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Palavras que Edificam

Pa u l D . Tr i p p 1

Eu estava no segundo grau e em meu Inclui não apenas as palavras que dizemos,
primeiro emprego quando, pela primeira mas também aquelas que deixamos de dizer.
vez, enfrentei um grande problema fora do O falar que edifica diz respeito a estarmos
contexto familiar. Meus colegas de trabalho preparados para usar as palavras certas, no
estavam roubando e causando prejuízos à fir- momento certo, praticando domínio pró-
ma. Eu sabia quem era o culpado, mas meu prio. É não deixarmos que nosso discurso
chefe não sabia. Eu não queria me envolver seja dirigido pela impulsividade e pelos
com o que estava acontecendo e, muito me- desejos pessoais, mas comunicarmos tendo
nos, queria ser culpado de algo que eu não em vista os propósitos divinos. É colocarmos
havia feito. Embora eu soubesse que preci- em prática a fé necessária para ser parte
sava falar com meu chefe e, possivelmente, da obra que Deus está realizando naquele
com meus colegas de trabalho, eu estava com momento.
medo. Tomei coragem para conversar com
meu pai sobre o que estava acontecendo e ele Quando as palavras destroem
admitiu que eu precisava falar com as pessoas Embora João e Beatriz fossem pessoas
envolvidas. “Seja cuidadoso, filho. Escolha bastante perceptivas, eles nunca tinham sido
as suas palavra com cuidado”, foi o que meu capazes de resolver os problemas em seu
pai me disse. Uma maneira amável de dizer relacionamento. Na época em que come-
que eu precisava comunicar com propósito çamos a nos encontrar, as brigas conjugais
definido e domínio próprio. eram intensas. Nos últimos dois anos, João
O falar que edifica tem tudo a ver com havia saído de casa três vezes, por períodos
a escolha cuidadosa das nossas palavras. que variaram de duas semanas a um mês.
Beatriz havia saído uma vez para “férias
1
Tradução e adaptação de Speaking Redemptively prolongadas” na casa dos pais. Eu tinha
Publicado em The Journal of Biblical Counseling. v. 16, diante de mim dois cristãos, casados há
n.3, Spring 1998, p. 10-18. vinte anos, com uma compreensão sólida

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das Escrituras e boa percepção mútua, mas crítico e legalista. Beatriz presenciou sua
que ainda assim não sabiam resolver seus mãe sendo agredida verbalmente à mesa
problemas pessoais. do jantar, noite após noite, quando o pai
Quando nos encontramos pela pri- criticava os trabalhos domésticos, a comida,
meira vez, a tensão estava a ponto de gerar o vocabulário, a aparência, e mesmo a sua
faíscas. Ou melhor, poderia mesmo provocar voz (“esta ladainha estridente”). Várias noites
um incêndio! João estava tão irado que se Beatriz chorou até pegar no sono ou ficou
levantou imediatamente após minha oração pensando em como dar o troco ao pai por
e disse: “Eu não sei o que estou fazendo aqui! aquilo que ele fazia.
Sei exatamente o que há de errado em nosso No início do namoro, João percebeu
relacionamento. Já falei isso para Beatriz cen- que Beatriz tendia a ser extremamente sen-
tenas de vezes. Ela se recusa a ouvir e se faz sível e isto, algumas vezes, o irritava. Mas
de vítima. Eu não tenho interesse algum em havia outras características em Beatriz que
sentar-me aqui e repassar mais uma vez todas ele admirava, e então João tentou passar por
as coisas horríveis que aconteceram entre nós cima deste aspecto. Ele não tinha uma ideia
dois nos últimos vinte anos! Eu simplesmen- muito clara de que estava se unindo a uma
te não posso fazer isso!”. Com estas palavras, mulher amargurada, autoprotetora, medrosa
ele saiu. Eu pedi licença a Beatriz e segui João e determinada a fazer o que quer que fosse
até o carro para convencê-lo a voltar. para se manter a salvo do “inferno” vivido
Havia muita verdade no que João dis- pela mãe.
se. Ele realmente tinha uma boa percepção Os pais de João, por outro lado, tinham
dos problemas do seu casamento, e já havia um relacionamento maravilhoso e expres-
falado várias vezes com Beatriz sobre coisas savam regularmente o seu apreço um pelo
que ela simplesmente se recusava a ouvir. outro. Quando discutiam, eles costumavam
Ela costumava assumir o papel de vítima pedir perdão não somente um ao outro, mas
nos momentos de confrontação. João tinha também aos filhos que tivessem presenciado
sido forçado, vez após vez, a repassar cenas o desentendimento. Na família de João, os
horríveis ocorridas no relacionamento con- erros não eram considerados o fim do mun-
jugal. E ainda assim, com toda esta análise do, mas havia encorajamento para erguer-se
e conversa, ele estava bem longe de ser um e começar de novo. João sempre alimentou
instrumento de mudança na vida de Beatriz. a esperança de ter um casamento como o de
Na verdade, o fruto das palavras de João era seus pais. Ele sonhava com aqueles bons mo-
uma esposa cada vez mais amargurada e que mentos ao redor da árvore de Natal e, desta
se fazia de vítima. Apesar de toda a sua per- vez, ele estaria no papel de pai. Ele se casou
cepção, ele nunca atuava como participante com Beatriz com esta ideia em mente.
naquilo que Deus estava procurando fazer O casamento de João com Beatriz não
na vida de Beatriz. Muito pelo contrário, ele foi um erro da soberania de Deus. Usar o
atrapalhava a ação do Senhor e dava grandes relacionamento entre eles como canteiro de
oportunidades para que Satanás agisse. obras para o processo contínuo de santifica-
Tanto Beatriz quanto João haviam ção era parte do propósito sábio e redentor
trazido para o casamento uma bagagem de Deus. No contexto deste relacionamento,
que contribuía para seus problemas. O pai os corações seriam expostos e transformados.
de Beatriz era um homem tremendamente Mas João não se casou tendo em vista o plano

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redentor de Deus; seus olhos estavam volta- Para começar, vamos olhar para o que
dos para os próprios sonhos. Beatriz também há de errado com João e Beatriz. Nossa fer-
não se casou tendo em vista o plano redentor ramenta de diagnóstico é o texto de Gálatas
de Deus; seus olhos estavam voltados para os 5.13-15.
próprios temores. Sendo assim, quando João Porque vós, irmãos, fostes chamados
viu seu sonho desmoronar e Beatriz começou à liberdade; porém não useis da
a ver seus temores se concretizarem, eles não liberdade para dar ocasião à carne;
reagiram com pensamentos nem palavras sede, antes, servos uns dos outros,
edificantes. pelo amor. Porque toda a lei se
Sim, João sabia que Beatriz estava cumpre em um só preceito, a saber:
sempre pronta a identificar críticas em suas Amarás o teu próximo como a ti
palavras, mesmo quando ele não as fazia. E mesmo. Se vós, porém, vos mordeis
Beatriz sabia que João estava sempre desa- e devorais uns aos outros, vede que
pontado porque a família real não condizia não sejais mutuamente destruídos.
com a família dos seus sonhos. Mas apesar de As três partes em que este texto se
toda a percepção que tinham do problema, divide podem nos ajudar a entender o que
a situação entre os dois foi se agravando no há de errado no relacionamento entre João
decorrer dos anos. A conversa que girava e Beatriz, particularmente na área de co-
em torno das dificuldades conjugais não fez municação.
nada além de acrescentar barreiras e maior
sofrimento. Ao invés de exigir mudanças na 1. “Não useis da liberdade para
vida um do outro, João e Beatriz precisavam dar ocasião à carne; sede, an-
aprender o que significava falar de modo tes, servos uns dos outros pelo
edificante frente ao desapontamento, à dor, amor”.
aos erros e ao pecado em experiências corri- Se você perguntasse a João e Beatriz se o
queiras neste mundo caído. relacionamento entre eles baseava-se em dar
ocasião à carne, ambos responderiam com
Por que as palavras destroem? um forte “NÃO”, mas estariam inteiramente
Como podemos entender a falta de errados. O relacionamento e a comunicação
habilidade de João e Beatriz para resolver entre eles não eram moldados pela lei do
os problemas em seu relacionamento? Qual amor. Faltava-lhes muito da postura de servo
é o caminho de mudança para eles? O que recomendada neste texto.
significa para eles, e também para nós, “es- Eles não costumavam perguntar a
colher as palavras certas” e falar “palavras Deus como poderiam ser um instrumento
que edificam”? útil para encorajar um ao outro ou apoiar a
Há um texto na Epístola aos Gálatas obra de Deus na vida um do outro. Eles não
que nos explica com clareza o relaciona- pensavam em como “estimular um ao outro
mento entre João a Beatriz. Este texto é ao amor e às boas obras” (Hb 10.24) nem
seguido por outro que aponta o caminho procuravam consolar, encorajar, admoestar
de mudança. Ambos definem o que significa e ensinar um ao outro. Eles não encaravam
escolher nossas palavras para que façamos as dificuldades como oportunidades para
parte daquilo que o Senhor está operando ministrar a graça divina nem buscavam
na nossa vida e na de outros. ajudar um ao outro a carregar os fardos

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pessoais. Eles não escolhiam palavras que Cobiçais e nada tendes.” O relacionamento
encorajassem unidade, amor e ministério deste casal era um conflito constante porque
mútuo. João e Beatriz simplesmente bus- o coração de ambos estava governado pelos
cavam ser servidos - ele queria concretizar desejos da natureza pecaminosa. Tiago fala
seus sonhos, enquanto ela queria distância sobre desejos que lutam no nosso interior,
de seus medos. Desta forma, nenhum dos desejos que militam para estabelecer controle
dois estava procurando servir. sobre pessoas, recursos, “territórios”. A ba-
A esta altura, o texto de Gálatas é par- talha entre o desejo de uma família perfeita
ticularmente proveitoso, pois nos fala que e o desejo de autoproteção tomava conta
o oposto de servir em amor não é falta de do casamento de João e Beatriz. De acordo
amor e falta de serviço, mas a prática de dar com a descrição de Tiago, o resultado eram
ocasião à natureza pecaminosa! Temos duas contendas contínuas.
opções: vivemos como servos do Senhor,
aceitando o Seu chamado para servir aqueles 2. “Porque toda a lei se ­cumpre
que estão ao nosso redor ou vivemos para em um só preceito, a saber:
satisfazer os desejos da natureza pecaminosa, Amarás o teu próximo como a ti
esperando que os outros também colaborem mesmo”.
para nossa satisfação. Embora discordassem Este versículo também oferece insights
inicialmente deste ponto de vista, João e significativos para o caso de João e Beatriz.
Beatriz chegaram à compreensão de que O problema no relacionamento do casal
tinham entrado no relacionamento conjugal não era essencialmente horizontal (pessoa/
centrados em desejos egoístas. pessoa), mas vertical (pessoa/ Deus).
João estava correndo atrás do alvo de Se alguém considera o viver para a gló-
ter uma esposa e uma família perfeitas. Com ria de Deus como um alvo de vida mais im-
isso, ele logo ficou nervoso e desapontado portante do que buscar a realização pes­soal,
quando percebeu que Beatriz era um obs- e se o seu amor a Deus está acima do amor
táculo que o impedia de alcançar seu alvo. a qualquer outra pessoa ou coisa e também
Beatriz casou-se tendo como alvo pessoal do amor a si mesmo, então o seu objetivo
a autoproteção. O relacionamento e a co- prático será duplo: agradar a Deus em tudo
municação com João eram constantemente quanto fizer e falar tudo quanto Ele mandar.
dominados pelo foco voltado para si mesma E um fruto garantido deste compromisso
- “Como estou sendo tratada?”. Movida de coração com o Senhor é amar ao próxi-
por este alvo de autoproteção, ela analisava mo como a si mesmo. O primeiro grande
tudo quanto João dizia ou fazia e sempre mandamento sempre precede e determina o
conseguia encontrar algo que julgava ser cumprimento do segundo - ninguém pode
insensível, crítico, negligente ou “abusivo”. amar a seu próximo como a si mesmo se não
Desapontada, ela despejava então sua raiva amar acima de tudo a Deus.
contra João. Mais uma vez, o capítulo quatro de
Tiago 4.1-2 explica como os desejos de Tiago pode-nos ser útil. No versículo 4, em
João e Beatriz afetavam a dinâmica de seu meio à sua argumentação sobre as causas
relacionamento: “De onde procedem guerras e a solução do conflito humano, Tiago
e contendas que há entre vós? De onde, senão apresenta o conceito de adultério espiritual.
dos prazeres que militam na vossa carne? O adultério ocorre quando o amor que foi

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prometido a uma pessoa é dado a outra. O necessária quanto uma mudança radical
adultério espiritual se dá quando o amor que em seu coração. Esta última é que alteraria
pertence a Deus é dirigido para algum outro profundamente a maneira de falarem um
aspecto do mundo criado (cf. Rm 1.25). com o outro.
Tiago diz algo extremamente proveitoso A questão principal não era o fato de
para que entendamos o relacionamento entre terem entrado no casamento com problemas.
João e Beatriz: os conflitos humanos têm Isto acontece com todos nós e, além do mais,
suas raízes no adultério espiritual! Quando o problemas fazem parte do próprio projeto de
desejo de determinada coisa assume o lugar Deus para o casamento. O mais importante
de Deus como força que controla o coração, dentre os relacionamentos humanos existe
o resultado será conflito em nossos relacio- primeiramente não para o nosso prazer, mas
namentos. Os conflitos têm raízes verticais como instrumento do processo contínuo
que frutificam na dimensão horizontal em de santificação que Deus está operando em
lutas e contendas. O amor a Deus que nos nós, a fim de sermos para o louvor da Sua
faz desejar cumprir a Sua lei sempre resulta glória. Não é por acaso que o relacionamento
em uma expressão prática de amor para com humano mais significativo (o casamento)
o próximo. acontece em meio ao processo mais impor-
tante da vida (a santificação). Deus planejou
3. “Se vós, porém, vos mordeis que fosse assim, para a Sua glória e para o
e devorais uns aos outros, vede bem de Seus filhos!
que não sejais mutuamente Seria um erro dizer que o casamento
destruídos”. de João e Beatriz chegou a este estado la-
Está última parte do capítulo 5 de mentável porque sobrevieram dificuldades
Gálatas é uma descrição bem apropriada fora do comum. O problema não estava
da comunicação diária entre João e Beatriz. em terem problemas. O âmago da questão
Eles mordiam e devoravam um ao outro era como os desejos do coração ditavam sua
com palavras. Seu diálogo nunca era cons- maneira de reagir um ao outro em meio
trutivo, fortalecedor ou encorajador. Muito aos problemas. Por estarem vivendo para si
pelo contrário, eles tinham habilidade para mesmos e não para Deus, eles mordiam e
ferir um ao outro. João conhecia os pontos devoravam um ao outro até quase o ponto
fracos e vulneráveis de Beatriz e atacava jus- de se destruírem. João estava expressando
tamente estes pontos sempre que olhava para dúvidas sobre a fidelidade e o amor de Deus,
Beatriz como obstáculo no caminho para a e Beatriz tinha deixado completamente de
realização de seu sonho. Beatriz sabia como ir à igreja. A fé de ambos jazia ferida sob os
ferir João: ela conseguia destruir a alegria ou destroços do conflito.
esperança do esposo com algumas poucas Hebreus diz que a Palavra é eficaz “para
palavras sagazes. discernir os pensamentos e propósitos do
As palavras do casal eram cheias de coração” (Hb 4.12). Gálatas 5 tem exata-
crítica e condenação, manipuladoras, amea- mente este papel na vida de João e Beatriz,
çadoras, carregadas de julgamento, egoísmo, revelando que seu relacionamento não era
malícia, exigência, aspereza e vingança. Elas governado pela lei do amor, mas pelos dese-
revelavam que uma mudança radical no jos da natureza pecaminosa. Visto Deus não
vocabulário de João e Beatriz não era tão estar no controle, eles viviam cada situação

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procurando satisfazer os próprios sonhos, o reino de Deus os que tais coisas
desejos e exigências. Irados e desapontados praticam. Mas o fruto do Espírito é:
um com o outro, eles agrediam verbalmente amor, alegria, paz, longanimidade,
um ao outro. Suas palavras dilaceravam o benignidade, bondade, fidelidade,
relacionamento porque a fé em seus corações mansidão, domínio próprio. Con-
estava dilacerada. tra estas coisas não há lei. E os que
são de Cristo Jesus crucificaram a
O uso de palavras edificantes em carne, com as suas paixões e concu-
um mundo pecaminoso piscências. Se vivemos no Espírito,
João e Beatriz ajudam-nos a perceber andemos também no Espírito. Não
que falar de modo edificante não é apenas nos deixemos possuir de vanglória,
uma questão de escolha superficial de pala- provocando uns aos outros, tendo
vras certas, mas de um coração fundamen- inveja uns dos outros. Irmãos, se
talmente comprometido com a escolha de alguém for surpreendido nalgu-
palavras que promovam a obra de Deus em ma falta, vós, que sois espirituais,
determinada situação. Eles tinham perdido corrigi-o com espírito de brandura;
de vista a verdadeira batalha por trás das e guarda te para que não sejas tam-
contendas humanas. Pensando que sua ba- bém tentado. Levai as cargas uns dos
talha fosse contra carne e sangue, lutavam outros e, assim, cumprireis a lei de
um contra o outro para concretizar os sonhos Cristo. (Gl 5.16-6.2)
que haviam conquistado o domínio do seu Esta passagem provê, passo a passo, um
coração. Suas armas principais eram as pala- guia para descobrir o que significa o falar
vras. O que representaria para João e Beatriz que edifica. Lembre-se de que dizer palavras
falar de modo edificante nesta situação? que edificam não significa desconsiderar os
Gálatas 5 oferece-nos ainda outras problemas práticos da vida. Seria impossível
respostas proveitosas: ignorá-los, pois estão diante de nós diaria-
Digo, porém: andai no Espírito e mente. Pelo contrário, dizer palavras que
jamais satisfareis à concupiscência edificam significa lidar com estes problemas
da carne. Porque a carne milita con- de forma que promova os interesses do Rei,
tra o Espírito, e o Espírito, contra a conforme veremos a seguir.
carne, porque são opostos entre si;
para que não façais o que, porven- 1. Falar o que edifica tem início
tura, seja do vosso querer. Mas, se com o reconhecimento da luta
sois guiados pelo Espírito, não estais que há dentro de nós
sob a lei. Ora, as obras da carne são (veja versículos 16 e 17).
conhecidas e são: prostituição, im- Enquanto o pecado ainda habitar em
pureza, lascívia, idolatria, feitiçarias, nós, haverá uma guerra em nosso coração
inimizades, porfias, ciúmes, iras, (Rm 7.7-15; Ef 6.10-20; Tg 4.1-10). De-
discórdias, dissensões, facções, in- vemos estar sempre cientes deste conflito,
vejas, bebedices, glutonarias e coisas pois esquecer a presença e o poder do pecado
semelhantes a estas, a respeito das que habita em nós leva-nos imediatamente a
quais eu vos declaro, como já, ou- problemas em nosso falar. Este é o conflito
trora, vos preveni, que não herdarão verdadeiro, a base de qualquer outra batalha

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que combatemos. Nunca devemos dar lugar Falar o que edifica significa dizer não
à ideia de que nossa guerra principal é contra para qualquer comunicação que flua destes
a carne e o sangue (veja Ef 6.10-12). desejos. O falar edificante não começa pela
Nunca devemos nos permitir olhar avaliação da situação, das necessidades da(s)
para nosso cônjuge, pai, mãe, filho, irmão pessoa(s) com quem precisamos falar nem de
ou amigo como o inimigo. Quando agimos trechos das Escrituras que possam nos dar
desta forma, nosso alvo logo passa a ser a discernimento quanto àquilo que devemos
vitória sobre quem está ao nosso lado, e o dizer. Não. Falar o que edifica tem início
falar que edifica sai de cena. Há somente um com um autoexame.
inimigo que está conspirando, manipulando,
tentando, enganado e usando disfarces para 3. Falar o que edifica signifi-
nos fazer esquecer da batalha verdadeira ca recusar-se a dizer qualquer
e para nos tentar a ceder aos desejos da palavra que seja contrária ao
natureza pecaminosa. Derrotamos a obra que o Espírito está procurando
deste inimigo quando falamos uns com os produzir em mim e nos outros
outros motivados por uma consciência ativa (veja versículos 16-18).
da verdadeira batalha espiritual em nosso Como cristão, o que há de mais impor-
interior. tante em minha vida é a conclusão da obra
de Deus em mim e nos outros “para o louvor
2. Falar o que edifica signifi- da Sua glória”. Em momento algum eu quero
ca nunca ceder aos desejos da impedir a obra de edificação de Deus nos
natureza pecaminosa em nossa menores detalhes da vida. Reconheço que,
conversação (veja versículo 16). no final das contas, estes momentos não per-
Todos nós lutamos contra uma varie- tencem a mim, mas a Ele. São laboratórios
dade de desejos conflitantes. Quando algo onde Ele opera a Sua obra de santificação.
dá errado, podemos ter o desejo de encontrar Minha tarefa é ser um instrumento útil nas
uma solução apropriada, de acordo com mãos dAquele que produz a edificação. To-
o propósito de Deus. Mas outros desejos das as vezes que eu falo com base nos meus
também estão atuando. Talvez queiramos desejos pecaminosos, estou comunicando de
avaliar de quem é a culpa ou nos afastar da modo contrário àquilo que o Espírito Santo
responsabilidade. Pode ser que sejamos leva- está procurando produzir em mim.
dos pelo desejo de relembrar todas as outras
vezes em que aquela pessoa falhou conosco 4. Falar o que edifica envolve
ou fazer com que a pessoa sofra tanto quanto disposição para examinar como
nós. Talvez queiramos compartilhar os erros as obras da carne estão presentes
desta pessoa com outra pessoa. Pode ser que na minha fala (veja versículos
fiquemos com ciúmes, achando que alguém 19-21).
mais está roubando a atenção que julgamos Se estou procurando viver de modo
merecer. Podemos nos sentir amargurados e coerente com a obra do Espírito em mim,
cheios de ódio para com alguém que tenha sem dar lugar ao inimigo, eu devo estar dis-
o costume de falhar conosco regularmente. posto a examinar minha fala com o espelho
Podemos ficar cheios de raiva. da Palavra de Deus. Quero que “as palavras

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da minha boca e o meditar do meu coração” pessoas da igreja como obstáculo para aquilo
sejam agradáveis aos olhos do Senhor (Sl que eu queria, ao invés de vê-las como objeto
19.14). Procuro identificar as palavras de do chamado que eu havia tão alegremente
inveja, ciúme, orgulho, facção, dissensão recebido do Senhor. Posso me lembrar de
e divisão. Também procuro identificar as ocasiões em que recebia telefonemas e per-
palavras de cólera, raiva, malícia e ódio, e guntava à minha esposa “Quem é agora?!”.
ainda as palavras de egoísmo, justiça própria, Mas em seguida, respondia com um “Alô”
autoproteção e defesa, bem como aquelas amigável e pastoral.
que evidenciam impaciência, irritação, falta Um sábado à tarde, eu estava em casa
de perdão, longanimidade e bondade. Pro- com minha esposa e filhos, gozando momen-
curo identificar um falar que seja ríspido ou tos de descontração, quando recebi uma liga-
materialista. ção de um jovem desesperado. Ele já andava
Não examino a mim mesmo com uma desesperado há muito tempo e parecia ter
atitude de autocrítica mórbida que tende o dom de me ligar nos momentos errados.
ao desalento. Eu me examino com alegria, Estava sempre desanimado, sempre pedindo
reconhecendo que pela presença do Espírito ajuda, embora sempre oferecesse resistência
Santo que habita em mim, eu não sou obri- ao auxílio que lhe era oferecido. Nada pare-
gado a viver debaixo do controle da natureza cia funcionar para ele; dizia ter tentado de
pecaminosa (Rm 8.5-11). Com alegria, eu tudo, sem obter benefício algum. Ele estava
busco agradá-lO em todos os aspectos, em agora em um dos hotéis de baixa categoria
todas as situações! Quero falar de modo dig- da cidade, dizendo que daria fim à sua vida
no da vocação a que fui chamado (Ef 4.1). de uma vez por todas e cometeria suicídio
antes do fim dia a não ser que encontrasse
5. Falar o que edifica significa uma razão para viver. Eu descobri onde ele
dizer “não” a qualquer raciona- estava, pedi a minha esposa que orasse, e
lização, transferência de culpa entrei no carro para ir falar com ele.
ou discussão egoísta que possa Orei pelo caminho, e sabia que
servir de desculpa para um fa- minha esposa estava orando, mas havia
lar contrário à obra do Espírito uma batalha dentro de mim. Meus dese-
Santo ou que possa fazer com jos eram conflitantes! Eu realmente não
que este falar pareça apropria- gostava daquele rapaz - não gostava da sua
do ou aceitável para um crente postura, da voz lamurienta, da necessidade
(veja versículos 19-20). que ele tinha de ser o centro das atenções.
Eu era um jovem pastor de uma pe- Eu odiava o modo como ele havia des-
quena congregação que lutava para sobrevi- prezado cada conselho que eu havia lhe
ver, necessitada de muito aconselhamento. oferecido, e estava ressentido do tempo
Parecia-me impossível ter um momento que ele havia roubado da minha família e
quieto em casa sem que alguém não me de outras áreas do meu ministério. Agora
telefonasse em meio à maior e mais recente eu estava com raiva de ter que ir ajudá-lo
crise. Eu temia ouvir o telefone tocar à noite mais uma vez. Enquanto eu dirigia, meus
e temia ainda mais ouvir as palavras “Paul, é pensamentos agitavam-se em uma guerra
para você”. Embora eu não percebesse isto, entre preocupação pastoral e ressentimen-
cada vez mais eu olhava para determinadas to pessoal.

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Cheguei ao hotel, e nos sentamos em momento em que ela disse estas palavras, eu
um cômodo com aspecto sujo, cheirando a percebi com clareza minhas racionalizações
cigarro e suor. Ele despejou a ladainha de autoprotetoras e fiquei tomado de remorso.
reclamações costumeiras, e eu comecei a Mais tarde, Deus usou a confissão do meu
responder com verdades bíblicas. Foi então pecado e o conflito com aquele homem para
que ele me interrompeu e disse: “Você não começar a transformá-lo.
vai pregar o mesmo sermão de novo, não é Deus quer que atentemos não só para
mesmo? Você não tem nada novo para me o falar que se opõe à obra do Espírito, mas
dizer?”. Eu não podia acreditar no que estava também para as racionalizações pecaminosas
ouvindo. Lá estava eu, preocupado com ele que utilizamos para fazer com que o nosso
a ponto de dispor do tempo que teria com discurso seja aceitável à consciência.
minha família, e ele zombava do meu esfor-
ço para auxiliá-lo, sem mostrar nenhuma 6. Falar o que edifica significa
consideração! Perdi o controle, dei lugar à “andar no Espírito” no que diz
raiva que eu havia alimentado por semanas respeito às nossas palavras
e o agredi verbalmente, arrasando-o. Eu (veja versículo 25).
disse a ele exatamente o que eu e a igreja Andar no Espírito significa estar com-
pensávamos a seu respeito. Lancei sobre ele prometido com falar de modo coerente com
tanta culpa quanto pude e disse-lhe que devia a Sua obra em mim e que encoraje a Sua
acordar daquela mesmice e finalmente fazer obra em outras pessoas. Neste texto, a obra
algo de bom. Orei por ele (!) e saí. Eu estava do Espírito é apresentada com clareza. O
fervilhando enquanto voltava para casa. Espírito trabalha para produzir em nós um
No caminho para casa, não demorou fruto correspondente ao caráter de Cristo:
muito para que eu começasse a me condenar. amor, alegria, paz, longanimidade, benig-
Também não demorou muito para que eu nidade, bondade, fidelidade, mansidão e
começasse a racionalizar e criar argumentos domínio próprio. Andar no Espírito no que
para me desculpar. Chegando em casa, eu diz respeito ao falar significa que, por um ato
estava convencido de que havia falado como de fé e submissão, eu elevo o meu falar ao
um dos profetas do Antigo Testamento, padrão do fruto do Espírito e olho para as si-
proclamando um “assim diz o Senhor” em tuações difíceis da vida como oportunidades
meio ao pecado e à rebeldia. Eu havia me concedidas soberanamente por Deus para o
convencido de que Deus usaria aquele mo- amadurecimento deste fruto em mim, pela
mento dramático de revelação da verdade Sua graça. Dificuldades não são obstáculos
para gerar uma mudança permanente na para o desenvolvimento do fruto do Espírito,
vida daquele homem. Quando entrei em mas oportunidades para vê-lo crescer.
casa, minha esposa, que estivera orando, Anos atrás, havia um homem em nossa
perguntou-me o que havia acontecido. igreja que era particularmente crítico em
Contei-lhe que eu havia falado tão duro com relação ao meu ministério. Eu travava uma
aquele rapaz quanto eu nunca havia falado luta interior todas as vezes que via aquele
antes no meu ministério. Certifiquei-me homem ou mesmo pensava nele. Posso
de usar a analogia do profeta com minha lembrar-me de como ficava aliviado quando
esposa. Ela imediatamente disse: “Parece- chegava a alguma programação da igreja e
me mais que você ficou irado e falhou”. No descobria que ele não estava lá. Eu também

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estava ciente de que ele não guardava consigo em primeiro lugar comigo mesmo, examinar
mesmo as suas opiniões. Ele havia começado o meu coração, confessar o pecado que estava
a reunir ao redor de si pessoas que concor- lá e decidir falar de modo condizente com
davam com ele. Nossa igreja não era grande, o fruto que o Espírito estava trabalhando
e assim o descontentamento foi ficando em mim.
cada vez mais evidente. Eu decidi que já era À medida que examinei meu coração,
tempo de pedir àquele homem para termos encontrei mais coisas que precisavam de
uma conversa. Contei a minha esposa que mudança do que eu havia imaginado. Meu
eu estava planejando falar com Pedro (nome problema não era apenas ódio e ira, mas
fictício), e ela imediatamente perguntou-me pecados ainda mais profundos. Boa parte da
o que eu estava pretendendo dizer. Enquanto minha motivação para o ministério não era a
eu compartilhava meus pensamentos com obra do Senhor, mas meu sonho pessoal.
ela, pude perceber que ela estava reagindo Eu sonhava ir para um campo ministe-
negativamente, e então perguntei o que havia rial difícil e ser bem sucedido como ninguém
de errado. Ela disse: “Antes de você lidar com mais. Eu sonhava ser altamente respeitado
ele, Paul, você precisa lidar consigo mesmo. por uma igreja em crescimento contínuo e,
Parece-me que você odeia este homem. Eu em pouco tempo, pela comunidade evangé-
não creio que algo bom possa resultar de uma lica inteira. Eu sonhava ver um crescimento
confrontação do erro de Pedro até que você numérico, construir instalações amplas e
lide com as próprias atitudes”. modernas e liderar a igreja mais dinâmica da
Eu queria crer que Luella, minha espo- região. Mais que tudo, eu sonhava ser visto
sa, fosse apenas mais uma entre as pessoas como a figura central em tudo isso.
que estavam me entendendo mal e julgando Eu odiava aquele homem porque ele
erradamente; mas não era de fato assim. estava certo! A maneira pela qual ele lidava
Ninguém havia dito palavras tão verdadeiras com suas preocupações a respeito do meu
quanto as dela. Eu odiava aquele homem. ministério não era correta, mas ele estava cer-
Odiava o efeito controlador que ele exercia to na percepção que tinha do meu orgulho.
sobre mim e também odiava o fato de ele ter Sim, eu gostava de estar no centro de cada
influenciado outros contra mim. Odiava o programação. Sim, eu queria ter a palavra
quanto a sua crítica provocava uma reavalia- final em cada assunto. Sim, eu ficava frustra-
ção constante de tudo quanto eu fazia como do quando as pessoas eram obstáculos para
pastor! Ainda odiava a maneira pela qual ele meus planos. Eu odiava o quanto as coisas
havia destruído meu sonho de ministério e andavam devagar e o quanto as pessoas eram
nossa igreja, bem como odiava o sorrisinho negativas. E eu lutava com Deus por ter-me
arrogante no seu rosto. Na verdade, eu não colocado em um ministério tão árduo.
queria lidar com ele. Eu simplesmente queria Aquele homem que eu odiava começou
vê-lo longe de mim! a ser um instrumento de resgate nas mãos
Luella tinha razão. Eu não estava em do Senhor. Por meio de Pedro, meus sonhos
condições de ser um instrumento do Espí- egoístas e arrogantes foram expostos e come-
rito na vida de Pedro. O meu falar não seria çaram a morrer. Sob o calor desta provação,
edificante. Eu decididamente não estava Deus revelou-me o pecado em meu coração
andando no Espírito no que dizia respeito a de uma maneira nova. À medida que gastei
este relacionamento, e precisava de fato lidar vários dias examinando a mim mesmo e a

Coletânea de Aconselhamento Bíblico  Volume 2 99


situação, comecei a ser grato pelo homem que ele desse apoio aos meus sonhos. Mesmo
que eu havia odiado. Não se tratava de uma como pastor de Pedro, a última coisa que eu
gratidão pelo pecado de Pedro, mas por queria era ser um instrumento de edificação
como Deus o havia usado em minha vida. na vida dele. Até o momento da conversa
Assim que desenvolvi gratidão, comecei a com Luella, eu nem mesmo tinha conside-
ouvir o que Pedro tinha dito a meu respeito rado a possibilidade de ser um instrumento
e como ele havia falado. Percebi que havia útil ao Espírito para produzir fruto bom na
coisas que Deus queria que eu aprendesse vida de Pedro.
mesmo por meio daquele mensageiro irri- Afinal, quando a conversa com Pedro
tante. Finalmente, à medida que atentei para aconteceu, eu tinha uma disposição radical-
como ele comunicava seus pensamentos, mente diferente daquela que eu havia revelado
descobri muitas semelhanças entre ele e eu. inicialmente à minha esposa. Eu não queria
Pedro era orgulhoso, opinioso, pronto a falar mais “vencer”. Eu não queria mais que ele se
e impaciente. Eu odiava todas estas coisas, calasse e concordasse com os meus sonhos. Eu
mas descobri que elas estavam presentes em realmente desejava ser usado por Deus para
mim também. produzir o fruto do Espírito em Pedro. Ele
Naqueles dias, Deus me deu um amor chegou para a nossa conversa pronto para a
genuíno e pastoral por Pedro. Quando con- luta. Estava evidente que ele havia preparado
versamos, eu fui capaz de comunicar com ele as suas armas e ensaiado a defesa. Mas não
de modo paciente, amoroso, bondoso, paci- houve batalha. Eu lhe disse que estava agra-
ficador e com domínio próprio. À medida decido por suas percepções; que por meio
que refleti no bem que o Espírito havia feito dele o Espírito tinha de fato exposto o meu
em mim por meio de Pedro, eu até mesmo coração, e lhe pedi perdão. Antes mesmo que
fui capaz de estar alegre com a oportunidade eu tivesse oportunidade de falar a respeito
de ter aquela conversa difícil. dele, ele disse: “Paul, eu também errei. Para
Andar no Espírito quanto ao falar não ser honesto, eu deveria dizer que odiei você
significa somente falar de maneira consis- e que procurei oportunidades para criticá-lo
tente com o que o Espírito está fazendo diante dos outros. Eu estava irado com você
em mim; significa também falar de maneira e irado com Deus por ter-nos colocado nesta
que encoraje o crescimento do fruto na ou- igreja. Eu lhe peço perdão”.
tra pessoa. Sinceramente, eu não estava me Aquela noite, pela primeira vez em
importando com o fato de Deus me usar na muito tempo, Pedro e eu andamos no Espí-
vida de Pedro até que Luella mencionou isso rito em nosso falar, e o Espírito produziu um
para mim. Apenas duas coisas importavam novo crescimento em nós. Mas não deixe que
para mim: eu queria provar que Pedro estava a questão central passe despercebida: tudo
errado, e depois eu queria que ele saísse da começou com alguém que me confrontou
nossa igreja e me deixasse em paz! Eu tinha e encorajou a examinar o próprio coração
me deixado levar pela ideia de que a minha antes de confrontar Pedro. Andar no Espírito
luta era contra “carne e sangue” (Ef 6.10-12). quanto ao falar significa separar tempo para
Eu via Pedro com o inimigo a ser derrotado, ouvir, examinar, refletir e preparar. Significa
e tinha perdido de vista a batalha espiritual comunicar com base no compromisso de
que acontecia abaixo da superfície. Eu não participar da obra contínua do Espírito na
queria ser um servo para Pedro; eu queria nossa vida e na de outros.

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7. Falar o que edifica significa de Cristo desapontados que difamam seus
não dar lugar às paixões e aos líderes, todos estes estão dando lugar às
desejos da natureza pecaminosa paixões e desejos da natureza pecaminosa.
(veja versículos 24 e 16). O resultado é uma colheita de fruto mau:
Preste bastante atenção às palavras do relacionamentos quebrados, problemas não
versículo 24: “E os que são de Cristo Jesus resolvidos e complicações adicionais.
crucificaram a carne, com as suas paixões e Falar palavras moldadas pela emoção e
concupiscências”. Repare que este texto não por desejos da natureza pecaminosa é negar
está na voz passiva. Ele diz que quando acei- a promessa que Cristo fez de nos libertar do
tamos a Cristo, nós crucificamos as paixões domínio do pecado e também negar o nosso
e os desejos da natureza pecaminosa. Este compromisso de viver como pessoas que per-
texto leva-nos a considerar um aspecto do tencem a Ele. Falar de modo edificante significa
evangelho que com frequência é omitido. falar com base na capacidade de domínio
O evangelho é uma mensagem gloriosa que próprio concedida a nós por Cristo, Aquele
fala de consolo, perdão dos pecados, livra- que quebrou as cadeias de nossa escravidão ao
mento da condenação, restauração do rela- pecado e nos deu o dom de Seu Espírito que
cionamento com Deus, dádiva do Espírito habita em nós. Nossa boca pode ser instrumen-
e garantia da eternidade. Mas o evangelho to de justiça! Podemos dizer “não” às emoções
é também um apelo a abandonar a vida em e desejos da natureza pecaminosa.
conformidade com os anseios da natureza
pecaminosa para que possamos viver para 8. Falar o que edifica significa
Cristo. A salvação, no sentido mais amplo, ver os relacionamentos como
não se resume em receber consolo; ela inclui meio de restauração
também a resposta ao apelo de santidade. (veja capítulo 6, vs. 1 e 2).
O compromisso assumido de uma vez por Paulo diz:
todas com uma vida piedosa, crucificando as “Irmãos, se alguém for surpreendido
paixões e os desejos da natureza pecaminosa, nalguma falta, vós, que sois espirituais,
deve ser vivido em todos os nossos relaciona- corrigi-o com espírito de brandura”. Ele está
mentos e circunstâncias de vida, pelo poder mencionando uma condição que diz respeito
de Cristo em nós. a todos nós aqui na terra. Somos “surpreen-
Não há lugar onde este compromisso didos” em ira, orgulho, autocomiseração,
seja mais necessário que na área da comu- inveja, vingança, justiça própria, amargura,
nicação. Se formos humildes e honestos, cobiça, egoísmo, medo e falta de fé. Muitas
admitiremos que muito do que dizemos é vezes não estamos cientes de que caímos
guiado pelas paixões e desejos da natureza em pecado, nem mesmo sabemos como nos
pecaminosa e não por um compromisso com livrar. Há pecados aos quais somos cegos ou
a vontade e a obra de Cristo. Os maridos que constituem nosso campo de batalha em
que lançam em direção às esposas palavras particular. Haverá um dia em que as ciladas
de crítica carregadas de ira, as esposas que cairão por terra e estaremos com Cristo para
se entregam à murmuração e às queixas, sempre! Mas até aquele dia, precisamos re-
as crianças que explodem em ira contra os conhecer que nós, como pecadores, caímos
pais, os pais frustrados que agridem seus facilmente no pecado. Por isso precisamos
filhos com palavras, os membros do corpo uns dos outros.

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Paulo diz: “vós, que sois espirituais, responder como um restaurador que quer
corrigi-o com espírito de brandura”. Quando ser um instrumento nas mãos do grande
“andamos no Espírito” (verso 25), estamos Restaurador.
em condições de ser um dos instrumentos Quando um casal discorda mais uma
de restauração de Deus. vez a respeito daquele assunto já tão batido, é
Falar o que edifica significa permitir que hora de fazer algo mais que lamentar um ca-
esta disposição restauradora controle nossos samento que não funciona ou queixar-se do
relacionamentos. Todos nós somos tentados cônjuge que nunca se define. Eles precisam
a pensar que nossos relacionamentos nos descobrir onde estão sendo “surpreendidos”
pertencem. Tendemos a olhar para as outras e precisam reagir um ao outro não com uma
pessoas como se elas nos pertencessem. Os disposição de fazer exigências, mas de res-
pais caem nesta armadilha com seus filhos; taurar. A maior tarefa nos relacionamentos
mais tarde, na adolescência, quando os filhos humanos não é a procura da felicidade do
são mal-sucedidos, os pais são incapazes de homem, mas a reconciliação com Deus e a
superar a própria ira e dor para serem agen- restauração da imagem de Seu Filho.
tes de restauração daquilo que eles mesmos
promoveram! Maridos e esposas acreditam 9. Falar o que edifica significa
que é responsabilidade do cônjuge fazê-los falar com humildade e brandura
feliz. A vida passa a se constituir de uma série (veja capítulo 6, versículo 1).
de testes em que as pessoas são julgadas de Diante da fraqueza do próximo, da
acordo com a maneira de reagir a nós e com tentação e do pecado, as palavras ásperas
base em como elas nos afetam. Procuramos (“Por que você não dá um jeito na vida?”, “Se
receber respeito, amor, apreciação, aceitação você acha que vou arrumar a sua bagunça,
e honra adequados, e descobrimos que é di- está muito enganado!”) e orgulhosas (“No
fícil dar continuidade a um relacionamento meu tempo” ou “Não posso me relacionar
quando estas coisas não existem. com alguém que faz isso!”) simplesmente
Paulo está nos chamando a algo com- contradizem a mensagem do evangelho.
pletamente diferente. Esta nova disposição Nossa reação natural quando vemos
nos relacionamentos tem suas raízes no re- um irmão seduzido pelo pecado deve ser
conhecimento básico de que nossos relacio- de brandura. Devemos reconhecer que,
namentos não pertencem a nós, mas a Deus. não fosse pela graça de Deus, estaríamos
Uma vez que começamos a conceber nossos onde ele está. E então devemos responder
relacionamentos desta forma, percebemos com a mesma graça que recebemos. Deus
também a necessidade de restauração ao nos amou quando não éramos merecedo-
nosso redor. Por exemplo, quando você está res de amor. Ele nos perdoa a despeito de
em viagem de férias e as crianças começam pecarmos repetidas vezes. Na verdade, é
a discutir no banco de trás, há algo mais Seu amor que nos leva das trevas para a
acontecendo do que o simples fato de suas Sua maravilhosa luz. Mesmo enquanto
férias tão preciosas estarem sendo arruinadas! ainda lutamos com a realidade do peca-
A necessidade de restauração está se fazendo do, é vital que a nossa comunicação uns
sentir. Você pode reagir a esta situação como com os outros seja reflexo do amor de
um pai irritado, cujos filhos estão rouban- Cristo que nos constrange. Ele é nossa
do as férias dos seus sonhos, ou você pode única alegação persuasiva, nossa única

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esperança. Apenas Ele é capaz de mudar 10. Falar o que edifica signifi-
nosso coração. Queremos falar de modo ca viver e comunicar tendo os
tal que leve as pessoas a depositarem es- outros como centro da atenção
perança nEle. (veja Gálatas 6.2).
Também estamos livres para falar A ilustração aqui é de pessoas cami-
com brandura porque abrimos mão com- nhando. Elas não estão fixando o olhar
pletamente da esperança de que o coração apenas naquilo que precisam carregar, mas
possa ser transformado por pressão, lógica olhando ao redor para identificar aqueles
e poder humanos. Em momento algum é que precisam de ajuda. Com as palavras
o volume da nossa voz, o poder das nossas “levai as cargas uns dos outros”, Paulo
palavras, o drama da situação, a criativi- apresenta-nos a sua intimação. Ele nos
dade das nossas ilustrações, a força do chama a olhar além do conforto, sucesso
nosso vocabulário, o fantasma das nossas e vantagens pessoais, de modo que enxer-
ameaças, a majestade dos nossos gestos o guemos as pessoas que estão lutando para
que provoca mudança nas pessoas. A bran- carregar seus fardos e dividamos com elas
dura flui do conhecimento da verdadeira o peso. Este é o método de Cristo.
fonte do poder. Deus pode usar palavras Também somos intimados a falar uns
pronunciadas em voz baixa para produzir com os outros movidos por esta mentali-
uma convicção tremenda em um coração. dade de “carregadores de fardos”. Quando
Sim, queremos pensar e falar adequada- vemos alguém que luta com sua fraqueza,
mente, mas somente porque queremos ser apontamos para a força que há em Cristo.
instrumentos úteis nas mão dAquele que Ao ignorante falamos com palavras de
produz de fato a mudança, e não porque verdade que transmitem sabedoria; ao te-
depositamos confiança na nossa habilida- meroso falamos do Deus que está sempre
de para produzir mudança. presente nas dificuldades; ao aflito pro-
Palavras de brandura não vêm de curamos oferecer palavras de conforto; ao
uma pessoa que está irada e querendo desencorajado procuramos levar palavras
decidir o placar. Vêm de uma pessoa que de esperança; ao solitário acolhemos com
está falando motivada não por aquilo que expressões do nosso amor e da presença
quer de você, mas por aquilo que quer de Cristo; ao irado apontamos um Deus
para você. Sou capaz de falar com bran- de retidão, vingança e justiça; ao que está
dura somente quando não falo motivado envolvido em conflitos procuramos falar
por dor, ira e amargura pessoal, mas por como pacificadores e reconciliadores; ao
um amor sacrificial que visa edificação. ansioso apontamos para o descanso que
Eu me dirijo a você não porque o seu Cristo deu aos Seus.
pecado me atingiu, mas porque ele está Falar de modo edificante significa
prendendo você em uma armadilha e eu escolher nossas palavras com cuidado,
desejo vê-lo livre deste laço. Não estou sem dar lugar às paixões e aos desejos da
em missão de confrontação egoísta, mas natureza pecaminosa. Não queremos in-
de resgate amoroso. E eu sei que, de certa duzir outros ao pecado por meio da nossa
forma, todos nós precisamos deste resgate própria vaidade e inveja. Também não
diariamente. queremos morder e devorar uns aos outros

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com palavras, antes estamos comprometi- Que reavivamento, reconciliação e
dos em servir uns aos outros em amor por restauração radical aconteceriam em nossas
meio das nossas palavras. Queremos falar igrejas, lares e amizades se respondêssemos
em consonância com aquilo que o Espírito a esta intimação em cada relacionamento e
está procurando produzir em nós e nos situação! Quão diferentes as coisas seriam
outros, de modo compatível como Seu se estivéssemos firmemente comprometidos
fruto e que encoraje o crescimento deste com falar de modo edificante! Quão diferen-
fruto em outros. Finalmente, queremos te teria sido o relacionamento entre João e
falar em humildade e brandura, como Beatriz se eles tivessem atendido ao apelo de
agentes de restauração, como carregadores Deus para falarem um com o outro usando
de fardos comprometidos com viver pela palavras que edificam! Como é importante
lei do amor de Cristo. para nós a boa escolha das nossas palavras!

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