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uma abordagem social

Alexandra Marcella Zottis


Denise Russo
Margarete Panerai Araujo
(organizadoras)
SUSTENTABILIDADE
uma abordagem social
Associação Pró-Ensino Superior em Novo Hamburgo - ASPEUR
Centro Universitário Feevale

Instituto de Ciências Sociais e Aplicadas - ICSA

SUSTENTABILIDADE
uma abordagem social

Alexandra Zottis
Denise Russo
Margarete Panerai Araújo
(organizadoras)

Novo Hamburgo - Rio Grande do Sul - Brasil

2009
PRESIDENTE DA ASPEUR EDITORA FEEVALE
Argemi Machado de Oliveira - Coordenação
Celso Eduardo Stark
REITOR DO CENTRO UNIVERSITÁRIO - Analista de editoração
FEEVALE Maiquel Délcio Klein
Ramon Fernando da Cunha - Assistentes de editoração
Helena Bender Hennemann
COORDENAÇÃO EDITORIAL Maurício Barth
Inajara Vargas Ramos Moris Mozart Musskopf

REALIZAÇÃO EDITORAÇÃO ELETRÔNICA E CAPA


ICSA - Instituto de Ciências Sociais e Aplicadas Helena Bender Hennemann
Coordenador Juarez Buriol

REVISÃO
Valéria Koch Barbosa

DADOS INTERNACIONAIS DE CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO (CIP)


Centro Universitário Feevale, RS, Brasil

Sustentabilidade : uma abordagem social / Alexandra Zottis, Denise Russo,


Margarete Penerai Araujo (organizadoras). – Novo Hamburgo: Feevale,
2009.
128 p. ; 21 cm.

ISBN 978-85-7717-080-7

1. Sustentabilidade. 2. Desenvolvimento sustentável. 3. Conservação da


natureza – Aspectos sociais. I. Zottis, Alexandra. II. Russo, Denise. III.
Araujo, Margarete Penerai.

CDU 504.06

Bibliotecária responsável: Lílian Amorim Pinheiro – CRB 10/1574

© Editora Feevale – TODOS OS DIREITOS RESERVADOS – É proibida a reprodução total ou parcial de


qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei n.º 9.610/98) é crime estabelecido
pelo artigo 184 do Código Penal.

CENTRO UNIVERSITÁRIO FEEVALE


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Fone: (51) 3586.8800 – Homepage: www.feevale.br
Apresentação

A questão social figura, neste novo milênio, como uma preocupação


universal que envolve chefes da maioria das nações, das Organizações Não-
governamentais – ONG's, assim como das administrações regionais e
locais e da sociedade civil preocupada com a qualidade de vida no planeta e
na comunidade.
Os debates sobre “desenvolvimento sustentável”, que tomam corpo
desde a década de 80, apresentam duas linhas de pensamento relacionadas
com a gestão das atividades humanas: uma centrada nas metas de
desenvolvimento e outra, no controle dos impactos negativos das
atividades humanas sobre o meio ambiente. O significado da palavra
desenvolvimento, contida na expressão “desenvolvimento sustentável”, pode
ser associado ao conteúdo da Declaração Universal dos Direitos Humanos
das Nações Unidas. Nesta, tal palavra diz respeito ao direito de todos de
desfrutar um nível de vida adequado em termos de saúde e bem-estar, o que
inclui a alimentação, o vestuário, a moradia e a assistência médica, bem
como os serviços sociais necessários. A Declaração Universal dos Direitos
Humanos, o relatório “Nosso Futuro Comum”, assim como documentos
subseqüentes, sublinham que as metas de desenvolvimento devem incluir o
direito de votar em um contexto de estruturas de governo representativas.
A questão ambiental, como questão social e ecológica, ampliou-se a partir
das preocupações com o efeito estufa e o aumento dos estragos que os
homens fazem no meio ambiente, levando chefes de Estado de diversos
países a se encontrarem a fim de discutir e buscar soluções para o problema.
O livro “Sustentabilidade: uma abordagem social” foca ações sociais
que promovam a responsabilidade como uma das preocupações dos
autores, que incorporam nas suas pesquisas uma reavaliação dos modos
de produção, de consumo e mesmo de investimento na criação de novas
tecnologias, os quais possibilitem a harmonia entre as organizações e o
meio ambiente.
O objetivo central visa a reestruturar as atividades econômicas, a
ética, a postura prática e as tomadas de decisões pouco atentas às
realidades socioambientais – para uma nova visão da relação entre as
atividades econômicas, as políticas dos homens e os diversos
compartimentos do ecossistema.
Esta obra começa estabelecendo uma relação de recomendações
sobre a responsabilidade empresarial, a inovação, o turismo como alavanca
do desenvolvimento, passando pela governança corporativa, a crise do
Estado, o conhecimento e os indicadores de sustentabilidade, trazendo a
experiência de anos dos autores, dedicados ao tema e a projetos
relacionados ao desenvolvimento sustentável.
Por fim, esperamos que, para os leitores, o que está contido nesta obra
sirva para aprender sobre as experiências ora relatadas, associadas às
próprias vivências empíricas, com vistas a seguir na busca da melhora da
qualidade de vida da população.

Prof. Juarez Buriol


Diretor do Instituto de Ciências Sociais Aplicadas
Centro Universitário Feevale
Sumário

Introdução .......................................................................................................... 9

A responsabilidade social empresarial e a sustentabilidade das empresas ..... 13


Dagoberto Lima Godoy

Do welfare state ao Estado-agência .................................................................. 25


Fernando Luís Schüler

Sustentabilidade e os novos parâmetros de Responsabilidade Social ........ 39


Denise Ries Russo e Margarete Panerai Araújo

Inovação e Conhecimento: desafios para a Sustentabilidade ...................... 51


Ernani César de Freitas

Sustentabilidade e Turismo: Reflexões e Perspectivas


para o desenvolvimento .................................................................................. 67
Mary Sandra Guerra Ashton

O Conhecimento como paradigma da Sustentabilidade Organizacional ..... 85


Eunice Maria Nazarethe Nonato, Jucelaine Bitarello e Tarcisio Staudt

Desenvolvimento Sustentável: indicadores de sustentabilidade nos


aspectos social, econômico e ambiental, como ferramenta para
gestão pública local ........................................................................................ 109
Alberto de Souza Rossi e Sérgio Carvalho
Alexandra Zottis, Denise Russo e Margarete Panerai Araújo (organizadoras)

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Sustentabilidade: uma abordagem social

Introdução

Estamos vivendo o desafio da sustentabilidade. Nota-se que o


conceito engloba inúmeras variáveis e diferentes relações com as
dimensões da economia, da política, da cultura, da inovação, do ambiental e
do social. A educação, porém, ensinou-nos a fragmentar todas essas idéias e
separá-las como coisas de diferentes áreas, em diferentes momentos
históricos. Segundo Morin (1998), separamos os objetos de seus contextos
e a realidade em disciplinas compartimentadas umas em relação às outras.
Mas sabemos, também, que a realidade é feita de laços e interações, e o
conhecimento adquirido é incapaz de perceber essa separação e essa
complexidade do mundo real. Nesse sentido, caracterizar a
sustentabilidade, em nossa sociedade organizada/organizadora, é
compreender, portanto, essas relações e combinações possíveis. As
variáveis trabalhadas neste livro destacam diferentes manifestações da
sustentabilidade através de uma obra de caráter didático e acessível,
fornecendo instrumentação teórica básica para estudos em vários campos.
O livro reúne diferentes autores com suas análises sobre as novas correntes
voltadas ao estudo da sustentabilidade e seus aspectos sociais. Assim, segue
um rápido resumo dos artigos reunidos.
Dagoberto Lima Godoy apresenta os enfoques mais recentes da
Organização Internacional do Trabalho (OIT) e da Organização
Internacional dos Empregadores (OIE), bem como as discussões sobre os
rumos da sociedade na busca da sustentabilidade. Expõe, de forma didática,
os desafios da sustentabilidade na ótica dessas grandes organizações
internacionais.

09
Alexandra Zottis, Denise Russo e Margarete Panerai Araújo (organizadoras)

Fernando Luis Schüler apresenta, em seu artigo, argumentos e as


conseqüências da chamada “crise do Estado”, identificando o surgimento e
a consolidação gradativa de um novo tipo de organização da esfera pública,
que se poderia chamar de Estado-Agência, em oposição ao velho modelo
do welfare state. Nesse novo modelo, centra que o foco da atuação do setor
público é gerar as condições adequadas para a emancipação dos cidadãos
em relação às redes de proteção governamentais. Da mesma forma, trata-se
de um modelo de estado que confere um papel crescente às organizações
civis voluntárias e sem fins lucrativos na execução dos mais diversos tipos
de serviços públicos e de ações afirmativas.
Denise Russo e Margarete Panerai Araújo abordam a relevância e
a necessidade do alinhamento da responsabilidade social e da
sustentabilidade como um novo desafio empresarial. O artigo reúne alguns
dados conceituais, destacando a governança corporativa como um
conjunto de mecanismos que vem sendo utilizado pelas grandes
corporações. Pode-se considerar, finalmente, que a responsabilidade social
e a sustentabilidade aprimoraram novos mecanismos de gestão.
Ernani César de Freitas traz como proposta a reflexão do tema
inovação, conhecimento e a sustentabilidade na sociedade, sem perder de
vista as especificidades pelas quais as organizações estão passando nos
tempos atuais. Explora, ainda, a pertinência da discussão acerca do tema de
cunho humanista, separando a inovação dos processos tecnológicos e das
atividades empresariais.
Mary Sandra Guerra Ashton oferece uma reflexão acerca da relação
que pode existir entre sustentabilidade, turismo e desenvolvimento, com o
objetivo de revelar as convergências entre as três categorias sob uma
perspectiva de importância sócio-ambiental e o desenvolvimento
econômico voltado para o bem-estar da população. Sua sustentação teórica
destaca características intrínsecas e conceituais específicas de cada área,
sugerindo interfaces complementares, promovendo o diálogo e buscando
os vetores comuns dessa trilogia.
Eunice Maria Nazarethe Nonato; Jucelaine Bitarello e Tarcisio
Staudt resgatam o conhecimento compreendido como mola propulsora da
sustentabilidade organizacional. O estudo compreende a aprendizagem
organizacional e aborda o binômio treinamento (capacitação) e
conhecimento. Esse binômio é produzido e absorvido por três agentes
básicos: o indivíduo, o grupo (equipe) e a organização. O estudo possibilita
que sejam identificadas variáveis que permitem perceber diferenças no
decorrer dos períodos abordados.

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Sustentabilidade: uma abordagem social

Alberto de Souza Rossi e Sérgio Carvalho apresentam questões


sobre o desenvolvimento e a forma como ele se relaciona com os
indicadores de sustentabilidade, envolvendo as dimensões sociais,
econômicas e ambientais. Com base nessas dimensões, diferentes
ferramentas utilizadas e aplicadas contribuíram para a gestão pública local.
Um cenário de referências é proposto para ilustrar a análise de acordo com
o tema apresentado, procurando proporcionar um mapa de discussões
acerca da sustentabilidade.
Com base no desafio da sustentabilidade e seus conceitos e suas
dimensões busca-se, portanto, os laços e interações desse conhecimento e
das suas diferentes combinações. Deseja-se frisar agradecimentos à
CaixaRS, Agência de Fomento do estado do Rio Grande do Sul, através do
grande apoio oferecido às organizadoras para efetuarem esta publicação.
Também agradecimentos à editora Feevale, a qual acolheu, novamente,
mais um trabalho em torno da temática social, do desenvolvimento, da
responsabilidade e da sustentabilidade.

Dra. Margarete Panerai Araujo

Patrocinador: CAIXARS –
Agência de Fomento do Estado do
Rio Grande do Sul

Organizadoras desta publicação:


Alexandra Zottis
Denise Russo
Margarete Panerai Araújo

11
Alexandra Zottis, Denise Russo e Margarete Panerai Araújo (organizadoras)

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Sustentabilidade: uma abordagem social

A responsabilidade social
empresarial e a sustentabilidade
das empresas
1
Dagoberto Lima Godoy

Nunca será demais ressaltar a importância da empresa como principal


fonte de crescimento e emprego. O que impulsiona o crescimento
econômico é, antes e acima de tudo, a criatividade e a árdua labuta dos
empresários e dos trabalhadores. Movidas pela busca de lucros, as
empresas inovam, investem e geram emprego e rendas derivadas do
trabalho (OIT, 2007).

Este artigo tem um único propósito: aportar os enfoques mais


recentes da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e da
Organização Internacional dos Empregadores (OIE) à discussão sobre os
rumos que a sociedade está desafiada a encontrar na busca da
sustentabilidade de nosso (pequeno) mundo ─ ora, inquestionavelmente,
em evidente situação de risco. E, ao fazer isso, expô-los de forma, tão
sucinta quanto didática, adaptada ao espaço oferecido pelos organizadores
do livro. Daí o uso de figuras e quadros, a par das citações selecionadas
dentre os extensos documentos indicados nas referências bibliográficas.
Na 96ª Conferência Internacional do Trabalho (CIT), realizada em
junho de 2007, houve um fato inédito: pela primeira vez, em seus 88 anos de
laboriosa experiência, na defesa dos direitos humanos ─ em especial dos
trabalhadores e das trabalhadoras de todo o mundo ─ , a OIT pôs em
evidência a importância da empresa “como principal fonte de crescimento e

1
Engenheiro civil e advogado. Mestre em Direito. Professor do Centro de Ciências
Contábeis Econômicas e Administrativas da Universidade de Caxias do Sul – UCS. Membro
do Conselho de Administração da Organização Internacional do Trabalho. Vice-presidente
para a América Latina e o Caribe da Organização Internacional de Empregadores.

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Alexandra Zottis, Denise Russo e Margarete Panerai Araújo (organizadoras)

emprego”, tal como destacado na epígrafe. Até então, a atividade empresarial


vinha sendo vigiada sob a ótica do paradigma marxista da luta de classes como
um dos pólos do incontornável conflito entre Capital e Trabalho: a empresa,
identificada com o capital, tenderia a explorar os trabalhadores e estes, por
serem hipossuficientes numa relação assimétrica de poder, precisariam da
proteção dos Estados, por meio de normas rígidas e punitivas.
É verdade que, a partir dos anos 90 do século passado, essa visão
começou a mudar, diante da evidência do fracasso definitivo das últimas e
das mais rigorosas experiências do socialismo real, a par da evidente
superioridade do padrão de vida dos trabalhadores dos países capitalistas
desenvolvidos. Desde então, a voz e os argumentos do Grupo dos
Empregadores, coordenado pela OIE, passaram a encontrar algum eco no
único organismo das Nações Unidas com estrutura tripartite. Mas ainda
não prosperavam, sem restrições e condicionamentos, as teses que
defendiam a iniciativa privada como o único motor eficaz da economia e
que apontavam a empresa como a ferramenta adequada para a geração da
riqueza indispensável ao desenvolvimento pleno.
Então, se a eficácia dos sistemas produtivos baseados nas empresas era
impossível de negar, o reconhecimento passou a ser contrabalançado pelos
chamados ao setor empresarial para que avançasse, além de suas atividades
produtivas e do cumprimento de suas obrigações legais, a fim de preencher
os vazios da ação do Estado, no atendimento das necessidades sociais. Sob a
égide do princípio da subsidiariedade2, avolumaram-se os apelos ao que
passou a ser citado como a Responsabilidade Social da Empresa (RSE).
No âmbito da OIT, os empregadores sempre reconheceram que têm,
em conjunto com os demais atores sociais, um papel importante no
desenvolvimento das comunidades onde atuam suas empresas. Aceitaram o
conceito da Responsabilidade Social da Empresa (RSE) para expressar a
grande variedade de iniciativas inovadoras e positivas tomadas pelas
empresas, em sentido amplo, tanto no mercado como na comunidade. Mas
ressaltam a necessidade de estabelecer os limites próprios entre as

2
O princípio de subsidiariedade é definido no artigo 5º do Tratado que institui a Comunidade
Européia. Esse princípio, tal como definido no referido artigo, pretende assegurar uma tomada
de decisões tão próxima quanto possível do cidadão, mediante a verificação constante de que a
ação a empreender em nível comunitário se justifica relativamente às possibilidades oferecidas
pelo nível nacional, regional ou local. A União só deve atuar quando a sua ação seja mais eficaz
do que uma ação desenvolvida em nível nacional, regional ou local - exceto quando se trate de
domínios da sua competência exclusiva.

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Sustentabilidade: uma abordagem social

responsabilidades do Governo e o papel que a empresa pode desempenhar


por meio de ações sociais voluntárias, pois, como alerta a OIE:
Esto está desembocando en un conflicto de expectativas entre lo que
corresponde hacer al Gobierno, por una parte, y la contribución que
cabe esperar de las empresas, por otra. Este conflicto tiene grandes
repercusiones para todos los actores. En primer lugar, distorsiona la
RSE y socava el concepto de imperio de la ley. En segundo lugar, puede
dar lugar a que la sociedad alimente expectativas injustificadas e
irrealizables. Por último, puede dejar a las empresas expuestas a críticas
por no cumplir con estas expectativas, y apartarlas de su papel
fundamental, que es el de proporcionar los medios esenciales para la
creación de riqueza en la sociedad a través de una actividad que
produzca beneficios (OIE, 2003).

O século XXI trouxe consigo uma maior conscientização sobre o


conceito de sustentabilidade, envolvendo “um comprometimento com a
promoção da integração social por meio de sociedades estáveis, seguras e
justas, baseadas na promoção e na proteção de todos os direitos humanos e na
não-discriminação, na tolerância, no respeito pela diversidade, a igualdade de
oportunidades, a seguridade e a participação de toda a gente, incluindo os
3
grupos e pessoas descapacitados e vulneráveis” . Nesse contexto, a atividade
empresarial deve inserir-se na “forma de progresso que satisfaz as
necessidades do presente, sem comprometer a capacidade das gerações
futuras de satisfazer as suas”. Sob essa condição, a OIT dispôs-se – ou foi
compelida – a reconhecer na empresa o instrumento adequado e eficaz para
atender a “um princípio fundamental do pilar social do desenvolvimento
sustentável [que] é, certamente, a geração de meios de vida seguros mediante
um emprego produtivo livremente escolhido” (OIT, 2007).
O informe produzido pelos técnicos da OIT, como elemento de
informação prévia à 96ª CIT, analisou o duplo sentido dessa última
afirmação, ou seja, quais os requisitos para o desenvolvimento da atividade
empresarial, produtora do substrato de riqueza indispensável ao
desenvolvimento, por um lado, e, por outro, quais os compromissos a
serem assumidos pelas empresas perante a sociedade e o meio ambiente
natural. A Figura 1 esquematiza, num enfoque integrado, o complexo
entorno que promove a empresa sustentável e, ao mesmo tempo, lhe impõe

3
O Consenso de Copenhague – Cúpula Mundial para o Desenvolvimento Social, 1995,
Compromisso 4.

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Alexandra Zottis, Denise Russo e Margarete Panerai Araújo (organizadoras)

compromissos de sobrevivência. Sua análise permite discernir três esferas


operacionais e políticas superpostas e independentes, nos níveis micro,
macro e meta.

Figura 1

– No centro (Figura 1), está a empresa sustentável, que compreende


uma série de “stakeholders”, incluindo acionistas, empresários,
empregados e clientes, assim como as relações com fornecedores,
governos e a comunidade como um todo. O nível micro diz respeito
ao que se passa no interior da empresa ou ao seu entorno imediato (o
gerenciamento de recursos humanos e financeiros e a utilização de
outros recursos, como energia, transportes e comunicações); a
interface com seus clientes e fornecedores; e o diálogo entre os
interlocutores sociais, entendidos como tais os empregadores e os
empregados, cujo relacionamento vai ou não derrogar o já referido
paradigma do conflito capital x trabalho, mediante uma administração
que conduza a uma co-participação, tanto na superação dos desafios
quanto na partilha dos resultados.

16
Sustentabilidade: uma abordagem social

– No nível seguinte (Figura 1) - o macro –, estão as políticas (fiscal,


macroeconômica e cambial, a par de outras setoriais, regionais, etc.)
que definem o ambiente competitivo e as condições dadas à empresa
para enfrentar a competição, determinando a sua sustentabilidade e o
seu potencial de crescimento.
– No nível meta (Figura 1), estão as condições gerais, políticas, sociais e
meio-ambientais, que determinam, entre outras coisas, a qualidade das
instituições, a governança e o diálogo social mais amplo, incluindo
aspectos não diretamente inerentes à vida empresarial, mas que
influenciam o desenvolvimento do setor, como a segurança jurídica e
os níveis de desigualdade ou de corrupção.

Por fim, ao final da discussão geral sobre o tema, na 96ª CIT, já era
possível reconhecer que não há desenvolvimento sustentável sem
empresas sustentáveis:
Há uma relação simbiótica entre empresa e desenvolvimento –
negócios florescem onde sociedades florescem – e o setor privado tem
um papel vital a desempenhar ajudando os países a atingir os Objetivos
de Desenvolvimento do Milênio (ODMs), [...] uma vez que o ODM 8
especifica que uma parceria global para o desenvolvimento, incluindo
cooperação com o setor privado, deveria reforçar os esforços
internacionais. Isso faz da criação de condições adequadas para o
desenvolvimento de empresas lucrativas e sustentáveis e o
investimento privado uma alta prioridade em política de
desenvolvimento e para a Agenda de Trabalho Decente (OIT, 2007).

A construção da simbiose entre desenvolvimento e empresa não pode


olvidar que o papel fundamental que se atribui a esta, no sistema da
sociedade, é a criação de riqueza e que o cumprimento desse encargo é
essencial para o desenvolvimento social. Ou seja, se o sentido da civilização
está no desenvolvimento pleno, definido na bula papal como “o
crescimento de todos os homens e do homem todo”, seu indispensável
substrato encontra-se no desenvolvimento econômico e, para que este seja
logrado, em bases sustentáveis, há que se dispor de empresas, por suposto,
também sustentáveis.
Já o papel que incumbe aos governos consiste em promulgar a
legislação e velar por seu cumprimento, assim como criar e manter sistemas
legais e políticos estáveis e previsíveis, em um clima propício para o
progresso econômico e social. É responsabilidade do governo investir na

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Alexandra Zottis, Denise Russo e Margarete Panerai Araújo (organizadoras)

educação e no bem-estar de seus cidadãos, de modo a propiciar as


condições apropriadas para o nascimento, o crescimento e a
competitividade das empresas. As empresas podem cooperar com os
governos, dando exemplo e aplicando, em suas próprias atividades, normas
sociais adequadas, bem como encorajando seus parceiros de negócios a
fazer o mesmo, especialmente quando, por qualquer motivo, não exista tal
iniciativa governamental (OIE, 2003). Essa ação subsidiária não deveria,
entretanto, comprometer a sua competitividade, visto que, na atualidade da
economia globalizada ─ na qual a regra é a competição implacável ─, só a
empresa competitiva será sustentável.
O Informe da OIT para a 96ª CIT expõe, com clareza, a situação:
A estrutura da vida civil e política é, sem dúvida, um importante
determinante de competitividade, crescimento econômico e empresas
sustentáveis. Boa governança – que implica respeito por direitos
humanos, instituições democráticas eficientes, liberdade de expressão,
direitos iguais para mulheres e homens, mecanismos efetivos para
diálogo social, etc. – geralmente provêm uma base segura para um
desenvolvimento sustentável. Governos que mantêm estabilidade
econômica e asseguram transparência e devido processo na formulação
de políticas, que salvaguardam direitos de propriedade, que recanalizam
a receita de impostos para a economia através de investimentos
produtivos em capital humano e infra-estrutura física, que garantem
que boas leis sejam produzidas e aplicadas, que ordem e segurança
públicas sejam mantidas e que haja apropriado cuidado com o ambiente
natural, estão aptos para criar as melhores condições sócio-econômicas
para que empresas sustentáveis floresçam.
Há ampla evidência de que a atividade empresarial é severamente
constrangida em uma economia na qual direitos de propriedade não
estão adequadamente definidos. Quando os proprietários, seja de bens
materiais ou intelectuais, não têm seus direitos garantidos, eles perdem
a motivação para investir mais, enquanto potenciais novos integrantes
do mercado formal são incentivados a permanecer na economia
informal, fora do domínio do trabalho decente. Outrossim, as
empresas estarão aptas a estabelecer-se em bases mais seguras onde a
sociedade adotar uma sólida cultura de apoio à atividade empresarial
(OIT, 2007).

A Figura 2 e o Quadro 1 esquematizam o conjunto de condições básicas


e fatores que condicionam a criação e a sustentabilidade das empresas.

18
Sustentabilidade: uma abordagem social

Figura 2

QUADRO I - Fatores condicionantes de criação e sustentabildade das empresas


Endógenos Exógenos

– Boa gestão e espírito empresarial – Diálogo social e organizações fortes


– Boas relações laborais (diálogo social) de empregadores e trabalhadores
– Boas tecnologias e equipamentos – Políticas macroeconômicas,
– Acesso a recursos comerciais, regionais e setoriais
– Trabalhadores sadios e – Crescimento dos mercados
qualificados – Condições meio-ambientais
– Finanças (crédito e inversão) – Instituições e políticas públicas
– Recursos físicos e naturais: – Entorno propício
energia, terra, TIC, etc. – Respeito aos direitos de
propriedade e de liberdade de
associação e sindical
– Normas claras, estáveis e
previsíveis
– Entorno regulatório e jurídico
– Infra-estrutura de qualidade
– Cadeias de valor, indústrias
conexas e serviços de apoio.

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Outra formulação dos mesmos condicionantes apareceu na


Declaração de Caracas, como conclusão do Simpósio “A Empresa
Sustentável Na América Latina”, promovido pela OIE, em maio de 2007,
na Venezuela, sob a denominação de “Nove Pilares do desenvolvimento
empresarial sustentável” (Quadro II).

QUADRO II - Nove pilares do desenvolvimento empresarial sustentável

1. Propriedade privada e segurança jurídica


2. Clima político, social e econômico favorável ao investimento
3. Estabilidade política e macroeconômica
4. Respeito ao Estado de Direito, aos princípios éticos e aos valores democráticos
5. Gestão transparente, compromissada e competente das instituições públicas
6. Educação e capital humano
7. Diálogo Social
8. Respeito aos Direitos Trabalhistas Fundamentais
9. Responsabilidade Social.

Sustentabilidade e Responsabilidade Social Empresarial


Na verdade, mais e mais empresas vêm reconhecendo o papel que
lhes corresponde no desenvolvimento das comunidades em que atuam,
adotando "iniciativas desenvolvidas de maneira voluntária, nas quais se
integram inquietudes tanto sociais como meio-ambientais para a gestão
de suas operações e a interação com seus próximos". Assim, a
Responsabilidade Social Empresarial (RSE) constitui-se, cada vez mais,
um aspecto fundamental das atividades das empresas e não uma função
meramente acessória; integra-se, cada vez mais, nas atividades
empresariais, na governança e nos sistemas de gestão e de reflexão
estratégica, inspirando-se em princípios que têm obtido respaldo
internacional — como os formulados na Declaração da OIT relativa aos
Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho, na Declaração
Universal de Direitos Humanos e na Declaração do Rio sobre Meio
Ambiente e Desenvolvimento (OIE, 2003).
Entretanto, há que se destacar a indispensabilidade do caráter
voluntário com que a RSE é concebida e exercida, com características
próprias de cada companhia, em sintonia com fatores tais como a
localização da empresa, seu tamanho, o tipo de sociedade em que se insere,
os recursos financeiros de que dispõe, os mercados e o setor de negócio
específico. Ademais, o conceito de RSE deve ser dinâmico e

20
Sustentabilidade: uma abordagem social

multidimensional, evoluindo para se adaptar às mudanças das


circunstâncias econômicas, políticas, sociais e meio-ambientais. Qualquer
ação destinada a regulamentar esse processo ─ ou mesmo a normatizá-lo,
como pretende a Organização Internacional de Normatização (ISO) ─ põe
em risco o caráter inovador, flexível e voluntário com que vem sendo
praticada a RSE (OIE, 2003).
De resto, o que não falta são pontos de referência e de orientação às
empresas: (a) de origem empresarial (por exemplo, os Princípios de Caux
para as Empresas, os Princípios Globais de Sullivan, a Carta das Empresas
4
para um Desenvolvimento Sustentável – da ICC , etc.); (b) orientações
emanadas da ONU ou de origem intergovernamental (por exemplo, a
Declaração de Princípios Tripartite da OIT sobre as Empresas
Multinacionais e a Política Social, as Diretrizes da OCDE para as Empresas
Multinacionais, o Pacto Mundial, etc.); (c) emanadas de ONGs (por
exemplo, as Diretrizes da Anistia Internacional em Matéria de Direitos
Humanos para as Empresas, os Princípios CERES, o Código de Práticas
5
Laborais Básicas da CIOSL/SPI, as Redes de Empresas Sociais , a Iniciativa
6
de Informação Global , etc.); (d) da iniciativa dos governos (por exemplo,
7
os Princípios Estadunidenses da Empresa Modelo , o Livro Branco da
Comissão Européia, os Princípios Voluntários sobre Seguridade e Direitos
Humanos dos Estados Unidos e do Reino Unido); (e) iniciativas comerciais
(por exemplo, Accountability 1000, SA 8000, KPMG, etc.); (f) iniciativas de
empresas (por exemplo, os diversos códigos de conduta de empresas
específicas, os mecanismos de apresentação de informações, etc.). É esse
repertório de possibilidades que permite às empresas encontrar o meio de
ação mais adequado para a circunstância dada, sem prejuízo de sua
competitividade (OIE, 2003).
Ainda mais, estando a economia globalizada cada vez mais estruturada
sob forma de cadeias e redes de produção, muitas empresas procuram
envolver suas cadeias no intercâmbio de boas práticas e na promoção de seus
próprios valores e iniciativas de RSE. Com isso, contribuem para desenvolver
a sensibilidade de seus fornecedores com respeito à RSE, ajudando-os, ao
mesmo tempo, a manter-se competitivos em um mercado cada vez mais

4
International Confederation of Commerce.
5
Social Venture Networks.
6
Global Reporting Initiative.
7
US Model Business Principles.

21
Alexandra Zottis, Denise Russo e Margarete Panerai Araújo (organizadoras)

exigente. Por outro lado, a propagação do conceito de RSE, entre os


consumidores, leva as empresas a divulgar suas iniciativas sobre a matéria, bem
como ao surgimento dos “fundos éticos de investimento”, os quais captam
recursos para aplicar nas empresas, que, na opinião dos gestores do fundo,
atuam de maneira socialmente responsável8 (OIE, 2003).
Mas a RSE não requer somente uma estratégia empresarial que seja
responsável do ponto de vista social: demanda também populações que
estejam dispostas a valorizar a RSE, em sua esfera de ação pessoal, e a se
comportar de acordo com ela. Em uma época de crescente individualismo,
isso impõe uma mudança cultural do público consumidor, pois a RSE não é
um fenômeno isolado da sociedade, é a resposta das empresas conscientes a
cada ambiente social, com seus peculiares valores, suas expectativas e suas
legislações (OIE, 2003).
Assim, é preciso ter presente que a prática da RSE consome recursos
da empresa, o que pode colocá-la em inferioridade competitiva em face de
concorrentes que não tenham a mesma sensibilidade social. Assim, a
sociedade não deve exagerar a pressão sobre as empresas para o incremento
da RSE, ao exigir-lhes mais e mais iniciativas nesse campo. Ainda mais que
autoridades públicas e agentes políticos tendem a sobrecarregar as
empresas com encargos tipicamente de natureza pública, isto sem a
desejável compensação com algum alívio na carga impositiva. Tais atitudes
equivocadas podem induzir as empresas a se desviarem do seu foco
primordial e, conseqüentemente, tornarem-se menos aptas para
desempenhar o seu papel básico de geradoras de riqueza a fim de embasar o
desenvolvimento social (Godoy, 2004).
O alerta quanto aos exageros nas demandas sociais por RSE não
pretende negar os retornos econômicos que dessas ações decorrem para a
empresa, seja pela motivação de seus quadros de pessoal, decorrente da
consciência social dos empregados, seja pela conquista da preferência dos
consumidores. Isso porque a cidadania impõe parâmetros sócio-políticos e
ecológicos a demandas, desejos e expectativas do consumidor, razão pela
qual a empresa, desejosa de satisfazer ao mercado, é compelida a buscar um
comportamento social politicamente correto. Não é por outra razão que a
RSE tende a estar tanto mais presente, quanto mais evoluída for a
sociedade, isto é, quanto mais desenvolvida a consciência dos seus cidadãos

8
Alguns fundos éticos de investimento dos Estados Unidos têm demonstrado obter
rendimentos mais elevados que a média dos fundos tradicionais, que não selecionam as
empresas em que investem pelo critério da RSE.

22
Sustentabilidade: uma abordagem social

em relação aos padrões éticos e aos direitos humanos.


É nesse quadro de sociedades culturalmente desenvolvidas, com a
exata noção da responsabilidade social compartida entre empresas e demais
atores sociais, que se pode construir o círculo virtuoso, no qual a boa
governança promove as empresas sustentáveis e estas viabilizam a
sustentabilidade da civilização.

Referências
FAIRBANKS, Michael, LINDSAY, Stace. Arando o mar. São Paulo:
Quality Mark, 2000.
GEUS, Arie de. A empresa viva. Rio de Janeiro: Campus, 1998.
GODOY, D. L. RSE – uma visão empresarial. In: ARAUJO, Margarete
Panerai (organizadora). Responsabilidade social como ferramenta de
política social e empresarial. Novo Hamburgo: Feevale, 2004.
ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DE EMPREGADORES.
Corporate social responsibility. An IOE approach. Genebra: OIE, 2003.
_______. El papel de las empresas en la sociedad. Genebra: OIE, 2007.
ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO. Report VI.
The promotion of sustainable enterprises. Genebra: OIT, 2007.
PORTER, Michael. A vantagem competitiva das nações. Rio de
Janeiro: Campus, 1993.

23
Alexandra Zottis, Denise Russo e Margarete Panerai Araújo (organizadoras)

24
Sustentabilidade: uma abordagem social

Do welfare-state ao
Estado-agência
1
Fernando Luís Schüler

A crise do Estado
No final dos anos 80, o Estado brasileiro chegou a controlar 258
empresas estatais. O governo produzia aço, aviões, minério, computadores,
distribuía telefones e atuava no ramo supermercadista. Hoje, há um
reconhecimento de que não é esse o papel do governo. Governos devem
gerar políticas públicas e coordenar processos de desenvolvimento. Devem
gerar ambientes favoráveis ao empreendedorismo e aos investimentos e
fazer com que as instituições funcionem. Em particular, devem assegurar
que haja justiça social, através de programas focalizados que beneficiem
aquelas pessoas e famílias que foram deixadas para trás na loteria social e no
jogo do mercado.
De que modo se produziu essa nova percepção sobre o papel do
Estado, que nos orienta sobre o que os Governos devem (e sobre o que eles
não devem fazer)? A resposta a essa questão nos remete ao processo da
chamada crise do Estado, observada nas três últimas décadas. Nesse
período, assistimos à falência da velha social-democracia, amadurecida no
pós-guerra, e dos estados burocráticos. As razões dessa falência são muitas.
Citamos três delas. Em primeiro lugar, o processo de globalização
econômica. Ao longo da década de 90, o volume de dinheiro movimentado
em trocas internacionais elevou-se a uma taxa de 6,5% ao ano, contra um
ritmo de crescimento de 3,5% da produção econômica. Não havia mais

1
Doutor em Filosofia. Mestre em Ciências Políticas pela Universidade Federal do Rio
Grande do Sul. Atualmente, exerce o cargo de Secretário de Estado da Justiça e do
Desenvolvimento Social no governo do Estado.

25
Alexandra Zottis, Denise Russo e Margarete Panerai Araújo (organizadoras)

espaço, nesse processo, para economias fechadas e pouco competitivas. Era


preciso ajustar o tamanho e o custo dos estados nacionais (como também
dos governos locais) para que as respectivas indústrias e empresas nacionais
(ou locais) pudessem prosseguir atuando em um mercado global cada vez
mais competitivo.
Em segundo lugar, a emergência de uma sociedade mais aberta, mais
reflexiva, na expressão de Giddens, e geradora de maiores e até então
desconhecidas demandas sociais. A ruptura do núcleo familiar, a expansão
do consumo de drogas e da violência urbana são apenas alguns dos
fenômenos que marcaram esse período. Novos sujeitos de direitos, novas
exigências quanto a redes de proteção social. Em uma época em que era
preciso respostas mais complexas a questões geradas por um novo tipo de
ordem social, o antigo welfare state vivia sob a pressão da redução de custos,
da burocracia, do número de funcionários e estruturas públicas.
Em terceiro lugar, houve um crescimento vertiginoso do mercado e da
sociedade civil. Gradativamente, foi possível perceber que as organizações da
sociedade civil eram mais eficientes, em regra, para responder à crescente
demanda por serviços sociais, em amplo sentido, do que as velhas burocracias
estatais. Para além da identificação, na teoria econômica clássica, das falhas de
mercado, houve um processo crescente de identificação das falhas de Estado,
em particular o processo progressivo de criação e cristalização de burocracias
e de sistemas de privilégios estamentais sob a pressão de minorias bem
estabelecidas no aparelho de Estado. Descobriu-se, aos poucos, a perfeita
congruência existente entre os interesses das corporações públicas e o sistema
político tradicional. Políticos, interessados na expansão da malha pública e
avessos a processos de reforma que produzam ônus eleitorais de curto prazo,
encontraram perfeita sintonia com os interesses de corporações na expansão
dos sistemas de privilégios no setor púbico. No Brasil, esse processo alcançou
contornos dramáticos no processo da Constituição de 1988, com a
generalização, sem critérios, do RJU – regime jurídico único dos servidores
públicos - e a instituição de um regime previdenciário de repartição
simples,claramente, insustentável em longo prazo. O País assistiu a um
processo agressivo de captura do Estado pelos interesses concentrados de sua
própria burocracia, bem protegida pelo estatuto da estabilidade no emprego.
De um modo geral, as últimas três décadas são apresentadas como
marcadas pela vitória intelectual do liberalismo econômico e político sobre
as velhas idéias da social-democracia e do socialismo. De fato foi isso o que
ocorreu. Em 1989, Francis Fukuyama apresentou seu clássico artigo sobre
o fim da história. Foi amaldiçoado, mas o sentido de seu argumento era

26
Sustentabilidade: uma abordagem social

correto: derrubado o muro de Berlin e bem examinado o que havia do outro


lado, ninguém, seriamente, iria, doravante, questionar as idéias da economia
de mercado e da democracia constitucional como os vetores desejáveis da
organização social. Finalmente, era possível dizer que nós, pelo menos no
ocidente moderno, sabíamos que o fundamentalismo (seja de matiz política
ou religiosa), os regimes totalitários e as economias de comando são formas
indesejáveis de organização das sociedades humanas (mesmo que
prossigam existindo pessoas e grupos que pensem o contrário). Nesse
sentido, podia ser concebida a idéia de fim de um processo de busca
intelectual sobre o modelo de Estado a adotar na modernidade.
A vitória do pensamento liberal foi a vitória da idéia-força, segundo a
qual a função essencial do Estado é assegurar a vigência das liberdades
individuais e garantir que haja justiça social. Por justiça social, compreende-
se, progressivamente, algo muito simples: que a cada indivíduo sejam
asseguradas as condições básicas necessárias para a sua afirmação como
agente de um projeto de vida livremente concebido. De um modo geral,
pode-se pensar na idéia de uma mudança de paradigmas. Do velho welfare
state para um tipo novo: agencystate. De uma maneira direta: o sentido ético
da ação do Estado, na contemporaneidade, concentra seu foco em
assegurar não tanto o bem-star de que goza cada cidadão, mas alcançar um
estado de coisas que ofereça, a cada um, condições ótimas de obtenção de
sua condição de agente. Uma forma de tratar esse tema é dizer que a idéia de
responsabilidade individual passa a ocupar um lugar central no pensamento
sobre o Estado e a sociedade.
Escrevendo sobre o que chamou de “social-democracia de novo
tipo”, Giddens registrou, no início dos anos 90, que temos que moldar
nossas vidas de maneira mais ativa do que fizeram gerações anteriores e
precisamos aceitar, mais ativamente, responsabilidades pelas conseqüências
do que fazemos e dos hábitos de estilo de vida que adotamos. O tema da
responsabilidade, ou da obrigação mútua, estava lá na social-democracia do
velho estilo, mas permanecia, em grande parte, latente, já que era
submergido no conceito de provisão coletiva. Temos de encontrar um novo
equilíbrio entre indivíduo e responsabilidade coletiva hoje.
Por responsabilidade individual, compreende-se tanto a
responsabilidade que cada pessoa tem em prover sua própria sobrevivência
e sobre o tipo de vida que resolver levar (uma vez que lhe foi dado o acesso a
certas condições básicas de desenvolvimento pessoal) como a
responsabilidade coletiva (e ainda voluntária) que cada um assume, ao
participar da vida civil e buscar a resolução de problemas humanos sem

27
Alexandra Zottis, Denise Russo e Margarete Panerai Araújo (organizadoras)

esperar pela ação protetora do Estado. Giddens apontou, acertadamente, o


fato de que a jovem social-democracia européia dos anos 80/90, tendo
como ponta-de-lança o new labor britânico, não deixou de ser social-
democrata pelo fato de aceitar lições importantes oriundas do pensamento
liberal. São lições que vieram da história vivida, da crise do estado e da
experiência totalitária do socialismo.
Pois bem, talvez tenhamos ido um tanto longe do objetivo central
deste artigo, que é o de argumentar a favor da reforma do Estado e na
direção das chamadas políticas de atuação em rede do setor público. De
uma maneira geral, nosso argumento dirá que a experiência das últimas três
décadas nos mostrou a completa inadequação da idéia de um Estado total,
provedor universal de serviços e garantidor de bem-estar social. Nesse
processo, assistimos ao naufrágio tanto da velha social-democracia como
de seu primo distante, mais grotesco e daninho, o chamado socialismo real,
que, ao cabo, única forma de socialismo existente, real ou irreal.
Ao mesmo tempo, assistimos a uma mutação no interior da própria
tradição liberal. Uma mutação, diga-se de passagem, perfeitamente
congruente com o argumento clássico de Hayek, que rejeita a idéia pouco
razoável de um Estado mínimo insensível a suas obrigações com a
formação dos cidadãos para o próprio exercício da liberdade individual.
Uma social-democracia mais sensível à noção da responsabilidade
individual e um liberalismo mais sensível à provisão das capacidades básicas
requeridas pelo indivíduo-agente. Talvez a chave para a convergência
programática da política neste fim/começo de século, talvez o sentido do
anunciado e bem-vindo fim das ideologias.
A idéia do fim das ideologias pode significar muitas coisas. Talvez, um
dia, o século XX seja conhecido como o “século das ideologias”, assim
como o século XVIII é referido como o “século das luzes”. As ideologias
levaram à barbárie. Ao nazi-fascismo, ao bolchevismo, ao maoismo e
variantes. No mundo civilizado, encontramos uma ideologia forte por
detrás de cada tragédia histórica. No mundo pós-queda do muro de Berlin,
há boas razões para imaginar a emergência, em definitivo, de um fazer
político mais pragmático, próximo ao que Weber tão brilhantemente
definiu, em seu “A Política como Vocação”, como uma ética da
responsabilidade. Uma ética comprometida com as conseqüências da ação
política, capaz de aprender com a experiência e revisar conceitos. É nessa
lógica que devemos compreender a idéia da reforma do Estado dos anos 80
para cá. Ela é o resultado de um processo histórico determinado. Estadistas
foram os que compreenderam esse processo.

28
Sustentabilidade: uma abordagem social

O Brasil e o Rio Grande do Sul


O Brasil iniciou, tardiamente, o processo da reforma do Estado. Nos
anos 80, a pauta brasileira era a reconstrução da democracia, não a eficiência
da gestão pública. Os anos de autoritarismo ajudaram a alimentar a idéia
ingênua de que a democratização do Estado e o aumento dos controles
sociais produziriam, per si, melhores políticas públicas. A transição à
democracia, por outro lado, não foi conduzida por uma liderança política
modernizante. A Constituição de 1988 é a expressão de uma gama variada
de tendências estatizantes e corporativas. Do ponto de vista da gestão
pública, o que ela faz é consagrar, com alguns agravantes, o próprio modelo
de Estado tecnocrático e autárquico produzido pelo regime militar. A
reforma ficaria para os anos 90 e viria, como em boa parte da Europa, pelas
mãos da social-democracia.
O primeiro movimento da reforma do Estado, ainda no final dos anos
80 e durante os 90, foi marcado pelo processo das privatizações. Esse
processo ocorreu com relativa velocidade. Basta observar que, em dez anos,
entre 1988 e 1998, passamos de 258 para 93 empresas estatais controladas
pela União. Os anos 90 foram marcados pelo avanço das chamadas
reformas de primeira geração. Estabilizamos a economia, iniciamos um
processo de reforma da Previdência, desenhamos o processo da reforma
administrativa e aprovamos a lei da responsabilidade fiscal.
Trata-se, claramente, de uma agenda inconclusa. A reforma
administrativa foi, efetivamente, pouco implementada na prática. Avançou em
estados como São Paulo e Minas Gerais, o que é muito pouco. Em
praticamente nada avançamos nos temas da reforma tributária e da reforma da
legislação trabalhista. Neste último aspecto, causa espanto que o Governo
Federal envie ao Congresso a proposta de adesão do País à Convenção 158 da
Organização Internacional do Trabalho, cuja conseqüência evidente será o
engessamento ainda maior de nossas relações de trabalho. José Pastore,
professor de economia da USP, calcula que, caso regulamentada, a Convenção
pode gerar um custo 100% superior para as empresas pela demissão de um
funcionário, relativamente ao custo atual, que já é alto. Trata-se de um
arcaísmo inconcebível para um País que deseja dispor de uma economia
dinâmica, capaz de responder, com rapidez, aos desafios do mercado global,
gerar empregos e estimular a meritocracia no setor produtivo.
No presente artigo, concentramos nossa ênfase em um aspecto
bastante específico, que integra o esforço de modernização do País e que,
julgamos, constitui-se em um dos vetores centrais da segunda geração de
reformas que devemos realizar no Brasil. Se o combate à inflação e as

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Alexandra Zottis, Denise Russo e Margarete Panerai Araújo (organizadoras)

privatizações foram a pedra de toque do primeiro movimento de reformas,


pode-se dizer que, nesta segunda etapa, terá grande importância o tema da
publicização, ou ainda, o movimento de contratualização da prestação de
serviços não exclusivos de Estado com o terceiro setor. Trata-se de um
novo processo de especialização das funções na esfera pública. Sua idéia-
força parte da constatação empírica, amadurecida nos últimos 20 ou 30
anos, de que os governos, por diversas razões, não são bons gerenciadores
de serviços públicos diretos e complexos, como hospitais, universidades,
museus, orquestras, TVs educativas, centros de pesquisa, parques
ambientais e instituições de assistência social. Temos boas razões para
acreditar que não demorará para que isso seja objeto de um amplo consenso
na sociedade brasileira, assim como hoje o é a convicção de que o Estado
não é um bom gestor de fábricas de aviões e de supermercados.
Há boas razões a favor desse novo processo de especialização das
funções dos governos. Uma delas segue a idéia da focalização da ação dos
governos. Estes devem buscar o nível máximo de excelência no
cumprimento das chamadas funções exclusivas de Estado – funções
judiciárias, segurança pública, fisco, fiscalização, regulação, formulação de
programas de desenvolvimento e de promoção da justiça social. Para isso,
devem recrutar e treinar quadros especializados nas chamadas carreiras de
Estado. Devem apostar, firmemente, na formação de quadros de alta
administração pública, em número reduzido, mas bem pagos e com
contratos de exclusividade. Para isso, é importante manter boas escolas de
Governo. Exemplos destas são as que funcionam em Brasília (ENAP) e em
Minas Gerais (Fundação João Pinheiro).
Outra razão é a proteção contra os pequenos interesses do sistema
político e a oferta de estabilidade na gestão das organizações prestadoras de
serviços públicos. Imaginemos o seguinte: qual a empresa que consegue
prosperar mudando toda a diretoria a cada quatro anos ou menos?
Imaginemos mais: que boa parte dos diretores contratados quase nada
entenda do negócio, sendo recrutada por afinidades partidárias ou
interesses eleitorais. Qual é o resultado esperado de uma situação dessas? A
resposta parece evidente e é precisamente assim que acontece no sistema
tradicional de gestão estatal. Isso ocorre não porque falta sensibilidade ou
inteligência a nossas lideranças políticas, mas porque as regras do jogo
autorizam e incentivam esse comportamento. Se não mudarmos as regras,
não há por que imaginar que algo sairá diferente no futuro.
Em 1998, instituiu-se, no País, a chamada Lei das Organizações
Sociais (9.637/98). Trata-se de uma lei ainda relativamente pouco

30
Sustentabilidade: uma abordagem social

conhecida e pouco utilizada como instrumento de organização gerencial


dos Governos. No modelo das chamadas OSs (organizações sociais), o
Governo estabelece contratos de gestão com organizações privadas sem
fins lucrativos, devidamente qualificadas, transferindo a gestão (parcial ou
integralmente) de órgãos prestadores de serviços de interesse público (e
não de atuação exclusiva do Estado), e aporta recursos para o
financiamento dessas organizações contra a fixação de metas a serem
cumpridas e critérios para avaliação de desempenho.
A partir daí, essas organizações passam a dispor de autonomia de gestão,
devendo ampliar suas fontes de financiamento e buscar, permanentemente,
ganhos de produtividade, de modo que se possa, gradativamente e com
responsabilidade, diminuir o aporte relativo de financiamento direto do
Estado em cada contrato, a fim de que os recursos públicos possam ser mais
bem aproveitados para o financiamento de mais serviços e políticas públicas
nos diversos setores e nas regiões que demandem investimentos. Recursos
orçamentários, por vezes esquecemos, são escassos. Em regra, os governos
tradicionais gastam boa parte de seus recursos para financiar o custeio integral
de um pequeno número (por vezes, nem tão pequeno assim) de agências
estatais, ao invés de estruturar um sistema de gestão em rede, no qual, com o
mesmo recurso, seria possível assegurar o funcionamento de um amplo
conjunto de organizações não-governamentais, capaz de atender a uma
público muito mais amplo e com melhor qualidade.
No modelo das organizações sociais, o resultado esperado é a
profissionalização da gestão pública: de um lado, o Governo especializa-se
nas tarefas de definição de políticas públicas, especificação de metas e
indicadores, bem como no acompanhamento dos contratos de gestão e
termos de parceria; de outro, as organizações especializam-se na gestão das
diversas organizações setoriais, com as vantagens da administração privada
e as garantias dos controles e atendimentos das finalidades públicas.
Ainda que bastante recente, trata-se de um modelo que não pode mais
ser considerado como experimental em nível nacional. Ele já funciona, com
grandes resultados, em diversos estados. No estado de São Paulo, uma rede,
hoje com 20 hospitais, já é administrada, desde o início da década, a partir
desse modelo, com produtividade média 42% superior aos hospitais
gerenciados conforme o modelo tradicional-estatal. Também na área da
cultura, 12 organizações administram equipamentos culturais exemplares
para o País, como é o caso da Pinacoteca do Estado de São Paulo e da
OSESP - Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo, reconhecida como a
melhor da América Latina.

31
Alexandra Zottis, Denise Russo e Margarete Panerai Araújo (organizadoras)

O Rio Grande do Sul inovou, ao aprovar, em dezembro de 2007, o


marco regulatório das OSCIPs – Organizações da Sociedade Civil de
Interesse Público. O projeto foi concebido a partir da então recém-criada
Secretaria da Justiça e do Desenvolvimento Social, com a preocupação de
avançar em relação ao modelo regulatório das OSs, tal como existente em
outros estados. A principal inovação foi a instituição da seleção pública para as
organizações civis com as quais o Governo irá assinar termos de parceria para
o gerenciamento de serviços públicos. Trata-se de um avanço significativo,
porque evita riscos de patrimonialização do sistema de contratualização.
Aqui vale a pena uma observação. O sistema puramente estatal de
prestação de serviços, tal como concebido nos anos do regime autoritário,
mais especificamente com o Decreto Lei 200, de 1967, foi erguido sob
premissas que desapareceram na década de 80, nos anos da
redemocratização. Uma dessas premissas era a flexibilidade executiva, a
qual contaria a chamada administração indireta do Estado. A Constituição
de 1988 e sua regulamentação posterior terminaram, definitivamente, com
qualquer vestígio dessa autonomia gerencial. Outra premissa era a noção da
extração tecnoburocrática dos quadros dirigentes dos organismos
prestadores de serviços, assim como das empresas estatais. Parecia razoável,
aos construtores daquele modelo, a imagem de um Estado abrangente e
tentacular, gerenciando, diretamente, uma rede de órgãos prestadores de
uma ampla gama de serviços, com grande autonomia de gestão e sob o
comando de quadros técnicos e profissionais.
O modelo já estava destinado à falência, mesmo sob o ambiente
autoritário. Na democracia, a idéia de extração tecnoburocrática dos
quadros dirigentes foi substituída pela nomeação indiscriminada desses
mesmos dirigentes por parte do sistema político, que tornou nossa malha
de autarquias e fundações estatais moeda de troca no mercado político. O
modelo ruiu de maneira trágica. Em municípios, estados e na União,
milhares de órgãos estatais prestadores de serviços entregues à direção de
militantes e quadros partidários, em regra sem nenhum preparo técnico
para as funções desempenhadas e com visão de curto prazo, administrando
estruturas burocráticas sem nenhuma autonomia ou flexibilidade gerencial.
Parece não haver sentido substituir esse modelo tipicamente
patrimonial, em que o setor público passa, facilmente, a ser um recurso à
disposição dos interesses do sistema político, por um modelo em que é
dado aos Governos o poder de escolher, discricionariamente, quais
organizações da sociedade civil terão a prerrogativa de gerenciar este ou
aquele serviço público. É preciso estruturar um modelo competitivo e

32
Sustentabilidade: uma abordagem social

meritocrático também para a seleção das organizações que farão a


contratualização com os Governos. Assim é na Lei das OSCIPs gaúchas.
Com o cuidado de que os processos seletivos tenham o acompanhamento
externo do Ministério Público Estadual.
Interessa-nos observar, neste artigo, que o modelo das OSCIPs, tal
como aprovado no Rio Grande do Sul, talvez seja menos a expressão de
uma certa concepção teórica sobre a organização do Estado e mais o
reflexo da experiência vivenciada pelas comunidades e pelos poderes
municipais, nas diferentes regiões do Estado, na criação das chamadas redes
conveniadas, em particular nas áreas sociais. A sabedoria empírica dos
administradores municipais ensinou-lhes que, quando se tratava de gerar
redes de atendimento para crianças, em creches, ou abrigos para moradores
de rua, ou ainda asilos para idosos, podiam-se obter melhores resultados a
menor custo conveniando-se com organizações civis privadas, bem
enraizadas nas comunidades, ao invés de gerar pesados organismos estatais,
com funcionários concursados e estáveis, procedimentos burocráticos de
gestão e estruturas físicas custosas.
O modelo das OSCIPs é, em síntese, apenas uma regularização,
certamente mais sofisticada e exigente, da idéia-força que conduz o
estabelecimento dessas redes conveniadas. É mais exigente, pois requer,
além da seleção pública, a fixação de metas e indicadores para a mensuração
de resultados. Sua efetivação requer que os governos façam sua parte:
disponham de recursos para que os serviços sejam contratados e de
capacidade técnica para fixar metas e indicadores, além de gerenciar, de
modo competente, os termos de parceria.
Os maiores adversários desse novo modelo são os políticos tradicionais e
as corporações públicas. No sistema estatal tradicional, esses dois segmentos
partilham o poder. De um lado, o poder de nomear cargos e manipular
orçamentos; de outro, o pequeno poder de controle da máquina e a segurança
das prerrogativas e dos privilégios do setor estatal. Após o fim das ideologias,
boa parte do que restou do chamado discurso de esquerda, no espectro
político brasileiro, consiste, basicamente, na defesa das prerrogativas e dos
privilégios das corporações públicas. Sua característica principal é a aversão
aos sistemas de mérito, à avaliação de desempenho e a qualquer tipo de
estratégias concorrenciais, as quais ameacem o monopólio que exercem sobre
espaços e recursos públicos. O conceito de esquerda, aqui utilizado, não
pretende remeter a nenhum tipo de agrupamento programático mais
significativo. Refere-se apenas à designação de um tipo de discurso arcaico,
que obstaculiza o avanço do País e a modernização do Estado.

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Alexandra Zottis, Denise Russo e Margarete Panerai Araújo (organizadoras)

Sociedade de Rede
Bill Clinton, em seu Giving, apresentou três razões capazes de explicar
o crescimento acelerado das organizações não-governamentais em nível
global. De fato, registra-se um crescimento significativo: os Estados Unidos
contam com mais de um milhão de organizações civis sem fins lucrativos, o
dobro das existentes há apenas uma década atrás. No Brasil, temos cerca de
300 mil organizações, contra menos de 5 mil no início dos anos 80. As três
razões de Clinton dizem respeito à expansão da democracia em nível global;
ao crescimento extraordinário da riqueza na era da globalização; e à
revolução nas tecnologias da informação, com a Internet à frente, que
permitiu a multiplicação dos doadores privados de pequeno porte, capazes
de somar enormes quantidades de recursos, quando mobilizados.
A equação é bastante clara: mais riqueza, mais liberdade, mais
informação. Poderíamos acrescentar outros elementos: um deles, sem dúvida,
é o aspecto tempo. As pessoas vivem mais e dispõem, progressivamente, de
mais tempo para realizar atividades voluntárias. Em parte, isso está associado
ao aspecto riqueza. Cada um de nós terá, no futuro, cada vez mais tempo livre e
mais recursos para financiar atividades voluntárias.
Estamos assistindo a um processo acelerado de redução da pobreza
absoluta no mundo, entendida como a privação da renda suficiente para a
realização dos funcionamentos básicos por parte dos indivíduos, para
utilizar a expressão clássica de Amartya Sen. Os problemas sociais tendem,
progressivamente, a uma especialização. O suicídio, as carências de auto-
estima, as psicopatias e a privação de oportunidades culturais terão mais
importância e mobilizarão relativamente mais as políticas públicas, em
poucas décadas, do que a privação absoluta de renda. Esse será o quadro,
pelo menos, de boa parte das sociedades ocidentais.
Apenas uma rede bastante complexa de organizações sociais flexíveis,
especializadas e dotadas de forte sentido de missão poderá dar conta do
enfrentamento desses problemas. Em Porto Alegre, conhecemos a
Fundação Tiago Gonzaga, dedicada à conscientização de jovens sobre os
riscos da imprudência no trânsito. Sua líder, Diza Gonzaga, perdeu o filho
adolescente em um acidente. Nenhum governo será capaz de fazer o que
essa organização faz. Governos conseguem gerenciar, adequadamente,
programas de escala, relativamente uniformes e simples. O Bolsa Família
pode ser um bom exemplo (necessariamente, não o programa, ele mesmo).
O programa trabalha com variáveis simples (renda, freqüência escolar,
vacinação). Ele é inteiramente cego diante da diversidade das razões que
produzem a condição de pobreza para esta ou aquela família, para esta ou

34
Sustentabilidade: uma abordagem social

aquela comunidade. Podemos imaginar que existam centenas de razões que


levem uma família à condição de pobreza. O programa resume sua
abordagem àquelas três variáveis. Pode-se argumentar que, quando se está
tratando de privação absoluta de renda, ou do combate à fome, um
programa desse tipo faça sentido. Afinal, trata-se de assegurar a freqüência
de crianças à escola e a sobrevivência física de pessoas com um mínimo de
dignidade. Frente a esses argumentos, justifica-se uma política do tipo
assistencialista. Ou ainda: uma política cega diante de aspectos ligados à
responsabilidade individual e às variáveis focais determinantes da pobreza.
O mesmo tipo de argumento não servirá, quando estiverem em jogo temas
mais complexos, como os referidos anteriormente.
Sociedades complexas demandarão redes sociais altamente
especializadas. Ao Estado caberão três esferas de responsabilidade: a
produção de políticas públicas de desenvolvimento econômico e justiça
social; a produção da informação adequada para a contratação de serviços e
o monitoramento de resultados; o desenho do marco legal adequado a fim
de que as redes de organizações civis atuem de maneira eficiente.
Aqui, pode ser interessante citar o exemplo do Rio Grande do Sul. Na
chamada “área social”, o estado possui uma fundação que gerencia 40
abrigos para crianças e pessoas que necessitam de proteção especial; uma
outra fundação que gerencia 10 centros de referência para pessoas com
deficiências; e ainda outra que gerencia perto de 60 unidades de
intermediação de mão-de-obra. Ao mesmo tempo, não possui nenhuma
inteligência sistematizada em termos de indicadores e metodologia para
avaliação de impacto social de políticas públicas nem metodologia alguma
de combate à pobreza. O Estado, simplesmente, abdicou de seu papel
estratégico de formulador e coordenador de políticas de longo prazo e
contentou-se em prestar serviços, em regra, de pouca qualidade.
O Estado acertou, quando criou, em 2002, a chamada Lei da
Solidariedade (Lei 11.853/02). É possível que a Lei não tenha sido
concebida a partir de uma reflexão estratégica mais aprofundada e,
certamente, não veio acompanhada de uma série de medidas
complementares necessárias. Mas sinalizou uma direção correta: a criação
de mecanismos inteligentes de incentivo às organizações da sociedade civil.
A Lei é um mecanismo inteligente por diversas razões: ela respeita a idéia da
parceria público-privada, ao estipular um fator de multiplicação do recurso
público da ordem de 1,33 para cada real aportado pelo Governo; ela
concede a um conselho paritário, Estado-sociedade civil, a decisão sobre o
aporte de recursos; ela permite que o conjunto dos aportes seja direcionado

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Alexandra Zottis, Denise Russo e Margarete Panerai Araújo (organizadoras)

a partir de focalizações deliberadas pelo Governo em conjunto com o


Conselho; por fim, ela prevê, a partir de modificações realizadas em 2007, já
no âmbito da Secretaria da Justiça e do Desenvolvimento Social, que parte
(5%) dos recursos mobilizados seja destinada à formação de fundos
patrimoniais permanentes para a sustentabilidade das organizações sociais
(no modelo endowment).
Esse é um exemplo de inteligência na criação de uma política pública.
Os exemplos em contrário abundam. A instituição do artigo 18 da chamada
Lei Rouanet, por exemplo. Ao invés de estimular a parceria público-privada
(como fazia a redação anterior da legislação), o artigo assegura 100% de
abatimento fiscal às empresas para o patrocínio de projetos culturais em
algumas áreas. Trata-se de um tipo de incentivo que reduz, drasticamente, o
volume dos aportes em projetos (dada a limitação dos 4% para a dedução
fiscal sobre o Imposto de Renda devido) e deseduca o setor privado para o
mecenato cultural. Outro exemplo de legislação pouco inteligente: a lei de
incentivo aos fundos da criança e do adolescente. Concedem-se 100% de
isenção fiscal, agora limitada a 1% do Imposto de Renda devido, com um
agravante: o recurso das empresas é reestatizado, sendo depositado em
fundos de natureza estatal, para, posteriormente, ser liberado às
organizações sociais privadas e prefeituras por meio de convênios.
A Lei é, novamente, pouco inteligente, ao não gerar a alavancagem de
recursos privados a partir do aporte de recursos públicos e ao gerar uma
enorme burocracia para a liberação dos recursos para as organizações civis:
o recurso ingressa no tesouro do Estado e, por vezes, perdem-se até 5 ou 6
meses para fazê-lo chegar às entidades que gerenciam projetos em favor de
crianças e adolescentes.
Qual o significado desses exemplos? Há um amplo espaço, no Brasil,
para o ajuste de nossas instituições com vistas à formação de uma sociedade
de rede. Instituições incentivam e modelam atitudes e comportamentos. Se
observarmos que toda a legislação de incentivos fiscais, no País, para as
áreas cultural e social, vetam a inversão de recursos incentivados para a
formação de poupança nessas duas áreas, é de surpreender que não existam
fundos de sustentabilidade nem uma “cultura instalada”, nessa direção, em
nossas organizações? Não nos parece prudente desprezar a variável
institucional no processo de formação das sociedades de rede. Na
sociedade da informação, nos tempos de Internet, todo o conhecimento
necessário está à nossa disposição para cometermos a menor quantidade de
erros na modelagem de nossas instituições.
O século XXI assistirá à formação de uma sociedade mais fluida. No

36
Sustentabilidade: uma abordagem social

final do século, a miséria terá sido erradicada da terra e a expectativa média


de vida irá girar em torno dos 100 anos. Viveremos em abundância e
incomensuravelmente menos presos à disciplina do trabalho, tal como
vivemos no século XX. A democracia prosperará, assim como a integração
dos estados nacionais. A visão do velho Kant, enunciada nos artigos sobre a
Paz Perpétua, publicados em 1795, terá possivelmente sido realizada. A ele,
finalmente, será dado o reconhecimento como o gênio da modernidade.
Viveremos em uma comunidade de nações democráticas e republicanas.
Teremos paz e necessitaremos muito pouco de exércitos nacionais. A
tecnologia permitir-nos-á viver livre de boa parte das doenças que, neste
início de século, ainda nos afligem. A arte, a cultura e os prazeres da vida
intelectual vicejarão como sequer podemos imaginar à luz do presente.
Neste mundo, não será tolerado nada que represente uma ameaça à
liberdade individual. George Orwell e seu 1984 ainda serão lidos, como a
alegoria terrível de um mundo que, enfim, foi vencido. Essa será a sociedade
das redes de cidadãos voluntários. Das organizações que, em liberdade,
cuidarão das pessoas e seus carecimentos e produzirão uma sociedade
fundada em normas razoáveis de consentimento. Uma sociedade que
necessitará muito pouco do Estado.

Referências
FUKUYAMA, Francis. O Fim da história e o último homem. Rio de
Janeiro: Rocco, 1992.
HAYEK, Friedrich A. von. O Caminho da servidão. [4. ed.] Rio de
Janeiro: Instituto Liberal, Expressão e Cultura, 1987.
GIDDENS, Anthony. As conseqüências da modernidade. [1. ed.] São
Paulo, SP: UNESP, 1991.
ORWELL, George. A revolução dos bichos. Rio de Janeiro: Record, 1997.
SEN, Amartya K. Desenvolvimento como liberdade. [1. ed.] São
Paulo, SP: Cia de Letras, 2000.
SEN, Amartya. Sobre ética e economia. São Paulo, SP: Companhia das
Letras, 1999.
KANT, Immanuel. Crítica da razão prática. Lisboa: Edições 70, 1999.

37
Alexandra Zottis, Denise Russo e Margarete Panerai Araújo (organizadoras)

38
Sustentabilidade: uma abordagem social

Sustentabilidade e os novos
parâmetros de
Responsabilidade Social
1 2
Denise Ries Russo e Margarete Panerai Araújo

INTRODUÇÃO
Com o início do terceiro milênio, viu-se que o século XX deixava
várias dúvidas para todos os cidadãos do mundo. Segundo Hobsbawm
(1995, p. 541), o século acabou numa desordem global, cuja natureza não
estava clara, e sem um mecanismo óbvio para mantê-la sob controle. Essa
impotência frente a uma complexidade da crise mundial envolveu não só a
economia, mas as questões sociopolíticas, demográficas, culturais e
ecológicas. Contudo, mesmo as expectativas pessimistas não deixaram de
lado a importância da economia mundial e seus aspectos decorrentes. Viu-
se que as atividades empresariais econômicas, administrativas e de gestão
também buscaram explicar as múltiplas mudanças, que não podem existir
isoladamente de seu contexto e de suas conseqüências. Toma-se como
exemplo o emblemático debate da governança corporativa, sua
responsabilidade social frente aos diversos públicos e a chamada
sustentabilidade decorrente.
Este artigo tem como objetivo central destacar, teoricamente, a visão
contemporânea da responsabilidade social e da sustentabilidade, abordando a

1
Cientista Social, com mestrado em Serviço Social e doutorado em Comunicação
Social. Professora-pesquisadora da Feevale. E-mail mpanerai@terra.com.br.
2
Administradora de Empresas, com mestrado em Gestão Empresarial.
Professora da Feevale . Atualmente exerce o cargo de Diretora da FGTAS –
Fundação Gaúcha do Trabalho e Assistência Social do governo do Estado do RS e
Conselheira Suplente da Comissão Estadual Tripartite do Trabalho. E-mail
deniserr@terra.com.br.

39
Alexandra Zottis, Denise Russo e Margarete Panerai Araújo (organizadoras)

importância dos chamados stakeholders. A gestão social é uma resposta


empresarial, baseada na realidade, pois, ao compreender os desafios e as
limitações do contexto, as empresas legitimam ações coorporativas,
investindo na reconstrução de seu capital humano interno e externo, e
alinham a sua estratégia a esse novo desafio: a gestão social sustentável.
As questões metodológicas norteadoras estão vinculadas ao que
Demo (2002) denomina de conceito de complexidade aplicado à realidade e
ao conhecimento. Em especial, de um lado, tem-se o real (ontologia) e, de
outro, a possibilidade de captar essa realidade considerada dinâmica e não-
linear (epistemologia). Nesse sentido, partir de leituras, pesquisas e demais
estudos, inclusive os empíricos, identificando e analisando o contexto
chamado de pós-moderno, passa por compreender e explicar que essa
dinâmica é, predominantemente, analisada através de uma percepção de
que a realidade é complexa e não-linear. Interessa, aqui, proceder a uma
rápida análise dessa dinâmica que vem se instaurando. Demo (2002) ainda
apresenta que sempre é válida uma cautela metodológica, uma vez que os
argumentos estão repletos de contextos prévios. Com esse critério,
previamente definido sobre a visão da realidade e de sua captação científica,
bem como seu manejo crítico, o artigo tem um teor lógico e bibliográfico
voltado para a chamada compreensão dos desafios pós-modernos.
Como qualquer outro fenômeno social, a responsabilidade social se
coloca sob uma grande complexidade, envolvendo conhecimentos novos,
práticos e teóricos, que pouco a pouco passam a ser incorporados ao
conceito de sustentabilidade. Este artigo apresenta conceitos de
responsabilidade social e de sustentabilidade, além de definir os públicos de
relacionamento de uma empresa: os stakeholders.

1. RESPONSABILIDADE SOCIAL
A questão da responsabilidade social empresarial é um tema recente,
polêmico e dinâmico, que envolve desde a geração de lucros pelos
empresários, em visão bastante simplificada, até a implementação de
indicadores sustentáveis no plano de negócios de suas empresas, em
contexto sofisticado e complexo. A abordagem da atuação social
empresarial surgiu no início do século XX com o filantropismo. Em
seguida, a partir do esgotamento do modelo utilizado com o
desenvolvimento da sociedade pós-industrial, o conceito de
responsabilidade evoluiu, passando a incorporar os anseios dos agentes
sociais no plano de negócios das corporações. Assim, além do
filantropismo, desenvolveram-se conceitos como voluntariado

40
Sustentabilidade: uma abordagem social

empresarial, cidadania corporativa, responsabilidade social corporativa e,


por último, desenvolvimento sustentável, segundo Tenório (2004). A
caracterização da responsabilidade social empresarial concentrou-se em
dois períodos distintos. O primeiro compreendeu o início do século XX até
a década de 1950; o segundo representou a abordagem contemporânea,
estendendo-se da década de 1950 até os dias atuais, incorporando a
discussão do conceito de desenvolvimento sustentável.
Assim como o conceito de responsabilidade social, não existe um
marco histórico específico, pois o aparecimento da realidade empresarial
resultou no fruto de um processo histórico que envolve não somente as
transformações sociais, mas também aquelas que ocorreram nos conceitos
de administração de empresas. Segundo El Fórum EMPRESA: não existe
uma definição única de responsabilidade empresarial, ela geralmente se
refere a uma visão de negócios que incorpora o respeito por valores éticos,
pelas pessoas, comunidades e pelo meio ambiente, entre outros. O El
Fórum EMPRESA é uma rede hemisférica de organizações empresariais
que provem a RSE nas Américas. Mesmo assim, a concepção histórica
apresentada por Tenório et al. (2004) indica que, até a década de 1950, a
resolução das questões sociais eram atividades exclusivas do Estado, numa
visão que incorporava, claramente, os princípios do liberalismo. Mas, pouco
depois, verificou-se o agravamento de questões como qualidade de vida,
meio ambiente e condições de trabalho, gerando pressões para a resolução
desses problemas. A instauração de um pensamento neoliberal e o início do
processo de globalização resultaram na predominância do mercado como o
regulador da sociedade e, conseqüentemente, das atividades empresariais.
Essa percepção de mudança gerou uma nova ordem econômica, social e
política, em que é visível o predomínio do mercado, as transformações
econômicas, o enfraquecimento do Estado, o aumento dos problemas sociais
e da desigualdade entre as classes, bem como o surgimento da consciência da
necessidade de resolver os desafios causados por essa nova ordem. Vieira
(1999, p. 112) afirma que o Estado e o mercado não demonstram ter
capacidade de resolver a crise econômica, social e ambiental em que a
sociedade globalizada se encontra, pois se devem formular alternativas.
A prática da responsabilidade social, na verdade, iniciou-se a partir da
preocupação das pessoas com a realidade social. O desenvolvimento
global passou a ser visto não somente como sendo uma necessidade, mas
também como um fator agregado de valor à empresa. Dessa forma, a
responsabilidade social, dentro das organizações, é um processo dinâmico,
que se altera de acordo com as transformações do ambiente e,

41
Alexandra Zottis, Denise Russo e Margarete Panerai Araújo (organizadoras)

particularmente, com as exigências do público consumidor.


Godoy (2004, p. 11) explica que a responsabilidade social empresarial
“[...] não é algo estático; trata-se de um conceito dinâmico e
multidimensional, que não deixa de evoluir para adaptar-se às mudanças das
circunstâncias econômicas, políticas, sociais e meio ambientais”. Tenório et
al. (2004, p. 33-35) descrevem-na como resposta “[...] às legislações
ambientais, aos movimentos dos consumidores, à atuação dos sindicatos
em busca da elevação dos padrões trabalhistas, às exigências dos
consumidores e das comunidades”.
Melo Neto e Froes (2001) apontam a responsabilidade social como
uma nova racionalidade social, enfatizando a visão da empresa como
grande investidor social. O foco das ações sociais passa a ser centrado na
comunidade, ao invés da sociedade. Essa concentração nas comunidades,
no meio ambiente e nas pessoas focou-se em suas necessidades. É uma
prática que “[...] busca estimular o desenvolvimento do cidadão e fomenta a
cidadania individual e coletiva” (MELO NETO; FROES, 2001, p. 27).
Segundo o Instituto Ethos (2007), a "Responsabilidade Social” é uma
forma de conduzir os negócios da empresa com parceira co-responsável
pelo desenvolvimento social. É necessário que a empresa estabeleça, na sua
estratégia de operação, as metas, os indicadores, o planejamento de suas
atividades, para atender às demandas do entorno e não apenas dos
acionistas ou proprietários. Se a responsabilidade social é uma forma de
conduzir os negócios com sustentabilidade e com compromisso de
desenvolvimento social e ambiental, é preciso difundir esses conceitos
junto aos novos administradores, de forma que os resultados sejam as boas
práticas de gestão com sustentabilidade.
Conforme o Guia de Gestão Social (PGQP, 2005), a responsabilidade
social empresarial imprimiu um caráter de liderança às empresas, já que gera
e divulga valores à sociedade e ao entorno em que ela opera. Com essa base,
as empresas podem capitalizar valores intangíveis - marca, reputação,
credibilidade, etc. -, que representam 75% do capital frente aos 25% dos
ativos fixos da empresa.
Flores e Ogliastri (2007) apresentam temas-chave da responsabilidade
social empresarial, com relação aos stakeholders e seus valores e ainda em
relação a alguns temas transversais, conforme adaptado no quadro1a seguir.

42
Sustentabilidade: uma abordagem social

RESPONSABILIDADE SOCIAL EMPRESARIAL


Responsabilidade Intensiva
Acionistas: sustentabilidade financeira
Responsabilidade Extensiva
Colaboradores
Fornecedores
Clientes
Comunidades
Sociedade e Governo
Temas Transversais
Direitos Humanos
Meio Ambiente
Ciência e Tecnologia
Governança Corporativa
Valores e Transparência
Fonte: Adaptado pelas autoras da publicação do BID: O Argumento Empresarial da RSE/2007.

Por outro lado, nasce a necessidade de as empresas adaptarem-se a


esse novo contexto social, com grandes desafios de gestão; variáveis antes
não atendidas passam a ser vitais, como a variável ambiental e social.
A economia capitalista necessita de empreendimentos para seu
desenvolvimento, e a canalização de decisões corporativas passou a ser a
idéia-chave de utilização de novas práticas. Dessa forma, nasce no
âmbito da gestão interna e externa, a governança corporativa. Esta passa
a ser um instrumento fundamental de gestão, pois consegue reunir todos
os conceitos necessários ao acompanhamento da eficácia gerencial,
essenciais ao crescimento e à transparência das empresas. Assim,
compreender, inicialmente, os conceitos oficiais dessa temática e
relacioná-los à responsabilidade social é tarefa importante, pois a
sustentabilidade passa pela compreensão de novas práticas de gestão,
mais completas, e, dessa forma, torna-se relevante, à medida que os
reflexos desses mecanismos se universalizam.

43
Alexandra Zottis, Denise Russo e Margarete Panerai Araújo (organizadoras)

A governança corporativa é uma área de pesquisa nova, que envolve


finanças, economia, direito, contabilidade, administração, além das demais
áreas sociais. Pode ser entendida como a tentativa de minimizar os custos
decorrentes do problema dos gestores, ou seja, a definição operacional do
termo reflete, na prática, os registros de expropriação da riqueza e de
acionistas controladores, que têm como objetivo apenas o lucro pessoal.
Assim, o termo governança corporativa vem sendo conceituado de
diferentes formas, como, por exemplo, as que seguem.
[...] é um novo nome para o sistema de relacionamento entre acionistas,
auditores independentes e executivos da empresa, liderado pelo
conselho de administração (LODI, 2000, p. 9).
[...] é o conjunto de mecanismos de incentivo e controle, tanto internos,
quanto externos, que tem a finalidade de minimizar os custos
decorrentes de problemas de agência (SILVEIRA, 2006, p.45).

A sustentabilidade das empresas vem sendo mais facilmente


conquistada através dos programas de responsabilidade social e da gestão
da Governança Corporativa, ou seja, através da implantação de um sistema
pelo qual as empresas optam por serem dirigidas e monitoradas,
envolvendo os relacionamentos com todos os seus públicos de interesse:
acionistas/cotistas, administradores, governo, comunidade, diretoria,
auditoria externa, colaboradores, fornecedores e clientes. Esse processo
visa a atingir, a partir da sua implementação, os reais objetivos de
transparência, prestação de contas e eqüidade.
No Brasil, essa visão passou a ser uma realidade no início dos anos 90,
mas somente a partir deste século é que as grandes empresas começaram a
praticar a responsabilidade social de uma forma mais abrangente. O
administrador ou gestor integra diferentes aspectos, fugindo dos resultados
apenas financeiros. Visando a um novo modelo de organização e gestão
sugerida, as empresas estão mais atentas aos compromissos e às
responsabilidades que possuem com seus públicos, com os quais se
relacionam e que antes não eram citados como partes interessadas na
administração das empresas.
A sustentabilidade faz parte do conceito de social, ou melhor, não existe
responsabilidade social sem uma visão de sustentabilidade, e é exatamente
esse o desafio empresarial, isto é, aliar à sua estratégia essa visão,
implementando a governança corporativa de forma integral, com vistas a
garantir a sustentabilidade completa do sistema. E é exatamente esse tema que
se aborda a seguir, objetivando aprofundar o conceito e o seu entendimento.

44
Sustentabilidade: uma abordagem social

2. SUSTENTABILIDADE EMPRESARIAL
O conceito de sustentabilidade empresarial estava diretamente
associado à questão da preservação ambiental. Segundo Melo Neto e Froes
(2001), uma empresa socialmente sustentável praticava ações de
desenvolvimento e preservação do seu capital natural. Portanto, essa
dimensão era, inicialmente, ambiental e ecologicamente responsável.
A mudança de paradigma exigiu a harmonização de conceitos como
proteção ambiental, crescimento econômico e eqüidade social. O fio
conceitual dessa nova visão é entendido como uma estratégia empresarial
sólida. Ou seja, as empresas devem se convencer de que os impactos nos
negócios asseguram o desenvolvimento de um novo sistema. Um dos
conceitos mais adotados foi o da Comissão Mundial sobre o Meio
Ambiente e Desenvolvimento (1988), em que a terminologia de
desenvolvimento sustentável “atende as necessidades do presente sem
comprometer gerações futuras”, conforme Becker (2003, p.181). O
desenvolvimento sustentável é uma nova tendência que vem sendo
caracterizado com uma conotação extremamente positiva. Até mesmo
grandes entidades internacionais, como o Banco Mundial e a UNESCO,
apontam que o termo traz incorporada uma nova filosofia do
desenvolvimento, pois reúne diversas dimensões.
Sustentável pressupõe o equilíbrio. Melo Neto e Froes (2001, p.184)
afirmam que a palavra-chave é “dar sustentabilidade ao sistema” como
regulação empresarial. É, portanto, com base em novos instrumentos
gerenciais ligados à responsabilidade social e à sustentabilidade social (tripé
composto por proteção ambiental, crescimento econômico e eqüidade
social) que esse novo paradigma se profissionaliza e ocupa a vanguarda de
vários setores.
O conceito de sustentabilidade, por conseguinte, abriga todos os
conceitos - social, econômico, financeiro e ambiental - e contempla a ação
empresarial em todas essas dimensões, atendendo a todos os seus públicos
de relacionamento: os stakeholders, temática que se aborda no próximo item,
com o objetivo de entender essa visão empresarial que alia a
responsabilidade interna e externa, a qual alguns autores já descrevem
como intensiva e extensiva, segundo apresentada no livro O Argumento
Empresarial da RSE, editado pelo BID em 2007.

45
Alexandra Zottis, Denise Russo e Margarete Panerai Araújo (organizadoras)

3. STAKEHOLDERS (OS PÚBLICOS INTERNOS E


EXTERNOS)
Os chamados stakeholders são os públicos de interesse de uma
organização com focos diversos. A empresa que desejar, efetivamente, ter
indicadores de sustentabilidade global deve se voltar para as necessidades
desses públicos e, principalmente, incluí-los em seu planejamento
estratégico.
Um dos grandes desafios das empresas que pretendem atuar com
sustentabilidade, sem dúvida, é construir um modelo de negócio que seja,
ao mesmo tempo, interessante do ponto de vista econômico e coerente do
ponto de vista do desenvolvimento sustentável da região, do estado e do
país. Daí relacionar esses mecanismos com os stakeholders.
Segundo o Guia de Sustentabilidade (2005), o termo, em inglês,
stakeholders é utilizado para designar pessoas físicas e/ou pessoas jurídicas,
as quais podem afetar uma empresa, direta ou indiretamente, por meio de
suas opiniões ou ações. São divididos em primários, quando vinculados às
funções principais da empresa, e secundários, quando estão relacionados às
atividades indiretas. Portanto, eles têm interesses diversos, e a empresa que
desejar praticar a governança corporativa deve se comprometer com as
necessidades, como a proteção às partes envolvidas, principalmente,
alinhando cooperação e sistema organizacional.
A figura 1 ilustra essa relação da empresa e a sua responsabilidade
frente aos stakeholders, ou seja, exemplifica os indicadores necessários para
atuar com responsabilidade social. O movimento da governança
corporativa passa pela compreensão dessas relações, que devem ser

Público
Clientes
Interno

Missão
Comunidade Fornecedores

Visão de

Meio Valores e
ambiente Transparência
Governo e
sociedade

Figura 1: A empresa e os Stakeholders


Fonte: ASHLEY, 2002. Adaptado pelas autoras.

46
Sustentabilidade: uma abordagem social

Atualmente, as empresas têm sido pressionadas a estabelecer níveis


elevados de governança interna. Na medida em que se torna evidente a
influência das corporações nas mudanças econômicas, ambientais e sociais,
os investidores e demais partes interessadas passam a exigir os mais
elevados padrões éticos, de transparência e de responsabilidade por parte de
executivos e administradores. A governança não é um modismo, é um
sistema aperfeiçoado de gestão, porque dela emana o comprometimento da
diretoria executiva de passar mais informações ao mercado, como maneira
de agregar valor ao negócio e também de estruturar a administração da
empresa, para que o valor dos acionistas seja aumentado através do
mercado de capitais.
A responsabilidade social associada à Governança Corporativa agrega
um valor imenso à organização, pois ela é a ferramenta para conduzir todo o
processo de discussão da gestão e pode ser a grande direcionadora de ações
junto aos stakeholders.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
A capacidade das empresas de aliar sucesso financeiro a equilíbrio
ambiental e social responsável vem sendo aceita como uma fórmula de
definição de desenvolvimento sustentável. Isso porque atende às
necessidades presentes sem comprometer a capacidade das futuras
gerações de satisfazerem suas próprias necessidades.
As grandes discussões e os relatórios anuais da política das maiores
empresas do mundo incluem, atualmente, a governança corporativa, a
responsabilidade social e seus stakeholders como temas-chave para sua
sustentabilidade econômica e social. A busca da sustentabilidade tornou-se
uma urgência e não pode ser conquistada por uma única cooperação.
Assim, as estratégias pensadas para orientar as ações das empresas em
consonância com as necessidades sociais devem prever, além do lucro e da
satisfação de seus clientes, o bem-estar da sociedade, esse é o desafio. Essa
busca do desenvolvimento sustentável enfatiza que, para ocorrer a
sustentabilidade, devem ser utilizados programas consistentes, contínuos,
de resultados tangíveis, que disseminem conhecimento e promovam o
crescimento global. Essas novas oportunidades nos negócios encontram
eco com a diminuição de custos e riscos, com o aumento de rendimentos e a
participação no mercado.

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Alexandra Zottis, Denise Russo e Margarete Panerai Araújo (organizadoras)

Os exemplos desses novos desempenhos vêm sendo os melhores na


geração de valor, pois a prática da sustentabilidade consegue progressos
significativos, que mobilizam, sensibilizam e ajudam as empresas a gerir seus
negócios de forma mais responsável. A nova visão contemporânea da gestão
sustentável inclui a governança corporativa e as práticas sociais responsáveis.

Referências
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Econômica. São Paulo: Atlas, 2005.
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Negócios. São Paulo: Saraiva, 2002.
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Necessidade e/ou Possibilidade? Santa Cruz do Sul: Edunisc, 1997.
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48
Sustentabilidade: uma abordagem social

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49
Alexandra Zottis, Denise Russo e Margarete Panerai Araújo (organizadoras)

50
Sustentabilidade: uma abordagem social

Inovação e Conhecimento:
desafios para a Sustentabilidade
1
Ernani César de Freitas

Introdução
A proposta deste estudo é avançar no debate reflexivo e formador
sobre a inovação, o conhecimento e a sustentabilidade na sociedade
contemporânea, sem perder de vista as especificidades das organizações e
as complexidades do conhecimento.
Além disso, pretende-se, neste trabalho, explorar a necessidade de
discussão acerca da temática Inovação, Conhecimento e Sustentabilidade,
bem como proporcionar uma reflexão de cunho humanista, que procura
descolar a inovação apenas dos processos tecnológicos e da atividade
empresarial. Nessa tentativa, procurou-se percorrer caminhos reflexivos
que possibilitem a inclusão de outras áreas do conhecimento, além das
tradicionais exatas e tecnológicas.
Assim, esses movimentos, delimitados pela abrangência deste estudo,
suscitam uma reflexão sobre o ser e o processo à luz da inovação e seus
desdobramentos, através da seguinte problematização: o que é inovação? O
que é conhecimento? Como inovação e conhecimento articulados podem
gerar sustentabilidade nos contextos sócio-organizacionais?
Ações e reações diante do mundo globalizado sugerem que se deve
sair da zona de conforto em que se encontram as organizações, para
encontrar novos modelos, novas tecnologias e novos parceiros na busca e

1
Doutor em Letras, área de concentração Lingüística Aplicada (PUCRS); Mestre em
Lingüística Aplicada (UNISINOS); MBA Executivo na FGCRJ; pós-graduado em Gestão
Empresarial (UFRGS. Professor pesquisador no Centro Universitário Feevale; e-mail:
ernanic@feevale.br.

51
Alexandra Zottis, Denise Russo e Margarete Panerai Araújo (organizadoras)

melhoria das soluções em vez de usar a mesma mentalidade, esperando


resultados diferentes, mas que não resolvem os mesmos desafios.
É preciso visão, inovação, ousadia e espírito empreendedor, para dar
um grande salto rumo a um mundo diferente. A escala de desafios é imensa
e exige abordagens radicais para mudanças essenciais, transposição de
consciência, desenvolvimento espiritual, conciliando razão e emoção,
cabeça e coração. São essas as principais exigências do cenário global para
uma evolução sustentável.
Uma revisão dos valores humanos, diante de uma crise civilizatória,
impõe ainda o exercício do diálogo com alicerce na ética, capaz de conciliar
e agregar três forças distintas: o chamado primeiro setor, ou poder público;
o segundo setor, constituído pelo poder privado; e o terceiro setor,
representado pelas organizações não-governamentais.
Construir um ambiente institucional favorável à evolução sustentável exige
da sociedade um nível mínimo de conscientização sobre o desafio e de consenso
sobre as possíveis soluções: ações articuladas entre Estado, empresas e sociedade
civil. O caminho da transformação exige estratégia, metodologia, persistência e
muita coerência. Requer o reconhecimento de políticas públicas como fator de
universalização de interesses coletivos e a coerência dos agentes econômicos
entre esse consenso e suas práticas cotidianas.
A capacidade de articulação entre governo, empresa e sociedade civil
vai determinar a velocidade da mudança de atitude, que pode acelerar a
transição de um mundo baseado em um modelo esgotado de relações
ambientais, sociais e econômicas para a nova era do Conhecimento e da
Sustentabilidade. Não por acaso, a falta de articulação institucional, entre
empresas, setor público e sociedade civil, tem sido apontada como principal
obstáculo à incorporação dos desafios da sustentabilidade aos objetivos e às
ações estratégicas das organizações. Os desafios são incomensuráveis e a
labuta, inesgotável.

Dinâmica Inovativa
Nas transformações em curso desde as últimas décadas do século XX,
projeta-se o papel estratégico da informação e do conhecimento em diferentes
dimensões da vida em sociedade. Este trabalho parte do reconhecimento de
que a produção, a socialização e o uso de conhecimentos e informações, assim
como a conversão destes em inovações, constituem processos socioculturais e
que tais práticas e relações se inscrevem no espaço e na própria produção do
espaço, em suas várias escalas.
No final do século XX, conforme Mota (1998, p. 03), “o processo de

52
Sustentabilidade: uma abordagem social

mudança tecnológica atingiu uma velocidade e importância nunca antes


vistas na história humana”. As aceleradas, profundas e abrangentes
transformações marcaram o esgotamento da sociedade industrial, e o
ingresso na sociedade do conhecimento colocou-se como fator-chave para
o desenvolvimento econômico e social de regiões e países.
Desse modo, a valorização das atividades de ciência e tecnologia e de
pesquisa e desenvolvimento, para estados nacionais, empresas e
universidades, são evidências claras desse processo.
Nesse contexto, as inovações em tecnologia e conhecimento surgem
como as variáveis decisivas para alcançar e sustentar vantagens competitivas
de empresas, setores e espaços econômico-sociais. Elas são tão decisivas
que, quase sempre, inovação e uso de tecnologias ou novas tecnologias
aparecem como sinônimos, o que é bastante equivocado.
Sabe-se que a dinâmica da inovação depende mais dos processos de
aprendizagem do conhecimento do que da disponibilidade de recursos,
assim como seu impulso ocorre de maneira sistêmica. Desta forma, ela está
fortemente vinculada aos processos de interação entre as organizações e os
agentes que permitem gerar, reproduzir e retroalimentar processos de
aprendizagem e convertê-los em atividade inovadora. Ainda que a empresa
seja considerada a unidade básica para materializar a acumulação
tecnológica, seu desempenho está fortemente condicionado à densidade da
infra-estrutura tecnológica existente no seu entorno, como, por exemplo,
nas universidades e nos segmentos que trabalham com pesquisa e inovação,
que pode assegurar externalidades dinâmicas positivas. Observa-se essa
circunstância na forte integração das atividades dos sistemas de ciência e
tecnologia dos países de economia industrial avançada.
O início do século XXI, caracterizado por uma maciça revisão de
valores éticos nas corporações e na sociedade em geral, traz à tona das
discussões acadêmicas e das estratégias empresariais a preocupação com a
solução de problemas sociais fundamentais (FISCHER, 2002). De acordo
com o discurso vigente, novas combinações de recursos, sob a forma de
inovações em suas diversas configurações, são necessárias e urgentes para o
alcance de metas mundiais de desenvolvimento sustentável.
A importância do processo e das formas de organização do
conhecimento está associada à consciência dos cientistas sobre o papel que
exercem a informação e a tecnologia no contexto produtivo
contemporâneo. Nele, a importância crescente do conhecimento associa-se
à sua capacidade de responder às necessidades sociais.
A inovação tecnológica pressupõe o desenvolvimento de uma idéia,

53
Alexandra Zottis, Denise Russo e Margarete Panerai Araújo (organizadoras)

utilizando uma infra-estrutura adequada, que permita a produção de um


bem ou serviço com qualidade, que satisfaça as condições exigidas para seu
uso prático. Ela está associada ao desenvolvimento de produtos intensivos
em conhecimento, que possibilitem aos seus consumidores interagirem
com seu meio social.
Toda a seqüência tecnológica visa a um único fim: o desenvolvimento,
força motriz da competitividade. Barreto (1992, p. 13) entende que o
desenvolvimento “compreende o uso sistemático de conhecimentos
científicos ou não, em geral provenientes da própria pesquisa, visando a
produção de novos materiais, produtos, equipamentos e processos”.
Para Schumpeter (2002), em artigo escrito em 1932, desenvolvimento
pode ser definido como a transição de um modelo de sistema econômico
para outro modelo, sendo que o caminho dessa transição não pode ser
decomposto em passos infinitesimais. O desenvolvimento só acontece com
capacitação tecnológica. É necessário que o setor produtivo a possua para
que possa se instalar a inovação.
Schumpeter, considerado o pai da inovação, categorizava-a como a
“introdução de um novo produto ou um novo método de produção; a
abertura de um novo mercado; a descoberta ou conquista de uma nova
fonte de matéria-prima ou a introdução de uma nova estrutura de mercado”
(apud BERNARDES; ALMEIDA, 1999, p. 89). O que se observa é que
existem duas ramificações: área mercadológica – foco do usuário – e área
produtiva – novidades nos processos, produtos e serviços.
Inovação é a capacidade de conceber e incorporar conhecimentos
para dar respostas criativas aos problemas (FINQUELIEVICH, 2005). A
inovação e o conhecimento são fundamentais para a criação de uma
sociedade humana sustentável. Como sociedade, não seremos capazes de
ser bem-sucedidos na criação de um mundo sustentável, se nos
preocuparmos unicamente em ser mais eficientes naquilo que já fazemos.
No entanto, as tecnologias inovadoras são descobertas, desenvolvidas
e comercializadas num ambiente que consiste em mercados, cadeias de
fornecimento e redes de distribuição, a par de uma série de tendências
perturbadoras social e ambientalmente: ecossistemas e sistemas de apoio
social ameaçados, um afastamento cada vez maior entre ricos e pobres, falta
de acesso às verdadeiras fontes de conhecimento, mesmo estando inseridos
num mundo pleno de informação e de grandes preocupações com os
efeitos da globalização.
Será que a inovação e a tecnologia podem fazer parte da solução para
reverter essas tendências negativas? Se assim for, como deve o mundo

54
Sustentabilidade: uma abordagem social

empresarial atuar, de forma a que a inovação tenha um impacto positivo


sobre essas tendências e, ao mesmo tempo, crie valor para as empresas?
Dosi (1988) discute o processo da inovação tecnológica como uma
mudança de paradigma, visto que a busca pela descoberta, pelo
desenvolvimento, pela imitação e pela adoção de produtos é a sua essência.
Freeman e Perez (1986 apud Dosi, 1988) já utilizavam a expressão
“paradigma tecnológico” para descrever esse processo.
Através desse conceito expandido de inovação, entendemos ser
possível avançar para diversas possibilidades. Na dimensão organizacional,
a inovação pode ser tecnológica (produtos e serviços melhorados ou
desenvolvidos e gerados para o mercado) ou administrativa (estrutura
organizacional e processos administrativos melhorados ou desenvolvidos e
gerados). Na dimensão cultural e econômica, pode-se identificar a inovação
radical (que requer um conhecimento muito diferente daquele já existente,
tornando este último obsoleto) ou incremental (que se apóia no
conhecimento existente, sem destruí-lo). A inovação radical é considerada
como destruidora das competências antes adquiridas, pois se instala
solicitando novíssimas habilidades para a implantação de novíssimos
métodos. Já a inovação incremental é considerada como “alavancadora” de
competências, pois é uma evolução do que já se sabe, ou seja, agrega novas
habilidades.
Independente do grau de novidade de uma inovação, a consideração
principal é que ela garanta a sustentabilidade da organização em sua missão
institucional. Barbieri (1997a) mostra diversos modelos de processos de
inovação, dentre eles, o demand pull, que é um modelo linear, em que a
necessidade do mercado é a propulsora da geração de idéias.

Conhecimento como capital social


O conhecimento é o principal capital de uma organização. Com todo o
investimento em aprendizagem, o conhecimento adquirido pelos
servidores não é mais um ativo pessoal, mas também da organização. Da
mesma forma com que administramos os demais ativos, devemos passar a
gerenciar o capital intelectual, uma prática que requer evitar a sua
depreciação e garantir identificação, armazenamento, localização e
recuperação adequados e, principalmente, o seu compartilhamento. Isso
abrange o conhecimento explícito, sistematizado, e também o
conhecimento tácito, que se depreende na prática individual e grupal.
Quanto mais o conhecimento for compartilhado e recuperado, de forma
organizada, mais os indivíduos poderão capitalizar seu próprio

55
Alexandra Zottis, Denise Russo e Margarete Panerai Araújo (organizadoras)

conhecimento, aumentando, exponencialmente, a massa intelectual.


O conhecimento é socialmente moldado, possuindo não apenas uma
dimensão temporal/histórica, mas também espacial/territorial. Ainda que
se possa fazer referência a um conceito genérico de conhecimento, os
conhecimentos são específicos e diferenciados. Em um mesmo contexto
econômico e sociocultural, o conhecimento diferencia-se segundo áreas e
comunidades de especialistas, segmentos e agentes econômicos, segmentos
e grupos sociais, empresas e organizações, constelações regionais e redes
sociais e produtivas (FORAY, 2000; ALBAGLI; MACIEL, 2003).
A capacidade de gerar, de adaptar/recontextualizar e de aplicar
conhecimentos, de acordo com as necessidades e especificidades de cada
organização, país e localidade, é, portanto, central. Desse modo, tão
importante quanto a capacidade de produzir novo conhecimento é a
capacidade de processar e recriar conhecimento, por meio de processos de
aprendizado; e, mais ainda, a capacidade de converter esse conhecimento
em ação, ou, mais especificamente, em inovação. Isso é particularmente
relevante no caso de países em desenvolvimento. Importa, sobretudo,
compreender e conhecer "os mecanismos endógenos de criação de
'competências' e de transformação de conhecimentos genéricos em
específicos" (YOGUEL, 1998, p. 4).
O aprendizado, por sua vez, não se limita a ter acesso a informações;
consiste na aquisição e construção de diferentes tipos de conhecimentos,
competências e habilidades. A informação serve, fundamentalmente, à
circulação ou ao transporte de conhecimentos (LATOUR, 1987), mas não
necessariamente gera conhecimento; não é, por si só, capaz de alterar estruturas
cognitivas. O aprendizado deve ser pensado como relação social, como um
processo em que "as pessoas não só são participantes ativos na prática de uma
comunidade, mas também desenvolvem suas próprias identidades em relação
àquela comunidade" (HILDRETH; KIMBLE, 2002, p. 23).
Esse debate reflete também a afirmação de um conceito mais
abrangente de inovação para além da inovação tecnológica. Nesse, valoriza-
se não apenas o conhecimento formalizado e dito avançado (conhecimento
científico-tecnológico), mas também o conhecimento não-formalizado,
construído nas práticas econômicas e socioculturais - os conhecimentos de
indivíduos, em seus papéis de trabalhadores, consumidores e cidadãos, de
organizações públicas e privadas, de populações, comunidades e povos
tradicionais, entre outros grupos e segmentos. Em contrapartida, boa parte
do próprio conhecimento científico também é tácita, assim como o dito
conhecimento prático pode ser, em parte, codificado.

56
Sustentabilidade: uma abordagem social

Cada local ou região dispõe, assim, de diferentes combinações de


características e bens coletivos - físicos, sociais, econômicos, culturais,
políticos, institucionais -, que influenciam sua capacidade de produzir
conhecimento, de aprender e de inovar. E, no sistema de relações que
configuram o ambiente local, a dimensão cognitiva dos atores - expressa em
sua capacidade de tomar decisões estratégicas e em seu potencial de
aprendizado e inovação - é determinante de sua capacidade de capitanear os
processos de crescimento e mudança, ou seja, de desenvolvimento local.
Nessas interações locais, desenvolve-se um conhecimento coletivo, o
qual é diferenciado e desigualmente distribuído, podendo ou não constituir
importante fonte de dinamismo para aquele ambiente. Esse conhecimento
coletivo não corresponde, simplesmente, à soma de conhecimentos de
indivíduos e organizações, pois resulta das sinergias geradas a partir dos
vários tipos de interação, e altera-se, inclusive, na sua interseção com a
circulação globalizada de informação e conhecimento.
As chamadas aglomerações produtivas, científicas, tecnológicas e/ou
inovativas, tais como distritos industriais, clusters, milieux inovadores, arranjos
produtivos locais, entre outros (CASSIOLATO; LASTRES, 1999), são
consideradas ambientes propícios a interações, à troca de conhecimentos e ao
aprendizado, por meios diversos, tais como a mobilidade local de
trabalhadores; as redes formais e informais; a existência de uma base social e
cultural comum, que dá o sentido de identidade e de pertencimento.
A construção de novos formatos organizacionais e a ênfase em
atividades de parceria, prestação de serviços, intercâmbios e convênios
envolvendo empresas, governos, universidades, incubadoras e centros de
pesquisa em regras múltiplas e variáveis passam a constituir a pré-condição
para qualquer inovação. A crítica aos padrões lineares e simplistas de
inovação, que enfocavam as relações estritas entre mercado e indústria,
permitiu a construção de uma agenda de pesquisa centrada na difusão de
informações e conhecimento e de novas variáveis de análise (NICOLAS;
MYTELKA, 1994).
Portanto, ocorre uma abrangência cada vez maior do conceito de
inovação, que passa a incorporar bens intangíveis em adição às variáveis
econômicas presentes nas discussões anteriores. A produção e a circulação
de conhecimento, tácito ou codificado, passam a ser consideradas um
elemento essencial para a efetivação das práticas de inovação tecnológica. A
passagem de formas de conhecimento, em atuação pública ou privada,
redefine o sentido da inovação, de modo que a capacidade de gerar, de
adaptar/recontextualizar e de aplicar conhecimentos, de acordo com as

57
Alexandra Zottis, Denise Russo e Margarete Panerai Araújo (organizadoras)

necessidades de cada organização, país e localidade, é, portanto, central.


Desse modo, “tão importante quanto a capacidade de produzir novo
conhecimento é a capacidade de processar e recriar conhecimento, por
meio de processos de aprendizado; e, mais ainda, a capacidade de converter
esse conhecimento em ação, ou, mais especificamente, em inovação [...]”
(ALBAGLI; MACIEL, 2004, p. 10).
O contexto de comunicação entre os agentes participantes da prática
inovativa torna-se assim o pressuposto para que ocorra um
compartilhamento de códigos e iniciativas e, desse modo, o fluxo de idéias e
práticas cooperativas.
De acordo com essa corrente de pensamento, a inovação depende
menos de investimento intensivo de capital e inventividade técnica, e mais
da criação de redes de circulação de informação e conhecimento. A
problemática da inovação torna-se menos tecnológica e mais pedagógica,
adquire um sentido econômico (distributivo) e social (coesão) que
transcende os ditames operacionais e funcionais dos objetos técnicos.
A prática da gestão e do compartilhamento do conhecimento e dos
bens intangíveis constitui o meio e o fim da atividade dos inovadores. Faz-se
necessário expandir o conceito de inovação de forma a incluir as condições
coletivas para a qualificação de profissionais, aperfeiçoamento de parcerias
e agilidade corporativa (MACIEL, 2002; GIBBONS et al., 1994).
Para a inovação se fortalecer como prática tecnológica, ela precisa
apresentar sua positividade, seu potencial de articulação entre as máquinas e
as instituições sociais. E, nesse sentido, a indeterminação e a insegurança
garantem a originalidade e o sucesso dos procedimentos inovativos.
Nesse sentido, então, quando se pensa em Gestão do Conhecimento,
há uma superposição na direção das análises “micro” (indivíduos e grupos),
“meso” (organização) e “macro” (ambiente). Reconhece-se, assim, que o
aprendizado e a criação individual incluem a capacidade de combinar
diferentes inputs e perspectivas, que o aprendizado organizacional demanda
uma visão sistêmica do ambiente e a confrontação de modelos mentais
distintos e, finalmente, que o processo de inovação requer, crescentemente,
a combinação de diferentes habilidades, conhecimentos e tecnologias de
campos distintos do conhecimento e mesmo de diferentes setores
econômicos e sociais.

Sustentabilidade e desenvolvimento
Desde há muito, as questões do desenvolvimento foram tratadas
como um patamar mais elevado do que o simples crescimento econômico.

58
Sustentabilidade: uma abordagem social

Se a ligação entre crescimento econômico e coesão social, nos âmbitos


nacional, regional e global, constituíram um dos primeiros traços
diferenciadores, a proteção ambiental somou-se a essas preocupações,
quando o desenvolvimento econômico começou a pôr em causa o futuro
para as novas gerações.
O agravamento dos problemas ligados a uma inadequada gestão dos
recursos naturais, com os riscos inerentes à proteção do equilíbrio físico,
juntou-se aos problemas da desigualdade na distribuição da riqueza e do
progresso científico.
É neste contexto que se desenvolvem preocupações e políticas em
nível global, regional, nacional e local, focalizadas na preocupação com a
sustentabilidade do desenvolvimento, tendo em conta as futuras gerações e
o equilíbrio entre o desenvolvimento econômico, social e ambiental.
A expressão sustentabilidade teria aparecido, pela primeira vez, em
1980, num relatório da International Union for the Conservation of Nature
and Natural Resources (IUCN), World Conservation Strategy, que sugeria
esse conceito como uma aproximação estratégica à integração da
conservação e do desenvolvimento coerente com os objetivos de
manutenção do ecossistema, preservação da diversidade genética e
utilização sustentável dos recursos.
O conceito de desenvolvimento sustentável foi mais tarde consagrado
no relatório "O Nosso Futuro Comum", publicado em 1987 pela World
Commission on Environment and Development, uma comissão das
Nações Unidas, chefiada pela então primeira-ministra da Noruega, Gro
Harlem Brundtland.
O Relatório Brundtland (1987), como ficou conhecido o documento,
definia desenvolvimento sustentável como o "[...] desenvolvimento que
satisfaz as necessidades do presente, sem comprometer a capacidade das
gerações vindouras satisfazerem as suas próprias necessidades”.
A noção de desenvolvimento sustentável tem implícito um
“compromisso de solidariedade com as gerações do futuro”, no sentido de
assegurar a transmissão do “patrimônio” capaz de satisfazer as suas
necessidades. Implica a integração equilibrada dos sistemas econômico,
sociocultural e ambiental,e dos aspectos institucionais relacionados com o
conceito muito atual de "boa governança".
A idéia da sustentabilidade coloca-se como contraponto ao caráter
perdulário do modelo prevalecente, na medida em que a economia, por um
lado, está baseada no desperdício da matéria-prima fornecida pela natureza
num padrão de consumo descompassado com o seu ritmo e sua capacidade de

59
Alexandra Zottis, Denise Russo e Margarete Panerai Araújo (organizadoras)

fornecimento e, por outro, tem tratado a natureza como mero depositário de


resíduos, sem considerar sua capacidade de absorção e reciclagem. A
sustentabilidade contrapõe-se, por fim, à característica antropocêntrica do
modelo: o homem como centro da questão numa postura dominante sobre o
entorno natural, cujas ferramentas científicas e tecnológicas embasam uma
economia que subjuga a natureza, colocando-se acima desta.
Portanto, pensar em sociedade sustentável obriga a imaginar uma
sociedade que não seja injusta e que necessita ser reconstruída. Logo, estamos
diante de questões básicas quanto à forma e ao conteúdo: um dilema para toda
a humanidade. Como construir o novo e com que ferramentas? São questões a
partir das quais as distintas visões de mundo são estabelecidas e os projetos
disputados. Condicionam os saberes, constroem os objetivos, estabelecem as
estratégias e determinam as atitudes. Estão alicerçadas e alicerçam valores e
princípios e determinam a ética.
Porém, o que mais dizer sobre o assunto que ainda não foi dito? Com
relação à forma, o pensamento de Paulo Freire (1986) continua mais
oportuno do que nunca: “[...] a educação necessita ser libertária”. Da
mesma forma, com relação a Bertold Brecht: “[...] a ciência só tem sentido
se for para aliviar o sofrimento humano”. E cabe repetir à exaustão as
palavras de Albert Einsten: “[...] você não pode resolver um problema
usando o mesmo tipo de raciocínio que o criou”. É evidente que o novo –
sustentável – necessita ser construído a partir dessas premissas. Caso
contrário, é a repetição do velho travestido do novo que utiliza as mesmas
ferramentas para a construção da espiral de injustiça, que o idioma espanhol
permite expressar tão bem: ...más de lo mismo.
Com relação ao conteúdo, apesar do vertiginoso avanço científico e
tecnológico, da velocidade de sua geração, do reconhecimento de que o
homem foi capaz de gerar mais conhecimentos nos últimos 50 anos do que
em toda a sua própria história, o equilíbrio entre os aspectos quantitativos e
qualitativos do desenvolvimento ainda não foi alcançado.
O desafio multidimensional abriu-se para todas as organizações da
sociedade que buscam uma gestão duradoura e equilibrada. Os
componentes vetores dessa busca podem ser assim descritos, como o
foram claramente na Agenda 211 (BARBIERI, 1997b):
– crescimento e manutenção da economia do sistema no qual a

2
A Agenda 21 Local é um processo participativo, multissetorial, que visa a atingir os objetivos
da Agenda 21 em nível local, através da preparação e implementação de um plano de ação
estratégico de longo prazo dirigido às prioridades locais para o desenvolvimento sustentável.

60
Sustentabilidade: uma abordagem social

organização está inserida;


– a qualidade desse crescimento: o sistema de tomada de decisões, a
inclusão dos stakeholders (traduzido como interessados em determinada
iniciativa; alguém que é afetado pelos resultados daquele empreendimento),
a composição de parcerias, as necessidades sociais presentes e futuras;
– a consideração das necessidades de todos;
– a manutenção dos níveis populacionais sustentáveis;
– conservação e melhoria da base de recursos naturais;
– reorientação das relações comerciais internacionais;
– normatização e controle da poluição;
– geração de novas tecnologias;
– administração de riscos;
– inclusão do meio ambiente e da sociedade em todas as decisões;
– administração das taxas de substituição.
Como se vê, as variáveis incluídas na busca da sustentabilidade são
muitas e não terminadas. O sistema social ficou bastante complexo e, hoje,
há o reconhecimento de que os elementos acima citados são indissociáveis e
que, alterando um deles, modifica-se o todo. O isolamento de qualquer das
variáveis pode conduzir a uma tomada de decisão errada, a investimentos
equivocados, a resultados não desejados.
Para Mello (1999), a busca da sustentabilidade está na capacidade
organizacional de dialogar e viver na dinâmica do sistema complexo, de
modo a otimizar todos os aspectos intrínsecos a ele. Esse diálogo da
organização busca articular as várias informações (científicas, sociais,
econômicas, etc.) em um todo consistente e coerente, para manter uma
uniformidade, sem sufocar a criatividade humana.
Melo (1999) cita como fonte os estudos apoiados na Complexidade,
3
elaborados, entre outros, por Edgar Morin , que aponta para a existência de
fenômenos organizacionais de duas ordens: uma autônoma e outra
dependente. Na autonomia, tem-se aquilo que é interno ou próprio à
organização e que dá a sua identidade. Na dependência, têm-se os diversos
níveis de relações. A questão é que não existe a linearidade da relação causa e
efeito, mas, sim, o constante fluxo e refluxo, em que causas e efeitos se
alternam como origens e conseqüências dos fenômenos, gerando uma
complexa sinergia.
Sachs (1993 apud Oliveira, 2002) propõe cinco dimensões que devem
ser consideradas na sustentabilidade da organização: a) social; b)
3
Sociólogo e filósofo francês; um dos principais pensadores sobre Complexidade.

61
Alexandra Zottis, Denise Russo e Margarete Panerai Araújo (organizadoras)

econômica; c) ecológica; d) espacial; e) cultural. Nessa abordagem, fica clara


a necessidade de integrar, simultaneamente, na vida organizacional, os
diferentes aspectos do desenvolvimento humano, cada um com seu tempo,
seu ritmo e sua natureza.
Emerge, portanto, que a Sustentabilidade de uma organização é a
situação de busca equilibrada e permanente por manter saudáveis todos os
subsistemas envolvidos com a organização: a tecnologia, os
relacionamentos, as finanças, a qualidade dos serviços, os recursos naturais,
financeiros, a cultura local e o resultado social. Percebe-se que há sempre
uma vertente interna à organização e outra externa. A arte em equilibrar
esses dois lados da vida organizacional conduz a formas de planejamento
que atendam a ambos.
É fundamental, portanto, compreender a necessidade de educar com
base em novos valores e, conseqüentemente, novos princípios, que
embasarão estratégias e ações para a construção de um futuro melhor e que
possibilite a vida: o futuro sustentável.
A base desse conjunto de valores está alicerçada em Epicuro (341-270 a.
C), o “filósofo da amizade e do prazer”, que identificava a idéia de progresso,
do ponto de vista moral, com o bem soberano do prazer, o qual deveria ser
encontrado na prática da virtude e na cultura do espírito; assim, a busca da
perfeição faz parte da natureza humana, ensejando valores éticos previamente
definidos. Ele propunha, do ponto de vista material, os prazeres do sentido,
mas com parcimônia e comedimento e dizia: ...nada é suficiente para aqueles que o
suficiente é pouco... Este é o cerne da questão. Educar para construir o saber
pressupõe a ética da vida, na expressão de Leonardo Boff (2000).
E como construir a ética da vida? Como educar para isso? Novamente
voltamos à questão de forma e conteúdo. Fritjof Capra (1997) – visto de
soslaio em setores conservadores da academia - em seu livro “Teia da Vida”,
sugere-nos imitar a natureza, num processo que denomina de eco-
alfabetização, como base das ações em educação, administração, política,
economia, etc. Uma proposta de imitação de como os ecossistemas
funcionam e que exige compreender noções de interdependência,
diversidade, não-linearidade, eficiência energética, cooperação,
adaptabilidade, natureza cíclica, redes, etc. Nessa mesma perspectiva,
Filomena (2001) propõe que o “desenho ambiental sistêmico” poderia ser
um eixo único para a formação universitária, em que o objetivo seria a
formação do homo sistemicus. Aqui também estão presentes questões de
forma e conteúdo. Exigem-se conhecimentos científicos construídos
através da noção de felicidade e sua garantia para todos.

62
Sustentabilidade: uma abordagem social

São essas as premissas básicas para a sustentabilidade do


desenvolvimento ou, em outras palavras, para uma sociedade sustentável,
especialmente porque enseja, através da visão coletiva das comunidades, a
participação, reafirmando, assim, a importância da realidade local, através
da valorização e preservação de seu patrimônio histórico, cultural e natural,
que conformam os ecossistemas. É dessa maneira que devem ser
percebidos pelo conjunto de saberes, especialmente por aqueles que tratam
diretamente com a natureza.

Algumas Considerações
Diante das considerações feitas neste estudo, buscamos oferecer
respostas, subsídios para reflexões e estudos sobre a temática “Inovação,
Conhecimento e Sustentabilidade”, com o objetivo de estabelecer análises
que possibilitem reflexões valorativas e criativas para as organizações e, por
conseqüência, para a sociedade como um todo.
Nesse sentido, retomamos o questionamento: mas o que é inovação?
Percebe-se, de maneira geral, que ela deve ser entendida dentro da cultura
de cada organização interagindo com o ambiente.
Assim sendo, a inovação é uma ação pragmática e aplicada do
conhecimento na criação e transformação de produtos e processos,
buscando elementos de diferenciação e aproveitamento, de forma
incremental ou revolucionária dos paradigmas.
Ou ainda, inovação é ação pragmática e aplicada do conhecimento no
desenvolvimento e na transformação de produtos e processos, buscando
elementos de diferenciação e aprimoramento com vistas ao
desenvolvimento socioeconômico.
Nesse sentido, seria extremamente produtivo pensar nas múltiplas
dimensões que a inovação adquire, privilegiando as capacidades de fazer
com que as idéias se transformem em resultados concretos. Esse pode
constituir-se num exercício interessante, adequado e dentro de nossa
cultura organizacional, ampliando a participação e os resultados de um
verdadeiro tecido inovador corporativo e pessoal.
Em resumo, fica bastante evidente que o primeiro passo para a
construção do novo está na percepção individual da necessidade de
mudança. Nesse sentido, embora possa surgir de maneira espontânea a
partir das histórias individuais de cada um, é fundamental considerar os
mecanismos de potencialização, estímulo e catalisação que ensejem
participação e reflexão. Para tanto, faz-se mister a implantação de projetos

63
Alexandra Zottis, Denise Russo e Margarete Panerai Araújo (organizadoras)

pedagógicos que construam novos princípios e valores e que afirmem seu


compromisso com os interesses coletivos e a formação crítica, criativa e
capaz de transformar a realidade.
As atitudes inter e transdisciplinares, apesar de necessitarem ser mais
bem identificadas, sistematizadas e metodologicamente construídas, são
fontes de riqueza e fundamentais para superar os gigantescos desafios que
se colocam para a construção do novo. A transdisciplinaridade coloca-se
como uma extraordinária ferramenta para a educação, na medida em que
exige considerar os distintos saberes constituídos - científico, filosófico,
popular e religioso – na interpretação, nas soluções e na harmonização das
relações entre os componentes da biosfera, incluído o homem, e sobre os
quais a sociedade ainda não está preparada, tanto em forma como em
conteúdo.
Nunca, como agora, foi tão necessário ousar em busca do
efetivamente “novo”, assim como considerar a afirmativa de
Schopenhauer: Novas idéias são primeiramente ignoradas, depois são ridicularizadas,
depois são violentamente combatidas, depois são adotadas como evidentes, justamente
pelos que as combatiam...

Referências
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In: LASTRES, H. M. M.; CASSIOLATO, J. E.; MACIEL, M. L. (orgs.).
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66
Sustentabilidade: uma abordagem social

Sustentabilidade e Turismo:
Reflexões e Perspectivas para o
*
desenvolvimento
1
Mary Sandra Guerra Ashton

Introdução
O Turismo tem se apresentado como um fenômeno social de
importância econômica e cultural, em crescimento em nível mundial, o que
reforça a relevância em analisar o tema proposto sob a perspectiva do
desenvolvimento sustentável. Sua complexidade exige a participação de vários
atores, desde a formatação dos produtos e serviços até a consolidação dos
destinos turísticos, além da necessidade de compreender como as relações
sociais, econômicas, culturais e ambientais são estabelecidas.
Assim, a viagem turística tornou-se um dos mais importantes
fenômenos humanos do novo século. Em 2005, foram registrados 808
milhões de turistas estrangeiros; em 2006, foram contabilizados 842
milhões de viajantes no mundo, perfazendo um crescimento de 4,5% em
relação ao ano anterior. A Europa, por sua vez, conseguiu atrair um público
de 458 milhões de turistas, sendo que 76 milhões ficaram na França, país
que ocupa o primeiro lugar no ranking mundial em número de chegadas de
turistas. O maior crescimento, no entanto, foi registrado na América do Sul,
com 7,2%, conforme dados divulgados pela Organização Mundial do

*
Este trabalho é parte das investigações realizadas no Grupo de Pesquisa em Desenvolvimento
Regional, na linha de Desenvolvimento Regional e Globalização, para a pesquisa intitulada: “O
Desenvolvimento Regional Endógeno e suas manifestações, a partir das contribuições
observadas na Cadeia Produtiva do Turismo na Região do Vale do Rio dos Sinos”.
1
Doutora e Mestre em Comunicação Social – PUCRS. Especialista em Produção e Gestão
do Turismo. Bacharel em Turismo pela PUC/RS. Atua como professora e pesquisadora no
Centro Universitário Feevale/RS, no Grupo de Pesquisa em Desenvolvimento Regional. E-
mail: marysga@feevale.br.

67
Alexandra Zottis, Denise Russo e Margarete Panerai Araújo (organizadoras)

Turismo – OMT2.
Em nível mundial, a busca de soluções para os problemas
socioambientais reúne investigadores e governantes desde o final do século
XX. O alerta parte de que é preciso ter consciência de que a sustentabilidade
do desenvolvimento está intimamente associada à redução das
desigualdades sociais, priorizando projetos centrados na solução da
exclusão social e das disparidades regionais. O desenvolvimento sustentável
está centrado na relação homem-natureza, enfocando a utilização racional
dos estoques de recursos naturais. Portanto, o compromisso social deve ser
o ponto de partida para o desenvolvimento sustentável, que pressupõe a
convergência dos planos e projetos na direção das expectativas das pessoas,
com relação ao seu futuro e à sua qualidade de vida. Deve, ainda, ser
complementado com o processo participativo de construção, no qual as
instituições políticas, a sociedade civil e os grupos de interesse organizados
encontrem espaço para exercer o seu papel de representação política e
institucional como agentes de transformação.
Dessa forma, o artigo propõe uma reflexão a partir da relação entre
Turismo e sustentabilidade, voltado para uma perspectiva que envolve o
desenvolvimento econômico, que tem como vetor o tripé formado pelo
compromisso social, pela utilização dos recursos naturais e pelo processo
participativo, focado no bem-estar da população. Para tanto, busca
fundamentos na compreensão do fenômeno Turismo, desenvolvido por
De La Torre (1997) e Turismo sustentável, conforme a ONU (1995), Beni
(2004) e Mares Guia (2006); de sustentabilidade, segundo a Rede de
Cooperação para a Sustentabilidade (2003) e Bueno (2008); e na noção de
desenvolvimento, conforme Sen (2000), Veiga (2006) e Barquero (2002).
Quanto à metodologia, assume um caráter de pesquisa exploratória com
revisão bibliográfica.
Portanto, este artigo foi estruturado da seguinte maneira: inicialmente,
aborda os conceitos de sustentabilidade, buscando a compreensão do
termo na sua amplitude. Num segundo momento, foi apresentada a
contextualização acerca do Turismo como um fenômeno social de
importância econômica, para, em seguida, tratar da questão do
desenvolvimento que possa, efetivamente, contribuir com o bem-estar e a
melhoria da qualidade de vida da população, contemplando as esferas
social, cultural, ambiental e econômica.
2
OMT - Declaração do Secretário Geral, Francesco Frangialli, em 29/01/2007. Disponível
em: <http://www.oglobo.com.br>. Acesso em: setembro de 2007.

68
Sustentabilidade: uma abordagem social

Sustentabilidade: redefinindo as ações da coletividade


As discussões em torno da sustentabilidade estão, cada vez mais,
chamando a atenção de estudiosos de todos os setores e em todo o mundo.
O aquecimento global, os altos índices de poluição dos rios e mares, a
devastação das florestas tropicais, o inchaço dos centros urbanos, o uso
racional dos recursos naturais, a reciclagem, a ética e a cidadania, além de
outros temas, figuram entre as principais preocupações em nível mundial.
Na busca de soluções para esses problemas, com investimentos da ordem
pública e da privada, surge a sustentabilidade e seu conceito vem sendo
amplamente discutido em seminários e congressos mundiais, os quais
esclarecem que empresas e indivíduos devem se preocupar com as
conseqüências de suas ações (ENDEAVOR, 2007).
A sustentabilidade tem a ver com a biodiversidade e com a
sociodiversidade e só pode ser construída/realizada pela mobilização da
coletividade. Tem ligação com a redução da pobreza, com os direitos das
crianças e dos adolescentes, com o acesso à educação e ao trabalho, com a
solidariedade, com o respeito à diversidade e à liberdade de expressão. Está
vinculada, ainda, à valorização dos saberes e do conhecimento. Ela decorre
das políticas públicas, coordenadas pelos governantes, mas também de
decisões individuais (BUENO, 2008).
Portanto, a sustentabilidade envolve questões econômicas, sociais,
culturais e ambientais, sendo que o seu nível de influência e de compreensão
abrange a cultura e a sociedade, estando diretamente ligada aos indivíduos e
ao seu comportamento e, principalmente, às suas ações. Assim, adquire um
aspecto sistêmico, relacionado com a continuidade dos elementos
intrínsecos ao desenvolvimento humano, não podendo ser compreendida
apenas relacionada às questões ambientais. Para tanto, comporta sete eixos
fundamentais, conforme desenvolvido pela Rede de Cooperação para a
Sustentabilidade - Catalisa (2003):

Sustentabilidade Social – envolve as questões ligadas à melhoria da


qualidade de vida da população, à eqüidade na distribuição de renda e à
diminuição das diferenças sociais, com participação e organização popular.

Sustentabilidade Econômica – trata do público e do privado, da


regularização do fluxo desses investimentos, da compatibilidade entre
padrões de produção e consumo, do equilíbrio de balanço de pagamento,
do acesso à ciência e à tecnologia.

69
Alexandra Zottis, Denise Russo e Margarete Panerai Araújo (organizadoras)

Sustentabilidade Ecológica – encontra-se vinculada ao uso dos


recursos naturais, com o objetivo de minimizar danos aos sistemas de
sustentação da vida: redução dos resíduos tóxicos e da poluição, reciclagem
de materiais e energia, conservação, tecnologias limpas e de maior eficiência
e regras para uma adequada proteção ambiental, conforme a figura 1.

Figura 1
3
Fonte: Biólogo Ingo Hübel

Sustentabilidade Cultural – está relacionada ao respeito aos diferentes


valores entre os povos e incentivo a processos de mudança que acolham as
especificidades locais, além da manutenção dos valores e da cultura locais,
visando à preservação do patrimônio cultural (material e imaterial).

Sustentabilidade Espacial – trata do equilíbrio entre o rural e o urbano,


do equilíbrio de migrações, da desconcentração das metrópoles, da adoção de
práticas agrícolas mais inteligentes e não agressivas à saúde e ao ambiente, do
manejo sustentado das florestas e da industrialização descentralizada.

3
Palestra: “Turismo Sustentável” apresentada pelo Biólogo Ingo Hübel, na Disciplina de
Tendências em Turismo, em 28/03/08, Curso de Turismo, no Centro Universitário Feevale.

70
Sustentabilidade: uma abordagem social

Sustentabilidade Política - no caso do Brasil, a evolução da


democracia representativa para sistemas descentralizados e participativos, a
construção de espaços públicos comunitários, maior autonomia dos
governos locais e descentralização da gestão de recursos.
Sustentabilidade Ambiental - conservação geográfica, equilíbrio de
ecossistemas, erradicação da pobreza e da exclusão, respeito aos direitos
humanos e integração social. Abarca todas as dimensões anteriores através
de processos complexos.

Portanto, os eixos que envolvem a sustentabilidade devem ser


contemplados com equilíbrio e igualdade por parte dos setores públicos e
privados, a fim de que possam garantir o bem-estar da população. Fazem
parte do desenvolvimento do ser humano na sua integridade e totalidade. A
sustentabilidade tem uma dimensão essencialmente humana e precisa ser
entendida dessa forma, conforme apresentado na figura 2.

Sustentabilidade
Ambiental
Sustentabilidade Sustentabilidade
ecológica Espacial

Sustentabilidade
Social

Sustentabilidade Sustentabilidade
Política Cultural

Sustentabilidade
Econômica

Figura 2

Desse modo, a sustentabilidade pode ser definida como “a capacidade


de desenvolver a atividade econômica atendendo as necessidades da
geração atual sem comprometer as gerações futuras” (ONU, 2007). Ou,
ainda, conservar o capital natural e cultural sem comprometer as
necessidades de futuras gerações, de uma maneira que o desenvolvimento
no presente seja possível. A sustentabilidade assume um papel fundamental
na sociedade e deve contribuir para diminuir as desigualdades e para
aprofundar as justiças, além de indicar caminhos, resgatar vivências e
experiências e convidar a todos para uma ação coletiva, solidária e corajosa
(BUENO, 2008). Desse modo, a sustentabilidade significa mais do que a

71
Alexandra Zottis, Denise Russo e Margarete Panerai Araújo (organizadoras)

soma das partes. Ela deriva de relações saudáveis, éticas, democráticas,


equânimes e socialmente justas.
Bueno (2008) relata que estudos e experiências recentes mostram que
não há incompatibilidade entre crescimento econômico e responsabilidade
social e ambiental. Muito pelo contrário: investir em tecnologias limpas e
cuidados socioambientais gera valor para as empresas no longo prazo. “O
cliente já começa a valorizar as empresas com preocupações de
sustentabilidade [...]. Ela não está, de forma alguma, dissociada do lucro”.4
Nesse sentido, torna-se importante destacar, ainda, o Compêndio para
Sustentabilidade, lançado em 2007, que trata da idéia de mostrar alternativas
para as organizações dos setores público, privado e das ONGs, que desejem
avançar na implementação da sustentabilidade em seu dia-a-dia. Com
patrocínio da Petrobrás, Comgas e patrocínio cultural de Anglo American
(versão em inglês), AES Tietê e da Lei de Incentivo à Cultura - Ministério da
Cultura, a publicação com o título – Ferramentas de Gestão de
Responsabilidade Socioambiental: Uma Contribuição para o
Desenvolvimento Sustentável - reúne ferramentas de apoio à gestão
sustentável utilizadas em 33 países e visa a ilustrar a imensa gama de
instrumentos que estão disponíveis no mundo.
Se quisermos orientar o desenvolvimento sustentável para o bem-estar
comum na sociedade, devemos utilizar os instrumentos disponíveis
que auxiliem na construção desses resultados. Quanto mais estas
ferramentas forem aplicadas e aprimoradas, mais as organizações terão
condições de integrar as práticas de responsabilidade socioambiental às
suas atividades cotidianas.5

Desse modo, a busca por novos indicadores, que possam ajudar


empresas, governos e pessoas a enxergar o mundo de maneira precisa, é
necessária, para que se avalie, de forma concreta, a utilidade social das
atividades. Só assim se pode construir uma base para decisões políticas e
criação de estratégias empresariais condizentes com o estado atual do
mundo, de escassez e insustentabilidade.
4
Altair Assumpção, Diretor de Middle Market do Banco Real, no workshop “Sustentabilidade:
uma escolha que dá resultado”, o qual ocorreu em março de 2007 em São Paulo.
5
Declaração de Anne Louette, idealizadora do projeto Ferramentas de Gestão de
Responsabilidade Socioambiental: Uma Contribuição para o Desenvolvimento Sustentável.
Em outubro de 2007, antes do lançamento no Brasil, o Compêndio para a Sustentabilidade
foi apresentado no Fórum Mundial da Economia Responsável, em Paris, por Philippe
Vasseur, ex-ministro do governo Jacques Chirac.

72
Sustentabilidade: uma abordagem social

Conforme relata Cardoso (2008), entre as várias ações que vêm sendo
oferecidas para a compreensão e a contribuição da sustentabilidade,
destaca-se, ainda, a iniciativa do Instituto Ethos e a Usaid - Agência dos
Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional. As empresas
lançaram o Prêmio Inovação em Sustentabilidade, o qual contemplará a
melhor solução inovadora que contribua para o desenvolvimento
67
sustentável, que já esteja em uso e tenha demonstrado bons resultados.
Portanto, existe uma mobilização mundial unindo governos e civis, os
quais, por meio de investigações, congressos, conferências mundiais e
documentos oficiais disponibilizados para a população, vêm buscando
compreender, explicar e aplicar os conhecimentos acerca da
sustentabilidade de maneira ampla e abrangente, priorizando o
compromisso social.

Turismo: a sustentabilidade do destino


A partir de 1960, o Turismo explodiu como atividade de lazer,
envolvendo milhões de pessoas em nível mundial e transformando-se em
fenômeno econômico, garantindo lugar no mundo financeiro
internacional. A viagem turística tornou-se um dos mais importantes
fenômenos humanos do novo século, os números alcançados pelo turismo
mundial são extraordinários. Em 2005, os turistas gastaram US$ 682
bilhões, representando 6% de crescimento das exportações mundiais de
bens e serviços turísticos. Em 2006, observou-se um crescimento de 4,5%
em relação ao fluxo de turistas do ano anterior (desde 1995, a taxa média
anual com relação ao fluxo turístico mantém um crescimento que varia
entre 4,1% e 4,6% ao ano), conforme dados divulgados pela Organização
8
Mundial do Turismo – OMT .
Os números que são atribuídos aos deslocamentos turísticos no

6
O prêmio de R$ 60.000 será destinado ao aperfeiçoamento e/ou ganho de escala do
projeto e a aplicação desse recurso será monitorada pelos organizadores do prêmio
(Mercado Ético – CARDOSO, 2008).
7
Será lançada, em 2008, a publicação Gestão do Conhecimento Volume II - Compêndio de
Indicadores de Sustentabilidade de Nações - uma Contribuição ao Diálogo. Trata-se da
apresentação de 25 Indicadores de Sustentabilidade de Nações destinados a mensurar,
monitorar e avaliar a sustentabilidade do nosso planeta. Em processo de aplicação no
exterior e no Brasil, esses indicadores consideram aspectos ambientais, econômicos, sociais,
éticos e culturais (Compêndio para a Sustentabilidade).
8
MARES GUIA, Walfrido dos. 2006. A Construção do Turismo Sustentável. O estado de
São Paulo. 07/11/2006.

73
Alexandra Zottis, Denise Russo e Margarete Panerai Araújo (organizadoras)

mundo têm despertado a atenção de vários investigadores nas mais diversas


áreas. Trata-se de um tema abrangente, complexo, o qual exige a
participação de vários atores sociais, que devem agir desde o levantamento
das potencialidades, a formatação dos produtos e serviços até a
consolidação dos destinos turísticos, além da necessidade de compreender
como as relações sociais, econômicas, culturais e ambientais são
estabelecidas, no sentido de favorecer o desenvolvimento das regiões e
consagrar o Turismo como um dos agentes do desenvolvimento
(NICKERSON, 1996).
Desse modo, as bases do Turismo são formadas a partir das políticas
públicas e do envolvimento dos governos, de empresários e do terceiro
setor nos diversos setores de abrangência. O entendimento acerca do
Turismo deve partir da compreensão do fenômeno por ele representado na
sua totalidade, ou seja, não apenas a esfera econômica deve ser priorizada,
mas também a social, a cultural, a ambiental e a territorial/espacial. Por
conseguinte, um novo olhar para o Turismo torna-se fundamental para que
se possa avançar em relação aos pensares que levem aos fazeres
sustentáveis. O Turismo exige profissionais que se assumam como agentes
sociais. Para tanto, devem estar atuando nas diversas áreas que compõem o
sistema produtivo do Turismo, com o propósito de serem multiplicadores
das boas idéias e das boas ações para a transformação.
Por sua vez, as discussões que permeiam a atividade turística vêm, em
maioria, priorizando a questão econômica, deixando os aspectos sociais em
segundo plano ou até mesmo no esquecimento, evidenciando a idéia do
homo economicus. No entanto, êxito econômico e compromisso social fazem
parte de um binômio rumo ao bem-estar da população, devem andar juntos,
premissa básica do desenvolvimento sustentável. Para tanto, no Brasil, em
1966, foi criada a EMBRATUR, defendendo e anunciando o Turismo
como propulsor e acelerador do desenvolvimento econômico, da geração
renda e de emprego, num setor que permanecia adormecido no país, sem
um plano suficientemente claro, definido e que conseguisse sensibilizar
todos os envolvidos, principalmente, com relação ao papel a ser
desempenhado por cada um no processo.
De tudo isso, constata-se a importância da elaboração das políticas de
turismo, pois, conforme Kadt, “o principal objetivo de uma política é elevar
o bem-estar de seus cidadãos [...] a entrada de divisas deve estar entre os
objetivos secundários” (KADT, 1991, p.52). Para Montejano, “a política é a
ciência do Estado que trata da atividade relacionada com o bem público da

74
Sustentabilidade: uma abordagem social

sociedade baseada no conjunto de operações realizadas por indivíduos,


grupos ou poderes estatais” (MONTEJANO, 1999, p. 33). Assim, o
objetivo das políticas públicas não deve ser a maximização do resultado
quantitativo, mas, sim, oferecer oportunidades para que os indivíduos
alcancem o bem-estar.
Beni (2004) destaca que sujeito, economia e preservação
socioambiental devem estar alinhados, caminhando juntos, somente assim,
pode-se conceber um novo tipo de Turismo – o Turismo Sustentável. Dessa
forma, torna-se consenso mundial que o Turismo tem de se firmar em
quatro pilares fundamentais, a seguir descritos.
Ambiental – trata-se da principal fonte de matéria-prima dos atrativos
turísticos.
Social – é abrangente e compreende a comunidade receptora, o
patrimônio histórico-cultural e a interação com os visitantes; ao mesmo
tempo, eleva o padrão de vida e a auto-estima dessa comunidade.
Econômico - com todos os inter-relacionamentos e interdependências
da cadeia produtiva, permitindo sua articulação, com a identificação correta
de suas unidades de produção e de negócios,para estabelecer uma rede de
empresas, a fim de atuar de forma integrada, pró-ativa e interativa, obtendo
níveis de comparatividade e produtividade para o alcance de competitividade.
Político - que se instrumentaliza mediante estratégias de gestão que
possibilitem coordenar as iniciativas locais na criação de um entorno
emulativo de produção, favorecendo o desenvolvimento sustentável
(BENI, 2004).
O Turismo Sustentável, portanto, em sua vasta e complexa
abrangência, envolve: compreensão dos impactos turísticos; distribuição
justa de custos e benefícios; geração de empregos locais diretos e indiretos;
fomento de negócios lucrativos; injeção de capital com conseqüente
diversificação da economia local; interação com todos os setores e
segmentos da sociedade; desenvolvimento estratégico e logístico de modais
de transporte; encorajamento ao uso produtivo de terras tidas como
marginais (Turismo no espaço rural); subvenções para os custos de
conservação ambiental.
9
Conforme Mares Guia (2006) , a OMT, em 1995, declarava que
Turismo Sustentável é aquele ecologicamente suportável no longo prazo,

9
MARES GUIA, Walfrido dos. 2006. A Construção do Turismo Sustentável. O estado de
São Paulo. 07/11/2006.

75
Alexandra Zottis, Denise Russo e Margarete Panerai Araújo (organizadoras)

economicamente viável, assim como ética e socialmente eqüitativo para as


comunidades locais. Logo, entende-se que o Turismo Sustentável trata da
utilização consciente e responsável dos recursos naturais e culturais, a fim
de que o crescimento não comprometa o ambiente para as gerações futuras.
O conceito surgiu no final do século XX, com a preocupação sobre o
esgotamento dos recursos naturais e com relação à cultura e à preservação
da diversidade étnica e social. Para a OMT, o desenvolvimento sustentável
do Turismo é aquele que:
Atende às necessidades dos turistas atuais e das regiões receptoras e, ao
mesmo tempo, protege e fomenta as oportunidades para o futuro. O
desenvolvimento sustentável do Turismo se concebe como um
caminho para a gestão de todos os recursos de forma que possam
satisfazer-se as necessidades econômicas, sociais e estéticas,
respeitando ao mesmo tempo a integridade cultural, os processos
ecológicos essenciais, a diversidade biológica e os sistemas que
sustentam a vida (OMT, 2005).10

Um desenvolvimento sustentável do Turismo satisfaz as necessidades


dos turistas atuais e das regiões receptoras enquanto protege e aumenta
oportunidades no futuro. Isso, porém, leva a um manejo de todos os recursos,
de maneira que necessidades econômicas, sociais e estéticas possam ser
satisfeitas, enquanto a integridade cultural, os processos biológicos essenciais,
a diversidade biológica e os sistemas de suporte da vida são mantidos. Essas
idéias foram reforçadas e amplamente divulgadas quando a Organização
Mundial do Turismo (OMT), o Conselho Mundial de Viagens e Turismo e o
Conselho da Terra aprovaram a Agenda 21 para a indústria de viagens e
turismo, com ações prioritárias a serem desenvolvidas por governos,
empresários e pelo terceiro setor. Além disso, novos posicionamentos ficaram
marcados pela ONU na declaração do Ano Internacional do Ecoturismo, em
2002, realizada em Quebéc, e na Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento
Sustentável, realizada em Johannesburgo, África do Sul, no mesmo ano
(MARES GUIA, 2006). A seguir, a figura 3 apresenta alguns dos encontros
mundiais referentes ao Turismo sustentável.

OMT, 2005. Disponível em: < http://www.world-tourism.org/sustainable.htm > Acesso


em: 12/11/2006.

76
Sustentabilidade: uma abordagem social

Documentos mundiais referentes à Sustentabilidade do Turismo


1980 – Declaração de Manila sobre o Turismo Mundial.
1982 – Documento de Acapulco sobre o direito de férias.
1985 – Carta do Turismo e código do turista.
1989 – Declaração de Haia sobre o Turismo.
1995 – Carta do Turismo Sustentável de Lanzarote.
1995 – Declaração da OMT, Turismo sexual, no Cairo.
1998 – Conferência “Turismo Sustentável nas ilhas”, Lanzarote.
1999 – Código de Ética Mundial para o Turismo.
2002 – Declaração de Hainan – Turismo sustentável nas ilhas.
2002 – Declaração de Quebéc sobre Ecoturismo.
2003 – Declaração de Djerba sobre Turismo e Mudança Climática.

Figura 3
Fonte: Adaptado de DIAS e AGUIAR (2002).

Por conta disso, Beni (2006) destaca os três eixos fundamentais em


relação ao Turismo: a sustentabilidade econômica – tem como objetivo
garantir um desenvolvimento economicamente eficiente, beneficiando
todos envolvidos e a comunidade; gerir recursos de modo a garantir a
disponibilidade destes para gerações futuras; a sustentabilidade social e
cultural – apresenta como objetivo garantir a diminuição das desigualdades
sociais e a manutenção dos valores e da cultura local, visando à preservação
do patrimônio cultural (material e imaterial); a sustentabilidade ambiental –
assume como objetivo garantir que o desenvolvimento seja compatível com
a manutenção dos processos ecológicos essenciais, da diversidade biológica
e dos recursos naturais.
Conforme Beni (2006), para que o Turismo Sustentável seja efetivado,
deve obedecer a alguns critérios norteadores. São eles: ser ecologicamente
aceitável no longo prazo; financeiramente viável; justo para as comunidades
locais, sob o ponto de vista social e ético; conservar as tradições e as
heranças culturais; melhorar a qualidade de vida das comunidades locais,
dos atores envolvidos, da comunidade, dos visitantes, do setor público, do
setor privado e das ONG's.
Além disso, existem algumas condições que devem ser levadas em
conta para alcançar o desenvolvimento sustentável da atividade turística:
formular uma política de Turismo; o Turismo como parte do
desenvolvimento global do local, atento ao enfoque integrador; avaliação
de impacto ambiental em todos os projetos turísticos; priorizar o meio
ambiente natural, cultural e os residentes em detrimento das vontades dos

77
Alexandra Zottis, Denise Russo e Margarete Panerai Araújo (organizadoras)

turistas; respeitar os limites de crescimento, estabelecendo as capacidades


de carga nas quatro dimensões: capacidade de carga física; psicológica;
social e econômica.
Para De La Torre, “posto que o Turismo é um fenômeno social, por
derivar de deslocamentos humanos e de interações com o meio receptivo,
teve, desde o seu início, uma estreita interdependência nas relações de
interação com outros fenômenos sociais” (DE LA TORRE, 1997, p. 101).
Portanto, a complexidade do Turismo exige a participação de vários agentes
desde a formatação até a consolidação dos destinos turísticos, além da
necessidade de compreender como as relações sociais, econômicas,
culturais e ambientais são estabelecidas, no sentido de contribuir, fazer
parte do desenvolvimento sustentável.

Desenvolvimento: bem-estar socioambiental


No Pós-Guerra, a busca pelo desenvolvimento econômico voltou-se
para a produção de bens de capital. Assim, concebeu-se a industrialização
como um novo recurso para a aceleração do crescimento, em uma política
que passou a se concentrar na absorção de tecnologia como forma de
aumentar e diversificar a produtividade a qualquer custo, baseando-se na
produção de bens em larga escala.
Nesse cenário, ocorreu a passagem de uma sociedade tradicional para
uma sociedade moderna, ou seja, uma tentativa de se alcançar o
desenvolvimento. Esse processo de transformação agrícola e artesanal para
industrial tomou como base os caminhos percorridos pelos países
europeus. No entanto, as diferenças históricas e sociais, as singularidades e
as características, os atrasos ou os avanços dos países em questão não foram
considerados, desencadeando conseqüências desastrosas em níveis sociais,
culturais, econômicos e políticos para alguns dos países envolvidos
(CARDOSO; FALETTO, 2004).
Contudo, a soma dos diferentes fatores de produção de bens e serviços
que emergem na atualidade, facilitados pela globalização, pelas preocupações
com as questões ambientais, a cidadania, o bem-estar social, enfim, pelos
elementos intrínsecos à sustentabilidade, vem contribuir para a diversificação
de alternativas na busca do desenvolvimento de regiões e nações.
Assim, as questões que envolvem a definição de desenvolvimento são
bastante amplas e diferem da noção de crescimento. Amartya Sen define o
“desenvolvimento como um processo de expansão das liberdades reais que as
pessoas desfrutam”, incluindo a idéia de eliminação da privação na sua totalidade
(SEN, 2000, p. 53). Para o autor, a liberdade figura como o papel constitutivo do

78
Sustentabilidade: uma abordagem social

desenvolvimento. Observa-se um distanciamento da idéia de o desenvolvimento


estar, unicamente, baseado no crescimento do PIB ou da industrialização, mas
destaca a liberdade como parte integrante do enriquecimento do processo de
desenvolvimento, assim, vista como meio e como fim.
Portanto, o desenvolvimento requer um papel eficiente dos diversos
atores responsáveis pelas suas instituições e interações. “A formação de
valores e a emergência e a evolução da ética social são igualmente partes do
processo de desenvolvimento” (SEN, 2000, p. 336). Nesse sentido, a
contribuição do crescimento econômico “tem de ser julgada não apenas
pelo aumento de rendas privadas, mas também pela expansão de serviços
sociais” (SEN, 2000, p. 57), uma vez que os indivíduos se encontram
condicionados às oportunidades sociais, econômicas e políticas.
Para tanto, Sen (2000) estabelece a diferença entre capital humano, no
qual tende a colocar a capacidade do ser humano para aumentar a
possibilidade de produção, e a perspectiva da capacidade humana, a qual se
orienta no potencial para levar as pessoas a terem a vida que elas escolherem
para si, no sentido de melhorar suas escolhas reais, de sentirem-se mais
felizes e, portanto, mais livres, levando uma vida mais digna.
Sob essa ótica, o indivíduo adquire autonomia (liberdade) na sua
forma de pensar, de agir, de conduzir sua própria vida, de fazer suas
próprias escolhas, a partir da liberdade individual, como gerador de
mudança social, política e econômica, atento às questões ambientais e
contribuindo para o bem-estar geral e para a expectativa de vida. Para Sen
(2000), a liberdade individual é um comprometimento social, na medida em
que é transformadora, ou seja, promove o desenvolvimento e, portanto, o
bem-estar da sociedade em sentido amplo e eqüitativo.
Logo, é necessário destacar que o desenvolvimento está interligado a
três aspectos fundamentais: “o papel do bem-estar e da liberdade das
pessoas, o papel da influência para a mudança social e o papel para a
produção econômica” (SEN, 2000, p. 335). Esses fatores devem ser
considerados juntos, na sua interdependência, como premissas básicas para
as nações que almejam o desenvolvimento de longo prazo. Para Barquero
(2002), o desenvolvimento pode se dar em duas dimensões: a primeira,
econômica, na qual se enfatiza a organização da capacidade de produção,
tornando-a o mais produtiva possível e, em segundo lugar, a sociocultural,
em que as bases recaem sobre os valores constitutivos da sociedade local.
Nesse contexto, julga-se necessário conceituar o desenvolvimento
sustentável. Na concepção de Veiga (2006), trata-se de um modelo
econômico, político, social, cultural e ambiental equilibrado, que satisfaça as

79
Alexandra Zottis, Denise Russo e Margarete Panerai Araújo (organizadoras)

necessidades das gerações atuais, sem comprometer a capacidade das


gerações futuras de satisfazer suas próprias necessidades. Essa concepção
começa a se formar e difundir-se junto com inúmeras inquietações e
questionamentos quanto ao estilo de desenvolvimento adotado.
O grande marco para o desenvolvimento sustentável mundial foi a
Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento,
realizada no Rio de Janeiro em junho de 1992 (a Rio 92 e ECO 92), em que
se aprovou uma série de documentos importantes, dentre os quais, a
Agenda 21, um plano de ação mundial para orientar a transformação
desenvolvimentista, identificando, em 40 capítulos, 115 áreas de ação
prioritária. A Agenda 21 apresenta como um dos principais fundamentos
da sustentabilidade o fortalecimento da democracia e da cidadania, através
da participação dos indivíduos no processo de desenvolvimento,
combinando ideais de ética, justiça, participação, democracia e satisfação de
necessidades (CATALISA, 2003).
Para Tavares (2001), por meio da Agenda 21 brasileira, foram
realizados, entre setembro de 2000 e maio de 2001, 26 encontros estaduais,
nos quais foram apresentadas e discutidas 5.800 propostas, com a
participação de cerca de 3.800 entidades e instituições dos setores
governamental, civil e produtivo. Foram realizados também cinco
seminários regionais e audiências públicas de âmbito nacional. Tudo isso
para produzir um documento a ser apresentado ao Governo, ao Congresso
Nacional e à sociedade, como referência para o desenvolvimento
sustentável nos próximos anos.
O processo iniciado no Rio de Janeiro, em 1992, reforça que, antes de
se reduzir a questão ambiental a argumentos técnicos, deve-se consolidar
alianças entre os diversos grupos sociais responsáveis pela catalisação das
transformações necessárias. A Agenda 21 destacou alguns pontos
prioritários, entre eles: cooperação internacional; combate à pobreza;
mudança dos padrões de consumo; habitação adequada; integração entre
meio ambiente e desenvolvimento na tomada de decisões; proteção da
atmosfera; abordagem integrada do planejamento e do gerenciamento dos
recursos terrestres; combate ao desflorestamento; manejo de ecossistemas
frágeis: a luta contra a desertificação e a seca; promoção do
desenvolvimento rural e agrícola sustentável; conservação da diversidade
biológica; manejo ambientalmente saudável dos resíduos sólidos e questões
relacionadas com os esgotos; fortalecimento do papel das organizações
não-governamentais: parceiros para um desenvolvimento sustentável;
iniciativas das autoridades locais em apoio à agenda 21; comunidade

80
Sustentabilidade: uma abordagem social

científica e tecnológica; fortalecimento do papel dos agricultores;


transferência de tecnologia ambientalmente saudável, cooperação e
fortalecimento institucional; ciência para o desenvolvimento sustentável;
promoção do ensino, da conscientização e do treinamento.
Portanto, a Agenda 21 propõe um modelo de desenvolvimento
sustentável a ser adotado mundialmente, por considerá-lo responsável,
abrangente e consolidador, como forma de evitar atitudes ingênuas e
impensadas, que possam levar a ações desastrosas. Assim, o
desenvolvimento encontra-se centrado na mudança social para a expansão
do bem-estar e para a produção econômica no respeito aos direitos
humanos e aos das demais espécies.

Diálogo e Inter-relações: os vetores do bem-estar


Por meio da contextualização das categorias, foi possível observar que
as noções apresentadas se acham complementares. Assim, sustentabilidade,
desenvolvimento e Turismo, apesar de suas particularidades, possuem
pontos em comum, já que partem de princípios comuns, ligados ao bem-
estar da população, à justiça social e à relação com a capacidade de
desenvolver a atividade econômica de maneira responsável.
A sustentabilidade, por sua vez, tem suas bases fundamentadas nas
questões ligadas ao bem-estar da sociedade, portanto, assume uma perspectiva
de ordem humana, quando se refere aos benefícios socioambientais, e outra de
ordem econômica, ligada ao uso racional dos recursos. Porém a dimensão
econômica e a humana devem se dar numa relação de equilíbrio e cidadania,
pautadas pela ética e pela mobilização coletiva.
Desse modo, não pode ser dissociada da noção de desenvolvimento.
Ambos, sustentabilidade e desenvolvimento, tratam do bem-estar social e
econômico. Assim, torna-se premissa que o desenvolvimento só pode se
dar dentro dos limites propostos para a sustentabilidade. Então, o
desenvolvimento se acha envolto pela sustentabilidade. Um pressupõe o
outro, pode-se dizer que se encontram em estado de simbiose, sendo
impossível dissociá-los.
A complementaridade entre desenvolvimento e sustentabilidade
também encontra relação com o Turismo. Os vetores comuns quanto ao
bem-estar e ao desenvolvimento econômico são, fortemente, inter-
relacionados com a atividade turística. O Turismo apresenta, entre seus
objetivos, a proposta de desenvolvimento econômico e tem como principal
motivador dos deslocamentos os atrativos turísticos. Por conseguinte, a
utilização consciente dos recursos naturais e culturais é premissa básica para

81
Alexandra Zottis, Denise Russo e Margarete Panerai Araújo (organizadoras)

garantir o êxito do Turismo no longo prazo, isto é, não se podem destruir as


bases que o sustentam.
Partindo do exposto, depreende-se que a sustentabilidade é
pressuposto do desenvolvimento do Turismo. Assim, as três categorias
dialogam entre si, formando um trinômio, no qual uma é complementar à
outra. Quanto à questão conceitual de sustentabilidade destacada no texto,
revela a necessidade do desenvolvimento econômico, porém deve ser
compreendido como gerador de bem-estar, cidadania e justiça social,
presente, ainda, no conceito e nos objetivos do desenvolvimento do
Turismo propostos pela OMT e pela ONU.
Portanto, conforme a investigação, o desenvolvimento, compreendido
como a expansão das liberdades reais, a sustentabilidade, fundamentada na
noção de bem-estar socioambiental, e o Turismo, na formação de agentes
sociais, formam um novo conceito quanto aos valores coletivos da ética social,
contribuindo com partes iguais para o processo de desenvolvimento.

Considerações Finais
Este artigo ocupou-se da reflexão em torno da relação existente entre
as categorias sustentabilidade, Turismo e desenvolvimento. A
contextualização revelou que os movimentos sociais observados na
atualidade, delineados no Turismo e sustentados pela interação e pela
relação social que se estabelece, são elementos motivadores e responsáveis
pelos deslocamentos, juntamente com os recursos e os atrativos turísticos
do local receptivo. Além disso, as bases para o desenvolvimento do
Turismo, no longo prazo, como os recursos naturais e culturais, são
extraídas, definidas e determinadas no local, assim, devem manter a
identidade local e, portanto, utilizadas de maneira racional e direcionadas ao
bem-estar da população.
Logo, os ingredientes importantes para o desenvolvimento sustentável,
que permeiam o embasamento conceitual das noções apresentadas,
promovem uma nova base conceitual, agora formada por três elementos que
se mostraram complementares e até mesmo inseparáveis. Assim, a
sustentabilidade, o Turismo e o desenvolvimento assumiram as convergências
reveladas entre si, por meio de um diálogo preliminar, como uma
possibilidade de conhecimento, respeitando as particularidades dos teóricos e
estabelecendo os níveis de convergência entre as noções apresentadas.
Dessa maneira, foi possível observar que os fatores determinantes das
formas de produção de bens e produtos, característicos do
desenvolvimento sustentável, estão presentes na noção de Turismo. Por

82
Sustentabilidade: uma abordagem social

outro lado, o artigo buscou mostrar, ainda, que o Turismo desempenha um


papel relevante na sociedade no que tange às formas de interação entre os
agentes econômicos e socioambientais.

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84
Sustentabilidade: uma abordagem social

O conhecimento como paradigma


da Sustentabilidade Organizacional
1 2 3
Eunice Maria Nazarethe Nonato , Jucelaine Bitarello eTarcisio Staudt

Introdução
Com o advento da globalização, as organizações, de um modo geral,
renderam-se a um mundo sem fronteiras, especialmente, a partir da última
década do século XX e no princípio do atual, pois, neste século XXI,
entendido como o século do conhecimento, as organizações encontram-se
diante dessa variável, a qual requer quebra de paradigmas.
O objetivo central deste estudo é compreender como se dá a forma de
aprendizagem organizacional, abordando o binômio treinamento
(capacitação) e conhecimento. O estudo está pautado pela resposta à
questão da pesquisa: de que forma ocorre a aprendizagem organizacional
com foco no treinamento (capacitação) e conhecimento? Há vasta literatura
disponível abordando a questão da aprendizagem organizacional, inclusive
fazendo contrapontos entre as visões dos diversos autores. A pesquisa

1
Doutoranda em Ciências Sociais pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos. Mestre em
Sociologia Ambiental pela Universidade de Minas Gerais, graduada em Pedagogia.
Coordenadora de Extensão e professora de Políticas Públicas no Centro Universitário
Metodista – IPA/RS. E-mail: Eunice.nonato@metodistadosul.edu.br.
2
Mestre em Desenvolvimento Regional pela Universidade de Santa Cruz do Sul - UNISC,
graduada em Ciências Contábeis pela Universidade de Santa Cruz do Sul - UNISC,
professora dos Cursos de Administração e Ciências Contábeis do Centro Universitário
Feevale - NH Professora e Coordenadora do Curso de Ciências Contábeis das Faculdades
Monteiro Lobato - FATO/RS . E-mail: jubitarello@terra.com.br.
3
Mestre em Ciências Contábeis e Controladoria – UNISINOS/RS, graduado em Ciências
Contábeis – Feevale/RS. Professor dos cursos de Ciências Contábeis e Administração no
Centro Universitário Metodista – IPA/RS e das Faculdades Monteiro Lobato – FATO/RS.
Experiência em atividades Públicas e Privadas. E-mail: staudt@uol.com.br.

85
Alexandra Zottis, Denise Russo e Margarete Panerai Araújo (organizadoras)

caracteriza-se como uma revisão bibliográfica, abordando as principais


literaturas sobre o assunto, destacando-se a visão reflexiva e crítica dos autores
sobre o tema. Estudos como este servem de subsídio para pesquisas mais
abrangentes, especialmente, para futuros trabalhos que pretendam ilustrar
estudos quantitativos. Dessa forma, essa temática pode ser pródiga para a
produção de dissertações e teses na área da contabilidade e da administração.
A relevância e a contribuição da pesquisa consistem na ampliação do foco da
gestão organizacional, sob dois aspectos principais: [1] a reflexão sobre a
sustentabilidade da organização e a responsabilidade de seus gestores; [2]
servir de instrumento de motivação para o desenvolvimento de outros
estudos dessa natureza na ampliação da crítica do tema.

Do Treinamento ao Desenvolvimento de Competências e


Habilidades
O sistema de treinamento, na concepção da administração científica,
apresentava-se calcado no ensinar os procedimentos aos funcionários e
adestrá-los nas habilidades que a tarefa exigia. Esse meio garantia a
competência requerida, mas excluía o trabalhador do amplo domínio da
atividade, por fazer etapas padronizadas do processo de produção.
Cherns (apud MALVEZZI, 1994) considera que a inabilitação dos
trabalhadores para operar no sistema de fábrica configurou-se, no século
XVIII, como um obstáculo incontestável à eficácia. Essa inabilidade dos
operários podia, talvez, naquela época, estar atrelada a um novo cenário que
se desencadeava no mundo: a Revolução Industrial.
Para Malvezzi (1994), o trabalho especializado (a partir de 1880) fez o
empresariado dar maior atenção à habilitação profissional. A abordagem de
treinamento era racional e garantia a diminuição de erros, bem como a
atualização dos trabalhadores para executarem tarefas diferenciadas, condições
importantes para o crescimento e as mudanças sofridas pelas empresas.
Na época, as organizações tinham os recursos de capital, técnica e
gerência bastante limitados. A estrutura era dividida em direção e execução,
tendo, na direção, o próprio dono, fundador ou herdeiro, que mantinha o
mesmo estilo de gestão, uma vez que este estava prosperando. A execução
ficava a cargo dos empregados, que respeitavam uma hierarquia baseada no
grau de responsabilidade, e não pelo poder de decisão ou de autoridade
direta na gestão dos negócios da organização. A metodologia de
treinamento era o treinamento operativo, tendo como instrutor um
trabalhador qualificado ou o próprio supervisor, e o ensino demonstrativo,
no qual a programação não era organizada e a duração dependia do

86
Sustentabilidade: uma abordagem social

desempenho do treinando. Nessa fase, também ocorreu o início de algum


treinamento administrativo (BONFIM, 1995).
O treinamento, na administração científica, era um instrumento de
desenvolvimento de condições individuais para obtenção do sucesso na
realização da tarefa; tinha como missão precípua manter as condições pessoais
dos trabalhadores válidas e atuantes, uma vez que as tarefas eram definidas.
Em virtude disso, segundo Malvezzi (1994, p. 23), "as habilidades
motoras predominaram no cenário de chão de fábrica e as habilidades
cognitivas predominaram no cenário da gerência e dos escritórios".
Percebe-se que, com a evolução industrial, esse paradigma foi quebrado,
quando empresas investiram na qualificação do “chão de fábrica”, porém
outras, que não adotaram políticas de investimentos em pessoas, ficaram
alheias à evolução do conhecimento.
De acordo com Malvezzi (1994), em 1930, o treinamento atingiu um
novo status como atividade administrativa e passou a fazer parte da
estratégia empresarial. Tal status requeria informações científicas sobre
habilitação e aprendizagem profissional, e muitos experimentos e teorias
resultaram desses esforços, como pode ser constatado em propostas como
o Training Within Industry – TWI – e a Pesquisa-Ação.
As atividades de capacitação, nessa fase, exigiam informações
científicas mais seguras sobre condições de desempenho profissional. A
Psicologia, através da Psicometria, criou instrumentos para aferição
científica das condições apresentadas pelos trabalhadores. O foco de
avaliação da Psicometria centra-se nos traços motores, cognitivos e de
personalidade, aspectos que visam a garantir o controle das competências,
tendo em vista o alcance de um bom desempenho na execução das tarefas.
A defasagem detectada pelos instrumentos da Psicometria, entre o perfil
padrão – conjunto de requisitos exigidos de um indivíduo para a realização
de uma tarefa – e aquele apresentado pelo indivíduo, indicava a necessidade
de treinamento (MALVEZZI, 1994).
O modelo burocrático das organizações, adotado a partir de 1940,
direcionou o foco da administração de pessoas e do treinamento. Dentro do
modelo da burocracia, o homem era considerado um recurso, um meio de
produção, no qual a criatividade e as idéias, além de não serem estimuladas,
não eram consideradas adequadas ao sistema.
Os estudos de Hawthorne, nas décadas de 20 e 30, foram
corroborados na reflexão de Malvezzi, demonstrando que o trabalhador era
um membro de grupo. Seu desempenho não era apenas um produto de suas
capacidades físicas, mas estava claramente correlacionado à sua capacidade

87
Alexandra Zottis, Denise Russo e Margarete Panerai Araújo (organizadoras)

social, e ele não reagia como indivíduo, mas como membro de grupo. A partir
do desempenho individual no ambiente de trabalho, decorre o sucesso da
equipe, na junção das habilidades motoras e mentais (BONFIM, 1995).
Bastos (1994, p. 17) considera que "o imortal e persistente desejo de
associação comprometerá seriamente o desenvolvimento de uma
sociedade em sua capacidade de adaptação, se não for idealizado
oportunamente um sistema tal que facilite e permita aos indivíduos de um
grupo se integrar em outro". Embora reconhecendo, em parte, a
importância da influência dos aspectos psicológicos e sociais no processo
produtivo, o modelo do homem apregoado pelos humanistas era o modelo
reagente aos valores e às determinações de seu contexto. Assim, a ação de
treinamento, nessa época, visava ao ajustamento do trabalhador ao seu
ambiente de trabalho, para o fazer, para dar conta da produção, e não ao seu
crescimento como indivíduo.
Para alguns economistas, a educação era totalmente dispensável para os
trabalhadores. Outros economistas e políticos mais perspicazes, contudo,
percebiam a importância da instrução escolar, pois consideravam que esta
estava ligada a uma tendência modernizadora de sociedades mais avançadas.
É possível entender que a forma de gerenciamento vigente na era
industrial concedia um saber controlado, o qual permitia a execução do
trabalho sem, contudo, representar uma ameaça aos proprietários. Era
concebido um saber, mas não completo, sobre o processo, o domínio
completo ficava nas mãos e na cabeça dos dirigentes.
De acordo com Bennis (1976), as organizações precisam se renovar,
para enfrentar as transformações aceleradas, já que a burocracia não atende
ao novo contexto e só prospera em condições de competição, segurança, e
previsibilidade.
Para Argyris (apud Malvezzi, 1994, p. 18), a competitividade e a rapidez
da evolução tecnológica, na década de 70, levaram a eficiência dos negócios
a depender mais da contínua atualização e aprendizagem do que da
autoridade gerencial. Alguns fatores sinalizam essa necessidade de
atualização e desenvolvimento do trabalhador, tais como:
1) a maior reivindicação dos trabalhadores nos processos decisórios;
2) o falido controle entre a estrutura formal das tarefas e as tarefas
realmente praticadas;
3) a fragilidade do controle externo sobre tarefas e pessoas começou a
ser insuficiente, para garantir a eficiência (MALVEZZI, 1994, p. 18).

Visando a fazer frente a essas pressões, as organizações foram se

88
Sustentabilidade: uma abordagem social

adequando, empregando, para isso, uma política de inovação, que pode ser
resumida em quatro elementos básicos: a competência, a tecnologia, a
parceria e a flexibilidade.
Considerando que, se treinamento e capacitação elevam o
desempenho profissional dos funcionários e geram a competência na
organização, então, a busca do entendimento e a identificação de
necessidades de treinamento levam, conseqüentemente, à realização de
treinamentos que visem a contribuir na busca dos resultados desejados pela
organização. Por isso, passa a ser relevante avaliar e pesquisar a correlação
entre treinamento e desempenho funcional.
A influência das inovações para a questão da capacitação profissional
revela uma reorientação em busca de atuações de resultados e,
conseqüentemente, a exigência de um trabalhador com uma postura
autogerenciável, constituída de compromisso, criatividade e competência.
Em conseqüência desse perfil do trabalhador, também há a necessidade de
mais preparação da força trabalhadora e da adequação de novas formas de
organização e produção.
Dessa forma, a capacitação deixa de ser investimento aplicado apenas
no know-how – capacitar para fazer, e passa a ser investimento também no
know why – capacitar para pensar, fazer autocrítica e agir. Com esta última
abordagem, o treinamento amplia a atuação, a participação consciente no
processo e, também, a empregabilidade do trabalhador, distanciando-o do
estereótipo de mero seguidor de manuais.
As características que conduzem a organização para a autonomia
funcional, o crescimento e o desenvolvimento são:
Habilidade de aprender através da experiência, de codificar e de
armazenar o conhecimento. Habilidade de “aprender a aprender”,
aperfeiçoar metodologias para o melhoramento do processo de
conhecimento. Habilidade de adquirir e utilizar informações para as
próprias atuações, de desenvolver um processo de auto-análise.
Habilidade de governar o seu próprio destino (BENNIS, 1976, p. 191).

Observa-se, ao analisar as características acima, que ajudar o


trabalhador a construir o seu projeto profissional, pela aquisição de
habilidades, de conhecimentos e de uma postura de aprender
continuamente, auxilia a própria organização, pois ocorre, diretamente, o
crescimento, o desenvolvimento e a sustentabilidade desta.
Focalizando a capacitação e o treinamento nas organizações
brasileiras, verifica-se que, segundo pesquisa da Associação Brasileira de

89
Alexandra Zottis, Denise Russo e Margarete Panerai Araújo (organizadoras)

Recursos Humanos – ABRH (1999), a partir da década de 70, o treinamento


e o desenvolvimento passaram a ser mais requisitados devido à necessidade
de formação de mão-de-obra para suprir a forte demanda de pessoal
especializado, resultante do segundo grande desenvolvimento empresarial.
Em seguida (1972), houve a necessidade de capacitar o corpo
gerencial, em virtude de muitos desses profissionais serem oriundos da área
técnica e terem sido promovidos a chefes e gerentes. Com a expansão
empresarial, em 1990, a globalização da economia e o aumento da
competitividade levaram as organizações a desenvolverem times e,
atualmente, em função da rápida evolução da tecnologia e dos
conhecimentos necessários para fazer frente à globalização, a tendência é o
investimento, por parte das organizações, em aprendizagem.

Globalização e o Panorama Organizacional


As economias estão passando por transformações rápidas e intensas
influenciadas, sobretudo, por duas grandes forças. Uma delas é a
globalização, definida por Sandroni (1999, p. 265) como o "termo que
designa o fim das economias nacionais e a integração cada vez maior dos
mercados, dos meios de comunicação e dos transportes", o que gera um
crescimento explosivo do comércio global e da competição internacional.
A outra força é a mudança tecnológica, com avanços notáveis na
disponibilidade de informações e na velocidade das comunicações.
Segundo Gasalla (1996, p. 28), “estamos imersos em um todo
complexo, interconectado, [...] no qual vamos depender uns dos outros cada
vez mais". Com as mudanças ocorrendo em escala rápida e interminável,
empresas de grande sucesso no mercado morrem e novas aparecem. Esse
contexto é corroborado em Kotler (1998, p. 13):
[...] um ambiente de competição, no qual a empresa opera em um
mercado Darwiniano onde os princípios de seleção natural levam à
sobrevivência das mais capacitadas [...] o sucesso de mercado é
conquistado pelas empresas mais ajustadas aos imperativos ambientais
atuais – aquelas que podem entregar o que as pessoas estão dispostas a
comprar – bens e serviços.

O processo de globalização obriga, de certa forma, as organizações,


independentemente de seu porte e faturamento, a se reorganizarem e se
reposicionarem no mercado, como forma de viabilizar a sustentabilidade do
seu negócio no futuro. O reposicionamento é conseqüência da queda que vem
ocorrendo nas reservas de mercado, permitindo às empresas visualizarem um

90
Sustentabilidade: uma abordagem social

mundo sem fronteiras para a colocação de seus produtos e serviços.


As organizações, diante das transformações, estabelecem metas,
tentam realizá-las e, para tanto, esperam dos líderes e dos funcionários que
as compõem um comportamento empreendedor na busca de adequação a
esse novo paradigma.
Há organizações que estão mudando de forma consistente. São
organizações que estão mobilizando suas energias, fazendo emergir a
criatividade e a iniciativa de seus funcionários e criando uma cultura comum,
disposta a aceitar as mudanças, através de um novo conceito de treinamento e
desenvolvimento. Dessa maneira, tais organizações têm conseguido unir
esforços educacionais à sua estratégia de sustentabilidade e visão global.

Do Treinamento à Aprendizagem Organizacional


No contexto atual, é possível observar, nas organizações, os impactos
da administração emergente, influenciando, também, as práticas de
treinamento que, fundamentalmente, repousam sobre dois pilares: a
organização e o indivíduo.
A abordagem de capacitação e treinamento encontra-se distanciada
do treinar apenas para o fazer. O treinamento atual deve atender outra
demanda, qual seja, levar o trabalhador a refletir, saber, saber fazer e
aprender a aprender. Essas condições permitem uma maior participação do
trabalhador, por fornecer um meio de ampliar a visão deste, reconstruir
seus quadros mentais e sua história. Com essa abordagem, segundo Freire
(1996) e Nonaka e Takeuchi (1997), a empresa terá sua força de trabalho
como uma vantagem competitiva. Não há por que desvincular o
treinamento da educação, pois ele pode ser considerado uma vertente do
processo educacional. Segundo Macian (1987, p. 3):
Temos encontrado, freqüentemente, posições muito extremadas, de
ambos os lados; educadores subestimando profissionais de
treinamento e estes se esforçando para garantir a identidade de seu
trabalho, 'vacinando-se' contra os males da educação institucionalizada,
da individualização do ensino e da diretividade da educação.

Para fins deste estudo, seguindo o pensamento de Macian,


treinamento deve ser considerado como "meio de fornecer conhecimentos,
consciência, autocrítica e capacidade de reelaboração, visando o preparo da
pessoa dentro ou fora do ambiente de trabalho". Essa abordagem encontra-
se muito próxima à visão de treinamento como uma forma de educação
para o trabalho. O autor ainda destaca que o trabalho foi, é e continuará

91
Alexandra Zottis, Denise Russo e Margarete Panerai Araújo (organizadoras)

sendo o princípio educativo do sistema de ensino em seu conjunto. O


trabalho determinou o “surgimento do sistema de ensino sobre a base da
escola primária, o seu desenvolvimento e diversificação e tende a
determinar no contexto das tecnologias avançadas, a sua unificação”
(MACIAN, 1987, p. 165). Logo, educação é, basicamente, uma contínua
reconstrução de nossa experiência pessoal. Na verdade, essa reconstrução é
caracterizada pela observação e pela prática do dia-a-dia de nossa vida.
Para Macian (1987), portanto, não há receita para esse dilema. A
questão consiste em conceder a capacitação visando a alcançar o
desempenho eficaz e, ao mesmo tempo, garantir ao indivíduo sua condição
de criatura humana, capaz de atuar, conscientemente, como um agente de
mudança do cenário produtivo.
A formação e a educação continuada surgem como tendência para
fortalecer e desenvolver a força de trabalho de forma ampla e contínua, em
virtude da velocidade com que ocorrem as inovações. "Na antiga economia,
a vida de um trabalhador era dividida em dois períodos: aquele em que ele ia
para escola e o posterior à sua formatura, em que ele começava a trabalhar.
Agora, espera-se que os trabalhadores construam sua base de
conhecimentos ao longo da vida" (MEISTER, 1999, p. 11).
A conceituação de capacitação, como preparação da pessoa para as
atividades do cargo dentro e fora de seu ambiente de trabalho, coaduna-se
com o conceito de educação, propriamente dito, com o de treinamento,
adotado neste trabalho.
Malvezzi (1994, p. 29) acredita que isso "reconceitua capacitação
profissional como algo que vai além de aquisições de informações,
mudanças de atitudes e desenvolvimento de habilidades, para incluir a
reelaboração de significados e a revisão dos referenciais de ação". Um dos
constantes desafios das organizações tem sido criar propostas para
incrementar a intensidade dos conhecimentos, proporcionando respostas
em tempo adequado, tendo em vista as descontinuidades criadas pela
globalização, pela competição e pela explosão de conhecimentos. O
conhecimento torna-se, dentro das organizações, um amálgama de
experiências, valores e informações, os quais contribuam para a
sustentabilidade no mercado.
[O conhecimento] É uma mistura fluída de experiência condensada,
valores, informação contextual e insight experimentado, a qual
proporciona uma estrutura para avaliação e incorporação de novas
experiências e informações. Ele tem origem e é aplicado na mente dos

92
Sustentabilidade: uma abordagem social

conhecedores. Nas organizações, ele costuma estar embutido não só em


documentos ou repositórios, mas também em rotinas, processos, práticas
e normas organizacionais (DAVENPORT e PRUSAK, 1998, p. 6).

Em última instância, e de maneira muito simples, o treinamento pode


ser considerado como a ação intencional de fornecer meios para possibilitar
a aprendizagem, conforme ensina Bastos (1994). A aprendizagem pode ser
definida como uma série de experimentações e erros que levam à aquisição
de determinada capacidade.
[A aprendizagem] É a modificação adaptativa do comportamento de
processos repetitivos. Distingue-se nos animais, a aprendizagem por ensaio
e erro, que dá uma curva de progresso sujeito a oscilações mais acentuadas,
até que se estabeleça percentagem elevada de reações motoras;
aprendizagem intuitiva - corresponde a uma adaptação rápida por
compreensão. Do ponto de vista profissional, a aprendizagem designa
exercícios preparatórios a uma forma de atividade profissional que assegure
a aquisição dessa capacidade específica (BASTOS, 1994, p. 39).

Moscovici (1994, p. 22), por sua vez, defende o fato de que "a
Aprendizagem envolve a pessoa como um todo e não só o seu intelecto".
Estudiosos, como Freire (1999) e Moscovici (1994), têm ponderado
que as propostas de ensino para adultos devem diferir, em natureza, das
atividades pedagógicas destinadas a crianças. Senge (1990), por sua vez,
considera que compreender como o adulto aprende é importante para
entender, plenamente, a aprendizagem organizacional, uma vez que a
entidade primeira de aprendizagem é o indivíduo e não a organização.
Segundo Merrian e Caffarela (apud KUENZER, 2000, p. 67), a
autodireção é uma característica natural da vida do adulto, sendo que a
aprendizagem autodirecionada "é uma forma de estudo na qual o aprendiz
tem a responsabilidade primária pelo planejamento, condução e avaliação
de suas próprias experiências de aprendizagem".
O termo Andragogia surgiu como sinônimo de educação de adultos, e
esta relação adulto/adulto baseia-se numa relação democrática e
participativa, e não autocrática, como a inerente à concepção de Pedagogia
(BONFIM, 1995).
Knowles (apud MOSCOVICI, 1994, p. 19), considerado um dos
principais pesquisadores sobre aprendizagem dos adultos, aponta
diferenças entre crianças e jovens, em situações de aprendizagem,
principalmente, em relação a autoconceito, experiência, prontidão,
perspectiva temporal e orientação da aprendizagem.

93
Alexandra Zottis, Denise Russo e Margarete Panerai Araújo (organizadoras)

Segundo Moscovici (1994), a situação de aprendizagem para o adulto


caracteriza-se por uma "atmosfera adulta". Dessa forma, exige relações
horizontais entre facilitador e aprendizes, como sócios e colaboradores de um
empreendimento conjunto, em que os esforços de todos são somados, ao invés
de relações do tipo professor-aluno, comuns no ambiente usual de ensino. Existe
menor dependência da relação professor/aluno, dos livros e dos textos para a
conclusão correta. O clima psicossocial, no ambiente de aprendizagem, é de
respeito mútuo; os colegas tornam-se recursos para a aprendizagem uns dos
outros, pela experiência anterior de cada um, a qual é oferecida, analisada,
discutida e somada à própria experiência pessoal dos alunos.
A andragogia utiliza a motivação e a experiência dos aprendizes
adultos como molas principais para evocar o conhecimento. As
experiências de cada um podem servir como ilustrações e exemplos para
facilitar a compreensão e a aquisição de novos conceitos, conhecimentos e
técnicas, pois são significativas, mais reais e concretas do que qualquer
exemplo retirado de livros e textos.
Freire (1996, p. 25) afirma que "ensinar e capacitar não é transferir
conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua produção ou a sua
construção". O autor entende que todos os homens são capazes de
transcender e humanizar o mundo, fazer história e cultura. Isso só é possível
através da reflexão, dada a capacidade crítica do homem, numa visão
educativa progressista.
Para Freire (1996), uma das tarefas fundamentais da prática educativa
progressista é o desenvolvimento da curiosidade crítica, insatisfeita, indócil.
Freire (1999, p. 44) considera, ainda, que a metodologia utilizada para
alfabetizar e educar leva à tomada de consciência, na imersão do processo de
realidade vivida pelo estudante – "uma educação para a liberdade, educação
para o homem sujeito" –, sendo valorizada a cultura do adulto trabalhador, o
que ele sabe e o que ele faz, traduzindo-se como educação libertadora.
A educação libertadora de Freire produz o comportamento pró-ativo
da pessoa, ao passo que a educação tradicional estimula o comportamento
reativo. Um ambiente libertador sensibiliza o aprendiz a perceber a
contínua transformação e estimula a consciência crítica, para que o aprendiz
não se exima da sua responsabilidade de agente de transformação social.
Para Freire (1996), a práxis educacional libertadora está baseada na
reflexão e na ação do mundo concreto. A reflexão, para o aprendiz, serve
para que ele não se torne apenas ativista – agir sem pensar nas
conseqüências das ações; e a ação, para que o aprendiz não se torne um

94
Sustentabilidade: uma abordagem social

verbalista – falar muito, mas realizar pouco ou nada. Assim, ao reconhecer


uma realidade que não se adequou às suas expectativas, o adulto deve fazer
uma inserção crítica nessa realidade para objetivá-la e, então, agir sobre ela.
Os conceitos de Freire são úteis, na medida em que permitem um olhar
específico e crítico sobre as questões relativas à aprendizagem do adulto,
levantando a questão da inconclusão do ser e sua curiosidade crítica. "É neste
sentido que reinsisto em que formar é muito mais do que puramente treinar o
educando no desempenho de destrezas" (FREIRE, 2001, p.15).
Assim, a educação libertadora vem ao encontro do paradigma do
conhecimento que valoriza os profissionais em todos os níveis,
contrariando a cultura milenar, paternalista e autoritária. Nesse contexto, a
visão empresarial precisa transcender o conhecimento piramidal. Essa nova
concepção de gestão voltada para o conhecimento contribui para o
fortalecimento do indivíduo e a sustentabilidade da organização.
Segundo Freire (2001, p. 25), "quem ensina aprende ao ensinar e quem
aprende ensina ao aprender. Quem ensina, ensina alguma coisa a alguém.
Por isso é que, do ponto de vista gramatical, o verbo ensinar é um verbo
transitivo-relativo. Verbo que pede um objeto direto – alguma coisa – e um
objeto indireto – a alguém".
No contraponto de Freire (2001), Rogers (apud MOREIRA, 1999, p.
145) defende a idéia de que ensinar a alguém é impossível devido à
velocidade das mudanças nas informações, “o que é ensinado torna-se
rapidamente obsoleto”. Nesse contexto, o único homem educado é o que
aprendeu a aprender, a se adaptar e mudar; que percebeu que nenhum
conhecimento é seguro e que só o processo de busca do conhecimento dá
uma base para segurança.
Finalizando este tópico, aponta-se que, apesar das contribuições nas
citações de Freire e Knowles, para o ensino do adulto objetivando a
educação como ser integral, tem-se consciência dos limites dessa formação
em um espaço organizacional, burocrático, onde impera o ensinamento
visando à produtividade e à competitividade.
O próximo tópico analisa o conhecimento organizacional no
trabalho, uma vez que o fato de as organizações lutarem por vantagens
competitivas faz com que surjam interesses em compreender a questão
da aprendizagem organizacional (SENGE, 1990) e do conhecimento
organizacional (NONAKA; TAKEUCHI, 1997), além de como as
empresas aprendem (GEUS, 1999).

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Alexandra Zottis, Denise Russo e Margarete Panerai Araújo (organizadoras)

O Conhecimento Organizacional como Vantagem Competitiva


O objetivo de obter vantagem competitiva, para se distinguir em seus
segmentos de mercado, levou as organizações a buscarem recursos para
uma gestão competitiva. O movimento para a qualidade trouxe benefícios,
mas não correspondeu a todas as expectativas dos empresários. Segundo
Davenport e Prusak (1998, p. 10), "o desapontamento com tais conceitos
levou as empresas a buscarem algo mais básico, irredutível e vital, para o
desempenho, a produtividade e a inovação". Assim, os empresários
perceberam a importância do conhecimento para o funcionamento de uma
organização e a mentalidade equivocada de alguns gestores, os quais
presumiram que a tecnologia poderia substituir a qualificação e o
julgamento de um trabalhador capacitado e experiente.
Na nova economia, o conhecimento não é apenas mais um recurso, ao
lado dos tradicionais fatores de produção – trabalho, capital e terra, mas
sim o único recurso significativo atualmente, e que o trabalhador do
conhecimento desempenha um papel central na sociedade, pois é um
executivo que sabe como alocar o conhecimento para o uso produtivo,
assim como o capitalista sabia alocar o capital para o uso produtivo
como o maior ativo (DRUCKER apud NONAKA; TAKEUCHI,
1997, p. 5).

A organização de negócios não só processa o conhecimento, mas


também o cria. Os estudos sobre a administração negligenciam a criação
de conhecimento pela organização, principal fonte da competitividade
internacional das organizações japonesas estudadas por Nonaka e
Takeuchi (1997).
Quinn (apud NONAKA; TAKEUCHI, 1997, p. 5) raciocina na
mesma linha de Drucker, ao afirmar que "o poder econômico e de
produção de uma empresa moderna está mais em suas capacidades
intelectuais e de serviços do que em ativos imobilizados". O autor vai um
pouco mais adiante, ao apontar o fato de os valores da maioria dos produtos
e serviços dependerem, principalmente, de como os fatores know-how
tecnológico, projeto de produto, apresentação de marketing, compreensão
do cliente, criatividade pessoal e inovação podem ser desenvolvidos.
A necessidade de a organização aprender já foi abordada por Geus
(1999, p. 7), quando este considera que, "para enfrentar um mundo em
constantes mudanças, qualquer entidade precisa desenvolver a capacidade
de migrar e mudar, de desenvolver novas habilidades e atitudes, em resumo:
a capacidade de aprender".

96
Sustentabilidade: uma abordagem social

O conhecimento organizacional tem sido classificado e usado dentro


de uma multiplicidade de abordagens. Isso se deve à atenção que
acadêmicos e profissionais de diversas áreas passaram a ter com a
aprendizagem organizacional (PRANGE, 2001). Dessa forma, a
aprendizagem organizacional, segundo Easterby, Smith e Araújo (2001,
p.17-18), pode ser classificada como um processo técnico ou social: "a visão
técnica supõe que a aprendizagem organizacional diz respeito ao
processamento eficaz, interpretação de resposta, informações tanto de
dentro como de fora das organizações".
Na perspectiva social, focaliza-se a maneira pela qual as pessoas
atribuem significados às suas experiências de trabalho. Essas experiências
podem derivar de fontes explícitas, como informação financeira, ou de
fontes tácitas, tais como a sensibilidade que um talentoso artesão possui, ou
a intuição desfrutada por um brilhante estrategista. Nessa perspectiva, o
conhecimento é algo que emerge de interações sociais, normalmente, no
ambiente natural de trabalho. É fundamental, também, que as organizações
se tornem aprendizes eficientes e sejam capazes de se adaptar à rápida
alteração de condições em seu ambiente, gerando a inovação que lhes dará a
vantagem competitiva, permitindo sua sobrevivência.
As organizações não têm cérebros, mas possuem sistemas cognitivos e
memória, pois desenvolvem rotinas ou padrões de atuação para lidar com
problemas externos e internos. Essas rotinas vão sendo incorporadas, de forma
implícita ou inconsciente, na memória organizacional. Contudo, a criação do
conhecimento organizacional deve ser entendida como um processo que amplia
“organizacionalmente” o conhecimento criado pelos indivíduos, cristalizando-o
como parte da rede de conhecimentos da organização.
O conhecimento é o novo recurso competitivo que atingiu o Ocidente
como um relâmpago. Porém, toda essa conversa sobre a sua importância,
tanto para as empresas como para países, pouco ajuda a compreender como
se cria o conhecimento (NONAKA; TAKEUCHI, 1997). Constata-se que
o desafio para as organizações reside em proporcionar o processo de
aprendizagem individual e organizacional, com vistas a alcançar os
patamares de competitividade, nos quais as empresas de países
industrializados estão inseridas, ou, pelo menos, se equiparar a eles.
Embora seja utilizada a expressão "criação do conhecimento
organizacional", para Nonaka e Takeuchi (1997, p. 63), "a organização não
pode criar conhecimento por si mesma, sem a iniciativa do indivíduo e a
interação que ocorre dentro do grupo. Logo, a criação do conhecimento
ocorre em três níveis: do indivíduo, do grupo e da organização”.

97
Alexandra Zottis, Denise Russo e Margarete Panerai Araújo (organizadoras)

Kim (apud FLEURY, 1995) e Senge (1990) compartilham a suposição


de que a aprendizagem é necessária, que deve haver esforço para obtê-la,
mas que há uma série de condições, estruturas pessoais e culturais, as quais
podem impedir a aprendizagem organizacional. Isso os encoraja a
introduzir modelos e métodos planejados para melhorá-la de tal modo que
a aprendizagem possa ocorrer livre de quaisquer obstáculos.
Para que o conhecimento ocorra e se mantenha, deve haver uma
cultura para a aprendizagem, pautada pelos valores básicos da organização.
Fleury (1995, p. 29-30) identifica alguns pontos essenciais, que permitem a
dinâmica da aprendizagem na organização e uma visão sistêmica do
fenômeno organizacional:
– o processo de inovação, de busca contínua de capacitação e
qualificação das pessoas e das organizações é um processo
permanente;
– o processo de aprendizagem é um processo coletivo, partilhado por
todos, e não o privilégio de uma minoria pensante;
– os objetivos organizacionais são explicitados e partilhados, o
comprometimento com estes objetivos ocorre em função da
congruência entre os objetivos individuais de autodesenvolvimento e
os objetivos de desenvolvimento organizacional;
– a comunicação flui entre as pessoas, áreas, níveis, visando a criação de
competências interdisciplinares; sistêmica e dinâmica do fenômeno
organizacional.
A organização em aprendizagem deve oferecer oportunidades que
propiciem a reelaboração do projeto de vida de seus profissionais,
concedendo oportunidades de ações que permitam a apreensão de
critérios, ajudando-os a eleger caminhos, ensinando-os a pensar, a
reelaborar, constantemente, seus significados e aprender a fazer autocrítica.
Os processos de aprendizagem, nas organizações, têm utilizado práticas
interativas, com o objetivo de exercitar o confronto com outros
conhecimentos, legitimando ou reconstruindo a posição adotada pela
organização. Nesse cenário, a educação continuada tem sido a tônica na
contemporaneidade para obtenção de vantagens competitivas.

A Tendência: Educação Continuada


No cenário mundial, os investimentos em capacitação e
desenvolvimento são tendências irreversíveis. Por conseguinte, as empresas
necessitam qualificar o quadro de profissionais para obtenção de vantagens
competitivas, uma vez que significativo contingente de seus trabalhadores

98
Sustentabilidade: uma abordagem social

ainda possui formação educacional bastante reduzida.


As organizações buscam, além da capacitação, uma orientação estratégica,
que se paute pelo mercado, estabelecendo desafios e metas para o futuro. O
planejamento estratégico visa ao acompanhamento das rápidas mudanças de
mercado, para melhorar a produtividade e enfrentar a concorrência; alia
capacitação e desenvolvimento às mudanças comportamentais de filosofia.
Logo, através da capacitação, é possível compartilhar novos conhecimentos com
os funcionários. Essa filosofia, suportada por um gerenciamento mais pró-ativo
e mais empreendedor, estimula a maior participação dentro dos requisitos de
excelência e dos valores éticos.
A tradicional forma de atuação do “Setor de Treinamento” não
corresponde mais às atuais necessidades das organizações. Segundo
Meinster (1999), a tendência é o gerenciamento da aprendizagem na
organização, tendo maior foco nos negócios e no futuro, a demonstração de
custo-benefício de suas atividades e a imagem de um centro de lucro. Com
essa abordagem pró-ativa, o centro de capacitação e aprendizagem tem uma
nova missão, deixando de ser solução para problemas que já ocorreram. As
organizações que já gerenciam de acordo com essa abordagem apresentam-
se mais criteriosas no gerenciamento da aprendizagem e do
desenvolvimento, por terem como objetivo o controle rígido do processo,
relacionando os programas de aprendizagem às metas estratégicas da
organização. Um dos valores fundamentais dessa nova visão de
desenvolvimento é que cada gerente é um “Gerente de Pessoas” e, sendo
assim, é um profissional de capacitação, é um prestador de serviços, que
oferece suporte e apoio às suas equipes e até às de outras áreas.
Assim, a tendência presente é a existência de universidades
corporativas, que muito mais do que departamentos de capacitação
revestidos de um novo nome representam um esforço notável para
desenvolver, em funcionários de todos os níveis, as qualificações, o
conhecimento e as competências necessárias do trabalho. Essa nova forma
de aprendizagem há muito é oportuna, pela necessidade de completar e até
mesmo remediar algumas deficiências oriundas da primeira formação de
trabalhadores, a fim de desempenhar atividades técnicas e específicas de
uma empresa e, ainda, assegurar permanente formação em um cenário de
rápida evolução dos perfis profissionais.
"Um número crescente de empresas começaram a perceber a
necessidade de transferir o foco de seus esforços de treinamento e educação
corporativa, de eventos únicos em uma sala de aula, cujo objetivo é
desenvolver qualificações isoladas, para a criação de uma cultura de

99
Alexandra Zottis, Denise Russo e Margarete Panerai Araújo (organizadoras)

aprendizagem contínua" (MEISTER, 1999, p. 21). Nesse novo modelo de


geração de aprendizagem no local de trabalho, a empresa conta com a
colaboração de funcionários mais experientes, os quais aprendem uns com
os outros e compartilham inovações e melhores práticas, com o objetivo de
solucionar problemas empresariais reais. Dessa forma, a eficácia da
empresa está apoiada na experiência conjunta do corpo de colaboradores.
As empresas mais bem-sucedidas, ao invés de esperar que as escolas
tornem seus currículos mais relevantes, trouxeram a escola para dentro da
empresa. Abandonaram o paradigma de que educação seria um capítulo da
responsabilidade social da empresa e passaram, de forma muito pragmática,
a entender que o diferencial decisivo de competitividade reside no nível de
capacitação, em todos os níveis, de seus funcionários, fornecedores,
principais clientes e até membros da comunidade onde atuam. Para Meister
(1999), esse é o fim da era de “Treinamento e Desenvolvimento” tal como
se conhecem hoje.
Constata-se que, para a capacitação ser eficaz, precisa manter uma
presença confiável e consistente, isto é, deve ser contínua e não um evento que
ocorre apenas uma vez. Pode-se, portanto, dizer que a universidade
corporativa é um instrumento de ação permanente para enriquecer a
experiência, os conhecimentos e as competências acumuladas nas empresas.
Meister (1999) assegura que, ao se gerenciar capacitação com
continuidade, a universidade corporativa atende às necessidades das
organizações no contexto atual, nos seguintes quesitos: a emergência da
organização hierárquica enxuta; o advento e a consolidação da "economia
do conhecimento"; a redução do prazo de validade do conhecimento; o
novo foco na capacidade de empregabilidade para a vida toda; e uma
mudança fundamental no mercado da educação global. Essas tendências
abrangentes apontam para um novo e importante veículo de criação de
vantagem competitiva sustentável.
Em sua obra, "A Empresa Viva", Geus (1999, p. 187) assinala:
Poder concentrado significa ausência de liberdade. A ausência de
liberdade significa pouca criação de conhecimento e, pior, pouca
disseminação de conhecimento. Ausência de disseminação de
conhecimento se traduz em pouco aprendizado institucional e,
conseqüentemente, ausência de ação eficaz perante as mudanças do
mundo. Uma das forças motrizes da empresa é o desenvolvimento de
seu potencial. Podemos criar uma forma de governo que maximize o
potencial de nossos membros e, desta forma, reduzir a taxa de
mortalidade corporativa.

100
Sustentabilidade: uma abordagem social

Atualmente, são novas as competências exigidas pelos empregadores


para força de trabalho. Essas competências foram, um dia, associadas aos
gerentes, mas, no século XXI, a necessidade empresarial identifica-se, cada
vez mais, com profissionais inteligentes, com iniciativa e capacidade de
resolver problemas complexos. Outro aspecto quanto ao desenvolvimento
dessas competências é proporcionar, aos funcionários, a compreensão das
demandas complexas do trabalho que cada um faz, propiciando que as
várias partes criem um todo integrado numa visão sistêmica do negócio.
As transformações drásticas no mercado e a forma de competitividade
alteraram a segurança do emprego, o qual não é mais uma decorrência do
trabalho em uma única empresa, mas da manutenção de uma carteira de
qualificações, que permite capacidade contínua ao empregado para ter
melhor produtividade e manter-se com empregabilidade. "Os
empregadores estão dando aos empregados a oportunidade de desenvolver
uma melhor capacidade de emprego, em troca de maior produtividade e
algum nível de comprometimento com a missão da empresa" (MEISTER,
1999, p. 10). As empresas que investem em educação corporativa estão
transformando seu ambiente em estruturas de aprendizagem corporativa,
nas quais o objetivo é desenvolver meios de estimular novas oportunidades,
entrar em novos mercados globais, criar relacionamentos mais profundos
com clientes e impulsionar a organização para um novo mundo. O foco saiu
da sala de aula e dirigiu-se para um processo de aprendizagem, em que a
prioridade é entrar em contato com o conhecimento da organização.
A vantagem competitiva baseada na força de trabalho está provada ser mais
duradoura do que a competitividade baseada na tecnologia, que desaparece
rapidamente, quando novas tecnologias se tornam igualmente acessíveis às
empresas. A excelência da força de trabalho resulta, exclusivamente, das práticas
de recrutamento e capacitação de uma empresa, pois, com a utilização adequada
desses meios, criam-se vantagens que não podem ser facilmente duplicadas e
sempre podem ser renovadas e aperfeiçoadas.
De acordo com Soderberg (apud MEISTER, 1999, p. 212), "as pessoas
acreditam, equivocadamente, que, depois que obtêm o diploma de uma
faculdade, estão prontas para a próxima década, quando, na verdade, elas
estão prontas para os próximos segundos". A educação continuada veio
evidenciar meios encontrados pelas universidades, para proporcionarem
aos funcionários a aprendizagem permanente, como instrumentalização
capaz de dar resposta às organizações com vistas à sustentabilidade.

101
Alexandra Zottis, Denise Russo e Margarete Panerai Araújo (organizadoras)

Capacitação Orientada para Resultados


A nova tendência de organizações que aprendem caracteriza-se como
capacitadora de seus funcionários, de tal forma que cria resultados
valorizados, tais como: inovação, eficiência, vantagem competitiva e melhor
alinhamento com o ambiente. Apesar da ampliação ocorrida na abordagem
de capacitação, com foco no desenvolvimento do funcionário como um
todo, “trata-se agora do saber, saber fazer, saber ser e saber conviver"
(KUENZER, 2000, p. 16). Para essa autora, os modos de verificar a
capacitação trazem diferencial para o negócio, distinguindo-se de
referenciais tradicionais.
Autores como Meister (1999) acreditam em uma nova abordagem de
avaliação, em detrimento do modelo de avaliação tradicional, apesar de
essas medidas representarem um ponto de vista útil para a avaliação de
investimentos na educação de funcionários.
A verdadeira oportunidade está em deixar para trás a medida dos
investimentos, número de dias ou horas dos alunos, para adotar uma
medida dos resultados ¾ a contribuição de um investimento em
educação ¾ para que seja cumprida uma estratégia empresarial
(MEISTER, 1999, p. 55).

O modelo de treinamento orientado para resultados (TOR),


conforme Destro (1994), surgiu para preencher essa lacuna, partindo do
pressuposto de que treinamento e desenvolvimento são funções
tipicamente econômicas e, como tais, devem ser capazes de mostrar
resultado como qualquer outra atividade de negócios.
Para o modelo TOR, os resultados de treinamento são muito mais do
que gráficos contendo números de homens treinados no ano e total de
horas-aula realizadas. São as contribuições demonstráveis das ações de
treinamento para a redução de custos, o aumento da produtividade, o
incremento da qualidade,a melhora do clima organizacional.
De acordo com Destro (1994), quando os executivos falam de
"desempenho de empresa", estão se referindo, implicitamente, ao
desempenho conjunto de pessoas que nela trabalham. O desempenho da
empresa é uma das responsabilidades básicas do setor de treinamento e
desenvolvimento.
É primordial, para o estabelecimento das contribuições de
qualificação, a definição clara e mensurável do objetivo. Deve-se ressaltar,
contudo, que é preciso estar atento à distinção entre problemas que podem,
ou não, ser tratáveis por uma ação de capacitação profissional. Dessa forma,

102
Sustentabilidade: uma abordagem social

ao identificar necessidades de capacitação, devem-se destacar os objetivos a


que se pretende chegar e escolher indicadores adequados, visando à
avaliação dos resultados.
As técnicas praticadas para prospectar, avaliar e validar resultados de
capacitação consideram a percepção do capacitando, a do facilitador e a da
chefia imediata. Podem ser realizadas através de questionários e reuniões
com as chefias ou as equipes de trabalho. Todas as técnicas exigem
preparação dos envolvidos no processo.
Percebe-se que a tendência de avaliação está voltada para a avaliação
dos impactos dos investimentos sobre os negócios. Exemplo disso é o
posicionamento de Jay Zimmerman, Gerente de Pesquisa e Qualidade do
Institute of Learning do banco de Montreal: "Eu gosto de falar sobre fatos ou
indicadores de impacto. [...] além das medidas tradicionais, níveis de
avaliação de Kirkpatrik, a avaliação deve ter uma abordagem em equipe, não
há receita, o importante é o tipo de mudança que você está tentando
empreender" (ZIMMERMAN apud MEISTER, 1999, p. 79).
Destro (1994, p. 63) observa "que o processo de avaliação de retorno
de investimento enobrece os processos de treinamento e desenvolvimento
e os leva às pautas de reuniões de planejamento estratégico das principais
organizações do mundo todo". Ele afirma que o sucesso da avaliação de
treinamento está atrelado a vários fatores críticos:
1) análise da necessidade - o que se esperava que o treinamento
realizasse,
2) preparo organizacional: a organização deve estar disposta a investir
tempo e recursos humanos necessários para levar a avaliação até o final e,
3) competências necessárias: o pessoal de treinamento deve
desenvolver competências e conhecimentos técnicos para fazer avaliações
efetivas (DESTRO, 1994, p. 63).
Frente a esse contexto, Destro (1994, p.51) apresenta algumas razões
adicionais para que se faça avaliação de treinamento,, conforme seguem,
– Determinar o quanto o treinamento satisfaz as necessidades dos
participantes.
– Determinar em que extensão os participantes dominam o conteúdo
do treinamento.
– Identificar se os métodos e meios de treinamento ajudaram os
participantes a atingir os objetivos de aprendizado.
– Avaliar quanto do conteúdo do treinamento, incluindo conhecimento
e habilidades recém-adquiridos, foi transferido para o
comportamento de trabalho.

103
Alexandra Zottis, Denise Russo e Margarete Panerai Araújo (organizadoras)

– Determinar se os resultados do treinamento contribuíram para o


cumprimento das metas da empresa.
O mesmo autor ressalta, contudo, que, quando não são realizadas
avaliações de treinamento, podem ocorrer conseqüências como as seguintes.
– Os participantes podem continuar a fazer cursos em que não
conseguem aprender.
– O treinamento pode ser visto como um uso esbanjador de recursos.
– As modificações do curso podem não ser baseadas nos dados de
resultados do participante, e as mudanças podem fazer com que as
atividades de treinamento efetivas sejam substituídas por atividades
ineficientes (DESTRO, 1994, p. 51).
Percebe-se, portanto, que um processo de avaliação, adequadamente
implementado, fornece valor agregado para a organização e é um
investimento relevante, que posiciona seus recursos humanos em termos
operacionais e estratégicos. Existem algumas características significativas
para o sucesso da empresa, isso quer dizer desenvolver instrumentos que se
destinem a capacitar empresários para a criação, a manutenção e a expansão
dos negócios das empresas. O empresário precisa estar atento às mais
diversas formas de desenvolver suas habilidades, para operar num contexto
global, entendendo e adaptando-se às diferenças culturais que caracterizam
os mercados atuais.
Piaget (1996) afirma que cada indivíduo nasce com uma determinada
capacidade e só vai desenvolver as habilidades que sua capacidade permitir.
Sendo assim, faz uma distinção entre três formas de conhecimento: em
primeiro lugar, há uma imensa categoria dos conhecimentos adquiridos
graças à experiência física em todas as suas formas, isto é, a experiência dos
objetos e de suas relações, mas com abstração a partir dos objetos como tais,
caracterizando-se o uso da inteligência prática. Em segundo lugar, há a
categoria dos conhecimentos estruturados por uma programação
hereditária, estruturas perceptivas e dimensões de espaço. E, em terceiro, a
categoria, pelo menos tão extensa quanto a primeira, dos conhecimentos
lógico-matemáticos, “ações exercidas pelo sujeito sobre os objetos”
(PIAGET, 1996, p. 306).
Nesse contexto, a capacitação pode ser caracterizada como um
programa que abrange tanto a aquisição de novas habilidades e
conhecimentos quanto o desenvolvimento de outras características
comportamentais. Diante do exposto, a empresa está envolta em
influências econômicas, culturais e sociais, caracterizando-se como um
laboratório de desenvolvimento do conhecimento, marcando seu espaço

104
Sustentabilidade: uma abordagem social

no mercado e garantindo a sua sustentabilidade. A partir desse cenário, a


empresa assume a responsabilidade de se manter no mercado, cumprindo
seu papel social, garantindo não somente sua função econômica, na
obtenção de resultados, mas também a capacitação dos seus funcionários
como agentes transformadores, multiplicadores, disseminadores e
somadores do conhecimento.

Considerações Finais
O conhecimento possui relevância para o avanço da aprendizagem
organizacional, pela eficiência no uso de modelos e processos que
permitem às organizações a eficácia da junção dos esforços possíveis dos
três elementos básicos destas: o indivíduo, o grupo (a equipe) e a
organização. Esses elementos, conjuntamente, permitem a prosperidade,
decorrente da atuação responsável socialmente.
No primeiro momento, o estudo pretendeu concentrar-se na história
do desenvolvimento do treinamento como forma de execução das tarefas
nas organizações. Nesse contexto, a organização exercia um papel de
propiciar, ao indivíduo, meios necessários para que este desenvolvesse suas
atividades de forma treinada, não lhe sendo necessário possuir habilidades
intelectuais, tornando-se uma extensão da máquina propriamente dita.
Restava-lhe apenas o comprometimento de desenvolver bem suas tarefas
em troca de remuneração.
Essa forte presença na história da industrialização, tida como período
da produção em série e de massa, perdurou, praticamente, até o final da
década de 80 do século XIX. Pode-se afirmar que esse foi um período de
asfixia funcional, em que pouca oportunidade havia para o
desenvolvimento do conhecimento nas massas operárias. Podem ser
citadas como variáveis dessa asfixia: a produção monopolista de alguns
países; os regimes políticos existentes; as políticas econômicas fechadas das
organizações e dos países.
No segundo momento, o conhecimento foi tido como forma de
sobreposição ao treinamento, sufocando, de certa forma, o treinamento, mais
especificamente a partir da última década do século XX e, mais
acentuadamente, no princípio do século atual. Esse fato se deve à abertura das
fronteiras econômicas dos países, formando blocos econômicos regionais,
inclusive transregionais, como parceiros econômicos. Essa variável passou a
impressão de que seria necessário apenas o conhecimento específico.
Em decorrência da variável globalização - política e econômica -, as
organizações tanto públicas quanto privadas necessitam ajustar-se, revendo

105
Alexandra Zottis, Denise Russo e Margarete Panerai Araújo (organizadoras)

suas posições. O alcance de novas posições concentra-se na busca da


capacitação profissional, preparando os trabalhadores tecnicamente. Porém
isso não é o suficiente, se não houver a desalienação do conhecimento
A alienação do conhecimento técnico ao capital cria uma espécie de
atrofia do intelecto e é nessa linha que as universidades precisam se engajar,
como cooperadoras e propagadoras da reflexão e da crítica ao processo da
produção e do desenvolvimento do conhecimento, pois é dessa forma que
ocorre a aprendizagem organizacional com foco centrado no treinamento
(capacitação) e no conhecimento.
O conhecimento desenvolvido pelo conjunto dos elementos básicos
permite que as organizações construam, mutuamente, uma sociedade mais
justa e igualitária; socialmente responsável pelo desenvolvimento de
políticas ambientais de participação, motivação e comprometimento de
todos. A produção do conhecimento desencadeia a concepção de que a
responsabilidade social é de todos e não exclusiva das organizações.

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Sustentabilidade: uma abordagem social

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107
Alexandra Zottis, Denise Russo e Margarete Panerai Araújo (organizadoras)

108
Sustentabilidade: uma abordagem social

Desenvolvimento Sustentável:
indicadores de sustentabilidade
nos aspectos social, econômico e
ambiental, como ferramenta para a
gestão pública local
1 2
Alberto de Souza Rossi e Sérgio Carvalho

Introdução
O Brasil, ultimamente, tem enfrentado um processo de urbanização
desenfreada pelo ritmo de aceleração do crescimento populacional e das
atividades econômicas, o que tem causado pressões sobre o meio ambiente e,
conseqüentemente, alterações da qualidade ambiental dos municípios
brasileiros. O aumento das taxas de crescimento demográfico de urbanização
observadas nas duas últimas décadas contribuiu para a elevada concentração
da miséria, ocasionando a degradação dos recursos naturais, resultando na
diminuição da qualidade de vida da população. A insuficiência de
planejamento municipal provocou diversos problemas ambientais, tais como
a poluição do ar e das águas, as enchentes e os deslizamentos, entre outros,
resultando em conseqüências desastrosas para a população.
Para modificar esse cenário e fortalecer as estratégias da gestão
ambiental em âmbito municipal, é necessária a criação de programas nos
municípios, objetivando proteger e conservar as questões ambientais e
obter a qualidade e o equilíbrio necessários ao meio ambiente. Esses
objetivos poderão ser atingidos pelas organizações que se adequarem às

1
Mestrando em Gestão Tecnológica: Qualidade Ambiental. Centro Universitário Feevale.
alberto@feevale.br
2
Professor-pesquisador. Centro Universitário Feevale. Coordenador do Mestrado em
Qualidade Ambiental sergiocarvalho@feevale.br

109
Alexandra Zottis, Denise Russo e Margarete Panerai Araújo (organizadoras)

novas normas ambientais, em busca de uma sustentabilidade, forma essa de


contribuir com o desenvolvimento sustentável (Bello, 1998).
A procura por um desenvolvimento sustentável, no século XXI, é
caracterizada como um desafio proeminente para muitas organizações, as
quais acreditam que esse novo modelo de desenvolvimento possa ser a
forma de assegurar a qualidade ambiental e a garantia de um meio ambiente
cada vez mais saudável.
Os problemas ambientais acabaram por marcar a segunda metade do
século XX. Permite-se, aqui, resgatar alguns acontecimentos envolvendo
desastres ambientais que ficaram registrados na história mundial. Entre
eles, destacam-se acidentes como: Baía de Minamata, no Japão, o acidente
de Bhopal, na Índia, e o acidente na usina nuclear de Chernobyl, na extinta
União Soviética. Esses acidentes provocaram, na Europa, um
impressionante crescimento da conscientização sobre os problemas
ambientais. Também um ponto de referência foi o vazamento de petróleo
da Exxon Valdez, que obteve o mesmo impacto na América do Norte,
provocando imensa irritação popular nos Estados Unidos.
Observa-se que esses danos causados são, de certa forma, menores do
que aqueles que estão sendo localizados, cumulativamente, no meio
ambiente, embora não existam ainda instrumentos que permitam realizar
balanços ecológicos. A Organização para Cooperação e Desenvolvimento
Econômico (Organization for Economic Cooperation and Development –
OCDE) estimou os danos ambientais acumulados para a Europa em 4% do
produto nacional bruto médio de cada país (CALLENBACH et al., 1993).
Os debates referentes às discussões do desenvolvimento sustentável
iniciaram-se através da tomada de consciência sobre os possíveis problemas
ambientais até o presente momento, os quais evoluíram significativamente.
A relação que se refere à sociedade e ao meio ambiente, tão pouco abordada
nas discussões iniciais sobre a problemática ambiental, passou a ser
observada de forma criteriosa e a própria concepção do problema passou a
ser uma forma mais globalizada e cada vez menos localizada. Essa reflexão
sobre a crise ecológica moderna no nível local leva ao surgimento de novas
alternativas de relacionamento da sociedade contemporânea com seu
ambiente, buscando alcançar a redução dos impactos que esta produz sobre
o meio que a cerca.
Visivelmente, nos últimos séculos, a dependência das sociedades
humanas em relação aos recursos naturais vem diminuindo. Esse fato, por
sua vez, pode ser admitido pela diminuição da produção e do consumo de
recursos energético-intensivos, pelo aumento de consumo de produtos

110
Sustentabilidade: uma abordagem social

energéticos não-intensivos e pelo crescimento do setor de serviços.


Utilizando-se uma base relativamente baixa na entrada de recursos naturais,
os sistemas tecnológicos atuais, mais eficientes, são capazes de criar e operar
complexas estruturas com alta produtividade (WEIZSÄCKER et al., 1995).
As regiões do Brasil que concentram maior número de população
estão vulneráveis a problemas sérios relacionados ao meio ambiente,
provocando impactos ambientais, contendo áreas críticas de degradação:
“assentamentos ilegais, sistema de transportes e de saúde falidos, déficit
habitacional, saneamento básico, falta de escolas e creches, menores
abandonados, violência urbana acentuada e outros” (TOURAINE apud
MENEZES, 2001, p. 23).
[...] a falta de uma vontade política dos governantes em estabelecer uma
meta para o desenvolvimento das cidades, adequado ao seu
crescimento. Políticos e administradores municipais não devem ignorar
o fato de planejar o desenvolvimento urbano daqui para frente
(MENEZES, 2001).

Os gestores públicos, em âmbito municipal, estadual e federal deste


país, precisam se conscientizar de que investir em meio ambiente é
essencial, afinal, não existe saúde sem que o meio ambiente esteja
equilibrado. Para isso, é preciso desenvolver políticas ambientais e deixar de
lado os “palpites ambientais” (JÚNIOR, 1996).
Finalmente, um desenvolvimento sustentável serve para enfrentar
problemas no meio ambiente e relacionar as diversas dimensões existentes,
entre elas: sociais, econômicas e ambientais. Os indicadores aqui
demonstrados permitem resgatar seus princípios, seus tipos, sua função e
como se articulam para um sistema de gestão local.
Para concretizar este trabalho, teve-se como instrumento de pesquisa
uma revisão de literatura, com o objetivo de contribuir com questões acerca
do desenvolvimento sustentável de uma forma prática e objetiva,
procurando relacioná-lo aos indicadores de sustentabilidade, contribuindo
para uma gestão pública que a priorize.

Desenvolvimento Sustentável: conceitos e métodos praticados


O desenvolvimento sustentável tem sido considerado um discurso
necessário e global. Entretanto, os conceitos e os princípios formulados
recentemente disponibilizam alternativas aos debates acerca de
desenvolvimento e vicissitudes sobre as formas democráticas de gestão das
políticas públicas.

111
Alexandra Zottis, Denise Russo e Margarete Panerai Araújo (organizadoras)

O ritmo acelerado, a partir da segunda metade do século XX,


referente à revolução industrial, trouxe grandes transformações nas
questões da urbanização, com o envolvimento do excesso de população
inserido nesse contexto. Esse processo acabou causando profundos
impactos, afetando, principalmente, a esfera social e ambiental e, por
conseqüência, acabou interferindo em outras esferas, como a econômica,
a política, a cultural e a tecnológica, surgindo, assim, a necessidade por
um desenvolvimento sustentável.
Imediatamente, houve a obrigação de desenvolver estratégias com o
objetivo de encarar questões relacionadas à sustentabilidade, tanto global,
regional, quanto local. Para tornar viável a busca por um ambiente
sustentável, necessita-se da interação de políticos e da sociedade,
participando juntos em busca de um mesmo objetivo centralizado nas
questões sobre o desenvolvimento sustentável.
O conceito desenvolvimento sustentável surgiu a partir da década de
80, no momento em que as discussões se referiam às questões ambientais,
resultando na preocupação voltada aos recursos naturais não-renováveis,
evidenciando a necessidade da criação de novos padrões de
desenvolvimento econômico, social e ambiental (SILVA, 2005).
Segundo o Banco Mundial, a UNESCO e outras entidades
internacionais, o termo “Desenvolvimento Sustentável” traz implícita a
função de uma nova filosofia do desenvolvimento, que reúne eficiência nas
dimensões econômica, social e ambiental. O termo Sustentável já traz a idéia
de equilibrar-se, não cair, auto-alimentar-se. Segundo Sachs (2002), esse
termo é utilizado para representar a sustentabilidade ambiental, mas a
dimensão social deve estar sempre em primeiro lugar, por se destacar como
finalidade última do desenvolvimento.
[...] uma vez que um transtorno econômico traz consigo o transtorno
social, que, por seu lado, obstrui a sustentabilidade ambiental; – o
mesmo pode ser dito quanto à falta de governabilidade política, e por
esta razão é soberana a importância da sustentabilidade política na
pilotagem do processo de reconciliação do desenvolvimento com a
conservação da biodiversidade (SACHS, 2002, p. 71).

Para Becker e Wittmann (2003), bem como para a Comissão Mundial


sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento (1988), o desenvolvimento
sustentável “atende as necessidades do presente sem comprometer
gerações futuras”. A referência a esse conceito é relacionada às questões das
necessidades básicas e dos recursos naturais.

112
Sustentabilidade: uma abordagem social

Sachs (apud Cavalcanti et al, 2001) afirma que um dos utilizadores do


conceito de desenvolvimento sustentável diz que “a imaginação social da
população e do planejador necessita de conceitos de apoio sob a forma de
estudos comparativos e das maneiras como outros povos lidam com situações
similares”. O planejador, portanto, deve estar atento às pesquisas e às atitudes,
assim como aos acontecimentos de outras localidades, pois situações
semelhantes trazem possíveis respostas a eventuais problemas, ampliando a
perspectiva das dimensões econômica, social e ambiental em análise.
Ainda o mesmo autor reforça que o desenvolvimento vem se
tornando insustentável, pois o homem está utilizando os recursos naturais
de forma abundante, acima da capacidade necessária, tornando-os menos
disponíveis para as gerações futuras. Diante desse ponto, percebe-se que o
conceito apresentado, anteriormente, pela Comissão Mundial sobre o Meio
Ambiente e Desenvolvimento (1988), afirmando que “Desenvolvimento
Sustentável atende as necessidades do presente sem comprometer gerações
futuras”, ainda está a uma longa distância.
Para tornar existente o desenvolvimento sustentável, o consumo deverá
ser efetuado com mais rigidez, moderação e maior naturalidade. Os sistemas
que interagem em conformidade com a natureza seguem regras que
respeitam, rigorosamente, os limites dos recursos sustentáveis. Percebe-se
que, de acordo com Cavalcanti et al. (2001), essas determinadas regras, que se
denominam econômicas, foram observadas, como a utilização dos recursos.
Esses autores trazem como exemplo o fato de que os índios, na caça e na
pesca, caçavam e fisgavam somente aquilo de que precisavam.
Continuamente, na concepção dos mesmos autores, eles afirmam
ainda que o tipo de desenvolvimento que o mundo conhece, nos últimos
duzentos anos, especialmente depois da Segunda Guerra Mundial, é
insustentável. As possibilidades de aproveitamento exigidas pelo
desenvolvimento estão muito dependentes. Vários são os modelos
metodológicos de planejamento de políticas, que vêm tentando contribuir
com o homem, de forma a estabelecer uma nova relação com a natureza,
melhorando as condições de adaptação no meio natural.
O sentido da referência recente ao conceito de desenvolvimento
sustentável é precisamente marcar a necessidade de se inserir a análise
econômica das escolhas num quadro mais amplo de exigências
refletindo a preocupação pela reprodução a longo prazo do meio
ambiente em termos de patrimônio essencial, a transmitir-se às
gerações futuras (CAVALCANTI et. al., 2001, p. 335).

113
Alexandra Zottis, Denise Russo e Margarete Panerai Araújo (organizadoras)

Seguindo o raciocínio do autor, sustentabilidade significa a


probabilidade de se conseguir, sucessivamente, condições similares ou
superiores de vida para um grupo de pessoas e seus sucessores em dado
ecossistema. Numa situação sustentável, o meio ambiente é menos
degradado, embora, como se conhece, o processo entrópico nunca
interrompa, procedendo à recuperação invisível e irrevogável. Esse conceito
equivale à idéia de manutenção de nosso sistema de suporte da vida e significa
um comportamento que procura obedecer às leis máximas da natureza.
As discussões relacionadas ao desenvolvimento sustentável devem ser
realizadas, na sociedade local, não somente nas estruturas convencionais de
representação (atores sociais), mas através do envolvimento direto dos
cidadãos (JARA, 1996). Muller (1997) compreende que o desenvolvimento
sustentável deve ser relacionado com uma sociedade envolvida em um
círculo virtuoso de crescimento econômico e um padrão de vida adequado.
O tema aqui em estudo, fortificou-se a partir da Conferência das
Nações Unidas sobre o Ambiente Humano, ocorrida em 1972, em
Estocolmo, onde, por sua vez, se colocaram assuntos sobre meio ambiente
na agenda internacional. A partir dessa Conferência, foram implementadas,
através do encontro realizado pelo Founex, de 1971, discussões acerca das
dependências entre o desenvolvimento e o meio ambiente. Após a
realização desse evento, cerca de vinte anos depois, ocorreu uma série de
encontros promovidos através de relatórios internacionais (SACHS, 2002).
A partir da Conferência das Nações Unidas, colocou-se a questão
ambiental como um ícone importante nas agendas oficiais internacionais
em relação ao desenvolvimento sustentável. Foi a primeira vez que
representantes dos governos se uniram para discussões a partir da
necessidade de tomar medidas referentes ao controle dos fatores que
envolvem a degradação ambiental. No referido evento, ficaram populares
as palavras ditas pela primeira ministra da Índia, chamada Indira Gandhi: “A
pobreza é a maior das poluições”. Com base nesse contexto, os países do sul
asseguraram que a solução quanto à poluição não era apenas valorizar o
desenvolvimento como um todo, mas, sim, orientar o desenvolvimento,
preservando o meio ambiente e dando ênfase aos recursos não-renováveis
(ANDRADE et al., 2000).
Conforme o referido autor, a reunião realizada em Estocolmo serviu
de base para a Conferência sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento
realizada no Rio de Janeiro, em junho de 1992, denominada (Rio92). A
declaração do Rio teve como premissa “estabelecer acordos internacionais
que respeitem os interesses de todos e protejam a integridade do sistema

114
Sustentabilidade: uma abordagem social

global de ecologia e desenvolvimento”.


Como dito, a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente
e Desenvolvimento foi realizada no Rio de Janeiro, em 1992 (Rio92), e
contou com a presença de 178 países e 112 Chefes de Estado. A questão
central que está sendo discutida em decorrência dos documentos
aprovados pela Rio92 é a disponibilidade de recursos adicionais para países
pobres promoverem o desenvolvimento. O Instituto de Pesquisa e
Desenvolvimento da ONU – Organização das Nações Unidas - estimou,
em 1992, que os países subdesenvolvidos necessitam cerca de U$ 60 bilhões
a cada ano, somados a outros U$ 60 bilhões a serem gastos, anualmente,
objetivando a proteção do meio ambiente. Os investimentos seriam
ofertados pelos países mais ricos do planeta (G7), destinando 0,7% do seu
PIB – Produto Interno Bruto -, mas ainda sem definição de data para a
concretização desse fato (JÚNIOR, 1996).
Giansanti (1998) resgata que o Brasil, para fortalecer o
desenvolvimento sustentável, participa do programa chamado Agenda 21,
um documento que prevê ações concretas e tem menor força jurídica e
política do que uma convenção ou um tratado, mas serve para promover
projetos, recomendando redução de índices de desertificação, regular os
estoques de água doce, controlar as epidemias e a subnutrição do planeta.
Sugere, ainda, a adoção de padrões de consumo sustentável, o plantio de
florestas e uma previsão de gastos para programas diversos, como a
obtenção de energia alternativa, a erradicação da pobreza, a melhoria da
saúde, a educação da população, entre outros.
A Agenda 21 relaciona-se aos problemas da atualidade e busca
preparar o mundo para os seus desafios do próximo século. Refere-se ao
consenso global e ao compromisso político, tendo como objetivo o
desenvolvimento ambiental. No entanto, para o sucesso da Agenda 21, faz-
se necessário o esforço por parte dos políticos, engajando a
responsabilidade voltada às políticas públicas.
A Agenda 21 contempla um plano de ação, que tem como objetivo
colocar em prática programas para evitar o processo de aceleração da
degradação ambiental, bem como os princípios da Declaração do Rio.
Esses programas estão divididos em capítulos, que apresentam os seguintes
problemas a serem administrados pelas políticas públicas: “atmosfera,
recursos da terra, agricultura sustentável, desertificação, florestas,
biotecnologia, mudanças climáticas, oceanos, meio ambiente marinho, água
potável, resíduos sólidos, resíduos tóxicos, rejeitos perigosos, entre outros”
(ANDRADE et al., 2000).

115
Alexandra Zottis, Denise Russo e Margarete Panerai Araújo (organizadoras)

A ênfase em função do desenvolvimento sustentável ocorreu através


da Agenda 21, que procurou reunir propostas de modelos para um
desenvolvimento sustentável, tornando-se a maior tentativa já realizada de
construir um novo padrão de desenvolvimento para o século XXI, cuja
base é norteada pelas questões que envolvem as dimensões econômica,
social e ambiental (NASCIMENTO et al., 2008).
Nesse aspecto, o conceito de desenvolvimento sustentável tornou-se
motivo para inúmeros debates, não apenas dirigindo-se aos aspectos da
sustentabilidade destinados às questões ambientais, mas também quanto à
sua relação com o desenvolvimento econômico, social, entre outros,
construindo, à sua volta, diversas interpretações e consensos. Nota-se que a
sustentabilidade não é um modelo simples de desenvolvimento, e, sim,
contempla a complexidade caracterizada tanto das relações humanas como
dos ambientes naturais.
As questões voltadas ao Desenvolvimento Sustentável vêm ao
encontro dos chamados indicadores de Sustentabilidade. A seguir,
apresenta-se uma descrição sucinta desses indicadores, relacionando aos
aspectos sustentáveis, procurando alcançar o objetivo deste trabalho.

Indicadores de Desenvolvimento Sustentável: principais aspectos


A detecção do esgotamento dos recursos naturais, explorados de
forma significativa, resultou na necessidade de avaliar as condições do meio
ambiente e as alterações realizadas pelas atividades antrópicas. Desde o
século XX, foi proposto o monitoramento do estado e das pressões
exercidas no meio ambiente, descobrindo, então, a real necessidade da
criação de indicadores alocados nas dimensões: econômica, social e
ambiental. Assim, foram apresentadas diversas propostas, definições e
métodos para a sua realização.
O desenvolvimento dos indicadores é definido por Meadows (1998) como
sendo indicadores de diagnóstico do meio ambiente, em que foram adicionados
metas e limites a serem observados e a série temporal para comparações.
Conforme Xarxa (2000) (apud Corrêa, 2007, p. 44), os indicadores devem
[...] refletir a dinâmica do uso, observando o estado do local em um
momento pontual e possibilitando análise evolutiva em escala
temporal, com capacidade para orientar a transformação de uma
localidade e formar um ciclo de tomada de decisões em função das
tendências verificadas e das metas estabelecidas.

116
Sustentabilidade: uma abordagem social

Indicadores de desenvolvimento sustentável têm sido objeto de vários


estudos, em que pesquisadores nacionais e internacionais discutem sua
construção e buscam determinar suas reais significâncias. Não são apenas
necessários, mas indispensáveis para a tomada de decisão nas mais diversas
áreas. Projetos com esses indicadores surgem com a necessidade de uma
definição clara, contribuindo para a gestão em nível de desenvolvimento
local, regional e até mesmo global.
Conforme modelo desenvolvido pela OECD (1993), os indicadores
de sustentabilidade podem ser determinados através das seguintes etapas:
Pressão, Estado e Resposta (PSR – Pressure, State and Response). Os
indicadores de pressão descrevem os impactos, diretos ou indiretos,
desenvolvidos pelas atividades antrópicas em função da quantidade e da
qualidade dos recursos naturais. Os de estado verificam a qualidade do meio
ambiente e dos recursos naturais, apresentando uma visão sistêmica da
situação do meio ambiente e da sua evolução, segundo as pressões sofridas.
Por fim, os indicadores de resposta apresentam a reação da sociedade civil
organizada, objetivando avaliar as ações individuais ou coletivas em relação
ao meio ambiente, à degradação ou à preservação, procurando resolvê-los.
Estados membros da União Européia (UE) já publicaram
documentos sobre indicadores de sustentabilidade, sendo pioneira a
Agência Européia do Ambiente (AEA), desenvolvendo um conjunto de
trabalhos, estimulando e sistematizando informações, procurando
cooperar com outros organismos, como a Eurostat3 e a Organização para a
4
Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE ).
De acordo com Sato (2005), "os indicadores são instrumentos que
permitem simplificar, quantificar e analisar informações técnicas para
transmiti-las aos mais diversos grupos de usuários". Conforme Fernandes
(2004, p. 3), a tarefa básica de um indicador é
[...] expressar, da forma mais simples possível, uma determinada
situação que se deseja avaliar. O resultado de um indicador é uma
fotografia de um dado momento, e demonstra, sob uma base de
medida, aquilo que está sendo feito, ou o que se projeta para ser feito.

3
Organização estatística da Comissão Européia, que produz dados estatísticos para a União
Européia e promove a harmonização dos métodos estatísticos entre os estados membros.
4
É uma organização internacional dos países desenvolvidos e industrializados, com os
príncipios da democracia representativa e da economia de livre mercado. A sede da organ

117
Alexandra Zottis, Denise Russo e Margarete Panerai Araújo (organizadoras)

A constituição de indicadores sustentáveis surge a partir da idéia de


fornecer uma fotografia sistêmica do potencial, fornecido pelas vertentes,
sócio-econômico e ambiental. É um importante instrumento para gestores
públicos, assim como para especialistas e pesquisadores que
contextualizam esse tema. Os dados poderão ser acompanhados de análise,
tanto quantitativa como qualitativa, e interpretados a partir das dimensões
sócio-econômica e ambiental, nacional e internacional, garantindo a
comparabilidade das informações. Um indicador, segundo Abbot e Guijt
(1999), é "algo que auxilia a transmitir um conjunto de informações sobre
complexos processos, eventos ou tendências”.
O indicador pretende ser uma medida, não um instrumento de
previsão ou medida estatística. A partir dele, verifica-se uma dada situação
ou realidade. As previsões poderão ser realizadas através dos indicadores,
de acordo com o grau de conhecimento do observador e visão de mundo
(MARZALL e ALMEIDA, 2000, p.3).
Indicadores da sustentabilidade servem para medir, quantificar,
traduzir ou simplificar conteúdos complexos de um sistema. Busca-se,
através deles, localizar informações relevantes para avaliação do estado de
um sistema e das possibilidades de seu estado futuro. Segundo o
documento do Australian Department of Primary Industries and Energy
(1995), indicadores são medidas da condição do comportamento dos
sistemas complexos. A previsão de futuras gerações poderá ser feita diante
da relação dos indicadores nas dimensões econômica, social e ambiental,
em que se podem evidenciar modificações que ocorrem em uma dada
realidade (AUSTRALIAN DEPARTMENT OF PRIMARY
INDUSTRIES AND ENERGY, 1995), principalmente, as mudanças
formatadas pela ação antrópica (MARZALL, 1999).
A “agenda 21", como visto anteriormente, apresenta, no seu capítulo
40, assunto referente à informação para a tomada de decisão, utilização de
dados indicadores e índices estabelecendo métodos para avaliar medidas de
inter-relacionamento entre as dimensões, ambiental, demográfica e social,
apresentando parâmetros para a sua aplicabilidade. Indicadores
sustentáveis podem contribuir para a sustentabilidade auto-reguladora de
integrados sistemas ambientais e desenvolvimento. O relatório Brundtland,
de forma simplificada, apresenta a necessidade de indicadores de
desenvolvimento sustentável (BRUYN, 1999). O desenvolvimento de
indicadores, nos dias atuais, é estimulado pela Comissão das Nações Unidas
sobre Desenvolvimento Sustentável. Essa comissão tem por objetivo

118
Sustentabilidade: uma abordagem social

monitorar a evolução e a manutenção da Agenda 21. Em função disso,


destaca-se a importância dos indicadores sustentáveis.
Portanto, indicadores sustentáveis servem para facilitar a
comunicação entre o desenvolvimento e sua sustentabilidade, ou seja,
através de medidas descritivas, numéricas, tabelas, símbolos, entre outros.
Esses indicadores englobam um conjunto de medidas para diferentes
características do ecossistema (RIBEIRO, 2000).
Por conseguinte, indicadores deverão ser construídos a partir do
universo científico, para que as informações tenham uma melhor validade e
aceitação. Dessa forma, os indicadores terão capacidade científica de modo
a contribuir para as necessidades na tomada de decisão e na urgência da ação
(HARDIN e ZDAN, 1997). Essa forma de mediar a sustentabilidade deve
quantificar, sempre que possível, simplificar fenômenos complexos e
colaborar no entendimento sobre a realidade no desenvolvimento de uma
região. Esses indicadores partem da agregação de dados brutos, que, ao
serem processados dentro de uma lógica adequada, definem valores de
indicação do fenômeno em análise (RIBEIRO, 2000).
O maior desafio para a construção de um sistema de indicadores
sustentáveis é a relação que poderá ser atribuída entre as dimensões
econômica, social e ambiental. Existem lógicas diferentes entre essas
dimensões. Conforme pesquisadores da área, articular uma lógica própria
para ambos em busca da viabilidade rumo à sustenabilidade é um dos
maiores desafios do desenvolvimento sustentável.
Para Jesinghaus (apud Bellen, 2002, p. 48), um sistema de avaliação,
desenvolvido através dos indicadores sustentáveis, colabora nas metas e
estratégias, resultando no auxílio aos tomadores de decisão no que se refere
à possibilidade de escolha, de comparações e evoluções, trazendo as
melhores decisões para a sustentabilidade. Esse sistema possibilita uma
visão do presente com o passado, relacionado às metas estabelecidas
anteriormente e à comparação entre diferentes regiões, possibilitando
reflexão no sentido de observação de tendências a partir dos efeitos de
diferentes políticas aplicadas. Indicadores expressam uma obrigação de
trazer a realidade e, apesar de sua impressão, dizem respeito à compreensão
das questões que relacionam o homem e o meio ambiente dentro da esfera
do desenvolvimento. Por definição, segundo o autor, os indicadores de
“sustentabilidade são instrumentos imperfeitos e não universalmente
aplicáveis, sendo que cada vez se torna mais necessário conhecer as
particularidades dos diferentes sistemas, suas características e aplicações”.

119
Alexandra Zottis, Denise Russo e Margarete Panerai Araújo (organizadoras)

A base principal dos indicadores de desenvolvimento é apoiar-se, da


maneira mais adequada, à política ambiental e oferecer diversos níveis para a
tomada de decisão. O nível mais elevado seria o global, incluído
internacionalmente. Nesse sentido, os acordos internacionais relacionados
a temas específicos, como “clima, biodiversidade, desertificação”, são
importantes e o papel dos indicadores é auxiliar no processo decisório,
validando os próprios acordos. Um dos desafios é tornar os indicadores
aceitáveis internacionalmente, estabelecendo critérios de avaliação e
metodologias uniformes para uma melhor comparação entre as regiões,
podendo ser global (GALLOPIN, 1996, apud Bellen, 2002).
Em tese, o autor confirma inúmeras ferramentas, que procuram
contribuir com a mensuração do grau de sustentabilidade, reconhecidas
internacionalmente pelos mais variados especialistas. Portanto, essas
ferramentas potencializam uma relação com o conceito de
desenvolvimento sustentável.
A seguir, apresentam-se quatro sistemas de indicadores, sendo que os
três primeiros se referem aos estudos de Bellen e o último, feito pelo IBGE
– Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.
1. Ecological Footprint Method – constitui a área de um espaço, na
ecologia, necessária para a sobrevivência de uma determinada população ou
um sistema, fornecendo recursos naturais e fontes de energia, sendo capaz
de absorver os resíduos do próprio sistema.
2. Dashboard of Sustainability – representa, através de um índice, a
sustentabilidade de um sistema, incluindo uma mediana de indicadores com a
mesma formatação, distribuídos em três dimensões: econômica, social e
qualidade ambiental. Esse método possui uma forma mais simples em relação
aos demais. Ele pode ser verificado através de uma escala de cores, que varia do
vermelho-escuro, significando resultado crítico, cruzando pela área amarela,
até chegar ao verde-escuro, em que demonstra um resultado positivo.
3. Barometer of Sustainability – permite, por meio de uma escala de
performances, a comparação de diferentes indicadores representativos do
sistema, propiciando uma visão geral do estado da sociedade e do meio
ambiente. Os resultados são apresentados por índices, em uma escala que
varia de uma base 0 (ruim ou péssimo) a 100 pontos (bom ou ótimo).
Segundo seus autores, o Barometer of Sustainability é destinado a
tomadores de decisão e profissionais que trabalham com a questão do
desenvolvimento sustentável, tanto em nível local, regional, como global.
Essa ferramenta propõe uma interação mais clara entre a sociedade e o

120
Sustentabilidade: uma abordagem social

meio ambiente. Os indicadores, através dessa ferramenta, devem ser


combinados de uma maneira mais adequada, sendo necessária uma medida
comum entre as dimensões, para que não haja distorção (PRESCOTT-
ALLEN apud BELLEN, 2002).
4. IDS – Indicadores de desenvolvimento sustentável criados pelo
IBGE. Publicação de indicadores nas dimensões social, econômica e
ambiental, apresentando, através deles, informações para o
acompanhamento e a disponibilidade de dados, fotografando o
desenvolvimento do país. O desafio é a construção dessa ferramenta,
associando inúmeras variáveis de diferentes dimensões (IBGE, 2007).
A construção de indicadores sustentáveis é um processo que exige certa
complexidade, pois tem como objetivo simplificar dados e trazer uma
conexão entre sociedade e meio ambiente. Para essa construção, necessita-se
de informações que correlacionem as dimensões econômica, social e
ambiental e que sejam adequadas para mensurar o caminho com destino à
sustentabilidade (RIBEIRO, 2005). Essa ferramenta deve ser utilizada por
administradores públicos, pois são eles os interessados em desenvolver as
estratégias com vistas à sustentabilidade. O desenvolvimento sustentável e
seus respectivos indicadores deverão servir de base para serem colocados em
prática através dos administradores públicos. Com base nesse pensamento, a
seguir, serão abordados aspectos relacionados à gestão pública local.

Gestão pública local


De acordo com Osório (2005), administradores e/ou gestores são
sujeitos conceitualmente bem distintos. Gerir é algo mais do que apenas
administrar, implicando mudanças de modelos conceituais, teóricos e
pragmáticos. O surgimento e a ampliação do quadro gestor público
corresponde a uma nova mentalidade dentro da realidade administrativa,
novos papéis, nova forma de visualizar e mentalizar as coisas, deslocando-
se a figura dos administradores para uma posição distinta.
O gestor, ao contrário do clássico administrador, goza de mais
liberdades, preocupa-se com resultados e nem sempre será um funcionário
público. O gestor local pode
[...] ser o agente que goza de autonomias funcionais para o desempenho
de suas atribuições administrativas, dentro de padrões mais amplos de
discricionariedade, como pode ser alguém contratado pelo setor
público para implementar políticas públicas, ou pessoas concursadas
com posições de alta responsabilidade (OSÓRIO, 2005, p. 21).

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Alexandra Zottis, Denise Russo e Margarete Panerai Araújo (organizadoras)

O município conta com gestores técnicos e, ao mesmo tempo,


políticos, porque são ligados às políticas públicas. Os setores públicos e
privados seguem distintos, em muitos de seus modelos, tendendo a
orientar-se por parâmetros teóricos de qualidade, produtividade e controle
de resultados. Os resultados positivos esperados devem-se à qualidade do
setor público, que passa pela cobrança da sociedade (OSÓRIO, 2005).
Seguindo a idéia do referido autor, a finalidade da gestão pública local é
gerenciar pessoas e recursos para satisfazer o bem comum, sendo as ações
dos órgãos públicos voltadas para os objetivos governamentais, que, por
sua vez, representam o interesse coletivo.
Os agentes dos setores públicos não costumam buscar inovações,
tecnologias de ponta. Ao contrário, o que se observa, em geral, é a repetição de
procedimentos, a burocratização e o registro de falta de produtividade. A culpa
recai nas estruturas pesadas, sem velocidade, e nos funcionários públicos, vistos
como “semi-adormecidos”, deixando de cumprir seus deveres para com o
cidadão, conforme afirma Figueiredo (apud GIGLIO, 1998).
O “desenvolvimento municipal” é, repetidamente, diminuído e
interpretado como um processo de modernização administrativa, que se
entende a definir novas funções para o governo local, assim como suas
estruturas organizacionais para operacionalização do atendimento dos
diferentes problemas e das demandas relacionadas à gestão pública local.
Portanto, os gestores públicos locais carecem de uma cultura para o
desenvolvimento sustentável. O paradigma de gestão que predomina é o
clássico, no qual as lideranças políticas trabalham ainda de forma
patrimonialista na direção da coisa pública, administrando os interesses do
grupo por meio de práticas clientelistas, possuindo pouca transparência,
sem abrir espaços para que os excluídos possam ser representados e
determinar suas próprias idéias, através de projetos. Sendo assim, fica mais
fácil para os “poderes locais” (JARÁ, 1996).

Considerações Finais
Diante das discussões levantadas, a idéia do desenvolvimento
sustentável não perderá a sua importância nas ciências sociais do século que se
inicia. Precisa-se enfrentar e absorver as desigualdades sociais entre nações e
garantir o futuro da humanidade com mudanças, procurando deixar o meio
ambiente mais equilibrado. Portanto, através da problemática do
desenvolvimento sustentável, cresce, nas academias, a importância desse
contexto em que se faz necessário o enfrentamento da degradação ambiental.

122
Sustentabilidade: uma abordagem social

Percebe-se, através da literatura, que o conceito de desenvolvimento


buscou um destaque excepcional a partir da década de 1990,
transformando-se num dos termos mais empregados para se definir um
novo paradigma de desenvolvimento. Nota-se que não existe apenas um
consenso referente ao conceito de sustentabilidade, percebe-se uma
disparidade conceitual apreciável nas discussões que envolvem as
dimensões econômicas, sociais e ambientais.
As ferramentas utilizadas para definir ações em busca do
desenvolvimento sustentável se definem através da criação e da aplicação de
indicadores, que possuem importância no que tange a medir o ambiente,
além de avaliar a realidade levantada em questão.
Ao estabelecer um conjunto de indicadores, é essencial que eles se
destinem às interações entre as suas dimensões, refletindo o sistema na sua
forma local, regional e até mesmo global, sem desconsiderar as partes,
portanto, devem alcançar uma abordagem sistêmica.
A complexidade é encontrada ao se utilizarem indicadores de
sustentabilidade, sendo que vários autores observam que, apesar de se tratar
de um fenômeno complexo como o desenvolvimento, os procedimentos
que procuram mensurar a sustentabilidade devem buscar a simplicidade, de
forma a deixar claros os resultados para uma comunidade em geral.
Do mesmo modo, ponderar o grau de complexidade de um
instrumento, visto, aqui, como indicadores, é difícil estabelecer parâmetros
claros, para que se possa obter uma fácil leitura deles.
O indicador de desenvolvimento sustentável traz, assim, uma nova
dimensão ao sistema de gestão pública local, o qual deverá ser preparado
adequadamente, com a capacitação dos profissionais envolvidos, a
promoção da participação efetiva da população e o desenvolvimento de
política pública para o suporte legal.
Por fim, acredita-se que este trabalho alcançou, de forma simplificada,
seus objetivos, procurando relacionar as questões referentes ao
desenvolvimento sustentável e atrelando seus respectivos indicadores,
servindo de base para um estudo aplicado em uma determinada região,
procurando, dessa forma, avaliar a sustentabilidade do desenvolvimento,
em busca de um ambiente cada vez mais sustentável, colaborando e
servindo como ferramenta de gestão para os administradores públicos.

123
Alexandra Zottis, Denise Russo e Margarete Panerai Araújo (organizadoras)

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Sustentabilidade: uma abordagem social

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A diagramação e produção gráfica deste livro foi realizada pela Editora Feevale, impressão
Gráfica ???? (Cidade/ESTADO). CAPA: Papel Supremo 240g com termolaminação fosca
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