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Revista Criticn de Cigneias Sociais n° 1 Junho 1978 Boaventura de Sousa Santos DA SOCIOLOGIA DA CIENCIA A POLITICA CIENTIFICA* Chegados aqui, que ligdes nos cabe tirar deste circuito para o problems da responssbilidade actual do loge filo- sofico perante uma téenica cua efcéca the denuncia 0 vasto ‘das sans significagies, solddo das suas cvidéncias, © a impotéwcia do seu poder de dialogar sum mundo onde a0 ‘acordo dos espirits se substitu a direerdo das conscitncias pela administrapdo das coisas? (Victor Matos © $4, A dimensto técnica do homem) A Constituigio Politica de 1976 estabelece as grandes linhas do projecto nacional de desenvolvimento social ¢ determina expressa- ‘mente que a politica cientifica ¢ tecnolégica deve colocar-se ao servigo desse projecto. Diz o art. 77 n.® 2: «A politica cientifica e tecno- ‘6gica tem por finalidade o fomento da investigacio fundamental e da © © presente trabalho —originalmente publicado com ligesas alteraobes no ns LIV de BIBLOS (Miscelinia de homenayem a0 Prof. Victor Matos e SA) 6.0 primeira de uma série de artigos sobre © mesmo tema publicar em mimeros subseauentes da Revista Critiea de Cifncias Socials, Tive ocisiio de discutir rmuitas das idelas aqui expandidas com os membros do grupo de Ciencias Sociais dds Faculdade de Economia de Coimbra, sobretudo com agueles que comigo leccio- nam ou leceionaram a cadeira de Introducto ts Citncias Socials: Drs. Carlos Lea castre Costa, Carlos Fortuna, Jacques Houart, Rogério Leitfo, Fernando Ruivo € José Veign Torres, Agradeso também os comentirios do Dr. Madursira Pinto. tl investigagio aplicada, com preferéncia pelos dominios que interessem a0 desenvolvimento do pais tendo em vista a progressiva libertagdo de dependéncias externas, no ambito da cooperagio e do intercimbio com todos os povost. A luta por uma tal politica cientifica deve ser a preocupaglo central de todos os cientistas portugueses interessados na realizagao do projecto de sociedade socialista consagrado na Cons- timuigio. E por se dever tratar de uma luta esclarecida, torna-se neces- sitio tomar consciéncia dos obsticulos a vencer. Alguns desses obstéculos comprometem 0 projecto nacional no seu todo, que, convém lembri-to, é o projecto de «um Estado demo- critico baseado na soberania popular, no respeito e na garantia dos direitos ¢ liberdades fundamentais ¢ no pluralismo de expressio ¢ ‘organizagio politica democraticas, que tem por objective assegurar a transigdo para o socialismo mediante a criagko de condigBes para 0 exercicio democratico do poder pelas classes trabalhadoras» (art. 2 da Constituicio). Nao é dificil descortinar os obsticulos & instaurago de um projecto de sociedade socialista no contexto de relagées internacionais ainda dominadas pelo modo de producéo capi- talista ¢, sobretudo, num pais integrado num bloco politico-militar em que a defesa da democracia € identificada com a defesa do capitalism. Outros obsticulos sto especificos do dominio cultural © cien- tifico a sua elucidacio, que constitui o tema principal deste trabalho, hhi-de resultar da andlise sociolégica da pritica cientifica internacional. ‘A sociologia critica da cigncia aqui proposta parte do principio de que a cigncia contemportinea deve ser analisada no contexto s6cio- -econémico-politico do mundo contemporineo ¢, portanto, no con- texto dialéctico do imperialism e do nacionalismo. Pode parecer estranho que se levante a questio do imperialismo ¢ do nacionalismo a propésito da ciéncia, O imperialismo envolve ‘um sistema de relagdes internacionais caracterizado pela dominacio econémica ¢ politica de paises centrais (avangados, edesenvolvidoss) sobre os paises periféricos (jatrasadost, ésubdesenvolvidos:). O nacio- nalismo, movimento politico ¢ ideolégico dos iiltimos duzentos anos, envolve a exaltacéo dos valores nacionais (contrapostos aos estran- geiros), a lealdade ao Estado-Nagio e, por vezes, a reacgo anti-impe- Tialista. A cincia parece nada ter a ver nem com um nem com outro. © conhecimento cientifico & habitado pelo mais puro espirito univer- 12 salista, a ruptura das barreiras nacionais é feita em nome de uma comu- nidade universal onde no hé dominadores nem dominados. Por isso, a ciéncia & o factor internacionalista por exceléncia do mundo contemporineo, Entre muitas outras provas, basta constatar como, por sobre lutas politicas e guerras internacionais (frias ou quentes), 0s cientistas dos varios paises so capazes de se sentar & mesa do iilogo € da cooperagio, ¢ em igualdade. Procurarei demonstrar neste trabalho que esta ideia do inter- nacionalismo universalista ¢ igualitirio da ciéncia falseia 0 modo dominante da prética cientifica, quer a nivel interno, quer a nivel internacional. Trata-se de uma ideologia que visa constituir a ciéncia em aparelho de legitimaglo das ordens interna e internacional insti- tuldas. A pritica cientifica contemporinea, isto é, a ciéncia enquanto sistema dominante de produgio, distribuigio e consumo de conhe- ‘mentos cientificos reproduz e reforga, no seu dominio especifice, a estrutura de dominago econdmica ¢ politica, quer no plano interno, quer no plano internacional. A discussio ¢ definigdo de uma politica cientifica em Portugal € tarefat urgente pois dela depende a neutralizagdo do perigo da adho- cracia que tem rondado as decisdes (¢ as indecisdes) sobre as inicia- tivas culturais ¢ cientificas tornadas politicamente vidveis no segui- mento da revolugio de 25 de Abril de 1974. Esta tarefa pressupde, no entanto, a clucidagio das dimensdes do ecompromisso social» da citncia. Essa andlise prévia, que releva da sociologia da citncia, constitui objecto do presente trabalho. A sociologia da ciéncia € uma disciplina de formagdo recente. Constitui-se na década de 40 € no seu desenvolvimento distingo duas fuses ou linhas: uma, que se inicia na década de 40 e € dominada pela obra de Robert Merton; outra, que tem infcio nos iltimos anos da década de 60 e 6 dominada pela obra de Thomas Kuhn, ainda que em meu entender a teoria de Kuhn s6 possa frutificar plenamente no seio da teoria social de Marx. No texto que se segue analisam-se sucessivamente as duas fases ou linhas. B

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