Sie sind auf Seite 1von 5

Reinaldo Azevedo

Polícia, Chicago e
caserna
Ou Bolsonaro devolve a política a seu lugar, ou não há como esse
arranjo dar certo

o

30.nov.2018 às 2h00

 EDIÇÃO IMPRESSA

 Diminuir fonte

 Aumentar fonte

Platão expulsou os poetas de sua "República"; Jair Bolsonaro, os


políticos. Vai funcionar? O presidente eleito decidiu lotear o Executivo
entre três legendas, e essa tripartição o aprisiona e o faz refém de sua
própria concepção de mundo.

Dividirão o poder o Partido da Polícia, liderado pelo


indemissível Sergio Moro; o Partido de Chicago, comandado pelo não
menos indispensável Paulo Guedes, e o Partido da Caserna, composto
pelo generalato da reserva.

Esses anéis de poder representariam o avesso virtuoso da política.


Moro é aquele que mandava os políticos para a cadeia e que, já deixou
claro, pretende ser juiz informal de seus colegas de ministério. Guedes
é o que tem o dever de arrumar as contas que aqueles teriam
destroçado. E os militares entram como a força incorruptível, despida
de egoísmo.

O presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL), durante formatura da Escola


Superior de Aperfeiçoamento de Oficiais, na Vila Militar, no Rio de
Janeiro - Pedro Prado - 29.nov.2018/Folhapress

Ecoam, na visão bolsonariana, o país edênico da ditadura militar, com


serviços públicos eficientes, escolas sem partido, pleno emprego,
menino brincando de bola, e menina, de boneca. Cada coisa em seu
lugar.

Nada que lembrasse, note-se à margem, a mesa com que


Bolsonarorecepcionou John Bolton em sua casa: bolo de fubá, café,
marxismo cultural, celular, suco de laranja na caixinha, banana, Cuba,
tela de computador, manteiga a céu aberto, Israel, Pabllo Vittar,
Danoninho, Venezuela, água de coco, ideologia de gênero, queijo em
isopor de padaria, Gramsci... Um caos de ofertas claras. Abarrotada,
não havia lugar naquela mesa para uma ideia que fosse. Mas volto ao
ponto.
Bolsonaro se dedica a uma arquitetura que sobreviva a si mesmo. E
isso, então, escreveria a sua biografia de estadista inaugural. O
presidente eleito integra a galeria dos governantes que ambicionam
nascer póstumos.

Importa a ele menos a administração cotidiana do país, com sua pauta


e rotina de dificuldades, do que a suposta grande obra que, na sua
imaginação, os pósteros hão de reconhecer.

Ele ainda nem tomou posse, mas já vê a si e à sua herança pelos olhos
das gerações futuras. Não por acaso, resolveu ecoar uma afirmação
perigosa de Carlos Bolsonaro, um dos filhos, segundo quem há pessoas
próximas interessadas na sua morte. Esses temperamentos têm atração
intelectual pelo trágico.

Nas democracias bem-sucedidas, governantes são eleitos para tentar


melhorar os marcos institucionais, aumentar a eficiência da máquina,
elevar o bem-estar da população, fazer reformas pontuais etc. Essas
chatices.

Nada ambicionam de extraordinário. Levam a vida a simular modorra


mesmo em tempos de grande agitação. É o caso de Theresa May, a
enfrentar a sandice vitoriosa do Brexit. São os tipos que prefiro.
Esforçam-se para conferir uma aparência de rotina à gestão, ainda que
os problemas sejam invulgares.
Os militares do governo Bolsonaro

LEIA MAIS
Voltar

 Facebook
 Whatsapp
 Twitter
 Messenger
 Google
 Pinterest
 Linkedin
 E-mail
 Copiar link
E há os líderes à moda Bolsonaro, Lula ou Donald Trump, cada um
com suas peculiaridades, determinados a deixar a sua marca. Podem
ser tipos perigosos --às vezes, também para si mesmos, como sabe o ex-
presidente brasileiro.

O petista exorcizava a dita herança maldita; Trump quer a "América


grande outra vez", já que teria sido amesquinhada por Obama, e o
capitão anuncia que vai tirar o Brasil do caos, para onde o teriam
conduzido a corrupção dos políticos, o marxismo e o globalismo. Se
não o matarem, ele alerta.

Acontece que não basta prender mais alguns corruptos ou organizar


expedições punitivas nos morros do Rio e periferias das grandes
cidades. Igualmente ineficaz será produzir diagnósticos cuja síntese
pode ser esta: "O Brasil precisa parar de gastar mais do que arrecada".

Não menos ocioso será tingir de verde-oliva a infraestrutura capenga


do país, sob o olhar atento de militares vigilantes e certamente bem-
intencionados. Onde está o dinheiro?

Na arquitetura de poder de Bolsonaro, os partidos da Polícia, de


Chicago e da Caserna se encarregam de governar, e aos políticos,
expulsos de uma República já sem poetas, caberia a missão patriótica
de aprovar os tais "remédios amargos", que dariam eficiência aos
poderosos de fato.

Fiel à sua visão de mundo, o presidente eleito pôs um general para


dividir com um civil a tarefa de negociar com o Congresso.

Ou Bolsonaro devolve a política a seu lugar, ou não há como esse


arranjo dar certo. Nascerá póstumo no pior sentido. Para o mal de
todos.

Das könnte Ihnen auch gefallen