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Ficção: por uma antropologia da possibilidade

Prof. Dr. Joel Felipe Guindani/ Disciplina de Prod. Audiovisual

“O processo do mundo ainda não está decidido em nenhum lugar, nem


tampouco está frustrado; e os homens podem ser na terra os guardiões do seu
rumo ainda não decidido, quer para a salvação, quer para a perdição. O mundo
permanece, na sua totalidade, como um fabril laboratorium possibilis salutis”.
(Ernst Bloch).

Muitas são as teorias que fundamentam o conceito de ficção.


Inicialmente na literatura e posteriormente nas artes visuais, na dramaturgia e
no cinema, a ficção é genericamente compreendida com um ato ou efeito de
fingir. Uma simulação. Criação da imaginação, invenção fabulosa. No cinema,
as primeiras ficções estiveram ancoradas na ciência, ou seja, na ficção
científica, narrativa inspirada pelo progresso da ciência e da tecnologia, e cujos
lances, situados em geral no futuro, pretendem antecipar-se (e às vezes se
antecipam) a novas descobertas científicas. Porém, o que sugiro é pensarmos
a ficção desde a antropologia, ou seja, a partir da natureza humana, que
sabemos, não é apenas material ou racional, mas espiritual, mística e
metafísica.

Por este caminho, devemos situar a nossa humanidade como um


constante “vir a ser”, ancorado, sobretudo, na projeção, na imaginação, da
mesma forma que Platão demonstra com o Mito da caverna. Desde a história
antiga, a disputa para compreender e descrever a realidade se situa no limite
entre a descrição do que acontece e do que acontecerá. É uma disputa quase
que natural entre todas as áreas do conhecimento. No entanto, nesta disputa, a
produção do conhecimento e as formas de expressão da realidade sempre
tenderam mais à possibilidade do que a realidade. O conhecimento da história,
nada mais é do que uma tentativa de anunciar as possibilidades.

Assim, a antropologia da possiblidade exige necessariamente um


entendimento do mundo aberto ao futuro e à história: a esperança humana
encontra-se fundada nas infinitas possibilidades abertas do processo cósmico.
Sem estas possibilidades reais, a esperança seria um absurdo, porque,
segundo Kierkegaard, a esperança é precisamente a "paixão pelo possível".
Bloch valoriza muito mais o conceito de possibilidade do que o conceito de
realidade: a realidade mais não é do que a realização de alguma possibilidade.

Por isso, Bloch elaborou uma ontologia (entendimento do ser) do que


“ainda-não-é”, mas que é possível ou susceptível de vir a ser. Ao sentido de
realidade do homem corresponde logicamente o sentido de possibilidade. O
mundo em que vivemos e esperamos não é um edifício acabado e concluído,
mas uma combinação de realidades e de possibilidades, isto é, um processo
aberto. Não é um sistema de estruturas eternamente repetíveis e
reproduzíveis, mas uma história aberta, onde acontecem e podem ser
realizadas coisas novas.

Por este motivo é que o gênero ficcional (a grande maioria) faz tanto
sucesso. É uma linguagem que oferece ao espectador mais possibilidades do
que evidencias ou respostas. Por este caminho, produzir o gênero ficcional e
esperar um relativo sucesso é estar atento aos limites entre o humanamente
possível e impossível. O cuidado está em não exagerar nas possibilidades a
ponto de não oferecer ao espectador um mínimo de identificação ou de
realidade.

Termino esta reflexão com Aristóteles. Na sua Poética, Aristóteles


contrapõe duas formas básicas de narrativa: a histórica e a poética. A primeira
tem por objeto o dado concreto e inscreve-se no domínio da realidade efetiva,
da experiência empiricamente verificável. A segunda, pelo contrário, é definida
como uma realidade demarcada do mundo objetivo e transportada para o reino
do possível: "Não é obra de um poeta dizer o que aconteceu, mas o que
poderia acontecer, e o que é possível acontecer, segundo o que é verosímil e
necessário." (Poética 1451a). A ficção surge, portanto, no pensamento de
Aristóteles, como o território da verosimilhança, ou seja, daquilo que sem ser
real é credível que tenha ou possa ter acontecido. O verosímil não é mais,
portanto, que uma analogia do verdadeiro, e por isso podemos dizer, como
Ricoeur, que a ficção é a capacidade de um fazer-crer, mercê do qual o artifício
é tomado como um testemunho autêntico sobre a realidade e a vida (Ricoeur,
1983). Assim, a produção audiovisual também é a arte da aposta, que conta
uma estória através de imagens, sons, planos, composições, ângulos, mas
sempre enraizada na nossa essência antropológica: a capacidade de estar no
real e apostar no mundo das possibilidades.

Referencias:

RICOEUR, Paul (1983). Temps et récit. Paris: Seuil. /SOUZA, Francisco Saraiva de. Cybercultura e democracia.
Disponível em: http://cyberdemocracia.blogspot.com.br/

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