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NOVEMBRO 2014
DATA: 24.11.2014
NOME: Ricardo Mariz de Oliveira
Bruno Fajersztajn
Fabiana Carsoni F. da Silva
Ramon Tomazela
Apresentação
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O impacto das novas regras contábeis sobre a lei tributária dependerá do grau
de abertura concedido pelo próprio sistema jurídico. A ciência contábil e o direito constituem
sistemas autônomos e distintos, que constroem a sua própria realidade a partir dos eventos
que ocorrem na realidade social. Dessa forma, o mesmo fato social pode ser reconhecido e
processado de forma diversa pelo direito e pela contabilidade, uma vez que o processo de
conhecimento pauta-se em pressupostos distintos em cada campo do estudo.
Evidencia-se, assim, que tanto o direito quanto a ciência contábil captam fatos
concretos ocorridos na realidade social, em decorrência do exercício da atividade econômica
da sociedade. A forma utilizada pela contabilidade para retratar os eventos sociais, a partir
1
No presente trabalho, optamos por utilizar a expressão “essência econômica”, no lugar de
“substância econômica”, como consta na redação da pergunta. Isso porque a substância corresponde
ao conteúdo efetivo de qualquer ato ou negócio jurídico, assim entendidos os efeitos que ele produz
de acordo com as normas jurídicas pertinentes, atribuindo direitos e obrigações para as respectivas
partes (causa do negócio jurídico), conforme apontado na questão 2 abaixo.
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Em suma, a lei tributária utilizou o lucro líquido contábil como ferramenta para
a identificação do acréscimo patrimonial experimentado pelo contribuinte.
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NABAIS, José Casalta. Direito Fiscal. 3ª Edição. Coimbra: Almedina, 2005, p. 576.
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Segundo Fernando Daniel de Moura Fonseca, a relação entre normas tributárias e regras contábeis
pode ser verificada em três diferentes situações, nas quais o legislador poderá: (i) empregar
vocábulos que se referem a institutos contábeis atribuindo a eles sentido diverso ou criando um
conceito tributário autônomo; (ii) incorporar, expressa ou implicitamente, conceitos contábeis, o que
pressupõe a manutenção do seu sentido original; ou (iii) fazer remissão ao fato contábil como
referência para a incidência da norma de tributação, tal como regulado na Contabilidade (reenvio
direto). (FONSECA, Fernando Daniel de Moura. Normas Tributárias e a Convergência Das Regras
Contábeis Internacionais. Dissertação de Mestrado. Universidade de São Paulo, 2013, p. 84).
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para a exigência do tributo envolve a definição dos seus aspectos essenciais, como fato
gerador, sujeito passivo, base de cálculo e alíquota, nos termos do art. 97 do Código
Tributário Nacional (“CTN”).
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O Comitê de Pronunciamentos Contábeis, ou simplesmente CPC, é o resultado da iniciativa conjunta
de diversas entidades brasileiras dos mercados financeiro e de capitais. Trata-se de organismo não-
governamental criado em 2005, com a atribuição de estudar, preparar e emitir pronunciamentos
técnicos de contabilidade, a fim de subsidiar a emissão de normas pelas entidades reguladoras
brasileiras (como a CVM e o Banco Central do Brasil), levando sempre em conta a convergência da
contabilidade brasileira aos padrões internacionais.
9
Art. 6º do Decreto-lei n. 9295, de 27.5.1946.
10
Cf. Pronunciamento Técnico CPC n. 38.
11
Cf. Lei n. 8.981, de 20.1.1995, e Instrução Normativa RFB n. 1.022, de 5.4.2010.
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No mesmo sentido, leciona Marco Aurélio Greco: “Não é a maneira pela qual vier a ser
contabilizada determinada figura que irá determinar a sua natureza jurídica para fins de incidência. A
contabilidade retrata a realidade, mas não cria realidades jurídicas novas, desatreladas da substância
subjacente”. (GRECO, Marco Aurélio. “Cofins na Lei 9.718/98 – variações cambiais e o regime de
alíquota acrescida”. Revista Dialética de Direito Tributário n. 50. São Paulo: Dialética, 1999, p. 81).
13
GONÇALVES, José Artur Lima. Imposto sobre a Renda – Pressupostos Constitucionais. 1ª Edição.
2ª Tiragem. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 90.
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Vale registrar que essa disposição legal, de grande valia, não foi alterada pelas
Leis n. 11638, de 28.12.2007 e 11941, de 27.5.2009, ou pela Medida Provisória n. 627, de
11.11.2013. As referidas leis e medida provisória trataram dos efeitos da nova contabilidade
em matéria tributária, tendo inclusive alterado diversos dispositivos do Decreto-lei n. 1598 e
mantiveram incólume o referido art. 9º.
Mais do que isso, como será exposto mais adiante, as referidas leis
estabeleceram como regra geral a neutralidade dos novos padrões contábeis para fins
fiscais. Ora, se a legislação consagra a neutralidade como regra, não há que se falar em
efeitos antielisivos.
Logo, por ausência de norma que atribua esse tipo de efeito à contabilidade,
ela não pode servir como norma antielisão. Entender o contrário seria violar o princípio
basilar da legalidade, estatuído no art. 5º, inciso II, e 150, inciso I, da Constituição Federal e
nos art. 3º, 97, dentre outros, do Código Tributário Nacional.
Ainda sob a ótica formal, uma lei ordinária, como são as citadas neste trabalho,
não teria o condão de introduzir uma norma antielisão, eis que essa é uma matéria reservada
a lei complementar, nos termos do art. 146, inciso III, da Constituição Federal.
16
“Art. 9º - A determinação do lucro real pelo contribuinte está sujeita a verificação pela autoridade
tributária, com base no exame de livros e documentos da sua escrituração, na escrituração de outros
contribuintes, em informação ou esclarecimentos do contribuinte ou de terceiros, ou em qualquer outro
elemento de prova. § 1º - A escrituração mantida com observância das disposições legais faz prova a
favor do contribuinte dos fatos nela registrados e comprovados por documentos hábeis, segundo sua
natureza, ou assim definidos em preceitos legais. § 2º - Cabe à autoridade administrativa a prova da
inveracidade dos fatos registrados com observância do disposto no § 1º (...)”.
17
”Art. 116. Salvo disposição de lei em contrário, considera-se ocorrido o fato gerador e existentes os
seus efeitos: (...) Parágrafo único. A autoridade administrativa poderá desconsiderar atos ou
negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador do tributo ou
a natureza dos elementos constitutivos da obrigação tributária, observados os procedimentos a serem
estabelecidos em lei ordinária.”
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Tanto que introduzido no ordenamento jurídico pela Lei Complementar n. 104, de 10.1.2001.
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Seria muito imaginar que as leis que trataram dos novos padrões contábeis e
respectivos efeitos na órbita do IRPJ, CSL, PIS e COFINS, poderiam ser interpretadas como
as leis necessárias à regulamentação do art. 116, parágrafo único, do Código Tributário
Nacional.
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OLIVERIA, Ricardo Mariz de, FAJERSZTAJN, Bruno, SILVA, Fabiana Carsoni Alves Fernandes da
Silva. In Coord. MARTINS, Ives Gandra da Silva. Questões Controvertidas no Processo Administrativo
Fiscal – CARF. Pesquisas Tributárias. Nova Série 18. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2012.
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do CPC vêm sendo emitidos desde 2008 e vêm introduzindo no Brasil regras contábeis
segundo o padrão IFRS.
20
Vide OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. “A tributação da renda e sua relação com a com os princípios
contábeis geralmente aceitos”. In MOSQUEIRA, Roberto Quiroga, LOPES, Alexsandro Broedel.
Controvérsias Jurídico-Contábeis (Aproximações e Distanciamentos). São Paulo: Dialética, 2010. p.
402 e seguintes.
21
Vide a esse respeito, dentre outros, MOSQUEIRA, Roberto Quiroga, LOPES, Alexsandro Broedel.
“Direito contábil. Fundamentos conceituais. Aspectos da experiência brasileira e implicações”. In
MOSQUEIRA, Roberto Quiroga, LOPES, Alexsandro Broedel. Controvérsias Jurídico-Contábeis
(Aproximações e Distanciamentos). São Paulo: Dialética, 2010. p. 56 e seguintes.
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Sobre o subjetivismo responsável, confira-se IUDÍCIBUS, Sérgio, MARTINS, Eliseu, LOPES,
Alexsandro Broedel “Os vários enfoques da contabilidade”. In MOSQUEIRA, Roberto Quiroga,
LOPES, Alexsandro Broedel. Controvérsias Jurídico-Contábeis (Aproximações e Distanciamentos) 3º
Volume. São Paulo: Dialética, 2012. p. 350/351.
23
É grande a controvérsia a respeito da possibilidade de se manter a isenção de imposto de renda
sobre dividendos pagos com base em um balanço apurado segundo padrão IFRS se esse balanço
implicar um lucro maior do que aquele apurado segundo as práticas contábeis anteriores (vide
Parecer PGFN 202/2013). Há também divergência sobre o cálculo de juros sobre o capital próprio na
vigência do RTT, isto é, sobre se as contas do patrimônio líquido a serem consideradas para tais
efeitos devem ser aquelas registradas segundo os novos padrões ou não, dentre outros. Vide
comentários a respeito na resposta à questão 6.
24
17.3.2014.
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correto de neutralizar, para fins fiscais, os lançamentos contábeis que refletem a essência
econômica, na visão prospectiva e subjetiva do IFRS. Ainda no exemplo acima dado, as
operações de arrendamento mercantil foram mantidas em geral como despesas
operacionais, para fins fiscais, a despeito de seu novo tratamento contábil de ativo
imobilizado.
25
Também não se pode dizer que a visão jurídica tenha sido abandonada pela contabilidade. Como
não poderia deixar de ser, a contabilidade reflete o patrimônio a partir de direitos e obrigações, mas
em algumas situações, consideradas relevantes aos fins a que se destina, ela dá maior ênfase à
essência econômica, como no caso das operações de arrendamento mercantil.
26
Confira-se sobre o assunto OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. A tributação da renda e a sua relação com
os princípios contábeis geralmente aceitos. In MOSQUEIRA, Roberto Quiroga, LOPES, Alexsandro
Broedel. Controvérsias Jurídico-Contábeis (Aproximações e Distanciamentos). São Paulo: Dialética,
2010. p. 398.
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essência econômica, eis que os riscos e benefícios estão com ela, em detrimento da
substância jurídica do negócio, que não contempla transmissão da propriedade até a opção
de compra.
Pois bem. Não se deve perder de vista que as leis que regularam os efeitos
tributários dos novos padrões contábeis estabeleceram a sua neutralidade como regra
geral 27. Se é assim, não há como se conceber a hipótese de a nova contabilidade possuir
efeitos de uma norma antielisão.
Mas não é só. Uma norma antielisão, para que possa atingir sua finalidade,
não deve simplesmente mostrar a essência econômica. Sem entrar no mérito de sua
validade constitucional 28, as normas gerais antielisivas tem como objetivo coibir o
planejamento tributário abusivo, preservando a arrecadação tributária. Esse tipo de norma
geralmente considera que determinados atos ou negócios, desde que atendidas algumas
condições, são inválidos para fins tributários, ou não seriam oponíveis ao fisco. A norma
antielisão requalifica o fato para fins fiscais, de modo a impedir ou reduzir as hipóteses de
elisão.
27
A neutralidade é o princípio que norteou a Lei n. 11941 ao instituir o RTT. Ainda que se possa
discutir a exata extensão dessa neutralidade, é certo que ela é a regra geral. A Medida Provisória n.
627 não propõe neutralidade, mas também procurou anular os efeitos fiscais da maior parte das novas
regras contábeis que registram fatos segundo a primazia da essência econômica e que refletem
efeitos prospectivos.
28
Mas é necessário registrar que uma norma que impeça a busca da economia fiscal pelo contribuinte
não teria suporte na Constituição Federal.
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à gerência, ao público e ao fisco. 29 Em outras palavras, a contabilidade não cria fatos, muito
menos direitos, devendo simplesmente refletir fielmente a realidade fenomênica, o que não é
suficiente para uma norma antielisão 30.
Pode até mesmo ocorrer de a contabilidade registrar os fatos de tal forma que
seja mais vantajosa ao contribuinte do ponto de vista fiscal. Veja-se questão do ajuste a valor
presente, tratada no art. 183, inciso VIII, que implica o reconhecimento como receita
financeira de parte do preço de venda a prazo de uma determinada mercadoria.
Considerando-se que as receitas financeiras estão atualmente sujeitas à alíquota zero das
contribuições ao PIS e COFINS devidas no regime não cumulativo, a utilização do AVP para
fins tributários reduziria a tributação. Como admitir efeitos antielisivos nesse caso?
Por fim, uma possível serventia que a contabilidade poderia trazer no âmbito
da tributação seria se houvesse previsão da chamada interpretação econômica, já
empregada em outras jurisdições, e que chegou a constar do projeto de lei que culminou na
edição do Código Tributário Nacional, em 1966 31, mas que foi rechaçada justamente por
29
Para ilustração, confira-se, por exemplo, o acórdão n. 103-10391, de 22.5.1990, da 3ª Câmara do 1º
Conselho de Contribuintes do Ministério da Fazenda, no qual se lê: “A circunstância inclusive de a
contabilidade da empresa não ter sido fiel e/ou imprecisa quanto aos fatos não é acontecimento
irreparável.... De regra, consoante é princípio geral, a contabilidade não cria nem modifica direitos,
apenas deve registrar os fatos... Mas a contabilidade, nem por isso, criou, extinguiu ou modificou
qualquer direito que antes não tivesse previsto, nem poderia, e mesmo que o tivesse, isso seria
absolutamente sem efeito, por não ser da sua natureza, esse qualificativo constitutivo, modificativo ou
extintivo de direitos” (inteiro teor em meu arquivo, p. 31 e 35; o grifo é do original). Mencione-se
também o acórdão n. 103-10472, de 21.6.1990, em cuja ementa consta que “a circunstância da
contabilidade registrar determinada rubrica como de empréstimo, por si só não tem o condão de
transformar a natureza das coisas, até porque a contabilidade apenas registra fatos, não lhe sendo
próprio a força de criar, extinguir ou modificar direitos” (DOU-I de 15.10.1990, p. 19574; grifos nossos).
30
O papel da contabilidade foi corretamente identificado pela Ministra Rosa Weber, em voto proferido
no julgamento do Recurso Extraordinário n. 606107-RS, de 22.5.2013 pelo Pleno do Supremo
Tribunal Federal, conforme mencionado na questão anterior.
31
O art. 74 do projeto dizia: “Art. 74 - A interpretação da legislação tributária visará sua aplicação não
só aos atos, fatos ou situações jurídicas nela nominalmente referidos, como também àqueles que
produzam ou sejam suscetíveis de produzir resultados equivalentes.”
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Ainda assim houve quem tivesse pretendido propagar a interpretação econômica no sistema
brasileiro, mas a jurisprudência não acolheu a ideia. Basta citar Supremo Tribunal Federal, Pleno,
recursos extraordinários n. 94580-6-RS, julgado em 30.8.1984, e 116121-3-SP, decidido em
4.10.2000.
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Não obstante, por esta ou por aquela razão, a lide no Supremo Tribunal
descambou para a discussão sobre a constitucionalidade também da disposição que foi
inserida no art. 43 do CTN pela Lei Complementar n. 104, de 10.1.2001, a despeito de que a
finalização do julgamento tenha se concentrado no art. 74.
Além disso, seis ministros da corte atual não votaram, um por se declarar
impedido e cinco porque substituíram aqueles que já se retiraram. Realmente, da atual
composição do Supremo Tribunal apenas quatro ministros votaram e, curialmente, três pela
inconstitucionalidade do art. 74 e apenas um pela inconstitucionalidade parcial. Nada menos
do que seis ministros na data de encerramento e sete atualmente, não participaram da
votação. 33
Não à toa, pois, como resultante de tudo, o que se verificou foi uma junção de
votos sem qualquer coerência dialética, com o que a Suprema Corte desenvencilhou-se de
mais um processo, como se pode ver dos debates finais, em que os ministros buscaram
“entender” qual deveria ser o resultado.
33
Em síntese, da atual composição não votaram Gilmar Mendes, Teori Zavascki, Rosa Weber, Luiz
Fux, Dias Toffoli, Cármen Lúcia e Roberto Barroso; Celso de Mello, Marco Aurélio e Ricardo
Lewandowski votaram pela inconstitucionalidade total; apenas Joaquim Barbosa votou como resultou
a decisão.
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Não à toa, também, que o veredicto final padeça dos vícios da insuficiência e
da contrariedade com volumosa doutrina predominante sobre o específico tema, além da
falta de coerência, que desaguam na continuidade da insegurança jurídica e dos conflitos de
interpretação.
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Quanto aos dois primeiros itens da ementa, seria possível dizer que o acórdão
admite a aplicabilidade do art. 74 apenas às controladas em países com tributação
favorecida ou paraísos fiscais, pois, não fosse assim, o item 2 não teria sido restritivo a
essas jurisdições, bastando ter falado em controladas. Fosse esta a intelecção da decisão,
controladas fora dessas jurisdições não poderiam ser submetidas ao art. 74.
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Claro que tal posição do fisco depende de futuros julgamentos dos itens sobre
os quais ainda não houve qualquer decisão, que são aqueles dados pela constitucionalidade
sem efeito vinculante “erga omnes”.
Como a indagação não pede a apreciação do que foi decidido, mas, sim, da
congruência da decisão com o regime de tributação em bases universais, fica-se
dispensado, para este fim, de adentrar em outras falhas que se verificam na leitura do
acórdão e dos seus votos, a despeito de que, para responder outras questões, estejamos
adentrando nos fundamentos jurídicos que devem (ou deveriam) ser considerados para a
apreciação da (in)constitucionalidade da indigitada norma.
Por outro lado, a decisão não se coaduna com o Sistema Tributário Nacional,
mas não é oportuno, nesta resposta, renovar a demonstração de todos os fundamentos que
levaram a doutrina a esmagadoramente afirmar a contrariedade do art. 74 com esse conjunto
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Seja como for, estas são breves observações válidas num encontro científico
de juristas, mas inócuas para solucionar a insegura realidade em que vivemos, na qual o
Supremo deu sua palavra parcial mas final, pelo menos até a mudança da sua atual
composição, ou mesmo até que a sua atual composição tenha a oportunidade de votar por
inteiro sobre o assunto, ainda que tolhida pela força do efeito vinculante, que precisaria ser
substituído numa outra ação apta para tanto.
Quanto à Medida Provisória n. 627, tal como editada 34, não se pode dizer que
as diretrizes adotadas no seu capítulo intitulado “Da Tributação em Bases Universais”
estejam de acordo com a decisão da Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 2588-DF.
34
Não se considera aqui as possíveis alterações feitas durante a sua tramitação pelo Congresso
Nacional, porque este texto foi entregue ao editor antes da sua possível conversão em lei, ou da
promulgação da respectiva lei de conversão.
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que está estatuído na nova medida provisória, sinalizando-se, portanto, a continuidade das
lides fiscais.
35
OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. “Princípios Fundamentais do Imposto de Renda”. In: Direito Tributário
– Estudos em Homenagem a Brandão Machado. Coord. Luís Eduardo Schoueri e Fernando Zilveti.
São Paulo: Dialética, 1998, p. 214.
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ESTRUTURA SOCIETÁRIA
BR
Brasil
Exterior
A B C
B1 B2
36
OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. Fundamentos do Imposto de Renda. São Paulo: Quartier Latin, 2008,
p. 215.
37
QUEIROZ, Mary Elbe. Imposto sobre a Renda e Proventos de Qualquer Natureza. Barueri: Manole,
2004, pp. 36-37
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É justamente por isso que Alberto Xavier 38, Heleno Torres 39, João Francisco
Bianco 40, Luís Eduardo Schoueri 41 e Marco Aurélio Greco 42 têm defendido a
38
XAVIER, Alberto. Direito Tributário Internacional do Brasil. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 427.
39
TÔRRES, Heleno Taveira. “Compensação de prejuízos de controladas e coligadas no exterior. In:
Estudos Avançados de Direito Tributário. Estudos Avançados de Direito Tributário – Tributação
Internacional: normas antielisivas e operações internacionais. Coord. Clovis Panzarini Filho; Daniel
Vitor Bellan, Fernando Tonanni et all. Rio de Janeiro: Elsevier, 2012, pp. 107-128.
40
Particularmente, Bianco considera que o direito à compensação de prejuízos depende de norma
legal expressa que o preveja, mas não deixa de registrar sua opinião no sentido de que a vedação
contida no parágrafo 5º do artigo 25 da Lei n. 9249/1995 é “inadequada, incoerente, inconsistente e
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contrária ao que é praticado nos países desenvolvidos” (BIANCO, João Francisco. “O Regime de
Compensação de Prejuízos e Perdas Sofridas no Exterior”. In: Grandes Questões Atuais do Direito
Tributário. 6º Volume. Coord. Valdir de Oliveira Rocha. São Paulo: Dialética, 2002, pp. 209-224).
41
SCHOUERI, Luís Eduardo. “Princípios no Direito Tributário Internacional: Territorialidade, Fonte e
Universalidade”. In: Princípios e Limites da Tributação. Coord. Roberto Ferraz. São Paulo: Quartier
Latin, 2005, pp. 373-374.
42
GRECO, Marco Aurélio. “Globalização e Tributação da Renda Mundial”. In: Revista Fórum de
Direito Tributário n. 2. Belo Horizonte: Fórum, 2003, pp. 86-90.
43
OLIVEIRA, Ricardo Mariz. “A Disponibilidade Econômica ou Jurídica de Rendas e Proventos
Auferidos no Exterior”. Revista Fórum de Direito Tributário n. 4. Belo Horizonte: Fórum, 2003, p. 27.
44
SCHOUERI, Luís Eduardo. “Princípios no Direito Tributário Internacional: Territorialidade, Fonte e
Universalidade”. In: Princípios e Limites da Tributação. Coord. Roberto Ferraz. São Paulo: Quartier
Latin, 2005, p. 374.
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a obriga a suportar os respectivos prejuízos 45. Além disso, o MEP não deve ser utilizado
sequer para mensurar o resultado do exterior a ser submetido à tributação no país. Isso
porque esse método não reflete apenas os lucros e os prejuízos das pessoas jurídicas
controladas ou coligadas no exterior, mas também mutações patrimoniais distintas (v.g.
transferências registradas em reservas de capital e variações cambiais do investimento) 46.
- violação ao art. 153, inciso III, bem como ao art. 195, inciso I, alínea “c”,
ambos da Constituição Federal, em virtude da exigência do IRPJ e da CSL sobre acréscimo
patrimonial não disponível para a pessoa jurídica no Brasil;
45
OLIVEIRA, Ricardo Mariz. “A Disponibilidade Econômica ou Jurídica de Rendas e Proventos
Auferidos no Exterior”. Revista Fórum de Direito Tributário n. 4. Belo Horizonte: Fórum, 2003, pp. 19-
23.
46
Como exemplo, a 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), no Recurso Especial n.
1.211.882-RJ, de 14.04.2011, considerou que a legislação tributária somente autoriza a tributação do
lucro auferido por controladas e coligadas no exterior, na proporção da participação da pessoa jurídica
brasileira no capital social da investida. Em consequência, a Corte considerou que é ilegal a utilização
do MEP para a tributação de valores que superam o lucro efetivamente auferido pela sociedade
investida no exterior.
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Com base nas considerações acima, percebe-se que a lei tributária não pode
determinar a adição dos lucros das controladas indiretas ao lucro real e à base de cálculo da
CSL da pessoa jurídica brasileira. Vale dizer, a pessoa jurídica brasileira não pode ser
obrigada a reconhecer diretamente a sua participação nos lucros da controlada indireta,
tampouco pode ser compelida a aplicar o método da equivalência patrimonial para
reconhecer a sua participação sobre as contas do patrimônio líquido das controladas
indiretas. A rigor, o MEP não pode ser considerado como índice para a tributação dos lucros
auferidos pelas controladas diretas no exterior, pois o seu reflexo no patrimônio da empresa
investidora no Brasil não representa acréscimo patrimonial efetivo e disponível. No caso de
controladas indiretas, a impossibilidade de tributação dos lucros apurados no seu balanço
fica ainda mais evidente, pois não há sequer ajuste contábil via equivalência patrimonial para
refletir os lucros apurados no balanço da sociedade estrangeira.
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ordenamento jurídico 47. Daí a afirmação de que o exercício do poder de tributar por parte do
Estado brasileiro pressupõe a existência de relação entre o fato econômico e o seu
ordenamento jurídico (como exemplo, o vínculo de residência fiscal serve como elemento de
conexão para a tributação, no Brasil, da renda auferida no exterior). Note-se que a exigência
de elemento de conexão diz respeito ao próprio alcance abstrato da norma tributária
(“jurisdiction to prescribe”), independentemente da questão relativa à eficácia da sua
execução administrativa (“jurisdiction to enforce”).
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Não há dúvida de que o Estado brasileiro pode tributar os seus residentes por
fatos econômicos praticados no exterior. O ponto é que o lucro da controlada indireta não
pode ser considerado um fato econômico atribuído à pessoa jurídica brasileira. Aliás, se a
simples constatação de que o contribuinte é a pessoa jurídica brasileira fosse suficiente para
justificar a tributação, então seria forçoso reconhecer que a lei tributária brasileira poderia
determinar a inclusão, no lucro real e na base de cálculo da CSL, dos lucros auferidos por
quaisquer sociedades constituídas em outros Estados soberanos, mesmo sem domicílio ou
51
Para uma análise detida do princípio da territorialidade, conferir: SCHOUERI, Luís Eduardo.
“Princípios no Direito Tributário Internacional: Territorialidade, Fonte e Universalidade”. Princípios e
Limites da Tributação. Coord. Roberto Ferraz. São Paulo: Quartier Latin, 2005, pp. 323-374.
52
AVI-YONAH, Reuven. International Tax as International Law - An Analysis of the International Tax
Regime. New York: Cambridge. University Press, 2007, p. 5; 22-37.
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atividade econômica no país (nesta visão, a lei poderia determinar, por exemplo, que a
empresa brasileira adicionasse à base de cálculo do IRPJ e da CSL os lucros auferidos por
um distribuidor no exterior, sem que essa forma de tributação ferisse a territorialidade
material). Ora, não há dúvida de que não é a sociedade controlada indireta no exterior quem
suporta a carga do tributo. Afinal, o imposto é cobrado da pessoa jurídica controladora
sediada no Brasil. Ocorre que os lucros auferidos por empresas estrangeiras, enquanto não
distribuídos, estão fora do alcance da jurisdição brasileira, em razão da ausência de
elemento de conexão, motivo pelo qual não se pode determinar a sua adição aos resultados
da controladora no país. A mera circunstância de a sociedade estrangeira ser controlada por
uma sociedade controlada direta não é elemento de conexão com território nacional, para
efeito de legitimar o exercício da soberania fiscal do Estado brasileiro.
Ousamos discordar da intepretação acima, pois não há base legal para que os
lucros das controladas indiretas sejam adicionados diretamente (“per saltum”) ao lucro real
e à base de cálculo da CSL da pessoa jurídica brasileira. Como visto, a pessoa jurídica
brasileira não está obrigada a reconhecer diretamente a sua participação nos lucros da
controlada indireta, tampouco autorizada a aplicar o MEP para reconhecer a sua participação
sobre as contas do patrimônio líquido das controladas indiretas.
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Tais conceitos, extraídos a partir dos citados dispositivos, são aplicáveis tanto
a pessoas jurídicas como para pessoas físicas, eis que referidos comandos não
contemplaram qualquer distinção que justifique tratamento diferenciado. E faz sentido que
assim seja, eis que os conceitos de renda e a aquisição de sua disponibilidade estão
umbilicalmente ligados com o conceito de patrimônio, que é aplicável igualmente a pessoas
físicas ou jurídicas.
Pois bem. No âmbito das pessoas jurídicas, essa matéria vem sendo discutida
desde 2001, quando o art. 74 da Medida Provisória n. 2158, de 24.8.2001 estabeleceu o que
se convencionou chamar de “disponibilização ficta” de lucros auferidos por intermédio de
investimentos detidos no exterior.
Por aquelas mesmas razões, não está de acordo com a Constituição Federal a
determinação de tributação no sócio pessoa física dos lucros decorrentes de participações
em sociedades controladas domiciliadas no exterior na data do balanço no qual tais lucros
tiverem sido apurados. Isto em virtude do conceito de renda e de sua disponibilidade
aplicável, como dito, tanto às pessoas físicas como às jurídicas.
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De qualquer modo, na quadra atual, o mínimo que se pode dizer com alguma
segurança é que os investimentos detidos por pessoas físicas, sem controle e fora de
paraísos fiscais, não podem ser tributados antes de sua efetiva disponibilização.
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Se, por um lado, a regra do art. 71 é opcional, de outro, é certo que algumas
normas da Medida Provisória dispondo sobre a não incidência tributária em determinadas
situações, além daquelas disciplinas nos art. 1º a 66, abrangidos pela opção, só têm
aplicação aos sujeitos passivos que efetivamente adotarem antecipadamente o novo regime
fiscal.
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Pode-se dizer que a norma dos arts. 67 e 68 foi editada com o mister de
espancar controvérisas sobre a aplicação da norma de isenção atinente aos lucros e
dividendos (art. 10 da Lei n. 9249, de 26.12.1995) e também sobre a forma de cálculo dos
juros sobre o capital próprio (art. 9º da Lei n. 9249), surgidas em função das modificações
inseridas na lei societária pelas Leis n. 11638 e 11941. Isto porque, com as alterações dos
critérios e padrões contábeis, discutia-se se a isenção abarcava os lucros e dividendos
calculados com base no novo resultado societário, ou naquele que seria apurado caso as
regras contábeis em vigor em 31.12.2007 ainda produzissem efeitos. Também havia dúvidas
sobre a forma de cálculo dos juros sobre o capital próprio, mais precisamente se o
patrimônio líquido, que é referência de sua apuração, deveria ser mensurado pelas novas
regras e padrões contábeis, ou pelas regras existentes antes das alterações implementadas
pelas Leis n. 11638 e 11941 na Lei n. 6404.
55
A Procuradoria da Fazenda Nacional, em relação aos lucros e dividendos, também se posicionou de
igual maneira, conforme pode ser colhido pela leitura do Parecer PGFN/CAT n. 202/2013.
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56
Para outras considerações sobre o tema, vide: SANTOS, RAMON TOMAZELA. “A avaliação de
investimentos pelo método da equivalência patrimonial e os impactos tributários das novas regras
contábeis”, Revista Tributária e de Finanças Públicas, Ano 21, vol. 112, set-out. 2013, p. 269/293.
57
A despeito de não ser ponto pacífico na doutrina, a nosso ver, as limitações ao poder de tributar
constituem verdadeiros princípios, conforme acenou Ricardo Mariz de Oliveira, ao afirmar que: “as
limitações ao poder de tributar são prescrições decorrentes de superiores princípios adotados pelo
constituinte, sendo expressos em forma negativa, enquanto que outros princípios contêm valores de
igual estrutura, sendo todavia expressos em forma afirmativa. Ou, por outras palavras, tanto os
princípios quanto as limitações exprimem e espelham valores fundamentais prestigiados na
Constituição Federal, e tão somente a sua maneira de expressão é diversa”. (“Fundamentos do
Imposto de Renda”, São Paulo: Quartier Latin, 2008, p. 244).
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Lembre-se de que o art. 60, parágrafo 4º, inciso IV, da Constituição Federal não autoriza seja objeto
de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir direito ou garantia fundamental.
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“caput”, da Constituição Federal), pode deixar de exercê-los, se assim lhe convier 59, e desde
que sua manifestação de vontade seja expressa 60, voluntária e legítima, não sofrendo
influência de coerção ou coação de qualquer ordem.
59
Essa frase não pode ser tomada em caráter absoluto, eis que alguns direitos fundamentais, na
medida em que podem abalar o Estado Democrático de Direito e a dignidade do homem, devem, sim,
ser exercidos, sob pena de comprometimento à sociedade e à liberdade dos demais indivíduos. É o
caso, por exemplo, dos direitos que resguardam a vida do ser humano. Como explica Humberto Ávila,
distinguindo os direitos fundamentais em individuais e coletivos (ou comunitários), “Quando se
tratarem, portanto, de direitos fundamentais marcadamente individuais, o cidadão pode abdicar do
exercício de determinados elementos concretos desses direitos. (...) Quando, no entanto, se estiver
diante de direitos fundamentais acentuadamente coletivos, porquanto vinculados a elementos
estruturais do Estado de Direito, a disponibilidade total do indivíduo desaparece, não podendo ele nem
renunciar ao direito como tal, nem mesmo abrir mão de elementos concretos do seu exercício, nos
casos em que os princípios estruturantes do Estado de Direito forem atingidos, quer pela intensidade
dos efeito provocado, quer pela plausibilidade de que a falta do seu exercício venha a comprometer a
própria eficácia do sistema de direitos fundamentais” (“Confissão cria tributo? Apontamentos sobre a
disponibilidade do contribuinte sobre direitos fundamentais”, in “Grandes questões atuais do direito
tributário”, 12º volume, São Paulo: Dialética, 2008, p. 259/260). Não nos parece, no caso ora
examinado, tratar-se de direito fundamental cujo não exercício possa abalar o Estado Democrático de
Direito ou que possa criar distúrbio no seio da comunidade. Daí afirmar-se que é possível ao
contribuinte deixar de exercê-lo.
60
Sobre a impossibilidade de renúncia tácita, vide MASAGÃO, “A presunção de renúncia tácita pelo
pagamento de JCP acumulados - análise da hipótese à luz do Código Civil”, Revista Dialética de
Direito Tributário n. 222, 2014, p. 49.
61
“Direito Constitucional”, Coimbra: Almedina, 5ª edição, 1991, p. 636.
62
Gilmar Ferreira Mendes, Inocêncio Mártires Coelho e Paulo Gustavo Gonet Branco consentem que
o art. 62, parágrafo 2º, da Constituição Federal consolida outro princípio da anterioridade, ao
afirmarem que ele: “Estabeleceu que, para fins do atendimento do princípio da anterioridade, deve ser
considerada a data da conversão em lei da medida provisória” (“Curso de Direito Constitucional”,
Editora Saraiva, São Paulo, 2007, pg. 843). Trata-se, como se pode ver, de outra limitação
constitucional ao poder de tributar, que convive ao lado das demais limitações contidas no art. 150 da
Constituição Federal.
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Ora, em que pese o art. 71, no plano teórico, atenda à premissa geral de que
os direitos e garantias fundamentais, em geral, podem deixar de ser exercidos pelo
contribuinte à sua livre escolha, é possível que o não exercício destes direitos e garantias e,
pois, a adoção antecipada do novo regime de tributação não se dê mediante manifestação
de vontade livre e por um fim nobre, justo ou legítimo. É que a opção pela antecipação do
novo regime fiscal, em muitos casos, dar-se-á por coerção criada pela própria Medida
Provisória n. 627 em seu art. 70, quando condiciona a não incidência tributária à opção.
Nesse contexto, a opção pela aplicação das novas normas tributárias em 2014,
e não em 2015 e, pois, pela abdicação do exercício do direito ou garantia fundamental do art.
62, parágrafo 2º, da Constituição Federal (princípio da anterioridade), conquanto seja
possível no plano teórico, somente será válida se a manifestação de vontade do sujeito
passivo for legítima, é dizer, se não estiver eivada de vício de qualquer ordem.
63
“Curso de Direito Civil”, Parte Geral, 1º volume, São Paulo: Saraiva, 37ª edição, 2000, p. 194.
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num caso concreto (uma renúncia geral de exercício é inadmissível) deve considerar-se
sempre sob reserva de revogação a todo tempo; (f) uma solução diferenciada exige ainda
que se tome em atenção o direito fundamental concreto e o fim da renúncia” 64.
64
Op. cit., p. 636.
65
Op. cit., p. 233-234.
66
Não obstante essa autolimitação seja, em tese, possível, é questionável a cláusula de
irretratabilidade contida no art. 71, na medida em que, como ensina J. J. Gomes Canotilho, o não
exercício de um direito ou garantia fundamental deve, em qualquer caso, estar sujeito a revogação a
qualquer tempo. Se esta cláusula de irretratabilidade, a todo rigor, não é bastante para macular a
regra do art. 71 em sua totalidade, no mínimo é possível entrever inconstitucionalidade parcial no art.
71.
67
Isso é assim, na medida em que a pessoa jurídica, nessa situação, atua como responsável tributária
pela retenção e recolhimento do imposto de renda. Nestes casos, quando a incidência na fonte tiver a
natureza de antecipação do imposto a ser apurado pelo contribuinte, a responsabilidade da pessoa
jurídica pela retenção e recolhimento do imposto extinguir-se-á, no caso de pessoa física, no prazo
fixado para a entrega da declaração de ajuste anual, e, no caso de pessoa jurídica, na data prevista
para o encerramento do período de apuração em que o rendimento for tributado, seja trimestral,
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ou acionistas que receberam lucros, dividendos ou juros sobre o capital próprio, e que são os
contribuintes dos tributos incidentes sobre estas grandezas, não há dúvida de que, a
prevalecerem as regras da Medida Provisória n. 627, muitas pessoas jurídicas adotarão
antecipadamente o novo regime fiscal apenas com o objetivo de evitar que elas e também os
seus sócios ou acionistas venham a ser autuados, o que torna a norma do art. 70 ainda mais
nociva e desarrazoada 68.
Daí a invalidade da norma do art. 70, que de maneira alguma poderia compelir
o sujeito passivo à adoção antecipada do novo regime de tributação unicamente para que ele
ou terceiros escapem à incidência tributária sobre determinados eventos ocorridos no
passado 69.
mensal estimado ou anual, embora a fonte pagadora, nesses casos, fique sujeita à cobrança de multa
e juros. Se a hipótese for de retenção exclusiva na fonte, como ocorre, por exemplo, nos casos do art.
9º, parágrafo 3º, inciso II, da Lei n. 9249, a responsabilidade da fonte subsistirá, mesmo que ela não
tenha retido o imposto. Essas orientações podem se colhidas no Parecer Normativo COSIT n. 1, de
24.9.2002.
68
O art. 70 é ainda mais nocivo e desarrazoado se se pensar que muitos beneficiários, ou não terão
conhecimento se a pessoa jurídica que lhes distribuiu lucros, dividendos ou juros sobre o capital
próprio fez, ou não, a opção de que trata o art. 71, ou, se o souberem, não terão condições de
oferecer à tributação, (se este for o caso, inclusive se a hipótese não for a de retenção exclusiva na
fonte) a quantia recebida em montante superior ao que lhes seria pago caso ainda vigorassem as
normas contábeis de 31.12.2007, o que não poderão fazer por absoluta falta de conhecimento desta
quantia.
69
Como explica Humberto Ávila, “Quanto mais vulnerável estiver o cidadão, e quanto mais depender
da relação, mais cautela se deve ter com relação a efetiva voluntariedade da manifestação de
vontade” (Op. cit., p. 262). É justamente o que parece acontecer com os sujeitos passivos que fizerem
a opção pela adoção antecipada do novo regime de tributação em decorrência do conteúdo da norma
do art. 70 da Medida Provisória n. 627.
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sobre o capital próprio pagos no passado, não obstante esta incidência tributária seja
altamente duvidosa.
Justamente por isso é que a lei nova, como regra, vale somente para o futuro,
isto é, tem efeitos prospectivos, de modo que haja segurança jurídica, mediante a
preservação do ato jurídico perfeito, do direito adquirido e da coisa julgada (princípio da
irretroatividade, previsto no art. 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal).
A esse respeito, o Superior Tribunal de Justiça, por sua Corte Especial, não
tardou em decretar a inconstitucionalidade do art. 4º, segunda parte, da Lei Complementar
n. 118, de 9.2.2005, que declarou a natureza interpretativa do art. 3º desta mesma lei, o
qual, modificando a jurisprudência iterativa daquele Tribunal no sentido de que o prazo
para a restituição de tributos sujeitos a lançamento por homologação é de dez anos, dispôs
que tal prazo é de 5 anos (Argüição de Inconstitucionalidade nos Embargos de Divergência
em Recurso Especial n. 644736-PE). Na ocasião, o Ministro Relator, Teori Albino Zavascki,
com acuidade, destacou, a propósito das leis interpretativas, que:
70
Também se pode dizer que a lei interpretativa é rara, ou excepcional, porque decorrente do que se
chama de “interpretação autêntica”, que é aquela realizada pelos órgãos legislativos, de forma
anômala, porque alheia à sua função típica, que é editar leis, e não interpretá-las, esta, sim, tarefa
típica do Poder Judiciário, ou oriunda de sua atividade típica de zelar pelo cumprimento da lei. Daí que
as leis interpretativas, ainda que desta forma se declarem, só podem ser editadas excepcionalmente,
sob pena de ofensa à tripartição dos Poderes (art. 2º da Constituição Federal), sem prejuízo de outras
inconstitucionalidades.
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Nesses termos, e para arrematar, a nosso ver, no plano teórico, o art. 71 não
padece de nenhum vício 71, dada a possibilidade de o contribuinte abdicar do exercício de um
direito ou garantia fundamental, como se dá em relação ao princípio da anterioridade. No
entanto, o não exercício de um direito ou garantia fundamental deve ocorrer de forma livre,
espontânea, sem influência de coerção de qualquer espécie, de vez que a regularidade do
ato volitivo é inerente e indispensável à validade da opção pela aplicação antecipada do
novo regime de tributação.
71
Exceção feita à cláusula de irretratabilidade, conforme explicado em nota anterior.
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