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Do fordismo à acumulação flexível


David Harvey

Em retrospecto, parece que havia indícios de problemas sérios no fordismo já em meados dos
anos 1960. Na época, a recuperação econômica da Europa Ocidental e do Japão tinha se completado,
seu mercado interno estava saturado e o impulso para criar mercados de exportação para os seus
excedentes de capital tinha de começar. (...) O consequente enfraquecimento da demanda de
consumo foi compensado nos EUA pelo combate à pobreza interna e pela guerra do Vietnã. Mas a
queda da produtividade e da lucratividade das empresas depois de 1966 marcou o começo de um
problema fiscal nos EUA que só seria sanado às custas da impressão de moeda, cujo efeito colateral
foi a aceleração da inflação e a inviabilização do dólar como moeda-reserva internacional estável. (...)
Foi também perto dessa época que as políticas de substituição de importações em muitos países do
Terceiro Mundo (da América Latina em particular), associadas ao primeiro grande movimento das
multinacionais na direção da manufatura no estrangeiro (no Sudeste Asiático em especial), geraram
uma onda de industrialização fordista competitiva em locais inteiramente novos, nos quais o contrato
de trabalho e as leis trabalhistas eram fracamente respeitados ou inexistentes. Daí por diante, a
concorrência internacional se intensificou à medida que a Europa Ocidental e o Japão, seguidos por
vários países recém-industrializados, desafiaram o domínio estadunidense no âmbito do fordismo a
ponto de fazer cair por terra o acordo de Bretton Woods e de produzir a desvalorização do dólar.
De modo mais geral, o período de 1965 a 1973 tornou cada vez mais evidente a incapacidade
do fordismo e do keynesianismo de conter as contradições próprias ao capitalismo. Na superfície,
essas dificuldades podem ser melhor explicadas por uma palavra: rigidez. No fordismo, havia
problemas com a rigidez dos investimentos em larga escala e de longo prazo em sistemas de
produção em massa que impediam maior flexibilidade de planejamento empresarial e necessitavam
de crescimento estável e sem variações negativas na demanda de consumo. Havia muita rigidez no
mercado de trabalho e nos contratos de trabalho estabelecidos – especialmente em grandes
empresas e transnacionais –, os quais dificultavam, por exemplo, demissões ou reduções na jornada
de trabalho com reduções de salário. E toda tentativa de superar esses problemas de rigidez
encontrava a força aparentemente invencível da classe trabalhadora – o que explica as ondas de
greve e os problemas trabalhistas do período 1968-1972. A rigidez dos compromissos do Estado foi se
intensificando à medida que programas de seguridade social (saúde, previdência e assistência social)
e direitos de pensão aumentavam sob pressão para manter a estabilidade política em um momento
em que a rigidez na produção dificultava expansões da base fiscal (aumento de impostos) para
propiciar gastos públicos.
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(...) Somaram-se a esses problemas os efeitos da decisão da Organização dos Países


Exportadores de Petróleo (OPEP) de aumentar os preços do petróleo e da decisão dos países árabes
de impedir as exportações de petróleo para o Ocidente durante a guerra árabe-israelense de 1973.
Isso mudou o custo da energia de maneira dramática, levando todos os segmentos da economia a
buscarem modos de economizar energia através da mudança tecnológica e organizacional.
(...) Ao mesmo tempo, as grandes empresas estadunidenses estavam com suas fábricas e
equipamentos ociosos, o que revelava sua capacidade excedente inutilizável em condições nas quais
a competição com as empresas estrangeiras aumentava ainda mais. Isso obrigou as empresas dos
EUA a entrar em um período de reestruturação e intensificação do controle da classe trabalhadora. A
mudança tecnológica, a automação, a busca por novas linhas de produto e novos nichos de mercado,
a dispersão geográfica para zonas de controle do trabalho mais fácil, as fusões e medidas para
acelerar o tempo entre a produção dos produtos e o seu consumo (buscando-se garantir o retorno
mais rápido dos investimentos) ocuparam as prioridades das estratégias das empresas para
sobreviver em meio à profunda crise do capitalismo.
A profunda recessão de 1973, aumentada com as crises do petróleo, impunha ao mundo
capitalista buscar se livrar da quase paralização na produção de bens e a alta inflação de preços
(fenômeno conhecido como “estagflação”) e fez com que se levasse adiante um conjunto de
processos que deveriam mudar a acumulação de capital baseada nos sistemas de produção e de
organização do trabalho fordistas. Em consequência, as décadas de 1970 e 1980 foram um difícil
período de reestruturação econômica e de reajustamento social e político. Em meio a todas as
incertezas criadas, uma série de novas experiências podem representar a passagem para um regime
de acumulação do capital inteiramente novo, associado a um sistema de regulamentação política e
social diferente do keynesiano.
A esse novo regime de acumulação chamarei de acumulação flexível. Ela é marcada por um
confronto direto com a rigidez do fordismo. Ela se apoia na flexibilidade dos processos de trabalho,
dos mercados de trabalho, dos produtos e dos padrões de consumo. Caracteriza-se pelo surgimento
de setores de produção inteiramente novos, novas maneiras de fornecimento de serviços financeiros,
novos mercados e, sobretudo, altas taxas de inovação comercial, tecnológica e organizacional. A
acumulação flexível envolve rápidas mudanças nos investimentos em diferentes locais, com áreas do
mundo prósperas podendo surgir, ao passo que outras podem entrar em profunda crise. Ou seja,
cria-se um intenso movimento na ampliação do chamado setor de serviços, bem como conjuntos
industriais de alta tecnologia completamente novos em regiões até então subdesenvolvidas (tais
como os vários vales e gargantas do silício, para não falar do forte aumento de novas atividades
econômicas em países recém-industrializados, como a Coréia do Sul). A tomada de decisões tanto das
empresas privadas quanto das instituições de Estado se acelera, sobretudo devido à ampliação da
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comunicação via satélite e a queda de custos de transporte, possibilitando cada vez mais a difusão
imediata dessas decisões.

Disponível em: HARVEY, David. Do fordismo à acumulação flexível. In.: HARVEY, David. A condição
pós-moderna. São Paulo: Loyola, 2005. p.135-140. Adaptado.

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