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RESENHA
O PODER SIMBÓLICO
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Mestrando no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Mato Grosso. Cuiabá -
2015.
como a sociologia do sociólogo deve interpretá-los. É uma obra em que Bourdieu apresenta
ao leitor o resultado de suas vastas pesquisas em diversas áreas e ilustra como a teoria
sociológica proposta por ele pode ser aplicada nos diversos fatos sociais.
Nesta resenha, faz-se a opção por destacar três dos conceitos principais presentes na
análise sociológica proposta por Bourdieu, quais sejam campo, capital e habitus. Conceitos
que são expostos pelo autor de maneira esparsa ao longo da obra, com destaque no Capítulo
III em que aborda a gênese dos termos campo e habitus. Assim, sua compreensão é feita a
partir das demonstrações de como tais conceitos, que são entendidos como modus operandi,
se aplicam aos fatos sociais pelo autor descritos.
No primeiro capítulo, abordando o poder simbólico, o autor afirma que os sistemas
simbólicos são instrumentos de conhecimento e comunicação, assim exercem um poder
estruturante, possibilitando conhecer o mundo, por que são estruturados, entendendo o poder
simbólico como um poder de construção da realidade.
A produção simbólica é entendida como instrumento de dominação, relacionada a
ideologia e produzida pela classe dominante – cultura dominante, que une, separa e legitima –
com efeito sobre a classe dominada. Une porque intermedia a comunicação, separa porque é
instrumento de distinção entre as classes e legitima, porque defina as culturas em suas
distinções em relação a dominante. Nesse aspecto, há uma relação de luta em que as classes
sociais concorrem para impor as demais sua visão de mundo. Ocorre que nessa luta a posição
hierárquica da classe, definida pelo seu capital – que Bourdieu estende para além do
econômico, como ver-se-á adiante – define o sucesso nas relações.
Preconiza que o trabalho de pesquisa do sociólogo não deve ser atado pelo método,
embora se recorra a ele, pois se anulariam as possibilidades de compreensão da realidade pela
mera antecipação do fato ao se definir entre esquemas metodológicos. Ao contrário defende a
liberdade do pesquisador, para a partir das observações que sejam feitas as escolhas
metodológicas. Nesse aspecto fala também da construção do objeto, fazendo indicações
contrárias a construção do objeto previamente, pois nesse caso passa-se a análise de um objeto
pré-construído. A respeito do objeto, Bourdieu fala da objetivação participante, assim
definida:
“Mas para tentar converter em preceito positivo todas estas críticas, direi
apenas que é preciso desconfiar das recusas sectárias que se escondem por
detrás das profissões de fé sectárias e tentar, em cada caso, mobilizar todas
as técnicas que, dada a definição do objeto, possam parecer pertinentes e que,
dadas as condições práticas de recolha dos dados, são praticamente
utilizáveis”(Ibidem, p. 26).
Dentro do espaço social, que para Bourdieu é tão material quanto o espaço geográfico,
é que ocorrem as lutas entre integrantes por legitimação de suas crenças, e na dinâmica que
estabelecem por ascender a posições mais elevadas, com o necessário acúmulo de capital,
acabam perpetuando as relações que mantém o campo. Por isso,
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Capital para Bourdieu vai além do capital econômico definido por Marx, que se restringe a materialidade,
alcançando o plano simbólico, onde a posição dos indivíduos dentro de um campo é definida pelo volume de
capital acumulado, com valor simbólico para cada campo. Assim teremos capital cultural, científico, econômico,
tantos quanto sejam os campos e o que tem valor para cada campo e posiciona seus agentes, assegurando-lhe
todas as vantagens e benefícios que se pode ter acumulando-os, e que agora o capital econômico, não se podem
comprar com moeda.
A maneira como se perpetuam as condições de existência de um campo são
explicitadas por Bourdieu da seguinte forma:
“é nas lutas internas – e por meio delas – dos clérigos, lutas em que o que
está em jogo não é nem nunca poderá ser exclusivamente e explicitamente
temporal, que eles mesmos produzem – sem necessariamente as pensarem
como tais – as estratégias adequadas a assegurar as condições econômicas e
sociais da sua própria reprodução social” (Ibidem, p. 76).
Para compreensão do campo partir de sua história é a única forma legítima de análise,
porque sempre há um predecessor antes do percussor, que analisados nas suas relações
revelam as condições de sua existência, sua essência.
“Aquele que tira o chapéu para cumprimentar reactiva, sem saber um sinal
convencional herdado da Idade Média no qual, como relembra Panofsky os
homens de armas costumavam tirar seu elmo para manifestarem as suas
intenções pacíficas. Esta atualização é consequência do habitus, produto de
uma aquisição histórica que permite a apropriação do adquirido histórico”
(Ibidem, p. 82-83).
Comenta que a teoria dos Aparelhos – Igreja, Estado ou Partido – permite “uma
denúncia abstrata do Estado ou da Escola que reabilita os agentes, consentindo que eles vivam
no desdobramento da sua prática profissional e das suas opções políticas” (Ibidem, p. 86). Faz
uma crítica a tal teoria que considera o sujeito como passivo dentro de tais estruturas, pois
para Bourdieu há uma ação do sujeito na perpetuação de tais estruturas, por que delas acredita
se criarem as condições para sua sobrevivência, por força do habitus que lhe foi incorporado.
Para Bourdieu a definição de classe como objeto estático não corresponde à realidade,
o que existe “é um espaço de relações qual é tão real como um espaço geográfico, no qual as
mudanças de lugar se pagam em trabalho, em esforços e sobretudo em tempo (ir de baixo para
cima é guindar-se, trepar e trazer as marcas e estigmas desse esforço)” (Ibidem, p. 137).
Assim, todo esforço por quantificar, identificar, diferenciar classe assemelha-se ao trabalho
taxonômico, e que nesse sentido desconsidera a dinâmica real do espaço social.
Neste capítulo encontra-se uma definição bastante esclarecedora do capital, que como
dito anteriormente, Bourdieu expande para além do econômico.
Para exemplificar o acúmulo de capital, que à maneira do econômico também pode ser
acumulado e pelo estado é defendido inclusive juridicamente, temos o poder de nomeação,
pelo qual a justiça e o estado com seus atos escritos estabelecem normas, temos a constituição
do capital acadêmico, que acumulado pelos agentes do campo acadêmico lhes confere poder e
benefícios sobre os demais.
Assim, temos tanto universidades como institutos federais, cada qual no seu campo, e
dada a reforma também sofrida pela Rede de EPT, entrando em parte no campo das
universidades sob condições inferiores – pois não possui o habitus científico e seu capital na
educação profissional técnica não é transferido para o campo onde atuam as universidades,
atuando pela perpetuação das condições do campo: disputa entre os integrantes por posições
de prestígio dentro da hierarquia, pelo acúmulo de capital – econômico, cultural, científico – e
condições de existência.
BOURDIEU, Pierre. A Dominação Masculina Rio de Janeiro: Editora Bertrand Brasil, 2003,
p 64. Wikipedia – acesso em 29 de maio 2015, disponível em
http://pt.wikipedia.org/wiki/Habitus