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ALBUQUERQUE JÚNIOR, Durval Muniz de. História.

a arte de
inventar o passado. Ensaios de teoria da história. Bauru: Edusc,
2007. 256 p.
Nathália da Costa Amedi1
Renilson Rosa Ribeiro2

A história está aprendendo, talvez, que mais do que desencantar


ela precisa encantar seus leitores e aqueles que a fazem.

O professor-pesquisador Durval Muniz de Albuquerque Júnior reúne


em seu mais novo livro, História. a arte de inventar o passado, uma coletânea
de ensaios que nos chega em muito boa hora. Ler (e ouvir) Durval Mu-
niz é sempre um convite ao deleite e um bom pretexto para reafirmar
a nossa paixão pela história. Fruto de mais de dez anos dedicados ao
magistério superior no campo da Teoria da História, ministrando cursos
nesta área de especialização, para alunos de graduação e pós-graduação,
seus textos, tendo como temática central: as diferentes maneiras de se
escrever a história, convida-nos a um outro olhar sobre o passado, ao
aproximar a sua escrita de um tom mais literário, sem deixar de lado
o rigor dos conceitos necessários a sua análise. De escrita cativante,
audaciosa e criativa, a sensibilidade poética na abordagem dos temas
provoca certo desconforto para aqueles acostumados ao terreno seguro
da ordem científica, presos aos fundamentos dogmáticos da chamada
história-verdade-objetiva. Seu livro é um belo mosaico de ensaios que for-
mam uma bela colcha de retalhos com diferentes cores e tonalidades.
Durval Muniz é doutor em História Social pela Universidade Estadual
de Campinas, professor titular do Departamento de História da Universi-
dade Federal do Rio Grande do Norte. É autor de: A Invenção do Nordeste
e outras artes; Nordestino: uma invenção do “falo” – uma história do gênero
masculino e Preconceito contra a origem geográfica e de lugar – as fronteiras da
discórdia. Trabalha ainda com História das identidades espaciais, História
de Gênero, História da Cultura e Teoria da História.

1 Licenciada em História pela Universidade do Estado de Mato Grosso (UNEMAT).


2 Professor do Departamento de História da Universidade Federal de Mato Grosso – Campus Universitário de
Rondonópolis. Doutorando em História Cultural pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP).

COLETÂNEAS DO NOSSO TEMPO 2008 Ano VII – v. 8 p. 155-160 nº8


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Com prefácio deste livro, contamos com Manoel Salgado Guima-


rães, que debate a importância dessa obra na historiografia brasileira
e o percurso intelectual trilhado pelo autor. O livro está dividido em
três partes com uma série de artigos dedicados à escrita da História, a
relação entre a História e a Literatura, fazendo uma análise de autores
importantes para a historiografia contemporânea, com uma série inteira
de artigos dedicados ao filósofo francês Michel Foucault, que teve muita
influência no pensamento de Durval Muniz e, para finalizar, uma reunião
de artigos variados. São textos em sua maioria curtos, mas com forte
poder de argüição, crítica e estilo.
Na Introdução, o Durval Muniz traça um panorama de como ele
pensa o ofício do historiador, marcando posição quanto aos principais
temas que são objeto de análise em nosso campo de atuação, ao mesmo
tempo contextualiza e problematiza o conceito de invenção, palavra
muito recorrente em nossa área, cerne de seu trabalho como historiador.
O autor apresenta uma consistente abordagem sobre o momento refle-
xivo pelo qual vem passando a História, a preocupação com a questão
da narrativa, da própria escrita da História e de como está participa na
elaboração do fato, demonstrando a dimensão ficcional, poética e “in-
ventiva do discurso do historiador” (p. 20-21). Os objetos e sujeitos se
desnaturalizam e passam a ser pensados como fabricação histórica, com
criação por meio dos discursos, deixando de lado o caráter metafísico
e racionalista, isso desde a “virada lingüística” da década de setenta do
século XX.
Ainda nesta parte introdutória, Durval Muniz debruça-se sobre
a divisão um tanto artificial na historiografia contemporânea entre a
História Social e Cultural. Não menos importante, uma discussão sobre
a noção de evidência da História emerge em suas reflexões, ou seja, a
ilusão que se tem de que os fatos se impõem ao historiador, que inter-
roga as evidências com perguntas que revelariam o passado tal como
aconteceu, como se não fosse o historiador que as evidenciasse por
intermédio de seus procedimentos e aparatos teórico-metodológicos os
eventos que mais o interessam. Para o autor, “Não podemos pensar que
a História escreve a si mesma, que os fatos se impõem ao historiador,
que se impõem como evidência” (p. 32). Manter essa atitude diante da

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“evidência” da história seria como se acreditássemos que uma rede se


faz por si mesma sem a intervenção do artesão. Assim igualmente é a
história, que, “tecida” pelas mãos do historiador, através da sua lingua-
gem e narrativa, a fabrica e a traduz.
Nos artigos da primeira parte, o autor persegue a relação entre a
História e a Literatura, dissolvendo essa oposição clássica entre historia-
dores e literatos, demonstrando os seus pontos comuns e seus limites,
em que, como afirma Durval Muniz, “(...) a clara defesa de um campo
de saber mal disfarça a luta pelo poder no interior da academia” (p. 12).
O autor questiona-se por que será que os historiadores temem tanto a
Literatura. A sua hipótese é de que essa oposição, de longa data, seja
fruto de um questionamento da Literatura sobre o próprio estatuto
do saber histórico e o caráter inventivo de nosso ofício. Ao longo dos
ensaios desta parte, peregrinando pelos textos de Clarisse Lispector,
da dupla Bouvard e Pécuchet, de Fleubert, de Franz Kafka e do poeta
Manoel de Barros, o objetivo do autor “(...) não será separar a História
da Literatura, não será encontrar seus limites e suas fronteiras, mas
articulá-las, pensar uma com a outra.” (p. 44). O que Durval Muniz
pretende vislumbrar é a dimensão artística de nosso ofício e de nossa
prática, tomando a história como a arte de inventar o passado, mas sem
esquecer a dimensão metódica da produção do saber, de sua marca
científica e dos limites impostos pelo “nosso” arquivo, só podendo ser
historicizado aquilo que deixou rastros.
A segunda parte da coletânea é dedicada aos trabalhos de Foucault
em seis instigantes ensaios. Interessante destacar o segundo, em que o
autor analisa a obra de Foucault, à luz de sua produção, relacionando
o trabalho do filósofo com sua existência, com sua maneira de ser e
estar no mundo e com seus costumes. Aqui Durval Muniz propõe que
o pensamento do francês seja usado, que suas idéias sejam discutidas e
que se distancie de um certo senso comum que prevalece na abordagem
de suas idéias. O ensaio seguinte debate a diferença entre a forma como
Edward P. Thompson utiliza o conceito de experiência e a forma como
Michel Foucault utiliza o mesmo conceito, apresentando as diferenças
nas formas de se pensar a História e a práticas historiográficas desses
autores. Para o autor, Thompson a limita, a sua noção de experiência

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é remetida a um sujeito fundante, a um sujeito coletivo, com base nas


classes sociais, já o filósofo evita essencializar às experiências históricas,
não buscando nelas um caráter fundacional. De acordo com Foucault,
nada é fixo no homem, suas experiências são fragmentárias, os sujeitos
são históricos como também é sua natureza.
Nos dois ensaios seguintes são analisados, ainda com base no
pensamento de Foucault, a questão do objeto histórico, propondo a
desnaturalização dos objetos da história, de pensá-los como constru-
ções discursivas; também aborda a questão do ‘jogo’ na história, sendo
ela mesma pensada como uma espécie de jogo, aberta as incertezas.
Ela seria como uma ficção resultante da imaginação humana, e da sua
descontinuidade, sempre interpretada por meio de novas regras, novos
sentidos. Durval Muniz pretende analisar a historiografia como uma
luta pelo poder, disfarçado de verdade. Por fim, ele traz uma singela
homenagem a Foucault, o homem que morreu de rir, de si, dos outros
e dos poderes instituídos, que utilizou o riso como arma.
A terceira e última parte da coletânea é composta por seis ensaios que,
embora não tenham uma temática comum, constituem certa unidade
entre si. É discutido temas sobre a relação entre história e memória; a
singularidade dos eventos históricos; a relação entre a escrita e a orali-
dade – a chamada história oral; a prática historiográfica e seus desafios
contemporâneos.
No primeiro ensaio, Durval Muniz aborda a questão da manipulação
da memória pelos historiadores, sejam elas, escritas ou orais, individuais
ou coletivas, que nos últimos tempos vem sendo importante fonte para
o trabalho da “gestação da História”. Ele critica a escassez de estudos
sobre os diálogos entre as memórias e a História diante da fecundidade
de tal relação. Para o autor, o que se vê na chamada História Oral é a
falta de discussão sobre os aspectos teóricos e metodológicos de quem
trabalha com memórias no campo historiográfico. A necessidade de
cuidados que vão desde a conceituação de memória e História, que
evite considerar as memórias como um discurso mais verdadeiro, mais
próximo da “verdadeira história”, se contrapondo a “história oficial”,
desde uma clara definição dos métodos, tanto na coleta de dados des-
tas memórias como seu uso no interior do discurso historiográfico.

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Segundo Durval Muniz, a relação dos historiadores com as memórias


é uma relação de violência : “a História é também uma violência que
se pratica com as armas dos conceitos, do pensamento, da razão. Por
mais bem intencionado que o historiador esteja em relação ao buquê de
memórias que tenha coletado, ele terá de deflorá-la para poder gestar a
História” (p. 206).
A História ressignifica o que fica de memórias dos indivíduos e das
identidades. A violência do historiador, que com seus conceitos, dá
novos significados a essas memórias ao recortá-las ou destruí-las, e a
partir delas gestar a história.
Ainda neste mesmo caminho mas discutindo a História Oral, no
quarto ensaio o autor vai tratar da “(im)possibilidade” da História
Oral, como bem diz ele “uma história que se diz oral, mas que se faz
por escrito” (p. 229). Ao observar que esta anula significativamente a
manifestação dos gestos e das emoções de quem fala pela interferência
do roteiro, e também pela presença do historiador-entrevistador, ele
próprio personagem da entrevista, Durval Muniz questiona: “terá ela
conseguido converter a derrota histórica das oralidades para a escritura?
Não me parece, até porque ela seria um agente infiltrado, que continua
em busca dos segredos dos que falam para escrevê-los, tornando-os
documentos, inscrevendo-os como monumentos” (p. 229). Mas acre-
dita que nesta (in)definição está todo o seu charme, seu encanto e sua
produtividade. Para além de provocar os historiadores que trabalham
com a história oral, ele tenta debater com estes profissionais e busca
respostas também para suas inquietações, ao assumir que: “A história
é mais um artefato que reafirma a dominação dos que escrevem sobre
os que falam” (p. 233).
Essa lucidez de Durval, ao assumir essa relação de poder da escrita
sobre a oralidade, só reafirma o cuidado que temos que ter ao trabalhar
com as fontes, seja elas quais forem, para tentar, mesmo sendo impos-
sível, não “matar” pela nossa escrita os sujeitos que dela fazem parte.
Para finalizar, num ensaio com a sensibilidade a flor da pele, Durval
Muniz faz uma homenagem a um historiador, que não existe material-
mente falando, mas muito vivo por meio de sua obra e de seu pensa-
mento, seu professor-orientador, na Universidade Estadual de Campinas,

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e amigo Alcir Lenharo. Ele analisa as contribuições de Alcir Lenharo


para a produção historiográfica, que segundo Durval Muniz, era uma
aventura carnal, uma questão de sensibilidade mais do que racionalidade.
Segundo o seu amigo-orientador, produzir História é uma formar de se
aproximar do outro, do estranho, e dele fazer um amigo, e para, além
disso, estabelecer uma relação de intimidade com o seu tempo e com o
pensamento. Para ser historiador é necessário uma certa generosidade,
distribuir pistas, indícios, instrumentos para a livre reflexão de quem
quer que seja. O que fica como reflexão, sobre Alcir aos olhos de Durval
Muniz, amigos em vida e na vida, é essa capacidade de se encantar pelo
outro, na História e pela História, de luta contra todas as formas de
opressão que impedem as pessoas de se “fertilizarem mutuamente”, uma
luta constante contra toda forma de injustiça e preconceito (p. 215).
Como bem destaca Manoel Salgado Guimarães, no prefácio da co-
letânea, ler os ensaios de Durval Muniz é “partilhar a pergunta sobre
o que efetivamente nos faz humanos (...) Sobre isso nos fala o livro de
Durval Muniz de Albuquerque Júnior. A isso nos convida sua escrita e
sua leitura, a nos deixar tocar pela força das palavras em sua dimensão
poética quando tratamos de nosso ofício” (p.16).
Para além do ambiente puramente acadêmico, problematizando
o próprio mundo em que vivemos e o que estamos fazendo de nós
mesmos, é uma escrita para fazer amigos, uma escrita de amor à vida e
ao mundo, talvez esse seja o grande desafio de Durval Muniz e todos
nós, procurando fugir das cadeias identitárias e essencializantes. Boa
leitura a todos!

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