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PAISAGENS GEOGRÁFICAS
Editora da FECILCAM
Diretora - Ana Paula Colavite
Vice-diretora - Dalva Helena de Medeiros
Rosangela Maria Pontili - Coordenadora Geral
Coordenador Consultivo - Edson Noriyuki Yokoo
Secretário Executivo - Fernando Árthur de Medeiros Machado
Conselho Editorial
Presidente - Ana Paula Colavite
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Luciana Aparecida Bastos
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Editora da FECILCAM
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CEP 87303-100 - Campo Mourão - PR
Telefone: (44) 3518-1838 - E-mail: editorafecilcam@gmail.com
Organizadores
PAISAGENS GEOGRÁFICAS
Um tributo a Felisberto Cavalheiro
Campo Mourão
2009
© 2009, Dos Autores
Direitos desta edição reservados à Editora da FECILCAM
Capa:
Fotografia de Felisberto Cavalheiro
Editoração e composição:
Editora da FECILCAM
Vários Autores.
ISBN 978-85-88753-07-5
CDD:910.2
Organizadores
Autores
Andréa Presotto
Débora Olivato
Douglas Gomes dos Santos
Fabiane dos Santos Toledo
Felisberto Cavalheiro
Gelze Serrat S. C. Rodrigues
Gert Gröning
Humberto Gallo Junior
João Carlos Nucci
Lívia de Oliveira
Marlene T. Muno Colesanti
Paulo Celso D. Del Picchia
Vânia Rosolen
Yuri Tavares Rocha
Equipe de Apoio
página
Apresentação 08
Douglas Gomes dos Santos
1 Felisberto Cavalheiro e um exemplo de cooperação Brasil-Alemanha 10
na cultura de jardins e desenvolvimento de espaços livres
Gert Gröning
2 Histórico do ordenamento da paisagem 18
Paulo Celso D. Del Picchia
3 Ecologia e planejamento da paisagem 50
João Carlos Nucci
4 Urbanização e alterações ambientais 65
Felisberto Cavalheiro
5 Planejamento dos espaços livres localizados nas zonas urbanas 78
João Carlos Nucci
Andréa Presotto
6 Um índice de áreas verdes para a cidade de Uberlândia/MG 103
Fabiane S. Toledo
Douglas Gomes dos Santos
7 Legislação, políticas ambientais, Unidades de Conservação e gestão 118
do território
Humberto Gallo Junior
Débora Olivato
8 Planejamento e gestão de Unidades de Conservação 135
Humberto Gallo Junior
Débora Olivato
9 Percepção ambiental 153
Lívia de Oliveira
10 Educação para o meio ambiente e Geografia 164
Marlene T. Muno Colesanti
Gelze Serrat S. C. Rodrigues
11 Pedogênese e mudanças na paisagem: um exemplo da região 170
Sudoeste da Amazônia Brasileira
Vânia S. Rosolen
12 Pau-Brasil e a transformação da paisagem da Floresta Atlântica 181
Yuri Tavares Rocha
8
APRESENTAÇÃO
Por fim, eu e João Carlos Nucci discutimos sobre a necessidade de incorporar à obra
um texto do Prof. Felisberto, e a escolha foi um artigo publicado em 1994 em obra organizada
por Samia Tauk, que é referência até os dias de hoje.
Gert Gröning1
Berlim, Alemanha, 2006
Tradução: João Carlos Nucci
Em 1974, retornei de Berkeley, Califórnia para Hanover, Alemanha, vindo de uma bol-
sa-de-estudo concedida para pesquisa a universitários já graduados. A bolsa foi fornecida pelo
Departamento de Arquitetura da Paisagem, Faculdade de Design Ambiental, da Universidade
da Califórnia em Berkeley. Para um estudante da Alemanha em arquitetura da paisagem era
absolutamente singular o recebimento de uma concessão americana naqueles dias. Isso foi
possível graças à eminente arquiteta paisagista americana Beatrix Jones Farrand (1872-1959)
que havia decidido doar sua herança profissional e algum dinheiro para bolsas-de-estudo na
Universidade da Califórnia em Berkeley. A bolsa-de-estudos tinha o nome de Beatrix-Farrand-
Grant. Durante meus estudos de pós-doutorado em Berkeley, eu pude experienciar aberta-
mente todos os tipos de assuntos estrangeiros e, também, ter acesso a uma rara biblioteca do
Campus, a qual eu realmente apreciei.
Os seis meses em Berkeley provaram ser um gratificante suplemento para meus estudos
em Arquitetura da Paisagem na Alemanha. Com um bem estabelecido programa de conferen-
cistas e professores visitantes de todas as partes do mundo, a Universidade da Califórnia em
Berkeley ofereceu uma oportunidade única de familiarização com os aspectos da arquitetura
da paisagem que eu nunca tinha ouvido falar. Pela primeira vez em minha vida, encontrei es-
tudantes de fora do mundo europeu, tais como Japão, Austrália e América do Sul.
Minha experiência em Berkeley fortaleceu uma abertura e orientação internacional em
meus campos de pesquisa e ensino. Entre outros, isto se materializou no seminário “Questões
gerais no Planejamento de Espaços Livres” que eu coordenei na Universidade de Hanover em
1974. Por alguma razão, um brasileiro chamado Felisberto Cavalheiro sentiu-se atraído pelo
tópico e participou desse seminário. Ele apresentou um discurso sobre “Problemas específicos
do planejamento de espaços livres em uma grande cidade de rápido crescimento – o exemplo
de São Paulo, Brasil”. Felisberto contou para sua “Kommilitonen”, colegas bolsistas e a mim
uma estória sobre espaços livres que nós achamos difícil de acreditar.
Em sua apresentação, ele apontou que as questões relacionadas aos espaços livres
eram entendidas muito diferentemente do que se via na Alemanha. Isto não era tudo, ele ex-
plicou que, naqueles anos, a população de São Paulo crescia a uma taxa de cerca de 300.000
pessoas por ano. Aquele crescimento anual de São Paulo podia ser comparado ao número de
habitantes da cidade de Hanover, Alemanha, que havia permanecido mais ou menos estável
em 300.000 habitantes por muitos anos. A administração municipal dos espaços livres, depar-
tamento de parques e recreação, o departamento de cemitérios e o departamento de floresta
1 O professor doutor Gert Gröning foi orientador do trabalho de tese de doutoramento de Felisberto
Cavalheiro, em Hanover (Alemanha) e, atualmente, trabalha com Cultura do Jardim e Desenvolvimento de
Espaços Livres no Instituto para História e Teoria do Design da Universidade das Artes de Berlim (Berlim,
Alemanha).
11
em Hanover eram conhecidos por terem um bom time de funcionários e por serem muito
bem equipados, considerados uma liderança na Alemanha2.
Para os estudantes do seminário, que vieram de vários países europeus, a magnitude
do crescimento anual da população urbana de São Paulo estava além da imaginação, e isto
me incluía. Para nós, os anos de 1970 na América do Sul, especificamente nas cidades do
Brasil, eram muito interessantes. Esses lugares para a Alemanha, e, provavelmente para alguns
outros países europeus, estariam associados com Carnaval e exotismo. Além disso, Felisberto
enfatizou em sua apresentação, que o planejamento de espaços livres era quase desconhecido
na metrópole de São Paulo. Apesar do rápido crescimento das cidades brasileiras, o planeja-
mento de espaços livres não era o maior problema e não havia nenhum programa universitá-
rio para a formação de arquitetos paisagistas.
Também, como apresentado, todos nós não tínhamos idéia do real tamanho do Bra-
sil, a imensidão de seus espaços livres, suas várias regiões e enormes cidades, muito menos
qualquer conhecimento acerca da sociedade brasileira. Por exemplo, não tínhamos idéia da
evolução demográfica de sua população que havia pulado de 71 milhões em 1960 para mais
de 100 milhões em 1972, para a surpresa dos próprios brasileiros. Em 2006, o Brasil está se
aproximando dos 190 milhões de habitantes e, mundialmente, está se tornando o quinto
colocado em tamanho de sua população e em área3. No início dos anos 1970, descobrimos
alguns fatos sobre sua história e constituição social e não sabíamos nada sobre os “paulistas” e
os “bandeirantes”, ambos originários de São Paulo. Tais estudos foram publicados trinta anos
depois, no início do século XXI por Berquó4 e outros que ainda não estão disponíveis para
nós. Então, a apresentação de Felisberto foi uma real abertura-de-olhos. Ela permitiu-nos um
vislumbre da vida real das cidades brasileiras e uma percepção razoável sobre as questões
dos espaços livres.
Apesar das numerosas deficiências para o desenvolvimento de espaços livres, Felis-
berto se mostrava muito entusiasmado e compromissado com seu caso brasileiro. O conheci-
mento de Felisberto ajudou a consolidar algumas ligações com a América do Sul e, especial-
mente, com São Paulo em meu, ainda, vago campo de conhecimentos acerca da arquitetura
da paisagem mundial, com grandes falhas no hemisfério sul. Aprendi muito com Felisberto
e ele queria muito aprender a respeito da situação na Alemanha, pois ele acreditava pudesse
servir como um exemplo da cultura de jardins e desenvolvimento de espaços livres no Brasil
e, especialmente, em suas grandes cidades.
Com esse primeiro encontro, meu relacionamento com Felisberto tornou-se mais pró-
ximo. Tomei conhecimento de que ele havia nascido em São Paulo e lá permaneceu até ini-
ciar seus estudos de graduação, em 1963, na Escola Superior de Agricultura ‘Luiz de Queiroz’
da Universidade de São Paulo em Piracicaba, fundada em 1892. Ele trabalhou por doze anos
no departamento de parques e recreação da cidade de São Paulo e, assim, teve um íntimo
conhecimento da administração de espaços livres. Em 1972, Felisberto foi voluntário por três
meses no departamento de parques e recreação da cidade de Hamburgo na Alemanha. Em
2 Para maiores detalhes sobre os 100 anos de desenvolvimento da administração de espaços livres em
Hanover de 1890 a 1990 veja: GRÖNING, Gert and Joachim WOLSCHKE-BULMAHN 1990: Von der Stadtgärtnerei
zum Grünflächenamt, 100 Jahre kommunale Freiflächenverwaltung und Gartenkultur in Hannover (1890-1990),
Berlin.
3 veja THOMAS, Vinod 2006: From Inside Brazil, Development in a Land of Contrast, Stanford, CA.
4 veja por exemplo BERQUÓ, Elza 2001: Demographic Evolution of the Brazilian Population during the
Twentieth Century, in: Hogan, Daniel Joseph (org.), Population Change in Brazil: contemporary perspectives,
pp.13-33, Campinas, SP, Brazil.
12
muitas ocasiões, ele me contou quão impressionado estava pelo alto grau de realização na
cultura de jardins e desenvolvimento de espaços livres apresentada por aquela administração
e que ele sentia fortemente a necessidade de uma instituição comparável àquela em sua cida-
de de São Paulo. Após um novo retorno para o Brasil, Felisberto veio para a Universidade de
Hanover onde queria continuar seus estudos na arquitetura da paisagem.
Tornou-se claro para mim que Felisberto estava interessado em escrever sua tese de
doutoramento e que ele acreditava que eu pudesse ajudá-lo na implementação de alguns
aspectos relacionados com espaços livres, planejamento, design, e administração no Brasil e,
especialmente, enfatizando seu rápido crescimento das cidades. Contudo, ele não estava certo
de que pudesse fazê-lo. Seu receio se baseava no fato de que a ‘Luiz de Queiroz’ era uma es-
cola de agricultura e não de arquitetura da paisagem. Porém, não havia escola de arquitetura
da paisagem no Brasil naqueles dias. Não obstante, setores da Escola Superior de Agricultura
‘Luiz de Queiroz’ obviamente tratavam de arquitetura da paisagem.
Com apoio de Luiz Teixeira Mendes, professor de cultura de frutos e florestas da Es-
cola Superior, o arquiteto paisagista belga Arsênio Puttemans projetou, por volta de 1907, um
parque para essa escola no estilo paisagístico inglês e supervisionou sua execução em 1909.
Até hoje o design inglês de Puttemans para o parque de Piracicaba/SP, na Escola Superior
de Agricultura, é considerado único em todo Brasil5. Puttemans implantou claramente em
seu conceito vários eixos de visão e, assim, forneceu um exemplo local para os estudos de
arquitetura da paisagem. O interesse em arquitetura da paisagem tornou-se claro para mim
quando tive a chance de ver o parque em Piracicaba, na ocasião do I Fórum de Debates sobre
Ecologia da Paisagem e Planejamento Ambiental, organizado por Felisberto, em Rio Claro/
SP, em 2000.
Puttemans também ensinou arquitetura da paisagem no departamento de horticultura
da Escola Superior de Agricultura ‘Luiz de Queiroz’. Naqueles dias, ele era um designer de
espaços livres bem conhecido no Brasil. Em 1909, ele também projetou o Parque da Inde-
pendência, algo de reminiscência dos Jardins de Versailles, França. O parque se localiza em
frente ao Museu do Ipiranga, construído no estilo neoclássico em 1895, que hoje é o Museu
Paulista administrado pela Universidade de São Paulo.
Embora estivesse claro para mim que o interesse de Felisberto era na arquitetura da
paisagem, sua educação formal não me parecia suficiente para uma qualificação como es-
tudante de doutorado na Universidade de Hanover na Alemanha. Contudo, convencido de
que seu compromisso com as questões profissionais da arquitetura da paisagem era sério e
forte, eu escrevi uma carta para o decano da Faculdade de Horticultura e Manutenção da terra
(Fakultät für Gartenbau und Landespflege) da Universidade de Hanover juntamente com o
professor Konrad Buchwald em outubro de 1976. A carta explicava que, com base em nosso
ponto de vista, Felisberto havia adquirido conhecimento suficiente em sua Universidade no
Brasil, bem como durante sua passagem pela administração de espaços livres em São Paulo,
e também com seus estudos adicionais na Universidade de Hanover. Nós acreditávamos estar
justificado que todos os seus estudos e sua experiência eram equivalentes a graduação em
arquitetura da paisagem na qual, os que são aprovados nos exames, podem receber o título
de Diplom-Ingenieur na Universidade de Hanover.
Se o decano concordasse com isso, então, Felisberto poderia iniciar sua tese de dou-
5 Ver BARBIN, Henrique Sundfeld 2001: Study of the transformations in display of arboreal/shrubs
masses of the park of the Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” using vertical aerial pictures and
floristic surveys of different times”, master thesis, Department of Forest Sciences, University of São Paulo, Brazil,
supervisor: Prof. Dr. Valdemar Antonio Demétrio.
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torado que seria essencial para seu interesse futuro de estabelecer uma disciplina de planeja-
mento de espaços livres no Brasil. O decano apresentou o caso para o conselho da faculdade
(Engere Fakultät) que, então, determinou que Felisberto teria de fazer três exames adicionais.
Um em planejamento da paisagem (Landschaftsplanung) com o professor Buchwald, um
em história do planejamento de espaços livres e história de cidades verdes (Geschichte der
Freiraumplanung und Geschichte des Stadtgrüns) com o professor Hennebo, e outro em pla-
nejamento de espaços livres e planejamento do verde (Freiraumplanung und Grünplanung)
comigo. Após intensa preparação, Felisberto realizou os exames em dezembro de 1976 e
janeiro de 1977, e os resultados foram encaminhados para o conselho.
Em 11 de janeiro de 1977, Felisberto, com sucesso, realizou sua primeira apresentação
em um colóquio de pesquisa que eu ofereci para estudantes de doutorado na cadeira de
planejamento do verde – planejamento da paisagem de regiões metropolitanas (Grünpla-
nung - Landschaftsplanung der Ballungsräume) na Universidade de Hanover. Seu tópico
era evidente. Foi a implementação e o estabelecimento da administração de espaços livres
na cidade de São Paulo com todas as suas implicações e conseqüências. No dia primeiro de
fevereiro de 1977, o decano informou a Felisberto que ele havia atingido todos os requisitos
para a admissão como estudante de doutorado na Faculdade de Horticultura e Manutenção
da terra. Também, foi solicitado que ele enviasse um título preliminar de sua tese de douto-
ramento para a reunião do conselho da faculdade em 9 de fevereiro de 1977. Além disso, o
Serviço de Intercâmbio Acadêmico Alemão (DAAD) concordou em fornecer a Felisberto um
suporte para seu Promotions-Studium, estudos que o conduziriam ao título de doctor rerum
horticulturae na Universidade de Hanover. Foi-lhe concedido, também, uma verba adicional
para a pesquisa empírica que ele planejara ao retornar para São Paulo.
Como título de trabalho de sua tese Felisberto entregou Chancen und Probleme der
Institutionalisierung einer Freiraumverwaltung in einer wachsenden Großstadt der Dritten
Welt, dargestellt am Beispiel São Paulo/Brasilien (Oportunidades e problemas da instituciona-
lização de uma administração de espaços livres em uma metrópole do Terceiro Mundo em
crescimento, exemplo de São Paulo/Brasil). Logo após enviou um projeto para o Serviço de
Intercâmbio Acadêmico Alemão (DAAD), explicando como gostaria de proceder com sua
tese, e eu fiz um comentário sobre seus propósitos para o DAAD. Nesse projeto, Felisberto
mostrava acreditar que seria capaz de terminar sua tese no final de setembro de 1978, isto é,
em um ano e meio, um árduo calendário para uma tese de doutorado. Então, em meu parecer
para o DAAD sobre os planos de Felisberto, eu senti que deveria ser cauteloso. Eu sugeri um
ano adicional antes que Felisberto fosse capaz de concluir os exames finais, o disputatio, de
sua tese. Felizmente, o DAAD acolheu esse ponto de vista.
O que se seguiu foram semanas e meses intensos de estruturação da tese. Felisberto
desenvolveu uma série de hipóteses. Algumas delas Felisberto queria verificar por meio de
questionário. Outras, ele preferiu verificar em entrevistas pessoais, planejadas para serem
aplicadas a pessoas da administração de espaços livres e outros especialistas em São Paulo.
Em dezembro de 1977, viajou para São Paulo e começou seu trabalho com as entrevistas.
Em uma carta do início de março de 1978, a mim endereçada, Felisberto relatou acerca das
dificuldades encontradas em São Paulo. Ele percebeu que algumas pessoas que ele havia se-
lecionado para as entrevistas tentavam se esquivar das questões. Ele escreveu: “Die meisten
wollen über alles sprechen aber nicht über das Thema” (A maioria quer falar acerca de tudo,
mas não sobre meu tema). Alguém sugeriu que ele mesmo deveria responder as questões
porque ele sentiu que o tópico era sério demais para ser aplicado para o Brasil. Alguns se
recusaram a falar quando ele solicitou o nome do entrevistado, mesmo com a concordância
no início da entrevista. Alguns pareciam estar receosos de que ele pudesse citar suas opiniões
em sua tese, embora tivesse garantido que não mencionaria seus nomes. Alguns sentiram
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que por ele ter estado na Alemanha por muito tempo, e devido ao seu interesse de pesquisa,
tivesse se tornado um “alemão”.
A finalização das entrevistas consumiu muito mais tempo consumido do que Felis-
berto havia planejado. Ele conversou com pessoas do DEPAVE (Departamento de Parques
e Áreas Verdes), departamento de parques e recreação da cidade de São Paulo e de outras
cidades tais como Rio de Janeiro, Belo Horizonte, e em Ouro Preto falou com funcionários
do município, e muitos outros da educação, planejamento, arquitetura, esportes, habitação,
agricultura, economia e proteção da natureza. No final, contudo, ele ficou satisfeito com o
que pôde conseguir.
Também, ativo como sempre foi, teve a oportunidade de realizar três conferências
em São Paulo nas quais explanava sobre a contribuição que o desenvolvimento de espaços
livres poderia trazer para o planejamento da cidade. Como membro da Sociedade Brasileira
de Paisagismo, participou da preparação de dois encontros científicos no Brasil em 1978. Um
deles foi organizado pela Associação Brasileira para o Progresso da Ciência. Aqui Felisberto
fazia parte de um grupo de pessoas que escreveu recomendações sobre legislação ambiental.
O outro evento foi organizado pela Federação Internacional de Arquitetos Paisagistas, que
realizou seu encontro anual em Setembro de 1978 no Brasil.
Logo após retornar para Alemanha, Felisberto foi para o hospital onde ficou por quase
dois meses. Obviamente devido à sobrecarga de trabalho durante o tempo em que esteve no
Brasil. Depois, conforme conselhos médicos, teve que tomar muito cuidado no decorrer do
ano. Isto significou um sério contratempo para o trabalho de sua tese, e ele teve que cancelar
os planos de entregá-la ao final de setembro. Em meu relato ao DAAD em junho de 1979, as-
sumi que dado ao seu estado de saúde, Felisberto não seria capaz de realizar o seu disputatio
antes do final de março de 1980. Infelizmente, isso acabou sendo a verdade. Todavia Felis-
berto lutou contra todas as adversidades. Em maio de 1980, ele estava certo de que poderia
fazê-lo no final do ano, mas uma séria doença favoreceu o atraso de seu trabalho. No início
de novembro de 1980, eu escrevi ao DAAD que Felisberto estava na fase final de sua tese, mas
necessitava de alguns meses até o início de 1981. Isso foi aceito pelo DAAD e Felisberto teve
a garantia de subsídios na reta final até maio de 1981. Em 22 de abril de 1981, o conselho do
departamento de horticultura e manutenção da terra da Universidade de Hanover concordou
com a promoção do Herr Eng. Agr. F. Cavalheiro para doctor rerum horticulturae, Dr.rer.hort.
Felisberto, finalmente, conseguiu entregar sua tese.
Comparando o título de seu trabalho com o título final da tese, houve somente uma
leve alteração para Die kommunale Freiraumverwaltung in São Paulo/Brasilien - Gegenwär-
tige Situation und Chancen zukünftiger Entwicklung (Administração Municipal de Espaços
Livres em São Paulo/Brasil – situação atual e oportunidades para o desenvolvimento futuro).
Como o professor Buchwald, o co-orientador da tese, estava no Instituto de Engenharia Am-
biental da Universidade Nacional de Taiwan, a data esperada para o disputatio teve que ser
postergada por dois meses. Finalmente, o exame ocorreu em 29 de junho de 1981.
A banca para o mündliche Doktorprüfung (exame oral de doutoramento) foi constituída
pelo ecólogo da paisagem, professor Hans Langer; o geobotânico, professor Konrad Buchwald;
o planejador da paisagem, professor Hans Kiemstedt; o historiador de jardins, professor Dieter
Hennebo e por mim. Todos nós concordamos que Felisberto assentou a pedra fundamental do
desenvolvimento dos estudos no campo do planejamento de espaços livres em São Paulo, e
talvez em todo o Brasil. Nós concordamos que eram necessárias pessoas como ele para enca-
minhar as questões sobre meio ambiente, legislação ambiental, estabelecimento de programas
especiais para arquitetos paisagistas em universidades, e também, a institucionalização da ad-
ministração de espaços livres, para enfrentar os múltiplos problemas relatados sobre espaços
livres que poderiam acompanhar o futuro desenvolvimento do Brasil.
15
6 Para uma breve descrição e algumas imagens ver Caesalpinia echinata Lam. in: Lorenzi, Harri 2002:
Brazilian Trees, A Guide to the Identification and Cultivation of Brazilian Native Trees, Nova Odessa, SP, p.161.
Eu sou muito grato ao professor Yuri Tavares Rocha que presenteou-me com um exemplar desse livro único.
7 CAVALHEIRO, Felisberto 1991: Urbanização e Alterações Ambientais, in: Tauk, Sâmia Maria; Gobbi, Nivar,
and Harold Gordon Fowler (org.), Análise Ambiental: Uma visão multidisciplinar, FAPESP:SRT:FUNDUNESP,
pp.88-99, São Paulo, aqui p.90.
16
sobre “Espaços Livres e Qualidade de Vida Urbana” 8 juntamente com João Carlos Nucci, outro
orientando de Felisberto e, agora, professor do Departamento de Geografia da Universidade
Federal do Paraná, Curitiba/PR, que também se tornou atuante nessa área.9 Em 2001, junta-
mente com Davis Gruber Sansolo, um de seus orientandos, que hoje trabalha como professor
da Universidade Anhembi Morumbi em São Paulo, Felisberto publicou “Geografia e Educação
Ambiental”.10 Esses são apenas alguns exemplos das bem distribuídas atividades de Felisberto,
e com isso eu concluo: por tudo que Felisberto Cavalheiro realizou, ele pode ser considerado
o pioneiro da cultura de jardins e do planejamento de espaços livres no Brasil.11
REFERÊNCIAS
BERQUÓ, Elza Demographic Evolution of the Brazilian Population during the Twentieth
Century, in: Hogan, Daniel Joseph (org.), Population Change in Brazil: contemporary
perspectives, pp.13-33, Campinas, SP, Brazil, 2001
CAVALHEIRO, Felisberto; João C. Nucci. Espaços Livres e Qualidade de Vida Urbana, in: Pai-
sagem e Ambiente - Ensaios, volume 11, pp.277-288, 1998
GRÖNING, Gert. Professor Dr.rer.hort. Felisberto Cavalheiro (1945-2003) - Ein Pionier der
Freiraumplanung in Brasilien, Stadt und Grün, 52, 12, 57-58, 2003
LORENZI, Harri. Brazilian Trees, a guide to the identification and cultivation of Brazili-
an native trees, São Paulo: Nova Odessa, 161p, 2002
8 Ver CAVALHEIRO, Felisberto e João C. Nucci 1998: Espaços Livres e Qualidade de Vida Urbana, in:
Paisagem e Ambiente - Ensaios, volume 11, pp.277-288.
9 Ver e.g. NUCCI, João Carlos 2001: Qualidade Ambiental & Adensamento Urbano: Um estudo de Ecologia
e Planejamento da Paisagem aplicado ao distrito de Santa Cecília (MSP), Humanitas/FFLCH/USP, São Paulo,
Brazil.
10 Ver SANSOLO, Davis Gruber e Felisberto CAVALHEIRO 2001: Geografia e Educação Ambiental, in: Dos
Santos, José Eduardo and Michèle Sato (eds.), A Contribuição da Educação Ambiental à Esperança de Pandora,
pp.109-131, São Carlos, SP, Brazil.
11 Ver GRÖNING, Gert 2003: Professor Dr.rer.hort. Felisberto Cavalheiro (1945-2003) - Ein Pionier der
Freiraumplanung in Brasilien, Stadt und Grün, 52, 12, 57-58.
17
NUCCI, João Carlos. Qualidade Ambiental & Adensamento Urbano: Um estudo de Ecolo-
gia e Planejamento da Paisagem aplicado ao distrito de Santa Cecília (MSP), São Paulo:
Humanitas/FFLCH/USP, 2001
SANSOLO, Davis Gruber; CAVALHEIRO, Felisberto. Geografia e Educação Ambiental, in: Dos
Santos, José Eduardo and Michèle Sato (eds.), A Contribuição da Educação Ambiental à
Esperança de Pandora, pp.109-131, São Carlos, 2001
THOMAS, Vinod From Inside Brazil, Development in a Land of Contrast, Stanford, CA,
2006
CAPITULO 2
HISTÓRICO DO ORDENAMENTO DA PAISAGEM
Desde tempos imemoriais, o Homem tem ordenado a paisagem nos locais que habita.
Como uma característica da espécie humana o fato de o Homem não ter um nicho restrito na
face da Terra e o fato de ser cosmopolita determinou a necessidade de modificar o meio am-
biente segundo as suas necessidades de sobrevivência. A concepção da natureza e o desenho
da paisagem desenvolvem-se acompanhando a evolução histórica da Humanidade.
Ao abordar a representação da paisagem na pintura, Clark (1961) mostra como a cul-
tura ocidental está, historicamente, ligada à evolução cultural do Homem. Para ele “a pintura
da paisagem marca as fases da nossa concepção da natureza”. Desde a Idade Média, a pintura
da paisagem é um ciclo em que o espírito humano procura criar harmonia com aquilo que o
rodeia. Afirma, ainda, que a Antiguidade Mediterrânea, ciclo que precedeu a época medieval,
estivera impregnada do sentido grego de valores humanos o que levou o conceito da natu-
reza a desempenhar um papel secundário. A paisagem era usada para fins decorativos sendo
seus elementos apresentados como cenário para os feitos humanos. Percorrendo os caminhos
da pintura, ele fala de uma “paisagem de símbolos”, da “paisagem dos fatos”, da “paisagem
fantástica”, da “paisagem ideal” e da “visão natural”.
A “paisagem de símbolos” da arte medieval não representava os objetos naturais em
sua real aparência. A representação da paisagem estava ligada à filosofia cristã medieval em
que a vida terrena é passageira e o ambiente em que ela é vivida não deve absorver toda
nossa atenção. Os sentidos nos desviariam da noção de Deus e poderiam induzir ao pecado.
É a época dos “jardins do paraíso”. Flores, frutas, pássaros, a Virgem, o Unicórnio, jardins
encerrados por muros, isolados do mundo exterior. No campo da arquitetura e do jardim, o
equivalente seriam os pátios e claustros monásticos.
A “paisagem dos fatos” é apresentada por exemplos da pintura flamenga notadamente
dos séculos XV e XVI. Fala da representação da luminosidade, da busca resoluta da verdade,
do estudo minucioso de cada objeto retratado e conclui que seguramente essas pinturas de-
viam mais à observação que à imaginação.
A “paisagem fantástica” é a representação do misterioso e do desconhecido que co-
meça já no século XV quando os artistas originários das cidades e que tinham como clientes
as populações urbanas, que já tinham aprendido a controlar as forças naturais e passaram a
encarar as ameaças da floresta e da inundação e podiam usá-las conscientemente para pro-
vocar um sentimento de horror. Cita Grünewald, Altdorfer e Bosch que haviam visto cidades
queimadas pelos mercenários, conheceram as barbaridades da Guerra dos Camponeses e as
guerras religiosas e pintaram aspectos da natureza que exprimiam as convulsões do espírito
humano, cheio de trevas, maldade e fúria.
A “paisagem ideal” reflete uma paisagem arcadiana, poética, idealizada. Os elementos
de realismo combinam-se com o sonho, o mito da Idade de Ouro na qual o Homem vivia
dos frutos da terra numa verdade antes poética que científica. Cita Giorgione, Poussin, Bellini,
12 Arquiteto (FAUUSP), Secretaria Municipal de Verde e Meio Ambiente, Departamento de Parques e Áreas
Verdes
19
Claude Lorrain.
Longe da idealização, a paisagem nos princípios do século XIX passa a ser retratada
numa “visão natural”. “Uma cena calma, com água em primeiro plano refletindo o céu lumi-
noso e enquadrada por árvores escuras, era algo que toda a gente estava de acordo em reco-
nhecer como belo”. Cita como expoentes dessa “visão natural” Turner, Constable, Corot.
OS JARDINS NA ANTIGUIDADE
Figura 2.1 - Maquete da Vila Adriana Em Tivoli – Roma. Foto do autor 1999.
As estátuas dos jardins gregos foram substituídas pela topiária, arte que foi primeiro
praticada por Cnaius Martius, amigo de Augusto, não havendo sinal dela antes dos tempos
imperiais. Em buxo eram representadas batalhas navais, caça, cães, cavaleiros, o nome do
proprietário e, muitas vezes, o do topiário. Arquitetura e verde se integravam e a topiária era
um dos primeiros sinais de um amadurecimento e consciência das potencialidades materiais
do jardim. Diferentemente do jardim grego, o jardim de Plínio está, essencialmente, voltado
ao desfrute privado, conforme suas palavras: “Deixe, meu amigo (porque é já tempo), a bai-
xa e sórdida perseguição da vida aos outros e, neste protegido retiro, emancipe-se para seus
estudos” (CLIFFORD, 1966).
O jardim da Idade Média formava uma unidade entre o jardim útil e o jardim artísti-
co (ERMER et al., 1996). Os jardins, então, foram mais funcionais que ornamentais. A água
passou de funcional para ornamental, o suporte das vinhas desenvolveu-se para a pérgola
e o caramanchão. As bordas cercadas para evitar as aves e cães transformaram-se no treliça-
do decorativo e daí desenvolveu-se para a balaustrada de cantaria. Esse jardim estático por
muito tempo tomou pulso e teve desenvolvimento dinâmico primeiramente na Itália. Esse
crescimento deveu-se à riqueza comercial e à relativa paz reinante na Itália, contrariamente,
às outras partes da Europa, além do mais, os restos do grande passado estavam pesadamente
no solo mais do que em qualquer outro lugar (CLIFFORD, 1966).
O JARDIM DO RENASCIMENTO
medieval. No jardim do Renascimento, casa e jardim fazem uma unidade reconhecível pelo
olhar. O jardim numa posição elevada, numa inclinação, poderia-se olhar sem dificuldade
para o mundo fora dele (CLIFFORD, 1966).
No período de 1503 a 1573, o jardim italiano se tornou um jardim de arquiteto. Terra-
ços e escadarias aparecem condicionados pela topografia. O que se pode observar nos jar-
dins desse período é o caráter público que assumem. Nos jardins de Plínio, o uso era para o
deleite do proprietário, agora, os jardins assumem um caráter de mais ostentação, sendo seu
uso mais social que privado. Bramante (Fermignano, 1444-1514) realizou, sob encomenda do
Papa, a ligação do Vaticano com o Belvedere. Como este estivesse em posição mais alta que
o Vaticano se fazia necessário procurar uma transição entre eles. Para resolver o problema,
Bramante utilizou um magnífico arranjo de escadarias e balaustradas e com isso compensou,
também, o desequilíbrio entre as duas construções de proporções desiguais. A novidade aqui,
já que escadas sempre existiram no jardim, em geral disfarçadas no desenho, é que as escadas
tornaram-se o mais importante elemento do desenho do jardim. (Figura 2.2).
Figura 2.2 - Pátio Do Belvedere, Roma. Detalhe Da Gravura De Hendryck Van Schoel, de 1579
Fonte: www.suite101.com/article.cfm/garden_design/111870
Neste período, a água vai desempenhar um novo papel. Na Idade Média a água apare-
cia no jardim na forma de uma fonte ou poço, sob a influência do gosto islâmico que chegou
à Itália através da Espanha, pois, no século XV, a Casa Real de Nápoles era aragonesa. Como
as vilas dessa época foram construídas em Roma onde não havia muita disponibilidade de
água, procuravam-se as encostas para satisfazer o desejo de fontes, jogos de água, o som e o
movimento da água corrente. Posteriormente, os Papas Sixto IV, Sixto V e Paulo V realizaram
obras para trazer a Roma água o suficiente para abastecer a cidade e seus jardins. A Villa Lante
atribuída a Vignola é um exemplo da transição entre o jardim do arquiteto e o jardim do escul-
tor. A Villa está localizada numa elevação suave, de modo que não foi necessário um maciço
arranjo de terraços para vencer a declividade. Outra característica do sítio era a presença de
bosques e abundância de água, o que não sucedeu com as outras vilas próximas a Roma. A
presença de bosques fez com que essa vila tivesse um parque ao lado do jardim, como vamos
encontrar em Versalhes e nos jardins ingleses. (Figura 2.3).
22
Distante do espírito da Villa Lante está a Villa D’Este em Tivoli desenhada por Pirro Li-
gorio. Se na Villa Lante tudo é moderação, na Villa D’Este tudo é exagero (CLIFFORD, 1966).
Segundo Clifford (1966), a Villa D’Este é um dos poucos jardins que preservam uma unidade.
Ele não vê a mesma unidade nos jardins Boboli de Florença (Figuras 2.4, 2.5 e 2.6) e na Villa
Borghese em Roma.
23
Figura 2.4 - Planta dos Jardins Boboli, Florença. Foto do autor 1999.
Figura 2.6 - Jardins Boboli (Fontana Del Forcone), Florença. Foto do autor 1999.
Para ele, o fascínio e engenhosidade de detalhe são os responsáveis por essa falta de
unidade. Na Villa D’Este, se fez amplo uso da água, aproveitando a presença do rio Ânio,
cujas águas foram canalizadas para o jardim. Jogos de água, fontes, cascatas descem pelas es-
cadarias numa engenhosidade espantosa, jardins aquáticos com esculturas de fonte, o famoso
teatro das águas, criando ambientes diversos e imaginosos. Construções e grutas em tufo e
conchas criam diversos motivos de interesse. O plano do jardim tem uma certa simplicidade
apesar do tamanho e complexidade de suas partes. Um linha central marcada por fontes,
estátuas e as escuras entradas de grutas levam o olhar de volta para cima onde está a grande
ênfase horizontal do próprio palácio. Eixos paralelos ao principal levam calculadamente para
algum enfático elemento arquitetônico (Figuras 2.7, 2.8, 2.9, 2.10 e 2.11).
25
Figura 2.7 - Villa D’este, Tivoli, Roma. Vista do Eixo Central do Jardim a partir da Casa. Foto do autor 1999.
Figura 2.8 - Villa D’este, Tivoli, Roma. Vista dos Jardins Junto a Casa. Foto do autor 1999.
26
Figura 2.9 - Villa D’este, Tivoli, Roma. Vista do Eixo Principal do Jardim olhando para a casa. Foto do autor 1999.
Figura 2.10 - Villa D’este, Tivoli, Roma. Fontes e Jogos de Água. Foto do autor 1999.
27
Figura 2.11 - Villa D’este, Tivoli, Roma. Fonte. Foto do autor 1999.
A sociedade italiana no século XVI sofreu uma mudança radical que produziu um novo
estilo de arte, o barroco.
O JARDIM FRANCÊS
As aventuras dos franceses na Itália entre 1494 e 1524 colocaram-os em contato com o
renascimento italiano. Carlos VIII voltou da Itália trazendo artistas italianos e objets d’art. Uma
série de artistas italianos como Leonardo da Vinci (1442-1519), Cellini (1500-1571) e outros de
menor fama foram viver e trabalhar na França.
A diferença entre os jardins franceses e italianos deve-se à estrutura do país e sua his-
tória política. As restrições da Guerra dos Cem Anos impôs aos franceses uma vida cercada e
com fossos. Os castelos rodeados de fossos e murados, inicialmente, condicionaram o desen-
volvimento dos jardins. Outra condicionante para essa diferença entre a Itália e a França no
desenho dos jardins está na topografia e no clima. A França tornou-se uma monarquia unifi-
cada com seu centro de gravidade na planície norte. O centro e o norte da França eram mais
planos, mais frios e mais úmidos que as vizinhanças de Roma, de Florença ou de Milão. A
população rica da Itália nos séculos XVI e XVII, como no tempo de Plínio, vivia no campo só
nos meses de verão. As vilas situadas nas baixas encostas das colinas aproveitavam as brisas
frescas e o som da água corrente. Essa situação permitia vistas em distância, construções terra-
ceadas. O jardim italiano tinha uma unidade com a inter-relação arquitetônica dos terraços.
Na França, o rei e os nobres viviam em seus castelos o ano inteiro, mudando de um
para outro em busca de variedade. Raramente, retornavam a sua casa da cidade como a aris-
tocracia de Roma e Florença fazia habitualmente. Assim, a vila italiana era uma casa de verão,
uma luxuosa cabana de piquenique. O castelo francês oferecia tudo que o proprietário ne-
cessitava, casa urbana e caça combinados. Os reis franceses viviam, por segurança, fora de
Paris, desde os dias de Luís XI, com poucas exceções. O jardim francês desenvolveu-se em
terrenos planos, levemente inclinados onde era mais fácil obter águas paradas do que casca-
tas e fontes. Vistas nessa topografia só podiam ser obtidas por meio de vistas prolongadas e
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escrupulosamente organizadas. Embora os terraços existissem, eles tendiam a ser menos altos,
menos freqüentes e arquitetonicamente menos importantes.
Caminhos elevados continuaram a ser construídos nos quatro lados do jardim, de acor-
do com o princípio medieval mesmo quando, na Itália, eles já tivessem sido abandonados.
Esses caminhos elevados levaram ao parterre e, foi por causa dele que esses caminhos ele-
vados continuaram a ser construídos mesmo quando as exigências defensivas já haviam de-
saparecido. A palavra parterre foi primeiramente usada no meio do século XVI e derivava de
par terre, no chão. O parterre levou ao compartiment de broderie. Claude Mollet (1564-1649),
jardineiro de Henrique de Navarra escreveu em 1618 “Le Théâtre des Plans et Jardinages”, a
bíblia do parterrista.
A característica essencial do parterre é a perfeita simetria. Mollet popularizou o uso do
buxo que pelo seu crescimento lento, pela facilidade de modelar, pela sua coloração escu-
ra, revelou-se a planta ideal para a definição do parterre. Jacques Boyceau (1560-1633), no
princípio dos século XVII, enfatizou em um livro publicado em 1638 a necessidade de pro-
porção; a altura das árvores e sebes deveria estar relacionada com o comprimento e largura
dos caminhos. Além da proporção e simetria, ele pedia, também, variedade. Essa proporção,
simetria e variedade, foram os grandes princípios que regeram, daquela época em diante o
jardim francês.
O italiano Francesco Primaticcio (Bolonha 1504 – Paris 1570) criou em Monceaux-en-
Brie, um jardim para Catarina de Médici (1560-1633) que prenunciou o jardim de vista em
Vaux-le-Vicomte e Versailles que dispunha um canteiro retangular atrás do outro, juntando-os
no mesmo eixo da casa. (Figura 2.12).
Luís XIV, que não estava presente na festa inaugural do castelo, fez prender Fouquet
que morreu 19 anos depois na Fortaleza de Pignerol, e levou a equipe do projeto para cons-
truir Versalhes para ela. Segundo o Marquês de Saint-Simon (op. cit. Saint-Simon at Versailles,
tradução de Lucy Norton) Versalhes não era um sítio muito agradável. Ele a descreve como o
lugar mais sombrio e falto de interesse, sem vistas, florestas, água, sem solo e, além do mais,
toda a terra adjacente era areia movediça ou brejo e o ar não poderia, assim, ser saudável.
Tudo o que foi dito para Vaux-le-Vicomte pode ser dito de Versalhes como jardim. Versalhes
foi a apoteose do jardim de vista francês. Em torno da famosa perspectiva outros jardins foram
construídos e refeitos ao sabor das necessidades por festas da corte. Temos, então, aquilo
que os jardineiros franceses ao longo da história do jardim na França haviam preconizado: a
grande perspectiva unificadora e os jardins em sua volta, rodeados por bosques, que davam
a almejada diversidade. (Figura 2.15).
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Figura 2.15 - Vista Do Eixo Central Dos Jardins Do Castelo De Versalhes, Versalhes, Paris. Foto do autor, 2000.
Um dos famosos exemplos desses arranjos periféricos é a famosa Gruta de Tétis que
era descrita, externamente, como se fossem três arcos do triunfo e, internamente, como três
grandes alcovas ocupadas por grupos de estatuária. Apolo e suas ninfas e, de cada lado, os
cavalos do deus do sol guiados por tritões. No teto, havia um grande reservatório de água
que alimentava inúmeros dispositivos de gotejamento e esguicho de água; o chão era elegan-
temente pavimentado; as paredes eram incrustadas de inúmeras conchas. Enquanto Le Nôtre
viajava em missão diplomática a Roma, Luís XIV encomendou a seus arquitetos o Palácio de
Marly-le-Roy que tinha os mesmos defeitos apontados por Le Nôtre no “Bosquet de la Colon-
nade” construído por Charles Hardouin-Mansard para servir de substituto das funções teatrais
da velha Gruta de Tétis. Pressionado pelo rei a opinar, Le Nôtre disse: “Bem Sire, o que diria?
Vós transformastes um pedreiro em jardineiro e ele levou-vos a um dos truques de seu ofí-
cio”. Este castelo que custou imensas somas e trabalhos ingratos, construído para satisfazer
um capricho do rei, foi arrasado pelo povo durante a Revolução Francesa em seu ódio pelos
desmandos da monarquia (CLIFFORD, 1966).
32
Na Inglaterra, na terceira década do século XVIII, houve uma grande revolução na arte
do jardim. As muralhas se foram, os fossos se foram, as linhas retas ainda permaneciam no jar-
dim. Iniciou-se a rejeição dessas linhas retas. Despontou a noção da linha ondulante da beleza
(the wavy line of beauty). O jardim de vista francês foi substituído por uma nova abordagem
do desenho do jardim e foi na Inglaterra que isto ocorreu. Entre as razões para que isto suce-
desse na Inglaterra estava o prazer do inglês em fazer um passeio pelo campo. Os jardins da
Renascença Italiana eram museus onde os homens vadiavam, discursavam e conspiravam. Os
jardins da França eram palcos para paradas e exibição. Os pátios da Espanha e Portugal eram
salas ao ar livre nas quais se podia passar a siesta e desfrutar a sombra e o barulho da água
corrente. Por outro lado, a Inglaterra não era lugar para a grande ocasião cerimonial en plein
air sem a necessidade de um providencial abrigo. O clima inglês era diferente daquele da Île
de France. Para os ingleses um jardim deveria ter sempre um lugar para caminhar e jogar e
satisfazer a preferência do inglês pelo exercício físico como um prazer em si. O jardim inglês
visava à economia, à parcimônia, o que inviabilizava o modelo de jardim francês.
A economia passou a ser um dos principais fatores para o bom desenho do jardim,
por isso dever-se-ia afastar as decorações com buxo e outros ornamentos e substituí-los por
gramados e bosques. O plantio e disposição de árvores constituiu a nova tarefa do jardineiro.
Os filósofos haviam descoberto a beleza do mundo antes do pecado original. Os economistas
haviam descoberto que a sujeição da vegetação era excessivamente cara. O velho desenho do
jardim não permitia mais introduzir novidades. O olhar do mundo elegante estava familiariza-
do com os padrões assimétricos da porcelana, laca e sedas chinesas. O despotismo monárqui-
co estava morto, o despotismo clerical foi rejeitado, tudo conspirava para o desfrutar de um
mundo cheio de surpresas e suspense. Se a paisagem deveria ser admirada, não haveria nada
de mais valor que a paisagem inglesa. Negaram-se as árvores podadas e as avenidas retas.
Se o jardim até agora era considerado uma extensão da casa e, assim, uma questão
arquitetônica, a partir de então a natureza deveria ser “idealizada” até às paredes da casa.
O primeiro e fundamental passo para o novo jardim foi a aparente remoção dos limites do
jardim. O objetivo do jardineiro francês era que a natureza parecesse subordinada a sua arte.
Removendo a inevitável linha divisória para o mais longe do eixo central, ele pode ignorar a
existência do dia-a-dia do campo a sua volta. A intenção do jardineiro inglês ao ocultar a li-
nha divisória era fazer parecer que os jardins eram parte do mundo total da natureza, embora
sendo uma parte idealizada dela.
O método adotado para disfarçar o limite do jardim foi o ha-ha. Perto do final do
século XVII, na França, apareceu o método de ocultar a linha divisória por uma cerca oculta
dentro de um fosso. No século XVIII, o conceito de natureza só era claro num ponto: era que
se detestava a linha reta. Este era o dizer favorito de William Kent (1645-1748) o pioneiro do
jardim “natural” que vai desenvolver-se no jardim paisagístico inglês (Figura 2.16).
33
Figura 2.16 - William Kent, Jardins de Stowe. Fonte: CLIFFORD, 1966, prancha 62
famosos jardins da metade do século XVIII que mais devem à paisagem estão Painshill, Lea-
sowes e Stourhead. Leasowes era obra do poeta Shenstone. O trabalho começou em 1743 e,
de acordo com Shenstone, as cenas do jardim poderiam ser divididas entre o sublime, o belo
e o melancólico ou pensativo. A despretensiosa casa de Shenstone estava em um gramado
envolvida por um ha-ha. O restante do terreno estava arranjado numa sucessão de cenas ou
perspectivas a serem vistas de um caminho-cinturão.
O cinturão no jardim da metade do século XVIII era mais importante que o ha-ha.
Consistia em um plantio irregular de árvores envolvendo a propriedade e provendo um cami-
nho ou estrada no seu perímetro. Significativo porque o jardim era para ser visto olhando-se
para dentro. O cinturão refletia uma mudança do ponto de vista. Shenstone fez das sucessivas
vistas cruzadas de seu “cinturão-caminho” a principal característica de Leasowes. Como ele
não era um homem rico como Lord Cobham, ele não pôde construir casas de verão como
em Stowe; ao invés disso ele espalhou urnas, bancos de jardim e placas com versos apropria-
dos indicando os sentimentos apropriados a cada lugar. Embora seu jardim fosse desenhado
como uma série de paisagens pictóricas, não havia realmente pinturas satisfatórias nele.
O segundo tipo de jardim foi o “jardim poético”. O assim chamado “jardim pitoresco”
deve muito ao “jardim poético”. A confusão entre um e outro vem da natureza dos pintores
que eram, na verdade, pintores poéticos. O “jardim poético” era uma questão de atmosfe-
ra. O freqüentador ligava-se na “solenidade”, no “sublime”, na “grandeza”, “dignidade” ou
“elegância”, conforme a porção do jardim em que estivesse. Abismos, uma pedra com textos
melancólicos, templos clássicos, uma ruína gótica, deveriam evocar as sensações apropriadas.
Os arranjos no jardim deveriam criar, evocando, um genius loci, o espírito do lugar. Numa
sociedade burguesa, Figuras, estátuas, vasos de flores, urnas etc., pré-fabricados, deveriam
fornecer decorações poéticas ao jardim. Assim, o arquiteto voltava ao jardim fornecendo o
mobiliário poético a ele. O visitante deveria vagar de uma sensação para outra numa série de
cenas evocativas. O resultado foi que esses jardins perderam sua unidade artística. Um dos
elementos do “jardim poético” era o “eremitério”, habitado, logicamente, pelo seu “eremita”,
uma pessoa contratada para desempenhar um papel relacionado à cena que habitava. Se um
tonel no jardim, o eremita evocaria Diógenes.
O “jardim poético”, como toda manifestação romântica, sofreu de uma falta de disci-
plina e, em 1780, a grande revolução do jardim na Inglaterra, e em toda parte, havia perdido
seu rumo.
A teoria da “linha ondulante de beleza” (the wavy line of beauty) apareceu cedo, no
século XVIII, e tornou-se um princípio estético muito forte. William Kent proclamou que “a
natureza detesta a linha reta”. A teoria da linha ondulante da beleza foi subscrita por todos os
produtores de jardins, seja os poéticos ou os pitorescos. Em 1750, apareceu o grande mestre
do jardim paisagístico inglês: Lancelot Capability Brown (1716 – 1783). Os elementos poéticos
e pitorescos do jardim foram banidos, restando só o domínio da linha ondulante da beleza.
Lancelot Brown recebeu o cognome de Capability porque costumava dizer que podia
ver capabilities of improvement nas áreas que deveria tratar paisagísticamente. Ele abandonou
o uso de estatuária, usou bem menos edificações que os jardineiros poéticos e concentrou-se
quase, inteiramente, oo uso das ondulações contrastadas e relacionadas. A cor desempenhou
pouco ou nada em suas idéias. Usou o contraste tonal, luz e sombra para dispor a harmonio-
sa organização da linha. Ele mesmo comparou sua arte com a composição literária, como se
usasse vírgulas, parênteses e, assim, dirigisse a vista e comandasse os temas em seus jardins.
Capability Brown usou poucos meios criando tramas simples. Contornos de grama verde,
ondulações do terreno, espelhos d’água, poucas espécies de árvores usadas isoladamente ou
em grupos ou em cinturões lineares e intencionais (CLIFFORD, 1966) (Figura 2.17).
35
Figura 2.17 - Os Jardins De Stowe Modificados Por Lancelot Brown. Fonte: CLIFFORD 1966, prancha 64
O jardim de Brown com sua economia de meios, composto mais de gramados e árvo-
res alcançou um ponto de saturação e o jardineiro florista reagiu e reapareceu com suas flores
no desenho do jardim trazendo de volta a cor e o perfume. Foi o momento de Humphrey
Repton (1752 – 1818) que se definiu como um “jardineiro paisagista”.
Repton definiu o que ele considera como os princípios de sua arte, a “jardinagem
paisagística”: primeiro mostram-se as belezas naturais e escondem-se os defeitos naturais de
cada situação; segundo, deve-se dar a aparência de amplidão e liberdade, disfarçando-se cui-
dadosamente ou escondendo-se as divisas da propriedade; terceiro, deve-se, estudadamente,
dissimular toda interferência de arte, por mais que custosa, com a qual o cenário é melhorado;
quarto, todos os objetos de mera conveniência ou conforto, na impossibilidade de torná-los
ornamentais ou de tomar parte própria no cenário geral, devem ser removidos ou apagados.
O estilo de Repton influenciou a jardinagem vitoriana e, com seu ecletismo, sua influência
chegou até o Brasil no princípio do século XX.
Sob a base de Brown ele procurou construir alguma coisa que pudesse incluir ao mes-
mo tempo as belezas de Le Nôtre e os jardins pitorescos, procurando satisfazer as necessida-
des do jardineiro florista e do colecionador botânico. Repton era governado pelo pensamento
lógico. Para ele, o jardim é um objeto artificial e não tem pretensão de ser natural sendo
conseqüência do crescimento das plantas que o adornam; sua cultura deve ser toda trabalho
artístico; e ao invés da linha invisível ou cerca escondida (Ha-Ha), que separa o gramado
cortado do gramado que alimenta o gado, é mais racional mostrar que os dois objetos são
separados. O não banimento do jardim de flores, da horta e dos estábulos da vizinhança da
casa era o principal objetivo da plataforma de Repton. Brown os havia escondido bem longe
da casa, o que passou a ser considerado não funcional. Repton combateu a necessidade de
perspectivas em toda a parte do jardim dizendo que um pouco de reclusão era necessário.
36
Isto levaria a uma segregação do parque e do jardim o que ele evitou provendo um terraço
balaustrado que servia como cerca entre a parte plantada e o parque e servia, também, como
uma plataforma visual elevada. Esses terraços elevados constituem uma marca reconhecível
de muitos jardins de Repton.
Com a introdução de plantas novas e exóticas e de flores, o jardim passou a ser obra
não de filósofos, poetas e arquitetos, mas de jardineiros. O ecletismo de Humphrey Repton
está relacionado com o jardim de todo o século XIX. Foi Repton quem ensinou como a irresis-
tível enchente de novas plantas foi organizada na estrutura de um pleasure ground13 e justifi-
cou sua presença no jardim. Os elementos dos jardins passaram a ser o gramado, que assumiu
o papel de um parque paisagístico em miniatura, uma expansão da grama aparada pontuada
com arbustos exóticos e árvores em grande variedade, tudo em escala reduzida; arbustos; o
velho bosquete, densamente plantado e com grande variedade de espécies, atravessado por
caminhos serpenteantes; o caminho-terraço, que substituiu o parterre, mirava distantemente o
parque; a estufa em estrutura de ferro substituiu a orangerie. O domínio dos jardineiros no de-
senho do jardim estabeleceu que as plantas deveriam ser plantadas onde melhor crescessem
e não onde tivessem o melhor efeito. Era o chamado estilo “jardinístico” (CLIFFORD, 1966).
Figura 2.18 – Gruta, Parque Da Luz, São Paulo. Foto do autor 2005.
13 Hermann Fürst von Pückler-Muskau faz a seguinte observação sobre o „pleasure ground“: „A palavra
pleasure ground é difícil de traduzir-se para o alemão e eu tenho por mim que é melhor deixá-la em inglês.
Pleasure Ground significa um terreno ornamentado e cercado junto à casa, com dimensão bastante grande para
ser tratado como jardim, sendo, de certo modo, um meio termo, uma estrutura de ligação entre o parque e os
próprios jardins”(PÜCKLER-MUSKAU 1988).
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Figura 2.19 - Parque Municipal, Belo Horizonte, Minas Gerais. Foto do autor 2005.
Esses jardins parecem ter chegado até nós através de modelos franceses. Entre os li-
vros que pertenceram a Arthur Etzel, filho de Antonio Etzel que deu ao Jardim da Luz o seu
desenho atual, estava o livro “Les Parcs et Jardins au commencement du XX éme siécle” (VA-
CHEROT, 1909) que mostra modelos de jardins semelhantes a esses. Esses modelos que se
expandiram da Paris de Haussmann, dos trabalhos de Jean Charles Adolphe Alphand (Figuras
2.20 e 2.21), e se espalharam pelo mundo, estão bem descritos por Georges Lefebvre que
aborda o “estilo paisagístico moderno”.
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Após a Revolução Francesa, com o colapso das grandes fortunas, o jardim paisagísti-
co ou inglês foi adaptado a jardins menores. Para remediar a insuficiência de extensão das
propriedades, criaram-se aléias curvas alongando as distâncias e oferecendo sempre novos
pontos de vista ao visitante. As modificações que essa escola moderna fez acontecer no es-
tilo paisagístico antigo vê-se, notadamente, nesse novo traçado das aléias, no modelado dos
gramados em ondulações (vallonnement) e na criação de canteiros floridos. No início desse
novo estilo, as aléias eram numerosas, dividindo terreno em um grande número de peque-
nos gramados com maciços de vegetação minúsculos. Depois, as aléias tornaram-se menos
numerosas, as superfícies gramadas maiores, sem a fragmentação exagerada do terreno. As
ondulações do gramado (vallonnement) modelam a superfície em curvas côncavas graciosas
no centro do terreno, e se perdem nas extremidades em direção aos maciços vegetais e aléias.
Enfim, as flores, que haviam sido abandonadas até Capability Brown e retomadas por Repton
e seus seguidores, servem para compor corbelhas dispostas sobre os gramados em grupos
isolados ou junto aos maciços de arbustos (LEFEBVRE, 1897).
Esse modelo de jardim ainda encontramos no Parque da Luz e no desenho original da
Praça da República em São Paulo, hoje destruído pelas constantes intervenções espúrias.
Georges Lefebvre fala ainda do estilo misto ou composto. O estilo misto é um com-
posto do jardim regular ou francês e do jardim paisagístico ou inglês onde se aplica às duas
partes da composição as teorias que lhe concernem, tendo-se o cuidado de estudar o acordo
dos dois estilos de modo a criar um conjunto harmonioso (LEFEBVRE, 1897). Um exemplo
desse estilo composto, eclético, encontrávamos em Franca – SP, na Praça Nossa Senhora da
Conceição, no projeto de Chauviére (DEL PICCHIA, 1991) (Figura 2.22), antes que esta fosse
modificada em meados dos anos 1950 (FERREIRA, 1983).
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Figura 2.22 - Praça Nossa Senhora da Conceição, Franca, São Paulo. Fonte: DEL PICCHIA, 1991, p.120.
Figura 2.23 - Azulejos e piso de tijoleira, Quinta da Bacalhoa, Vila Fresca do Azeitão, Portugal. Foto do autor
2002.
Figura 2.24 – Embrechados, Palácio dos Marqueses de Fronteira, Benfica, Lisboa. Foto do autor 2002.
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Figura 2.25 - Alegrete (Canteiro Elevado), Palácio dos Marqueses de Fronteira, Benfica, Lisboa. Foto do autor
2002.
Figura 2.26 – Latada, Palácio do Marques de Pombal, Oeiras, Portugal. Foto do autor 2002.
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Figura 2.27 – Caniçada, Palácio dos Marqueses de Fronteira, Benfica, Lisboa. Foto do autor 2002.
Figura 2.28 – Topiária, Casa de Mateus, Vila Real, Portugal. Foto do autor 2002.
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Figura 2.29 – Escultura, Palácio dos Marqueses de Fronteira, Benfica, Lisboa. Foto do autor 2002.
É interessante observar que não se conhece similares desses jardins no Brasil, salvo
uma observação sobre dois pavilhões que existiram no Passeio Público do Rio de Janeiro de
Mestre Valentim.
Nos extremos do terraço que descortinava a Baía da Guanabara e que ficava no fim
do eixo principal do jardim em oposição ao Chafariz das Marrecas, erguiam-se dois pavilhões
hexagonais em que se exibia a arte muralista de painéis com conchas e penas, obras de
Francisco dos Santos Xavier - Xavier das Conchas, e de Francisco Xavier Cardoso Caldeira -
Xavier dos Pássaros (CAVALCANTI, 2004). Esta arte muralista de conchas seria, talvez, a dos
embrechados portugueses, existindo no Museu dos Oratórios de Ouro Preto de autoria de
Xavier das Conchas.
CHINA E O JAPÃO
uma vida de moderação. A isto se adicionaram os ensinamentos de Buda que cultivava a cal-
ma, a contemplação, a libertação de todas as formas de desejo, num nível místico. No caráter
cultural chinês, estavam unidos o amor à natureza e uma magnífica receptividade passiva à
sensação. Esta é a origem do jardim chinês, cuja primeira função era induzir um desejável es-
tado de espírito. Por seu caráter selvagem mais do que urbano, a geometria não tinha lugar no
jardim chinês. O jardim era projetado como uma série de cenários como num rolo de pintura
de paisagens, cada uma delas completa em si mesma. Como esses jardins eram réplicas esca-
lares de cenários naturais, a escala relativa tinha especial importância. O esqueleto do jardim
eram as pedras, não as pedras esculpidas, porém, as pedras naturais e elas desempenhavam
o mesmo papel que as esculturas no jardim ocidental. O mesmo acontecia no jardim japonês.
A qualidade procurada pelos chineses em seus jardins era o “pitoresco/emotivo” (CLIFFORD,
1966).
Os japoneses reduziram a uma regra o modo como os chineses usaram os ingredientes
da paisagem natural, produzindo, assim, algo original (CLIFFORD, 1966). O jardim japonês
aconteceu no século VI, conforme o modelo do jardim chinês. Nas residências da aristocracia
nos séculos X a XII, o jardim era colocado ao sul dos edifícios do palácio. Seu ponto central
era um tanque com uma colina ao fundo. Nesse tanque, navegava-se num barco exótico
desfrutando poesia e música. O jardim era plantado com diversas plantas floridas. Este jardim
teve forte influência Zen, cultura do sul da China. Importante é que antes, em relação com
o monastério, apareceu uma outra arte do jardim, um jardim plano. Pensamentos filosóficos
influenciavam a forma do jardim que tinha uma significação simbólica. Com o desenvolvi-
mento da cerimônia do chá desenvolveu-se um novo tipo de jardim, o jardim do chá. Pedras
delineavam o caminho, lanternas de pedra, bacias de água em pedra tornaram-se elementos
indispensáveis do jardim da cerimônia do chá. Árvores de folhagem perene, principalmente
coníferas, distribuíam uma impressão de calma. O jardim do chá é importante por ser a for-
ma básica que deu origem ao jardim japonês. Dos séculos XVIII até o XIX o jardim japonês
tipificou-se, dividindo-se em dois tipos principais: o jardim com colinas (Figura 2.30) e o jar-
dim plano (Figura 2.31).
Cada um desses dois tipos foi depois estruturado em três tipos: Shin, Gyô e Sô. Shin
apresenta um jardim que procura ser construído, segundo a natureza e tem um aspecto for-
mal. No Sô, a natureza apresenta-se simplificada e simbolizada, a sensação é leve e amigável.
Gyô deve ser observado como uma forma intermediária entre Shin e Sô. Todos esses jardins
foram popularizados e normatizados de modo que sua forma foi tornada possível para cada
jardineiro. A influência européia se fez sentir nos jardins japoneses modernos, porém, os ja-
poneses mantiveram no fundo do coração a tradição do próprio jardim japonês (YOSHIDA,
1954).
Por volta de 1929, Alfred Agache realizava os jardins da Praça Paris no Rio de Janei-
ro com um desenho de jardim do ecletismo vigente ainda nos princípios do século XX. Em
1934, Roberto Burle Marx realizou os primeiros jardins com senso ecológico em Pernambuco
utilizando plantas da caatinga, contrariamente ao que usavam os paisagistas como Agache
e Glaziou (MOTTA, 1983). Roberto Burle Marx, artista plástico, trabalhou com botânicos,
destacou-se no desenho de jardins completamente diferenciados dos modelos do passado
recente, tornando-se uma das grandes personalidades do desenho do jardim contemporâneo.
No Rio de Janeiro, Fernando Chacel, arquiteto, trabalhou no escritório Burle Marx e carregou
um pouco do seu desenho de jardim.
Em São Paulo, lembramos quatro Figuras no desenho do jardim contemporâneo, Otavio
Augusto Teixeira Mendes, Waldemar Cordeiro, Roberto Coelho Cardoso e Rodolfo Geiser.
Otavio Augusto Teixeira Mendes (1907 - 1988), engenheiro agrônomo, ao voltar de
uma pós-graduação na Universidade de Columbia nos Estados Unidos, passou a se auto-
intitular arquiteto paisagista. Teve ação destacada no Serviço Florestal do Estado de São Paulo
como precursor de políticas ambientais e, entre seus trabalhos como paisagista, se destacam
o Parque do Ibirapuera e o jardim da atual Fundação Maria Luísa e Oscar Americano em São
Paulo (MARIANO, 2005).
47
Waldemar Cordeiro (1925 – 1973), pintor concretista, atuou, também, como paisagista.
Seus jardins refletem os propósitos de sua pintura (BELLUZZO, 1986; MEDEIROS, 2004).
Roberto Coelho Cardoso, professor de paisagismo da Faculdade de Arquitetura e Ur-
banismo da Universidade de São Paulo (FAUUSP), influenciou muitos jovens paisagistas que
atuam em São Paulo e que trabalharam com ele. Segundo relato do arquiteto João Batista
Villanova Artigas, Roberto Coelho Cardoso chegou ao Brasil com uma recomendação de Gar-
rett Eckbo, dos Estados Unidos e passou a lecionar na FAUUSP.
Em São Paulo atuou, também, o engenheiro agrônomo Rodolfo Ricardo Geiser que
tem se dedicado ao projeto paisagístico de residências, condomínios residenciais, praças e
parques públicos, projetos paisagísticos para instalações industriais e recuperação de áreas
degradadas. Dedicou-se, também, ao ensino de paisagismo em escolas públicas e privadas.
Seus projetos, diferentemente dos arquitetos que se formaram com Roberto Coelho Cardoso,
dão ênfase maior ao uso da vegetação na conformação espacial do jardim como é o caso,
também, de Otávio Augusto Teixeira Mendes.
No ano de 1967, o engenheiro agrônomo Felisberto Cavalheiro começou a atuar no,
então, Serviço de Parques, Jardins e Cemitérios da Prefeitura do município de São Paulo,
depois, Departamento de Parques e Jardins. Projetou e implantou várias áreas verdes de São
Paulo. Permaneceu no Departamento até sua partida para a Alemanha onde, em Hannover,
fez doutoramento, tendo recebido o título de Doctor Rerum Horticulturae com a dissertação
“Die Kommunale Freiraumverwaltung in São Paulo/ Brasilien” (CAVALHEIRO, 1981). Após
sua volta da Alemanha, trabalhou na Secretaria Especial do Meio Ambiente – SEMA que mais
tarde se transformou no Ministério do Meio Ambiente. Participou, então, da elaboração das
primeiras leis ambientais federais que organizaram o Sistema Nacional do Meio Ambiente –
SISNAMA. Antes de sua partida para a Alemanha, participou da elaboração do “Projeto Urba-
nístico para o Vale do Rio Jahu, perímetro urbano” e do projeto de um parque junto ao Rio
Jahu em Jahu, São Paulo (DEL PICCHIA e CAVALHEIRO, 1987) (Figura 2.32).
Figura 2.32 - Projeto Paisagístico Para O Vale Do Rio Jahu – Perímetro Urbano – Jahu-SP
Fonte: DEL PICCHIA e CAVALHEIRO (1988) Vol. 1, P. 239
REFERÊNCIAS
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Contemporânea da Universidade de São Paulo, 1986. 193 p., il.
CLARK, K. Paisagem na Arte. Lisboa: Editora Ulisseia, 1961. 184 p., il.
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il.
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jeto paisagístico. In: XXXVIII CONGRESSO NACIONAL DE BOTÂNICA, 1987, São Paulo. Acta
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Brasil, 1988. Vol.1, p. 231-241.
FERREIRA, M. Franca: itinerário urbano. Franca-SP: Laboratório das Artes de Franca, 1983.
171 p., il.
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ramento) – Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo, São Paulo.
MOTTA, F. L. Roberto Burle-Marx e a nova visão da paisagem. São Paulo: Nobel, 1983.
247 p., il.
Beschreibung ihrer praktischen Anwendung in Muskau. Frankfurt am Main: Insel, 1988. 377
p., il.(Insel Taschenbuch).
YOSHIDA, T. Das Japanische Wohnhaus. Tübingen: Ernst Wasmuth, 1954. 204 p., il.
CAPITULO 3
ECOLOGIA E PLANEJAMENTO DA PAISAGEM
A CIÊNCIA DA PAISAGEM
O termo paisagem apresenta ao longo de sua história vários significados e, desde o iní-
cio do século XX, vem retomando sua importância nos estudos que tratam tanto da natureza
quanto da cultura.
A paisagem foi introduzida como termo científico-geográfico no início do século XIX
pelo alemão Alexander von Humboldt (1769-1859), o grande pioneiro da moderna geobotâni-
ca e geografia física. Na língua alemã, o termo paisagem (Landschaft) contém uma conotação
geográfico-espacial no prefixo land, diferentemente da paisagem com significado de cenário
encontrado nas artes e na literatura.
Interessante lembrar que o “Espaço Geográfico desde os tempos mais remotos (gregos)
sempre foi encarado de forma integrada, visão esta que desapareceu com o tempo até ressur-
gir com ênfase com A. von Humboldt” (TROPPMAIR, 2004).
Para Humboldt, Geografia Física significava descrever as formas da terra firme como
base da vida humana, correlacionando a caracterização morfológica da evolução da paisa-
gem, com base na Geologia, na Climatologia, na Hidrologia, na Fitogeografia, na Zoogeogra-
fia, nos homens, na economia, no comércio, nos transportes, na população, na colonização,
na cidade e na aldeia e na sociedade. A Geografia Física de Humboldt não se interessava em
descobrir novas espécies, mas em correlacionar os fenômenos já conhecidos, ou seja, desco-
brir os nexos (BECK e SCHOENWALDT, 1999). Todavia,
nação dinâmica, portanto instável, de elementos físicos, biológicos e antrópicos que, reagindo
dialeticamente uns sobre os outros, fazem da paisagem um conjunto único e indissociável, em
perpétua evolução. É preciso frisar bem que não se trata somente da paisagem “natural”, mas
da paisagem total integrando todas as implicações da ação antrópica (BERTRAND, 1972).
Bertrand (op cit.), também influenciado pela visão sistêmica, esboçou uma interessante
definição teórica de geossistema considerando-o como o resultado de relações entre o poten-
cial ecológico, a exploração biológica e a ação antrópica (Figura 3.1).
Além de Bertrand, outros biogeógrafos próximos das Ciências Biológicas, como Rou-
gerie seguidos por geomorfólogos, como Tricart, avançaram nos estudos atuais das paisa-
gens naturais. Para Rougerie e Beroutchachvili (1991), o geossistema seria composto por três
componentes: os abióticos (litosfera, atmosfera, hidrosfera), os bióticos (flora e fauna) e os
antrópicos (o homem e suas atividades).
O esboço metodológico de Bertrand (1972) apresenta uma Geografia Física Global que
se nutre dos estudos especializados tradicionais procurando entender as combinações, a dinâ-
mica e evolução das paisagens, e se abre para os problemas de ordenamento das paisagens.
Esse seu trabalho constitui, portanto, mais um material básico que vem auxiliando na mudan-
ça da abordagem somente analítica e linear para uma abordagem com orientação sistêmica,
sintética e integrativa, muito necessária nos dias atuais (NUCCI, 2004).
Troppmair destaca a contribuição de Georges Bertrand dada ao estudo dos Geossiste-
mas, afirmando que Bertrand:
(...) ressalta que na pesquisa dos geossistemas, além do estudo dos elementos abióticos
(clima, solo, hidrologia etc) e bióticos (flora e fauna) ‘é necessário utilizarmos elementos da
sociedade, da história, da economia, não para fazer sociologia, mas estudar o meio ambiente
(...) quer dizer, analisar o meio ambiente de épocas passadas e, em particular, o que passa
na história recente (...) o meio ambiente toma a dimensão cultural, e nós trabalhamos com a
diversidade’. (TROPPMAIR, 2004)
54
A ECOLOGIA DA PAISAGEM
Existem modelos matematicamente muito sofisticados, mas que são dúbios quando são
aplicados em casos concretos; existem problemas fundamentais para os quais técnicas não-
matemáticas são mais adequadas (...) seria melhor um modelo não-matemático (verbal) do
que iniciar com um modelo matemático e, assim, possivelmente, restringir o campo de visão
(BERTALANFFY, 1993).
15 Segundo Sukopp (1998) foi Schouw que em 1823 usou a expressão “plantae urbanae” para as plantas
que ocorriam perto das vilas e cidades e que por volta de 1850 as investigação da ocorrência e distribuição da
flora e da fauna de áreas urbanas eram considerados estudos de “História Natural”. Nas décadas de 30 e 40 (séc.
XX) surge a primeira tentativa de síntese geral dos estudos de Ecologia Urbana (Stadtökologie). Na década de 50
esses estudos investigam as plantas ruderais que cresciam nas ruínas da 2ª Guerra Mundial e somente na década
de 70 é que ocorre uma intensificação dos estudos de Ecologia Urbana (SUKOPP, 1998). SUKOPP, H. Urban
Ecology – scientific and practical aspects. In: BREUSTE, J.; FELDMANN, H.; UHLMANN, O. (Eds.) Urban Ecology.
Berlim: Springer, 1998, 714p.
57
Monteiro (1978) afirma que nossa tradição em realizar pesquisas em equipe, é muito
reduzida, especialmente aquelas que se projetam multidisciplinarmente. Uma tentativa de se
romper essas barreiras, que atravancam os estudos no campo das preocupações ambientais,
aconteceu no I Fórum de Debates sobre Ecologia da Paisagem e Planejamento Ambiental,
realizado em Rio Claro/SP em junho de 2000, presidido por Felisberto Cavalheiro16 .
A diversidade de profissionais convidados, muitos conhecidos internacionalmente, para
as conferências, mesas redondas e debates, bem como a oportunidade para a exposição de
trabalhos de alunos, principalmente de pós-graduação, de professores e outros pesquisadores,
presença de representantes de diferentes comunidades, políticos e a oportunidade de, também,
vivenciar concretamente as belas paisagens da região, por meio de excursões, fizeram do I Fó-
rum um marco da Ecologia da Paisagem no Brasil (vide programação do Fórum – anexo 1).
É necessário compreender que “A complexidade ambiental incorpora um processo de
construção coletiva do saber (...) A pedagogia da complexidade ambiental abre o encontro
infinito de seres diversos dialogando a partir de suas identidades e diferenças” (LEFF, 2001).
17 Interessante ressaltar que Gomes Orea utilizava o termo Planejamento Ambiental ou Planificacion del médio
ambiente, porém com a perda de precisão do termo “ambiente”, o autor passou a utilizar “planejamento do meio
físico”.
60
(...) o planejamento será presidido por uma nova “razão”, em via de elaborar-se no momento
presente. Desde que – como já admite a ciência - não sejamos tolhidos pelo trauma imposto
pela obsessão do objetivo, do exato, do verdadeiro, mas conciliemos o físico ao metafísico,
adicionando ao probabilístico, ao subjetivo, ao aproximativo, os planos poderão abrir-se a
novas utopias (MONTEIRO, 1992)
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Até o momento, não se encontrou uma teoria única com base científica capaz de tratar,
ao mesmo tempo, das questões naturais, econômicas, sociais e culturais, pois a construção
desse tipo de teoria constitui um dos desafios das ciências integradoras ou de síntese, como
a Geografia.
Como ponto de partida e com a intenção de enfrentar esse desafio, sugere-se entender
a paisagem como um termo fundamental e de importante significado para a Geografia. Como
um fato concreto e a feição (fisionomia) da estrutura, das inter-relações e da evolução que
ocorrem em determinada área.
61
Ainda, para uma primeira e possível aproximação dessa complexa questão, toma-se
a liberdade de indicar o trabalho de Bertrand (1972) por apresentar uma Geografia Física
Global que se nutre dos estudos especializados tradicionais para entender as combinações,
a dinâmica e evolução das paisagens. Seguindo pelo mesmo caminho, sugere-se o método
“Planejamento da Paisagem” como uma ferramenta de pesquisa e aplicação interdisciplinar
que busca uma proposição ótima de uso e ocupação do solo18.
REFERÊNCIAS
BECK, H.; SCHOENWALDT, P. O último dos grandes. Alexander von Humboldt. Bonn: Inter
Nationes, 1999, 48 p.
FORMAN, R.T.T. Land mosaics. The ecology of landscapes and regions. New York: Cam-
bridge University Press, 1995, 632 p.
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GÓMEZ OREA, D. El Medio Fisico y la Planificación. Madrid: Cuadernos del CIFCA, v.1 e
v.2, 1978.
KIEMSTEDT, H.; von HAAREN, C.; MÖNNECKE, M.; OTT, S. Landscape Planning: contents
and procedures. Hanover: The Federal Ministry for the Environment, Nature Conservation and
Nuclear Safety, Universidade de Hanover, 1998, 39 p.
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grafia 17, São Paulo: Inst. de Geografia/USP, 1981 (Trad. Monteiro, 1a. ed. 1974).
McHARG, I. L. Design with Nature. Paperback edition. New York: The American Museum of
Natural History, 1971. 198 p.
Naveh, Z.; Lieberman, A.S. Landscape Ecology. Theory and Application. New York: Spring-
er-Verlag, 1984, 105 p.
NUCCI, J.C. Qualidade ambiental & adensamento urbano. São Paulo: Humanitas/FAPESP,
2001, 236 p.
278 p.
PEARSON, S.M. Interprerting landscape patterns from organism-based perspectives. In: GER-
GEL, S.E.; TURNER, M.G. (Eds.) Learning Landscape Ecology. A practical guide to concepts
and techniques. New York: Spring-Verlag, 2002, p. 187-198
SUKOPP, H. Urban Ecology – scientific and practical aspects. In: BREUSTE, J.; FELDMANN,
H.; UHLMANN, O. (Eds.) Urban Ecology. Berlim: Springer, 1998, 714 p.
ZONNEVELD, I.S. Scope and concepts of landscape ecology as na emerging science. In:
Zonneveld e Forman (eds.) Changing Landscapes: an ecological perspective. Berlin: Spring-
Verlag, 1990, 286 p.
64
ANEXO 1
Local: Horto Florestal Navarro de Andrade e Instituto Biociências/Unesp – Rio Claro/SP – Bra-
sil.
Realização:
SEB – Sociedade de Ecologia do Brasil
CEA – Centro de Estudos Ambientais – Unesp
IB – Instituto de Biociências – USP
IGCE – Instituto de Geociências e Ciências Exatas – Unesp
CEAPLA – Centro de Análise e Planejamento Ambiental – Unesp
FFLCH – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas – USP
PPG-ERN/UFSCar – Programa de Pós-graduação em Ecologia e Recursos Naturais
IF – Instituto Florestal – SMA
PMRC – Prefeitura Municipal de Rio Claro
SBAU – Sociedade Brasileira de Arborização Urbana
Felisberto Cavalheiro20
19 Artigo originalmente publicado no livro “Análise ambiental: uma visão multidisciplinar” (Sâmia TAUK
et al. (orgs). Rio Claro/SP : UNESP/FAPESP, 1991, p. 88-99
20 DG-FFLCH-USP, 1945-2003
66
e por resíduos sólidos. Embora elas sejam o ambiente mais importante do homem hodierno,
são esparsas as tentativas de estudá-las, considerá-las e reconhecê-las como unidades fun-
cionais (ecossistemas).
Talvez a aversão que os pesquisadores das ciências naturais têm em relação às cidades
deva-se à pressuposição de que estas sejam menos convenientes para estudar-se a natureza
e as repetitivas afirmações de que o meio urbano é, em geral, nocivo à vida. Nessas conside-
rações, esquece-se que a paisagem urbana nada mais é do que uma paisagem alterada, ou,
como muitos desejam, derivada da natural.
Para se fazer uma reversão dessa situação, há necessidade de uma reflexão no conceito
de paisagem proposto por Bertrand (1972):
No Brasil, Monteiro et al. (1985) têm buscado dar uma interpretação holística nesse
sentido. Assim, é na paisagem alterada que se deve ir buscar, estudar, analisar e prognosticar
as degradações e impactos ambientais.
A Figura 4.1 procura representar, de forma esquemática, as principais alterações am-
bientais induzidas pelo ser humano em grandes cidades, sobre as quais será feita uma dis-
cussão melhor mais adiante. Deve-se ressaltar que em cidades pequenas as alterações podem
ser significativas, entretanto via de regra são pouco perceptíveis. A preocupação da pesquisa
das alterações dos diversos componentes da paisagem urbana não é recente, porém sempre
houve a tendência de estudá-los isoladamente, sem inter-relacioná-los.
67
No século XIX Howard (1883) estudou as alterações no clima londrino. Entre os auto-
res da atualidade, pode-se mencionar Landsberg (1956, 1970), Nischizawa e Yamashita (1967),
Bordreuil (1977), que estudaram de perto a influência da urbanização sobre o clima, mor-
mente no que tange ao fenômeno relativo à ilha de calor. Entre nós, os estudos iniciaram-se
com Monteiro et al. (1972), Monteiro e Tarifa (1973). Estes estudos foram isolados, contudo,
referentes, principalmente, à temperatura e umidade. Como pioneiro, no sentido de proposi-
ção de teoria relativa ao clima urbano, cita-se Monteiro (1975).
No entanto, todos os estudos enfocam muito mais o efeito clima (TARIFA, 1977), sem
cruzarem com o tipo de revestimento de solo que induz à modificação, isto é, encaram a
cidade como um todo homogêneo. Estudos que diferenciam os diversos tipos de cobertura
são raros e indicam antes uma constatação do fato do que proposições para o planejamento
urbano Bach (1972), Carvalho (1982), Eriksen (1983). Entre nós, um dos trabalhos que propõe
diretrizes nesse sentido é o de Lombardo (1985). Já na literatura alemã se encontra Bernatzky
(1974), Finke (1976), Univ. Freiburg e Hohenheim (1977). Outros componentes dos ecossiste-
mas urbanos são ainda escassamente estudados, merecendo maiores referências à vegetação
e alguns trabalhos sobre animais: Usteri (1911, 1919), Bernatzky (1969, 1974), Sukopp (1972),
Sukopp e Kunick (1973), Sukopp et al. (1974), Chevallerie (1976), Rapoport (1976), Rapoport
et al. (1983), Troppmair (1976, 1977, 1987), Dansereau (1978), Richter (1981), Siegler (1981),
Eriksen (1983), Cavalheiro e Caetano (1984), Milano (1984, 1989), Fowler (1982, 1983) e Dou-
glas (1983).
68
Seria importante que as pesquisas de ecologia urbana passassem a ser mais desenvol-
vidas, e isso, sem duvida, pressupõe um esforço interdisciplinar de vários especialistas. Sig-
nificaria, também, abandonar o corporativismo tão arraigado entre nós e usado como rótulo
de defesa profissional. Se melhor interpretado, no entanto, deve ser entendido como uma
estratégia de “lobbies”; de não se dar oportunidade para que especialistas de diversos ramos
da ciência demonstrem suas capacidades. A seguir passa-se a relatar com mais precisão as
principais alterações nos diversos componentes urbanos, alertando-se para o fato de que tal
análise, quando feita de forma isolada, peca pelo reducionismo, já que a paisagem é um todo
contínuo (BERTRAND, 1972).
Clima
Que o clima de uma cidade diferencia-se, mais ou menos, da paisagem que a circunda
é um fato já há muito constatado. Pode-se, mesmo, falar de um clima urbano que, embora
regido pelas condições mesoclimáticas, é diferenciado microclimaticamente em função da
cobertura do solo e do balanço térmico urbano, que está representado de forma esquemática
na Figura 4.2.
A Tabela 4.1 mostra de forma evidente que os parâmetros metereológicos sofrem tal
alteração que se pode dizer que a cidade é transferida para um outro local diferente daquele
em que, inicialmente, se desenvolveu. Deve-se ressaltar que os valores apresentados referem-
se a valores médios, mas que em casos isolados podem ser bem maiores. Justamente, esses
casos extremos são os que produzem condições “estressantes” para os seres humanos e têm
efeitos ecológicos diretos sobre a biota urbana.
Os estudos realizados até agora indicam que o fenômeno denominado ilha de calor
deve-se menos ao efeito estufa e muito mais a fatores urbanos específicos, tais como: efeito da
transferência de energia nas construções urbanas, com formas especiais (estruturas verticais,
cores albedo e tipo de material constituinte); evaporação reduzida e conseqüentemente falta
69
do efeito refrescante a ela associado (pouco revestimento vegetal e rápido esgotamento das
águas pluviais por canalizações); produção de energia antropogênica pelos processos realiza-
dos nas indústrias, trânsito e residências (ERIKSEN, 1983).
Resumindo, pode-se dizer que a importância do clima urbano para o homem moderno
traduz-se no aumento das chuvas fortes, induzidas pela urbanização, inundações, bem como
na formação de corredores de vento que podem ocasionar grandes catástrofes e que frequen-
temente são relatadas na imprensa, que identifica a natureza como a grande vilã causadora
dessas desgraças.
Não menos graves são os “estresses” bioclimáticos ocasionados na população, tais
como problemas circulatórios, cardíacos, respiratórios e de insônia. Infelizmente faltam-nos
dados brasileiros, tais como os apresentados na Tabela 4.2 para a Inglaterra. Deve-se lembrar
que a ilha de calor, quando instalada, dificulta ou mesmo impede a troca de ar da cidade
com seu entorno não-urbanizado e a circulação do ar passa a processar-se, internamente, de
forma “viciada” (Figura 4.3).
Relevo e solos
espécies utilizadas na arborização de ruas, cinco delas perfaziam mais de 80% do total, com o
agravante da mais freqüente, a sibipiruna (Caesalpinia peltophoroides Benth), perfazer 52,5%
desse total (Figura 4.5).
Além da homogeneidade florística, lembre-se também que muitas espécies (não nati-
vas) cultivadas nas cidades são exóticas, seja por razões culturais, seja porque as condições
ambientais foram tão alteradas que as espécies nativas não têm mais condições de prosperar
nesses locais. Outra particularidade da flora urbana é a grande escassez de epífitas, que por
serem muito sensíveis à poluição não subsistem em áreas altamente urbanizadas, servindo
como bioindicadores, conforme já foi relatado para os líquenes.
Digno também para o relato é o caso das plantas ruderais (as que crescem sobre escom-
bros), que, na verdade, nada mais são que as pioneiras dos ambientes urbanos, colonizando
trincas de calçamento, terrenos baldios e outros. Exemplos comuns de ruderais em nossas
cidades são, entre outras: Alternanthera brasiliana O. Kuntze, A. ficoidea, R.Br., conhecidas
por sempre-vivas, perpétua-do-mato; diversos Amaranthus, conhecidos por caruru; muitas
gramíneas, como o Cynodon dactylon Pers. (grama-seda), a Eleusine indica Gaertn. (capim-
de-pé-de-galinha), o gracioso Eragrostis pilosa Beauv. (capim-mimoso), ou diversas espécies
do gênero Euphorbia da família das euforbiáceas e outras. Embora tenha sido feito o registro
de plantas ruderais rasteiras, não se deve esquecer de que entre as ruderais urbanas existem
muitas espécies arbustivas e arborescentes, das quais são exemplo a mamona (Ricinus comu-
nis), da família das euforbiáceas, e a gurindiva (Trema micrantha Blume), das ulmáceas.
Figura 4.5 – Espécies utilizadas na arborização de três bairros de Rio Claro (SP).
Org: SILVA, Michelle C. M., 2006.
74
Os animais na cidade
Segundo Müller (1977), as tendências que se verificam em relação aos animais nas
cidades são: diminuição abrupta da diversidade específica de algumas ordens; diminuição
significativa da diversidade; a preferência de alguns animais pela cidade. O mesmo relata uma
bióloga polonesa para o caso da formiga Nonomorium faraonis, que em Varsóvia aproveita-
va-se da grande quantidade de lixo e dos “conduítes” de eletricidade ocos atrás de azulejos
habitacionais construídos nas décadas de 1960-1970. Infelizmente, não se dispõem dos dados
da publicação, para a referência bibliográfica.
Outras espécies são lembradas quando se trata de cidades: ratos e baratas, que tendo
à disposição, além de diversos abrigos, muita alimentação, proliferam em demasia. Em visão
não maniqueísta, deve-se identificar essas espécies como importantes para a decomposição
de resíduos, como para a desobstrução de várias canalizações urbanas. Porém, devido a sua
grande abundância, causam grandes danos e são significativos vetores de doenças.
Proposições
o planejamento urbano, no geral, está inserido na estratégia geral do consumo: grande pre-
ocupação com o sistema viário eficiente, setorização de atividades, visando funcionalidade e
proporcionalização dos espaços, com o objetivo equilíbrio numérico das diversas atividades
urbanas.
Outra questão a ser tratada é a preocupação com melhor integração dos diversos tipos
de espaços urbanos, principalmente os espaços livres de construção. Estudos realizados por
Faeth e Kane (1978), em Cincinnati (Ohio), demonstraram que os parques urbanos funcionam
como ilhas para os dípteros e coleópteros, funcionando para eles a fórmula de biogeografia
de ilhas de McArthur e Wilson (1967). Nesse contexto, tem-se evidente a importância da ar-
borização de ruas (que deveria ser a mais diversificada possível) para integração das praças
e parques, funcionando como corredores da fauna e contribuindo para a Conservação da
Natureza. Claro que se poderia discorrer sobre muitas outras proposições como melhoria
das condições de sobrevivência das árvores nas cidades e que importâncias específicas elas
desempenham nos ecossistemas urbanos. Julgamos, entretanto, que essas considerações de-
veriam ser feitas em trabalhos específicos, razão porque deixamos de relatá-las. Da mesma
forma, evitou-se abordar as funções estéticas, culturais e econômicas que as áreas verdes de-
veriam desempenhar nas cidades.
REFERÊNCIAS
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CAPITULO 5
PLANEJAMENTO DOS ESPAÇOS LIVRES LOCALIZADOS NAS ZONAS URBANAS
Para muitos, cidade e natureza devem ser consideradas como conceitos opostos. A
cidade representaria um meio adaptado às necessidades da espécie humana e não às neces-
sidades das espécies vegetais e animais. A urbanização se caracteriza pela substituição dos
ecossistemas naturais por centros de grande densidade criados pelo homem, em que a espé-
cie dominante é a humana e o meio está organizado para permitir a sua sobrevivência.
Mas para Sukopp e Werner (1991), expoentes no reconhecimento da importância da
conservação da natureza nos assentamentos humanos, a cidade deve mostrar as condições
ideais para a conservação da natureza e da paisagem.
O Professor Dr. Felisberto Cavalheiro, no prefácio de Nucci (2001), observa que so-
mente depois da década de 1970, principalmente, na antiga República Federal da Alemanha,
é que pesquisadores tentam fazer estudos integrados sobre o ambiente urbano, ressaltando
que as cidades têm que ser enfocadas tanto pelos estudos sociais e de engenharia como pelos
de ecologia de forma integrada.
Também, no Brasil, inicia-se uma preocupação com a conservação da natureza em
áreas urbanizadas, fato que pode ser comprovado pelo Estatuto da Cidade (Lei nº 10.257, de
10 de julho de 2001), o qual prevê que para cumprir o objetivo de ordenar o pleno desenvol-
vimento das funções sociais da cidade, a política urbana deverá promover, entre outras dire-
trizes gerais, a ordenação e controle do uso do solo, utilizando como instrumento a instituição
de unidades de conservação (BRASIL, 2001).
É evidente a preocupação geral em se conservar a natureza em áreas urbanas. Para tan-
to, são necessárias pesquisas que forneçam métodos, técnicas e indicadores para a avaliação
da paisagem urbanizada objetivando-se a conservação da natureza.
Porém, a substituição de hábitats naturais por edificações, derrubada de florestas, erra-
dicação de animais e ervas daninhas, introdução de espécies exóticas, poluição atmosférica,
hídrica e dos solos, mudanças nos padrões naturais de percolação das águas, etc, fazem das
áreas urbanas sinônimos de perturbação de ecossistemas e de erosão da diversidade biológica
(MURPHY, 1997).
Para Sukopp e Werner (1991), as condições ideais para a conservação da natureza nas
áreas urbanas poderiam ser assim resumidas:
cados.
Implantação de zonas verdes de grandes dimensões e com alto grau de conexão entre
elas.
Evitar ao máximo a pavimentação excessiva dos espaços verdes.
Adequação e integração da vegetação espontânea da zona verde.
As folhas e ramos caídos das árvores não devem ser eliminados, pois são hábitats para
artrópodos, que são os recursos alimentícios de pequenos mamíferos e aves.
Evitar os gramados ornamentais primorosamente cortados e árvores exóticas que são
mantidos com alto custo e com utilização de fertilizantes e pesticidas.
Substituir o gramado por campo com plantas ruderais que apresentam uma maior di-
versidade de espécies e cumprem melhor as funções ecológicas para a fauna.
Evitar a construção de tanques que não permitem a instalação natural da flora e da
fauna.
Considerar os terrenos baldios com vegetação espontânea como biótopos potenciais
muito especiais, pois podem constituir zonas de refúgio para espécies e apresentar
grande biodiversidade.
A edificação em terrenos baldios deve ser considerada perda de espaço verde e deve-
ria ser compensada.
Um terreno baldio de grande tamanho e que esteja em um estado avançado de suces-
são, deveria ser conservado como zona verde merecedora de proteção e não transfor-
mado em estacionamento e posteriormente edificado.
Os cemitérios também deveriam ser planejados com base em programas especiais de
conservação da natureza e, assim, comporem o sistema de espaços verdes urbanos.
Favorecimento das espécies ruderais e das árvores nativas, diminuição da pavimenta-
ção, do uso de fertilizantes e de pesticidas nos pequenos jardins privados.
Integração dos pequenos jardins privados criando superfícies comuns que sirvam como
pontos de união entre os espaços verdes.
Fomento ao reverdecimento de telhados e de fachadas23.
A relação de itens acima poderia ser utilizada como uma lista de checagem na ava-
liação das paisagens urbanizadas. De acordo com as características da cidade-ideal, em se
tratando da conservação da natureza sugeridas por Sukopp e Werner (1991), poucas são as
áreas urbanas que realmente colaboram com a conservação da natureza e, também, apontam
problemas nas características dos parques urbanos:
Muitas espécies animais e vegetais não se adaptam aos altos níveis de tensão (ruído,
contaminação, etc) e agressões (pisoteio, podas, etc) a que estão submetidas.
A alteração das condições hidrológicas originais (retificação de cursos d’água, cons-
trução de represas, reforço de margens, etc), provocam assoreamento, aumento da
carga de compostos poluidores, aumento de partículas em suspensão com diminuição
da visibilidade, destruição da vegetação natural das margens, etc, impactos negativos
que não permitem a sobrevivência da fauna e flora nativas e de outros seres vivos em
condições equilibradas.
Nos parques de tamanho reduzido, cercados por edificações e fragmentados pelo siste-
ma viário, as espécies nativas não resistem e desaparecem. Algumas espécies de aves
23 No anexo 1, encontra-se um exemplo de como esse fomento poderia ser calculado com base no valor
do biótopo.
80
de floresta, por exemplo, necessitam de pelo menos 0,2 ha de bosque tranqüilo para
nidificar (GOLDSTAEIN et al., 1983).
Os parques dos centros urbanos são criados para cumprir uma função fundamental-
mente recreativa e, portanto, as possibilidades de melhorar a situação da flora e da
fauna por meio de sistemas mais naturais são limitadas.
As instalações desportivas e as piscinas públicas ao ar livre não apresentam grande va-
lor do ponto de vista da conservação da natureza e não deveriam ser incluídas como
parte do sistema de espaços verdes se não conseguem cumprir as funções relaciona-
das com a conservação da natureza.
A manutenção excessiva de um parque urbano (eliminação do material vegetal vivo
e morto situado debaixo das árvores, alta porcentagem de árvores e arbustos não
nativos, formações de grupos de árvores isoladas sem conexão com os bosques, pa-
vimentação de caminhos, etc.) e a sua superutilização provocam uma diminuição das
possibilidades para a vida nativa. Em um parque urbano há poucas zonas tranqüilas
nas quais os seres vivos possam se desenvolver naturalmente.
Verifica-se, então, que mesmo nos parques urbanos, de acordo com suas característi-
cas, corre-se o risco de não se efetivar plenamente a conservação da natureza.
Breuste e Wohlleber (1998) afirmam que, por mais de 20 anos, as leis de conservação
da natureza da República Federal da Alemanha têm encorajado a conservação da natureza e
proteção da paisagem para assegurar o básico para a vida das pessoas e, também, assegurar
a satisfação das necessidades de recreação em contato com a natureza. Essas atitudes cons-
tituem pontos básicos para o planejamento geral da conservação da natureza e proteção da
paisagem nas áreas urbanas. Os autores recomendam que as paisagens urbanas deveriam ser
estruturadas por meio de uma rede de áreas verdes criadas para as pessoas terem contato
com a natureza e poderem relaxar nas imediações de seu ambiente de vida; corredores verdes
regionais deveriam contribuir com a conexão entre as áreas verdes intra-urbanas e a paisa-
gem aberta, formando um “Sistema Combinado Ecologicamente”. (BREUSTE e WOHLLEBER,
1998)
Constata-se nas grandes cidades que, além dos problemas sócioeconômicos, que a
qualidade ambiental vem, a cada dia, piorando e que as medidas de planejamento sugeridas
são paliativas e adeptas do populismo, não atingindo as causas da degradação ambiental.
Van Kamp et al. (2003) afirmam que a identificação da qualidade ambiental urbana é
uma estratégia que vem sendo adotada em vários países e que está presente em uma série de
publicações científicas. Os pesquisadores ainda se questionam sobre quais fatores poderiam
determinar a qualidade ambiental.
Por outro lado, em Nucci (1996, 2001) pode-se encontrar uma forma simples de avaliar
a qualidade ambiental urbana, incluindo a cobertura vegetal como um dos indicadores de
qualidade.
A vegetação em áreas urbanas pode exercer uma série de funções como conservação
de biótopos, elemento purificador da atmosfera pela fixação de forma mecânica de partículas
suspensas, proteção do solo e de cortes de aterros, criação de microclimas benéficos ao ser
humano, reflexão e desvio de ruídos, aumento da capacidade de assimilação de biomassa; no
plano estético, a vegetação facilita a relação ser humano-natureza por meio de adequada dis-
tribuição e composição de cenários, integra espacialmente ruas e a cidade, fornece anteparo
81
sem dúvida o jardim concentra e registra a privacidade retendo uma porção da natureza, en-
quanto que a praça vem a ser um espaço aberto na natureza, senão contra ela (...) o advento
da praça corresponde, mais do que ocorre com o jardim, a uma eliminação da natureza.
projeção do verde em cartas planimétricas que pode ser identificada por meio de fotogra-
fias aéreas, sem auxilio de esteroscopia24. A escala da foto deve acompanhar os índices de
cobertura vegetal; deve ser considerada a localização e a configuração das manchas em
mapas. Considera-se toda a cobertura vegetal existente nos três sistemas de espaços (espa-
ços construídos, espaços livres e espaços de integração) e as encontradas nas Unidades de
Conservação, inclusive na zona rural.
Essa conceituação, sugerida por Cavalheiro et al. (1999), vem sendo aplicada em bair-
ros de algumas cidades brasileiras, podendo-se citar em São Paulo/SP por Nucci e Cavalheiro
(1999) e por Nucci (2001), em Guarulhos/SP por Nucci et al. (2000) e por Nucci e Ito (2002) e
em Curitiba/PR e região por Nucci et al. (2003), Moura e Nucci (2005), Buccheri Filho e Nucci
(2005, no prelo) e por Netto (2005), e vem se mostrando de fácil entendimento e de grande
utilidade para o planejamento e avaliação da qualidade dos espaços urbanos. Os resultados
desses levantamentos podem ser encontrados no Anexo 2.
Levantamentos bibliográficos recentes demonstram que essas proposições e suas apli-
cações não estão descoladas do que vem sendo pesquisado e publicado em outros países
sobre o estudo da vegetação urbana.
Em uma revisão sobre os métodos utilizados para a determinação da cobertura urbana
por meio de fotografias aéreas, Novak et al. (1996) afirmam que o “Scanning method” é o
mais preciso e detalhado método de análise. Nesse método, os limites de cada área de cober-
tura vegetal são digitalizados em uma base cartográfica ou delimitados em sua posição exata
em uma folha de acetato (overlay) colocada sobre a fotografia aérea. A cobertura vegetal pode
ser quantificada com base no mapeamento, por meio de programas de computador ou, sim-
plesmente, medindo-se as áreas com técnicas tradicionais.
Em termos de análise da cobertura vegetal, Novak et al. (1996) consideram importante
saber a proporção de copas de árvores em relação ao total de superfícies verdes e, também, a
“vegetação natural potencial”25 que é a vegetação que existiria hoje se os seres humanos não
tivessem removido e tivessem permitido a continuidade da sucessão vegetal até o estágio de
clímax.
Para Akbari et al. (2003) é importante que se faça uma caracterização do tipo de estru-
tura encontrada abaixo da copa das árvores, especificando o uso e o tipo de superfície. Na
área central de Sacramento (EUA), esses autores encontraram, por observação aérea, que a
vegetação cobria 30% da área enquanto que, abaixo dessa cobertura, havia 52% de superfícies
pavimentadas, 26% de telhados e 12% de gramados; verificaram também que, na maioria das
áreas não residenciais, a pavimentação atingia 50-70% da área e que nas áreas residenciais
atingia, em média, 35% da área.
Esse fato mostra que se deve tomar cuidado ao se tentar uma relação direta entre quan-
tidade de cobertura vegetal e taxa de permeabilidade dos terrenos, mas isso não desmerece o
levantamento da quantidade de cobertura vegetal mesmo que seja apenas constituída por co-
pas de árvores, pois estas também executam um importante papel na qualidade ambiental.
Akbari et al. (2003) também enfatizam a necessidade de se classificar a cobertura ve-
getal com base na propriedade, se pública ou privada, bem como uma análise para se saber
o quanto existe de vegetação arbórea, arbustiva ou herbácea, pois essa distribuição está rela-
cionada com conforto térmico e qualidade do ar, podendo essa classificação ser realizada por
meio de fotografias aéreas e verificação de campo.
Attwell (2000) mostra que estudos realizados em cidades da Dinamarca, utilizando fo-
tografias aéreas preto-e-branco, do ano de 1996, na escala 1:6.000, interpretadas com auxílio
de esteroscopia, com o mapeamento e análise de toda cobertura vegetal (árvores, arbustos e
herbáceas), verificaram que a maior parte da vegetação é herbácea.
Por exemplo, para o município de KØge (Dinamarca), segundo Attwell (2000), em área
de habitação unifamiliar, foram encontrados 53% de cobertura vegetal, sendo 60% herbácea;
em áreas de alta densidade de residências, mas não verticalizada, foram encontrados 48% de
cobertura vegetal, sendo 82% herbácea; em áreas ocupadas por apartamentos, 45% de cober-
tura vegetal com 67% herbácea e, no centro da cidade, foram encontrados 25% de cobertura
vegetal sendo 59% herbácea.
Justifica-se o resultado encontrado devido ao fato de que a maior parte das áreas recre-
ativas dos centros urbanos estudados foi elaborada com base na tradição de parques e jardins
e não de acordo com o conceito de reflorestamento. Assim, gramados e árvores isoladas e
alguns arbustos são os elementos predominantes e os agrupamentos de árvores e bosques são
raros, e o cenário de uma paisagem pastoril das paisagens dos jardins ingleses ainda pode ser
visto como uma inspiração costumeira (ATTWELL, 2000).
Attwell (2000), constatando que os centros urbanos dinamarqueses estudados apre-
sentaram em média 25% de vegetação florestal e que 75% da área vegetada são constituídos,
principalmente, por gramados, assevera que os gramados podem ser considerados como
“desertos verdes” devido a sua baixa biodiversidade e ao dispendioso controle humano para
mantê-lo, concluindo que as cidades estudadas são verdes com base na vegetação total, mas
não de acordo com a cobertura de árvores e arbustos.
Novak et al. (1996) fazem um alerta sobre o perigo de se comparar índices de cober-
tura vegetal de locais muito diferentes, pois muitos fatores podem influenciar no desenvolvi-
mento da vegetação, dentre eles os autores apontam os dois principais: o ambiente natural
do entorno e o uso da terra.
Portanto, antes de se iniciar as comparações seria importante fazer um levantamento
das condições de precipitação e de evapotranspiração, pois em cidades onde a evapotrans-
piração é menor do que a precipitação há um potencial para uma maior cobertura vegetal,
enquanto que cidades que se desenvolvem, por exemplo, em regiões desérticas, geralmente,
apresentam menor cobertura vegetal.
Novak et al. (1996) citam estudos em que foram encontrados de 15 a 55% (média de
31%) de cobertura de copas de árvores em cidades localizadas em regiões de florestas; para
cidades localizadas em regiões de savanas, foram encontrados de 5 a 39% (média de 19%)
de cobertura vegetal arbórea; e em cidades localizadas em desertos de 0,4 a 26% (média de
10%).
Dentro da cidade, o uso da terra é outro fator importante, pois certas estruturas po-
dem criar dificuldades para o desenvolvimento da vegetação; terras ociosas, parques e áreas
residenciais em regiões de floresta, geralmente, apresentam maiores coberturas e em áreas
comerciais e industriais a cobertura vegetal tende a ser menor (NOVAK et al., 1996).
Akbari et al., (2003) observam que os índices de cobertura vegetal não devem ser
extrapolados para outras regiões, mas o tipo de análise utilizado deveria ser aplicado para
muitas outras cidades.
Porém, a extrapolação e a comparação com outras cidades podem ser feitas se forem
tomados os devidos cuidados referentes à explanação minuciosa sobre as bases de informa-
ções (fotografias aéreas, imagens de satélite, etc), suas escalas, a data; às técnicas de mapea-
84
mento e quantificação, acrescentando-se, ainda, uma caracterização básica (meio físico e uso
da terra) da área de estudo.
Estudos sobre vegetação urbana na Alemanha estabeleceram objetivos para a cobertu-
ra vegetal baseados nas melhores práticas executadas em Munique. Para as áreas residenciais
de baixa verticalização, a meta para Munique é de 50% de cobertura vegetal, sendo 25% de
cobertura de árvores e arbustos; para área ocupada por complexo de apartamentos, a meta é
de 30% de cobertura vegetal, sendo 15% para árvores e arbustos; para as áreas industriais, a
meta é de 20% de cobertura vegetal com 10% para árvores e arbustos; portanto, para Muni-
que, a metade de qualquer quantidade total de cobertura vegetal deveria ser constituída por
floresta (PAULEIT e DUHME, 1995 apud ATTWELL, 2000).
Miller (1997) afirma que, segundo o Forest Conservation Act – Maryland/1991 (EUA),
as áreas ocupadas por florestas devem estar relacionadas ao tipo de uso da terra, ou seja, 50%
de área de florestas em zona de agricultura, 25% de floresta em áreas residencial de média
densidade e zonas institucionais e 15% de florestas em zonas residenciais de alta densidade,
comerciais e industriais.
Ainda sobre a quantificação, Oke (1973 apud LOMBARDO, 1985) estima que um índi-
ce de cobertura vegetal na faixa de 30% seja o recomendável para proporcionar um adequado
balanço térmico em áreas urbanas, sendo que áreas com índice de arborização inferior a 5%
determinam características semelhantes às de um deserto26.
Como visto, anteriormente, a cidade ideal de Sukopp e Werner (1991), para mostrar
condições ideais para a conservação da natureza e da paisagem, poderia edificar ou pavi-
mentar, aproximadamente, somente dois terços da superfície do centro, ou seja, 33% da área
central da cidade deveriam ser permeáveis e não edificadas e deveria apresentar ampla cone-
xão entre a vegetação da zona rural e a das zonas centrais, com uma redução dos gradientes
entre esses dois tipos de uso.27
Resultados de levantamentos realizados com base em fotografias aéreas em escalas que
variam entre 1:10.000 (NUCCI, 2001) e 1:6.000 (NUCCI e ITO, 2002) apontam para áreas com
alto grau de urbanização, com uma quantidade insuficiente de cobertura vegetal (de 4 a 7%),
mal distribuída e desconexa (Anexo 2).
Também, com utilização de fotografia aérea 1:8.000 e quantificação com papel vegetal
milimetrado e extrapolação de dados, Ruszczyk (1986) constatou que em Porto Alegre (RS), a
zona de edifícios altos ou de alta intensidade de urbanização e as áreas industriais e comer-
ciais apresentaram, em geral, valores abaixo de 20% de cobertura vegetal, sendo que o valor
mínimo de 7% ocorreu nas imediações da Estação Rodoviária. Nas áreas centrais da cidade, a
cobertura vegetal esteve abaixo de 15%, afirmando ser uma situação encontrada em desertos
(Anexo 1).
Até o momento, no Brasil, a preocupação tem se voltado para a conceituação, ma-
peamento e quantificação da cobertura vegetal como um todo, porém, um passo deve ser
dado em direção à classificação, já que a quantidade e distribuição das principais categorias
de cobertura vegetal, ou seja, herbácea, arbustiva e arbórea, estão relacionadas com conforto
térmico, com a qualidade do ar, escoamento superficial, etc.
É interessante salientar que em outros países a preocupação não se restringe mais e tão
somente à quantificação e às qualidades estéticas dos espaços livres. Nos estudos realizados
26 Para Sukopp et al. (1979), as áreas centrais das cidades podem ser consideradas como um “deserto de
epífitas”, batizado por Douglas (1983) como “deserto florístico”.
27 Sukopp et. al. (1979), afirmam que a área urbana construída de Berlim Ocidental apresenta 32% de sua
superfície cobertos por vegetação.
85
ESPAÇOS LIVRES
Conjunto de espacios urbanos al aire libre, destinados bojo todo tipo de conceptos al peatón,
para el descanso, el paseo. Ia práctica del deporte y, en general, el recreo y entretenimiento
de sus horas de ocio (...) destinado al peatón, entendiendo a este, volvemos a insistir, como
contraposición de Ias personas que se mueven por Ia ciudad en un medio motorizado.
O autor também define área verde como “Cualquier espado libre en el que predomi-
nen Ias áreas plantadas de vegetación (...)”. Por exemplo e apenas como sugestão, um con-
junto residencial, segundo Llardent (op. cit), poderia ter seus espaços divididos em:
livres de edificação e, também, de construção, ou quem sabe, talvez, com uma infraestrutura
mínima para o uso, como por exemplo, as trilhas para facilitar o contato com a natureza.
Observa-se, também, que para Llardent (op cit) a rede de passeios a pé (rede de pea-
tones) deve oferecer segurança e comodidade com separação total da calçada em relação aos
veículos; os caminhos devem ser agradáveis, variados e pitorescos. Neste caso, somente as
calçadas isoladas do sistema viário para veículos motorizados devem fazer parte do sistema
de espaços livres.
Esses espaços, que estariam mais relacionados com a escala dos conjuntos residenciais
ou escala de bairro, são realmente livres com apenas algumas regras mínimas de convivência,
o que difere das “dotações esportivas”, também sugeridas por Llardent (op cit), que devem
contar com 4m2/hab, porém esse espaço seria semipúblico pois estaria sob regras mais rígidas
de utilização.
O Sistema de Espaços Livres na escala de cidade conta com os seguintes aparelhos:
Parque de Jogos, Parque de Atrações, Zoológico, Jardim Botânico, Parques de Esportes, Áreas
para usos Especiais e Parque Urbano.
Para Llardent (op. cit.), o Sistema de Espaços Livres teria 50,0m2/hab, sendo 35m2/hab
totalmente públicos e livres de regras rígidas.
Jámbor e Szilágyi (1984) sugerem para cidades com mais de 10.000 habitantes um
total de 21 a 30m2 de espaços livres públicos por habitante, enquanto Sukopp et al. (1979)
afirmam que a área urbana de Berlim Ocidental apresenta 32% de sua superfície cobertos por
vegetação.
A identificação e análise das funções que um espaço livre pode exercer são ações que
ajudam na caraterização da qualidade desse espaço, questão fundamental, pois não basta ape-
nas a existência do espaço livre, mas devem-se considerar a sua qualidade e sua distribuição
espacial, pensando na facilidade de uso pela população.
Um espaço livre poderá ou não, dependendo de sua qualificação, desempenhar a fun-
ção de facilitador da realização social da personalidade, favorecer o contato entre pessoas,
fornecer uma noção de referência escalar, ajudando a equilibrar as dimensões e espaços; à
caracterização de ruas, logradouros com a noção de referencial para toda a cidade. Enfim, os
espaços livres podem colaborar na delimitação de espaços e representam, por si, a possibili-
dade de vivência espacial.
Portanto, além da quantificação, é muito importante que os espaços livres sejam locali-
zados em mapas com a indicação de seus raios de influência, pois em exercendo sua função
recreativa, um dos maiores requisitos do espaço livre seria sua localização em relação aos
usuários. “Um grande peso é a distância entre o usuário e o espaço livre” (distâncias maiores
do que 10 a 15 minutos, a pé, a utilização decai) (DI FIDIO, 1985).
Lorusso (1992) também orienta para uma melhor distribuição e maior ampliação do
“Sistema de Áreas Verdes”, de modo que o usufrutuário não tenha que dispender, andando
normalmente, mais do que 10 (dez) minutos para alcançar o equipamento mais próximo.
Henke-Oliveira et al. (1994), além do levantamento quantitativo das áreas verdes de
89
São Carlos (SP), fazem uma análise qualitativa dessas áreas, descrevendo algumas praças,
como, por exemplo:
(...) esta praça não tem função social devido à inexistência de manutenção (...) valor social
bastante comprometido, uma vez que a acessibilidade é baixa, devido ao intenso tráfego de
veículos e o fato de que os canteiros centrais têm pouca extensão (...).
Esse é um procedimento muito importante, pois não basta ter a área à disposição da
população. Às vezes a área verde não apresenta condições de uso, portanto, após a qualifi-
cação dos espaços livres dever-se-ia trabalhar com dois índices: um indicando a quantidade
total de espaços livres e outro indicando a quantidade de espaços livres utilizáveis pela co-
munidade de acordo com suas qualificações.
Sendo assim, na análise de um espaço livre deve-se considerar não só a sua área, mas
também o ordenamento da vegetação, as barreiras de vegetação que propiciam um isolamen-
to da área em relação aos transtornos da rua, o entorno, a acessibilidade, a porcentagem de
área permeável, as espécies vegetais naturais e as exóticas, a densidade de vegetação, a al-
tura da vegetação, a função social, os equipamentos de recreação, telefonia, estacionamento,
bancos, sombras, tráfego, manutenção, valor estético, valor ecológico, serviços, iluminação,
calçamento, isolamento visual, sanitários, avifauna, etc. 29
Os espaços livres, portanto, são elementos fundamentais no planejamento dos usos e
ocupações, pois exercem um importante papel na qualidade ambiental e de vida dos habitan-
tes das zonas urbanizadas. Para assegurar o bem-estar dos cidadãos, a legislação que discipli-
na o desenvolvimento urbano deve observar as taxas mínimas de espaços livres, a proteção
de áreas já existentes e o planejamento da ocupação do solo.
Compete ao Poder Público planejar, criar e ajudar a manter ambientes agradáveis e
estéticos, além de acomodações e instalações variadas, de modo a facilitar a cada pessoa fazer
escolhas acertadas de lazer, segundo o seu gosto e sob a própria responsabilidade.
Lefebvre (1969) fala sobre a importância da existência de lugar e tempo para o cum-
primento das necessidades sociais:
(...) necessidades sociais (...) segurança, abertura, certeza, aventura, organização do trabalho
e do jogo, previsibilidade, imprevisto, unidade, diferença, isolamento, encontro, indepen-
dência, solidão, comunicação, acumular energias, gastar energias, desperdiçar energia no
jogo, ver, ouvir, tocar, degustar, atividade criadora, de obra, informações, simbolismo, ima-
ginário, atividades lúdicas (...) As necessidades urbanas específicas não seriam necessidades
de lugares qualificados, lugares de simultaneidade e de encontros, lugares onde a troca não
seria tomada pelo valor de troca, pelo comércio e pelo lucro? Não seria também a necessi-
dade de um tempo desses encontros, dessas trocas?
A recreação é algo mais do que uma atividade física qualquer. Dependendo da qualidade
do espaço livre pode-se ter a oportunidade de ter experiências com sons, odores, texturas,
paladar da natureza, importantes árvores frutíferas (...) lugares para andar descalço: areia,
29 Uma lista de checagem para avaliação dos espaços livres, elaborada pelo professor Felisberto Cavalheiro,
pode ser consultada no anexo 4.
90
gramado (...) sons e cores criados pelas árvores (...) contato com aves e pequenos mamíferos
(...) experiências que já não encontramos tão facilmente e que fazem parte da segurança e
saúde psíquica do cidadão (...) Nós precisamos resgatar a vida harmônica com a natureza, e
os parques e espaços livres têm este papel (...) (LUTZIN e STOREY, 1973).
Cavalheiro e Del Picchia (1992) chamam a atenção para uma indicação de índices
urbanísticos para espaços livres sugerida pela “Conferência Permanente dos Diretores de
Parques e Jardins da República Federal da Alemanha”, que serve como apoio para reflexão
sobre a qualidade e disponibilidade de diversas categorias de espaços livres, e como termos
de comparação entre cidades diferentes (Anexo 6).
O quadro do anexo 6 apresenta uma classificação para parques e outros tipos de es-
paços, com base no uso da população, ou seja, consideram-se as faixas etárias dos usuários,
a proporção entre área e população, a área mínima para cada categoria, a distância da resi-
30 Sobre os usos dos termos “construção” e “edificação” em se tratando de Espaços Livres, indica-se o
trabalho de Cavalheiro, Presotto e Rocha (2003).
31 “Na República Federal da Alemanha, embora não haja leis, nem normas que obriguem que se siga uma
certa proporcionalidade, observa-se que os espaços de integração viária constituem 10-20% do território urbano,
os construídos de 40-50% e os livres de construção outros tanto 40-50%. Ficando assim destinados aos espaços
livres de construção, quase sempre, um mínimo de 40% e, depois de designados no zoneamento urbano, não
são mais permitidos usos que venham impermeabilizar esses espaços. Assim, garagem subterrânea só podem
ser construídas nos espaços destinados à integração viária e as construções”( CAVALHEIRO e DEL PICCHIA,
1992).
32 No Anexo 5, encontra-se uma convenção de representação cartográfica do zoneamento dos espaços
urbanos.
91
dência e se o acesso é para todos, ou seja, público, ou se há barreiras de acesso como nos
espaços privados.
Cavalheiro e Del Picchia (1992) ressaltam, ainda, que os índices não são receitas a se-
rem seguidas, antes eles servem como apoio científico para o planejamento e que a assertiva,
difundida e arraigada no Brasil de que a ONU, ou a OMS, ou a FAO consideram ideal que
cada cidade dispusesse de 12m2 de área verde por habitante, não pôde ser comprovada pelas
pesquisas, por carta, que os autores fizeram junto a essas organizações e esse índice, também,
não é conhecido entre as faculdades de paisagismo da República Federal da Alemanha.
Somos levados a supor, depois de termos realizado muitos estudos, que esse índice (12m2/
hab.) se refira, tão somente às necessidades de parque de bairro e distritais/setoriais, já que
são os que, dentro da malha urbana, devem ser sempre públicos e oferecem possibilidade
de lazer ao ar livre (CAVALHEIRO e DEL PICCHIA, 1992).
Um outro aspecto muito importante quando se trata de espaços livres, está relacionado
com o planejamento desses espaços. Segundo Cavalheiro e Del Picchia (1992), para que os
espaços livres possam desempenhar, satisfatoriamente, suas funções, é necessário que sejam
abordados de forma integrada no planejamento urbano, ou seja, que o paisagista tenha sua
ação, tanto em nível da “grande paisagem” (escalas espaciais menores), bem como em nível
do planejamento das cidades (escalas espaciais maiores), sugerindo um adequado ordena-
mento dos espaços livres urbanos, visando a uma integração da natureza com a cultura do
ser humano.
Gert Gröning33 (1976) apresenta, na forma de quadro (Anexo 7), as operacionalidades
no planejamento de espaços livres, apontando as diferentes designações para a ações, conte-
údos, intenções, de acordo com a escala espacial adotada.
Segundo Gröning, ao se pensar em planejamento, dever-se-ia pensar desde o Planeja-
mento do Sistema de Espaços Livres, em escalas da ordem de 1:100.000 até 1:50.000; para a
localização de áreas que não devem ser construídas no município e região de entorno, como
o modelo do Greenbelt (Cinturão Verde) de Londres - até a localização de diferentes tipos de
espaços livres em bairros, quadras e conjuntos residenciais, em escalas da ordem de 1:10.000
a 1:500.
Escalas ainda maiores, entre 1:500 e 1:5, estariam relacionadas com o projeto de espa-
ços livres, incluindo os detalhes de construção.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
33 Gert Gröning é professor doutor da Universidade de Artes de Berlim, Instituto de História e Teoria do
Design e trabalha com Desenvolvimento de Espaços Livres e Cultura de Jardins. Foi orientador no doutoramento
do professor Felisberto Cavalheiro em Hanover/Alemanha.
92
ponto de partida para as análises da eficiência dos espaços urbanos na conservação da nature-
za, sugere-se a utilização dos pontos salientados por Sukopp e Werner (1991), anteriormente
listados.
Os esforços encaminhados para a conservação da natureza darão frutos se estiverem
em conexão com o desenvolvimento de um programa de proteção ambiental total sendo,
portanto, indispensável a união das diversas esferas de governo.
Nos tempos atuais com uma tendência de ocupação de todos espaços livres urbanos
por edificações, acredita-se ser conveniente, resgatar e transcrever as conclusões de Lorusso
(1992):
Para voltar a nos sentirmos donos de nós mesmos, sem dúvida teremos de começar por nos
sentirmos donos da paisagem e por reestruturá-la em seu conjunto”. Esta citação de Munford
(1964), reflete a preocupação efetiva com as tendências urbanísticas “devoradoras de espa-
ço”, que acabarão por aniquilar todos os recursos estéticos da paisagem, toda a reserva de
verde necessária a qualidade de vida das cidades. Para que tal catástrofe não ocorra, medi-
das políticas necessárias devem ser tomadas para preservar e estabelecer a “matriz verde” das
cidades, pois a tarefa pública mais importante, em torno e além de cada centro urbano em
curso de desenvolvimento consiste em reservar espaços livres definitivos, suscetíveis de serem
dedicados ao lazer e à recreação, ou destinados à preservação das potencialidades paisagís-
ticas e ecológicas. (LORUSSO, 1992, p. 116-117).
Finalizando, com a mesma crença de Cavalheiro e Del Picchia (1992), pode-se concluir
que o planejamento da paisagem deve fazer parte do planejamento integral, devendo ser ela-
borado sob a ótica conjunta da relação natureza e sociedade.
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96
ANEXO 1
O quadro abaixo foi organizado com base em transparência das aulas do professor Felisberto
Cavalheiro.
“Estudos realizados na Alemanha demonstram um interesse no aspecto de reverdecimento de
fachadas, quando realizam classificações dos tipos de áreas associando-se a elas um valor de
biótopo que é utilizado nos cálculos do desconto no imposto urbano” (NUCCI, 2001).
Fator de
Tipos de áreas Explicação - exemplos
multiplicação
Piso impermeável para ar e água, sem crescimento de
1 Impermeabilizada zero
vegetação - asfalto, concreto, ...
P a r c i a l m e n t e Piso permeável ao ar e água, sem vegetação – mosaicos,
2 0,3
impermeável placas, paralelepípedos unidos com areia, ...
Piso permeável, com percolação de água e com
3 Meio abertas 0,5
vegetação – placas, grades com grama
4 Com vegetação Jardins sobre laje com menos de 80cm de espessura 0,5
sem ligação com
5 Jardins sobre laje com mais de 80cm de espessura 0,7
o solo
Com vegetação
6 e ligação com o Áreas propícias ao desenvolvimento da flora e fauna 1,0
solo
Percolação
Para cada m2 de telhado – água da chuva conduzida
7 da chuva em 0,2
para a percolação no solo
telhados
8 Vegetação vertical Até 10m de altura em pedras e muros com vegetação 0,5
Vegetação sobre
9 Telhado cultivado extensivamente e intensivamente 0,7
telhado
Org. Nucci, 2006
ANEXO 2
ANEXO 3
Fluxograma das conseqüências do adensamento por verticalização das edificações, de acordo
com Nucci (1996, 2001).
ANEXO 4
Ficha de levantamento de campo de Espaços Livres
(Fonte: Cavalheiro, F. 2002/ Org. Presotto, A. 2002 in Presotto, 2004)
Privado [ ]
Potencialmente Coletivo [ ]
Público [ ]
CATEGORIAS:
1. Jardim de Ornamentação [ ]
2. Espaço de Lazer
Praça [ ]
Parque Setorial [ ]
Distrital [ ]
Regional [ ]
3. Verde Viário
Arborizado [ ] Clube [ ]
Canteiro central [ ] Escola [ ]
Jardim [ ] Terreno [ ]
Quintal [ ] Outros [ ]
Quais: _____________________________________________________________
4. Horta Comunitária [ ]
5. Verde Religioso (cemitério, igrejas) [ ]
Unidade espacial em metros quadrados (aproximadamente): _________________
ANEXO 5
Segundo o professor Felisberto Cavalheiro (transparência das aulas da disciplina Teoria Ge-
ográfica da Paisagem), no Exterior a representação em planta do zoneamento é simples e de
fácil leitura.
ANEXO 6
Sugestão de índices urbanísticos para espaços livres
Quadro 2 - Sugestão de índices urbanísticos para espaços livres elaborada pela �����
“Con-
ferência Permanente dos Diretores de Parques e Jardins da República Federal da Ale-
manha”,
ANEXO 7
Operacionalidade no Planejamento de Espaços Livres
Projeto de
Planejamento de Espaços Livres
Espaços Livres
Projeto de
Planejamento de Estruturas de Espaços
Instalação de Planejamento de Sistema de Espaços Livres
Livres
Espaços Livres
Modelo de
Designação Projeto de EL Plano de conjunto de Plano de tipos de Plano de Sistemas de
desenvolvimento de
do Plano com detalhes Espaços Livres Espaços Livres Espaços Livres
Espaços Livres
Localização de Localização de
Localização de um Localização de áreas a
Localização e diferentes tipos de áreas a não serem
tipo de espaço livre não serem construídas
Conteúdo ordenamento de espaços livres em construídas no
em comunidades nas comunidades
Espaços Livres quadras, quarteirões município e na
urbanas urbanas e municípios
ou conjuntos região
Plano de Play-Grounds
Modelo de faixa
Plano de áreas para
de associação de
esporte Plano de áreas livres
Pátio de escolas Situação de espaços assentamentos
Plano de “Kleingarten” de Hamburg
Parques livres em quarteirões urbanos do Ruhr
Plano de Cemitérios Plano paisagístico de
Exemplos Cemitérios deteriorados, Modelo do
Regiões para Salzburg
Camping conjuntos residenciais “Greenbelt” de
conservação da Ordenamento do
etc. modernos etc. Londres
natureza verde de Hannover
Modelo da faixa
Áreas de proteção
Hamburg-Munique
ambiental
A existência de espaços livres nas cidades é uma necessidade quando também vincu-
lada aos benefícios deles oriundos, o que eleva ainda mais as importância das áreas verdes.
Em vários trabalhos de renomados pesquisadores tem-se discutido o valor dessas áreas para
a qualidade de vida da população. Segundo Nucci (2001):
As áreas verdes estabilizam as superfícies por meio da fixação do solo pelas raízes das
plantas; criam obstáculos contra o vento; protegem a qualidade da água, pois impedem que
substâncias poluidoras escorram para os rios; filtram o ar; diminuem a poeira em suspensão;
equilibram os índices de umidade no ar; reduzem o barulho; abrigam a fauna; contribuem
para a organização e composição de espaços no desenvolvimento das atividades humanas;
colaboram com a saúde do homem e também atenuam o impacto pluvial, auxiliando na
captação de águas pluviais, tendo em vista que a impermeabilização crescente e progressiva
do solo prejudica o escoamento superficial, não tendo a rede de captação de águas pluviais
capacidade suficiente para escoar de modo rápido o grande volume de água que faz trans-
bordar os córregos e se acumula nos vales do sítio urbano.
Atualmente, as áreas verdes são essenciais a qualquer planejamento urbano aliado ���se-
gundo a análise da distribuição espacial da população atual e futura (estimativa). Há também
que se pensar nos locais reservados a essas áreas, pois a política de um sistema de áreas ver-
des não deve se limitar às grandes reservas na periferia da cidade. Citada por Barbin (2003)
a carta de Atenas (1969), documento elaborado no IV Congresso Internacional de Arquitetura
Moderna, já alertava para esse problema, em que a falta de superfícies livres no interior das
cidades faz com que as áreas verdes se situem na periferia, perdendo muitas vezes o caráter
de prolongamento direto ou indireto da habitação.
Conforme a cidade cresce, surge a necessidade da manutenção ou criação das áreas
verdes. O propósito dessas áreas está relacionado à quantidade, qualidade e a distribuição da
mesma dentro da área urbana. Para Sanchotene (2004):
O índice de áreas verdes é determinado pela quantidade de espaços livres de uso pú-
blico por habitante da cidade. Pode-se falar em muitos índices ou em muitos elementos fun-
damentais a serem considerados para esse cálculo. Foi difundida a idéia de que a Organização
Mundial de Saúde (OMS) e a ONU utilizam o índice de 12m² de área verde por habitante como
34 Geógrafa, IG-UFU
35 Geógrafo (DG-FFLCH-USP), Professor Doutor, Instituto de Geografia - UFU
104
ideal, porém tais organizações não reconhecem esse índice, nem possuem estudos nesse
sentido. Além disso, Cavalheiro e Del Picchia (1992), embasados em consultas e pesquisas,
também não adotam nem declaram sua existência trabalhando, inclusive, com autores que
propõem outros índices.
As pesquisas relacionadas ao índice ideal denotam a existência de diversas metodo-
logias, mas como não existe um padrão único convencionado a comparação entre elas não
fará parte deste capítulo. ����������������������������������������������������������������
O planejamento de áreas verdes requer, primordialmente, o conhe-
cimento sobre a quantidade e a distribuição das mesmas na malha urbana, bem como a asso-
ciação desses espaços com a população para, posteriormente, embasados em outros fatores,
se fazer o diagnóstico da qualidade de vida dos habitantes, o que torna propensa a avaliação
da questão ambiental. É importante ressaltar a evidência de que tal análise é apenas uma das
primeiras a se considerar para efetuar uma conclusão efetiva da qualidade de vida da popu-
lação relacionada às áreas verdes.
Diante das considerações apontadas torna-se urgente a realização de pesquisas que
envolvam os espaços livres, mais precisamente as áreas verdes de maior consideração como
os parques e as praças, nas cidades em crescimento, para que ainda seja possível um planeja-
mento preventivo de caráter ambiental ou, se for o caso, reverter quadros corrigindo possíveis
equívocos.
Uberlândia se enquadra nessas circunstâncias, já que está em fase de expansão e cres-
cimento populacional acelerado. O município possui um importante centro urbano regional,
no âmbito do Triângulo Mineiro, com população de 501.214 (IBGE, 2000), e estimada em
600.368 com data de referência em 1º de julho de 2006 também pelo IBGE.
Como em várias cidades brasileiras, nesse contexto, Uberlândia tem um número muito
pequeno de trabalhos que analisam tal problemática e discutam o papel das áreas verdes nos
centros urbanos, apesar de serem imprescindíveis pesquisas e estudos nessa composição,
pois como já detectaram Soares et al. (2004) Uberlândia já convive “com a carência de arbo-
rização e espaços livres, sejam parques, praças e canteiros ajardinados, áreas de conservação
de mananciais e de cerrado típico.”
Aprofundar tal questão é de extrema importância tanto para população como para os
órgãos públicos, já que a política de espaços verdes urbanos é responsabilidade do município
e deve ser estabelecida pelos Planos Diretores e Leis de uso do solo dos municípios, como
é embasado nos artigos 4º e 22 da Lei 6766/79, Lei do Parcelamento do Solo, também nos
artigos 122, 176 e 202 da Lei Orgânica do Município – do Desenvolvimento e Política Urba-
nos, Desporto e Lazer e da Proteção ao Meio Ambiente, respectivamente, como destacado
abaixo.
Para atingir os objetivos propostos, foi desenvolvida, primeiramente, uma pesquisa teó-
rica acerca dos conceitos como espaços livres, áreas verdes, índices de áreas verdes, parques,
praças, e outros que se fizeram necessários ao longo do trabalho, com o aporte dos princi-
pais autores no assunto, possibilitado assim a compreensão e a escolha do embasamento e
dos indicadores que foram considerados, referenciando a idéia de realizar o levantamento, a
quantificação, e a análise, simplificada, das áreas verdes urbanas de Uberlândia tendo como
destaques os parques e as praças.
Na execução prática para se definir os aspectos do município proeminentes ao estudo
das áreas verdes fez-se o uso do Banco de Dados Integrados de Uberlândia (BDI) 2006 obtido
na SEPLAMA, os quais possibilitaram a elaboração e organização dos mapas e a formação de
tabelas e figuras para a escala de abordagem necessária.
Para identificação das áreas verdes, foram usadas, além da carta base do município,
mapas colhidos na PMU/SEDUR (2004), posteriormente organizados de acordo com intenção
de exibição das mesmas. A proposta de utilização da cartografia digital como a base principal
para representar as áreas verdes do município (parques e praças) encontra respaldo na impor-
tante ferramenta que representa na análise urbana. Por si só, a cartografia temática já fornece
a possibilidade da visão integrada do espaço urbano.
Como ilustrações dos principais pontos de áreas verdes da área urbana foram realiza-
dos diversos trabalhos em campo para o recolhimento de fotografias e informações. Utilizou-
se também figuras, em diversas escalas, selecionadas no portal eletrônica da Prefeitura Muni-
cipal de Uberlândia (PMU). Os dados censitários da área foram recolhidos em dois momentos,
primeiro no Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), e no outro na SEPLAMA, na
Coordenação do Núcleo de Pesquisa Estatística e Banco de Dados do Município de Uberlân-
dia.
Dentre as várias técnicas e métodos existentes para se computar o Índice de Áreas Ver-
des, foi escolhida a metodologia mais utilizada para o cálculo, ou seja, considerando o soma-
tório das áreas verdes em metros quadrados (m²) dividido pela população da área estudada;
embasada nas considerações de Nucci (2001) as quais afirmam que, para calcular o índice
de área verde, devem ser consideradas somente as áreas verdes públicas localizadas na zona
urbana e ligadas ao uso direto da população residente nessa área.
Para se obter a somatória dessas áreas, foram realizadas visitas e entrevistas na PMU,
junto à Secretaria de Planejamento Urbano e recolhidas informações no memorial descritivo
da mesma, além de visitas aos próprios locais para confirmação de dados.
Os índices de áreas verdes são expostos de diferentes formas por diferentes pesqui-
sadores, para diferentes cidades, sendo talvez, uma conseqüência da falta de consenso entre
os conceitos, já discutida neste livro. Cavalheiro e Nucci (1998), alertam que o confronto de
índices de áreas verdes entre cidades pode ser um equívoco, pois o índice desacompanha-
do da definição de termo “área verde” não estabelece parâmetros para comparações. Além
disso, sabe-se que muitas administrações aumentam seus índices colocando todo espaço não
construído como área verde e/ou até consideram a projeção das copas das árvores sobre as
calçadas.
No entanto, em termos gerais, o índice de áreas verdes é aquele que denota a quantida-
de de espaços livres de uso público, em km² (quilômetro quadrado) ou m² (metro quadrado)
dividido pela quantidade de habitantes de uma cidade. Para Sanchotene (2004), entende-se
por índice de área verde por habitante a relação entre a densidade populacional e a metra-
106
gem quadrada total de áreas verdes de uma cidade ou de partes dela. Acrescentando-se que
para Guzzo (2003), apud Rondino (2005) essa matemática é feita entre os espaços nos quais
o acesso da população é livre, ou seja, as praças, os parques e os cemitérios. Para aquele
autor, o índice deveria, primeiramente, ser calculado em função da quantidade total das áreas
existentes e, posteriormente, recalculado, demonstrando quantas dessas áreas estão sendo
realmente utilizadas, após uma avaliação do seu estado de uso e conservação. Todavia, este
índice está intimamente ligado à função de lazer que desempenham ou que venham a de-
sempenhar.
Nucci (2001) afirmou que, para calcular o índice de área verde, devem ser considera-
das somente as áreas verdes públicas localizadas na zona urbana e ligadas ao uso direto da
população residente nessa área.
Cavalheiro e Del Picchia (1992) referem-se ao índice mais difundido no Brasil, o qual
teria sido desenvolvido pela Organização Mundial de Saúde (OMS), pela ONU e pela Or-
ganização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), que considerariam
como ideal que cada cidade dispusesse de 12m² de área verde/habitante. Porém, os autores
mencionados e a ONU não o admitem. A Sociedade Brasileira de Arborização Urbana (SBAU)
propôs como índice mínimo para áreas verdes públicas destinadas à recreação o valor de 15
m²/habitante (SBAU, 1996). Para Escada (1987), os índices são instrumentos que devem ser
utilizados como guia para questões muito complexas e por isso são muito subjetivos. Como
destaca Magalhães Jr (2007):
O índice é um instrumento para reduzir uma grande quantidade de dados a uma forma mais
simples, retendo o seu significado essencial (Ott, 1978). A construção de um índice sintético
pode facilitar a ordenação ou comparação entre comunidades, mas “um índice envolve o
problema da ponderação dos indicadores, o que, em última instância, envolve algum juízo
de valor. Significa dizr que os pesos atribuídos aos indicadores não são neutros e envolvem,
necessariamente, a introdução de algum nível de arbítrio” (Ipea/FJP/Pnud, 1998)
Oliveira (1996) fez um levantamento das áreas públicas do município de São Carlos/
SP e obteve dois índices diferentes, o primeiro, chamado percentual de áreas verdes (PVA),
foi estimado para grandes áreas da cidade, no qual entraram todas as áreas verdes públicas
da cidade, sem contar a acessibilidade da população. Posteriormente, foi calculado o índice
de áreas verdes (IAV), considerando somente as áreas verdes públicas de acesso livre para
a população. O índice de áreas verdes para a cidade como um todo também foi calculado e
considerado um indicador de qualidade de vida da população.
A PMU através do artigo 202 da Lei Orgânica do Município, atualizada até 08/02/2006,
assegura os índices de área verde por habitante embasados nos possíveis valores propostos
pela ONU, ou seja, 12m² per capita. A citar:
XXIII - estimular e contribuir para a recuperação da vegetação em áreas urbanas, com plantio
de árvores preferencialmente frutíferas objetivando, especialmente, atingir os índices mínimos
de área verde por habitante estipulados pela Organização das Nações Unidas.
fícies com elevado índice de reflexão, bem como a impermeabilidade quase total dos solos,
Barbin (2003).
A alta concentração da população gera a deterioração da qualidade de vida urbana
acarretando o desconforto da mesma por meio da deficiência no abastecimento em geral,
problemas na eliminação e deposição de lixo, ruídos, poluição, congestionamentos, compe-
tição, escassez de espaços livres para o lazer e falta de participação popular. Sendo este um
problema que atinge a maioria das cidades de médio a grande porte, questiona-se um número
que expresse a densidade populacional ideal (Nucci, 1996). Para este autor, o número ideal
para a densidade populacional varia entre 100 e 500 habitantes/ha.
Buscando as origens da crise urbana e, conseqüentemente, da crise ambiental atual,
ter-se-ia que procurar as causas e o período em que começaram a se dissolver os limites da
cidade e as mudanças sócio-culturais que acompanharam essa dissolução. No final do século
XIX e início do século XX, aproximadamente, já com a Revolução Industrial, devido ao cresci-
mento da área do município, o aumento populacional e a expansão da zona urbana, a cidade
transformou-se em joguete dos interesses da especulação financeira e imobiliária. Segundo
Lima (1991), surge o “urbanismo moderno” baseado em quatro objetivos fundamentais:
Segundo Guzzo (1999), as cidades são constituídas, do ponto de vista físico, de espa-
ços de integração urbana, espaços construídos e espaços livres “(...) visando uma integração
da natureza com a cultura do ser humano”. Para tal, é necessário que se tenha idéia das alte-
rações ambientais provocadas pela urbanização.
Os Sistemas de Áreas Verdes, em geral, são estruturados com base no Plano Diretor de
Desenvolvimento Urbano que é o instrumento básico de definição do modelo de desenvolvi-
mento para municípios com mais de vinte mil habitantes. Modernamente está incorporando
o enfoque ambiental passando a chamar-se Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano e Am-
biental (SANCHOTENE, 2004).
A Lei n° 6.766 de 19 de dezembro de 1979, regulamentou o parcelamento do solo urba-
no, em seu artigo 4°, inciso 1, parágrafo 10, preconizando que os loteamentos deviam possuir
áreas destinadas a espaços livres de usos públicos, proporcionais à densidade de ocupação
prevista para a gleba, não podendo ser inferiores a 35% (trinta e cinco por cento) da gleba,
exceto nos loteamentos maiores que 15.000m² (quinze mil metros quadrados), caso em que
a porcentagem poderia ser reduzida. Porém, este dispositivo legal foi atualizado e alterado
pela Lei n° 9.785 de 29 de janeiro de 1999, na qual a porcentagem destes espaços não é mais
quantificada e deve ser prevista pelo Plano Diretor ou aprovada por Lei Municipal para a zona
em que se situem, que definirá os usos permitidos e os índices urbanísticos de parcelamento
e ocupação do solo, incluindo, obrigatoriamente, as áreas mínimas e máximas de lotes e os
coeficientes máximos de aproveitamento.
A Lei Complementar nº. 245 de 30 de novembro de 2000, dispõe sobre o parcelamento
e zoneamento do uso e ocupação do solo do município de Uberlândia, subseção I, do lote-
amento e reloteamento:
Define ainda nessa Lei, no art. 5º “Área de Recreação” sendo “aquela reservada a ativi-
dades culturais, cívicas, esportivas e contemplativas da população, tais como praças, bosques
e parques.”
O Plano Diretor de Uberlândia, Lei Complementar n.º 432, de 19 de outubro de 2006,
tem como diretriz ambiental, no art. 14, alínea III, “garantir a proteção dos recursos hídricos e
vegetais, a redução dos problemas de drenagem e a criação de áreas para lazer na concepção
dos parques, áreas de preservação e unidades de conservação”.
Com relação ao que se dispõe ao lazer a Lei Orgânica do Município, no Art. 176 esta-
belece que o município proporcionará meios de recreação sadia e construtiva à comunidade,
mediante “reserva de espaços verdes ou livres, em forma de parques, bosques, jardins e asse-
melhados, como base física da recreação urbana”. No Art. 202, alínea XXIII esta Lei propõe:
“estimular e contribuir para a recuperação da vegetação em áreas urbanas, com plantio de
árvores preferencialmente frutíferas objetivando, especialmente, atingir os índices mínimos de
área verde por habitante estipulados pela ONU.”
Para o caso dos grupos de áreas verdes, o SNUC define em seu art. 2º:
I – Unidade de conservação: espaço territorial e seus recursos ambientais, incluindo as águas
jurisdicionais, com características naturais relevantes, legalmente instituído pelo Poder Públi-
co, com objetivos de conservação e limites definidos, sob regime especial de administração,
ao qual se aplicam garantias adequadas de proteção;
VI - proteção integral: manutenção dos ecossistemas livres de alterações causadas por inter-
109
ferência humana, admitido apenas o uso indireto dos seus atributos naturais.
Ainda,
Art. 11. O Parque Nacional tem como objetivo básico a preservação de ecossistemas naturais
de grande relevância ecológica e beleza cênica, possibilitando a realização de pesquisas
científicas e o desenvolvimento de atividades de educação e interpretação ambiental, de
recreação em contato com a natureza e de turismo ecológico.
§ 4o As unidades dessa categoria, quando criadas pelo Estado ou Município, serão denomi-
nadas, respectivamente, Parque Estadual e Parque Natural Municipal.
Parques
Em termos de classificação foi verificado que o município não tem nenhum documento
legal ou mesmo concordância entre as secretarias responsáveis pelo meio ambiente e patri-
mônio no que se refere ao conceito de parques municipais. Assim fica estabelecido para este
estudo, as Leis Federais e Estaduais existentes como a Lei 4.771, de 15 de setembro de 1965,
110
o Código Florestal, que permite a criação dos parques nos termos do artigo 5º, alínea “a”, a
qual foi revogada pelo SNUC.
Todos os Decretos de criação determinam a finalidade dos Parques conforme o mes-
mo artigo 5º, alínea “a” do Código florestal, ou seja, “de resguardar atributos excepcionais
da natureza, conciliando a proteção integral da flora, da fauna e das belezas naturais com a
utilização para objetivos educacionais, recreativos e científicos”; e ainda acrescentam a res-
ponsabilidade sob as condições do bem-estar público. Para ressaltar, os Parques Municipais
Santa Luzia, Victório Siquierolli e Natural do Óleo são UCs, no grupo de Unidades de Proteção
Integral, que de acordo com o 2º art., alínea VI do SNUC entende-se por “manutenção dos
ecossistemas livres de alterações causadas por interferência humana, admitido apenas o uso
indireto dos seus atributos naturais;”
Assim, o município de Uberlândia possui sete Parques Municipais de acordo com os
Decretos n.º 7.452 de 27 de novembro de 1997, n.º 8.166 de 05 de maio de 2000 e n.º 9.505
de 02 de junho de 2004. Em relação à área total dos mesmos foi comprovada uma divergência
nas informações da SEPLAMA com os Decretos mencionados, conforme resumida nas Tabelas
6.1 e 6.2.
Para os cálculos até 2000 não foi considerada a área do Parque Natural do Óleo, pois
sua criação é de 2004. Acerca do Parque Municipal São Francisco de Assis, observado na
Tabela 6.3, firma-se que o mesmo é localizado na zona rural do município, não integrando,
portanto, a área estudada.
Art. 1º. Fica criado o Parque Ecológico São Francisco, Unidade de Conservação da
Natureza de Proteção Integral, localizado na zona rural do Município de Uberlândia.
(Decreto n.º 9.185 de 09 de junho de 2003).
Apesar de o presente trabalho ter como foco principal as medidas totais foi imprescin-
dível o estudo particular de cada parque para constatação de dados estatísticos, geográficos,
estruturais e coletas fotográficas. A distribuição dos parques urbanos e das praças no períme-
tro urbano de Uberlândia está apresentada no Mapa 1.
Praças
Foi constatada uma população urbana de 585.723 habitantes para o ano de 2006. Esses
dados foram resumidos e finalizados na Tabela 6.6.
IAV = TAVC
NH
Onde:
Para 2000,
TAVC = Σ áreas de parques (m²) + Σ áreas de praças (m²)
TAVC = 3.706.818,64
IAV = TAVC
NH
IAV = 3.706.818,64
Para 2006,
TAVC = Σ áreas de parques (m²) + Σ áreas de praças (m²)
TAVC = 3.894.304,99
IAV = TAVC
NH
IAV = 3.812.200,44
Assim, o índice de áreas verdes, nas categorias praças e parques, para a área urbana
do município de Uberlândia, é de 6,6m²/habitante. O que nos atesta uma falha nos objetivos
114
é importante que se ressalte que os índices existentes não são receitas a serem seguidas,
antes eles servem como apoio científico para o planejamento, já que se deve lembrar que a
ciência se preocupa com uma acumulação de conhecimento da humanidade e que se deve
ter o apoio do que já foi gerado.
REFERÊNCIAS
BARBIN, H. S. Histórico da evolução do uso do solo e estudo dos espaços livres públi-
cos de uma região do município de Piracicaba/SP. Tese (Doutorado), Piracicaba, 214 p.,
2003
BRASIL. Lei Federal no 84.017, de 21 de Setembro de 1979 – Aprova o Regulamento dos Par-
ques Nacionais brasileiros
BRASIL. Lei Federal no 9.785, de 29 de Janeiro de 1999. Altera a Lei de uso e parcelamento
do solo
BRASIL. Lei Federal no 9.985 de 18 de Julho de 2000. Sistema Nacional de Unidades de Con-
servação da Natureza (SNUC)
CAVALHEIRO, F.; DEL PICCHIA, P. C. D. Áreas verdes: conceitos, objetivos e diretrizes para
o planejamento. In: Congresso Brasileiro sobre Arborização Urbana, I, Vitória/ES, Anais I e II,
p. 29-35, 1992
CAVALHEIRO, F.; NUCCI, J. C. Espaços livres e qualidade de vida urbana. Paisagem Am-
biente Ensaios no 11, p. 277-288, 1998
ESCADA, M. I. S. Caracterização dos espaços livres de uso público de São José dos Cam-
pos. Rio Claro: UNESP : Instituto de Biociências, 1987
GUZZO, P. Estudo dos espaços livres de uso público da cidade de Ribeirão Preto com
116
LIMA, S. T. Verde urbano: uma questão de qualidade ambiental. In: Encontro Nacional de
Estudos Sobre o Meio Ambiente, no 3, Londrina, 1991. Anais. Londrina: UEL, p. 27-39, 1991
MINAS GERAIS. Lei no 21.724, de 23 de Novembro de 1981. Aprova o Regulamento dos Par-
ques Estaduais
SOARES, B. et al. Dinâmica urbana na bacia do Rio Araguari (MG) – 1970-2000. In: LIMA, S.
C.; SANTOS, R. J. (orgs.) Gestão ambiental na bacia do Rio Araguari – rumo ao desenvol-
vimento sustentável. Uberlândia: UFU : IG; Brasília : CNPq, 2004
UBERLÂNDIA. Lei no 5.969, de 07 de Março de 1994. Retifica e dá nova redação à Lei 4.790/88,
que estabelece o perímetro urbano da sede do município de Uberlândia
No Brasil, uma análise da evolução das políticas ambientais permite verificar que hou-
ve muitos avanços no que diz respeito ao aumento da capacidade institucional, bem como
no que tange à formulação de uma legislação específica para a conservação da natureza e
proteção ambiental.
Monosowski (1989) fez uma análise do processo histórico de evolução das políticas
ambientais no Brasil, estabelecendo uma categorização em que o subdivide em quatro etapas:
1. a administração dos recursos naturais; 2. o controle da poluição industrial; 3. o planejamen-
to territorial; e 4. a gestão integrada de recursos naturais.
A primeira etapa, que deu início às primeiras ações em relação à proteção do meio
ambiente em território nacional, teve início em 1934, no primeiro mandato do presidente Ge-
túlio Vargas, com a criação do Código das Águas, do Código de Minas e do Código Florestal
Brasileiro, além da criação, em 1937, do Parque Nacional de Itatiaia e da legislação de prote-
36 Geógrafo, Doutor em Geografia Física / USP. Pesquisador Científico do Instituto Florestal / SMA-SP.
37 Geógrafa. Mestre em Geografia Física / USP.
119
Em 1989, o governo federal criou o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais
120
Renováveis (IBAMA), regulamentado pela Lei nº. 7.735, de 22 de fevereiro de 1989, fundindo
a SEMA a órgãos de florestas, pesca e borracha. Conforme ressaltou BRITO (2000), O IBAMA
resultou da consolidação das instituições de meio ambiente anteriormente existentes, como
o IBDF (Secretaria da Agricultura), a SEMA (Ministério do Interior) e das Superintendências
do Desenvolvimento da Pesca (SUDEPE) e do Desenvolvimento da Borracha (SUDHEVEA),
ambas do Ministério da Agricultura.
Deve ser também citada em relação à temática ambiental, a Política Nacional de Recur-
sos Hídricos (lei nº. 9.433/97), que visa ao gerenciamento dos recursos hídricos em território
nacional por meio da delimitação de bacias hidrográficas e da formação de comitês para a
sua gestão.
Também merece destaque a Lei de Crimes Ambientais de 1998, que prevê a responsa-
bilização e a aplicação de penalidades para os causadores de danos ao meio ambiente. Além
disso, foram estabelecidas uma série de normas e critérios para a utilização dos recursos natu-
rais, visando à manutenção da qualidade ambiental e à recuperação de áreas degradadas.
No que diz respeito à participação do setor privado, devem ser mencionados os siste-
mas de certificação ambiental, como por exemplo, os selos ISO 14.000 e ISO 14.001, concedi-
dos para empresas que adotem práticas que promovam a diminuição dos impactos causados
ao meio ambiente, bem como a obrigatoriedade de licenciamento e estudo de impactos am-
bientais para a instalação de empreendimentos e atividades potencialmente danosas ao meio
ambiente.
Medeiros (2004) reconhece as unidades de conservação como um instrumento geopo-
lítico de controle do território, entendendo que a política de criação de áreas protegidas no
Brasil é resultado de um longo e lento processo de aparelhamento e estruturação do Estado.
Este autor destaca três grandes fases no movimento de criação de unidades de conservação
no país:
a) Os primeiros anos da República até 1963, mas, sobretudo na década de 30, que marca
o surgimento os primeiros instrumentos legais voltados para a criação de áreas prote-
gidas no país, cuja culminância é a instituição do primeiro Parque Nacional;
b) O período que compreende a ditadura militar (1964-1984), quando os instrumentos
criados no período anterior são revisados e outros novos são instituídos. A criação
de áreas protegidas toma uma dimensão nacional, fruto da estratégia geopolítica do
Estado de integrar e desenvolver todas as regiões do país;
c) Pós 1985. A redemocratização do país levou a uma nova fase de expansão e reestru-
turação da proteção da natureza no país, tendo como resultado prático uma clara
mudança de estratégia em relação à tradição empregada nos períodos anteriores.
Uma das mais importantes leis federais para a conservação da natureza em território
nacional é o Código Florestal Brasileiro, que teve a sua primeira versão promulgada em 1934,
sendo substituída pela Lei nº. 4771, de 1965, posteriormente alterada pela lei nº. 7803, de
121
área protegida nos termos dos artigos 2º e 3º desta Lei, coberta ou não por vegetação na-
tiva, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade
geológica, a biodiversidade, o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o
bem-estar das populações humanas.
a) Ao longo dos rios ou de qualquer curso d’água desde o seu nível mais alto em faixa marginal
cuja largura mínima seja:
1) de 30 (trinta) metros para os cursos d’água de menos de 10 (dez) metros de largura;
2) de 50 (cinqüenta) metros para os cursos d’água que tenham de 10 (dez) a 50 (cinqüenta)
metros de largura;
3) de 100 (cem) metros para os cursos d’água que tenham de 50 (cinqüenta) a 200 (duzen-
tos) metros de largura;
4) de 200 (duzentos) metros para os cursos d’água que tenham de 200 (duzentos) a 500
(quinhentos) metros de largura;
5) de 500 (quinhentos) metros para os cursos d’água que tenham largura superior a 600
(seiscentos) metros;
b) Ao redor das lagoas, lagos ou reservatórios d’água naturais ou artificiais;
c) Nas nascentes, ainda que intermitentes e nos chamados “olhos d’água”, qualquer que seja a
sua situação topográfica, num raio mínimo de 50 metros de largura;
d) No topo de morros, montes, montanhas e serras (terço superior);
e) Nas encostas ou partes destas com declividade superior a 45º;
f) Nas restingas, como fixadoras de dunas ou estabilizadoras de mangues;
g) Nas bordas dos tabuleiros ou chapadas, a partir da linha de ruptura do relevo, em faixa nun-
ca inferior a 100 metros em projeções horizontais;
h) Em altitude superior a 1.800 metros, qualquer que seja a vegetação.
tegridade da vegetação nativa, tais como: prevenção, combate e controle do fogo, controle
da erosão, erradicação de invasoras e proteção de plantios com espécies nativas, conforme
resolução do CONAMA; as atividades de manejo agroflorestal sustentável praticadas na pe-
quena propriedade ou posse rural familiar, que não descaracterizem a cobertura vegetal e não
prejudiquem a função ambiental da área; e as demais obras, planos, atividades ou projetos
definidos em resolução do CONAMA.
Reserva Legal foi definida na Medida Provisória nº. 2.166-67, de 24.08.2001, como:
O percentual da propriedade que deve ser declarado como Reserva Legal não é uni-
forme em todo país, variando de acordo com a região em que está situada. Em 1996, o Có-
digo Florestal foi alterado por meio de Medida Provisória editada pelo Presidente da Repú-
blica, que ampliou o percentual das Reservas Legais em cada propriedade rural. No caso da
Amazônia, que apresentava elevados índices anuais de desmatamento registrados por meio
de imagens de satélite, passou de 50% para 80% da propriedade. No restante do país, passou
de 20% para 50%.
Depois de ampla discussão com a bancada ruralista no Congresso Nacional, que rei-
vindicava a diminuição do percentual correspondente à Reserva Legal na Amazônia, que era
de 80%, houve uma alteração pela Medida Provisória 2.166-67, ficando a distribuição atual
da seguinte forma: 80% em área de floresta localizada na Amazônia Legal; 35% em área de
cerrado localizada na Amazônia Legal; 20% em área de floresta ou outras formas de vegetação
nativa nas demais regiões do País; 20% em área de campos gerais localizada em qualquer
região do país.
Segundo Guillaumon (2000), além de reduzir os percentuais das APPs e Reservas Le-
gais, a bancada ruralista também pretendia permitir o uso econômico das APPs. O autor
explica que as APP não são indenizáveis por não serem de uso econômico e representam,
em média, 30% a menos no valor das indenizações pagas aos proprietários desapropriados,
principalmente, para criação de Unidades de Conservação. Desta forma, se a proposta de per-
missão do uso econômico das APPs fosse aprovada, o valor das indenizações em processos
de desapropriações para fins de reforma agrária ou para criação de Parques, Estações Ecoló-
gicas e outras Unidades de Conservação aumentaria significativamente.
Segundo Brandão (2001), prevalece atualmente no direito brasileiro o princípio da fun-
ção social da propriedade, de acordo com artigo 5º, XXIII, da Constituição Federal de 1988, o
que condiciona o seu uso à satisfação do interesse coletivo. Para ele, a Constituição de 1988
consagrou a trilogia propriedade, função social da propriedade e proteção ambiental, apon-
tando a utilização adequada dos recursos naturais e a preservação do meio ambiente como
requisitos básicos para o cumprimento da função social da propriedade rural.
A Constituição Federal definiu os seguintes requisitos para o atendimento da fun-
ção social da propriedade: 1) propriedade urbana - atender às exigências fundamentais de
ordenação da cidade contidas no plano diretor, que é o instrumento básico da política de
desenvolvimento e de ordenamento da expansão urbana obrigatório para as cidades com
mais de vinte mil habitantes; 2) propriedade rural – a) aproveitamento racional e adequado;
b) utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente; c)
observância das disposições que regulam as relações de trabalho; d) exploração que favoreça
o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores (BRANDÃO, 2001)
123
Assim, as APPs e as Reservas Legais instituídas pelo Código Florestal fazem parte dos
limites internos do direito de propriedade, tendo em vista a manutenção do meio ambiente
ecologicamente equilibrado, bem comum de todos e essencial à sadia qualidade de vida,
conforme preconiza a Constituição brasileira de 1988.
A Lei nº. 6.939, de 31 de agosto de 1981 (regulamentada pelo Decreto nº. 99.274, de 06
de junho de 1990), estabeleceu a Política Nacional de Meio Ambiente, instituindo o Sistema
Nacional de Meio Ambiente (SISNAMA), bem como o Cadastro Técnico Federal de Atividades
e Instrumentos de Defesa Ambiental. No artigo 2º, são apresentados os objetivos da Política
Nacional de Meio Ambiente, conforme segue:
A Política Nacional de Meio Ambiente tem por objetivo a preservação, melhoria e recu-
peração da qualidade ambiental propícia à vida, visando assegurar, no País, condições ao
desenvolvimento sócio-econômico, aos interesses da segurança nacional e à proteção da
dignidade da vida humana, atendidos os seguintes princípios:
No artigo 4º da Lei 6.939/81, ficou definido que a Política Nacional do Meio Ambiente
visará:
A seguir, são apresentados alguns dos instrumentos definidos pela Política Nacional de
Meio Ambiente, definidos na Lei federal supra-citada:
Art. 225 - Todos tem direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso co-
mum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coleti-
vidade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
§ 2º Aquele que explorar recursos minerais fica obrigado a recuperar o meio ambiente de-
gradado, de acordo com solução técnica exigida pelo órgão público competente, na forma
da lei.
§ 3º As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores,
pessoas físicas ou jurídicas, a sansões penais e administrativas, independentemente da obri-
gação de reparar os danos causados.
§ 4º. A Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato-
Grossense e a Zona Costeira são patrimônio nacional, e sua utilização far-se-á, na forma da
lei, dentro de condições que assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive quanto
ao uso dos recursos naturais.
Espaço territorial e seus recursos ambientais, incluindo as águas jurisdicionais, com carac-
terísticas naturais relevantes, legalmente instituído pelo Poder Público, com objetivos de
conservação e limites definidos, sob regime especial de administração, ao qual se aplicam
garantias adequadas de proteção.
128
conjunto de métodos, procedimentos e políticas que visem a proteção a longo prazo das es-
pécies, habitats e ecossistemas, além da manutenção dos processos ecológicos, prevenindo
a simplificação dos sistemas naturais.
Nas categorias de uso sustentável é possível o uso direto dos recursos ambientais38,
desde que seja efetuado de forma a garantir a sua manutenção, de acordo com as diretrizes e
restrições do plano de manejo elaborado para a área.
Por meio do Decreto nº. 4.340, de 22 de agosto de 2002, que regulamenta alguns
38 Na lei 9.9.985 é apresentada a seguinte definição para recurso ambiental: “a atmosfera, as águas
interiores, superficiais e subterrâneas, os estuários, o mar territorial, o solo, o subsolo, os elementos da
biosfera, a fauna e a flora”.
129
artigos da Lei nº. 9.985, a Reserva da Biosfera foi incorporada como mais uma categoria de
proteção integrante do Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (SNUC).
No referido Decreto, a Reserva da Biosfera é definida como:
um modelo de gestão integrada, participativa e sustentável dos recursos naturais, que tem
por objetivos básicos a preservação da biodiversidade e o desenvolvimento das atividades
de pesquisa científica, para aprofundar o conhecimento dessa diversidade biológica, o mo-
nitoramento ambiental, a educação ambiental, o desenvolvimento sustentável e a melhoria
da qualidade de vida das populações.
Sustentável. Porém, nas unidades de proteção integral, a presença humana não é legalmente
permitida. Um grande problema para a gestão dessas áreas é o fato de que grande parte das
unidades de conservação de proteção integral brasileiras possuem comunidades vivendo no
seu interior. A legislação determina que essas pessoas sejam realocadas, sendo sua permanên-
cia permitida apenas de forma temporária nas unidades de conservação, devendo ser regu-
lada por contratos estabelecidos junto ao órgão gestor. O artigo da lei do SNUC, que tratava
da conceituação sobre as comunidades tradicionais, foi vetado na íntegra, o que dificulta a
caracterização e a tomada de decisões em relação a estas populações.
Outro aspecto fundamental no SNUC é a questão da posse e domínio das terras pro-
tegidas pelas unidades de conservação. A presença conjunta de terras de domínio público e
privado é permitida em algumas categorias, como as APAs, ARIEs, Monumentos Naturais e
Refúgios de Vida Silvestre. Porém, a lei determina que nos Parques Nacionais, Reservas Bio-
lógicas, Estações Ecológicas, Florestas Nacionais, Reservas Extrativistas, Reservas de Fauna e
Reservas de Desenvolvimento Sustentável, a posse e o domínio da terra deve ser integralmen-
te do Estado. Desta forma, as terras particulares no interior das unidades das categorias citadas
acima devem ser desapropriadas.
Nas Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPNs), a posse e o domínio da terra
são integralmente particulares, sendo que a criação de unidades nesta categoria de manejo de-
pende da iniciativa dos proprietários. As RPPN’s são relativamente recentes, tendo sua criação
se iniciado no início da década de 1990. Segundo os dados do IBAMA39, no ano de 2001 exis-
tiam mais de 300 RPPN’s em território nacional, cobrindo uma área de mais de 450.000 ha.
... qualquer alteração das propriedades físicas, químicas e biológicas do meio ambiente, cau-
sada por qualquer forma de matéria ou energia... que, direta ou indiretamente, afetem:
I – a saúde, a segurança e o bem estar da população;
II – as atividades sociais e econômicas;
III – a biota;
IV – as condições estéticas e sanitárias do meio ambiente;
V – a qualidade dos recursos ambientais.
A Lei Federal nº. 6.938/81 (Política Nacional de Meio Ambiente) estabeleceu em seu
artigo 10º que a construção, instalação, ampliação e funcionamento de estabelecimentos e ati-
vidades que utilizam recursos ambientais, considerados efetiva e potencialmente poluidores,
bem como os capazes de causar degradação ambiental, dependerão de prévio licenciamento.
Em seu artigo 225º, a Constituição brasileira de 1988 tornou obrigatória a exigência,
na forma da lei, de estudo prévio de impacto ambiental para instalação de obra ou atividade
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A análise da evolução das políticas ambientais brasileiras permite verificar que houve
muitos avanços no que diz respeito ao aumento da capacidade institucional, bem como no
que tange à formulação de uma legislação específica para a conservação da natureza e pro-
teção ambiental.
Existem atualmente leis específicas para diversos temas atinentes à questão ambiental
e seria exaustivo referenciar toda a legislação existente.
A instituição do SNUC pela Lei 9.985/2000 marca a tentativa do estabelecimento de
uma política integrada para as áreas protegidas em território nacional e a sua regulamentação
e aperfeiçoamento contribuirão, significativamente, para a conservação do patrimônio am-
biental brasileiro.
É importante ressaltar, porém, que a maioria dos órgãos responsáveis pela aplicação
da legislação ambiental não dispõem de recursos humanos, técnicos e financeiros suficientes
para promover as atividades de fiscalização e controle sobre os danos causados ao meio am-
biente.
Desta forma, conclui-se que embora exista um amplo aparato legal para a conservação
da natureza e defesa do meio ambiente e dos recursos naturais no Brasil, ainda, não há uma
estrutura administrativa compatível e a operacionalidade adequada para a sua efetiva aplica-
ção.
Quanto ao planejamento da paisagem, é fundamental que se considere, além dos as-
pectos do meio físico, biológico e antrópico, toda a legislação pertinente, principalmente, no
processo de identificação e mapeamento de unidades de paisagem e na análise e elaboração
de projetos que prevêem intervenção direta sobre o território.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Lei nº. 6.939/1981. Institui a Política Nacional de Meio Ambiente, cria o Sistema
Nacional de Meio Ambiente e o Cadastro Técnico Federal de Atividades e Instrumentos de
Defesa Ambiental
BRASIL. Lei nº. 9.985, de 18 de Julho de 2000. Regulamenta o art. 224, p. 1º, incisos I, II, III e
VII da Constituição Federal, institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natu-
reza (SNUC) e dá outras providências.
GUILLAUMON, J.R. Código Florestal Brasileiro: dados sobre as últimas atualizações do Có-
digo Florestal. São Paulo: Instituto Florestal, 66 p., 2000
MARETTI, C. Comentários sobre a situação das Unidades de Conservação no Brasil. In: Revis-
ta de Direitos Difusos, Vol.5 – fevereiro/2001 – Florestas s Unidades de Conservação.
Brasília, Ed. Esplanada-ADCOAS, p. 633-645, 2001
a) que fossem controladas pelo poder público, e cujos limites não poderiam ser alterados,
onde nenhuma parte poderia estar sujeita a alienação, a menos que decidido pelas autorida-
des legislativas competentes;
b) que fossem estabelecidas para propagação, proteção e preservação da fauna silvestre e
da vegetação nativa, e para a preservação de objetos de interesse estético, geológico, pré-
40 Geógrafo, Doutor em Geografia Física / USP. Pesquisador Científico do Instituto Florestal / SMA-SP
41 Geógrafa. Mestre em Geografia Física / USP.
42 O Sistema Nacional de Unidades de Conservação, instituído pela Lei Federal 9.985/2000, estabeleceu
duas modalidades de categorias de unidades de conservação: Proteção Integral e Uso Sustentável.
136
b) que a mais alta autoridade competente do país tomasse medidas no sentido de prevenir
ou eliminar, na medida do possível, a exploração ou a ocupação de toda a área, e manti-
vesse, efetivamente, os aspectos ecológicos, geomorfológicos ou estéticos que justificaram o
estabelecimento das referidas áreas; e
c) que fosse permitida a entrada de visitantes sob condições especiais, para fins educativos,
culturais e recreativos. (BRITO, 2000)
naturais protegidas denominada Reserva da Biosfera, com o objetivo de delimitar áreas nos
países membros da ONU para a proteção dos ecossistemas naturais e para a realização de
pesquisas científicas. Essa categoria reconhecida, internacionalmente, incorporou a questão
da ocupação humana dessas áreas, o que normalmente vinha sendo desconsiderado em ou-
tras categorias, como os Parques Nacionais. De acordo com a UNESCO (1984), as principais
premissas das Reservas da Biosfera são:
Segundo Brito (op cit), o princípio de zoneamento em parques nacionais foi incorpo-
rado na 11º Assembléia Geral da UICN, em 1972, em Banff no Canadá, sendo ratificadas pelo
II Congresso Mundial de Parques Nacionais, realizado em Yellowstone, também em 1972. Na
referida Assembléia, foram criadas 11 zonas, que são apresentadas a seguir:
Brito (2000) menciona também que, em 1978, a IUCN aprovou um sistema de áreas
protegidas, que foi aplicado em muitos países e incluía as seguintes categorias: Reserva Na-
tural Estrita; Parque Nacional; Monumento Natural; Reserva Manejada; Paisagem Protegida;
Reserva de Recursos; Reserva Antropológica; Área de Uso Múltiplo; Reserva da Biosfera; e
Sítio do Patrimônio Mundial.
No final da década de 1970, a União Internacional para a Conservação da Natureza
publicou o documento intitulado “Estratégia Mundial para a Conservação: A Conservação dos
recursos vivos, para um desenvolvimento sustentado” (UICN, 1984), no qual define priorida-
des, estratégias e metodologias para a conservação da natureza em nível global. Neste docu-
mento, a conservação foi definida como:
a gestão da utilização da biosfera pelo ser humano, de tal sorte que produza o maior benefí-
cio sustentado para as gerações atuais, mas que mantenha sua potencialidade para satisfazer
as necessidades e as aspirações das gerações futuras. Portanto, a conservação é positiva e
compreende a preservação, a manutenção, a utilização sustentada, a restauração e a melho-
ria do ambiente natural.
FIGURA 8.1 - Princípios geométricos, procedentes de estudos biogeográficos insulares, propostos para o projeto
das reservas naturais. (UICN, 1984) / FONTE: UICN (1984) / Organização: GALLO JUNIOR (2002)
139
Em 1988, a Oficina Regional da FAO para América Latina e Caribe publicou em parce-
ria com o PNUD o Manual de Planificacion de Sistemas Nacionales de Areas Silvestres Protegi-
das en America Latina (MOORE e ORMAZÁBAL,1988), fornecendo uma série de informações,
metas, conceitos, critérios e um roteiro metodológico para o estabelecimento dos sistemas
nacionais de áreas protegidas nos países latinoamericanos. Neste trabalho, Moore e Ormazá-
bal (1988) definiram o Sistema Nacional de Áreas Protegidas como:
Pesquisa científica;
Proteção da vida selvagem;
Preservação das espécies e da diversidade genética;
Manutenção de serviços do meio ambiente;
Proteção dos aspectos naturais e culturais específicos;
Recreação e turismo;
Educação;
Uso sustentável de recursos de ecossistemas naturais;
Manutenção de atributos culturais tradicionais.
Brito (2000) salienta que dentre todas as categorias de áreas naturais protegidas pro-
postas, os Parques Nacionais e as Reservas da Biosfera são as únicas que possuem uma políti-
ca internacional delineada. Desta forma, a tendência é que os países definam, de acordo com
as suas especificidades, o seu Sistema Nacional de Unidades de Conservação, observando os
princípios estabelecidos pela UICN.
Em 1997 a CMAP organizou um evento denominado “Áreas Protegidas no Século XXI:
de ilhas a redes” (Protected Areas in the 21st century: from islands to networks), realizado na
Austrália. No intuito de demonstrar a importância das áreas protegidas para os programas
econômico, social e ambiental, foram identificados neste evento os principais desafios para as
áreas protegidas no século XXI:
No trabalho realizado por Amend e Amend (1995), foram identificados diversos proble-
mas que podem ser considerados como ameaças à integridade das unidades de conservação
na América do Sul (Tabela 8.1). Milano (1993) apontou as principais dificuldades enfrentadas
para o funcionamento das unidades de conservação no Brasil: falta de regularização fundiária;
falta de pessoal para manejo e gerenciamento; falta de qualificação e treinamento do pessoal
existente; burocracia da administração pública (a relação hierárquica entre as unidades e entre
os órgãos); falta de recursos financeiros ou indisponibilidade de uso dos existentes.
O trabalho de Queiroz et al. (1997), com base na aplicação de questionários e análise
de dados secundários, identificou as principais ameaças as unidades de conservação brasi-
leiras (Tabela 8.2). É possível verificar nesta tabela que em grande parte das unidades de
conservação brasileiras não existem informações relativas às ameaças a sua integridade, o que
também pode ser considerado um grande obstáculo ao manejo dessas áreas protegidas.
44 Sobre a metodologia de análise de lacunas de conservação ver RODRIGUEZ et al. Global Gap
Analysis: towards a representative network of protected areas. Advances in Applied Biodiversity
Science 5. Washington DC: Conservation International, 2003; e PAGLIA A. Lacunas de conservação e áreas
insubstituíveis para vertebrados ameaçados da Mata Atlântica. In: Congresso Brasileiro de Unidades de
Conservação, Curitiba (PR) p. 39.50, 2004.
145
Entende-se por Plano de Manejo o projeto dinâmico que, utilizando técnicas de planejamen-
to ecológico, determina o zoneamento de um Parque Nacional, caracterizando cada uma de
suas zonas e propondo seu desenvolvimento físico, de acordo com suas finalidades.
documento técnico mediante o qual, com fundamento nos objetivos gerais de uma unidade
de conservação, se estabelece o seu zoneamento e as normas que devem presidir o uso da
área e o manejo dos recursos naturais, inclusive a implantação das estruturas físicas necessá-
rias à gestão da unidade”. Manejo foi definido de forma ampla, como “todo e qualquer pro-
cedimento que vise assegurar a conservação da diversidade biológica e dos ecossistemas.
O Plano de Manejo deve ser flexível, pois está sujeito a modificações, conforme novas
informações sobre a área forem sendo obtidas. Entretanto, todas as modificações devem ser
realizadas de maneira a assegurar a continuidade do plano, e também deve contemplar os
seguintes aspectos:
Além dos Planos de Manejo, as unidades também podem elaborar Planos de Ações
Emergenciais (PAE) e Planos Operativos Anuais (POA), para ações a curto prazo, ou em
virtude de situações não abarcadas ou previstas em seu Plano de Manejo, o que serviria de
subsídio para a revisão e reformulação deste Plano, que deve ser efetuadas em um período
146
de 5 anos.
Em 2002, o IBAMA publicou um roteiro metodológico para a elaboração de planos de
manejo nas unidades de proteção integral - Parque Nacional, Estação Ecológica e Reserva Bio-
lógica (IBAMA, 2002). De acordo com o roteiro proposto, o Plano de Manejo deve envolver
a área abrangida pela unidade de conservação, a área de entorno ou zona de amortecimento
e, também, quando for o caso, os corredores ecológicos. O roteiro estabelece que o processo
de planejamento deve ser contínuo, gradativo, flexível e participativo, envolvendo todos os
atores relacionados com a unidade de conservação.
As três abordagens propostas pelo IBAMA envolvem: a) Enquadramento; b) Diagnósti-
co (contextualização, análise regional e analise da unidade de conservação); e c) Proposições.
Os tópicos foram divididos em 6 encartes: 1. contextualização; 2. análise regional; 3. análise
da unidade de conservação; 4. planejamento; 5. projetos específicos; 6. monitoria e avalia-
ção.
Em relação à participação, que é um dos pressupostos fundamentais do roteiro, são
sugeridas como forma de envolvimento dos diversos atores nas diversas etapas de elaboração
do plano: visitas a prefeituras, organizações governamentais e não governamentais; realização
de reuniões abertas nos municípios; oficinas de planejamento; reuniões técnicas com pes-
quisadores; formação de conselhos consultivos para as unidades de conservação; e busca de
cooperação institucional.
O primeiro passo é a contextualização da unidade de conservação nos enfoques in-
ternacional, federal e estadual, buscando avaliar a sua relevância para o sistema de áreas
protegidas.
Em relação à análise da região em que está inserida a unidade, é fundamental que
sejam considerados os seguintes aspectos: caracterização ambiental; aspectos culturais e histó-
ricos; uso e ocupação da terra e problemas ambientais; características da população; visão das
comunidades sobre a unidade de conservação; alternativas de desenvolvimento econômico
sustentável; legislação Federal, Estadual e Municipal pertinente e potencial de apoio à unida-
de de conservação. Para a análise da unidade de conservação, são relacionados os seguintes
requisitos:
Quadro 8.1 – Zonas Definidas Pelo IBAMA para as Unidades de Conservação de Proteção Integral
ZONA DEFINIÇÃO OBJETIVOS DO MANEJO
É aquela onde a primitividade da natureza permanece Esta zona é dedicada à proteção integral de ecossistemas,
o mais preservada possível, não se tolerando dos recursos genéticos e ao monitoramento ambiental. O
ZONA INTANGÍVEL quaisquer alterações humanas, representando o objetivo básico do manejo é a preservação, garantindo a
mais alto grau de preservação. evolução natural.
É aquela onde tenha ocorrido pequena ou mínima O objetivo geral do manejo é a preservação do ambiente
intervenção humana, contendo espécies da flora e natural e ao mesmo tempo facilitar as atividades de
ZONA PRIMITIVA da fauna ou fenômenos naturais de grande valor pesquisa científica e educação ambiental permitindo-se
científico. formas primitivas de recreação
O objetivo do manejo é a manutenção de um ambiente
É aquela constituída em sua maior parte por áreas
ZONA DE USO natural com mínimo impacto humano, apesar de oferecer
naturais, podendo apresentar algumas alterações
EXTENSIVO acesso ao público com facilidade, para fins educativos e
humanas.
recreativos.
É aquela constituída por áreas naturais ou alteradas
O objetivo geral do manejo é o de facilitar a recreação
ZONA DE USO pelo homem. O ambiente é mantido o mais próximo
intensiva e educação ambiental em harmonia com o
INTENSIVO possível do natural, devendo conter: centro de
meio.
visitantes, museus, outras facilidades e serviços
É aquela onde são encontradas amostras
do patrimônio histórico-cultural ou arqueo-
ZONA HISTÓRICO- O objetivo geral do manejo é o de proteger sítios históricos
paleontológico, que serão preservadas, estudadas,
CULTURAL ou arqueológicos, em harmonia com o meio ambiente.
restauradas e interpretadas para o público, servindo
à pesquisa, educação e uso científico.
O objetivo geral do manejo é deter a degradação dos
É aquela que contém áreas consideravelmente
recursos ou restaurar a área. As espécies exóticas
ZONA DE antropizadas. Zona provisória, uma vez restaurada,
introduzidas deverão ser removidas e a restauração deverá
RECUPERAÇÃO será incorporada novamente a uma das Zonas
ser natural ou naturalmente induzida. Esta Zona permite
Permanentes
uso público somente para a educação
É aquela que contêm as áreas necessárias à
administração, manutenção e serviços da UC,
abrangendo habitações, oficinas e outros. Estas O objetivo geral do manejo é minorar o impacto da
ZONA DE USO
áreas serão escolhidas e controladas de forma a implantação das estruturas ou os efeitos das obras no
ESPECIAL não conflitarem com seu caráter natural e devem ambiente natural ou cultura da Unidade.
localizar-se, sempre que possível, na periferia da
UC.
Constituem-se em espaços localizados dentro de
uma UC, cujos usos e finalidades, estabelecidos
antes da criação da Unidade, conflitam com os
O objetivo de manejo é contemporizar a situação existente,
ZONA DE USO objetivos de conservação da área. São ocupadas
estabelecendo procedimentos que minimizem os impactos
CONFLITANTE por empreendimentos de utilidade pública, como
sobre a UC.
gasodutos, oleodutos, linhas de transmissão, antenas,
captação de água, barragens, estradas, cabos óticos
e outros.
São áreas dentro das UC’s onde ocorrem
ZONA DE concentrações de populações humanas residentes e
as respectivas áreas de uso. Zona Provisória, uma
O C U P A Ç Ã O vez realocada a população, será incorporada a uma
TEMPORÁRIA das Zonas Permanentes
O levantamento de dados primários do meio biótico foi realizado por meio de uma
avaliação ecológica rápida (AER), metodologia em que são identificadas áreas de amostragem
149
para a coleta e análise integrada de dados primários referentes aos diversos grupos biológi-
cos47.
Para a definição do zoneamento são cruzadas as informações das cartas temáticas re-
alizadas nos diagnósticos do meio físico (geologia, geomorfologia, solos, risco), da biodiver-
sidade (vegetação, fauna, flora), do uso da terra, vetores de pressão, patrimônio histórico e
cultural, uso público (trilhas, infra-estrutura para visitação).
Os programas de manejo são estabelecidos de acordo com a categoria de manejo e
suas finalidades, sendo que para cada programa são planejadas as metas, ações, atividades,
investimentos, cronogramas e recursos necessários para que se consiga atingir os objetivos de
manejo e gestão da unidade de conservação.
Pagani et al. (1996) apresentaram uma subdivisão dos programas de manejo em três
grandes categorias: Meio Ambiente, Uso Público e Operações. (Quadro 8.2)
PROGRAMAS DE MANEJO
47 Sobre a metodologia de avaliação ecológica rápida ver SOBREVILLA, C.; BATH, P. Evaluacion
Ecologica Rapida - un manual para usuários de América Latina y el Caribe. Edición preliminar. Arlington, VA,
EUA: The Nature Conservancy.231p. 1992.
150
ídos pelo diretor da unidade, que é o seu coordenador e por representantes do governo e da
sociedade, considerando-se os princípios da paridade e representatividade.48
O Decreto Estadual 49.672, de 05 de junho de 2005, regulamentou o processo de cria-
ção e funcionamento dos Conselhos Consultivos das unidades de conservação de proteção
integral do Estado de São Paulo.
Grande parte das unidades de conservação estaduais está em fase de criação e estrutu-
ração dos seus conselhos consultivos. No caso do Parque Estadual da Serra do Mar, que en-
volve 23 municípios, a idéia é a de implantar conselhos consultivos para os seus oito núcleos
administrativos, além de um conselho gestor para o Parque como um todo, na perspectiva de
gestão integrada e participativa.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
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Seatle and London: University of Washington Press, 1988
GRUMBINE, R.E. What is ecosystem management?. In: Conservation Biology, v.8, n.1, p.
48 Sobre a metodologia da constituição dos conselhos consultivos ver RAIMUNDO, S. et al. A criação
dos Conselhos Consultivos nas Unidades de Conservação de Proteção Integral: Estudo de caso no Estado de
São Paulo.In: Anais do Congresso Brasileiro de Unidades de Conservação, 2002
151
27-38, 1994
MARETTI, C.C. et al. A Construção da Metodologia dos Planos de Gestão Ambiental para Uni-
dades de Conservação em São Paulo. In: Anais do I Congresso Brasileiro de Unidades de
Conservação. Curitiba-PR, p. 234-247, 1997
MORSELLO. Áreas Protegidas Públicas e Privadas. Seleção e Manejo. São Paulo: FAPESP :
Editora Annablume, 343 p., 2001
PAGANI, M.I. et al. As trilhas interpretativas da natureza e o ecoturismo. In: LEMOS, A.I. (Org)
Turismo: impactos Sócio-ambientais. São Paulo: Ed. Hucitec, p. 151-163, 1996
Queiroz, H.L. et. al. Um banco de dados para a Rede de Unidades de Conservação do Brasil.
In: Anais do I Congresso Brasileiro de Unidades de Conservação. Curitiba,PR, p. 901-912,
1997
RAIMUNDO, S. et al. A criação dos Conselhos Consultivos nas Unidades de Proteção Integral:
Estudo de caso no Estado de São Paulo. In: Anais do III Congresso Brasileiro de Unidades
de Conservação. Fortaleza-CE, p. 223-233, 2002
UICN. Estratégia Mundial para a Conservação: A Conservação dos recursos vivos, para um
desenvolvimento sustentado. São Paulo: CESP, 1984
UICN / CMAP / CMMC. Directrices para las Categorias de Manejo de Areas Protegidas.
Gland, 261 p., 1994
UICN / CMAP. Áreas Protegidas: beneficios más allá de las Fronteras, la CMAP em acci-
ón. Gland, Suiza, In: http//www.uicn.org, 17 p., 2000
UICN, VHT IUNC World Parks Congress User Guide and Daily Programme. In: http//
www.uicn.org/themes/wcpa/wpc2003, 57 p., 2003
UNESCO. Action Plan for Biosphere Reserves. Nature and Resources. Paris: UNESCO, v.
XX, nº 4, 1984
Lívia de Oliveira49
Neste capítulo queremos prestar nossas homenagens ao nosso saudoso e tão admirado
colega de tantas lutas em prol da paisagem e do meio ambiente: o eminente biogeógrafo,
pesquisador e mestre. Para tanto, nos propusemos a tecer algumas considerações sobre per-
cepção ambiental, naturalmente, mais do ponto de vista geográfico, do que ecológico. Nossa
responsabilidade é dupla, porque Felisberto Cavalheiro foi um grande professor de Bioge-
ografia, pois suas aulas cobriam uma gama enorme de assuntos ligados ao meio ambiente;
e um grande pesquisador, pois suas investigações procuravam sempre relacionar as pessoas
com seu meio ambiente.
Tentaremos, por conseguinte, fazer uma varredura geográfica, partindo das noções
básicas para melhor compreender e explicar a própria percepção ambiental. Procuraremos
levantar questões de percepção ambiental urbana, passando pela rural, chegando às regiões
selvagens e tentando vislumbrar as perspectivas para uma percepção ambiental.
que não pode ser reduzida a simples termos convencionais, pois o sistema homem é alimen-
tado por um tipo de energia tremendamente dinâmico e segundo ritmos e regulações muito
sofisticados que é a afetividade. Os processadores deste sistema não atuam somente em um
plano, mas sim em vários, tais como: sensório-motor, perceptivo, simbólico, intuitivo, repre-
sentativo, operatório (concreto e formal). Por outro lado, a representação é a capacidade e
evocar por um signo ou símbolo o objeto ausente ou a atividade realizada, independente da
percepção.
Convém lembrar que tanto a percepção/cognição como a conduta espacial estão na
dependência do conhecimento, da atitude, opinião que o indivíduo tenha do espaço. Isto
equivale a dizer que subjacente à ação (perceptiva e cognitiva) exercida sobre um deter-
minado espaço se constrói sempre uma noção de espaço e, mais ainda, a adoção de uma
teoria que conceitualize o espaço em termos de definição, limitação, classificação, função,
hierarquização, organização etc. São estes termos que determinam a escolha da representação
cartográfica do espaço.
As atitudes, os valores e os símbolos revelam características espaciais em termos da
natureza e da cultura. Todas estas observações necessitam ser encaradas diante das tendên-
cias contemporâneas de uniformização de atitudes, homogeneização de valores e de trans-
formação dos símbolos tendendo a se dissolver pela ação avassaladora da industrialização e
urbanização modernas.
PERCEPÇÃO AMBIENTAL
Atualmente, o sentido que se atribui ao termo meio ambiente é tudo e todos que nos rodeiam:
o natural e o construído; o perto e o distante; o que amamos e não amamos; é tanto o social,
quanto o religioso; o concreto e o abstrato; o visível e não visível. Assim, concebido, para
se estudar, pesquisar o meio ambiente deve-se recorrer a uma equipe interdisciplinar, cada
elemento contribuindo para sua esfera. Em outras palavras, pode-se, mesmo, afirmar que é
multidisciplinar, podendo-se dizer que é transdisciplinar.
O que queremos dar ênfase, aqui, é que a abordagem perceptiva/cognitiva em relação
ao ambiente exige uma plêiade de interessados; pois o problema não é simples, mas, sim
complexo, muito dinâmico e implica afetividade. Como as indagações são imbricadas, as res-
postas, também serão intricadas, esperando que o planejamento para o ambiental conte um
número necessário de profissionais para se chegar a uma solução satisfatória.
Quanto se trata de percepção ambiental, trata-se, no fundo, de visão de mundo, de vi-
são do meio ambiente físico, natural e humanizado, na maioria é sociocultural e parcialmente
é individual; é experienciada em grupo ou particularizada; é uma atitude, uma posição, um
valor, uma avaliação que se faz do nosso ambiente. Ou seja, usando o neologismo topofilia,
para expressar os laços afetivos que desenvolvemos em relação ao nosso meio ambiente,
direta ou simbolicamente.
Concordamos com a maioria dos intelectuais que consideram a questão ambiental, e a
percepção ambiental, os problemas cruciais para o século XXI, como nos séculos XIX e XX foi
a questão social. Contudo, não estamos preparados tanto política quanto afetivamente para
enfrentar as questões referentes às relações entre natureza e sociedade. A nosso ver a questão
exige que equacionemos a solução para o problema sob um ponto de vista ético, muito mais
do que socioeconômico. Enquanto ignoramos que o meio ambiente é finito, nem sempre re-
novável e inesgotável e não desenvolvemos uma afetividade em relação a ele, continuaremos
a usá-lo e depredá-lo sem misericórdia e sem fim. Em geral, para nós, a idéia de que o meio
ambiente é uma paisagem banal, do cotidiano e nosso planeta é estático, tranqüilo e imutável,
não é correta, ao contrário, apesar se ser silencioso e aprazível, este ambiente se apresenta de
maneira explosiva e inesperada.
saico urbano. Aqui os artesões, ali os comerciantes, acolá os clérigos, mais além os governan-
tes. Também, as edificações começaram a se especializar em: oficinas, lojas,igrejas, palácios,
as construções de casas de moradia surgiram e se multiplicaram.
As cidades modernas são vistas como conglomerados de casas residenciais, de prédios
de trabalho, de edifícios públicos, de templos religiosos, de acervos de museus, de parques e
praças. Ao se estabelecerem relações perceptivas e cognitivas com o espaço urbano é preciso
considerar os anseios da população: o que quer, o que gosta/não gosta, o que sonha, o que
espera do futuro. Os governantes e os planejadores devem partir de baixo para cima. Primeiro
fornecer informações dos planos, depois saber das necessidades e vontades da comunidade.
Aí que entra a percepção ambiental urbana. Como os indivíduos ou grupos percebem
o meio ambiente. De que maneira este meio ambiente era e é visto pela sociedade. Lembrar
à própria sociedade que a implantação de uma cidade está sobre um relevo, sobre um solo,
constituído de rochas e sedimentos; que antes havia uma cobertura vegetal natural, que abri-
gava pássaros e animais, insetos e répteis; que as águas drenadas eram limpas e potáveis. Es-
pecialmente, em cidades grandes, de proporções metropolitanas, estas lembranças são esque-
cidas. Só são lembradas quando, após as chuvas torrenciais de verão, os córregos estouram as
tubulações e os rios provocam enchentes, cobrando seus espaços para espraiarem suas águas
atingindo as várzeas, que sempre foram de seus domínios.
Precisamos mudar essa maneira de perceber e conhecer a natureza; precisamos reco-
nhecer os direitos da natureza; desenvolver uma consciência pública e individual, insistir na
informação básica e na comunicação; e talvez, o mais importante formar atitudes e condutas
positivas e afetivas para com o meio ambiente, conduzindo toda a comunidade a reconhecer
a topofilia como o elo afetivo fundamental entre as pessoas e os seus lugares.
A percepção e cognição ambiental precisam ser equacionadas de maneira integrada;
perceber e conhecer a cidade como constituída de partes imbricadas e não segmentadas, as-
sim sendo as favelas, as periferias, os bairros residenciais de classes alta e média, os distritos
comerciais e culturais são partes do todo e não pólos da realidade, não podendo ser enfren-
tados separadamente. A tendência é perceber em separado e procurar a resolver as questões,
também, separadas.
Em se tratando de percepção ambiental urbana é fundamental prever e organizar áreas
recreacionais intra-urbanas. É preciso planejá-las através do tempo do espaço, considerando
as dimensões duração e extensão. Sabe-se, perfeitamente, que as áreas recreacionais, quer
denominadas parques de diversão, de playground, áreas verdes, campinhos de futebol ou de
basquete, são locais onde se pode passar o tempo, se divertir, folgar, sentir prazer ao ar livre.
Portanto, elas necessitam de uma concretização no espaço, de uma extensão que comporte os
equipamentos de recreação, desde sofisticados aparelhos de diversão até uma simples bola.
As áreas recreacionais têm início e fim, enquanto são usadas, valorizadas e consi-
deradas, principalmente por crianças, adolescentes e velhos. Em geral, quando instaladas
ostentam-se limpas, lindas, arborizadas, com bancos e canteiros floridos e muito agradáveis
Ao correr dos anos se observam: bancos quebrados, lixo espalhado, canteiros cheios de mato,
árvores decepadas, indicando um desleixo generalizado por parte das autoridades e, também,
pelos usuários, que cresceram, se tornaram adultos e se desinteressaram por essas áreas. Os
novos usuários procuram novas áreas de recreação.
Do ponto de vista ambiental, tanto perceptivo como cognitivo, os planejadores e urba-
nistas ao implantarem uma área verde recreacional, devem considerar a localização, o uso, a
finalidade em relação aos citadinos, moradores ou visitantes da cidade.
Na realidade, não estamos preparados para enfrentar problemas ambientais urbanos
de magnitudes metropolitanos. Ao ser fundada uma cidade, em geral, não são respeitadas
as leis da natureza do sítio urbano. O exemplo da metrópole de São Paulo: as várzeas dos
157
Como não deixar de destacar as moradias rurais: com as casas dispondo de água en-
canada, luz elétrica, banheiros, vários cômodos, cozinhas aparelhadas bem recentemente,
contanto com conduções próprias (automóveis e caminhonetes modernas e velozes).
Este cenário variado das plantações imensas e dos rebanhos numerosos marcam inde-
levelmente a cultura do agronegócio, comercial, globalizada e, principalmente, voltada para
a exportação. A percepção ambiental da paisagem rural é sempre eivada de pobrezas e de ri-
quezas, pois, o campo está sempre subordinado quanto às dependências: climáticas (pouca /
muita chuva); econômicas (custo / benefício); mercado (alto / baixo); maquinárias (avançadas
/ obsoletas); sementes (transgênicas / comuns); culturais (modernas / tradicionais); fundiárias
(latifúndio / minifúndio); cultivos (lavouras / pastagens). Os empresários rurais, quer como
donos ou trabalhadores, estão sempre submetidos a escolhas entre o mais rentável, mais pro-
dutivo e menos oneroso.
Muitas vezes, essas escolhas dependem da percepção e da cognição do momento,
que necessariamente vão influenciar em um futuro próximo ou longínquo. Essas tomadas de
decisões são cruciais, pois precisam ser decididas rapidamente: o que plantar/criar, em que
terrenos/solos, financiar ou não a safra. Todas essas decisões a serem tomadas dependem
diretamente das informações disponíveis e obtidas. Uma fração de dias ou meses, no atraso
da decisão compromete toda uma vida de trabalho e dedicação.
Talvez, a percepção ambiental rural é tão importante quanto a urbana porque nós, aca-
dêmicos, não separamos a paisagem urbana da rural. Estas constituem um contínuo territorial
geográfico e histórico, intercalados de vilas e povoados, limitados por estradas e caminhos.
conversas, de literatura, de pintura; virou moda e a procura de lugares com belos atributos
da natureza, tais como a floresta, os rios, as savanas, as montanhas. Eram locais que gozavam
de mistério e encantamento.
Esta percepção das regiões selvagens, somente mais tarde é que foi enriquecida pela
ciência. Foi deixada a idéia de que os desertos, os pântanos as ilhas isoladas abrigavam os
maus espíritos e eram deformidades da superfície terrestre. Foi, então, que os cientistas e
eruditos conheceram e perceberam estes fenômenos da natureza como expressão da ordem
natural e das diversas obras humanas construídas. Apesar de terem passados séculos, muitas
pessoas, tanto habitantes das cidades, como do campo, ainda sentem medo, experimentam
sensações de insegurança quando se defrontam ou adentram lugares selvagens. A natureza
selvagem provoca sentimentos opostos; é a criação divina em seu estado puro; é a beleza
rude e exótica; entretanto é muito perigosa, muito traiçoeira, abrigo de animais ferozes e
plantas venenosas.
As regiões selvagens, na atualidade, vêm despertando cada vez mais interesse e exigin-
do necessidade de preservar os ecossistemas únicos e incomparáveis e de extensões maiores
possíveis. Reconhecemos que, contemporaneamente, o selvagem é mais um símbolo dos
processos naturais ordenados; é mais como um estado de espírito, é mais subjetivo do que
objetivo, é mais uma descrição de uma paisagem longínqua, de difícil conceituação. Podemos
descrevê-lo, como aquela natureza virgem, que não é o campo e nem o seu oposto que é a
cidade. Tanto o campo como a cidade são construções humanas, feitas inteiramente pelo ho-
mem, são duas polaridades, uma antítese da outra, de onde surge um termo intermédio, que
não é rural nem urbano, que é o selvagem.
A idéia que sempre prevaleceu entre as relações sociedade/natureza é que os biomas
conservados representam entraves ao desenvolvimento econômico, ao progresso. A socieda-
de sempre utilizou os recursos naturais de uma maneira exploradora, não se preocupando
com a reposição vegetal ou animal, ou com estratégias racionais com a exploração dos mi-
nerais. O mito da natureza inesgotável, que se pode destruir e que sempre existirão recursos,
que sempre serão renovados, tem sido a tônica durante os milênios da ocupação do homem
sobre a Terra.
O exemplo clássico e mais perto de nós mesmos é a nossa ocupação do território,
agora denominado, brasileiro, nestes 500 anos de história. A destruição da cobertura florestal
representada pela Mata Atlântica, a ocupação desordenada do cerrado do Brasil Central e
mais recentemente a derrubada da floresta amazônica. Tudo isso vem acontecendo diante dos
nossos olhos, somos informados pela mídia, diariamente, com a intensificação da tecnologia.
A alteração do mundo natural atende aos propósitos imediatistas e individualistas. Nem sem-
pre o homem comum ou mesmo os administradores relacionam as causas aos efeitos.
Porque assistimos as piores secas, como as da Amazônia, ou as piores enchentes no
Sudeste? Talvez porque sempre encaramos ou percebemos a natureza, como estática, um
cenário silencioso, uma paisagem tranqüila, aprazível, nos esquecemos ou não nos apercebe-
mos que a natureza é extremamente dinâmica, é um sistema complexo, contendo fluxos de
matéria e energia e que o homem surgiu apenas há algum tempo sobre a superfície terrestre.
O que dizermos sobre a proposta governamental da transposição do rio São Francisco? Há
milênios, o rio tem esse curso e vem construindo seu talvegue, suas várzeas, seus meandros
e lutando bravamente contra a poluição e o seu mau uso.
Não conhecemos inteiramente as leis da natureza e queremos interferir nas mesmas.
Lembramos que o poder que temos sobre o meio ambiente não nos permite exercer contro-
le sobre ele. Temos tido poder de destruição (devastação florestal, drenagem de mangues,
poluição dos rios e dos solos), no entanto, não temos poder de reconstruir esses biomas, de
maneira rápida e eficaz, não sabemos como redesenhar a nossa biosfera. A ciência investiga a
160
natureza, chegando o mais perto possível da realidade, em relação a outros sistemas de cren-
ça e conhecimento. Sabemos que o conhecimento científico é neutro, do ponto de vista ético,
desprovido de valor, não libertando o Homem, apenas aumenta o seu poder. A ciência não se
preocupa, essencialmente, com a felicidade do homem, mas sim com a verdade científica.
Talvez, seja necessário e premente equacionar a questão ambiental como um todo, não
abordando separadamente o econômico do social. Para tanto, será preciso educar as pessoas
a perceber e a conhecer o seu meio ambiente com suas fragilidade e seus poderes e, pri-
mordialmente, desenvolver sentimentos de afetividade. Não basta conhecer, é indispensável
amar, gostar da natureza, quer urbana, rural ou selvagem. Gostar implica respeitar, “cativar”,
reverenciar e aceitar, não com simples emoção, mas com o intelecto, com a esperança de
melhoramentos.
Nos últimos dois séculos do milênio anterior, assistimos revoluções e muitas discussões
sobre os direitos humanos: direito da mulher, da criança, do idoso, das minorias raciais e re-
ligiosos. Chegamos até estruturar uma Nações Unidas para congregar as nações e os povos
do planeta. Organizamos associações governamentais e não governamentais para lutarem
contra a discriminação, pobreza, desamparo, e a favor da habitação e da vida decentes, da
água potável, das estradas conservadas, da energia elétrica, da alimentação básica para todos,
independente de etnia, religião, localização geográfica.
Em grande parte, no segundo quartel do século vinte, atingimos patamares razoáveis,
principalmente nos aspectos sanitário e de higiene: a vacinação de crianças e adultos contra
várias doenças endêmicas, os transplantes de órgão vitais, a coleta e tratamento do lixo, a
recuperação de bacias hidrográficas, o combate de endemias (malária, fome, desnutrição).
Quanto aos aspectos políticos assistimos a luta a favor das eleições livres e do combate ao
autoritarismo, às ditaduras sangrentas e indiscriminadas.
Quanto aos aspectos socioeconômicos, relativamente se fez pouco: as diferenças de
classes sociais e a distribuição de rendas, não é marcante nas paisagens geográficas. Perma-
necem os ricos e abastados de um lado e os pobres e subdesenvolvidos de outro. Quanto aos
aspectos ambientais defrontamos com um quadro mais ou menos semelhante aos demais: a
percepção e a cognição em relação ao meio ambiente foram auspiciosas, pois nos desper-
tamos para a natureza, nos interessamos pelo ambiente natural, estamos desenvolvendo um
sentimento de afetividade especial para com os animais e plantas selvagens, estamos tomando
consciência da necessidade da preservação, conservação e recuperação ambiental. Hoje, há
ecólogos, geógrafos, ambientalistas, biólogos e outros mais, estudando, pesquisando, traba-
lhando nessa área. Diríamos, como Tuan, que a topofilia floresceu entre os homens. Este
elo afetivo para com o lugar surgiu concreta e vividamente, como uma experiência pessoal
e coletiva e persistirá entre nós, “incluindo todos os laços afetivos dos seres humanos com o
meio ambiente material”.
Não devemos nos esquecer que o despertar de sentimento topofílico, também apre-
senta o seu reverso: o sentimento topofóbico. Muitas pessoas desenvolvem uma topofobia
em relação a certos lugares, em geral, relacionadas com a emoção, as lembranças, os acon-
tecimentos e sentem verdadeiras fobias por alguns lugares e espaços. Ainda, podemos nos
defrontar com um topocídio de um lugar. Exemplo de desaparecimento de vilas e povoados
resultantes da inundação de áreas para construir represas. Mais, recentemente, assistimos a
busca de uma topo-reabilitação para paisagens valorizadas e consideradas únicas, por em-
presas estatais e não estatais, patrocinando a recuperação de cidades antigas, edifícios, obras
arquitetônicas e formação de profissionais para esse mister.
Estes têm sido e deverão ser os direitos e os deveres humanos para com as construções
históricas e modernas, a serem preservados para a posteridade. Mas, quais são os direitos e
deveres para com o natural? O que preservar ou conservar, ou reconstruir do natural, do sel-
vagem? Cada sociedade, cada comunidade percebe de uma maneira, valoriza certos aspectos,
prioriza algumas atitudes, prepara a seu modo as relações ambientais. Este século será mar-
cado pelos direitos naturais. Temos tomado consciência de que a natureza exige atenção res-
peitosa, reclama que as leis sejam cumpridas e implementadas, que os códigos sejam acatados
e, principalmente, que aprofundemos nossos conhecimentos em relação ao meio ambiente. A
política ambiental deve ser abordada tanto local como mundialmente, pois, hoje vivemos em
uma “aldeia global”, as interações acontecem aqui e agora, lá e acolá, em todas as partes.
As perspectivas para uma percepção/cognição ambiental devem incluir, não apenas
admiração pelas belezas exóticas e únicas, mas, também, recuperar biomas degradados, pre-
servando a diversidade genética da biota. Lembremos sempre que não vivemos em regiões
selvagens, mas necessitamos delas para nossa sobrevivência psicológica e biológica. Reco-
162
nhecemos que a nossa experiência com o selvagem, apesar de indireta e passageira, é im-
prescindível para manter nosso equilíbrio e harmonia com o meio ambiente como todo. O
nosso contato com o selvagem, com a natureza intocada, temos tido, indiretamente, através
da mídia. Quem não aprecia os vídeos e os filmes sobre as regiões selvagens? Quem não so-
nha em participar de um safári fotográfico no Pantanal ou nas savanas africanas, para “ver” os
animais e principalmente as aves coloridas? Quem não fantasia uma viagem submarina para
descortinar o fundo do mar e seus misteriosos peixes, corais e algas?
Por tudo isso e talvez muito mais é preciso passar da visão utópica para a ação efeti-
va, para uma ética em relação ao manejo da Terra, para uma afetividade positiva para com o
nosso planeta, atingindo a “corte amorosa da Terra”. São razões estéticas e morais, além das
econômicas e ecológicas, para preservar e conservar paisagens geográficas e históricas.
Termino com as palavras de René Dubos, em seu livro “Um Deus Interior”:
Muitas vezes é difícil manter a fé no destino do Homem, mas é certamente uma ati-
tude covarde desesperar dos fatos (p. 234)
REFERÊNCIAS
DEL RIO, V.; OLIVEIRA, L. Percepção ambiental, a experiência brasileira. São Paulo:
Studio Nobel, 1996.
WARD, B; DUBOS, R. Uma Terra Somente. São Paulo: Melhoramentos e EDUSP, 1973.
CAPITULO 10
EDUCAÇÃO PARA O MEIO AMBIENTE E GEOGRAFIA
A degradação das condições ambientais não é um fenômeno novo. O que adquire cer-
to grau de modernidade são as discussões realizadas por inúmeros especialistas a respeito dos
problemas ambientais, propondo uma série de questões relacionadas com as diversas formas
de degradação do meio ambiente. Isso impulsiona a participação de setores da população nos
debates e movimentos relacionados à problemática ambiental, o que antes não ocorria.
Tem-se colocado, cada vez mais, a necessidade de procurarmos compreender tanto
os dinâmicos processos da natureza como as relações que o homem estabelece, no tempo e
espaço com o meio natural. A interferência nessa dinâmica, muitas vezes operada de forma
irreversível e as conseqüências dessas atitudes, muitas vezes catastróficas, têm suscitado pre-
ocupações sobre a possibilidade de vida futura no planeta.
Na verdade, foi no século XX que o acúmulo de saber e poder mais se acentuou,
considerando-se a grande revolução dos meios de informação trazida pelas novas tecnolo-
gias. Concomitantemente a essa grandeza tecnológica, porém, graves problemas ambientais
também se processaram, como por exemplo: poluição de recursos hídricos, miséria, fome nas
grandes concentrações urbanas.
Ao analisar-se tal paradoxo, pode-se pensar que o planeta se tornou inviável; contudo,
esta não é a conclusão correta. Com uma mudança de mentalidade em relação ao uso dos
recursos naturais ainda disponíveis, reorganização dos valores sociais em benefício de todos
e vontade política, ainda é possível o resgate de uma relação outrora equilibrada entre o ho-
mem e a natureza.
Para que isso ocorra é necessário, portanto, a formação de uma consciência ecológica
e uma nova postura ética do homem perante a natureza, bem como perante a ele próprio.
Faz-se, também, necessário que se instrua o homem sobre os processos dinâmicos da natu-
reza e as conseqüências advindas de suas ações e destas para a vida na Terra. Tal processo
educacional deve visar à melhoria da qualidade de vida e à preservação do planeta para as
gerações futuras.
Tendo em vista tal preocupação, a Educação Ambiental passa a ser um dos eixos fun-
damentais para impulsionar os processos de prevenção da deterioração ambiental, o aprovei-
tamento sustentável dos nossos recursos e o reconhecimento dos direitos dos cidadãos a um
ambiente saudável.
Segundo Oliveira (1998), a Educação Ambiental implica uma nova concepção do pa-
pel da própria escola. A articulação de seus conceitos, métodos, estratégias e objetivos é
complexa e ambiciosa; inclui dimensões ecológicas, históricas, culturais, sociais, políticas e
econômicas da realidade e a construção de uma sociedade baseada em princípios éticos e de
solidariedade.
CONTEXTUALIZANDO ...
vel, o que promoveria a proteção e melhoramento do meio ambiente em toda a sua dimensão
humana. Previa-se que tal ação levaria tanto os jovens como os adultos a tomarem medidas
protetoras, que de acordo com suas possibilidades, poderiam ordenar e controlar o meio am-
biente, visando à melhor capacidade da Terra de produzir recursos vitais renováveis.
Em 1975, realizou-se em Belgrado, o Seminário Internacional de Educação Ambiental,
com a participação de representantes de 60 países. Durante o evento foi redigida a carta de
Belgrado, a qual define metas, objetivos, destinatários e princípios de orientação para os pro-
gramas de Educação Ambiental.
A Educação Ambiental passaria, então, a ter como meta principal proporcionar um pro-
cesso de construção de conhecimentos, aptidões e motivação que favorecessem a consciência
do meio ambiente e o interesse por ele e por seus problemas conexos. Preconizava, ainda, a
necessidade da universalização de uma ética mais humana que induzisse a adoção de atitudes
e comportamentos consoantes com o lugar ocupado dentro da biosfera.
Do final de 1976 a setembro de 1977, foram realizadas reuniões regionais na África,
América Latina e Caribe, Ásia, Europa e Estados Árabes, para tratar especificamente de Edu-
cação e preparar para a Primeira Conferência Intergovernamental sobre Educação Ambiental,
realizada em outubro de 1977, Tbilise, URSS. Nessa Conferência foram elaboradas orientações
gerais sobre Educação Ambiental para os países participantes e membros da UNESCO organi-
zarem e desenvolverem os seus próprios programas.
A tônica do documento produzido nessa Conferência é a de que toda ação política, na-
cional e internacional, deveria ter como principal preocupação a melhoria do nível de vida de
todos os habitantes do planeta. Esta finalidade implicaria no esforço para o desenvolvimento
sem o qual não seria possível colocar à disposição dos homens os bens necessários que dão
dignidade à sua existência.
Tal esforço seria fruto do trabalho, da organização social, da tecnologia e, também,
da utilização racional dos recursos naturais, sendo necessário, portanto, que todos os países
empreendessem ações corretivas, as quais, num quadro de desenvolvimento planejado, de-
veriam levar em conta, em nível nacional e internacional, os diversos aspectos da vida social
em suas inter-relações com o meio biofísico, dedicando-se a preservar e a consolidar os equi-
líbrios essenciais para um melhoramento constante das condições de vida.
O documento afirma, também, que as soluções para os problemas do meio ambiente
não são possíveis sem uma mudança no ensino geral e especializado em todos os níveis,
já que é necessário que as pessoas de diferentes idades e meios compreendam as relações
fundamentais que vinculam o homem a seu padrão de vida, o que favorece a existência de
comportamentos responsáveis frente ao meio ambiente, para o gozo constante de seu melho-
ramento.
Fala sobre a necessidade do estabelecimento de um padrão geral para a Educação Am-
biental, da adoção de medidas a fim de se formular um programa internacional de educação
sobre o meio, de enfoque interdisciplinar e com caráter formal e informal. Estabelece, ainda, a
intenção de se atingir todos os níveis de ensino, o público em geral, especialmente, o cidadão
comum que vive nas zonas urbanas e rurais, os jovens e adultos indistintamente, favorecendo,
em todos os níveis, a participação responsável e eficaz da população na concepção e aplica-
ção das decisões que colocam em jogo a qualidade do meio ambiente.
No Brasil, o governo brasileiro, com a criação, em 1973, da Secretaria Especial do Meio
Ambiente, estabeleceu como parte de suas atribuições o desenvolvimento de programas que
visassem ao esclarecimento sobre o conceito de meio ambiente e à educação do povo no
tocante ao uso adequado dos recursos naturais, visando à sua conservação.
Em 1981, a Educação Ambiental também foi contemplada pela Lei nº 6.938/81, que
instituiu a Política Nacional do Meio Ambiente, a qual estabelece que a Educação Ambiental
166
plexa do meio ambiente, resultante da interação de seus aspectos biológicos, físicos, sociais
e culturais, facilita o entendimento da interdependência dos diversos componentes do meio
ambiente, no espaço e no tempo, de modo a favorecer a utilização mais reflexiva, e mais pru-
dente, dos recursos para a satisfação de suas necessidades materiais e espirituais, presentes
e futuras.
A Educação Ambiental deve, acima de tudo, favorecer, em todos os níveis, uma par-
ticipação responsável e eficaz da população nas decisões que colocam em jogo a qualidade
do meio ambiente. Deve mostrar, com clareza, as interdependências econômicas, políticas e
ecológicas do mundo moderno e o fato de que muitas decisões e condutas em um determi-
nado país, podem ter conseqüências de alcance mundial.
Nesse sentido, a Educação Ambiental desempenha função importante para a formação
de uma atitude democrática de responsabilidade e solidariedade entre as pessoas, garantindo,
assim, a conservação e preservação do meio ambiente.
Neste início de século, faz-se necessário que a nossa atuação seja mais ousada e efe-
tiva. Precisamos criticar, mas sempre que possível, propormos soluções, evitando, assim, a
vivência inábil de meras situações de levantamento de problemas, realização de diagnósticos,
delimitação de áreas, organização de comissões sem, no entanto, chegar-se a uma solução
para convencermos as pessoas de que a Terra é, e continuará sendo, a morada do Homem.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A Educação Ambiental não deve ser uma disciplina isolada. Deve ser tratada de forma
interdisciplinar, por meio de projetos, nos quais os assuntos sobre meio ambiente tenham um
enfoque holístico, global e integrado, considerando os vários ângulos e implicações de um
mesmo problema.
As abordagens sobre meio ambiente devem ser feitas em seu sentido amplo, consi-
derando a totalidade de ações e concepções produzidas pelos indivíduos e pelos diversos
grupos humanos, em tempo e lugar variados. Isto significa pensar o meio ambiente em seus
múltiplos aspectos: ecológicos, geográficos, históricos, econômicos, políticos, culturais e edu-
cacionais.
A Educação Ambiental deve permear todas as disciplinas que compõem o currículo
escolar e percolar todos os conteúdos, integrando todas as disciplinas da grade escolar nas
escolas de Ensino Infantil, Fundamental e Médio.
Ligando consciência e construção de conceitos básicos ecológico-ambientais, a Educa-
ção Ambiental envolve o desenvolvimento de processos afetivos, cognitivos e de habilidades,
especialmente, para o desenvolvimento de atitudes e valores que motivam as pessoas a se
envolverem com a solução de problemas ambientais.
Do mesmo modo, auxilia o desenvolvimento dos processos de raciocínio do aluno,
o que pode ser eficiente na solução de problemas ambientais complexos, na exploração do
ego, bem como na relação deste com o mundo natural.
O processo de ensino-aprendizagem de Educação Ambiental implica que se deve
aprender a pensar em termos de sistemas de fatores que interagem, ou seja, pensar não só
racionalmente sobre as partes de um sistema complexo, mas desenvolver um sentimento in-
tuitivo para o comportamento dinâmico deste mesmo sistema como um todo.
Requer, da mesma forma, um compromisso com o desenvolvimento e com a utilização
de todas as situações em que a aprendizagem possa ser nutrida através de experiências, e ati-
vidades que cultivam um profundo respeito e amor pelo mundo natural, incluindo exemplos
dos problemas ambientais locais, bem como estudos de caso, dramatizações, simulações e
jogos que proporcionem oportunidades de examinar e participar das complexidades da to-
mada de decisões, da compreensão de valores alternativos e pessoais e da real operação dos
169
REFERÊNCIAS
VIANNA, L. et al. Política Nacional de Educação Ambiental. In: Ministério da Educação. Tex-
tos da Série Educação Ambiental do Programa Salto para o Futuro. Brasília: Ministério
da Educação, julho/2000.
CAPITULO 11
PEDOGÊNESE E MUDANÇAS NA PAISAGEM: um exemplo da região sudoeste da Ama-
zônia brasileira
Vânia Rosolen52
LOCALIZAÇÃO DA ÁREA
Essa região caracteriza-se como uma vasta área de terras baixas limitadas ao norte pelo
escudo das Guianas, ao sul pelo escudo Brasileiro e a oeste pela cordilheira dos Andes. A
vegetação natural é, principalmente, constituída pela floresta tropical úmida e pelos campos
de savana. Predominam os sedimentos da Formação Solimões (Plioceno superior/Pleistoceno
inferior) e os sedimentos fluviais holocênicos (VILLAS-BOAS, 1993). O relevo é aplainado
com altitude inferior a 250m, pouco ou muito dissecado e com interflúvios tabulares. Os pla-
tôs, separados pelos principais eixos de drenagem, apresentam numerosas depressões suaves,
com desníveis métricos, que se desenvolvem desde a borda até o centro dos platôs. Essas
depressões possuem diferentes formas e tamanhos. Foram identificadas pelo RADAMBRASIL
(1978a) e denominadas de lagoas que enchem e transbordam durante as chuvas e secam du-
rante a estiagem. Ao transbordarem, algumas se interligam, iniciando a formação de uma rede
de drenagem secundária.
A precipitação média anual é de 2.200mm com uma curta época seca entre os meses
de junho e agosto. A temperatura média anual é de 23ºC. As associações de solos são o Po-
dzólico Vermelho-amarelo e a Laterita Hidromórfica (segundo a classificação adotada pelo
Radambrasil, 1978a, 1978b). A escala de abrangência do mapeamento do RADAMBRASIL
(1:1.000.000) associa as Lateritas Hidromórficas com os campos de savana e o Podzólico
Vermelho-amarelo com as áreas de floresta.
Este trabalho foi realizado em duas escalas de observação: um estudo detalhado dos
solos ao longo de uma vertente representativa da paisagem regional e, outro, na escala da
bacia elementar em uma paisagem de contato floresta-savana. Ambos os estudos foram reali-
zados seguindo o conceito da análise estrutural da cobertura pedológica proposto por Boulet
172
et al. (1982a, 1982b). Foi aberta uma trincheira de 90m de extensão e 2,5m de profundidade.
A montante localiza-se na parte alta do platô sob cobertura de floresta e a jusante no centro
de uma depressão sob cobertura de savana.
Na escala da bacia elementar foi realizado o mapeamento através de tradagens em
toposseqüências dispostas radialmente a partir do centro da depressão visando localizar o
apacimento/desapacimento dos principais horizontes e definir, espacialmente, seus limites.
Foram feitas 19 toposseqüências numa superfície de 10ha e elaborada a carta de isolinhas de
diferenciação dos horizontes de solo.
Em seguida, foi realizado um mapa das feições da superfície do solo, principalmente,
feições ligadas à erosão laminar, depósito e atividade biológica. Esses dados fornecem sub-
sídios para avaliar a dinâmica do escoamento superficial e contribuem para o conhecimento
da evolução do modelado e dos solos. Esta etapa da pesquisa foi realizada tomando como
exemplo o levantamento proposto por Valentin (1989). Também foram delimitadas as áreas
de floresta e savana.
sob vegetação de savana não alagada: esta vegetação cobre aproximadamente 40%
da superfície. É composta essencialmente por vegetação herbácea reagrupada em
tufos ligeiramente sobrelevados (até 10cm), onde se observam aspectos da mesofau-
na. Ocorrem zonas circulares (3-5m de diâmetro) de vegetação arbórea que podem
ser relíquias de floresta. Nos espaços entre a vegetação herbácea, aparece crosta de
erosão com superfície lisa, cor bruna e sem porosidade aberta. A dessecação provoca
o rachamento dessa crosta, que chega a se separar da superfície do solo, formando
pequenas placas de espessura igual ou inferior a 5mm. Rejeitos da mesofauna (micro-
peds de cupins e formigas), bastante numerosos na superfície (50%), freqüentemente
estão incorporados à crosta de erosão.
174
Há uma estreita relação entre a distribuição dos principais horizontes dos solos e a to-
pografia e discordância com a vegetação (figuras 11.2a e 11.2b). As áreas deprimidas formam
dois eixos. Um eixo principal, grosso modo, no sentido norte–sul e um eixo secundário no
sentido oeste–noroeste/leste–sudoeste que se conectam no sul do mapa e formam um talve-
gue drenando temporariamente as zonas deprimidas inundadas ao eixo de drenagem local.
O resultado do mapeamento mostrou a estreita relação entre a distribuição dos princi-
pais horizontes e da topografia. Percebe-se que a presença dos horizontes ricos em matéria
orgânica e dos horizontes brancos é sistemática e exclusivamente associada às áreas deprimi-
das. A partir das zonas deprimidas, a distribuição dos horizontes relacionados com as posi-
ções elevadas da vertente é radial.
175
Figura 11.2b – Distribuição dos horizontes dos solos em uma área representativa de 10 ha.
Org.: ROSOLEN, 2007
se expande para o meio da vertente coincidindo com os limites do horizonte branco. Como
resultado há uma homogeneização do tamanho das partículas na matriz do solo com predo-
mínio do esqueleto quartzoso associado ao surgimento de uma nova porosidade, de forma
irregular e diâmetro maior (tipo “cárie”).
Nas regiões tropicais, os processos de evolução do solo que levam a separação entre
o plasma argilo-ferruginoso e o esqueleto quartzoso é o motor de severas transformações in-
ternas (MILLOT, 1977). Em estações contrastadas, o plasma migra lateralmente, o esqueleto se
reorganiza e há perda volume. Há a formação e o aprofundamento da depressão por subtra-
ção de matéria. O aumento da porosidade acentua a permeabilidade e o grau de intemperis-
mo. O avanço deste processo denominado de intemperismo centrífugo (FRITSCH et al., 1986)
ou divergente (PHILLIPS, 2005) se caracteriza por um progressivo alargamento e amplificação
das pequenas variações iniciais, expondo as transformações na topografia (GUNNELL e LOU-
CHET, 2000; PHILLIPS, 2005).
No caso em estudo, a abertura do sistema e a ampliação do “ponto de fuga” é a cone-
xão da depressão com o eixo de drenagem. A perda de matéria aprofunda a depressão sobre
o platô e resulta em uma diminuição do desnivelamento topográfico, aplainamento do rele-
vo e aumento da extensão da área a ser alagada sazonalmente. O alargamento ocorre pela
progressão lateral remontante, a partir do ponto de fuga. A progressão lateral do horizonte
gerado (horizonte banco) é feita em detrimento da organização do solo original (seqüência
vertical na montante no platô). Sua extensão espacial é lateral centrífuga em relação ao eixo
da depressão (jusante da vertente) com uma dinâmica lateral remontante no modelado.
CONCLUSÃO
REFERÊNCIAS
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landscape of low relief. In: The hydrology of Areas of Low Precipitation. Proc. Camberra
Symp. (Int. Assoc. Sci. Hydrol.), 128: 385-395, 1979
INTRODUÇÃO
Figura 12.1 – Os 25 hotspots mundiais de importância para a conservação da natureza (Myers et al., 2000)
Figura 12.2 – Pau-brasil com cerca de 30m de altura, Usina Coruripe, Coruripe, Alagoas (Rocha, 2004)
182
Figura 12.3 – Tronco de pau-brasil cortado, podendo se observar o cerne (avermelhado) e o alburno (amarela-
do), Usina Coruripe, Coruripe, Alagoas (Rocha, 2004)
A história das alterações sofridas por esse Domínio, principalmente na área de ocor-
rência do pau-brasil (de estado do Rio de Janeiro até o estado do Rio Grande do Norte), du-
rante os primeiros 300 anos de ocupação do Brasil, ainda é pouco conhecida; seu estudo é
de “extrema importância sob o ponto de vista biogeográfico e ambiental, porquanto foi nessa
fase da nossa história que se processaram os grandes desmatamentos que afetaram considera-
velmente toda a região, tanto no que se refere à fitofisionomia quanto à desestabilização das
condições ecológicas” (Coimbra-Filho & Câmara, 1996).
Justamente a ocupação do Brasil “se iniciou pela costa atlântica, na zona de matas
que primeiro forneceu o pau-brasil e depois as terras apropriadas para o plantio da cana-de-
açúcar” (Ribeiro, 1977).
O pau-brasil foi explorado comercialmente desde o início do século XVI até meados
do século XIX, principalmente pelo corante extraído de sua madeira. Esse corante, relativa-
mente caro, era utilizado para o tingimento de lã, seda e algodão, dando a cor vermelha a
esses tecidos. Dessa maneira, somente pessoas mais ricas podiam ter roupas dessa cor, indi-
cando seu status social (Rocha, 2008).
Por causa da intensa exploração e posterior diminuição do Domínio Atlântico, do qual o pau-
brasil é endêmico, essa espécie foi considerada extinta durante cerca de 100 anos, entre 1876 e 1972;
inúmeras ações a partir de 1973 têm sido realizadas para mudar essa situação de quase extinção (Ro-
cha, 2008). Em 1992, a Portaria IBAMA n.37-N declarou o pau-brasil como espécie da flora brasileira
em perigo de extinção. Em 2007, a espécie foi finalmente colocada na lista da Convention on Inter-
national Trade in Endangered Species of Wild Fauna and Flora – CITES (Rocha & Simabukuro, 2008).
O pau-brasil está listado no Anexo II, sendo necessária emissão da licença de exportação CITES para
exportação de toras, madeira serrada, laminados, incluindo artigos de madeira não acabados utilizados
para fabricação de arcos para instrumentos musicais de corda (CITES, 2009), atual uso comercial da
madeira.
183
Por ter desempenhado importante papel nos primórdios da história do Brasil e por ter forne-
cido o nome ao país, o pau-brasil é considerado a árvore nacional pela Lei Federal n. 6.607 de 1978,
cuja comemoração ocorre em 3 de maio (Rocha, 2004).
Nas três primeiras décadas do século XVI, para tornar a extração do pau-brasil mais efi-
ciente, foram estabelecidos pontos de ocupação chamados de feitorias, “temporárias, em que
os habitantes cuidavam de armazenar toras de pau-brasil, peles, essências florestais, madeiras
de lei, algodão e papagaios, além de feitorias permanentes onde já havia sinais de posse efe-
tiva da terra, como a que foi fundada por Américo Vespúcio no Cabo Frio [no atual estado
do Rio de Janeiro] e a de Itamaracá [no atual estado de Pernambuco], fundada por Cristóvão
Jaques” (Andrade, 2000).
Tais feitorias tinham a função principal de fazer o escambo de pau-brasil cortado
por indígenas e seu armazenamento, até a chegada das embarcações que transportariam o
pau-brasil para a Europa, além de manter agentes comerciais, funcionários e militares para a
defesa e servirem de postos de articulação entre as rotas marítimas entre Europa, América e
Oriente (Prado Júnior,1989; Ziebell, 2002).
A instalação dessas feitorias e a posterior e progressiva ocupação do Brasil foram deter-
minadas, em grande parte, pela existência dos acidentes geográficos da costa (Mauro, 1997).
Muitas vezes, portos naturais, enseadas, baías e barras, aliados à existência de pau-brasil e de
indígenas mais amistosos, determinaram a fixação de feitorias, vilas e povoados, uma das mais
importantes conseqüências da exploração do pau-brasil na história do país, impossível de ser
ignorada em qualquer análise da ocupação urbana do território brasileiro.
A extração do pau-brasil também provocou a “dissolução dos grupos tribais mais den-
sos e sua dispersão pelas matas através do engajamento dos homens como remeiros e tarefei-
ros e das mulheres como amásias e produtoras de mantimentos”, caracterizando “fenômenos
de aculturação e de transfiguração étnica” (Ribeiro, 1977).
Posteriormente, algumas dessas feitorias se transformaram em núcleos de colonização
do Brasil, mais organizada a partir de 1530, já que algumas razões levaram o rei português
D. João III (1521-1557) a criar e distribuir as capitanias hereditárias a donatários que tinham
a obrigação de colonizar suas áreas: o fracasso do comércio oriental, por causa da fragilidade
do domínio português na Índia, e a presença dos corsários e piratas franceses na costa brasi-
leira, que contrabandeavam o pau-brasil (Andrade, 2000; Ziebell, 2002).
No século XVI, a Floresta Atlântica “se estendia ao longo da costa, numa faixa de 200
a 300 quilômetros de largura desde o Nordeste até o extremo Sul do País, ora avançando pro-
fundamente para o interior, ora alcançando a orla marítima, [...] do sul da Bahia até o vale do
rio Doce. [...] Na vertente oriental da Serra do Mar, havia [...] mata alta e espessa, enleada por
parasitas e lianas, oferecia grande variedade de contrastes em suas grimpadas pela morraria e
descambamento sobre vales profundos, [...] a oeste, a mata se prolonga em galerias, acompa-
nhando o curso dos rios, e se torna mais rala até confluir com os cerrados” (Ribeiro, 1977).
Na classificação fisionômica e florística das províncias de vegetação do Brasil, feita pelo
botânico alemão Carl Friedrich Philipp von Martius em 1824 (Figura 4), a área de ocorrência
do pau-brasil era a Província de Dryades, que designava a hoje conhecida Mata Atlântica ou
Floresta Pluvial Atlântica (Joly et. al., 1999). Dryades ou Dríades foi um nome dado em refe-
rência às divindades imortais Dryas, que eram responsáveis pelos bosques, principalmente de
carvalhos (Fernandes, 2003).
Com a evolução dos estudos fitogeográficos, climáticos e geomorfológicos, outros au-
184
Figura 12.4 – Classificação fisionômica e florística feita por von Martius em 1824 para as províncias de vegetação
do Brasil (Fernandes, 2003)
Ab’Saber (1966, 1970, 1973, 2003) designou o domínio onde ocorre o pau-brasil como
Domínio dos Mares de Morros e Chapadões Florestados do Brasil Atlântico, ou simplesmente
Domínio Atlântico, como um domínio onde predominam morros de formas mamelonares e
chapadões, com as influências climáticas do Oceano Atlântico e que apresentam a cobertura
vegetal predominante de floresta, a Floresta Pluvial Atlântica.
186
Os indígenas brasileiros não tocavam “nas matas senão para o fabrico das flechas, das
lanças, dos tacapes, das pirogas” (Ribeyrolles, 1980). Já os portugueses começaram a explorar
os recursos vegetais por motivos energéticos – lenha e madeira – e alimentares – palmitos e
frutas (Filgueiras & Peixoto, 2002).
De acordo com Urban (1998), o pesquisador Alceo Magnanini estimou, em 1961, as
áreas de florestas primitivas nos estados de ocorrência do pau-brasil, estado do Rio de Janeiro,
limite sul da ocorrência, até o estado do Rio Grande do Norte, limite norte (Rocha, Presotto
& Cavalheiro, 2007), no início do século XVI (Tabela 1).
Tabela 12.1 – Áreas de florestas primitivas nos estados brasileiros de ocorrência do pau-brasil no início do sé-
culo XVI estimadas Alceo Magnanini em 1961.
Estado Área (km2) % do Estado % do Brasil
Rio de Janeiro 41.000 93,02 0,49
Espírito Santo 36.000 90,00 0,42
Bahia 170.000 30,20 2,00
Sergipe 10.000 45,45 0,12
Alagoas 14.000 50,00 0,16
Pernambuco 20.000 20,40 0,23
Paraíba 15.000 26,31 0,18
Rio Grande do Norte 10.000 18,87 0,12
Total 316.000 - 3,72
Fonte: Urban (1998). Organização: Rocha (2004).
A Floresta Atlântica já chegou a ocupar 1.300.000 km2 do Brasil, cerca de 15% de seu
território brasileiro; hoje, restringe-se a menos de 8% de sua área original, aproximadamente
108.800km2 (Conservation Internacional do Brasil, 2000). Dados mais atuais da Conservation
Internacional (2009) indicam uma redução da área original para 99.944 km2, com uma densi-
dade populacional média de 87 habitantes/km2, sendo que a média nacional é de 23 habitan-
tes/km2 (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 2009). A Figura 8 mostra essa variação
de ocupação de área pela Floresta.
188
Figura 12.8 – Variação de ocupação de área pela Floresta Atlântica na região de ocorrência do pau-brasil,
estados do Rio de Janeiro (RJ), Espírito Santo (ES), Bahia (BA), Sergipe (SE), Alagoas (AL), Pernambuco (PE),
Paraíba (PB) e Rio Grande do Norte (RN) – cujos remanescentes estão em verde (Conservation Internacional
do Brasil, 2000)
vários autores.
Depois, com as atividades agrícolas, a cultura da cana-de-açúcar foi “predatória da
natureza, da flora e fauna nordestinas” (Gouvêa, 1998). Mais adiante, em meados do século
XIX, “os fazendeiros de café queimam hoje mais árvores do que antigamente elas caíam, em
um século” (Ribeyrolles, 1980).
Um ofício de 7 de junho de 1798, assinado no Rio de Janeiro pelo conde de Rezende
e provavelmente dirigido à Rainha (Folhas 157 frente a 159 verso do volume 8 do Códice 69,
Arquivo Nacional), evidenciava o conflito entre o interesse da Coroa Portuguesa em conservar
as madeiras de lei e as necessidades dos proprietários de fazendas e engenhos: “[...] entendo
ser da maior importância que conserve cada um nas suas matas os paos de Ley, e especial-
mente os que Vossa Majestade tem mandado reservar para o uso das Armadas Reais; porém
julgo ser de grande prejuízo aos moradores a proibição de fazerem derrubadas nas suas terras
em que se acham algumas madeiras de construção, porque depois de três, até quatro anos
é indispensável fazer as ditas derrubadas, e lançar fogo aos paos cortados, entre os quais
talvez sucederá perderem-se alguns de boa qualidade; mas não havendo outro método para
continuarem as suas plantações nem para diminuírem o grande consumo que se faz de lenha
nas fábricas de açúcar, parece-me conveniente conservar se em seu vigor a cláusula até agora
declarada nas Cartas de Sesmarias permitindo-se também o corte dos mesmos paos para usos
particulares com pleno conhecimento das suas precisões [...]”.
Assim, a ocupação européia e colonizadora fez surgir algumas feitorias e portos que
cresceram, tornaram-se povoados, vilas, arraiáis, cidades e metrópoles, resultando na exis-
tência de 2.528 municípios brasileiros no Domínio Atlântico, 46% do total do Brasil (Conser-
vation Internacional do Brasil, 2000), onde se localizam as principais capitais estaduais (São
Paulo, Rio de Janeiro, Salvador e Recife) e onde vivem, atualmente, mais de 104 milhões de
habitantes, mais da metade da população brasileira estimada para 2007 (Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística, 2009).
As Figuras 9, 10 e 11 mostram a evolução desse povoamento na região de ocorrência
natural do pau-brasil de acordo com Brasil (2000b). A figura 12 mostra a densidade popula-
cional em 2000 (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 2009).
Como conseqüência, as alterações ocorridas no Domínio Atlântico deixaram “rema-
nescentes secundários reduzidíssimos, distribuídos pelos estados que constituem a região
nordeste” do Brasil (Coimbra-Filho & Câmara, 1996).
190
Figura 12.9 – Povoamento da região de ocorrência do pau-brasil no século XVI (Brasil, 2000b)
191
Figura 12.10 – Povoamento da região de ocorrência do pau-brasil no século XVII (Brasil, 2000b)
192
Figura 12.11 – Povoamento da região de ocorrência do pau-brasil no século XVIII (Brasil, 2000b)
193
Figura 12.12 – Densidade populacional na região de ocorrência do pau-brasil, estados do Rio de Janeiro (RJ),
Espírito Santo (ES), Bahia (BA), Sergipe (SE), Alagoas (AL), Pernambuco (PE), Paraíba (PB) e Rio Grande do
Norte (RN), considerando os dados demográficos de 2000 (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 2009)
CONSIDERAÇÕES FINAIS
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