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Resumo
Tendo como ponto de partida o ensino de História nos anos iniciais do Ensino Fundamental,
objetivou-se verificar as metodologias, conteúdos e concepções em interação com o
conhecimento histórico. Em consonância, buscou-se avaliar a inserção dos avanços
historiográficos na prática pedagógica e os desafios postos aos professores pedagogos que
atuam nessa fase de escolarização. Nas referências teórico-metodológicas que orientam o
ensino de História hodierno percebe-se uma variedade de estudos relacionados aos anos finais
do Ensino Fundamental, momento em que a disciplina deve ser ministrada pelo professor
licenciado em História. Em relação aos anos iniciais, indicam a carência de estudos relativos a
essa fase de escolarização, principalmente no que se refere à relação com a historiografia
contemporânea na prática pedagógica dos professores que iniciam os alunos no saber
histórico escolar. Como instrumento de coleta de dados, utilizou-se a aplicação de
questionários. Foram recebidos trinta e três questionários de docentes dos anos iniciais do
Ensino Fundamental, com variados tempos de experiência profissional e em exercício nas
redes municipais, estaduais e particulares da Região Metropolitana de Belo Horizonte. Os
achados da pesquisa corroboram com estudos recentes sobre o ensino da disciplina nos anos
iniciais, nos quais se destacam algumas mudanças e permanências que endossam os desafios
colocados ao sujeito professor que atua nessa fase de escolarização: avanços metodológicos e
historiográficos no saber de referência; professor pedagogo, sem formação específica na área
da História; reprodução de concepções; manutenção de metodologias, conteúdos e conceitos
tradicionalmente empregados no ensino de História; público infantil, com as especificidades
do ser criança.
1
Mestre em Educação pela PUC Minas. Professora da Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG) –
Unidade Ibirité. E-mail: patriciakarlass@hotmail.com.
ISSN 2176-1396
18850
Introdução
Tendo como foco o ensino de História nos anos iniciais do Ensino Fundamental,
objetivou-se verificar as metodologias, conteúdos e concepções em interação com o
conhecimento histórico. Em consonância, buscou-se avaliar a inserção dos avanços
historiográficos na prática pedagógica e os desafios postos aos professores pedagogos que
atuam nessa fase de escolarização. A pesquisa objetivou a busca de dados para possibilitar a
análise das questões propostas, articulando a literatura sobre o tema a uma mostra do que está
sendo praticado nesse espaço escolar, no que se refere ao ensino de História.
Nas referências teórico-metodológicas que orientam o ensino de História hodierno
percebe-se uma variedade de estudos – que produzem reflexões sobre as concepções,
métodos, práticas e materiais pedagógicos – relacionados aos anos finais do Ensino
Fundamental, momento em que a disciplina deve ser ministrada pelo professor licenciado em
História. Em relação aos anos iniciais, indicam a carência de estudos relativos a essa fase de
escolarização, principalmente no que se refere à relação com a historiografia contemporânea
na prática pedagógica dos professores que iniciam os alunos no saber histórico escolar.
(CODANI, 2000; SILVA, 2013). Nessa perspectiva, entende-se a relevância deste trabalho.
Pesquisas recentes destacam que o ensino de História nos anos iniciais tem algumas
peculiaridades que necessitam de reflexão para orientar o processo de ensino. A primeira
delas é a característica específica da fase de desenvolvimento que os alunos desse nível se
encontram. Nesse sentido, evidencia-se que repensar as práticas pedagógicas para essas
crianças passa por elementos como o currículo, a formação inicial e continuada dos
professores e os materiais didáticos, (AZEVEDO, 2010; SILVA, 2013).
No intuito de avaliar as questões propostas, a presente pesquisa buscou associar as
disciplinas “Conteúdos e Métodos Curriculares da História I e II”, ministradas pela
pesquisadora, ao estágio curricular obrigatório dos estudantes do 4º e 5º período do curso de
Pedagogia da Universidade do Estado de Minas Gerias – unidade Ibirité, objetivando
estabelecer a relação teoria e prática no decorrer das disciplinas. Propôs-se que o campo de
coleta de dados fosse a escola onde o discente do curso estagia, sendo que o material coletado
tendeu a tornar-se propício para análise da prática docente, durante as disciplinas.
Como instrumento de coleta de dados, utilizou-se a aplicação de questionários. Foram
recebidos 33 questionários de docentes com tempos de experiência profissional que variam,
desde menos de um ano até mais de 25 anos, atuando em realidades diversas: 16 em exercício
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Pesquisas recentes sobre o ensino da disciplina nos anos iniciais indicam a persistência
desses conteúdos, a que se refere Bittencourt (2011), nas práticas docentes. Tais estudos
analisam esse fator a partir da formação do docente que atua nos anos iniciais ou mesmo
como uma dita herança da formação nacionalista e patriótica a qual se prestou a História, ao
longo da sua constituição como disciplina escolar. (ABUD, 2011; AZEVEDO, 2010)
Nos PCN´s há a indicação para organização dos conteúdos em eixos temáticos. Os
eixos propostos procuram introduzir noções e conceitos básicos para a História a partir do
processo de alfabetização, sendo progressivamente trabalhados ao longo de todo o ensino
fundamental e médio. No documento curricular destacam-se os conceitos de cultura, de
organização social e do trabalho e as noções de tempo / espaço históricos, sendo que o
conceito tempo é apresentado por meio da noção do antes e do depois, buscando uma
construção conceitual que não se restrinja a ideia de tempo cronológico (BITTENCOURT,
2011).
Bittencourt (2011) aponta a presença em algumas propostas pedagógicas de uma
concepção de história do local ou de “história do lugar” que, de maneira geral, procura
estabelecer relações entre o mais próximo, o vivido da criança, e a história nacional, regional
e geral ou mundial. A autora ainda complementa,
A essa história local, articula-se a história do cotidiano que, junto a seus métodos,
oferece ao ensino da disciplina as ações de pessoas comuns na constituição histórica,
colocando homens, mulheres, crianças e idosos na condição de sujeitos da História, tirando o
foco das ações exclusivas de políticos e das elites sociais.
O saber histórico escolar, a partir da influência da historiografia contemporânea,
objetiva então estabelecer articulações constantes, nos diferentes níveis escolares, entre o
local, o nacional e o geral, utilizando, para tanto, as diferentes fontes históricas para a
aquisição desse saber.
Delineadas as influências que permeiam a construção dos currículos oficiais para o
ensino de História nos anos iniciais, importa agora verificar como essas influências
materializam-se nas proposições curriculares dos docentes que atuam nessa fase de
escolarização, por meio de suas afirmações sobre esse cenário.
Em pesquisa sobre o ensino de História nos anos iniciais, Azevedo (2010) indica na
memória espontânea de futuras professoras / pedagogas a persistência da História como uma
matéria decorativa, centrada em um nacionalismo marcado pela exaltação dos grandes nomes
e das datas cívicas. A autora remete este fato às lembranças registradas por esses indivíduos
durante o seu processo de escolarização no Ensino Fundamental.
No mesmo sentido, Abud (2012) aponta a persistência nessa visão da História como
uma disciplina cuja tradição escolar obriga a decorar, sendo tal tarefa algumas vezes auxiliada
pelos feriados nacionais. Segundo a autora,
No mesmo sentido, Silva (2013) aponta uma desvalorização do saber histórico nos
anos iniciais, tal fato é atribuído ao foco na alfabetização, de acordo com o que determinam os
documentos oficiais para os três primeiros anos de escolarização. O autor corrobora com Silva
e Fonseca (2010), que consideram que algumas concepções e práticas de ensino não inserem
o conhecimento histórico no processo de alfabetização e letramento, de maneira que a
História apenas é introduzida após a consolidação da leitura e da escrita. Entretanto,
consideram ainda que,
[...] os objetivos da escola básica, segundo essa lei, não se restringem à assimilação
maior ou menor de conteúdos prefixados, mas se comprometem a articular
conhecimento, competências e valores, com a finalidade de capacitar os alunos a
utilizarem-se das informações para a transformação de sua própria personalidade,
assim como para atuar de maneira efetiva na transformação da sociedade
(BEZERRA, 2007, p. 37).
Tais assuntos enquadram-se nas diretrizes dos PCN´s, em consonância com o eixo
temático “História Local e do Cotidiano”, cujo enfoque está nas diferentes histórias
relacionadas aos grupos de convívio da criança, dimensionadas em diferentes tempos. Nessa
organização de conteúdos, destaca-se que,
Datas cívicas;
História e convívio dos indígenas;
Descobrimento do Brasil;
Colonização;
A pré-história em MG;
Os primeiros habitantes e a colonização;
Os índios e a sua cultura;
Grandes navegações;
História do Brasil;
Período açucareiro e economia na América portuguesa;
Ciclo do ouro;
Descobrimento do Brasil e capitanias hereditárias;
As revoltas coloniais;
A corte portuguesa no Brasil. (Questionários)
Nesse sentido, pode-se afirmar que a permanência dos conteúdos ditos tradicionais da
História no 4º e no 5º ano do Ensino Fundamental é parte de uma “seleção cultural escolar”,
na perspectiva de Forquin (1992), permeada por uma notável herança dos Estudos Sociais no
ensino da disciplina nos anos iniciais, endossando uma marca nacionalista e patriótica. A Lei
5.692, de agosto de 1971, instituiu os Estudos Sociais no então chamado Primeiro Grau.
Sobre esse método de ensino, Bittencourt (2011, p. 76), afirma,
Ao lado dos textos, o livro didático produz uma série de técnicas de aprendizagem:
exercícios, questionários, sugestões de trabalho, enfim as tarefas que os alunos
devem desempenhar para a apreensão ou, na maior parte das vezes, para a retenção
dos conteúdos. Assim, os manuais escolares apresentam não apenas os conteúdos
das disciplinas, mas como esse conteúdo deve ser ensinado.
Ao se recuperar esses materiais, que são fontes potenciais para construção de uma
história local parcialmente desconhecida, desvalorizada, esquecida ou omitida, o
saber histórico escolar desempenha um outro papel na vida local, sem significar que
se pretende fazer do aluno um “pequeno historiador” capaz de escrever monografias,
mas um observador atento das realidades do seu entorno, capaz de estabelecer
relações, comparações e relativizando sua atuação no tempo e espaço (BRASIL,
1997, p. 39).
Outra indicação que permeia as orientações curriculares para o ensino de História está
na recorrência da defesa do trabalho interdisciplinar. Nas respostas aos questionários, a
grande maioria dos docentes afirmou trabalhar a disciplina em associação com outras, sendo o
Português e a Geografia as mais indicadas. Nota-se a manutenção de uma representação
clássica da disciplina: ao associá-la, de imediato ao desenvolvimento das habilidades de
leitura e escrita; ao associá-la ao saber geográfico, o que possibilita a compreensão das
dimensões temporais e espaciais, mas que também se mostra como uma continuidade da
forma de entender a disciplina sob o viés dos Estudos Sociais.
Os aspectos incongruentes entre o previsto nas propostas curriculares e o que se
realiza na esfera da prática demonstra os limites dos avanços historiográficos no ensino de
História dos anos iniciais. Sendo a necessária redução dessa distância, entre o previsto e o
praticado, um dos desafios, não recente, posto à disciplina nessa escolaridade.
Considerações
Percebe-se, todavia, que essas crianças que vivem sob a égide do mundo tecnológico,
não mais se surpreendem com tais avanços, nasceram em uma época na qual as inovações são
esperadas e alcançam a categoria do normal e do corriqueiro na vida cotidiana, o game de
última geração em breve tem que estar ultrapassado para dar espaço a outro com funções
aprimoradas. Para essas crianças, parece possível dizer que o surpreendente é o passado, com
suas máquinas manuais e seu tempo lento. Os brinquedos e brincadeiras antigas, o dia-a-dia
dos antepassados, as fotografias que utilizavam filmes e requeriam uma “pose” pomposa, as
canções no disco de vinil, e tantas outras coisas resgatadas de um passado, não muito distante,
tornam-se oportunidades de a História despertar a surpresa em tais crianças. Aos professores,
um lembrete aparentemente simples: a História é múltipla, assim como as fontes históricas
que nos permitem revisitar o passado.
Para essa mesma geração de crianças, cujas possibilidades de entender o mundo
mostram-se amplas, o estudo do passado pelo passado, centrado apenas nos textos e
atividades de repetição, mostra-se um contrassenso. Este responsável por uma disciplina
sempre às vias de responder a questão: História para quê?
REFERÊNCIAS
ABUD, Kátia Maria. O ensino de História nos anos iniciais: como se pensa, como se faz.
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Disponível em: <http://www.ufrrj.br/graduacao/prodocencia/publicacoes/pesquisa-pratica-
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SILVA, Marcos Antônio da; FONSECA, Selva Guimarães. Ensino de história hoje: errâncias,
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