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O Enigmático Capricornus-Makara

Segundo Helena Blavatsky, na sua monumental obra A Doutrina Secreta, Makara é o mais sagrado e
misterioso de entre todos os signos do Zodíaco.

Para levantarmos um pouco o véu e penetrarmos na significação deste fascinante símbolo, iniciaremos,
primeiramente, um périplo por alguns trechos da riquíssima mitologia grega.

A mitologia grega presenteia-nos, regra geral, com múltiplas versões, de diferentes épocas, sobre um
mesmo tema. Porém, o seu significado essencial é sempre o mesmo; o que varia é o revestimento
externo.

Começaremos pela história do nascimento da deusa Atena:

O nascimento de Atena
Métis, a primeira esposa de Zeus, ficou grávida de Atena. Perante este facto, Urano e Geia aconselharam
o augusto deus a que engolisse a esposa, pois, de acordo com uma profecia, se Métis concebesse uma
filha, e esta um filho, o neto viria a apropriar-se da soberania do avô.

Quando chegou ao fim a gestação de Atena, Zeus começou a sentir insuportáveis dores de cabeça. Pediu,
então, auxílio ao deus das forjas, Hefesto, para que lhe abrisse a cabeça com um golpe de machado.
Hefesto assim fez, e da cabeça de Zeus surgiu Atena, já adulta e armada com uma lança e uma égide.

A Vocação de Atena
Em dada altura, os deuses do Olimpo debruçaram-se atentamente sobre certos acontecimentos que se
desenrolavam na Terra. Na verdade, eles sabiam que estava eminente o alvorecer de uma grande
revolução, que viria iluminar o caminho dos homens…

Cécrope, rei da Ática, intentava congregar as tribos da região por forma a edificar uma cidade-estado,
cuja coesão e organização deveria trazer novos rumos de sabedoria e de paz.

Ante esta visão grandiosa, não era de admirar que os deuses se empolgassem e quisessem, cada um deles,
o privilégio de ser patrono da cidade. Seguiu-se uma verdadeira querela e, no final, restaram apenas dois
à altura do grande desafio: Posídon(-Neptuno), o deus dos mares, e Atena(-Minerva), a deusa da
sabedoria e da prudência. Decidiu-se que se tomaria por protector da cidade o deus que produzisse a
coisa mais útil.

Posídon, tocando a terra com a ponta do seu tridente, fez surgir um fogoso cavalo e fez jorrar uma fonte
de água marinha, querendo com isso significar que o seu povo seria navegador, voluntarioso e guerreiro.
Mas Atena interceptou-o e, aproximando-se do animal, afagou-o e domou-o, transformando-o num dócil
aliado do homem. Logo após, tocando a terra com a ponta da sua lança, fez aparecer uma oliveira
carregada de frutos, pretendendo com isso fadar o povo para que fosse industrioso, para que soubesse
frutificar a terra, e para que pudesse iluminar os lares e os templos.

A azeitona, anunciou ela, seria portadora de vida: proviria alimento para os homens e óleo santo para os
sacrifícios aos deuses. A sua árvore seria forte e resistente, frutificando mesmo na terra mais agreste e
rochosa. Mas o mais importante era que a oliveira representaria a paz, enquanto que o cavalo, por obra
dos homens, permaneceria associado à guerra.

Gerou-se silêncio entre aquela solene plêiade de deuses e, embora nenhum desejasse melindrar Posídon,
e todos admirassem vivamente a sua magnífica criação, tiveram de reconhecer que Atena fora a
vencedora.

E assim, sob o seu protectorado floresceu a grandiosa Cidade de Atenas.


Atena e Hefesto
Hefesto, o deus ferreiro e ourives, que trabalhava afanosamente no interior dos Vulcões e nos imensos
filões metálicos no seio da Terra, fabricava todo o tipo de artefactos e armas para os seus pares do
Olimpo. Hefesto era o mais sombrio e reservado entre os deuses, sendo a sua aparência algo repulsiva:
era vesgo (1), coxo e curvado sobre si mesmo, sempre enegrecido da fuligem que eternamente bulia das
suas abissais forjas.

1) Em algumas versões do seu mito, Hefesto era cego de um olho.

Certo dia, despeitado pelo amor não correspondido que nutria pela exuberante Afrodite, virou-se para a
filha predilecta de Zeus, Atena, por ela tomando-se de desejos. Também neste caso, foi repudiado.
Iniciou, então, uma perseguição irrefreável, e tentou mesmo raptá-la. Atena debateu-se e conseguiu
resistir-lhe – não sem que se visse forçada a limpar-se do sémen do seu perseguidor, com um trapo de lã,
que depois arremessou para a Terra. Foi, por tal bizarro modo, esta que foi fecundada, e daí nasceu
Erictânio (também chamado “o filho da Terra”), um estranho mas bondoso ser com cabeça e tronco de
homem, mas cauda de serpente. Apesar de não ser filho do seu ventre, Atena afeiçoou-se a ele, assumiu a
sua criação e educação, e fez dele rei de Atenas.

Erictânio foi um bom governante. Entre outras coisas muito úteis, ele ensinou o seu povo a dominar os
cavalos e, instruído por Atena, costumava usá-los nas quadrigas – espécie de carruagens puxadas por 4
cavalos.

Quando ele morreu, Atena elevou-o aos céus, transformou-o numa estrela e colocou-o na constelação do
Cocheiro (ou Auriga), para que brilhasse para sempre no firmamento.

Hefesto, o deus que ata e desata


Hefesto, mal amado, desde o nascimento, por sua mãe, a deusa Hera, fabricou um presente envenenado
que lhe enviou: um magnífico trono de ouro, artisticamente cinzelado. Hera ficou maravilhada e logo
nele se sentou. Foi, porém, com espanto e horror que verificou não mais se poder levantar daquela prisão
dourada. É que unicamente o ourives divino conhecia o segredo do atar e desatar…

Foi também Hefesto que, segundo o mito grego, criou a primeira mulher, Pandora. Não só a modelou a
partir do barro mas animou-a com um sopro divino – tal qual como os Elohim, de que Jeová (1), o deus
tutelar dos judeus, era um entre eles.

1) Jehovah, no Talmud, é Achad, “o Um em Muitos”.

O nascimento de Zeus
Reia ficou grávida de Cronos mas, temerosa, pois o marido devorava todos os próprios filhos, refugiou-
se no Monte Dicta (ou Ida, noutras versões), em Creta (embora a Ática também reclame esta honra para
si) para dar à luz, e logo depois o escondeu nas profundezas de uma inacessível caverna. Aí, o pequeno
Zeus foi amamentado por Amalteia, que era ao mesmo tempo uma ninfa e uma cabra. Mais tarde,
reconhecido, Zeus instalou-a nos céus como a estrela Capela (Cabrinha) da constelação do Cocheiro (ou
Auriga). Com frequência, em múltiplas versões do mito, se atribui a invulnerabilidade da égide de Zeus
ao facto de esta ser recoberta da pele da cabra Amalteia.

Numa outra variante deste aspecto do mito, Aegipã (cabra-pã) era filho de Zeus com uma cabra chamada
Aex, cuja pele era invulnerável. Quando esta morreu, Zeus retirou-lhe a pele e com ela fez a sua égide.

Capricórnio, a cabra-peixe
Numa batalha que travou contra o monstro Tifon, Zeus perdeu os tendões dos braços e dos pés, que
Tifon, então, escondeu. Depois de algumas perseguições e peripécias várias, os seus filhos Aegipã e
Hermes tomaram de volta os tendões do pai (o qual recuperou, assim, as suas forças), mas Tifon
perseguiu-os até ao Egipto, onde eles se disfarçaram mudando de forma. Aegipã mudou a sua metade
inferior para a de um peixe, a fim de lhe facilitar a sua fuga por mar.
Zeus mostrou a sua gratidão colocando Aegipã nos céus como a constelação do Capricórnio. Ele ainda
mantém a sua forma: na contraparte superior, de cabra, e na inferior, de barbatana de peixe.

O símbolo Capricórnio-Makara
Em ocultismo, a cabra é um dos símbolos atribuídos ao Akasha, como o é da essência vital (Jîva)
aprisionada na matéria. O Akasha é representado pelo Pentagrama. É por isso que o famoso “Bode de
Mendes” (2), inscrito num pentagrama (com o vértice virado para cima, e assim figurado por Eliphas
Levi), é sinónimo da Luz Astral (o aspecto ou nível mais inferior do Akasha), onde a Magia comum,
elemental se pratica.

2) Em algumas raras representações, o “Bode de Mendes” é representado com uma cabeça de ancião e
inscrito num pentagrama invertido, como alusão à natureza ilusória e enganadora da Luz Astral e à
necessidade de muita prudência e discernimento para lidar com esse depósito ancestral, velho como o
mundo, somatório de todos os bons e maus eflúvios produzidos pela humanidade e pela natureza animal
em geral.

O Bode de Mendes é identificado ao andrógino Baphomet (3) grego, ao que se julga, cultuado pelos
Templários. Segundo Von Hammer, o termo significa “baptismo ou iniciação na Sabedoria”, derivado
das palavras gregas Baph [Baptismo] e Metis [Sabedoria”], e da relação de Baphometis com Pã.
De facto, Baphomet era um símbolo hermético-cabalístico, decomposto como se segue: Beth-Pe-Vav-
Mem-Taf. Aplicando-se-lhe a cifra Atbash e utilizando-se o método de transferências e codificação
usado pelos cabalistas judeus, obtém-se Shin-Vav-Pe-Yod-Aleph, que compõe o termo gnóstico Sophia
(Sabedoria, em grego).

3) Helena Blavatsky relaciona Baphomet a Azazel, o bode expiatório do deserto mencionado na Bíblia
Judaico-Cristã, e cujo sentido original, segundo ela, foi pervertido pelos tradutores das Escrituras. Azazel
seria a conjugação das palavras Azaz e El, significando, assim, “Deus da Vitória”.

À essência vital aprisionada na matéria, alude a lenda do Titã Prometeu agrilhoado para sempre a uma
rocha. Durante o dia era supliciado por um abutre que lhe devorava o fígado e, para eternizar o suplício, à
noite este era regenerado. Num aspecto do mito, Prometeu figura a mónada humana na sua prisão de
carne, encarcerada no “Quaternário inferior”. Ele era corroído, incessantemente, nas entranhas, pelas
paixões e concupiscências próprias da natureza inferior.

Mas Prometeu roubou o fogo dos deuses, a Centelha de Manas (Mente Superior), que, só ela, permite a
salvação deste cárcere (a rocha a que estava preso). Prometeu simboliza, então, aqui, os Kumâras (a
Tríade Superior (4) ou o Ego Espiritual) que vieram, a meio da 3ª Raça (5), trazer uma luz à humanidade-
animal e lhe possibilitaram o caminho para a Liberdade e para a Imortalidade.

4) Por isso, também às vezes chamados os Triângulos, entre outros muitos nomes: Pitris Agnishvâttas,
Mânasaputras, Dhyâni-Buddhas, Prajâpatis superiores, Aswins, etc.
5) Curiosamente, é dito que Vulcano, o planeta intra-Mercuriano que “vela o sol”, deixou de ser visível
nos finais da 3ª Raça. (Blavatsky Collected Writings, XII). A este propósito, falaremos mais à frente,
quando tratarmos da simbologia Hefesto-Vulcano.

De acordo com o sustentado por Helena Blavatsky, no Zodíaco bramânico os signos são todos eles
presididos por, e dedicados a, um dos grandes deuses. No caso de Makara (Capricornus), a divindade a
que o mesmo é dedicado é Pulaha, que, segundo o Rig-Veda, é um dos sete Richis-Prajâpatis nascidos da
mente de Brahmâ.

E lemos na sua Doutrina Secreta “… A Quinta Hierarquia, a dos Kumâras, é muito misteriosa, uma vez
que está relacionada com o Pentágono Microcósmico, a estrela de cinco pontas representando o homem.
Na Índia e Egipto, aqueles Dhyânis [Kumâras] eram associados ao Crocodilo e o seu domicílio era em
Capricórnio. Na astrologia indiana, Crocodilo e Capricórnio são termos conversíveis, porquanto este 10º
signo do Zodíaco é chamado Makara, livremente traduzido por ‘crocodilo’ [mas, mais propriamente,
simbolizando um ser anfíbio]. Ele é o “Dragão da Sabedoria” de Manas, e tornou-se o foco e a missão da
5ª Hierarquia – os misteriosos seres que governam sobre a constelação do Capricórnio, Makara ou
‘Crocodilo’ … para inspirar a forma animal vazia e etérea, e dela fazer o Homem Racional” (6).
Podemos ler, ainda, a respeito, no Glossário Teosófico da mesma autora: “Se, conforme as sustentações
exotéricas, Capricornus estava relacionado, de algum modo, com a cabra Amalteia que alimentou Júpiter
com o seu leite, ou se era o deus Pã, que se transformou em macho cáprio e deixou impressa a sua marca
nos arquivos siderais, é irrelevante. Cada uma das fábulas tem o seu significado. Cada coisa na Natureza
guarda íntima correlação com as demais, e assim os estudantes da arcaica sabedoria não se surpreenderão
quando se diz que ‘os sete passos dados pelo recém-nascido Buda na direcção de cada um dos pontos
cardeais, ou seja, os vinte e oito passos’ estão intimamente relacionados com as vinte e oito estrelas da
constelação de Capricórnio”.

6) O 10º Portal é o da Gnosis. O 10 é o número que dá nascimento às almas – à alma humana e, bem
assim, à alma divina. Os Kumâras têm no domicílio de Makara o seu foco e a sua missão (e é, com
certeza, significativa a particularidade da permutação fonética).

Makara ou Panchakaram é o Pentágono. Este é o símbolo do homem-pensante (dotado do 5º Princípio,


de Manas) e também, num certo sentido, do Akasha (7). Makara é o mais recôndito, etéreo e interno de
todos os signos. É o signo dos Deuses Solares e Salvadores do Mundo: Dionísio, Osíris, Hórus, Zeus,
Mithras, Apolo, Baco, Jesus todos nasceram em Capricórnio. É o símbolo da iniciação, do novo-
nascimento, e dos novos começos. O filósofo Luciano deixou dito que “o símbolo geométrico do
Pentagrama (representando o Amor e a Euritmia vivente) era a contra-senha da Sociedade Pitagórica (…)
Na verdade, o ‘número de ouro’, pitagórico, [1,618] resume aritmética e algebricamente as propriedades
da dominante geométrica – o pentagrama” (8).

7) Makara, literalmente, significa 5º Raio (Ma = cinco; kara = raio ou potência, do sol ou da lua. Kara
também significa “mão”).
El Número de Oro, de Matila C. Ghyka.

O Fogo de Manas foi-nos trazido, como já vimos, pelos Kumâras, os Senhores de Vénus. Diz-nos a
Doutrina Oculta que Vénus é o protótipo espiritual da Terra. Daqui estar escrita a alegoria de que o carro
de Sukra-Uzanas (isto é, o de Vénus-Lúcifer (9)) conduz um grupo de oito “cavalos nascidos da Terra”,
enquanto os “corcéis” dos cocheiros dos demais planetas são em diferente número.

9) Lúcifer (ou Phoroneus), o “Portador da Luz”.

Com efeito, os antigos eram conhecedores de uma significativa ocorrência cosmológica entre os dois
planetas irmãos. Em períodos (cíclicos) de, sensivelmente, oito anos, dão-se cinco conjunções ditas
inferiores, isto é, de Terra-Vénus-Sol, e, também, com a mesma duração, cinco conjunções superiores, de
Terra-Sol-Vénus, sendo que, em ambos os casos, Vénus desenha nos Céus um pentagrama (10). Este
acontecimento extraordinário não podia ser visionado pelos astrónomos da antiguidade, pois, na verdade,
só seria observável de fora da órbita terrestre; contudo, eles o sabiam!

10) Como é do conhecimento comum, a arquitectura do pentagrama regular está absolutamente


determinada pelo número de ouro - “1,618” -, o número régio da proporcionalidade e da harmonia.
(Lamentavelmente, pela extensão deste artigo, não é aqui oportuno fazer essa demonstração). De acordo
com certas teorias astronómicas, apenas devido ao facto de a órbita da Terra ser uma elíptica (e não um
círculo) com excentricidade superior à de Vénus, o pentagrama descrito não é absolutamente regular. A
excentricidade de Vénus é quase nula, “0,0068”, e a da Terra é de “0,0167”. Não só os Gregos e Hindus,
mas também outros povos, como os Maias, eram detentores de sofisticados conhecimentos astronómicos.
O Códice de Dresden, por exemplo, um dos legados dos Maias que chegou aos nossos dias, exibe um
calendário com o ciclo completo de Vénus, de 5 grupos de 584 dias cada um, totalizando assim 8 anos
(terrestres), e seguindo-se ciclicamente o mesmo esquema.
Vénus é positivo em relação à Terra e é o seu Alter-Ego. Corresponde à Tríade Superior, enquanto que a
Terra representa o Quaternário inferior.

A cabra, a serpente, o golfinho, o peixe, o crocodilo


Originalmente Capricornus não era uma cabra e, sim, um ser híbrido metade cabra e metade peixe (isto
mesmo pudemos observar no mito grego de Aegipã). O símbolo de seres bi-compostos, terrestres numa
das metades e, na outra, marinhos, é recorrente e significa, invariavelmente, a qualidade ou
potencialidade da expressão em dois mundos ou planos. Na verdade, a palavra grega amphibios (de
amphi, “de um e de outro lado”, e bios, “vida”) significa simplesmente “vida em dois planos”. A classe
de seres simbolizados por Makara, ou pelo Crocodilo, ou por Capricornus alude aos nossos Pais
primordiais, os Kumâras, que (provenientes de Planos internos e, em termos evolutivos, muito superiores
a este em que estamos enfocados) dotaram a humanidade do princípio da Mente e, progressivamente, a
vieram instruir em todas as artes e ciências. Em muitas latitudes, sobreviveram lendas a respeito de
alguns desses seres iniciadores, que (simbolicamente) durante o dia emergiam das águas profundas para
instruir os homens, e à noite regressavam ao seu elemento natural: Oannes ou o Annedotus, o homem-
peixe das lendas caldeias; Dag ou Dagon, das hebraicas; os Nâgas ou Reis-serpentes, das búdicas;
Matsya, o avatar-peixe, primeira encarnação de Vishnu, da cosmogonia hindu. Enfim, até o próprio
Jesus, o Instrutor dos homens, do Novo Testamento Cristão, foi chamado, figurativamente, de “Ichthus”,
ou “o Peixe” (em grego), sendo o peixe uma das senhas de reconhecimento entre os seus seguidores, no
início do Cristianismo. Mas muito significativamente, quanto ao primeiro que aqui se enuncia, na época
pré-Babilónica Oannes era o Ea-Oannes (11), “O Antílope das Águas Profundas”, também nominado
“Aquele do Vasto Intelecto”, “Senhor do Olho Sagrado”, Deus da Sabedoria”. E Ea-Oannes era
frequentemente representado na figura de uma cabra com cauda (barbatana) de peixe, figura também por
vezes referida com o designativo de suhurmashu.

11) Na Suméria, a constelação de Capricornus era associada ao deus Enki, mais tarde identificado a Ea,
que trouxera cultura das profundidades oceânicas para a humanidade. Bem cedo os povos daquela região
mesopotâmica dominavam conhecimentos astronómicos e geodésicos. Reconheciam, por exemplo, três
paralelos principais: o equatorial, ou caminho das estrelas de Anu (o Ouranos grego), e dois tropicais, ou
caminhos de Enlil (Câncer) e de Ea (Capricórnio).

O símbolo híbrido da cabra-peixe estava ainda representado no imaginário de povos como os chineses, os
árabes, os assírios, os persas. Para os chineses era Ko ki; para os árabes era Alcaucurus ou Alcantarus;
para os assírios era Kunaxa; para os persas era Vahik.

Igualmente, para os gregos, aigokereus, o símbolo anfíbio capricórnio, era metade cabra, metade peixe, e
representava a ambivalência da vida nos dois mundos, telúrico e urânico. Era a cabra mítica nutriz, cujos
cornos simbolizavam a prodigalidade (a abundância e a fertilidade) – a Mãe do Mundo – em simbiose
com o símbolo do peixe, o qual, por sua vez, alude à fluente movimentação e liberdade nas águas
profundas e primordiais – as águas do Âmnio celeste, onde se gera a Vida Universal. Amalteia, Amnius,
Ama (12) Amrita (13), Amónia (14), Alma, Anima, Amen, Ammon (15), todos estes termos remetem
para a noção de mãe, geratriz, nutriz, princípio, soro divino, grande mar ou águas primordiais…

Varuna (Uaruna foneticamente), ou Uruvana, nas antiquíssimas inscrições de Boghaz Keui, que
remontam ao século XVI a. C., é o protótipo do Ouranos grego. É o deus das “Águas do Espaço” ou, em
certo sentido, o Akasha (14.) Varuna anda sobre as águas montado num peixe ou animal marinho
chamado Makara (16). É o principal Aditya entre os sete grandes deuses planetários.

12) Além do significado usual português de ama, “aquela que amamenta”, ama é também “mãe” em
hebraico, sendo ainda um título da Sephira Binah. Em caldeu, “mãe” designava-se amia. Âma-bhu é um
termo sânscrito que significa “existência anímica”, ou “que existe como alma” [“O que existe por si
mesmo”, isto é, “Brahmâ e outros deuses”] Glossário Teosófico.
13) O Amrita é o alimento que confere a imortalidade, o elixir da vida retirado do Oceano de Leite, na
alegoria dos Purânas. É idêntico ao Sudhâ, néctar dos deuses, simbolizado nas águas sagradas e
purificadores do Mandâkimâ cujo aspecto inferior é o rio Ganges - águas essas, personificadas na deusa
Gangâ, de que Makara, misticamente, é o veículo. O Amrita é ainda uma designação, nos Vedas, para o
suco sagrado Soma, utilizado nos Mistérios do Templo, como é, também, idêntico ao Haoma, o fruto
místico, proibido, da Pippala, a Árvore do Conhecimento. Deste termo sânscrito haoma deriva o grego
haîma, que significa sangue, o veículo da vida.
14) E até ureia (do grego ouron, ouranós). Parecerão abusivas estas correlações mas estes termos
guardam, na nossa perspectiva – não tanto na etimologia formal e mais aparente mas por uma estranha
atracção oculta baseada na fonética – uma identificação com a substância íntima e geratriz da Natureza –
o Akasha, o Aether no sentido superior, a Anima Mundi, o Amrita ou Elixir da Vida, Ambrósia dos
deuses, o Azoth dos alquimistas (também chamado Leite da Virgem). Este Azoth é a Essência Vital, o
princípio anímico presente em toda a natureza e a partir do qual toda a materialidade com a sua
incomensurabilidade de fenómenos se podem manifestar. Embora, na verdade, este Azoth não seja o
azoto da Química, não é por acaso que ambos têm essa designação. O azoto (nitrogénio) é o mais
insondável e enigmático dos elementos, porque o mais radical, se assim nos podemos expressar. Ele é, na
verdadeira acepção, a fonte da vida fisiológica. Para sustentarmos, um tanto (na medida que nos é
acessível) esta assertiva, ilustraremos simplesmente com o conhecido fenómeno da hibernação, detido
por alguns animais: os ursos, por exemplo, conservam e acumulam ureia no seu organismo, para, no
período da hibernação, reconverterem essa ureia em nitrogénio essencial, a partir do qual fabricarão os
aminoácidos fundamentais para a manutenção da vida.
15) Ammon idêntico a Pã, o deus da Natureza ou a Natureza personificada.
16) Do mesmo modo que, entre os hindus, Makara é o veículo de Varuna, entre os egípcios, Sebek, o
sagrado crocodilo do Nilo, é o veículo de Hórus. No Livro dos Mortos, Sebek assim se pronuncia: “Eu
sou o peixe e a sede [morada] do grande Hórus de Kem-ur”.

Também o Ouroboros ou Uroboros (Theli, na Caldeia), aparentemente com a mesma etimologia,


representava o Grande Dragão que circunda simbolicamente o Cosmo. “Uroboros, é a Serpente que
morde a própria cauda. Representa o andrógino divino no qual, no curso de um Manvantara,
primeiramente ocorre o despertar da vida consciente. É a Grande Nâga, a Grande Serpente que ‘atrai a
cauda para a sua boca naquela busca incessante do negativo pelo positivo’ e morde ‘com a sua cabeça
activa a cauda passiva, de cujas emanações nasceram mundos, seres e coisas” (The Mahatma Letters to
A. P. Sinnet). O Uroboros é, ainda e por conseguinte, uma alegoria ao útero da Grande Mãe, o qual
contém as fecundas águas amnióticas. Numa frase emblemática da Tábua de Esmeralda, de Hermes
Trimegistus, pode ler-se: “O Thelesma [o Ouro Celeste ou Espírito Universal] de todo o mundo está aqui.
O seu poder não tem limites sobre a Terra”.
Ainda com alguma relação fonética, parece estar o Uraeus, outra serpente, Cobra Capella (do tipo naja) e
um símbolo sagrado no Egipto antigo. Segundo o egiptólogo James Bonwick, “o Uraeus adornava a parte
anterior do Atef, a coroa de Hórus, bem como a mitra de Osíris, além de encimar a fronte de outras
divindades, masculinas ou femininas. Com o disco solar, o uraeus guarda os portais do Hades. Ele é o
companheiro dos abençoados no Paraíso e guarda-os da aproximação do mal”. Segundo uma velha lenda,
também os antigos Buddhas têm como guardiã uma Cobra-Capella. Na verdade, a ciência arcana ensina
que o Uraeus é um símbolo da iniciação e da sabedoria oculta.

Na astrologia grega, o terceiro decanato do Capricórnio é chamado Delphinus (Golfinho). Na astrologia


persa, este decanato é tanto representado pela figura de um peixe, ou animal marinho, como de uma
corrente de água. Nos sistemas orientais, incluindo o egípcio, o signo por inteiro é sempre simbolizado
por um ser híbrido, metade cabra, metade animal marinho. Por vezes, ainda, essa natureza híbrida inclui
uma metade serpente; com efeito, na Grécia, numa medalha pitagórico-órfica de Thurium, não é nem o
cavalo, nem os grifos que ornam o capacete de Atena, mas um híbrido fantástico com cauda de serpente.

O crocodilo, como já foi dito, é uma forma de figurar o ser anfíbio, com assento e domínio nos dois
mundos. No antigo Egipto detinha um carácter iniciático. No Livro dos Mortos, no capítulo XXXI, que
versa sobre o emprego das palavras de poder (as hékau, dadas por Ísis) para chegar até Osíris, na grande
passagem nos caminhos para o “Mais Além”, a alma, enfrentando um dos guardiões, o Grande Crocodilo
Sui, dirá: “… Eu vivo pela vontade das palavras de poder que levo comigo…”. Lembremos que, segundo
o mito, fora precisamente o ínsito poder de Ísis que lhe franqueara os caminhos pelas águas do Grande
Mar ao percorrer os sete cantos do mundo em busca dos pedaços do corpo morto de Osíris, para de novo
lhe insuflar o sopro de vida. Cruzando-se com inúmeros crocodilos, nenhum ousou impedi-la.

Paralelamente, também em antigos templos hindus, nomeadamente em alguns dedicados a Shiva, o


símbolo de Makara, o crocodilo, figurava sobre os Portais (Toranas), abençoando as arquitraves dos
acessos ao Adytum (o Santum Sanctorum). Nessas representações Makara corporifica, na sua metade
inferior, uma espiral, símbolo da incursão e interiorização aos mundos ocultos. Makara assume, aqui, o
papel do Pontífice (ou do Avatara), aquele que torna apreensível e representável o Insondável e
Desconhecido aos olhos do aspirante no Caminho. É tanto o Guardião quanto, também, a própria Ponte
entre o mundo dos homens e o mundo dos deuses. E é com esta última conotação que, ainda hoje, essa
sua insígnia – a espiral – se perpetua, como herança, encimada no báculo dos bispos da Igreja Romana.

Entretanto, e fazendo, de novo, contraponto com a simbologia dos egípcios, o véu levanta-se um pouco
mais quando entrevemos o fio das muitas correlações que permaneciam obscurecidas relativamente a
este enigmático signo: Assim, temos que Seb ou Sib é o Saturno egípcio, pai do tempo (17) e de todos os
deuses, incluindo Osíris e Ísis. Sua esposa é Nout ou Neith, a “Grande Mãe” (a Matéria Primordial e
Espaço Infinito) e, contudo, “Virgem Imaculada”. Nout é a precursora de Ísis, e seu protótipo.

17) Sebti significa sete ou o sétimo [planeta].

Muito curiosamente, a divindade egípcia Sebek ou Sevekh (18) é representada com cabeça de crocodilo.
E Sevekh é também o deus do tempo (Cronos). Tal como na alegoria grega-latina, em que Cronos
engolia, inteiros, os próprios filhos, assim o faz o crocodilo, ao engolir, inteiras, as suas crias (esta era
uma realidade que os egípcios frequentemente presenciavam). Sevekh é uma divindade solar pois exibe
como emblemas o disco solar e chifres de carneiro.

18) O crocodilo é o dragão egípcio. Era o grande réptil de Tifon e o seu santuário era em Crocodilopolis,
onde era consagrado a Set e Sebek, que se dizia serem os seus criadores. Segundo as palavras do
historiador Christian Bunsen, nesse tempo “Tifon era um dos mais venerados e poderosos deuses, que
distribuía bênçãos e vida aos governantes do Egipto…”.

Makara (o crocodilo), que contém velado, sob o seu nome, o anagrama Karma, está sob dominação de
Yama, um dos 4 Mahârâjahs ou Regentes dos 4 Pontos Cardeais (19). Com efeito, cada qual possuindo
uma propriedade oculta, os quatro governam as Forças cósmicas de tais pontos e representam a
funcionalidade da Lei do Karma e sua administração sobre a Terra. Yama é o Senhor do Sul e (dos
quatro) o seu máximo ponto focal. E Yama é também a personificação da Terceira Raça (a primeira que
foi dotada de consciência, Sanjnã/Manas), na qual se operou a grande união entre Espírito e Matéria. É,
nesta acepção, Yama-Yamî, bipolar (o símbolo do Manas dual).

19) Também chamados os “Quatro Dragões Ocultos de Sabedoria” ou, ainda, os “Nâgas Celestes”.

Saturno (o Regente do signo astrológico Capricórnio-Makara) é idêntico a Kâla (o tempo, como


regulador e destruidor do mundo, e um dos sobrenomes de Yama) e é também idêntico ao Agruero
fenício (protótipo do Jeová israelita) (20). Por outro lado, os Agra-sandhâni são os “assessores” de Yama
e os “registradores do karma” (idênticos aos Lipika), aqueles que ajustam o fiel da balança entre as forças
positivas e as forças negativas cósmicas, celestes e humanas. Daí o símbolo dual de Makara ou de
Capricornus, que reúnem numa única figura a integração das duas potências. (21)

20) Saturno era associado a Ildabaoth (segundo Orígenes, Ildabaoth é o Génio do planeta Saturno), e o
Codex Nazaraeus (o Evangelho dos nazarenos e ebionitas) identifica Ildabaoth a Jehovah. Equivalia
ainda ao Zurvan Daregho-Chvadhata iraniano.
21) Isto mesmo é inferido pelos Gnósticos Peratae, quando chamam Leviathan ao Makara
(Philosophumena, Livro V). O Leviathan é, no esoterismo bíblico, a Divindade na sua dupla
manifestação de bem e de mal.
Em certo trecho do Vishnu Purâna é dito que “a forma mais poderosa do Universo é a do Shishumara
(22), metade animal, metade humano. Na metade inferior ele tem a forma de um crocodilo e simboliza o
tempo como ‘o devorador’. No extremo da sua cauda está presa Dhruva, a estrela polar (22). A metade
superior é de homem, com quatro mãos [tal como Vishnu]…”. E o significado do termo shishumara era,
precisamente, o “devorador de crias”!

22) Shishumara era o nome que na antiga Índia se dava à constelação do Dragão. A estrela Thuban
(Dhruva, em sânscrito) foi a estrela polar cerca de 2700 anos a.C..

A cabra e o leite
Muitos são os símbolos que revestem a figura simples da cabra. Na Índia, o vocábulo que a designa, aja,
ajina, significa igualmente não-nascido, pelo que a cabra é um símbolo da substância primordial não
manifestada Mûlaprakriti (Pradhâna, ou também Akasha). Aja é um dos sobrenomes do ingénito deus
Kâma, epíteto, aliás, comum a muitos dos deuses primordiais, como Brahmâ, Shiva, Vishnu, mas
principalmente ao primeiro Logos. É a irradiação do Absoluto no Plano da Manifestação.

Significativamente, na bandeira de Kâma, deus do amor (23) (na sua verdadeira acepção esotérica e
espiritualizada), figura um símbolo denominado Jalarûpa, um dos nomes de Makara. Literalmente,
Jalarûpa significa “de forma ou corpo aquoso”, isto é, nascido das Águas do Caos primordial, e, no
homem, tem relação com o nosso Ego imortal. O divino Kâma é a ponte entre o Manas e o puro Âtmâ-
Buddhi.

23) Equivalente ao Eros grego, antes de ser decaído e antropomorfizado pelo homem, nas concepções
exotéricas e dogmáticas, na figura de Cupido.

A cabra Amalteia, que nutre o soberano do Olimpo com o seu leite, é, assim, Mûlaprakriti. O seu leite é o
Akasha, ambrósia dos deuses. É o Leite da Virgem citado pelos alquimistas. Amalteia é a Mãe Divina – a
Grande Virgem Mãe, de cujo Regaço promanam todos os seres, cujo Regaço abriga todos os seres.

Por outro lado, a Via Láctea é um tema recorrente nos mitos pitagóricos relativos à vida trans-terrena.
Numa das estelas funerárias pitagórico-órficas de Thurium (24), pode ler-se a seguinte inscrição –
palavra de passe e resposta:

Cabrito, caí no leite!


Cabrito, caíste no leite!

O Cabrito, aqui, representa a alma do místico, que transpõe os portais da morte para a Vida plena, e, por
analogia, o neófito que passa pelas provas iniciáticas e, ante a Grande Deusa, se abre para o novo-
nascimento.

24) Segundo se crê, nestes túmulos de Thurium foram sepultados, durante o séc. IV, os últimos
pitagóricos de Síbaris.

Na mitologia germânica, a cabra Heidrun alimenta-se das folhas do freixo Yggdrasil (25) e o seu leite
alimenta os guerreiros do soberano Odin.

No Râmâiana, o amrita ou elixir da vida, alimento dos deuses, surge do batimento do Kchîra-samudra, o
Oceano de Leite. Como já vimos, o leite é universalmente o símbolo da abundância, da fertilidade, como
também da iniciação e da imortalidade. Precisamente, Héracles suga o leite da imortalidade no seio de
Hera.

Num antigo templo egípcio, no culto a Osíris derramava-se leite em cada uma das 365 mesas
propiciatórias que rodeavam o seu túmulo, uma por cada um dos dias do ano, e tais aspersões visavam
ajudar o deus a ressuscitar todas as manhãs.
Em numerosas tradições e mitologias, a cabra está associada ao raio e ao relâmpago. É assim com os
chineses, com os tibetanos, com os gregos, com os judeus, com os escandinavos. Diz a lenda que,
durante as tempestades, Thor, o deus germânico do trovão, cruzava os céus no seu carro puxado por dois
bodes Tanngrisni e Tanngnost, e produzia relâmpagos com o seu martelo mágico. “Jeová ter-se-ia
manifestado a Moisés no monte Sinai em meio a raios e trovões. Como recordação dessa hierofania, a
cobertura do tabernáculo era confeccionada com fios entrelaçados de pêlos de cabra. Romanos e sírios,
quando invocavam os seus deuses, para testemunhar a sua união com o divino, usavam, por vezes, uma
indumentária denominada cilicium, cilício em português, confeccionada de pêlos de cabra. Para os
cristãos, o uso do cilício tem, no fundo, o mesmo sentido: a mortificação da carne pela penitência, e a
libertação da alma que se entrega inteiramente a Deus. O bode designa muitas vezes Dionísio em transe
místico, símbolo de um recém-nascido para uma vida divina. Em todas as tradições, a cabra aparece
como símbolo da nutriz e da ‘iniciadora’, tanto no sentido físico quanto místico dos termos” (26). A
cabra e, principalmente, os cabritos de leite são também, como vimos, símbolos do neófito, que passa
pelas mais duras provas para alcançar a iniciação. Com efeito, os capríneos percorrem os mais áridos,
austeros e íngremes caminhos, em busca do seu sustento; os penhascos são o seu habitat. Parsifal,
candidato à iniciação, é representado ladeado por dois machos cápreos, usando o capuz (ou capela) em
bico, dos Cabires.

25) A Árvore do Universo, do Tempo e da Vida, equivalente à Ashvatta hindu, à Zampu tibetana, à
Sung-Mîn-Shû chinesa, à Ficus religiosa ou Árvore Bo budista… A Yggdrasil secará e desaparecerá
somente no dia em que for travada a última batalha entre o bem e o mal.
26) Dicionário Mítico-Etimológico, de Junito Brandão

A égide, poderosa arma de Zeus, fora, segundo algumas versões do mito, forjada por Hefesto e revestida
com a pele da cabra Amalteia, que amamentara Zeus com o seu leite. O deus do raio e do trovão
presenteou-a a Apolo, e depois a Atena. A égide é pródiga de símbolos celestes e, na interpretação de
Homero, ela figura a própria tempestade que, como fogo e luz, parte do escudo divino.

Nas mais antigas medalhas romanas, e segundo a tradição, que remonta aos Etruscos, Juno Sospita (27) é
representada vestida com pele de cabra e com todas as insígnias semelhantes às de Minerva-Atena.
Igualmente, os escultores romanos deixaram preciosos bronzes e mármores onde a cabra representa um
papel de importância. Nas pinturas de Pompeia, figuram, amiúde, a cabra e o tirso como emblema de
Baco, e, nos vasos gregos, o bode é frequentemente representado acompanhando Baco.

27) Juno “a Salvadora”, protectora de todos os novos começos, incluindo os nascimentos.

Segundo a tradição, a palavra Sufi provém de suf, termo com o qual se significava igualmente o feltro de
pêlo de cabra com que se faziam as vestes ritualísticas dos dervixes de algumas confrarias místicas
muçulmanas.

Por outro lado, o termo latino capela (que significa cabra pequena) designava originalmente o conjunto
das vestes litúrgicas e, por extensão, o lugar onde se conservavam. Só depois passou a englobar o sentido
de “lugar abrigado de culto, provido de altar”.

No passado, no grau de aprendiz maçon e no de companheiro maçon do Rito Escocês Antigo, como um
dos paramentos obrigatórios para participar nos trabalhos da Loja, estava o avental feito de pele de cabra,
tingido de branco.

Num importante cerimonial em honra de Dionísio, denominado Ditirambo, festejava-se a chegada da


Primavera, como símbolo de fecundidade. Em torno do seu altar, doze músicos-poetas cantavam e
dançavam, representando uma elaborada dramatização cosmológica, todos envergando vestes feitas com
pele de cabra. No final, uma cabra era oferecida em sacrifício.

Com efeito, na generalidade dos cultos do mundo antigo, eram comuns os sacrifícios de bodes ou cabras
(como também de carneiros). Os homens, mesmo os mais rudes (muitos deles pelo seu enfoque
demasiado astralizado), conheciam a natureza fortemente efusiva da energia vital derramada das rezes
sacrificadas (28). E sabiam (e sentiam) que as potências ctónicas, a que chamavam deuses, as absorviam
avidamente.

28) Os glóbulos vermelhos da cabra atingem valores na ordem dos 17.300.000, por mm3. O mamífero
que lhe fica mais perto é o carneiro, com 10.3000.000. O gato tem em média 8.100.000. O cavalo, a vaca
e o cão andam pelos 7.000.000 (para se ter uma referência comparativa, o homem possui entre 4.500.000
e 5.700.000, e a mulher, entre 4.200.000 e 5.200.000). Na vida animal, quanto mais astralizado, mais
entranhado na matéria, e mais concentração de essência vital.

Por último, não poderíamos deixar de considerar o mito de Pã. Não é seguramente por acaso que esta
divindade é representada como um macho cápreo, ou melhor, Pã é em parte zoomorfo e em parte
humano. A sua imagem é a de um ser peludo, com cascos e chifres de bode. Ele é a personificação da
Natureza em toda a sua prodigalidade, e traz à manifestação todos os dons e potencialidades da mesma
Natureza, por meio dos sons que produz na sua mágica flauta de sete tubos. Nela – simbolizando o
Universo com as suas 7 Esferas ou Planos – se tange o Som Criador que acorda e desprende os
arquétipos jacentes na Alma do Mundo, revestindo-os de Forma e dando, assim, origem à pluralidade dos
mundos, e ao desdobramento de todos os fenómenos. Pã é a energia genésica do Cosmos, inclusive nos
seus aspectos sensitivos (os sentidos, o universo das sensações – na Natureza e no homem (29) – estão
nele exuberantemente representados).

Relativamente a este mito, de novo se lê impressa, na Psique Universal, a figuração do símbolo do


Cápreo como equivalente do Akasha, a potência oculta da Natureza e a raiz da Materialidade.
Verdadeiramente, em todas as culturas, os símbolos não são aleatórios; são, sim, expressões definidas e
viventes na Alma do Mundo.

29) O equivalente aos tanmâtras, da filosofia Sânkhya.

Chaves para a Interpretação dos Mitos Helénicos

Hefesto
Hefesto(-Vulcano) é um deus ctónico, subterrâneo, que trabalha as grandes forças da materialidade bruta.
O seu fogo não é o Fogo superior, espiritual, e, sim, o telúrico, das paixões.

Hefesto simboliza ou encarna também a sua obra – a humanidade prisioneira nas peias das paixões e da
animalidade: primeiramente ele une-se e apaixona-se loucamente por Afrodite, o símbolo do Kâma no
seu aspecto inferior, dos desejos passionais que grudam e entranham o ser-humano à sua condição
animal. Só depois (noutra etapa da sua evolução), ele se vira para Atena, o símbolo de Manas (a Mente
Superior), saída directamente da cabeça de Zeus. Contudo, não a consegue possuir, muito embora ela lhe
dê atenção e o apadrinhe. É este o sinal da sua primeira aproximação à possibilidade de transpor o limiar
da sua condição sombria e telúrica.

Hefesto trabalha os metais, muito especialmente o ferro: na verdade, é precisamente o ferro o veículo do
Ser (da sua essência vital; em que a alma está polarizada), que assegura a incarnação e nos mantém
prisioneiros no nosso veículo de carne. Desse modo, é ele, também, quem forja as correntes que
prenderam Prometeu à rocha do Cáucaso. Mas Hefesto também opera nos filões auríferos (simbolizando
a alma, polarizada no sangue das nossas veias) e vai fazendo belas obras.

É representado coxo e vesgo. Essa é uma figuração da sua condição desequilibrada – o ser, não completo,
o homem-animal que não realizou ainda a ligação com a sua contraparte superior, espiritual. E o ser cuja
visão é ainda velada, condicionada, desfigurada.

O Hefesto grego encontra correspondência com o Tvachtri hindu (30), o construtor do carro de Shiva e
aquele que forjava as armas dos demais deuses, incluindo o temível raio de Indra. Era o arquitecto das
mansões celestiais. Tvachtri era também conhecido pelo nome de Vizvakarman (31) (o carpinteiro
celeste védico), no qual a teologia cristã parece ter-se inspirado para a figura do pai “adoptivo” (José) do
seu Cristo – Jesus (32). E de novo vemos recair neste signo do Capricórnio o alegórico berço de
nascimento dos deuses solares, Salvadores do Mundo.

30) Corresponde, ainda, ao Vil-kan babilónico, um dos filhos de Anu, bem como ao Thubal-Cain hebreu,
por sua vez assimilável aos Cabires, dos Mistérios da Samotrácia, e uma figuração utilizada no grau de
Mestre maçon, no ritual e cerimónias dos franco-maçons. (Sustenta-se, a este propósito, que o
designativo copta Phree Messen, que significava “Filhos da Luz”, inspirou a adaptação Free Mason e
Franc Maçon, com o significado de “pedreiro livre”). Os Cabires foram os epónimos da cidade de
Hebron – ou Kirjath-Arba –, literalmente a cidade dos “Quatro Senhores [os Cabires]”. Nesta cidade,
segundo a lenda, um Isarim ou iniciado teria encontrado a “Tábua de Esmeralda” no corpo morto de
Hermes.
31) O 3º dos sete Raios Solares. Equivale ao Espírito Santo na concepção teológica cristã.
32) Tvachtri, como artífice dos deuses e forjador das suas armas é denominado Kâru, “artífice”; como
carpinteiro é chamado Takchaka. Segundo A Doutrina Secreta, Tvachtri ou Tvast é o grande patrono dos
Iniciados…

Vizvakarman é um dos aspectos de Agni, o Deus do Fogo. O “Fogo Sagrado”, Agni, tem Tvachtri (o
carpinteiro) por pai, e Maya (Maria) por mãe. Também o nascimento de Agni foi astronomicamente
predito pelo surgimento de uma estrela nos Céus, a Savanagraha, como se diz do nascimento de Cristo, o
Cordeiro (agnes) de Deus…

Voltando a Hefesto, é ele, numa das suas caracterizações, o “deus que ata e desata”. De facto, no seu
aspecto deífico de construtor, é quem, nos seres, logra a união das almas com os veículos inferiores (do
Quaternário). É também ele que desata esses nós, quando as almas desencarnam e se recolhem ao seu
próprio Plano. (33)

33) É no mínimo sugestivo assinalar aqui a alegoria dos Platónicos de que “as almas, quando deixavam a
corporidade, ascendiam aos Céus através das estrelas do Capricórnio, a que chamavam a ‘Porta dos
Deuses’”.

Nesta sua função genésica ele é idêntico ao agregado dos Elohim da teologia hebraico-cristã (ou Alhim,
na Babilónia), e aos Pitris-Barhishad da antropogénese do sistema hindu, ou à Plêiade dos Fetahil, dos
gnósticos (34).

34) Segundo a Ciência Arcana, a Natureza físico-química do homem é conformada a partir dos Chhâyâs
(ou sombras, à falta de melhor terminologia descritiva) exsudados dos nossos Ancestrais Lunares, os
Elhoim ou Pitris-Barhishad. Essa proto-matéria genésica foi-se coagulando (à semelhança do que ocorre
no interior albuminóide de um ovo) e dela foram formados os modelos ou tipos do homem-físico.

Já muitas vezes foi referido nas páginas desta publicação, em múltiplos artigos, que os Elohim bíblicos
são a colectividade de deuses (potências) que se encarregaram da construção da humanidade-animal, bem
como de tudo o que se desenrola sobre o Plano da sua jurisdição – o Quaternário, isto é, os chamados
Planos Rûpa (com forma) e os mais inferiores do Grande Septenário.

Noutras religiões do passado, por outros nomes foram esses construtores referenciados. No Egipto,
Hefesto teve equivalência com Tifon (35), o aspecto inferior de Osíris (ou, numa época ainda anterior, de
Phtah). O homem-integral é composto de Tríade Superior e Quaternário Inferior. Assim, temos a
duplicidade dos deuses (ou os símbolos que eles representam): Osíris-Tifon; Pitris Agnishvatta-Pitris
Barhishad; Vishnu-Shiva; Zeus-Hefesto; Júpiter-Vulcano; Ormuzd (ou Ahura Mazda)-Ahriman, etc.
Também aqui se pode aplicar o axioma cabalístico Daemon est Deus inversus (o Demónio é Deus
invertido). De todos estes duplos, os respectivos aspectos inferiores mais não são do que “espelhos” da
Augusta Sabedoria, sem cuja existência ela seria pura abstracção.
35) “Séculos antes do êxodo de Moisés, o macho da cabra [o baphomet] era consagrado a Tifon, e sobre
a sua cabeça os egípcios confessavam os seus pecados, sendo o bode depois enviado ao deserto. ‘E Aarão
tomará o bode emissário… e colocará suas mãos sobre a cabeça desse macho vivo e confessará sobre ela
todas as iniquidades dos filhos de Israel… e o enviará ao deserto’ (Levit. XVI)” . In Glossário Teosófico,
de Helena P. Blavatsky.

Atena-Minerva
Atenas é o símbolo da eloquência e da sabedoria serena própria de Buddhi-Manas (36). Entre as suas
insígnias está a famosa égide, o escudo da invulnerabilidade, forjado por Hefesto, revestido com a pele
da Cabra Amalteia, e tendo, na sua superfície, fixada a imagem da cabeça da Górgona Medusa. Ele
tornou-se invulnerável porque foi temperado nas forjas da incessante luta humana, na longa peregrinação
pelos cenários da vida terrena.

36) Representa o Nous (a Alma racional, o Ego Espiritual), na filosofia grega.

O escudo é um produto e uma arma da Psique, neste caso da Panpsiquis ou Psique Universal – de novo
temos a remissão para o Akasha ou a Alma do Mundo, reforçado pelo facto de o mesmo ser recoberto
pela pele da Cabra Amalteia. O Akasha é, aqui, como um espelho onde se reflectem, nuas, as iniquidades
humanas. Deste modo os guerreiros inimigos, inflamados de ódio – prontos para derramar sangue e
infligir dor – são vítimas da sua própria imagem reflectida, simbolizada pela terrífica Górgona.

Atena porta numa das suas mãos a Níke, a representação da Vitória – o que significa a vitória sobre os
vícios e as tentações, o culminar da luta bem sucedida na aventura evolutiva humano-terrena. Aparte o
episódio com Hefesto, não se retratam quaisquer outros envolvimentos românticos ou sexuais seus com
outros deuses ou mortais (37). Amada por todos, é antes um modelo inspirador das virtudes superiores e
mais nobres, ao alcance da condição humana. Inspirou e protegeu heróis como Jasão, Orestes, Teseu,
Héracles, Aquiles, Perseu e Ulisses.
————————-
37) Exceptua-se uma muito remota tradição isolada que representa Atena como a “Eterna Virgem”
esposa de Alalkomeneus, o herói epónimo de uma cidade da Beócia, onde outrora se erguera um templo
à deusa. Numa ode de Píndaro, Alalkomeneus é apresentado como um símbolo do primeiro homem
[provido de mente]. A alegoria é óbvia.

Durante as Khalkeia, festas dos metalúrgicos no Ceramico de Atenas, em tributo a Hefesto e Prometeu,
Atena era igualmente homenageada como a protectora dos artesãos. Fora ela quem domou o cavalo (a
criação de Posídon) e idealizou a quadriga, a que o atrelou. Também concebera a nau Argo, em que os
Argonautas, liderados por Jasão, viajaram em demanda do “Velo de Ouro”. Segundo Plutarco, “a nau a
que os gregos chamaram Argo é uma imagem da barca de Osíris, constelada em sua honra, e navega sob
as constelações de Orion e do Cão Maior [de que Sothis ou Sirius era a principal luminar]. A primeira
constelação, de Orion, era considerada pelos egípcios como a barca sagrada de Hórus [H-or-os, Or-ion],
e a segunda, como a de Ísis”. Significativamente, Sothis, o veículo (a arga) de Ísis (e a palavra egípcia
para Sirius), é idêntica a Sophia (38), a taça do Conhecimento ou Sabedoria (o Kykeon, dos Mistérios
gregos, fluido da Sabedoria, alimento da Gnose, licor da Iniciação).

38) A Sophia Achamôth, personificação da Luz do Conhecimento do Akasha.

Atena impulsionou a civilização e inspirou os Atenienses (simbolizando os primeiros homens dotados de


mente) para a invenção e o aperfeiçoamento de todas as artes e ciências. Inspirou Talo na sua criação da
roda de oleiro e na sua invenção do esquadro, instrumento fundamental de pedreiros e carpinteiros. E, no
mito de Erictânio, vimos que, a este, a deusa o instruiu no “comando da quadriga” e, no final dos seus
dias na Terra, o elevou aos Céus e lhe deu uma morada perene na brilhante constelação Auriga (o
Cocheiro). O auriga era, então, o “condutor dos carros”, e simboliza o autodomínio e controlo das
paixões, e o poder ou domínio de uma Vontade enfocada. Em face dos movimentos tumultuosos e
desordenados dos cavalos, que simbolizam, em nós, as nossas paixões e instintos, o auriga é o Eu-
superior (a Alma, aqui alegorizada por Atena) que domina, controla, vigia e coordena os instrumentos do
Quaternário inferior (os 4 cavalos), canalizando-os ao serviço do homem espiritual.

É patente a semelhança com o mito de Krishna e o seu discípulo Arjuna. Também Krishna foi o
condutor-guia do carro de guerra, puxado por 4 cavalos, de Arjuna (no campo da batalha espiritual, de
Kurukshetra (39), que toda a “personalidade” tem de enfrentar, desbravando caminhos e fazendo
escolhas, entre o Bem e o Mal). Igualmente aqui os cavalos representam o conjunto das forças cósmicas
e psíquicas que têm de ser conduzidas; o condutor é o espírito que as dirige.

39) Segundo se descreve no Bhagavad-Gîta, a luta entre os Pândavas (simbolizando o Eu-superior ou


espiritual) e os Kurus (simbolizando o Eu-inferior ou “Personalidade”), no campo de batalha de
Kurukshetra (o Palco da Vida, com todas as suas miríades de cenários, i.e., as vidas sucessivas).

Também Ovídio, nas suas Metamorfoses, nos deixa um testemunho romanceado e poético do papel
conjunto de Atena e Prometeu na evolução da humanidade: “Depois do Dilúvio [de Deucalião e Pirra],
Zeus incumbiu Prometeu e Atena de produzirem uma nova raça de homens do lodo deixado pelas
águas”, e, segundo podemos ler na Doutrina Secreta, de HPB, “nos tempos de Pausânias ainda se
mostrava, na Fócida, o limo que o herói utilizara. Em vários monumentos antigos ainda pode ver-se
Prometeu modelando o corpo do homem, ora sozinho, ora com a ajuda de Atena”.

Atena instituiu o primeiro Tribunal, o Areópago, cujos julgamentos eram levados a cabo por um corpo de
doze júris. Com isto, ela projectou o modelo de uma Ordem superior na emergente e incipiente
organização humana (a Divindade solar tem sob si doze deuses menores, os doze signos do Zodíaco).

O ideal personificado por Atena é a meta dos pioneiros da humanidade, é o horizonte em que se
focalizam os mais esforçados e subtilizados dos seus membros. Ela apadrinhou Erictânio, paradigma do
homem comum, mediano, que revela bondade e vontade de ser útil, e esboça os primeiros sinais de
amadurecimento e sublimação.

Ela inspira, anima, abençoa (dá a mão) àquele que se dispõe a cruzar o acutilante caminho do “gume da
navalha” – a ponte “Antahkarana” – para chegar, depois de longo e merecido esforço, à outra margem, à
Terra dos imortais.

Isabel Nunes Governo


Vice-Presidente do Centro Lusitano de Unificação Cultural

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