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3. Fatores de superação do modelo estadualista. Questões emergentes.

A dogmática jurídica atual baseia-se num modelo de pensamento com origem no conceito de Estado-
Nação, originário do período da Revolução francesa. Nas tabelas seguintes, sintetizamos as
características fundamentais, quer do paradigma estadualista, quer do pós(anti)-estadualista; apontando
ainda alguns problemas apresentados pelo pós-estadualismo.

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3.1 O paradigma estadualista do direito.
Axioma Consequências

· O direito corresponde a essa vontade geral que decorre do pacto e, logo, deve ser
Individualismo e contratualismo - o Estado interpretado de acordo com a vontade (do legislador, no direito público) 
(i.e., a entidade que dispõe em exclusivo do Interpretação subjetiva da lei e dos contratos; tendencial exclusão de limitações éticas,
direito de empregar a força para se fazer de boa fé, de razoabilidade, de ordem pública, na teoria dos contratos;
obedecer) baseia-se num pacto social, logo, · O direito deve corresponder ao livre curso das vontades e dos interesses individuais
num acordo de vontades, entre indivíduos; (liberalismo) (primado do direito subjetivo, harmonizado com os outros direitos
subjetivos e excecionalmente “comprimido” pelo interesse público ;

Identificação entre lei e direito:


· Redução das fontes de direito à lei;
Legalismo – um direito correspondente à
vontade geral. · Inexistência de critérios para avaliar se a lei está de acordo com o direito;
· Negação ao judiciário de poderes normativos para o caso concreto  adoção do
modelo do “silogismo legislativo”.

· O interesse geral sobrepõe-se aos interesses privados, sendo mais do que a soma
destes;
· O Estado é o delegado de todos os cidadãos e/ou o garante do interesse geral e do mais
racional e neutro equilíbrio dos interesses particulares;
Estadualismo · A legitimidade do Estado radica, se não na vontade geral, nesta sua capacidade de
árbitro racional ou de representante do interesse geral;
· O direito com o Estado (Staatsrecht) corresponde a essa norma neutral com que o
Estado garante, face a outros interesses particulares, o interesse geral embebido num
direito geral e abstrato.

· A doutrina (“ciência do direito”) como expressão racionalizada da vontade do povo


(Volksrecht  Professorenrecht);
Cientismo doutrinal – um direito · Presunção de que o legislador é sistemático e racional – ideia com impacto nas teorias
correspondente à razão (a uma vontade da interpretação e da integração;
racional) jurídica, já que a vontade geral é
assimilada à vontade racional (<> vontade - A sistematicidade do pensamento legislativa exprime-se na formulação de “princípios
arbitrária). gerais de direito”;
· Automatização das decisões jurídicas casuísticas (dedução da solução a partir de
princípios gerais – “jurisprudência dos conceitos”, silogismo conceitual).

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3.2 A crise do paradigma “estadualista”, “legalista”, “voluntarista” e “cientista”. O advento da ideia
de “comunidade pluralista de direitos”.

Fatores do anti-estadualismo Consequências Questões problemáticas

- Busca de critérios supralegais de verificação da


legitimidade da lei (v.g., direito natural, direitos
- Como se definem os padrões supra
humanos; princípios constitucionais não escritos);
- O advento dos regimes políticos positivos de avaliação das leis (incluindo a
- Reforço da ideia da existência de um momento
autoritários dos meados do séc. XX, constituição) ou os princípios valorativos
ético ou “moral” incorporado nas constituições
identificando o direito com leis implícitos na constituição ?
(“constituição material”), inviolável pela vontade
geralmente tidas como injustas e com a - Como se constitui (quem constitui) o órgão
constituinte bem como pelas leis;
autoridade totalitária do Estado. jurisdicional de controle da
- Reforço da ideia de controlo da conformidade
constitucionalidade ?
das leis cona constituição, incluindo nesta as tais
referências a princípios axiológicos;
- Qual o fundamento do direito contra
- Reforço das garantias individuais contra o maioritário ?
- O receio de um Estado omnipotente Estado; - Quem cuida da regulação no interesse de
ou omnipresente, mesmo democrático - Valorização dos direitos “negativos” (ou de todos ?
(ditadura das maiorias ou ditadura resistência) em relação aos direitos “positivos”; - Como se protegem os direitos elementares
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maioritária; totalitarismo do Estado) . - Formulação do princípio da “subsidiariedade do dos mais fracos, senão por um Estado
Estado” providência, promotor de políticas sociais
públicas ?
 - Como se assegura o cuidado pelos
interesses comunitários (ambiente,
urbanismo, pagamento de impostos,
políticas sociais públicas [saúde, educação,
segurança social], defesa de interesses
comunitários estratégicos) ?
- O Estado ineficiente e “gordo”. - Políticas de privatização e de Avalia-se a eficiência do “privado” ?
desregulamentação; - boas práticas ?
- Fomento da autorregulação; - honestidade ?
- Valorização do “direito do mercado” - transparência ?
- boa gestão ?
- Como se asseguram os interesses dos
grupos subalternos (trabalhadores,
consumidores, desempregados, idosos,
jovens) ?
- Como se evita o darwinismo social ?
- Introdução de mecanismos de democracia - Algumas das medidas da coluna anterior
participativa; supõem uma “democratização interna” da
- Descentralização; sociedade civil, sob pena de ainda poderem
- O desencanto com a democracia - Reforma dos sistemas eleitorais, reforçando, agravar os défices democráticos do governo;
representativa. nomeadamente, a responsabilização dos eleitos - Os pressupostos da democracia
perante os eleitores (círculos eleitorais deliberativa ou participativa – educação
uninominais): cívica e política; promover uma função
- Aprofundamento da democracia, no sentido de esclarecedora, consciencializadora e não
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uma “democracia deliberativa” (Cass Sunstein ); alienante dos media;

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Veja exemplos de dois modelos de constituição, um caraterizadamente estadualista (Moçambique, 2004 -
http://www.mozambique.mz/pdf/constituicao.pdf; www.portaldogoverno.gov.mz/.../constituicao_republica/) e outro de grande
abertura ao pluralismo político e jurídico (Bolívia, 2009 - http://www.geocities.com/cpbolivia/newcpe.htm). Note as novidades
deste último, logo a partir do preâmbulo.
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Aconselha-se vivamente a leitura de Cass Sunstein, Republic.com, Princeton, Princeton University Press, 2002, um
livro interessante para se entenderem os processos de corrupção da democracia pelo senso comum massificado, bem como as
propostas para contrariar esta tendência . V. súmula das suas ideias em “Is the Internet really a blessing for democracy?”, em
http://www.bostonreview.net/BR26.3/sunstein.html; or “the daily me”, in http://press.princeton.edu/chapters/s7014.html. Do
mesmo autor, mas em sentido divergente, Id., Sunstein (2006), Cass, Infotopia: How Many Minds Produce Knowledge, Oxford,
Oxford University Press, 2006.

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Fatores do antilegalismo:

- Alargamento das medidas jurídicas de proteção


dos direitos humanos, sobretudo contra as
violações destes pela lei;
- Criação de instâncias judiciais nacionais - Caráter problemático de uma definição
(tribunais constitucionais) e internacionais de abstrata e geral de “direitos humanos”,
recurso contra a violação estadual, normativa ou independente das tradições histórico-
por ato isolado (eventualmente, não estadual) culturais.
- O progressivo êxito da ideia de dos direito humanos ou dos direitos
- Perigo de se “naturalizar a cultura”,
“direito humanos” ou “direitos fundamentais) (aplicabilidade imediata dos
transformando em naturais direitos que são
fundamentais”; direitos fundamentais, recurso de amparo,
específicos de uma cultura hegemónica.
eficácia “externa” dos direito fundamentais;
criação do Tribunal Europeu dos Direitos - Desigualdades no acesso prático à
Humanos e do Tribunal Penal Internacional); proteção dos direitos humanos (individuais
ou grupais)
- Alargamento do conceito a categorias de
cidadãos particularmente carenciados: direitos
das mulheres, dos idosos, das crianças, dos
deficientes, das vítimas;

- Garantia de neutralidade (não egoísmo,


 Criação ou reconhecimento de polos ou formas
- A morosidade e inadequação das leis não paroquialismo, não corporativismo)
de autorregulação não estadual.
destes polos.

- A ideia de que a legitimidade do


direito não depende apenas da - Como salvaguardar o princípio republicano
- Valorização autónoma da doutrina e da
autoridade do Estado (imperium), mas da soberania do povo, expresso,
jurisprudência, bem como (menos
ainda da força intelectual de um saber designadamente, no carácter democrático
frequentemente, valha a verdade) do “direito
– o saber jurídico (auctoritas) - e dos do direito: direito como expressão do
vivo” na consciência popular.
sentimentos de justiça da comunidade consenso generalizado ?
(mores)

- Como evitar uma regulação hegemónica


- Reforço da ideia de diferenciação dos polos e (dominada pelos mais fortes)?
- A redescoberta do pluralismo social
níveis de regulação, com ênfase para os não
(de vários sentidos … [pré-moderno e
estaduais. Entre os quais, com enorme força - Como evitar que a regulação pelos media
pós moderno]); se transforme em manipulação pelos
expansiva, os meios de comunicação social.
media ?

- Reconhecimento de fontes de regulação . Como salvaguardar o princípio republicano


- A globalização e o desvanecimento do
transnacionais, com impacto na esfera jurídica da soberania de cada povo, expresso, nas
Estado-Nação.
interna. suas tradições culturais, sociais e políticas ?

- Reconhecimento de direitos sociais (i.e., de


direitos que se relacionam, não com o indivíduo
em abstrato mas com ele “em situação” - como
trabalhador, como educando, como carente de
assistência social, como carente de cuidados de
saúde);
- Reconhecimento de direitos da comunidade [ou - Como evitar a tendência corporativa de
- Reação contra uma conceção “interesses difusos”, “interesses, juridicamente certos direitos “de classe” ?
puramente individualista do Estado e reconhecido, de uma pluralidade indeterminada - Como compatibilizar esta proteção de bens
dos direitos. ou indeterminável de sujeitos, eventualmente
comuns com o dinamismo dos interesses
unificada mais ou menos estreitamente com uma
individuais (livre empresa) ?
comunidade e que tem por objeto bens não
suscetíveis de apropriação exclusiva” ], relativos a
bens comunitários (ambiente são, identidade
cultural), tutelados com recurso a ações na
disponibilidade de qualquer membro da
comunidade [ação popular; CRP, n.º 3 do art.º 52;
Lei n.º 83/95, de 31 de Agosto]; class actions).

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Fatores de anticientismo:

- Revalorização de formas de ponderação dos


interesses (“jurisprudência dos interesses”) ou
das intenções da norma (“jurisprudência
- Como encontrar os critérios de
- A oposição da Justiça à Lógica, como teleológica”);
ponderação (de hierarquização) dos
objetivo do saber jurídico; - Revalorização de formas não sistemáticas (por interesses ?
ponderação de argumentos contraditórios) de
pensamento jurídico (“tópica”, “teoria da
argumentação”).

- Introdução de figuras do discurso que


pretendem “captar a lógica normativa da vida”
- A denúncia do “formalismo” do saber (boa fé, prudência, boas práticas, equidade, - Como evitar que, por detrás destas
jurídico e do seu consequente natureza das coisas, direito do quotidiano): cláusulas gerais, funcione o subjetivismo e o
alheamento da vida. arbítrio do julgador ?
- Realce dos momentos “políticos” de realização
do direito;

- Como evitar que isto agrave o problema do


- A antipatia cultural pela generalidade - Revalorização do papel de criação do direito subjetivismo e da deficiente
(despersonalizadora). pelos juízes, em função de casos concretos. controlabilidade do processo de decisão do
juiz ?

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Fatores teóricos

- Não estão bem estudadas ainda, do ponto


- A teoria dos sistemas auto-poiéticos, - Reconhecimento de que cada esfera da vida
de vista teórico e empírico, as condições de
que concebe a sociedade como um social se regulamenta autonomamente a si
validade desta teoria, bem como o modelo
conjunto de sistemas (normativos) mesma, sendo insensível / impermeável, à
de impermeabilidade das fronteiras entre os
isolados uns dos outros (v., infra, __) regulamentação de esferas vizinhas ou superiores.
sistemas.

- A teoria do “direito comunicativo” (cf.,


- Verificam-se, nos foros referidos, as tais
infra, ___), que identifica o direito justo
- Reconhecimento que cada foro de diálogo social condições de neutralidade, igualdade e não
com o produto de um diálogo regulado
constitui um espaço de gestação de direito, tão manipulação do diálogo, tidas como
e igual, e não como a imposição “a
legítimo (ou até mais) do que o direito do Estado. indispensáveis para que ele gere direito
partir de cima” de normas que
justo ?
“colonizem a sociedade civil”.

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