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Ricardo Terra, Luiz Repa

TEORIA CRÍTICA

DOSSIÊ
INTRODUÇÃO

Ricardo Terra*
Luiz Repa**

Não é exagero dizer que a pesquisa sobre nuidade dessa tradição nos tempos atuais.
a tradição de pensamento conhecida pelo nome Perdia-se de vista igualmente o que susten-
de “Teoria Crítica” passa por um momento de tava a verdadeira unidade dessa tradição no inte-
forte renovação no cenário acadêmico brasileiro rior de sua evidente multiplicidade teórica e dis-
e internacional. Entre os fatores principais que ciplinar: a constante busca de atualizar o diag-
propiciaram essa renovação, do qual o presente nóstico de época segundo as exigências de apre-
dossiê pretende ser um exemplo, consta certa- ender os potenciais emancipatórios inscritos na
mente o fato de ter ocorrido uma desmistificação realidade das sociedades capitalistas contempo-

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do termo “Escola de Frankfurt”. Tal termo, cuja râneas e, simultaneamente, identificar os obstá-
origem tardia e utilização político-acadêmica fo- culos ao desenvolvimento desses potenciais. Es-
ram analisadas por uma série de investigações sas exigências foram postas por Horkheimer, em
históricas desde os meados dos anos setenta, aca- seu texto “Teoria Tradicional e Teoria Crítica”,
bou se tornando um obstáculo para a compre- como os dois princípios que as distinguem. Como
ensão da complexidade e da fecundidade da Te- mostra o artigo de Rúrion Melo, apoiando-se nos
oria Crítica. De maneira indevida, ele conferia estudos recentes de Marcos Nobre, esses princí-
uma homogeneidade doutrinária (a ideia de “es- pios são articulados por Horkheimer ao se referir
cola”) a autores tão distintos, ao mesmo tempo à obra de Marx como matriz da Teoria Crítica, e,
em que restringia seu alcance a uns poucos pen- ao mesmo tempo, orientar-se para um diagnósti-
sadores, fazendo perder de vista tanto o ambi- co do capitalismo moderno bastante distinto do
ente interdisciplinar diversificado como a conti- de Marx. O conceito de Teoria Crítica só surge,
*
Doutor em Filosofia. Professor titular da Universidade de
portanto, no momento em que componentes teó-
São Paulo. ricos centrais do marxismo pareciam invalidados.
Av. Luciano Gualberto 325. São Paulo – SP. ricardor@usp.br
**
Doutor em Filosofia. Professor do Departamento de Filoso- Dadas essas exigências da Teoria Crítica,
fia da Universidade Federal do Paraná. luizrepa@uol.com.br entende-se a diversidade dos diagnósticos seja

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em relação aos potenciais e aos obstáculos para tir da questão sobre o significado da ideia de “eman-
a emancipação, seja para a própria concepção de cipação”. Também aqui, sobretudo aqui, apresen-
emancipação, sem que, com isso, a própria uni- ta-se o momento em que a conceitualização dessa
dade dessa tradição se enfraqueça. Ao contrário, forma de teoria por parte de Horkheimer passa
sua atualização constante, que frequentemente por um distanciamento em relação a Marx. Pois
se realiza por meio de críticas severas entre os em Marx e no marxismo em geral, a emancipa-
seus representantes, é a condição mesma da sua ção significou, na maioria das vezes, a configu-
unidade e da sua continuidade. O presente dossiê ração de uma sociedade do trabalho, que toma-
ilustra esse ânimo próprio da Teoria Crítica de va como central a crítica ao “trabalho abstrato”,
uma dupla forma: primeiro, por apresentar, em próprio da lógica de reprodução do capital. Já
seu conjunto, aquela diversidade de diagnósti- Horkheimer e, com ele, Adorno principiam uma
cos; segundo, pelo fato de os colaboradores bus- forte crítica ao potencial emancipatório da cate-
carem também renovar os potenciais teóricos dos goria de trabalho, cuja lógica é, então, aproxi-
autores analisados para os problemas da socie- mada à daquela da razão instrumental, concei-
dade contemporânea. to-chave com que ambos os pensadores buscam
Cabe mencionar ainda um terceiro aspecto entender a realidade das sociedades capitalistas
em que as colaborações se deixam animar pelas dos anos quarenta. Porém, segundo o autor, so-
exigências determinantes da Teoria Crítica. Seus mente a partir de Habermas se conseguiu abrir
autores participam diretamente ou são colabora- novos sentidos para o conceito de emancipação,
dores frequentes do Núcleo Direito e Democracia livrando-se do modelo produtivista. Com isso,
do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento também a oposição entre “reforma e revolução”
(NDD/CEBRAP), o qual, há uma década, tem rea- deixa de ser, em princípio, um dilema para o
lizado pesquisas teóricas e empíricas sobre as ten- pensamento de esquerda, uma vez que ambos
dências jurídicas, políticas e sociais contemporâ- os polos refletiam a mesma equação de identifi-
neas, em um ambiente interdisciplinar que reú- car “emancipação” e “sociedade do trabalho”.
ne pesquisadores de filosofia, direito, ciência Se o artigo de Rúrion Melo oferece uma
política e sociologia. Tendo como referência ini- ampla visão da Teoria Crítica a partir de uma
cial a obra de Habermas sobre direito e demo- questão nuclear como essa sobre os sentidos da
cracia, mas contando com uma grande emancipação, o texto de Luciano Gatti, que ana-
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heterogeneidade de perspectivas metodológicas lisa os comentários de Walter Benjamin sobre


e teóricas, o NDD se tornou um centro de for- Bertolt Brecht, apresenta, de maneira quase mi-
mação, pesquisa e reflexão voltado para a teoria croscópica, como o interesse pela emancipação
social em seu sentido amplo. Naturalmente, os social se aloja na reflexão “estética” daquele pen-
diversos modelos de Teoria Crítica desenvolvi- sador. Contrariando uma forte tendência da lite-
dos desde a época de Horkheimer se tornaram ratura de comentário, a de ver, em Benjamin, o
objeto de investigação e discussão nesse núcleo. filósofo da perda da experiência e, com isso, nos-
Com isso, acreditamos que o dossiê aqui apre- tálgico das tradições pré-modernas, Luciano Gatti
sentado permite, no interior de seus limites, ofe- intenta descobrir, nas suas críticas literárias, no
recer uma contribuição importante e qualifica- caso especialmente de um artista revolucionário
da para a compreensão da Teoria Crítica, princi- como Brecht, as condições atuais da experiência
palmente no que se refere à sua complexidade e urbana, explorando seus potenciais de negação
fecundidade. da realidade capitalista.
O artigo de Rúrion Melo, que abre o dossiê, Por sua vez, a contribuição de Luiz Repa
toma por objeto os princípios da Teoria Crítica, foca um problema de natureza mais histórico-
propondo uma reconstrução de sua história a par- filosófica e metodológica, tematizando o uso dos

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conceitos de negação determinada e de totalida- o déficit democrático de Marcuse. Também nes-


de em Theodor W. Adorno, segundo sua pro- se caso, tal déficit deve ser atribuído à dívida
posta de fornecer um modelo eminentemente teórica para com Marx.
negativo de dialética. Reconstituindo a crítica de Já na contribuição de Felipe Gonçalves Sil-
Adorno ao elo indissociável entre totalidade e va, a questão sobre os potenciais emancipatórios
negatividade na dialética hegeliana, o autor pre- e seus bloqueios se configura como fio condutor
tende mostrar, contudo, que também Adorno para uma reconstrução da teoria habermasiana
recorre a um conceito de totalidade social, com do direito e da democracia. A partir do conceito
uma função explicativa e crítica. Esse recurso se habermasiano de emancipação, referido aos pres-
daria em um nível macrológico, enquanto, em supostos de uma discussão isenta de domina-
um nível micrológico, Adorno insiste na crítica ção, Felipe Gonçalves Silva decifra as estratégias
à categoria de totalidade. A combinação desses mais gerais do pensador para escapar tanto de
níveis poderia ser entendida, segundo a hipótese um realismo cético como de um normativismo
interpretativa de Luiz Repa, a partir dos concei- utópico a respeito daqueles potenciais. Ao mes-
tos de crítica imanente e de ilusão socialmente mo tempo, o autor procura mostrar que a pro-
necessária. Ao contrário de Hegel, Adorno pensa posta de Habermas padece de algumas limita-
a negação determinada como uma crítica imanente ções importantes, tais como a restrição a um con-
voltada contra a falsa identidade e, portanto, a ceito de direito excessivamente vinculado à ideia
falsa totalidade em que se encontram os indiví- de coerção, déficits sociológicos importantes acer-
duos socializados no capitalismo tardio. ca das patologias sociais contemporâneas e, por
A questão sobre o potencial emancipatório fim, a centralização igualmente excessiva do pro-
e seus bloqueios inscritos na realidade social re- cesso legislativo para a compreensão da política
aparece nas contribuições de John Abromeit e deliberativa. Contudo essas críticas devem ser,
de Felipe Gonçalves Silva, porém em contextos por fim, inseridas em uma correta compreensão
teóricos diversos. No artigo de John Abromeit, da teoria habermasiana do discurso, ou seja, como
ela se apresenta como pano de fundo da análise um projeto inacabado a ser explorado conforme
específica sobre a crítica marcuseana da o fluxo das demandas dos movimentos sociais.
tecnologia. Contrapondo-se à leitura de que Por fim, o artigo de Nathalie Bressiani exa-
Marcuse é influenciado por Heidegger nessa crí- mina o modelo crítico de Nancy Fraser no con-

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tica, o que suscita elogios ou reprovações, texto de sua discussão acirrada com Axel
Abromeit parte da tese de que Marcuse assimila Honneth a respeito da melhor compreensão das
abordagens fenomenológicas sem comprometer demandas de justiça existentes nas sociedades
o quadro teórico maior, dado pela compreensão modernas contemporâneas, ou seja, a discussão
marxiana da técnica como força produtiva. Des- acerca da redistribuição ou reconhecimento como
sa maneira, o autor procura analisar todas as prin- conceitos normativamente orientadores. O inte-
cipais etapas da crítica de Marcuse ao desenvol- resse da autora, no entanto, incide sobre os mo-
vimento tecnológico no capitalismo tardio, re- delos de teoria social que estão na base da dis-
cuperando, para cada uma delas, o contexto his- cussão entre Fraser e Honneth, os quais ela
tórico específico, a fim de mostrar que o filósofo elucida, reconstruindo as críticas que eles diri-
nunca deixou de sublinhar o potencial gem a Habermas, especialmente à Teoria da ação
emancipatório da técnica, mesmo nos momen- comunicativa. Segundo Nathalie Bressiani, ain-
tos em que ela se converte em meio privilegiado da que essas críticas apresentem muito seme-
de dominação social. Segundo Abromeit, a in- lhanças, sobretudo no que diz respeito à separa-
fluência de Heidegger é bastante localizada, e ção estanque entre as esferas da reprodução ma-
tampouco deve servir de premissa para explicar terial e da reprodução simbólica, isto é, entre

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sistema e mundo da vida, elas se dirigem a re- sível abordar outros teóricos importantes dessa tra-
sultados bastante distintos. Enquanto a teoria dição, como Franz Neumann, Friedrich Pollock, Otto
social de Honneth caminha para uma espécie de Kirchheimer, Iris Young, Seyla Benhabib, Klaus
monismo normativo, centrado no conceito de Günther, assim como variar os enfoques e os pro-
reconhecimento, Fraser pretende atenuar o blemas tratados em cada um dos autores aqui anali-
dualismo habermasiano, insistindo na sados. Porém, como dissemos de início, o dossiê
interligação entre sistema e mundo da vida como pretende refletir algo essencial para a ideia de Teo-
fonte de injustiça, mas também na especificidade ria Crítica: sua preocupação com o presente, com
dessas esferas para a produção de diversas ou- as potencialidades de uma sociedade emancipada e
tras formas de subordinação social. justa, com os obstáculos para a efetivação dessas
É preciso sublinhar, finalmente, que o pre- potencialidades, sem querem criar, para isso, uma
sente dossiê não pretende, de modo algum, esgo- escola.
tar nem mesmo fornecer uma visão de conjunto
a mais ampla possível da Teoria Crítica. Seria pos-
(Recebido para publicação em 30 de junho de 2011)
(Aceito em 15 de julho de 2011)
CADERNO CRH, Salvador, v. 24, n. 62, p. 245-248, Maio/Ago. 2011

Ricardo Terra - Doutor em Filosofia. Professor titular da Universidade de São Paulo. Coordenador o Núcleo
Direito e Democracia do CEBRAP, desenvolvendo pesquisa sobre filosofia política e teoria crítica. Co-organi-
zou “Direito e Democracia. Um guia de leitura de Habermas”. São Paulo: Malheiros Editores, 2008; “Recht
und Frieden in der Philosophie Kants”. Berlin: Walterde Gruyter, 2008. Publicou Kant & o direito. 1. ed. Rio
de Janeiro: Zahar, 2004.
Luiz Repa - Doutor em Filosofia. Professor do Departamento de Filosofia da Universidade Federal do Paraná.
Integra o Núcleo de Pesquisa Direito e Democracia do CEBRAP, desenvolvendo pesquisas na área de filosofia
política e teoria crítica. Suas mais recentes publicações são: Hegel, Habermas e a modernidade. Dois Pontos:
Curitiba, v. 7, p. 151-162, 2010; A transformação da filosofia em Jürgen Habermas: os papéis de reconstru-
ção, interpretação e crítica. São Paulo: Esfera Pública, 2008; Reconhecimento da diferença na teoria crítica.
In: Amarildo Luiz. (Org.). Cultura, diferença e educação. Porto Alegre: Sulina, 2010.

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