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Os AVEs isquêmicos são subdivididos em cinco tipos diferentes, com base em sua
causa: trombóticos em artérias de grande calibre (20%), trombóticos em pequenas artérias
penetrantes (25%), embólicos cardiogênicos (20%), criptogênicos (30%) e outros (5%)
(ver Tabela 67.1). Os AVEs trombóticos em artérias de grande calibre são causados por
placas ateroscleróticas nos grandes vasos sanguíneos do encéfalo. A formação de trombos
e a oclusão no local da aterosclerose resultam em isquemia e infarto (necrose tecidual em
uma área privada de irrigação sanguínea) (Hickey, 2009).
Os AVEs trombóticos em pequenas artérias penetrantes afetam um ou mais vasos e
constituem o tipo mais comum de AVE isquêmico. Os AVEs trombóticos em pequenas
artérias também são denominados AVEs lacunares, por causa da cavidade criada depois da
morte do tecido cerebral infartado (American Association of Neuroscience Nurses [AANN],
2011; Hickey, 2009).
Os AVEs embólicos cardiogênicos estão associados a arritmias cardíacas,
habitualmente à fibrilação atrial. Os AVE embólicos também podem estar associados a
valvopatia cardíaca e trombos no ventrículo esquerdo. Os êmbolos originam-se do coração e
circulam até a vasculatura cerebral, mais comumente a artéria cerebral média esquerda,
resultando em AVE, que se for do tipo embólico pode ser evitado com o uso de
anticoagulante em clientes com fibrilação atrial.
As últimas duas classificações dos AVEs isquêmicos são os criptogênicos, que não têm
nenhuma origem conhecida, e os de outras causas, como uso de drogas ilícitas,
coagulopatias, enxaqueca, dissecção espontânea das artérias carótida ou vertebral.
Fisiopatologia
Em um ataque cerebral isquêmico, ocorre interrupção do fluxo sanguíneo cerebral,
dada a obstrução de um vaso sanguíneo. Essa interrupção do fluxo sanguíneo desencadeia
uma complexa série de eventos metabólicos celulares, conhecidos como cascata isquêmica
(Figura 67.1).
A cascata isquêmica começa quando o fluxo sanguíneo cerebral diminui para menos de
25 mℓ por 100 g de sangue por minuto. Nesse ponto, os neurônios não são mais capazes de
manter a respiração aeróbica. As mitocôndrias precisam passar, então, para a respiração
anaeróbica, que produz grandes quantidades de ácido láctico, causando alteração no pH.
Essa mudança para a respiração anaeróbica menos eficiente também torna o neurônio
incapaz de produzir quantidades suficientes de trifosfato de adenosina (ATP) para preservar
os processos de despolarização. As bombas da membrana que mantêm o equilíbrio
eletrolítico começam a falhar, e as células param de funcionar.
No início da cascata, há uma área de baixo fluxo sanguíneo cerebral, conhecida
como região de penumbra, em torno da área do infarto, a qual consiste em tecido cerebral
isquêmico, que pode se recuperado com intervenção no momento apropriado. A cascata
isquêmica ameaça as células na penumbra, visto que a despolarização da membrana da
parede celular leva a um aumento do cálcio intracelular e à liberação de glutamato. O influxo
de cálcio e a liberação de glutamato, se forem continuados, ativam diversas vias causadoras
de lesão, que resultam na destruição da membrana celular, liberação de mais cálcio e mais
glutamato, vasoconstrição e produção de radicais livres. Esses processos aumentam a área
do infarto na penumbra, ampliando o AVE. Uma pessoa geralmente perde 1,9 milhão de
neurônios a cada minuto no AVE não tratado, e o encéfalo isquêmico envelhece 3,6 anos a
cada hora sem tratamento (Saver, 2006).
Perda da comunicação
Outras funções cerebrais afetadas pelo AVE são a linguagem e a comunicação. De
fato, o AVE constitui a causa mais comum de afasia (incapacidade de se expressar ou de
compreender a linguagem). As disfunções da linguagem e da comunicação são as
seguintes:
• Disartria (dificuldade em falar), causada pela paralisia dos músculos responsáveis pela
produção da fala
• Disfagia (comprometimento da fala) ou afasia, que pode consistir em afasia
expressiva (incapacidade de se expressar), afasia receptiva (incapacidade de
compreender a linguagem) ou afasia global (mista) (ver Tabela 65.5)
• Apraxia (incapacidade de realizar ação aprendida anteriormente), como a que pode ser
observada quando um cliente faz substituições verbais para sílabas ou palavras
desejadas.
Distúrbios perceptivos
A percepção é a capacidade de interpretar a sensação. O AVE pode resultar em
disfunções perceptivas visuais, distúrbios nas relações visuoespaciais e perda sensorial.
As disfunções perceptivas visuais são causadas por distúrbios nas vias sensoriais
primárias entre o olho e o córtex visual. A hemianopsia (cegueira em metade do campo
visual) homônima pode ocorrer em virtude de um AVE e pode ser temporária ou
permanente. O lado da visão afetado corresponde ao lado paralisado do corpo.
Os distúrbios das relações visuoespaciais (percepção da relação entre dois ou mais
objetos em áreas espaciais) são frequentemente observados em clientes com lesão do
hemisfério direito.
Perda sensorial
As perdas sensoriais em decorrência de AVE podem se apresentar como um
comprometimento leve do toque, ou podem ser mais graves, com perda da propriocepção
(capacidade de perceber a posição e o movimento de partes do corpo), bem como
dificuldade na interpretação dos estímulos visuais, táteis e auditivos. As agnosias são
déficits na capacidade de reconhecer objetos anteriormente familiares percebidos por um ou
mais dos sentidos (ver Tabela 65.6).
Prevenção
A prevenção primária do AVE isquêmico continua sendo a melhor abordagem. Um
estilo de vida saudável, incluindo não fumar, manter um peso saudável, seguir uma dieta
saudável (inclusive consumo modesto de bebidas alcoólicas) e exercícios regulares, pode
reduzir o risco de AVE (Towfight, 2011). A possibilidade de ocorrer coronariopatia e AVE
diminuiu tanto em homens quanto em mulheres com a dieta Dietary Approaches to Stop
Hypertension (DASH), a qual é rica em frutas e vegetais, moderada em produtos derivados
do leite com baixo teor de gordura e pobre em proteínas animais (apresenta quantidade
substancial de proteínas vegetais oriundas de legumes e castanhas). Há evidências amplas
para a incorporação de uma orientação sobre a dieta DASH nos programas de risco do AVE
(Satterfield, Anderson, e Moore, 2012).
As triagens para risco de AVE proporcionam uma oportunidade ideal para reduzir o risco
desse distúrbio, identificando pessoas ou grupos de pessoas que correm alto risco de AVE e
orientando os clientes e a comunidade sobre o reconhecimento e a prevenção do AVE. Os
achados de pesquisa sugerem que o ácido acetilsalicílico em baixa dose pode reduzir o risco
de um primeiro AVE em pessoas com fatores de risco (Goldstein, Bushnell, Adams et al.,
2011).
A idade, o gênero e a raça constituem fatores de risco não modificáveis bem conhecidos
para o AVE. Os grupos de alto risco incluem pessoas com mais de 55 anos de idade, e a
incidência de AVE aumenta mais que o dobro a cada década sucessiva. Os homens
apresentam uma taxa ajustada para a idade de AVE mais alta que as mulheres. Entretanto,
a magnitude do AVE nas mulheres não deve ser subestimada; 1 em cada 6 mulheres morre
de AVE, em comparação com 1 em 25 por câncer de mama (Ennen, 2013; Goldstein et al.,
2011). Outro grupo de alto risco é o dos afrodescendentes; a incidência do primeiro AVE
nesses indivíduos é quase duas vezes maior que a de pessoas de raça branca (Roger et al.,
2012).
São muitos os fatores de risco para o AVE isquêmico (Boxe 67.1). Para pessoas que
correm alto risco, intervenções que alterem os fatores modificáveis, como tratamento da
hipertensão arterial e da hiperglicemia e suspensão do tabagismo, reduzem o risco de AVE.
Outras condições passíveis de tratamento, que aumentam o risco de AVE, incluem a
doença falciforme e valvopatias (p. ex., endocardite, próteses de valvas cardíacas). A
doença periodontal também foi ligada ao risco de AVE. A associação entre a doença
periodontal e o AVE pode resultar da resposta inflamatória do hospedeiro e da infecção
bacteriana crônica, porém o mecanismo exato envolvido ainda não está totalmente
elucidado. A doença periodontal é uma condição passível de tratamento e prevenção. O
lúpus eritematoso sistêmico e a artrite reumatoide são outras condições inflamatórias
crônicas que foram associadas a um risco aumentado de AVE (Goldsteinet al., 2011).
Foram identificados diversos métodos de prevenção de AVE recorrente para clientes com AIT ou com
AVE isquêmico. Os clientes com estenose moderada a grave da carótida são tratados com endarterectomia de
carótida (EAC) ou angioplastia da carótida e colocação de stent. Nos clientes com fibrilação atrial, que aumenta
o risco de embolia, a administração de um anticoagulante que inibe a formação de coágulos pode impedir os
AVE tanto trombóticos quanto embólicos (Furie, Kasner, Adams et al., 2011).
Manejo clínico
Os clientes que sofrem AIT ou AVE devem receber manejo clínico para prevenção
secundária. Aqueles com fibrilação atrial (ou AVE cardioembólicos) são tratados com
varfarina com doses ajustadas, tendo como alvo uma razão normalizada internacional (RNI)
de 2 a 3. Outros anticoagulantes mais recentes, que podem ser prescritos como fármacos
alternativos, incluem dabigatrana ou rivaroxabana, a não ser que estejam contraindicados.
Se o uso de anticoagulantes estiver contraindicado, o ácido acetilsalicílico é a melhor opção,
embora outros medicamentos possam ser usados se ambos estiverem contraindicados
(Furie, Goldstein, Albers et al., 2012; Furie et al., 2011).
Os medicamentos inibidores das plaquetas, incluindo ácido acetilsalicílico, o dipiridamol
de liberação prolongada mais ácido acetilsalicílico e o clopidogrel, diminuem a incidência de
infarto cerebral em clientes que sofreram AIT e AVE em consequência de causas embólicas
ou trombóticas suspeitas. O medicamento específico utilizado baseia-se na história de saúde
do cliente.
As pesquisas sugerem que os medicamentos conhecidos como estatinas reduzem os
eventos coronarianos e a ocorrência de AVE, particularmente em clientes que também
apresentam diabetes melito (de Vries, Denig, Pauwels et al., 2012). Os benefícios
observados foram independentes dos níveis de colesterol, e, hoje em dia, esses
medicamentos são amplamente usados para a prevenção do AVE. A FDA incluiu indicações
para as estatinas, como a sinvastatina, para incluir a prevenção secundária do AVE. Após o
período crítico do AVE, são também utilizados medicamentos anti-hipertensivos, quando
indicados, para a prevenção secundária do AVE (Furie et al., 2011).
Uma pesquisa em andamento está se concentrando nos diversos aspectos do manejo
clínico do AVE isquêmico agudo (Jauch et al., 2013). A FDA aprovou dispositivos de
recuperação de coágulo, que dilatam a artéria bloqueada e restabelecem o fluxo sanguíneo
para o encéfalo. Esses dispositivos incluem um específico cujo formato se assemelha a um
minúsculo saca-rolha, um outro que utiliza aspiração e um terceiro que usa um stent para
comprimir e aprisionar o coágulo.
Terapia trombolítica
São utilizados agentes trombolíticos para tratar o AVE isquêmico por meio de
dissolução do coágulo sanguíneo que está bloqueando o fluxo sanguíneo para o encéfalo. O
t-PA recombinante é um tipo de t-PA (uma substância trombolítica produzida naturalmente
pelo corpo) obtido por engenharia genética (Karch, 2012). Atua por meio de sua ligação à
fibrina e conversão do plasminogênio em plasmina, que estimula a fibrinólise do coágulo. O
rápido diagnóstico de AVE e a instituição da terapia trombolítica (em 3 h) em clientes com
AVE isquêmico levam a diminuição no tamanho do AVE e a melhora global do resultado
funcional após 3 meses (Jauch et al., 2013; NINDS, 1995). A meta consiste na
administração de t-PA por via intravenosa (IV) no intervalo de 60 min após a chegada do
cliente ao SE (Jauch et al., 2010). A administração intra-arterial de t-PA é uma alternativa
para a sua administração por via parenteral. Esse tipo de administração pode possibilitar a
administração direta de uma concentração maior do fármaco ao coágulo, e a janela de
tempo para o tratamento pode ser ampliada para 6 h. Os clientes não elegíveis para
administração por via intravenosa podem ser elegíveis para a via intra-arterial, e esses
métodos também podem ser combinados. O tratamento com a via intra-arterial precisa ser
realizado em centros especializados com acesso à angiografia cerebral de urgência e
centros cirúrgicos intervencionistas (Jauch et al., 2013; Summers et al., 2009). Ensaios
clínicos em andamento continuam investigando a eficácia de outros agentes trombolíticos.
Para obter todo o potencial da terapia trombolítica, é necessária uma orientação
comunitária direcionada para o reconhecimento precoce dos sinais do AVE e a obtenção de
cuidados de urgência apropriados para assegurar o rápido transporte do cliente a um
hospital e o início da terapia no período recomendado de 3 h (que pode se estender para 4,5
h em alguns centros de AVE) (Del Zoppo et al., 2009). Os atrasos tornam o cliente não
elegível para a terapia trombolítica, visto que a revascularização do tecido necrótico (que se
desenvolve depois de 3 h) aumenta o risco de edema e hemorragias cerebrais.
Dosagem e administração
O cliente é pesado para determinar a dosagem de t-PA. Em geral, são estabelecidos
dois ou mais locais IV antes da administração do t-PA (um para o t-PA e o outro para a
administração de soluções intravenosas). A dose de t-PA é de 0,9 mg/kg, com dose máxima
de 90 mg. São administrados 10% da dose calculada como bolus IV durante 1 min. A dose
remanescente (90%) é administrada por via intravenosa durante 1 h por meio de uma bomba
de infusão (Summers et al., 2009).
O cliente é admitido na unidade de terapia intensiva ou em uma unidade de AVE agudo,
na qual são realizados monitoramento cardíaco contínuo e avaliações neurológicas
frequentes. Os sinais vitais são obtidos com frequência, dispensando atenção particular para
a pressão arterial (com a meta de reduzir o risco de hemorragia intracraniana). Um exemplo
de protocolo padrão seria obter os sinais vitais a cada 15 min nas primeiras 2 h, a cada 30
min nas 6 h seguintes e, em seguida, a cada hora até 24 h após o tratamento. A pressão
arterial deve ser mantida com uma pressão sistólica inferior a 180 mmHg e uma pressão
diastólica abaixo de 105 mmHg (Summers et al., 2009). O manejo das vias respiratórias é
instituído, com base na condição clínica do cliente e nos valores da gasometria arterial.
Efeitos colaterais
Uma vez estabelecido o cliente como candidato para a terapia com t-PA, nenhum
agente anticoagulante deve ser administrado nas próximas 24 h. O sangramento constitui o
efeito colateral mais comum da administração de t-PA, e o cliente é rigorosamente
monitorado para qualquer sangramento (locais de inserção intravenosa, local do cateter
urinário, tubo endotraqueal, tubo nasogástrico, urina, fezes, vômitos, outras secreções).
Recomenda-se adiar em 24 h a colocação de tubo nasogástrico, cateteres urinário e de
pressão intra-arterial. O sangramento intracraniano constitui uma importante complicação,
que ocorreu em aproximadamente 6,4% dos clientes no estudo inicial do t-PA (NINDS,
1995). Diversos fatores estão associados à ocorrência de sangramento intracraniano
sintomático: idade acima dos 70 anos, escore basal de NIHSS superior a 20, concentração
sérica de glicose de 300 mg/dℓ ou mais, e edema ou efeito de massa observado na TC inicial
do cliente (NINDS, 1995).
Terapia para clientes com acidente vascular encefálico isquêmico que não
recebem ativador do plasminogênio tecidual
Nem todos os clientes são candidatos à terapia com t-PA. Em alguns centros, outros
tratamentos podem incluir a administração de anticoagulantes (heparina intravenosa ou
heparina de baixo peso molecular). Em razão dos riscos associados à anticoagulação, seu
uso geral não é mais recomendado para clientes com AVE isquêmico agudo (Jauch et al.,
2013).
A manutenção cuidadosa da hemodinâmica cerebral para manter a perfusão cerebral é
de suma importância após a ocorrência de AVE. É possível que a pressão intracraniana
(PIC) se eleve em consequência de edema e complicações associadas após um AVE
isquêmico de grande proporção. As intervenções durante esse período incluem medidas
para reduzir a PIC, como a administração de um diurético osmótico (p. ex., manitol) e a
manutenção da pressão parcial de dióxido de carbono arterial (PaCO 2) dentro de uma faixa
ligeiramente mais baixa de 30 a 35 mmHg. Outras medidas terapêuticas incluem as
seguintes:
• Administração de oxigênio suplementar, se a saturação de oxigênio for inferior a 92%
• Elevação da cabeceira do leito a 25 a 30° para ajudar o cliente a eliminar as secreções
orais e diminuir a pressão intracraniana
• Possível realização de hemicraniectomia para a PIC elevada em consequência de
edema cerebral em um AVE muito de grande proporção
• Entubação com tubo endotraqueal para estabelecer uma via respiratória pérvia, quando
necessário
• Monitoramento hemodinâmico contínuo (as metas para a pressão arterial permanecem
controvertidas para o cliente que não recebeu terapia trombolítica; o tratamento anti-
hipertensivo pode ser suspenso, a não ser que a pressão arterial sistólica ultrapasse 220
mmHg, ou a pressão arterial diastólica exceda 120 mmHg)
• Avaliação neurológica frequente para determinar se o AVE está evoluindo, e se há
desenvolvimento de outras complicações críticas. (Essas podem incluir convulsões,
sangramento em consequência do uso de anticoagulantes, ou bradicardia induzida por
medicamentos, que pode resultar em hipotensão e diminuição subsequente do débito
cardíaco e da pressão de perfusão cerebral.)
Manejo de complicações potenciais
O fluxo sanguíneo cerebral adequado é essencial para a oxigenação do cérebro.
Quando o fluxo sanguíneo cerebral é inadequado, a quantidade de oxigênio suprida para o
encéfalo diminui, com consequente isquemia tecidual. A oxigenação adequada começa com
cuidados pulmonares, manutenção de uma via respiratória pérvia e administração de
oxigênio suplementar, quando necessário. Não se pode superestimar a importância da troca
gasosa adequada nesses clientes, visto que muitos deles correm risco de pneumonia por
aspiração.
Outras possíveis complicações após um AVE incluem infecções urinárias, arritmias
cardíacas (ectopia ventricular, taquicardia e bloqueio cardíaco) e complicações da
imobilidade. A hiperglicemia tem sido associada a resultados neurológicos precários no AVE
agudo e deve ser tratada se o nível de glicemia for superior a 140 mg/dℓ(Summers et al.,
2009).
Mudança de posição. O cliente deve ser trocado de posição a cada 2 h. Para posicionar
o cliente em decúbito lateral (deitado de lado), coloca-se um travesseiro entre as pernas
antes de o cliente ser virado. Para promover o retorno venoso e evitar o edema, a parte
superior da coxa não deve ser flexionada em ângulo agudo. O cliente pode ser virado de um
lado para outro; todavia, se a sensação estiver comprometida, o tempo permanecido sobre o
lado afetado deve ser limitado.
Figura 67.4 A posição de decúbito ventral com travesseiro como apoio ajuda a impedir a flexão dos quadris.
Preparação para a deambulação. Tão logo seja possível, o cliente é auxiliado a sair
do leito e a iniciar um programa de reabilitação ativo. O cliente é inicialmente instruído a
manter o equilíbrio enquanto se senta e, em seguida, aprende a se equilibrar quando estiver
em pé. Se o cliente tiver dificuldade de se equilibrar em pé, pode-se utilizar uma mesa
inclinável, que traz o cliente lentamente a uma posição ereta. As mesas inclináveis são
particularmente úteis para clientes que estiveram em repouso no leito por um período
prolongado e apresentam alterações ortostáticas da pressão arterial.
Se o cliente precisar de uma cadeira de rodas, o tipo dobrável com freios manuais é o
mais prático, visto que possibilita ao cliente manipular a cadeira. A cadeira deve ser baixa o
suficiente para possibilitar que o cliente a impulsione com o pé não afetado, e estreita o
suficiente para viabilizar seu uso em casa. Quando o cliente é transferido da cadeira de
rodas para outro lugar, os freios devem ser aplicados e travados de ambos os lados da
cadeira.
O cliente geralmente está pronto para deambular tão logo alcance o equilíbrio em pé. As
barras paralelas são úteis nesses primeiros esforços. Uma cadeira comum ou uma cadeira
de rodas deve estar facilmente disponível, caso o cliente se sinta subitamente fatigado ou
tenha tontura.
Os períodos de treinamento para deambulação devem ser curtos e frequentes. À
medida que o cliente ganha força e confiança, uma bengala ajustável pode ser usada para
apoio. Em geral, uma bengala de 3 ou 4 apoios fornece um suporte estável nas fases iniciais
de reabilitação.
Melhora do autocuidado
Tão logo possa se sentar, o cliente é incentivado a participar nas atividades de
higiene pessoal. Ele será auxiliado no estabelecimento de metas realistas; se possível, uma
nova tarefa é acrescentada diariamente. A primeira etapa consiste em realizar todas as
atividades de autocuidado no lado não afetado. Pentear o cabelo, escovar os dentes,
barbear-se com um barbeador elétrico, tomar banho e comer são exemplos de atividades
que podem ser realizadas com uma das mãos e devem ser estimuladas. Embora o cliente
possa se sentir desajeitado inicialmente, essas habilidades motoras podem ser aprendidas
pela repetição, e o lado não afetado se tornará mais forte com o uso. A enfermeira precisa
se certificar de que o cliente não negligencia o lado afetado. Dispositivos de assistência
ajudarão a compensar alguns dos déficits do cliente (Boxe 67.3). Uma pequena toalha é
mais fácil de manusear para se secar depois do banho, e usar caixas de lenços de papel é
mais prático que um rolo de papel higiênico.
O retorno da capacidade funcional é importante para a recuperação após a ocorrência
de um AVE. No planejamento da equipe e no estabelecimento de metas para o cliente, é
importante efetuar uma avaliação inicial basal da capacidade funcional com um instrumento,
como a Functional Independence Measure (FIM), amplamente utilizada na reabilitação do
AVE, que proporcione informações valiosas sobre as funções motora, social e cognitiva. O
moral do cliente pode melhorar se as atividades de deambulação forem realizadas com
roupas de sair. A família é instruída a trazer roupas que sejam, de preferência, um número
maior que o tamanho habitualmente utilizado. As roupas com fechos frontais ou laterais, ou
com fechos de Velcro®, são as mais apropriadas. O cliente tem melhor equilíbrio se a maior
parte das atividades de se vestir for realizada enquanto estiver sentado.
Problemas de percepção podem fazer com que o cliente tenha dificuldade em se
vestir sem ajuda, dada a incapacidade de adequar a roupa às partes do corpo. Para ajudar o
cliente, a enfermeira pode tomar providências, a fim de manter o ambiente organizado e sem
desordem, visto que o cliente com problema perceptivo se distrai com facilidade. As roupas
são colocadas do lado afetado, na ordem em que vão ser vestidas. Um espelho grande para
se vestir promove o reconhecimento do que o cliente está vestindo no lado afetado. O cliente
precisa fazer muitos movimentos compensatórios ao se vestir; os quais podem produzir
fadiga e torções dolorosas dos músculos intercostais. Devem-se proporcionar apoio e
estímulo para evitar que o cliente fique excessivamente fatigado e desanimado. Mesmo com
um treinamento intensivo, nem todos os clientes conseguem ser independentes para se
vestir.
Melhora da comunicação
A afasia, que prejudica a capacidade do cliente de se expressar e de compreender o
que está sendo dito, pode tornar-se evidente de diversas maneiras. A área cortical,
responsável pela integração das numerosas vias necessárias para a compreensão e a
formulação da linguagem, é denominada, área de Broca. Localizada em uma convolução
adjacente à artéria cerebral média, essa área é responsável pelo controle das combinações
dos movimentos musculares necessários para articular cada palavra. Por sua proximidade à
área motora esquerda, um distúrbio na área motora frequentemente afeta a área da fala.
Isso explica por que muitos clientes que estão paralisados do lado direito (por causa de dano
ou lesão ao lado esquerdo do encéfalo) não podem falar, enquanto aqueles que são
paralisados do lado esquerdo têm menos probabilidade de apresentar distúrbios da fala.
O fonoaudiólogo avalia as necessidades de comunicação do cliente acometido por AVE,
descreve o déficit preciso e sugere o melhor método global de comunicação. A maioria das
estratégias de intervenção de linguagem pode ser individualizada para cada cliente. Espera-
se que o cliente tenha uma participação ativa no estabelecimento das metas.
A pessoa com afasia pode tornar-se deprimida. A incapacidade de conversar ao
telefone, responder a uma pergunta ou participar da conversa frequentemente provoca raiva,
frustração, medo do futuro e desamparo. As intervenções de enfermagem incluem
estratégias para tornar a atmosfera propícia à comunicação. Isso inclui ser sensível às
reações e necessidades do cliente e responder a essas de maneira apropriada, tratando
sempre o cliente como um adulto. A enfermeira deve fornecer um forte apoio emocional e
compreensão para aliviar a ansiedade e a frustração do cliente.
Um erro comum que pode ser cometido pela enfermeira ou outro profissional de
saúde é completar os pensamentos ou as frases do cliente. Isso deve ser evitado, visto que
faz com que o cliente fique mais frustrado em não poder falar, e pode prejudicar seus
esforços em elaborar pensamentos e completar frases. Um horário consistente, rotinas e
repetições ajudam o cliente a funcionar, apesar dos déficits significativos. Uma cópia por
escrito dos horários de todos os dias, um folheto com informações pessoais (data de
nascimento, endereço, nomes dos familiares), listas de verificação e uma lista em fita de
áudio ajudam a melhorar a memória e a concentração do cliente. O cliente também pode
beneficiar-se de um quadro para comunicação, que tenha figuras sobre necessidades
comuns e frases, e possa ser traduzido em qualquer língua.
Ao conversar com o cliente, é importante que a enfermeira obtenha sua atenção, fale
devagar e mantenha a linguagem das instruções consistente. Uma instrução deve ser
transmitida de cada vez, dando tempo para que o cliente possa processar o que foi dito. O
uso de gestos pode melhorar a compreensão. Falar é pensar alto, e a ênfase é no
pensamento. Ouvir e separar as mensagens recebidas exige esforço mental; o cliente
precisa lutar contra a inércia mental e necessita de tempo para organizar uma resposta.
Ao trabalhar com clientes com afasia, a enfermeira precisa se lembrar de conversar com
eles durante as atividades de cuidado. Isso proporciona contato social ao cliente. O Boxe
67.4 descreve os aspectos a serem lembrados na comunicação com o cliente portador de
afasia.
Reavaliação
Fisiopatologia
Hemorragia intracerebral
A hemorragia intracerebral ou sangramento dentro do tecido cerebral é mais comum
em clientes que apresentam hipertensão arterial e aterosclerose cerebral, visto que as
alterações degenerativas dessa doenças causam ruptura do vaso sanguíneo. Uma
hemorragia intracerebral também pode ocorrer em consequência de certos tipos de
patologia arterial, tumores cerebrais e uso de medicamentos (p. ex., agentes anticoagulantes
orais, anfetaminas e uso de drogas ilícitas).
O sangramento ocorre mais comumente nos lobos cerebrais, nos núcleos da base, no
tálamo, no tronco encefálico (principalmente na ponte) e no cerebelo (Hickey, 2009). Em
certas ocasiões, o sangramento rompe a parede do ventrículo lateral e provoca hemorragia
intraventricular, que é frequentemente fatal.
Hemorragia subaracnóidea
Pode ocorrer hemorragia subaracnóidea (hemorragia dentro do espaço subaracnóideo) em consequência de
MAV, aneurisma intracraniano, traumatismo ou hipertensão. As causas mais comuns consistem em aneurisma
extravasante na área do círculo de Willis e MAV congênita do encéfalo (Bader e Littlejohns, 2010).
Manifestações clínicas
O cliente com AVE hemorrágico pode apresentar ampla variedade de déficits neurológicos, à semelhança do
cliente com AVE isquêmico. O cliente consciente relata mais comumente a ocorrência de cefaleia intensa. A
realização de uma avaliação abrangente revela a extensão dos déficits neurológicos. Muitas das mesmas funções
motoras, sensoriais, cognitivas, dos nervos cranianos e outras que são interrompidas após a ocorrência de AVE
isquêmico também são alteradas após um AVE hemorrágico. A Tabela 67.2 fornece uma revisão dos déficits
neurológicos frequentemente observados em clientes com AVE. A Tabela 67.3compara os sintomas observados
no AVE do hemisfério direito com os observados no AVE do hemisfério esquerdo. Outros sintomas que podem
ser observados com mais frequência em clientes com hemorragia intracerebral aguda (em comparação com o
AVE isquêmico) consistem em vômitos, alteração precoce e súbita do nível de consciência e, possivelmente,
convulsões focais, dado o comprometimento frequente do tronco encefálico (Hickey, 2009).
Além dos déficits neurológicos (semelhantes aos observados no AVE isquêmico), o cliente com aneurisma
intracraniano ou MAV pode apresentar algumas manifestações clínicas singulares. A ruptura de aneurisma ou
MAV produz habitualmente cefaleia súbita e extremamente intensa e, com frequência, perda da consciência por
um período variável. Podem estar presentes dor e rigidez da parte posterior do pescoço (rigidez de nuca) e da
coluna vertebral, em decorrência de irritação meníngea. Ocorrem distúrbios visuais (perda visual, diplopia,
ptose) se o aneurisma for adjacente ao nervo oculomotor. Além disso, pode haver zumbidos, tontura e
hemiparesia.
Algumas vezes, o aneurisma ou a MAV extravasa sangue, levando à formação de um coágulo que veda o
local de ruptura. Nessa situação, o cliente pode exibir pouco déficit neurológico. Em outros casos, ocorre
sangramento grave, resultando em lesão cerebral, seguida rapidamente de coma e morte.
O prognóstico depende da condição neurológica do cliente, da idade, da presença de doenças associadas,
assim como da extensão e localização da hemorragia ou do aneurisma intracraniano. A hemorragia
subaracnóidea em consequência de aneurisma é um evento catastrófico, com morbidade e mortalidade
significativas.
Prevenção
A prevenção primária do AVE hemorrágico constitui o melhor método e consiste no manejo da hipertensão e na
melhora de outros fatores de risco significativos. O controle da hipertensão pode reduzir o risco de AVE
hemorrágico. Outros fatores de risco incluem idade avançada, gênero masculino e consumo excessivo de
bebidas alcoólicas (Bader e Littlejohns, 2010). As triagens para risco de AVE proporcionam uma oportunidade
ideal para reduzir o risco de AVE hemorrágico ao identificar pessoas ou grupos de alto risco e ao fornecer
orientação aos clientes e à comunidade sobre seu reconhecimento e prevenção.
Complicações
As possíveis complicações do AVE hemorrágico consistem em sangramento recorrente ou expansão do
hematoma; vasospasmo cerebral, resultando em isquemia cerebral; hidrocefalia aguda, que ocorre quando o
sangue livre obstrui a reabsorção do líquido cerebrospinal (LCS) pelas vilosidades aracnóideas; e convulsões.
Vasospasmo
O desenvolvimento de vasospasmo cerebral (estreitamento do lúmen do vaso sanguíneo craniano acometido)
representa uma grave complicação da hemorragia subaracnóidea, assim como constitui importante causa de
morbidade e mortalidade em clientes que sobrevivem à hemorragia subaracnóidea inicial. Entre os clientes que
apresentam vasospasmo cerebral, 15 a 20% morrem (Wuchner, Bakas, Adams et al., 2012). O mecanismo
responsável pelo vasospasmo não está bem esclarecido; todavia, está associado a quantidades crescentes de
sangue nas cisternas subaracnóideas e nas fissuras cerebrais, como visualizado na TC. O monitoramento à
procura de vasospasmo pode ser realizado pelo uso de ultrassonografia transcraniana com Doppler ou
angiografia cerebral de acompanhamento à cabeceira do leito (AANN, 2009).
O vasospasmo ocorre mais frequentemente entre 7 e 10 dias após a hemorragia inicial (Connolly,
Rabinstein, Carhuapoma et al., 2012), quando o coágulo sofre lise (dissolução), e a probabilidade de novo
sangramento é aumentada. Provoca resistência vascular elevada, o que impede o fluxo sanguíneo cerebral e
causa isquemia (isquemia cerebral tardia) e infarto cerebrais. Os sinais e sintomas observados refletem as áreas
do encéfalo envolvidas. Com frequência, o vasospasmo é anunciado por um agravamento da cefaleia,
diminuição do nível de consciência (confusão mental, letargia e desorientação) ou déficit neurológico focal
recente (afasia, hemiparesia).
O manejo do vasospasmo continua sendo difícil e controvertido. Acredita-se que a cirurgia precoce para a
aplicação de clipe no aneurisma possa evitar o sangramento recorrente e que a remoção do sangue das cisternas
basais ao redor das artérias cerebrais principais possa evitar o vasospasmo.
Os medicamentos podem ser efetivos no tratamento do vasospasmo. Com base na teoria de que o
vasospasmo é causado por um influxo aumentado de cálcio na célula, a terapia farmacológica pode ser usada
para bloquear ou antagonizar essa ação e impedir ou reverter a ação do vasospasmo, se este já estiver presente.
O bloqueador dos canais de cálcio usado com mais frequência é o nimodipino, cuja prescrição, pelas diretrizes
atuais, é recomendada a todos os clientes com hemorragia subaracnóidea (Connolly et al., 2012). Na atualidade,
trata-se do único fármaco aprovado pela FDA para a prevenção e o tratamento do vasospasmo na hemorragia
subaracnóidea (AANN, 2009).
Outra terapia para o vasospasmo e a isquemia cerebral tardia resultante, designada como terapia do triplo
H, tem por objetivo reduzir ao mínimo os efeitos deletérios da isquemia cerebral associada e consiste em: (1)
expansores do volume de líquidos (hipervolemia); (2) hipertensão arterial induzida; e (3) hemodiluição.
Entretanto, as pesquisas e diretrizes atuais defendem a euvolemia para a prevenção da isquemia cerebral tardia e
a hipertensão arterial induzida para o tratamento da isquemia cerebral tardia (Connolly et al., 2012).
Hipertensão arterial
A hipertensão arterial constitui a causa mais comum de hemorragia intracerebral, e seu tratamento é de
importância crítica. As metas específicas para o manejo da pressão arterial, que são individualizadas por cliente,
permanecem controversas e podem depender da presença de PIC elevada. Atualmente há ensaios clínicos em
curso para investigar melhor o controle da pressão arterial na hemorragia intracerebral (Morgenstern et al.,
2010). A pressão arterial sistólica pode ser reduzida para impedir o aumento do hematoma. Se a pressão arterial
estiver elevada, pode-se prescrever a terapia anti-hipertensiva (labetalol, nicardipino, nitroprusseto, hidralazina).
Durante a administração de anti-hipertensivos, o monitoramento hemodinâmico é importante para detectar e
evitar queda precipitada da pressão arterial, que pode provocar isquemia cerebral. São usados emolientes fecais
para evitar o esforço à defecação, que pode elevar a pressão arterial.
Manejo clínico
As metas do tratamento clínico para o AVE hemorrágico consistem em possibilitar que o encéfalo se recupere
da agressão inicial (sangramento), em evitar ou reduzir ao mínimo o risco de sangramento recorrente e em
impedir ou tratar as complicações. O manejo pode consistir em repouso no leito com sedação, a fim de evitar a
agitação ou o estresse, manejo do vasospasmo e tratamento clínico ou cirúrgico para impedir novo sangramento.
Quando o sangramento é causado por anticoagulação com varfarina, a RNI pode ser corrigida com plasma
fresco congelado e vitamina K. A reversão do efeito anticoagulante dos anticoagulantes mais recentes é mais
complicada. Os protocolos podem incluir hemodiálise, uso de carvão ativado por via oral, administração de
concentrados de complexo protrombínico ou administração do fator VII ativado recombinante (Kaatz, Kouides,
Garcia et al., 2012). Quando ocorrem, as convulsões são tratadas com agentes anticonvulsivantes, como a
fenitoína (Bader e Littlejohns, 2010). A hiperglicemia também deve ser tratada, e recomenda-se a
normoglicemia. O cliente utiliza dispositivos de compressão sequencial ou meias de compressão elástica para
evitar a trombose venosa profunda (TVP). Se o cliente ainda estiver imóvel 1 a 4 dias após o início da
hemorragia, e a interrupção do sangramento for documentada, podem ser prescritos medicamentos para a
prevenção da TVP (heparina de baixo peso molecular ou heparina não fracionada) (Morgenstern et al., 2010).
Podem ser prescritos analgésicos para a dor na cabeça e no pescoço. A febre deve ser tratada com paracetamol,
aplicações diretas de soro fisiológico gelado e dispositivos como cobertores de resfriamento (Bader e
Littlejohns, 2010). Após a alta, a maioria dos clientes necessita de anti-hipertensivos para diminuir o risco de
outra hemorragia intracerebral.
Manejo cirúrgico
Em muitos casos, a hemorragia intracerebral primária não é tratada cirurgicamente. Entretanto, se o cliente
apresentar sinais de agravamento no exame neurológico, PIC elevada ou sinais de compressão do tronco
encefálico, recomenda-se, então, a evacuação cirúrgica para o cliente com hemorragia cerebelar (Morgenstern et
al., 2010). A evacuação cirúrgica é mais frequentemente realizada por meio de craniotomia (ver Capítulo 66).
O cliente com aneurisma intracraniano é preparado para intervenção cirúrgica tão logo sua condição seja
considerada estável. O tratamento cirúrgico do cliente com aneurisma não roto é uma opção. A meta da cirurgia
consiste em evitar sangramento em um aneurisma não roto ou maior sangramento em um aneurisma que já
sofreu ruptura. Esse objetivo é alcançado isolando o aneurisma de sua circulação ou fortalecendo a parede
arterial. O aneurisma pode ser excluído da circulação cerebral por meio de ligadura ou clipe através de seu colo.
Caso isso não seja anatomicamente possível, o aneurisma pode ser reforçado se for envolvido com alguma
substância para proporcionar suporte e induzir a cicatrização.
Os avanços na tecnologia levaram à introdução da neurorradiologia intervencionista para o tratamento dos
aneurismas. Na atualidade, essas técnicas estão sendo usadas com mais frequência. As técnicas endovasculares
podem ser utilizadas em clientes selecionados para ocluir o fluxo sanguíneo da artéria que alimenta o aneurisma
com molas ou outras técnicas para ocluir o próprio aneurisma. Se o aneurisma for muito grande ou muito amplo
no colo, pode-se utilizar um dispositivo semelhante a um stent feito de uma rede muito fina para desviar o fluxo
sanguíneo do aneurisma. A escolha da técnica empregada baseia-se em muitos fatores (características do cliente
e do aneurisma) e deve ser feita por especialistas endovasculares experientes (Connolly et al., 2012).
As complicações pós-operatórias são raras, porém podem ocorrer. As possíveis complicações incluem
sintomas psicológicos (desorientação, amnésia, síndrome de Korsakoff [distúrbio caracterizado por psicose,
desorientação, delirium, insônia, alucinações, alterações da personalidade]), embolização intraoperatória ou
ruptura de artéria, oclusão pós-operatória da artéria, distúrbios hidreletrolíticos (em consequência da disfunção
do sistema neuro-hipofisário) e sangramento gastrintestinal.
PROCESSO DE ENFERMAGEM
Cliente com acidente vascular encefálico hemorrágico
Avaliação
Uma avaliação neurológica completa deve ser realizada inicialmente e incluir a
verificação dos seguintes itens:
• Nível de consciência alterado
• Reação pupilar lenta
• Disfunção motora e sensorial
• Déficits de nervos cranianos (movimentos extraoculares do olho, queda facial, presença
de ptose)
• Dificuldades da fala e distúrbio visual
• Cefaleia e rigidez de nuca ou outros déficits neurológicos.
Todos os clientes devem ser monitorados na unidade de terapia intensiva após a
ocorrência de hemorragia intracerebral ou subaracnóidea. Os achados da avaliação
neurológica são documentados e relatados, quando indicado. A frequência dessas
avaliações varia, dependendo da condição do cliente. Quaisquer alterações na condição do
cliente exigem reavaliação e documentação completa; as alterações devem ser relatadas
imediatamente.
Diagnóstico
Diagnósticos de enfermagem
Com base nos dados da avaliação, os principais diagnósticos de enfermagem podem
incluir os seguintes:
• Perfusão tissular (cerebral) ineficaz relacionada com sangramento ou vasoespasmo
• Ansiedade relacionada com a doença e/ou restrições impostas pelo médico (precauções
para aneurisma)
Problemas colaborativos/complicações potenciais
As complicações potenciais podem incluir as seguintes:
• Vasoespasmo
• Convulsões
• Hidrocefalia
• Sangramento recorrente
• Hiponatremia.
Planejamento e metas
As metas para o cliente podem consistir em melhora da perfusão tissular do cérebro,
alívio da ansiedade e ausência de complicações.
Alívio da ansiedade
A estimulação sensorial é mantida ao mínimo para clientes com precauções para
aneurisma. Para os clientes que estão despertos, alertas e orientados, uma explicação sobre
as restrições ajuda a reduzir a sensação de isolamento do cliente. A orientação da realidade
é fornecida para ajudar a manter a orientação.
Manter o cliente bem informado sobre o plano de cuidados proporciona tranquilização e
auxilia na redução do nível de ansiedade. A tranquilização apropriada também ajuda a aliviar
os medos e a ansiedade do cliente. A família também necessita de informações e apoio.
Monitoramento e manejo de complicações potenciais
Vasoespasmo. O cliente é avaliado à procura de sinais de possível vasoespasmo:
cefaleias intensificadas, diminuição no nível de responsividade (confusão mental,
desorientação, letargia) ou evidências de afasia ou paralisia facial. Esses sinais podem
surgir vários dias após a cirurgia ou no início do tratamento e precisam ser relatados
imediatamente. Deve-se administrar nimodipino, um bloqueador dos canais de cálcio, para a
prevenção do vasoespasmo, e podem ser também prescritos expansores do volume de
líquidos (Connolly et al., 2012).
Convulsões. As precauções das convulsões são mantidas para todo cliente com risco de
atividade convulsiva. Caso ocorra uma convulsão, as principais metas consistem em manter
a via respiratória e impedir a lesão. A terapia farmacológica é iniciada nesse momento.
Hidrocefalia. A presença de sangue no espaço subaracnóideo ou nos ventrículos impede
a circulação do LCS, resultando em hidrocefalia. Uma TC indicando dilatação dos
ventrículos confirma o diagnóstico. Pode ocorrer hidrocefalia nas primeiras 24 h (aguda)
após a hemorragia subaracnóidea, ou por vários dias (subaguda) ou várias semanas (tardia)
depois. Os sintomas variam de acordo com o momento do início e podem ser inespecíficos.
A hidrocefalia aguda caracteriza-se pelo início súbito de estupor ou coma, e o manejo
consiste em dreno de ventriculostomia para diminuir a PIC. Os sintomas da hidrocefalia
subaguda e tardia incluem início gradual de sonolência, alterações comportamentais e
marcha atáxica. Uma derivação ventriculoperitoneal é cirurgicamente colocada para tratar a
hidrocefalia crônica. As alterações na responsividade do cliente são relatadas
imediatamente.
Novo sangramento. A taxa anual de hemorragia recorrente é de aproximadamente 2,1 a
3,7% por cliente após uma hemorragia intracerebral primária (Morgenstern et al., 2010). A
hipertensão constitui o fator de risco mais grave e modificável, mostrando a importância do
tratamento anti-hipertensivo apropriado.
O novo sangramento do aneurisma ocorre mais frequentemente durante as primeiras 2
semanas após a hemorragia inicial e é considerado uma complicação importante. Os
sintomas de sangramento recorrente incluem cefaleia intensa e súbita, náuseas, vômitos,
nível diminuído de consciência e déficit neurológico. O novo sangramento é confirmado por
TC. A pressão arterial é cuidadosamente mantida com medicamentos. O tratamento
preventivo mais efetivo consiste em fixar o aneurisma se o cliente for candidato à cirurgia ou
tratamento endovascular.
Hiponatremia. Após a hemorragia subaracnóidea, verifica-se o desenvolvimento de
hiponatremia em até 50% dos clientes (AANN, 2009). Os dados laboratoriais precisam ser
verificados com frequência, e a hiponatremia (definida como uma concentração sérica de
sódio inferior a 135 mEq/ℓ) deve ser identificada o mais cedo possível. O médico do cliente
precisa ser notificado sobre a persistência de um nível sérico baixo de sódio por 24 h ou
mais. Em seguida, o cliente é avaliado quanto à suspeita de síndrome de secreção
inapropriada de hormônio antidiurético (SIHAD [descrita no Capítulo 13]) ou de síndrome
cerebral perdedora de sal. Esta última síndrome ocorre quando os rins são incapazes de
conservar o sódio, resultando em depleção de volume. O tratamento mais frequente consiste
no uso de soro fisiológico hipertônico a 3% por via intravenosa.
Promoção dos cuidados domiciliar e comunitário
Orientação do cliente sobre autocuidados. O cliente e sua família recebem
orientações que os capacitarão a cooperar com os cuidados e as restrições necessárias
durante a fase crítica do AVE hemorrágico, bem como os prepararão para o retorno à casa.
A orientação ao cliente e à sua família incluem informações sobre as causas do AVE
hemorrágico e suas possíveis consequências. Além disso, são informados sobre os
tratamentos clínicos que estão sendo implementados, incluindo intervenção cirúrgica, se
necessário, bem como a razão de intervenções realizadas para evitar e detectar as
complicações (i. e., precauções para o aneurisma, monitoramento rigoroso do cliente).
Dependendo da presença e da gravidade do comprometimento neurológico e de outras
complicações resultantes do AVE, o cliente pode ser transferido para uma unidade ou centro
de reabilitação para orientação adicional do cliente e da família sobre estratégias para
readquirir a capacidade de autocuidado. A orientação aborda o uso de dispositivos auxiliares
ou a realização de modificações no ambiente domiciliar para ajudar o cliente a viver com a
incapacidade. Podem ser necessárias modificações na residência para proporcionar um
ambiente seguro.
Cuidados contínuos. A fase crítica e de reabilitação dos cuidados concentra-se nas
necessidades, nas questões e nos déficits evidentes para o cliente com AVE hemorrágico. O
cliente e sua família são lembrados da razão de seguir as recomendações para evitar outro
AVE hemorrágico e de manter as consultas de acompanhamento com profissionais de
saúde para monitorar os fatores de risco. O encaminhamento para cuidado domiciliar pode
ser necessário para avaliar o ambiente domiciliar e a capacidade do cliente, assim como
para certificar-se de que tanto o cliente quanto a sua família são capazes de realizar o
tratamento no domicílio. As visitas domiciliares oferecem oportunidades para monitorar o
estado físico e psicológico do cliente e a capacidade da família de enfrentar quaisquer
alterações no estado do cliente. Além disso, a enfermeira de cuidado domiciliar reitera ao
cliente e à sua família a razão de continuar a promoção da saúde e as práticas de triagem.
O Boxe 67.6 fornece uma lista de orientações aos clientes que se recuperam de um AVE.
Reavaliação
1 Identifique as prioridades, a abordagem e as técnicas que você usaria para fornecer cuidados a
um cliente que acaba de ser admitido no SE em decorrência de um AVE isquêmico. Como suas prioridades,
abordagem e técnicas irão diferir se o diagnóstico do cliente for de AVE hemorrágico?
2 Uma cliente de 55 anos de idade com história de hipertensão arterial e diabetes melito e fumante ativa está
com alta prevista para casa hoje, após permanência de 4 dias em consequência de AVE. Ela apresenta
fraqueza residual do lado direito e déficit de campo visual. Que instruções estão indicadas para evitar outro
AVE?