Beruflich Dokumente
Kultur Dokumente
Introdução
A estreita ligação entre Processo e Direito material obriga ao reexame dos
procedimentos de jurisdição voluntária, à luz no novo Código Civil.
Não se trata, aqui, de comparar o antes com o depois, mas de descrevê-los, tais como
se apresentam no Direito agora vigente, segundo a classificação que adotamos no livro
“Jurisdição Voluntária”, Rio de Janeiro, Aide, 1992.
Não se cogita, pois, na hipótese assim examinada em abstrato, de uma lide entre
herdeiros, sujeita a decisão judicial, daí o seu enquadramento no âmbito da jurisdição
voluntária. Trata-se, em última análise, de um ato solene, de constituição de um
curador ao nascituro.
Observa HUMBERTO THEODORO JÚNIOR que "o Código não determina a citação dos
interessados, expressamente, mas também não a dispensa. Assim, por força do art.
812, impõe-se aplicar, complementarmente, o rito dos arts. 802 e 803, devendo os
interessados serem citados para contestar o pedido em cinco dias. (Sérgio Sahione
Fadel entende, também, que 'deve haver ciência dos interessados'). Aliás, o parágrafo
2° do art. 877 faz presumir que os interessados integram a relação processual, pois
dispõe que 'será dispensado o exame se os herdeiros do falecido aceitarem a
declaração da requerente', o que, como é óbvio, deve se dar no prazo de contestação"
[5].
Também Ovídio Baptista da Silva exige a citação dos demais herdeiros: "Os
legitimados passivos hão de ser os demais herdeiros que concorram com o nascituro"
[6].
A sentença constitutiva proferida em processo de jurisdição contenciosa declara o
direito à mudança jurídica. "O objeto da sentença constitutiva", diz Chiovenda [7], "é a
vontade concreta de lei por força da qual se deve produzir a mudança, ou, em outros
termos, o 'direito à mudança jurídica.'" Porque há essa declaração é que a sentença
produz
coisa julgada material.
Pergunta-se: há declaração tal, na posse em nome do nascituro? A sentença, aí,
declara a gravidez da mãe e, portanto, a existência do nascituro. Pode-se ir além, e
dizer que a sentença declara o direito do nascituro de concorrer à herança de seu pai.
É certo, contudo, que tal sentença não produz coisa julgada. Evidenciada a falsidade
da gravidez, os atos
praticados pela mãe permanecerão válidos, por aplicação da teoria da aparência, mas
os herdeiros do pai não precisarão promover prévia ação rescisória, para pleitear em
juízo, contra a mãe, indenização, com fundamento na falsidade da gravidez por ela
afirmada e dos prejuízos que seus atos, praticados em nome de inexistente nascituro,
vieram a causar.
Por que não há coisa julgada? Porque, ao investir a mãe na posse dos direitos do
nascituro, o que o juiz declara é a "aparência" de haver um nascituro, o que, no Direito
brasileiro, bem se evidencia pela colocação da medida entre as cautelares: não há
periculum in mora vinculado a posterior sentença, definitiva, mas o juiz assegura
eventuais direitos do nascituro, com base no fumus boni juris.
Não há, pois,"declaração de direito", mas de aparência do direito, motivo por que
tampouco há produção de coisa julgada material.
Ovídio Baptista da Silva confirma: "Parece induvidosa a conclusão de que a declaração
a que se refere o art. 878 não tem qualquer semelhança com o efeito natural das
sentenças declaratórias, no sentido do art. 4° do CPC, de tal modo que o suposto
'reconhecimento dos direitos' do nascituro ficassem protegidos pela indiscutibilidade do
que fora judicialmente declarado. A demanda de que se trata, de resto, não põe em
causa nenhuma relação jurídica cujo reconhecimento se peça. As severas limitações
das defesas permitidas ao demandado, que tornam impossível a contestação da
paternidade, ou outras exceções similares, está a indicar que toda esta matéria não
poderá ficar imune ao exame judicial em processo subseqüente. Daí porque não nos
parece coerente a conclusão a que o mesmo Pontes de Miranda chega, de que a
sentença contenha elemento declarativo bastante para a produção de coisa julgada
material, 'entre partes'." [8].
Com razão afirma Humberto Theodoro Júnior que "é possível à mulher pedir, em outra
oportunidade, a repetição do exame, alegando deficiência do primeiro" [9].
Investida na posse dos direitos do nascituro, a mãe promoverá, se necessário, as
ações cautelares, possessórias, petitórias ou ainda outras que forem pertinentes.
O processo tem caráter cautelar, não no sentido próprio, de regulação provisória da
lide (litisregulação), mas no sentido de que assegura direitos incertos, isto é, direitos
de pessoa que poderá não vir a existir, decidindo, outrossim, o juiz, com base na
aparência (fumus boni juris) da gravidez. Ao invés de classificar aposse em nome do
nascituro como processo de jurisdição voluntária, o Código a inclui entre as medidas
cautelares, com o igual efeito de excluir a produção de coisa julgada, o que mostra que
a presença ou ausência desta não serve como critério para distinguir a jurisdição
contenciosa da
voluntária.
A sentença, embora declaratória da gravidez, é predominantemente constitutiva: imite
a mãe na posse dos direitos do nascituro. Não há condenação dos demais herdeiros.
Se estes negam a paternidade ou que determinados bens sejam da herança, há
necessidade de outro
processo. Nada, a respeito, se resolve no processo de posse em nome do nascituro.
Em síntese, temos que, no processo de posse em nome do nascituro, não há partes,
porque não se supõe a existência de conflito de interesses entre pessoas diversas;
mais claramente ainda, nele não há lide, nem substituição, nem produção de coisa
julgada material. A
sentença é constitutiva, podendo-se mesmo dizer que corresponde ao exercício de um
direito formativo da mãe: direito de, por declaração de vontade expressa na petição
inicial e em conjugação com a sentença, investir-se na posse dos direitos que assistam
ao nascituro.
A existência ou inexistência desse direito não é, porém, declarada com força de coisa
julgada, porque a declaração assenta na aparência de haver ou não gravidez, além da
incerteza quanto ao subseqüente nascimento com vida.
Trata-se de ação? Sim, porque há pedido de tutela jurisdicional formulado em face de
outrem, para asseguração de direitos do nascituro e, por outro lado, a sentença
proferida não tem natureza meramente homologatória. Tem forte conteúdo decisional:
provada a gravidez, imite a mãe na posse dos direitos do nascituro.
1.2. Testamentos
Os artigos 1.125 a 1.141 do Código de Processo Civil contêm disposições relativas à
tutela judicial dos testamentos. Resguardam-se, assim, os direitos de herdeiros
testamentários e de legatários, certos ou incertos. Não se trata, porém, de processos
tendentes a dirimir conflitos de interesses entre herdeiros. Não há o pressuposto da
lide em abstrato, que caracteriza os processos de jurisdição contenciosa.
Os testamentos dividem-se em ordinários e especiais.
São testamentos ordinários o público, o cerrado e o particular (Cód. Civil, art. 1.862).
O testamento público é escrito por tabelião, ou por seu substituto legal, em seu livro
de notas, de acordo com as declarações do testador, e lido em voz alta pelo tabelião,
ou pelo testador, na presença de duas testemunhas (Cód. Civil, art. 1.864).
O testamento cerrado é escrito ou assinado pelo testador, ou por outra pessoa, a seu
rogo; o testador entrega-o ao tabelião, em presença de duas testemunhas, declarando
ser aquele seu testamento e que quer que seja aprovado; o tabelião lavra o auto de
aprovação, que é lido, em seguida, ao testador e testemunhas, e assinado por todos
(Cód. Civil, art. 1.868).
O testamento particular é assinado pelo testador e lido na presença de pelo menos três
testemunhas, que o subscrevem (Cód. Civil, art. 1.876). Em circunstâncias
excepcionais, declaradas na cédula, o testamento particular, de próprio punho e
assinado pelo testador, pode dispensar testemunhas (Cód. Civil, art. 1.789).
São testamentos especiais o marítimo, o aeronáutico e o militar (Cód. Civil, art.
1.886), como tal considerado o nuncupativo (Cód. Civil, art. 1.896).
O testamento marítimo pode ser feito por quem estiver em viagem, a bordo de navio
nacional, perante o comandante, em presença de duas testemunhas, por forma que
corresponda ao testamento público ou ao cerrado (Cód. Civil, art. 1.888).
O testamento aeronáutico pode ser feito por quem estiver em viagem, a bordo de
aeronave, perante pessoa designada pelo comandante (Cód. Civil, art. 1.889).
O testamento marítimo, assim como o aeronáutico, caduca, se o testador não morre
na viagem, nem nos noventa dias subseqüentes ao seu desembarque (Cód. Civil, art.
1.891).
O testamento militar pode ser feito pelos militares e demais pessoas a serviço das
Forças Armadas em campanha, dentro do País ou fora dele, assim como em praça
sitiada, ou que esteja de comunicação interrompidas (Cód. Civil, art. 1.893). De regra
caduca, permanecendo, depois, o testador por noventa dias seguidos em lugar onde
possa testar na forma ordinária (Cód. Civil, art. 1.895).
O testamento nuncupativo é verbal. A pessoa empenhada em combate, ou ferida,
confia a sua última vontade a duas testemunhas; não produz efeitos, se o testador não
morre na guerra ou convalesce do ferimento (Cód. Civil, art. 1.896).
Codicilo é o documento escrito, datado e assinado por pessoa capaz de testar,
contendo disposições sobre o seu enterro, sobre esmolas de pouca monta ou legados
de móveis, roupas ou jóias, não muito valiosas, de seu uso pessoal (Cód. Civil, art.
1.881).
1º – Apresentação de testamento cerrado
Falecido o testador, o testamento cerrado será apresentado ao juiz, que o abrirá e o
fará registrar, ordenando seja cumprido, se não achar vício externo que o torne eivado
de nulidade ou suspeito de falsidade (Cód. Civil, art. 1875).
A competência para a abertura de testamento cerrado é do juiz do lugar em que se
encontra o seu portador (José Olympio de Castro Filho [10]).
Ao receber testamento cerrado, o juiz, após verificar se está intato, o abre e manda
que o escrivão o leia na presença de quem o entregou, lavrando-se, em seguida, o
auto de abertura (CPC, art. 1.125 e seu parágrafo único).
O procedimento de abertura de testamento cerrado não visa senão à autenticação do
estado em que o documento se encontrava, quando de sua apresentação em juízo, daí
a importância de o juiz indicar, no auto, qualquer defeito ou vício da cédula, bem
como, se for o caso, a declaração de se achar intata, prevenindo, assim, possíveis
modificações ou alterações no documento (Idem, ibidem). Conflito entre os herdeiros,
sobre a validade do testamento, será objeto de ação própria, de caráter contencioso.
Conclusos os autos, o juiz, ouvido o órgão do Ministério Público, mandará registrar e
arquivar o testamento e, não havendo vício externo que o torne suspeito de nulidade
ou falsidade, determinará o seu cumprimento (CPC, art. 1.126).
Mas, ainda que o testamento contenha o maior defeito, não poderá o juiz dispensar o
seu registro e arquivamento, pois seria absurdo que o mandasse jogar fora. Assim,
havendo defeito manifesto, o que cabe ao juiz é omitir o habitual “cumpra-se” (Castro
Filho, ibidem).
Determinado o cumprimento, o escrivão intima o testamenteiro a assinar, no prazo de
cinco dias, o termo da testamentária.
Incumbe ao juiz nomear testamenteiro dativo, não havendo testamenteiro nomeado
ou estando o mesmo ausente ou recusando-se a aceitar o encargo (CPC, art. 1.127).
2º –Busca e apreensão de testamento
O artigo 1.129 do Código de Processo Civil dispõe: “O juiz, de ofício ou a requerimento
de qualquer interessado, ordenará ao detentor de testamento que o exiba em juízo
para os fins legais, se ele, após a morte do testador, não se tiver antecipado em fazê-
lo. Parágrafo único. Não sendo cumprida a ordem, proceder-se-á à busca e apreensão
do testamento, de conformidade com o disposto nos arts. 839 a 843”.
Havendo fundado receio de que o detentor destrua o testamento, expede-se desde
logo mandado de busca e apreensão, de ofício ou a requerimento de qualquer
interessado. A providência compete ao juiz do inventário. “Se não existe o inventário,
a intimação há de ser requerida ao juízo do lugar em que se encontra o detentor, ou
ao juízo competente para o inventário, cumprindo instruir o pedido com certidão de
falecimento do testador, bem como indicar as razões que possam levar a crer que
existe o testamento e que este se encontra em poder do indicado” (Castro Filho [11]).
O detentor que oculta ou destrói o testamento cerrado inibi ou obsta a disposição da
herança pelo testador, incidindo, pois, o artigo 1.814 do Código Civil: pode, por ação
própria, ser excluído da sucessão, se herdeiro ou legatário.
A busca e apreensão de testamento, seja decretada de ofício ou a requerimento de
interessado, seja decretada incidentemente no curso do inventário ou como medida
preparatória de processo de abertura e registro de testamento, constitui procedimento
de jurisdição voluntária. Não se trata de jurisdição contenciosa, por não se tratar de
processo estruturado para a composição de conflito de interesses entre o requerente e
o requerido, o que bem se evidencia da circunstância de que nem um nem outro
precisam ser herdeiros legais ou testamentários do testador. Trata-se de procedimento
voltado à tutela de interesses de pessoas incertas.
Não constitui ato administrativo, mesmo quando decretada de ofício, porque voltada à
tutela de interesses privados. A atividade administrativa, pelo contrário, visa à tutela
de interesse público.
3º – Confirmação de testamento particular
Os artigos 1.130 e seguintes do Código de Processo Civil regulam a confirmação do
testamento particular.
A denominação não é adequada, pois não se cuida de uma confirmação, mas de apurar
se o testou livre e espontaneamente e se foram observadas as formalidades legais. O
procedimento, assim, é de apuração da regularidade do testamento particular (Castro
Filho [12]).
O disposto no artigo 1.133 deve ser complementado com a norma superveniente do
Código Civil: “Art. 1.789. Em circunstâncias excepcionais declaradas na cédula, o
testamento particular de próprio punho e assinado pelo testador, sem testemunhas,
poderá ser confirmado, a critério do juiz”.
A confirmação ou negativa de confirmação judicial de testamento particular, por
constituir procedimento de jurisdição voluntária, não produz coisa julgada, não
impedindo o aceso dos interessados às vias contenciosas,
4º – Prestação de contas do testamenteiro
Cumpridas as disposições testamentárias, deve o testamenteiro prestar contas (CPC,
art. 1.135), em forma mercantil, ouvido o órgão do Ministério Público.
Se necessário, no interesse do espólio ou por dúvidas levantadas por qualquer
interessado, a prestação de contas pode ser determinada ainda no curso do
procedimento, enquanto a execução se desenvolve (Alcides de Mendonça Lima [13]).
Essa prestação de contas constitui procedimento de jurisdição voluntária, sem força de
coisa julgada.
Pode ocorrer que sobrevenha ação contenciosa, contra o testamenteiro, visando à
cobrança de alegado alcance. Competente para essa ação é o foro do domicílio do
testamenteiro, segundo a regra geral do artigo 94 do CPC. (Contra, afirmando a
competência do foro do inventário: Alcides de Mendonça Lima [14]).
5º – Registro, pelo testamenteiro, de hipoteca legal
O artigo 1.136 do CPC tratava da inscrição da hipoteca legal em favor de mulher
casada, de menor ou de interdito, instituídos herdeiros ou legatários.
A referência à mulher casada perdeu sua razão de ser com a Constituição de 1988,
cujo artigo 226, § 5º proclamou: “Os direitos e deveres referentes à sociedade
conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher”.
O restante do dispositivo restou derrogado pelo novo Código Civil, que já não confere
hipoteca legal às pessoas que não tenham a administração de seus bens, sobre os
imóveis de seus tutores ou curadores, como dispunha o artigo 827, IV, do Código Civil
de 1.916.
Nas Disposições Transitórias do Código vigente previu-se, inclusive, o cancelamento
das hipotecas anteriormente inscritas, de conformidade com o citado dispositivo.
6º – Remoção de testamenteiro
O artigo 1.140 do CPC dispõe que o testamenteiro será removido e perderá o prêmio: I
– lhe forem glosadas as despesas por ilegais ou em discordância com o testamento; II
– não cumprir as disposições testamentárias.
Não se esclarece, aí, sobre o procedimento a observar. Não há que se pensar em
aplicação analógica dos dispositivos referentes à remoção de tutor ou curador (CPC,
arts. ‘1.194-7), porque incide a regra geral do art. 1.103. A requerimento do
interessado ou do Ministério Público, o testamenteiro será citado para responder em
dez dias. Produzidas as provas, inclusive as determinadas de ofício, o juiz decidirá o
pedido, sem que esteja obrigado a observar critério de legalidade estrita, podendo
adotar a solução que reputar mais conveniente ou oportuna.
Havendo motivo grave, poderá o juiz suspender o testamenteiro do exercício de suas
funções, por medida liminar.
O procedimento de remoção de testamenteiro inscreve-se entre os de jurisdição
voluntária, por conceber-se a testamentária como encargo, e não como direito
subjetivo do testamenteiro.
1.4 – Descoberta
No plano do direito material, impõe-se dever ao descobridor: “Quem quer que ache
coisa alheia perdida há de restituí-la ao dono ou legítimo possuidor. Parágrafo único.
Não o conhecendo, o descobridor fará por encontrá-lo, e, se não o encontrar,
entregará a coisa achada à autoridade competente (Cód. Civil, art. 1.233).
No plano processual, a descoberta apresenta-se como atividade de jurisdição
voluntária, desenvolvida pelo juiz, para a tutela de pessoas incertas, relativamente a
bens seus, perdidos ou esquecidos.
O Código Penal define como crime a apropriação de coisa alheia achada (art. 169, II).
Tudo isso, que está na lei, é pouco observado. A regra costumeira é outra: "encontrei,
é meu". A imprensa noticia com alarde raros casos em que o descobridor de coisa
valiosa a entrega à autoridade competente. Sei de caso de um trabalhador que não
conseguiu emprego, por haver o empregador ficado sabendo que ele aparecera nos
jornais, “envolvido num caso de jóia perdida ou roubada”. De outro descobridor, sei
que encontrou uma carteira com dinheiro e documentos. Por telefone, combinou com o
dono dia, hora e local para a entrega. Apresentando-se, foi recebido por um policial (!)
sendo liberado somente depois de muitas explicações. São tão poucos os que
cumprem a lei, que se desconfia dos honestos.
O descobridor que restitui a coisa achada tem direito a uma recompensa não inferior a
cinco por cento do seu valor, e à indenização pelas despesas que houver feito com a
conservação e transporte da coisa, se o dono não preferir abandoná-la (Cód. Civil, art.
1.234). Responde por perdas e danos, se procedeu com dolo (Cód. Civil, art. 1.235).
Sendo a lei observada, a coisa encontrada é entregue à autoridade policial ou
judiciária, que a arrecada, lavrando-se auto que a descreve, dele constando,
outrossim, as declarações do inventor, sobre as circunstâncias em que a encontrou
(CPC, art. 1.170). À autoridade competente incumbe dar conhecimento da descoberta
através da imprensa e outros meios de informação (Cód. Civil, art. 1.236). Se o valor
da coisa comportar, o juiz determinará a publicação de edital de citação, por duas
vezes, no órgão oficial e com intervalo de (10) dias, para que o dono ou legítimo
possuidor a reclame (CPC, art. 1.171).
Nos termos do art. 232, IV, do Código de Processo Civil, incumbe ao juiz determinar o
prazo para que se aperfeiçoe a citação, que variará entre vinte (20) e sessenta (60)
dias, correndo da data da primeira publicação. Antes de decorrido esse prazo, não
ocorre a perda da propriedade. Tampouco ela ocorre pelo simples transcurso desse
prazo. Mas, decorridos sessenta dias da divulgação da notícia pela imprensa, ou do
edital, não se apresentando quem comprove a propriedade sobre a coisa, será esta
vendida em hasta pública e, deduzidas do preço as despesas, mais a recompensa do
descobridor, pertencerá o remanescente ao Município em cuja circunscrição se deparou
o objeto perdido (Cód. Civil, art. 1.237). Sendo de diminuto valor, poderá o Município
abandonar a coisa em favor de quem a achou (Cód. Civil, art. 1.237, parágrafo único).
Apresentando-se o dono, antes da arrematação, e provando o seu direito, três
situações, pelo menos, podem ocorrer. Pode receber a coisa, conforme previsão do
artigo 1.172 do CPC; pode abandoná-la, caso em que o descobridor pode requerer lhe
seja adjudicada, e pode recusar-se a pagar as despesas e o prêmio do inventor, o que
vale como abandono, segundo Alcides de Mendonça Lima [15].
O artigo 1.175 do Código de Processo Civil dispõe: "O procedimento estabelecido neste
Capítulo aplica-se aos objetos deixados nos hotéis, oficinas e outros estabelecimentos,
não sendo reclamados dentro de um mês." A norma somente se aplica aos objetos
cujo dono se ignore, como esclarece José Olympio de Castro Filho [16] Efetivamente,
não teria sentido a citação por edital, exigida pelo art. 1.171, se conhecido o dono ou
legítimo possuidor do bem esquecido em hotel ou oficina.
2. Tutela de incapazes
2.1 - Poder familiar
Os filhos, enquanto menores, estão sujeitos ao poder familiar (Cód. Civil, art. 1.630).
Durante o casamento e a união estável, compete o poder familiar aos pais; na falta ou
impedimento de um deles, o outro o exerce com exclusividade (Cód. Civil, art. 1.631).
Compreende-se no poder familiar, quando a pessoa dos filhos menores, a competência
dos pais para (Cód. Civil, art. 1.634): I – dirigir-lhes a criação e educação; tê-los em
sua companhia e guarda; III – conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para
casarem; IV – nomear-lhes tutor por testamento ou documento autêntico, se o outro
dos pais não lhe sobreviver, ou o sobrevivo não puder exercer o poder familiar;
representá-los até aos dezesseis anos, nos atos da vida civil, e assisti-los, após esse
idade, nos atos em que forem partes, suprindo-lhes o consentimento; VI – reclamá-los
de quem ilegalmente os detenha; VII – exigir que lhes prestem obediência, respeito e
os serviços próprios de sua idade e condição.
No caso de separação, de fato ou de direito, pode o filho menor ser confiado à guarda
de um dos pais, sem que isso implique perda do poder familiar pelo outro, a quem se
confere, então, o direito de visita.
Divergindo os pais quanto ao exercício do poder familiar, é assegurado a qualquer
deles recorrer ao juiz para a solução do desacordo (Cód. Civil, art. 1.631, parágrafo
único). Tem-se, aí, caso típico de jurisdição voluntária, porquanto não se trata de
assegurar direito subjetivo de qualquer das partes, mas de tutelar interesse único, no
caso, do menor, a respeito do qual se estabeleceu a divergência entre os pais.
No caso de dissolução da sociedade ou do vínculo conjugal pela separação judicial por
mútuo consentimento ou pelo divórcio consensual, observa-se o que os cônjuges
acordarem sobre a guarda dos filhos (Cód. Civil, art. 1.583). Não havendo acordo,
defere-se a guarda a quem revelar melhor condições para exercê-la, que pode,
inclusive, ser um terceiro (Cód. Civil, art. 1.584 e seu parágrafo único). O pai ou a
mãe, em cuja guarda não estejam os filhos, poderá visitá-los e tê-los em sua
companhia, segundo o acordado com o outro cônjuge, ou fixado pelo juiz (Cód. Civil,
art. 1.589).
Na concepção moderna, o pátrio familiar não é um direito sobre a pessoa dos filhos,
mas um poder que se exerce na medida do interesse do menor. Por essa razão, são
casos de jurisdição voluntária a busca e apreensão de pessoa, de que trata o art. 839
do Código de Processo Civil, medida aplicável a incapazes (menores e interditos), que
se sujeitam à guarda e pode de outrem; a posse provisória dos filhos, nos casos de
separação, divórcio ou anulação de casamento, de que trata o art. 888, III, do Código
de Processo Civil; o depósito de menores ou incapazes, castigados imoderadamente
por seus pais tutores ou curadores, ou por eles induzidos à prática de atos contrários à
lei e à moral, de que trata o art. 888, V, do mesmo Código; a regulação da guarda e
educação dos filhos e do direito de visita, prevista no art. 888, VII, da lei processual.
Em todos esses casos, ainda que possa existir, em concreto, conflito de interesses, do
ponto de vista legal, ou seja, em abstrato, não há lide, mas apenas controvérsia sobre
o melhor modo de tutelar-se o interesse único a considerar, que é o do incapaz. Não se
trata, em absoluto, de definir direito subjetivo sobre o incapaz, por qualquer dos
interessados. Crianças, adolescentes, e os incapazes de um modo geral, não são
coisas, que possam ser tratados como objeto de direitos. Trata-se, nesses casos, de
encontrar a solução mais conveniente para o incapaz, e não de definir “direitos” do pai
ou da mãe. Essa a razão pela qual nos encontramos, nesses casos, ante hipóteses de
jurisdição voluntária.
Por iguais razões, são procedimentos de jurisdição voluntária a ação de suspensão ou
destituição do pátrio poder, regulada pelos artigos 155 e seguintes do Estatuto da
Criança e do Adolescente.
Compete essa ação ao Ministério Público ou a algum parente (Cód. Civil, art. 1.637). A
causa petendi deve inscrever-se entre uma das hipóteses previstas no artigo 1.638 do
Código Civil: castigos imoderados, abandono material ou intelectual, prática de atos
contrários à moral ou aos bons costumes, abuso de autoridade, atos em geral que
constituam faltas aos deveres inerentes ao poder familiar ou ruinosos aos bens dos
filhos [17].
Proposta a ação, pode o juiz, liminarmente, ou no curso dela, suspender o pátrio
poder, até o julgamento definitivo da causa (Lei 8.069, art. 156). No caso de maus-
tratos, opressão ou abuso sexual, pode o juiz determinar o afastamento da moradia
comum (Lei cit., art. 130).
Citado, o requerido tem o prazo de dez dias para responder (art. 158), através de
advogado. Sendo-lhe concedido o benefício da assistência judiciária, conta-se o prazo
a partir da intimação ao advogado do despacho de nomeação (art. 159).
A ausência de resposta não produz os efeitos da revelia, mas o juiz pode, não
obstante, proferir sentença independentemente de audiência (art. 161). Esta somente
se realiza quando necessária (art. 162, § 2º).
Como se trata de procedimento de jurisdição voluntária, não há produção de coisa
julgada material. Observe-se que o juiz não declara direito do autor em face do réu,
como ocorre na jurisdição contenciosa. Poder-se-ia contra-argumentar, dizendo que se
trata de sentença desconstitutiva de direitos do pai ou da mãe sobre o filho menor.
Todavia, na concepção moderna, não há direito subjetivo dos pais em face dos filhos.
Além disso, embora ouvido sempre que possível e razoável (Lei 8.069, art. 161, § 2º),
o menor não é parte no processo de destituição do pátrio poder.
Não obstante a perda do poder familiar, continua o pai ou a mãe obrigado a cumprir os
deveres de ordem patrimonial. A perda do poder familiar não implica sua extinção no
sentido de afastamento definitivo ou impossibilidade permanente de continuar no seu
exercício. O poder familiar perdido pode ser restabelecido, desaparecida a causa que a
determinou. A reintegração no exercício do múnus deve ser pleiteada judicialmente.
(Orlando Gomes [18]).
Cessam, porém, todos os vínculos e torna-se irreversível a perda do poder familiar,
sobrevindo adoção (Lei 8.069, art. 41, Cód. Civil, art. 1.626).
2.4 - Interdição
O Código Civil estabelece que estão sujeitos à curatela aqueles que, por enfermidade
ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para os atos da vida
civil; aqueles que, por outra causa duradoura, não puderem exprimir a sua vontade;
os deficientes mentais, os ébrios habituais e os viciados em tóxicos; os excepcionais
sem completo desenvolvimento mental; os pródigos (art. 1.767).
Os destituídos do necessário discernimento para a prática de atos da vida civil, assim
como os que não podem exprimir sua vontade, são absolutamente incapazes (art. 3º).
A incapacidade dos demais pode ser absoluta ou relativa, conforme o decreto de
interdição (art. 9º, III). O artigo 1.772 do Código Civil prescreve: “Pronunciada a
interdição das pessoas a que se referem os incisos III e IV do art. 1.767, o juiz
assinará, segundo o estado ou o desenvolvimento mental do interdito, os limites da
curatela, que poderão circunscrever-se às restrições constantes do art. 1.782”.
Pode-se definir a curatela como o “encargo cometido a alguém, para dirigir a pessoa e
administrar os bens de maiores incapazes (Caio Mário da Silva Pereira [21]).
“O pressuposto fático da curatela é a incapacidade; o pressuposto jurídico, uma
decisão judicial. Não pode haver curatela senão deferida pelo juiz” (Id. Ibidem).
“Decretando a interdição, o juiz nomeará curador ao interdito”, estabelece o art. 1.183
do Código de Processo Civil.
Também Sílvio Rodrigues assevera que “a distinção fundamental entre a tutela e a
curatela consiste em que a primeira se destina a proteger o incapaz menor, enquanto
a segunda se destina a proteger o incapaz maior”. E transcreve a definição de
Beviláqua: “Curatela é o encargo público, conferido, por lei, a alguém, para dirigir a
pessoa e administrar os bens de maiores, que por si não possam fazê-lo” [22].
Contudo, poderá ser submetido à curatela menor relativamente incapaz anomalia
psíquica, necessite ser representado e não meramente assistido por seu pai, mãe ou
tutor (Alcides de Mendonça Lima [23]).
A natureza contenciosa ou voluntária do processo de interdição é controvertida, na
doutrina. "Enquanto Wach, Chiovenda, Garsonne et Bru sustentavam que o processo
de interdição é de jurisdição contenciosa, sobretudo porque nela se pode instaurar
dissídio e ainda porque se trata de fazer atuar a vontade da lei, no interesse do
Estado, Carnelutti entendia que é de jurisdição voluntária, porque nele o juiz não
decide frente a duas partes, com interesse em conflito, senão face a um interesse
público, cuja tutela reclama sua intervenção, sendo tal interesse do incapaz" (Castro
Filho [24]).
Conforme Carnelutti, o processo de interdição é de jurisdição voluntária, porque nele
não há lide. É preciso, porém, que se compreenda: não há lide em abstrato, porque se
trata de processo instituído por lei unicamente para fins de tutela do interesse único do
incapaz. No plano concreto, o conflito de interesses é, com freqüência, uma realidade
que não se pode afastar com meras palavras. Em particular no caso de interdição por
prodigalidade, é manifesto o interesse do cônjuge, ascendente ou descendente (Código
Civil, art. 1.768) em impedir a dilapidação do patrimônio comum ou da futura herança,
pelo pródigo.
Na verdade, com ou sem lide, o processo de interdição é de jurisdição voluntária,
porque nele não se trata de determinar direitos e deveres de uma parte em face da
outra. Ainda que incapaz o interditando, não há direito subjetivo do requerente à
decretação da interdição.
A competência para a ação de interdição é do foro do domicílio do interditando, por
aplicação da regra geral do art. 94 do CPC.
São legitimados ativos os pais ou tutores; o cônjuge, ou qualquer parente; o Ministério
Público (Cód. Civil, art. 1.768), este somente em caso de doença mental grave, não
existindo, sendo incapazes, ou não promovendo a interdição os demais legitimados
(Cód. Civil, art. 1.769).
O art. 1.181 do Código de Processo Civil determina a citação do interditando.
Mendonça Lima [25] preconiza a aplicação dos parágrafos do art. 218 no caso, que
facilmente pode ocorrer, de o Oficial de Justiça constatar a impossibilidade de o atando
receber a citação, por demência manifesta. Parece-me que, nesse caso, tendo-se em
vista a finalidade do processo de interdição, basta que o Oficial de Justiça certifique o
ocorrido, não havendo necessidade de um prévio exame médico, apenas para o efeito
de citação.
O interditando pode outorgar procuração a advogado que o defenda (CPC, art. 1.182,
§ 2°). Contudo, promovida a interdição pelo Ministério Público, deve o juiz nomear
defensor ao suposto incapaz; promovida por outrem, é o Ministério Público seu
defensor (Cód. Civil, art. 1.770).
O interrogatório a que se referem os artigos. 1.181 do Código de Processo Civil e
1.771 do Código Civil, já é ato do processo, sujeito ao princípio do contraditório,
impondo-se, por isso, além da citação do interditando, a intimação do Ministério
Público e, sendo este o requerente, também a do curador à lide (Ver art. 1.182, § 1°).
O Código não prevê julgamento antecipado da lide, por sentença de improcedência
anterior à nomeação de perito, medida que MENDONÇA LIMA entende admissível, "em
casos extremos, isentos de qualquer dúvida" [26].
Da nomeação de curador provisório pode-se cogitar em duas situações distintas: a
primeira delas, verdadeira medida litisreguladora, quando há risco de dano vinculado à
demora da sentença definitiva; a segunda, quando há expectativa de recuperação da
capacidade mental, como no caso lembrado por Celso Antônio Rossi, de inconsciência
decorrente de acidente [27].
Em ambos os casos, é de se admitir a nomeação de curador provisório, por liminar
fundada no princípio a que se refere o art. 1.109, segunda parte, do Código de
Processo Civil, desde que haja comprovação inequívoca da incapacidade mental e se
verossímeis os alegados riscos de dano.
Os efeitos da sentença de interdição produzem-se ex nunc. "Tem-se visto afirmar que,
ao decretar a interdição, com fundamento em alienação mental, deve o juiz dizer
desde quando se hão de produzir os efeitos da providência, fixando o dies a quo no
momento em que, à luz da prova colhida, houver começado a incapacidade decorrente
da anomalia psíquica. Os requerentes costumam pedi-lo, e os órgãos judiciais às vezes
se consideram obrigados a atender a semelhante pedido, ou até a incluir ex officio, na
sentença, cláusula do teor indicado. Semelhante ideia repousa num equívoco", observa
José Carlos Barbosa Moreira [28]. Efetivamente, efeito da sentença de interdição é a
constituição da curatela, insuscetível de projetar-se para o passado. A declaração de
incapacidade, nela contida, é declaração de fato, que não produz coisa julgada. Integra
a motivação da sentença, não o decisum. Os atos jurídicos praticados pelo interdito
são nulos, por causa da interdição. Os que praticou antes são nulos em virtude de sua
incapacidade, que precisa ser provada. "Esclareça-se bem: necessária é a prova, não a
propositura de ação especificamente destinada à invalidação, consoante ocorreria se se
cuidasse de anulabilidade. A nulidade do ato do incapaz é declarável incidenter tantum,
e por conseguinte argüível em defesa, sem que importe em nada sobrevir ao ato a
interdição, ou mesmo não haver sido jamais decretada. Não se exclui, obviamente, a
possibilidade de algum legitimado propor ação para ver declarada a inexistência de
relação jurídica que nasceria do ato, baseando o pedido na nulidade deste e arcando
com o ônus da prova da incapacidade" (Id. Ibidem)
2.5 - Ausência
Há que se distinguir a ausência decretada (o ser ausente, a pessoa juridicamente
ausente) da simples ausência (o estar ausente, a pessoa faticamente ausente). A
primeira supõe, além do fato da ausência e da a falta de notícias, como decorre do art.
1.163 do CPC (“sem que se saiba do ausente”), a decretação da ausência, com a
arrecadação de bens do ausente e a nomeação de curador que os administre. Mesmo
nas leis, quando se falta em ausência, quase sempre é da segunda que se trata, ou
seja, da ausência simples, decorrente do fato de não se encontrar a pessoa em seu
domicílio,
Da decretação da ausência tratam os artigos 22 a 39 do Código Civil e 1.159 e
seguintes do Código de Processo Civil. Distinguem-se três fases: a da curadoria dos
bens do ausente, a da sucessão provisória e a da sucessão definitiva. A cada uma
corresponde processo próprio.
Na primeira fase, procede-se à arrecadação dos bens do ausente e se lhe nomeia
curador. A sentença, que se profere, é constitutiva da curatela. Decorrido um ano da
arrecadação dos bens do ausente, ou três anos, havendo ele deixado representante ou
procurador, podem os interessados requerer a abertura da sucessão provisória.
Trânsita em julgado a respectiva sentença, tem início a segunda fase. Procede-se à
abertura do testamento, se houver, e ao inventário e partilha dos bens do ausente,
como se falecido, imitindo-se os herdeiros em sua posse, mediante caução de os
restituir, dela dispensados os ascendentes, os descendentes e o cônjuge, provada a
sua qualidade de herdeiros. Decorridos dez anos, ou cinco anos sem notícia de ausente
octogenário, tem início a fase da sucessão definitiva, levantando-se as cauções
prestadas. A sentença que se profere é constitutiva da sucessão definitiva.
Declaração de morte presumida, sem decretação de ausência. A morte pode ser
declarada, por presunção, sem decretação de ausência: I – se for extremamente
provável a de quem estava em perigo de vida; II – se alguém, desaparecido em
campanha ou feito prisioneiro, não for encontrado até dois anos após o termino da
guerra. A declaração da morte presumida, nesses casos, somente pode ser requerida
depois de esgotadas as buscas e averiguações, devendo a sentença fixar a data
provável do falecimento (Código Civil, art. 7º, parágrafo único).
A declaração de morte presumida autoriza o cônjuge a contrair novo casamento.
Curadoria dos bens do ausente. O Código Civil estabelece: “Desaparecendo uma
pessoa do seu domicílio sem dela haver notícia, se não houver deixado representante
ou procurador a quem caiba administrar-lhe os bens, o juiz, a requerimento de
qualquer interessado ou do Ministério Público, declarará a ausência, e nomear-lhe-á
curador” (art. 22). “Também se declarará a ausência, e se nomeará curador, quando o
ausente deixar mandatário que não queira ou não possa exercer ou continuar o
mandato, ou se os seus poderes forem insuficientes” (art. 23).
Arrecadam-se os bens do ausente, providência que o juiz pode determinar de ofício.
Procede-se à arrecadação da mesma forma que a da herança jacente (CPC, art.
1.160).
É nomeado curador o cônjuge, desde que não separado judicialmente ou, de fato, por
mais de 2 anos; em sua falta, o pai, a mãe ou os descendentes, precedendo os mais
próximos os mais remotos (Cód. Civil, art. 25).
A sentença deve ser registrada no Registro Civil de Pessoas Naturais (Lei 6.015/73,
art. 29, VI), no cartório do domicílio anterior do ausente, produzindo os mesmos
efeitos do registro de interdição (Lei cit., art. 94).
Feita a arrecadação, publicam-se editais, reproduzidos de dois em dois meses,
anunciando a arrecadação e chamando o ausente a entrar na posse de seus bens
(CPC, art. 1.161). Há, pois, um edital, que é publicado uma vez e reproduzido, depois,
seis vezes, num total de sete publicações (Mendonça Lima [31]).
A curadoria cessa, por sentença averbada no livro de emancipação, interdições e
ausência (Lei 6.015/73, art. 104): a) comparecendo o ausente, seu procurador ou
quem o represente; b) sobrevindo certeza da morte do ausente; c) sendo aberta a
sucessão provisória (CPC, art. 1.163).
Sucessão provisória. Decorrido um ano da arrecadação dos bens do ausente, ou três
anos, havendo ele deixado representante ou procurador, podem requerer a abertura
da sucessão provisória o cônjuge não separado judicialmente; os herdeiros
presumidos, legítimos ou testamentários; os que tiverem sobre os bens do ausente
direito dependente de sua morte, como o nu-proprietário e o fideicomissário de bens
de que o ausente seja, respectivamente, usufrutuário ou fiduciário; os credores de
obrigações vencidas e não pagas.
Requerida a abertura da sucessão provisória, citam-se pessoalmente os herdeiros
presentes na comarca, bem como o curador e, por edital, os demais (CPC, art. 1.164).
Também devem ser citados o cônjuge e o Ministério Público.
A citação dos herdeiros faz-se para que ofereçam artigos de habilitação, isto é, para
que comprovem sua qualidade de sucessores do ausente. A habilitação obedece ao
processo do artigo 1.057 do Código de Processo Civil (CPC, art. 1.164).
Passada em julgado a sentença que determinou a abertura da sucessão provisória,
procede-se à abertura do testamento, se houver, e ao inventário e partilha dos bens.
Não comparecendo herdeiro ou interessado que requeira o inventário, a herança será
considerada jacente (CPC, art. 1.165 e parágrafo único).
Ainda que concluído antes o inventário, os bens somente são entregues ao herdeiro
cento e oitenta dias depois de publicada pela imprensa a sentença que determinou a
abertura da sucessão provisória. Esse o sentido do artigo 28, primeira parte, do Código
Civil.
A sentença deve ser averbada no Registro Civil, no assento de ausência, com
referência especial ao testamento do ausente, se houver, e indicação de seus herdeiros
habilitados (Lei 6.015/73, art. 104, parágrafo único).
Cumpre aos herdeiros, imitidos na posse dos bens do ausente, prestar caução de os
restituir (CPC, art. 1.166). São, porém, dispensados de prestá-la os ascendentes, os
descendentes e o cônjuge, uma vez provada a sua qualidade de herdeiros (Cód. Civil,
art. 30, § 2º).
Empossados nos bens, os sucessores provisórios ficarão representando ativa e
passivamente o ausente, de modo que contra eles correrão as ações pendentes e as
que de futuro àquele forem movidas (Cód. Civil, art. 34).
Se durante a posse provisória se provar a época exata do falecimento do ausente,
considerar-se-á, nessa data, aberta a sucessão em favor dos herdeiros, que o eram
àquele tempo (Cód. Civil, art. 35).
Sucessão definitiva. A sucessão provisória cessa pelo comparecimento do ausente.
Converte-se em definitiva: I – quando houver certeza da morte do ausente; II - a
requerimento dos interessados, dez (10) anos depois de passada em julgado a
sentença de abertura da sucessão provisória, com o levantamento das cauções
prestadas; IIII – provando-se que o ausente conta 80 (oitenta) anos de nascido, e que
de 5 (cinco) datam as últimas notícias suas (Cód. Civil, arts. 37-8; CPC, art. 1.167).
Autorizada a abertura da sucessão definitiva, presume-se a morte do ausente (Cód.
Civil, art. 6º).
A conversão não é desde logo tão definitiva quanto a denominação dá a entender.
Regressando o ausente nos dez anos seguintes à abertura da sucessão definitiva, ou
algum de seus descendentes ou ascendentes, aquele ou estes haverão os bens
existentes no estado em que se acharem, os sub-rogados em seu lugar, ou o preço
que os herdeiros e demais interessados houverem recebido pelos bens alienados
depois daquele tempo (Cód. Civil, art. 39, caput).
Depois de dez anos, esse direito se extingue, por decadência.
2.7 – Emancipação
A menoridade cessa aos dezoito anos completos, quando a pessoa fica habilitada à
pratica de todos os atos da vida civil (Cód. Civil, art. 5º). A maioridade pode cessar
antes, por emancipação, tendo o menor dezesseis anos completos (Cód. Civil, art. 5º,
parágrafo único, I), extinguindo-se o poder familiar (Cód. Civil, art. 1.635, II).
A emancipação dos menores sob pátrio poder pode ser concedida pelos pais,
conjuntamente, ou por um deles na falta do outro, por instrumento público,
independentemente de qualquer ato judicial.
Depende de sentença, proferida em procedimento de jurisdição voluntária, a
emancipação de menores sob tutela (Cód. Civil, art. 5º, parágrafo único, I). O
requerimento é formulado pelo próprio menor, representado por advogado ou pelo
curador de menores, em face de seu tutor, que deve ser citado, podendo impugnar o
pedido e produzir prova de suas alegações. A resistência do tutor determina a
existência de controvérsia, mas não de lide, porque, em abstrato, supõe-se devida, ela
própria, à intenção do tutor de atender ao interesse do menor, que unicamente deve
ser levado em consideração.
A competência é do foro do domicílio do tutor (Alcides de Mendonça Lima [34]).
A emancipação, quer por instrumento público, quer por sentença, deve ser registrada
no Registro Civil das Pessoas Naturais (Cód. Civil, art. 9º, II; Lei 6.015/73, art. 29).
até a celebração do casamento (Cód. Civil, arts. 1.517 e 1.518). Mas o juiz pode suprir
a denegação do consentimento, quando injusta (Cód. Civil, art. 1.519).
O pedido é formulado pelo próprio menor, representado por advogado ou pelo curador
de menores.
Não se trata de jurisdição contenciosa, ainda que, em concreto, haja conflito entre o
menor e a pessoa que se recusa a consentir e embora se possa ver, na atuação do
juiz, aqueles caracteres de secundariedade e substituição, com que Chiovenda
procurou caracterizar a jurisdição contenciosa. Trata-se de jurisdição voluntária,
porque se trata de tutela os intereses de incapaz, sem que haja, de sua parte, direito
subjetivo ao consentimento de seu pai, mãe, tutor ou curador. O exame do juiz situa-
se no plano da conveniência.
Não há ação principal a ser proposta, o que evidencia que a medida não tem natureza
cautelar ou litisreguladora.
3.2 - Casamento
A habilitação para o casamento processa-se perante o oficial do Registro Civil das
Pessoas Naturais e, ouvido o Ministério Público, é homologada pelo juiz (Cód. Civil, art.
1.256).
Se o Ministério Público impugnar o pedido ou a documentação, haverá decisão do juiz.
Terceiro pode apresentar impugnação, alegando impedimento ou causa suspensiva,
mediante declaração escrita e assinada, instruída com as provas do fato alegado, ou
com indicação do lugar onde possam ser obtidas (Cód. Civil, art. 1.529). Nesse caso, o
oficial do registro dará aos nubentes ou a seus representantes nota de oposição,
indicando os fundamentos, as provas e o nome de quem a ofereceu, podendo os
nubentes oferecer prova contrária (Cód. Civil, art. 1.530). Após, decide o juiz (Cód.
Civil, art. 1.531, primeira parte), por ato que é de jurisdição voluntária, não obstante a
existência de controvérsia entre os interessados, por não se cogitar da existência de
direito subjetivo do opoente, ainda que fundada a oposição.
O juiz é também a autoridade competente para, havendo urgência, dispensar os
“proclamas”, ou seja, a publicação do edital, nas circunscrições do Registro Civil de
ambos os nubentes e, na imprensa local, onde houver (Cód. Civil, art. 1.527).
Não mais subsiste o procedimento com nomeação de médicos, para casamento de
colaterais de terceiro grau, previsto pelo Decreto-lei n. 3.200/41. O novo Código Civil
proíbe, sem qualquer exceção, o casamento de colaterais, até o terceiro grau inclusive
(art. 1.521, IV). Portanto, não podem casar tio e sobrinha, com ou sem exame
médico.
O casamento é ato dos nubentes (Cód. Civil, art. 1.514), presidido pelo Juiz de Paz
(Constituição, art. 98, II), que os declara casados.
Mais relevante é a atividade desenvolvida pelo Juiz de Direito, na hipótese de
casamento em iminente risco de vida (casamento nuncupativo). “Quando algum dos
contraentes estiver em iminente risco de vida, não obtendo a presença da autoridade à
qual incumba presidir o ato, nem a de seu substituto, poderá o casamento ser
celebrado na presença de seis testemunhas, que com os nubentes não tenham
parentesco em linha reta, ou, na colateral, até segundo grau” (Cód. Civil, art. 1.540).
Realizado o casamento, devem as testemunhas comparecer perante a autoridade
judicial mais próxima, dentro em dez dias, pedindo que lhes tome por termo a
declaração de: I - que foram convocadas por parte do enfermo; II - que este parecia
em perigo de vida, mas em seu juízo; III - que, em sua presença, declararam os
contraentes, livre e espontaneamente, receber-se por marido e mulher. Autuado o
pedido e tomadas as declarações, o juiz procederá às diligências necessárias para
verificar se os contraentes podiam ter-se habilitado, na forma ordinária, ouvidos os
interessados que o requererem, dentro em quinze dias. Verificada a idoneidade dos
cônjuges para o casamento, assim o decidirá a autoridade competente, com recurso
voluntário às partes. Se da decisão não se tiver recorrido, ou se ela passar em julgado,
apesar dos recursos interpostos, o juiz mandará registrá-la no livro do Registro dos
Casamentos. O assento assim lavrado retrotrairá os efeitos do casamento, quanto ao
estado dos cônjuges, à data da celebração” (Cód. Civil, art. 1.541 e seus parágrafos).
Nesse caso, a sentença do juiz, declarando celebrado o casamento e mandando que se
registre o ato, documenta, certifica e torna pública sua celebração pelos contraentes.
[1] Direito Civil. Parte Geral, 18. ed. São Paulo, Saraiva, 1988, pp. 37-8.
[2] Sílvio Rodrigues. Direito das Sucessões. 15a ed. São Paulo, Saraiva, 1988, p. 192.
[3] Id. Dos contratos e das declarações unilaterais de vontade. 16. ed. São Paulo,
Saraiva, 1987, p. 207.
[4] Caio Mário da Silva Pereira. Direito de Família. 3. ed., Rio de Janeiro, Forense,
1979, p. 313-4
[5] Processo Cautelar, 5a ed.. São Paulo, Universitária de Direito, 1983, pp. 364-5.
[6] Ovídio A. Baptista da Silva. Comentários ao Código de Processo Civil. Porto Alegre,
Le Jur, 1985, p. 605.
[7] Instituições. 1/208.
[8] Ibid. p. 609.
[9] Loc. Cit.
[10] Comentários, Rio de Janeiro, Forense, 1976, p. 156.
[11] Comentários ao Código de Processo Civil, Rio de Janeiro, Forense, 1976, v. X, p.
163).
[12] Comentários, p. 166 e 169).
[13] Comentários ao Código de Processo Civil, São Paulo, Revista dos Tribunais, 1982,
v. XII, p. 270).
[14] Ibidem, p. 272.
[15] Comentários ao Código de Processo Civil, Forense, 1982. p. 418.
[16] Comentários ao Código de Processo Civil, Forense, 1976, pp. 254-5.
[17] Prescinde de ação a suspensão do poder familiar decorrente de condenação, por
sentença irrecorrível, por crime cuja pena exceda a dois anos de prisão (Cód. Civil, art.
1.637, parágrafo único). Trata-se, aí, de efeito anexo da sentença penal.
[18] Direito de Família. 5. ed., Rio de Janeiro, Forense, 1983, p. 369.
[19] Processo cautelar. 12. ed., São Paulo, Universitária de Direito, 1990. p. 279.
[20] Comentários ao Código de Processo Civil. Rio de Janeiro, Forense, 1976. v. X, p.
294-5.
[21] Instituições de Direito Civil. 3. ed. Rio de Janeiro, Forense, 1979. v. V, p. 308.
[22] Direito Civil. São Paulo, Saraiva, 1988. p. 413-4).
[23] Comentários ao Código de Processo Civil. São Paulo, RT, 1982. p. 433).
[24] José Olympio de Castro Filho. Comentários ao Código de Processo Civil. Rio de
Janeiro, Forense, 1976. v. X, p. 258-9.
[25] Comentários, p. 452.
[26] Comentários, p. 454.
[27] Do curador provisório em processo de interdição. Revista dos Tribunais, (503):
252-3, set. 1977.
[28] Eficácia da sentença de interdição por alienação mental. Ajuris. Porto Alegre, (37):
238-44, jul. 1986.
[29] Sentença e coisa julgada. 2a ed., Porto Alegre, Fabris, 1988, p. 118.
[30] Comentários, p. 457.
[31] Alcides de Mendonça Lima, Comentários ao Código de Processo Civil, Revista dos
Tribunais, 1982, p. 379-80).
[32] José Olympio de Castro Filho. Comentários ao Código de Processo Civil, Rio de
Janeiro, Forense, 1976. v. X, p. 87, nota 78).
[33] Comentários ao Código de Processo Civil, São Paulo, RT, 1982, v. XII, p. 141.
[34] Comentários. v. XII, p. 92.
[35] Direito Civil. Parte Geral. 18. ed., São Paulo, Saraiva, 1988. v. I, p. 70.
[36] Princípios de Direito Administrativo. Porto Alegre, Sulina, 1964. p. 66.
[37] Comentários, p. 111.
[38] Comentários, p. 90.
[39] Curso de Direito Civil. Direito das Coisas. 4. ed. São Paulo, ^Saraiva, 1961. p.
303.
[40] Ibidem, p. 114).
[41] Divórcio e separação judicial. Rio de Janeior, Renovar, 1991, p. 108.
[42] Curso de Direito Civil Brasileiro. Introdução e Parte Geral. 5. ed. São Paulo, RT,
1987. p. 100.
[43] Comentários, p. 108.
[44] Comentários. São Paulo, Revista dos Tribunais, 1982. p. 532.