Sie sind auf Seite 1von 282

DNA Educação

0
DNA Educação

DNA Educação

Ivanio Dickmann
(organizador)

1
DNA Educação

CONSELHO EDITORIAL

Ivanio Dickmann - Editor Chefe - Brasil


Aline Mendonça dos Santos - Brasil
Fausto Franco Martinez - Espanha
Jorge Alejandro Santos - Argentina
Miguel Escobar Guerrero - México
Carla Luciane Blum Vestena - Brasil
Ivo Dickmann - Brasil
José Eustáquio Romão - Brasil
Enise Barth Teixeira - Brasil

FICHA CATALOGRÁFICA
_______________________________________________________
D553v Dickmann, Ivanio
v. 5 DNA educação 5 / Ivanio Dickmann (org). – São Paulo: Dialogar,
2018. (Coletânea de artigos da educação, 5).

ISBN 978-85-93711-42-8

1. Educação. I. Título.

CDD 370.1
_______________________________________________________

Ficha catalográfica elaborada por Karina Ramos – CRB 14/1056

EDITORA DIÁLOGO FREIRIANO


dialogar.contato@gmail.com

2
DNA Educação

Ivanio Dickmann
[organizador]

DNA EDUCAÇÃO
Volume V

Diálogo Freiriano
São Paulo – SP
2018

3
DNA Educação

ÍNDICE

EDUCAÇÃO – NOSSO COMPROMISSO.


Ivanio Dickmann ................................................................................................ 6

RESÍDUO DO PASSADO: ENTRELINHAS VISUAIS


Lisiane Soares ..................................................................................................... 8

CAROLINA VAI À SALA DE AULA


Luciane Silva ....................................................................................................35
AS NOVAS TECNOLOGIAS NA EDUCAÇÃO SUPERIOR
CONTEMPORÂNEA NO BRASIL: O ENSINO À DISTÂNCIA
COMO PORTA DE ACESSO PARA A CIDADANIA
Lucibeli Bastos Alves Matos..............................................................................53

A PARTICIPAÇÃO DA FAMÍLIA NA GESTÃO


DEMOCRÁTICA DA ESCOLA PÚBLICA
Luís Carlos da Silva .........................................................................................66

“NOSSOS VOOS COTIDIANOS”: O TEATRO E A


PEDAGOGIA DO OPRIMIDO COM CRIANÇAS DO
MUNICÍPIO DE JACAREZINHO
Luiz Matheus Macedo Périco, Everton Ribeiro ..................................................82

MOTIVAÇÃO PARA APRENDIZAGEM COM


BENEFICIÁRIOS DO PROGRAMA BOLSA FAMÍLIA (PBF)
EM UMA UNIDADE DE ENSINO DO MUNICÍPIO DE
CARUTAPERA-MA
Magno Fernando A. Nazaré.............................................................................99

AVALIAÇÃO DO RENDIMENTO ESCOLAR A PARTIR DA


BNCC
Maiara Ariana Silva Paula ........................................................................... 122

NOVAS TECNOLOGIAS E TRABALHO DOCENTE: UM


OLHAR SOBRE A PRÁTICA DO PROFESSOR EM
CONTEXTOS DE ENSINO A DISTÂNCIA
Marcella da Silva Estevez Pacheco Guedes, Reginaldo Guedes ........................ 144

4
DNA Educação

CENAS DO COTIDIANO ESCOLAR, DESVENDANDO O


ESTIGMA DENTRO DA INCLUSÃO ESCOLAR
Manoel Alves do Nascimento.......................................................................... 156

ANÁLISE COMPARATIVA DO USO DAS TICS NO


PROCESSO DE ENSINO: APRENDIZAGEM DOS SABERES
GEOGRÁFICOS
Marcelo Alves dos Reis ................................................................................... 172

A REFORMA DO PENSAMENTO CRÍTICO DO DOCENTE


REFLEXIVO
Marcelo Teixeira ............................................................................................ 194

AS CONTRIBUIÇÕES DAS POLÍTICAS PÚBLICAS PARA A


IMPLEMENTAÇÃO DAS CLASSES HOSPITALARES
Jaqueline Bragio, Marciane Cosmo, Hiran Pinel ............................................. 210

EDUCADORAS DAS INFÂNCIAS: O PRINCÍPIO


BIOCENTRICO NO PROCESSO DE FORMAÇÃO
Márcio Xavier Bonorino Figueiredo, Paulo Ricardo do Canto Capela.............. 224

A MÚSICA COMO PARTE INTEGRANTE NA MEDIAÇÃO


PARA O DESENVOLVIMENTO COGNITIVO DO
INDIVÍDUO COM EPÉCTRO AUTISTA
Margareth Souza Anselmo Barbosa ............................................................... 243

NARRATIVA AUTOBIOGRÁFICA: EXPERIÊNCIAS DE


VIDA DE UMA PROFESSORA E AS INFLUÊNCIAS NA SUA
PRÁTICA
Maria Eduarda R. da Silva Pinto .................................................................. 256
A UNIVERSIDADE PÚBLICA POR UMA NOVA
COMUNICAÇÃO ESTRATÉGICA
Maryângela Aguiar Bittencourt....................................................................... 265

5
DNA Educação

EDUCAÇÃO – NOSSO COMPROMISSO.


Com muita alegria e satisfação apresentamos ao você leitor e
leitora nossa nova coletânea de artigos DNA Educação. Como seu pró-
prio nome sinaliza, é uma seleção de artigos escritos por quem incorpora
no mais íntimo de seu ser o compromisso vital com a educação no Brasil
e dá sua vida para transformar os espaços pedagógicos em lugares de
ensino-aprendizagem onde a mudança se faz pelo fazer destes educado-
res e educadoras.
Nossa editora se orgulha de ter escolhido a Educação como luz
que ilumina nosso trabalho! Queremos, como também querem estes ar-
ticulistas, que os processos educativos sejam reconhecidos como fun-
dantes de uma nova sociedade mais justa e inclusiva, que muda a vida
das pessoas, que mudam o mundo a partir de nova visão da realidade
construída a partir da intervenção crítica de professores e professoras
comprometidas com esta nova sociedade.
Não importa o espaço pedagógico que cada um de nós atua,
pode ser uma escola, um sindicato, uma universidade, uma organização
não governamental, uma associação comunitária, todos estes lugares de-
vem ser entendidos como espaços pedagógicos e não podemos negligen-
ciar esta perspectiva, sob pena de não dialogarmos sobre como podemos
produzir conhecimento nas relações de ensino-aprendizagem presentes
nos encontros com alunos/as, com os universitários, com o público
atendido na ONG, com os associados/as da entidade de base.
Educação não é uma panaceia. Temos que ter isso presente.
Contudo, sem ela pouco podemos conceber sobre transformações con-
sistentes em vista de um novo mundo. Essa consciência é fundamental
para sustentarmos a pertinência da educação em nosso tempo. E quando
sustentamos essa ideia – que é uma ideia de prática – na verdade estamos
sustentando tudo o que envolve a complexidade dos processos educati-
vos, o que inclui – inevitavelmente – as políticas públicas de educação.
Não há processo pela metade, se cremos que a educação é importante,
precisamos estar prontos para contribuir e debater sobre os processos
políticos envolvidos.
Além do mais, não há sociedade organizada e que avance sem
uma política pública bem organizadas, e isso passa pelas políticas sociais,
nas quais a educação está inserida. Não estamos projetando um time de
educadores panfletários e que só pensem em política 24 horas por dia,
não é isso. Mas, queremos estimular o envolvimento político de cada
educador/a em espaços onde podem interferir e ajudar a consolidar uma

6
DNA Educação

perspectiva de mundo baseada na participação e no diálogo das diferen-


tes ideias. Assim, o mundo vai se ajustando e avançando.
Ter o DNA da Educação é ser pleno na sua concepção de edu-
cador e educadora. Quem tem o DNA da Educação assume por com-
pleto sua tarefa histórica de educar. Precisamos de mais gente com este
DNA encrustado na sua base genética. Os autores e as autoras dos arti-
gos que você vai ler nesta coletânea tem esta marca. São pessoas que,
além de fazer, dispensam tempo para elaborar suas ações, refletir sobre
seu próprio fazer. Mais ainda, custeiam coletivamente esta publicação e
compartilham suas boas práticas para que possamos aprender com elas,
avançar sobre seus ombros e ver mais longe.
O compromisso – eu estou usando muito esta palavra nesta
apresentação propositalmente – de quem educa é fazer o melhor possível
com o que se tem e partilhar nossos erros e acertos para que todos pos-
samos crescer mais rápido. Compartilhar é gesto nobre e revelador. De-
monstra o compromisso daquele/a que partilha com um projeto maior
que o seu, um compromisso com outros educadores e educadoras que
vão poder usufruir deste saber para que outras vidas sejam tocadas e
transformadas.
Boa leitura amigos e amigas. Queremos poder tocar vocês que
nos leem também. Que nossos textos possam ser úteis. Que nossos es-
forços sejam parte desta construção coletiva que é o processo educativo.
Que possamos nos encontrar na escola da vida e compartilhar abraços e
compromissos em comum. Nossa esperança é que depois desta leitura
seu fazer pedagógico seja mais pleno e leve um pouco de cada um de nós
contigo.
Um grande abraço e força na luta!
IVANIO DICKMANN
Organizador do DNA Educação

7
DNA Educação

RESÍDUO DO PASSADO: ENTRELINHAS VISUAIS


Lisiane Soares1
RESUMO:
Considerando-se que o homem é a sua contemporaneidade, ele expressa
o que o norteia. Sendo assim, entende-se como necessário trazer novas
tecnologias para que se desperte interesse, motivação e curiosidade nas
aulas de História e o aluno se perceba como ser histórico. Trazer para
sala de aula a fotografia se mostra como uma ferramenta de muitas pos-
sibilidades. Assim, iremos nos debruçar no imaginário, criando indaga-
ções. A pesquisa foi efetuada por meio de autores como Leandro Karnal,
Luiz Eduardo Robinson Achutti, Valesca Giordano Litz e Boris Kossoy,
aliados à pesquisa empírica por meio de saída de campo.
Palavras-chave: Fotografia. Tecnologia. Imagem.

ABSTRACT:
Considering that a man is his contemporaneity, it is understood that he
expresses what guides him. Therefore, bringing in new technologies to
spike interest, motivation and curiosity in History classes leads the stu-
dent to perceiving himself or herself as being historical. Bringing photo-
graphs to the classroom is a tool of many possibilities, so we will inves-
tigate the imaginary, creating inquiries. This research was carried out
through authors such as Leandro Karnal, Luiz Eduardo Robinson
Achutti, Valesca Giordano Litz and Boris Kossoy, aligned with empiric
evidence through field research.
Keywords: Photography. Technology. Image.

1Graduada em Licenciatura História Centro Universitário Leonardo da Vinci - Uniasselvi, pesqui-


sadora na área de educação, já trabalhou com crianças de inclusão e alfabetização.

8
DNA Educação

Introdução
O presente trabalho refere-se à área de concentração “as dinâ-
micas do ensino da história”, onde o tema em estudo são o uso das imagens
e fotografias como método de ensino e sua aplicabilidade no contexto
escolar. Discuto, aqui, qual a importância em mudar as metodologias de
ensino quando, percebendo as mudanças que vivemos, com uma avalan-
che de informações e as tecnologias que fazem parte do dia a dia de nos-
sos alunos, eles se tornam a cada dia menos motivados. Esse cenário
demonstra a falta de concentração e a escola tem se focado ainda na in-
disciplina.
O propósito desse estudo é apresentar métodos que despertem
interesse e a apropriação do conteúdo por parte do aluno nas aulas de
História em especial. Irei discutir acerca das práticas pedagógicas, pas-
sando pela construção da pesquisa e um breve histórico sobre a fotogra-
fia.
É importante trazer a o uso das imagens e a fotografia para que
eles possam fazer a leitura através dela, como instrumento de inovação e
algo representativo e significativo na sua aprendizagem. Ademais, fazer
da pesquisa uma troca entre eles e incentivar o aluno construtor de seu
conhecimento. Então, deve-se criar cenários fotográficos que façam com
que eles percebam e visualizem esta construção. Abordarei a tentativa de
trazer para sala de aula algo que se faça pertinente na vivência destes
alunos que possa ser discutido, analisado e eles se percebam autores e
coautores da História e ainda se sintam agentes responsáveis (transfor-
mador) em modificá-la.

Construção
Nos últimos tempos, temos notado o quanto a aula de História
tem sido vista pela maioria dos estudantes como cansativas, entediantes.
O professor, do início do ano letivo ao final, tem seguindo as inúmeras
páginas do livro didático, como se não houvesse a possibilidade de algo
novo, que fosse capaz de surpreender os alunos, saindo do formal. As-
sim, não há novas abordagens ao ensino, causando uma imensa desmo-
tivação e falta de interesse pelas aulas de História. É preciso mudar esse

9
DNA Educação

olhar e trazer novos questionamentos, fazer com que os alunos se espan-


tem e se sintam desconfortáveis e, com isso, tenham interesse pelas aulas,
pois assim conseguiremos avançar e reverter o que vemos hoje.
Pensando em avançar em um aprendizado prazeroso e interes-
sante, me apoio em vários conceitos de Leandro Karnal (2015), princi-
palmente na abordagem que ele propõe no livro que organizou, “História
na sala de aula”. Este faz refletir sobre as metodologias nas suas práticas,
na mudança das abordagens. Utilizo, também, o autor Luiz Eduardo Ro-
binson Achutti (2004), que traz em seu livro “Fotoetnografia” as várias
possibilidades do uso da fotografia, estudar a cultura com um novo olhar,
coletar dados, interpretar através dela.
Também utilizo a autora Valesca Giordano Litz (2009) que
aborda o uso da imagem em sala de aula sabendo-se que, atualmente,
estamos passando por um processo onde quase tudo está associado a
imagens, são informações que chegam em grande velocidade. Tornou-se
imprescindível que o professor, em especial o de História, tenha um
olhar sobre esses aspectos em sala de aula, e pesquise ferramentas fa-
zendo manipulação de imagens. Utilizo Boris Kossoy (2012) que aborda
em seu livro “Fotografia e História” as várias interpretações, ao fazer uso
da fotografia, abordando de maneira investigativa e análise crítica para
uso das fontes fotográficas, pautado em procedimentos específicos para
obter maior proximidade do que é real ao utilizá-la, pois existe uma in-
tencionalidade ao fazer o registro fotográfico.

Breve histórico da fotografia


As imagens estão sendo utilizadas pelo homem há muito
tempo. Tem-se como primeiro registro fotográfico em 1839, na cidade
de Paris, onde foi apresentada na Academia de Ciências. Desde então
vem se propagando o uso das imagens através da fotografia. Foi em
agosto que Louis Jacques Mandé Daguerre e seu sócio Nicéphore Niépce
fizeram a divulgação de seu invento, já que era um segredo e muitos que-
riam reivindicar a criação do projeto (XIX), o que atualmente se aceitam
vários inventores até Hercule Florence como sendo construtores do in-
vento já que trabalhavam com o mesmo propósito, conforme coloca Ma-
ria Inês Turazzi:

10
DNA Educação

Desde janeiro de 1839, os jornais franceses alardeavam a in-


venção da “daguerreotipia”, processo de fixar sobre uma
placa metálica as imagens obtidas com câmara escura pela
ação da luz solar. A partir daí, a imprensa mundial aguardou
com ansiedade a história e a descrição do daguerreotipo
(TURAZZI, 2010, p. 18).
Este foi só o início da descoberta da grande invenção, que logo
saiu para dar a volta ao mundo. Essa foi a primeira expedição a ter a
bordo um aparelho que pudesse fazer o registro dos acontecimentos, o
que não foi de propósito, dados os interesses políticos, culturais e co-
merciais, o que já era típico do século XIX. Isso proporcionou à França
exportar esta ideia para todas as nações, sendo que a expedição já havia
entrado para História, como sendo a maior viagem até então ao redor do
mundo.
Essa tecnologia passou por um longo processo de transforma-
ção e aperfeiçoamento ao longo do tempo. No entanto, veio para ficar.
Explica Achutti:
A fotografia surgiria então como uma nova técnica e estaria
marcada a diferença em relação aos meios visuais existentes
anteriormente – escultura, desenho, pintura e gravura. Sur-
giria à fotografia, um novo meio, fruto de descobertas cien-
tíficas, que iria somar-se rapidamente às artes visuais
(ACHUTTI, 2004, p. 98).
Principalmente com a Revolução Industrial, a fotografia se fez
mais presente, já que ocorria uma grande transformação de pensamen-
tos, uma mudança social, cultural e econômica o que faz da fotografia,
neste contexto, ter um papel primordial no meio da pesquisa científica.
Seu uso começou a ascender constantemente, com grandes investimen-
tos de países europeus para melhorar os equipamentos. Foi no ano de
1860 que se percebe o grande salto de consumo da fotografia, o que pro-
porcionou um crescimento financeiro industrial
Foi possível, então, fazer grandes registros da arquitetura, as-
pectos culturais, de fatos políticos, sociais entre tantos outras, foi virando
hábito. É como se o homem se tornasse mais íntimo de sua própria rea-
lidade e a realidade de outrem, pois até então lhe era acessível apenas

11
DNA Educação

documentos de forma escrita, oral e através de pinturas, a fotografia lhe


permitiu maior proximidade (KOSSOY, 2012, p. 26).
Derivada de uma coletividade de aquisições e experimentos em
plena ascensão, a fotografia se desponta no século XX antes de tudo, em
uma sociedade que busca por novos horizontes percebendo na fotografia
várias possibilidades, podendo ser utilizada de várias maneiras e em vá-
rias áreas do conhecimento (Biologia, Arquitetura, Literatura, História,
por exemplo), como investigativa, como recordação, como criação artís-
tica, ou servindo como documento, entre tantas outras. As possibilidades
se incumbiram de difundir suas estruturas inventivas. Em contrapartida,
era temida como fonte de testemunha, pois essa poderia ser manipulada,
pois nela consta olhar do fotógrafo, então é preciso perceber sua fonte
verídica tendo em vista sua subjetividade ao fazer o registro, propiciando
uma verdadeira revolução (KOSSOY, 2012, p. 27).
A fotografia se mostra como grande ferramenta em todas as
áreas, não é o simples apertar num clique, mas por trás delas estão o olhar
e a percepção de quem a faz. Questiona-se: qual o sentido da fotografia?
Qual sua intencionalidade? A partir delas podemos registrar aconteci-
mentos, mudanças (geográficas), a cultura de cada povo, monumentos,
vestimentas, arquitetura, elas sobrevivem por séculos podendo ser apre-
ciadas em diferentes contextos históricos.
Fazer uso da fotografia em sala de aula requer por parte do pro-
fessor preparo, bem como estar bem-definido qual a sua intencionali-
dade, definindo os documentos que irão pesquisar, pois são registros de
um tempo, são marcas que ficaram, existe um sentimento de quem fez a
fotografia. Deve-se ensinar a fazer a leitura das imagens, o que não esta-
mos acostumados, uma vez que não fomos preparados para isso: ler por
meio e através da imagem. É o registro de um tempo ou até mesmo do
agora. De acordo com Achutti (2004, p. 99), “as ciências que proporcio-
naram o surgimento da fotografia progrediram posteriormente utili-
zando-a como uma de suas ferramentas. ”

12
DNA Educação

Metodologias e seus desafios


As tecnologias estão em constante mudança, e o acesso cada
vez mais rápido a informações a todo instante. Pensando em fazer com
que os alunos se sintam parte da aula e tenham maior participação, mudar
as metodologias de ensino se faz necessário já que, nos dias atuais, as
crianças e adolescentes têm se mostrado sem motivação e interesse.
Com o passar do tempo, as tecnologias vêm se refletindo nas
metodologias de ensino, em especial de História, nas suas práticas. Po-
rém, este caminho é longo e desafiador, uma vez que o ensino esbarra
em práticas tradicionais, onde o inovador toma descrédito de pais e alu-
nos (KARNAL, 2015, p. 10).
No campo da História, existe uma grande fenda entre professor
e aluno no que se entende por “moderno”, pois o que diz respeito a isso
seria o momento após a Idade Média, considerando a cronologia histó-
rica. Há grande observação em relação a isso, pois se dá também o mo-
derno após a queda de Constantinopla. Por isso, não é adequado dar
conceitos prontos sobre os assuntos, pois isto nos deixa reduzidos. É
necessário deixarmos que os alunos desenvolvam estes conceitos, é ne-
cessário instigar todas as respostas feitas por estes alunos, a fim de que,
a partir desses conceitos, se criem novas perspectivas, novos olhares e se
desenvolva a reflexão e a criticidade.
Para iniciar um trabalho a postura deve ser socrática – ques-
tionar todas as respostas, insistir no óbvio para provocar re-
flexão, estimular “tempestade cerebral” como uma prepara-
ção do terreno (KARNAL, 2015, p. 137).
Ele enfatiza o trabalho com imagens que podemos trazer para
sala de aula e trabalhar em vários momentos, como no Renascimento. O
trabalho pode ser feito por meio de quadros, das construções, dentre
tantas outras. O que pode ser utilizado para esta apresentação são os
slides, que são muito utilizados. Atualmente, a maioria das escolas possui
o retroprojetor para este fim.
São inúmeras as possibilidades de se trabalhar a arte. Pode-se
trazer quadros antigos, slides ou até mesmo levar os alunos a um museu
para ver exposições, se ele mesmo não souber fazer esta leitura. Há, en-
tretanto, empecilhos, como a falta de motivação por parte do professor,

13
DNA Educação

devido à remuneração baixa, os recursos limitados para se trabalhar, in-


cluindo a formação continuada que não é incentivada. Entende-se como
necessário ao professor a pesquisa diária, a manipulação das imagens e
assim reconhecê-las e se apropriar do objeto em estudo.
Assim, fazemos com que os alunos possam tirar suas próprias
conclusões, sem fazer com que esta obra se torne algo confuso, querendo
fazer comparações que agreguem valores que nela não existe, mas sim
qual o valor que ela agrega na atualidade, qual o reflexo dela nos dias
atuais. Trazer para sala de aula dois tempos de arte e fazer com que o
aluno faça uma análise percebendo cada período histórico de forma dis-
tinta (KARNAL, 2015, p.134). Como mencionei, pensar em algo mo-
derno, novo, que seja atraente, que faça com que o aluno se interesse,
que desperte sua alma investigativa, se sentindo pertencente ao que está
em estudo. Como fazer isso hoje se o “moderno” se torna obsoleto em
pouco tempo, o que antes era novo já passa a ser ultrapassado?
Tornou-se imprescindível que o professor tenha um olhar so-
bre esses aspectos, pois as informações chegam a uma velocidade cons-
tante e tudo pode ser registrado – basta ter um celular, tablet, ou até
mesmo a câmera fotográfica. Estamos passando por um processo onde
quase tudo está associado a imagens. Então, são reponsabilidade do pro-
fessor fazer com que os alunos se integrem às aulas, fazendo o uso das
tecnologias em sala de aula como ferramentas que agreguem de maneira
positiva e representativa.
Ao se trabalhar com imagens é preciso ter em mente quais ob-
jetivos, o que quero alcançar ao analisar uma imagem. É preciso que esta
esteja bem-representada para ser bem-explorada e, assim, permitir que se
possa fazer uma análise bem-sucedida no aspecto conhecimento. Às ve-
zes é preciso que se coloque um texto para melhor compreensão do que
se está expondo.
Em métodos que integram as questões pedagógicas e histo-
riográficas, o uso de imagens possibilita a interpretação da
história, em determinados períodos ou épocas, com uma ri-
queza de informações e detalhes sendo, portanto, uma ex-
celente fonte de pesquisa para o ensino de história na atua-
lidade (LITZ, 2009, p. 6).

14
DNA Educação

Portanto, o que vamos analisar deve ser algo que nos possibilite
ter uma compreensão e que seja significativo no contexto a que se refe-
rem à imagem, nos dê condições de perceber em que época vive qual seu
papel social. Deve-se ter uma análise crítica acerca do que se está sendo
representado, sabendo-se que toda obra está vinculada a percepções de
quem a produziu. É preciso saber qual a intenção que está sendo passada
por meio da obra, sua intencionalidade; é importante que nos rebusque-
mos de conhecimentos para que possamos trabalhar de forma positiva a
iconografia em sala de aula.
Sabe-se que para que isso aconteça é preciso investir em forma-
ção continuada, se preparar para enfrentar os desafios constantes de
transformação na sociedade e seus valores e, assim, mostrar de forma
leve e prazerosa os caminhos que percorremos e no que isso nos afeta,
nos faz presentes na atualidade. Neste aspecto estamos nos preparando
para mediar o que realmente nos foi apropriado do conhecimento
(LITZ, 2009, p. 16).
Quando trabalhamos com as iconografias, há que se ter uma
análise que englobe vários aspectos. Por exemplo: sua procedência, sua
finalidade, o tema abordado, estrutura formal e simbolismos.
Sendo assim, deve-se ser capaz de percebemos o quanto signi-
ficativo este tipo de abordagem traz para nossas aulas. Como coloca Litz:
Assim, quando somos colocados frente a um material ico-
nográfico, precisamos refletir: um ícone possui ideias, foi
produzido por alguém, com determinado objetivo. Isso
pode estar claro, ou não, quando vemos uma imagem. Por-
tanto, é preciso que se busquem pistas no contexto social,
político e ideológico da época em questão, para que possa-
mos questionar e entender as ideias vinculadas pelo seu au-
tor (LITZ, 2009, p. 19).
Todo documento histórico (imagens, filmes, cartas entre ou-
tros) tem em seu registro representações da sociedade de sua época, de
quem a viveu. Logo, ao analisar uma obra, precisamos estar atentos para
não fazermos anacronismos e sim ver seu real significado perante a época
em que foi produzido.

15
DNA Educação

Para tanto, então temos que determinar ao analisar todo e qual-


quer documento, qual o objetivo que quero trazer para meus alunos,
quais as relações para eles no contexto histórico-social, e fazer com que
o aluno consiga fazer uma análise do que vive no seu presente e fazer
conexão com o passado. Devemos estabelecer representações entre o
presente e o passado, percebendo que o passado tem reflexos na sua vida
presente e, perceber que ele é um ser histórico.
O que nos cabe como professores é conseguir fazer com que o
aluno seja o construtor do seu saber, sendo ele passível de interpretar e
compreender, criticar de que maneira cada representação é pertinente ao
caminho que está seguindo, ou seja, ele como agente de transformação.
...ver não é o mesmo que olhar, assim como ouvir não é igual
a escutar. Ver apenas envolve o esforço de abrir os olhos;
olhar significa abrir a mente e usar o intelecto. Olhar uma
pintura é como partir para uma viagem – uma viagem com
muitas possibilidades, incluindo o entusiasmo de comparti-
lhar a visão de outra época. Como em qualquer viagem,
quanto melhor a preparação, mais gratificante será a expedi-
ção. A melhor maneira de viajar é com um guia que o ajude
enquanto você se familiariza com o novo ambiente, e que
lhe mostre coisas que do contrário passariam despercebidas
(CUMMING, 1996 apud LITZ, 2009, p. 21).
Temos muitas possibilidades de trabalhar com as tecnologias e,
como disse, é para agregar ao trabalho. Como para todo o trabalho é
preciso um planejamento, não é em todas as turmas que conseguiremos
fazer a introdução de tecnologias, e para isso temos que estar preparados
e trazer outras atividades, caso não consigamos trabalhar com as ima-
gens.
O grande diferencial de se trazer esses novos modelos pedagó-
gicos é mudar a visão da escola tradicional, onde escrever na lousa e o
uso exclusivo do livro didático seriam suficientes, o que torna as aulas de
História cansativas e desmotivadores, já que são conteúdos imensos. Te-
mos que sair do lugar comum e da monotonia. Não estou falando em
deixar de passar os conteúdos, e não usar esses tipos de materiais, mas
sim fazer com que as aulas sejam leves e que estimulem a crítica e refle-
xões sobre acontecimentos passados no presente.

16
DNA Educação

Deve-se impulsionar questionamentos. Qual o reflexo da His-


tória do Brasil colonial no modo de vida político, religioso, na sociedade
como um todo? Fazer com que os alunos se questionem e se sintam
motivados a investigar as respostas e se percebam ainda serem agentes
modificadores de sua própria História e do espaço em que os rodeia.
Cada dia é mais evidente a necessidades de mudanças nas metodologias,
tudo muda a todo instante, estar preparado é preciso.
Focos, olhar e percepção
Desde os tempos do Império que a fotografia tem se mostrado
como constante em nossas vidas. Naquele tempo, era a visão de um novo
mundo, onde era vista com muita admiração. A fotografia nos causa es-
panto até hoje, pois é um reflexo, um registro de algo, momento que não
pode voltar atrás. É a captura de um olhar. A fotografia nos abre várias
possibilidades para o desenvolvimento de nossas aulas, ter um olhar do
outro lado das câmeras e estudar a cultura, coletar dados, interpretar atra-
vés da fotografia. Deve-se trabalhar com fotografia em sala de aula, par-
tindo do conhecimento prévio do estudo em particular feito através das
pesquisas mediadas pelo professor.
Levando em consideração que vivemos uma época em que as
imagens são significativas e se fazem presentes, pode-se dizer que é im-
portantíssima no dia a dia dos estudantes, onde cada momento é regis-
trado através de um clique. Estas são reflexo das mudanças tecnológicas
e do acesso a elas. Na atualidade, não se faz necessário ter uma câmera
fotográfica: as fotos são tiradas de vários tipos de equipamentos, telefo-
nes, tabletes. Se pensando neste acesso, onde a maioria tem um telefone,
sugere-se buscar uma metodologia que desperte a atenção e faça com
que o aluno possa se identificar como o protagonista.
A fotografia e a antropologia nasceram praticamente na
mesma época e com as mesmas preocupações. Tanto uma
quanto a outra se esforçam em compreender a vida do ho-
mem e suas características culturais e já faz muito tempo que
os antropólogos foram seduzidos pela técnica da foto-grafia
e pelo número incalculável que ela pode proporcionar
(ACHUTTI, 2004, p. 78).

17
DNA Educação

Tratando-se deste olhar, temos que perceber o quanto a foto-


grafia envolve e o quanto ela por si pode representar, ou melhor, o
quanto ela pode transcrever uma história de maneira a não precisar se
quer usar uma linha escrita. Dentro deste contexto, ela se torna algo de
muita importância, sendo que quem a tira está colocando o seu olhar
sobre determinado assunto de pesquisa. Ao olharmos as fotografias an-
tigas, temos que ter a clareza neste aspecto de sua linguagem e interpre-
tação. Fazermos algumas indagações: que época vivia, como se vestiam,
qual sua alimentação? Não podemos generalizar e muito menos tornar
algo significativo em algo sem valor, e sim estar atento ao que cada autor
(fotógrafo) traz na sua bagagem. Não é algo mais de ingenuidade, mas
sim uma linguagem fotográfica do seu pensar.
Trabalhos com fotografias não significam só fazer um registro
através delas, mas também usar a linguagem fotográfica como fonte de
dados de uma história com suas próprias características. Podemos fazer
uso dela com diversos olhares, resgatar uma história, de uma praça, um
monumento histórico, uma igreja, um local que seja próximo ao aluno,
que ele às vezes passe em frente no seu dia a dia, porém não teve o olhar
histórico daquele local.
Seria uma narração dos fatos por meio da fotografia sem preci-
sar colocar cabeçalhos ou rodapés para explicar, uma leitura pelas ima-
gens. O que se mistura o tempo todo é enfim o homem expressar a rea-
lidade. Para Garrigues (apud ACHUTTI, 2004, p. 86):
Um dos temas de pesquisa mais apaixonantes é com certeza
essa tentativa de aproximação estrutural do texto e da ima-
gem que favorece uma convivência entre a construção do
texto e os quadros da imagem, entre a frase, o parágrafo e
sua pontuação por parte da imagem. Inventar uma lingua-
gem que uma a linguagem-imagem e a linguagem-texto
abrem perspectivas experimentais tanto científicas quanto
artísticas permite recorrer a encontros entre pesquisadores e
criadores e articular também o sensível e o racional aprofun-
dado essa necessidade cada vez mais evidente de ter uma
abordagem científica não-multilante do emotivo e do subje-
tivo como portadores de conhecimento da realidade (GAR-
RIGUES, 1997, p. 171 apud ACHUTTI, 2004, p. 86).

18
DNA Educação

Sendo a fotografia um ato onde o fotógrafo tenta expressar


uma realidade, uma emoção, um trabalho de pesquisa, ela se torna mais
abrangente que um texto, uma vez que, ao olhar uma imagem, podemos
visualizar no enquadramento, na posição de cada um na foto o que o
fotógrafo quis descrever no contexto da mesma. Isso torna quem está
vendo mais próximo dos fatos, o que ativa ainda mais o imaginário. No
entanto, para fazer um trabalho com tamanha reponsabilidade, é preciso
ter domínio de algumas técnicas para que fortaleça o trabalho do pesqui-
sador. Um determinado olhar pode transmitir ao espectador toda a sua
sensibilidade e criatividade, assim encorajando-o a fazer esta leitura de
imagens percebendo todo encanto que há em sua composição. Ainda
conforme Achutti:
As fotografias são recortes arbitrários, traduções da reali-
dade. Suas margens delimitam as escolhas feitas pelo fotó-
grafo para demarcar o tempo e o espaço; elas são resultado
de um só gesto último e definitivo, aquele de apertar o dis-
parador; é um ato intencional determinado pelo ponto de
vista particular daquele que olha e adota certa posição frente
à realidade. Uma fotografia é a materialização de um olhar,
é o discurso de um olhar (ACHUTTI, 2004, p. 111).
Este olhar que irá fazer com o nosso aluno se envolva, é a ma-
neira com que ele percebe as coisas ao seu redor. Trabalhar com a foto-
grafia traz muitos benefícios, tira o aluno da zona de conforto, faz com
que ele busque a pesquisa, se aprofunde e desenvolva suas imagens para
desenvolver sua própria linguagem, o que o aproxima da pesquisa e o faz
refletir. Ele aprende através da observação o contato com o objeto em
estudo, cria ferramentas que o leva a ter uma criticidade e assim se per-
ceba como protagonista capaz de, possivelmente, modificar sua própria
história.
Porém, para que aconteça de modo significativo, é preciso não
abrir mão de suas anotações, para que elas venham a acrescentar em seu
trabalho. Não estamos falando aqui que seja preciso largar tudo e qual-
quer escrito e fazer uso somente da fotografia, mas sim que além dos
papiros usados para o estudo do objeto, o aluno consiga ter um novo

19
DNA Educação

olhar e perceba sua forma de ver o mundo, de se relacionar com o outro.


Para o autor:
A eficácia da fotografia como um meio de capturar as ima-
gens e de difundi-las depende, sobretudo, das capacidades
do pesquisador, de sua aptidão para ver as coisas que o cer-
cam, de sua habilidade e de seu domínio da técnica (ACHU-
TTI, 2004, p.94).
O aluno será capaz de construir verdadeiros textos por meio da
fotografia, o que seria a materialização de um olhar. Não há problemas
em fazer uma narrativa escrita se assim o desejar, pois não seria uma
regra.
Fazer o uso da fotografia em sala de aula torna as aulas mais
dinâmicas. De maneira nenhuma quero dizer para abandonarmos todos
os métodos utilizados, mas sim que possamos fazer com que as tecnolo-
gias sejam presentes em nossas aulas, já que ela está no dia a dia de nossos
alunos. Ao usarmos a fotografia, já tão comum na vida deles, estamos
apenas fazendo com que eles tenham uma interação com sua realidade,
o mundo ao seu redor. E ainda, fazer com que muitos possam perceber
a realidade do outro. O que é uma responsabilidade social, se sentirem
como cidadãos conscientes, como pode-se entender abaixo:
Vive-se atualmente uma época extremamente rica, pois o le-
que de possibilidades que permite prática da antropologia
visual associada à utilização da fotografia cresce cada dia. É
chegada a hora de redefinir sua utilização, o que permitirá
um questionamento da concepção que se tinha dela até en-
tão. Em breve, portanto, a fotografia deverá deixar de ser
uma técnica que visa apenas captar evidências.
O que parece interessante para antropologia é a utilização da
fotografia para trabalhar além das aparências, pois, no que
diz respeito à pesquisa o que mais conta não são os simples
registros dos fatos, mas o que está fora do campo da visão,
a construção do sentido graças à imagem; isso para tornar-
se um meio de restituição, uma oura forma de narrar nosso
olhar sobre o Outro (ACHUTTI, p. 87, 2004).
Conhece-se os grandes desafios encontrados pelos professores,
que muitas vezes não possuem formação para trabalhar com as tecno-
logias, além da falta de infraestrutura na escola, que muitas vezes não

20
DNA Educação

comportam espaços para laboratórios de informática ou até mesmo uma


sala específica com Datashow ou retroprojetor. Na maioria das vezes em
que encontramos escolas que possuem salas disponíveis para informá-
tica, nos deparamos com outro obstáculo: o acesso à internet, que é ine-
xistente em várias escolas. Entretanto, ao trabalhar com fotografia, po-
demos utilizar outros meios. Em todo o processo do projeto (que não
será um trabalho simples) precisaremos do apoio da equipe diretiva da
escola, além do auxílio dos colegas. Esta é uma excelente maneira de
fazer com que aconteça a interdisciplinaridade.
Precisa-se de um bom tempo para que se faça a construção dos
saberes, e as devidas saídas de campo. Dessa forma, nossas aulas serão
verdadeiros laboratórios de aprendizagem, além do conhecimento histó-
rico será preciso apropriação das técnicas de fotografar, para que dê sen-
tido ao trabalho apresentado. Esta união entre as disciplinas tornará não
só as aulas de História agradáveis e com sentido, mas todas as disciplinas
ligadas, uma entrelaçada à outra, o que faz com que o aluno desperte e
se aproprie dos conteúdos. Nesse sentindo, afirma Kossoy:
As fontes fotográficas são possibilidades de investigação e
descoberta que promete frutos na medida em que tentar sis-
tematizar suas informações, estabelecer metodologias ade-
quadas de pesquisa e análise para a decifração de seus con-
teúdos e por consequência, da realidade que a originou
(KOSSOY, 2012, p. 32).
São planejamentos que devem acontecer com antecedência
para que não haja rupturas e que o projeto seja apresentado de maneira
consolidada. E para que, a partir das fotografias, o aluno consiga criar
seus textos, seus artigos, fazendo uma releitura delas. Despertar, assim,
o interesse, fazendo com que ele tenha seu próprio olhar. No momento
em que ele tem que fazer o registro fotográfico, vai ter o olhar do melhor
ângulo, do que realmente é pertinente para a pesquisa. Isso proporciona
maior integração e proximidade com o objeto em estudo. É sempre im-
portante, no final de um projeto, que se mostre o trabalho pronto, fa-
zendo exposições dentro da escola, podendo ser vistas até mesmo pela
comunidade escolar.

21
DNA Educação

A fotografia nos abre várias possibilidades para o desenvolvi-


mento de nossas aulas. No seu livro, Achutti nos presenteia com seu
trabalho de pesquisa em que denominou Fotoetnografia. Partindo de
este olhar estudar a cultura, coletar dados, interpretar através da fotogra-
fia. Este é um ensaio fotográfico que fiz ao longo do meu TG, irei de-
senvolvendo o trabalho e mostrando algumas das fotos e assim deixar o
registro da nossa História, turma HID 0401.

Figura 1: Uniasselvi Figura 2: Uniasselvi

Fonte: Soares (2018) Fonte: Soares (2018)

22
DNA Educação

Figura 3: Uniasselvi Figura 4: Uniasselvi

Fonte: Soares (2018) Fonte: Soares (2018)

Figura 5: Uniasselvi Figura 6: Uniasselvi

Fonte: Soares (2018) Fonte: Soares (2018)

23
DNA Educação

Figura 7: Uniasselvi Figura 8: Uniasselvi

Fonte: Soares (2018) Fonte: Soares (2018)

Figura 9: Uniasselvi

Fonte: Soares (2018)

24
DNA Educação

Registro para assim inscrever em linguagem fotográfica nossos


dias em aula. Claro que não tenho pretensão de ser fotógrafa, mas sim
demostrar como podemos desenvolvê-las em sala de aula. Trabalhos
com fotografias não representam apenas um registro através delas, mas
também o uso da linguagem fotográfica como fonte de dados de uma
história com suas próprias características. Podemos fazer uso dela com
diversos olhares para pensar em resgatar a história de uma praça, de um
monumento histórico, de uma igreja, de um local que seja próximo ao
aluno, em que ele passe em frente no seu dia a dia, mas sobre o qual
nunca olhou historicamente.

Estúdio
Essas fotos foram feitas ao longo das aulas para fazer o registro
de nossos dias (como são muitas, fiz uma pequena seleção das fotos que
foram mais significativas para o desenvolvimento, mas também para de-
monstrar as possibilidades de se trabalhar com fotografia, a facilidade de
manipulação do objeto). Ficou mais evidente para mim o quão significa-
tivo foi todo o processo de construção, uma vez que fiz parte da pesquisa
em todos os aspectos e isso fez com que eu me envolvesse e tirasse me-
lhor proveito de tudo.
Escolhi a faculdade Uniasselvi (que já mostrei) e o teatro São
Pedro para servir de base para minha pesquisa por meio das câmeras. A
faculdade foi escolhida para demostrar como é possível escrever de
forma fotográfica, assim fazendo registro dos dias de alguns ambientes
que circulamos momentos em sala de aula. Pretendi fazer a inscrição a
partir do meu olhar o que representa esse espaço hoje e, assim, meus
colegas possam se identificar e ter seu próprio olhar, e fazer suas leituras
além da minha percepção.
No teatro, faço registros para desenvolver de forma hipotética
a construção de um trabalho com fotografia em sala de aula, partindo da
experiência que adquiri em 2 anos de estágio e mais os estágios obriga-
tórios desenvolvidos ao longo da vida acadêmica. Este projeto surgiu dos
meus dias em sala de aula, como aluna ouvindo os ensinamentos do mes-
tre Cristiano Soares Vianna, e procurando buscar melhores formas de
ensinar História. Foi a partir do livro de Achutti (2004) que decidi por

25
DNA Educação

desenvolver este trabalho, e pretendo aplicá-lo quando estiver exercendo


a profissão de docência.
Primeiramente, faria um projeto que fosse aplicável na rotina
da escola, dentro do PPP e do planejamento.

Quadro 1: Cronograma: Projeto “Fotografia em Sala de Aula”


Atividades Períodos
Explicar o projeto e fazer uma votação do lugar a estudar 1 período
Fazer uma pesquisa sobre o lugar e sua importância na atualidade 2 períodos
Continuação aula anterior e trabalhar as imagens disponíveis do lugar 2 períodos
Trabalhar as técnicas de fotografia, se possível trazer um profissional da área. 2 períodos
Desenvolver a habilidade em fotografar 4 períodos
Saída de campo 5 períodos
Apresentação das fotos, onde cada aluno faz o relato do seu olhar. 2 períodos
Exposição das fotos no mural da escola 1 período
Fonte: Soares (2018).

Procurei cumprir o cronograma e desenvolver todas as ativi-


dades de maneira significativa para que cada aluno e possa ter consciên-
cia da representatividade de nossa história cultural. Dentro deste con-
texto, executei passo a passo o cronograma acima. Inicialmente, fiz
uma pesquisa bibliográfica, para me apropriar do assunto e entender o
contexto em que foram criados, os acontecimentos que os cercavam e
ainda conseguir ter a percepção do antes e do agora, além de todas as
mudanças que afetam na atualidade. Grande parte da pesquisa escrita
foi feita pelo acervo digital, buscando o conhecimento teórico que eu
precisava para realiza-la.
Este acervo é do Theatro São Pedro (TSP). Tive acesso também
a fotos do início da construção escavações e concretagem de blocos, os
andaimes e antigas estruturas do palco, o que me deixou encantada. Por
fim então, fui ao teatro São Pedro em uma visita guiada onde fui recebida
pelo supervisor operacional, Wagner Mattos, que se mostrou receptivo e
me relatou a história do teatro, suas vitórias e lutas, que são contínuas.
O TSP tem apresentações para escolas com entrada franca e estão com
as portas abertas para receber as instituições basta fazer o agendamento
prévio. O lugar realmente é encantador – eu já conhecia, porém agora
foi algo mágico, uma vez que eu estava atrás das cortinas, conhecendo o

26
DNA Educação

coração do teatro. Acho que, enquanto professores, deveríamos levar


nossos alunos ao teatro, pois muitos não têm acesso o que limita uma
visão de mundo.

Theatro São Pedro


Desde a época colonial que se pensava em um teatro que se
pudesse desenvolver um trabalho com a diversidade cultural de nossa
região. Foi Manoel Antônio Galvão, Presidente da Província na época
(1833), quem fez a doação do terreno para que fosse possível a constru-
ção do teatro.
Foi um projeto arquitetônico de estilo neoclássico de Filipe de
Normann que começou a construção que foi interrompida pela Revolu-
ção Farroupilha 1835 a 1845. Com retorno das obras tempos depois,
com grandes polêmicas acerca do custo do investimento, sendo precisar
pedir empréstimos, já que os recursos estavam limitados (BLOG THE-
ATRO SÃO PEDRO, 2018).
No entanto, em 27 de junho de 1858 o teatro foi inaugurado
com a presidência de Ângelo Moniz da Silveira Ferraz. Neste momento,
ocorreu a performance de Recordações da Mocidade e, no ano de 1862,
o teatro foi considerado efetivo patrimônio púbico. Isso transformou a
vida cultural da cidade, sendo uma das principais influências política. Na
Revolução Federalista (1893-1895), as apresentações são prejudicadas –
o teatro ficou desamparado de artistas e público.
O local foi palco de muitos acontecimentos, passando pela di-
tadura militar e outros episódios históricos. Teve que ser reformado, pois
os cupins tomaram conta de toda a estrutura do TSP, e seu caixa era
totalmente zero, o que provocava preocupação, pois corria o risco de
desabar. Então, foi fechado no ano de 1973. Foi o jornalista Paulo Amo-
rim quem ficou responsável pelo Departamento de Assuntos Culturais
da Secretária da Educação do Estado e solicitou em 1975 que Eva So-
pher assumisse a coordenação das obras para a recuperação do teatro.
Foi ela a responsável por todos os grandes feitos. Ela viveu o teatro de
alma e coração. Hoje, permanecem seus valores, uma grande programa-
ção artística plural e que trabalha duramente para manter a missão de se
fazer teatro em nosso país. Estes são fatos que marcam a nossa História

27
DNA Educação

e que dão ao teatro esse mistério, aumentando o nosso imaginário


(BLOG THEATRO SÃO PEDRO, 2018).

Bastidores
Figura 11: Theatro São Pedro Figura 12: Theatro São Pedro

Fonte: Soares (2018) Fonte: Soares (2018)

Figura 13: Theatro São Pedro Figura 13: Theatro São Pedro

Fonte: Soares (2018) Fonte: Soares (2018)

28
DNA Educação

Figura 15: Theatro São Pedro Figura 16: Theatro São Pedro

Fonte: Soares (2018) Fonte: Soares (2018)

Figura 17: Theatro São Pedro

Fonte: Soares (2018)

29
DNA Educação

Figura 18: Theatro São Pedro

Fonte: Soares (2018)

Figura 19: Theatro São Pedro Figura 20: Theatro São Pedro

Fonte: Soares (2018) Fonte: Soares (2018)

30
DNA Educação

Figura 21: Theatro São Pedro

Fonte: Soares (2018)

Nesse trabalho, ficou evidente a necessidade de buscar novos


caminhos, o que faz da fotografia um dos melhores meios para modificar
a aula tradicional. Serve também como comparativo, ao olharmos as fo-
tos antigas podemos perceber tudo que rodeia o objeto em estudo. A
fotografia fala por si – ela pode nos informar sobre a vida e o mundo.
Porém, ela tem suas especificidades, suas próprias características se não
conhecermos o que nela nos é exposto de nada significará, é preciso que
tenhamos um conhecimento prévio para que ela tenha sua real represen-
tatividade. Como diz Kossoy:
Toda e qualquer fotografia, além de ser um resíduo do pas-
sado, é também um testemunho visual no qual se pode de-
tectar – tal como ocorre nos documentos escritos – não ape-
nas os elementos constitutivos que lhe deram origem do
ponto de vista material (KOSSOY, 2012, p. 166).
Hodiernamente, a fotografia se faz presente a todo o mo-
mento. Quando a trazemos para a sala de aula, nos tornamos mais pró-
ximos dos alunos e suas realidades e nos tornamos os protagonistas da
História. Quando existe a proximidade, nos tornamos os realizadores,
deixando o mero consumismo de lado. Ademais, coloca Achutti:

31
DNA Educação

Ocorre que a fotografia não é um simples ato mecânico, que


consiste em apenas apertar o disparador. Ainda mais do que
técnica, a determinação e a clareza dos propósitos são fato-
res indispensáveis à prática da fotografia. De nada serve sa-
ber manipular o aparelho fotográfico se não se sabe o que
será fotografado nem porque se fotografar. Além disso, qual
a razão de acumular uma pilha de fotos, mais ou menos me-
díocres, sem saber o que faz com elas? (ACHUTTI, 2004, p.
102).
Conclusão
O tema abordado é de grande relevância, uma vez que, como já
mencionei, os alunos estão desmotivados, sem interesse e é preciso que
o professor esteja atento aos fatores que envolvem o quadro escolar.
Logo, pensar em aulas mais atrativas preconiza de grande envolvimento
e preparo do professor, que precisa pensar em todos os aspectos ao uti-
lizar fotografia e demais imagens. O professor tem que ter o conheci-
mento prévio de como irá trabalhar esses veículos para que seja signifi-
cativo para os alunos, o que este veículo de informação irá agregar; en-
fim, ter bem definido os objetivos.
Se pensando em novas abordagens, e trazendo para sala de aula
as imagens e fotografia, o professor tem grandes chances de sucesso. No
entanto, nem só a tecnologia ou a aula tradicional serão capazes de suprir
todas as desigualdades sociais tanto de acesso à educação ou qualidade
de vida e muito menos ser capaz de fazer com que todos tenham acesso
aos meios tecnológicos e seus benefícios e malefícios. Nem tudo é algo
absoluto com definição de fim, de concreto.
Apesar de todas as dificuldades encontradas em sala de aula,
como a falta de material, de infraestrutura adequada e às vezes até mesmo
os móveis, sem falar dos alunos indisciplinados, desconcentrados vi-
vendo em tamanha vulnerabilidade, temos que estar preparados para de-
senvolver nossa aula independente do que vamos encontrar. Assim, de-
vemos conseguir administrar cada dificuldade. Buscando fazer da Histó-
ria um agente transformador, pensei em trazer para sala de aula o uso da
fotografia como instrumento de pesquisa, pois atualmente tudo e a qual-
quer momento podemos fotografar e termos acesso a uma imensidão de
informações, a todo o momento. Além disso, a pesquisa documental

32
DNA Educação

pode fazer com que o aluno se reconheça e saiba mais dos lugares que o
rodeiam. São diferentes estratégias de aprendizagem. É importante evi-
denciar que as fotografias, na sua linguagem específica, compreendem a
cultura de cada povo, sua maneira de vestir, sua alimentação, seus rituais.
Elas representam uma maneira de ver mundo dentro do seu tempo.
Busca-se fotografar lugares nunca visitados e assim saber sua
história através da imagem. Tenta-se interpretar, viajar no mundo do des-
conhecido, mesmo que tenha vivido a vida inteira no mesmo lugar, pois
muitas vezes não conhecem outros locais. Almeja-se se sentir perten-
cente à História e se perceber como ser histórico para quem sabe modi-
ficar sua visão de mundo e sua própria vida. Por isso, trabalha-se uma
linguagem de fácil acesso já que eles mesmos irão trazer suas vivências.
No momento que propomos algo novo, com certeza isso irá
causar certo desconforto tanto nos alunos como no corpo docente. São
temas que ainda causam estranheza em alguns professores e ainda algu-
mas polêmicas. Isso ocorre porque a tais atividades requerem, por parte
do professor, um maior envolvimento em pesquisa e flexibilidade em seu
planejamento, o que muitos não estão dispostos a fazer.
Os alunos acostumados ao simples “decorar questões” terão
que desenvolver sua própria pesquisa e conhecer o espaço, fazendo re-
gistro, vivendo no tempo presente a História o que torna as aulas signi-
ficativas e sai do lugar comum. Todo projeto requer planejamento para
que aconteça de forma esperada e o ideal é que ocorra a interdisciplina-
ridade, para que possa ter uma ligação entre os saberes. Deve-se atentar
ainda a questões como: horário (horas/aula), saída de campo, pois é pre-
ciso fazer o agendamento das visitas nos lugares que iremos pesquisar,
para que se tenha um grande aproveitamento dos conteúdos e do mate-
rial que foi apurado, para que não seja um apanhado de coisas, mas sim
significativo.
Portanto, cabe a cada professor saber o que será pertinente para o de-
senvolvimento de suas aulas. Particularmente, me sinto bem à vontade
para utilizar essas ferramentas que, na minha perspectiva, vieram a acres-
centar ao nosso trabalho como professores e pesquisadores, já que nos
permite ir além da escrita, ter um olhar investigativo, crítico, reflexivo, se
fazendo como agentes transformadores da História. E, ainda dentro

33
DNA Educação

deste processo, as aulas se tornam mais significativas e representativas


para o aluno investigador, já que não é só no “passar o conteúdo” que
ele se percebe, e sim a maneira com que ele sente o passado dentro do
seu presente e a maneira com que ele modificará este a partir deste olhar.
Referências
ACHUTTI, Luiz Eduardo Robinson. Fotoetnografia. Porto Alegre:
UFRGS/Tomo Editorial, 2004.
GUERRA, Tatiane Gasperin de Chaves; BENVENUTI, Jaqueline. A
Fotografia como uma nova estratégia para o ensino de História. Revista
Listhe, Porto Alegre, jul. 2015. Disponível em: <http://seer.ufrgs.br /in-
dex.php/revistadolhiste/article/view/59819/36935 >. Acesso em: 15
abr. 2018.
KARNAL, Leandro (Org.). História na sala de aula: conceitos, práticas e
propostas. 6. ed. São Paulo: Contexto, 2015.
KOSSOY, Boris. Fotografia e História. 4. Ed. São Paulo: Ateliê Edito-
rial, 2012.
LITZ, Valesca Giordano. O uso da imagem no ensino de história. Pa-
raná. 2009. p.1-43. Disponível em: <http://www.diaadiaeducacao.pr.
gov.br/portals/pde/arquivos/1402-6.pdf>. Acesso em: 15 abr. 2018.
REVISTA DE HISTÓRIA. Fotografia uma viagem sem volta. Rio de
Janeiro: PNDE 52, ano 5, jan, 2010.
SOARES, Lisiane. Fotos: Uniasselvi. 18 abr. 2018.
SOARES, Lisiane. Fotos: Theatro São Pedro. 16 abr. 2018.
TAFNER, Elisabeth Penzlien; SILVA, Everaldo. Metodologia do Tra-
balho Acadêmico. Indaial: UNIASSELVI, 2011.
THEATRO SÃO PEDRO. Blog. Disponível em: <http://www. teatro-
saopedro.com.br/galerias/theatro-sao-pedro/> Acesso em: 15 abr.
2018.
TURAZZI, Maria Inês. A Viagem do Oriental-Hydrographe (1839-
1840) e a Introdução da Daguerreotipia no Brasil. Acervo, Rio de Janeiro,
v. 23, no 1, jan/jun 2010, p. 45-62.

34
DNA Educação

CAROLINA VAI À SALA DE AULA

Luciane Silva1

“Não tenho força física, mas as minhas palavras


ferem mais do que espada.”
“Percebi que os que sabem ler têm mais
possibilidades de compreensão
Se desajustarem-se na
vida poderão reajustar-se”
Carolina Maria de Jesus

RESUMO:
O artigo trata de analisar o impacto do livro, Quarto de despejo, de Carolina
Maria de Jesus, no ensino básico. O trabalho foi feito em forma de pesquisa
qualitativa e provou que a Literatura afro-brasileira não é apresentada aos alunos
do ensino fundamental. O conteúdo curricular de língua portuguesa, proposto
para o sétimo ano, no segundo bimestre, abrange: biografia, relato autobiográfico
e memórias. Como o livro apresenta uma autobiografia de uma mulher, negra,
pobre, moradora de comunidade e semi-analfabeta, com a sua leitura discutiu-se
o gênero textual em questão, racismo, preconceito e discriminação. Assuntos que
permeiam o ambiente escolar.
Palavras-chave: Literatura afro-brasileira. Autobiografia. Racismo. Discrimi-na-
ção.
ABSTRACT:
The article tries to analyze the impact of the book, Quarto de despejo, by Caro-
lina Maria de Jesus, in ensino básico. The work was done in the form of qualita-
tive research and proved that Afro-Brazilian Literature is not presented to ele-
mentary school students. The curricular content of the Portuguese language, pro-
posed for the seventh year, in the second two months, includes: biography, au-
tobiographical account and memories. As the book presents an autobiography
of a woman, black, poor, living in a community and semi-illiterate, her reading
of the textual genre in question, racism, prejudice and discrimination was dis-
cussed. Subjects that permeate the school environment.
Keywords: Afro-Brazilian literature. Autobiography. Racism. Discrimination.

1Mestre em Letras, subárea Literatura Portuguesa e Africana em Língua Portuguesa. Universi-


dade do Estado do Rio de Janeiro, UERJ, Professora do Estado do Rio de Janeiro e da prefeitura
de Barra Mansa. E-mail: lucianessga_75@hotmail.com

35
DNA Educação

Qual a importância da Literatura afro-brasileira?


Sendo a Escola um espaço privilegiado de formação do indiví-
duo é nesse contexto plural que a promoção da igualdade de oportuni-
dade deve ser efetivada. A Literatura afro-brasileira é o alicerce dessa
construção. Já que o aluno negro não se sente efetivamente acolhido,
integrado à escola.
O espaço escolar tem trabalhado com uma memória, acerca dos
negros no Brasil, elaborada a partir de construções sociais negativas es-
tereotipadas. A escola é um micro-espaço dentro da sociedade, formador
de opinião, escolhas e construção de conhecimento. No qual a cri-
ança/adolescente precisa se sentir pertencente para construir a sua iden-
tidade como cidadão atuante na sociedade.
Conforme Evaristo: Colocada a questão das identidades no in-
terior da linguagem, isto é como ato de criação linguística, a literatura,
como um espaço privilegiado de produção e reprodução simbólica de
sentidos, torna-se um locus propício para enunciação ou para apaga-
mento das identidades. Nesse contexto, a desconstrução de estereótipos
ligados aos negros, abordados na literatura brasileira acompanhado de
um olhar valorativo sobre a cultura negra brasileira, trazida por autores
afro-brasileiros, traz aos alunos, especificamente alunos negros, reconhe-
cimento da sua linhagem histórica e subsídios autênticos para a constru-
ção das suas identidades.
Ainda segundo Evaristo: Como uma poética da memória, a li-
teratura afro-brasileira, muitas vezes, se volta para o passado remoto para
reinventar África e tradições, entretanto, lida não só com o passado re-
moto, mas também com o recente, com a continuidade e com a descon-
tinuidade, com a ruptura, com o cotidiano, com a matéria do hoje e do
agora.
O autor afro-brasileiro acaba por explorar na sua tessitura, a
ancestralidade africana a partir da perspectiva que precede a escravidão.
Reconstruindo uma historicidade do negro, dando-lhe um fio condutor
que principia, por exemplo, na antiguidade das organizações dos reinos
africanos. Apresentando peculiaridades, tradições, costumes, que per-
meiam a cultura brasileira na atualidade. Refazendo assim uma ponte en-
tre o passado e o presente. Literatura negra, um exercício de resistência.

36
DNA Educação

A presença do negro na literatura brasileira


A presença do negro na literatura brasileira foi tão marginali-
zada e silenciada quanto o foi no processo de formação da sociedade. O
projeto de nação não contemplou em nenhum aspecto a população negra
brasileira, portanto não é ilegítimo ponderar que esse projeto foi pensado
e realizado pela e para a população branca dominante e dirigente, cujo
único objetivo era expurgar da dinâmica social, política e econômica a
causa do atraso. Nesse sentido, expurgar a “cor negra” da conjuntura
brasileira. (BASTOS; MERISSI; ALENCAR, 2010, p.4)
Ao longo do processo literário brasileiro, o personagem negro
foi caracterizado por diversos estereótipos reduplicadores. Sob uma vi-
são preconceituosa, algumas vezes explícitas outras veladas.
Nesse contexto, a representação da mulher negra na literatura
brasileira, desde as obras de Gregório de Matos, século XVII e autores
subsequentes, foi atrelada a estereótipos negativos, no que concerne a
sua etnia e a equidade ao poder masculino. De acordo com Campos:
Em contrapartida, estereótipos literários como os da don-
zela casadoura branca, da mulata sensual e fogosa, da negra
abnegada, submissa, máquina de trabalhar, corresponderam
respectivamente à procriação, à questão patrimonial, fami-
liar e sucessória e à exploração da mão de obra numa socie-
dade patriarcal, sexista e racista e na qual a literatura frequen-
temente reforçou os lugares sociais assinalados ao gênero
feminino e às chamadas raças. (CAMPOS, 2007, p. 2).
E aliado a essa discriminação sobre o personagem feminino,
ainda se constata na tradição literária brasileira a ausência significativa de
escritoras negras, ressaltando-se o silenciamento de suas obras tendo
como consequência a invisibilidade de sua escritura.
Segundo (PROENÇA, 2007, p. 159-177) podem-se perceber na
trajetória do discurso literário nacional, dois posicionamentos: a condi-
ção negra como objeto, numa visão distanciada, e o negro como sujeito,
numa atitude compromissada. Tem-se, desse modo, literatura sobre o
negro de um lado e literatura do negro de outro.
Conforme (MOOT, 1989, p. 1-16), Maria Firmina dos Reis,
nascida em São Luís em 1825 é considerada pelos estudiosos a primeira
mulher negra escritora no Brasil. Dedicou-se ao magistério aos 22 anos,

37
DNA Educação

foi a primeira professora primária concursada no Maranhão, uma das


poucas atividades trabalhistas “designadas” às mulheres de sua época.
Paralelamente às atividades como professora, Maria Firmina teve parti-
cipação constante na imprensa local, publicando diversas poesias, crôni-
cas e contos.
Em 1859, publicou o romance Úrsula, considerado o primeiro
romance brasileiro de autoria feminina e primeiro romance abolicionista
brasileiro. Sob a perspectiva interna e comprometida politicamente em
recuperar e narrar à condição do ser negro no Brasil. Conforme Charles
Martin:
Úrsula não se limita a repintar os negros de alma branca —
como fazem muitos livros de sua época. Mostra como os
escravos buscavam a estima de seus donos e tinham seus
próprios padrões de comparação, os quais derivavam do
passado africano.
(...)
Raramente os livros do século XIX trataram da mulher se-
não como procriadoras ou amantes. É bastante surpre-en-
dente que Maria Firmina descreva a relação entre marido e
mulher como “despótica” e “tirânica”. (MARTIN, 1988,
prefácio).
Maria Firmina, de acordo com Luiza Lobo, escreveu também o
primeiro diário de mulher de que se tem notícia (embora publicado ape-
nas em 1975, pelo historiador José Nascimento Moraes Filho, integrando
o importante Maria Firmina, fragmentos de uma vida). Neste livro, Moraes
Filho inclui suas composições enquanto folclorista, autora de charadas e
compositora. (LOBO, artigo online).
Em 1880, a escritora funda a primeira escola mista e gratuita do
Estado. No entanto, por misturar meninos e meninas foi considerada um
escândalo, fechada dois anos e meio depois. Adotou cerca de dez crian-
ças, morreu pobre, cega e esquecida, aos 92 anos, na cidade de Guima-
rães, longe da capital.
Teve o privilégio em vida de presenciar a abolição da escrava-
tura e a proclamação da República, porém, não pode presenciar o devido
reconhecimento da sua obra, revelada ao público apenas na década de
70.

38
DNA Educação

Outra escritora silenciada e esquecida foi Auta de Souza, nas-


cida em 12 de setembro 1876, no Rio Grande do Norte, na pequena
cidade de Macaíba.
Criada no seio de uma cultura patriarcal e católica bastante
arraigada às tradições e sendo a única mulher no meio de
quatro irmãos homens, para se firmar enquanto escritora,
Auta teve de superar barreiras de gênero e raça em uma
época preconceituosa e sexista, sobretudo para com as mu-
lheres que se dedicavam à escrita (FARIAS, 2013, p.1).
Estudou em um colégio religioso do Recife destinado ao ensino
de meninas, o que caracteriza que sua formação legitimava a sociedade
patriarcal em que os valores eram imbuídos na preparação das meninas
para serem freiras ou esposas.
Em sua grande maioria, as mulheres oitocentistas brasileiras
eram analfabetas, inclusive as abastadas, sendo tão somente relegadas ao
espaço doméstico e resguardadas pelos pais, irmãos, maridos ou senho-
res. (TELLES, 2004, p.401-442).
Em colégio católico, Auta rapidamente aprendeu francês, lite-
ratura, inglês, música e desenho. Em razão do diagnóstico de tubercu-
lose, aos 14 anos, ela teve que deixar o colégio, mas continuou sua for-
mação intelectual sozinha, tornando-se autodidata. Ainda sim, começou
a escrever e a declamar, hábito muito comum nas reuniões sociais da
época.
Aos 17 anos iniciou sua produção poética e com 18 estreou na
imprensa publicando poesias em uma revista denominada Oásis, de cir-
culação restrita, pois era veículo do grêmio literário Le Monde Marche.
No século XVIII, surgem os primeiros grêmios literários na Ba-
hia e no Rio de Janeiro. Segundo Gonçalves, no Rio Grande do Norte:
[...] funcionando como espaços que aglutinavam os intelec-
tuais potiguares reunidos com a finalidade de produzir lite-
ratura. (GONÇALVES, 2014, p.61).
Os Grêmios ou associações literárias foram excelentes divulga-
dores de novos escritores e difusores da Literatura Brasileira.
Dois anos depois, Auta passaria a colaborar no jornal A Repú-
blica, periódico com maior visibilidade que o primeiro, não só porque era

39
DNA Educação

o mais lido, mas por estabelecer diálogo com a imprensa de outras regi-
ões. Assim, mesmo vivendo fora do circuito de maior efervescência in-
telectual, Auta passaria a ser conhecida e ter seus poemas divulgados no
jornal O País, do Rio de Janeiro.
A partir de 1897, Auta passaria a publicar seus versos assídua-
mente em A Tribuna, de Natal, um jornal de prestígio, com participação
de vários escritores famosos do Nordeste.
Entre 1899 e 1900, Auta passou a usar os pseudônimos de Ida
Salúcio e Hilário das Neves para assinar seus poemas. Vários deles foram
musicados por compositores regionais e transmitidos oralmente, desde
o final do século XIX.
Além de ser mulher, o fato de Auta querer se integrar aos
círculos intelectuais também era algo complicado naqueles
idos, as mulheres que circulavam pelo espaço público eram
mal vistas e criticadas. Somado a isso, ter a pele escura e
descender de africanos era outra subalternidade a ser derru-
bada por ela. [...] era grande a carga de preconceitos sofridos
pelas escritoras negras oitocentistas, sobretudo para aquelas
que faziam questão de se dizerem abertamente que eram ne-
gras para termos uma idéia do quanto a militância e o afirmar
era complicado. (FARIAS, 2013, p.13).
Seu grande e único livro publicado foi Horto, em 1900, que me-
receu prefácio do mais consagrado poeta brasileiro da época, Olavo Bi-
lac. Em seu texto, Bilac escreve: [...]. Não há nas estrofes do Horto o
labor pertinaz de uma artista, transformando as suas idéias, as suas tor-
turas, as suas esperanças, os desenganos em pequeninas jóias, [...]. (BI-
LAC, apud. SOUZA, 2009, p. 29).
O texto de Bilac tanto exalta quanto expõe com reservas a obra
de Auta.
Em 1910, O Horto ganha uma segunda edição, em Paris; em
1936, uma terceira, no Rio de Janeiro; uma quarta edição em 1970, pela
Fundação José Augusto, de Natal (RN); e, por fim, uma quinta edição de
2000, em comemoração aos cem anos da obra, agora pela Editora Auta
de Souza (Cf. GOMES, fonte eletrônica: 11). Além disso, em 1961, Luís
da Câmara Cascudo publica a biografia da autora no Vida breve de Auta

40
DNA Educação

de Souza (1876 – 1901), o que passa a conferir-lhe uma maior visibili-


dade.
Apesar disso Auta não pode ver sua escrita reconhecida, faleceu
pouco depois da publicação de seu livro, acometida pela tuberculose, em
7 de fevereiro de 1901, com 24 anos.
Podemos ainda citar Ruth Guimarães, Antonieta de Barros, en-
tre outras... A literatura do negro começa a ter representatividade a partir
da década de 70, momento de efervescência dos movimentos de autoa-
firmação da etnia, quando o negro ultrapassa os estereótipos e promove
sua assunção como sujeito do seu discurso e sua ação em defesa da iden-
tidade cultural.
No entanto, em 1960, Carolina Maria de Jesus, negra, pobre,
semianalfabeta e catadora de papel tem seu diário íntimo publicado
“Quarto de Despejo: Diário de uma favelada”, obra também silenciada
e colocada à margem na literatura brasileira.

Carolina
Se doer só mais um pouco,
as palavras brotarão de meus poros
e minha boca se demorará em silêncios.
Lívia Natália
Os silêncios de Carolina tornavam-se voz no seu diário, pala-
vras entrecruzadas de dor, euforia, angústias, tristezas, vazios e esperan-
ças.
A 15 de julho de 1955, a escritora inicia seu diário:
Aniversário de minha filha Vera Eunice. Eu pretendia com-
prar um par de sapatos para ela. Mas o custo dos gêneros
alimentícios nos impede a realização dos nossos desejos.
Atualmente somos escravos do custo de vida. Eu achei um
par de sapatos no lixo, lavei e remendei para ela calçar. (JE-
SUS, 1993, p. 9).
E assim sucessivamente, dia após dia sua vida era registrada, os
registros em sua maioria conforme DANTAS (JESUS, 1993, p. 3)

41
DNA Educação

A fome aparece no texto com uma freqüência irritante. Personagem


trágica, inarredável. [...] Em sua rotineira busca da sobrevivência no
lixo da cidade, ela descobriu que as coisas todas do mundo – o céu, as
árvores, as pessoas, os bichos – ficavam amarelas quando a fome atin-
gia o limite do suportável.
A fome foi assunto constante no seu diário, para além dessa
necessidade de ratificar a sua busca diária de suprir a fome dos seus três
filhos, persistia em esmiuçar o cotidiano. A protagonista - autora narrava
o dia a dia na favela, brigas entre vizinhos, as dificuldades da falta de
saneamento, de energia elétrica, de água, hospital próximo, entre outros.
Mas, Carolina acima de tudo escrevia para se manter de pé.
Clarice Lispector, no trecho do livro Água Viva (1999, p.12)
discorre sobre o ato de escrever:
A harmonia secreta da desarmonia: quero não o que está
feito, mas o que tortuosamente ainda se faz. Minhas dese-
quilibradas palavras são o luxo de meu silêncio. Escrevo por
acrobáticas e aéreas piruetas – escrevo por profundamente
querer falar. Embora escrever só esteja me dando a grande
medida do silêncio.
Escrever para Carolina era a possibilidade de organizar o caos,
a desarmonia ao seu redor. Construir sob a sua perspectiva uma realidade
outra, ainda que difícil tortuosa. Um embate dela com a inóspita favela,
com seus habitantes, as palavras e dela com ela mesma. A decorrência
desse conflito é o seu diário íntimo. Para SILVA (2009, p.162), no diário:
[...] somos tocados pelo ar que esse personagem respirava.
Tendemos a ver nele um testemunho, ou seja, um índice, me-
tonímia, e não uma metáfora, que é tradução imagética e
mais distanciada dos fatos arrolados. Além disso, o diário
possui também uma respiração, um ritmo, que expressa e
aponta para a situação anímica e corpórea de seu autor. Os
traços materiais inscritos no diário – que muitas vezes se
desdobram em características bem sensíveis, matéricas,
como o estado do papel, a caligrafia, os borrões de tinta, as
rasuras etc. – reforçam o teor testemunhal do diário.
Quarto de Despejo evidencia um caráter testemunhal muito in-
tenso, nos manuscritos/textos originais do livro “Não há como não se

42
DNA Educação

emocionar com a letra de Carolina. Firme, grande, corrente, vigor e ener-


gia depreendem da fluidez com que escrevia. Tanta vitalidade justifica a
pergunta, [...] por que ela escrevia e copiava o que fazia? ” (MEIHY,
1993, p.29).
Trechos do diário de Carolina foram publicados no jornal Folha
da Noite, em 1958, e mais tarde (1959) na revista O Cruzeiro, chegou-se
ao livro, em 1960.
Quarto de Despejo foi publicado em agosto de 1960, pela edi-
tora Francisco Alves, da capital paulista e recebeu esse nome porque se-
gundo a escritora:
Quando estou na cidade tenho a impressão que estou na sala
de visitas com seus lustres de cristais, seus tapetes de velu-
dos, almofadas de cetim. E quando estou na favela tenho a
impressão que sou um objeto fora de uso, digno de estar
num quarto de despejo. (JESUS, 1993, p.33).
Logo na primeira semana de lançamento, o livro vendeu cerca
de cem mil cópias, segundo o jornal Folha da Manhã foram batidos todos
os recordes de vendas de livros em tardes de autógrafos. Pela primeira
vez uma livraria foi invadida pelo povo que se espremia em todo o re-
cinto, Carolina autografou mais livros que os três recordistas anteriores:
bateu sucessivamente Alzira Vargas, Carlos Lacerda e Jorge Amado, seis-
centos livros. Conforme (SANTOS, 2009, p.2):
Carolina Maria de Jesus lança mão de um recurso narrativo
inovador para a época, final da década de 50, princípio de
60, a narrativa em diários e/ou relatos memorialísticos, es-
pecialmente, oriundos das penas, das mãos de uma mulher
e, antecipa, em 10 anos, este tipo de gênero textual materia-
lizado por escritores (homens) e, se vale dele, para alinha-
var/tecer um relato, em que os fios discursivos, embora cha-
muscados de dor, entremostram a memória de uma mulher
negra, semiescolarizada, favelada, mãe solteira, moradora da
favela do Canindé e catadora de lixo.
Passados seis meses, Quarto de Despejo obteve uma vendagem de
noventa mil cópias por todo o país. A atenção da imprensa nacional so-
bre a figura de Carolina foi a sua projeção para o sucesso internacional.

43
DNA Educação

Seu livro foi publicado em 13 línguas em mais de 40 países, incluindo o


Japão e a antiga União Soviética.
O contexto histórico político e social da obra e seu lançamento
perpassa pela morte de Getúlio Vargas (1954), Café Filho assumindo a
presidência e Carlos Luz o substituindo por problemas de saúde.
Carlos Luz ameaçou dar um golpe, já que Juscelino havia ga-
nhado a eleição presidencial, militares intervieram e Carlos Luz foi de-
posto e quem acabou assumindo depois foi Nereu Ramos, que se encar-
regou de passar os cargos a Juscelino e João Goulart, seu vice.
Juscelino Kubitschek virou história, seu governo (1956 – 1961)
entrou para história do país como a gestão presidencial na qual se regis-
trou o mais expressivo crescimento da economia brasileira. Na área eco-
nômica, o lema do governo foi “Cinquenta anos de progresso em cinco
anos de governo”. Para cumprir com esse objetivo, o governo federal
elaborou o Plano de Metas, que previa um acelerado crescimento econô-
mico a partir da expansão do setor industrial, com investimentos na pro-
dução de aço, alumínio, metais não-ferrosos, cimento, álcalis, papel e ce-
lulose, borracha, construção naval, maquinaria pesada e equipamento
elétrico. Sobre Juscelino, Quarto de Despejo nos diz:
O que o senhor Juscelino tem de aproveitável é a voz. Pa-
rece um sabiá e a sua voz é agradável aos ouvidos. E agora,
o sabiá está residindo na gaiola de ouro que é o Catete2. Cui-
dado sabiá, para não perder esta gaiola, porque os gatos
quando estão com fome contempla as aves nas gaiolas. E os
favelados são os gatos. Tem fome. (JESUS, 1993, p. 30).
O Plano de Metas teve pleno êxito, pois com o passar da gestão
governamental a economia brasileira registrou taxas de crescimento da
produção industrial (principalmente na área de bens de capital) em torno
de 80%.
A prioridade dada pelo governo ao crescimento e desenvolvi-
mento econômico do país recebeu apoio de importantes setores da soci-
edade, incluindo os militares, os empresários e sindicatos trabalhistas. O

2Referência ao palácio do Catete, situado no Rio de Janeiro e na época residência oficial do


presidente da República.

44
DNA Educação

acelerado processo de industrialização registrado no período, porém, não


deixou de acarretar uma série de problemas de longo prazo para a eco-
nômica brasileira.
O governo realizava investimentos no setor industrial a partir
da emissão monetária e da abertura da economia ao capital estrangeiro.
A emissão monetária (ou emissão de papel moeda) ocasionou um agra-
vamento do processo inflacionário, enquanto que a abertura da econo-
mia ao capital estrangeiro gerou uma progressiva desnacionalização eco-
nômica, porque as empresas estrangeiras (as chamadas multinacionais)
passaram a controlar setores industriais estratégicos da economia nacio-
nal.
O controle estrangeiro sobre a economia brasileira era prepon-
derante nas indústrias automobilísticas, de cigarros, farmacêutica e me-
cânica. Em pouco tempo, as multinacionais começaram a remeter gran-
des remessas de lucros (muitas vezes superiores aos investimentos por
elas realizados) para seus países de origem. Esse tipo de procedimento
era ilegal, mas as multinacionais burlavam as próprias leis locais. De
acordo com (LEVINE; MEIHY, 1994, p.138):
Neste processo, a urbanização ganhava foros determinantes
e procedia-se à inversão da taxa demográfica, que definhava
em termos rurais para engrossar as fileiras citadinas. A trans-
formação dos camponeses em operários era uma imposição
surda à consciência das pessoas, que viam suas vidas condu-
zidas por uma força histórica imperceptível. O que restava,
isto sim, eram as justificativas pessoais e a adequação da vida
à contingência do poderoso destino social e político.
A partir da década de 1940, um enorme fluxo de migrantes nor-
destinos veio para São Paulo em busca de trabalho e de melhores condi-
ções de vida. Esse fluxo aumentou com o plano de metas do governo
Juscelino, pois a maioria das empresas multinacionais, como as grandes
montadoras de automóveis: Ford, Volkswagen, Willys e GM (General
Motors) entraram no país nesse período.
Estas indústrias instalaram suas filiais na região sudeste do Bra-
sil, principalmente, nas cidades de São Paulo, Rio de Janeiro e ABC

45
DNA Educação

(Santo André, São Caetano e São Bernardo). As oportunidades de em-


pregos aumentaram muito nesta região, atraindo trabalhadores de todo
Brasil.
Carolina seria uma dessas migrantes que saiu do campo – mais
especificamente de Minas Gerais – para tentar viver na grande cidade.
Esse fluxo de gente levou São Paulo a uma urbanização caótica, pois
assim como ela, muitos migrantes sem lugar para morar, ocuparam ter-
renos vazios e devolutos, encostas de morro, etc., sem qualquer infraes-
trutura e no abandono completo das políticas públicas.
Apesar de todos esses problemas, Kubitschek recebeu apoio de
todas as frentes e gerou uma fase de otimismo no povo brasileiro. Todos
acreditavam, principalmente os intelectuais, que a pobreza poderia ser
combatida, efetivamente, com programas sociais e de educação.
Conforme Levine, de início, a receptividade da história de Ca-
rolina foi, em certo nível, fruto da romantização da vida dos pobres. An-
tes de dar o choque que colocaria a opinião pública em outro extremo,
cabe recordar que a elite via o povo de maneira alienada. Quarto de Despejo
acaba com a visão idealizada das favelas que é trocada pelas evidências
testemunhais da violência.
O diário íntimo de Carolina prenuncia através da voz de um
sujeito-autor, narrador e personagem, sob uma linguagem fraturada, uma
sociedade desigual, bipartida. De um lado a favela e de outro a cidade
grande. De acordo com Carolina:
.... Eu classifico São Paulo assim: O palácio, é a sala de visita.
A prefeitura é a sala de jantar e a cidade é o jardim. E a favela
é o quintal onde jogam os lixos. (JESUS, 1993, p.28).
Quarto de despejo: Diário de uma favelada (esta última parte do título
incluída pelo jornalista Audálio Dantas), fez da sua autora uma celebri-
dade nacional e internacional e como salienta Levine, ocupando lugar de
realce na história editorial brasileira, latino-americana e até mundial. E a
queda da obra e da autora foi tão brusca quanto a sua ascensão. De
acordo com (ALVES, 2002, p. 235), sobre a produção literária de autores
e autoras negras:

46
DNA Educação

Primeiro é acusada de essencialismo, depois é punida com o


anonimato. Trata-se de um anonimato complexo, que retira
a legitimidade do negro como escritor. A esse escritor é re-
servado um lugar de objeto de estudos no discurso de pes-
quisadores, ou seja, alguém que só tem existência através do
agenciamento do outro [...] Na verdade, existe a prática de
defender o status quo da literatura e a visão de que é um
lugar reservado a determinados assuntos, específicos das
suas formas de abordagens.
Quarto de Despejo e Carolina foram relegados ao esquecimento,
com o golpe militar de 64, seu livro não foi proibido, mas os editores
evitaram as vendas por receio da ditadura, pelas denúncias que a obra fez
sobre os governantes, por toda crítica social que o livro relata, a obra
acabava por transmitir uma inadequação, ao padrão de mensagem pro-
posto pelo golpe, que evitava a crítica social.
Aliado a esse fator, as reações da escritora em relação à atitude
impertinente, implicante, preconceituosa e racista da imprensa, que a
todo o momento provocava, julgava e estereotipava Carolina. “Feita
mercadoria, passava a ser – e quem conta é o jornalista Elias Raide –
como um animal estranho”. (LEVINE; MEIHRY, 1994, p.32).
De qualquer forma é notável como a presença, e mesmo os
momentos de silêncio de Carolina, irritavam a imprensa, que
se manifestava contrária àquela mulher que emergiu como
possível crítica da sociedade. (LEVINE; MEIHRY, 1994, p.
38).
Após Quarto de Despejo, Carolina teve mais quatro livros publi-
cados: Casa de Alvenaria (1961), Provérbios (1963), Pedaços de fome (1963) e
Diário de Bitita (1986) póstumo. Nenhum deles alcançou relevo como o
primeiro.
Em 13 de fevereiro de 1977, Carolina termina a sua trajetória,
com 63 anos, doente, fragilizada, morre vitimada por uma crise de asma,
em Parelheiros, São Paulo. Os recursos para o seu enterro foram doações
de vizinhos.

47
DNA Educação

E a partir dos anos 90 seu Quarto de Despejo torna-se um quarto


de visitas, pesquisadores, professores, estudantes, entre outros, debru-
çam-se sobre a sua emblemática vida e sua inusitada obra. Carolina ainda
tem muito a dizer...

Cenário de estudo
O Colégio Municipal Anchieta está localizado no bairro Vista
Alegre, na cidade de Barra Mansa, no interior do Estado do Rio de Ja-
neiro. É uma escola de referência, inclusive selecionada para o projeto
Escola Integral, da prefeitura da cidade.
Atualmente, a escola abriga setecentos e vinte alunos, distribu-
ídos em turmas do ensino fundamental, anos iniciais e anos finais. Du-
rante a noite, a escola abriga turmas de Educação de Jovens e Adultos
(EJA).

Participantes do estudo
Os participantes do estudo são alunos do sétimo ano do ensino
fundamental, final, na faixa etária de 13/14 anos. O trabalho foi efetuado
com quatro turmas, compostas por uma média de vinte a vinte e dois
alunos.

Coleta de dados
A aula começa com a professora fazendo uma leitura em voz
alta, com os alunos, de trechos do livro, Quarto de despejo: diário de
uma favelada. Em seguida, narrando a biografia da escritora Carolina de
forma bem informal. Nesse momento as questões levantadas são: Vocês
conhecem autores negros? Vocês conheciam Carolina? Por que conhe-
cemos poucos autores negros?
A aula seguinte, prossegue na sala de informática, para apresen-
tar Carolina Maria de Jesus aos alunos. A professora apresenta os vídeos,
Carolina Maria de Jesus, heróis de todo mundo e Nação – TVE – Caro-
lina. Depois da apresentação é promovido um debate, as questões levan-
tadas são: O que a Carolina abordava na sua escrita? Os assuntos abor-
dados pela escritora ainda são atuais? A literatura é importante, assim
como o hábito da leitura? Escrever é importante?

48
DNA Educação

Na terceira aula da sequência didática, a professora lê mais tre-


chos do livro e distribui um questionário com três perguntas:
1. Como foi a história de vida da Carolina?
2. O que mudou na sua história conhecer a história da Carolina?
3. Se você pudesse falar algo para Carolina o que seria?
João Paulo Souza – Turma 703
1. Ela era pobre, negra, morava na favela e ninguém dava nada por
ela, e também lutava pelo preconceito e escrevia.
2. Mudou que a gente tem que se dedicar a escola, precisa valorizar a
comida, os outros...
3. Eu ia falar que ela é guerreira e para ela continuar escrevendo
Luana Vitória Santos – Turma 705
1. Muito difícil a vida dela, tinha que lutar para sustentar seus filhos.
2. Motivou-me para eu não desistir dos meus sonhos e desejos.
3. Não desista!
Kaique – Turma 702
1. Era uma vida difícil, com dificuldades e preconceito.
2. Aprendi um pouco mais sobre desigualdade.
3. Estou aqui para te ouvir.
Vitor Samuel – turma 701
1. Carolina tinha uma vida muito dura, ela era muito batalhadora,
mas sofria muito.
2. Mudou em mim que não podemos fazer racismo, pois somos todos
iguais. E também passei a ser focado mesmo com minhas dificuldades.
3. Está de parabéns, mesmo sofrendo, esforçou-se e conseguiu.

49
DNA Educação

Considerações finais
Quando a educação não é libertadora,
o sonho do oprimido é ser o opressor.
Paulo Freire

Uma educação libertadora, pressupõe um professor capaz de


mediar conflitos, inserir conteúdos dinâmicos e enriquecedores à forma-
ção do aluno. Desdobrar-se para incentivar o debate, fomentar questio-
namentos e elucidar distorções da historiografia hegemônica.
Com base nesta perspectiva, apresentar Carolina Maria de Jesus
e seu diário que se tornou livro, Quarto de despejo, aos alunos do sétimo
ano, da escola municipal Padre Anchieta foi provar que é possível traba-
lhar com a literatura não canônica e inseri-la no conteúdo progra-mático
curricular.
A receptividade dos alunos a obra foi bastante significativa. Dos
setenta e cinco entrevistados, somente dois disseram já ter ouvido falar
da Carolina, mas não de seu livro. E pelo menos trinta alunos interessa-
ram-se em ler o livro em sua integridade. Nenhum aluno soube dizer o
nome de um autor negro e a professora mencionou que Machado de
Assis é negro. Ressaltando a invisibilidade dos escritores negros, não por
ausência, mas por racismo e discriminação.
Os alunos perceberam a abordagem que Carolina fazia do seu
cotidiano, os assuntos abordados e compreenderam o gênero textual au-
tobiografia, memória e relato. Destacaram o constante falar da autora
sobre a fome, o racismo, a valorização do negro e a discriminação sofrida
pelo local de vivência. Essas questões foram intercambiadas e dialogadas
no contexto escolar pela professora.
Outras questões bastante relevantes foram as relacionadas a li-
teratura, sua importância e o hábito da leitura. Muitos alunos declararam
que escrevem contos, diários e poemas. E relataram sentir-se estimulados
a continuar suas escritas por causa da Carolina.
Provou-se dessa forma que os alunos foram impactados positi-
vamente com a escrita da Carolina e que realmente a literatura afro-bra-
sileira precisa ser mais difundida e os autores negros serem revelados
pelos professores e inseridos nos programas curriculares das escolas.

50
DNA Educação

Como disse Carolina: “Percebi que os que sabem ler têm mais
possibilidades de compreensão. Se desajustarem-se na vida poderão rea-
justar-se” (JESUS, 1986, p.177).

Referências
ASSMANN, Aleida. Espaços da recordação: formas e transformações
da memória cultural. Campinas: Unicamp, 2011.
ASSMANN, Jan. Religión y memoria cultural. Buenos Aires: Lilmod,
2008.
BHABHA, Homi. O local da cultura. Belo Horizonte: Editora UFMG,
1998.
BARCELLOS, Sergio. Vida por escrito – Portal biobibliográfico de Ca-
rolina Maria de Jesus. Disponível em: <www.vidaporescrito.com>.
Acesso em: 14 fev. 2016.
BAMPI, Lisete. Governo, subjetivação e resistência em Foucault. .
Disponível em: <http://www.seer.ufrgs> Acesso em: 23 de março de
2016.
BASTOS, Ana Paula; MERISSI, Lais. As políticas de ação afirmativa
e a tentativa de desconstrução da discriminação racial: a lei
10639/03, 2010.
BERND, Zilá. Identidades e nomadismo. In: JOBIM, José Luís. (Org).
Literatura e identidades. Rio de Janeiro: J. L. J. S. Fonseca, 1999. p.
95–111.
BESSE, K. Susan. Modernizando a desigualdade. São Paulo: Edusp,
1996.
BILAC. Olavo. Prefácio da 1ª Edição. In: SOUZA, Auta. Horto, outros
poemas e ressonâncias: obras reunidas. Natal: EDUFRN. 2009.
BOURDIEU, Pierre. A dominação masculina. Rio de Janeiro: Ber-
trand Brasil, 1999.
BRITO, M. C. E. Literatura negra: uma poética de nossa afro-brasili-
dade. 1996. Dissertação (Mestrado) - Pontificia Universidade Católica
do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 1996.
CARRIJO, Fabiana Rodrigues; SANTOS, João Bôsco Cabral dos. Nas
fissuras dos cadernos encardidos: o bordado testemunhal de Carolina
Maria de Jesus. Uberlândia: Scielo, 2012.
CAMPOS, Maria Consuelo Cunha. Representação da mulher negra
na literatura brasileira. Rio de Janeiro: UERJ/Pen Clube do Brasil,
2006.
EVARISTO, Conceição. Literatura Negra. Rio de Janeiro: CEAP, 2007.

51
DNA Educação

DIAS, Maria Odila Silva. Hermenêutica do cotidiano na historiografia


contemporânea. Projeto História: trabalhos da memória. São Paulo, n.
17, nov.98. p. 223-232.
HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. Rio de Ja-
neiro: DP&A, 2001.
HAMILTON, Russell G. Apresentação. In: SEPÚLVEDA, Maria do
Carmo; SALGADO, Teresa (Org.). África & Brasil: letras em laços. Rio
de Janeiro: Atlântica, 2000.
JESUS, C. M. de. Quarto de despejo: diário de uma favelada. São Paulo:
Ática, 1997.
___________. Diário de Bitita. São Paulo: SESI Editora, 2014.JOBIM,
José Luís. Narrativa e História. In: ___________. Formas da teoria.
Rio de Janeiro: Caetés, 2002, p. 149-161.
LEJEUNE, Philippe. El pacto autobiográfico y otros estúdios: el
mundo iluminado. Ciudade del México: Lúmen, 1998.
MEIHY, José Carlos Sebe Bom; LEVINE, Robert M. Cinderela negra:
a saga de Carolina Maria de Jesus. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 1994.
__________. Carolina Maria de Jesus: meu estranho diário. São Paulo:
Xamã, 1996.
MOTT, Maria Lúcia de Barros. Escritora negras: resgatando a nossa
história. Rio de Janeiro: CIEC/UFRJ, 1989. (Coleção Papéis Avulsos).
PERRONE, Leyla Moisés. Altas literaturas: escolha e valor na obra crí-
tica de escritores modernos. São Paulo, 1998.
PROENÇA FILHO, Domício. A trajetória do negro na literatura brasi-
leira. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/ea/v18n50/
a17v1850.pdf>. Acesso em: dez. 2013.
SANTOS, Alessandra Rufino. A importância da literatura como
fonte de pesquisa na construção do pensamento social brasileiro.
2013. Dissertação (Mestrado) - Roraima: UERR, 2013.
SANTIAGO, Silviano. Uma literatura nos trópicos. 2. ed. Rio de Ja-
neiro: Rocco, 2000.
SEIXAS, Rogério Luis da Rocha. A condição estratégica do exercício do
poder em Michel Foucault. Rio de Janeiro: UFRJ, Revista de Filosofia
– Argumentos, 2011.
SILVA, Márcio Seligmann. História, memória, literatura: o testemu-
nho na era das catástrofes. Campinas: Ed. Unicamp, 2003.
__________ . O esplendor das coisas: o diário como memória do pre-
sente na Moscou de Walter Benjamin. São Paulo: Iluminuras: Fapesp,
2009, p. 162.

52
DNA Educação

AS NOVAS TECNOLOGIAS NA EDUCAÇÃO SUPE-


RIOR CONTEMPORÂNEA NO BRASIL:
O ENSINO À DISTÂNCIA COMO PORTA DE
ACESSO PARA A CIDADANIA

Lucibeli Bastos Alves Matos1

RESUMO:
Este trabalho tem como objetivo refletir sobre a importância das novas
Tecnologias na Educação superior contemporânea no Brasil e de como a
proposta da modalidade do Ensino à Distância vem ganhando espaço no
meio educacional tanto nas Instituições privadas e mais recentemente nas
Públicas em nosso país. O tema abordado tem sido muito debatido na con-
temporaneidade por estudiosos, acadêmicos e sociedade em geral por se
tratar de um assunto de interesse social muito sério e que vem trazendo
uma nova perspectiva para pessoas que buscam neste modelo de Educação
a consolidação da sua cidadania.
Palavras-chave: Tecnologias; Educação à Distância; Cidadania

ABSTRACT:
This study aims to reflect on the importance of new technologies in contem-
porary higher education in Brazil and how the proposal of the Distance
Learning modality has been gaining space in the educational environment
both in private institutions and more recently in the Public in our country.
The subject has been much debated in contemporary times by scholars, ac-
ademics and society in general because it is a subject of very serious social
interest and that is bringing a new perspective to people who seek in this
model of Education the consolidation of their citizenship
Keywords: Technologies; Distance Education; Citizenship

1 Mestranda em Ciência da Educação pelo Instituto Superior de Educação do CECAP - ISCE-


CAP; Especialista em Gerontologia Social pela Universidade Católica do Salvador (UC-
SAL,2009); Especialista em Planejamento Educacional e Docência do Ensino Superior
(ESAB,2011); Especialista em Gestão Social: Políticas Públicas, rede e defesa de direitos (UNO-
PAR,2012).Bacharel em Serviço Social pela Faculdade Nobre de Feira de Santana (FAN,2007).
E-mail: ascibeli@gmail.com

53
DNA Educação

Introdução
O mundo contemporâneo trouxe consigo novos modelos para
as mais diversas atividades nos ambientes de trabalho, e a educação como
uma dessas áreas também recebeu uma nova roupagem e com o surgi-
mento das novas tecnologias da informação e da comunicação as práticas
educacionais ganharam novos atores para novas práticas.
A Educação à Distância (EAD), como nova modalidade de en-
sino deu um novo impulso à educação, utilizando-se das tecnologias para
oportunizar uma nova maneira de ensinar e aprender. E para compor
esse novo cenário, surgiu também a necessidade de mudança no papel
tradicional do professor e dos alunos. Esta modalidade nos leva a perce-
ber como as questões do ensinar e aprender mudaram e como estas estão
se redesenhando diante do mundo globalizado.
A escolha por essa temática deu-se por conta da pesquisadora
estar inserida na prática como professora/tutora de sala do curso de Ser-
viço Social em uma instituição de EAD, e perceber cotidianamente a im-
portância da modalidade como porta de acesso para muitas pessoas em
um curso de nível superior, visto que tinham o desejo de uma formação
acadêmica, mas, nos moldes tradicionais seria difícil de realizar diante das
mais variadas dificuldades destes cidadãos e de um país que ainda apre-
senta muitas dificuldades para ofertar educação. Isso também nos faz
refletir a carca da viabilidade que o EAD proporciona diante de uma
sociedade que na contemporaneidade necessita de flexibilidade em todas
as suas atividades e na educação isso não poderia ser diferente.
A Educação a Distância nas últimas décadas vem ganhando es-
paço no sistema educacional e o objetivo desse ambiente virtual é suprir
a deficiência que infelizmente existe em nossa realidade. Sem dúvidas
utilizar ferramentas tecnológicas na educação superior abriu portas para
diminuir a distância entre o que ensina e o que aprende, facilitando muito
para um aprendizado diferenciado, onde o aluno pode dentro das suas
possibilidades e afazeres diários ter uma formação, que o validará en-
quanto profissional de acordo com a área que ele escolher, sem contar
que nesta modalidade o sujeito tem a mão todo o material virtualmente
para que possa acessar em qualquer lugar e hora que tiver tempo.

54
DNA Educação

A relevância deste estudo justifica-se pela possibilidade de mos-


trar a comunidade acadêmica e profissional como tem ocorrido o pro-
cesso de educação à distância em nosso cotidiano e de como a educação
mediada pelas tecnologias vem transformando a vida de muitas pessoas,
contribuindo para a consolidação da sua cidadania.
Neste contexto, foi tratada a luz de alguns autores a relação en-
tre educação, tecnologia e cidadania nos dias atuais vislumbrando novas
formas de ensinar e aprender objetivando mostrar que a Educação passa
por transformações significativas e que estas vêm contribuindo para a
promoção da cidadania, visto que, vem estimulando com esta nova rou-
pagem o acesso à formação de muitos que sem essa oportunidade seria
muito difícil alcançarem sua formação acadêmica.

Ensino superior à distância EAD: Breve contextualização do sur-


gimento desta modalidade
Levando em consideração a importância do tema Educação à
distância ou como popularmente é apelidada EAD, inevitavelmente será
preciso fazer um passeio pela história para entender o seu contexto e
visualizar mais claramente o desenvolvimento desta modalidade de
acordo com cada momento em que se deu este processo, principalmente
por entender o dinamismo das sociedades em que vivemos e como se
deu a sua evolução, principalmente para que se possa visualizar que essa
modalidade não é tão nova como muitas pessoas imaginam, na verdade
houve mudanças nos formatos de acordo com os avanços educacionais
e tecnológicos e que culminou no EAD da contemporaneidade.
Na busca por entender de forma mais clara o contexto da Edu-
cação à distância, faz-se necessário mostrar um pouco da sua trajetória
histórica e a partir daí visualizar o seu processo de desenvolvimento,
principalmente por conta do processo dinâmico pelo qual esta modali-
dade vem passando e de como se deu o seu desenvolvimento até chegar
ao que está posto no momento. Contribuindo com esta questão Silva,
Melo e Muylder (2015, p.203), dizem:
A educação a distância (EaD) vem se revelando como uma
significativa tendência na esfera educacional, principalmente
na educação superior. A modalidade já não é novidade no

55
DNA Educação

mundo educacional, uma vez que os primeiros registros de


sua utilização foram identificados em 1728, por meio de um
curso por correspondência na cidade de Boston, nos Esta-
dos Unidos. Contudo, na atualidade, a palavra que se instala
no auge da EaD é “interação”, que se torna possível medi-
ante as tecnologias de comunicação cada vez mais fluentes
e eficazes.
Levando em consideração a história da educação e os vários
processos de mudanças pelo qual passou e vem passando historicamente,
notam-se as mais diversas transformações e quebra de paradigmas, prin-
cipalmente por conta dos modelos tradicionais que ainda vivenciamos
nos processos educacionais de várias instituições.
Logicamente que quando se fala em ensinar processos educati-
vos e em modelos e métodos para ensinar e aprender, não contamos
apenas com uma única metodologia, até porque nossas sociedades são
dinâmicas e com o desenvolvimento social, econômico e tecnológico
tudo muda continuamente e muito velozmente em todas as áreas e com
a educação não é diferente e esta evolução vem auxiliando educadores e
educandos a alcançar seus objetivos e contribuir nesse processo de cons-
trução de uma sociedade melhor. Cabral (2008, p.1), aponta:
Segundo muitos pensadores contemporâneos, vivemos na
pós-modernidade. No entanto, não cabe discutir esse con-
ceito aqui, mas podemos constatar que pelo menos num as-
pecto, todos os pós-modernos concordam: atravessamos
uma crise de paradigmas. Contexto em que o conhecimento
é sistematicamente colocado a prova, ao mesmo tempo em
que se afirma o relativismo das verdades historicamente
construídas pela Modernidade. [...]
Diante desta evolução e avanço tecnológico, caminhando para
o período mais a frente, o ensino a distância começou a ganhar espaço,
e de acordo com Nunes (2009, p. 3), o primeiro momento importante da
educação a distância aconteceu quando Cauleb Phillips, professor de ta-
quigrafia anunciou na Gazeta de Boston, em 20 de março de 1728, em
que convidava a todas as pessoas daquela região que desejassem aprender
e que receberiam semanalmente as lições, e partir daí, o ensino à distância
começou a ganhar consistência.

56
DNA Educação

De acordo com a data acima e para uma melhor e mais resu-


mida contextualização, no quadro abaixo está datada de forma cronoló-
gica, mostrando que o EAD já era uma realidade nos séculos XVIII e
XIX e abaixo estão alguns dos principais momentos/eventos que mar-
caram a evolução do EAD no âmbito mundial.

Quadro 1: Quadro cronológico, principais momentos /eventos do EAD no mundo


ANO/
EVENTO/MOMENTO
PERÍODO
O número 30 do periódico sueco Lunds Weckoblad comunica a mudança de en-
1833 dereço, durante o mês de agosto, para as remessas postais dos que estudam
"Composição" por correspondência;
Isaac Pitman na Grã-Bretanha ofereceu o curso de taquigrafia por correspondên-
1840
cia;
Funda-se a Phonographic Correspondence Society, que se encarrega de corrigir
1843
as fichas com os exercícios de taquigrafia anteriormente aludidos;
Em Berlim, a Sociedade de Línguas Modernas patrocina os professores Charles
1856
Toussain e Gustav Laugenschied para ensinarem francês por correspondência;
A Universidade de Londres passa a conceder certificados a alunos externos que
1858
recebem ensino por correspondência;
1873 Surge, em Boston, EUA, a Sociedade para a Promoção do Estudo em Casa;
1880 Skerry’s College, cursos preparatórios para concursos públicos
Começa a funcionar, em Ithaca, no Estado de Nova Iorque, EUA, a Universidade
1883
por Correspondência;
1884 O Foulkes Lynch Correspondence Tuition Service, cursos de contabilidade;
Nos Estados Unidos, Thomas J. Foster ofertou curso sobre segurança de minas;
1891 Por iniciativa do reitor da Universidade de Chicago, W. Raineu Harper, é criado um
Departamento de Ensino por Correspondência;
O Rutinsches Fernelehrinstitut de Berlim organiza cursos por correspondência para
1894
obtenção do Abitur (aceitação de matrícula na Universidade);
1903 Julio Cervera Baviera abre, em Valência, Espanha, a Escola Livre de Engenheiros;
A Universidade de Queensland, na Austrália, dá inicio aos programas de ensino
1910 por correspondência; Professores rurais do curso primário começam a receber ma-
terial de educação secundária pelo correio, em Vitória, Austrália;
Ainda na Austrália, com a intenção de minorar os problemas das enormes distân-
1911 cias, a Universidade de Queensland começa a experiência para solucionar a difi-
culdade;
Na Noruega, fundase a Norst Correspondanseskole e, na Alemanha, a Fernschule
1914
Jena;
1920 Na antiga URSS, implanta-se, também, este sistema por correspondência;
A New Zeland Correspondence School começa suas atividades com a intenção
1922 inicial de atender a crianças isoladas ou com dificuldade de freqüentar as aulas
convencionais. A partir de 1928, atende também a alunos do ensino secundário;
1924 Fritz Reinhardth cria a Escola Alemã por Correspondência de Negócios;

57
DNA Educação

A BBC promove cursos para a educação, dá início aos cursos para educação de
1928
adultos usando o rádio.
No Canadá, na cidade de Victória, realiza-se a Primeira Conferência Internacional
1938
sobre a Educação por Correspondência;
Nasce o Centro Nacional de Ensino a Distância na França (CNED), que, em prin-
1939 cipio, atende, por correspondência, a crianças refugiadas de guerra. É um centro
público, subordinado ao Ministério da Educação Nacional;
Na década de quarenta, diversos países do centro e do leste europeus iniciam esta
1940 modalidade de estudos. Já por estes anos os avanços técnicos possibilitam outras
perspectivas que as de ensino meramente por correspondência;
A Universidade de Sudafrica (UNISA) começa a ensinar também por correspon-
1946
dência;
Através da Radio Sorbonne, transmitem-se aulas de quase todas as matérias lite-
1947
rárias da Faculdade de Letras e Ciências Humanas de Paris;
A Universidade de Sudafrica, atualmente única Universidade a Distância na África,
1951
dedica-se exclusivamente a desenvolver cursos a distância;
Funda-se o Beijing Television College, na China, que encerra suas atividades du-
1960 rante a Revolução Cultural, o que acontece também ao restante da educação pós-
secundária;
Inicia-se, na Espanha, uma experiência de Bacharelado Radiofônico; A Universi-
dade de Dehli cria um Departamento de Estudos por Correspondência, como ex-
1962
periência para atender aos alunos que, de outro modo, não podem receber ensino
universitário;
Surge na Espanha o Centro Nacional de Ensino Médio por Rádio e Televisão, que
substitui o Bacharelado Radiofônico, criado no ano anterior;Inicia-se, na França,
um ensino universitário, por radio, em cinco Faculdades de Letras (Paris, Borde-
1963 aux, Lille, Nancy e Strasbourg) e na Faculdade de Direito de Paris, para os alunos
do curso básico;Duas instituições neozelandesas se unem (Victoria University of
Wellington e Massey Agricultural College) e formam a Massey University Centre
for University Extramural Studies da Nova Zelândia;
O Centro Nacional de Ensino Médio por Rádio e Televisão da Espanha se trans-
1968
forma no Instituto Nacional de Ensino Médio a Distância (INEMAD);
Cria-se a British Open University, instituição verdadeiramente pioneira e única do
1969 que hoje se entende como educação superior a distância. Inicia seus cursos em
1971. A partir desta data, a expansão da modalidade tem sido inusitada;
Cria-se em Madri, Espanha, a Universidad Nacional de Educacion a Distancia
1972 (UNED), primeira instituição de ensino superior a suceder a Open University em
nível mundial;
Criada a Universidade Aberta de Israel, que oferece, em hebreu, cerca de 400
1974
cursos em domínios variados;
Criada a Fernuniversitätt, na Alemanha, dedicada exclusivamente ao ensino uni-
1975
versitário;
Criado o Instituto Português de Ensino a Distância, cujo objetivo era lecionar cur-
1979 sos superiores para população distante das instituições de ensino presencial e
qualificar o professorado;
O Instituto Português de Ensino a Distância dá origem a Universidade Aberta de
1988
Portugal;
Fonte: LANDIM (1997); NUNES (2009)

58
DNA Educação

Levando em consideração todo esse contexto, pode-se ver que


o EAD surgiu principalmente da necessidade de preparar profissional e
culturalmente as pessoas que, pelas mais variadas razões não podiam fre-
quentar o ensino presencial, e evoluiu com as tecnologias disponíveis em
cada momento histórico e que culminou no que existe na atualidade.
Partindo deste contexto histórico do Ead no mundo e no Brasil,
Maia e Mattar (2007, p. 21 e 22), apontam que a modalidade em seu de-
senvolvimento está basicamente dividida em três gerações, conforme os
avanços e recursos tecnológicos e de comunicação de cada época.
A primeira geração sendo o estudo por correspondência, no
qual o principal meio de comunicação eram materiais impressos, geral-
mente um guia de estudo, com tarefas ou outros exercícios enviados pelo
correio; a segunda geração segundo eles aparecem as primeiras Universi-
dades Abertas, com design e implementação sistematizadas de cursos a
distância, utilizando, além do material impresso, transmissões por televi-
são aberta, rádio e fitas de áudio e vídeo, com interação por telefone,
satélite e TV a cabo; e a terceira geração baseada em redes de conferência
por computador e estações de trabalho multimídia.
De acordo com os estudos realizados, nota-se que no nosso
país o ensino a distância, segundo Maia e Mattar (2007, p.23), diz que
inicialmente o modelo seguiu os padrões do que era realizado internaci-
onalmente com os cursos por correspondência. Posteriormente, houve
um avanço positivo e com muita aceitação da modalidade com a utiliza-
ção do rádio e da TV, mídias que antecederam a internet.
Assim como no contexto mundial houve eventos e momentos
que marcaram a introdução do EAD, no Brasil também existe uma linha
temporal que aponta esses avanços e que serão descritas na tabela abaixo:

59
DNA Educação

Quadro 2- Quadro cronológico, principais momentos /eventos do EAD no Brasil


ANO/
EVENTO/MOMENTO
PERÍODO
1904 Implantação das Escolas Internacionais, instituições privadas que ofereciam cursos
pagos por correspondência em jornais;
1923 Fundação da Rádio Sociedade do Rio de Janeiro, que oferecia cursos de português,
francês, silvicultura, literatura francesa, esperanto, radiotelegrafia e telefonia.
1927 Criação da Comissão de Cinema e Educação;
1932 Lançamento do Manifesto da Nova Escola, propondo o uso de rádio, cinema e im-
pressos na educação brasileira;
1934 Instalação da Rádio-Escola Municipal do Rio;
1936 Doação da Rádio Sociedade do Rio de Janeiro ao Ministério da Educação e Saúde;
1937 Criação do Serviço de Radiodifusão Educativa do Ministério da Educação;
1939 O ensino a distância é ofertado pelos primeiros dos Institutos brasileiros, Instituto
rádio técnico Monitor;
1941 Fundado o Instituto Universal Brasileiro – IUB, por um ex-sócio do Instituto Monitor;
1943 A Voz da Profecia, que começou nos Estados Unidos em 1929, transmitiam séries
bíblicas, e que foram gravadas em Português, dando inicio ao primeiro programa re-
ligioso e que atualmente é O Sistema Adventista de Comunicação;
1947 SENAC, SESC e emissoras associadas fundam a Universidade do Ar;
1959 Início das escolas radiofônicas em Natal (RN);
1960 Início da ação sistematizada do Governo Federal em EAD; contrato entre o MEC e a
CNBB: expansão do sistema de escolas radiofônicas aos estados nordestinos, que
faz surgir o MEB - Movimento de Educação de Base -, sistema de ensino a distância
não formal.
1961 Movimento de Educação de Base -, sistema de ensino a distância não formal – MEB,
marco da educação não formal no Brasil;
1962 Fundada em São Paulo a Ocidental School, para cursos de eletrônica;
1965 Inicio dos trabalhos da Comissão para Estudos e Planejamento da Radiodifusão
1967 Instituto Brasileiro de Administração Municipal – IBAM, Fundação Padre Landell de
Moura e Projeto Satélite Avançado de Comunicações interdisciplinares (PROJETO
SACI);
1970 Projeto Minerva;
1977 Telecurso;
1981 Centro Internacional e Estudos Regulares – CIER;
1991 Salto para o Futuro.
Fonte: MAIA E MATTAR (2007)

Sendo assim, pode- se entender um pouco da história do pro-


gresso do EAD no mundo e no Brasil, e de como esta modalidade ga-
nhou e vem ganhando força e espaço no que diz respeito ao processo de
ensino/aprendizado, e que indubitavelmente só avançará e contribuirá
para o desenvolvimento das pessoas que buscam qualificação acadêmica
e profissional e acima de tudo a consolidação da sua cidadania, visto que

60
DNA Educação

o direito à educação em todos os seus níveis é um direito básico e é justo


que todos aqueles que assim desejarem seja em que modelo for tenha
essa opção de acesso.
Na verdade, o EaD tornou-se uma alternativa viável no atendi-
mento não apenas para um público específico, ou seja, aqueles que tem
um poder aquisitivo mais baixo, vê-se muitos alunos que dispõe de alta
renda e acesso as tecnologias, e principalmente, para grupos que geogra-
ficamente estão distantes.
Não existe um modelo único e rígido de educação à distân-
cia. Pelo contrário, a riqueza de modelos e combinações
possíveis exigem que em cada caso se escrevam criativa-
mente metodologias e esquemas que resultam nas mais
apropriadas, levando em conta as necessidades, condições e
meios de cada situação particular. (ARMENGOL, apud
JUSTIFINIANI, 1994, p. 14)
Portanto, inicialmente a educação a distância foi um recurso
utilizado para superação de algumas deficiências que existiam na área
educacional, buscando a qualificação profissional e aperfeiçoamento dos
alunos na atualização de seus conhecimentos.
Na contemporaneidade, a modalidade é vista por muitos como
uma proposta de ensino alternativo competente que complementa e
oportuniza a educação em todas as suas fases para todos que por ela
optem e que pelos mais variados motivos dentre eles o econômico para
os que não tem condição ou acesso ao sistema regular de ensino presen-
cial.
A educação à distância no Brasil: Instrumento de acesso e conso-
lidação da cidadania?
Levando em consideração a questão da educação superior à dis-
tância em nosso país é importante tratar da questão da cidadania, visto
que, uma está ligada a outra e não se pode vê-las dissociadas. É muito
nítido no nosso contexto atual verificar que, principalmente, para uma
camada da sociedade que não dispõe de condições e oportunidade para
cursar uma faculdade e acender socialmente tornava-se muito difícil rea-
lizar o sonho do acesso ao nível superior, o que causava inevitávelmente

61
DNA Educação

uma barreira para que a sua cidadania fosse plena contrariando o que
garante a nossa Constituição Federal de 1988 no art. 205, expressando:
A educação, direito de todos e dever do Estado e da família,
será promovida e incentivada com a colaboração da socie-
dade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu pre-
paro para o exercício da cidadania e sua qualificação para o
trabalho.
Notadamente, a Educação a Distância no Brasil vem consoli-
dando de forma acelerada mesmo com todos os entraves e dificuldades
pelas quais vem passando desde que passou a integrar as normativas le-
gais da educação brasileira e ganha força e espaço para oportunizar a
garantia do direito expresso na CF/1988 e nas normativas existentes.
Mesmo diante de todos os percalços e preconceitos sofridos e
pelas dificuldades que passou e vem passando, a modalidade à distância,
nota-se que não é fácil quebrar paradigmas principalmente no que se re-
fere à educação tradicional a qual muitos, se não dizer a grande maioria
dos educadores da nossa sociedade de certa forma estavam acostumados
e acreditando ser a forma “certa e única” de se ensinar e aprender. De
acordo com o que está ressaltado no Decreto 5.622, de 19 de dezembro
de 2005 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB).
Art.1º.Para os fins deste Decreto, caracteriza-se a educação
a distância como modalidade educacional na qual a media-
ção didática pedagógica nos processos de ensino e aprendi-
zagem ocorre com a utilização de meios e tecnologias de in-
formação e comunicação, com estudantes e professores de-
senvolvendo atividades educativas em lugares ou tempos di-
versos (BRASIL, P.183 2010).
Segundo Dias (s.d), com a democratização da tecnologia abri-
ram-se espaços para novas oportunidades e acima de tudo aumentou e
estimulou para o exercício da cidadania em nosso país, em que todos os
interessados, dentre eles estado, sociedade civil, ONGs, dentre outros
podem usá-la conscientemente, visto que, são sujeitos de uma sociedade
organizada e que é capaz de entender a noção pura de cidadania. E para
ratificar Aguiar e Passos (s/p, s.d) diz:

62
DNA Educação

A palavra cidadania vem ganhando visibilidade dentro das


instituições escolares na contemporaneidade. Associada à
educação garante a disseminação de instrumentos básicos
para o desenvolvimento da consciência e construção da
identidade, precondição imprescindível na busca de direitos
civis, políticos e sociais. Desta relação surge à necessidade
de se definir um conceito de cidadania que tenha objetivi-
dade e significado dentro do processo educativo.
Sem dúvida, pensar na EaD nos dias atuais é visualizar o pro-
cesso de democratização do acesso à educação, principalmente quando
pensamos nos países com menores condições econômicas. Desta forma,
a modalidade à distância tem o poder de ampliar o acesso ao ensino em
todas as suas fases até porque a nossa sociedade denominada como na
era da informação e do conhecimento cobra de todos essa qualificação.
A oferta de graduações na modalidade EAD em nosso país está
em pleno crescimento, fortalecendo-se e consolidando-se, visto que, as
novas tecnologias nos ambientes educacionais de nível superior possibi-
litam uma educação mais flexível para uma época em que as pessoas vi-
vem de forma muito acelerada e o tempo disponível tem sido cada vez
mais escasso e ao contar com uma modalidade que possibilita novas for-
mas de aprendizagem as pessoas passaram a se interessar mais e voltar a
estudar e concretizar sonhos que estavam esquecidos pelos mais diversos
motivos, sendo assim, a educação mediada pelas tecnologias abriram no-
vos caminhos para este camada da nossa sociedade e principalmente para
a consolidação da cidadania. Neste ponto Dias (s/p, s.d), aponta:
O processo de desenvolvimento de tecnologias abriu espaço
para a introdução de novas abordagens no contexto educa-
cional e fomentou a utilização dessas ferramentas para al-
cançar objetivos diversos dentro das potencialidades de sua
utilização. O ensino à distância representou uma oportuni-
dade única para milhares de pessoas, com tempo e recursos
escassos, em adquirir conhecimentos e tais características fo-
ram captadas por gestores que incorporaram a idéia da edu-
cação para a cidadania ao EAD. Ainda que não seja a melhor
das alternativas devido aos inúmeros desafios postos á soci-
edade brasileira rumo á igualdade social, a promoção de
ações que visam à redução da assimetria informacional e a
ampliação do controle social tende a ganhar cada vez mais

63
DNA Educação

escopo, bem como a propiciar a tão galgada inclusão social,


via inclusão digital.
Sendo assim, nota-se a importância da educação mediada pelas
tecnologias e de como estas são necessárias para a construção de uma
sociedade cidadã. Claro que a tecnologia na educação não irá resolver
todas as questões e problemas pelo que passa o sistema educacional, mas,
sem sombra de dúvidas pode reduzir muito as desigualdades geradas pelo
sistema capitalista, principalmente porque abre novas oportunidades
para aproximar às pessoas dos espaços educacionais de nível superior
dando-lhes acesso à garantia de um direito constitucionalmente garan-
tido a todos.
Conclusão
Levando em consideração todo o contexto abordado neste tra-
balho, é nítida a importância das novas tecnologias nos ambientes aca-
dêmicos e de como isso irá impactar positivamente a vida de milhares de
pessoas, principalmente no que se refere à construção e acesso á cidada-
nia, visto que, quando se tem acesso à educação seja em que modalidade
for à formação do ser cidadão, sem dúvida será mais consistente.
Evidentemente que a tecnologia em si só não resolverá todos
os problemas pelos quais a educação vem passando e passa, mas, ajuda
muito a ampliar a cidadania e democratiza o acesso ao ensino superior,
que nesse caso, conta com a modalidade à distância para mediar este en-
sino e oportunizar principalmente para aqueles que estavam sem pers-
pectiva de cursar um curso de nível superior, adentrar em uma sala de
aula e acessar informações e transformá-las em conhecimento.
Desta forma, pensar em educação à distância significa pensar
em um modelo de ensino que tem muito a ser aproveitado, visto que,
sua forma democrática e dialógica, proporcionará acesso à educação de
qualidade aos cidadãos, ampliando as suas perspectivas e oportunidades,
diante de uma sociedade que exige formação superior.
Portanto, com a evolução e desenvolvimento das tecnologias,
o EAD, veio como ferramenta benéfica para o nosso cotidiano, mos-
trando a necessidade de novas configurações, modelos e formas de em
ensinar e aprender. Assim como a nossa sociedade é dinâmica e mutável

64
DNA Educação

a educação também passou e passa por transformações na busca por me-


lhorias para a vida dos cidadãos e fazê-los seres críticos e comprometidos
com a nossa sociedade.
Em suma, a Educação à Distância, abre uma porta de acesso
para muitos que fazem dela a sua oportunidade. Evidentemente, que esse
processo de ensino, precisa ser pensado com responsabilidade e ofertado
com qualidade para que o aprendizado seja eficaz e o resultado seja cida-
dãos formados com competência para assumir compromissos com a so-
ciedade em que está inserido através da cidadania conquistada.
Referências
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil.
Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, p. 123, 1988.
BRASIL, LEI DE DIRETRIZES E BASES DA EDUCAÇÃO NACIONAL
(LDB) – Ed 2 – Rio de Janeiro 2010.
AGUIAR, Iana Assunção de; PASSOS, Elizete. A tecnologia como caminho
para uma educação cidadã. s.d. Disponível em: http://www.cairu.br/revista/ar-
quivos/artigos/2014/Artigo%20A%20TECNOLOGIA%20COMO%20CA-
MINHO%20PARA%20UMA%20EDUCACAO%20CIDADA.pdf. Acesso
em: 10 de agosto de 2017.
CABRAL, Bruna Marques. Diálogos entre História e Educação: O ensino de
História e a diversidade cultural. 2008. Disponível em: http://www.educacaopu-
blica.rj.gov.br/biblioteca/historia/0068.html. Acesso em 28 de julho de 2017.
DIAS, Ana Gabriela Caldeira et AL. EAD como indutora do processo de cida-
dania. s.d. Disponível em: http://ueadsl.textolivre.pro.br/2012.1/pa-
pers/upload/33.pdf. Acesso em 10 de agosto de 2017.
JUSTIFINIANI, Antonio Miranda. La educacion a distancia, uma estrategia para
los paises em vias de desarollo: el modelo cubano,1994. Disponível em: http:
/www.intelecto.net/cn-ead. Acesso em 24 de julho de 2017.
LANDIM, Claudia Maria M. P. F. Educação à Distância: algumas considerações.
Rio de Janeiro, 1997.
MAIA, C.; MATTAR, João. ABC da EaD: a educação a distância hoje.
São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2007.
NUNES, Ivônio Barros. Noções de Educação a Distância. Disponível em:
http;/www.intelcto.net/ead/. Acesso em 20 de janeiro de 2011.
SILVA, Mariana Paiva Damasceno; MELO, Marlene Catarina de oliveira Lopes;
MUYLDER, Cristina Fernandes de. Educação à Distância em foco: Um estudo
sobre a produção científica brasileira. 2015. Disponível em: http://www.sci-
elo.br/pdf/ram/v16n4/1518-6776-ram-16-04-0202.pdf. Acesso em 10 de abril
de 2018.

65
DNA Educação

A PARTICIPAÇÃO DA FAMÍLIA NA GESTÃO DEMO-


CRÁTICA DA ESCOLA PÚBLICA
Luís Carlos da Silva1
RESUMO:
O conceito de gestão democrática da Escola Pública é recente. Iniciou,
no Brasil, a partir da Constituição de 1988. São 30 anos de história, ob-
jetivando construir uma escola pública onde todos os seus agentes parti-
cipem, de forma efetiva, nos espaços de decisão, fortalecendo as ações
da escola e contribuindo para que ela construa seu objetivo primeiro na
aprendizagem dos alunos e na construção da cidadania. A própria pro-
posta de uma escola democrática, serve como modelo para uma socie-
dade mais participativa, onde todos possam ter voz e vez. Vários espaços
da escola pública contribuem com essa participação como a Associação
de Pais e Mestres e o Conselho Escolar. O enfoque deste artigo será a
participação da família nesta gestão democrática da Escola Pública.
Palavras-chave: Gestão. Democrática. Escola Pública. Família
ABSTRACT:
The concept of democratic management of the Public School is recent.
It began in Brazil from the 1988 Constitution. Its 30 years of history aim
to build a public school where all its agents participate effectively in de-
cision-making spaces, strengthening the school's actions and contrib-
uting to its construction its first objective in student learning and in the
construction of citizenship. The very proposal of a democratic school
serves as a model for a more participatory society, where everyone can
have voice and time. Several spaces of the public school contribute with
this participation as the Association of Parents and Masters and the
School Council. The focus of this article will be the participation of the
family in this democratic management of Public School.
Keywords: Management. Democratic Public school. Family

1Licenciado em Letras, Pedagogia e Filosofia, Bacharel em Teologia, Especialista em Direito


Educacional, Comunicação e Cultura: abordagens teóricas e práticas, Docência do Ensino Su-
perior, Educação Inclusiva e Psicopedagogia. Professor de filosofia há 10 anos e Gestor há 7
anos.

66
DNA Educação

Introdução
A gestão democrática da escola pública está unida a todas as
outras questões políticas e sociais do país. Durante quase todo o século
XX foi um anseio de grandes pensadores e pedagogos alcançar essa de-
mocratização, mas ela foi uma construção que se fez paulatinamente,
conforme o próprio país ia construindo a sua democracia e seus meca-
nismos vivos de participação e envolvimento popular. Em alguns mo-
mentos a democracia e a participação foram mais fortes e consolidadas,
em outros momentos, perdeu-se completamente o sentido do democrá-
tico e a escola pública, foi afetada por todos estes movimentos.
No início da década de 60 por exemplo, Paulo Freire, na edu-
cação de jovens e adultos, conseguiu proporcionar um espaço de diálogo
e reflexão para os aprendizes, que participavam ativamente do processo
pedagógico, no qual estavam inseridos.
Seu método, desenvolvido na década de 1960 como estraté-
gia para a alfabetização de adultos e popularmente conhe-
cido como “Método Paulo Freire”, possui fundamentação
humanista ao vislumbrar na educação um ato criador, a me-
dida em que proporciona ao indivíduo autonomia, consci-
ência crítica e capacidade de decisão2.
Por outro lado, no período da Ditadura Militar (1964-1985)
houve a centralização do poder escolar sobre seus dirigentes, imitando
assim, o que acontecia no âmbito político. Tirando da escola a autonomia
e silenciando as vozes que se colocassem contra o Regime e contra a
forma de gestão escolar.
o amplo poder dos diretores sobre as escolas advinha da
concepção de delegação de poder institucional naquele pe-
ríodo histórico, acrescido do domínio das técnicas adminis-
trativas (bem) trabalhadas nos cursos de preparação destes
quadros dirigentes e da hierarquia e do respeito devido à
própria estrutura forte da burocracia. (SOUZA; TAVARES,
2014, p. 279)

2 PEREIRA, Lucila Conceição, Método Paulo Freire, in. Infoescola, disponível em:
https://www.infoescola.com/pedagogia/metodo-paulo-freire/acesso em: 09.jul.2018

67
DNA Educação

Somente na Constituição Brasileira de 1988, se consolidou a


gestão democrática do ensino público, literalmente escrita no artigo 206,
em seu parágrafo VI. Após mais de duas décadas de Regime Militar, a
redemocratização do país, abriu condições para que os movimentos so-
ciais e a sociedade civil se organizassem e dessem sua importante contri-
buição na elaboração da Lei Maior do Brasil, possibilitando que a Cons-
tituição abrisse caminho para que a democracia acontecesse, de fato, nos
diferentes espaços sociais e políticos. A escola pública também foi bene-
ficiada com este movimento.
No entanto, foi somente em 1996, 8 anos depois da promulga-
ção da Constituição Federal, que a Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional, consolidou, no seu artigo 3º parágrafo VIII, a gestão democrá-
tica do ensino público, trazendo em suas linhas, a definição de como
seria a gestão desta educação em todos os âmbitos.
A partir da consolidação da gestão democrática, muitas vozes
se ergueram para defender este processo e dar bases para que pudesse se
organizar nas escolas públicas de todo o país.
Esta nova forma de gestão, deu um novo dinamismo à escola
pública e possibilitou uma maior autonomia dos Sistemas Escolares.
“Um processo de gestão que construa coletivamente um projeto peda-
gógico de trabalho tem já, na sua raiz, a potência de transformação. ”
(FERREIRA, 2000, p. 113)
A gestão democrática possibilitou a efetivação da coletivização
das construções dentro do espaço pedagógico, através da união de esfor-
ços e através do diálogo e do respeito entre as partes que compõem a
Comunidade Escolar.
Esta nova forma de gerir a escola pública é uma forma concreta
de se construir uma aprendizagem que seja significativa, regionalizada,
dentro da cultura e da vida da comunidade, cumprindo seu objetivo de
formar o indivíduo para a cidadania, através do exercício da participação.
A comunidade escolar é composta por todos aqueles agentes
que constroem o espaço escolar, como seus gestores, educadores, funci-
onários, alunos, bairro e a família.
Cada agente tem o seu papel dentro da gestão democrática do
ensino público. O foco deste artigo é a família. Entender a família neste

68
DNA Educação

novo momento do país e da educação e refletir sobre seu papel na gestão


democrática do ensino público é de fundamental importância para dina-
mizar sua participação e seu envolvimento nos espaços de decisão.
Este artigo irá abordar o conceito de gestão democrática do en-
sino público, o conceito de família e sua participação nesta gestão e as
formas oficiais de participação da comunidade escolar, finalizando com
alguns exemplos concretos de participação e envolvimento. O artigo
parte de referenciais teóricos bibliográficos e eletrônicos e da participa-
ção concreta de seu autor frente a gestão da escola pública.
Conceito de gestão democrática do ensino público
Quando se fala em gestão escolar, compreendese a equipe que
compõe a organização do espaço escolar. Na maioria das vezes, depen-
dendo do tamanho da Unidade Escolar, é composta por um (a) diretor
(a), um ou mais vice-diretores (as) e um ou mais coordenador (a) ou ori-
entador (a) no âmbito pedagógico. Essa equipe tem como uma de suas
principais atribuições a coordenação dos trabalhos escolares, tanto nas
questões pedagógicas, quanto nas questões burocráticas.
Os gestores escolares, constituídos em uma equipe de ges-
tão, são os profissionais responsáveis pela organização e ori-
entação administrativa e pedagógica da escola, da qual re-
sulta a formação da cultura e ambiente escolar, que devem
ser mobilizadores e estimuladores do desenvolvimento, da
construção do conhecimento e da aprendizagem orientada
para a cidadania competente. Para tanto, cabe-lhes promo-
ver a abertura da escola e de seus profissionais para os bens
culturais da sociedade e para sua comunidade. Sobretudo de-
vem zelar pela constituição de uma cultura escolar proativa
e empreendedora capaz de assumir com autonomia a reso-
lução e o encaminhamento adequado de suas problemáticas
cotidianas, utilizando-as como circunstâncias de desenvolvi-
mento e aprendizagem profissional. (LUCK, 2009, p. 22)
Esta liderança e estas atribuições da equipe gestora, na gestão
democrática da escola pública, devem ser compartilhadas com toda a co-
munidade escolar, de forma participativa e dinâmica, envolvendo a todos
e todas nos espaços de reflexão e tomada de decisão. Portanto, a equipe
gestora deve sempre estar aberta ao diálogo e ser a primeira a fomentar

69
DNA Educação

a participação de todos os que, de uma forma ou de outra, fazem parte


do espaço escolar.
A gestão democrática do ensino público ainda é uma novidade
para muitas famílias e muitos dos aprendizes que frequentam a escola,
pois durante décadas, a escola era apenas um local de aprender conteú-
dos e técnicas voltadas para o mercado de trabalho e nunca um espaço
dinâmico de participação e envolvimento. Numa país acostumado a de-
legar o poder através das urnas, a sociedade civil se acostumou a delegar
a autoridade a uma minoria privilegiada. Contudo, com a redemocratiza-
ção do país, aos poucos, as pessoas vão tomando consciência de que, a
sociedade se constrói com a efetiva participação de todos e todas, inclu-
sive no espaço escolar.
Os objetivos sociopolíticos da ação dos educadores voltados
para as lutas pela transformação social e da ação da própria
escola de promover a apropriação do saber para a instru-
mentação científica e cultural da população, é possível não
só resistir às formas conservadoras de organização e gestão
como também adotar formas alternativas, criativas, que con-
tribuam para uma escola democrática a serviço da formação
de cidadãos críticos e participativos e da transformação das
relações sociais presentes. (LIBÂNEO, 2006, p. 328)
Portanto, conforme o autor, a escola pública, no momento em
que assume sua gestão democrática, assume também o papel de contri-
buir para uma nova sociedade e para novas relações de poder, baseadas
no diálogo constante, no envolvimento popular e na formação de cida-
dãos críticos e participativos, fortalecendo ações que beneficiem toda a
população e não apenas pequenas minorias que durante séculos, centra-
lizaram a economia, a política e o poder na sociedade brasileira.
A escola é um reflexo da sociedade. Se nos espaços sociais, os
indivíduos estão se fortalecendo em movimentos sociais, organizações
não governamentais, grupos políticos, sindicatos, grupos minoritários,
buscando uma maior participação junto aos espaços de decisão sociais e
políticas, envolvendo-se na construção de políticas públicas mais popu-
lares, o espaço pedagógico deve estar também aberto a esta participação
e deve ser um incentivador desta conquista da cidadania. Exercer a lide-
rança dentro da escola, de modo democrático e participativo, é uma

70
DNA Educação

forma concreta de realizá-la de forma efetiva, fomentando na comuni-


dade escolar, este espírito de participação e democracia.
Dentro do entendimento de uma gestão democrática e partici-
pativa, é possível pensar que:
Todos os segmentos da comunidade podem compreender
melhor o funcionamento da escola, conhecer com mais pro-
fundidade os que nela estudam e trabalham, intensificar seu
envolvimento com ela e, assim, acompanhar melhor a edu-
cação ali oferecida. (GADOTTI e ROMÃO, 1997, p. 16)
A gestão democrática do ensino formal está intrinsecamente li-
gada ao estabelecimento de mecanismos legais e institucionais, como a
Associação de Pais e Mestres e Conselho Escolar, por exemplo, e à or-
ganização de ações que possibilitem a participação social, através da for-
mação de políticas educacionais presentes em vários espaços: “no plane-
jamento; na tomada de decisões; na definição do uso de recursos e ne-
cessidades de investimento; na execução das deliberações coletivas; nos
momentos de avaliação da escola e da política educacional.” (LUCE;
MEDEIROS, 2008, p. 28)
Uma palavra de fundamental importância na compreensão da
gestão democrática do ensino público é “autonomia”. A comunidade es-
colar constrói ações que levam em conta sua realidade, sua cultura e os
anseios pedagógicos em busca de uma formação de qualidade, dentro do
contexto social na qual está inserida. Ligada ao currículo oficial mas com
independência para criar ações próprias, no âmbito curricular e nos pro-
jetos escolares, a comunidade escolar desempenha com autonomia a ges-
tão do espaço pedagógico, fortalecendo o vínculo com a realidade dialo-
gando com a sociedade, possibilitando uma educação que disponibilize
às novas gerações, os conhecimentos científicos e técnicos necessários e
o senso crítico e a participação, capazes de gerar as transformações ne-
cessárias para uma sociedade democrática.
Além da equipe gestora e demais funcionários e aprendizes que
circulam o espaço escolar, a gestão democrática, em prol da cidadania e
de uma educação articulada com a realidade social, precisa considerar e
efetivar a participação da família na escola. Durante muitos anos, ela fi-

71
DNA Educação

cava à margem das decisões, sendo apenas chamada para reuniões bi-
mestrais, onde eram passadas as menções dadas aos alunos e alguns avi-
sos gerais. Com o conceito de gestão democrática a família tem espaço
privilegiado dentro da escola, podendo participar de tudo o que acontece
dentro dela e para fora de seus muros.
O papel da família na gestão democrática da escola pública
Antes de aprofundar o papel da família na gestão democrática
da escola pública, é preciso pontuar o conceito de família, pelo entendi-
mento de que não há um único modelo de família, mas vários modelos
que convivem naturalmente no espaço escolar. A família não se limita a
um modelo tradicionalmente concebido de pai, mãe e filhos. Com o pas-
sar dos anos, houve maior clareza das diferentes formas de constituição
da família e, todas elas, são entendidas com o mesmo conceito de família,
não sendo uma melhor ou pior que a outra, ou uma mais importante do
que a outra, todas são importantes e fundamentais para a construção da
sociedade e de sua cultura, bem como, todas contribuem com o espaço
escolar, trazendo para ele as crianças, que são o sentido primeiro da es-
cola pública, independente da forma de vínculo que possui essa família.
o termo “família” é um tanto vago e pode significar: a) o
grupo composto de pais e filhos; b) uma linhagem patrili-
near; ou uma linhagem matrilinear; c) um grupo cognático,
isto é, de pessoas que descendem de um mesmo antepas-
sado, seja através de homens ou de mulheres; d) um grupo
de parentes e seus descendentes, que vivem juntos.
(MELLO, 2009, p. 326)
A escola pública não pode optar ou valorizar um modelo de
família mas deve abranger todas as famílias e convidar a todas para fazer
parte da gestão democrática. Essa diversidade de modelos familiares não
vêm, de forma alguma, diminuir o objetivo da escola pública, mas, ao
contrário, enriquecê-lo com suas especificidades e sua forma de entender
as relações sociais.
O papel da escola não é ter uma opção religiosa ou uma opção
político partidária ou um modelo de família único. A escola é o espaço
da diversidade, aberta ao diálogo e a construção de saberes carregados

72
DNA Educação

de significados e ressignificados vindos de todos os agentes que a com-


põe. Nisto está a grande riqueza do espaço pedagógico e é essa amplitude
que colabora para aprendizagens significativas e para a formação do
senso crítico, fundamental para a construção de uma sociedade mais justa
e igualitária, onde todos e todas têm seus direitos respeitados.
A perspectiva de formar uma nova geração dentro de um
projeto educacional inclusivo é fruto do exercício diário da
cooperação, da colaboração, da convivência, do reconheci-
mento e do valor das diferenças, que marcam a multiplici-
dade, a natureza mutante de todos nós. (MANTOAN, 2015,
p. 16)
Quando a família sente-se incluída no espaço escolar, ela traz
consigo, toda sua cultura, sua riqueza e sua singularidade. Várias famílias
é sinal de muita riqueza e muitas contribuições para a construção deste
espaço de saberes e sabores. A convivência não é fácil, como não é fácil
a convivência na sociedade como um todo, mas a escola pública tem um
ponto em comum: a educação das crianças e a perpetuação das tradições,
cultura e aprendizagens adquiridas por esta sociedade. Este ponto em
comum pode ser referência para o diálogo e para a partilha das diferentes
visões de mundo, fazendo com que a escola seja um espaço de respeito,
de tolerância, onde todos possam conviver e formar a próxima geração
para o senso crítico e para a transformação da sociedade.
A presença da comunidade na escola, especialmente dos
pais, tem várias implicações. Prioritariamente, os pais e ou-
tros representantes participam do conselho de escola, da as-
sociação de pais e mestres (ou organizações correlatas) para
preparar o projeto pedagógico-curricular e acompanhar e
avaliar a qualidade dos serviços prestados. (LIBÂNEO,
2001, p. 144)
As organizações citadas no excerto são uma das formas dos pais
e de toda a família participar da gestão democrática. Pode-se citar tam-
bém os grêmios estudantis, onde os próprios alunos assumem a autono-
mia de ações dentro da escola, em diálogo estreito com a equipe gestora.
Contudo, existem outras formas possíveis e outras ainda a serem pensa-
das, pois o espaço escolar é rico e dinâmico, passível de se transformar,
de se avaliar e reavaliar, criando e recriando ações em prol de seu objetivo

73
DNA Educação

primeiro que é a educação, unindo todos seus agentes envolvidos num


grande mutirão de participação.
A equipe gestora deve ser a primeira animadora dessa partici-
pação de todos e todas. Não deve esperar sentada em seu gabinete, que
os pais e demais familiares queiram participar de ações promovidas na e
pela escola mas deve ir ao encontro destes, motivando-os e sendo a pri-
meira a fomentar o diálogo e a participação democrática.
O convite para participar das organizações da Unidade Escolar
deve se estender a todos e todas e ser motivado pela gestão, mostrando
o papel dessas organizações, sua autonomia e respeitando, de fato, suas
decisões.

Mecanismos de uma gestão democrática do ensino público


Há muitas formas da família participar da gestão democrática
do ensino público. Esses diferentes meios de participação e envolvi-
mento na escola pública, possibilita à família contribuir na construção de
uma escola mais dinâmica. Existem meios que vão além da própria Uni-
dade Escolar, como o Conselho Municipal de Educação e o Conselho
do Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Bá-
sica e de Valorização dos Profissionais da Educação). No entanto, a tí-
tulo de exemplo, para mostrar a importância do papel da família na ges-
tão democrática e para citar algumas formas de participação, serão cita-
dos apenas dois dos importantes meios dentro do próprio espaço esco-
lar: O conselho Escolar e a Associação de Pais e Mestres (APM).
O Conselho Escolar, entre outros mecanismos, tem papel
decisivo na gestão democrática da escola, se for utilizado
como instrumento comprometido com a construção de uma
escola cidadã. Assim, constitui-se como um órgão colegiado
que representa a comunidade escolar e local, atuando em
sintonia com a administração da escola e definindo cami-
nhos para tomar decisões administrativas, financeiras e po-
lítico-pedagógicas condizentes com as necessidades e poten-
cialidades da escola. (GRACINDO, 2007, p. 39)
O Conselho Escolar se renova anualmente, pois está compro-
metido com aquele ano letivo e com os fatos e eventos daquele momento
específico da Unidade Escolar. Ele precisa ser formado por indivíduos

74
DNA Educação

da equipe pedagógica, como professores, gestores, administrativos e


também elementos externos, como a família, em número proporcional,
para que todos sejam respeitados e valorizados no momento das deci-
sões. O próprio Regimento Escolar daquela escola específica é que esta-
belece os critérios da formação e participação no Conselho Escolar.
Chama-se “conselho” mas não é criado apenas para aconselhar
o diretor do que deve ou não fazer no espaço escolar, mas é um meca-
nismo de tomada de decisão, de representação da comunidade escolar,
ao mesmo tempo em que deve estar aberto a ouvir os demais elementos
que compõem a escola na qual está inserido, representando a todos e
todas.
Todo início de ano, a equipe gestora faz a chamada de todos e
todas para a eleição do Conselho Escolar. Este momento deve ser feito
com muita solenidade e compromisso com a gestão democrática. Nin-
guém deve se sentir excluído. Uma das formas de excluir é manter na
ignorância. Muitas famílias não sabem qual o objetivo de um Conselho
Escolar, não sabem a força que tem esse mecanismo para decidir, avaliar
e retomar a caminhada da escola. Se todos os familiares soubessem, ha-
veria, todo início de ano, uma grande eleição, onde muitos iriam querer
participar, se comprometendo com a construção da escola onde estão
suas crianças.
O que se vê, no entanto, é o contrário. O diretor sai implorando
para que alguns participem ou, o pior, acaba captando entre os próprios
funcionários pais de alunos para compor a parcela de pais do Conselho
Escolar.
Conforme Gracindo (op.cit., 2007), o Conselho Escolar é fun-
damental para desenvolver um acompanhamento responsável, ético e
propositivo do processo educativo na escola, visando uma educação
emancipadora. Para tanto, alerta a necessidade de se estar atento a alguns
aspectos extremamente relevantes desse processo: o projeto de educação
deve ser discutido, deliberado e seguido por todos; a pluralidade deve ser
a marca do processo educativo; o Projeto Político pedagógico da escola
deve ser sinal da unidade das ações; a qualidade voltada ao social e não
ao mercado; todos são responsáveis pelo desenvolvimento da prática

75
DNA Educação

educativa; a aprendizagem se dá pela construção coletiva do conheci-


mento; a avaliação deve ser processual, considerando: o contexto social,
a gestão democrática, a ação docente, as condições físicas e pedagógicas
da escola; transparência nas ações da escola; espaços de participação nas
decisões devem ser sempre ampliados e a solidariedade e a inclusão social
devem ser princípios fundamentais da escola.
Essas atribuições do Conselho Escolar devem ser sempre
muito claras para as famílias, para motivarem, por si só, o interesse e a
participação efetiva nessa instituição. Elas vão percebendo que a escola
pública é um espaço onde terão voz e vez e onde poderão contribuir
efetivamente para a educação de suas crianças. Mais do que receber, po-
derão trazer e partilhar suas ideias, seus conhecimentos e suas propostas
para uma escola pública de qualidade, em todas as suas nuances, desde
as questões financeiras, até as questões mais pontuais do pedagógico.
Ao retirar a centralidade da gestão escolar do diretor, a Consti-
tuição de 1988 não quis transferir este papel para o Conselho Escolar.
Ao contrário, quis que a escola pública fosse essencialmente democrática
e participativa. Portanto, o Conselho Escolar não detém o poder, mas
representa todas as famílias e toda a Comunidade Escolar e constrói com
estas, uma escola para todos e todas, embasada nos princípios de parti-
cipação e autonomia.
O eixo da formação para a ação supõe duas opções bastante
claras no âmbito das práticas escolares. A primeira refere-se
à opção pela qualidade, seja na sala de aula, no gabinete da
direção, na cozinha, no pátio da escola, enfim, nas relações
estabelecidas por um sem número de decisões que, todos os
dias, se impõem de forma substantiva e permanente. A se-
gunda inscreve-se no campo das relações escola-comuni-
dade. Sem transformar as atuais concepções a respeito do
papel que cumprem os familiares na formação escolar dos
seus filhos, na relação com professores, coordenadores pe-
dagógicos e dirigentes escolares, os agentes do intramuros
da escola não poderão avançar na direção de uma escola que
seja uma ampla comunidade de aprendizagem, na qual todos
os envolvidos ensinam, aprendem e decidem seus destinos.
(LUIZ, 2010, p. 67).

76
DNA Educação

Muitas escolas públicas agregam ao Conselho Escolar a partici-


pação dos próprios alunos, despertando nestes o interesse pelos espaços
de decisão e propiciando um aprendizado substancial para a participação,
por toda a vida, de outros espaços de construção de práticas democráti-
cas e libertadoras.
Outro mecanismo de participação e gestão democrática na es-
cola pública é a Associação de Pais e Mestres (APM).
A APM, por sua vez, é um órgão de caráter jurídico, sem
fins lucrativos, com participação de educadores e responsá-
veis pelos estudantes. Sua atribuição é auxiliar no gerencia-
mento dos recursos financeiros, o que inclui verbas públicas
(como o Programa Dinheiro Direto na Escola – PDDE),
parcerias, convênios (como o Programa Mais Educação, do
Ministério da Educação – MEC) e doações. Ela deve deba-
ter – envolvendo o Conselho e outros colegiados existentes
– e mostrar à direção a visão da comunidade sobre cada ati-
vidade proposta, além de contribuir para mobilizar recursos
humanos e materiais e estabelecer parcerias, entre outras ati-
vidades para melhorar a qualidade do ensino.3
A Associação de Pais e Mestres tem estatuto próprio, possui
CNPJ quer facilita o envio de doações e o manuseio de recursos finan-
ceiros. Ela tem em seu estatuto as diretrizes de sua fundação e dos mem-
bros que devem fazer parte de sua diretoria. Nestas diretrizes obriga-se
a participação de pais e responsáveis pelas crianças. Isto dá maior credi-
bilidade a este mecanismo de ação da escola pública e possibilita maiores
e melhores parcerias.
Existem várias experiências de escolas públicas, onde os fami-
liares assumiram as diretorias da Associação de Pais e Mestres e fizeram
um excelente trabalho de arrecadação financeira e de gestão escolar,
comprometendo-se com a aprendizagem das crianças.
Em algumas situações, o Poder Público não permite aos gesto-
res escolares, cargos ligados ao Governo, através de concurso público ou

3 SOUZA, Joelma, A diferença entre Conselho Escolar e APM, 2015, disponível em:
https://gestaoescolar.org.br/conteudo/1110/a-diferenca-entre-conselho-escolar-e-apm acesso
em: 9.jul.2018.

77
DNA Educação

designação, de se manifestarem publicamente sobre questões ligadas à


Unidade Escola. Portanto, os pais têm uma autonomia muito maior de
se expressar e de dialogar com diferentes grupos sobre a escola, tomando
o cuidado, segundo o Estatuto da Instituição, de não direcionar a Asso-
ciação para políticas partidárias.
A Associação de Pais e Mestres possui responsabilidade tam-
bém pela cultura e lazer da Unidade Escolar. Essas dimensões são im-
portantíssimas para otimizar o vínculo com a Comunidade escolar,
dando possibilidade para a realização de eventos que podem contribuir
com o financeiro, com o pedagógico e com o relacionamento com toda
a comunidade do entorno.
Os repasses financeiros do Governo Federal ou Estadual, e em
alguns casos, também Municipal, entram na escola pública através da
APM, que possui CNPJ e conta bancária. Com isso, torna-se transpa-
rente as entradas financeiras e os gastos, que devem constar em ata de
reunião da Instituição e de seu plano de trabalho anual, dificultando qual-
quer gasto desnecessário ou que não possua um real interesse da comu-
nidade escolar.
os objetivos estatutários da APM apregoam que cabe à as-
sociação mobilizar os recursos humanos, materiais e finan-
ceiros da comunidade para auxiliar a escola, provendo con-
dições que permitam a melhoria do ensino e a conservação
e manutenção do prédio, dos equipamentos e das instala-
ções.4
A participação da família na Associação de Pais e Mestres pos-
sibilita maior credibilidade e transparência a Instituição, além de maior
autonomia, melhores condições de organização financeira e de realização
de eventos de âmbito cultural e pedagógico que una a comunidade esco-
lar e, o mais importante, melhor qualidade na aprendizagem, focando a
melhor parte dos recursos financeiros e humanos neste objetivo que é o
principal da escola pública.

4PAIDÉIA, A atuação da APM: avanços, desafios e perspectivas, 2004, disponível em: http://
www2.fe.usp.br/~apm-ea/wwwroot/pages/paideia/paideia4, acesso em: 11.jul.2018.

78
DNA Educação

Diferentes formas de participação da família na escola pública


O Conselho Escolar e a Associação de Pais e Mestres são for-
mas Institucionalizadas de participação da família na gestão democrática
do ensino público. Fora estas duas, existem muitas outras maneiras da
família se fazer presente na administração do espaço escolar, contribu-
indo de forma efetiva, com a qualidade da educação.
O momento de planejamento das atividades pedagógicas, por
exemplo, não contava com a presença das famílias, sendo atribuição pró-
pria de educadores e gestores. Contudo, nos últimos anos, com o avanço
da democratização da escola pública, os familiares participam também
deste momento e contribuem de forma efetiva para questões práticas do
cotidiano escolar que vão se desenvolvendo durante o ano. Como ajudar
no planejamento, também se fazem presente na avaliação de final de ano,
ajudando a pensar os erros e acertos, em vista do próximo ano letivo e
pensando numa escola de maior qualidade a cada ano que passa.
As reuniões de pais e responsáveis, realizada normalmente a
cada dois meses, no final dos bimestres, onde os pais, por direito, rece-
bem informações sobre o pedagógico apresentado a seus filhos, é tam-
bém um momento de diálogo, participação e envolvimento. A família
não deve ser passiva diante do pedagógico, mas questionar, opinar e par-
ticipar integralmente da formação de seus filhos.
Como a escola pública possui autonomia e está sob a Lei da
gestão democrática, não cabe neste artigo todos os exemplos e todas as
possibilidades de participação da família no espaço pedagógico. O que
foi apresentado é apenas uma reflexão e uma contribuição diante de tudo
o que pode ser pensado, criativamente e dinamicamente, dentro de cada
cultura e cada realidade, para que a família participe, efetivamente da ges-
tão escolar.
Considerações Finais
Ao ler este artigo, muitos poderão dizer que é utopia e que a
realidade é bem diferente. Poderão dizer ainda que nem os pais, quanto
menos a família, estão interessadas na gestão escolar, delegando toda a
responsabilidade da educação de seus filhos à escola. Não estariam erra-

79
DNA Educação

dos em fazer esta crítica. Isto na verdade, é o espelho da sociedade bra-


sileira. As pessoas viveram muito tempo sobre a Ditadura Militar e Go-
vernos autoritários, fechados ao diálogo e desinteressados na participa-
ção popular. Isto reflete na forma de ser da equipe gestora e reflete tam-
bém na apatia das famílias. Contudo, há um movimento forte no Brasil
por envolvimento e participação. Esta nova realidade também entra nos
muros da escola. Aos poucos as pessoas vão se chegando e, timidamente,
mostrando interesse em participar.
Já existe a Lei que exige uma gestão democrática do ensino pú-
blico, já existem pessoas interessadas em participar. Compete a escola
dar o primeiro passo e ir agregando as pessoas e possibilitando que sejam
motivadas e sintam que, de fato, participam de uma gestão democrática.
Todos têm a ganhar com a participação e a presença efetiva da família
no espaço escolar e, principalmente, o pedagógico, que é a essência da
escola pública.
Este artigo, de longe, quer finalizar o assunto, mas contribuir
com tantos outros trabalhos nesta linha e fazer a cada leitor e leitora re-
fletir sobre a importância da família estar envolvida na gestão democrá-
tica da escola pública e buscar meios para que esta prática se efetive, para
o bem da escola, do pedagógico, da família e de toda a sociedade.

80
DNA Educação

Referências
BRASIL, Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei 9394/96,
Brasília: MEC, 1996.
BRASIL. Constituição Federal (1988), artigo 206.
FERREIRA, Naura S. Carapeto. Gestão democrática da educação: atuais
tendências, novos desafios. São Paulo: Cortez, 2000.
GADOTTI, Moacir & ROMÂO, José Eustáquio (Org.) Autonomia da
Escola: princípios e propostas. São Paulo: Cortez, 1997.
GRACINDO, Regina Vinhaes, Gestão Democrática nos Sistemas e Na
Escola, Brasília: Universidade de Brasília, 2007.
LIBÂNEO, J.C. Educação Escolar: políticas, estrutura e organização
Coleção docência em formação. Série saberes pedagógicos. 3. ed. São
Paulo: Cortez, 2006.
______________ Organização e gestão: teoria e pratica, São Paulo: Al-
ternativa. 2001.
LUCE, Maria Beatriz; MEDEIROS, Isabel Letícia Pedroso de. Gestão
Escolar Democrática: concepções e vivências. Porto Alegre: Editora da
UFRGS, 2006.
LÜCK, Heloísa. Dimensões de gestão escolar e suas competências. Cu-
ritiba: Editora Positivo, 2009.
LUIZ, Maria Cecília, Conselho Escolar: algumas concepções e propostas
de ação, São Paulo: Xamã, 2010.
MANTOAN, Maria Teresa Eglér, Inclusão Escolar: O que é? Por quê?
Como fazer?, São Paulo: Summus, 2015.
MELLO, Luiz Gonzaga. Antropologia Cultural: Iniciação, teoria e te-
mas. 17 ed. Petrópolis, Vozes, 2009.
SOUZA, Ângelo Ricardo; TAVARES, Taís Moura, A gestão educacional
no Brasil: os legados da ditadura, RBPAE - v. 30, n. 2, p. 269-285,
mai./ago. 2014, disponível em: http://www.seer.ufrgs.br/rbpae/arti-
cle/viewFile/53674/33089, acesso em: 8.jul.2018.

81
DNA Educação

“NOSSOS VOOS COTIDIANOS”:


O TEATRO E A PEDAGOGIA DO OPRIMIDO COM
CRIANÇAS DO MUNICÍPIO DE JACAREZINHO

Luiz Matheus Macedo Périco1


Everton Ribeiro2

RESUMO:
A Pedagogia do Oprimido de Paulo Freire assim como o Teatro do Opri-
mido de Augusto Boal lutam contra as desigualdades e contra as opres-
sões por meio da arte e da práxis pedagógica. O presente trabalho apre-
senta um relato de experiência realizado no bairro Aeroporto em Jacare-
zinho (PR) com crianças de 10 a 13 anos. A experiência resultou diversas
reflexões e novas leituras, por meio da troca de saberes entre educandos
e educador, houve a construção e ressignificação da realidade de todos
envolvidos nesse projeto.
Palavras-chave: Pedagogia do Oprimido; Teatro do Oprimido; Práxis
Pedagógica.
ABSTRACT:
The Pedagogy of the Oppressed by Paulo Freire as well as the Theater
of the Oppressed by Augusto Boal struggle against inequalities and
against oppression through art and pedagogical praxis. The present work
presents an experience report in the Aeroporto neighborhood in Jaca-
rezinho (PR) with children aged 10 to 13 years. The experience resulted
in several reflections and new readings, through the exchange of
knowledge between learners and educator; there was the construction
and resignification of the reality of all involved in this project.
Keywords: Pedagogy of the Oppressed; Theater of the Oppressed; Ped-
agogical Praxis.

1 Luiz Matheus Macedo Périco é Técnico em Informática (IFPR) e Licenciando em Pedagogia


(UENP).
2 Everton Ribeiro é Doutorando em Educação (UFPR), Mestre em Educação (UNICENTRO),

Bacharel e Licenciado em Artes Cênicas (UNESPAR) e Licenciado em Pedagogia (UNINTER).

82
DNA Educação

Introdução
O Teatro e a Educação são inerentes à vida humana há muito
tempo, sempre revelando indícios sobre os contextos históricos vividos.
Para além disso, revela também movimentos de resistência para com a
cultura dominante. Estudar e praticar teatro são em essência compreen-
der o que se pode dizer e entender além daquilo que já está posto, pois
o teatro diz ao mesmo tempo com palavras, ações, pelo jogo e até mesmo
pela própria organização do espaço, e a Educação nos permite a reflexão
de nossas subjetividades e de nossa realidade.
A presente pesquisa busca entender uma área de conhecimento
que é o Teatro-Educação através de uma revisão bibliográfica, baseada
no método de Paulo Freire, Augusto Boal e Viola Spolin, o que implica
reflexões acerca do papel do Teatro-Educação, dos Jogos Teatrais e dos
Temas-Geradores. Far-se-á essa reflexão por meio de um relato de ex-
periências vivenciadas em um projeto de extensão do Instituto Federal
do Paraná Campus Jacarezinho nos anos de 2014 e 2015 com crianças e
adolescentes (de 10 a 13 anos) do bairro Aeroporto – de extrema vulne-
rabilidade social – no Centro da Juventude José Richa, instituição res-
ponsável por ministrar oficinas alternativas em períodos em que aquele
público se encontra fora de sua rotina escolar.
Nesta perspectiva o presente artigo reflete sobre a importância
do teatro para a práxis pedagógica e os elementos que a envolve como
formação docente e contexto político/social. Para Freire (1996, p.12)
não se aprende sozinho, não se ensina sozinho, se aprende e se ensina
em conjunto, o Teatro enquanto área de pesquisa e prática dentro da
Educação se torna de suma importância para que exista esta troca, e re-
vela uma complexidade de saberes relevantes para o processo en-
sino/aprendizagem no que se diz respeito à formação integral, nos as-
pectos físicos, cognitivos e crítico-sociais.
Metodologia: Por meio de quais instumentos e quais leituras se dá
o trabalho?
A presente pesquisa traz um recorte do projeto de extensão do
IFPR – Instituto Federal do Paraná campus Jacarezinho que foi execu-

83
DNA Educação

tado nos anos de 2014 e de 2015. No ano de 2014 fizemos eu, o profes-
sor orientador Everton Ribeiro e mais três alunos, encontros semanais
para as diversas leituras e laboratórios experimentais que foram eficien-
tes, pois elas oportunizaram aos bolsistas e voluntários do projeto uma
primeira relação com a área da docência, porém foi um desafio já que
este contato com essa área de extensão e com a Pedagogia do Teatro era
muito nova para nós.
Em 2015, iniciamos nossa aplicação na comunidade. As ativi-
dades no mês de julho foram de estruturação e reorganização do trabalho
que foi aplicado do mês agosto até o mês de dezembro, com uma fre-
quência de duas vezes por semana, no período da manhã das nove às
onze horas, na Sala de Dança do Centro da Juventude José Richa.
As aulas eram planejadas de acordo com o processo de criação
e levava em consideração o que foi proposto pelos próprios educandos.
As aulas foram organizadas a partir de jogos de improvisação, e também
de frequentes diálogos com todos envolvidos no projeto. O mês de de-
zembro, por decisão dos alunos que foi unânime em apresentar alguma
experimentação cênica para a comunidade de onde moram, neste sentido
o mês inteiro foi de criação de cenas e ensaios.
O planejamento da aula se constituía da seguinte maneira: ini-
ciava com alongamentos e exercícios de respiração, fazíamos alguma ati-
vidade de concentração, posteriormente aplicaríamos algum jogo drama-
tico ou teatral relacionado ao tema da aula e finalizávamos com uma roda
de conversa, nessa roda de conversa podíamos tirar as dúvidas da aula,
expor sugestões e novas ideias e/ou mesmo falar como foi o nosso dia e
a nossa semana.
Durantes as aulas, foram utilizados tais recursos: folha sulfite,
caneta, lápis, caderno de anotação, tinta guache, objetos diversificados,
caixa de som e pendrive. Para a execução do cenário utilizamos caixas
pintadas, roupas elaboradas por todos nós com TNT, um varal pregado
com letras pintadas em folha sulfite e tampas de panela para fazer alguns
efeitos sonoros de nossa montagem.

84
DNA Educação

A ética que me envolvo para escrever este trabalho e para apli-


car as atividades com os educandos é aquela que se contrapõem às rela-
ções de opressão a classe mais baixa, ao machismo, ao racismo e a ho-
mofobia. Como afirma Freire (1996, p.9):
Falo, pelo contrário, da ética universal do ser humano. Da
ética que condena o cinismo do discurso citado acima, que
condena a exploração da força de trabalho do ser humano,
que condena acusar por ouvir dizer, afirmar que alguém fa-
lou A sabendo que foi dito B, falsear a verdade, iludir o in-
cauto, golpear o fraco e indefeso, soterrar o sonho e a uto-
pia, prometer sabendo que não cumprirá a promessa, teste-
munhar mentirosamente, falar mal dos outros pelo gosto de
falar mal. A ética de que falo é a que se sabe traída e negada
nos comportamentos grosseiramente imorais como na per-
versão hipócrita da pureza em puritanismo. A ética de que
falo é a que se sabe afrontada na manifestação discriminató-
ria de raça, de gênero, de classe. É por esta ética inseparável
da prática educativa, não importa se trabalhamos com crian-
ças, jovens ou com adultos, que devemos lutar.
A coleta de dados neste sentido é baseada no Sujeito Implicado
no Conhecimento Cientifico, que já entende que não existe essa neutra-
lidade, o pesquisador busca vivenciar e sentir junto com seu objeto de
pesquisa, não colocando-se em uma posição de distanciamento, mas sim
de parte do grupo, por ser Educação e Teatro, por ser a Pedagogia do
Teatro, não há como existir esse distanciamento, a ideia não é fazer uma
coleta de dados, mas sim experimentar novas possibilidades pedagógicas,
de práticas e de conhecimentos , para posteriormente realizar uma analise
daquilo foi vivenciada com um filtro do que é relevante discutir, tanto
em aspectos que foram positivos para a prática, quanto os negativos para
que estes assim não ocorram novamente.
Ainda que nos dias atuais se reconheça amplamente a im-
possibilidade da separação sujeito-objeto nas atividades de
produção científica, é inegável que o significado disso difere
bastante de um campo para outro, de uma grande área de
saber para outra, manifestando-se diferentemente nos dis-
tintos produtos resultantes do esforço de produção de co-
nhecimento. (NARVAI, 2013, p.646)

85
DNA Educação

Sob esse aspecto, faço uma pesquisa exploratória e implicada,


na qual eu faço intervenções e analiso estas. Fazer este tipo de pesquisa
exige e envolve uma contínua reflexão sobre a práxis pedagógica, Paulo
Freire aborda que esta reflexão é elemento fundamental para todo o tipo
de ação docente (1996, p.26).
O jogo teatral e as possibilidades de trocas espontâneas
Existem diversos conceitos que buscam a definição do que é o
jogo e a sua contribuição para o desenvolvimento, principalmente, da
estrutura psicossocial do indivíduo. Os jogos são atividades propostas
para que as pessoas possam experimentar novas sensações através da
imaginação, do corpo, do exercício a concentração e ao pensamento ve-
loz.
O jogo é uma forma natural de grupo que propicia o envol-
vimento e a liberdade pessoal necessários para a experiência.
Os jogos desenvolvem as técnicas e as habilidades necessá-
rias para o jogo em si, através do próprio ato de jogar. As
habilidades são desenvolvidas no próprio momento em que
a pessoa está jogando, divertindo-se ao máximo e recebendo
toda a estimulação que o jogo tem para oferecer – é este o
exato momento em que ela está verdadeiramente aberta para
recebê-las. (SPOLIN, 1979, p. 4)
Portanto, existem os jogos que foram propostos por teorias
educativas, o que aborda tanto acerca da ludicidade e existe uma gama
muito grande de pesquisa nessa área, mas existem também aqueles jogos
que foram propostos por teatrólogos. Desde a escrita de Constantin Sta-
nislavski e seus jogos para a formação de um ator que seja realista, até os
jogos propostos Augusto Boal que tem um foco de libertar-se da opres-
são e da alienação corporal.
A pesquisadora referência nessa relação entre jogo e teatro é a
Viola Spolin, que arquivou um fichário com diversos jogos, cada um com
um nível e um tipo de aplicação diferente, em cada ficha possui um plano
de jogo, definindo todo o aspecto pedagógico que envolve o jogo (RA-
BELLÓ, 2011, p.23).

86
DNA Educação

Outro principio fundamental do jogo é, proporcionar entendi-


mento da realidade de modo espontâneo, ao propor atividades, experi-
mentações, exercícios e atividades que requerem criatividade e resposta
instantânea, de maneira não direta e não consciente, a criança expressa a
si mesma e a sua realidade. Para além de proporcionar momentos de
troca e diversão entre educando e educador, educando e educando, fa-
zendo-os interagir de modo saudável por meio dos jogos escolhidos.
Rabelló (2011, p.9) nos apresenta a profundidade do jogo:
A conquista gradativa da autonomia por parte dos jovens é
um relato pungente das potencialidades educacionais do
jogo teatral como exercício radicalmente democrático, O
agir comunicativo não permanece no plano verbal, mas
atinge camadas mais profundas de percepção, mobiliza a
corporeidade, a expressividade e a ocupação do espaço,
dando oportunidade para a articulação da voz e do verbo
dos participantes.
Neste sentido o jogo atinge o patamar da espontaneidade que
o dialogo em vários momentos não atinge, e o diálogo atinge o patamar
de reflexão que o jogo outrora não atinge. Desse modo um completa o
outro. A frequente presença entre o fazer teatral e o refletir teatral. As
relações entre o jogo e a pesquisa se constituem, portanto, na dinâmica
de ressignificação de uma realidade.
A educação dialógica e os temas-geradores: o pássaro e a criança
Dois elementos primordiais que usei como principio das aulas
e da minha postura política enquanto educador foi a Educação Dialógica
e os Temas-Geradores, ambos elementos que aprendi com a leitura de A
Pedagogia do Oprimido de Paulo Freire.
A Educação dialógica nos coloca em uma postura de igual para
igual com os educandos, onde ambos aprendem e ensinam, sob esta pers-
pectiva cabe ao educador, planejar e propiciar espaços de aprendizagem.
Momentos em que é possível estabelecer essa troca de conhecimentos e
reflexões. Como explicita Freire (1987, p.46): “Ao fundar-se no amor, na
humildade, na fé nos homens, o diálogo se faz uma relação horizontal,
em que a confiança de um pólo no outro é consequência óbvia”.

87
DNA Educação

A proposta de construção dos conteúdos a serem trabalhados


se dá de forma dialógica e coletiva, assim como nesta proposta o texto
teatral não partiu de um texto já prescrito, ou de um tema pré-determi-
nado, mas sim por meio de conversas não estruturadas. Freire (1987,
p.47):
Para o educador-educando, dialógica, problematizador, o
conteúdo programático da educação não é uma doação ou
uma imposição – um conjunto de informes a ser deposita-
dos nos educandos, mas a revolução organizada, sistemati-
zada e acrescentada ao povo, daqueles elementos que este
lhe entrou de forma desestruturada.
Isto significa, que o educador, deve observar o contexto, captar
as frases, ações, movimentações espontâneas e transforma-lo em maté-
ria, em debate, em reflexão, pensamento crítico e conhecimento cientí-
fico. Deve partir dos anseios de onde trabalha para pensá-lo certo.
O outro elemento que nos guia com esse trabalho são os Tema-
Geradores, momentos pelos quais o educador-educando a partir de um
olhar crítico para a realidade de seus educandos, faz uma pesquisa rigo-
rosa e escolhe as temáticas das quais eles vão partir. Freire (1987, p.55)
completa: “Este é um esforço que cabe realizar, não apenas na metodo-
logia de investigação temática que advogamos, mas também, na educação
problematizadora que defendemos. O esforço de propor aos indivíduos
dimensões significativas se sua realidade, cuja a análise crítica lhes possi-
bilite reconhecer a interação de suas partes”.
Como estes temas influenciaram em minha práxis educativa e
no processo de criação do texto teatral? Uma das propostas que fazia era
perguntar de muitas coisas em relação a realidade deles, perguntava sobre
questões simples e cotidianas, mas que poderiam me trazer informações
simbólicas. Perguntas como “o que fez essa semana? ”, “o que gosta de fazer?
”, “você tem um sonho? ”, “vocês têm medo de que? ”.
E partindo desses diálogos descobri que no bairro eles possuem
um costume de matar pombas para se alimentar, achei esse hábito dis-
tante da cultura dos outros bairros do município, mas para muitas crian-
ças que moram ali isto é uma questão cultural. Foi partindo do questio-
namento de uma das crianças que descobrimos nosso tema-gerador, a

88
DNA Educação

indagação se dava no sentido de “mas e se você fosse o pássaro? ”, sob esta


ótica, o efeito estético e a representação que o pássaro poderia ter para
aquelas crianças e aquela comunidade foi um tema-gerador interessante
a se pensar e a se discutir.
Como falávamos da questão da liberdade, da idade, da infância,
escolhemos duas palavras que uniriam as cenas que íamos criando: “pás-
saro” e “criança”, ambas com sete letras, e ambas com um simbólico que
mistura fragilidade, inocência e liberdade. Partindo desse pressuposto
criamos várias cenas que como um todo formou a peça Nossos Voos
Cotidianos.
O teatro-educação sobre as desigualdades e as opressões
As sociedades desde seus primórdios se dividem em grupos, e
assim os seres humanos exercem de algum modo e em alguma instância
poder uns sobre os outros. Essas relações implicam em uma série de
fatores específicos para cada contexto, momento histórico e espaço ge-
ográfico. Fatores esses que envolvem relações globais ou locais. No atual
cenário não seria diferente, como explicar a presença das desigualdades
sociais no Brasil? E como se posicionar? É preciso se posicionar? Para
Freire, se colocar politicamente é um dever ético (1994, p.17) “E aí está
a grande tarefa humanista e histórica dos oprimidos libertar-se a si e aos
opressores”.
No Brasil existem diversas explicações sobre as questões que
influenciam nessa negação de direitos. Um dos fatores indissociáveis a
isso é o capitalismo. Como comenta (CARVALHO, 2002, p.10): “Os
direitos sociais permitem às sociedades politicamente organizadas redu-
zir os excessos de desigualdade produzidos pelo capitalismo e garantir
um mínimo de bem-estar para todos”.
Entende-se, portanto, que marginalização é o processo de ex-
clusão social consequente do modo de vida capitalista, foi a partir da
urbanização e da busca por condições mínimas de moradia e trabalho
que foram sendo constituídas as comunidades que ainda são privadas de
seus direitos básicos. Isso significa que o processo de marginalização é
também um processo histórico.

89
DNA Educação

Histórico em detrimento não do que passou, mas do que per-


maneceu. O que a marginalização dos dias atuais tem relação com alguns
momentos históricos do país? Qual é o papel da Educação perante em
relação a isso? A pessoa que vive no Brasil consegue se localizar en-
quanto sujeito histórico? Ou ele nega a própria história? Paulo Freire
(1997, p.9) afirma: “objetivar o mundo é historicizá-lo, humaniza-lo. En-
tão, o mundo da consciência não é criação, mas sim, elaboração humana.
Esse mundo não se constitui na contemplação, mas no trabalho”.
Freire (1996, p.9) entende que a Educação é um meio de inter-
vir nessas relações desiguais, mas não qualquer Educação, ele aborda
uma Pedagogia baseada na relação dialógica, onde educador e educando
trocam conhecimentos, a relação não se estabelece de um para o outro,
mas sim de um com o outro: “Ninguém educa ninguém, ninguém educa
a si mesmo, os homens se educam entre si, mediatizados pelo mundo”.
Boal tem uma perspectiva com pontos semelhantes ao método
educacional de Freire, só que em relação ao Teatro, o autor (1980, p.58)
explicita:
... Ensino é transitividade, democracia, diálogo, o T.O. (tea-
tro do oprimido) cria o diálogo, busca a transitividade, inter-
roga o espectador e dele se espera uma resposta. O teatro
do oprimido procura o desejo de criar espaço no qual se
possa criar aprender; ensinar...transformar.
Foi partindo deste ponto de semelhança em que baseio minha
experiência no Centro da Juventude localizado no Bairro Aeroporto, em
um método de Teatro e de Educação, mas principalmente de Teatro-
Educação que fizesse intervenções sobre uma determinada realidade pri-
vada de seus direitos. Em um local que existe potência de fala e de cria-
tividade, mas em que vezes são abafadas pelo próprio contexto de desi-
gualdades e opressões que existe no Brasil.
Jardim paraíso: O lugar onde não habita a cidade
Uma das justificativas pelas quais o bairro Aeroporto e mais
especificamente o Jardim Paraíso, foram escolhidos para as oficinas de
Teatro-Educação é por ser um bairro periférico, geograficamente e soci-
almente. Para se chegar até o bairro é preciso atravessar uma pequena
rodovia que afasta o bairro da cidade. O chão não era asfaltado ainda no

90
DNA Educação

ano em que as oficinas foram aplicadas, e a própria criação do órgão


Centro da Juventude José Richa é baseada nos índices de vulnerabilidade
social.
Uma política organizada pelo Conselho Estadual dos Direitos
das Crianças e do Adolescente, como apresenta na seção virtual do sitie
oficial do conselho:
O novo espaço para garotos e garotas de 12 a 18 anos da
Comunidade Jardim Paraíso no bairro Aeroporto, vai ofere-
cer atividades esportivas, além de ações para o desenvolvi-
mento pessoal e profissional. “Nesta comunidade vivem
cerca de 300 famílias em situação de risco e vulnerabilidade
social, por isso, o centro trará nova oportunidade a essas fa-
mílias e a seus filhos”, explica o chefe do escritório regional
da Secretaria da Família em Jacarezinho, Antonio Carlos de
Almeida.
No processo deliberativo de N°11/2010 – Cedca/PR encon-
trase os objetivos pelos quais esse órgão foi instalado:
O Programa Atitude (aprovado pela Deliberação nº
019/2007 – CEDCA – PR) da Secretaria de Estado da Cri-
ança e Juventude do Paraná realizado em parceria com as
Prefeituras Municipais busca concretizar direitos e garantias
assegurados pelo Estatuto da Criança e do Adolescente e
focaliza suas ações em territórios com alta incidência de fa-
tores de risco à violência relativa à criança e ao adolescente,
e que as ações previstas se baseiam em eixos como: o forta-
lecimento das famílias, abordagens educativas e terapêuticas
aos usuários de drogas, redução da evasão escolar, criação
de oportunidades de esporte, cultura e lazer, cursos profis-
sionalizantes e a criação de redes de proteção para crianças
e adolescentes.
Essas desigualdades não são somente explanadas em documen-
tos e conselhos, como também na própria práxis no local, em uma das
primeiras oficinas, uma das crianças que participa do projeto me per-
gunta: “professor, você mora na cidade? ”, nessa pergunta encontra-se um pen-
samento embutido de que eles não se sentem pertencidos ao município,
a cidade é algo que está afastado da realidade deles, é algo que está do
outro lado, não somente geograficamente, como as políticas que envol-
vem o município.

91
DNA Educação

Durante as aulas encontram-se diálogos como “comi um pedaço


de pizza hoje”, comida esta que relatada pela criança encontrou no “lixo”.
Ou também quando uma das crianças era violenta com as outras e a
questionei “e violência resolve alguma coisa, gente? ” e o menino me responde
“resolve! meu irmão tava aprontando muito e meu pai desceu o cacete nele, e ele me-
lhorou.”. São por meio de diálogos como esse que percebemos, para além
do estigma social e das documentações, discursos de pessoas que foram
privadas de algum direito. De pessoas que vivem na própria experiência
a desigualdade.
O nome da comunidade dentro do Aeroporto chama-se Jardim
Paraíso, mas em vários momentos em que eu comentava para colegas de
sala, eles denominavam “a favela? ”, isto mesmo, o lugar aonde as políticas
públicas chegam de forma precária. Jardim Paraíso, o lugar onde a cidade
não habita ou habita precariamente.
O protagonismo e a autonomia da criança em um mundo confuso
Paulo Freire possui uma obra que se chama Pedagogia da Au-
tonomia, esta em que ele explicita saberes pedagógicos necessários para
uma práxis que desenvolva a autonomia do educador e do educando.
Partindo dessa troca, ambos se sentem preparados para romper com os
estigmas da opressão.
O pensador comenta que valorizar a capacidade crítica de seus
educandos é indispensável (1996, p. 13) “O educador democrático não
pode negar-se o dever de, na sua prática docente, reforçar a capacidade
crítica do educando, sua curiosidade, sua insubmissão. Uma de suas ta-
refas primordiais é trabalhar com os educandos a rigorosidade metódica
com que devem se “aproximar” dos objetos cognoscíveis”.
A ausência do reconhecimento de suas palavras e de suas opi-
niões foi uma indagação dos próprios alunos durante o andamento das
oficinas, todo o final de cada aula cada aula, eu abria um espaço para eles
dizerem o que quiser sobre a semana e a vida deles. E nesse momento
era possível encontrar relatos como “tô com raiva do professor x lá da escola
por que ele não deixou eu falar”, “parece que minha tia não entende o que eu falo”,

92
DNA Educação

e mais algumas explanações sobre a relação autoritária entre adulto e cri-


ança, que muitas vezes refletia e permeava em uma relação autoritária
entre criança e criança.
Na tentativa de tornar as relações mais iguais, construímos de
forma coletivo duas cenas, a primeira que se baseia em um dialogo entre
duas meninas que desabafam seus sentimentos em relação ao não ser
escutado pelo mundo adulto. Elas discorrem por meio de uma conversa
entre amigas o quanto chateia elas a não valorização e o não entendi-
mento de seus desejos, de frases que escutam como “quem você pensa que é
para falar alguma coisa? ”, “olha o seu tamanho, menina! ”, palavras estas já
escutadas realmente pelas próprias educandas.
A outra cena que criamos chama-se Ordens Confusas, e ela é
baseada em um aquecimento que fazíamos, em que as crianças respon-
diam ordens por meio do corpo como: corre, senta, bate a mão no chão,
para, ande em câmera lenta. A cena se baseava em quando dois adultos
passam a ordenar movimentos diferentes, e iniciam um diálogo de intriga
e conflito, o que faz as crianças ficarem confusas, o que na cena elas
expressam com um grito de chega em três segundos e se jogam deitadas
no chão.
Esta cena das Ordens Confusas gerou um relato de uma edu-
canda, que a executou em um momento real de intriga na sua casa, en-
quanto sua tia discutia com sua mãe, sem saber expressar seu incomodo
em relação a isso, ela interviu na intriga fazendo exatamente o que ensai-
ávamos nas oficinas, gritou chega durante três segundos e se jogou no
chão. De acordo com a menina a mãe e a tia pararam de brigar para tentar
entender o porquê a menina estava fazendo aquela encenação “estra-
nha”.
Para Rabelló (2011, p.14) o jogo juntamente com a construção
de um texto por meio dessas experimentações cênicas nos traz essa pos-
sibilidade semiótica de transição e ressignificação da realidade e do en-
tendimento sobre determinado sentimento de forma mais eficiente do
que o trabalho tradicional com textos pré-determinados:
De outro lado, estudos na área conhecida como teatro-edu-
cação reacenderam a preocupação com a semiótica teatral: o
gesto, a expressão facial, a movimentação, a maneira de falar

93
DNA Educação

e de se relacionar em cena diferenciados. A experiência in-


terativa, compartilhada no jogo teatral, em confronto com
os símbolos da realidade, ganhou uma nuance diferente com
a incorporação do texto dramático clássico.
O que se entende por meio da ação desta educanda, é que uma
situação a incomodava, sentimento parecido com o que havíamos discu-
tido durante as aulas, e em especificamente esta cena, como ela não havia
encontrado meio de intervir pelo diálogo, ela repetiu o que sentia assim
como na cena. Fez um processo ressignificação de seu sentimento.
Os meninos e o mundo: A dança e o Rap
O que os educandos consumiam no sentido cultural sempre foi
de grande interesse meu enquanto educador-social, pois seria da fonte
deles pelas quais eu pesquisaria, é partindo da realidade deles que devo
iniciar minha pesquisa.
Havia um grupo de cinco meninos que embora não se expres-
sem muito por meio do dialogo, eles se expressavam por meio da movi-
mentação corporal e que demonstravam bastante interesse pela dança.
Partindo desse pressuposto, pensei juntamente com eles em possibilida-
des de cenas que possuíssem danças e partituras corporais vinculadas
com alguma questão social.
Em uma determinada aula perguntei qual estilo de música eles
gostavam, e uma boa parte do grupo disse que se interessava por rap,
estilo musical que relatava de forma bem clara a vida na periferia por
meio de rimas. Logo lembrei de Emicida, pois ele possui algumas com-
posições que trazem essas desigualdades que a criança sofre em uma lin-
guagem acessível para as crianças.
A música que começamos a ensaiar foi “Aos de Uma Criança”,
trilha sonora do filme O Menino e o Mundo, tanto a música quanto o
filme discorriam dos conflitos que uma pequena criança encararia ao vi-
ver em um mundo tão grande e tão confuso quanto este. Um mundo
dominado por máquinas e desigualdades sociais. Conflitos esses que dis-
correm sobre a fome, a solidão, a saudade e as histórias de vida das cri-
anças no Brasil. Elaboramos um varal escrito “C-R-I-A-N-Ç-A”, cada

94
DNA Educação

letra pendurada sob uma folha neste varal, conforme eles dançavam, pin-
tava em outras folhas com tina guache a palavra “P-Á-S-S-A-R-O”, que
substituiria essa insegurança pela metáfora do voo.
A ideia metafórica era que mesmo que crianças, eles são como
pássaros, que aos poucos estão aprendendo a voar.
A “princesa” e a “favelada”: Os estigmas da representação femi-
nina no teatro
A maneira pela qual as pessoas enxergam o teatro dificultou,
por exemplo, na própria procura pelas oficinas. Muitos possuem uma
concepção burguesa do teatro, sendo aquilo se passa na televisão, aquilo
feito para quem quer ser ator, feito para quem quer representar histórias
românticas, baseado naquilo que as mídias tecnológicas expressam.
Boal (1980, p.99) explica este fenômeno que o teatro e os fil-
mes, posterior aos movimentos cinematográficos de Hollywood, possu-
íram um caráter de representar certos modos de vida baseado nos valores
capitalistas: o de competitividade, o de possuir pertences materiais, o que
apresenta com protagonismo o rico e o branco.
Esses estigmas ficaram mais evidentes em algumas falas como
“profe, legal esses jogos, mas quando é que eu vou me vestir de princesa?”. Outro
indício consequente desse movimento teatral de estigmas capitalistas foi
em alguns momentos quando eu convidava algumas crianças que esta-
vam ali por perto para participar das oficinas e elas diziam: “isso não é pra
mim não”. O que subentende que eles não se sentem representados pelos
teatros e filmes expostos pela cultura industrial. O teatro é coisa de rico.
É coisa de branco. O teatro sempre esteve lá, não aqui.
É importante também evidenciar os movimentos de resistência,
uma menina que participava das oficinas se apresentava em alguns mo-
mentos com conhecimento crítico e com vontade de expressar seu coti-
diano e suas dores por meio do teatro. Mas muitos de seus colegas a
pronunciavam com essas palavras: “bruxa”, “favelada”, “fedorenta”. A
menina branca que queria ser princesa e a menina negra que queria contar
sua história. Dois paradigmas construídos, desconstruídos e construídos
num movimento dialógico e dinâmico sob a concepção de duas crianças
que tem desejo em fazer teatro.

95
DNA Educação

Dentro desses diálogos há uma implicação também nas ques-


tões de gênero, a visão da sociedade e da menina sob ela mesma, quem
é esta menina vista perante a sociedade, como ela quer ser vista e como
ela foi ensinada que quer ser vista? Como ela quer ser vista e como ela é?
E como aborda a célebre frase de Simone Beauvoiur em O Segundo Sexo
(190, p.9): “Ninguém nasce mulher: torna-se mulher. Nenhum destino
biológico, psíquico, econômico define a forma que a fêmea humana as-
sume no seio da sociedade; é o conjunto da civilização que elabora esse
produto intermediário entre o macho e o castrado que qualificam de fe-
minino”.
Portanto a filosofa nos aborda a questão do gênero como sendo
uma construção social baseada nas relações econômicas, histórias, sociais
e políticas. A idealização da “princesa” em distanciamento com o estigma
da “favelada” nos mostra o quanto se pode perceber e presenciar essas
relações por meio da educação, do teatro e do diálogo.
As diferenças dentro do espaço educativo é nítida, nas próprias
aulas de teatro nota-se a “panelinha” dos meninos que estão a todo mo-
mento a competir com a “panelinha” das meninas. E a todo o momento
com ofensas e brincadeiras agressivas. Em um dos jogos de integração e
treinamento da memória, onde cada um falaria o “eu fui para a lua” e
continuaria a frase dizendo todos os elementos ditos anteriormente e um
novo, foi possível relatar um momento de expressão dessa relação por
um menino de onze anos que disse “eu fui para a lua e levei um lanche para
comer todas essas meninas”. O que nos apresenta essa espécie de brincadeira?
Que desde a infância meninos são educados e influenciados a exercer
poder sobre o sexo feminino.
A intervenção socioeducativa em relação a essa situação, além
dos diálogos, foi por meio da construção da cena A Menina e O Pássaro,
texto de Rubem Alves, alegoria esta que explicita que a beleza do pássaro
consiste em sua liberdade. A menina que sofria essas violências foi a que
atuou o pássaro, para que de modo direto e inconsciente ela entendesse
que sua liberdade é o que a tornava bela. Para que não tivesse sua autoe-
stima rebaixada por padrões, por modos de vida e pela própria pobreza.

96
DNA Educação

Nossos voos cotidianos: Tecendo o processo de ensino-aprendiza-


gem (considerações finais)
A última cena se deu com todos os educandos cantando o re-
frão da música Passarinhos do Emicida, momento este em que eles ex-
pressam que somente a união entre eles pode criar engajamento, força e
luta por uma vida mais digna e menos privada dos seus direitos, do acesso
à um ensino de qualidade, da sua ocupação em espaços públicos.
Assim nós formamos a peça Nossos Voos Cotidianos, onde to-
das as cenas se interligavam com o tema Pássaro e com o tema Criança,
todas as cenas expressavam nossas angustias, nossos conflitos e subjeti-
vidades. Nossas reflexões e conversas durante as aulas.
Entende-se que o Teatro-Educação além das diversas caracte-
rísticas que potencializam o ser humano, assim como a organização do
pensamento, habilidade, corporeidade e comunicação, é também uma
oportunidade de repensar a própria existência, de se localizar no mundo.
Este projeto de extensão nos fez entender o quanto precisamos
falar sobre o que vivemos de forma engajada e estética, de forma artística
e o quanto a arte nos apresenta para gente mesmo situações que até então
estavam naturalizadas ou conformadas.
A arte nos permite enxergar os conflitos da própria existência e
também os conflitos que as desigualdades nos provoca. A ausência de
acesso aos direitos básicos, a autoestima da pessoa marginalizada preju-
dicada são questões para todos se pensar. O Teatro-Educação é um meio
em que podemos provocar: “o que eu quero dizer ao mundo? ”, “como
dizer o que sinto ao mundo? ”.

97
DNA Educação

Referências
ALVES, Rubem, A menina e o Pássaro Encantado / Rubem Alves; ilus-
tração Bruna Pellegrina. – 1. ed. – Americana, SP: Adonis, 2017.
BOAL, Augusto. Teatro do Oprimido e outras poéticas políticas. Rio de
Janeiro: Civilização Brasileira, 1980.
BEAUVOIR, Simone de. O Segundo Sexo. Rio de Janeiro, Nova Fron-
teira, [1949] 1980.
CARVALHO, José Murilo de. 2005 (2001). Cidadania no Brasil – o
longo caminho. 7ª ed. Rio de Janeiro :Civilização Brasileira.
EMICIDA. Aos Olhos de Uma Criança, in O Menino e o Mundo. Dir.:
Alê Abreu, animação, Brasil, 80’, 2014.
________. Passarinhos. Sobre Crianças, Quadris, Pesadelos e Lições de Casa.
São Paulo: Laboratório Fantasma. 2015.
Freire, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática edu-
cativa / Paulo Freire. – São Paulo: Paz e Terra, 1996. – (Coleção Leitura)
________, Pedagogia do Oprimido, 17ª edição. ed. Rio de Janeiro, Paz
e Terra, 1987.
NARVAL, Paulo Capel. O sujeito implicado e a produção de conheci-
mento científico. São Paulo, SP: USP, 20113.
PARANÁ, Secretária da Família e Desenvolvimento Social. Conselho
Estadual do Direito da Criança e do Adolescente. Governo vai entregar
em Jacarezinho 19.º Centro da Juventude. Curitiba, 2013. Disponível em
<http://www.cedca.pr.gov.br/2013/04/132/Governo-vai-entregar-
em-Jacarezinho-19o-Centro-da-Juventude.html> Acesso em: 10 jun,
2018.
_______, Secretária da Família e Desenvolvimento Social. Conselho Es-
tadual do Direito da Criança e do Adolescente. Deliberação N°11 de 22
de Outubro de 2010. Disponivel em < http://www.cedca.pr.gov.br/ar-
quivos/File/deliberacao112010_atitude.pdf>. Acesso em: 10 jun. 2018.
RABÊLLO, Roberto Sanches. Teatro-educação: uma experiência com
jovens cegos / Roberto Sanches Rabêllo. - Salvador : EDUFBA, 2011.
SPOLIN, Viola. Improvisação para o teatro. Tradução de Ingrid Dor-
mien Koudela e Eduardo José de Almeida Amos. São Paulo: Perspectiva,
1979.

98
DNA Educação

MOTIVAÇÃO PARA APRENDIZAGEM COM BENE-


FICIÁRIOS DO PROGRAMA BOLSA FAMÍLIA (PBF)
EM UMA UNIDADE DE ENSINO DO MUNICÍPIO
DE CARUTAPERA-MA
Magno Fernando A. Nazaré1
RESUMO:
Este artigo empreende análise de experiência durante a Oficina II denominada
“Construindo sonhos”, visando perceber como as atividades foram desenvolvi-
das junto às crianças beneficiárias do Programa Bolsa Família, identificando as
contribuições para sua motivação durante o processo ensino e aprendizagem, e
se possibilitou nas crianças a construção de novos saberes. Apresenta-se a expe-
riência na oficina de extensão que possibilitou identificar seus modos de pensar,
sentir e agir durante aulas na disciplina de Matemática para então empreender
análise sobre a mesma a partir de alguns estudiosos no sentido de entender edu-
cação, motivação, aprendizagem e pobreza.
Palavras-chave: Oficina de Extensão. Educação. Motivação. Programa Bolsa
Família.

ABSTRACT:
This article undertakes an analysis of experience during Workshop II called
"Building dreams", aiming to understand how the activities were developed with
the beneficiary children of the Bolsa Família Program, identifying the contribu-
tions to their motivation during the teaching and learning process, and the con-
struction of new knowledge. We present the experience in the extension work-
shop that made it possible to identify their ways of thinking, feeling and acting
during classes in the Mathematics discipline, and then to undertake an analysis
about them from some scholars in the sense of understanding education, moti-
vation, learning and poverty.
Keywords: Extension Workshop. Education. Motivation. Family Grant Pro-
gram.

1 Licenciado em Pedagogia-(FAEPI) e Ciência com Habilitação em Matemática-(UEMA), Espe-


cialista em Educação, Pobreza e Desigualdade Social-(UFMA), Especialista em Filosofia da
Educação-(FAEME) e Mestre em Ciência da Educação-( UAA).

99
DNA Educação

Introdução
A motivação é fator fundamental da aprendizagem. Sem moti-
vação não há aprendizagem. Pode acorrer aprendizagem sem professor,
sem livros, sem escola e sem uma porção de outros recursos. Mas mesmo
que existam todos esses recursos favoráveis, se não houver motivação
não haverá aprendizagem.
Entretanto, apesar de sua importância para a aprendizagem, à
motivação nem sempre recebe a devida atenção do professor. É muito
mais fácil providenciar um manual, transmitir a matéria, a fim de que
estudem de forma independente e criativa, é muito mais difícil. Mas,
nesse caso, os resultados serão muito gratificantes para professores e alu-
nos, pois ao final do processo, todos se sentirão realizados (PILETTI,
1997, p.63).
Embora saibamos da relevância da educação para o desenvol-
vimento do ser humano, o difícil é fazer com que essas crianças enten-
dam isso, e de fato é um grande desafio. É notável em estudos que as
crianças estão chegando às escolas cada vez mais desmotivadas com os
estudos, o que gera a repetência e muitas vezes a evasão escolar. (BIAN-
CHI, 2011. p.7).
Como presenciamos atualmente no município de Carutapera
temos 1609 crianças e adolescentes de 06 a 14 anos em situação de ex-
trema pobreza, de acordo com o Ministério do Desenvolvimento Social
e Combate à Fome (MDS, 2010), onde mais de 50% dos extremamente
pobres do município são crianças e adolescentes que se encontram no
ensino fundamental nos anos iniciais e segundo Censo Escolar de 2010,
apresentamos um número de matrícula de 3012 alunos no ensino regular
dos anos inicias. Isso fez com que surgisse a preocupação de trabalhar
os casos de desmotivação e repetência por parte dos beneficiários do
programa bolsa família, visto que hoje temos um número menor de alu-
nos matriculados nessa modalidade, correspondendo a 2548 (Censo Es-
colar, 2015), se comparados ao MDS de 2010 temos um número expres-
sivo de crianças e adolescentes que vivem nessa condicionalidade.
Sendo assim fica evidente que essas crianças e adolescentes tem
dificuldade de socializar-se e incluir nas atividades no âmbito da sala de

100
DNA Educação

aula e no meio social. Em razão disso, faz-se necessário para quais alter-
nativas aplicarem com essas crianças e adolescentes para que os mesmos
permaneçam motivados a escola.
As oficinas de extensão “Construindo Sonhos” da especializa-
ção em educação, pobreza e desigualdade social, desenvolvida no perí-
odo de março a outubro de 2016, a qual se apresentou como proposta
de motivar as crianças dessa modalidade de ensino no contexto educaci-
onal, desenvolvendo atividades pedagógicas durante as oficinas.
Assim fez com que surgisse a temática desta pesquisa intitulada
em: Motivação para aprendizagem com beneficiários do Programa
Bolsa Família (PBF) em uma unidade de ensino do município de
Carutapera-MA como forma de estimular o interesse pelas atividades
educacionais nos mais variados contextos da educação, despertando para
o prazer de aprender a aprender, ampliando assim a sua capacidade cog-
nitiva como também, atitudinais sendo capaz de pensar e repensar sua
realidade.
Pretende-se discutir nesta pesquisa situações ocorridas no am-
biente escolar, tendo como problemática: Tendo sido desenvolvido a
ação “Construindo Sonhos”, de que maneira as crianças se sentiram mo-
tivadas para a aprendizagem?
Para apresentação e análise dos dados optou-se pela abordagem
indutiva. Destarte, o esse trabalho está dividido em três partes além dessa
introdução. Primeiramente apresentamos a experiência durante a oficina
de extensão com destaque para as ações de motivação desenvolvidas na
escola comparando com nosso fazer no cotidiano da sala de aula; e num
segundo momento analisamos essa experiência a partir de alguns autores
e por fim são apresentadas as considerações finais.
A motivação com beneficiários do PBF na condicionalidade da
educação depende do benefício, mas também do professor que deve fa-
zer com que os alunos e alunas sintam-se motivados a participarem das
aulas. Espera-se que este trabalho pode contribuir com futuros estudos
no sentido de despertar o interesse pela temática proposta em questão
tendo a motivação com beneficiários do PBF na condicionalidade da
educação um instrumento para combater a reprovação, a evasão escolar.

101
DNA Educação

Motivação, programa bolsa família e pobreza


Ao se falar em motivação e aprendizagem no âmbito educacio-
nal, não podemos deixar de abordar a pobreza, pois é de grande impor-
tância nessa pesquisa para que se compreenda o eixo central da motiva-
ção com beneficiários do programa bolsa família.
O Programa Bolsa Família, criado pela medida provisória no.
132 de 20 de outubro de 2003, transformada na Lei n. 10.836 de 09 de
janeiro de 2004 e regulamentado pelo Decreto n. 5.209 de 17 de setem-
bro de 2004 é o principal Programa de Transferência de Renda do Go-
verno federal. Constitui-se num Programa estratégico no âmbito do
Fome Zero, orientando-se pelos seguintes objetivos: combater a fome, a
pobreza e as desigualdades por meio da transferência de um benefício
financeiro associado à garantia do acesso aos direitos sociais básicos –
saúde, educação, assistência social e segurança alimentar; promover a in-
clusão social, contribuindo para a emancipação das famílias beneficiárias,
construindo meios e condições para que elas possam sair da situação de
vulnerabilidade em que se encontram”. (BRASIL. MDS, 2016).
A instituição do Bolsa Família decorreu da necessidade de
unificação dos Programas de Transferência de Renda no
Brasil conforme diagnóstico sobre os programas sociais em
desenvolvimento, elaborado durante a transição do Go-
verno Fernando Henrique Cardoso para o Governo de Luiz
Inácio Lula da Silva, destacando concorrência e sobreposi-
ção de programas, objetivos e público alvo; desperdício de
recursos por falta de uma coordenação geral e dispersão dos
programas em diversos ministérios; falta de planejamento e
mobilidade do pessoal executor, além de alocações orça-
mentárias insuficientes, com não atendimento do público
alvo conforme os critérios de elegibilidade determinados
(OZANIRA apud BRASIL, 2002).
Como percebe-se na visão da autora a bolsa família surge de
uma necessidade a apartir de um diagnóstico sobre o programa que es-
tava sendo desenvolvido no país, ocorrido durante a transição de go-
verno dos presidentes Fernando Henrique Cardoso e o governo de Luis
Inácio Lula da Silva, sendo o último tendo uma forte influencia e desper-
tando para uma visão de organização dos recursos adquirido para esses

102
DNA Educação

fins e assim garantir ao público alvo a garantia de adquirir uma renda


conforme lei vigente.
No Brasil, as crianças, adolescentes e jovens beneficiários (as)
do Programa Bolsa Família que chegam às escolas públicas com vivên-
cias de pobreza e extrema pobreza poderão ter um percurso escolar até
exitoso e saírem da escola sem nunca terem ouvido falar da pobreza, sem
ter recebido explicações, conhecimentos que os ajudem a entender suas
vivências e os processos históricos da produção de sua condição, ou seja,
por que são condenados a essa situação. Na maioria das escolas, os pro-
fessores e gestores já devem ter percebido que muitos alunos vivem na
pobreza ou na pobreza extrema, visto que a extensa quantidade de dados
gerados pelo Programa Bolsa Família nos permite saber a quantidade de
alunos e alunas menores de 17 anos que, por serem de famílias cuja renda
per capita é menor que o valor da linha de pobreza, participa do PBF.
Os municípios maranhenses na sua totalidade são pobres, sua
principal fonte de receita é constituída pelo Fundo de Participação Mu-
nicipal – FPM. Segundo Silva e Silva (2006, p. 38) o FPM associado a
transferências de renda oriundas das aposentadorias rurais e de Progra-
mas como O PBF, compõe um montante que representa quase toda a
renda que circula em muitos municípios.
Estudos e pesquisas referentes do perfil socioeconômico do
Maranhão mostram um quadro social marcado por desigualdades, ex-
pressas em baixos padrões no que se refere às condições de vida da mai-
oria da população do Estado. Segundo a pesquisa de Lima et al (2002,
p.14) o Maranhão se configura como um Estado marcado por contradi-
ções, dentre as quais as autoras destacam o fato de ser possuidor de um
amplo e significativo patrimônio cultural, arquitetônico, histórico e am-
biental e ser classificado como um Estado detentor dos piores indicado-
res sociais.
Com base nas informações atualizada último em 2015, pelo Ins-
tituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE o Maranhão possui
uma área de 331.935,507 km², uma população estimada em 6.569.683
habitantes, dividida em 217 municípios, distribuídos em 05 mesorregiões
e 21 microrregiões. Dentre os estados da região Nordeste foi aquele onde
se registrou o maior crescimento populacional na última década, 16,51%.

103
DNA Educação

Apesar de registrar a quarta maior população da região, atrás apenas dos


estados da Bahia, Pernambuco e Ceará a densidade demográfica do Ma-
ranhão ainda é considerada baixa, 19,78 habitantes por km².
Sendo o décimo sexto na lista de estados brasileiros por densi-
dade demográfica. O mesmo tem um Índice de Desenvolvimento Hu-
mano igual a 0,683, comparável ao do Brasil em 1980 e superior apenas
ao de Alagoas na lista dos estados brasileiros por IDH. O estado possui
a segunda pior expectativa de vida do Brasil, também superior apenas à
de Alagoas.
Com todo esse questionamento faz refletir que os coletivos de
docentes-educadores (as) que recebem esses milhões de educandos (as)
pobres estão se perguntando como incorporar, nos currículos, nas áreas
do conhecimento, no material didático, elementos que ajudem não ape-
nas os (as) alunos (as) pobres, mas todos (as) a entenderem uma realidade
tão persistente em nossa sociedade, nas cidades e nos campos, tal como
é a pobreza? Essa realidade impõe a necessidade de uma reflexão sobre
a pobreza no âmbito escolar, ou seja, ela deve ser incorporada aos currí-
culos. Um caminho para articular pobreza e currículo pode começar por
identificar que experiências, que práticas acontecem nas escolas que pro-
curam incorporar as vivências e a história da pobreza nos currículos, se-
jam de Educação Básica – da educação infantil ao ensino médio e a EJA
–, seja nos currículos dos cursos de licenciatura.
A ideia é procurar compreender o currículo na prática, ou seja,
se professores-educadores (as) tratam desse assunto e como incorporam
a pobreza nos currículos, nos temas de estudo e no material didático.
A pesquisa
Para o procedimento metodológico utilizou-se de uma aborda-
gem indutiva, primeiramente realizou-se pesquisa bibliográfica sobre os
temas Motivação na escola, Aprendizagem, PBF entre outros através de
livros, dissertações, artigos e meios eletrônicos.
Em seguida aplicação das oficinas “Construindo Sonhos” do
curso de especialização, educação e desigualdade social em uma unidade
de ensino do município de Carutapera-MA.

104
DNA Educação

A escolha dessa temática se deu em função de ser um tema per-


tinente a realidade das crianças e adolescentes, onde esses alunos são be-
neficiários do PBF e repetentes, são filhos e filhas de pais que vivem da
agricultura e pesca artesanal, onde as crianças exercem em consequência
disso algumas tarefas em casa relacionada à atividade de ajudar nas des-
pesas do dia a dia.
O estudo caracterizou-se como uma pesquisa indutiva de forma
experimental e comparativa da motivação da aprendizagem relacionado
ao beneficiário do programa bolsa família (PBF), articulando as oficinas:
“Construindo Sonhos” e as aulas diárias na unidade de ensino perten-
cente à rede de ensino de Carutapera-MA. Realizada em dois momentos
de aplicação sendo no primeiro no dia 06 de julho de 2016 e no segundo
momento no mês de outubro tendo como amostragem nesta pesquisa
21 alunos (as) nesta condicionalidade de pobreza que participaram de
forma voluntária na faixa etária entre 09 a 14 anos de idade que compõe
a turma do quarto ano, neste estabelecimento de ensino. Para a coleta de
dados foi mediante à técnica de observação participante, quando os da-
dos são obtidos no contexto natural com um certo controle interno.
Com essa técnica foi possível explorar a realidade. As informações cole-
tadas foram relatadas e posteriormente analisadas conforme o desenvol-
vimento da ação com o projeto “construindo sonhos” com o propósito
de coletar informações referentes ao tema proposto neste artigo.
Trajetória da especialização e as oficinas: “Construindo sonhos”
A atividade que aqui se apresenta insere-se no contexto das
ações do curso de Especialização em Educação, Pobreza e Desigualdade
Social da Universidade Federal do Maranhão.
A experiência da oficina da Especialização em educação, po-
breza e desigualdade social a Iniciativa Nacional Educação, Pobreza e
Desigualdade Social parte da constatação da persistente existência da po-
breza no país, que afeta crianças, adolescentes, jovens e adultos. Ela re-
conhece que a pobreza não deixa de existir no momento em que esses
sujeitos entram na escola; ao contrário, os efeitos de tal fenômeno social
manifestam-se de maneira contundente nos espaços de educação.

105
DNA Educação

Essa Iniciativa trata das relações entre educação, pobreza e de-


sigualdade social e visa promover reflexões e discussões sobre as vivên-
cias em circunstâncias de pobreza e extrema pobreza, bem como em re-
lações sociais e políticas injustas. Confrontar essas vivências com as vi-
sões predominantes nas políticas educacionais, na gestão da educação e
no contexto escolar da educação básica é um dos principais desafios. O
objetivo é promover a práxis em torno de princípios político-ético-eman-
cipatórios assentados no direito à vida, à igualdade e à diversidade.
A formação continuada – no âmbito da Iniciativa Nacional
Educação, Pobreza e Desigualdade Social – deverá estar associada a de-
bates e reflexões a respeito da formação inicial, sobretudo nos cursos de
Licenciaturas, principalmente a partir da relação entre essa Iniciativa e
Programas implementados pelo MEC (PIBID, PARFOR, Universidade
Aberta do Brasil – UAB –, dentre outros) ou pelas próprias Instituições
Federais de Ensino Superior – IFES. Para além da dimensão “formação
continuada”, expressa neste Curso de Especialização, a Iniciativa Nacio-
nal Educação, Pobreza e Desigualdade Social promoverá pesquisas sobre
essa temática e divulgação dos conhecimentos produzidos.
O curso está organizado em cinco módulos, onde os cursistas
acessam conteúdos específicos sobre a temática Educação, Pobreza e
Desigualdade Social, assistem vídeos e realizam algumas atividades.
Contudo além do aporte teórico o curso também possibilita ati-
vidades de reflexão-ação-reflexão, voltadas para o conhecimento da rea-
lidade das crianças beneficiarias do PBF sob a condicionalidade de Edu-
cação e estimulo de ações que modifique as condições sociais e educaci-
onais dessas crianças.
As atividades de extensão pretendem articular teoria com os
contextos sociais emprobecidos, e seu desenvolvimento envolvem os
alunos e alunas cursistas do curso de especialização em educação, po-
breza e desigualdade social, onde alunos de graduação de universidade
pública e privada do estado puderam desenvolver atividades de pesquisa
evolvidas com praticas pedagógicas alem de ter a oportunidade de apre-
ender como as crianças pensam, sentem e agem.
Dessa forma, as ações de extensão tiveram como foco a temá-
ticas sonhos e educação financeira incluindo conteúdos de inovação e

106
DNA Educação

negócios sociais, além de trabalhar também a afetividade e a motivação


em crianças e adolescentes [...]. (CEEPS, p.11).
Para realizar as oficinas tomamos como premissa a necessi-
dade de desenvolver estratégias que possam viabilizar ações
de enfrentamento à pobreza, fortalecendo a produção de ri-
queza material e espiritual das futuras gerações. Um dos ob-
jetivos foi estimular a capacidade dos cursistas e alunos de
graduação na identificação de possibilidades de desenvolvi-
mento pessoal e profissional que envolvessem ações empre-
endedoras, inovadoras e perspectivas de geração de lucro
em atividades materiais e imateriais, que estivessem impacto
positivo sobre os modos de vida de toda comunidade.
(CEEPS, p. 11)
Assim, foram realizadas as oficinas I, II e III que tiveram como
objetivos, respectivamente, aproximar os cursitas da realidade das crian-
ças e adolescentes pobres nas escolas publicas do Maranhão, procurando
identificar seus modos de sonhar, sentir e agir. Já a oficina II o intuito
foi despertar os sonhos das crianças e adolescentes para acreditar no seu
potencial e através da educação, planejar sua vida estudantil e profissio-
nal. E por fim a oficina III pretendeu dar oportunidade para esse público
compreender seu papel social para com o próximo e com o meio ambi-
ente, além do seu lugar a produção de riqueza2.
Assim, na Oficina II intitulada “Construindo sonhos” desen-
volvidos em uma unidade de ensino do município de Carutapera-MA no
período de março a outubro de 2016 com a seguinte temática: “Constru-
indo Sonhos” que tinha como objetivo contribuir para o fortalecimento
de ações que contribuam para a melhoria dos modos de vida e dos pro-
cessos pedagógicos no trabalho com crianças e adolescentes de 06 a 16
anos.
Participaram das atividades de oficina crianças de 9 a 11 anos
sendo 8 do sexo feminino e 13 do sexo masculino, todas cursando o 4º
Ano do Ensino Fundamental que estudam na unidade de ensino e per-
tencentes ao município, onde a maioria vivem na extrema pobreza e são

2Informações retiradas do Projeto Político Pedagógico do curso de Especialização Educação,


Pobreza e Desigualdade Social

107
DNA Educação

beneficiárias do “Programa Bolsa Família” na condicionalidade de edu-


cação, ou seja, os responsáveis por essas crianças têm o compromisso
matricular e manter a frequência e aproveitamento dos seus filhos e filhas
na escola. O participante do PBF precisa cumprir essa condicionalidade
para continuar a receber o beneficio, assim crianças e adolescentes pre-
cisam ser matriculados e apresentar frequência na escola de 85% e 75%
respectivamente.
Durante a oficina foram desenvolvidas tais atividades como: em
primeiro momento foram pensando em que apresentar para que chamas-
se a atenção daquelas crianças, visto que a Motivação é uma palavra que
muitas vezes se usa para tentar explicar ou compreender como aconte-
cem as ações ou cada ação. Buscam-se respostas possíveis para esclarecer
os motivos de determinadas condutas. Todavia, as causas que podem
determinar uma ação não são apenas motivacionais. Os comportamentos
de uma pessoa podem ser esclarecidos ou entendidos também por deter-
minantes sociais, cognitivos, afetivos, além dos motivacionais
(SCHWARTZ, 2014).
Assim foi pensando em algo mais lúdico e dinâmico com o sen-
tido de repensar o que pensam e agem cada criança e adolescente do
estabelecimento de ensino pertencente à secretaria de educação desse
município a respeito dos seus sonhos.
Fazendo assim compreender que temos muito valor no mundo
e o valor do dinheiro nunca pode ser maior do que o nosso. Por isso,
temos que usar o dinheiro com inteligência para que ele nos beneficie e
traga coisas boas para nossa comunidade. Como o propósito de motivar
os alunos foram desenvolvidas 3 atividades lúdicas (ROLETA, FA-
ZENDA E BALCÃO) com o propósito de trabalhar nas crianças e ado-
lescentes o valor do dinheiro e assim compreender como elas se sentem
motivadas através das oficinas “Construindo sonhos” e como se mani-
festaram durante as oficinas.

108
DNA Educação

Momentos de aprendizagem dos alunos em uma aula nor-


mal e execução da oficina com a roleta dos valores.

Figura 1: momento de execução da oficina (roleta)

Fonte: próprio autor, 2016

Figura 2: aula normal

Fonte: próprio autor, 2016.

Como verifica-se na figura 1 os alunos se encontram atento e


cheios de entusiasmos a participarem das dinâmica e atividades realizadas
durante a ação da oficina realizando sonhos, bem como todos apresen-
tam características de animo e autoestima para participarem com a qual
se demonstrou a importância das mesmas como documentos e fontes de

109
DNA Educação

informações para entender como se processa a motivação da aprendiza-


gem em crianças em condicionalidade de extrema pobreza, capazes de
auxiliarem os educadores e demais interessados na compreensão da mo-
tivação de permanecerem em sala de aula mesmo devido várias repetên-
cias em anos anteriores.
Almeida (2001, p. 16) considerava “que todas as crianças deve-
riam estudar de forma atrativa, sugerindo como alternativa a forma do
jogo”, relata também, que na prática dos jogos os povos egípcios, roma-
nos e maias, ensinavam valores, conhecimentos, normas e padrões de
vida com a experiência dos adultos, aos mais jovens. No entanto como
observamos na figura 2 as crianças em uma aula normal, onde apresen-
tam fisionomia de algo repetitivo e cansativo, fazendo assim com que
perca a autoestima e a vontade de sonhar e continuar na escola. Para
Macedo (2005, p. 16) o brincar é o mais importante e deve ser ressaltado
no lugar da violência, repetição e da repressão.
Quanto às reflexões feitas durante a aplicação e realização das
oficinas realizadas podemos identificar que cada criança agiu e pensou
de acordo com a sua necessidade e de forma bastante diversificada
quanto o que leva eles permanecerem na escola de forma ativa, no pri-
meiro momento os alunos tiveram uma surpresa, onde de forma livre de
ter a oportunidade de falar espontaneamente sobre seus sonhos e pers-
pectivas de vida, algo que nunca haviam presenciado, e pensar em outros
recursos que poderiam fazer parte da sua rotina. Na sua imaginação, co-
locaram sonhos como ter uma família bem estruturada, para alguns até
mesmo ter um pai seria um sonho a serem realizados, outros como ter
um computador e meios digitais. Imaginam máquinas fantásticas, eleva-
dores modernos e muitos outros instrumentos. Para a maioria dos alunos
isso faz com que eles continuem estudando, pois a ausência de algo como
citado anteriormente faz com que permaneçam na escola.
Isso faz reconhecer que os mesmos sabem que só através da
educação de forma motivadora fará com que continue na escola e so-
nhando em construir uma vida de dignidade e esperança.
Segunda atividade executada durante a realização da oficina
teve o objetivo de questionar sobre o trabalho e assim compreender seus
sonhos e expectativas.

110
DNA Educação

Figura 3: oficina construindo sonhos (Fazenda)

Fonte: próprio autor, 2016

Figura 4: aula diária

Fonte: próprio autor, 2016

Como vemos na figura 3 os alunos o aspecto observado que


para as crianças, o trabalho serve para ganhar dinheiro e daí construir o
que almejamos. Nessa visão fica evidente que as crianças observam que
só estudando isso vai se concretizar, assim como vivenciando o compor-
tamento dos adultos que os cercam e sobre eles tem como recompensa
o dinheiro do seu trabalho. Limitar o valor do trabalho somente à re-
compensa material advinda dele pode prejudicar muito a formação das
crianças. Há mais valores ligados ao trabalho. Afinal uma das razões mais

111
DNA Educação

importantes para se trabalhar é a possibilidade de através dele termos a


nossa realização.
Realização como pessoa, capaz de realizar algo com competên-
cia, de fazer alguma coisa com paixão. Outra importância do trabalho fez
nos permitir ajudar as outras pessoas. Com o nosso trabalho, somos ca-
pazes de melhorar a vida de outras pessoas.
Feita toda essa reflexão com os alunos eles sentiram e agiram
de forma que fez com que entendesse que a escola não está apenas para
ditar conteúdos e sim orienta-los e ouví-los quanto as suas expectativas
de vida. A visão do brincar é uma atividade humana, criadora, na qual a
imaginação, fantasia e a realidade interagem na produção de novas pos-
sibilidades de interpretação, de expressão e de ação e reação, com novas
formas de construir as relações com os outros sujeitos Vygotsky (1999,
p. 35).
No terceiro momento usou-se o balcão para as crianças a
troca de mercadoria e em seguida uma reflexão da importância do
planejamento e do trabalho em grupo e outras observações sobre
o que aconteceu na atividade.

Figura 5 e 6: jogo dos sonhos (Balcão)

Fonte: próprio autor, 2016

112
DNA Educação

Figura: 6: falando dos sonhos

Fonte: próprio autor, 2016

Nos jogos e brincadeira, além de desenvolver uma série de ati-


vidades lúdicas no processo assume a função de promover o desenvol-
vimento da criança enquanto indivíduo, e a propiciar a construção de si
próprio. No entanto, a brincadeira e jogos não podem ser considerados
uma atividade complementar, mas, sim uma atividade fundamental que
necessita de planejamento para a prática pedagógica. Quando o brincar
não serve para auxiliar a ação docente para resultados em relação à apren-
dizagem; conceitos e noções ou, mesmo, ao desenvolvimento de algumas
habilidades, nesse caso, o objeto conhecido como brinquedo não realiza
sua função lúdica, deixando de ser brinquedo para tornar-se um simples
material pedagógico (Kishimoto, 2008, p.14).
Como ressalta o brincar em ações pedagógicas servem para des-
pertar no aluno o caráter de promover e desenvolver atitudes motivado-
ras no próprio aluno, porém sem regras o mesmo deixar de ser funda-
mental e passa ter apenas um mero trabalho sem objetivo e meta. Assim
a oficina nos apresentou grande contribuição para o processo de moti-
vação desses alunos, visto que muitos deles ao falarem citam que a mu-
dança é essencial para que haja motivação e que a oficina só contribuiu
para que eles pensassem e agissem de forma diferente quanto a sua par-
ticipação na sociedade. Pois compreenderam para se sentirem motivados

113
DNA Educação

não basta ter apenas dinheiro, mas desejo e disposição em querer apren-
der.
Motivar significa predispor o indivíduo para certo comporta-
mento desejável naquele momento. O aluno está motivado para apren-
der quando está disposto a iniciar e continuar o processo de aprendiza-
gem, quando está interessado em aprender certos assuntos, em resolver
um dado problema, etc.
Segundo Piletti apud Mouly (1997, p. 64), são três as funções
mais importantes da motivação:
Os motivos ativam os organismos. Os motivos levam o in-
divíduo a uma atividade, na tentativa de satisfazer suas ne-
cessidades. Qualquer necessidade gera tensão, desequilíbrio.
Os motivos mantêm o organismo ativo até que a necessi-
dade seja satisfeita a tensão desapareça.
Os motivos dirigem o comportamento para um objetivo.
Diante de uma necessidade, vários objetivos se apresentam
como capazes de satisfazê-la, de restabelecer o equilíbrio. Os
motivos dirigem o comportamento do indivíduo para o ob-
jetivo mais adequado para satisfazer a necessidade. Não
basta que o organismo esteja ativo, é preciso que sua ação se
dirija para um objetivo adequado. Assim na sala de aula, não
é suficiente que os alunos participem de várias atividades
dispersas, sem sentido. É necessário que essas atividades se-
jam orientadas para objetivos que satisfaçam necessidades
individuais.
Os motivos selecionam e acentuam a resposta correta. As
respostas que conduzem a satisfação das necessidades serão
aprendidas, mantidas e provavelmente repetidas quando
uma situação semelhante se apresentar novamente. Nossas
necessidades são numerosas, especialmente as psicológicas,
e muitas delas continuam sempre insatisfeitas. Assim, me-
lhor do que afirmar que o professor deve motivar o aluno, é
dizer que ele deve apresentar objetivos adequados para a sa-
tisfação dos motivos. (PILETTI apud MOULY, 1997,
P.64).
Como podemos verificar a motivação é um impulso interno
que nos leva a ação, sendo esta a base e o motivo que dirige o sujeito na
satisfação da sua necessidade. Ela é importante no processo de aprendi-
zagem em sala de aula, pois a intensidade e a qualidade do envolvimento

114
DNA Educação

exigido para aprender dependem dela. Os estudantes desmotivados pelas


tarefas escolares apresentam desempenho abaixo de suas reais potencia-
lidades, distraem-se facilmente, não participam das aulas, estudam pouco
ou nada e se distanciam do processo de aprendizagem. Assim, aprendem
pouco correndo risco de evadir da escola limitando suas oportunidades
futuras. Ao contrário, um estudante motivado mostra-se envolvido de
forma ativa no processo de aprendizagem, com esforço, persistência e
até entusiasmo na realização das tarefas, desenvolvendo habilidades e su-
perando desafios (BZUNECK, 2009; GUIMARÃES; BORUCHO-
VITCH, 2004).
Portanto, a motivação é um processo psicológico no qual inte-
gram as características de personalidade e as peculiaridades ambientais
compreendidas. Isso provoca que a motivação dos alunos pode ser alte-
rada através de mudanças nos mesmos, mas também através da alternân-
cia no seu ambiente de conhecimento escolástico.
A motivação é aplicada a todo tipo de atividade humana e tem
recebido atenção de estudiosos de várias correntes teóricas. Por se tratar
de um fenômeno complexo, multideterminado e com especificidades re-
lativas ao contexto, o conteúdo tem sido estudado sob variados concei-
tos. A palavra motivação tem sua origem etimológica no verbo latino
movere cujo tempo supino motum e o substantivo motivum do latim
tardio, deram origem ao termo, semanticamente aproximado, “motivo”.
Desta maneira, a palavra motivação é derivada do verbo motivar e refere-
se ao motivo que, genericamente, é aquilo que move uma pessoa, que
põe o indivíduo em ação, o faz mudar de curso, impulsionando para al-
gum objetivo (BZUNECK, 2009).
Como resalta o autor a motivação faz mudar, Para tanto, o pri-
meiro passo é identificar os obstáculos encontrados por esses alunos e
profissionais para relacionar pobreza e currículo, e também perceber
como a pobreza é abordada nos documentos legais que orientam o cur-
rículo na escola. Se analisarmos as Diretrizes Curriculares de Educação
Básica e as Diretrizes Curriculares de Formação Docente, perceberemos
que as referências à pobreza estão diretamente ligadas ao papel da edu-
cação como um dos elementos fundamentais para combatê-la; porém,

115
DNA Educação

continua não havendo lugar para as vivências da pobreza e para a discus-


são da sua produção histórica.
A pobreza tem força na vida do aluno e isso faz transparecer
bem claro a sua ideologia em parar de estudar, visto que o aluno nessa
condicionalidade não apresenta motivo para continuar no âmbito educa-
cional, pois o seu foco está em querer trabalhar precocemente sem antes
ter o mínimo de formação, levando assim a desqualificação da mão de
obra, assimo como consequência a má qualidade de vida.
Assim faz pensar e repensar para a criança e adolescente o con-
ceito de pobreza, pois nessa concepção a educação pode e deve oferecer
informações que motivam a reflexão, fortalecer valores de justiça e res-
peito pelos outros, aproximar vozes e experiências humanas e nos ajudar
a conhecer e a agir. Mais o que é pobreza?
Muitas vezes, a primeira noção de pobreza que vem a mente
esta ligada a ideia de subsistência, de fome, falta do que co-
mer. Muita gente já trabalhou com o conceito de pobreza a
partir da carência de alimento. O economista britânico Tho-
mas Malthus - final do século XVIII, inicio do XIX - profe-
tizava que a humanidade iria morrer de fome, porque não
conseguiria produzir alimento na mesma proporção que ge-
rava mais gente. Josué de Castro – décadas de 1930 a 1970 -
rompe com a ideia malthusiana de que o excesso de pessoas
gerava sobreutilizacao dos escassos recursos naturais e, con-
sequentemente, pobreza e fome. Ele denunciava a situação
degradante das pessoas que não tinham nada que comer e
mostrava como estava relacionada com a questão da má dis-
tribuição dos recursos – desnaturalizando a relação entre
fome e clima ou fome e preguiça individual. (KittaEitler,
Ana Paula Brandão, 2014. P,41).
De acordo com a autora a primeira ideia de pobreza vem em
mente a falta do que comer, visto que hoje podemos nos referi no con-
texto da educação a falta de algo que venha promover e estimular a ação
de pessoas e grupos em favor da justiça e de valores que representam o
bem comum. Portanto, o compromisso da educação com o tema da po-
breza vai muito além da simples terminologia fome, denuncia ou da in-
dignação momentânea.

116
DNA Educação

Devemos pensar as formas como os currículos abordam a po-


breza e os (as) pobres – seja contemplando-os, seja ignorando-os –, tanto
na formação de professores como na Educação Básica, refletem-se nas
maneiras adotadas pelas escolas para tratar os (as) alunos (as) pobres,
suas famílias e suas comunidades. Buscar esse entendimento é um desa-
fio que precisamos encarar para procurar, em conjunto, alternativas que
viabilizem, de fato, uma escola de qualidade para todos e todas.

Por que motivar beneficiários da bolsa família sob a condicionali-


dade da educação?
Visto que a criança e adolescente em condicionalidade de po-
breza apresenta uma desvantagem quando se fala em escola. Onde a li-
teratura ressalta que a escola tem um grau de controle significativo sobre
certos aspectos que podem contribuir para desmotivar alunos adolescen-
tes (ANDERMAN; MAEHR, 1994; BZUNECK, 2009; KAPLAN;
MAEHR, 2002).
Dentre eles, está a crença de que o êxito acadêmico é resultado
exclusivo da inteligência e não uma consequência da dedicação e do em-
penho. Com isso, a inteligência passa a ser entendida como uma caracte-
rística fixa da pessoa, tornando-se bastante habitual na escola valorizar a
capacidade relativa do indivíduo em termos de nota e comparação com
os colegas, ao invés dos progressos individuais na aprendizagem. No iní-
cio da adolescência, o jovem já é capaz de perceber a diferença entre a
capacidade e o empenho e, se acreditar que a capacidade intelectual é
algo fixo, pode começar a evitar investir esforço nas atividades escolares.
Ao contrário, quando o aluno entende que a inteligência é algo maleável,
há maiores chances de que ele se esforce nas tarefas acadêmicas e se pre-
ocupe mais com o próprio crescimento intelectual e o domínio do con-
teúdo.
Zusho e Pintrich (2001) também destacam a importância das
crenças motivacionais em relação aos estudos focalizando dois compo-
nentes globais como essenciais à motivação do da criança e adolescente:
as expectativas e a valorização. As expectativas consideram as crenças de
controle e de autoeficácia. Com isso, crianças e adoles-centes acredita em

117
DNA Educação

suas capacidades e assume responsabilidade pela sua própria aprendiza-


gem e resultados, ele tem maior probabilidade de persistir na tarefa e vir
a ter sucesso acadêmico. Já a valorização envolve as orientações às metas
de realização (que se refere aos diferentes propósitos que um estudante
pode adotar em relação a uma tarefa) e a valorização das atividades aca-
dêmicas (que se refere à percepção de utilidade destas atividades). Nesta
concepção, ambientes que valorizam o processo de aprendizagem com
atividades significativas têm maiores chances de desencadear em seus
alunos comportamentos positivos em relação ao aprender.
Dessa maneira, é importante adequar o contexto de sala de aula
às necessidades de desenvolvimento do jovem para fomentar a motiva-
ção para aprender. A falta de adequação da escola em fazer um ajuste
entre as necessidades de desenvolvimento do adolescente e o contexto
de sala de aula, em parte, explica a diminuição da motivação dessas cri-
anças e adolescentes pelas atividades propostas.
Cabe ressaltar que, uma atitude não é somente a somatória de
atividades, é antes de tudo uma maneira de ser, de estar, de pensar e de
encarar a escola, bem como, de relacionamento com as demais crianças.
As oficinas para a criança são como uma linguagem universal, dessa ma-
neira, a atividade lúdica dentro de uma oficina deve ser explorada no
ambiente escolar, a fim de tornar a aprendizagem em um ato prazeroso.
Contudo, as atividades lúdicas propiciam a criança construir sua
própria autonomia, aprendendo com os erros e acertos durante a vida,
pois, quando uma criança brinca seu mundo transforma em um universo
de possibilidades.
Ao brincar a criança entra em um mundo imaginário, estimu-
lando a criatividade enriquecendo o processo de ensino-aprendizagem.
Sendo assim, o lúdico vem proporcionar um cuidado integral, especial-
mente em crianças que não tiveram e não tem a oportunidade de brincar
em casa, como o caso dos alunos participantes da pesquisa, assim faz
com que as brincadeiras, oficinas, cantos e danças realizadas em classe
sejam um meio fundamental para a motivação das que vivem em condi-
cionalidade de pobreza, não para subsidiar o aprendizado, mas para dar

118
DNA Educação

mais sentido para a criança desenvolver a sua inteligência, sua sensibili-


dade, habilidades e criatividade, além de aprender a socializar-se com ou-
tros.
É fascinante ver como as crianças se evolvem em um mundo
imaginário e faz deste mundo encantador, para isso buscam-se novas
maneiras de ensinar por meio do lúdico uma educação de excelência que
consiga ir ao encontro dos benefícios e necessidades da criança sem se
importar com a classe social pertencente à mesma.
Fica evidente que, cabe ao educador a função de criar condições
para que o estudante desinteressado se torne motivado e de proporcionar
um ambiente que sustente e aperfeiçoe a motivação dos aprendizes pe-
rante as atividades escolares, visto que somente o bolsa família não é
suficiente para tal, pois a intenção aqui é valorizar a criança e adolescente
como construtor de sua própria historia e a motivação é a peça funda-
mental para essa realização.
Considerações finais
Constatou-se durante a pesquisa que as oficinas realizadas na
escola vieram como ponto crucial para entendermos de que maneira as
crianças se sentiram motivadas, haja visto que são crianças e adolescente
que vivem em condicionalidade de pobreza.
Embasados na perspectiva da realização desta pesquisa, cuja,
sua extrema relevância para o desenvolvimento e entendimento dos fatos
ocorridos na relação motivação, pobreza e aprendizagem na integração
como forma de relacionar os valores na comunidade escolar.
Ao término desta, fica evidente a relevância do papel do Pro-
fessor na motivação, onde focado em métodos inovadores. Tanto as ofi-
cinas e escola, são referências fundamentais para a motivação da criança
e adolescente enquanto ser que está em constante aprendizado. E quanto
mais intensa, colaborativa e próxima for esta relação, mais positiva será
o desempenho escolar do aluno. Visto que a oficinas lhes proporcionou
momentos de distração e elevação do conhecimento a esses alunos que
vivem nessa condicionalidade neste município.

119
DNA Educação

As oficinas “Construindo sonho” contribuíram para que crian-


ças e adolescente fizesse sua própria reflexão e assim entender o seu pa-
pel e da educação, onde viram que a oficina lhes despertou ao prazer de
continuar estudando.
Essa constatação nos leva a refletir sobre as dimensões e con-
tribuição das mesmas como meio de motivação.
Nesse sentido, todas as formas de contatos entre escola e as
oficinas focadas para a pobreza leva a motivação, a qual servem para
aproximar os alunos do universo escolar e para que a escola possa co-
nhecer a dinâmica do aluno e entender que quanto mais a escola conhece
o aluno, mais próximas estarão do sucesso na educação dos mesmos.
Assim, a participação efetiva das oficinas no processo de aprendizagem
facilita a prática pedagógica dos professores, evidenciando a responsabi-
lidade e a integração dos mesmos num só objetivos.
Consideravelmente, a oficina com esse foco, como espaço de
orientação e construção da identidade de um indivíduo deve promover
juntamente com a escola, uma parceria, a fim de contribuir no desenvol-
vimento integral da criança e do adolescente.
Para tanto, faz-se necessário entender, que este trabalho tem
como objetivo, favorecer a interação e a integração do professor e sua
relevância, propiciando assim uma educação de qualidade e proporcio-
nando a comunidade.
E o importante na escola são as relações que se estabelecem.
Porque a criança, o adolescente e o jovem sabem que se não tiverem
competência, conteúdo, não conseguirá enfrentar a sociedade.
Tanto as comunidades escolares como as comunidades famili-
ares não podem permanecer distanciadas em seu processo de desenvol-
vimento e funcionamento organizacional, mas devem estar vinculadas e
abertas aos recursos educacionais que dispõem a determinar por sua his-
toricidade a dimensão cognitiva e educativa que pretende-se aplicar no
processo de desenvolvimento humano, e mais precisamente no acompa-
nhamento das novas gerações. E só assim teremos mentes capazes de
transforma a sua própria realidade e rever que a pobreza é algo que não
tem haver com o próprio conhecimento humano e a motivação é força
para entender esse processo.

120
DNA Educação

Referências
ALMEIDA, A. M. O. O lúdico e a construção do conhecimento: Uma pro-
posta pedagógica construtivista. Prefeitura Municipal de Monte Mor: Departa-
mento de Educação. 2001
ANDERMAN, E. M.; MAHER, M. L. Motivation and schooling in the mid-
dle grades. Review of Educational Research, n.64, p. 287-309, 1994.
ARROYO, Miguel. Pobreza e currículo: uma complexa articulação. Disponível
em: file:///C:/Users/User/Downloads/modulo4%20(2).pdf. Acessado: 31.
dez. 2016. p. 7-9.
BARRERA, S.D. Teorias cognitivas da motivação e sua relação com o de-
sempenho escolar. Poíesis Pedagógicos- V.8, N.2 ago/dez. 2010; p. 159-175.
Disponível: https //www. Portaleducacao.com.br/pedagogia/ artigos/motiva-
ção-e-desempenho-escolar. Acessado em: 29. Dez. 2016.
BIANCHI, Sara Rebecca. A importância da motivação na aprendizagem no
ensino fundamental. Monografia: Universidade Federal de São Carlos – UFS-
Car. 2011.
BRASIL. Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS). Per-
guntas e respostas sobre o Bolsa Família. Brasília, 2005, disponível na página
www.mds.gov.br , acesso em 20/12/2016
Brasil tem mais de 204 milhões de habitantes, segundo o IBGE. Disponível em:
http://g1.globo.com/economia/noticia/2015/08/brasil-tem-204-milhoes-de-
habitantes-segundo-o-ibge.html. Acessado em: 15.01.16
BZUNECK, J. A. A motivação do aluno: aspectos introdutórios. In: BO-
RUCHOVITCH, E.; BZUNECK, J. A. (orgs.). A Motivação do Aluno: Con-
tribuições da psicologia contemporânea. 4. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2009. p. 9-
36.
GUIMARÃES, S. É. R; BORUCHOVITCH, E. O estilo motivacional do pro-
fessor e a motivação intrínseca dos estudantes: uma perspectiva da Teoria
da Autodeterminação. Psicologia: Reflexão e Crítica, Porto Alegre, v.17, n. 2,
p.143-150, 2004.
KISHIMOTO, T. M. Jogo, brinquedo, brincadeira e a educação. 11ª. Ed.
São Paulo: Cortez. 2008.
MACEDO, L. Os Jogos e o Lúdico na Aprendizagem Escolar. Porto Alegre:
Artmed.2005.
PILETTI, Nelson. Psicologia educacional. Série Educação. 15. Ed. São Paulo:
Ática, 1997.
SILVA, Maria Ozanira da Silva. Os Programas de Transferência de Renda
enquanto Estratégia atual de enfrentamento à pobreza no Brasil, o Pro-
grama Bolsa Família. 2006
SILVA, Maria Ozanira da Silva. O programa bolsa família nos marcos da luta
contra a pobreza no Brasil. 2006, p. 9-10.
VIGOTSKY, L.S. A. Formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes. .
1999

121
DNA Educação

AVALIAÇÃO DO RENDIMENTO ESCOLAR A PAR-


TIR DA BNCC
Maiara Ariana Silva Paula1
RESUMO:
Este artigo tem por objetivo propor uma reflexão sobre a avaliação do
rendimento escolar a partir da BNCC. Discute também a relação entre a
BNCC, os currículos, as concepções contemporâneas de avaliação e as
possibilidades de adequação das avaliações externas. Para tanto, realiza
um resgate histórico sobre a proposta de se criar uma base nacional cur-
ricular comum, percebendo a presença de tendências pedagógicas e a
existência de menção a procedimentos ou conceitos de avaliação. Por
fim, apresenta algumas considerações ponderando potencialidades e fra-
gilidades na delicada reorganização da prática avaliativa.
Palavras-chave: Avaliação. BNCC. Currículo.
ABSTRACT:
This article aims to propose a reflection on the evaluation of school per-
formance from BNCC. It discusses the connections between BNCC,
curriculums, contemporary conceptions of evaluation and the possibili-
ties of adequacy of external assessments. It also presents a historical res-
cue about the proposal of creating a common national curricular base,
identifying the presence of pedagogical tendencies and if there are any
mentions of evaluation procedures or concepts. Finally, it presents some
considerations about potentialities and fragilities in the delicate reorgan-
ization of evaluation practice.
Keywords: Evaluation. BNCC. Curriculum.

1Mestre em Educação pela Universidad del Salvador – USAL, Buenos Aires/AR. Pedagoga.
Especialista em Avaliação Educacional, Psicopedagogia e Supervisão Escolar. Coordenadora
de Programas Educacionais e Formação de Professores em EaD.

122
DNA Educação

Introdução
Que a avaliação das aprendizagens não deve ser excludente e
meramente classificatória já é, há muito, tema de estudos e discussões no
campo educacional. Proposições acerca de como as tendências pedagó-
gicas influenciam na concepção e execução da avaliação nas escolas re-
velam quais rumos segue a educação.
O cenário educacional brasileiro vem sofrendo grandes trans-
formações, num momento de forte desequilíbrio político. O advento de
se conceber uma proposta de base nacional comum curricular em um
momento delicado como esse traz à tona questionamentos sobre a real
necessidade do documento e, sobretudo, no que a homologação da
BNCC influencia na prática pedagógica das escolas brasileiras.
Dispomo-nos a refletir sobre qual ideário e que sujeito a escola
irá formar. Um forte ponto de estudo se revela nas entrelinhas da BNCC:
como serão os currículos e a avaliação do rendimento escolar?
BNCC: Contexto e sentidos
Há algum tempo já se faz menção à construção de uma base
nacional comum curricular, sendo citada inicialmente a necessidade de
elaboração na Constituição Federal de 1988, em seu artigo 210 “serão
fixados conteúdos mínimos para o ensino fundamental, de maneira a as-
segurar formação básica comum e respeito aos valores culturais e artísti-
cos, nacionais e regionais”. Posteriormente, surge a menção na Lei de
Diretrizes e Bases para a Educação Nacional, Lei n° 9394/96, em seu
artigo 26, redatado pela Lei Federal nº 12.796/2013, com o seguinte
texto:
Os currículos da educação infantil, do ensino fundamental e
do ensino médio devem ter base nacional comum, a ser
complementada, em cada sistema de ensino e em cada esta-
belecimento escolar, por uma parte diversificada, exigida pe-
las características regionais e locais da sociedade, da cultura,
da economia e dos educandos (BRASIL, 2013, on-line).
Entre os anos de 1996 a 2013, houve a publicação das Diretri-
zes Curriculares Nacionais (DCNs, 1997), dos Parâmetros Nacionais
Curriculares (PCNs, em 1997) e dos Referenciais Curriculares Nacionais
para a Educação Infantil (RCNEIs), em 1998), que direcionavam a ação

123
DNA Educação

docente e os conteúdos a serem praticados nas escolas públicas de todo


país, pautados na ideia do que ensinar, conceito de “currículo mí-
nimo”. Na CONAE (Conferência Nacional de Educação) de 2010, foi
novamente reforçada a necessidade de construção do documento, refe-
rendada por meio da Resolução nº 04, de 13 de julho de 2010.
A oficialização da evidente construção de uma base nacional
comum curricular se deu com a Lei Federal n° 13.005/2014 que institui
o Plano Nacional de Educação (PNE), indicando a elaboração da base
nacional comum curricular que serviria como documento norteador, no
qual se estabelecem os objetivos de aprendizagem a nível nacional. Em
meio às 20 metas estabelecidas pelo PNE, destacam-se, por se relacionar
e serem indicadas com frequência em textos sobre o tema, especifica-
mente as Metas:
[...] 02 universalizar o ensino fundamental de 9 (nove) anos
para toda a população de 6 (seis) a 14 (quatorze) anos e ga-
rantir que pelo menos 95% (noventa e cinco por cento) dos
alunos concluam essa etapa na idade recomendada, até o úl-
timo ano de vigência deste PNE;
[...] 03 universalizar, até 2016, o atendimento escolar para
toda a população de 15 (quinze) a 17 (dezessete) anos e ele-
var, até o final do período de vigência deste PNE, a taxa
líquida de matrículas no ensino médio para 85% (oitenta e
cinco por cento);
[...] 07 fomentar a qualidade da educação básica em todas as
etapas e modalidades, com melhoria do fluxo escolar e da
aprendizagem, de modo a atingir as seguintes médias nacio-
nais para o IDEB: 6,0 nos anos iniciais do ensino fundamen-
tal; 5,5 nos anos finais do ensino fundamental; 5,2 no ensino
médio (BRASIL, 2014, p. 19 - 31).
Porém, vale ressaltar que a depender da intencionalidade, o en-
foque em cada uma das metas pode mudar.
Partindo de preceitos democráticos para que fosse elaborada
coletivamente e com participação popular, iniciou-se em 2015 a elabora-
ção da BNCC, com discussões de grupos como, por exemplo, técnicos
de secretaria, pesquisadores de universidades e professores. Em junho
do mesmo ano, o MEC (Ministério de Educação) lança a Portaria n° 592,
instituindo uma comissão de especialistas para a elaboração de proposta

124
DNA Educação

para a BNCC, com forças do Consed (Conselho Nacional de Secretários


de Educação) e da Undime (União dos Dirigentes Municipais de Educa-
ção) enquanto grupos responsáveis pela redação da 1ª versão. Já no mês
de setembro a primeira versão foi aberta à consulta pública, tendo rece-
bido mais de 12 milhões de contribuições.
Em maio de 2016 é disponibilizada a 2ª versão da BNCC para
consulta popular, mas desta vez divulgada e debatida em todo o país por
meio de seminários estaduais organizados pelo Consed e pela Undime,
contando com mais de 9 (nove) mil participantes. Em abril de 2017 é
lançada a 3ª versão da BNCC, que já apresentava propostas para a Edu-
cação Infantil e o Ensino Fundamental. De junho a setembro foram re-
alizadas audiências públicas junto ao CNE, marcadas por movimentos
populares, em sua maioria de rechaço ao documento e sua implementa-
ção. Vale ressaltar o contexto histórico-social-político que atravessa o
país, tendo entre a divulgação da 1ª e 3ª versões (2015-2016), passado
por três ministros da educação e dois presidentes da república.
A BNCC carrega consigo a marca das polêmicas e inúmeros
questionamentos e contrapontos. Em destaque, a Reforma do Ensino
Médio que põe em xeque o ensino de funções operatórias sobre as cog-
nitivas, uma clara forma de influência de formação para o trabalho tra-
vestida de “educação profissional”, educação essa que visa formar mão
de obra em contraponto ao estímulo à reflexão, criticidade e conheci-
mento em relação às Artes, Filosofia, Sociologia.
Há ainda a questão da fragilidade do princípio da laicidade na
escola com a tentativa de instituir o ensino religioso; a transposição em
graus de importância e presença nos currículos das áreas do conheci-
mento obrigatórias, áreas do conhecimento facultativas e educação pro-
fissional.
O cerceio às questões de relação de gênero também aparece
como um dos pontos de maior divergência, reflexo da crise política que
assola o país, nesse caso resultado das pressões de movimentos religio-
sos, e sobremaneira da polarização entre direita e esquerda em que se
emaranhou a sociedade, dividindo-a entre “eles” e “nós”.
A própria separação da BNCC em dois documentos distintos
(uma BNCC para a Educação Infantil e Ensino Fundamental e outra

125
DNA Educação

BNCC direcionada exclusivamente ao Ensino Médio) reforça a ideia de


ruptura entre as Etapas da Educação, fragilizando o discurso presente no
próprio texto de que a educação deve ser integral.
O principal ponto de fragilidade da BNCC seria a incongruên-
cia entre o que prega a parte introdutória, que carrega concepções de
educação integral, formação para a prática da cidadania e bem comum,
liberdade, acesso e permanência na escola para todos, em contradição
com o que apresenta todo o restante do documento, direcionado à for-
mação de competências e habilidades em grande quantidade, que tem
inspiração no modelo norte americano de “eficiência” e “capacidade”,
com pleitos embasados na Teoria Socioemocioal e na Educação Empre-
endedora. Para a filósofa política Hanna Arendt significa que “[...] na
prática, a primeira consequência disso seria uma compreensão bem clara
de que a função da escola é ensinar às crianças como o mundo é, e não
instruí-las na arte de viver” (2005, p. 246).
Em dezembro, com o Parecer CNE/CP n° 15/2017, a BNCC
para a Educação Infantil e Ensino Fundamental recebe a aprovação do
CNE (Conselho Nacional de Educação) e em 20 de dezembro de 2017
é homologada pelo MEC.
Mas afinal, o que é a BNCC?
[...] é um documento de caráter normativo que define o con-
junto orgânico e progressivo de aprendizagens essenciais
que todos os alunos devem desenvolver ao longo das etapas
e modalidades da Educação Básica. Conforme definido na
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB, Lei
nº 9.394/1996), a Base deve nortear os currículos dos siste-
mas e redes de ensino das Unidades Federativas, como tam-
bém as propostas pedagógicas de todas as escolas públicas e
privadas de Educação Infantil, Ensino Fundamental e En-
sino Médio, em todo o Brasil (BRASIL, 2017, p. 7).
É de suma importância que em cada oportunidade na qual se
discuta educação seja reforçado que a BNCC não é e não deve ser sinô-
nimo de currículo.
Há muitas formas de se conceituar currículo, entretanto o defi-
nimos como as situações que geram aprendizagens na escola. O que cur-

126
DNA Educação

rículo não é? Definitivamente não é mais uma lista de conteúdos progra-


máticos. Currículo é práxis, portanto dinâmico. Assim, “da restrita visão
de currículo como lista de disciplinas e conteúdos, passa-se a uma visão
de currículo que abrange praticamente todo e qualquer fenômeno edu-
cacional. Ou seja, o currículo torna-se tudo ou quase tudo” (MOREIRA,
2000, p.75).
Ao longo da história da educação o currículo teve vários signi-
ficados e representações, mas todas voltadas à seleção entre o que deveria
ser ensinado ou não e a sequencialidade dos conteúdos, com vistas a
conservar o modelo de sociedade de cada época. O currículo escolar foi
sendo adaptado às necessidades do tempo histórico. Entretanto, falamos
aqui de uma concepção já ultrapassada de currículo, que foi sobreposta
pelas Teorias Críticas do Currículo, nas quais se busca compreender toda
a complexidade que o termo representa e sua função “desalienante”
(SILVA, 1999), ainda que na teorização existam diferentes tipificações
de currículo.
O currículo pode emancipar ou aprisionar os sujeitos, por isso
o que não se pode negar é que, a cada escolha e omissão do que se dis-
cutir, ensinar e aprender na escola caminha-se rumo a uma intencionali-
dade, um modelo de sociedade.
O currículo é um dos locais privilegiados onde se entrecru-
zam saber e poder, representação e domínio, discurso e re-
gulação. É também no currículo que se condensam relações
de poder que são cruciais para o processo de formação de
subjetividades sociais. Em suma, currículo, poder e identi-
dades sociais estão mutuamente implicados. O currículo
corporifica relações sociais (SILVA, 1996, p. 23).
Para Sacristán (1999, p. 61) o currículo é “a ligação entre a cul-
tura e a sociedade exterior à escola e à educação; entre o conhecimento
e cultura herdados e a aprendizagem dos alunos, entre a teoria (ideias,
suposições e aspirações) e a prática possível, dadas determinadas condi-
ções”. Dessa forma, a BNCC está para nortear a construção e/ou reade-
quação dos currículos de todas as escolas brasileiras, sejam públicas ou
privadas, garantindo os direitos de aprendizagem, trazendo em si uma
mudança de enfoque em relação aos PCNs, já que ao invés de propor o

127
DNA Educação

que se deve ensinar, ela apresenta aquilo que os educandos do Brasil têm
direito de aprender.
Da definição de currículo apresentada por Sacristán (1999) é
que também emerge o que a própria BNCC traz em seu texto em relação
à importância de que, no movimento de construção e/ou readequação
dos currículos, haja espaço para os saberes locais e demais aspectos cul-
turais, que não poderiam ser contemplados num documento a nível na-
cional, dado o Brasil enquanto país multicultural que é.
Em cada omissão ou apresentação há uma intenção, a educação
é um ato político, não há neutralidade nenhuma nisso. O currículo não é
um espaço neutro de transmissão de conhecimentos, ele constitui o ob-
jeto central da ação pedagógica.
Crise da Educação ou Projeto de Crise?
A famosa frase dita pelo antropólogo Darcy Ribeiro em uma
palestra na Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, na PUC-SP
em 1977, afirmava que “a crise da educação no Brasil não é uma crise, é um
projeto”. Posto a ideia de que seria necessário construir uma base nacional
comum curricular, pomo-nos a investigar de onde veio tal necessidade.
É inegável a constatação de que a sociedade vem se transfor-
mando ao longo do tempo e que claramente a escola precisa acompa-
nhar. Mas e a qualidade da educação? Primeiramente, quando nos reme-
temos a essa expressão, estamos partindo da premissa e do direito garan-
tido por lei de que a escola seja um espaço de formação para a vida em
sociedade. Mas não é qualquer vida. Trata-se de vida com qualidade, com
oportunidades para desenvolver-se, ser e agir no mundo.
Segundo o filósofo Mario Sérgio Cortella (2015, p. 48) “existe
na educação escolar uma crise em vários momentos, mas ela nem sempre
é negativa”. O autor afirma que a crise, em sua essência, purifica. E jus-
tamente por isso “a crise não é negativa por ser crise. Uma crise só é
negativa quando ela deixa em estado desanimado, inerte” (CORTELLA,
op.cit.).
Desse modo, podemos entender também, as tantas convic-
ções políticas emitidas, a todo momento, pelos que, perce-
bendo o que se decidiu chamar de “a crise da escola”, apre-
sentam soluções fáceis para as grandes discussões que são

128
DNA Educação

necessárias entre as tantas posições e imagens existentes so-


bre as questões curriculares. No momento atual brasileiro,
essas questões se apresentam como a de necessidade de uma
Base Nacional Comum (ALVES, 2014, p. 1467).
Seria a BNCC a porta para o tão famigerado “desmonte da edu-
cação nacional” ou a utopia de solução aos problemas da educação?
Uma breve análise da história da educação nos permite perce-
ber, a cada ponto no tempo/espaço, alguma crise que resultou em uma
medida que propunha alguma mudança ou, até mesmo, ruptura de para-
digma. Talvez o maior exemplo contemporâneo seja a polarização entre
o chamado construtivismo e o ensino tradicional, que se contrapõem de
forma abrangente na vivência e no papel social da escola. A já surrada
armadilha do velho contra o novo, do novo contra o velho, na qual a
novidade sempre surge enquanto uma solução mágica.
Falar em crise na educação significa assumir algumas mazelas
que, embora sejam diferenciadas, parecem essencialmente permanentes.
A conservação do mundo tem relação direta com a educação. Partindo
dos preceitos de que conservar, nesse sentido, não significa manter como
está, como conservadorismo, mas sim no sentido de continuidade, de ter
condições para prosseguir (ARENDT, 2005).
A crise da educação é reflexo da crise política, não só no Brasil,
mas no mundo. As relações estão cada vez mais fragilizadas.
O que seria essa crise na educação? Vivemos numa sociedade
de massa, que valoriza, sobretudo, o consumo e o trabalho, traços do
sistema capitalista. Se o que essa sociedade “precisa” é de sujeitos que
trabalhem em troca de um salário e que gastem esse salário em diferentes
modos de consumo, a escola, por sua vez, “deveria” entregar à sociedade
apenas meros trabalhadores. Aí está outra crença, bastante equivocada,
mas que é constante no paradoxo das tendências pedagógicas: a escola é
preparatória para a vida, sobretudo para o mundo do trabalho.
Os estudos do filósofo John Dewey em suas obras “Vida e
Educação” (1975) e “Experiência e Educação” (1979) reafirmam que a
educação é um processo de desenvolvimento, é o cultivo para o cresci-
mento do ser humano. De tal modo, uma de suas máximas diz que “a
educação é um processo social, é desenvolvimento. Não é a preparação

129
DNA Educação

para vida, é a própria vida”. A educação é uma forma de continuidade


social, não sendo possível que o sujeito viva instâncias separadas, como
se em um momento fosse preparado para a vida e no outro vivesse a
vida, trata-se de processos intrínsecos. Vivemos aprendendo.
A educação conta com inúmeros apontamentos que fomentam
a importância de que a escola, por meio de seu currículo e organização
dos tempos e espaços, seja bastante próxima da realidade dos sujeitos
que nela estão. A educação precisa ser coerente com o meio. O desafio
está em alinhar concepções sobre a pessoa enquanto humano completo,
e não apenas a ênfase em sua capacidade para o mundo do trabalho.
Além de trabalhar (o que não elimina a necessidade do desenvolvimento
de muitas habilidades e aprendizagens), o sujeito precisa ser pensante,
consciente, reflexivo. Só assim terá condições para transformar a reali-
dade.
Um dos grandes teóricos da educação brasileira, Paulo Freire
(1921-1997) afirmava que a função da educação é conscientizar, e que a
educação é um ato político, não podendo ser de forma alguma alienante.
A educação deve oferecer/criar oportunidades para que os sujeitos per-
cebam sua condição, principalmente os das classes desfavorecidas da so-
ciedade, para que possam agir em favor da própria libertação. Às escolas,
que se sustentam na condição de transmissoras do conhecimento, sendo
o aluno passivo, um mero recebedor de informações e comandos, Freire
chamou de “educação bancária”, a educação voltada à continuidade e
cristalização da sociedade dividida em classes.
Para o contexto econômico é fundamental a massificação das
pessoas, a padronização que faz questão de anular a diversidade humana.
A grande questão é que o trabalho é fonte de estudos na antro-
pologia por sua significância e papel no humano, atrelado à ideia de uti-
lidade, de colaboração, de sentido da existência, porém parafraseando o
ditado popular “nem só de trabalho vive o homem”. Esse humano é
pensante, afetivo, racional, justamente o que o difere das demais espécies
animais e proporcionou-lhe a condição de dominante.
É urgente que se repense e qualifique a função social da escola,
a fim de que contribua para com a verdadeira formação integral, que é

130
DNA Educação

também para o trabalho, mas não somente. Cabe contrapor o anseio vo-
raz que nos leva a um futuro vazio por priorizar o imediato, o finito.
Pensar em crise na educação impele caminhar por entre as ve-
redas do cenário atual. Dados divulgados pelo INEP (Instituto Nacional
de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira) (Fluxo Escolar,
2007- 2015) e pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística)
na Pnad contínua de 2016 (Pesquisa Nacional por Amostra de Domici-
lio) revelam que:

 O Brasil tem em torno de 11,8 milhões de analfabetos, o que corresponde a 7,2% da


população jovem de 15 anos ou mais;
 Aproximadamente 25 milhões de jovens entre 14 e 29 anos estão fora da escola;
 51% da população com 25 anos ou mais tem até o Ensino Fundamental completo;
 11,02% dos jovens no Ensino Médio desistem dos estudos;
 3,02% dos estudantes nos Anos Finais do Ensino Fundamental migraram para a EJA;
 12,9% e 12,7% dos alunos matriculados na 1ª e 2ª série do Ensino Médio, respecti-
vamente, evadiram da escola de acordo com o Censo Escolar entre os anos de 2014
e 2015;
 A repetência no 1° ano do Ensino Médio é de 15,3%;
 O 6º ano do Ensino Fundamental tem taxas de 14,4% de repetência;
 15,03% da população concluiu o Ensino Superior;
 Apenas 30,04% das crianças em idade de 0 a 03 anos frequentam a creche.

Articulando os dados apresentados com o cumprimento das


metas do PNE, talvez o Brasil precise avançar. Em destaque a Meta 09,
sobre a redução do analfabetismo a 6,5% é uma das que não foram al-
cançadas, lembrando que o prazo legalmente estabelecido de erradicação
do analfabetismo até 2024. São muitos os aspectos fragilizados da edu-
cação.
Como já citado neste texto, a 3ª Meta do PNE diz respeito ao
índice que se deseja alcançar no IDEB (Índice de Desenvolvimento da
Educação Básica), calculado a partir de dados de aprovação do Censo
Escolar e das médias de desempenho no Saeb (Sistema de Avaliação da
Educação Básica) e na Prova Brasil, para os anos iniciais do Ensino Fun-
damental, que é 6.0, Anos Finais, 5.5 e Ensino Médio, 5.2. As médias
alcançadas nas últimas avaliações em larga escala foram 5.5 para os Anos
Iniciais do Ensino Fundamental (0,5 abaixo da meta), 4.5 para os Anos

131
DNA Educação

Finais (1 ponto abaixo da meta) e 3.7 para o Ensino Médio (1.5 abaixo
da meta).
Há de se considerar os múltiplos pontos que existem entre o
alcance de uma meta e a realidade das escolas brasileiras. São muitas as
interpretações frente ao quadro da educação nacional, entretanto não
basta analisar a ponta do iceberg, “sem dúvida que, para além da espinhosa
questão de saber por que razão o Joãozinho não sabe ler, a crise na edu-
cação envolve muitos outros aspectos” (ARENDT, 2005, p. 02).
A educação ocupa um lugar difícil, até mesmo paradoxal na
função de mediadora do conhecimento. Em linhas gerais, a crise con-
temporânea da educação apresenta a dicotomia complexa entre educação
escolar e valores da sociedade. Especificamente sobre que sujeitos a es-
cola deve formar. Segundo Hanna Arendt (2005) a crise na educação é
integrante da modernidade, característica da “sociedade de massas” e do
animal laborans, no qual o sujeito não consegue se libertar do ciclo traba-
lho-consumo-felicidade imediata.
Estudos sobre a crise na educação iniciaram-se no final do sé-
culo XIX, com os aportes de Émile Durkheim (2003) que a entendia
como um desdobramento da crise na sociedade, assim como Michel
Foucault (1984) quando afirma que a ideia de crise está enraizada na pró-
pria configuração das instituições modernas, ou seja, a crise enquanto
consequência da modernidade.
Ao longo da história da educação nos países da América Latina,
análises que partem das ideias de Foucault apontam para a existência de
outro ciclo baseado no binômio crise-reforma. Tal ciclo acaba por sus-
tentar a necessidade das reformas na educação, uma vez que estas são
tentativas de instaurar um processo de “governamento” da população,
tendo em vista uma homogeneidade por meio do processo de escolari-
zação (Foulcault, 2008).
A educação básica, nesse contexto, configura-se enquanto um
espaço de múltiplos interesses. Não é novidade alguma a prática de im-
portar experiências de sucesso de outros países. Em cada momento de
crise na história algum país serviu de inspiração à educação brasileira.
Para a pesquisadora do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento

132
DNA Educação

Científico e Tecnológico) Nilda Alves (2014) desde a premissa da globali-


zação, considera-se que seria possível trazer influências e inspirações a
partir da experiência de outros países.
Na tentativa de implantar modelos pedagógicos de outros paí-
ses partindo da ideia de que é necessário investimento financeiro na edu-
cação, abre-se o leque para interesse capitalista, alto nível de entrosa-
mento e poder do setor privado naquelas que deveriam ser políticas pú-
blicas. Tais políticas voltadas à educação ganham vida por meio do mo-
vimento “Educação para Todos”, que conforme consta no site, são seus
apoiadores a Fundação Lemann, Gerdau, Unibanco, Fundação Vale,
Santander, Itaú, Bradesco, Dpaschoal, Suzano, Telefônica/Vivo, Insti-
tuto Península e Instituto Camargo Correa.
Há muito tempo é difundida a concepção de que conhecimento
é sinônimo de poder, e é com base nisso que ocorre a assimilação, a
transposição do conhecimento como mercadoria. Assim, muitos países
vêm repensando seus currículos e bases nacionais na tentativa de acom-
panhar as mudanças bruscas da economia.
Uma das principais vertentes dessa importação é a abordagem
das competências socioemocionais (Big Five). Uma tendência que é evi-
denciada como responsável pelo sucesso de países referência em educa-
ção como a Finlândia e Singapura.
O Big Five tem crescido com o apoio de alguns profissionais da
psicologia e consiste em pressupostos de que seria possível analisar a
personalidade de uma pessoa por meio de cinco dimensões: abertura às
novas experiências, extroversão, amabilidade, consciência e estabilidade
emocional.
A proposta é incluir o desenvolvimento das competências e ha-
bilidades socioemocionais concomitantemente ao desenvolvimento das
demais competências, compreendendo-as enquanto parte essencial para
o progresso humano, um meio de conectar o indivíduo ao meio em que
vive. O principal argumento para o trabalho com essas competências é
justamente a formação integral, entretanto, não implica em abandonar o
aspecto cognitivo.
Outrossim, a BNCC brasileira apresenta especialmente inspira-
ções nos modelos de educação de Singapura, Finlândia, Estados Unidos,

133
DNA Educação

Canadá, Austrália, França, Chile, Portugal e Reino Unido. Todos acres-


centaram o Big Five às suas bases curriculares.
O trabalho com as competências socioemocionais busca impul-
sionar o desenvolvimento rumo à maior eficiência, potencialidade da
pessoa, com a alegação de que quando os aspectos interpessoais e pes-
soais estão bem equilibrados, se alcança melhores resultados.
Para Hanna Arendt (2005) uma das características da crise na
educação é o pragmatismo: ao substituir o aprendizado pelo fazer, pela
concepção de aprender fazendo, tal prática revela que o papel da educa-
ção seria o de firmar uma habilidade, resultando, assim como o exemplo
dos Estados Unidos, na transformação de escolas em centros vocacio-
nais.
Avaliação no ensino por competências e habilidades
Frente ao cenário relatado de caracterização da crise na educa-
ção, passemos a problematizar de que forma podem harmonizar-se a
BNCC, os currículos e as práticas de avaliação do rendimento escolar.
Se a BNCC foi construída a partir do preceito da necessidade
de garantia de direitos de aprendizagem aos educandos do Brasil, medi-
ante os baixos índices apresentados pelo IDEB e IBGE, considera-se
que seu advento modificará práticas escolares em grande escala, o que
para Macedo (2014, p. 1549) significa que:
Está em curso a construção de uma nova arquitetura de re-
gulação e de que, nela, os sentidos hegemonizados para a
educação de qualidade estão relacionados à possibilidade de
controle do que será ensinado e aprendido. Trata-se, por-
tanto, de um discurso circular, no qual a medida da quali-
dade torna-se seu esteio e a sua garantia. A evidência de qua-
lidade se torna a própria qualidade que se está advo-gando.
Uma nova regulação educacional se configura a partir da
BNCC. Desse modo, inicialmente faz-se necessário compreender peda-
gogicamente o significado de algumas terminologias utilizadas no texto
do documento, principalmente a ideia de competências e habilidades.
A BNCC apresenta “Dez Competências Gerais” que devem ser desen-

134
DNA Educação

volvidas ao longo de toda a Educação Básica, certamente são competên-


cias bastante complexas, por isso o longo prazo para serem desenvolvi-
das.
Os termos competências e habilidades são amplamente utiliza-
dos em sistemas de educação pelo mundo, especialmente na América do
Norte e Europa. Já no Brasil, aparece nos PCN’s e nas avaliações de larga
escala, como Prova Brasil e ENEM, por exemplo. Utilizaremos defini-
ções para os termos a partir dos estudos de Perrenoud (1999), Zabala e
Arnau (2010) e Macedo (2005).
O conceito de competência surgiu primeiramente no âmbito
profissional, com relação à execução de tarefas com excelência, e este
sim indica seu antônimo: a incompetência (Perrenoud, 1999), a não rea-
lização das tarefas com eficiência. Evidentemente que este não é o em-
prego do termo na educação!
Após migrar para o campo educacional, a competência está re-
lacionada à “capacidade de agir eficazmente em um determinado tipo de
situação, apoiada em conhecimentos, mas sem limitar-se a eles” (Perre-
noud, 1999, p. 07). Ou seja, ter determinada competência no processo
de aprendizagem significa a eficácia para resolver conflitos, situações-
problema do cotidiano, partindo do conhecimento já consolidado, jun-
tamente com novas estratégias de solução. É a capacidade de agir articu-
ladamente utilizando diferentes recursos. Zabala e Arnau (2010) refor-
çam afirmando que competência é a capacidade de mobilização das ha-
bilidades e conhecimentos para resolver situações durante toda a vida.
O uso do termo na educação gerou e ainda gera desconfortos,
principalmente se considerarmos seu ressurgimento com força total nos
últimos três anos. Para Zabala e Arnau (2010) a fonte dos conflitos se
concentra na revisão e transformação da maneira de ensinar e aprender.
Isso porque o trabalho pedagógico por competências e habilidades dis-
sipa a concepção do ensino fragmentado por matérias/disciplinas e em-
basado na memorização, uma vez que a proposta está voltada para a for-
mação integral do sujeito, daí pensar em áreas do conhecimento que se
interrelacionam e no ensino a partir de situações-problema. O que já es-
tava explicitado nas palavras de Paulo Freire (2004, p. 22) “[...] ensinar

135
DNA Educação

não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua pro-


dução ou a sua construção”, e também exposto por Perrenoud (1999)
quando diz que o papel da escola não se restringe à “transferência” de
conteúdos disciplinares, mas sim o desenvolvimento de competências
pessoais, é oferecer ferramentas para o domínio da vida e compreensão
do mundo.
Para dilucidar ainda mais o conceito de competência, e princi-
palmente ter condições de levá-lo à sala de aula, faz-se necessário perce-
ber que nele estão intrínsecas as categorizações de conteúdo. Os conte-
údos conceituais, atitudinais e procedimentais (Zabala, 1998), que, de
maneira geral, significam: 1- Conceituais: conhecimentos relacionados a
fatos, informações, datas, símbolos e princípios; 2- Atitudinais: se refe-
rem a valores, normas e atitudes; 3- Procedimentais: realização de proce-
dimentos, a prática, realização de determinada atividade. Além de outras
concepções, como a dos “Quatro Pilares da Educação” (aprender a co-
nhecer, aprender a conviver, aprender a ser e aprender a fazer), de coor-
denação de Jaques Delors (2001) para a UNESCO (Organização das Na-
ções Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura).
Toda e qualquer competência é construída em longo prazo,
como já dito, trata-se de um processo complexo. Para que se possa cons-
truir uma determinada competência, antes é preciso ter já consolidado
um conjunto de habilidades. Uma competência exige que se orquestre
um conjunto variado de esquemas de percepção, pensamento, avaliação
e ação (Perrenoud, 1999).
As habilidades é que formam, dão corpo à competência. Para
Perrenoud (1999) habilidade é o “saber-fazer”, é uma série de procedi-
mentos mentais que são acionados para resolver uma situação. “Por
exemplo, quando um aluno está aprendendo a multiplicar ele utiliza a
habilidade da adição e da conservação do número, que ele já possui, para
resolver o novo problema” (SILVA e FELICETTI, 2014, p. 19).
Pensar o ensino por competências e habilidades implica trans-
por a concepção daquilo que se deve ensinar para aquilo que se tem o
direito de aprender, segundo a própria BNCC, possibilita indicar clara-
mente os direitos de aprendizagem. Para Perrenoud (1999) os educado-
res que se apropriam do ensino por competências e habilidades assumem

136
DNA Educação

uma responsabilidade na escolha de suas práticas, dando ênfase às práti-


cas sociais, ao respeito da cultura e da diversidade, compreendem que o
processo educativo vai além do domínio de informações.
Nesse processo, realiza-se a substituição do ensino por conteú-
dos pelo trabalho com as habilidades, que implicam ação sobre o objeto
de conhecimento. As habilidades, conforme descritas na BNCC, apre-
sentam uma estrutura textual delicadamente organizada, sendo com-pos-
tas por um verbo no infinitivo, que explicita o processo cognitivo; um
objeto de conhecimento, complemento do verbo, que explicita a mobi-
lização da habilidade; modificadores que explicitam o contexto ou uma
maior especificação da habilidade (BRASIL, 2017, p. 29).
Utilizar verbos para indicar ações de aprendizagem não é novi-
dade da BNCC. A prática vem sendo expandida desde o final da década
de 1940, por meio do desenvolvimento de estudos relacionados à Taxo-
nomia de Objetivos Educacionais. Segundo o dicionário Caldas Aulete
(on-line), taxonomia é a “parte da gramática que trata da classificação das
palavras”.
Tais estudos foram realizados por um grupo de educadores e
psicólogos da educação num congresso em 1948, que, liderados por Ben-
jamim Bloom, consolidaram a ideia de que era necessário criar uma lin-
guagem comum entre os educadores, principalmente por conta da prá-
tica avaliativa, tendo em vista a melhora da comunicação entre eles.
As taxonomias têm sua origem nas proposições de Ralph Tyler
(1902-1994), que por volta dos anos 1930, sentia a necessidade de utilizar
a avaliação como recurso para tornar eficiente o ensino, uma tentativa de
combate às altas taxas de reprovação escolar (Luckesi, 2011). Uma das
principais contribuições de Tyler para a educação foi sua pesquisa “Es-
tudo de Oito Anos” (1935-1943), que resultou no livro “Princípios bási-
cos de currículo e ensino” (1949), no qual sistematizou a taxonomia: o
ensino por objetivos, que deveria consistir em um ensino sistematica-
mente organizado, planejado e executado. Vale ressaltar que tanta neces-
sidade de regulação do processo educativo se deu num cenário de total
reconstrução, no período pós Primeira Guerra Mundial (1914-1918).
O uso do verbo para iniciar a habilidade a ser trabalhada tem
suas potencialidades no sentido de que torna mais clara a efetiva ação

137
DNA Educação

que se espera do educando, “o entendimento e a configuração clara do


que se deseja ao exercitar as práticas pedagógicas no ensino escolar,
tendo por base processos fundamentais da psicologia humana relaciona-
dos com o ensino e a aprendizagem” (Luckesi, 2011, p. 39).
Na prática, significa planejar as ações pensando na construção
das competências em longo prazo e, em curto prazo, na consolidação
das habilidades. O que ocorre pela proposta de ensino e aprendizagem
baseado em situações-problema, aprendizagem significativa e muita
atenção na elaboração dos enunciados, deixando para trás perguntas pu-
ramente conceituais como “o que é” ou “como ocorre”.
Em uma pedagogia das situações-problema, o papel do
aluno é implicar-se, participar de um esforço coletivo para
elaborar um projeto e construir, na mesma ocasião, novas
competências. Ele tem direito a ensaios e erros e é convi-
dado a expor suas dúvidas, a explicar seus raciocínios, a to-
mar consciência de suas maneiras de aprender, de memori-
zar e de comunicar-se (PERRENOUD, 1999, p. 65).
O Conselho Nacional de Educação determinou ao INEP que,
em um ano após a homologação da BNCC as avaliações de larga escala
sejam adequadas à matriz do documento. Nesse sentido, o INEP é o
responsável direto pelo SAEB – Sistema de Avaliação da Educação Bá-
sica, que apresenta suas diferentes matrizes de avaliação por competên-
cias e habilidades.
Trata-se de um alinhamento entre as habilidades e competên-
cias presentes na BNCC e as matrizes de avaliação de larga escala, o que
aproxima a prática docente de uma zona perigosa: a de transformar o
que se cobra nas avaliações de larga escala em currículo escolar. De modo
que o ensino seja plenamente pautado naquilo que será pedido nos exa-
mes.
A reformulação das avaliações de larga escala está em anda-
mento no CONSED por meio de um Grupo de Trabalho que tem por
objetivo desenvolver uma proposta inicial para as avaliações estaduais
com projeção às federais. As ações são apoiadas por parceiros como Ins-
tituto Ayrton Senna, Fundação Itaú Social, Instituto Unibanco e Insti-

138
DNA Educação

tuto Natura. As primeiras posições do GT foram discutidas no Seminá-


rio Internacional de Avaliação, que aconteceu em Recife/PE, em outu-
bro de 2017.
O que fica marcado quando se pensa na BNCC e na reformu-
lação das avaliações de larga escala é o controle externo do fazer peda-
gógico, reforçando uma vez mais a prática de priorizar bons resultados
nos exames, ainda que em detrimento da construção de outros conheci-
mentos. Dessa forma, os objetivos de aprendizagem seriam considerados
o padrão nas avaliações.
Por outro lado, deve ficar claro que existem diferentes esferas
de atuação das avaliações. As avaliações da aprendizagem, também co-
nhecidas como avaliações processuais são aquelas que se executam na
autonomia das escolas, as avaliações produzidas e realizadas pelos edu-
cadores. Avaliam os conhecimentos mais específicos e devem ser ade-
quadas à turma, considerando suas particularidades e o currículo local.
Devem ter como projeção a construção de competências sim, entretanto,
precisam ser formuladas com o objetivo de verificar a construção de ha-
bilidades.
Já as avaliações de larga escala, também conhecidas como ava-
liações externas, além de serem censitárias e trabalharem por amostra-
gem, buscam verificar os níveis de aquisição de competências. O que lhes
confere esse caráter “distante” da realidade que muitos professores apon-
tam. Avaliação em larga escala é apenas um recorte do currículo!
Compreender essas diferenças se faz fundante para uma prática
pedagógica que não institua a avaliação processual como cobrança vazia
ou preparação para outros exames, o que resultaria numa armadilha que
silencia estatisticamente os dados sobre aqueles que não aprendem o ade-
quado à idade/série.
Considerando ainda que a BNCC não faz nenhuma menção
quanto aos processos de avaliação a partir deste novo cenário educacio-
nal. O que, sem dúvida, representa a perda de uma ótima oportunidade
de discussão e reflexão sobre a importância da avaliação do rendimento
escolar.
Por fim, há de se ter cautela sobre como utilizar a BNCC, como
construir ou reformular os currículos e como e o quê avaliar sem nunca

139
DNA Educação

perder de vista que trabalhamos com humanos, colaborando para a for-


mação da humanidade nas pessoas.
Considerações finais
O nível de compreensão quando se trata de um novo horizonte,
como é o caso da BNCC, se faz imprescindível para que esta não se con-
figure na prática escolar apenas enquanto mais um documento distante
e que desconsidera as realidades. Trata-se de conhecer as terminologias
pedagógicas empregadas, bem como inteirar-se do significado delas, de
maneira que se possa trazê-las para o contexto, conferindo-lhes sentido.
Se o objetivo é melhorar a qualidade da educação, o olhar para
a formação das competências e habilidades, sobretudo, deve ser caute-
loso e respeitoso. Percebendo que a educação não é linear, mas sim um
processo complexo e individual, que deve considerar a trajetória dos su-
jeitos, dando a cada um a liberdade de ser como é, mas sem deixar de
lado a orientação à formação necessária para sua atuação na sociedade.
Um dos maiores desafios está na proposta das competências
socioemocionais, ao passo que as críticas recaem sobre o estabeleci-
mento de padrões de comportamento, de modos de ser e agir no mundo,
aproximando-se da homogeneidade, que já é sabido não existe em se tra-
tando de pessoas.
Corre-se o risco de se avaliar apenas levando em consideração
as habilidades propostas na BNCC, os comportamentos “esperados”
dentro do Big Five, as aprendizagens que deveriam ter sido construídas.
Não podemos voltar às práticas que valoram demasiadamente
o cognitivo, o índice de aproveitamento, o que provocaria um aumento
expressivo do fracasso escolar, da desvalorização das pessoas.
A avaliação do rendimento escolar, a partir da reelaboração das
avaliações de larga escala, terá como um de seus objetivos a aproximação
com a sala de aula. O que por um lado direciona o trabalho para a garan-
tia dos direitos de aprendizagem dos educandos em escala nacional, e por
outro pode configurar-se como um instrumento de controle. Influenci-
ando diretamente na adequação dos Projetos Políticos-Pedagógicos, dos
Planos de Ensino, e por fim da própria ação docente.

140
DNA Educação

Em outras palavras, o controle externo da avaliação do rendi-


mento escolar encurta a distância entre a concepção do que deve ser en-
sinado e a emissão de juízos de valor em relação aos resultados. Uma
perigosa fenda para a meritocracia.

Referências
ALVES, N. Sobre a possibilidade e a necessidade curricular de uma base
nacional comum. Revista e-Curriculum, São Paulo, v.12, n.03 pp. 1464-
1479, 2014. Disponível em: < https://revistas.pucsp.br/index.php/cur-
riculum/article/view/21664/15948>. Acesso em: 10 jun. 2018.
ARENDT, H. Entre o passado e o futuro. Tradução Mauro W. Barbosa.
5 ed. São Paulo: Perspectiva, 2005.
BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular:
educação é a base. 2017. Disponível em: < http://basenacionalco-
mum.mec.gov.br/images/BNCC_20dez_site.pdf> Acesso em: 19 fev.
2018.
_________. Constituição (1988). Constituição da República Federativa
do Brasil. 40 ed. São Paulo: Saraiva, 2007.
_________. Lei Federal nº 9394/1996, de 20 de dezembro de 1996. Es-
tabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Lei de Diretrizes e
Bases da Educação Nacional. Disponível em: <http://www.pla-
nalto.gov.br/Ccivil_03/leis/L9394.htm>. Acesso em: 19 fev. 2018.
_________. Lei Federal n° 12796/2013, de 04 de abril de 2013.
Altera a Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as di-
retrizes e bases da educação nacional, para dispor sobre a formação dos
profissionais da educação e dar outras providências. Disponível em: <
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-
2014/2013/lei/l12796.htm>. Acesso em: 11 jun. 2018.
_________. Lei Federal n° 13005/2014, de 25 de junho de 2014.
Aprova o Plano Nacional de Educação - PNE e dá outras providências.
Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-
2014/2014/lei/l13005.htm>. Acesso em 11 jun. 2018.
_________. Portaria n° 592, de 17 de junho de 2015. Institui Comissão
de Especialistas para a Elaboração de Proposta de Base Nacional Co-
mum Curricular. Disponível em: <http://siga.anec.org.br/Documen-
tos/Legislacao/portaria_no__592_de_17_de_junho_de_2015.pdf>.
Acesso em 13 jun. 2018.
_________. Resolução n° 04, de 13 de julho de 2010. Define Diretrizes
Curriculares Nacionais Gerais para a Educação Básica. Disponível em:

141
DNA Educação

< http://portal.mec.gov.br/dmdocuments/rceb004_10.pdf>. Acesso


em 13 jun. 2018.
CORTELLA, M. S. Ética e Convivência: ainda dá tempo. Reflexões ur-
gentes para pais, docentes e educadores. São Paulo: Cortez, 2015.
DELORS, J. Educação: um tesouro a descobrir. Relatório para a
UNESCO da Comissão Internacional sobre educação para o século
XXI. 6 ed. São Paulo: UNESCO, MEC. Brasília: Cortez, 2001.
DEWEY, J. Vida e Educação. 9 ed. São Paulo: Melhoramentos, 1975.
_________. Experiências em Educação. 3 ed. São Paulo: Ed. Nacional,
1979.
DURKHEIM, É. Educación y Sociología. Barcelona: Península, 2003.
FOUCAULT, M. Vigiar e Punir. 3 ed. Rio de Janeiro: Vozes, 1984.
_________. Segurança, território, população: curso dado no Collège de
France (1977-1978). Tradução Eduardo Brandão. São Paulo: Martins
Fontes, 2008.
FREIRE, P. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática edu-
cativa. São Paulo: Paz e Terra, 2004.
GRUPO MOVIMENTO PELA BASE NACIONAL COMUM (São
Paulo). Construção da BNCC: linha do tempo. 2017. Disponível em: <
http://movimentopelabase.org.br/linha-do-tempo/>. Acesso em: 22
jun. 2018.
IBGE. Taxas de Analfabetismo, 2016. Disponível em: < https://brasi-
lemsintese.ibge.gov.br/educacao/taxa-de-analfabetismo-das-pessoas-
de-15-anos-ou-mais.html>. Acesso em: 15 jun. 2018
IDEB. Resultados e Metas, 2015-2021. Disponível em: <
http://ideb.inep.gov.br/resultado/resultado/resultadoBra-
sil.seam?cid=1541530>. Acesso em: 14 jun. 2018.
INEP. Dados do Fluxo Escolar 2007-2015. Disponível em: <
http://portal.inep.gov.br/artigo/-/asset_publis-
her/B4AQV9zFY7Bv/content/inep-divulga-dados-ineditos-sobre-
fluxo-escolar-na-educacao-basica/21206>. Acesso em: 14 jun. 2018.
LUCKESI, C. C. A taxonomia de objetivos educacionais sessenta anos
depois. Educatrix. São Paulo, v. 1, n. 1, set. 2011, pp. 39-47. Disponível
em: <file:///C:/Users/maiaraasp/Downloads/Educatrix_ed_01.pdf>.
Acesso em 12 mar. 2018.
MACEDO, L de. Competências e habilidades: elementos para uma re-
flexão pedagógica. In: BRASIL. Ministério da Educação. Instituto Naci-
onal de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. Exame Naci-
onal do Ensino Médio (Enem): fundamentação teórico-metodológica.
Brasília, 2005. p. 13-28. Disponível em: Acesso em: 20 jun. 2018.

142
DNA Educação

MACEDO, E. Base Nacional Comum Curricular: novas formas de soci-


abilidade produzindo sentidos para a educação. Revista e-Curriculum,
São Paulo, v. 12, n. 3, p. 1530-1555, out/dez., 2014.
MOREIRA, A. F. A crise da teoria curricular crítica. In: COSTA, M. V.
)org). O currículo nos limiares do contemporâneo. Rio de Janeiro:
DP&A, 2000.
OBSERVATÓRIO DAS METAS DO PNE. Disponível em:
<http://www.observatoriodopne.org.br/metas-pne>. Acesso em: 20
jun. 2018.
PATTO, M. H. S. Criança da escola pública: deficiente, diferente ou mal
trabalhada. In: Revendo a Proposta de Alfabetização [S.I: s.n.], 1985.
PERRENOUD, P. Construir as competências desde a escola. Porto Ale-
gre: Artmed, 1999.
_________. et al. As competências para ensinar no século XXI: a forma-
ção dos professores e o desafio da avaliação. Porto Alegre: Artmed, 2002.
SACRISTÁN, J. G. Poderes instáveis em educação. Tradução de Beatriz
Affonso Neves. Porto Alegre: Artmed, 1999.
SILVA, G. B.; FELICETTI, V. L. Habilidades e competências na prática
docente: perspectivas a partir de situações-problema. Educação por Es-
crito, Porto Alegre, v. 5, n. 1, mai. 2014, p. 17-29. Disponível em: <
http://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/porescrito/arti-
cle/view/14919/11497>. Acesso em: 12 mar. 2018.
SILVA, T.T. Documentos de Identidade: uma introdução às teorias do
currículo. Belo Horizonte: Autêntica, 1999.
_________. Identidades terminais: as transformações na política da pe-
dagogi e na pedagogia da política. Petrópolis: Vozes, 1996.
TAXONOMIA. Dicionário on-line Caldas Aulete. Disponível em:
<http://www.aulete.com.br/taxonomia>. Acesso em 13 jun. 2018.
ZABALA, A. A prática educativa: como ensinar. Porto Alegre: Artmed,
1998.
_________; ARNAU, L. Como aprender e ensinar competências. Porto
Alegre: Artmed, 2010.

143
DNA Educação

NOVAS TECNOLOGIAS E TRABALHO DOCENTE:


UM OLHAR SOBRE A PRÁTICA DO PROFESSOR EM CONTEX-
TOS DE ENSINO A DISTÂNCIA

Marcella da Silva Estevez Pacheco Guedes1


Reginaldo Guedes2

RESUMO:
Na área da educação percebemos um grande movimento de virtualização
do ensino, na perspectiva de e-learning. O professor passou a ter várias
denominações, tais como: professor online, tutor, mediador etc. Inde-
pendente da denominação recebida pelo professor, ele necessita desen-
volver habilidades diferenciadas para atuar neste novo modelo que trans-
cende as dimensões tradicionais do ensino presencial. A partir de relatos
de professores/tutores e de alunos de dois cursos: um de pós-graduação
lato-sensu (especialização) e outro de graduação, ambos realizados a dis-
tância, este breve cenário apresentado nos instigou a refletir sobre as
competências dos docentes necessárias para o desenvolvimento e atua-
ção no ensino a distância via internet. Além de discutir os obstáculos
enfrentados neste meio e as estratégias adequadas para superar a distân-
cia geográfica e temporal existente entre professor-aluno, busca proble-
matizar questões pontuais, tipo: Quais dificuldades foram encontradas,
por parte dos cursistas e tutores? Quais foram superadas? Como superou

1 Doutora em Ciências Humanas - Educação pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de


Janeiro (PUC - Rio). Mestre em Educação pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
Graduada em Pedagogia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). É Professora
Adjunta da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), área de Ensino-Aprendizagem,
do Departamento de Formação de Professores, da Faculdade de Educação da Baixada Flumi-
nense (UERJ - FEBF). É professora docente I (Formação de Professores - Ensino Médio), de
disciplinas pedagógicas, na Secretaria de Estado de Educação do Rio de Janeiro (SEEDUC).
Tem experiência na área de Educação, atuando principalmente nos seguintes temas: formação
de professores, didática e currículo
2 Docente dos cursos de Graduação da Faculdade Unyleya. Pedagogo pela Universidade Fede-

ral do Rio de Janeiro (UFRJ). Especialista em Planejamento, Implementação e Gestão da Edu-


cação a Distância (Universidade Federal Fluminense - UFF) e Mestre em Educação pela UFRJ.
Tem experiência na área de pesquisa educacional e no trabalho de Avaliação e Monitoramento
de Políticas Públicas em Educação.

144
DNA Educação

as dificuldades? Por meio da análise de mensagens eletrônicas e de ob-


servações realizadas no ambiente virtual de aprendizagem do curso de
graduação, foi possível traçar um perfil do alunado a partir das interações
realizadas (via e-mail) com os professores/tutores. Os mais recorrentes
foram: perfil empático, acusador e agressivo.
Palavras-chave: Educação a Distância; Tecnologias; Tutoria; Compe-
tências.
ABSTRACT:
In the area of education we perceive a great movement of teaching vir-
tualization, from an e-learning perspective. The teacher started to have
several denominations, such as: online teacher, tutor, mediator, etc. Re-
gardless of the denomination received by the teacher, he needs to de-
velop differentiated abilities to act in this new model that transcends the
traditional dimensions of face-to-face teaching. Based on reports from
teachers / tutors and students from two courses: a post-graduation lato-
sensu (specialization) and a graduate degree, both carried out from a dis-
tance, this brief scenario presented us instigated to reflect on the skills of
the necessary teachers for the development and performance in distance
learning via internet. In addition to discussing the obstacles faced in this
environment and the adequate strategies to overcome the geographical
and temporal distance between teacher-student, he seeks to problematize
specific questions, such as: What difficulties were encountered by the
students and tutors? Which were overcome? How did you overcome the
difficulties? Through the analysis of electronic messages and observa-
tions made in the virtual learning environment of the undergraduate
course, it was possible to draw a profile of the student from the interac-
tions (via e-mail) with the teachers / tutors. The most recurrent were:
empathetic, accusatory and aggressive.
Keywords: Distance Education; Technologies; Tutoria; Skills.
Introdução
Com a expansão da Educação a Distância via internet no Brasil,
novas relações entram em cena e precisam ser discutidas no âmbito da
educação e da sociedade, de modo a desempenhar esforços para uma
formação integral, a um público que especialmente busca essa modali-
dade de ensino, o qual deve assumir responsabilidade não somente com
as possibilidades de garantir a oportunidade à distância, mas, sobretudo,
garantir uma boa formação do aluno. O crescimento e ampliação da

145
DNA Educação

oferta de cursos online fazem com que a modalidade de Educação a Dis-


tância (EaD) contemple hoje um dos maiores desafios proporcionado
aos profissionais da educação3. Neste contexto, percebe-se a importância
na gestão e no planejamento de ações colaborativas e de interações por
parte das equipes pedagógicas diante do processo de aprendizagem me-
diado pela tecnologia. Vislumbrando, junto ao corpo docente, o desen-
volvimento e aprendizado de novas ferramentas para a construção de um
promissor estoque de competências, que sustentem um novo olhar para
este formato de aprendizagem, tendo como prospecção uma visão mais
detalhada de novas estratégias na EaD.
Barreto (2004) destaca que tais mudanças proporcionam a aná-
lise do surgimento de um “novo paradigma” (também chamado de pa-
radigma emergente) na área da educação. Percebemos um grande movi-
mento de virtualização do ensino, na perspectiva de e-learning: cujo uso
mais comum tem sido “educação a distância via Internet” ou, em termos
gerais, aprendizagem por meios eletrônicos. Com a introdução de siste-
mas de comunicação mediada pelo computador, emergem novas práticas
de ensino, as quais nos levam a novas reflexões sobre o papel do profes-
sor no processo de ensino-aprendizagem. Um maior grau de
interatividade implica também a bidirecionalidade da comunicação, ou
seja, usuários não só acessam informações na internet, mas criam e
difundem estas informações tornando-se emissores e não apenas
receptores. Esta é a base da Educação On-line sobre a qual estamos
dialogando e nos apoiando: provocar a atividade entre professores e
alunos (interatividade) de forma que todos sejam agentes da construção
de conhecimento colaborativa com a qual estão envolvidos.
No “novo paradigma” o professor passou a ter várias denominações, tais
como: professor, professor online, mentor, tutor, mediador etc., entre outras já existentes
e outras que ainda surgirão. Independente da denominação recebida pelo professor, ele

3Dialogando com Silva (2003), destacamos que a Educação a Distância (EaD) ocorre quando
os participantes estão distantes geograficamente, e grande parte da interação acontece através
da Internet. Apesar de nem todos os cursos na modalidade à distância serem on-line, neste
estudo estamos trabalhando com a educação on-line, realizada a distância, via internet.

146
DNA Educação

necessita desenvolver habilidades diferenciadas para atuar neste novo modelo de sala
de aula que transcende as dimensões tradicionais do ensino presencial. Ou seja, há
demanda de procedimentos, estratégias e competências comuns. De acordo com Pedrosa
et al (2012), a tutoria a distância tem sido foco de vários debates nos quais a função
a ser exercida pelo professor/tutor é colocada em evidência: “enquanto alguns autores
enfatizam a ação e a importância desse ator no processo ensino-aprendizagem, outros
minimizam essa função alegando que o sujeito aprende apenas a partir da sua intera-
ção com o conteúdo”. Os Referenciais de Qualidade de Educação a Distância, embora
evidencie a obrigatoriedade dos tutores a distância não deixa claro suas reais ações no
processo, o que acarreta diferentes interpretações. Como consequência, percebe-se que,
em alguns cursos os tutores atuam de forma reativa, apenas tirando dúvidas quando
surgem e, em outros, interagindo com os alunos exercendo uma postura mais ativa:
através da mediação pedagógica (op.cit.).
Esta nova proposta dialética de aprendizagem on-line significa
também em se aventurar e conhecer novos formatos de avaliação e no-
vos ambientes. E no caso da EaD via internet, torna-se fundamental co-
nhecer o seu ambiente de trabalho: os Ambientes Virtuais de Aprendi-
zagem (AVA). Para atuar nestes novos ambientes há muitas condições
necessárias para que o ensino online seja bem-sucedido, que Berge (1997)
categorizou em quatro áreas e propõe quatro funções/ dimensões atri-
buídas ao professor online:
a) Dimensão Pedagógica (intelectual; tarefa) - os professo-
res trazem seu conhecimento e percepções especiais, usam perguntas e
tentam provocar respostas dos alunos que direcionem a discussão para
conceitos, princípios e habilidades críticos;
b) Social - criar um ambiente amigável e sociável que promova
o aprendizado também é essencial para o ensino on-line bem-sucedido.
Fornecer oportunidades para que os alunos desenvolvam um senso de
coesão de grupo;
c) Gerencial (organizacional; procedural; administrativo) -
esse papel envolve definir a programação e o ritmo da experiência de
aprendizagem: os objetivos da discussão, os horários, as regras de proce-
dimentos e as normas de tomada de decisão. Os comentários do profes-
sor podem ser usados para resolver problemas de contexto e ajudar os

147
DNA Educação

participantes a lidar com o excesso de informações. Deve gerenciar o


fluxo sem represá-lo;
d) Técnica - os professores devem primeiro se sentir confor-
táveis e hábeis com a tecnologia e então garantir que os participantes
estejam confortáveis com o sistema. O objetivo técnico final para os pro-
fessores é tornar a tecnologia transparente.
A partir de relatos de professores/tutores e de alunos de dois
cursos: um de pós-graduação lato-sensu (especialização) e outro de gradu-
ação4, ambos realizados a distância e oferecidos pela AVM Faculdade
Integrada, este breve cenário apresentado nos instigou a refletir sobre as
competências dos docentes necessárias para o desenvolvimento e atua-
ção no ensino a distância via internet. Além de discutir os obstáculos
enfrentados neste meio e as estratégias adequadas para superar a distân-
cia geográfica e temporal existente entre professor-aluno, busca proble-
matizar questões pontuais, tipo: Quais dificuldades foram encontradas,
por parte dos cursistas e tutores? Quais foram superadas? Como superou
as dificuldades? Por meio da análise de mensagens eletrônicas (e-mail) e
de observações realizadas no ambiente virtual de aprendizagem do curso
de graduação, foi possível traçar um perfil do alunado a respeito do nível
de interação com seus respectivos professores/tutores.
O desenvolvimento profissional dos docentes
Na área da Educação encontramos uma grande literatura que
aborda a temática das competências docentes, seja a docência online ou
presencial.
Segundo Oliveira et alli (2004), como definição de competências
profissionais temos o de um conjunto de conhecimentos, habilidades e
atitudes que capacitam um profissional a desempenhar as suas tarefas de
forma satisfatória, tomando como critério avaliativo os padrões espera-
dos em um determinado momento histórico, em uma determinada cul-
tura.

4Estamos direcionando nossa atenção ao curso de graduação a distância em Pedagogia. Am-


bos os cursos (Gestão de RH e Pedagogia) foram selecionados devido ao fato dos autores do
presente artigo já terem atuado ou atuam na Tutoria desses respectivos cursos.

148
DNA Educação

Por outro lado, Machado (2002) ao comparar os parentescos


semânticos entre competência e competitividade, relacionando-os à disputa e
busca pelo conhecimento, demonstra que quando se disputa algo com
alguém se chega a uma conquista: um perde e outro ganha. Mas o co-
nhecimento não é um bem material que se gasta ou se vende, é um “bem”
que se conquista e se “disputa” junto com o outro. Tal reflexão nos pro-
porciona uma ampliação no significado do termo competência no sentido
de se buscar junto com.
Para se buscar o conhecimento junto com o outro se faz neces-
sária uma mudança que enfatize a importância de um desenvol-vimento
de competências profissionais que se organize em torno da exploração
colaborativa.
Saberes necessários à docência
Cabe ressaltar que a expressão competência não é unanimidade e
autores como Maurice Tardif (2001) prefere o uso de outra expressão:
saberes docentes. Constata que o saber do professor é plural (composto de
saberes de variadas áreas do conhecimento) e estratégico (pelo impacto
que tem junto às gerações jovens, à construção de novos conhecimentos
e à definição de hegemonias no contexto social, entre outros fatores).
Assim, Tardif (idem) apresenta os saberes docentes, como os
compreende:
a) Saberes da formação profissional – transmitidos pelas ins-
tituições de formação de professores, pertencentes às Ciências da Edu-
cação e à ideologia pedagógica;
b) Saberes disciplinares – pertencentes às variadas áreas do
conhecimento;
c) Saberes curriculares – correspondentes aos discursos, ob-
jetivos, conteúdos e métodos constantes dos programas escolares, e que
o professor precisa saber aplicar;
d) Saberes experienciais – desenvolvidos pelos professores
na sua própria prática, no exercício das suas funções. Segundo Tardif
(idem), vão sendo incorporados à experiência individual e coletiva atra-
vés do habitus e das habilidades (do “saber - fazer” e do “saber - ser”).

149
DNA Educação

Percebemos que os quatro saberes apresentados acima são re-


levantes para o exercício do magistério, e em especial, os saberes experien-
ciais surgem como o núcleo vital do saber docente.
Retomando a nossa discussão inicial, Perrenoud (1998) afirma
que é preciso reconhecer que os professores não possuem apenas sabe-
res, mas também competências profissionais que não se reduzem ao do-
mínio dos conteúdos a serem ensinados. O autor relata que há dez novas
competências para ensinar e para o desenvolvimento desse ensaio explo-
ratório, vamos nos ater, em especial, à oitava competência por ele listada
(utilizar as novas tecnologias) e ao exercício da docência online.
Discursos, percepções e práticas de tutoria construídas
Com uma proposta político-pedagógica direcionada a democra-
tização da formação continuada em nível superior no país, a AVM Fa-
culdade Integrada, que já atuava no âmbito presencial passou, desde
2001, a oferecer também cursos de Pós-Graduação lato sensu na modali-
dade a distância via internet5. Em 2005 a instituição lançou seu primeiro
curso de graduação semipresencial de Licenciatura em Pedagogia. Atra-
vés da experiência vivenciada no pólo central da AVM, no Rio de Janeiro,
apresentamos na Figura 1 o ambiente colaborativo de aprendizagem We-
bensino, disponível no endereço http://avm. webensino.com.br/
Figura 1: Página inicial do Webensino–curso de Graduação/Pedagogia.

5O aluno conta com recursos online como meio de complementar sua aprendizagem: PLATOR
– plataforma de orientação de monografia; textos complementares, e-mail; chat etc.

150
DNA Educação

Após esta breve apresentação acerca do ambiente virtual We-


bensino e do sistema PLATOR (utilizado nos cursos de pós-graduação),
vamos dar prosseguimento com a análise das situações enfrentadas pelos
professores/tutores dos dois cursos acima citados: Pedagogia e Gestão
de RH. Com o objetivo de promover uma reflexão acerca das compe-
tências, práticas e habilidades essenciais ao exercício da docência online6.
Em determinados momentos de ambos os cursos, foi possível traçar um
perfil do alunado a partir das interações realizadas (via e-mail) com os
tutores. Os mais recorrentes foram: perfil empático, acusador e agressivo.
- Perfil Empático
Prezado Tutor, gostaria de agradecer pelo seu excelente desempenho como
tutor das disciplinas do curso de Pedagogia. Tem sido um prazer inenarrável poder
contar com o seu apoio durante o semestre letivo.
Parabéns! Muito obrigado! Aluna T.
(E-mail 1 - enviado em setembro/2012 por uma aluna do curso de Pedagogia).
Fico muito feliz que você esteja satisfeita com a nossa equipe de tutoria e mais
feliz ainda de ao se sentir bem atendida, reconhecer o trabalho de nossos colaboradores.
Parabéns à você pela atitude. Bjs! Coordenação Acadêmica - Graduação: Licencia-
tura em Pedagogia.
(Resposta da Coordenação ao E-mail 1).

- Perfil Acusador
Prezada professora, encaminhei o plano pesquisa em junho de 2010 e até
então não obtive resposta alguma. Desta forma, diante ao silêncio virtual da AVM
e da dificuldade em encontrar referências para elaboração da monografia do plano que
enviei anteriormente, reenvio outro plano com um tema pertinente ao meu ambiente de
trabalho e a referência bibliográfica disponível. Espero veementente uma resposta UR-
GENTE sobre a avaliação do meu plano de pesquisa, pois minha meta era concluir
este ano esta especialização. Gostaria de não ter problemas na comunicação com meu
tutor, já que aprendi que o carro chefe da EAD é o feedback.
(E-mail 2 – enviado em novembro/2010 por um aluno do curso de Gestão de RH).

6Os dados e relatos analisados foram coletados a partir de interações realizadas de maneira
assíncrona (via e-mail) entre professores/tutores e cursistas. Os e-mails selecionados foram dis-
ponibilizados na íntegra, incluindo suas formatações originais (alguns em caixa alta) como forma
de detectarmos os possíveis perfis de interação dos sujeitos em questão.

151
DNA Educação

Olá, Aluno B. Avaliei o seu plano em 22/07/2010. Enviei para você


um e-mail na mesma data. Acredito que não tenha recebido o e-mail. Penso que você
deveria ter entrado em contato comigo há mais tempo, justamente para saber o que
aconteceu... Meu trabalho é pautado no comprometimento e responsabilidade e por isso
acredito que o retorno ao aluno é essencial... Por favor, confirme o recebimento do e-
mail e reproduzo a avaliação feita, que poderá ser comprovada ao acessar a sua secre-
taria virtual: (...)
(Resposta da Tutoria ao e-mail 2 – enviado pelo aluno do curso de Gestão de RH).

- Perfil Agressivo
Cara Professora, SE VOCÊ NÃO ME RESPONDER AS PER-
GUNTAS, NÃO SABEREI COMO FAZER. SE ESTA MONOGRA-
FIA SAIU E ESTA NESTE PONTO FOI PORQUE FUI ATRÁS DE
COLEGAS QUE TRABALHAM COMIGO NA UNIVERSIDADE
FEDERAL DE MINAS GERAIS PARA PERGUNTAR, POIS JÁ FI-
ZERAM ESPECIALIZAÇÃO, MESTRADO E DOUTORADO. SE
EU DEPENDESSE DE VOCÊS NÃO TINHA SAÍDO NADA. A
COMEÇAR PELO QUESTIONÁRIO. SE EU FOSSE A ORIENTA-
DORA, AQUELE QUESTIONÁRIO USADO PARA COLETA
NÃO SERIA APROVADO DAQUELE JEITO. FICOU "INTRABA-
LHAVEL" . SÓ DESCOBRI DEPOIS QUE FUI FAZENDO A PES-
QUISA E INTENDENDO UM TRABALHO CIENTÍFICO. E
TUDO QUE EU FIZ FOI PELO MEU ESFORÇO, PESQUISANDO
NA INTERNET, LENDO LIVROS E QUANDO EU PERGUNTO
A VOCÊS, ALÉM DE VOCÊS NÃO ENTENDEREM OU FINGI-
REM QUE NÃO ENTENDEM, NÃO ME RESPONDEM. MAN-
DEI UMA CÓPIA PARA A TUTORIA ANALISAR E DEPOIS QUE
ELA ME DEVOLVEU EU VI O TANTO DE INCOERÊNCIA
QUE PASSOU. PORQUE ELA NÃO ME FALOU ISTO ANTES.
ELA ESTÁ AÍ PRA QUÊ? ELA ME MANDOU FAZER EXATA-
MENTE O QUE VC ESTÁ FAZENDO, O QUE JÁ ESTÁ LÁ. EU
QUERO SABER É O QUE NÃO ESTÁ LÁ. NÃO QUERO QUE
VOCÊS FAÇAM O TRABALHO PARA MIM. VOCÊS DUAS [coor-
denação e tutoria] PARECE QUE NÃO CONVERSAM ENTRE SI!
(E-mail 3 – enviado para Tutoria em março/2010 por uma aluna do curso de Gestão de RH).

152
DNA Educação

Olá, V.!!! Para localizar os exercícios você deve primeiramente clicar em:
Minhas disciplinas/Ensino da matemática/Sala de aula/Ao lado esquerdo da aula
tem um sinal de “+”, aperte-o e verá os exercícios! Lembrando que, conforme o “Plano
de estudos” da disciplina, os exercícios fecham a cada sexta-feira às 20h! Qualquer
dúvida, entre em contato com a tutoria! Abraços!
(E-mail 4 - enviado em agosto/2012 pela Tutoria do curso de Pedagogia para tirar dúvi-
das de uma aluna).
TUTORIA, EU NÃO SOU "DEMENTE" E JÁ ESTOU NO
4º PERÍODO E SEI PERFEITAMENTE LANÇAR OS EXERCÍ-
CIOS!!! CONTINUO PEDINDO PROVIDENCIAS PARA A AULA
1 E 2 QUE NÃO, NÃO , NÃO ABRE PARA POSTAR, QUANDO
CLICO APARECE DIZENDO QUE " A AVALIAÇÃO NÃO ESTÁ
DISPONÍVEL "!!! NÃO É POSSÍVEL, ESTOU DESDE O DIA 3
FALANDO A MESMA COISA E VCS RESPONDENDO OUTRA,
OUTRA, OUTRA COISA. QUERO POSTAR AULAS 1 E 2 DE MA-
TEMÁTICA!!!!!! CONTINUO AGURADANDO SOLUÇÃO!
ALUNA V.
(Resposta da aluna V. ao e-mail anterior enviado pela Tutoria do curso de Pedagogia).
Estimada Aluna V., Pelo que acompanhei dos e-mails anteriores tenta-
mos orientá-la da melhor forma possível e sinceramente não vejo motivo para se alterar
deste jeito, somos profissionais e estamos tentando ao máximo ajudá-la. Nos envie o
exercício que postaremos para você. Veja se o problema está ocorrendo com os demais
exercícios e nos sinalize. Atenciosamente, Tutoria da Pedagogia.
(E-mail enviado pela Tutoria do curso de Pedagogia – em resposta ao e-mail anterior da
aluna V.).
É verdade ! peço desculpas a todos (as). Att. Aluna V.
(Resposta/Pedido de desculpas da aluna V. ao e-mail anterior enviado por ela à Tutoria
do curso de Pedagogia).

Considerações Finais
Vimos que Zane Berge (1997) classificou as várias tarefas e pa-
péis exigidos do professor online em quatro áreas: pedagógica, gerencial,
técnica e social. Os desafios do professor no ambiente virtual são, em
sua maioria, novos para esse profissional da educação e também para o
aluno que, na maior parte das vezes, não teve nenhuma experiência edu-
cacional nesse segmento do ensino. Diante dos obstáculos e dificuldades

153
DNA Educação

apresentadas acima, o professor/tutor necessita possuir determinadas


qualidades perante o atendimento ao cursista: a) possuir clara concepção
de aprendizagem; b) estabelecer relações empáticas com os seus interlo-
cutores; c) não ter uma postura ofensiva; d) partilhar sentidos; e) facilitar
a construção do conhecimento. Nas mensagens dos alunos, de teor acu-
sador/agressivo, é importante que o professor/tutor: a) tente conversar/di-
alogar com os cursistas; b) sinalizar de maneira educada que os alunos
devem tratar os educadores com respeito e c) para que dessa forma, os
alunos passem a enxergar os professores/tutores como profissionais do
ensino.
Embora este estudo tenha tido como objeto traçar um perfil do
alunado a respeito do nível de interação com seus respectivos professo-
res/tutores, por meio da análise de mensagens eletrônicas (e-mail) e de
observações realizadas no ambiente virtual de aprendizagem do curso de
graduação, foi possível também refletir sobre as dificuldades e compe-
tências necessárias aos professores/tutores de dois cursos de nível supe-
rior. Não fazendo levantamentos mais abrangentes, as habilidades e
competências descritas já permitem identificar que o professor online
possui diversos desafios e assume uma posição diferenciada do professor
tradicional. Para Tardif (2001), os docentes são os principais mediadores
da cultura e dos saberes escolares, porém, muitas vezes a formação inicial
desse professor não dá conta de prepará-lo para essa nova realidade que
se coloca e, principalmente, para a rapidez das mudanças na sociedade.

154
DNA Educação

Referências
BARRETO, R.G. (2004, Set./Dez.) .Tecnologia e Educação: Trabalho e
Formação Docente. Educação e Sociedade, Campinas, vol. 25, n. 89, pp.
1181-1201. Disponível em http://www.cedes.unicamp.br
PEDROSA, S. M. P. A. (et al). Reflexões sobre a teoria e prática na me-
diação pedagógica. Anais do 18° CIAED - Congresso Internacional
ABED de EaD. Setembro de 2012, São Luís/Maranhão. Disponível em:
http://www.abed.org.br - Acesso em: 25/02/2013.
BERGE, Z.L. (1997). Characteristics of online teaching in
post-secondary, formal education. Educational Technology,
n.37.
OLIVEIRA, E. S. G. (et al). (2004). A importância da ação tutorial na
educação a distância: discussão das competências necessárias ao tutor.
Disponível em: http://www.niee.ufrgs.br/ribie2004/Trabalhos/Comu-
nicacoes/com20-28.pdf. Acesso em: 12 de setembro de 2011.
MACHADO, N. J. (2002). Sobre a ideia de competência. In: Perrenoud,
P. As competências para ensinar no século XXI: a formação dos profes-
sores e o desafio da avaliação. Porto Alegre: Artmed Editora.
TARDIF, M. (2001). Saberes docentes e formação profissional. Petró-
polis: Vozes.
PERRENOUD, P. (1998). Dez novas competências para ensinar. Porto
Alegre: Artmed.
SILVA, M. (org.). Educação On-line. São Paulo: Edições Loyola, 2003

155
DNA Educação

CENAS DO COTIDIANO ESCOLAR, DESVEN-


DANDO O ESTIGMA DENTRO DA INCLUSÃO ES-
COLAR

Manoel Alves do Nascimento1

RESUMO:
As pessoas com deficiências são excluídas da sociedade, devido à marca
negativa de descrédito recebida pelo meio social. O estudo analisou
como o estigma incorporado pelos alunos com deficiências influencia no
processo de interação e inclusão. Inicio-se com uma revisão de literatura,
conjuntamente a pesquisa etnográfica, utilizou como estratégias de pes-
quisa, entrevistas com 3 professores e observações registradas através de
cenas do cotidiano escolar de 2 escolas públicas de SP. A pesquisa vem
identificando que a escola e os professores através da mediação, pro-
move a interação e criação de saberes tem um papel importante no pro-
cesso de mudança, apesar de muitas vezes reproduzir o estigma social.
Palavras chave: Exclusão, Inclusão, Estigma e Representação Social.
ABSTRACT:
People with disabilities are excluded from society, Because of to the neg-
ative mark of disrepute received by the social environment. The search
analyzed how the stigma incorporated by students with disabilities influ-
ences the process of interaction and inclusion. Beginning with a literature
review, jointly with ethnographic research, used as research strategies,
interviews with 3 teachers and observations registered through daily
school scenes of 2 public schools of SP. Research has identified that
school and teachers through mediation, promotes interaction and
knowledge creation plays an important role in the process of change,
although often reproduce the social stigma.
Keywords: Exclusion, Inclusion, Stigma and Social Representation.

1 Mestre em Educação é Bacharel e Licenciado em Educação Física. Possui especialização em


Surdez/Libras e Deficiências Múltiplas. É professor especialista em educação especial, desen-
volve pesquisas nos seguintes temas: estigma e inclusão, representação social, deficiência in-
telectual e neurociências. manoel.ed.fisica.especial@gmail.com

156
DNA Educação

Introdução
A inclusão escolar é um tema de grande debate na educação
nacional, sendo assim, justifica sua importância e a preocupação de se
pesquisar sobre inclusão e estigma, essa visão dentro do contexto do es-
tigma provoca indagações e questionamentos para aqueles que convivem
e trabalha com pessoas com deficiência, o desafio que começou desde a
Declaração de Salamanca (1990) e que produz reflexão s até hoje, e que
norteia as políticas educacionais, nos faz agora olhar a inclusão através
sobre as facetas do estigma e de suas possíveis manipulações. O artigo
teve origem através da analise de minha dissertação que pesquisou a
questão do estigma, interação social e inclusão escolar.
Sendo assim, o estudo teve como objetivo identificar como o
estigma incorporado pelos alunos com deficiência influencia no processo
de interação e inclusão escolar. Analisando os indícios de como se de-
senvolve o processo de estigmatização no cotidiano escolar, baseados na
visão de interações social e estigma de Goffman (1988), mostrando nas
interações como o estigma é gerado, se reproduz, ou é superado.
A problemática apresentada no estudo põe em questão; como
trabalhar com alunos que já incorporaram uma série de estigma, e que
são marcados negativamente no ambiente social e escolar? E ainda como
os professores e a equipe escolar atualmente entendem esta questão?
Para responder a essa problemática, o estudo apresenta as se-
guintes hipóteses: primeiramente as pessoas que possuem um estigma
são tratadas como incapazes no interior da escola. Ressalta-se que es-
tigma, muitas vezes, não é superado em toda a trajetória escolar, mesmo
com os projetos de inclusão, porque os estudos de inclusão escolar mui-
tas vezes não tratam deste tema.
Outra hipótese apresentada refere-se aos indivíduos estigmati-
zados que se utilizam da manipulação de seu estigma em seu favor, utili-
zando-o como recurso simbólico. Assim, deixa de cumprir atividades que
tem plenas condições de exercer ou utiliza-o como recurso para acober-
tar uma má conduta social, ou seja, quando agride física ou verbalmente
alguém, espera que os outros acreditem que isso ocorre devido à sua de-
ficiência.

157
DNA Educação

O artigo ficou centrado nos resultados da pesquisa de campo,


sendo que a pesquisa empírica pautou-se na pesquisa participante e et-
nográfica baseados nos estudos etnográficos de Erving Goffman, bus-
cando a imersão do pesquisador no cotidiano de duas Escolas Estaduais
da periferia de Mauá, observando as interações de cinco alunos com de-
ficiências, três diagnosticadas, duas sem diagnósticos, observadas em au-
las de Educação Física, nos intervalos e eventos escolares além de entre-
vistas semi-estruturadas com três professoras.
Justificando essa estratégia, Ludke apud (Bordam & Biklen,
1994) acrescenta que o aporte metodológico do presente estudo é a et-
nografia da prática escolar. A etnografia se desenvolveu ao final do sé-
culo XIX e início do XX, como alternativa, na antropologia, para a ob-
servação e descrição de cunho holístico dos modos de vida das pessoas
nas sociedades (Bordam & Biklen, 1994).
As observações foram registradas em formato de cenas; de
modo a mostrar como as ações, gestos e comunicação falada e corporal
dos atores sociais influenciam na incorporação, reprodução e superação
do estigma.
O registro das cenas apresentou os envolvidos como atores so-
ciais, dentro de um cenário dramatúrgico dentro de um enredo interaci-
onal. A análise mostra os atores envolvidos em varias facetas do estigma.
O perfil dos atores observados demonstra que são crianças de 7 a 8 anos,
que nasceram e moram na periferia do município de Mauá. Alguns que
participam de tratamentos e possui uma boa condição financeira. Já para
outros a situação econômica é desfavorecida, ou seja, são alunos de baixa
renda, e que quase não fazem acompanhamento terapêutico.
Foram realizadas ainda entrevistas semi-estruturadas com 3
professores com idade entre 27 e 47 anos. Dois entrevistados já haviam
trabalhado anteriormente com alunos com necessidades especiais, sendo
que uma delas teve neste ano de 2008 seu primeiro contato com aluno
com deficiências. A formação acadêmica das entrevistadas varia muito,
uma delas possui graduação em Pedagogia e especialização em deficiên-
cia mental, outra possui magistério e a última é especialista em Educação
Física Adaptada.

158
DNA Educação

Para o entendimento das cenas foi necessário entender como o


estigma é reforçado nas interações cotidianas, mostrando que o espaço
escolar como toda a sociedade apresenta um grande palco social em que
as pessoas normais e estigmatizadas manipulam suas identidades para
conviver em um mundo padronizado e excludente.
Estigma e inclusão
As pessoas com deficiência historicamente são excluídas do
contexto social mais amplo e da comunidade escolar. Devido a seu es-
tigma, são considerados seres incapazes, imperfeitos, improdutivos e, às
vezes, visto como não pessoa, essa categoria de não pessoa é definida
por Goffman (1988) ao explicar a situação do indivíduo estar no grupo,
mas não ser percebido, não ter voz nem vez, e permanecer isolado em
um canto.
Segundo Castro e Silva (2006) nosso entendimento em relação
que venha a ser o estigma perpassa os padrões de normalidade presentes
na sociedade. A definição de normalidade, por um lado, expressa a con-
formidade com um tipo médio e, por outro, a ausência de patologia.
Tudo o que apresenta características que não se assemelham às nossas,
nos chamam a atenção porque quando nos deparamos com imagens que
nos chocam por suas características grotescas, estas nos causam estra-
nhamento e tomamos tal imagem como referencial de diferença e pre-
conceito. Depois do estranhamento inicial procuramos manter esta ima-
gem longe de nossos olhos, pois o que não é belo e semelhante não é
aceito em nosso meio social.
Para Castro e Silva (2006) tentamos sempre tornar invisíveis ce-
nas que nos desagradam, e isso pode ser visualizado principalmente nos
grandes centros urbanos, quando ao andarmos pelas ruas passamos por
pessoas doentes, com feridas expostas, exibindo a falta de membros dos
corpos ou até mesmo pessoas com aparência descuidada, usando roupas
sujas e rasgadas. Deparamos-nos todos os dias com essas imagens que,
embora cotidianas e evidentes, são por vezes ignoradas porque ferem o
que é considerado belo.
Segundo Goffman consideramos uma pessoa com estigma
desta forma:

159
DNA Educação

Num caso extremo, uma pessoa completamente má, peri-


gosa ou fraca. Assim deixamos de considerá-la criatura co-
mum e total, reduzindo-o a uma pessoa estragada e diminu-
ída. Tal característica é um estigma, especialmente quando o
seu efeito de descrédito é muito grande; algumas vezes ele
também é considerado um defeito, uma fraqueza, uma des-
vantagem e constitui uma discrepância entre a identidade so-
cial real e a virtual (Goffman 1988, p.12).
Goffman (1988) aponta que o indivíduo estigmatizado é um ser
desviante, porque está fora da norma social; está desacreditado, devido
ao atributo de descrédito criado pelo meio social e que é incorporado
por ele mesmo, recebendo uma marca social negativa que faz com que
as pessoas fiquem distantes dele, considerando-o uma não pessoa, o que
pode levar o deficiente a sentirse isolado, excluído, tornando-o um ser
incapaz socialmente. Goffman apud (Daniel, 2001) aponta que o indiví-
duo estigmatizado é:
...aquele indivíduo que está tendo uma conduta negativa em
relação às normas e aos padrões de conduta estabelecidos
positivamente em nosso convívio social, o desacreditável é
indivíduo sobre o qual nossas expectativas são negativas em
relação a ele (Daniel, 2001 p. 4).
Velho acrescenta (1979) em estudo clássico sobre desvio em
Copacabana que um indivíduo desviante recebe esse rótulo de um grupo
que acredita ser normal e acrescenta que para categorizar, é necessário
que um grupo organizado estabeleça normas, sendo que todos aqueles
que estão fora desta norma ou padrão são considerados desviantes e es-
tigmatizados. O desvio (diferença) não é pejorativo por si mesmo, mas
constitui-se no significado cultural vinculado ao atributo ou comporta-
mento que define o modo como é interpretado, criado socialmente, ca-
tegorizado por Velho (1979) como uma patologia social. Assim,
Goffman (1988) alerta que “não é para o diferente que se deve olhar na busca da
compreensão da diferença, mas sim para o comum” (Goffman, 1988 p. 138).
Na era cristã, o termo ganha outras conotações: sinais corporais
de origem divina em forma de flores na pele, por exemplo. Posterior-
mente, a alusão médica, isto é, marcas corporais de problemas físicos

160
DNA Educação

reafirmam a posição negativa do estigma, relacionando o estigma à ques-


tão de atributo recebido socialmente e a um conceito de descrédito. To-
davia, o aprendizado do estigma é parte integrante da construção da iden-
tidade do estigmatizado, ou seja,
a pessoa estigmatizada aprende e incorpora o ponto de vista
dos normais, adquirindo, portanto, as crenças da sociedade
mais ampla em relação à identidade e uma idéia geral do que
significa possuir um estigma particular (Goffman, 1988, p.
41).
Pontua as principais conclusões, dizendo sobre a relação do es-
tigma com a identidade pessoal, para Goffman, o fato de se conhecer
pessoalmente o estigmatizado e de se poder vir a estabelecer com ele
uma rotina diária de normalização da interação, não reduz necessária-
mente o menosprezo. No entanto, toda questão da manipulação do es-
tigma está intimamente relacionada com o fato de se conhecer pessoal-
mente ou não o indivíduo estigmatizado.
Para Goffman a descoberta de um estigma num indivíduo
prejudica não só a situação social corrente, mas também as
relações já estabelecidas e a imagem que os outros terão dele
no futuro, ou seja, a sua reputação as conseqüências da des-
coberta de um estigma podem prolongar-se por toda a vida
do individuo interessante ressaltar que Goffman não con-
corda com a suposição de que o fenômeno do encobrimento
leva o indivíduo a viver num alto nível de tensão e ansiedade
por ter que manter a todo o momento uma imagem falsa
que poderá colapsar a qualquer momento. (GOFFMAN,
1998 apud CUNHA, 2003, p.9).
Para o autor podem-se mencionar três tipos de estigma nítida-
mente diferentes: em primeiro lugar, há as abominações do corpo, ou
seja, as várias deformidades físicas; em segundo as culpas de caráter in-
dividuais, percebidas como vontade fraca, paixões tirânicas ou não natu-
rais, crenças falsas e rígidas, desonestidades, sendo inferidas a partir dos
relatos conhecidos, por exemplo; distúrbio mental, prisão, vícios, alcoo-
lismo, homossexualismo, desemprego, tentativas de suicídio, e compor-
tamento político radical.; finalmente, há estigmas tribais de raça, nação,
e religião, que podem ser transmitidos através de linhagem e contaminar

161
DNA Educação

por igual todos os membros de uma família. A forma de expressar o


estigma é extremamente particular e prejudicial aos indivíduos do meio
social porque segundo Goffman:
...acreditamos que alguém com estigma não seja completa-
mente humano. Com base nisso, fazemos vários tipos de
discriminações, através das quais efetivamente, e muitas ve-
zes sem pensar, reduzimos suas chances de vida. Construí-
mos uma teoria do estigma, uma ideologia para explicar a
sua inferioridade e dar conta do perigo que ela representa,
racionalizando algumas vezes uma animosidade baseada em
outras diferenças, tais como as de classe social. Utilizamos
termos específicos de estigmas como aleijado, bastardo, re-
tardado, em nosso discurso diário como fonte de metáfora
e representação, de maneira característica sem pensar no seu
significado original” (Goffman, 1988, p. 34).
É interessante ressaltar que o indivíduo estigmatizado tende a
ter as mesmas crenças sobre identidade que nos temos, ou seja, devido
as pessoas normais os tratarem desta forma, com estes estereótipos, ro-
tularem o estigmatizado, eles internamente se sentirão desta forma que
os marcaram, a vergonha é outro fato central, que surge quando o indi-
viduo percebe que um de seus próprios atributos é impuro e pode ima-
ginar-se como um não portador dele.
Quando a sociedade coloca estigma nos indivíduos e os coloca
como imperfeitos, fora deste ou daquele padrão, forma um pensamento
dicotomizado, demarcando-os, que segundo Mantoan (2003) recorta a
realidade permitindo subdividir os a alunos como em “normais e com
deficiência” ou pior:
...é marcada por uma visão determinista, mecanicista, forma-
lista, reducionista, própria do pensamento cientifico mo-
derno, que ignora o subjetivo, o afetivo, o criador, sem os
quais não conseguimos romper com o velho modelo escolar
para produzir a revira volta da inclusão (p.190)
Goffman (1988) acrescenta que não existe essa separação entre
o ser estigmatizado e o normal porque ambos são parte um do outro;
primeiro porque são interdependentes, o que para categorizar um ou ou-
tro deve se estabelecer em grupos distintos, para superar essa dicotomia
surge a necessidade de se resgatar a verdadeira identidade social, atrás da

162
DNA Educação

deficiência, ou seja, enxergar o ser completo com limitações e potencia-


lidades.
O normal e o estigmatizado não são pessoas, e sim perspec-
tivas que são geradas em situações sociais durante os conta-
tos mistos, em virtude de normas não cumpridas que prova-
velmente atuam sobre o encontro. (p.146).
O ser corporalmente estigmatizado que está fora dos padrões
de normalidade, fica a margem da sociedade, porque s pessoas“normais”
só conseguem enxergar os atributos negativos, que são transmitidos atra-
vés da aparência de sua deficiência: nem o ser estigmatizado se aceita,
tentando acobertar seu estigma, e nem a sociedade em que esta inserido
o aceita, porque os normais pensam ser pessoas normais e superiores.
Portanto, a sociedade em geral, por medo do diferente, se dis-
tancia do indivíduo, colocando várias barreiras e estigma que impedem
uma nova observação do todo, por que já esta contaminada com um
olhar de superioridade, que categoriza, separa, compara e exclui. O indi-
víduo estigmatizado deve ter calma para se perceber e fazer com que o
outro o perceba, no sentido de uma reeducação complacente do normal
mostrando ponto a ponto, que ele é um ser humano completo.
Cenas do cotidiano escolar
Nesta parte final da pesquisa buscou apresentar à análise das
entrevistas e dos registros das cenas do cotidiano escolar, mostrando que
nas relações cotidianas, muitas facetas do estigma. Nas cenas observadas
identificamos que os alunos com deficiência sofrem com os estigmas, e
outros utilizam os mecanismos de incorporação, manipulação e acober-
tamento estigma, como estratégia interacional para se favorecer ou sim-
plesmente sobreviver em um sistema escolar, homogêneo, seletista, que
enquadra os indivíduos em padrões sociais, buscando sua formatação a
um modelo ideal de ser, alienado, produtivo e submisso a uma ideologia
dominante.
As cenas selecionadas apresentam os atores envolvidos, o cená-
rio, e o enredo das interações. Identificando os mecanismos do estigma
incorporado pelos alunos com deficiência, mostrando como as pessoas
com deficiência manipulam seu estigma, acreditando que as pessoas

163
DNA Educação

“normais’ tem a mesma percepção da que foi apresentada pelo estigma-


tizado, mostra como o acobertamento do estigma é uma estratégia para
esconder a vergonha ou ser aceito por um grupo. Por fim, pontua como
os alunos com deficiência tentam superar seu estigma, superando desa-
fios do cotidiano escolar.
Incorporação
O Richard é um aluno travado, ele põe bloqueio, se esforça para
não participar, é resistente; tento convencê-lo, não quer se loco-
mover sozinho, alguém precisa empurrar o Richard, tem que
tratar ele diferente da Bianca. Atividade que depende da loco-
moção ele diz, não vou fazer, não vou fazer, ele não aceita, não
sabe lidar”.
Manipulação
O professor quer atenção de todos, então pede para que Jonathan
venha para frente para participar da aula e ele se recusa. Então
o professor conversa com ele sem obter sua atenção, pois ele fica
brincando com os objetos se recusando a participar. Então o
professor pega a caixa com o material dourado e coloca no ar-
mário, Jonathan fica triste e com raiva, os alunos intervêm a
favor de Jonathan dizendo que a professora deixou Jonathan
brincando, o professor explica a atitude dizendo, que Jonathan
tem de participar da aula junto como os amigos, e que será co-
brado igualmente.
Superação
“A Bianca possui uma vontade imensa, ela é altamente parti-
cipativa, tudo que se propõe a fazer ela topa fazer, prático, teó-
rico, possui dificuldades, mas sempre está com sorriso no rosto”
Observamos nestes três exemplos como o estigma dentro de
um processo interacional, pode se modificar em decorrência da situação
e do grupo em específico, as pessoas deficientes e “normais”, vão utilizar
esses sistemas para conviver neste grande palco social que é a vida coti-
diana. Nas páginas seguintes apresentaremos algumas cenas utiliza-das
na dissertação, analisando a luz do pensamento de Erving Goffman, em
relação aos conceitos de estigma e interação social.

164
DNA Educação

Cena: 2
Atores: Jonathan, professores, alunos 2ª série B.
Cenário: Sala de aula, alunos da 2ª série B sentados nas ca-
deiras e o professor em frente à lousa.
Enredo: O professor de Educação Física inicia a aula conver-
sando com os alunos a proposta do dia. Alguns minutos depois,
ocorre uma interrupção, outra professora traz o Jonathan de ou-
tra sala, dizendo que ele deve fazer as atividades na sala pró-
pria, com seus amigos.
Jonathan chora e abraça sua professora e enquanto isso, o pro-
fessor entrega as atividades que ele desenvolveu na outra escola,
com a outra professora, e vendo as atividades, faz a professora
perceber que Jonathan, não fazia atividade atualmente por ma-
nha e falta de interesse. A conversa termina com os professores
dizendo que ele deve participar de todas as aulas
Analisando esta cena ocorre outro dado importante em relação
às estratégias de utilização do estigma dentro de uma ordem interacional.
Neste processo os professores começam a entender que Jonathan pode
fazer várias atividades, e às vezes não o faz por se aproveitar de sua de-
ficiência, essa atitude é causada pela identidade social de descrédito, que
lhe foi atribuída socialmente. Quando a professora percebe que, na outra
escola, ele fazia coisas que na escola atual se recusa, a mesma identificou
que não é incapacidade devido à sua limitação, mas sim uma forma de se
aproveitar da situação e fazer o que mais lhe agrada.
Goffman (1988) contribui relatando que os contatos mistos en-
tre normais e estigmatizados muitas vezes são difíceis na interação, uma
vez que ambos atuam para defenderem seus papéis. De um lado há o
aluno que para se estabelecer em determinados grupos, ou simplesmente
interagir no meio social se utilizará de todos os recursos do estigma tanto
para a superação como da manipulação para conviver em um mundo de
pessoas “iguais”, e do outro lado há os educadores que dentro do espaço
escolar lhe foi atribuído um papel, e atribuições, que muitas vezes não se
adéqua à realidade da sala de aula provocando assim, na interação pro-
fessor- aluno situações de conflitos, “uma vez que tanto o estigmatizado quanto

165
DNA Educação

nós, os normais, nos introduzimos nas situações sociais mistas, é compreensível que
nem todas as coisas caminhem suavemente. (Goffman, 1988, p.27)”
De um lado, o professor que necessita oferecer seu conteúdo,
porque é exigido dentro do cotidiano escolar, como parte de sua atuação
profissional e do outro lado uma forma de manifestação do indivíduo
por meio do estigma para se favorecer na situação, ou simplesmente para
sobreviver em um sistema de ensino totalmente padronizado e homoge-
neizado.
Cena 7
Atores: Bianca, Jefferson, professor de educação física e demais
alunos da 2ª série B
Cenário: Aula na quadra com os alunos desenhando no chão
e se movimentando.
Enredo: O professor inicia a aula pedindo para todos os alu-
nos se sentarem, e pergunta para Bianca se teria algum problema
se ela saísse da cadeira e fosse para o chão. A aluna gosta da
idéia e vai para o chão. O professor entrega um giz na mão de
cada aluno e pede para que os alunos façam um desenho no chão
e fiquem em cima do desenho.
O professor aguarda até que todos terminem seu desenho. Neste
momento Bianca está bem à vontade fazendo seu desenho e logo
após o término, o professor explica como vai funcionar a ativi-
dade. Explica que todos devem se movimentar e quando ele der
um sinal devem voltar para o seu desenho.
Bianca se diverte muito na atividade, ela se movimenta em qua-
tro apoios sem ajuda de ninguém. Conversa com as amigas e
continua fazendo seu desenho e aparentemente demonstra uma
sensação de liberdade e satisfação por ter saído da cadeira de
rodas. O professor sugere uma alteração na atividade, propõe
que todos os alunos se movimentem agachados ou em quatro
apoios. Todos os alunos se divertem e Bianca muito mais, todos
agora estão na mesma posição e enfrentam as mesmas dificulda-
des de locomoção que Bianca.

166
DNA Educação

Em conversa informal, a professora relatou que Bianca faz to-


das as atividades da sala de aula, e que termina a lição primeiro
que a maioria dos alunos, diz que ela é muito esforçada e que a
mãe colabora muito.
Analisando essa cena, percebemos como o estigma de Bianca
adquirido pela imagem social, ou seja, a pessoa que possui uma deficiên-
cia física teria grandes dificuldades para se desenvolver na escola. Bianca
é PC (paralisia cerebral) na imagem de muitos alunos e da própria socie-
dade em relação à essa deficiência, a aluna não teria condições de fazer
atividades que exigem muito de seu corpo e principalmente cognitivas,
mas na fala da própria professora essa limitação não a impede de ser um
dos melhores alunos na aprendizagem.
Bianca é um caso interessante de ser analisado, pois na maioria
das cenas observadas percebemos que não incorpora a marca negativa
de incapacidade, não se recusa a fazer atividades mesmo quando o desa-
fio motor é muito grande, Bianca tenta superar seu estigma quando não
se preocupa em errar nas atividades e se propõe a enfrentar os desafios
das atividades cotidianas. Desta forma, seus amigos, a professora e a pró-
pria família compartilha com seu estigma, e entendem as limitações de
sua deficiência. A esse respeito Goffman (1988) relata que o indivíduo
estigmatizado pode encontrar nessas interações pessoas compreensivas
à sua deficiência, dispostas a entender seu modo diferente de ser, ou seja:
ele descobrirá que há pessoas compassivas, dispostas a ado-
tar seu ponto de vista e a compartilhar o sentimento de que
ele é humano e “essencialmente” normal apesar da aparên-
cias e a despeito de suas próprias dúvidas. Neste caso deve
se considerar duas categorias. O primeiro grupo de pessoas
benévolas é, é claro, o daquelas que compartilham seu es-
tigma. Sabendo por experiência própria o que se sente
quando se tem esse estigma em particular, alguma delas po-
dem instruí-lo quanto aos artifícios da relação e fornecer-lhe
um círculo de lamentação no qual ele possa refugiar-se em
busca de apoio moral e do conforto de sentir-se em sua casa,
em seu ambiente, aceito como uma criatura que realmente é
igual a qualquer outra normal. (Goffman,1988, p.29)

167
DNA Educação

Goffman (1988) relata que quando as pessoas “normais” já vi-


venciaram situações de exclusão e preconceito, a forma de agir com o ser
estigmatizado é de complacência, ou seja, aceitação e ajuda, buscando
mostrar como este deve agir perante aos conflitos e até compartilhando
com o efeito de estigma do amigo.
Todavia, dentro do cotidiano escolar, por meio de nossas ob-
servações o atual Sistema Educacional do Estado de São Paulo, não au-
xilia a inclusão, mas sim a integração, e em vários momentos ocorrem
situações da marca de estigma. Sendo assim, como o atual sistema edu-
cacional é homogêneo, seletista e defende a competição para avanço das
aprendizagens, acaba por produzir o estigma, uma vez que não está pre-
parado para conviver com o diferente. Em suma, para interagir neste
sistema o aluno manipula seu estigma, para se favorecer, ou utiliza-o
como estratégia de sobrevivência nesta ordem interacional, que reproduz
a ideologia dominante e excludente.
Goffman (1988) apresenta alguns caminhos para superação do
estigma: o primeiro apontado pelo autor, gira em torno da pessoa defici-
ente, desviante, estigmatiza ou normal, que deve se aceitar como ele é
realmente, com atributos positivos e negativos que compõe sua identi-
dade social. Outro ponto diz respeito ao estigmatizado que deve procu-
rar não responder às agressões verbais de preconceito com arrogância,
entretanto deve se tentar quebrar o gelo na interação e utilizar a própria
deficiência como fato de naturalidade, que não gera desconforto para
ambos, mostrando que tem pleno conhecimento de si e de sua limitação
mostrando que isso não atrapalha nas atividades cotidianas.
Portanto, Goffman com seu olhar refinado nos permite enxer-
gar as opressões que acontecem no micro mundo das ações sociais, ou
seja, é nos contatos face-a-face, nas conversações cotidianas, que as pes-
soas “normais”, marcam aqueles que se desviam do padrão social, essas
marcas são tão sutis, que sem um olhar criterioso, as pessoas acreditam
que essa exclusão, os preconceitos e separação, surgem com naturali-
dade, e devem ser aceitas sem questioná-las, provocando um processo
interacional de exclusão que marca os indivíduos negativamente como
seres incapazes.

168
DNA Educação

Considerações
Sendo assim, os dados demonstraram que em vários momentos
o estigma está presente no cotidiano escolar, mostraram ainda que são
poucas as discussões sobre sua problemática dentro da escola, e que as
conversas continuam em torno da inclusão, sobre como adaptar as ativi-
dades ou quem está preparado ou não para freqüentar o ensino regular.
Ainda não existe a preocupação de entender como os sujeitos com defi-
ciência e sem deficiência nas interações cotidianas, percebem e tratam
dessa marca negativa.
Outro ponto abordado no presente estudo trata da questão de
incorporação e diz respeito, aos professores que em vários momentos na
prática escolar, em suas exposições, marcam alguns sujeitos dizendo que
são "burros" e que não vão aprender de maneira alguma, afirmando que
eles não deveriam estar neste lugar, que os deficientes já são assim (inca-
pazes).
Percebemos em nossas observações que mesmo a escola repro-
duzindo o estigma da social e não se preocupando com o indivíduo,
mesmo assim, surgem esforços constantes de alunos e professores para
combatê-lo, travando lutas contra o sistema político e excludente. O pro-
fessor é um dos agentes que estão mais próximos dos conflitos interaci-
onais que geram o estigma, sendo assim, quando percebe as atitudes de
preconceito e promove a reflexão, resgata valores humanos de igualdade
e socialização, transformando a sala de aula em um espaço democrático,
em que os sujeitos podem se aceitar como são, provocando assim a su-
peração dos mecanismos estigmatizantes e auto auxílio.
É importante ressaltar que em um processo contínuo de intera-
ções, em que ambos os grupos; “normais” e “estigmatizados” vivenciem
seus conflitos e limitações e debatem seus papéis sociais e políticos, pode
ocorrer uma mudança de olhar para aceitação da diversidade. Defende-
mos que se é na interação social entre os indivíduos que ocorre a estig-
matização, a incorporação, o acobertamento e a manipulação, da mesma
forma este deve ser o caminho a ser seguido e observado para a aceitação
do diferente e para a construção da inclusão.
Quanto mais os grupos de normais e estigmatizados freqüenta-
rem o mesmo espaço social, a busca de um processo de socialização

169
DNA Educação

ocorre dentro deste grupo diminuindo as diferenças e não as acober-


tando, provocando a aceitação e superação do estigma. Percebeu-se em
nossas observações que quanto mais cedo a criança com deficiência está
dentro de um espaço escolar, o olhar de diferenças de seus amigos dimi-
nui, chegando a certo ponto de se olhar como parte de seu grupo social.
Portanto, quando enxergamos o sujeito e não a deficiência e
buscamos conhecê-lo aceitando suas limitações e sua aparência, como
ele é, podemos promover situações que os indivíduos enfrentem seus
desafios e consiga ter autonomia, força de vontade e até sonhos, conse-
guindo melhorar um pouco as situações de aprendizagem.
Referências
BRASIL Ministério da Educação Secretaria de Educação Especial. Polí-
tica Nacional de Educação Especial. Brasília MEC,1994.
BOGDAN, R.; BIKLEN, S. Investigação qualitativa em educação.
Porto: Porto Editora, 1994
CASTRO, P. A.; SILVA, A. L. Estigmatização na sala de aula: aspectos
na interação professor-aluno sob a ótica da exclusão. 2006. Universidade
do Estado do Rio de Janeiro, Conselho Nacional de Desenvolvimento
Científico e Tecnológico. Orientador: Carmen Lúcia Guimarães de Mat-
tos.
EZPELETA, J.; ROCKELL, E. Pesquisa participante. 2. Ed. São Paulo:
Cortez, 1989.
GASTALDO. Edison. Erving Goffman Desbravador do Cotidiano or-
ganizador-Porto Alegre Tomo Editorial, 1ª edição, 2004
GOFFMAN, Erving. Estigmas, Notas sobre a Manipulação da Identi-
dade Deteriorada. Rio de Janeiro, Editora Guanabara Koogan, S.A. 4ª
edição 1988.
_____________A Elaboração da Face - Uma análise dos elementos ri-
tuais da interação. In.: FIGUEIRA, S. (Org.). Psicanálise e Ciências So-
ciais. Tradução J.Russo Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves S.A p.
76-114, 1980.
_____________Manicômios, prisões e conventos. São Paulo, Perspec-
tiva, 1974. 6a ed. Tradução de Dante
____________, A representação do Eu na vida Cotidiana, São Paulo:
Editoras Vozes, 4ª Edição,1985
JOSEPH, Isaac. Erving Goffman e a microssociologia. Rio de Janeiro:
Editora da FGV, 2000.

170
DNA Educação

LOPES, M.G O estigma da exclusão social, educação, poder e a utopia


da inclusão. Vº Congresso Português de Sociologia - Sociedades Con-
temporâneas: Reflexividade e Acção, Braga: Universidade do Minho, 12
a 15 de Maio de 2004
MANTOAN, Maria Teresa Eglér Uma escola para todos e com todos: o
mote da inclusão. Porto Alegre, Educação, 2003.
MANTOAN, M. T. E. O direito a diferença na escola. Pátio: revista pe-
dagógica. Porto Alegre, RS: Artmed, ano. VIII, n. 32, nov 2004 / jan
2005, p.12 – 15.
MELO,Z.M. Estigma: A Deterorização da identidade social. In Seminá-
rio Internacional sobre Sociedade Inclusiva, Belo Horizonte. 1999. pp.1-
4.
MELO, Z.M. Estigma: Espaço para Exclusão Social Revista Sumpo-
sium. Ciências Humanas da Universidade Católica de Pernambuco, nú-
mero especial Letra ano 4-. Dezembro de 2000. p1-
SALAMANCA, Declaração de linhas de ação sobre necessidades educa-
tivas. Espanha, l994. Trad. e Ed. CORDE, Brasília, 1994.
SEVERINO. A.J. Metodologia do trabalho científico, diretrizes para o
trabalho científico-didático na universidade: São Paulo, Cortez e Moraes,
1975
WINKIN, Yves. Os momentos e Seus Homens Lisboa: Relógio D’ Água
Editores 1999
VELHO, Gilberto Desvio e Divergência uma crítica a patologia social.
Rio de Janeiro: Editora Zahar 3ª edição, 1979.

171
DNA Educação

ANÁLISE COMPARATIVA DO USO DAS TICS NO


PROCESSO DE ENSINO:
APRENDIZAGEM DOS SABERES GEOGRÁFICOS

Marcelo Alves dos Reis1

RESUMO:
Este trabalho trata da contribuição das TICs nos saberes geográficos. A
pesquisa elegeu como objetivo geral: Analisar a contribuição das TICs
no processo de Ensino Aprendizagem nos saberes de geografia, na Uni-
dade Escolar Valdivino Tito cidade de Campo Maior – PI, com os se-
guintes objetivos específicos: Identificar se o uso das TICs, principal-
mente da informática, auxilia o ensino aprendizagem em geografia; exa-
minar a participação e o feedback dos alunos na utilização das TICs no
ensino de Geografia; efetuar uma análise comparativa a fim de identificar
se há uma melhor compreensão dos conteúdos geográficos com a utili-
zação das tecnologias da informação e comunicação.
Palavras-chave: TICs. Geografia. Educação.
ABSTRACT:
This work treats of the ICTs’ contribution in the geographical knowl-
edges. The research chose like general objective: Analyze the ICTs’ con-
tribution in the Geography knowledges teaching-learning process, in the
Unidade Escolar Valdivino Tito, Campo Maior – PI city, with the fol-
lowing specific objectives: Identify if the ICTs’ use, mainly of the com-
puting, aids the teaching-learning in Geography; examine the participa-
tion and the students feedback in the ICTs’ utilization in Geography
teaching; perform an comparative analysis in order to identify if there’s
with the use of information and communication technologies a best un-
derstanding of the geographical contents.
Keywords: ICTs. Geography. Education.

1Licenciado em Pedagogia pela Universidade Estadual do Piauí – UESPI, Licenciado em Geo-


grafia pela Universidade Estadual do Piauí – UESPI e Especialista em Docência para o Ensino
Superior pela Faculdade Kurios – FAK. olecramoitavoanjo@hotmail.com.

172
DNA Educação

Introdução
Quando o escritor norte-americano de ficção científica Isaac
Asimov, numa entrevista gravada por Bill Moyers no programa de TV
World of Ideas, ano de 19882, fala do futuro da educação com a utilização
das tecnologias no ensino aprendizagem, o entrevistador não consegue
conceber a tal inclusão dos computadores nas casas de pessoas comuns.
Não sabia ele, o entrevistador, que o visionário Asimov previu, com de-
talhes, a propagação dos microcomputares e a disseminação da internet.
As novas tecnologias, principalmente o computador, estão in-
seridas no cotidiano da sociedade. A educação contemporânea exige do
profissional educador uma reflexão crítica de sua prática pedagógica de
como mediar o conhecimento junto ao aluno, ou seja, de como e para
quê se educar. Em uma infinidade de segmentos profissionais e sociais,
os recursos tecnológicos estão presentes; a escola não deve excluir-se
dessa realidade, e sim se apropriar das tecnologias em sua prática educa-
tiva.
No Brasil, a informática, com finalidades educativas, foi inse-
rida nos anos de 1970, obteve inúmeros programas de políticas públicas
para a utilização das TICs na educação, muitos intelectuais se debruça-
ram para essa temática, refletindo sua contribuição. (MORAES, 1997).
O livro didático, ferramenta mais utilizada pelos professores, é
um importante instrumento; quando bem utilizado, proporciona uma ex-
celente aprendizagem. Entretanto, com as novas tecnologias, o professor
possui um grandioso acervo para trabalhar, de forma efetiva, a aprendi-
zagem. O computador, o principal produto das TICs, possui um grande
acervo audiovisual, proporcionando ao ensino de geografia diversas for-
mas de ensinar de forma lúdica os inúmeros conteúdos.
A ação docente necessita utilizar-se das ferramentas tecnológi-
cas disponíveis para uma prática inovadora. Ferramentas que correspon-
dem a um ambiente familiar aos educandos, pois habitam nessas mídias
precocemente. O professor deve ser o mediador do processo de inclusão
desses novos recursos no ensino de geografia, tornando as aulas mais

2 Entrevista disponível no endereço eletrônico: youtube.com/watch?v=CI5NKP1y6Ng

173
DNA Educação

atrativas, pois nosso processo de modernização tecnológica exige um


profissional qualificado e que domine metodologias inovadoras de en-
sino.
As tecnologias estão inseridas em muitos segmentos da socie-
dade, auxiliando no processo de crescimento e desenvolvimento hu-
mano. Para tanto, as TICs são fundamentais para a sociedade, como tam-
bém para a educação, que carece de uma evolução que conquiste a aten-
ção dos educandos. Diante disso, a pesquisa intitulada “Análise compa-
rativa do uso das TICs no processo de ensino-aprendizagem dos saberes
geográficos”, tem o intuito de responder as seguintes questões: A utili-
zação das TICs, no contexto escolar, contribui para melhorar o desem-
penho da aprendizagem no ensino de geografia? Quais são os benefícios
que as TICs podem trazer para o ensino-aprendizagem em geografia?
O uso da informática nas aulas de geografia desperta a curiosi-
dade dos alunos, consequentemente, melhora o ensino–aprendizagem,
trazendo um atrativo à educação que foge das aulas tradicionais, onde o
decorar ainda predomina, não somente ao atrair o interesse dos educan-
dos, mas também para estabelecer um diálogo em ambiente novo, inte-
rativo.
Assim, a pesquisa tem como objetivo geral: analisar a contribui-
ção das TICs no processo de ensino aprendizagem nos saberes de geo-
grafia na Unidade Escolar Valdivino Tito, na cidade de Campo Maior –
PI, e os seguintes objetivos específicos: identificar se o uso das TICs,
principalmente da informática, auxilia o ensino aprendizagem em geo-
grafia; examinar a participação e o feedback dos alunos na utilização das
TICs no ensino de Geografia; efetuar uma análise comparativa a fim de
identificar se há uma melhor compreensão dos conteúdos geográficos
com a utilização das tecnologias da informação e comunicação.

As TICS empregadas nos saberes de geografia: Uma reflexão so-


bre a informática na educação
Estamos em um momento na história da humanidade em que
a fluidez das informações é quase que imensurável. Com a globalização
e o período técnico-científico-informacional torna-se quase impossível

174
DNA Educação

assimilar as transformações que ocorrem constantemente. Essas trans-


formações podem ser entendidas, de acordo com Santos (2004, p.14),
em que “O atual é tanto mais difícil de apreender, nas fases em que a
história se acelera, quanto nos arriscamos a confundir o real com aquilo
que não o é mais. ” Então, torna-se difícil compreender o real, quando a
história é dinâmica.
O mundo onde vivemos não foi sempre assim, com informa-
ções em tempo real ou com técnicas capazes de moldar totalmente a su-
perfície da terra. E, “as técnicas são oferecidas como um sistema e reali-
zadas combinadamente, através do trabalho e das formas de escolha dos
momentos e dos lugares de seu uso”. (SANTOS, p. 23, 2000) Para en-
tender, vamos aos primórdios da raça humana, época em que ainda não
possuíamos técnicas para artificializar a natureza e quando tínhamos, no
entanto, eram bastante rudimentares.
De acordo com Santos (2004), no início do processo histórico-
social do homem, ele estava no período compreendido como meio na-
tural (pré-técnico), suas necessidades eram os recursos naturais em seu
aspecto mais primitivo, o trabalho era feito de forma que a natureza não
sofria muita agressão, as técnicas eram básicas. Nos dias atuais, estamos
inseridos no período técnico-científico informacional, onde os objetos
são cada vez mais artificializados e,
[...] são elaborados a partir dos mandamentos da ciência e se
servem de uma técnica informacional da qual lhes vem o alto
coeficiente de intencionalidade com que servem às diversas
modalidades e às diversas etapas da produção (SANTOS,
2009, p.234-235).
Libâneo (2010) em sua obra: “Adeus professor, adeus profes-
sora”, analisa as transformações da sociedade e como os professores e as
escolas são um importante instrumento democrático para a sociedade
contemporânea. Explica ainda que, num mundo globalizado, onde ocor-
rem várias transformações científicas e tecnológicas em escala mundial,
o papel da escola e dos professores é de ajudar o educando a “pensar
cientificamente” os problemas humanos. Afirma que:
A escola tem, pois, o compromisso de reduzir a distância
entre a ciência cada vez mais complexa e a cultura de base

175
DNA Educação

produzida no cotidiano, e a produzida pela escolarização,


junto a isso tem, também, o compromisso de ajudar os alu-
nos a formarem-se sujeitos pensantes, capazes de construir
elementos categorias de compreensão e apropriação crítica
da realidade. (LIBÂNEO, 2010, p.04)
A escola tem a função de realizar a transposição didática entre
ciência e realidade, ao mesmo tempo, mediar o educando a pensar criti-
camente sobre seu cotidiano, sua realidade. A contemporaneidade pre-
sente no cotidiano da sociedade exige uma educação voltada as novas
exigências da realidade.
O surgimento de uma sociedade pós-industrial trouxe consigo
inúmeras transformações que provocaram mudanças em diversas esfe-
ras: sociais, políticas, culturais, econômicas, entre outras, consequente-
mente, afetando a educação. As mudanças políticas, através dos interes-
ses dos governantes pela mundialização econômica, extinguindo-se a
ideia de nação, valores nacionais, tradições locais, fez perder os laços de
solidariedade e identidade das pessoas, como também, o desinteresse das
pessoas por política.
Observa-se na economia, uma globalização dos mercados, do
consumo; novas profissões surgem e desaparecem outras, a inserção das
novas tecnologias no processo de produção, exigindo mais capacitação
dos trabalhadores. Percebem-se transformações nos padrões de produ-
ção e de consumo.
No campo cultural e educacional observa-se, de acordo com
Libâneo (2010, p. 08):
No plano cultural e ético – político, a ideologia neoliberal
prega o individualismo e a naturalização da exclusão social,
considerando esta como sacrifício inevitável no processo de
modernização e globalização da sociedade. No plano educa-
cional, a educação deixa de ser um direito e transforma-se
em serviço, em mercadoria, ao mesmo tempo que acentua o
dualismo educacional: diferentes qualidades de educação
para ricos e pobres.
Compreendemos que a educação, num cenário político e edu-
cacional neoliberal, transforma em uma mercadoria o processo de ensino

176
DNA Educação

aprendizagem, acentuando a segregação e o dualismo educacional, atra-


vés dos quais há diferentes qualidades educacionais entre as classes soci-
ais.
Com essa diferenciação das qualidades de ensino, podemos ob-
servar e criticar a formação de professores em modalidades aligeiradas,
que não proporcionam uma qualidade educativa equiparada à educação
privada de ensino, como também a diferenciação entre escolas públicas
e particulares de ensino básico, onde há uma qualidade educacional dis-
tinta. Assim como modalidade a distância que se encontra em constante
crescimento, proporcionando uma precarização da formação profissio-
nal.
O professor de geografia como mediador
Podemos analisar que, o ambiente no qual estamos inseridos,
de certa forma, é mascarado envolto em uma cortina, mostrando a apa-
rência, a qual é, de competência do professor, mostrar para o aluno como
descortinar esse ambiente, assim, mostrando sua essência. Essa comple-
xidade existente no espaço geográfico torna quase imperceptível as trans-
formações espaciais. Com a geografia, podemos compreender por trás
da aparência, cabe também ao professor mediar esse conhecimento geo-
gráfico para os educandos.
A criança e o adolescente, antes mesmo de saber ler escrever,
possui um entendimento do mundo em sua volta, mesmo que formado
do senso comum. Há então, uma leitura prévia do mundo vivido. Faz-se
necessária uma educação que privilegie a experiência vivida do educando.
Não há mais espaço para um “ensino bancário”, onde o estudante é pas-
sivo no processo de ensino aprendizagem.
Enquanto na prática “bancária” da educação, antidialógica
por essência, por isso não comunicativa, o educador depo-
sita no educando o conteúdo programático da educação, que
ele mesmo elabora ou elaboram para ele, na prática proble-
matizadora, dialógica por excelência, este conteúdo, que ja-
mais é “depositado” se organiza e se constitui na visão do
mundo dos educandos, em que se encontram seus temas ge-
radores (FREIRE, 1987, p. 102).

177
DNA Educação

Para que se construa, de forma efetiva o conhecimento, é salu-


tar uma compreensão de que o processo educacional atua de forma con-
junta - professor e aluno - sendo eles, sujeitos da educação. O professor,
com sua formação voltada para esclarecer as condições sociais de mundo
e possuidor de uma identidade local está apto para a construção do co-
nhecimento juntamente com o educando, pois compreende as contradi-
ções inatas à globalização. Freire nos mostra que o processo de ensino
não é só apenas uma transferência, pois:
[...] ensinar não pode ser um puro processo, como tanto te-
nho dito, de transferência de conhecimento do ensinante ao
aprendiz. Transferência mecânica de que resulte a memori-
zação maquinal que já critiquei. Ao estudo crítico corres-
ponde um ensino igualmente crítico que demanda necessa-
riamente uma forma crítica de compreender e de realizar a
leitura da palavra e a leitura de mundo, leitura do contexto.
(FREIRE, 2001, p. 264)
O educador com essas habilidades corrobora para o aprendi-
zado do aluno, na construção de um alunado crítico, que não somente
viva no mundo, mas também desvenda e leia, de forma crítica, o mundo.
Esse mediador, vivendo numa sociedade contemporânea, necessita inse-
rir em seu processo de aprendizagem as tecnologias como mais uma fer-
ramenta auxiliadora do ensino.
Antes se pensava que, com a inclusão das novas tecnologias na
educação, sobretudo o computador, o professor seria substituído, isso
seria a extinção do profissional educador como conhecemos. Entretanto,
o que se vê, atualmente, é a grande importância que o professor possui
no processo de mediação utilizando ferramentas inovadoras no ensino-
aprendizagem. É papel do professor mediar o conhecimento junto ao
aluno para compreender as transformações do mundo onde vivemos.
Para isso, ler o mundo é essencial para compreendê-lo.
Alguns professores confirmam a utilização das TICs em seu co-
tidiano pessoal e no preparo de materiais didáticos. Uma quantidade ín-
fima utiliza as mídias educativas para o aprendizado na sala de aula, onde:
Há diversas possíveis explicações para esta situação. Parte
do problema está na forma como tem sido alocado o inves-
timento: a maior parte dos financiamentos tem sido em

178
DNA Educação

hardware, significamente menos em software e menos ainda


em treinamento de professores (BUCKINGHAM, 2010, p.
41,42).
O investimento em treinamento dos professores, no manejo
das tecnologias com o intuito da aprendizagem é insuficiente, com isso,
compreendemos um dos motivos que não há uma utilização das tecno-
logias nas escolas, precisamente, no ensino aprendizagem. Como em ou-
tras situações, o professor não desprende do modelo tradicional de leci-
onar, contribuindo para um ensino fatídico e mecânico. O professor, ao:
Ensinar utilizando a Internet pressupõe uma atitude do pro-
fessor diferente da convencional. O professor não é o infor-
mador, aquele que centraliza a informação. [...] Sua primeira
tarefa é sensibilizar os alunos, motivá-los para a importância
da matéria, mostrando entusiasmo, ligação da matéria com
os interesses dos alunos, com a totalidade da habilitação es-
colhida. (MORAN, 1997, p.152)
O educador não é um informador, como vimos na análise de
Moran; ele é um sensibilizador e motivador da importância da matéria
para a vida cotidiana dos alunos, como, por exemplo, o professor de ge-
ografia media para o aluno a apresentação do espaço geográfico, junta-
mente com o contexto do aluno.
O professor de Geografia, utilizando as TICs, pode proporcio-
nar uma melhoria didática no ensino, mediando juntamente com as TICs
os inúmeros conteúdos dos saberes geográficos. A maioria das escolas
públicas carecem de materiais pedagógicos geográficos; o computador
seria uma ferramenta fundamental para apresentar aos estudantes conte-
údos diversos. Segundo Vesentini (1996, p.3):
O mundo mudou e o ensino da Geografia procura acompa-
nhar essas mudanças, pois o papel da Geografia no sistema
escolar nada mais é do que explicar o mundo em que vive-
mos, ajudando o aluno a compreender a realidade espacial
na qual vive e da qual é parte integrante.
Então, a utilização das tecnologias na educação auxiliará ao edu-
cando a compreender sua realidade e consequentemente o espaço geo-
gráfico em sua totalidade, de forma crítica. De acordo com Cavalcanti

179
DNA Educação

(2002, p.82) “um grande desafio enfrentado atualmente pelos professo-


res na prática de ensino é o de considerar que o trabalho escolar inseresse
numa sociedade plena de tecnologia”. A autora afirma ainda que:
O aluno é um sujeito permanentemente estimulado pelos
artefatos tecnológicos: TV, vídeo, games, computador, in-
ternet. Ainda que ele não seja dono de uma série deles, esse
mundo “entra” em sua cabeça pela TV e outros meios, di-
tando os ritmos e os movimentos da sociedade atual, os pa-
drões e valores da vida, as linguagens e leituras do mundo
(CAVALCANTI, 2002, p.82).
Diante disso, o professor de geografia deve estar inserido nesse
contexto tecnológico para fazer a transposição didática dos saberes geo-
gráficos com as novas tecnologias.
As TICs no ensino de geografia
A tecnologia vem transformando a interação do homem com o
meio, já que vários segmentos da sociedade se adaptaram à complexidade
do mundo moderno, onde as tecnologias da informação e comunicação
são parte necessária para a realização do trabalho. A escola e o professor
devem fazer parte dessa transformação, no que diz respeito à utilização
desses recursos em sua prática pedagógica.
O computador, como principal instrumento das TICS, apre-
senta uma enorme gama de recursos que podem ser utilizados no auxílio
do ensino-aprendizagem, como na apresentação de imagens didáticas,
por exemplo, paisagens locais do conhecimento do aluno, jogos eletrô-
nicos, como batalha naval, que auxiliam no ensino de coordenadas, fil-
mes, como Wall-e, que aborda temas como meio ambiente, sites, como
o blog Só geografia3 e blog de Geografia, que possui um grande acervo de con-
teúdos geográficos, jogos entre outros recursos disponíveis.
O site Só geografia possui um acervo de jogos que podem ser
trabalhados nas aulas de geografia, como jogo da bandeira, jogo das amé-
ricas, das regiões do Brasil, rosa dos ventos, entre outros.

3 Fonte: http://www.sogeografia.com.br/Jogos/

180
DNA Educação

Uma prática docente necessita instrumentalizar esses recursos.


Esse processo de inserção das TICs no ensino também propicia a cons-
trução de um aluno crítico, pois o tornam autônomos de sua aprendiza-
gem, o qual não fica limitado ao livro didático, mas também a um vasto
campo de informações, que é a internet.
A geografia, sendo uma ciência do presente, é contemplada
com uma gama de aplicativos disponíveis, como o Google Earth, que com-
preende imagens de satélites atuais de todo o planeta Terra, tornando-o
acessível para a maioria das pessoas. Esse instrumento possui uma com-
pleta gama de dados que podem ser trabalhados pelos saberes geográfi-
cos, como por exemplo, podemos localizar a cidade onde estamos inse-
ridos, compreender a estrutura urbana, os rios que a cidade possui, o
relevo da região, entre outras formas de uso. Como podemos observar
na figura 2, onde mostra a cidade de Campo Maior, no Estado do Piauí,
podem ser trabalhados vários conteúdos, contextualizando o cotidiano
do aluno.

Figura 1: Vista parcial da cidade de Campo Maior – PI.

Fonte: Google Earth

Não somente o planeta Terra, mas também todo o sistema so-


lar, contribuindo para uma forma interativa e motivadora de aprender
um dos diversos conteúdos geográficos.

181
DNA Educação

A geografia escolar antepõe uma dificuldade de apresentar seus


conceitos e métodos geográficos na prática educacional do educador, em
que a complexidade do espaço não é trabalhada de forma que o edu-
cando apreenda a realidade que nela faz parte. Como afirma Kaercher
(2003, p.173) enfatiza:
[...] A geografia não deve se restringir às aparências, ao visí-
vel (...) a geografia deve falar, sobretudo, das pessoas. São
elas que com seu trabalho modificam o espaço e os lugares.
Riquezas, mapas, cidades e países são frutos do trabalho des-
tas pessoas, principalmente dos mais humildes. E como vive
este homem? O que lhe resta depois do trabalho?
Essa dificuldade de apresentar o real vem de uma estrutura edu-
cacional ainda tradicional de ensino, em que o contexto social do aluno
não é levado em consideração pelos profissionais da educação.
O ensino de geografia deve compreender esse novo processo
do mundo contemporâneo, o acesso aos meios tecnológicos, e a inserção
dessas novas tecnologias em sua didática, pois:
No mundo contemporâneo, as práticas cotidianas das pes-
soas (que são práticas especializadas, e por isso interessa à
Geografia) são complexas, fragmentadas, desiguais, diferen-
ciadas, multiculturais, interculturais, desterritorializadas, or-
ganizada, em fluxos e redes, midiáticas ou informatizadas.
(CAVALCANTI, 2006, p.32)
Com isso, a inclusão das mídias na educação é um processo
contemporâneo, complexo, fragmentado, desigual, diferencial, multicul-
tural, intercultural, desterritorializado, organizado, em fluxos e redes, mi-
diáticas, devido isso, interessa ao professor de Geografia.
Metodologia
Para a realização da pesquisa foi utilizada a abordagem qualita-
tiva com enfoque descritivo. Segundo Marconi e Lakatos (2011, p. 269)
a “metodologia qualitativa preocupa-se em analisar e interpretar aspectos
mais profundos, descrevendo a complexidade do comportamento hu-
mano. Fornece análise mais detalhada sobre as investigações, hábitos,
atitudes, tendências de comportamento”. Percebemos que a abordagem

182
DNA Educação

qualitativa é fundamental para a compreensão da complexidade do com-


portamento social.
É descritivo devido à observação e o registro do pesquisador
no seu campo de estudo. Como afirma Gil (2008, p.28), as pesquisas
descritivas são “as que habitualmente realizam os pesquisadores sociais
preocupados com a atuação prática. São também as mais solicitadas por
organizações como instituições educacionais, empresas comerciais, par-
tidos políticos etc.”
Utilizaremos da pesquisa bibliográfica para melhor compreen-
são do campo de estudo, como afirma o autor:
A principal vantagem da pesquisa bibliográfica reside no
fato de permitir ao investigador a cobertura de uma gama de
fenômenos muito mais ampla do que aquela que poderia
pesquisar diretamente. Esta vantagem se torna particular-
mente importante quando o problema de pesquisa requer
dados muito dispersos pelo espaço. (GIL, 2008, p. 50).
Observamos que a pesquisa bibliográfica é fundamental para a
realização de um trabalho, pois proporciona, para o pesquisador, uma
infinidade de fontes necessárias para sua pesquisa, tais como, livros, ar-
tigos científicos, periódicos, entre outras fontes bibliográficas. Foi abor-
dado, a pesquisa de campo com a finalidade de observar os sujeitos no
local do fenômeno estudado; segundo as autoras, a pesquisa de campo:
É a pesquisa em que se observa e coletam-se os dados dire-
tamente no próprio local em que se deu o fato em estudo,
caracterizando-se pelo contato direto com o mesmo, sem
interferência do pesquisador, pois os dados são observados
e coletados tal como ocorrem espontaneamente (LAKA-
TOS E MARCONI, 2011, p. 75).
Podemos constatar que a pesquisa de campo faz com que o
pesquisador tenha contato direto com o fenômeno a ser pesquisado, por
isso é observado sem a interferência do pesquisador. Os dados observa-
dos são coletados com uma significativa taxa de precisão, pois ocorrem
espontaneamente no local da pesquisa.
Abordaremos também um pesquisa-ação para compreender
melhor a realidade estudada, que corresponde a:

183
DNA Educação

Um tipo de pesquisa com base empírica que é concebida e


realizada em estreita associação com uma ação ou com a re-
solução de um problema coletivo e no qual os pesquisadores
e participantes representativos da situação ou do problema
estão envolvidos de modo cooperativo ou participativo
(THIOLLENT, 2008, p.14).
Como foi realizado uma comparação com as turmas estudadas,
utilizamos essa forma de investigação desse problema a ser compreen-
dido de maneira cooperativa e participativa, entre pesquisador e sujeitos.
Para a coleta dos dados utilizamos a observação como um ins-
trumento “fundamental para a pesquisa”, pois segundo Gil, (2008, p,
100) “A observação nada mais é que o uso dos sentidos com vistas a
adquirir os conhecimentos necessários para o cotidiano”. Utilizamos as
entrevistas, pois:
É uma das técnicas de coleta de dados considerada como
sendo uma forma racional de conduta do pesquisador, pre-
viamente estabelecida, para dirigir com eficácia um conte-
údo sistemático de conhecimentos, de maneira mais com-
pleta possível, com o mínimo de esforço de tempo. (ROSA;
ARNOLDI, 2006, p17.)
As entrevistas realizadas com os alunos do 1º ano “A” do En-
sino Médio da unidade escolar pesquisada foram, individualmente, dei-
xando o entrevistado tranquilo para responder às questões; os entrevis-
tados foram escolhidos aleatoriamente, levando em consideração as aulas
com utilização das TICs nos conteúdos de geografia.
Como também, para melhor compreensão do fenômeno estu-
dado, será utilizado o método comparativo. Gil (2008, p.16/17) destaca
que:
O método comparativo procede pela investigação de indiví-
duos, classes, fenômenos ou fatos, com vistas a ressaltar as
diferenças e similaridades entre eles. Sua ampla utilização
nas ciências sociais deve-se ao fato de possibilitar o estudo
comparativo de grandes grupamentos sociais, separados
pelo espaço e pelo tempo. Assim é que podem ser realizados
estudos comparando diferentes culturas ou sistemas políti-
cos.

184
DNA Educação

Nesta pesquisa comparamos um ambiente escolar com utiliza-


ção das TICs em seu processo de ensino aprendizagem e outro com um
ambiente tradicional de ensino. Com isso, pretendemos analisar e iden-
tificar se há benefícios na utilização das TICs no ensino aprendizagem,
em geografia.
Para compreendermos se há realmente uma contribuição na
utilização das tecnologias educativas no ensino de geografia, foi realizada
uma análise comparativa entre duas turmas da Unidade Escolar Valdi-
vino Tito, sendo uma do 1º ano “A” do Ensino Médio, compreendendo
28 alunos matriculados e frequentando somente 22 alunos e, do 1º ano
“B”, compreendendo 34 alunos e frequentando 30. Realizamos 1 (um)
mês de atividades, na turma do 1º ano “A”, foram utilizados, em todas
as aulas, multimeios educativos e no 1º ano “B” foram utilizados meios
tradicionais, como livro didático e o quadro de acrílico.
Para avaliar o desempenho de cada turma foi realizado uma
avaliação objetiva com 7 questões acerca dos conteúdos trabalhados du-
rante esse mês de intervenção. Com o resultado de cada turma, fizemos
uma comparação de como sairia o desempenho de cada turma. No dia
da avaliação comparativa estavam presentes no 1º ano A 16 alunos e, no
1º ano B, 20 alunos.
No término da intervenção, foi realizado uma entrevista com
10 alunos do 1º ano “A”, correspondendo a 6 questões para compreen-
der a opinião dos educandos, no que diz respeito às aulas de geografia
com a utilização das TICs. A entrevista foi realizada individualmente e,
para segurança dos sujeitos, seus nomes não foram revelados. Para iden-
tificação dos entrevistados, foram atribuídas as iniciais de cada sujeito.
A pesquisa foi realizada na Unidade Escolar Valdivino Tito, si-
tuada à Avenida José Paulino, 464/ centro de Campo Maior – PI, existe
desde 03/02/1929, foi batizada com a presença do Dr. João de Deus
Pires Leal, com o nome de Grupo Escolar Valdivino Tito, na Praça Rui
Barbosa. Funciona hoje jurisdicionada à 5ª Gerência Regional de Educa-
ção – 5ª GRE. Em seu histórico, consta que em 04/07/1934 ganhou
prédio próprio, no centro da cidade, atual endereço. Observamos abaixo
o mapa da localização da área de estudo.

185
DNA Educação

Figura 2: Mapa de localização da área de estudo.

Os sujeitos selecionados foram os componentes de duas turmas


do 1º ano da Unidade escolar Valdivino Tito, com faixa etária entre 14 e
16 anos de idade, correspondendo a 62 alunos pesquisados. A escolha
foi motivada pela possibilidade de comparação das duas turmas em uma
mesma unidade escolar. A identidade dos sujeitos foi preservada, e para
a identificação dos mesmos, foram utilizadas as iniciais do nome dos par-
ticipantes.
Análise e discussão de resultados
Análise das questões objetivas
Com os resultados obtidos das questões objetivas observamos
que a turma do 1º ano “A”, tendo em vista a utilização das TICs em sala
de aula, obteve um alto índice de questões acertadas. Com a observação
em sala de aula, podemos constatar uma maior interação dos alunos nas
aulas, os quais, em sua grande maioria, participaram efetivamente e aten-
tamente das aulas.
A avaliação foi realizada com os alunos do 1º “B”, onde as aulas
foram ministradas tradicionalmente, com a utilização de ferramentas
como o livro didático, o quadro de acrílico e o pincel. Com os resultados
obtidos, pudemos concluir que houve uma queda no quesito de questões
acertadas dessa turma.

186
DNA Educação

Com esses resultados da avaliação realizada nas duas turmas,


podemos concluir que a turma do 1º ano “A”, cujas aulas foram minis-
tradas com as TICs, tiveram um resultado bem acima que a turma do 1º
ano “B”, onde as aulas foram ministradas sem recursos tecnológicos.
Com as observações feitas no decorrer da pesquisa e das aulas,
podemos concluir que a utilização das TICs nas aulas, traz benefícios ao
ensino aprendizagem dos educandos, na apresentação dos conteúdos,
nas informações extras que proporcionam uma maior imersão ao conte-
údo estudado, despertando a atenção dos alunos com aulas que fogem
aos padrões tradicionais de ensino.

Análise das entrevistas


Realizamos, também, uma entrevista com 10 alunos do 1º ano
“A”, correspondendo a 6(seis) questões para compreender a opinião dos
educandos, no que diz respeito às aulas de geografia com a utilização das
mídias educativas. A entrevista foi realizada individualmente; para segu-
rança dos sujeitos seus nomes não foram revelados. Para identificação
dos entrevistados, foram atribuídas as iniciais de cada sujeito. No pri-
meiro questionamento foi abordado quais instrumentos (metodologias)
os professores utilizam em suas aulas.
Compreendemos por meio das respostas dos educandos, que
quase unanimidade dos professores ao ministrarem suas aulas nessa série
específica utilizam, em suas aulas, o livro didático. Isso é um fato em
aulas tradicionais; a utilização de metodologias em que o professor, por
vários motivos, não inova em suas aulas. Entretanto, compreendemos a
importância desse instrumento na docência.
Em seguida, houve segundo questionamento realizado, sobre a
relação das tecnologias utilizadas pelos alunos para estudarem, dentro ou
fora da escola.
Podemos observar, com as respostas obtidas, que os alunos, em
sua maioria, utilizam o celular como fonte de estudos. O celular compre-
ende uma ferramenta elementar para buscar informações para os alunos,
entretanto devemos ter em mente que essa tecnologia só funcionará efe-
tivamente para a aprendizagem, por meio do envolvimento em projetos,

187
DNA Educação

com a participação de todo corpo escolar, devido esse recurso compre-


ender, em muitas vezes, uma ferramenta que pode conter vários malefí-
cios para a educação. Um dos motivos para que esse recurso seja abolido
das escolas é o fato de que o aluno “cole” nas provas, pois com o uso
acessível à maioria de internet móvel, isso poderia levar o aluno a essa
prática; entretanto, na maioria das avaliações tracionais, os alunos sentem
que:
[…] estão diante de provas e atividades que permitam ou
estimulem a cola. Essas provas e atividades são geralmente
pobres e requerem apenas uma resposta „decorada‟ ou que
se assinalem alternativas, coloque-se verdadeiro ou falso ou
se forneça um número como resposta. Nesses casos colar é
a solução mais inteligente como resposta a uma avaliação
pouco inteligente. (ANTÔNIO, 2010, p.03).
Com as avaliações que exijam mais do caráter subjetivo dos alu-
nos, não haverá espaço para tal prática. A geografia possui esse rótulo de
disciplina decorativa. O professor deve usar de sua formação, mudar essa
concepção, com uma prática mais construtiva.
Sabemos que as escolas, em sua maioria, trazem consigo uma
metodologia tradicional que pode se opor a práticas de ensino inovado-
ras. O celular está presente na vida cotidiana do aluno; essa tecnologia é
íntima ao alunado responsável pelo primeiro intercâmbio do estudante
às tecnologias interativas, com isso a escola deve refletir sobre o uso
desse multimeio para a educação.
Compreendemos também, com as respostas dos sujeitos, que o
acesso a outras tecnologias, como por exemplo o computador, é ínfimo.
Isso representa uma exclusão digital de recursos indispensáveis para uma
boa formação escolar.
A grande maioria dos alunos brasileiros não possui recursos
avançados nem em casa nem na escola, principalmente na
escola pública. A internet chega atualmente a 15% dos bra-
sileiros. É um crescimento notável, mas, por outro lado,
mostra que 85% ainda estão fora. Para os alunos que tem
acesso as novas tecnologias, a escola pode estimular ao má-
ximo a pesquisa ligada ao cotidiano deles, aos seus interes-
ses, a sua vida (MORAN, 2005, p. 13).

188
DNA Educação

De acordo com Moran (2005), observamos o abismo digital que


separa a maioria dos alunos de escolas públicas das mídias educacionais.
Isso nos faz refletir e persistir numa educação inclusiva de diversas for-
mas, nesse caso, com um aparelhamento digital nas escolas com as TICs.
Em seguida os alunos foram questionados sobre a utilização da
internet nas atividades escolares. A intenção dessa pergunta foi compre-
endermos a importância desse meio na busca de informações necessárias
para abranger os conhecimentos.
Observamos com as respostas obtidas que em sua maioria os
estudantes utilizam internet para atividades escolares. Vemos a impor-
tância dessa ferramenta para a educação, onde sua gama de informações
é quase que ilimitada.
A Internet traz muitos benefícios para a educação, tanto
para os professores como para os alunos. Com ela é possível
facilitar as pesquisas, sejam grupais ou individuais, e o inter-
câmbio entre os professores e alunos, permitindo a troca de
experiências entre eles. Podemos mais rapidamente tirar as
nossas duvidas e dos nossos alunos, sugerir muitas fontes de
pesquisas. Com todas estas vantagens será mais dinâmica a
preparação de aula. (TAJRA 2001. p. 157).
Vemos os inúmeros benefícios que a internet traz para educa-
ção, segundo a autora, como pesquisas, troca de experiências entre os
sujeitos da educação, como na preparação das aulas a serem ministradas,
como na diversidade de informações contidas na internet. Onde:
A pesquisa pode ser um componente muito importante na
relação dos alunos com o meio em que vivem e com a ciên-
cia que estão aprendendo. A pesquisa pode ser instrumento
importante para o desenvolvimento da compreensão e para
explicação dos fenômenos sociais. (ORIENTAÇÕES CUR-
RICULARES PARA O ENSINO MÉDIO, 2006, p. 125 e
126).
No ensino médio, onde o jovem está em pleno desenvolvi-
mento de suas competências cognitivas, a pesquisa se faz necessária para
a compreensão dos fenômenos que o rodeiam. A ciência geográfica tem
papel fundamental nessa compreensão, pois nos apresenta a realidade
dos fenômenos ocorridos no espaço.

189
DNA Educação

Em seguida, elucidamos a opinião dos sujeitos a respeito da uti-


lização de tecnologias em sala de aula.
Todas as repostas são positivas no que diz respeito à utilização
das tecnologias em sala de aula. Certamente como foi observado nas au-
las com a intervenção das tecnologias, os alunos ficaram mais motivados
a participar das aulas; consequentemente, fez com que os alunos prestas-
sem mais atenção nos conteúdos de geografia abordados.
Em seguida o questionamento foi compreender a visão dos alu-
nos na diferença entre as aulas tradicionais e as aulas com a utilização das
mídias educacionais.
Observamos que com as respostas dos alunos, a diferença com-
preende à praticidade, curiosidade e o contato com a tecnologia. Isso faz
com que as aulas se tornem mais interessantes.
Entretanto observamos com a fala de G. R., que responde “Às
vezes é melhor usar o livro”. Compreendemos que, para ele, o livro é
uma boa ferramenta para o ensino-aprendizagem. Realmente, em algu-
mas instituições, o livro é a única ferramenta à disposição do professor,
sendo de real importância para a construção do conhecimento. Entre-
tanto, com a tecnologia, o educador pode realizar a transposição didática,
ou seja, contextualizar o conteúdo para a realidade do educando, opor-
tunidade que o livro não traz, já que muitas vezes, possui ilustrações e
conteúdos desconexos com a realidade dos educandos.
Em seguida, foi questionado, no ponto de vista dos alunos, os
pontos positivos e negativos do uso das tecnologias na sala de aula. Ob-
servamos as seguintes respostas:
Podemos perceber que os pontos positivos são entre desenvol-
vimento escolar, melhora a aprendizagem, aulas não-padronizadas, a
busca de mais informações, familiarizar com as tecnologias, ou seja,
como foi observado durante as aulas, as tecnologias, quando bem utili-
zadas, contribuem para uma melhor compreensão e participação nos
conteúdos programáticos na disciplina de geografia.
Com as respostas dos entrevistados, percebemos a importância
das TICs no ensino de geografia, pois proporciona um maior entendi-
mento dos conteúdos trabalhados, como também faz com que os alunos
prestem mais atenção às aulas.

190
DNA Educação

Considerações finais
A pesquisa pretendeu analisar a contribuição das TICs no pro-
cesso de ensino aprendizagem nos saberes de geografia na Unidade Es-
colar Valdivino Tito, na cidade de Campo Maior – PI. As novas tecno-
logias devem estar presentes no contexto educacional, já que a escola
necessita estar contextualizada no mundo contemporâneo, onde as tec-
nologias fazem parte cotidianamente.
Com as reflexões realizadas nesse trabalho, compreendemos a
importância dos professores de geografia utilizarem as TICs em sua prá-
tica pedagógica, como auxílio do ensino-aprendizagem. Por isso, forma-
ções continuadas para professores são necessárias. No contexto escolar,
o educador possuidor de uma formação adequada, juntamente com a
equipe gestora, proporcionará a construção da aprendizagem dos edu-
candos, utilizando as TICs para esse fim.
A pesquisa foi realizada na Unidade Escolar Valdivino Tito, lo-
calizada na cidade de Campo Maior – PI. Em um universo de 374 alunos,
trabalhamos com 02(duas) turmas de 1º ano do Ensino Médio; em uma
turma trabalhamos em todas as aulas em 01(mês), utilizando as TICs nas
aulas e, na outra turma, também de 1º ano, trabalhamos com aulas tradi-
cionais, no mesmo período de tempo. Com a aplicação de uma avaliação
composta com 07(sete) questões, concluímos que a turma onde se traba-
lhou com as TICs em suas aulas obteve um maior rendimento nas notas
por isso houve uma melhor participação nas aulas. Enquanto na outra
turma, onde se trabalhou com aulas tradicionais, obtivemos um resultado
abaixo, em relação a outra turma.
Com a análise das entrevistas feitas com 10(dez) alunos da
turma do 1º ano “A”, onde foram trabalhadas as TICS, percebemos que
a maioria dos alunos sentiu-se mais à vontade para participar das aulas
obteve um maior entendimento nos saberes geográficos, pois possibili-
tou trabalhar com conteúdos contextualizando-os para a realidade dos
educandos.
Com as respostas das entrevistas, concluímos que as tecnolo-
gias são fundamentais para a construção do conhecimento dos saberes
geográficos e que as TICs proporcionam uma maior interação com os

191
DNA Educação

educandos. Entretanto, há vários desafios a serem superados, como es-


trutura física das escolas, que ainda está necessitando de muitas adequa-
ções; assim como os materiais tecnológicos, que são insuficientes para
todos os alunos e professores e capacitações para os professores para os
mesmos manusearem essas ferramentas em suas aulas.
Nesse trabalho percebemos, a importância da inserção das
TICs no ensino-aprendizagem em geografia, como também em outras
áreas do conhecimento, por isso, esse estudo é uma continuidade de vá-
rias reflexões que são feitas com a utilização dessas ferramentas no en-
sino-aprendizagem.
Referências
ANTONIO, José Carlos. Uso pedagógico do telefone móvel (Celular),
Professor Digital, SBO, 13 jan. 2010. Disponível em: <https://profes-
sordigital.wordpress.com/2010/01/13/usopedagogico-do-telefone-
movel-celular/> Acesso em: 16 de dezembro. 2017.
BUCKINGHAM, David. Cultura digital, educação midiática e o lugar da
escolarização. Educ, real., Porto Alegre, v.35, n.3, p. 37 – 38, set/dez,
2010.
CAVALCANTI, Lana. de Souza. Geografia e práticas de ensino. Alter-
nativa, Goiânia, 2002.
_____________. Bases teóricos-metodlógicas da Geografia: uma refe-
rência para a formação e a prática de ensino. In: CAVALCANTI, L. S.
(ORG.). Formação do professor: concepções e práticas no campo da
Geografia. Goiânia: editora Vieira, 2006.
FREIRE, Paulo. Carta de Paulo Freire aos professores. In: Revista Estu-
dos Avançados. vol. 15, n. 42, 2001. p. 259-268.
_____________. Pedagogia do oprimido. 27ed. Rio de Janeiro, Paz e
Terra, 1987.
GIL, Antonio Carlos. Métodos e técnicas de pesquisa social. - 6. ed. -
São Paulo: Atlas, 2008.
KAERCHER, N. A. Desafios e Utopias no Ensino de Geografia. In:
CASTROGIOVANNI, A. C. et al. (Org.) Geografia em Sala de Aula:
práticas e reflexões. Porto Alegre: AGB, Seção porto Alegre, 2003.
LIBÂNEO, José Carlos. Adeus professor, adeus professora? Novas exi-
gências educacionais e profissão docente / José Carlos Libâneo, 4ª Ed.
– São Paulo: Cortez, 2010.
MARCONI, M. de A. LAKATOS, E. M. Metodologia Científica. 5ª ed.
São Paulo: Atlas, 2011.

192
DNA Educação

MORAES, Maria Cândida. Informática educativa no Brasil: uma história


vivida, algumas lições aprendidas, Revista Brasileira de Informática na
Educação 1, 19-44, Florianópolis/Editora da UFSC, set. 1997.
MORAN, José Manuel. Como utilizar a Internet na educação: relatos de
experiências. Ciência da Informação, Brasília, v. 26, n.2, p. 146-153,
maio/ago. 1997. Disponível em http://www.eca.usp.br/prof/mo-
ran/internet.htm. Data de acesso: 17/12/2017.
___________________. As Múltiplas formas do aprender. A. &. Expe-
riência, Entrevistador. Julho de 2005.
Orientações Curriculares para o Ensino Médio. Volume 3: Ciências Hu-
manas e suas tecnologias Brasília-2006. Ciências humanas e suas tecno-
logias / Secretaria de Educação Básica. – Brasília: Ministério da Educa-
ção, Secretaria de Educação Básica, 2006.
ROSA, Maria Virgínia de Figueiredo Pereira do Couto; ARNOLDI,
Marlene Aparecida Gonzalez Colombo. A entrevista na pesquisa quali-
tativa: mecanismos para a validação dos resultados. Belo Horizonte: Au-
têntica Editora, 2006.
SANTOS, Milton. A Natureza do Espaço: Técnica e Tempo, Razão e
Emoção. 4ed. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2009.
______________. Pensando o espaço do homem. 5 ed. São Paulo: Edi-
tora da Universidade de São Paulo, 2004.
______________. Por uma outra globalização: do pensamento único à
consciência universal. Rio de Janeiro: Record, 2000.
TAJRA, Sanmya Feitosa. Informática na Educação: novas ferramentas
pedagógicas para o professor da atualidade. 3 ed. São Paulo: Érica, 2001.
THIOLLENT, M. Metodologia da pesquisa-ação. São Paulo: Cortez,
2008.
VESENTINI, J. W. O Ensino de Geografia no Final do Século XX.
Editora Ática, 1996.

193
DNA Educação

A REFORMA DO PENSAMENTO CRÍTICO DO DO-


CENTE REFLEXIVO
Marcelo Teixeira1
RESUMO:
Transformar a educação para modificar o pensamento do homem é uma
das divisas primordiais do DNA da Educação na escola contemporânea
e essa axiologia requer uma centralização entre a consciência plural e a
intencionalidade de um plano educacional que corresponda com os sa-
beres de educandos e educadores para uma metacognição que retribua
aos conteúdos estudados dentro de uma prática da práxis professoral. A
reforma do pensamento crítico do ato docente transforma a consciência
humana em plural quando há a intenção de melhorar o outro em um
contexto que visa entender o real, o ideal e o flexível, favorecendo o ar-
gumento em prol do conhecimento.
Palavras-chave: Conhecimento; Educação; Práxis; Transformação.
ABSTRACT:
Transforming education to modify human thought is one of the curren-
cies in the primary of the DNA of Education in the school contem-
porany and this axiology requires a centering of consciousness plural and
the intentionality of one educational plan that matches the knowledges
of learners and educators to a metacognition that may requite to the con-
tent studied within a practice of the human consciouness in the plural
form when there is the intention to improve the other in a context that
aims to understand the real, the ideal the flexible, favoring the argument
in favor of knowledge.
Keywords: Knowledge; Education; Praxis; Transformation.

1Graduado em Pedagogia pelo Centro Universitário Anhanguera de São Paulo, Professor de


Educação Infantil, Ensino Fundamental I e Educação Especial e Inclusiva, com cursos de exten-
são e pesquisas voltados para a Educação Básica e Pós-Graduando em Educação Inclusiva
com Ênfase em Deficiência Intelectual pelo Centro Universitário Ítalo Brasileiro de São Paulo. e-
mail: marceloteixx@gmail.com

194
DNA Educação

Não é de hoje que a Educação carece de competentes educa-


dores para poder servir a um punhado de gente que necessita abarcar
desesperadamente no âmbito da civilização humana em detrimento da
dicotomia centralizadora enraizada no codinome do pensamento crítico.
Mas o que de fato isso quer dizer? Quando nos tornamos educadores,
professores ou transformadores da ciência humana por meio do ato re-
flexivo do pensar, estamos lidando diretamente com aquela pessoa que
poderá enxergar outras dimensões com maiores potencialidades. É a cha-
mada reforma do pensamento crítico do docente reflexivo. É preciso
urgentemente mudar o DNA da educação que está no poder dos impos-
sibilitados de estarem atuando, pois eles não têm uma fundamentação
crítica daquilo que estão falando para aqueles que estão formando.
Em outras palavras, o docente precisa reformar o pensamento
acrítico e errôneo daquele ser que precisa ser condicionado ao ato do
pensar crítico para que possa se tornar, ele mesmo, um ser reflexivo com
potencialidades, competências e habilidades operantes com senso de
pensamento catalisador daquilo que se pretende reproduzir. Não se trata
de uma mera questão socrática do diálogo que persiste numa simbiose
de questões fundamentadas na raiz do semântico profundo da pessoa
para se obter um resultado plausível de uma resposta contundente, mas
sim, de uma nova modalidade de pesquisa e retórica por meio da teoria,
do ato cognoscente para o fundamento maior da criticidade literária e
atemporal para se chegar a um resultado fulminante e conclusivo sobre
aquilo que se deseja ensinar.
Estamos diante de alunos que estão no construtivismo da es-
cola nova com raízes fundadas na filosofia da educação do século dezoito
em que naquele tempo a razão era a destinação clara e certa da ciência de
um tempo em que a instrução tinha seus preceitos e suas ramificações.
Hoje o docente precisa encontrar forças para depositar, positivamente,
o conceito de uma educação sensata para postular nesse aluno os funda-
mentos do conhecimento como base de uma ampla pesquisa reflexiva
sobre o temperamento dos objetivos educacionais.
Há de haver um conflito de leituras, arroubos de informações
e de comunicações livrescas que conversem paralelamente entre seus pa-
res e entre suas vozes para que esse movimento educacional possa ser

195
DNA Educação

útil para aqueles que ainda persistem na questão da educação como


forma de pensamento humanitário na conquista de uma transformação
social. Esse conflito de perspectivas que reúnem leituras, palavras, obje-
tos que envolvem axiologias para uma formação competente, faz com
que o professorado esteja mais presente na educação e esteja mais refle-
xiva em seu maior momento, que é a sala de aula.
Esse ambiente tão formal, tão característico do homem que
busca uma postura ideal e tão atual quanto remoto em seus pilares enge-
nhosos que se entrelaçam por séculos, é visto hoje como um local apro-
priado para um conhecimento de oralidade informal, onde são deposita-
dos em seus educandos os meros atributos de informalidades. Esse DNA
precisa ser revisto, repensado, reformulado, remodulado e redemocrati-
zado dentro das limitações que envolvem a postura da pesquisa acadê-
mica feita e ingerida pelo docente que realmente quer não apenas modi-
ficar o seu ambiente de trabalho, mas transformar a sociedade e a comu-
nidade como um todo.
Trata-se de um trabalho árduo, penoso, mas que produzirá múl-
tiplas inteligências capazes de gerar o conhecimento por meio do con-
texto, pois o conhecimento gera o argumento, que catalisa na pedagogia
das ambições literárias o sentimento mais humano do fator de se impe-
trar um sabor de frescor em querer refletir sobre aquilo que se está co-
nhecendo para poder ensinar o próximo aquilo que se adquiriu por meio
do ato reflexivo. Esse pensamento acrítico, desinformado e desinteres-
sante, gera a reforma do pensamento reflexivo crítico que está sendo
modificado com o conhecimento gerador do argumento, que será depo-
sitado no outro pensamento como fonte de riqueza intelectual pronta-
mente preparado para condicionar a outra informação em busca de mai-
ores desafios.
O docente precisa ser e estar sensível ao ponto de querer buscar
o novo, buscar no educando a sua força maior de poder dizer que estão
juntos em um processo de ensino e aprendizagem capazes de liderar for-
ças e obterem maiores resultados por intermédio da pedagogia não ató-
pica, que é aquela pedagogia inflamada, não cauterizada, sem reformas
de um pensamento autoral e crítico. Precisa-se mudar esse paradigma e

196
DNA Educação

o docente mais bem preparado para atuar nessa área precisa ser o norte-
ador dessa intervenção pedagógica, sendo o mediador dos conflitos ge-
radores de questionamentos e apto para ser um professor crítico com
pensamentos educacionais reflexivos.
O campo magnético entre a Psicologia da Educação e a Pedagogia
Seria excêntrico incluir a tecnologia histórica da Psicologia sem
perceber sua ligação com a educação e, numa forma geral, com a Peda-
gogia. Ambas as disciplinas caminham atreladas e ambas são fundamen-
tais e de extrema importância para o ato educacional, para o educador e,
principalmente, para o educando. É essencial a teoria da Psicologia para
a prática pedagógica da Pedagogia e, sem essas duas correntes, teoria e
prática, é quase que impossível obter resultados satisfatórios para uma
educação sensata.
Há um campo magnético muito forte que liga as duas matérias
e isso é tão enriquecedor para o entendimento formal e intuitivo da Pe-
dagogia, que praticamente é impraticável pensar na Psicologia sem pen-
sar na formação do Pedagogo, do Professor ou do Educador. É extre-
mamente importante compreender que o fundamental campo que a Psi-
cologia se alargou foi no campo educacional, e o principal embasamento
científico da educação era essa disciplina. A adesão à Psicologia foi im-
prescindível para que se pudesse apreender o desenvolvimento sensível
e trabalhar com as crianças desse novo argumento, pois o trabalho dessa
ciência seria apresentar respostas às questões necessárias sobre o novo
exemplo de ensino que estava aparecendo.
Com a ampliação e o trabalho mais rebuscado da Psicologia, o
consultório passou a ser a modalidade mais avaliada e favorita da mesma,
e foram diminuindo o empenho pelo campo educacional, pois a psicolo-
gia agora calcada numa miragem clínica atuava na psicologia escolar
muito aperfeiçoada nessa perspectiva, e tratavam agora a educação como
um fator clínico. E através disto as condições socioculturais e pedagógi-
cas eram descuidadas, produzindo uma carência intelectual que na ver-
dade não existia, produzindo diferenças e preconceitos.
Portanto, a Psicologia e a educação têm uma relação diferente
sendo mais formal, educacional, abrangente e menos preconceituosa.

197
DNA Educação

Mesmo envolvendo disciplinas acadêmicas díspares, uma matéria com-


plementa a outra para a formação intelectual e devida do futuro peda-
gogo, professor ou educador, propiciando, assim, uma mentalidade mais
evoluída e mais centrada nos dizeres e saberes educacionais; e a Psicolo-
gia tenta se redimir com a sociedade e a educação, não produzindo mais
tanta desigualdade e não se sujeitando às camadas influentes.
Apesar de todas as análises, vale a pena advertir os eventos his-
tóricos, pois por meio deles pode-se analisar e aguçar as arestas produzi-
das em determinados contextos históricos, sociais, culturais e econômi-
cos. Sendo assim, é ulterior que ambas as matérias estejam atreladas, ca-
minhando juntas e sendo detentoras de uma educação híbrida moderna,
difusora e atemporal (no sentido de estarem juntas num mesmo propó-
sito e em prol da educação brasileira). É preciso pensar em Psicologia
quando se pensa em Pedagogia, porque ambas estão interligadas no sen-
tido direto de pluralizar a formação e o caráter do aluno para um futuro
disseminado pela mentalidade abstrata e concreta. E ambas são impor-
tantes para o DNA da Educação e para a aprendizagem para com a Pe-
dagogia.
Educadores e educandos: ética moral e postura cívica!
Paulo Freire2(1921 – 1997), o grande Patrono da Educação Bra-
sileira, disse uma frase avassaladora e explicativa que enaltece a transfor-
mação da educação por meio dos saberes humanos: “Presença humana,
presença ética, aviltada toda vez que transformada em pura sombra” (2015, pg.
100). Poucos poderão entender essa frase, mas ela se faz presente neste
instante em que escrevo estas palavras e as ponho em minha cabeça para
citar que o futuro pedagogo, professor ou educador precisa ser, antes de
mais nada, um ensaísta, um pesquisador, um ser humano capaz de nos
pôr em cadência exemplar diante do leigo aluno.
Analise: presença humana (pessoas), presença ética (comporta-
mento, valores, civilização, disciplina), aviltar (desonrar). O professor
precisa entender que seus alunos são humanos e suas disciplinas são a

2FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. 52º ed.
São Paulo, Paz & Terra, 2015. 143 pgs.

198
DNA Educação

ordem conjunta para um aprendizado, portanto, não pode haver a de-


sonra educacional para um ato não intencional. A frase é um fechamento
certeiro para uma autorreflexão e a ela me refiro para iniciar o ponto
nevrálgico entre a comunicação e o futuro professor, a ética e o futuro
pedagogo e a postura cívica e o futuro educador.
A Pedagogia nos incita à epistemologia, ao saber da informação
que nos será útil, capaz de nos fazer pensar, agir e reverberar perante
nosso ato professoral. O Pedagogo / Educador precisa encontrar res-
postas democráticas para perguntas autoritárias, conversas atribuladas ao
dia a dia, confrontos com relação à política, debates e mais debates na
qual o pedagogo precisa ter como gabarito de uma consciência plena de
argumentos. Como dito anteriormente e explanada mais adiante, o co-
nhecimento gera o argumento dentro de uma sistemática plural de acon-
tecimentos mundanos que reiteram a consciência crítica do professor
para a reflexão pautada e significativa do aluno.
Eis aqui um dos pontos necessários para o cerne do DNA da
Educação: o caráter embrionário entre o dizer, o ouvir, o pesquisar, o
buscar, o conhecer e o desconhecer para poder reconhecer naquilo o
poder de sua internalização ética e moral e epistemológica. O professor
desperta a atenção de quem precisa de informação. E isso passa a girar
em uma conformidade intrínseca entre educador e educando, entre busca
e rebusca, entre teoria e prática, entre dizer e conhecer.
A ética moral e a postura cívica que precisamos ter agora fará
toda a diferença para alguns alunos que não sabem a dimensão que um
evento pensativo como esse nos traz e esse movimento passa a ter uma
importância muito maior quando bem orquestrada e bem intencionada.
Sendo assim, o passeio floral em que buscamos intervir para conhecer e
sublinhar faz com que os saberes do professor sejam ministrados numa
forma lógica de praticidades que chegam até o aluno em sua caixa ence-
fálica mantenedora com um conhecimento mundano que pode ser trans-
formada e adequada para o novo.
Ser Pedagogo / Educador / Professor é muito mais que assistir
a um documentário no teatro da faculdade das utopias: é estar infiltrado
em tudo o que a cultura, a política, os ensinamentos e a riqueza de deta-
lhes nos permite angariar.

199
DNA Educação

Esse DNA perpassa por nossas veias, assim como o sangue nos
catalisa para a vida. Esse mesmo professor precisa ler para entreter o
outro, precisa estar apto para a aptidão do outro e precisa estar além de
seus conhecimentos para adquirir conhecimento ao outro.
É estar atrelado até o último fio de cabelo com tudo aquilo que
nos rodeia, nos permeia e nos capacita. Não conhecemos algo? Busque
informações. E é justamente essa a função do professor: incitar a pesqui-
sar, a formatar noções e a equiparar nossos conhecimentos para um fu-
turo não muito distante.
Teorias e práticas da educação brasileira
Diferentemente do que muitos pensam, teoria e prática peda-
gógica são assuntos totalmente distintos, que precisam de uma atenção
especial tanto por parte dos educandos quanto, principalmente, por parte
dos educadores. Esses, por sua vez, muitas vezes causam confusão nos
estudantes por falta de coerência educacional, falta de estrutura, organi-
zação e didática. É preciso muita atenção para que não tenhamos que vir
a toda hora explicar que uma é a particularidade e a outra é a fundamen-
tação, que, como já disse, são de diferentes teoremas, diferentes conspi-
rações e distintas enumerações.
A disparidade de uma complementa a formação da outra, por-
tanto, ambas precisam estar atreladas, caminhando juntas, lado a lado,
para que não possa haver uma singularidade inferior perante as duas. Mas
sobre o que estamos falando aqui exatamente? Antes de tudo é preciso
dizer que todo professor é um exímio pesquisador, amante das palavras
e da leitura e, por assim sendo, é preciso saber diagnosticar todos os se-
tores de sua área. Assim dito, teoria e prática pedagógica fazem parte de um
processo de educação que precisa estar atrelado à mentalidade do pro-
fessor – que precisa saber discernir os dois aspectos fundamentais para
uma boa aula – quanto do aluno – que precisa ter os dois lados da moeda
como mote central de sua linha de raciocínio.
Mas o que é teoria? Teoria é um conjunto de explicações sobre
certo assunto centralizado em algum estudo, fenômeno ou um grupo dos
mesmos; a teoria nos serve de base para alimentar nossa estrutura para
colocarmos em prática aquilo demonstrado em ensinamentos teorizados,

200
DNA Educação

rebuscados e com ampla pesquisa. Já a prática pedagógica é a atividade


planejada colocada, exposta ou feita numa ação, tendo como embasa-
mento central a teoria. Ou seja, ambas, teoria e prática, precisam estar,
definitivamente, atreladas para um bom entendimento. Mas o que é en-
tão teoria pedagógica? Essa é uma das práticas mais comuns nos arredores
universitários e, quando o educador se forma, acaba praticamente esque-
cendo de suas ricas observações e de seus detalhes importantes para um
bom trabalho nos campos escolares.
Teoria Pedagógica fornece uma explicação geral das observa-
ções científicas, feitas em um determinado campo do conhecimento, que
refletem diretamente nas relações ocorridas nos atos de ensinar e apren-
der de forma ampla e generalizada, de acordo com uma visão determi-
nante de mundo sobre a evolução da espécie. Nenhuma prática pedagó-
gica é oca, vaga ou rasa e todas estão apoiadas em idealizar o processo
de aprendizagem e o objetivo dessa aprendizagem. Ao analisarmos esse
exposto, a teoria que sustenta a prática docente tem sido alvo de estudos
daqueles que querem ir mais além de suas expectativas e/ou avançar so-
bre o conteúdo administrado por professores acadêmicos.
Uma pequena parcela do professorado acadêmico procura
pouco investigar o referencial teórico subjacente ao trabalho dos teóri-
cos, preferindo assim trabalhar a parte da prática pedagógica à sua ma-
neira ou como a entender. Essa é a parte nefasta do processo educativo
como mote centralizador para uma educação de qualidade. Isso é um
erro gritante, pois o professor está formando cidadãos para o futuro. In-
vestigar é um ato importante para todo professor e não pode ser apenas
um ato corriqueiro de conclusão de trabalho. O que ainda não dá para
entender é o porquê alguns educandos insistem em fugir do padrão de
ensino investigativo e preferem morrer à míngua com suas próprias pa-
lavras.
A intenção deste artigo não é provar que A vem depois de B ou
que 1+1 é igual a 2, mas sim, salientar, demonstrar e inteirar que o pro-
fessor, antes de adentrar em uma sala de aula, é preciso ter conteúdos
satisfatórios e intrigantes para apresentar ao seu aluno, ter o enfoque ne-
cessário para atrair a atenção da sala e ter à disposição de todos a clara
certeza de que ele é o mediador de toda a aprendizagem ali demonstrada.

201
DNA Educação

É preciso ter um plano de aula para pôr em prática o seu planejamento


real de ação. Estar centrado nos arredores, nos entornos e nas missões
envolta de sua própria linha de sobrevivência educacional para somar
juntamente com o corpo discente acerca do ato cognoscente.
Aqui vale o belo reflexo de Morin3(1921), que, baseado na filo-
sofia de Montaigne (1533 – 1592), salienta, em linhas ornamentais, a im-
portância da teoria pedagógica com a finalidade de termos e fazermos “a
cabeça bem-feita e não bem cheia, com aptidão para tratar os problemas
e permitir ligar os saberes e lhes dar sentido” (MORIN, 2017, pg. 21).
A era virtual, as tecnologias da informação e as metodologias
ativas estão aí à deriva de muitos questionamentos e prova que muitos
professores estão copiando seus conteúdos sobre aquilo que viram em
redes sociais e apresentando aos mesmos como marca registrada de seus
trabalhos. Muitos o aplaudem porque desconhecem o tema; poucos se
contentam porque duvidam; alguns saem da sala de aula e vão pesquisar.
A teoria precisa da prática pedagógica como o lápis necessita do caderno
para só assim termos a teoria pedagógica pronta e não dissimulada para
ser contextualizada numa forma coerente e plausível.
Ser professor é ter paciência pedagógica
A educação no Brasil é diferente da educação que se encontra
na Finlândia, na Suécia, em Portugal e até nos Estados Unidos da Amé-
rica: enquanto aqui ainda buscamos o ideário de uma educação centrali-
zadora e horizontal que envolvam educadores e educandos, lá essa hie-
rarquização já é um tanto valorizada, explorada e centrada nos saberes
diversificados entre ensino e aprendizagem, entre professor e aluno.
Ainda que não fosse difícil explicar com exatidão o desenvolvimento es-
tudantil desses países, o Brasil perpassou por diversas fases voláteis até
se encontrar no DNA da Educação Nova.
A filosofia socrática do século V a. C. era um movimento que
fazia da razão os questionamentos diários e constantes e com isso, fir-
mou-se uma coligação entre o que saber e o que não saber, criando assim

3MORIN, Edgar. A Cabeça Bem-Feita: repensar a reforma, reformar o pensamento. 23º ed. Rio
de Janeiro, Bertrand Brasil, 2017. 128 pgs.

202
DNA Educação

um movimento filosófico de raiz ocidental que buscava no outro uma


resposta para a nossas perguntas. Com o advento da Filosofia Moderna,
os grandes pensadores mundiais uniram-se com os pensamentos de Só-
crates e desenvolveram um partido em que os valores discentes eram
considerados favorecidos em virtude do ato docente.
Aqui no Brasil essa corrente filosófica se fez presente por um
longo tempo, mesmo com a catequização dos jesuítas pelos índios e por
todos os brasileiros, mas não era o suficiente para detectar o cerne dessa
educação: ainda era preciso encontrar uma variante de significação para
o entendimento natural das coisas. A escola tradicional passa a ter vigor
maior nesse ínterim e, com ares magistrocêntricos, o poder estava cen-
trado apenas no professor, não deixando vazão para que os alunos pu-
dessem expor suas ideias, suas razões ou seus consentimentos acerca da-
quilo que estavam estudando. O conteudismo, o autoritarismo e o com-
portamento estúpido dos docentes perante seus discentes era tão gri-
tante, que ninguém conseguia barrá-los. Esse, definitivamente, não é o
tipo de DNA da educação que merece ser copiado, mas precisa ser lem-
brado para termos uma conscientização das escolásticas no Brasil.
De acordo com a ciência, DNA é uma sigla para ácido desoxir-
ribonucleico, que é um composto orgânico, cujas moléculas contêm as
instruções genéticas que coordenam o desenvolvimento e funciona-
mento de todos os seres vivos; é a principal célula encontrada no interior
dos cromossomos e que não possuem núcleo. Trocando em miúdos: o
professor do século XXI precisa ter em mente toda a história da Educa-
ção entrelaçada em si, para poder entender o seu alunado de ontem, de
hoje, do amanhã e do que está por vir.
A escola nova e o construtivismo tiveram como mote central a
linha de retomada perdida no contexto da escola tradicional e indo de
encontro com a filosofia de Sócrates do século V a. C. e com a filosofia
moderna de Kant, Rousseau e Herbart, que catalisaram a ideia central de
fazer com que o aluno pensasse com a razão e agindo com o pensamento
para gerar um entendimento substancial acerca dos conteúdos adminis-
trados. Esse DNA que havia sido perdido em uma época da escolástica
brasileira acabou encontrando nos dias de hoje a postura ideal do pro-
fessor questionador e reflexivo.

203
DNA Educação

Essa é a motivação maior do professor e do educador do século


XXI: procurar a sua essência, a sua verdade, a sua luta ideal, os seus por-
quês, a sua caracterização professoral. Para isso, é preciso o professor
entender o porquê se tornou professor e o porquê quer fazer parte da
educação. O professor precisa estar sendo professor para poder trans-
formar a realidade local, não o mundo, mas a sua realidade também, as-
sim, convencendo-se de que pode ser capaz de tal transformação, con-
vencerá o outro de que é possível ser transformado igualmente. O pro-
fessor precisa entender que ser professor é estar apto a mudanças do
mundo mundano, que precisa estar atrelado à história da educação, aos
acontecimentos acadêmicos, aos livros, ao mundo todo. Somente assim,
com essa personificação do entendimento do que vêm a ser a educação,
o professor poderá ter a certeza de que o que pode fazer em prol do
outro terá um sentido. É o que chamo de paciência pedagógica.
Para conseguir ter a paciência pedagógica, o educando precisa
ter em mente que a educação carrega consigo circunstâncias precárias de
uma educação magistrocêntrica arcaica e uma centralização pedocêntrica
atual e que essa dicotomia favorecerá o seu desempenho perante os edu-
candos e à família numa forma espiral que o levará ao conjunto orques-
tral de humanização. A paciência é o vigor do homem e sem ele não
poderemos chegar a lugar nenhum, senão a evasão de pensamentos e de
sentimentos absortos. O ato pedagógico é único e unilateral do homem
de todos os tempos, cada qual adequando ao seu jeito, ao seu tempo e
ao seu espaço.
A paciência pedagógica se faz nos três tempos: passado, pre-
sente e futuro!
Portanto, hoje a maior virtude do professor é a paciência, mas
não aquela mensurada em plena sexta-feira com o intuito de se livrar do
aluno, mas sim, como algo importante que cultivamos e plantamos em
cada um deles. Ser professor é uma tarefa árdua, constante, difícil, com
resultados pouco notórios de início e que nos leva ao desanimo quando
não queremos ou não entendemos a real dimensão da nossa missão. Mas
professor é aquele que não desiste, que pega na mão do aluno e o ensina
a escrever seu nome, dezenas e dezenas de vezes, sem cansar, sem esmo-

204
DNA Educação

recer, sem perder a linha do raciocínio. É preciso ser e estar sendo profes-
sor para captarmos a certeza de que estamos plantando o melhor para o
amanhã: cada aluno, cada sorriso, cada gesto é importante.
Existe algum meio de paciência pedagógica para aturarmos o
dia a dia inconstante da profissão? A recomendação mais clara e objetiva
é a paciência educativa, ou seja, mesmo as mães não educando seus filhos
em casa, a escola tem o dever de ensinar e educar seus alunos, traba-
lhando em conjunto a educação formal, informal, não informal e a inci-
dental. Para tanto, o estudante precisa do professor como precisa do lápis
para escrever e do caderno para somar, como se fosse um depósito de
informações com nexo, com fundamento e com histórias para contar. O
professor é quem zela por tudo, desde a sua entrada na escola até o re-
creio e a sua saída. É preciso uma valorização da paciência repetitiva, do
consolo imediato, do conforto quase que impossível.
Ser professor é mais que tudo isso: é levar trabalho para casa,
ler livros e mais livros, pensar na educação e na sua forma de sobrevi-
vência. Isso parte de um projeto que envolve a paciência reflexiva como
meta central. O bom professor não espera presentes no dia dos profes-
sores nem aguarda um bolo de aniversário: ele espera um gesto de hu-
manização, um sorriso de entendimento, um profundo respiro do edu-
cando sobre uma equação dificílima. Ser professor é olhar no olho desa-
tento do aluno, é descer do salto, esquecer as unhas pintadas e entender
que o giz e o quadro negro fazem parte de seu processo educacional. Ser
professor é persistir no erro para chegar a um acerto, é ter nuances pe-
dagógicas de como se aproximar de um resultado satisfatório, é dar risada
quando se está triste e é respeitar o próximo como se fosse você mesmo.
O bom professor não magoa o aluno e não retira de si a autoridade que
tem para poder aprender. Por fim, ser professor é ter a mais pura e digna
profissão, desvalorizada para muitos, mas respeitada por multidões.
Ser professor é ter todas as paciências do mundo: educativa,
pedagógica, humanitária, social, antropológica, psicológica, livresca e re-
flexiva!

205
DNA Educação

A prática pela não prática: a educação atópica


Com tantos dilemas e desafios educacionais, conflitos igualitá-
rios, desafios diários e a luta permanente pela educação brasileira, há uma
pergunta pertinente que precisa urgentemente de uma resposta cabível
de pensamentos estratégicos: qual é o DNA da educação? Ser professor
numa metrópole como São Paulo ou Rio de Janeiro ou nos cafundós
escondidos do sertão nordestino, cada qual com suas culturas e seus tre-
jeitos, suas ramificações e seus paradigmas, ser educador numa seara com
grandes dificuldades facultativas torna-se, ao mesmo tempo, sedutor e
desafiador, estimulador e característico de ressalvas problemáticas, em
que o sistema nos impõe limites, mas a prática nos prega pragas.
A prática como práxis educativa requer muito mais que ser edu-
cador: é ser plausível de uma luta constante pela identidade de um aluno,
pela perseverança de uma criança indefesa, pela sensibilidade de um
adulto sagaz, pelo crescimento de ideias e pelo caráter de um ser humano
compreensível. Sem esses adjetivos, não há educação e o mesmo passa
pela educação atópica, aquela que, como já mencionada, é inflamada e
que está prestes de ser infeccionada. É preciso encontrar na pergunta que
seja feita uma solução para que cada dia seja um dia diferente, longe das
rotinas costumeiras impostas por pessoas que sequer adentram em uma
sala de aula.
Requer, acima de tudo, muita dedicação, muita afetividade,
muita garra, perseverança e muita capacidade em poder manter uma
classe numerosa em sintonia, impondo seus conhecimentos e seu res-
peito, sem desrespeitar o outro. É preciso uma prática nova, diferenciada
e contumaz, que beneficie professor e aluno numa simbiose somatória
do saber, onde o ato passe a ser o mote central de todo o sistema. É
saber procurar distinguir o certo do errado, o sujeito obscuro do objeto
perverso, o adjetivo vulnerável do substantivo incompleto, do verbo im-
perativo para o verbo conjugado numa preposição digestiva entre o saber
e a epistemologia.
Em minhas viagens pelo Nordeste brasileiro, pude conhecer
alunos que moravam longe de suas escolas, mas que não perdiam a
chance de irem à escola ao menos para aprenderem o alfabeto. Conheci

206
DNA Educação

educadores que faziam questão de ensinar e conheci educadoras que fa-


ziam de tudo para que seus alunos não perdessem as aulas. Essa é a prá-
tica da práxis hierarquizada pela teoria livresca e que se torna atemporal
aos nossos olhos: eis aqui o verdadeiro significado de ser e estar sendo
professor!
A prática da práxis introduz no educador a prática que pratica
a prática.
Essa realidade não é neutra. Ela tem raízes, significados e atos
para uma aprendizagem significativa com escuta ativa. Assim sendo, a
prática é a realização completa de uma práxis que é flexível, não arredon-
dada e não superficial. O professor e a professora precisam entender que
a educação não está morta, que precisa ser reinventada todos os dias para
que não haja uma utopia educacional e que há a necessidade de fazer com
que ela não se atrofie gradativamente. Por essa mesma razão, a prática
prevalece aos olhos do professor que pensa na educação como transfor-
mação mundana.
Ser professor e ser professora é ter a capacidade de poder ensi-
nar ao próximo aquilo que sabe, aquilo que estudou e aquilo que digeriu
por anos a fio, aquilo que adquiriu como novos conceitos pedagógicos,
aquilo que absorveu das leituras dos teóricos referenciais. É a realização
plena de uma sabedoria sem fim. Com os novos adventos incorporados
na educação, com as metodologias ativas, com as tecnologias da educa-
ção, com o novo alunado, com a entrada triunfal do aluno com necessi-
dades educacionais especiais, o professor passa a ser, no século XXI, o
novo modelo de superação para além desse DNA.
Hoje sei que cada vez que passam os dias, as horas, os minutos
e as leituras em torno da educação, mais sei que podemos lutar por essa
categoria e retirar de suas mazelas a sabedoria de um futuro melhor, com
alunos mais determinados ao conhecimento e a sensatez de uma catego-
ria digna de um respeito profundo entre educador e educando.

207
DNA Educação

O conhecimento gera o argumento


A educação precisa ser salva!
Parece-me fácil dizer isso com certo entusiasmo, mas o fato é
que a educação precisa ser salva, sim. Para que isso possa acontecer, te-
mos que lutar, professores e professoras, em torno daquilo que é o mais
óbvio: dos estudos. Estamos em um momento que requer novas desco-
bertas como nunca visto antes na educação brasileira e nós somos os
protagonistas dessa transmutação, dessa visão e desse tempo. Temos que
arregaçar as mangas, tirar da cartola o plano B, suar a camisa e mostrar
que não estamos atrofiados dentro de uma garrafa para o sempre. Temos
e podemos mudar toda a educação!
Para gerar o argumento é preciso de conhecimento e para gerar
um conhecimento é preciso estudos, capacitação, horas de complemen-
tação envolta daquilo que se pretende se especializar. O professor e a
professora com seus argumentos em prol dos conhecimentos favorece-
rão aos seus alunos e alunas maior internalização de conteúdos que po-
derão ser facilmente compreendidos por meio do diálogo em forma de
autonomia.
Não se trata, em momento algum, de um conteúdo memori-
zado, mas, sim, de um encontro entre o que já se sabe daquilo que poderá
ser sabido de uma forma mais contextualizada. A educação está aí em
todos os níveis e em todos os lugares, em todos os contextos e em todos
os segmentos e o professor precisa entender que seu DNA está voltado
para esse aluno que precisa entender que seu lugar é hoje e seu território
será o amanhã.
Essa conversa entre o conhecimento e o argumento é tão forte
quanto preciso, pois recai sobre ambos, educador e educadora e edu-
cando e educanda, todos os tipos possíveis de busca pelo novo, busca
pelo fato, busca pelo conflito de leitura, busca pela rebusca de uma sin-
tonia rebuscada. Esse pensamento é tão atual quanto ulterior: o que a
boca fala é algo que vem da mente que, originalmente, vem de um pen-
samento que buscou no conhecimento para gerar o argumento.
O professor precisa ter esse domínio do conhecimento estu-
dado para gerar em sala de aula um argumento espontâneo baseado na-
quilo que estudou. Os livros, fontes inesgotáveis de inspiração, passam a

208
DNA Educação

ser sua alegoria perfeita entre teoria e prática, entre o saber e o explicar,
entre o estudar e o dar aula. O argumento não pode, sendo assim, ser
inválido, oco, vago, dissimulador, mas precisa, necessariamente, ter uma
verdade, uma fonte, elo entre o que fazer e o que dizer. E a função dia-
lética, nesse caso, se torna algo tão presente e natural quanto estimulador.
A reforma do pensamento crítico do ato docente transforma a
consciência humana em consciência plural quando há a intenção de me-
lhorar o outro, melhorar o contexto, melhorar a educação no sentido de
humanizar a prática dentro da práxis, convertendo o real, o ideal e o fle-
xível para uma intencionalidade em que o conhecimento gera o argu-
mento. Essa metalinguagem da educação contemporânea é o resultado
de uma longa mudança social em que o intuito é fazer da pedagogia ató-
pica em um senso construtivista, ressignificando a educação em seus pi-
lares e fazendo desse assunto um plano de escopos em que educador e
educadora se entendam e entendam os dizeres e conflitos de seus edu-
candos e educandas.

209
DNA Educação

AS CONTRIBUIÇÕES DAS POLÍTICAS PÚBLICAS


PARA A IMPLEMENTAÇÃO DAS CLASSES HOSPITA-
LARES

Jaqueline Bragio1
Marciane Cosmo2
Hiran Pinel3
RESUMO:
O presente artigo foi elaborado após a realização de uma pesquisa bibli-
ográfica e culminou na apresentação de um seminário sobre as políticas
públicas que perpassam o cenário da Educação Especial no Brasil e no
Espírito Santo. O seminário foi apresentado na Disciplina de Educação
Especial e Processos Inclusivos ministrada pela Profa Dra Denise
Meyrelles de Jesus e destinou-se aos alunos de Doutorado em Educação
do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal
do Espírito Santo- PPGE/UFES. O objetivo deste artigo foi o de siste-
matizar o percurso histórico das Políticas Públicas sobre a implantação
das Classes Hospitalares no Brasil e no Espírito Santo, desvelando algu-
mas práticas e experiências que vem à lume nesse processo de historici-
zação. O percurso metodológico adotado foi o fenomenológico-biblio-
gráfico que visou ir em busca dos fenômenos e experiências que emergi-
ram, nesse caso, da historicidade das políticas públicas de educação es-
pecial. Os dados coletados e o embasamento legal doravante discrimina-
dos, foram selecionados intencionalmente para que pudéssemos analisar,
refletir e tecer um olhar reflexivo acerca da implementação dessas políti-
cas públicas na prática. Como referencial teórico, nos ancoramos nas leis
e diretrizes que regulamentam a Educação Especial e na contribuição de
dois autores que nos ajudaram a dialogar com as políticas e com as pes-
quisas na academia sobre as Classes Hospitalares: Freitas(2016) e Fon-

1 Enfermeira. Mestre e Doutoranda em Educação, UFES/ CE/ PPGE. bragio.jaque-


line@gmail.com
2 Pedagoga. Mestre e Doutoranda em Educação, UFES/CE/PPGE. marciane_cosmo@hot-

mail.com
3 Professor do Programa de Pós-Graduação em Educação PPGE/UFES. hiranpinel@ig.com

210
DNA Educação

seca(2011). A pesquisa bibliográfica foi realizada a partir de artigos e pe-


riódicos que versavam sobre o assunto. Como descritores utilizamos os
termos: classe hospitalar, pedagogia hospitalar, atendimento escolar hos-
pitalar e escolarização hospitalar por considerarmos semânticamente es-
ses termos muito próximos perante a legislação e por se apresentarem
em alguns periódicos como sinônimos. No decorrer desse processo de
pesquisa, buscamos desvelar as ações políticas de organização do sistema
de atendimento educacional em ambientes hospitalares nos atentando a
compreender as práticas pedagógicas, a diversidade de sujeitos que estão
hospitalizados e as pesquisas acadêmicas que vêm sendo desenvolvidas
nesse cenário.
Palavras-chave: Classe Hospitalar; Políticas Públicas; Educação Espe-
cial; Pedagogia Hospitalar.
ABSTRACT:
This article was elaborated after the accomplishment of a bibliographical
research and culminated in the presentation of a seminar on the public
policies that perpasses the scenario of the Special Education in Brazil
and in the Holy Spirit. The seminar was presented at the Discipline of
Special Education and Inclusive Processes taught by Prof. Denise
Meyrelles de Jesus and was intended for PhD students in Education of
the Post-Graduation Program in Education of the Federal University of
Espírito Santo - PPGE / UFES. The objective of this article was to sys-
tematize the historical course of Public Policies on the implantation of
the Hospital Classes in Brazil and in Espírito Santo, revealing some prac-
tices and experiences that come to light in this process of historicization.
The methodological course adopted was the phenomenological-biblio-
graphical one that sought to go in search of the phenomena and experi-
ences that emerged, in this case, of the historicity of the public policies
of special education. The data collected and the legal basis from which
we discriminated were intentionally selected so that we could analyze,
reflect and weave a reflective look at the implementation of these public
policies in practice. As a theoretical reference, we anchor ourselves in the
laws and guidelines that regulate Special Education and in the contribu-
tion of two authors who helped us to dialogue with the policies and re-
search in the Academy about the Hospital Classes: Freitas (2016) and
Fonseca (2011). The bibliographical research was carried out from arti-
cles and periodicals that dealt with the subject. As descriptors we use the
terms: hospital class, hospital pedagogy, hospital attendance and hospital
schooling because we consider semantically these terms very close to the

211
DNA Educação

legislation and for presenting themselves in some journals as synonyms.


In the course of this research process, we seek to unveil the political
actions of organization of the educational service system in hospital en-
vironments in order to understand the pedagogical practices, the diver-
sity of subjects that are hospitalized and the academic researches that
have been developed in this scenario.
Keywords: Hospital Class; Public policy; Special Education, Hospital
Pedagogy.
Introdução
Muitas crianças se encontram doentes, o que muitas vezes acar-
reta a necessidade de internação em ambientes hospitalares. O contexto
hospitalar por si já é agressivo, considerando a realidade de muitos hos-
pitais no Brasil, onde o ambiente é desconhecido, frio e nada acolhedor,
quando comparado ao aconchego do lar ao qual a criança estava acostu-
mada. Soma-se a esse fator a mudança radical no papel de ser criança, já
que suas rotinas, desejos e companhias nem sempre são respeitadas. Ou-
tro ponto de destaque é a restrição da criança a sua escola, e assim como
ao convívio no espaço-tempo escola, seus amigos da sala, sua professora
e suas rotinas (BRAGIO, 2014).
Diante disso, é importante que o cuidado com a saúde não des-
mereça ou diminua o cuidado com a escolarização. A saúde e a Educa-
ção, nesse sentido, precisam estar juntas, numa relação consistente e sig-
nificativa, de modo a tornar possível um cuidado eficaz, ampliado e in-
tegral.
Considerando a educação como um direito de toda e qualquer criança e
adolescente (BRASIL, 1988), inferimos que as crianças e adolescentes
que estejam hospitalizadas também devem ter garantido esse direito
(BRAGIO, 2014).
O processo de escolarização realizado na Classe Hospitalar é
uma modalidade de atendimento que proporciona espaços/tempo e mo-
mentos de ensino-aprendizagem à crianças e adolescentes internados em
ambiente hospitalar, e/ou em atendimento ambultorial, ou em assisten-
cia domiciliar (BARROS et.al,2011), garantidos pela legislação.

212
DNA Educação

Considerando o exposto, nosso envolvimento e motivação para


a produção do presente artigo aconteceu durante a realização de um Se-
minário em Pesquisa, apresentado no curso de doutorado em Educação
na disciplina Educação Especial e Processos Inclusivos - ministrada pela
Profa Dra Denise Meyrelles de Jesus - na Universidade Federal do Espí-
rito Santo- PPGE/UFES. Realizamos um levantamento bibliográfico
sobre as políticas públicas que perpassam o cenário da Educação Espe-
cial no Brasil e no Espírito Santo com foco na pedagogia hospitalar.

OBJETIVOS E PERCURSO METODOLÓGICO DO ARTIGO:


 Objetivo Geral:
 Descrever as políticas públicas sobre o atendimento escolar hospitalar no
cenário nacional brasileiro e no Espírito Santo, desvelando práticas e ex-
periências acerca desse processo nas classes hospitalares e ainda;
 Objetivo específico:
 Mapear historicamente os aportes legais que tratam das classes hospitalares
e do respectivo atendimento escolar hospitalar no Brasil e no Espírito
Santo.
 Metodologia
Para a realização desse artigo começamos delimitando os des-
critores que utilizaríamos para a busca na legislação sobre o assunto e em
sites acadêmicos e de periódicos nacionais. Os descritores escolhi-dos
foram: classe hospitalar, pedagogia hospitalar, atendimento escolar hos-
pitalar e escolarização hospitalar pois ao digitar um descritor, éramos di-
recionados para outros descritores (citados anteriormente) e que trata-
vam do mesmo assunto como se fossem sinônimos.
Recorremos ao método de pesquisa qualitativa de revisão bibli-
ográfica fenomenológica. Assim, o levantamento do material foi intenci-
onalmente construído pelas autoras mediante as leituras e selação do
tema pesquisado. Após esse movimento, partimos para uma elaboração
de títulos que julgamos importante trazer a lume dando nossas opiniões.
A justificativa pela escolha desse método de pesquisa bibliográfica feno-
menológica se dá pela oportunidade de envolvimento e aproximação das
autoras na produção - à medida que íamos lendo o material, realizávamos

213
DNA Educação

o envolvendo e distanciando procurando capturar os sentidos do texto


para serem analizados e dialogados com a temática proposta (BRAGIO,
2014).
Como referencial teórico, nos ancoramos nas leis e diretrizes
que regulamentam a Educação Especial e na contribuição de dois autores
que nos ajudaram a dialogar as políticas e com as pesquisas na academia
sobre as Classes Hospitalares: Freitas (2016) e Fonseca (2011).
De quem é a responsabilidade da escolarização das crianças nas
classes hospitalares?
Partimos dessa indagação para começarmos a analisar os pro-
cessos de escolarização nos hospitais - que ora acontecem nas classes
hospitalares, ora nos ambulatórios e também nos leitos dos hospitais. Ao
realizarmos a pesquisa bibliográfica sobre as políticas do atendimento
escolar hospitalar, verificamos inicialmente que essa prática teve início
desde a década de 30 no Brasil, mas só foi consolidada como respon-
sabilidade do Ministério da Educação a partir de 1994 quando publicada
a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação
Inclusiva. O Ministério da Educação/Secretaria de Educação Continu-
ada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão apresentou a Política Nacio-
nal de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva, que per-
cebendo os avanços do conhecimento e das lutas sociais, visava consti-
tuir políticas públicas promotoras de uma educação de qualidade para
todos os estudantes, incluindo os das classes hospitalares.
Essa pergunta foi disparadora e nos impulsionou ir em busca
dos aportes legais que subisidiassem o encontro dessa resposta no cená-
rio nacional brasileiro. Dentro da pesquisa desenvolvida a primeira refe-
rência legal encontrada no Brasil sobre Educação Hospitalar foi no De-
creto Lei n. 1044, de 24.10.1969 que diz no seu art. 1º:
São considerados merecedores de tratamento excepcional
os alunos de qualquer nível de ensino, portadores de afec-
ções congênitas ou adquiridas, infecções, traumatismo ou
outras condições mórbidas, determinando distúrbios agudos
ou agonizantes, caracterizados por: a) incapacidade física re-
lativa, incompatível com a frequência aos trabalhos escola-
res; desde que se verifique a conservação das condições in-

214
DNA Educação

telectuais necessárias para o prosseguimento da atividade es-


colar em novos moldes; b) ocorrência isolada ou esporádica;
c) duração que não ultrapasse o máximo ainda admissível,
em cada caso, para a continuidade pedagógica de aprendi-
zado, atendendo a que tais características se verificam, entre
outros, em casos de síndromes hemorrágicos (tais como he-
mofilia), asma, pericardites, afecções osteoarticulares sub-
metidas a correções ortopédicas, etc.
Em 1995 foi fundado o Conselho Nacional de Defes dos Di-
reitos da Criança e do Adolescente (CONANDA). Segundo os registros
históricos, a partir de sua fundação, foi elaborada e aprovada Resolução
nº 41 de 13 de outubro de 1995 em que passou a estender o direito à
proteção integral à infância e adolescência, aos eventos de hospitalização
também nos âmbitos jurídicos e políticos para além da questão moral.
Definiu enquanto direito ao paciente/aluno o acompanhamento do cur-
rículo escolar durante sua permanência hospitalar, como descrito no ar-
tigo abaixo do CONANDA:
Art.9º. Direito a desfrutar de alguma forma de recreação,
programas de educação para a saúde, acompanhamento do
curriculum escolar, durante sua permanência hospitalar
(Res.nº 41/1995).
Em 1996 com a publicação da Lei de Diretrizes e Bases da Edu-
cação Nacional, é instituído como modalidade escolar a educação espe-
cial. Por meio dela, as crianças e adolescentes hospitalizados passa-ram a
ter atendimento escolar hospitalar, ou seja, tornou-se responsabi-lidade
dos profissionais e secretaria de Educação Especial de cada estado e/ou
município acompanhar a escolarização desses sujeitos por apresentarem
um quadro clínico/ pedagógico que demanda um atendimento educaci-
onal especializado. Assim prescreve a LDB 9.394/96 no artigo,
5º: O atendimento educacional será efetivado em escolas,
classes ou serviços especializados, sempre que em função
das condições específicas dos alunos, não for possível a sua
integração nas classes comuns de ensino regular.
O artigo acima faz menção às crianças e adolescentes que es-
tando em estado de hospitalização não conseguem se integrar nas classes
comuns do ensino regular, sendo necessário que aconteça o atendimento

215
DNA Educação

educacional nas classes hospitalares, ambulatórios e no próprio leito do


hospital.
A legislação federal especifica que o fato de a criança/ adoles-
cente estar hospitalizado caracteriza o sujeito como um sujeito que apre-
senta necessidades especiais, uma vez que sua situação de saúde o im-
possibilita de estar integrado em seu cotidiano (mesmo considerando
uma necessidade especial temporária). Hoje, a Educação Especial é uma
modalidade de ensino reconhecida pelo Ministério da Educação através
da Secretaria de Educação Especial, onde o atendimento escolar hospi-
talar está inserido.
Nessa direção, compete ao poder público materializado nas se-
cretarias de educação especial ofertar o atendimento escolar hospitalar
que se caracteriza como “o acompanhamento dos processos de desen-
volvimento e de aprendizagem da criança doente durante sua internação
no hospital” (FONSECA, p.3, 2011) e de acordo com o MEC (2002)
esse atendimento escolar hospitalar deve acontecer nas classes hospita-
lares.
Seguindo nos marcos legais que amparam o atendimento esco-
lar hospitalar, no ano de 1999 é publicado o Decreto nº 3.298, de 20 de
dezembro onde no seu artigo 24, inciso V estabelece o oferecimento
“obrigatório dos serviços de educação especial ao educando portador de
deficiência em unidades hospitalares e congêneres nas quais esteja inter-
nado por prazo igual ou superior a um ano” (BRASIL, p.3,1999).
No ano de 2001 é publicada a Resolução do Conselho Nacional
de Educação nº 02 de 11.09.2001 que propõe que os sistemas de ensino,
mediante ação integrada com os sistemas de saúde, devem organizar o
atendimento educacional especializado a alunos impossibilitados de fre-
quentar as aulas em razão de tratamento de saúde que implique interna-
ção hospitalar, atendimento ambulatorial ou permanência prolon-gada
em domicílio. A resolução especifica ainda:
§1º As classes hospitalares e o atendimento em ambiente
domiciliar devem dar continuidade ao processo de desen-
volvimento e ao processo de aprendizagem de alunos matri-
culados em escolas da Educação Básica, contribuindo para
seu retorno e reintegração ao grupo escolar, e desen-volver

216
DNA Educação

currículo flexibilizado com crianças, jovens e adultos não


matriculados no sistema educacional local, facilitando seu
posterior acesso à escola regular (BRASIL,p.2, 2001).
No ano de 2002 o Ministério da Educação publica o docu-
mento orientador intitulado de Classe Hospitalar e Atendimento Peda-
gógico Domiciliar: Estratégias e Orientações para subsidiar o trabalho
dos profissionais da educação nas classes hospitalares e no atendimento
escolar hospitalar, de forma a “ assegurar o acesso à educação básica e à
atenção às necessidades educacionais especiais, promovendo o desenvol-
vimento e contribuindo para a construção do conhecimento desses edu-
candos” (2002, p. 07).
Avançando no campo das legislações, em 21 de março de 2005 é publi-
cada a Lei nº 11.104 que dispunha sobre a obrigatoriedade de instalação
de brinquedotecas nas unidades de saúde que oferecesse atendimentos
em regime de internação.
A obrigatoriedade da instalação de brinquedotecas nos hospi-
tais que ofertam regime de internação pediátrico veio fortalacer esse mo-
vimento de escolarização nos hospitais pois garantiu à criança e ao ado-
lescente além do acesso ao currículo e aos conhecimentos historicamente
produzidos, passaram a ter acesso à ludicidade e ao brincar. Corrobo-
rando com essa perspectiva de oferta, a Resolução nº 04 de 02 de outu-
bro 2009 que dispõe sobre o atendimento educacional especializado des-
creve no seu artigo 6º que o atendimento educacional especializado em
ambiente hospitalar será ofertado aos alunos, pelo respectivo sistema de
ensino, a Educação Especial de forma complementar ou suplementar.
Ou seja, compete aos sistemas de ensino coordenarem e subsidiarem esse
atendimento às crianças e adolescentes hospitalizados.
Adensando um pouco mais nossas buscas e pesquisas, decidi-
mos por investigar como essas políticas estavam sendo aplicadas no es-
tado do Espírito Santo e desvelar nessa procura, quais eram/são as polí-
ticas de educação especial que inserem o atendimento escolar hospitalar
na prática dos hospitais do Estado. Para que pudéssemos realizar uma
pesquisa consolidada, fomos em busca de publicações veiculadas pela
Secretaria Estadual de Saúde e de Educação.

217
DNA Educação

As classes hospitalares no Espírito Santo


De acordo com as diretrizes da educação especial na educação
básica e profissional para a rede estadual de ensino no Espírito Santo
publicadas no ano de 2011, encontramos o seguinte amparo legal:
O atendimento educacional especializado em ambiente hos-
pitalar ou domiciliar será ofertado aos alunos com deficiên-
cia, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilida-
des/superdotação, pelo respectivo sistema de ensino, de
forma complementar ou suplementar, quando suas condi-
ções de saúde assim o exigirem.
Essas diretrizes foram publicadas com objetivo orientar a im-
plementação de uma política de Educação Especial no Sistema Estadual
de Ensino do Espírito Santo, visando “[...] à organização de escolas que
valorizem as diferenças como fator de enriquecimento do processo edu-
cacional, a fim de favorecer a transposição de barreiras para a aprendiza-
gem e propiciar a participação dos alunos com igualdade de oportunida-
des” (2011, p.6). Notamos nessa apresentação, que o enfoque das dire-
trizes foi dado às escolas regulares e resumidamente encontramos - na
citação acima - como será ofertado em ambientes hospitalares e domici-
liares, ou seja, não há um aprofundamento de orientações ou um con-
junto de instruções, indicações que descrevam organização do desenvol-
vimento de um trabalho da Educação Especial nesses espaços.
Ao realizar o movimento de analisar as diretrizes e investigar a
prática, no Espírito Santo o Atendimento Escolar Hospitalar se dá nas
Classes Hospitalares implantadas em três hospitais a saber:

REDE ESTADUAL (ESPÍRITO SANTO)


Hospital Infantil e Maternidade Dr .Alzir Bernardino Alves(HIMABA)- Vila
Velha
Hospital Infantil Nossa Senhora da Glória (Hinsg)- Vitória
Hospital Dório Silva (HDS)- Serra
Fonte: SESA –Secretaria de Saúde do Espírito Santo,2015.

Nesse processo de investigação, percebemos que a Classe Hos-


pitalar é uma parceria do Governo do Estado por meio das Secretarias
de Estado da Educação(SEDU) e de Saúde(SESA). Atual-mente a

218
DNA Educação

SEDU conta com o trabalho de 15 professoras que atendem os alu-


nos/pacientes (de 7h às 12h/ 13h às 18h). Duas professoras para traba-
lhar com Deficiencia Visual. Com a implantação das Classes Hospitalares
a partir de 2004 até 2015, foram atendidos aproxima-damente 13.000
alunos/pacientes (SESA, 2015).
As pesquisas no cenário acadêmico
Como pesquisadoras que vamos nos constituindo, sentimo-nos
inquietadas a investigar no campo acadêmico como esses temas vem
sendo pesquisados e discutidos na academia. Como referência, investi-
gamos inicialmente o nûmero de hospitais no Brasil que têm classes hos-
pitalares. No mapeamento, descrito por Ramos (2016), o número de hos-
pitais cadastrados que dispõe de classes hospitalares e oferecem o aten-
dimento escolar hospitalar assim distribuídos:

Fonte: Levantamento das Escolas em Hospitais no Brasil, professora Eneida Simões da Fon-
seca, 2015. Disponível em: (RAMOS,2016, pg. 33).

Destacamos que,
[...] este quantitativo apresenta somente as Classes Hospita-
lares onde os professores são concursados e fazem parte do
quadro da SMS ou da Secretaria Estadual de Educação

219
DNA Educação

(SEE) deixando de fora as Classes que oferecem esse aten-


dimento através de projetos de extensão oferecidos pelos
Cursos de Licenciatura em Pedagogia, como também os de-
senvolvidos por trabalho voluntário ou ONG. (RAMOS,
2016, p. 33).
Tomamos como referência esse levantamento de número de
hospitais para perceber quão reduzido é esse quantitativo de hospitais
que dispõem de classes hospitalares num país tão populoso como o Bra-
sil, mas que as políticas públicas instituídas são os primeiros passos em
prol da oferta de uma educação para todos (as).
Ao chegarmos nas pesquisas acadêmicas, os dados são ainda
mais reduzidos. Realizando um mapeamento das produções acadêmicas
na última década, encontramos 37 trabalhos vinculados a programas de
pós-graduação em Educação.Dentre os temas pesquisados encontramos:
as políticas públicas da pedagogia hospitalar, pesquisas sobre práticas e
sobre a escolarização da criança hospitalizada.
Freitas (2016, p.3) nos mostra alguns dados atualizados se re-
portando a 09 pesquisas/produções em programas de pós-graduação em
Saúde, sendo: 06 estudos sobre o impacto da doença crônica sobre a
escolarização de crianças e jovens enfermos; 03 estudos sobre as ativida-
des lúdicas nos hospitais.
Percebemos, que tanto nos programas de pós-graduação em
educação como nos programas de pós-graduação em saúde, o quantita-
tivo de pesquisas ainda se mostra tímido frente a tantas políticas e sujei-
tos que evocam a necessidade de serem ouvidos. Destamos a necessidade
de haver mais pesquisas na área de modo que os dados, os desafios, as
experiências, as hostórias de vida, as conquistas na área da pedagogia
hospitalar sejam publicizadas e quiçá, repercutam em novas políticas pú-
blicas voltadas para esse público-alvo das classes hospitalares.
Algumas reflexões acerca das classes hospitalares
Apesar da evolução e contribuições acerca da temática da esco-
larização de crianças e adolescentes hospitalizados, observamos um nu-
mero reduzido de profissionais qualificados para atuar nesses espaços.
Dessa maneira, muitas vezes a atuação do professor ainda tem sido con-
fundida com as ações de outros profissionais da equipe hospitalar, tais

220
DNA Educação

como psicólogo, assistente social, terapeuta ocupacional, ou em algumas


situações do recreador.
Contudo, apesar da preocupação governamental com as neces-
sidades educacionais das crianças e adolescentes hospitalizados e ser este
ser um tema de grande relevância para os profissionais da educação e da
saúde, ainda há lacunas importantes em relação às informações oficiais
sobre classes hospitalares, como a elaboração de estudos que tracem o
perfil das classes hospitalares. Nesse contexto, fica inviabilizada a possi-
bilidade de termos parâmetros para conhecer a dimensão e a distri-bui-
ção dessas atividades no âmbito nacional.
Essa pesquisa possibilitou um aprofundamento no estado da
arte das contribuições das políticas publicas na implementação das clas-
ses hospitalares, assim como destacar a necessidade de mobilizar aos se-
tores envovlidos (comunidade, escola, familia, professores, orgãos publi-
cos, educadores) para o reconhecimento do espaço hospitalar como con-
tinuação da escolarização de crianças e adolescentes internados, que ne-
cessitam de acompanhamento da educação especial, e dessa forma a ma-
nutenção da garantia do seu direito de estudar.
Destacamos a necesisdade de que novas pesquisas e debates
corroborem no sentido de aprofundar a possibilidade de práticas peda-
gógicas que podem ser inseridas nessa modalidade educacional; assim
como o envolvimento com a formação profissional dos sujeitos que
atuam nesses espaços-tempos, o desenvolvimento de currículo educaci-
onal assim como aprofundamentos teóricos-metodológicosna área.
Precisamos pensar na Pedagogia Hospitalar não apenas como
uma possibilidade educacional, mas como uma temática que satisfaz duas
áreas básicas e essenciais ao ser humano: saúde e educação.

221
DNA Educação

Referências
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil:
promulgada em 5 de outubro de 1988. Disponível em:
<http://www.mec.gov.br. Acesso em 15 de abril de 2010.
______. Direitos da criança e do adolescente hospitalizados. Diário Oficial, Bra-
sília, 17 out. 1995. Seção 1, p. 319-320. Disponível em:
<http://www.mec.gov.br. Acesso em 15 de abril de 2010.
______.Decreto lei nº 1044 de 24 de outubro de 1969: Dispõe sobre tratamento
excepcional para os alunos portadores das afecções que indica. D.O.U. de
22.10.1969 e retificado no D.O.U. 11.11.1969.. Disponível em : http://www.pla-
nalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del1044.htm. Acesso em 14 de junho de
2017.
______. (1994). Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação
Especial: Política Nacional de Educação Especial. Brasília, DF. v. 1. Disponível
em: <http://www.mec.gov.br. Acesso em 15 de outubro de 2010
______. Resolução n° 41/1995- Conselho Nacional dos Direitos da Criança e
do Adolescente: Direitos da Criança e do Adolescente hospitalizados. Outubro
de 1995. Disponível em: http://www.portal.educacao.salva-
dor.ba.gov.br/site/documentos/espaco-virtual/espaco-educacao-saude/clas-
ses-hospitalares.Acesso em 14 de junho de 2017.
______. Lei de Diretrizes e Bases. Lei nº 9.394/96, de 20 de dezembro de 1996.
______.Diretrizes da educação especial na educação básica e profissional
para a rede estadual de ensino do Espírito Santo.2ª Ed. Vitória:2011.
_______.Resolução CNE/CEB nº 2 de 2001. Institui Diretrizes Nacionais para
a Educação Especial na Educação Básica.Disponível em: http://por-
tal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/CEB0201.pdf.Acesso em 14 de junho de
2017.
BARROS, Alessandra Santana Soares; GUEUDEVILLE, Rosane Santos; VI-
EIRA, Sônia Chagas. Perfil da publicação cientifica Brasileira sobre a temática da
Classe Hospitalar. Revista Brasileira de Educação Especial. V.17, N 02, p.335-
354, Mai.-Ago., 2011.
BRAGIO, Jaqueline. O sentido de ser educadora das/nas brinquedotecas do
hospital infantil de Vitória/ES: um estudo a partir dos conceitos de “xperiencia”,
“narrativa” e “cuidado”. 2014. 1v. 141pg. Dissertação (Mestrado em Educação).
Universidade Federal do Espírito Santo, Centro de Educação, Programa de Pós-
Graduação em Educação. Espírito Santo. Disponível:http://reposito-
rio.ufes.br/bitstream/10/1143/1/Dissertacao.Jaqueline%20Bragio.pdf . [captu-
rada em 28 junho de 2017] .
FONSECA, Eneida S. A situação brasileira do atendimento pedagógico-educa-
cional hospitalar. Educação e Pesquisa. São Paulo, v. 25, n. 1, p. 117-129,
jan./jun. 1999.
Lei nº 11.104 (2005). Brinquedoteca: um direito das crianças. Brasil: Câmara dos
debutados. Brasília, DF: Autor. Sítio: HTTP://legislacao.planalto.gov.br/le-
gisla/legislacao.nsf/viw).Capturado em 20 de Fevereiro de 2017.

222
DNA Educação

LEI nº 8.069 (1990,13 DE JULHO). Estatuto da Criança e do Adolescente. Bra-


sília, DF. Casa Civil. Subchefia para assuntos Jurídicos. Sítio: HTTP://www.pla-
nalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8069.htm Capturado em 10 fevereiro de 2017.
MATOS, Elizete Lúcia Moreira; MUGIATTI, Margarida Maria Teixeira de Frei-
tas. Pedagogia hospitalar: A humanização integrando educação e saúde. 2. ed .
Petrópolis: Vozes, 2007.
RAMOS, Maria Alice de Moura, Classe hospitalar: processos e práticas educati-
vas pela humanização. 2016. 1v. 142 pg. Tese (Doutrado em Educação). Univer-
sidade Federal Fluminense, Faculdade de Educação.
Disponivel em: https://sucupira.capes.gov.br/sucupira/public/consultas/co-
leta/trabalhoConclusao/viewTrabalhoConclusao.jsf?popup=true&id_traba-
lho=4032050
[ capturado em 10 de julho 2017].
SESA – Secretaria de Saúde do Espírito Santo, 2015. Disponível em:
http://saude.es.gov.br/sedu-amplia-classe-hospitalar-para-o-hospital . [captu-
rado em 10 junho de 2017].

223
DNA Educação

EDUCADORAS DAS INFÂNCIAS:


O PRINCÍPIO BIOCENTRICO NO PROCESSO DE
FORMAÇÃO

Márcio Xavier Bonorino Figueiredo1


Paulo Ricardo do Canto Capela2

RESUMO:
Esta escrita discute a formação de educadoras das infâncias com base
no princípio biocêntrico. Falamos das expectativas, das relações, dos
processos de vida, das diferentes possibilidades de conhecimentos, das
atuações pedagógicas, das dimensões integradoras dos afetos. Fazemos
uma “leitura/ análise” na perspectiva fenomenológica dos registros/
entrevistas, das verbalizações das educadoras das infâncias das escolas
municipais de Pelotas em parceria com a Faculdade de Educação da
UFPel, colhidos durante as vivências de formação. Necessitamos vi-
venciar outros ritmos dos corpos, das faces, dos olhares, das alegrias
que teimam em desobedecer aos rituais das padronizações. Das trans-
formações da insegurança, da vergonha, da ansiedade, surgem a cora-
gem, a tranquilidade, a calma emocionada e a esperança anunciada di-
ante do outro e do mundo. Portanto, atentos aos princípios geradores
de vida no aqui e agora.
Palavras chave: formação, educação biocêntrica, infâncias

1 Professor Titular da Universidade Federal de Pelotas, UFPEL – Escola Superior de Educação


Física e Faculdade de Educação. Doutor em Educação e Filosofia pela USP. Facilitador em
Biodanza pela Escola Paulista de Biodanza.
2 Professor Adjunto da Universidade Federal de Santa Universidade Federal de Santa Catarina.

Atualmente é doutorando em Educação, linha de investigação História e Sociologia da Educação


UFSC e um dos Coordenadores do Núcleo de Pesquisa (CNPQ/UFSC) denominado Vitral La-
tino-Americano de Educação Física, Esportes e Saúde.

224
DNA Educação

Introdução
O presente texto tem como perspectiva organizar e sistema-
tizar um processo que envolveu expectativas, verbalizações, vivências
de trabalho desenvolvido com as educadoras a partir da Educação Bi-
ocêntrica. A temática é a formação das educadoras das infâncias.
O problema que nos instigou foi o de encontrar possíveis ma-
neira de vivenciar e refletir a formação das educadoras das infâncias, no
sentido de viabilizar vivências3 e reflexões que permitam um processo
de integração e de fortalecimento da corporeidade e das emoções, di-
ante das dificuldades de atuação cotidiana vivido nas escolas.
Nossa convicção é de que, através do conhecimento viven-
cial-teórico do princípio biocêntrico, seja possível desencadear o de-
senvolvimento de vivências com ênfase na corporeidade, na afetividade
e na criatividade.
As vivências de Educação Biocêntrica/biodanza iniciam-se
com a roda. Em todo o mundo e em todas as épocas, foi e será o “local”
do encontro, da festa, da brincadeira, da comemoração. Desde os po-
vos primitivos, a roda é um símbolo que representa o encontro para
compartilhar a vida.
Que prazeroso é sentir o encontro das mãos na roda e brincar,
dançar o reencontro dos elos perdidos! Toda educadora pode propiciar
esse encontro solidário e cooperativo às crianças.
Sendo assim, baseados nas fontes teóricas e nas verbalizações
do grupo, antes, durante e depois dos encontros, damos a seguinte es-
trutura a este texto:
No primeiro momento, indicam-se alguns fundamentos teó-
ricos para compreensão desta experiência. Faz- se uma síntese do Prin-
cípio Biocêntrico e de sua aplicabilidade no processo de formação.
Em segundo lugar, são apresentadas fenomenologicamente as
expectativas das participantes, verbalizadas nos inícios dos encontros.
Fala-se das expectativas, das relações, da atuação pedagógica, dos pro-
cessos de vida, das diferentes possibilidades de conhecimentos, das atu-
ações pedagógicas, das dimensões integradoras dos afetos.

225
DNA Educação

Em terceiro lugar, passamos aos depoimentos. Assim, fala-se


dos encontros, dos espaços de conhecimentos, das lições apreendidas,
das transformações.
No último momento, procura-se fazer uma síntese dos sonhos
e embalos sugeridos nos diversos encontros durante o desenrolar deste
projeto de formação das educadoras das escolas infantis.
Uma educação centrada na vida
A roda demarca o espaço, o espaço do encontro, o “útero afe-
tivo”, onde não existe quem é mais nem quem é menos. Resgatando o
compromisso com o dar “as mãos...”. Contar consigo mesmo e com os
outros... É o espaço onde todos têm a possibilidade de olhar... Olhar
para si... Olhar o brilho dos olhos, perceberem as semelhanças e as dife-
renças... Olhar os sonhos... O dito e o vir-a-ser. Na roda, neces-sitamos
estar de peito e braços abertos... Estar abertos para a vida que está nesse
espaço.
É na roda que se tecem vínculos e se desenvolve um processo
de sensibilização da educadora para se perceber e poder perceber as cri-
anças com as quais trabalha, estando atenta para o cuidar da vida. Em
diferentes situações, um gesto, um movimento, um símbolo e, às vezes,
uma palavra, são suficientes para despertar a pessoa. Esta, uma vez des-
pertada, se abre para construir-se e passa a colaborar com a construção
do mundo que a rodeia. As educadoras assumem o compromisso de fa-
cilitarem o próprio desenvolvimento e o da criança, criando condições
para ela “ser mais”.
Para sensibilizar as educadoras a respeito desse processo, é
necessário estarmos sensíveis às expressões, às corporeidades, às expe-
riências. Para isso, contamos com a nossa experiência de educadores,
em diferentes níveis de ensino. A sensibilidade para perceber-se e per-
ceber o outro foi despertada através das vivências corporais envol-
vendo os princípios da biodanza. Ela é um sistema que promove o de-
senvolvimento do ser humano em uma totalidade. As vivências enfati-
zam o “aqui e o agora” e permitem, ao participante, integrar pensa-
mento, corporeidade, emoção, sentimento, percepção e intuição.

226
DNA Educação

A biodanza nos dizeres de Viotti e Carvalho (1997, p. 45) per-


mite que:
O acesso à realidade por outra via, por outro canal, outra
linguagem; cala nossa fala para ouvir nosso corpo, nosso ins-
tinto, nossa emoção. Sua fala é silenciosa: música, gestos,
movimentos, olhar. Aprendemos a realidade não ao pensar-
mos nela, mas ao senti-la. Abrimos espaços ao corpo sensí-
vel de que nos fala Merleau Ponty; aprendemos sobre nós
mesmos, não através da consciência, como nos foi ensinado,
mas da vivência, inversão epistemológica que nos faz trans-
formar a realidade ao vivê-la.
Trabalhar com as educadoras propondo-lhes vivências, nesta
perspectiva anunciada acima, significa criar condições para que se per-
cebam como pessoas inteiras, capazes de ver e sentir a si e aos outros.
Na medida em que percebam seus limites e possibilidades, podem estar
abertas para educar, cuidar, brincar e orientar crianças durante o seu
processo de integração no e com o mundo.
A capacidade para “cuidar do outro” é despertada quando se
trabalham os potenciais humanos primários, de modo a estabelecer
uma integração entre a dimensão motora, o sensorial e o visceral, faci-
litando a expressão da afetividade, da cognição e do movimento numa
totalidade.
Educar e cuidar de crianças é educar e cuidar da vida num
momento em que ela tem pulsação vibrante e uma disposição crescente
para explorar o ambiente. A educadora é convidada, pela criança, a par-
ticipar da aventura de viver com intensidade, de tornar-se questiona-
dora, do permanente interrogar-se, das descobertas, do ines-perado, de
viver o tempo chamado por Rubem Alves (2003, p. 166) de Kairós, em
que se vive das permanentes surpresas, das batidas do coração e do
tempo Chronos, mas muitas vezes a educação, vida se organiza num
tempo fechado que se rege no mesmo ritmo, da precisão, dos números,
tempo do relógio, dos números.
Embalado no “Tempo do coração”, caminho com minhas lem-
branças das vivências nas escolas como criança. Como educador me
interrogo: Em que tempos os corpos dançam no cotidiano das escolas?
Em que ritmos as educadoras e crianças se manifestam? E os cursos de

227
DNA Educação

formação, como têm percebido o tempo do coração, ou se pautam no


tempo do cronometro? Para essas indagações, busco encontrar cami-
nhos neste processo de formação que articula reflexão vivencial e teó-
rica com as bases teóricas da educação biocêntrica /biodanza.
Educar-se no cuidado e na escuta: O principio biocentrico
Ao estabelecer uma proposta de formação de educadoras cen-
trada na vida, devemos concretizar ações que se relacionam com o “cui-
dar a vida”, com uma nova pedagogia de vida. Assim, é preciso desen-
volver a corporeidade vivida, a criatividade, e transformar a própria vida,
almejando uma percepção, uma inserção e uma construção ampliada do
mundo em que vivemos. Torna-se necessário estar sensível ao vínculo
consigo mesmo, com outras pessoas e com o universo. Ao mesmo
tempo, é necessário estar aberto e romper com o tempo Chronos, pois
o novo exige um desprendimento do passado com o diverso, é viver um
processo de criação no tempo Kairos. Ser educadora de crianças peque-
nas em processo de vir-a-ser é estar aberta às transformações. É reedu-
car-se também na e com a corporeidade conti-nuamente, em comunhão
com as crianças, com os pais, com a escola e a comunidade, em uma
relação profunda e comprometida.
Ao desenvolver uma educação organizada pelo tempo do cora-
ção proposta por Rubem Alves (2003) e baseada no Princípio Biocên-
trico, iniciamos uma reflexão a respeito do que é “cuidar da própria
vida”. Cuidar da vida de uma criança é cuidar dos encontros com as for-
ças vitais em crescimento. É um cuidar que não significa superproteger.
Esse cuidar envolve estar atento a tudo que se passa na escola, na vida é
estar junto, oferecendo condições para que o crescimento do outro de-
senvolva as suas potencialidades. É gerar vida a partir da própria vida. É
estar atento ao outro sem querer determinar o seu caminho. É caminhar
ao lado e com o outro percebendo mutu-amente os ritmos, que passam
a não ser mais os ritmos individuais, mas, sim, os ritmos das relações. O
cuidar deve ser entendido como a arte do encontro, encontro que en-
volve crianças, pais, mães e educadores e comunidade em processo con-
tínuo de transformação.

228
DNA Educação

Estar em sintonia com as crianças pressupõe estar aberto para


o universo que elas partilham que vivem cotidianamente. Ter coragem
para viver junto às suas corporeidades, emoções, curiosidades, estar dis-
posto para acompanhar suas idas e vindas, seus desvios, seus sonhos,
seus direitos é aceitar seu egocentrismo, respeitar seu direito de expressar
sua corporeidade, brincar, fantasiar, deixar-se aventurar no mundo des-
conhecido, ter o direito de sonhar. Para que isso aconteça, é necessário
que as educadoras possam sentir admiração e respeito por si mesmo, pe-
los outros, pelo universo.
As ações da Educadora Biocêntrica se expressam em um pro-
cesso criativo que transforma a vida de cada um que está envolvido no
processo construindo relações de encontros consigo mesmo, com o
outro e com o universo.
Uma educação, nesta perspectiva, não nega a corporeidade, a
emoção, o prazer, a alegria, o sonho: permite o pulsar dos diferentes
conhecimentos, construídos nos espaços da escola. Ela viabiliza o equi-
líbrio da razão e da emoção, rompendo com as abordagens fragmenta-
das e dualistas. Um processo nesta dimensão raramente está presente
nas escolas, principalmente naquelas que lidam com crianças pequenas.
As educadoras que trabalham com crianças podem, além de
compreenderem os conhecimentos teóricos e técnicos, conhecer as
linguagens das crianças e a sua própria, permitir a expressão das
emoções e experimentar as diversas formas de conhecer e interagir no
mundo e com o mundo.
Neste sentido, Moraes (2002, p. 84) indica novas maneiras de
pensar a escola- mundo afirmando que:
(...) para o resgate do ser humano, com base em uma visão
sistêmica, ecológica, interativa, indeterminada. O aluno pas-
sará a ser visto com aquela que aprende que atua na sua re-
alidade, que constrói o conhecimento não apenas usando o
seu lado racional, mas também utilizando todo o seu poten-
cial criativo, o seu talento, a sua intuição, o seu senti-mento,
as suas sensações e as suas emoções (...
Assim, compreendemos como a autora, da urgente necessidade
de outras referências educativas pautadas no resgate da corporeidade das

229
DNA Educação

educadoras, das crianças, portanto, de uma visão sistêmica de vida onde


podemos reconhecer a consciência da unidade da vida e da interdepen-
dência de suas diversas manifestações, dos seus ciclos de mudanças e
transformações.
A comunicação da criança ocorre no corpo em movimento,
que brinca que ri e chora, nos seus olhos que brilham, na expressão de
seu rosto, nas exclamações de agrado ou desagrado. Ela nos oferece na
sua corporeidade “pistas” para compreendermos sua vida e a nossa pró-
pria.
Cavalcante (1999), ao comentar sobre a Biodanza afirma que
este sistema surgiu de uma reflexão sobre a vida, do desejo de restaurar
em nós próprios o paraíso perdido, integrando os nossos gestos de soli-
dariedade numa dança de conspiração para gerar mais vida dentro da
vida.
Nessa obra, a autora considera que, ao trabalhar a identidade
através da música, do movimento, sentimento, poesia, estabelece-se uma
comunicação dialógica e afetiva entre todos os que se envolvem no pro-
cesso educativo. Há, então, possibilidade de construção de conheci-
mentos em ambientes interativos. Desta forma, uma educação que en-
volve a expressão da corporeidade autêntica que parte das vivências das
educadoras, das crianças, torna-se possível integrar os saberes produzi-
dos, conectados com os sentimentos. Em consequência, a vivên-cia da
cidadania pauta-se no respeito e no amor pela vida no aqui e agora.
Nesse sentido, as vivências que realizamos com as educadoras
nos deixam várias interrogações: O que significa tecer redes de sensibili-
zação criativa dentro de nossas escolas? Será que existe sensi-bilidade
dentro das instituições? Como as educadoras olham para as crianças,
sentem seus cheiros, seus tatos, suas interrogações, seus medos, suas cer-
tezas e incertezas? Será que as direções das escolas, as coorde-nações,
conseguem olhar nos olhos das educadoras e enxergam a vida que ai
pulsa? E os planejadores da educação do País, do Estado, do Município,
enxergam as diretoras, as coordenadoras, as educadoras, as crianças, os
pais, as mães e a comunidade como seres que necessitam ser compre-
endidos, educados, cuidado e amados?

230
DNA Educação

Neste sentido, os fragmentos de “cenas” vindouras expressam


“fotografias” das corporeidades dos diferentes momentos vividos no
processo de formação com as educadoras.
Tecendo diálogos: Os registros, as verbalizações, as expectativas
e os sonhos
Partimos de uma análise fenomenológica das expectativas, ex-
pressas e registradas a partir das verbalizações das educadoras, colhi-das
durante as vivências. Delineamos os caminhos percorridos, as perce-
pções, as lições que ficam, as propostas nascidas dos sonhos das educa-
doras. Das sínteses, constituem-se os saberes e os conhecimentos siste-
matizados e compartilhados com as educadoras.
As expectativas das educadoras oferecem um “panorama foto-
gráfico” expressos nas manifestações verbais delas, onde emergiram vá-
rios eco fatores que não favorecem uma vida plena nas relações nas es-
colas e fora delas. No conjunto, estes representam as corporeidades, mo-
dos de viver, estilos de vida centrados no antropocentrismo vigente so-
cial e cultural.
As situações que se evidenciaram foram a competição, o egoís-
mo e o consequente isolamento. A falta de apoio e de companhei-rismo
se associa a estruturas de organização cotidianas das escolas numa pers-
pectiva tradicional e autoritária, que implica em cobranças, críticas que
levam à desqualificação pessoal e do trabalho do outro. A ausência de
encontros nutritivos, a agitação crescente, o isolamento no trabalho de
cada um, configuram um quadro de ações dissociadas, sem sabor e sem
estímulo. Da mesma forma, ao chegar à escola, a educadora sente difi-
culdade de integração por não ter formação adequada para o trabalho
com as infâncias e pela indiferença das pessoas e dos grupos que não
envolvem e não integram a educadora principiante. Adicionam-se as efe-
tivas dificuldades de olhar-se olho no olho, tocar-se, abraçar-se e criar
vínculos. A ausência de amor e de companheirismo é tocante, concomi-
tantemente com a falta de compromisso com valores éticos comprome-
tidos com a vida.
A vigilância social-cultural, associada ao mau humor, às más-
caras e a consequente insegurança tornam os espaços restritivos e de

231
DNA Educação

difícil articulação pela desqualificação, pelos rótulos, pelo desrespeito,


criando um clima pesado e a vivência de solidão e falta de alegria, de
prazer. Somam-se a isso um “espaço” descuidado e o tédio da cobrança
dos pais distantes da escola e na educação dos seus filhos, enquanto as
educadoras se culpam por não cuidarem dos próprios filhos e de si mes-
mas. Há uma angústia e um desencanto no ar por não conseguirem tra-
balhar a corporeidade, a afetividade, as perdas, os silêncios, os ritmos
dissociados. Enfim, interrogamos: que formação das educadoras das in-
fâncias será necessária construir nesses ambientes para que a vida seja a
centralidade?
A educação das infâncias, muitas vezes, é o espaço que torna as
ações pedagógicas marcadas por limites decorrentes também de uma vi-
são antropocêntrica restritiva e que não permite as condições de uma
ação conjunta e integrada ao processo educativo. Imobilidade, espaços
não criativos, rotinas, ignorância e falta de qualificação dos profissionais
geram ansiedade, falta de fluidez, de criatividade para trabalhar com a
espontaneidade da criança.
Restrições de ordem pessoal como uma corporeidade que ex-
pressa a vergonha, a insegurança, a timidez, desorientação, medo de se
expor, solidão, contradições, marcas das infâncias, verdades veladas, falta
de respeito e de confiança das companheiras que não iluminam as expe-
riências de trabalho, tornam as ações cotidianas desgastantes e sem satis-
fação, sem prazer e alegria. Como romper com estas ações e viabi-lizar
outras integradoras da vida?
Quando olhamos por uma janela semi-aberta, podemos visua-
lizar a noite que chega o nascer de um novo dia, as pessoas que cami-
nham de diferentes maneiras, enfim, somos iluminados pela vida circun-
dante e passante. Quando se tem abertura, abertura ao outro, abertura
ao grupo, abertura ao novo, abertura à vida, temos a condição para de-
sencadear um processo de formação das educadoras de vida, integrando
à construção dos saberes na escola, num ambiente de cui-dado, num am-
biente feliz, onde se aprenda a ser calmo, a cultivar as amizades, os vín-
culos, o amor, a conexão, a confiança, a confidência.
Assim, o colo, o conhecimento de si e do outro, a cooperação,
o cuidado, expressam a sincronização no convívio espontâneo com a

232
DNA Educação

criança. A ajuda, a doação, a cooperação, o cuidado consigo e com o


grupo, somam-se às condições de perceber, relacionar-se, dar carinho,
dialogar, descontrair-se.
A sedução à relação democrática se amplia com a abertura de
si e do pensamento que vão sendo compartilhados nos novos e renova-
dos encontros. A escuta é uma postura profundamente educativa que,
ao ouvir o outro, permite que ele aconteça como outro.
Fazer o que se gosta é valorizar-se. Fazê-lo com carinho, diá-
logo e consideração pelo grupo, permite gostar das pessoas, do ambiente
de trabalho e permite o crescimento. A sensibilidade no olhar, no movi-
mento, nos ritmos, nos cheiros, facilita a interação, o intercâmbio e as
trocas na comunidade implicada na escola. A qualifi-cação e a iluminação
do outro pelo elogio dos pais, das mães, das colegas, eleva a auto-estima
e a capacidade de ação amorosa. Este é um processo que permite que as
educadoras, ao colocarem-se no lugar das outras, no lugar dos outros
pela corporeidade da empatia, possam criar um ambiente de acolhi-
mento, de bem-estar, um ninho de gestação e de conexão com o que é
invisível aos olhos dos menos sensíveis. Além da fala, as linguagens da
corporeidade expressam diferentes estados emocionais e permitem a in-
tegração silenciosa.
Pensar no outro, abrir-se, pedir ajuda, permite a proximidade,
a acolhida das diversidades. Acolher, ouvir, ser simples, ser sincero, sor-
rir, abre espaços para a criação de vínculos surpreendentes e encantado-
res, de uma educação, de uma poética do encontro em uma multiplici-
dade de dimensões. Assim, diante destas percepções, interrogamos: que
cuidados a escola tem dedicado às educadoras das crianças?
Almejamos uma escola que enfatize outras sensibilidades, ca-
paz de muitos jeitos de parir a vida. Precisamos descobertas que rompam
e transcendam os velhos estilos de educar, que substituam as ações roti-
neiras que amordaçam e matam as centelhas de esperança que circulam
nesses espaços esquecidos e descuidados. Necessitamos vivenciar outros
ritmos das corporeidades, das faces, dos olhares, das alegrias que teimam
em desobedecer aos rituais da mesmice; uma cultura com outras sabe-
dorias e conhecimentos muitas vezes esquecidos pelas educadoras, pelas

233
DNA Educação

gestoras que não percebem que as crianças simbolizam o desabrochar


da vida, do novo, da transformação vibrante e contagiante.
Assim, perguntamos: que ações devem ser construídas na for-
mação das educadoras das escolas das infâncias para não continu-armos
fechados/as às transformações, às descobertas, ao equilíbrio da razão e
da emoção?
Serão necessárias ações pedagógicas novas para transformar e
arrumar a escola, onde a educação tenha uma cara realmente nova, para
que as educadoras, ao irem chegando, sejam capazes de construir uma
proposta coletiva que crie processos de vida em todos os momentos.
Uma realidade que se compõe de muitas contradições que, muitas vezes,
impede que os encontros sejam sistemáticos e verdadeiros. Ações capa-
zes de atentar para os diferentes anseios da comunidade, que assegurem
uma educação de qualidade e que expressem a cidadania no aqui e agora.
Esperança, que exige muitas formas de energia, de coragem para viabili-
zar processos de trabalhos que assegurem o pleno desenvolvimento das
crianças, das educadoras, da comunidade e de todos os envolvidos na
escola.
É fundamental construir um viver nas escolas das infâncias di-
ferentes, que sejam gratificantes, que inovem sem negar os velhos co-
nhecimentos, mas transformá-los. Uma corporeidade de união, salas am-
plas, materiais, espaços, ambientes que permitam a expressão das crian-
ças, das educadoras, são outras formas de trabalhar que vão além do cui-
dar. Organização, paciência, formação sistemática, onde as educadoras
mantenham os pés no chão, através de ações que lhes permitam colocar
em ação aqueles elementos que Madalena Freire (1999) indica como fun-
damentais na formação das educadoras: a observação, o registro, a refle-
xão para repensar o cotidiano e transformá-lo.
Para construir uma corporeidade que gere vida no aqui e agora,
será necessário transformar posturas e idéias em outros sonhos, nos
quais a confiança será a tônica nesses ambientes para construir um
mundo mais digno. Ações capazes de valorizarem a vida, onde todos
possam ser cidadãos que expressam um viver na sua totalidade – ser um
cidadão inteiro e feliz. Nesta linha de pensamento, interrogamos: que
caminhos são necessários para que as ações pedagógicas, no processo de

234
DNA Educação

formação das educadoras, permitam o novo, de salas repletas de alegria,


de esperança, de confiança, de cidadania, de vida?
São necessários ambientes que cultivem a auto-estima, capazes
de cativar, de expressar o contentamento, o amor, a compaixão e o en-
cantamento. É preciso uma escola infantil que prime pelo equilíbrio e
pela harmonia, que tenha uma paixão incondicional à vida que se mani-
festa na satisfação do olhar, nos sentimentos de solidariedade. Relações
que permitam tempo para as educadoras cuidarem de si próprias, dos
outros, de encontros onde a alegria, o brincar, os brin-quedos, a arte, a
música, a dança, a ciência, a fantasia, o sonho, sejam expressões perma-
nentes do viver. Espaços de prazer, de conquista, onde a vida seja o cen-
tro das diferentes ações que circulam na escola.
Descobrir o renascer desses afetos será um desafio para todas
as educadoras das escolas das infâncias. Uma proposta pedagógica que
integre as dimensões da corporeidade, da afetividade com a dimensão
pedagógica, onde todas possam re-encontrar a própria criança que fo-
ram, que vive em si; onde possam viver como possibilidade de encontro
e crescimento, com as crianças com as quais trabalham em permanente
transformação.
As lições apreendidas: nos encontros emocionados, as surpresas
Lá estava a sala – o palco organizado, esperando as educadoras.
A tarde ia se aproximando de seu final e com ela se aproximava a noite
que trazia as educadoras; lentamente iam chegando e sentando nos luga-
res aparentemente protetores – cantos, proximi-dade das paredes ou da
porta. Um início ao som de uma música, um convite a ser – “um eterno
aprendiz, cantar e cantar” como nos convida Gonzaguinha na música O
que é que é? Espanto, nos olhares, nas faces, as corporeidades se inquie-
tam, assim foi nossa chegada: falando sem falas, com outras expressões
de vida. Começos com movimentos que rompem com as expectativas e
fazem uma dança de vivenciar outras maneiras de fazer a formação das
educadoras. Continuamos com uma interrogação: quais são as expecta-
tivas das educadoras ao participarem em cursos de formação?

235
DNA Educação

Os encontros se constituíram em surpresas para a grande mai-


oria, cuja expectativa era participar de um encontro onde seriam debati-
das idéias, textos, sugestões e receitas de como trabalhar na educação
infantil. Muitas esperavam trabalho expositivo, chatices, esperavam re-
ceber coisas prontas, coletar conhecimentos. Para essas educadoras, os
encontros foram surpreendentes pela forma como foram realizados, pe-
las dinâmicas vivenciadas, pelas possibilidades de relação nova com as
colegas. Algumas não imaginavam ser possível tais tipos de trabalhos,
tampouco era esperado. Algumas estavam condicionadas pelos encon-
tros costumeiros, onde os coordenadores chegam com a pauta e com os
caminhos predeterminados, consequentemente recheados de dicas, co-
branças, exigências sem a efetiva participação.
Esse fato ficou evidenciado em um seminário realizado poste-
riormente aos nossos encontros. Nele, a indignação estava no ar, a tensão
fez parte daquele espaço, o tédio era visível em algumas das participantes
que se quedavam adormecidos, sonolentos nas cadeiras; outras optaram
por instantes de dispersão e de esvaziamento da platéia. Exemplos foram
os prolongados e cansativos monólogos, cuspidos por educadores
alheios à educação das infâncias, talvez perdidos e dissociados da própria
infância e dos interesses e das experiências das participantes. A culmi-
nância desse ato se configurou com o desenvolvimento de uma metodo-
logia que deixou dúvidas quanto à sua ação democrática, através de per-
guntas escritas em pequenos bilhetes, que não estabeleciam um diálogo,
não ouviam a voz do/a perguntador/a. Fica uma indagação já rotineira
nos meios acadêmicos: que concepção de educação está inserida numa
proposta desta natureza?
Nos encontros que realizamos a intuição e a percepção de mui-
tos participantes era de que foram fecundos e corresponderam aos dese-
jos e anseios de uma ação de integração, de qualificação, de nutrição das
educadoras. Cotidianamente, as profissionais das escolas se sentem des-
gastadas pelas atividades rotineiras, em um espaço muitas vezes desinte-
grado e fastidioso. A ausência de encontros, de ações engajadas e coleti-
vas, a falta de solidariedade e união, representa uma escola que mantém
uma estrutura rígida e inadequada aos desejos do novo, insatisfatória por

236
DNA Educação

não promover o desenvolvimento dos potenciais das educadoras. As vi-


vências, o encontro com o outro, ao encontrar a educa-dora que está
sendo, confirmaram as expectativas e os desejos desse grupo, cujas ma-
nifestações foram de surpresa, alegria e uma vontade forte de continui-
dade das vivências iniciadas.
Na experiência de solidão, de isolamento, de despreparo, de
falta de compensação pelos esforços, as relações tensas e dissociadas do
cotidiano escolar, os encontros fizeram-nas plenas de entrosamento, de
descoberta de si e dos outros e reafirmaram o desejo de uma efetiva par-
ticipação desses encontros nutritivos e qualificadores.
Algumas, contudo, esperavam discussão de propostas inova-
doras em educação infantil e não tiveram a percepção de que o trabalho
consistia em uma proposta diferenciada, indicativa de uma dimensão de
educação que envolve as dimensões da corporeidade, emocionais, afeti-
vas, e os potenciais do educando e da educadora integrados ao processo
de construção do conhecimento e da comunidade.
Muitas esperavam que os encontros se reduzissem a reuniões
administrativas que já faziam parte do ritual de formação a que estavam
habituadas. As surpresas as levaram a encontros calorosos, descontração
e amizade. O desejo sentido ou intuído de ter tempo para si, tempo de
relaxamento, descontração e tranquilidade, ocorreu como um presente,
sendo ajudadas e nutridas no trabalho.
Pensar que os encontros seriam a repetição de experiências pas-
sadas abriu espaço à descoberta de novas amizades, aproximação, cria-
ção de vínculos, descoberta de novas colegas, contato com a corporei-
dade coletiva, com emoção, com a calma, com o prazer e a alegria. A
vontade de ter momentos para relaxar, conversar e ouvir muitas pessoas
se concretizou por meio das dinâmicas-vivências e nas verbalizações dos
sentimentos e das experiências de cada uma durante os encontros.
Houve identificação que despertou respeito, compre-ensão, equilíbrio
com as colegas que emergiram com preocupações e desejos iguais em
relação ao trabalho educativo e em relação à própria vida.
Na entrada da sala, estava estampada na pele, no olhar, no ca-
minhar, no falar de cada educadora, uma corporeidade de desconforto,
desconfiança, a inibição ao adentrar em um espaço onde não havia mesas

237
DNA Educação

para se apoiar, nucas para olhar, costas para se esconder, enfim, havia
um espaço vazio e desafiador que inquiria a mudanças na maneira de ser
e estar no e com o mundo.
As primeiras emoções que ecoam em cada coração se expres-
sam em analogias poéticas e surpreendentes – a fala de uma educadora
sintetiza esse estado: “é como se estivesse adormecida e fosse despertada
para a vida”. Uma vida que vai transformando a vergonha, a timidez, o
medo, o não acreditar em suas próprias possibilidades em caminhos de
segurança, em ficar à vontade, descontraída e calma, transformando es-
paços de desconfiança em confiança, de desintegração em integração, de
controle em liberdade, de críticas em escuta, de monólogos em diálogos.
Assim se manifesta uma corporeidade, uma vida que pulsa dan-
çante no universo, capaz de aflorar mil emoções escondidas, amordaça-
das em cada uma das educadoras.
As escutas na roda anunciam e abrem um processo de renova-
ção, de despreocupação, de segurança, de mais leveza e criativi-dade para
a educação. As tristezas, as apatias vão cedendo lugar às alegrias, a não-
percepção das emoções cotidianas dando lugar à paz interior; o isola-
mento dá lugar ao companheirismo, o individualismo dá lugar ao encon-
tro, a tensão dá lugar ao relaxamento, o olhar severo dá lugar aos sorrisos
tímidos; do corpo enrijecido surgem a descontração e a fluidez, os cami-
nhares tímidos vão se transformando em movimentos dançantes e ca-
minhares de determinação.
Da clausura dos horários e tempos rígidos que aprisionam, as-
fixiam e matam qualquer possibilidade, nasce o tempo da eternidade, dos
olhares que se cruzam, das mãos que se tocam, das danças que se inte-
gram e dos cantos que ecoam pelo universo; dos desgastes cotidianos
brotam a leveza, a alegria, a expansão e a pertença ao todo.
Das falas tímidas e inaudíveis, surge a energia que contagia, que
conecta, que vincula numa corporeidade de escuta e permissão de ser
mais. As velhas expectativas cedem lugar a ações educativas integradoras.
Das interiores transmutações da insegurança, da vergonha, da ansiedade,
surgem a coragem, a tranquilidade, a calma emocionada e a esperança
anunciada diante do outro e do mundo. Nos espaços do desconforto, da

238
DNA Educação

ansiedade, germinam as expressões do prazer de viver. Assim, pergunta-


mos: que mudanças encontros sistemáticos nesta perspectiva, tendo a
vida como centralidade, poderão desencadear?
Dos encontros, surge a exigência de mudança de vida pessoal
e profissional. A postura de ser ouvido é o que permite ao outro se ex-
pressar como o outro. Neste sentido, fica suposto que não podemos
julgar pela aparência. Os problemas da educação das infâncias são co-
muns às escolas. A integração com outros grupos, com momentos de
reflexão e de descontração permitem, ao mesmo tempo, investir em nós
mesmos, em oportunidades semelhantes a esta que vivenciamos nos
processos de formação de educadores e educadoras. Viver nossas cor-
poreidades cotidianas nas escolas indica-nos que temos que deixar nossa
timidez e conquistar o próprio caminho. A abertura ao diálogo favorece
que não vivamos sozinhos. A solidão pode ser superada no contato com
as crianças, com as colegas e com a comunidade. A educação do passado
tornava tudo difícil. É urgente a abertura de espaços que nos facilitam
expor nossas diferentes linguagens. A exigência de ir ao encontro do
outro é condição para superar as dificul-dades que permeiam a escola e
as relações com as educadoras, os pais, as mães e a comunidade.
Dentre as lições aprendidas nestes encontros, ressaltamos o
aprendizado de se doar e, na emergência da proposta de vivenciar a
sensibilidade, a corporeidade, surge a possibilidade de trabalhar dessa
forma em diferentes espaços educativos.
A segurança e a confiança em si mesmas e nas próprias opini-
ões somaram-se a grande experiência em relação aos colegas e à família.
Foi possível compreender a dificuldade de dar e de receber carinho e
compreensão. Mas a fortaleza é necessária diante das dificul-dades en-
quanto que se percebe a importância de saber conviver em grupos. O
nosso saber é limitado, mas se acresce a cada novo dia.
O diálogo exige muita paciência. Faz parte do saber socializar.
Entendemos que as palavras não são a única forma de expressão que
possuímos. O corpo expressa muitas maneiras de comunicação.
A solidariedade é importante para cada uma possa se superar.
A melhoria do nosso espaço de construção da solidariedade vem com a

239
DNA Educação

descontração e com a alegria. Mesmo que as coisas sejam marcadas com


dificuldades, cada situação pode servir de estímulo para crescer e viver.
É necessário algum tempo de reflexão e de conexão com a vida,
durante o dia, para qualificar a forma de estar no mundo. As experiências
no processo de formação podem ser aceitas e associadas ao encontro
consigo mesmo e aceitação do outro como ele é. Abertura às mudanças
permite aceitar os novos caminhos com confiança.
Não vivemos sozinhos. Para um trabalho desafiador, o grupo
tem que ter harmonia. Quando um dá amor ao outro é porque está bem
consigo mesmo: Outra situação que pode ser considerada uma lição é
aquela própria das mães que trabalham e ficam com culpa por deixar os
seus filhos em casa para cuidar e educar os filhos dos outros.
Assim, também a vida é estressante sem um momento de liber-
dade e de cuidado consigo mesmo. Uma brincadeira pode trazer ótimos
resultados. É importante a troca com outros/as colegas de profissão.
Ressalta-se que, hoje, as pessoas não param para se abraçar, para terem
contatos, para criarem vínculos e sorrirem com os olhos da alma.
E por fim: Uma síntese possível...
Singramos muitos mares, novos portos se descortinam no ho-
rizonte, acreditamos que, para uma compreensão da leitura deste ensaio,
é preciso fazer diferentes olhares que passeiam por diferentes mundos.
Assim, as educadoras enfatizam o crescimento pessoal, a valo-
rização do grupo presente e a construção de um ambiente de um mundo
melhor. Dizem que, no contato com as colegas, adquiriram conhecimen-
tos fundamentais ao trabalho infantil, que permitem uma reflexão mais
sistemática sobre as crianças, a escola, as famílias e a vida. Indicam que
a condição é perceber os limites da realidade para poder transformá-la,
mantendo a unidade do grupo, compreendendo e criando processos de
ações solidários. Houve integração, respeito e compre-ensão nos dife-
rentes espaços de vivências.
Muitas participantes sugerem a continuidade dos encontros,
tendo em vista que a tarefa da educação de infâncias é muito difícil e que
há necessidade de muitas contribuições para nosso trabalho que ilumi-

240
DNA Educação

nem novos caminhos no processo de educação com as crianças. Os en-


contros devem ser momentos de qualificar as profissionais em uma va-
riedade de dimensões, como da corporeidade, a intelectual, a afetiva, a
emocional. Um dos aspectos dessa qualificação é que a educadora possa
resgatar a sua criança interior para melhor relacionar-se com as crianças
com as quais trabalha. Todas as profissionais têm a necessidade de vi-
vências que envolvam razão e emoção, num permanente cuidado pelos
organizadores de políticas públicas de formação continuada junto com
as universidades.
Mediante as expectativas, vivências, relatos e avaliação das par-
ticipantes dos encontros, tendo valorizado e articulado todas as mani-
festações, podemos dizer que: “As expectativas revelaram a in-tuição e
a necessidade de encontros nutritivos, questionadores, orienta-dores, di-
alógicos e fortalecedores da corporeidade das educa-doras das escolas”.
Ficou explícita a necessidade de prosseguir com vivências que possibili-
tem a escuta, o diálogo e a ação transformadora dos estilos de atuação
das educadoras para transcender os medos, as inseguranças, o não cuidar
de si, das práticas pedagógicas, os espaços e a vida. Enfim, conectar-se
consigo, com o outro e com o universo.
Nas verbalizações das vivências surgiu a surpresa da maioria
das participantes com a metodologia do trabalho desenvolvido e as con-
tribuições na formação de cada pessoa e dos grupos. Iluminaram-se no-
vos caminhos com o trabalho de formação que mobilizou as energias
integrativas dos participantes.
Para a maioria das educadoras fica a vontade de participar de
novos encontros que valorizem a vida: reafirmam a necessidade de en-
fatizar a humanização dos espaços da escola infantil. E assim, construir
uma cultura de participação em que se possa repensar as ações cotidia-
nas, buscando novos caminhos para formação das educadoras que
atuam com a infância.
Estes são mundos em que a vida é o centro de uma poética do
encontro, onde as educadoras, as crianças, os pais, as mães e a comu-
nidade são convidadas a participarem da aventura de viver com intensi-
dade e abertura para o novo. Onde aceitam a condição de transcender
os próprios limites.

241
DNA Educação

Referências
ALVES, R. Conversas com que gosta de ensinar. 19. Ed. São Paulo: Cortez & Autores
Associados, 1987.
. O amor que acende a lua.8. Ed. Campinas: Papirus, 2003.
ARROYO, M. O significado da infância. Criança, Brasília, n. 28, p. 17-21, 1995.
CAVALCANTE, R. (Org.). et al. Educação Biocêntrica: um movimento de constru-
ção dialógica. Fortaleza, 1999.
FALEIROS, A. M. Professor: a pessoa se transformando profissionalmente. São
Paulo, 1998. Tese de Doutorado. Faculdade de Educação da USP.
FIGUEIREDO, M. X. B. A corporeidade na escola: brincadeiras, jogos e desenhos.
6ª Ed. Pelotas: Editora da UFPel, 2008.
_________ O jogo da corporeidade na educação: Da infância à escola. Pelotas: Editora
da UFPel, 2006.
_________ e SOARES, J. M. Por dentro da escola: Corpos e o controle na edu-
cação das crianças. Curitiba/PR: Editora CRV, 2012.
_________ et al (Orgs.). Diários Educativos: Cultura, Infância e Educação In-
fantil, v. 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7 e 8. Pelotas/RS: Editora da UFPel, 2008-2016.
_________ Diário de Campo: Observações, registros, reflexões. UFPel: 2015.
FREIRE, J. B. Educação de corpo inteiro. São Paulo: Scipione, 1989.
FREIRE, P. A educação na cidade. São Paulo: Cortez, 1991.
. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa.
Co-autora e tradutora Sandra Costa. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1976. (Coleção
Leitura).
GARANDY, R. Dançar a Vida. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1982.
MORAES, M. C. O paradigma educacional emergente. 8. Ed. Capinas: Papirus, 2002.
PACÍFICO, M. I. C. Biodanza para crianças. São Paulo, 1990. Monografia. Escola
Paulista de Biodanza.
REDIN, E. Pré-escola, para quê? São Paulo: Idéias, 1988.
SILVEIRA, M. B. A arte como uma proposta de desenvolvimento humano na escola. São
Carlos, 2000. Dissertação de Mestrado. Universidade Federal de São Carlos.
VECCHIA, A. M. D. Afetividade e ética. Pelotas: Editora da UFPel, 2001.
VIOTTI, L. S. e CARVALHO, G. B. A empresa no tempo do amor: Biodanza
nas organizações. Belo Horizonte: Editora Fenix, 1997.
TORO, R. A. Biodanza a cura di Eliane Matuk. Milão: Red edizion, 2000.
. Teoria Biodanza. Coletânea de Textos. Fortaleza: ALAB,
1991.
. E LUZZI, C. Biodanza para crianças. São Paulo: Monografia,
não publicada.

242
DNA Educação

A MÚSICA COMO PARTE INTEGRANTE NA MEDI-


AÇÃO PARA O DESENVOLVIMENTO COGNITIVO
DO INDIVÍDUO COM EPÉCTRO AUTISTA

Margareth Souza Anselmo Barbosa1


RESUMO:
Por meio do estudo de livros dedicados ao tema, os processos de apren-
dizagem e desenvolvimento, sobretudo no que tange à música, de crian-
ças com Transtorno do Espectro do Autismo, são destacados mecanis-
mos de interação e relações de avanço cognitivo, psicomotor e afetivo,
possibilitados por meio da Educação musical. Esclarece-se ainda a dife-
rença entre Educação Musical e Musicoterapia. Conclui-se que a música
é fundamental, sobretudo, pela sua função socializadora que contribui
no desenvolvimento e formação integral do indivíduo.
Palavras-chave: Transtorno do Espectro do Autismo; Neurociências;
Interação; Comunicação e Educação Musical; aprendizagem.
ABSTRACT:
Through the study of books dedicated to the theme, the learning and
development processes, especially with regard to music, of children with
Autism Spectrum Disorder, are highlighted mechanisms of interaction
and relations of cognitive, psychomotor and affective advancement,
made possible by music education. The difference between Music Edu-
cation and Music Therapy is also clarified. It is concluded that music is
fundamental, above all, for its socializing function that contributes to the
development and integral formation of the individual.
Keyword: Autism Spectrum Disorder; Neurosciences; Interaction;
Communication and Music Education; learning.

1Graduada em Pedagogia, Pós-Graduada em: Psicopedagia, Neropsicopedagogia, Metodologia


do Ensino da Arte, Especialização em Língua Portuguesa, Redação e Oratória, pela Faculdade
de Educação São Luís. E-mail do autor: margareth.pedagoga@gmail.com

243
DNA Educação

Introdução
O assunto de hoje é o uso da música como valioso recurso
para o tratamento e desenvolvimento da criança com autismo. Mas qual
seria a forma mais adequada de utilizar a música para que esses obje-
tivos sejam atingidos e resultados satisfatórios alcançados?
O autismo é um universo desconhecido por muitas pessoas.
É um transtorno que desafia a ciência, por ser complexo, ter causa des-
conhecida, diferentes graus que apresentam tanto crianças que não
conseguem falar, quanto outras que apresentam habilidades extra-ordi-
nárias. Geralmente, quando os pais descobrem que têm um filho au-
tista, se sentem bem confusos e temerosos, principalmente em relação
ao grau do transtorno.
Neste trabalho, vou falar das principais características do
Transtorno do Espectro Autista que, segundo dados de 2015 da Orga-
nização das Nações Unidas (ONU), acomete cerca de 1% da população
mundial (aproximadamente 70 milhões de pessoas). Trazendo a impor-
tância do uso da música como valioso recurso na mediação para trata-
mento o desenvolvimento cognitivo da criança com autismo
Os estudos mostram que a rede de neurônios que coordena
no cérebro a comunicação e os contatos sociais é organizada de uma
forma diferente em autistas. O transtorno afeta quase todos os aspec-
tos do comportamento humano: a fala, o interesse por amizades e vida
social, os movimentos do corpo, as emoções e interações.
O autismo deve ser diagnosticado precocemente, por meio de
testes de comportamentos e questionários respondidos pelos pais. Sa-
bemos que a plasticidade cerebral (estrutura cerebral que é capaz de se
modificar de acordo com os estímulos recebidos) é muito intensa dos
0 aos 6 anos. Nesta fase inicial, o tratamento apresenta melhores resul-
tados. Depois disso, as deficiências são agravadas, portanto, é essencial
buscar ajuda caso a família perceba indícios de autismo no seu filho,
que são eles:

244
DNA Educação

 Atrasos na fala;
 Olhar distante. Muitas vezes não responde quando é chamado
pelo nome;
 Não interage a estímulos afetivos como um olhar, um abraço
ou um sorriso. Atitude ausente;
 Quando bebezinho, não estica os braços para ser tirado do
berço. Muitas vezes para chamar atenção prefere fazer movi-
mentos repetitivos;
 Brinca de forma sistemática, não lúdica. Ex: Em vez de interagir
com o boneco (mundo da imaginação), prefere alinhá-lo a ou-
tros brinquedos, enfileirando-os;
 Na presença de outras crianças se isola, por falta de interesse.
Ao perceber estes indícios, os pais devem procurar ajuda de
um especialista, pois só ele poderá dar o diagnóstico. O tratamento do
autismo é multidisciplinar (envolvendo psicólogas, psicopedagogos, te-
rapeutas comportamentais, etc) e deve ser iniciado o mais rápido pos-
sível, pois o autismo traz uma série de fatores aliados. É importante a
união e colaboração de todos que têm contato com a criança autista,
principalmente da família, além de muita paciência e amor pela criança
durante o processo, que muitas vezes, dependendo do grau do trans-
torno, é lento.
Respeitar o tempo e o limite da criança é muito importante,
mas sem deixar de trabalhar as dificuldades. É importante ensinar a
criança autista, que para um relacionamento funcionar, são necessários
pequenos gestos de gentileza (contato visual, cumprimentar as pessoas,
conversar, etc.). Indivíduos autistas não possuem estas habilidades,
mas é algo que pode ser aprendido, apesar de para eles não ser algo
natural e prazeroso.
Desenvolvimento:
A música como terapia
O fato de pensar de uma forma muito lógica, faz com que
muitos autistas tenham muita facilidade em matemática e em música.
Aliás, cada vez mais estudos apontam a música como ferramenta po-

245
DNA Educação

derosa para desenvolver habilidades, inclusive em crianças autistas. So-


mos estimulados através dos sons (matéria-prima da música) desde o
quinto mês de vida intrauterina, quando nosso sistema auditivo está
apto para receber informações.
A importância da música e de sua estrutura musical era expli-
cada pelos gregos, como uma estrutura onde possui ordem, harmonia e
equilíbrio e a utilizavam sistematicamente para prevenir e curar doenças.
Durante a Primeira Guerra Mundial, os hospitais de veteranos dos Esta-
dos Unidos contrataram músicos profissionais para entreter os pacientes,
observaram que a música trazia resultados positivos na recuperação dos
feridos, desta forma, médicos se interessaram pela música como forma
de terapia, entendendo haver a necessidade de um UniÍtalo em Pesquisa,
São Paulo SP, v.6, n.3 julho 2016 treinamento específico para formar
Musicoterapeutas. (MUSICOTERAPIASP, 2014). Baranow, (1999), ex-
plica que o primeiro plano de estudos foi elaborado em 1944 em Michi-
gan (EUA) e em 1950 foi fundada a Associação Nacional para terapia
Musical nos EUA.
Na Argentina, houve a primeira jornada LatinoAmericana de
Musicoterapia em 1968. Os cursos a serem realizados com esse fim No
Brasil, foram fundados em 1971, no Paraná e Rio de Janeiro, e em 1980
a Universidade Federal do Rio de Janeiro deu início a prática da Clínica
Musicoterápica. A Musicoterapia é uma carreira de nível superior, com
duração no Brasil de 4 anos, reconhecida pelo conselho federal de edu-
cação (MEC) desde 1978 através do parecer 829/78.
A Prática Clínica da Musicoterapia Brasileira, iniciou-se em
1980. O que é Musicoterapia? A Federação Mundial de Musicoterapia
diz que: A Musicoterapia e a utilização profissional da música e seus ele-
mentos, para a intervenção em ambientes médicos, educacionais e coti-
dianos com indivíduos, grupos, famílias ou comunidades que procuram
otimizar a sua qualidade de vida e melhorar suas condições físicas, soci-
ais, comunicativas, emocionais, intelectuais, espirituais e de saúde e bem-
estar. Investigação, a educação, a prática e o ensino clínico em Musico-
terapia são baseados em padrões profissionais de acordo com contextos
culturais, sociais e políticos. (WFMT, 2014).

246
DNA Educação

Ao se falar de música, já demarcamos um território repleto de


movimentos e fenômenos acústicos que envolvem e que quando juntos
possibilita-se o fenômeno musical, porque separados podem ser defini-
dos como não musicais e servir aos efeitos terapêuticos. A música sendo
arte e ciência dirigi-se a dois elementos do processo evolutivo do ser hu-
mano e ao estudarmos a evolução do homem, constataremos que UniÍ-
talo em Pesquisa, São Paulo SP, v.6, n.3 julho 2016 fazem parte da co-
municação. Segundo Gainza (1988), em seus estudos sobre a conduta
musical, explica que a música e o som são energias, essas energias no
sujeito estimulam o movimento interno e externo, impulsionando-o á
ação e promovendo várias condutas de diferentes qualidades e graus. Be-
nenzon (1988) explica que a Musicoterapia tem como objetivo a terapia;
a finalidade deste conceito é valorizar o aspecto terapêutico sobre o mu-
sical, assim como reabilitar e recuperar.
A música é interessante para a criança desde sempre e isso é
maravilhoso, porque a motivação (vontade e interesse em querer
aprender o conteúdo) é essencial para a construção da aprendizagem.
Os pais dos autistas geralmente recebem orientações para que estejam
atentos aos interesses do seu filho, porque ao descobri-los, poderão
utilizá-los como links para desenvolver diversas habilidades.
Usar a música como recurso é sem dúvida uma ponte para
atrair a atenção da criança autista pois facilita na aprendizagem. Estu-
dos de ressonância magnética funcional apontam que a música causa
um efeito único em pessoas autistas, principalmente como intervenção
terapêutica. A música, quando utilizada de forma adequada, é capaz de
relaxar e trazer sensação de bem-estar, o que pode auxiliar, de forma
natural, no tratamento em conjunto com outras terapias.
Outro fato importante é que pessoas com Transtorno do Es-
pectro Autista (TEA), apesar de terem grande dificuldade em perceber
sentimentos nas expressões faciais, são capazes de perceber sentimen-
tos de alegria e tristeza em uma peça musical, ou seja, os sentimentos
de uma peça musical tornam-se mais claros para um sujeito com TEA
do que a visualização de expressões faciais.

247
DNA Educação

A música é uma ferramenta para se descobrir interesses e ne-


cessidades individuais de uma criança e tem o poder de ser uma facili-
tadora de comunicação, mas para que o autista seja realmente benefi-
ciado, com resultados em longo prazo, é necessário que a mesma seja
utilizada de acordo com os interesses da criança, com um professor
que realmente conheça as especificidades do transtorno e que saiba uti-
lizar técnicas de musicoterapia.
As atividades de música para autistas, deve ser diversificar e
com metas bem definidas. Os exercícios são lúdicos, com diversos ob-
jetivos, como socializar a criança (através de brincadeiras de roda, brin-
cadeiras em dupla onde o contato visual é estimulado e valorizado),
desenvolver sua psicomotricidade (através de jogos psicomotores, pe-
dagógicos, canções utilizando sons do corpo, manuseando instrumen-
tos musicais), a linguagem (através de jogos cênicos, contação e orga-
nização de histórias cantadas com figuras associadas, jogos de tabu-
leiro), dentre outros. Brincando, a criança associa gestos e movimentos
a conceitos musicais mais abstratos, aprende regras sociais, aumenta
sua expressividade e descobre o mundo de forma agradável.
Além disso, descobrimos através das brincadeiras os interes-
ses e necessidades individuais da criança, o que é de suma importância,
pois através destas descobertas, as pessoas que interagem com o autista
poderão utilizar estes interesses como temas para desenvolver conteú-
dos específicos. Exemplo: muitos autistas demonstram interesse por
animais, dinossauros, outros preferem carrinhos, trens, etc. O profes-
sor geralmente percebe esses interesses e os utiliza nas aulas, pois a
motivação é essencial para a construção da aprendizagem.
A música é uma arte extremamente acessível a todas as classes
sociais. As famílias também podem estimular seus filhos em casa atra-
vés da música. Existem músicas sobre qualquer tema, para trabalhar
diversos conteúdos. É necessário, porém, muita pesquisa, dedicação e
muita observação por parte da família em relação à criança, no sentido
de descobrir os interesses dela, para fazer com que ela se interesse em
interagir com as propostas.
Se a criança gosta de pular, procure músicas que estimulem os
movimentos corporais. Se a criança demonstra interesse por instru-

248
DNA Educação

mentos musicais, ofereça: tamborzinhos, clavas, chocalhos e toque


com ele, acompanhando diversos estilos musicais. Se ele gosta de brin-
car com a bola, ligue o som com uma música que ele gosta e brin-que
de bola com ele olhando nos olhos e toda vez que ele olhar nos seus
olhos, comemore com muita animação. Sabemos o quanto é difícil para
o autista o contato visual, portanto, devemos criar atividades que esti-
mulem o desenvolvimento desta habilidade.
Brincar com a música é muito mais do que diversão. É uma
linguagem essencial, onde a criança aprende a se expressar melhor e a
descobrir o mundo. Ela pode ser a ferramenta que fará grande dife-
rença no desenvolvimento e na qualidade de vida da criança autista. A
música é uma ferramenta pra se descorir interesses e necessidades
idividuais de uma criança, está disponível a todos e é muito poderosa.
A importância da Música no desenvolvimento cognitivo das
crianças com Perturbações Autísticas possibilita um conhecimento mais
abrangente, acerca das especificidades do Autismo, tal como, benefícios
que a música manifesta nesta perturbação ao nível cognitivo, socializa-
ção/interação, comunicação e psicomotricidade.
Música é, assim, uma arte afetiva baseada nos sentimentos que
não podem ser, por isso, postos de lado. É uma arte abstrata e os seus
estímulos provocam respostas que variam conforme as percepções que
temos, primeiro em relação a pequenos e simples sons para chegar aos
mais difíceis e complexos. Ao mesmo tempo, também é uma atividade
social, uma atividade comunitária em que a execução musical é trocada
com os outros, já que enriquece mais a experiência do que outras áreas
pois, desenvolve os sentimentos e permite apercebermo-nos de forma
mais «intensa» das outras culturas.
A experiência estética permite estimular a imaginação, e senti-
mentos nas crianças enquanto que a experiência artística permite a cria-
ção de bases para que a cognição, conceitos, juízos e ações se desen-
volvam, e ao desenvolver a imaginação desenvolvem-se também as
ideias, os valores, os objetivos e as teorias. A experiência musical permite,
por seu lado, tocar, manipular, ver, examinar, ouvir, usar o corpo e mús-
culos em interpretação de ritmos, por exemplo, desenvolvendo assim os

249
DNA Educação

sentidos e fornecendo ao mesmo tempo conhecimentos e prazer pelo


trabalho musical.
A criança tem a capacidade de perceber sons desde o quinto
mês da sua vida intrauterina, adquirindo assim, esta capacidade antes de
falar ou andar. (Maudale, 2007:10) defende que a audição influência em
muito o movimento, a linguagem e a aprendizagem da criança. Para o
autor, escutar é ouvir e é ter a motivação de ouvir. Define ouvir como
sendo a faculdade que a criança tem de receber sons e escutar como a
capacidade que requer a habilidade de selecionar os sons que lhe interes-
sam entre toda a diversidade que lhe chega aos ouvidos. Deste modo,
ouvir é um ato passivo enquanto que escutar é um ato ativo e voluntário.
Ao saber escutar a criança consegue perceber com precisão a
informação que deseja. (Maudale,2007, p.2) faz ainda referência aos sons
emitidos pela própria criança através do aparelho fonador, sendo a cri-
ança capaz de escutar e concentrar-se na sua língua materna, moldando
aos poucos a sua própria linguagem.
Segundo o autor referenciado, o objetivo principal da escuta é
que esta permite estabelecer a comunicação entre a criança e o seu meio
ambiente. E esta capacidade só se desenvolve se a criança se sentir mo-
tivada a comunicar com o mundo que a rodeia. 40
MUSICOTERAPIA: Modificando vidas

 Conceito das ondas (Energia/ Meio / Direção / Medição);


 Som + Indivíduo;
 Fisiologia do corpo ao som;
 Música: melodia, harmonia e ritmo.

250
DNA Educação

Deste modo, a música é muito importante para o ensino e de-


senvolvimento das características musicais de cada um, pois desenvolve
três aspetos fundamentais na vida do Homem. São eles:
* a motricidade, quando nos movemos ao som de algo,
quando batemos o ritmo com o pé;
* a cognição e criatividade, quando analisamos o que ouvimos,
tocamos e quando improvisamos;
* a afetividade, quando sentimos algo enquanto ouvimos de-
terminada música, suscitando-nos inúmeros tipos de senti-
mentos e reações, como por exemplo, sentir um arrepio na
pele quando se ouve algo de que gostamos ou que nos «toca»
sem sabermos como nem porquê.
Através da música a criança poderá desenvolver o seu pensa-
mento musical, podendo ouvir, discriminar as estruturas sonoras, conhe-
cer a literatura musical, interpretar cantar, tocar e dançar em com-junto,
compor, criar, improvisar e elaborar estruturas musicais.
 Desenvolvimento cognitivo/ linguístico: a fonte de co-
nhecimento da criança são as situações que ela tem oportunidade de ex-
perimentar em seu dia a dia. Assim sendo, quanto maior a riqueza de
estímulos recebidos por ela melhor será o seu intelectual. Neste sentido,
as experiências rítmicas musicais que permitem uma participação ativa,
favorecem o desenvolvimento dos sentidos das crianças. Ao trabalhar
com os sons ela desenvolve sua acuidade auditiva; ao acompanhar gestos
ou dançar ela está desta forma, a trabalhar também a coordenação mo-
tora e a atenção; ao cantar ou imitar sons desenvolve as suas capacidades,
proporcionando-lhe o estabelecimento de relações com o mundo envol-
vente.
 Desenvolvimento psicomotor: as atividades musicais ofe-
recem inúmeras oportunidades para que a criança aprimore as suas habi-
lidades motoras, aprendendo a controlar os músculos e mover-se com
agilidade. O ritmo tem um papel importante na formação e equilíbrio do
sistema nervoso. Isto porque toda expressão musical ativa atua sobre a
mente, beneficiando a descarga emocional, a reação motora e aliviando
as tensões. Qualquer movimento adaptado a um ritmo é resultado de um

251
DNA Educação

conjunto completo (e complexo) de atividades coordenadas. Por isso ati-


vidades como cantar com acompanhamento de gestos, dançar, bater pal-
mas, pés, são experiências valorizadas para a criança, pois estas possibi-
litam o desenvolvimento rítmico, coordenação motora, além destas van-
tagens, vai favorecer também o processo de aquisição da leitura e da es-
crita.
Através da Música, é possível criar um meio de comunicação
de carácter emocional, sendo que, esta, torna-se valorizada aplicando-se
precisamente onde a comunicação ver não se utiliza. As atividades de-
senvolvidas no âmbito da Música, para crianças pequenas e crianças com
distúrbios de comunicação e linguagem, não tem como objetivo desen-
volver técnicas específicas da música como leitura, execução e composi-
ção, mas sim, usar a música como meio.
Segundo (Sousa, 2005, p.127) a música instrumental é um exce-
lente meio de desenvolvimento mental, físico, afetivo e social permitindo
que a criança possa usufruir de satisfações imediatas, independentemente
da gravidade da sua patologia, uma vez que aquilo que a criança escuta e
o modo como a interpreta são uma criação que vem dela e que corres-
ponde às suas experiências física, intelectual e emotiva. Bang (Sousa,
2005:130) considera que a música pode estabelecer um contato sem pa-
lavras podendo mesmo promover o desenvolvimento da linguagem.
A Música deve ser explorada com total liberdade por parte da
criança, de modo a que elas explorem até ao mais ínfimo a sonoridade
musical.
Exemplo de instrumentos musicais que podem ser que podem
ser utilizados neste processo:

252
DNA Educação

Figura 1 - Bangô, tambor, flauta doce, flauta de pan, ganzás e instrumentos musicais de
sucata.

Figura 2 - Aparelho de som, panderolas, guiro, xilofone, maracas, clavas, pandeiro e


reco-reco cubano.

Figura 3 - Violão e surdo.

A intervenção musical como estratégia deve ser utilizada de di-


ferentes maneiras, as quais incluem desde a audição de músicas, danças
de roda, até a (re)criação e composição musical, assim contribuiu para
propiciar momentos de interação, por meio do uso criativo de rimas,
gestos, ritmos diferentes e elaboração de histórias cantadas relacionadas

253
DNA Educação

à repetição verbal. É interessante utilizar-se da ecolalia e, a partir das pa-


lavras e expressões repetitivas e descontextualizadas, ampliar o repertó-
rio da criança.
Uma realidade é que hoje as crianças autistas que recebem tra-
tamento terapêutico junto à música, estão tendo um melhor desenvolvi-
mento, do que crianças autistas que fazem o mesmo tipo de tratamento,
porém com a ausência da musicoterapia.
Pesquisas realizadas por diversos países, incluindo o Brasil, mos-
tram que este tipo de trabalho com crianças autistas tem sim a capacidade
de desenvolver habilidades através da música.
Conclusão
A Psicopedagogia cada vez mais se faz necessária nas clínicas e
instituições escolares. Seu papel é de suma importância, contribuindo
para prevenir disfunções ou dificuldades e potencializando o desenvol-
vimento do sujeito para o aprendizado saudável. O Psicopedagogo com
sua observação técnica e terapêutica colherá dados e analisará os fatores
físicos, administrativos e pedagógicos e seu funcio-namento na institui-
ção. Na clínica irá analisar, avaliar, interpretar e contribuir, no fracasso
escolar apresentado, potencializando e enriquecendo o desenvolvimento
do sujeito.
Segundo especialistas em Musicoterapia, pessoas com autismo
tendem a contar com uma alta capacidade para percepção de melodias,
além de que em função do contato com a música, conseguem relacionar
emoções e sentimentos, assim facilitando a comunicação, algo tão di-
fícil de ser feito por pessoas com autismo.
As pesquisas sobre a relação música e autismo segue em desen-
volvimento, com o intuito de tentar tirar o máximo dos benefícios da
música.
Reafirmando as pesquisas, recentes estudos de ressonância
magnética funcional, tem mostrado que a música causa um efeito único
em pessoas com autismo, em especial como forma de terapia.
Relacionando autismo e educação musical desta forma, ob-
serva-se um futuro promissor, uma vez que o autismo requer do sistema

254
DNA Educação

educacional diversidade e personalização, e a Educação Musical já de-


monstrou promover a autonomia do indivíduo, além de contribuir para
a ativação de processos conscientes e criativos, tanto na aprendizagem
cognitiva quanto afetiva, revelando valores de humani-dade intrínsecos
a considerando a sua relação com o outro em um viver harmonioso e
solidário, onde a paz e ao bem-estar sejam plenamente cultivados.

Referências
SAMPAIO, Simaia, Atividades Neuropsicoedagógicas de Intervenção e
reabilitação, vol. 4, 2° Edição. Editora Wak, Rio de Janeiro 2016
GAINZA, V. H. Estudos de Psicopedagogia Musical. 1° Edição: São
Paulo. Editora Summus, 1982.
SOUSA, Alberto B. (2005), Psicoterapias Activas (Arte-Terapias), Lis-
boa, Livros Horizonte.)
BARANOW, A. L. V. Musicoterapia: Uma Visão Geral. 1° Edição. Rio
de Janeiro: Editora Enelivros, 1999.
BENENZON, R. O. Musicoterapia: De la Teoria a la Practica. 1° Edi-
ção. Buenos Aires: Editora Paidós, 2002.
BEYER, Ester; KEBACH, Patrícia. Pedagogia da Música: experiências
de apreciação musical. Porto Alegre: Mediação, 2009.
Estudos de Psicopedagogia musical. Tradução de Beatriz C. Canabrav.
São Paulo: Summus, 1988.
BENENZON, Rolando. Teoria da musicoterapia: contribuição ao con-
texto não-verbal [tradução de Ana Sheila M. de Uricoechea]. São Paulo:
Summus, 1988.

255
DNA Educação

NARRATIVA AUTOBIOGRÁFICA:
EXPERIÊNCIAS DE VIDA DE UMA PROFESSORA E
AS INFLUÊNCIAS NA SUA PRÁTICA

Maria Eduarda R. da Silva Pinto1


RESUMO:
O presente artigo tem como objetivo conhecer as experiências ditas
como marcantes na vida de uma antiga professora considerada notável e
compreender como a mesma influenciou nas suas práticas como pessoa
e educadora. A pesquisa teve uma abordagem qualitativa utilizando o
método autobiográfico. Nesta pesquisa foi proposto que a professora
investigada respondesse a um questionário, que continha a seguinte per-
gunta: Como se deu o seu processo de formação e quais as suas maiores
dificuldades mediante esse processo? A partir dos dados colhidos obtive
as seguintes categorias: Professora como exemplo; responsabilidade do-
cente; importância cultural e articulei com os seguintes autores FREIRE
(1996); PILLETE (1997); SCOZ (2008); NÓVOA (2007); BELOTTI e
FARIA (2010), e Agnes Heller (1992), que apontaram as experiências
anteriores ou durante a formação como um dos fatores determinantes
na proposta educativa da professora.
Palavras chave: Narrativas autobiográficas. Professores. Formação.
Identidade
ABSTRACT:
This article aims to know the experiences described as outstanding in the
life of a former teacher considered remarkable and to understand how
she influenced her practices as a person and educator. The research had

1 Nascida em 1993, palestrante motivacional, professora da educação Básica e aluna UERN


campos AÇU/RN, mais conhecida como (Duda) de curiosidade intelectual admirável e de uma
simpatia singular, ela é proveniente da Cidade de Pendências, terra acolhedora e de grande
pluralidade cultural.

256
DNA Educação

a qualitative approach using the autobiographical method. In this re-


search it was proposed that the teacher investigated respond to a ques-
tionnaire, which contained the following question: How did your training
process take place and what are your biggest difficulties through this pro-
cess? From the data collected I obtained the following categories:
Teacher as an example; teaching responsibility; cultural importance and
articulated with the following authors FREIRE (1996); PILLETE
(1997); SCOZ (2008); NÓVOA (2007); BELOTTI and FARIA (2010),
and Agnes Heller (1992), who pointed out previous experiences or dur-
ing training as one of the determining factors in the teacher's educational
proposal.
Keywords: Autobiographical narratives. Teachers. Formation. Identity
Introdução
O uso de narrativas autobiográficas tem sido muito utilizada
como ferramenta valorosa para as pesquisas qualitativas acerca da for-
mação de professores, pois a mesma possibilita a conservação da subje-
tividade do indivíduo. Permite ainda dessa forma novas interpretações
dos processos formativos, dos quais os professores, ou alunos das licen-
ciaturas são submetidos. Tais compreensões são mediadas pela própria
percepção e entendimento que estas pessoas têm desses procedimentos,
quando os expõem oralmente ou quando escrevem sobre suas experiên-
cias. Dessa forma foi selecionada uma professora da educação básica,
que foi escolhida pelo seu ilustre trabalho, e propuséssemos á investigá-
la usando essa riquíssima fonte de estudo. Sob isso, temos como objetivo
principal conhecer quais experiências foram marcantes na sua vida e
como elas influenciaram na sua escolha pela docência e como as mesmas
interferem nas suas práticas educativas. O trabalho desenvolvido tem por
justificativa, que existem poucas pesquisas que narrem á história de vida
de educadores norte rio-grandenses. Assim esta pesquisa, contribuí de
forma significativa na formação de futuros docentes, além de propiciar
novos olhares a respeito das experiências pessoais e suas influências no
trabalho docente.
O presente trabalho foi realizado a partir de relatos auto-bio-
gráficos desta professora, sobre as experiências vivenciadas por ela, antes

257
DNA Educação

e durante sua vida profissional. Esta pesquisa está inserida dentro de uma
abordagem metodológica qualitativa, tendo como eixo epistemo-lógico
a fenomenologia. Além das narrativas da professora, tal estudo foi sub-
sidiado por uma pesquisa bibliográfica. O recurso utilizado para colher a
descrição da professora sobre suas experiências, foram questionário e
analise de documentos da mesma. No qual continha uma justificativa
explicitando o motivo pelo qual ela foi escolhida para colaborar com o
trabalho, seguido apenas de uma pergunta: Quais experiências fizeram
com que você se tornasse a educadora que é hoje? Para melhor compre-
endermos o tema, abordamos, autores que levam em consideração a sub-
jetividade como algo inseparável da vida profissional do educador.
De acordo com SCOZ (2008) A subjetividade configura a
forma de estar e de se entender o mundo e o trabalho humano em geral.
Afetando, no caso da profissão docente, as perspectivas do professor em
relação a sua formação e atuação profissional. A subjetividade por sua
vez não é definida por ordem biológica, mas sim construída pelas expe-
riências vivenciadas ao longo da vida. Segundo PILLETE (1997, p.80)
“Nossos comportamentos são respostas constantes e contínuas ao am-
biente físico e social”.
A partir dos dados apresentados pela professora, conforme es-
tes nos apresentavam como relevantes para a pesquisa, distribuindo-os
em categorias, nas quais procuramos respaldo científico para dialogar-
mos com o que foi dito pela professora e com o que dizem autores que
tratam sobre o tema
Quem é Dodora do Porto?
A professora Dodora disse:
“Sou Maria das Dores Barbosa, mais conhecida como (DO-
DORA DO PORTO), nasci no distrito do Porto do Carão
no município de Pendências, sou filha de mãe agricultora e
pai salineiro, casada com agricultor e mãe de vários filhos,
sou professora, mestre griô, líder comunitária e guardiã da
memoria da minha cidade”
A professora em questão mostra-se muito forte e objetiva na-
quilo que quer e faz, é muito querida e prestigiada por sua atuação como

258
DNA Educação

professora, é respeitada por todos, é compositora também de versos, po-


emas e prosas sobre acontecimentos históricos de sua comunidade.
Paulo Freire em uma de suas falas nos diz que “ninguém começa a ser
professor numa certa Quarta-feira as 4 da tarde... ninguém nasce profes-
sor ou marcado para ser professor, a gente se forma como educador per-
manentemente na pratica e na reflexão sobre essa pratica”. Pois ser pro-
fessor vai muito além da sala de aula, atravessando paredes, pulando mu-
ros e enfrentando barreiras.
Comente qual foi a maior dificuldade?
A professora Dodora disse:
“Foi pra estudar, pois eu me criei no sitio, eu vim praqui
(Pendências) quando eu fui estudar em Macau, mais tinha
muita dificuldade, fiquei na casa de meu padrinho, não fal-
tava nada, mais tinha que deixar meus pais, ainda pequena,
pra ir estudar em Macau, não faltava nada para o estudo,
mais era difícil, depois veio o exercito e havia muita pertur-
bação o povo se perturbava muito na época da ultima
guerra, a prostituição era grande em Macau, cidade portuá-
ria”.
A professora em questão foi desafiada muito cedo pelo con-
texto histórico da época, tendo que ser forte pra enfrentar os seus medos,
anseios e a falta da presença dos seus pais para conseguir estudar, em
uma época de constante conflito e prostituição ela foi forte para presen-
ciar tamanho caos e não ser afetada pela mesma, ela se mostra forte desde
muito pequena. A mesma ainda ressaltou que conclui o primário pela
escola radiofônica, que era uma escola pelo rádio do MEB.
Segundo Freire a pessoa conscientizada tem uma compreensão
diferente da historia e de seu papel, pois recusa acomodar-se, mobiliza-
se, organiza-se para mudar o mundo.
Quais experiências fizeram com que você se tornasse a educa-dora
que é hoje?
A professora Dodora disse:
“Ao longo de minha vida, muitos processos, vivencias e pes-
soas foram importantes para a minha escolha profissional.

259
DNA Educação

Entre estes muitas pessoas, as que mais me motivaram, em-


bora indiretamente, sem o incentivo de que eu deveria ser
uma educadora, como exemplo Dona Sabina que era ótima,
era uma artista, ela ensinava a gente bailando, ela tinha uma
maneira de ensinar que era só dela”.
O ser humano ao longo de sua história se forma e se transforma
em interação com outros (NÓVOA, 2007). Assim, compreender como
uma pessoa, em especial o professor, formou-se é encontrar relações en-
tre a pluralidade de suas trocas e vivências internas ou externas nos di-
versos momentos de sua vida. Além disso, compreende-se que essa for-
mação está diretamente relacionada à construção da identidade do ser
professor e, portanto, de si mesmo, na qual o desenvolvimento dos sig-
nificados e valores se transforma ao longo de toda a trajetória de forma-
ção pessoal e profissional.
Assim de acordo com BELOTTI e FARIA (2010), “Todo professor
apresenta-se como uma referência para a formação dos educandos e é
muito importante a maneira como se relaciona com eles”.
Já FREIRE (2001, p. 51), diz que “toda prática educativa en-
volve uma postura teórica por parte do educador” e que esta postura
implica “uma concepção dos seres humanos e do mundo”. Segundo ele,
isto ocorre porque os seres humanos, diferentemente dos animais, ori-
entam-se no mundo não apenas pela associação de imagens sensoriais,
mas pelo pensamento-linguagem, o que “envolve desejo, trabalho-ação
transformadora sobre o mundo, de que resulta o conhecimento do
mundo transformado”. p.04)
Dificuldades para alcançar a formação:
A professora Dodora disse:
“Tornei-me professora à custa de enormes esforços, que in-
cluíam assistir aula com fome, após viajar léguas na carroce-
ria de um caminhão até chegar à cidade do Açu”,
“Todos esses detalhes eu nunca tinha falado para ninguém.
Eles estão marcados, muito fortes na minha vida. A ponto
de eu saber datas… de eu saber horários, saber pontos de
parada, enfim. Porque realmente foi… foi doloroso. Não di-
ria trabalhoso. Mas foi doloroso todo esse processo para
chegar até aqui. Mas faz parte”.

260
DNA Educação

A professora em foco ainda relata que não foram poucas as ve-


zes que ela passou por essa situação de dificuldades e conflitos e em mui-
tas das vezes que conseguiu carona em transporte publico escolar ainda
era oprimida pelos estudantes mais novos, que diziam piadas e indiretas
a mesma por sua idade já avançada, onde vinham com questionamentos
preconceituosos do por quê que ela ainda queria estudar, que velho não
aprendia mais nada. Com tudo isso, Dodora, a professora em questão só
conseguia ter mais foco e coragem para chegar ao destino desejado, se
formou no ensino médio, graduou-se em estudos sociais e historia e fez
especialização ainda na área.
A identidade do professor, segundo NÓVOA (2007, p. 16), não
é um dado adquirido, uma propriedade ou um produto, é “um lugar de
lutas e de conflitos, é um lugar de construção de maneiras de ser e de
estar”.
Deste modo compreende-se que a identidade profissional do
professor é construída, dinâmica e constantemente, pelo significado que
cada professor confere à sua atividade. Esse significado deriva dos seus
valores, de seu modo de se situar no mundo, de sua história de vida, das
representações, dos saberes, das angústias, dos desejos e, é claro, do sen-
tido que tem em sua vida o fato de ser professor.
Você teve apoio familiar para estudar?
A professora Dodora disse:
“O apoio para estudar veio desde muito pequena através de
minha avó que me ensinava no quintal de casa as primeiras
letras com galhos de pitombeira, meus pais eram analfabetos
e minha avó conhecia algumas palavras e me ensinava, onde
eu morava quando pequena não tinha escola próxima”.
Segundo PILLETE (1997, p.80) “Nossos comportamentos são
respostas constantes e contínuas ao ambiente físico e social”. O que nos
faz entender que os mesmos mudarão de acordo com uma dada situação
de seu cotidiano ou de seu contexto histórico.
De acordo com a fala da professora, podemos perceber a pre-
ocupação de sua avó em incentiva-la a conhecer a suas primeiras letras,
e a importância que esse acontecimento teve na sua infância que reper-
cutiu de forma positiva na sua formação como pessoa que através deste

261
DNA Educação

pequeno gesto teve incentivo o de estudar e de se formar como profes-


sora. Professora essa que com seu exemplo de perseverança não se dei-
xou abalar, muito menos entristecer, e ao longo dos anos conseguiu che-
gar ao seu grande objetivo profissional.
FREIRE (2001, p. 51), diz que “toda prática educativa envolve
uma postura teórica por parte do educador” e que esta postura implica
“uma concepção dos seres humanos e do mundo”. Segundo ele, isto
ocorre porque os seres humanos, diferentemente dos animais, orientam-
se no mundo não apenas pela associação de imagens sensoriais, mas pelo
pensamento-linguagem, o que “envolve desejo, trabalho-ação transfor-
madora sobre o mundo, de que resulta o conhecimento do mundo trans-
formado”.
Diante da fala de Freire, podemos dizer que a professora em
questão conseguiu chegar ao patamar que chegou pelo desejo e pelo tra-
balho-ação de todos os dias, em vencer um dia de cada vez, de transfor-
mar sua curiosidade em descobertas e conhecimentos adquiridos. Pois
segundo (FREIRE, 1974a, p.42) construir-se como pessoa, transformar
o mundo e estabelecer com os outros homens relações de reciprocidade
é de grande importância e significação para a formação da identidade e
da formação de cada ser.
A partir de tudo apresentado na fala da professora, e com base
nos estudos realizados em nossos referencias teóricos percebemos quão
importante é a ação do professor, pois o mesmo apesar de não lidar com
objetos nos quais possa manusear e moldar conforme sua vontade, tra-
balha com sujeitos ativos dotados de inteligência, no entanto são influ-
enciados pelos que com eles convivem, já que o processo de autocons-
trução do homem se dá mediante o contato com os outros homens.
Neste trabalho podemos constatar a importância de uma for-
mação capacitada, de boas influências dentro e fora do âmbito escolar, o
apoio familiar, a necessidade de ser um pesquisador, tudo isso tem in-
fluência diretamente na formação da identidade docente, que mesmo
com as mudanças ocorridas na sociedade e essa identidade se modifi-
cando, existem princípios que não se modificam e esses são construídos
desde a infância.

262
DNA Educação

Ao valer-se da metodologia de história de vida, encontra-se


mais uma importante contribuição deste trabalho. Essa escolha possibi-
lita o acesso às referências que orientam os sujeitos em sua construção
de significados, o desvelamento dos aspectos contextuais, relacionais e
construtivos e, ainda, as influências da elaboração das suas identidades,
a partir dos relatos obtidos, pode-se obter uma valiosa compreensão do
papel da formação na construção da identidade docente. Pois acredita-se
que as vivências dos professores, suas experiências pessoais e/ou profis-
sionais, e os saberes que são mobilizados à medida que estes desenvol-
vem seu trabalho e, portanto, a história de vida, são fatores constituintes
do processo de construção de suas identidades. E que essas histórias e
identidades impactam as vidas dos professores e marcam esses alunos
como pessoas e como profissionais.
Mesmo que sem intenção a ação do professor jamais será neu-
tra, pois pertencente ao gênero humano, sempre utilizará da sua subjeti-
vidade. As experiências obtidas pelo os professores refletem-se nas suas
práticas educativas em sala de aula, pois assim como os alunos, os pro-
fessores trazem consigo a realidade na qual convivem ou conviveram e
acaba repassando-as mesmo que de uma forma implícita.

Foto: Professora Dodora do Porto

Fonte: Fundação Felix Rodrigues

263
DNA Educação

Referências
SCOZ, Beatriz. J.L. Subjetividade de professoras/es : sentidos do
aprender e do ensinar. Psicol. educ. n.26 São Paulo jun.2008
PILLETE, Nelson. Psicologia da educação. São Paulo. Ed. Ática,
15º edição, 1997.
NÓVOA, António. Os professores e as histórias da sua vida. In:
NÓVOA, António (Org.). Vidas de professores. Porto: Porto Edi-
tora, 1992.
HELLER, Agnes. O cotidiano e a história. 4. ed. Rio de Janeiro: Paz
e Terra, 1992.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários a
pratica educativa/ Paulo Freire. – São Paulo: paz e terra, 1996. -
(coleção leitura).
BELOTTI, S. H. A.; FARIA, M. A. Relação professor-aluno. Sabe-
res da Educação, v.1, n. 1, p. 01-12, 2010.

264
DNA Educação

A UNIVERSIDADE PÚBLICA POR UMA NOVA CO-


MUNICAÇÃO ESTRATÉGICA
Maryângela Aguiar Bittencourt1

RESUMO:
Este artigo propõe retratar as contribuições da universidade pública para as mu-
danças sociais, políticas e econômicas do Brasil e dessa forma passando a ter uma
preocupação com uma condução mais cuidadosa de seus processos comunicaci-
onais perante seus públicos. Certamente, a Metodologia da Comunicação Estra-
tégica sobre a qual se apoia [ minha] argumentação tem sido difundida há apro-
ximadamente 25 anos pela Escola de Comunicação da Universidade Nacional de
Rosário/Argentina, tendo por objetivo assegurar que a universidade crie media-
ções no ambiente micro e macro social, onde favoreça a construção de sentidos
e ações compartilhadas, projetando para isso estratégias comunicacionais vincu-
lada à qualidade de suas práticas institucionais e o alcance de se suas metas orga-
nizacionais.
Palavras Chaves: Comunicação Estratégica; Escola de Comunicação da Uni-
versidade Nacional de Rosário; Universidade Pública.
ABSTRACT:
His article proposes to portray the contributions of the public university to the
social, political and economic changes of Brazil and thus to have a concern with
a more careful conduction of its communication processes before its public. Cer-
tainly, the Methodology of the Strategic Communication on which [my] argu-
ment is based has been disseminated for approximately 25 years by the School
of Communication of the National University of Rosario / Argentina, aiming to
ensure that the university creates mediations in the micro and macro social envi-
ronment , where it favors the construction of shared meanings and actions, de-
signing for this communication strategies linked to the quality of its institutional
practices and the achievement of its organizational goals.
Keywords: Strategic Communication; School of Communication of the Na-
tional University of Rosario, Public University.

1Professora da Universidade do Estado do Amazonas–UEA/AM. Doutora em Administração pela


Universidad Nacional de Rosario – UNR /Argentina. Mestre em Administração Pública pela Fun-
dação Getúlio Vargas – EBAPE/RJ. Especialista em Gestão pela Qualidade pela Universidade
Federal do Amazonas – UFAM/AM. Email mradm@oi.com.br

265
DNA Educação

A visibilidade de mundo não basta para torná-lo mais compreensível.


Mesmo onipresente, a informação não pode explicar um mundo percebido
como mais complexo. (Wolton, 2006, 2003, p. 19)

De acordo com Baldissera (2007), pode-se dizer que na soci-


edade da promoção do consumo tem se instituído um forte desejo de
explicar os fenômenos (o mundo) de maneira simplificada (rápida e uni-
versal). Essa condição tem sido intensificada pela revolução tecno-lógica
e pela velocidade da informação que particularmente trazem consigo o
imediatismo do tempo, dos resultados, dos lucros, da visibili-dade e, no-
tadamente, impulsionam respostas sempre mais rápidas, pontuais e es-
petaculares para as soluções dos problemas que afligem as sociedades.
Sem dúvida, na sociedade da volatilidade da imagem, onde a
prática discursiva organizacional, de tempos em tempos, inaugura uma
nova forma de servir ao propósito da dominação técnica e econômica,
as universidades não têm escapado dessa nova ordem e, como alerta So-
brinho (1996) a universidade sobretudo pública, não deve ser medida e
nem guiada pela eficiência meramente produtivista e a qualidade mercan-
tilista, mas pela eficácia democrática e a qualidade social e política de sua
gestão.
Ademais, é preciso reconhecer que a universidade precisa ter
a capacidade de estabelecer um equilíbrio dinâmico entre pertinência so-
cial, qualidade acadêmica e equidade (TRINDADE, 2009). Em suma,
reconhecer que as questões pertinentes à gestão universitária, ou seja, de
qualidade educacional em uma universidade, não se limitam somente ao
âmbito acadêmico (eficiência), ao âmbito pedagógico (eficácia), ao as-
pecto político (efetividade), transcendendo-os consideravelmente ao âm-
bito antropológico (relevância) (SANDER, 1984, apud LOPES, 2001).
Outro fator típico da sociedade do século XXI que cuidado-
samente necessita ser observado, refere-se ao modelo de gestão geral-
mente adotado pelas organizações e incorporado pelas univer-sidades
brasileiras, como adverte Baldissera (in Kunsch, 2009, p.140) tem corrido
o risco de muitas vezes ser enquadrado em uma o qual
condição de leis e fórmulas simplificadas /simplificantes, esquemáticas
/esquematizantes.

266
DNA Educação

Dessa forma, percebe-se que a universidade não pode ser expli-


cada por nenhum tipo de lei simples quando confrontada com a comple-
xidade da sociedade das massas em razão de um emaranhado de intera-
ções, de tensões, conflitos, cooperações e desorganizações, tornando-se
por consequência ineficaz ao enfrentamento dos desafios contemporâ-
neos.
Como alertam Bernheim e Chauí (2008) deve a sociedade bra-
sileira constituir universidades públicas participantes, opondo-se ao
mesmo tempo ao modelo de universidade enclausurada — de costas para
a sociedade — e ao modelo de universidade militante, invadida pelos
ruídos e o pelo clamor das ruas. Postulam, ainda, uma universidade que
participe em todos os aspectos da vida e da sociedade, sem perder seu
caráter de academia.
Em outras palavras, como ressalta Trigueiro (1998) a univer-
sidade deve ser vista como uma organização multifinalista, ou seja, a uni-
versidade é um organismo milenar que subsiste porque consegue se ade-
quar e antever a necessidade da sociedade.
Convém elucidar que na realidade do contexto brasileiro, as
universidades devem não somente buscar uma reflexão sobre seu papel
quanto à pesquisa, quanto à cultura, quanto à atuação do Estado por
meio de uma visão pragmática, mas indiscutivelmente devem pautar-se
em modelos de universidade como ressalta Souza (2007), que trabalha
alguns elementos essenciais para alcance de seus objetivos, como, por
exemplo:
a) possuir uma estrutura administrativa enxuta que a torne fle-
xível;
b) elaborar seu projeto organizacional e estrutural;
c) definir sua estratégia e eficácia;
d) ser transparente e partícipe da realidade sociocultural onde
está inserida;
e) estar atenta à inovação e à mudança; e
f) e gerenciar conflitos, poder e política, entre outros.
É valido registrar que foi partilhado em 1978 pelo então Vice-
Reitor da Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG, o professor
José Henrique Santos, no Seminário sobre o Sistema Universitário e a

267
DNA Educação

Sociedade Brasileira2, promovido pelo Conselho de Reitores das Univer-


sidades Brasileiras - CRUB, o modelo de universidade crítica. Modelo
esse que notadamente defende uma universidade que visa a superação da
dependência sociocultural, econômica e da alienação, em busca de um
posicionamento crítico em face do advento do neoliberalismo e do pro-
cesso de globalização.
As suas ideias, por conseguinte, defendem 6 (seis) pressupos-
tos, descritos no quadro a seguir:

Quadro 1: Modelos de Universidade


Modelo Tradicional Modelo Crítico
1) Separação entre Universidade e 1) A Universidade tem consciência de si
Sociedade. A Universidade como como parte da sociedade e reflete em sua or-
lugar privilegiado do saber, dos es- ganização as contradições da sociedade.
tudos superiores.
2) A Universidade tende à inércia e 2) A Universidade tende a ser independente
à dependência. e dinâmica. Inquietação permanente.
3) A Universidade permanece neu- 3) A Universidade se coloca diante dos pro-
tra em relação aos problemas soci- blemas sociais concretos e os discute.
ais e não os discute.
4) A Universidade sanciona, com a 4) A Universidade produz uma crítica social,
prática, o modo de relação social e, ao mesmo tempo, uma autocrítica.
vigente.
5) A prática científica é fracionada 5) A prática científica e integrada (integração
em “generalização” que nada têm curricular e interdisciplinar). Os currículos in-
em comum. A complexidade do tegrados tentam captar uma realidade com-
real é fragmentada na visão do es- plexa.
pecialista.
6) A participação estudantil é res- 6) A participação é estimulada.
tringida.
Fonte: DIAS, F. C. Construção do Sistema Universitário no Brasil. CRUB, pág. 113, 1989.

Devido a essa condição de universidade crítica, sua avaliação


não pode estar voltada exclusivamente para um olhar da qualidade edu-
cacional baseado em aspectos funcionais e operacionais, (como número

2Seminário sobre o sistema universitário e a sociedade brasileira, João Pessoa, outubro de


1978. Anais: Brasília, Construção do Sistema Universitário no Brasil. CRUB, 1978, p. 137.

268
DNA Educação

de alunos formados, número de cursos oferecidos, quantitativo de pro-


fessores com a mais alta titulação acadêmica e produção científica ele-
vada), mas deve ser analisada a qualidade educacional pelo comprome-
timento com a comunidade local, através de uma estrutura administrativa
coerente com sua vocação institucional.
Nessa mesma perspectiva, há todo um esforço que vem se
consolidando por parte das universidades brasileiras através da Asso-ci-
ação Brasileira dos Reitores das Universidades Estaduais e Municipais -
ABRUEM3 (2012) para a defesa e a oferta de um ensino de qualidade,
bem como o enfretamento das pressões cada vez maiores dos governos
e da sociedade sobre o retorno do investimento financeiro.
Esse esforço pretende estabelecer estratégias para justificar os
investimentos depositados nas universidades visando à missão de criar
conhecimentos, transmitir a cultura e formar cidadãos capacitados para
contribuir para o bem da sociedade, tornando-se um espaço que passa a
priorizar cinco pilares, como:
1) Modelo acadêmico de pertinência social;
2) Pesquisa e Pós-Graduação;
3) Integração com a comunidade, produtividade e inovação;
4) Mobilidade acadêmica; e
5) Educação a distância.
Contudo, como ressalta Kunsch (1992) a universidade para
promover esses cinco pilares deverá ter sensibilidade e coragem para mu-
dar primeiro internamente, simplificando sua burocracia, criando estru-
turas mais ágeis que contribuam não só para sua consolidação no espaço
geográfico, mas acima de tudo, contribuam para construção do sentido
de pertença, da interação entre os saberes elaborados na acade-mia e pela
coletividade local.
Como elucida Trigueiro (1999) as universidades necessitam pri-
meiro superar os seus principais entraves ciente de que estes não estão

3 A Associação Brasileira dos Reitores das Universidades Estaduais e Municipais - ABRUEM foi
fundada em 1991 por ocasião do XII Fórum de Reitores das Universidades Estaduais e Munici-
pais Brasileiras, na cidade de Maringá, Paraná. Na oportunidade foi aprovado seu Estatuto, o
qual a definiu como pessoa jurídica de direito privado sem fins lucrativos, com sede em Brasília.

269
DNA Educação

fora dela, mas em seu próprio interior em função da adoção de práticas


obsoletas e a dificuldade em adequar-se a um novo contexto de relações
sociais.
Percebe-se que as universidades brasileiras ainda possuem uma
série de barreiras institucionais que enfraquecem o aprimoramento de
sua atuação no contexto em que estão inseridas e principalmente na su-
peração de entraves típicos da ação administrativa.
Por outro, é sabido que essas barreiras se evidenciam, sobre-
tudo, nas dificuldades que o ser humano tem em relação à constru-ção
do diálogo que precisa ser efetuado diante do outro ou o objeto a ser
apreciado. Ou mais ainda, as barreiras se intensificam pela visão errônea
de que capacidade de comunicabilidade consiste simplesmente no ajusta-
mento e acomodação às ideias.
Por estas razões, as universidades devem começar a incorporar
em sua ação administrativa a consistência entre o discurso e prática, pro-
movendo a capacidade reflexiva, ora já defendida por Freire e citadas nas
palavras de Xavier (2009, p. 37) quando adverte:
Quanto mais os homens praticam sua capacidade de refletir
sobre si e sobre sua relação com o mundo e com o outro,
maior será o campo de sua percepção, enxergando coisas
que antes, mesmo se existentes, não eram percebidas por
eles.
Por fim, é preciso reconhecer que a universidade ocupou e
continua a ocupar posição destacada nas sociedades em que se fez pre-
sente. Por exemplo, no século XVI, esteve invariavelmente envolvida
nos principais momentos da história, podendo destacar sua participação
no período Renascentista com a recuperação dos saberes da Grécia An-
tiga, no Iluminismo com as inspirações humanistas e científicas, no sé-
culo XIX; na promoção do avanço técnico, no século XX, para as dis-
cussões acerca dos rumos da Modernidade e do novo aporte tecno-ló-
gico. Ao mesmo tempo a universidade continua tendo um grau de im-
portância na estruturação social, política e econômica do mundo. E mui-
tas vezes com participação efetiva nos próprios rumos da civili-zação
(FÁVERO, 2000).

270
DNA Educação

Assim sendo, o sentido de universidade que é defendido neste


artigo, fundamenta-se na concepção de que essas instituições devem co-
locar-se como espaços de diálogos com as diferenças, respeitando as al-
teridades presentes em seus diversos atores sociais, promovendo as es-
pecificidades das diversas áreas do conhecimento e, acima de tudo, co-
locando o conhecimento, sua tecnologia, seus produtos e serviços e,
principalmente, seus quadros humanos a serviço do conjunto da socie-
dade local, nacional e internacional.
O Modelo da Comunicação Estratégica defendido pelas Escola de
Comunicação de Rosário-UNR e sua aplicação nas Instituições
Universitárias
Assim, após ter conhecimento do trabalho que vem sendo di-
fundido há aproximadamente 25 (vinte e cinco) anos sob a coor-denação
da professora argentina Sandra Massoni4 com sua Metodologia da Co-
municação Estratégica em conjunto com a equipe de docentes5 da Cáte-
dra da Teoria da Comunicação II da Universidade Nacional de Rosário
– UNR/Argentina, foi possível trilhar um percurso reflexivo para emba-
sar este artigo , a partir das contribuições da nova matriz de estilo acadê-
mico-científico, intitulada como da Comunicação Estratégica, na qual a
Comunicação constitui-se uma matriz relacional que passa a ser vista
como:
a) uma capacidade humana de caráter sociocultural que nos
ajuda a sobreviver e a melhor viver mediante a interpretação, comparti-
lhamento e geração de sentidos com os seres com os quais nos relacio-
namos nas organizações; e,

4 Professora catedrática da Escola de Comunicação Estratégica da Universidade Nacional de


Rosário/Argentina, atualmente coordenadora do Mestrado em Comunicação Estratégica e da
Especialização em Comunicação Ambiental da Universidade Nacional de Rosário/Argentina. Já
publicou quinze livros e vinte e sete capítulos de livros dentre os quais: Metodologías de la Co-
municación Estrategica: Del Inventario al encuentro sociocultural (2013). Fonte: <http://www.ten-
dencias21.net/fluido/> Acessado em 15 de julho de 2013.
5 São alguns docentes do Mestrado em Comunicação Estratégica da UNR: Dra. Sandra Massoni,

Dra. Denise Najmanovich, Dr. Luis Jesús Galindo Cáceres, Dra. Mariana Piola, Dra. Nancy Eli-
zabeth Díaz Larrañaga, Washington Uranga, dentre outros. Fonte:<http://www.fcpolit.
unr.edu.ar/wp-content/uploads/16Cuerpo-docente-5-de-marzo.pdf>. Acessado em junho de
2015.

271
DNA Educação

b) um espaço de encontro das alteridades coletivas e que tam-


bém tem como diferencial facilitar a incorporação da ciência da comuni-
cação aos programas e políticas públicas, como elemento estraté-gico de
intervenção das dinâmicas socioculturais.
Dessa forma a Comunicação surge como uma das bases de aná-
lise e consequente estímulo ao diálogo; à orientação e ao consenso; à
integração do fator cultural com reconhecimento das diferenças, bem
como o respeito às identidades.
Todavia, embora haja evidências indiscutíveis que diante da
complexidade do mundo contemporâneo, as universidades acabam
tendo uma preocupação em evidenciar na sua fala oficial que a Comuni-
cação tem se tornado um componente estratégico fundamental para o
êxito organizacional e, por isso que se esforçam para promover canais de
Comunicação mais abertos e intitulado pelas organizações “mais partici-
pativo”.
Entretanto, no dia a dia nem sempre é evidenciado uma coe-
rência entre discurso e pratica da ação comunicacional, ou melhor di-
zendo, a área de Comunicação das universidades, na maioria das vezes
não trabalha de forma estratégica, e dessa forma, mesmo tendo canais
para promover a Comunicação, não conseguem assegurar uma partici-
pação mais efetiva dos atores presentes na organização.
Por isso as universidades devem reconhecer que a estratégia co-
municacional não pode ser conduzida somente com base na fala oficial
realizada pela organização, como por exemplo a comunicação adminis-
trativa, o conteúdo do site oficial da instituição, mas devem sobretudo
ter como referência os atores envolvidos na relação macro e micro social
(Massoni, 2007a).
Os atores de uma universidade muito embora pareçam restrin-
gir-se aos docentes, discentes e técnicos administrativos, os mês-mos
compreendem um público alvo amplo e diversificado e, além da socie-
dade no sentido amplo, compõe-se de cientistas, outras univer-sidades,
entidades sindicais e empresariais, poderes executivo, legislativo e judici-
ário, público internacional, só para citar alguns.

272
DNA Educação

Por outro lado, precisa reconhecer que em cada relação entre


os diversos atores, se operacionaliza uma outra parcela do fluxo de sen-
tidos no âmbito das relações organizacionais onde são atualizadas pelas
conversas nos corredores, na internet (blogs, comunidades virtuais, entre
outros), que contam com especulação, boato, fofoca e/ou manifes-tação
em favor de/ou contra a organização (Baldissera, 2009).
É oportuno evidenciar que para cada um desses atores, se im-
põe o uso de linguagem específica, da popular à científica, de modo que
a mensagem seja transmitida de forma adequada.
A partir do que foi posto até o momento, é mister ressaltar que
a Comunicação também vem sendo guiada por mudanças de paradigmas.
E como evidencia a professora brasileira Scrofernecker (2000), ao anali-
sar as contribuições de Goodal Jr. e Eisenberg (1997) percebe-se que a
Comunicação Estratégica Organizacional vem se consolidando como
aporte teórico a partir de quatro perspectivas:
1) Ato transferência de informação, ou seja, aquela em que é
descrita como transferência de informação que visa promover
o contato entre uma fonte e o receptor;
2) Processo transacional, aquela que utiliza a figura do feedback,
pois busca analisar como a emissão foi recebida e reconstruída
pelo receptor;
3) Estratégia de controle, é aquela em que o operador da Co-
municação busca selecionar estratégias para o alcance dos ob-
jetivos organizacionais; e
4) Equilíbrio entre criatividade e constrangimento /coação /su-
jeição (constraint6), é aquela que trabalha a Comunicação para
mediar as tensões entre as obrigações organizacionais e sua ca-
pacidade criativa (creativity7) de resolução de problemas.
Desta maneira, para que ocorra uma efetiva Comunicação Es-
tratégica nas organizações, e neste caso, nas universidades que são insti-
tuições reconhecidas como espaço de excelência na produção de conhe-
cimento, de formação profissional e promoção do progresso econômico,
político, cultural e social do país, faz-se necessário refletir como melhorar

6 Expressão que na língua portuguesa refere-se à “o que deve ser feito”.


7 Expressão que na língua portuguesa refere-se à “o que se deseja fazer”.

273
DNA Educação

a comunicação da Universidade com a sociedade em geral e com os vá-


rios públicos específicos e também como transmitir para a sociedade a
produção de uma Universidade que opera em todas as áreas de conheci-
mento.
Vale ressaltar que para Massoni (2007b) a Comunicação Es-
tratégica também implica trabalhar tanto os aspectos:
a) simbólicos (mensagens, palavras, imagens, textos e etc.),
b) aspectos materiais (práticas comunicacionais, rotinas pro-
dutivas, canais e etc), e
c) afetivos (interesses e necessidades).
Assim, para que a Universidade tenha êxito na sua ação orga-
nizacional, é preciso trabalhar a Comunicação como processo aberto e
de permanente sentido, ou seja, que viva a conectividade, respeitando as
alteridades, considerando as consequências da temporalidade, tanto so-
bre o pensamento, como sobre a ação comunicativa (CÁCERES, 2012).
Dessa forma, a Universidade deve pautar suas práticas comuni-cacionais
refletindo o respectivo modelo conceitual de Comunicação Estratégica
desenvolvida pela Escola de Comunicação da UNR esque-matizado na
figura a seguir:
Figura 1: O Modelo Conceitual de Comunicação Estratégica.

Fonte: Adaptado por Lorena Uría (SALVADOR, 2014) a partir de Massoni (2007a)
Assim, evidentemente como ressalta Massoni (2007b), a Comu-
nicação no mundo organizacional só será de fato estratégica no mo-
mento em que cada setor/departamento se disponibilizar, por meio de

274
DNA Educação

seus atores e considerando, naturalmente, seus interesses e neces-sidades


atuais, à capacidade de “poder e querer escutar”. Para assim definir qual
a problemática prioritária que se deseja transformar e superar, pois o
grande êxito da Comunicação Estratégica é justamente sua capacidade
de integrar, tanto a Comunicação interna, como a interinstitucional e ex-
terna.
Certamente para que haja um efetivo engajamento de toda a
comunidade da Universidade em seus diversos níveis, unidades, departa-
mentos, docentes, discentes, funcionários e a sociedade em geral, pro-
põe-se a implantação da Metodologia da Comunicação Estratégica, de-
talhada suas etapas no esquema descrito a seguir.

Figura 2 – Metodologia da Investigação Enativa proposta pela Escola de Comunicação


de Rosário/Argentina.

Fonte: Figura construída pela autora a partir de dados disponibilizados em Massoni (2013).

Percebe-se que o sentido de Comunicação Estratégica elu-ci-


dado neste artigo não tem a pretensão de constituir–se como resposta

275
DNA Educação

absoluta para todos os problemas enfrentados pelas universidades. To-


davia, visa contribuir para que as universidades acabem logrando êxito
em um dos célebres dilemas, que é justamente a sua capacidade de esti-
mular a participação mais efetiva da comunidade (interna e externa) no
tocante à resolução de seus problemas e ao alcance da eficiência e eficá-
cia organizacional.
Isso porque as universidades, ao desenvolverem aplicação dessa
metodologia, possibilitam o exercício um modelo de Comuni-cação que
combina a consistência do discurso com a prática da escuta empática, ou
seja, uma Comunicação mais assertiva, mais dinâmica, de participação
ativa, da motivação e integração de equipes (SALVADOR, 2014, p. 6)
Considerações Finais
O presente artigo defende que não é mais possível que as uni-
versidades, simplesmente em busca de visibilidade e legitimação para ga-
rantir o alcance da eficiência, eficácia e efetividade, acreditem que por
disponibilizar canais de comunicação ditos “mais abertos” e intitulados
pela estrutura diretiva como “mais participativos”, vão assegurar uma
participação mais efetiva entre os atores sociais e assim promover os
ajustes que a universidade necessita.
Por meio desta abordagem da Comunicação, mais do que per-
mitir uma aproximação entre os sujeitos, as universidades devem criar
espaços, onde todas as vozes sejam legítimas, onde se aceitem as dissi-
dências, buscando pontos de encontro a partir da identificação das ma-
trizes socioculturais e das diversas dimensões que a comunicação deve
passar assumir e, assim as construções das dinâmicas sociais possam ser
vistas como uma oportunidade de transformação social (MASSONI,
2009).
Por fim, apresenta-se algumas constatações:

 Que toda política de Planejamento Estratégico não deve mais ter como
prioridade concentrar-se na superação de conflitos, e sim na melhoria do padrão de
conectividade, de articulação com a trama social. Ou seja, criar e melhorar oportuni-
dades de articulação a partir do reconhecimento de diversas e parciais convergências
que possam complementar as alteridades socioculturais presentes em uma situação co-
municacional.

276
DNA Educação

 Que a Comunicação deve ir além de ter como objetivo a implementação


do paradigma clássico-informacional que contribui para a persuasão e conscientização,
mas também assumindo novas dimensões que possibilitem a negociação, o diálogo, a
socialização, a transformação e muitas outras configurações;
 Que uma Universidade, ao implementar uma Comunicação Estraté-
gica, deve ter a consciência de que é responsabilidade de todos e não exclusivamente da
equipe de Comunicação, pois a universidade deve trabalhar a partir de uma análise
contingencial e situacional, abrigando em suas reflexões os distintos campos discipli-
nares que estão associados às diversas matrizes socioculturais pertinentes aos aspectos
do problema, isto quer dizer, primeiro buscar o encontro dos saberes disponíveis a
serem trabalhados, e segundo, buscar propiciar o encontro dos atores que participam
do ambiente micro e macrossocial da universidade, e,
 Que as Universidades não devem ter como pauta para melhoria de sua
Comunicação a criação de comitês ou de grupos de trabalhos, uma vez que os vínculos
gerados, além de terem um período curto de duração, acabam por sua vez não captando
em seus discursos os reais interesses e necessidades dos atores. Por isso que a tarefa de
dinamizar a Comunicação deve ser de toda a comunidade, promovendo uma conver-
sação macrossocial que interpele os diferentes atores e trabalhando com aqueles que se
relacionam com maior ou menor grau com os problemas que afetam a universidade.

277
DNA Educação

Referências
ABRUEM. Associação Brasileira de Reitores das Universidades Estadu-
ais e Municipais. Políticas e Gestão da Educação Superior no Brasil.
Fórum Nacional do CNE. Brasília/DF- 2012. Disponível em <
http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_do-
cman&task=doc_download&gid=12077&Itemid=>. Acessado em 15
de março de 2015.
BALDISSERA, Rudimar. A teoria da complexidade e novas perspec-
tivas para os estudos da Comunicação Organizacional. In KU-
NSCH, Margarida M. Krohling (org). Comunicação Organizacional:
históricos, fundamentos e processos, volume 1. São Paulo: Saraiva, 2009.
BALDISSERA, Rudimar. Reflexões sobre Comunicação, Relações
Públicas e Complexidade. In I Congresso Brasileiro Científico de Co-
municação Organizacional e de Relações Públicas. São Paulo:
ABRAPCOR/Eca/USP, 2007.
BERNHEIM, Carlos Thunnermann; CHAUÍ, Marilene de Souza. De-
safios da universidade na sociedade do conhecimento: cinco anos
depois da conferência mundial sobre educação superior. Brasília:
UNESCO, 2008.
CÁCERES, Jesús Galindo. Comunicología y Ingeniería en Comuni-
cación Social de conflito y la articulación. Apuntes para un programa
de trabajo en comuniconomía de la Comunicación Estratégica. Reflexión
Epistemológica. El Colegio de Jalisco, mar-ago, 2012.
DIAS, F. C. Construção do Sistema Universitário no Brasil.
CRUB,1989.
DIAS SOBRINHO, José. Dilemas da Educação Superior no Mundo
Globalizado. Sociedade ou Conhecimento ou Economia do Co-
nhecimento? São Paulo: Casa do Psicólogo, 2005.
EISENBERG, Eric M. GOODAL JR, H. L. Organizational Commu-
nication: balancing creativity and constraint. 2ª ed. New York (USA): St.
Martin’s Press, 1997.
FÁVERO, Maria de Lourdes de A. Universidade do Brasil: das ori-
gens à construção. Rio de Janeiro: Universidade Federal do Rio de Ja-
neiro, 2000.
FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. 46ª Ed. Rio de Janeiro: Paz
e Terra, 2005.
______________. Educação e Mudança. 6ª Ed. Trad. Moacir Gadotti e
Lilian Lopes Martin. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983.

278
DNA Educação

GEORGEN, P. Universidade e Responsabilidade Social. In: J. C.


Lombardi (org.) Temas de Pesquisa em Educação, p. 101-121. Campinas:
Autores Associados, 2003.
KUNSCH, Margarida Maria Krohling. Universidade e Comunicação
na edificação da sociedade. São Paulo: Editora Loyola, 1992.
MASSONI, Sandra. Metodologías de la Comunicación Estratégica:
Del inventario al encuentro sociocultural. 1ª ed. Rosario: Homo Sapiens
Ediciones, Faculdad de Ciencia Política - UNR, Argentina e Benemérita
Universidad Autónoma de Puebla, México, 2013.
______________. Comunicación Estratégica – Comunicación para la
innovación. 1ª ed. Rosario: Homo Sapiens Ediciones, 2011.
______________. Comunicación Estrategica: Somos seres en-red-dán-
donos. FISEC – Estratégias, v1, ano V, nº 12, pgs. 3-24, 2009.
______________. Estrategias - Los desafíos de la comunicación en un
mundo fluido: Homo Sapiens Ediciones. Rosario, Argentina, 2007a.
______________. Modelo de Comunicación Estratégica. Versión de
Tres Movimientos y Siete Pasos para comunicar estratégicamente, Homo
Sapiens Ediciones. Rosario, Argentina, 2007b.
______________. Estratégias de comunicación: una mirada comunica-
cional para la investigación sociocultural en Recepción y mediaciones.
Casos de investigación en América Latina. Enciclopedia Latinoameri-
cana de sociocultura y comunicación, Orozco Gómes Guillermo (co-
ord.). Buenos Aieres/Venezuela: Grupo Editoral Norma, 2002.
______________. Estrategias de comunicación: tiempo de investigar-
nos vivos. Revista Comunicación y Sociedad Nº37, Universidad de Gua-
dalajara, México, 2001.
MORIN, Edgar. Os sete saberes necessários à Educação do Futuro.
8ª edição. São Paulo: Cortez; Brasília, DF: UNESCO, 2003.
PINTO, Álvaro Vieira. A questão da Universidade. São Paulo: Cortez:
Autores Associados, 1986.
RIBEIRO, Darcy. A Universidade necessária. Rio de Janeiro: Paz e
Terra, 1982.
SALVADOR, María Lorena Uría. Training de Comunición baseado
en el modelo estratégico de Sandra Massoni. Dissertação (Psicologia
Organizacional). Pontífica Universidade Católica de Ecuador: 2014.
SCROFERNECKER, Cleusa Maria A. Perspectivas Teóricas da Co-
municação organizacional. Associação Latino-Americana de Investi-
gação em Comunicação, 2000.
SOBRINHO, José Dias. Concepções de universidade e de avaliação
institucional. In: Universidade em ruínas: na república dos professores.

279
DNA Educação

Hélgio Trindade (org.) Petrópolis: Vozes/Rio Grande do Sul: CIPE-


DES, 1999.
SOUZA, José Carlos Victorino de. Gestão Universitária em Institui-
ções Particulares: Os documentos institucionais como indicadores do
modelo de gestão. Tese (Doutorado) Pontifícia Universidade Católica de
São Paulo. São Paulo, 2007.
TEIXEIRA, Anísio. Educação e universidade. Rio de Janeiro: UFRJ,
1988.
TRIGUEIRO, Michelangelo Giotto Santoro. Universidades públicas:
desafios e possibilidades no Brasil contemporâneo. Brasília: Editora
da Universidade de Brasília, 1999.
____________A avaliação institucional nas universidades brasileiras: di-
agnósticos e perspectivas. CRUB: Brasília, 1998.
WALTON, Dominique. É preciso salvar a comunicação. São Paulo:
Paulo ,2006.
XAVIER, Rosineide Barbosa. A Compreensão do Diálogo segundo
o pensamento de Paulo Freire: Uma proposta de valorização do hu-
mano. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC –
SP), 2009.

280
DNA Educação

281

Das könnte Ihnen auch gefallen