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UFMG – FACULDADE DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS

DEPARTAMENTO DE FILOSOFIA

Fichamento: Uma Teoria da Justiça


Camilla de Carvalho Felicori

Fichamento apresentado para avaliação


da disciplina Rawls do curso de bacharelado em
Filosofia da Universidade Federal de Minas Gerais.
Professor: Newton Bignotto

BELO HORIZONTE
Junho 2007
2

Capítulo I – Justiça como eqüidade

[equidade do Lat. Aequitate // s. f., igualdade; rectidão; imparcialidade; justiça.]

Objetivo do capítulo:
(1) descrever o “papel da justiça na cooperação social”1
(2) apresentar uma “breve explicação do objeto primário da justiça” 2, considerando que a justiça é “a
estrutura básica da sociedade”3.
(3) consideração da justiça como eqüidade  “uma teoria da justiça que generaliza e leva a um nível
mais alto de abstração o conceito tradicional do contrato social”4.
(4) troca: pacto  situação inicial + restrições de conduta = razões para um acordo inicial sobre os
princípios de justiça.
(5) considerações acerca das concepções de justiça (a) utilitária e (b) intuicionista, diferenciando-as da
concepção proposta de justiça como equidade.  justiça como equidade: teoria alternativa em relação
às outras.

1. O papel da justiça

“A justiça é a primeira virtude das instituições sociais, como a verdade o é dos sistemas de
pensamento.”5  “Sendo virtudes primeiras das atividades humanas, a verdade e a justiça são
indisponíveis.”6  primazia da justiça.

A verdade está para a teoria assim como a justiça para as leis.  se as leis são injustas, elas devem ser
reformadas.

“(...) a justiça nega que a perda da liberdade de alguns se justifique por um bem maior partilhado por
outros.”7  liberdades: invioláveis em uma sociedade justa.  O que a justiça assegura é inegociável.

Pensar os princípios da justiça, para isso:


1
P.3
2
p.3
3
p.3.
4
p.4.
5
p.4.
6
p.4.
7
p.4
3

Suposição: uma sociedade “é uma associação mais ou menos auto-suficiente de pessoas que em suas
relações mútuas reconhecem certas regras de conduta como obrigatórias e que, na maioria das vezes,
agem de acordo com elas”.8

Regras  cooperação  a fim de promover o bem mútuo.

Sociedade:
- empreendimento cooperativo -> vantagens mútuas (identidade de interesses), mas tem que lidar com
conflitos de interesses.  dificuldade / problema está nesse conflito de interesses que se relaciona com
a distribuição de vantagens.

As formas de ordenação social determinam as distribuições de vantagens, por isso é necessário escolher
uma forma de ordenação social.

Para isso (escolher) são necessários princípios da justiça social: “eles fornecem um modo de atribuir
direitos e deveres nas instituições básicas da sociedade e definem a distribuição apropriada dos
benefícios e encargos da cooperação social”9.

Sociedade bem ordenada:


(1) promove o bem de seus membros
(2) é “regulada por uma concepção pública de justiça”10:
2.1) “todos aceitam (...) os mesmos princípios de justiça”
2.2) as instituições sociais satisfazem esses princípios.

Homens:
(1) inclinação ao interesse próprio (faria separar) X (2) sentido público de justiça (possibilita unir).

“Entre indivíduos com objetivos e propósitos díspares, uma concepção partilhada de justiça estabelece
os vínculos da convivência cívica; o desejo geral de justiça limita a persecução de outros fins”11

8
p.4.
9
p.5.
10
p.5.
11
p.5.
4

Sociedades concretas: conflitos entre o que é justo e o que é injusto.  ainda que discordem acerca dos
princípios da associação (que se baseiam na noção de justiça), “cada um deles tem sua concepção de
justiça”12.

Ter uma concepção de justiça: saber da necessidade de princípios que definam (1) direitos e deveres e
(2) distribuição de vantagens e encargos.

“(...) as instituições são justas quando não se fazem distinções arbitrárias entre as pessoas na atribuição
de direitos e deveres básicos e quando as regras determinam um equilíbrio adequado entre
reivindicações concorrentes das vantagens da vida social.”13

Para uma comunidade humana viável são necessários:


(1) consenso nas concepções de justiça
(2) coordenação (entre os planos dos indivíduos)
(3) eficiência (em relação à execução dos planos do indivíduos devem ter coerência com a concepção
de justiça)
(4) estabilidade (cooperação social)  Necessário haver “forças estabilizadoras que impeçam maiores
violações e que tendam a restaurar a organização social”14

Uma concepção de justiça boa deve dar conta desses três últimos aspectos da melhor maneira possível;
para tanto é necessário um consenso na concepção pública de justiça.

“(...) embora a justiça tenha uma certa prioridade, sendo a virtude mais importante das instituições,
ainda é verdade que, em condições iguais, uma concepção da justiça é preferível a outra quando suas
conseqüências mais amplas são a mais desejáveis.” 15  pensar a concepção de justiça relacionada à
organização social.

2. O objeto da justiça

12
p.5.
13
p.6.
14
p.7.
15
p.7.
5

O que pode ser justo ou injusto: muitas coisas: pessoas, ações, disposições, etc.  circunscrever a
justiça a ser trabalhada: justiça social.

Objeto primário da justiça:


estrutura básica da sociedade

Instituições sociais: distribuição de direitos e deveres + determinação de vantagens.  como as
instituições fazem isso é o objeto primário da justiça16.

Instituições: constituição política e principais acordos econômicos e sociais17.

“A estrutura básica é o objeto primário da justiça porque seus efeitos são profundos e estão presentes
desde o começo”18
Intuitivamente  estrutura social: posições sociais diferentes  homens que têm condições diferentes
 desigualdades decorrentes das instituições sociais  uns são mais favorecidos que outros.  noções
de mérito ou valor não justificam essas desigualdades

“É a essas desigualdades, (...), que os princípios da justiça social devem ser aplicados em primeiro
lugar”19.

Justiça: direitos e deveres + condições sociais (oportunidades econômicas)

- Limites da indagação:

(1) justiça para uma sociedade como um sistema fechado:


Um caso especial do problema da justiça  (justiça no que se refere à “distribuição de algo
considerado racionalmente vantajoso ou desvantajoso”20)  Pensar essa concepção de justiça no que
tange a uma sociedade pensada “como um sistema fechado, isolado de outras sociedades”21.
16
“(...) ou mais exatamente, a maneira pela qual as instituições sociais mais importantes distribuem direitos e deveres
fundamentais e determinam a divisão de vantagens provenientes da cooperação social” (pp. 7,8.)
17
p.8.
18
p.8.
19
p.8.
20
p.8.
21
p.9.
6


o porquê dessa restrição: “É natural conjeturar que, assim que tivermos uma teoria sólida para esse
caso, à sua luz os problemas restantes da justiça se revelarão administráveis” 22  isso a partir de
modificações da teoria à situação em questão.

(2) justiça para uma sociedade bem ordenada  “Presume-se que cada um aja com justiça e cumpra
sua parte para manter as instituições justas.”23

- “A razão para começar com a teoria ideal é que ela oferece, creio eu, a única base para o
entendimento sistemático desses problemas prementes”24.  melhor forma de obter um entendimento
profundo acerca do problema.

Conceito de estrutura básica  vago  deixar para resolver isso depois  trabalhar com uma idéia
intuitiva de estrutura básica.

Princípios devem se aplicar aos casos mais importantes de justiça social. A concepção de justiça
“não deveria ser descartada só porque seus princípios não são satisfatórios em todos os casos.”25

“Deve-se, então, considerar que uma concepção de justiça social fornece primeiramente um padrão
pelo qual se devem avaliar aspectos distributivos da estrutura básica da sociedade.”26

Ideal social: definição de concepção completa dos princípios “para todas as virtudes da estrutura
básica”27  vai além da concepção de justiça.  princípios da justiça fazem parte do ideal social, ainda
que seja a parte mais importante dele.

Ideal social refere-se a uma concepção de sociedade.

≠ noções de sociedade  ≠ concepções de justiça

22
p.9.
23
p.9.
24
p.10.
25
p.10.
26
p.10.
27
p.10.
7

Justiça:
(1) “equilíbrio adequado entre reivindicações concorrentes” 28
(2) “um conjunto de princípios correlacionados com a identificação das causas principais que
determinam esse equilíbrio”29
(3) “parte de um ideal social” 30

Conceito de justiça: “se define pela atuação de seus princípios na atribuição de direitos e deveres e na
definição da divisão apropriada de vantagens sociais” 31

Concepção de justiça: interpretação dessa atuação.

Ainda que essa abordagem pareça não se adequar à tradição, ela o faz > Aristóteles > noção de
pleonexia: “evitar que se tire alguma vantagem em beneficio próprio tomando o que pertence a
outrem”32 > definição aplicável a ações > pessoas são justas quando agem com justiça > uma pessoa
age de modo x quando deve agir de determinada maneira; quem indica como uma pessoa deve agir são
as instituições.

3. A idéia principal da teoria da justiça

Concepção de justiça que leva a um plano mais abstrato teorias contratuais de Locke, Rousseau e Kant.

Contrato: “os princípios da justiça para a estrutura básica da sociedade são o objeto do consenso
original”.

Princípios de justiça: contrato (consenso original) pessoas livres e racionais + posição inicial de
igualdade + interesses próprios + cooperação social.  justiça como equidade (esse modo de
considerar os princípios da justiça)

Homens escolhem (cooperação) princípios da justiça: estes envolvem a atribuição de direitos e deveres
e a distribuição de vantagens.
28
p.10.
29
p.10.
30
p.10.
31
p.10.
32
p.10.
8

O contrato é uma decisão racional de um grupo de pessoas que estão de acordo sobre o que é justo ou
injusto.  essa escolha se dá em uma situação hipotética de igualdade de condições e liberdade
eqüitativa  eles decidem então quais vão ser os princípios da justiça.

“Na justiça como eqüidade a posição original de igualdade corresponde ao estado de natureza na teoria
tradicional do contrato social.”33  posição original: hipotética para possibilitar a formulação de uma
concepção de justiça.

Posição original (hipotética) de igualdade: “ninguém conhece seu lugar na sociedade, a posição de sua
classe ou o status social.”34 véu de ignorância para escolher os princípios da justiça:

“Uma vez que todos estão numa situação semelhante e ninguém pode designar princípios para
favorecer sua condição particular, os princípios da justiça são o resultado de um consenso ou ajuste
eqüitativo. ”35  [visa minimizar os efeitos da contingência social.]

seres racionais  interesses próprios (+) senso de justiça  princípio da justiça

[Sem o senso de justiça não é possível formular o princípio de justiça porque é o senso de justiça que
possibilita equilibrar os interesses próprios. ]

Justiça como eqüidade: princípios são acordados em uma situação inicial equitativa 36.  uma das
escolhas mais genéricas  “a escolha dos primeiros princípios de uma concepção da justiça que deve
regular todas as subseqüentes críticas e reformas das instituições.” 37  após a escolha de uma
concepção de justiça, as definições da constituição, leis, etc., devem estar de acordo com esses
princípios de justiça.

O conjunto de princípios é definido na situação original em uma situação hipotética de eqüidade.  “O


reconhecimento geral desse fato forneceria a base para a aceitação pública dos princípios
correspondentes da justiça” 38. Fora da situação hipotética, as pessoas nascem em posições particulares

33
p.13.
34
p.13.
35
p.13.
36
p.14.
37
p.14.
38
p.14.
9

e essa particularidade afeta suas perspectivas de vida e afetaria a escolha dos princípios de justiça. É
necessário pensar na situação hipotética de eqüidade a partir da qual é possível formular “princípios
que pessoas livres e iguais aceitariam em circunstâncias eqüitativas” 39.

O homem é considerado na situação inicial como racional e desinteressado. Desinteresse no sentido de


40
“pessoas que não têm interesse nos interesses das outras” e racionalidade no sentido de “adotar os
meios mais eficientes para determinados fins” 41.

Situação inicial  acordos aceitos.

Consideração acerca do princípio da utilidade: ele se enquadra dentro dos princípios de justiça da
situação inicial?
“Parece pouco provável que pessoas que se vêem como iguais, com direito a fazer exigências mútuas,
concordariam com um princípio que pode exigir para alguns expectativas de vida inferiores,
simplesmente por causa de uma soma maior de vantagens desfrutadas por outros” 42.  “ninguém tem
razão para aceitar uma perda duradoura para si mesmo a fim de causar um saldo líquido maior de
43
satisfação” .  princípio utilitarista é incompatível com a “concepção da cooperação social entre
iguais para a vantagem mútua” 44.

Na situação inicial o que se escolhe:


(1) igualdade de direitos e deveres básicos
(2) “desigualdades econômicas e sociais (...) são justas apenas se resultam em benefícios
45
compensatórios para cada um, e particularmente para os membros menos favorecidos da sociedade”
 “não é justo que alguns tenham menos para que outros possam prosperar. Mas não há injustiça nos
benefícios maiores conseguidos por uns poucos desde que a situação dos menos afortunados seja com
isso melhorada” 46.

39
P.15.
40
P.15.
41
P.15.
42
P.15.
43
P.16.
44
P.16.
45
P.16.
46
P.16.
10

A concepção de justiça deve tentar minimizar os efeitos das contingências e circunstâncias sociais, que
não são naturais.

Justiça como eqüidade:


(1) escolha na situação inicial  situação hipotética.
(2) princípios aceitos consensualmente47  consenso: aceitar certos princípios morais48.

Não é possível que os dois pontos sejam satisfeitos adotando os princípios de justiça do utilitarismo e
do perfeccionismo:

(3) teoria contratualista.


Contrato  escolha racional + pluralidade  cidadãos têm que saber quais são os princípios
(publicidade dos princípios políticos)
A justiça como eqüidade, diferentemente das teorias contratualistas, não busca formular um “sistema
que inclua princípios para todas as virtudes” 49, mas se preocupa apenas com os princípios da justiça. 
“Precisamos reconhecer o alcance limitado da justiça como eqüidade e do tipo genérico de visão que
ela representa” 50.

4. A posição original e sua justificativa

Questão da justiça + teoria da escolha racional: “quais princípios seriam racionalmente adotados dada a
situação contratual” 51, isto é, eqüidade da situação original.

Para a justificativa: natureza do problema da escolha.

Suposição: Princípios de justiça devem ser escolhidos em condições determinadas 52. Esses princípios
deveriam determinar um único conjunto de princípios, “mas eu me darei por satisfeito se eles bastarem
para classificar as concepções mais tradicionais da justiça social” 53.

47
P.17.
48
P.18.
49
P.18.
50
P.19.
51
P.19.
52
P.20.
53
P.20.
11

Sobre a escolha de princípios: “parece razoável e geralmente aceitável que ninguém deva ser
favorecido ou desfavorecido pela sorte natural ou por circunstâncias sociais em decorrência da escolha
de princípios” 54. Entretanto, a escolha dos princípios não pode ser fundada em aspirações particulares.
Por esse motivo faz-se necessário o “véu da ignorância” que diz de uma situação na qual “fica excluído
o conhecimento dessas contingências que criam disparidades entre os homens e permitem que eles se
orientem pelos seus preconceitos” 55. Desse modo têm-se na situação original igualdade de direitos no
que diz respeito à escolha de princípios. A igualdade diz de um ser humano pensado como pessoa ética
e capaz de ter um senso de justiça.

Síntese da situação original: “Juntamente com o véu da ignorância, essas condições definem os
princípios da justiça como sendo aqueles que pessoas racionais preocupadas em promover seus
interesses consensualmente aceitariam em condições de igualdade nas quais ninguém é consciente de
ser favorecido ou desfavorecido por contingências sociais e naturais” 56.

Sobre esses princípios:


(1) podemos aceitar intuitivamente  “combinam com nossas ponderações de justiça” 57
(2) podemos aceitar após reflexão  ampliam de modo aceitável nossas ponderações sobre justiça.

Algumas questões sobre a justiça podem ser resolvidas intuitivamente, como o consenso que a
discriminação racial é injusta (1). No entanto, outras questões não são tão claras e consensuais, como é
o caso da distribuição de riquezas e poder (2).

Busca de descrição adequada da situação inicial:


condições partilhadas e genéricas  conjunto de princípios  sim?  ok
condições partilhadas e genéricas  conjunto de princípios  não?  busca de outras premissas
razoáveis.

54
p.20.
55
p.21.
56
p.21.
57
p.22.
12

Discrepância na escolha dos princípios: escolha: “podemos ou modificar a avaliação da situação


original ou revisar nossos juízos atuais” 58. “equilíbrio reflexivo” 59. “Trata-se de um equilíbrio
porque finalmente nosso princípios e opiniões coincidem, e é reflexivo porque sabemos com quais
princípios nossos julgamentos se conformam e conhecemos as premissas das quais derivam. Neste
60
momento tudo está em ordem.” . Ainda que não seja necessariamente estável, essa situação de
equilíbrio possibilita uma concepção da posição original.

Roteiro hipotético de reflexão  pressupostos filosóficos em relação aos princípios + juízos


ponderados (que aceitamos como razoáveis) sobre a justiça61.

A justificativa para os princípios de justiça está no fato de que “foram aceitos consensualmente numa
situação inicial [hipotética] de igualdade” 62.

5. O utilitarismo clássico

Várias formas de utilitarismo. Objetivo: teoria da justiça alternativa à explicação utilitarista.

Contratualismo X Utilitarismo
Justiça como eqüidade X intuicionismo, perfeccionismo e utilitarismo.

Tipo de utilitarismo considerado: doutrina clássica de Sidgwick idéia principal: “é a de que a


sociedade está ordenada de forma correta e, portanto, justa, quando suas instituições mais importantes
estão planejadas de modo a conseguir o maior saldo líquido de satisfação obtido a partir da soma das
63
participações individuais de todos os seus membros” . Nesse caso, um princípio aplicável a um
indivíduo, o de buscar sua satisfação e para isso abrir mão de determinadas coisas para conseguir outras
é estendido à toda sociedade. O que importa é a somatória de vantagens. Se no final o saldo líquido de
satisfações é positivo então a sociedade é justa. Outro ponto a favor dessa posição diz da aplicação da
teoria ética ao problema. Considerando teoria ética como aquela que busca relacionar o justo com o
bem, sendo o bem independente do justo e o justo como o que maximiza o bem, busca-se o bem maior

58
p.22.
59
p.23.
60
p.23.
61
p.23.
62
p.24.
63
p.25.
13

dentro das possibilidades reais em um apelo intuitivo dentro da idéia de racionalidade 64. O problema da
distribuição aparece aqui relacionado à maximização de bens, isto é, “A distribuição correta nos dois
casos é aquela que permite a máxima realização.” 65. Uma vez que o objetivo é a maximização de
vantagens avaliada em sua somatória, “em princípio não há razão para que os benefícios maiores de
alguns não devam compensar as perdas menores de outros” 66. O argumento é pensado em uma
generalização, do particular para o geral, ou seja, se um homem pode buscar a maximização de seus
desejos, também “é justo que uma sociedade maximize o saldo líquido de satisfação obtido com
referência a todos os seus membros” 67. Com esse deslocamento do particular para o geral o utilitarismo
não leva em conta a diferença entre as pessoas para determinar suas escolhas.

6. Algumas disparidades inter-relacionadas

senso comum:
exigências da liberdade e do direito X desejo do aumento do bem-estar agregado

prioridade para essas exigências.

Membros da sociedade  direito natural  “A justiça nega que a perda da liberdade para alguns se
justifique por um bem maior partilhado por outros”68.  “Portanto, numa sociedade justa as
liberdades básicas são tomadas como pressupostos e os direitos assegurados pela justiça não estão
sujeitos à negociação política ou ao cálculo dos interesses sociais” 69.  liberdade: direito inegociável.
 raciocínio do senso comum  justiça como eqüidade justifica esse lugar da liberdade em escolha na
posição original (igualdade inicial e hipotética de condições + racionalidade).

Diferenças utilitarismo e teoria da justiça:

(1) “Enquanto a doutrina contratualista aceita nossas convicções acerca da prioridade da justiça como
globalmente sólidas, o utilitarismo procura explicá-las como uma ilusão socialmente útil”70.

64
p.26.
65
p.28.
66
p.28.
67
p.28.
68
p.30.
69
p.30.
70
p.31.
14

(2) utilitarismo: extensão “à sociedade o princípio da escolha feita por um único ser”71 X teoria da
justiça como eqüidade: escolha dos princípios é baseada em um consenso original.  O utilitarismo,
uma vez que é a escolha de um indivíduo estendida aos outros, não abarca a pluralidade de pessoas,
marca essencial das sociedades humanas72.

(3) utilitarismo: teoria teleológica X teoria da justiça como eqüidade: teoria deontológica, ou seja,
“não especifica o bem independentemente do justo, ou não interpreta o justo como maximizador do
bem”73  bem: satisfação do desejo racional.  o princípio de maximização do bem, típico do
utilitarismo não aparece na teoria da justiça como eqüidade.

Utilitarismo: bem-estar social depende “dos níveis de satisfação ou insatisfação dos indivíduos” 74 
objetivo: maior soma de satisfações  satisfação relacionada a desejos particulares  uma pessoa
pode desejar a “sujeição de outrem a um grau inferior de liberdade como um meio de aumentar sua
auto-estima”75. X A teoria da justiça como eqüidade não corre o risco de situações como essa uma vez
que a definição de princípios ocorre em uma situação na qual as pessoas não sabem qual é sua posição
na sociedade: “as pessoas aceitam de antemão um princípio de liberdade igual e o fazem sem conhecer
seus próprios objetivos pessoais”76. Assim, os “desejos e aspirações são restringidos desde o início
pelos princípios de justiça que especificam os limites que os sistemas humanos de finallidades devem
respeitar”77  A limitação dos desejos marca uma característica imporante da teoria da justiça como
eqüidade que é a de priorizar o justo em relação ao bem.  a justiça não pode ser violada em vista da
busca da satisfação de um desejo.

Resumo final:
Utilitarismo clássico X teoria da justiça como eqüidade  diferença entre ass concepções de sociedade.

71
p.31.
72
p.31.
73
p.32.
74
p.33.
75
p.33.
76
p.33.
77
p.34.
15

Utilitarismo  sociedade: “a administração eficiente de recursos sociais para maximizar a satisfação


do sistema de desejos construído pelo observador imparcial a partir dos inúmeros sistemas individuais
de desejos aceitos como dados”78.
t. da justiça como eqüidade  “sociedade bem-ordenada como sendo um sistema de cooperação para a
vantagem mútua regulada por princípios que as pessoas escolheriam numa situação inicial que é
eqüitativa”79.

7. O intuicionismo

O intuicionismo pensado de uma forma mais genérica é uma doutrina que pesa e compara um conjunto
de princípios básicos a fim de estabelecer qual deles é o mais justo80.

O intuicionismo lida com a complexidade dos fatos morais sem escolher princípios a partir de padrões
determinados.  há múltiplos princípios que podem inclusive serem contraditórios entre si e não há
um método definido para escolher um a outro; a escolha é feita a partir do equilíbrio pela intuição 
escolha “pelo que nos parece aproximar-se mais do que é justo”81.

Distinção entre as doutrinas intuicionistas na filosofia pode ser feita a partir da observação do “nível de
generalidade de seus princípios”82.

No âmbito do senso comum, o intuicionismo procura ponderar reivindicações particulares,


equilibrando demandas de interesses divergentes de acordo com diferentes posições sociais 83; trata-se
de uma ponderação difícil já que são múltiplos os interesses. “Ponderações diferentes neste caso não
são de forma alguma variações triviais, pois muitas vezes correspondem a convicções políticas
profundamente opostas”84

78
p.36.
79
p.36.
80
p.36.
81
p.37.
82
p.38.
83
p.38.
84
p.39.
16

Quanto às concepções filosóficas, seus princípios são de espécie mais genérica 85. O problema da
acumulação / distribuição é o exemplo para pensar isto. Deve-se buscar dois fundamentos dessa
dicotomia no que se refere ao planejamento da sociedade:
(1 ) o máximo bem (saldo líquido de satisfação)  princípio da utilidade.
(2) distribuir satisfações de modo igualitário padrão de justiça (equilibra distribuição de vantagens)
86
.

Não há regra que determine como esses dois princípios devem ser equilibrados; por isso trata-se de
uma concepção intuicionista. Pessoas diferentes podem colocar pesos diferentes para esses pontos e,
ademais, “a alteração da inclinação numa curva de indiferença mostra como a urgência relativa dos
princípios muda na medida em que eles são mais ou menos satisfeitos. (...) vemos que diminuindo a
igualdade exige-se um aumento cada vez maior da soma de satisfações para compensar uma
diminuição ainda maior da igualdade” 87.  o equilíbrio é compensatório e deve ser buscado na
tentativa de um posicionamento imparcial diante do problema (sem que fixar muita atenção aos
próprios interesses).  “O intuicionismo afirma que em nossos julgamentos sobre a justiça social
devemos atingir uma pluralidade de princípios básicos a respeito dos quais possamos apenas dizer que
nos parece mais correto equilibrá-los de um certo modo e não de outro” 88.  essa doutrina pode ser
verdadeira, já que não contradiz a racionalidade.  argumento contra o intuicionismo: mostrar critérios
éticos para definir pesos à pluralidade de princípios89.

8. O problema da prioridade

Intuicionismo: como explicar nossos juízos sobre o justo e o injusto.  problema sem resposta 
confiança em nossas capacidades intuitivas90.

Utilitarismo clássico: apelo à intuição a partir do critério do ajuste dos pesos com referência ao
princípio da utilidade. Com isso, evita-se a dependência em relação à intuição91.

85
p.39.
86
p.39.
87
p.41.
88
p.42.
89
p.43.
90
P.44.
91
p.44.
17

Mas a dependência em relação à intuição não é irracional, ainda que uma concepção intuicionista da
justiça seja parcial, já que os juízos variam de acordo com as pessoas. Para evitar essa parcialidade é
necessário definir critérios éticos razoáveis92.

No caso da teoria da justiça como eqüidade, limita-se o papel da intuição uma vez que os princípios da
justiça são definidos na posição original, isto é, uma situação hipotética que visa uma escolha racional e
consensual para julgar as reivindicações mútuas93.

Em uma segunda possibilidade de escolha de princípios temos a baseada na “ordem serial ou lexical”.
Essa perspectiva, “exige que o primeiro princípio da ordenação seja satisfeito antes de podermos passar
para o segundo”, isto é, “um determinado princípio não entra em jogo ate que aqueles que o precedem
sejam plenamente aplicados ou se constate que não se aplicam ao caso” 94. Assim não é necessário
ponderar princípios, já que o primeiro tem peso maior que o segundo e assim por diante.

Para atingir o objetivo de alcançar um consenso para uma concepção coletiva de justiça, é necessário
“reduzir a nossa dependência em relação aos juízos intuitivos, e não eliminá-los completamente” 95.
Assim, “nosso objetivo deveria ser formular uma concepção da justiça que, por mais que apele para a
intuição, ética ou sábia, tenda a tornar convergentes os nossos entendimentos meditados sobre a
justiça”96.

9. Algumas observações sobre a teoria moral

Sobre a natureza da teoria moral: juízos ponderados em equilíbrio refletido.

Cada pessoa desenvolve um senso de justiça a partir do qual ela busca agir e espera que os outros ajam
 aptidão moral  complexa.
Teoria moral: “uma tentativa de descrever a nossa capacidade moral” 97.  princípios para orientar
nossos juízos e julgar os juízos dos outros. A teoria moral não pode ser adquirida apenas baseada no

92
P.45.
93
p.45.
94
p.46.
95
p.48.
96
p.48.
97
pp.49-50.
18

senso comum ou em princípios da aprendizagem, indo “muito além das normas e padrões referidos no
dia-a-dia98”.

Juízos ponderados são “aqueles juízos nos quais as nossas qualidades morais têm o mais alto grau de
probabilidade de se mostrarem sem distorção”99 são importantes para decidir quais juízos devemos
escolher. Por exemplo, devemos desconsiderar juízos que fazemos quando estamos nervosos, com
medo ou em uma situação muito vantajosa, já que esses juízos têm maiores chances de estarem errados.
Os “juízos ponderados são simplesmente os que são feitos sob condições favoráveis ao exercício do
senso de justiça”100.

A noção de equilíbrio refletido se traduz na correspondência entre juízos ponderados e as escolhas de


princípios feitas na posição hipotética original: “Segundo o objetivo provisório da filosofia moral,
pode-se dizer que justiça como eqüidade é a hipótese segundo a qual os princípios que seriam
escolhidos na posição original são idênticos àqueles que correspondem aos nossos juízos ponderados e,
assim, esses princípios descrevem o nosso senso de justiça. 101”. mas é uma explicação simplificada;
os juízos ponderados, ainda que formulados em circunstâncias favoráveis podem sofrer distorções. Mas
esses juízos podem ser revisados. “Do ponto de vista da teoria ética, a melhor explicação do senso de
justiça de uma pessoa não é a que combina com suas opiniões emitidas antes que ela examine qualquer
concepção de justiça, mas sim a que coordena os seus juízos em um equilíbrio refletido.” 102. Isso é
possível a partir da avaliação de varias concepções propostas e consequentemente da escolha de revisar
seus juízos ou conformar-se com um deles. Essa avaliação tentou ser feita em relação a outras
concepções acerca da justiça, como é o caso do utilitarismo. “Assim, a justiça como eqüidade nos
aproxima mais do ideal filosófico; sem, obviamente, atingi-lo”103.

Quanto à divergência das posições acerca da justiça: suposição de que “todos têm em si mesmos o
modelo completo de uma concepção moral”104 para que seja possível formular a teoria da justiça como
eqüidade.

98
P.50.
99
p.51.
100
p.51.
101
p.51.
102
p.52.
103
p.53.
104
p.54.
19

Capítulo II – Os princípios da justiça

Teoria da justiça é formada por duas partes principais:


“(1) uma interpretação da situação inicial e uma formulação dos vários princípios disponíveis para a
escolha e
(2) uma demonstração estabelecendo quais dos princípios seriam de fato adotados.” 105.

Objetivo desse capítulo: explicar dois princípios de justiça para instituições e vários princípios para
indivíduos.  esse capítulo trabalha com apenas a primeira parte da teoria.

10. As instituições e a justiça formal

“O primeiro objeto dos princípios da justiça social é a estrutura básica da sociedade, a ordenação das
principais instituições sociais em um esquema de cooperação” 106.  Princípio da justiça para
instituições. Para isso: atribuição de direitos e deveres de distribuição de benefícios e encargos.

Instituição  sistema público de regras que define cargos, posições, direitos e deveres 107.  regras
mostram o que é proibido e o que é permitido e criam penalidades para quando elas não são
respeitadas.

Instituição pensada de dois modos:


(1) abstrato  “uma forma possível de conduta expressa por um sistema de regras” 108.  esfera do
poder ser (possibilidade)  poderia ser justa ou injusta.
(2) concreta  “como a realização das ações especificadas por essas regras no pensamento e na
conduta de certas pessoas em uma dada época e lugar”109.  esfera efetiva: é justa ou injusta.

Funcionamento de uma instituição  obedecimento de um sistema de regras que dizem respeito à


ação.  As pessoas que fazem parte de uma instituição conhecem quais são as regras que a
caracterizam e sabem que todos os membros da instituição conhecem essas regras.  Ainda que não
seja inteiramente satisfeito, este é o ideal para o funcionamento de uma instituição.
105
P.57.
106
p.57.
107
p.58.
108
p.58.
109
p.58.
20

Importância da publicidade das regras de uma instituição: “assegura que aqueles nela engajados saibam
quais limites de conduta devem esperar uns dos outros, e que tipos de ações são permissíveis” 110,
ademais, “há um entendimento comum acerca do que é justo e injusto”111

Importante diferenciar:
(1) “regras constitutivas de uma instituição”
(2) “estratégias e regras de conduta acerca de como tirar o melhor proveito da instituição para
propósitos particulares”112  quais ações o indivíduo deve escolher dentro das permitidas pelas regras
visando seus interesses.
Quanto a (2), “Idealmente as regras devem ser fixadas de modo a fazer com que os homens sejam
conduzidos por seus interesses predominantes a agir de modos que promovam fins sociais
desejáveis”113 Entretanto, as estratégias individuais para atingir interesses “não são parte dos sistemas
públicos de regras que as definem”114.

Também é necessário distinguir:


(1) uma regra, ou várias regras
(2) a instituição
(3) a estrutura básica da sociedade

Uma regra, ou várias regras podem ser injustas sem que todo o sistema social o seja. Por outro lado, um
sistema social pode ser injusto como um todo sem que haja partes que o sejam. Nesse caso, a injustiça
decorreria da combinação das partes115.

Em uma determinada estrutura básica na qual “as regras satisfazem uma concepção de justiça” 116
existem princípios de justiça que assumem o papel da justiça na medida em que “fornecem uma
atribuição de direitos e deveres fundamentais e determinam a divisão de vantagens advindas da
cooperação social”117. As autoridades dessa estrutura devem administrar de acordo com essa regra e a
110
p.59.
111
p.59.
112
p.59
113
p.60.
114
p.60.
115
p.60.
116
p.61.
117
p.61.
21

administração seguindo esses padrões, “imparcial e consistente” trata-se da “justiça formal”. O


conceito de justiça formal diz de uma igualdade entre a administração das leis e as próprias leis. Em
outras palavras, “a justiça formal é a (...) obediência ao sistema” 118. Entretanto, ainda que a justiça
formal seja exercida, é possível que haja injustiça. Isso pode ocorrer devido aos princípios segundo os
quais a estrutura social é montada. Supondo que a estrutura social é razoavelmente justa, a aplicação de
suas regras minimiza as injustiças. Pode ocorrer injustiça quando as autoridades não agem de acordo
com as regras119. Nesse caso, a injustiça, quando ocorre, é ainda maior já que aquele que a sofre não
pode ser protegido pelas regras. Entretanto, há casos (particulares) em que um desvio da regra pode
proteger o sofrimento de alguém que sofre alguma injustiça.  dificuldade: determinar quando é mais
ou menos justo seguir as regras.

11. Os dois princípios da justiça

Há um consenso na posição original acerca dos dois princípios da justiça aplicáveis à estrutura básica
da sociedade. Primeira formulação, ainda não acabada:
Primeiro: cada pessoa deve ter um direito igual ao mais abrangente sistema de liberdades
básicas iguais que seja compatível com um sistema semelhante de liberdades para as outras.
Segundo: as desigualdades sociais e econômicas devem ser ordenadas de tal modo que
sejam ao mesmo tempo (a) consideradas como vantajosas para todos e (b) vinculadas a posições
e a cargos acessíveis a todos120.
Princípios:
(1) Liberdades “básicas iguais” p. ex: liberdade política, de expressão, de consciência.
(2) Desigualdades “econômicas e sociais” distribuição de renda e riquezas (deve ser vantajosa para
todos) e diferenças de autoridade e responsabilidade (que deve ser acessível para todos).

Deve-se pensar esses princípios segundo uma ordem serial, sendo que o primeiro antecede o segundo,
isto é, “as violações das liberdades básicas iguais protegidas pelo primeiro princípio não podem ser
justificadas nem compensadas por maiores vantagens econômicas e sociais”121.  prioridade do
primeiro princípio em relação ao segundo.

O segundo princípio deve ser consistente com liberdades básicas e com igualdade de oportunidades.

118
p.62.
119
p.62.
120
P.64.
121
p.65.
22

A partir desse princípio tem-se uma concepção geral de justiça:


Todos os valores sociais – liberdade e oportunidade, renda e riqueza, e as bases sociais da auto-
estima – devem ser distribuídos igualitariamente a não ser que uma distribuição desigual de um
ou de todos esses valores traga vantagens para todos 122.
A partir dessa concepção de justiça, conclui-se que a injustiça “se constitui simplesmente de
desigualdades que não beneficiam a todos”123.
Consequentemente,
“Se certas desigualdades de riqueza e diferenças de autoridade colocam todos em melhores condições
do que nessa posição hipotética, então elas estão de acordo com a concepção geral”124.
 As desigualdades são trabalhadas nessa concepção de justiça como aceitáveis apenas quando a
posição de todos é melhorada.

A distinção entre os dois princípios marca “uma diferença entre os bens sociais primários” e
consequentemente uma “importante classificação no sistema social” 125. Eles se aplicam a instituições,
logo estão diretamente relacionados à estrutura básica da sociedade.

Liberdade: “é um certo padrão de formas sociais”126 baseada em regras que devem ser aplicadas
igualmente a todos. O que pode limitar a liberdade é quando uma liberdade interfere na outra. Busca-
se, assim “a mais abrangente liberdade compatível com uma igual liberdade para todos”127.

Os princípios referem-se aos “sistemas institucionais básicos” e, portanto, não são aplicáveis a casos
particulares128.

Segundo princípio: como cada um se beneficia das desigualdades da estrutura básica  cada homem
“deve achar razoável preferir as suas perspectivas com a desigualdade às suas perspectivas sem ela” 129.
No entanto, são muitos os modos como as pessoas podem ter vantagens tomando como ponto de
partida a igualdade. Qual modo deve ser escolhido é o que será trabalhado a seguir.

12. Interpretações do segundo princípio

122
p.66.
123
p.66.
124
p.67.
125
p.67.
126
p.68.
127
p.68.
128
p.69.
129
p.69.
23

A frases “vantajosas para todos” e “igualmente abertos a todos”  ambíguas  cada uma tem dois
sentidos independentes um do outro  ao final tem-se “quatro significados possíveis”130.

Interpretações:
(1) liberdade natural
(2) igualdade liberal
(3) igualdade democrática
(4) aristocracia natural

(1) Liberdade Natural:


- Primeira parte do segundo princípio  “princípio de eficiência” aplicado à estrutura básica da
sociedade.
- Segunda parte do segundo princípio  “sistema social aberto”  economia de mercado livre

Princípio da Eficiência:
“(...) as posições estão abertas àqueles capazes de lutar por elas e dispostos a isso, levará a uma
distribuição justa”131. A partir desse princípio:
(...) uma configuração é eficiente sempre que é impossível mudá-la de modo a fazer com que
algumas pessoas (pelo menos uma) melhorem a sua situação sem que, ao mesmo tempo, outras
pessoas (pelo menos uma) piorem a sua132.
Esse princípio da eficiência, muito comum na literatura da Economia, aplicado à estrutura básica da
sociedade pode ser resumido da seguinte forma:
(...) uma organização de direitos e deveres na estrutura básica é eficiente se, e somente se, é
impossível mudar as regras, redefinir o esquema de direitos e deveres, de modo a aumentar as
expectativas de qualquer dos homens representativos (pelo menos um) sem ao mesmo tempo
diminuir as expectativas de um (pelo menos um) outro homem representativo 133.
Nenhum dos dois princípios pode ser violado ao mudar a estrutura básica. Em resumo: “Uma
organização da estrutura básica é eficiente quando não há como mudar essa distribuição de modo a
elevar as perspectivas de alguns sem diminuir as perspectivas de outros”134.

130
P.69.
131
p.71.
132
p.71.
133
p.74.
134
p.74.
24

Dentro das diversas possibilidades de organizações eficientes (divisão de vantagens + cooperação


social) busca-se uma que concilie “uma concepção de justiça que eleja também como justa uma dessas
distribuições eficientes”135. Isso porque o princípio da eficiência sozinho não implica necessariamente
em uma sociedade justa. Assim é necessário completar esse princípio de algum modo.

No caso do sistema da liberdade natural “o princípio da eficiência é restringido por certas instituições
básicas”136 que, se respeitadas, consideram justas as distribuições eficientes. Nesse sistema a
distribuição inicial é regulada por uma igualdade formal de oportunidades, isto é: “todos têm pelo
menos os mesmos direitos legais de acesso a todas as posições sociais privilegiadas” 137 a partir de uma
concepção de “carreiras abertas a talentos”. Entretanto, a distribuição inicial é influenciada por
contingências naturais e sociais o que acaba por ser uma injustiça desse sistema, já que os fatores de
distribuição inicial são arbitrários o que tem como conseqüência uma igualdade apenas formal e não de
fato.

A igualdade liberal tenta resolver esse problema aliando à concepção de carreiras abertas a talentos “a
condição adicional de uma eqüitativa igualdade”138. Com isso, busca-se uma igualdade eqüitativa e não
apenas formal. Por igualdade eqüitativa entende-se “que aqueles com habilidades e talentos
semelhantes devem ter chances semelhantes na vida”139 independente do lugar que ocupam no sistema
social.  igualdade eqüitativa de oportunidades.  “As expectativas daqueles com as mesmas
habilidades e aspirações não devem ser afetadas por sua classe social”140. Essa solução busca minimizar
as contingências naturais e sociais. Para isso “é necessário impor ao sistema social condições
estruturais básicas adicionais”141.  A solução está na estrutura de instituições políticas e legais. 
“evitar acúmulos excessivos de propriedade e riqueza” + “iguais oportunidades de educação para
todos”142. Em resumo:
As oportunidades de se atingir conhecimento cultural e qualificações não deveriam
(*) depender da posição de classe de uma pessoa, e assim o sistema escolar, seja publico
ou privado, deveria destinar-se a eliminar barreiras de classe.

135
p.75.
136
p.76.
137
p.76.
138
p.77.
139
p.77.
140
p.77.
141
p.77.
142
p.77.
25

Essa concepção tem como problema o fato de que mesmo que elimine a influência das contingências
sociais, “ela ainda permite que a distribuição de renda e riqueza seja influenciada pela distribuição
natural de habilidades e talentos”143.  “loteria da natureza”  resultado arbitrário  distribuição de
renda e riqueza obedecendo à casualidade histórica ou social + “princípio de oportunidades eqüitativas
só pode ser realizado de maneira imperfeita”144  na prática não há como assegurar igualdade de
condições.

Concepção de aristocracia natural: não se tenta minimizar as contingências sociais. Igualdade formal de
oportunidades mas “as vantagens das pessoas com maiores dotes naturais devem limitar-se àqueles que
promovem o bem dos setores mais pobres da sociedade.”145 Ideal aristocrático  sistema aberto 
“(...) a melhor situação daqueles favorecidos por ele é considerada justa apenas quando menos
possuiriam os que estão em posição inferior se menos fosse dado para os que estão em posição
superior”146.

Concepção liberal e da aristocracia natural  instáveis  contingência natural +/ou acaso natural. 
ambas parecem perspectivas arbitrárias.  melhor solução dentre as quatro alternativas: concepção
democrática.

13. A igualdade democrática e o princípio da diferença

Igualdade democrática: igualdade eqüitativa de oportunidades + princípio da diferença que “elimina a


indeterminação do princípio da eficiência elegendo uma posição particular a partir da qual as
desigualdades econômicas e sociais da estrutura básica devem ser julgadas”147.

Liberdade igual e igualdade eqüitativa de oportunidades demandam que “as maiores expectativas
daqueles em melhor situação são justas se, e somente se funcionam como parte de um esquema que
melhora as expectativas dos membros menos favorecidos da sociedade”148.

O princípio da diferença

143
p.78.
144
p.78.
145
p.78.
146
p.78.
147
p.79.
148
pp. 79,80.
26

Resumo do princípio: “se não houver uma distribuição que melhore a situação de ambas as pessoas
(...), deve-se preferir uma distribuição igual”149.

Concepção utilitarista  indiferente “ao modo de distribuição de uma quantia fixa de bens” 150. 
recorre à igualdade para resolver impasses.

Distribuição de renda entre classes sociais pensada a partir de indivíduos representativos


(“Suponhamos que os vários grupos pertencentes a diferentes faixas de renda estejam correlacionados a
indivíduos representativos”151).

Diz o princípio da diferença: “a desigualdade é justificável apenas se a diferença de expectativas for


vantajosa para o homem representativo que está em piores condições”152.

Necessário distinguir o princípio:


(1) Expectativas dos menos favorecidos  maximizadas  Nenhuma mudança daqueles que estão em
melhor posição pode melhorar a sua situação153.  esquema perfeitamente justo.
(2) “as expectativas de todos os mais favorecidos de qualquer forma contribuem para o bem-estar dos
menos favorecidos”154  nesse ponto ainda não se chegou ao máximo.  o esquema justo mas a
organização não o é.

Esquema injusto: Expectativas mais altas são excessivas + violação dos outros princípios da justiça.

Princípio da diferença: princípio maximizador.

“A diferença ainda maior entre as classes viola o princípio de vantagens mútuas e também o da
igualdade democrática”155.

149
P.80.
150
p.81.
151
p.82.
152
p.82.
153
p.83.
154
p.83.
155
p.84.
27

Princípio da diferença compatível com o da eficiência.  quando o princípio da diferença está


satisfeito “é impossível melhorar a situação de qualquer homem representativo sem piorar a de outro,
ou seja, a do homem representativo menos favorecido cujas expectativas devemos maximizar” 156, “a
posição de cada homem é melhorada em relação à ordenação inicial de igualdade” 157 a partir da busca
da maximização de expectativas a fim de trazer benefícios para todos.  “A justiça tem primazia sobre
a eficiência” mas “um esquema perfeitamente justo é também eficiente” 158.

Um conceito importante para pensar o princípio da diferença é o de ligação em cadeia. 


desigualdades de expectativas ligadas em cadeia, isto é, entrelaçadas: “se uma vantagem tem o efeito
de elevar as expectativas da posição mais baixa, ela também eleva as expectativas de todas as camadas
intermediárias”159. Com isso, todos se beneficiam ao se satisfazer o princípio da eficiência. No caso
dessas condições não serem satisfeitas, considerando como prioridade a melhoria para os menos
favorecidos (maximização), as pessoas em situação melhor não deveriam “ter poder de veto em relação
aos benefícios disponíveis para os menos favorecidos”160.

Duas características das instituições que possibilitam distribuição de benefícios (estrutura básica) são:
(1) elas “são montadas para promover certos interesses fundamentais que todos têm em comum”161.
(2) nelas os cargos e posições são abertos.
Com isso, é possível que a ligação em cadeia esteja correta desde que estejam em vigor os outros
princípios da justiça.

As conseqüências dos princípios de justiça em geral, tais como o princípio da diferença e o princípio da
eficiência são as contribuições positivas, isto é, as “vantagens daqueles em posições privilegiadas
aumentam as perspectivas dos menos favorecidos”162, ou seja, “qualquer movimento na direção da
ordenação perfeitamente justa melhora as expectativas de todos”163.

Esquema social justo  difusão geral de benefícios.

156
p.84.
157
p.84.
158
p.84.
159
p.85.
160
p.85.
161
p.87.
162
p.87.
163
p.87.
28

Mas é possível que não ocorra o entrelaçamento e não funcione a relação de ligação em cadeia
(melhoria de uns  melhoria de outros). Para resolver esse problema, princípio do intervalo lexical que
consiste em
(...) em uma estrutura básica com n representantes, primeiro maximizar o bem-estar do homem
representativo em pior situação. Segundo, para obter igual bem-estar do representante em pior
condição, maximizar o bem-estar do homem representativo cuja posição desfavorecida vem logo
após a do primeiro, e assim por diante até o último estágio que é, para obter igual bem-estar de
todos os representantes que precedem n-1, maximizar o bem-estar do homem representativo na
melhor situação.
Mas esse princípio é difícil de ser colocado em prática em casos concretos uma vez que, com a
melhoria potencial dos mais favorecidos terá também uma melhoria para os menos favorecidos. 
Com isso, melhor usar o princípio da diferença. Ao fim, resumo do segundo princípio:
As desigualdades econômicas e sociais devem ser ordenadas de modo a serem ao mesmo tempo
(a) para o maior beneficio esperado dos menos favorecidos e (b) vinculadas a cargos e posições
abertos a todos em condições de igualdade eqüitativa de oportunidades. 164

14. A igualdade eqüitativa de oportunidades e a justiça procedimental pura

Segunda parte do segundo princípio (princípio liberal da igualdade eqüitativa de oportunidades) 


ligado ao princípio de diferença  relacionado com a idéia de justiça procedimental pura  diferente
da noção de carreiras abertas a talentos.

Exigência das posições abertas  não é unicamente nem principalmente de eficiência 165.  “Pode ser
possível melhorar a situação de todos através da atribuição de certos poderes e benefícios a
determinados cargos, apesar do fato de certos grupos serem excluídos delas” 166.  Essa exclusão de
alguns grupos vai contra o princípio das posições abertas segundo o qual há injustiça se há posições
que não estão abertas para todos os grupos.  Contra essa posição está o fato de ser possível que no
caso citado, no qual o acesso é restrito a alguns cargos, seja possível “atrair talentos superiores e
encorajar melhores desempenhos”167.

Estrutura básica  objeto primeiro da justiça na teoria da justiça como eqüidade (nem todas as teorias
éticas fazem essa relação entre justiça e estrutura básica).

Teoria da justiça como eqüidade:


164
p.88.
165
P.89.
166
P.90.
167
P.90.
29

Sociedade: “empreendimento cooperativo para a vantagem de todos”168.


Estrutura básica: regras  atividades  homens agindo juntos  maior quantidade de benefícios 
direitos a cada um sobre os produtos169. // Dentro dessa estrutura o que uma pessoa faz está
intimamente relacionado com os direitos que ela tem.

Questão das partes distributivas  questão de justiça procedimental pura.

Justiça procedimental pura  para entendê-la, comparar: justiça procedimental perfeita e justiça
procedimental imperfeita.

Justiça procedimental perfeita:


- “Há um critério independente para uma divisão justa”170 definido e separado antes de acontecer.
- “É possível criar um procedimento que com certeza terá o resultado desejado”171.
 Padrão (qual o resultado se quer) + Procedimento (como se chegar ao resultado pretendido).

Justiça procedimental imperfeita:


Exemplificada pelo processo criminal: “O resultado desejado é que o réu seja declarado culpado se, e
somente se, ele cometeu o crime de que é acusado”172.  A conclusão do processo deve ser baseada na
verdade. Mas nesse caso parece impossível saber com certeza qual é a verdade, já que: “Mesmo que a
lei seja cuidadosamente obedecida, e os processos conduzidos de forma justa e adequada, pode-se
chegar ao resultado errado”173.  Trata-se de um erro judiciário; não é uma falha humana, mas “da
combinação fortuita de circunstâncias”174.
Justiça procedimental pura:
“(...) se verifica quando não há critério independente para o resultado correto: em vez disso, existe um
procedimento correto ou justo de modo que o resultado será também correto ou justo, qualquer que seja
ele, contando que o procedimento tenha sido corretamente aplicado.” 175.  Influência das
circunstâncias contextuais (exemplo do jogo de apostas). Nessa justiça, o processo para se chegar ao

168
P.90.
169
P.90.
170
P.91.
171
P.91.
172
P.91.
173
P.92.
174
P.92.
175
P.92.
30

resultado deve ser levado a cabo176.  “Um procedimento eqüitativo traduz a sua eqüidade no
resultado apenas quando é efetivamente levado a cabo” 177.  Para que isso seja possível é necessário
(construir e administrar) um sistema justo de instituições 178.  Com isso não se faz mais necessário
“controlar a infindável variedade de circunstâncias nem as posições relativas mutáveis de pessoas
particulares”179.

Objetivo do princípio da igualdade eqüitativa de oportunidades: “assegurar que o sistema de


cooperação seja um sistema de justiça procedimental pura” 180.  Assim, a organização da estrutura
básica deve ser julgada a partir de um ponto de vista geral181.

Aquilo que é produzido segue um sistema público de regras que determinam “o que é produzido,
quanto é produzido” e como182.

Na teoria da justiça como eqüidade a distribuição é corrigida a partir da cooperação.  A distribuição é


pensada dentro do sistema, de acordo com os indivíduos que fazem parte dele.  A pergunta abstrata
sobre a distribuição, ou seja, essa pergunta feita desvinculada de um sistema de regras, não faz sentido.

A justiça alocativa “se aplica quando um dado conjunto de bens deve ser dividido entre indivíduos
concretos com necessidades e desejos conhecidos”183.  É natural pensar que a distribuição deve ser
feita “de acordo com desejos e necessidades, ou até mesmo maximizar o saldo líquido de
satisfação.”184.  Justiça como eficiência (ao menos que se prefira a igualdade).  Essa concepção de
justiça alocativa está de acordo com a perspectiva do utilitarismo clássico.  O utilitarismo segue
como padrão para distribuição a busca de obter “o maior saldo líquido de satisfações”185. Para isso, “as
instituições são organizações mais ou menos imperfeitas cuja finalidade é atingir este objetivo” 186. Com
isso, a estrutura básica da perspectiva utilitarista é “um caso de justiça procedimental imperfeita”187.

176
P.92.
177
P.93.
178
P.93.
179
P.93.
180
P.93.
181
P.93.
182
P.94.
183
P.94.
184
P.94.
185
P.95.
186
P.95.
187
P.95.
31

Para a teoria da justiça como eqüidade, “as duas partes do segundo princípio são lexicalmente
ordenadas”188, mas é necessário investigar “baseada em quais suposições, se é que existe alguma, a
escolha da ordenação lexical deveria ser feita?”189.

Concepção de parcelas distributivas  simplificação para caracterizar a estrutura básica como uma
forma de ordenação que segue a idéia de justiça procedimental pura190.

15. Os bens sociais primários como a base das expectativas

Os próximos capítulos apresentarão a organização de instituições segundo a concepção de justiça


trabalhada nos capítulos anteriores a partir dos dois princípios de justiça.

Discussão das expectativas  comparação com o utilitarismo.

Utilitarismo: maximização das utilidades esperadas considerando as posições relevantes. Para isso,
supõe uma concepção de utilidade.
Utilidade: medida (para cada representante individual) + método de “correlacionar as escalas de
pessoas diferentes”191  a noção de utilidade não pode ser baseada na intuição, mas em noções éticas e
outras que não são éticas, como é o caso do preconceito e do interesse pessoal.  As comparações
interpessoais de bem-estar não implicam necessariamente em uma constatação fundamentada do que
seja uma boa concepção de bem-estar. Por isso é necessário avaliar esses julgamentos comparando-os a
partir de algum fundamento objetivo. Esse é um problema do utilitarismo, uma vez que “A discussão a
respeito das comparações interpessoais obscurece a verdadeira questão, ou seja, a de saber se deve ser
maximizada em primeiro lugar a felicidade total ou a felicidade média” 192.

No caso da teoria da justiça como eqüidade, o princípio da diferença busca “estabelecer as bases
objetivas para as comparações pessoais de dois modos”193:

188
P.95.
189
P.95.
190
P.95.
191
P.96.
192
p.97.
193
p.97.
32

(1) “identificar o homem representativo menos favorecido”194 e, a partir dessa constatação é possível
saber “de que posição o sistema social deve ser julgado” 195.  não é necessário calcular soma de
vantagens a partir de comparações interpessoais qualitativas; estas só são importantes para calcular
qual é a posição mais baixa. A partir disso os juízos do homem representativo são suficientes196.
(2) “simplificação para a base de comparações interpessoais”197 a partir de expectativas de bens sociais
primários.
Bens sociais primários: “são coisas que se supõe que um homem racional deseja, não importa o que
mais ele deseje”198 e que “tendo uma maior quantidade desses bens, os homens podem geralmente estar
seguros de obter um maior sucesso na realização de suas intenções e na promoção de seus objetivos,
quaisquer que sejam eles”199. São eles os direitos, as liberdades e oportunidades, renda e riqueza e estão
intimamente ligados à estrutura básica na medida em que “as liberdades e oportunidades são definidas
pelas regras das instituições mais importantes, e a distribuição de renda e riqueza é por elas
regulada”200.

Não há discordância entre a interpretação do bem contratualista e utilitarista. Idéia principal: “(...) o
bem de uma pessoa é determinado pelo que é para ela o mais racional plano de vida a longo prazo,
dadas circunstâncias razoavelmente favoráveis.”201  homem é feliz quando tem algum sucesso na
realização de seu plano.  bem: “satisfação de um desejo racional” 202.  os bens sociais primários são
aqueles que possibilitam a realização desses desejos.

“Construção da lista ordenada de bens sociais primários”203:


Suposição: os dois princípios da justiça ordenados de modo serial  liberdades básicas: iguais +
igualdade eqüitativa de oportunidades + direitos de autoridade (distribuição variável) + rendas e
riqueza (também de distribuição variável).

194
p.97.
195
p.97.
196
p.97.
197
p.97.
198
p.97.
199
p.98.
200
p.98.
201
p.98.
202
p.98.
203
p.98.
33

(1) Problema da lista ordenada: como “estabelecê-la para o grupo menos favorecido” 204  Para isso,
tentativa de assumir o ponto de vista de um indivíduo representativo desse grupo menos favorecido e, a
partir desse ponto de vista, pensar como será a distribuição. Entretanto, essa operação só é possível
baseando-se em estimativas intuitivas.

(2) Outra objeção possível: expectativas poderiam ser pensadas não como uma lista ordenada de bens
primários, mas como a satisfação dos planos racionais (possíveis de serem realizados a partir desses
bens primários) uma vez que a felicidade consiste na realização desses planos 205.  Mas a teoria da
justiça como eqüidade não assume esse ponto de vista, já que “supõe que os membros da sociedade são
pessoas racionais capazes de ajustar as suas concepções do bem à própria situação”206  “A todos é
assegurada igual liberdade para que persigam qualquer plano de vida que lhes agrade, contando que
isso não viole as exigências da justiça”207.  O importante é que a organização da sociedade funcione
de modo justo. Assim, as pessoas têm condições (as “coisas das quais presumivelmente todos eles em
geral precisam para realizar seus planos”208) de buscar satisfazer seus planos.  Essa é a base do bem
para a concepção da teoria da justiça como eqüidade, já que não é possível chegar a um consenso
acerca daquilo que deve ser buscado (através dos planos).

16. Posições sociais relevantes

Concepção de indivíduos representativos e a visão tida por eles do sistema social possibilitam a
aplicação dos dois princípios de justiça à estrutura básica da sociedade 209. Entretanto, para se chegar a
isso é necessário escolher quais posições sociais são relevantes uma vez que não é possível em uma
teoria da justiça abarcar toda a multiplicidade de posições existentes no mundo.  “identificar certas
posições como mais básicas que as outras e capazes de fornecer um ponto de vista apropriado para o
julgamento do sistema social”210.  Como fazer esta escolha?

Resumo da teoria da justiça como eqüidade:

204
p.99.
205
p.99.
206
p.100.
207
p.100.
208
p.100.
209
p.101.
210
p.101.
34

Objeto primeiro da justiça: estrutura básica da sociedade, que “favorece alguns lugares de partida em
detrimento de outros na divisão dos benefícios da cooperação social” 211.  Os dois princípios devem
regular essas desigualdades (acaso natural e boa sorte social), mas quando estas são reguladas surgem
outras a partir das ações do homem exercendo a liberdade de associação212.

Posições sociais relevantes são “os lugares de partida generalizados e agrupados de forma adequada”213.

Cada pessoa ocupa duas posições na sociedade:


(1) cidadania igual
(2) posição ocupada na sociedade de acordo com a distribuição de renda e riqueza (variada)

Estrutura básica: cidadania igual: (1) princípio de liberdade (direitos e liberdades) + (2) princípio de
igualdade eqüitativa de oportunidades.

Princípio do interesse comum:


Segundo tal princípio, as instituições são classificadas de acordo com a sua eficácia em garantir
as condições necessárias para que todos promovam seus objetivos de forma igual, ou segundo a
sua eficiência em proporcionar objetivos partilhados que beneficiarão a todos de forma
semelhante”214.

Definição de homens representativos não é satisfatória para julgar as desigualdades econômicas e


sociais. Homens representativos definidos por níveis de riqueza e renda (bens sociais primários) que
estão intimamente relacionados com as diferenças de autoridade e responsabilidade 215. problema:
delimitar qual é o grupo menos favorecido.

O grupo menos favorecido é o que sofre mais dos três tipos de contingências:
(1) origem familiar e de classe
(2) dons naturais
(3) sorte ao longo da vida
Esses três tipos são relacionados com os bens sociais primários.

211
p.101.
212
p.102.
213
p.102.
214
pp.102,103.
215
P.103.
35

Entretanto, ainda considerando essas contingências, é difícil evitar que a escolha da posição menos
favorecida seja arbitrária. Isso porque é possível fazer essa escolha com critérios diferentes, por
exemplo, (1) escolher uma posição social particular considerando a questão da renda e riqueza, ou
outro exemplo, (2) pensar a questão da renda e riqueza não particularmente, mas de modo relativo, sem
referência às posições sociais.  Ambos critérios abarcam os mais desfavorecidos pelas contingências.
A partir deles é possível fornecer uma base “para determinar em que nível um mínimo social pode ser
fixado, a partir do qual (...) a sociedade poderia começar a satisfazer o princípio da diferença”216.

A teoria da justiça como eqüidade “analisa o sistema social a partir da posição de cidadania igual e dos
vários níveis de renda e riqueza”217 .

Direitos básicos desiguais  características naturais físicas  posições relevantes a selecionar.


Quando essas características não podem ser mudadas, tem-se pontos de partida na estrutura básica218.

Desigualdades  posições relevantes  dificultam a aplicação dos dois princípios  não são
vantajosas para os menos beneficiados  logo, quando menos desigualdades e, consequentemente
posições relevantes, mais justa será a sociedade.

Posições sociais relevantes (ponto de vista geral) ≠ posições particulares.  Prioridade para juízos
feitos a partir de posições relevantes em relação aos juízos de situações particulares para a aplicação
dos dois princípios de justiça219.  “As posições sociais relevantes especificam, então, o ponto de vista
geral a partir do qual os dois princípios da justiça devem ser aplicados à estrutura básica”220.

17. A tendência à igualdade

Princípio da reparação: segundo ele, “desigualdades imerecidas exigem reparação; e como


desigualdades de nascimento e de dotes naturais são imerecidas, elas devem ser de alguma forma
compensadas”221.  “reparar o desvio das contingências na direção da igualdade” 222. Esse princípio não

216
p.104.
217
p.105.
218
p.105.
219
p.105.
220
p.106.
221
p.107.
222
p.107.
36

é o único que deve ser levado em conta como critério de justiça mas deve ser considerado, sendo um
dos elementos da teoria da justiça como eqüidade. Entretanto, o princípio da diferença e o princípio da
reparação não são o mesmo princípio, ainda que o primeiro realize uma parte dos objetivos do último.

Princípio da diferença: tentativa de minimizar a influência das contingências na sociedade que


beneficiam uns e não outros. Para isso, busca-se ordenar a estrutura social “de modo que as
contingências trabalhem para o bem dos menos favorecidos” 223 através de benefícios compensatórios
(menos favorecidos recebem, mais favorecidos dão).

Distribuição natural de contingências  não é justa nem injusta, mas apenas fatos naturais. “O que é
justo ou injusto é o modo como as instituições lidam com esses fatos” 224.  sistema social pensado
como “padrão de ação humana”  pode ser mudado: as contingências naturais não são necessárias
(como o próprio nome diz).

“O princípio da diferença expressa uma concepção de reciprocidade” 225  reciprocidade no sentido de


benefício mútuo que pode parecer distorcido em relação aos menos beneficiados.

“O princípio da diferença como uma base eqüitativa de regulação da estrutura básica” 226 através de “um
sistema justo de cooperação com uma estrutura de regras comuns, e estando as expectativas fixadas por
ele”227.

Princípio de fraternidade:
Normalmente esse princípio ocupa um lugar menos importante na teoria democrática 228. Isso talvez se
deva porque seja comum relacionar laços sentimentais ao princípio de fraternidade. Entretanto, esse
princípio incorpora exigências do princípio da diferença na medida em que, segundo ele: “Aqueles que
estão em melhor situação estão dispostos a receber seus objetivos mais elevados apenas dentro de um
esquema no qual isso resulte em benefícios para os menos afortunados”229.

223
p.108.
224
p.109.
225
p.109.
226
p.110.
227
p.110.
228
p.112.
229
p.113.
37

Interpretação democrática dos dois princípios da justiça da teoria da justiça como eqüidade:
Primeiro princípio  liberdade  (igualdade –cidadão– + igualdade eqüitativa de oportunidades).
Segundo princípio  diferença  fraternidade.

Uma vez que está relacionada a um dos princípios estruturantes da sociedade, a fraternidade “impõe
uma exigência definida sobre a estrutura básica da sociedade” 230.  Com isso, a interpretação
democrática dos dois princípios não implica em uma sociedade meritocrática.

Sociedade meritocrática  carreiras abertas a talentos + igualdade de oportunidades. Considerando as


contingências, a igualdade de oportunidades faz aumentar as diferenças: “A igualdade de oportunidades
significa uma chance igual de deixar para trás os menos afortunados na busca pessoal de influência e
posição social”231.  Essa perspectiva não está de acordo com o princípio da diferença da teoria da
justiça como eqüidade, segundo o qual “as maiores habilidades são consideradas como um bem social a
ser usado para o beneficio comum”232.

18. Princípio para indivíduos: o princípio da eqüidade

Para uma concepção do justo são necessários princípios. No caso da teoria da justiça como eqüidade,
há uma ordem de prioridade dos princípios para a estrutura básica da sociedade: (1) princípios para a
estrutura básica da sociedade (2) princípios para indivíduos (3) princípios para o direito
internacional233.

Esses princípios estão relacionados a alguns deveres (obrigações).

Obrigações  princípios para as organizações sociais (escolhidos antes dos princípios para os
indivíduos)  esse fato implica na constatação da “natureza social da virtude como justiça, sua íntima
ligação a práticas sociais”234  “na maioria dos casos os princípios para obrigações e deveres devem
ser determinados depois dos princípios para a estrutura básica”235.

230
p.113.
231
p.114.
232
P.115.
233
p.116.
234
p.118.
235
p.118.
38

Concepção do justo: escolha das partes na posição original de uma concepção de justiça + os princípios
que a sustentam236.  Para a concepção de justiça é necessário um consenso acerca das noções
principais (como as noções eqüidade e fidelidade).  Algo é justo “se está de acordo com os princípios
que, na posição original, seriam reconhecidos como aplicáveis a coisas do mesmo tipo”237.

Princípio de eqüidade: Segundo esse princípio cada pessoa deve fazer sua parte de acordo com as
regras da instituição que satisfaça os dois princípios de justiça (seja justa e eqüitativa) e que “a pessoa
tenha voluntariamente aceitado os benefícios da organização ou tenha aproveitado a vantagem das
oportunidades que ela oferece para promover os seus interesses próprios” 238.  Importante para esse
princípio o fato dos membros da instituição participarem dela de modo a terem uma “cooperação
mutuamente vantajosa”239  Estão de acordo com regras que restringem sua liberdade para que todos
sejam favorecidos.  Nesse sentido, quando todos fazem sua parte, a organização da sociedade é justa.
 Para tanto são necessárias obrigações que os membros da organização social devem obedecer para
que ela seja justa.

Duas partes do princípio da eqüidade:


(1) “as instituições ou práticas em questão devem ser justas” 240  condição para que (2) a segunda
parte, que “caracteriza os atos voluntários exigidos”241, seja obedecida.  O obedecimento a
obrigações só pode ser exigido em formas de governos justas: Não é possível exigir que se obedeça a
formas de governo arbitrárias.  Isso porque as obrigações são resultado de atos voluntários,
“manifestação de um compromisso explícito ou tácito, (...) como no caso da aceitação de benefícios” e
“são em geral devidas a indivíduos definidos, ou seja, aqueles que cooperam juntos para manter a
ordenação em questão”242.

19. Princípios para indivíduos: os deveres naturais

236
p.118.
237
P.118.
238
P.119.
239
P.120.
240
P.120.
241
P.120.
242
P.121.
39

O princípio da eqüidade explica as obrigações, mas há deveres que são naturais, positivos e
negativos243.

Deveres naturais:
(1) Ajuda mútua: “dever de ajudar o próximo quando ele está necessitado ou correndo perigo, contanto
que possamos fazer isso sem perda ou risco para nós mesmos” 244  dever positivo (faz algo de bom
pelo outro).
(2) “não lesar ou agredir o próximo”245 e (3) não causar sofrimento desnecessário  deveres negativos
no sentido de não fazer algo ruim ao outro.

 Distinção dever negativo / positivo: intuitiva.  Por isso pode muitas vezes falhar. Essa distinção é
importante em relação ao problema da prioridade no que diz respeito a qual deve tem mais peso que o
outro, um dever positivo ou um negativo.

Obrigações X Deveres naturais: Os últimos não dependem de nossos atos voluntários nem têm relação
com instituições ou práticas sociais, mas se aplicam às pessoas consideradas morais iguais, ou seja,
pessoas em geral246.
Do ponto de vista da justiça como eqüidade, um dever natural fundamental é o dever da justiça.
Esse dever exige nosso apoio e obediência às instituições que existem e nos concernem. Ele
também nos obriga a promover organizações justas ainda não estabelecidas, pelo menos quando
isso pode ser feito sem nos sacrificar demais 247.

“Uma vez que temos em mãos o conjunto completo de princípios, uma concepção do justo plenamente
formulada, podemos simplesmente esquecer concepção da posição original e aplicar esses princípios
como faríamos com quaisquer outros”248.

O dever natural é mais fundamental que o princípio da eqüidade:


(1) Dever natural  se aplica aos cidadãos de modo geral e “sua aplicação não exige atos
voluntários”249.
X

243
P.122.
244
P.122.
245
P.122.
246
pp.122,123.
247
P.123.
248
P.124.
249
P.124.
40

(2) Princípio da eqüidade  “vincula apenas aqueles que ocupam cargos públicos, (...) ou aqueles que
(...) promoveriam seus objetivos dentro do sistema”250.

250
P.124.
41

Referência Bibliográfica

RAWLS, John. Uma Teoria da Justiça. Tradução: Almiro Pisetta e Lenita M. R. Esteves. São Paulo:
Martins Fontes, 2000.

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