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Considerações acerca do contexto ambiental dos sítios arqueológicos do alto rio Uruguai: Projeto Salvamento Arqueológico
Uruguai UHE-Itá.
R. Museu Arq. Etn., São Paulo, n. 21, p. 153-166, 2011.
registrou 201 sítios.3 Neste artigo, selecionamos a última etapa de campo ocorreu em janeiro e
apenas aqueles registrados nas cotas de desvio fevereiro de 1996 e, nesse período, os 167 sítios
do rio Uruguai e de enchimento do reservató- foram reavaliados, constatando-se o estado
rio, totalizando 167 assentamentos. De acordo generalizado de destruição dessas unidades
com os relatórios4 disponíveis, estimamos que ocupacionais (Goulart 1997a: 99). Os estudos
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Fig. 2. A partir do rio Uruguai (parte inferior da foto), ocorre a sequência do 2º terraço (seta 1),
encosta inferior (seta 2), meia encosta (seta 3), encosta superior (seta 4), platô (seta 5) e cume (seta
6). Não é observado, no local, o 1º terraço. Fonte: Goulart (1997b).
tram 93,41% dos assentamentos localizados. de sítios localizados. As únicas feições nas quais
Já as áreas de encosta superior, platô e feição não foram encontrados assentamentos são o
indefinida apresentam apenas 6,59% do total primeiro terraço e o cume.
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Fig. 3. (1) Nova Itá; (2) Itá Velha; (3) topos convexos a aplanados; (4) platôs bem desenvolvidos e alongados; (5)
encosta inferior; (6) meia encosta; (7) encosta superior.
Fonte: Goulart (1997a).
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Fig. 4. Implantação dos sítios 287 e 288, junto aos rios Uruguai, do Peixe e afluente de 3ª ordem.
Fonte: Goulart (1997a).
Outro dado obtido foi a distância dos sítios de 300 a 390 metros, estão quatro sítios, que
em relação às drenagens mais próximas. Confor- somam 2,4%; entre 400 e 490m, apenas 1 sítio,
me Goulart (1997b: 48), a distância foi medida que correspondem a 0,6%. Nota-se, a partir dos
em metros, a partir do centro do sítio, conside- 167 assentamentos, que a distância do manan-
rando a distância obtida da parte central da área cial mais próximo até o sítio varia de 10 e mais
de distribuição do material até a drenagem mais de 490 metros, predominando a de 10 a 190
próxima. O Gráfico 3 apresenta as distâncias metros, com 92,20% dos sítios analisados.
entre as drenagens e os 167 assentamentos: na Os dados relacionados à ordenação e à
distância de 10 a 90 metros, ocorre a grande distância das drenagens também devem ser ana-
maioria com 114 sítios, perfazendo 68,25%; lisados com precaução, uma vez que se funda-
entre 100 e 190 metros, estão quarenta sítios, mentam nas características atuais das drenagens,
correspondendo a 23,95%; entre 200 e 290 que podem ter sofrido profundas alterações em
metros ocorrem oito sítios, representando 4,8%; relação ao período de ocupação por parte das
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As principais fontes de
matérias-primas, como as rochas
e os argilominerais, utilizadas
para a fabricação dos artefatos
líticos e cerâmicos, respectiva-
mente, são encontradas, segun-
do Goulart:
Amplamente expostos em
afloramentos próximos aos sí-
tios, em ocorrências rochosas
ou ao longo das cascalheiras
das praias do rio Uruguai,
assim como nos depósitos de
materiais areno-síltico-argilo-
sos encontrados ao longo das
planícies de inundação das
principais drenagens, gerados
pela deposição das corren-
tezas durante as épocas de
cheias (Goulart 1997b: 48).
Quanto aos afloramentos de
rocha localizados próximos aos
sítios (Fig. 5), Marilandi Goulart
organizou da seguinte forma: em Fig. 5. Afloramento de basalto com presença de níveis de siltito, argilito e bre-
todos os sítios nota-se que foram chas presentes entre os diferentes derrames de lavas. Fonte: Goulart (1997a).
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mos que, para os afloramentos de basalto, foram estabelecem uma série de considerações sobre a
registradas aproximadamente 456 ocorrências, pesquisa arqueológica em ambientes fluviais.
o basalto/brecha6 apareceu 233 vezes e, por fim, Na associação das cascalheiras com os sítios
as cascalheiras, com 98 ocorrências. arqueológicos, deve ser ressaltado que elas
Os afloramentos de basalto que ocorrem podem não ser contemporâneas aos sítios, uma
com mais frequência constituíram-se como vez que a dinâmica do rio poderia ser diferente
fonte de captação de recursos para a confecção da atual, principalmente em relação à vazão
de objetos líticos. Por outro lado, as cascalheiras (com reflexos na capacidade de transporte) e no
(Figs. 6 e 7) do rio Uruguai são constituídas por traçado do canal.
uma variedade de grânulos, seixos, blocos e, em Esta correlação é dificultada pela falta de
alguns casos, matacões de rochosos e minerais datações para os sítios arqueológicos e de uma
como: quartzo, ágata, calcedônia, brechas basál- abordagem paleoambiental envolvendo direta-
ticas, basaltos, entre outros; constituíram-se na mente o rio Uruguai. Nestas cascalheiras foram
grande área de captação de recursos geológicos encontrados vestígios culturais cerâmicos e líticos
para o desenvolvimento da indústria lítica das que poderiam perfeitamente estar relacionados
culturas pretéritas (Goulart 1997b: 125). com sítios arqueológicos localizados a montante.
As cascalheiras localizadas nas margens Deve-se mencionar que o vale do rio Uru-
convexas estão relacionadas com a dinâmica guai, na região, foi modelado por processos de
atual do rio Uruguai, canal com índice de geomorfogênese, além de eventos neotectônicos,
sinuosidade compatível com rios Meandrantes,7 sobre diferentes derrames de basalto sobrepostos,
mas que não apresenta as demais características com características próprias e distribuição hori-
que definem o sistema. Rubin et al. (2003) zontal, o que proporcionou um controle vertical
na obtenção das diferentes matérias-primas. Desta
forma, quase todos os sítios teriam, nas proximi-
dades, afloramentos de rochas diferentes para
(6) Brechas basálticas (ou brechas basálticas/sedimentares)
com limites irregulares surgem com frequência nas zonas de
explorar, do platô à encosta inferior (Figs. 8 e 9).
contatos interderrames, refletindo os processos atuantes no Nas áreas com declividades suaves afloram
intervalo entre as pulsações de extravasamento das lavas basál- predominantemente basaltos com diáclases hori-
ticas (Goulart 1997b: 32). Os sedimentos finos (silte e argila) zontais e basalto vesicular e amigdaloidal, onde
que envolvem os fragmentos de rochas, pela alta temperatura
dos derrames, resultaram em uma matéria-prima de excelente
a retenção da água favorece a decomposição
qualidade para o lascamento. da rocha e desenvolvimento da vegetação. Nos
(7) Rio de canal único com índice de sinuosidade (relação paredões com declividade, geralmente de 90º,
comprimento do canal/comprimento do vale) superior a 1,5, predomina basalto com diáclases verticais, onde
onde predomina o transporte de carga em suspensão. A mi-
gração lateral dos canais ocorre por meio da erosão progressiva
ocorre disjunção colunar (Leinz; Amaral 1980),
das margens côncavas e sedimentação nos leitos convexos dos ótima fonte de matéria-prima para confecção de
meandros (Riccomini et al. 2001: 209). mãos-de-pilão.
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Fig. 6. Cascalheira (seta 1) formada pelo acúmulo de material transportado pelo rio e à direita da
foto, uma feição geomorfológica correspondente ao 2º terraço (seta 2), depósito este proveniente
da encosta ou formado pela planície de inundação do rio. Fonte: Goulart (1997b).
Fig. 7. Cascalheira junto à margem erosiva (esquerda) do rio Uruguai. Fonte: Goulart (1997a).
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Considerações finais
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era descrito a partir do ponto central. Porém, as Como mencionado, a orientação do projeto
questões relacionadas com a dinâmica da área, seguiu, em parte, os procedimentos adotados por
principalmente em relação ao escoamento super- Pallestrini no Projeto Paranapanema, mas também
ficial, processos erosivos e perdas de solos, além apresenta reflexos da diversidade de profissionais
de dinâmica fluvial e paleoambiente, ficaram em que trabalharam com as variáveis ambientais,
segundo plano ou não foram abordados, fato que sem que houvesse uma continuidade na linha de
gerou uma lacuna no conhecimento relacionado abordagem, fato que teve repercussão na contextu-
ao contexto ambiental dos sítios. Deve-se mencio- alização dos sítios arqueológicos e ambiente. Por
nar também que os trabalhos de caracterização outro lado, esta diversidade colocou à disposição
do campo de visão, a partir do centro dos sítios, diferentes visões desta relação, ressaltando a neces-
refletem bem a condução da pesquisa, sempre sidade da multi e interdisciplinaridade.
alicerçada no ambiente atual. As considerações apresentadas e discutidas
Na reavaliação de alguns sítios, realizada em neste texto permitem estabelecer uma série de
1996, constatou-se que as ações antrópica e dinâ- conclusões e reflexões, seja pelo detalhamento
mica da área destruíram completamente algumas de algumas como compartimentação geomor-
manchas pretas, identificadas na meia encosta em fológica, descrição de afloramentos e distâncias
etapas de pesquisa realizadas em 1989/90 (Figs. 10 das drenagens, seja pelas lacunas e ausências de
e 11), distribuindo os vestígios culturais na encosta outras, como aspectos paleoambientais e dinâmica
inferior, fato que ilustra muito bem a necessidade superficial. Acima de tudo, permite fazer uma
de relativizar os dados ambientais atuais, mas que reflexão envolvendo procedimentos metodológicos
são indispensáveis para a compreensão dos proces- desenvolvidos entre as décadas de 1960 e 1970,
sos modeladores da paisagem e suas relações com aplicados em um projeto de pesquisa executado nas
os sítios. Esta realidade demonstra que também a duas décadas posteriores com vistoria de campo em
observação de Noelli (1996) deve ser relativizada 1996 e relatórios finais de 1997, analisados com os
quando da ausência de estruturas. conhecimentos disponíveis no final de 2010.
Fig. 10. Escavação evidenciando manchas pretas bem preservadas, frequentes nas pesquisas reali-
zadas no final da década de 1980 e início da década de 1990. Fonte: Goulart (1997a).
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Fig. 11. Área do sítio 01 que apresentava mancha preta em 1989, não identificada na reavaliação
dos sítios realizada em 1996. Ao fundo ainda verifica-se o solo levemente escuro, resquícios das
manchas pretas. Fonte: Goulart (1997a).
Abstract: In this paper we have analyzed the data regarding the environ-
mental aspects and the archaeological sites surveyed during one of the stage
from Uruguay Archaeological Rescue Project, held between the 1980’s and
1990’s. We present some reflections on the dynamics of the area and anthropic
action, and how these processes might have altered the sites until the time of
their record. We underline the importance of the relativity of the information
collected simultaneously to avoid misinterpretations.
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