Momentos críticos são determinadas ocasiões raras relacionadas à
atividade crítica das pessoas e que desempenham papel importante na vida social, envolvendo um momento reflexivo interior e uma performance exterior. Tais momentos provocam um retorno ao passado para se construir uma narrativa e interrompem o fluxo da ação e, ao serem externados, podem desembocar em um “escândalo” (querelas domésticas ou litígios), um desacordo de natureza provisória. As pessoas envolvidas estão sujeitas a um imperativo de justificação, que seguem regras de aceitabilidade, que dão suporte a sua crítica. As pessoas, ao buscar o acordo, precisam pôr em evidência (regime de justiça) uma convenção de equivalência (princípio de equivalência) que lhes é externa, transcendendo sua singularidade e definindo uma forma de generalidade na definição dos objetos pertinentes à situação. No regime afetivo, são difíceis as operações de acumulação e cálculo das equivalências. A pré-condição do acordo é um reconhecimento comum de uma equivalência convencional que possa sustentar um juízo acerca da importância ou grandeza relativa das pessoas, objetos e ações envolvidas. A legitimidade de uma crítica ou justificação opera-se por sua capacidade de generalização. Os autores vão buscar superar a dicotomia entre universalismo formal e pluralismo ilimitado na definição de uma grandeza legítima ou justa, por meio de um pluralismo limitado de princípios de equivalência possíveis de serem usados para dar suporte a críticas e acordos. Os autores identificam mundos com suas próprias ordens de grandeza, a saber, da inspiração (graça ou criatividade), doméstico (estima, reputação, dentro de uma cadeia hierarquia), cívico (interesse coletivo), da opinião (renome, na avaliação pública), mercantil (preço), industrial (eficiência, produtividade). As críticas costumam relacionar duas ou mais dessas grandezas. O deslocamento da grandeza de um mundo a outro (transporte de grandeza) pode ser considerado como injusto e criar situações ambíguas. O momento crítico, contudo, pode ser superado e se retomar o curso habitual da ação, por exemplo, por meio do compromisso ou acordo confirmado por uma prova de realidade ou pelo abandono de um princípio de equivalência e a adoção do perdão.
AXEL HONNETH Luta por reconhecimento
Honneth desenvolve uma teoria da intersubjetividade pós-metafísica com
base em Hegel e na psicologia social de George Herbert Mead, que complementa a ausência, naquele, da relação intersubjetiva como um curso empírico no interior do mundo social. Trata-se de uma teoria crítica da sociedade em que os processos de mudança social são explicados com referência às pretensões normativas estruturalmente inscritas na relação de reconhecimento recíproco. Como premissa, utiliza-se a concepção de Mead de que a reprodução da vida social se efetua sob o imperativo de um reconhecimento recíproco porque os sujeitos só podem chegar a uma autorrelação prática quando aprendem a se conceber, da perspectiva normativa de seus parceiros de interação, como seus destinatários sociais. O elemento dinâmico, o imperativo citado, opera como uma coerção normativa que confere a expressão social às pretensões subjetivas que se regeneram constantemente, pois obriga a deslimitação gradual do conteúdo do reconhecimento recíproco. Em Hegel e Mead, a luta social é uma força estruturante na evolução moral da sociedade. Para o autor, o conceito de pessoa e da construção da identidade do indivíduo é constituído pelo reconhecimento intersubjetivo nas esferas do amor (ligação afetiva; primeira etapa; autoconfirmação da natureza concreta das carências pessoais; aquisição, na primeira infância, da capacidade para o equilíbrio entre a simbiose e a autoafirmação, “intersubjetividade primária” – Winnicott; cerne estrutural de toda eticidade - Hegel), jurídico-moral (relações de direito e autorrespeito; percepção normativa de direitos e deveres cooperativos do “outro generalizado” – Mead; princípio de fundamentação universalista pós-convencional - Hegel) e da estima social (relações de solidariedade; permite que o sujeito humano se refira positivamente a suas propriedades e capacidades concretas; modelo da divisão cooperativa do trabalho, já institucionalmente concretizado). Às referidas esferas correspondem três maneiras de não-reconhecimento: a violação, a privação de direitos e a degradação, que podem influir no surgimento de conflitos sociais na qualidade de motivo da ação.