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Como estudar elites

5. Viagem pela alta hierarquia: mento em Ciência Política e se desdobrou em novas pesquisas ao longo de
vários anos, tendo por objeto central a composição e as transformações da
pesquisa de campo e interações elite eclesiástica no Brasil ao longo do século XX3. O material de base para as

com elites eclesiásticas reflexões aqui desenvolvidas são fundamentalmente experiências de conta-
to direto (sobretudo entrevistas gravadas e não gravadas, conversas e obser-
vações) e indireto (via telefone e mensagens) com uma variedade de dirigen-
Ernesto Seidl tes religiosos católicos: em sua maioria bispos (em atividade ou eméritos),
teólogos, intelectuais, diretores de seminários e de faculdades, superiores de
ordens e de congregações, secretários regionais da Conferência Nacional dos
Bispos do Brasil, sacerdotes dedicados a setores específicos (pastorais, em-
presariado) e, em menor escala, leigos administradores de órgãos ligados à
Igreja, como Cáritas Internacional e Associação de Professores Católicos. Em
suma, um espaço físico e, sobretudo, de relações entre uma multiplicidade
muito grande de agentes sociais, que chamo mundo da Igreja4.
Obviamente, não se trata aqui de contar a história da pesquisa ou da cons-
trução do objeto de análise, muito menos de explorar o imponderável ou o
pitoresco que todo investigador que adota alguma modalidade de trabalho
de campo, de viés etnográfico ou não, experimenta em certa medida. Preten-

1
Este texto beneficiou-se de discussões realizadas em duas reuniões do grupo CAPES
Procad/NF, uma ocorrida na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, em
2011, e outra na Universidade Federal do Paraná, em 2012. Agradeço a Adriano Codato
e a Renato Perissinotto por diversas sugestões à versão final do capítulo.
O TÍTULO DESTE CAPÍTULO inspira-se no livro Voyage en grande bourge- 2
Embora escolarmente canônicos, os estudos sobre elites são marginais na hierarquia
dos objetos das Ciências Sociais brasileiras (SEIDL, 2013a, 2013b). Por sua vez, dentro
osie: journal d’enquête, publicado em 1997 pelo casal de sociólogos france-
dos estudos sobre religião – bastante valorizados e desenvolvidos no país – o alto clero
ses Michel Pinçon e Monique Pinçon-Charlot. A publicação apresenta um ou os dirigentes religiosos têm recebido pouquíssima atenção dos pesquisadores. Esse
ponto é desenvolvido em Seidl (2008b).
conjunto de reflexões apoiado em experiências de dez anos de investiga- 3
Uma primeira e mais intensa etapa desses estudos desenrolou-se entre 2000 e 2003,
ção junto à aristocracia e à alta burguesia. Obra original, relata com rigor as seguida de outros momentos entre 2008 e 2014. Os primeiros resultados da pesqui-
sa encontram-se em Seidl (2003). Parte dos resultados posteriores está em Seidl (2007;
condições concretas e subjetivas de pesquisa encontradas em um espaço
2008a; 2008b; 2009a; 2009b; 2012; 2013) e em Seidl e Neris (2011).
social pouco conhecido das Ciências Sociais. Mais do que isso, expõe com 4
Gostaria de chamar atenção para o caráter múltiplo dos procedimentos metodológicos
empregados em meus estudos sobre o mundo da Igreja: pesquisa documental e biblio-
minúcia procedimentos raramente levados à fase de publicação dos resul-
gráfica, registro fotográfico, questionários, entrevistas e observações diretas. Isso decorre
tados de estudos científicos das áreas de ciências humanas e que compõem de uma perspectiva segundo a qual as Ciências Sociais não devem ser reféns das divisões
acadêmicas e, dessa forma, valer-se unicamente dos respectivos métodos considerados
justamente o cotidiano das interações sociais de pesquisa, dos imprevistos,
próprios a cada uma delas: as fontes escritas e os arquivos sendo domínio da história; o
descobertas e dificuldades na exploração do campo1. uso de questionários e do tratamento estatístico cabendo à Sociologia e à Ciência Política;
a entrevista e as observações, o dito “trabalho de campo”, constituindo a démarche própria
É dentro dessa tomada de posição que se situa o presente trabalho, tam-
à Antropologia. Sem ignorar a existência de tipos dominantes de produção de dados cien-
bém ele originado de pesquisas sobre um universo social que tem desperta- tíficos no interior de cada uma dessas disciplinas, sua unidade epistemológica pode e deve
servir de estímulo ao uso extensivo e criativo de todos os instrumentos postos à disposição
do pouco interesse nas Ciências Sociais dentro e fora do Brasil – a alta esfera
do pesquisador empenhado em compreender alguma dimensão da vida social. Esta pers-
eclesiástica2. O estudo em questão teve início no quadro de um doutora- pectiva é mais bem desenvolvida em Seidl e Grill (2013).

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do, neste texto, expor e discutir aspectos julgados indispensáveis a qualquer intensa relação direta com membros da instituição católica somente reforça-
pesquisa que invoque o princípio da reflexividade teórica (BOURDIEU, 1994a; va, portanto, certa insegurança em um pesquisador com pouco traquejo em
1994b; BOURDIEU; WACQUANT, 2006), raramente eles próprios objetos de negociações e condução de entrevistas. Sobretudo com atores da Igreja. Por
demonstração ou de questionamento sistemático5. Trata-se em especial de outro lado, devo acrescentar que a experiência anterior em um estudo so-
abordar as condições específicas e as peculiaridades que marcaram o per- bre a elite do Exército (SEIDL, 1999) – porém, com recorte histórico distante
curso de uma pesquisa concreta, com elementos não inteiramente transpo- no passado – criara expectativas de encontrar as mesmas formas de trata-
níveis ao contexto de outra investigação semelhante conduzida por outro mento recebidas nessa outra instituição de características semelhantes às da
pesquisador, pois ainda que o objeto fosse exatamente o mesmo, as proprie- Igreja. Notadamente, receava desconfianças exageradas frente à pesquisa e,
dades sociais dos investigadores e suas idiossincrasias nunca seriam idên- sobretudo, embaraços ou bloqueios causados pela estrutura hierarquizada
ticas6. Assim, o esforço é colocado em apresentar elementos que permitam da instituição, como o apego a formalidades preciosistas e a quase sempre
problematizações sobre processos de objetivação do pesquisador voltado necessária intermediação de algum membro de posição inferior no acesso
ao estudo de elites, em especial eclesiásticas e institucionais, e que sirvam aos indivíduos em postos mais elevados. No entanto, já desde os primeiros
à vigilância que facilmente escapa a seus desejos. De forma combinada, são contatos com a instituição católica ficou claro que, embora equivalentes na
dimensionadas questões caras às práticas de pesquisa que exigem interações estrutura de suas respectivas instituições, bispos e generais não são a mesma
sociais diretas e põem em jogo a mobilização da identidade do pesquisador coisa e Igreja e Exército apresentam muitas diferenças.
sob registros variados e costumam envolver inseguranças e hesitações tanto Começando pelas condições de contato inicial e de negociação de en-
de sua parte quanto daqueles com quem interage7. trevistas e encontros com membros da Igreja, uma primeira surpresa veio
da facilidade e da naturalidade em contatá-los e em obter respostas quan-
1. Negociando a pesquisa com religiosos: apresentação e manejos to à proposição de encontro pessoal – como regra geral. Sem dúvida essa
Como mencionado, estudos sobre dirigentes da Igreja católica são raros. surpresa também derivava de uma visão da esfera eclesiástica como algo
Com algum caráter etnográfico, então, quase inexistentes, até onde se saiba8. cerrado e essencialmente refratário à exploração por indivíduos exógenos.
A ausência de um ponto de partida mínimo para uma pesquisa que cobraria Isto é, dei-me conta de que compartilhava em boa medida uma imagem
corrente no senso comum segundo a qual a Igreja, e em especial suas esfe-
ras mais altas, constitui um “mundo à parte”, cercado por mistérios, segre-
dos e códigos cujo acesso é privilégio dos “de dentro”.
5
Em poucas palavras, a reflexividade teórica consiste na aplicação sistemática do racio- Assim, a concordância em colaborar com o trabalho e a presteza em dar re-
nalismo a todas as operações do fazer científico, muito em especial àquelas mais iniciais
torno ao contato realizado foram traços marcantes da relação estabelecida com
e decisivas, que dizem respeito à escolha da temática e à construção do objeto. Esse
princípio implica que o pesquisador se pergunte, por exemplo, sobre as origens de seu profissionais da Igreja, fato que seguramente tem a ver com a forma de apresen-
interesse e do investimento em tal ou qual tema, por que formulou estas e não aquelas
perguntas, por que privilegiou estes e não outros níveis de observação. O uso das ferra-
mentas das Ciências Sociais para a compreensão das condições sociais de construção do
objeto de pesquisa e de realização concreta de suas operações está, assim, na base da
reflexividade como atitude crítica indispensável.
6
Está excluída qualquer intenção de me deter nos detalhes ditos pessoais de condução siásticas era então o artigo de Bourdieu e Saint Martin (1982) sobre o episcopado francês.
da pesquisa e em idiossincrasias do investigador. No entanto, lembrando observações Embora amplamente apoiada em entrevistas, realizadas por uma assistente, a pesquisa traz
de Becker (2007), sabe-se que é possível identificar muitos aspectos gerais e recorrentes poucos elementos sobre as relações com o espaço investigado. Uma das poucas (porém,
em pesquisas sociológicas a partir de casos específicos, isto é, pode-se tomar determina- muito úteis) alusões ao universo do alto clero aparece em outro texto de Bourdieu (1996,
da idiossincrasia como uma variante de tal ou qual problema geral. p. 189-203). Por outro lado, pude servir-me em alguma medida de trabalhos com elemen-
7
Um esforço recente para expor esse tipo de discussão a partir de experiências de cam- tos etnográficos dedicados a outros grupos dirigentes, principalmente a alta burguesia e a
po vividas por cientistas sociais mulheres no Brasil é encontrado na coletânea organizada nobreza (CHAMBOREDON et al., 1994; COHEN, 1999; COOKSON; PERSELL, 1985; HERTZ;
por Bonneti e Fleischer (2007). No mesmo sentido, consultar também o artigo de Leirner IMBER, 1995; LE WITA, 1988; OSTRANDER, 1993; PINÇON; PINÇON-CHARLOT, 1997;
(2009) sobre pesquisa com militares. 1998; 2000; SAINT MARTIN, 1993). O recente artigo Machado (2013) discute dificuldades
8
Minha principal referência inicial na construção da problemática em torno das elites ecle- de pesquisa com uso de entrevistas com lideranças de várias religiões no Brasil.

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tar o tema da pesquisa e as justificativas de solicitação de um depoimento. Há, revelou-se acertado. Para ser mais preciso, o estudo não foi apresentado como
no entanto, uma série de nuanças nessa relação que dizem muito sobre diver- uma tese de doutorado em História, mas como um estudo na área de história
sos aspectos tanto em um nível mais geral, sobre formas de regulação interna da Igreja, sem especificar a disciplina. Nos raros casos em que me foram pe-
das relações hierárquicas e com os leigos, quanto sobre as diferentes posições didos detalhes quanto ao curso e ao orientador da tese, forneci todas as infor-
existentes na esfera eclesiástica e os modos de ocupá-las – com as respectivas mações sempre ressalvando a abordagem “histórica” pretendida, escapando
variações de recursos sociais e de percursos de seus membros –, estando sem- assim às indagações sobre o que a Ciência Política teria a ver com a Igreja.
pre em jogo alguma representação sobre as Ciências Sociais e o papel do pes- Por outro lado, em diversas situações de observação ou de convívio em gru-
quisador. Antes de ver com mais detalhe essas variações, cabe comentar as es- po, como durante uma Assembleia Geral dos Bispos do Brasil, me vali de uma
tratégias de apresentação da pesquisa e de aproximação com o meio estudado. apresentação como sociólogo - outra denominação mais legítima aos olhos da
A fim de minimizar parte dos problemas inerentes a qualquer tipo de in- Igreja –, geralmente permanecendo, no entanto, o termo “pesquisador”, segu-
vestigação que exija o estabelecimento de relação direta com o universo ramente o melhor passe partout encontrado na elaboração de minha identidade
investigado, nomeadamente, os questionamentos sobre os propósitos do ao longo do estudo10. Em etapas posteriores de pesquisa sobre a elite da Igreja,
estudo, as desconfianças quanto aos “verdadeiros” interesses do pesquisa- já com o doutorado concluído e na condição de professor universitário, man-
dor e a série de porquês que costumam surgir pelo lado daqueles com quem tive as mesmas orientações quanto aos interesses da pesquisa, com esforços
o investigador se defronta, foram adotados princípios relativamente bem muito menores para justificar encontros e entrevistas, salvo no contato com
conhecidos de apresentação. Assim, num primeiro período da pesquisa, bispos no período logo após a divulgação de casos de pedofilia de religiosos11.
o status de doutorando de uma reconhecida universidade federal foi sem Sem entrar em detalhes quanto às muitas e complexas relações entre
dúvida valioso na execução de todo o trabalho de campo ao produzir per- Igreja e Ciências Sociais (temos bispos sociólogos!), não deixaria de men-
cepções de garantia de “seriedade” e de “boas intenções” que facilitaram cionar a familiaridade de parte da hierarquia, para não falar dos religiosos
enormemente o desenrolar das atividades9. Talvez pudesse ser ainda me- intelectuais (teólogos, professores-pesquisadores), com pesquisadores ou
lhor caso fosse aluno de uma instituição católica. especialistas em e da Igreja. Se a Igreja talvez não chegue a registrar sistema-
Quanto à apresentação do tema e dos objetivos do estudo, optei por manter ticamente o material produzido pela ciência sobre a instituição, a exemplo
certa generalidade. Preferi nunca evocar a denominação Ciência Política para do Exército (LEIRNER, 2009), por outro lado, dispõe de leigos e religiosos
minha área de estudo, posto que os riscos de mal-entendidos seriam grandes com autoridade acadêmica que lhe assessoram em diversos temas, pesqui-
frente ao menor reconhecimento social dessa disciplina em relação às outras sam em seu nome e divulgam informação através de um robusto aparato
Ciências Sociais e, sobretudo, devido à carga social da palavra “política”, re- editorial e de comunicação. Dito de outra forma, o próprio mundo acadêmi-
pleta de conotações que dão margens ao temor de “classificação de opções co encarrega-se em parte da apropriação de conhecimento para a institui-
ideológicas ou partidárias”, “denúncias de preferência ou adesões” e muitas ção através de experts trafegando entre os dois espaços. Certamente, o Cen-
outras suspeitas. Nesse sentido, o uso do termo História, ao mesmo tempo
menos ofensivo e socialmente mais valorizado, como rótulo geral do estudo,

10
Os efeitos das representações correntes sobre os ofícios de sociólogo e de historiador
na relação com outros especialistas e com o público em geral são discutidos por Bour-
dieu e Chartier (2011).
9
Exemplo disso, quase uma blague acadêmica, foi a grande presteza com a qual um 11
O tópico “política” fez parte da maior parte dos roteiros de entrevista utilizados, em
bispo da arquidiocese de Porto Alegre, presença constante na televisão na condição de especial com o episcopado, teólogos e dirigentes de pastorais. As questões propostas
“especialista em artes”, aceitou minha solicitação de entrevista, via contato telefônico. No buscavam captar não apenas tomadas de posição e visões pessoais, mas também even-
dia marcado, ao me encontrar numa ampla sala da Cúria Metropolitana, visivelmente sem tuais relações com o político – sob registros variados – ao longo de seus trajetos e pos-
saber que eu era o tal pesquisador (certamente muito mais jovem do que imaginara!), síveis efeitos na composição das carreiras. Sobre dificuldades de acesso e de condução
me informou com certa gravidade que não poderíamos conversar naquele momento de entrevistas com líderes de diferentes religiões em pesquisas sobre os temas gênero e
“porque estava aguardando um pesquisador da UFRGS” para entrevistá-lo. sexualidade, consultar Machado (2013).

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tro de Estatística Religiosa e Investigações Sociais (CERIS), criado em 1962 parte do cotidiano profissional de outros indivíduos e de cujo auxílio o in-
por ação conjunta da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e vestigador não pode prescindir. Ambos os casos referem-se a tentativas de
da Conferência dos Religiosos do Brasil (CRB), é a instituição que melhor marcar entrevistas com arcebispos de posição destacada, um deles emérito
encarna as tarefas de subsidiar intelectualmente a Igreja brasileira em suas há poucos anos, pelo intermédio de suas respectivas secretárias. No primeiro
diversas facetas12. Para mencionar um caso exemplar, a CNBB, órgão má- caso, a solicitação feita por telefone teve por resposta a possibilidade de um
ximo de representação da Igreja, há muitos anos conta com um sociólogo encontro de apenas meia hora, na semana seguinte ao contato. Chegando
assessor, intelectual orgânico de alto prestígio entre o episcopado e cons- com antecedência ao arcebispado no dia previsto, fui recebido cordialmente
tantemente solicitado em eventos, como na Assembleia Geral dos Bispos13. pela secretária e, enquanto esperava minha hora, pude conversar descontrai-
O fato de grande parte dos indivíduos que entrevistei estarem habituados damente e estabelecer uma relação de empatia que resultou numa “ajuda”
a controlar seu discurso e a apresentação de sua imagem em situações varia- em obter uma segunda entrevista, para a outra semana, e essa com duração
das, tais como entrevistas à imprensa, programas de rádio, aulas, palestras, excepcional de uma hora, realizada no primeiro horário da manhã. Tive aí,
conferências e, obviamente, os eventos religiosos (missas, cursos, aconselha- portanto, oportunidade de utilizar circunstâncias excepcionais para me en-
mentos), apresenta um duplo aspecto. Se por um lado tornava mais fácil o contrar, sem dúvida, com o clérigo gaúcho de agenda mais comprometida.
consentimento do entrevistado em falar a um estranho e a deixar gravar seu O contraponto a essa circunstância inesperada de colaboração no acesso a
depoimento, por outro lado exigia o esforço de romper com suas representa- indivíduos em cargos de destaque na Igreja e com escassa disponibilidade de
ções sobre as situações da entrevista (o que se imaginava encontrar), o que me tempo veio pouco depois. Após uma série de pedidos de encontro com um
levou a destacar o caráter pessoal e informal da “conversa” que lhe propunha. arcebispo emérito feitos por telefone a sua secretária particular – cuja respos-
Procurei, portanto, insistir nesse caráter de informalidade já a partir dos con- ta repetida sempre fora a de que iria encaminhá-los –, aproveitei o encontro
tatos iniciais, sempre relembrado antes de começar a entrevista, ressaltando a com um padre muito bem posicionado na instituição (secretário-executivo
vontade de conhecer a “história do entrevistado dentro da Igreja”14. da seção regional da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) e com quem
Desconsiderando as situações de dificuldade de horário, agenda lotada vinha mantendo uma relação de confiança, para relatar o que se passava e
ou outras contingências com as quais se defronta qualquer interessado em pedir colaboração. A reação foi imediata e teve efeito surpreendente. Em mi-
ver uma pessoa em condição formal, deparei-me com duas situações opos- nha presença, ele telefonou à secretária em questão e, colocando o telefone
tas que ilustram bem o quanto pode haver de involuntário e de aleatório em som ambiente, explicou-lhe “meu caso” e lhe sugeriu que me “desse uma
numa pesquisa que envolva relações pessoais diretas. Trata-se aqui de cha- chance”, numa evidente e desejada demonstração de poder. Como pude
mar atenção ao papel exercido por aquelas pessoas encarregadas de regular ouvir, sua resposta ao padre foi rápida e positiva. No mesmo dia telefonei
novamente à secretária do arcebispo e pude então tranquilamente encami-
nhar a entrevista, finalmente contornando o bloqueio sistemático que havia
enfrentado para poder encontrar um arcebispo aposentado que passava a
12
Como informa o sítio do centro, “[...] atendendo uma exigência das ações pastorais e so- maior parte do dia a ler no gabinete de sua residência.
ciais da Igreja Católica no Brasil, o CERIS tem, também, o objetivo de dar suporte técnico e
Outra estratégia que julgo muito eficiente para a boa condução de investiga-
sociológico aos trabalhos da Igreja e sempre foi uma instituição que tem como marca a ava-
liação de projetos, pesquisa e monitoramento de experiências populares e pastorais, além ção em ambientes institucionais, onde se encontra um corpo de funcionários
de assessoria a movimentos sociais e eclesiais, financiamento e apoio a pequenas iniciativas”.
presente constantemente nos mesmos locais, como é o caso da Igreja católica e
Disponível em: <http://ceris.org.br/institucional/sobre-o-ceris/>. Acesso em: 26 ago. 2015.
13
Sobre o papel dos assessores na CNBB, ver Seidl (2008a); quanto à apropriação pela do Exército, é a do contato visual mais amplo e longo possível com membros da
Igreja do conhecimento das Ciências Sociais, consultar Coradini (2012), Montero (2007)
instituição. Isso não significa, obviamente, que se possa ou deva falar com to-
e Seidl (2007).
14
Era especialmente notória a preocupação revelada por muitos bispos, ao serem contata- das as pessoas presentes num determinado recinto, tal como a cúria, o bispado,
dos, em estar preparados para a entrevista e poder, assim, dar “boas respostas”. Esse dado
uma casa de retiro espiritual ou um seminário. Mas o fato de ver e, especialmen-
tem relação com a posição de autoridade dos bispos no sistema de poder da instituição, a
qual implica elevado grau de controle sobre suas falas. te, ser visto por integrantes da instituição e que são, muitos deles, importantes

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aos interesses da pesquisa – seja como informantes, mediadores ou meramen- Sem demasiadas preocupações de linearidade, a dinâmica de pesquisa foi
te como funcionários, porém muitas vezes facilitadores de contatos –, exerce estabelecendo paulatinamente um percurso próprio orientado à constitui-
papel que, segundo experimentei, pode ser chave na aquisição da confiança ção das redes reais do meio estudado, adaptando-se, assim, aos circuitos
necessária na figura do pesquisador que circula num meio que “não é o seu”. sociais locais conforme surgiam novas indicações, pistas, bloqueios ou er-
Assim, muitas vezes fui diretamente a repartições ou órgãos da Igreja, sem ros. No entanto, alguns passos preestabelecidos na ordem de contato dos
ter feito contato prévio, tentar um pouco ao acaso ver determinadas pessoas interlocutores mostraram-se eficazes no acúmulo tanto de informações es-
e, a partir desses encontros que permitem uma aproximação menos impesso- tratégicas quanto de respaldo da pesquisa junto ao universo investigado17.
al e dão corpo e cara ao pesquisador, distinta do telefonema ou da mensagem Um passo a ser citado foi a decisão de iniciar a série de entrevistas com
eletrônica, buscar estabelecer bases para uma relação propícia ao recolhimen- membros do episcopado a partir de elementos que elegi como chaves. As-
to de informações e à continuidade dos contatos. Em várias ocasiões, também sim, o primeiro bispo escolhido para se entrevistar foi o responsável pela
aproveitei a estada em outra cidade, geralmente em sedes de diocese, para diocese sediada em meu município de origem, onde reside a maior parte
visitar o bispado e conversar com pessoas de pertencimento bastante variado de meu grupo familiar e no qual ainda mantenho uma rede razoavelmen-
à instituição, visitas essas que se mostraram preciosas à coleta de materiais, à te extensa de relações de amizade. Apresentando a justificativa de desejar
sugestão de novos informantes, ao esclarecimento de dúvidas, à obtenção de começar o trabalho por minha cidade natal e, já então na ocasião da entre-
endereços e à observação do cotidiano; enfim, um conjunto de procedimen- vista, situando minhas origens familiares, obtive condições que considero
tos nem todos eles inicialmente previstos. Já no início da pesquisa de campo privilegiadas para a situação: tempo de duração da entrevista indetermina-
percebi que os dividendos dessa abordagem direta eram enormes tratando-se do, interesse e disposição do entrevistado em prestar informações, ininter-
de uma instituição na qual predomina a lógica da familiaridade – no duplo rupção da conversa e rápido estabelecimento de uma relação de empatia.
sentido de “não estranho” e de pertencimento ao grupo ou, propriamente, à Minha primeira experiência de pesquisa e, em especial, de entrevista
“família da Igreja”15. Foi assim que ao cabo de algum tempo, mediante esfor- gravada, com um membro do alto clero católico foi, portanto, das mais ani-
ços para estar presente em lugares estratégicos como os mencionados acima, madoras e me encorajou a dar continuidade à sequência prevista de entre-
minha visibilidade converteu-se em certa garantia de confiança dentro de vistas com todos os bispos do Estado. Nesse sentido, o fato de tê-la iniciado
círculos importantes da instituição, eliminando alguns dos obstáculos mais com um prelado que desfrutava de considerável visibilidade e “simpatia”
comuns ao trabalho de campo que é a condição de estranho ou estrangeiro16. no cenário católico regional contribuiu em grande medida ao encaminha-
De par com essa atitude com vistas a me tornar figura conhecida aos mento dos contatos subsequentes, posto que “ter conversado com Dom X”
olhos de parcela qualitativamente significativa de membros da Igreja do me licenciava, em boa medida, a conversar com seus homólogos. Foi se-
ponto de vista de meus interesses, me vali do princípio da arborescência guindo essa mesma ideia de me municiar inicialmente com a notoriedade
ou ramificação para organizar uma parte importante dos encontros e das de determinados bispos a fim de garantir uma circulação respaldada pela
entrevistas a serem realizados. Vale dizer, se possuía previamente uma lista alta hierarquia no meio do episcopado gaúcho que obtive uma entrevista
de interlocutores identificados a servir de base ao estudo – notadamente, o com o então bispo presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil,
conjunto dos bispos trabalhando no Rio Grande do Sul, eméritos inclusive, segundo prelado com o qual estabeleci relação. A partir dessas duas entre-
e alguns clérigos em postos de destaque –, outra lista de igual tamanho foi vistas encontrei-me em condições nitidamente mais favoráveis de condu-
sendo elaborada somente à medida que avançava nos contatos previstos. ção do estudo e estrategicamente incorporei os nomes dos primeiros entre-
vistados em todas as apresentações e solicitações de encontro seguintes.

15
Sobre os elementos da “lógica familiar” invocada pela Igreja, ver Bourdieu (1996, p. 124-135).
16
Para uma discussão sobre as ambiguidades e desconfianças em situações de observa- 17
Para mais detalhes acerca do método reputacional o leitor pode consultar o primeiro
ção participante, consultar Oliveira (2010). capítulo deste livro, em particular o item 5 (p. 24) e a nota de rodapé nº 9, na p.27 (N.R.).

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O efeito progressivo da informação obtida junto a esses religiosos foi es- Ainda um terceiro elemento-chave na composição desse grupo estratégico
pecialmente importante. Na ocasião da entrevista com o presidente nacio- formado pela rede inicial de contatos que constituíra me foi apresentado jus-
nal da CNBB, realizada em sua residência num município do interior, soube tamente durante a referida Assembleia Geral dos Bispos do Brasil. Trata-se de
de um encontro regional de dioceses que reuniria, numa cidade vizinha, um padre diocesano cujo cargo na estrutura administrativa regional da Igre-
os respectivos bispos de três dioceses do extremo sul (incluindo o próprio ja permitia visão muito abrangente sobre grande variedade de dimensões da
informante) e alguns clérigos de determinada região do estado. Fui, então, instituição e com quem consegui criar laços fundamentais ao desenrolar da
até o local do retiro – um balneário pouco habitado naquele período do ano pesquisa. Transformado em meu principal informante e “padrinho” de pes-
– e, após rápida apresentação ao bispo responsável pelo evento, pude facil- quisa, sua cooperação foi muito além do fornecimento de informações de di-
mente marcar entrevistas com os dois religiosos participantes, uma naque- fícil obtenção junto a religiosos, pois me colocou à disposição vários contatos
le mesmo dia, após o jantar, e outra no dia seguinte. institucionais (seminários, institutos, dioceses, ordens) e pessoais que abri-
Porém, talvez o fato mais positivo de toda situação - sem falar na importân- ram as portas mais indispensáveis às minhas necessidades (um exemplo é a
cia de travar pela primeira vez relação com um grupo de clérigos reunido, ser intermediação, mencionada acima, que realizou para que pudesse ultrapassar
apresentado diretamente por religiosos e, desse modo, poder consolidar estra- a barreira posta pela secretária de um bispo). Poderia também lembrar o fato
tégias de apresentação e de elaboração de minha identidade como “pesquisa- de ter sido incluído, por sugestão sua, na listagem de endereços eletrônicos
dor interessado no episcopado” –, foi a sugestão dada pelo bispo que me aco- da sede regional da CNBB e assim receber, desde então, o boletim informativo
lheu de ir à Assembleia Geral dos Bispos que aconteceria dentro de poucos dias semanal divulgado pela instituição, com informações das mais diversas sobre
no estado de São Paulo, “já que desejava entrevistar todos os bispos do Rio a Igreja regional e nacional, tais como anúncio de eventos exclusivos ou não a
Grande do Sul”. A ideia soou excepcional dada a possibilidade de encontrar religiosos (reunião de bispos, de pastorais, procissões, celebrações, romarias),
em um mesmo espaço vários bispos que, de outra forma, teria de ir visitar em pronunciamentos de bispos, nomeações, sagrações e transferências de bispos
suas dioceses espalhadas pelo estado. Hesitando, contudo, sobre a viabilidade no estado ou bispos gaúchos fora do Rio Grande do Sul, entre muitas outras.
de acesso à assembleia e aos bispos, indaguei se poderia contar com o auxílio Por outro lado, apesar de contar – além dos bispos citados – com esse
do bispo em questão para contatar seus colegas e pedir-lhes colaboração com a indivíduo situado em posição crucial, dotado de recursos privilegiados e
pesquisa. Sua resposta afirmativa me encorajou, assim, a enveredar por um ca- sempre pronto a colaborar, em nenhum momento foi dispensado o prin-
minho imprevisto no programa de investigação e que implicava uma série de cípio da triangulação, a checagem cruzada com pelos menos um outro in-
circunstâncias novas, tais como um longo deslocamento ao campo de trabalho formante, como forma de não tornar a pesquisa prisioneira de uma única
e uma estada mais demorada fora de casa, a convivência prolongada com re- fonte oral. O próprio número total de entrevistas realizadas numa primeira
ligiosos e leigos membros da Igreja; ou seja, uma multiplicidade de variáveis etapa da pesquisa (51) bastaria para demonstrar as preocupações tanto com
bastante típicas do ofício etnográfico para as quais tinha conhecimentos mais a representatividade numérica dos indivíduos a servir de base empírica ao
acadêmicos do que práticos. Acrescento ainda que, entre os preparativos para estudo quanto com a apreensão da multiplicidade de pontos de vista dis-
essa etapa, voltei a procurar o primeiro bispo que havia entrevistado e lhe pedi poníveis sobre questões que lhe são pertinentes19. Mesmo assim, saliento o
o mesmo serviço solicitado a seu colega. Tive a reafirmação de apoio ao tra-
balho e a promessa de que agiria como mediador na obtenção das entrevistas
que pretendia fazer com alguns dos bispos gaúchos presentes na assembleia18. 19
É sabido que, como regra geral, as informações tendem a ser redundantes a partir
de 30 entrevistas. O número bastante elevado nessa pesquisa sobre a elite eclesiástica
deveu-se a dois motivos principais. A dificuldade em obter dados – em especial quanto a
origens familiares – sobre os dirigentes católicos através de outras fontes e meios (ques-
tionário enviado por correio, e-mail e fontes oficiais); e a própria natureza do objeto da
18
Essa intensa experiência de observação e de interação diretas com o conjunto da elite investigação, que envolvia dimensões como as transformações do papel de sacerdote e
eclesiástica em carne e osso, reunida num espaço físico de acesso altamente controlado, de bispo, a reconstituição das disputas no espaço de formação teológica e as nuanças na
é apresentada em Seidl (2003, p. 415-437; 2008a). especialização de diferentes ordens, congregações e institutos.

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repetido cruzamento de informações com vistas ao controle sobretudo de No caso de uma pesquisa envolvendo uma instituição religiosa dominante,
dados de caráter mais factual e eventual – a cobrar do informante menos cuja influência cultural se dá em diversos níveis e a qual, entre outras coisas,
uma avaliação do que uma descrição sobre algum ponto –, através de suces- controla parte significativa do sistema de ensino no país, não há dúvidas de
sivos questionamentos a indivíduos escolhidos pelo critério de quantidade que as dificuldades de objetivação são consideráveis. Esse fato, aliado a pecu-
e qualidade de informação potencialmente disponível, tomando em conta liaridades de meu trajeto social, reforçou a ideia de que a exposição daqueles
as distintas posições no interior da esfera eclesiástica. condicionantes e das implicações que tiveram sobre o desenvolvimento do
É assim, por exemplo, que para entender as diversas fases pelas quais trabalho pudesse ser um exercício metodológico valioso21. Nessa linha de ra-
passou um seminário maior em cinco décadas, entrevistei não apenas seu ciocínio, pretendo pôr em evidência as principais propriedades sociais a inter-
atual reitor, ele próprio ex-aluno da instituição, mas também um padre vir em minha relação com o universo investigado e, ao mesmo tempo, de que
professor de teologia que trabalhava e morava no seminário praticamente maneira parte dessas propriedades agiram como trunfos de pesquisa.
desde sua fundação, além de muitos religiosos ex-alunos. Ou ainda, que a O primeiro aspecto mais central a ser visto é minha relação com a religião
fim de reconstituir parte do processo de expansão do ensino de teologia católica e com a Igreja. Ambos os ramos de minha família tiveram tradição
no estado, tenha conversado com indivíduos nele envolvidos a diferentes de pertencimento católico em graus bastante similares através de partici-
títulos, seja como bispos protagonistas da criação de novos cursos em dife- pação na organização comunitária, nas práticas religiosas habituais e no
rentes dioceses, como alunos de teologia à época, ou ainda como professo- empenho na transmissão da religião aos descendentes – praticamente to-
res do até então principal centro de formação religiosa superior do estado. dos passaram pelas etapas de iniciação cristã marcada pelo batismo, segui-
da pela primeira comunhão e reafirmada pelo matrimônio religioso. Dentre
2. Interações de campo: reflexividade, acesso e relações face a face o ramo paterno, tive dois tios-avós padres jesuítas (irmãos de meu avô, por-
Entre os procedimentos metodológicos que procurei adotar nas investiga- tanto com o mesmo nome de família que carrego) dos quais cheguei a co-
ções aqui mencionadas, provavelmente o de mais difícil realização seja o da nhecer, de modo superficial, apenas um. Pelo lado materno não identifico
auto-objetivação através da explicitação de minha posição social, bem como religiosos, porém era patente uma relativa participação, sobretudo de meu
dos principais determinantes sociais e culturais presentes em meu trajeto. Os avô, em atividades paroquiais e o entretenimento de boas relações com os
pressupostos epistemológicos em que se fundamenta essa atitude já foram clérigos da área central da cidade, incluindo o bispo diocesano. Se quanto
amplamente discutidos tanto em obras dedicadas especificamente a questões ao grupo familiar a prática religiosa e a observação dos sacramentos eram
de epistemologia e de metodologia das Ciências Sociais quanto, de forma mi-
noritária, em capítulos ou seções de obras que tratam de algum tema de inves-
tigação em particular (BOURDIEU, 1990a; 1994a; 1994b; BOURDIEU; CHAM-
BOREDON; PASSERON, 1999; BOURDIEU; WACQUANT, 2006; CHAMPAGNE et 20
Pinçon & Pinçon-Charlot (1997, p. 53) lembram que “não há sociologia possível sem
sociologizar os sociólogos, ou seja, sem situá-los na relação com seu objeto”. A práti-
al., 1996; LAHIRE, 2005; PINÇON; PINÇON-CHARLOT, 1997). Por essa razão,
ca sistemática da “sociologia da sociologia”, o uso do instrumental sociológico pelos
não pretendo retomá-los aqui. Bastaria fazer referência ao princípio geral da pesquisadores para a compreensão de sua própria prática, constitui um dos pilares do
exercício científico controlado, tal como o concebe a perspectiva de Bourdieu (1994b)
neutralidade axiológica como linha de mira nos esforços de controle das per-
apresentada especialmente em Lições da Aula.
cepções do pesquisador sobre um mundo social no qual está inserido, em que 21
Como indica Bourdieu (1990b, p. 108; grifos no original), a questão não é saber, “como
frequentemente se finge acreditar, se as pessoas que fazem sociologia da religião têm
ocupa um espaço determinado e que estrutura suas visões sobre si próprio e
fé ou não, nem mesmo se elas pertencem ou não à Igreja. Deixando de lado o problema
sobre os outros. Ao dispor das aquisições acumuladas pelas Ciências Sociais da fé em Deus, na Igreja e em tudo o que a Igreja ensina e garante, trata-se de colocar o
problema do investimento no objeto, da aderência ligada a uma forma de pertencimento,
quanto aos mecanismos e lógicas da vida social, seu uso pelo investigador
e de saber em que a crença, tomada nesse sentido, contribui a determinar a relação com
em uma socioanálise voltada a ele mesmo constitui o principal instrumento o objeto científico, a determinar os investimentos nesse objeto, a escolha desse objeto.
[...] é a cada sociólogo da religião que cabe interrogar-se, para o interesse de sua própria
de tentativa de neutralização de suas propriedades sociais frente ao universo
pesquisa, se, quando ele fala de religião, ele quer compreender as lutas que têm por
estudado e com o qual muitas vezes interage diretamente20. objeto as coisas religiosas, ou tomar partido nessas lutas”.

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muito mais intensas nas duas gerações anteriores à minha, por outro lado, Dessas condições de socialização e de proximidade com parte do uni-
o ambiente familiar e escolar em que realizei parte de minha socialização verso católico deriva familiaridade considerável com uma série de ele-
continuavam, todavia, bastante marcados por uma forte ética católica. mentos constitutivos da religião católica, entre as quais o vocabulário
Meu percurso escolar até a conclusão do Ensino Médio foi todo cumpri- peculiar, a organização hierárquica, a ritualística e a simbologia, a indu-
do em uma escola dirigida por irmãos Maristas, na qual a oração diária no mentária, elementos da arquitetura e de espaços físicos, os códigos de
início das aulas, o ensino religioso e a inculcação dos princípios católicos, conduta (postura, tom de voz, expressões, maneira de se portar em di-
aos mais variados títulos, tiveram consequências óbvias na formação das ferentes recintos católicos)23, além de outros. Se por um lado esse fato
percepções sobre uma infinidade de aspectos da vida social e sobre a pró- representava a necessidade de esforços muito maiores ao distanciamento
pria religião e a instituição católica. Ao mesmo tempo, o envolvimento com e ao estranhamento fundamentais à apreensão analítica de algumas di-
um grupo de jovens ligado à Igreja e coordenado por leigos, na pré-ado- mensões da instituição católica, por outro lado é inegável que ao mesmo
lescência, além do cumprimento da socialização formal católica (batismo, tempo me proporcionava recursos muito vantajosos no andamento de um
primeira eucaristia, crisma), reafirmou esse conjunto de princípios morais estudo que exigia contato pessoal com o universo analisado.
e de visões sociais e configurou um determinado tipo de pertencimento à Afora a vantagem óbvia de o pertencimento familiar à religião, explici-
religião que ia além da mera prática individual. tado sempre que necessário, facilitar uma cumplicidade quase imediata
Ao longo do percurso escolar esse pertencimento foi gradualmente se mo- em qualquer relação com membros da Igreja – sem dúvida distinta da-
dificando até o abandono total, nos anos iniciais de estudo superior, de cren- quela produzida caso tivesse me declarado agnóstico, ateu ou praticante
ças e práticas relacionadas ao mundo católico ou a qualquer outra religião, de outra religião –, o relativo domínio de alguns códigos fundamentais da
não se tratando, contudo, de “rupturas”, “desilusões” ou “revoltas” frente instituição funcionou como uma espécie de prova desse pertencimento
ao catolicismo ou à instituição católica, nem muito menos de uma conversão ao grupo (de fiéis) e eliminou grande parte das desconfianças suscitadas
a outra religião, seita ou filosofia esotérica. Sublinho esse aspecto pelo fato pela situação de pesquisa. Em várias entrevistas fui indagado, já de início,
de não ser incomum o caso de ex-católicos – leigos fiéis ou clérigos – utili- se era católico. Em um caso, ao final de uma entrevista bastante tensa,
zarem as Ciências Sociais como instrumento para acerto de contas pessoais marcada por reticências e ironias, laconismo e uma atitude de clara des-
com a religião, com a hierarquia católica ou mesmo com algum outro religio- confiança por parte de um teólogo, este me perguntou se eu era católico;
so ou instituição católica em particular. Do mesmo modo, também seria útil ao responder afirmativamente, disse que havia pensado que eu era pro-
tornar explícito que a relação entre meu trajeto social e a escolha do tema de testante, indicando o quanto uma determinada filiação religiosa poderia
investigação para essa pesquisa limita-se, até onde me é possível perceber, a gerar impactos negativos na interação. Nos contatos seguintes que tive
questões de investimento acadêmico ligadas a meu percurso escolar. com esse padre (também professor de pós-graduação), o ceticismo deu
O interesse pelo estudo de elites teve início com uma pesquisa sobre o lugar à simpatia e muita colaboração.
alto oficialato do Exército e resultou numa dissertação de Mestrado em
Ciência Política. Uma série de indicações quanto ao peso notável da Igreja
católica na formação de grupos dirigentes no Rio Grande do Sul, combina-
da com a visibilidade numérica e de poder do clero gaúcho na hierarquia 23
Ao lado das formas de vestir, a hexis corporal ocupa lugar importante entre as estra-
tégias de apresentação de si e permite localizar rapidamente o espaço social pelo qual
da instituição, orientou a manutenção do investimento no terreno pouco
circula o pesquisador e, ao mesmo tempo, seu grau de familiaridade com o universo
explorado das elites22. que investiga. A título de ilustração, citaria a moderação no tom de voz em conversas
e nos espaços da instituição e a observação de momentos de silêncio e de reverências
ritualísticas, como o sinal da cruz e a genuflexão ao entrar em recintos que o exigiam.
Um exemplo das precauções necessárias com a elaboração da imagem e do controle
de si em situações de observação ou entrevista é fornecido por Pinçon & Pinçon-Char-
22
A leitura do trabalho de Miceli (1988) sobre a elite eclesiástica na Primeira República, lot (1997, p. 37-39). A esse respeito, consultar também Beaud e Weber (2007), Olivier
rico em pistas de pesquisa e na indicação de fontes, foi central na elaboração do objeto. de Sardan (1995) e Ostrander (1993).

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Porém, há ainda dois aspectos que facilitaram em ampla medida o aces- dito remeter em parte a essa visão24, embora haja no estado expressiva
so aos indivíduos que contava ver e que merecem comentário. O primeiro população de origem germânica cuja confissão é luterana. Por outro lado,
já foi mencionado pouco acima e é o fato de ter tido dois tios-avós padres há fortes indicações de que tal empatia derive de uma percepção de per-
jesuítas de sobrenome igual ao meu, um deles meu padrinho, embora já tencimento comum que extrapola a mera religiosidade, situando-se em um
falecido há vários anos. Não é difícil entender a lógica de favorecimento sentimento de compartilhamento de uma origem étnica e de uma trajetória
aos mais “próximos” ou “semelhantes”, válida em muitas esferas sociais social do grupo familiar marcada pela imigração e por uma série de aspec-
– porém mais fortes em instituições que formam um “espírito de corpo”, tos correlatos (como ética do trabalho, valorização das “origens” e reconhe-
como as Forças Armadas, algumas religiões, certos tipos de escola, buro- cimento de ascensão social)25.
cracias –, intervindo nessa situação e que me permitia tirar vantagem do Ao longo dos contatos com membros da Igreja chamou-me atenção o
parentesco com membros da instituição católica. É interessante verificar frequente interesse por minha própria origem étnica e geográfica, tema
que o efeito dessa circunstância era muito mais forte em meio ao clero que muitas vezes deu início a conversas descontraídas que rompiam com
ligado a ordens ou congregações – sem contar, obviamente, o tratamen- a artificialidade inerente à situação de entrevista. Se os questionamentos
to dispensado pelos jesuítas –, tal como se a cumplicidade do “espírito sobre aspectos biográficos e de formação profissional do pesquisador são
de corpo” se duplicasse pelo fato de, além de ter tios-avós padres, es- absolutamente legítimos como formas de eliminar parte do desequilíbrio
ses também lhes tinham em comum a opção pelo sacerdócio religioso, de informação entre investigador e investigado – uma vez que o primeiro
e não pelo diocesano. Ainda nessa lógica de pertencimento ou afiliação sempre dispõe de algum conhecimento prévio sobre o segundo, em raros
percebida nos contatos com membros da Igreja, coloca-se a condição de casos havendo reciprocidade –, as situações experimentadas são significa-
ex-aluno de uma escola Marista, dado que valia em situações muito va- tivas de algumas das propriedades sociais e de percepções do clero gaúcho,
riadas por atestar percurso escolar com a chancela cristã, e sobremodo no no caso, as conexões entre origem étnica e geográfica e religiosidade.
trato direto que tive com os próprios Irmãos Maristas e com padres pro- Já foi citado o interesse despertado por minhas origens familiares, sobretu-
fessores da maior universidade católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS), do (mas não exclusivamente) em indivíduos de ascendência germânica, o que
dirigida por aqueles religiosos. permitia minha localização mais ou menos precisa no interior de uma catego-
O segundo aspecto a ser apresentado é mais complexo e remete a percep- ria de “descendentes de alemães”, adicionada pela “confissão católica” (com
ções no seio da Igreja do Rio Grande do Sul de uma relação entre identidade frequência, mencionava nessa oportunidade meu parentesco com padres je-
étnica e religiosidade, traço estruturante do catolicismo que se consolida suítas falecidos). Simultaneamente, dei-me conta de que ser natural de uma
ao longo do século XX nesse estado. O predomínio de indivíduos de ascen- cidade do interior do estado – no caso, um dos centros da colonização alemã –
dência alemã e italiana na estrutura geral da Igreja gaúcha (corpo clerical, também produzia percepções vantajosas, o que não causa nenhuma estranhe-
religiosos e funcionários), originários de regiões culturalmente marcadas za quando se constata que a quase totalidade dos sacerdotes e religiosos do es-
por essas etnias e pela prática católica, consolidou fortes representações tado nasceram fora da capital e provêm de áreas rurais ou de pequenos centros
sociais segundo as quais a origem étnica funciona como indicador de cer- urbanos. Não poucas vezes fui perguntado se havia nascido na “zona rural”
to tipo de religiosidade. Nessa óptica, a população gaúcha de ascendência ou no “interior” (aqui como oposição a “cidade” e “zona urbana”), ao que res-
alemã ou italiana seria portadora de “cultura religiosa” mais “sólida”, “in- pondia negativamente, mas sempre ressaltando “conhecer um pouco da vida
tensa” e “profunda” do que a da população “luso-brasileira”, visão reforça-
da pela fácil constatação de uma maioria absoluta daquelas etnias entre as
vocações sacerdotais no Rio Grande do Sul, notadamente entre o episcopa- 24
Em diversas ocasiões, fui descontraidamente saudado em alemão, em tom de brincadeira.
do. Dessa forma, minhas origens germânicas imediatamente identificáveis Também durante as entrevistas eram comuns citações ou referências feitas nesse idioma.
25
Os elementos centrais dessas percepções e o processo de emergência de uma etni-
pelo nome de família e confirmadas por características físicas inspiravam
cidade teuto-brasileira em oposição à “cultura luso-brasileira” no sul do país são ampla-
muitas vezes, como percebi com facilidade, reações de empatia que acre- mente discutidos em Seyferth (1982a; 1982b; 1986; 1999).

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rural”. Esse aspecto tinha efeito especialmente visível durante relatos biográ- ção aos membros do episcopado, a tomar em conta seus percursos escola-
ficos sobre o ambiente familiar e a socialização dos entrevistados, momento res frequentemente marcados por especializações ou doutorados, estadas
em que a demonstração de alguma familiaridade com o universo descrito dava de estudo no exterior e conhecimento de idiomas. No entanto, o desenrolar
muito respaldo aos propósitos da entrevista. Em outras palavras, havia boas das entrevistas com bispos fez com que percebesse diferenças significati-
condições para eu ser considerado não somente um “amigo” da Igreja, para vas entre suas posições e aquelas de clérigos dedicados a tarefas de ensino
utilizar expressão recorrente no Exército (LEIRNER, 2009), mas uma pessoa e pesquisa frente a um pesquisador acadêmico, embora o caso dos prelados
com a qual os religiosos facilmente encontravam pontos de identificação que considerados “intelectuais” se enquadre no segundo grupo.
levaram a relações de confiança e, mesmo, de cumplicidade. Creio que isso se deva basicamente a duas razões: primeiro, pelo fato de a
Ainda na discussão de uma parte central dos encaminhamentos metodo- formação intelectual dos bispos não incluir, necessariamente, uma titulação
lógicos adotados nesse estudo, caberia examinar em maior profundidade as escolar no mesmo nível da dos padres e teólogos professores – e de, portanto,
relações objetivas depreendíveis das situações de entrevista ou de contato in- tanto o tipo de preparação recebida quanto a relação com o conhecimento for-
formal com grupo bastante extenso de indivíduos em posições variadas na es- malizado serem distintos –, mesmo que vários desses bispos apresentem per-
fera católica. Tendo sempre em perspectiva a reflexividade sobre as condições cursos escolares idênticos aos seus e tenham tido trajetos profissionais muito
da prática sociológica, trata-se de tornar mais explícitos os efeitos da interação semelhantes até a nomeação ao episcopado. Segundo, pelo fato de a posição
entre pesquisador e universo de pesquisa por meio da compreensão das dife- do prelado, ainda que esse seja possuidor de títulos acadêmicos importantes e
rentes propriedades sociais detidas pelos indivíduos implicados, bem como de “voltado à reflexão”, não desfrutar da mesma legitimidade percebida pelos sa-
suas percepções recíprocas, o que inclui aquelas sobre as próprias questões da cerdotes “intelectuais” no exercício de analisar, comentar ou avaliar aspectos
pesquisa. Assim, faz parte desse tipo de procedimento a tentativa de compre- da Igreja católica e do catolicismo, isto é, de se colocar na condição de “pen-
ensão da diferença entre as concepções do investigador e as do investigado so- sador” da instituição e da religião. Vale dizer, embora a totalidade dos clérigos
bre o objeto da pesquisa, as representações sobre o pesquisador variando em entrevistados, assim como dos leigos, possuam escolarização superior – uma
função das representações que o entrevistado possui sobre o universo da in- vez que a condição escolar para a sagração sacerdotal é o cumprimento dos
vestigação e da universidade (BOURDIEU, 2008; CHAMBOREDON et al., 1994; estudos de Filosofia, seguidos pelos de Teologia –, há uma grande heteroge-
DAMAMME, 1994; LEGAVRE, 1996). Entender as distorções inscritas na estru- neidade na composição dos recursos culturais desses indivíduos que interfere
tura da relação de pesquisa, suas assimetrias e as consequências que daí deri- diretamente no confronto com os recursos apresentados pelo investigador.
vam é um passo necessário na tentativa de controlar melhor essas condições. As percepções de diferenças entre o tipo de ensino obtido em uma uni-
A interação com os membros da Igreja que compuseram o universo es- versidade pública e laica e aquele obtido em um seminário maior e/ou em
tudado variou não apenas segundo as diferentes composições de capital um instituto de Teologia parecem frequentemente produzir sensações de
que aqueles indivíduos apresentam, mas também de acordo com os dife- relativa inferioridade nos indivíduos cuja ocupação principal exigiu meno-
rentes papéis e posições que significam diferentes tipos de poder dentro da res investimentos intelectuais26. Tomando o outro polo, a tendência verifi-
instituição, como recorda Lagroye (2006). Considerando o tipo de recursos
sociais e culturais de que eu dispunha e a posição social que ocupava, nota-
damente fundada num capital cultural representado por extenso percurso
26
Sem considerar as particularidades da estrutura pedagógica dos seminários e casas
escolar e legitimado pelo pertencimento ao universo acadêmico em nível
de formação religiosa, instituições à parte no esquema de ensino, pode-se atribuir essa
elevado (doutorando e posteriormente professor), confirmaram-se em boa percepção ao fato de o Ensino Superior público ser dominante no contexto brasileiro,
redobrada pela baixa posição ocupada por cursos como Filosofia e Teologia na hierar-
medida as expectativas de estabelecer relações mais equilibradas, do ponto
quia das carreiras universitárias. Além desses aspectos, seria plausível pensar no próprio
de vista social, com indivíduos situados perto do polo mais intelectualiza- status social em declínio do religioso em sociedades fortemente secularizadas, sem es-
quecer os efeitos de imposição da ideologia meritocrática, defensora do ideal da “escola
do da Igreja, isto é, teólogos, professores e pesquisadores dos institutos de
libertadora”, na composição de uma imagem desvalorizada dos estudos e do tipo de
teologia, principalmente. Ao mesmo tempo, também o esperava com rela- relação com o conhecimento oferecido por instituições de ensino religiosas.

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cada é exatamente oposta, com os professores e pesquisadores (doutores) oposto, encontram-se aqueles indivíduos cujos menores recursos esco-
de vida acadêmica situados no extremo. Nessas situações, o status de estu- lares ou a ausência de ligação com instâncias mais intelectualizadas da
dante – ainda que de um curso de doutorado, e não de graduação –, quase Igreja conduziam a uma leitura mais modesta – expressa inclusive em
sempre uma posição confortável ao investigador, podia reforçar formas de termos de “incompetência” – de sua potencial contribuição ao estudo
dominação favoráveis ao entrevistado pelo fato de ser mais velho e expe- que lhes propunha28. Às hesitações, recusas iniciais e questionamentos
riente, ter formação mais completa, muitas vezes contar com estudos “mais sobre o “quanto poderia realmente ajudar em minha pesquisa”, buscava
profanos” (passagem por universidades laicas) e se mover por ambientes contrapor a estratégia de situar sua intervenção como “testemunha” ou
menos marcados pela religião. Nas situações posteriores de pesquisa, com “informante”, insistindo sobretudo na ideia de uma conversa em torno
uma tese defendida “sobre a Igreja” ou “sobre o episcopado”, dezenas de de sua história em relação à Igreja, diferentemente dos casos referidos
entrevistas realizadas e contatos estabelecidos com figurões da Igreja, pro- acima, em que era conveniente destacar a condição de “especialista” ou
fessor de uma universidade federal e, não menos importante, com um pou- de “intelectual” a partir da qual meu interlocutor falaria.
co mais de idade, esses efeitos diminuíram consideravelmente. Duas situações de entrevista diametralmente opostas poderiam ajudar na
Várias indicações me levaram a essas observações. Algumas bastante visualização desses aspectos. Numa primeira situação, temos um padre re-
evidentes, outras, mais sutis. Assim, entre as primeiras está uma ten- ligioso de cerca de 50 anos, cuja principal atividade ao lado do atendimento
dência de os indivíduos dispondo de maiores recursos escolares e cultu- paroquial é escrever livros sobre imigração e cultura italianas no Rio Grande
rais apresentarem “interesse” mais explícito em colaborar com o estudo do Sul. Embora tenha feito uma viagem de pesquisa a Itália, não possui espe-
e assim concederem algum tempo de seu dia para conversar sobre sua cializações acadêmicas nem exerce funções de ensino ou de formação teoló-
“história”, sobre a “história da Igreja”, sobre o órgão ou instituição espe- gica ou filosófica. Desde o início da entrevista, realizada no depósito da edi-
cífico a que pertencem ou ainda sobre aspectos pontuais. A julgar pelas tora em que trabalha e na qual reside, sua condição de entrevistado para uma
reações à solicitação de que participassem de uma pesquisa cujo tema pesquisa de doutorado deixava perceber um desconforto que praticamente
era a “história da Igreja”, ficou claro que esses indivíduos mais intelec- desapareceu à medida que os temas avançavam de suas origens familiares
tualizados demonstravam maior inclinação a “depor” sobre ou a “ana- a seus interesses profissionais, longamente explorados. Porém, toda insegu-
lisar” alguma dimensão da instituição, apresentando-se como especial- rança inicial retornou com força ao entrarmos na parte final da conversa, mo-
mente autorizados a fornecer uma interpretação particular, muitas vezes mento em que lhe pedia para comentar determinados aspectos da estrutura
legitimada por um saber formal. Nesses casos é visível uma percepção católica no Rio Grande do Sul. Ao indicar que passaríamos para a parte que
de que se realizava uma conversa “entre pares”, tanto entrevistador exigiria seu ponto de vista a respeito da Igreja, sua fisionomia contraiu-se em
quanto entrevistado com formação universitária avançada e interesses sinal de atenção e, a partir daí, o diálogo tornou-se inicialmente menos fluido,
de trabalho situados em um “terreno comum” (a Igreja, o catolicismo), como se a expectativa de “perguntas difíceis” lhe tivesse turvado o raciocínio
na qual a diferença fundamental entre leigo e sacerdote (ou ex-sacer-
dote) permanecia absolutamente apagada em detrimento da identifica-
ção como “pesquisadores”, “intelectuais” ou “historiadores”27. No polo
ção de pesquisa com o clero anglicano na Inglaterra – em função de uma identificação
de status entre pesquisador e pesquisado –, ver Aldridge (1995). Sobre a posição de
dominação do pesquisador sob todos os aspectos em meio à alta burguesia e à nobreza,
consultar o artigo de Pinçon & Pinçon-Charlot (2007).
28
Longe de ser atribuída unicamente a uma questão de “educação” – fazendo parte dos có-
27
O uso de certo jargão das Ciências Sociais, a referência à Sociologia e à Antropologia digos sociais de polidez –, a “modéstia” nos casos referidos pode ser interpretada, antes de
e a adoção de um tom didático são bastante frequentes nos discursos desses indivíduos. mais nada, como percepção de “incapacidade” ou “incompetência” em manifestar pontos
Em alguns casos, após a entrevista, o próprio entrevistado revelava interesse pelo anda- de vista sobre o tema apresentado. Por outro lado, nos contatos com indivíduos sentindo-
mento da pesquisa, fazendo perguntas e comentários e até mesmo falando de suas pró- -se autorizados a falar sobre as questões sugeridas, é frequente o uso de expressões de
prias pesquisas, todos eles sinais de que “conhecia exatamente” as etapas da formação “modéstia” socialmente consagradas (“não sei se posso ajudar muito”, “vou dizer o pouco
acadêmica e “entendia” o momento pelo qual eu passava. Sobre a facilidade na condu- que sei”, entre outras), porém quase invariavelmente seguidas de um pequeno sorriso.

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até que, pouco a pouco, foi ficando à vontade com sua própria análise, dimi- tido, o exame das condições de cada situação de interação experimentada,
nuindo as pausas para pensar e estendendo as respostas com tranquilidade. notadamente das entrevistas, conduziu à adoção de leque mais amplo de ati-
A segunda situação deu-se numa entrevista com um padre secular, em tudes. Desde as estratégias de apresentação até o tipo de vocabulário empre-
torno de 65 anos, ocupando alto cargo na administração de uma universi- gado, procurei pôr em evidência os trunfos julgados mais convenientes em
dade católica no estado, professor de Filosofia em programa de pós-gradu- cada momento e a melhor forma de manejá-los a fim de aumentar a sensibili-
ação, diretor da editora da universidade e detentor de vários títulos acadê- dade aos interesses da pesquisa e a neutralizar os desequilíbrios próprios aos
micos, alguns obtidos no exterior, e com currículo ostentando quantidade contextos que ela criava. Em outros termos, ficou bastante clara a necessida-
impressionante de publicações nas áreas de Filosofia e Teologia. Sua gentil de de abandonar regras gerais e dançar conforme cada música. Entre essas
acolhida deu-se em seu amplo gabinete administrativo, onde comecei a estratégias, citaria a menção a meus títulos escolares, algumas publicações,
entrevista – como de praxe - por questões biográficas e sobre seu grupo fa- estadas de estudo e experiências no exterior e as relações com professores
miliar. Toda essa parte, nitidamente percebida como “questões menores”, conhecidos, quando do encontro com agentes fortemente dotados de capital
foi respondida de forma lacônica e sem entusiasmo, às vezes com certa iro- cultural e em posição mais vantajosa na interação; e, ao revés, o destaque a
nia, causando constrangimento que rapidamente me levou a acelerar em minhas origens em uma cidade do interior, certa familiaridade com alguns
direção aos pontos sobre os quais previa que meu interlocutor esperava ser aspectos da vida rural e o uso de expressões do cotidiano, no caso oposto.
perguntado. Ou seja, sua atitude mostrava insatisfação frente a perguntas Destacaria ainda, quanto a essas atitudes, o rápido abandono de uma
“triviais” (“sigilosas”, para usar seu termo irônico) sobre uma figura “sufi- postura de “neutralidade” – no sentido mais vulgarizado do termo, como
cientemente conhecida” no meio intelectual gaúcho (afirmou que “já ha- equivalente a passividade, registro mecânico ou frieza – durante as entre-
viam escrito sobre ele”) e cujo título de colaboração numa pesquisa cientí- vistas à medida que ganhava experiência e informação práticas que per-
fica não poderia ser menos do que “analítico” ou “crítico”. mitiam intervenções estimulantes no andamento da situação proposta,
Acredito que essas duas experiências forneçam elementos importantes sem, no entanto, buscar a transformação de determinadas representações
para refletir quanto à estruturação da relação de entrevista com membros da do entrevistado de acordo com minhas expectativas30. Esse afastamento
Igreja católica – e certamente com outros grupos, dominantes ou não. Antes da imagem difundida do entrevistador fazedor de perguntas, sem dúvida
de qualquer coisa, chamam atenção para a pluralidade de hierarquias, escalas gentil e atento, porém protegido pela dita imparcialidade científica, ge-
de poder e de prestígio dentro das próprias elites. Assim, um ponto que apa- rou dividendos particularmente importantes ao criar climas de entrevista
rece em primeiro plano é a variação no equilíbrio da interação de acordo com propícios ao envolvimento mais integral do entrevistado. Além de permi-
as propriedades sociais e a posição do entrevistado e suas consequências na tir melhor demonstração de familiaridade do pesquisador com os temas
condução da relação. Se no primeiro caso a clara dominação pelo pesquisador abordados – umas das condições principais de uma comunicação “não-vio-
demonstrou ser uma vantagem questionável, no caso seguinte, a inversão da lenta” (BOURDIEU, 2008) – também provou estimular reações positivas de
situação em favor do entrevistado reforçou a necessidade de pensar a com- investimento mental no entrevistado, tais como raciocínios longos, revi-
plexidade das agressões simbólicas constitutivas desse tipo de relação, que sões de comentários e acréscimos, maior demonstração das emoções, com
apesar de eufemizada, é uma relação de força (LEGAVRE, 1996, p. 216) entre frequência dando à entrevista tonalidades de conversa.
agentes sociais dotados de recursos que raramente são iguais29. Nesse sen-

30
Partilho da visão de Legavre (1996, p. 220), segundo a qual “crer que essas interven-
ções transformam radicalmente a verdade das representações que o entrevistado tem
29
Ver também os comentários sobre situações de pesquisa com indivíduos de grupos so- de sua prática ou trajetória seria um erro. Não há, de um lado, ‘falsas’ imagens mentais
ciais dominantes feitas por quatro jovens pesquisadoras em Chamboredon et al. (1994), do entrevistado influenciado pelo pesquisador e, de outro lado, as ‘boas’ representações
e o conjunto de discussões sobre a condução de entrevistas junto a grupos dominantes do entrevistado quando a entrevista proposta é não-diretiva. O que há é simplesmente a
diversos apresentado em Cohen (1999). coprodução de uma certa realidade com o pesquisador” (grifos no original).

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Viagem pela alta hierarquia Como estudar elites

Considerações finais: por uma política do campo de pesquisa Referências


Dos cursos de graduação aos de doutorado, é comum repetir-se a ideia de
que sempre se sabe como uma pesquisa começa, porém nunca como ter-
ALDRIDGE, A. Negotiating Status: Social Scientists and Anglican Clergy. In: HERTZ, R.; IMBER.
minará. Não compartilho a afirmação nesses termos e talvez seja o caso de J. B. (Ed.). Studying Elites Using Qualitative Methods. Londres: Sage Publications, 1995.
matizar melhor as sentenças. O pesquisador deveria preparar-se ao máxi-
BEAUD, S.; WEBER, F. Guia para a pesquisa de campo: produzir e analisar dados
mo para iniciar uma investigação em posição vantajosa com vistas a tirar etnográficos. Petrópolis: Vozes, 2007.
o maior proveito possível das incertezas dos rumos que tomará. É claro
BECKER, H. Segredos e truques da pesquisa. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2007.
que a proposição permanece vaga e isso não poderia ser muito diferente.
BONNETTI, A. de L.; FLEISCHER, S. (Ed.). Entre saias justas e jogos de cintura. 2. ed.
Mesmo assim, nela estão presentes novos elementos. Entre eles, a neces-
Santa Cruz do Sul: Edunisc, 2007.
sidade de se reunir informações centrais a respeito do universo investiga-
BOURDIEU, P. Objetivar o sujeito objetivante. In: _____. Coisas ditas. São Paulo: Brasiliense, 1990a.
do antes de se iniciar os contatos mais diretos e as interações próprias ao
campo; isto é, investir com seriedade numa “política do campo”, como _____. Sociólogos da crença e crenças de sociólogos. In: _____. Coisas ditas. São Paulo:
Brasiliense, 1990b.
propõe Olivier de Sardan. Tal postura implica, via de regra, colocar-se
questões que costumam ser tomadas levianamente pelo pesquisador, tais _____. Introdução a uma sociologia reflexiva. In: _____. O poder simbólico. 3. ed. Lisboa:
Difel, 1994a.
como: quais as características próprias do universo social estudado e qual
sua história social; quais as principais propriedades sociais dos agentes _____. Lições da aula. 2ª ed. São Paulo, 1994b.
que o compõem (idade, sexo, origens, escolarização etc.); quais as pro-
_____. A economia dos bens simbólicos. In: _____. Razões práticas. Campinas: Papirus, 1996.
priedades do pesquisador e que posição ocupa no espaço social; e ain-
_____. Meditações pascalianas. São Paulo: Bertrand Brasil, 2001.
da, uma das mais complexas: como estão construídas nossas percepções
individuais – e também as coletivas, incluído um possível senso comum _____. Esboço de autoanálise. São Paulo: Companhia das Letras, 2005.
acadêmico – desse espaço social e de seus agentes.
_____. Compreender. In: _____. (Ed.). A miséria do mundo. 7. ed. Petrópolis: Vozes, 2008.
Certamente continuaríamos com o problema da relativa incerteza quan-
BOURDIEU, P. CHARTIER, R. O sociólogo e o historiador. Belo Horizonte: Autêntica, 2011.
to aos rumos da pesquisa, questão bissexta e em parte incontornável. No
entanto, como sabido, já foi há muito tempo por terra qualquer ambição de BOURDIEU, P.; SAINT MARTIN, M. de. La sainte famille: l’épiscopat français dans le champ
du pouvoir. Actes de la Recherche en Sciences Sociales, n. 44-45, p. 2-53, 1982.
controle total das práticas de produção de conhecimento científico, dado
válido, aliás, para todas as áreas e particularmente discutido por antropólo- BOURDIEU, P.; WACQUANT, L. Um convite à sociologia reflexiva. Rio de Janeiro:
Relume-Dumará, 2006.
gos e filósofos da ciência. E então? É mais do que óbvio que não se trata de
querer controlar o imponderável, a circunstância, o acaso e o desconheci- BOURDIEU, P.; CHAMBOREDON, J-C.; PASSERON, J-C. A profissão de sociólogo:
preliminares epistemológicas. Petrópolis: Vozes, 1999.
do. Uma boa pista parece estar em como o investigador colocar-se em con-
dições de, em primeiro lugar, minimizar esses elementos; em segundo e CHAMBOREDON, H. et al. S’imposer aux imposants: à propos de quelques obstacles
rencontrés par des sociologues débutants dans la pratique et l’usage de l’entretien.
mais importante, saber transformá-los em dados de pesquisa – da mesma
Genèses, n. 16, p. 114-132, 1994.
forma que uma não-resposta, um silêncio ou um bloqueio de pesquisa o
CHAMPAGNE, P. et al. Iniciação à prática sociológica. Petrópolis: Vozes, 1996.
são. Como insiste o metodologicamente atento Howard Becker (2007), o
pesquisador deve repetir constantemente que nada do que ele pode ima- COHEN, S. (Ed.). L’art d’interviewer les dirigeants. Paris: Presses Universitaires Françaises, 1999.
ginar é impossível e que é necessário, portanto, procurar as coisas mais
COOKSON JR., P. W.; PERSELL, C. H. (Ed.). Preparing for Power: America’s elite boarding
improváveis que podemos imaginar para integrar sua existência, ou a pos- schools. New York: Basic Books, 1985.
sibilidade de sua existência, ao nosso pensamento. Não é pedir pouco, mas
CORADINI, O. L. Os usos das ciências humanas e sociais pelo catolicismo e pelo luteranismo
temos aí bons pontos de partida. e as relações centro/periferia. Revista Pós Ciências Sociais, v. 9, n. 17, p. 67-99, 2012.

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