nao verem por fóra
os outros as chamas em que ardia : refiftialhe
valerofamente o fervo deDeos,& com a agua
de /bas lagrimas, que coi tinuamente derra*
rnava, pertendia apagar o incendio de que
/efentiaconfumir. Acodiaà oracáo, & ao
Altar, aonde clamava a Déos do mais intimó
de feu coracáo, pedindolhe o remedio do feu
trabalho. SuípsndiaoSenhor o focorro,para
affim fazer mais gloriofo o feu triunfo ; &
Creícia a affliccáo do Religiofo , vendo que
crefeia a tentacáo com a tardança do reme
dio. E affim , dizendo hum dia Milía, & eftan-
do para coníumir o SantiffimoSacramentoJhe
di(Te : Rey Omnipotente , á quem agora ен ,
aindaque indgno, hcide receber, & a cu jos
olhos nada fe ocçulta-,kmbraivos do trabalho,
& affliccáo de voíTo fervo ; & jà que em meii
çerpo peccadpr heide receber o volío puriífi-»
„ Ощ mo.,
Tratad» ^
& fojs vinho que gera virgens , &r
que alegra jaós efcólhidòs ; fazei que em rfii
caya o orvalho de voíla graca,& a chuva datCÍa-
flidade 3 que extinguindo efte ;perigofo frtgo ?
íne traga o refrigério dp quê meu coração nef
peíUta. Dizendo eftas palavras cõfumio as Ya-
gradas efpecies ? 8: na rr.efrnoiníbnte expe*
riiyientou fenlivclmente j.ique da cabeça ao
peito, & dq peito ao mais corpo hiadecendo o
fogo , £r ficava todo refrigerado : & conhe-
ceq qije Q Senhor heo que ajuda nas tribula-
coens , & 'procurou recebe l Io cada dia com
roais fervor.
As razoens que particularmente perfiiadèra
O ufq freqijeíite do Sacramento da Peniten
cia , pódetri fer. i . Porque a confiffáp traz
conilgo pejo , áf vergonha' : & aíTj,m como ,
Ic eííc pj)c> nos vence , comecemos novo pecr
íàio,afíim íç nès o vencemos ? adquirimos
nqva graça ;* &- eíía'^ nos ajuda a em:darnos. ÍV«
• * -*^* •*• ' " •

vida de in;t? P. S.Felippe Neri fé lê , que im,-


poí a lium laícivo confuetúdinario efta só pe-
tiitcncía •> que em vecaindó fé tornalfe acon-
felFar : &'diílíe rriocfo veyo aTarar dr> ftti rnal
áj>tin;Q? i. Pqtque as tentaçoens delcubertas
ÍÍQ Gonfdíor? Í5t Pach'é efpiritual perdem a fu4
* ç3, de force que atlié '£ intehção , ou pro-
,., Datiirtttdedataßjdade. 57
Pofito de as defcobrir,baftaàs vezespara ai
ciefterrar. Illico enlm (dilTe Cafiîario ) ut pâte- Coliли
fjtfÎÀ futrir to'itatio 'maligna marccfcit: & ante- г.сарт
quam â:fcrtti'Jn'is Judicium proferaiur.ferpem te- l0#
firrimus yelttt è tinebrofo , & fabrcrratito fpe-
'ся y'nttite confefßonis protractus, ad lucem quo-
'dämntodo dehoneflatus aùfcedit. ?; Porque na
Confiífáo ditferida , & гагд ordinariamente
eí querem muytos peccados : os quaés nao po*-
demos deteírar, & rctraftar^fe nao cm geral,
& coníufamcnte ; & por conieguinte a emen*
da delies fica mais difTjcil : porque quanto
mais em geral fazemos os prqpoíítos , tanto
menos erncazes fáo
Suppofto poïs oconheeimento da importan
cia defte remedio , digamos aîgûas regras de
como fe deve applicar. Seja a i. que a con-
fiflao fe façafempre com o mefmo ConfeíTor,
quanto permittir a occaíiáo , & para iffo fe
efcolha Sacerdote prudente , douco , & pió ;
!& hua vez efcolhido fe nao largue facilmen-
'te,ainda que elle moílre levar effa carga fem
toda a caridade , & paciencia ; & ainda que
as vezes diffira ou negué a abfolvicár». A.iuti-
'lidades diño fací mnytas. Porque primeira-
mentenáo pede o penitete faltar aocoftums
de confeffarfe, lern que o CófeíFor o advirtá,
& procure faber'acaüfá; Alem ''dlfto, feniob
ConfeíTor r> mefmo, tem' o penitente mai«
çonfianfа сощ elle , & fe explica' co.-tv menos
pala-
48 Tratade .
palavras : & fe refrea mais das recahidas,
vendo que о Confelfor fabe das outras. E fi
nalmente efte lheapplica mais convenientes
remedios como Medico de cafa , & jà notició
lo da qualidade do enfermo. Defte- ponto tra
taremos mais de propoíico га pergunta XXI.
2. Tenha o penitence grande conta com
levar a devida preparacio de do: dos peccados
cometidos, propollto de os nao cometer mais :
& qje efta cbr, jk arrepcndimenco lhe nafça
ído amor que tem a Dzoi , por fer efte Senhor
fun imente bon , & digno de fer amado : ou
до m^nos,que hafça do temar que tem ao jul
io de Deo; , íc ao inferno. E fe no propofito
da emenda fe achaíraco, peca aoCoitfeflor
?[ue o exhorte; 3c no feu coracáo a Deosj que
. he dé ver iadeira compuncáo , pela amargue
ra de fuá Payxáo , & morte facratiffima. ,
3. Comece a con№o pelo peccado,que
lhe caufa mais pejo : porque affimiîcarà logo
ma is ai leviado para dizer os outros , & a tal
antecipacáo , ou preíTa ajudaavenceromef-
mo pejo, o quäl crefce com a demora , como
inchalTo apoftemado em quanto o nao farjáo
com a lanceta. Alera de que por efte modo
feefcufa deouvir as afoerezas do ConfelTor,
quando fóra, . de feu tempo fe admira, ou nos
'reprehéde: com que as materias que fe haviáo
depuvgar, feencruäo, & ficáo dentro fola-
pando^Sc encancerando a «>nfcienc¡a. E fe
■ toda,
Va Virtual da Caßidade. 59
todavia o penitente nao. puder acabar, confi-
goodefcobrir alguma torpeza mayor (mu-
Uieres fáo mais arnfeadas a ifto ) diga ao me
nos : Padre por amor de Déos pergunte em
materias que caufáovergonha, porque ntecí-
(ito, & eftou em tentacáo de as cohrir.
. 4. Adverte-fe aqui de paflagem (porque
poderà fer util) que nopcccadocomanimaes,
que he hum dos q pödem caufar efte pejo,r.áo
be neceflario declarar que animal era. E no
pecado de penfamentoí immundos,&blasre-
mos , que vem à memoria , ou à imaginaçao
à cercadeDcos,oudaVirgem MARIA S. N.
ou dos Santos, nao. ha para que fazermnyto
cafo, nem tomar grande pena , por fevos , &
horrendos que fejáo ; porque em quanto a
sima deliberadamente os nao quer , & lhe
aborrecen! , & defeja que !he nao verháo ao
/entido, nao hapeccado, &porconf;giiinte,
nem obrigacáo de conf\ (Tallo. E nos brincos
Jaícivos, que pódem fucceder entre mininos,
ou mininas, antes de faberem que niíTo pec-
caváo , & oríendiáo a Déos , umbem nao ha
.peccado : febtmo melhor be dizellos, porr
que os taes fogeitos nao pódem certificar bem
.que o nao fabiáo naquelle tempo, falvo pela
idade /ermui atraz dos fete annos, temr<o
pmque coftuma começaroufodarazâo :~ tifo
tambem porque cafo que háó'houveiTe pen
cado mortal, o podia havef venial, & efte
r. "¡í aínda
ainda que nforíié obrigação, confeíTallo ,
confelhòmuy acertado. : . -."
5 . Tanto que p peccador recair, não dilate
o confelíarfS j porque as feridas freícas fbldáo
mais facilmente, & differída a fura criáo hef-
pcs. Qjiero duer, que o 'pecado, fé fcTiátt
atalha :çefá:penitència, multiplica -novo? pec-
frados ; como fé vio nas nçgaçoens de S, Pé-í
Homií dro, ?fc^/vw ( eniina S. Gregorio.) , quoitfêt
j _ • * 'fxznitftitiifin VM deletur , pèccittnm eft , & C4«f<<
i(ed PecC(tti' 'Dó Atibade Ltyrnrieo conta Theodo-
reto (o qUalfallou côrn relle •rmuytas vezes1)
q'ue'pjrando a calo huma víbora, que eftava
dormindo, efta lhe pregoíros Bentesnopè; St
cjueredofoccdrrellocom a mão, mordeolhe è
hi ao ; acudio naturaFmente com a outra1,' áè
mordeolhe também a outra \ 8t por efteiâiçfi'
3o lhe fez íucceffivamenteT&z feticlas, & éip.
tão fatisfeitá fugío para à fua'tot3.: Efcufà <i
íími! applicarfe : baila dizer, que o peccado hè
Víbora , & fé a náo matarmos logo, irá rrlut
tiplicando as mordeduras;" .
6. Nunca o peccador fe-Séfa!iftitne pôHei
rem as recaídas muytas , & o vicio envelhei-
i tido; porque ilTo feria cerrar os maííros: â nà'6,
entregàrfe à tormentáv &;riàufràgio. cef-
niifo os démbriios & agravàrf-
TO o poder d^^èa^eD^oSjSi a infinidade áfe
íua mifcrícò'r8fa. Fii:ca.',í'ã"tál .péíTóa- f Iib
cpparkçáo vif pói"ènrpidpriájcòstó tfSdre torh
*Da virtpde da Caßidade. &y
ц touro -,que quantas vezes efte o acomete',
& derriba, tantas elle le levanta , & çndire^-
;a. О effeito que ali faz a chumbada , hade Fal
zer no noíTo cafo a confiaça na mifencordia de js
Déos, merecimentos de Chriíto^&intercef- ib
fío da Virgem, É o Senhor vendo o noflo tr;ú ;'
Wlhoacodirà. ,,,
7. Huma vez coñfefladas as culpas contra
p-Cexto mandamento, nao revolva mais a me
moria délias : fe lhe lembrarem, abomine-as
cm geral , & debaixo de hum conceito univer-
fal , & confufo, & logo as lance no mar do
Sangue de ]ESU-Chrifto , & paffe a conííde-
raroutra coufa mais util. Porque efta parti-
cuJaridade tcm aquellespeccadps(comoob-
fervou S. Hieronymo , & a experiencia o en-
íina ) que athe no tempo da contriçâo délias^
tevivem, & quandb procuramos apagallos,. •» *
tornáo a levantar chama : Sola libido triam in К ' \
ipfo tempore pacnitenAi preteriros ßimulos pad-' „.
tur , & titillationem carnls , GT incentiya pescar Ш »
ti y fuper hxc qua corrigi cHpimns , cogitantes x
rnrfujn fit memoria peccati ? ч
. §. QuantoafagradaCommünháo, tanto
fera proveitqfa ', quanto chegarmos corn ma- $
yor difpoficáo. Confifte efta erri fè viva, con-
nanca certa , contricáo , & confiíTáo verda«.
deira , humildade profunda, paz de eípirito,& .
caridade inflamada. Dos aromas deftas virtu-i
fas fe compeem o preciofo ihimkma da De-
-i m ' • yoçâo.
€г Tratado
voçâo ; & fe requere que Teja acbial ao tcrrt-
po de recéber o Senhor , & erri quanto duráo
cm nolíb peito as eípecies facrámentaés , íc
quizermosfentir'a fuavidade, & gofio Jefte
divino bocado ; porque tambem na Iguaria
"Euchariíí.'ca fe verifica o Axioma medico i
Q^tmi fapit , mtrit ; que o que bem fabe mais
nutre. V ' ■ ' *T
9. Os Sacerdotes que poreoílums се!еЬта'а
acceleradamente, & ftm à gravidade , рай*
fa , & decoro que pede o mais fanto ,j& veije-
favel myíterio de. nolía ReiigiäoCatholic«, he
como fe na cafulla pela parte detv'az tiveíTem.
eferito de letras grandes eftero:u lo : Corihéi
cao todos que effou indevoto, & que de Sacer
dote mais parece tenho o nome, que a fuftah.-1
cia. Porque como diffe S. Fráncifco de Sales ,
á-prtfla lie a pefte da devocáo : & confidera-
da be a mnltidáo de ritos, aecóes , oracóes , 8c
; liçoes de q confta a Vfifsa, fetodavia poJemcs
concluiüa em quarto, & meyo de ho' a, be fi
nal manitelto de que as nao acompanhamos
com a£tos interiores , nos quaes confifteoef-
pirito,& devocáo. Ncm o pretexto de ñáo
enfadar os ornantes he digno de íe allegai, ao
menos quando a detença exceder poucó de
meva hora : porque âlem de nao 1er eíte o
motivo principal da nofsa pfefsa ( poes atlie
1 cm particular , & afliftindo únicamente o
Acoiytho celebramos do mefmo modo ) : ißi*
xacf*
Da virtude da. CaftidaJe.
mefmo de querer agradar a Iiomens, defa-
gradando a Deos , nos convence de 'ná0 fer-
mos íervosdeChrifto,pe!a fentcça doApoftolo:
SI édbtic hominibus pluctrim , Chrífti (ertut nan
tjjctn. Qiiamo mais que na dita fuppoííçáo it |J
padecemos claro engano ; pões nem aos ho-
snens agrada aquella precipitada velocidade j
antes, quanto mais homens faõ, maisosdeíè-.
íiifica. Porque qualquer homem , afllm como"
lie certo ter duas vontades, huma da pane in
ferior , outra da fivperior : aflim tem dous'
agrados , Sc duas difplicencias ; & bem pjde
a natureza , & appetite folgar , ao intimo
tempo, que o elpirito reprova, murmura , Sc
lê elcandaliza. Mas tornando ao noffo prin
cipal intcnto(que he domar os furores da nof-
fa carne, pela frequente recepção da de Chri-
fto) , defenganemonos , que ainda que che
guemos quotidianamente , pouco fruto rece
beremos , fé pouca difpoficáo levarmos. Hti-
ma , & outra coufa , ainda mal , vemos cm'
jnuytos Sacerdotes , que cada dia fobern ao
Alçar, & nunca defcem de fcusmàos cofhi-
mes.

PER-
*
Tratad» \;;-?ъ\
PER G U NT A ***<■■*-■*

.M.v.-' g»í frecuencia em cókmtíngar ierh titi- l


•° l • v. /w¿ -pe/Sitó , ##e «/¡г ¿¿/ífe remedia'
;i,j i . , />йгй л Laßidade. i . .,. . . , \
Е1рожкЯе primeiramente ¿ que¡ fenáo
R,
^_. ^ p^ determinar iftö ao cerro i riem po
demos fikaîar outra regra maisgerai ,*. & nie,-'.
nos fogeita a inconvenientes, do que o jwizo .
pratico dQ,Çonfelior prudente^ È elía he a que .
iHiodernAJTJiCníe hnaíoú o SantiiÇmo P« Inno- ,
cencío %l, eferevérujoa jfefpanha -íobre aî;
duvidasda ^mrhunháqqijotidjana. Sórmjcij*,
te apont^feiaqui alguns avizos \ quepareceruT':
raeionayçis , para format eóm mais асепо щ
íbbredittO; juizOí .;•.,....;,:: ■;. -iVi.-a?.
, i: Qí}€¡fe nao governe o Con feííor tanto;
pela pureza da con feiencia dp penitente , &,
innocencia da, fuá vida, quanto pelo proveito,,
q Ihe reí/ulfiaida^óniiunháo, falvo a tal pureza,
íe a.!quirio por via defta.Por onde,- fe a rieçef-s
fidade o.pedir , & o etfeito pertendido fe expe»
f¡mentar, ainda que feja hum grande pecca-
dor , & muy metido hö feculo, concedaihe
comfnünhoens mais fréquentes , do que рог-
ventura concedería as outras almas virtuos

■•^■*' ъАгка*-**..* »до


Quç
^bavirtudè âaCaftidaÀe. Vf
- i : Qjje cm mulheres efte proveito da faw : . '. ■ ,
grada Communháo he mais enganofoj & dif-í , *. . v
• hcildeconbecerfe: porque^ como dizia meu - л
- Padre Sé Fei ippe Neri 3 parece ás vezes , que-. .
tero grande efpirko , &apettado iereíolvc_
cm quail nada¿ A caufa de ve fer o feto natu-*
raímente mais tierno, & capaz dcimpref-«
- fóes, mais eftremoío, & encarecido em feas
afFectos , ou penda para o mal , ou para o
, bem¿ .::-.' V.:..! ч ■
-.''. д.- Oye aínda a Communháo quotidian^
• em peffoas leigas requere grandiffim* diípcH
•ficáo, & muy particulares íinaes de ¿provei-
; tamento ( 8c digo requere, nao para fer licita t
qne para iflo bafta chegar fem cónfciencia de
peccado mortal , & com devocáo adua) t
para que nem aihda venialmente feja pee-
caminoía , fe nao quanto áo fer conve
niente ; que muytas coufas podemos fazer
fem culpa , que nao faremos ièm impruderi-i
cia ) : todavía nao deve o ConfeiTor proceder
emperchado em negar o tal ufo , & efpantar-
fe mtiyto dos outras , que a CGncedem : lèa eriï
Vega cómoda por efcandalofo o feprovaüa : Theto^
lèaem Blofio, como Chrifto N. S. fallando Тйл Un.
com Santa Gertrudes, reprehendeo os Confef- i486,
fores , que geralmente a prohibem : lea ño Moni-
-P. Jofeph Gavarri, como elle teftifica de expe- lis Spi*
riencia, o grande fruto, que com e^la fezem ñt«.i-
almas innumeraveis, muytas dejlascomvin- lischt
6 Lts
фб '■ .' - Tratado .
б.§« l •"•* * tr*nta annus de concubinato publicOjufíi-

uc'ion- 4: Queiindaque eftc remedio da Com-


rf д, v;¿>munba6 frequence he excellentiffimo, &ef-
V¿rf- '^гаС1"г"По> poique em Era naque lie divino
P¡rj_ - iSacramentoéíla rea! , & peíloalmente a fon-
tual r JjtE ^ ^^ Р&ф~» 4UC ^e a defbuicáo .dp
'^э^* ; todo opxhecado , & гераглсао d* noiïa .natü-
oreza tragi Ucoimudo ¡nao deve o Confeífor
conftkuñ o bem do feu fi!hoefpiritual.so em
-ftmedios que etráofóra de nos , ¡к que de-
-pendem.de outras muyeascircunftancias cx-
-trinfecae' ¿qualité o da fagnada Communháo;
.porque em falcando dk , txltirà tambemso
aproveito.} bemeorao a .arvore efftamada -a
.regaríe, tamo que raltar o, riego , murcharà.
-Ат:>шНсасао,аф.г zade vida, elludo da
prefença de Otos,■ defecto dos bais terrenos,
xiefvio de mà.5 occafi -ens, paciencia, & igual-
~dade á¿ animo nas -.ribulaçoens , caudade
•géra! com os próximos , & outros iemJlutn-
-tes meyos , que tillo na noua roáo , & de
nos dependem ,elTcsfáomaisnccelianos , &
menos ruidoibs, & públicos, & faztm em nos
muyta obra , mediarte a frata de Deos , quo
'. os ir,f} kü , & acompanba, & juntamente, dip
Joem a aima para a ingrada Ccmraunhá")
ihflm'r4ie!!a mais poderofamente,cpmo lticce«
- dia aos Monges irirfeitadores dos de ftrtos , que
*à ■comajuntarfe acs Domingos na Jgre/a ,
\ . jara
'DavirtHMàaÇafiiiaâe. б;-
pa*a receter о coçpo do Senlior , tipháo grar
$a de ^itifllma. çoniemplaçio , ¿У jmperip for
-bre gs feras , i'qbrf qs fjenvntps , & fobre оц
demonios. Nao he minha efta doutrina, ¿Sc dir
#«n*b.íof»áQdQy.R fr. Ша de Granada.

PERGUNTA XI.
Ççmofipoem Щ fraxe o remedie que of.
finta aponíalos 4ojejum ,& a/pe-
гесяфуШ
-Tm Eíponde-íe. que primeiraine.nte import
XV ta que a pefioaconbeça , & faça conceit
^o vivo da efficack defte remedio ; porque de
.outro raqdo níoo euirnarà , nem о applicab
le como deve. Em ordern pois a eft« fim , con,,
íider'e , que a arvore planuda em regadio , 3c
bem cultivada carrega de frutos.Qjie he.o cor-
p.) humano fenáo hua arvorei & quai he о feu
■г- go, S? cultura , fiando a comida , & bebida,
& o regalo? Ojie muico logo , que .tratado
<bem lance os ieus frutos, que fto appetiaee
defordenados, ítntimentos impuros, palavral
malfnantes, aeçoensaborainaveis î
Coníidere , que fe viíTemos , que alguem
para, apagar hum incendio, em vez de afaftar
a knha, tha miniftrava mais copiofa,fLrn duT
vrda,enten(kriarnos que eftava louco , ou de-
w- E ij men?
68 Tratada
menta o. Os dementados , & laucos forño
nos j que nao querendo fer abftinentes , 8C
parcos ,» queremos fer continentes , & ca
llos.
• Confidere como os cavallos quando vei»
do verde faó mais brincadores , & briofos , Se
impacientes da fella , freyo, & elpora, O nof-
fo corpo he bruto, deque o noiTo efpirito he
ocivalleiro: nao lhe conceda efte muytasii-
berilades nopüto, fe näo quer experimentar
njititas rebeldías no governo.
Confidere, cómo os que chamamos Buzios,
&tempov oíhci ) pelear pero!as,coftumáoíe a
comer pouco, parapoderem andar hum qaäf-
to de hora , <S¿ talvez meya hora debaxo Ал
agua, defpegando as conchas do fundo do mar,
& das raizes dos penedos , fem tomar folego.
Petólas fáo as virtudes , eípecialmente a da
Caftidadc, pelo que te n de fria , fragil , can-
dida¡¡,& mais ufada ni ornato das mulheres.
Por certo nao p . craeftapero'a, quemnáp
íouber fechar a ¿oca , moderando! he o fu-
fítrto.
■ Conlidcre , como a CaíHdade eleva ao
hörnern as kmelhanças de An jo, & a gula o
abate as de bruto. Logo quanto pode fervir
o grao de bruto para fubir ao de An jo, tanto
ferviràa gula para adquirir a Caftidade.-,Ef-
GSat pÍHtOj & carne fáo contrarios, comodifíeo
x^ j J■- Apofteb, & todost experimentamos : logo tu-
.: :••■« de
*Da Virtuài dd Caßidade . 69
¿а о que favorecer о partit oda carne clara
eftá que hade impugnar o doelpirito.
Pondere affim mefmo , como ñas fagradas
letras ordinariamente andáo emparelhados,
ou ícguidos eftes dous vicios , gula, & luxuria.
Noílos primeiros paes , tanto quecometáo о
pomo vedado ,experimentaráoa rebeüáodo
corpo , & íentíráo a ntcellidade de o cobri^
rem, ,Noe no mefmo tempo cometeo inad
vertencias na materia da abftintreia beben-
do, & na da boneftidade dçfcobrindo-fc. Нол
Jofernesprcparouíe com lui efplendidd ban
quete para o imaginado logro de íe.us roins in
tentos , que meditava ; adiando q era propria
di/po/îçao Baco para Venus. Aquelles impios
de que falla o livro da Sabedoria , igualmente
iê exhortaváo à fartura da meía,que as licen-
fas da luxuria: Cemed^mrts , &. ЫЬлтш , &с.
nullum pratumfir, r\md pan ftrfratifeut luxmia а£л
noßrd. E das abominaçoens da Cidade de So- 2Й#
doma diz o Profeta Ezequiel que tiveráo fuá
origem na abundancia de. pao: Шс fuit imt¡u¡- j*ÍC%#
tas Sodom.-t fororis tu* , fitperhia, faturitas рл- 16.4a
nis , & ahundantia. EChriftoSenhor N. fal
lando das demafias , de eftragos , que havia
110 mundo antes do diluvio , ajuntou o comer,
& beber cora o cazar: Erant in diebus ante dilu- Watth.
yiitm ementes 3 úrbihentes y mitbtnttsi<S' nnptni 2.4.3.8
tradenfai. ,. : • " ••,-•■. ,..-• . ■••'■■ ":»
Por outra parte fe attsnder ap que ¿izcm , .«,
и '-' * Eiij 0$
fo Tràtndt
es Sântbl PP. afínas achata a'gim , que f\3b
Jouve , & inculque a vjrtûdedo jejumpaKi
ébmbatër contra os demonios, & vencer os
màos délejbs , que eues kmeâo nö Cbraçào
humano. S» Aaxbrcfiô diz , que : ФфкЪг И*
b'aloc'jnviyiiS) riHtritur del'ci't, v:ni ¿ccctifd'tttir}
ibrkt.ite ¡rifUmm-ttitr. A luxuria fe apa'icenta
com os banquetes, le cria com as delicias, fe
accemlç -, & inflamma como vjñho. S. Joío
Ghrvfoíbmo diz que o jejum directamente íe
oppne manatí treza dos demonios,* fheshe
odioíb: ¿4;tverf/ú J.< mómtfn rt.itnr¿t¡h cViißiturum
efijcjb&m. Nem aquel les ántfros Padres db
evmodaváo por entrado na efcola da vida ef-
piritua! , a q'íem nao tivelfe ainda vencido o
efpiritb da gula -, porque entendiíó fer eftè о
pri meirô palTo para adquirir as virtudes. Por
onda, quem nao faz repavo evrt éomér quañt'o ,
& quahdo , Se como Ihe pede ó a^pfctite , ttío
' temqüe fe admirar que feu coraçâo íe'ahum
manáiicíal perenne, & fétido dé impuros pen-
, ■ ÍATtentb5',ífebrutaesde^ejbf!.
• > - Oinc'uo éfta fuaforia com o fegüfnte exe-
. fio , qu • evidentemente moftra a efficacia
Иг»»"'- Áo leíu n para deírrui- atentacáo da Carrie.
f"e Hm Genova vívia huma doncella chamada
■mtii'-sfañbA, b:m prendada corn 'dotes dffi'*! da
a&fk ъьмсгаьЪгпг) ê,t fbraina; 'Cafmftcófo ha
ф;п- yobre comratador por noms Arono, « qua! vi-
W» rHo c\4KVTib -algum tempo em 'gründe amir ,
&
Da virtud« da Caflidade. ft
8t paz. E hum diatomandoaàpartelhedif-fVrfo
fe; \'<m fabeis, Marina, que for meyo da mer- -^bfii-
cancia temos a profperidade que vedes ,. Aemuria*
honra, & fazenda. CLtgoume noticia cer~.
ta , de que alguns géneros que embarca-'
mos eu , & outros parce ii os para Alexandria,.
fe váo ali perderlo ror falta de preiençar
de peíloa a quem <3oáo. Qyeria , fe me dais
licença,partirapôrmftoa ordern conveniens
te , & qiianto an.es poiTavokarei a аА'.Шт-»
vos. Marina ouvindo il о moftrou grave Icn-
t'-memoteftificado corn enternecidas la. ту»;
reas: porèm otorgou aretiçao condicionad*»
com a brevidade da amencia. Huma ceufa-
( acrefcentoi Arono) meda grande cuidado
por volTa caufa; & he, que faltando eu ao vqf-
fo lado , os moços nobres , & ociofos defta
Gidade armem laço à minha honra, por cobi-»
ça de voiTa fermofura. Marina ouvindo iflo,
dobrouas lagrimas, & fe veftiráo fuas faces*
de cores da modefria, & lhc prometto, que,
por efta parte poiia ir fegum , porque confia-
va nä proteccáb Divina , & no grande amos
com que fuá alma eftava com elk vinculada«
Partido em fim Arono, nao tardai ík> ociofos>
em paíTear a Marina, & darlhe muficas , & £a-
zer jogos, & faraos díante de fuas }ar;ellas.
Porèm ella as mandou fechar todas, deixand»
íomsnte aprecifa lúa para a ocenpacío hone-
fta > Se tanto nao apparJcia , que puds-ra pre-
!..-•» Eiiij fumit-
71" .'•' • Tratado*
liimirfe tsmbem aufer te. AÍTm paliou
f empo, no qual dandoríc já ror vencedora
eoraecou a natureza a qutrer algum allivio
de tanta rlaufura. Jànáo r?ctav«t al.omar às
jane! Ias t onde fuccedeo reparar em l um Va
rão de galharda, & rrodefta prtíniça, que
por a!li paliava frequentemente. Pcrgur.tou
a feus criados quem cta ; & lhe ^ifTerão , que
pra hamavogado, Doutor cm ambos os Di
reitos, por nome Dagmano , muy conhecido ,
& abonado por Iba grande íciencia, & nobre?
procedimentos, O -neimo íoi ouvir Marina
efta informaçáo?que efcorregar nos penlamé-r
tos màos ;& eique rida de fuás obrigaçoens ,
pomoçou a querer fer vifta , & ptrtendidade
Bagmano. E como ti lê paiTalTe.com os olhos
baxos , & roftro grave , ftm fazer cafo dos
attractivQs,q ella lhe armava diante, acetideo-
fc mâisnoappe;:i-e,& fc arrojou ao ultimo de-?
latino^ que foy, mandóljp chamar a cafa a ti
tulo de confultar com elk negócios de fuafa^
zenda. Veyo fem folpeitar maldade : & cila o
fahio a reeeber, efquipada de todos os adere-»
cos que pqdiáo ajudar feu louco intento. Dei-*-
cobrio em poucas palavras , o que rrvolvia
emmiivco.s pen lamentos, Tanto pôde huma
pâxípnáo atalhada aos princípios. Era Dag
o earto , pio > & prudente : como cafto
aíftTitio à tentação: como pio fé compa-
tttla irjiícru cfprkual de
'Davktude daCafïidade. 7$
<èu proximo : & como prudente coníultou , &
с legeo dentro eníli brevemente o oy pouuno
meyo com que a remediar ; & foy ñngir, que
eile fe tinhapor muy vtnmrofo ein llie otfe-
recer a fortuna aquelle hirco táo para efti-.
mado (defte modo,& de outros peyores falláo
os múdanos, & cortezäos) : rorèm q Iiavia hü
leve cbftaculopara o leu logro ; o qual lhe
communicaria fmcerameme , porque nao
prefumilíe fer nH!e tibieza de affeóto , ou in-
gratidáo gioííeira,o que s6 era dilaçào precila«
Saberus Senhora, ( lhe diíTe ) que lindo eu
eftudante na Umverfidade deBobnhafucce-
deo entre outros meus condifcipu'os liña pen
de г cia táo renhida,q ficaráo del! a fevidos mui-.
tos, & algñs mortos.Sobreveyo a Juftica,pren-
deo os qpode, & a mi entre elles, Na dcvaiïa,
fiquei carregado mais do que mtrecia roinha
innocencia , porque me deráo alguns por au
thor da révolta. Éntáo vendóme em ptrigo ,
& em hum tenebrolo carcere , & carrregado
mais de ferros,que de culpas, fiz voto a Déos,
que fe me livrafle , obfervaria caftidade por
humanno, jejuahdotodososdiasdelle a pao,
& agua. Ouvio oSenhorminha affiicáo, &
me deferio cemo eu dt zejava. PaíTados alguns
annos, quiz pagar o voto, em cujo vinculo
remanecía ainda preío , & comecei a jejuar :
$ö feffenta dias me faltáo : elles paílados , me
tendes ao vpflo ferviffo. Marina tendo eíta
> . ■•■■■' nar-
Tratado
narração por (Verdadeira , fuípirou , & Pr
qtiuxou de tio prolixa tardança. Dagmano
tingindo-te magoado acrekentou , que lê tila
queria tomar fobre li amctade do dito jejum»
elk compriria com a outra : porque já guan
do votara , fora debaxo da condição de qt«e
por urgente cauia pudeiTe fnprir por outra
ptííoa,o que peia própria não alcancaíTe ; &
que bem via ella, que não feria raci^fenáo a
quem o amatíe mvtito , encarregarie da di ta
penitencia. Em hm Marina crendo como
mulher ,admittio as partilhas como amante j
& começou animòfarnente a jejuar em hon
ra do demónio; Sc a martyrizar feu corpo, pa
ra lhe fazer a vonxade. Dagmano voltou dali
a breves dias a vilitalla,paraver fé cumpria o
jejum. Ella oreccbeo mais com cortesia, do
que cora tlgnifkaçoens do primeiro agrado.
Outra, viítta lhe rezaoíèptimo dia-, & já a
achou quebrada de coves ,& desfeita de car
nes. A terceira foi aos quinze dias j & já
apenas fé podia levantar para o fair a receber,
porque o íangiie fé lhe esfriara de modo, que
nem com muita roupa aquecia. A quarta ,
«Btulcima foi aos vinte & nove dias , & então
eftr/a quaíí defemparad* de forcas, & apenas
tinha alento para fallar. Diílelhc então cm
fem, & gefto qitelè deixava entender, a tra
ça de que até ali ufára : Qrje he ifto , Marina *
Reyna ainda neSes membros frias o fogodix
amo
DayirftidedâCartidade. /{
amor impuro í Ella tornando em fi , entrou
tto conlufcimenco de que Dágmano cuidara
do bem de (iiaa!ma ,& honra, for mcyoda-
quelle eitratagegia prudétiíTimo,& lhe liiiTtr сб
pudor, & lagrimas: Graças vos undo, ó varáo
fabio, & caritativo, porque aflim foubeftes
curar mirha infirmidacle , & compadecervos
d*e minha mi feria; Si nao so fleo agradecida
por minha parte • fináó tambem pe'á de meu
marido aultn ce , viílo que elle nao pode ía-
tisíá¿er efta obrigacáo , para elle táo occulta,
cómo para mi manifctta. Déos vos cemíer-
ve , & augmente em todo o genero de Virtu
des. Com eftes , & outros fememahtes ter
mos de urbanidade,& efpiritual amor Ге def-
pediiáo. E nefte illuftre exemplo ficáo to.
tes os que o lêrem enfinados , como o je
juni he emeáz , & proprio meyo de defender ,
& confervar aCaftidade : íe bem nao de-
vtm imitar nélle as mentiras deDagmano :
porque nunca fáo licitas , ainda que "délias le
figa o bem efpiritual de militas almas.
Suppofto ô conheciméto da neo. ííidade de-
fté remedio, aponte mos agora alguns uíos
flelle em pártíorlar.
i. Evite apefToa quánto for pofnVe! ir a
convites ; porque neftas folemnidades rijas
tio Déos Ventre , padece grandes difpendios,
du ao rhenos,pertg'is a Caftidade,& Pudicicia.
Quancto a caufapeça prmfamettte a affifté-
cu
уб Tratado
cia (q4ambem Chrifto , 5c MARIA Santiflï-
ша notfos Senhores fe acháráo ñas vodas de
Cana de Galilea ) lembrelhe o conterfe den
tro dos limites da temperancia. Nem tema a
nota de ímgularidade entre osfocios ; porque
(alera de que elles de fi para coníigoo louvá«
deípoeí ) melhor he fer murmurada dos dií-
fblntosjdoque íer hum délies.
i . O u fo do vinho todos o reprováo na mo-
cidade jorque he aífcprar o fogo da feníu ali
dade, neceffitándo efte de que o extinguamos.
EmanifefUméte a Efcritura (agrada dá a efte
licor por criminólo nos exceííos daquelle vi~
Êpbef. cío: Kolite inehriarivirioyin qu$ efl luxuria. Luxtt-
5 . 1 8. rio(a res , vinum : & tumultuof* ebrieras. Qiian-
ï> o- do a idade he mayor , & o eftamago debilita-
■vtrb. do, pódefiarfe delle, mas temperado com
л o. i . agua, fenáo for nociva ao mefmo que íé pre
tende remediar. Mas lembre-fe quem tratí
da virtude* que hade amalla mais que afau-
S*p.J. de , & bom trato do feu corpo : Superfalutem,
lu- <s jpeciem JÜexi ilUm : & que no feco da ab-
ítins-ncia ,& fobriedade morre о pexe dalu-
Iv« xima,comodi(Tehumdifcreto; LuxurU pifefs
taiHK'iJnab UhtentU ßcce moritur.Pa.T9 mulheres ainda
»*j. eítá mais interdicto o ufo do vinho ; porque
nellas parece mais feya a torpeza, ioltura , &
У¡tie antmoildade. E tanto attcnderáo a ifto os
n.io- Romanos antigos, que havia entre elles ley
,«¡ b de com pena de morte contra a mulher que be-?
1 ' • bene
Vavirtude daCaßidade. fj
befle vinhó -, & deíde os tempos de Romulo Ufu
tinha cfta ley leu vigor , & prompta execu- MarU
cao , de que Plinio traz varios exemptas. //'¿. j.
3. Ñas ceas feja parco: nao s6 terà mais Jacio*
quieta noute , melhor faude, & vida mais lar- ría Ал
ga (enáo q evitara muitos lances arriícados , -virgin»
com que os demonios nocturnos fazem pot datte
entrepreneur â noífa liberdade* & o lográoc. xa.
nao peucas vezes. Por iíTo vendo huma pelfoa
cear hum (eu viíinho em huma noute de Vc-
ráo varios pratos de abundancia, & regalo,
diíTe para nutros com quem eftava , & viào
о meffno .' Tudo aquillo fio illufoens По-
âurnas.
4. Advirta , que náó fomente confîfte a
gula em exceder na quantidade neceflaria; íe-
näo em outras quatro deforderis , que fáo ,
"Putpropere , Uutt , ardenter, flmíioje, ifto lie,
cora regalo , & grandeza , fóra de horas , com
Tofreguidáo , & com melindre, capricho, acc-
pipes , & temperilhos. E todos eftes vicios dáo
notavel brio á carne , para fe amotinar con
tra o efpirito , & ao demonio para fe confe
derar com a carne.
. 5. Com a fobnedade no comer hade con
cordar a temperança nos mais fentidos ; ifto
he, que o trato do corpo, quando nao fe ja
auftero, & mortificado, como fazem os Solita
rios , & Varoens eípirituaes , cVpenitentesj
ao menos nao feja molle , regalado , & amigo
<fc
i
78 Tratado ■ *'T j
Üe muytas commodjdadfcs. Deixe ambares,
pçrfumes , agitas de cordova , *ffeites, oían*
das, purpuras, banhos, «eves, diícamcs, ou
tonjlhos poucohoneftos, £bno<&eiafiado,5íc.
Pon|uetudoifto milita contra o elp rito , &
Jizoogea a carne ; a qual £цшт a nao tiver
por iniraiga,lhe fará a vwitaideem aturas clu«.
laípcyoreü, que Ihe pedir. ,n ¡ . . .

<
P> ERG
- •
U FIT • А -ХИ.". •!

G>»w fe fûemempraxe orfmedio dert-


finir logo ao principio daten-
■■■■'-' .':>::■■ taffol:) ,. i -, . . .:.

REfponde>-íe que primeramente impar*


ta nao deiprefar es tae« principios , &
■entender que daqui penek miiyto a victoria
■dastentaçoens. Todos os principios ßo mí y
podcroH )s affim para o bem, enmo para о ma/,
fe fe deixáoconvakfcer:& qualquex beouxiui
1ie faci! de impedir, fe «ó tempo fe ataiha, A
luxuria be incendio, a tentado faifea, a alma
.Cí ;'lade & Téplo de Déos. Por hua faifea def-
prefada'pode abrazar fe humaCidade intcm.
Quem fcràtam Hercules, que arranque cora
a man hum c'rrefte já formado em fiiblime
& funeral pyramide , ou hum earvalho que
àffombra cora leus fironcWos bracos boa par»
te.
fía virtude da Cafiidadè. fy
te da terra î E hum bolque inteiro délies po
sera diflipar hum menino , le os arrancar
quando nafcem. ßrigar hum hörnern com
huma ferp*nte te га a vitoria muy duvidoía ,
Sc arriícada: & muytas ftrpentes poderá fá
cilmente deftruir,quebrando-lheos ovos. Os
primeiros alíomos da tentacáo ou os nao ob-
îêrvamos,ou Utes náoacodimos:por pequeños,
hu mas vezes fogem da r.oífa attencáo , ou-
,tras faó materia do nçflo defprezo. Ifto he o
-que quer o demonio, porque cm achando fen-
-da por onde meta a unha , procura introduztr
-todo o braco , & todo o corpo : & de rept nte
-nos adiamos entreprefos , Se faqueadoi. Por
¿Го avifa o Efpoíb à Alma Santa , que cace
.as rapólas em.quan«o pequeninas, para que
nao deftruâo a vioha : Cdpite nobis -pulpes par- Слпг,%
tulas , ¿¡ил (Umo\wnttirv'ine.ts, Efteheoati- 15.
rar com os pequeninos de Babylonia contrae
pedra, rara que nellafe eípedacem : Beatus -р(Лоо1
/jui allidit párvulos tuos лАреггш : Ifto he, ex» R
tinguír ospenfamétos maos , quando naícem,
com a prefenca de Deos,ou memoria de Chri-
fto. incenths vinorim(à\z S. HieTonymo eP-
crevendo à Virgcm Demetriades ) llarim in
mente juguUbis , & párvulos B.tbyhnis ¿Hides
dd petram, in qua (erpentts veßi?unoa reoerintt-
tur , TL eferevendo a Euftcqiiio : Helo fin^s
aordrioatm Ubi¡luis crefore : nihil in te ЬлЬу-
Unium¡nihil ct»)¡#jioms аМф.и s dum pdrvút
«о Tratdetö
efl hoß'ts i interfice :nee¡uit¡a , ne in \ \.m 'd cTr/-
€at , in femine eliddturi ■ i. ••
Advirta,& obferve quaes fía os princi-
, pios , ou anteprincipios da eencacáo , para
eftar acautelado^ Ordinariamente colhimáo
fer enes. i.A vifta de (mandada em objtöo;
perigofos* Porifloo S. Jobdizia, que fizera
concerto com osolhos , para nao cuidar em
mulher aínda honefta,&virgé. Porque fe nao
deixalle de ver, nao fei fe deixaria de cuidar.
. i. O ufo das galas , ambares , ungüentos o-
doriferds , banhos , ou de qualquer outra lin*«
•peza neceifaria ao corpo;porqne fe neftas cou
fas le nao proceder corn moderacáo, 8c recaí
to y pode fácil mente o bruto da carne atirar
coücee 3« O comer , & beber com mulheres,
ainda que fejáochegaiasño fangüe ; porque
tanto que fe alegra , & conforta o genio , lo*
go tambem fe f.icilita* ■ 4* A ocioíidade ,
elpecialmente defpois de jamar : fáo horas
arrifeadasà invafáo dodemonio meridiano,
como diz Дет fi experimentou David pec-
cando com Bethfabee. 5. A licáo de livros
<le novellas , & comedias « & ainda de Th со?
Jogia moral na materia de matrimonio ra-
quelles importa qtieimallos; & eftes , quan-«
do íaó necesario?, importa 1er i fem formar
(quantofor poffivel ) nafantafia figuras de
epufas inhoneftas. 6, A pouca modeftia no
veftirle , ou deípirfe f ou lavarfe , ou coçariè.
,; 7>Oj
^avirtnJe daCaßidade. 81
7. Os foils de inftrumentos ou vo7.es hum?«
' ras , em torn picado , & farabandas > que in-
■ Vtñtou o demonio , & fe ufa hos theatres . &
Êor miferia dos tempos, ate has tgrcjas, 8,
кат inar a coilíciehcia , ou ouvir confifloens
nefta materia, fem ageneralidade, cautela,
& abíhaccáo,que he conveniente. Outras
auafi mnumeraveis pódem fer as oçcafioens,
de que о inimigo pegue,para nos atirar as fuae
Janeas : mas aponíamos eftas por via dç exç*
plo, porferero mais ordinarias.
Tanto que a реЯоа advertio, que eítave
cuidando em objefto mao,coftume^iè a invo
car logo o auxilio Divino , dizendo o Padre U
Cu o Sub turna f>r*jtd'ium confugJrn*s SamBaDti
stnîtnXytSTciy ou outra qualquer oraçào: &
bafia que fe diga mentalmente. E airida que
lhe eufle fazer promptamente eite recurfo,
infifla , & porfíe -, que dos ados repetidos fe
fórmáo os hábitos , & do« hábitos procede o
ebrarem gofto ,& facilidade.
Se a imaginacáo (ou o demonio) porfía Cm
reprefentar as figuras , on efpeçies torpes , he
util remedio trazer à memoria , ou à imagi
nacáo as efpeçies, ou figuras de hum Chri'fto
crucificado, ou acontado à colima, & repre
fentar que beja aquellasChagas facratiffimas,
&que fe acolhe a ellas, como hum fugitivo
ferfeguido vai bufear a fegurança do couto,
»u do lugar fagrado. E paraacharnothefou* •A ..'S

F rq . t
82 Tratado -
roda imaginação facilmenteí.eftas efpecics,
"quando qacio vakrme delias, heide ter dean-
tes olhado muitas vezes com affe&o pio , Sc
devoto para a tal imagem fagrada.
Não poupemos as torças , & remédios que
fervem para vencermos a tentação , à conta
de que nos parece leve , & não aperta muito:
fev.ão que logo logo lhe demos com toda a
carga , que olugar , & tempo prefen.te pei-
mi:\e,m. Porque de brincarmos cora a tenta
ção, fempre o inimigo tira lucros : .& fé nos
não rompeoo efcudo, ao meros p arrolgou.
Deve a alm*:amadora da CaftiJade íàhir de-
fta fornalha deBabylonia , não fomente fem
fé abrazar , mas ainda fem cheirar ao fogo ;
i como fuccedeo aos três manctbos: Et odor
!• tgnts
.» . non tranjtjjet f«v eot.
'" Ha humas tenta^oens não ab olutas , mas
condicionadas ,que importa termos conheci-
ào , porque fão embeiçada do demónio , o
qual propõem, neíta forma aonoiTo fentido:
Óícuder a Deos , i(To não •> guarda , que he
pcccado mortal confentir no dezejo torpe :
mas fé me eu viíTe em tal ou tal occafiáo, que
faria ? ou fé por impofíivel fora precifo eíco-
Ihcr entre ta! , & tal íogeico meos conheci
dos ( fuppofto que a nenhú delles qnero) qual
me ravcce quecíjolheriaí1 Aqui vai tnuito
veneno diííiinulaclo.O que hade fazer a alma
herefponder: Nãofei o que faria: ou:Náo
quero
m
Da virtude da Caßidadi. S$
qüero-agora refolver effas queftoensiou ,Que«.
töir logo para о Inferno emeorpoj& alma*
antes do q offender a men Deosjü o meílior he
г ä > rclponder coufa a propofito : fenáo de re-1
ptnte eltender as azas , & levafitar o voo aö
Ceo, 1 agendo algura acto de amor Divinó*
Porque : Frufirx jacirur rete ante oculos реппл- pfi j i
tortim : De balde arma o Demonio a rede da i y4
tentacáo aos que tanto que a deícobrem ,toJ
гпзо ligeivos ovooda Oracáo.
Outra tentaçao ha encuberta , quepre-
tende oceupar a alma na confuleracáo da feal-
¿ade defte ,ou daquelle vicio, ou torpeza, co
mo quem abomina , & pondera a miferia dos
que a ella vivem fögeit05, & o defagrado que
4aráoaDéos. A malic;a do tentador he me«
temos na fantafia. as efpeeies torpes , que
váo em companhia defta ponderacáo. Ná*
convèm efpirituaíidades,que vera a pai ar ems
carnalidades ; como nao convèm tocar na
inmundicia i añida que Teja para a larcaf fó*
fa , polendo larwcarfefóra fem Ihe tocar* ч
As febeliiocs da carne oü na.fcáo do demo
nio, q cerca os lugares húmidos^ ali ampara
á fuá (ombra* como diíTe Job-, ou naícáo da
confenfo do appetite com openfamento^q jà
eomeçou na fantafia : ou na fcáo da irieíma
rragilidade humana ,como fáo as que pade-
eém até os mininos., nao fe devem aplacar »
ou procurar reroittirc-om diligeucias Çxter-
Fi| »as
84 Tratado
ras próximas ou immediatas ao tal lugar: fe*
nao, que as redeas defte feroz, bruto fe háode
reger por dentro; ifto be levantando o efpiri-
to ao Ceo , & fazendo Oracáo , & claman
do ao Ceo com defconfiança de fr rneímo.
Mas tambem aproveitarà o picar ¡rijámente
a polpa interior da coxa ; ou cingilla com с.«
lirio de ferro; guardando porcm todo o reca
to quando fe poem, 8c tira, affim em or
dern ao fcntido da vifta , como do tacto. ;
Aínda que a pelToa nao aprenda logo, nem
fe ache deftra em todos eftcs pontos, nao fe
defconfole, nem defanime : porque tudo re-
quer feu tempo ; & Déos q he piiffimo , náa
folta as torcas do inimigo contra os traeos, &
bizonhos ;Sc poucoapouco, por via da mef-
ma tentacáo os vai enfinando , & confor
tando.

PERGUNTA XIII.
Como fe poem empraxe o remedio da hu*
tmldade,para defenfado ammo
caño.
REfponde-fe primeramente , que impor
ta ter entendido , & aífentado, que Déos
caftigaa foberba docoracáocom a luxuria da
carne-, porque juíto htyeme fe pela, foberba
y..:t ■ i íe
Vavirtude daCaßidade. 8f
íé rebella о efpirito contra Déos , pel i luxu
ria fe rebelle a carne contra о efpirito J;' &
que,fe a efte o levátar о appetite da excellen-
cia propria , o abata a experiencia da propria
mileria. He ponto efte, que enfináo as Elcri-
turas fagradas , & Santos Padres , & confirm
máo laftimofas experiencias. Tanto que nof-
fos primeiros paes fetocàrâo do appetite de
ferem mais do que eráo , iritis peut Dil , logo
fentiràôa rebelliáo da carne, & procuraráo/;¿2g
cobrir fuá defnudez vergonhofa : lile primus Mfli;c.
rnobedietis (dizS. Gregorio Magno ) тох м х_
fuperbiendo peccavit , pudenda contexit .... (¡niл
тох cotttumelldm carnis invertit. Aífim cafti-
gou Dees tarabem ao feu po o, conforme ha-
via profetizado Ofeas: Spirita sfornicatiomm 0¡e.$i
in medio eoriim , & Dominum no» cognoyerunt, &
refpondebit drro^antia ifrdel in facie ejus:Oa.K\i
povo ( diz oSenhor ) me deiconhecèo a mi :
pois eu farei, que fe conheça a fi, fendo véci-
dos do efpirito da luxuria', & a arrogácia ,que
encobre no covaçao , lhc fahirà ao roftro
com as cores do pejo. Aflîm caftigou tam
ben, aquelles Filofofos Gentios inchados de
feiencia, vafios de virtudé ; dos quaes diz S. Ram; 1
Paulo: Evanuerttt in co*ita'ianibus fuis: dicentes 1,2 ц
fe efje (apientes, ßultifacii finit: Defvanecèrao-fe
em feu penfamento altivo, fabios na propria
opiniáo, mas na verdade nefeios Atè aqui a
culpa da fobeiba: feguefe a penada fenfuali-
F ii¿ dadç:
96 Tratada
dade r frspterea trad'id'it tilos Deus In paffia*
pes ignominia , &c. Por cíla razáo permictio
Dens fe entregalfem а feus feyos , & brutas?
appetites.
Сб as Eferituras (agradas concordáo os San
tos Padres: qur quizer veja S. Agoftinho no Li-
Vrp 2. De S¿n&,Vhgm & S. Irineo libf 5. c«*-
/r* VdlentUms , & a Sao Gregovio íobre
foh,\o, aquiilode Job: f > opter fuperb'um quai 1е.<щт
j-6. С? P^V* >«? •' & fobre aquillo do mefmo Job:
Ji.iß, Bdtheum 1{e*um diffoh't, &c : E aqui so efcre-
yerei huma fentença do mefmo S. Gregorio ,
por fer na verdade muyto para confiderada, Se
ternida : Ctßitas ( diz elle ) in fine yitx peral-,
tur%quid fuperbU ufíjue ¿d fine m Vitл cooperta.re+
К pnttm : Muytos no fim da vida perdem a Ça-
Oidade, porque até p fim da vida conferva*
rao occulta a foberba. .-...'.<
Ajuntemos as fobreditas auchoridades o
íeguintecaíolaftimofo. Afpirando à perfei-»
Cao certa Religiofa , trabalhava com particu
lar çftudo por efmerarfe na Caftidade ; jul-
gandoefta Angelica virtude por muy propria
(cómo na verdade he) da íua idade , fexo , &
Jj4. , profilfáo. Entretanto que cuidava da fermo-
t fura defte espiritual edificio que erigia, def-
cüidou^fe de iâçar mais profundos os aliceífes
da tnirriilda. Je, Сотгсои a fe gerar em feu со-?
racáo húa iVisfaçaq de fi propria , tanto mais
perigqfa , qy anto mais encuberta ? & quantq
araiz
Da virtude da Caßtdade. 87
a raiz, deque nafcia era mais nobre. Che-
gou em fim a'tanto a complacencia de fer lim-
pa , & о defcuido de fei- humilde ; que ouVin»
do louvar a penitencia daquella amante, Sc
amada de Chrifto , S.Maria Magdalena , co-
ftumavadizer , que nao quería 1er fanta co
mo ella o fora ; pofto que arre; endida , publi
ca peccadora. Eftanefcia pakvi a tantas ve- J
zes repetida guardou o Senhor r os thefouros
de fua ira : & como antiguamente acodio
pela Santa contra о Farizeo , affim agora con
tra a que tinha o mefmo efpiritn. Permittio
oôis,que fofle tentada : & no tempo dà tenta-
cáo faltouthe com a graça efticaz , q<ie a nin-
guem deve , a dàaos humildes mais copiofa.
Prefaemfim de hum amor profano, veyo я
afoftatar fahindo-fe do Moíteiro com a fua
ma occafiáo, na quai viveo muytos annos ; &
defpois veyo a admittir o 'tras muytas , & a
que mais he, a morrer defaftradamente , com
nlopoucosfinaesde fùacondenaçâo. Porque
fe de antes era pomba , que nao fahia da ar
ca, por nao pôr opè onde fe manchaffe: def
pois foy corvo , que nao tornan à arca, pican
do , & cevando-fe na corrupçao dos corpos
fflortos. A caufa foy fua foberba:& a refpoíta
daquella palavra arrogante deutha !>eos nâ
cara- : fyfpondebir amgantia in facie e\us : & ' '•
como a arrogancia era de efpiríto, a confufaó ' • ' •
foy da carne.
к -i Fiiij Оце
S8 , Tratado
Qye a£tos pois de humildade ha <4e fazer o
quedezejYconfervarfe caílc ; pode-fe dizer,
que os feguintes.
í Não revelar a mercê que Deos lhe tiver
feito hefte particular: falvo aoConfeflbr no
Calo, que elle para fuá, melhor direcção Jhô
pergunte. S. Gregorio furonenfe conta de
dous caiados, que guardavão virgindade. Mor
ta a mulher, dilíe o marido diante de muyta
gente : Graças Vo^ rendo Senhor ; que aflim
como ma deites virgem, aífim vola entrego.
Neíle ponto a defunta defde o efquife abrio os
olhos , Sc diffe : Homem de Deos , para que
de/cobres o noílo fegredo, pois ninguém to
pergunu?
i : Qyando ouvir a ruinado outro nío lê
efcãdaliie, nem fé encha de zelo amarjíofo:te.
"»* , • compadeçafe , & ore : Vlaln ^Íes,qu>'<t
.cefMitcfdriff; Gemeôfaya , porque cahio o
cedro, Todos nós fomos eftatuas com pés de
barro: 5ía pédrinhafem mãos , que deu em
hiía, pó ie dar em ouçra.
3. Mão fé fie de perigos , por lhe parece-
fem leves , & remotos : que mal pôde fazer a
cautejademaiiada? a pouca fimi que o tem
feito náo poucas vezes. Nas ilhas Filippinas
fé acha hama hçrva , a que deráo nome de
^ergonhoía; parque ao fer tocada com o de
do , logo fç encolhe , & recolhe dentro defi
mefma,deiando de fora AS folhas mais vê*
lhas,
Da virtude da Caflidade. 89
lha?, para defenfados olhmhos mais tenros.
Aflim fé -hade portar o cfpirito cairo .-antes
penda.para encolhido , que para efpalliado ;
antes para receoío, q para confíado:o dedo to
cando, pôde defpois vir a fer mão arrancando,
4. Os que vi\'em em fuperior citado de
continência não dclprcfem em feu coração os
cafados. Que maior pureza que a de Chrifto,
& íiia Mãe Santiífima ? & não fé dedignàrão
<le affiílircom agrado aos calados de Cana de
Galika-, & ali obrar o Senhor por inrercelTão
da Senhora o primeiro de (eus milagres. Santo
Agoftinho d:z: 'Mditis e/í bumile co]u£utmMÚm
fuperb* -virginiras : fi enim nabtrtt , non ha- I;L
íeref Howen unde extollerttnr)& baheret fntnuni, i c
quo re»tntur-: Melhor, he o Matrimonio \-\n- y-lfV
roilde , que a Virgindade foberba: porque fé -
cazaíTe^não teria titulo para prefurair,& te-C -
ria freyo para fé reger.
. ^. Para huni fé humilhar , fera Iwa indu-
ftriafuppor às vezes, pu fingir para configo,
<jne rcfvalou em pecfado mortal: & veja co
mo devia portarfe fé affim fora na verdade :
como não levantaria olhos ao Ceo, como não
attenderiaaosdefeicos alheyosjcomo entraria
confu fona Oração; que poucas palavras diria
naquelles primeiros dias ; que deiconfiado
de h ficaria para daji por diante í procure pois
fazelloaífim em faude,& andará mais livre
ida infirmidade.
6Náo
ço Tratado
6. Nío appetecamos modos altos de Ora
ção elevada , luípendendonos fem queDeos
rios íiifpenda.Porque virá o demónio, & equi
vocando a coníolacão fenílial com a èipiri-
tual ,a da carne. & fangue com a do Efpirito
Santo , fé ro lerão feguir as miferias que Mo-
Jinos enlinava lerem pofliveis , fem perder o
alto da contemplação.

PERGUNTAXIIII.
Qaecoufa he exercício de Oração mèn-
íal, & como fépõem em praxe efte
meyo acima apontado , fará
a Caftidade ?
R Eíponde-fe, que Oração (como definem
Os Santos ) não he outra coufa , que hu-
ma elevação do efpirito a Deos, para commu-«
nicar com elle. E fé a efte efpirito acompanha
a lingua com palavras , he oração vocal : fé
falíamos só com o coração ( pois bafta para
Deos nos entender ) he oração mental : & fé
frequentamos efta communicação , chamafe
Exercício da Oração mental. He efte tão ef-
ficaz , & poderofo para fé mudar o homem
deixando vícios, & adquirindo virtudes; que
tenho para mi , que toda a peflba que o con
tinuar como deve, poderá confervar a graça
de
^Dtfvirtude da Caftidade. 9r
de Deos por muitos annos , & ainda por toda
9. vida : & todoo peccador, aue fé não fundar
nelle, nunca na fuá converíao fará progreííos
coníid^raveis , permanentes ,& feguros. Por
que fé achamos alguns , que o fazem ; vaylheS
de que na verdade tem oração aos poucos j St
c mTV mira ofeu efpirito com Deos, ainda
que a elles náo pareça que aiem.E digo mais,
que todos os outros,remedios diflicultofamen-
te fé poderão pôr por obra ao menos com a
ferfe /crança nccelfaria , fé não forem arri
mados a efte exercicio. De lorte que , fé não
tiver coftume de orar, de fcon fio de que fre-;
q u ente os Sacramentes, & continue com Im
só Padre Efpiritual; de que feja devoto da Vir
gem S. N. ; de que tenha esforço para fé dar à'
penitencia, & vida mortificada , & luz para
conhecer os perigos , & tentaçoens , & refi-
ftirlhe logo aos principies ; & de que fé ponha
a confiderar nos exemplos dos que forão cairos,
& no fim defgraçado dos que o não forão, ti
rando dahi o defengano,que fé pretende: &
fé fizer alguma coufa difto, (era pouco, & mal,
& interpolado ; & quando defenda a porta da
Caftidade guardando efte mandamento , o
inimigo romperá por outras , fazendo-o que
brar outros. Pelo contrario, fé tiver exercicio
certo, & continuado de oracio meneai, creyo,
q«e mais difficultofo lhe fera omittir eftes
jneyos,3coutros que na mefroa oração fé aprê-.
dcm,
£¿ Tratado
dem , do que com effeito applicallos,
A razio djfto he : porque todos os fentidos,
& potencias exteriores do home , & por con-
íéguinte a> obras , que delies procedem, íe
governáo pelas potencias interiores , & eftas
pelo elpirico. Por onde , conforme he o efr
pirito de cada hum, affim he nelle tudo e mais.
Logo fendo a oracáo elevacáo do eipirito a
Déos, he força, que continuando a oracáo,
tome delle o efpirico a rorma , feicáo , &
forças para todo o bem. Ponhamos por exé-
plo: como. lia o peccadorde emendara fuá
vida,fenáo teme aDeosíE como ha de temer
aDcos,fe nao confidera quern he ,&oque рбч
de?E como ha efta coníideracáo de fer forte, &
etíeftiva , & penetrante, fe nao for bem con
tinuada ? Do mefmo modo : Comohei de en
reformar os meus coftumes , fem confiderar
em que neceílitáo de reforma, & quautode-
fagradáo a Déos , & que nao poderei fazer di
ligencia util fem fuá graça ? E quandoheidc,
fazer efte exame , & ponderacäo , ou quando-
heide inftar em pedir efta graça, fe me näo re-
colher em mi , & clamar ao Ceo com vivos
dtzejoshuma & muytas vezes? Affim tam-
bem : que importa que eu crea, que ha mor
te , j'uizo, inferno , ou paraizo por toda a eter-
niciade , fe eu nao pondenar entre mi atten-
tamente a incerteza da morte, o rigor defte
juizo,a atrocidade daquellas penas,& agtóde-
za
Da virtude da Caßidadel 95
za ineifavel daquella felicidade? Semejante
mente : os exeraplos de Chrifto Salvador nof-
fo, que nos deu em fuá vida, paixáo, & morte
facratiffima , tem grande força , para mover
a nolTa vontade: porèm,fe os nao contemplar-
mos devotamente , & rom eftudo repetido ,
pouco ou nada moveràô : porque toda a caufa
exemplar, para íér imitada, primeiro ha de fer
vifta.
lito pois he oque fe faz na oracáo mental:
eonfidsra-fe por exercicio , & como por of
ficio, nos fobreditos pontos, &outros feme-
lhantes : & daqui vai o efpirito recebendo te
mor, &amor de Déos : & tanto que elle te
me , & ama a Déos , jà eftà fáo, & fabe re
ger as fuas potencias ,& fentidos , & tem for
ças bailantes para fe defviar do mal , & a-
braçar o bem , conforme aquella mefma me
dida , cm que tiver o tal temor , & amor de
Déos. E pelo mefmo cafo que fe abftem de
peecados , & procura as virtudes , vai o Se-
tilior infundindo-lhe mais graça , & dons,
& chegando-o para fi , ate o fazer perfeito ,
fe elle nao réfiftir a eftes atractivos. Sarado
pois o efpirko , nao lhe curta mnyto a domar
a carne : & ainda que fe levantem tentaçoens
( as quaes fempreconvèm parafe humilhar,
purificar , & merecer), acha luz para conhe-
cellas ,& fortaleza para refiftillas : com que,
em vez de meterem no cativeiro do demonio
- aab
94 Tratada
a alma, lhe grangeáo a liberdade de filha de
Deos j & a adeftrão para oucras novas bata
lhas i em que alcança novas coroas.
Poderá alguém dizer: que tudo ifto pôde
«ftar muito bem só com a oração vocal: n ãa
.helogonecelTaria a mental. Mas rtfponde-
fe finalmente : que riáo affirmamos , que a
oração rtjental he neceflaria precifa & abío-
lutameate ; ftnáo para melhor fé confçguir
Hcilo intento. AlTim conio, para huiri enrermo
farar , r.âo he forçolo ^ & precifo que tome as
medicinas-, ou pai-ahunlfolda^o militar, na»
he precifo que ein já a efpada. Porem c5 grade
difticuldade alcançará o enfermo faude , &
o foldado vidòria , hurri fem medicinam , aí
outro fern efpadaé
Reftâ só declarar donde lhe vem à oração
ifiental a mayór effic«cia fobre a vocal r para
ré formar os coftumes. A o que ré poíidorque
â vocal, náoobitante fer hum aóto deReli^
giáotam nobre , & fan-.o , & eníinado por
rolTo Salvador ]ESU-Chrifto ., & ufado em
toda a Igreja Catholica: com tudo , quanto he
de íeu género , não deixa attender tanto o
efpiruoas coutas Divinas, & pcnetrarfe del
ias, como a mtntah Porque naquella a atttn-
çáo fé ata às palavras , & nefta o eípirjto fe-
Cué IVT< mi rtr ociue < c que lhe he nccdfa-
rio , & as mrcqes t'oÉfpirito Santo , & pira
tomar o peio «, & fuftaíici» do que vai ccníw
Va virtude da Caßidade. 9f
aerando. Ponhamos exemple» : quando eu di
go vocalmente : fadre noffo, que ejus nos Ceos :
por muy de vagar que o diga,náo medito.que
coula he fer Déos nolTo Pae.E fe oro mental
mente , vou partindo, & maftigando efte grao
de moftarda,para que lance del! o ardor que
encerra; & reparo como efte Senhor de infini«
ta rnageftade verdadeiramente lie nolïb Рае,
pojs nos deu o fer , & dá o fuflento, & hií Ayo,
que nos aflifta, que he о Anjo Cuftodio,& nos
Caftiga qoando erramos,& nos guarda o mor-
gadodaBem-aventurança;queheo que fa-
zem no feu tato os bös paes.Do mefmo modo:
cjuando eu rezando о Credo , digo : Foi cruel.
ficado , mono , & jepultddo , nao paro a confia
derar , quem he a j'eíToa'., que padecco morte
de G uz, & porque a padeceo; que fáo os pon
tos em que iê detem quem ora mer.talmen-
te. Bern fe mollira logo que a oraçao mental
de feu genero he mais reformativa doscoíhi-
mes, & mais proporción adapara illuílraro
entendimenso , & abalar a vontade.
E finalmente nefta materia nao tenho para
que multiplicar raz cens , rem allegar ambo*
ridades : remetome à experiencia de quem o
quizer provar. E pela que cu tenjio no ufo de
vinte, & cinco annos de confeffionario publi
co, onde ainda que a affifteiicia nao folie tan,»
ta, como a de outros operarios delta Congre-
gacáo ,náo podiáo as obfervaçoens deixar de
fer
96 Tratado
ícr muitas , & muitos os defenganos : poflb
aíTegurar , que por eftragado que Teja hn pec-
cador neftes vicios,<fe que varaos tratando , Ce
Regarda oracáo mental, & fouber conler-
varfenella, ha defurgir doabyínlOjernqiie
íe acha furaergido , & fahir homem de vir-
cude.
Em ordern pois a eile fim apótaremos ago
ra alguns documentes praticos , & breves, re-
metendo o Leycor dezejofo de mais copioía
doutrina à direceáo que anda nos livros das
meditaçpens do NolTo mui.o Vencravel PÎ.
Bartholomeu do Quental ., ou à inftruçâo
que anda na primeira parte das noflas medi-
taçoens dos Noviffimos ; ou quaesqueroutros
Jivros cue tratáo efte ponto magiftralmente,
como fao Molina, Puente, Alvarado, &c.Os
documentos iao eftes.
i. Bufqne Padre efpiritual,quelhefirva
de guia ; fe depon de feitas fuas diligencias, o
ráoachar, fie-fe de Déos , que elle o guiará.
E ñas dúvidas principaes confulte por eferi«
to pcfloa,que polTa reíbfvellas. E coílumefe à
Jiçâo de bons livros , que ali achara muña
Ju¿.
z. Antes de entrar no exercino prepare/e
com licáo efpiritual , para ter onde arrime a
memoria , & com que fomente o efpirito. Se
nao fabe 1er, valha-fe do que Ihe ewfina a Fe,
& tem ouvido pregar , ou 1er a antros.
З.Те*
*Da virtude da C? ftidade. 9/
3. Tenha lugar i & hor* certa de faxéro
tal exercício : & não lê mude, quanto for pof-
fivel , iem jufta caula ; vrqiie cfta igualdade
ajuda a perfeverança. Ò melhor lugarahe o
mais retirado, ou na Igreja,-que lie Gafa dt
Deos : a melhor hora he alta noute , ou de
ih;idrugada.Mas não podendo fer de outro mo^
do , em todo o lugar , & tempo , acha a Deoi
quem o bufca.
^. No principio da oração applique-fc be
à preferça de Deos,fundando-íe na Fé de que
ali o cila vendo : adore-o profundamente ^
benzá-le, arrependa-fe de feus peccados, in
voque o auxilio do Eípirito Santo ,que o alu-
«lie , & enfine. È aquiete o íeu interior qtJã-
to puder , deixando cuidados para outro tera-
fo,& crendo que lhe não hade faltar,pelo que
dá aDeoSi
5. De diftraccoens , & vagíieaçoens dó
^penfamento não íè eípahte : A imaginaçáa
iiâo a teinos fechada no Punho, para q lhe náo
occorrão varias coufas : tfle traballio tivcrá«
também os outros : fofra como elJes fofre-
rãò. Com o terripo, & ufo, & muyto rilais comi
o auxilio de Deos , irá entrando em mais re
colhimento. Entre tanto bàfta tornar a ap-
plicarfe , quando fé fentir diftrahido : ma9
ifto fem angnftia,nem impaciência.
*. Em difcurftísgaftes^o que baftar para
aquecer o efpirho, & entre logo? às outras
G f«^
ç8 Tratado,
fartes daoraçao, q íáo affedos, colloquíos,
j ropoíitos , paiçocDS , orlerecimento , ас çao
de graças. Quandofe esfria« & feca, pegue
de outro porno, diiccrrcndo nelle, \ ara fe mo-
v».r de novo.
7. Se о efpirito acha çumo de devoçao ,
ou luzdeconhecimsntoem algum tor to ou
paffo particular , nao corra mais terra: deixe-
ieatiettar, em qúanto о efpirito nao defpe-
,gua, mas q gafte em hú sí) arfeûo todo o tem
po da oraçào. .
■ 8. Nun :a por desamparado, &fcco,que
fe veja , deiconríe .le ü-os ,nem murmure -,
nem Jeixe o leu exe'cicio. forme hum gran
de, & firm« coi ceito da bonJade de fte Sc-
nhor \ Se nao o imag.ne tri te, irado, ef-
caco, inacccflivel, & cançadodeo foirer ; f¿
nao fummarrunte alegre , benigno , libera/,
pericaJor , & am ig »de couiinunicarfe , &
einfim bondadj íem 're mayor,& mayor fem
limite.
o. Se fentir triítezas , nao faca cafo di(To :
anatureía negaiio-íclhe aordinaria racáode
óu*ros ¿rollos, fe te-o,& amua-ft como m ni
ño, que ¡he tir .0 a nurenda. Mais adiante
; chara aKgriainterior , que he a yerdadeira.
10 Sj padecer tentaçoens , &confuláo de
,. reníamentos perplcxos, mais do que tinha an
tes de fi. dar a efte exercicio , nao fe admire -,
pois eftà efcrito : Filho ao chegarte para o fer-
M90
Wai-irhíde daCaßidade. £9
vîçt de Déos , prepara-te para a tentación
"Nao he muitoqueó demonio faca guerra a
quem Iba faz , & que a rao fizc'ÍTe , a quera
Ihaníofazia: nem he muko,queo madeitci
verde antes de porto no lume , nao fualle , nS
defle eftal!os¿ '/
i i.' Contra efcrupulos o melhor remedía
he obedecer cegarnentc ao Confelfor« Queni
he kfo de hum pè, eftriba lobte o bordUo ':
quem he lefo de jüífó ( comoiäötodos osef-
crupúloíos na materia de fuá conítiencia)
porque tiáb há de cftribar íobre outro juifo
fiel que efte'adefóraiTambctnlíe'bom nao
fütidar a fuá falvacío , & perfeitáo unto fie
bre as proprias induñrias,comoíbbre as for
ças da gTaça ,& mifer'covdiá de Dcos¿
i'i Guarde-le de appeteccr favores extra
ordinarios de Deós, v.g. viíoens , extáfes , lu
me de profecia,milagres, &c. Pôrq ifto coftu-
mañafcerde foßerba3& a foberba aíugcnta a
Dcós','& chama pelo Demonio. Qucira fó o
"■que Deosquizer ; fervillo, amallo, & falvar-
íe, para máis ó amar, & fervir. ; ' .
J'\ii Nao trate a Déos na oracáo com faci-»
lidades pueris , ácnefc'as, fenäo com fiimmd
r'efpeito-, & 1штШасдо : & quahtó mais con-»
far.ça ihe parecer qué ó Senhór Jhe dà , mais
fe abata , & aniquile ; porèm fem ahgüftia^
r.em.trifte¿a*
14* Nao poifie cm figurar ña. imagina-a

.-•'
i oo Tratado
cao os palTos da vida , & Payxáo do Scnhe«
(guando a cabeça cança,ou o efpirito repugna
muyto, puxando para a prcfençadeDeos por
modo elpíritua' , & íimplex, ordeacha íof
fego; poique ifto h : melhorqueo outro.
i 5 . No dilcurfo do dia nao derrame os
fencidos, &o coracáo pelas creaturas, vendo ,
ouvindo, fallando, goltandb,& cuidando tu-
.doo que quer : circuncide íuas vontades ainda
no, licito, Fazendo força contra fi mefmo:
quantas mais vitorias deftas alcançar , tanto
mais recolhitnento achara r.a oracáo.
1 6. Ná> fe aferré tanto aos exercicios in
teriores , que atrepelle as obras de caridade
do proximo, &deixe de Ihes preftar noque
pode. Nem deíprefe os que nao terri oraçâo
' & os vè imperfeitos, & percadores-, porq íllo
fazia o Fari!eo,antepondo-fe ao Publicano: 8ç
a efte , & n lo aquel le Juftificou Déos.
17 Algumas peíToas tem medo de eftar
ai e(curas em parte retirada. Efta paixáo mais
fe ven :e com torca , & fazendo experiencias,
do qu; com razoens. Conftranja a natureza,
aeífar a!i onde te ne , & veja> & toqiie ,
quenada era o que temía. Mas por le a cafo
o demonio lite imprime eíTe pavor , ben¿a-
fe , 'anee agua benta, Se defprefe o inimigo ,
que nada pode Tem licença de Deos,& quan-
to mais o tememos , faz peyor.
1 8é Соп.ца ~л mokftia , où tcntacáo do
'./ : ■•. '' "-''//'-rv-W , *"iono

y
f *Da virtude da Can¡aide, ioi
fono Гад bons remedios mudar de roftura o
corpo , ou levantando-fe cm pe , ou eiLn«
dendo os bracos em cruz : tomar huma dilci—
puna breve , ou buns pos de tabaco , fe a pefc
loa nao he muy coftumada a elle; picarfe com
hum alfinete : nao afíentarfe , nem encofrar
le , rem enrouparfe muito: & melhor que
tudo, ter de antes adquirido efpirito de devo-
cáo por via da prefença de Déos , & mortifica-
cao bem continuadas.
1 9. Náotema o que diráo,v.g. que fe fez
beato , que fe meteo ш fantidades , &c. Por
que ifto nao he mais que hum gigante de pa
llia a'îombroib a mininos , ridiculo a quem
tem juiíb. Emquanto fepuder encubrir en-
cubrafe , quando nao ha obrigacáo de dar
exemplo : mas fe nao pode, lembre-fe , que
ter vergonhade fervir a Déos he coûta ver-
gonhofiílima; & que a efte Sinhor , & náoaos
murmuradores, bade dar corta de fuá vida.
i o. Que ollwndo para o que fica dito , Ihc
parecerá Caftidade muy cara pelo cufio de-
ftas diligencias!, da mefmaoracáo tice as ar
mas de luZjpara rtbater efta tentacáo de tre-
vas : coi fidtre íc lhe fairà barato o interno
compran do-o pela vida folta % de folgazá :
Coníííiere fe ftriáo prudentes merradoresos
Santos , que ifto enfinaráo , & praticaráo : Có-
fidere fcfcràv.rdade oque dùChrifto, que
0 feu jugo Ы fuave , & a fuá carga leve,
1 ■ Giij PER-
I ©j Tratado
. .... i

PERGUNTA* XV. "■ *


Que confa he andar emprefença de Deáf¿
ф- cornqferve еfie remedio para a
Caßidadef
REfrxçde-iç, que andar huma pefToa em
prefença de Déos, he trazer о efpirito
aduadana coníideracáo fréquente, &
attenta de que Déos о tfià yendo ; & da-
qui refulta exercitarfe era actos pios inte
riores acerca do mefmo c.bjefto. Funda- fe
efta confideracáo na Fè certa de que eße Se-
nhor he imrqertfo , & infinitamente fabio*. çor
moirnrnetilo.eftà em toda a parte pot fua ef-
fencia, & £ penetra com tqJas as coufas màte-
riaes, & efpirituaes, mais intimamente do
que eHas.eíláo ptefentes a fi mei|ma$,pois elle
hè о que Ibes dà о fer , %vida , & o movimen-
r.Q : In ¡pfo çtiimyh'tmHS y & mavemur , & ÍH"
was: сощо fapientiilimo nenhua coufa for per
guita q em à fe ja, pode efeapar ao feu conhe-
{amanto çpmprehenfivo , ou cahirlfie da me
moria. Para a fuá noticia táo pertoeftb. o in
fern о como QC;o,táq evidentes os futuros ,
conjq ôs pre.fenjtcs,täo expoíloj os no(Tos pen-
farrjentos , compasqbras exteriqres. Por on-
ífe diífe S, (¡regqçiQ, qiœ quajr£doj$q crerqos
2)¿ virtude da Caßidade. iо$
i ou näo cuidamos ) que Déos nos vè , traze-
mns fechados as olhos ao Sol; cfcondemolo a
elle de nos, mas nao a nos délie: Cum a Deo non
creditnns nos vidtr'jn (ole cluufosoculos rerinemus;
Шит л nobis abjcond'imus , non nos ¡lit. Dizem
que Syrene terra de Alexandria, tfru lieu ada
emtal clima, que no folfticioaomeyodia,láo
alhimiadoscs poços atèo fundo. Déos he Sol;
poco o hoffo coracáo: nao ha relie pu>.undefa,
- que lhe nao feja patente : Omnts vi* bom'nis fnv.
(A z Salamíor.os Proverbios) pafenteculis ejus, 16.
Jphitumn p^nderafotejt Domnus.
Efta corfideracáo coníovme formais , оц
menos conti nua , nflim nos guarda o coracáo
г"е todo o gererode vicios , & ros sperfeicoa
í m tocio o peñero de virtudes. Para Abraham
íi r perfeito näo lhe deuDeos outro documento
mais que efte : ЛтЬи\л coram me , & eßo perfe- ^eney.
Fins Eiie he o que praticava David : Provide- 1 7* '•
ham Dominum in confpeffn mrofemper. Efte о q >p( jt#
compungió, & converteo a S.Pedro de pois das 8.
neg.içoens ; ver que o Senhor olhava para el
le : Conyerf«s Dominus refpexlr fetrum : & re- Lnc*
rordatns eft Tews, Or.Efte he o que esforçou огь.
coracáo de Su far. na , para que antes defpre--6l,
zaíTe a vida, & honra, do qo temor de Déos,
eonfentindo com os vellios lafcjvos : Melius eß Di^
mihi abffjfe owe ineidere in minus vcßrASrfnam j ,
peccare in corfptclu Domini: como pelo contra- , ,
rio ¿lies le atveviâo a tarn execranda nulda-
'•-* .; .'_ ..>• . Giiij '■■'.. -■■ óádej
: ..1
J04 Tratado
de ; porque fe confíderaváo fem teílemunha
alguma : Oftia pomatijclaiifa (»ut , & nemo tíos
yider. \ . -]
Finalmente he eft;e hum remedio taoM*
ral , & effiçaz contra todos os majes da alma;
queacaia palToo eftáo inculcando as fagra-
das Efcrituras , & Satos Padres, Mas para que
onecciïiiadqdellê nefta materia que vamo?
(triando, fique mais atfectq ao praticar, traf*-
ladarei aqui humanotavel doutrina , & vifáo
da Seráfica M. S. Terefa pelas fuas mefmas
pa!avras:&ajuntareidefpois alguns notaveis
èxemplos , aínda que ja vulgares. [ Eílan lo
uua vez en oración ( diz a Santa Doutora ) fe
me reprefentó muy en breve lln ver cofa for
mada, mas fue una reprefentacion со toda cla
ridad, com fe veen en Dios todas las cofas, y
pomo las tiene todas en fi. Saber eferivir ейо,
yo no Iq fe : mas quedo muy imprimido en raí
alma, y es una de las grandes mercedes que
el Señor me ha hecho , y délas quemas me
han heçhq con fundir, y avergonzar , acordán
dome de Iqs peccadosque he hecho. Creo fi
К- el S;fhr fuera férvido , viera efto en otto tier
po , ynj lq vieran los que le ofend:n,que no
tendrían coraçon , ni atrevimiento para ha?
zerlo ]. E mais abano ptofegue a Santa dizen-
*lo: [ Digamos fer la Divinidad como un muy
flaro diamante muy mayor que todo el mun-
„díb ó efpejo а raançr* de lo que dixe dtl al
ma
Da virtudt 4a Caßidadf. iof
та. en eftotra vifion, falvo que es por tan fu-
bida manera , que yo no lo Tabre encarecer; y
que todo lo que haze mos fe vee en efte dia..
mante , fiendo Je manera, q el encierra todo
en íi -, porque noay nada que falga fuera de-» j
fta grandeza, Cofa efpantofa me fue en tan
breve efpaeio ver tantas cofas Juntas aqui en
efte claro diamante: y laftimofifíima cada vez
que fe me acuerda, ver que cofas tan feas, fe.
reprefentavan en aquella limpieza de clari
dad , como lo eran mis peccados : y es aífí que
quando fe me acuerda , yo no fe como lo pue
da llevar: y aíli quede emonces tan avergonça
da que no fabia (me parece ) adonde me me
ter. O' quien pudielTedar a enttndereftoa
Jos que muy deshoneftos, y feos peccados ha-
zen : para que fe acuerden q no ion ocultos, y
que con razón lo líente Dios , pues tan pré-
fentes a fu Mageftad paffan,y defacatada-
mente nos avernos delante del. Vi qu'an bien
fe merece el infierno por una fola culpa mor
tal: porque no fe puede entender quan gravi f-
ííma cofa es hazerla delante de tan grande
Mageftad , y que tan fuera de quien el es fon
cofas lêmejantes, & affi fe vce mas fa mif*-
ricordia , pues entendiendo nosotros toJo
efto , nos fiifre. Hame hecho conüderar, fi una
„cofa como efta dexa cfpantada , que fjrà el
_dia del jui¿io, quando efta Mageftad clarar
menee fe nos moftrarà , y varemos las ofen-
fas,
ip<5 , . Tratado
fas, que'hemos hecho i ]. Até aqui a Santa
Doutora.
Quanto aos exemplos. O pt imeiro fuccedeo
a S. Eírem,a quem huma mulherímlia dtf-
honeftà fé atreveo a felicitar : & o Santo pia-
dofamente aíluto lhe deu a entender , que
náoconfenciria ,falvo ella tíveffe animo pa
ra pecrar no meyn Já praça. Envergonhou lê a
pobre , & dilfe admirada : E pois não haveis
de ter pejo diante'dos olhos dv; tantos ^ Ref-
pondeo Efrem já declarando o fcu intento:
E tu miferavel , onde quer que peccares , tão
tens pejo dos olhos de Dais ,qutvè mais que
todos f1 E!la ferida do arco de D^os, que efta-
va na mão do Santo , ponderou a fentença,
cahio na conta , mudou de vida. A força de
ite argumento declarou hum Poeta no íeguin-
te diftico.
SiquiJfortefjtcis ^(\vnâ me fpefíanfe rtiheres:
~* ' CuYfptflttve EM jí-'» nm"js !pfe rubest
O outro caio pafTon ao Abhade Pafuncio
con Thaes farhofá peccadora em Alexandria.
Para a rcduíir de verdade ao caminho da ver
dade, a foi folicitar fingitiamente para o da
perdição. Hiacomefpirito de Apoílolo em-
trajes de fadado : por demro todo cilícios ,
por fora todo galas. Akgrbjiíè a trifte coro o
novo hofpede que oftvntava. riqueza, & ga
lhardia (d0iisjiontosrr.de põem a mjra feme-
ILantes íogejtos, que ílrvem a Plutão , & Vè-

'Da "Virtude da Caflidade.
rus ) •, Sc o foi condufin.-lo para huma quadra
interior. Mas elle aííeâando rcceyos defer
/èn;ido : Ni" tens ( lhe perguntou) outra par
te mais mirada ^Thacselcarntcendodo me
lindre, mas condefctndendo com a demanda> o
levou mais para dentro , & Pafuncio olhando
à rocia, Jiíle de fcontente.- Ti. mo que nos ve-
jão. Chegou em fim ao mais retirado da ca-
fa, & ali outra vez temerolo perguntou : Efta-
mos aquifjguros, Sc fcm teftemanhas? Quem
nos pòcle ver ( refpnndeo Thacs) falvo Deos ^
ou o diabo f O Santo , ouvindo iuo, fé encheo
de horror , Sc fufto: & t '/n ou a perguntr.rllie,
fecna tm D^o% Crcyo (refpondeo Thaes).
È Pafuncio : E que em toda apa-teeítà
prefcnte , & tudo regiílra com feus olhos?
Também íèi iíTo ( dilleella ). E que para os
peccadores tem decretado foço etçrnoí Aílim
ne (rcfpondeo Thaes). E pois cremos iílo (cõ-
duioo Santo latgandp o disfarce ) & nos atre
vemos a peccar, & dizes queeftamos aqui
íèguros f Thaes ferida fubitamentc da com
punção , cahioa feus, pés , primeiro attonita ,
& logo desfeita em lagrimas: & quantas vezes
renovava a Fé. de que os olhos Divinos ha-
yiío 4do teftemunijas iíe fiias torpezn s, tan-
'tasos feus oeráodelúa contrição verdadeira.
Inftruidacrnfirn no modo que liavia de guar
dar para hum,a nqya vida , a fechcni o Santo
Abbacíe
•X.1 f '~ : • . jem:./,;!>
hun^ cubículo,
••-:.. no, qual*- llie
. lina-
.* • .
ísll
lou
ic8 Tratado
loH so pam , Sc agua para o corpo, oraçao , &
lagrimas para o cirineo, Perguntou que ora
çao haviade ter? Rcipondtulhe : Nao es dig
na de dizer mais que eítas palavras: Senhor
quemeformuir.es. hatfeidemi nv lericordia.
Ñifto gaítou tres annos , que foráo todos o*
de fuá vida; poiq até entáo nao vivendo Para
Deosera morca. Ao cabo de I les fe deíatou
| fuá alnsa dos membros que a inficionarlo com
o deleite, & delpois a purgaráo com a peni
tencia. A quai roi táo perfeita , que S. Paulo
o Simplcz , difcipulo do grande Antonio , vio
na mefma hora h'um4riquiffimo leyto prepa
rado ñas alturas do Empyreo; & peguntan
do para quem era táo txcelfo,& deliciólo def.
canlo , lhe íoi refpondido; Para Thaes a pec-
cadora , q e agora paíTa do mundo. Eifaqui
quam poJcroío motivo he para nos refrear
do peccado, cóiiderar vívamete como os olhos
"deDeos devaffáo todas nolTas aeçoens, pala-
vías, & peníamemos: Té!река ejus iritf>ro¿jtit
filos hominuw..
i . A praxe deíle exercicio confífte primei-
ramente emqfecoíriimeapeiroa aeftacon-
íideracáo, ncompanhando o '¿to de fè,com
alguns ou tros de amor ,ou louvor dt Déos, ou
de peticáo de feus auxilios, ou de aecáo de gre
cas ,ou de outra qua'quer virtude, uiündo de-
fíe exercicio ao veftiríe ,& dtípirft , ao en
trar,'& fair, quancio anda, quaimö come, &
tm
Da virtude 4& Caflidadel i o9
errTqualquer outro tempo , & lugar. Porque
corrio confta de actos breves , & interiores, &
o obiedo, quehe Deos immenfo,eftà prefen-
te com noíbo : em qualquer occafíáo , cabe m
facilmente , íe o efpirito quer applicaríê , &
niitb infifte contra a natureza amiga de foi-
turas.
i. Também pode ufar de owtros modos de
prefença de Deos , imaginando v. g. Chriílo
Crucificado r, & que beja fuás {àcratiffiraas
Chagas,& que nellas íè recolhej como a pom
ba nos buracos da pedra : ou amarrado á co
luna, & figurando que com eHe fé ata,&
prende a íeus Divinos pés: eu orando no Hor-
tOj ou no deferto, & que ali ora em fuá corg- '
panhiaj&c.
3 . Sendo efte exercício proveitoíõ em ter
do o tempo, & hum excellente modo de com-
prir com aquillod.e Chriílo N. Senhor: Opar-
tcf \twper orttre\& numaitA Jcficm:tmporta orat
limpre , & nunca desfaJecer; muyto mais im-
J>orta no tempo da tentação : pois então hc
o pegar das armas , quando he f> tocar a re
bate. Por iflb dizia o Padre Meftre João de
Ávila: Latentacion a ti,&tnaDios.
4. Efta prefença de Deos pôde quem eivei
commodo ajudaHa.tendoem cafa pinturas^
eftampas lx»as dos paíTos da vida, Payxáo , &
morte de J E S U-Chrifto Redcmj-tor, & Sal
vador noflò. Porciue.asiínagsrtó-íagradíisíld-
drem
iio Tratado* '
dre quanto quizererh os Herejes ) edifícao,&
defpertáo bons pen 'amêíos:como pdo contra
rio as profanas,& obfcenastcntão,& induzem
para o mal. E aflim como no pinco-,que coii-
ferva em cafa eiras, hc peccadò , aííim iro ccr,
de Tua.- & venerar aquellas para o fim de lemb arfe
trím, de Deos Senhor N. he.mujto agrado íeu/j>ro-
lib. 9. veito t & merecirnento'riò(Toi
*' PERGUNTA XVI.
l'-r
n ò Qae tx&nfasdos qite cultivarão a, CajU-
t dáaièpoderà hu confiâèYnrtfara ntats j
( fe afeiçoar a eftavtftiideí '•", •

RÉfpohde-fe apontando alguns, para


loas que não terft livros onde os ach
ou lhes falta tempo , & curioíldade para os aiv-
j ibulcando.
dar r j
,; í. João Valente grave efcritor da Ordem
r 'l Fpntébra'klyifereferc,qi!C indo certo Prirce-
e ' ° e pé viilrar hu Morteiro de Freiras daquclla Or-
• * ,- dem,vio Húa de tão fingúlar ferrhofura ,que !o-
' go ficou prelo cio ícu arrfcr. E não pjdendo
m° "°~ tirar da imaginação aqi\e) Ia etrtcie , que co*
w* Kf~ mo jèljtápágò ò deslumbrara , mardoii finm
terceiro ( i- imca cites fakàrán tios Pa'acios)
que lhe fàiláljc", pergdntándo da fuá parte
An* fuaílunle,^ oijercctndo^fòrara tudo o q
foffe
Da virtude da Cafiidadè. nj
fofle de feu goftc. Entendeo logo a K.eligiofa
onde fé encaminhaváo tão magnificas offertas i
pergmntou que coufa agradara nella mais ao
Princepe. E refpondendo-lhe , que os olhos,
pedio licença para ir dentro , & voltar logo ;
& fem coufulta, nem demora (raro valor,
notável refolucáo, que íenão deve imitar fem •> ,íf g
nvuito efpecial impulfo do Efpirito Santo) ti
rou os olhos com hum canivete 7 & poftos era
hua falva , lhos trouxe , juntamente com eftc
recado: Levai ao Princepe ,& dizeilhe,q gofe
do que lhe agradou. TJremeo aquella peffoa i
vifta de tal accáo O Princepe pafmou , & mal
acabava de crer o mefmoque eflava vendq.
Mas aquelles olhos privados da luz,a dcráo aos
de íua alma : trocado o amor do feculô no da
virtude, deu grandiofos dons aoiMoíkyro, &
lhe edificou enfermaria , & convalefcenca. O
P.Theofilo Raynaudo,onde li o cafo,lhe appli-
ca os verfos de hum Poeta í-rancez a outra
<k>nzellaEfcoce?a, por nomeTriduana, que
obrou femelltf.nte lance: & o amante vendo' .
aquel!esolhos,exckmou:
HSH! ijuo ;«>'í oculi , ~v'n ço ftirriffimj,

Não (êi , Varonil Donzella ,


n ao fei , em que razão cahe ,
que os meus o!Los facão o crime , '
& os vofíos a pena paguem.
Mas aindaqueonoffocafonáoTeja

lar,nada perde de admirável. Pónderéfe como
no efpirito deita litta Religiota efiava altamete
gravado o arriór daGaftidade,pois tão promp-
, ta como afiirnòfariientepoz por obra , &en-
lendeoaòpèda letra o que Chrifto diíTe na
Evangelho : Qye lê os teus olhos te efcanda-
M*i*0.1izâo(ifl:dhe , fé te podem ler califado' pec-
il.8» 9' cad'o ) os tires fora* Oh qnantds perigos evi
tou de ha lance.' Quantos fenfaiitcntos màoS
atalhou em (i , & nos r/rexírfros .' Qiiarri co»
piofo prefnio receberia de feti divino Efpofo
zelador da pureza / Quarfi fefmofos, & che.
yos de Itít divina tinh^os olhos' da fna alma/
È que viva*, Se fotte repvchcnláo deixou à'
muitas que pfofeffando o niefjtio eftado , &
obriga jão deCáftidade,pái-ece riáo profelTárão
fcnão ò maldito appetice de verem , & ferert
Vifias. Mas tftas fáo as verdadeiramente ce
gas, pois diz Chrifto ^ quec|ú:m onio Cegue/
'anda em trevas* Cahio fobre ellaso fogo da
concupifccncia,'St aílim não' vcíri o Só! da gra
ça de Deos : SHflerceciiiir i*n'Sj& nm -ylilerunt
•|fl/í»j1Nèm verão d de fiía rjoria , fé corri terri-
'po fenáo converterem^ Pr-fèrn continuemos
eorfi a narração de outros exemplos^
a. S.Li!ÍsdeTo!ofa filho primogénito de
Carlos Rey de jeni falem , cias duas Sicilias, &
íbbrinho de S.LuisRcy.dcFrâca.Foi tão jmsn-*
tedaCaílidcidc) airida antes de entrar Reli-
giofo da Ordem Scraphicí , <jue -
náô coi]fen. '
ЗЬл virtttde da Caßidade. гii
tía que fuá propria máe llie dtlíeofculo аию
cómujum áe Franca. Eftranhandb ella tanta
efquivahca¿ & dizend¿-lhe : Filho meu ¿eni
• yolTa máe que perigb tehdesi Reípondeo.Berri
fei eu que íois máe , mas tarribem vos fabeis¿
que ibis muí her À efta pureza do tado ajun-
tava a da viíta ; porque viíitando a fuá irmá,
ñáo levahtou os olhösparaaver; Como efta
virtude he toda flor na fermóíura com que
agrada, na fragancia com q edifica, & no mi-
ftia, & reigüardb com que fe quer tratada :
Îremibu Déos a efte Santo com prodigios tá-
¡em de flores. Hú foy , que ao ponto de efpi-
rar Jiie faliio da boca huma fermofiflímarofai
Outro hej que em huma Ermida ¿ó Santo,que
efta emburrias ferras altas ¿ no Confelhbde _.; .
Rengos , Principado de Afturias , todos os j **. ,
ahnos ñpdiadefua fefta, de ttrnpo imme- dene'r*
jnoriavel a efta parte , ao celebrarfe a MilTa * ""ff*
¿o dia em preft nca de multo povo q ali cócbr- 'y
re, começao a florecer as pedras das paredes, П4.у
Os madeiros do tedo,os ladrilhos do pavimé- y
to , Si até a fochadnra^ & ferrolíio da mefraa
£rmida } 8c tudo fe enche dé humas florezi-
chas bracas,' & pbr ferem milagrofas as leva a
gente como reliquias de muita eftima;
Сб fer o prodigio táb ceTto, & público, tb -
dûvia para mayor abono dtlle, à mihha inftá-i
da ( diz o P. ¥<: Antonio de Sa na fuá Chro
nica de & Frácifco }.no anno de 1 607, fe fez
H hums
,tífl TràtaÀo
huma informação autemicaante oEftriv fò
& juftiça daqúella tetra, com muitas teíte*
tnunhas juradas, que depõem de vifta : S£al»
gúas juráo que talvez, fuccedeo floreter tam
bém a cáfúlà ,& Cálix com que o Sacerdote
celebrava. Ed fui a efta romaria no'annp de
1 609. parajver efta maravilha , & achei fer
Verdade. E em efpecial a experimentei na
torta da Ermida, porque acabando de a alim
par «m as mangas do habito para«mayor cer-
íezadé que ali nada havia,vinafcer fogo hu-
ftiafiór dehuni prego de madeira que eftava
Cr.de eu acabava de alimpar. Vi-anafcer, &
creícer em hum ponto , até que não crefcen-
do maiâj a cortei , & trouxe comigo,
i Ate qui o dito Chronifta • qae rallando em
tm^ Evota com Manoel Severim de Faria, lhe ré Ja-
Zki- toiimaisporextenroasparcifularidades Aclte
TUítl hovo & ensracado prodigio.No qual fc olten-
/o/.oi.taq'.iàntoaDèosagvada avirtudeda Caltida-
'de ; pois a efta publicando , & ornando corn
e logios de Rores. E razão era , que eftas fof-
fem brancas, pequeninas , & milagrofas 5 pá*
rã concordar o lymbolocom aquellavimide^
& tambtem heíandida, & dependente de miu
dezas, •& cjuafi miUgrofa , efpecialmeníe
cm mocos, fiííios de grandes Senhores^E co
mo tftasfioi es convirão ao louvor de"' "
as cria •> & ao (eguimento da virtude, que m-
éulcão: Um-podemds dizerlhes aquillodo
Eccle--
Ра virtude da Cafiïda de. 11f
Bctlefiáílico: Florete flares qu.tß Щ'шт , Ö* ал~ Ecclifl
it oàtrtm , Ö* frotidtte in *глплт , & collduda- j g,
te cauticûm i<jf betted',ele Dem пит in oftribut inj (
/и/Л
j; Demos outro exenplo de outra flor
Inctiana,meTcladóobranco da Caftidâde com
o encarnado dö martyrio pela пае macular;
Na vida do novo Taumaturgo о V. P. Jofeph
de Anchieta fé efcrtve,que elrando duas In
dias infus lavrando rolos de cera por fçr)'
fuá oceupacáo efta, fez Lúa duas velas4,parteí
É perguntándo-lhe a irmá , para que eráo ;
rcfpondeo muy fobre o feguro: Que eráo pa
ra o P. Anchie-:a lhé dizér huma Miíla em feu ч
Jouvor , & honra, quando foffe Santa, & Mar«1«
tyr. OtTetecidas as velas ao Padre ¿ elle as
suardoir. fuccedeo pois, que vindo os Barbaros
infléis fobre aquella povoacáo , leváráo en
tre outros cativos aquella India. Intentou lo
go o Capitáodaquella a(Taltada,violar fuahó*
îreitidade.Porèm ella com varonil esforcofe)
defendeo , aflegurando-lhç , que trabalhava
de balde -, porque fendo Chriíiá , Se cafada,' »
niohavia de offender a feu Déos y nema feu
marido. Entáo o Bárbaro Ihe tirou a vida emí
odio da Fe ¿ & da Caflidade. No mefmo dia
acliando-fe o P. Anchieta aufente em muy;
diftantes terras , accendeo as düás velas : ¿¿
movii'o ( ao que fe deve crer) por efpecial im-
1 alio' do' Efpni.o Santo, que lhe infundio a-2
Hij quelle
Ь» ' tratado
quelle luire profetico , dille MiíTa de huma
Santa Manyï nomeando-a naColle&a pelo
feu nome. Reparando niíio outro Padre,
& pergunt-r n !o-lhe , q nova Santa era aquel
la J diffe quem era , 8^-que no mefmo ponto
em que deva a vida em detenía da Caftidade ,
lhe moitràra o Senhor fuá bendita alma en
trando no Ceo coroada có laureola de Martyr.
. Aqui devem parar , & reparar as cazadas ,
que nao vivendo ( como eíla ) nos certóes da
America , mas na [gemma da Chriftandade ;
nem fendo ameaçadas có ferro violento , mas
solifongeadas com dadivas ,efcritos, & paf-
íéyos , táo levianas fe rendern f como traido
ras adulteráo. E nao fomente fe expeem (co
mo deveráo ) ao perigo da morte por nao of
fender a Déos : fenáo que por offender a Déos
fe expoem a e(Te perigo da morte -, & morte
nao so temporal , mas eterna •, fendo marty
res do dial o , & offerecendo-lhe por máos de
feu aleivofo appetite júntamete a honra, a fa
ma, a vida, & a alma-, & talvez q nao so a pro
pria j mas tambera a alliea , ou do cóplice que
foy colhido , ou do marido que fe achava me
nos armado , ou da creatura que nao vio a luz
do Bautifmo. Antrittes/ Ah miferaveis/ Co
mo nao vedes qaantos enes fe fecüem do
hum erro -, & quam horrivel he a profuhdeza,
onde por voíío pè concis a precipkavvos? On
de cilio pejo , & vergonha táo propria de
voffo
Da virtude da Caftidade. 117
VcfTo fexoj&tão precila ao vollo citado ? Tem
pos houve (' ô bons tempos.') em que das Por-
tugue/.as cazadas fé r.ão conhecia fora de cal«i
o nome. Era necetíario para a explicação, di- ,..•/
zerem : A mulher de fulano. Hoje conhece»
fé o nome, conhecefeo roftro, conhecefe o
Içyto, Mas he porque as taes não conhecem a
fi , nem aChrifto. Se fé conheceíTe*n , enver-
gonharáo-fe como fêmeas , & recearáo-fe co
mo cazadas: fé conheceíTcm a Chrifto, ama-
riáoa tambomPae.refpeitariúoa tão gran
de Senhor , ou io menos temerião a tão íeve-
ro ]uiz , que ha de punir momentos de fogo
íenfual, com eternidades de infernal fogo.
Deíviounos o ferver do zelo. Voltemos a^
própofito da pergunta , ajuntando mais algús
exemplos : & para não ferem poucos, não íe-
rão compridos,
« 4. S. Macario Alexandrino fentindo a!- Qfexf,
gurnas rtbetlioens da carne , & tçmendo- /-HS
li defte inimigo tan.o mais traidor, qu;-,n- p ^ /
to mais frágil , defpiofe , & foy affencav- *
íe em huma lagoa , onde grandes mofqur-
tosandaváiembandas, Acafofoy efta pe
nitencia por poucas horas , ou só por alguns
dias? Seis mc7.cs a fovorton para picar bem os
membros, qneopicaváo mal. Dali fahiotal,
íque parecia Icprofo, & sí> p. Ia falia aconhç* .
cião. ••
5. S.Margaíita Infanta de Ungria recufo
- ... H iij con
ii8 Tratada
rJ*ne¡r íonftantemente os cnfamentosdosReys de
гл n<t Polonia , Boemia , & Sicilia. E dizendolhe ai-*
f»d т/ч guns que o Papa difpcnlaria no feu voto, ref-
dá, pondeo,que,eítava determinada antes a cor-t
¿arfeos narizes ,& labios, & tirarfe os oIÍiqs,
do que cqnfentir era deípoforios com pelfoa
humana.
6. Certa Donzella Alexandrina habitou
T?™* «bzeannos em hum nicho debaixo da terra,
f*f-í» fabricado pava collocar a urna dos olios de al-«
gum de Funto. Cau fou admiracáo quando ali
foy defcuberta. E perguntandolhe quefazia,
refpondeo ; 6jardo o thefouro da Caftidade
encre eftascaveiras fecas,, dqnde nenhum ío>
go fe levanta.
7. S. Cafimiro filho dos Reys de Polonia ,
a quem a Igreja celebra a 4. de Marco , quiz'
aptes (quai Armiñho ) perder ávida , do que
manchar a pureza ; rejeitandq q confélho dos
Médicos , que diziáo fer neceíTario perder efta,
,paraconfervar aquella,
f , '-•(?, AS. LuisBifpo'emGatalunha fuara-
,a га gentileza o paz ещ grave perigo, & fuá
f ■'].' muita honeflidade o livróudelle. Solicitado
i por huma Rainha de Franca, olhou para ella
.-. }. ., a travez corn ta! in4ignaç|o,& defprezo,quc
:..V ю? .\? baítoj para à envergonhar,& reprimir. Agra-r
doutantóa Dios 3 acçuq,qqe áquclle plho^
pom, que ja raeyq vokada a cabeça,repreheHT
... ; ; ico л tentadora , fe^onfervou inpprruptq, &
2X* virtude ãa Cajttdade. 119
*" e(plandecente<x>mo criftal quatrocentos an-
3?. Paconio Eremita fendo já de cincoen- V"rt#\
ta amuis não carecia de tentaçoens moleftif- íVw
ílmas : & nos doze íeguintes (ifto affirmou el-
le mefmo com juramento ) nenhum dia hou
ve, em que não eftivefle à eftacada batalhan
do valemfainentejfenipre quaíi no ultimo rif-
ço , & fcmpre no te (ao primeiro. Efte çafo tç
mais que admirar, do que à primei rã facefç
repufcnta : & dá muita confolacáp , & fasii-»
mo aoi virtuoibs perfeguidos nelta meteria,
10. AmmoniojMonje de virtude afamada Tym*
em tempo de Conftantino Magno, viveo de-
Ibuto annos deportas a dentro gnardandp
virgindade com íua mulher, cpmo fé fora fu.a
irmá. No hn* náo fé fiando de íl próprio , &
temendo que em hum initante caule táo CK-
çelfa, & fermofa fabrica de virtudes ? fé a-,
partoupara odeferto, Efta fanta 4efcpjifian-
ça erao felloque faltavapara maisa,b,pnar,8i
jionrar fuá Caftidadç.
1 1. Mais ainda he, que o Conde Ekaza-
ro , & fuá mulher De l fina ( amjjps Saptos da
Or dem terceira de S. Fniricifço ) náoapartai»-
- dó o Jeyio , não vjolaráp a 'Virgindaidç.* Mas
..era efte tjjQcafto pelo influxo da graça cefe-
.ffialj que liuma irnjã da.mefma Dclfiiin, frçi,
,fâ, quando padecia Y.ipltntos cftimulo! da
Xenfiialidddc, corria a abrrçarfc com o p^da
•i Iliíij quçUsT
+
Ï2Q Tratada ' "
quellacaraa , & fe liie mitigaväo»
r n. Seria nunca acabarle deixalTemos \'бя%
r&*!°~ a penna pela copia defies exemplp;. Remato
*0&в com im de hum Portuguez eftudante Ccmim-
Lttfitd- bricenfe : dcpois fe chamqu Fr. Roque do Ef-
*ei prito Santo , & toy Religiofo da Santifllma
Trindade , & ali quatro vezcs Provincial,
Efts achandq emicaia huma mullierfinhamú-
daña que feu companb-iro convidara: por апт
teciparo remedio da tentacáo, que errttal
lance era certa, pozo dedo polegár íbbre л
çandea : & como lhe näo.pudeirem com toda a
força aíaílar nem o lume, nem o braco , en-
vergonharáofe os dous, & nao peccaráo : com
que q Demonio tirou perda donde eípera"a
cirar lucro; porque o bom exemplo pqde aquí
niai§ que p eícandalo.
Ncftes exemplos achata a peffoa, que ne-
çeffita da Caílidade , como eíla viréude nao
?o he fermofa ? 3c honcfta x mas poífivel , &
fácil , m¿diantte a gtaça de Chrjfyo , cujo ju-
■' . . . go he fuave , Se cuja carga be leve, com tanta
que hiiTj а queira tomar fobrefi.E affinj di
ga com, S. Ágpftinhq ( grande peççador antes,
pe d^pqis grande Santo ) Ttt поц piteyh, 'quoa
ißi , & iß* ? Tu näo poderás q que tantos , &
tanças puderiq ? açafo elles nao eráo de barí
to romo tu ; ou tu nao tens a Déos que te
"*ь - ajude comp a elles? toma animo, quebtaçom.
■^eD^manio.fazete violencia , levántate do
Pa virtud« da Qaflidade'. ii t
îodaçal onde jazes ; que quanto mais te deii
xas eftar, mais abaixote (ornes: toma animo,
Deoî te ajudarà : & fe pcríUHres cm applicar
os remedios, verás a tua liberdade reftituida ,
& loqvaràs a Deos? que te livrou tie jojeicáó
täo miferavei.

PE ^ QU NT A XVII. ;
Pe que exemptes poderà hu m tirar o frit -
ta do efear»tentо na. pre/enîe ma ■
■• fefia.
REfponde-fe apontando tambem nîguns
mais horrendos , entre irmumeraveis , q
■ ieeiicoturàq pelos livras.
l Conta-ie po Hiftorial para to.bs о dcC- з.^>.,
graçada firn de tres щосоз dados à vida fen- dîjcmfc
lua! com tal foltura , que pareçiao do nume- 3 8,«,ь
ro daquejles impios , que exhortando-fe huns
a outras , dizem ( como eftà eferito no Hvro
da Sabedoria): Kùllftm pwitmfit , quod non ¡.er- Sap. 1.
■ tranfeat luxmU no Hra : Nenhum prado haja , 8
onde noflb beftia! appetite nao parte. E affim, * '*
onde nao podiáo entrar com dadivas , ou im- 1
porturtaçoens, ou outros meyos ordinarios ,'.
rompiáo por violencia. Aiïim ó irite-itárá) '
' pom huma honrada vi«va , caja termofura ,
^ne nuaera vulgar, os provocou^ & cujas vir
tudes^
12* Tratado ""**
pides, que eráo ungulares, os nao "refreáfácw
Excluidas as priiacyrasiníUncias,refolvcráo
ufar de força, attendendo só à rraqutza de
mulher, & nao ao valor de Santa.Huma nou*
te (que he a capa de deiaroros) arrimáráoef-
cadas, para fub:r pelas janel'as. Dos tres, o
primeirono atrevimento , Se mao defejo , o
i íoytambemna avancada , nao fem pieven-
$ cao de armas , fica.ido os mai» de efeoka.
Eftava a ferva de Déos em oracáo : boas ar
mas para cal rebate : porq aílim como aquelle
lobo famintoquiz acometerá innocente ove-
Jlia , o Demonio ,que tinha licença de Déos,
Jhe lâçou a garra , ¿ o urogou, & lançou mor,'
to a íeus pès. Repuráráoos (ocios na tardarn
ça úo amigo : iubio hum delies a reconhecer
a caula : mas anees que pudeíTe certificarfe da
defgraçado pameiro, jà nella lhefaziacom-
panhja ; porque o Demonio o afogou tam-
btm. Subió finalmente o terceiro, & fucef-
dto-lhe o mefmo. E a ferva de Déos, vendo-
ib amparada de leu omnipotente braco, &
.• , livre de tan evidente perigo , Ihe deu por if-
ío graças : & tratou de expelí ir fóra aquel !çs
ь' cadáveres , cujas almas infeliciffimas eftav^o
ja fepultadas no abyfmo do Inferno , onde fe
faráo companhia no tormento , aílim como a
fueráona maldade.
Апелг f-'O P.Frácifco Patinho da Côranhia'de JE-
(¡et. 5.- SUS by bum famofo Operario Eyágeliconas
Indias
Da virtude da Caßidade, 123
Indias Occidentaes. Entrando em certa po- JotVd-
voacáo a exercitar eile Apoftoüco minifterio, roens ■
em que tanto feintereiîa na lalvaçâo das al- Uli fin :
nus , & gloria de Déos, achou que o Cura ti- va yltl*
nha amiga em er. fa, & della mukös filhos, </е//е, л
jtio fem pejo , & fobroça , corno fe fora cafa- fereo
do na face da ïgreja. O qual temsndo-le que JeDeos
o Padre o delátale ao Biípo , procuran impe-
dirlhe a miffáo. Porcm elle vencendodifh'cut-
dades, pregou com notavel fruto de todos, ex
cepto do miferavelCura, que,nío obftant"*
as repetidas , & fervorólas exhortaçoens, qtis
cm particular Ihe fez o Paire , intimando-lhs
ínuv próxima a ira de Déos, nenhum cafo fez
Äe iuas palavras, & ameaças.Djulhe logo hu-
maaguda doença, que opoz no ultimo pen-
go : & devendo abrir os ollios , para fe apro-
yeitar defte efpecial beneficio, com que Deot
mifericordiolàmente o defpertavai pelo con
trario os fechou mais , com outra horrendo
peccado, que foy mandar chamar hum Indio
feiticeiro , para que o curalfe. Fez eile em fuá
preièriça os conjuros : acodio o Demonio
prompto para o mal : & rindo-fe o feiticeiro,
perguntou o Cura, de que fe ria. Rióme (ref-
pondeo elle), porque me diz o meuDeo;,1
qne eu adoro , & aqui eftà prefente , que me
calle, & nada Ihe peca por ti, porque es leu
Amigo , & ha muitodefeja levares configo,
feftrcmecido, Se atemorizado o Cura de ouvir
ii ifb f
í 24 Tratado
ifto, fez fobre (í o final da Cruz , Sc pela virtth»
<ic defte fugio o Demónio. Mandou pois çha.
mar ao P. Patinho , que fé achava dali quatro
Jeguas. Veyo com toda a preíTa, & o esforçou
quanto pode à contrição de léus receados , &
da parte de Deos lhe prometco faude, íe da
íua houvelTe emenda. Oííereceo o doente de
o fazer affim com todas as veras.Porèm o meí^-
mo foy recobrar lande, que tornar a meter em
tafa a amiga , & comeHa à cabeceira , fobre-
vindo Iium accidente , morreo de improvifo
le.m Sacramentos, Porque de Deos não Ce
zomba : Deus won Irriektur: & coftuma efte
Senhor com os Santos fer Santo ; & com os
Perverfos proceder de modo, como lê fora ta-
?/, f 7. bem perveríb : Cum Sunflo Sanctu* eris ... , &r
1 6,'júr eum penerfa perverrcris,
17. - 3. O P. Andrade da Companhia de JESUS,
Varão bem conhecido por léus efcritos , Sc
piedade, que nelles refplandece, refere que
em Granada Iwm Chrilláo ( mal merecido
nome em fé tão pouco arraigada, como fé vio
dcfpois) fé namorou tão defatinadamente de
huma Moura; que fendo efta defpois refgata-
da ,a fegujoà fuá terra ; & dizendo-lhe ella
.rio ferpoíTivel cazarfe com elle, feno fazer-
fe Mouro : cego da payxão libidinefa 3 & aca
tando de encravar o coração nas unhas do
Demónio , confentio no partido. Pois , a pri
meira diligencia ( difle ella ) bç citcuncidarr
te.
\Da virtude da Caßidade. 4if
.¿ Mtnos repafou nifto : mas ao executarfe о
golpe, lahio tanta copia de fangue (nao eoftu«
mando fer baftantecaufaefta para táo eílra^
nliöefteito) ) que em outo dias o háo pode . -.
eftáncar. Ao cabo dos quaes, morreo mifera^
vdmente , fóra do gremio da Igreja, & ferü
lograr as defejadas bodas. Pódere-fe corno nc*
ñe cafo fe verificaráo tres f.ntenças , que na
divina Efcriptura temos para noffa doutrina,
l : que fe o Fiel entrar ao commercio torpe
com a infiel, efta certifíimamente Ihe ha de
perverter o coracáo , & fazelloapoftataríNo» ?.fy£«*
ingrtditmhi ad eus,ñeque de Ulis ingredient** ad II* *¿
*peßras : Certiffimè enim ayértent corал veßra tHt .. .,
fequamini Déos елгит. г : Que o peccadgr,tan- <proyt
to que chegaao profundo da fuá raaldade , j8, 3^
tudo defprefa: impius^um in prifundum -»enerit
feccatorttm , contemnit. 3 : Que pelos inöru- 5^. tr«
mentos, por onde hum pecca, por efleshe a 17,
wrmen*ado : fer qua peceat quis , per bac , if
torquetur,
4. Na Cidade de Palermo em Sicilia pele _t .
rnez.de Novembre de i64;?.fuccedçohuca-R /
fo , que bem moftva como Déos nao dorme »
* t'm
para v'ngar fuas orïetifas , ainda que haja dif- Углю
fimu lado para efperar a emenda délias. ÇertO/- . .
hörnern , que entrevue as foltuias,& imrftun- / r
dici as da carne , tuina por 'avgo tempo irrita-
do a paciencia diviña i eftando actualmente
nopeccado, de rtpeiîtc difparou о Ceo hum
rayo}
f2 6 Tratado
rayo , & fepdtou fuá alma no Inferno; Maá
cortio Deos coírurfia ajuntar os favores de fuá
mifericordia com as d;monftraçocns de fuá
foi ? jaftica: Cum iríttusfueris^rniferkorciiíi rec/»\l.i-
1*3»* ' beris': a compiice dopeccado efcapou illefa- &
fc ' fezpenitencia.Qyaíiomefmofuccedeoahurn
Portuguez na índia : excepto , que teve o mi-
jeravel mais tempo de tornar em íi , fé qui-
zera. Porque começando as nuvens a rerrarfe,
& tiovoar, ella vendo a lança de Deos vibra-
• da, o avizou do perigo : maséíle defprezan-
'«•'• ' do-o ,pereceo convertido errí cinza:
* 5. O feguintecafonãoparOtièmflm táf*
^ .i- . defgracado: porém foy burla aíláz pezíída, 8£
• ~*!*~ encamínhouíe ao efcarrhentô ^ & penitencia.
verttia ^^Q^uni lafcivo na fuá cama tam efque-
7? eido do temor de Deos, como fé efte Senhor
e ' não viífe às efcuras , ou para a tia prífenca
« houveíTe recanto algum efcufc : o D:monio o
arrebatou pela janella fora , & deu com e\lc
r- eftrevaria deliu m fidalgo j dcbaxo dos pés
• ,' dos cavallos. C5s quaes fentindo a prefençá
l . do efpiricornaligno por algum éffeito^ que el-
)e rhèPnocaufcu, começarão á luar , & tre-
• hicr, 5í -lar bufidos , corcovos j 5í coucos. Aro-
dirdoçehte aceftrepito, oDerrtonio tomou
ft ;:.«ndo v.-ro iroin a (iia preza fias tinhas , _ &
deíicom omiG;ra-.'el homem dentro da tina
de !mm tintareiro,hnde o deixou de molho r,á
tinta. Quando ao outro dia feráo os oíEciaes
de
VavirtuâédaCaftidâdè.
de cafa fazer feu officio , & aclúràoalli hum
corpo humano mergulhado, nu, denegridoj&
«juafi efpirando, não acabaváo de admirarfe.
Em fim íabido o cafo o tii árão da tina , & lê»
varão a curar ao Hofpital. Se quizermos de£.
cobrir nefte cafo proporção entre a pena, &
d culpa, em Èzequiel temos ò luxuriofo com
parado ao cavai Io : Infanhit libiitine, &c. ficai v?ré'
fluxaí equorum flaxus taram ; &em Nahum o y\ /*
peccado com nome de defnudez vergonhofa:
Rf-veLibo pudendít tttA In fade tua , & efteneÍ4m ft4
tiln nudittrem tuam : & em S. Ambrofio a ne- 3 .
greguradoviciocópafada à da tinta.-^rr/f»- . ^,
turlibri) non jcripti Artumento^tà'fceUrum in- * *•
ijninamento. r" *
6. 0 P.Fr. Hieronymo Gracian contépora- 1 .
neo da gloriofa S.Tereza de JE£US,& primei-
ro Provincial de fna fagrada Reforma,efcreve
que íbube de certo o calo que agora contare- c. z o
mós. Era hnma moca donze!la,que fé entre- tit. r>e
tinha em máos peníamentos , porto que não hcnffl/*
diegaváo a obrs. Ifto baftou ao Demónio me- d
ftre da luxuria ( como lhe chamou Antero Pa- '
pá) para induzilla ao mais execrando ,& hor
rível peccado cjue ha nelta matéria. Porque
Asfarcado na figura de hum certo mancebo-
galhardo, em quem ella empregava os olhos,
entrou pda meya noute no fui apofento, &
.-evedellaoquequiz. Dali em diante conti
nuou a mefnla vifica toda* as noutcs ; porque: :
Жг 8 ' ; Trätddö
he tyrariflb efte, que quanto he da fuá
parte nao larga a pofle.huriia vez concedida.-
Porèm Déos N.S.,)-íira juffinear mais leus jui-
20S, & nao poder eíta laceadora allegar igno-
lancia , reveloti a vcrdade a huma vjfinha ,
mülher de oraçâd ¡- & virtude ; para que a
defehgahalTe de que aquellc feu hol pede no-
iturna nâo era hoirie my mas Demonio* Affim
^odiíTe^aconfelhad'i.f'rimeiro com Геы Со-
feflor. E a moca , cchfiJerando entáo a impol-
ílbilidade de que o mancebo vieíTe de táo Ion-
ge todas as hoütes ¿ & entrarte as porcas fe
chadas , creó que era Demonio; Mas andou
tam imprudente , que volcando na íeguinte
noute o inimigo , llie diíTe : Sabes tu ,• que me
dizem , que nao es fulano,' fehâoefpirito do
Inferno? Refpondeó defcaradamente , como
cjuem era ja íenkór da cafa : He verdade; mat
que fe te dá a ti diíTo ? continuemos , que iífo'
he bom: & fuppofto que nao irás ao Cea (que
eu nao te hei de dizer huma cou Га por outra )
fio meuReynö teràs grandes goílos,& ñenhu-
ina pena , & entretanto logras a moeidade.
A miferavel (como de antes nao tinhaexer-
cicio de virtudes ) deu crédito ao рае da men
tira :& dalipordiarite deixandd-fejà de te
mores, &remorfos¿ cobrou tal affeicáo ao
Demonio , que fazia peío fervir era nido o
que entendis fer de fiú goftó. Eaffimelle
^íeenímou a engañar muitas almasy& a irrí-
poz
Ùa virttidé da Caßidade. ii§ >
{кй no officio dasbruxas". &do qùé paflou nd
ireftante de lúa depravada vida , diz ó dito Pa
dre j fe рскНа eompo'r Kurü livro ; fe berh nao1
declara em que acabou. Quem confíderar, to
mo huma mu I her teve cal cufadia dé tratar
"com o Demonio táo familiarmente , bem pó*
decrer, quenelíanaohavíade antes funda
mento algum de virtiídé.ntrn devciçâo da Vir-
gem , nsmfrequencia de Sacramentos, nerh
licáo de'iiVros éfpiritúaés, r.erri oceupacáo emi
trabalho honefto : que ras cafas affim aber*
tas, & íem porta , entra o Demonio, & difpoe
à fuá vontáde.
7« Na vida daVeneravél Virgé Ánna de ¿ и ¿
íAgoftinhó , Religiofä Gafmélica defcalça fëclg.-
"conta como humámulher, que eítava em ca- * *■ •
Ta de hum feü thio , fe corr^f} ondiá pcculta-
"mente com certó mancebo,a titulo de futuro
cafamento. De lance em lance chégaráo ao
"ultimo empenho , íc cantinuàrâo a amiza-
"de (ou para melh'or dizer o odio de fias pro*
prias almasr Qal âlUglt lnif¡u'ratem у офг Ànl-•*> f^t
пыт (uam) fem temor né de Dccs,nem da in- ¿ '
famia,nem do perigo. Por intervençao de hu
ma criada entrava о amante de route, dando
a miferavel os' avifos / & pohtós ntctíTarios^
Atè que Déos fe canioïi de lofrer , & Ihé tn«
viou o cafïigo , fe btm' temperado com miíc-
ricórdia. Huma noute, que ella fe íevantetí
* recebeltó fem mais compoftura , queáquét
i tí>
, JL^O ,-. Tratado
tirha ria cama, es acometeo de repente Imia
íabujon uy grande , & feyo , & bravo, ÔC
íe arren eçou à garganta do moço. Elle> ainda,
quetuitado, arrancou daefpada c mas o cão.
'pegar, de -lhe delia cornos dentes lhe tirou fó-
"ÍA a h lha,deixandolhe BO punho a guarni-
*ção. Como fa vio defarmado , fugio para li-
"vrar a vida deixando EQS dentes tio inimigo
"aeípada, & a rnulhtr junto a elle.O qual duas
'vezes ainveítio para a dcfpedaçar : mas, não
tendo'licença para mais, só lhe raf^ou a ca-
miza. Cáhio a pobre de íinayada : 8f tornando
em fi depois de muito tempo, vio que ainda.
ocãoeQayacomodeguarua jiintoa ella , ro
a boca aberta,. 8í ring: ndo com grande cólera,
Amánlíècia já : Sc o.thio fc levantou cedo,por-
que havia de fazer jornada , & chamou a fo-«
t>rinlia pedindo de aknõrcar. Aquifoy a no
va pena , & anguília, vendo que não podia.
ntrn cfconcíei fé, ntm rt íponder.Com tudo eG«
Forcava a voz o que podia: & o thio enca
minhando para aqutlla parte os patTos, avio
metida trh.luim canto , & ofabujo er cai aio
nellíi;, arripiadoopek) , & aberta a disforme
Eóca.»E nefte tempo arrtmeteo terceira \ tz à
moça ,& pegandojhe c >m os dentes pela ca-
tniza a áiraflou pela cafa, & delapareceo.
pa,,fa yv,z dtimayatlaa levou o thio para a ca
ma, cndc feitos alguns remédios para tornar
~(émfeu
L acordo,lhe perguntou pe^o cafo ' , fem
A aunar
Va virtude da Caft idcaí. i$i
atinar como qucforTe\ E*:l!a Ihe armou de
fepente huma patranha, com que ficou ainda
mais fatlsfeito da fuá vjrtude, vendo que о
Demonio a perfeguia¿ Confolou-á : & ella
dilTe queria tallar com a ferva de Dios Anna
de S¿ Àgoltinho , que era affamada era bata-
lhas com os Demonios. О thio a acompanhou
ao Mofkifo com outras tres mulheres* Veyoi
a ferva de Deos : & pedirác^lhe fuas oraçoens
para certa neceffidade grande , que huma
délias padeciaw A ferva de Deos refpondeo
com a mefma gencralidade que Ihe falaváo,
nao bbftañte que já tiñha revelacáo do caío¿
Mas ao defpediremfe chamou a moça à par
te , & lhe dilTe feeretamente: Ja fei о que efla
noute lhe fuccedeo com o cao : faiba que era
f» Demonio , & que fe Deos lhe dera licença,
os matara a ambos , & os levara aonde mere-,
ce о ièu peccado. E aquí !he foy dando as ra-
ècens efpiritúaes , que'convinháo à iùa eme*
da ; & moftroute que aproveicàrao, porque
ceíTou aquella comfmmicaçâo illicitae
8.- Aös fobreditos exemples ajuntó rhaíí
âlguns de que tive noticia por via certa, & fi
dedigna. Ceftö hörnern forafteiro querefidia
ñefta Cidade de Lisboa , ahdou amancebado
quinze annosi Nao lhe faîtàrao faudaveis avi^
ios de Deos , & dös homens. Porèm tomó a
fuá vontade eftava jà muy corrupta ,- & а
encendimento muy cegó: qüando algum аюм
lj l Tratado -r
go lhe aconfelhava, jfetiraíTede t*m perigo-
fo eftado , dnva com a ponta do pé para dian
te, como quem defpreza alguma couía , &
dizia; N. Senhor logo perdoa itlo. Mas co
mo o pecrado de premncão aíTanha mais a ira
de Deos, & atalha fuá mifericordia: fuccedeo,
que huai dia eílahdo à meza com a fuá Vtnuc,
de improvifo lhe deu hum accidente: & aflim
com o boccado na Locca efpirou , fera dizer
JESUS, nem pedir conníFâo. Quem duvida ,
que foy íua defventurada alma onde experi
mentará , que o que Dcos perdoa logo aos
tem ntes , não perdoa por toda a eternidade
âps temerários ?
_ 9. Não iúccedco longe o feguínte cafo
nem no lugar , nem no tempo. Hum cavador
del-Rey D. Affonfo o VI. ardavapúVHcamé-
te amigado com huma China por nome N,
faindo hum dia a apr.rtar Iiuma briga cora hu^
ma efpingarda na mão , o matarão feracon»
fffáo. Depois dizia a dita mulher ,que o via
35- par :cer diante de fi muitas vezes , & que a
chamava. Succedia eílar fallando com qual
quer outra pcíToa,& de repete fé lhe otfertcia
diante aquella figura , & de efpanto cahia
defmay.aJa. Por eftacauia mudou de mora-
-da : ^ ccíTou aquei Ia horrível, & mokftifli-
rnavifáf). Mastornandodtpois para as meC~
mas.cafas { grande imprudência, a q-ie a leva-
ya o feu meímopeccado/y reparai ao .hum dia
os
DavirtudeâãCaftidfldc.
os viílnhos,queafiiaporta fenáo abii.0.. Sof-
peitàráo alguma defgraça : entráiáo ancn -
bando a porta: & achai ao a miferavel mu II er
morta na fuá cama ; corpo, & cava dcncgnYos
como carvão, & tia garganta hur.s fif.r.cs 01
nodas como de dedos , que a afogarão. Pinlc:
bem ftr, que fuá alma fé falvc(Te , porque
citaria bem cor fc (Ta da. Pr: em qiu-rto ao que
fé indica do fucceílb, ella.dtvia ter muita
culpa da condenação cio corr.plice i & í.iver
chamado para a ctfcr.fa, a qiRm clépois a cha-
mavafarao toimtr.T. Ehum doscaigos re-
yores de limar no juizo de Dcos , l;e l.aver fi
do caufaeffcaz da conclenaç,1o dop-oximo ,
fé bem na condenação do Filho de Dcos á
morte de Cruz , tudo u m remédio, fé o Luf-
camos.
i o. Tsmbem foute por via certa como
nefta Cidade hr.m meço divertido nos vícios
daquella idade, qusrdo fé desboca do freyo
do temor de Deos, ao fahir de cafa huma rou-
te , lhe perguntou huma fuá irmã onde hia.
Aoqueelle enfadado refpondco: Vou para o
Inferno .-quereis que vrs 'leve para lá algu
ma ravta 3 E d,,li a poucos disseftar.do em
.'iclua! percado , mcrreo t! ç fu^itc.
n. Airdaiemcircunffanci^s mais horrí
veis (.enfoque lê feguc. Eftando h mefa cer-
o homem com a fuá íi-iyga dÍ!Te:Nós ]à agora
i mpolTiVv;! he aparurtoiaiè amort£:aca(T]rn
i -' liij opri-
"Tratado M í
p primeiro de nos que morre, vai direito acr \
Interno. Mal lhe tinha fahido a palavra
da boca , q latido lhe fahio a alma do corpar
& teve o co Tiprimento.fkl,do pacto que fizerr-
racom a morte, & com o Inferno, "Jegundo
fia', aquillo de ífaias: Pír:a(jimut fadus. cun» morte f
í §. J J & ~!trn 'mferno fecimus ptâum»
12. Sc alguerp vaciiia no credito deites
exemplos, riao fãltáo outros das Efcrituras fa-
GfW?7r geadas, que fãp de Fé divira. Se a authoridade
defta fé não interpufera , quem havia de
crer , que em caftigo da luxuria atrolouDeos
todo o género humano, refervando só owto
Ctén. ?eiFoas na Arca? para tornar a povoar a terra ?
. ' Ern caftigo da luxuria choveoo Ceo fogo ,
IA & enxofre , que abrazou toda a Região de Pé-
•* tap")!is , com táo voraxes chamas, que até o
chaca cjuziroirár» , de forte que ainda depo/5
de muitos fcculos ( tilo fei fé hoje dura o meí-
mr) efíeito) os frutos vinhão cheyosde cinza
por dentro. Em caftigo da luxuria , &poríê
fíW} mifturarem qs Ifraelitas com mulheres Ma-
i>» <Íianita?? que erao infiéis, mandou Deos en-
fprcar to ios os Princspss, & Gabos do feu ço-
VO.-^E alem difto forsh mortos à efpada yin-
te, 82 quatro mil homens & Phinees vendo
çntrarlvJmern cafa de huma mulher pecca-
dQra,arrebatandq hum punhal , levado do ze-r
Jq Ha honra de D;os, os. atravedou a amlx»
|lintqs pela g^rtes/^eniçaes^ como. d.i^Q fsgf%!
7)a virtude da Caftidade. .
<3o Texto. Muito mais aiTombrofo foy o cafo
<jue fé refere no livro dosjui/.es,da mulher tio io.
Levita morta pela fúria , com que uiáráo mal
<iel)a huns homens Ímpios da Tribu de Bcn- ,
jamin : &o marido, que cie outro modo não
podia vingarfe, a fez em doze portas junra-
mente com os oíTos , & mandou cada huma à
íiia Tribu > relatando-lhe o cafo. E ioy tal o
furor que em todos fé acerdeo contra es cul
pados, que não querendo os da (ua Tribu en-
treg. lios à pena, fkhirão com exercito forma
do ap( fiados a deftruil'a toda. Os Ikn j. mitas '
puzeráo outro em campo , & chocando por
três vezes , morrerão de parte a parte felfcnta
& cnco mil pdToas de armas. É todas as Ci-
dades,8dugares daquellaTribu forão queima
dos , chegando a vingança até aos brutos.
Outro cafo admirarei , & henettiiiftlino
^mn matéria.

Ao me pareccorazlojhavendo referido
N tantos exercplos dos caftigos deite vicio,'
deixar de fora o ie^u nte ; poí fe'r em todas
/uascircunft.incias tão notável, que verce o
que tem já de ulgarifadó entre os Authoves;
pois o trazem Tnthemio., Nauclero , Bautifíst
Fulgoíio, Caniíío no íèu Máríal, ÁloÍA no
Ceo eírrellado , João Mayor no Efpclho dê"
exemplos, Ârirtgo1 rto Tríarres -ffctitattfítf />ef-
l iiij fi»"*t
136 Tratado . • V
^/»* , & outros muitos , & liiccedeo pelos
nos do Senhor 985., imperando Octháo ter-
peiro, n n forma cjue agora diremos, ,
Na C i(Ja lê de Magdeburgo, q he Metropo-?
Jitana no i).içado de Saxonia? cariava as eíco-
Jas hum eiiudante por nome Udo, de tam cur
ta capacidade para as letras, a q fuppoftq ap-
pjicava da fuá parte q trabalho , & dilige/j -
fia , rijo tirava de aqui mais fruto, que mofa,
?c zombaria dos condifcipulos , enfado cios
imítres , & aflição dq próprio eipirito. Hum
dia que efta n apertou m.iis , entrou na Sé t'ar
^uclia^ Cidade , -quê he dedicada a Dcos era
h'.)nra d° inclyco Capitão S. ivlaur.cío Mattyr,
& Je toda a fuá Legião Tfhebf a: Sf ali p oiti a-
do em oraçio fervente,, rogovi à Virgem S.
N. Sf só rn.efmo S. Maiiricio , ! he alcançalTein,
de nx.o> luz nt> entendimento para os eftudos.
^dtorrpcceoj'Sç ali cm fonhps lhe appareceo a.
riisnnaSljnhnra , Si' l|ie ditfç •' Ouvi tuaOta-
Ç$o , Zí não só te concede meu bendito Filho o
tajçntq das [etras ; fenão q por ellas fubitàs a
í"vri$ifpQdeíla Igreja por morte do que agora
governa. Si acodires fielmente às obrigações
deflonrEcio, fera grande o teu prernio : po^
rern fé fores, negligente , fera, grande o teu ca-
go/'
r)çfappareceQ a vifáo: acordou Udo:&def-
hqra náq achou difficuídade em
que eftudajTe. Foy o íèguinte:,
°" ' v dia
'Da Virtud« da Caßidade. 137
día as efcolas , & começou a dar táo boa conta
de fi, que feus condifcipulos admirados diziäo:
Näo he efte Udo , de quem ha po со nos ria-
mosí Como táo brevemente fe fez táo excel
lente Slozofoí Nameíma admiracáo eftava
o meft: e , ponderando a capacidade rara coro
que compreliédia as materias, a agudeza com
que penetrara as diffculdades, a deftreya, Se
facilidadecomqueasfoitava,& a retentiva
com que tudo o que lia , & ouvia , Ihe ficava
como gravado na memoria. Finalmente ga-
nhou nome táo famofo cm poucos arr os, que
vagando aqutlle Ai'cebifpado, foy eltico nel-
Je por commum applaufo do Povo.
Collocado pois na cadeira Arcebifpal ,
procedeo louvavelmente aos principios. Po-*-
rèm como os officios grandes coftumáo mudan
os procedimentos da peíToa, que náoefta fun
dada cm /olidas virtudes: foy pouco , & pouco
efquccendo-fe de luâs pbrigaçoens & encre-
gardo-lê a vicios de tal forte ,que mais pare
cía lobo , que entrava noaprifco a degolar о
rebanho de Clrrifto , do que pallor para o ar
pafcentar,& defender. Deu/e particularmen
te ao vicio da fcníualidade , táo fem freyo do
temor de Déos , & do efeandalo do Povo que
náoha'ia mulhet,caiadanemdonzella, íegura
de fuá mfaciave! torpeza. E como era rico,'3s
poderof1 , & com muitos dependentes da fuá
máo,ninguem le atrevía a impedillo,nem a
■ л ' repre-'
138 Tratado
reprehendello. Fez com ifto mais profundo o
íeu peccado : & dcfmandou-fe a folicitar Re-
Jigiofas: & tiroa de nú Mofteiro а Abbade/Га,
com a quai publicamente vivia amäcebado.
Quem efperara tal deiatino de hum hörnern
letrado, tal delenvoltura de, hum Prelado Ec-
cltííaftico, tal ingratidáo de hum fegeito tam
obri gado á Virgem < Porèm o vicio da carne
. cega mimo a luz doefpirito: tambe m Sala-
mäo era íabiojtambcm como Rey devia dar
bom cxemplo; tambem como devedor do be
ne ficio da íabedoria ,dcvia honrar , Se íervir
a Déos , que lha concederá.
QuizoSenhor piadohffimo juíHfrar mais
a íua caula,primeiroque defcarregaífc ogol-
рг : & affim 1 he fc7 tres como amoeftacoés ca
nónicas. Eftando Udo huma noutecom. aquel-
Ja concubina áilharga ,ouvio huma voz, que
que dizia : Ce(la de ludo , quia lufißi (aus Udo :
Celfa jádc jugar Udo, porque tens jugado
' multo. Fczomiferavel poucocafo difto : &
ficou jazendo no feu peccado. Na fegtiinte
route teve na mefma forma o mefmo avi fo,
& tambem o defyrezou ; porque o Demonio ,
queeftavamnyacaftelladona fuá alma com
pofTe pacifica , logo Ihe divertía o penfamen-
to ; & com fazerihe repetir o peccado, fe hiáo
embafkecendo mais as fuastrevas interiores.
Na terceira rtoute ouvio a mtfmavoz muito
mais terr ivel , & efpantofa. Começou â te*
- ., . * mer,
ЧУа virtnde ал Ca Hidade. 139»
nier , & anciarfc ; porèm brevemente fe tor-
nouaqiiie ата faifa paz de fuá cauteriada
çonlciencia. Converter) pnis Déos a fuajufH-
ça em juizo : Sc dirigió elte na rórma fe-
gninte.
Hum Conegodaque'la Sé, Varáo de muita
crncáo, & virtudes ( cj¡ fem aquella mal pode-
ría ter cftas ) ncou na Igreja huma noute de-
pois deMatinas, encomendando a Heos N
S. efte negocio ; & lhe pedio com vivas lagry-
mas , & gerrndos , que ou fuá Mageftade
abrandaíTe о с mpedevrido coraçao de l do, ou
quáao elle riío íc qnizeiíe crnverter,lhe tirade
a vida , & o caftigaffe para celTarem os efean-
dafos , que cada día eráo mayores. Neite
tempo entmu ría Igreja hum grande pè de
vento qapagou todas a<.- a'anroadas. Temeo ó
Conego, &fe lhe arripiáráo os cabellos :mas
voltando-fe para Déos , & pcdindoihc animo
fe recobrou , & vio elle admiravel elp¿cta-
cuío.
Entrarlo na Igreja emnarelhados dons má-<
celaos de eítremada galhardia, com tochas'
acezas. ñas máos , de claridade fuperior aqua
coftuma haver na terra : & fazendo profun
da referencia ao Altar mór,fe pu¿cr.ío em p :,
hu a hú lado , & outro a ontro. Entraría lo
go outros quatro: dons délies com alcatifa»
preooaßima? , que eíre-ideráo no pavimen
to da capella -, & dous com cadeiras- de puro-,
que
Но «'■• Tratado
que collocáráo emcima , huma apar da outra.
Vierao depois doze veneraveis perfonagésjde
táo rcfpeitofo alpeäo, que cada quai parecía
Emperador do mundo : porèmno imeyo dél
ies vinba outro Senhor incomparavelmente
mais mageftolo-,com coroa de ou^'oracabe-
ça, & fceptrona máo: era Chrifto Salvador N.
& aquelle's, íeus fagrados Apodólos : os quaes
dividindo-fe a huma & outra parte , Ihe fize-
ráo íumma reverencia: & oSenhor fe aííertou
em huma das cadeiras. Entrón logo a Rainha
do Ceo MARIA Santiílima S. N. com nume
róla comitiva de Virgtrs , & Martyres; &
feita reverencia ao Senhor , tcmou a outra ca-
deira.
OConego,ládefdeo feu cantinho, éfta-
va embebido emadmiraçoens, mas deíperto,
ciperandoque accáofereprefcntaria digna de
táo apraratofo theatro. Quandn \è, que en-
.traS. Mauricio Patráodaquelle Templo3com
toda a triunfante legiáo dos Martyres feus со-
ranheirós (que dizem foráo 6666, ) todos
coreados de luz , & ornados de decoro , &
mageftade : dt feita adoracáo ao Rey ,&ou-
tra à Rainha das alturas ,- le dilpuzaáo por
todo aquelle ámbito em bem ordenadas filei-
ras. Eis que entra outto fermofiff mo mance
bo de galharda eftatura, armado de ponto em
branco , com efpada mía & reUizenteni
ir.áo , come? pintáaajtifuca . & depoes.de fei
ta
D a virtude da Caf.idadé. 1 4т
a femelhante adoracáo com os joelhos em
t-rra , le poz no meyo , & levantando a voz ,
fan cou elle pregáo: Todos os Santos, cujas re
liquias aqni fe conlerváo,levantaivos, & vin-
de a efte juizo. Immediatamente appareceo
allí hña grande multidáode Santos, Martyres*'
& Virgéns , ConftíTores ,& Doutores , ci po-
ílos tambem por fuá ordern enobreceräo mai*
aquel le illuftriffimo conclave.
. Sabio entáo o Capitáo S. Mauricio, dando-
fe por Author naquella caufa : &proclamou
dizendo: Reftiffimojuiz, tempo he dcqvof-
lafoberana Madeirade faça juftiça. Mandón
entáooSerhor,que'hetrouxe(Tem allia Udoí.
voáráo logo huns AnJos,Sf tirando-o da ilhar«
ga da concubina, com quem eftava abracado,
o puzeráona prefença de Chrifto,no mevo de
todo aquelle concurfo, com tal ronfufao do
miíeravel, que nao he pcffivel explicarte. E S.
Mauricio começon aporlheos cargos, dizen-
do.-Efte, foberano S/nhor, he aquelle Udo,
a quem vofTa Мае Santiffima , que prefente
eíla, fez táoparticularesbencficios; aquem,
por íiía intercefíáo, deftes o talento da fabe-
doria ; a quem encomendarles o cuidado de-
ílalgreja, &re!'e, em vez de arafcentar as
voíTas ove!has,as tem areftado com o contagio
de feus vicios , gaR-andonelles o patrimonio
da mefmaTsreia. Efte he o q"e teve atreví--
mentó de violar as voilas efpofas confagra-^
das,
j 42 Tratada
das , & de perfiftir na fuá maldade contra d
fcu próprio voto,contra o feu oíficiojconcra as
leys humanas ,£ divinas, contra os rc/nor-
íbs de fuá conícicncia, & eontra hum , Sc ou
tro , & outro aviíbs do Ceo , que lhe enviou
Voíla paciência , & piedade.
Ouvia o íupremo Juiz ofc graves artigos da*
quelle proceíto : & voltando o roftro para
aquelles Santos , que lhe afliftião ,-diííe : Co*
mo vos parece que nos portemos corri efte ho-
mem ? Aqui levantando a voz o mancebo
da efpada nua, diíTc em nome de todos aqucJ-
les affeílores: Digno he de morte. E o Senhor
pronunciou a ientenca ncíta forma ; Execu-'
te-fe : & pois não íbubs fer cabeça da Igi ejay
que lhe encomendarão , cortem-lhe a cabeça*
No mefmo ponto chegou o iriancebo , & má-
dou a Udo , que inclinalfe a cabeça , para o
degollàr^ Levanta a efpada, vai para deícari
regar o golpe ; quando hum dos outros An*)os
acode, dizendo : Detem-te, que eiTe mào
homem celebrou hontefn,& commungou em
peccado mortal, & por vofitade de Deos fé
confcrváo airjda em feu corpo as efpecies fa-
cramentaes : & he neceffario tirarmos com
decência a Hoftia confagradái Nefte ponto
kvaritou-fe da cadeira a Virgem Santiííima S,
N. & acompanhada de Anjos , & Santos, che
gou com humr.il x de ouro na mão, no qual
outro Anjo, daiíçlo nas cofias de Udo hna pan-
cada,
<Da virtude da Ca/ftdade. . 1 43
cada,lhe tez lácar a (agrada rórma. E a Senho-
ra a punficou com Iba máo , & colkcou o cali«
íobre a pedra de Ara, com toda a decencia, &
acompanhamento de An ios, & Santos lito
feito, o valeroío mácebo defearregou o golpe,
& deítrencou aquelle miieravel coipo, ?'al?
tando a cabeça para a outra parte ,& ficando
as lagensdaquelle lugar marchadas com feu
torpe fangue. Executada a fenttnçadtfappar"
receo toda aquella robre comrar¡hia,deixan-
do o Templo as e feúras ,como antes eftava.
Attonito aqutlle virtuofo .Sacerdote coma .
leprefentacáo de calo táoeílupendo,náo fabia
que fíze(Te,nem em q fe determinalfe: & dizia
t ntre ib Que he ifto q vi< fonho meu , ou illu-
fáo do Demonio,ou revelaçlo de Déos? Sonrio
nao o parece , que fempre eftive defperto, &
fiz diífo mefmo actos reflexos : mas quero cer
tificarme fe eftà aquio corpodo defVentura-»
do Arcebi fpo. Animou-fe pois , & foy buf-»
car luz ( por ventura a fuá cafa , ou a alguma
capella mais retirada no clauftro, onde hotf-
vtíTe lampada) : acendeo as da Igreja , chegoa 4
aolugarondevira o íupíicio, &com eríeito
vio o corpo deftroncado , & a cabeça lançada
à outra parte , & aspedras banhadas no fan*
gue frefeo : fubio ao Altar, & vio nel le о calià
de ouro corn a forma cenfagrada dentro.Náo
foy logo fonho ( diffe entaó novamente ad
mirado ) mas dempnftraçao publica da divina
juftb
144 Iratado '.,-.-
juftiça,poisàorTenfa também era publica. E
cerradas as portas da Igreja, rby, antes que:
amanhecelfe, noticiar aos Capitu lares , Sc oa-
tras peffoas principaes doPovo tudo o íúccedi-
do. Divulgoufeocafo : abriráo-fe as portas
dalgreja, entrou innumeravel genié , &:o-
dos toráo teftemunhas daquelle tam rato^co*
mo formidável efpe&aculo: & louvarão o > jui.
•zos de Deos, que fendo hurna; vízes occultos,
& outras manifeftos , fempre fio reftos , S
juftificados per íi rneimos;
Até aqui revelara Deos N. S* a condena
ção de Udo quanto á morte temporal : íègUe*
fé outrocafo, emquerevetotuoiKroSace do^
te a fuá condenação quanto à morto •eterna,
Era efté hum Capei láo do mefmo Arcebifpo,
& corretor nos tratos de fuá to, peza , & eílc
o havia mandado fora da Cidade a negócios
de importância -, Sc fé vinha nefte mefmo
lempo recolhendo, mandadasià diante a>car.
gas.Vindo pois caminhado por hn efcampado,
o carregou hum fono tão pez^do , que não
podendo refiftirlhe dcfmohtòu> & atando as
rédeas do cavalloáobfáço jfe lançou a dor
mir ao pé de huma arvore. Apenas aâormcci-
do, vioem fonhoshusna^umcrofà tropa de
Demonicis fazendo grande roido,ármados to
dos de divcrfas armas com lanças , piques, £
alabardas nas -m âfis , & que fazião alto na-,
Lqusllê cárapo'. Vinha c»«e elles hum , que iw
l• aSl"
*Da virtitde da Cafliâaâe. 115
agigantado da eftatura , nodisfoimedo av>
pe£to , & no foberbo das acçoens mcftra-
va fer о Princepe das treväs. Levantáfáo-
J he logo alii hum tribunal , em que tomou àf-
fento, & todos lhe fizeräo reverencia; Aflo-
mou nefte tempo por otitra paite outra ca
terva dé demonios , que vmháo dando déf-
comportas rifadas , & fazendo grande algazaH
ra, como que traziáo alguma rica preza , otf
defpojo , corn que fe moftraváo contentes^
Eraeftea miferavel alma de Üdo em figura
corporal , para que pudelTe fer villa por femó*
Ihantes efpecies. Vihha amarrada cem cacicas
defogo, & fobre todo encarecimcuto fey*¿
trifte ,& defcahfoîada : & quando jàchegavsi
perto do Princepe Demonarca,a!guns daquel-
Jes infemaes mimftrbs correváo díame , mais
ligeiros que abütres,a darlhe.ahova, & di*
zi«o : Praça , praça, que veril húapeíloa prin
cipal : façao lugar^que vent burn fogeítósiuj/,
benemérito do hoffo reyno. .•
Chegandoó miferavel Udo% poztielle ЪлЛ
cifer os afogueados olhos , & lhe dilfe mofan
do : Se ja volTa Senhoria muy berri 'vihdó; quo
tem fidoafuavinda muy fufpiradä em me«
Pa tocio, & Corte, & défejániDS todos pa-
garlhe tantos , & täo finakrífes ferviços , con*
tiue tem augmentado a notTaCJpróa : CH4"v?Ef-'
fa'los meus, he razSo que fé^alerriqí ao novó
hoípede -, dailhe nigua, coufa que coma» Qíe
146 Tratado \
gáráo logo huns demónios com pratos ne
gros, & atqueroíbs cheyos de capes , & vi-
boras,&íerpentes vivas :& abrmdofhs por
força a bocca , oconftrangèrão a comer. En
trarão outros com giandes.va/bs de fel de dra-
goens, & enxofre derretido, & o obrigarão 3
beber, efgotando até as fezes. DiíTe então Lu-
c ifer : Agora que lua Senhoria comeo , §: be-
beo , he bem que goze também da fuavidade
dos noíTos banhos. Dito , & feito : afafíou há
demónio huma grande lage, que fervia de
tampa a hum poço que eftava alli perco : do
qual rebentarão tantas, Sc táo_impetuofas , &
vorazes lavavedas , qu - parecião qi erer efca-
.lar o Ceo: & dezafogando-fe por a^uellc cam
po , tornarão em cincas não só as arvores,
mas as mcfmas pedras , Si até huma fonce,
que por alli corria , a deixarão fccca^ fem goc»
ta. Agarrarão logo outros daquelle dtlven-
curado, & o embocárão pelo peco dentro:
-onde havendo eftado largo efpaço o tiraras
da cor de hum ferro, que efteve na fragua,
' fcitobi-azaviva.:& otornaráoápreíencade
Lucifer;0qualefcarnecendo, lhe diííe: Que
Hie parece a V, S. dos noffos banhos < não ião
fuaves,&, regalados i Pois iftonão he mais
que hua prova , ou enfayo da grande paga , Õ
temos p-venjda ,para os hnaladosferviços,
& merecimentos ue V. S. . , r
AuKlomouHhacnadocmfiknco^cf
"' • •
Dd virtude, da Càftidaâf.
venttífado Udò: & vehdo-le já condenado a
Luma duração interminável de tcrntentosj&
que de fetis olhos fé aufêtáfa para nunca mais
tornar, a efperança às rt médio, levantou 3
temeroía vòç } & corh prolixps $ & altiílimoB
.gemidosdizitt.: Ayde mi.' Aydemi defgra-
cado.' Oh qdercarosme curtirão meus delei
tes/ Qii que greves forão j & momentâneos ^
fendo a penajdelleS eterna / Maldito feja o
dia em que íui gerado •, maldita a hortt em cjr
nafci no mundo; malditos os paei que me de-
ráo o fer; malditos todos ps que me ajudárãd
a çeccar; maldito (aqui com :cou a blasfemar,
deDeos, & da Virgem, & de todos os San
tos ) : & os demónios ou vindc-p> desfecharão
em rifadas , & diziáo :.Oh que bem fabe já d
noítoofficio! OU que lindamente canta.' Ne-í
ceíTario he que fque em notía cafa , & catite
no nolfo coro. Pois levay-o fogo ( diíTe Luci-
£er ). & dai lhe hu.m dos primeiros lugares. En
tão remeterão a ;cllc como cães .danados 3 8t
pegartdo-lhe com unhas,& dcntes,.fe Itifhirãcí
f»eja'bocca do poço, com tão ruidofo eítrondoj
que parecia virem fc abaixo as.bovedas do fir
mamento, & que os montes íê atrar.cavão de
fe«s alTentos* •-' .--. .-. ;. :.-
Ficou todavia-o Demonarca corri outros
cfpirii-os malignos que lhe faziáo corte : CT
qua) pondo os efpantofoSj & terríveis olhos j
•que paredão carvoem accíbs; y no Clérigo qnà
" *
14,8 'Tratado
eítava dormindo: Aquetle (diffe) que alli eftá
¡dormindo nao he o Capelláo de Udo, & fea
alcoviteiro ï" razáo he que^ o acompanhe ñas
penas, foi> Ihe miniftrou ñas culpas: trazeyo
aqui logo. Comráo a 'tlls os detnonios , para
-o agarrar. E nefte paffo o Ckrigo com a força
do íuílor.cerdoudaquelle formidavel fonho.
£ como fe levantou eftrabuxando , & efpavo-
ridó,efpantoufeocavaLlo, fj eftava atado ao
jfeu braco, & correo furioíamente pelo cam
po arraftrando-¡o por krgo efpaco, até que Ihe
quebroua ciña deüe. Porèm çomoDcosque-
ria darlhe Hígar de penitencia , & que íoíe
teflemunha ¿o que vira , parou em fim o bru
to, & fe araanfou de force , qae o Clérigo po
de outravet montar, ainda que com grande
dor, & crabalho. Gicgando 4 Cidade vio que
em nerihuma outra coufa fe falava mais que
na infeliz, Se repentina morte de feu amo:
& coniejríndo o q tinha pallado no caftigodo
coi po, com o qwe vira no d'à alma, ficou a vei-
•dade de hua & outra vifáomai^conteftada.
Porèm como as obras de Deosem quálquer
genero fáo pufeítas , faltava ainda algiía de-
tíaonftracáoda-ira divina acerca daqueüe mi-
ieravel cad 'cr,quena Igreja £cára deg>!-
kdo. Eftaf •Vjqi.ienáo quizeráoosda Cida !e
ídar'he fepukura em fagra:lo, Lácaráo-no cm
Jiuma la^oa: porèm logo fahiráodosboíques,
& brenjws, Se coya«Averfas feras, q<uî allí ti-
:.■ - ' • •** nháo
'Da virtude da Caftidade. 149
nl*ão feus efcondrijos: ôt entrando na- lagoa y
tirarão fós a o corpo , & o levarão arrsií ianci$
pelos campos, fem nenhuma lhe dar dema.'af
como que abominavão couía tãp.m fkiua. E
os paftores , £ rufticos, que com iflo padeciáo-
n ao pequeno aííombro, & dano t ft virão o-
brigadosa queimar aqi>ellc corpo» Lauçái ao
as cinzas íklle norio Ãlba : & no mcímo pó»
to ( coufâ maravilhoía .' ) todq^.os pcxes dellç
fugirão para o mar, & «ao apparcceoalli pef-.
ca algúa pelos dez an nos íeguintes : até que
os nacuraes applacàrão a ira de Deos com pro-
ciffoens , penitencias , & ladair.l-.as , & entáp
começarão os; pexesatrrnar para o rio. , :
Dura a memória deite efpantofo cafo na- *.
quella Pvovincia até o prcfentedia ; & ainda,
q os Saxonios o quizeílem negar , as mefmas
pedras o publicáo ; porque cm huma da dita
Igreja fé moílra claramente p fanguedaqucl-
le juftiçado >; cuja noda não ]óde afagarle
por eílar incorporada com a mefma pedra,
que parece a embebeo em fi. Eítà cuberca com
htfifltaf* te ; <3ç quando ha nova promoção de^
Arcebifpo a dtfcoUre.m , &: lha p^ftráo , <iir;
zendoj: Q]JC veja bem Cf rno caíliga Deos a.
quem não adminiftra,como dçvejaquella dig
nidade, que lhe encommenda,-,
Até aqui a relação docaíp. No'fj»a] lê of-.
ferecião muitas coufas digna^de ponderação:
0-pcrigodas.lctiaSi quando,
chão das virtudes: o fácil abuíbdasr f
& dignidades,para a depravação dos co{lumesr
a graveza doefcánda!o,quándo: o caufão pcf-
foas grandes, particularmente Eccleílaftieas:
a dureza do coracár» humano re(iftjndo ás vo->
zes divinas, Sc defpenhandq-fede hnmpcc^7
pado erp outro mais profundo t â effiçacia d*
Pi'açío dos juftos em ordem ao bem publi co,
& á honra divina: o defamparo dê huma alma
tantq que a Virgem St N. fica emílencio , &
nâq a^oga-por ella: o execrando facrilegiq dos
cjue commtingá9'ém peccado mortal, & ò rei-
peito que fé 'deve ao auguftiílimo Sacramen
to da Altar : a juftificaçáq exacl:iílima , & va
lia profundeza- dos divinos juízos : a honra ,
$c Fama íkíí:peccàdQres trocada- fvibitániénte
cm infâmia $ &• ignominia ? á ingratidão' co-
?tiQ he caracter péòprio dç alma1?' réprobas •.: o :
pffendcr alDeos por íervir aos impios>como he
arrifrado a fazerílies companhia na peiia etet»
na: as oieaturas!todas 'corno perfeguiMáo ao
peccador5-íè Deró lhes deífe licença: & outros
muitos dcM.imnãésavizos,^He deita hiftoria
fé provão manircftamence. Porém como o
noíTo inten:ç> nefta obra naq tem esfera tão
^rt)p!a3Sfi pescando agqra,5[ tirernos^Qm tem
po o defcnganp /que aquelta alma ponderou
já\;irdé.:Ql{-dc]eites da carne ( dizia eíla'' a-
bHiido rã pena os-qlhõs que fechara na culpa)
íomo cuílais c.aros.' que brevemente pa{íaíí<jsi
Da virtude da Cafti<íi(ie. 151
Sr como voffo tormento não paliará ecema-
mente .' Gcnflderemos attentamerite > cotr.o
não indo entre o peccador, & o Inferno mais q
o fio da fuá vida , que pôde quebrar em qual
quer inftante , náo pôde haver loucura mais
de fatinada , do que deixarfe o ptccador viver
no citado, em que náo quizera morrer; £ por
hú gofto torpe, Si momentâneo vendei1 a íaN .
vação eterna da fuá alma.
•E finalmente,tornando á conclufáo do r ré*
íènte capitulo, digo que Ião tantas no inundai.
as defgraças-, ruínas , iedicoens, crueldades ,
8í fucceííos trágicos-, que cfte só vicio da c;-í-
ne tem caulado-,que apenas ha pelToa,das que
tem annos de diférição , & experiência, qt:e
não poíTa referir vários, exemplos. Nèftes póia
deve carregar có a confidtraçáo quem defe^
}A tirar efcarmento j; & pedir a Deos lhe con-
ceda:f.u fanto temor, para conterfé nos limi*
tes ,-quç (inala fuá ley, • "
".
-Síú ; . .; . i -p
t . .-.;";r)i!:. ?
n., w-i .;, '..cqíJi .
• .
-.- -i...' c.iijy
•'•:•- '..: •

•^ . • ' . , , "J3.

' ..... -r, -r- tS


k iii) PER-
ifi Tratadq ^ с

PERGUNTA XVIII.]
Refera conveniente meyo paraatalhar ai
rdécidéeias da fenfnalidade , fa-zer vo~
to de Caßidade, oiifigeitarfe ao 1Ц-
-:.,. . .-..^o do Matrimonio i
Efponie-f.i primeii-amence quanto ao
Ж , votp, que he verdad¿ que ells dá mayor
Crinera à vontade humana para .a conilancia
em feus b^nsprqrxMÎcos, conforme aquilloà\
^ftfîm. Pfalmifta; Iut4v}9 c¿* ¡htai atfteJire judiçU
i 1 8, ' jn¡1jr¡¿ ty.4 : à huma , porque о hörnern teme
уЛоб. commet.ter dpas peccados , hum contra a
Caftidade ? outrq contra a. Rcligiáo violando
o votq: à QUtra> porque Déos- Ñ. S. coneorrs
com mais copiofa graçi rre.murjeraii lo no'ía
offerta , & agradando7Íe.! da diligencia , que
applicamos pelo nao qïender, Se ajudándo a
que cumpramos o preceho, que fcfbre nos im
putemos , affim coma ajuda a cumprirmos os
que elle nos ieipoem. Por onde alguis com-
paráo diícretamente a Gaítidade "junta cqm o
voto aq velo de Gcdeao ja feparado da ovelha,
que fe encheo de orvalho do Gieo,3í a que nao
tem vqtq annesçq, ao velo pagado à carne da
pvelha , da quai , etn lugar de qrvalho , toma,
^mundicia. Mas náq obftante -, fe a pelToa
nao
" DavirtudedaCaßidade.' 1Щ\
nío tem aínda fufficientemente arraigado em i
íeu coracáo o temor de Déos , para lofrer os !
combates da tentacáo contraria, romperá tu-
¿o , & faltará o muro , & o contramuro , ri
fado Déos mais ofifcndido, & a alma mais der
rota Ja ; & o demonio maisorgulhoíb. Ene-
ík cafo fe deve feguir o didame do Ecclefía- ;
íks:Que muito meliior hé nao fazer voto,que j
r.áoguardaüo depois de feito: Muítoque we-\
lius esí пап vovere , quam ¡>oß yotum promißk:
non reddere. \ . . . '
Pelo que pareceme , que o tal voto fe acó- Ес^Ф
fclhes&nos termos , em que a peffoa fendo 5» 4» ¡
temente a Déos, &c de condicáo generofa , &
juizo inteiro , por outra parte a fragilidade
humana a faz efcarregar algugaas vezes : Se
ainda affim nao feja o vo;o perpetuo , fenáo
limitado a rertos prazos de tempo breve : &
conforme adiar, que o obferva, aífim o pode-
rá. ir prerogando. Mas advirta de caminlio ,
q fe a tal fragilidade , ou inconftancia proce
de de occaíko. próxima extrrin feca, entao nao
convem fazer vc»to, fem que primeiro eíla Ce
tire; porque mais poderofa coihima ícr a oc
cafiáo para a nofTa ruina , c'p.que o voto pa-'
ra.a noifa firmeza. Tambero Imprudencia me
ter no voto a Igáa condicáo, para- que -nao fi
que abfpluto,,& perfeito, o qnal nao pode o
ConfeíTor coramutar pelo privilegio.da Huí la,
como pode fendo condicionado , ',& impcrfei-;
to
if 4 Tratada
to : que vem а Гег о mefmo , que fechsrfe о
vovtnte , mas entregar a chavea hum amigb^
jara que lhe abra, fe nao puder aturar a clau-
Iura. '*'
Qyanto ао Matrimonio ( que era a outra
parte da pergunta) ref ponde-fe, q îe he verda-
i de, que hum do > tins , para que toy inilicuida
elle Sacramento, he pat a remedio da conçu -
p¡fcencia : Sc'S. Paulo diz, que melhor hé
cafarfe , do que queimarf.; : "Mtlius eft mibere^
. qiùm un, Eleospaes de familias nao andaf-
iemtáo defcuidados ncítá parte, пДэ fequei-
maria laltimofamete a honra de tantas filhas :
porque muito raros fáo os que para Ihes da-
rem eftadoconfultâbasrazoens doefpirito ,
«ttendendo fomente às'temporalidades. po«
Yèm huma coufa he refponder as perguntas
erri gérai : outra contrahindo-as a certa pe/Toa,
Jugar , & tempo. E affirft -o qué convem , аЪ-
'iolutaïwente ta! lando, pode nao convir a efte,
'ou äque lie particular : Sc aqui entra o confe-
Jhorompedoas deidade , difcriçâo , 3c pru
dencia ,'0£(о' riáo proceder aceleradamente,
& o pedir a Déos inftantemeheè o acertó dé
hum diado , que de feu genero he perpetuo.
Porque, -Coíiio diz Salamát) nos Proverbios -
Bcmpódemos paes dar cafa,8c riqueza a fens
filhos : porèm rhullierboa so Déos Ihapode
dar : Domtis , & Ahitla tfoñtnr й p.tmitibtM i Ï
Üoni'ino ¿ttirewfropfie hxíy pmilens. So . huma
. regt*
Da virtude da Caflidadè. i ? f
rf «w darei ncfl a matéria ,que poderá fcr «til:
Cffce, que lê a pelToa he de gemo qim to, pio ,
& ar to rnra as ceufas de dewçáo , & o moti
vo qve a lê', a a tomar aqudle jugo , he uni
camente remediar vidos, caze antes com a
Oração , & frequência de Sucrarruntos. Cer
to càvalhero cafado por çoníelho do fui Con-
fefforpara fé livrar depeccados , expeTimcn-
tando depois as pep foens con jugaes , que ião
muitas & muy pezadas , dizia: Ah Padre/ ai-
lim como me difftfte , Ç^ttt .poiqueine não ^
áifitfte, Ow. Razão cijilia na queixa : iV i»/» IQ ,
fn.nes caeiunt wbmn iftad.
f \

VPERQUNTA XIX.
Coma havemos de pedir a Nofto Senhor,
', o dom da Cajitdade ?
i.i: ••-• '
REfponde^fe -j' «joc primeiramente havw
iftos de fazer conceito de fummadepen-
tÍencia,quetein(3ííle;Oeos , para nos conce-
jder efte preciofo dom , & repreendemos
ida fumma negligencia , quedemos cm lho
pe4ir.Coiifa he •certamente digna de toda a
iaftima, q recorrendo os homens apeostati-
to qiie os aperta alguma neceffidade de bens
ternponaes , & terrenos , soem pedir os eípi-
fituaes, & ccndueentes áíaivaçáoeterna^ao
' lhes
1 56 Tratado '
lhas lembra efte recurfo, ou fé lhes repreíenea
rauy diriicultofo. Defeja ha na fuá caía Mor
gado, que a perpetue : oh quantos votos faz,
quantas novenas, quantas oraçoens pede aos
Icrvosde Deoi .'- Delejá o bom fucceffo de hu-
ma denwnda., ou viagem, ou de hutn ado
publico de lctvas:como lego manda dizer Mif-
í as, como toma a Virgem por valedora, como
fé prepara' com os Sacramentos / Do mefmo
modo nos havemos nas infwmidades , cafa-
mentos, tribuiaçoens de fome, guerra, ou ca-
lumniaj & ppreílão de pelíoa poderofa. Só
• quando neceffitamos das virtude*, que fáq os
bens da a!rr.a,&q valem mais que todo o mu
do , &.q só Deos.as pôde, & quercóceder, não
act)dirho5 àfuaprefençapromptos, humildes,
& peiTeverantes. Se fuccede lermos períègui-
dcs dosefíiriiulos da carne,, ou lhes não re/í/-
tirnos,(que:he o mais ordinário) ou refiftimos
froxamente, & não chamamos de todo o co-
lacaõ a quf-m nos póáç ajudar ; arto flos^í-
rece que lutamos, <e nos não entregamos lo
go : & ainda vendemos /ervicqs a Deos , al-
JegandonteíTa fragilidade., &a força da ten
tação ; parecendonosj que em fer homens ,
temos, abundante defcplpa para fer brutos, ou
demónios, r . •.>-.-.. -.
Procede jftp de que -não temos feita digna
êítimaça.0 de quanto váJ 8 .Caftidade , & que
da mão de Deos nos hade vir per fuá miferi -
* cordia
^Da. 'virtude da Cajttdade.
eordia fcllicitada pela nolTa oração ; '& que
íem el!e a conceder, debalde ferão todas
nollas induftrias ; porque não he obra da Na-
tureza, más da Graça, viver o homem neíle
mundo como fé fora Anjo ; & eftando liga
do o efpiritòcòmacarne , ignorar a corrup-
cão da me fma carne. Etoda-yia juftamente
fenos imputa o pèccacío caufado defla cor
rupção : porque o fraco, que não pede ajuda
podendo, & devendo pedil Ia j por fuá culpa
fica vécido; como o fóldado, ou o qnão íeva ar
mas, por fuá culpa o matâo, ou apri/ionão ; Se.
o caminhante q não leva bâculo;por fuá culpa
re/vall.i; & o naufrago q fé não abraça cem &
taboa, por fuá culpa fé afoga. De fòrte,cjDeos
manda que féjamos caftos,& dá que féjamos
caftos : manda-o pela ley j concedè-o pela
graça; mat)da-o.,porqne he purifíimo •, conps-
de-o} porque he c!em,ertiflimo.
Allente pois o que defeja fer cafto ra-
quelle defengánp j qvie nos dá Salaraáo di
zendo: Sem quonlítm <t!iterni>n poflem efie con- S*?- ^*
tlmitf , ifip fítus ilet : & hoc ipfttm tirnt fitplet)- T« íl*
tia , fdre cujas effet boc eJonrti» : Conheci de
certo, que naõ era poílivel fer continente, fé
Deos o naõ concèdeífe-, & além diffo, que efte
mefnjo conhecimento, &defêngano, era
outro beneficio do ijiefmo Senhor. Os prin,
cipiantes inev^eftbs , & faltos de conheci
mento prpprio fiindaõ-fc nimiameníe nas
íoi*
158 Tratado
forcas da liberdade própria para reíjftir á teri*
tacão. .E ainda que exteriormente (econ-LA
fáo por miferaveisj & deperidentcs : todavia
no fundo do efpiritoeonfervão presunção de
íiruefraos j o q lie grande obftecuía à gra
ça. Por iiTp,impori:a , que efte conhecimento
fejap atico,&bernc<;rcifictdo5 que lie q que
aEfcripcura alienada (tonificou por aquere
verbo. Sc;y.::Eu foubeàít ) he,cqnhcci de certo,
aííentei comigo, acatei de entend.r, qut não
podia fercaíto , fé Dsos me não concedelfe
: eftedprrJi- , . ,
' |'« Eaí^inpaVaiios corrobtírarmos mais ne-
Ae conceito,,&paraqueern.yirtudj del!e no;
appliquemos a pedir os auxílios , apontarei
aqui ou.tras authoridades dos Concilio; , &
Padves, failando geraimenre de qualquer ten
tação. O Papa Inhacencio í. na Ejjttola i $.
ao Concilio Cavthagineiife diz aííim: P&cs
tios adrefifteríJm» ,nett Uberum arb.tr!um , \tà
Ée! folum jiofeft fdcere ííUKÚlum : Q^ em no? faz
fufiicientes para refiftir, pãot^e o noíTo livre
alvedriojfenáo fomente o auxilio divino.É de-
pois torna a dizer: ]\fecefje eft, «t quo iiux'il':an.
te •vhichntts , to twum non ^///nuf/v yinc.im'!í:
He confequenciaforcofa ,-que fé ajudando-
nós oSenhor vencemospãó rios ajudando elle,
feremos; vencidos. O Concilio Arauíkano
cap.4.dizailFm; D'v/»/'. , e/? mttntns c^orics
'pules noflros à fal&att] &.injn[iit/ít tAternus: Da
mer-
Da virtndeda Caflidade\ ifp
merce.de Decs procede , todas as veres , cue
náorefvalamos,tm peccado. Ouçamostam-»
bem a S. Hieronymo no dialogo fëgundo con
ti a Pelagio : Si Huertas atbitrii fatis effet .id
yinçendam tenatioiiem, non dixißet Cbrißus : Vi*
gild e, & orate, ne intretis intentationan'. Se
para vencermos a tentaçao baftaffe a força da
noiîa liberdade, nao différa Chrifto: Vigiai,&
orai,,para tjue nao entréis em tentaçao. E S.
Ambrollo ibbreoPfalmo 43. Quis eßtamfor-
tis , ut nequáquam in tentarione moveatur , uiß
Dominus ei adjutor afßßat ? Quem he tarn for-,
te , que a tentaçao o nao abale , le o SenJior
Ihe nao affiftir fuftentando-oîE tudo con
corda com a fcntença de S, Paulo , que efcre-
vendo aos Romanos , diz : Eu (into outra ley ^
em meus membros,quepeleja centra акуДГ'"'"
<3omeu,efpirito, E logo ajunta: Quern me 7,z3*
livrarà do corpo defta mortalidade f & refpó-
de affignando sí» efte único refugio : A gra-*
ca de Déos pelos mereximentos de JESU
!Cbrifb. ....
.Supporta efra primeira diligencia ; ( qué
quanta mais bem feita for,tanto efeufaremos
de aprender ейе defenganq à cuira de lafti-
mofas experiencias ) feguV-ie a fegunda,que
he pedir a Déos о dito dorn da Çaftidade. No
que fe deve proceder com as cendiçoens, que
ihe fazem grata, & eftkaz a nofla Oraçao; a
faber , redta insençaoJhi4miJila4e;perfeveran
1 6o frataáf
ça,& confiança em Deos,por fer e!!e infíníta-
I mente bom , & poderofo,& pelos meVèci-
j mentos de Chrifto, & imercelíão da Vrr^em.
, E advirta, que à conta de fer efra mercê de
JDeos,nem poriíTo deixe de applicat as dili*i
gencias, que puder da íua parte , qne faõ as
qne nefte Tratado fé apontão , &mais efpe-
cialmente as que fervem de remover Os im
pedimentos da graja ; a qual he como rego
. de agua , que he necelfario lhe abramos ca-
' ihinho, conduzihdo-a para o lugar que defe-

E hão cuide algiiem , q o fer cafto he mer


cê que Deoscoítuma fazer pôr huma rez , &
«depor junto (bem aflim como fé htim Rey
deite a hum feu criado huma grofla cdmmenj
da com que paflalTe defcahfado toda a vida ) :
fenãoqueo modo ordinário he irDeòsPou-
^ co, & pouco (conforme a alma fé difpoern, Sc
ÍJhe convém ) mitigando como refrigério do
Èfpirito Santo os fervores da fenfua'lidade,
&dtípegandoa noffa affeição do tranfitorio
para o eterno , & dó cõcupifcivel para o hone-
fto,& apartando-lhe as occaíloês perigofas, St
encurtando as licenças ao demónio, ou af-
fiftindo-nos com áuxilios máyorès , para que
vençamos; & femeando em noflo cpracâo de-
fejòs do retirado feculo , de oração, & fre
quência de Sacrani.nto's, & prepárandorios as
opportâhidáács paraiílb. Por eítes, & outrqs
rtíeyoí
bà ixrtUàé âa CaftiàaAe'. t& i
tnèyos que o Senhor fabe , vái communicant
dgnos о dorn da Caftidade« Pelo que bem роч"
demos affehtar ieguramente ,■ que todas ais
vezes , que pedimos a Déos efte dorn, femprc
aproveita para o noflo intento. E aflîm n*
Oracáo , na MiíTa , na Cómmunháo fagrada ¿ ¿p
& em outras occafioens que nos parecer con- Щ
veniente, infteraos em pedirlho para o fervír;
rhelhöf com elle. Sera tambem útil ter em al*
gum lugar decente alguma imagem j où eftá-
pa da Virgem S. Ñ. , Se todas as vezes que en- *
ti amos , & fahimos do noflo apofento ,> fau«¿ -\
dalla com aquelles veríos do hymno Eccle-*
/íaftico : Virgo fingularis inter omites mitisi noi
Cftlpisjolutos mitesf<tc,& cafióSi
Se náovixmos logo ö defejadd effeitö, riiáá
antes novos, & repetidos defmanchos def
nofla fragilidade ¿ nem por ifiodefmáyemos^
nem largtientós a efbpreza¿ Refere o P.Theo-
filoRaynaudo,que huma pefloa perseguida
¿e tentaçoens venéreas ,' qúáfi fe via preci
pitada a tornar ao vomito , qué Já lañeára* Ë
íiippofto pedia a Déos íoceoiro, como efte taje-
dava, perdía o animo. Suc'cedeo, que tirando
a forte dos Santos ( conioem muitâS Comu
nidades i & fgrejas fe ufa cada mez , & ero
outras cada anfio J o deípert«dQr,.efpiritúaP¿ ^ Г '
ou fénfenûay-qu'e com' ella Hte слЩ,Щ''c0siJ:z T
àc $. Gregorio : Kelt- céffart лЬ oüiione f*^; r"; •
quèaémrrt hrgltm-HS efi T)eHSx non negaí-ti , fed ¡
h Mi
i£l v1- ' ; ^Tratado ••••■-■•:»
.<##«* Nao ceiîes de tua petieáo;porqíie tar*
.darodefpachodella, rao he porque Déos o
rrjegue , fenáo porque o difiere. Com táo ale
are y, & oportuno avifo doCeo, le esfotçou
•açmelle pertendente , & confeguio o effeito
de íiua perfeverança.

^FERGUNTA ЗГХ
"СЫя /ë hade portar hua ¡>eßoa , que efil
" ' " em.coftwne do peccado de immundi-
►V г, i •-..: (ia contra a naturezai
}.:., v>,.. '■•- ,•.•••.•■ ■■■•. -••('-..
R"Efponde-fe,que o regimeto convenient;
ao enfermo defle mal,confifte primei-
•ramente em que defeje muito verfe livre de
táo duro , & miferavel cativeiro ¿o demo-
'nio; çonfiderando para iiïo ( nao de paifagem;
jitftaq de affentb^). a fcaldade deire vicio ,
, Os danos que trais çoRÎïgo,& o perigo de mor
der empççcadoj .
,.-;.■ ÀFealdade defte vicioh'etanta , que nao
;sp he contra a graça divina , utas, tambera сб-
.(¡raanauireza.humcna; & até os que fe nao
Vcnycrgcr.liáp deque outros peccados feus con
tra o mefmp fexto manilamente , apparecáó,
1 & fe fubliquem , defte fempre fe recatáo r&
■ ercobiem; porqije até o junóme proprio he
vdos mais infamas , & afroptoíos; & bafta pa
*Da virtude da Caßidade. 1 6"Ï
ra fe explicar bem a lua leal Jade, que Mafo- Euftrit*
mana fualeyopermitiiïe. Eemfim he яп-tius
dar em certo modo amancebado com o de- apU(¡
monio,que he a extrema m i feria que pode fer Thcofi-
em huma alma eftampada com a imagem da (иЦлу-\
Santifîîma Trindade , & creada para a ver mud.
eternamente , & remida com o fangue de tom.Ji,
J E S U-Ghrifto, : -elrtu-k
Os danos , que traz configo faomuitos , & tlhus\
graviffimos. Diflipa as forças,embotao enge- лд^ Í4>
nho , cega o juizo , debilita a vifta , afemina ca* 8#
o animo , encurta ávida. Mas eftes danos ne- л j^^
nhuma comparacáo tern com os da alma: por
que deftroe a graça , & virtudes , afugenta
asinfpiraçoens de Déos , he caufa de muitas
nullidades no Sacramento da Penitencia por
falta de verdadeira dor , & propofito ; pega o
coracáo as coufas terrenas , & tranfitorias, &
o torna efquecido das eternas -, porque affim \
como no vinho ha luxuria ( como diffe S. Pau
ló!' Vitium ivquo eft luxuria ) affim na luxuria p • *
ha vinho 5 quero dizer, effeitos femelhantes " »*
aos do vinho quando he muito •, que aliena o
juizo, & dtfterra os cuidados de importancia,
deixando s6 vontade de rir, folgar, & dormir,
& tornar a beber.
Alèm difto o miferavel que ferve a eile
Vicio , vive muy arrifeado a efeorregar em
out' o; maisabominaveii, porque mora /и/«7- f^
wbms Gomorrluc: & roete ao demonio den- 'a,í*
i ¿I Tratado
tro em feu corpo , porque cfte he caifa fuá ,
^oiso venceo: & nelle monta, & brinca a-
feu gofto , mellior do que coftuma fazer hum
picador fobre hum cavaüo. E fe o máo coftu-
me fe nao ataliia Com tempo a todo o caíto,
& diligencia,vcm а dar em huma devaffidáo
tal , que o que he liyre.alvidrio, partee vio-
"'; . lenca néctffidade. Donde fe feguem tenta-
" " • çoens contraa Fè,8c contra a Elperança de fal-
vacáo , tnftczas profundiffimas , eípirito de
* * blasfemia , fofpeitando , que Déos nao tem
Vontadefmcera de falvar as almas, ou que he
•' ' mjufto em prohibir eftas coufas , que pode-
riáo paitar como indifferentes. Porque ja ne
ues termos o peccador , vendo que nao pode
amoldar o feu gofto à ley de Déos, quer amol
dar a ky de Déos ao feu gofto. Hum fingu-
Jar , & bem notavel exemplo daremos aqui , .
de que fe colhe , & confirma parte defta ver
lade.
Eftando a fefvade Déos Anna de S. Ago-
íh'nho huma noute em 0|acáo diante de hum
4 '• - Guci'fixQ, a fagrada imagem Ihefallou, codif
ie eftas foi macs palavras: Dins л {ulano : que
a m!t Era certa pelToa Eccleíiaftica, que о Se-
nhor nomeou , Sí ella bem conhecia , & an-
dava em máo eftado. Porèm a ferva de Déos ,
de humilde , oí encolhida nao fe atreveo a
*-.. d\,fcobrif queoScnhor fallava com ella :8c
h^ «fiimnáo deu o recado. Nafegumte noute,
fl)a virtude da Caflidade.
& no mc(mo lugar ,& exercício tornou o Se
nhor a mandarlhe : Dl^e ufaúno: rjue A mi. Ne
com efte fegundo preceito Te determinou a
fallar. Repetioo Senhor na terceira ncute o
mefmo avifo , dizendo com voz mais fcvera 3
Sc íentida : Di^e A fultnr. que a ml \ & f/ue b*~
ft<t ]í. Convencida finalmente , & temcrofa
de defobedccer , chamou o tal fogsito , para
que a ouviífe de confiííão. Vcyo : & no mil-
mo aíto de ronfiíláo lhe refcrio tudo o cjue
paíTara. Ainda cjuc as palavras do reca Io erão
tstm breves, & efciiras, logo oConretTor cn-
tendeoo c^ue fignificax'áo ; porque lhe toca-
vão onde tinha ferida a conlciencia. E adver
tindo que eftava faílandocom huma alma tão
favorecida deD;os, & a quem elle fé fervia,
de tomar por inftrumento de fuá converfáo,
declarou com muitas lagrimas hum peccado,
em que havia muito tempo reincidia corn fre
quência , & animo de perfeverar nelle. Era
oetal qualidade, (diza ferva de Deos ) q me
lhor he para cal lado, que para efcrito. Com
efte avifo doCeo, & a exortaçã^ caritativa)
que a ferva de Deos lhe fez,animando-o à pe
nitencia, propoz emendarfe. Poucodepois fc
aufaiicou para outra terra muy diftante da em
que efta Religlo'a vivia. E fobrevindo-lhe
huma doença de perigo, dcfejoti muito que
efta fuá infigne bemfeitora efpiritual foubcf-
fê do aplico em q fc áchava.Parecc'0-lhe'irti-
L iij pol»
i bS Tratado .~ *
poílivel pela diftancia dos lugares , & por nao
haver meyo por onde lhe encarninhaíTe o avi»
ío. E toda-via lhe poz Déos no coracáo que
cícreveíle huma carca: äqual poz íobre húa
banca, fem faber porque viaa remetefle : &
Déos N. S. mandou a hum demonio que fof-
fe o portador della. Chegou efte em brevifc
fimo efpaço à portaría , & roda do Mofteyro :
perguntou pela Madre Anna de S. Agoftinho,
& lhe entregou a carta , dizendo : Eu fou hü
demonio, que me chamo Efquibel. E logo de-
fappareceo,corrido de que o obrigatTem a ier-
vir à que tanto aborrecía. Abrió ella a carta,
. & pela data, 3c lugar donde vinha , conheceo,
,íj so por minifterio de algü Anjobom, ou máo
podia haverlhe chegado á máo em táo breve
tempo. Encomendou a Déos aquella peíToa
com to k> as veras : & depois foubs paflara
deila vida poucas horas depois de lhe haver
eferito.
A'.è aquí a hiftoria: na quai coim Ce efpeci-
fica q aquelle peccado era de reincidencia an
tigua, & mais para callado , que para eícri-
to , patees fe deixa prefumír feria algúa fra-
. qjeza contra о fexto. E bem fabem os Theo-
lo^os modernos as propoiiçoe'ns que o Papa
Tropa- innoc»nCjo Xi. condenou, contra alguns q
^'",' diziáo fer licita, fenáo ouveíTepreceito,que
4». ^"aprohibe. Ifb fippoíb : com.Q a refpoíta ha-
49- íde-fuppar.necelfariamsnte afgunia pergunte,
%)a virtude da Gaflidade. f&f
fe he de pelföa prudente ; pode fer que efte-.
P.eccador , que fe determinava a perfeverar
no vicio , levando-fe dos penfamentos delta •
faifa opiniáo ( que cráoos eríeitos,& ceguci- •
ra que afuma diziamos caufava o mefmo pee- ■
4o ) diífeffe no feu coracáo : jLquem oßericlo ea i
пфлассло ? A efta pergunta poes eftuka , Se
defatinada , vefpondeo Senhor mifericordio-
famente : Di^e л fulano , que л m'< ; & que baflx
já: como fe o Senhor dilíelle: tu fou o oríendi-
<lo, a mi afronta, a mi crucifica, a mi que fou a
mefma pureza , & cujos olhos nao podern
empregarfe na maldade , obriga a que feja
teftemunha de fuas abominaçoens, & minhas
injurias : veía poes que já lhe tenho fofrido
muico, já efpereipor largo tempo a que fe
emmendalTe j já lhe infpirei muitas vezes o
mal que faz , & o perigoem que anda. Agova
ceíTe de oííenderme \ que baila ja : nao irri
te mais minha ira, náo.abufe de minha pa
ciencia: bafta já de peccados. Efte parece fer o
fentido daquellas palavías : porèm vai funda
do so em conjecturas. E( qjiis novit fevftim Do
mini? Ecomtudo femprc daqui verá o, ley-cor
quam terrivel , & danofo mal he o deftas re
cidivas. , • . •■ ; ,■ : г Ь
. O perigo de morrer em peccado , ainda mal
que he táo contingente.. Porque ainda- que •*fl
nos últimos apéreos baja copia de 0»пЫ1*ж: "• '. ~ *
corntuda j Cjomo o demonio qntáo reíbroe
► í,v Liiij mais
'i 68 Tratado
piáis os combates , & a alma em vez de eírar
deftra emrefiflir aos máos penfamentos , eftá
coftumadaaeoftfentillos, & revolver na fan-
tafia imagens de coufas torpes : he muy fácil
efcorregar em algum defejo mió ,оц deleita-
çao morofa:& fcràcoufa como de niilagre,qus
Déos fufpenda as forças do tentador , ou de
repente reftaure as do tentado, que tinha per
didas pelo contrario habfto viciofo. Mem der
ve hum fiar-fe de que chegara aos annps da
velhilFe, em que о langue esfria , & Iherefta
tempo bailante para emendarfe, & acolherfe
ao fagrado da penitencia« Porque todo efte
difcurfb vai armado fobré falfidades; poes nerrç
a vida he certa, nem Déos prometeo darlhe
graça efficaz para fe converter; ( fem a quai
ninguem fe converte ) antes effa prefuncáo
merece que Iha negtje , como a muitos tera
negado: nem finalmente a vontade de peccap
íe acaba com os fervores da juvenili dade;por?
que o habito viciofo fe radica na alma, &
quandonáo tenha effeitos de obra, os tem de
defejo çoqfentido , que he harto íúfficiente
caufa para ir ao Infernó, Pelo que difle o S,
Job , que os oíTos do peccador fe encheriáo
dos vicios de fuá mocidade , Se compile iriáo
, dormir à fepulturá: OJaejuslmplebunrtar »Á¡
■ * tus ¿ritlefctnriJt e']us->& cum ев in pulvere dvr-i
48г14' mienf* E S. Anaftafio Sinaita affirma, que elle
çonheçep veUiqs decern annos, trémulos, &
- ерСЧЬ
VavirtudedaCaflidaáe, 169
encûrvadps fobre a fepultura , os quaes toda
vía náofépodiáoabftordopeecado,pelomáo
coílume em que eíraváo poltos: Ego cerré vidi l*b¿ ]
y¡res centum annos natos }imbecillos , & tote fe^ Q**"*.
>e hementts corpore , qui tarnen non potuerunt ¡iion4
ébflinere à peccato propter diuturnam conjuetiu quttfiA,
diner»,
A ifto fe aerefcenta o perigo de morrer no
mefmo peecado aâualmente; defgraçâ a mais
formidavel , que fe pode confiderar , & de
q ha nao poucos exemptas. Porci aqüi dous, ^
náoandáo p:bs livres. Hum me referió hum
Padre da noíía Congregacáo,Varáo elpiritua!,
& digno de crédito, Efoy,que eftando hum
ia/èivoaâuahnente otíendendo a Déos ( com
efta efpecie de peccado , de que vamos fallan
do) no campo ao pè de húa arvore , de impro-
vifo difparou o Ceo hum rayo , que ti fez em
cinza. E feguio-fe (ohmiferia.') atrazdo mo
mentáneo que deleita , o eterno que ator
menta. Ooutroexemploouvi a outro Padre
den» Caía pratirando, o qual diffe Ihe confta-
va de certd : & paffou affim, Bufcando hum
eftudante a outro feu amigo para irem juntos
as efcolas, Ihefoyrefpondidoem fuá cafa q «■ '
efperaffe, porque ainda fe nao levantàra.Tar-
iou tanto, que foy necdTario illo acordar,Maí
nao o adiando na cama , fenáo fomente os
fínaes deque fehavia levantado fem Ce ve
rtir , o buíHráo por coda a caía, ate que'o fb«
rao .
1 j
i "o Tratado
rao achar em hum retrete nefta miferavet
forma. Eftava morto , & afogado : a cabeça
.' tinha fumcrgida em hum vafo immundo : o
corpo , & pès levantados para o ar , & intei/i-
çados:& os mais indicios, que he efcufado
t, particularizar ^todos publieaváo a enormida-
de,que ali fe acabara de cometter. De que foy
fácil inferir , que a obra que o demonio co-
meçou fendo inftigador da culpa , o mefmp
demonio a aperfeiçoou fendo verdugo da pe
na : a qual foy proporcionada , poes a culpa
tambem era immundicia. E eis aqui temos
poucos annos colhidos de repente pela Jufti-
ça divina com ode licto na máo, & punidos
com morte defgra ¿ada,a que fe fegue a ferrie
piterna.
E quando alguem fe nao fatisfаса со exem-
. píos modernos , parecendo-lhe de menos cré
dito , Lea o capitulo 3 8. do livrode Geneíis ,
que he bem antigo, & de fè divina, onde acha
ra outras dous exemplos de Her , & Onan a
quem Déos por femelhantes, peccados man
dón matar pelo demonio; & fe entende haver
Tob»6, lîdo Afmodeo , aquelle que matou os íete ma-
1 4» ri4os de Sara por luxui iofos.
Afrentando firmemente no coraçao o defe-
j'o de fair defte cativeiro, mais duro que o de
Faraó para os fillios de Ifrael : fegue-fe ap-
plirar os meyos ?& diligencias convenientes.
Pailas húas. fáo antecedentes aocorvflicb. Да
t.i> "\ ten
Da virtude da Caflidade. 1 71
téntaçâo, outras concomitantes, outras íub«
fequentes. As primeiras já affima ficáo decla
radas ; que fáo devocáo da Virgem , modera-*
cao no comer , tratar o corpo com afpereza,
iugirdemàscompanhias, nao eftar jà mais
ociofo, pedir aDeos o do da Caílidade , & de-
fendcllacom o efpirito dehumildade.& muito
,em efpecial a frequencia de confiíláo com o
mefmo Padre efpiritual. Da qual o Cardeal
. Toledo ( depois de haver dito, que a mayor
parte dos condenados foy.infe&a com eile a-
bominavel vicio ) acrefcenta eílas palavras
dignas de fe notarem : Vixputo ullum efficax Inß~
, remédiant invenir! , niß frequentifßmam confef- ntal.$
fionem cam eodem confefftrio \ ter in beb Joma- с, 13»
¿л yß fieri poffiti alioqui nun fibi quifrjuain pro-
mittAt tmeniitt'ionem , niß per mitACulum ¿
Deо , ш rmffimnm tri vilegium : Apenas fe
acha remedio para eile mal , fenáo a confií-
flo muy amiudada com o msfmo ConfelTor -у
tres vezes na femana, fe puder fer ; falvo рэг
. milagre de Déos , ou privilegio rariflimo. lito
affirma eile grave Author. Mas he porque os
eícravos deíle vicio parecendolhes muito caro
o feu refgate, nao lecktermináoapor os re
medios ácima inculcados : que d ñzerem da
fuá parte , Déos ajudarà fielmente, porque«
nao quer a perdicáo do peccador ; fenáo que
fe converta , & fajve.
Aqui pertence tambem outro avifo тцу
Z .4 Priu"
ff г Tratado
principal : & he, que fe ha complice do mef-
mo kxo (& fendo ds différente, cone a mef-
ma razáo ) importa em todo cafo quebrar a
amifade ,& correfpondencia com elle; mas
que feja por termos que pareçâo defeortezes,
& ingratos , nao podendo fer de outro modo ;
& apartar totalmente de fua companhia , vi
das, & trato, nem ainda por cartas; para о que
íe póJe armar alguma defcontîança, ditîabor ,
ou queixa , quando nao haja zelo para lhe di-
zer a caufa verdadeira. Se eftá fervindo algum
nobre,ou mecánico, ou aprédendo algú officio
moftre-fedefeontente, & bufque outra cafa
oceultamente , & deipida-femaiscomo ef-
feito prorapto,que com razoens de íatisfacáo,
porque o nao deiperfuadáo do feu intento. A
pobreza nunca deve fer caufa de dormirem
juntos, fenäo de dormir hum délies delàcom-
modado , a titulo de alguma outra razáo ho-
nefta: porque a todo o curto he neceíTario def-
viarfe do perigo proximo,& evidente.. O Con-
feffor entonará o mais que nao pode eferever-
fe. E fe alguem lhe parece efte çonfelho muy
apenado, he que náoconhece ainda quanto
he o feu mal, nem em que rifeo anda, nem
quanto val ¡i graça de Déos, ñera o que quer
dizer o primeiro mandamento da fuá ley qua-
do diz: Л'maris л Déos jobre todas as confas:Ñía
regamos que alguns calos ha, em que a
dita feparacáo ,' nao he moralmente pofrive!,
peló
4)á Vtrtude da Cafliâade. 175
pelo menos fem infamia. Entáo sh Déos lhe
pode dar o remedio ; & devemos pedirlho сб
muita Oracáo,& dando esmolas,& mandando
celebrar muitas MiíTas,para que fe digne de
mandar a fuá viraçao, & orvalho do Cco, que
reprima a aftividade das chamas deíta forna-
lha de Babyloh ia.
As outras diligencias , que fervem para o
tempo do conflicto, Se depois delle , pódem fer
as fegui»tes. t
1. Tanto que fubíraópenfamento a me
moria do peccado& Ihepulfao defejo delle,
logo logo recorra à Oraçao, dizendo o Padre
110IT0, ou mental ,ou vocalmente , oua SaU ,
ve Rainha , ouo Subtuwn fr^ßdium confugî* ,
mus Sintia Dei genitrix , noßras deprecdtîones ■
tie defpicids in ntcctfitatibus noßris , ftJ a perU
cult's cunf/is libera nos fetnper y'ngo gUtiofd &
ètnedlfta, E nao deixe as arma* da mäo ate
veneer.
i. О doutiffimo Gerßo em hum Tratado .
feu- ¿os ternedios contra as recidivas neíte
tniú, entre outras efpirituaes ioduftrias qne
traz de hpm Doutor Theologo PariGcnfe de
conhecida virtude Se doutrina , aponta a fe* w
guinte:Qye о peccador fe obrigue com jura- - ■
mentoarezaros fette Pfalffios Penitenciaes , m," I#
ou a ajoelhar humas tantas vezes adorando я ,AS
image de Chrifto crucificado, primeiro q corn- '"fs
tnettaa obra, ainda no cafo q ji eftek delibe- ' rat
, Tratado-
rado a cometella. Porque poderá fer,(diz eíle
Author ) que o Senhor fé compadeça , & o te
nha da fuá mão, com que a me ima tentação
Jhe fique em proveito. Da compaixão de Deos
N. S.com os pecradores ninguém duvida; nem
eu da oportunidade defta receita , fé o enfer-
mo ufar delia. Duvido porém muito de que
ufe, e m lance tá precipitado. Quando a luz
da rázáo eftá já tão offufcâda , que o homem
íe delibera em antepor o golto proprid à hon,
raMeDeosA defpreza fuá amizade, por fé não
fazerhura pouco de violência , o mais certo
he, que ha de romper amroos os cordéis , & in- •
duzir hurh peccado fobre outro peccado. Por
que o Senhor que fez o fegundo mandamen
to de não jurar falfo , também fez o fexto de
guardar Caftidade: logo fé o Urfo esfaimadoj.
& amigo do mel faltar efta tranqueira, tam
bém faltará aquel!ou:ra. Oh,que elfa he mais
alta,porqp peccado de facrilegip he mais gra
ve. Já advirto ilTo:mas'o pé ccador então não
o adverte com á põJeração q baíre.Alèm de Tj
rada importará eíTa advertência , 8í pondera
ção fem a graça deDcos prcfente: & o Senhor
que liade dália, ia o íurfomos aggravadòcom
a deliberação do pení; mento. E em conclu-
fáo efte arbitrio ( com licença de feu author ,
& fallando precilas círcunftácias), me pancc
huma torre edificada fobre barro : porque fé
funda na vontade do qv.e fa/. o juramento, a
qual
Davirtfíde dä'Caßidade. iyy
a quai he táo fragil , & deftituidä do temor
de Deos,como fe prefuppoem no mefmo cafoi
.5. Se, effo memoria do peccado , & envite
a que fe come:ta,vier eflando a pelloa na ca~
ma , deve iogo faltar fóra ; como o faria fe
viíf e o fogo ateado no feu apofento. Porque
affim como a melhoria do íitio em que o Ge-»
neral afíenta , & forma as füas efquadras, fat
inuito ao cafo , para vencer a batalha quan*
do vem a rompimento.« affim he na do eípiri-i
to con tra о согро^ para o qua 1 o brando,& aga-»
falhado do leyto he muy favoraveí. . 1
4. Indo-featentacáo náofe de por fegu*
ro : antes fique à lerta , & com o olho , como
dúem , fobre o hombro ; porque logo o touro
torna a dar volta : mas fe vier mil vezes, mil
vezes faca a mefma forte , fem fe enfadar pop
i(To,nem reputar o jogo por de grande tra-.'
balho: porque para ilToheavida, & liberdade,
& as forças da alma , & dacorpojparalutar1
contra fi , & contra o demonio , & merecer
a coroa de vencedor. ' :! ]-:lí: j. . . :
5. Das defcompoíicoens, que na parte in-)
Éerior fe fegnem ao máo penfamento, náo¡
conjecture que eftá já vencido ,& derrocado.
Porque o peccado nao eftà no fentimento'do
corpo, fenáonoconfentimento da alma: &
euer o demonio que o fiípporhamesjá vence-;
dor, para que fraqueemos, &nos acabemos'
de entregar.
6. Se,
ij6 Ttatddo
6.Se eftás defcompofiçoens apertao rhûiYo,
Çcpœmemperigo evidente de arraftrar о ef-
piritOjclame a Deos com irtais fervor,& ancia:
Senhor neo medefempareis.-Senlior nao en
treguéis as bertas feras efta pobre aima , que
crtifcrti» volTo noroeî tiens in adjurarium тент
iniende , Dvmine ad ddjiivandiim me feß!nat ,fi
le ha lugar accômodado , tome huma difëipli-
na , guardando recato ao defpojariè dos verti
dos aiîïm no taâo, como na vifta, Eftes aófcos
qmnto riláis fortes , & refolutos os fizef, tan
to mais deprcíTa acceleráo o auxilio , & am*
A gentáo a tentaçlo*
7. Pode fucceder que à parte inferior pa*
deçà о ultimo atrevimento , que pode fer ne-
fta materia j & todavía о efpirito näo confen-
eiíTe, Ehtío merece mu ko cm fenáo venderá
efta violencia ,& o tentador , fícará dali por
diante mais debilitado« Adverte-fe efte por¡-
to,porquc nao imagine a pelToa erradamente
. q já foy veticida,& ñéíta fa !fa fuppoíiclo^fer-
feiçoe ou repita o peccado.Tambem fe avifa,
(mais por abundancia de doutrina } do que por
neceffidade )que as violencias de que nefte
numero , & no feguinte fallamos , hito fáo as
de q falloU Miguel de Molinos ñas fuas pro-
fofícoens j dcfdea 41« até 13. ou outras íe-
jnelhantes condenadas todas peía Santidade
do Papa Innocentio XL em z8,de Agofto de
.1 6 8 y: antes fe differencáo tanto, como con-
■' *? . ftftrà
*Da virtude da Caflidade. 177
ftará à primeira vifta de quem as ler. O que
eíle illufo affirtnava errada , & impiamente,
neceffarianaente fupposm concurfo, & coope
ração da pá rce do fogeito,náo só interiormen
te conftntinclo a aioia,mas também exterior-
menre movendo-fe o corpo para o mal; & fo-
bre ifto vinha o engano do demónio, pcrfua-
dindo-lhe râõ haver tal confentimento inte
rior: &, porque ao menos os movimentos ex*
terioresnáoíe fodião encobrir á noticia dá
tal pelToa , perfuadia-lhe também que eiâó
violências fuás, em que ella não tinha parte,
como huma mu !her honefta a não terá na for
ca, que lhe fizer O aduhero.O que nós aqui di-«
zemos, n ao he outra, cou fa , que poder a ten
tação, & calor venéreo chegar a pontos, em
que a carr.e frágil padeça exteriores efteitos,
ainda que o elpirito faça por reprimilla, ne
gando toda a cooperação de feus fentidos , &
membros. E hc claro , c|tie aílirn como pôde
haver cfitrao fero fer libidinofa ou deleitoíâ,
aífim a póJe haver libidinofa lern fer volun
tária r & fó r,o libirinofo voluntário ( fora
do legitimo uíò do matrimonio ) fé acha pcc-
cado.
8. Se por vehemencia da tentação, & com
pleição frágil da carne , on occaíiáo do oíficio
quenaopc.de cxcuiar exercitarié, continuar
«fte trabalho; grsnde he para quem defeja jxr*
Ic teto. niílb algum
178 Tratado
género de euIpaJPorèm não o permitte Deos
ienáo a quem tem já dado forças para o ío-
portar fem renderfe : & fé com fuá ajuda
vencemos huma vez; comamefma, porque
não venceremos muitas ? Importa então não
relaxar o efpirito da oração fervente , fazen
do pelo atar fortemente à prefcnça , & amor
de Deos ; Sc humilharfe muito, & fazer al
gumas penitencias , que troquem a fenfibili.
dade deleitofa , pela dolorofa : & ainda que
o trabalho não ceife , nunca indignai fé con
tra Deos ,nem daríè por defamparado delle.
9. Outra occulta malícia do inimigo he
necelTario ter advertida : & he, que as ditas
deicompoíicoens da parte inferior não <£ ,devc
refrear , ou aplacar por fora, fenáo por dentro}
quero dizer não tocando-nos , ou remexen
do-nos , fenão por via de applicacác do e/pi-
rito à oração ,& prefença de Deos, divertin
do a ajma para outro objedo. He verdade q.
o picarfê wa polpa da perna,ou arertarlhe hum
cijieio.deferrojtambem ajuda a efte intento.
10. Que.n dorme a fefta, vigie-fe do in-
curfo ,& demónio meridiano , que naquelli
Isora coíruma andar folto. Tanto que acor
dar levante-fe, & encommendc-fe a Deos,
& occupe-fe em alguma coufa útil , & que
Jhe divirta o fentido , & fé a tentação vier,
hajaíc como acima diffcmos; & podendo ir
dar cota ao Padre efpiritital, aproveitará para
(ii afugetâda. " " '*íi,ím-
T)a virtude da Caßidadi. 1 79
11. Importa ter grande cautela, & recato,
& vigia íebre o trato de ícu meímo corpo,
.air.da ñas funçoens, & aeçoensque julgar por
muito forçofas , & nccelfarias ; porque o de
monio cofUima armar titilas os feus laços, &
filadas. E para fe evitar o perigo em feme*
lhantcs occaíioensjdeve aalmaacompanharíe
tntáo do temor de Déos, & íua d/vina prefen«
ça , on cutros bons parlamentos,
i ¿. Se o peccador cair mi feravel mente na
ter.tacáo , ou por fuá fraqueza, ou por pouco
dcftroem jugar eftas armas , ou tambem,
r orque a fuá fobtrba oceulca defobriga a
Déos de llie dar mayores auxilios, veja Ьещ
que tem aqui outro barraco que faltar; & he,
1 áo fegundar as punhaladas em fuá pobre ai
ra 1 já morta. Coníidere o que diz o Efpirito
6an:o por bocea de Ecclefiaílico: Filho pecca-
íte? nao multipliques o peccado. Ou faça por
entrar no fentimento com que foy compofta Euch»
a feguinte copla 2I».*|
Quando pecas pen farás , . *■• ..
que a Chriflo eíHs acotando ;
y que el te dize llorando :
Hijo, no me acotes mas. , • •

1 5. Vá logo que puder bufeaf o remedie)


Va cœfiff 10 :& feo Con feííor proprio lhe nc4
£ar , ou differir a abfokicáo, nao porfié muí*
M'ij »
i So .-' Tratado
to com eile em que Ilia conceda, nembufque
a de outvo Sacerdote; porque ifto nao lhe eítá
bcm à fuá cura. No que ha de por fuá dili
gencia, & defafogara fijador, he em obede
cer ao fm Director , & conceber mayor co-
ragem para pelejar contra o vicio, nado na
ajuda de Déos. E fe lhe vierem temores de
morí er fem Sacramentos; faiba qj£ fáo !alfos,
& fiiliDs su da nacureza, & nao da grata ; por
que fe foffem verdadeiros , haviáo d: vir na
cccafiáo de cometer aoícnfa, Aièm deque
pode remediarfe com o ado de contricáo, que
junto com o propofito de confcíTaríé, bafta r;a-
ra fe falvar.
14. Se vir que o máo coícume faz treguas
confideravei , tema entáo mais , & mais vi
gie. Eñáocáo acachado, para dar o falto de
repente: eftà o inimigode embofcada,pam
levar a praça por entrepreza. Не tempo de a
» ' fortificar cum fanto;exercicios, & metetAhe
4- -•••■-- «le"t о pi efidio de virtudes, que poflao fuften-
la T outres cercos , que a efperáo -, & fe velar
attentamente, achara, que o váo minando fú
tilmente , com a omiffáo da prefença de Déos,
com o divertimento de outros goftos ícnfiveis,
corn a palavra vá,ou pouco honeíta,com o me
nos recato ñas occafioers, & outras coufas fe-
(ineJbantes. E de tudo o que fica dito neíla
»лтшеги verá claramente quam preciofa he a
vVirpwJe» & como nunca lhe chegarà ao aican-
. .■ M . •- ce
Da virtude da Caflidade. 1 8 1
cê, fé lhe não fizer as~diligercias. E r.áo ob-'
ftante ilTo , he verdade certiflima , que fé o
Senhor não guardar a Cidade , debalde vigia ^
quem a guarda: N!fi Dominas cttflodhrit civita- f]*'*
tcm,fmjtrít viçtUt , quí citflodit eAm. i 3.6.1

PERGUNTA XXL
^Porque razão he cotwenicnte nZo variar
de Confejjorfem fre;ifa cavfa,particu
larmente em cajos de nmcidenciafre*
quente no peccado í
SUppoem-fe primeiramcc : remo coufa cer«
t a-, que nenhuma obrigação ha, (regular
mente tallando j & precindindo de particula
res eftatutos de alguma Religião) de que ha
penitente faca as foas confiíToens com hú sò>
determinado Sacerdote ; ôí muito raenos de?
confeíTar o feu peccado duas vezes ao melma
Sacerdote , ou a diverfos. Porqwe buroa vez
abfolvido, tem fatisfeito ao preceito-diviftOj
& fica perdoada a culpa, fé houve os maisre-
quiluos para ido neceÓfafios, de verdadeira
dor , propofito &c. Com que a çrefente per
gunta só inquire o que dos termos ddl.i con-
fta ; que he a utilidade , & effieacia deite ré- -
médio de náo variar de Confeffor , em ortkm
A feccar as raizcs do habito peccaminofo i
Miij
18г Tratado
que he effeito muito différente, do alie o per-
dáo de qualquer peccado de per iî , & reftitai-
çao à graça , & amizade de Dees, lfto fup-
pofto ,
Refponde-fe , que fera raroocafo,em que
o peccador recupere perfei ca faude elpiri-
tual , fe fizer eftas mudanças. Oque fe mo-
ftra das feguintes razoens.
Г, Porque os principios ou fundamentos
da fuá emenda fío: i , a mayor graça com que;
Déos ajuda , & correfponde à fuá humildade,
& fidelidad: г, omayoresforço que о pec-
cador poem da fua parte para fe emendar : 3 ,
amayorconfufáo que padece em fe declarar
com o Conftftcr amigo, ou lhe fer negada,
ou diferida por algum tempo a abfolvicáo :
4, a mayor noticia que o Medico efpiritual
tem da fua enfermidade , & condiçao ; 5 j
o mayor affecfco , & dependencia que o peni-i
tente tem do feu Padre efpiritual. E tudo ifto
falta , indo buícarConfeíTorque o abfolvaa
preffa , so por aquietar remorfos de fua accu-
fadora confcien'ciâ» " ' •
1. Porque o glorioíb P.S. Bernardo aflen-
13 , que o coftume de peccar nefta materia he
huma fortiflima cadea , quemáis fedeve de-
fengrazar & abrir por arte , do que romper
5 ■''"• por força , Eß autem contactudo Ьлс gravis r/ил-
e ^ ,,*ew ^ perniciosa catevajehenâa utique fac/liîii,
jm. J 1«àm rampendant fjîc maxim* yulgan illudpro
*Da virtude da Caffidade. 1 8j
Verbittm yidedW ufarpari , itieluflriant vialeiiria
patiorem. Logo he conveniente que hum só
Director efpintual, ouConfeflor pio,difcre-
to, & experimentado entenda ndtaobra: &
buícando a muitos,feráo forçpfamenre diver-
íos os di&ames , & induftrias ; & hum def.
manchai à a direccáo docutro, como fuccede
quando variamos de medico em cafo de algu-
madirricultofa enfermidade. E mnis quando,
quem foge do ConfelTor prop io,náo vay buf.
car no eitranho a cura do leu mal quanto a ar
rancar as raizes delle .-fenaoprecilamente о
beneficio da abfolviçSo, para atabafar (como
diziamos ) os remorfos da confcîencia , ou
evadir alguma infamia , ou perigo délia, que
fe lhe fegue.E pela mayor parte bufea Con
felTor, qualquer que lùcceda encontrar,ou at-
gnm certo de quem nao tem tanto pejo,por
nao fer no feu conceitotáo efpirituai , & ze-
bfo. E eftes nao fáo idóneos para fe applica*
rem de veras a desfazer a dita cadea: antes ca
da hum fe dará por contente com fazer o feu
officio por aquella vez, nao fe dando por entre
guedacura daquella alma , que depende de
mais vagar, & continuacáo do penitente, ou
de mais pericia & doutrina do ConfeíTbr.
E que nem todos os Confederes fáo fuffi-
cientes para affiftir à cura défie mal, confia , ..,
entre outras varias experiencias laflimofas, do '
íesuime cafo, qae-refere Thomas Cantipra-* f,
M inj ten- *
ï8+ Tratado
tenfe.Ouvia efte erudito, & pío Varío«
cerno penitente enfezado com o maldito co-
ftume de polluirfe : Sf defconfiando junta
mente do propoíito que elle afhrmava ter de?
cmendarfe , em razáo das fréquentes recaí-,
das , quiz remçtello ao Bifpo, para valeric
de fuá doutrina , Sí explorar algiim novo re-*
medio. Porèm outro Sacerdote me aconfe-.
Jliou fizelTe , que o penitente pcfto de joelhos
rogaffe a Déos N. S. com todas as vera* d»
fuá alma , que enviaffç fobre elle a fuá ira, ¿b
outra vez mais o oífendeffe naquella efpecía
de p¿ccado.Porque íe o peçcador (dizia aquel-
le Sacerdote ) pragueja fobre ñ , com a nima
táo determinado , aqui temos nao so final do
feu firme propoíito de emenda, fenáotam-
bcm hum poderofo freyo , que o reprima , &
amedrente, Confenti no confelho, ( diz o di
to Cantipraçenfe) & ay de mi , que confênti/
Paz-fe de joelhos o peccador , & refolutame-
te pedio fóbve fi a ira , & vingança divina , fe
cutra vez reçaiîe, E iílo feito o abfolvi ; &
elle fe foy contcnte.Porèm pouco tardou, que
Bao voltaífe ao vomito (tanto pode o rnáo co-
•ftume,fe odeixamostomar força); & mal
acabada de cometer a often fa de Déos , come-
çou a clamar hornvelmente:Eila a ira de Déos
íobre mi: & morreo de repente, fegundo me
íeferioomefmo que rae deuo tai confelho,
f. cif-aqqi a condenacáo eterna de húa al год
Da virtude da Cafltdade. i 8f
Cau&da.ou ao menos accelerada pela impe-
ric a de hum Confeffor:& if-aqui como a di-
reccáo de hum Sacerdote mais aprelïado tur
ba , & impede a deoutro mais vagarofo : Se
eif-aquicomoefta cadeanáo fedeveiomper
por torca repentina , íenao por arte indu-
ílriofa , trabalhando por diminuir & enfra-
quecer o habito contrario com paciencia , &
caridade,
3. Porque a cura defte mal inveterado de
pende de copioíá graça de Déos , fem a qual
he impoílive! , q o hörnern carnal fe converts
de bfüto em An jo. E no difpenfar elta graça
lie de faber ,que Déos N. S. (ordinariamen
te fallando) procede com o hörnern do modo
que o homem procede com elle: com o Santo
he Sato; com o innocente, innocente; & có o
infiel , & perverfo tábem cepera >pu fubtrahe
os íeus auxilios de forte,q a nodo modo de fal-
lar,parece infiel & perverfo:C»w Sanch Sarins Ца1,
er¡s3úr cum yiro 'innocente Innocent eris , & cttm i 7.
perverfo perverth/'s: deque efeufamos trazer 27.
exemplos das fagradas letras , por nao fer do
notío principal intento , & defejarmos brevi- .
dade. Por outra-parte be claro , que o peni
tente , que varía de Confesores, so com a
mira em ficar abío.lvido,cncobrindo ao feu pro
prio? o m i fe ravel eftado de ftra alma cm fre-,
fjuentes recaídas, nao procede diante de Deo;,
fielmente; antes guarda no peito fiecáo eje г
hipo-»"
1 86 Tratado
hipocriíia , & (oberba efpirkual. Merecerá
logo , quando muito, que Deos N. S. !he de a
primeiragraça nidificante naquella confiffáo
(fe levar para ilTo as outras condiçoens requi«
fitas) : mas tambem merecerá que llie negué
alguns auxilios efficaces para perfeverar na
emenda: vifto que o peccador nao bufca a
Deos puramente , fenáo a fi proprio-, нет Ihe
doe tato a honra defte Senhor offerdido,quan-
to a fuá propria honra em perigo de difcrêdi-
to; пет vay buícar remedio do feu mal quan-
to ao habito, fenáo fomente a abfolvicáo das
culpas prefentes.
4. Porque na arte de fazer mal as almas ,
& induzirapcccad? , ninguem por aíhito 8¿
perverfoquefeja, fabe tanto como qualquer
demonio :que porilTo no livra de Job ( como
intrepreta S.Hieror¡ymo)fe chama Aguia,cpe
eftà contemplando a preza defde as alemas
Iob.3 9 inacceiïïveis da fuá remontada ma;icia:lw ргл-
Xj," rupt'nfdklbus commoratur ; inc/e contempUrur
efeam. Enós vemos, que o demonio procura
por quantas vias póde,afafcar o peccador re in
cidente do feu Confelíor afttigo , quando
Ihe nao pode perfuadir que tape a bocea, & ne
gué os peccado?. Sabe, logo¿ que o continuar
com elle fielmente, His eftorva feus dañados
intentos. Ajuizeims como quizermos ,& an
demos buícandd poraqui , *" ou porali varios
pretextos jtrabaihando por fingir a nos roef-
mos>
%
*Da virtude da CaÏÏidade. 18y
mos , que iáo racionavtis , & juftns : fempre
haremos de vir a parar nef re ponto , que afa-
ftando-nos do ConfeíTor proprio , que mais
nos ama , & melhqr nos conhece,fazemos a
vcntade do demonio , & com efíeito o nolTo
voto concorda oom o feu, oqiuil nunca pude
efíar bem à noíía alma. E fe cada hum quizer
fie Imente tomar o pulfo a fi mefmo , achara
с 'aro o dcfcngano : porque no buiirar oucro
ConfelTor,que nao excede ac primeiro noto
riamente em prendas uteis para o nolTo inten
to , a natureza alarga & delcc: & no declarar-
fe com o proprio fcbe,, & cuftalhe. Logo por-
aqui he o caminho da em enda , & por acola
o do precipicio ; poraqui fe ajufta o r.oíío co-
racáo com Déos ; & por acola fe confedera o
demonio com noíTo coracáo. -:>v;
5» Porque os Varoens doutos, efpirituaes,
& experimentados, rilo lie oque aconfelháo:
& a cada hum no feu officio deve-fe dar ere-
dito. O Seráfico Doutor S. Boaventura diz af- • :• l- *
fim nefte ponto : Non eß confeicnti* ordinate , in fp^
feu pura -varios (¡U/erere Confcßores : fit tarnenJ¿t* сн\о
lubriter , ut cuî de peccatis prxterit'n femel getic- difei-
raliterquis eß confeßus , de quotidian!s et!am рЦпл
confiteatureidem -.ydno'vofihœferit c/iratorijav- p. itC#
rum denuo vulnerum perfeHc dperiat corrupte- ç„s
lam: Nao he de confciencia bem ordenada ,
& pura bufear varios Confeiïores : ¿V aprovei*
ta muito confeífar os peccados quotidianos da
vida
1 88 "Tratado
vida prefente, como omefmoqúe oúvio a
KoíTa confilTáo geral da vida paíladaiou quan
do íeja necelfario tomar novo Medico efpiri-
tual , defcobrirlhe inteiramente a corrupção
dos antigos vicios.Eír,a doutrina he defte grã-
^ Doutor da Igreja Catholica.
As palavras do Cardeal Tole'do, quefalla-
7V t r*° especificamente das recaídas no peccado
ín (u ' -^ iroroundicia , já affitna as referimos: & vi-
intt l < mos tyráto fé aíTegura efte Doutor em que ef-
fe j ' caçamente lê poderá achar outro remédio ef-
ficaz^enão o de confelfarfe duas ou três ve
zes cada femana fempre com o mefmo Sacer
dote: & que de outro modo não fé prometta
hurn a emenda , falvo por milagre , ou efpé1-
Colai cialiflimo privilegio da graça de Deos. O P.
/«.i./i.GeorgeGobat da Companhia de ]ESUS,aca-
Mraci. bando de referir efta tal authoridade , acreA
7.c4/« centa: Lta Toletns , ira & eg»í& <A«thons
1 7.». omnes períti : AÍIim falia Toledo , & aflim àt«
549. go eu também, & todos os Authores peritos.
•ímber ° p-T°ljias Lonher Vaváo erudito & pio da
Inftra- m£fma Companhia na fuá quinta Inftruccão
ctione ?raticaí 1ue "e a dos Confellores, chegando a
- .; 2 tratar efte ponto,leváta a queftão de,Qije re-
c*u>\ 3 *medios fé hão de applicar a tão difficultofa en-
„ z ' fermitlade í E o primeiro que aponta, he efte
mefmo que vamos irculcando. Kefpornieo /»>•/-
w>ò, ttb experfls cotijeffarlls nsn imtviri cfficiídiis
rcmedinin , quam frequenretn confó/ioticm , qux
i..,/ " f*
Da virtuûe da Caflidade. 1 8p
fiateidemConfeffario; uti& Commumoncm cre-
bram. Quer dizer. Refpondo em primeiro lu
gar , que os ConfelTores experimentados nao
tem achado mais efficaz remedio , do que a
confiííáo amiudada com o mefmo ConfeíTor j
como tamben: a Communháo fréquente.
O P.CaftvoPalao,Author de primeira claf- де gJm
fe ñas materias deTheologia mora!3cita a Vi- Cr<init~
¿tor , & Silveftre , os quaes fentem , que o to <pIXm
bufcar o peccalor confuetudinario outros Có- niten~
feflores tora do feu ordinario , he illicito , & t¡¿
obfta à devida inteireza da confilTáo ,pela hi- Trac!
çocrifia queaqii vai envolvida, & pelo impc- % ,
dimento que poem à fuá correcçâo : ^Affirmât Щрш
Victor , & inclmat Sylveßer illis'.tum eße , Cr ttnic.t
integritatî confeffw/s obflare , oh h'peerißm y&> }}Unft0
impedimtntum quodçme&ioni praßatur, E lup«1 \ r, n
pofto q о mcfmo Catiro Palaonäp fcgue elra j 0>
fcntcnça: todaviabern Ге deixa entender,que
ao menos por mifcria humana, & porque o„
conhecinunto do noiTo <oracáo nos lie muy

noífa alma. E por i lío o dito Aitthor fe modi


fica & limita logo, acrecentando : Timen.-!*/»
yero tibi efl, »i humanm» honorem qiwtns 7con~
fefjar'os ¡ncopn'fosddeundo , (л!Wem tn<t лп'/т*
amittas; vel q:<ia if>S nefc'mnt tibi mtden'; vel
quia tu Ail Ulis AtCtíjs *Щие yero pnpofito.
■ - enrcrt-
i 90 Tratado
emenJdthnis:Vorém deves temer, que por ík!«
var a tua honra múdana,náo pecas a falvacáo
da tua alma ; ou porque os Coifetfores inco
gnito; q bufcas a nao fab¿ curar, 011 porque tu
nao chegas com vevdadeiro pro»o.¿co de eme-
da. Até aquí elle Douter.
De forte que affim como o tal enfermo
anda amancebado comíígo mefmo , & com-
figo trazo demonio eneafado em íeu corpo
(ainda que nao dominante em íuas potencias,
Scmembrosjcomo föccede aosendemoriinha-
dos):affim parece que nteeffita de trazer com -
figo muy unido , & familiar bum Padre cfpi-
ritual muy caritativo , entregando-fe ao leu
regimentó, & fiando-fe delle como de outra
aJma fuá , «Sí mais ainda , pois a fuá eftá cega.*
'que.efta cegueira he de hum dos efpecifico.,
efleicos do pe;cado da carne : & neiie Ceti .
feíTorha de fazerocafbÜo ,&praça das füas
armas, o refugio dos feusperigos , o repaio
de íuas forças , & o conidio de fuasperplexi-
dades. Porque so por so [ deixando decorfi-
derar poffibilidades meta£or;cas.& que baftáo
para falvar a über lade de nao rair, fenáo qui
zer cair ; & indo lómente ao que coíluma ne-
ftescafos fucceder) ma! poderi vencer eftas
durifíimas bata'has, tanto mais occafionadas,
& continuas, que as outras, cuanto mais do-
mefticas : porque a vontsde convertida quaíí
cm naturezá pelo máecoltume, eftà como
beba-
Da virttide da Caftidaae. 1 9 i
bêbada com o deleite ; & empolgando nella
o demónio , pela poífe que lhe concederão ,
rendefe faciliífimamente : com que dobrão
feu defventurado fadário , & fé atafca mais
no atoleiro : & he muito de temer que opec-
cador venha a dar em.defefperação,ou em
fentir , & dizer mal de Deos , porque de po
tência abíbluta a náo livra fazendo milagre.
Affim aconteceo a certo Cónego, em cuja
adolefcencia lhe pegou efte infame vicio hum Go&t
feu meftre. C Ah corruptores dos pobrefínhos )*?r^
moços ignorantes , que inferno vos efpera .' ) '" ^
no qual correndo depois á rédea folta , final- P'n«'
mente huma noute , que elle não prefumio lftr*
feria a ultima de feus torpes deleites, & a pri- &•
meira, & eterna de feus tormentos ; depois de
cear regaladimente com léus amigos, reco
lhendo-fé ao leyto , começou a dar horrendos
gritos, & a chamar que lhe acodilTem. Veyo
o Deão para o confelTar : & exhortando-o
elle, & outros Cónegos a que recebe {f; aquel-
Je Sacramento, nunca puderao render aquelle
obftinado coração, ero que Satanás eftava for
tificado. Antes, torcendo os olhos, & fazendo
yifagens já como de condenado , diíTe defef-
peradamente : Ay daquclleque me enganou/
para que hei de invocar o auxilio , & miíeri-
cjardia de Deos , que^me náo quer falvar < Eif-
aqui eftou vendo o inferno aberto : eifaqui
prefçntes muitos demjnios com as garras, &
bcccas
102 Tratado
boceas abenas para me tragaren!« Edizcndo
ifto , fechou os olhos, virou o roftro, deu hanl
urro efpantoíb , & efpirou.

PERGUNTA XXII.
Que avtfosfervirao aos concubinaiios pa*
radeixaremfeu mío tfiaáo, & гш
tornarem afe implicar nelleí
REfponde-fe primeiramente. Importa q
apeífoaque anda nelbmiierabi'iinmo
cativeiro, aprehendaj & conhecá bé o evident
teperigo de fuá condenacáo ecerna em que
vive. Tenha por certo , que o demonio lhe ta
pa os olhos da alma para que lhe nao entre al-
gum rayo da luz do Ceo,com que deíciibra
eftas verdades : & affim faca quantas diJIgen-
cías puder por oíhar para ii, & dar lugar à luz
da fè , & da razáo; porque defte conhecimen-
tö proprio depende o principio do feu remed o.
Qyetemeridade feria fe hú fe putui а(Ге de ha
delgado fio,dentro da bocea de l.um poco pro-
fundiffimo?' Poisdizeme hörnern defannado,
que fio pode haver mais quebradizo , & fraco
que o da vida humara ? ou que poco mais pro
fundo , que o do inferno? Tu bem poderàs nao
coníidcrar citas verdades . mas negallas nao
podes ainda que queiras , pois fáodefe. He
tie
t)aywtttde'aaCeßidflde. ijrj
<îe fè,qnehoje &agoia logo podes morrer :
\л de rè , que fe morres neife eilado , vas api-» .
que ao interno , & que hüa vez eaido dentro,
räo tens remedio em quanto Deos tor Deos¿
Pois d:z^ m. ,como te atreves aviver no eítado
cm que te nao atreves a morrer r Qttomodo yí - Sitiera
■veré non timet, ubi mori non audes < De querri te nárde¿.
fiús nefeio? De.ti nao-, porque tu nao te podes
valer , para que vivas mais ¿ ou para q mor-
rendo nao te condenes* Do mundo nao ; por* -
que tambem te nao r ode ajudar nem na mor
te , nem no inferno ; & que pudera,náo fe lhe
dá de щ nem de ti fe lembra. Do demonio á
quem fetves , tábem iíTo nao eftà na fuá máo:
& elle be o que mais defeja levarte , & jà o ti*
vera fdto, fe Déos lhe defíe licerça. De Deoi,
elle eftá em grave odio contigo , parqueo of-
fendes , & defprezas ; nem te deii palavra de
que morreras so quandoeftiveres convertido*
Pois de quem te fias nefdo , & infenfato ?
Oh que efte Senhcr he de infinita fniferi*
cordia ,- & fácil cm perdoar , & cenhece nofla
fraque7a« Tüdo ifto concedo : mas qué infe
res da hifA mifcricordja divira he infinita em
■ ; nías nao hè infinita em todos fctis effeitos :
aflim como othcfouro de hurrj Rey he grande:
masd&hi tío fe fegue Ц dá quafltasefmolas
cabem ñas poíTcí deíTe thefoofOi Bern podé,
a m ferlcôrdia de Dcos falvar a todo o raundo?
& еода tuiio lie de fè^ a mayor parte do щЫ).
H. fe
194- Tratado
Uitrb.k nao ШеиМяШ enimfunt уоелП , piucî ve.
.ie.i6. ro eleft/.Pois por ventura deixa por lifo de fer
a misericordia de Déos infinita , ou deixáo os
máos, & obftinadosde ir ao inferno? Déos
perdoará,fequiz.erpor fuá bondade livre ; Sc
nao perdoarà , fe nao quuer, por fuá vontadc
jufba. Perdoarà fe te converteres : mas fe te
nao converceres, como efperas qué teperdoe?
ty.ioiEllefabea tua fraqueza: Ipfe cognovit fiemen*
Щ. tum noflrum : mas tambera, condece a tua raa-
licia^T4rmn rß cer hominis cptiscognofcet illudí
I*™' E'oDomhm fcrutans cor,& pro bans renes qui do
7'9' ипкищие ]uxu viam (uam : & conhece a ayu
da que tens na fuá graça:& fe tu engatas a fuá
graça , que ajuda a tua fraqueza , ja es fraco,
•porque o queres fer, que he o mefmo que fe-
res maliciofo. Logo a tua efperança he fa! la ¿
pois fe funda so na tua apprehenúo, & no
defejo diffimulado de que Déos te deixe pee-
car quantoquizeres ,& depois te íalve amda
que náoquciras. , • ,
Dirmehas : Pàdre , pois logo hei de mor-
rer 2 Tambem hontem, & o mez paííado , &
os outres snnos podia fuceder iffo, & nao íuc.
cedeo;* muitos peccadores vivem largo tem
po. Adverte impio, queja,o Efpinto Santo
tinte fabido effa tua replica chea de eítukicia,
Ecclef. &refpondido a ella pelo Eccknaíhco Ued,-
5. 4. xerisWecuvi/S quid. mihi: лссЯп т^.ЯЩ '
Jnmtnhnpatiens efl redditor: Nao digas : lJe-
- • -- f • - ,v - Cjuei,
*Da virtude da Caßidade. 1 9f
quei , & que mal me fuccedeo ? porque o AI-
tiffimo primeiro fofre , & depois paga-fe. Tu
bem labes que já te tem fofrido; por onde fa-
Les , que te íbfrerá mais ? fe affim andarte ha
ja mezes , ou annos, & Déos te nao matou j
dahi inferes , que tambem andarás mais tem*
fо , & nao te matara <

Numero determinado
tem o peccado : & nao fabes,
fe para fer condenado ,
fomente falta que acabes ■»
de cometter 1шт peccado.

Por ventura, nao o fez affim com muítos ?


Affim como trazes exemplos dos que morre-
rao convertidos; porque os nao trazes dos que
morreráo impenitentes? Por certo fáo tantos,
que pela experiencia que tenho, & peía licáo
dos livros , acho que e amancebamento he mi
dos vicios que Déos mais freqtienterhente ca-
ftiga com mortes repentinas. Pois vem cà mi«
feravel , & infenfato : com Déos zomba*fe ,
ou arguméta-fecHafde porlhe pleito,fe te con-* ,
denar? Sao poucas as miiericordias, queja
temufado contigo? Nao te efpera,náo te a-
Vifa, nao te chama, nao te défende por hum
. An jo, nao morreo por ti , nao te convida pa
ra o perdáo otfcrecendote os Sacramentos ?
náoeftá actualmente allumiandote ,quarute»
N ij cftas
T~ Tratado
eftas regras vás lendo ? Pois que chamas tu a
iílo , fcnáo mifericordias de Deos í Que mais
queres logo í milericordias íem cento , pat#
peccares íem conto ? E eíTas a teu mandar 5
quando , Sc como tu quizeres aceitallas í E o
Senhor dos Ceos, & da terra que te íbporte, &
em cima ampare a tua vida, & honra , & te
proíperecoTi faade, & fazenda ; & qu« no
cabo de repente te falve ? Em fim queres til
governar a Deos ,& não governarte por elle^
Não vês , que tudo ifto fào defprppoficcs naf-
eidos da tua loucura?
\ff Padre ( tornarás a dizer) , bera fei que me
vou ao inferno : porém náo potTo mais contra
mi , nem tenho forças para quebrar os gri-
Jhoens d;fte máo coftums. O inferno náo Ce
fez para beiras, fenáo para homens : muitos
companheiro 5 acharei lá: & paliados os pri
meiros três dias de fogo , tão demónio lerei
eu como qualquer demónio. Affim refponie
v "o peccadov quando eftá rematado: (não pa
reça ao leytor que ião oUjecçoes imaginadas)
portj am chagando ao profundo c'os vkios,def-
Prov, preza: Ímpias cum In profuadum v:nir'it peccjio-
18. í. ^itnycmíimn^. E como ifto ião delírios az
frenético, ftáo feria acertado refponderlhes.
Mas porque tão pouco o feria delprczar eftaJ
almjs, pois ainda po.km tornarzmfi, apon-
t.irfi aqui as diligencias que k hão de acon-
fe!):ar a cft.;s taes
Vua vtrtade da Caßidade. 19;
__ I. Cheguem-fe muitas vezes ao Confdlor
índa que os náoabfolva.
2. Rezem о Rofario , Coroa , ou Terco á
Virgem S. N. todoi os dias, aínda cjik va mal
rezado,
3. Dem efmolas com arîecb de compai-
xáo do pobre, & mande dizer Mrlfas por re»
miíTáo de feus peecados.
'. 4. Ouçlo a palavra de Déos , & leáo vidas
de Sanios ,ainda que Ibes cuñe repugnancia,
atormento da confeiencia.
5. Sirváo na Irmandade do Sahtiffima Sa
cramento, honrando-o ,acompanhando-q, &
cJifpendendo para o feu culto, poique he culto.
do Senhor.
<>. Travem amizade com pefToas, q eftáo
«m fama de que agradáo a Déos , & as íirváo,'
& ajudem no que puderem. - - < . ■■ • ■
7. Se houver occaíiáo de fazer au/encia
por caufa de qualquer negocio, vot»-, ouro-
roaria , nao a pereâo. ...л
8. Olhem devotamente para a imagem da
algumCrucifixo, fazeedo por compadecerfe
de fuas penas: & digáo: Miftrerc mihi mtfera>
tulfericordioßffime Detts ': Hàvèi •imfèricopdia
defie miferavel , ó Déos mifericordíofíffirn«.
<>. Leáo alguns excmploshorriveis neíía
materia , que nao faJtao pelos liVros 5 <3f- ná»
deixareide apontar aqüi aíguns.- •' ;' ' "¡■»v,-
Seja o priraeiro,o que fe• l'è "pifttaie-na
N iij pos»
ip8 Tratado
Tortaria da noíTa Congregação de Parnam-
buço, & fuccedeo no Rio de S. Francifco,qtie
difta dali 8o. léguas-, & foy publico, & muy
íbado por aqueilas partes , & mo referio pef.
foa fidedigna fegundo o ouvio aos Padres da-
quella Caía. Certo Porttiguez andava com hu-
ma fuá comadre, 3í náopbftanteoefcandalo:
que era publico, & as correcçosns , &avifos
que fobre ifto teve , afíim pèrfíftio , & aílira
morrerão ambos femfe defatarem. Dali por
diante viáo os daquella povoação , que fica ao
longo da ribeira, todas as noutes vir do mar
por cirna delle correndo acavallo dous vultos,
ou eftatuas de horrível fogo.Entrando em ter-
rat o maváo campo, como cavalleiros defafia-
dos , 5{ punha-fe hum defronte do outro era
difkncia competente : & logo partião Jiuni
contra o outro, a juftar com as lanças de fogo,
$t fé atrsvelíavão de parte a parte. Tornaváo
a,apa»'wr&, & tornavãp ajuftar , mais ou me-«
nps vezes, até que defapareciâo. Amedren'*
com tão continuo & temerofo
V,P.Jofeph de An-
áqíiella terra , que os
;AÍJiiTio fez^ mandandolhes dá
appaveceílem ali mais,
i tew«am»:liavião tirado o
}<Z íihliá» dada ewrj,fuá
verfa. DcfJe.ejt)(yáán.W£3-/fi)flis- forão

porçio.
Da "virtude da Caftidade.
porcionada a pena com a culpa : pois a Efcri-
tura compara a luxuria ao fogo: Ignls e/l ufane j0r.
#d perditionew devorais: Sc os nolTos corpos , *
(quando os não rege o freyo do temor de f 2'
Deos) a cavallos, que correm impetuofamen-
te para a batalha: Omncs canverfi fitnt adcai'- Ierenit'
(um futtmrfujfi eqHtis intfetu "vadens ad yyxlium. 8. d.
. Outra viíão notável teve a V. Mariarina
«k JESUS da terceira Ordem de S. Francifco,
mulher illuftre em virtudes , que floreceo em
Toledo; & fé refere na fuá vida do modo fe-
guinte. Vi hum grancfiffimo fogo todo de aí-
cuas muy encendidas, como troncos de carva-
flio muy grandes.- E em hum grande efpeto
comporto de três eígalhos apartados hum do
outro , eftava atraveffada hurraalma, de tal
maneira,q o tfgalho principal lhe fahia pelo
cafco da cabeça:& n os outros açus tinha atra \
veíTados os braços pelos fangradouros.Efta al
ma era de hum homem : & a que o acompa-
nliava era de hfia mulher , a qual eftava pega
da ao meímo lume da fogueira , volteando
com ambas as mãos o efpeto muy de vagar j
& moílrava padecer terrivelmente em o mo
ver , pelo grande pezo que tinha. O efpeco -
eftava toJo em braza como ferro na fragua;
& aílim lhe queimava fortemente as mãos ,
&todaella eftava abrafada com o exceílivo • ;. ••.
calor da fogueira.E affim como fé hia moven
do aquelle artificio, & dando volta-o homem, ; t • \
. • Niiij ao
>©э Tratado
_ао chegar com о rotro ao braíido , deitaVa а
lingua tora muy çonaprida , Sc a palTava pelas
afcuas : Si com huma máo colhia huma gran
de braza , & na feguinte volca foltava aquel?
la , & colnia outra coma outra máo : & iílq
mefmo fazia íl'tnpre\quádo o hiáo volt ando,
E to ias as vezcs , que rjrava com o r ift ro pa
ra cima,abria os oíhos , &os punha na mu-
Iher que tinha a feus pès , & logo os cerrava
dando hum triftiffimo,& afligidiffimo fufpi,
ro.E da grande forçadofogofe lhefaziáohu-
mas empollas oabexigaspor todo o corpo,
táo grandes como cabaeas,com que vinha a
ficar hum m^nftroinchadiffimo , &femfigu-
ra. Logo lhe rebencava por muirás par
tes de fcu corpo grande quantidade de gor-<
dura como azeite,quelevantava huma for-»
tiffima labareda , Se o cobria todo : & defte
indmq fog » era invellida Se penetrada a mu«
Iher, com grandifiimo tormsnto, Cadavez
que rebentaváo aquellas empollas, dava hum
grande grko,dizenda; Parque folicitei ; & ella
refpondia : Porque confènti, Perguntandoa
fferva de Déos .30 Anjo, que a havia levado á«
^ftrni- q'ielle luga*, quem eráo os atormentados,
torlnm reípondeoque eráo dons, que tinháo vivido
»»,</« ащяпсеЬаЛоз rauitq tempo.
]fei 1.2. Z Zentner no féu livro intitulado Cabo ал
$.5.-?, 7я> efperjnça tra?. o (èguinte cafo , que he
f"j. iaíHmoíiffirao, aindaque n^q lingular. Em
"' '' ' " Cow
Юа virtuâî da Cafiidade. tot
ComoCidade de Italia, hum concabinario ja
<k (confiado dos Medieos, ¿V com о pè nas por
tas da morte, foy exhortado pelo Ccnfelíbr ,
que era hum Sacerdote d.a Companhia de JE^
SU, a quelançafle fóra de cafa a loba que
tantos annos tinha fuftentado , pois fe via em
termos de entrar em contas com D^os cada
momento. Refpondeo enfadado , que nao po
dia em tal neceílidade privarfe das affiften-
cias de huma mulher, a quem tantas obriga-
çoens devig. Ouvindo o Pa«re r¿folucáo táo
contraria à falvaçao daqueüa alma , mandou
atodos os da familia, que fizeflem par elle
fervorofa oracáo -, na qua! os aeompanhou có
lagrimas, & gemidos. E logo com as mefmas
demonífoacoens de earidade , fe chegou á ca-»
ma do moribundo , & de joelhos !he pedio in-
ftarttemente , que naqueile terrivel ponto, de
que pende a eternidade , ao menos fe lem-
brarte de ñ , 8c mandarte expel lir a concubina.
Ouvio elle ao Padre ; porque primeiro tinha
ouvido Déos fuas oraço:ns. Excluida a occa-
fiáo , eonfeíTcufe com dir de feus neceados, Sc
no mcfmo dia partió delta vida. Na manhá
íeguinte , quiz o dito Comeflor dizer MilTa
por aquel le difunto : mas aofahir do cubícu
lo com eile intento, fentio hum impeto, que
llie embargava os partos, & ouvio huma vo¿
qne Ihe dizia : Onde vas < A'Turtoufe , & te
rne© : porèrn foy por diante. Eis que ao cmrar
na
201 Tratado
na Sacriftia , fentio íegundó impulfo , que a
arremeçou para traz diltancia de dous palios.
Ntm perillo ddíftio do intento ( foípeitando
por ventura , que o demonio procurava impe
dir o íutfi'agio daquella a!ma).Porèm eítan-
do já ao pe do Alear ,quando o Acolyto come-
çava o Corißtcoy, vio para a parte cía Epiílola
jumo ao meímo Altar hum monftro horrivel,
que pregando nelle os olhos,feveramente llie
CÜffe : Kao ores por mi : guárdate de fa^er ral.
Porque nao; ( diife o P. ) nao es tn o que hon-
tcm ouvi de confilTáo,& moftrafte eitar con
trito de teus peccados < Ay de mi .' (refpon-
deo dando hum fufpiro tnftiffimo ) eile ibu ,
& bem me coníehei » & já Déos me tinha
perdoado. Mas de que valeoí aíTimco'mo vol
taire as coilas, entrón aquella mulher, & ebe-
gando-fe per'to-para fervirme em algúas cou
las do fen officio , fui tentado , & prevaleceo
omaocoftiimeantigOj&coníentino mío de-
lejo : & pefte ponto (oh defgracado de mi.' )
fe me acabou a vida , & comecei a eternida-
de.Ditas ellas palavras defappareceo: & o Sa
cerdote mudou a intencáo da Mida. E referia
depois o caíb para efearmento de iemelhátes
peccadores.
"Pare aquí hum penco o leytor: & pondere
quam neceiTario he ter vencido de antes os
rnáos coftumes , & nao deixar negocio de tan
ta importancia para hum ponto tam apenado,
&
'Da virtude dá Cafíidade. 205
& definitivo. Veja fé difcurfa bem o pecca-
dor quando blafonamuy confiadamente: De-
me Deos eípaço para me confetlar •, que em
iium quarto de hora polTo remediar toda a vi
cia paítada. De fmarcada fatuidade lie cuidar o
homem , que lia de levar a Deos ( digamofo
aífim ) oCeo de codilho. Porém refiro mais
outro cafo não dilTemelhame.
JoãoNicio no livrados exemplos fele&os Exeni*
traz o feguinte, teftificando que o ouvio a hú fio 5 3,
Pregador da Ordem dos Eremitas de S. Ago-
ílinho; o qual no Sermão publicamente dif-
feque a elle lhefuccedera , indo poucos dias
antes por humarua de Romax. Chamado a to
da a preíla de huma janella, que fubilTe a cõ- ^
feíTar hum moribundo , fubio , & achou o en
fermo com a concubina à cabeceira, a qual
( como coftumão as deite ofticio , & o demo-
tiio as ajuda a fazello) fé moftrava muy dili
gente } & folicita em o fervir. E fabendo dei-
4e o Padre porque titulo lhe pertencia aquel-
Ja malher , lhe mandou pela authoridade do
íeu officio, que logo logo a excluiífe ; porque
de outro modo não podia concederlhe o bene
ficio da abfolvicáo, Refpondeo o mifcravel :
Como he poflivel,mcu Padre,que a huma mu
lher tam fie!, & cuidadofa em meu ferviço ,
agora , que mais neceffuo delia , & não te
nho aqui. parentes , nem conhecidos , a lance
£mt íjuando.tal de ini não efpera ? Por efte
í.-UÍ modo
204. Tratado
modo foy accumulando tantas razocns & tí
tulos de neccilidade-, que o Padre lhe ditfe :
Pois Senhor «áreme v. m. que tanto que con
valecer, hade expulfalla, & nao tornar mais
à fuá communicacáo. A efta inftancia ref-
pondeo: De prefentenada pofso prometter :
cobrando faudeentáo tomare i de libera fáo,
& ferá a que maris a conto me eftiver. ( Dé
via de fuppor efte infenfato , que fazia
muita merce a Déos em fe deixar falvar quá-
doquizefse. ) Vendo o Padre a falta de com-
puncáo , fe foy trifte, & a poucos pafsos , <м-
vindo que outra vez o chatmváo , voltou ale
gre , entendendo , que o moribundo fe en
trara mais do temor de Déos > & vinha no
pa-tido,que lhe propuzera. Porèm nao era
efta acaula. Achou ao miferavel ja fem fal
la , & agonizando; & a concubina ( bom An
ja, ou Padre efpiritual para aquella hora) lhe
tinha a vela na máo. E a poucas re fpiraçoens,
arrancou , fem final algum de arrependi-
mento.
De femelhantes cafos defgraçados, pude-
ramos trazer hum grande numero. E de todos
elles fe vç claramente quam p^rigofo he a-
quclle eftado , &quam cheasde erros craf-
fiííimoSj&diftamesfalfostem o demonio as
potencias defies miferaveis,que fe coftumáo
a fervillo , & obedecerlhe ; & aflim amarra
dos com as cadeas do deleite falfo, os leva co
mo
Da virtade dá Cafttdade. i o j
mo rezesj para onde fáo pafto da morte que
não tem fim : Slcui otts in inferno pofiti funf ffi*
mprs Jepítfcet eos. 15
Tornando agora ao noíTo principal inten
to: fé por eftes refquicios, que remos dito, co
meçar o peccador, mediante a graça divina,
a ter vontade de lair dopeccado, feguem-fe
então outras regras, que ha de praticar, E a
primeira de todas he laçar fora a má occafião,
íe vive cora ella de portas a dentro : menos
difto náo fé prometta emenda. Advirta tem
tieíle ponto •, porque lho affeguro como coufa
moralmente certa.Aparte-fe a pólvora do fo
go-, fenão, ha de hav€r incêndio. Aparte-fe 0
Ferro da £edra de cevar, fenáo ha de atrahillo
a fi , & ajuntarfe com elle. Oh , que he paren-
ta , & pobre , & não tem outro arrimo. Não
importa ; vá íóra em todo cafo. Oh que me he
neceíTaria para o meu ferviço, & não he fácil
achar outra , que o faca com, tanto amor &
fidelidade. Náo importa : fora com effa'má
mulher: o perigo da alma prepondera ds com-
modídades do corpo : eífe amor he falfo pois
concorre para a fuá condenação eterna: fofra
como lofreria , fé a doença o collic(Te ern hiíá
eftrada,ou eílalagem.Oh, qne fé fícáo confir
mando na vifinhanca as fofpcítas ^ no(]-o
peccado. Não importa: fé procura fe^uranc.7
corte por tudo , que primeiro qne ^l](j^ p^
a náo offender a Deos,& o íálvaj a almn, Nán.
digo
зоб Tratado
digo eu c[ neíb refolucáo fe eírolhao os rfle-
yos,& modos que fáo mais rijos ,& eftrondo-
fos , havendo outros mais fuaves, & occultos.
Mas fempre fe leve o tino em que a occafiáo
vá fóra,& nao torne, E crea-fe que o nao fc
nos depararem logo eftes meyos, vai de que a
nolTa vontade de a expellir , nao he ínteira , &
táo generofa , como devera fer ; & pcriflb o
noíTo entendimcntologo fe cega,Sc ataiba dos
inconvenientes q apparecem, nao lh; achando
faida, & julgandopor abfoluta impoffibilida-
de , oque nao he fenäo falta de querer reío-
luto,& de faber engenhaffe para a obra , &
pouco cuidar niiTo, & nenhum recurfo я Déos ,
nem feria fuá providencia.
Feíta efta feparacáo, he neceffario ^ fe cor-
tem todos os caminUos por on íe o demonio co-
ftuma tornar a entabolar o feu jogo.Náo íead«
mitáo recados,ne efcritos,nem prefentes & da
divas: os menfageiros deüas correfpódeneus,
tratem-fecomdefvioj&afpereza. Se ha re-
tratos, prendas, vilhetes, &c, tudo fe entre
gue ao ConfelTor para o queimar , ou conver
ter em ufos lícitos. Nemrecee a peffoa odif-
credito de ingrata, & defeortex: porque Déos,
& nao o mundo ha de julgalla.
Se vierem tentaçoens de tornar ao vomi
to , já fica dito como fe háo de refiftir logo ao
Erincipio ,& com que armas. Mas advirta-fe
em , que em taes peffoas a reincidencia pro
Da'virtude da Caßidaae. г о/
cede de que nao procuráo dar volta perfeita á
fuá vida , alongando-fe quanto puderem 4a
j peccado, & fazendo fruftos dignos de peni-
' tencia. Querem ficar nem no Ceo , nem no
inferno. No inferno nao, porque já o teraem;
no Ceo nao, porque lhes cufta. E fendo certo
que quem nao grangea com Chrifte, efperdi-
Ça : Qiti non colligit mecum , dtfpergh, feguefe Luc. 1 1
ordinariamente , que a natureza mal domada 23,
torna a vencer a graça mal correfpondida : &
adiando o demonio efta cafa de vago; ifto he,
efta alma fem fantos exercicios,chama outras
fete demonios>& entrando nella, fazem ma
yor eftrago que antes : Et trmt nsvtffimA ho-L":/xl
tnin'is illius peiord príortbus, •
Sealgum comprehendido nefte malchega
a 1er os remedios delle-> mas padecendo algum
defcontentamento leve de fi mefmo, dà hum
fufpiro, & cerra o livro, & nao acode aos
remoríbs, nem conclue coufa algurna acerca
da fuá reforma, faibaque tem mais еЯе ar
tigo contra fi no proceíTo da fuá ccndenacáo.

PEU-
го8 Iratado \

PERGÜNTA XXIÏI.
Comqtte conßdctdwns podera hum en
trar em temor de Déos } para fi au
ßer dopeccado de adulterio.
REfpondé-fe apont&ndoalgumas. ï.Oikï
fídere a graveza deíte peccado , que
verdade he lwim dos mais enormes^ execra-
veis, porque enterra ffti fi militas mal cías.
Sobre a da copula fimpíez á¿cr¿fcenta a da in-i.
jufticagraviílima contra o conforte ofkfldidoí
& fe os complices ambos fáo caJa-Joj , duas
fáoas injuftiças, porque dous fáo os offendi-
«los: as quaes necelíaria menté le bao de decla
rar naconfiíTáoj porque conftituerri différente*
peccados. A quai injuftiç'a lie tanto mai: gra
ve que a do furto , ou rerirriento , quanto a
' peíToa adulterada lie para fcû conforte feffa
de mayor eftima, que a fazenda, ou faude. De
íorte que fe hum hörnern puzeGe ó fogo a to
das as fearas, cafas,& mais poCTefsoens de feu
proximo , & ft eficfiera de cüti!adas,& fiomes
afrontofos jliáo lhe faria (claro eíri) tâo gra
ve injuria como cofihecendó a fuá muirte« E
he táo profunda a chaga de infamia* & afron
ta que daqui re fu ¡taño innocente cffendido,-
q nao fe cura como temroj & fcrnpve fica re-
ftfr.i
Da virtude àa Catfidade.
fentirio , & envergonhado.
i. Alèmdillofazò adúltero efpecial -ag*
gravo a Deos3que he o Author do MatriiBo-
tno,& guarda do thàlamo conjugal, como
ponderou S. Ambrofio : Et (i nuaítam aJultet' L» títí
fefelléris,r>onf,tllesDeHm ; eiji nutriram evafe- iAbra*,
r t, etjt juiikew fori Inferis ,tion ty^des juiíi- ]}am cj
tem totiusmúdii llie gra-vlits ulcifcirur injuriam 2é
inopisfoittuweUitm impúJentis nutrir!t Ttfaiw »ft
enim iujuria atitborein & cuftedcm tbalamifpre*
ttim ejjt, & nort corifisteratam: Aihda q tu ô adui-
eero ( diz o Santo Doutor ) enganares o Itia-
íido5nãohas de encanar a Deos ; aijtida que
etcapafses da vingança do otfendido , ou das
penas da ley , lie certo que blo efcaparàs do
Juiz do mundo utiiverfo. Arues tanto mais
gravemente caftigavà elle o aggravo do pobre
m aridp, quanto lhe toca também efte defptc •
io, por parte de fer author , 6< guardíi do tia."
lamo conjugál.E também íedunda o aggpr
vo em Chrifto Saltador N» que elevoti o cqn-
trato do Matrimonio à dignidade de Sacra- ' <•
mento,pcla lignificacão da união dç ília Pe(T<8-
coiri a Humanidade ,& com a Igreja, que a
Efpofa^ fuá ; & ambas eftas ekcellentiíJiijias , • •
Sc nobiliflimas femelhanças^ancha St deflu- vir$
fíra o adultério. S^réntentUm tnatrimonij (diT- jf'/**^
fé hum douto ) rtfrvr.còtíÍHtffini Chrífti & Es* £ffà
clifa. ifa ífiimitcííi itiwi BctHtritij» ref»'<t(tnt*t r>r'^'^
•VJf íidrdteY; purijjimw Itcdcji* porfavxtn gerit *
2 io Tratado,
3 . A íílo fé chega a contumelia dos filhos
legítimos, & effunos: dos Itgitimos ; por-
j, que fé G infunde m cim os eípurios, & fé ef,
pedacao,& tra iltornao as cognaçoens , 8c
r :• heranças, como pondero uS. Ifidoro Peluíio-
-\t ta : FiUorum nobilhítem [ ddiilteríum ] czntu-
p''ff mellaaffidtj&cogndtioncs Ijcertf , ac Jentejne
V * bnm.in.tm omnem ~vít.tm fefíi<d.ír^ & e~yeytit. Dos
•' * < efpuriosiporcjue íè fedeicobremjficão,ainda
gue innocentes , fem honra , fem fazenda, 8c
fem pae algum ; fem o allieyo , porque, íje
alheyo, & os aborrece, & perfegue; fem o pro~
prio, porque anda aufuite ,& temerofo>& nào
Hb.de ^° ^cus kgki"105' Q»od ff àtrtgMH.- injurU,
Aelí- f^z Phi'° ) miferriml ertint , Itcef >»í »'et p>ierir
lo?o *** tlellf)'o ttcccnfendi gtnere , me w.uír/, nec ndttlt
firi,
4. Conhecefe também a graveza defle
peccado pelas penas acerbíllimas,que os Jegi'A
ladores !he impuferáo. Na Icy de Movf^s fr a
o. i morrer apedrejado do povo. E quando o (kli-
» âo'nJo era raanifeílo,mas o marido o .fofpti-
^- g tava,tidia direito para averiguar pela ley de
* ' " Zclotypia.; na qual fc ordenava , que o Sacs r-
/ dote difsefie liurnas terríveis praças fobre a
w* mnlher,feeftavacomprehendida.E refponde-
^-, ; -doellàdtias v^zes ^fmen; cfcritas em l.um
•. -. piipdytdeliJas em agua lhas dava a beber : &
fé efta a ir nocente, nenhum mal , lhe fazia"):
».- •> F01^111^ cwlpada , iheinchavíi o ventre, &
apo-
'' t
Da virtude da Cajlidade] i 1 1
apodrecia» Entre os Egypcios , fé o adultério Z)/Wer*
fé cometia íèm do!o,nem força, o homem lê- l',b, i,
vava mil açoutes, fc a mulher lhe cortaváo os cap. 6,
narizes* Tenedio Rey fez ky (& depois a exe* *,
cutcu cm leu prcíptio filho) q juntos os aduí- / *rT
terosos partilièm com huín machado. Por if- "s "*
fo cunhou moeda , em q citava hurh macha*- > _, •*
dn , & duas cabeças faidas de liú rieleoco* Nos
povos da antigua Saxonia ufaváo dous modos
áe pena, ambos liorrehdos: hum era,obrigar à '' *
adultera a enforcarfe por fuás mãos, & debai-
xo lhe punháo fogo : & fobre as cinzas da mi»
feravel enfofcavão tábem o adúltero. O outro
era , levar a adultera a açoutar yeJas ruas , & /• 5*
pelas aldeãs , & lugares convifinhoSj & os Virtv
verdugos erão todas n* mulheres, que quizef-/ff^« .
fcta rtioftrarfe homadas^Sd zelofas ^ as quaes CAp*
íaindo humas de huma parte, & outr«s de ou- Wí
cva , a hiam fuftigando com varas > & reta
lhando com canivetes j & cortandolhe os ve
rtidos até a cintura -, com que em fim a maca-
váo, ou deixaváo por morta é
5 . È fiiialmente em quafi todas as nações,
ainda as que carecem da policia chrifrã j tem
efledelidto pena de morte, & n marido im-
ptmidade , fé a executar. E táo aborrecivel
he j que no Senado Parifiehfe fé pronunciaíi
fentcnça de vetdadeiro crime de adultério
contra; a viuva , que durante o tempo dg rha-
yor kto , adaituo comercio de Vajáo; pré
Oij
г\ г ^Tratad»
fumindofe fer efïeitp,ou continûaçao dos tra
tos deshoneftos jà cqmeçados no tempo de ca
Jim- zada. Outra fentença feveriflîma , porèm ju
ila , refere Timpio. E foyo caib , que no
V ; • territorio de Miláo certo Maeiftrado tinha
Ыми- /• • i i 4
i ■ o_ para ientenciar hum homem nobre, cuja van-
j * 5 * lher pelo livrar , confentio no рдйо de fe en-
*"" tregar ao Juiz , com tanto que elle lhe entre
gare feu maí.icto.( Amar neício ind¿lcreto,que
olhava para о fim honeilo , & nao para, o me-
#, ' yo torpiffimo ). Depois que a conheceo,acref-
centádo ao adulterio a perfidia, lhe entregoti
o corpo do marido morto. Chegou efta noti
cia ao Duque , & о obrigou com medo extrin-
• fèco a cafar corn aquella mulher : & logo de-
pois о m andou matar, & adjudican a viuva
: , > • todos os feus bens. Eile mefmo odio de táo
... abominave! delicio fe moítra do que futre«
jjf^ deo a Alexandre Magno-, que fendo moço,&
cfr . Toldado, & Emperador, & de coílumes livies,
ahobh t°davia huma noute que lhe foy trazidahtu
thtztn m,,^ier ■> & aoqueixarfe da fuá tardança,ou-
6 " vio que fe difeulpava com a de feu marido
... em recolherfe ; nao a quiz tocar , & chaman-
^ do aos criados lhes mandou a tornaffem a por
t em fuá cala ; & os reprehtndeo afperamery
tejdizendo- : Pouro faltón , que me fuelléis
aùultcro.Talboryor tinlia concebido hu Gen-
,-..,• tioaelèepeccado,de que muitos cavaHieros
» chriíláoi ou tûzein gaja, cu r.áo fazeuicafo.
»'-А,' .... • .; Tfcm
V"
'Da viftude ddCaftidade. 213 .
Nem tem que allegar para diiculpa o titu
lo commum da fraqueza da carne. Outra ca
ca liavia no bofque para о leäofaminto ,que
r>äo roíTe manfa,& com dono proprio: bulcnr
amulhcr ou marido alheyos, mais he mali
cia , & dtpravaçâo,ilo que fraqueza, & gofto.
E ainda eite vai tâo deicontado corn perigos,
& temores dos criados, dos vifinhos , dos ami
gos , & das mefmas paredes, & íombras ; que
mais tem de empenho defatinado , pelo im-
pulfo diabólico; quede eftimulo dfl carne li-
cenciofa.Ne« haben quid/ptam feteß ( he dou- .
trina de S. loáo Chryíoílomo , fallando do a- ;•
i 1
tlultero) x quo \eexctt]et
ft , neca/mdii- homines, nee ve&ts
., ■
a¡md Deum, etiamft decies willies allegarit iixtn~
valem yoluptatem.Imo qua: poffit illic ej]e yolui>-
tASy ubi metusy ubi Щ.сг'тнпунЫ peticidum, ubi .t
tantmum malorum exj>efUfio,ub¡ tribtmalia,nbi „^
dcciifationes, ubi judiéis ira''. Omnia payet metuir-
nue , umbras, ¡¡arietes , lapides ,famuîos} hoßes t
am ico s y <S"c.
7. Entre os ditos perigos,&tcmores,t«nv
bem nao lie mal fúdado o de que a propria mu-
lher vendo-fe defprefada , !he arme traicáo á
vida , airida cem difpendio da propria: poique
aspaixocns no fexo feminiro láo'vilunieE*-
tiffimas, & a mçfma natural fraqueza in duz
a defefperacáo , 8c- 'crueldade.Ccntarei bve- ,
veniente hum cafo horrivel, que mi "Apuk- j:,b.%i
yo.Tinháhum Ser.hor hum clcravejquc llx> -r^;¡<r¿
•Ощ ■ ■■ ■ .. corría
% г 4. Tratado
corría com teda fuá fazenda , & vivía com
fiia muljjer , & hum fiihinho na melma fami
lia. Soube ella que andava divertido com cu*
tra mulher: & toy cao íuriola a raiva,que fe
apoderou de feu coraçao-, que fe determinou
pa feg« inte vingança mais horrenda que a de
Medea contra о feu Jalao, Primdramentç
bufeádo para iffocëpoopportuno,rafgou todos
os papéis das coritas do mai- ido ; 1 pgo poz fogo
aos celeiros>3¡ nao contente com Uto, fe atou
com hum laço ai pefçoço, pendurandona ou»
tra porita o hlhinho -, & fe precipito« com e/»
le em hum poço altilíimo, Vai agora o fup»
licio do marido. Vcyo feu Senhor : & infor
mado do que paíTara , nao fe fatisfez com os
rigores de qualquer genero de morte apresada;
inventou outre inaudito, & aueliffimo, Def»
pio о eferavo, & untou-ю codo com niel ;& о
prou t'ortiffimam-nte ao tronco de huma fi»
gueiravelha , em rujas tocas havia grandifíi-
mos formigueiros.Sairáo em efquadfoens ¿s
formigas , &: pcîuco , & poueo com prolonga
do,^ moleitiilùrntormento lhe foráo comedo
a carne, & entranhas, ate deixarem sé os oííos
alve jando. Mal obrou o adultero, peyer o Se-
nhor jP^ffimamente a eferava : mas de tu do
foy caula aquelle primeiro delicto.
'r4.mbr. ?t Tambem deve temer o adultero cafa*
l'rb. de ^o, 4"Ç fuá mulher lhe pague na mefma moe^
ь/$Ьт(& da« Nempoderé nefte cafo allegar juftarnen -
ce
Da virtude da Cflftiâaae. i15
te a diffcrença entre o aduherio que faz , &
o que pá lece , parecendolhe efte de outra ef- c-, 4.
feciequeaquelle. Os Santos Padres nos' en- (bryf.
linãoo con;rario: & o Emperador Antonino H»w.5
P io, ordenou q~ue aíTun o marido como a mu- !n r.ttt
íher convictos levem femelhante pena por 7/wp//.1
culpa fcmelhante. E efta ley appvova S. Ago- iitti • >
ílinliOjreípondcndo nervoian tnte à raTião de E^fln
que faó homens: fé fáo homers como não pó- 'aã
<ícro,o que as mulheres? ie fát) homens, rot- Ocesn.
rue fé não vencem < Se faó k mens, porque Atr^,'-
ráo fabcm conhecer, & ufiftir melhor às an^.
icntaçocns, Or.ji
n.i.
exemples trtmer(\s y em .il)<m'n4CAoda 2eno
.-tduttcric, $t>; (lê
•. .
9 Qyardo as raroens não bailem para in-
dilzir ao temor d ire peecado : pr exemptes
fé moftra mais vi amente a graveza delie.Dà
trágica deítruiclo de toda a Tribu de Benja-
minijà aflima dilíemosq teve a catifa no> adu'- iu\'IAm
teros j que violentar!ô a m.ilherdo Levita. A. je
Davidcom fer antes táogr.;to a Deos, pclo-^w/A>
adultério com a mulher de Urias, lhe matou ^^ /0
o Senhor hum filho, & llie notificou que r un- je \ 3>
cadeiuacafa fé apartaria a efpada de- feus ^:ff
inimigos : & de feu próprio filbo, Abfâ-
Jão foy perfeguidõ , Sc afrontado : pov-
«-jueo-qtie Ôavid fez emocculto cera BerGi- ,
Oiii; bee,
»16 Tratado
bee, fez Ábfaláo era publico с im as concubi
ñas de Dayid. Porèm demos oucros cafos , que
aínda que nao fáotáo illuureíjfáobem hor
rendos , & admiraveis.
/. т. dt Refere Thomas Cantipratenfe , que hum'
l/tiy, hörnern cafado levátandofe de noute da ilhar-
ç. $o, gadefuarnulherjfahioabuícar outra ;comet-
tido o pecçado , quando veyo a reçolherfe,vio
amulhercomaclaridadedaL.ua que entrava
por hum poftigo, o roff.ro de feu marido too
• feyamente demudado, que jul gando nao fer
fe náo.algum mónftro infernal , começou a
dar vozes, & fazer efpantos grandiffimos,Co-
nheceo elle logo, que allihavia algum exraor-
diriarin,^,fobrenatural elieio do feu pecca-
áo : & le ocçultou dp modo q pode até ama
necer: oí entáofahr'o a bufear na confiífáo o
remedio de fuá confciencia açcufadora. Porèm
<on) quanços-çncontrava llie lùccedia o mef-
1 , зло; porque codos, ainda que o viíTem muy de
longe, fugiáo como fe fora dodemonio; & ate
«w gados no carneo, del amparando os paftQS,
& os pallar?; , le dcfiíarraváo as carreiras ,
,, .como fe alguma furiofa tempeftade os efpa*
".. _ Ihara, Com i fio aquel le peccador fe con firma-
ма no Cea pentamemo, Se fe compungía mais
[ da fuá culpa, Oiegou em fim. à.Freguezia,a
cuias portas e flava o Sacerdoce rezándolo quai
tanto que o vio, fe levanto«, & a> feehonda
golpe а рД* apreffa.Q pobre n|o de/confian-
4o
*Da virtude da Caftidade. 217
«Ioda mifericordia divina, & fáberido que pelo
Sac arrumo da penitencia tornaria à fuá tor-
ma , péjio da parte de fora eftc remédio , de-
claiando o feu mal com humildade. Ouvido
em fim de conftiTáo , & abíblvido , tornou co
mo outro Na-bucodonoíor i fuá antirçua , &; '
natu ai figura. Eiíaqui deícuberta como em
hum efpelho a fealdade defte peccado. Obre
pois em nós ou:ros peccadores a certeza da
Fé , o que nefte obrou a evidencia do fentidp.
Nas partes de Helvecia,pelos annosdoSe- r
nhor de mil & quinlientns,viveo lium venera-
vel Ermitão por nome Nkolao da Rocha, tão^1""'"''
dsdo à vida contemplativa, St favorecido do iz* ..
Senhor ; que por 1 9. annos & meyo não cc-». ><rm
meo nembebeo coufa alguma, (utlertandofe'" yit*
unicamente com a fagradaCommunhão. Decv'^' ""
varias partes o vifitaváo muitas pedbas.buf- ^ °*
cando em fuás oraçoens , & doutrina rerm>
djo,confolacão,5c,confelho. Veyo hum ho
mem, que andava «kfencaminhado có mulher
alheya,& lhe pergútou muitas coufas,moíl:rá-.
dcfe com atfeftada fimulacão muy deíejoíb
de aprender os caminhos daperfeicão. O fer-:
vodeDeos,quecoin divina luz penetrava a
feu interior ficto , lhe p^goii do braço , &
o levou até a margem do rio Mdcha.que cor
re ao ps daque i lês rochedos; & IheditrerAqui
te mofti-arei o eftado que tem no onero mun
do os que ncfte lê enredarão com os deleites
do
2 18 Tratado
«3o adultério : olha para baixo. Olhou o tomêj
& vio (rafo maraviíhofo.') íair das aguas doas
comolombras medonhas, & disformes fobre
todo o encarecimento : eftavão da cor de fer
ro em braza viva •, & como efte faido da fra-
çua, & golpeado com os martellos «ietpcde
ínuiras lalpic^s de fogo, aflím delias faltaváo
globos abrafados. Arremetia huma à outra
hiriofaméte,8c levantadas em alto fé abraca-
vão chocando com horrendo Ímpeto : & lo
go por occulca força,tornaváo a mergulharfe,
&defaparecião. Daquitornaváoafurgir, re
petindo laftimofos gritos 3 & os abraços ator
mentadores , com que parecia fé deípedaca-
vaõ , até que outra vez íe fumião no rio. Efte
funeltifUmo , & tremendo e ipecxacnlo fere-
prefentoji atejumas vezes, aiè que deixou de
npparecer. Com o qual aquelle psccadorícou
tão defHtuido dt forcas, & animo,q não podia
Aiftentarfe em pé, & Hie faltavão os fentidos.
Então o fervo de Deos lhe fez a pregação que
convinha, exhortando-o a temer a juftiça de
Dcos, & a eípevar em fuá mifericordia. Vol
tou o homem para fuá cafa; porém tam de-
irmdado, que nunca mais tornou às torpezas
íintiguas. Aquellas duas figuras de fombra ,
&frgodevião fer algum par de adúlteros,
que penaváo no inferno ; & D^os pov oraçcçs
tio Teu fervo os moftrou àquelle peccador,para
que do tormento alheyo^ ífrelTe o efcarmento
próprio. Fó <«,
Da vrrtttde da Cafíidaae. 219
Fora dos muros da Cidade de Parma lia hu-
ma Igreja dos Ssntos irmãos mauyres Ger-
yafio , & Protídio. Em huma noute da (i)a
veípora tinha faidohurn camponcz muito de
madrugada a lar car as íL-asbeftas ao capo. Hú
viíinho obfervando aocrafiâo, entrou fingin
do fer o mefmo, & que trazia ftbre, &
fé meteonacama onde eflava a mulher, &
ufoumal delia •, & logo !evantar.dc-le íahio
deixando a porta si>mente cerrada como a
achara. Voltou o marido defpois de algum ef-
paço de tempo ;ao qual ella reprehendeo da
incontinência , pelo coftume que ambos ti-
nháo de fé abfter naquelle dia à honra dos
Santos Martyres. "Élle refpondéo, que a não
entendia : Si a mullier vendo-o entrado na
iná fofpeita , contoulhe o fqcceíTo. Vé*ndo-le
pois ambos enganados tão afrontofa mente ,
vâoíê à dita Igreja , & diante de todo o con-
curfo de gente , pofto de parte o pejo , conta
rão com vozes , & lagrimas o cafo todo. E a
mulher poftrada ern terra , começou a clamar
a Deos : Senhor, q conheceis os coracoens, &
fois teílemunba da minha innocencia& de co
mo em femelhante noiite, até có meu marido
ráocómunico, vingai a offenía feita aosvof-
fos Santos : & aqui à vifta de todos moflrai
o author deftâ aleivofia , para gloria de vof-
fo fantiífimo nome , & abono de minha in-
nocencia. Eftava prefente o adúltero : & de
ira
220 Tratado
improvifo entrcu nelle o demonio , & o ator-
mcntou de modo , que metia efpanto aos cir-
ciiníbmtes. Horalhedava com a cabe ça pe-
¿s paredes, ¡jora atirava com elle à terra
hora o arrehatava no ar : jà o fa¿ia rugir со-
/mo leáo, jà bramir como urfo, jà uyvar
'como cao, & morder lúas proprias carnes-do
... fapiadadamt nte,atè que o accabou de matar :
' * * & o feu íangue ( diz Sao Pedro Damiáo , que
-/"■/•• refere a hiíioria )fe viaainda naquelle sem-
' ' po ñas pedras onde deu com a cabeoa. Para
Sap. qu с p Miamos dizer com o Sabio:Qye os irr píos
lo. 8. ueixaráo final da fuá eftulcicia, para que nao
pudeífe eícqnderíe o feu peccado ; Infifien-
t'tít ¡их reliquernnt bominibus memoriam , ut
in his (¡их peccdveruní , net latere potu'iffettf.
ÎVot. Verificoufe tambem о que Salamáo difle
^•^•nos Proverbios : ge* rngreâitur *l muUerem
frox'uni fui , non erit munàus , cum tetigerit
edm; turpitudinem & ignomlniam congregAt ßbi ,
opprobrium illius non delebitur'.O que encra à
mulherde feu vifinho,ná« ficará limpo tocaa-
do-a:parafi ajuma torpe z& ignominia, &
r.áo fe apagará*feu opprobrîo. A infaroia de-
íte adultero, que podia pouco , & pouco ir
psiTando de peiToa em peiToa,na Igreja a achou
toda junta : & as nodas de feu fangue fora»
p final do feu opprobrio que fe nao apagou.

PER
Vavirtude daCaßidade. 211

P ERG UNTA XXIV.


Comofe portarл hua mulher сafada.para
mo cahir em adulterio , ou jà caí
da neHe.
REÍponde-fe apontandolhe aîguns docu* . .
mecos, ou regras mais fuftahciaes. I . Ao
contrahir Matrimonio efcolha quito for poi.-
fivel parelha na idade , condiçao , & faude,&
qualidade: porque das cótrarias defigualdades
fe origináo os defgoftos , aborrecimentos , &
aufenciasj que depois vem a parar em adulte.-
TÏos. Slejua voles .tpte mbere, nube pari: k que- 0f¿/,
res nao cafar mal, cafa com igual.
г. Seja muito amiga da honra, & bom no.
me, que como enfina o Efpirito Santo, val
mais que militas riquezai: & para almas,que
nao eftáo muy feitas em eftimar a honra de
Déos fobre tudo, val muito, quando'fáo ten
tadas, eftimar ao menos a propria.
3 Leáo , & medite exemplos de Matronas'
naftas, que antes efcoHieráo perderá vida, que
violar a fé conjugal. Bern íábido , & certo he
ode Sufanna, quando amsaçada pelo; iuizes -^.m.
impios ,que fe nao confe.nciffe com elles, lhe ' 3»
imporiáo o crime , & a pena de adultera , ref-
road;o,qu<; m;Uior en «air паз lúas míos
- inno-
зг г Tratado
innocente, do que peccaí diante de Déos,- Ou-
tro exemple referimos ácima da mulher India
que morreo martyr em defenfa da CaíHdade*
Outro ( fuppofto que náa para fe imitar^ mas
Lib *• ^mente Para & admirar ) traz Eufebio Ce/à*
■tx rienfe.Inquietava oEmperador\4auíicio publi-1
çgn_ camente mulheres cafadasjfolgando de a fron-»
ßdiit.c. tara fens- maridos«, ainda que folTem peíToa»
i~j.<& de conta. Nao achou táo franca entrada cam
¿g^ as Chriftás como com as gentias« Huma da-
quellas quando vio cm fuá calaos criados do
Emperador ,queo ferviäo neffe infame offi-
cio;& que feu marido, nao ohftante o ftrPre-
feito de Roma , amedrentado nao «¿odia à
fue defenfa : pedio hum breve efjßaco pa
ra entrar no camai im aveftirfe, &ornaiièi
& ali metenáo hum punhal pelos peittís, ca
bio morta.
4 Nao aceite cm cafa criada de quempaf»
fa haver fofpeitamá, ou defeonfiança. Se al-
gumas das que a ferverrí } começar a fazer of
ficio de rJérccira tvazendo algum efcrito,oü re
cado , ou ¡olivando as prendas de tal ou tal fo*
geito , ou fnetefidolhe tedios & defpvefos da
marido proprírí: dilTirriule porentáo, &buf-
que ou arme algurna caufa de a defpedir de
.... feu ferviço ; quando" !he nao eíteja melhor
revelara verdadeira.
5 Ñas aufencias do marido cohveffl oh-
fervar mais recato^ ¡k recalhimento. E para q[
elfas
DavirtudedaCaftidaaè. 123
efraspoffâo levarfe fem perigo ou tentaçâo,
coítume-fe de anees a tomar o confelho do
Apoñolojque heabfterfc do thoro conjugal
abreves intervallos com mutuo côfentimen-
to , para fe dar melhor à owtcáo»
6 De nenhum hörnern aceite dadivas, fem
titulo claramente honefto. porque efta he hu
madas portas principaes por onde os folicita-
dores entráo a entabolar fuá pertencáo. E íe
for cobiçoza , ha de querer moftrarfe agrade
cida, & depois amorofa.
7 Nao fe confie levianamente de parentes
por confanguinidade , ou affinidade , ainda
que a idade,&gravidade,& a ordern facra
05 accrédite. Poucas viíitas, & eífas diante de
gente , & recebidas fempre com attencáo ao
decoro, & fobre os eftribosda fífudeza: que a
occafiáo prompta he máe de muitos atreví-
memos : & melhor he a rufticidade rom
honra , que íem el la a corte fan ia.
8 Se algu ociofo ao palTar Ihe differ razoens
de galanteo, nada refponda, nem ainda para
fe moftrar irada: porque femelhajjies homens
tomáo eítes defprefos, & ameaças por primei-
ra vafa do feu jogo : & poriffo hum fe queixa-
va,dizendo:Ni de aggravios me vi favorecido.
Mas o melhor modo de evitar eítes encontros,
he faindo raramente fóra , efpecialmente a
grandes publicidades. Até a Igreja,Cafa dé •
Deas , pode fer que muitas veiès lhe nao con- ¡
'. -, -, vehha
2 2 4* Tratado
venha tanto como a fuá própria : pofqde per
ttiiferia humana, & infrigaçáo diabólica, po
de íúcc'eder,que indo a buicar indulgência s,
traga peccados*
p. Não queira e m fuá cafa mais alfayas,
nem apparato do que as peites da fuá foz.enda
lõfrert.:nem íe introduza em empenhes eu-
ftofos j ou lances de oftemacáo, & grandeza.
Porque cairá no laço dodemonio^que lhe mo-
ftrarà com/1 fendo neeetfario dinheiro paraefte
fim,fobre o penhor da honra não faltará qu.m
lho empreita
10 Raroferà.que â mulher que de veias
não quer , nem dá avios a iffo j chegue a pa> e-»
cer violências.' mas íê as hauver.j lembreíeq
orecurfoaDeoSj&àVirgem Sttmsííima S,
N. a porão em falvo. Faca por ter merecida
fuá protecção, & a do Anjo Guftodio, com ter
muito fuá devota,
1 1 Emenda certiíl?mamente,q o fés çct-
cado, 6í tratos i Ilícitos, fé os admittir, t-ar-
de. ou cedo hão de lair a publico. Qutfrf não
guarda Fé a Decs,nerH a fi própria, a ir-da com
perigo da Vída,romocfr;era que outra peífo
lha guarde por muito tempo < Não fei coma
havendo nefte particular tant«sdefengatioiiO
ainda ha tantos enganados. ,
11 Comettidojà o pecado (oquet)eos
nSo permitia ) não o continue.- corte o fio an
tes que ít dobre-,' & colivcrca cm amarra
Con-
Da virtude dá Caftidade. 2 2 f
confeffe-fe com verdadeira dor ,& arranque
de raiz todas as occafíoens : & Deos llie per
doará , como fez com a cutra adultera ; Vmlt ,
& nolt amplias peccare, I. 1 1«
1 3 Se o marido lhe dá mão exernpío nefta
matéria , & poriffo lhe vem tentação de re-
.compenfarhfia injuria com outra ícmelhan-
te,advirta bem,que neíte penfamento vão en
volvidos muitos erros , & deíatinos. Porque
todo o Chriftáo he obrigado a feguir o que
Chrifto mandaj que he não dar mal por mal,
lenão bem. Além dequeeíTa que he vingan
ça a relpeito do marido , he offenía gravjfli-
ma a refpeito de Deos, & adultério efpiri-
tual da alma que fé defpoíou com Chrifto pe-
JoBautifmo. Pois que culpa teve, nem podia
ter efte Senhor na noíla injuria particular (q
-elle prohibe , & hade cafligar^ para fernova-i
mente injuriado , & offendido por outra via? ,
E finalmente muynercio modo de vingança
he a que mayor dano caufa em quem a toma: ~7s
& claro eftá,que a adultera faz mal a íèu ma- ' •"''.-.
rido^na honra ; porém também o faz a fi na
honra & na alma.
14 Se a adultera c.oncebeo a tempo, que
não pôde o fruto aitribuirfe ao mando, ve:a
bem não procure aborfo, ou rnovito,por qual
quer via natural, ou diabólica; porque, fé pre-
fipita na condenação eterna , com a qual ne
nhuma dor, jKumçnto,.infâmia, nem morte
P tenj
2íS Tratado
tem comparação. Porém fé o fruto efpurio
pôde equivocarfe cornos legitimes, atten da a
dar àquelle o defvio conveniente , aconfe-
Ihando-fe na confilTáocom peíToas prudentes,
para que não entre à parte da herança. E não
podendo fer fem conhecido rifcoda própria
honra , não he obrigada a iflo. Mas faça peni
tencia, &converta-fe de veras a Deos. Bom
exemplo tem em S. Theodora Alexandrina, a
qual cahindoem femelhante peccado, mais
por r'raqueza,que por malícia, fé arrependeo
logo com tão viva dor, que infpirada do Cco
deixou a cafa de feu marido, julgádo-fe indig
na de fuá companhia; & era traje de homem
com nome fuppoíto de Theodoro , íè foy a há
Mofteyro do deíerto ; onde foy admittida , &
yiveo em continua oração , penitencia, & ba
talhas com es demónios. Até que outra mu
lher roim concebendo , & parindo hum me
nino , levantou falfamente ao imaginado
Theodoro, que elle era o pae verdadeiro. E
fendo por efta canfa expulfa doMofteyro,per-
levercu com tudo fette annos às portas delle,
criando como filho próprio o que o não era. £
ultimamente recolhida outra vez per com.
paixão dos monges, viveo outros dous encar«
ccrad.3. E eftando já para paflar defta vid*,
revelou Deos ao Abbade a immenfa gloria 5j|
í e preparava no Ceopara aquella ditofa alma.
Em cujo corpo já defunto fé conheceo de
pois
Da'virtude da Cajlidade. jj7
pois com admiração, & lagrimas de todos,
quamfalfo era o dclióto que lhe haviáo im-
fmtado , & quam lu.rcicas virtudes havia
Theodora exercitado dt penitencia,fofrimen.
to , humildade , caridade , & pcrfeverança.
Bem podemos appHcariheaquilloque o outro
dilTe d; Scevola, qae fc não errara, não fizera
coufa tão grande: Si no» errajje?,fecerát ille mi
nas. Veja pois a que feguio a Theodora no er
ro, quanto lhe importa fcgui!a,quandonáo
«a refolução , ao menos no arrependimento.

PERGUNTA XXV.
e confidefaçoens JervirÃo para que as
Religiofas , & freiraticos fé entrem
do temor de Deos, & deixemjua pro
fana converfaçaõ í
REfponde-íè,que além das outras confi-
deraçoés geraes, q condufem para a con-
A^eríào de qualquer outro peccador , podem,
nefte calo fervir duas; huma da graveza &
multidão de culpas , que efta communicacáò
traz coníigo •, outra dós fins defgraçados cora
«lueDeosa caftiga. Porque aífim como Na-
bucodonoforvafouos olhos a El-Rey Zede-*
cias,& logo amarrado comcadeaso levou
paraàfuaCortedeBabylonia: aflim o diabo
Pij procu»
í 2$ Tratado
procura privar ao peccador da vifta , & confi«
deracáo das culpas q comete,& das penas que
Q efperão , para que amarrado nas cadeas
do leu máo coftume , o leve a fepultar no
interno.
,, Quanto ao primeiro ponto. Atalconver-
facáo profana defterra totalmente o efpirito
de anelar à perfeição evangélica, q he obri
gação de todos os que profeffão eftado reli-
giolo. E aílim como de huma arvore cerrada
pelo tronco não ha que elperar.flor,nem fru?
to: & huma náo derribados os maílros não
faz viagem,fenão naufrágio certo: affim qual
quer Religiòfo , ou Rei igiòfa , huma vez que
abrio mão de imitar a Chrifto , & abraçar os
confelhos evangélicos, ráo poderá dar paflb
iia virtude , nem guardar a fuá regra , antes
íè encherá deinnumeraveis peccados.
Ainda no cafo que nefta correfpondencia
não haja peccado mortal (o que fera raras ve
zes , em raz,ão do perigo, & do efcanáalo, co
rno logo diremos) : fempre entibia o amor de
Peos. E quem náo.fabe que ao paíToque fal
ta em huma alma o amor de Deos, faltão to
das as virtudçs, & perde as forças para obrar
b^em, &refiftir às tenuçoens com que o ju
go de Chrifto,q.ne de íl he leve , & fuave , fé
torna guviflirpo , & infoportavel. ;
, .He tombem cauía de faltar a muitas obfer-
\'4n.cias da regra , &eftijos da/prdem 3 aflim
'Davirtude da Caftidade. 129
porque não ha para i(To tempo , pois fé cm-'
prega mat cm tão largas , & comindas vifitas,
8c efcritos ; como porque falta o efpirito, que
diftr.iido cem as coufas do lecuio, não goíta
das de Deos; & imaginando nas panellas da
carne doEgypto, lhe enjoa o mannàdo Ceo.
- Induz não poucos peccados contra os três
votos efTenciaes: eontra o da Pobreza-, porq
fé di (pendem , & aceitáo regalos , & prendas,
que às vezes fão de cufto confideravcl , & pa
ra iíío fé fazem empenhos , contratos , & tra-
paffas. Contra a Obediência; porque muitas
vezes r.áo ha licença para dar cilas coufas , &
a que fé pede à Prelada , para falcar a efte ou
aquelle acto de Communidade, ou para faiV
ao locutório, lie tirada por arte , Sc com enga
no, & em termos que a não concederia, lê
lhe conítaífc da verdade. Contra a Caftidade^
porque não fão eftas cóverfacoens outra cou«
Jamais, que hum feminario de mios penía^
mentsos , & palavras , que não poucas vezes'
produzem obras peífimas,como publica a ex
periência* :. •- '
Atiça a murmuração, & detraçáo já contra"
a Superiora , que nega , ou difficulta as grades/
ou põem as efcutas,ou devaíTa dos procedi^
mentos ; já contra o Confeffor , & Pregador,'
porque reprehende , & eftranha cftes comér
cios; já contra a outra Religioíã., ouifeciilaf ,•
de quem feÍQrmáoos zelos. Eaquilie omor-(
-i: .í Piij der
230 Tratado
der ñas geraçoens, & o motejar da falta de le
tras , & prudencia , ou de outras prendas , ou
de qualquer outro defeito ,que a malevolen
cia fabe obfervar , & acrefcentar , com gra*
ve difcredito da honra ,& fama alhea, & pre-
juizo da confciencia propria.
Ainda que a peffoa nao conímta em penfa-
mentos torpes, ( о que fera raro ) muitas ve-
zes iê poem nèfle perigo : & ifto bafta para a
conftituir em eftado de peccado mortal ; por
quanto he contra o reípeito , que deve a
Deos , & caridade que deve à fua propria ai
ma. Porque todos temos obrigaçao , nao so de
nao quebrantar qualquer preceito da Ley di
vina , ou da Santa Madre Igreja ; fenáo tara-
bem de nos nao expor ao perigo proximo de
lta tranfgreflao : oqual perigo he certo neftas
converfaçoens , quando f|o fréquentes, & fa
miliares , & entre pefloas de annos juvenis ,
& que nao tem teftemunhas , ou eflas fáp
taes , que participao, Sí ajudáo о roalj era vez
de o impedirem,
Defta mefma origem procede a altivez de
efbirito, Sr loucürade fantafia, & a hypo-
çrifia,com que a tal Religiofá todas fuas cou
fas eftima,todas as dos outros defdenha; en-
çhe-fe de melindre, impertinencia, Scaflíe-
¿racáona voz, nos paffos, no rifo, no comer,
beber , & yeftir ; finge accidentes , & defma-
yos , para merecer çompaixoens , & oftentar
7.1' ' i <! deli
<Da virtude da Caftidade\ г\г
delicadezas-, toma fangrias, nao para intei-
rar a (aude , fenáo para quebrar a cor, ou pa
ra dar occafiáo aos eftremteimentos de quem
a ama , & aos brincos , & regalos de quem
a prefentea: enjoalhe a pobreza, & achaques
das outras, defprefa-fe dos minifterios bai-
xos,qualquer falta de alleyo lhe revolve o
eftomago, ao me fmo tempo que traz corrupta
« alma , manando bichos de mil defeitos , &
peccados. Em fim vaife convertend'o em ído
lo de fi propria , so propicio a quem concor
rer corn adoraçoens , & o incenfar com peren
nes lifonjas, que todas ere , & admitte , por
exorbitantes, & ridiculas que fejáo.
Traz tambemcor.figo neceffariamente eíla
convevfacáo efeandalo de outras Religiofas, q
em nenhuma parte he táo nocivo , & com-
tagiofo, comoem Communidades , &mais
паз de mulhercs.O qual efeandalo he de duas
fortes ; porque humas muí muí ao,& revelad o
que fabem , & perdem o ponto da caridade ,
que devem a todas : outras como tracas le-
váo-íe domáo exemplo, & feguem o melmo
precipicio, perdendo- lhe o horror, porq tem
nelle companhia. Mas quem 1ha fez , dará
conta nao so dos peccados proprios , mas tam-
bem dos alheyos , àquelle Senhor, que nao
so cófiíkra , & examina nofTos paífos , Гепаэ
tambera as pegadas, que eftes deixáraó.
Nos feçulares , que fabem ellas con verfa.-'
P Üij COSOS
íjl Tratado.
çoens ptfofanascom Efpofas de Chriflo , tam-
bem redundió eftes dous modos de efeanda«
Jo.Porque os fizudos concebem defeftimaçâo,
"n áo so da tai peíToa particular, fer.áo do Mo-
fte iro : de tal modo , que já na Cidade fe fa-
be , & tem calculado quaes fáo os Mofteiros,
em que nao covèm recolher fuasfilhas, ou
irmás , fe as querem virtuofas : & muitas fe
divevtem do intento da vida regular, por llies
parecer nos prefentes termos menos quieta
para aconfeiencia, & mais arrifeada para a
ialvacáo. E pelo contrario os mundanos que--
rem tambem provar do mefmo paíTatempo ,
ou galanteyo, como elles lhe chamaof porq
os máos juntos em turba fe fazem mais ani-
mofos , & defenfreados, E de todos eftes ef-
candalos hade dar contaao Supremo Juiz a
TAxttb. Religiofa quç os caufou : Keceße efi tn'tm ut w-
f 8 7. v'^Ht fc4n^a > vermtamtn ул bomtni Uli fer
quem faruLltiin yetiit. >
, Gómetem-fe tambem mukös peccados da
lingua; que fe em alguma parte fe verifica
mais о nom?, que о Apoftolo lhe dea de Uni-
verfîdade de maldades , he em hum defle9
locutorios. Qyaii tudo alii fáo mentiras , pa
ra 1 i fon gear prendas, para encarecer affecta?,
para difcu'par intençoens , para pedir fuper-
fluidacks , para affeâar generofidade , nobre-
za , diferiçao, &c. Fervem os embuftes , nw*
iflos,eftulticias, juras, detraeçoens , applica-
çoens
Vá virtude da Caftidade. j3j
çoens irreverentes do íagrado ao profano: re-
velão-fe fcgredos , faltando à fidelidade de
quem lhos fiou : facilita-fe o turpiloquio por
termos de corte, com fignificaçáo do inferno:
finalmente reyna a loquacidade, que quan
do não tivera outro vicio mais, que o de ócio-
fa, bailava para íer artigo da conta que fcha-
de dar a Deos, como elle avifa no Evangelho.
Occafionão-fe também muitas Confifíoens
Tiullas , & facrilegas , ou por falta do devido
exame, nãoattédendopor ignorancia,cu def-
cuido culpável ao numero,& graveza dos pec-
cados; porque o noílo appetite, & o demónio
noscegão : ou por medo, & pejo do Confef-
for,eípecialmente quando as reincidências
fáo muitas: ou também por falta de verdadei
ra dor, & propofito de emenda, porque ainda
o efpirito fica cativo da affeição ao peccado ,
& só diz íuperficialmente as palavras De <jue
lhe pe^J , & propõem tuo peccar metis, como hú
papagayo as diria fé o enfinaíTem. Com o que
feneftecafo vamos commungar, também a
Communháo he facrilega-, & nella em vez de
ievarmos o fuftento da alma, comemos a no£
ia condenação. •
A ifto fé ajunta o vicio da ingratidão a
Deos,defconhecendo, & efperdiçando o inn
comparável beneficio da vocação só citado
religiofo , que he o jardim fechado da Igreja
Catholica , & p thalamo fecreto , & o lugar
-. . (quan
î34 Tratade.
(quantohe de fi)mais acöcmodado para fubii
a rauy altos graos de graça, & gloria. Por on
de, huma Religiofa, que íe condeha, tendo
tantas opportunidades para fe falvar, lie certo
que terá muito mais horrendo inferno pela
eterna confufáo dofeu opprobrio, bicho roe
dor de íua conciencia , & incendio que cor-
refponde ao de fuá facrilega,& adulterina сб
ей pifeencia.
Se algú leytor nimiamente pió lhe parecer
o fobredito difeurfo nimiamëte exaggetado ,
faiba que prefeindimos aqu j, de que a tal con-
verfacáo chegue aos excefíos da fenfualidade
que o mundo publica, & lamenta a República
Chriftá. Prefcinde-fe tambem dos odios , &
vingácas atrozes , que por efta eccafiáo fe fe-
guem muitas vezes. Prefrinde-fe tambem da
violacáo da claufura , a que dáo talvez adito,
nao obftantes penas,cenfuras, ¡c preceitos , &
o efeandalo das fámulas que para iffocoflcor-
rem : & da apoftaíia,quando fe defampara o
Mofteyro ,ou o habito , a qual involve con-
figo outros innumeraveis peccados, & nao
faltáo della exemplos , nem na tradicáo nem,
nos livros. Prefcinde-fe tambem do facrile-
gio,affim da parte da Religiofa, pois eftá con
sagrada a Déos com voto folemne > como da
parte do íeu amante , fe tem o mefmo voto*
ou pela profiflao regular, ou pela Ordern fa-
cra. E ¡por concluir com materia táo odiofa,&
no-
Da virtude da Caftidade. 2 3 f
nojenta , fão tantas as miferias , que deite só
appetite immortificado procedem ; que a cõ-
íciencia de buma deitas Religiofas/>u dos de-
votos que as cornmunicão,nlo he outracou-
fa que num inferno anticipado a outro , que
os elpera eternamente, íe com tempo fenão
arrependem. Oh quem tivera lagrimas de
fangue para chorar tal calamidade / Quem a
cufto da própria vida pudera darlhe remédio .'
Alguns exemplos laftttnofos tcercn Jefta
matéria»

Quanto ao z. ponto, que era confíderar al-


gunSjCafos exeplares dos caftigos q ainda nefta
vida tiveráoos que frequentavão efta con-
verfacáo profana , apontarei aqui alguns ^pa-
ra que a falta de outros livros não feja a caufa
de fé não lograr o efcarmento, que Deos quiz
tiraílemos delles.
Em certa Cidade de Heípanha huma Re-
ligiofa tinha por devoto a humfecular; com Paula.
cujas frequentes viíitas, converfaçoens, & ré- fons
galos fé accendeono peito de ambos hum tão èmfea
íacrilego fogo, que ella fé determinou a dar- myflico
Jhe entrada pefa janella. Apontonlhe hora Serc...
cmqueoeíperaria ; & para raayor diflimu- fimjL,
laçáoadvcrtioá criada, que dormia em ou- yd 5,
tro apofento mais interior , q«e fé não'dífcur*
inquittaffe , ainda que ouviiTe algum ru ido v 2 3.
1 por-
г $6 Tratado
Vio- porque ellaandava indifpofta , & nao poclia
do. i, dormir. Naquella mefma noute antes da ho
ra concertada, entrou o demonio no apoíen-
co da Freirá, & lhe apertou a garganta com
tanta força , que adeixou afogada. E febem
a criada a ouvia gemer , & eftrabuxar, quando
o inimigo lhe eftava dando garrote : nao fe
moveo, julgandoque efáo efíeitosda indifpo-
íícáo de fuá ama, conforme ella lhe tinha avi-
fado. Pore m como o demonio arremeíTaífe
depois aquelle miferavel eorpo no mejto da,
cafa ,com grande ruido, levantou-fe a cria
da, & o vio jádeftituido do vital alentó, 8¿
desfigurado com hum afpeâo horrendo. "Ao
mefmo ponto fubio o devoto í janella, & cha**
moucomvozbaixaa Religiofa pelo feu no
me. Ouvio a criada , abno a janella , & lhe
dille: Vedes aqui a minha ama morta ás máos-
do demonio. Nao he crivel o pafmo, & affom-
bro que o fecular recebeo com efpe&aculo
.{, wtáo trifte, & inopinado. Abrio-Ihe Deosos
olhos da alma ; tornou logo a decerfe ; cho-
rou,& confeflou feus peccados, & nunca mais:
teve correlaçao com Freirás. ,:
л Semelhante caftigo experimentou outra
Religiofa em humaCidade de Caftella a ve-
à . . . lha , cuja cega aífeicáo a hum eftudante , fo
mentada com fréquentes vifitas , eferitos , &
prefêntes chegou a tanto , que fe determina»
* ^ rao a que entrafle elle na lúa celia por huma.
». • pare-
Da virtude da Caftiâãde. 237
parede bem alta. Executou o eftudante no fi-
lencio da noute tão facrilego atrevimento :
entrou no Mofteyro , & Caminhando para a
parte onde fabia eftar a cella da fuá devota ,
vio que em húa fala eftaváo dous negros fe-
ijfílmo.s jugando a péla (devia fcr figniíkação
viílvel do jogo que inviíivelmente fazião os
demónios com a alma daquella Freira já en
tregue nas fuás mãos, como logo veremos )
caufoulhe horror a vifaó : porém feu defen-
freado appetite o alentou a paflar a diante.
Chegou á cella, abrio a porta: & quando ima?-
ginava achar a fuá devota muy chea de al
voroço^ alegria, a vio no roeyo da cafa mor
ta, & amortalhada no feu habito , com duas
velas à cabeceira; & outra Freira , que elle
não conhecia , a qual a eftava velando. Tre-
meo, & fé lhe arripiárâoos cabellos, & fé lhe
anguftiou o coração. Paffado o primeiro íii-
fto, & tornando mais em íl^efandou logo o
caminho mais depreífa do que viera; ao fal
tai a parede , eftropeou huroa perna : cahida ,
que lhe foycaufade levantarfe-, porque fez
logo voto lê Religião.Arrojando -fé como po
de , chegou a cafa : no feguinte dia acharão
aquella Freira morta na fuá cella : foube-fe
ocafodaboca do me fmo eftudante ,& obrou
jnuitos efcarmentos:& elle,pajTados os dias da
cura , cumprio o feu voto , & viveo como b6
íleligjofo , a-gradecido à miferkçrdm divina ,
que
258 Tratado
que o livrou da meírria pena , fendojelle com-
pliceda mefma culpa.
A mefma morte defgracada teve outra,que
concertou com o feu devoto a entrada pela
portaria ( devia ter chave falfa). Porém quã-
do elle fay a acommetter a entrada , & eípe-
rava achar a íua correfpondente , que lhe a-
briffe , experimentou , que duas ou três vezes
que fé chegou á porta , rechaçarão o íèu atre
vimento com graves golpes. No ultimo lan
ce lhe cahio hum papel nas máos.Recolheu-o,
retiroufe , & na primeira porta onde achou
luz , quiz ver o que continha : & achou nelle
hum retrato da dita Freira rodeado de infer-
rnaes labaredas. Recolheo-fe a íúa caía pen-
fativo ' pela manhã ouvio , que naquelle Mo-
fteiro Jobraváo a defuntos , & foube que Ga
vião achado aquella Freira morta de fabito,
El!e enfermou logo ; & dentro em outo dias
paflbu a dar a Deos conta.
O feguinte cafo ainda tem circunftancia de
mais cnminofo, & mais funcfto. ErãoReligi-
ofa,& Religiofo(sò nos habitos)os q fé cómu-
nicavão profanamente : & por femelhantes
princípios de vifitas, efcritos ,&c. chegarão a
femelhante remate de concertar hora, & lu
gar, & entrada na claufura. Soube difto cer
ta peflba , que ou movida do ódio de ambos ,
ou irritada dos desfavores que da Religiofa ti
niu recebiddjfeguindo aquella noute do con
certo
<Da virtude da Caflidade. i 39
ceno os errados paiîos daquelle Religiofo,a-
guardou a que entrafle no apofento del la ; Sc
pela meíima parte entrón elle tambem acom-
panhado de 1m amigo : &achandoos dous no
lacrilego leico os cozeráoa punhaladas, & fa-
hiráo para fe pôr cm cobro. Mas nao foy táo a
feu falvo,que a juftiça, divulgado ccaíb,náo
colheffe ao principal dos matadores , do quai
fe fez publico fupplicio, & efquartejado o di
vidirlo pelas portas da Cidade : onde precifo
era j que táo notorio foffe о deliâo dos mor-
tos, como о do matador.
E porque naopareçados fobreditosexem-
plos , que Deos so détende , & caftiga a viola-
çáo da clatifuraj referirei outra mais domefrj-
co, em que punió fomente a converfaçao pro»
fana , & elïa ainda nao de todo confûmmada.
Na Relaçâo da viagem de huma nofla frota ,
que capitán eon Francifco de Brito Freiré, &
anda no fîm da fuá primeira Decada Brafilica,
fe conta como eftando furtos no porto de húa
Ilha defta Coroa de Portugal, fakáráo em ter
ra alguns Capitáes , & hum délies galanteou
huma Freirá no raro do feu Mofteiro. DilTe-
Iheella, quevielTe de tarde antes da húa ho
ra ,& teria grade. Elle por moftrar pontuali-
áade ctiegou ainda mais cedo.Mas perguntan-
<lo pela Religiofa ( cujo nome levava fabido)
Ihe refponderáo , que morrera de repente , &
gue eftav a cuberta de pintas , & com o roftro
meck»
240 Tratado
medonho, E foy o cafo : que a dita Religio-
fa ouvindo dizer , que o enxofre bebido fazia
o carao rozado; logo que fe apartou do raro,
& deixou concertada a vifita , mandou buícar
hü pouco,a tempo q outra Freirá tinha máda-
do tábem bufcar roíalgar para alimpar a cel
ia de ratos. Na roda fe trocarlo os papéis : &
a raiferavel com a preífa, que lhe dava о ар-
petite de fe fazer'fermofa, nao averigou o en
gaño , & bebeo o rofalgar. E fe bem padecía
grandes ancias no coracáo « com tudo , ima
ginando feretíeitos do enxofre em ordern ao
íeu váo intento , fofreo , & calou quanto po
de \ até que quando Jhe acodiráo , foy já tar
de para o remedio proprio , & muito a tem
po para o efearmento allieyo : porque efpiroa
breviffimámente , ficando táo disforme , Se
feya, que metia horror aos que a viáo,
Muito havia que reparar nefte notaveí ca-
íb , fe o permittira a prefla que levamos ne
fte Tratado (o qual, nao he noíTo intento am
plificar , como fuá materia merecía -, fenáo
fomente miniftrar aos qne neceffitarem hú
prompto,& manual foccorro , para adquirir *
&confervar a Gaílidade ). Porèm notem-fe
de paíTagem os feguintes pontos. 1. A ocio-
fidade, & defaforo defte foldado , q em fainda
а terra , em vez de ir adorar o Santiffimo, ao.
confeífaríe , & commungar para tomar hum
refreíanla ajma neceflario aos que trazem a
vida
Da virtude da Caflidade. 14. t
•vida , & morte táo equivocas fobfe as ondas
cio mar , foy inquietará cafade Deos huma
luaefpofa. i: a prompt:dáo com que efta ad-
mittioogalanteyo, & conchavou a vifita :
muita pólvora havia nefte coração do amor
do feculo 5 pois com táo leve faiíca levantou
incêndio» 3 : a facilidade com que a Superio
ra deu a licença , & concedeo â grade , ícra
examinar primeiro para quer», & para que
era,efpecialmenteahora táo exquiíita. Por
iíTo a fubdita fez. a promeffa táo fobre o fe-
guro , porque faberia que neftas petiçoens
nunca íe punha,N3e ha que deferir. 4: a vaida
de , & lafcivia com que procurou enfeitarfe.
Beber enxofre para fé fazer corada/ Ha ma-
yor loucura , que acrefcentar fermofura ao
corpo com difpendio dafermofura da alma ?
Beber enxofre depois de haver bebido o pec-
cado/ Oh como ifto cheira já a vcfperas de
inferno .' O que no inferno bebem os pecca-
dores he enxofre , & fogo : Ignis & fulphMr.. pr
pars calicís corum. Se efta miferavel não tive- ;
rã bebido o fogo na concupifcencia da carne , ' *
oáoquizera beber o enxofre para a fermofura
da carne. 5 : o modo com que a caftigou a di
vina Juftiça. Oh como he Decs para fer temi
do / pois cora huma sòpermiíTáo fuá traftor-
na todos noíTos defignios , & faz que fcus ini
migos fé vão por fcu pé metter no caftigo do
pu erro. Náç fezDeos mais q pevmittir a tro-
24* Tratado
ca daquelles pí>s:& lá vay a honra,a fama,a vi
da , & tal vez a falvacáo daquella mifcrave],
E note- fe como he exacto o proceder da divi*
na Juftiça. Quería tira mulher parecer fer»
mofa , & fícou medonha : quena occu !tar fiía
vaidade , & ficou publica : quería fair ao lo
cutorio , & entrou para a cova, cafa do filen*
ció eterno: determinou hora para converter
profanamente , & primeiro lúe determinou
Déos hora para lhe tomar conta. Determinar
hora para offender a Déos .' que defatino po
de fer mayor , quando effa meima hora , que
eu decermino para fa¿er a fuá offen ià , pode
elle determinar para tomar a minha conta ?
Outres exemples connл os folicttadorcs Je
Bfligiofas»
Tornando aos exemplos ( queperfuadem
mais eficazmente que as razoens ) apontarei
maiü alguns contra os freiraticos , para que
nao fiquem fem o fsu quinháo , fendo nellej
mais reprehenfivel efte p:ccado. Refere Au
thor fidedigno , que certo cavalhero tinha
fréquente converíacáo com huma Freirá , re
calcitrando ás vivas infpiraçoens , que N,
Slnhor lhe dava em contrario. Hum dia
citando na grade ( que por mi uda , & forte
que feja , veda os corpós, mas nao os pee«
cados ) fobreveyo tío furiofa tempeftade de
chuveiros , & pedra , & rayos , que fe
€Ofen-
<Ba virttide da'Cañidade: i 43
©htendeo aflblarja todos os campos , & her-
dades daquelle diíhicb; fahindo depois ao
campoaverasfuasr"az(.ndas, achou que em
todas ellas, & sonellas tinha cabido o daño:
Íorque citando as dos vifinhos fem final de
:fáo alguma , as fuas eftaváo totalmente
deftmidas.Táocega, &poderofafoy a pay-
xío que com ifto tomou , que alli logo lhe fal-
tou hum olho fóra da cara. Entáo fe ]he abri*
táo os da alma para connecter , que merecía
«quelle açoute rigorofo da pezada máo de
Déos, jaque náodera pelos feus toques bran «
dos , & faudaveis*
Nao a fazenda , nem a faudcs fenío a vi*
da eterna lhe cuftou a outro femelhante fa*
miliaridade* Refere o cafo a V. Madre Anna
Maria de S. Jofeph , celebre por virtude em
Salamanca, onde viveo , & foy Abbadefla do
Mofteiro de S. Clara,& merreocom acclama-
çoens de Santa« Outro fecular ( diz efta fe:*
va de Déos ) tinha devocáo ( que nao he fc-
náo payxáa viciofa de fe ir ao vedado, & de
dicado aDeoSjOterfamiliaridade com Frei
ras ) com huma Religiofa : & confiftia so em
converfar , & perder tempo ,& mandar rega
los de parte a parte, Morreo elle , & асе o dia
de fuá morte durou a dita amizade, que ao pa
recer nao era das peyores : & eftando eu en
comendando fuá alma a Déos, me fov di
to : CÄadknado ejjá : KulU eft redemptio.
&ij Ifto.
2 44- Tratado
líto diz a ferva de Deos , & acrafcenta : [ Se
foubeflemosque tcmeííe vicio o psrigo em
que andáo fuás almas , logo logo fé aparta-
não. E ainda que ellas dão muitas vezes oc-
caiião , em fim eftáo debaixo de chave 7 & ern
claulura •, & fé as náo viíitaffem , nemuíaf-
fcm de papeis , facilmente tirarião a occa«
iiáo. ]
Efte andarem os freiraticos em tão formi
dável , & evidente perigo, & com tudo não o
conhecerem , procede da cegueira do mefmo
peccado,que multiplicado a multiplica; cíie»
gando ás vezes a tanto, que da mefmaeftul-
ticia fazem galhardia ; & homens por outra
parte difcretos,Sc catholicos, ufáo termos
que parecem gentílicos. De hum me confia ,
que adoecendo,& chegando às portas da mor
te , ordenou que o feu enterro paííalTe por on
de o viíTe deíde a cella a fuá devota. Affim
fé fez : & ella eftimando a fineza ( affim lhe
chamáo no feu vocabulário) , a celebrou todo
aquelledia comtriftes, & faudofas endechas
cantadas à aipa: Rifam tcneatts amtci. Vay hú
appcndiculo defte cafo, que o faz mais notá
vel , & moftra o pouco conceito , que de fuás
mcfmas miferias formão os mundanos. Coin-
tando-fc a fobredita doudice em preíença de
cerco Ecclcfiaflico-, elle admirando-a com ap-
p: oração errada , difTe muito ao fentenciofo:
líTo fim , que he íer freira. Qiie cenfura jufta
y mere
Юа virtude daCaßtdade. г±$
enerèçaeftain)iiftacenfura,he ftrperfluo en
tre Chriftáos o declarallo. Muitos íao os de cu
ja falvacáo nao devemos defeonfiar, por amor
do que diz o Pfalmifta: Homines & jumenta fal-
yabis Démine , quemadmodum multiplkißi mi-
ferkordi.im tnam Dens. Mas paffemos do cómi
co ao trágico.
Sabido he, & vulgar entre os hiftoriadores цщш
o defgraçado , fim de Alexandre de Medicis C4SÍ,p
¡Duque de Florença, & de feu primo Louren- ¿л jq';a
со de Mcdicis : & fe attribue a ferem ambos <pont;f.
muy devotos de freiras, O Lourenço era o fo- nav;Ji
Jicitador , & companheiro de Alexandre em je ydU_
fuas liberdades. E depois levado da ambicáo, i0 щ
ou do falfo zelo (porque dizia que o Duque * . '
tyrannizava a Patria )ocondu/.ioàfuamel-
ma recamara , fmgindo que lhe trazia certa
mulher , que elle havia p-rtendido muito
tempo. Alli o fez deitar na cama , & lhe cor
reo as cortinas: & voltando com dous lacayos,
quando já eftava dormindo , lhe cravou huma
adaga pelas cortas. Acordou, & inveftio como
hum Leáo ao primo, dizendo : Ah traydor, co
mo me matasíPorem os criados o acabáráo de
matar, Lourenço paiïados primeiro graviffi-
mos trabalhos ,& fugitivo de terra em terra,
veyo de Confiant in op la a parar em Veneza :
onde os criados do Duque morto , o eozeráo a
punhaladas.
Mukös maUcafoslaftimoíos, & horren -
•• • Qiij dos
»j.6 Tratado
dospuderamosreferir-,porèm baile ösfobrdü
ditos.Eifaqui os dous motivos,qpodem ajudar
aos que quúerem retirarfe deltas amizadesj
que he a confideraçao attenta de fuas culpas,
¿c as penas com que Déos ainda nefttt
inundo os caíliga. M is perguntarà alguem ;

PERGU NTA XXVI.


Em que forma hade dirigir feus procedí-
mentes hita Religtofat que dejeja evi
tar eflas converjaçoens ?
REfponde-fe apontando-lhe alguns docu-
mentos , que fe ficarem puramente no
papel ,nada aproveitaráo -, antes lhe aggravât
rao a conta ; pois conhecendo quai era o hem
caminho , nao entrou por elk : mas fe da li
gio paffarem ao ufo, & exercicio, faráo gran
de fruto, E fallo efpecialmente com as Reli-
giofas, porque délias o efpero mayor, do que
dos feus profanos folicitadores,
Seja pois o primeiro: que a tal Religiofa íe
determine com grande refolucáo , Sç fem te
mer difficuldades , a guardar a fuá. regra in
tegramente ; entendendo q efta he a fuá obri-
gacáo , & prometía folemne, que fez a Deosj
& que fem iílo nao he verdadeira Religiofa ;
perqué efte Senhornáo olha para o habito,
fenáo
*Da virtvde da Cafiidade. Í47
ícnao para o efpirito ; neraparao nome,ie-
náo para a virtude, Defte modo andará com
grande paz , & confola ¿áo do feu efpirito, fa-
rà as confilíoens fem remorfo , & anxiedade ,
nao fentirà repugnancia em obedecer as Su-
perioras , amará a todas igualmente , fobrar-
Jhe-ha tempo para fervir a Déos , & tratar
de feus empregos particulares, dará cheyro de
bom exemplo , & terá morte foílegada.
г . Affim como fugio do mundo para o Mo»
fteyro, affim fe no Moíleyro achar metido
cambemo mundo,fuja délie para a fuá celia,
& para a Oracáo. E fe quer hum excellente
modo de aufentarfe da claufura , fem о crime
da apoftafia , guarde bem fikncio : porque fe-
gundo dizia hum Santo Monje : Andar calla
do, he andar auzente: Ptregr'tn<tt¡o efi tAcertJZó
ifto fe cortáofamiliaridades,novas do feculo,
rumores vaos,recados impertinentes, lifonjas,
mentiras, comprimentos, &c. E nao tema q a
murmurem de ííngular, ncfcia,& ruftica: por
que a murmitracáo, acalumnia fempre an
da? atraz da vircude : todos os que fcguirâo
efta,fofreráo a }uella:D;os bem conliecc a fuá
intencáo : a elle ha de dar corita.
3. Summamente fe recate de travar anri-
zade particular có efta , ou aquella Religiofa.
Aindaque comece a titulo de amor efpiritual,
ou de agradecimsnto a feus bons termas ,8c
eftinucáode fuas ungulares .prendas: íayba
QJiij que
248 Tratado
que eíTas faó asflores onde a fei pente: fé 'H*
conde, que de improvifo ha de faltar, & mor-
delia. Não he difticil (fé quizer applicar a vi-
fia interior) difcern ir entre o amor eipiritual,
& o fenfual , pelos indícios que abaixo apon
taremos na íeguinte pergunta.
4. Ainda lae mais necetfario efte retiro
refpeito de mulheres feculares que fervem
na claufura : porque cómummente he gen*
te de baixa forte , & pouca criação , & fácil
de fé vencer de pertencoens alheas : & en
fezadas com o veneno que beberão em outra
parte , pegão o contagio aos que fé não acau-
teláo.
f. Não appareçana grade, ou locutório',
fera muy juftiíicada caufa •, confiderando pri
meiro qual agrada mais a feu divino Bfpofo
naquelle ciíb ; fé o retiro , íe a communica-
ção. E efte Senhor lhe pagará admittindo-a
aos feuscolloquios, que fem comparação al-
gua fão mais íuaves,honeftos,&proveitofos.E
por qu anto aPrelada, 6^ concede eftas licenças
eílá obrigada em confciencia a examinar fé a
cauíã he jufta,& a negallas não o fendo^he ne-
4ceíTario que a informe a fubdita cõ verdade,
& ííngelleza. De outro modo o engano fica có
a autora delle.
6 . He também de advertir, que como hu-
madas caufasdeftefair ao locutório coftuma
fer aiiepédencia dos feculares, para copias tá
*Da virtude da Caftidade. 2 4.9
15em do feeulo: deve a boa Rcligiofa cm mui
tas delias amar a pobreza, dcfamparo, & def-
valimento , £ fiarfe mais de Deos, que ufa
de eípecial providencia com os que fé lhe en-
tregáo, &tios diz no Evangelho: Bufcai pri
meiro o Reyno de Deos , Sc a virtude , &
tudo o mais fé vos dará de crefcença^ porque
muito bem fabe vofío Pae Celeftial , o de que
neceffitais.E faiba,qquem fuftenta, & honra
os Conventos , não ião as Freiras r iças , bem
aparentadas, & cortejadas : fenão as pobrefi-
nhasj que oráo, & chorlo, & obferváoa
fuá regra.
7. Náolea livros de comedias, novçllas,
& femelhantesprofanidades.Em quanto go-
ftar diílo faiba que o pàdar de feu eípirito eftá
corrupto , Sc eftragadoj como em algúas mu-
Jheres pejadas, que lhes pede o feu antojo co
mer cal,& can'ão , & outras peyores coufas.
Não vai longe defte penfamento S. Hierony-
mo , quando efcrevendo a S. Damafo Papa ,
& faltando das cafcas que o Pródigo dezejava
comer com os animaes immundos , diz que fé
pódern entender por eftas cafcas os verfos dos
Poetas profanos , a difcrição mundana , &
pompa de palavras rhetoricas ; que tudo he
manjar dos demónios. Se a peíToa pois tem
em feu poder efte cafcabulho entregue-o ao
fogo , ou desfaça-fe cklje para comprar livros
Os Jivros.que cqnvem à boa JUligiofa
í OU
г ¿o Tratado
( ou a qualqùer peífoa timorata ) Cío vidas de
Santos, Chronica« das Religiocns , Granada ,
Eufebio, Eílella, Avila , Palafox, Kempis,
Puente,Alonfo Rodriguez,& outrós femelhá.
tes. Porq em fim o 1er he converfar : & quaes
fio as petfoas com quem tratamos, taes os со-
ftumes , que aprendemos.
8. Náocuredecompofturas no traie, an*
res as abomine. V.g. hábitos muy novos, Se
fraldados como nos Rabinos , & Farifeos no-
tava ChriftoSenhor N. Dilatant phiUchriafuj:
alentos,que mais propriamente fe pode m cha
mar defmayos da pudicicia , & modeftia, que,
váo efpirando: finaes pórticos na face ; que o
fío manifeftos da vaidade , & efpirito ridi
culo de quem os traz : aguas odoriferas , &
balfamos apopléticos, que cheiráo mal nao sb
a Daos, fenáoaqualquer peíToa que tem o
bom olrato da prudencia : calcado muy jufto,
que por iíTomefmofe chegapara tnuypecca«
dor: & outras couías que enfada o profeguil-
Ias,& defedifica o trazellas. Ex hxbitn pr¿t{nm-
turpetfona : рг1о traje fe conjectura o efpirito
dapeffoa.S: a Religiofa,profeíTa fer Efpofa de
Chrifto, porque hade andar no feu tanto co
mo rameira ? Se o feu eftado he de defpreío
do mundo, porque ha de moibar que a efti*
ma? Para qheaarmaçio onde nao hade ha-
ver fefta/ Ou de que ferve o veo cobrindo
oroítrojfetudao mais ßo revelaçaen s , que
'• ■ / pubk
DavirtudedaCaflidade. 25a
publícSo о feu efpirito leviano , & fecular ?
9, Occupe-fe cm obras proprias do feu
eftado: porque a ocioiîdade he meftra da ma
licia: & a occupaçao em obra: inuteis ou no
civas talvez que feja peyorque acciofidade.
Os empregos que nao fáo proprios de huma
Religiofa, antes Ihe fáo nocivos , fáo о 1er
ruins livros, (como fica dito) o eferever vilhe*
tes amatorios, ou so de comprimentos imper-»
tinentesj ofrequentar a grade; ocenfervar
lá dentro amizades particulares ; vifitarfe no
meímo dia repetidas vezes fern neceffidade ■,
•Sccadavez que feencontráo nas officinas du
dormitorios , perguntarfe pela faude , como
fe vieflem de huma longa aufencia ; o fazer
doces , & confervas em notavel quantidade ,
para prefentes grandioíbs •, o gaftar quafi to
do o tempo, que tem de feu,em fazer curiofi-
dades de máos táo miudas , & impertinentes
que cegáo a vifta , & efperdicáo as horas; &
outras coufas femelhantes a eftas,de que nao
vamos aqui a fazer minuta,fenáo moftrar al-
guns exemplos. Pelo contrario os empregos
psoprios de huma verdadeira Religiofa , & de
que achara fruto nefta , & na ontra vida , fáo
obfervancia da regra , & eftilos da cafa , aín
da emrouías pequeñas jpontualidade no co
ro , & mais aétos de communidade , ouvir
Mifla,& a palavra de Déos, 1er livros devotos,
elidir ás.obrigacoens do of£cio,¡que. lhe iro-
¡•n ppz
«5* fratado
poz a obediência , fem querer fazer nelle ga-
ítos extraordinários com que não pôde ( por
que difto fé feguem graves inconvenientes ) j,
viíltar ,& fervir as enfermas; fugir de ran
chos, corrilhos , Sc parcialidades , & rumores
do feculo ; dar culto às imagens fagradas , &
a Deos as horas que puder no filencio da ora
ção; fazer penitencia conforme às fuás forças,
& à vocação do feu inftituto ; ajudar com
fiiffragios as almas do Purgatorio-,trabalhar na
nlmofada,ou no baílidor, & nas coufas neceí-
farias da cella. Eftas , & oucras occupaçoens
íèmelhantes de tal forte defterráo o ócio , que
edificáo o efpirko. ..
io. Finalmente, efcolha bom Confeílor;
porque defte depende muito a reforma de mu
lheres metidas cm claufura. £ fé a Ordem lho
não di C fupponhamos agora que affirn he
como cila murmura , & fé queixa ) bem poda
chamar algum outro , de eu já virtude, 8c dou
trina lhe confta ; fenão para abfolvella , ao
menos para tratar com el lê as coufas de fuá
direcção efpiritual •, que o primeiro bem po
dem , & convirá prohibirlho os Prelados,mas
o fegundo não he razão que o facão. Porém
advirta, que deveobedecerlhe , &ter nelle
fèjparaque Dsos concorra com feu rendimen
to. E fefentirappstitedevariardemeftre, &
multiplicar outros , faiba que he terrtacão da
demónio f o>: efcrapulo de malencolica,

Da v'trtude da Caflidadel г 53
ou impertinencia de mulher.

PERGUNTA XXVII.
Pdf ondefe conhecerkfe o amor que huma,
peßoa tem a outra he ejpmtual>&
puro -, ou impuro t & fen/uali
REfponde-fe,que a arvore fe conhece рае
los frutos ; & o efpirito pelas obras, O
primeiro final pois de nao íer o tal amor, &
communicaçâo, ou familiaridade pura , & es
piritual apontou S. Thomas, dizendo: Tenha- opufc
íe por certo q a atfeicáo qiie nao he puramcte 64,
por Déos, impede , ainda as peflbas virtuofas,
os exercicios de devocáo,caufando huma da-
nofa inquietacáo do penfamento na Oracáo
mental, & vocal.
O 2. apontou S. Boaventura , dizendo :
O amor carnal como faz feu proprio o que
ama ,& he efcaiïo, & defcortez, fente que
goze outrem о que poilue o noíTo coracáo,jul-
gando que fe lhe furta aquella parte do amor,
Ifto diz o S. Doutor: Por onde fe da tal com-,
municacáo fe origináo zelos, envejas,queixu-
mes, detraeçoens, & pendencias , certamente
he amor carnal : porque a cómunicacáo que
he no Efpirito Santo a todos abraça-,& quátos
mais;mais fe alegra. A vifla deíte defengano,
, , gue
2 ff Tratado
que diremos do eftilo, que o demonio intro-i
duzio em algnns Mofteyros, onde para huma
Religiolàfallaraalguerode tora he neteíTa-
rio q peca , & alcance primeiro lîcença da ou
tra com quem ella tinha correfpondencia > &
nao precedendo efte deípacho , fe tem por ca
fo de injuria digno de defempenho, & vin-
gançaf
О J fáo as palavras nimiamente temas,-
affectuofas , & rizonhas; efpecialmente ent
lances que nao pediáo racionavelmente tanto
//¿.5 . carinho. Porque como diffe Caffiodoro : Nao
£>*#. pode haver melhor calificacáo do cípirito,do
з,г, 4ue a qualidade das palavras bem examinada,
, O Filofofo diffe : Que fe a ovelha tem debai-
./''!' xo da lingua huma vea branca, o cordeiro que
Ub.de parlT (сх% kranco. & fe negra, negro. Efta vea
Anima que a]gumas Religiofas , & Religiofos tem
lio, o. debajxo ¿л lingua nao parece branca : logo o
amor que dentro tem concebido, tamben»
nao he puro,& candido. Negro amor he o que
nao fabe fallar fe nao mininiffes , imperti
nencias , & carinhos.
- O 4 he huma infaciavel ancia de eftar
femprecoma pefloa amada. Efte apontouo
illuminado Doutor Ioáo Gerfáo , oqual diz.'
O argumento que fe pode ter para conhecer
quandoeftas afteicpens nao fáo puramente
£ efpirituaes, he quando os que fe vem,& com-
municáo ,çcm tal uniUo de coraçoens , que
y nao
Da virtude da Caflidaâè. з ff
nao acértáo a delpedirfe , ainda que a noute
os defpida -, comotambem moftrar particula
res fentimentos ao aufentarfe : de forte que o
dia que fenáo vem , andáo trines , & íe pe««
dem fatisfaçoens , & zelos.
O 5 he recear teftemunhas defta af-
fiftcncia , & familiaridades porque nao fica
liberdade para as palavras , juguetes , &
leviandades, que a natureza tem concebí-■_ .,
das na fuá fenfualidade. Ouçamos a Sao "¡~.
Leandro Bifpo :Náo tenhas amizade particu- «j£ '**
lar com algúa apartando-te das outras. Saibáo otef- i
todas o que he bem que faiba huma. Attende c* °*-
ao que diz o Senhor: O que em particular vos
digOjdizeyo em publico: o que vos fallo ao ou-
vidojprègayonaspraças. Se he bora o que
fallas ; porque o ha de faber huma, & nao to
das ^ Se he máo , nem íe deve fallar,nem cui-?
dar, queteenvergonha que outras o faibáo.
Nao fe prefumebem, quando huma Religio-
fa fal la à puridade com outra, olhando para
todas as partes, q rao feja ouvida.Porque qu«
obra mal, diz o Senhor , aborrece a luz. Tu, ô
virgé,poriflb fallas em fegredo,porq nuotens
deq gloriarte. Porèm quando engañas os ou-
vidos , & olhos humanos, poderàs engañar a
Déos que tudo fabe? At aqui S. Leandro.
O 6 affinou S. Boaventura por eftas pa
lavras : He huma defordenada diffimulacáo, ^ : *
com que hua encobre as culpas da outra, efeu-
fando
if6 Tratado
lando cada qüal a fuá amiga , oil já para
com as companheiras, ou já para com a Pre
lada , iaindo à defenfa quando a reprehen^
de da falta , ou diminuindo fuá graveza ,
fe por fuá notoriedade fe nao pode Regar*Até
aqui o Santo. E daqui fe ve que foy acerca
da huma conftituicáo das Reiigiofas defcalçat
da GoHceiçâo, que ordena : Qjje quando húa
, Freirá fair em favor de outra, contra a Madre
Abbadeffa , ou Vigaria , q a reprehende , feja
privada do veo fem difpenfaçâo por tres dias.
O 7 he fazer gaftos em coufas íüperfíuas
para regalar a peffoa amada. Aqui he o con-
fumir as fuas tencas, & o trabalhar de áh , Se
<le noute por nao ficar inferiores ñas fígnifica-.
çoens da fineza de feu affecto, ou pontualida-
de do feu defempehho. Efte final apontou
S. Hieronymo. O amor fànto ( dizelie) nao
jnanda prefentes , nem eferitos amoroíbs
lencos , & toucadores , nem parte o bocado
«omooutro , nemlhe enxuga o fuor ; que
tudo ifto tem refabios de fenfuajidade. Eftas
fio palavras oefte grande Padre. E poriífo S.
Canal. carjos Borromeo prohibió feverameate as
mtdio- fms preiras f que na-0 mandaffem prefen*
.*f* ces aos Confeffores ,nem fe oceupaffem cm
nt. de fazer doces , 8t regalos para elles.
Мям- о 8 final ( ou para melhor dizer, efFeito
(ikUh claro) do amor impuro fáo algumas imagina-
çoeps impúdicas , & inquietaçoens dofexo,
que
Da virtude da Caßidade. г^у
que eftáo fazendo prompto o animo a bro
tar pelos fentidos em viñas , palavras , canti
gas, brincos demáos ; tudo fumos de Troya
que já arde , porque abrió a muralha ao ini-
migo bruto do feu appetite.
Nenhum dos fobreditos finaes quadra ao
amor efpiritual , o qual he caufado doEfpi-
rito Santo , & defta fonte participa ümpe га ,
liberdade, defintereíTe, quietaçâo , modeftia,
zeIodifcreto,& toda avircude. Peloquean-t
dáo muito engañados osquetem as íobredi-
tas amizades particulares por irreprehenfí-
veis, ou indifferentes; nao fendo na verdad«
«utracoufaque fenfualidade, deftruicáo dos
fantos exercicios , & caminho da perdicáo
eterna, tudo cuberto com a cegueira que cau-
fa o efpirito de trevas.

PERGUNTA XXVIIL
Com que conßderacoemfe perfuadirk hita
peßoa aje abfier de palavras torpes,
& defcompoßas í '. \
REÍponde-fc.Confidere primeiraméte co
mo o Aportólo S. Paulo nos foy dado pot
meilre,& forma de bons coftumes-,& para eftc
eríeito quiz Peo$ fe confervaffem na Igrejâ ifs
filas quatorze cartas, como Efcrituras cano¡»
nkas, & dianas de toda a atten^aojífe reípei-
■V R. eo¿
2 f8 Tratado
to , as quaes a mefma Igreja díflribue em li
ções nas Epiftolas daMiira,para íè lerê publica-
mête ao povo Chriftáo. Em húa carta pois fuá
nos diz aífim o Apoftolo :fom içaria ante;n , &
, r omnls immttndhiíí, aut avantiit nec nomlnetar in
f yobis , ficut decet (MÍÍOS; aut tmpitudo, aut flul-
>' *' tilorjHium^HtfcunilitiiSjqu* adrern non fertinet;
^' fed magis sY<tt'urnm ttctio : De coufas tocantes
ko fexto Mandamento , nem os nomes to
meis na boca ; porque aílim convém a homés
Chriftáos : nemobfcenidades,nem eftulticias,
nem chocarrilTes, que não tem propofito.' /ê-
não em lugar dillo louvar a Deos , & darlhe
graças. Ifto diz hú S. Paulo , ou para melhor
dizer, o EfpiritoSanto por elle.
2 . Coníidere que em quanto hú falia efías
deícompofturaSj o feu An/o fé afafta, & os de
mónios fé chegão ; affim como onde ha im-
múdicia, fogem as abelhas, & acodem as mof-
cas.Beelzebub quer dizerPrincepe das mofcasj
ps demónios pois, como mofcas cõ o feuPvin-
cépe Beelzebub folgão , & fé deleitáo, & con-
foláo com ouvir palavras immundas: porque
cada hú fé chega para o feu femelhante.
• ..^1. Confidere que f« lhe preíèntaílem na
fuá meia o pão , ou qualquer outro man
jar , em hum prato ou vazo que houvefle íèr-
yjdo em coufas que não fío para fé nomear,
quanto fé indignaria contra o feu criado pot
cftagroffaria&dcfattenção. E quem duvida
/a gue
3Drf -virtitâe âa Caftidade. i fp
£|ne mu ito mais reprehenfwelhe, que alingua
tlelni fiel } que ferve de patena ao verdadeiro
corpo de Chrifto, quando corhmimga,firvadâ
inftrurriento a palavras torpes, & indecentes?
4. Confulereque quem uiade (emethan-»
te linguagem,por mais que fé delculpe,dizen-«
do que lhe não enfra da boca para dentro , Sí
que hesò por rir > & paflar tempo j dá claro
indicio de que o fcu interior eftá corrupto*
Porque oráculo he de Chrifto Senhor M.que â
bocca falia conforme o de que abunda oco»
ração: EX ahimUantitt enhtt cordls os iot]tt!rttr:&t
outra vez diiTe: Qye do coração faetri os máos 12,34,
pénfameiitos: & claro he , q o que veyo à lin- &\et
gtia, primeiro efteve no penfamento: & ainda , «é
Seneca aíTentou »que o modo com que cada
hum falia he o traíladoou copia do ftu e 'piri
te : Imaty mentis fermo eft ; cjit.-t!!s v/Vj falis ord-
tle: Eporiífo o outro Filofofo querendo to- "/ tc*
mar noticia de hum difcipulo que lhe trazião, '?
dilfe ; Fallarriinino, para que te veja. Logo >ov*
quem he coftumado a fatiar defcompofturàs,
com q verdade aírírma,que lhe náoentráo no
coração < & fé até os íbnhos de hum adorrhe*
ciclo., Sc os delírios de hum frenético , fáo Or-»
dinariamente das coufas a q a natureza efta*
vá coftnmada: quanto mais fé conhecerá o
n^ffointeriovpélas palavras que proferimóí
efrandoern tiorlTo fizo , & liberdade f1 Verda-
pà-le liumíi^nificar de palavra al-
Rij guta
Tratado
guin mão defejo,& não ter o ta! dezejo; porq
mente ; ou ja&arfe também com mentira da
torpeza que não fez. Porém aquelle tal ou
qualpeccado,que cometteo dizendo a palavra
defcompofta,he certo que primeiro eiteve no
coração , & q fé náo acháo femelhantes ter
mos em pelToas tementes aDeos. Porq eftas
náo fazem matéria de rizo , do que à hora da
morte , & no ponto do juizo, fé lhe troque em
matéria de pranto : nem bufcáo em que paf.
faro tempo com perigo de patTar mal para A
eternidade : & conhecem que fé o Senhor nos
temavifado de que ha-de pedir conta até de
huma palavra ociofa; muito mais a pedirá das
palavras feyas,torpes , & efcandaloías.
5. Coníidere o efcandalo , ou dano efpiri-
tual, que eftas palavras caufaó nos que as ou
vem Porque ou fé confundem , & envergo-
nháo; & então ficâo avaliando por homem
nefcio , & mal criado a quem as diz : ou ref-
ponderapelomefmotom -, & então ficáoos
peccados alheyos carregando mais Ibbre o feu.
Lembrame a efte propoíito o que cfcrevc
Strabáo, que ha na índia hum género de fer-
pentes corri azas como de pergaminho , que
voando de noute facodern humas pingas de
fuor tão pcftifero, que onde caem caufaó cor*
rupcáe. Taes m. parecemos que entre con-
verfaçaõ folcáo palavra^, & chiftesdeícompo-
ftos; que fâo eftcs fcnáp pingas de fuor aíque-
roíi
Da virtude da Caßidade. гбг
rofiffimo,q onde caem, geräo maos penlâmé-
tos,& corrompem os coítumes dos ouvintesí E
feeftes fiogence dctenraidadc,acorrupcäo
he mais promp:a,3¿ mais certa; porque mini
nos fáo taboas razas onde o bem , & mal fe
pintáo fácilmente : pelo que mais refpe.ito íc
deve ter a hum minino, para nao fallar roins
palavras cm fuá prezença , do que a homens
de cans veneraveis : porque eftes fabemeo-
nhecer, & rtprovar o mal, & aquelles näo:ne-
ftecafo licaráquem fallou mal, temerofo de
acharr-preherfáo : naquelloutro ficará con
tente de achar imitadores. Por iílo diííe o Poe
ta Satyrico :
N/7 diera fedum , yijuque hxc limine Iuve-
tttn^dt nal.
Una c¡u4 puer efl ¡ SatyrA
"Maxima debetur futro reyertntia , fi- 1ал
quid
Тигре paras tnec tu pueri contempferis
amos,
Born exempta he S. Luis de Gonzaga, que
porque ouvio a gente livre femelhantes pala
vras, as dizia fem entender о que fignifica-
váo : & depois que o aviíáráo, aqui teve que
fentir , & de que accùfarfe toda a fua tida ,
fuppoítoque nunca mais as proferta.
6. Goníidere como Déos caftiga eñe pee-
cado.náo faltáo dilïo exemptas: porèm sb
hum apornarei> porque o foube por via certa.
Riij Tire
í (5 1 Trataâo ' •-?
Tive nos annos paíTados por filho de confi fl^o
hú fidalgo da Beira: o qual fainco pelo campai
em companhia de outros amigos, começou
hum deflçs a dizer algúas obfcenidades, Efte
como era pio,8fáe mayor idade lhe deu correc
ção, lcbrando- !ht q cftava diante de Deos, &
podia o Senhor naquelle mefmo ponto cha
mai io a juízo. Zombou o outro : porem poucw
mais adiante não o vendo os companheiros,
voltou hum delles a bufcallo, parecendo'Jhe
que em dobrando- hum cotovello de eftrada o
acharia. E verdade íoy que o achou ! porém
morto , & eíHrado , íem íinal algum de feri
da, ou mordedura, ou quedajOU acddente. De-
fte, & de outros muiços cafos notáveis } que
Jlíg fucçederáo tirou a tal peffoa grande defcn-
gano , & aborrecimenco do mundo : & fé me-«
teoReligiofa de S. Franciíco , fegujndo íúa
rlhulhçr o mefrho exemplo,
7. Finalmente eoniidere (& poderá fet
que eíte motivo fendo mais baixo que os
putros, obre melhor effeito)que o fatiar paUí
vras indecentes , não he de gente de honra;
fensío para marotos,& arrieirosAfuppoe falta
de criação, Sf mingua de juko. E tudoofo.
bredito fé entende não só das palavras mate-
fialrpente mgl foantes ,& impudicas ; fenáo
das quç encerráa, & inculcão figni-
pu çpnçeitptorfe? ainda «jue em fi o
-:
Da virtndt da Caßidaae. 263

' ÍERGUNTA XXIX. Í


iSé fo contra a virtude daCaßidade ou-
vir comedias i к... ■>

REfponde-fc que a foluçao defta per-


gunta i\e bem clara -, falvo para quera
<k propoiîto quizer fechar os olhos. Porque
afíim como lia herejes da Fè Catholica : aflim
tambcm os ha dos bons coftumes. Aquelles
negáo 03 dogmas , que nos enfina a Igreja :
eftes negáo os áiálames , que nos moftra a
razáo,& confirma á experiencias Ir à come
dia conhecendo nao fer coftume louvavel , he
ter corrupta a vontade , porèm o juizo ainda
fáo : mas ir à comedia , defendendo que nao
tem perigo , & reputando por nefeios , & fa-
tyros os que Iho acháo , ifto he ter corrupto
o entendimenco , & defte entendimento fe
pode fazer comedia. Já ouve monftro da es
pecie humana,que tinha o pefcoçp de tal forte
torcido, quei os olhas Ihe ficaváo para traz,
&o-toutiço para diänte. Taes parecem alguns
cacheros rríocos /patronos do pateo» & apo
lógicas do tablado .: os olhos da alma , que
fáoocBtendiméto,os eemvoltados de modo,
qqeaoprováo o máleomobem, de que fe fe«
gue¿ refutar o bem como таЦ .. j .1 ~. \ ■ . 1
bí^Sí Riiij Dif:
2бф Tratado
Dille por via de exemplo, Cavalberos mocar*
fe lito he o menos para laftimar. О. mais lie,
que tambem Sacerdotes , Religiofos , Se Ple
gadores velhos fáo monftros de pefcoço tor
cido. Porque que mayor monftruofidade , do,
que o Sacerdote deleitarle com a profanidaJe-
o Religiofo feguir о feculo , o Pregador abo?
nar a relaxaçâo, & o velho amar as verduras.
S¿ ja exemplo o fcguinte cafo. Certo Prega
dor zelofo da honra de Déos reprehenderá no
pulpito lniraudisrormidade que na comedia
fe tinha fe ico , faindo a bay lar a chacoyna
huma mulherzinlia que pouco antes no mef-
що aítj h¿era o papel de S. Catharina de Se
na. Na feguinte Dominga acodio ( como íe o
defafialTem ) -xuro Plegador velho, & autho-
rizado de certa Religiáo , & pondo-fe em
campo em favor das comedias , diffe que o re
prebéndelas erada Prègadores mocos -, &quc
militas coufas boas fe podiao aprender délias.
Eifaqui vemos o monftro de pefcoço torcido,
& olhos virados: logo veremos quaes íao eftas
cou fas boas q na comedia fe aprendem.Qyan
do íoube difte o Bifpo, que era D. Fr. Diogo
de Ycpesjda Ordern de S. Hieronymo,& Con-
feffor que tinha fide delRey D. Filippe I I.
mandón alquilar huma muía, & com hum
(criado lhe enviou adizerjönomefmoponto
íaiife do feu Bifpado , 2c defcuidaffe da Q¿ia-
refma, que lhe eftava eneoramendada em lula
Igreja
*Da virttiâe âa Caflidaâe. 1 6$
Igrcja principal ; porqae elle proveria. Affim
ie executou iem replica.
Envergonhemos agora о defenfado defta
eoniciencia em hum Religiofo fallando defde
o pulpito , com o timorato , & modefto de hu
ma gentiarecem convertida àFè deChrifto.
O Padre FelippeCuplet na hiftoria de D.Can
dida Senhorä China , & Chriftá , refere que
nunca feu filhoD. Baíllio pode confeguir dél
ia, que vifle as comedias, ou reprelentaçoens,
com que elle feftejava os feus annos : fendo
que eftas veprefentaçoens fáo honeftas, &
nao centèm mais que as vidas dos varoens il-
luflres que antiguamente floreceráo naquelle
Imperio : & as mulherestcm lugares repara
dos donde vem íem fer viñas. E diz mais o di
to Author , que as Chriftás nacjuellas partes,
i"azemefcrupulodebffiftir,& feaccufáo de-
fta curioíidade ao Confeffor.
Mas refpondendo direitamente à perguntà,
he femduvidaque o afliílir as comedias., do
modo que hoje feufáo,danifica, ou pelo me
nos arrifca a Caftidade.Porque o ^ordinaria
mente vemos nellas , fáo affumptos amato
rios reprefentados por mulheres mocas de
roim viver , bailes indecentes, tra/es defcom-
pollos ( & as vezes tranfpoftos , faindo a fe-
mea com vellidos de varáo ) affeâos lafcívos
metidos em verfo, para fe pregarem mais na
memoria, tonilhos , & farabandas muy pica
das,
Tratado.^- '
das, que parece as inventou o áiabo, gaJan.
teyos tecidos com tal arte fobre a trama da
,hiitoria, ou fabula, que a alma gofta domef-
mo veneno que eftà bebendo.
. Em fim o que hoje vemos , he o mermo
£ni termos que fé via nos tempos de S. João
. Chryíbíiomo , que faliando defta matéria
flont. • <Jiz a{Jirn: In theMro omnit r!fui , ineptitacío^tf-
OI.M -fjis (jitbolt j ejfitfiojcrifiium , tem/taris impendiu,
fofiu'., ^Hperflitorum drerttm carfmttptiifjtutl* cupldifr-
i tis indueiio .j adulrtril medirtttio , forn!c.ir!onis
gymn*[iiw , iateinferantia fcbola , turpltudínis
exlwtafto , inh?neft.ít!s exempla : No theatvO
tudoherizo, defpropofito, pompa do diabo,
"derramamento dos ícntidos , efperdico do
tempo, malogro dos dias fuperfluos : alli fé
acha a indução dos máos deíejos,a meditação
do adultério , a paleftra da luxuria, aeíco/a
da intéperanç.i , a exhortacão à torpeza , & os
exemplos da deshoneftidade. Ifto diz aquelk
S. Doutor. Vêj ao aqui os devotos que bellá
meditação, os mininos que efcola, os eftudátes
que aula, os ofticiass q modo de poupar o tem
po , Sc a fazenda; & todos, qjie coníelho , &
que exemplo. Serão eftas as muitas coufas
toas , que aquelle Pregador; velho dizia k
podiáo t irar das comedias í - • - -\
Se me dizem que os SS. Padres ( de quem
puderamos.trazer muitas ; Si ^raviíEmas au-
• dioridad«s fíalláo do Theaao gentílico, qn«
^fí l» cva
^Da virtude dá Caftidãde. 1 67
era rriais profano: refpontlo que dado}mas náo
concedido, quç delfe rallem, pouco importa ao
nolTo cafo efla differenca de nomes, hunu vez
que a náo ha nos coftumes, que elles rcpre-
hcndcm.Se nefta parte os Chriíláos precede
mos como os gentios , quem rt prova es gen
tios, porventura Icnvaos Chriíí aos < Sempre
•& contenda vem a reduzirfe a qucftáo de fa-
cic: íe p,iíía , ou não psfla «'fl:m na verda
de :'& queftoensde íaÔonão íe decidem por
razoer.s , fumo pr r villa de olhos ,;c.u credito
tie bcas ttlknninhas.Seique o Vc neravel Pre-
•jtdo D. Li:is Ciefpi de Eoija Bifpo de Ori-
£uela,& de Plccer.cia, da r.ctfa Congregação
•t'o Otíitorio , Vai ao sciediudo em letras,
•& virtudes , íc rr.pie ííí imcu , & piègou fer
illicito o ulo das comedias do modo que fc
fazem cm Hcfpriha. Mas por quanto em hu-
ma junta one fobe eíta matéria fé fez em
Vaknça,úílinou cem outros ler licicd debai
xo de certas modificaçoens, que alli fé aponta
rão ; & depois efte papel feimprimio fem el-
las : elle chegando-lhe o dito papel á mão fç
retratou logo diante de hum Notário, & im-
primioefta retraâação, anullando pelo teor
delia fuá primeira firma, & proteftando eftar
rã fentencade que náo eráo licitas as come
dias: & que fendo pra&icamenre impoíTivel
emendarem-le com as ditas modificaçoens ,
ttftava unicamente o jemedio de prohibilas.
*. - .. *. 4 _. .
Bis
l6S Tratado.
Eifaqui teftemunha quaiificada , que e'epoera
Jo facto , & del к conclue a refpofta á noffa
pergunta* Comque nao tenho para que prole-'
guirnella.
Sóadvirtoquc dado que das comedias íe
poíTáo tirar algumas coufas boas, nao fe infe
re bem daqui que as comedias fáo boas , &
nao corre nellas perigo a Caflidade. Por
que fe efta confequencia he legitima , tam-
bemoferáoeftoutras. Do andarem os Mon
jes, & Religiofas p^Us ruas da Cidade, pó-
dem tirar ronhecimento das vaidades do mu.
do,& eftima da fuá vocacáo. Andern logo
os Monjes , & Freiras pelas ruas da Cidade.
Do 1er livros de Herejes podemos tirar noticia
dos feus embuftes , & falfidades , & confir
marnos na verdade de nolTa Santa Fè Catho
lics. He logo bom confelho que nos pon/ia-
mos a 1er livros de Herejes. De fe coftumar
Mithridates a comer peçonha defde piqueno
tirou o nao Ihe fazer mal , & ficar impenetra-
vel por efta parte as traiçoens de feus ínimi-
gos. Será logo bom que os Reys fe cofturnera
a comer peçonha.Do eropregar S. Nono Bifpo
osolliosem Pelagia mulher mundana, que
hiapaíTando muy énfeiuda , tirou compun-
cao, & conhecimento do pouco que elle eflu-
dava em agradar a Déos , procurando aquella
mulher agradar tanto aos homens. Logo ca
daver que pallar huma mulher femcllwnte,
lera
Da virtuâe da Caßidade. 269
fera bom ir feguindoa com os olhos. De con-
fíiltarS. Cipriano Mago ao demonio , & oa-
virlhedizer que elle nao podia fazer o mal
que fe procuiava a S.Juftina, porque adorava
a Chriltocom eípirito, & verdade, tirou e
deixar fuas más artes, &cóverterfe á Fè.Logo
ferá bom fallar com o demo nio.E defies ab-
furdos podíamos inferir inu meraveis. Poique
nao ha mal algum de qfenáo poíTa feguir algú
bem.Bem fe moftra logo , que para htama
peffoa obrar prudentemente,náo baila que fe
Jhe figa algum bemtla obra que faz,ou q nella
ache alguns proveitos: porque le os danos fo-
rem mayores,o demonio he que fíca de ganho,
& nos perdendo. Que importa pois que tire-
ftiDS da comedia o divertimento da melanco
lía , a noticia das hiftorias , os termos da elo
cuencia , ou urban idade : fe por outra parte
aüi perdemos a raodeftia,a devocáo,a Cafti-
dade,o tempo neceffario para coufas ferias,
& o eípirito evangélico; & vimos dalli todos
repaflados em eípirito mundano , & affeábp
a eftas coufas vifiveis , & caducas ?
Poièm fallando últimamente com os an
tros, que canhecem o daño , mas nao deixáo
de o bufcar ; & tem o juizo íao, aínda que te-
nháo eftragado o appetite; quando ouvirem
referir nos pulpitos como hum Herodes of-
ferecia ametade do feu Reyno, & com effeito
éta a cabeça do Bautiftá pelo bayle de huma
mucha«
ifo Tratado
muchacha defenvolta, nao feeípanterH defté
arrojo , tendo-o por accáo feita íobre meza :
& crueldade influida pelo demonjo.porq ( liip-
poíto que affina foy)náo me poderàô negar
comoCatholicos, que o agrado de Déos val
mais que a cabeça do Sautilla*, & o perigo da
alma , mais que ametade de humReyno, Se
que muitos Reynos , & muitos mundos: cora'
tudo elTe agrado de Déos , eíTe riíco da alma
otrocáo fácilmente pelo bayle de outras mu
flieres. Mas a raiz do feu mal eftà em que tem
olhos so de carne,& eítes fabé ver o bayle, $c
a comedia , & nao fabem ver cite defagrado
de Déos, & efte rifeo das fuas almas .

PER G UN TA XXX.
Se o que defejafer caflo deve fugir livrai
amatorios , pinturas obj'cenas , mtificas
lafeivas , сheiros dtlietofos, Caraos , &
bailes onde entrâo muíheres i
REfponde-fe que fem duvida alguma to
das eftas coufas fazem grande eftrago
na Caftidade : & fáo humas como eminen
cias, ondeo efpirito da fenfualidade aceita
a iba artilharia groíla , para bater os muros
da Cidade de Déos , que he a nolfa alma. Б
forillo os Santos ,procuraváo fempre re fguar-*
... -.4 dar
Da virtude da Caßidade. yj\
dar o coracao , & Temidos de tudo o que os
deJeita , & conlöla ; porque fabiáoque a car
ne, fe condefcendemos com ella era algumas
licenças, vem logo pedindo outras mayores;
& do licito paíTa a demandar o illicito ; & das
venialidades efcorrega fácilmente no peccado
mortal.
Contra os Ihros amatorios.
Primeiramenre os livros que tratáo de mate
rias pouco honeftas , ainda que fallem com
cftyllo ornado , & palavras comportas , fem-
pre incukáo coufas torpes , & geráo na fanta-
zia , & coracáo penfamentos , & defejos in*
dignos da prefcnça de Déos, que os eftà ven-
do : & fazem que goftando o Jeytor da fabu
la , queira goftar da realidade ; & celebrando,
o concertó difcreto, fe lembrç melhor da im
pureza nelle fignificada. E alíirn com xazîd
diíTe hum Author grave, que a propria biblio».
theca de femelhantes livros he huma foguei-
ra> ou diamine aceza : Conyenientlfslma ctf- Ф
cams libris bibliotheca camitms eflx aut roçus. £ 7 ', ,
nefta colocarlo fuasmefmas obras muyeos,« ЬевГ-
quemcegouo demonio & o amor proprio, ^
guando as compuzèrjo., & allumiou a graça * •
divina quando arrepe ndidos as abrazàrao.Tal
foy hußernardino Realino,que efcreveo febre
Çatullo de Kuptijsfelei , &Tbetidls: mas
de poes redufindo-fe ao caminho da verdade
fez quanta,s diligencias, pode por recolher os •
• 'f livros ',
Tratado
livros , & os condenou a fogo : & os qu e n5o
pode haver á mão , dizia que tomara ap«tga l los
com feu próprio fangue. O mefmo fizerão Pi
co Mirandolano , Francifco Petrarca, Pedro
Bembo , Torcato TalTo , & Gelar de Buz ,
cuja converfáo começou por outra femelhan-
te queima , & lhe chamarão o cego com vifta,
porque carecendo da corporal ,gofavada efpi-
ritual em contemplação muy alta. ECatha-
rinonofeu opufculo Dt libris malis exretml-
VAndls , diz que na fuá pa:ria,fendo elle mini-
no , coftumavãoosbons Pregadores incitar o
povoafazereftecadafalfo.dos máos livros:
& juntas grandes rimas delles os arreraeca-
váo n* fogueira cm holocaufto /iiave fana
Deos.
Melhor era arderem os livros do que c»
Jeytores; aqui nas chamas da concupiscência ,
& depões nas do inferno , ou purgatório. E
também a provekaria efta queima, para na o
arderem ai li tanto feus authores;porc\ue(cpn-
forme a fentença de graves Theologos com
l» S- ^fi^0? & & comprova de hum exemplo que
logo referiremos ) oefcandaloque vai conti-
nuancfo cá na terra, caufa no outro mundo
„,>. às almas que o dèráo novqs augmentos de pç-
Gerfott na , ainda que accidental , & tranfeunte.
Tract, Aquelle roes que deíèja fer amigo da Ca-
ftidade, feia-o tamb m d; livros úteis ,&
pios,&dosqn€ComeçãoporS, cjmo.dizií
meu
3)a virtude da Caftidade. f 7$
tneu 'P."S. FelippeNeri,que iãoastíbrasque t;um $
compuzerão os Santos , ou as íúas vidas. ^ / '
Eftcs à hora que rijais quizer , & dentro do $r'[ef
íeuapofento, lhe enfinárão as verdades , & Q?
lhe.'curarão as infirmidades occultas de fuá
ajrria. Contáo Eneas Sylvio , & António
PAnçrmitano , que El-Rey D. Affonfo o Sá-
(aio , achando-fe doente em Capua, rtcebeo
grande recrearão de efpirito com a lijâo de
Quinto Curílo. E, como defde então começou n^ i~y
a melhorar , dizia: Vafe embora Avicena,.&, lt7
mais Hipocrates , 8c venha Curíiq rdílaura- >*.-jv»l
dor da minha íaude. Com quanta mais razão
gòdehum Chriftão dizer: ,Vafe çrrj^oya Ou-
víÁiodeArtc tmandi , & Tlballp, & muitas.
coufas de Marcial , Sc Juvenal , & Heliodero K!ce~
gue antes quiz fer depoílo do fei} Billpado , pb*r* /.
do que reprovar o feu Theagenesj yão-ie em- u. c.
laprà outros mais-modernos, Sc vulgares , que 54»
não nomeyo pelos não inculcar ; .& -ainda
Guvfio: & venha o Fios Sanftonim,o Vitas Pa-
trum , o Prado eifpiritual •, venháo as obras de
S.Thereza , os foliloquios de S.Agoílinho, o
Kempis , 8c o Granada j Venha o Evangelho de
.Nqílo Senhor JESU Chrifto , verdadeiro rer
da noffa &u<k.
- . '
_Contra AS-:.pintam ,, -
: : oífceiuf.
s deshoneftas ;
1 ..v • ape catííao gruviffifeios danos da СаШсШе,г
¿j ■ efrufaprovarfecomauthoridadcsj&íazóéiWj
.. ,. wfobrand&ejfperi encías. Refiramos afgúmaVj
.л , ч. tíñele junfalmtiifte fe уё o daño -¿i- duTpás '% ',sSá
T_ , o da pení/Sí'-Profpero te'ftifica huméafó> pü-
.'. . e bÜcindYcetempoi de foMtonoça Ar'abe^de
в""Г nâçao , $ quetraßa habítd de beata ,па^»а1
5'°. /í_ vendtsnobanhbhüjÉVAíftáttía-deVenlia^ukio
£?'?£• em'pecca&y¿& IbgodUemonio Jhéapértóuá
»■1v" ' gargaritó?d¿ -modo1, que fëflenta dias náb pode
, eom^rptfem beber coitf/algtima. O P. Será*
Inc'6* rio,;-inhghe^ieolo*oppißtivo <?á CoiFpanhia
"Tob'tj tr-áí de HuñYíbldadd -, que Vendo na eftátageiü
&*/"«- WmaJ>mtüra provocativa aomaJ, acomprou
c«/.í20 áoÍioTpe%tí i&ao1 dcTpeftdtrfala da parede ,
,*v',' para а enrolar , & íevar-eoniigo', km derail
•■ ••*•' niódelrnpfoviío atiroucbrfrélle ao chao com
--•--■ tal impeíó', que logo oarrebenteu. ' " f -■
•■K' 2 -Mais moderno, aindá'que nao táodefgra-
Koa, no cade; Uéx, cafo que refere fr. Jofeph'dejESUS
tratado MÀRI.AjGarmelitâdéfc'aiio; Fizera hu-ptotet
do ítor-^ñ retabillo para a Igrejaí &> morreo deixando
&ttmo''^afk MiíTas o p'reçoda obrâl'Sua alma appare*
ceo-depoesaOutroRéligioío da mefma Or
dern cormecido defte que o refere : & Ihedif-
fe como fora ecufada no tremendo Juizo ¿t
Dcos , pelo cargo de muitas almas, que Fe"
naváo no'Trifernopor ocçàfiâo de huma fu*
pintura desiionefta. E que vendo-fe nefte ter*
hbilffimo aperto , attíiirle muitös SäticM
- .J ü alie-
Va virt&deda Caßidaai. zjf
állüggjido'quetinhafeUQ penitencia , &pin-
çadofuas imagen? ,&; ¡epm iffo grarigeado ve-
jieraçâo.a Deas, &4ecóio aos lugares omie he
juàpxsào , pelo c{t pjhe.rçgavéoufaifc de cle
mencia : & que fr+andára о $enhor que foffe
depofitadono Purgatorio, em quanta íe nao,
queirqava a tal pintura obíccna. Vtnho ago
ra à. pedirte ( aç*eiccntpu a alma .) avjfès a
Fulano , que aquejme logo ; lern final da ver»
dadç Ihe morretaó dons filhos dentro defte
jrnç?.: & elle rambem , (e náp, obedecer, os
ieguirà brevemente. Avilada aquella y-illba,
queimqu o painel «jCtHnpriofe o final da mor
te dps filhos;fe¿ penitencia, &fatisfcz nú-
dando pintar Imagens de S:¡t^toíji2tUn;ir ■
Çonfidercni agora fe deyem temer; cite
juiz.o ios Scnhorçft fc -&; cavalí^r^ j.que, con-
.íerváqnas fuas galavias , & falasyj& ttazem
na^popas das fuas caijeges, &,feges,íeíne lian
tes pinturas efçandalofas. He poffivel que nao
ЪаОа;)а noiîa.depravaçao fer çada^um mao
par* fi., fe tambem riáo for maa para osou-
;trqs ; Ыаэ baila cometer o peccado á ¡ante devs
4>U}QS:de Deps j fenáp, que badecfc,imar> &
cppfervar a1fprraa(,'.&. e frampa, ,4e,lje dian-
,t£;dQSolhos dpsbqrnens ? Já queífomospec-
-cadores,nápteremp5ao menos yergonha de
, ppublicar i. O no.ffp deliftp hpde, fer/^ometi-
vdo, & demais arojai^hade fej- pregado: fecca-,
t tWÍuwquj§SiQfopi¿ p-<tdka-vtjunt {. JHadç fx
M Sij hum
hum fidalgonafua calége^aíTeflndorSí1 âkC-
de a popa delia , ccmo íe fora dç huma'náo-de
guerra, ha de. ir difparando tiros d&eícanddloj
•a quantos empregarem alH os olhos? Nãòta-
íta a defcompoftura qiie facilitaram os retiros
do apofento :. fefiáo que hade tftar a imagfem
delia erri vúkòs de jafpe,ou alabaftro , exp<>-
fta ("obre osljofetes,& guardaíròupas? Grande
miferia /-Grande efquccimento de Deos,&
defprefoáoqiièçlle tanto eftima, que laõas
almas; porqÉiem deu o fangiãe^ & a vida em
humaOrBzT* '"'
Oh. ('-refpóhder á algú com grande paz <fe
cofaçáo:)Náoo fa^opeiaipintura fer pouco
honefta;maspefo afce ptihjõrõíà com que éfli
feita, SpoFfer deta! ou tal rnão afamada,
& pele exoeíEVopreço,qtie cuftou a meus ante
fiaíTadòy.Poes, meu Príncèpe , porque razão
não eftima a fuá alma & as de íeus próximos,
íêndo 1magehs!vivas dáSàhtifllma Trindade,
feitas pek arte de Dtíos Pádre^ que he o Ver
bo divino í1 Há couià mais feYmofa nefte
mundo-, que húa alma ettí graça de Deos ; oa
coufa maisfeya > & horrenda que huma alma
em peccaáo mortaKLago fe eftima tanto efta
pintura, ou eftatua, porque ftè fermofa : como
Jhenáo parecem mal eftòfitràs imagens, f&t-
do táo teyas ?''£• íe áqueMa a're(guarda do^ó ,
e ftou trás porque as cobre de inimundicia*? E
fé confsrva a pintum já de tempos ãntig*»,
v -^ por
'Da virtvde da Castidade, j 7 f
|x>fqiie não coníerva a alma e$n graça, fé quer • . _
A<jè á feguinte. confiíTão ? A calo fera porque a
pintura cuftou muitos cruíãdos:& a fuá alma
pwftou todo o fangue de jESUChriftoí Ora já
que t^m magoa de queimar ,a pintura , por
que cuftou o feu dinheiro ,; julUficado eftá
efte Senhor fé lhe queimar a alma , náoob»
ílante que cuftou o feu fangue.
• • ' (\ >rp'ií «L -• . - •
Contra as mufcas lafchv.
.','..
Quanto às muíicas do tempo tarribern he grá- •
de o detrimento que nel Ias padece aCaftjda-
de. Porque aílim como o canro grave, & de
voto ajudaa levantar o efpirito gerando nel-
lê bons penfamentos^raudades^fpatriaCer;
leftial; & por ido íe ufa nas Igrejas entre o«,
divinos officios: aflimas farabandas ^St mo
dos muy feftivos, & picados , q diftrahem ,
atfeminão, & corrompem ; & por i(Tq fé u fa
nas comedias , nas, ceasnupeiaes , & nas mu-
ficas, & difcantes dos que de noute fazem pé
de janella para os fins. ,com que à mocidade 95
inquieta. Mas prouyera a Deos, que deites !UT
gares não tivera já paliado algúacoufitam-.
bem às Igrejas, • v ^^.j.^, y '.' \ f
Seayoz-jiç de mulher, ainda traz mayor, J
pçr.igo.S. Leão Papa chama atreiçoados aos*'.
ÍÊHS q'icbros,& gargantas,£.brandas;pijnha- le>""'
^Jas,com,que:atraveira o corajíade quem """
CK1J3 '
278 - *l ':lrbétW----'?
Kt^Jn ouve aefc«iÖa*Ä S. Gregorio Nazi^ènofcKâ"*
Tetr. и. mallie cañtoMe Sereáá /; qité catrfa cerro nau¿
j 7. fragio. S. Ambrbfio;itíaHdo da mefma fábula
avifa que he n¿ct(íario tapar bs ouvidosj'ceffló
UlylTes feza'iíeus cómpánheiros cons ceYa-, ai
atado bem ä^truz, como elle.ao mallro da
пал. S. Ghryfoftomolhediama pefte que
у*У- inflamma о incerdio da eoncupifcenciá. Ö
¡0ß* _ Anchor do liyro Deßngularttare Clericorum.
Нот /»affirma, qùe máís tüleravél heoàvir os fil-
°9*<n vos de hum bafilifco. Por iffo as que tern war
1Лл"^' to mentricíódéfejaó aprender mufica/pärai
combatercm os ánimos -com armas dobradas¿
pelos oJhos y & pelos ouvidos". .-i.v»
Daqui ^e entenderá quam reprehenfíve(
abufo íeja*o de algumas Religiofas , qué;
ájuntarido*fe na grade ém vifica com fécula?
res ', gaftába tarde eiri motetes , & chaca-'
ras , &J_- difeantes , bftëntândb cada huriiá
à fuá habiWdade. Seguérn-fe as lifónjáS '\
& app'iuifos , & rizadas, & diferiçoeni
concéitueías , où eftultieias vérdadeiras. Se
éfta mufica de-vozes de mulheres , cheasde
melindre, & affcétacáb Faz confonancia coin.
fi modeftia, & honeftidade propria daqnelle
. > . ¿foto ,& eftaip, na verladene milito para
л , nos maraV-lharmos i & sámente ferá necelía-
.'^b\rioirivent:ármos outras definiçoens as vírtú-i
_.'\( ^desVPorernifeíáz^iflónañcia com' ellas» ve*
/ jlolá os PrelatiosiSj Preladas cortto« confert*
Va virtufó âal&aBidade. ¿79
áiarcm.
Outfo máo ufo vempsbneib<:-£idade de
Lisbca, muy perniciofo aos ouvidos caftos , &
*a inda (nais aos que nao ferem caüosíque.íáp
30s Dnados de iignifiçaçao torpiffima, metidos
cada hum em (ua-içroya ,¡ que os rooççs catt-
■tápdenoute pela§.ruas. .^embrame oque о
Д£*,£*& infigne Martyr Marcello Maftril- ?и~
rie da Companhia 4e, 1£§Д§! i^fë^ em '1Ц- ' «o i
Ли carta fuá , de Ьцгвсепр genero de armas
■q-ufi ufáp os Moilros Ade Mindanao- ( he hú-»1 •' u
¿naj tíha'das onzç jnU Filippiças,)>• Sciáo - ■••}
Jíumas fettas n^y pcqutninasr&miiídijs .a -il
quecharaáo fompites. Atiráo-fe com ,e-Í0- .í ; ,\
■pro por efgravatanas, : & ondç fe pregá>, \-0
Чгрщр fáo hervadas,auçapcertamenK,feïpgp
.fe- nao acode corn contra-peçonha. Tacs me
.^ajrecemeítas cantigas de que vou fallando.
JSsp;Jîfçv£s., ф ,_hejyadas com 0 cpnceifp." r'v-.ï
Jafcïvo que eñfetráo : atiráo-fe £ргл o,foprp .^1 ,\
-ФЧг-'àlCnto-dà volque; canta : .pregáo-fe na
jnemoria pelo conloante do verfo^fcörro«»-
феш.р cpracáo pelo mal a.q p. pogQc^. lift-1 •Й1гЧ
ipQrw$?9Ís<luC íar!t0 ;fl4e a peflba-, cfuvjsVíks?^ ^
je%çaMatanasat\r^r çô .¡eftesrVjejicÁftfcscíbmj-
;p.iïÇS>Jpgplûgp tape.ps euvidps. ',& nápqncjr
jra. entender o fim аадгога^ле ajli eiU cl ,hW-
vadd 4е11й«':СХсюас,^о...а fetta. #.епдоиь
-с<*#ещ; acudir ар eoppvgnertp 4de, aJg.u¡$
р.ла- Siiij atte
i8o ■-'■ Tratadv
»ftp ele amor dç Dtos, ou verib devote, Se plot

: -Cintra os cbeim ¿ffem'tndtios.

Qyanto aos eheíros: os delicados , & brandoa


nao ten* boa opiniáo aínda entre os Authores
Ethnicos , quanto mais para cornos Santos
Padres. Séneca dille . que no corpo o me«>
MhiH Jhor cheiro era nenhñ : Opt¡mus odor in wpo*
jog' re'eHnullus, Marcial picou a hum duendo
" que Ihe náocheirava ber» que fempre chei«
lib. X, rafTe ]эет . fgßbuMg по» Уем 0\tt , qui hem
*\>ЧГ* femper oler. Plinio fente j que efte he hurt
,J" dos luxos mais fuperfluos : Нлс eß marerù
/. aj. luxas è cunÛls maxime fupervacur, О Era«
c.¡. peradorVeípafiano,vindohum moço a ren-
derlhe graças pelo haver defpachado com hó
lugar honrofo , reparou que os vertidos re«
cendilo : & recolhendo a provifáo Ihe dií-
smon.fe defgöftado ; Mais tomara que me cheiraC«
»•I0- ièisaaHios. - -
Que diráb logo os Santos Padres ? O Chñ*
ftáo ( diz Chryfoftomo ) deve cheirar a vitttw
Нот. i áes j & nao a ungüentos : & nao ha final mais
ft lacerto de fer a alma fordida, do que andar em
•tíñrfb chekofo : ■' Te veri non oportet olere u«*
•guéntam , fed¡pirare virtúferñ : nihil immmMús
lanimi^íjuotíts corpus tdlem habet frapantiam. S,
цДтЬгоПо diz que o cheirar bem -he de home
¡ащгЬСщоа jpara теЦгф diterjflao he de f«í-
'•■" t« ¡ --' . pjem
Da virtude da Caßidade. г &г
tnem : Zuxuriofi hominis , yet potius n»n homi- Incdp,
vis , eß olere ungtten/um. ES, Gregorio Nif- 7.
feno enfina*, qpelo olfato attrahindoos háü- Luc, \
tos cheiroiös , fe inficiona о hörnern interior
com mayores vicios, do que fácilmente fe
pode entender: Нлпит dfafiu ,& attractu va- Ördt,,
forum , ma?nis virus , (\ил\'ы сощеВпгл ejuis j,He
facile aßequi поп ¡wfßr у bominem inßcere inte- fyfurr,
riorem.
Para pena deftas delicias he feito o tanque ,' :
de enxofre no inferno: & a corrupçao dos ror- ■ - .,
pos condenados fera tal , que fe qualquer del- 15
les afpareceiîe fobre a terra, baftaria para a*
cender pefte: De cddaverihus eorum фепаег fa- /fa*'.■ -
tor( diz Ifaias ) : Dos feus corpos , que mais 34. J.
propriamente fáo cadáveres , exhalará o fedor } *5
"írrfpportavel, Е eifaqui em que fe tornaráo as ~\
' aguas odoríferas , os aromas peregrinos, as
• confeiçoens preciofas , os ungüentos fuaves ,
os ambares , algalias , polvilhos , balfamos1,
& perfumes. Era jufto que a pena eorrefpón"
"deiTe à culpa ; & que fe contrapefaffe em torV
ineptos } o que fe earregou em delici as, : ' ^
•• ''j ' ■ ' fi *'j ■ • i-, • ' э:>

r ' •!• ... • '■■


Contu es :íayles,
,:■ ... ■ • :.!
A'iflda eftes fáó mais arrifeados dofjoscheí-
rós , quanto no movimento dos membros
leváó mais o féntido do tacto, queche mais
gíofleiroi
- ■■•: A &ehegadoà bratalidade,'Ouçamo*s
OVp-
•ïU* ,«íV; >Д- gratado
.<,, (\ о voto dos Santos. Padres, que fáo os meftrce
- 4osbons,-cpflunie3.§.Bafilioíf7Ví лс femin*
Howl. communes coiifiituentes choras , maloque Axrftar
1 4« ¿e ni miferds tridentes anima fe[t invkem Ubidir
Ebri- mm teHs confodiunt , atquffacerant : Dancas
ttfe, ¿е homens, & mulheres juntamente he o
&{u~ mefmoqueentregaremhuns,& outros fuas
**> - miferaveisalfiias яо, demonio, &atraveíra,-
• ' remfecon íácas do libidinofo appetite. Leafe
T-t o q o S. Doütör.alli pröfegue,fázendo inveóti-
j P" va contiaefte máocqftume. S. Ambrofio alle-
• -,/Г"^а,& approva a fentença de hú que dizia:Que
5""'* o faltar «a so para duas caftas de pelToaf,
Тгя8< ebrios ,&doudos; Пето ]Á tat fobius, n$
Je Lu- qui inJMiit, S. Efrem chama aos bayle-V.?1^
\dicrit rija dos demonios, &triftezados Anjos Япг
cbrif. 'geloru trißiti*, & diaboli feßum£) qu ; Le C#
tia.no. та сб hú ejemplo , q anda na.yida de S.EÍje-
fugitd. váoBiipoPienfe, em que foráo viftos os de
monios andar cambem na dança , afervora
ndo a fefta, Porèm. o mayor exéplo que fe pode
jtrazer em abominacáodos bay les he o de Щ-
rodes,que pelo de hua muchacha enlcuquccfio
de modo , que cffereceo por elle mëyo Rey-
no, & com eCeitpdeuoquei valia mais que
muitos Reynos, a cabeça do Sagrado Bautifta.
JE do fobredito fe V^qra'quancâ razio aEl ji-
«to Santo nos amonita рф Ecclefi^co; que
-náofrequenteníos,baylí(S;<>ade.entTáoímulhe-
aes,fenáp/jneremo?quj,.a.ípr.sa-dje (eus gdb»
& tai"
<Dd virtttde da Cafiidade. 18£
•èc meYíeyosnósarruinem: Cinnfahatricene ф Жсс!',
ßAmsfis ; ne forte penas in efficacU illiui. . "j ç,fy
t.: ..- ■ . •'• ,;■ ■'.: ■ <~ - " '■■■, Г \ „t

: ÇERGUNTA XXXI.
Se nofer efpalhado de olhos , & muy fa
cti emfallar¡pode correrperigo a -,
• •!■• .-■•••'■ Caßidadei'.. /

^ olhos
Eíponde-le
podeíeprovar
qfim. Equanto
pelas feguintes
à licença do$
ra

ices i.Poiq oElpirito Sato diz pelo Eccleííaíli*


coque : Fornicario maliens in eXtottentiä (Ala.- ^c''»
•flat explica : In volatibtts , in jatlibiis ) ocuio- г 6»
lorum , & in palpebris illius agriifeew: Ä luxu* I z»
íia da mulher fe; conliece no levantar dos
olhos, & nainquietacáOj& arremeçoddlesi
1 z. Porque quem nao líe fiel nbpoüco,tam*
bem o nao fera no muito , como dizso Evan-»
gelho. Logo fe o efpiritb fe nao refrea Щ
deleite de ver coufas varias, vans , 8c ai- loan,
•fiofas , indicio dá de que nao repugna a ou> !$»•!
tros mais poderofos attráótivos do fentido ei
do tado. Porque cada fentido tem fuá efpe*
cial luxuria no gcíb do objecto que lhe toca i
& oefpirito mortificadfcem todos effestem
perfeita continencias -S ' "' ■-'• ■■ cv':f»
$. Porque !d que nSôrecolhe' a vïftâ, mal
pode recolhere -coracáo ; falvo for*-pc'iloù
284 Tratado
muy proveSa em virtude , & que de nece&
., . . fidade trata com muytos : & ainda cites pa-
decem as vezesniíTo detrimento; pois hum
S. Hieronymo confefta de fi , que nem as
lagrimas copiofas de compunçao, nem as
penitencias rigidiffimas podiáo apagar as
imagens que beberá pelos olhos , vendo as
donzellas Romanas, fuas danças, enfeites , &
vaidades. E havendo no mundo tantos encon-
tros perigofos , tanto fubir a morte pelas ja-
nellas-,quem nao for coftumado à preferí ça-^e
Déos , & oraçao fréquente ( a quai logo ptitfa
para dentro pelos olhos , & os abate) moftra,
que ou nao reconhece eftes perigos, ou os def-
preza, porque nao craz guerra contra a^ ten«
taçDens. E hüa , & outra coufa he final , que
nao cuida muito da Caftidade : affim como,
quem nao guardaffe huma joya entre muí ta
gente deíconhecida »final feria de que ou nao
conheciao feu valor» ou nao fe Ihe dava de a
perder: pois porque o Santo Job íe lhe dava de
» a perder,por iílo recatava os o\l\ouVe//igi falit's
Ioí.^l <»m octtl'ts meh,ut ne cogita e (¡uldem áe yirgWm
S+ 4. Porque os Santos , que floreceráo era
Caftidade , eráo mortificados navifta. S, Joatf
Evangelifta appareçendq a hum feu devoto
eom inexpliçayel reíplandor & fermofura nos
olhos, lhe diíTe, Que era. pr-e-rnio de fe nao har
ver atrevido abyantaHos, para ver^oroftrode
MARIA SajitiffimaSeálx^a ¡Ñcfla * #F. 3U*
v -•.•' trata-
*Da virtnâe da Caftidadel »8f
tratava,& em cuja dulciflima côpanhiavi-
тк. S. Pedro de Alcantara morou tres ar.nos
©m hum Convento, lèm conhecer a Religio« Ï3X
fcalgummais que pela voz, nem faber onde
eftaváo as officinas da cafa. E diz S. Therefa ,
que ifto Ihe afrirmou o Santo, acrecentando,
que para elle ja ö ver, & nao ver eráo p
rncfmo. Sigiritha filha de Sinaldo Rey de
Dania foy de táo infigne pudicicia , que nun-«
ca lhe poderlo perfuadir levantaíTe os olhos
direitos para feu marido. A veneravel Madre
Hieronyma da AlTumpcáo,ReligiofaFrancif-
cana no Convento de S. babel de los Reyes
em Toledo , fahindo daqui para fundar em
Manila, que he jornada de cinco mil leguas, íWr
nunca em todo o caminho lhe viráo roftro ,
nem a outras tres côpanheiras fuas. De men i
P. S. Filippe Neri dizia húa fuaconfeffada de
muytos annps, que nunca lhe podèra ver de q
cor tinha os olhos. Logo pe\o contrario qué oí
nao refguarda , nao moftra fer eftudiofo da
Caftidade: porquanto a fruta fem caica he fa-
cil de fe corromper; & da Caftidade a cafca he
a modeftia, & çompoftura em todos os movi
mientos dos mébros, efpecialmente dos olhos.
Por onde diffe S.Thomas , que a inquieta- QbUr
cao dos fentidos exteriores denota a interior ¿ г J'
dosaffecbs , & paixoens: Inflabilitas mtem M *•/
txreriorum fenfúum, & тетЬшиттпМлЫНы- ^'• '
|m indica <iff<£tknHtn3 & tmmmn ¡nmiorum. ' ' '
ES,
»8d Л ■': 'Tratado.^ ' •;?
¿;¿ s ES.XfidoroPdufiotadizqosolhosimmodei
£p}fi ' ftos,&pefcoço erguido, & fréquente agita
it! fáodas íobrancelhas he argumento de animo
torpe , o qual imprime no corpo os ílnaes ,
ainda que efcuros,de fuas pertubaçoens inte
riores: Itvpudens ocuhs ,& elata- cervix\¿-.&
perpetua fjtpercil'iorum agitano,,.feAtffimi animi
trgumeñtum é ,. obfcurjs реПМклШтт nota
cerporijmprtMVritîSi; jn?/'.i\ >tl .:.
• ,Qiiantd;i licença da lingua , que tam
bero äs vezes feja argumento de pouca hone-
ftidade , mayprjnente em .peflbas de- anno?
verdes .^moitra-fe :. porque a vergonha hç
guarda da' Gaftidadc ,& o fijençio lié com-
TraB. .panheiroda vergonha;- .Silentium С diíTe &
deord'i .Bernardo )tflmaxhhttincl^syerecmdlx Alen»
«e vit. Mo , o fallar muyto «azconfigo raujitat
communicaçoens, & familiaridades, peto
quáes fe pega o efeandalo, o perigo , & a
noticia de -muytas coufas , que melhor he
j.gnoraílas. Acrefcema-fe , que onde nao ha
jnuita oraeáo, ma! pode haver prendas excel*
•lentes , & raras da graça divina , como al
ienta S. JoáoGhryfoftomo.Eqcoufa mais«*
odíente., &.rara em huma alma unida*
.. fs carne , do, que nao fe manchar com os eon«
;: tagios.-dar,mefma carne? Ou quecouía mais
'• *''''; Gontwriaàawçap^uehetrato coro.P<SQS,<fr
■l:ví" qué a faciWade em fallar- muito, que he
'""'' 'f jtrato cpm os homens í Pótcerto fera coa
Da "virtude da ^aftidaete. 287
; Prdífficultoía de Crer , que 6 cfefnionio não
;: aeommetta ao homem por huma porta , por
; oride tantas victoiias coftuma ganhar , qual
: hè : a da feníiialidade , vendo-o diftrahido de
: céracão , & todo efpalhado em íblturas da
Jihgua. ..;. -yj{i.

= PERGUNTA XXXÍI.;
Stkt cotifà{potíW tonforme àCaftidade
3r:f!- • animaes>::''-
. . • "fi':"---,trfcO-i-

REfp9nde--(è c^uenefta, maioria lambem


pôde haver lua defordem ^ Si perigo :
pcrque o fentidddo tafto perceteabrandu-*
ta;das efpeeies ^que ferveinràrfua esfera,
fcm diferençar , lê he defte , ou «kquelle lo-
geitp , racional , ou bruto. , B i&ffim como
dizia meu P. S. filippe Neri que o demo
íiio he lógico , & para tentar de incefto ,
abftrahe a ra^ãode mulher da^ diiíerença de
irmã : aflim também o mefmo deimonio , ou
•o noíío appctite (quehe grande-fem parceiro)
Jpí>de fazer outra abftracçáo majs univer>
ia l , reprefentando carne vivente., fem at*
tender a q hede tal, ou.tal UtwtQé E rainda que
•ó efpirito fé ache prompto pata abominar, &
negaras ultimas .ccnftquencias , que daqui
«podem inferirfe : com tudo a; parte'fenficiva
experimentar alguns longe?, do vicio.
Daqui
»88 S v % Tratada
Daqui fe fegue que as donzellas , & Reli-
giofas, que criâo cachorrinhos de íraída, & os
penteáo , enfeitáo ¡, beijáo , & agafalháo con
figo na cama »obráo mal , §c repreheníive]-
mente, pondo ofeu affecto em huma creatu-
ra táo vil, & indigna, que deviáo por fómenr
te em feu Creador -, Se confummdo em mini-
nices , & ï|d}çilarças o '.piecjöib ; tempo que
Jhes he dado , para trabalharem no alcance
das virtudes, E deyeráo advertir que todoQ
amor caufa feraelhança , & faz uhiáo entre
o amante,& a coufa amada.fe efta he vil, o en-,
vüece; fe nobre , o dignifica;: fe torpe, on
immunda , o a£eya , & inficiona ; em tal form
ina q dilTe S.Agoitinho: Amasa terra,es terra;
amas o Ceo, es Ceo ; & fe amares a Deos,que
tedirei , fenáo que es deificado î Veja agora
que confequencia quer tiremos daqui quem
ama hum cao , ou a qualquer . óütro bruto ¿
Deixo em filencio outras mal ici as quepo*
de haverna materia , masa mefma Caítida-
de , que inculcamos , prohibe declarallas.
§6 acrefeento huma coufa q he bem nao igno
remos; &he,quenem todos os movimentos
& geftos , que fazem eftes animaes domefti-
cos , com que nos divertimos, procedem sb
das fuaspotencias naturaes ; fenáo que o de
monio as vezes os ajuda, & irnpelle para nof-
lo mal. Éapefloa cu idarque brinca com hum
cacliorrinho,ou que talla com hú papagayo^
bugio ,
'DavirtudedefCaßidade. a 89
Ъи«ю , & eità brincando , Sc Fallando com о
demonio. Nem pateca coufa nova que die
inimigo fe meta as vezednos corpos dos ani-« ,
macs: poesda vida de S. Hilarias confia que
fe meteo em hu camelo ; Se da de S. Simeáo
Salo , que fe meteo em !ntm cío -, Se do livro
do Genefis,que fallou a Eva pela ferpente.

PERGUNTA XXXIII.
Que remedios hovera para nao, padecer
i; illiifoens venéreas mtlurnaii
REfponde-fe que eflas (fegundo tn fina S, In .
Thomas)coftumáo proceder de tres cau- Jfn
las i .intemperáca no comer, & beber; enten- > * l
de-lcaqui, nao so a que fe tevenaceaproxi- z
-ma, & antecedente -, fe náotambem a habi* "*
tual dos diaspaífados: nem só a que fe empre
sa em manjares delicados ; fenáo tambem a
fartura de pao , & agua. 2. A immundicia de
'efpirito: ifto he, o revolver fantafias torpes,8e
penfamentos màos, efpecialméte quando nos
deitamos a dormir : & aqui entra tábem algw
confentimctofubrcpticio,q entre dia demos
a elles, 3c o poucoTecato da vida, ouvidos , Se
tafto namcfma materia, que refpeita acón-»
traria vimide da Caílidade. 3. A illufáo do
demonio^ que como efpirito immundo,& ma-
Ikiofo , intenta for ella yiafazar injuria ao
► a f cor-
Tratado : : , ^ •
cot pó, & alma, & talvez impedir íi íâgrada
Comunhão do feguinte dia, ou deixar impref-
fas na memória as efpccies obfcenas, que inci
tou cm lenhos. t
E he tanta a fuá malignidade; que até aos
mininos de jnnocente idade ; procura ir a-
deftrando cm íonhos porvia dcíías rcprefcn-
taçotns impuras , para a tentação mais de
clarada 3 com.que ikpoes oselpera. Affim fé
Jè no Vttas fatrttm, que hum Santo Monge Je.
vara coniigo para o deferto hum rninino , que
aUi lê foy criando entre fen os de Dcos, íèm
noticia alguma de mulheres. E fendo jàma-
yorzinho, começarão os demónios a moftraí-
Ihe em fonhos damas muy fermoíãs , & bera
ataviadas. Elle como não fabja. cjue coufas
erão aquellas , dizia ao feu Kleftre-, xjuc via
de notue dormindo coufas feimofas.Éo Mc-
ftre Iheteípondia: Aquietate, n ao cures de
fonhos. Oífereceufe depões occafiáo de o \ e-
var configo a Egypto : & ao paliar por ham a
rua onde iOa\ ao liumas mulheres enfeitadas. *
dilTe o mtichacho : Padre , Padre: Aquillohe
o que vejo dormindo. O Monge advertindo
na mal icia do tentador, que tão de ante-máo
procura corrompemos , chorou , Sc diffe pa
xá o muchaclio: Anda filho , que aquellas Ião
os mãos monges do ftxulo. Aflim que não há
duvida que o dtmonio he também cauta de-
fonhos : antes porque clle coftuma in-
í «o
Da virtude da Caftidadt.
troduzirfe qnafi ícmpre c õ as outras dcas cuu-
íãs ( perraiundo-lho Deos para abatei ncf-
fas vanglorias » & fobeibasjrporilfo abíolu-
tamente chamamos a eftcs lanhos illufoens.
Eftas pois no primeiro cafo íáo filhas da gul-
Ia j no fegundo, da luxuria ; no terceiro , da
inveja do demónio, & da noffa fobcrba.
, ,.fíao declaramos efte ponto mais fcientifi-
camente,por confultar o decoro: oqual he
. mais delicado nos livros efpirituaes , do q«e
nos de Theologia moral , & Medicina : po-
lèm não quifemos deixar de o apontar, para
que os directores de ai mas náo Ihies palfe por
alto, quando fc otferecer occafúodc exami
nai Ias. .»
.Suppoftaa noticiadas caufas , faliirá mais
acertada a applicação do remédio. E aponta-.
mós aqui juntos os que occorrem,para qiic ca-
íla hum efcolha , & prove ; porque nem íèm-
prc lhe fera fácil diftinguir donde procede a
infirmidade. O i. He pedir a Deos efte pri.
vilcgio da Caftidade ,por intercelTáo da Vir
gem das Virgens fuá Mae Sántiflima z. O
Padre Senhere da Coropanhia de JESUS jn-
c«ílcaadevoção derefartres Avê Marias,* fa
zendo a cada huma. fuá Cruz no peito ; & na
primeira dizendo: Virgem antes do pano : na
•fcgunda : Virgem no parto : na terceira: Vir
gem depões do parto. 3. Meu P. S. Filippe
Ncri diz que aproveita rezar o byiQno <ia
Tij
39¿ Tratad»
Completa : T« lucís ante teminum, onde efta
. graça fe pede a Deos.4.Serà util rezar ao An-
jo da Guarda quando vamos a nos reco!her ,
Se entregarlhe o noífo corpo. 5. O ufo d^
agua benca , fazendo afperíoens na cama ,
&apofcnto,afugentaoseípirkos malignos ,
que proeuráo minar as caías dos noflos cor-
pos. Enaverdadehe muitopara eílranhar ,
queraraméte nos valemos defle remedio en
nolTas habitaçoens, como íuppondo he só par*
aslgrejas. OP.Francifco de Ribera inngne
с fcriturarie , o tinha por cao familiar que tra
ita perpetuamente configo hum vidrinho com
agua benta para apagar peccados venues, Se
aíaftar de fi o tentador. 6. A cama menos
branda, St algum cilicio cingido tambera а-
partáo a vifinhança do inirmgo invifivel, que
taz fuá negociacáo ñas trevas. 7. Ceas mo
deradas, & abftineneiadevinho, & nao dor
mir de coilas, fenáo fobre o lado direito, aitv
da naturalmente conduzem para o mefmo in->
tentó. 8, Nao fazer penitencias nimias fem
confelho , & direccáo. oJDefterrar do Efpiri-
to, quanto puder fer com ajuda de Déos, os
penfamentos de foberba , reconhecendo-fe
fempre por miferavel. 10. Occupar a me
moria em penfamentos fancos , & caítos ,
reilftindo com prefteza aos que fáo contra
rios; & guardar comíigo mefmo modeftia,
fk recato , he cortar as raizes , de que o
f-K-..» de-
Da virtude da Caftiâaele. 29 5
demónio fé vai depões. para irritar a fanulia
em fonhos.Porq em fim ordinariamente cada
humfonhadorminéojG que tratou velando:
c . Tetnpare no{iif,no rtddit Arnica, qa/et
.& Nilo Abbade.ob feriou .que quando.
pcíToa efpirkual anda,çorn interior tranquilli-
«lade^áí os feus exercícios poftos era fuá coma:
o.áemonioou lhe airtemella alguns impulíbs
fortes de ira repentjna-contra os proximos,p*-
ra; J.he,perturbar efta .paz j ou lhecaufa em fo-
nlios algáa torpe illufáo, para o injuriar, &
affligir. Pelo que lie neceííario naquelle tem
po applicar mais as fobreditas diligencias.
. Pé caminho fé advertem duascoyfas: i, q
ao : acordar im mediato à illufãox:omk pôde
haver perigo de algn confcntimento, convém
levantar logo o p^nfamento a Deos, & defter-
rar da fantafia as jma^ns impuras , com pu-
trás bs(as( v.g. alg\l pálTo'da Páyx»'áfe ClirU
fto), que para efte effeitc havemos ter já de
antes preparadas. Do gloriofo S. Frácifcò Xá- '
vier eícreveo o P. Ribadeneira, queacordãdo
com hú fonha man, foy tal a preíbfa, & for
ça comque acodioá refiftencia,que Ihç rcbé-
t<>u o fangue pelos.narizej. z. que na duv ida
de . fé a pelToa eílava , ou não eftaya acor
dada, & có plenà-.iiberda^e para o confcnti
mento, fehade julgar a favor da. pefloa; por-r
<pie .km .prova i^o fé prefuaie.. o;
• ioa^ T iij
1 94 Tratad*'.- ■ f-\
bam da que Ihc parcça por alguns indicios
que eftava defptrta, & fabiaoque f*zit»r;
com tudo fe fe nao atreve a affirma По , &'îie -
peiïoaq nao coltuma cometter peccado mor
tal , & depoes deftcs fonhos fempre fica com o
mcfmoamora Caftidade,& aborrecirnen-
to á torpeza contraria : deve entenderle que
nao liouve da fuá parte cooperacáo cora pie«.
no confentimento ;& que he operaçâb db'eïV
pirito immundo, que por efta via pertènde
affligilla, & metellaem defefperaçâo. E aC-
fim o que convem neftescafos,quando a per»
íeguicáo continua , he humilharfe a Déos ,
oraryinvotar a Virgem , fofrer a tentacáo, ou
íeja prova, ou purgaCáo , oucaftigo, & nun
ca exafpérarfe , nem defconfiar da bondade
Divina.> v- '■

PERGUNTA XXXIV.
Comojedem portar httmCcnfeßor que
nao defeja manchar a Cafitdadt ?
REfponde-fe que p,ircc:m fer medidos
com o nivel daefpiritual prudencia os fc-
guintes avifos. - ' . - .
i.- Se nlo tem ca/tidadevaleroía , &" exa
minada, nao fe exóofiha a c©nfeiTar,e-fviciai
menté miriheres .- porque eiêrito eftà 'que fe
--• i o nof*
virtude da C a/lidade. j 9 j
o noílo olho direito nos efcandaliza , o arran
quemos •, Sc. que o fal infatuado náo ferve
íe íiífo para fer lançado fora ; & que fé hun ,
não tem valor para vencer com a virtude a ~£
in iquidade,náo queira tomar o oflicio de Juiz: ' * *
Sc S. Dionylío Areopagita dille , que os que
cem poroincio purihcar a outros, convém qu e
o facão em virtude de fuá Apropria pureza ;
VargJtores oporret ntAgníttttUnim pmgAtltnis _
étliií tradere própria c<tft!t<tre» Qyem hoover de • ^
exercitar eíte divino mimfterio com rruto ''.*
alhsyo, & fem dano próprio, deve fer como • ''"''"'•
o julto Lo-h de quem diz S. Pedro, que habi.^'5'
tandoencreos de Sodoma , & vendo, & ou
vindo tantQS exceífos contra a Caftidade, ain
da affim procedia rectificado nos olhos, & o\í-
viàas.*A(ptflu,& audittt juftus er<tt. O que 3.,fttr
mal poderá hú Confeflor confeguir femexer- i.8i
cicios de oração, & morcificaçío; que fáo os q
humedecem o nolTo f'ames , para que nelle
não prendáo facilmente as faiicis, que cftáo
faltando durante o adodaconfilíãoii &tam*
bem dcpo3s cíeHe,sòcom a memória. Por iC-
foem rauycas Religiosns , & Bifpados eftá
b£m ordenado, que nenhum Sacerdote con-
feile mulheres, íem ter quarenta annos : para
que já que o perigo externo he inexcufave!» •
não fé c anjurem de. dentro com elle os brios
Javénis do próprio fangue. •• i '• '
*• Náo obftawtc efta doutrina (que he ver-
503 T iiij
?р6 '\-.'.:Г.-' Tratada'•■:••?-. С»
dadcira ) deve о Confeffor nao acovardarfe>
tanto, que fe tente a fi meímo , ou venha a
psccar por confcicncia errónea. Fie muito da
obediencia, quando he mandado , & do am
paro da graça de Déos que ajuda , & défende
aos que leväo intencáo ге&з, & humilde de э
íervir nefte minifterio, que lhe he fúm amen-
ce agradavel. Coníidere, quefe ha fornalha ам
cefa & voraz, como a de Babylonia: tambem
ha viracáo frefca do orvalho celeíba!,que nao
.■•••• deixa ncm cheirodefpgonosveftidos. Etam-
•bem pode temer, que por ventura fe prive a fi
mcfmo do dom da Caffidade, que o Senhor lhe
daria, ou confirmaría a intuito daneceffidade
■delle para tratarcom os próximos , conforme
i .p. aquella fentença de S.. Gregorio, Qui (ил , & •
PußfCj, non alltirim lucra.cogrtttnt jipfije yqtne privAtA
J(4.i habere, appetunt, botih privant*. . ■ .
* -5. S¿J4,muy.circunfpecto, & medido ñas
palavras;, & dputrinas , efpecialmente quan-.
do falla com mulheres^declatando bem o fcn-
■tido, & intento délias : porque fcndo aquel-
îe fexo muy rude para outras materias, tem о
faro muyeípeftqparatudoo que toca apon-
tos de Caftidade. E nao baña > que o Cóf etfor
tenha efíarvirtude; fenáoque, amoftre : poríj
Be f, j.comodiíTe S.Agoftinho, aboaconfcienciahe
no vi- neceffariá para cada hu; perèm a boa fama he
liult с nece'^ana Para nnffos p"roximos? : Kohh ne-
ií* ' ceßarta eft 'vitл naßra , diij^áfftájtafir.i, EjnuH
i- j •'. i' tos
Da virtude da Caftidade. 197
tos. ( como fé queixava S. Ambrqfia) não
dando lugar ao erro próprio , o deráo à foi*
pfica alhea : Oyuaneino» dederuntlocum fr.
W'rt& (hfíerunrfuipitiont, He o Sacerdote co
mo a Arca de Deos , porque em feus excel-
kntiífimos minifterios fé guarda, & faz guar-
{lar a ky divina. E não fcm myfterio orde
nou t>eos que aqueHa Arca fpffe chafpea-
ítadecuro não só por dentro, \ mas por fo
ra : O quro interior fervia mais iflirnediata-n
mence para dccp^o da Ley •, o ouro exterior ,
parade coroda mcfma Arca, em ordem ao
mayqr refpeito dos -Fieis à mefma Ley. A al
ma e]ue na cafa de;P;e>s : chegou a fermáe de /
.famílias, hade trabalhar como aqudla , de
que falia Salamão, fiando , & tecendo linho,
.& lã ; Qv#fi~oit lanam , .& littitm^ <& ope* ÍVo-y»
rttA eft confilio mttnuwn fttftrum : linho de que 13.
.fé corta roupa interior , & lã de 'que fé fa- 13.
.zem, os, veílidos exteriores. Porque : não ba-
:fta andar agafalhado , & limpo na própria
(Confciencia: henecplTario proceder honefto,
.& ornado nos olhos allxeyos. Qjiit ampliar
,-efta doutrina a. bcnr 4e alguns ConfeíTores
virtupfos , mas .de ;gen,ip fácil ., repemincfc,
& defcuidado. Qs quaes fé quiserem tempc-
rrarfe, nem poriílo:temáo a hypocrifía : pojí
' fé não pretende ^iftq -a eftimaçáo da pef-
íba , mas a do minifterio , que redunda
cm Chiifío , &. na fqai Igteja , & na Re-
Tratad»
ligiáo , & eílado que prof profeflao. E ,
o minifterio rio do confefliona
confeflionario tambtm he
Apoftol iço, pôde cada hum dizer com S Pau-
k« QnxnA}» ytidem ega fttm GsHtittm
minifitrtuitt' ineumbonorifkitbyi
*?• -j 4. Quando for chamado para ouvir de con-
•filTáo aíg«ma enfetma, fé no eiladoquepro-
felTa ha cftawto ou regra (orna ha na Com
panhia , SC nefta Congregação ) de eftar o
eompanliefco à viíla , obferve-o pontualmen
te, quanto permictir o tegredo do figilb,àin-
da em cafa de grandes Senhoras: as quaes não
fzzém eftrknhez, antes eílirm, defte ponto de
perfeição , fé lho teclarão. Deite modo os
paes,8c maridos eftáo mais longe de roins fof-
psitas, 5c oCófelíor mais feguro de cafòs inv
#<• -V penfados, fcperigofos , de que não faháo exé-
.t t Pios nas hiftorias. D^ tanta importância c on-
,{i AJefòà^fte avifa o P. Leio H:nrqusl da
Companhia de JESUS-, que ficcedendo def-
«âirargiifli tanto a cortina da alcoba, onde a.
;€ríFermaeftava, fé levantou a erguelk pau
ficar hiafe patente ao companheiro, & tor
nou a continuar feu officio. E do P. Nano
aã Gunh^ da mefhla Companhia , pclloa
beméótihêèidanefteReyno por fuá virtude,
' & qualidade, fé foube, que fendo já ancião,
& viíiaiíáo a fuá irmí á Condeça de Víilar-
mpre fazia en<ttaf diante o coffl
, a <?uat eífetva ouvindo tudo o qoe
^ cnctp
Va virtude da Caßidade. tpq
entre fi trataváo. Ifto he о que eu chamava
obrar de linho, & lu , attendendo à confeien-
cia , & mais àrepuraçao. Verdade he quepo-
de ■ haver fegrcdos,& negocios, aínda fóra
de confiffáo , de que o corapanheiro devenía
fer. participante. Eftes partie ulates mede a
peudencia» • ■ < ..•:•::-« , . : ; ;••
- $ Nao с cnfeiîe roulheres fem eftar de per*
meyo algumas gradinhas , ou raro. Affim о
aconfelhava meu P. S. Filippe Neri ,&feufa
nefta Congregaçao , & em ouïra s muitas par-1
tes. E aínda difte modo nao convèm ter vira*
deoroftro , fenáoo oiivido para a pen ic ente. •
Nem pareça ifto demafiada imperçraécia.-por- '
que àièm de que mulheres háo de fer tratadas
como armas de fogo carregadas ç ifto he, com
grande defvio, & refguardo: a malicia dof
fèculareshemuyperfpicaz para obfervar as'
acçoensdos Religiofos; & já ouvi que repä-
raváo nefte ponto. • г.:Л , •: ■ ; :.i
б O efpiritual, & douto P.Luis de la Puen-^Tow»
te da Companhia de JESUS ( Mcftre de efpi- 3 . ¿e U
iko aflaz acreditado)havendo dado varios avi- perfc~
ios acerca do recato, & mortificaçâo em toitos с/в» ,
os fentidos, de que fe deve acompanhar o tra- tratada
tetom mulheresjconclne dizendo cftas pal a-; 2.c.e„
vrás [Todo lo que en ellos fe ha dicho de mo¿ я« fin
derar Jas afHciones, y tener recato en él trató
con mugeres ¿ fe ha de entender también en
¿ir modo con .genw de foca edad] .Porque ef
■'-'■> muy
3 оо л* , '; •'•'•/ Tratado.- v V:
raay verdadera aquella fentencia commun
■} •ссНле : Q^9.-¿ /'л m'dleribas facit ]cxus , «я
/wem faoit xtxs. Sec. ] Daqui fe moftra, со-'
що nao convèm que o Coníeífor ( precindin-
4o de alguma razáo urgente, & particular)fe
çhegueparaos confesados , aínda do mef-
mo fexo , mais do que for necelTario para
oseuvír: nemos trate com deraafiada af-
fabilidade, que degenere de benevolencia
cm- facilidad^. Porque fiíppofio que a affa-
bilidade,& benevolencia em fuá prudéce me
dida feja conveniente nefe: ministerio , .*'
faeilidade nunca o poie fer; ante? he con
traria ao refpeitQ , & decoró do mefmorai-
niíterio. .i „■!, c~ ] ■ '■■&■• ■••"">
,r 7 Na conta deft.is facilitates , ou cari-
nhos puerís •> & d^mifiadoí ,. ..qu&iaqui dif-
fuadimos , entra o chamar por Tu aos filhos,
ou filhas efpirituaes , ainda que lejío an
tiguas , & bem intencionadas. E fuppofto
v. -que aô Gonf-èuot'pareça , que efta lhane-
Vl.; è,za fem máo animo as facilita para defeo-
„>\ ibrirem o feu interior ,& as attrahe pa«
u,,.ra perfeverarem no confeflionario : toda-
,'j^^. via nao (ao. termos eftes.¿ que fe approvem
r pelos Varbens.anciaós , efoirituaes , & «*-
,, :. . ,perimentaaój f & concordera; com minute
ro cao grav*>>.& divino.. Nam o amor que
délies fe¡prod«í! he efpirítual/puramente ;-.fe
nao que IcKímáytode natural, mininciro ¿
y.flf &
Da virtude da Caftidade.
& impertinente. A benignidade que conr
fola, & attrahe os penitentes , bem fé lhec
pôde moftrar por outros modos mais condu
centes ao intento. Se acaío fé achar efcrito
exemplo de algú Santo em contrario, advir-
ta-fe ,que nem tudo o cjue nzerão os Santos
he coníéquencia qu« o facão os que o náo"
fomos : que por iífo S. Filippe Neri acau
telava os feus , que o náo imitaíTem em
algumas acçoens íúas -f porque nem todos '
tinhão os mefmos dons. De outro modo ,
atiraríamos às pedradas , como fez S. Si- '-: '••
meão Saio; ou andaríamos em galhofas, &
merendas , como fé conta de S. Pedro Gon-
çalvez j ou pegaríamos ca barba aos que á \-
tiveflem comprida , como huma vez pe
gou em publico o mefmo São Filippe Ne- • ' '
ri. '- • í-' '• • *•;•••••"•'-'
•- 8 O dar á mio a beijar aos penitentes^
pareee acção ( de feu género) pouco confor
me à perfeição, & miudeza da Caftidade ,
& aoefpirito de humildade, de que tam»
bem deve o Cpnfellor dar -exemplo. E to*
da via , como fáb mãos fagradas , qae o po
vo todo coftunaa beijar aos Sacerdotes co-
vos; & como o Conreflorhe pae quanto á-'
geração do efpirito , em virtude da graça
que adffliniftra : não vejo inconveniente ,
em que fendo • de idade pfbvtítá , pféf-'
mitta algumas Vezes «íta ccnfolsção- a at*
фсг Tratado
gum devoro, nao padccendo nhTo danoefpi-
íitua).
- o Náoconvem que viíitc filhas efpirituaeí,
fal vo era caíos raros, & cqm racionavel ne-»
ceffi iadc , efpecialmence í¿ nao íáo de an-
to.Bd- nos mayores. M;u P. S. FilippeNeri( & he
///.Cew-doutrinadï S. Baíilio ñas Cjftituiçoens mo-
flir. naiticas , öc de S. Ambroíio » & oucros PP. )
monaß. nao coníentia aos feus eftas viíítas, fenáo com
c.4. -D. cftes tres prefuppoftos; 1 .urgente cafa: г. bre-
ьЛтЬг. viffima detença : 3 companhia do focio. D*
/.1.0/- V. P. Fr. Agollinho dos Reys da fagrada Rer
fice, forma do Çarmelo,fe efereve, que fendoPrior
". emeerto Convento, foube que havia nelle
T. Fr. (falta de recolhimentOjâe q fe faziáo algumas
Iofeph yiíuas, aínda que feguras, impertinentes. E
deS. calljgou iftptáó feveramente , que a dous
Теп\л Religiófos nefte particular demaíiados, aínda
nolhro quevirtúofos , privou das lic^nçaS deconref-
p.*¿< Cu i dizendp , [ Q^e a v íua , ainda que lici-
çbrott. ta, fe he efeufada ,.& impertinente , nao eftà
с. 2.3. longedefe fazer.j.Hicitaj.Bomhe o didame
». 7. de S. Hieronymj ( Si anda inferto no Direi-
C. fío/- to Canónico ) o qual diz : [ Se vires que at-
phioU guma mulher te ama fantamente , corref»
Difl. pondelheso em efpirito , mas nao a viíites c»
32. frequencia]. ( • -,
í o T arabem he confelho faudave! , &
importante , nao ferere os ConfetTores facéis
em aceitar dos-penitentes dadivas , ainda de
.re.--' COU-
Da virtude dA Caftidade. 30J
ccufas de pouco valor , curiolas , & de devo
ção : porque esfriáo o elpirito, & deieccáo o
leite da doutrina, que hão miftcr para os criar
bem ; & prendem algum tanto a liberdade ,
& inteireza , quando he necelTaria para faze
rem incorrupcamsnte o oíficio de Juiz. Ea-
Icm chilo induzem menos rclpcito & opi
nião, nos coníeíTados & maculáo a Religião,
& piedade com algús veftigios de grangearia ;
que he o que reprehende o Apcftolo , quando
diz: Exifttmantes eiuxjíum ef]e pief^trem» Bom he '-,
(digo outra vez) o didarae, & fentença * *•
liem fabida de S. Hicronymo , o qual allenta> • J*
que .• Crebra mtmufculat&(li(U*es litterus,&/«-
aarlolit , GTc, fanclus amor nen b*bct. Onde no-'
to , que o Santo Doutor diffc Crebra, y & diffcí
Túunufcula: crebr* , para dar lugar a alguma
exceicáo racionavel: Manufcul* , para que en-
tendeflemos,que as dadivas ainda que de pou-'
ca conta, pòJernnáo fazer, boa conta com o
amor fanco. . . t,'. ; :a
ri S.- o penitente por rudeza, ou iaadver-
cencia , fé explica mais clarameme do que de-
vera,ferá bom enílnallo, como deve confeflac
cftes pontos. £ o ConfeíTor faça pelos não
perceber por via da imaginação formando fi
guras do que ouve 5 fenão por via do «nten-
dimento ~, ifto he ,ipor conceito fimplez , -íe
<rpiritual.Eltapu,ieza da imaginação fé adqui-
re pelq habito de andar em preferia de Deos ,
-f' •' com
J04. л' Tratado
com adös de Fè fïmplez, & pela mortificaçao
dos Cencidos bera continuada.
i* Nao faça mai? psrguntas do que he ne-
ceílariopara entenderá efpeciedo peccado :
porque nao fuceda meter o pè no lodo, que
vay cayando-, ou enfinar ao penitente alguma
malicia, que até alli ignorava. Entenda o
Ganfelfof como doutrina fuá no prefente ca
lo , aquella formula , com que Déos anti
guamente mandava,que o acredor'arrecadaf-
¡)tHfttiz as fíus. dividas : Cmn\ rtpetes à proximí rut
•jV '" rem aliqrum,quxm debet tibí¿ion ingredieris do-
1 \¿- • mum e)»y , ut pigms auferas. ; fed ßabit forts , &
Ule tibi proferet quod babueih : Quando fores
(. diz o Senhor) cobrar alguma divida de teti
proximo , nao íhe entraras em cafa-, fenáo q
¿•ando de fóra elle te farà prefente o que ti-
ver.Todo o penitente he devedor ao Sacerdo
te da inteireza da confiffáo: mas efte para ar-
lecadallá , nao deve meterfe dentro da conf-
ciencia daquelle , por perguntas milito par
ticulares , & miudas ; fe nao ficar à porta ,
fazendo-lhe as que fáo mais geraes , & de
vicios ordinarios : & elle vira faindo, & en
tregando o que tiver nos cantos da caía. O
.Y.Prekdo D. Joáo de Palafox no feu livro
intitulado Lu\a losplms, & defendant tn Us
muertes , refere que em Madrid appareceo a
alma decerto-Gonfeffot de Ordern recoleta,
penando no confcffionaiio , por hiver feita
alli
*Da virtude da Caßidade. 3 эf
alii perguntas indifcretas. Nao obíUnce ,
fe a pefîoa he rude , ou muito vergonhofa ,
bem pode о acredor meter opà mais alguns
palTos dentro , fempre com vagar , & fentido.
Poritfo ditTeS. Agoftinho,que o inveftiga-
dorlutil, Se diligente inquere do percador
com difcreta lagacidaJe о que por ventura el
le ignora , ou por vergonha encobre : Dili- De ve~
gens inquifitor, О* fubtilis inyeßigator fapienter, m,&
&" (¡naß dßute interrogat a peccatore , quod faifa
for[tun ignorât , aut yerecundè relit occultare. fmii-
13 Succedendoque fe ache moleftado de tent'¡a ,
movimentos impuros , faça actos interiores circa,
<le amor de Déos , & tenha prompto recnrfb fintw
ao favor de MARIA Santiflîma;& pique-fe có r, 4.
algum inftrumento accomodado para eñe
efteito. Pallando o perigo amanifefto, pe
ca com bom modo licença рата fe levantar t
como que lhe deu algum arvoamento de ca«
beça, ou tem alguma neceflidade inexcufa-
vel, prometiendo voltar logo : & naquella
breve aufencia ore a Déos mais applica da-
mente , ou cinja hû cilicio, ou tome alguns
golpes de difciplina. Porque nao pode havcr
razáo que prevaleça , á que huma alma tern
para defenderfede cairem peccado mortal«
Quandonáobaftern diligencias , & o corpo
obre como quem he ( & iníinua o feu nome
trocado por anagramma ) '. nao fe entrifteça ,
pem conturbe , huma vez que nao defle vo-
V lunta-
sotf Tratado
Juncario aíTenfo. E fe entende , ou duvida que
о deu ,faça a£tü de contriçao, & va por dian-
%e com о leu officio, & nao havendo cómo
do de ir bufcar Conídlor fem reparo ou eí-
candalo dos circunftantes: em outra hora con-
feffarà ciTe peccado certo , ou duvidoib.
14 Se fentir que alguma filha efpiritual
Ihe cobrou amor impertinente, & q forma ze-
los de que traca mais com outra , & tendo li-
cença fua , & caufas racionaveis para mudar
de Confeflor, nao fe defpede, antes fe empe-
nhamais,&nem poriífo ceíláo queixumes ,
& murmuraçoens,& com a manfidáo , & pa
ciencia do ConfeíTor fe enfoberbece mais :
corte de huma vez efte laço , & nao admicta
mais a tal peíToa. Porque alguma coufa inten
ta o demonio fazer per ella , que ella mefma
por ventura nao entende.
f $ Se o demonio (cujo hálito, como diz
a Efcritura/az arderás brafas) inftigara al
guma confeíTada que o íbllicite no confeflio-
nario (cafo, que nao he metafifico , ainda
que raro ) , levántele de repente , & deíam-
pare o lugar , como que lhe occorreo cafo pre
dio a que acodir. Achando-iè com clpirito
robufto & zelofo , pode tambem revirar a
fetta contra qué 1 ha atircu;dando-lhe o vexa»
me que merece, & pondo-lhe diante dos olhos
da alma a fealdade do peccado , a honra de
Déos defpreíada , a ecernidade das penas do
, infer
Юа virtude da CafiUaât. 3 07
îïi ferno , & outras íemelhantes verdades cl a-
r as, breves, & fortes. Todavía o fugir he mais
íeguro:poré feja com tal cautela,cj nao infame
я penitente, nem offenda o íígillo, no cafo q
baja e(Ta obrigacáo.
1 6 Tenha de quando em quando ceítos
dias, em que retirado do trato com os próxi
mos, cuide sb do aproveitamento proprio,
Dos iagrados Aportólos fe le no Texto Evan
gélico , que deíceráo a lavar as redes ' Tifcdto- т,ее
res autem defcenderant , & Uyabant retía. Por i
e'piricuaes que Tejamos , fempre da commu-
nicaeäo com os próximos ( aindaque feja em
ordern a converteüos ) fe nos pegáo algumas
immundicias : fe as nao lavarmos, pedem a-
podrecer as redes , & nao fervirparao of
ficio.
Outro avifo, que podia pertencer a efta
mcfma materia, ajumo na feguinte pergun-
ta ; feparando-o dos mais , por depender a
nfpr.fra de fer mais confirmada com autho«
ridades.

ъ
-

Vij PER-
308 Tratado

PER G UN TA XXXV.
Se 0 Confeßor de mulheres (falladogérai*
mente)deve fer breve, & algum
tanto ajuero com ellas?
Efponde-fe que fîm : & como o mea
„parecer
! he de pouca authoridade, faia
1er íeguido de outros Conieflores, que por
ventura opinio o contrario , !he ajuntarei ou
tros votos de mayor crédito. Noflo P. S. Fi-
lippe Neri , que foy grande mcftre de efpiri-
Scuol* to em Roma>dizia: S¡ guardino d¡ rdgionawen-
difatt- fi 1япф'1 con loro т Си ardtm-fe os Ccnttffoies
tital.^ de converfaçoens prolixas com efte ftxo, &
lettio- claro effà que falla do arrefoar e fpirkualmen-
■nt 17. tc, que o maisnem com mulheres nem com
n, 4.. líomens he licito no confeffionario em afto de
confitíáo : pois como diiîe S. Lourerço Jufti-
niano : Cctifefßo non efl conyerfario. E do mef-
mo S. fe efereve que encûmendava aos feus,
& elle affim о praticava , que ufailem antes
depalavras afperas, do que affaveis , & cari-
nhofas , & que mais fe appl icaflem a confef-
farhomens, que mulheres: Nondiceva con ejje
( fâo palavras do P. Jozeph Crifpim fallando
dö nolTo Santo quando ouvia de confiíláo
jnulheres ) parole ajfabill , ma piu tofto *f/>rt, <sr
lever«.
7)avirtHdedaCaffidade. , 309
etrrt * tentv'do la facU ri-vohл altrrer. Do" P.
A îodinho Manni da me fma Congrega ç á о, &
diicipjlo do Santo, fe refere fer de pouquiffi- '
mai pahi'.'ras com eile fexo.
Geifáo Varío illuftrado, & Cancellario
Pariíienfe fallando defte ponto diz aim: Hoc т,^#
front puè cortßderare neeejje eßß ßt mulier , quali- Troff,
tercumfuis confeíjoúbus convsrf л'иг, & ¡nßmfto- ¿е Pri>~
r'tbus : ß collo:utionibns itt'endit continuis, fub ob- botione
Tentu, nunc ciebr.-e cortfeßonis , nunc prolix* nor - ÍP'rt~
ration!s -vißmum fita um} nunc altertus cujuflibet tliUm >
confobnlutionis. Expertis crede prxferttm Jíugu- *¿ ß™
fiino, ac Domino Bonoventurx : Уix eß altera pe-
ßis, vel efß:aciorad nocendum , vel infanabilior.
Quodß nihil baberet aliud detrimenti } niß tem-,
ports pr.tjenrh Utiffimam hone confumptionem ,
abunde diabolo fotis eßet. Nao conftruo , por
que fallo com S icerdotes letrados.
О P. Tobias Lhoner da Companhia de
JESUS, diz afii:n. Brevitereas ( feilicet mulleres) Inßm"
¡мах!meßfrequentius conßteontwyxpediat; ideo* ",оПе
que lon»asf& impertinents rwratiuncuUs , proli- РГ4&'С*
xas adbortationestúr curiofas,maps quafalutares 1u*nU
quißionesßudlofi deVttet. E mais abaixo:ÍM ipfo ?* z*
eonfefßioiiis provreßufeverum fe pot¡us}quam fa- c»Xlm
miliarem oßendat. E logo traz o dito de S. Ba- ?**••
filio: Qie о amor efpiritual, &о carnal tem
asporcas huma junto da outra-, com que fue-
cedeáívezes erranros a entrada,8í nao achar
boafahida.
Tüj OP.
j то Tratado
Trocí. O P.Theophilo Raynaudo, tábem da Cont
ri /e, panhia de JESUS, deípoes de haver acôfelhado
iría como oConfeíTor deve eícolher (fe eftiver na
pequé- fuá máo ) confeíTar antes homens,do que mu-
tañone Hieres, diz fallando do trato com eftas. АЦ-
tnullc- tinedt familidritdtc Indecora , dgarque grayior ac
rum per mature , propendens poilus ad feveritatem, quan-
homi- tum per chdritdtem, Ó" debitum muneñsfui exer~
fes fu- cittum Heer, Com o que faz confonancja я
eras, с. fentença de Dionyfio CarthuGano , que diz:
I J.J.8 Sermo brevis, afper, & rlgidus cumjœmims efl ha-
bendus.K mefma traz S. Boaventura attribuin-
do-a a S. Agoftinho , & acrefcentadfl com as
Ъето- feguintes palavras : Kectdinen quia janciiores
do соfi- fuerint ideo minus cayendo,
rend! Con fultei efte ponto com húPadre deOracáo
cap, 4, Sobrenatural , & experiencia antigua, & por
fer de différente naçaô,me refpondeo na lin
gua Latina eftas palavras: Brevis infirucllo veri-
tatis fufficit pro animayocata: ßverayocationem
non habet, nihil prodefl longafermocinatto. Et eà»*
viderîntfe (falla das filhas efpirituaes) non tarn
leniterfotdS , vel proment Vires fuas, vel defißem ;
& ßeconfeflarius non teret înutiliter tempus ;pau-
dfßm<* enim funt midieres qu¿ proficiitnt. Лосе
verltdtem , &~ remitte illas ad "Promoventem
( jcîllcet Deum ) , qui ye! perfielet , vel fegregabît
íonas л malls , & ßc remanebis in íntegro cum
tuo tempore , quo melius impendas. Até aqui
éfte Sacerdote, Mais authoridades poderamos
W4-
'Davirtude da Caftidade. 3 ïï
trazer: porèm para quem eftas nâo baftarem,
ju !go qtábem , nao baítáráo outras.Jà fe fup-
poem , que nas cou fas moraes qualquer regra
admitte fuas exceiçoens , qre o Varáo pru Je
te faberá fazer, evitando extremos viciofos ,
& fabendo temperarfe ao genio dos peniten
tes, para que os nao afugente da confilfáo , ou
■occafione que nao feja inteira.

PERGUNTA XXXVI.
'Donde procede que a peßoa contemplati
va eflando em Oraçao fente as vexes
moviimntos impuros na parte infe
rior ; ér como fe hade haver nefle
• cafo ? .

POJe fer util a folucáo defta duvida, por


que nao he efp¿culativonem muy raro o
cafo,q (uppozmMHcbdS v:\isfncede (fío pala-
vras do Myftxo doutor, o B.Fr.Joáo de la Cruz)
que en los m'fmos exerclc'iot efpiritaales , finfer en
manes delUs ( dos exercitantes ) fe levantan y
[temen enlafenfualidad movimientos no limpios;
y a ve^TS aun quand» el ef¡tirito efiÁ en тисЬл
oración , o exercitando los Sacramentos de la fe~
nitenzia , y Etobanfila. Para refpondermos
poes mais fundamentalmente,devemos afren
tar primsiro, queacontemplacáo leva a al«'
V iiij ma
gie Tratado
ma a utiilla com Déos : para fer unida , pri-
meiro lude fer illuminada; poes Déos be luz,
& a luz nada participa com as trevas : para fer
illum¡nada,primeiro hade fer Purgada; co
mo о efpe!ho,que primeiro fe alimpapaia fer
penetrado do? ravos do Sol.Elta purgaçao lie
de dous modos, porque duasíáo as poiçcens
da alma ; huma fuperior , Sc inte) lea iva , ou
tra inferior , & feníitiva. A intelleótiva or-
dinariament e fe purga com tentaçoens con
tra a Fe,defefperaío=ns, efcrupulos, temores
de condenacáo eterna , fubtrarcáo de confo-
laçoens do Ceo, efpirito de blasfemia , &c.
A féfitiva púrgale com defamparo das creatu
res , perda dos bens temporaes , enfermida-
des prolongadas, vexaçio de demonios , Se
tentaçoens contra a Caftidade , que he o tra-
balho de que trata a pergunta.
Eile padeccráo muytos Santos -, hú S. Pau
lo , que havendo inflado por tres vezes com
Déos, que fe ferviíle de lho tirar , teve por re-
poíla: Baílate, Paulo, a minha graça; que
avirtudefe aperfeiçpa na fraquefa: huma S.
Angela de Fulgino , que chegava brafas
vivas a feu corpo , para mitigar com hum ro
go os furores de outro fogo; & fe o ConfeíTor
lho nao prohibirá , continuara remedio t5o
violento , porque affirmava refolutamente,
que antes quería fer affada , do que comba-
eidac om táomolefta , & continua perfegui-
fâo..
Da virtude âa Caftidade. 313
çío: huma Maria de JESUS, Rcligiola no
Convento da Conceição na Povoa dos Anjos
que lhe era ntcelTario trazer os dedos das
máos abertos, & apartados huns dos outros,
porque de fé tocarem, fé lhe levantava logo
huma batalha centra a Caftidade li&^hralmé-
te outros muitos fervos deDeos , & peflbas
aproveitadasna virtude.
O fim paraqueDcos permitteeftetraba-
lho , he para que por via das noíías refiften-
cias, & vi&orias repetidas, lê fortifique, &
arraigue mais a contraria virtude-, que por ]0,m ^
iíloGerfáò lhe chamou Antipariftaíe cfpiri- j»j^."
mal •, que he augmento das forças de hú con-/?^ g
trario por occaíiáo da guerra que lhe faz o ou- rf</ #»?!
tro. S; bem em alguns San tos, por ventura
que efte trabalho não firva de os purgar; fe-
náodelheacrefcentar merecimentos, & pre-
fervallos de vágloria: como de fi expre (lamen
te confedao Apoftolo : Kelmagnltudo revela- 2-f"£>>'''«
tionum extollat metdíttttsejtmihi fiimuluscarnís '**•* z*
me*, <tn*elus Satan*, ejui me colaphis^et : ou por 7»
outros proveitos efpirituaes , que a tentação
coftuma trazer configc. O grande lago A£
phaltites não he combatido de ventos : por
iííofechamao mar morto: & íuppoftoque '
em fi recebe todos os grados cabedaes do Jor-
dão,náofabe criar mais cue bitume mal chei-
rofo. Ventos fáo as tentaçoens ; & o efpirito
que não lie batido delias, he mar morto : em
vio
314. Tratado
váorccebeo os influxos da graça ; & fempre
inclina a produzir vicios. Logo eftes ventos
das tentaçoés ainda q furiofos, lâo falutiferos,
Ifto fuppofto,refponde-fe àpergunta, que
alèm defta fobredita raufa mais alta , de ou
tras tres inferiores póia proceder eile trabt;-
Jho. 1. ( ainda que pou cas vezes , &em ío-
geitos fracos ) do gollo que toma o natural
nascoufasefpirituaes. Porque comoa peffoa
canda de efpirito, & carne entre fi unidos ,
como ramos do m.fmo tronco; abalado hum,
aba!a-fe o ostro: povèm cada hum a feu mo
do ; o efpirito efpiritualmente -, & a carne car-
nalmcnte: por quanto efta nao tem habilidade
para participar dos íobejos do goílo efpiritua/ ,
lenáo groíTeira , & brutalmente conforme o
axioma da Filofofo , que tndo o que fe recebe
Аса à maneira de quem o recebe : Omnt ijriod
recífürur^ti nudum recipient}s ricipîtur. Nem
tlaqui fe infere que em todos fuccederà lo
go o meftno : porquanto o natural nao
tememtodos a mefmafraqueza : ou porque
a parte do efpirito jà reformada embebe em (I
todo o ^oílo, dcixandoosfentidos em jejum:
ou tambem porque D^os o nao permitte , por
nao achar o fogeito capaz da pac iencia, & ha-
mi Made, que requer- eíbi purgacáo: ou per
ourros fins a elle notorios, & a nos oceultos.
A i. caufa donde outras vezes procedem
eftes movimentos impuros , & rebellioens da
car-
'Da virtude da Caßidade. 3т%
carne , he o demonio , o quai como vè о efpi-
rito embebido em Déos, & que pelo deferto
•da contemplacáo dentro Ihe vai eícapádo do
tiro do arco , ra¿ pelo avocar fora , com elles
reclamos ; & procura que fe inquiete, & en-
trifteça , & encha de ¿ávidas, & temores;
para que oudefampare a orajáo, ou perca
muytó tempo,que pedia aproveitar nella.Por-
que por húa parte iendo táo feas as reprefen-
taçoens, que alli llieofferece o artifice de to
da a impureza; por outra aborrecendo-as tan
to a alma, que dezeja unirfe com Déos, &
nao fabendo fe confente nellas ^he força que
padeça muyto,quando o trabalho iníiite: &
fe fe entrega à melancolia, deftroe a difpofi-
cao necefíaria para o trato com Déos , que
he a paz , & ferenidade de efpirito.
A j. caula pode fer o mefmo temor que a
alma tem de lhe virem efras tentscoerts; por
que affim de fperta a memoria délias, & tai-
vez lhe ajú ta o exame de fe deu confintiméto,
ou a indignacáo contra o trabalbc. E e m qual-
quer deltas coufas vai envolvido o obj<¿to
donde faltáo as ditas faifeas, com que bum fe
tenta a fi mefmo; comoapefloa que eltardo
em lugar alto, &ingreme,o temor de cair
a faz tremer > &cair.
Quanto ao modo com que o paciente fe
ha-de portar, confííte tile nos figiiintes avi-
fos. 1. que faiba como had e itíiftir as ten
ta
j16 Tratada
uçpen?. Porque dous m i los ha de o fazer;
hu negativo, & outro pollcivo. O negativo he
lufpendendo fomente o confentimento , &
deixando ( digamolo aflím) ao inimigo dar o
feu cordelejo de noute à nolfa porta iem ref-
pond:rlhe, nem abrir. O poli-.i vo he re fiítin-
docom aftas interiores , ou q jaefquer outras
diligencias,ou induftrias exteriores :& ifto po
de fer de outros dous modos • i . quando
cites a¿t>s , & diligencias fáo direitamentc
contrarias à ten tacáo: 2, quando nao fáo direi-
tamente contrarias , fe nao que a alma diver
te para o amor de Dios, v. g. ou para aecáo
de graçis , ou ге(цпасао, од aínda para cou «
fas in iitf¿rentes. О prim :iro modo ¡ que he
o negativo , nao parece feguro : porque a
o^iniáo mxis fegura , Se p .ática he, que tem
obrigacío de pe'ejar contra o; m mm entos
libidinofos; parque o contrario feria hu m in
terpretativo m rio déos fomentar , & con-
S~á;b:s firvar.Suppjíloqus amb;m h^provavel (&
/. 3. dt Dautor de primiira claíe lhe cham a proba-
mt~ biliflima ) que cal obriajacíonío temos rpelo
н;т% menos, havendo algumi difplicencia dos taes
¿>y« movimintos, aindaqií nao haja luta cen-
4f. n. tra elles,baílara para q fe entenda que os nao
jf ^ r*om:n;am:>s. E fepor oatra parte ha câufa
/. x in ra-bnavel para que a alma fe nao ponha em
ü:c.x- ar™"s:v.g. parque experimenta que affina fe
/^^¿aguíáoraaisoíinimigos.-cncáo nem venia!
feria
Da v'trttide ¿à Gflßiaadc, 3ij
feria о haverfe negath hmétcMastudoiito íe я. i j.
entende preciíb o pi rigo proximo de polluçâo, Ffla fr
on de deleitacäo morofa; о quai cormgo erdi- gut ca
nariamente trazem eftas icnfibilidades täo Hr.fa-
attraftivasda noffa mal inclinada natureza. lag, que
О tègundo , que he rtfiftindo com actos , cita
& diligencias direitamente comrarias,tem a!- wttitos,
guns inconvenientes: debilita a cabeça: Sc jr. з..
a alma naquelle tempo nao fe acha com for- de pec-.
cas, para applicarfe ao extremo oppefto fem cans ,
muy ta violencia:& em fim he porfe como a ju- ¿ifp. г.
gar , ou difputar com o deraenio argumen- pu«8.
tante impertinente, quenem conclue, nem ю.§,5
fe cala. Refta poes que o melhor modo he o »;. 3,
terceiro, refíftmdo com años de cutras vir- Cyied»
tildes, ou indifferentes. Boas palavrasas de de-vi-
Gerfáo ao prefente intento: Cogitations car- tijsy&
nales ( diz elle ) &fluxns indefequentes ahfque peccatñ
confenfu voluntan» yinatntuY plerumque fallt- Tr. 6,
írius, tKtiits , & efficAciiiSjß ratio fe habeat con-
circa illas pe> modum non curantis ,vel diverten- troy.A¡
tisvoluntatemadalia, quam ß folicitttur^ tri- ptmcl.
fret m-, & conetur tales expeliere. 3,
i Avifo: Devem eftas almas acautelarfe Тот.г'.
muito de dar da fuá parte occafiáo alguma a Traft.
eftes movimentos : abftendo-fe de cómu- depra-
nicacáocom mulheres, ou quaefquer outros parati-
fogeitos perigofos,dentro das leys da caridadç «rie ad
junta com a prudencia: fugindo de ver, ouvir, Щ-
& ler,coufas|tQcnos honeftasj&da regalar o /<*«».. -
çorpok
3i8 Tratado
corpa com mefa abundante J cama branda,
lavatorios cheirofos , & outras coufas feme-
Ihantes ; conforme a doutrina do Apollólo :
. . Ornais autem qui in agone contenait, ab omnibus fe
abfiiner.
S: Nao fe perfuadáo fácilmente que pec-
caráo : porq he impoffivel haver peccado mor
tal fem deliberacáo plena,&perfeita.'Pece'<«íffw»
( diz S. Agoftinho ) adeo efi -»sluntarium , quod
pyoluntariummneß , ptecatum von eß, E das
meimas queixas , duvidas , temores, & penas
de hua deltas almas , fe eftà vendo, que nao
tiveráotal deliberacáoperfeita, Seque con -
fundemo fentir com o confentir. De forte
que o dúvidar ferve aqui fomente de inftru-
mento para purgar : porque fe à alma lhe con-
ftàra decerto nao haver confentido, pouco
fe lhe dera defte trabalho(como ellaproteftaj:
,:, . & por confeguinte nao fe purgara. E daqui
vem,q nemnosconfelhos dos Padres efpiri-
. , tuaes,nemnos livros acluconfolacáo,mais
que por breve tempo , & accidentalmente :
porque importa que a obra de Déos fe va fa-
zendo , a qual confide em pena , & nao em a-
Jivio, faU'oaquelleque precifamente he ne
cesario, para foportar a contieuacáo da mef-
raa p:na.
Toda a fobredíta doutrina he de Authores
graves oí doutos na materia. Leáo-fe ef-
Hilip. pálmente os Padres Fr. Filippe da Santiffi.
roa
Vá 'virtude da Caflidade 319
ma Trindade, Fr. António doEípiritoSanto,* 5V«-
Fr. Jofeph de J E S U MARIA, & Fr. An- fHfliM
tonio da Annvmciaçáo : porém melhor que to- irinít.
dos o Beato Fr.João de laCruz acima referido, jnfiw*
em cuja doatrma concorrem três razoe ns pá- 1 becl.
rã fé venerar: i , fer dehú Santo , que ao fer Myftic.
beatificado , primeiro haviáo de fer examina- P, i,7).
dos na Cúria Romana feus efcritos: 2. , ccn- í.difc.
íèrvarem -fé incorruptos os dedos com que a i.urt.i
eícreveo , fcgundo fé lií'na fuá vida, & nota- jLnton.
mós a femelhante pròpofito no noíTo livro à
de Ltt^ , & Cítlor , na doutrina da contem-
plaçáo adquirida: 3 , fero primeiro Cai me-
Jitadcfcalço,cujapena parece vercfimil que
a .'ivina Sabedoria rc5gcííe , para governo de Ir. 2.
tantos profelTores da vida conttinplativa, que <////>. 5.
iiaqueila fa grada Reforma haviáo de floreccr. Scc.j.
».
PERGUNTA XXXVII. .
Comofe hade haver a pffioa , epte tendo *""•'•
feguido alguns amo* os exercícios efpi
rituaes , & ejludo da perfeição , cahi»
tniferavelmente offendtndo a Lojh- i.^
dade ? 7\h
Erponde-fe primeiramente, que cm ré- jg '
R nhum modo cóvem defaltntarfe, & per- '
o anima i porque a pufilanimidade lhe fa- p

Tratado.
rà mayor dano do que o mefmo peccado,ind«-
- findo-a a abrir máo da vida elpiritual , Ôc a
entregarfe a outros muytos abfurdos. He
jD/*í,/. certo que a miíericordia de Dcos ainJa lhe
j.c. 2. não fechou as portas,poes a juftiça lhe não
& 6.B. tomou já as contas. Cahio como frágil j levá-
te-fe como arrependido , & vá caminhando
como defcnganado com mayor cautela, & di-
ligencia. Aííim fez Daviddeípoes do caio de.
1. 1. fie B^thfabe : affim S. Pedro defpoes das três ne-
h nocbe gaçoens: aflim outros muitos San cos, tãto mais
t\c»rd y Santos, quito mais peccadores. Entre osquacs
ftp.A. fte celebre hum Fr. João Guarino , famofo
Anacoreta, que trazendo-lhe hum Conde fuá
filha , paraque expclliffe delia o demónio,
( como com eríeito expellio) defpoes a deflo-
rou,& para encobrir efta enormidade,comet-
teo outra mais horrenda macandoa cruelflien-
ce , Si enterrando-a. Porém não apartando
delle Deos os olhos de fuá mifericordia , tex
aíperrima,& prolongada penitencia, andando
de rojo muy:osannos como bruto , & fendo
reputado por monítro filveftre : até que o
Senhor lhe fignificou milagrofamente como
fuás cuípas eftaváo perdoadas.
í. Procure examinar qual foy a canfa da
fuá queda , & creyo achará harer fido fober-
ba occuka, conforme aqúillo de David: Priitf-
quitm hnmiliarer , tZo (tcliejul : Quando fiz o
meu peccado,ainda náo era hujpailde: & aquil-
lo
Юа-virtude da Caßidade. 321
lo de Ofeas : Spiritus fornjcationnm in medio eo-
*rum ... Û* refpondebit arrogant/л ifrael in facie
ejus : O efpi rito da luxuria entrará no meyo
délies: & a arrogancia de Ifrael lhs dará a ref-
pofta na cara : Jicß diceret ( pondera S. Gre
gorio ëftas palavras) : culpa qua per elat/onem
metis in occult0 Idtuity per earn!s luxuria in aperto
refpondit : como fe différa o Profeta : A culpa
da íoberba que eftava occulta no coraçâo, ap-
J>areceo manifefta pela luxuria da carne. Pe-
o que importa que dali por diante fe appli
que mais de veras ao eftudo da humildade pe-
dindo-a com inftancia a Déos Senhor Noffo ;
& aproveitando as occafioens de a exercitar
com aâos interiores, & exteriores; guardan
do-fe fummamente de fe reputar , ou affeclar
Гег reputado por virtuofo , & de eftíanhar os
defeitos dos próximos , ou anteporfe a elles
no proprio conceito.
3. Suppofta aconfiffáo facramental (que
para bem hade 1er com o mefmo Sacerdote ,
que antes governava a fuá alma ): os primei-
ros dias q a prudencia determinar, faca algúas
penitencias , & raortificaçoens menos ordi
narias, do que coflumava, para vingar em û
a traicáo , & injuria que fez a Déos. E peça-
îhe lagrimas de verdadeira contricáo , para
lavar a fuá mancha. Porque comodiz S. joáo
Chryfpftomo , fáo huma grande merce de
Peos;poes dadas empeña fe coavertem em
3» Tratado
lalvaçao.-& aflim como a madeira cria o bi
cho , mas o bicho deftroe a madeira : affim do
peccado nafcem as lagrimas , mas as lagrimas
deftroem o peccado.
4. Nao fe períuada todavía , que por mui*
toq feca(b'gue,& atormente, pode dar fatiC
faca ) a D¿:os,cuja offenfa he em certo modq
infinita. Os merecimentos , & fatisfacáo de
Chrifto (quetambem he PeíToa Divina), fáoa
nolla perfeita juftificacáo.Eltes offereça mili
tas vezes ao Eterno Padre : neftes ponha fuá
confianea. Mas para que fe digne de Ihos ap..
Shear , importa que faca da fuá parte. Mo-
rouDeos a/ualerva Maria de la Antigua,
hnm preciofo averna! de purpura, ou eícarla-
ça,o quai tinhanas pontas huns cordellinhos
muydeípreíiveis: & ditTelhe que a purpura
fra o feu fangue ; mas que efte para fe nos
applicar requería as noflas diligencias ; aínda
que fracas , & de pouco valor.
5. Depoes de chorar feus peccados ,'provi
ga nos feus exercicios guardando o mefmo
porte de vida que antes j aflim na reparticáo
das horasjcomo nos pontos da meditaçâo, fera
fer neceííario tornar à via purgativa , fe jà
tinha paíTado della. Mas fe fentir efpecial mo-
çâo a mais rigor de vida, mais oracáo, & mais
/euro das creaturas ; & eftes impulfos íáo vi
vos ,& fréquentes , bem a pode feguir, ap-
provoando-o o feu director efpiritual. E fe
- DeoS
Da virtude da Caßidadf. 323
Deoso chama para eftado Religiofo, appli-
quemfe as regras,que para difcernir efta vcca-
cao fe devem obfervar : com advertencia, que
a fegurança do noííb eípirito nao confine so
po habito , & claufura , & perfeicáo do in*
ftituto ; fenáo principalmente na obfervan-
cia delle , a qua! em humas cafas tem feu vi
gor , por merce de Déos ; em outras nao , por
miferia noffa. "
Om outras muitas queftoens podíamos
amplificar efte tratado. Porèmcomoas fobre-
ditas fáo as princ:paes, & da refoluçao délias
fe poderà colher a de outras ; & levamos
ô intento de nao fer diffufos , largarnos aqui
a penna : rogando a Déos N. Stnhor, que ce
da cudo em gloria, & louvor feu, que he o
fim que deve dirigir todas noíías obras.

Tudo fogeita feu Author com animo


rendido , & efpontaneo ao fentit
da Sata Madre Igreja Catho-
lica Romana.

Finis. Laus Deo , ©* Beatiffimœ

»r.ï<; . xij -■■-• De-


DEVOÇÃO PROVEI-
toíã para alcançar a virtude da
Caílidade por interceflao da
"' - Virgem Beatiííima.
DTTO o verfo: Letts'in adjutwu,
meu intende) Domine ad adjwvan-
dum me feftinu : & logo o Çlorta PMYÍ ,
CSV. fé reza h ú Terço, pondo em lugar
de Ave M ARI AS efta jaculatória :
Vir^em M^ÍRI^4 M*e deDeos rogai
A i ES V fcr nós : em lugar de Padre
NoíTos, a feguinte antífona, verfo, &
6ração.
Aiitif. Percinge nos Domine citigul&ptiri-
tatis , & extingue in lnmbis noftris
Iwmorem líbidtws j ut maneat \n-
t ttobis vírtus çontinentia 3 & caftr*
Utis.
&• Bigíiare tneUudarete Virgo fa-
CTAtít.
ty. JJa, miht Virtíitem contra Inoftes
.. : tuos. . Ora
3*f
Oremus,-
Oraçao T) ERfanElam 'phgrnitatem^
JL & immacttlatam Cunccp-
tionem tuam , Purijßma Virgo ,
emunda cor, & carnemnoflram-^
in nomine Patris s -Ji &" fíüjjjf
. f, & Spiritus -f santti.^men.

As tres cruzes fáo final de que faz a


Cruz tres vezes nocoracáo.

Afíim fe váo refando as ííncoenta


jaculatorias rematando cada dez com
a dita antífona , oraçao , & verfo : &
no fim fe diz os Hymno^^i- maris Stel
la; & logo о Snb tuuprafidium cofigimuf
Sa¿ía LeiGenitriXy noftras deprecationes ne
de/pidas in neceffitatibus nojtris , Jed л
fericulis cunSiis libera nos [emper Virgo
Cbriofa y &1 BenediBa.
Defpoes о verfo: Ora pro nobis Sanfla
VeiGeniirix. щ. vt d'tgni efficiamnr pro-
miffionibasChrißi. AC'iiQ'J«**

Xiij;;^
}2б

Oremus.
F^muUstuis ^qua/Minus Domine3 c<e-
iefiiS gratia muñas impertiré; ut qui'
bus BeatЛ Vtrginis partus extitit falutis
exordium fonceptionis ejus totifa tomme-
niordtw fdcis tribuat incrementum. Per
Chrißttm Dominum noßrum> Лтеп.

-'BLI0TESA Y.JÍ '•-•■. ■'


é-

Das könnte Ihnen auch gefallen