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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

Instituto de Artes

PATRICIA KISS SPINELI

ENTRE ESCOLHAS: O PROCESSO CRIATIVO E A POÉTICA


FOTOGRÁFICA DE OTTO STUPAKOFF

AMONG CHOICES: THE CREATIVE PROCESS AND THE


PHOTOGRAPHIC POETICS OF OTTO STUPAKOFF

CAMPINAS
2017
PATRICIA KISS SPINELI

ENTRE ESCOLHAS: O PROCESSO CRIATIVO E A POÉTICA


FOTOGRÁFICA DE OTTO STUPAKOFF

AMONG CHOICES: THE CREATIVE PROCESS AND


THE PHOTOGRAPHIC POETICS OF OTTO STUPAKOFF

Tese apresentada ao Instituto de Artes da


Universidade Estadual de Campinas como
parte dos requisitos exigidos para a obtenção
do título de Doutora em Artes Visuais

Thesis presented to the Institute of Arts of the


University of Campinas in partial fulfillment
of the requirements for the degree of Doctor
in Visual Arts

ORIENTADOR: DR. EDSON DO PRADO PFÜTZENREUTER

ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE À VERSÃO


FINAL DA TESE DEFENDIDA PELA ALUNA
PATRICIA KISS SPINELI, E ORIENTADA
PELO PROF. DR. EDSON DO PRADO PFÜTZENREUTER.

CAMPINAS
2017
Agência(s) de fomento e nº(s) de processo(s): Não se aplica.
ORCID: https://orcid.org/0000-0001-8423-8611

Ficha catalográfica
Universidade Estadual de Campinas
Biblioteca do Instituto de Artes
Silvia Regina Shiroma - CRB 8/8180

Spineli, Patricia Kiss, 1980-


Sp46e SpiEntre escolhas : o processo criativo e a poética fotográfica de Otto
Stupakoff / Patricia Kiss Spineli. – Campinas, SP : [s.n.], 2017.

SpiOrientador: Edson do Prado Pfützenreuter.


SpiTese (doutorado) – Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Artes.

Spi1. Stupakoff, Otto, 1935-2009. 2. Fotografia. 3. Processo criativo. 4. Poética.


5. Semiótica. I. Pfützenreuter, Edson do Prado, 1957-. II. Universidade
Estadual de Campinas. Instituto de Artes. III. Título.

Informações para Biblioteca Digital

Título em outro idioma: Among choices : the creative process and the photographic
poetics of Otto Stupakoff
Palavras-chave em inglês:
Stupakoff, Otto, 1935-2009
Photography
Creative process
Poetics
Semiotics
Área de concentração: Artes Visuais
Titulação: Doutora em Artes Visuais
Banca examinadora:
Edson do Prado Pfützenreuter [Orientador]
Marcelo Santos de Moraes
Fernando Cury de Tacca
Filipe Mattos de Salles
André Novaes de Rezende
Data de defesa: 07-12-2017
Programa de Pós-Graduação: Artes Visuais

Powered by TCPDF (www.tcpdf.org)


BANCA EXAMINADORA DA DEFESA DE DOUTORADO

PATRICIA KISS SPINELI

ORIENTADOR: DR. EDSON DO PRADO PFÜTZENREUTER

MEMBROS:

1. DR. EDSON DO PRADO PFÜTZENREUTER


2. DR. MARCELO SANTOS DE MORAES
3. DR. FERNANDO CURY DE TACCA
4. DR. FILIPE MATTOS DE SALLES
5. DR. ANDRÉ NOVAES DE REZENDE

Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais do Instituto de Artes


da Universidade Estadual de Campinas.

A ata de defesa com as respectivas assinaturas dos membros da banca examinadora


encontra-se no processo de vida acadêmica da aluna.

Data da defesa: 7 de dezembro de 2017.


DEDICATÓRIA

Para Otto Stupakoff (in memoriam),


Telma Valença (in memoriam)
e Charles Morphy
AGRADECIMENTOS

Expresso meu agradecimento ao meu orientador Dr. Edson do Prado Pfützenreuter


pelo apoio, confiança e incentivo.
Agradeço ao Instituto Moreira Salles por permitir minha pesquisa no acervo de Otto
Stupakoff, compartilhar informações para a tese, e pela autorização do uso das imagens para
fins acadêmicos.
Também agradeço a Sérgio Burgi pelo acolhimento dessa pesquisa, assim como pelos
depoimentos e esclarecimentos oferecidos.
Um agradecimento especial a Virginia Albertini pela afabilidade, competência,
atenção e espírito de cooperação na pesquisa com o acervo do IMS e a Fernando Laszlo que,
além da gentileza de entrevista, disponibilizou-me materiais fundamentais.
Expresso minha gratidão aos entrevistados: Bob Wolfenson, Thomaz Souto Corrêa,
Jussara Romão e Bico Stupakoff, que compartilharam comigo suas vivências com Stupakoff
e que gentilmente me cederam tempo e atenção com meus questionamentos. À Mariana
Newlands por compartilhar informações levantadas na curadoria da exposição 2016/2017.
Aos professores membros da banca de qualificação Dra. Sylvia Furegatti e Dr.
Fernando de Tacca pela leitura e apontamentos pertinentes ao trabalho. Também agradeço
aos membros da banca de defesa, Dr. Marcelo Santos de Moraes, Dr. André Novaes de
Rezende, Dr. Filipe Mattos de Salles e novamente Dr. Fernando de Tacca pela avaliação do
trabalho e sugestões dirigidas.
Aos funcionários das instituições: Reserva Técnica fotográfica do Instituto Moreira
Salles, Biblioteca Municipal Mario de Andrade, Biblioteca da Escola de Comunicação e Artes
da USP, Biblioteca do Museu de Arte de São Paulo, Biblioteca do Museu de Arte Moderna de
São Paulo, Arquivo Multimeios do Centro Cultural Vergueiro e Espaço Memória Itaú
Unibanco que me auxiliaram na consulta aos materiais ali depositados e aos funcionários do
MoMA, Nixon Library, Museu Nacional de Antropologia do México, Museu de Haia e Custom
Editora pelas informações fornecidas, meu sincero reconhecimento.
Minha eterna gratidão a Charles Morphy, pelo amor, companheirismo, cumplicidade,
apoio incondicional e presença essencial em todos esses anos, como também pela leitura do
trabalho, sugestões e revisão.
Sou grata à minha irmã Telma Valença (in memoriam) por nossa proximidade
fraterna e intelectual, pelo apoio e exemplo de vida.
Aos meus gatos: Brigitte, Titilo, Yuki e Francisca por se manterem ao meu lado
oferecendo conforto pelo simples fato de existirem.
RESUMO

A tese tem como objetivo central estudar a obra do fotógrafo brasileiro Otto Stupakoff (1935
– 2009) evidenciando aspectos de sua poética fotográfica e do seu projeto poético. O estudo
aqui proposto auxilia a refletir sobre a produção de um fotógrafo complexo, cuja obra dialoga
com várias vertentes fotográficas. Discute-se também a autonomia por ele demonstrada em
suas produções, bem como aspectos subjetivos e objetivos presentes na sua obra fotográfica,
suas habilidades, referências e processo de criação. A fonte principal da pesquisa é o material
fotográfico repassado pelo fotógrafo ao Instituto Moreira Salles em 2008, tendo como corpus
de análise basilar um conjunto de sequências fotográficas dispostas em duas caixas – Caixa 1
e Caixa 2 – organizadas pelo próprio Stupakoff. Pelo âmbito da escolha pessoal em como
organizar e preferenciar seu material antes de repassá-lo a uma instituição de salvaguarda, o
fotógrafo demonstrou seu olhar frente ao próprio trabalho. A sistematização das caixas feita
pelo próprio autor também possibilitou a realização de inferências sobre o seu processo
criativo. Além disso, as folhas de contato, oriundas dos materiais contidos nessas duas caixas,
foram vistas como documentos de processo que possibilitam o estudo e a análise do percurso
criativo do fotógrafo. Para debater sobre uma poética fotográfica de Stupakoff, essas folhas de
contato, assim como outros materiais auxiliares (entrevistas, cartas, textos), foram analisados
sob a luz da crítica de processo de criação, apoiando-se também em teorias específicas para
compreensão mais aprofundada do percurso de criação deste objeto específico (a fotografia).
A metodologia de análise adotada foi a de um movimento de aproximação do objeto, no qual
realizou-se tanto recortes pontuais quanto visões mais amplas, considerando o uso da teoria
semiótica peirceana como norte analítico. Foi possível identificar, na obra de Stupakoff, a
tendência à captura de certa naturalidade, expressa no uso de luz natural, cenários externos e
objetivas que se aproximam da percepção do olhar humano; ainda, identificou-se a
constância do gosto pelo feminino, o trato com o puer aeternus e a investigação do registro
do ser humano. Outros elementos também puderam ser reconhecidos: valorização da
perspectiva e tridimensionalidade do espaço, uso de cenários do cotidiano, preferência por
planos mais abertos, valorização dos detalhes na composição, propensão em repetir o registro
do motivo com pequenas variações e realce de texturas e padronagens. Durante toda a
carreira de Stupakoff permaneceram – em seus editoriais de moda, retratos, registros de rua
e de viagens – a simplicidade e a preocupação em retratar o humano para além da superfície.
Justifica-se dessa forma a promoção da reflexão sobre a memória e arquivos fotográficos
tendo Otto Stupakoff, um fotógrafo de relevância na fotografia brasileira e mundial do século
XX, como objeto de estudo. Como resultado, esta tese procurou contribuir para uma melhor
compreensão dos processos criativos na fotografia a partir da perspectiva de uma poética
fotográfica de Stupakoff.

Palavras-chave: Otto Stupakoff; Fotografia; Processo de criação; Poética; Semiótica; Folha de contato.
ABSTRACT

The thesis aims to study the work of the Brazilian photographer Otto Stupakoff (1935 –
2009), highlighting aspects of his photographic poetics and his poetic project. The study
proposed here helps to reflect on the production of a complex photographer whose work
dialogues with several photographic aspects. It also discusses the autonomy he demonstrated
in his productions, as well as subjective and objective aspects present in his photographic
work, his skills, references and creation process. The main source of the research is the
photographic material passed on by the photographer to Instituto Moreira Salles in 2008.
The main corpus of the analyses is a set of photographic sequences arranged in two boxes –
Box 1 and Box 2 – organized by Stupakoff himself. Through his personal choices concerning
how to organize and hierarchize his material before passing it on to a safeguard institution,
the photographer showed his perception on his own work. The author’s own systematization
of the boxes also allows us to infer on his creative process. In addition, the contact sheets,
derived from the materials contained in these two boxes, were seen as process documents
that allow the study and analysis of the creative journey of the photographer. In order to
discuss Stupakoff’s photographic poetics, these contact sheets, as well as other auxiliary
materials (interviews, letters, texts), were analyzed in the light of the creation process
criticism, also relying on specific theories for a deeper understanding of the creation of such
specific object (the photograph). The analytical methodology adopted here was that of a
movement towards the object, in which specific samplings and more general outlooks were
presented considering the use of Peircean semiotic theory as an analytical guidance. It was
possible to identify, in Stupakoff’s work, the tendency to capture a certain naturalness,
expressed in the use of natural light, external scenarios, and photographic lens that approach
the perception of the human eye; still, the constancy of his taste for the feminine, his dealing
with the puer aeternus and investigation of the registry of human beings were identified.
Other elements could also be recognized: appreciation of perspective and spatial three-
dimensionality, use of daily scenarios, preference for open plans, valuation of details in
composition, propensity to repeat the registration of the motif with slight variations, and
enhancement of textures and patterns. Throughout Stupakoff’s career – fashion editorials,
portraits, street and travel records – simplicity, and concern with portraying the human
beyond the surface were present. Thus, a reflection on memory and photographic archives is
justified, with Otto Stupakoff, a relevant photographer in Brazilian and world 20 th century
photography, as an object of study. As a result, this thesis aimed to contribute to a better
understanding of the creative processes in photography from the perspective of Stupakoff’s
photographic poetics.

Key-Words: Otto Stupakoff; Photography; Creation process; Poetic; Semiotics; Contact sheet.
LISTA DE FIGURAS

Figura 1. Estúdio de Otto Stupakoff em Cavalhada, Porto Alegre, 1955..........................................30


Figura 2. Estúdio na Avenida Ipiranga e na Frei Caneca..................................................................32
Figura 3. Filmagem para o happening O grande espetáculo das Artes, 1963.................................34
Figura 4. Duda Cavalcanti em trajes de Dener..................................................................................35
Figura 5. House of card depositado no MoMA em 1966..................................................................38
Figura 6. Anúncio na Folha de São Paulo, 1971 e no Diário da noite, 1968....................................41
Figura 7. O menino Stupakoff com o pai........................................................................................... 46
Figura 8. Caixas 1 e 2 de Stupakoff no IMS......................................................................................56
Figura 9. Folha de contato de médio formato, Tom Jobim (1956-1957)..........................................57
Figura 10. Parcial da folha de contato, René d´Harnoncourt,1977..................................................58
Figura 11. Pietro Maria Bardi, 1978................................................................................................... 59
Figura 12. Fotogramas 16, 18 e 19, Teatro em Ho Chi Minh, 1967...................................................59
Figura 13. Capas de disco para Caymmi, Bonfá, Telles e Demônios da Garoa.................................63
Figura 14. Capas de disco para Morris, Mike Falcão, Casanova e Copacabanas..............................64
Figura 15. Capas de disco para American Symphony, Bernstein, Batera e Mendes........................66
Figura 16. Manchete (1961), publieditorial da Rhodia.....................................................................68
Figura 17. Pôster para a McCann Erickson e anúncio Biotônico Fontoura......................................71
Figura 18. Anúncios da Oca na revista Módulo e Senhor.................................................................72
Figura 19. Pôster da FAAP, 1961........................................................................................................ 73
Figura 20. Folhas do calendário Shell, 1963.....................................................................................74
Figura 21. Folhas janeiro e fevereiro do calendário Volkswagem, 1980...........................................75
Figura 22. Anúncio da Valisère, Manequim, 1960............................................................................76
Figura 23. Anúncio do Relatório Anual do Itaú, Vogue Brasil, 1980...............................................76
Figura 24. Anúncio Bradesco, Veja, 1994.......................................................................................... 77
Figura 25. Bo Jackson para Nike....................................................................................................... 77
Figura 26. Anúncios na Harper’s Bazaar, s/d, 1975........................................................................78
Figura 27. Luxo para todos, Cavalera, 2007.....................................................................................78
Figura 28. Vista do Pacaembu para a Camargo Corrêa, 2007..........................................................79
Figura 29. Agenda Lion-Caterpillar. Trabalhadores rurais, 1978....................................................80
Figura 30. Criança em Canela, Rio Grande do Sul...........................................................................80
Figura 31. Revistas com trabalho de Stupakoff, Rio e Cruzeiro........................................................81
Figura 32. Revistas com trabalhos de Stupakoff, Módulo e Senhor.................................................82
Figura 33. Trabalhos de Stupakoff para a revista Senhor................................................................82
Figura 34. Páginas 54 e 55 da revista Íris, 1979................................................................................83
Figura 35. Capa e página 22 da Novidades Fotóptica, 1970............................................................84
Figura 36. Trabalhos para a Vogue Brasil, 1975 e 1980...................................................................84
Figura 37. Vogue Brasil, 1980, editorial em Salvador......................................................................85
Figura 38. Vogue Brasil, 1989, editorial com Xuxa Meneghel.........................................................85
Figura 39. Vogue Brasil, Algarve, Portugal, 1988 e edição 169........................................................86
Figura 40. Trabalhos para a RG Vogue, 2006 e 2007......................................................................86
Figura 41. MIT, 2008, último editorial de moda de Stupakoff.........................................................87
Figura 42. Revista Claudia, 1963 e 1964........................................................................................... 88
Figura 43. Claudia, páginas internas, 1964......................................................................................88
Figura 44. Claudia 1966.................................................................................................................... 89
Figura 45. Quatro Rodas, 1963......................................................................................................... 90
Figura 46. Realidade, 1966................................................................................................................ 91
Figura 47. Playboy, 1980................................................................................................................... 91
Figura 48. Popular Photography, 1956............................................................................................92
Figura 49. Editorial para a Harper’s Bazaar, 1972..........................................................................93
Figura 50. Glamour, 1968 e 1984..................................................................................................... 93
Figura 51. Editorial para Vogue França, 1974...................................................................................94
Figura 52. Elle francesa, 1974............................................................................................................ 95
Figura 53. Ladies’ Home Jornal, 1969 e 1972...................................................................................95
Figura 54. GQ, 1982........................................................................................................................... 96
Figura 55. Esquire, 1966.................................................................................................................... 96
Figura 56. Ampliações de Stupakoff. Ouro Preto, 1958 e Brasília, 1958..........................................97
Figura 57. Fotografias para Aurelio Martinez Flores........................................................................97
Figura 58. Museu de Antropologia da Cidade do México.................................................................98
Figura 59. Páginas do livro Art to Wear...........................................................................................98
Figura 60. Exposição da Petite Galerie, 1963..................................................................................100
Figura 61. Fotografias de Stupakoff expostas no MASP/1978........................................................101
Figura 62. Fotografias da exposição SPFW, 2005..........................................................................103
Figura 63. Fotografias da exposição IMS 2009...............................................................................103
Figura 64. Fotos da exposição IMS, 2016/2017..............................................................................104
Figura 65. Negativos de Robert Capa e de Stupakoff......................................................................110
Figura 66. Parcial da folha de contato de Marc Riboud, 1953.........................................................113
Figura 67. Parcial de contatos de Lessing, Griffiths, Arnold, Erwitt e Abbas.................................114
Figura 68. Fotogramas em folha de contato com código visual Stupakoff......................................115
Figura 69. Sequência de fotos de Josef Koudelka............................................................................116
Figura 70. Sequência e imagens individualizadas de Xuxa, Copacabana Palace...........................120
Figura 71. Fotogramas individualizados de Paolozzi e Russey.......................................................120
Figura 72. Bresson analisando ampliações......................................................................................125
Figura 73. Fotograma de David Seymor..........................................................................................126
Figura 74. Parcial folha de contato do Camboja..............................................................................126
Figura 75. Contorcionista, 1962....................................................................................................... 127
Figura 76. Micha Bar-Am, Tel Aviv, 1976........................................................................................128
Figura 77. Dennis Stock, James Dean in Times Square, 1955........................................................130
Figura 78. Richard Avedon, Lyal Burr e seus filhos Kerry and Phillip, 1981..................................131
Figura 79. Fotografias de Ian Berry. Transvaal, África do Sul........................................................132
Figura 80. Fotograma de Elliott Erwitt...........................................................................................133
Figura 81. Vogue francesa, 1974, justaposição de fotos..................................................................135
Figura 82. Página da revista Quatro Rodas, Stupakoff...................................................................137
Figura 83. Parcial do copião Joatinga, Rio de Janeiro, 1978..........................................................140
Figura 84. Folha de contato, Pelé, Santos, 1979..............................................................................140
Figura 85. Sequência dos fotogramas 19 à 24 da série Ian, 1963....................................................146
Figura 86. Parcial de copião. Xuxa, 1989........................................................................................148
Figura 87. Parcial de copião. Mãos de Wesley Duke Lee e Sérgio Mendes, 1978...........................148
Figura 88. Folha de contato de Robert Capa...................................................................................149
Figura 89. Parcial do copião OS53 de Stupakoff.............................................................................150
Figura 90. Exemplo de marcação de Stupakoff em sequência no Camboja....................................151
Figura 91. Parciais de folhas de contato Camboja...........................................................................152
Figura 92. Anotações feitas por Stupakoff nos porta-cromos.........................................................153
Figura 93. Câmera da tortura na Prisão de Tuol, Camboja.............................................................154
Figura 94. Páginas do portfólio que Stupakoff apresentou em Nova York, 1965...........................156
Figura 95. Leslie Bogart, 1967 e Oskar Werner, 1965.....................................................................160
Figura 96. Bercheres-sur-Vèsgres, 1976, Betsy, 1965 e Bico Stupakoff, 1964.................................161
Figura 97. Trabalhos comissionados e editoriais na Caixa 1...........................................................162
Figura 98. Algarve, Xuxa e Stuttgart............................................................................................... 163
Figura 99. Renata, 1991 e Margareta Hotel D'Inghlterra, 1969......................................................164
Figura 100. Nus, Pelourinho, Salvador............................................................................................165
Figura 101. Irã, Vietnã e Amsterdã.................................................................................................. 166
Figura 102. Lauren Hutton, Princesa de Vizcaya, Ian Stupakoff e Bill Blass..................................167
Figura 103. Fotografias de Stupakoff na coleção Pirelli/MASP, 1991.............................................169
Figura 104. Fotografias de Stupakoff na coleção Pirelli/MASP, 2003...........................................169
Figura 105. Fotografias de Stupakoff na coleção Pirelli/MASP, 2012............................................170
Figura 106. Parcial de copião Tom Jobim com indicação no fotograma 29...................................170
Figura 107. Folha de contato da série Xuxa, 1989...........................................................................177
Figura 108. Marcações na folha de contato do Camboja, 1994 e Saigon, 1968..............................178
Figura 109. Folha de contato do editorial Algarve, Vogue Brasil, 1988.........................................180
Figura 110. Parcial da folha de contato Saigon, 1968......................................................................180
Figura 111. Leslie Bogart para a Harper’s Bazaar, 1967.................................................................183
Figura 112. Sequências de fotogramas de Saigon e imagem para a SPFW.....................................183
Figura 113. Folha de contato e imagem publicada de Ian e Bico....................................................184
Figura 114. Folha de contato e foto publicada de Oskar Werner....................................................185
Figura 115. Folha de contato e imagem escolhida de Tom Jobim, 1964.........................................188
Figura 116. Folha de contato e imagem escolhida de Sérgio Mendes, 1967....................................189
Figura 117. Folha de contato e imagem escolhida, Margareta, 1972..............................................191
Figura 118. Folha de contato e imagem escolhida, Baden-Baden, 1974.........................................192
Figura 119. Folha de contato e imagem escolhida, Ansiedade, 1990..............................................194
Figura 120. Três nus, três ilhas, 1978..............................................................................................195
Figura 121. Sharon Tate, 1969.......................................................................................................... 197
Figura 122. Margareta, Hotel D'Inghilterra, 1969...........................................................................198
Figura 123. Registro de rua em Amsterdã.......................................................................................199
Figura 124. Apache Peak, Arizona, 1969.........................................................................................203
Figura 125. Trabalhos de nu feminino de Stupakoff antes de 1965...............................................208
Figura 126. Renata, Nova York, 1991.............................................................................................. 208
Figura 127. Parcial da série de fotografias de rua em Saigon, 1968................................................210
Figura 128. Margareta, Gabriela e Sef, 1974....................................................................................211
Figura 129. Margareta, Gabriela e Sef em Berchères-sur-Vesgre, 1974..........................................212
Figura 130. Margareta, Gabriela e Sef em Long Island...................................................................212
Figura 131. Sequência da viagem para Disney.................................................................................213
Figura 132. Saigon, 1968 e interior de São Paulo, 1970 e Salvador, s/d.........................................215
Figura 133. Editorial de moda infantil para a Harper’s Bazaar, 1967 e 1969................................215
Figura 134. México. Exemplo de imagem planificada.....................................................................217
Figura 135. Externa com Margareta e Gabriela, interna com iraniana...........................................217
Figura 136. Diferentes usos do estúdio por Stupakoff....................................................................218
Figura 137. Do estúdio às externas nos retratos de Stupakoff antes de 1965.................................219
Figura 138. René D’Harnancourt, 1967...........................................................................................219
Figura 139. A modelo Mira no editorial da Vogue Brasil...............................................................220
Figura 140. O pacote perseguidor, Cláudia, 1963 e Cavalcanti, Jóia, 1965...................................221
Figura 141. Hotel D'Inghilterra, Roma, folha de contato e ampliações..........................................222
Figura 142. Grand Hotel Cabourg, 1976.......................................................................................... 224
Figura 143. Sequência de Renata, 1991........................................................................................... 225
Figura 144. Sequência Algarve, 1988.............................................................................................. 226
Figura 145. Sequência Leslie Bogart, com marcação de Laszlo e Wolfenson.................................227
Figura 146. Sequência Homenagem a Balthus...............................................................................228
Figura 147. Baden-Baden Vogue, 1974............................................................................................ 229
Figura 148. Diapositivo e a ideia do registro repetitivo..................................................................230
Figura 149. Leslie Bogart................................................................................................................. 231
Figura 150. Mãos de Wesley Duke Lee e Sérgio Mendes................................................................232
Figura 151. Teatro de Saigon e mulher iraniana.............................................................................233
Figura 152. Xuxa Meneghel para Vogue Brasil, 1989.....................................................................233
Figura 153. Páginas de O pacote perseguidor, Claudia, 1963........................................................234
Figura 154. “Sobrecarga informativa” na obra de Stupakoff..........................................................235
Figura 155. Margareta na piscina em Joatinga, 1978......................................................................236
Figura 156. Desfoque nos planos posteriores e anteriores..............................................................237
Figura 157. Grand Hotel Cabourg, 1976..........................................................................................238
Figura 158. Renata no estúdio da Rua Varick, Nova York, 1991.....................................................239
Figura 159. Exemplos do uso da luz por Stupakoff.........................................................................240
Figura 160. Carrie Nygren, Vogue, 1975..........................................................................................241
Figura 161. Renata e Wesley Duke Lee............................................................................................ 242
Figura 162. Eva Gschopf, 1967 e Jardim em Boulogne-Billancourt, 1975......................................244
Figura 163. Baden-Baden, 1974, Algarve, 1988, dos Prazeres, ca. 1958 e Pangnirtung, 1989.......245
Figura 164. Arnella Flynn e Agneta Frieberg, ca. 1967...................................................................246
Figura 165. Diários de viagem, 1989, Ártico: mapas geográficos, diagramas e notas de jornal....255
Figura 166. Editorial Algarve: cor e preto e branco........................................................................259
Figura 167. Editorial O pacote perseguidor, Cláudia, 1963............................................................262
Figura 168. Editorial Gentlemen preferer blondes, Harper’s Bazaar, 1972..................................263
Figura 169. Editorial The young you, Harper’s Bazaar, 1972........................................................264
Figura 170. Folha de contato com viagem de Stupakoff e família para a Disney, ca. 1970............265
Figura 171. Folha de contato com viagem de Stupakoff e família para a Disney, ca. 1970............266
Figura 172. Folha de contato com viagem de Stupakoff e família para a Disney, ca. 1970............267
Figura 173. Página revista MIT, 2008............................................................................................. 268
Figura 174. Otto Stupakoff em ação com câmeras..........................................................................273
Figura 175. Estúdio de Stupakoff na rua Varick, Nova York...........................................................278
Figura 176. Henri Rousseau e Juliana Paes....................................................................................279
Figura 177. Denpasar, Bali, 1968..................................................................................................... 279
Figura 178. Homenagem a Balthus, 1991 e The Victim, de Balthus, 1938......................................281
Figura 179. Fotografia para a Harper’s Bazaar..............................................................................282
Figura 180. Homenagem a Balthus, Glamour, 1977 e Therese dreaming, de Balthus, 1938........283
Figura 181. Balthus, 1970, Harper's Bazaar...................................................................................283
Figura 182. O Helicóptero de Wesley Duke Lee com fotografias de Stupakoff..............................285
Figura 183. Layout de Bea Feitler e fotografias de Stupakoff para a Harper’s Bazaar................286
Figura 184. Wesley Duke Lee, Stupakoff, 1958, e Tennessee Williams, Irving Penn, 1951............291
Figura 185. Quatro Rodas, Stupakoff, 1964, e Irving Penn, Vogue, 1943......................................292
Figura 186. Movimento e leveza. Art to wear, Stupakoff, e Jean Shrimpton, Richard Avedon.....293
Figura 187: As caixas de vidro de Stupakoff...................................................................................309
Figura 188. Colagens de Stupakoff..................................................................................................310
Figura 189. Uso de Stupakoff da imagem fotográfica na assemblagem.........................................312
Figura 190. Aproximação da linguagem fotográfica de Stupakoff com a ideia de colagem...........313
LISTA DE TABELAS

Tabela 1. Reprodução do texto de Otto Stupakoff............................................................................60


Tabela 2. Copiões da Caixa 1 com marcações dos curadores e indicações de Stupakoff................181
Tabela 3. Copiões da Caixa 1 com marcações divergentes entre Stupakoff e de terceiros.............182
Tabela 4. Copiões da Caixa 1 com marcações e indicações somente de Stupakoff........................182
SUMÁRIO

Introdução.......................................................................................................................................... 17
Sobre a crítica de processo criativo e a semiótica peirceana........................................................18
Procedimentos realizados............................................................................................................. 20
1. Otto Stupakoff: uma trajetória....................................................................................................... 26
1.1 O começo: a formação e atividades do fotógrafo no Brasil.....................................................29
1.2 Chamado à aventura: a recusa de Mr. Penn e o descrédito de Brodovitch............................36
1.3 Os anos áureos e as grandes viagens na Europa......................................................................41
1.4 O primeiro retorno: Brasil, uma indefinição...........................................................................42
1.5 As últimas décadas em Nova York: estabilidade e viagens.....................................................44
1.6 Renascence Man: o fim da trilha e a volta definitiva para casa..............................................45
1.7 Exilir: o continuar a existir por sua obra.................................................................................48
2. A produção de Stupakoff: acervo no IMS, fotografia aplicada e exposições.................................51
2. 1 Conservação e pesquisa no Instituto Moreira Salles..............................................................52
2.2 O material fotográfico de Stupakoff no IMS e sua organização.............................................54
2.3 A diversidade fotográfica de Otto Stupakoff...........................................................................61
2.3.1.Capas de discos long play (LPs)........................................................................................61
2.3.2 As campanhas para a Rhodia........................................................................................... 66
2.3.3 Publicidade e materiais promocionais.............................................................................69
2.3.4 Publicação em periódicos – revistas brasileiras..............................................................80
2.3.5 Publicação em periódicos – revistas estrangeiras...........................................................92
2.3.6 Arquitetura....................................................................................................................... 96
2.3.7 Fotografias para livros e catálogos de arte.......................................................................98
2.4 A produção de Otto Stupakoff: exposições.............................................................................99
2.5 Uma síntese........................................................................................................................... 105
3. Considerações sobre folhas de contato, seleção e edição............................................................107
3.1 Folha de contato e suas particularidades: usos e funções.....................................................109
3.2 Marcações recorrentes nas folhas de contato........................................................................112
3.3 O uso da folha de contato como meio de seleção...................................................................117
3.3.1 A edição como processamento da fotografia para apresentação....................................124
3.3.2 A seleção e a edição sob o olhar do fotógrafo, do editor e do curador...........................131
3.4 A folha de contato como documento de processo.................................................................142
4. As escolhas de Stupakoff.............................................................................................................. 155
4.1 Caixa 1, primeira escolha....................................................................................................... 158
4.2 Caixa 2, segunda escolha....................................................................................................... 166
4.3 Escolhas para além das Caixas.............................................................................................. 168
4.4 O estudo da Caixa 1 como ponto de partida para a visualização do projeto poético............171
4.4.1 Procedimentos metodológicos da análise das sequências..............................................173
4.5. Sobre as escolhas e usos dos fotogramas como estratégias criativas...................................176
4.6 Escolhas reiteradas................................................................................................................ 186
4.7 Escolhas divergentes.............................................................................................................. 195
5. Sobre a construção da imagem fotográfica..................................................................................201
5. 1 Os referentes da fotografia de Stupakoff: o que está fotografado?......................................202
5.1.1 Retratos: do cara que trabalha no posto de gasolina às personalidades........................205
5.1.2 Nus femininos................................................................................................................. 207
5.1.3 Fotografias de rua e viagens........................................................................................... 209
5.1.4 Família............................................................................................................................. 211
5.1.5 O puer aeternus em Stupakoff........................................................................................214
5.2 Da importância do espaço na fotografia de Stupakoff..........................................................216
5.3 O gesto do fotógrafo frente ao referente e o registro repetitivo...........................................222
5.4 Os recortes de Stupakoff........................................................................................................ 231
5.5 Composição: os detalhes que contam...................................................................................235
5.6 Iluminação e as janelas de Stupakoff....................................................................................239
5.7 O congelar de um instante.................................................................................................... 241
5.8 A raridade dos efeitos e das distorções.................................................................................242
5.9 A cor, as texturas e padronagens na superfície da foto........................................................243
6. Caminhos da criação: perseverança e constância.......................................................................247
6.1 Sobre o planejamento das fotos............................................................................................. 253
6.2 O contador de histórias como traço criativo........................................................................260
6.3 Quem se preocupa em excesso com a técnica, esquece o que quer dizer............................268
6.4 Referências e afinidades para Stupakoff..............................................................................275
6.4.1 Homenagem a Balthus....................................................................................................281
6.4.2 Wesley Duke Lee e Bea Feitler: dois parceiros..............................................................284
6.4.3 Lew Parrella: um interlocutor........................................................................................287
6.4.4 Richard Avedon, Irving Penn e a fotografia norte-americana......................................289
6.5 Uma força que sussurra: alguns aspectos do estilo de Stupakoff.........................................293
6.6 Não apenas um fotógrafo de moda......................................................................................301
6.7 Quando eu era fotógrafo: das colagens e assemblages aos textos........................................308
Considerações finais......................................................................................................................... 315
Arquivos/Acervos consultados........................................................................................................ 323
Fontes orais..................................................................................................................................... 323
Referências bibliográficas............................................................................................................... 323
Apêndices......................................................................................................................................... 342
  17

INTRODUÇÃO
A presente tese se debruça sobre a fotografia de Otto Stupakoff (1935-2009) e
versa sobre sua poética fotográfica. Stupakoff foi um renomado fotógrafo brasileiro que
iniciou suas atividades ainda na década de 1950 produzindo seus primeiros trabalhos para
agências de publicidade e para a gravadora Odeon. Devido à sua contundente atuação como
fotógrafo de revistas especializadas em moda na década de 1960, é considerado um pioneiro
na fotografia de moda no Brasil.
Stupakoff consolidou sua carreira através da fotografia como arte aplicada em
uma expressiva atuação profissional no exterior, principalmente Nova York e Paris,
trabalhando para importantes revistas como Harper’s Bazaar e Vogue. Apesar de obter
maior reconhecimento por sua fotografia de moda e retrato, a vultosa produção de Stupakoff
se estendeu para fotografia de rua e viagens, família, nus e still life. Essa versatilidade marca
uma obra que tem na fotografia sua maior força para a expressão pessoal e criativa.
O problema de pesquisa desta tese fundamenta-se em duas questões essenciais: é
possível argumentar sobre o projeto poético de Stupakoff a partir da análise de suas
sequências materializadas em folhas de contato? O que esse material fotográfico, incluindo as
escolhas do fotógrafo, conjuntamente a outros materiais de apoio, nos revelam sobre o
movimento de criação da fotografia de Stupakoff e como refletem a sua poética?
Considerando-se, portanto, o problema de pesquisa e o objeto investigado, o
objetivo central desta tese é discutir a obra, o processo de criação e a poética fotográfica de
Otto Stupakoff, identificando elementos de sua jornada pessoal e da sua trajetória
profissional que o influenciaram, tanto do ponto de vista poético quanto temático e técnico, a
partir da análise comparativa entre suas folhas de contato e as fotografias e ensaios que
vieram a público, seja através da publicação em periódicos especializados, uso em
publicidade ou em exposições.
Parte-se da prerrogativa de que as folhas de contato de Stupakoff são evidências
fundamentais para a compreensão do seu processo criativo, revelando aspectos da sua obra e
de suas escolhas que corroboram nossa visão inicial sobre o fotógrafo como um autor
coerente em sua perspectiva a respeito da fotografia e na praxis fotográfica desde suas
primeiras incursões na área, perpassando sua internacionalmente reconhecida competência
na fotografia comissionada de moda e alcançando até mesmo seus registros mais livres,
construídos fora do ambiente controlado dos estúdios e locações. A análise das sequências
apresentadas via folha de contato nos permite discutir e nos aproximar de uma poética do
fotógrafo, assim como visualizar suas escolhas marcadas nessas folhas, as quais, por sua vez,
revelam os “gostos” do autor, suas construções e preferências imagéticas.
Para debater sobre uma poética fotográfica de Stupakoff foram analisadas suas
folhas de contato sob a luz da crítica do processo criativo e da semiótica peirceana. Assim,

 
  18

partimos do pressuposto de que a análise de imagens isoladas fornece apenas elementos


gerais para se estabelecer uma discussão sobre a poética de um fotógrafo, sendo necessário o
estudo e análise das sequências de fotogramas registradas em folhas de contato
conjuntamente a outros materiais (ampliações, textos). Compartilhamos do pensamento de
Boni (1998) que sugere ser fundamental preservar o acesso ao “conteúdo bruto” acumulado
ao longo de vidas, as histórias completas, “(...) portfólios, ampliações, provas, filmes, notas e
outros documentos, elementos que nos permitem entender, como cifras de um código, o
processo de criação de mensagens, a comunicação por imagem” (BONI, 1998, p. 6). Nesse
sentido, discutimos como a seleção/edição fotográfica, i.e., a maneira como o fotógrafo
analisa e escolhe as imagens a serem apresentadas dentro de seu trabalho, faz parte do seu
processo criativo.

Sobre a crítica do processo criativo e a semiótica peirceana


A crítica do processo criativo é uma possibilidade teórico-crítico, um
procedimento investigativo utilizado para estudar o percurso de produção de uma obra
(SALLES, 2001, 2006, 2008). Esse procedimento tenta compreender o modo como se
desenvolvem os diferentes processos de construção da criação, ocupando-se das questões
próprias do processo criativo e tendo como objeto de estudo o caminho do autor: da gênese
até o término daquilo que ele elabora como obra.
O aporte teórico que a crítica de processo oferece auxilia na compreensão da
história das obras entregues ao público (BIASI, 2002). Nos procedimentos investigativos são
identificados fundamentos que permitam “(...) desvelar o conjunto de significações que
permite ver a obra sobre uma nova abordagem: a do processo e não do produto” (CIRILLO,
2010, p. 6).
O objetivo da crítica de processo é revelar a teoria da criação implícita em cada
processo criador e, consequentemente, chegar à uma compreensão, ainda que incompleta, do
processo criativo (GRÉSILLON, 1999). Incompleta no sentido de que há uma impossibilidade
de se determinar o exato início e o término de uma obra, pois esta é o resultado de um
processo contínuo e cíclico, uma sequência criada a partir de outra que teve um significado, e
porque nunca temos acesso à totalidade do processo criativo.
Temos, portanto, uma aproximação do processo para o qual Salles (2001, 2013),
utilizando conceitos extraídos da semiótica, propõe a existência de um processo sígnico de
desenvolvimento da criação no qual não podemos conhecer o seu início, pois ele estaria em
uma regressão infinita da semiose – entendendo por semiose uma ação que é, ou envolve, a
cooperação de três elementos: um signo, seu objeto e seu interpretante (PEIRCE, 1958, CP.
5.484). Todo processo de investigação criativa parte de uma inferência, uma aproximação do

 
  19

processo de criação e visão parcial com possibilidades de se levantar hipóteses sobre o


caminho percorrido e suas significações (GRÉSILLON, 1999).
A crítica de processo está apta a investigar signos pertencentes aos mais
diferentes sistemas semióticos como desenhos, esculturas, escritos e fotografias. A fotografia,
como sistema semiótico, deve ser tratada na pesquisa de acordo com suas especificidades. Ao
se analisar o índice fotográfico como índice de processo de criação, buscam-se marcas
deixadas durante a construção da obra, visto que não é possível dissociar a imagem
fotográfica do ato que a define (DUBOIS, 2012). A crítica de processo traz aportes para a
discussão sobre o ato criador, o acompanhamento de percursos criativos e a análise de
documentos de processos criativos nas artes e na ciências (SALLES, 2000a, 2002a, 2007,
2008).
Todos os apontamentos residuais e os documentos deixados pelo autor,
independentemente de sua materialidade, contêm a ideia de registro e podem oferecer
informações significativas sobre o ato criador (SALLES, 2002a, 2008). Para Salles (2008),
esses documentos desempenham dois papéis ao longo do processo criador: o de
armazenamento – anotações, diários – no sentido de armazenar informações que atuam
como auxiliares no desenvolver da obra; e o de experimentação – rascunhos, story-boards,
por exemplo – visando à concretização da obra, ressaltando que esses documentos variam de
um processo para o outro. Para tanto, toda a discussão da crítica de processo é sustentada na
pesquisa e no acompanhamento dos percursos de criação a partir de documentos das mais
variadas ordens: diários, maquetes, esboços, roteiros, partituras, manuscritos, vídeos (BIASI,
2002).
Na presente tese convencionou-se chamar esses documentos de registros ou
rastros criativos como documento de processo (SALLES, 2000a, 2002a, 2008, 2013), i.e,
registros materiais do processo criador. No sentido amplo da arquivologia, documento é todo
o registro de informação, independentemente de seu suporte físico e que abarca tudo que
pode transmitir o conhecimento humano: livros, revistas, fotografias, filmes, transparências,
desenhos, mapas, informes, normas técnicas, patentes, fitas gravadas, discos, partituras,
manuscritos, selos, quadros, fac-símiles e, de maneira geral, tudo que tenha um caráter
representativo nas três dimensões e esteja submetido à intervenção de uma inteligência
ordenadora (HERRERA, 1991).
Os documentos de processo apresentam materialidades diversas. No entanto, a
ideia do registro é similar em todas as áreas: na dança, pode ser a marcação dos passos em
um papel, na literatura o argumento para uma história. O certo é que os documentos de
processo apresentam grande variedade de índices, inclusive vestígios do testemunho material
de uma criação em processo. Na fotografia inferimos que os documentos de processo possam
ser a própria folha de contato e as anotações nelas realizadas, nos print files ou mesmo em

 
  20

um determinada cópia (na fotografia digital os equivalentes seriam os arquivos editados ou


as folhas de contato digitais). No caso da presente pesquisa, são as folhas de contato
conjuntamente a outros materiais como os negativos e anotações pertinentes para o estudo
da fotografia de Stupakoff.
O signo fotográfico pertence a um conjunto de significações e um sistema
semiótico definido por leis e convenções a partir das quais é possível sua apreensão e
compreensão como fenômeno. Dessa forma, recorre-se à crítica de processo conjuntamente à
semiótica peirceana – que contribui para o entendimento do movimento geral da criação pelo
modo de ação do signo – para se desvendar ao menos parte desse processo criativo (SALLES,
2013). Como os conceitos peirceanos se aportam nas generalidades, também foi necessário
recorrer a teorias específicas para compreensão mais aprofundada do percurso de criação
sobre um objeto específico (no caso, a fotografia).

Procedimentos realizados
A pesquisa consistiu de procedimentos metodológicos que incluíram revisão
bibliográfica sobre o tema e descrição analítica e comparativa. O material de estudo está
centrado no acervo de Otto Stupakoff – negativos, diapositivos, folhas de contato, ampliações
– depositado na sede do Instituto Moreira Salles (IMS), no Rio de Janeiro. Em 2008, o
material fotográfico registrado por Stupakoff entre 1955 e 2005 foi transferido pelo próprio
fotógrafo ao Instituto Moreira Salles (IMS), que tem feito, desde então, o resgate, a
manutenção e a curadoria da obra.
Para além desse material do IMS outras fontes foram consultadas: bibliografia
específica disponível, entrevistas e depoimentos publicados do fotógrafo, relatos de terceiros
publicados e coletados pela pesquisadora, textos dos catálogos de exposições,
correspondências recebidas e enviadas por Stupakoff, documentos oriundos de instituições
públicas e privadas, cadernos de clipping do fotógrafo (coletâneas de recortes de periódicos
que ele mesmo reuniu e selecionou), além de documentos tratados na pesquisa como
produção intelectual (textos reflexivos e pequenas citações escritas por Stupakoff, além de
outras expressões visuais como colagens, assemblagens e pinturas).
O agrupamento dos documentos coletados de várias fontes conjuntamente às
folhas de contato auxiliou na construção de uma linha indicativa quanto aos aspectos da vida,
obra e criação de Stupakoff. Diante dessas frentes de pesquisa, procurou-se angariar o maior
número possível de materiais relacionados ao fotógrafo. Ainda assim, é sabido que este é um
inventário em processo, visto que estamos diante de um cenário de pulverização da obra de
Stupakoff em diferentes meios e veículos, tanto no Brasil quanto no exterior.  
Quando iniciei a pesquisa em 2013, Stupakoff havia falecido há quatro anos,
impossibilitando uma abordagem direta ao autor. Diante disso e seguindo exemplo de

 
  21

Baxandall (1991) procuramos diversas qualidades de documentação para a compreensão da


fotografia de Stupakoff, desde as mais tradicionais, como entrevistas e depoimentos,
matérias de jornal e revista, cartas e textos publicados do fotógrafo, até as mais raras como os
seus textos reflexivos não publicados.
Partindo dessas fontes, estipulamos um meio de apuração de dados pertinentes
para a pesquisa no sentido de resgatar informações e conteúdos válidos para compreensão de
determinado contexto, que norteassem as discussões e possibilitassem inferências sobre o
processo de criação de Stupakoff. As discussões da tese estão fundamentadas na articulação
entre o material fotográfico e a estrutura de pensamento do fotógrafo agrupada nos
depoimentos, entrevistas e textos pessoais, que foram fundamentais para nos distanciarmos
de generalizações vazias e que nos permitiram construir uma linha indicativa dos aspectos da
vida, obra e criação.
Não obstante, as declarações de Stupakoff são rastros do pensamento do autor e
expressam um ponto de vista dentro de um recorte do tempo. Como declarações pessoais,
acomodam-se na linha de pensamento Paulo Ricoeur para quem “com o testemunho
inaugura-se um processo epistemológico que parte da memória declarada, passa pelo arquivo
e pelos documentos e termina na prova documental” (RICOEUR, 2007, p.170), oferecendo
subsídios à análise sobre o processo de criação e a poética.
Os materiais de Stupakoff obtidos, como documentos (cartas, entrevistas,
anotações) e dispositivos de memória, devem ser considerados entendendo seu contexto e as
possíveis nuances adquiridas com sua permanência no espaço-tempo tendo-se a consciência
de que memória é uma construção psíquica e intelectual que acarreta de fato uma
representação seletiva do passado, que nunca é somente aquela do indivíduo, mas de um
indivíduo inserido num contexto familiar, social, nacional (LE GOFF, 2013). Dentro da
perspectiva da seleção, “lembrar significa selecionar certos capítulos de nossa experiência e
esquecer o resto” (FONTCUBERTA, 2010, p. 39), e entendendo que as fontes não são
suficiente em si mesma, pois “(...) todas encerram enigmas, defeitos e lacunas. Até aquelas
aparentemente incontestáveis – cartas, anotações ou diários do sujeito mesmo da biografia –
apresentam contradições e exigem reserva” (CASTAÑEDA, 2009, p. 8).
Mesmo diante da mais vasta documentação, as informações dos documentos e as
conexões estabelecidas a partir deles permitem uma aproximação parcial do processo de
criação, visto que muitas ações e experimentações são mentais e não registradas. Há uma
incompletude natural na pesquisa da obra de um autor, pois o modo de ação do criador
perpassa por ações e decisões intelectuais e sensíveis de cunho consciente ou não consciente
(SALLES, 2001). A formação mental e articulações inconscientes dificilmente são
contempladas no tratamento da pesquisa e esbarram no limiar subjetivo do autor que nem

 
  22

sempre verbaliza e expressa simbolicamente a totalidade do seu processo criativo a fim de


dar conta de todo o fenômeno.
O encadeamento do processo de pesquisa para esta tese foi iniciado na revisão
bibliográfica buscando quadros teóricos para construir espaços referenciais e discussões
sobre processo criativo na fotografia.
Posteriormente foi realizado o levantamento do material fotográfico de Stupakoff
disponível no IMS para delimitar as sequências estudadas e estabelecer técnicas de coleta e
estruturação de registros que de algum modo estivessem relacionados à produção da obra.
Todo o material considerado relevante foi tido como evidência basilar para se traçar uma
linha de pensamento do fotógrafo e recompor o percurso de formação das imagens estudadas.
Também foram levantadas publicações editoriais, exposições e outros materiais nos quais as
fotografias de Stupakoff foram veiculadas considerando o quadro histórico e a cronologia de
atuação do fotógrafo.
Destaca-se aqui que o levantamento dos dados brutos deu-se em fluxo contínuo
durante todo o trabalho de produção desta tese e que houve uma dificuldade inicial em
encontrar e compilar todo o material, visto que eles têm datações diversas, perfazendo as
cinco décadas de atuação do fotógrafo, e estão depositados em diferentes locais (como
bibliotecas, arquivos públicos, coleções privadas) no Brasil e no exterior.
Em uma terceira etapa, os dados coletados foram estruturados e organizados em
um dossiê de maneira que pudessem ser relacionados e produzir sentido dentro de um
universo que pode estar disperso e/ou desconexo. É fato que os documentos de processo que
regem a criação aparecem às vezes agrupados, às vezes avulsos, fragmentados, desordenados
tanto formalmente como cronologicamente (como foi o caso na presente pesquisa). Nesse
sentido, é tarefa do pesquisador “(...) reunir, classificar, decifrar, transcrever e editar dossiês
que serão investigados cientificamente para desvelar nuances da criação em ato” (CIRILLO,
2010, p.7) buscando construir uma linha de coerência, desvelar alguns dos princípios
direcionadores que regem o processo de criação, além de analisar os documentos da criação e
acompanhar os percursos criativos.
Na última etapa da pesquisa, debruçou-se sobre o material disponível e se
estabeleceu uma proposta de análise – à luz da crítica de processo e da semiótica peirceana –
que visou iluminar aspectos do processo criativo de Stupakoff, resultado em considerações
pertinentes à sua poética.
Para esclarecer o problema de pesquisa, as fotografias constituíram-se em nosso
ponto de ancoragem: as sequências a partir das folhas de contato e suas condições e
modalidades de criação/produção. No processo de análise do processo criativo coube: (a)
seguir evidências quanto a morfologia das fotografias de Stupakoff, composição, elementos
fotográficos, formas, entre outras, para sugerir um possível padrão na criação do fotógrafo; e

 
  23

(b) estabelecer relação com as escolhas das imagens publicadas a fim de resgatar possíveis
motivações para seleção de determinadas imagens dentre uma mesma sequência de fotos. A
partir do material delimitado, foi realizada então uma análise comparativa entre o que foi
publicado e/ou exposto, como foi publicado e o que não foi selecionado, a fim de contrapor as
diversas aplicações da fotografia e, consequentemente, as diversas formas de seleção de
imagens fotográficas. A análise de outros materiais para além dos registros fotográficos
permitiu o delineamento de propostas mais amplas quanto ao seu processo de criação.
Para dar conta do corpus do trabalho, foi estabelecida a seguinte a estrutura para
a tese:
No capítulo 1 aborda-se o perfil biográfico de Otto Stupakoff, apresentando sua
trajetória de vida com foco nos aspectos profissionais e alguns aspectos pessoais.
O capítulo 2 trata da descrição e organização do material de Stupakoff no
Instituto Moreira Salles. Também faz um levantamento da produção do fotógrafo não
depositada no IMS e que clarifica a abrangência de sua atuação como fotógrafo.
O capítulo 3 discute a respeito das folhas de contato e do seu uso como material
de pesquisa, edição e seleção. A base argumentativa justifica o uso das folhas de contato
como material de análise pautada na ideia de que cada fotógrafo olha a realidade e o assunto
da sua obra de uma maneira muito particular. As observações oriundas da análise das
sequências fotográficas de um mesmo filme apontam para características particulares do
olhar de Stupakoff perante o objeto/cena fotografados, o modo como foram fotografados e
como ele abordava e construía seus temas. O capítulo também aborda a discussão
sedimentada naquilo que Soulages (2005) apresenta como fotograficidade, uma articulação
entre o irreversível e o inacabável. Irreversível diante da característica do ato fotográfico, que
Dubois (2012) vê como opção única, global e irremediável do fotógrafo, que é no processo da
inscrição da imagem no material fotossensível, dado de uma só vez em toda superfície e no
qual não é possível intervir na imagem. E inacabável no trabalho com o negativo, pelo qual a
operação na imagem, segundo Soulages (2005), é infinita.
O capítulo 4 fundamenta-se na análise das folhas de contato de Stupakoff, assim
como de outros materiais, a partir da base da pesquisa concentrada no material
salvaguardado no Instituto Moreira Salles (cerca de 16.000 negativos). Diante desse vasto
material – Stupakoff fotografou entre a década de 1950 até meados de 2000 –, foi necessário
estabelecer uma amostragem daquilo que compôs o corpus da análise da tese. Optamos pelo
estudo prioritário do material depositado no IMS contido na Caixa 1 e eventuais incursões na
Caixa 2, assim como os desdobramento das imagens nelas contidas como publicações em
revistas, anúncios e exposições. Esse recorte se justifica pelo fato das caixas terem sido
organizadas pelo próprio Stupakoff, refletindo uma seleção pessoal; assumiu-se, portanto,
que essas escolhas, por serem um olhar direto sobre a sua própria produção, são capazes de

 
  24

dar indícios que revelam aspectos da poética do fotógrafo. Além disso, a Caixa 1 apresenta
uma quantidade significativa de imagens, como também uma pluralidade de fotos em
diferentes modalidades fotográficas, perpassando diversos períodos históricos, o que foi
relevante como estudo poético para essa pesquisa.
Uma outra linha condutora da discussão no capítulo 4 se baseia na ideia do optar
e decidir, ações inerentes do processo de criação e que na fotografia estão presentes desde o
planejamento, culminando no ato fotográfico – momento em que o fotógrafo escolhe o quê e
como fotografar – e na seleção de uma imagem em uma sequência (feita pelo fotógrafo,
editor, curador) até a maneira como essa imagem será apresentada. Na tese essa discussão
está nas escolhas de Stupakoff, seus critérios e interpretações para decidir sobre a(s)
imagem(ns) da sequência fotográfica a serem divulgadas. Frente a isso, a discussão permeia
tantos as escolhas gerais do fotógrafo quanto as escolhas diretas de fotogramas para
exposições e publicações.
O capítulo 5 trata das sequências de fotos que evidenciam o desenvolvimento
espacial e temporal do fotógrafo no registro do assunto, possibilitando não somente analisar
o movimento do assunto fotografado como também o movimento do fotógrafo em relação à
cena. Para isso, recorremos tanto aos conteúdos das Caixas 1 e 2 quanto aqueles fora delas
como estratégia para abordar características mais amplas encontradas na prática fotográfica
de Stupakoff. A partir disso, tem-se um indicativo do desenrolar do evento que constituiu o
registro das imagens e de como a visão fotográfica particular do fotógrafo se realiza frente a
uma determinada cena ocorrida em um espaço-tempo. Ainda que uma imagem única
apresentada desconectada de sua série tenha em si um discurso inerente e suficiente como
obra, no presente trabalho atribuiu-se importância ímpar ao estudo da sequência como um
todo partindo-se do pressuposto de que uma imagem fotográfica dialoga com as outras da
série na qual ela foi registrada e de que mesmo os fotogramas não selecionados também são
reflexo de um pensamento criativo. Assim, valida-se o estudo do processo de criação pela
análise contrastiva e comparativa entre as sequências. Também foram abordados os recursos
fotográficos empregados por Stupakoff para construção das imagens.
O capítulo 6 versa sobre a poética de Stupakoff, discutindo a autonomia por ele
demonstrada em suas produções, bem como aspectos subjetivos e objetivos presentes na sua
obra fotográfica, suas habilidades, referências – tanto no âmbito da fotografia quanto de
outras expressões artísticas –, e processo de criação. O capítulo discute a questão do quanto a
obra de Stupakoff deve ser analisada para além da alcunha tradicional estabelecida para ele,
a de ser um ‘fotógrafo de moda’, estabelecendo a sua importância também como autor de
registros fotográficos em múltiplas temáticas e estilos, ainda que sua atitude nos permita
identificar uma linha condutora presente em sua obra, revelando a integridade e coerência do

 
  25

olhar do fotógrafo durante toda a sua vida profissional. No final do capítulo é apresentada a
aderência de Stupakoff a outras formas de expressão dentro das artes visuais e da escrita.
Por fim, o alinhamento entre os capítulos da tese apresenta o problema nodal e se
justifica nas discussões gerais sobre o estudo do processo de criação na fotografia e da seleção
e edição fotográfica como partes de um processo criativo. Esse afunilamento da discussão
sobre o processo criativo culmina na discussão específica do trabalho de Stupakoff como
objeto para aplicação das questões levantadas nos pontos descritos acima.
Para além de uma pesquisa que visa discutir as particularidades poéticas e o
processo criativo de Otto Stupakoff, este trabalho busca articular prognósticos sobre o
processo de criação na fotografia, lastreando-o em diferentes nuances e fomentando debates
em torno da criação da imagem fotográfica.

 
  26

CAPÍTULO 1

1. Otto Stupakoff: uma trajetória


– O senhor é o autor daquelas fotos da OCA?
– Sim, Otto Stupakoff. E o senhor é o cronista?
– O próprio. Meus parabéns pelos seus trabalhos.
Mas o senhor é bem jovem, não?
– Outros também acham. Tenho 20 anos. Isso será algum obstáculo?
– Claro que não, absolutamente. Foi uma observação ociosa.
Sente-se e conversemos sobre seus estudos, sua arte, seus planos.1

O perfil biográfico 2 apresentado neste capítulo discorre sobre algumas


particularidades da vida e obra de Otto Stupakoff e procura estabelecer relações entre esses
dois aspectos (por isso um perfil biográfico e não uma biografia propriamente dita). Não se
estabelece aqui uma narrativa de vida – narração metódica baseada apenas em causas,
efeitos e fatos – por entendermos que a vida e obra de uma pessoa apresenta mais
irregularidade e imprevisibilidade do que regularidade e previsibilidade.
Quem foi Otto Stupakoff? Quando se estuda a obra e seu autor sob o viés da
critica de processo (SALLES, 2002b, 2013), essa é uma pergunta cabível de se formular. O
perfil biográfico se justifica por apresentar dados do autor que oferecem subsídios para
entender, pelo menos parcialmente, a gênese da obra (COLI, 2012).
No entanto, é sabido que não se alcança a vida de alguém na sua totalidade,
mesmo levando-se em conta somente o âmbito profissional. No caso do fotógrafo e suas
experiências, uma pergunta simples requer uma resposta complexa e não hermética, tendo
em vista tudo o que Stupakoff fez no decorrer de sua vida – por vezes contraditória. Não cabe
aqui, portanto, estabelecer conceitos e ideias fechadas. Assim, podemos nos direcionar pelos
dizeres de Pablo Picasso:
Quando ouço falar em evolução de um artista, parece que ele é visto de pé
entre dois espelhos, um de frente para o outro, que reproduzem sua imagem
infinitamente. Suas imagens sucessivas são contempladas num dos espelhos,
como se representassem seu passado, e as que se refletem no outro espelho,
como seu futuro, enquanto a imagem verdadeira é considerada seu presente.
Não percebemos que são as mesmas imagens, mas vistas de perspectivas
diferentes (PICASSO apud INSTITUTO TOMIE OTHAKE, 2016)3.
Otto Stupakoff foi a seu tempo o mais reconhecido fotógrafo brasileiro no exterior
devido a qualidade e criatividade dos seus trabalhos. Também era descrito por muitos como
um homem de notável cultura e inteligência (FERNANDES JUNIOR, 2006; MENDES, 2016;
CORRÊA, 20174; LASZLO, 20175; WOLFENSON, 20176).

                                                                                                               
1 MAURICIO, Jayme. Stupakoff e a fotografia. In: Jornal Correio da manhã, Rio de Janeiro, 17, mai.1956.
2 Perfil biográfico ou texto biográfico: concentra-se em alguns aspectos do personagem central, alguns inputs
(facetas, episódios, convivas, pertences, legados, o feito, o não-feito).
3 Picasso, exposição Mão erudita, olho selvagem no Tomie Otake, 2016.
4 CORRÊA, Thomaz Souto. Fonte oral. Depoimento concedido a Patricia Kiss Spineli em 5 mai. 2017.
5 LASZLO, Fernando. Fonte oral. Depoimento concedido a Patricia Kiss Spineli em 27 jan. 2017.

 
  27

Sua fase mais produtiva ocorreu em Nova York e Paris, quando ele fotografou
para as revistas Vogue, Harper’s Bazaar, Glamour, Esquire, Elle, Marie Claire, McCall’s,
Look Magazine, Stern, L’Officiel, Votre Beauté e Jardin des Modes; no Brasil, com trabalhos
para as revistas Manchete, Cláudia, Vogue Brasil, Realidade e Senhor. Suas séries
fotográficas mais conhecidas são as que registram moda e retratos de pessoas do meio
político e artístico. Entre eles, estão o ex-presidente dos EUA Richard Nixon, as atrizes
Isabelle Adjani e Lana Turner, o escritores Harold Pinter e Jorge Amado, o atleta Pelé, os
músicos Tom Jobim e Dorival Caymmi e a apresentadora Xuxa. Entre as obras de Stupakoff
menos exploradas, mas não menos importantes, estão seus retratos de desconhecidos, nus
femininos, viagens, família, still life e instantâneos de rua, que tiveram maior visibilidade
após 2005 em decorrência da volta do fotógrafo ao Brasil, de exposições contemporâneas e
dos lançamentos dos livros Otto Stupakoff (FERNANDES JUNIOR, 2006) e Sequências:
Otto Stupakoff (INSTITUTO MOREIRA SALLES, 2009a).
No filme Blow up (BLOW UP, 1966), a trama está centralizada em um fotógrafo
de moda (Thomas, vivido pelo ator britânico David Hemmings) que registra fotografias de
um casal em um parque londrino e que, ao ampliar as imagens, depara-se com o enigma de
um possível crime. Na caracterização do personagem principal, o metier de um fotógrafo é
apresentado suscintamente – sessões fotográficas em estúdio com modelos, fotografias do
inesperado na rua, ampliações em laboratório fotográfico – e Thomas representa um ideal de
fotógrafo bem sucedido e cercado por mulheres atraentes (MENEZES, 2001). Para o
fotógrafo brasileiro Bob Wolfenson, esse filme foi responsável por influenciar uma geração de
fotógrafos brasileiros; segundo ele, Stupakoff personificaria o ideal de fotógrafo atraente,
namorador e cercado de glamour como representado por Antonioni em sua obra
(CHIODETTO, 2005; WOLFENSON, 2017): “Otto, como poucos, personificou a figura do
fotógrafo charmoso, sedutor e aventureiro, prefigurado, mais de uma década antes, por
Michelangelo Antonioni em seu seminal filme Blow-up” (INSTITUTO MOREIRA SALLES,
2009a, p. 8).
Stupakoff, por sua vez, se recusava a assumir o rótulo ao qual Wolfenson se
refere: “Por ter convivido com modelos e atrizes famosas, acham que fui um playboy
comedor [sic] de mulheres. Não fui, não exageradamente” (STUPAKOFF apud HARA;
WOLFENSON, 2002, p.36). Ele afirma que o glamour existiu, mas não a fama. Muitos dos
trabalhos que desempenhava para as revistas teriam acontecido pelo fato dele ser capaz de
lidar com as personalidades e estabelecer relações de confiança, não misturando o pessoal
com o profissional (OLIVANI, 2005). Não obstante, a trajetória de Stupakoff mostra que ele
de fato foi um destacado personagem de uma época de ouro da fotografia de moda e do
retrato, nos anos 1960 e 1970. Como fotógrafo de moda, foi contemporâneo de nomes como
                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                         
6 WOLFENSON, Bob. Fonte oral. Depoimento concedido a Patricia Kiss Spineli em 11 fev. 2017.

 
  28

Richard Avedon, Irving Penn, Diane Arbus (nos EUA) e Guy Bourdin, Frank Horvat, Helmut
Newton e Philippe Halsman (na Europa).
Uma das particularidade de Stupakoff foi sua inclinação à psicologia analítica
junguiana tanto como analisando quanto estudioso da teoria (FERNANDES JUNIOR, 2006).
Essa aproximação da psicologia junguiana se perpetuou ao longo da vida do fotógrafo e foi
fundamentada principalmente pelos aspectos do puer aeternus, sincronicidade, self, anima e
busca interior, discutidos mais adiante no presente trabalho.
Partindo-se da premissa de Joseph Campbell (1989) de que a busca interior se
configura na jornada do herói, podemos constatar que a jornada empreendida por Otto
Stupakoff apresenta características de um monomito 7 . O monomito de Campell (1989)
persegue a aventura do herói, sendo que o verdadeiro caminho do herói seria o da
individuação, da vida criativa e da mudança. Mais do que um caminho reservado a poucos
escolhidos, ele pode ser percorrido por todos os seres humanos impelidos a desenvolver uma
jornada de vida (MÜLLER, 1987).
O fim da jornada do herói não é seu engrandecimento, mas a conquista da
sabedoria e do poder de servir aos outros (CAMPBELL, 1990). Ao final de sua jornada, pode-
se dizer que Stupakoff conquistou a sabedoria, tendo plena consciência de ter servido às
pessoas através de suas fotografias:
Tenho consciência da minha responsabilidade social para com a humanidade
e quando digo que a meta final da minha produção é a compaixão, as pessoas
ficam surpresas. Mas toda arte é comunicação e isto implica em um
aprendizado sobre o ser humano. Por isso sou fotógrafo e tenho imenso
prazer em comunicar aquilo que sei. Levei muitos anos para chegar onde
cheguei, e não foi batendo chapas, e sim aprendendo com as pessoas. E isto é
coisa que não acaba. (STUPAKOFF apud SAMPAIO, 2007, p.4).
Tendo em vista as características acima explicitadas, o percurso de Stupakoff aqui
apresentado segue uma narrativa em forma de monomito, com um ponto de partida, seguido
de desenvolvimento e do regresso. O importante nessa narrativa é entender o percurso desse
fotógrafo brasileiro reconhecido pelos seus trabalhos fotográficos com moda e retrato e que
empreendeu uma jornada para estabelecer um estilo próprio e buscar a integridade
fotográfica. Desenvolvemos abaixo uma descrição de trajetória de Stupakoff em três grandes
eixos: Brasil, Estados Unidos e Europa. Em torno desses eixos foram consideradas as
atuações profissionais do fotógrafo e dados de sua vida pessoal que foram determinantes
para sua trajetória profissional. Para o texto argumentativo recorreu-se a depoimentos e
declarações publicadas ou inéditas do próprio Stupakoff e de terceiros que tiveram com ele
alguma relação pessoal ou artística.

                                                                                                               
7 Monomito é um conceito apresentado por Joseph Campbell (1989) que diz respeito à jornada cíclica presente

nos mitos – estrutura dinâmica de personagens, cenários e situações típicas. Essa jornada pode ser transposta
para o ser humano comum.

 
  29

1.1 O começo: a formação nos EUA e as atividades do fotógrafo no Brasil


“A primeira vez que usei uma câmera foi aos oito anos.
Não parei mais” 8

Otto Stupakoff, descendente de russos e sicilianos, filho de Ernst Walter Erwin


Stupakoff e Dulce Cunha Bueno Calacibetti, nasceu em 28 de junho de 1935 na cidade de São
Paulo, e faleceu no mesmo local em 22 de abril de 2009. Fotógrafo brasileiro, Stupakoff é
reconhecido nacionalmente como o “primeiro fotógrafo que se fez lá fora”: tinha como diretriz
profissional a ideia de que “o fotógrafo precisa achar o seu próprio caminho”.
Ainda em tenra idade, desenvolveu experiências com as imagens ópticas,
primeiramente com a câmera fotográfica que ganhou do pai aos oito anos e posteriormente
com o cinema ao dirigir e fotografar, aos dezesseis anos, o curta-metragem A missão de 1951
em bitola 8 mm pela Miniatura Filmes, sua produtora (CINE... 1951; MENDES; ARRUDA,
2001). A primeira vez que Stupakoff usou a câmera, segundo ele mesmo, foi para se
fotografar. Esse autorretrato feito em frente a um espelho teve a figura humana como seu
primeiro referente, elemento significativo em suas fotografias.
Essas primeiras experiências e a inclinação para a área artística direcionaram as
atividades profissionais de Stupakoff para a fotografia. Ainda segundo o fotógrafo: “(...) eu
tinha preocupações visuais [na infância] que mais ninguém tinha” (STUPAKOFF 2000a, p.6).
Ele atribuiu sua realização na fotografia a uma exigência psíquica de composição arquetípica9
trazida de outras gerações e que ainda na infância culminou em algo que diz respeito ao
espírito10 (OLIVANI, 2005). Aqui temos uma clara menção de Stupakoff à teoria de Jung
quanto ao inconsciente coletivo 11 . Para o fotógrafo, foi uma sensibilidade inata, algo
inconsciente, uma chama que comove e culmina na melhor maneira para se comunicar e
transmitir fatos pessoais (OLIVANI, 2005). O próprio Stupakoff ressalta que essa foi uma
escolha fundamentada em uma necessidade íntima para se expressar e um motivo para
existir (HARA; WOLFENSON, 2002).
Aos 17 anos de idade, Stupakoff partiu para os Estados Unidos. Entre 1953 e 1955,
estudou artes com ênfase em fotografia no Art Center School (atual Art Center College of
Design) em Pasadena, Los Angeles (MAURICIO, 1956; FERNANDES JUNIOR, 2006). Antes
disso, em Porto Alegre, aprendeu com um fotógrafo de eventos os fundamentos da técnica de
revelação e ampliação. O firme propósito de Stupakoff pela formação nos Estados Unidos
estava relacionado à procura por escolas que ensinassem arte e fotografia de uma maneira
                                                                                                               
8 Texto de um Anúncio da Vasp, c. 1978.
9 Stupakoff se declara adepto à psicologia profunda de Jung. Para Jung arquétipos são imagens primordiais
originadas de uma repetição progressiva de uma mesma experiência durante muitas gerações, armazenadas no
inconsciente coletivo (JUNG, 2000).
10 Aqui espírito está no contexto junguiano, referente ao ponto de vista psíquico aludindo ao aspecto estimulante e

revigorador do inconsciente (JUNG, 1984).


11 Inconsciente coletivo para Jung é um reservatório de imagens latentes chamadas de arquétipos ou imagens

primordiais, que cada pessoa recebe de seus ancestrais (JUNG, 2000)

 
  30

consistente, visto que no Brasil havia carência de propostas educacionais de maior


envergadura, que fossem além dos cursos livres organizados especialmente pelos fotoclubes
(SALVATORE, 1963; MENDES, 2012). Na Art Center School, o ensino era realizado com
aulas práticas nas quais, após uma explanação do docente, os discentes executavam os
trabalhos e os submetiam à crítica e comparação (MÓDULO... 1956). Nesse período de
formação, Stupakoff documentou durante dois meses os ensaios do The New York City Ballet
conduzidos pelo coreógrafo russo George Balanchine. Nessa mesma época, portava um
cartão de imprensa como correspondente da revista brasileira Manchete (ainda que não
existam evidências disponíveis dos seus trabalhos para a revista no período) e estabeleceu
amizade com a atriz e cantora luso-brasileira Carmen Miranda após uma ligação telefônica
que fez a ela (CASTRO, 2005).
Stupakoff retornou ao Brasil em 1955 e estabeleceu residência em Porto Alegre,
na cidade dos pais, onde projetou seu primeiro estúdio com colaboração do arquiteto Max
Hermann Schlüpmann (Figura 1). O projeto contemplava um espaço – estúdio e dois
laboratórios (MÓDULO... 1956) – para que o jovem fotógrafo trabalhasse prioritariamente
com a qualidade profissional da fotografia de grande formato em preto e branco, referência
aos mestres da fotografia dos EUA nas décadas de 1930/1940. É nesse contexto que se inicia
o desenvolvimento de sua linguagem na fotografia.

Figura 1. Estúdio de Otto Stupakoff em Cavalhada, bairro de Porto Alegre, 1955.


Fonte: Instituto Moreira Salles.

As fotografias produzidas no estúdio em Porto Alegre foram enviadas ao


arquiteto Oscar Niemeyer, que as publicou na matéria Fotógrafo profissional, arquiteto
amador, da revista Módulo de março de 1956. O contato com Niemeyer também rendeu à
Stupakoff um convite para que documentasse as obras do arquiteto em Brasília, registrando o

 
  31

processo de modernização do país e o convívio com a equipe de construtores da capital. No


mesmo ano, ele registrou o barroco brasileiro na cidade mineira de Ouro Preto12.
A iniciativa de Stupakoff em procurar primeiro Carmen Miranda, ainda em Los
Angeles, e depois Oscar Niemeyer, já no Brasil, demonstra um traço de sua personalidade
que pode ser interpretada como desprendida e desbravadora – ele se autointitulava “um
penetra” (STUPAKOFF apud FERNANDES JUNIOR, 2006, p. 154). Penetra no sentido de
abordar pessoas renomadas com intuito de estabelecer vínculos que, de certa forma, fossem
condizentes com suas proposições profissionais (ou mesmo vínculos afetivos, como no caso
de Carmem Miranda). Há relatos de outras ocorrências ‘intrometidas’: ainda na adolescência,
ele teria abordado o cineasta Alberto Cavalcanti para pedir conselhos sobre como ser cineasta
no Brasil (e foi desencorajado por Cavalcanti); nos Estados Unidos, foi ao encontro do
fotógrafo Edward Weston 13 na pequena cidade californiana de Carmel (FERNANDES
JUNIOR, 2006); telefonou ao fotojornalista norte-americano Lew Parrella, um interlocutor
durante anos, quando soube que este havia se mudado para o Brasil (MANJABOSCO, 2016).
Em 1956, Stupakoff migrou para o Rio de Janeiro devido à escassez de trabalho
em Porto Alegre. No Rio de Janeiro, enfrentou dificuldades para posicionar-se no mercado
publicitário, uma vez que a contratação de serviços fotográficos era pautada na experiência
profissional do fotógrafo na área, algo que Stupakoff ainda não tinha. As empresas não
acreditavam na capacidade de execução fotográfica de quem tivesse estudado em escolas
especializadas – na realidade, desconfiavam que os trabalhos fotográficos apresentados por
Stupakoff eram de autoria de seus mestres da Art Center School (MAURICIO, 1956).
Ao vencer algumas resistências, ele iniciou seus primeiros trabalhos fotográficos
para agências de publicidade como a JW Thompson – onde se destacou pela produção de um
conjunto de 20 imagens para um calendário da Esso Petróleo (ver capítulo 2) –, a McCann-
Erickson do Brasil e a gravadora Odeon Records. Para a Odeon fotografou capas
significativas no meio cultural, como dos músicos Dorival Caymmi e Luiz Bonfá (descritas no
capítulo 2).
Em 1957, Stupakoff prosseguiu com sua carreira profissional nas áreas de
fotografia publicitária, moda e retratos na cidade de São Paulo montando primeiramente um
estúdio no quinto andar da Avenida Ipiranga (Figura 2A), acima de uma joalheria, e
instaurando o estúdio-hangar14 (Figura 2B) na rua Frei Caneca, 134815, este na década de

                                                                                                               
12 Essas imagens históricas de arquitetura foram expostas na Galeria Espasso/Nova York.
13 Lendário fotográfo norte-americano; no momento do contato com Stupakoff, Weston sofria de mal de
Parkinson, que o levaria ao óbito em 1958.
14 Segundo Krauss (2013), na cidade de São Paulo até o final da década de 1940 havia cerca de 148 estúdios

fotográficos comerciais oferecendo diferentes serviços de produção fotográfica, de laboratório e serviços gráficos,
vide o Fotolabor. A partir da década de 1950 o campo da produção fotográfica nacional foi marcado pela expansão
dos investimentos em publicidade, crescimento editorial e consolidação dos estúdios voltados à fotografia
industrial. Foi nesse cenário que Stupakoff estabeleceu e alçou sucesso com seu estúdio.
15 Ainda utilizou o estúdio da Standard Propaganda na Praça Roosevelt no período em que trabalhou para a

agência.

 
  32

1960. O mercado da foto publicitária se expandia e impunha a necessidade de


profissionalização e especialização (COSTA; SILVA, 2004). Dessa forma, esse estúdio-hangar
foi significativo para que Stupakoff desenvolvesse seu trabalho para campanhas publicitárias
de grande porte, pois contava com áreas para fotografias de cenas e de produtos volumosos
fotografados com câmeras de grande formato (o equipamento pôde ser visualizado via folhas
de contato que mostram os bastidores de uma sessão fotográfica)16. Nesse estúdio, contou
com a parceria do assistente José Prezado do Jesus (Zé do Otto) e de Maria Seelig (a Maria
do Otto), assistente de produção que, segundo Stupakoff, foi a primeira produtora de moda
do Brasil. Além das campanhas publicitárias, é sabido que Stupakoff realizou nesse estúdio
sua produção mais significativa de retratos. Segundo consta “(...) os temas gerais são tratados
por ele com a mais fina percepção, mas a sua preferência e o seu indiscutível espírito criador
o tem levado pelos caminhos da pesquisa em retratar (...) sua última busca nos caminhos da
fotografia-arte” (MOREIRA, 1962, p. 13).

(A) (B)
Figura 2. Estúdios de Stupakoff (A) Fachada do estúdio na Avenida Ipiranga. (B) Estúdio da Frei
Caneca, n. 1348, década de 1960. Fonte: Instituto Moreira Salles.

Vale ressaltar que o estúdio-hangar na rua Frei Caneca, referência de produção


fotográfica17, transformou-se também em ponto de encontro de artistas plásticos, diretores de
arte, profissionais da comunicação e intelectuais da época, como o poeta Roberto Piva, os
artistas Carlos Fajardo e Wesley Duke Lee, os publicitários Francesc Petit e José Zaragoza. O
próprio Stupakoff considera que no período ele tinha se transformado em legenda na cultura
paulistana (STUPAKOFF apud FERNANDES JUNIOR, 2006, p. 156). Nesse período, o
fotógrafo manteve um intenso relacionamento com a cena artística local, principalmente com

                                                                                                               
16 Na falta de material sobre tais trabalhos, essas atribuições fotográficas puderam ser constatadas pelas cenas de

bastidores registradas em 35mm e impressas em copiões.


17 Abrigou campanhas publicitárias de grande porte, como as da nascente indústria automobilística.

 
  33

o artista plástico Wesley Duke Lee, com quem manteve duradoura amizade e intercâmbio
artístico. Todo esse contexto corrobora a crença de Stupakoff de que é “de vital importância
para um fotógrafo não pensar tanto em fotografia, mas buscar referências na literatura, na
pintura, no desenho, na música” (STUPAKOFF apud FERNANDES JUNIOR, 2006).
Em 1963, Stupakoff integra o movimento artístico Realismo Mágico18 idealizado
por Wesley Duke Lee e formado pela pintora Maria Cecília Gismondi, o crítico de arte Pedro
Manuel-Gismondi e o escritor Carlos Felipe Saldanha (COSTA, 2010). Como integrante do
movimento, Stupakoff participou do que é considerado o primeiro happening do Brasil,
intitulado O grande espetáculo das Artes (23 de outubro de 1963) no João Sebastião Bar19,
em São Paulo (FERREIRA, 2006). O happening foi uma resposta à dificuldade de Duke Lee
em expor sua série Ligas no circuito tradicional das artes, por esta ser considerada erótica e
obscena. A ação consistiu de uma filmagem de 15 minutos, realizada por Stupakoff, em que
Maria Cecília Gismondi, com vestido de alta costura, luvas e chapéu, caminha pelas ruas de
São Paulo como se estivesse indo a um encontro (Figura 3) e chega no João Sebastião Bar,
onde estava exposta a série Ligas conjuntamente a recursos multimídias. O filme foi
projetado em uma tela de papel na qual, em um dado momento, Maria Cecília Gismondi
rasga o painel e simula um strip-tease. Nesse contexto houve uma apresentação com a
presença dos integrantes do movimento – além do Corpo de Bombeiros de São Paulo, que
tentou impedir a realização do show (FERREIRA, 2006). O filme feito por Stupakoff
desapareceu, mas um making of com fotos foi encontrado por Max Perlingeiro, diretor da
Pinakotheke Cultural, RJ (COSTA, 2010).

                                                                                                               
18 Realismo Mágico em São Paulo foi um acontecimento espontâneo, sem manifestos nem densas definições

acompanhando o seu aparecimento. De tendências neo-figurativas, foi uma alternativa ao academicismo do


abstracionismo no Brazil; sobrepunha aspectos da realidade e do imaginário, dando voz às mitologias pessoais e a
situações sentidas, vividas ou inventadas, na criação de séries imagéticas e ações conceituais de traços particulares,
por meio das quais postulava narrativas temporais e atemporais, ficcionais e metafóricas, perpassadas por forte
ironia (COSTA, 2003).
19 Local onde artistas de diferentes áreas se encontravam para discutir novas ideias e trocar informações.

(MENDONÇA, 1988).

 
  34

Figura 3. Filmagem para o happening O grande espetáculo das Artes, 1963. Stupakoff (filmagem) e
Maria Cecília Gismondi (performance). Fonte: COSTA, 2010 (Acervo Maria Cecília Gismondi).

Nos primeiros anos como fotógrafo e artista no Brasil, Stupakoff apresentou seu
trabalho em diversas exposições, a primeira realizada no Instituto Cultural Brasileiro Norte
Americano (ICBNA), em Porto Alegre, no ano de 1955, seguida da exposição fotográfica na
Galeria Oca do Rio de Janeiro, em 1956, e a emblemática exposição, com forte repercussão da
crítica de arte, na Petite Galerie20 em São Paulo, 1963, ocasião em que apresentou fotografias
e colagens (VEIRA, 1963).
Para além da fotografia, mas ainda no âmbito artístico, Stupakoff desenvolveu
outras expressões pessoais em sua trajetória de vida, como uma significativa produção de
colagens e assemblages. Como citado anteriormente, ainda na adolescência, sua primeira
opção de atuação profissional foi com o audiovisual; em 1958, iniciou seus trabalhos em
multimídia e colagens e, em 1963, na pintura (MENDES; ARRUDA, 2001). Apesar de
incursões em outras atividades artísticas, seu foco de produção profissional e expressão
pessoal continuou sendo a imagem fotográfica, para qual julgava ser a fotografia de moda a
única que propiciava ao fotógrafo a oportunidade de se expressar tanto quanto uma
ilustração ou uma reportagem (FERNANDES JUNIOR, 2006).
Se na década de 1950 a fotografia publicitária já desfrutava de significativa
produção no Brasil – com Chico Albuquerque, Milan Alram, Henrique Becherini e Hans
Gunter Flieg, por exemplo –, a produção e divulgação da fotografia de moda ainda era
incipiente. Até meados do século XX, não havia no Brasil publicações especializadas em
moda e era corriqueira a importação de modelos e padrões de vestimentas e acessórios,
especialmente franceses (FREYRE, 1997). Essa prática se refletia no uso nas matérias das
revistas de fotos produzidas fora do Brasil, compradas de agências internacionais como a UPI
e a Dalmas (BONADIO, 2005). Junto a isso, houve uma permanência prolongada do uso da
ilustração de moda em revistas com seções dedicadas ao assunto, com destaque para o
trabalho do estilista Alceu Penna em As garotas, ensaio publicado na revista O Cruzeiro

                                                                                                               
20 Petite Galerie foi uma galeria localizada na Avenida Paulista, 1731, e funcionou entre as décadas de 1960 e 1980.

 
  35

(JÚNIOR, 2011). Frente a esse cenário, Stupakoff atribui a si o feito de ter realizado a
primeira fotografia de moda do país (STUPAKOFF, 2006a):
Jamais havia visto uma foto de moda publicada no Brasil, antes de eu fazer a
primeira. É incrível, porque já éramos uns 100 milhões de habitantes. Pedi
ao Dener (estilista) um vestido emprestado. Coloquei na mala, peguei um
ônibus para o Rio de Janeiro, combinei com minha namorada, Duda
Cavalcanti, e fomos para a casa do Heitor dos Prazeres, amigo pintor e
sambista, que morava numa casa art noveau. Nesse terraço, coloquei a Duda
com o vestido do Dener, que ele havia feito, em 1955. Era um vestido branco
e azul-marinho. Nesse dia, no terraço da casa de Heitor, a Duda vestindo
Dener, foi feita a primeira foto de moda no Brasil. Essa foto, que fiz para
mim, nunca foi publicada. (STUPAKOFF apud ALLEONE, 2012, p.82).
Ainda que o fotógrafo assim o diga, não há evidências
suficientes para confirmar esse fato. A imagem a que Stupakoff se
refere em sua citação não foi encomendada por nenhuma
publicação e teria sido, segundo ele, uma iniciativa pessoal de
experimentação em direção ao desenvolvimento de um estilo e
linguagem próprias (ALLEONE, 2012). No acervo do fotógrafo
salvaguardado pelo Instituto Moreira Salles há uma imagem que se
aproxima da descrição em questão (Figura 4).
No final da década de 1950, ocorreu a revolução do
vestuário no Brasil (MELLO; NOVAIS, 2000) com o
desenvolvimento da indústria têxtil e a introdução dos tecidos
sintéticos no mercado, que reduziram os custos das vestimentas e,
Figura 4. Duda Cavalcanti consequentemente, impulsionaram as coleções de prét-à-porter
em trajes condizentes com
o design de Dener, (BONADIO, 2005). Também houve o crescimento e renovação do
conforme referido por
mercado de revistas especializadas em moda conjuntamente com a
Stupakoff, e fotografada na
casa de Heitor dos introdução de processos de impressão em película de acetato, que
Prazeres. Cartão de Boas
festas. Fonte: Instituto conferiam maior grau de sofisticação à impressão (BRAGA;
Moreira Salles.
PRADO, 2011), favorecendo a apresentação fotográfica.
O cenário do período foi favorável para a veiculação das fotografias de moda. Desde
o princípio, o nome de Otto Stupakoff surgiu como autor em editoriais de revistas, tendo seu
trabalho divulgado nas revistas Jóia, Cláudia, Manchete e O Cruzeiro. Nesses termos, fica
patente que Stupakoff participou da fase de implantação da fotografia de moda no final de
década de 1950; a ele se pode atribuir o pioneirismo na fotografia deste segmento no Brasil
menos pelo controverso ensaio não publicado de 1958 e mais pelos seus publieditoriais –
mistos de editorial e publicidade – realizados para a empresa Rhodia. Stupakoff reitera que “O
mercado de trabalho de foto de moda não existia, foi formado nessa época por Licínio
[Almeida]21, Lívio Rangan22 e eu.” (STUPAKOFF apud MENDES; ARRUDA, 2001, p.10).
                                                                                                               
21 Diretor de arte da Standard Propaganda.
22 Diretor de publicidade da Rhodia.

 
  36

Os publieditoriais da Rhodia eram produzidos pela Standard Propaganda, uma


das mais antigas e estruturadas agências publicitárias do país. Stupakoff foi contratado como
fotógrafo oficial da Rhodia através da Standard Propaganda entre 1958 e 1961 devido à sua
especialidade em publicidade em cores (THORMES, 1960) 23 e fazia parte do núcleo
estruturante das campanhas conjuntamente aos publicitários Júlio Cosi, Licínio de Almeida e
Ivan Meira, que trabalhavam na praça Roosevelt (São Paulo) onde a Standard mantinha um
estúdio fotográfico utilizado por Stupakoff para produzir as publicidades (MENDES;
ARRUDA, 2001; DUAILIBI, 2004).
Ainda no âmbito editorial, Stupakoff iniciou parceria com a editoria Abril
fotografando para capas e aberturas de matérias da revista Cláudia, especialmente para a
sessão A arte de ser mulher de Carmem da Silva (CORRÊA, 2008). Com seu expertise
técnico e uma visão fotográfica moldada na fotografia norte-americana, Stupakoff contribuiu
não somente para a elaboração da fotografia de moda, mas também com a adequação desse
tipo de imagem a um visual mais moderno que essas novas publicações estavam alçando.
A primeira fase profissional de Stupakoff no Brasil foi pautada pela fotografia de
moda, retrato, publicidade e capas de disco. Até aqui se define uma previsão feita em 1956
pelo cronista Jayme Maurício do Correio da Manhã: “Não temos dúvidas em prever para
esse moço Stupakoff uma carreira bem sucedida. Aliás, ele parece saber disso” (MAURICIO,
1956, p. 12).

1.2 Chamado à aventura: a recusa de Mr. Penn e o descrédito de Brodovitch


“Otto, você jamais vai ser um fotógrafo de moda”24

Em meados da década de 1960 ocorre uma bipartição nos interesses de Otto


Stupakoff. Por um lado, ele estava com a carreira fotográfica consolidada, era fotógrafo
profissional no Brasil há pelo menos uma década, tinha fotografado materiais de toda sorte –
publicidade, retratos, editoriais e matérias para importantes veículos impressos –, tinha a
confiança de seus clientes e seguridade financeira. Seu talento e criatividade eram
valorizados por importantes nomes da cena brasileira da criação, como Alex Periscinoto
(publicitário): “Pode existir fotógrafo melhor do que Otto Stupakoff para o gênero de fotos
que ele faz?” (PERISCINOTO apud KOSSOY, 1975, p. 6). Por outro lado, estava insatisfeito
com sua conduta profissional, que parecia não promover seu desenvolvimento criativo
(STUPAKOFF, 1978a):

                                                                                                               
23 Na matéria é mencionado o valor pago a Stupakoff: “Sem a menor dúvida um bom fotografo já pode ficar rico. O

senhor Cícero Levenrath (da Standard Propaganda) contratou o fotógrafo Otto Stupakoff por 150 mil cruzeiros
mensais e mais 20 mil por fotografia. Facilmente o Senhor Stupakoff (que é brasileiro, apesar do nome) chegará
aos 500 mil mensais. A sua especialidade é publicidade em cores.”
24 Frase de Alexey Brodovitch (BRODOVITCH apud FERNANDES JUNIOR, 2006).

 
  37

Um dia coloquei minha produção de 11 anos e olhei tudo. Foi decepcionante.


Tinha poucas fotos boas. Percebi que havia entrado num ciclo em que
importava apenas clientes e dinheiro. Não havia uma busca intelectual.
Faltava complexidade. (STUPAKOFF apud CHIODETTO, 2005, p. 6).
Aquela produção não bastava a ele. Enquanto fotógrafo, em termos junguianos,
Stupakoff fez da fotografia a sua busca pessoal; assim, não estava satisfeito com o patamar ao
qual havia chegado. Não é equivocado dizer que a fotografia teria para Stupakoff um sentido
muito mais subjetivo do que o obtido através da mera realização técnica. Ao ressaltar que não
estava em suas metas profissionais ter na fotografia somente um “meio de ganhar a vida”, ele
evidencia seu interesse por um caminho pessoal, de plena expressão individual e com o qual,
mais do que qualquer coisa, ele pudesse encontrar integridade no trabalho fotográfico.
Frente a este cenário, em 1965 o fotógrafo rompeu com sua trajetória profissional
nacional e familiar – era casado com Catherine Jeanette Josephine De Wit desde 1958 e pai
de Ian (nascido em 1959), Victor (vulgo Bico, 1961), Catherine (vulgo Kitty, 1963) e Tânia
(1965) – e migrou para os Estados Unidos.
Articular especificamente os motivos pelos quais levaram Stupakoff a migrar para
os EUA não compete a essa pesquisa, uma vez que entraríamos em meandros por demais
subjetivos em busca de justificativas pessoais as quais, muitas vezes, nem o próprio
protagonista seria capaz de precisar. No entanto, há como formular conjecturas através das
declarações e atos do próprio Stupakoff. Elas revelam sua insatisfação pessoal como fotógrafo
na medida em que julgava estar menosprezando seu real estilo fotográfico, colocando-se à
mercê da execução de trabalhos que não eram de sua natureza somente para pertencer a
determinado contexto profissional: “Senti que não desenvolveria meu estilo porque de
manhã fotografava carro e à tarde eletrodoméstico. Em Nova York você tem que se
especializar” (STUPAKOFF apud MARRA, 2005, p.3). Em um momento de reflexão que o
fotógrafo denominou “o dia da verdade”, Stupakoff constatou ser ele próprio a única força
que o impulsionava profissionalmente; visto por esse ângulo, o campo fotográfico brasileiro
nada mais tinha a lhe oferecer (STUPAKOFF, 1978a). A escolha por Nova York deu-se em
função da característica cosmopolita e múltipla da cidade, o que lhe ofereceria um leque de
novas perspectivas (STUPAKOFF, 1978a).
É nesse momento de crise que o sujeito pode alcançar novos objetivos – nesse
processo de ariscar-se, em que o criador não se encontra nem aqui (solidificado, confortável
em seu processo) nem lá (algo a devir que ainda não se sabe o que é), ele se desenvolve e dá
continuidade ao que Jung denomina de sua verdade (JUNG, 2001). Em meados dos anos
1960, Otto Stupakoff estava nesse campo do devir, “estar aberto a”.
Dado o seu retrospecto histórico, no entanto, essa não parece ter sido uma
decisão repentina. Mesmo consolidado profissionalmente no Brasil, Stupakoff continuava a
manter relações profissionais com os Estados Unidos, tendo feito visitas ao país desde que

 
  38

saíra da escola de arte em Los Angeles. Assim, podem ser encontrados indícios da propensão
de Stupakoff em tentar carreira no exterior muito antes de 1965: primeiramente houve um
vínculo educacional e de formação profissional pela Art Center School, posteriormente houve
inserções esporádicas do seu trabalho nos Estados Unidos.
Entre 1961 e 1962, ele ofereceu seus serviços de assistente ao fotógrafo Irving
Penn. Na ocasião, Penn recusou-lhe o pedido ao olhar o portfólio de Stupakoff, alegando que
não poderia aceitá-lo como assistente pois seu trabalho já o configurava como fotógrafo
(FERNANDES JUNIOR, 2006). Ainda no início dos anos 1960, Lew Parrella afirmou em
entrevista (MANJABOSCO, 2015) que Stupakoff almejava trabalhar para as revistas de moda
norte-americana, como Vanity Fair e Vogue. Em 1964, ele inscreveu fotografias para o The
New York World’s Fair25 (no Kodak26 Pavilion, Nova York) – um concurso de fotografias em
cores que recebeu cerca de 12oo imagens, das quais 300 foram selecionadas para exposição –
sendo premiado com a medalha de prata (a fotografia foi posteriormente publicada pela Life
Magazine 27 ). Em 1964 28 , Stupakoff viajou
novamente a Nova York e conheceu o curador do
MoMA, John Szarkowski, além do diretor de arte
Alexey Brodovitch e os fotógrafos Richard Avedon,
Art Kane e Louis Faurer (as visitas a esses
profissionais eram agendadas e Stupakoff
apresentava a eles algumas de suas fotos como
meio de obter avaliações) (STUPAKOFF, 2000b).
Nessa viagem, ele também reencontrou uma
antiga namorada, Betsy, com quem realizou uma
série de quarenta e três fotografias que foram base
para as impressões 10,8X15,9 cm coloridas a
mão 29 e doadas ao MoMA em 1966, as peças
Figura 5. Produção de Stupakoff inspirada
no House of card, depositada no MoMA em foram inspirada no brinquedo educativo House of
1966. Fonte: Divulgação/MoMA/ card (Figura 5), dos designers Charles e Roy
Sarah Meister.
 

                                                                                                               
25 Sobre o The New York World’s Fair ver Picture Ahead: a Kodak e a construção do turista-fotógrafo de Lívia

Aquino, publicado via projeto Funarte em 2016.


26 Por se tratar de uma pesquisa que se utiliza da sequência fotográfica como objeto de análise, vale ressaltar que a

Eastman Kodak Company historicamente foi pioneira em seu processo fabril e comercial na produção do filme em
rolo, que por sua estrutura produz sequências fotográficas.
27 Essa fotografia não foi localizada no acervo da Life. Aqui nos baseamos nas informações divulgadas por jornais

da época (O GLOBO, p. 2, 11 ago. 1964) e que apontam para uma retrato de D. Olimpia de Ouro Preto.
28 Em entrevista a Ricardo Mendes e Valdir Arruda, Stupakoff afirma ter feito a viagem em 1963 (mas também

afirma estar confuso com as datas). No entanto, outras fontes apontam para 1964.
29 Sobre a montagem: “as fotos são coladas em um pedaço de papel cartão rígido; atrás é recoberto com um tipo de

papel oriental; os cartões com as fotos são acondicionados em uma caixa de madeira com uma pequena porta”
(STUPAKOFF, 2000b). Nos cartões também constam trechos das cartas trocadas entre Stupakoff e Betsy.

 
  39

Eames30. Ainda em 1964, expõe na The Underground Gallery, no Museu Municipal de Haia
(na Holanda) e na 43ª Exhibition of the Art Director’s Club of New York.
Em Nova York, Stupakoff apresentou como portfólio os retratos, produção vista
por ele como a mais genuína do que havia realizado até o momento (STUPAKOFF, 2000b).
Nesse portfólio, não incorporou nada da sua produção comercial no Brasil, basicamente
porque era desse tipo de trabalho que estava tentando se desvincular. A partir de 1965,
Stupakoff iniciou sua carreira internacional profissional em Nova York, desenvolvendo
durante oito anos trabalhos para agências publicitárias e para as revistas Harper's Bazaar,
Esquire, Glamour, Look Magazine, Twentieth Century, Ladies Home Journal, Town &
Country, Seventeen e McCall’s (STUPAKOFF, 1978c).
Nesse recomeço em terras estrangeiras, Stupakoff se deparou com questões
relacionadas tanto à perda de padrões financeiros estabelecidos em sua zona de conforto no
Brasil quanto à impossibilidade de exercer a mesma posição profissional que possuía aqui,
pois ainda não gozava de prestígio junto ao mercado fotográfico norte-americano. Seus
primeiros trabalhos remunerados nos Estados Unidos foram fotografias para capas de discos
da Columbia Records (STYCER, 2005) e através da docência em fotografia na Parsons School
of Design (em 1966). Instalou seu estúdio fotográfico no Carnegie Hall, Stúdio 1101, local
onde outros fotógrafos de renome, como Art Kane – de quem se tornou amigo – haviam se
estabelecido. Dentro desse ambiente, Stupakoff confessou que “Aqui há um desafio
emergente, mas sem urgência. Reconsiderei, revi, reeditei; confessei os pecados, reorganizei
a alma, renunciei, sobretudo à mentira. Nova York é um processo de exorcismo, de despejar
demônios instalados. Só aqui se recomeça todos os dias [grifo nosso]” (STUPAKOFF apud
VASCONCELOS, 1967, p. 3). Percebe-se que, para o fotógrafo, a ida para os EUA corresponde
a uma busca pelo novo, uma fuga da mesmice do seu trabalho anterior realizado no Brasil.
Ainda em 1965, Stupakoff produziu uma série de cinco comerciais para a Johnson
& Johnson na Venezuela, foi premiado com o The Art Director’s Club de Nova York, e
começou a fotografar para a Look Magazine, Esquire e Glamour.
Seu acesso à revista Harper’s Bazaar deu-se através das fotografias feitas em um
hotel com o ator Oskar Werner (revista Harper’s Bazaar, outubro de 1965) que havia
terminado as filmagens de Jules and Jim, do cineasta francês François Truffaut. Stupakoff
considerava esses retratos como um significativo progresso em sua busca pessoal (MARRA,
2005), tanto que os manteve dentre seus favoritos. Os primeiros trabalhos de moda para a
Harper’s foram editoriais com crianças, India’s littlest ambassadors (março de 1967) e A girl
with a natural style com Leslie Bogart (abril de 1967), filha dos atores Humphrey Bogart e
Lauren Bacall (STUPAKOFF, 1978a). Apesar da descrença de Alexey Brodovitch – ex-editor
                                                                                                               
30 Na criação dos Eameses os cartões com fendas exibem uma grande variedade de fotografias dos reinos animal,

mineral e vegetal de um lado e um asterisco no outro. A House of Cards pode ser montada em conjunto para
formar estruturas em diversos tamanhos.

 
  40

da revista e um dos mais reconhecidos diretores de arte na história do design – na


capacidade de Stupakoff em fotografar moda, explícita em sua frase “Otto, você jamais vai ser
um fotógrafo de moda” (BRODOVITCH apud FERNANDES JUNIOR, 2006, p.161), pois não
amava cada prega e dobra do vestido –, Stupakoff foi capaz de desenvolver sua fotografia
pelas vias da moda, tendo dedicado boa parte de sua carreira a esse segmento.
A parceria com a revista Harper’s Bazaar, entre 1965 e 1972, proporcionou a
Stupakoff um significativo trabalho de moda e retrato. Em Nova York, ele produziu editoriais
e retratou personalidades como Trumam Capote, Sharon Tate, Richard Nixon, Sophia Loren
e Jack Nicholson. A atuação e seriedade profissional rendeu a Stupakoff acesso à Casa Branca
como fotógrafo cadastrado e, com isso, registrou a Primeira Família dos EUA: o presidente
Richard Nixon (revista Ladie’s Home Journal, julho, 1972), a primeira-dama Patricia Nixon
(revista Ladie’s Home Journal, fevereiro, 1972) e sua filha Tricia Nixon (revista Ladie’s Home
Journal, junho 1970). Ainda na Harper’s Bazaar, ele estabeleceu estreita colaboração com a
editora de arte Bea Feitler31, designer carioca que dirigiu a revista na década de 1960, e
também ampliou seus contatos internacionais, intensificando suas viagens entre 1967 e 1968
e fotografando moda e beleza em diversos pontos do mundo (Tahiti, Fiji, Austrália, Java, Bali,
Tailândia, Camboja, Vietnã, Índia, Irão, Grécia, Itália, França e Inglaterra). Essas expedições
a trabalho para as editoras permitiram a Stupakoff também registrar uma vasta diversidade
de imagens para seu portfólio pessoal, tendo em vista a quantidade de viagens e visitas feitas
a lugares e povos diferentes.
A partir do seu estabelecimento como fotógrafo de moda nos EUA, Stupakoff teve
como seus pares na fotografia de moda mundial profissionais como Helmut Newton, Richard
Avedon, Irving Penn, David Bailey, Arthur Elgort, Diane Arbus, Duane Michael, Art Kane,
Hiro e Frank Horvat. Em contato com fotógrafos de renome e diretores de arte criativos,
Stupakoff encontrou abertura para ampliar sua trajetória internacional e expandir sua
perspectiva fotográfica em termos expressivos no que tange ao desenvolvimento de uma
poética própria (conforme discutido no capítulo 4, 5 e 6 desta tese). No Brasil, sua carreira
internacional teve seu mérito reconhecido e ele foi equiparado a Penn e Bert Stern, como
mostram os anúncios da Metz (Figura 6A) veiculado na Folha de São Paulo – “Este é o flash
dos monstros sagrados da fotografia” – e outro para a Novidades Fotóptica – “Essa família
foi salva pela Fotóptica” (Figura 6B).

                                                                                                               
31 Bea Feitler (1932- 1982) foi uma designer e diretora de arte brasileira que consolidou sua carreira em

publicações internacionais como Harper’s Bazaar e Vanity Fair nas décadas de 1960-1970. No Brasil atuou nas
revistas Senhor, início de 1960 e Setenta, 1970.

 
  41

(A) (B)
Figura 6. (A) Anúncio na Folha de São Paulo de 1971. Legenda: “Onde você encontrar um Irving Penn,
um Bert Stern, um Otto Stupakoff ou um Franco Rubartelli, você encontra também um Metz
Mecablitz”32. (B) Anúncio no Diário da noite, outubro, 1968. Legenda: “(...) Na segunda revelada e
copiada, a foto parecia tirada pelo Bert Stern. Ou pelo Irving Penn. Ou pelo Otto Stupakoff.33
Fontes: Reprodução dos jornais/ Acervo Folha/ Acervo Diário da noite.

Ainda em Nova York, ele começou a fotografar para revistas europeias – seu
primeiro trabalho foi publicado na Elle francesa em 1969. E, para além da fotografia e em
consonância com sua busca por diversidade na expressão artística, em 1970 estudou pintura
na Art Students League.
Na década de 1960, a vida pessoal de Stupakoff de certa maneira também
distanciou-se do Brasil. Em 1969, ele se casou com Margareta Arvidsson, modelo suéca e ex-
Miss Universo (premiada no concurso de 1966). Com ela teve dois filhos, Gabriela e Sef
Stupakoff. Além de esposa, Margareta foi parceira em vários dos seus trabalhos fotográficos
profissionais como Ladies’ Home Journal (novembro de 1969), Vogue França (novembro de
1973), Harper’s Bazaar (dezembro de 1972), e séries pessoais (nus).

1.3 Os anos áureos e as grandes viagens na Europa


Entre 1972 e 1976, Stupakoff estabeleceu-se em Paris trabalhando para as revistas
Vogue francesa, italiana, alemã e inglesa, Elle, French, Marie Claire e Votre Beauté, Jardin
des Modes e L’officiel. Também fotografou na Alemanha para agências de publicidade e para
as revistas Brigitte, Freundin, Petra e Stern. Esse deslocamento para a Europa pode ser
atribuído ao sucesso em Nova York, que lhe deu acesso à Paris e Londres, e ao fato dele já
estar constantemente em viagens para o continente europeu nesse período – antes mesmo de

                                                                                                               
32 Anúncio publicado no jornal Folha de São Paulo, Caderno 1, 7 de março de 1971.
33 Anúncio no Diário da noite, outubro, 1968

 
  42

sua ida em definitivo para a Europa, já era solicitado nas revistas francesas. Segundo o
próprio, o seu trabalho no velho continente era algo mais refinado, diferente do “mau gosto
inerente ao puritanismo americano” (STUPAKOFF apud STYCER, 2005, p. 65). Além disso,
dizia que em Nova York o fotógrafo era somente mais um na engrenagem profissional
(MENDONÇA, 1978b).
O início de sua colaboração com a Vogue francesa data de novembro de 1973 com
o editorial Des robes pour les lumières du soir 34 no qual sua então esposa Margareta
Arvidsson participou como modelo. Stupakoff consolidou sua parceria com a Vogue francesa
a ponto de publicar em todas as edições da revista no ano de 1974 e também na edição
especial, realizada em Baden-Baden, na Alemanha, na qual faz um de seus emblemáticos
editoriais (1974). Stupakoff foi reconhecido um dos mais significativos fotógrafos desse
periódico pelo Vogue Book of Fashion Photography (DEVLIN, 1979).
Uma vez na Europa, intensificou suas viagens a diversos lugares do mundo,
principalmente entre 1974 e 1976, pautado para realizar fotografias de editoriais de moda e
retratos de personalidades para diferentes publicações. No período, Stupakoff se auto-
classificou como: “(...) um viajante compulsivo, às vezes compelido” (STUPAKOFF, 1978d,
p.3). Pode-se depreender dessa fala que o compulsivo faz parte de sua personalidade e da sua
contínua propensão a buscar algo novo; as viagens de caráter comissionado permitiam-lhe
realizar esse potencial, ainda que também o forçavam a executar essa ação. No entanto,
apesar da projeção profissional conseguida no continente europeu, Stupakoff permaneceu
somente quatro anos na capital francesa. Declarou não se adaptar a vida na França
(STUPAKOFF, 1978a), o que favoreceu seu retorno ao Brasil.

1.4 O primeiro retorno: Brasil, uma indefinição


“O Brasil não me aceitou de volta”35

O Brasil sempre esteve na rota de viagens de Stupakoff mesmo quando ele estava
baseado em Nova York ou na Europa, tanto por conta do vínculo familiar quanto por ocasiões
profissionais, como na ocasião em que selecionou modelos para as revistas Vogue e Elle em
1973 e 1974 (AMARAL, 1973) e para a Vogue Brasil – Ana Maria de Orleans e Bragança, em
1974.
No final de 1976, após quatro anos na Europa, o fotógrafo fez seu primeiro
retorno ao Brasil após sua bem sucedida carreira internacional. Entre 1976 e 1980, ele
estabeleceu residência em Joatinga, no Rio de Janeiro, e manteve uma base profissional em
São Paulo no edifício Copan. Ainda manteve vínculo profissional com a Vogue francesa e
continuou viajando para diversos pontos do mundo – Ártico, Rússia, Noruega – a serviço das
                                                                                                               
34 Foto apresentada no capítulo 5 (Figura 154C).
35 STUPAKOFF apud STYCER, 2005, p. 65.

 
  43

editoras europeias (MORAIS, 1978). Concomitantemente ao trabalho internacional, produziu


fotografias para grandes empresas brasileiras (Varig, Itaú, Caterpillar e Som Livre).
Ao se repatriar, Stupakoff declarou não conseguir nem mesmo viajar até Nova
York quanto menos se estabelecer novamente naquela cidade (STUPAKOFF, 1978b). Pode-se
estabelecer um paralelo entre um dos possíveis motivos da rejeição à cidade norte-americana
que o acolheu durante nove anos com os de sua partida do Brasil na década de 1960: não
conseguir se realizar plenamente como fotógrafo. Para Stupakoff, naquele momento Nova
York estava estagnada e não lhe oferecia desafios:
Nova York é uma cidade onde vivi nove anos. Eu sei o que me espera, eu sei
quem são as pessoas, eu sei quem vou procurar, quais são as possibilidades
de trabalho que eu tenho. Quanto vou ganhar. (STUPAKOFF, 1978b).
Contrariamente à sua perspectiva profissional no Brasil de 1965, em 1977
Stupakoff considerava que havia vitalidade no mercado fotográfico brasileiro e que se
estabelecer profissionalmente no país era acatar a possibilidade de realizar trabalhos com
mais entusiasmo que em Nova York. O fotógrafo, em carta endereçada ao MASP, afirma que:
“voltei ao Brasil com a intenção de realizar, num outro grau, melhor, o que fiz lá fora”
(STUPAKOFF, 1978c, p. 1).
No entanto, apesar da confiança do fotógrafo quanto às suas possibilidades de
atuar no Brasil, essa prerrogativa não se consolidou nesse seu primeiro retorno. Stupakoff se
deparou com a relutância das revistas e agências de publicidade em lhe encomendar
trabalhos e ficou desapontado por não conseguir desenvolver projetos fotográficos na mesma
intensidade de sua carreira no exterior. Segundo ele, em quatro anos realizou menos de vinte
de projetos, dos quais 10 ele mesmo idealizou36 (STUPAKOFF, 2000b; OLIVANI, 2005);
mesmo esses pequenos números são imprecisos: em Fernandes Junior (2006) consta que
Stupakoff teria executado apenas 12 trabalhos comissionados, inflando-os na expectativa de
convencer potenciais clientes. Um dos motivos levantados para essa falta de atuação
profissional no Brasil foi o fato das pessoas tratarem Stupakoff como um mito e não se
sentirem confortáveis para contratá-lo por receio de que alguns diretores de arte pudesse se
sentir intimidados. Outros ainda entendiam que o fotógrafo fosse muito custoso, dada a sua
experiência profissional internacional (FERNANDES JUNIOR, 2006). Em sua defesa,
Stupakoff alegava trabalhar pelo valor ofertado pelos clientes e que uma possível intimidação
pela equipe era infundada, uma vez que ele se considerava uma pessoa afável durante o
trabalho, afirmação corroborada por terceiros, e.g. Jussara Romão (ROMÃO, 2016 37 ) e
Fernando Laszlo38 (LASZLO, 2017). Os depoentes confirmam que o fotógrafo exibia gentileza

                                                                                                               
36 Entre os trabalhos propostos por Stupakoff às empresas estão as agendas Lion-Caterpillar, 1978 e Varig, 1979.

Também houve uma proposta para a Aços Villares, centrada na figura de Santos Dumont, mas não foi
concretizada.
37 ROMÃO, Jussara. Fonte oral. Depoimento concedido a Patricia Kiss Spineli em 12 mai. 2016.
38 Fernando Laszlo foi assistente de Stupakoff no editorial para a Vogue Brasil de 1989.

 
  44

e fino trato com as pessoas da equipe, sempre educado e delicado. Jussara Romão39, por
exemplo, salienta que Stupakoff era um fotografado generoso, sabia que aquilo que ele estava
construindo, todo mundo estava construindo junto e que a liberdade de criação era total,
porque ele sabia direcionar.
Não obstante os argumentos supracitados, ainda há um estigma do preconceito
do brasileiro em relação ao profissional que alcança sucesso no exterior. Nesse sentido,
Stupakoff cita Carmen Miranda, que não foi bem recebida ao retornar ao Brasil, e também os
conselhos dados a ele por Tom Jobim e Sérgio Mendes, de que seria necessário, para que
fosse continuamente bem recebido aqui, visitar o país ao menos uma vez ao ano, “dar as
caras” (STUPAKOFF apud FERNANDES JUNIOR, 2006).
Também é fato que a fotografia profissional brasileira estava diferente daquela
deixada por Stupakoff quando da sua ida para o exterior em meados dos anos 1960. As
décadas de 1950 e 1960 foram responsáveis pelo “despertar” fotográfico brasileiro de um
modo geral, após um período de semi-hibernação desde o começo do século XX (VASQUEZ,
1986). Isso continua na década seguinte e, no final dos anos 1970, é explícito o aumento de
profissionais especializados, levando ao desenvolvimento de um campo fotográfico mais
complexo no qual passam a coexistir intenções das mais díspares com grande variedade
temática e conceitual (COSTA; SILVA, 2004).
O não acondicionamento em território nacional conjuntamente a diminuição do
seu patrimônio financeiro40 acarretou na nova ida de Stupakoff para Nova York em dezembro
de 1980. Lá se tornou cidadão americano em 1984 e trabalhou até meados da década de 1990.

1.5 As últimas décadas em Nova York: estabilidade e viagens

A ausência de Stupakoff por nove anos dos Estados Unidos resultou na perda do
seu acesso ao mercado norte americano e uma demora de cinco anos para se consolidar
novamente (OLIVANI, 2005). Nesse período, Stupakoff fotografou para revistas menos
reconhecidas e de menor pretensão cultural como a Housekeeping, além de ter produzido
outros trabalhos de menor monta, como catálogos.
Entre as décadas de 1980 e 1990, Stupakoff produziu trabalhos comissionados
para a revista Glamour e para todo território europeu. Ele continuou vindo socialmente e
profissionalmente até o Brasil para realizar trabalhos para a Vogue Brasil (em 1988 e 1989),
Playboy Brasil (em 1980 e 1989) e para o Bradesco (em 1994) (ver capítulo 2).
Nesse período, ele continuou a realizar grandes viagens. Em 1994, produziu,
conjuntamente com seu filho (e também fotógrafo) Bico Stupakoff, um significativo trabalho
                                                                                                               
39Jussara Romão foi parceira no editorial para a revista MIT (junho de 2008).
40Em entrevista, Stupakoff afirma que nesse período no Brasil seu patrimônio diminuiu de 500 mil dólares para
30 mil (STUPAKOFF, 2000d).

 
  45

documental no Camboja para o Cambodia National Trust for land mine victims (FERREIRA,
2004; STUPAKOFF, 201641). Nessa ocasião, fotografou o Balé Real Cambojano, as ruínas de
Angkor Wat, as selvas de Battambang, hospitais militares, os campos de execução usados
pelo Khmer Vermelho42 e a prisão de tortura de Tuol Sleng (material depositado no Instituto
Moreira Salles). Como discutido na sequência dessa tese, para além da fotografia de moda e
do retrato, as produções documentais foram uma vertente do trabalho do fotógrafo.
Há evidências de que o fotógrafo não se tornou totalmente imêmore no país
mesmo fora do Brasil. Para a 20ª Bienal Internacional de São Paulo, de 1989, teria uma Sala
de Retratos sob a curadoria de Rosely Nakagawa, que não foi montada devido à falta de
patrocínio, mas que apresentaria obras de Stupakoff junto a outros fotógrafos. Em 1991 e
2003, as edições 1 e 12, respectivamente, da Coleção Pirelli/MASP de fotografia
incorporaram e apresentaram imagens de Stupakoff. Em 1985, o MAC/USP apresentou
algumas fotografias de Stupakoff em uma retrospectiva da produção fotográfica dos anos
1960 – Fotografia e os Anos 60 – no espaço Fotóptica MAC/USP. Em 1991, a Galeria
Fotóptica realizou exposição coletiva com uma seleção de destacados fotógrafos brasileiros,
incluindo obras de Stupakoff. Essas exposições mostram que, apesar de não atuante ou
mesmo presente no país, Stupakoff e sua obra mantiveram-se na mente de algumas pessoas e
na memória da fotografia nacional.

1.6 Renascence Man43: o fim da trilha e a volta definitiva para casa


“Toda viagem te leva de volta para casa. Não importa onde você vá”44

O fotógrafo diminuiu significativamente sua atuação na fotografia em meados da


década de 1990 e se dedicou à pintura, colagens, esculturas e desenho (CHIODETTO, 2005).
Justificava que, como artista, podia por momentos “desligar-se” da fotografia e dedicar-se a
esculpir, fazer cinema, vídeo, pintar ou escrever: coisas que fez de tudo um pouco. Para ele, o
impulso de mudar de pele, como uma cobra, é o que faz o artista mudar de direção e saltar
sobre abismos que aparecem entre uma forma de arte e outra (FERREIRA, 2004). Nessa fase
realizou algumas exposições nos Estados Unidos. Em Hurley (EUA), onde residiu nos anos
2000, Stupakoff manteve um estúdio e se integrou à cena artística da região. Inseriu-se em
uma organização de arte sem fins lucrativos que fazia parte da Galeria de Coffey, e previa a
visita nos ateliês de artista: "É uma maneira de me familiarizar (com a área) e as pessoas se
familiarizarem comigo”(STUPAKOFF apud EDWARDS, 2002, p.17).

                                                                                                               
41 STUPAKOFF, Bico. Fonte oral. Depoimento concedido a Patricia Kiss Spineli em 14 abr. 2016.
42 Na época, o Camboja ainda apresentava grupos remanescentes da ditadura comunista do Khmer que
combatiam o novo governo de coalizão (pró-Vietnam e rebeldes). Esses soldados prenderam e interrogaram Otto
e Bico Stupakoff (STUPAKOFF, 2006a).
43 Título usado pelo próprio Stupakoff em decorrência de sua volta ao Brasil em 2005.
44 STUPAKOFF, 1978a.

 
  46

Apesar de se dedicar a outras expressões artísticas somente nas últimas décadas,


essas foram presentes em sua vida desde sua aproximação com grupos artísticos de São Paulo
na década de 1960, como citado anteriormente. A propensão à expressão gráfica esteve com
ele desde a infância (Figura 7).
O fotógrafo que deixei de ser é aquele que ainda sou: o que pensa,
consciente. (...) Sinto-me mais livre agora que vejo o pensamento como
sendo a semente do artista, que tenho mais acesso a um interior infinito, que
minha alma realmente treme ao se deparar com os mistérios da vida. O amor
que se libera em meu trabalho é o único permanente” (STUPAKOFF apud
HARA; WOLFENSON, 2002, p. 45).

A reflexão de Stupakoff sobre o próprio trabalho


nos permite entender que, para ele, existe um pensamento
artístico não condicionado a um único meio de expressão,
mas que se materializa de diversas formas. Para ele, arriscar-
se em outras expressões é atuar como um chef de cozinha que
forja novas receitas e não se atem sempre às mesmas
(FERREIRA, 2004).
O distanciamento de Stupakoff da fotografia
também pode ser entendido à luz de outros fatores: seus
trabalhos comissionados diminuíram drasticamente, ao que
ele atribuiu à sua entrada na velhice, dizendo que as pessoas
associam velhice à ideias antiquadas45 e que um fotógrafo
mais idoso seria preterido em relação aos mais jovens, pois
Figura 7. Foto recuperada de estes pretensamente teriam ideias mais contemporâneas,
seu HD pessoal mostrando
principalmente no ambiente da moda, tido como de enorme
Stupakoff com o pai. O título
da imagem é “drawing”. Fonte: vitalidade (STUPAKOFF, 2000d; FERNANDES JUNIOR,
Instituto Moreira Salles
  2006) .
Também a indústria da moda adquiriu novos contornos nas últimas décadas do
século XX. A partir de 1980, ampliou-se a ‘profissionalização’ no campo da moda no sentido
de emprego de mais profissionais segmentados (e.g., produtora de moda, diretor artístico)
levando a um aumento na quantidade de fotógrafos no mercado e do conjunto de
profissionais por trás da foto46. Com isso, houve uma descentralização na criação do fotógrafo
e uma mudança no lidar com fotografia de moda, assim explicadas por Anna Wintour em
1988 (editora-chefe da Vogue norte-americana):

                                                                                                               
45 Salvo alguns fotógrafos como Richard Avedon que fotografou até o final da vida para as melhores publicações:

“Mas ele era um gênio, eu não sou” (STUPAKOFF apud STYCER, 2005, p.66).
46 Somado a isso, Stupakoff relata que, por contingência econômica, no final de 1970, as revistas concediam aos

anunciantes mais espaços nas matérias de moda e os editores pautavam a matéria em função de um cliente
específico. Com isso: “A influência econômica alterou algo que era expressão artística” (STUPAKOFF, 2000b).

 
  47

Nossas necessidades são simples. Queremos que o fotógrafo pegue um


vestido, faça a menina parecer linda, mostre-nos muitas imagens para
escolhermos e não mostre nenhuma atitude (...) os fotógrafos – se eles são
bons – querem criar arte” (WINTOUR apud FREEMAN, 2013, p. 65).

A fala de Wintour converge com a prática dos anos áureos de Stupakoff e de


outros fotógrafos do mesmo calibre, em que a fotografia de moda era concebida pelo
fotógrafo e pelo diretor de arte: “Quando eu fotografava, ficávamos apenas eu, a modelo e,
quando muito, o assistente de luz. Hoje tem o cabeleireiro, a produtora...” (STUPAKOFF
apud ANDRADE, 2005, p.1). De certa forma, o fotógrafo escolhia a moda, aprovava os
detalhes antes de ir para a direção de arte e a editora só via o trabalho já pronto
(STUPAKOFF, 2000b).
Stupakoff também afirmou que o poder da editora de moda era limitado –
basicamente o de vestir a modelo – e classificou como “íntimo e sagrado” (STUPAKOFF apud
HARA; WOLFENSON, 2002, p. 42) o momento de fotografar, assim como relatou que, até a
década de 1970, não acontecia o que Richard Avedon chamava de ‘invasão de domicílio’,
circunstância em que há a intromissão da produtora e outros tantos membros da equipe na
criação do fotógrafo (FERNANDES JUNIOR, 2006).
Chega-se então a campos de força contrários: de um lado Stupakoff ansiando em
manter o processo de criação centrado no fotógrafo, de outro, um mercado modificado com a
absorção de novos profissionais e a divisão da criação fotográfica entre eles. Frente a esse
cenário, na década de 1990 Stupakoff demonstrou insatisfação com os modos de criação da
fotografia de moda. “Nos anos 90 comecei a me interessar cada vez menos por fotografia por
não ter mais liberdade para ser criativo” (STUPAKOFF apud ANDRADE, 2005, p. 1).
No período, uma série de acontecimentos de monta pessoal – como excessivo
gasto médico com sua última esposa Norma Fidalgo (que veio a falecer em fevereiro de
1998) – trouxeram complicações financeiras para o fotógrafo. Uma de suas últimas
residências no exterior firmou-se na cidade de Hurley 47 , e, por último, em Bangkoc
(Tailândia), por oito meses no ano de 2005. Em todos esses lugares, Stupakoff dispôs de
parcos recursos financeiros.
Em 2002, na cidade de Hurley, já sem trabalhar com fotografia, foi contatado
pelo fotógrafo Bob Wolfenson e pelo jornalista Hélio Hara para uma entrevista ao número de
estréia da revista S/Nº. A partir desse encontro houve uma mobilização por parte de
Wolfenson e do também fotógrafo Fernando Laszlo para o resgate e restabelecimento da obra
de Stupakoff.
Laszlo organizou uma exposição na galeria Espasso em Nova York com as
fotografias de arquitetura produzidas por Stupakoff na década de 1950, a fim de angariar
                                                                                                               
47 A última morada de Stupakoff nos EUA foi na cidade de Wellesley (Massachusetts). Em entrevista o fotógrafo

também menciona que tinha intenção de residir novamente no Rio de Janeiro em 2001; chegou a alugar uma casa
no Leblon, mas desistiu (STUPAKOFF, 2000d).

 
  48

fundos para o fotógrafo. Por outro lado, iniciou-se um levante para uma exposição de maior
monta no Brasil. Essa exposição, com curadoria de Wolfenson e Laszlo, aconteceu em 2005
como uma homenagem a Otto Stupakoff na São Paulo Fashion Week na mostra Moda sem
Fronteiras (CHIODETTO, 2005).
A visibilidade e a valorização de Stupakoff aumentou no país em decorrência da
mostra Moda sem Fronteiras. Essa exposição marcou a retomada e uma nova ascensão de
Stupakoff na fotografia brasileira, além de marcar sua volta ao Brasil. Mais que uma
homenagem, a exposição despertou interesses diversos sobre o fotógrafo, que passou a
produzir editoriais e publicidade, lecionar na Escola Panamericana - SP, e atuar como
personagem central em entrevistas entre 2005 e 2008. Nessa ocasião, Stupakoff diz ter
“chegado ao fim da trilha, no fim de minhas aventuras depois de correr o mundo inteiro”
(STUPAKOFF apud OLIVANI, 2005).
Otto Stupakoff faleceu em 22 de abril de 2009 de causa não divulgada.

1.7 Exilir: o continuar a existir por sua obra


"(...) descobertos pelos porteiros no dia da última faxina"48

Uma questão primordial na vida de qualquer artista, particularmente próximo a


morte, é como salvaguardar e perpetuar sua obra. A frase da epígrafe se refere a um
infortúnio comum ao acervo de artistas: ter a produção da vida desprotegida e renegada sem
que algum cuidador a acolha e a preserve.
Nos anos 2000, houve um movimento por parte de Stupakoff para que seu
material fotográfico fosse repassado a terceiros que se responsabilizassem pela sua
conservação. Fernando Laszlo, que acompanhou de perto esse processo, afirma que
Stupakoff por vezes direcionava esse material a pessoas ou instituições – caso do Museu de
Arte Moderna de São Paulo, que não acolheu o material por indisponibilidade de meios para
conservar matrizes na instituição (LASZLO, 2017). Também houve interesse das Fundação
Armando Álvares Penteado (FAAP) que não se concretizou.
Se o artista vive através de sua obra, Stupakoff “(...) já estava imortalizado pela
sua obra, que não vai ser mais esquecida” (WOLFENSON apud MORRE..., 2009, p.8). Em
setembro de 2008, Stupakoff repassou ao Instituto Moreira Salles (IMS) todo o acervo
fotográfico que tinha em mãos. Dentro de um contexto de salvaguarda, o IMS tem como
missão manter, conservar e disponibilizar para pesquisa esses materiais fotográficos.
Como legado, Stupakoff também teve produções incorporadas em museus como
MoMA, MASP e MAM, e, por quatro décadas (de 1960 a 2000), mostras coletivas e
individuais internacionais e nacionais apresentaram suas obras (ver Apêndice II). Dentre os

                                                                                                               
48 Em: http://styleforallkind.blogspot.com.br/2009/02/otto-stupakoff-no-ims.html.

 
  49

destaques dessas mostras há: The Best of Harper's Bazaar (Doubleday Gallery, Nova Iorque,
em 1970); São Paulo Fashion Week (Pavilhão da Fundação Bienal, São Paulo, em 2005); Otto
Stupakoff: fotografias, em 2009, e Beleza e inquietude, em 2017, ambas no Instituto
Moreira Salles (a primeira no Rio de Janeiro e em São Paulo; a segunda no Rio de Janeiro e
programada para ser reapresentada em São Paulo no ano de 2019). A obra de Stupakoff está
também apresentada em suas publicações para revistas e anúncios, além de reunida em
livros como Fotografias Otto Stupakoff (1978), Otto Stupakoff (2006), Rio erótico (2006),
Sequências Otto Stupakoff (2009), A hora e o lugar (2015) e uma possível publicação via
Instituto Moreira Salles em 2018 (BURGI, 2017)49.
Em um texto para o jornal O Estado de São Paulo (datado de 12 de dezembro de
2006), o jornalista Antônio Gonçalves Filho adjetiva a vida e trajetória de Otto Stupakoff
como pendulares (GONÇALVES FILHO, 2006). Um pêndulo, pela descrição do objeto, é um
dispositivo que consiste em uma massa puntiforme presa a um fio que oscila em torno de um
ponto fixo. O movimento pendular, nesse caso, é algo que proporciona movimento e variação
dentro de um espaço e contexto específicos; a massa puntiforme, ao final, sempre retorna ao
ponto fixo. A análise apresentada no correr do presente trabalho, no entanto, destoa dessa
interpretação. Um pêndulo não é algo que represente Stupakoff. Ele alçou movimentos largos,
de ruptura, de transformação. Suas voltas não eram para um centro fixo, pois este não se
fixou propriamente, seus retornos eram para lugares já transformados. Uma melhor
metáfora para a vida e obra de Stupakoff seria um atrator estranho (GLEICK, 2008), que
pode ser definido como o conjunto de comportamentos característicos para o qual um
sistema dinâmico evolui, nunca voltando exatamente para a mesma posição inicial e sim para
posições análogas modificadas.
Se pudermos falar de consistência no trabalho de Stupakoff, essa seria em relação
a sua visão de mundo, modo de pensar e coerência de expressão usando a fotografia. É
possível que alguns quesitos de sua estética fotográfica tenham mudado ao longo do tempo,
fruto do amadurecimento e prática profissional. Mas entre essas mudanças, a linha
condutora sempre foi a sua fidelidade em relação ao seu trabalho, a ser ele mesmo. O
embrião do que é Otto Stupakoff estava virtualmente estabelecido desde suas primeiras
incursões na fotografia, e que a evolução desse embrião (no sentido do seu desenrolar)
ocorreu de acordo com o ambiente e escolhas pessoais que o fizeram ser Otto Stupakoff.
Stupakoff e o fotógrafo Thomas, personagem de Blow-up de Antonioni, não se
assemelham por conta do glamour e da sensualidade: de fato, a identificação mais próxima
entre ambos está na prática da fotografia como algo espontâneo e cotidiano que reflete a
busca pelo conhecimento. O uso da fotografia como ferramenta para conhecer o mundo e
registrar temas para além da fotografia de moda e publicidade.
                                                                                                               
49 BURGI, Sérgio. Fonte oral. Depoimento concedido a Patricia Kiss Spineli em 18 de jan. 2017.

 
  50

Ainda estabelecendo um paralelo com a ficção, outro personagem próximo de


Stupakoff é o fotógrafo Finn do filme Palermo Shooting, dirigido por Wim Wenders (2008) .
A aproximação de ambos ocorre pela forte presença do inconsciente, tanto nos respectivos
processos criativos quanto na compreensão do si mesmo, como também no alargamento da
expressão fotográfica para além da foto de moda e publicidade. Assim como Finn, Stupakoff
se lança na fotografia de rua à procura de outros distantes (pessoas, culturas). Para aquilo
que Finn produz em Palermo, Stupakoff o faz no Camboja, por exemplo.
Dado esse perfil biográfico dividido em fases, tendo a narrativa do monomito
(CAMPBELL, 1989) como norte da apresentação, a trajetória traçada demonstra os caminhos
percorridos por Stupakoff para viver sua jornada pessoal. Aqui, foram destacadas algumas
ações chave significativas nesse trajeto e que se refletem na construção de sua obra (como
será argumentado posteriormente nesta tese). Em uma interpretação livre, sua jornada se
inicia na sua primeira viagem para estudar nos EUA; o chamado à aventura (nos termos de
Campbell) corresponderia a seu estabelecimento profissional e pessoal em Nova York em
meados da década de 1960. Ainda na década de 1970, Stupakoff revelou aspectos de sua
jornada interior em busca do autoconhecimento ao constatar que toda viagem levava a si
mesmo, não importando o lugar no qual se estivesse (STUPAKOFF, 1978d). Nesse constante
buscar, em que “cada novo horizonte a que se chega revela um novo horizonte à distância”
(STUPAKOFF, 1978d, p. 2), imprime-se a inquietação como uma característica constante de
sua vida: “A medida que fico velho, sinto um imenso prazer de não ter raízes profundas em
lugar nenhum” (STUPAKOFF apud LACERDA, 1990, p. 4).
Para Campbell (1990), o final da jornada é a conquista da sabedoria. Em
Stupakoff, pode-se entender que, no fim de sua trajetória, ele de fato conseguiu êxito não
apenas do ponto de vista profissional, mas também na capacidade de entremear a fotografia
– e outras expressões artísticas – à sua própria vida, tendo reconhecido explicitamente sua
responsabilidade social mediando a relação com o mundo através da expressão fotográfica.

 
  51

CAPÍTULO 2

2. A  produção  de  Stupakoff:  acervo  no  IMS,  fotografia  aplicada  e  exposições  


Um mapeamento da obra de Otto Stupakoff pôde ser realizado através do acesso
ao material depositado no Instituto Moreira Salles - RJ, no qual se centra essa pesquisa. No
entanto, como dito anteriormente, o material do IMS não contempla toda a obra do autor, o
que torna necessário, para que a obra de Stupakoff seja vista de uma forma mais abrangente
e precisa, apresentar também material complementar ao do acervo do instituto.
Os trabalhos comissionados e as exposições foram os principais meios para
visualização das imagens de Stupakoff. É notório que as suas séries fotográficas mais
conhecidas são as de moda e retratos de pessoas do meio político e artístico; entre as obras de
Stupakoff menos conhecidas, mas não menos importantes, estão seus retratos de
desconhecidos, nus femininos, viagens, família, still life e instantâneos de rua – retomadas
após 2005 em decorrência do retorno do fotógrafo ao Brasil – da organização de exposições e
dos lançamentos dos livros Otto Stupakoff (FERNANDES JUNIOR, 2006) e Sequências:
Otto Stupakoff (INSTITUTO MOREIRA SALLES, 2009a).
Para além do material constante do acervo do IMS (que inclui negativos e folhas
de contato), o processo de pesquisa da obra de Stupakoff para o presente trabalho resultou
no resgate de imagens que são amostras do universo fotográfico do fotógrafo. Aqui, elas serão
apresentadas e descritas no formato em que foram veiculadas – material publicitário,
editoriais de moda, matérias em revistas nacionais e internacionais, calendários, discos,
arquitetura e fotografias para livros de arte – e não como matrizes fotográficas. Nesse sentido,
o material discutido é aquele aplicado no veículo de comunicação e não a sequência
fotográfica produzida.
O escopo deste material abrange uma diversidade fotográfica que inclui
fotografias em publicações de menor apelo cultural e/ou de menor visibilidade mas que
também representam importante vertente da produção de Stupakoff. Se por um lado o
fotógrafo se faz por suas imagens célebres, por outro, ele também tem um material com alta
qualidade fotográfica que nem sempre tem o apelo das imagens proeminentes. Uma amostra
de imagens remanescentes não contempladas neste tópico foram acondicionadas na tese
como material complementar e apresentadas nos Apêndices, assim como uma lista de
revistas com fotografias de Stupakoff. Ainda no final do capítulo, também são descritas
algumas de suas exposições no Brasil, pois destacamos a importância destas para a
visibilidade pública de sua produção e a relevância das mesmas para o próprio fotógrafo.
Nesse capítulo procuramos dar conta da amplitude de atuação fotográfica de Otto
Stupakoff que não se restringiu à área da moda, ainda que esse tenha sido um interesse do
fotógrafo por toda a sua carreira.

 
  52

2. 1 Conservação e pesquisa no Instituto Moreira Salles


Os acervos de fotógrafos no Brasil são formados por meio de coleções privadas
(TACCA, 2015) e de instituições públicas ou privadas. Esses acervos, normalmente, são
constituídos pela determinação de um foco: um estilo, escola, suporte, época ou grupo, e as
coleções são encorpadas via aprofundamento de um determinado setor da arte fotográfica
(CHIODETTO, 2010).
São poucas as instituições brasileiras que oferecem condições para acondicionar e
conservar acervos de material fotográfico de grande monta. Em comparação à manutenção
de outros tipos de obras visuais, como a pintura, a conservação do acervo fotográfico não se
pauta na ideia de preservação da obra como única, que não pode ser realizada novamente,
mas sim na conservação da matriz fotográfica que pode gerar diversas reproduções.
O Instituto Moreira Salles (IMS), em sua vertente para a área de fotografia,
representa a introdução de um modelo de agente cultural que é o de resgate de acervos de
grande porte, reunindo extensos conjuntos produzidos por determinados fotógrafos e
favorecendo a preservação da memória fotográfica brasileira, uma vez que tanto arquivos
quanto bancos de imagens são “geladeiras da memória” (KOSSOY apud ENTLER, 2012). O
IMS normalmente apresenta amplo enfoque na montagem de suas coleções – há uma
variedade de estilos, épocas, suportes e autores. Essas várias vertentes, e o volume generoso
de imagens depositado nas suas coleções, fazem do IMS um importante detentor de
informações de fontes primárias que podem ser utilizadas na pesquisa acadêmica.
O acervo fotográfico do IMS começou a ser formado em 1995 com a aquisição da
coleção Mestres da Fotografia Brasileira do Século XIX e negativos de Claude Lévi-Strauss
com imagens de São Paulo, um conjunto inicial com cerca de 2600 imagens (BURGI, 2013).
O acervo tem sido ampliado ao longo dos anos, com destaque para o acréscimo maciço de
mais de 850 mil imagens em 2013 (dentre as coleções importantes do IMS estão, por
exemplo, a obra completa do fotógrafo franco-brasileiro Marc Ferrez) e a incorporação em
2016 dos arquivos pertencentes ao Diários Associados (cerca de 300 mil negativos e 700 mil
impressões).
O instituto também formou um conjunto relativo à produção fotográfica
brasileira da primeira metade do século XX e tem um crescente número de autores mais
contemporâneos. Entre eles está o objeto de estudo do presente trabalho, Otto Stupakoff. O
acervo de Stupakoff, assim como o de todos os fotógrafos resgatados pelo IMS, está reunido
na Reserva Técnica Fotográfica do Instituto Moreira Salles, na Gávea, Rio de Janeiro.
Os princípios básicos para se estabelecer uma coleção são coletar, pesquisar,
preservar e difundir (MENDES, 2002, p. 19). O IMS tem a função de acondicionar, catalogar
e preparar para a pesquisa todo material de determinado autor. A salvaguarda desse material
fica condicionada à decisão de como ele será catalogado, refinado e disponibilizado aos

 
  53

pesquisadores internos e externos à instituição. O processo de formação das coleções


apresenta variações de acordo com o objeto, o contexto e a matriz. Segundo Sérgio Burgi
(s/d), coordenador de fotografia do IMS, as coleções fotográficas do instituto procuram
representar a obra completa, a trajetória, a carreira e as questões autorais de seus fotógrafos.
Sobre coleções fotográficas Entler pondera que:
Diante da insuficiência de uma imagem fotográfica, a coleção é, ao mesmo
tempo, uma forma de dar ao olhar o tempo e os instrumentos necessários à
interpretação, uma tentativa de recompor contextos por meio da associação
com outras imagens (ENTLER, 2012, p.141)
No caso de material fotográfico, o IMS promove a digitalização do acervo e, com
isso, permite a visualização digital e on-line do seu conteúdo. Como critério para a
digitalização, são mantidos todos os fotogramas que fazem parte de uma série. A tendência
do instituto é considerar todos os fotogramas que apresentam imagem mínima, mesmo que
tenham apenas uma indicação ou um resquício de imagem (ALBERTINI, 20141).
Depois de recebidas as coleções do fotógrafo, todo o trabalho é feito para
preservar os originais. O objetivo principal é a conservação das matrizes.
Antes de irem para as salas apropriadas, que são reservas técnicas
climatizadas ou câmaras de baixa temperatura no Rio de Janeiro, é realizado
um trabalho de pesquisa, um acondicionamento preliminar para poder
digitalizar e depois pesquisar, catalogar e definir o arranjo como um todo.
Após essa primeira fase são feitas a higienização e o acondicionamento
definitivo para a guarda na câmara fria, onde permanece preservado em
baixíssima temperatura (16 graus negativos) (ALBERTINI apud INSTITUTO
MOREIRA SALLES, 2009b).
Todo material que chega ao IMS é catalogado e arquivado de forma a fazer
sentido na organização daquele conjunto para conservação e para o uso dos pesquisadores
internos e externos. Essa organização é sistematizada pela equipe do instituto e cada coleção
recebe determinado tratamento.
Em minha primeira visita em 2014 ao Instituto Moreira Salles para visualizar o
arquivo de Otto Stupakoff, presenciei sua manutenção e organização mais “pura”, i.e, muito
próximo de como o fotógrafo havia entregado seu material ao instituto e pouco trabalhado ou
modificado pela instituição mantenedora. Nesse primeiro momento, havia a tendência de se
manter os conjuntos na maneira como o fotógrafo os teria organizado e catalogado.
Posteriormente, já em 2017, com o acervo digitalizado, constatei a manutenção de uma
organização que contempla as particularidades e o cuidado que Stupakoff teve para preparar
seus arquivos. Isso evidencia ao pesquisador a ordenação do próprio Stupakoff, que é
significativa para entender o olhar do fotógrafo frente a sua obra.

                                                                                                               
1 ALBERTINI, Virginia. Fonte oral. Depoimento concedido a Patricia Kiss Spineli em 1 jun. 2014.

 
 
  54

2.2 O material fotográfico de Stupakoff no IMS e sua organização


Derrida (2001) indica o arquivo como uma narrativa construída a partir de um
pensamento dominante que pretende instituir a verdade, a regra e a lei, mas é somente uma
possibilidade de construção discursiva. De certa forma, todo acervo ou coleção é resultado de
uma seleção que elege certos materiais e exclui outros. Essa configuração exerce um poder
informacional que prima por uma determinada ordem na apresentação da informação. No
entanto, a formação de um determinado arquivo não esgota esse conhecimento.
Ao mesmo tempo, “o arquivo ideal deveria resgatar seu aspecto de coleção, e a
singularidade dos fragmentos que a compõe é mais forte que o método que busca, através das
categorias abstratas, dá a este um sentido preciso” (ENTLER, 2012, p. 144).
O acervo de Stupakoff do IMS configura-se por um recorte de tempo (1955-2005)
e daquilo que o fotógrafo tinha em mãos da sua própria obra. Mesmo que de forma não
intencional, ao se selecionar o que será depositado no acervo (pelas contingências da vida –
perdas, doações, retenção em agências), alguma porção do material foi excluída. A despeito
disso, há um movimento por parte do IMS de se resgatar toda a obra do fotógrafo, além da
manutenção permanente da pesquisa, identificação e catalogação das suas imagens, e da
higienização e digitalização do material. Nesse acervo, ainda há lacunas e informações
incompletas e algumas das imagens não têm datação, local e propósito2. Segundo Albertini:
A maioria das vezes é um trabalho de busca, de investigação, de arqueologia
mesmo, vamos juntando as informações, para construir, dar sentido,
identificar uma imagem e contar uma historia. Nas coleções em que o autor
está ausente, trabalha-se no silêncio, com lupa, para captar, nas imagens,
elementos para melhor entender o caminho do artista. Todo o nosso esforço
para entender e traduzir o percurso do autor, numa sequencia de imagens
estruturada e codificada, visando a uma leitura mais próxima possível da que
o autor concebeu (ALBERTINI apud INSTITUTO MOREIRA SALLES 2009b).
Os críticos de processo passam por processos semelhantes, independentemente
da área de atuação, sendo que o primeiro momento da pesquisa é a organização do material
(GRÉSILLON, 1999).
A primeira iniciativa para reunir o acervo fotográfico de Stupakoff foi realizada
pelos fotógrafos brasileiros Bob Wolfenson e Fernando Laszlo na ocasião da realização do
São Paulo Fashion Week de 2005 (WOLFENSON, 2009). Segundo Wolfenson, o acervo
estava pulverizado entre a residência do fotógrafo e de alguns dos seus filhos. Laszlo, que
na ocasião residia em Nova York, cuidou da logística e do resgate desse material, enviando-
o ao Brasil.
Em setembro de 2008, Stupakoff concluiu o trâmite para repassar a salvaguarda
de seu acervo fotográfico ao IMS. Esse acervo conta com aproximadamente 16.000 negativos

                                                                                                               
2 A despeito disso, Stupakoff contribuiu para identificação de seu material em vida através de anotações pré-

existentes no próprio material ou auxiliando os curadores da SPFW indicando contexto e legenda para as fotos
que seriam expostas.

 
  55

e diapositivos3. Integram esse espólio: folhas de contato, diapositivos, negativos 35mm,


negativos 6X6, 8X10, 4X5 e cópias fotográficas4 realizadas entre 1955 e 2005. O volume
maior desse material constitui-se de imagens em preto e branco em negativos de 35mm. Em
menor quantidade estão imagens coloridas em diapositivo e em negativos 35mm, e os
negativos em médio e grande formato.
Nesse acervo, as imagens abordam moda e retratos de pessoas do meio político e
artístico produzidos para revistas estrangeiras e sequências de moda e retratos produzidos
para revistas brasileiras. Entre o material ainda podem ser encontrados outros conjuntos
como retratos de desconhecidos, nus, instantâneos de rua, fotografias das inúmeras viagens
feitas por Stupakoff pelo mundo e fotos de família, além de alguns abstratos e paisagens.
Ainda que bastante diversa em temas, a obra de Stupakoff depositada no IMS não
é abundante em termos numéricos, tendo em vista seus mais de cinquenta anos dedicados à
fotografia. É importante destacar, no entanto, que o material depositado no instituto não
contempla toda a obra do autor. A observação do acervo lá depositado permite concluir que
vários dos seus fotogramas estão ausentes em alguns conjuntos os quais, no decorrer da
pesquisa para o presente trabalho, foram analisados através de imagens publicadas.
Essas lacunas são muitas vezes decorrentes da retenção das matrizes fotográficas
pelas agências e produtoras, pois os fotógrafos comissionados, por vezes, cedem seus
negativos aos contratantes e nem sempre ficam com sua produção. Também acreditamos que
parte desse material tenha se perdido quando Stupakoff se desfez de uma fatia significativa
de sua produção, ainda na década de 1960. Ainda, dado o fato do fotógrafo ter se deslocado e
residido em diversos cidades e países ao longo da vida, esse percurso pode ter contribuído
para o desaparecimento de ao menos parte do seu material – é sabido, como apresentado em
seu perfil biográfico no capítulo anterior, o seu apreço pela mobilidade e liberdade; sua
bagagem limitava-se a duas malas pequenas, sendo que maior parte dos seus pertences foram
sendo repassados aos filhos (ANDRADE, 2005).
A transferência do seu acervo fotográfico ao IMS foi negociada e realizada pelo
próprio Stupakoff, que também foi quem organizou o material antes de repassá-lo à
instituição. Segundo Virginia Albertini, antiga coordenadora-assistente do acervo fotográfico
do instituto, essa organização prévia realizada por Stupakoff não é algo comum nas
concessões, pois grande parte dos fotógrafos entrega suas coleções sem muita sistematização
ou diretrizes para a organização do material (ALBERTINI, 2014). A despeito dessa impressão
de Albertini, em 2000 Stupakoff relata que seu material ainda não estava devidamente
organizado, e que precisava aprender a catalogar e providenciar uma serviço especializado
para auxiliá-lo nisso (STUPAKOFF, 2000a).

                                                                                                               
3 Diapositivos, também conhecidos como cromos, são filmes positivos.
4 De algumas imagens há somente a cópia, sem o negativo.

 
  56

A organização pessoal feita por Stupakoff segue a seguinte ordenação: alguns


negativos foram divididos em duas caixas pretas denominadas pelo IMS como Caixa 1
(Figura 8A) e Caixa 2 (Figura 8B); em ambas as caixas o conteúdo é composto por negativos
acondicionados em porta-negativos (print file5).

(A) (B)
Figura 8. Caixas de Stupakoff no IMS. (A) Caixa 1: primeira seleção de Otto Stupakoff.
(B) Caixa 2: segunda seleção de Otto Stupakoff. Fonte: Fotos da autora/Exposição no Instituto
Moreira Salles 2016-2017.

Na Caixa 1 (Figura 8A), que diz respeito à primeira seleção de Stupakoff, o


fotógrafo escreve: “Minha seleção negativos 1955-2005”, “Total negativos escolhidos como os
mais importantes para serem scaneados em alta (1 cópia para o fotógrafo) e, os originais
preservados: 148 35mm”, e ainda “Minha seleção negativos 1955 – 2005”.
Nessa Caixa 1, os print files estão soltos em determinada sequência, que não fica
evidente per se se é aleatória ou se expressa algum grau de importância para o fotógrafo. São
negativos em 35 mm correspondendo a determinados trabalhos de moda, retratos,
fotografias de família, nus, viagens e instantâneos de rua com datação variada. Na Caixa 1,
nem todas as sequências estão completas, com parte da série disposta nessa primeira seleção
e outra parte na Caixa 2 ou em envelopes. O fotógrafo normalmente indicava no print file o
título do trabalho. Exemplo: “Bazaar: Leslie Bogart”. É comum observar uma marcação em
“X” com caneta vermelha no próprio print file – muitos em papel opaco – que pressupomos
serem os fotogramas escolhidos por Stupakoff para ampliação em uma indeterminada época.
Na Caixa 2 (Figura 8B), sua segunda escolha, há o título: “Negativos de Otto
Stupakoff (1955-2005). Segunda escolha, porém, de qualidade de conteúdo. Não existe mais
uma terceira escolha”. Nessa Caixa 2 há conjuntos de negativos em 35mm e em médio
formato; nela encontram-se os mesmos temas fotográficos observados na Caixa 1, sendo que
                                                                                                               
5 Folhas transparentes que armazenam os negativos protegendo-os de sujeira, poeira e riscos  

 
  57

algumas sequências fazem parte da série de negativos organizados na primeira caixa. Há


poucas indicações de seleção na Caixa 2 e somente em alguns print files há a marcação em X
indicando a escolha do fotograma. A maioria dos fotogramas são de 35mm, outros de 6X6,
como a série de Tom Jobim (1956-1957, indicação de data do próprio fotógrafo) (Figura 9).
Aqui optamos por apresentar as folhas de contato já com os fotogramas positivados e não
em negativo.

Figura 9. Folha de contato de médio formato, Tom Jobim (1956-1957), Otto Stupakoff.
Fonte: Instituto Moreira Salles

Em alguns print files há anotação em caneta ao lado do título indicando uma


possível escolha do fotógrafo. Exemplo: “Rene D’Harnoncourt (MoMA) 29 e 18 (esse último
circulado) (Figura 10 – fotogramas positivados). A hipótese aqui aventada é de que o
fotógrafo selecionou os fotogramas 29 e 18 e, em um momento seguinte, escolheu o 18 para
ampliação em uma época indeterminada.

 
  58

Figura 10. Parcial da folha de contato, René d´Harnoncourt, diretor do MoMA, New York, 1977, Otto
Stupakoff. Fonte: Instituto Moreira Salles.

Como parte do material entregue por Stupakoff ao IMS há também uma relação
de folhas de contato ampliadas em Nova York, produzidas para a ocasião da São Paulo
Fashion Week em 2005 e encomendadas pelos curadores da exposição Bob Wolfenson e
Fernando Laszlo.
A respeito da materialidade propriamente dita das folhas de contato há
indicações que se destacam. Todas estão grafadas e numeradas como OS seguido de um
número dado aquele copião 6 , por exemplo, OS 127 e OS 315. As marcações feitas em
vermelho nos fotogramas são de Bob Wolfenson e Fernando Laszlo, assim como também
alguns dos comentários nelas contidas, sendo as marcações em branco de Otto Stupakoff
(WOLFENSON, 2017). Há também inscrições “Otto 16 e 19”, por exemplo, que se referem
explicitamente à escolhas feitas por Stupakoff.
A figura 11 apresenta fotogramas individualizados da folha de contato nomeada
OS 127, que diz respeito à série com Pietro Maria Bardi, realizada em 1978. Da esquerda para
a direita, na sequência dos fotogramas digitalizados pelo IMS, aparecem as seguintes
numerações 031OS_127_3, 031OS_127_17 e 031OS_127_20. Essa nomenclatura torna
evidentes determinadas informações importantes ao pesquisador que estiver acessando o
arquivo de Stupakoff: 031 é a numeração dada ao acervo do fotógrafo no IMS, o número
seguinte identifica a qual folha de contato física se refere (no caso, a 127), e o último qual é o
fotograma da sequência (nesse exemplo, respectivamente os fotogramas 3, 17 e 20). Para ter
acesso às anotações específicas, o pesquisador precisar recorrer ao copião impresso ou
digitalizado. Na série realizada com Bardi, somente pelo copião foi possível verificar que há
uma marcação em retângulo vermelho no fotograma 3, possível escolha de fotograma.

                                                                                                               
6 Sinônimo para folha de contato.

 
  59

Figura 11. Pietro Maria Bardi, 1978. Fotogramas 3, 17 e 20, respectivamente. Otto Stupakoff.
Fonte: Instituto Moreira Salles.

A OS 315, que também faz parte da Caixa 1, diz respeito às fotografias realizadas
no Teatro em Ho Chi Minh, antiga Saigon, no Vietnã. Nessa sequência há 36 fotogramas com
as escolhas indicadas nos fotogramas 16, 18 e 19 (Figura 12). Nela, lê-se: Teatro em Ho Chi
Minh, antiga Saigon no Vietnã. Da esquerda para direita: 031OS_315_16; 031OS_315_18 e
031OS_315_19. A figura 12 apresenta os fotogramas escolhidos e já individualizados.

Figura 12. Fotogramas 16, 18 e 19, respectivamente. Teatro em Ho Chi Minh, 1967. Otto Stupakoff.
Fonte: Instituto Moreira Salles.

No acervo do IMS há também caixas contendo envelopes pardos que receberam


as numerações Caixa 10/17, 11/17 e 12/17. Na Caixa 10 encontram-se os envelopes de 3 à 50,
na Caixa 11, os envelopes de 51 à 80 e, na Caixa 12, os envelopes de 81 à 136.
A numeração das caixas descritas acima foi realizada pelo IMS, mas a divisão dos
negativos nos envelopes é de responsabilidade do próprio Stupakoff. Nesses envelopes
pardos há negativos de temas e motivos diversos, tais como fotos de família, da Vogue Brasil
e de São Paulo na década 1960, por exemplo. Em alguns envelopes lê-se somente o título do
conteúdo datilografado à máquina de escrever. O título indica o conteúdo do envelope.
Exemplos: “Pauline – Miami [datilografado]. Vizinha – 3036 Day Are (?) Coconut Grove, FL.

 
  60

Rosto marcante, na piscina e em pé no APTO. Vendedoras jóias importadas” [anotado em


caneta preta]7 .
Algumas anotações nos envelopes trazem certas particularidades, como exemplo:
“Diversas – Todas boas” (Para ampliar e transformar (sépia) em Biombo de 3 partes)”.
“Angels 4 X 5”. Apesar da indicação de 4X5, nesse envelope há também negativos de outro
formato, o que indica que Stupakoff pode ter sintetizado a informação em um título que nem
sempre corresponde ao conteúdo integral dos envelopes.
A Caixa 7 contém slides. São diapositivos de diversos trabalhos em cor e que,
diferentemente dos negativos, estão acondicionados de maneira que não formam uma
sequência de um mesmo trabalho fotográfico; são, portanto, materiais avulsos. Há também
cromos com algumas reproduções de páginas de revistas com fotografias publicadas de
Stupakoff.
Há uma caixa com negativos em grande formato retratando a arquitetura de
Brasília e de Ouro Preto da década de 1950, e uma caixa à parte somente com o material do
Camboja, projeto fotográfico de 1994 que consistiu no registro da população e da situação do
país assumidos pelos rebeldes do Khmer Vermelho. A caixa do Camboja apresenta tanto
negativos em cor e em preto e branco quanto folhas de contato com algumas anotações de
Stupakoff (marcas de seleção, grafia do assunto registrado, diretrizes para ampliações).
Acompanha o material uma pasta em L, onde é possível ler (Tabela 1):

Tabela 1: Reprodução do texto de Otto Stupakoff.

Cambodia
Pnom-pehn
Siem-peap
Bottambang
Transporte no pais, cortesia do “Cambodia Trust” com base em
Oxford, Inglaterra. Fotos (e 20 pinturas digitalizadas) foram postas a
leilão na “Academia de Ciências” de N.Y em leilão organizado pela
“Christie’s. Fora poucas anotações que fiz em um mês, o texto deve ser
re-escrito. “Anima Mundi” veio a ser um título utilizado demais.
“Morte e ressurreição” como tema me parece mais apropriado. (...)
Acho que fotos mais antigas, com a retícula do jornal ampliada
também devem contar o genocídio que não presenciei.
Livro deve ser vendido com o livro. Os negativos estão perdidos.
Necessário scan (????)”8

Como dito anteriormente, na divisão entre Caixa 1 e Caixa 2, as sequências não


estão necessariamente juntas. Os fotogramas de uma mesma série podem estar em parte na
Caixa 1 e em parte na Caixa 2, por exemplo. Esse desmembramento realizado pelo próprio
Stupakoff indica-nos que ele não considerava a sequência toda como uma primeira escolha.

                                                                                                               
7 As observações entre colchetes são grifos da autora.
8 A interrogação em parênteses é do IMS, pois não foi possível decifrar a grafia do fotógrafo.

 
  61

Dentro de determinada série de fotogramas, alguns seriam mais significativos que outros.
Entretanto, para o pesquisador que desejar ter ideia do conjunto, é necessário ordenar a
sequência pela numeração atribuída ao copião.
Atualmente, as sequências fotográficas em 35mm e médio formato, os
diapositivos, os negativos em grande formato, cópias fotográficas e algumas fotografias
individualizadas estão digitalizados e disponíveis para consulta via sistema Cúmulus do IMS.
Para o desenvolvimento do presente trabalho, a consulta a esse material foi realizada
especialmente via material digitalizado recorrendo-se ao material físico em alguns
momentos.

2.3 A diversidade fotográfica de Otto Stupakoff

2.3.1.Capas de discos long play (LPs)


Na década de 1960 no Brasil, a fotografia amplia seu espaço na linguagem gráfica
em geral, passando a se fazer mais presente em cartazes, capas de revista, capas de livro e, em
particular, em capas de discos (MELO; RAMOS, 2011). O layout das capas de discos
normalmente objetiva apresentar a essência do conteúdo (tema, gênero) sendo comum uma
composição a partir do retrato do intérprete. A maneira como o retratado é apresentado,
conjuntamente com outros elementos de cena, por vezes busca traduzir ou sugerir o teor da
gravação fonográfica.
A produção de fotografias para capas de discos esteve presente por vários
momentos na vida profissional de Stupakoff, ainda que de maneira intermitente entre as
décadas 1950 e 1980 (SPINELI; PFÜTZENREUTER, 2017). Ele desenvolveu extensa e
significativa produção fotográfica para as gravadoras Odeon, Imperial e Som Livre no Brasil.
Em Nova York, ao fixar residência a partir de 1965, recomeçou sua carreira fotografando para
as gravadoras Columbia Records, A&M Records, Atlantic Records, MTA Records e Capitol.
Em 1957, Stupakoff produziu seus primeiros trabalhos no Brasil no campo da
fotografia aplicada fotografando capas de LPs para a gravadora Odeon.
O diretor artístico da Odeon, André Midani, ao detectar a falta de um profissional
formalmente responsável pelo setor de discos brasileiros da gravadora, assumiu essa função
em meados de 1950. Nesse período estavam ocorrendo mudanças técnicas e artísticas na
produção de discos, com uma atenção especial à produção das capas, iniciada pelos norte-
americanos com a preocupação de aumentar a sua durabilidade e de torná-las
comercialmente mais atraentes9.

                                                                                                               
9 Entre 1900 e 1930 os discos eram embalados em capas sem relação com o conteúdo do disco, de papel pardo e

com um orifício no meio. Somente em 1940 nos Estados Unidos a Columbia iniciou os projetos gráficos para
capas de discos e álbuns fazendo alusão ao artista ou ao conteúdo (REZENDE, 2012).

 
  62

Midani constatou que as capas de discos brasileiros eram “monstruosas de feias”


(MIDANI, 2008, p.70) e convidou o designer César Villela e os fotógrafos Otto Stupakoff e
Chico Pereira para produzirem o visual da embalagem, denominando-os como ‘grupo de
choque’:
Convidei o Chico para revolucionar as capas de discos. Chico, por sua vez,
apresentou-me César Villela, e eu levei ao grupo um menino superdoce, Otto
Stupakoff, recém-chegado de Los Angeles, onde estudara fotografia. E tinha
estudado tão bem que, ao visitar as agências de publicidade cariocas,
ninguém lhe dava trabalho, duvidando que o extraordinário portfólio que
apresentava fosse seu. Ronaldo [Bôscoli] veio, então, se juntar ao que eu
chamaria de meu “grupo de choque”, composto por Chico Pereira, César
Villela e Otto Stupakoff, dentro da Odeon. Publicamos um trade paper
mensal chamado Etiqueta O, que até hoje surpreende pela qualidade estética
e pelo conteúdo revolucionário nos conceitos que ainda não eram
identificados como “estratégia de marketing”. (MIDANI, 2008, p.36).
A refundação da produção fonográfica nacional – separando-a do campo
radiofônico a qual estava atrelada até aquele momento (LIMA, 2009) – trouxe
profissionalização ao campo da música gravada. A contratação de Stupakoff como
profissional especializado pelos os trabalhos fotográficos da Odeon reflete essa iniciativa.
Para César Villela, Stupakoff era “excelente profissional, bastante jovem e
recentemente chegado de Los Angeles. Ficou por pouco tempo. Voltou para os Estados
Unidos e se tornou um dos melhores de Nova York, na época” (VILLELA, 2003, p. 19).
A primeira fotografia de capa de disco feita por Stupakoff foi para o LP Caymmi e
o mar, lançado em 1957 (Figura 13A) (FERNANDES JÚNIOR, 2006, p. 153). Essa capa se
destaca pela solução apresentada por Stupakoff, que posicionou o músico Dorival Caymmi
defronte ao mar e o fotografou em longa exposição. O longo tempo de exposição do filme à
luz, como técnica fotográfica, permitiu a lenta captura do movimento das ondas batendo nas
pedras, proporcionando o registro das etapas do movimento do mar, um efeito borrado10. O
posicionamento de Caymmi, de costas para a câmera e olhando para a direita, destoa das
convencionais fotografias posadas em que o retratado encara a câmera. Essa disposição
também promove um encontro de textura entre as ‘espumas’ do mar e o cabelo branco do
cantor. Além disso, os sinais visuais da fotografia de capa remetem ao conteúdo sonoro do
disco expresso no título do álbum.
Pela Odeon, Stupakoff também acompanhou o nascimento da bossa nova, visto
que a gravadora foi pioneira na gravação e comercialização fonográfica desse estilo musical
(LIMA, 2009). A bossa nova proporcionou à Odeon “uma cara muito mais contemporânea”
(MIDANI, 2008, p.37) e Stupakoff marcou sua presença com a fotografia de Luiz Bonfá para
o álbum Alta Versatilidade, de 1957 (Figura 13B; e Apêndice III na versão da Capitol).

                                                                                                               
10 É o resultado estético da técnica fotográfica que mantém um tempo mais longo na captura do referente. A longa

exposição proporciona a captura das etapas de um movimento (aqui as ondas) evidenciando-o.

 
  63

Ainda em 1957 Stupakoff fotografou a capa do LP Carícia, com sambas-canção


contemporâneos, de Sylvia Telles (Figura 13C) e Joel e sua Bossa de Joel de Almeida
(Apêndice III). Em 1961, foi o responsável pela capa do disco Demônios em Sambas
infernais, dos Demônios da Garoa (Figura 13D).

Figura 13. (A) Caymmi e o mar, Dorival Caymmi, Odeon, 1957. (B) Alta Versatilidade, Luiz Bonfá,
Odeon, 1957. (C) Carícia, Sylvia Telles, 1957. (D) Demônios em Sambas infernais dos Demônios da
Garoa em 1961. Fotos de Stupakoff. Fonte: www.discogs.com

Em 1960, o mesmo André Midani da Odeon criou A Imperial, selo independente


administrado por ele. No seu catálogo inicial, constavam doze discos de dança, bolero, tango,
valsa, entre outros estilos correlatos (MIDANI, 2008). Para a produção desses discos, Midani
utilizou a gravação de orquestras e artistas brasileiros com pseudônimos que emulavam
origem estrangeira, prática comum na indústria fonográfica nacional (BARCINSKI, 2014).
A consolidação de Stupakoff como fotógrafo, sua proximidade com Midani e sua
produção pregressa e de qualidade para a Odeon resultaram em trabalhos também para a
Imperial Discos. Destacam-se as seguintes capas entre a sua produção para o selo: Frank
Morris, Let’s Dance, 1960 (Figura 14A); Mike Falcão, Sonhei que estávamos dançando, 1960
(Figura 14B); Ivan Casanova e seus conjuntos, Melodias célebres do cinema, 1960 (Figura
14C) e Zezinho e os Copacabanas, Um coquetel uma dança, 1962 (Figura 14D).

 
  64

Figura 14. (A) Frank Morris, Let’s Dance, 1960; (B) Mike Falcão, Sonhei que estávamos dançando,
1960. (C) Ivan Casanova e seus conjuntos, Melodias célebres do cinema, 1960. (D) Zezinho e os
Copacabanas, Um coquetel uma dança, 1962. Fotos de Stupakoff. Fonte: Coleção da autora.

Stupakoff continuou produzindo fotografias para capas de discos no começo de


sua carreira em Nova York. Suas primeiras produções foram para capas da Columbia Records
(STYCER, 2005). Entre os seus trabalhos de destaque para a gravadora, fotografou a capa do
LP Ives/Symphony n.4 da American Symphony Orchestra, lançado em 1966 (Figura 15A).
Ainda na Columbia, Stupakoff também fotografou España, de 1965 (Figura 15B)
e Salomé’s Dance Don Juan, de 1966 (Apêndice III), ambos da New York Philharmonic com
condução de Leonard Bernstein. Também produziu as fotografias de Lucho Bermudez Y Su
Orquestra, The exciting tropical dance rhythms of Colombia, s/d, The Fiesta Brass, Viva
Tijuana! de 1966, The New Christy Minstrels, Christmas With The Christies, de 1966, Linda
Vera, Tropical fiesta, s/d, Les & Larry Elgart, The wonderful world of today hit’s, de 1967, e
The Philadelphia Orchestra/Eugene Ormandy, Capriccio Italien/Capriccio Espagnol, de
1982 (todos no Apêndice III).
O trabalho de Stupakoff no mercado fonográfico norte-americano também
contou com fotografias para capas de discos da A&M Records, Atlantic Records, MTA
Records e Capitol – gravadoras atualmente incorporadas a outros grupos ou não mais
atuantes no mercado. Estas capas foram produzidas em dois momentos: em meados da
década de 1960, na primeira mudança de Stupakoff para Nova York, e na década de 1980,
após seu retorno aos Estados Unidos.

 
  65

Para a Capitol Records, em 1966 Stupakoff fotografou Álbum 2 da banda The


outsiders, e Cabaret, de King Richard’s Fluegel Knights, para a MTA Records (ambos no
Apêndice III). Em 1966, pela Atlantic, o fotógrafo foi responsável pela capa do álbum de
Sérgio Mendes e sua banda The Great Arrival (Figura 15C). Em 1970, com capa de Stupakoff,
foi lançado um outro disco de Mendes, Greatest Hits (pela A&M Records) (Figura 15D);
ainda pela A&M Records, Stupakoff repetiria a parceria com Mendes em Picardia, de 1982, e
Confetti, de 1984 (ambos no Apêndice III).
Destacamos aqui a parceria entre Otto Stupakoff e Sergio Mendes em diversos
álbuns para as gravadoras A&M Records e Atlantic Records. Essas gravadoras lançaram
discos do cantor e compositor brasileiro que despontou com o gênero bossa nova no Brasil e
continuou carreira com o samba jazz e a pós-bossa nova. Sergio Mendes, radicou-se nos EUA
em 1964, mas estabeleceu amizade com Stupakoff ainda no Brasil em 1962. O
relacionamento entre eles, que perdurou por décadas, surgiu em decorrência da forte atuação
de ambos na cena artística carioca e paulistana e se prolongou para a parceria profissional.
Essa parceria foi consistente durante três décadas, de 1960 a 1980.
Ainda com relação à sua produção para o mercado fonográfico, vale lembrar que
Stupakoff fotografou capas de álbuns brasileiros para a Som Livre ao regressar ao país em
1976 e fixar residência em Joatinga, no Rio de Janeiro. A Som Livre é uma gravadora
brasileira pertencente ao grupo Globo Comunicações, fundada em 1969, e tinha como
principal objetivo a produção de álbuns com as trilhas sonoras das novelas da Rede Globo.
Dos dois projetos desenvolvidos por Stupakoff para a Som Livre, um foi o disco do
percussionista Chico Batera, Ritmo (Figura 15E) e outro, mais uma vez, Sergio Mendes em
Horizonte Aberto (Figura 15F), ambos de 1979.

 
  66

(A) (B) (C)

(D) (E) (F)


Figura 15. (A) Charles Ives, The American Symphony Orchestra, 1966. (B) Leonard Bernstein,
España: New York Philharmonic, de 1965. (C) The Great Arrival, Sérgio Mendes, 1966. (D) Greatest
Hits, Sérgio Mendes e Brasil 66, 1966. (E) Chico Batera, Ritmo, 1979. (F) Sérgio Mendes, Horizonte
aberto, 1979. Fotos de Stupakoff. Fonte: www.discogs.com

Tanto Ritmo quanto Horizonte Aberto são resultados da parceria entre Stupakoff
e o artista brasileiro Wesley Duke Lee. Duke Lee teve um significativo trabalho nas artes
gráficas através da elaboração de projetos para capas e outros suportes. Stupakoff e Duke Lee
foram amigos durante toda a vida e também firmaram parceria na área profissional, sendo
que, não raras vezes, Duke Lee utilizou fotografias de Stupakoff em suas obras artísticas e em
seus projetos comerciais.

2.3.2 As campanhas para a Rhodia


Na década de 1950, a Rhodia11, iniciou a produção de fios sintéticos. Até aquele
momento, o algodão era a principal matéria-prima para as vestimentas no país. A renovação
e especialização da indústria têxtil brasileira, com a inserção das fibras sintéticas no mercado,
culminaram no prêt-à-porter e, consequentemente, no enfraquecimento dos modistas e

                                                                                                               
11 Marca de origem francesa, presente no Brasil desde 1919, estava preocupada no período em vender seu enorme

catálogo de novas fibras sintéticas (em especial, o nylon) para as fábricas têxteis, as tecelagens e os confeccionistas
brasileiros.

 
  67

alfaiates familiares e na diminuição da importação dos moldes e cópias de vestimentas


estrangeiras (BONADIO, 2005).
Algumas políticas de publicidade elaboradas pela Divisão Têxtil da Rhodia, sob o
comando do diretor de publicidade da empresa Lívio Rangan, e executadas pela Standard
Propaganda, foram empreendidas para gerar aceitação do público a esses novos tecidos
sintéticos. Primeiramente, foram estabelecidas colaborações com os artistas plásticos Iberê
Camargo, Tomie Ohtake, Alfredo Volpi e Willys de Castro, e com os estilistas Dener
Pamplona e Jorge Farré para desenharem as estampas de cada coleção (BONADIO, 2014).
Também foram idealizados os desfiles-show12 apresentados na Feira Nacional da Indústria
Têxtil (Fenit) desde 1958, abordando como temática elementos da cultura nacional e música
popular brasileira para associar o produto da multinacional à criação de uma “moda
brasileira” (BONADIO, 2005, p. 10). Ainda segundo Bonadio (2005), essas manifestações
artísticas com o universo da moda eram um meio da empresa disseminar uma
sensibilidade moderna.
Além das feiras de moda e desfiles-show, a Rhodia organizou no Brasil uma série
de campanhas publicitárias calcadas na produção de editoriais de moda para revistas de
significativa visibilidade – O Cruzeiro, Manchete, Cláudia e Jóia (posteriormente tornou-se
Desfile) (Apêndice IV) entre 1960 e 1970 (BONADIO, 2005, p. 153). Os ensaios da empresa,
intitulados Seleções Rhodia, traziam informações sobre tendências de moda, mas não faziam
parte do conteúdo editorial da revista. Eram conhecidos como publieditorial, estavam
inseridos como publicidade e contemplavam a ideia de fotografia de moda. Segundo matérias
da época: “As campanhas da Rhodia iniciaram no Brasil uma nova tendência em fotografias e
anúncios de moda” (PETITE..., 1963).
A inovação partiu de Lívio Rangan e Roberto Duailibi (publicitário da Standard
Propaganda) que instituíram o publieditorial com o objetivo de promover e popularizar os fios
sintéticos produzidos pela Rhodia no Brasil (BONADIO, 2005) em uma época em que era
incomum a aplicação da publicidade indireta. Duailibi confiou a Stupakoff a execução das
fotografias, que marcaram a passagem do fotógrafo pela agência Standard Propaganda.
Eu falei com o Lívio: Por que nós, ao invés de fazer anúncio, que você não
tem dinheiro para isso, vamos fazer reportagens de moda e vender para as
revistas. E o Lívio viu nisso uma possibilidade e realmente topamos. Ele
falaria com os fabricantes de tecidos e com as confecções. Nós tínhamos o
estúdio fotográfico na Standard, que era dirigido pelo Otto Stupakoff, então a
gente produziria reportagens de moda, que era uma coisa já revolucionária
na época também e o Lívio levou isso ao extremo (DUAILIBI, 2005, p. 11)

                                                                                                               
12 Lívio Rangan, diretor de publicidade, foi o idealizador dos desfiles-eventos da Rhodia. “O pretexto dos shows

era promover a alta costura nacional, oferecendo o espaço de desfile a uma série de jovens costureiros, e mostrar a
estamparia feita por artistas plásticos na função de conceber padrões ‘bem brasileiros’.(…) Para reforçar ainda
mais a ilusão de ‘inspiração nacional’ da alta costura então nascente, a Rhodia fez viajar pelo Brasil costureiros,
manequins e coleções, de modo a autenticar sua ‘brasilidade’ em sítios celebrados como símbolos da
nacionalidade, como Salvador, Ouro Preto e Brasília.” (DURAND, 1988 p. 79).  

 
  68

Ainda segundo Duailibi (2005), os fabricantes e confeccionistas viram nessa


empreitada uma oportunidade de divulgar seus produtos, especialmente os tecidos, tendo
cada anúncio de seis a oito clientes. E Adolpho Bloch, fundador da Bloch Editores e diretor
da revista Manchete, viu a oportunidade de economizar na verba publicitária.
Nesses termos, a fotografia de moda aparece como forma de dar visibilidade a
uma indústria nacional do vestuário que estava em expansão, demonstrando que a moda
podia ser consumida também por meio da imagem fotográfica.
As fotografias de moda para a Rhodia em São Paulo foram as primeiras
fotografias de moda feitas no Brasil. Até então, nos anos 50, os anúncios da
Rhodia eram de tinta à nanquim... Eu tenho a impressão de que nada do que
nós fizemos já tinha sido feito no Brasil. Tudo que a fotografia de moda
representava naquela época era novo. As idéias visuais, estéticas, de beleza
vinham de mim; a parte comercial vinha do Lívio e a parte de direção de arte
vinha do Licínio13. (STUPAKOFF apud MENDES; ARRUDA, 2001, p.4).
Stupakoff iniciou em 1958 sua colaboração com a Rhodia via Standard
Propaganda e realizou uma série de publieditoriais no início de 1960. Por essas vias foi
publicado nas principais revistas do país. A título de exemplo, podemos citar o publieditorial
da Rhodia para a revista Manchete, abril de 196114 intitulado A personalidade da moda para
o inverno 1961. Esse ensaio original foi considerado o maior encarte sobre moda veiculado na
imprensa do país até aquele momento (ÉBOLI, 1961). Era um encarte publicitário com 24
páginas (Figura 16 e Apêndice V) retratando, conjuntamente com as modelos, personalidades
como Tom Jobim, Oscar Niemayer, Millôr Fernandes, Jorge Amado, Manabu Mabe, Dener
Pamplona de Abreu e Abílio Pereira de Almeida em seus ambientes de ofício ou de criação.

Figura 16. Manchete (1961), publieditorial da Rhodia, fotos de Otto Stupakoff.


Fonte: Reprodução da Manchete, 29 de abril de 1961/Acervo Biblioteca ECA-USP.

                                                                                                               
13 Licínio de Almeida (diretor de arte).
14 Manchete de 29 de abril de 1961 (edição nº 471, p. 57-73).

 
  69

Essa reunião de personalidades atreladas à divulgação de moda pode ser vista


como um prolongamento da ideia de unir moda e cultura popular presente já nos desfiles-
show promovidos pela empresa e que tratavam de arte, moda, poesia e música em meio aos
desfiles de moda. Também é justificado na abertura do editorial pelo seguinte texto: “(...) ao
lado das últimas criações de moda para 1961, com os detalhes que a personalizam aos olhos
femininos, apresentamos as personalidades que mais atraíram a atenção feminina este ano,
nos diversos setores de vida em que se destacaram” (grifo nosso) (PONGETTI, 1961).
Em termos estéticos, esse publieditorial apresenta um posicionamento rígido dos
personagens, uma vez que, por ser fotografado em formato 8X1015, a captura do movimento
era dificultada. Quanto à concepção do conceito, Stupakoff afirma que as ideias visuais,
estéticas e de beleza partiam dele, a parte comercial ficava nos domínios de Lívio Ragan e a
direção de arte com Licínio de Almeida16 (STUPAKOFF apud MENDES; ARRUDA, 2001).
Fica claro na fala do fotógrafo que ele tinha autonomia na criação imagética, o que não
significa autonomia na criação do conceito. Apesar de inovador no Brasil, esse tipo de
publieditorial já havia sido utilizado pela Rhodia como estratégia publicitária em outros
países: a empresa usava, por exemplo, o mesmo expediente na França, o que pode ser
verificado no número 470 da revista de moda francesa L’Officiel, de 1961 (SANT’ANNA,
2010, p.108).
No contexto da feitura dos publieditoriais, observa-se aqui o estímulo para a
produção em locações externas em detrimento das fotografias feitas em estúdio fotográfico
onde a modelo normalmente fica posicionada em um fundo infinito. Aqui podemos sugerir a
identificação de Stupakoff com essa maneira de fotografar moda, que favoreceria e
impulsionaria o trabalho do fotógrafo em ambientes externos, algo que veio a ser uma de
suas marcas.

2.3.3 Publicidade e materiais promocionais


O crescimento do mercado de revistas e jornais a partir da década de 1950
alavancou o mercado para a fotografia publicitária e o estabelecimento de uma produção
fotográfica mais sofisticada na área. Novos perfis profissionais foram definidos e, conforme
se expandia o mercado comercial fotográfico, exigia-se mais especialização do fotógrafo e
impunha-se a necessidade de profissionalização (COSTA; SILVA, 2004).
Apesar de incipiente, o mercado de foto publicitária no Brasil já estava delineado
por nomes como Chico Albuquerque, Henrique Becherini e Hans Gunter Flieg desde a
década de 1940.

                                                                                                               
15 8X10 é proveniente das câmeras de grande formato, pesadas e com negativo em chassi.
16 Licínio de Almeida, diretor de arte da Standard Propaganda.

 
  70

Ao retornar de seus estudos em Los Angeles em 1955, Stupakoff encontra no


Brasil um cenário favorável para a produção desse tipo de fotografia e dedica a esse nicho
parte de seu trabalho. Segundo ele:
“(...) procurei a sua aplicação (fotografia) também na propaganda, não
apenas, como se poderá pensar, por objetivismo comercial, mas porque
acredito ser, na propaganda fotográfica nos jornais e nas revistas, que se
desperta o interesse e se forma o gosto do público”. (STUPAKOFF apud
MAURICIO, 1956, p.12).
O público ao qual o fotógrafo se refere seria capaz de julgar o valor da “ilustração
publicitária” (MÓDULO..., 1956). Nesse sentido, precisaria haver um esforço das agências para
que os anúncios fossem de qualidade.
Stupakoff foi apontado por seus pares da época como um profissional importante
para a propaganda brasileira. Duailibi (2004) comenta que Stupakoff era criativo e tinha
muito bom gosto, em contraponto a outros fotógrafos publicitários da época como o
supracitado Chico Albuquerque os quais, apesar de competentes, tinham uma visão
mais ortodoxa, tratando a concepção fotográfica como um produto, no máximo um
pequeno cenário.
Na década de 1960 a propaganda obteve maior projeção profissional no Brasil.
Nesse período, foram feitos os primeiros anúncios fotográficos nacionais para o lançamento
do Ford Galaxy, pela Metro 3, dos publicitários Francesc Petit e José Zaragoza (OLIVETTO,
2008). O publicitário Washington Olivetto (2008) destaca Otto Stupakoff como o fotógrafo
daquele momento – no seu estúdio-hangar da Frei Caneca em São Paulo, Stupakoff
fotografou material publicitário para a indústria automobilística (Ford, Volkswagen,
Mercedes Bens e Alfa-Romeo).
Nesta primeira fase de produção de Stupakoff para a publicidade no Brasil, pode-
se destacar um pôster (Figura 17A), um calendário para Esso Petróleo17 e os anúncios da
Biotônico Fontoura de 1958, vencedores do Prêmio Souza Ramos18 (Figura 17B e C). Todos
fotografados por ele ainda na década de 1950 para a McCann Erickson, maior agência de
publicidade e propaganda do país, com filiais no Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte e
Porto Alegre (ABREU; PAULA, 2007).

                                                                                                               
17 Esse calendário não foi localizado. No entanto, Stupakoff (2000a) comenta que fez as fotos em longa exposição

acompanhando o caminhão descendo a Rodovia Caminho do Mar (estrada velha de Santos). O resultado é uma
fotografia na qual o caminhão aparece múltiplas vezes na estrada.
18 Prêmio relacionado à Escola de Propaganda de São Paulo, concedido às agências pelas melhores campanhas e

anúncios do ano. O prêmio é uma homenagem ao publicitário João Alfredo de Souza Ramos.

 
  71

(A)

(B) (C)
Figura 17. (A) Imagem para pôster solicitada por Armando de Moraes Sarmento, publicitário e
presidente da McCann Erickson. (B) e (C) Anúncio Biotônico Fontoura. Fotos de Stupakoff.
Fonte: (A) Instituto Moreira Salles, (B) (C) Revista Propaganda, março, 1959/Acervo BMA.

Os anúncios para a Oca, loja de móveis do designer brasileiro Sérgio Rodrigues,


em especial do Sofá Mole, e o pôster para a Fundação Armando Alvares Penteado (FAAP), em
São Paulo também são destaques no período.
A fotografia para o catálogo do Sofá Mole foi realizada por Stupakoff em 1958. O
sofá foi uma encomenda feita a Sérgio Rodrigues pelo próprio fotógrafo19 para seu estúdio no
Rio de Janeiro, um móvel para descanso e poltrona esparramada, em que a tônica fosse o
conforto (GALLI, 1988). A imagem apresenta o mobiliário na praia do Rio de Janeiro (Figura
18A). “Vai ficar bem brasileiro” (STUPAKOFF apud GAMA, 2008, p.21). Segundo Rodrigues
(ZAPPA, 2015), Stupakoff escolheu esse cenário por não ter um estúdio especializado com
fundo infinito – Rodrigues relata que a maré subiu e uma onda alcançou os móveis no
momento do registro da foto: “(...) temos até hoje o comprovante colorido do espetáculo que

                                                                                                               
19 Curiosamente, Stupakoff não pôde adquirir a peça, pois o material empregado e a mão de obra especializada

encareceram o sofá acima das possibilidades financeiras do fotógrafo.

 
  72

foi, ao vermos aturdidos, algumas peças, inclusive o sofá, arrastadas encharcadas por uma
onda marota” (RODRIGUES, 1962, p. 72). Esse acontecimento repercutiu na imprensa e o
jornal Correio da Manhã noticiou o fato como se eles houvessem lançado os móveis ao mar
como um tipo de oferenda (RODRIGUES, 1962).
Segundo Licínio de Almeida, diretor de arte da Standard Propaganda, esse tipo de
produção destoava do convencional realizado na fotografia comercial brasileira.
Nesses tempos, o que é que eles fariam lá? Botariam na loja, arrumavam um
cantinho e faziam as fotos para o catálogo. Sabe o que o Otto fez? Pegou os
móveis e disse assim: ‘Sérgio, amanhã, cedinho, seis horas da manhã, a luz tá
linda aqui na praia, Ipanema tem uma luz rosada linda perto do Arpoador,
você manda um pessoal varrer a areia e põe os móveis lá.’ ‘Na areia, cara?’ ‘É
na areia’. Então ele fez as fotos na areia. Na época criou uma revolução
estética. É móvel de casa o cara põe na areia! Nossa, precisa ver a atmosfera
que o Otto criou. Ele começou a dar um toque à foto que não havia no Brasil.
(ALMEIDA apud BONADIO, 2014).
Posteriormente Rodrigues faria a poltrona mole, originária do sofá mole (LEON,
2012) e que também foi fotografada por Stupakoff para um anúncio da Oca em 1960 (Figura
18B), assim como anúncios com outros móveis (Figura 18C).

(A) (B) (C)

Figura 18. Anúncios da Oca publicados na revista Módulo (A) 1958 e (B) 1960. (C) Anúncio da Oca na
revista Senhor, junho de 1962. Fotos de Stupakoff. Fonte: Reprodução/Acervo BMA/Acervo Biblioteca
FAU-USP.

 
  73

Em 1961 a Fundação Armando Álvares Penteado


(FAAP) contratou Stupakoff para fotografar a imagem do pôster
que anunciaria os cursos livres de arte e cultura da instituição
(Figura 19). A fotografia é um still life criado especificamente
para a primeira peça publicitária da fundação. Segundo
Fernandes Júnior (2012), à época, Stupakoff era um expoente
fotógrafo de São Paulo e esse still life marca uma exceção em
sua carreira pontuada principalmente por retratos e moda.
Fotografias como essa – montagens de cenas com
materiais muitas vezes recolhidos ou que estavam à sua
disposição no estúdio – também marcam os primeiros anos da
Figura 19. Pôster da FAAP, 1961, foto
obra de Stupakoff.
de Stupakoff. Fonte: Fernandes
Junior, 2012/Matriz no IMS.
 

Calendários
O prestígio da fotografia aplicada à comunicação no Brasil aumentou em
consonância à expansão de empresas da área industrial entre 1955 e 1965. O
desenvolvimento do mercado industrial incentivou a publicação e difusão de calendários
empresariais e a realização de concursos como o Prêmio Ampulheta – Concurso de
Calendários e Arte Editados e Impressos no Brasil – promovido pela Biblioteca Municipal
Mário de Andrade em São Paulo (MELO, 2011). A importância do calendário está no alcance
da mensagem cultural, visto que circulava pelas mais diversas esferas, dos altos executivos a
ambientes populares (MELO, 2011), dando grande visibilidade para o trabalho do fotógrafo.
O Prêmio Ampulheta foi ofertado pela primeira vez em 1963, contabilizando oito
edições, e seu objetivo principal foi estimular o design e a produção gráfica por meio de
prêmios, menções honrosas e exposições. A iniciativa visava promover o calendário de arte
enquanto instrumento de difusão cultural. Contava com um corpo de jurados especializados,
entre eles o crítico de arte Mario Pedrosa, o artista neoconcretista Willys de Castro e o
designer gráfico Alexandre Wollner (MELO, 2011).
Na primeira edição, Stupakoff recebeu menção honrosa 20 pelas imagens
apresentadas no Calendário Shell (CALENDÁRIO..., 1963) (Figura 20 e Apêndice VI). Em
1971, todos calendários foram expostos em uma Mostra de calendários artísticos que ocorreu
no Museu de Arte Moderna de São Paulo (MAM); nessa ocasião o trabalho de Stupakoff foi
apontado pelos críticos como ponto alto da mostra em virtude da qualidade das fotos
(MAURICIO, 1971).

                                                                                                               
20 O calendário premiado em primeiro lugar foi das Usina de Aços Villares, ilustrado com fotografias de João

Xavier com cenas internas do funcionamento das forjas de aço.

 
  74

A relevância da apresentação fotográfica nele contida pode ser medida também


pelas palavras do escritor e consultor publicitário Roberto Menna Barreto ao elencar
exceções criativas na fotografia publicitária brasileira “(...) Otto Stupakoff, este
absolutamente criativo, capaz de cumprir por exemplo a tarefa de criar fotograficamente um
calendário completo para a Shell (isto é, trabalhar no regime correto de criação), foi
realmente um caso excepcional” (BARRETO, 2004, p. 66).
Stupakoff justifica sua criação na primeira folha do calendário:
As ilustrações dêste calendário são o resultado de um arranjo de formas e
símbolos conhecidos, criando uma imagem inusitada, na tentativa de
transmitir ao observador uma experiência visual do fotógrafo, assim como a
criança cria o seu mundo, associando objetos e dando-lhes um novo
significado de estranha poesia. (STUPAKOFF, 196321).

Figura 20. Folhas do calendário Shell, 1963. Fotos de Otto Stupakoff.


Fonte: Reprodução/Acervo Biblioteca Mário de Andrade.

                                                                                                               
21 Texto de Stupakoff na folha 1 do Calendário Shell, 1963.

 
  75

Em 1965, ainda pelo Prêmio Ampulheta, dos 22 calendários inscritos, 11 foram


selecionados para exposição e premiação – na ocasião, Stupakoff recebeu o diploma de
mérito pelas fotografias do calendário Eternit do Brasil Cimento-Amianto22 (1964) (FRANÇA,
1965).
Apesar do sucesso de crítica alcançado por esse tipo de produção, Stupakoff só
viria a trabalhar em um novo calendário quase duas décadas depois. O calendário Retrato de
uma cidade chamada Volkswagen, lançado em 1980 (Figura 21 e Apêndice VII), foi um dos
poucos trabalhos que Stupakoff produziu em seu primeiro retorno ao Brasil em meados dos
anos 1970. Nele o fotógrafo documenta, durante dois meses, as pessoas envolvidas em todos
os setores de produção da montadora alemã Volkswagen acompanhando o fluxo dos
funcionários em sua dinâmica na fábrica em São Bernardo do Campo. No texto que
acompanha o calendário afirma-se que as fotos feitas correspondem à interpretação do
artista ao retratar uma cidade23.

Figura 21. Folhas janeiro e fevereiro do calendário Volkswagem, 1980. Fotos de Otto Stupakoff.
Fonte: Reprodução/Acervo Biblioteca Mário de Andrade.

Anúncios para revistas


A produção de fotografias para anúncios de revistas está presente em toda a
carreira de Stupakoff. Na década de 1960, além dos publieditoriais da Rhodia apresentados
acima, sua produção de maior destaque também incluiu trabalhos comissionados para
empresas do setor de vestuário (Figura 22).
                                                                                                               
22Essa peça gráfica não foi localizada durante a pesquisa.
23Calendário Wolkswagen. O retrato de uma cidade chamada Volkswagen. São Paulo: Volkswagen, 1980. Acervo
Biblioteca Municipal Mario de Andrade/Biblioteca de Arte.

 
  76

Em sua estadia no Brasil em 1978 Stupakoff


produziu para o Banco Itaú um Relatório Anual do Itaú,
também tema de publicidade veiculada na revista Vogue
Brasil em 1980 (Figura 23). No anúncio, lê-se: “Tão
bonito quanto esta revista só mesmo o Relatório Anual do
Itaú que foi feito pelo mesmo fotógrafo. Otto Stupakoff,
que fotografou esta magnífica edição de Vogue sobre Jorge
Amado publicada agora no início dos anos 80, fotografou
também o Relatório Anual das Instituições Financeiras
Itaú em 1978 – publicado no início de 1979 -, com o tema
“O Homem do Campo Brasileiro”. Isso é uma prova de que
Figura 22. Anúncio da o Itaú tem com as suas peças de comunicação o mesmo
Valisère, Manequim, n.11, cuidado que tem no atendimento do seus clientes.”    
1960, foto de Stupakoff.
Fonte: Bonadio, 2005. Esse Relatório Anual das atividades do banco,
  além dos dados empresariais, contava com uma
documentação visual por meio de fotografias. Destinado a
clientes, acionistas e parceiros, o relatório seguia o mesmo
apreço estético que o Itaú empregava para formar sua
coleção de arte e expor nas áreas internas das agências
(BEZAMAT, 2013).
Sob a temática Homem do campo, Stupakoff
registrou cenas rurais e trabalhadores do campo de norte a
sul do interior do Brasil. Suas fotografias refletem as
diferentes realidades do trabalhador rural dentro de um
país de proporções continentais. Esse pode ser visto como

um trabalho documental de Stupakoff que, ao retratar


Figura 23. Anúncio
publicitário sobre o Relatório diversos tipos de trabalhadores do campo, também
Anual do Itaú, publicado na
Vogue Brasil em 1980, foto incorpora nas composições índices – um galão de leite ou
de Otto Stupakoff. Fonte: uma enxada – que apontam para o tipo de trabalho
Reprodução da Vogue Brasil,
fevereiro de 1980. realizado pelo retratado. Esse relatório, em formato
 
25X25cm e organizado em setenta e duas páginas, apresenta vinte e seis fotografias
acondicionadas por vezes em página dupla ou simples. Está disponível para consulta no
Centro de Memória do Itaú - SP, sendo vetada, pelo banco, a reprodução das imagens.
Mesmo residindo em Nova York nos anos 1990, Stupakoff continuou a prestar
serviços fotográficos no Brasil, vide a campanha institucional do Banco Bradesco O dia-a-dia
do Brasil tem Bradesco de 1994 (Figura 24), constituída por fotografias dele em conjunto

 
  77

com outros fotógrafos como Arnaldo Pappalardo, David Zingg, Pedro Martinelli e Sebastião
Salgado (LASMAR, 2013). Nessa campanha, criada pela agência Salles, em cada inserção em
revista destacavam-se três fotógrafos sob a alcunha de “O Bradesco sabe quanto é importante
confiar no futuro” (revista Veja de 31 de agosto de 1994).

Figura 24. Anúncio Bradesco veiculado na revista Veja, primeira capa interna, em 31 de agosto de
1994, foto de Otto Stupakoff. Fonte: http://www.propagandaemrevista.com.br/ano/1994/08/

Dos seus anúncios internacionais


destacamos a fotografia do jogador de futebol-
americano Bo Jackson (Figura 25) e do
jogador de basquete Michael Jordan, ambos
para a marca Nike, em 1989. Stupakoff
também produziu fotografias publicitárias
publicadas em revistas estrangeiras como
Vogue e Harper’s Bazaar (Figura 26 A e B).

Figura 25. Bo Jackson para Nike, fotos de Otto


Stupakoff. Fonte: Instituto Moreira Salles.
 

 
  78

(A) (B)
Figura 26. (A) Anúncio para Danskins, nd (B) Anúncio Harper’s Bazaar, abril, 1975. Fotos de Otto
Stupakoff. Fonte: Reprodução das revistas.

Em seu regresso ao Brasil nos anos 2000, Stupakoff foi o responsável pela
campanha Luxo para todos, da Cavalera (em 2007), veiculada em diferentes revistas do país
(Figura 27) e pela Vista Pacaembu para a Camargo Corrêa (2007) (Figura 28).

Figura 27. Luxo para todos, da Cavalera, 2007, fotos de Otto Stupakoff.
Fonte: www.institucional.cavalera.com.br/portugues/campanhas.html

 
  79

Figura 28. Vista Pacaembu, da Camargo Corrêa, 2007, foto de Otto Stupakoff.
Fonte: Folha de São Paulo, 8 dez. 2007.

Agendas
Dentre os trabalhos comissionados de Stupakoff, também se destacam as
fotografias para ilustração de agendas de grandes empresas, uma produção restrita aos anos
em que ele atuou no Brasil no final de 1970. Em 1979, o fotógrafo trabalhou para a Mangels
indústria de aço. Essa agenda24, além de fotos de Stupakoff, trazia também trabalhos de
Cláudia Andujar, Cristiano Mascaro, Lew Parrella, João Xavier, Ruth Toledo e Sérgio Jorge,
com texto de Rubem Braga comentando as fotografias. As fotos versavam sobre brasileiros
em suas atividades cotidianas (MORAIS, 1979). No ano de 1978, Stupakoff produziu uma
agenda para a Lion, representante da maquinaria da Caterpillar no Brasil. A série com 56
fotografias em preto e branco teve projeto gráfico de Wesley Duke Lee, encadernado em
espiral e oferecido como presente anual da empresa (FERNANDES JUNIOR, 2006). Nesse
trabalho, as fotos de Stupakoff homenageavam as pessoas que mais usavam as máquinas e
equipamentos da Caterpillar: os trabalhadores do campo (Figura 29). Para a Varig, em 1979,
Stupakoff produziu uma agenda constituída de 56 fotografias em cor e em preto e branco
sobre as crianças brasileiras, fotografadas em 29 cidades destinos da companhia aérea. A
agenda foi produzida no Ano Internacional da Criança determinado pelo Fundo das Nações
Unidas para a Infância (UNICEF) (Figura 30).

                                                                                                               
24 A agenda não foi localizada durante a pesquisa.
 
 
  80

Figura 29. Foto para a agenda Lion-Caterpillar, 1978. Trabalhadores rurais, São Paulo. Fotos de
Stupakoff. Fonte: Instituto Moreira Salles.

Stupakoff dizia ter grande


interesse na produção de fotografias para
agendas, visto ser esse um produto
oportuno para a apresentação de um
vasto material fotográfico (ele se referia
aos modelos de agenda com os quais
trabalhou, que incluíam fotos para todas
as semanas) (STUPAKOFF, 2000b).
Figura 30. Criança em Canela , Rio Grande do
Sul. Foto de Stupakoff para Crianças brasileiras,
VASP. Fonte: Reprodução/revista Íris, 1979/IMS.
 

2.3.4 Publicação em periódicos – revistas brasileiras


A partir da década de 1950 há uma modernização visual no mercado de revistas
nacionais (MARTINS; LUCA, 2013); Otto Stupakoff participou da primeira geração de
profissionais que implementaram esse novo formato. O ideário desses profissionais
privilegiava tanto a parte técnica quanto uma ampla formação intelectual.
É notório que o fotógrafo obteve maior divulgação de seu trabalho no exterior,
principalmente em revistas especializadas em moda. No entanto, o panorama aqui traçado
ressalta um ponto importante de sua trajetória profissional: a veiculação de suas imagens em
significativas revistas brasileiras, do ponto de vista de conteúdo e circulação. Trabalhos de
Stupakoff apareceram em periódicos importantes na história da imprensa nacional como
Senhor, Realidade, Novidades Fotóptica e Módulo, entre as décadas de 1950 e 1960, e nas
revistas de moda Vogue Brasil e RG Vogue a partir da década de 1970.
Ainda em 1956, nos primórdios de sua carreira, a revista Rio empregou
fotografias de Stupakoff interagindo com outros elementos de capa sob o layout do designer
Michel Burton (Figura 31 A e B).

 
  81

Na década de 1960 o vínculo de Stupakoff com a fotografia de moda para a


Rhodia possibilitou a publicação de suas fotos em O Cruzeiro (Figura 31C), uma das
principais revistas ilustradas brasileiras do século XX que, dentre os diversos assuntos
tratados em suas páginas, também abordava moda.

(A) (B)

(C)
Figura 31. Revistas nacionais com trabalhos de Stupakoff. (A) capa da revista Rio, n. 207, set. 1956.
(B) capa da revista Rio, n. 209, nov./dez. de 1956. (C) Capa e miolo de O Cruzeiro, setembro de 1960.
Fonte: (A) e (B) CERBINO, 2015; (C) Reprodução/Biblioteca Nacional.

Para além da reportagem sobre seu estúdio em Porto Alegre na edição n. 4 da


Módulo (1958), na capa da edição de número 12 de 1959 desta mesma revista (Figura
32A), Artur Licío Pontual utilizou a fotografia de Stupakoff, uma fachada em Ouro Preto,
sob o efeito gráfico de moiré 25.
Digna de nota também é a produção de Stupakoff para a revista Senhor. Foi um
periódico de cultura que circulou entre 1959 e 1964. Teve, nos seus três primeiros anos, um

                                                                                                               
25 Moiré é um resultado gráfico que deixa evidente os pontos que formam as imagens no papel acarretando uma

ilusão de ótica. O efeito ocorre quando há divergência na angulação dos pontos de cada camada da imagem.

 
  82

próspero desempenho com uma significativa tiragem – cerca de 50 mil exemplares –, e um


qualificado corpo de colaboradores, estabelecendo um diálogo fértil entre as artes visuais e o
design no Brasil. Segundo Edeson Ernesto Coelho, diretor da revista, a Senhor era uma
revista ideal que pagava bem os funcionários, imprimia com qualidade e comprava as fotos
dos melhores fotógrafos, como Otto Stupakoff (COELHO, 2004). A capa da Senhor de
dezembro de 1961 (Figura 32B) é de Stupakoff; o fotógrafo ainda publicou nas edições de
maio de 1962 – na seção “Humor” com O rapto da musa Art Nouveau (Figura 33A) – e julho
de 1962 – na seção “Pin-Up” com Mulher deitada para seu próprio conforto (Figura 33B).

(A) (B)
Figura 32. Revistas nacionais com trabalhos de Stupakoff. (A) Capa da revista Módulo n. 12,
fevereiro de 1959. (B) Capa da revista Senhor, dezembro, 1961.
Fonte: (A) Reprodução/Acervo Biblioteca FAU-USP (B) Reprodução/Coleção da autora.

(A)

 
  83

(B)
Figura 33. Trabalhos de Stupakoff para a revista Senhor (A) Maio, 1962, layout de Wesley Duke Lee e
texto de Mengo de Escamoens, fotos de Otto Stupakoff. (B) Julho, 1962, fotos de Otto Stupakoff.
Fonte: Reprodução das revistas/Acervo Biblioteca MASP.

Logo após sua primeira volta ao Brasil, no ano de 1979, Stupakoff publicou nas
revistas Íris (Figura 34) e Novidades Fotóptica (Figura 35 e Apêndice VIII), especializadas em
fotografia. Esses trabalhos fotográficos de caráter mais ensaístico procuraram ressaltar a
expressão pessoal do fotógrafo fora de um circuito mais comercial. Muitos dos fotógrafos que
tiveram seus portfólios publicados em Íris e Novidades Fotóptica atuavam na fotografia
comercial, vide Miro, Tripolli, J.R. Duran e Bob Wolfenson.

Figura 34. Páginas 54 e 55 da revista Íris, agosto de 1979. Fotos de Stupakoff. Fonte: Reprodução da
revista/ Acervo Biblioteca MASP26.

                                                                                                               
26 Os negativos fotográficos constam no Instituto Moreira Salles.

 
  84

Figura 35. Capa e página 22 da Novidades Fotóptica, dezembro de 1970 (ensaio com os filhos no Natal
de 1968). Fonte: Reprodução da revista/Coleção da autora27.
 
Revista  de  moda  brasileira, a Vogue Brasil foi lançada em maio de 1975 pela Carta
Editorial (VIANA, 2000) e esteve no portfólio da empresa até 2010. Foi uma publicação de
amplo destaque na década de 1970 (MELO; RAMOS, 2011), tanto por sua ampla difusão
quanto por sua inventividade editorial e requinte gráfico, já reconhecidos nas Vogue
pioneiras de outros países. Stupakoff, que era colaborador das Vogue europeias (comentadas
na próxima seção desse capítulo), fotografou a primeira capa brasileira, que estampou a
modelo Betsy Monteira de Carvalho, em 1975 (Figura 36A). Posteriormente fotografou o
escritor Jorge Amado para a capa e matéria de fevereiro de 1980 (Figura 36B).

(A) (B)
Figuras 36. Trabalhos de Stupakoff para a Vogue Brasil. (A) Vogue Brasil, n.1, 1975, modelo Betsy
Monteiro de Carvalho. (B) Vogue Brasil, fevereiro de 1980, ensaio com Jorge Amado e família.
Fonte: (A) www.vogue.globo.com/moda (B) Reprodução da revista.
                                                                                                               
27 Os negativos fotográficos constam no Instituto Moreira Salles.

 
  85

O fotógrafo contribuiu em diferentes momentos para essa publicação. Aqui


destacamos, na mesma edição de Jorge Amado, o editorial de moda de fevereiro de 1980
(Figura 37, Apêndice IX), e a célebre edição da Vogue Brasil 1990, n. 173 com a
apresentadora Xuxa Meneghel (Figura 38 e Apêndice X), além do especial Vogue Brasil em
Portugal de 1988 (Figura 39A) e a edição 169 da década de 1990 (Figura 39B).

Figura 37: Vogue Brasil, fevereiro de 1980, editorial de moda realizado em Salvador, modelo Mira.
Fotos de Stupakoff. Fonte: Reprodução da revista.

Figura 38: Vogue Brasil, janeiro 1990, editorial especial com Xuxa Meneghel. Fotos de Stupakoff.
Fonte: Reprodução da revista28.

                                                                                                               
28 Os negativos fotográficos constam no Instituto Moreira Salles.

 
  86

(A) (B)
Figura 39. (A) Vogue Brasil, 1988, editorial em Algarve, Portugal. (B) Vogue Brasil edição 169. Fotos
de Stupakoff. Fonte: Reprodução das revistas/Acervo Stupakoff no IMS.

Desde 2002, a RG Vogue da Carta Capital, foi parte das publicações brasileiras
para o setor de moda e comportamento feminino29. Para o periódico, Stupakoff fotografou as
edições com a cantora Ivete Sangalo (fevereiro, 2007, Apêndice XI), com as atrizes Carolina
Dieckmann (julho, 2006), Alice Braga (julho, 2007) (Figura 40A) e Juliana Paes (junho,
2006) (Figura 40B). Lembrando que essas são produções que marcam o retorno de Stupakoff
à fotografia comercial (ver perfil biográfico no capítulo 1 do presente estudo).

(A) (B)  

Figura 40. (A) RG Vogue, julho de 2007, editorial com Alice Braga. (B) RG Vogue, junho de 2006,
editorial com Juliana Paes. Fotos de Stupakoff. Fonte: Reprodução das revistas/Coleção da autora.
                                                                                                               
29 Após o fim da parceria entre Carta Capital e Condé Nast, a RG Vogue circula online com o nome RG.

 
  87

A revista MIT (da Mitsubish Motors) de junho de 2008 (Figura 41, Apêndice
XII) foi o último vínculo de Stupakoff com os editoriais de moda. Na ocasião, o fotógrafo
anunciou que esse seria seu último trabalho para o segmento editorial (BERGAMO, 2008).
Ele veio a falecer meses depois.

Figura 41: MIT, junho, 2008, último editorial de moda de Stupakoff.


Fonte: Reprodução da revista/Coleção da autora.

As revistas da editora Abril


Merece um comentário mais pormenorizado a colaboração de Otto Stupakoff com
a Editora Abril. Ele começou a trabalhar para a empresa por indicação de Wesley Duke Lee
ao redator chefe Thomaz Souto Corrêa e foi assíduo colaborador dos periódicos dessa editora.
A indicação de Stupakoff deu-se por conta da sua experiência profissional e de um portfólio
diferenciado que o qualificava a ilustrar inúmeras reportagens (CORRÊA, 2017)30.
Colaborou com revistas como Manequim, Cláudia, Realidade, Quatro Rodas e
Playboy. Entre os destaques editoriais pela Abril estão seus trabalhos para a revista Claudia,
para a qual Stupakoff iniciou colaboração em outubro de 1963 (Figura 42A), registrando uma
das primeiras fotografias a substituir as capas ilustradas, técnica utilizada em todos os
números anteriores do periódico31, e continuou colaborando com outras capas (Figura 42B e
Apêndice XIII).
Claudia foi a primeira revista feminina do Grupo Abril, lançada em 1961, sob o
comando do jornalista Luís Carta. Essa publicação é vista como pioneira em técnicas
jornalísticas de abordagem do público feminino e também na produção de reportagens de

                                                                                                               
30CORRÊA, Thomaz Souto. Fonte oral. Depoimento concedido a Patricia Kiss Spineli em 5 de maio de 2017.
31Segundo Thomaz Souto Corrêa, Claudia originou-se a partir de uma revista veiculada na Argentina, esta
produzia as capas desenhadas e as enviava ao Brasil.

 
  88

moda seguindo tendências editoriais mundiais (MARTINS; LUCA, 2013) (Figura 43 e


Apêndice XIII). Vale destacar que Claudia teve como um dos grandes marcos editoriais
(além de matérias sobre cozinha experimental e conselhos de especialistas) a produção de
reportagens de moda com o objetivo de inspirar as leitoras as quais, nesta época, ainda
faziam suas roupas na costureira de confiança ou costuravam por si (CORRÊA, 2008;
PRADO; BRAGA, 2011).

(A) (B)
Figura 42. (A) Claudia, capa, outubro de 1963, modelo Karen Rodrigues. (B) Claudia, capa, agosto de
1964. Fotos de Otto Stupakoff. Fonte: Reprodução das revistas/Acervo Biblioteca ECA-USP.

Figura 43. Claudia, páginas internas, agosto de 1964. Fotos de Otto Stupakoff.
Fonte: Reprodução da revista/Acervo Biblioteca ECA-USP.

O periódico assumiu a liderança no mercado de revistas femininas e inovou ao


tratar de temas relevantes como aborto, sexualidade e divórcio, principalmente através da
seção de artigos de Carmem da Silva em A arte de ser mulher. Essa seção, que promovia o

 
  89

debate e a reflexão da condição da mulher e sua emancipação nos anos 1960, foi quase
exclusivamente fotografada por Stupakoff e sempre abria em página dupla com foto em preto
e branco (Figura 44 e Apêndice XIII) e título instigante. Foi sucesso tanto pela temática e
quanto pela expressão gráfica do layout (CORRÊA, 2008, p. 9).

Figura 44. Claudia, novembro de 1966. Foto de Otto Stupakoff.


Fonte: Reprodução da revista/Acervo Biblioteca ECA - USP.

Sob a direção de arte de Attilio Baschera, Claudia apresentou como diferencial


para a época um layout mais moderno e elegante (MARTINS; LUCA, 2013). As fotografias de
Stupakoff faziam jus a esse tipo de layout e, em conjunto com a arte de Baschera, mostraram
um resultado informativo e com qualidade internacional. As fotografias de Stupakoff foram
publicadas nas capas, nas matérias, nas reportagens de moda da revista e também nos
publieditoriais da Rhodia (discutidos anteriormente), embora esses não se restringissem aos
espaços publicitários, sendo muitas vezes usados na própria capa.
Stupakoff também colaborou com a Quatro Rodas produzindo fotografias para as
edições de dezembro de 1963 (Figura 45) e janeiro de 1964. A Quatro Rodas é reconhecida
por ser a primeira revista brasileira a ter o automóvel como pauta principal. Surgiu em agosto
de 1960 como iniciativa de atender os leitores interessados no turismo e na indústria
automobilística. Essa linha editorial converge com o momento histórico de nascimento da
indústria automobilística brasileira. Stupakoff, como fotógrafo publicitário, produzia
imagens para Ford, Volkswagen, Mercedes-Benz e Alfa-Romeo. No entanto, para a edição de
dezembro de 1963 (Figura 45), ele se distanciou da imagem do automóvel e contribuiu com
fotos para uma grande reportagem apresentando a Bahia. Essas fotos ilustram o cotidiano da
região a qual os editores chamaram de Bahia pitoresca.

 
  90

Figura 45. Quatro Rodas, dezembro, 1963. Fotos de Otto Stupakoff.


Fonte: Reprodução da revista/Coleção da autora.

Inspirada no new journalism norte-americano, em que assuntos polêmicos e


contemporâneos são abordados de maneira crítica e com cunho autoral (WEINGARTEN,
2006), inclusive no trato fotográfico, a editora Abril lançou em 1966 a revista Realidade.
O auge da revista abrange os anos de 1966 a 1968, com tiragem de 450 mil
exemplares, período em que se consolidaram os principais traços de sua produção e seu
projeto histórico (FARO, 1999), destacando-se seu corpo de jornalistas e fotógrafos de
primeira linha. Pela abrangência dos temas que reportou e pela maneira como o fez,
Realidade é referência nacional no campo cultural e de produção jornalística. A força visual
da revista residia no tratamento dado à fotografia em suas páginas; entre os fotógrafos
colaboradores assíduos apareceram nomes significativos da fotografia brasileira como
Cláudia Andujar, Lew Parrella e George Love. Stupakoff, mesmo residindo em Nova York no
período, contribuiu em duas edições da revista: Maio e Junho de 1966 (Figuras 46A e 46B).

 
  91

(A) (B)

Figura 46. (A) Realidade, n. 2, maio de 1966. (B) Realidade, n. 3, junho de 1966, modelo Paula
Pritchett. Matéria Receita de Mulher, fotografias a partir do poema de Vinícius de Morais.
Fotos de Otto Stupakoff. Fonte: Reprodução da revista/Coleção da autora.

No segmento das revistas masculinas da Editora Abril, a contribuição de


Stupakoff foi menos expressiva. Para a Playboy, o fotógrafo publicou A noite no trem, de
1979; realizou o ensaio da atriz Angelina Muniz (Figura 47A), para a edição número 60,
publicada em julho de 1980 e As garotas de Playboy de abril de 1980 (Figura 47B).

Figura 47. (A)


Playboy, julho de
1980, modelo
(A) Angelina Muniz. (B)
As garotas de
Playboy, abril, 1980.
Fotos de Otto
Stupakoff. Fonte:
Reprodução/Coleção
da autora.
 

(B)

 
  92

2.3.5 Publicação em periódicos - revistas estrangeiras


A partir da sua ida para os Estados Unidos em 1965, a produção de Stupakoff
torna-se cada vez mais presente em uma série de periódicos estrangeiros. Em meados de
1960, ele tem trabalhos publicados nas mais significativas revistas de moda internacionais,
assim como também em revistas de menor projeção cultural. Nos Estados Unidos, publica na
Cosmopolitan, Look Magazine, Harper’s Bazaar, Glamour, Esquire, McCall’s, Ladies Home
Journal, Seventeen, Good House-Keeping, Town & Country, New York, Photography e GQ.
Na Europa, suas fotografias estão na Vogue (francesa, italiana, inglesa), Elle, Marie Claire,
Freulien, Brigitte, Petra, Stern e Madame Figaro.
Ainda em 1956, posteriormente aos seus estudos nos EUA, Stupakoff teve uma
fotografia publicada na edição de fevereiro da Popular Photography, uma das revistas de
maior circulação internacional no segmento (o periódico
octagenário encerrou as atividades em 2017) e com viés
editorial que contemplava a informação e a discussão
técnico-artístico da fotografia. A figura 48 mostra a
primeira publicação conhecida de Stupakoff em uma
revista estrangeira.
A sesquicentenária revista Harper’s Bazaar
(lançada em 1867), conjuntamente à Vogue, é a mais
influente publicação de moda do mundo. Harper’s e
Vogue foram pioneiras na inserção de fotografias em
suas páginas e com isso consolidaram um tipo de
jornalismo de moda que é praticado ainda atualmente.

Figura 48. Revista Popular O requinte e a rigidez das revistas femininas


Photography, fevereiro, 1956. Foto de europeias dominaram no período entre guerras. Esse
Otto Stupakoff. Fonte: Reprodução da
revista/ Google Books. paradigma imagético foi rompido somente em 1945 em
  Nova York com a Harper’s quando esta passa a apresentar uma visão mais espontânea e
natural da jovem americana. Esse estilo foi a base da foto de moda pós-década de 1950,
direcionada por editores de arte como Alexander Brodovitch em páginas duplas da revista
(BREUILLE, 2011). Seguidamente a Brodovitch, que encerraria suas atividades na revista em
1957, entrariam na Harper’s as diretoras de arte Ruth Ansel e Bea Fleiter; com elas,
Stupakoff trabalhou ativamente.
Stupakoff colaborou com a Harper’s Bazaar de 1965 a 1972 (BURGI, 2017).
Como já mencionado no perfil biográfico, seu primeiro trabalho para a revista foi o retrato do
ator austríaco Oskar Werner, em outubro de 1965; um ponto de inflexão em sua carreira foi
uma de suas primeiras matérias de moda para a Harper’s de 1967, com a atriz Leslie Bogart
(apresentada no capítulo 4) a convite de Bea Feitler. A continuidade da inserção de seus

 
  93

trabalhos nessa revista foi para ele “um grande progresso em sua busca pessoal” (MARRA,
2005, p.3) (Figura 49 e Apêndice XIV).

Figura 49. Editorial para a Harper’s Bazaar, setembro, 1972. Fotos de Otto Stupakoff.
Fonte: Reprodução da revista.

Outra revista de moda e comportamento feminino estadunidense para a qual


Stupakoff contribuiu assiduamente na década de 1960/1970 e depois na década de 1980 foi
Glamour, do grupo Condé Nast (Figura 50 A, B e C).

(A) (B) (C)

Figura 50. (A) Glamour, setembro, 1968 (B) Glamour, 1970 (C) Glamour, setembro, 1984. Fotos de
Otto Stupakoff. Fonte: Reprodução das revistas.

Como já citado, o outro polo de influência mundial na imprensa de moda é a


revista Vogue lançada em 1892 por Condé Nast. Além de ser uma publicação dedicada à

 
  94

moda, ela se estende à abordagem do comportamento feminino em geral. No jargão


jornalístico, Vogue é o carro-chefe de um dos maiores grupos internacionais de edição de
revistas. Com sede em Nova York, possui subsidiárias em diversos países europeus, sendo
que Stupakoff fotografou principalmente para a Vogue França (Figura 51 e Apêndice XV)
durante a década de 1970.

Figura 51. Editorial para Vogue França, setembro, 1974. Fotos de Otto Stupakoff.
Fonte: Reprodução da revista.

Para além das edições do grupo Condé Nast, Stupakoff fotografou para outras
revistas francesas de significativa projeção internacional, como Elle (Figura 52). As
produções para as revistas européias demandavam viagens por todo o continente europeu,
assim como para outras localidades como Islândia, Quênia, Índia, Rússia para a Vogue
(1974), Ilhas Mauricius e Marrocos para a revista encartada no Le Figaro (1990) e Alaska,
Japão e Tailândia para a Vanity Fair (1992), imprimindo em seus editoriais a composição de
ambientes diversos.

 
  95

Figura 52. Elle francesa, janeiro, 1974. Fotos de Otto Stupakoff. Fonte: Reprodução da revista.

Não menos importante foi o trabalho de Stupakoff para a Ladie’s Home Journal
(surgida em 1883), uma tradicional e popular revista do segmento feminino norte americano
que aborda temáticas como relacionamentos, beleza, comportamento e atualidades diversas.
O ensaio com a família presidencial Nixon, mencionado no capítulo 1, apareceu nas páginas
deste periódico. Na Ladie’s Home Journal foram publicados trabalhos de Stupakoff entre
1970 e 1973 (Figura 53 A e B; Apêndice XVI).

(A) (B)
Figura 53. (A) Capa da Ladies’ Home Jornal Nixon e sua filha, julho de 1972. (B) Capa da Ladies’
Home Jornal com Margareta, novembro de 1969. Fonte: Reprodução das revistas/Coleção da autora.

Apesar do trabalho editorial de Stupakoff se concentrar nas revistas femininas, o


fotógrafo colaborou pontualmente para periódicos dos EUA voltados ao público masculino

 
  96

como a GQ (Figura 54) e a Esquire (Figura 55) produzindo tanto matérias de moda
masculina quanto de comportamento.

Figura 54. GQ, novembro, 1982. Fotos de Otto Stupakoff. Fonte: Reprodução da revista.

Figura 55. Esquire, julho, 1966. Foto de Otto Stupakoff. Fonte: www. archive.esquire.com

Além das revistas pontuadas acima, no Apêndice II há uma lista de periódicos nos
quais fotografias de Stupakoff foram publicadas.

2.3.6 Arquitetura
A fotografia de arquitetura está entre os trabalhos menos conhecidos e divulgados
de Otto Stupakoff. Destacamos aqui dois conjuntos: os registros de Ouro Preto e Brasília
(Figura 56), ainda na década de 1950, e, posteriormente, o registro da arquitetura de Aurelio
Martinez Flores (LAGO, 2002), arquiteto mexicano radicado em São Paulo.
Em 1958, Stupakoff registrou as obras em construção dos arquitetos Oscar
Niemeyer e João da Gama Figueiras de Lima (popularmente conhecido como Lelé) em
Brasília, sob a encomenda de Niemeyer. No mesmo ano, fotografou o estilo barroco e as ruas

 
  97

estreitas e sinuosas da histórica cidade de Ouro Preto. Essa produção de Stupakoff foi
resgatada por Fernando Laszlo em 2005 para a exposição na galeria Espasso em Nova York32
(LASZLO, 2017).

(A) (B)
Figura 56. (A) e (B) Registros fotográficos da cidade de Ouro Preto, 1958.
Fonte: Instituto Moreira Salles.

O apreço de Stupakoff por projetos de arquitetura fica evidente em sua declaração


“A arquitetura sempre foi a minha maior paixão, meu maior interesse” (MENDES; ARRUDA,
2001, p. 7) e na iniciativa em projetar seu primeiro estúdio em Porto Alegre (ver perfil
biográfico no capítulo 1 do presente estudo). No entanto, Stupakoff deixa evidente que nunca
se ateve a esse tipo de imagem, declarando ter arquivado as fotos de Brasília e Ouro Preto e
que não mais recorreria a esse tema, tendo voltado a fotografar arquitetura somente nos anos
2000 em atenção ao amigo Aurelio Martinez Flores para quem produziu fotografias de
externas e de interiores publicadas no livro Aurelio Martinez Flores – Arquitetura (LAGO,
2002) (Figuras 57 A e B; Apêndice XVII).

(A) (B)
Figura 57. Projetos de Aurelio Martinez Flores, fotos de Stupakoff. (A) Residência Zaragoza, Guarujá,
São Paulo, 1973 e (B) Casa Rua Suécia São Paulo. Fonte: LAGO, 2002.

                                                                                                               
32 Texto do Convite para exposição Espasso, 2004. Acervo: Fernando Laszlo.

 
  98

2.3.7 Fotografias para livros e catálogos de arte


Assim como seu trabalho para arquitetura, o registro de obras de arte é uma
vertente fotográfica de Stupakoff pouco conhecida. Ele registrou obras de arte para
publicações como o livro de luxo sobre a vida e obra de Manabu Mabe, 1986 (BARDI, 1986) e
o livro Cubistas e futuristas do Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São
Paulo de 1965. Também passou dois meses no México produzindo imagens em grande
formato para o livro sobre o Museu de Antropologia da Cidade do México, ca. 1966 (Figura
58) e o Art to Wear (DALE, 1986) 33 com fotos para diversos estilistas: Dina Knapp, Raoul
Spiegel, Jamie Summers, Norma Rosen, entre outros e peças como artigo de arte (Figura 59).

Figura 58: Fotos do Museu de Antropologia da Cidade do México. Fotos de Stupakoff.


Fonte: VÁZQUEZ, 1994.

Figura 59. Páginas do livro Art to Wear. Fotos de Stupakoff. Fonte: DALE, 1986.

                                                                                                               
33 Art to wear é um livro; no entanto, Stupakoff não aprecia o projeto por considerá-lo mais um catálogo, um

image book, que nos termos da moda apresenta a marca e se restringe a documentação das vestimentas.

 
  99

2.4 A produção de Otto Stupakoff: exposições


As exposições mais significativas na carreira de Stupakoff foram realizadas no
Brasil: MASP/1978, São Paulo Fashion Week /2005, IMS/2009 e IMS/2016–2017. Além de
terem sido voltadas exclusivamente para a obra do fotógrafo, também mostram um
panorama de sua produção, com uma significativa quantidade de imagens expostas.
MASP/1978 contemplou as fotografias dos treze anos de trabalho fora do Brasil,
São Paulo Fashion Week/2005 marcou a retomada do fotógrafo no país, IMS/2009 foi uma
mostra apresentando seu acervo depositado no Instituto Moreira Salles e IMS/2016–2017
trouxe uma retrospectiva que aborda mais profundamente sua obra. Abaixo também são
comentadas outras exposições de importância ímpar e que foram marcos na carreira de
Stupakoff, como a da Petite Galerie em São Paulo, primeira vez em que expôs fotografias e
colagens em uma galeria de arte.
Os anos 1960 impulsionaram os fotógrafos brasileiros a conquistarem espaços
tradicionalmente consagrados às artes plásticas. Dentro desse contexto, a Petite Galerie,
galeria paulistana da época e reconhecida por sua significativa programação, expôs o
trabalho de fotografias e colagens de Stupakoff em 1963.
A entrada da fotografia nos museus de arte já ocorrera no final da década de 1940
– em 1948 no MASP Thomaz Farkas foi o primeiro fotógrafo a realizar uma mostra
individual em um museu de artes – mas foi na década de 1960 que a fotografia ingressou no
circuito comercial via galeria de arte (COSTA; SILVA, 2004), um recinto consagrado às artes
plásticas que, a partir desse período, estendeu-se à fotografia.
Stupakoff não foi o primeiro a expor e vender fotografias em espaços de arte,
visto que tentativas parecidas já haviam ocorrido em São Paulo (SALVATORE apud COSTA;
SILVA, 2004). No entanto, a exposição na Petite Galerie (Figura 60) se destacou por ter
ampla cobertura de críticos tradicionalmente vinculados às artes, com resenhas em jornais,
revistas e suplementos literários e artísticos. Além de expor a primeira mostra individual de
um fotógrafo em uma galeria de arte no Brasil, também foi a primeira vez que apresentava
algo do gênero em seu espaço expositivo: “Mediante dois processos assimétricos, a
colagem e a fotografia, Otto Stupakoff apresenta sua exposição dupla na Petite Galerie”
(VIEIRA, 1963, p.3).
Aberta em 21 de janeiro de 1963, a exposição contava com 50 fotografias
exclusivamente de cunho pessoal (como retratos de artistas) e 15 colagens (ÊLES... 1963)
com organização e curadoria do fotógrafo Lew Parrella. O texto para o folder da mostra
enfatiza algumas características importantes da fotografia de Stupakoff, principalmente seu
aspecto de construção e a experiência com trabalhos na área de publicidade:

 
  100

(…) As fotos da exposição convidam-nos a especular em como é inata sua


inclinação a construir, ou em quanto a sua experiência em ilustração de
propaganda influenciou as suas abordagens pessoais. […] Em expressões que
seguem a tradição dos grandes fotógrafos do passado, mas que nos dizem
das coisas dos dias de hoje. (PARRELLA, 1963, p. 1).

(A)   (B)  

Figura 60. Exposição da Petite Galerie, 1963: (A) Teatro Santana (1962); (B) Fernando Odriozola
(ca.1961). Fonte: Instituto Moreira Salles.

De maior monta foram as exposições de Stupakoff no Museu de Arte de São Paulo


(MASP), na São Paulo Fashion Week e no Instituto Moreira Salles. O MASP, desde a sua
fundação em 1947, possui um histórico de realização de exposições nacionais e internacionais
de fotografia, assim como de outras atividades relacionadas à prática fotográfica (TABOADA,
2011). Em 1976, foi criado o Departamento de Fotografia do MASP, sob a supervisão de
Claudia Andujar. No mesmo período, o então diretor Pietro Maria Bardi manifestou o
interesse institucional pela aquisição de fotografias e itens relacionados, com o intuito de
formar uma coleção com verba própria ou através de doações (SOARES, 2006). Desde então,
diferentes conjuntos fotográficos considerados pelo seu potencial arquivístico têm sido
incorporados ao acervo artístico do MASP.
Dentro desse contexto histórico de exposições fotográficas no MASP, a convite de
Bardi, Stupakoff apresentou uma antologia de 20 anos de sua carreira em uma mostra
individual viabilizada em 1978 (Figura 61) com imagens selecionadas pelo próprio fotógrafo
(STUPAKOFF, 1978a) e consultoria de Wesley Duke Lee. Nos anos 1990, Stupakoff também
teve algumas de suas imagens expostas e incorporadas ao acervo da Coleção Pirelli/MASP
nas edições 1 (de 1991), 12 (de 2003) e 19 (de 2012).

 
  101

(A) (B)

Figura 61: Fotografias de Stupakoff expostas no MASP/1978; (A) Kolkata, Índia (ca. 1968);
(B) Margareta, Puerto Vallarta, 1972. Fonte: Instituto Moreira Salles.

Os primeiros contatos entre o MASP e o fotógrafo para uma exposição datam do


começo de 1970 quando a intenção de Pietro Maria Bardi era expor Stupakoff conjuntamente
a fotógrafos norte-americanos e alguns brasileiros. Na impossibilidade de realizar essa
exposição coletiva justificada pelo fato de que “(...) o ambiente aqui em São Paulo não
permite fazer, juntamente com os trabalhos dos fotógrafos americanos, uma exposição com
fotógrafos brasileiros (pelas brigas, etc.)” (BARDI, 1970b, p.1), Bardi disponibilizou à
Stupakoff a sala de exposições do Museu “(...) especialmente dedicada à influência que você
exerceu na própria arte brasileira, uma exposição que conte toda a sua história de fotógrafo e
artista” (BARDI, 1970b, p.1).
Stupakoff recuou diante desse primeiro convite alegando não ter fotografias com
qualidade para esse tipo de exposição, apesar de Bardi deixar claro que as fotografias de
Stupakoff – referindo-se aqui a cinco imagens enviadas por Stupakoff – o entusiasmaram
muito (BARDI, 1970b). Esse apreço também foi demonstrado na edição de um álbum de
fotografias de Stupakoff pela galeria Mirante das Artes da qual Bardi era proprietário
(FERNANDES JUNIOR, 2013).
O convite de Bardi foi reiterado em 1977 justificando que o MASP desenvolvia um
trabalho dedicado à divulgação da fotografia, tinha uma plateia apreciadora desse meio de
expressão e almejava divulgar trabalhos de grandes fotógrafos (BARDI, 1977). A exposição
negociada no início de 1970 se concretizou em 1978 com a apresentação da retrospectiva de
20 anos de carreira de Stupakoff.
A exposição MASP/1978 originou a publicação do livro Otto Stupakoff pela Práxis
Gráfica Propaganda e Editora (STUPAKOFF, 1978d) contendo 57 imagens para tiragem de
1.000 exemplares com projeto gráfico de Wesley Duke Lee. No final da década de 1970 estava

 
  102

sendo desenvolvido no Brasil um mercado editorial para fotografias, e a editora Práxis34


promovia produtos de qualidade em padrão e acabamento gráfico (KNYCHALA, 1980). No
entanto, Stupakoff considerava o catálogo publicado uma amostra insuficiente da sua
produção – pelo processo de seleção para escolha das imagens ali contidas (STUPAKOFF,
1978a), foram inseridas apenas 57 das 200 imagens expostas. A exposição também contava
com projeção de slides e um grande mapa mundi35 que continha linhas vermelhas delineando
a cruzada pessoal do fotógrafo pelos continentes e que dialogava com as fotografias
registradas no Vietnã, Bali, Índia, Islândia, Irlanda, Ceilão, Córsega, Irã, Dinamarca,
Itália, Inglaterra, Porto Rico, Brasil, entre outros países visitados pelo fotógrafo. Com
todas essas apresentações, Stupakoff considerou a exposição MASP/1978 a maior já
realizada sobre seu trabalho.
Essa exposição foi importante na apresentação nacional do trabalho de Stupakoff,
tanto por apresentar uma retrospectiva de sua carreira quanto por despertar interesses em
outros profissionais, como o fotógrafo Bob Wolfenson, que conheceu e apreciou as fotos de
Stupakoff via exposição do MASP (WOLFENSON, 2017).
Os caminhos de Wolfenson e Stupakoff se cruzariam novamente décadas depois.
Com curadoria do primeiro e do também fotógrafo Fernando Laszlo, a edição de 2005 da São
Paulo Fashion Week apresentou a exposição Moda Sem Fronteiras: Otto Stupakoff 1955 –
2005. Essa exposição (Figura 62) contou com cerca de 80 imagens e alguns painéis, uma
antologia dos 50 anos de profissão do fotógrafo. Segundo Wolfenson (2017) e Laszlo (2017), a
direção da curadoria foi a de contemplar a fotografia de moda e retratos de personalidades
pelo viés da própria Semana de Moda. Como ressaltado anteriormente no perfil biográfico
(capítulo 1), essa exposição teve importância ímpar para o ressurgimento do interesse pela
obra de Stupakoff no Brasil e na sua volta à fotografia.
Os curadores acessaram o acervo de Stupakoff espalhado entre a residência do
fotógrafo e de alguns dos seus filhos para fazer a seleção do material (CHAGAS, 2005;
LASZLO, 2017; WOLFENSON, 2017). O próprio Stupakoff acompanhou e interagiu com os
curadores para a identificação das obras.

                                                                                                               
34 A partir de 1976, a Práxis passa a publicar livros de fotografias. Foram editados, entre outros, fotógrafos como

Lew Parrella, Claudia Andujar e Maureen Bisilliat.


35 Um mapa semelhante ficava no estúdio do Soho (NY), no qual Stupakoff colocava linhas coloridas das viagens

(cada cor era um tipo de trabalho). A aparência do mapa era uma cobertura total de linhas, significando muitas
viagens (CORRÊA, 2017).

 
  103

(A) (B)

Figura 62. Fotografias da exposição SPFW, 2005: (A) Marisa Berenson, 1983; (B) Hotel St Regis,
Harper's Bazaar, Nova York, 1972. Fonte: Instituto Moreira Salles.

Quatro anos depois, em 2009, o Instituto Moreira Salles (do Rio de Janeiro)
realizou uma nova exposição (Figura 63). A curadoria de Sérgio Burgi explorou os cinquenta
anos de fotografia de Stupakoff e foi direcionada para os retratos de personalidades – Tom
Jobim, Jack Nicholson, Sharon Tate, Truman Capote, entre outros –, e imagens menos
conhecidas – instantâneos de rua (Sudeste Asiático, México, Índia), nus e geometrismos.
Essa exposição no IMS foi uma retrospectiva com 89 imagens em preto e branco e apenas
uma colorida (Jardins de Boulogne, publicada na revista Town & Country nos anos 1970, ver
Figura 162B)36 em formatos de impressão variados. Também foram contempladas algumas
outras fotografias de sequências como da série Homenagem a Balthus.

(A) (B)

Figura 63. Fotografias de Stupakoff na exposição IMS 2009: (A) Maria Tallchief, 1954;
(B) Mulher Pássaro, ca. 1980. Fonte: Instituto Moreira Salles.

                                                                                                               
36 Vale informar que algumas das imagens da exposição, apesar de serem originalmente cor, foram expostas em

preto e branco, e.g. Mulher pássaro, figura 63B.

 
  104

Segundo Burgi, a reunião das imagens feitas pelo IMS em 2009 foi uma
introdução ao trabalho de Stupakoff: “Discuti muito com o Otto essa mostra, é uma espécie
de cartão de visitas à obra dele, que ainda tem muito a ser estudada” (BURGI apud GIOIA,
2009, p. 5) e “Quisemos fazer uma exposição inicial para mostrar como havia uma interface
entre sua linguagem pessoal e seu trabalho de moda” (BURGI apud VELASCO, 2009, p.1).
Outra exposição estava programada como precursora da retrospectiva de Stupakoff
programada pelo IMS para 2011 após a digitalização de todo o acervo (VELASCO, 2009, p.1),
mas esta foi aberta ao público somente no final de 2016.
Entre dezembro de 2016 e abril de 2017, o IMS no Rio de Janeiro apresentou uma
retrospectiva dedicada à obra de Stupakoff intitulada Otto Stupakoff: beleza e inquietude
(Figura 64 A e B) com curadoria de Bob Wolfenson e Sergio Burgi, a maior sobre o fotógrafo
já realizada até o momento. Essa retrospectiva reuniu aproximadamente 300 fotografias,
publicações e vídeos como um recorte da extensa produção do fotógrafo, realizada entre 1955
e 2005. Abordou quatro temas principais: (1) anos 1950 com formação e primeiros trabalhos;
(2) de 1960 a 1970 e sua colaboração com as principais revistas de moda do mundo (e.g.
Figura 64A); (3) sua série de nus; e (4) fotografias de viagens (e.g. Figura 64B) e família. Nessa
exposição, um diferencial da apresentação da obra de Stupakoff foi a inserção de colagens e
assemblages resultado de sua atuação nas artes plásticas ao longo de toda a sua trajetória.

(A) (B)

Figura 64. Fotos de Stupakoff na exposição IMS, 2016/17: (A) Vogue francesa, Baden-Baden, 1974;
(B) Saigon, Vietnã, 1968. Fonte: Instituto Moreira Salles.

Segundo Burgi, o intuito da retrospectiva foi revelar as múltiplas facetas da obra


de Stupakoff (TESSITORE, 2016) e dar uma visão ampla da trajetória do fotógrafo. Essa
visão foi confirmada por Bob Wolfenson, também curador, que salientou a prática dos
curadores em imergir na obra de Stupakoff e encontrar novos nexos para além da figura
conhecida como fotógrafo de moda, apresentando um Stupakoff multifacetado (REINA, 2016).
Desde de meados de 1950, eventos menores, mas não menos importantes,
também contaram com obras de Stupakoff. Sua primeira exposição individual no Brasil data

 
  105

de 1955 no Instituto Cultural Brasileiro Norte Americano (ICBNA), em Porto Alegre. Na


ocasião, foram expostas fotografias em preto e branco e cor oriundas do seus trabalhos de
formação em Los Angeles.
Pode-se destacar também as mostras coletivas na Oca/Rio de Janeiro em 1956,
ocasião em que expôs fotografias produzidas durante os estudos em Los Angeles. No New
York World Fair, Pavilhão Kodak em Nova York (com o tema O mundo e seus povos, na qual
obteve medalha de prata) e no Museu Municipal Haia na Holanda, ambas em 1964, como
também na 43ª Exhibition of the Art Director’s Club of New York (em que recebeu certificado
de mérito) em 1965. No Brasil, foram importantes as mostras coletivas: Criança brasileira,
encomendada pela Vasp, no Museu de Imagem e Som/RJ, em 1979; em 1985, no MAC/USP,
uma retrospectiva da produção fotográfica dos anos 1960; participação na Coleção
Pirelli/MASP nas edições 1 (1991), 12 (2003) e 19 (2012); 3º Jamenson Mostra SP de
Fotografia em 2012; e na exposição de parte do acervo do Museu de Arte Brasileira da FAAP,
a Momentos e Movimentos em 2012. Além disso, Stupakoff também apresentou fotografias
em galerias como Underground Gallery (Nova York, em 1964), Galeria Luz e Sombra37 (Rio
de Janeiro, em 1980), Staley-Wise Gallery (Nova York, em 1982 e 1992), Exposição
retrospectiva da Série Arquitetônica, década de 1950 na Galeria Espasso (Nova York, 2004) e
na Leo Burnett (São Paulo, em 2007). Uma lista com estas e outras exposições pode ser
visualizada no Apêndice II.

2.5 Uma síntese


A amostra dos trabalhos fotográficos de Otto Stupakoff apresentada neste
capítulo explicita a dimensão do universo de atuação do fotógrafo. A evidência de um
significativo material editorial nas revistas brasileiras e estrangeiras, principalmente
relacionado à moda e comportamento feminino, demonstra uma sólida e constante, mas não
restrita, atuação de Stupakoff nesse segmento. Outros materiais publicados – publicidade e
materiais promocionais, capas de discos, arquitetura e livros – manifestam a sua
diversificada produção.
Ainda na explanação sobre essa produção, percebe-se que alguns trabalhos com
viés comissionado foram resultado de uma prática fotográfica mais documental, como visto
no registro de crianças brasileiras realizado para a VASP e nas fotos para a Lion-Caterpillar.
Sobre isso, Stupakoff considerou o trabalho para a Lion-Caterpillar o melhor que fez no
Brasil nessa época (1978) devido ao assunto ‘boia-fria’ ser cativante para ele: “(...) um homem
praticamente feliz, por uma questão que ele não espera que o impossível aconteça um dia: ele
vive o agora, aqui nesse momento” (STUPAKOFF, 2000b, p. 10). Stupakoff apontou que a

                                                                                                               
37 Essa galeria criada no final dos anos 1970 se destaca conjuntamente à criação da FUNARTE e da Fotogaleria

como um novo ciclo de reconhecimento e organização da fotografia brasileira no final da década de 1970
(FERNANDES JUNIOR, 2003).

 
  106

significância desse trabalho está na validade do argumento, revelando que “(...) o assunto me
fez descobrir que na realidade eu teria me dado muito melhor como fotógrafo fazendo
reportagens do que fazendo moda”. (STUPAKOFF, 2000b, p. 29). Sobre esses trabalhos, vale
destacar que Stupakoff se aproxima do registro de uma realidade tendo como perspectiva sua
visão própria do mundo, um modo singular de ver o retratado dentro de um contexto. Essa
visão de Stupakoff se distancia de outros fotógrafos brasileiros que produziam fotos
documentais com viés de denúncia, vista na representação das condições precárias dos
trabalhadores rurais ou no registro da exploração do operário brasileiro – vide Nair
Benedicto –, por exemplo.
O impulso para fotografar os trabalhadores rurais e crianças brasileiras em
situações diversas reflete ainda o interesse de Stupakoff em pessoas cuja felicidade – ou ao
menos sugestão de – independeria de poses materiais (STUPAKOFF apud NOGUEIRA, 1979),
um contraponto à moda que necessita da evidência dos bens materiais. Para Stupakoff, o
assunto em si não tinha importância quando o objetivo da fotografia de moda era apenas a
comercialização; ela só adquiriria relevância quando o registro refletisse alguma expressão
artística (o que fez para a Vogue de todas as nacionalidades: francesa, inglesa, italiana,
espanhola e brasileira) (STUPAKOFF, 2000b).
Cabe ressaltar que o vultoso material fotográfico de Stupakoff também foi
resultado das inúmeras viagens realizadas pelo fotógrafo ao redor do mundo ao longo de sua
trajetória profissional, cujos registros estão tanto no âmbito da moda quanto no âmbito
pessoal, com fotografias de rua e viagem.

 
  107

CAPÍTULO 3

3. Considerações sobre folhas de contato, seleção e edição


A criação fotográfica relaciona-se intimamente com aquilo que François Soulages
(2005) denominou de fotograficidade. A fotograficidade é a articulação entre o irreversível –
a obtenção da imagem fotográfica (analógica ou digital) (ou irremediável, na acepção de
DUBOIS, 2012) – e o inacabável, o trabalho após o registro da imagem. Em torno da
conjuntura estética da fotograficidade, são três as realidades que especificam a fotografia: as
condições de possibilidades de uma foto, a foto em si e as condições de obtenção da foto.
No trabalho com a fotografia, há o estudo das condições de possibilidade de uma
foto. Soulages (2005, 2010) delimita como correlatos intencionais de qualquer imagem
fotográfica o objeto a fotografar, o sujeito que fotografa e o material fotográfico. O material
fotográfico per se é classificado como terceira etapa, que é o trabalho com o negativo, a
seleção do fotograma que será ampliado, a passagem do negativo à foto e a edição da foto.
Para a análise feita no presente trabalho, partiremos do conceito de que seleção é uma
operação de escolha que se materializa inicialmente na marcação das opções pretendidas e de
que edição é a preparação para a publicação, sendo que editar fotografias pode ser também
utilizado no sentido de adequar, modificar ou interferir no material fotográfico.
A proposta aqui delineada se insere no que Soulages (2005, 2010) classifica como
a segunda maneira de analisar o trabalho do fotógrafo, que é a cisão entre o ato fotográfico e
o trabalho com o negativo. Nesse trabalho com o negativo, a folha de contato materializa
aquilo que foi registrado no ato fotográfico e transparece na sequência fotográfica1, que é um
encadeamento de fotogramas realizados em um suporte físico (filme) ou digital e que
apresenta o desenvolvimento de uma série, um tema fotográfico ou imagens dispersas –
como discutido, por exemplo, em Spineli e Pfützenreuter (2016). A folha de contato funciona
como um documento que informa aquilo que foi registrado pelo fotógrafo e permite a
visualização de parte do seu processo criativo. Ao mesmo tempo que funciona como
documento, algo objetivo, cada fotograma nela contido é uma obra em si.
Seguindo as indicações de Soulages (2005, 2010) no que tange ao trabalho com o
negativo, tão importante quanto o registro é a seleção e edição da imagem de um
determinado trabalho, visto que normalmente nem todas as imagens registradas são
selecionadas para apresentação ao público.
Nessa perspectiva, aqui trabalharemos a folha de contato como material que
demonstra as escolhas fotográficas tanto do autor quanto de terceiros, a edição por via da

                                                                                                               
1 Aqui podemos entender sequência como uma série de variantes possíveis de um mesmo acontecimento
fotográfico (MORA, 1983)

 
  108

folha de contato e a importância da folha de contato como documento de processo que


transparece os gestos do fotógrafo frente ao ato fotográfico.
No campo da crítica do processo criativo, especificamente no processo de execução
de uma obra, Cecília Salles diz que “Nas concretizações das obras, hipóteses são levantadas e
postas à prova” e que “É nesse momento de testagem que novas possibilidades podem ser
levadas adiante ou não” (SALLES, 2007b, p. 14). No caso da fotografia, o fazer a imagem, isto é,
o ato fotográfico em si, já concretiza a obra. Isso nos faz pensar que essa testagem de novas
possibilidades ou de avaliação da obra pode se dar na análise do copião, quando o fotógrafo, ao
observar sua produção, verifica o que é pertinente e o que faz sentido, determinando, assim,
aquilo que dará continuidade no processo de realização da obra fotográfica em detrimento
daquilo que será abandonado. Outra forma de se pensar essa questão é que as escolhas prévias
do fotógrafo quanto ao que pesquisar e ao que utilizar para produzir determinada imagem
(sejam os aspectos técnicos, como testes de equipamentos, ou de outra natureza) podem
direcionar sua criação.
Por vezes o processo de criação em geral é pautado em optar e decidir. Nas
palavras de Salles (1992, p. 31): “O processo de criação é um ato permanente de tomada de
decisões”; isso pressupõe-se primeiramente uma ação do indivíduo criador que resultará em
um trabalho que posteriormente será avaliado segundo critérios e interpretações do próprio
autor. Na fotografia temos a produção da sequência fotográfica que posteriormente será
objeto de apreciação do fotógrafo para uma futura decisão e seleção daquilo que será
entendido como obra.
É importante lembrar que o que não foi escolhido dentre uma sequência de
fotogramas também faz parte da obra e tem potencialidades, permitindo que o fotógrafo
continue o processo de optar e decidir depois das imagens prontas. Nas palavras de Soulages
(2010, p. 151), “(...) todas as operações do trabalho com o negativo e todas interpretação-
apresentação abrem-nos para infinitos de infinitos. O negativo faz nascer uma infinidade de
universos de fotos”. Nesse sentido, o negativo está dentro do inacabável, que é uma
característica da fotograficidade.
Sob o estudo da crítica do processo criativo (SALLES, 2007b, 2013), a visualização
de uma sequência fotográfica via folha de contato pode oferecer uma perspectiva sobre a
criação do fotógrafo e a sequência impressa nos copiões nos permite produzir um
interpretante2 (PEIRCE, 2003) para cada imagem isolada da sequência e outro na análise de
todo o conjunto da sequência, mesmo que esses interpretantes se sobreponham. Queremos
dizer aqui que a observação global de uma sessão fotográfica pode sugerir e indicar outros
interpretantes que a imagem isolada não traz. Essa outra maneira de olhar para o material
                                                                                                               
2 Na relação triádica da semiótica peirceana – objeto, signo, intepretante –, intepretante é o efeito que o signo cria

na mente de alguém. Ainda segundo Santaella: “O signo determina o interpretante, e, ao determiná-lo, o signo
transfere ao interpretante a tarefa de representar o objeto pela mediação do signo.” (SANTAELLA, 2005, p. 192).

 
  109

do fotógrafo enriquece a análise da imagem isolada. Ao considerar o conjunto de fotos


podemos refletir sobre o que esse conjunto – e não apenas a imagem individualizada – nos
comunica e revela.

3.1 Folha de contato e suas particularidades: usos e funções


Os negativos são acondicionados em print files3 após a revelação e isso possibilita
a catalogação da produção por identificação de data, nome do fotógrafo e tema (SPINELI;
PFÜTZENREUTER, 2016). Uma sequência de negativos dispostos sobre o papel fotográfico,
em uma folha de aproximadamente 20X24 cm – o padrão mais usado, mas há variações
conforme os objetivos do fotógrafo4 –, normalmente contém seis tiras com seis fotogramas
em cada tira, sensibilizados com a luz do ampliador por um determinado tempo, resultando
em miniaturas de imagens positivadas do filme 35mm e médio formato. Esse tipo de
impressão por contato direto é conhecida como prova/folha de contato ou copião fotográfico
(LEWIS, 1977).
A folha de contato configura-se como a reunião dos acontecimentos de todo o
filme em um mesmo espaço e pela reunião de uma série de registros fotográficos. Como
ferramenta de trabalho, a função do contato na fotografia analógica é assegurar ao fotógrafo a
organização e visualização rápida de toda a produção registrada e indicar a seleção das
imagens antes de ampliá-las (WIEDEMANN, 1983).
Essa seleção pode ser realizada segundo critérios conceituais, estéticos e técnicos.
Diferentemente da cópia feita por projeção, a cópia por contato é realizada sem o aumento da
proporção do negativo original; as imagens miniaturizadas de determinada série de negativos
oferecem uma visão parcial das condições técnicas dos registros fotográficos, uma vez que o
mesmo tempo de exposição à luz é utilizado para positivar todas as imagens contidas no rolo
fotográfico. Com isso, não são consideradas as especificidades técnicas de cada imagem, visto
que uma determinada fotografia pode aparecer mais clara ou mais escura na folha de contato
do que seria na ampliação individualizada. Apesar dessa restrição técnica, a fotografia
miniaturizada pode ser vista como uma aproximação do resultado final da ampliação.
Considera-se também que a forma ideal de se armazenar um trabalho fotográfico
analógico é manter os negativos acompanhados de suas respectivas folhas de contato para se
ter acesso à uma visão geral do que foi fotografado, mesmo que essa folha possibilite uma
visão parcial das imagens, sem comprometimento estético. Sem a sequência fotográfica
impressa no copião, dificulta-se o processo de escolha do fotograma, uma vez que o fotógrafo
terá que olhar fotograma por fotograma sob a luz (Figura 65) para verificar o assunto

                                                                                                               
3 Os print files são folhas que armazenam os negativos protegendo-os de sujeira, poeira e riscos. Normalmente são

transparentes, não sendo necessário retirar o negativo de dentro para visuáliza-lo.


4 A título de exemplo pode-se citar Helmut Newton que em um trabalho usa uma folha de contato de 82X99 cm

para fazer um copião gigante (CONTATOS 1, 2015).

 
  110

registrado no filme, nem sempre sendo capaz de observar todos os detalhes da imagem. Vale
ressaltar, no entanto, que o fotógrafo que processa seu material tem um primeiro contato
com sua produção através da materialidade bruta do negativo. Após a revelação, é comum o
fotógrafo conferir as imagens pelo próprio negativo.

(A) (B)
Figura 65. (A) Negativos de Robert Capa observados sobre a caixa de luz. (B) Negativos de Otto
Stupakoff em grande formato e em 35mm. Fonte: Fotos da autora/ (A) Exposição na Caixa Cultural,
Valise Mexicana, 2016 (B) Exposição no Instituto Moreira Salles 2016-2017.

Segundo Wiedemann (1983), há fortes indícios de que a reunião dos fotogramas


de um filme inteiro em uma única folha tenha sido inicialmente disseminada pela prática do
fotojornalismo ainda na década de 1930, especialmente com o uso da câmera de 35 mm que,
pela dimensão do fotograma, favorece a impressão da sequência em uma prancha. Para
Sicard (2015b), o uso desse recurso para visualização dos fotogramas de um filme se
intensificou após a Segunda Grande Guerra, o que não significa que tenha sido originada
nesse período, visto que a fotógrafa Gisèle Freund já produzia folhas de contato como meio
de ter pequenas impressões visuais de seu trabalho (SICARD, 2015b). De qualquer forma, o
nascimento das folhas de contato foi um corolário do afastamento do conceito de imagem
única que deu lugar à circulação simultânea de sequências de fotogramas pelo copião
(WIEDEMANN, 1983).
Em um passado recente, o uso das folhas de contato foi considerado parte
essencial do processo fotográfico analógico. No documentário A grande tradição do
fotojornalismo, Contatos, Vol.1 em uma série de conversas filmadas sobre fotografia, e na
introdução do livro Magnum Contatos, Kristen Lubben deixa claro a importância da folha de
contato como uma forma de trabalho:
(...) este volume acompanha a evolução e o abandono de uma forma de
trabalho que era tão onipresente a ponto de ser vista como parte inevitável e
inextricável do processo fotográfico: o uso das folhas de contato como
registro do que foi fotografado, ferramenta para a edição e índice para um
arquivo de negativos. (LUBBEN, 2012, p. 9)
Atualmente, substituiu-se o contato analógico por outras formas digitais de

 
  111

apresentação do material registrado, como o uso de softwares específicos que recriam


digitalmente a ideia de folha de contato, o que, para Vigouroux (2005), é algo mais formal do
que realmente funcional. Vigouroux reitera que na fotografia digital dificultou-se a
possibilidade de revisitação à imagem, uma vez que essas são armazenadas em computador
com poucas chances de serem resgatadas posteriormente:
A memória visual é cada vez mais efêmera. Ansioso por memorizar tantas
informações visuais quanto possível, seja o amador ou o profissional, o novo
operador sofre frequentemente de amnésia imediata... [tradução livre]
(VIGOUROUX, 2005, p. 32).
Para Stuart Franklin (apud LUBBEN, 2012), na seleção a partir de arquivos
digitais perde-se a oportunidade de se refazer os passos dados pelo fotógrafo na incursão
fotográfica. Com o advento da fotografia digital e a ampliação do seu uso a partir dos anos
2000, as folhas de contato impressas têm se tornado cada vez mais obsoletas (SPINELI;
PFÜTZENREUTER, 2016), ainda que alguns fotógrafos continuem a usar desse expediente
como recurso para visualização, análise e seleção de seu trabalho.
Dada a vasta presença do contato fotográfico analógico durante o século XX e
começo do XXI, existe um material significativo produzido por inúmeros fotógrafos, ainda
inexplorado, com potencial para averiguações e análises quanto aos aspectos criativos no
campo da fotografia. Como citado na abertura deste capítulo, através da folha de contato é
possível observar os comentários, as escolhas e as sequências a partir das quais, muitas vezes,
o fotógrafo selecionou apenas uma fotografia.
Se para alguns fotógrafos a folha de contato é um material que promove a análise
do trabalho realizado e permite visualizá-lo a ponto de favorecer uma escolha fotográfica,
para outros ela não serve como material. Os fotógrafos brasileiros Ana Regina Nogueira e
Luis Humberto afirmaram selecionar as imagens com uma lupa a partir do negativo,
dispensando o uso do contato (PAIVA, 1989). O fotógrafo Don McCullin, por exemplo, diz
confiar mais em sua memória que nas pranchas de contato; ele se considera capaz de saber
que registrou uma boa fotografia no momento do disparo do obturador e que, por isso, não
precisaria do copião. “Os contatos são ótimos para editores, mas eu quero manter o controle
sobre o meu trabalho” (McCULLIN apud, CONTATOS 1, 2015, 6 min30seg). O fotógrafo
italiano Mario Giacomelli diz não utilizar as folhas de contato; para o fotógrafo norte-
americano Leonard Freed, elas são desperdício, pois na grande maioria apresentam apenas
os erros dos fotógrafos (LUBBEN, 2012).
Ainda assim, a folha de contato na fotografia analógica é de grande valia,
oferecendo ao fotógrafo (e a terceiros que venham a lidar com o material) meios para avaliar
o resultado imagético e, por vezes, verificar a qualidade técnica das imagens, visto que elas se
apresentarão ao fotógrafo somente após a revelação do negativo – diferentemente da
fotografia digital em que a imagem pode ser verificada imediatamente pelo display de cristal

 
  112

líquido (lcd, sigla para o inglês liquid crystal display) da câmera. Nas palavras de
Martine Franck:
Eu sabia que tinha tirado uma foto memorável, mas precisei esperar três
semanas até voltar a Paris, revelar o filme e fazer a folha de contato. Foi um
grande alívio ver que a imagem não estava borrada e que a exposição tinha
sido correta”. (FRANCK apud LUBBEN, 2012, p. 389).
Os copiões, assim como as cópias-teste5, ainda podem ajudar no processo criativo.
Visto como uma etapa intermediária no processo fotográfico entre o ato e a cópia final
(MORA, 1998), muitas vezes são ferramentas essenciais para a aprendizagem e avaliação do
fotógrafo, que consegue, assim, visualizar seus “acertos” e “erros”. Ao se colocar diante do seu
próprio falibilismo, ele pode produzir correções no material antes de ampliá-lo,
aperfeiçoando sua produção de acordo com suas intenções.
O fotógrafo Minor White propõe que o fotógrafo critique conscientemente seu
próprio trabalho e reflita sobre os efeitos que as cópias (ampliações) produzem, verificando
se atendem às suas intenções iniciais (WHITE, 2007 [1952]). Para David Hurn (apud
LUBBEN, 2012), a folha de contato é um instrutor valioso: se o fotógrafo tem senso crítico,
pode analisar as razões entre a lacuna e a realidade; nesse sentido, a análise da folha de
contato pode ser um método de ensino como meio de verificar se algumas variações de
ângulo e posicionamento fotógrafo/câmera poderiam ter “melhorado” a imagem.

3.2 Marcações recorrentes nas folhas de contato


Ao discorrer sobre desenhos do artista francês Eugène Delacroix, Daniel Ferrer
(2002) diz ser natural que dois sistemas semióticos, o verbal e o pictórico, incidam sobre as
folhas de desenho. Nos copiões, a naturalidade da incidência da anotação verbal e do
pictórico também é observada. Os sistemas verbais são as informações técnicas próprias do
filme impresso no copião: número do fotograma 6 , marca e tipo de filme. Os sistemas
pictóricos são as inscrições gráficas inseridas a posteriori pelos fotógrafos e/ou editores como
um código visual para indicar as imagens selecionadas para ampliação e eventualmente
alguma correção.
Para Fleig (1983), o contato é um material sintético, com uma configuração
particular, a partir do qual as ações após o registro fotográfico se operam. É próprio da
folha de contato: a separação entre os pontos de vista de um fotograma ao outro em um
espaçamento ritmado (constante), fundo preto, diversidade da escala de cinza ou
espectro cromático, e exposição de um fotograma a outro. Dessa forma, temos como
informações particulares do contato explicadas na Figura 66 (SPINELI;
PFÜTZENREUTER, 2016):

                                                                                                               
5 Ampliação fotográfica vista como uma prévia e que possibilita recomendações para a ampliação final.
6 Fotograma é cada imagem de um filme.

 
  113

(1) uma informação imagética: cada fotograma e o conteúdo das imagens;


(2) uma informação temporal: a sequência que separa um fotograma de outro e
que expressa a sequência do disparo;
(3) uma informação verbal: o tipo e a marca do filme, e a numeração do fotograma7;
(4) uma informação de qualidade técnica: exposição do fotograma (superexposto,
subexposto, exposição equilibrada); e
(5) uma informação gráfica: anotações verbais e visuais inseridas na folha, além de
símbolos gráficos.

Figura 66. Parcial do copião de Marc Riboud, Torre Eiffel, 1953. Fonte: Modificado de LUBBEN, 2012.

As indicações dos fotogramas escolhidos para ampliação são expressas através de


símbolos empregados na própria folha de contato, na maioria das vezes assinalados com lápis
dermatográficos coloridos: vermelho, amarelo, azul e branco, com cores que possam se
destacar no fundo preto do copião e, salvo algumas particularidades, podem ser vistos em
folhas de contato de vários fotógrafos. Essas informações gráficas, realçando indicações
técnicas e criativas, são uma forma de comunicação entre o fotógrafo e/ou editores e
terceiros, como laboratoristas e profissionais gráficos (FLEIG, 1983). Em alguns casos, as
marcações de escolha podem ser realizadas no próprio porta negativos e não no copião – caso
do material fotográfico de Otto Stupakoff (comentado no capítulo 2 do presente trabalho) em
que foi possível verificar essas marcações no próprio porta negativo.
Ainda que nem todas as informações apareçam ao mesmo tempo, as marcações
nos contatos por vezes apresentam a seleção de imagem para publicação, a indicação de
alterações nos fotogramas e a maneira como serão impressos e publicados (discutido abaixo).
O material da Agência Magnum Photo8 publicado em Magnum Contatos (LUBBEN, 2012)
permite identificar algumas das marcas comumente encontradas (Figura 67) (SPINELI;
PFÜTZENREUTER, 2016).

                                                                                                               
7Em alguns copiões a numeração do fotograma não é originada do filme, mas anotada a posteriori.
8Importante agência fotográfica fundada em 1947 pelos fotógrafos Henri Cartier-Bresson, Robert Capa, David
Seymour e George-Rodger.

 
  114

1) Retângulo em todo fotograma;


2) Marcação dentro do fotograma (estrelas; marcas em V; marcas em X);
3) Círculo em todo o fotograma;
4) 2 ou 3 marcações com cores diferentes no mesmo fotograma;
5) Retângulo com um X no meio;
6) Marcação com pequenas etiquetas circulares;
7) Traço embaixo do fotograma;
8) Uso de seta indicando o fotograma escolhido.

Figura 67. Parcial de contatos (da esquerda para direita, de cima para baixo) Erich Lessing, Philip
Jones Griffiths, Eve Arnold, Elliott Erwitt e Abbas. Fonte: Modificado de LUBBEN, 2012.

Em relação ao tipo de marcação utilizada nas folhas de contato por Stupakoff,


objeto de análise desta tese, a observação do seu material depositado no Instituto Moreira
Salles nos levou a considerar o código visual apresentado na figura 68 (um V, parcial de uma
seta, grafado próximo ao fotograma) como o mais recorrente.

 
  115

Figura 68. Fotogramas em folha de contato de Otto Stupakoff mostrando um tipo de código visual
usado por ele. Fonte: Instituto Moreira Salles.

A predisposição de inserir um símbolo gráfico em determinado fotograma e não


em outro nos revela um ato de escolha. Na semiótica peirceana a relação do signo com seu
objeto pode ser classificada como ícone, índice e símbolo (PEIRCE, 2003). O símbolo é uma
convenção, algo estabelecido que se ajusta a determinado significado. Os códigos comuns
inseridos nos fotogramas do copião para determinar escolhas e modificações são convenções
adotadas na prática da fotografia (principalmente na analógica, como dito anteriormente).
Essas marcas podem ser observadas em copiões disponíveis em agências fotográficas,
redações de jornal/revista e arquivos pessoais de fotógrafos. A título de exemplo, podem ser
encontrados em publicações como Contacts: the art of photojournalism (PLEDGE;
MENASCHE, 2003), De la genèse photographique à la photographie génétique (NOIROT,
2011) e no documentário Contatos, Vol. 1 (CONTATOS 1, 2015).
Símbolos como X ou V grafados no contato são marcas utilizadas para considerar
que em determinado rol de alternativas, uma foi escolhida. O mesmo vale para as setas, que
são categorias de signos sujeitas a variadas operações semióticas, podendo indicar, a
representação de direção (MARTINS; QUEIROZ, 2010), apontando uma escolha. Setas
inscritas na folha de contato funcionam como indicadores, similar aos ponteiros, que por
convenção tratam de uma relação de modo indicativo apontando um objeto (fotograma)
dentro de um contexto (folha de contato). A seta está contida no subgrupo dos signos
deícticos, que, assim como as flechas, têm como referente o objeto, a direção assinalada
(KRAUSS, 2002).
Círculos e retângulos envolvendo todo fotograma, demarcando as miniaturas nas
folhas de contato, apontam que tais fotogramas estão sendo destacados de outras
possibilidades. As etiquetas circulares também revelam indicativos de escolha de imagem
para ampliação em uma determinada sequência fotográfica, uma vez que a colocação de uma
marcação por etiquetagem indica pontuação dos itens que foram eleitos.
Segundo o fotógrafo René Burri (apud LUBBEN, 2012), os editores na Magnum
faziam uma marca (retângulos, círculos, entre outros) vermelha nas imagens para apontar
suas escolhas dentre as sequências fotográficas apresentadas nos copiões. Aqui, percebe-se

 
  116

que a cor é uma simbologia significativa, podendo variar conforme o fotógrafo ou o editor da
imagem. É recorrente a existência de folhas de contatos com duas, três e até quatro cores
diferentes de marcações no mesmo fotograma. Esse procedimento indica que as imagens
foram escolhidas e reforçadas em momentos distintos, com objetivos díspares ou mesmo por
pessoas diferentes.
O uso de diversas marcações nos copiões fica evidente na afirmação do fotógrafo
norte-americano Eli Reed (apud LUBBEN, 2012, p. 382): “(...) Já que nem sempre há tempo
para examinar tudo da primeira vez, sempre repasso as folhas porque então descubro imagens
que me surpreendo por ter deixado de fora”. No trabalho de Reed, usualmente as marcações
em um primeiro estágio eram feitas com lápis dermatográfico vermelho, que assinalava quais
imagens iriam para a etapa da escolha final, e, posteriormente, em amarelo, indicando seus
fotogramas prediletos e sua seleção definitiva.
Josef Koudelka, fotógrafo tcheco, também descreveu seu método de escolhas
pela variação de cores na marcação (Figura 69). Ele utilizava um código visual bem
específico para rotular as fotografias. As cores determinavam a importância de cada
imagem: a marcação com a cor branca ressaltava aquelas que o agradavam mais, em
amarelo as imagens que a Magnum poderia utilizar, em vermelho uma segunda seleção de
fotografias, para serem publicadas em livros, e em azul as marcações indicavam o material
que iria para “a gaveta de exposições” onde Koudelka mantinha os negativos de suas
melhores fotografias (LUBBEN, 2012).

(A) (B)
Figura 69. (A) Sequência para o livro de fotos panorâmicas de Josef Koudelka: Mission
Photographique Transmanche, 1989. (B) Fotogramas de A invasão de Praga, 1968, Josef Koudelka.
Fonte: Modificado de LUBBEN, 2012.

O procedimento de editar do fotógrafo brasileiro Sebastião Salgado segue a


seguinte fórmula: pela prova de contato ele seleciona cinco ou seis fotos e então faz cópias de
13X18; muitas vezes copia até 350 fotos por dia. Por vezes, Salgado retorna a esse material e
descobre uma foto significativa, que não lhe interessou na época da primeira edição. Pela
folha de contato, quando há duas fotos fortes uma ao lado da outra, ele copia as duas para
compará-las e então escolhe a partir da cópia (PAIVA, 1989).

 
  117

Os copiões da agência Magnum Photo são um exemplo da importância das


marcas nas folhas de contato para o processo de criação fotográfica. Ainda que existam
particularidades, referentes a idiossincrasias de um determinado fotógrafo, editor ou mesmo
agência fotográfica, alguns dos tipos de marcação de escolha são recorrentes e observáveis
em grande parte das folhas de contato produzidas, e podem ser consideradas representações
universais – vide bibliografia e filmografia de fotógrafos que publicam seus copiões, como
Helmut Newton, William Klein e Raymond Depardon (CONTATOS 1, 2015) e apresentações
de folhas de contato em exposições como da Contact Press Image (PLEDGE; MENASCHE,
2003). Até mesmo em obras de ficção, como no filme Blow-up, de Michelangelo Antonioni
(BLOW-UP, 1966), o protagonista Thomas, escolhe a fotografia a ser ampliada utilizando
uma lupa e marcando o negativo com um lápis.

3.3 O uso da folha de contato como meio de seleção


A ideia de seleção está implícita no ato fotográfico, quanto às escolhas do que e
como fotografar, e se estende no trabalho com o negativo e a cópia. Para o fotógrafo francês
Henri Cartier-Bresson (2007 [1952]) há margem para arrependimentos nos dois tipos de
seleção que o fotógrafo pode realizar: ao enquadrar o motivo no visor da câmera e após a
revelação e ampliação do filme.
Diante das imagens produzidas pelo fotógrafo, viabiliza-se a terceira etapa frente
ao material fotográfico, que é a escolha do fotograma que será ampliado, o trabalho com o
negativo e a cópia da foto (SOULAGES, 2010). Nesse processo usualmente há a reunião do
material que possibilita o processo de escolha e edição – folha de contato físico, digital,
ampliações, edição na própria câmera – e que condiciona o processo de seleção e edição via
marcações, possibilitando o debate entre as partes envolvidas nessa demanda (fotógrafo,
editores, curadores). Dados os objetivos da presente pesquisa, nos atemos aqui às folhas
físicas de contato, cópias-teste e ampliações.
A ideia de seleção na fotografia está intimamente conectada à escolha efetuada no
momento do registro fotográfico, que é um recorte espaço-temporal, e à seleção sobre a prova
de contato. É neste segundo recorte frente a série de registros que se identifica qual imagem
ampliar e qual rejeitar. Ainda que não seja possível determinar de maneira definitiva quais os
motivos pelos quais determinado fotograma foi escolhido, podemos nos aproximar do que
determina esse processo: gosto pessoal, trajetória de vida, lembranças pessoais e
necessidades específicas do projeto em questão são possíveis explicações de como o fotógrafo
faz a mediação entre o que foi registrado e o que foi divulgado.
Normalmente o que se estabelece na seleção fotográfica, no momento da
visualização de uma sequência, é a comparação entre as opções possíveis na fotografia.
Comparar é uma forma de compreensão silenciosa da relação entre as imagens (COLI, 2012).

 
  118

Para o fotógrafo norte-americano Bruce Gilden, as folhas de contato no processo da


fotografia analógica são imprescindíveis para a edição das imagens:
Quando examino uma folha de contato, sigo a ordem de 1 a 36. Assinalo as
de que gosto e, a menos que algo realmente salte da página, revejo uma por
uma para determinar qual é a melhor (GILDEN apud LUBBEN, 2012, p.
402).
Há aqui uma ideia de busca por determinada imagem ao se examinar a folha de
contato. Muitas vezes, dentro da sequência uma única imagem será selecionada porque foi
tida como ‘a imagem’. (LUBBEN, 2012, p. 320).
Para o fotógrafo Ken Heyman (HEYMAN; DURNIAK, 1986) a folha de contato é
um instrumento que mede a extensão da visão fotográfica do fotógrafo, fazendo-se necessário
usá-la de forma criativa. Um julgamento superficial das imagens dos copiões pode, de certa
maneira, prejudicar o trabalho do fotógrafo, já uma edição engenhosa pode dar mérito ou
ressaltar fotografias aparentemente medíocres, mas cujo potencial foi bem explorado na
etapa posterior ao registro.
Quanto às especificações sobre o momento da seleção, o fotógrafo suíço René
Burri diz que:
Antigamente, você começava com 100 rolos, repassava todos para escolher
60, 80, 100 imagens e as projetava para contar a história. Levava depois um
ou dois carrosséis de diapositivos para o editor de imagens com quem
estivesse trabalhando, editando então o material. Na Magnum enviávamos
nossos rolos e, quando as imagens chegavam ao escritório, os editores faziam
uma marca vermelha: muitas vezes, a gente não tinha tempo de fazer a
seleção. Cartier-Bresson também examinava nossas folhas de contato. Ele
sempre as punha de cabeça para baixo. Tornou-se uma espécie de dança.
Estranhamente, ele não queria ver a fotografia! (...) Se uma foto não
estivesse corretamente enquadrada, ele esperava que a descartássemos.
(BURRI apud LUBBEN, 2012, p. 109).
Um exemplo sobre o processo fotográfico da criação à edição também pode ser
visto na imprensa brasileira. A fotografia no Jornal do Brasil acontecia em três níveis
hierárquicos de decisão, segundo três pontos de vista distintos: (1) o fotógrafo escolhia o
enquadramento e o ângulo da imagem do fato ou acontecimento proposto pela pauta do
jornal; (2) o editor de fotografia, geralmente um ex-repórter fotográfico, separava aquelas
imagens julgadas significativas para ampliação; e finalmente (3) o editor-chefe decidia se a
matéria jornalística traria uma imagem e qual imagem seria editada (LIMA, 1983).
Diante da impossibilidade de se selecionar todas as imagens do copiões, há uma
imposição de leitura do contato em função do desejo, da pulsão, da memória, e de história de
quem edita. Assim, a seleção de negativos pela prova de contato torna-se algo individual
(SOULAGES, 2010) que contempla escolhas diferentes de acordo com a vivência pessoal de
quem trabalha o material nessa fase do processo fotográfico.
É possível acontecer do fotógrafo realizar uma determinada edição pelo copião e
posteriormente voltar à suas folhas de contato para escolher outras imagens (NOIROT,

 
  119

2011). Gilles Mora (1983) aponta que parte considerável dos fotógrafos retorna regularmente
à suas folhas de contato a fim de selecionar outras imagens a partir de um novo ponto de
vista. Isso deixa claro que a folha de contato não é somente uma fase intermediária do
processo fotográfico, mas uma ferramenta que possibilita novas escolhas e revisitação ao
trabalho fotográfico em momentos distintos. Como afirma Nori (1983, p. 50), elas
correspondem à “gestação e gestão do trabalho”.
O escritor e fotógrafo francês Denis Roche (2007) comenta sobre seu trabalho 4
avril 1989. Trinidad. Farrel House, chambre 3202 (2 contacts successifs) que, quando se
“volta no tempo” folheando as folhas de contato, pode-se descobrir uma combinação de duas
imagens sucessivas que anteriormente não haviam sido percebidas. Mora (1983) faz uma
distinção entre o que chama de “dia do disparo” – momento do registro fotográfico e que
pode ser imprevisível – e a “hora do foto” – que é o exame da folha de contato onde se
procura detectar possíveis reavaliações formais.
Quando questionado sobre o momento que descobre que tem a foto, Otto
Stupakoff afirmava que a revisão a posteriori do trabalho fotográfico às vezes implicava em
uma nova escolha (FERNANDES JUNIOR, 2006) e que fazia nova visualização distinta do
material quando voltava a ele anos depois. Essa nova escolha estava atrelada ao
distanciamento do fotógrafo, nesse momento de revisitar o trabalho anterior, em relação ao
evento da tomada da foto, distância essa necessária para outras descobertas durante a edição.
Esse pensamento de Stupakoff está em consonância com o que o fotógrafo francês Bernard
Plossu (apud SOULAGES, 2010) entende por fazer uma recapitulação pela folha de contato
daquilo que foi fotografado, depois de se ter decantado as impressões vividas, com a distância
necessária do tempo.
Um exemplo desse processo de Stupakoff está na sequência que o fotógrafo fez de
Xuxa no Copacabana Palace (Figura 70). Na revista Vogue de 1989, assim como na Coleção
Pirelli/MASP, o fotograma selecionado foi o número 8. Em um momento posterior – visto
que essa folha de contato foi produzida em 2005 e o negativo é de 1989 –, podemos observar
que o fotógrafo sinaliza o fotograma de número 7 em que a apresentadora olha para a
câmera, indicando uma escolha diferente daquela publicada.

 
  120

(A)
Figura 70: (A) Sequência de Xuxa no Copacabana Palace. (B) Imagem individualizada a partir do
fotograma 8. (C) Imagem individualizada a partir do fotograma 7. Fonte: Instituto Moreira Salles.

Por outro lado, escolhas também podem ser reiteradas a cada nova veiculação da
imagem. No trabalho de Stupakoff, isso é recorrente. É o caso, por exemplo, das obras
Eduardo Paolozzi (Figura 71A) e Olivia Russey (Figura 71B), de 1968, em que os mesmo
fotogramas foram expostos no MASP/1978 e na SP Fashion Week, 2005.

(A) (B)
Figura 71. Fotogramas individualizados de Eduardo Paolozzi (A) e Olivia Russey (B), 1968.
Fonte: Instituto Moreira Salles.

 
  121

Essa revisitação ou adiamento da verificação do contato pode ser explicada pelo


fato de que as imagens adquirem uma nova dimensão tempos depois do registro e da
primeira escolha a partir dos copiões, i.e., aos poucos o desapego entre a fotografia e o “real”
representado possibilita evidenciar as particularidades formais do trabalho (BAURET, 2010).
Muitos fotógrafos relacionam de certa forma a folha de contato com a ideia de resgate do
tempo: “Elas constituem uma ferramenta que permite lutar contra o tempo” (DEPARDON
apud LUBBEN, 2012, p. 323); “(...) só quando você retorna às folhas de contato é capaz de
ver como a cena evoluiu no tempo” (FRANK apud LUBBEN, 2012, p. 229).
A partir do depoimento desses fotógrafos, percebe-se que a revisitação à folha de
contato para selecionar outras imagens pode ser vista com naturalidade, permitindo o
redescobrir de imagens que não fizeram parte da seleção em um primeiro momento.
Os fotógrafos profissionais escolhem determinadas imagens de suas folhas
de contatos, mas isso não os leva a destruir as outras. Sabem muito bem que
seus “fracassos” de hoje podem vir a ser os “sucessos” de amanhã, quando
seu olhar ou a expectativa do público possam ter mudado. Sua seleção
obedece não tanto a uma opinião definitiva, mas antes ao desejo de salientar
uma continuidade em sua obra” (TISSERON, 2000, p. 132).
A afirmação de Tisseron (2000) sugere que há sempre um outro olhar sobre as
imagens registradas em um determinado espaço-tempo e que, a cada novo olhar sobre o
copião, dependendo da vivência e das associações entre símbolos e códigos visuais (que não
são fixos), quem edita pode escolher uma imagem diferente. Os sentidos de todas as imagens
são múltiplos e podem ser recriados a cada novo olhar, influenciado, por exemplo, pela
mudança do contexto da época, ou mesmo pela observação de um detalhe antes não notado
ou que não fazia sentido em um primeiro momento. Esse outro olhar depende da
circunstância presente e denota que a experiência visual não se realiza de modo isolado, mas
é engrandecida por conhecimentos e imagens de diversos universos na vida de cada um
(KNAUSS, 2006). Isso sugere que (1) as imagens podem ser resgatadas em qualquer
momento, ainda que o seu registro tenha sido feito em um período e lugar específicos; e que
(2) o olhar que lançamos a elas é fluido e se mudarmos, muda-se também os gostos e
parâmetros de escolhas, indicando que a obra fotográfica não é passiva, tanto para quem a
produz quanto para quem a interpreta (SPINELI, 2009).
Para explicar o que e porque escolhemos, Soulages (2010) afirma que a
preferência por determinada imagem em um grupo de imagens está condicionada à história
pessoal de quem edita; assim, quando essa história se transforma, imagens diferentes podem
ser selecionadas a partir de um mesmo negativo. Fica evidente que o estudo do processo de
escolha deve ser abordado sob o ponto de vista da seleção dentro de um contexto histórico,
social e artístico, e que sensações, ações e pensamentos sofrem intervenções do consciente e
do inconsciente de quem escolhe e edita. Tanto as imagens selecionadas e editadas de
determinada maneira, em uma certa época, quanto as imagens não escolhidas podem ter

 
  122

potencial expressivo, de qualidade técnica e de conteúdo, e se tornarem passíveis de outros


usos a posteriori.
Para a fotógrafa francesa Florence Chevallier (apud SICARD, 2015a), há partes
inteiras de uma sequência fotográfica que são deixadas de fora por parecerem pertencer a
uma história diferente daquela ocorrida no curso principal do trabalho. Ainda que
preteridas em uma primeira escolha, mas não menos importantes, essas fotografias não
utilizadas se mantiveram em suspenso, até que alguém as visualizasse, as selecionasse e as
expusesse novamente.
Raymond Depardon (1978) também ressalta a ideia da importância do resgate de
imagens às quais não foi dada devida importância em um primeiro momento da edição na
folha de contato. Segundo ele, “Há sempre fotografias das quais nos esquecemos, de que não
gostamos ou que nos decepcionam à primeira vista. No entanto, a passagem do tempo as
transforma. Elas ganham valor, tanto sentimental quanto visual” (DEPARDON apud
LUBBEN, 2012, p. 323).
Aqui podemos pensar sobre a questão da ação do tempo, não sobre a matéria
fotográfica em si, mas sobre o conteúdo da imagem frente a uma outra vivência (do fotógrafo
ou terceiros) e um outro contexto para o conteúdo da imagem, visto que o zeitgeist modifica
o modo como essas imagens são vistas inclusive pelo próprio fotógrafo. A folha de contato
tem uma temporalidade menos linear e mais circular, uma vez, que segundo Yannick
Vigouroux (2005, p. 32):
A imagem considerada muito boa na época do registro pode parecer banal e
ser excluída tempos depois, por outro lado, um registro considerado
insignificante ou até mesmo deslocado ou perdido, se mostra uma imagem
muito boa com o passar do tempo [tradução livre]9.
A noção do tempo circular, presente na filosofia desde os pré-socráticos (LONG,
2007), e no eterno retorno com Nietzsche (LEFRANC, 2005), distancia-se da narrativa linear,
implicando na possibilidade de uma consideração de eventos distinta quando eles são vistos a
partir de uma nova perspectiva. Em um sentido amplo, apesar da singularidade da produção
fotográfica, essa ideia de tempo circular acarreta o retorno de certas ocorrências, ainda que
elas não sejam exatamente as mesmas dado que novos ambientes são capazes de promover
novas escolhas.
É inerente da cópia por contato revelar, manifestar, produzir e indicar tempo
(SOULAGES, 2010). Um desses intervalos está no espaço negro entre um fotograma e outro
na folha de contato, às vezes chamado de “tempo ocioso” (NOIROT, 2011); apesar de por
vezes dar a ilusão de uma sucessão de registros, ele nem sempre se refere ao tempo
‘cronológico’, mas sim do corte e da descontinuidade – visto que os fotogramas podem estar

                                                                                                               
9 L'image jugée très bonne dans le feu de l'action l'année de la prise de vue peut paraître banale et être finalement

exclue quelques années après ; à l'inverse, une prise de vue jugée insignifiante voire maladroite ou ratée, s'affirme
avec force comme une très bonne image avec le recul du temps passé.

 
  123

separados por segundos, horas, dias. É um tempo paradoxal, como sugere Soulages (2010),
no sentido de que a soma dos acontecimentos-instantes cria um tempo – visto por ele como
um rosário de acontecimentos – que também é um tempo feito com instantes.
Para Soulages (2010) o tempo da fotografia está no paradoxo entre o “tempo real”,
o momento do registro, e o “tempo subjetivo” experimentado pelo fotógrafo, denominado
pelo autor como “memória não fotográfica” (vivência no momento que independe da foto).
Dessa forma, frente à folha de contato o fotógrafo pode experimentar hesitação para realizar
uma escolha de imagem, pois este habita em um tempo plural: o tempo objetivo de quando se
fotografa, o tempo subjetivo vivido ao fotografar, o tempo estrutural da cópia por contato que
pode ligar tanto dois acontecimentos separados por segundos quanto separado por anos e o
tempo da memória não fotográfica, aquele que o fotógrafo tem antes de visualizar a folha de
contato (SOULAGES, 2010, p. 150).
Sob a perspectiva de Bergson (2005), o tempo é aquilo que impede que tudo seja
dado de uma só vez; ao contrário, é processo contínuo, um fazer-se constante e ininterrupto
da realidade. O tempo real, que é pura duração, é o que torna o mundo e a realidade que
vivemos não um ‘tudo dado’ inelutável e acabado, mas antes um trabalho de invenção, de
criação da vida: uma obra nunca inteiramente dada e acabada e, sim, uma obra inteiramente
aberta. Quando a fotografia deixa de ser processo e passa a ser obra? Em algum momento
isso acontece, pois sempre é possível rever o negativo ou mesmo a sequência fotográfica e
dali tirar novas possibilidades. Cada fotograma é uma obra em potencial.
Segundo Soulages (2010), um mesmo negativo gera uma infinidade de fotos
diferentes, uma mesma foto é apresentada e atualizada em diversos contextos: “(...) a
fotografia induz uma obra aberta (...) obra viva que adquire uma nova dimensão e um novo
destino a cada transformação em obra (...) uma obra que pede novas interpretações, novas
apresentações, novas distribuições, em resumo, novas criações” (SOULAGES, 2010, p. 191)
Sob a perspectiva da crítica de processo, se sempre há a possibilidade de voltar a
esse material bruto – a sequência de fotogramas registrada inicialmente – e fazer novas
escolhas e novas edições, temos que o trato com o copião é sempre inacabável, no sentido
dado por Salles (2013) de que a obra é sempre inacabada. Assim, enquanto as fotografias
ganham vida própria ao saírem das mãos do fotógrafo, as folhas de contato, segundo
Leornard Freed, pertencem ao fotógrafo (FREED apud LUBBEN, 2012) e esse pode
deliberadamente decidir sobre o que fazer com essas imagens iniciais, até mesmo se abstendo
de mostrá-las ao público.
Ainda que a obra seja um gesto final do autor, Salles (2013) admite que há
concretizações alternativas e que outras obras teriam sido possíveis. No caso da fotografia,
algumas das possíveis concretizações existiram – no sentido da fotografia ser um ato que,
através da captura de um instante em um determinado espaço, tenta conter a finitude de uma

 
  124

realidade ou evento pelo registro da imagem. Essas concretizações estão no copião. Nesses
termos, podemos pensar que o gesto final do autor é a escolha da imagem entregue ao
público; no entanto, diante de novas percepções, o autor pode voltar ao copião e selecionar
novas imagens para serem apresentadas como obra.

3.3.1 A edição como processamento da fotografia para apresentação


Ainda versando sobre o material fotográfico per se, a edição pode ser classificada
como a terceira etapa do estudo das condições de possibilidade de uma foto (SOULAGES,
2005; 2010). Podemos entender a edição do material analógico sob dois pontos de vista: (1) o
processo de escolha da foto dentre um rol de outras imagens; (2) o apontamento de
alterações – cortes, correção de iluminação, por exemplo – nas imagens indicadas no
próprio contato e/ou nas cópias-testes.
Quanto à reprodutibilidade da imagem fotográfica, é nesse aspecto que se tem a
possibilidade de “modificar” a obra (matriz), podendo essa variação se estender a um novo
corte ou em inferências mais acentuadas de cor, forma, fusão. Considerando que a imagem
fotográfica está no interior da matriz e pode ser ampliada em diferentes suportes e formatos,
Krauss (2002) argumenta que a relação física da imagem com seu suporte é específico para
cada ampliação.
O fotógrafo norte-americano Ansel Adams deixa explícito que todos os materiais
são importantes na criação fotográfica:
(...) o negativo é apenas um passo intermediário em direção à cópia acabada,
e significa pouco como um elemento em si. Para se conseguir a melhor
‘matéria-prima’ possível para a cópia final, muito esforço e controle são
exigidos na preparação do negativo (ADAMS, 2002b, p. 13).
Fica explícito nessa passagem, que a cópia é a oportunidade do fotógrafo
interpretar e expressar as informações relativas à visualização original contida no negativo.
Adams ainda refere-se ao Sistema de Zonas (ADAMS, 2002a), método de obtenção tonal
desenvolvido por ele, que oferece a quem fotografa o devido controle das características do
processo fotográfico. O Sistema de Zonas possibilita o registro do tema com a máxima
fidelidade possível e com os valores de luz desejados, como também permite que o fotógrafo
explore seu universo criativo ao interpretar a luz de forma pessoal. Nesse método, o espectro
tonal do filme foi dividido em dez zonas – do preto máximo ao branco máximo, perpassando
pelos cinzas – cada uma das zonas tem uma definição de como ser representada na
ampliação final. A aplicação do método permite que, ao se manipular o filme por meio de
sub-revelações ou super-revelações tendo como base uma revelação normal, determinada
região de qualquer tonalidade seja representada de acordo com a interpretação desejada. Isso
nos mostra que a criação fotográfica não se restringe ao registro da imagem no negativo, visto que
um intrincado processo fotográfico pode ser percorrido da captura da imagem até a cópia final.

 
  125

Para o fotógrafo britânico John Stewart, o produto final é o que importa no


processo fotográfico; para ele, o produto final é a ampliação, e “(...) a textura da foto – o que
eu chamo de gramática – vem da impressão” (STEWART apud FREEMAN, 2013, p. 76). Na
mesma linha de raciocínio, Cartier-Bresson (2007 [1952]) defendia o processo de ampliação
como essencial para recriar os valores e climas do momento da captura, tendo-se a liberdade
para modificar a cópia de acordo com as intenções do momento da tomada fotográfica. Ele
ainda afirmava que o momento final da criação ocorria no quarto escuro e que a evidência
decisiva para o fotógrafo seria a cópia.
O processamento da imagem pode ser realizado tanto pelo fotógrafo quanto pelo
laboratorista. Quando feito pelo laboratorista, a relação do fotógrafo com aquele que irá
continuar seu trabalho na sala escura é fundamental no processo de obtenção da cópia final.
Nesse sentido, o diálogo entre fotógrafo e profissional de laboratório deve versar sobre o
assunto fotografado, a qualidade da luz e o ponto fotometrado da imagem que está no
negativo. Para isso, a mediação feita através das folhas de contato e das marcações feitas
sobre elas, como discutidas anteriormente, é significativa.
Há fotógrafos que preferem processar o próprio material, outros delegam essa
tarefa a outros profissionais. Para Cartier-Bresson, por exemplo, o que importava era o
instante de registrar a fotografia. Por isso,
ele sempre abdicou de fazer as cópias de
suas imagens, delegando a tarefa a estúdios
que acertavam as diretrizes para manter a
tonalidade das fotografias e seu equilíbrio
(HILL; COOPER, 2001). Essa prática pode
ser verificada no documentário The
Impassioned Eye (HENRI, 2003) nas
Figura 72. Bresson analisando ampliações.
Fonte: HENRI, 2003. cenas em que Cartier-Bresson analisa uma
sequência de imagens ampliadas por um
técnico de sua confiança a partir de um mesmo fotograma (Figura 72). O fotógrafo compara
as ampliações considerando o enquadramento, as diferenças de luminosidade e outros
elementos resultantes da ampliação para então escolher a fotografia que melhor satisfaça a
sua busca estética.
Como dito anteriormente, o copião fotográfico facilita a escolha de imagens em
determinada sequência. Da imagem selecionada para copiagem10 também é possível verificar
indicações simbólicas de edição para ampliação. A indicação de corte no próprio copião pode
ser vista no trabalho do fotógrafo polonês David Seymour como um exemplo visual dessa
expressão gráfica. Uma marcação retangular em vermelho dentro do fotograma indica um
                                                                                                               
10 Operação de copiar por processos fotoquímicos.

 
  126

crop, um corte final, que a imagem deverá receber para


ser publicada. No caso do fotograma da figura 73, as áreas
laterais do registro original foram excluídas. O motivo
para esse tipo de eliminação pode variar de foto para foto
(algumas vezes funcionam para correção de
enquadramento e ajuste da composição, outras para
retirar objetos indesejáveis).
Em relação ao trabalho de edição de Otto
Stupakoff, a análise das folhas de contato contraposta
com algumas de suas imagens finais publicadas nos
Figura 73. Fotograma de David
permitiu identificar a pequena interferência do fotógrafo
Seymor. Fonte: Modificado de
LUBBEN, 2012. no momento da ampliação, na composição e no
enquadramento das imagens registradas. No trabalho de
Stupakoff com o negativo e na ampliação, no geral observa-se que há poucas indicações de
corte (crop) em seu material bruto, salvo em algumas sequências como as imagens do
conjunto do Camboja nas quais há indicação gráficas para que se estabeleça algum corte na
imagem em determinados fotogramas para ampliação (Figura 74), ou em casos como da
Contorcionista, de 1962, em que, apesar de não haver indicação explícita de corte pelo copião
a comparação entre a folha de contato (Figura 75A) e a imagem individualizada final (Figura
75B) permite identificar os ajustes realizados: o enquadramento mais aberto no ato
fotográfico registrou parte do cenário que foi excluído na ampliação.

Figura 74. Parcial folha de contato do Camboja. Indicação de Stupakoff de reenquadramento no


primeiro fotograma. Fonte: Instituto Moreira Salles.

 
  127

(A) (B)
Figura 75. Contorcionista, de 1962. (A) Parcial do copião. (B) Imagem publicada com corte na
ampliação final. Fonte: Instituto Moreira Salles.

Em uma declaração de 1963, Stupakoff disse que: “A boa fotografia é antes de


mais nada aquela que traduz uma intenção anterior do fotógrafo e jamais aquela que só
depois de revelada e cortada demonstra possuir algo a ser transmitido. O importante para se
fazer fotos artísticas é saber o que dizer, ter o que dizer, e não inventar em torno do já
realizado” (STUPAKOFF apud FOTOGRAFAR..., 1963, p. 2). A análise realizada na presente
tese nos permite afirmar que Stupakoff foi consistente à tal perspectiva sobre o trabalho
fotográfico ao longo de toda sua carreira e que, apesar de em alguns momentos se utilizar dos
cortes, sua produção mostra que ele tendeu a manter a imagem assim como foi enquadrada
no momento do registro.
Essa visão se aproxima daquela professada por Cartier-Bresson, para quem
raramente uma foto mal composta poderia ser salva pela reconstrução de sua composição no
laboratório, visto que a integridade da visão do fotógrafo não estaria mais presente
(CARTIER-BRESSON, 2007 [1952]). No entanto, muitas vezes a fotografia pode ser
processada de acordo com sua finalidade expositiva. Há diversas técnicas combinatórias para
várias formas de apresentação (se impressa ou projetada), além de diversidade de papéis,
tamanhos e cortes (HEYMAN; DURNIAK, 1986). No caso das publicações em comunicações
impressas, a edição da imagem deve estar de acordo com a indicação editorial tanto para
conteúdo quanto para qualidade.

 
  128

Um exemplo da importância da edição, dada as necessidades específicas do meio


em que a fotografia será publicada, pode ser visto a partir da tira de contato do fotógrafo
israelense Micha Bar-Am (Figura 76A). Nela, três fotogramas aparecem selecionados. Um
deles, escolhido para ser publicado em uma página de jornal, está com a demarcação de
corte, indicando como a imagem deveria ser editada para ser publicada. O mesmo fotograma
ampliado contém também a mesma indicação para corte e uma mensagem verbal para o
laboratorista “Please, use this cropping” (em tradução livre, “Por favor, use esse corte”)
(Figura 76B). Nota-se na imagem publicada (figura 76C) que os elementos laterais foram
suprimidos, evidenciando a ação do abraço entre as duas figuras centrais do registro original.

Figura 76. Micha Bar-Am, Tel Aviv, 1976. (A) Parcial da folha de contato. (B) Cópia de trabalho. (C)
Publicação. Fonte: Modificado de HOELSCHER, 2013.

Bar-Am comenta que escolheu a versão recortada do fotograma 26 (Figura 76C)


por melhor representar o momento dramático da liberação de reféns durante a Operação
Entebbe, uma missão de resgate contraterrorista levada a cabo pelas Forças de Defesa de
Israel em 1976. Apesar dessa ter sido sua escolha para aquela dada situação e momento, Bar-
Am diz que, hoje, teria realizado uma edição diferente, um tríptico da sequência em que
várias mãos seguram o refém (LUBBEN, 2012).
Além de indicações no copião fotográfico, as cópias de trabalho ou cópias-teste
são uma outra forma de se trabalhar a edição da imagem. Esse tipo de manipulação possui
um código de comunicação, geralmente fotógrafo–laboratorista, laboratorista–laboratorista
ou editor–laboratorista (ou de qualquer relação entre quem indica e quem receberá a
demanda). Alguns fotógrafos preferem trabalhar com a cópia e não com a folha de contato
(CONTATOS 1, 2015) sob o argumento de que esta pode dificultar a escolha, uma vez que
 
  129

cada fotograma no contato está no tamanho real do negativo (24X 36mm no formato de 35
milímetros; esse tamanho pode aumentar ligeiramente em filmes de médio formato). Esse
inconveniente pode dificultar a escolha, ainda que não constitua um impedimento – pode-
se utilizar expedientes como o das lupas conta-fios para magnificar detalhes das miniaturas
nos contatos.
No processamento da imagem no laboratório é possível obter resultados
imagéticos diferentes na ampliação de negativos ou positivos de acordo com o procedimento
técnico empregado (SPINELI; PFÜTZENREUTER, 2016). Essa gama de possíveis resultados
fica geralmente a cargo da indicação do fotógrafo, sendo que contraste, escala tonal, grão,
definição, foco, podem ser controlados pelo fotógrafo/laboratorista no momento da
ampliação com a intenção de minimizar ou enfatizar certos aspectos da imagem que melhor
se adequem à estética fotográfica do autor. Para Ansel Adams:
A criatividade no processamento da cópia é bastante similar à criatividade na
preparação dos negativos: nos dois casos, começamos com condições que
nos foram “dadas”, e nos esforçamos pra interpretá-las. (...) Assim como
fotógrafos diferentes interpretam um mesmo elemento de maneiras
distintas, eles também fazem cópias diferentes de negativos idênticos
(ADAMS, 2002b, p. 13).
Um exemplo da importância do trabalho de processamento da imagem no
laboratório pode ser visto na figura 77 (A–D), que revela parte do processo de criação por trás
de uma obra do fotógrafo norte-americano Dennis Stock. Na figura 77C, verifica-se as
anotações para impressão final em uma cópia de trabalho feitas por Pablo Inirio, mestre
laboratorista da Magnum Photos em Nova York. As anotações com linhas e números
rabiscados indicam uma complexa fórmula para escurecer e/ou clarear áreas em ampliação
direta no papel (HOELSCHER, 2013). Essas anotações sugerem correções referentes à luz e
contraste, principalmente tempo de exposição à luz para mais ou para menos em cada região
da imagem. O conceito de tempo de exposição do material sensível à luz para obtenção da
imagem é válido tanto para o registro pela câmera como para copiagem. Assim, cada
fotograma no filme pode ter sido registrado em um tempo de exposição diferente de outro. O
mesmo se dá para copiagem, pois para cada foto há um tempo de exposição do papel à luz.
No entanto, a partir desse tempo geral, é possível iluminar mais ou menos algumas áreas.
A comparação entre a imagem escolhida no copião (Figura 77A) com a ampliação
apresentada na figura 77B deixa claro que os elementos de último plano apresentam-se
esmaecidos devido à superexposição no ato do registro. Na cópia de trabalho (Figura 77C),
esses elementos no plano de fundo já aparecem com maior definição de contornos e solidez.
Por essa cópia de trabalho, verifica-se as indicações para aumentar o tempo de exposição
nessas áreas e, com isso, fazer com que se apresentem um pouco mais detalhadas na
ampliação final (Figura 77D).

 
  130

Figura 77. Dennis Stock, James Dean in Times Square, 1955. (A) Parcial da folha de contato. (B) e (C):
cópias fotográficas de trabalho. (D) Cópia com alterações. Fonte: Modificado de HOELSCHER, 2013.

Outro exemplo está no trabalho com a fotografia de retrato intitulada Lyal Burr -
minerador e seus filhos Kerry e Phillip (AVEDON, 1985), do fotógrafo norte-americano
Richard Avedon (Figura 78). Na cópia de trabalho é possível verificar o nível de detalhes nas
instruções passadas por Avedon a seu laboratorista para a copiagem final do retrato (Figura
78A). Na imagem distribuída ao público, o rosto do pai impõe presença e intensidade
marcantes em relação aos rostos dos filhos que estão ao seu lado (Figura 78B). Esse destaque,
principalmente no olhar, é resultado das instruções minuciosas dadas por Avedon no
momento da obtenção da cópia. Foi empregado um cuidado rigoroso no sentido de

 
  131

acentuar o contraste entre as aberturas dos olhos e as áreas adjacentes mais próximas.
Segundo Sergei Tisseron:
Partindo do tempo geral de exposição, indica-se [-4] para os olhos, [-6]
para as partes inferiores das pálpebras, enquanto que as áreas mais
próximas recebem uma acentuação na exposição indicada como [+20] logo
abaixo das pálpebras, [+30] no canto externo dos olhos e [+40] acima das
sobrancelhas. Usando esses procedimentos laboratoriais, fez-se com que o
olhar de Lyal Bur pareça resplandecente no momento da copiagem
(TISSERON, 2000, p. 96).
A indicação de “+8” no queixo indica 8 segundos a mais tempo que antes e as
indicações “-4” e “-2” nos olhos e boca indicam que essas áreas precisavam ser suavizadas na
impressão, expondo-as menos tempo à luz para surgirem os detalhes. Esses ajustes podem
ser feitos através de máscaras que protegem partes da imagem no momento da ampliação,
processos químicos (como o uso do rebaixador11), papéis que oferecem maior ou menor
contraste, contra-máscaras e ajustes de revelação.

(A) (B)
Figura 78. Lyal Burr e seus filhos Kerry and Phillip, fotografia de 1981. (A) Instruções de Richard
Avedon para o laboratorista. (B) Fotografia final publicada. Fonte: TISSERON, 2000.

3.3.2 A seleção e a edição sob o olhar do fotógrafo, do editor e do curador


Se optar e decidir são inerentes ao processo de criar (SALLES, 2013), na
fotografia trabalha-se a priori com ideia de que, além das preparações que antecedem o ato
fotográfico, há pelo menos dois momentos bem delimitados em relação à decisão sobre a
foto: um no ato de captura da imagem e o outro no momento da seleção e edição das imagens
fotografadas (sendo que, ainda no ato da captura da imagem, uma ideia acerca da futura
edição já pode ser estabelecida). No caso do fotojornalismo, Leonard Freed afirma que:

                                                                                                               
11 Rebaixador é um químico que no processo fotográfico visa corrigir o excesso de densidade das cópias, imagens
muito escuras geradas a partir de uma suberexposição ou de uma revelação precária.

 
  132

Pode ser difícil tomar uma decisão porque você gosta de uma chapa por um
determinado motivo e de outra por outro motivo diferente. Cada fotografia
tem sua força particular. Mas você só pode selecionar uma. Ela tem de
representar o conjunto. Por isso, sempre tento pôr tudo numa só imagem: a
mensagem, o fundamento, a composição, a história, a personalidade
individual – tudo junto numa única imagem” (FREED apud LUBBEN, 2012,
p.144).
Como supracitado, outras vezes o fotógrafo antevê qual a imagem será
selecionada e copiada logo no momento do registro. Uma série de 1976 da fotógrafa belga
Martine Franck sobre uma piscina privada em Provença, na França, exemplifica essa
afirmação (LUBBEN, 2012). Ela fez quatro fotogramas da cena até que um dos personagens
enquadrados se mexeu. Com isso, Franck soube, no momento, que já tinha feito a fotografia
que seria publicada pois não teria uma segunda chance de registrar a situação conforme seu
desejo inicial.
Frente a esse cenário, os motivos relativos ao selecionar e editar determinada(s)
imagem(s) nos informam sobre o modo como um fotógrafo entende sua fotografia. Para
Cartier-Bresson (2007 [1952]), na seleção deve-se separar aquelas imagens que não
apresentam maior força expressiva, apesar do registro técnico adequado.
No entanto, muitas vezes a fotografia escolhida para publicação não é a imagem
que o fotógrafo selecionaria em um primeiro momento. De sua série fotográfica sobre um
funeral da África do Sul em 1985, o fotógrafo britânico Ian Berry considera que escolheria os
militantes carregando o caixão (Figura 79A) e não das mulheres idosas e com velas na mão
do Congresso Nacional Africano (Figura 79B), preferida pela revista na qual a imagem foi
publicada (LUBBEN, 2012).

(A)

 
  133

(B)
Figura 79. Fotografias de Ian Berry. Transvaal, África do Sul. (A) Militantes carregando caixão. (B)
Mulheres idosas do Congresso Nacional Africano. Fonte: LUBBEN, 2012.

Algo semelhante aconteceu com Elliott Erwitt, que indicaria para publicação um
fotograma em que um transeunte com um carrinho de bebê passa pela cena de sua sequência
de moda para a revista Vogue (Figura 80), diferente do pretendido pelos editores
(CONTATOS 1, 2015).

Figura 80. Fotograma de Elliott Erwitt. Fonte: CONTATOS 1, 2015.

Alguns fotógrafos perseveram em participar da escolha das fotos: “Para mim, um


bom fotógrafo não é aquele que entrega muitas fotografias. É aquele que está consciente do
assunto. Eu me lembro que escolhi esta fotografia. Eu insisti nesta”, diz Lew Parella (apud
MANJABOSCO, 2015, p. 1), apontando para uma imagem do cineasta Alfred Hitchcock.
“Estamos num frigorífico, Alfred, eu e as duas manequins. Era muito engraçado, Alfred
fez piadas. Deixei a câmera dentro por um tempo e congelou o mecanismo. A moda que
está nessa foto é ridícula, completamente estúpida. Não é uma foto de moda, é uma piada
com Hitchcock. O humor dele ficou aparente na foto” (PARELLA apud MANJABOSCO,
2015, p. 1).

 
  134

Há a presunção de que o editor seleciona uma imagem fotográfica baseado em


sua experiência e conhecimento, o que poderia autorizá-lo a identificar os exemplos mais
marcantes, tanto tecnicamente quanto intelectualmente, da obra do fotógrafo. Esse crédito
na experiência do editor baseia-se no pressuposto de que ele já tenha visualizado diversas
imagens em folhas de contato e que suas decisões são, portanto, cuidadosamente ponderadas.
“Um editor com experiência seleciona as melhores fotos com seu coração, depois de maneira
sutil as mais intrigantes até isso desembocar nas fotografias mais impactantes de grande
sucesso” (HEYMAN; DURNIAK, 1986, p. 14).
Apesar disso, alguns fotógrafos garantem que aos editores não deveria ser
confiado a seleção de uma imagem destinada a um grande número de pessoas. Em suma,
toda a responsabilidade pela escolha do que será veiculado não deveria ser restrita ao editor.
Quanto a isso, o fotógrafo suíço-americano Robert Frank critica o jornalista comercial por ele
não estar “a serviço da imagem, mas a serviço das preocupações ou do olhar de um redator-
chefe” (FRANK apud ROUILLÉ, 2009, pg.171). Essa postura é uma recusa de Frank até
mesmo à mínima imposição externa e uma afirmação quanto à autonomia do “eu” do
fotógrafo para justificar sua fotografia-expressão. O fotógrafo brasileiro Milton Guran, por
sua vez, diferencia os transformadores culturais dos meros operadores de filme, sendo esses
últimos aqueles fotógrafos que vendem o filme sem ao menos verificar o resultado ou
experimentar em cima da produção (GURAN, 1983). Para o fotógrafo André Dusek, o ideal
seria o repórter fotográfico participar de todo processo, desde fotografar até acompanhar a
diagramação de sua foto (PAIVA, 1989).
Em concordância com o ponto de vista de Robert Frank, o fotógrafo Luis Humberto
menciona que a fotografia deveria ser tratada com a possibilidade de várias saídas de registros e
não como algo uniforme e pautado a partir do editor. Em suas palavras:
Acho que a posição de um editor de fotografia é muito mais a de um pastor
de sensibilidade do que a de um feitor. Infelizmente, o que ocorre é
exatamente o contrário. A posição de editor de fotografia significa muitas
vezes poder e a esse poder se junta uma vontade de se auto-preservar o que
faz com que as pessoas acabem fazendo o jogo dos patrões (HUMBERTO,
1983, p. 79)
Por outro lado, o olhar de um editor pode ser benéfico ao fotógrafo. Quanto a isso,
Sebastião Salgado reconhece o “olhar fabuloso” de sua editora e esposa, Lélia Wanick Salgado,
quando esta o percebe apegado a uma ou outra imagem. Esse apego ocorreria por ele ter
vivido o momento fotografado, mas ao mesmo tempo o faria perder o rigor na seleção,
deformando o apuro da escolha (SALLES, 2013).
Um ponto de consonância entre editor e fotógrafo são as parcerias colaborativas
entre ambos como prerrogativa na criação e edição fotográfica. A figura do editor ou diretor
artístico está fortemente vinculada ao sucesso da criação do editorial. Historicamente,
recortando exemplos do campo da moda, encontramos os nomes de Richard Avedon

 
  135

associado a Alexey Brodovitch; Irving Penn associado à Alexander Liberman e, aproximando-


nos de nosso objeto de estudo, Otto Stupakoff associado à Bea Fleiter, editora de arte da
Harper’s Bazaar – que ele dizia ser a melhor diretora de arte com quem já havia trabalhado
(FERNANDES JUNIOR, 2006, p.157).
Uma das principais questões na relação fotógrafo/editor, principalmente no
mercado editorial, está no impedimento do fotógrafo decidir sobre o uso final das imagens
por ele produzidas. Na seleção e edição fotográfica para publicação impressa, as imagens
podem ser selecionadas de acordo com um layout pré-estabelecido. A edição fotográfica para
um jornal ou revista, por exemplo, normalmente está em acordo com uma paginação definida
por um projeto gráfico e relacionada ao fator de impacto, expressão e importância daquela
imagem em especifico para a matéria jornalística (FREEMAN, 2013). Quanto a isso, Orlando
Brito (editor e fotógrafo) argumenta que: “Nem sempre o ‘bonito’ é necessário, mais
importante é conseguir as fotos dentro do que se precisa mostrar” (BRITO apud PAIVA,
1989, p. 212).
Já a criação fotográfica para a publicidade e editorial de moda satisfaz a um
layout gráfico em que espaços para outros elementos de comunicação – textos, logotipos,
grafismos – são previstos. No editorial, por exemplo, o editor de fotografia e o diretor de arte
criam determinada sensação dependendo do arranjo visual. Diferentes arranjos visuais
resultam em diferentes sensações, o que permite que o ensaio fotográfico seja um trabalho
criativo, também podendo ser visto como uma narrativa visual – vide as fotorreportagens
publicadas nas revistas Life, Paris Match, O Cruzeiro (TACCA, 2006). Além disso, em
consonância com a fotografia, nas publicações são usadas legendas, as quais, por uma
linguagem sincrética, direcionam o interpretante da imagem.
O ensaio de Stupakoff para Vogue francesa, feito em 1974 (Figura 81), exemplifica
a importância do layout no resultado final da obra. Aqui, há uma insidiosa edição gráfica e
fotográfica utilizada para criar a estrutura da página. Nela, duas fotografias foram
cuidadosamente vinculadas para sugerir visualmente uma ideia de continuidade, impressão
essa presente apenas por conta da justaposição previamente determinada.

Figura 81. Foto de Otto Stupakoff nas páginas de Vogue francesa 1974, justaposição de fotos.
Fonte: Reprodução da revista.

 
  136

Sobre o processo de escolha para as revistas Harper’s Bazaar e Vogue, Stupakoff


atesta que, até a década de 1980, o fotógrafo entregava para Harper’s (Nova York) as fotos com
uma edição feita por ele, depois as fotos eram projetadas para o fotógrafo visualizar seu próprio
trabalho e este sempre via o layout antes da publicação; para a Vogue (Paris) o fotógrafo marcava
suas fotos favoritas, e, caso ele não estivesse presente no momento da seleção, conferia o layout
em momento oportuno, sendo que as fotos não eram publicadas sem a sua aprovação
(STUPAKOFF, 2000d). A despeito dessas experiências, afirmou que nos anos 2000 isso já não
existia mais em nenhum dos dois lugares.
Na mídia impressa (como jornais e revistas), a decisão de qual e como a imagem
entrará na página normalmente fica a cargo do editor de fotografia e do diretor de arte. Nesse
tocante, a imagem poderá apresentar alterações, como no corte, sob a justificativa da
necessidade de se realizar um recorte “criativo” que é, nas palavras de Harold Evans, editor
do Sunday Times entre 1967 e 1981, o “reconhecimento de que uma porção dentro da foto é
que realmente é sua matéria principal” (EVANS apud FREEMAN, 2013, p. 78). O recorte
“rotineiro” por vezes funciona como ajuste para dar forma ao propósito da matéria e melhor
encaixe na página, quando a imagem precisa ser adequada ao formato da página seguindo a
orientação de certa prismagem12.
Às vezes, as imagens são ampliadas antes que uma decisão possa ser tomada.
John Durniak, ex-editor de imagens do New York Times e da revista Time, primeiramente se
pautava por uma boa impressão produzida a partir do negativo, e então decidia se parte da
imagem seria mais significativa do que o todo e se o corte iria melhorar a comunicação.
Quando uma única imagem não era suficiente para contar toda a história, Durniak analisava
novamente a sequência de fotos a partir da qual aquela primeira havia sido escolhida, e
selecionava as que complementavam a história a ser contada, nunca descartando imagens
que aumentavam a possibilidade de comunicação (HEYMAN; DURNIAK, 1986).
Práticas como a de Durniak têm uma consequência importante: ao retirar
elementos da composição, o reenquadramento da imagem consequentemente altera seu
sentido. Se no processo de criação a seleção do que será incluído no enquadramento nos
conta sobre o modo como o fotógrafo visualiza e elabora determinada cena (DUBOIS, 2012),
a edição acarreta mudanças na criação original, transformando o discurso da imagem.
Assumindo que o discurso faz parte da criação do fotógrafo, sob o ponto de vista criativo essa
seria uma interferência no seu processo criativo. Como diz Tisseron:
O conjunto de gestos com que a pessoa que fotografa se desloca, se aproxima
ou se afasta do assunto, gira, enquadra no visor, aperta o disparador, avança
o filme para, conforme o caso, disparar de novo, participa na operação de
simbolização do acontecimento, na forma sensorial-afetiva-motora. O

                                                                                                               
12 No jargão da editoração prismagem é o destaque de um elemento ou detalhe na imagem obedecendo às regras

de proporção na redução ou ampliação.

 
  137

enquadramento, em particular, participa intensamente na formalização e


apropriação simbólica do mundo (TISSERON, 2000, p. 26)
Na obra de Otto Stupakoff encontram-se exemplos de como a interferência
durante o processo de edição alterou o conteúdo da fotografia. Na página da revista Quatro
Rodas, dezembro de 1963 (Figura 82A), houve uma interferência direta dos editores de
imagem no trabalho publicado, pois este é um reenquadramento de uma imagem mais aberta
(Figura 82B). Dada a prática comum na editoração de interferência quanto às formas de uso
do material imagético original (BONNICI; PROUND, 1998), é provável que o
reenquadramento da imagem tenha acontecido à revelia do fotógrafo e por uma necessidade
de adequar ao formato mais retangular da página da revista. Nota-se um redimensionamento
pelo centro que acarretou na perda de áreas laterais e de cima-baixo.

(A) (B)
Figura 82. (A) Página da revista Quatro Rodas, Stupakoff. (B) Fotografia original de Stupakoff.
Fonte: (A) Reprodução da revista/ Coleção da autora (B) Instituto Moreira Salles.

Não só os editores de imagem ou diretores de arte são figuras importantes para


determinar como as fotografias serão selecionadas e publicizadas. Nesse processo de seleção
e edição frente à obra de um fotógrafo, o curador de exposição também tem um papel
significativo quanto à maneira de apresentar a obra fotográfica, carregando consigo uma
série de particularidades no processo de escolha.
Para Guran (2011), é necessário, antes da curadoria em si, que o curador delimite
as obras a serem expostas para dar visibilidade ao conteúdo sem que elas se percam no
emaranhado de informações visuais de uma grande coleção. Dessa primeira seleção proposta
a partir do conjunto de obras podem emergir associações entre imagens que, em um primeiro
instante, não pareciam coerentes, ou serem destacadas obras que pareciam irrelevantes,
criando, assim, um conjunto exposto que estabelece um diálogo entre o público e o fotógrafo
(GURAN, 2011).

 
  138

No trato com o conjunto de fotografias, o curador precisa detectar linhas de


força13 e reorganizá-las por meio de conexões poéticas, formais e simbólicas (CHIODETTO,
2013). Não há caminhos pré-definidos no processo de edição e curadoria: cada curador age
conforme as particularidades do conjunto fotográfico à sua disposição procurando sugerir
novos pontos de vista sobre a obra, amplificar a sua potência e, no tratamento das
informações, clarificar pontos obscuros da história a ser contada na exposição. Pela edição,
poderá propor o estabelecimento de narrativas, contíguas ou descontínuas, que reforcem
determinadas atmosferas, salientem o estilo do fotógrafo e a pluralidade de interpretações.
Na elaboração da narrativa de uma exposição, cabe ao curador auxiliar para que se realize a
comunicação entre as obras e o público da forma mais enriquecedora possível para ambos,
seja pelo didatismo, pelas conexões históricas, estéticas, pelo questionamento gerado a partir
da montagem da mostra ou, principalmente, pelos desdobramentos surgidos a partir das
premissas inerentes à obra de arte.
Para Soulages (2004), a curadoria faz uma aproximação sensível com as obras.
Em um primeiro instante, como qualquer outro receptor não especializado, o curador tem
uma experiência mediada por seus sentidos individuais. Esse processo de aproximação
sensível reflete-se em uma combinação criadora, significando que o curador de uma
exposição reúne obras que se relacionam umas às outras para fazer do conjunto algo coerente.
Chiodetto (2013) também defende que a principal ocupação do curador é a
pesquisa; o desenvolvimento de um projeto curatorial parte da pesquisa a partir de uma ideia
ou da investigação do curador em coleções das quais ele trará à tona questões fundamentais
que nortearão a seleção das obras. Para o autor, toda curadoria é um projeto de comunicação
sem neutralidade, pois o curador adota um posicionamento e um discurso ideológico em que
são realizadas opções estéticas e conceituais para impactar o público.
Tendo em vista esses delineamentos abordados por Chiodetto, temos que as
escolhas das fotografias por um curador estão impregnadas de intenções delimitadas a partir
de uma linha curatorial. O curador se serve da pesquisa em acervos – que já são recortes –,
seja de uma instituição ou de particulares, e, em meio às imagens, começa a delinear as
linhas de força daquele acervo, o que leva à formação de um pequeno núcleo de imagens com
uma lógica interna. A partir desse núcleo de imagens pré-estabelecido, as edições
prosseguem. Dentro desse cenário, Chiodetto (2013) argumenta que é comum que algumas
fotografias com qualidade técnica, conceitual e estética, ao não se enquadrarem em um eixo
conceitual de trabalho, fiquem fora da edição.
Nas palavras de Sergio Burgi, coordenador da área de fotografia do Instituto
Moreira Salles, “(...) uma exposição tem que ser fundamentalmente alicerçada na emoção,

                                                                                                               
13 Linhas de força podem ser vistas também como linhas de tensão que atuam como ancoradouro conceitual e

redutos que abrigam as escolhas das imagens e suas possíveis e indizíveis relações (TACCA, 2016).

 
  139

um estímulo primeiramente sensorial por meio de experiência visual, mas também


acompanhada de um conteúdo, algo que seja consistente para o espectador” (BURGI apud
INSTITUTO MOREIRA SALLES, 2009b). Para Burgi, a curadoria conjectura sobre os
aspectos formais e estéticos e as articulações dos conteúdos nos vários níveis. Ele considera
que a relação sensorial com as imagens e as várias informações agregadas a elas são
importantes para que a experiência vivida se enraíze no visitante.
Burgi foi o curador da exposição de Stupakoff realizada em 2009 no IMS. Sendo
esta exposição um meio de celebrar a incorporação do acervo de Stupakoff ao Instituto, ela
também iniciou os estudos e trabalhos curatoriais realizados sobre os 50 anos de sua carreira
(BURGI, 2009). Sobre essa ocasião, Burgi (2014) afirmou que estava em consonância com o
fotógrafo, ainda vivo no momento dos preparativos da exposição, para que juntos
selecionassem as imagens que refletissem uma trajetória fotográfica não pautada somente na
fotografia de moda, mas na abordagem da pluralidade fotográfica contida em meio século do
trabalho fotográfico de Stupakoff.
Nas curadorias para exposição e publicação dos trabalhos de Stupakoff, podemos
vislumbrar algumas linhas norteadoras (lógica interna, certas reincidências conscientes ou
inconscientes relativas a enquadramento e composição) que dirigiram o trabalho dos curadores.
Segundo depoimento dos fotógrafos Fernando Laszlo (2017) e Bob Wolfenson
(2017), nomes importantes no resgate da obra de Stupakoff no Brasil em meados dos 2000
(como discutido nos capítulos 1 e 2 da presente tese), a linha curatorial estabelecida para a
exposição na São Paulo Fashion Week de 2005 era encontrar um discurso capaz de trazer à
tona os núcleos significativos fundamentais da obra de Stupakoff mais focados para
apresentação das fotografias de moda e retratos, condizentes com o evento. Tais depoimentos
demonstram que um trabalho de curadoria é pleno de intenções. O norte sobre o que
selecionar da obra do fotógrafo, para delinear a linha expositiva, depende das intenções
comunicativas – o tema, o artista, a cronologia – e do entendimento do curador, que irá
privilegiar imagens que fazem sentido para ele, frente à obra e ao ambiente onde serão
expostas as imagens (WOLFENSON, 2017). Dessa forma, a cada olhar sobre a obra do autor,
novas seleções podem ser realizadas com arranjos diferenciados.
Usando como ilustração a exposição da obra de Stupakoff na São Paulo Fashion
Week de 2005, podemos visualizar o procedimento do trabalho de curadoria realizado por
Wolfenson e Laszlo. As marcações no copião da Figura 83, por exemplo, sugerem que os
curadores selecionaram, para ampliação e subsequente exposição, o fotograma marcado em
vermelho dessa determinada sequência. Stupakoff concordou com a indicação, pois seu nome,
grafado em caneta cinza, aparece abaixo do fotograma indicado (LASZLO, 2017;
WOLFENSON, 2017).

 
  140

Figura 83. Parcial do copião Joatinga, Rio de Janeiro, 1978. Fonte: Instituto Moreira Salles.

Um outro exemplo extraído de material exposto na São Paulo Fashion Week vem
da série de Pelé (Figura 84). Laszlo (2017) deixa claro que foi opção dos curadores apresentar
as fotografias com o enquadramento mais aberto, com Pelé sentado na pedra tendo como
fundo a cidade de Santos, em contraponto àquelas já publicadas em close na revista Íris,
agosto de 1979, conforme discutido no capítulo 2. As marcações em vermelho na folha de
contato atestam essa informação.

Figura 84. Folha de contato, Pelé, Santos, 1979. Fonte: Instituto Moreira Salles.

 
  141

Alinhavando os depoimentos de Chiodetto, Burgi, Laszlo e Wolfenson, no sentido


prático, entendemos que as folhas de contato podem funcionar como ferramenta da
curadoria em um primeiro momento, mas que, em fases curatoriais posteriores, surge a
necessidade de se trabalhar com formatos maiores de imagem, i.e., cópias de trabalho
ampliadas a partir dos fotogramas escolhidos. Chiodetto expressa melhor essa necessidade:
“sempre peço imagens impressas (...) o exercício de edição é semelhante ao um jogo de tarô.
É preciso embaralhar, rever a ordem, testar combinações no intuito de buscar simbolismos
que se desprendem das imagens no momento em que elas são vistas lado a lado”
(CHIODETTO, 2013, p.27).
Para a edição da SPFW, Laszlo (2017) afirma que as fotos foram primeiramente
selecionadas via folha de contato, depois ampliadas em papel resinado 24X30 cm para
finalizar a escolha. A partir dessa última seleção, as cópias de trabalho foram para o
laboratorista ampliar em definitivo, e por último, Chris Bishop retocou todo o material.
É notório que cada fotógrafo observa a realidade e/ou assunto a ser fotografado
de uma maneira particular e que esse modo de olhar fica expresso nas imagens registradas
em uma sequência. Como visto, através da análise dessas sequências podemos realizar
algumas inferências quanto às características do olhar do fotógrafo perante a cena e a
maneira como ele a fotografou. O editor do fotógrafo Josef Koudelka, em depoimento no
documentário A grande tradição do fotojornalismo, diz que quando, analisa as folhas de
contato de Koudelka, ele “(...) viaja no olhar do fotógrafo” (CONTATOS 1, 2015).
Já ao analisarmos os olhares do editor e do curador podemos entendê-los como
olhares de recepção, visto que eles – através do copião – compreendem as imagens das
sequências à sua disposição produzidas pelo fotógrafo e as apresentam conforme sua própria
leitura sobre aquele conjunto de registros.
Poderíamos ir além e colocar o fotógrafo na posição de receptor e leitor de suas
próprias imagens no momento da edição e da escolha. Baseados nos argumentos de Dubois
(2012) sobre a foto como uma imagem-ato que não se limita apenas ao gesto da produção (o
gesto da tomada), mas que inclui o ato de sua recepção (sua contemplação), abordar a questão
sob esse ângulo nos permite diferenciar dois momentos distintos, ainda que complementares, da
criação da imagem por parte do fotógrafo: o registro e o momento da edição. Esses dois olhares
são distintos e dialéticos, pois um depende do outro.
É importante notar que a percepção, entendida por Peirce (2003) como um
processo sígnico, i.e., um signo formado a partir de outro signo em um processo iterativo ad
infinitum, envolve primeiramente o fotógrafo. É ele quem, ao produzir as imagens, estabelece
as primeiras seleções e relações a partir de um repertório contextual. O leitor da imagem –
público em geral, editor, curador, pesquisador – no seu uso da foto, também terá uma
percepção, fará correlações e estabelecerá um interpretante, i.e., o resultado da relação

 
  142

sígnica entre o objeto (o que foi fotografado) e o signo (a fotografia per se). O contexto é dado
pelo fotógrafo que, em uma cadeia de signos, produzirá um signo que será apreendido e
interpretado pelo leitor.
Visto por esse ângulo, entre os leitores da obra do fotógrafo, incluímos o próprio
fotógrafo, que depois de produzir a imagem irá observar e ler o copião tendo uma outra
relação com a sua criação. É nesse cenário em que ele se coloca como leitor que o fotógrafo
escolherá e entenderá essas imagens, gerando interpretantes para selecioná-las. No processo,
ele expressa suas preferências e faz ajustes – técnicos e/ou conceituais – que se adequem
melhor a um determinado processo comunicativo.
Também não podemos deixar de considerar que os agentes do sistema de criação
fotográfica tratados nesse texto – fotógrafo, editor e curador – afetam-se mutuamente, e que,
se as condições das fotografias entregues ao público muitas vezes não conservam as
condições iniciais de sua feitura, é porque os parâmetros de um sistema nem sempre
predominarão sobre suas condições iniciais. Dito de outra maneira, o trabalho do editor
influencia o trabalho do fotógrafo, assim como o do curador também o faz, ao mesmo tempo
em que o trabalho do fotógrafo influencia a ambos.
Ainda é válido acrescentar que, no caso do curador, este por vezes é o elemento
chave que agencia a entrada do fotógrafo/artista em coleções museológicas ou privadas e
promove o reconhecimento e a legitimidade total ou parcial de uma obra.

3.4 A folha de contato como documento de processo


As folhas de contato podem ser vistas como documentos de processo, que,
segundo Salles (2002a, 2013), são aqueles que contêm sempre a ideia de registro do processo
criativo de uma obra. A folha de contato constitui-se de um documento valioso tanto para o
fotógrafo quanto para o pesquisador, uma vez que se presta para um tipo de análise de
gênese cuja proposta metodológica permite discutir sobre o ato criador, o acompanhamento e
a análise de percursos criativos (SPINELI, 2014; SPINELI; PFÜTZENREUTER, 2016).
Assim, o estudo da folha de contato possibilita a análise de parte do percurso criativo do
fotógrafo – visto que somente o registro fotográfico impresso no copião não nos permite a
percepção de todas as motivações culturais e psicológicas de quem cria as imagens – e as
características peculiares de cada profissional.
Pela folha de contato podemos refletir sobre a maneira como o fotógrafo reagiu
diante de um fluxo de acontecimentos – personagens, ambientes e ações – e sobre o que ele
achou relevante registrar. Podemos entender aqui que, como documentos de processo, os
copiões são índices do fotógrafo em ação, refletem um pensamento em movimento, uma
sequência de gestos vindos da mão criadora. Conjuntamente a outros índices de produção
intelectual que nos mostram um processo de criação – vestígios dos catálogos de exposições,

 
  143

correspondência passiva (recebida) e ativa (enviada), documentos depositados em


instituições públicas, recortes de periódicos informando as atividades (cadernos de clipping),
arquivos de hard disk, anotações pessoais – (exemplos de materiais no acervo de Stupakoff),
os copiões formam um dossiê de estudo de crítica de processo.
Se entendermos que uma fotografia representa em seu conteúdo uma interrupção
do tempo, sem outros fotogramas a lhe darem sentido (KOSSOY, 2001), é através da
visualização da sequência da qual aquele registro específico foi extraído que podem ser
montados ou articulados determinados sentidos mais amplos do antes e depois daquela dada
imagem fotográfica. A sequência também oferece possibilidades de se vislumbrar o contexto
da realidade na qual a imagem escolhida foi registrada, salvo nas situações em que não se
produziu um material para seleção.
O fotógrafo húngaro William Klein no documentário Contatos, Vol.1 ressalta que:
Folha de contatos: 36 exposições. Seis tiras de seis fotografias tomadas uma
depois da outra. Você lê as tiras da esquerda para a direita, como se fosse um
texto. É o diário do fotógrafo. Você vê o que ele viu através do visor, suas
hesitações, seus sucessos, suas falhas, suas escolhas. Ele escolhe um
momento, um ângulo. Escolhe outro momento, outro ângulo. Ele insiste. Ele
para. É raro ver os contatos de um fotógrafo. Só vemos a imagem escolhida,
não vemos o antes ou o depois, como numa folha de testes. O que você sabe
do trabalho de um fotógrafo? Uma foto, digamos, tirada a 1/125 de segundo.
Uma centena de fotos, digamos 125, já é uma obra. Mas podemos dizer
também que isso corresponde a apenas um segundo. Vejamos mais, digamos
250 fotografias, uma obra considerável – dois segundos. A vida de um
fotógrafo, até mesmo de um grande fotógrafo, corresponde a uns poucos
segundos (KLEIN apud CONTATOS 1, 2015).
Partindo da premissa de que na criação fotográfica tudo é fluído, a visualização da
sequência fotográfica pode evidenciar as rotas e os gestos do fotógrafo em torno das cenas a
fotografar, sua obstinação para a captura de movimentos e os sinais que anunciam
intencionalmente sua escolha de um enquadramento para um ponto de vista. Diante da
fluidez da criação fotográfica e contrariando a ideia de imagem única – imagem síntese –
atrelada à fotografia, representada, por exemplo, pelo conceito de ‘momento decisivo’ de
Cartier-Bresson14 (2007 [1952]), Sicard (2015a) argumenta que as fotografias não são apenas
imagens, mas sim artefatos às vezes infinitamente reformulados. Esta distinção é
fundamental para a compreensão dos entusiasmos fotográficos.
Alguns fotógrafos seguem a ideia da imagem síntese como resultado do momento
decisivo: entre eles estão Leonard Freed e o fotógrafo norte-americano Harry Whittier Frees,
para os quais a fotografia tem que representar, em um mesmo fotograma, um conjunto
formado por mensagem, fundamento, composição, história e personalidade individual
(LUBBEN, 2012).

                                                                                                               
14 A definição de Cartier-Bresson (2007 [1952]) contempla a imagem única, captada em um momento singular,

como aquela que tem uma riqueza na composição e cujo conteúdo é tão expressivo que ela em si é uma história
completa. No entanto, nesse mesmo tempo o próprio fotógrafo aponta que essas imagens são raras.

 
  144

No entanto, para outros fotógrafos, como o brasileiro Bob Wolfenson, “uma


fotografia não dá conta de um todo, de uma situação, de uma cena, de uma ideia e,
principalmente, de um ver” (WOLFENSON in INSTITUTO MOREIRA SALLES, 2009a, p.
10). Nessa linha de raciocínio, mostrar a sequência fotográfica faz mais sentido que
apresentar uma única imagem em algumas ocasiões. O fotógrafo brasileiro Alair Gomes
compartilhava do pensamento fotográfico sequencial ao mencionar ter consciência nítida de
que suas imagens isoladas não o satisfaziam e que seu caminho fotográfico tinha que ser o da
sequência e não o da imagem isolada, incorporando isso em sua poética (GOMES, 1983).
De um modo geral, a visualização da folha de contato revela a dinâmica da praxis
do ato fotográfico em si (FLEIG, 1983); o estudo dos copiões e do processo de feitura da
imagem fotográfica como um todo auxilia a desfazer o estigma da foto única, do instante
decisivo, possibilitando a reunião de elementos para ajudar a compreender o processo de
busca do fotógrafo frente à sua criação em andamento, com erros e acertos, oscilações e
hesitações (SPINELI, 2014; SPINELI; PFÜTZENREUTER, 2016).
Alguns fotógrafos, no entanto, discordam da divulgação de seus contatos. Elliot
Erwitt argumenta que “(...) a folha de contato ainda não é a fotografia” (apud AVELLAR,
2015, p.9) e, por ser ainda processo, não deve ser mostrada a ninguém. Leonard Freed
reforça que essas folhas são registros pessoais e pertencentes apenas ao fotógrafo, visto que
nos contatos há, para muitos fotógrafos, o que eles consideram como “erros” (LUBBEN,
2012). Esse pensamento que resguarda as folhas de contato sugere um controle do fotógrafo
frente ao que pode ser exposto e ao que ele considera como sua obra fotográfica de fato. Por
isso, alguns fotógrafos pensam em seu trabalho como tendo uma única edição e não
permitem a publicação de suas sequências. Não é o caso do objeto de estudo da presente tese:
Otto Stupakoff sempre permitiu que editores, críticos e curadores acessassem seu material e
estabelecessem novas relações e interpretações (INSTITUTO MOREIRA SALLES, 2009a).
Tendo em vista o estudo de produção da obra fotográfica, a sequência
materializada em um copião é um estado dialético, pois é obra não sendo. É obra porque as
imagens foram registradas no ato fotográfico, mas, ao mesmo tempo, ainda não é obra
porque, sob a perspectiva que a obra se realiza no outro (SALLES, 2013), essa ainda não foi
selecionada e divulgada.
Desta forma, cada fotograma no copião representa potencialmente um objeto
acabado que, por sua vez, representa um momento do processo. Recorremos novamente à
Soulages (2010) quando este afirma sobre a potencialidade do negativo, pois o fotógrafo
sempre pode retornar a esse negativo para dele extrair ‘novas obras’. Diferentemente de
outros materiais de processo, na folha de contato não há indicação de evolução no sentido de
um processo de transformação contínua em diferentes complexidades. Cada fotograma se
encerra em si e já é obra se assim o autor quiser. Aquilo que vemos no conjunto da sequência

 
  145

é um pensamento, e é isso que pode ser estudado, visto que essa visão do conjunto através do
copião é o lugar da tomada de consciência do gesto fotográfico, o desenvolvimento de uma
ideia durante o ato do registro da sequência.
Esse processo, entretanto, não demonstra um pensamento linear, no sentido de
um direcionamento claro que vai do menos para o mais acabado, e sim relaciona-se mais
propriamente a um pensamento circular, tautológico, no qual não há um começo e um fim:
da primeira à última imagem da sequência, cada fotograma tem o potencial de ser
selecionado como obra, ampliado e, posteriormente, entregue ao público. Ainda que alguns
fotógrafos usem os primeiros fotogramas de uma série como ensaio até chegar no que
consideram a imagem ideal – ou mesmo ensaiam sem colocar o filme na câmera, caso da
húngara Madalena Schwartz, que primeiramente iniciava uma sessão de fotos sem o filme
(GONÇALVES, 2016) –, isso não é necessariamente uma regra válida para todos.
Retomando a visão da folha de contato como material de processo e sob a
perspectiva da crítica do processo criativo no que tange ao olhar do autor sobre a própria
obra (SALLES, 2013), a folha de contato também pode ajudar o próprio fotógrafo a entender
seu trabalho. Segundo o fotógrafo britânico David Hurn:
As melhores imagens só ficam óbvias depois que você olha as folhas de
contatos. A imagem poderia ser melhorada caso desse um passo para frente
ou para trás? Qual seria o resultado caso tivesse tirado a foto um momento
antes ou depois (HURN apud LUBBEN, 2012, p. 151).
Há uma concordância entre fotógrafos e pesquisadores sobre o que nos mostra a
folha de contato. Para Heyman e Durniak (1986), a folha de contato revela tanto como o
fotógrafo trabalha tecnicamente quanto também sua espontaneidade e intelectualidade. O
fotógrafo britânico Stuart Franklin argumenta que uma folha de contato é o registro de uma
busca e traz uma circunvolução em torno de uma ou mais ideias, que podem ser tanto
meramente técnicas, como alterações de diafragma, quanto estéticas, acerca da composição
do motivo fotografado (LUBBEN, 2012). Bauret (2010) nos fala que a prova de contato
materializa aquilo que antecede a imagem e as operações que a precedem. Pode ser vista
também quase como um tipo de rascunho ou esboço, com a diferença que as sequências
presentes nas folhas de contato não se constituem em camadas de versões ou etapas que se
substituirão; na fotografia convencional, não há de fato sobreposição (salvo nas duplas
exposições) e sim sucessão de imagens. O trabalho dá-se no tempo e não na superfície.
A produção da obra fotográfica converge com aquilo que Salles (2008, 2013)
aponta para a criação artística: uma trama complexa de tendências singulares expressas
através de buscas, resolução de problemas, testagem de hipótese, encontros e desencontros.
Acreditamos que a folha de contato reflete essas tendências singulares ao mostrar as
circunvoluções do fotógrafo frente ao que foi fotografado explicitando, mesmo que
parcialmente, os olhares do autor perante seu objeto retratado. Ainda, segundo Bauret (1983,

 
  146

2010), os copiões nos oferecem respostas para a análise dos diferentes pontos de vista de um
mesmo tema fotografado e permitem reconstruir e formular hipóteses sobre o método e
hábitos de trabalho de um fotógrafo.
As sequências de fotogramas via folha de contato proporcionam um vislumbre da
visão fotográfica particular do fotógrafo, em que é possível observar seu desenvolvimento
espaço-temporal no ato do registro de um assunto específico. Através da análise de toda a
série de fotogramas, é possível investigar o desenrolar do assunto fotografado e presumir a
conduta do fotógrafo em relação à cena: se registra obstinadamente o tema ao perceber
potencial em uma cena e emprega esforço para chegar à imagem final bem-sucedida, se
realiza modificações significativas alterando motivos fotográficos e visões de tomadas, se é
levado pela espontaneidade, ou se capturou imagens sem aparente encadeamento, aleatórias
(mas não desprovidas de intenções).
A série que Otto Stupakoff fez de seu filho Ian, de 1963 (Figura 85) ilustra a
afirmação acima. No trecho entre os fotogramas 19 ao 24 (uma parte da série) visualizamos
que o fotógrafo acompanha e registra o desenrolar da atividade lúdica de seu filho Ian
condicionado em um espaço interno. Primeiramente, vemos um encadeamento da ação por
um desenvolvimento temporal – as inserções gráficas na parede feitas pela criança – depois,
a maneira com que a criança interage com a câmera. Todos esses momentos são registrados
por Stupakoff com o mínimo de alteração de ângulo e composição (salvo o primeiro
fotograma da sequência). O aprofundamento da discussão sobre as potencialidades das séries
de fotogramas nas folhas de contato de Stupakoff e seu processo de escolha será feito no
capítulo 4 desta tese.

Figura 85. Sequência dos fotogramas 19 à 24 da série Ian, 1963. Fonte: Instituto Moreira Salles.

 
  147

Ainda considerando a folha de contato como documento de processo, ela


explicita os elementos materializados em imagens, assim como os elementos que foram
auxiliares dessa realização (ambos capturados no negativo), o que nos permite inferir sobre
as preferências do fotógrafo por temas e referentes a serem fotografados.
Consequentemente, também está expressa na folha de contato a maneira como esses
aspectos foram fotografados – composição, ângulo e enquadramento, entre outros
elementos da plástica visual da fotografia – que nos remontam à poética do fotógrafo e ao
seu pensamento fotográfico. Esta tese se debruçará especificamente sobre a poética na obra
de Stupakoff nos capítulos seguintes.
O acúmulo de registros é um dos recursos de criação do fotógrafo visualizados
pela folha de contato. Segundo Entler (2005), assim como o pintor faz vários esboços antes
da versão definitiva, o fotógrafo poderia fazer várias tomadas de uma mesma cena. No
entanto, como discutido anteriormente, os vários fotogramas não correspondem a versões
incompletas do que será a fotografia definitiva selecionada. Dependendo da postura do
fotógrafo frente ao que será fotografado, é possível que ele pense isoladamente cada
fotograma sem tecer uma relação com os anteriores e posteriores, criando, assim, imagens
que não tenham diretamente relação conceitual ou formal com as outras do mesmo filme. No
caso da produção encadeada de fotogramas que se relacionam, cada imagem registrada em
um espaço-tempo poderá desencadear uma reflexão no fotógrafo quanto ao que e como
registrar o próximo fotograma, influenciando esteticamente e conceitualmente a captura da
próxima imagem. Em contrapartida, pode-se também disparar o obturar sequencialmente,
sem pausa para elucubrações, esperando uma captura automática.
O tipo de conduta durante o registro da sequência irá direcionar o modo como o
fotógrafo se dá com a imagem registrada quanto à edição – se faz um grande número de
imagens para ter escolhas na edição ou se faz poucos registros, com uma tomada de
consciência maior do que pretende (do que está em seus planos, em sua cabeça). Na obra de
Stupakoff, o primeiro caso é recorrente. Nota-se nas sequências exemplificadas nas figuras
86 e 87 pouca ou nenhuma variação do referente ou de ajustes técnicos feitos por parte do
fotógrafo (o aspecto do gesto fotográfico como um registro repetitivo será discutido no
capítulo 5).

 
  148

Figura 86. Parcial de copião. Xuxa, 1989. Fonte: Instituto Moreira Salles.

Figura 87. Parcial de copião. Mãos de Wesley Duke Lee e Sérgio Mendes, 1978.
Fonte: Instituto Moreira Salles.

Para Fleig (1983), pela maneira com que os fotogramas são impressos na folha de
contato – formando uma sequência, no sentido de contiguidade espacial e temporal, de
acordo com a ordem de disparo da câmera –, o copião pode ser visto como uma prancha de
leitura. Essa leitura, além de permitir a escolha de uma imagem para publicação, também
demonstra uma porção do universo fotográfico de determinado autor e, consequentemente,
parte de seu processo de criação.
A folha de contato também incorpora o senso do tempo em marcha, o rastro
duradouro de um movimento no espaço, a questão do tempo da fotografia – a disposição dos
fotogramas normalmente obedece à ordem de registro sequenciado na câmera. Como
observado por Soulages (2010), a folha de contato também pode ter uma forma temporal que
não é necessariamente a linear, cronológica ao tempo sequencial de registro. Em uma folha
de contato publicada em Gilles Caron: repórter do fotojornalista francês Gilles Caron
(DEPARDON, 1978), a disposição dos negativos apresenta a seguinte ordem: 14-19, 20-25, 2-
7 e 8-13, não sendo essa nem a ordem que as imagens foram registradas e nem a ordem do
tempo. Para Soulages (2010), esse é um corpus particular do fotógrafo que o influencia na
seleção das fotos a serem copiadas.
Uma outra situação plausível é a disposição na mesma folha de contato de
miniaturas que nem sempre foram registradas no mesmo filme, nem no mesmo espaço/tempo.
Verifica-se com isso a flexibilidade do uso do procedimento do contato para a visualização e
edição das imagens, inclusive a articulação de diversos negativos na mesma folha.
Um motivo atribuído a essa “desordem” de posicionamento da sequência
fotográfica na folha de contato pode ser o de economia do espaço da folha. Rogniat (1997)
cita o fotógrafo húngaro André Kertész que, em alguns dos seus copiões, dispunha as tiras
tanto verticalmente quanto perpendicularmente a fim de utilizar todos os cantos disponíveis.

 
  149

Esse procedimento foi detectado como algo comum nos fotógrafos contemporâneos de
Kertész, muito provavelmente pela escassez de materiais de trabalho na economia entre
guerras (ROGNIAT, 1997). Em alguns copiões do também húngaro Robert Capa é possível
visualizar essa disposição aparentemente aleatória dos fotogramas aproveitando ao máximo
o papel (Figura 88).

Figura 88. Folha de contato de Robert Capa. Disposição dispersa dos fotogramas.
Fonte: Foto da autora/Exposição Valise Mexicana, Caixa Cultural SP, 2016.

Esse tipo de ordenamento sui generis também está presente no material de


Stupakoff. Na folha de contato da Figura 89 há quatro trabalhos distintos em um mesmo
copião: Joffrey Ballet (s/d), o músico Leonard Cohen (1967), a atriz Sirpa (1974) e o pintor
Fernando Odriozola (ca. 1960). São momentos distintos no espaço-tempo, separados por
décadas, impressos em conjunto provavelmente para reaproveitamento da folha e por
estarem no mesmo print file. No estudo desses copiões o pesquisador precisa se atentar a
essas particularidades, evitando estabelecer possíveis relações espúrias entre sequências de
fotogramas que não necessariamente dialogam entre si.

 
  150

Figura 89. Parcial do copião OS53. Quatro trabalhos distintos ocupando a mesma folha.
Fonte: Instituto Moreira Salles.

Para se reconstruir integralmente uma sequência de tomadas pode-se localizar as


semelhanças entre os documentos (ROGNIAT, 1997). Assim, como pondera Nori (1983), a leitura
da folha de contato consiste no ir e vir da análise de um fotograma a outros que façam parte dessa
mesma sequência – normalmente no sentido ocidental no qual a dinâmica do olhar se dá pela
leitura da esquerda para direita. Como discutido anteriormente no presente capítulo, para além
do que está inscrito nos fotogramas e que foi materializado no ato fotográfico, também é possível
visualizar através da folha de contato as edições propostas para os fotogramas, se houve edição
nas imagens, prováveis reenquadramentos, cortes ou se os limites do que foi registrado foram
respeitados no processo de seleção. Isso irá acarretar em um trabalho maior ou menor em cima
dos copiões.
No lidar com as folha de contato como um documento, os códigos visuais
surgidos da prática do trabalho fotográfico e adotados pelo fotógrafo como diálogo consigo
mesmo e com outras pessoas envolvidas no processo de criação – editores, parceiros,
laboratoristas – comunicam indicações de escolha e de edição de fotografias (como visto
anteriormente nesse capítulo). Para a pesquisa em crítica de processo, esses códigos são
evidências da criação. Na obra de Stupakoff, um exemplo está no material produzido no

 
  151

Camboja. Nele, há diversas anotações do fotógrafo, em folhas de contato e no próprio print


file, indicando tanto as imagens selecionadas, quanto sugestões ao laboratorista sobre como
as ampliações das imagens deveriam ser feitas. Na folha de contato da figura 90 há anotações
de Stupakoff indicando como editar dois fotogramas e propondo um sandwich fotográfico:
“Por favor, tente sandwich dos dois negativos (templo dentro da esfera amarela), se não for
possível amplie isso em azul-verde [tradução livre]”.

Figura 90. Exemplo de marcação de Stupakoff em sequência do Camboja. A marcação se refere a


direcionamentos para ampliação. Fonte: Instituto Moreira Salles.

Ainda em outro print file deste material, a seleção indica o fotograma 8, em que
há um apontamento para uma área da imagem propondo um “Burn in” “16X20” (Figura
91A), que, nos termos usuais da comunicação utilizada no laboratório fotográfico, significa
escurecer uma parte da imagem que ficou superexposta. Em outro print file (Figura 91B) há a
indicação de seleção e de como reenquadrar e ampliar: “crop 16X20”. Em um terceiro
exemplo (Figura 91C), a indicação é quanto ao formato de ampliação: “Both full neg. 16X16”,
i.e. ampliar sem reenquadramento no formato 16X16.

 
  152

(A)

Figura 91. (A) (B) (C) Parciais de folhas de contato Camboja. Otto Stupakoff.
Fonte: Instituto Moreira Salles.

Essas indicações demonstram que Stupakoff utilizava-se das própria folha de


contato para apontar edições nas fotografias recorrendo a outras linguagens – anotações
verbais, setas e retângulos desenhados diretamente no fotograma – em um percurso
organicamente intersemiótico, i.e, através do uso de linguagens diversas que comunicam as
intenções em relação àquelas imagens e adquirem valor como elementos auxiliares do
percurso de criação: o uso do verbal no visual, assim como outros códigos pessoais próprios
do fotógrafo (seu repertório de signos)15. Quanto ao uso desses símbolos, de uma maneira
ampla “(...) são códigos pessoais como, por exemplo, o uso de flechas ou formas geométricas
que passam a ter um determinado valor daquele processo para aquele artista” (SALLES,
2013, p. 124).
Essas anotações, como também as empregadas nas cópias de trabalho para
indicar procedimentos de edição da imagem no momento da copiagem (como visto
anteriormente), demonstram uma ação criativa. A descrição e discussão dessas marcas
auxiliam o pesquisador a entender os direcionamentos e o pensamento do fotógrafo para
determinado conjunto de fotos: as evidências sobre as possibilidades de uma foto ficam
explícitas ao nos depararmos com um material em que o tratamento a ser dado em
determinada imagem está anotado e grafado através de um código específico. Essas
marcações nos mostram os pormenores de um processo de criação fotográfico e reforçam que,
entre o ato fotográfico e a cópia final, foi percorrido um significativo processo de escolhas,
abandonos e alterações.
                                                                                                               
15 Esse tipo de anotação se encontra em maior quantidade no material do Camboja.

 
  153

Outro tipo de anotação presente em folhas de contato e/ou no próprio negativo


são indicações quanto ao assunto da foto, recurso muito utilizado por Stupakoff no próprio
espaço do porta cromo, do print file ou da folha de contato. Observa-se identificação por
escrito em alguns porta-cromos – “Princesa Marroquina” (Figura 92A), “Moda inverno
estúdio, NYC”, “Pirineus, Elle Paris” (Figura 92B), “Cynthia, Alsacia 1983”, “Meu barco Long
Island”, “Meu estúdio 80 Vanick ST NYC, banheiro” – e mesmo em algumas folhas de
contato: “Mérida México”, “Paris”, Trem Vietnã-Praga”, “Meu jardim”.
Algumas inscrições detalham aspectos particulares da série ou alguma imagem
individual. Em certos cromos, as indicações são mais longas e revelam um pouco do contexto
em que a fotografia foi produzida: “Giuliano Vangi escultor do museu de arte do Vaticano”,
“Depois de presenciar a morte de Eva Gshop16 nas mesmas circunstâncias” (Figura 92C),
“Grafite feito por Lord Byron. Templo de Sounion Grécia” (Figura 92D), “Destroços do avião
onde morreu Will Rogers”, “Máscara da minha filha Gabriela, em resina”, “Foto do dono do
esqueleto" e “Akunsharan (Obrigado)”.

(A) (B)

(C) (D)
Figura 92. Exemplos de anotações feitas por Stupakoff diretamente nos porta-cromos. (A) Princesa
Marroquina. (B) Pirineus. (C) Agneta Frieberg, ca. 1967. (D) Grafite de Lord Byron, Grécia.
Fonte: Instituto Moreira Salles.

                                                                                                               
16 Eva Gschopf foi uma modelo norte-americana, namorada do fotógrafo Guy Bourdin, que faleceu após cair de

uma árvore. Agneta Frieberg presenciou a morte de Gschopf e tempos depois faleceu ao cair de um terraço em
Paris.

 
  154

Para grafar particularidades sobre


as sequências, Stupakoff por vezes usava o
print file para descrever o resumo do lugar
como em “Câmara de tortura Prisão de Tuol –
Sleng, Bairro de Pnom-Pehn numa antiga
escola. 16.000 foram mortos aqui” (Figura 93).
A prática de anotar informações
nos copiões e print files não é algo exclusivo de
Stupakoff. Fotógrafos como Inge Morath,
Leonard Freed, Marc Riboud, Paolo Pellegrin,
Robert Frank já usaram desse expediente
(LUBBEN, 2012). Para alguns fotógrafos a
folha de contato em si é uma forma de
relembrar acontecimentos, funcionando como
um caderno de memórias. A folha de contato,

Figura 93. Câmera da tortura na Prisão de assim, permite a rememoração no sentido de


Tuol. Print file, médio formato, Camboja. Otto olhar e lembrar a partir delas, como faz
Stupakoff. Fonte: Instituto Moreira Salles.
  Raymond Depardon em seu filme San
Clemente (1982) em que reflete, a partir de seus copiões, sobre a ação fotográfica empregada
no trabalho fotográfico feito no asilo psiquiátrico San Clemente. As anotações na própria
folha, além de uma maneira de atribuir uma informação à uma determinada imagem ou ao
conjunto de fotos, podem ser vistas como um adicional de recurso para recordação.
Para o estudo em crítica de processo, indicações feitas diretamente nas folhas de
contato, nos print files e nos porta-cromos auxiliam na obtenção de certas informações as
quais, além de identificar um trabalho e facilitar a localização em que foi produzida a imagem,
permitem também reconstruir o contexto no qual os fotogramas foram registrados através do
estabelecimento de conexões entre as fotografias e outros materiais textuais ou imagéticos.
Os capítulos seguintes da presente tese lidarão mais especificamente com o processo de
criação e a poética de Stupakoff através da análise de suas folhas de contato e do seu material
publicado em diferentes veículos.

 
  155

CAPÍTULO 4

4. As escolhas de Stupakoff
Fotografar pressupõe um ato intencional e de tomada de posição do fotógrafo que
determinará a concretização da imagem fotográfica. É um fazer escolhas tanto antes como
depois do ato fotográfico (KOSSOY, 1999, 2001; KRAUSS, 2002; SOULAGES, 2005, 2010;
DUBOIS, 2012). No antes, o fotógrafo decide o tema, o lugar, o sujeito a fotografar e os
elementos constitutivos da linguagem fotográfica (como ângulo, enquadramento, composição
e foco), o tipo de dispositivo mecânico e todas as suas possibilidades de variação (objetivas,
diafragma, obturador, filtros), processo químico ou digital de obtenção da imagem (revelação,
ampliação) e gradações de suporte do material sensível, i.e., todos aqueles estágios próprios
da fotografia e que fazem do ato criador um objeto de conhecimento. No depois, as escolhas
se referem à revelação, tiragem, formatos, tipo de papel, eventuais trucagens e a definição do
uso da foto – imprensa, exposição em galeria, moda, álbum familiar, entre outros –, ainda
que esses usos possam ser determinados antes do registro per se.
É fato que nem todas as decisões no que tange ao processo fotográfico partem do
fotógrafo. Por outro lado, a identificação das suas decisões frente à maneira como realizou o
trabalho fotográfico – desde sua conduta em relação à tomada da foto, até as escolhas dos
materiais para revelação e ampliação – e à maneira com que ele lidou posteriormente com
esse material fotográfico produzido proporciona subsídios para se realizar inferências em
relação à poética do fotógrafo, que transparece tanto no modo como ele faz a foto quanto no
processo de escolha do material imagético produzido. Com relação ao objeto de estudo da
presente tese, fica claro que a poética e a autonomia de Otto Stupakoff estão plenamente
refletidas nas suas escolhas fotográficas.
Em um âmbito geral, podemos considerar parte das escolhas de Stupakoff
partindo da sua formação, atuação e das suas decisões tomadas no seu trabalho com a
fotografia. Estas, de certa forma, muitas vezes ecoam passagens da sua vida pessoal.
Retomaremos alguns pontos do perfil biográfico relatados no capítulo 1 como
meio de destacar aspectos da trajetória de Stupakoff que refletem suas decisões e que são
importantes na construção do argumento aqui organizado. Primeiramente o jovem Stupakoff
decidiu estudar em Los Angeles, EUA. Em retorno ao Brasil no ano de 1956, ele inclinou sua
produção fotográfica para a publicidade, moda e retrato. Após pouco mais de uma década,
dizendo-se insatisfeito com sua atuação profissional e com seu desenvolvimento criativo e
tendo montado um pequeno portfólio (Figura 94) em que fez rigorosa seleção a partir de uma
grande variedade de trabalhos acumulados nos anos de carreira no Brasil, ele decidiu partir
novamente para os EUA, fixando-se em Nova York. Em suas palavras, “(...) queimei milhares
de negativos e fui passar trinta e dois anos em Nova York” (STUPAKOFF, 2006a, p. 7) – o

 
  156

descarte dos negativos ocorreu por não interessar mais a ele o tipo de produção que realizara
nessa primeira fase no Brasil, como também por não poder levar esse material a Nova York
(STUPAKOFF, 2000a). Para este portfólio, Stupakoff escolheu poucas fotos, retratos em sua
maioria1, justificando que a seleção havia se baseado naquilo que lhe interessava mostrar, os
retratos, que seriam seus trabalhos de “maior integridade” (STUPAKOFF, 1978a, 2000a),
vistos como um trabalho mais pessoal2 e de maior prestígio (MENDES; ARRUDA, 2001) do
que suas fotografias mais comerciais.

Figura 94. Páginas do Portfólio que Stupakoff apresentou em Nova York em 1965.
Fonte: Divulgação/Acervo Bico Stupakoff.

Com a carreira consolidada em Nova York, Stupakoff transferiu sua residência e


atuação profissional para Paris, fotografando em toda a Europa e outros países do mundo
que lhe eram significativos (FERNANDES JUNIOR, 2006). Por uma inadaptação pessoal em
território francês, decidiu retornar e resgatar suas raízes no Brasil. Não tendo se adaptado ao
território e à dinâmica profissional brasileira, Stupakoff retornou novamente a Nova York,
onde viveu por quinze anos. A última década na cidade foi marcada pela decisão de Stupakoff
em abdicar da fotografia e se dedicar a outras atividades artísticas. O fotógrafo decidiu
retornar definitivamente ao Brasil apenas em 2005, vindo a falecer aqui em 2009.

                                                                                                               
1As outras imagens do portfólio são de still life, algumas foram expostas na Petite Galerie em 1963.
2Muitos desses retratos eram de artistas: Maria Bonomi, Fernando Odriozola, Giuliano Vangi, entre outros.
Stupakoff afirma sua satisfação em fazer retratos dos artistas e muitas vezes a forma de pagamento era a permuta
(ele fazia as fotos e em troca recebia uma obra) (STUPAKOFF, 2000b).

 
  157

À parte de sua decisão de se dedicar à outras atividades artísticas nas suas


últimas décadas e diante da multiplicidade de ações de expressão artística – pintura,
desenho, colagem – que Stupakoff produziu ao longo da vida, ele escolheu direcionar sua
atuação criativa para a fotografia como meio maior de se expressar. Assim, podemos afirmar
que ele viveu pela fotografia e para a fotografia por mais de sessenta anos.
As escolhas de trajetória de vida – ações de cunho pessoal e profissional – são
importantes para desenharmos um cenário sobre as inclinações e tendências do fotógrafo,
indiciando um aspecto do seu campo poético. Observadas corretamente, as características
dessa personalidade singular auxiliam no momento de se discutir as chaves que explicam a
obra de Stupakoff. Assim, os sistemas interpessoais do criador, como também os elementos
que compõem a sua criação, ou seja, o seu dossiê de criação, podem ser vistos como circuitos
de retroalimentação conforme discutem Anastácio e Silva (2012). Nesse circuito cada
elemento afeta e é afetado pelos demais. Dentro dessas escolhas mais amplas de trajetória,
estão as pertinentes ao campo do trabalho fotográfico e que também refletem os modos pelos
quais o indivíduo pensa frente à sua obra.
Na organização de um livro independente, por exemplo, pode-se expressar o
cerne da obra de um indivíduo. Como em Moments Preserved, de Irving Penn (1960), no
qual o diretor de arte da Vogue, Alexander Liberman, discute na introdução a importância do
livro fotográfico para entender o trabalho de um artista:
Uma coleção de trabalho de um fotógrafo é um registro inquestionável não
só do mundo exterior, mas de sua sensibilidade e reação interior ao mundo.
Suas fotografias coletadas são verdadeiramente o reflexo de sua mente. É
esta reflexão, ou segunda imagem, sobreposta a cada fotografia que dá à sua
fotografia a sua riqueza, e esta segunda imagem que nos dá uma imagem
composta da alma criativa do homem. Ela é revelada plenamente somente
em um acúmulo de imagens do mesmo artista (LIBERMAN, 1960, p. 3).
Podemos fazer uma correlação ao exemplo acima citado, ou mais precisamente
estabelecer uma analogia, entre alguns dos processos de escolha do seu próprio material
feitos por Stupakoff com as escolhas de um fotógrafo para a organização de um livro
independente que apresente a sua obra. Essa seleção de fotografias feita pelo fotógrafo e que,
segundo Penn (1960), refletem sua mente, podem ser visualizadas em Stupakoff em dois
momentos distintos: nas imagens por ele selecionadas para a exposição do MASP/1978,
abrangendo de 1957 a 1978, depois compiladas em um catálogo – e que, segundo o próprio
Stupakoff, refletia sua visão do momento (STUPAKOFF, 1978a) –, e especialmente na
organização pessoal do material fotográfico que o próprio fotógrafo entregou ao Instituto
Moreira Salles em 2008.
Referente à exposição do MASP/1978:
(...) uma exposição não é importante como consagração, mas serve para definir
um itinerário pessoal, para mostrar as preocupações ou os interesses num tipo
de trabalho (STUPAKOFF apud MENDONÇA, 1978a, p. 15).

 
  158

A descrição do material do IMS foi contemplada no capítulo 2 desta tese, mas


cabe ressaltar que Fernando Laszlo 3 e Bob Wolfenson foram os responsáveis pelo
levantamento e resgate do material fotográfico de Stupakoff, e também pela produção de
algumas folhas de contato em função da exposição do trabalho do fotógrafo organizada para
o evento São Paulo Fashion Week em 2005. Finda a exposição em questão, todo o material
retornou às mãos de Stupakoff. Segundo Laszlo (2017), entre idas e vindas, Stupakoff teve
tempo para trabalhar, analisar e reorganizar esse material. Assim, a reunião desse material
parte de Laszlo e Wolfenson, mas a organização para entrega definitiva ao IMS, com vistas à
incorporação na coleção permanente do Instituto, foi de Stupakoff.
Pelo âmbito da escolha pessoal sobre a maneira de organizar, selecionar e
preferenciar seu trabalho fotográfico antes de repassá-lo a uma instituição de salvaguarda, o
fotógrafo demonstra seu olhar para com a própria obra – em um gesto de rever, analisar e
redescobrir seu material –, estabelecendo alguns recortes significativos dentro de sua produção.
Aqui foi possível entender aquilo que o próprio Stupakoff selecionou como o mais significante
em sua carreira – as sequências organizadas na Caixa 1 e na Caixa 2 (Figura 8, capítulo 2) –,
verificar particularidades fundamentais presentes nas imagens selecionadas (algumas delas
reiteradas vezes) para apresentação ao público, e confrontar as potencialidades dessas imagens
frente ao que não foi divulgado da mesma série de fotogramas. Não obstante, a sistematização
das caixas feita pelo próprio autor também possibilita a realização de inferências sobre o seu
processo criativo.

4.1 Caixa 1, primeira escolha


Na Caixa 1 (Figura 8, capítulo 2) está aquilo que Stupakoff denominou “Minha
seleção negativos 1955-2005”. Entendemos ser essa uma seleção pessoal do fotógrafo, que
ainda indica conter ali “Total negativos escolhidos como os mais importantes para serem
scaneados em alta [definição]”, conforme inscrição presente na própria caixa4.
Ainda que os motivos para a escolha do material organizado na Caixa 1 não sejam
totalmente explícitos, uma vez que não há documentos como testemunhos, declarações ou outro
tipo de fonte através dos quais Stupakoff expresse suas reais motivações para a seleção de tais
sequências, algumas considerações a respeito dessas escolhas podem ser tecidas.
Primeiramente, acreditamos que o processo de escolha não considerou apenas
questões técnicas. A prática fotográfica de Stupakoff é bastante homogênea em relação ao
ajuste da exposição para um registro ideal – nem subexposto ou superexposto –, ou mesmo
nos acertos em relação ao foco e movimento, não havendo, portanto, justificativas puramente
técnicas para preferir um conjunto de fotogramas em detrimento a outros. Ainda sobre o
                                                                                                               
3 Destacamos aqui a importância de Fernando Laszlo como um dos últimos guardiões do material de Stupakoff.

Ele manteve sob sua guarda esse material até que Stupakoff se restabelecesse novamente no Brasil.
4 Uma lista com o número das sequências no IMS e uma breve descrição pode ser vista em Apêndice I.  

 
  159

material sensível, a grande maioria é composta por filmes em formato 35mm (na Caixa 1 há
apenas duas sequências em médio formato5), ficando ausentes os grandes formatos e os
diapositivos. Nessa seleção, Stupakoff prioriza suas sequências em preto e branco,
demonstrando, pelo gesto da escolha, um apreço maior pela linguagem em p/b em detrimento
da cor. Isso não significa, porém, que as fotografias em cor de Stupakoff sejam inferiores em
expressão e técnica (discutido no capítulo 5), apenas sugere uma inclinação do fotógrafo para a
fotografia em preto e branco.
Em relação aos outros elementos constitutivos dessas imagens – seu conteúdo,
local e data em que os registros foram realizados e propósito –, a datação é variada,
constando produções entre meados da década 1960 até 1990, com exceção de duas
sequências de seus filhos anteriores a 1965, e do retrato de Heitor dos Prazeres (de 1958) e de
Tom Jobim (de 1964). O fato da maior parte do material selecionado para a Caixa 1 ter sido
registrado após 1965, fase em que começa sua carreira internacional, corrobora a afirmação
do próprio fotógrafo quanto ao seu desinteresse pelo que havia feito em sua primeira fase no
Brasil, indicando que Stupakoff considerava seu trabalho mais relevante como tendo se
iniciado a partir de meados de 1960 (STUPAKOFF, 1978a, 2000a; CHIODETTO, 2005).
Verificar aquilo que ficou fora da Caixa 1 também é uma maneira de analisar o
processo de escolha quanto ao tema e tipo de conduta e processo fotográfico não
contemplados na escolha principal. O primeiro portfólio de Stupakoff não está presente in
toto na caixa, demonstrando que ele, ao analisar sua obra em perspectiva, deu a esse trabalho
menor importância. No entanto, da sua produção no Brasil, os retratos Heitor dos Prazeres
(de 1958) e Tom Jobim (de 1964) estão na Caixa 1, confirmando a importância, para
Stupakoff, dos retratos realizados como algo significativo no seu trabalho, tendo sido parte
fundamental do material que ele levou a Nova York na sua primeira saída do Brasil (discutida
no capítulo 1 desta tese). Também estão ausentes dessa seleção suas obras voltadas para a
publicidade, os still life, arquitetura e os trabalhos abstratos.
Ainda exemplificando a data do registro como um dado significativo quanto à
escolha, extraímos dessa primeira seleção o ensaio realizado com a atriz Leslie Bogart em
1967 para a Harper’s Bazaar (Figura 95A). Esse foi o segundo editorial de moda 6 de
Stupakoff publicado na revista e é considerado pelo fotógrafo um importante trabalho de sua
carreira (STUPAKOFF, 1978a). Vale ressaltar que na Caixa 1 há três conjuntos de sequências
dessa série. O retrato do ator Oskar Werner (Figura 95B), de 1965, primeiro trabalho de
Stupakoff para a Harper’s Bazaar, também consta da seleção. Bogart e Werner são os dois

                                                                                                               
5 O formato do filme na câmera define o tamanho e o formato da imagem a ser produzida. Para o médio formato
temos 6X4,5 cm, 6X6 cm e 6X7 cm, por exemplo, na relação largura e altura.
6 Consta na Harper’s Bazaar de março/1967 um outro trabalho com crianças, India’s Littlest Ambassadors, mas

Stupakoff afirma ter sido Leslie Bogart seu primeiro editorial fotografado, o que pode significar que mesmo
fotografado antes, o ensaio com Leslie Bogart foi publicado em edição posterior, na Harper’s Bazaar de abril de
1967.

 
  160

trabalhos inaugurais – respectivamente, retrato e editorial de moda – da prolífica


contribuição de Stupakoff para a Harper’s.

(A) (B)
Figura 95. (A) Leslie Bogart, 1967. (B) Oskar Werner, 1965. Fonte: Instituto Moreira Salles

O conteúdo da Caixa 1 reflete uma amostra das principais abordagens


fotográficas de Stupakoff – moda, retratos, fotografia de rua e viagens, nus femininos, família.
No cômputo geral, há uma maior quantidade de fotografias realizadas para editoriais de
moda da Harper’s Bazaar e da Vogue (15 trabalhos), além de retratos de personalidades
feitos para diversas publicações (17 trabalhos) e retratos de amigos e de desconhecidos (8
trabalhos). Também podem ser identificados os nus femininos (6 trabalhos), e, em menor
número, fotografias de família (5 trabalhos), fotografias de viagens e de rua (4 trabalhos)7.
Pelo teor do conteúdo da Caixa 1, há indícios de uma seleção afetiva, expressa
principalmente pelas escolhas das fotografias em que os referentes são membros familiares
ou com alguma proximidade à Stupakoff (Figura 96). Destas, destacam-se as sequências:
Bico Stupakoff, Brasil, 1964 (Figura 96C); Nus em Joatinga, Rio de Janeiro, 1978;
Margareta em Joatinga, 1978; Ian e Bico Stupakoff, Nova York, 1968; Margareta,
Gabriela e Sef, Bercheres-sur-Vèsgres, França, 1976 (Figura 96A); Wesley Duke Lee e
Sérgio Mendes em Joatinga, 1978; e Renata, Nova York, E.U.A, 1991. Um cunho mais
pessoal também está refletido na escolha da série Betsy, de 1965 (Figura 96B). Betsy foi um
amor juvenil nos tempos em que Stupakoff estudou em Los Angeles. Essas fotografias
culminaram na construção da obra inspirada em House of Card (Figura 5, capítulo 1) que
Stupakoff entregou ao MoMA em 1966.
                                                                                                               
7 A quantidade faz relação ao trabalho como um todo. Visto que cada trabalho pode ter mais de uma sequência, a

relação com número de descrição de todos os copiões está no Apêndice I.      

 
  161

(A)

(B) (C)
Figura 96. (A) Margareta e Gabriela em Bercheres-sur-Vèsgres, França, 1976. (B) Betsy, 1965. (C)
Bico Stupakoff, 1964. Fonte: Instituto Moreira Salles.

Na Caixa 1, como citado anteriormente, foram também selecionadas várias


fotografias extraídas de trabalhos comissionados e editoriais, tanto para a Harper’s Bazaar
quanto para a Vogue. Entre eles, podem ser destacados da Harper’s: Leslie Bogart, Nova
York (1967) (Figura 95A); Katharine Ross, Los Angeles (1967) (Figura 97H); Leonard Cohen
(1967) (Figura 97B); Olivia Hussey, Roma (1968) (Figura 97I); Tarran Hills, Austrália (1968)
(Figura 97G); Sharon Tate, Santa Monica (1969); Balthus (1970) (Figura 97E). Da Vogue,
foram selecionados: Margareta, Puerto Vallarta, México (1972) (Figura 97D); Chartres,
Paris (1974) (Figura 97C); Sirpa [Lane], Paris (1974) (Figura 97A); Baden-Baden, Brenner’s
Park Hotel, França (1974) (Figura 97F); Zoológico de Stuttgart, Alemanha (1976) (Figura
98C); Jorge Amado, Brasil (1979) (Figura 97J); Algarve, Portugal (1988) (Figura 98A);
Xuxa Meneghel, Brasil (1989) (Figura 98B); Grand Hotel Cabourg, França, (1976) (Figura
97K); José Saramago, (s/d). Da Glamour: Garota no trem, ca. 1980 (Figura 97L).

 
  162

(A) (B)

(C) (D)

(E) (F)

(G) (H)

 
  163

(I) (J)

(K) (L)
Figura 97. (A) Sirpa. (B) Leonard Cohen. (C) Chartres. (D) Margareta Puerto Vallarta . (E) Tributo a
Balthus. (F) Baden-Baden, Brenner’s Park Hotel. (G) Tarran Hills. (H) Katharine Ross. (I) Olivia
Hussey. (J) Jorge Amado. (K) Grand Hotel Cabourg. (L) Garota no trem, ca. 1980.
Fonte: Instituto Moreira Salles.

Ainda nessa linha de raciocínio entendemos que alguns trabalhos comissionados


para a Vogue assumem uma importância ímpar pela quantidade de conjuntos incorporados
na Caixa 1. São eles: Algarve, Portugal (1988) (Figura 98A), Xuxa Meneghel, Brasil (1989)
(Figura 98B) – Stupakoff pontua sua estima por esse ensaio devido ao modo particular como
ele teria apresentado Xuxa mulher (STUPAKOFF, 2000b) – e Zoológico de Stuttgart,
Alemanha (1976) (Figura 98C), todos com pelo menos quatro conjuntos.

(A) (B)

 
  164

(C)
Figura 98. (A) Algarve. (B) Xuxa Meneghel. (C) Stuttgart. Fonte: Instituto Moreira Salles.

Também parecem ter significativa importância para Stupakoff as séries íntimas


Renata, Nova York, 1991 (Figura 99A), com quatro conjuntos, e Margareta, Hotel
D'Inghilterra, Roma, 1969 (Figura 99B), com três conjuntos na Caixa 1.

(A) (B)
Figura 99. (A) Renata, Nova York, 1991. (B) Margareta Hotel D'Inghilterra, 1969.
Fonte: Instituto Moreira Salles.

Os nus femininos, sempre presentes na obra de Stupakoff, estão expressivamente


representados na Caixa 1, do registro de personagens femininas próximas – Joatinga, Rio de
Janeiro (1978) com Margareta e amigas, e Renata, Nova York (1991) – ao registro de
personagens ocasionais como na série de Bombaim (1968), Pelourinho Salvador (1979)
(Figura 100), Strip-Tease, Santos (1979) e Águas Termais em Baden-Baden (1974). Essas
abordagens ensaísticas sugerem um interesse pelo registro do corpo nu feminino tanto por
conta da sua forma quanto pela proximidade pessoal do fotógrafo para com as retratadas.

 
  165

Figura 100. Nus, Pelourinho, Salvador. Fonte: Instituto Moreira Salles.

Dentre os conjuntos citados até o momento, em relação ao referente fotográfico,


fica evidente a predominância do registro da figura humana, algo central na obra de
Stupakoff (discutido no capítulo 5), especialmente a figura feminina. Salvo registros de
objetos em poucos fotogramas esparsos dentro de alguns conjuntos, não há, por exemplo,
imagens de arquitetura – algo que parecia não lhe interessar muito enquanto fotografia,
mas sim como projeto (MENDES; ARRUDA, 2001) – ou de paisagens (mesmo nas
fotografias de viagem).
Das inúmeras viagens realizadas por Stupakoff, ele selecionou para a Caixa 1 as
fotografias registradas no Ártico (1970); Irã (ca. 1967) (Figura 101A), Saigon, Vietnã (1968)
(Figura 101B), Amsterdã, Holanda, s/d (Figura 101C), Índia (1968) e em Salvador, Brasil
(1979). O fotógrafo relata que as quatro visitas ao Círculo Polar Ártico foram muito especiais
para ele (STUPAKOFF, 1978c; FERNANDES JUNIOR, 2006), principalmente por ele ter
chegado a meia hora do Polo Norte – há um conjunto relativo a essa viagem na Caixa 1 e o
restante está na Caixa 2. As fotografias de viagem a Saigon são as mais expressivas em
quantidade na categoria viagem dentro da Caixa 1, apresentando cinco conjuntos
selecionados. Quanto à Saigon, onde ficou alguns meses antes da ofensiva do Tet (nome dado
ao ataque coordenado das forças norte-vietnamitas contra os EUA e o exército sul-vietnamita
em 1968, durante a Guerra do Vietnã), teria sido uma das mais prestigiosas em sua carreira
(STUPAKOFF, 1978b), na qual documentou a capacidade das pessoas continuarem com a
vida cotidiana apesar da iminência da guerra.

 
  166

(A) (B)

(C)
Figura 101. (A) Irã. (B) Vietnã. (C) Árabes, Amsterdã. Fonte: Instituto Moreira Salles.

4.2 Caixa 2, segunda escolha


Além da Caixa 1, Stupakoff fez uma segunda seleção acondicionada na Caixa 2
(como explanado no capítulo 2 desta tese). O fotógrafo escreve na Caixa 2 (Figura 8B,
capítulo 2) que esta é uma segunda seleção com qualidade de conteúdo e que não existe uma
terceira escolha.
Em uma observação comparativa entre as duas caixas constata-se que muitas das
séries não escolhidas na sua totalidade para a Caixa 1 se complementam na Caixa 28. É o caso
das sequências com Tom Jobim (1964), Bico e Kitty Stupakoff (1964), Leslie Bogart (1967),
Katharine Ross (1967), René D’Harnancourt (1967), Bico e Ian em Nova York (1968), do
Algarve, em Portugal (1988) e com Xuxa Meneghel (1989).
Para além das sequências que se estendem a partir do material selecionado para a
Caixa 1, há algumas poucas inclusões temáticas, como o série com o designer Bill Blass para a
revista Town & Country (1969) (Figura 102D); os editoriais Nova York, Margareta, Gabriela

                                                                                                               
8 Uma lista com o número das sequências no IMS e uma breve descrição pode ser vista em Apêndice I.

 
  167

e o Guarda (1972) para a Harper’s Bazaar; Sem título (Modelo no Jardim); com as modelos
Robyn (ca. 1994); Lauren Hutton (1985, Figura 102A); e Princesa de Vizcaya, para a Vogue
Miami (1992) (Figura 102B). Há também outras diversas, Tourada, México (s/d) e Ciganos,
Brasil (1970); fotos de família – viagem para a Disney (ca. 1972); Ian Stupakoff (1963, Figura
102C), outras de seus filhos ainda crianças no Brasil e uma sequência retirada de uma das
suas quatro viagens ao Ártico (1968).

(A) (B)

(C) (D)
Figura 102. (A) Lauren Hutton. (B) Princesa de Vizcaya. (C) Ian Stupakoff. (D) Bill Blass.
Fonte: Instituto Moreira Salles.

Frente a esse cenário detectamos alguns pontos evidentes: (1) as escolhas de


muitas das séries se confirmam, pois uma parte está na Caixa 1 e outra na Caixa 2; (2)
Stupakoff não fez a seleção somente pela série, mas sim pelos fotogramas das séries, o que é
especialmente válido para a Caixa 1, para a qual o determinante de inclusão foram os
fotogramas; (3) há sequências selecionadas para ambas as caixas que não apresentam todos
os fotogramas da série (é possível que, por várias das séries escolhidas serem oriundas de
trabalhos comissionados, alguns fotogramas podem estar com os contratantes, ou ainda
terem se perdido); e (4) além da divisão de uma mesma série entre a Caixa 1 e a Caixa 2, foi
também possível verificar parte desse material em outros acondicionamentos da coleção
entregue por Stupakoff para depósito no IMS, como nos envelopes pardos (ver capítulo 2
desta tese).

 
  168

4.3 Escolhas para além das Caixas


As escolhas da Caixa 1 e Caixa 2 sintetizam um olhar de Stupakoff sobre a sua
obra como um todo. No entanto, no decorrer da sua trajetória identificamos outros
momentos nos quais o fotógrafo se debruçou sobre o conjunto do seu trabalho fotográfico,
selecionando parte dele para exposições e livros; esse processo também se nota quanto
Stupakoff concorda com as seleções feitas por terceiros em cima de sua obra, e na observação
da reincidência de algumas imagens escolhidas por ele em variadas ocasiões.
Um exemplo relevante é a seleção das imagens para a exposição no MASP em
1978. As fotografias expostas nessa ocasião foram escolhidas pelo próprio Stupakoff. Ele
selecionou o material contemplando uma retrospectiva profissional tendo como norte a
expectativa de que “[sua exposição] conte que toda viagem é um início e qualquer uma que
você fizer leva ao mesmo lugar” (STUPAKOFF, 1978c, p.1).
Durante a organização desta exposição no MASP, disse Stupakoff:
Este mês em Nova York, mandei fazer uma série de novas ampliações em
cores e preto e branco. Já dei inicio à fazê-las emoldurar. Estou pensando em
como apresentar meus trabalhos impressos em revistas. Vou necessitar de
uma pequena sala escura para projeção de slides ininterrupta. Outra parte da
exposição será uma série de 150 fotos, um diário de viagem ao polo norte.
Dentro das tuas possibilidades, gostaria que você marcasse uma data para
que possa mandar imprimir também um cartaz. (STUPAKOFF, 1977).
Também para o MASP, já na década de 1990, algumas imagens de Stupakoff
passaram a integrar a Coleção Pirelli/MASP: Homenagem a Balthus, Cynthia, Medusa,
Ansiedade (incorporadas em 1991); Xuxa Copacabana Palace, Thaiti, Salvador
(incorporadas em 2003); e Ian, Águas termais em Baden-Baden (incorporadas em 2012). As
imagens que compõem esta coleção são escolhidas por um Conselho Deliberativo formado
por especialistas da área fotográfica, diretores da Pirelli e do MASP, com autonomia para
pesquisar, selecionar e decidir sobre a aquisição de obras para o museu. Como rota
operacional para o início da seleção das obras, os conselheiros partem de uma lista de
fotógrafos elaborada por eles próprios. A partir dessa primeira lista, alguns fotógrafos são
convidados a apresentar seus portfólios para a avaliação das imagens (MENDES, 2004).
Assim, a primeira seleção é a do fotógrafo: a partir da indicação de seu nome, ele envia um
portfólio de imagens para avaliação do Conselho Deliberativo do MASP. Novamente aqui, na
montagem do portfólio, houve uma escolha de Stupakoff na separação e indicação de seu
próprio material em 1991, 2003 e 2012 (Figuras 103, 104 e 105).

 
  169

Figura 103. Fotografias de Otto Stupakoff incorporadas na coleção Pirelli/MASP em 1991.


(A) Homenagem a Balthus. (B) Cynthia (C) Medusa. (D) Ansiedade.
Fonte: Instituto Moreira Salles.

Figura 104. Fotografias de Otto Stupakoff incorporadas na coleção Pirelli/MASP em 2003.


(A) Xuxa Copacabana Palace. (B) Thaiti. (C) Salvador. Fonte: Instituto Moreira Salles.

 
  170

Figura 105. Fotografias de Otto Stupakoff incorporadas na Coleção Pirelli/MASP em 2012.


(A) Ian. (B) Águas termais em Baden-Baden. Fonte: Instituto Moreira Salles.

Como discutido anteriormente, na exposição da Fashion Week, em 2005, as


imagens expostas foram selecionadas pelos curadores Bob Wolfenson e Fernando Laszlo,
com ciência e indicações de escolhas de Stupakoff. Laszlo também confirma que parte da
seleção feita pelos curadores foi pautada no material que Stupakoff tinha escolhido e
ampliado durante sua carreira, além da inclusão de retratos de personalidades mais
conhecidas (ampliados e já publicados anteriormente). Ainda que Stupakoff não materialize
suas escolhas diretamente no copião – visto que marcações como o retângulo em vermelho
da figura 106, foram feitas pelos curadores –, é possível perceber a participação ativa do
fotógrafo no processo de seleção a partir das indicações grafadas em cinza na folha de
contato, como mostra essa mesma figura 106. Wolfenson aponta que ocorreram algumas
discordâncias entre Stupakoff e os curadores quanto a edição feita para a mostra referida,
mas que também houve gratidão pela recuperação de imagens outrora ignoradas pelo
próprio fotógrafo (INSTITUTO MOREIRA SALLES, 2009a; WOLFENSON, 2017).

Figura 106. Parcial de copião Tom Jobim com indicação em vermelho no fotograma 29 feita pelos
curadores da exposição Fashion Week (2005) e ratificada por Stupakoff (texto em cinza).
Fonte: Instituto Moreira Salles.

Com relação à exposição no Instituto Moreira Salles realizada em 2009 no Rio de


Janeiro e em São Paulo, o curador da exposição, Sérgio Burgi, declarou que Stupakoff
participou do processo decisório quanto à seleção e aprovação das imagens expostas (GIOIA,
2009; BURGI, 2014). Como a referida exposição teve o intuito de apresentar significativo

 
  171

panorama da obra do fotógrafo, é possível dizer que Stupakoff percebe nas imagens
escolhidas parte representativa de sua carreira fotográfica.

4.4 O estudo da Caixa 1 como ponto de partida para a visualização do projeto


poético

Se no fazer literário, o texto pode ser um ponto culminante relativamente bem


identificado, no sentido de que, por uma comparação entre os textos escolhidos, tendo-se em
vista o levantamento das variantes, busca-se reproduzir o caminho do autor das versões
iniciais até o texto definitivo publicado (TOLEDO, 2000), na fotografia – assim como em
outras expressões –, rastrear o processo criativo requer que o investigador estabeleça um
ponto de partida, ainda que provisório, que o norteie. A definição desse ponto pode ser uma
unidade biográfica, uma imagem, uma série fotográfica, uma exposição, um livro, uma parte
ou todo o trabalho. Muitas vezes, ele pode ser definido a partir de uma única imagem
recorrente em vários projetos, ou tomando-se indicações do próprio fotógrafo, quando ele
reconstrói as coleções desenhando um sentido em seus arquivos, ainda que esse sentido não
necessariamente respeite a cronologia dos registros (SICARD, 2015a). É nesse último caso
que se enquadra nosso ponto de partida para discutir as escolhas de Stupakoff.
Aqui, após estudo pormenorizado das obras de Stupakoff constantes do acervo do
Instituto Moreira Salles, foi selecionada uma amostragem deste material. O corpus da análise
para o presente estudo consiste primeiramente nos negativos da Caixa 1 e a as folhas de
contato oriundas deles (que não se encontram nas Caixas, uma vez que ambas contêm apenas
negativos) e, quando necessário, imagens individualizadas das sequências para a
demonstração do argumento sobre o material analisado. Também recorremos à Caixa 2
quando da necessidade de complementar o raciocínio sobre a Caixa 1; eventualmente,
recorremos a outros conjuntos para reforçar a argumentação sobre algum ponto importante
para a discussão. Nesse cenário, salientamos que a Caixa 1 foi o eixo central para as análises,
mas que foi consultado todo o material disponível no IMS, assim como outras fontes
pertinentes fora do instituto, a fim de visualizar o todo e aumentar a robustez e consistência
das afirmações sobre a poética do fotógrafo. Sempre que algo parecia determinante na
análise dos copiões da Caixa 1, tiramos a contraprova com o material das outras caixas
organizadas por Stupakoff e do restante do material disposto em envelopes e organizado pelo
Instituto Moreira Salles.
Privilegiar a Caixa 1 em seu diálogo com outras fontes, i.e, buscar as tensões e
convergências que advêm das obras em questão e toda a documentação paralela que nos dá
acesso a alguns aspectos do contexto, foi a maneira proposta para enfrentar os objetos
fotográficos aqui estudados. Essas sequências que funcionaram como parâmetro para nossa

 
  172

leitura apresentam um amplo leque de situações e contextos na obra de Stupakoff, variando


de moda, família, nus, viagens e fotografias de rua.
Entendemos o acervo de Stupakoff no IMS como um recorte, uma seleção da obra do
fotógrafo (como tratado no capítulo 2), e estabelecemos a Caixa 1 como parâmetro norteador do
estudo da criação principalmente porque nela estão presentes escolhas do autor que refletem
uma seleção significativa dentre o conjunto de seu trabalho fotográfico. Consequentemente, esse
material nos oferece maiores indícios sobre o olhar de Stupakoff, dialogando com a perspectiva
histórica e focando nos limites de sua forma de expressão.
A Caixa 1, portanto, é uma amostra do projeto poético do fotógrafo. Por projeto
poético temos que:
Em toda prática criadora há fios condutores relacionados à produção de
uma obra específica, que por sua vez, atam a obra daquele criador como
um todo. São princípios envoltos pela aura da singularidade do artista;
estamos, portanto, no campo da unicidade de cada indivíduo. São gostos e
crenças que regem o seu modo de ação: um projeto singular e único
(SALLES, 2013, p. 44).
Pela amostra da Caixa 1 podemos analisar os aspectos singulares fotográficos, os
detalhes e as sutilezas de um propósito estético do autor que foram ganhando força na sua
obra e estão expressos nos negativos ali contidos.
O propósito estético do fotógrafo, que possui sua própria visão de mundo, ideias e
atitudes éticas – plano de valores e aquilo com que ele está comprometido –, manifesta-se no
conteúdo das suas ações, em suas escolhas, seleções, combinações, leis em estado de
construção e transformação daquilo que o artista quer e aquilo que ele rejeita (como suas
tendências políticas) (SALLES, 2013).
Das atitudes éticas profissionais está a tendência de Stupakoff em rejeitar o uso
comercial da fotografia; para ele, uma produção que somente visa o lucro fere a integridade
do fotógrafo: “(...) todos os anos de sua vida [de fotógrafo] dedicados a compreender e a não
fazer aquilo que outros querem e exigem que resulta em uma moralidade escrava e na
desintegração do corpo e do espírito” (STUPAKOFF, 2006, p. 6). Para Stupakoff, ter ética
individual, significa não renunciar a princípios básicos – satisfação em fotografar dentro do
próprio estilo e não somente para contentar um cliente, por exemplo (STUPAKOFF, 1978a).
Dois aspectos em relação à Caixa 1 nos permitem construir um raciocínio que leva
ao entendimento do projeto poético de Stupakoff: suas preferências por determinadas
sequências, e, a partir da análise minuciosa dessas sequências, a determinação de
dominantes9 (cf. FERRARA, 2004) – padrões ou características gerais norteadoras, como

                                                                                                               
9 A ideia de ‘dominante' é empregada aqui a partir de Lucrécia Ferrara (2004) que recorre à estratégia de eleger

uma dominante para compreender o espaço urbano como signo não-verbal. Ferrara, por conseguinte, extrai o
conceito do linguista Roman Jakobson (cf. 1973), o qual afirma que todo o texto ocorre a partir de uma dominante
que garante a esse texto coesão estrutural e hierarquiza as demais constituintes. Em Ferrara (2004) o estudo do
não-verbal parte da escolha de uma dominante que é um índice norteador por onde começar e que conduzirá a

 
  173

linguagem e gestos fotográficos – que podem ser extrapolados para compreender outros
trabalhos do fotógrafo e que, dessa forma, fornecem-nos indícios do seu processo criativo. A
correlação entre as sequências via elementos que tenham uma raiz em comum ou similar e
um padrão primordial pode revelar nuances que iluminam boa parte do processo de criação.
O projeto poético mostra princípios gerais – éticos e estéticos – que direcionam o
fazer do criador e norteiam o momento singular que cada obra representa. Pode-se dizer que
o processo de criação de uma obra é a forma do criador conhecer seu projeto de caráter geral
e que cada obra é uma possível concretização de seu grande projeto.
Ao acompanhar um processo específico, comparando rascunhos, esboços ou
qualquer outra forma de concretização das testagens que o artista vai fazendo ao
longo do percurso, os reflexos das tomadas de decisão e as dúvidas nos
permitem compreender alguns desses princípios direcionadores (...). A partir do
que o artista quer e daquilo que ele rejeita, conhecemos um pouco mais de seu
projeto (SALLES, 2013, p. 48)
A proposta aventada nesta pesquisa não é a de investigar o processo de criação de
uma obra específica de Stupakoff, mas, em um ato de ação reversa, partir do conteúdo da
Caixa 1 para tecer apontamentos sobre o projeto de caráter geral do fotógrafo. Nesse caso, o
objetivo aqui foi o de determinar pontos que pudessem sintetizar os princípios basilares do
criador. A visão desses pontos está fundamentada na premissa de que existe coesão no
universo fotográfico de Stupakoff.
Segundo Salles (2013), as tendências poéticas se definem ao longo do percurso. São
princípios em estado de construção e transformação; a consciência de alguns destes aspectos só
fica evidente para o criador após algum tempo, quando ele é capaz de ter uma visão de
perspectiva da sua própria obra. Acreditamos que a reunião feita por Stupakoff das sequências
nas Caixas 1 e 2 reflita de alguma forma suas tendências criativas, visto que ali estão trabalhos de
toda uma vida profissional, representando a sua diversidade fotográfica e permitindo-nos
considerá-lo não somente como um fotógrafo de moda. Além disso, suas escolhas nos fornecem
elementos significativos para compreender sua poética.

4.4.1 Procedimentos metodológicos da análise das sequências

Material
A proposta aqui delineada foi a de realizar uma análise sobre a poética de Otto
Stupakoff tendo nas suas sequências fotográficas as evidências primárias para tal. Na
presente pesquisa, a visualização das sequências fotográficas foi viabilizada pelas folhas de
contato entregues por Stupakoff ao IMS em 2008, conforme discutido anteriormente.

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                         
análise daquela expressão. A dominante também foi eleita para análise de trabalhos de narrativas hipermediáticas
(PFÜTZENREUTER, 2006) e aqui desdobramos para a fotografia.

 
  174

Partimos do pressuposto de que a folha de contato é um meio direto e eficiente de


analisar uma sequência fotográfica (SPINELI; PFÜTZENREUTER, 2016), pois, como já
discutido no capítulo 3, temos diante dos olhos um encadeamento de imagens capaz de
revelar-nos detalhes sobre o fazer do fotógrafo no ato fotográfico, e eventuais informações
nelas inseridas podem confirmar data, finalidade e contexto das imagens. A proximidade e
disposição dos fotogramas sobre uma mesma prancha também permite estabelecer um
princípio comparativo entre eles e mesmo entre sequências distintas, o que torna possível
construir uma noção do conjunto.
Tendo em vista a afirmação de Soulages (2010) de que nenhuma sequência de
fotogramas em uma folha de contato pode ser entendida isoladamente, desconsiderando seu
contexto, e em concordância com Paiva (2002, p.9), que afirma “(...) [dá] preferência a um
conjunto de imagens, ao invés da imagem isolada”, a noção do conjunto é fundamental para a
análise da poética do autor. O conjunto – o ensaio fotográfico – é o maior revelador da visão
do fotógrafo.
A partir da visualização da cópia por contato, são produzidas três possíveis
operações distintas: dinâmica de grupo – no sentido de que inicialmente os fotogramas
estabelecem relações entre si; visão estrutural – os fotogramas também adquirem sentido,
tanto pelas semelhanças quanto pelas diferenças, em relação aos outros contatos; e leitura
estrutural – a imposição de uma leitura particular de quem olha o contato (SOULAGES,
2010).
Os cuidados metodológicos aqui tomados foram: (1) verificar se a sequência está
impressa linearmente (pela numeração dos fotogramas), visto que no momento da
transferência algumas tiras de fotogramas podem não estar na sequência do registro; e (2)
verificar se as marcações são do próprio Stupakoff.

Descrição e contextos
Considerando que a imagem fotográfica é portadora de informações codificadas
de ordem formal – recursos técnicos empregados e recursos plásticos utilizados na concepção
e construção da representação – e cultural, além de referências diretas e indiretas ao tema
representado e elementos simbólicos da cultura material em que estão implícitos os indícios
que nos levam a contextualizar o assunto (KOSSOY, 2012), dentro do procedimento
metodológico adotado é apresentado um panorama descritivo da série com o número do
copião, seus dados técnicos (técnica, local, data), a quantidade de fotogramas na folha de
contato, tema/assunto, propósito e contexto fotográfico, e elementos constitutivos
(linguagem fotográfica). Foi ainda identificado se, em cada sequência e/ou imagem
individualizada citada na análise, há fotos escolhidas para divulgação (por exemplo em
exposições ou publicações diversas).

 
  175

Para nossa discussão, a contextualização é importante porque:


A contextualização é uma atividade estrutural que supõe uma lógica que
organiza as variáveis que interferem em um contexto a ponto de torná-lo
específico e produzir um lugar informado e como exigência metodológica
é necessário apreender o modo como se articulam as variáveis a ponto de
permitir o aparecimento da sua imagem característica (FERRARA, 1993,
p. 125).

A estrutura descritiva da análise sobre as escolhas de fotogramas específicos


considera se elas foram feitas pelo próprio Stupakoff versus a seleção por terceiros, se houve
publicação ou exposição desses fotogramas, e as reincidências da escolha dos mesmos
fotogramas para diversos tipos de divulgação. Também são discutidas, à luz dos fundamentos da
semiótica peirceana (PEIRCE, 2003), as potencialidades apresentadas pelas imagens escolhidas.

Procedimento metodológico
A análise das sequências foi realizada sob o viés do raciocínio da semiótica
peirceana como ferramenta analítica para descrever e discutir o objeto escolhido. Considera-
se que a semiótica “é capaz de explicar e interpretar todo o domínio da cognição humana (...)
Além de ser uma teoria do conhecimento, a semiótica também fornece as categorias para a
análise da cognição já realizada” (SANTAELLA, 2002, p. XIII). A semiótica funciona como
um mapa lógico que traça as diretrizes que devem conduzir uma análise e, por ser uma
ciência geral, necessita de subsídios de outras áreas para que a análise seja realizada
(SANTAELLA, 2002). Assim, o aporte teórico para a presente investigação é o da semiótica
peirceana, inter-relacionando-a paralelamente com o referencial das teorias específicas da
imagem, mais especificamente da fotografia.
Na análise, foi considerada a macroestrutura, i.e., o estudo dos vários níveis de
análise semiótica do signo. Aqui tratamos como signo: as caixas e seu conteúdo, as
sequências nas folhas de contato, as imagens individualizadas e como os referentes estão em
cada imagem. A partir dessa macroestrutura buscamos elementos significativos nesses signos
que indiquem o processo criativo de Stupakoff.
A base para a análise está pautada na seguinte indagação: o que nos mostra a
sequência fotográfica materializada em uma folha de contato e o que ela nos fala quanto à
poética do autor?
Frente a essa pergunta principal foram tratados os seguintes aspectos: (1)
Referente (aquilo que está na imagem); (2) Plástica visual (técnica, organização visual,
elementos da linguagem fotográfica); e (3) Gesto do fotógrafo (como se porta, aborda, vê e
registra o assunto). A análise desses três fatores é a base para o entendimento da
singularidade do fotógrafo no criar a imagem, visto que considera desde aquilo que despertou
seu interesse, perpassando as escolhas e articulação dos elementos que materializaram a
imagem até o modo de ação frente ao que será fotografado.

 
  176

Não entraremos no âmbito da comunicação pela imagem no que tange à sua


interpretação por terceiros, visto que o que nos interessa é o pensamento fotográfico de
Stupakoff para confecção dessas imagens (a não ser quando a preocupação da recepção da
imagem por terceiros for um aspecto determinante na criação). Aqui também não serão
emitidos julgamentos estéticos, que não convêm à crítica de processo criativo (SALLES, 2000).
Ressaltamos ainda que as folhas de contato como material de processo são
índices da construção intelectual e sensível do fotógrafo (SPINELI, 2014) e o texto
constituído pelo pesquisador a respeito dessas folhas de contato é a construção intelectual
referente à análise desse material. Esses dois aspectos se completam, sendo função da crítica
de processo transferir os materiais brutos para uma construção intelectual (SALLES, 1992).

4.5. Sobre as escolhas e usos dos fotogramas como estratégias criativas


As sequências nas folhas de contato apresentam o registro de várias fotos em um
determinado intervalo de tempo, como também uma série de variantes possíveis de um
mesmo acontecimento (ver discussão no capítulo 3, Figura 66). Posteriormente, essas fotos
permanecem sujeitas à escolhas que atendam às intenções, conscientes ou não, do fotógrafo
ou de terceiros.
Um ponto importante na discussão sobre o processo de seleção de Stupakoff é
estabelecer dois momentos distintos e de igual importância para o vislumbre dos atos de
escolha do fotógrafo: um é a seleção de diferentes sequências oriundas de um mesmo
trabalho (discutido anteriormente), o que demonstra suas preferências por tais trabalhos; o
outro é a seleção de um determinado fotograma em uma dada sequência, algo mais específico,
e que manifesta seu interesse por determinadas imagens. Consideramos que esses princípios
de escolhas são indícios daquilo que ele entende como mais representativo de seu projeto
pessoal em um determinado momento.
A escolha individualizada, do ponto de vista das marcações e indicações de
Stupakoff sobre um fotograma específico, reforça a visão de mundo do fotógrafo para além
daquilo que ele já recortou no ato fotográfico e manifesta o pensamento do autor sobre sua
obra. Essas manifestações nos oferecem subsídios para o entendimento de alguns aspectos
sobre a poética do fotógrafo. Dentro da concepção de recursos criativos da crítica de processo
(SALLES, 2000, 2013), estamos lidando diretamente com as escolhas do autor dentro do
conjunto. Isso nos permite elaborar inferências a partir do tratamento dado a esses
fotogramas: os padrões de escolha (técnica e linguagem fotográfica), a frequência de algumas
escolhas, potenciais motivos dessas escolhas, em que local foram expostos ou publicados os
trabalhos selecionados, e se houve modificações dos registros originais através de edição nas
imagens.
As Caixas 1 e 2 contêm apenas os negativos dentro de print files. Para visualizar

 
  177

as escolhas dos fotogramas, recorremos às provas por contato encomendadas por Fernando
Laszlo e Bob Wolfenson a partir dos negativos cedidos por Stupakoff a eles em 2005, e
também utilizamos os copiões ampliados pela equipe do IMS com base no material que o
fotógrafo entregou ao instituto em 2008.
Nos copiões produzidos para a exposição Moda sem fronteiras – Otto
Stupakoff: 55–05, na São Paulo Fashion Week (SPFW) de 2005, nota-se uma variedade
de inserções gráficas e textos indicando marcações de escolhas de fotogramas para a
exposição. Considerando que o presente estudo se pauta nas escolhas estabelecidas por
Stupakoff, foi de suma importância atribuir assertivamente as autorias das marcações em
cima da folha de contato fazendo a diferenciação entre as indicações feitas pelo próprio
Stupakoff e as de terceiros.
Frente a uma pletora de diferentes tipos de marcações, através das informações
oriundas dos curadores Laszlo (2017) e Wolfenson (2017), estabelecemos que as marcações
em vermelho e azul foram feitas por eles, enquanto a grafia ‘Otto’ em grafite cinza,
conjuntamente ao número de um fotograma, mostram as indicações de Stupakoff. As
marcações em branco na forma de seta ou V também são formas particulares de Stupakoff
materializar suas escolhas (Figura 107).

Figura 107. Folha de contato da série Xuxa, 1989. Fonte: Instituto Moreira Salles.

 
  178

O estilo do traço e o padrão gráfico usado para expressar uma escolha foram
atribuídos assertivamente a Stupakoff via comparação com marcações feitas em outros
copiões que antecedem à edição supracitada da SPFW, como no material do Camboja, por
exemplo (uma amostra pode ser vista na Figura 108A) e também pelo fato de que, findo o
evento da Fashion Week, Stupakoff retomou a posse de todo seu material fotográfico,
inclusive as folhas de contato, e teria remarcado algumas escolhas. É o caso do copião OS-
307 (Figura 108B) em que aparecem quatro marcações em seta branca demonstrando essas
novas escolhas do fotógrafo. Dos quatro fotogramas marcados por Stupakoff, os de números
9, 21 e 36 foram incorporados por Sérgio Burgi na edição de A hora e o lugar: Otto
Stupakoff, Saigon 1967-1968 (BURGI; TITAN JUNIOR, 2015), lançado após o falecimento
do fotógrafo. Isso demonstra que Burgi teria acatado algumas dessas escolhas posteriores de
Stupakoff na organização do livro com fotos da sua viagem ao Vietnã na década de 1960.

(A)

 
  179

(B)
Figura 108. (A) Marcações na folha de contato do Camboja, 1994. (B) Saigon, Vietnã, 1968.
Fonte: Instituto Moreira Salles.

Entretanto, nem sempre as escolhas do fotógrafo foram contempladas. Na


anotação de Stupakoff no copião OS-103, Algarve (Figura 109) fica evidente que ele teria
selecionado o fotograma 35 para ampliação. No entanto, para exposição organizada pelo IMS
em 2009, constata-se, através de fotografias do evento depositadas no sistema do instituto,
que a imagem exposta foi a do fotograma 34.

 
  180

Figura 109. Folha de contato do editorial Algarve, Vogue Brasil, 1988.


Fonte: Instituto Moreira Salles.

Nesse processo de seleção do fotograma sempre há margem para desistências e


mudanças de rotas. Essas mudanças ficam evidentes, tanto no copião acima (Figura 109)
quanto pelas rasuras que demonstram um cambiar quanto à escolha no copião abaixo
(Figura 110). Neste, Stupakoff teria a priori escolhido o segundo fotograma da tira da série de
Saigon, mas a rasura em sua marcação mostra a desistência desse fotograma em favor do
seguinte. Os dois fotogramas em questão dizem respeito à mesma cena, no entanto, o ciclista,
cerne da composição, está mais afastado no fotograma preterido; na imagem escolhida, todos
os elementos da cena estão mais próximos.

Figura 110. Parcial da folha de contato Saigon, Vietnã, 1968. Fonte: Instituto Moreira Salles.

 
  181

Como documento que explicita a gênese fotográfica, a folha de contato também


permite a verificação de que a criação não é unicamente uma questão de acumulação, mas
também de um processo de renúncia, abordado por Ferrer (2002) ao se referir a outras áreas
de criação. Essa renúncia fica implícita na mudança de intenções, no apagar, no abandonar
um estágio para passar ao seguinte sendo que “A gênese da obra de arte é o resultado de uma
série de sacrifícios custosos, de compromisso, de reequilíbrio e de transações
compensatórias” (FERRER, 2002, p. 216). Essa mesma linha de pensamento pode ser vista
na fotografia quanto ao abandono de certas imagens no momento da seleção nas folhas de
contato e na edição quando há cortes e reenquadramentos.
Nas tabelas abaixo estão listados, conjuntamente a uma breve descrição física e
de contexto, os copiões da Caixa 1 que apresentam algum tipo de marcação. Vale ressaltar
que nem todos os copiões correspondentes aos negativos da Caixa 1 apresentam marcas de
seleção e/ou edição.
Dos copiões com marcações, alguns possuem somente escolhas de fotogramas
feitas pelas curadores da SPFW, outros somente com marcações de Stupakoff e outros
marcações de todos os envolvidos. Há também casos em que Stupakoff não materializa suas
escolhas, mas alguém o faz através de escrita indicando a escolha dele. As tabelas 2 a 4
sintetizam algumas conclusões sobre o material pesquisado; as descrições balizam análises
(apresentadas na sequência desse capítulo) a partir desse material.

Tabela 2: Copiões da Caixa 1 com marcações dos curadores e indicações de Stupakoff


Copião (número Descrição da sequência Seleção de Seleção dos Observações
no IMS) Stupakoff curadores
031OS1 Hotel Cabourg, França. 1oA e 19 10A e 19
Editorial Vogue, 1976.
031OS9 Águas Termais em Baden- 19 A 19 A Tira impressa com
Baden, Alemanha, 1974. outras séries
031OS9 Baden-Baden, Alemanha. 33 33 Tira impressa
Editorial Vogue, 1974. conjuntamente a
outras séries
031OS8 Sharon Tate, E.U.A. 33 3 e 33
Harper´s Bazaar.
031OS5 Balthus, 17A 17 A
Nova York.
031OS013 Leslie Bogart, Nova York, 19 19
1967. Harper´s Bazaar
031OS4 Nus, Joatinga, Rio de Terceiro Terceiro Não é possível
Janeiro, 1978 fotograma fotograma visualizar a
última tira última tira numeração
031OS18 Renata, Estúdio da Rua 36 36, 22 e 15 36 foi para exposição
Varick, 80, 1991. SPFW
031OS42 Margareta Arvidsson, 29 29 e 6
Hotel D'Inghilterra, Roma,
1969
031OS113 Eduardo Paolozzi 36A 36A
(escultor). Londres, 1972
031OS53 Leonard Cohen. Harper´s 30 30 Tira impressa com
Bazaar, setembro, 1967 outras séries
031OS53 Sirpa, 1974 26 26 Tira impressa com
outras séries

 
  182

031OS125 Menina do Arpoador, Rio 17A 17A Tira impressa com


de Janeiro. outras séries
031OS125 Menina Cigana, 1970 16A 16A Tira impressa com
outras séries
031OS125 Heitor dos Prazeres. Rio de 4 4 Tira impressa com
Janeiro. 1958 outras séries
031OS055 Jorge Amado, Salvador, 27 27
1979. Vogue Brasil.
031OS072 Tom Jobim. Ipanema, 1964 29 29

Tabela 3: Copiões da Caixa 1 com marcações divergentes entre as escolhas de Stupakoff e de terceiros.
Copião (número Descrição Seleção de Seleção dos Observações
no IMS) Stupakoff curadores
031OS32 Xuxa Meneghel. 32 e 12 10 Remarcados por
Estúdio fundo cinza. Stupakoff após
Vogue Brasil, 1989. SPFW
031OS070 Sérgio Mendes. Central 14A 15 14A foi selecionada
Park, 1967 para o MASP-1978
031OS127 Pietro Bardi, São Paulo, 11 3
1978
031OS306 Saigon, Vietnã, 1968 10 A 15 A Remarcados por
Stupakoff após
SPFW
031OS77 Zoológico Stuttgart, 21A 21A e 37 Inscrição dos
Alemanha, 1976. Vogue curadores “Don’t
print this” no 21A

Tabela 4: Copiões da Caixa 1 com marcações e indicações somente de Stupakoff


Copião (número Descrição Fotogramas selecionados Observações
no IMS)
031OS075 Algarve, Portugal, 1988. Vogue 35
031OS96 Xuxa Copacabana Palace, 7 2 tiras de filmes
1989. Vogue diferentes
031OS96 Xuxa Meneghel (sorrindo 3 2 tiras de filmes
blusa preta), 1989. Vogue diferentes. Fotograma
Brasil publicado na Vogue
031OS126 Ansiedade, Nova York, 1990 19 Tira impressa com
outras séries
031OS126 Tarran Hills, Austrália, 1968. 3A Tira impressa com
outras séries
031OS126 Margareta, Puerto Vallarta, 33A Tira impressa com
México, 1972. outras séries
031OS126 Olivia Hussey, Roma, 1968 30 Tira impressa com
outras séries
031OS108 Sem título (modelo entre 29
caixas), s/d
031OS112 Sem título (modelo no metrô), 34
s/d
031OS027 Algarve, Portugal, 1988. Vogue 36A e 3A
031OS314 Ártico s/d 12A e 27A
031OS124 Oskar Werner, Nova York, 4 Exposto na SPFW
1965. Harper´s Bazaar
031OS307 Saigon, Vietnã, 1968 9A, 21, 35 e 36
031OS304 Sem título (Sef Stupakoff, Quinto fotograma da Numeração ilegível;
criança), ca. 1976 terceira tira Tira impressa com
outras séries
031OS107 Wesley Duke Lee, s/d 2 Exposto no IMS 2016

Apesar de alguns dos copiões trazerem somente as escolhas feitas pelos curadores
da SPFW, evidências adicionais levantadas (como matérias em que as fotos foram
publicadas) permitem verificar se essas indicações convergem ou divergem das escolhas de
Stupakoff em algum momento.
 
  183

Na sequência de Leslie Bogart (Figura 111), as marcações de Laszlo e Wolfenson


indicam a seleção dos fotogramas 25A e 37. No entanto, pela consulta aos negativos da Caixa
1, essa sequência traz uma marcação em X apontando para o fotograma 14A no próprio print
file (na Figura 111, o destaque dado ao fotograma 14A é nosso). Atribuímos essa marcação,
divergente à dos curadores, à Stupakoff.

Figura 111: Leslie Bogart para a Harper’s Bazaar, 1967. Fonte: Instituto Moreira Salles.

Um exemplo de convergência nesse processo de seleção dos fotogramas para


ampliação está na série de Saigon (Figura 112), na qual o fotograma 25 do copião (Figura
112A) foi selecionado pelos curadores da SPFW de 2005 e condiz com a imagem escolhida
por Stupakoff em 1978 para a exposição no MASP (Figura 112B).

(A)

 
  184

(B)
Figura 112. (A) Sequências de fotogramas de Saigon, Vietnã. (B) Imagem individualizada a partir da
escolha dos curadores da SFW, convergente à de Stupakoff. Fonte: Instituto Moreira Salles.

O confronto com o material publicado foi outro modo de verificar qual foi o
fotograma selecionado, ainda que não tenha sido diretamente marcado nos copiões. O copião
OS106 da série Ian e Bico Stupakoff, feita no Natal de 1968 em Nova York e publicada na
revista Novidades Fotóptica em dezembro de 1970, não traz nenhuma marcação de seleção
(Figura 113A), mas foi possível constatar, através da imagem no periódico (Figura 113B), que
o fotograma 36A foi o escolhido para a publicação.

(A) (B)
Figura 113. (A) Folha de contato Ian e Bico Stupakoff em Nova York. (B) Fotografia publicada na
revista Novidades Fotóptica. Fonte: Instituto Moreira Salles.

É notório que os trabalhos comissionados apresentam lacunas de tiras de


fotogramas nas sequências em que estavam as fotos publicadas, já que os registros originais,

 
  185

por vezes, permanecem com os contratantes e não com os fotógrafos responsáveis pelo
trabalho. Frente a esse cenário, Stupakoff fez suas escolhas dentro das possibilidades
permitidas pelo material que permaneceu com ele.
É o caso da série com o ator Oskar Werner em que a folha de contato (Figura 114A)
mostra do fotograma 2 ao 13 e depois do 26 ao 36. Na tira omissa está a imagem escolhida e
publicada pela revista Harper’s Bazaar em outubro de 1965 (Figura 114B). Ainda que dentre as
imagens que permaneceram com Stupakoff os fotogramas 26 e 27 apresentem características
muita parecidas com a imagem publicada, o fotógrafo optou pelo fotograma 4A (Figura 95B)
em sua seleção pessoal; nesta, o diferencial está no posicionamento de Werner em frente à
janela com o Central Park ao fundo, composição figura-fundo apreciada por Stupakoff
(STUPAKOFF, 2000a). É uma escolha reiterada por ele, aparecendo tanto na exposição do
MASP em 1978 quanto na SPFW de 2005.

4A

(A) (B)
Figura 114. (A) Folha de contato da sequência com o ator Oskar Werner. (B) Fotografia na página 216
da Harper’s Bazaar, 1965. Fonte: Instituto Moreira Salles.

 
  186

4.6 Escolhas reiteradas


Escolhas reiteradas, como a citada anteriormente, são constantes na carreira de
Stupakoff. Tendo por base as seleções feitas por ele para as Caixas 1 e 2 e comparando-as com
as imagens finais divulgadas, identificamos que Stupakoff opta por uma mesma imagem de
uma sequência em diversas ocasiões, seja para exposições e/ou para publicações diversas.
Aqui nomearemos as preferências imagéticas de Stupakoff como imagens representativas
para ele, i.e., as mais eloquentes da sua carreira. Essas imagens tornaram-se amplamente
conhecidas, dada a sua divulgação na mídia impressa ou sua exposição em inúmeros eventos.
Por terem relevância para o fotógrafo, visto que ele as seleciona várias vezes em ocasiões
distintas (algumas delas separadas por décadas), apontam-nos algo sobre a base poética do
fotógrafo, demonstrando e reforçando a ideia de que se constituem como imagens de fato
significativas para Stupakoff, ao ponto dele incorporá-las em sua primeira seleção para as
Caixas depositadas no IMS.
Das ocorrências apuradas que se enquadram no critério definido acima podemos
citar, em ordem cronológica de registro: Heitor dos Prazeres, Rio de Janeiro (1958); Sergio
Mendes, Nova York (1967); Sharon Tate, Santa Monica (1969); Saigon, Vietnã (1968);
Tarran Hills, Austrália (1968); Menina cigana, Brasil (1970); Puerto Vallarta, México
(1972); Sirpa (1974); Baden-Baden Águas Termais, Alemanha (1974); Cabourg, Paris
(1976); Joatinga, Rio de Janeiro (1978); Xuxa Meneghel (1989); Ansiedade, Nova York
(1990) e Renata, Nova York (1991). Essas escolhas reiteradas sugerem que o cerne da obra de
Stupakoff, em sua própria concepção, encontra-se na sua produção fotográfica entre os anos
1960 até o final da década seguinte.
Para estabelecer as sequências que teriam mais ênfase no procedimento de
análise, privilegiamos aquelas com marcações perpetradas na folha de contato e que tiveram
fotogramas divulgados. Ainda baseamo-nos nos desdobramentos e aplicações dessas imagens
em mais de uma apresentação, incluindo os ensaios para editoriais de moda e outras revistas
com viés comercial, assim como em informações de outras fontes e de outros materiais
elucidativos tais como cadernos de clipping do fotógrafo, depoimentos em jornais, revistas e
comunicação pessoal com terceiros, arquivos pessoais e outras documentações do processo
criativo que complementam o entendimento sobre a criação das imagens e dos motivos pelos
quais elas foram divulgadas. As bases consultadas a fim de estabelecer a relação entre os
negativos organizados na Caixa 1 e as imagens finais publicadas ou divulgadas foram as
exposições do MASP em 1978, do IMS em 2009, da SPFW em 2005, além de publicações em
livros e revistas.
Como discutido até o presente momento nesta tese, a produção de Stupakoff é
vasta, perfazendo diferentes temáticas, e uma análise como a proposta aqui demanda algum
tipo de amostragem entre o seu material disponível. Assim, destacamos como estudo de caso

 
  187

algumas séries bastante representativas da obra do fotógrafo: Tom Jobim (1964), Sergio
Mendes (1967), Margareta Puerto Vallarta (1972), Águas Termais em Baden-Baden (1974)
e Ansiedade (1990). Essas sequências proporcionaram subsídios para se discutir inferências
em relação à poética de Stupakoff, que transparece no processo de escolha do fotógrafo frente
ao material imagético produzido. Para tecer as discussões abaixo foram consideradas as
informações particulares do contato – listadas de 1 a 5 e apresentadas no capítulo 3 (ver
também exemplo da Figura 66).

Tom Jobim (1964) (Figura 115)


Essa folha de contato Tom Jobim mostra uma série com 13 fotogramas – do 25 ao
37 – que retratam o cantor e compositor Tom Jobim, junto com seu filho Paulo Jobim, em
uma praia de Ipanema no Rio de Janeiro, em 1964. Há uma indicação de escolha no
fotograma 29, assinalada em retângulo vermelho (procedente de Bob Wolfenson e Fernando
Laszlo), e uma anotação manual com caneta prata indicando ser essa a escolha de Stupakoff.
A imagem selecionada (Figura 115A) integrou a exposição da São Paulo Fashion Week em
2005 e as duas edições da exposição com a obra de Stupakoff organizadas no Instituto Moreira
Salles em 2009 e 2016–2017; consta ainda do acervo do Museu de Arte Moderna de São Paulo
(MAM), está publicada no livro Otto Stupakoff (FERNANDES JUNIOR, 2006) e é uma imagem
com significativa projeção comercial, vide a volumosa venda de ampliações 20x25cm na galeria
Luiza Strina (ca. 2000) (LASZLO, 2017).
No começo da sequência (Figura 115B), dos fotogramas 25 ao 28, a composição
incorpora Tom Jobim e seu filho. Dos fotogramas 29 ao 37, a sequência é dedicada somente
ao compositor. No processo de captura, o fotógrafo se mantém em um mesmo ponto
registrando a modificação da postura e das expressões dos referentes. O enquadramento
apresenta variação mínima, que não altera a captura pelo plano médio, mas registra uma
variação maior na pose dos personagens e no arranjo visual dos elementos em quadro,
inclusive com a supressão do filho de Jobim. A escolha incide no fotograma 29, que
individualiza Tom Jobim. O fotograma 29 é o único em que o compositor está totalmente
inserido no terço central e em gesto corporal que mantém postura verticalizada com
distribuição equitativa do seu centro de gravidade, diferentemente dos outros fotogramas,
nos quais Jobim também aparece individualizado, mas se apresenta levemente inclinado.

 
  188

(A)

(B)
Figura 115. Tom Jobim, 1964. (A) Imagem final escolhida a partir do fotograma 29. (B) Folha de
contato mostrando os 13 fotogramas da sequência. Fonte: Instituto Moreira Salles.

Sergio Mendes (1967) (Figura 116)


O retrato de Sergio Mendes, feito no Central Park em Nova York em 1967 (Figura
116A), é outro exemplo de escolha repetida. Na folha de contato, a indicação de Stupakoff
incide no fotograma 14A (imediatamente anterior à marcação dos curadores, em vermelho), a
mesma imagem exposta no MASP-1978 e no catálogo da exposição, na São Paulo Fashion
Week, em 2005, e que consta do acervo do Museu de Arte Moderna de São Paulo (MAM).
A série apresenta trinta fotogramas – do 1A ao 6A e do 13A ao 36A (Figura 116B).
A composição inclui Mendes em meio corpo – variando entre um enquadramento mais
aproximado e um mais distanciado – com variações do cenário ao fundo e de ângulo de
captura, alguns em plongée, outros em contre-plongée. A imagem 14A está entre uma
sequência de cinco fotogramas similares quanto ao ângulo plongée e o cenário, em que

 
  189

aparece parte do solo terroso e algumas árvores finas e desfolhadas. A escolha se destaca pela
composição do retratado próximo ao centro e o alinhamento dos ombros levemente em
diagonal, como também pelo rosto de Mendes destacando-se em relação ao cenário e
mantendo uma aparência rígida, esta digna de comentário em mensagem pessoal do próprio
Stupakoff para o fotógrafo Fernando Laszlo: “Pose ele não fez, estava duro assim mesmo,
quando o encontrei” (STUPAKOFF, com. pes.10).
Temos aqui a preocupação de Stupakoff com a relação figura-fundo (presente
também na sequência de Tom Jobim e de Oskar Werner). A escolha se estabelece partindo do
da composição que melhor harmoniza personagem e fundo, no sentido de que Sérgio Mendes,
ao mesmo tempo em que está dialogando com o cenário que o envolve, também está se
destacando do mesmo.

(A)

                                                                                                               
10  Comunicação pessoal de Otto Stupakoff, em 2005, recebida via correio eletrônico por Fernando Laszlo.  

 
  190

(B)
Figura 116. Sérgio Mendes (1967). (A) Imagem final escolhida a partir do fotograma 14A.
(B) Folha de contato mostrando os 30 fotogramas da sequência. Fonte: Instituto Moreira Salles.

Margareta Puerto Vallarta (1972) (Figura 117).


A série Margareta Puerto Vallarta foi realizada no México para um editorial da
revista Harper’s Bazaar em 1972 e apresenta uma tira com seis fotogramas – do 31A ao 36A
(Figura 117B). O fotograma 33A (ampliado na Figura 117A) consta da exposição (e do
catálogo) do MASP de 1978, foi exposta na São Paulo Fashion Week de 2005, no Instituto
Moreira Salles em São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte em 2009 e no Rio de Janeiro
em 2016–2017, consta no acervo do Museu de Arte Moderna de São Paulo (MAM), e está
publicada nos livros Otto Stupakoff (FERNANDES JUNIOR, 2006) e Sequências: Otto
Stupakoff (INSTITUTO MOREIRA SALLES, 2009a).
Em todos os fotogramas, o enquadramento abarca Margareta, modelo
internacional e segunda esposa de Stupakoff, a frente de garotos que a acompanham, com o
cenário ao fundo evidenciando as construções e a rua, além de um aglomerado de pessoas
que observam a cena. Essa estrutura se mantém constante em toda a sequência, mas com
variações quanto à composição e direção dos personagens. Margareta caminha da esquerda
para a direita nos dois primeiros fotogramas, e, nos demais, da direita para a esquerda,
sempre acompanhada pelos garotos. No caminhar, alguns aspectos do cenário ao fundo se
modificam, por vezes ressaltando a rua, em outras as construções e os populares.

 
  191

Desses enquadres, os fotogramas 31A, 32A, 35A e 36A apresentam leve


aproximação dos referentes, que promove um emolduramento muito justo da modelo e corte
de algumas de suas partes (chapéu, pé). Os fotogramas 33A e 34A são os que oferecem uma
distância maior e permitem a integração sem cortes entre cenário e personagens; também
são nesses em que Margareta é registrada fumando um charuto. A diferença significativa
entre os fotogramas citados está no cesto de lixo, à esquerda apenas no fotograma 34A,
restando o fotograma escolhido (o 33A) como aquele que distribui harmoniosamente cenário
e personagens na composição e que pontua o ato do fumar, algo que Stupakoff sugere, em
mensagem pessoal a Fernando Laszlo, ter sido categórico para a escolha: “Margareta em
Saint Laurent fumando um ‘Monte Cristo’; Virgem Maria” (STUPAKOFF, com. pes.11).

(A)
(B)

Figura 117. Margareta Puerto Vallarta (1972). (A) Imagem final escolhida a partir do fotograma 33A.
(B) Folha de contato mostrando os 6 fotogramas da sequência.
Fonte: Instituto Moreira Salles.

Águas Termais em Baden-Baden (1974) (Figura 118)


Águas Termais em Baden-Baden (1974) (Figura 118A) consta na exposição MASP
de 1978, incluída também no catálogo, foi exposta na São Paulo Fashion Week de 2005, no
Instituto Moreira Salles em São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte em 2009 e no Rio de
Janeiro em 2016-2017, consta no acervo do Museu de Arte Moderna de São Paulo (MAM) e
                                                                                                               
11 Comunicação pessoal de Otto Stupakoff, em 2005, recebida via correio eletrônico por Fernando Laszlo.

 
  192

está publicada nos livros Otto Stupakoff (FERNANDES JUNIOR, 2006) e Sequências: Otto
Stupakoff (INSTITUTO MOREIRA SALLES, 2009a)
Na sequência de Águas Termais em Baden-Baden, cujos negativos estão
depositados na Caixa 1, constam 6 fotogramas – do 19A ao 24A (Figura 118B). As fotografias
são frutos da viagem de Stupakoff à cidade de Baden-Baden, na Alemanha em 1974. Pela
visualização da tira de seis fotogramas percebe-se primeiramente que a posição de Stupakoff se
manteve fixa frente à cena das banhistas, havendo uma sutil variação no enquadramento e no
ângulo de registro. A modelo em primeiro plano praticamente sustenta a pose na mesma forma
– apenas com tênues variações – conforme registrado entre os fotogramas 20A e 24A. A
sutileza da variação se dá por uma mínima alteração de ângulo com o qual Stupakoff, no
abaixar, encobre com o cotovelo da modelo uma pia no último plano e mostra uma maior parte
inferior dessa personagem entrando no enquadramento. Nessa sequência, o fotograma 19A é o
único que apresenta de maneira diferenciada a forma do corpo e também uma movimentação
mais significativa da modelo. Sobre a imagem, Stupakoff escreve para Fernando Laszlo:
“Construída pelos romanos, sua névoa sulfúrica não oculta o inesperado terror provocado por
uma placa preta com letras brancas que diz ‘É proibido qualquer movimento que possa criar
ondas’” (STUPAKOFF, com. pes.12). Nesse sentido, pode-se dizer que o movimento suspenso da
modelo reflete a percepção de Stupakoff sobre o ambiente fotografado.

(A)

                                                                                                               
12 Comunicação pessoal de Otto Stupakoff, em 2005, recebida via correio eletrônico por Fernando Laszlo.

 
  193

(B)
Figura 118. Águas Termais em Baden-Baden (1974). (A) Imagem final escolhida a partir do fotograma
19. (B) Folha de contato mostrando os 6 fotogramas da sequência. Fonte: Instituto Moreira Salles.

Ansiedade (1990) (Figura 119)


A fotografia Ansiedade, de 1990 (Figura 119A), foi realizada como exercício
fotográfico autoral e sem pretensões de publicação em editorial. A sequência da Caixa 1
consta de seis fotogramas, do 19 ao 24, significando que existem registros anteriores e
posteriores a eles. Essa tira de fotogramas foi isolada do conjunto Homenagem a Balthus da
Coleção Pirelli/MASP13, de 1991, que apresenta enquadramento mais aberto com distinta
orientação de discurso.
Ansiedade foi exposta na 1ª edição da Coleção Pirelli/MASP de Fotografia e faz
parte do acervo do MASP; também foi exposta na São Paulo Fashion Week de 2005, no
Instituto Moreira Salles em São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte em 2009 e no Rio de
Janeiro em 2016-2017, consta no acervo do Museu de Arte Moderna de São Paulo (MAM) e
foi exposta nesse mesmo museu em Útero do Mundo, 2016. Além disso, está à venda em
casas de leilões e galerias estrangeiras e brasileiras14 e foi publicada nos livros Otto Stupakoff
(FERNANDES JUNIOR, 2006) e Sequências: Otto Stupakoff (INSTITUTO MOREIRA
SALLES, 2009a).
Todos os fotogramas da tira (Figura 119B) apresentam a fotografia em preto e
branco, foco parcial e close na face da modelo como aspectos representativos em comum.
Em uma comparação conjunta das imagens, verifica-se experimentação de
enquadramento: Stupakoff parte da captura de um plano mais fechado, em que somente boca
e maxilar são apresentados, para um mais aberto em que o rosto da modelo preenche o
quadro. A imagem do fotograma 19 é a única com enquadramento diferenciado, no qual o
close mostra lábio, nariz e maxilar, excluindo os olhos e impedindo, assim, a representação
de um rosto em particular; o direcionamento da atenção do leitor recai nas mãos da modelo
em torno do seu pescoço, destacando a ação do apertar. Nos outros fotogramas há variações
de enquadramento que alternam para uma prismagem15 mais afastada e que inclui o olhar
feminino encarando a câmera. Na composição equilibrada, mão e olhar aparecem na mesma
proporção e possuem o mesmo peso visual.

                                                                                                               
13 Essa imagem pode ser vista em: <http://www.colecaopirellimasp.art.br/autores/17>
14 Pequena Galeria Mario Cohen. <http://galeriamariocohen.com.br/?page_id=21729#prettyPhoto>.
15 Seleção de um detalhe que obedece às regras de redução e ampliação.

 
  194

A inclusão dos olhos na imagem – presentes apenas nos fotogramas não


escolhidos para a divulgação – amplia o processo de semiose, i.e, “uma ação, ou influência
que é, ou envolve, a cooperação de três elementos, tais como um signo, seu objeto e seu
interpretante” (PEIRCE, 1958, CP 5.484) e expande o rol de possíveis interpretantes. A
necessidade de analisar todos os signos que compõem a imagem nos permite afirmar que o
olhar da modelo é suficientemente expressivo para, no mínimo, partilhar com a mão no
pescoço a atenção do leitor ou mesmo deslocar a atenção deste da mão para os olhos. Ainda
existe o realce da mão apertando o pescoço nos fotogramas não selecionados, mas com uma
força expressiva menor.
Em comunicação pessoal com Fernando Laszlo, Stupakoff escreveu a seguinte
frase se referindo à imagem Ansiedade: “A palavra angústia em alemão, Angst, não ajuda a
gente a melhorar” (STUPAKOFF, com. pes.16). Nessa linha argumentativa, a configuração da
imagem no fotograma 19 sintetiza a ideia de ansiedade e se torna uma representação
adequada, uma vez que o corte dado na linha do nariz não inclui os olhos da pessoa
fotografada e, ao mesmo tempo, evidencia a mão e o ato da pressão no pescoço. Reforçamos
aqui que a força comunicativa da imagem escolhida está na supressão do olhar da modelo,
tornando-a enigmática a ponto de também permitir variadas intepretações, e no destaque da
mão comprimindo o pescoço.

(A)

(B)
Figura 119. Ansiedade (1990). (A) Imagem final escolhida a partir do fotograma 19. (B) Folha de
contato mostrando os 6 fotogramas da sequência. Fonte: Instituto Moreira Salles.

                                                                                                               
16 Comunicação pessoal de Otto Stupakoff, em 2005, recebida via correio eletrônico por Fernando Laszlo.

 
  195

4.7 Escolhas divergentes


Nem sempre as escolhas de Stupakoff frente a uma dada sequência se repetem
com o passar do tempo. Na série registrada em Joatinga, Rio de Janeiro, o fotograma
selecionado para a exposição MASP de 1978 (Figura 120A) não consta nas Caixas 1 ou 2
depositadas no IMS e difere daquilo selecionado para a SPFW, de 2005 (Figura 120B). A
imagem selecionada para a SPFW, Três nus, três ilhas está em uma sequência de seis
fotogramas (constantes na Caixa 1) com conteúdos similares de três mulheres – Margareta,
Ehlen e Susan – deitadas no deck da piscina da casa de Stupakoff em Joatinga, com três ilhas
visíveis no último plano. Nessa sequência, o enquadramento é mantido alternando-se apenas
a posição das três mulheres deitadas. Para a exposição de 2005, Stupakoff opta pela imagem
que apresenta harmonia entre a disposição dos braços e os rostos das mulheres: Margareta
aparece em primeiro plano, estirada ao chão, e olhando para frente, Susan (mulher do meio)
olha para Margareta e Ehlen (a última personagem), de costas, olha para o infinito. Quanto a
essa imagem, Stupakoff comenta que seu interesse por ela estava na sincronicidade, i.e., na
“(...) coincidência, no tempo, de dois ou vários eventos, sem relação causal mas com o mesmo
conteúdo significativo” (cf. JUNG, 1991, p. 849), das três ilhas ao fundo com as três mulheres
no deck (MARRA, 2006).
Em primeiro plano está minha ex-mulher, Margareta, que foi miss Suécia em
1966 e depois miss Universo. A do meio é esposa de um amigo. E a de costas,
a babá sueca de nossos filhos. Jung falava muito de sincronicidade, do
acontecimento de certas coisas simultaneamente por ordem casual que vem
do reduto espiritual. Repare bem, na foto, além das três mulheres, no fundo,
há três ilhas. (STUPAKOFF apud MARRA, 2006, p.2C).

A imagem exposta no MASP em 1978 (Figura 120A) também mostra as três


mulheres deitadas no deck da piscina, mas o enquadramento restringe-se ao espaço com as
mulheres, sem as ilhas ao fundo. Nessa composição o destaque incide em Margareta, que
olha fora do quadro para a sua esquerda, e é a única personagem com o rosto totalmente
evidenciado.

(A)

 
  196

(B)
Figura 120. Três nus, três ilhas, 1978. (A) Fotograma escolhido para a exposição do MASP de 1978.
(B) Fotograma selecionado para a exposição da São Paulo Fashion Week de 2005 (e constante da
Caixa 1 depositada no IMS). Fonte: Instituto Moreira Salles.

Da série com a atriz Sharon Tate registrada em Malibu, 1969, para a Harper’s
Bazaar, constam dezoito fotogramas na folha de contato. Dessa série, Stupakoff optou pelo
fotograma número 12 (Figura 121A) para a exposição no MASP em 1978, e pelo fotograma
número 33 (Figura 121B) tanto para a SPFW de 2005 quanto para a primeira exposição da
sua obra realizada no IMS em 2009. Toda a série é desenvolvida com Tate caminhando pela
praia acompanhada por um cão; o fotógrafo a retrata ao acompanhar essa caminhada. O
fotograma 12 apresenta Tate olhando para o fora do quadro à direita, mostrando seu rosto
em três quartos. Também aparecem na imagem um arremedo do cão logo atrás da atriz,
parte da praia e construções ao fundo. No fotograma 33, Tate caminha para fora do quadro à
esquerda; a foto em contre-plongeé acentua seu corpo longilíneo, o rosto da atriz está mais
evidenciado, assim como o cão, que ganha uma proporção maior dentro do cenário de praia e
mar (aqui, as construções ao fundo não são visíveis).
Em comentários feito a Fernando Laszlo sobre a imagem do fotograma 33,
Stupakoff contextualiza o dia da tomada das fotos e dos eventos ocorridos posteriormente
com a personagem fotografada: “Sharon Tate, já grávida. Me convidaram para o almoço que
a mãe do Roman [Polanski] preparou. Já haviam comprado o berço. A casa tinha sido de
Cary Grant. Não sabemos o que nos espera depois de um aceno de janela” (STUPAKOFF,
com. pes.17).

                                                                                                               
17 Comunicação pessoal de Otto Stupakoff, em 2005, recebida via correio eletrônico por Fernando Laszlo.

 
  197

(A) (B)
Figura 121. Sharon Tate, 1969. (A) Fotograma escolhido para a exposição do MASP de 1978. (B)
Fotograma selecionado para a exposição da São Paulo Fashion Week de 2005 e o Instituto Moreira
Salles em 2009. Fonte: Instituto Moreira Salles.

Da série Margareta, Hotel D'Inghilterra, registrada na cidade de Roma em 1969,


as escolhas estão pautadas em dois copiões distintos: o fotograma 37 (do copião OS45
depositado no IMS) (Figura 122A) para a exposição do MASP em 1978, e o fotograma 29
(copião OS042) (Figura 122B) para a SPFW de 2005 e a exposição do IMS em 2009. As duas
imagens se assemelham pela disposição de Margareta em contra luz na janela e se
diferenciam pela composição horizontal no fotograma 37, que abarca Margareta em meio
corpo encostada no parapeito da janela com enquadramento mais aproximado evidenciando
seu rosto e olhos fechados, em contraponto com a composição vertical no fotograma 29, que
incorpora todo o corpo de Margareta apoiada na janela. O enquadramento mais aberto deste
último fotograma mostra partes do ambiente interno e externo, além de revelar, ao fundo,
outro personagem que, assim como Margareta, também olha para a câmera de Stupakoff. Na
primeira escolha (fotograma 37) (Figura 122A), o direcionamento está para o semblante da
personagem, já na segunda escolha (29) (Figura 122B) o direcionamento está no contexto.
Essa série foi realizada na lua de mel do casal. Referindo-se ao contexto Stupakoff diz a
Fernando Laszlo: “Manhã de sol de mel” (grifo nosso) e “(...) durante nove anos de
casamento, todas as noites eu orava” (STUPAKOFF, com. pes.18). Essa frase condiz com o
clima da foto e sugere que o tipo de luz (referência ao sol de mel) incidindo em Margareta foi
determinante nas duas escolhas.

                                                                                                               
18 Comunicação pessoal de Otto Stupakoff, em 2005, recebida via correio eletrônico por Fernando Laszlo.

 
  198

(A) (B)
Figura 122. Margareta, Hotel D'Inghilterra, 1969. (A) Fotograma 37, escolhido para a exposição do
MASP de 1978. (B) Fotograma 29, selecionado para a exposição da São Paulo Fashion Week de 2005 e
o Instituto Moreira Salles em 2009. Fonte: Instituto Moreira Salles.

Seguindo a linha argumentativa de que as marcações nas folhas de contato


indicam interesses dos fotógrafos sobre alguns aspectos das imagens, é possível identificar o
valor que Stupakoff atribui a uma certa garota não-identificada da sequência de rua
registrada em Amsterdã, na Holanda (s/d) (Figura 123A). No fotograma 34, a garota está em
meio a um grupo de pessoas, mas se destaca do aglomerado pela lente de Stupakoff. No
fotograma seguinte há menos pessoas em cena e a garota olha para câmera – essa imagem é
marcada pelo fotógrafo duplamente no copião. No fotograma 36, a garota é capturada de
corpo inteiro caminhando na direção oposta àquela registrada nos fotogramas anteriores.
A análise desses três fotogramas em conjunto revela que o interesse de Stupakoff
é nessa personagem em específico, visto no encadear do ato fotográfico e na espera do
fotógrafo pelo retorno da garota, captado na última imagem da sequência.
Além do que mostra o copião, no hard disk de Stupakoff há um registro feito do
fotograma 35 via câmera compacta digital (Figura 123B), com um outro corte que realça o
rosto da menina. Um ponto importante nessa discussão é que, ao fotografar novamente o
fotograma 35, Stupakoff demonstra a redescoberta de suas imagens em acervo, já em meados
dos anos 2000 (antes, portanto, da entrega das Caixas 1 e 2 para o IMS), e o novo
enquadramento, que evidencia o rosto da garota, corrobora a hipótese citada acima sobre o
interesse dele nessa imagem e, mais especificamente, nessa personagem. Esse não é um caso
isolado, pois no hard disk de Stupakoff há outras experimentações demonstrando a mesma
intencionalidade.

 
  199

(A)

(B)
Figura 123. Registro de rua em Amsterdã. (A) Parcial do copião. (B) Registro do fotograma 35 da
sequência feito nos anos 2000 via câmera compacta digital. Fonte: Instituto Moreira Salles.

Em linhas gerais, uma visualização em perspectiva sobre o material de Stupakoff


nos permite afirmar que muitas das imagens das sequências têm potencial técnico,
expressivo e de conteúdo para serem publicadas ou apresentadas ao público. Quanto a
qualidade técnica, os fotogramas das sequências aqui analisadas não apresentam
significativos problemas de procedimentos técnicos fotográficos no registro de exposição –
foram registrados em exposição ideal, nem subexpostos ou superexpostos19 – demonstrando
assim que as imagens não foram descartadas por falhas ou problemas técnicos.
Em relação à construção do discurso pela linguagem fotográfica, observamos que
muitos dos fotogramas não selecionados apresentam composição estruturada, harmonizando
os principais elementos formadores da imagem: enquadramento, luz, ângulo. No entanto,
mesmo esses fotogramas apresentando qualidade técnica e conceitual, têm menor força
comunicativa para representar a ideia em questão ou ainda algum detalhe na composição fez
com que fossem eliminados da seleção. Outras vezes, somente não se adequaram em alguma
proposta editorial, curatorial ou mesmo pessoal do fotógrafo. Isso ocorre até mesmo quando
estas propostas não estão explícitas ou conscientes.
Após abordar na análise alguns aspectos das escolhas de Stupakoff, sustentamos
a proposição de que observar uma sequência como um todo é de importância ímpar para

                                                                                                               
19 Subexposta: quando não há luz suficiente incidindo no material sensível para formar a imagem e esta fica

escura. Superexposta: quando há excesso de luz incidindo no material sensível para formar a imagem e esta fica
clara.

 
  200

entender o contexto e a atmosfera fotográfica, visto que a série de fotogramas corresponde ao


registro de um processo. Mesmo que as outras imagens da sequência não tenham sido
selecionadas e apresentadas ao públicos, divulgadas em mídia impressa ou exposições, elas
participaram do processo criativo e, consequentemente, da construção do trabalho
fotográfico.

 
  201

CAPÍTULO 5
 
5. Sobre a construção da imagem fotográfica
O resultado da criação fotográfica é uma representação plástica, uma forma de
expressão visual incorporada no seu suporte e resultante dos procedimentos tecnológicos que
a materializaram (KOSSOY, 1999). A viabilização para a concepção da imagem e,
consequentemente, para corporificação da ideia/conceito do fotógrafo partem de um
processo técnico que determinará os elementos constitutivos da imagem fotográfica –
composição, iluminação, ângulo, plano, cor, movimento, foco, forma, textura, distorção e
perspectivas (KOSSOY, 1999).
A criação fotográfica baseia-se no modo como o fotógrafo decide abordar o
referente fotografado. Como cita o fotógrafo grego Nikos Economopoulos, “(...) a gente
sempre tem um tema, a questão é escolher a forma que funciona melhor. Em geral, um
elemento atrai de início minha atenção, e então começo a construir algo em torno dele”
(ECONOMOPOULOS apud LUBBEN, 2012, p. 356). Nesse sentido, a fotografia está baseada
na “organização disto que o fotógrafo tem em frente de si” (BECEYRO, 2005, p.125)1. Como
princípio organizador está o ato de eleger, dentre diversas possibilidades, a posição do
fotógrafo/câmera em relação ao referente, os diversos pontos de vistas, qual o
enquadramento, modo de iluminar e a composição. Os procedimentos relacionais, i.e, as
inúmeras articulações entre os elementos constitutivos da imagem, constroem mensagens
fotográficas a partir da elaboração plástica da forma.
Para Beceyro (2005), a estrutura propriamente constitutiva da fotografia
corresponde aos planejamentos articulados pelo fotógrafo sobre como ele expressa um
significado. Assim, o autor da foto parte das generalidades dos elementos constitutivos
para as particularidades no uso. A maneira como o fotógrafo constrói a fotografia revela
tanto seu impulso criador, definido aqui como o padrão de gestos e modos do fazer
fotográfico que evidenciam algo único do fotógrafo (BECEYRO, 2005), quanto o seu
pensamento plástico, i.e, o pensamento visual frente ao referente (questões formais
relacionadas ao uso de elementos como iluminação, tipo de enquadramento e composição
as quais, quando observadas em várias fotografias do mesmo autor, revelam-nos os
principais aspectos dominantes de suas imagens).
Sonaglio (2004) observa que, partindo-se do mesmo referente, o que se altera na
captura são alguns parâmetros da tomada fotográfica (ângulo, focalização, enquadramento)
condicionadas à máquina fotográfica:
Essas possibilidades, presentes no espaço topológico de representações das
                                                                                                               
1 Vale ressaltar que no contexto da citação, Beycero se contrapõe à posição de Roland Barthes que via a fotografia

como um simples análogo do mundo e com técnicas pouco claras ou próprias. Beceyro, por sua vez, argumenta ser
possível a análise da foto partindo das próprias técnicas fotográficas, como também da intervenção do fotógrafo
ao fazer uso dessas técnicas.

 
  202

imagens, são uma associação do olhar que percebe o mundo e a possibilidade


plástica oferecida pela linguagem escolhida (SONAGLIO, 2004, p. 174).
Quanto ao objeto de análise da presente tese, partimos do pressuposto de que
podemos entender a poética de Otto Stupakoff analisando a estrutura visual estabelecida em
cada fotograma de suas folhas de contato, como também comparando essa estrutura entre os
vários fotogramas de uma mesma sequência. Tendo por base o que foi discutido até o
presente momento, para uma análise consistente é necessário entender a imagem fotográfica
como resultado de um conjunto de fatores – composição, iluminação, motivo fotográfico –
que permitem a feitura da imagem acondicionando-a em um contexto fotográfico. Ao se
alterar o contexto, por exemplo, mudando a captura de uma mesma cena registrada ao meio-
dia para a meia-noite ou modificando seu registro com um enquadramento mais aberto em
contraponto a um mais fechado, altera-se o significado da imagem produzida.
No decorrer deste capítulo serão abordados diversos recursos fotográficos
mobilizados por Stupakoff para construção das imagens e que revelam características
particulares de sua produção. Primeiramente são apontados os referentes da fotografia para
depois incorrer na abordagem de elementos como enquadramento, composição, iluminação,
movimento, distorção, cor e textura.

5. 1 Os referentes da fotografia de Stupakoff: o que está fotografado?


Uma das condições para o ato fotográfico é a escolha do referente a ser
fotografado, sendo que o fotógrafo normalmente coloca-se em contato com os seus temas e os
vivencia antes de registrá-los (ENTLER, 2005). Dentre os determinantes da escolha do
fotógrafo constam aspectos objetivos e subjetivos. Para Kossoy (2001), ao se buscar os
elementos a serem fotografados e que se transformarão em matéria fotográfica2, eles irão se
mesclar aos conteúdos subjetivos do fotógrafo e, independentemente de qual seja o assunto
registrado na fotografia, esta também documentará a visão de mundo de quem captura a
imagem (KOSSOY, 2001).
Para Salles (2013), temas ou formas que instigam e atraem qualquer criador de
modo recorrente são exemplos do modo pessoal e único que o autor presencia o mundo.
Sontag (2004), ao analisar o trabalho de Diane Arbus, indica a obra do fotógrafo como fator
determinante para compreendermos sua proposta estética e social, também sugerindo que a
própria personalidade e história de vida do fotógrafo implica em suas escolhas temáticas.
Raciocínio semelhante vale para Stupakoff. Segundo suas próprias palavras, ele sempre
fotografava aquilo que lhe parecia significativo: “Fotografava paisagens, meu cachorro (...) As
coisas que eram importantes para mim” (STUPAKOFF apud FERNANDES JUNIOR, 2006, p.
151). No início, Stupakoff voltou-se para aspectos da natureza e paisagens, que
                                                                                                               
2 Entendendo matéria como tudo aquilo a que o autor recorre e escolhe afim de concretizar sua obra,

manipulando e transformando de acordo com suas necessidades e intenções criativas (SALLES, 2013).

 
  203

posteriormente passaram a ter menos importância para ele quando comparado ao potencial
fotográfico do registro do ser humano. “Meu interesse é o ser humano” (STUPAKOFF apud
FERNANDES JUNIOR, 2006, p. 162) e “Sempre gostei de fotografar gente. Isso sempre foi
muito forte para mim mesmo” (STUPAKOFF apud MENDONÇA, 1978b, p. 38).
Stupakoff dizia-se sempre ‘curioso’ em relação às pessoas e por isso as fotografava.
Assim, a inclusão da figura humana em seus grandes temas dentro do seu arcabouço de
produção – retratos, nus, instantâneos de rua, fotografias de viagens, editoriais de moda e
publicidade – era significativa para o seu entendimento do ser humano (FERNANDES
JUNIOR, 2006). A figura do ser humano – dado o corpo e suas expressões – oferece a
captura do gesto. Nas palavras do fotógrafo e curador húngaro Thomas Farkas, ao justificar
as escolhas de fotografias de Stupakoff para a Coleção Pirelli/MASP, essa visão do ser
humano estaria entre outras coisas na “(...) fina percepção da alma através do corpo”
(FARKAS, 1993, p.6).
Um dos motivos pelos quais Stupakoff fotografou poucas paisagens durante sua
carreira (um exemplo encontra-se na Figura 124) está no seu argumento de que a fotografia
não seria capaz de torná-las iguais ou melhores: “um simples e bucólico pôr-do-sol sempre é
mais bonito do que qualquer fotógrafo possa captar” (STUPAKOFF, 1960, p. 23). Pode-se
explicar essa ‘incompletude fotográfica’ frente à paisagem existente para além da foto pelo
fato do registro da cor fotográfica ser sempre “uma interpretação da cor visada a partir dos
próprios constituintes materiais do filme” (MACHADO, 2000, p. 2). Nesse sentido específico,
o balanceamento dos componentes da película é feito de tal maneira convencionalizada que
nos termos peirceanos têm implicação de norma generalizante. Das poucas paisagens por ele
registradas, Stupakoff dizia ver nelas algo da presença do ser humano, “um simbolismo de
gente que estava presente” (STUPAKOFF, 1978b), naquilo que Iuri Lotman (2011, p. 31)
chamou de “ausência significativa” segundo a qual um elemento consegue acentuar sua
presença e significado por meio de sua ausência.

Figura 124. Apache Peak, Arizona, 1969. Uma das quatro fotos do catálogo MASP-1978.
Fonte: STUPAKOFF, 1978d/IMS.

 
  204

Dentre sua predileção pelo registro fotográfico focado no humano, o feminino e a


criança são temáticas recorrentes para Stupakoff nas suas mais variadas vertentes
fotográficas.
O registro fotográfico dedicado à figura feminina é central na sua obra, seja pelo
ofício como fotógrafo de moda, por motivação pessoal, ou conjugando ambas pretensões.
Stupakoff fotografou o feminino sob perspectivas variadas – moda, família, nus – e em
propostas fotográficas mais intimistas, como as expressas em Margareta Hotel D'Inghilterra,
Roma (1969) (Figura 99B), nos diversos nus registrados em Joatinga (1978) (Figura 120), em
Ansiedade, Nova York, de 1990 (figura 119), em Renata (1991) (Figura 99A), em
Homenagem a Balthus (1991) (Figura 103A) e em Pelourinho (1979) (Figura 100).
Seu trabalho em editoriais de moda é idiossincrático, pois Stupakoff se dizia
mais interessado no registro da modelo como ser humano do que nas vestimentas
propriamente ditas:
(...) me interessa muito mais a mulher que a veste. Minhas fotografias de
moda, se você as olha hoje, são todas inteiramente dedicadas à mulher;
muito pouca consciência eu tive de como elas estavam vestidas
(STUPAKOFF apud BOCAYÚVA, 1979, p.10)
Stupakoff ainda justifica sua apreciação pelo feminino devido a seus anos de
análise junguiana, acionando a concepção de anima de Jung (2000) – a parte feminina que
reside dentro do homem.
A anima quase sempre é a grande musa inspiradora do artista. Então, a
minha apreciação pela mulher é tanto natural, espontânea, como também
baseada em conhecimentos, em estudos (STUPAKOFF apud FERNANDES
JUNIOR, 2006, p. 165).
O conceito junguiano do puer aeternus (latim para “eterna criança”) também
pode ser utilizado na tentativa de compreender partes significativas da obra de Stupakoff,
especialmente quando ele se materializa em composições com crianças ou transmutado em
várias formas de um olhar fotográfico que se divide entre editoriais de moda, registros de
suas viagens ao redor do mundo e família, conforme discutido em seções subsequentes
deste capítulo.
A partir da análise do material contido na Caixa 1, abaixo foram definidas e
discutidas cinco linhas temáticas da produção de Stupakoff presentes nessa primeira seleção:
moda, família, nus, viagens, rua e retratos. Delimitamos essas cinco linhas temáticas por
estarem fortemente presentes no acervo; com isso, seguimos por uma das abordagens
sugeridas em Chiodetto (2013)3 que são os temas referenciais. A partir dos temas referenciais,
foram aventadas as particularidades de Stupakoff .

                                                                                                               
3 Chiodetto (2013) as usa em curadoria. Julgamos pertinente estender essa ideia para a presente pesquisa.

 
  205

5.1.1 Retratos: do cara que trabalha no posto de gasolina às personalidades.


Stupakoff é reconhecido tanto por suas fotografias de moda quanto por seus
significativos conjuntos de retratos, que incluem desde registros de modelos e pessoas
renomadas, até familiares, amigos e desconhecidos.
Esse corpo de trabalho se desenvolveu em três principais vertentes: (1) pelo viés
editorial, meio pelo qual retratou principalmente modelos e personalidades; (2) retratos de
desconhecidos captados muitas vezes na rua e em viagens; e (3) retratos íntimos de família e
amigos. Essas vertentes são alinhavadas pelo interesse do fotógrafo no registro do ser
humano – como citado anteriormente, o fotógrafo se considerava um constante ‘curioso’ em
relação às pessoas.
No contexto da fotografia de pessoas, Stupakoff apontava seu interesse pelas
comuns e anônimas: “Fotografar gente importante não quer dizer nada, porque fazer fotos
sensacionais de gente famosa é mais fácil” (STUPAKOFF, 1978b) e complementa “O
importante realmente é você conseguir uma fotografia do cara que trabalha no posto de
gasolina da esquina, ninguém conhece, mas que você consiga transmitir algo a respeito dele
que te dê vontade de conhecer aquela pessoa” (STUPAKOFF, 1978b, 14min16seg). Para ele, o
fato da pessoa ser conhecida já seria algo chamativo. Stupakoff faz esse julgamento citando o
fotógrafo armênio-canadense Yousef Karsh e o norte-americano Francesco Scavullo,
celebrizados por seus retratos de famosos, mas que, apesar de apresentarem uma fotografia
competente e profissional, muito do mérito poderia ser dado mais por conta da renome do
fotografado do que propriamente da qualidade expressiva do trabalho do fotógrafo
(STUPAKOFF, 1978b). Para Stupakoff, o êxito em fotografar uma pessoa desconhecida, vulgo
comum, e conseguir transmitir algo a respeito dela ao ponto de provocar a vontade dos
receptores em conhecê-la melhor era mais importante que retratos de celebridades. Sua
produção de retratos de anônimos é significativa: Stupakoff registrou crianças pelo Brasil e
em Saigon, trabalhadores rurais brasileiros, e, em seus experimentos com a câmera digital,
fotografou pessoas nas ruas de Bangkok nos anos 2000. Ao valorizar mais o retratado
comum, Stupakoff mostra sua preferência fundamentada em um ponto de vista próprio sobre
retrato, uma colocação que, à revelia de ser válida para um senso geral, aponta para uma
linha de pensamento particular do fotógrafo.
Em contrapartida ao seu desinteresse pelos retratos de Karsh e Scavullo,
Stupakoff apontava Richard Avedon como um retratista capaz de captar a essência das
pessoas (STUPAKOFF, 1978b), citando o livro Avedon: Photographs, 1947-1977 (AVEDON,
1978) como amostra exemplar dos retratos desse fotógrafo. Essa admiração de Stupakoff por
Avedon será discutida de forma mais aprofundada no capítulo 6.
Em linhas gerais, os retratos e autorretratos são pautados na performance e no
jogo teatral naturalmente estabelecido entre fotógrafo, câmera e personagem e seus

 
  206

espelhamentos (SOULAGES, 2010). Sob o ponto-de-vista do fotógrafo, o retrato é uma


maneira dele se relacionar e conhecer a pessoa fotografada, ocupando um lugar de fronteira
entre a ideia de imagem e imaginação (GONÇALVES, 2016).
Pode-se perceber nos retratos de Stupakoff uma aproximação e uma tentativa de
entender o espírito humano através da fotografia. Segundo o próprio:
A capacidade de observação não só de elementos, mas também na hora do
retrato, a sua compreensão e o seu amadurecimento dentro da área da
psicologia, é de maior importância quando se trata de focalizar o que os
outros não viram, ou seja, o que você viu, sobre aquela pessoa (STUPAKOFF
apud FERNANDES JUNIOR, 2006, p. 167).
Tratam-se de imagens que exploram as identidades individuais e que constroem
narrativas para a imaginação do público. Há aqui uma via de expressão que se faz pela
capacidade do fotógrafo de entrar nos personagens retratados e apresentar ao público algumas
das suas particularidades: “Alguns pensam que a fotografia está somente naquele instantâneo
de rua tipo Cartier-Bresson (...) às vezes é muito mais importante a sua leitura sobre quem você
vai fotografar...” (STUPAKOFF apud FERNANDES JUNIOR, 2006). Uma concepção
sutilmente divergente foi apresentada por Stupakoff na década de 1960:
Fazer um retrato não significa fixar a aparência exterior de uma pessoa (...)
deve antes ser uma imagem interior que o fotografado faz de si próprio e
como o fotógrafo artista, através de sua sensibilidade, deve saber perceber,
analisar e registrar (STUPAKOFF..., 1963, p.1).
A convergência entre os pensamentos do fotógrafo, separados por décadas, está
tanto no início da carreira nos anos 1960 quanto nos anos 2000, permanece nele a ideia de
que o retrato não é somente o registro da aparência externa do retratado, mas algo que faz
resplandecer seu íntimo. No entanto, pode-se perceber uma tênue diferença de perspectiva:
na década de 1960, Stupakoff se coloca mais como alguém sensível para perceber e registrar a
imagem que o retratado faz de si, “cada modelo [retratado] conta sua própria história”
(STUPAKOFF apud MOREIRA,1962, p.13); nos anos 2000 ele considera a fotografia de
retrato baseada na interpretação que o fotógrafo faz do retratado: “O fotógrafo deve respeitar
a si e à opinião que tem sobre o retratado”. (MIGLIACCIO, 2006, B4).
Essa perspectiva de análise da condição humana – no sentido de procurar
compreender o retratado em seus aspectos subjetivos –, releva-se através de diversos
aspectos singulares na construção dos retratos de Stupakoff, como o uso frequente da luz
natural, composição com meio corpo ou corpo inteiro, com os personagens normalmente
centralizados, e a constante presença dos cenários encerrando e dialogando com os
retratados. Entre os retratos célebres de Stupakoff em que essas características estão
claramente postas encontram-se os de Leonard Cohen (Figura 97B), Olivia Hussey, (Figura
97I), Tom Jobim (Figura 115), Sergio Mendes (Figura 116), Sharon Tate (Figura 121) e Jorge
Amado (Figura 97J).

 
  207

A análise das sequências de retratos feitos por Stupakoff revela que o fotógrafo
procurava acompanhar as mudanças do retratado quanto aos gestos e expressões faciais
associadas a temperamentos, humores e emoções. Isso converge com o que Freund (1989)
denomina “penetrar no espírito” do retratado, distanciando-se do registro pautado
exclusivamente na fisionomia para enfatizar o “misterioso” subjacente. Uma maneira de
expressar tal “mistério” é a negação do riso nas fotografias, defendido por Stupakoff:
Uma risada é um clímax, e um clímax não deve ser fotografado – porque aí
nada mais resta ao leitor para imaginar. E isso diminui muito a emoção que
a fotografia poderia transmitir. Não se deve negar uma oportunidade à
imaginação do leitor – deixemos que ele imagine o clímax” (STUPAKOFF,
1960, p. 23).
O tempo dispensado com o retratado variava de minutos a dias. Com o ex-
presidente norte-americano Richard Nixon e sua filha Julie a sessão durou treze minutos
(conforme a agenda da Casa Branca do período); do ator Jack Nicholson Stupakoff produziu
apenas uma imagem. No geral, o fotógrafo preferia passar o dia todo com a pessoa, caso de
Grace Kelly e sua filha, às vezes mais de um dia (OLIVANI, 2005), caso da atriz Lauren
Hutton com quem fotografou durante dois dias, e as quatro vezes em que fotografou atriz
Sophia Loren (FERNANDES JUNIOR, 2006).

5.1.2 Nus femininos


Os nus femininos são significativos na obra de Stupakoff, tendo sido a maioria
deles produzido por interesse próprio, sem encomenda. Podemos entender esse olhar para o
nu em duas vertentes: uma pessoal e de relação íntima, visto que muitas imagens trazem
esposas e namoradas como referentes; e outra vertente comercial, caso de Rio Erótico
(STUPAKOFF, 2006c), com imagens de flagrantes do corpo no escopo público e uma
provocação do olhar para a câmera, e das imagens para a revista Playboy (como o ensaio
realizado com atriz Angelina Muniz em 1980 e apresentado no capítulo 2).
Há fortes indícios de que as séries com nus se intensificaram na fase
internacional da carreira de Stupakoff, após 1965, pois poucas imagens remanescentes de seu
primeiro portfólio apresentam conteúdo nesse teor. Foi possível identificar nos arquivos do
IMS apenas dois trabalhos com nu feminino feitos antes de 1965, um mais gráfico – Nu,
estúdio, de 1953 (Figura 125A) e outro mais pudico, Sem título, de 1961 (Figura 125B); há
também o trabalho Mulher deitada para seu próprio conforto publicado na revista Senhor
de julho de 1962 (Figura 33B) no qual o nu está presente. Alguns dos principais destaques da
sua obra selecionados para a Caixas 1 foram séries de nus produzidos a partir de 1965:
Joatinga (1978) (Figura 120), Pelourinho, Salvador (1979) (Figura 100) e Renata (1991)
(Figura 126) estão entre eles.

 
  208

(A) (B)
Figura 125. Trabalhos de nu feminino feitos por Stupakoff antes de 1965. (A) Nu, estúdio, 1953. (B)
Sem título, 1961. Fonte: Instituto Moreira Salles.

Figura 126. Renata, Nova York, 1991. Fonte: Instituto Moreira Salles.

A comparação entre algumas das séries realizadas por Stupakoff mostra que os
nus têm um caráter mais intimista e se contrapõem à sua produção de moda no registro das
roupas e acessórios. Normalmente, ele apresenta as retratadas em sua intimidade,
comportando-se de forma natural, absortas em suas vidas e não demonstrando saber que
estão sendo fotografadas (algo próximo ao que fazia o pintor polaco-francês Balthus,
referência para Stupakoff e discutido no capítulo 6). Essa é uma ideia transmitida ao leitor
pela imagem. No entanto, essa dinâmica não se furta de encenação (SOULAGES, 2010), já
que a “espontaneidade” nas fotos é construída, e que segundo o próprio Stupakoff é “buscada,
rebuscada” (STUPAKOFF apud FERNANDES JUNIOR, 2006, p. 161). Sua prática fotográfica,
revelada pela análise dessas folhas de contato, demonstra também que o “espontâneo” é
dirigido e que, sendo a espontaneidade algo buscado por Stupakoff, revela ser esta também
um dos aspectos do seu projeto poético.
Stupakoff retrata o corpo feminino estabelecendo uma relação com o espaço e
com os outros elementos da fotografia no modo como ele constrói essa figura do corpo da

 
  209

mulher. Recorrendo à análise da luz, enquadramento, composição e ângulo, podemos tecer


algumas generalizações: as retratadas aparentam um ar distante, normalmente não olhando
diretamente para câmera; a apresentação acontece em plano médio, algumas vezes
enquadrando o corpo todo, em outras enquadrando meio corpo – os closes são raros; e os
registros são normalmente feitos em alguma locação interna e privada, em que a luz natural
incide pela janela ou por outra fonte de luz natural e estabelece um desenho do corpo – aqui,
Stupakoff nos remete novamente a Balthus e sua série de cenas internas (LEYMARIE, 1990).
A abordagem do fotógrafo para os nus apresenta uma visão mais de voyer, no
sentido dado por Zunzunegui (1992) ao classificar o fotógrafo como um voyeur universal,
enquadrado na categoria de observador que examina a cena em que seus personagens estão
inseridos – esses, os observados – e os acompanha passando por eles de forma despercebida.
Essa observação converge para aquilo que o fotógrafo germano-australiano Helmut Newton
proclama: “todos os fotógrafos são mais ou menos voyers [e os que fotografam nus] mais
voyers que qualquer outro” (NEWTON apud CONTATOS 1, 2015).

5.1.3 Fotografias de rua e viagens


Em 1968, Stupakoff fez uma volta ao mundo em três meses, e, entre as décadas de
1970 e 1980, recebeu tarefas regulares para viajar designado a fotografar editoriais, mas
também registrando paisagens, ambientes culturais, alimentos e anônimos em diferentes
cidades distantes com o objetivo de capturar um certo sentido do lugar; para ele, “(...) viagens
também me ensinaram a realmente ver que seja onde eu for, perto ou muito longe, levo o que
sei e sou o que ainda não vi nem compreendi sobre o mundo” (STUPAKOFF, 2006a, p. 8).
Viajante contumaz – passou viajando 220 dias dos 365 dias do ano de 1970 (MIGLIACCIO,
2006) – Stupakoff esteve na Indonésia, Vietnã, Índia, Taiti, Irã, Cambodja e muitos países da
Europa e das Américas (conforme discutido no capítulo 1 da presente tese).
As fotografias de viagens e de rua eram feitas com filme de 35mm, normalmente
em preto e branco, e a dinâmica da abordagem do referente acontecia em um estilo muito
próximo da captura de instantâneos (na acepção de Dubois, 2017)4. Diferentemente das
longas sequências de moda em que o tema é fixo e controlável, a fotografia de rua registra
eventos que normalmente acontecem à revelia do fotógrafo e por um tempo indeterminado.
Nesse contexto, Stupakoff registrava signos naturais do dia-a-dia na medida em que se
desenrolava a cena do cotidiano (mesmo que aqui se considere que essa “naturalidade”
também é uma encenação), e transpunha essa linguagem do signo natural para o espaço
discursivo da fotografia (KRAUSS, 2002).

                                                                                                               
4 Em seu seminário ministrado em 28 ago. 2017 na Unicamp, Phillippe Dubois elencou algumas características

canônicas do instantâneo: suspensão e síntese de um movimento, expressão da velocidade, captura do inesperado


e das coisas ordinárias da vida, assim como o registro “da vida ao vivo”.

 
  210

Mesmo acontecendo sem programação, as cenas de rua não acarretam


necessariamente tomadas fotográficas aleatórias, dispersas e isentas de consciência plena dos
gestos. Stupakoff defendia a importância da atenção e de ser muito mais seletivo no registro
da fotografia de rua. Visto ser esse um ambiente onde muita coisa acontece
concomitantemente, o fotógrafo precisaria determinar para si aquilo que queria dizer e
mostrar nas suas imagens (STUPAKOFF, 1978a).
Ainda que as fotografias de rua de Stupakoff, quando vistas individualizadas de
suas sequências, ofereçam a impressão de registros fortuitos, imprevistos, resultado de
disposições acidentais, ao analisá-las dentro dos seus conjuntos, confirma-se que essas
imagens não são arbitrárias e realizadas por impulso: “eu determino antes o que é que eu
quero dizer na rua. (...) se você não fizer isso, fica perambulando, esperando que alguma
coisa aconteça” (STUPAKOFF, 1978a, 11min45seg). Há uma conexão do fotógrafo com a
cena; ele registra o evento de forma coordenada e planejada dentro do contexto da fluidez e
do inesperado da fotografia de rua, dedicando geralmente um trecho de no mínimo
três/quatro fotogramas para o desenvolvimento de um mesmo assunto fotográfico, que ele
acompanhava e o fotografava de maneira sistemática. Nesse sentido, é perceptível que
Stupakoff produzia variações sobre o mesmo referente ou registrava a variação desse
referente durante o desenrolar da cena, indicando uma ideia de persistência frente a um tema.
A série produzida em Saigon ilustra os pontos discutidos acima. Nos quatro
fotogramas da sequência (Figura 127), há um indicativo de que o fotógrafo se manteve em um
ponto, receptivo às cenas que aconteciam ao seu redor, para as quais ele acompanhou e
desenvolveu um estudo sobre um tema (bicicletas e motocicletas de Bangkok). Nessa
sequência, observamos que o fotógrafo ‘persegue’ seus referentes e registra o quanto for
possível (ou interessante para ele) de imagens sobre o assunto. Entendemos que permanecer
em um ponto é um modo de estabelecer ‘controle’ sobre a cena que lhe interessou, reforçando
a ideia da não-aleatoriedade do processo de registro fotográfico mesmo quando realizado em
ambientes mais dinâmicos.

Figura 127. Parcial da série de fotografias de rua registradas em Saigon, 1968.


Fonte: Instituto Moreira Salles.

 
  211

5.1.4 Família
Além dos retratos, nus femininos e das fotografias de viagens, o universo familiar
compõe o quarto conjunto de referentes fundamentais da fotografia de Stupakoff. O contexto
do lar, viagens em família, passeios, datas comemorativas e nascimentos formam um
arcabouço de temas para registros dos relacionamentos mais íntimos do fotógrafo (um
exemplo pode ser visto na Figura 128).

Figura 128. Margareta, Gabriela e Sef, 1974. Fonte: Instituto Moreira Salles.

Suas fotografias no contexto familiar correspondem, assim como os nus, a


flagrantes de situações dos personagens registrados em momentos íntimos. Nesse contexto,
Stupakoff também desenvolve uma narrativa, assim como o faz em grande parte de seus
editoriais de moda (conforme será discutido no capítulo 6). As séries Margareta, Gabriela e
Sef em Berchères-sur-Vesgre, França, de 1974 (Figura 129), cujos negativos foram
selecionados para a Caixa 1, bem como as sequências registradas em Long Island (ca. 1976)
(Figura 130) e na Disney (ca. 1972) (Figura 131) – ambas em outras caixas da coleção no IMS
– expressam bem essa conduta. As imagens apresentam situações fragmentadas, mas, se
observadas no conjunto, apresentam um contexto, uma situação, uma história.

 
  212

Figura 129. Margareta, Gabriela e Sef em Berchères-sur-Vesgre, 1974.


Fonte: Instituto Moreira Salles.

Figura 130. Registros de Margareta, Gabriela e Sef em Long Island. Fonte: Instituto Moreira Salles.

 
  213

Figura 131. Folha de contato com a sequência da viagem para Disney. Fonte: Instituto Moreira Salles.

É interessante notar que o próprio Stupakoff considerava suas fotografias de


Margareta, Gabriela e Sef em Berchères-sur-Vesgre (Figura 129) como autênticas fotos de
moda, realizadas dentro do seu estilo de fotografar, assim como as fotografias do nascimento
de seu filho Sef seriam para ele trabalhos de fotojornalismo (STUPAKOFF, 1978a). Fica claro
nesses exemplos o princípio da discussão que será aprofundada no capítulo 6, em que
argumentamos como o estilo de trabalho de Stupakoff não pode ser enquadrado em um único
gênero fotográfico.

 
  214

5.1.5 O puer aeternus em Stupakoff

“Mas se eu voltasse aos oito anos, tudo que eu gostaria de ter era a
mesma câmara e a mesma sensação”5

Em diversas ocasiões Stupakoff relatou o prazer em fotografar crianças


(HARPER’S BAZAAR, 1967; FERNANDES JUNIOR, 2006). O projeto Crianças do Brasil
proposto por ele e realizado para a companhia aérea VASP em 1979 teve como produto final
um calendário lançado em comemoração ao Ano Internacional da Criança segundo a
UNESCO. Este trabalho também foi exposto no MASP em 1978 e no Museu de Imagem e
Som do Rio de Janeiro em 1979. O projeto consta de 56 imagens com crianças brasileiras
fotografadas nas 29 cidades sob atuação da VASP à época e foi classificado por Stupakoff
como um dos melhores trabalhos de sua vida. Em parte por fotografar crianças do país todo
e também por permitir que ele conhecesse profundamente o Brasil (FERNANDES JUNIOR,
2006, p. 156).
O ímpeto em fotografar a infância está evidente em suas fotografias de família,
com o registro dos filhos, por exemplo, em suas viagens – como no longo registro de crianças
em Saigon (um exemplo de imagem se encontra na Figura 132A), na série Ciganos, feita no
interior do estado de São Paulo em 1970 (Figura 132B) e nas fotografias de crianças
soteropolitanas (Figura 132C) –, além de seus editoriais para revistas. Quanto a esses
editoriais, Sérgio Burgi (2017) relata que Stupakoff quase ficou marcado pelas fotografias
com crianças que realizou para a Harper’s Bazaar em ensaios de moda infantil (como nas
Figuras 133 A e B, respectivamente de 1967 e 1969). Stupakoff confirma ter realizados muitos
trabalhos de fotografia de moda infantil em uma época em que a Harper’s ainda fazia
editoriais para crianças. Os modelos infantis eram geralmente crianças comuns escolhidas
em escolas por Stupakoff e os produtores do editorial. A partir disso, eles selecionavam as
crianças mais adequadas aos personagens da matéria e Stupakoff as incentivava a fazerem
aquilo que quisessem:
Ah, era genial! Porque qualquer coisa que uma criança faz é muito mais
bonito, porque vem de um recôndito assim de algo espontâneo, não tocado,
em estado puro e natural (STUPAKOFF apud FERNANDES JUNIOR, 2006,
p. 162).

Como citado por Stupakoff, há particularidades nesse tipo de referente, visto que
a criança tende a se comportar de maneira mais direta e natural frente a câmera:
As crianças nunca, em qualquer caso, posavam. Elas faziam o que queriam
enquanto eu, puramente um observador, pegava-as em seus momentos mais
espontâneos e encantadores6 [tradução livre] (HARPER’S BAZAAR, 1967, p.3).

                                                                                                               
5Stupakoff em Anúncio Vasp, 1979.
6“The children were never, in any case, posed. They did just as they pleased while I, purelly an observer, caught
them in their most spontaneous and charming moments”

 
  215

(A) (B)

(C)
Figura 132. (A) Crianças, Saigon, 1968. (B) Ciganos, interior de São Paulo (1970).
(C) Crianças em Salvador, s.d. Fonte: Instituto Moreira Salles.

(A) (B)
Figura 133. Editorial de moda infantil para a Harper’s Bazaar, (A) 1967 e (B) 1969.
Fonte: Reprodução das revistas.

Nas palavras de Stupakoff há uma justificativa quanto à sua atenção para as


fotografias com crianças:
As crianças me ajudaram a saber e conhecer o que não sabia nem conhecia:
que estava presenciando um processo de crescimento e transformação onde
o inesperado se apresenta antes e além daquilo que esperávamos acontecer.

 
  216

Abrindo-me a porta do seu surpreendente mundo, me presentearam em


esquinas e curvas de rios, como novas visões de mistérios de uma infinita
realidade. Elas me fizeram sentir, como criança, crescido em homem, que
tudo aquilo que deixei para trás continua naquele distante país chamado
infância (STUPAKOFF apud BOCAYÚVA, 1979, p.10).
Pelo viés da psicologia junguiana – tão presente em Stupakoff conforme já
discutido neste capítulo – puer aeternus é um arquétipo que tem como instância específica o
modelo de “juventude eterna” (JUNG, 2000). Essa menção ao puer aeternus se confirma na
afirmação do próprio fotógrafo: “Conservei daquela época a alegria da criança ao brincar com
cores e formas – o que muito tem me ajudado” (STUPAKOFF apud BOCAYÚVA, 1979, p.10).
Visto por esse ângulo, podemos dizer que esse apreço pela infância é entendido por Stupakoff
também como uma força criativa.
Essa força criativa do puer aeternus pode ser verificada inclusive em seu livro Rio
Erótico (STUPAKOFF, 2006c), a despeito da temática e dos objetivos da obra serem
completamente distintos dos trabalhos citados acima. Nele, Stupakoff relembra que as fotos
são reflexo da eclosão dessa “eterna criança” que nele ainda reside, fazendo ecoar na sua obra
o que guardou da primeira visão de sensualidade do Rio de Janeiro que teve na pré-
adolescência, quando teria visto pela primeira vez corpos femininos desnudos acima do
joelho. Essas reservas íntimas, segundo Stupakoff, vieram à tona na tomada das fotografias
para o livro (MARRA, 2006, p2B).

5.2 Da importância do espaço na fotografia de Stupakoff


Os negativos, as folhas de contato e os textos que os acompanham fornecem
informações sobre o processo de concepção e construção da imagem. É de significativa
importância o entendimento dos lugares onde as imagens foram registradas, uma vez que é
inevitável que as fotografias estejam, de uma forma ou de outra, relacionadas aos locais de
sua criação. Afinal, esses locais não são neutros e resultam das escolhas do fotógrafo, que
interage finamente com o ambiente durante o ato fotográfico.
A designação de lugar tem por base uma referência geográfica ou topológica. É
um espaço ou posição indicada na ou pela imagem e um ambiente da visibilidade: de onde se
olha ou para onde se olha (FERRARA, 1993).
Nesse aspecto, Stupakoff constrói suas imagens atentando para uma
espacialidade que, por vias comuns de orientação (nas dimensões altura, largura e
profundidade), dá-nos noção do lugar em que o registro foi feito. O fotógrafo normalmente
reforça a ilusão da tridimensionalidade ao primar pelo uso de planos e volumes, e de ponto
de fuga central (por vezes lateral), sendo raros os trabalhos nos quais ele suprime a
profundidade e se utiliza apenas da altura e largura (como na Figura 134).

 
  217

Figura 134. México. Exemplo de imagem planificada. Fonte: Instituto Moreira Salles.

O material fotográfico de Stupakoff mostra que ele registra com maior frequência
imagens em ambientes externos, aproveitando-se do contexto da paisagem urbana ou
natural; quando em ambientes internos – salas, quartos, cozinhas – normalmente essas
imagens incorporam na composição os objetos específicos desses recintos. Após 1965,
quando da sua primeira ida para os EUA, o fotógrafo liberta-se dos cânones do estúdio,
especialmente do fundo infinito, e passa a se utilizar do espaço externo, ao ar livre, a partir de
encenações inseridas um cotidiano mundano tanto para produção dos seus editoriais de
moda quanto dos retratos (trabalhos muitas vezes desenvolvidos sob condições controladas
em estúdio). Dois exemplos ilustrativos podem ser vistos na Figura 135A para ambientes
externos e 135B para internos.

(A) (B)
Figura 135. (A) Nova York, Margareta, Gabriela e Guarda, ambiente externo. (B) Iraniana, ambiente
interno. Fonte: Instituto Moreira Salles.

Como citado acima, na obra de Stupakoff o uso de recursos tradicionais como de


fundo infinito e iluminação controlada, característicos do trabalho no estúdio fotográfico, é
mínimo. Sobre o fundo infinito – denominado por ele de “horizonte perdido” – dizia achar

 
  218

insuportável colocar uma mulher no vácuo enquanto havia muitos lugares mais interessantes
para fotografá-la (FERNANDES JUNIOR, 2006). Mesmo em suas fotos em estúdio, o fundo
infinito era um recurso que passava ao largo de seus registros, preferia um fundo dado por
uma parede e uma linha no chão, como na figura 136A. Do material depositado na Caixa 1,
apenas três sequências são fotografadas em fundo neutro: Sem título (modelo em estúdio e
no sofá inflável, s/d), Bico Stupakoff (1963) (Figura 96C), e Xuxa Meneghel (1989) – nesta
última, o fundo infinito neutro destaca os movimentos do corpo (Figura 136B). A consulta a
outras sequências fora da Caixa 1 permite-nos extrapolar a afirmação acima para o conjunto
da obra fotográfica de Stupakoff. É fato que, mesmo fazendo uso do estúdio, Stupakoff
procura utilizá-lo como um espaço ambientado, não sinalizando que é propriamente um
estúdio (como na Figura 136A).

(A) (B)
Figura 136. Diferentes usos do estúdio por Stupakoff. (A) Harold Pinter e Vivien Merchant, 1972. (B)
Xuxa Meneghel, 1989. Fonte: Instituto Moreira Salles.

Em seus primeiros anos de profissão (apresentados no capítulo 1 desta tese), o


estúdio fotográfico foi um ambiente ao qual Stupakoff recorreu com maior frequência para
produzir suas imagens; sobre isso, declarou ter construído seu estúdio em Porto Alegre na
década de 1950 porque havia se acondicionado a esse ambiente quando estudou nos EUA
(STUPAKOFF, 2000a). O fotógrafo ainda estava vinculado a esse espaço, principalmente
pela contingência de se produzir imagens mais técnicas. A migração do estúdio para
ambientes externos fica mais evidente a partir de sua ida à Nova York em 1965. No entanto, é
necessário apontar que a preferência de Stupakoff por ambientes externos era perceptível já
em seus primeiros anos de atividade profissional no Brasil. Nesse período, coexistiram em
sua obra fotografias registradas em espaço livre – vistas, por exemplo, em suas fotos de
moda (especialmente as da Rhodia) e capas de discos – e no estúdio em seus stills life,
alguns retratos e em diversos trabalhos para publicidade, conforme discutido no capítulo 2.

 
  219

Os retratos produzidos no Brasil até meados de 1960 apresentam uma expressão


mais contida e enraizada nos aspectos formais de uma fotografia tradicional de estúdio,
obedecendo aos cânones definidos do retrato clássico: controle de abrangência do espaço,
maneira de posicionar o rosto, incidência de luz artificial e relação do retratado com o
segundo plano neutro (Figura 137A). Em contraponto, outros registros do período inicial de
Stupakoff, quando ainda no Brasil, apresentam retratos em uma linguagem mais livre, vide a
série Heitor dos Prazeres (ca. 1957) (Figura 137B). Na obra de Stupakoff, essa prática do
retrato clássico de estúdio se transfere para espaços de interiores – casa do retratado, quartos,
salas – e exteriores – a rua, o campo – onde a espacialidade se insere na composição como
um elemento contextual, conectando a figura do retratado ao lugar no qual o sujeito realiza
suas ações (como exemplificado na Figura 138).

(A) (B)
Figura 137. Do estúdio à ambientes externos nos retratos de Stupakoff antes de 1965. (A) Maria
Bonomi, 1962. (B) Heitor dos Prazeres, 1957. Fonte: Instituto Moreira Salles.

Figura 138. René D’Harnancourt, 1967. Fonte: Instituto Moreira Salles.

 
  220

A escolha e a utilização do tipo de lugar em que o registro fotográfico é realizado


também tem importância fundamental na fotografia de moda feita por Stupakoff durante
toda a sua carreira. Nos editoriais de moda, o fotógrafo destaca e posiciona a figura humana
em espaços característicos pré-existentes – urbanos e/ou naturais. Os elementos desses
cenários rotineiros, assim como os personagens neles contidos, parecem pertencer aquele
determinado local, conferindo, assim, naturalidade à composição. É o caso do editorial com a
modelo Mira, feito em Salvador para a Vogue Brasil em 1980 (Figura 139 e Apêndice IX), no
qual as locações são ruas e praias da capital baiana onde a modelo encena gestos em sintonia
com as pessoas locais e com o cotidiano do lugar, e da RG Vogue de Ivete Sangalo (2007)
com locação na Praia do Forte, também na Bahia, em que retrata o habitat dos moradores
locais (Apêndice XI). Nesse sentido, Stupakoff faz uma mistura peculiar das modelos com os
ambientes naturais e/ou culturais sendo a cidade e os elementos urbanos cenários para as
situações por ele registradas.

Figura 139. A modelo Mira no editorial da Vogue Brasil. Fonte: Reprodução da revista.

Essa articulação com o contexto natural, a partir do uso em suas composições de


não modelos e/ou em locações existentes, pode ser vista já nos primeiros anos da carreira de
Stupakoff, antes mesmo da sua viagem aos EUA em 1965 (como mostra a Figura 140A e B),
tendo sido uma constante em seus trabalhos internacionais até o final de sua carreira. No
editorial Algarve feito em Portugal para a Vogue no ano de 1988 (Figura 98A), é possível
observar como a modelo interage com o cenário e pessoas locais. Outro exemplo em que isso
fica claro são as produções de Stupakoff feitas no México (Figura 97D) e em Paris (Figura 97F).

 
  221

(A) (B)
Figura 140. (A) O pacote perseguidor, revista Cláudia, dezembro de 1963. (B) Duda Cavalcanti na
revista Jóia, janeiro de 1965 (foto de 1964). Fonte: Reprodução das revistas/ Acervo Biblioteca ECA.

Uma outra questão que pode ser aventada é a de que o lugar escolhido para a
fotografia nos oferece índices sobre as decisões criativas do fotógrafo. Na obra de Stupakoff,
um exemplo pode ser visto na sequência Margareta no Hotel D'Inghilterra, Roma (1969). O
fotógrafo inicia a tomada dos cinco primeiros fotogramas (do 2 ao 6) (Figura 141A) com
Margareta próxima à janela, o que confere a ela uma contraluz que delineia seu corpo (como
na Figura 141B). Do fotograma 7A ao 33A, ela se distancia da janela (Figura 141A), surgindo
no meio do quarto em luz frontal que evidencia seu rosto e corpo (como na Figura 141C). A
partir do fotograma 34A dessa prancha de contato e das outras duas pranchas subsequentes
(marcadas como OS 42 e OS 45 na Caixa 1), as tomadas são feitas todas com Margareta em
frente à janela do quarto de hotel. Essa descrição evidencia alguns aspectos relativos à
criação fotográfica de Stupakoff como a variação de posicionamento do referente em meio ao
ambiente em que o registro é feito – no caso Margareta no quarto de hotel – como
experimentação sobre o local ideal, os efeitos plásticos da luz na pessoa-espaço e a
demonstração do local preferido pelo fotógrafo dentro daquele ambiente e para aquela
personagem que se propôs a fotografar. Uma indicação no título da fotografia dessa série
exposta na São Paulo Fashion Week em 2005 também ressalta os aspectos plásticos para a
escolha do lugar: Margareta, lua-de-sol (grifo nosso), Hotel D’Inghilterra, Roma, 1969. A
ideia de ‘lua-de-sol’ traz sentido duplo pois se refere à Margareta – que estava em plena lua-
de-mel com o Stupakoff no momento do registro –, e à incidência da luz sobre a personagem.

 
  222

(A)

(B) (C)
Figura 141. Hotel D'Inghilterra, Roma. (A) Folha de contato. (B) e (C) Ampliações do ensaio.
Fonte: Instituto Moreira Salles.

5.3 O gesto do fotógrafo frente ao referente e o registro repetitivo


A gênese de uma imagem fotográfica inicia-se a partir de um ponto de vista
estabelecido por quem a registra (DUBOIS, 2012). Em termos subjetivos, esse ponto de vista
expressa a visão pessoal do fotógrafo sobre o tema. No âmbito objetivo, é o lugar no espaço

 
  223

onde o fotógrafo se posiciona para selecionar e estabelecer relações espaciais entre os


elementos de uma fotografia. Qualquer alteração do ponto de vista pode alterar a estrutura e
o discurso da foto.
Sob o ponto de vista físico, i.e, do lugar onde Stupakoff decide se colocar para
registrar a imagem, observa-se que normalmente o fotógrafo não faz amplos movimentos
procurando “novos ângulos” em relação ao referente, mas mantém uma postura fixa perante
a cena fotografada ou faz movimentos sutis que promovem pequenas variações de posição
frente ao objeto. Essa postura exemplifica aquilo que Arlindo Machado (1984) entende como
petrificação do ponto de vista, visto que o sujeito que fotografa está “cristalizado no ponto
fixo e único da objetiva” (MACHADO, 1984, p. 102).
A sutileza como o fotógrafo aborda o tema transparece em muitas das sequências
da Caixa 1, como demonstradas nas Figuras 142, 143 e 1447. Nelas, Stupakoff mantém o
mesmo ângulo para a captura das imagens e as alterações de posição dele frente ao referente
são mínimas. Stupakoff se coloca mais como um observador fixo que espera o desenvolver de
uma cena para registrá-las. Nesses casos, a mudança e o movimento ocorrem naquilo que
está sendo fotografado.

                                                                                                               
7 Na coleção do IMS há uma grande quantidade de negativos que exemplificam esse procedimento técnico de

Stupakoff, entre as sequências de negativos marcadas como: OS-1, OS-4, OS-5, OS-9, OS-18, OS-27, OS-31, OS-32,
OS – 33, OS-42 e 45, OS-51, OS-53, OS-56, OS-58, OS-63, OS-69, OS-72, OS-75, OS-94, OS-98, OS-106, OS-107,
OS-108, OS-113,OS-126, OS-127 e OS-303.

 
  224

Figura 142: Sequência de Grand Hotel Cabourg, 1976. Fonte: Instituto Moreira Salles.

 
  225

Figura 143. Sequência Renata, 1991. Fonte: Instituto Moreira Salles.

Para além da visualização das sequências supracitadas, o depoimento de


Fernando Laszlo, que em 1988 foi assistente de Stupakoff no trabalho em Algarve Portugal
para a Vogue Brasil, confirma o gesto fixo do fotógrafo frente ao referente fotografado
(Figura 144). Laszlo (2017) descreve que, durante as seções fotográficas, Stupakoff ficava
estável em um ponto com a câmera em punho e fazia longas sequências registrando a
movimentação da(s) modelo(s) por um determinado espaço.
Tanto a observação do material fotográfico quanto o depoimento de Laszlo
pressupõem a assertividade de Stupakoff com relação a um motivo fotográfico delimitado e
uma ideia previamente concebida. Diante disso, o fotógrafo preservava uma posição e
disparava profusamente o obturador, registrando o movimento do fotografado de forma a
realizar uma cobertura de registros da cena, até mesmo em busca de aperfeiçoamento técnico
fotograma após fotograma, variando pequenos detalhes da composição.

 
  226

Figura 144. Sequência Algarve, 1988. Fonte: Instituto Moreira Salles.

Stupakoff, ao se fixar em um ponto, delimitava o contexto a ser fotografado e


fazia várias tomadas a fim de estender as possibilidades de registro de determinada figura em
relação ao lugar onde essa se posicionava. Uma ilustração dos resultados dessa prática do
fotógrafo pode ser vista na série de fotogramas da atriz Leslie Bogart, em que Stupakoff opta
por posicioná-la de frente a uma janela com alta incidência de luz (Figura 145).

 
  227

Figura 145. Sequência Leslie Bogart. A marcação em vermelho é de Fernando Laszlo e Bob Wolfenson.
Fonte: Instituto Moreira Salles.

Um amplo olhar sobre os conjuntos fotográficos de Stupakoff mostra que a


‘petrificação’ do seu ponto de vista (cf. MACHADO, 1984) frente ao referente condiciona
outra prática constante na criação do fotógrafo: a feitura de sequências com o mínimo de
variação tanto dos elementos que compõem a cena – como modelos e cenários – quanto dos
procedimentos de linguagem quanto à composição, ângulo e enquadramento nos fotogramas.
Essas pequenas variações permitem ao fotógrafo explorar imageticamente aquilo que está
sendo fotografado. Tal traço criativo está presente de forma mais incisiva nas produções
comissionadas de Stupakoff, como os editoriais de moda, retratos e similares, nas quais o
fotógrafo estabelece e controla o contexto, realizando uma exaustiva sequência de disparos
sob um mesmo enquadramento. Esse procedimento é menos recorrente nos conjuntos de

 
  228

fotos de rua, viagem e família, nos quais muitas vezes os fatores dinâmicos se movendo para
todos os lados deixam o fotógrafo à mercê do imponderável. Nesses registros, Stupakoff optava
por fazer variações maiores de elementos constituintes da fotografia (ângulo, composição,
enquadramento). Diferentemente das fotografias de moda, retratos e similares, que
apresentam fluxo de um mesmo tema em todo ou em mais de um rolo de negativo, na
fotografia de rua há o registro fotográfico de um grande tema implícito, como o exemplo do
trânsito de Saigon (Figura 108B e 110), em que Stupakoff dedicava-se ao registro fotográfico de
um determinado motivo durante o intervalo de alguns fotogramas e, depois, variava de motivo.
Um exemplo emblemático da qualidade da repetição na obra de Stupakoff está
em Homenagem a Balthus (Figura 146) na qual, por fotogramas seguidos, parece haver
pouca ou nenhuma mudança, salvo por pequenos detalhes como o leve movimento dos
membros da retratada.

Figura 146. Sequência Homenagem a Balthus. Fonte: Instituto Moreira Salles.

 
  229

Na tira de fotogramas registrados em Baden-Baden (ensaio publicado na revista


Vogue em 1974) (Figura 147), há um intervalo de quatro fotogramas com andamento similar
ao de Águas Termais, Baden-Baden (Figura 118), do mesmo ano, no que tange à composição,
enquadramento e ângulo que se mantêm fixos, com variação apenas do gestual da modelo em
segundo plano.

Figura 147. Baden-Baden Vogue, 1974. Fonte: Instituto Moreira Salles.

Essas singelas variações entre os fotogramas acabam por passar despercebidas e,


dessa forma, temos a percepção de que a cena não se modificou quando vistas pelo conjunto.
Quanto à ideia de repetição, quando em certas circunstâncias o fotógrafo “repete a foto”, o
resultado fotográfico desse outro registro não é necessariamente idêntico, pois, ainda que
sejam iguais os elementos que compõe imagem, sutis modificações de ângulo, foco e
enquadramento podem alterar o resultado final. Nesse caso, o distinto está na modificação
pelos pequenos detalhes da cena.
Esse “repetir” tem um análogo no processo de criação da literatura. “Não há uma
frase desse texto que eu não tenha escrito vinte vezes [...], finalmente o que chamam
Repentir 8 não é ninguém a não ser o demônio da escritura” diz Hélène Cixous (apud
GRÉSILLON, 2007, p. 310). O disparar sequencial da câmera para capturar imagens de uma
mesma cena teria, portanto, relações de similaridade com o processo de “reescrever” (no
sentido de refazer) da literatura, apesar de ambos se distanciarem nos aspectos próprios de
cada linguagem (a consciência diante da escrita é diferente do fotografar). Dubois (2012)
indica que a compulsão da repetição é algo essencial ao ato fotográfico, no sentido de que não
se registra apenas uma foto, mas sim uma série repetindo-se a tomada do mesmo assunto
para depois exercer uma seleção.
Segundo Wolfenson (INSTITUTO MOREIRA SALLES, 2009a), na maioria dos
casos, a captura de uma profusão de imagens de uma mesma cena é um método de trabalho
do fotógrafo para garantir que a imagem procurada – pelo fotógrafo ou terceiros – esteja à
disposição dentre as muitas registradas. A repetição então, indicaria o registro como

                                                                                                               
8 Em francês significa arrependimento.

 
  230

salvaguarda de possibilidades de escolhas pelos detalhes para o momento da edição em uma


futura publicação. Para Stupakoff, essa profusão de registros se justifica:
Porque na hora de escolher, que é a hora vital, eu tenho milhares desses
slides.... Tudo em que o, a, os, as modelos demonstravam qualquer cacoete
que parecesse foto de moda era pum! Pro lixo! Aquele pezinho levantado,
aquela mãozinha que está ali e que não tem motivo de ser (STUPAKOFF
apud FERNANDES JUNIOR, 2006, p. 162).
Nesse sentido, Stupakoff serve-se de uma quantidade significativa de fotogramas,
fazendo uma espécie de “cobertura” de imagem com pouca variação da cena para ter material
mais abundante que o possibilite, posteriormente, fazer um rigoroso processo de seleção
pelos detalhes (no caso das sequências da figura 148, os pés, mãos, poses...). Além disso,
essas sutis variações permitem ao fotógrafo explorar o referente imageticamente.

Figura 148. A ideia do registro repetitivo também pode ser vista nos diapositivos dessa sequência em
que há uma pequena variação na pose dos braços e mãos. Fonte: Instituto Moreira Salles.

Ao deflagrar vários registros de uma mesma cena, Stupakoff está usando o


aparato fotográfico como prótese para aumentar a capacidade do corpo humano (VIRILIO,
2002), uma vez que o aparato fotográfico mediatiza o que se situa entre o observador e o
mundo, pois também captura aquilo que o observador não percebe, sendo capaz de fixar e
mostrar o movimento com precisão e riqueza de detalhes que escapam à visão – vide os
estudos com o movimento do corpo feitos por Eadweard Muybridge no começo do século XX
(ADAM, 2014).
Pela fotografia, é possível tornar visíveis inúmeros fenômenos até então ocultos –
no sentido de que a câmera revela detalhes e ações fugidias ao olhar humano (KRAUSS,
2002) que no momento da captura não as percebeu –, passando a fazer parte da experiência
visual de todos os que contemplam e visualizam a imagem. Para o escritor Émile Zola, “a foto
põe em evidência uma multiplicidade de detalhes que teriam passado despercebidos” (ZOLA
apud FREUND, 2011, p. 58) e pode mostrar uma riqueza de detalhes e precisão
imperceptíveis ao olho humano consciente. Benjamin (1987) já havia percebido esse
‘inconsciente ótico’ ainda na primeira metade do século XX:

 
  231

“(…) Percebemos, em geral, o movimento de um homem que caminha, ainda


que em grandes traços, mas nada percebemos de sua atitude na exata fração
de segundo em que ele dá um passo. A fotografia nos mostra essa atitude,
através dos seus recursos auxiliares: câmera lenta, ampliação. Só a fotografia
revela esse inconsciente ótico (...)” (BENJAMIN, 1987, p.94).
Essa seria mais uma justificativa para se fazer uma cobertura de imagens
repetidas sobre um mesmo referente.

5.4 Os recortes de Stupakoff


Segundo Krauss (2002), o espaço dado pelo campo visual da objetiva mediante o
visor da câmera revela tanto a percepção de uma realidade quanto o ponto de vista do autor.
O aparato fotográfico reproduz o mundo através de enquadramentos e fragmentações – um
recorte de um conjunto maior de uma dita realidade – e aquilo que aparece delimitado pelo
enquadramento é uma recomposição do fotógrafo da ordem espacial do “mundo natural”.
Para Krauss, o recorte é um instrumento estético do qual depende a leitura da parte extraída
do todo e essa estética fotográfica se resume a uma percepção da realidade transformada em
representação visual.
Pelo enquadramento o fotógrafo sugere a maneira como ele interpreta uma dita
realidade, sendo capaz de expressar um valor particular frente ao espaço representacional ao
definir o referente a ser fotografado, caracterizando o grau e a relevância de determinado
elemento em relação aos outros.
Stupakoff constrói o enquadramento
preferencialmente pelo plano médio (exemplos: figuras 95
B; 96 C, 97 A, B, E; 98 B, C; 99 A; 100) e as vezes pelo plano
geral (exemplos nas figuras 132C, 139), em detrimento aos
closes, que são mais raros (exemplos nas figuras 150 e 151 A-
B). O plano médio, por sua principal característica,
individualiza determinado motivo, mas o mantém
enquadrado dentro de um contexto. A leitura da figura
acontece em relação ao todo e aos outros elementos da
imagem, contrariamente ao close, que evidencia uma parte
do objeto ou sujeito em detrimento do contexto.
Na série com Leslie Bogart, de 1967 (Figura 149),
Figura 149. Leslie Bogart. a personagem é apresentada em meio corpo inserida em um
Fonte: Instituto Moreira
Salles. ambiente interno, envolta por outros elementos da cena e ao
  lado de uma janela com luz natural. O recorte pelo plano
médio expõe as vestimentas de Bogart ao mesmo tempo em que a contextualiza dentro de um
ambiente no qual é possível visualizar uma estrutura de madeira que serve de apoio à
personagem, almofadas e plantas em primeiro plano, assim como o detalhe da pomba do

 
  232

lado externo da janela. Nesse exemplo, há a clara preocupação de Stupakoff em compor a


figura principal (Leslie Bogart) com os outros elementos de cena.
Entendemos que mostrar o espaço e o contexto como meio de descrever a ação e
o sujeito são aspectos criativos determinantes na poética de Stupakoff, lembrando que o
fotógrafo tinha aversão em colocar as personagens no fundo infinito do estúdio, conforme
apresentado anteriormente neste capítulo, preferindo posicioná-las em lugares que ele
pudesse escolher e que em seu julgamento fossem mais interessantes. Nesse sentido,
justifica-se a preponderância do uso de enquadramentos mais abertos.
Apesar do direcionamento de
Stupakoff para enquadramentos em
plano médio e geral, o fotógrafo não se
abstém totalmente de usar o close como
linguagem necessária para a construção
de uma mensagem fotográfica em que
possa realçar elementos para evidenciar
determinada região do motivo fotográfico
ou favorecer a visualização de detalhes e
de aspectos importantes da cena, como as
mãos entrelaçadas de Wesley Duke Lee e
Figura 150. Mãos de Wesley Duke Lee e Sérgio
Mendes. Fonte: Instituto Moreira Salles. Sérgio Mendes registradas na série
Joatinga (1978) (Figura 150).
Das séries nas Caixa 1 e 2 destacamos Ansiedade (Figura 119), Katharine Ross
(Figura 97H), Teatro de Saigon (Figura 151A) e Mulher Iraniana (Figura 151B) como as
poucas sequências em que Stupakoff utiliza um enquadramento mais fechado de forma a
ocultar o contexto em que se localiza o sujeito e isolá-lo do ambiente. Em Ansiedade apenas a
mão, parte do rosto e o colo da modelo são revelados, sendo a visão dos outros elementos
obliterada pelo enquadramento aproximado; algo próximo acontece no direcionamento para
expressão da personagem na série Katharine Ross e também em Teatro Saigon; nesta
última, a atenção recai no ator frente ao espelho em uma sequência retratando o ritual da
maquiagem.

 
  233

(A) (B)
Figura 151. (A) Teatro de Saigon. (B) Mulher Iraniana. Fonte: Instituto Moreira Salles.

Em outros momentos, Stupakoff também se utiliza de um recorte mais


aproximado em alguns fotogramas de determinadas sequências, mas esses são momentos
isolados: alguns fotogramas da série com Pelé (publicada na revista Iris em agosto de 1979)
mostram o jogador em primeiro plano com destaque para o rosto e parte do peitoral; closes
de partes do corpo também podem serem vistos em poucos
fotogramas das séries de nus femininos e na série com a
apresentadora Xuxa Meneghel (Figura 152). No entanto, como
discutido acima, vale ressaltar que as fotografias em close de
Stupakoff são exceções; em suas escolhas, ele consistentemente
opta por fotografias em planos mais abertos.
Para estabelecer um enquadramento, o fotógrafo
também utiliza o ângulo de captura – posição da câmera em
relação ao referente – que pode se dar de forma linear, plongée9 e
contre-plongée 10 . Foi observado que Stupakoff se propõe a um
registro do referente sem variações extremas dos ângulos de
Figura 152: Xuxa captura (como pode ser visto em várias das suas sequências, e.g.,
Meneghel para Vogue
Brasil, 1989. Fonte: Figuras 95A, 96, 97) e com isso assume um registro mais próximo
Instituto Moreira Salles.
do ponto de vista de um observador naturalmente inserido na cena
 
capturada; nesse sentido, Stupakoff escolhe ângulos de visão tomando posicionamentos
considerados triviais tendo por base o olhar humano dentro de um ambiente.
Ainda é pelo enquadramento que outros referentes significantes podem ou
não estar presentes no interior do espaço representado, criando assim inúmeras
possibilidades de relações semióticas (MACHADO, 1984). Essa relação com o referente pode
se dar pelo extra-quadro, aquilo que não está visível pelo enquadramento mas que, mesmo
                                                                                                               
9 Plongée (mergulho em francês), a câmera está posicionada em ângulo de cima para baixo
10 Contrée-plongée (contra mergulho em francês), a câmera está posicionada em ângulo de baixo para cima.

 
  234

assim, pode ser imaginado pelo leitor da imagem. Esse aspecto característico que se refere a
aquilo que não está sendo mostrado, como alguém ou algo, mas que faz parte da história, está
presente em várias sequências registradas por Stupakoff. Um exemplo claro da importância
do extra-quadro está em Grand Hotel Cauborg (Figuras 97K, 157), Leslie Bogart (Figura
95A) e Chartres (Figura 97C) constantes da Caixa 1, em que as personagens olham para fora
do quadro ressaltando que algo acontece para além dos limites das bordas da imagem. Outro
exemplo de sequência em que esse tipo de recurso foi utilizado está no editorial O pacote
perseguidor, publicado na revista Cláudia em 1961. No referido ensaio, isso fica explícito nos
olhares das personagens femininas para fora do campo (Figura 153). Em termos compositivos, a
imagem proporciona um jogo de olhares que permite ao leitor reconhecer e pontuar cada
personagem em cena e também, pelo acompanhamento dos olhares das mulheres, articular e
imaginar o que acontece fora do quadro registrado. Essa construção indica que a cena não se
encerra no que foi enquadrado pela lente, sugerindo que algo acontece para além do exposto
(SPINELI, 2017).

Figura 153. Páginas de O pacote perseguidor, revista Claudia, dezembro de 1963.


Fonte: Reprodução da revista/Acervo Biblioteca ECA - SP.

Todos os exemplos citados nos permitem considerar que o discurso nessas


imagens não se restringe ao que está apresentado no enquadramento e que o diálogo com os
elementos que estão fora do quadro pode ser viso como uma característica criativa de
Stupakoff. De certa forma, essa preocupação para com aquilo que está além do corte é
constante em Stupakoff, visto nessa declaração a partir de uma entrevista na década de 1960:
“(...) o essencial no momento de cortar uma foto é exatamente completar o modelo na
enquadração, finalizando com a linha do corte o que ainda existe para ser dito” (STUPAKOFF
apud MOREIRA, 1962, p.6).

 
  235

5.5 Composição: os detalhes que contam


Se entendermos composição como o arranjo visual dos elementos dentro de um
enquadramento (HEDGECOE, 2006), podemos ter uma composição que apresente concisão
ou profusão de elementos organizados no quadro.
Diante dessa característica, é notório o arranjo visual conjugando mais de um
elemento nas composições de Stupakoff, dentre as quais algumas apresentam até mesmo
sobrecarga de informação. Essa ‘sobrecarga informativa’ é proveniente da tendência do
fotógrafo em incorporar elementos díspares na imagem e pela contingência de registrá-la
com enquadramentos mais abertos, acomodando outros elementos na composição que
contextualizam o referente principal (exemplos podem ser vistos na Figura 154 A, B e C).

(A)

(B)

 
  236

(C)
Figura 154. Exemplos de “sobrecarga informativa” na obra de Stupakoff. (A) Trumam Capote. (B)
Palazzo Gangi Palermo, Sicília, Itália, 1974. (C) Margareta Arvidson, Vogue, Paris, 1973. Fonte:
Instituto Moreira Salles.

No entanto, sob o enquadramento do plano médio também se observam


resultados fotográficos minimalistas, com poucos elementos compositivos, como na foto de
Margareta na piscina de Joatinga (1978) (Figura 155), em que o corpo da personagem
aparece em um único ambiente neutro e uniforme.

Figura 155. Margareta na piscina em Joatinga, 1978. Fonte: Instituto Moreira Salles.

Mesmo quando há no registro da cena uma quantidade significativa de ambientes


em diversos planos ou múltiplos elementos – como cachorros, árvores e objetos diversos –,
Stupakoff harmoniza a cena de modo a não retirar o cerne do referente principal. Ele recorre
ao controle da profundidade de campo11 para determinar a quantidade de elementos que
ficarão nítidos na composição. Com a minimização da profundidade de campo, o fotógrafo
estabelece o foco seletivo que destaca pela nitidez um ou alguns elementos da imagem,
desfocando outros elementos da composição a fim de suavizar seus traços. Ao evidenciar uma
                                                                                                               
11 A profundidade de campo é a distância à frente e atrás do ponto de focagem na qual os objetos ficam focados.

Na fotografia, a alta profundidade de campo se refere ao quanto os planos estão nítidos (focados). A alta
profundidade de campo proporciona nitidez em todos os planos da imagem.

 
  237

parte da imagem, o foco seletivo dá maior atenção a um dado aspecto da imagem e,


consequentemente, estabelece pesos visuais. Dois exemplos desse procedimento de Stupakoff
podem ser vistos nas Figuras 156 A e B.

(A) (B)
Figura 156. (A) Eduardo Paolozzi, uso do desfoque nos planos posteriores. (B) New Deli, uso do
desfoque nos planos posteriores e anteriores. Fonte: Instituto Moreira Salles.

No entanto, há imagens nas quais Stupakoff emprega a maximização da


profundidade de campo, que promove a nitidez em todos os planos ressaltando todos os
aspectos da imagem (como na Figuras 157, 160, 164A). Com essa alta profundidade de campo,
todos os elementos de cena – personagens e cenário – são visualizados nítidos. Nesse
contexto, a harmonização resulta da coesão no conjunto dado pelos diferenciados pesos
visuais de cada elemento e pela maneira como eles ocupam o espaço compositivo; nos
exemplos das figuras 157, 160 e 164A, o destaque visual é dado pela cor e/ou textura, e
também pelo arranjo visual, com posicionamento e distribuição precisa dos elementos em
cada terço da imagem12.
Os detalhes da imagem – singelos elementos significativos no dar sentido a
algum componente maior da cena – são outro ponto de força nas composições de Stupakoff.
Esses detalhes vão desde pequenos objetos de produção incorporados à composição até
discretos gestos, como o posicionamento das mãos, e sutis alterações da postura do referente.
Um dos exemplos está na sequência feita com Sharon Tate na praia em Santa Monica, em
1969 (Figura 121B). No fotograma 33 da série, a postura altiva e a mão apoiada
delicadamente no ombro da atriz são significativos na apresentação da personagem. Outra
ilustração está na série registrada em Baden-Baden para a Vogue (1974) (Figura 97F). Nela,
podemos ver uma tênue diferença no gesto da modelo pelos detalhes das mãos e dos pés. A

                                                                                                               
12 Aqui se faz alusão à técnica da regra dos terços – caracterizada por dividir a imagem por duas linhas horizontais

e duas verticais e tida como uma regra que busca explorar os terços para harmonizar a composição; no entanto,
sua aplicação per se não garante a harmonização dos elementos em cena. Ainda assim, vemos que Stupakoff por
vezes utiliza na composição esse tipo de distribuição dos elementos constitutivos em cada terço da imagem.

 
  238

atenção aos detalhes estava contida na preocupação de Stupakoff em eliminar detalhes que o
incomodavam e que de certa forma parecessem posados (FERNANDES JUNIOR, 2006).
Há também a inclusão de pequenos objetos e outros elementos nas composições
de cena que de alguma forma aludem ao assunto registrado. A fotografia no disco Picardia de
Sérgio Mendes (Apêndice III), comentada no capítulo 2 da presente tese, traz o intérprete
dentro de um carro branco com o vidro da janela aberto por onde pende um cacho de
pimentas e ao fundo um cenário típico do estado do Novo México, EUA. A inclusão das
pimentas como detalhe de produção partiu de Stupakoff depois que ele julgou ‘calientes’ as
faixas de ritmos latinos do disco e por entender que a especiaria é um dos símbolos culturais
do Novo México (MENDES, 2016).
Mesmo que o cerne da construção de várias das imagens de Stupakoff esteja
nesses detalhes significativos, eles não retiram a atenção dos elementos chaves da fotografia.
Nas palavras do próprio fotógrafo: “Um bolo pode ficar mais fotogênico com creme de
chocolate, porém o fotógrafo deve tomar cuidado para não falar muito sobre o creme, a ponto
de fazer o público esquecer o bolo” (STUPAKOFF, 1960).
Para além da harmonização pelos distintos componentes do conjunto visual e
pelos detalhes, também é expressiva a inter-relação entre os personagens que compõem a
cena nas fotografias de Stupakoff. Há produções nas quais, além da contextualização espacial,
é estabelecido um diálogo visual entre os personagem da ação. Isso fica explícito em Grand
Hotel Cabourg (1976) (Figura 157), Chartres (1974) (Figura 97C) e Zoológico de Stuttgart
(1976) (Figura 98C), por exemplo.

Figura 157. Grand Hotel Cabourg, 1976. Fonte: Instituto Moreira Salles.

Outras vezes a personagem principal interage com um ambiente que dá sentido


às suas ações, como na série Renata, registrada em Nova York (1991), em que a modelo é
retratada executando ações cotidianas e se relacionando com o ambiente privado em que se
encontra (Figura 158). Esses apontamentos reforçam a ideia da importância dada por

 
  239

Stupakoff ao contexto em que o personagem retratado se insere, assim como de estabelecer


uma ação narrativa (conforme será abordado no capítulo 6).

Figura 158: Renata no estúdio da Rua Varick, Nova York, 1991.


Fonte: Instituto Moreira Salles.

Em linhas gerais, para Stupakoff, a composição não era um assunto trivial na


prática fotográfica. Ela requeria observação cuidadosa, estudo e intuição. Em suas próprias
palavras: “a composição não difere em nada da reflexão” (STUPAKOFF apud FERNANDES
JUNIOR, 2006, p. 149).

5.6 Iluminação e as janelas de Stupakoff


No trabalho com a iluminação, duas conjunturas se destacam na produção de
Stupakoff: o aproveitamento da fonte de luz natural diurna, tanto em ambientes abertos
quanto de interiores, e a suavização das sombras nos motivos fotográficos.
Sobre a luz natural diurna, Stupakoff dizia que suas fotos pertenciam ao universo
da luz do começo do dia: “Sou uma pessoa diurna” (STUPAKOFF apud FERNANDES
JUNIOR, 2006). Em outro depoimento, ele considerou ser a luz das 16:00 uma das mais
favoráveis para se registrar uma fotografia (STUPAKOFF, 1978b). Quando fotografou a atriz
Juliana Paes na floresta da Tijuca, sabia que isso deveria ser feito entre as 9:00 e 14:00,

 
  240

melhor incidência de luz para o local de mata fechada (FERNANDES JUNIOR, 2006). Esses
depoimentos confirmam a preferência do fotógrafo pela luz natural diurna, visível em sua
produção. Também expressam o conhecimento de Stupakoff sobre o estado da iluminação
natural (algo apropriado para um fotógrafo), cujas mudanças constantes de direção e ângulo
de incidência levam à alterações significativas no registro da cor e da textura dos referentes,
acarretando em efeitos significativos no motivo da imagem. Isso justifica a importância dada
aos estudos do ambiente e do momento do dia a se fotografar com o objetivo de alcançar o
resultado estético desejado.
Outro aspecto significativo quanto à iluminação utilizada por Stupakoff é o
predomínio da luz suave, muitas vezes uniforme, com fonte de luz extensa que alcança quase
todas as direções produzindo pouca ou nenhuma sombra (como na Figura 159A). Esses efeitos
são conseguidos pelos registros captados na luz da aurora e final do dia, quando o sol baixo no
céu atravessa camadas mais densas da atmosfera, o que reduz a intensidade da luz, deixando-a
mais difusa. Ainda sob a perspectiva da luz natural, a utilização da luz lateral proveniente de uma
fonte externa (como uma janela) funciona como recurso reincidente de fonte de luz para
ambientes internos (como na Figura 159B). Essa fonte reduzida emite luz de modo unilateral e
pode produzir algumas sombras amenizadas e menos delimitadas.

(A)

(B)
Figura 159. Exemplos do uso da luz por Stupakoff. (A) Menina Cigana, luz uniforme e suave.
(B) Tributo a Balthus. Harper’s Bazaar, 1968. Luz lateral de janela.
Fonte: Instituto Moreira Salles.

 
  241

Vale ressaltar que são raras, em toda a obra de Stupakoff, as fotos noturnas e
registradas em crepúsculos, como também são poucos os contraluzes e os contrastes
acentuados vindo das áreas densas de sombras. Exemplos de contraluz estão em Margareta
em Hotel D'Inghilterra, Roma (1969) (Figura 99B) e Ian e Bico em New York (1968) (Figura
113), nas quais é possível ver um acentuado contraste de luz e sombra.

5.7 O congelar de um instante


A apreensão do mundo sensível também acontece pela dinâmica do deslocamento
no sentido de se perceber que o movimento de um objeto dá-se sempre em relação a um certo
referencial. A representação do deslocamento na fotografia acontece pela evidenciação ou
estagnação do efeito de movimento em uma imagem fixa (DUBOIS, 2012). Nesse sentido, um
movimento pode ser congelado, regido pela ideia de suspensão temporal, e impedido de
mostrar qualquer efeito de condução. Por outro lado, quando o movimento está inscrito na
imagem – quando se forma um “rastro” –, revelam-se as etapas do deslocamento no espaço.
Stupakoff primava por uma temporalidade não inscrita na representação
(condição presente, por exemplo, na Figura 160); como opção plástica, seus registros
tendiam à manutenção do gesto estatificado da imagem ao congelar um instante. São raros,
entre os trabalhos do fotógrafo, os registros da segmentação do continuum e o seu
desdobramento espacial (que se apresentam através de efeitos borrados).

Figura 160. Carrie Nygren, Vogue maio 1975. Fonte: Instituto Moreira Salles.

Nesse sentido, não é típico de Stupakoff expressar na imagem um ‘tempo que se


acumula’. Sua linguagem converge mais para uma ideia de instantâneo, do tempo ínfimo, que
oblitera o vestígio do movimento.

 
  242

5.8 A raridade dos efeitos e das distorções


A trucagem fotográfica – do tipo colagem, sanduíches de negativos13, montagem
ou justaposição – não é uma prática muito evidente na obra de Stupakoff. Nesse sentido, o
fotógrafo assumiu uma postura que pode ser considerada mais purista da fotografia, não
trabalhando com modificação a posteriori de suas imagens via efeitos secundários capazes de
fazer variar o conteúdo da imagem através da intervenção no negativo ou positivo. Como
exemplo único de experimentações com o negativo, identificamos a imagem Nu, estúdio
(1953) (Figura 125A) que transparece ser uma dupla exposição.
No conjunto da obra de Stupakoff notam-se ainda raras distorções óticas
acentuadas, seja por deformações nas formas dos elementos da foto ou nas modificações dos
tons e das cores. Exemplos desse tipo de distorção estão nos fotogramas de Renata (de 1991)
(Figura 161A) e de Ian e Bico em New York (1968) (Figura 113B).
Há também uma série creditada a Stupakoff na qual ele fotografa Wesley Duke
Lee (Figura 161B) com uma objetiva olho de peixe que, por sua característica técnica,
promove a distorção de bordas e inscreve uma aparência circular na imagem. Essa série –
que não consta do material no IMS – foi realizada nos primórdios de 1960; podemos
classificá-la como exemplo isolado de uma época, visto que nenhum outro trabalho com esse
teor foi encontrado em seu arquivo.

(A) (B)
Figura 161. (A) Renata, 1991. (B) Wesley Duke Lee. Fonte: (A) Instituto Moreira Salles; (B)
reprodução de PARELLA, 1967 em Coleções especiais/Unicamp.

Essas observações ainda apontam que Stupakoff prima por manter a


proporcionalidade natural dos motivos ao evitar as distorções mais acentuadas.

                                                                                                               
13 Sobreposição de dois negativos para criar um efeito de dupla exposição.

 
  243

5.9 A cor, as texturas e padronagens na superfície da foto


Alguns fotógrafos constroem sua estética fotográfica pelo uso exclusivo do preto e
branco – caso do brasileiro Sebastião Salgado – ou pelo uso predominante da cor – como o
norte-americano William Eggleston. Apesar de predominarem as fotografias em preto e
branco nas escolhas de Stupakoff – como já descrito sobre o material organizado nas Caixas 1
e 2 depositadas no IMS – um olhar em perspectiva sobre sua produção indica-nos que o
fotógrafo também tinha um domínio estético para lidar com a linguagem da cor. Nas suas
próprias palavras: “Eu usava preto e branco, filme Tri-X e usava filmes coloridos, comecei
com o Kodachrome”. (STUPAKOFF apud FERNANDES JUNIOR, p.165).
O preto e branco está presente especialmente nos projetos pessoais de Stupakoff,
como nas suas séries de fotografias de família, viagens e em registros de rua. A ausência da
cor permite que o fotógrafo se concentre nas formas, texturas e padrões como elementos
primordiais para a construção da imagem (HEDGECOE, 2006). A fotografia em preto e
branco apresenta as gradações de cinza, entre o preto e o branco, e fica a critério do fotógrafo
estabelecer como reproduzir esses tons enquanto linguagem fotográfica. Há fotógrafos, como
o esloveno Evgen Bavcar14, que minimizam os tons de cinza, realçando os pretos e os brancos
e estabelecendo contrastes acentuados, outros optam por realçar a escala dos cinzas e
suprimir os pontos mais altos do preto e do branco (aqui um exemplo está em alguns
trabalhos da fotógrafa francesa Sarah Moon). Stupakoff usa toda a escala tonal do mais alto
ponto no branco, a escala completa dos cinzas, até o ponto mais alto no preto.
A fotografia em cor tem como característica apresentar uma variação de
frequência cromática que proporciona a percepção dos diferentes tons do espectro luminoso
(HEDGECOE, 2006). A percepção cromática favorece o destaque dos elementos fotografados
e a cor como informação atribui significado simbólico a esses elementos. Imagens coloridas
estão presentes em muitas das produções comissionadas de Stupakoff – como capas de disco,
fotos publicitárias e editoriais de moda (conforme visto no capítulo 2) – nas quais o fotógrafo
trabalha com a cor tendo em vista especialmente seu aspecto mais vivaz dentro da
composição (e.g., Figuras 162 A e B).

                                                                                                               
14 Evgen Bavcar é um fotógrafo deficiente visual que utiliza o tato e o olfato para conceber suas criações

fotográficas (TESSLER; BANDEIRA, 2003).

 
  244

(A) (B)

Figura 162. (A) Eva Gschopf, 1967. (B) Jardim em Boulogne-Billancourt, França. 1975.
Fonte: Instituto Moreira Salles.

Além dos elementos diversos coexistindo na mesma cena (como visto no tópico
sobre composição), as texturas e padronagens são elementos largamente presentes nas
composições de Stupakoff. Podemos entender textura como uma forma em miniatura que
expõe as reentrâncias e saliências de uma superfície. Na fotografia, as texturas se revelam
pela presença ou ausência das sombras realçadas pela iluminação incidente em uma
determinada área.
A textura como elemento visual na fotografia representa as qualidades de outro
sentido, o tato. A visualização de uma textura permite reconhecer seu aspecto, ainda que isso
difira da experiência sensória do tato. Ambos têm significado simbólico semelhante, mas não
o mesmo valor, pois o julgamento que o olho faz está no campo da aparência (parece ser
áspero, parece ser suave), enquanto a percepção pela pele é mediada por receptores de
estímulos táteis. Quando a textura não apresenta qualidades táteis mas apenas óticas (linhas
em uma página impressa ou padrões de um determinado tecido), ela no geral é entendida
mais como um padrão constituído pela repetição de um determinado elemento – tais como
contornos, formas, texturas e cores – do que propriamente como uma textura.
Nas fotografias para editoriais de moda registradas por Stupakoff, é comum que
a harmonia da composição seja estabelecida pela padronagem das roupas coexistindo com as
texturas do ambiente (como exemplificado nas Figuras 163 A e B). Para além da foto de moda,
esse trato com a textura e padronagens pode ser visto em outros dos seus trabalhos (e.g.,
Figura 163 C e D).

 
  245

(A) (B)

(C) (D)
Figura 163. (A) Baden-Baden, Vogue (1974). (B) Algarve, Vogue (1988). (C) Heitor dos Prazeres (ca.
1958). (D) Caçador Pangnirtung, Ártico (1989). Fonte: Instituto Moreira Salles.

Fica clara a maestria de Stupakoff no uso das cores, principalmente quando ele
objetiva revelar e ressaltar texturas e padronagens. Na Figura 164A, as cores vibrantes e os
contornos das formas ressaltam os padrões, tornando-os mais visíveis, porém a pele lisa da
modelo revela uma plasticidade que contrasta com a confluência de padrões das superfícies
dos outros elementos da cena. Dependendo de como o registro fosse feito, os padrões
justapostos talvez dificultassem a leitura da imagem, pois distrairiam a atenção do leitor,
levando-o a focalizar em uma coisa ou outra do quadro. Na referida composição de Stupakoff,
no entanto, os padrões aparecem em escalas diferentes e funcionam em conjunto.

 
  246

Na Figura 164B, fica claro o contraste estabelecido entre a maciez da roupa da


modelo e o aspecto felpudo do sofá em que ela se apoia. A pele e o tecido liso da vestimenta
da personagem revelam uma forma que contrasta com a textura das superfícies do ambiente.

(A)

(B)
Figura 164. (A) Arnella Flynn. (B) Agneta Frieberg, ca. 1967. Fonte: Instituto Moreira Salles.

Nos exemplos acima, Stupakoff usa como protocolo a construção de imagens que
mostram as aparências visuais dos objetos, mas que também aludem às suas qualidades
táteis. Esses e outros elementos da prática fotográfica de Stupakoff contribuirão para as
considerações sobre seu processo criativo discutidos no capítulo seguinte.

 
  247

CAPÍTULO 6

6. Caminhos da criação: perseverança e constância


À luz da semiótica peirceana, a criação pode ser entendida como a ação do signo
em movimento permanente e em momentos de retornos e avanços. O processo de criação é
um processo de semiose, gerativo de sentido que tende a um fim e se distancia do processo
cartesiano linear e do rigor de fórmulas (SALLES, 2013), pois conta com a lógica da incerteza
e do acaso como mecanismo para o surgimento de ideias novas.
No cerne da criação, uma ideia pode originar outras em um crescimento finito,
visto que há um momento no qual o autor interrompe a criação e um interpretante final é
atingido no interior da obra (SALLES, 1990). No processo de criação fotográfica,
identificamos alguns marcos que sinalizam estes términos: o registro da imagem no ato
fotográfico; a interrupção no fotografar de determinada sequência (nesse caso, podem ser
geradas desde pequenas tiras com poucos fotogramas até uma profusão de folhas de contato
de uma mesma sequência); e a finalização do trato com o negativo para a publicação. Ainda
dentro desse contexto, não podemos esquecer do sentido interminável da fotografia
(SOULAGES, 2010), visto que podemos retornar à matriz (i.e., ao negativo) e dali tirar novas
criações, conforme discutido no capítulo 3 da presente tese.
Todo processo de criação também é um ato comunicativo que produz efeitos
primeiramente no criador – em um diálogo intrapessoal – até alcançar os receptores
externos da imagem, os futuros intérpretes. Peirce qualifica todo pensamento como dialógico
(PEIRCE, 1958, CP 4.551), o que justifica o ato comunicativo como intrapessoal, visto que
ocorre tanto externamente entre duas ou mais pessoas, quanto internamente no pensar da
própria pessoa. Nesse sentido, segundo Salles (2002a), a criação é uma relação dialética
entre essas duas formas de dialogismo, o interno e o externo.
Sob esse ponto de vista dialógico, podemos realizar algumas inferências sobre o
processo de criação de Otto Stupakoff naquilo que explicita o seu pensamento fotográfico em
comunicação consigo mesmo e com terceiros. Partindo do pressuposto de que o resultado da
criação fotográfica é a imagem que o indivíduo cria a partir do seu ponto de vista e dos
processos mentais que refletem a sua maneira de ser, sua constituição pessoal, intelectual,
psicológica e perceptiva, bem como da sua vivência fotográfica, a observação de alguns
procedimentos e resultados fotográficos, além de depoimentos do autor e de terceiros, podem
auxiliar na elucidação de um caminho criativo.
Não obstante, assumimos a ressalva que o criador insere em seu trabalho
elementos que sua consciência racional muitas vezes ignora, o que nos aproxima do
argumento de Entler (2005) sobre a ocorrência de acasos na fotografia e as incertezas quanto
as causas de algumas das ações do fotógrafo, principalmente no que tange a separar, para a

 
  248

escolha do instante do registro da foto, suas motivações inconscientes. Frente às inúmeras


inter-relações e conexões possíveis, torna-se inalcançável detectar com precisão todos os
meandros constituintes de uma obra fotográfica – aqui entendida alternadamente como uma
foto, um conjunto de fotos ou a totalidade das fotos reivindicadas por um fotógrafo
(SOULAGES, 2010) – ou mesmo apontar assertivamente um único percurso criativo do autor.
Stupakoff aborda essa ideia ao dizer que:
(...) como se trata de um processo interno, enquanto você está fotografando, o
processo não é visível (...) o que está se passando vou verbalizar somente a parte
consciente. Mas não posso transmitir a parte mais poderosa que reside no meu
inconsciente. Em termos junguianos, isso não é acessível (STUPAKOFF apud
FERNANDES JUNIOR, 2006, p. 157 ).
Os caminhos criativos e a forma de conceber uma obra são particulares de cada
indivíduo. Para o psicólogo cognitivo Howard Gardner, em termos gerais a sensibilidade para
criar depende da visão global e humanista de quem cria, dando a medida do seu fazer e
pensar (GARDNER, 1999). Reconhece-se que, diante de um mesmo objeto a ser fotografado,
cada fotógrafo o fará a seu modo, pois “não há um caminho único para que a obra surja (...)
De outro modo, estaríamos no academicismo dos pequenos mestres repetidores”
(SOULAGES, 2010, p. 52). As características dessa personalidade singular auxiliam no
entendimento do processo criativo de Stupakoff. Assim, os sistemas interpessoais do criador
conjuntamente aos elementos que compõem a sua criação e o seu dossiê de criação podem
ser vistos como circuitos de retroalimentação em que cada elemento afeta e é afetado pelos
demais (ANASTÁCIO; SILVA, 2012).
Stupakoff entendia a fotografia como um ato de criação, partindo da concepção
de que “(...) somente o pintor pode criar formas. Ao fotógrafo cabe apenas reconhecê-las”
(STUPAKOFF apud MAURICIO, 1956, p. 12) e de que a sensibilidade do fotógrafo permitiria
capturar detalhes, ângulos, sombras e luminosidades despercebidas por um olhar insensível
e destreinado. No entanto, quanto a concepção da foto, Stupakoff afirmava que a simples
reprodução da realidade (grifo nosso) não refletiria o processo criativo do fotógrafo
(STUPAKOFF, 1960), no que compactuava com a ideia de que o fotógrafo não é neutro, mas
impregna sua obra com sua sensibilidade e ideologia (DUBOIS, 2012). Essa concepção de
Stupakoff sobre o fazer fotográfico oriunda da experiência também converge com o
pensamento de Soulages (2010), pois ambos compreendem que a fotografia não somente
restitui o objeto fotografado, mas metamorfoseia de maneira específica um fenômeno visual
que depende tanto do objeto registrado quanto do sujeito que fotografa, e do material
fotográfico.
Essa afirmação pode ser interpretada de muitas maneiras. Segundo Stupakoff
(1960), para fotografar é preciso saber selecionar. Nesse ponto, ele sustenta a ideia de que a
fotografia é “a arte de fazer o impossível em benefício dos insensíveis e desatentos”
(STUPAKOFF apud FERNANDES JUNIOR, 2006, p.149) e que “a vida do fotógrafo não

 
  249

pode ser vivida com indiferença, que a ele cabe ver o que para os outros é invisível”
(STUPAKOFF in FERNANDES JUNIOR, 2006, p. 8). Esse modo de ver a fotografia é
congruente com o entendimento de fotógrafos como Cristiano Mascaro, para quem fotografar é
“extrair do dia a dia algo que ninguém percebeu (...) não necessariamente a busca do insólito,
mas observar as coisas de forma sensível (MASCARO apud PAIVA, 1989, p. 193), e Antonio
Augusto Fontes para o qual “o fotógrafo normalmente presta atenção aquilo que as outras
pessoas não percebem” (FONTES apud PAIVA, 1989, p. 194).
Essas afirmações ressaltam que Stupakoff se posiciona como um receptor capaz
de apreender e captar uma realidade posta no mundo. Nesse sentido, ele se aproxima de uma
visão fotográfica subjacente à noção da “maneira de ver fotográfica” oriunda sobretudo dos
fotógrafos das décadas de 1930 e 1940, para os quais o desejo fotográfico era ordenar e
estruturar a realidade de forma a revelar a harmonia inerente a qualquer objeto ordinário e a
qualquer fragmento da natureza (KRAUSS, 2002).
Segundo Stupakoff, a motivação para fotografar partia de suas inquietações, que
se refletiam em seu processo criativo fotográfico: “Essa constante mudança, primeiramente a
falta da paz interna, é parte inerente do complexo sistema que faz da pessoa um criador”
(STUPAKOFF apud HARA; WOLFENSON, 2002, p. 43). Essas inquietações de Stupakoff
transparecem o sentido de pulsão – visto na acepção da psicologia – como todo movimento
de busca do ser humano, uma ação orientada por impulsos que são constitutivos da relação
sujeito-mundo e determinada por um estado de insatisfação (FERNANDES, 2007), como
também o sentido pessoal em se aventurar a buscar novos nortes dentro da expressão
fotográfica (como já discutido nesta tese quanto ao seus processos de escolhas).
Ao mesmo tempo em que se inquietava, Stupakoff também se aquietava – do
ponto de vista da concentração e introspecção – para atender a uma necessidade interna que
favorecesse seu processo criativo. Nas suas próprias palavras: “É preciso estar muito quieto
por dentro para ver o que eu gostaria de fotografar” (STUPAKOFF, 1978d, p. 39).
Essa constante relação dialética – inquietar / aquietar – reflete um processo de
busca e aperfeiçoamento pessoal, ao que Stupakoff ressalta: “Eu nunca vou estar preparado,
nunca vou chegar aquele momento, bom, terminei” (STUPAKOFF, 1978a, 2min28s). Esse
processo também demonstra que é através da fotografia que o fotógrafo comunica aquilo que
sente, aquilo que é, por isso a importância de buscar a verdade pessoal do seu olhar sobre o
mundo: “A fotografia é limitada apenas pela capacidade de ver do fotógrafo. Estou quase
desesperado nessa decisão, nessa minha insistência de que as próximas fotos cheguem aonde
sempre eu quis chegar” (STUPAKOFF, 1978d, p.26). Aqui se expressa um devir que pode ser
alcançado com o labor fotográfico, que demanda um processo de maturação oriundo da
experiência do fazer fotográfico e não de uma obra específica. Em suma, Stupakoff buscava
seu estilo conforme seguia fotografando.

 
  250

Stupakoff visualizava na fotografia uma prática diária e a priorizava como um


meio de expressão pessoal, que, por consequência, era também sua fonte de renda
(STUPAKOFF, 1960). “Fotografar é um modo de vida para mim” (STUPAKOFF apud HARA;
WOLFENSON, 2002, p.36), como também “(...) a fotografia é um meio de expressão, uma
maneira de conservar-me atento às pessoas e às coisas que me cercam” (STUPAKOFF, 1960,
p. 21). A partir disso, a prática e o exercício fotográfico eram para Stupakoff uma condição
para estabelecer sua expressão. Desde seus primeiros trabalhos, ele usava dessa prática diária
uma ferramenta para fortalecer seu conhecimento fotográfico, independentemente se os
registros seriam ou não publicados. Sobre o ensaio realizado em 1958 na casa de Heitor dos
Prazeres com Duda Cavalcanti, por exemplo, Stupakoff comentou: “Um exercício”
(FONSECA, 2007, p. 1), naquele que é aventado como sua primeira experiência com a foto de
moda. Ele usou desse expediente da prática constante em outras ocasiões de seu processo
criativo: ainda em tempos de estudos em Los Angeles no início dos anos 1950, Stupakoff
perambulava todos os dias para fotografar com amigos (BURGI, 2017).
A prática de registrar uma fotografia por dia era uma maneira do fotógrafo
manter sua expressão. “Praticamente todos os dias alguma fotografia eu tiro para mim.
Independentemente do meu trabalho”, dizia (STUPAKOFF, 1978b). Para Stupakoff, esse
exercício despretensioso de fotografar sem ambições comerciais e sem a necessidade de
registrar fatos tidos como importantes era uma prática criativa e uma maneira de aprender
algo, assim como também de se preparar para um próximo trabalho comercial:
Em cada fotografia que eu tiro, alguma coisa eu aprendo. Tudo isso faz parte
de uma pequena escada que você vai subindo aos poucos e todos os degraus
contam (STUPAKOFF, 1978b, 33min7seg).
Essa afirmação de Stupakoff evidencia que para ele a prática não era somente
uma forma de aperfeiçoar a técnica fotográfica, mas de encontrar caminhos que viabilizassem
futuras criações e possibilitassem a construção de uma estrutura de referências – para Salles
(2013), isso equivale ao criador esperando pacientemente por aquilo que pode ser impensável
hoje mas que talvez não o seja amanhã, em um processo contínuo de maturação e dedicação
permanente. Um questionamento que pode ser levantado é se tal pensamento se aplica à
prática fotográfica e se existe, na fotografia, esse esperar e esse processo de maturação, visto
que o registro da imagem, em termos canônicos, é um ato imediato.
Nesse sentido, Soulages (2010) argumenta que a foto não se faz de uma só vez,
ela tem um antes e um depois do ato fotográfico. A partir dessa afirmação, podemos entender
a criação fotográfica como um processo no qual é possível indexar algumas opções oferecidas
pelo repertório da criação em fotografia: (1) a preparação, que corresponde ao planejamento
e formação cultural, técnica e intelectual do fotógrafo; (2) o ato fotográfico per se, ou seja, as
escolhas do quê e como fotografar, o momento do registro; (3) o processamento da imagem
e/ou pós-produção dentro das particularidades no uso do filme – o processo de revelação e

 
  251

ampliação – e do CCD (sigla para o termo em inglês Charge-Coupled Device ou Dispositivo


de Carga Acoplada); e (4) a seleção e edição das imagens registradas e processadas para
serem aplicadas e divulgadas.
A conduta perfeccionista era outro traço particular e constante do processo
criativo de Stupakoff. Ele justificava esse seu modus operandi ao verbalizar que a
perseverança, no sentido de insistir em algo a que se propunha fazer, e a constância do
trabalho seriam de extrema importância para o aperfeiçoamento do fotógrafo (STUPAKOFF,
1978b). Para ilustrar esse ponto de vista, Stupakoff citava o processo criativo do fotógrafo
norte-americano Edward Weston, tomando como exemplo sua série de fotografias diárias de
um pimentão (referindo-se à série Pepper, de 1930) até obter o resultado que julgou
satisfatório (STUPAKOFF, 1978b). Observações de colegas, amigos e parceiros profissionais
também nos permitem entender como a exigência e a perseverança eram características da
criação de Stupakoff. O já citado ex-editor da revista Cláudia, Thomaz Souto Corrêa, atesta
esse extremo perfeccionismo de Stupakoff (CORRÊA, 2016). Jorge Amado fez uma avaliação
análoga em um depoimento epistolar:
Otto persegue em cada foto a obra-prima, não se contenta com o bem feito,
busca sempre ir mais além, jamais inteiramente satisfeito. Daí o caráter
excepcional de seu trabalho: cada foto é o produto de uma pesquisa, de um
tempo, de uma elaboração. Otto não se satisfaz com o bom, tenta e consegue
o melhor. Poucos artistas assim tão exigentes, tão severos no julgamento de
seu próprio trabalho” (AMADO, 1980).
Pode-se entrever esse viés de busca pela perfeição de Stupakoff tanto no seu
desenvolvimento profissional quanto em alguns aspectos da sua vida pessoal. O próprio
Stupakoff sugeria que duas perguntas eram suas norteadoras: “Será que hoje fui melhor do
que fui ontem?” e “Será que exercito minha potencialidade?” (STUPAKOFF, 1978b,
53min15seg). Nesse sentido, Stupakoff ainda ponderava que o desenvolvimento profissional
estaria intimamente ligado ao desenvolvimento humano, na medida em que, quando se
cresce como pessoa, o trabalho profissional cresce com o fotógrafo. Quanto a isso, podemos
sugerir que a necessidade de expansão pessoal e profissional foi um dos motivo de sua
partida a Nova York:
“Aqui [Brasil] eu estava no auge. O que fazia era bom, ninguém exigia que eu
melhorasse, o mercado dispensava minhas pesquisas. Nos Estados Unidos a
busca é indispensável, o mercado exige constantemente coisas novas, o país
estimula” (STUPAKOFF apud LEONAM, 1967, p. 8).
Outra forma de entender a persistência de Stupakoff está inscrita na sua
insistência em capturar uma cena repetidamente, com poucas variações entre os fotogramas
de uma sequência (como discutido no capítulo 5), no que pode ser interpretado como uma
tentativa de assegurar a existência de registros fotográficos entre as séries de fotogramas
obtidos nos quais ao menos um ou alguns satisfizessem a busca pelo ideal.

 
  252

Há também nessa constante procura pelo aperfeiçoamento fotográfico um


patente senso crítico com o qual o fotógrafo olhava para seu próprio trabalho. Isso fica
evidente em pelo menos duas situações distintas: quando Stupakoff se debruça, pouco antes
da sua primeira ida para os EUA nos anos 1960, sobre um portfólio de onze anos de carreira e
elege apenas poucas ‘boas fotografias’, e quando recusa o convite que Pietro Bardi lhe fez
para expor no MASP no início da década de 1970, alegando que não tinha material
significativo para a exposição – como visto no capítulo 2, o convite se concretizou em 1978
com a apresentação da retrospectiva de 20 anos de carreira. Em carta endereçada para Bardi,
de Nova York, em 22 de maio de 1970, Stupakoff disse:
Caro Bardi, ainda em tempo. Perdoe-me se me deixei levar pelo entusiasmo do
teu convite. Recentemente parei para olhar o trabalho que aprontei para te
mandar, revi as estrelas e apresso-me em te dizer que uma exposição no
momento é prematura. Espero mesmo muito que teu convite se renove,
quando eu sentir que a qualidade então mereça uma exposição na grande sala.
(STUPAKOFF, 1970).
Ao que Bardi respondeu em telegrama:
Considero você personalidade autêntica da fotografia contemporânea (stop)
compreendo suas dúvidas mas quando você estiver pronto museu lhe abrirá
suas portas. (BARDI, 1970c).
Ainda considerando a questão da busca pelo perfeccionismo em sua obra, Stupakoff
deixa evidente o desconforto frente ao imponderável na fotografia. Em suas palavras:
Por depender de meios mecânicos, o fotógrafo artista sofre em todos os
estágios de seu trabalho. Para muitos de nós que simplesmente apreciamos
fotografias, certas falhas e distorções não parecem coisa séria. Dá a
impressão de que é relativamente fácil pela simples observação de certas
regras obter-se boas fotografias. Engano. Se já é perigoso obter-se bons
assuntos, conteúdos que possuam consistência, no estágio de revelação e
cópia somos também surpreendidos por inesperadas distorções e
deformações na imagem dos objetos originais. Muitos podem não considerar
isso como algo sério, mas essas falhas são simplesmente alarmantes para o
fotógrafo que está seriamente tentando dominar seu instrumento de
expressão. São elas que fazem o fotógrafo sofrer agonizantes tensões durante
o período entre a exposição e a cópia final (FOTOGRAFAR..., 1963, p. 2).
A afirmação acima demonstra o anseio de Stupakoff em dominar o aparelho e os
códigos nele programados, no sentido discutido por Vilém Flusser (2011, p. 44), segundo o qual
“o aparelho [câmera] funciona em função da intenção do fotógrafo (...) o fotógrafo domina o
input e o output da caixa”. No entanto, ainda segundo Flusser (2011, p. 44) “(...) pelo domínio
do input e output, o fotógrafo domina o aparelho, mas pela ignorância dos processos no
interior da caixa, é por ele dominado”. Essa impossibilidade do controle total, i.e, a
dependência do aparelho, é fonte de angústia e descontentamento em Stupakoff.
Essa perspectiva de Stupakoff contraria a ideia de que o imponderável, visto
como a presença do acaso, é tão aceitável na criação fotográfica quanto a predeterminação da
fotografia erigida pelo fotógrafo a partir do controle dos aspectos técnicos e de linguagem.
(...) é preciso considerar que cada tomada de câmera corresponde a um
intervalo de exposição ínfimo, escolhido mais ou menos arbitrariamente

 
  253

entre inúmeros outros intervalos próximos. Daí por que se pode falar de um
certo caráter aleatório da imagem obtida pela câmera: pode-se dizer que o
obturador que torna visível a luz na película é ele próprio cego e governado
pelo acaso (MACHADO 1984, p.43-44).
Como anunciado por Dubois (2012, p. 312), “fotografar é não ver”, visto que não
se visualiza aquilo que se está fotografando no momento exato da captura, e dado que o autor
do registro fotográfico não mantém controle total sobre a criação, Machado (1984) defende o
papel do acaso como frequente na fotografia, ainda que menos perceptível ao público, pois o
resultado mostrado cotidianamente em álbuns, revistas e exposições é quase sempre
composto por imagens selecionadas, que podem excluir o imponderável.
Mesmo contemplada no processo de criação fotográfica, a ação do acaso não
condiz com aquilo que Stupakoff considerava ideal na criação fotográfica. Nesse sentido, ele
primava por processos que condicionassem a feitura da imagem de acordo com um
significativo controle criativo. Nestes, ele precisava restringir, mas não ignorar, a
possibilidade do aleatório, produzindo a imagem tendo consciência da linguagem empregada
e pré-visualizando fotograficamente, nos termos de Ansel Adams 1 (ADAMS, 2002a), os
possíveis resultados obtidos através de projeção mental da imagem fotográfica final antes de
iniciada a captura do objeto.

6.1. Sobre o planejamento das fotos


Há algumas particularidades quanto ao planejamento que rege o processo de
concepção e feitura da imagem fotográfica. Para muitos fotógrafos, os estágios anteriores ao
ato fotográfico – viagens, cadernos de campo, pesquisa documental, elaboração de um
projeto – são tão importantes quanto o registro da imagem em si (SICARD, 2015a). O tempo
da criação na fotografia pode ser alargado ou diminuído dependendo das diferentes
especialidades fotográficas: o instantâneo de rua e o fotojornalismo diferem da fotografia de
moda, de projetos pessoais ou de fotos publicitárias, por exemplo.
O tempo dilatado e as etapas para realizar as fotografias são determinantes no
processo de criação em projetos fotográficos de longa duração. Nesses projetos, a dinâmica
da criação depende de uma série de fatores particulares, da gênese da ideia a ser
desenvolvida fotograficamente à pesquisa em torno do tema, passando pela preparação de
infraestrutura, equipe e logística. Todos esses aspectos terão influência no registro e no
resultado final da imagem. Trabalhos como os dos fotógrafos brasileiros Sebastião Salgado e
Araquém Alcântara encaixam-se nesse modelo. Em Gênese, a pesquisa de Salgado durou
cerca de três anos, e foram vários meses percorrendo regiões pouco exploradas ao redor do
globo terrestre, muitas das quais de difícil acesso (PERSICHETTI, 2009). As expedições de
                                                                                                               
1 Em relação a Ansel Adams, este foi capaz de realizar o controle criativo da imagem ao explorar e dominar as

características do processo fotográfico (ver principalmente o Sistema de Zonas). Com isso, promovia uma
aproximação máxima do modo como ele queria o resultado fotográfico, dependendo da interpretação desejada, e
restringia o efeito do acaso.

 
  254

Alcântara iniciam-se com pesquisas bibliográficas e consulta a pessoas que já visitaram o


local a ser fotografado. Para o fotógrafo, essas informações são úteis para “clarear sua
percepção do lugar” (PERSICHETTI, 2009, p. 36 e 37).
O trabalho fotográfico de Otto Stupakoff também apresenta particularidades
quanto às etapas de planejamento. Por exemplo, ao esboçar uma nova expedição ao Ártico
em 1989, o fotógrafo produziu um diário de viagem no qual se utilizou de seus próprios
fotogramas (produzidos em viagens anteriores à região, vide a produção das fotos da
Gentleman’s Quartetly, de novembro de 1982, apresentado na capítulo 2) para apontar
contextos geográficos e humanos do Ártico e indicar verbalmente algumas características do
lugar (Figura 165A). Na continuidade desse material (Figura 165B) também se serve de
mapas geográficos, diagramas e notas de jornal a fim de traçar rotas sobre uma região
específica que seria percorrida futuramente. Vários sistemas semióticos (FERRER, 2002) – o
verbal das anotações do fotógrafo e dos recortes de jornal que discorrem sobre o lugar, o
desenho cartográfico localizando a região visitada e os fotogramas – são utilizados como
esquema desse projeto fotográfico.
Esse diário de viagem pode ser inserido naquilo que Sicard (2015a) entende como
materiais de etapas (objetos fotográficos, textos) para realização de uma fotografia, e que
expressam as tentativas, os ensaios e os contratempos para se alcançar um resultado. No
conjunto, podem ser vistos como uma maneira particular de Stupakoff fazer o planejamento
para os projetos que irá fotografar.

 
  255

(A)

(B)
Figura 165. Diários de Otto Stupakoff (A) Diário de viagem, 1989, Ártico. (B) Diário: mapas
geográficos, diagramas e notas de jornal. Fonte: Instituto Moreira Salles

Outra característica de Stupakoff quanto ao planejamento, principalmente para


os trabalhos comissionados de moda, publicidade e retrato, estava na sua predisposição em
se aproximar e conhecer as pessoas que seriam fotografadas (no caso dos retratos), e na
estreita relação prévia com as modelos, que envolvia manter contato no estúdio ou
restaurantes, convite para leitura de livros e observação de imagens (antes da execução das
fotos de moda) como forma de fortalecer a parceria entre os dois, a fim de que a modelo

 
  256

pudesse captar os detalhes daquilo que o fotógrafo almejava transmitir pela imagem
(STUPAKOFF, 2000c). A despeito disso, nem sempre havia a oportunidade de manter esse
tipo de relacionamento em seus trabalhos comissionados, caso da rápida sessão com o
presidente Richard Nixon e sua filha Julie (citada no capítulo 5 da presente tese) e com a
atriz Juliana Paes em ensaio para a Vogue RG Brasil – aqui, a pouca proximidade prévia com
Paes acarretou na falta de tempo para “reformular a única maneira que ela possuía de posar,
tipo estatuária grega” (STUPAKOFF apud FERNANDES JUNIOR, 2006, p. 161). Essa
possibilidade de maior contato com os retratados se modifica no contexto dos instantâneos
de rua, para os quais a feitura da imagem limita-se a um tempo diminuto e menos planejado.
Na fotografia aplicada (por exemplo na publicidade ou moda), apesar da
concepção fotográfica ser do fotógrafo, alguns parâmetros criativos são condicionados por
terceiros como editores ou diretores de arte. Na fotografia publicitária, parte-se de um
briefing e/ou layout estruturado, geralmente, por um diretor de arte. Ao fotógrafo cabe
elaborar sutis variações de linguagem (como enquadramento e ângulo) sobre o tema
proposto, mas no geral a fotografia é realizada de acordo com o estipulado pelo contratante
(CÉSAR; PIOVAN, 2007). Na concepção da fotografia para a moda, muito próxima da
publicitária, o fotógrafo segue uma pauta estipulada pelo conceito do editorial, e,
necessariamente, trabalha com uma equipe de produtores que poderão integrar o processo
de criação, que é, nesse caso, eminentemente colaborativo.
Quanto à Stupakoff, a autonomia e a participação efetiva em todas as etapas do
processo de criação são características centrais no seu trabalho profissional. O escritor e
consultor publicitário Roberto Menna Barreto refere-se ao trabalho de Stupakoff na
publicidade ainda na década de 1960 como tendo sido “absolutamente criativo, capaz de
cumprir, por exemplo, a tarefa de criar fotograficamente um calendário completo para a Shell,
foi realmente um caso excepcional” (BARRETO, 2004, p.66). Nesse contexto, Barreto
ressalta que a atitude criativa de Stupakoff divergia da rotina de criação publicitária dos
profissionais da época, na qual a preponderância criativa era do diretor de arte e não do
fotógrafo; Barreto sugere ainda que, diferentemente de outros fotógrafos, Stupakoff não
seguia minuciosamente o layout e que isso não era um problema, pois desempenhava
magistralmente a criação. O próprio Stupakoff reforça essa ideia:
(...) o fotógrafo é obrigado a se enquadrar dentro das exigências de terceiros.
Todavia, por uma questão de honestidade íntima, sempre procurei colaborar
com os layoutmans, se eu puder com a máquina melhorar a sugestão a
pastel que ele me mandou, eu faço. Felizmente, a grande maioria dos nossos
diretores de arte é inteligente e tem sabido prestigiar essa atitude
(STUPAKOFF, 1960, p.21).
Sob um viés autoral, Stupakoff dizia ter total liberdade para criar desde os tempos
da Rhodia, autonomia essa chancelada por Lívio Rangan, diretor de propaganda da empresa,
que teria ficado “(...) encantado com o que eu [Stupakoff] já tinha feito e me deu toda trela

 
  257

possível para eu poder trabalhar em cima e criar” (STUPAKOFF apud MENDES; ARRUDA,
2001, p. 9), e por Licínio Almeida, diretor de arte, que dizia a Stupakoff “não adianta eu ficar
fazendo aqui um esquema, eu sei que você vai mudar tudo” (ALMEIDA apud MENDES;
ARRUDA, 2001, p. 9). Na editora Abril, Luís Carta contratou Stupakoff permitindo liberdade
para criação (STUPAKOFF, 2000a); Thomaz Souto Corrêa reitera essa capacidade criativa de
Stupakoff ao afirmar que este tinha uma expressiva cultura iconográfica e um olhar
diferenciado se comparado aos demais nomes da fotografia aplicada brasileira da época
(CORRÊA, 2017).
A despeito dos depoimentos de Stupakoff sobre o tema datarem da década de
1960, a ideia da liberdade, mesmo nas fotografias por encomenda, repete-se na conduta
criativa de Stupakoff por toda a sua carreira. Ele defendia a liberdade do fotógrafo propor uma
ideia concreta e válida ao cliente para além do que lhe foi encomendado e não se sujeitar a uma
ideia imposta (STUPAKOFF, 1978a). Em Nova York, ele por vezes negou trabalhos não
condizentes com sua maneira de fotografar, inclusive para a Harper’s Bazaar; nesse sentido,
dizia: “tenho a impressão de que sempre fiz o que quis fazer e quando não fiz, mudei de
caminho” (STUPAKOFF, 1978a). Fica evidente em outra fala de Stupakoff que este
responsabilizava o fotógrafo por criar condições favoráveis de trabalho:
É preciso dispender uma grande quantidade de energia para criar as
condições de execução de um trabalho. É preciso dedicação, tempo, trabalho.
Cria-se aquele mito de que lá fora é mais fácil, mas na verdade lá fora
também não é fácil fazer exatamente o que se quer”2 (STUPAKOFF apud
BAHIANA, 1979, p. 86).
Quando Stupakoff sentiu que não teria mais a liberdade de ser criativo, desligou-
se da fotografia na década de 1990, confidenciando que: “Eu não estava mais acostumado
com isso [sobre a interferência criativa de produtoras de moda e diretores de arte]. Aguentei
alguns anos...” 3 (STUPAKOFF, 2000c, p. 14) tendo retomado sua produção fotográfica
apenas nos anos 2000, ao que Sérgio Burgi (2017) interpreta mais como resultado do ‘resgate’
de Stupakoff que por sua própria pulsão pessoal.
O conhecimento das etapas preparatórias da fotografia aplicada permite
reconstruir ao menos parte da maneira como o fotógrafo pensa a imagem de acordo com seu
uso. O editorial de revista, por exemplo, pressupõe um diálogo entre texto e imagem
encerrados em um formato de página. O fotógrafo, consciente dessa estrutura comunicativa,
sabe que sua imagem compartilhará espaço com outros elementos do layout da página,
podendo estender a comunicação com componentes de outras páginas, em uma sequência

                                                                                                               
2 Essa conduta de criar condições para se fazer a fotografia à maneira do fotógrafo também pode ser vista em

Sebastião Salgado quando cita o exemplo da reportagem da Etiópia e explica que impôs às revistas sua maneira de
trabalhar [em preto e branco e independente de qualquer orientação] e pode fazer seu trabalho dentro dos seus
princípios (PAIVA, 1989, p. 85).
3 Sobre isso ainda cita um grave desentendimento entre ele e uma editora no seu penúltimo trabalho de moda

antes do retorno ao Brasil em meados de 2000. A editora de moda tentava direcionar a fotografia sugerindo a
Stupakoff enquadramentos e posicionamento de câmera (STUPAKOFF, 2000c).

 
  258

linear ou conceitual. Assim, o conhecimento do fotógrafo sobre a configuração da página na


qual seu trabalho será publicado é de importância significativa para o seu processo de criação
fotográfica.
Ao refletir sobre a fotografia moderna em meados do século XX, Irving Penn
ressaltou que o fotógrafo moderno via o produto final como sendo a página impressa e não a
impressão fotográfica, destacando a importância do fotógrafo ter consciência de que sua foto
poderia ser vista muitas vezes e apressadamente (na sala de espera de um dentista, por
exemplo). Para Penn4, o fotógrafo moderno teria aprendido a economia de efeitos como um
artista gráfico e essa necessidade de trabalhar considerando a maneira como a imagem seria
publicada na página impressa e sua pouca perenidade se tornaria quase uma parte instintiva
da sua arte. Os trabalhos comissionados de Stupakoff inserem-se nessa tradição.
Na obra de Stupakoff, um exemplo sobre o planejamento para a concepção da
fotografia de moda é o editorial com a atriz Juliana Paes publicado na Vogue RG Brasil (de
junho de 2006). Sobre ele, Stupakoff relatou suas decisões frente a algumas adversidades da
produção: ele teve somente duas horas de luz ideal para realizar imagens para as oito páginas
do editorial. Nas suas palavras:
[...] vou fazer três fotos horizontais para cada foto ocupar duas páginas, com
três fotos eu resolvo seis páginas. Para não ficar muito monótono, tomei a
decisão de fazer duas páginas individuais, uma dela parada, em pé, entre
rochas e cachoeira, num furo dentro da floresta da Tijuca (STUPAKOFF
apud FERNANDES JUNIOR, 2006, p. 168).
É possível identificar que a maneira como Stupakoff concebeu as imagens para
este editorial estava diretamente conectada ao tipo de projeto gráfico e layout da revista. Isso
sugere que sua formação em artes visuais, aliada à sua experiência profissional, foram
subsídios para que ele pensasse as fotos de acordo com os processos gráficos, também
levando em consideração a influência das condições da luz na captura e no resultado estético
das imagens.
Para o trabalho da Vogue em Portugal (1989) Stupakoff recebeu um exemplar da
revista do mês anterior, uma forma dele conhecer o projeto gráfico e editorial da revista para
o qual estava colaborando e, de certa forma, direcionar sua criação para aquele veículo
(apesar de Stupakoff à época ter sólido conhecimento das revistas do grupo Conde Nasté,
para as quais já havia fotografado inúmeras vezes). No entanto, mesmo compartilhando do
mesmo projeto gráfico, as publicações regionais apresentam certas particularidades para que
não se perca a unidade visual entre as edições de países diferentes.
Dentro do contexto de criação deste editorial em Algarve, Fernando Laszlo
(assistente de Stupakoff para esse trabalho) nos informa que Stupakoff peregrinava pela
cidade portuguesa a fim de determinar possíveis locações. Como as páginas da revista

                                                                                                               
4 Irving Penn discursou no simpósio “O que é fotografia moderna?” no MoMA, Nova York em 20 out. 1950,

gravação de WNYC Radio Archive Collection.

 
  259

apresentariam uma mescla de fotografias em preto e branco e cor (Figura 166), Stupakoff
predeterminava o filme a ser utilizado no dia anterior à sessão de fotos (LASZLO, 2017). No
entanto, Laszlo reforça que durante à sessão de fotos, por vezes Stupakoff mudava o
planejamento e resolvia usar um filme não solicitado ao assistente. Esses apontamentos
mostram que, dependendo da situação encontrada no dia, havia uma variação de desígnios
mesmo em uma produção pré-estabelecida, o que revela as alternâncias das intenções de
Stupakoff durante a criação em curso.

Figura 166. Editorial Algarve: cor e preto e branco. Fonte: Instituto Moreira Salles.

Ainda quanto ao planejamento, outro exemplo está no seu trabalho para a revista
MIT, de junho de 2008, o último editorial de moda feito por Stupakoff. A preparação do
editorial envolveu a reunião da equipe no local – uma fazenda histórica do período imperial
brasileiro – dias antes da execução das fotos. Frente ao fator equipe, em que o fotógrafo
necessariamente depende de uma gama de pessoas para realizar a produção (stylist,
produtores, diretor de arte), outra conduta criativa de Stupakoff se pautava em reunir
previamente o grupo de profissionais e determinar diretrizes criativas, tais como a pesquisas
de obras artísticas, de filmes e outros materiais culturais que os auxiliassem na concepção da
ideia para o trabalho. Esse foi o caso na execução do referido editorial para a MIT, para o
qual Stupakoff mostrou as diretrizes criativas logo na primeira reunião de equipe,
distribuindo cópias de fotos de trabalhos antigos dele e uma quantidade de imagens de
pinturas do Oitocentos contendo grupos de pessoas (ROMÃO, 2016). Todo esse arcabouço
imagético clarificou o entendimento do grupo quanto a concepção visual imaginada pelo
fotógrafo para o editorial e direcionou o trabalho da produtora de moda, Jussara Romão, que
baseou a tabela de cores e a proposta de vestuário nas imagens prévias discutidas por
Stupakoff e a equipe. Durante os três dias reservados para a execução das fotos, Stupakoff
indicava à produtora o lugar, os detalhes e como visualizava a cena. Os modelos eram

 
  260

fotografados em situações usuais – andando, conversando, comendo, amamentando – que


deram a tônica do ensaio (ROMÃO, 2016).
Esse tipo de planejamento pode ser entendido como um rascunho da criação que
visa estruturar o trabalho fotográfico, reforçando a ideia de que os estágios anteriores ao ato
fotográfico são muitas vezes cruciais para o sucesso do registro da imagem. Como abordado
nos exemplos acima, na fotografia publicitária e de moda, o fotógrafo realiza um
planejamento antecipado que faz parte do seu processo criativo, diferindo, portanto, do
“instante decisivo” de Cartier-Bresson (2007 [1952]). Assim, a foto publicitária e de moda –
comissionada e envolvendo planejamento –, contrapõem-se à fotografia de rua, na qual o
fotógrafo depende do imponderável, como na straight photography (fotografia direta), em
que o instantâneo pode vir de um interesse pessoal momentâneo do fotógrafo frente à
alguma dinâmica que se coloca à sua frente.
É interessante notar que, mesmo sem um planejamento, a fotografia de rua era
vista por Stupakoff como “um grande momento de seleção” (STUPAKOFF, 1978a,
45min20seg) no sentido de que o fotógrafo deveria se abster do disparo ocasional (algo
propício no contexto desse tipo de fotografia), primando por delimitar, a partir da sua
própria linguagem pessoal, aquilo que se propusesse a abordar do cotidiano da rua:
Aquilo que você viu de inusitado tem algum valor para você? Para qual você
pode contribuir na forma de linguagem ou você está simplesmente
reproduzindo uma foto [de alguém]?” (STUPAKOFF, 1978a, 45min20seg).
A despeito de qualquer prática fotográfica e sob uma perspectiva mais ampla do
planejamento criativo, Stupakoff acreditava ser vital ao fotógrafo esclarecer para si aquilo
que almejava comunicar antes de iniciar qualquer trabalho, de modo a não tornar confusa a
produção fotográfica (STUPAKOFF, 1978a).

6.2 O contador de histórias como traço criativo


A observação de algumas sequências do acervo do Instituto Moreira Salles, de
imagens individualizadas e trabalhos comissionados publicados, conjuntamente a
depoimentos de terceiros, apontam a contação de histórias como parte do processo de
criação de Stupakoff. Apesar de também se utilizar da expressão verbal através de textos
ensaísticos e ficcionais 5 , é na fotografia que ele encontra seu principal veículo para a
construção de narrativas.
Em muitas de suas obras, Stupakoff estabelecia uma narrativa visual pela
maneira como elaborava seus editoriais de moda: via arranjo visual e encadeamento das
imagens nas páginas da revista. Outras vezes, a narrativa era estabelecida pela conexão de
imagens dentro de uma sequência fotográfica e também no modo de planejar uma produção.
Esse senso de narrativa de Stupakoff está posto em alguns de seus editoriais, dos quais
                                                                                                               
5 Três desses textos podem ser lidos no livro Sequências: Otto Stupakoff, do Instituto Moreira Salles, 2009.

 
  261

destacamos: O pacote perseguidor para a revista Cláudia (publicado em dezembro de 1963),


Gentlemen preferer blondes (de setembro de 1972) e The Young you (dezembro de 1972),
ambos para a Harper’s Bazaar.
No editorial com oito páginas intitulado O pacote perseguidor, Stupakoff, além
das fotografias, é co-autor do argumento em colaboração com Thomaz Souto Corrêa.
Primeiramente, destaca-se o fato de um fotógrafo também elaborar o texto de um editorial de
moda. Neste ensaio, a narrativa transparece tanto pela articulação entre imagem e texto,
quanto pelo encadeamento das imagens página a página. A primeira página do editorial é
dedicada aos créditos e apresenta uma sinopse que indica, para as próximas páginas, a
presença de uma fábula misteriosa de Natal apresentada em forma de “narrativa visual com
seis fotografias, oito fotografiazinhas e três frações fotográficas intituladas” (Figura 167A). A
trama se pauta em uma viagem de trem com as modelos Birgitta e Paula em cena junto a
vários outros personagens representados pelo ator e apresentador Jô Soares, que carrega um
pacote misterioso.
Nas páginas seguintes o encadeamento da história acontece sob a forma de uma
narrativa de mistério: na página 65 (figura 167B) o clima de mistério é acentuado pela
construção da imagem em preto e branco em contraste, a qual, aliada ao figurino das
personagens/modelos com sobretudo e à postura das personagens frente à câmera, alude ao
cinema noir6. Na página 68 (figura 167E), as cenas ocorrem dentro do trem e o recurso usado
por Stupakoff nessa página do editorial foi o de dispor oito imagens menores que, tomadas
sequencialmente, em leitura de cima para baixo, e da esquerda para a direita, somadas à
inserção textual no quadro ao pé da página, apresentem a ideia de encadeamento de uma
ação. As duas páginas finais (figura 167G e H) mostram que o mistério da narrativa está
relacionado ao Natal – no intitulado “pacote perseguidor” encontra-se uma árvore de Natal –
e nelas fica implícito o uso da elipse temporal com clara omissão de minutos ou horas entre o
acontecimento da imagem da página 70 – as personagens desembarcando do trem com os
tailler azul e rosa – e da página 71 –, o trem partindo com o Papai Noel e as personagens
femininas em conjunto preto e azul para noite (Figura 167H). Aqui se percebe mais uma
referência à narrativa sequenciada, na qual a mudança de alguns elementos em uma mesma
cena denunciam a passagem do tempo (SPINELI, 2017).

                                                                                                               
6 Subgênero do cinema, especialmente relevante nos EUA, que apresenta estilo visual de fotografia em preto e

branco com claros e escuros acentuados, e histórias de detetive nas quais geralmente personagens femininas
rompem com a moral maniqueísta.

 
  262

(A) (B) (C) (D)

(E) (F) (G) (H)

 
Figura 167. Editorial O pacote perseguidor, Revista Claudia, dezembro de 1963. (A) Pg. 64 (B)
Pg. 65 (C) Pg. 66 (D) Pg. 67 (E) Pg. 68 (F) Pg. 69 (G) Pg. 70 (H) Pg. 71.
Fonte: Reprodução de Claudia/Biblioteca ECA - SP.

Stupakoff já era consciente da potencialidade do aspecto ‘cinematográfico’ de


suas imagens desde as páginas produzidas para a Rhodia:
(...) na época dos meus trabalhos para a Rhodia muita gente dizia que, pela
primeira vez, eles esperavam a saída da revista como se fosse o lançamento de
um novo filme, porque nós fazíamos uma fotografia muito cinematográfica”
(STUPAKOFF apud MENDES; ARRUDA, 2001, p. 9).
O sentido de narrativa de Stupakoff também está presente em Gentlemen
preferer blondes, para a Harper’s Bazaar (de setembro de 1972) (Figura 168). A sinopse
baseia-se no relacionamento entre uma mulher e um homem mais velho (personagem
representado por Jua Haffers, comerciante internacional de café). O conjunto de imagens
mostra o casal chegando a uma embarcação marítima, que sugere uma viagem luxuosa,
notável pelas roupas de ambos, os objetos em cena e a ambientação, bem como pela
referência no título do editorial ao clássico de Howard Hawks, Os homens preferem as loiras
(de 1953), no qual a personagem de Marylin Monroe tem paixão por diamantes e homens
ricos. As sequências desenrolam uma narrativa registrando diversas situações entre o casal
durante essa viagem. Como em O pacote perseguidor, a mudança de elementos em cena
sugere a passagem do tempo

 
  263

Figura 168. Editorial Gentlemen preferer blondes, Harper´s Bazaar, setembro de 1972.
Fonte: Reprodução da revista.

Em The Young you, editorial para a Harper’s Bazaar (publicado em dezembro


de 1972) (Figura 169), há uma relação entre uma mulher e uma criança, indiciando serem
mãe e filho. Em um contexto urbano, os personagens estão inseridos em um cotidiano
familiar apresentado na primeira página por uma série pré-ordenada de acontecimentos –
quando as fotografias desenrolam uma ação contínua de uma situação ou evento – em
quatro imagens que propõem a relação entre mãe e filho em cenas do dia-a-dia, assim como
na página seguinte.

 
  264

Figura 169. Editorial The young you, Harper’s Bazaar, dezembro de 1972.
Fonte: Reprodução da revista.

A narrativa explícita nos editoriais citados acima é estabelecida pela ordem visual
e direção de leitura que trazem uma ideia de sequencialidade temporal. Junto a uma imagem
fixa, a disposição, pose e ação dos personagens na composição sugerem um antes e um
depois. Essa composição permite que o leitor imagine as ações das figuras impressas na
imagem pelos seus gestos, complementando o instante registrado e, consequentemente,
construindo o sentido de uma história sendo contada.
No processo de criação dos layouts das páginas para a Harper’s Bazaar, as
imagens impressas eram distribuídas pelas paredes e pelo chão a fim de se chegar a um arranjo
que pudesse servir ao propósito de linguagem da publicação como arte sequencial (na visão do
diretor de arte da revista no período, Alexey Brodovitch). Para Brodovitch, revistas e livros
deveriam ser entendidos como um todo sucessivo, uma onisciência do fuso contínuo das
páginas destinada a manter um ritmo de leitura variado, o que os aproximava da narrativa
cinematográfica; esse efeito também era buscado pelo uso de outros recursos como cortes,
fusões, zoom, planos e contra planos, por sua vez também emprestados do cinema (FEITLER,
2012). Tendo em vista essa característica na diagramação da Harper’s Bazaar, pautada nas
páginas de uma dupla sempre em diálogo, i.e., páginas dispostas uma ao lado da outra
relacionadas entre si independentemente do seu papel na sequência global da leitura, as
fotografias de Stupakoff favorecem tal tipo de construção.
O Stupakoff como contador de histórias através de narrativas visuais também se
faz presente em várias de suas sequências com fotos de família (e.g., Figuras 170, 171 e 172).
As sequências nas folhas de contato revelam uma história implícita – o trajeto de um passeio

 
  265

em família – que pode ser visualizada no modo como Stupakoff constrói o encadeamento
temporal dos fotogramas. Essa reflexão sobre a linguagem fotográfica a partir da construção
da narrativa permitiu a Stupakoff empregar um sentido de sequência e continuidade em seu
modo de construir a imagem fotográfica.

Figura 170. Folha de contato mostrando fotogramas da viagem de Stupakoff e família para a
Disney (ca. 1970). Fonte: Instituto Moreira Salles.

 
  266

Figura 171. Folha de contato mostrando fotogramas da viagem de Stupakoff com a família para a
Disney (ca. 1970). Fonte: Instituto Moreira Salles.

 
  267

Figura 172. Folha de contato mostrando fotogramas da viagem de Stupakoff e família para a
Disney (ca. 1970). Fonte: Instituto Moreira Salles.

Outras vezes a narrativa está inserida em seu processo de criação. Segundo


Jussara Romão (2016), Stupakoff criou um enredo para o editorial da MIT publicado em
junho de 2008 (Figura 41, 173 e Apêndice XII): casal de jovens apaixonados, o rapaz escreve
uma carta para a moça, uma mistura de juventude de época (no Brasil Imperial) com amor

 
  268

não correspondido. A partir desses elementos, Stupakoff procurou contar, juntamente com a
equipe de produção, uma história através do encadeamento das imagens. O editorial seria
algo parecido a um filme a ser fotografado, a ponto de Romão (2016) sentir que estava
compondo um figurino para uma obra cinematográfica.

Figura 173. Página revista MIT, junho, 2008. Reprodução da revista/Coleção da autora.

Como citado acima, a forma como Stupakoff empregava certas diretrizes de


criação para contar suas histórias se aproxima das características da narrativa audiovisual. A
inclinação do fotógrafo para com as artes cinematográficas se inicia em tenra idade, visto que
sua primeira intenção de atuação profissional era o cinema (conforme discutido no capítulo 1
da presente tese), e perdura ao longo de sua vida. Isso pode ser verificado na sua na produção
de curtas-metragens e documentários, como o seu pioneiro curta de ficção A missão (de
1951), seus diversos vídeos em 8mm e outros formatos – alguns de capturas feitas durante o
trabalho fotográfico e um especial autobiográfico no qual mostra algumas de suas casas, seus
filhos – não publicados ou divulgados7 (LASZLO, 2017), o documentário Cambodia Jokes de
1999 sobre as vítimas do Khmer Vermelho no Camboja (feito para o fundo humanitário
Cambodia Trust), entre outros. Dessa forma, parece natural a utilização por Stupakoff de
recursos visuais que se aproximem da imagem em movimento, incorporando, nesse sentido,
referências de outras linguagens em seu trabalho fotográfico.

6.3 Quem se preocupa em excesso com a técnica, esquece o que quer dizer
O processo criativo na fotografia acontece na articulação entre os componentes de
ordem material – equipamentos e materiais fotográficos – e os de ordem imaterial –
repertório pessoal, experiência, filtros psicológicos, ideológicos, demandas mentais e

                                                                                                               
7 Esse material não se encontra no IMS. Acredita-se que esteja com algum de seus filhos.

 
  269

culturais (KOSSOY, 1999). Segundo Kossoy, os componentes de ordem imaterial prevalecem


sobre os de ordem material e se pronunciam nas ações e na mente do fotógrafo ao longo do
seu processo de criação. Para dar corpo às suas criações, experiências e ideias estéticas, o
fotógrafo utiliza os meios – câmera, acessórios, objetiva, papéis, filmes, CCD, i.e, um
conjunto de materiais, ferramentas e técnicas – que são elementos concretos que se colocam
ao serviço de quem cria (PFÜTZENREUTER, 1995).
Stupakoff compreendia a técnica como parte do domínio do processo fotográfico
e meio pelo o qual o fotógrafo materializaria e traduziria as formas mentais de percepção e
visualização do referente fotográfico em imagens. No entanto, ele ponderava que o
equipamento deveria auxiliar o fotógrafo a transmitir uma ideia e não ser condicionante para
a criação fotográfica (STUPAKOFF, 1960), visto que “quem se preocupa em excesso com a
técnica, esquece o que quer dizer” (STUPAKOFF, 1978a). Para ele, “O fotógrafo iniciante
pensa muito na técnica e pouco no conteúdo” e ainda “Recomendo agir em sentido
exatamente oposto: primeiro é preciso ver ou imaginar o que se deseja fotografar e só então
pensar na maneira de fazê-lo” (FOTOGRAFAR..., 1963, p.2).
As citações acima permitem afirmar que Stupakoff considerava os componentes
de ordem imaterial – conforme a classificação de Kossoy (1999) –, sustentados pela técnica e
pelo pensamento fotográfico, como determinantes na criação fotográfica, defendendo a
importância de se transcender a técnica, vista por ele como uma questão mecânica e
desprovida de sentido se o fotógrafo não tivesse algo a dizer (STUPAKOFF, 1978a). Nas suas
palavras:
(...) o fotógrafo depende de meios mecânicos que devem ser dominados e
jamais dominar. Os passos que devem ser seguidos desde a seleção do
motivo até seu arranjo, seu registro, sua revelação e sua cópia, estão de tal
maneira cercados de armadilhas, que às vezes dá vontade de desistir na
metade (FOTOGRAFAR..., 1963, p.2).
Esse modo de pensar a fotografia não é exclusivo de Stupakoff e está em
consonância com a percepção de outros fotógrafos. Cartier-Bresson (2007 [1952]), por
exemplo, ressaltava a técnica como um importante meio para comunicar o que se vê, sendo
necessário adaptá-la à própria maneira pessoal de olhar de cada fotógrafo. O fotógrafo
alemão Franz Roh (2007 [1929]), por sua vez, defendia não ser suficiente dominar o
instrumento fotográfico, mas que o fotógrafo precisaria ter personalidade, como em qualquer
outra área da criação artística. Nas ponderações de Cartier-Bresson, Roh e Stupakoff está
inscrita a percepção do fotógrafo e sua visão de mundo como preponderantes na criação de
imagens, para além dos componentes materiais.
No entanto, Stupakoff concordava que há um complexo processo entre o pensar
criativamente e o fazer criativamente que exigiria domínio técnico por parte do fotógrafo
(STUPAKOFF, 1960). Para ele, na esfera da técnica está inscrita a capacidade do fotógrafo
diferenciar aquilo que vê do que a objetiva da câmera visualiza: “a intenção do fotógrafo pode

 
  270

estar carregada de emoção, diferentemente da objetiva, que capta o momento friamente”


(grifo nosso) (MAURICIO, 1956, p. 12). Fisiologicamente a visão se faz pela relação entre a
luz que incide nos fotorreceptores do olho e a constante interpretação desses estímulos
visuais pelo cérebro, fenomenologicamente na percepção pelo olhar estão embutidas
vivências e experiências prévias (MERLEAU-PONTY, 2005). Esses parâmetros são diferentes
da estrutura ótica da objetiva quanto à formação da imagem.
Sobre isso Stupakoff ressaltou que:
É necessário que o fotógrafo saiba selecionar, porque não é possível
fotografar as coisas como nossos olhos veem. A câmara as vê de maneira
diferente. Esse critério seletivo do fotógrafo é que o difere do amador e
faz diferença entre um simples instantâneo e uma boa fotografia
(STUPAKOFF, 1960).
A partir dessa constatação, é possível dizer que Stupakoff considerava o ato de ver
fotograficamente, no sentido de antecipar o resultado registrado no material sensível como
parte do domínio criativo do fotógrafo e de conseguir discernir que a criação não é igual ao
observado, como um dos pontos fundamentais do ato fotográfico, perspectiva essa que
converge com a de outros fotógrafos como Weston (2003 [1964]) e Adams (2002a). Edward
Weston (2003 [1964]) entendia que ver fotograficamente era traduzir instantaneamente os
elementos e valores tonais de uma cena para a fotografia, visualizar o referente de acordo
com a capacidade dos instrumentos de registro, e ter controle suficiente do seu equipamento
e dos processos fotográficos para determinar o resultado final da imagem. Para Ansel Adams
(2002a), o conceito de visualização era o processo consciente de projetar mentalmente a
imagem fotográfica final antes de iniciar a captura de fato do objeto, como a aplicação do
Sistema de Zonas (apresentado no capítulo 3), que propõe a antecipação e pré-visualização
fotográfica utilizando-se de uma escala tonal. Adams estava convencido de que todos os
fotógrafos de qualquer corrente estética “vêem a fotografia final de algum modo antes de
completá-la, seja pela visualização consciente ou por qualquer outro método intuitivo”
(ADAMS, 2002a, p.17).
Há nesse argumento um sentido semiótico de que para produzir o signo
fotográfico 8 o fotógrafo elabora a mediação sígnica entre aquilo que viu/sentiu e aquilo que
registrou. Se a relação do fotógrafo com a natureza é mediada pelo aparelho, determinando
a experiência que o sujeito tem com seu entorno, esse tipo de relacionamento é traduzido
em imagens que representam para o fotógrafo a sua visão fotográfica do mundo (COSTA;
SILVA, 2004).
Em relação à câmera como ferramenta, ao mesmo tempo em que a percepção do
fotógrafo é conduzida para o registro através do aparelho, fotografar é também um modo

                                                                                                               
8 “A representação é a operação semiótica, é o processo cognescente pelo qual o sujeito possui e produz signos. O

signo é sua única possibilidade de mediação com a realidade, de conhecer a realidade material e de conviver com
ela” (FERRARA, 1981, p.57).

 
  271

específico de ver a partir da câmera, sendo que a percepção é intermediada pela tecnologia.
Por conseguinte, a câmera seria algo mais complexo que apenas uma ferramenta para
registrar a imagem.
A despeito disso, Stupakoff ressaltava que o equipamento, apesar de necessário
para a boa qualidade fotográfica, seria secundário na criação. Dentro da perspectiva da
técnica como algo mecânico, ele classificava o uso da câmera como algo automático, assim
como dirigir um automóvel, quando não se pensa mais na troca de marchas (STUPAKOFF
1978b). Nesse aspecto, para ele “quanto mais simples a câmera, melhor” e “(...) quanto mais
automático ficar [o processo de registro da imagem fotográfica], mais tempo me dá para
pensar” (STUPAKOFF apud FERNANDES JÚNIOR, 2006, p. 163). Para Stupakoff, a
fotografia seria a extensão do seu pensamento:
Acho que é tudo igual, trabalho com qualquer um [aparelho]. (...) Porque a
fotografia é um processo que vem de dentro para fora, nunca de fora para
dentro. Para fotografar, uso basicamente a cabeça e o coração. Há os que
fotografam para ganhar a vida. Sou daqueles para quem a fotografia
representa uma maneira de viver. (STUPAKOFF, 2006b, p. 12)
E ainda:
Não gosto de discutir técnica, portanto a minha resposta é a seguinte: a
câmera, o filme, o chip, tudo isso não tem significado nenhum, porque as
câmeras são todas iguais; elas simplesmente registram o teu sentimento. E
você não fotografa com a câmera e sim com tua mente e o coração
(SAMPAIO, 2007).
Dentro dessa perspectiva, Stupakoff compara a câmera com outros dispositivos
técnicos que se interpõem entre ele e o mundo e minimiza a preponderância desse aparelho:
“Certas vezes não me dou conta do visor, não mais do que de um par de óculos. Outras vezes
as coisas me parecem mais como se estivessem por trás de uma parede. Esta ou aquela
sensação dependem de mim naquele momento, se estou realmente ali ou não” (STUPAKOFF
apud NOGUEIRA, 1979, p. 52). Podemos visualizar em outro comentário que essa linha de
pensamento acompanha Stupakoff desde os primórdios de sua atuação como fotógrafo: “O
equipamento é necessário como os pincéis para o pintor. É indispensável que seja de boa
qualidade: deve ajudar o fotógrafo a transmitir a sua ideia. Uma vez que funcione em ordem,
torna-se elemento secundário na criação” (STUPAKOFF, 1960, p. 22).
No entanto, sob a perspectiva da crítica de processo, os meios de concretização da
obra ou formas de ação que envolvem manipulação e consequentemente a transformação da
matéria são tidos como recursos criativos (SALLES, 2013). Do ponto de vista de Pareyson
(1989), as características físicas da matéria influenciam na linguagem e, consequentemente, na
criação, assim como “a intenção formativa se define como adoção da matéria, e a escolha da
matéria se efetiva como nascimento da intenção formativa” (PAREYSON, 1993, p.47). Tanto a
escolha de uma matéria quanto a intenção acontecem no momento em que a criação se inicia.
Nesse sentido, os recursos da máquina fotográfica – assim como a técnica de captura, a escolha
de acessórios, dos materiais sensíveis e do equipamento como um todo – são os meios que

 
  272

determinam um caminho para a expressão através da linguagem fotográfica e influenciarão no


resultado final da imagem.
No que tange ao tipo de equipamento e material fotográficos, estes pressupõem
usos e resultados específicos. Quanto a isso, Stupakoff afirmava ter possuído, no começo de
carreira, câmeras de grande formato com filmes em chapas de 8X10 polegadas (20X25 cm,
que utilizou tanto em estúdio quanto para fotografias de rua para a moda) (Figura 174A) e
4X5 polegadas (10X12 cm) (Figura 174B) (MENDES; ARRUDA, 2001). Ele utilizava esses
modelos especialmente para fotografar retratos, moda e still life, tendo-os mantido por toda a
sua vida (FERNANDES JUNIOR, 2006). Os modelos supracitados usam especificamente
películas de grande formato, que produzem uma ou duas molduras por negativo. Essas
câmeras, também conhecidas como câmeras de vista, apresentam fole flexível entre a lente e
a película, com amparo que controla a ascensão, queda, inclinação, e balanço do fole. Esses
movimentos determinam o efeito da luz sobre o filme, o que permitia a Stupakoff ajustar a
nitidez da imagem e profundidade de campo.
Para Stupakoff, os retratos feitos em grande formato eram mais fixos e formais
pelas características do equipamento (OLIVANI, 2005). A exigência do grande formato
também era condição para os primeiros trabalhos em revista de moda devido a sua qualidade
fotográfica, já que as revistas não comportavam outro tipo de captura (MENDES; ARRUDA,
2001). Por conseguinte as fotos de moda eram mais rígidas (ver Figura 16 e Apêndice V). A
35 mm, ao contrário, confere maior liberdade de postura e ação; era apreciada por Stupakoff,
o que pode ser ilustrado por seu comentário sobre a série com Oskar Werner em 1965: “ (...)
foi com a 35mm, graças a Deus, agora eu podia trabalhar com mais sossego” (STUPAKOFF,
2000b, p. 11). O fotógrafo também tinha apreço pelas câmeras de médio formato (possuia
uma 120mm), mais leves e menos robustas em relação à grande formato.

 
  273

(A) (B)

(C)
Figura 174. Otto Stupakoff em ação com câmeras. (A) Fotografando com um modelo 8X10
polegadas, 1969. (B) Modelo 4X5 polegadas e TRL (ca. 1960). (C) Otto Stupakoff fotografa Pierre
Verger com 35 mm, 1980. Fonte: Instituto Moreira Salles.

De acordo com Stupakoff, este afirmava não recordar ter utilizado o formato
35mm no início de carreira (considera que talvez tivesse algum modelo de câmera Leica)
(MENDES; ARRUDA, 2001), o que só viria a acontecer mais tarde. O material depositado no
IMS nos permite constatar uma significativa produção de Stupakoff com câmeras desse
formato, uso que também pode ser depreendido a partir de imagens do fotógrafo utilizando
esse tipo de equipamento (e.g., Figura 174C). O que se percebe é que ás vezes ele produzia um
mesmo trabalho em diferentes formatos e suportes. No trabalho do Camboja, por exemplo, a
produção contém 35mm, médio formato e cromos.
Ainda que tenha negado a importância do tipo de equipamento utilizado,
Stupakoff explicitamente valorizava a Hasselblad por esta apresentar nitidez superior, a qual
achava uma qualidade essencial no trabalho fotográfico (STUPAKOFF apud FERNANDES
JUNIOR, 2006). Sobre a valorização de qualidades como máxima nitidez e a fiel tradução da
escala tonal, Stupakoff se dirige a um corpus de trabalho empregado por fotógrafos como
Eugène Atget, Alfred Stieglitz e Edward Weston. Segundo Fontcuberta, dar valor às
qualidades citadas seria “um repertório programático segundo o qual os fotógrafos teriam
assumido a origem óptico-mecânica de seu meio” (FONTCUBERTA, 2010, p. 72).

 
  274

Ainda como equipamento, Stupakoff apontava a objetiva normal como aquela que
oferecia seu enquadramento ideal, pois resultava na imagem que mais se aproximaria daquilo
que ele visualizava (STUPAKOFF, 1978a). O fotógrafo dizia não saber o que fazer com uma
teleobjetiva nem com uma grande angular (ponderamos que essa seja mais uma força de
expressão para mostrar a preferência pela objetiva normal, visto que algumas de suas imagens
e o depoimento de Fernando Laszlo (2017) confirmam o uso de teleobjetiva) e também que não
utilizava nenhum filtro (como por exemplo, os Filtros C.C para a correção de cor) para corrigir
a imagem argumentando ter “verdadeiro horror a essas correções” (STUPAKOFF, 1978a), e que,
de certa forma, evitava o uso de recursos que afastariam a possibilidade de captação da câmera
fotográfica quando comparada à visão habitual do olho nu. Importante observar que esse
pensamento de não utilizar efeitos e correções diverge da fotografia publicitária; uma de suas
práticas profissionais, que por vezes se utiliza desse tipo de recurso e truques para estabelecer a
mensagem na imagem.
Ainda da perspectiva dos componentes de ordem material na criação fotográfica,
Stupakoff utilizou predominantemente os filmes Kodak preto e branco Tri-X e os coloridos
Kodachrome 9 (STUPAKOFF apud FERNANDES JUNIOR, 2006) e Ektachrome como
materiais sensíveis, informação esta que pôde ser confirmada pela análise do material
depositado no IMS tanto nas Caixas 1 e 2 quanto nos envelopes.
Abordando o trabalho com o negativo, dentro da perspectiva do inacabável
(conforme discutido no capítulo 3), uma particularidade da fotografia está na possibilidade
de se ampliar fotogramas diferentes registrados em sequência a partir do mesmo negativo
através da seleção das fotos que serão copiadas (assunto tratado nos capítulos 3 e 4) e da
escolha da maneira como o negativo será copiado (que pode variar por conta do uso de
formatos, papéis e do ajustes de grãos, entre outros) (SOULAGES, 2010). Nesse aspecto, para
Stupakoff a técnica deveria estar condicionada ao tipo de material utilizado: escolher o papel
correto para determinado negativo10, por exemplo (STUPAKOFF, 1978a).
Ao menos duas situações ilustram a necessidade explícita do controle técnico de
Stupakoff em relação às suas fotografias. Na ocasião da exposição no MASP-1978, o fotógrafo
afirmou que o resultado satisfatório da ampliação de suas imagens, feita no Laboratório Cine
Fotográfico Foto Curt11, teria sido motivado por sua participação direta no processo junto ao
especialista – e proprietário do laboratório – Kurt Werner Schulze (STUPAKOFF, 1978a).
Nesse ponto, Stupakoff deixa claro que ele considerava o fotógrafo como quem deveria tomar
controle de sua própria produção, i.e, não importaria tanto o lugar onde os negativos seriam
                                                                                                               
9 O diapositivo Kodachrome – atualmente descontinuado – possibilitava grandes ampliações (por apresentar

ausência de grão) e se destacava pela qualidade na reprodução de cores, ambos aspectos pertinentes para o tipo de
publicação para qual eram veiculadas as fotografias de Stupakoff.
10 Aqui se refere aos variados tipos de papeis que apresentam diferenças nos contrastes, nos tipos de base

(resinados, fibra) e tons (amarelados ou warmtone), por exemplo, e que influenciam no resultado final.
11 O laboratório Cine Fotográfico Foto Curt, de Kurt Schulze, a partir de 1955 passou a ser somente laboratório

(antes era laboratório e estúdio). O laboratório também comercializava produtos fotográficos (KRAUSS, 2013).

 
  275

ampliados, mas sim o controle do fotógrafo sobre esse processo. Em relação ao livro da
exposição do MASP-1978 (STUPAKOFF, 1978d) deixou evidente sua insatisfação com o
resultado da impressão:
Eram péssimos, não tinham um mínimo de qualidade. Tive que começar
tudo de novo (...) e tive que controlar tudo rigorosamente. Os caras, por
exemplo, não se conformavam em imprimir uma foto com fundo escuro,
subexposto. Queriam à força retocar, clarear a foto (STUPAKOFF apud
BAHIANA, 1979, p. 86).
Essa exigência por um controle pessoal de qualidade também ocorreu na
ocasião do trabalho sobre as crianças brasileiras no MASP no final de 1978, com fotografias
encomendadas para agenda VASP em homenagem ao ano internacional da criança segundo
a Unicef (discutido no capítulo 2 desta tese). Para a agenda, Stupakoff pediu que todos os
fotolitos fossem refeitos, pois julgou-os de baixa qualidade para impressão (AS
CRIANÇAS..., 1979).
É fato que a técnica, apesar de não ser o único pilar para a construção da
fotografia, condiciona a criação de acordo com os desígnios do fotógrafo:
Em termos tecnológicos, a fotografia é o resultado de procedimentos
químicos e óticos que podem ser utilizados e adaptados pelo homem
segundo suas capacidades técnicas e sua capacidade para a criação de
imagens (STEINERT, 2007 [1965], p. 271).
Stupakoff, apesar de se esquivar de tratar dos componentes de ordem material
por julgá-los menos relevantes na discussão fotográfica, não renunciava ao conhecimento
técnico para realizar suas produções. Quando examinamos as suas folhas de contato há nas
imagens uma constância da qualidade visual que demonstra uma significativa compreensão
das potencialidades e limitações dos equipamentos e materiais utilizados e um pleno domínio
técnico, condizentes com sua proposta poética.

6. 4 Referências e afinidades para Stupakoff


A criação é uma rede de relações múltiplas e de naturezas diversas que provocam
o artista e o incitam a se expressar (SALLES, 2007a). É a atmosfera com compartilhamentos
de ideias e opiniões formando um entrelaçamento cultural que propicia as inovações de
pensamento (MORIN, 1998). Nas suas propostas para o próximo milênio, o escritor italiano
Ítalo Calvino problematiza que:
(...) quem somos nós, quem é cada um de nós senão uma combinatória de
experiências, de informações, de leituras, de imaginações? Cada vida é uma
enciclopédia, uma biblioteca, um inventário de objetos, uma amostragem de
estilos, onde tudo pode ser continuamente remexido e reordenado de todas
as maneiras possíveis (CALVINO, 1998, p. 138).
A partir das ideias de Salles e Calvino citadas acima, podemos entender que não
existe criação em absoluto sem que o autor esteja entremeado por seu tempo, por seus
contemporâneos e antepassados. No âmbito da criação fotográfica, essa linha de pensamento
converge ao que o fotógrafo francês Bernard Plossu expõe ao dizer que, para ele, a produção

 
  276

de uma fotografia relaciona-se ao mesmo processo mental que a produção de uma obra
escrita: “acumula-se por anos uma cultura, um saber, uma sensibilidade que vêm à tona (...)
em um segundo” (PLOSSU apud SOULAGES, 2010, p. 270). Em um mesmo sentido, isso se
aproxima da afirmação de Stupakoff, para quem “nós, artistas, sejamos pintores, músicos,
escritores ou fotógrafos, somos resultados de um certo acúmulo de cultura que nunca é
instantâneo” (STUPAKOFF apud FERNANDES JUNIOR, 2006, p. 160).
Isso nos permite depreender que as afinidades culturais são particulares de cada
um que cria. O escritor e ensaísta argentino Alberto Manguel, ao discorrer sobre o alcance da
leitura no receptor, diz ser a relação íntima estabelecida entre os elementos dados pelo texto
e a experiência pessoal do leitor que promove a transformação de quem lê (MANGUEL,
2014). Dessa forma, a matéria da transformação não atinge a todos de maneira uniforme.
Também podemos entender o pensamento de Manguel pelo viés da semiótica, que encontra
eco na afirmação de Peirce de que nenhuma interpretação que um homem faz das palavras
está baseada exatamente na mesma experiência de qualquer outro homem (PEIRCE, 1958,
CP 5.506).
Essa perspectiva, quando direcionada à expressão visual pela fotografia, leva-nos
a perceber que determinada referência que funciona como estímulo para a criação de um
fotógrafo (seja ela fotográfica ou de outro tipo de iconografia, assim como afinidades
culturais de toda sorte) pode não funcionar como referência para outro. Esse é um dos
fatores que promove a diversidade na criação.
Através desse paralelo, é possível descobrir o fotógrafo em todas os experimentos
em que desenvolve a criação. Para o fotógrafo belga François Hers, era a literatura que o
fazia compreender as imagens que ele deveria produzir; para o francês Willy Ronis foram os
pintores e músicos – mestres como Pieter Bruegel e Johann Sebastian Bach – aqueles que lhe
ensinaram a composição (SOULAGES, 2010).
Essas afirmações legitimam a opinião sobre a criação fotográfica como um
sistema complexo no qual as referências ou bases para criação são oriundas de expressões
diversas para além dos alicerces da fotografia. Tendo em vista o objeto de análise da presente
tese, essas proposições também nos levam a questionar: qual seria a matéria de
transformação encontrada por Stupakoff via contato com suas referências? Seriam elas
literárias, fotográficas, musicais ou de outras naturezas?
Stupakoff compartilha com Plossu e Hers a visão sobre a importância da rede de
referências que participa da formação fotográfica. Para Stupakoff, era de vital importância
que o fotógrafo evitasse manter o foco somente na fotografia (FERNANDES JUNIOR,
2006b), procurando referências também na literatura, pintura, música e outras vivências –
como exemplos na prática criativa, durante o editorial da Vogue em Portugal Stupakoff lia
Fernando Pessoa (LASZLO, 2017); para o livro Rio Erótico usava frases de Millôr Fernandes.

 
  277

Também acreditava que “(...) a troca de ideias com pessoas criativas raramente é sobre um
trabalho. Tive muitas conversas com a Bea Feitler e sua melhor amiga, Diane Arbus, durante
jantares em nossos estúdios, em que fotografia jamais fazia parte do assunto da nossa
conversa. Criatividade não significa ter um montão de ideias novas, boas ou repelentes, senão
sensibilidade” (STUPAKOFF apud INSTITUTO MOREIRA SALLES, 2016, p.3).
Durante toda a sua carreira, não há registros publicados ou explicitados em
entrevistas, documentários ou notícias de jornal com Stupakoff declarando influências
diretas de outros fotógrafos em seu trabalho. De fato, ele revelou a necessidade de se afastar
das antigas influências quando migrou para Nova York em meados em 1965: “Queria
sobretudo, me livrar das influências estéticas do passado. Sentia necessidade de ver o mundo
com olhos novos. As influências nos deixam refratários ao novo. A busca por um caminho
próprio é dolorosa, temos que lidar como o desconhecido, com o imponderável”
(STUPAKOFF apud CHIODETTO, 2005, p. 6).
A despeito das influências não declaradas, Stupakoff argumentava que todo
fotógrafo deveria ter a capacidade de assimilar outras artes. Quanto a isso, como discutido
em capítulos anteriores da presente tese, ele expôs seu interesse por expressões distintas
(cinema, literatura, música, colagem e pintura) que, de uma forma ou de outra, teriam
influenciado seu trabalho fotográfico. Ele se inclinava particularmente para a pintura. “A
pintura é uma referência cultural muito importante para mim” (STUPAKOFF apud
FERNANDES JUNIOR, 2006, p. 161), e exaltava a música como meio de fazer melhores
fotógrafos (STUPAKOFF, 1960).
No âmbito da crítica de processo criativo, todos os registros deixados por um
autor são importantes, pois podem oferecer informações significativas sobre o ato criador
(SALLES, 2002b). Se para a crítica de processo as anotações de leitura, cenas observadas,
filmes assistidos, cenas lembradas têm valor equivalente como substrato à espera da
elaboração criativa (SALLES, 1990), podemos entender que as referências de Stupakoff
correspondem à matérias primas à espera de manuseio para utilização no seu trabalho
fotográfico. Além disso, a reconstrução da cultura visual de um autor nos fornece indícios
sobre suas referências para criação, visto que a bagagem cultural e a experiência são
norteadores importantes para o desenvolvimento de uma linguagem fotográfica particular.
Stupakoff atribuiu sua bagagem cultural a uma sólida formação iconográfica
acumulada desde a infância, quando, na casa da tia e dos avós, tinha contato com coleções
de objetos e quadros oriundos de toda a Europa. Também creditava à escola de arte o papel
de dirigir a capacidade criadora do fotógrafo e até mesmo ajustá-la à personalidade do
mesmo (STUPAKOFF, 1960). O estudo formal da arte, portanto, foi fundamental em sua
formação.

 
  278

No campo das artes, as fotografias de Stupakoff referenciam artistas destacados


como os pós-impressionistas franceses Paul Gauguin e Henri Rousseau e o artista moderno
Balthus. Essa inclinação à citação das artes em geral já era reconhecida desde a década de
1960 quando ficou evidente na vida do fotógrafo um intercâmbio artístico com a comunidade
de artistas plásticos de São Paulo, especialmente com o movimento Realismo Mágico, e na
sua longa parceria com Wesley Duke Lee (como discutido no capítulo 1 desta tese). Além
disso, no hard disk pessoal de Stupakoff, entregue ao Instituto Moreira Salles juntamente
com suas caixas de negativos, há uma coleção de referências artísticas como pinturas de
natureza morta, obras de Giuseppe Arcimboldo e Sandro Botticelli, imagens de estatuetas
africanas, referências fotográficas de Helmut Newton e Richard Avedon, além partituras de
Les Chanson de Miarka n.8, de Alexandre Georges. Além disso, fotografias de seus estúdios
revelam diversos objetos culturais espalhados pelo ambiente (Figura 175A) demonstrando
seus interesses diversos, e mostram também suas pinturas e colagens em progresso (Figura
175B).

(A) (B)
Figura 175. Estúdio de Stupakoff na rua Varick, Nova York. (A) Objetos culturais diversos. (B)
Pintura e colagens conjuntamente a fotos. Fonte: Instituto Moreira Salles.

Um exemplo explícito da inspiração a partir de obras de arte está no editorial de


2006 com a atriz Juliana Paes publicado na Vogue RG Brasil. Stupakoff conta sobre a
dificuldade em extrair da atriz algo mais profundo em sua representação para a câmera, dada a
pouca fluidez – que se aproximava de um quase absoluto enrijecimento – dos movimentos
corporais de Paes ao ser fotografada. Diante desse embaraço, Stupakoff relata o momento em que
uma associação lhe ocorreu: “quando a vi deitada na pedra, no meio da floresta, brotou no meu

 
  279

inconsciente aquela famosa pintura de Henri


Rousseau, Le rêve” (STUPAKOFF apud
FERNANDES JUNIOR, 2006, p. 161) (Figuras
176 A e B).
Outro exemplo está na preparação
para a fotografia Denpasar (Mãos) feita em
Bali, Indonésia (em 1968) (Figura 177). Para
A essa imagem Stupakoff declarou ter se
inspirado em um espetáculo de dança assistido
na noite anterior à feitura da foto. De posse de
uma ideia, convenceu quatro bailarinas do
espetáculo a fazerem gestos com as mãos no
intuito de simular a estrutura da árvore no
plano subsequente. A pergunta norteadora da
criação partiu de como ele poderia, de certa
maneira, transformar essa árvore em algo
sagrado. Visto que, para o fotógrafo “(...) a
B
fotografia só tem valor quando vem de dentro”
Figura 176. (A) Henri Rousseau, Le
rêve. (B) Juliana Paes, Vogue RG. Fonte: (STUPAKOFF, 2003), ele sugeriu que sua intenção
Reprodução da revista.
foi a de transmitir a ideia do processo de
 
individuação – sob o ponto de vista junguiano, a individuação é entendida como um processo
que significa alcançar uma singularidade profunda, voltar-se ao Si-Mesmo – simbolizado pela
árvore (STUPAKOFF, 2003).

Figura 177. Denpasar, Bali, 1968. Fonte: Instituto Moreira Salles

 
  280

Os exemplos acima refletem aquilo que Salles (2013) denomina de inevitável


imersão do criador no mundo que o envolve. Tomando por base os relatos (tanto escritos
quanto falados) aqui considerados, é possível reconhecer certas questões que preocupavam
Stupakoff como autor, assim como parte de suas preferências estéticas.
Apesar de Stupakoff não apontar influências diretas de outros fotógrafos no seu
trabalho, sua admiração por alguns profissionais serviu de baliza para propormos possíveis
afinidades que, de certa forma, teriam inspirado a formação fotográfica e expressão visual de
Stupakoff. Ele mencionou de forma textual uma especial admiração pelo norte-americano
Richard Avedon – “Richard Avendon. É ele o maior. Em moda, humanizou a mulher; em
retrato foi ao âmago das pessoas, fotografou-lhes o intestino” (STUPAKOFF apud LEONAM,
1967, p. 8) – e pelo alemão Helmut Newton, disse sobre este: “admiro imensamente o
trabalho de Helmut Newton e a maneira como ele se renovava constantemente”
(STUPAKOFF apud OLIVANI, 2005, p. 2). Também declarou admiração aos norte-
americanos Alfred Stieglitz, W. Eugene Smith, Edward Weston12 (NOGUEIRA, 1979), ao
francês Guy Bourdin e ao polonês Peter Lindbergh (FERNANDES JUNIOR, 2006) – e a
norte-americana Diane Arbus, com quem ele manteve proximidade em Nova York e que o
teria ensinado a compreender o compromisso do fotógrafo quanto à integridade e
honestidade com seu trabalho.
As afinidades também podem ser identificadas a partir daqueles dos quais
Stupakoff se afastava criativamente. O fotógrafo, por exemplo, expressou uma crítica
explícita ao armênio-canadense Yousef Karsh; como discutido no capítulo 5 da presente tese,
Stupakoff considerava engessados os retratos de famosos feitos por Karsh; a despeito da sua
qualidade técnica, eles exalariam certa falta de criatividade, algo do qual o fotógrafo
brasileiro procurava se distanciar (STUPAKOFF, 1978b).
Outras vozes integraram-se à rede cultural identificada para Stupakoff. Destas,
julgamos serem referências significativas no seu trabalho fotográfico (abordadas a seguir)
nomes como Wesley Duke Lee, Bea Feitler, Lew Parrella, Balthus, e suas múltiplas relações
interpessoais (como com os artistas e criativos de São Paulo, por exemplo), além da cultura
visual fotográfica norte-americana.
Ainda quanto à questão das influências, o fotógrafo brasileiro radicado na
Austrália, Terence Bogue, se diz influenciado por Stupakoff (BOGUE, 2013). Bogue foi
assistente de Stupakoff no Brasil e estudou na Art Center College of Design em Los Angeles
sob indicação do mesmo. Stupakoff também foi ponto de referência para os fotógrafos Bob
Wolfenson (2017), Fernando Laszlo (2017), Márcio Scavone (SCAVONE, 2014) e Juan Steves
(2009), que declararam ter em Stupakoff uma referência para suas gerações, especialmente
                                                                                                               
12 Fotógrafos esses vinculados a uma concepção e validação moderna da fotografia norte-americana,

promovedores da straight photography, que valoriza o fotógrafo em contato direto com o mundo (COSTA;
SILVA, 2004).

 
  281

por conta do seu pioneirismo na fotografia de moda no Brasil, por ter exercido a prática
fotográfica em uma época de poucos profissionais no país e por sua conduta profissional de
trabalho (que o permitiu desenvolver uma estética particular).

6.4.1 Homenagem a Balthus


Como discutido acima, os tipos de referências utilizadas para a criação fotográfica
auxiliam tanto na análise quanto na formação do criador. Algumas das principais referências
para o trabalho fotográfico de Stupakoff foram as pinturas do artista polaco-francês
Balthasar Klossowski de Rola, conhecido como Balthus (Paris, 1908 – Rossinière, 2001)
Eu usei Balthus como referência por uns oito ou dez anos. Via Balthus em
tudo. (STUPAKOFF apud FERNANDES JUNIOR, 2006, p.161).
Essa citação está explícita na fotografia Homenagem a Balthus (Figura 178A) da
Coleção Pirelli/MASP no que tange à aparência geral da imagem e à clara alusão na forma de
compor e de estabelecer a relação da figura humana com o ambiente. Nessa fotografia de
Stupakoff, ainda podem ser destacadas algumas correlações com a obra de Balthus (Figura
178B) através das situações visuais identificáveis: o uso da luz de janela, a posição da modelo –
descansando sobre algum móvel com as pernas entreabertas – e o seu despojamento, além da
similaridade entre os objetos de cena (no caso, o móvel e o lençol).

(A)

(B)
Figura 178. (A) Homenagem a Balthus (1991) exposta na edição Pirelli/MASP de 2012. (B) The
Victim, 1938, Balthus. Fonte: (A) Instituto Moreira Salles; (B) LEYMARIE, 1990.

 
  282

A poética de Balthus estava pautada na pintura figurativa. Para além dos retratos
de mulheres jovens, ele também pintou paisagem e natureza morta (LEVY, 1999). Suas
principais temáticas foram cenas de rua, retratos, cenas de interiores e de sujeitos diversos,
natureza morta e nus (LEYMARIE, 1990). A aproximação entre Stupakoff e Balthus não
acontece exatamente pela estética pictórica (no sentido das fotografias reproduzirem os
aspectos da pintura), mas pela captura da situação visual da cena (levando em conta o tema,
os personagens e a atmosfera). Nesse sentido, é nas obras em que registra cenas de interiores
e retratos que as citações à Balthus são mais recorrentes no trabalho do fotógrafo.
Nas cenas de interiores em que as referências são claras, Stupakoff emula as
situações visuais presentes em Balthus através da apresentação de uma ou mais pessoas,
normalmente jovens mulheres, alocadas em ambientes fechados, com luz natural
proveniente de janelas que incide e
realça a forma dos corpos. Estes, por
vezes, apresentam uma expressão
corporal relaxada, geralmente sobre
alguma superfície – deitados,
encostados em cadeiras ou poltronas
– vistos pelo enquadramento em
plano médio (e.g., Figura 179).
Para os retratos que
remetem à Balthus, Stupakoff se

Figura 179. Fotografia para a Harper’s Bazaar. inspirava nas formas, na disposição
Fonte: Instituto Moreira Salles. das modelos e na presença de alguns
 
elementos de cena tais como pequenos animais domésticos (como gatos), objetos (como
cadeiras) e poses específicas. Assim como nas pinturas de Balthus, esses retratos apresentam
flagrantes de intimidade. Na figura 180A, publicada na revista Glamour, Stupakoff se utiliza
de elementos de referência a partir do quadro Therese dreaming (1938) (Figura 180B). Em
ambas obras, a cena é construída a partir de componentes semelhantes: um gato, uma
cadeira e uma personagem feminina em pose análoga, recostada com os braços acima da
cabeça e a perna esquerda erguida.

 
  283

(A) (B)
Figura 180. (A) Homenagem a Balthus, revista Glamour (Nova York, 1977). (B). Therese
dreaming, de Balthus (1938). Fonte: (A) Instituto Moreira Salles; (B) LEYMARIE, 1990

Na caracterização da cena ficam patentes os aspectos subjetivos de Balthus:


personagens que parecem imersos em seu íntimo, sensação de introspecção e a captura de
nuances do universo feminino. As personagens
retratadas parecem não perceber a atividade
ao redor de si, talvez alheias ou absortas em
seus próprios pensamentos, imersos em sua
psique, em atividades como a leitura ou apenas
descansando. Tais aspectos podem ser
observados nos registros de Stupakoff
inspirados em Balthus (e.g., Figura 181).

Um aspecto significativo nas


pinturas de Balthus a partir de 1930 está na
inserção de adolescentes em posições eróticas e
vouyerísticas13 as quais, a despeito do conteúdo,
o artista não via como representação do erótico,
mas como representação de algo inconsciente
para o qual ele recorria à uma simbologia do
sonho e dos símbolos do inconsciente; a
sensualidade expressa em Balthus não se
Figura 181. Balthus, 1970, Harper's
Bazaar, Nova York, ambas. Fonte: Instituto referiria, portanto, a uma sensualidade
Moreira Salles.
realmente erótica, e sim a uma sensualidade
corpórea (WEBER, 1999), no sentido de atrair a atenção para os personagens presentes nas
suas obras pelo movimento do corpo. Para desvincular a ideia do erotismo das suas pinturas

                                                                                                               
13 Destaque para A lição de guitarra de 1934, que causou controversa em Paris pela temática ao mostrar uma

mulher mais velha com uma menina semi-nua em seu colo, fazendo as vezes de uma guitarra.

 
  284

com adolescentes, Balthus afirmou que as meninas seriam as únicas que ainda poderiam
passar por seres puros e sem distinção de idade, e que essas jovens nunca lhe interessaram
para além dessa ideia. O artista teria também alegado que representava a inocente falta de
pudor próprio da infância (WEBER, 1999).
A despeito do que realmente motivava Balthus para o uso de tais figuras
femininas em suas pinturas (motivações essas que permanecerão inescrutáveis), elas de fato
apresentam um apelo ao erotismo, visível através das poses das meninas, dos cenários e das
formas retratadas. O mesmo pode ser observado em muitas das imagens de Stupakoff.
Apesar dele empregar jovens adultas e não adolescentes, o fotógrafo também apresentava o
erotismo e a sensualidade na sua maneira de representar o feminino nas poses por ele
registradas. Stupakoff afirmou gostar do erótico como aquilo que não está dito, que está aí
para ser revelado. Para ele, erótico é a beleza em sua forma mais pura, que difere das
vulgaridades vistas nas revistas contemporâneas (PERSICHETTI, 2006).
Soulages (2004) explica três possíveis aproximações para com a obra de arte: a
aproximação sensível, uma primeira confrontação via nossos sentidos; uma aproximação
acolhedora, no modo como o sujeito recebe a obra, se gosta ou desgosta, se aceita ou rejeita; e
uma aproximação criadora, tida como aproximação poética pela qual cria-se uma obra a
partir de outra. Frente a isso, fica nítido que, ao mesmo tempo que Stupakoff teve uma
aproximação sensível em relação à obra de Balthus, também teve uma aproximação
criadora/poética. Nesses termos, produzir fotografias referindo-se a Balthus seria uma forma
de Stupakoff acolher e reagir à sua pintura.

6.4.2 Wesley Duke Lee e Bea Feitler: dois parceiros


No campo da expressão visual não é incomum a formação de parcerias que
originam produções de destaque, além de permitir tanto o desenvolvimento profissional
quanto pessoal dos envolvidos. Abarcando a fotografia, algumas dessas colaborações são
mais marcantes: essas parcerias podem ocorrer entre editor e fotógrafo, como entre o editor
da Vogue francesa na década de 1930, Lucien Vogel, e Edward Steichen; entre dois fotógrafos,
como com Yasuhiro Wakabayashi (fotógrafo nipo-americano conhecido artisticamente como
Hiro) e Richard Avedon; e entre designers e fotógrafo, como entre o designer de moda
japonês Issey Miyake e Irving Penn. Na trajetória profissional de Otto Stupakoff, destacamos
Wesley Duke Lee e Bea Feitler como dois dos seus mais significativos parceiros criativos.
Duke Lee teve importância ímpar na vida criativa de Stupakoff e é apontado por
muitos que conviveram com o fotógrafo como uma importante referência artística para ele
(CORRÊA, 2017):
Wesley Duke Lee foi durante cinquenta anos a única pessoa em cuja mente
encontrei o equivalente da minha, certeza da importância da alegria e
compaixão como meta do artista” (STUPAKOFF apud FERNANDES
JUNIOR, 2006, p. 5).

 
  285

Além da amizade duradoura, a afinidade e colaboração artísticas entre


Stupakoff e Duke Lee deu-se por diversas vias, desde produções conjuntas de colagem e
pintura, passando pela participação do movimento Realismo Mágico – criado em 1963,
em São Paulo (conforme discutido no capítulo 1 da presente tese) – e por parcerias em
diversos projetos comerciais.
Stupakoff colaborou diretamente com alguns dos projetos artísticos de Duke Lee.
Dentre eles, destacam-se: o ambiente Sala de visitas (1963) – composta por um cubo com
dois lados de vidros e dois lados de cartões recoberto com fotografias de Stupakoff e com
papel de parede14 – montado no estande de uma feira têxtil (COSTA, 2005); A zona: no
despolido (1964), a partir de um retrato
de Stupakoff construído como um objeto
remetendo aos aparatos técnicos da
fotografia; a fotografia de Stupakoff, a
partir da obra O terrível dragão de rodas,
para o folder que apresenta os 57
trabalhos de Duke Lee, sua primeira
individual em 1961, reunidos em um
álbum denominado O espírito das coisas
(COSTA, 2010); e a obra O Helicóptero
(1969) (Figura 182), um ambiente
cinético, no qual Duke Lee incorpora
algumas fotografias de Stupakoff
(COSTA, 2010).

Em contrapartida, Duke Lee


Figura 182. O Helicóptero de Wesley Duke Lee
com fotografias de Stupakoff. auxiliou Stupakoff na montagem da
Fonte: COSTA, 2010.
exposição do fotógrafo realizada no
 
MASP em 1978, e também projetou o livro da exposição, publicado pela editora Práxis
(STUPAKOFF, 1978d). Ambos também firmaram parecerias em diferentes projetos
comerciais, como algumas capas de disco e as agendas para a Vasp e Lion-Caterpillar,
ambas de 1978, diagramadas por Duke Lee com fotos de Stupakoff (discutidas no capítulo
2 desta tese).
Com a designer Bea Feitler, Stupakoff estabeleceu uma parceria frutífera a partir do
trabalho de ambos para a Harper’s Bazaar. Feitler pode ser considerada a madrinha
profissional do fotógrafo em Nova York, tendo sido responsável direta pela sua contratação

                                                                                                               
14 No interior do cubo, cena com mobiliário, objetos antigos e manequins vestidos como no século XIX mostram

com ironia um triângulo amoroso entre uma mulher que assiste a disputa de dois cavalheiros por ela. Na face
externa, uma foto estereotipada típica da publicidade de uma família feliz; dentro do aquário o que acontece é
uma verdade oculta.

 
  286

para as primeiras fotos na Harper’s Bazaar (com o ator Oskar Werner em 1965), os
primeiros editoriais de moda publicados nessa mesma revista e pela aproximação de
Stupakoff, através especialmente de jantares oferecidos pela designer, com nomes
significativos da fotografia norte-americana, como Richard Avedon e Diane Arbus
(FERNANDES JUNIOR, 2006). Foi nesse denso meio cultural que Stupakoff encontrou
abertura para iniciar sua trajetória internacional, expandindo suas relações profissionais e
criativas em Nova York. Segundo o próprio fotógrafo, Feitler colaborou intensamente para o
desenvolvimento de seu estilo pessoal de fotografia ainda na década de 1960 (PERSICHETTI,  
2006). Essa parceria se refletiu na harmonia das fotografias publicadas nas páginas da
Harper’s Bazaar (e.g., Figura 183) e também no enriquecimento da criação fotográfica de
Stupakoff.

Figura 183. Layout de Bea Feitler e fotografias de Otto Stupakoff para a Harper’s Bazaar, 1970.
Fonte: Reprodução da revista

Segundo Feitler, sua função como diretora de arte na Harper’s Bazaar era
“imaginar os cenários para as reportagens de moda que vão ser publicadas. Motivar a moda
apresentada, pelo décor que a enquadra. Estabelecer, junto com o fotógrafo especializado, as
poses dos modelos. E produzir os layouts (a paginação) quando textos e fotos estão prontos e
lhes chegam às mãos” (FEITLER apud FEITLER, 2012, p. 73). A partir dessas atribuições,
Feitler mantinha o padrão visual e a diferenciação de layout da Harper’s Bazaar e atuava
próxima aos fotógrafos (como Avedon, Hiro, Arbus e Horvat). A relação de Stupakoff com
Feitler, no entanto, se estendia também para a amizade, indo além do contato entre diretor
de arte e fotógrafo.
Stupakoff relatou que Feitler participava do processo de criação selecionando
referências visuais – como recortes de revistas – e culturais que adicionava nas pastas de

 
  287

trabalho do fotógrafo (FERNANDES JÚNIOR, 2006) e recomendando-lhe referências como


quando sugeriu a Stupakoff que este assistisse ao filme Um homem e uma mulher, de Claude
Lelouch (de 1966), para desenvolver um editorial sobre sapatos femininos.
Era uma época em que os diretores de arte tinham como missão educar o
olhar do fotógrafo. E, ao contrário do que acontece atualmente, os diretores
de arte estimulavam a diferença. A revista se adaptava ao fotógrafo e não o
contrário. Obviamente, a marca da revista era preservada”. (STUPAKOFF
apud PERSICHETTI, 2006, p. D2).
Ainda sobre Feitler, Stupakoff dizia que “(...) ela planejava cada ensaio fotográfico,
dava o tom de todos os editoriais de moda, era de uma exigência microscópica” (STUPAKOFF
apud PAIVA, 2008, p. 68). Apesar de planejar cada ensaio, Feitler não comparecia às sessões
fotográficas de Stupakoff, mas incentivava o fotógrafo a ‘buscar seu próprio caminho’.
O diretor de arte e crítico em design Steven Heller apontou como sendo a
qualidade mais distinta de Feitler a sua capacidade de orquestrar um arsenal de
profissionais requeridos na produção de revistas mensais e a disposição para incentivar
esses profissionais a produzir um todo estimulante e significativo (HELLER apud FEITLER,
2012, p. 73). Nessa sintonia profissional, Stupakoff descrevia Feitler como “a melhor
editora/diretora de arte do mundo, como nunca mais apareceu” (STUPAKOFF apud
FERNANDES JUNIOR, 2006, p.157).
É importante ressaltar que tanto a relação de Stupakoff com Wesley Duke Lee
quanto com Bea Feitler foram peças chave na construção de uma rede cultural em torno do
fotógrafo, com multiplicidade de trocas e desenvolvimento mútuo.

6.4.3 Lew Parrella: um interlocutor


“Lew, gotta go”15

O fotógrafo norte-americano radicado no Brasil Lew Parrella foi um interlocutor


criativo na época em que Stupakoff atuava como fotógrafo no país durante a década de 1960.
Ambos tornaram-se referência na fotografia de moda brasileira e foram premiados com
medalha de prata no The New York World’s Fair (no Kodak Pavilion em Nova York). Além
dos interesses profissionais em comum, também tornaram-se amigos.
Quando Parrella migrou para o Brasil em 196116, Stupakoff lhe telefonou dizendo
que o conhecia por meio de seus textos publicados na edição norte-americana da revista suíça
Camera (HARA, 2012/2013), sendo esse o estopim para a aproximação e início da amizade
entre os dois fotógrafos: “Frequentávamos muito a casa um do outro. [Stupakoff] Falava
                                                                                                               
15Expressão recorrente de Stupakoff para Parella.
16Entre o final de 1950 e 1960 importantes fotógrafos estrangeiros se estabeleceram no Brasil. Além de Lew
Parrella, destacamos Maureen Bisilliat (inglesa), Claudia Andujar (suíça-americana) e os americanos George Love
e David Zingg. Segundo Fernandes Junior (2003, p. 152), esses fotógrafos foram influentes na criação de um olhar
contemporâneo e sintonizado com a identidade brasileira, contribuindo na formação e divulgação da fotografia
como linguagem e expressão.

 
  288

inglês e havia uma compatibilidade de interesses.” (PARRELLA apud MANJABOSCO, 2015).


Para Parrella, Stupakoff era como um irmão. Em suas palavras: “(...) eu contei muita coisa
para ele e ele me contou muitas coisas, sobre o trabalho fotográfico, sua vida” (PARRELLA
apud MANJABOSCO, 2016, p. 56).
A bagagem cultural-fotográfica de Parrella – trabalhou como assistente dos
fotógrafos Arnold Newman, Phillipe Halsman e W. Eugene Smith, foi curador e crítico de
fotografia – era destaque frente ao cenário fotográfico brasileiro do início da década de 1960;
segundo o próprio Parrella, a fotografia brasileira carecia de técnica, educação fotográfica e
formação específica para os profissionais do país. Ele era crítico à fotografia brasileira da
época, classificando a maioria dos fotógrafos brasileiros como tecnicamente adequados, mas
culturalmente deficientes 17 (PARRELLA, 1967). Destacava somente José Medeiros e
Stupakoff como exceções a esse cenário nacional: “Vemos um Otto Stupakoff atingindo
personalidade em nível superior à média de oferecimento e apreciação de trabalho; acabou
encontrando em Nova York a posição merecida” (PARRELLA, 1967, p. 41). De acordo com
Parrella, Stupakoff já pensava em uma carreira internacional quando os dois se conheceram
(MANJABOSCO, 2015).
Foi Parrella quem organizou a exposição individual de Stupakoff na galeria Petite
Galerie em 1963 (ver capítulo 2 desta tese). Em seu texto para o folder de apresentação,
expressou sua visão fotográfica, demonstrando ver em Stupakoff um fotógrafo
contemporâneo:
Vemos que este fotógrafo é, antes de tudo, um construtor de formas, mais do
que um registrador de momentos ou fatos. […] O que o distingue de muitos
fotógrafos de hoje é a evidente cultura fotográfica – geral e profunda –
associada a uma especial sensibilidade artística e a um talento criativo que
constitui a base de sua arte (PARRELLA, 1963).
Em que pese a diferenciada visão fotográfica de Parrella, esta parece ter sido
motivadora da aproximação entre ele e Stupakoff, visto que ambos estavam alinhados quanto
ao mesmo pensamento fotográfico, e apresentavam trabalhos e formas de entender a
fotografia que se adequavam às novas demandas profissionais da época em que conheceram.
Quanto a isso Stupakoff ainda confirmou:
Quando o Lew chegou ao Brasil, em 61, eu estava isolado em termos de
diálogo fotográfico. Conversava com pintores, com outros artistas, mas não
com outros fotógrafos. Era difícil encontrar uma identidade de linguagem
(STUPAKOFF apud MENDONÇA, 1978a, p. 15).

                                                                                                               
17 A comparação com o cenário norte americano de fotografia também é feita pelo fotógrafo americano radicado

no Brasil, George Love. Love dizia faltar infra-estrutura fotográfica mais ampla no país, quando comparado com
os Estados Unidos e outros país desenvolvidos, no quais havia um conjunto de informações através de jornais,
revistas e cursos inexistentes no Brasil (Folha de São Paulo, 31/1/1970).

 
  289

6.4.4 Richard Avedon, Irving Penn e a fotografia norte-americana


O ambiente propício ao qual o criador está imerso – um momento histórico,
cultural e científico, ou seja, o zeitgeist – por vezes reflete de forma significativa em algumas
das características do seu processo de criação. No entanto, apenas a constatação da influência
do contexto cultural, social, histórico é insuficiente para o entendimento do processo criativo.
Para que isso ocorra, a investigação precisa apontar como a realidade externa de
determinado tempo e espaço se integram à obra e como o ambiente afeta o artista no seu
projeto pessoal (SALLES, 2013).
O primeiro apontamento sobre a influência do contexto cultural em Stupakoff diz
respeito à sua formação fotográfica em meados do século XX nos EUA, assim como o
convívio durante décadas com a fotografia norte-americana. Como visto no capítulo 1,
Stupakoff frequentou a escola americana de arte e fotografia entre 1953 e 1955; de volta ao
Brasil, manteve contato com a cultura visual norte-americana e, entre as décadas de 1960 e
1970, conviveu diretamente com os fotógrafos que marcaram época, como Richard Avedon,
Irving Penn, Diane Arbus, Duane Michael e Art Kane. Essas vivências testemunham um
contato próximo de Stupakoff com uma parte específica da fotografia norte-americana18, com
a qual ele se identificava e que influenciou sumamente sua expressão fotográfica.
Os anos de formação nos EUA parecem ter sido decisivos para a
profissionalização e instrumentação técnica e conceitual de Stupakoff, visto que o modelo
norte-americano de ensino da fotografia estava pautado na técnica como parte do processo, e
não como item mais relevante – a formação englobava o estudo de pintores e artistas de
diversas formas de expressão, oferecendo uma formação ampla em fotografia, desde a
publicidade até moda, e fotografia para a indústria. Além do aprendizado da técnica
fotográfica per se, estimulava-se a liberdade de escolhas, partindo do aluno conceber a
fotografia a partir de um dado tema e, através da crítica e comparação, realizar os
aperfeiçoamentos necessários (MENDES; ARRUDA, 2001).
Nesse contexto, Stupakoff esteve imerso no ambiente fotográfico acadêmico
conhecido como The Golden Decade (1945-1955) da fotografia da Costa Oeste norte-
americana, pela qual se destacaram nomes como Ansel Adams, Minor White, Edward
Weston, Dorothea Lange, Imogen Cunningham e Lisette Model (BALL; BALL, 2016). Dado o
cenário descrito acima, Stupakoff perpetuou uma relação muito mais próxima com os EUA
do que com a Europa – onde ele residiu e trabalhou por anos –, identificando-se de forma
mais orgânica com o universo da cultura visual fotográfica norte-americana, principalmente
entre as décadas de 1950 e 1980. A imersão de Stupakoff nos EUA incluiu sua aproximação
com a fotografia de moda, a ‘fashion photography’ das décadas de 1950 à 1970, na qual se
                                                                                                               
18 É pertinente considerar que os exemplos citados não representam toda a cultura fotográfica e artística dos EUA,

especialmente em Nova York. Há outras cenas do meio artístico no país referido, como a contracultura dos anos
1960 e 1970, com os quais não fica evidente uma relação direta de Stupakoff.

 
  290

destacam, entre outros, Irving Penn e Richard Avedon, sendo este último recorrentemente
citado pelo fotógrafo brasileiro.
Nas imagens de moda da primeira fase de Stupakoff no Brasil, pela maneira como
ele constrói o tema, na forma de apresentá-lo e no uso de cenários externos, pose e
movimentação das modelos em cena, fica evidente o princípio do seu discurso autoral: tendo
em vista a fotografia produzida fora do país, principalmente no eixo Estados Unidos –
Europa, a obra fotográfica de Stupakoff registrada no Brasil se aproximava, em termos
temáticos e compositivos, da forma como a linguagem da fotografia de moda era pensada e
realizada no exterior. Na década de 1950, revistas como Harper’s Bazaar, Vogue e Seventeen
Magazine já compunham muitos de seus editoriais com imagens que procuravam valorizar
um estilo de vida mais livre, representado em cenários externos que refletiam a crescente
espontaneidade da sociedade do pós-guerra. A propensão em trabalhar com externas ao
invés de no estúdio (como visto no capítulo 5) não é inovação de Stupakoff – o fotógrafo
húngaro Martin Munkácsi, a quem Stupakoff considerava gênio, já na década de 1930
preferia utilizar em suas fotografias ‘lugares verdadeiros’ (MARRA, 2008).
Somado a isso, em 1945 dá-se o rompimento da rigidez característica das revistas
femininas européias pela Harper’s, quando esta passa a apresentar uma visão mais natural
da jovem norte-americana. Em outros termos, a criação imagética feita por fotógrafos de
moda em meados do século XX foi capaz de captar o surgimento de uma nova identidade de
época baseada na ideia de uma mulher mais livre e segura de si que se refletiu nos editoriais
de moda do período (BREUILLE, 2011). Esse estilo espontâneo norteou a fotografia de moda
contemporânea, direcionada por editores de arte como Alexey Brodovitch (citado no capítulo
1). Foi esse o cenário encontrado por Stupakoff entre 1953 e 1955 quando ele se estabeleceu
em Los Angeles para os estudos na Art Center School. Também é sabido que o fotógrafo,
ainda na década de 1960, frequentava o consulado americano no Brasil para ver as revistas
Vogue e Harper’s, tendo afirmado ser essa a sua maneira de entrar em contato com
referências visuais de moda produzidas no exterior (STYCER, 2005, p.64).
Os fotógrafos de moda do começo do século XX, ainda na concepção do retrato,
trabalhavam com fotos em poses teatrais; construíam um mundo que representava a
atmosfera de sonho e charme feminino (vide a obra do britânico Cecil Beaton) (MARRA,
2008; BREUILLE, 2011). Stupakoff divergia dessa prática e declarava ter “pavor” da tradição
de fotografar a modelo como um fantástico cabide para as roupas (STUPAKOFF apud
FERNANDES JÚNIOR, 2006, p. 161), aproximando-se mais do estilo livre de Munkácsi do
que do viés das poses teatrais mais engessadas.
As imagens dos fotógrafos Irving Penn, Richard Avedon e Helmut Newton, por
exemplo, contribuíram para a construção imagética do século XX; nelas, é possível perceber a
ideia de que a fotografia de moda é também um estudo do comportamento humano,

 
  291

auxiliando no entendimento da mentalidade de uma época e sociedade (MAUAD, 1996). Essa


concepção da linguagem fotográfica para a moda, juntamente com a experiência
internacional, deram subsídios para Stupakoff refletir a respeito da sua atuação criativa em
sua primeira fase no Brasil no início da década de 1960. As afinidades entre a obra do
brasileiro e a produção de nomes como Avedon e Penn estão sugeridas nos dizeres do
fotógrafo e crítico Eduardo Salvatore ao comentar a exposição na Petite Galerie de 1963:
Percorremo-la demoradamente. E, não obstante aos seus reais méritos, na
verdade, exceção feita à meia dúzia de trabalhos, nada vimos esse
entusiasmo da crítica, sendo notória a influência sobre Stupakoff de alguns
artistas-fotógrafos publicitários, como Avedon e Irving Penn, que Otto
procura seguir na técnica e na expressão; sinal evidente que Stupakoff ainda
não encontrou sua personalidade própria, embora sejam inegáveis seu
esforço e seu domínio técnico (SALVATORE, 1963, p. 10).
Para com a fotografia de Irving Penn, há uma significativa aproximação de
Stupakoff, uma espécie de diálogo com aquilo que propunha Penn para suas séries de
retratos em fundo cinza. Isso foi marcante na produção de Stupakoff no Brasil na década de
1960 (um exemplo dessa convergência pode ser visto no comparativo entre as Figuras 184A
de Stupakoff e Figura 184B de Penn).

(A) (B)
Figura 184. (A) Wesley Duke Lee, de Stupakoff, 1958. (B). Tennessee Williams de Irving Penn,
1951. Fonte: (A) Fonte: Instituto Moreira Salles; (B) Art Institute Chicago Irving Penn.

Também fica implícita uma possível inspiração de Stupakoff nos still life que
Penn fotografava para revistas. Muitas das criações do fotógrafo norte-americano
constituiam-se de composições de objetos com características específicas, arranjados e
fotografados em um espaço, denotando por vezes uma narrativa do cotidiano humano
(Figura 185B). Stupakoff utiliza de expediente análogo quando também fotografava e
publicava em revistas imagens compostas por conjunções de elementos inanimados os quais,
juntos, estavam imbuídos de um mesmo tema (Figura 185A).

 
  292

(A) (B)
Figura 185. (A) Otto Stupakoff , Quatro Rodas, 1964. (B) Irving Penn, Vogue, 1943.
Fonte: (A) Reprodução da revista/Coleção autora (B) Art Institute Chicago Irving Penn.

Considerando suas recorrentes menções à obra de Richard Avedon, é possível


observar que alguns aspectos usados na composição das imagens de Stupakoff aproximam-se
daqueles usuais na fotografia do norte-americano. Um exemplo é o tratamento imagético
dado à flexibilidade dos movimentos humanos, com destaque para a sinuosidade do corpo,
como ilustrado na fotografia de Stupakoff publicada em Art to wear (figura 186A) na qual a
expressão gestual da modelo dá-se no levantar dos dois braços em equilíbrio ao movimento
das pernas, em uma cadência delicada e sutil. A energia e vitalidade impressas no movimento
dos braços em relação ao restante do corpo da modelo dialoga com a leveza do tecido,
expressa na sua profusão de dobras. Há aspectos nessa imagem de Stupakoff que fazem eco à
imagem da modelo Jean Shrimpton feita por Avedon e publicada em Richard Avedon
photographs, 1946-2004 (Figura 186B): a vivacidade do movimento do corpo, a captura da
leveza nas dobras do tecido, o trabalho em fundo neutro.

 
  293

(A) (B)
Figura 186. Movimento e leveza. (A) Fotografia publicada em Art to wear, de Stupakoff. (B) Jean
Shrimpton, por Richard Avedon (1970). Fonte: (A) DALE, 1992; (B) AVEDON, 1978.
 
 
6.5 Uma força que sussurra: alguns aspectos do estilo de Stupakoff
A acepção de estilo pode ser utilizada em diversos âmbitos: a maneira particular
de se expressar e exprimir um pensamento; o conjunto das qualidades características de uma
obra, um autor, uma época; um modo de vida (abarcando procedimentos e atitudes na
maneira de ser e criar). O estilo do autor pode ser compreendido através da singularidade de
seus trabalhos, quando se identificam um conjunto de características estéticas consideradas
únicas dentro de um sistema (como a fotografia, pintura e literatura), e entendido como um
traço particular capaz de revelar autenticidade e identidade do criador (SCHAPIRO, 1982).
Nesse sentido, Pareyson identifica o estilo como modo de formar do artista:
(...) Só depois que o genial artista, interpretando o espírito de uma época e
realizando sua vocação formal, fez com que a própria espiritualidade, rica em
ressonâncias históricas e ambientais, tornasse evidentes as correspondências
entre o estilo assim encontrado e o espírito individual do artista e coletivo de
sua era, porque a correspondência entre um espirito e seu estilo só aparece
se e quando esse espírito se fez totalmente no modo de formar. E, além disso,
que a espiritualidade do artista se define como espiritualidade, com seus
irrepetíveis traços característicos e a própria singularíssima natureza, só
enquanto e na medida em que se define como estilo e modo de formar.
(PAREYSON, 1993, p. 42).
Também fica claro nas vozes de outros autores que essa maneira de formar faz
transparecer a visão de mundo e personalidade de quem cria.
Estilo é antes de tudo um sistema de formas tendo uma qualidade própria e
uma expressão significante, através das quais são visíveis a personalidade do
artista e a visão do mundo de um grupo. Também é o meio de transmitir
certos valores dentro dos limites de um grupo, fazendo visíveis e
conservando os que se referem à vida religiosa, social, moral através das
insinuações emocionais das formas. Para os historiadores da cultura e para
os filósofos, o estilo é a expressão da cultura, que contém a totalidade dos
signos visíveis da sua identidade (SCHAPIRO, 1982, p. 35).

 
  294

Pareyson alerta que, além dos valores formais na abordagem do estilo, o caráter
de personalidade é significativo:
(...) a abordagem do estilo não deve limitar-se aos meros valores formais
sem ver nele um caráter histórico e espiritual, pois o estilo é tal somente se é
o modo de formar próprio de uma determinada espiritualidade, ou melhor,
se é uma espiritualidade que se fez modo de formar. Limitar-se a considerar
apenas os valores formais significa separar o formar de seu ineliminável
caráter de personalidade, o que seria como que separar o estilo de si mesmo
(PAREYSON, 1993, p. 43).
Na fotografia, o estilo pode ser visto como um conjunto de características
estéticas próprias do fotógrafo e/ou de uma cultura e época, além da “(...) atitude do
fotógrafo diante do mundo, sua percepção e sua construção de um sistema de equivalências
estéticas ou semânticas” (FERNANDES JUNIOR, 1992, p. 6). O estilo está arraigado no
modo como o fotógrafo produz sentido na imagem através das infinitas maneiras de explorar
a captura da imagem: enquadramento, ponto de vista, luz, composição, distância focal, cores,
nitidez e tempo de exposição. A maneira como o fotógrafo cria sentido e se expressa pela
imagem condiz com aquilo que André Rouillé entende como fotografia-expressão 19
(ROUILLÉ, 2009).
A partir das considerações abordadas acima, entendemos que a compreensão do
estilo presente na criação fotográfica de Otto Stupakoff seria incompleta se abordasse
somente uma apreciação dos aspectos formais e modos pelos quais ele criava suas imagens
(relacionados à composição, enquadramento, ângulo e formato, entre outros, como
discutidos no capítulo 5 desta tese). Nesse sentido, basearemo-nos na ideia de que o
indivíduo cria e estrutura sua obra a partir de um ponto de vista próprio que é reflexo de sua
maneira de ser e conviver em sociedade, dos aspectos da sua personalidade e constituição
intelectual, psicológica e perceptiva; tais elementos são condições fundamentais para a
formatação de um estilo fotográfico.
A discussão aqui estabelecida parte da afirmação de Stupakoff “Estilo eu adquiri
quando perdi o medo de entrar em cavernas escuras, onde o dragão zela pela pérola”
(STUPAKOFF, 2006b) e da sua percepção de que a escolha por caminhos não trilhados
refletiria a honestidade do fotógrafo para consigo mesmo, o que traria como recompensa o
encontro de um estilo pessoal (OLIVANI, 2005; FERNANDES JUNIOR, 2006). Stupakoff
utiliza a associação simbólica da psicologia junguiana para mostrar que, primeiramente, o
estilo pessoal do fotógrafo é algo de valor significativo (como uma pérola), sendo papel do
criador empreender uma busca, que muitas vezes é interna (adentrar a florestas, cavernas
escuras) para encontrar seu próprio estilo.
                                                                                                               
19 Para André Rouillé (2009, p. 19), a fotografia-expressão assume seu caráter indireto (afastando-se da crença de

uma mera impressão direta da realidade) em que se destacam a imagem com suas formas e sua escrita, o autor
com sua subjetividade e o Outro enquanto dialogicamente implicado no processo fotográfico. Nesse contexto,
Rouillé faz um contraponto com a fotografia-documento vista como representativa, no sentido de que os estados
das coisas são postos e a fotografia os registra, redução da fotografia a documento e do documento à
representação sensível.

 
  295

No sentido dado pela psicologia junguiana, as florestas e as cavernas escuras


simbolizam o inconsciente pessoal; o dragão é um animal fabuloso primordial, presente em
vários mitos de antigas tradições, simbolizando a matéria-prima, a massa informis, que será
transformada. Esses dois pontos de vistas relacionam-se com o devir criativo e com o
inconsciente instintivo enobrecido pelo lento processo de desenvolvimento individual
(JACOBI, 2016). Ao mencionar o dragão com a pérola em uma floresta, Stupakoff se refere ao
próprio processo de busca e de transformação pessoal ao qual ousou enfrentar em busca de
uma linguagem própria.
Stupakoff atribuiu a gênese de um estilo pessoal ao momento em que abandonou
a carreira em São Paulo e migrou para os EUA sob a justificativa de que no Brasil estava
somente a ‘copiar’ visando se integrar a um determinado contexto de criação fotográfica, o
que o impediria de desenvolver um estilo próprio (STUPAKOFF, 1978a). O fotógrafo também
afirmou ser a fase em Nova York, especialmente nos trabalhos para a Harper’s Bazaar da
década de 1960 (esta vista por ele como o laboratório em que desenvolveu sua linguagem
fotográfica para moda), como a mais significativa para o seu aprimoramento profissional; foi
quando visualizou na fotografia de moda um veículo para comunicar seus sentimentos, assim
como para a construção da sua expressão individual (STUPAKOFF, 1978a), Nas suas
palavras, a fotografia de moda seria “(...) a única que propicia ao fotógrafo a oportunidade de
se expressar tanto quanto uma ilustração, um trabalho editorial, uma reportagem”
(STUPAKOFF apud FERNANDES JUNIOR, 2006, p. 157).
É certo que o fotógrafo já demonstrava o apreço pela fotografia de moda em 1964,
ainda no Brasil:
As melhores fotos de moda do mundo são as editoriais, em que o que mais
conta é o “clima da moda”. Tecido e produtos manufaturados veem depois. O
resultado são fotos do gênero da Harper’s Bazaar. Aliás, as melhores fotos
de moda da mundo são publicadas na Bazaar e na Elle, revistas que guiam o
gosto do público e não são meramente comerciais.”(OTTO..., 1964, p. 9).
A integridade e a fidelidade a um estilo próprio, independentemente do veículo
para o qual ele fotografava, eram tidos como importantes valores para Stupakoff (1978a).
Para o fotógrafo, a alternância de estilos de acordo com a revista para a qual se estaria
trabalhando significava falta de autoria e de entendimento pessoal quanto aquilo que se
desejava comunicar. No entanto, Stupakoff também reconhecia a necessidade de fotografar
de acordo com o projeto gráfico da revista, mas sem abandonar sua maneira singular de ver
(STUPAKOFF, 2000c). Nessa perspectiva, ele próprio se classificava como fotógrafo que
criava pela própria força de vontade e por uma necessidade quase biológica de transmitir
uma mensagem pessoal (STUPAKOFF, 1960).
Ainda dentro da fidelidade a um estilo próprio, Stupakoff entendia ser
importante ao fotógrafo perceber quando “aquela foto não lhe pertencia”, compreendendo
sua linguagem pessoal a ponto de discernir entre aquilo que faz parte da sua própria

 
  296

linguagem imagética daquilo que não faz: “Você pode fazer motivos como Bresson, mas não
pode andar pelas ruas com Bresson na cabeça procurando imagens como as dele”
(STUPAKOFF, 1978a, 11min45seg). Para Stupakoff, a integridade significava articular o
conhecimento técnico do fotógrafo com aquilo que desejava transmitir dentro de parâmetros
que o satisfizessem, permitindo sensibilizar outras pessoas com visão semelhante a dele
(STUPAKOFF, 1978a). Também se abstinha de fotografar tudo a todo momento: “nunca fui
desses fotógrafos que andam eternamente com a câmera” (STUPAKOFF, 2000a, p. 23),
argumentando que diante da dor alheia, por exemplo, seria uma invasão do fotógrafo
registrar a pessoa, ou nos momentos sociais que às vezes não eram propícios aos registros
fotográficos.
Uma questão que emerge a partir desses apontamentos é como Stupakoff lidava
com sua necessidade de expressão pessoal e autonomia criativa frente às demandas impostas
pela foto comercial. Em fotos para revistas, por exemplo, existe um direcionamento criativo
muitas vezes definido previamente; além disso, os editoriais são pensados para atingir um
número significativo de pessoas. Uma resposta parcial a esse questionamento encontra-se
nos dizeres do próprio fotógrafo: “O autoral, sim, estará presente mesmo nos trabalhos
encomendados” (STUPAKOFF apud HARA; WOLFENSON, 2002, p.39). Ainda assim, ele
mesmo confessou uma tensão entre sua perspectiva da criação fotográfica com as
dificuldades com o mundo comercial: “A fotografia surgiu da necessidade íntima de achar
uma linguagem para me expressar e um motivo para existir. Minhas fotos desejam ser
viscerais, daí a dificuldade com o mundo comercial” (STUPAKOFF apud HARA;
WOLFENSON, 2002, p. 36).
À luz de Salles (2013), pode-se depreender que a criação realiza-se na tensão
entre o limite e a liberdade: “liberdade significando possibilidade infinita e limite estando
associado a enfrentamento de restrições” (SALLES, 2013, p. 68). Partindo-se dessa premissa,
a foto comercial estaria associada ao enfrentamento da lei, o que imporia, necessariamente,
ao menos algumas restrições à liberdade criativa do fotógrafo.
Quanto ao equilíbrio entre a liberdade e a restrição criativa, Stupakoff defendia o
ponto de que, mesmo em trabalhos comissionados, o fotógrafo deveria se sentir livre para
propor ideias concretas e válidas ao contratante, estabelecendo um diálogo de respeito mútuo
a partir de uma mesma escala de valores estabelecidas por ambos, e assim “criar as condições
para que você possa fazer o que você quer fazer” (STUPAKOFF, 1978a, 57min12seg).
Também fazia parte da sua relação com o universo comercial ter a possibilidade de negar
trabalhos que não se enquadrassem nos seus interesses – algo que teria aprendido em Nova
York – ou de interromper uma produção que não pudesse finalizar (por não ter as condições
corretas de prazo e modelo) – que aconteceu em trabalhos encomendados para a Vogue, por
exemplo (STUPAKOFF, 1978a). Somado a isso, Stupakoff afirmava existir no campo das

 
  297

revistas de moda uma significativa liberdade para a expressão pessoal (referindo-se às


décadas de 1960 e 1970), sendo a Harper’s Bazaar um veículo ideal para o fotógrafo mostrar
seu trabalho sem interferências (FERNANDES JUNIOR, 2006). Nesses termos, Stupakoff
parece ter encontrado um meio de conciliar as demandas da fotografia comissionada com sua
linguagem pessoal mantendo aquilo que ele denominava de integridade.
Outro ponto significativo quanto à maneira como o fotógrafo entendia o próprio
estilo estava naquilo que ele classificava como força sussurrante. Para ele, suas fotografias
“(...) não gritam, nunca gritaram” (STUPAKOFF, 1978a, 30seg). Essa delicadeza – e aparente
simplicidade – do registro fotográfico de Stupakoff está implícita no uso conciso de recursos
técnicos e de efeitos praticamente inexistentes, distanciando-o de superproduções e o
aproximando de um maior cuidado com os detalhes (como discutido no capítulo 5). Em um
aspecto mais amplo, a ênfase recai na sutileza com a qual ele construía as suas imagens.
Minhas fotografias têm ainda uma força que sussurra. E é através delas que
eu tento comunicar, sabendo que tenho que pensar e ver em diferentes luzes,
sempre curioso a respeito do modo de ser das pessoas, pronto para saber
apreciar as diferenças, minha câmera contando aos outros o prazer que
sempre tive (STUPAKOFF, 1978a, 33seg; 1978d,p.11)
Por vezes, Stupakoff reforçou a necessidade de simplificação da linguagem, que
tornaria mais fácil a comunicação (MENDONÇA, 1978a, p. 15). Esse é um traço criativo
expresso desde os primórdios da sua produção:
Procuro sempre ressaltar um detalhe ou outro, enquadrando minhas fotos
dentro de uma composição determinada. Os motivos que prefiro são os da
vida quotidiana: uma pessoa ou um animal que passa, um pedaço de rua ou
de casa. Nada acentuadamente dramático ou grandioso em si. Tento fazer
ressaltar o dramático ou o original nas coisas mais simples” (STUPAKOFF
apud MÓDULO..., 1956, p. 15).
A partir disso, também fica clara a ideia de que a força imagética da obra de
Stupakoff está na tentativa de revelar sentimentos mais profundos, para além da superfície
da fotografia. “Elas [as fotos] têm uma força que é intimista” (STUPAKOFF, 1978, 47seg.), no
sentido do receptor poder conceber ao menos parte daquilo que o fotógrafo sentiu ao
registrar a imagem. Esse buscar uma expressão mais subjetiva no registro fotográfico de certa
maneira dialoga com a teoria da equivalência de Alfred Stiglitz para quem o fotógrafo,
quando apresenta uma imagem que para ele é um equivalente20, está afirmando que teve um
sentimento no momento da criação e que aquela imagem apresentada ao receptor é uma
metáfora para aquele sentimento: “Emprego numerosos controles fotográficos para criar
uma imagem que seja ‘equivalente ao que vi e senti’ (...) Se eu me sair bem, o observador
aceitará a imagem como um fato, respondendo emocional e esteticamente a ela” (STIEGLITZ
apud WHITE, 2007 [1963], p.17).
                                                                                                               
20 Um exemplo está na produção da série Equivalentes (1923-1935), para a qual Stieglitz (1923) registrou imagens

de nuvens e do céu, sem fragmento de nenhum objeto, feitas para demonstrar a ideia de que sua fotografia refletia
a maneira como via as coisas e que transmitia um significado emocional e psicológico não pelo objeto temático em
si, mas pela forma como ele os capturava na imagem.

 
  298

Quanto a concisão de recursos técnicos, em 1978 Stupakoff declarou que “[as


fotografias] estão finalmente começando a chegar a um momento em que se torna
importante o que eu tenho a dizer e não os grandes efeitos” (STUPAKOFF, 1978a, 30seg).
Essa observação é confirmada por pessoas que o acompanharam em muitos dos momentos
do seu processo de criação. Thomaz Souto Corrêa (2017), por exemplo, diz que Stupakoff
usava de pouca iluminação e demais acessórios no momento de fotografar, essa informação
pode ser corroborada a partir de alguns fotogramas no qual há registro dos bastidores do
estúdio do fotógrafo na década de 1960. Neles, é possível observar elementos mínimos: dois
pontos de luz, a câmera e um cenário com modelos. Mais tarde, o próprio fotógrafo reforçaria
seu discurso quanto ao distanciamento de aparatos técnicos, confirmando sua procura por
tomadas mais próximas ao natural (FERNANDES JUNIOR, 2006).  
Ainda no âmbito da fotografia de moda duas particularidades se destacam no
estilo de Stupakoff conceber essas imagens: o trato das modelos como seres humanos reais e
não apenas como objetos a serem registrados pela câmera, e a fotografia de moda como
álbum de família.

Modelos como seres humanos, não objetos


Atrizes, atores e modelos fotografados por vezes são considerados pouco mais do
que objetos de cena. É notório o tratamento dado por muitos criadores a seus modelos – o
cineasta britânico Alfred Hitchcock, por exemplo, ficou célebre pela frase “Os atores são
gado” (apud TRUFFAUT, 2013, p. 140); o também cineasta Jean-Luc Godard clamava que
seus atores nunca trabalhavam o suficiente e não eram capazes nem mesmo de ler uma
página de jornal sem cometer um erro (BRODY, 2008). Stupakoff creditava ao seu modo
particular de fotografar pessoas o espaço profissional que alcançou no exterior. “(...) Quando
se tratava de ver as coisas de uma maneira mais humana eles me chamavam” (STUPAKOFF
apud SAMPAIO, 2007, p. 2).
O trato com os modelos (especialmente mulheres, ainda que ele também tenha
trabalhado com homens durante sua carreira) expressa duas características de Stupakoff: a
minimização da fotografia posada e seu olhar sobre o feminino. Quanto a trabalhar para diminuir
o registro de posturas estudadas e artificiais, ele dizia: “Sempre tentei que as modelos fossem o
mais descontraídas possível, que fossem atrizes, que pudessem viver a situação com a qual elas se
deparariam na locação” (STUPAKOFF apud CHICO, 2009, p.50).
Sobre a sua perspectiva do feminino, Stupakoff argumentava nunca ter
fotografado modelos, e sim, mulheres.
Meu diferencial era o olhar sobre o feminino. Enquanto os outros fotógrafos
de moda viam na modelo apenas um cabide para a roupa, eu buscava a
atmosfera de sonho e desejos femininos (STUPAKOFF apud CHIODETTO,
2005, p. 6).

 
  299

Com a consolidação de sua carreira, Stupakoff afirmava enfatizar as expressões


das modelos em suas fotografias mais do que as roupas que elas vestiam, sendo mais
importante capturar o que elas sentiam, o clima do lugar, do que meramente o detalhe da
roupa (MENDONÇA, 1978a). Nesse sentido, primeiro vinha a mulher, depois, já com o olhar
treinado, ele cuidava de apresentar bem a vestimenta. Para ele, a vida era mais importante do
que a moda (TESSITORE, 2016) e via “a mulher como ser humano, mais do que a
representação da modelo feita por uma modelo” (STUPAKOFF apud GIOIA, 2006, p.4). Esse
tipo de registro se perpetua ao longo da obra do fotógrafo. Para ele, “me interessa muito mais
a mulher que a veste. Minhas fotografias de moda, se você as olha hoje, são todas
inteiramente dedicadas à mulher” (STUPAKOFF apud BOCAYÚVA 1979, p. 10). Isso
permite-nos dizer que o fotógrafo tinha maior preocupação com a pessoa fotografada e não
somente com o vestuário que estava sendo registrado (STUPAKOFF, 1978b). Essa forma de
abordar o ser humano em suas fotografias reflete uma opinião própria de Stupakoff, que não
via o mundo sob o prisma da moda, apesar de sua profissão lidar diretamente com ela, mas
acreditava em uma sensibilidade especial capaz de transmitir emoção sendo impossível
reduzir a fotografia de moda a trajes, penteados e roupas (FERNANDES JUNIOR, 2006).

A fotografia de moda como álbum de família


Stupakoff apontava como uma de suas particularidade o fato de suas fotografias
de moda serem apresentadas com ‘ar de álbum de família’ (FERNANDES JUNIOR, 2006).
Demorei a entender que este era o diferencial de minhas fotografias. Elas
deveriam parecer instantâneos feitos nas férias, imagens que faríamos de
nossos familiares. É assim que eu vejo a fotografia (PERSICHETTI, 2006, p.
D2).
Ele também mencionou um editorial planejado para a Harper’s Bazaar, mas não
concretizado, como o ápice da menção ao álbum de família.
Havia um plano conjunto com a revista, que era pegar três ou quatro casais,
casados mesmo, e muita gente bonita, com filho, cachorro, etc, alugar uma
enorme casa, no campo de preferência, e fazer uma seleção de roupas para
cada um. Porém, seria dada aos casais a liberdade de escolherem o que
quisessem vestir e depois de fazer o que quisessem. Só então eu os
fotografaria. Mas queria deixar livre para que eles vivessem e eu ali, como
observador, sem dirigir ninguém. Esse seria o ápice do que eu gostaria de ter
feito. É uma ideia genial, porque tira o cacoete das fotos de moda e
transforma as imagens em um álbum de família, com enfoque na realidade
do momento. Imaginava alguém tocando violino, as pessoas tomando chá à
luz de velas. (STUPAKOFF apud OLIVANI, 2005, p. 3).
Apesar de Stupakoff não determinar assertivamente os aspectos que o permitiam
fazer uma associação direta entre as características de suas fotos de moda com aquelas de
álbuns de família, é possível inferir que o fotógrafo partia de uma concepção estética e
conceitual daquilo que se configuraria tradicionalmente como um álbum de fotos familiar,
identificável a partir de certos elementos recorrentes: (1) presença de personagens como pais,

 
  300

mães, filhos, irmãos, parentes; (2) registro de situações do cotidiano familiar; (3) registro de
situações de acontecimentos especiais como casamento, aniversário, viagens; e (4) fotografias
como objetos de recordação. Ainda, pode-se considerar o conceito de fotografia doméstica
que Soulages (2010) exemplifica como aquela realizada no domus (em casa, em família, em
férias, com amigos) e que nos permite lembrar do passado, no sentido em que “fui
fotografado assim, logo, eu existi assim” (cf. BARTHES, 2011).
A despeito de Barthes, um aspecto relevante na associação entre fotografia de
moda e fotografias de um álbum de família é que ambas podem ser entendidas como
encenações. Nesse ínterim, Soulages (2010) coloca no mesmo bojo desde a fotorreportagem
até a fotografia doméstica, alternando a ideia da objetividade fotográfica do “isso existiu
assim” para “isso foi encenado”. Ainda nesse sentido, Silva (2008) complementa que
“A foto [de família] é um ato teatral, se entendermos por teatral o que foi
feito deliberadamente, a criação de um espaço fictício, de personagens que
atuam e de um público que desfruta dessa atuação. Todavia, o que a
fotografia do teatro mais capta é algo tanto óbvio quanto inesperado: sua
condição de máscara – como já foi dito, de persona, sua máscara -, uma vez
que bater uma foto remete, sem dúvida, a algo inevitável: “como ficará
minha imagem” e, em seguida, “quem verá” (SILVA, 2008, p. 31).
Por esses termos apresentados acima, a fotografia de moda de Stupakoff explicita
o anseio de se aproximar do álbum de família ao emular um ideal cultural representado para
as câmeras, tendo a fotografia de moda uma ‘naturalidade’ ensaiada, assim como no álbum
de família.
Sob o ponto de vista social, Pierre Bourdieu argumenta que:
O álbum de família exprime a verdade da recordação social. Nada se parece
menos com busca artística do tempo perdido que estas apresentações
comentadas das fotografias de família, ritos de integração a que a família
sujeita os seus novos membros. As imagens do passado dispostas em ordem
cronológica, ‘ordem da estações’ da memória social, evocam e transmitem a
recordação dos acontecimentos que merecem ser conservados porque o
grupo vê um fator de unificação nos monumentos da sua unidade passada
ou, o que é equivalente, porque retém do seu passado as confirmações da sua
unidade presente. É por isso que não há nada que seja mais decente, que
estabeleça mais confiança e seja mais edificante, que um álbum de família
(BORDIEU, 1979, p. 31).
Ainda segundo Bourdieu, na imagem definida de antemão diante da câmera, a
ideia de naturalidade nada mais é que um ideal cultural, visto que o retratado apresenta para
as lentes uma imagem de si pautada em um conjunto de normas e nas quais ele está incluso
como ser social (BOURDIEU, 1979, p. 126-127). Por esses meios, nas fotografias de um álbum
de família o indivíduo atualiza a própria fábula pessoal.
Seguindo uma linha de raciocínio próxima a de Bourdieu, Fontcuberta (2010) diz
que nas coleção de fotografias pessoais aparentemente só se incluem situações agradáveis,
entendidas como exceções do cotidiano: ritos, celebrações, viagens, férias. Nesse sentido,
“Fotografamos para reforçar a felicidade desses momentos (...) Fotografamos para preservar
a estrutura de nossa mitologia pessoal” (FONTCUBERTA, 2010, p. 40).

 
  301

A abordagem da vida cotidiana nos editoriais de moda de Stupakoff segue os


atributos descritos por Bourdieu e Fontcuberta: registro de situações agradáveis,
representação de uma fábula pessoal e naturalidade ‘encenada’, pautada em um conjunto de
normas. Quanto a isso, Stupakoff confirmou sua tendência de procurar usar suas fotografias
para lembrar às pessoas do lado positivo da vida, mesmo em situações de conflito (caso de
Saigon) ou de pessoas em situação de pobreza (caso do trabalho Crianças brasileiras): “Há
muito tempo que eu procuro fotografar o lado positivo das coisas, porque é assim que eu me
sinto melhor”21 (STUPAKOFF apud NOGUEIRA, 1979, p. 50).
A partir dessa tônica de registro, os editores da Harper’s Bazaar consideravam
Stupakoff um fotógrafo da alegria e da espontaneidade cujo o calor com que tratava seus
temas revelava uma realidade sem amarras.
Um outro aspecto particular na abordagem da fotografia de moda de Stupakoff
que tangencia o álbum de família está naquilo que Irène Jonas (2010) aponta como mudança
na concepção da fotografia da foto familiar no final dos anos 1960, do retrato de família
ligado aos ritos de passagem (casamentos, festas de fim de ano, aniversários) de uma época
de restrição fotográfica – em que grande parte dos registros eram realizados por fotógrafos
profissionais – para os álbuns de família que contêm registros do dia-a-dia, a aparição de
novos momentos fotográficos, mais íntimos, a redução das fotos de grupo e de adultos em
posição central, e a diluição progressiva da fotografia posada para as de registro de
instantâneos mais soltos em situações diversas.
Nesses termos, diferentemente dos retratos de família de estúdio, observa-se na
obra de Stupakoff a variedade e espontaneidade de situações emulando casamentos, relação
entre pai e filhos e datas festivas até registros que expressam intimidades familiares. É
interessante notar que são tênues as diferenças entre as fotografias familiares do próprio
Stupakoff (como apresentadas no capítulo 5 desta tese) das suas fotografias de moda, uma
vez que, em ambas, a tônica não está no retrato tradicional – com familiares posando e
olhando diretamente para a câmera –, sendo mais livres e representando cenas do cotidiano
dos seus filhos e dos seus parentes mais próximos.

6.6 Não apenas um fotógrafo de moda


É certo que um dos aspectos condicionantes no reconhecimento do trabalho de
um fotógrafo é sua especialidade em determinada área, revelada pelas fotografias que se
tornam mais significativas, sendo publicizadas pelo próprio fotógrafo ou por terceiros (como
curadores, editores ou instituições culturais). A partir dessa perspectiva, mesmo a

                                                                                                               
21 Merece uma consideração a parte informar que apesar do aspecto positivo nas fotos de Stupakoff, este se dizia

capaz de registrar algo que para ele representasse tristeza. Cita uma foto feita em Salvador na qual uma mendiga
estende a mão a um transeunte todo de branco com as mãos em atitude de prece. Stupakoff compara o senhor de
branco com um anjo, e o atrela à falsa hipocrisia da “angelidade”: um anjo que não atende à mendiga (
STUPAKOFF apud FERNANDES JUNIOR, 2006).

 
  302

versatilidade e pluralidade de Stupakoff nas mais variadas expressões fotográficas – visível


na análise realizada nesta tese a partir dos seus copiões, dos diversos trabalhos fotográficos
da carreira e do levantamento da trajetória profissional do fotógrafo – não foram suficientes
para retirar a alcunha de “fotógrafo de moda” dada à Stupakoff pelo mercado norte-
americano (CLAUDIO, 2006).
Stupakoff afirmava ter um trabalho diversificado e se incomodava com o
reconhecimento do seu trabalho fotográfico somente pelo viés da moda. “Hoje, por exemplo,
estou fotografando flores” (STUPAKOFF apud CLAUDIO, 2006, p. 2):
(...) fotografei uma campanha de tintas buscando na natureza suas cores,
para a Vasp fotografei crianças nas vinte e nove cidades que ela servia, [fiz]
anúncios para o lançamento do Alfa Romeo e ainda assim me chamam de
fotógrafo de moda (STUPAKOFF in FERNANDES JUNIOR, 2006a, p. 7).
Ainda que Stupakoff tenha descoberto na fotografia de moda um caminho a
trilhar, de encontrar sua voz e linguagem pessoal, ele não se via definido apenas por esse
nicho da fotografia:
Eu não sou somente um fotógrafo de moda, pelo amor de Deus, eu pensei
que teria mais liberdade de me expressar, principalmente não fazendo
catálogo, mas, sim trabalhando para grandes revistas (STUPAKOFF apud
FERNANDES JUNIOR, 2006, p. 161).

Não se pode negar que há uma produção múltipla inserida na poética fotográfica
de Stupakoff e na qual a fotografia de moda é uma de suas vertentes. No entanto, isso não
descarta o protagonismo da moda na carreira do fotógrafo. A vultosa produção de Stupakoff
na área, especialmente para periódicos como Vogue e Harper’s Bazaar, e a sua citação como
um dos mais importantes fotógrafos de moda da década de 1970 no livro Vogue book of
fashion photography (DEVLIN, 1979) demonstram sua significativa contribuição para a
construção de uma cultura visual ligada ao mundo fashion.
Outro ponto importante que direciona a discussão sobre a especialidade na
produção de um fotógrafo está na determinação do gênero fotográfico. Em termos gerais,
gênero é empregado para sinalizar convenções de linguagens quanto à forma e estilo dentro de
uma categoria de comunicação (PICAUDÉ; ARBAIZAR, 2004). Segundo Krauss (2000, p. 220),
o gênero é um juízo que considera somente o referente – ‘é uma paisagem’, ‘é um retrato’ –
mas perde força quando se adentra nos discursos estéticos que tornam fluidas essas divisão.
Na fotografia, o gênero representa um conjunto de estratégias, opções formais e
princípios de constituição da imagem que se produz sob a interrelação da natureza do
referente, transformação sígnica e o tratamento expressivo que lhe acrescenta o fotógrafo
(SCHAEFFER, 2004).
Normalmente, a classificação por gêneros indica convenções associadas com a
história ou características daquele estilo – não somente com a finalidade de se estabelecer
regras, mas também para facilitar a coerência de signos. Outras vezes, não é a estrutura da

 
  303

imagem que sinaliza o gênero e sim o contexto em que ela aparece, a forma como está
ajustada. Se for formatada como um retrato, por exemplo, pode ser julgada em relação à
representação de um personagem, mas também pode ser usada em um anúncio, ilustrar um
artigo de reportagem ou ser exibida em uma galeria de arte. Com isso, ao atrelarmos
determinada foto a um gênero fotográfico é conveniente aludir também aos efeitos do
contexto – exposição, edição, difusão – e também ao uso do gênero como categoria receptiva
e/ou criativa. Perante a afirmação que as fotografias de Stupakoff para a Harper’s Bazaar
são fotografias de moda queremos dizer que elas têm sido tomadas em condições próprias da
reportagem de moda.
Quanto a isso, Schaeffer (2004) propõe um esboço de subdivisão de gêneros da
fotografia: (1) os meios técnicos utilizados (preto e branco, película, digital); (2) as práticas
sociais (publicidade, arte, comunicação); (3) os suportes (livro, exposição, periódico); e (4) os
objetos representados (retrato, paisagem, família). Essas classificações mais usuais impõem
distinções funcionais, como fotografia documental, científica, de arte e publicitária, distinções
referenciais, como paisagem, arquitetura, retrato, nu, e uma combinações de ambas.
Mesmo que parte da história da fotografia identifique a produção fotográfica a
partir de determinados gêneros fotográficos – retrato, moda, paisagem –, muitos fotógrafos
que se esquivam desse tipo de rótulo. É o caso, por exemplo, do francês Bernard Plossu, que
diz se sentir “simplesmente um fotógrafo de 50mm” (referindo-se à distância focal da
objetiva) (PLOSSU apud PICAUDÉ; ARBAIZAR, 2004, p. 108) e não um fotógrafo de viagem,
de crianças ou de motivos sociais, clichês estes que lhes são atribuídos. Para Fontcuberta,
“não é possível para a fotografia outro gênero que não a natureza-morta” (FONTCUBERTA,
2010, p. 48), no sentido de que qualquer parte do mundo, através do visor da câmera,
transfigura-se em um retalho de natureza inerte. Nesse sentido, a divisão da fotografia em
gêneros pode ser demasiado limitante, pois não contempla toda a mescla e intercâmbio
possíveis inerentes à criação fotográfica, como a imagem de imprensa que se transforma em
referência histórica ou uma natureza morta que se transforma em fotopublicitária
(PICAUDÉ; ARBAIZAR, 2004). Picaudé e Arbaïzar (2004) também levantam a questão se,
do ponto de vista da concepção, o gênero é um impedimento para a criação ou uma condição
para a expressão criativa.
Stupakoff compartilhava da visão dos teóricos acima citados, pois não via sua
expressão fotográfica condicionada a um único gênero. Ao contrário, ele sempre afirmou ter
uma única maneira de ver e uma mesma atitude fotográfica independentemente da aplicação
ou finalidade da imagem produzida, fosse ela para moda, em registros de rua ou retratos
(FERNANDES JUNIOR, 2006).
A ideia desse olhar único pode ser observada a partir da identificação de uma
linha condutora presente na múltipla e versátil produção de Stupakoff e que perpassa

 
  304

qualquer fotografia por ele produzida, independentemente da sua distinção funcional


fotográfica (moda, família, viagem), apontando para a integridade do olhar do fotógrafo. Sob
esse perspectiva, as análises da tese nos permitem apontar a presença de denominadores
comuns presentes nas imagens do fotógrafo. Entre eles, destacamos a predominância do
registro de pessoas (em detrimento a paisagens e still life, por exemplo), o trabalho dos
modelos como personagens (mesmo quando eram familiares sendo registrados), a inserção
de situações que extrapolavam o quadro, o tipo de enquadramento tendendo ao plano médio,
e a retratação do contexto (ambientes, histórias, situações) para além do que a imagem
enfatizava. Esses elementos recorrentes permitem-nos descrever a expressão fotográfica de
Stupakoff como algo amplo e desprovida da intenção de delimitações por gênero, mesmo que
suas imagens tenham sido por vezes enquadradas em algumas categorias.
De fato, muitas das obras do fotógrafo flertam com diferentes gêneros
simultaneamente. Como visto no capítulo 5, a série com sua ex-esposa Margareta com os
filhos Gabriela e Sef em Berchères-sur-Vesgres (Figura 129) constituia-se, para Stupakoff, de
autênticas fotografias de moda, dentro do seu estilo de fotografar trabalhos comissionados.
Esse exemplo se aproxima de uma situação vivenciada pelo fotojornalista Bernard Plossu,
que, diante de uma encomenda do Museu de Toulon para fotografar ‘o corpo, as provações:
preto e branco’, selecionou um conjunto de imagens registradas dos primeiros instantes e
primeiros dias de seu filho Joaquim (SOULAGES, 2010).
A reflexão acima também se aplica às fotografias de moda de Stupakoff quanto
aquilo que escapa aos estereótipos do gênero. Sob o entendimento de terceiros, como Bea
Feitler, algumas obras do fotógrafo eram ‘fotos de moda que não pareciam fotos de moda’
(STUPAKOFF, 1978a). Para Feitler e Ruth Ansel (ambas editoras de arte da Harper’s
Bazaar), muito do interesse pela obra de Stupakoff estava pautado na particularidade delas
não se parecerem com fotografias típicas de moda (STUPAKOFF, 1978a). Na mesma linha
pode-se enquadrar o interesse de Francine Crescent, editora da Vogue entre 1968 e 1987, que
disse: “Otto, o que nós mais gostamos em seu trabalho é que ninguém mais fotografa como
você e as suas fotografias não parecem da Harper’s Bazaar nem da Vogue” (CRESCENT
apud FERNANDES JUNIOR, 2006, p. 162).
Essa caracterização de ‘foto de moda com pouco de moda’ foi entendida por José
Nogueira (STUPAKOFF, 1978a) como correspondendo à fotografia soft – no sentido de não
ter as superproduções esperadas desse estilo fotográfico e também pelo fato de Stupakoff
dizer-se pouco interessado na moda em si, ainda que visualizasse a fotografia desse segmento
como um veículo pelo qual ele podia expressar seus sentimentos (STUPAKOFF, 1978a). “Eu
fazia questão que minhas fotos não parecessem fotos de moda. Sempre detestei maneirismos.
A vida é mais importante que a moda” (STUPAKOFF apud CHIODETTO, 2005, p. 6).

 
  305

Outra abordagem quanto à fluidez da obra fotográfica de Stupakoff no que diz


respeito à classificação em um gênero específico está no desprendimento da imagem do
espaço cultural no qual elas estavam ancoradas a princípio (revista, jornal, exposição) e na
eventual disseminação de seus significados em outros meios. Como exemplos, há registros
incorporados na Coleção Pirelli/MASP (e.g. Figuras 103 A-D, 104 A-C e 105 A-B) que
possibilitam um estudo comparativo e crítico sobre a inserção e exposição de fotografias que,
em um primeiro momento, não tiveram um viés museológico, mas que atendiam a critérios e
parâmetros que as levaram a serem expostas em um museu de arte.
Essa discussão nos possibilita entender se uma fotografia produzida em um
determinado contexto, atrelada a um possível gênero fotográfico, pode ser também entendida
como um sistema aberto de possibilidades e de espaços discursivos (KRAUSS, 2002).
Segundo Krauss, em relação aos espaços discursivos, uma mesma fotografia poderá estar no
espaço de discurso da estética ou da ciência dependendo de como é tratada. Um exemplo
oferecido por ela é a comparação entre a foto de Timothy O’Sullivan Tufa Domes em
Pyramid Lake, Nevada de 1868, que apoia-se nos códigos da fotografia de paisagens no
século 19, e a cópia litográfica dessa mesma tomada fotográfica utilizada na publicação da
obra de Clarence King, Systematic Geology (Geologia Sistemática) de 1878. A partir desse
exemplo, Krauss argumenta que diferentes discursos de uma imagem estão subordinados à
forma como ela é construída: uma mesma imagem fotográfica pode ser dotada de linguagem
em que são empregados elementos para uma análise científica ou ter esses mesmos
elementos suavizados e/ou transformados através de uma linguagem estética, apreciativa e
contemplativa.
Podemos ilustrar esse pensamento de Krauss através de imagens produzidas por
Stupakoff, como Cynthia (Figura 103B) e Ian (Figura 105A), as quais estariam
primeiramente no espaço discursivo da fotografia doméstica ou afetiva. Como discutido
anteriormente, Soulages (2010) exemplifica a fotografia doméstica como aquela realizada no
domus (em casa, em família, em férias, com amigos) e que nos permite lembrar do passado.
Tanto Cynthia quanto Ian, a despeito do contexto original em que foram criadas, são
também retratos, assim como o são Xuxa no Copacabana Palace (Figura 104A) e Tahiti
(Figura 104B), no sentido de serem registros orientados pela reciprocidade entre o que o
fotografado dá e o que o fotógrafo toma através de seu enquadramento. O retrato fotográfico
seria então um produto dessa intercessão (ACKER, 2004). As imagens Salvador (Figura
104C) e Águas Termais, Baden-Baden (Figura 105B) estariam dentro do contexto de
fotografia de viagem e ao mesmo tempo são registros de nus. Xuxa no Copacabana Palace e
Tahiti foram publicadas em revistas do segmento da moda. As imagens supracitadas
estariam atreladas a um determinado gênero com todas as suas implicações criativas, uma
vez, que no momento específico da criação, do planejamento e do ato fotográfico, o autor as

 
  306

concebeu com um pensamento determinista que pode ter direcionado seu ponto-de-vista
para uma finalidade específica; ainda assim, esses registros também funcionam em outros
contextos (o que os faria ser classificados em outro gênero). A foto é a arte do arquivo mais
por proporcionar usos e recepções diferentes segundo momentos e perspectivas distintas de
utilização do que por permitir guardar o passado (SOULAGES, 2010).
Também é fato que fotografias realizadas com intenção primeira de serem
documentais, jornalísticas e científicas, por exemplo, foram depois se diversificando em seus
usos, sendo incorporadas a outras linguagens como a da publicidade e da moda, afinal o
destino das imagens fotográfica pertence ao devir, ao vir a ser. Para Soulages (2010), sempre
é possível dar outro significado a uma fotografia pois seu destino social e histórico é adquirir
outros sentidos. É o caso, dentre muitas outras, de uma fotografia de Helmut Newton
inicialmente produzida para a publicidade dos Perfumes Rochas, tendo sido posteriormente
utilizada na capa do livro L’érotisme du toucher des étoffes (TISSERON-PAPETTI;
TISSERON, 1988) e também exposta em um museu de arte.
Conjecturas sobre a inserção de fotografias em diferentes espaços discursivos e
com funções outras que aquelas primeiramente determinadas podem ser construídas a partir
da filosofia da mestiçagem (SERRES, 1993). Ao discutir a aquisição de conhecimento, Serres
apregoa que a real inventividade não se dá pelos caminhos conhecidos, mas pelas intersecções,
nos caminhos terceiros. No conhecimento cartesiano algo é ou não é, sem uma terceira opção:
nesse tipo de lógica clássica, há apenas verdade ou falsidade, não há meio termo, e o terceiro
valor da expressão é excluído. Em contraponto ao cartesianismo, Serres (1993) enuncia aquele
que não está em uma coisa ou outra, que não está em um lugar ou outro, mas sempre um
terceiro. A terceira possibilidade – um intermediário, um caminho diferente, uma passagem
alternativa –, é para Serres o ponto fundamental. Em certo sentido, isso se aproxima da lógica
fuzzy ou difusa, na qual os valores das variáveis podem ser qualquer número entre 0 e 1, lógica
esta utilizada para lidar com o conceito de verdade parcial (onde os valores podem ser
compreendidos entre o completamente verdadeiro e o completamente falso) (CRILLY, 2017).
Ao trazer essa reflexão para a fotografia, que é uma fonte de conhecimento visual,
podemos dizer que esta pode se encontrar em um terceiro (cf. SERRES, 1993) no qual
existiria o contato entre as vertentes fotográficas, por exemplo. Assim, longe da lateralidade e
das categorias arbitrárias estanques “moda”, “arte”, “documental”, “retrato” do mundo
cartesiano, podemos atribuir ao trabalho de Stupakoff uma prática mestiça. As fotos de
Stupakoff estariam nesses lugares de contato, entre “fotografia moda – fotografia arte”,
“fotografia doméstica – fotografia arte”, “fotografia viagem – fotografia arte”, i.e., um terceiro
(cf. SERRES, 1993), sendo que essa linha de raciocínio pode ser aplicada também em outros
binômios, como “fotografia de moda – fotografia de família”, “fotografia de família –
fotojornalismo”.

 
  307

Esse terceiro é um espaço entre, espaço das interferências e da


interdisciplinaridade. Os nus são também retratos. Os retratos, por sua vez, têm um valor de
apresentar um personagem em uma página de revista e também têm um valor pessoal para
aquele que foi retratado. Ao mesmo tempo, algumas dessas referidas imagens de Stupakoff
estão à venda em leilões de arte e todas foram expostas e incorporadas a seu tempo em
acervos (como o do MASP e do Instituto Moreira Salles). O espaço terceiro pode ser visto
aqui como o acolhimento da polissemia da imagem fotográfica. A imagem fotográfica em si
permite multiplicidade de sentidos, mas, quando apresentamos a imagem rotulada como
fotografia de moda, fotografia publicitária ou fotografia doméstica, a polissemia é contida,
uma vez que há um direcionamento de interpretação.
Das pontuações desenvolvidas acima, fica claro que as fotografias de Stupakoff,
como a de outros tantos fotógrafos, suplantam a veiculação dos meios originais para o qual
foram cridas – no caso do nosso objeto de estudo, especialmente periódicos voltados para
moda – e são comercializadas em galerias de arte, por exemplo, alternando-se os espaços
discursivos e alargando a noção de gênero para uma região fronteiriça na qual entre um
gênero e outro há uma diluição.
No entanto, apesar de não haver elementos definitivos para se determinar a qual
campo pertence essa ou aquela imagem fotográfica, as decisões durante o processo criativo
por vezes estão atreladas ao tipo de discurso e aplicação à qual a imagem originalmente se
destina, influenciando as decisões do fotógrafo. Mesmo diante da sua indiferença por gêneros,
a disposição e olhar de Stupakoff para aquilo que fotografava carregava particularidades que
direcionavam seu processo de criação no que concerne a considerar o planejamento e o modo
que rege a feitura da imagem e sua aplicação. Tendo isso em vista, é possível discernir a
conduta de criação de Stupakoff mais na ideia de trabalho em ‘cenários criativos’ como o
retrato, a moda, a publicidade, registros de rua e viagens, com a pluralidade manifesta na
integração dessas diversas modalidades fotográficas, do que necessariamente em um
pensamento calcado no isolamento por gêneros.
Ainda sob o viés do estudo da imagem e do processo de criação caminhamos na
esteira de Soulages (2004), para quem é possível refletir sobre a fotografia, e colocar sua
estética em campo, quando podemos compreender os problemas que nela existem e elaborar
respostas ou formular outros problemas. A compreensão dessas questões surge a partir do
confronto e do exame das diferentes modalidades segundo as quais as fotografias são
encomendadas, produzidas, criadas, comunicadas, recebidas e, por fim, contempladas.
Dependendo dos diferentes conjuntos fotográficos ou diferentes modalidades de
produção/criação desses conjuntos, o problema pode ser colocado de diferentes formas. A
escolha desses conjuntos para um estudo tem a ver com seu valor, profundidade,
originalidade e exemplaridade, uma escolha estética axiológica provisória.

 
  308

6.7 Quando eu era fotógrafo: das colagens e assemblages aos textos

O fotógrafo que deixei de ser é aquele que ainda sou:


o que pensa, consciente22.

Na história da fotografia não é incomum encontrar fotógrafos que extrapolaram


seus limites criativos para além da expressão fotográfica. É o caso de Henri Cartier-Bresson,
que retornou à pintura e ao desenho próximo do final de sua vida, de Irving Penn, que
pintava cenas de rua e natureza morta, e Félix Nadar, reconhecido caricaturista e escritor de
curtas novelas e ensaios (NADAR, 1900). Esse também é o caso de Otto Stupakoff. A despeito
de ter concentrado sua expressão criativa no terreno da arte fotográfica – na acepção do
termo dado por Rouillé (2009) – pela maior parte da sua carreira, seu caráter
multidisciplinar o fez estabelecer diálogo com outras expressões visuais: colagem,
assemblage, desenho e pintura, e com o campo da produção audiovisual e de textos.
A aderência a outras formas de expressão dentro das artes visuais foi constante
por toda a trajetória de vida do fotógrafo, intensificando-se entre as décadas de 1990 e 2000.
Nesse processo, como representativas desse universo, destacamos a exposição de fotografia e
colagens na Petite Galerie (em 1963), a 63/66 Figura e Objeto ocorrida na Galeria Milan (em
1988), em que expôs uma de suas colagens do movimento Realismo Mágico (Figura 188A),
além da inclusão da sua obra House of Card (apresentada no capítulo 1 da presente tese) no
MoMA como os eventos mais importantes desse tipo de obra de Stupakoff, bem como as
exposições em pequenos circuitos de arte nos EUA nos anos 2000 (BURGI, 2017) como na
Galeria de Coffey (como visto no capítulo 1) e Amarcord Gallery na cidade de Beacon (estado
de Nova York), na qual exibiu assemblages em caixas de acrílico (FERREIRA, 2004).
A colagem e a assemblage destacam-se no montante das incursões artísticas de
Stupakoff. Sobre a colagem, expressão para qual o fotógrafo se dedicou desde a década de
1960, Corrêa (2017) nos conta que Stupakoff era um coletor de pedaços de papel, objetos e
restos de materiais encontrados nas ruas, tudo aquilo que pudesse ser incorporado em uma
compilação para colagens e assemblages; Pedro Manuel-Gismondi pondera que “nesse colher
e procurar velhos destroços para dar-lhes nova vida está o saudosismo do passado e a sede de
porvir de Otto Stupakoff” (MANUEL-GISMONDI, 1963, p. 4). Não deixa de ser notório que,
em certo sentido, ele dava ao lixo um novo valor de uso, agora do ponto de vista artístico.
A incursão na colagem ainda nos anos 1960 em São Paulo foi uma forma de
Stupakoff compensar o trabalho estritamente comercial e manter a integridade do trabalho
criativo (STUPAKOFF, 2000a); as colagens substituíram a carência dele permanecer dentro
da fine art em contraponto ao trabalho produzido no estúdio da Frei Caneca, normalmente
mais comercial.

                                                                                                               
22 STUPAKOFF apud HARA; WOLFENSON, 2002.

 
  309

Stupakoff atribuiu às diversas cristaleiras e alguns outros objetos de arte com o


qual teria entrado em contato quando criança na mansão da tia Zazá Cunha Bueno como
grandes inspirações em suas colagens, segundo ele:
Inspirado muito na minha memória de infância, das coisas lindas que minha tia
Cunha Bueno tinha na casa dela, dentro de uma cristaleira, e eu sempre queria
pegar as coisas e não podia porque a chave estava escondida. E eu faço as
minhas colagens por aí... (STUPAKOFF, 2000d, p. 12).
Segundo ele, as caixas de vidro vistas nas figuras 187 A-D foram inspiradas nessas
prateleiras, assim como seus objetos nelas trancados: “construí caixas de vidro dentro das
quais eu contava uma história, depois lacrava o vidro e nem eu mais podia entrar. Isso vem
de lá [prateleiras da tia Zazá]” (STUPAKOFF apud FERNANDES JUNIOR, 2006, p. 156).
Essas assemblages são dilatações das colagens que “agora se transformaram em caixas de
acrílico grandes, pequenas, com todo um mundo acontecendo ali dentro, intocável”
(STUPAKOFF, 2000d, p. 12).

(A) (B)

 
  310

(C) (D)
Figura 187. As caixas de vidro de Stupakoff. (A) Sem título, 1960. (B) Regrets Box, ca. 2003. (C)
Sem título, s/d. (D) Sorrow Box, 2003. Fonte: (A) (B) Fotos do Acervo Instituto Moreira Salles; (C)
(D) Arquivo pessoal de Stupakoff.

Juntamente com as caixas citadas acima, a série de colagens e assemblages


apresentadas nas figuras 188 A-F oferece uma visão geral do trabalho de Stupakoff em
expressões artísticas para além da fotografia entre as décadas de 1960 e 2000. Dentre as
quais Asura e Fortíssimo, ambas de 2004, fazem parte das vinte e nove colagens
incorporadas no acervo do MAM.

(A) (B)

 
  311

(C) (D)

(E) (F)
Figura 188. (A) Das under wasser boot, 1962. (B) Aquário do Imperador Ashoka, 2004. (C)
Asura, 2004. (D) Fortíssimo, 2004. (E) Sem título. 2006. (F) Eyes of God II, ca. 2006.
Fonte: (A) Mendonça, 1988; (B) (C) (D) Acervo MAM; (E) (F) Fotos das obras/Acervo IMS.

O aspecto lúdico e menos rígido da colagem como expressão artística foi


valorizado por Stupakoff, o que pode ser identificado por ele ter recorrido à citação do pintor
Robert Motherwell, que descreveu a colagem como uma forma de brincar, dizendo que lhe
trazia mais alegria e o fazia sentir-se menos austero (FERREIRA, 2004). Uma possível
interpretação sobre o interesse perene de Stupakoff por colagens e assemblages,
representativas desse ludos (do latim para jogos e divertimento), está relacionada ao caráter
de puer aeternus constante em sua trajetória profissional – visto, por exemplo, em suas
composições com crianças (analisadas no capítulo 5) –, significativo de um lado da infância
que teria permanecido como característica marcante em Stupakoff.

 
  312

Outro aspecto pertinente é propor uma


aproximação entre a colagem e o fotografar.
Primeiramente, a aproximação mais óbvia é quanto
ao uso da fotografia em seu formato canônico, que se
transforma ou se acomoda em função da interação
com os outros elementos, em algumas das colagens e
assemblages de Stupakoff (como na Figura 189). Ou
na concepção do Calendário Shell (de 1963, descrito
no capítulo 1) para o qual Stupakoff criou a
composição em natureza morta e a repensou em
termos fotográficos (STUPAKOFF, 2000a). Isso se
enquadra naquilo que Rouillé (2009) diferencia como
Figura 189. Uso da imagem arte dos fotógrafos, i. e., desígnio de um procedimento
fotográfica na assemblage. artístico interno ao campo fotográfico, da fotografia
Fonte: Acervo Fernando Laszlo.
dos artistas que remete à prática da fotografia por eles
ou a sua utilização como resposta a questões especificas da arte. Nessa questão, Stupakoff
atua pelos dois lados: tanto na arte dos fotógrafos, por conta da sua própria atuação
profissional, quanto na prática da fotografia por artistas, quando contribui com Wesley Duke
Lee em suas obras ou quando usa suas próprias fotografias em suas colagens.
Outra aproximação possível está em se estabelecer que tanto a maneira de
trabalhar, conceber e entender colagens e assemblages quanto a forma de fazer fotografias de
Stupakoff refletem um processo semelhante de pensar a construção da imagem. Em uma
digressão sobre a técnica da colagem, Stupakoff oferece uma imagem sobre a fixação das
formas na colagem.
O trabalho de recortar papéis, objetos e colar, em vez de pintar – a colagem –
tem origens muito antigas, perdidas na história desde seu início. Adquiriu
ímpeto maior na Rússia de 1910 e em Paris nos anos 20, com os cubistas e
construtivistas, e sua paixão por integridade e pela unidade das formas
afixadas, para “segurar” os fragmentos tempestuosos da realidade e colocá-
los onde pertenciam (STUPAKOFF apud FERREIRA, 2004, p. 8).
Partindo da concepção de que tanto a fotografia quanto a colagem envolvem
composições pelo ato ou efeito de combinar elementos semelhantes ou diferentes em
determinada ordem, alguns dos trabalhos fotográficos de Stupakoff se aproximam do
pensamento empregado para se fazer colagens no que tange a selecionar e reunir em uma
composição fragmentos da realidade que criam, juntos, um determinado contexto. Tomando
as figuras 190A e 190B como exemplo, vemos nessas composições a disposição de vários
elementos ou acontecimentos que se resolvem em uma unidade formal no quadro. Na figura
190A o plano da modelo com as crianças cria uma realidade que parece não ser a mesma dos
personagens ao fundo à esquerda e à direita, mas que se sobrepõem em um espaço (da foto).

 
  313

Algo similar pode ser observado na figura 190B na qual a modelo partilha espaço com
personagens e cenários ao fundo mesmo aparentando não compartilharem da mesma
realidade.

(A)

(B)
Figura 190. Aproximação da linguagem fotográfica de Stupakoff com a ideia de colagem. (A) Foto
do editorial Baden-Baden, 1974. (B) Página de Vogue Brasil, 1979. Fonte: (A) Reprodução da
revista/Acervo IMS (B) Reprodução da revista/Borges; Carrascosa, 2002.

Para além das expressões visuais, a escrita era outra manifestação criativa de
Stupakoff. Segundo o próprio, era uma maneira dele organizar seu pensamento: “Dedico-me
muito a escrever, rever e reescrever. É uma maneira de viajar, de colocar pensamentos em
ordem, de rever nossa psicologia. É também outra forma de estética, onde nos colocamos em
face à dignidade da arte” (STUPAKOFF apud MILLEN, 2016, p. 2).
A facilidade em se expressar pelo texto, tanto no âmbito da ficção quanto da não-
ficção, contribuiu para Stupakoff promulgar seus sentimentos e ideias através de uma linha
que não a das artes visuais. Dos seus textos publicados estão: Carta a um jovem fotógrafo,
da revista Íris (agosto de 1979), uma adaptação que Stupakoff fez do texto de Rainer-Maria
Rilke (STUPAKOFF, 1979); Lembretes (STUPAKOFF, 2006a), um texto introdutório

 
  314

apresentando a própria visão de vida e carreira; e três textos curtos narrativos-ficcionais


escritos entre 2004 e 2008 e incorporados no livro Sequências Otto Stupakoff (INSTITUTO
MOREIRA SALLES, 2009a), Ci, Kolkata e A mulher de Praga. Em entrevista, o fotógrafo
também sugeriu que estava preparando um livro que seria intitulado Encontros com o
feminino (título também de um documentário autobiográfico não realizado), que versaria
sobre as mulheres que conheceu em suas andanças pelo mundo, em uma confluência de
fotografias e textos, e que seria editado pela HarperCollins (FERREIRA, 2004;
PERSICHETTI, 2006). Alguns dos textos narrativo-ficcionais dialogam diretamente com
elementos de suas vivências fotográficas e possuem caráter memorialístico. Ci narra uma
viagem feita pelo rio Amazonas na segunda metade da década de 1970; Kolkata remete à
viagem à Índia em 1968 e relata sua interação com duas meninas indianas que o guiaram
pelas ruas da cidade de Calcutá (essas meninas foram fotografadas e a descrição no texto
coincide com a fotografia intitulada Kolkata, apresentada na figura 61A); e A mulher de
Praga referencia Renata, personagem presente em algumas de suas fotos (como nas Figuras
99A e 126). Esses textos são construídos de forma a lembrar um diário no qual Stupakoff
descreve de forma literária episódios de sua vida, normalmente referentes a viagens; na
escrita expressa aquilo que a fotografia não alcança, detalhes de seus sentimentos e sensações
dos momentos vividos.
As explanações acima mostram que a sintonia com outras formas de expressão
não era secundária na obra de Stupakoff e que as aproximações entre fotografia-texto,
fotografia-colagem e fotografia-assemblage eram condições identificáveis em sua forma de
pensar a imagem.
 

 
  315

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A presente tese apresentou a atuação e contribuição do fotógrafo brasileiro Otto


Stupakoff para o campo fotográfico nacional e internacional, e discutiu aspectos do seu
projeto poético via estudo do processo de criação. Para isso, discorremos sobre um caráter
peculiar e um percurso específico do indivíduo, tomando por base a obra construída por
Stupakoff durante mais de cinquenta anos, e permeando a argumentação de questões de
âmbito pessoal quando estas eram significativas para a análise da obra, tendo influenciado
sua conduta poética. Todas as evidências biográficas levantadas foram estratégias
encontradas para fornecer os elementos que permitiram apreender a dimensão visual da obra
e discutir as idiossincrasias e especificidades da vida e da produção de Stupakoff.
Stupakoff foi descrito como um homem generoso, gentil, tátil, que tinha
necessidade de produzir artigos manuais (vide sua obsessão por carimbos e os inúmeros
envelopes pintados e desenhados de próprio punho que enviava a amigos). Também foi
realçada sua simplicidade cristalina, e a ironia como aspecto constante de seu humor. Em
contraponto a essa simplicidade, ele também gozava de uma vida mais sofisticada,
hospedando-se em hotéis luxuosos e viajando pelo mundo em primeira classe; por vezes,
Stupakoff distanciava-se do bom humor, apontando em si uma certa melancolia (acentuada
nos últimos anos de vida)1.
As caracterizações descritas acima, de certa forma, delineiam e sintetizam
qualidades pessoais que se refletem na obra de Stupakoff. O transitar com desenvoltura de
um estado ao outro, da simplicidade ao requinte, demonstra a amplitude do seu trabalho, que
contém desde registro de crianças vietnamitas nas ruas de Saigon até rastros do genocídio do
Camboja, passando por crianças para editoriais da Harper’s e modelos em trajes sofisticados
da Vogue.
A carreira de Stupakoff despontou no final da década de 1950 e início de 1960. A
fotografia brasileira da época voltava-se para uma produção de imagens com viés moderno
(mais gráfico, vinculado à estética das vanguardas brasileiras) (COSTA; SILVA, 2004); uma
expressão significativa da fotografia brasileira estava calcada no fotojornalismo de tradição
clássica humanista, social e realista direcionada por periódicos como o Jornal do Brasil (no
Rio de Janeiro), que destacava a fotografia na primeira página, e no crescimento da fotografia
em revistas ilustradas impressas em cores como Manchete e O Cruzeiro, que compreendiam
a imagem fotográfica como notícia (FERNANDES JUNIOR, 2003). Apesar desse cenário,
Stupakoff preferiu se especializar nos EUA com um formação fotográfica que lhe desse maior
possibilidade de atuação. A escolha da fotografia como modo de expressão foi algo orgânico

                                                                                                               
1 Apesar da falta de diagnóstico oficial, alguns relatos sugerem que Stupakoff apresentava depressão existencial

no final da vida.

 
  316

para ele, que dizia ser esta uma consequência natural para sua existência, ao mesmo tempo
que era um meio de crescimento pessoal: “Eu sou fotógrafo porque é isto o que estou fazendo.
Mais ou menos como meu pai, que fabricava cerveja, eu faço fotografias enquanto trabalho
em mim mesmo” (STUPAKOFF apud NOGUEIRA, 1979, p. 52).
Para além do fotojornalismo, existiam no Brasil outras produções como os
registros em estúdio (de retratos e produtos) e a fotografia publicitária, em ascensão a partir
do final dos anos 1950 principalmente por conta de anúncios veiculados em revistas. Nesse
período, a publicidade era um campo propício para atuação profissional, principalmente
através da expansão de agências estrangeiras que trouxeram modernidade para a
propaganda nacional. Além disso, a industrialização e a urbanização crescentes das
principais capitais do país ampliaram um mercado promissor para produtos de consumo
diverso (COSTA; SILVA, 2004, p. 13). Com isso, as empresas passaram a apostar mais na
publicidade como forma de diferenciar suas marcas no mercado, anunciando nas principais
mídias: rádio, televisão (ainda incipiente) e revistas. Soma-se a isso o fato de ter sido uma
época de mudanças gráficas e editoriais na imprensa brasileira, com a diversificação das
publicações (na virada da década de 1950 para 1960 surgem, por exemplo, as revistas Senhor
e a feminina Cláudia).
Após seus estudos nos EUA, Stupakoff retornou ao Brasil em final de 1950 e
encorpou o rol de fotógrafos publicitários do país. Com o polo da propaganda concentrado no
eixo Rio de Janeiro – São Paulo, ele fixou sua base profissional nessas duas cidades,
direcionando sua atuação nesses primeiros anos de profissão para a fotografia de publicidade,
moda e para retratos de estúdio.
Em meados da década de 1950, o Brasil passava por significativas mudanças
sociais e políticas, dentre elas a construção da nova capital federal, Brasília, que Stupakoff
acompanhou ao registrar algumas das construções de Niemeyer com um viés mais
documental. Esse sentido de documentar aspectos da realidade apareceu intermitentemente
na obra de Stupakoff, como no registro dos trabalhadores rurais, das crianças brasileiras e
nas fotografias do Camboja. Desde o início da sua produção, tal flexibilidade de temática foi
marca desse fotógrafo. Ainda que reconhecido como fotógrafo de moda, Stupakoff produziu
para além desse rótulo.
Stupakoff foi contemporâneo do desenvolvimento da indústria têxtil e do fio
sintético no Brasil, que impulsionaram o prét-à-porter. Ele e outros personagens da Rhodia
contribuíram para o propagação desse setor – foram pioneiros na fotografia de moda no
final da década de 1950 ao produzir imagens que antes eram, na sua maioria, compradas do
exterior (com produção nacional ainda incipiente).
O desenvolvimento da carreira fotográfica de Stupakoff continuou nas revistas
internacionais para as quais produziu retratos, editoriais de moda e publicidade. Um

 
  317

significativo rompimento em sua trajetória foi seu afastamento do cenário nacional em


meados de 1960, motivado pela insatisfação com seu trabalho fotográfico comissionado no
Brasil e pela necessidade em satisfazer uma pulsão por crescimento tanto profissional quanto
pessoal. Essas mudanças de rotas iriam ocorrer em outros momentos de sua trajetória – o
deslocamento dos EUA para a França, sob o argumento de que em Nova York o fotógrafo
seria somente mais um na engrenagem profissional (MENDONÇA, 1978b), posteriormente
da França para o Brasil, na expectativa de realizar algo mais íntimo, ambos na década de
1970; o retorno aos EUA em 1980, por decepção com o mercado brasileiro; dos EUA à
Tailândia nos anos 2000, por questões financeiras, e finalmente, a repatriação definitiva ao
Brasil em 2005.
Entendemos as tantas mudanças de direcionamento em boa parte de sua vida
como um significativo traço da personalidade de Stupakoff: a inquietude refletida na busca
por novos desafios evitando o acomodamento, uma forma de se desvencilhar do consolidado
e estável, que segundo ele, não oferecia crescimento. Essa inquietação pode ser exemplificada
por sua justificativa de não renovar um contrato de trabalho com a Standard Propaganda:
“Todas essas coisas não podem durar para sempre, porque elas estagnam. Chega um
momento em que você precisa de mais ar” (STUPAKOFF, 2000a, p. 32); e condensadas na
fala de sua amiga Bea Feitler: “Eu não sei o que há com você, Otto, na hora em que está tudo
bom você pega sua pasta e as malas e vai embora...” (STUPAKOFF, 2000c, p. 30).
Na obra de Stupakoff, evidencia-se uma tensão permanente entre o aspecto
comercial e a liberdade criativa na fotografia. Ele procurava diferenciar o fotógrafo
estritamente comercial daquele cuja vida seria dedicada à fotografia (categoria na qual dizia
se encaixar). Para ele, o comercial se acomodava ao conseguir estabilidade financeira, já o
outro redirecionaria sua trajetória quando seu trabalho não mais o satisfizesse. Ainda que,
em retrospectiva, tenha considerado alguns dos seus movimentos péssimos do ponto de vista
comercial (sendo o mais grave a volta ao Brasil na década de 1970), Stupakoff (2000b)
considerou assertivas suas escolhas de caminho, do ponto de vista do crescimento pessoal e
profissional na prática da fotografia como expressão.
A presente tese apresentou um arcabouço visual de produção ampla e diversa –
capas de disco, materiais promocionais e arquitetura, por exemplo – que demonstra a intensa
dinâmica de produção de Stupakoff para além da fotografia de moda, área que lhe deu
reconhecimento internacional. O arquivo do fotógrafo depositado na sede do Instituto
Moreira Salles, no Rio de Janeiro, que constitui o cerne do material utilizado nas nossas
análises, contém retratos, nus, instantâneos de rua, fotografias de viagens, editoriais de moda
e still life. Para nossas análises, esse diversificado e qualitativo universo fotográfico
demandou o desafio de se encontrar um discurso totalizante capaz de fazer emergir os
núcleos significativos fundamentais da sua obra fotográfica. Diante dessa pluralidade de

 
  318

produção, como estabelecer um alinhamento dos aspectos comuns nas suas variadas
vertentes fotográficas? Nas diversas proposições fotográficas (moda, documental, família)
haveria um denominador comum, uma consistência fotográfica que permitisse reconhecer
um olhar próprio de Stupakoff?
Apesar da amplitude da sua obra, identificamos coesão no universo fotográfico de
Stupakoff, representada em especial por uma linha de pensamento constante: a importância
que ele dava para a integridade como valor na criação, o que significava manter uma mesma
conduta fotográfica ao fazer uma natureza morta, uma foto de moda ou uma imagem de rua.
Nesse sentido, a articulação e o diálogo entre essas diferentes vertentes da criação fotográfica
nos permitiu verificar um modus operandis e um olhar particular do fotógrafo. Para
Stupakoff, os gêneros fotográficos não estariam completamente isolados. Há uma diluição da
região fronteiriça entre um gênero e outro e a identificação estaria menos na separação em
categorias – moda, família, rua – e mais na predisposição primeira, i.e, a motivação para a
feitura do trabalho fotográfico: se comissionada e planejada para determinada revista, se
para um álbum particular ou portfólio pessoal. Diversa, a obra de Stupakoff ao mesmo tempo
que fragmentada (no sentido de constituída por vários gêneros ao mesmo tempo) é íntegra
no seu âmago e na sua construção.
A integridade também foi identificada como um valor ético pessoal no sentido de
Stupakoff atribuir ao fotógrafo a necessidade de assumir a responsabilidade pelo trabalho e
pela criação. Para ele, o fotógrafo deveria conceber as condições capazes de lhe permitir
expressar sua visão de mundo. Associada a isso, estava a constante busca por uma liberdade
criativa e pelo afastamento de trabalhos estritamente comerciais que fossem contrários aos
seus preceitos (ainda que nem sempre isso tenha acontecido).
Todas as considerações apontadas foram resultado das discussões tecidas a partir
da análise das sequências fotográficas materializadas em folhas de contato, fotografias
individualizadas e publicações – norteadas pela crítica de processo de criação e semiótica
peirceana –, e também do embasamento documental obtido em jornais, revistas e livros com
entrevistas e depoimentos do fotógrafo e de terceiros, assim como outros materiais
elucidativos (clipping, anotações, cartas).
Diante do nosso elemento primordial de análise, as sequências fotográficas
materializadas em folhas de contato, discutimos aspectos particulares desse tipo de material.
Primeiramente consideramos que as folhas de contato e as cópias de trabalho são
documentos de processo na fotografia, e as anotações via marcas gráficas e verbais
encontradas nesse tipo de material são recursos utilizados no processo de construção da
imagem fotográfica entre a captura e a entrega do produto final. Elas nos indicam a condução
da produção do fotógrafo e as possíveis direções de criação, apresentando um rol de

 
  319

intenções pertinentes ao processo criativo, as escolhas, as modificações sugeridas e a


orientação para o trabalho posterior de outros profissionais (como laboratoristas e editores).
Esses documentos de processo desempenharam tanto a função de
armazenamento, pela materialidade das anotações, quanto de experimentação que se estende
do ato fotográfico ao inacabável da fotografia.
A leitura das folhas de contato efetivou-se pelo resgate da tipologia descrita no
capítulo 2, na qual considera-se aspectos como códigos visuais perpetrados por Stupakoff nos
contatos (e suas diferenciações das marcações feitas por terceiros), o espaçamento ritmado e
a relação entre ponto de vistas de um fotograma a outro, a relevância da qualidade técnica e
as informações contidas nos filmes fotográficos (tipo e numeração).
Na discussão sobre o processo de criação e no trato com as folhas de contato
emergiu a relação com o tempo como uma questão primordial na fotografia: o tempo em que
se realizou a fotografia e seu contexto, o tempo da duração da captura, o tempo de
desenvolvimento de um projeto fotográfico, o tempo para a escolha da imagem fotografada,
que nem sempre estão na mesma cronologia. Para Soulages (2010), os negativos são
selecionados de acordo com um momento específico no tempo/espaço. Assim, uma imagem
escolhida hoje talvez não seja selecionada em momentos futuros. Como não se pode escolher
todos os fotogramas registrados inicialmente em uma série fotográfica, há de se impor uma
leitura da folha de contato em função do desejo, da pulsão, da memória e da história de quem
as edita. Frente a esse cenário, a articulação entre os fotogramas na folha de contato pode ser
algo muito particular do fotógrafo/editor, assim como a escolha de determinado fotograma
em relação a outros.
Em relação às escolhas no processo de criação da fotografia, entendemos o
processo de criação como um ato permanente de tomada de decisão (SALLES, 1992, p. 31).
Aqui, discutimos que esse processo inclui desde as decisões para a concepção da foto à
definição sobre quais imagens serão selecionadas, estendendo também para as decisões
pessoais de conduta de trajeto pessoal e profissional que influenciam na criação da obra.
Ao retomar os negativos e organizar as Caixas 1 e 2 (primeira e segunda seleção,
respectivamente) depositadas no Instituto Moreira Salles, Stupakoff exerceu um ato de
escolha frente a todo o material fotográfico em sua posse. Ao olhar para a totalidade da sua
produção e empregar uma análise própria no redescobrimento de sua obra, ele de certa
forma evidenciou seu projeto poético, pois nesse encontro com o material ele teria
visualizado e eleito aquilo que considerava mais representativo. A seleção das Caixas 1 e 2
contempla sequências de editoriais de moda, nus, fotos de família e retratos. Para além das
caixas, as escolhas em outras ocasiões (exposições, livros) seriam tentativas de Stupakoff
dominar todos os aspectos de sua produção fotográfica. Algumas dessas seleções foram
convergentes e outras divergentes a de editores e curadores que também se debruçaram

 
  320

sobre sua obra; o próprio Stupakoff divergiu das escolhas realizadas por ele em momentos
anteriores, alterando seu ponto de vista ao revisitar seu material. Isso corrobora a proposta
tecida aqui de que o olhar sobre a própria obra fotográfica se modifica com o passar do tempo.
Para apontar particularidades da poética de Stupakoff seguimos Dubois (2012),
que indica a importância maior do processo em relação ao produto na compreensão do que
constitui a originalidade da imagem fotográfica, e Schaeffer (1996), que argumenta existir
uma dissociação entre a avaliação de uma imagem individual e a noção de obra como um
todo, pois uma obra fotográfica dificilmente é identificável no âmbito da imagem isolada,
sendo necessário colocá-la em paralelo a séries completas de imagens do mesmo fotógrafo.
Sob um ponto de vista crítico e direcionada por um instrumental teórico, a
análise do material fotográfico de Stupakoff resultou em considerações que caracterizam sua
obra: (1) as formas de construir a imagem, que em determinados momentos parecem
contraditórias (movimento livre e disperso para rua, contido e repetitivo para moda e retrato,
por exemplo), mantêm a essência do olhar fotográfico de Stupakoff voltado primeiramente
para a captura de certa naturalidade identificada na sua preferência pelo uso de luz natural,
cenários externos e de objetivas 50mm, que se aproximam do recorte do olhar humano,
distanciando-o da distorção; (2) ainda que suas imagens estejam calcadas em uma dita
realidade cotidiana, Stupakoff, à medida que fabricava uma imagem descritiva e de
contemplação exterior, remetia aos seus próprios pensamentos expressando-os através de
suas composições; (3) essa transferência para a criação fotográfica de seus aspectos mais
subjetivos revelou-se na constância de temas como o gosto pelo feminino, o trato com o puer
aeternus e a investigação e registro do ser humano, não como uma objetividade ingênua, mas
como meio de atribuir sentido à existência da pessoa no momento do ato fotográfico.
Ainda sobre a construção da imagem na obra de Stupakoff, outros elementos
podem ser identificados claramente: o estabelecimento do espaço pela valorização da
perspectiva e da noção tridimensional, assim como uso de cenários do cotidiano; a
preferência para planos mais abertos abrangendo o entorno e a valorização dos detalhes na
composição da foto; a propensão em repetir o registro do motivo com pequenas variações; a
predileção por instantes congelados; e o realce das texturas e das padronagens.
No estudo do processo de criação de Stupakoff, que contempla mudanças
significativas e diferentes fases dentro de sua trajetória e história de vida, surgiu outra
pergunta pertinente: o que permaneceu em seu “olhar” e o que se modificou? Podemos dizer
que, após Stupakoff identificar um caminho profissional, permaneceu nele e em sua obra a
simplicidade, o intimismo, a preocupação em retratar o humano para além da aparência
superficial, buscando o entendimento do personagem registrado, seja ele uma modelo em um
editorial de moda, uma criança em determinada região do país ou um trabalhador rural no
exercício de sua atividade.

 
  321

Podemos entender a poética de Stupakoff como a expressão de mudanças de


percurso. A análise comparativa entre as fotos dos primeiros anos de atuação no Brasil e os
trabalhos subsequentes mostra que, a cada época, sua produção apresenta potência poética
quanto aos aspectos fotográficos dentro de um contexto específico (especialidade, contexto
histórico e cultural) apresentando soluções originais e diferenciadas para cada campo de
atuação (moda, publicidade, pessoal). Nos primeiros anos, o próprio Stupakoff se
posicionava como um fotógrafo acadêmico produzindo fotografias moldadas pela rigidez do
tipo de câmera, o retrato clássico de estúdio com fundo neutro e meio corpo. A mudança de
contexto cultural e profissional a partir de meados da década de 1960 contribuiu
indubitavelmente para o processo de abertura da sua obra para uma fotografia mais livre.
Nas considerações mais gerais quanto ao processo criativo de Stupakoff,
destacamos sua perseverança e constância nas condutas pessoais de criação, assim como a
valorização do transmitir uma ideia se sobrepondo a técnica per se. Também faz parte de seu
processo criativo o planejamento fotográfico, presente desde suas fotos comissionadas de
moda e retrato, até no estruturar de suas saídas para as fotos de viagem e de rua. Dentro
desse contexto, identificamos a tendência de Stupakoff em desenvolver narrativas através dos
seus registros fotográficos, explícita em alguns editoriais pelo encadeamento das imagens, ou
subjacentes em algumas sequências de cunho pessoal.
Ainda sobre o processo criativo de Stupakoff, identificamos referências pontuais
em suas obras, à artistas como Wesley Duke Lee e Balthus, e a fotógrafos como Irving Penn e
Richard Avedon, além da importância da cultura fotográfica norte-americana e de referências
mais gerais, como literatura, música e artes visuais. Mesmo influenciado pelo seu entorno,
ressaltamos a presença de um estilo próprio na obra de Stupakoff, conforme apresentado
acima.
Para além da fotografia, a expressão visual de Stupakoff abarcou a prática de
pinturas, desenhos, colagens e assemblagens, sendo que as últimas foram materializadas a
partir da dinâmica de se apropriar de fragmentos, objetos e elementos do dia-a-dia,
articulando-os em composições que expressavam simbolicamente seu inconsciente pessoal.
Nas colagens e assemblagens também estão implícitas a construção do sujeito Otto Stupakoff
no sentido de que sua obra é um conjunto de vivências, objetos e aparências que se relacionam
de tal forma que, juntas, representam seu projeto poético. Aqui vemos que o chamamento para
a aventura, nos termos de Joseph Campbell, transborda nos seus diversos caminhos pessoais e
seus variados tipos de expressão artística, mais uma vez como reflexo de um sujeito múltiplo.
De certa forma, essas outras expressões e a fotografia se acondicionam em uma mesma linha
criativa que era a forma de Stupakoff pensar a imagem.
Para contemplar as considerações descritas acima, o próprio desenvolvimento da
tese passou pelo prisma do recorte no que tange a estabelecer escolhas representativas frente

 
  322

ao objeto de pesquisa (a obra de um fotógrafo como Stupakoff com quantidade e diversidade


significativa de material conhecido). Coube aqui realizar uma edição daquilo que seria
pertinente para as discussões da tese, assim como determinar qual caminho seguir a partir
das possibilidades surgidas durante o processo de investigação.
O pesquisador de processo criativo manuseia um objeto que se apresenta
limitado em seu caráter material, ao mesmo tempo ilimitado em sua potencialidade
interpretativa (SALLES, 2008). Nesse sentido, concordamos com Salles que os documentos
evidenciam o trabalho criativo, no entanto, a análise como fonte interpretativa não se esgota,
visto que esse material pode ser exposto a outros ângulos e outros instrumentos analíticos.
A partir dos resultados específicos originários do objeto de estudo desta tese,
pôde-se buscar generalizações que contribuam para expandir a discussão sobre o processo de
criação. Acreditamos que a conexão e articulação das informações apresentadas no presente
trabalho, bem como as análises construídas, oferecem um novo prisma sobre a poética de
Otto Stupakoff, ampliando o discurso sobre processo criativo fotográfico da sua obra.

 
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1f. Recusa para expor no MASP.
______. [Carta] 31 ago. 1977, Joatinga - RJ [para] BARDI, Pietro, São
Paulo. 1f. Informa o andamento dos preparativos para exposição.
______. Otto Stupakoff: depoimento [22 mar. 1978a]. Entrevistador: José Nogueira. São
Paulo: MIS-SP, 1991. 2 cassetes sonoros.
______. Otto Stupakoff: depoimento [3 nov.1978b]. Entrevistador: José Nogueira. São
Paulo: MIS-SP, 1991. 2 cassetes sonoros.
______. [carta] [jan. 1978c], São Paulo [para] BARDI, Pietro, São
Paulo. 1f. frente e verso. Texto referente a ele e a exposição de 1978 no MASP.
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______. Otto Stupakoff: depoimento [10 out. 2000]. Entrevistadores: Ricardo Mendes e
Valdir Arruda. Centro cultural São Paulo, 2000a. 1 cassete sonoro. 1 transcrição.
______. Otto Stupakoff: depoimento [10 out. 2000]. Entrevistadores: Ricardo Mendes e
Valdir Arruda. Centro cultural São Paulo, 2000b. 1 cassete sonoro. 1 transcrição.
______. Otto Stupakoff: depoimento [10 out. 2000]. Entrevistadores: Ricardo Mendes e
Valdir Arruda. Centro cultural São Paulo, 2000c. 1 cassete sonoro. 1 transcrição.
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Valdir Arruda. Centro cultural São Paulo, 2000d. 1 cassete sonoro. 1 transcrição.
______. Otto Stupakoff : depoimento [2003]. Entrevistador: Fernando Laszlo e Angélica
Vieira. São Paulo: IMS -RJ 2003. 1 vídeo. Depoimento filmado.
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APÊNDICE I
 
Lista das sequências das Caixas 1 e 2 com numeração do Instituto Moreira Salles e
descrição modificada da autora.

Caixa 1:

031OS1: Grand Hotel Cabourg, 031OS2: Leslie Bogart, Nova 031OS3: Leslie Bogart, Nova
França, 1976 York, 1967 York, 1967
031OS4: Nus, Joatinga, RJ, 031OS5: Balthus, Harper’s 031OS8: Sharon Tate, Los
1978 Bazaar, Nova York, 1970 Angeles, 1969.
031OS9: Águas Termais em 031OS13: Leslie Bogart, Nova 031OS14: Chartres, Paris para
Baden-Baden, Alemanha e York, 1967 Vogue, julho (1974)
Baden-Baden, Brenner’s Park
Hotel 1974
031OS15: Chartres, Paris para 031OS16: Renata, Estúdio na 031OS17: Renata, Estúdio na
Vogue, julho (1974) rua Varick, Nova York, 1991 rua Varick, Nova York, 1991

031OS18: Renata, Estúdio na 031OS19: Renata, Estúdio na 031OS20: Joatinga, RJ, 1978
rua Varick, Nova York, 1991 rua Varick, Nova York, 1991
031OS21: Joatinga, RJ, 1978 031OS27: Algarve, Portugal, 031OS31: Xuxa Meneghel, 1989
1988
031OS32: Xuxa Meneghel, 031OS33: Modelo em rua de 031OS41: Margareta Arvidsson,
1989 Nova York, s/d Hotel D'Inghilterra, Roma, 1969
031OS42: Margareta 031OS45: Margareta 031OS51: Katharine Ross, Los
Arvidsson, Hotel D'Inghilterra, Arvidsson, Hotel D'Inghilterra, Angeles, 1967
Roma, 1969 Roma, 1969
031OS53: Leonard Cohen, 031OS55: Jorge Amado, 031OS56: Pelé, Santos, 1979
1967. Sirpa, 1974; Jofrey Ballet; Dorival Caymmi, Carybé, Pierre
Fernando Odriozola e filho, s/d Verger, 1979
031OS58: José Saramago, 031OS59: Jorge Amado com 031OS61: Nus, Santos, 1979
Portugal, s/d Zélia Gattai e família, 1979
031OS63: René 031OS69: Homenagem a 031OS70: Sérgio Mendes,
D’Harnoncourt, 1967 Balthus, 1991 Central Park, 1967
031OS72: Tom Jobim. 031OS75: Algarve, Portugal, 031OS76: Stuttgart, Alemanha,
Ipanema, 1964 1988 1976
031OS77: Stuttgart, Alemanha, 031OS78: Stuttgart, 031OS90: Stuttgart, Alemanha,
1976 Alemanha, 1976 1976
031OS92: José Saramago, 031OS94: Xuxa Meneghel, 031OS95: Xuxa Meneghel, 1989
Portugal, s/d 1989
031OS96: Xuxa Meneghel, 031OS98: Algarve, Portugal, 031OS103: Algarve, Portugal,
1989 1988 1988
031OS105: Betsy, 1965 031OS106: Ian e Bico 031OS107: Louis Chile, Paris;
Stupakoff Filhos em Nova York, Margareta para Vogue Paris,
1968 1973; Carrie Nygren, Vogue Paris,
1975; Wesley Duke Lee, s/d
031OS108: Modelo entre 031OS110: Modelo e policial 031OS112: Modelo no metrô em
caixas, Nova York, s/d em Nova York, s/d Nova York, s/d
031OS113: Eduardo Paolozzi 031OS114: Betsy, 1965 031OS115: Betsy, 1965
(escultor). Londres, 1972
031OS117: Modelo em estúdio 031OS121: família Stupakoff, 031OS123: Margareta,
no sofá inflável, s/d ca. 1962 Gabriela e Sef em Berchères-sur-
Vesgres, 1974
031OS124: Oskar Werner, 031OS125: Menina do 031OS126: Ansiedade, 1990;
Nova York, 1965 Arpoador, s/d, Rio de Janeiro; Tarran Hills, Austrália,1968;
Menina Cigana, ca. 1970; Heitor Margareta Arvidsson, Puerto
dos Prazes, Rio de Janeiro, 1958 Vallarta, 1972; Olivia Hussey, 1968
031OS127: Pietro Maria Bardi, 031OS128: Modelo e policial 031OS200: Saigon, Vietnã,
São Paulo, 1978 em Nova York s/d 1968; Irã, s/d
031OS202: Mulher iraniana, 031OS303: Nus, Bombaim, 031OS304: Wesley Duke Lee e
s/d s/d; Nus, Pelourinho, Salvador, Sérgio Mendes; Sef Stupakoff,
1979 quando criança, Joatinga, c. 1976
031OS305: Saigon, Vietnã, 031OS306: Saigon, Vietnã, 031OS307: Saigon, Vietnã, 1968
1968 1968
031OS314: Ártico, 1989 031OS315: Teatro, Saigon, 031OS318: Bico e Kitty
Vietnã, 1968 Stupakoff, ca. 1964
031OS320: Amsterdã, s/d;
Índia, s/d

Caixa 2:

031OS116: Família de Otto 031OS117: Modelo em estúdio 031OS118: Família de Otto


Stupakoff , Ian (?), ca. 1960 no sofá inflável, s/d; Família de Stupakoff , Ian (?), ca. 1960
Otto Stupakoff , Ian (?), ca. 1960
031OS317: Bico Stupakoff 031OS6: Leslie Bogart, Nova 031OS7: Leslie Bogart, Nova
(criança) de anjo no estúdio. York, 1967 York, 1967
031OS10: Leslie Bogart, Nova 031OS11: Leslie Bogart, 1967, 031OS12: Leslie Bogart, Nova
York, 1967 Nova York. York, 1967
031OS22: Xuxa Meneghel, 031OS23: Xuxa Meneghel, 031OS24: Xuxa Meneghel,
1989 1989 1989
031OS25: Robyn (modelo), ca. 031OS26: Robyn (modelo), ca. 031OS28: Algarve, Portugal,
1994 1994 1988
031OS29: Xuxa Meneghel, 031OS30: Xuxa Meneghel, 031OS34: Lauren Hutton,
1989 1989 Nova York, 1985
031OS35: Lauren Hutton, Nova 031OS36: Lauren Hutton, 031OS37: Lauren Hutton, Nova
York, 1985 Nova York, 1985 York, 1985
031OS38: Lauren Hutton, 031OS39: Lauren Hutton, 031OS40: Lauren Hutton,
Nova York, 1985 Nova York, 1985 Nova York, 1985
031OS43: Margareta, Gabriela 031OS44: Lauren Hutton, 031OS46: Princesa de
e Guarda em Nova York, 1972 Nova York, 1985 Vizcaya, 1992
031OS47: Modelo no jardim, 031OS48: Modelo no jardim, 031OS49: Modelo no jardim,
s/d s/d s/d
031OS50: Algarve, Portugal, 031OS52: Katharine Ross, Los 031OS57: Ciganos, interior de
1988 Angeles, 1967 São Paulo, ca. 1970
031OS60: Bill Blass e amigos, 031OS62: Strip-tease, Santos, 031OS64: René
Nova York, 1969 1979 D’Harnoncourt, 1967
031OS65: René 031OS66: Bill Blass, Nova 031OS67: Bill Blass e amigos,
D’Harnoncourt, 1967 York, 1969 Nova York, 1969
031OS68: René 031OS71: Algarve, Portugal, 031OS73: Tom Jobim.
D’Harnoncourt, 1967 1988 Ipanema, 1964
031OS74: Algarve, Portugal, 031OS79: Tom Jobim. Estúdio, 031OS80: Modelo, EUA, s/d
1988 1964
031OS81: Algarve, Portugal, 031OS82: Algarve, Portugal, 031OS83: Algarve, Portugal,
1988 1988 1988
031OS84: Algarve, Portugal, 031OS85: Algarve, Portugal, 031OS86: Algarve, Portugal,
1988 1988 1988
031OS87: Algarve, Portugal, 031OS88: Algarve, Portugal, 031OS91: Tom Jobim.
1988 1988 Estúdio, 1964
031OS93: Algarve, Portugal, 031OS97: Lauren Hutton, 1985 031OS99: Algarve, Portugal,
1988 1988
031OS100: Algarve, Portugal, 031OS101: Algarve, Portugal, 031OS102: Algarve, Portugal,
1988 1988 1988
031OS104: Bill Blass e amigos, 031OS111: Modelo na estação 031OS119: Ian e Bico
Nova York, 1969 de trem, Nova York, s/d Stupakoff em Nova York, 1968
031OS120: Ian Stupakoff, 1963 031OS122: Aeroporto e avião, 031OS201: Bastidores
viagem para Disney, ca. 1970 produção de moda, 1970
031OS203: Bea Feitler e 031OS204: Lauren Hutton, 031OS205: Barco, bastidores
amigos, Nova York, s/d Nova York, 1985 de produção, Brasil, ca. 1960
031OS300: Ártico, retrato de 031OS301: Ártico, retrato do 031OS302: Ártico, retrato
morador local piloto grupo de equipe
031OS308: México, tourada e 031OS309: México, tourada e 031OS310: Ártico, retrato de
cenas de rua cenas de rua morador local
031OS311: Ártico, retrato de 031OS312: Ártico, retrato de 031OS313: Ártico, retrato de
morador local morador local morador local
031OS316: Família, filhos e 031OS319: Família, filhos e 031OS321: Ártico, retrato de
Catherine (ex-esposa), ca. 1960 Catherine (ex-esposa), ca. 1960; morador local
Bastidores de produção de
moda
031OS322: Ártico, retrato de 031OS323: Ártico, retrato de
morador local morador local
APÊNDICE II

Acervos e Coleções de Otto Stupakoff


• Bico Stupakoff. Fotografias, colagens e assemblagens.
• Bob Wolfenson. Fotografias.
• Fernando Laszlo. Fotografias, colagens e assemblagens.
• Instituto Moreira Salles (IMS), Rio de Janeiro. Matrizes e impressões.
• Kitty Stupakoff. Fotografias.
• Museu de Arte de São Paulo (MASP) Coleção Pirelli/Masp de Fotografias.
• Museum of Modern Art (MoMA). Nova York, EUA. Coleção de Estudo: 43 fotografias
coloridas a mão (Untitled, 1964) e 2 fotografias em preto e branco de Rene
D’Harnoncourt.
• Rubens Fernandes Júnior. Fotografia.1
• Sílvio Frota. Fotografias.1
• Thomaz Souto Corrêa. Fotografias, colagens e assemblagens.

Galerias e Leilões
• Doc Galeria, São Paulo
• Galeria Leilões, São Paulo
• James Lisboa, São Paulo
• Galeria Mario Cohen, São Paulo
• Pontual Escritório de Arte, São Paulo

Prêmios e Mérito:
1963 - Prêmio de honra Associação Brasileira de Publicidade/ Propaganda
1964 - Prêmio e medalha de prata por fotografias na Kodak Pavilion World’s Fair.
Exposição: The world and it’s people. Nova York.
1965 - 43ª The Art Director’s Club of New York - certificado de mérito
1976 - The Dupont Award. Paris.
1980 - Prêmio especial do júri. Club des Directeurs Artistiques. Paris, France, 1980.
1980 - V Prêmio Abril (jornalismo, artes gráficas e fotografia). Otto Stupakoff (categoria A
melhor reportagem fotográfica (critério visual) - prêmio).
1981 - Clube dos Diretores de Arte de Paris - prêmio especial do júri

                                                                                                               
1 TACCA, Fernando Cury de. Colecionadores Privados de fotografia no Brasil. São Paulo: Intermeios, 2015.
Publicações
• Otto Stupakoff: Fotografias. São Paulo: Práxis, 1978.
• Art to wear. Nova York: Abeville, 1986.
• Rioerótico: A fotografia sensual de Otto Stupakoff. NY: HarperCollins, 2006.
• Otto Stupakoff. São Paulo: Cosac Naify, 2006.
• Sequências: Otto Stupakoff. Apresentação de Bob Wolfenson. IMS, 2009.
• A hora e o lugar. Vol. 4. IMS, 2015.

Palestras e Conferências
1965 e 1966 - Parson’s School of design. Nova York.
1978 - Escola de Artes Visuais do Parque Lage. Rio de Janeiro. 4 de outubro de 1978.
1988 - The Life times of the Rich and Famous. TV.
1989/1990 - Seminário, Cape May, New Jersey. Ensina fotografia de moda
conjuntamente a Arthur Elgort e Art Kane.

Exposições Individuais
1955 - Exposição no Instituto Cultural Brasileiro Norte Americano (ICBNA), Porto
Alegre. Fotos em cor e em preto e branco. Data: 20 a 30 de jul. de 1955.
1956 - Galeria Oca. Rio de Janeiro. Início: 30 de abr. de 1956.
1963 - Exposição na Petite Galerie, São Paulo. Fotografias e Colagens, 50 fotografias e
15 colagens. Data: 21 de jan. a 8 de fev. de 1963.
1978 - Retrospectiva no Museu de Arte de São Paulo (MASP), São Paulo. Exposição
individual com fotografias recentes e antigas. Data: 28 de mar. a 21 de abr. 1978.
1978 - Escola de Artes Visuais do Parque Lage. Rio de Janeiro.
1978 - Exposição sobre crianças brasileiras/Agenda Vasp. Local: Museu de Arte de São
Paulo (MASP). Data: dez. de 1978.
1979 - Exposição Crianças brasileiras/Agenda Vasp. Local: Museu de Imagem e Som do
Rio de Janeiro. 53 retratos de crianças em diversos pontos do Brasil. Data: 11 de abr. a
9 de mai. de 1979.
1988/1989 - Retrospectiva na New School, Parsons Faculty. Nova York.
2003 - Acrylic Boxes. Amarcord Gallery em Beacon. Nova York.
2004 - Espasso Gallery, Nova York. Ouro Preto e Arquitetura moderna. Início: 14 de
mai. de 2004.
2005 - Moda Sem Fronteiras: Otto Stupakoff 55-05, São Paulo Fashion Week. Pavilhão
da Fundação Bienal, São Paulo. Data: 26 de jun. a 4 de jul. de 2005. 80 imagens.
2005 - Restrospectiva Otto Stupakoff. Museu de Arte Moderna da Bahia, Salvador.
2007 - Laureados Sussuros. Leo Burnett Publicidade. 12 set. a 15 dez. 2007.
2009 - Otto Stupakoff. Instituto Moreira Salles (IMS). Rio de Janeiro. Data: 18 de fev. a
19 de abr. de 2009.
2009 - Otto Stupakoff. Instituto Moreira Salles (IMS). São Paulo, SP. Início: Data: 21 de
ago. a 22 de nov. de 2009.
2010 - Otto Stupakoff. Instituto Moreira Salles (IMS). Belo Horizonte. Data: 14 jan. de
2010 a 21 de mar. de 2010.
2016/2017 - Retrospectiva Otto Stupakoff: beleza e inquietude. Instituto Moreira
Salles. Data: 13 de dez. de 2016 a 16 de abr. de 2017. 300 imagens, vídeo e
publicações.

Exposições Coletivas
1962 - Galeria Michel, São Paulo. Fotografias de Otto Stupakoff e pinturas de Wesley
Duke Lee.
1964 - O mundo e seus povos. New York World Fair, Pavilhão Kodak Nova York, E.U.A.
Retrato de Dona Olímpia de Ouro Preto. Início: jul.1964.
1964 - Exposição de colagens. Seta Galeria de Arte, São Paulo - SP.
1964 - Exposição no Museu Municipal de Haia, Holanda.
1964 - Nova York, EUA. Underground Gallery. Data: outubro de 1964.
1972 - Nova York, EUA. The Best of Harpers Bazaar, na Scribner’s Gallery, Nova York.
Curadoria: Bea Feitler.
1978 - Escola de Artes Visuais do Parque Lage, Rio de Janeiro. Inicio: 2 de out. de 1978
1980 - Galeria Luz e Sombra. Shopping da Gávea, Rio de Janeiro. 30 fotografias de
trabalhos múltiplos. De: 11 de mar. até 3 de abr. de 1980.
1980 - Exposição da The Image Bank. Café des Art do Hotel Meridien. Inicio: 24 mar.
de 1980
1985 - A fotografia e os anos 60: Espaço Fotóptica Mac/USP, Pavilhão Bienal. Data: 30
de mar. a 2 de jun. de 1985.
1988 - 63/66 Figura e Objeto. Galeria Millan, São Paulo.
1989 - Exposição Images Professionnels. Arles, França.
1989 - Exposição Photokina Colônia, Alemanha.
1991 - 1ª Coleção Pirelli/Masp de Fotografias. Museu de Arte de São Paulo (MASP),
São Paulo.
1992 - Staley Wise Gallery, conjuntamente a Arthur Elgort e Helmut Newton. Nova York
1998 - A Imagem do Som de Caetano Veloso. Paço Imperial, Rio de Janeiro. Data: 19 de
nov. de 1998 a 28 de fev. de 1999.
1999 - Mostra individual de fotografias e pinturas. Academia de Ciências em Manhattan.
Camboja em benefício do Camboja Trust. Nova York.
2003 - 12ª Coleção Pirelli/Masp de Fotografias. Museu de Arte de São Paulo (MASP),
São Paulo.
2005 - Coleção IV. Mercedes Viegas Arte contemporânea. Gávea, Rio de Janeiro. Data:
15 de dez. de 2004 a 29 de jan. de 2005.
2005 - Coleções VI. Galeria Luisa Strina, São Paulo. Data: 4 de mar. a 8 de abr. de 2005.
2007 - Fotografia em perspectiva: acervo do Museu de Arte Moderna. Data: 12 de jan. a
4 mar. de 2007.
2009 - Fotografia em Revista. Museu de Arte Brasileira (MAB-FAAP). Data: 19 de mai. a
12 de jun. de 2009.
2012 - Momentos e Movimentos. Mostra com 34 fotógrafos. FAAP, São Paulo. Data: 14 a
29 de abr. de 2012.
2012 - 19ª Coleção Pirelli/Masp de Fotografias. Museu de Arte de São Paulo (MASP),
São Paulo.
2012 - 3º Jamenson Mostra SP de Fotografia. Espaço Canon. Data: de jan. a fev. de
2012. Fotos inéditas pertencentes do Primeiro Portfólio de Otto Stupakoff editado por
ele (1955-1965).
2013 - Um olhar sobre o Brasil: a fotografia na construção da imagem da nação. Centro
Cultural Banco do Brasil (CCBB), Brasília. Data: 20 de ago. a 20 de out. de 2103.
2015 - Fotografia contemporânea brasileira. LL Galeria de Arte e Antiguidades. Data: 27
de jan. a 7 de fev. de 2015.
2016 - O útero do mundo. MAM. São Paulo. De 5 de set. a 18 de dez. de 2016.
– SP Arte/ Foto: 2010, 2011, 2012, 2014, 2015, 2016 e 2017. São Paulo.

Lista (parcial) de revistas com fotografias de Stupakoff2


Claudia | outubro, dezembro, novembro de 1963 | fevereiro, março, junho, julho, maio,
outubro de 1964 | janeiro de 1965| fevereiro, abril de 1966|
Elle | julho 1973| janeiro de 1974 | março de 1975 |
Esquire | julho de 1966 |
Gentleman’s Quarterly (GQ), novembro de 1981 | novembro de 1982|
Glamour | junho e setembro de 1968 | dezembro de 1981 | janeiro, março, julho de 1982 |
março de 1983 | setembro de 1984 | fevereiro de 1986|
Good Housekeeping | setembro de 1981 |
Harper’s Bazaar |novembro de 1965 | fevereiro, março, abril, junho, julho, agosto,
setembro, novembro, dezembro de 1967 | janeiro, fevereiro, maio, junho, julho, agosto,
novembro, outubro, dezembro de 1968 | agosto, setembro de 1969 | setembro de 1970 | abril,
junho, julho, setembro, novembro de 1972 | outubro, novembro, 1981.
Íris  |  janeiro, agosto de 1979 |
Jóia | janeiro de 1965 |
Ladie’s Home Journal | novembro de 1969 | junho, agosto, novembro de 1970 | janeiro,
fevereiro, março, julho, outubro de 1972 | maio de 1973 |
                                                                                                               
2 Somente as encontradas durante a pesquisa
Look Magazine |10, dezembro de 1968|
Manequim | janeiro de 1965|
McCall’s | v. 114, 1986|
Módulo | fevereiro de 1959 |
New Woman | v. 13, 1983 |
The New York | 2 e 9 de dezembro de 1968 |
Novidades Fotóptica, n. 45, 1970 | n. 84, 1978 | n. 88, 1978 |  
O Cruzeiro | setembro de 1960 |
Playboy | julho de 1980 |
Popular Photography | fevereiro de 1956 |
Quatro rodas | janeiro de 1964 | dezembro de 1963 |
Revista MIT | junho de 2008 |
RG Vogue Brasil | junho, julho de 2006 | fevereiro, julho de 2007 |
Senhor | dezembro de 1961 | maio, julho de 1962 |
The Connoisseur | v. 216, 1986|
Town & Country | v. 121, 1967 | março de 1973|
Venture | v. 7, 1970|
Vogue Brasil | n. 1, maio 1975 | 1979 | fev., 1980 | n. 123, 1989 | n. 169, 1993|
Vogue França | julho, agosto, setembro, novembro de 1974 | março, abril, maio, julho,
setembro de 1975 | fevereiro de 1976| Especial “Choisit Baden-Baden”, abril de 1974

 
Apêndice III - Capas de discos com fotografias de Otto Stupakoff: décadas de 1950 a 1980 (continua na página seguinte)

Fonte: www.discogs.com
Apêndice III (continuação) - Capas de discos com fotografias de Otto Stupakoff: décadas de 1950 a 1980

Fonte: www.discogs.com
Apêndice IV - Revista Jóia, janeiro, 1965

Fonte: Reprodução da revista/Acervo Biblioteca ECA-USP.


Apêndice V - A personalidade da moda para o inverno 1961, revista Manchete, abril de 1961

Fonte: Reprodução da revista/Acervo Biblioteca ECA-USP.


Apêndice VI - Calendário Shell, 1963

Fonte: Reprodução/Acervo Biblioteca Mário de Andrade.


Apêndice VII - Calendário Volkswagen Brasil, 1980 (continua na página seguinte)

Fonte: Reprodução/Acervo Biblioteca Mário de Andrade.


Apêndice VII (continuação) - Calendário Volkswagen Brasil, 1980
Apêndice VIII - Novidades Fotóptica, dezembro de 1979.

Fonte: Reprodução da revista/Coleção da autora/Matrizes no Acervo IMS.


Apêndice IX - Vogue Brasil, fevereiro de 1980. Editorial de Moda

Fonte: Reprodução da revista.


Apêndice X - Vogue Brasil, janeiro 1990, n. 173, editorial especial com Xuxa Meneghel (continua na página seguinte)
Apêndice X (continuação) - Vogue Brasil, janeiro 1990, n. 173, editorial especial com Xuxa Meneghel

Fonte: Reprodução da revista/Matrizes no Acervo IMS.


Apêndice XI - Vogue RG, fevereiro, edição 58, editorial com Ivete Sangalo

Fonte: Reprodução da revista/Coleção da autora.


Apêndice XII - MIT, junho de 2008

Reprodução da revista/Coleção da autora.


Apêndice XIII - Revista Claudia (continua na página seguinte)

Claudia, novembro de 1963 Claudia, dezembro de 1963 Claudia, fevereiro de 1964 Claudia, junho de 1964 Claudia, outubro de 1964

Claudia, agosto de 1964


Fonte: Reprodução das revistas/Acervo Biblioteca ECA-USP.
Apêndice XIII (continuação) - Revista Claudia

Claudia,
março de
1964

Claudia, fevereiro de 1966

Claudia,
maio de
1964

Claudia, fevereiro de 1964


Fonte: Reprodução das revistas/Acervo Biblioteca ECA-USP.
Apêndice XIV - Revista Harper’s Bazaar (continua na página seguinte)

Harper’s Bazaar, dezembro de 1972. Resort Report.

Fonte: Reprodução da revista/Coleção da autora.


Apêndice XIV (continuação) - Revista Harper’s Bazaar (continua na página seguinte)

Harper’s Bazaar, agosto de 1969. Yugoslavia young Challis Rally.

Fonte: Reprodução da revista.


Apêndice XIV (continuação) - Revista Harper’s Bazaar (continua na página seguinte)

Harper’s Bazaar, março, 1967. India’s Littlest Ambassadors

Fonte: Reprodução da revista.


Apêndice XIV (continuação) - Revista Harper’s Bazaar (continua na página seguinte)
Harper’s Bazaar, maio de 1968

Fonte: Reprodução das revistas.


Apêndice XIV (continuação) - Revista Harper’s Bazaar

Harper’s Bazaar, setembro de 1972

Harper’s Bazaar, setembro de 1970

Fonte: Reprodução das revistas.


Apêndice XV - Revista Vogue França (continua na página seguinte)

Vogue França, março, 1975

Fonte: Reprodução da revista


Apêndice XV (continuação) - Revista Vogue França (continua na página seguinte)
Vogue França, julho, 1974

Fonte: Reprodução da revista.


Apêndice XV (continuação) - Revista Vogue França (continua na página seguinte)
Vogue França, agosto, 1974

Fonte: Reprodução da revista.


Apêndice XV (continuação) - Revista Vogue França (continua na página seguinte)

Vogue França, setembro de 1974

Fonte: Reprodução da revista.


Apêndice XV (continuação) - Revista Vogue França

Vogue França, setembro de 1974


Apêndice XVI - Revista Ladie’s Home Journal

Ladie’s Home Journal, junho de 1970, editorial com Tricia Nixon.

Ladies’ Home Jornal com Margareta, novembro de 1969

Fonte: Reprodução da revista/Coleção da autora.


Apêndice XVII - Arquitetura

Arquitetura de Aurelio Martinez Flores

Fonte: LAGO, 2002.

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