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INSTITUTO DE GEOCIENCIAS
PROGRAMA DE PÓS -GRADUAÇAO EM GEOCIÊNCIAS
INTRODUÇÃO À
EPISTEMOLOGIA
© RUALDO MENEGAT
rualdo.menegat@ufrgs.br
Porto Alegre
2014
“[...] a razão só discerne o
que ela mesma
produz segundo seu
projeto [...]”
APRESENTAÇÃO
Além disso, o próprio sucesso da ciência parece ser também ele uma
cortina para obscurecer a reflexão sobre a metodologia científica. Se o
resultado está dando certo, então o método para obtê-lo está
automaticamente justificado: ―para que discutir se dá certo?‖. Devido a esse
triplo bloqueio, a Epistemologia tem sido, via de regra, descartada como uma
área importante para a fabricação da ciência, o que seria impensável para os
primeiros cientistas do século XVII, como Galileu Galilei, Francis Bacon ou
René Descartes, para quem ―fazer a ciência‖ era indissociável de ―pensar a
ciência‖.
SUMÁRIO
3. REFERÊNCIAS 62
2 Para Watkins (1990, p. 14) ―Os filósofos usam frequentemente o termo 'conhecimento' como
uma palavra-sucesso; mas, neste livro, o termo será usado para denotar certo corpo
organizado de saber sem a implicação de estar livre de erro‖.
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10
Esta palavra designa a filosofia das ciências, mas com um sentido mais
preciso. [...] essencialmente é o estudo crítico dos princípios, das
hipóteses e dos resultados das diversas ciências, destinado a
determinar sua origem lógica (não psicológica), seu valor e seu alcance
objetivo. (Lalande, 1960[1926], p. 293)
Adotaremos aqui uma definição que procura delimitar a epistemologia
como disciplina distinta daquelas citadas como sinônimos, embora
assumimos que nem sempre as fronteiras entre elas são fixas, situada no
contexto intracientífico e enunciada de forma concisa e precisa em Greimas &
Courtés (1992):
Epistemologia é a análise dos axiomas, das hipóteses e dos
procedimentos, e mesmo dos resultados que especificam uma dada
ciência: com efeito, ela se propõe como objetivo examinar a organização
e o funcionamento das abordagens científicas e apreciar-lhes o valor.
Assim concebida, a epistemologia não poderia ser confundida nem com
a metodologia nem com a teoria do conhecimento (ou gnosiologia) - às
vezes denominada também epistemologia -, que estuda a relação entre
sujeito e objeto do ponto de vista filosófico. (Greimas & Courtés, 1992,
pp. 152-153)
Filosofia ou Teoria do
conhecimento
(a) F ILOSOFIA DA CIÊNCIA
-
(c) CIÊNCIA
CONHECIMENTO COMUM
No sentido desse quadro, epistemologia poderá ser lida por alguns como
um equivalente ou de metaciência, quando tratar um assunto de modo mais
técnico em relação à ciência, colocando-se desse modo como atividade no
caminho do próprio cientista, que às vezes o faz sem sabê-lo; ou de Filosofia
da Ciência, quando for mais externo e, nesse caso, será um conceito muito
mais flexível podendo expandir-se, no limite, até a esfera da teoria do
conhecimento enquanto um todo. Blanché (1988, p. 42) qualifica a
epistemologia interna como obrigatória, porque "é exigida por problemas que
se colocam no interior da ciência", sendo, portanto, um estudo mais preciso e
mais técnico em relação à ciência que problematiza; e, a externa, como
facultativa porque "é praticada deliberadamente em seguida a uma decisão
arbitrária", sendo mais filosófica e, nesse caso, pode estudar qualquer forma
de conhecimento.
Isto não acontece por efeito de uma moda passageira, mas porque as
crises recentes que abalaram as diversas ciências e as revoluções por
que tiveram de passar obrigaram aqueles que as praticavam a
efetuarem um retorno aos seus princípios e a interrogarem-se sobre os
seus fundamentos. (Blanché, 1988, p. 22-23.)
com base nas definições de Greimas & Courtés (1992) no qual temos, abaixo
da linha tracejada, a atividade tida como mais comum na ciência e, acima, a
atividade epistemológica.
EPISTEMOLOGIA - NÍVEL 4
METODOLOGIAS - NÍVEL 3
DESCRIÇÃO - NÍVEL 2
OBJETO - NÍVEL 1
0 Fatos
Com efeito, temos que reconhecer que existe mais um campo de tensão
– o da recorrência histórica – sem o qual nosso esboço para definir o objeto e
o conceito da epistemologia eivar-se-ia de dinamicidade. Tal recorrência
histórica pode operar em três níveis de simultaneidade não desconexos: no da
história da própria ciência; no da história do conceito de conhecimento e de
ciência; e no da história da humanidade.
4 Protágoras (480-410 a.C. apud História do Pensamento, 1987, v. 1, p. 46). Esse pensador
grego é considerado o primeiro sofista, e o aforismo completo é "O homem é a medida de
todas as coisas, das que são enquanto são e das que não são enquanto não são." Tal ideia
demarca aquilo que pertence ao mundo natural daquilo que pertence ao mundo dos
homens.
23
Nesse sentido, a ciência pode tanto ser estudada no seu aspecto atual,
como no seu devir histórico desde o seu surgimento. Um estudo é intemporal
e, o outro, temporal. Esse corte acaba aproximando a epistemologia da
história da ciência. E de fato, não existe um sem o outro, pois "não há história
das ciências que não seja epistemológica, não existe reciprocamente
epistemologia que não seja histórica"5. Contemporaneamente, estudos
epistemológicos vinculados à história da ciência têm sido os mais amplamente
empregados. Os vantajosos aspectos metodológicos envolvidos são assim
avaliados por Popper:
Essa dúvida, levantada desde a antiga Grécia por Platão na sua obra
Teeteto, pode ser considerada como originadora da epistemologia, no sentido
geral de teoria do conhecimento. [Ver Para saber mais]
BEM
c
IDEIAS DIALÉTICA [noêsis]
MUNDO CIÊNCIA
INTELIGÍVEL OBJETOS e CONHECIMENTO episteme
MATEMÁTICOS MATEMÁTICO [diânoia]
b
OBJETOS CRENÇA [pistis]
SENSÍVEIS
MUNDO d OPINIÃO
SENSÍVEL SOMBRAS ILUSÃO, CONJECTURA doxa
a
Figura 3.
8 Esse esboço foi modificado de Platão, 1987, p. xix e xx, e de História do Pensamento, 1987,
v. 1, p. 66.
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que não pode dissociar-se de sua permanente divulgação, sob pena de não ser
entendido por aqueles que, aprisionados pelo mundo das aparências na vida
comum, não podem buscar a verdade. (Ver Para saber mais)
[...] não haveria tal coisa como a realidade, pois, se houvesse, não
poderíamos saber dela, e que mesmo que pudéssemos conhecê-la, não
poderíamos comunicar nosso conhecimento acerca dela. (Gorgias [487-
380 a.C.] apud Hamlyn, 1967.)
Com efeito, a ideia clara de Descartes ―penso, logo existo‖ (cogito ergo
sum) era tida como verdadeira e, portanto, ideias claras semelhantes, também
haveriam de ser. A verdade é obtida por um processo do pensamento feito com
um método capaz de assegurá-la, pois o mundo exterior não fornece garantias
para a certeza do conhecimento. Tal verdade é, então, apriorística e
dogmática.
De outro lado, Hume declara que a certeza só pode ser uma crença
pois:
dará muito trabalho aos filósofos durante séculos inteiros; e como viver,
atuar, lutar e morrer quando somente contamos com conjecturas dará
trabalho mais que suficiente aos futuros filósofos de política e
pedagogos.(Lakatos, 1987, p. 24.)
10 Cf. Meotti (1984), que faz um extenso balanço crítico do empirismo lógico.
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a bandeira do ‗Positivismo‘.‖
―Os velhos positivistas só desejavam admitir como científicos os conceitos
(ou noções, ou ideias) que, como diziam, 'derivassem da experiência', ou
seja, os conceitos que acreditavam ser logicamente redutíveis a elementos
da experiência sensorial, tais como sensações (ou dados sensoriais),
impressões, percepções, lembranças visuais auditivas, e assim por diante.‖
11 Ver Lakatos & Musgrave (1979), onde são relacionadas as principais antinomias sobre o
tema na atualidade desenvolvidas no colóquio Internacional de Filosofia da Ciência,
realizado em Londres em 1965; também em Harré (1976), onde são coligidos os textos dos
participantes da conferência promovida pela Herbert Spencer lectures em 1973, em Oxford.
51
Progresso da Fator de
Escola Critério de Demarcação
Ciência mudança
Falseabilidade-
POPPER Contínuo Intracientífico
Dedutivismo
12 Ver o extenso estudo de Paolo Rossi (2006), Fancis Bacon, da magia à ciência.
53
Coloca-se de início uma regra suprema, que serve como uma espécie de
norma para decidir a propósito das demais regras e que é, por isso, uma
regra de tipo superior. É a regra que afirma que as demais regras do
processo científico devem ser elaboradas de maneira a não proteger
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56
13
61
Assim, a partir dos debates entre Popper, Lakatos e Kuhn, entre outros,
define-se o contexto da assim chamada Nova Epistemologia, no qual não
apenas as questões metodológicas, mas também os contextos sociais,
econômicos e culturais são considerados para entender a natureza do
conhecimento científico.
3. REFERÊNCIAS
Feyerabend, Paul 16, 25, 55, 62, 63, 64, 69 Kant, Immanuel ...................................... 2
filosofia, da ciência.... 7, 11, 12, 13, 14, 15, Kant, problema de .............. 5, 7, 27, 36, 43
6, 18, 20, 55, 64, 68, 70, 71 Koyré, ALexandre .................................. 25
distribuída ....................................... 25 Kuhn, Thomas ...... 6, 8, 25, 27, 55, 62, 63,
de tradição anglicana ....................... 14 64, 68, 70
de tradição italiana .......................... 14 Lakatos, Imre ...6, 8, 16, 25, 27, 36, 37, 55,
espontânea .............................. 4, 19, 69 59, 61, 63, 64, 65, 66, 67, 68, 70, 71
de tradição francesa .......................... 14 Laplace, demônio de ................................ 4
física atômica........................................ 31 lei, da ciência ........................................ 21
formalismo lógico .................................. 25 da experiência ................................... 53
Foucault. Michel. .................................. 26 universal ......................................44, 45
Fries, Jakob .......................................... 34 Leibniz, Gottfried W.. ............................ 32
Fries, trilema de ..................... 7, 33, 34, 35 linguagem ..... 19, 24, 31, 34, 35, 40, 47, 48
Galilei, Galileu ... 3, 7, 8, 38, 40, 42, 43, 45, Locke, John .......................................... 32
52, 53, 70 lógica da ciência ...............................11, 18
generalização ....................... 35, 41, 54, 56 Londres ..................................... 55, 70, 71
geologia ....................................... 7, 23, 65 Losee, John .......................................... 20
Geymonat, Ludovico ..... 12, 16, 17, 22, 23, Lyell, Charles ........................................ 65
70, 71 Marte .................................................... 49
gnosiologia....................... 7, 11, 13, 14, 15 Maxwell, James C. ............................ 4, 39
Gorgias ...................................... 28, 31, 32 Mercúrio ............................................... 49
Gramsci, Antonio ............................. 19, 70 metaciência .....................................11, 16
Grécia.............................................. 12, 28 metafísica .... 23, 39, 40, 43, 45, 46, 47, 48,
Habermas, Jürgen ....................... 7, 31, 70 51, 54
hábito ................................................... 33 meta-histórico ....................................... 23
Hamlyn, David W. ................................. 13 método, científico ......................... 3, 41, 65
Harré, Rom ........................................... 12 do verificacionismo ........................... 46
Heráclito ............................................... 28 indutivo ................................ 33, 56, 58
Herschel, John ..................................... 65 metodologia ......... 3, 15, 16, 17, 19, 65, 71
heurística, ................................. 66, 67, 68 Mill, John Stuart ..............................32, 65
negativa ...................................... 66, 67 mito da caverna ................................ 7, 30
positiva .................................. 66, 67, 68 Mizusaki, Ana Maria ............................... 6
Hilbert, David. ...................................... 16 modus ponens ....................................... 67
Hiroshima............................................. 31 modus tollens ...................................66, 67
história da ciência24, 35, 36, 42, 64, 65, 68 Monod, Jacques .................................... 25
história da Terra .............................. 51, 72 mundo inteligível .................................. 29
Hume, David32, 33, 35, 41, 42, 44, 45, 50, 70 mundo sensível .......................... 29, 32, 46
Hume, problema de ...... 5, 7, 27, 28, 50, 54 Nazi-fascismo ........................................ 46
ideal arquimediano ............................... 38 Newton, Isaac. ..................... 22, 39, 52, 53
imagem, da realidade ............................ 40 Nova Epistemologia .......... 3, 5, 6, 8, 55, 68
do mundo ........................................ 40 Novo Mundo ......................................... 40
incomensurabilidade, entre teorias ........ 62 objeto geológico ..................................... 23
indagação científica .............................. 21 obstáculo epistemológico ..................27, 47
infalibidade ........................................... 28 paradigma .......... 8, 10, 23, 27, 41, 42, 55,
instância prerrogativa ........................... 58 62, 63, 65
International Commission on the Parmênides ........................................... 28
History of Geological Sciences percepção ........................................33, 48
(INHIGEO) ........................................... 4 Piaget, Jean. ......................................... 26
intracientífico ................ 11, 15, 17, 19, 21 Pitágoras .............................................. 28
juízo, hipotético .................................... 67 placa litosférica ................................39, 67
a priori ........................................ 44, 53 Platão ................ 22, 28, 29, 30, 32, 46, 71
analítico ........................................... 45 Playfair, John ....................................... 23
da percepção .................................... 48 Poincaré, Henri. .................................... 16
sintético .................................. 8, 45, 53 polarização ciência-filosofia ................... 25
I N T R O D U Ç Ã O À E P I S T E M O L O G I A
68
Popper, Karl ..... 5, 8, 16, 17, 18, 24, 25, 27, Sneed, Joseph D. .................................. 64
34, 35, 36, 43, 48, 49, 50, 51, 52, 53, Sociedade Brasileira de História da
54, 55, 59, 60, 61, 63, 64, 66, 68, 71 Matemática ......................................... 4
positivismo lógico ....................... 46, 48, 51 Sociedade Brasileira de História da
praxiologia científica .............. 3, 11, 18, 27 Medicina ............................................. 4
Prigogine, Ylia ...........................................3 Sociedade Brasileira de História das
probabilidade ................... 8, 12, 49, 50, 51 Ciências .............................................. 4
probabilismo da verificação ................... 49 sociologia .............................................. 62
problema da indução .... 5, 7, 8, 27, 28, 35, Sócrates...........................................30, 52
41, 59 Sofistas ................................................. 28
programa, de pesquisa ... 27, 65, 66, 67, 68 Spinoza, Baruch ................................... 32
falseacionista ................................... 35 Stegmüller, Wolfgang .......................64, 72
kantiano .......................................... 44 Stengers, Isabelle .................................... 3
progresso científico ..... 5, 8, 27, 55, 56, 58, tábuas da descoberta ................... 8, 57, 58
61, 65 Tales de Mileto ...................................... 28
Protágoras ............................................ 23 Tarski, Alfred ........................................ 46
protocolo observacional ......................... 47 tática de pesquisa ................................. 20
pseudociência ............................ 36, 48, 54 Tectônica de Placas ............................... 67
psicologia, da descoberta....................... 63 Teeteto, de Platão .................................. 28
psicologismo ......................................7, 34 teoremas dos sistemas dedutivos ........... 38
Quine, Willard ................................. 25, 46 teoria, ........ 7, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16,
racionalidade ............................. 48, 61, 68 19, 23, 25, 28, 43, 47, 50, 51, 52, 53,
racionalismo crítico .............. 35, 46, 52, 55 54, 59, 60, 63, 67
recorrência histórica ........................ 21, 27 da ciência..................................... 9, 10
regressão infinita ............................. 34, 35 do conhecimento .. 7, 10, 11, 12, 13, 14,
Reichenbach, Hans .................... 16, 25, 46 15, 16, 28, 51
representação metalinguística ............... 19 empirista.......................................... 61
República, de Platão ......................... 29, 30 popperiana ....................................... 61
requisito extralógico .............................. 37 tradição, Ocidental ................................ 28
revolução científica .... 8, 38, 60, 62, 63, 70 epistemológica .................................... 5
Rossi, Paolo ..................................... 57, 72 Vênus ................................................... 49
Russel, Bertrand. .................................. 25 Whewell, William ................................... 65
Schlick, Moritz. ..................................... 16 Wittgenstein, Ludwig ........................25, 46
Serres, Michel ....................................... 17 Xenófanes ......................................... 8, 51
silogismo ......................................... 37, 58 Zenão ................................................... 28