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ANNO" rAULO, 4 DE JUNHO DE 1921 NUMERO 6

ANOVELLA
SEMANAL

BREVEMENTE: " A NOVA P L E I A D E "


COLLECÇAO de pequenos livros de versos a CADA volume, caprichosamente confeccionado,
se publicar sob a direcção de Amadeu Ama- impresso a duas cores em excellente papel,
ral (da Academia Bra slieira) e destinada a com artísticos ornatos e solidamente enca-
vulgarizar as obras dos poetas novos de dernado, será vendido a 2S500.
grande merecimento, ainda pouco conhe- Na NOVA PLEIADE somente serão publica-
cidos do publico. das obras de verdadeiro valor.
Iniciaremos a collecção com o primoroso livro MANHA do poeta paulista Graccho Silveira
SOCIEDADEjEDITORA OLEGARIO RIBEIRO - RuaJDr. Abranohes, 43 — Caixa, 1172 — S. Puniu *

lOr FnrrORA orKfiARIORIBEIRORiyABRANrHFSAVSPATTI O

_,, _. J
A NOVELLA SEMANAL DIRECTOR BRENNO FERRAZ

PUBLICA SE A O S SABBADOS
Tara os 30 milhões de brasileiros, mesmo desconta- VELLA SEMANAL se propõe a salvar do olvido as me-
dos os analphahetos, as tiragens dos livros nacionaes lhores paginas esgotadas e as sepultadas em collecoões
são ridículas. E as edições pequenas encarecem o li- de jornaes e revistas — preciosidades que representam
vro, limitam-lhe a expansão, impedem a razoável remu- um opulento thesonro literário quasi de todo desconhe-
neração dos auctores. Vivemos, assim, num circulo vi- cido e inaccossivel. Das obras ainda em extracção no
cioso : o livro não se difiunde entre nós porque é caro mercado livreiro, destacará — a exemplo do que se faz
e é caro porque não se difiunde. Isto succede com o em vários paizes, em anthologias de grande e pequeno
livro bom, pois dos de fancaria se_ tiram por ahi deze- tomo, didaoticas e populares, e em publicações periódicas
— as que sejam a melhor mostra do livro e do auctor,
nas de milhares e se esgotam edições sobre edições . . . de sorte a despertar nos leitores o desejo de ler os li-
Esta situação, de tão funestas conseqüências para o vros que, sem esse reclame, muitos provavel-
paiz, suggeriu a iniciativa da creação deste periódico, mente nunca leriam. E isso fará fornecendo ao mesmo
que representa um esforço no sentido de vulgarizar a tempo todas as indicações precisas para que _ qualquer
boa literatura. pessoa possa fazer encommenda, ao seu livreiro ou di-
Popularizar o livro, tornal-o accessivel a todos, sem rectamente ao editor, da obra da qual se apresentou
descuidar de o fazer ao mesmo tempo o mais attrahente aqui uma pequena amostra e das outras obras do mes-
possivel pela êscrupulosa escolha da matéria e pela ar- mo auctor. Esta publicação constituirá, portanto, ao
tística confecção de cada volume, e depois usar de to- mesmo tempo que uni abundante repositório de infor-
dos os meios para o diffundir em todo o território na- mações bibliographicns, uma selecta do pequenas obras
cional, de fronteira a fronteira, e entre todas as classes excellentes, organizada com o fito da tornar melhor co-
sociaes, desde as mais cultas ás menos letradas — eis nhecida a nossa literatura, dentro das nossas próprias
ahi, resumido em poucas palavras, todo o nosso pro- fronteiras.
gramma. Não viveremos, porém, de alheia seiva. Teremos a
Participando ao mesmo tempo da natureza do livro ; nossa collaboração especial, de um punhado dos mais
e da revista, A NOVELLA SEMANAL pretende reunir notáveis escriptores contemporâneos e acolheremos com
I as vantagens desta e daquelle : como a revista, será de prazer — e remuneraremos — todos os trabalhos inte-
' leitura leve e variada, será vendida a preço Ínfimo, será ressantes q u e n o s sejam enviados por auctores conheci-
apregoada nas ruas, nas estradas de ferro, em toda par- , dos e desconhecidos, consagrados e estreantes,comtanto
te, a toda gente ; mas nSo será futil e de interesse e- une taes obras tenham valor e sejam conformes com a
phemero como ella : pelo fundo — pela qualidade e pela feição d'A NOVEILA, isto é, que tenham pequena ex-
i extensão da matéria — constituirá uma verdadeira série tensão e possam ser lidas por toda gente.
ide pequenos livros, que se encadernarão no lim de cada Preferimos dar maior desenvolvimento á edição do
trimestre, em bellos volumes com os quaes se formará conto e da novella nestes volumes, por serem esses os
; uma bibliotheca literária realmente preciosa. gêneros que contam, entre o publico, maior numero de
Pretendendo ser lida, muito lida, lida por homens apreciadores. Mas não nos restringiremos a elles, em-
e creanças, senhoras e moças, ricos e pobres, letrados e bora delles tenhamos tirado o titulo desta publicação.
icuriosos, pela totalidade, emfim, da população ledora, Todos os outros gêneros terão o seu logar no nosso
procurará nos auctores a vida, a.acção, o interesse, de supplemento, verdadeira gazeta literária de pequenas
•modo a constituir o verdadeiro livro popular. proporções, onde se encontrará um pouco de tudo e só
Destinando-se a se tornar um instrumento de pro- do melhor.
paganda das boas letras — dos melhores auctores e dos Eis ahi ao que vem A NOVELLA SEMANAL, que
melhores livros nacionaes — não se limitará a publicar se colloca á disposição do publico, dos auctores e dos
trabalhos inéditos. Não seria este o melhor meio de se editores, aos quaes deseja servir e dos quaos espera re-
• cumprir esta parte do programma traçado, havendo por ceber um acolhimento sympathico.
ahi, esquecida e ignorada da maior parte do publico,
tanta cousa optima a pedir um editor. Assim, A NO- O s EoiTORICS.

Aos auctores / queiram nos auxiliar neste trabalho


Acceitaremos com prazer toda col-
laboração interessante para qualquer
Aos leitores que nos enviem relações do auctores
das secções deste periódico. A NOVELLA SEMANAL ambicio- e de livros publicados, de modo a nos
Os auctores devem nos remetter os na ser lida em toda parte : cidades, habilitar a adquirir os volumes para
seus trabalhos, declarando o seunome, villas, povouções. estradas de ferro, os examinar.
endereço e o preço pelo qual nos of- navios, hoteio, clubs, bibliothecas, e t c ,
ferecem a sua collaboração. estando porisso organisando um ser- Importante
Os originues devem ser escriptos de viço de distribuição que será o mais Toda pessoa que angariar três assi-
um só lado do papel, em calligraphia completo possivel, de sorte a não ha- gnaturas d'A NOVELLA SEMANAL,
bem legível e de preferencia dactylo- ver ponto do território nacional onde enviando-nos adeantadamente a res-
graphados. não "tenha leitores e não seja encon- pectiva importância, terá direito a
Toda a correspondência deve ser trada á venda. P a r a obter este resul- uma assignatura gratuita.
endereçada á Sociedade Editora Ole- tado contamos com o auxilio dos A toda pessoa que angariar qual-
gario Ribeiro -- Caixa postal n. 1172 nossos leitores, aos quaes pedimos que quer numero de assignaturas d'A NO-
— S. Paulo. nos indiquem endereços de livrarias, VELLA SEMANAL offereceremos a
agencias e vendedores de jornaes e titulo de brinde, livros, escolhidos no
Aos editores pessoas e instituições que possam se
interessar pela venda ou leitura des-
catalogo de qualquer livraria do Bra-
A NOVELLA SEMANAL publicará sil, no valor de 20 o/o sobre o preço
com prazer, e gratuitamente, o titulo, te periódico em qualquer localidade, total das assignaturas angariadas.
nome do auctor, preço e nome e en- por insignificante que seja.
dereço do editor, de todas as obras Interessados também em conhecer
editadas no Brasil, bastando para isso os escriptores e poetas de mérito de Assignaturas
que os editores lhe enviem aquellas todos os Estados e de todas as epoeus, Anno . . . 20$000
indicações. afim de lhes poder divulgar a obra. . . 10$000
De todas as obras das quaes lhe for muito agradeceremos qualquer indi- Semestre
remettido um exemplar, publicará a- cação que a este respeito nos seja Trimestre . . . 5$000
lém disso uma noticia critica. fornecida, rogando a todos quantos Numero avulso . . . . $400

SOCIEDADE EDITORA OLEGARIO RIBEIRO-R. Dr. Abranches, 43 Caixa Postal, 1172-Teleph.: Cidade, 5441-S.PAULO
ANNO I A N O V E L L A SEMANAL São P a u l o , 4 de Junho de 1921 NUMERO 6

PREÇO DE S A N G U E
Jorge Falleiros.
- SDMMARIO Simões Pinto — Louren-
" ço Filho.
ÇS VÍCIOS DELLES . - . - Vida literária — O parado-
Julia Lopes de A l m e i d a . x o da cultura. — A . M.
SUPPLEMENTO — A vida
CLARINHA D A S R E N D A S ECONOMIA DOMESTICA anecdotica e pittoresca Curiosidades literárias —
— Mario Sette. — Euclydes A n d r a d e . dos grandes escriptores Versos. — J o ã o Ribeiro.

PREÇO DE SANGUE
A antiga fazenda do Domingos Nunes agaoha-se dias de calor. Encostado duma banda, permanecia
num descampado, esparrimada nos flancos de um inerte o tear. Rocas desmanteladas jaziam para
declive que verte para um riacho. os cantos. No meio dos- trastes abandonados, em
Tem o aspecto sen.il duma tapera. As paredes desordem, como os destroços dum naufrágio, so-
denegridas, o madeiramento pesado, o telhado brenadava uma argola de ferro com duas hastes
ennegrecido e escabroso dão' aquella decrepitude como chifres, trazendo guizos nas pontas. Ao mo-
architectonica os ares torvos dalguma cousa morta. do de canga chineza, ia ao pescoço das fujonas
Para os fundos se mostra o quintal, no verde que costumavam varar matto. A parca luz, que
fosco das laranjeiras a enfeitar debalde sua ve- entrava pela única janella aberta e também enca-
lhice com as flores de noivado que todas rada pelo corredor que ia ter á cosinha, dava a
se desprendem á mais fagueira viração da tarde. tudo uns ares de sombra e de mysterio. O vasto
Na frente, o curral de aroeira fincada e o chão compartimento offerecia sahida a outros aposen-
duro do terreiro. Junto da porta, um montão de tos, cujas portas, fechadas desde muitos annos,
pedras á guiza de escadaria. A porta, muito gros- enclausuravam almas penadas e morcegos que a-
sa e perra nos seus gonzos ferrugentos, dá ac- tordoavam a casa, pela noite a dentro, com uma
cesso a uma sala desguarnecida e vasia. Apenas algazarra infernal. Junto da escada de madeira,
[alli se notam uma grosseira mesa de cerne, dois lisa pelo uso constante, arrumada á parede, Do-
i bancos duros de taboa e uns arreios de couro, mingos Nunes parou meditabundo, como atando
amontoados a um canto. a idéa da escada ás outras que tivera á ja-
|s A urna janella lateral, um velho magro, Domin- nella, em frente do paiol. Alli estava ainda
gos Nunes, estava olhando para os lados do paiol. no mesmo logar a maldicta escada, aquelle ins-
Um pouco além, subsistiam ainda uns destroços trumento de supplicios para as pobres captivas;
de senzala. ligadas debruços a ella, dos pés á cabeça, como
A tarde declinava. Domingos Nunes, como se numa cruz, supportavam entre gemidos a brutali-
o invadisse uma tristeza immensa, á vista do dade da pancadaria. Junto do moirão, aquém
paiol arruinado, arrancou-se dalli e, arrastando os da senzala, ainda se achava a sepultura anony-
passos pelo assoalho de grossas pranchas de pe- ma daquella mestiça que sucumbira aos golpes
roba, enveredou para o salão, onde outr^ora as do azorrague. Domingos Nunes chamou para
.africanas laboriosas trabalhavam nos interminos dentro, na sua voz asthmatica:
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— Escrava! ficava tranzido de agonia. Todo barulho extra-


Outra voz também asthmatica respondeu: nho o congelava de susto. Já era noite fechada
— Sinhô . . . quando elle se recolheu ao quarto junto da sala.
E á bocca do corredor assomou uma annosa Accendeu a candeia, abriu a janella e derreou-se
creoula, meio coxa : no parapeito. Soffria de insomnia. Antes de con-
— Veva! ciliar o somno não arredava d'alli, -a olhar os
— Sinhô . . . astros como um cão de guarda. Naquella noite
— Ainda resta lenha para o lume ? estava preocupado com recordações dolorosas.
— Sim, s i n h ô . . . Depois de ficar assim uma hora esquecida, a ab-
— Leva também esta escada para queimar. sorver a aragem e o silencio, começou a sentir
— Sim, sinhô . . . um tremor exquisito nas carnes. Súbito pare-
Sahindo difficultosamente LOIII o traste, Geno- ceu-lhe ouvir uma voz semelhante á sua dizer-lhe
veva murmurava entre dentes, benzendo-se: ao ouvido o seu nome:
— Credo! Sinhô parece capeta ! Raias de san- — Domingos Nunes!
gue nos olhos! Sinhô não tarda morrer! . . . Todo tremulo e reprimindo a respiração, despre-
Veva estava livre, mas em Domingos Nunes goú-se da janella e se recostou á parede como
era tão entranhado o sentimento daquella pro- temendo que uma alma do outro mundo o as-
priedade que não a tratava como tal. Depois, saltasse pelas costas. E que, na pressão do medo
ella mesma tinha, por instincto e habito, Ín- que sentira, não viu que fora elle mesmo quem
dole por demais servil; no dia 13 de Maio de pronunciara o próprio nome. Mas, como reinasse
1888, rejeitara a liberdade. Prezava-a menos do depois um silencio de pedra, começou a recupe-
que a honra e esta lhe fora extorquida por aquel- rar a tranquillidade, imaginando:
le homem cruel. Pouco se lhe dava agora pas- — Foi o vento . . .
sar o resto da vida sob o seu jugo. Por orgu- Teve então uma idéa que já o salvara em e-
lho e por despeito renegara aquella liberdade guaes conjunturas, para dissipar as sombras do
tardia. Os filhos que nasceram da sua deshonra e espirito: — abrir o seu bahú — porquanto na-
das suas dores, ella os vira partir, um a um, nos da o distrahia mais do que mirar e remirar, con-
balaios, em cargueiros, vendidos como vis ani- tar e recontar o dinheiro que rendera a venda
maes. A sede de fortuna fizera do seu senhor um dos seus filhos. Foi á canastra, tirou o bahú,
deshumano. E não fora só ella a victima; todas as approximou a candeia, espalhou sobre a cama os
suas companheiras de escravidão foram também pacotes embolorados de papel-moeda. E contou
sócias do mesmo infortúnio. Por tudo isso, por toda .mentalmente :
aquella deshonra e por toda aquella revolta que — Onze maços de cinco contos de reis!
sentia dentro d'alma, Veva sardonicamenle prefe- E accrescentou depois duma demora:
rira ficar junto do déspota, alimentando a espe- — Tudo preço de sangue ! . . .
rança de se vingar um dia. Vingar-se terrivel- Ngsse mesmo momento explodiu lá dentro a
mente, povoando de phanrasmas e assombrações sarabanda das almas perdidas. Gemidos, vozerio,
o fim da vida do velho fazendeiro. Ainda na pancadaria, ranger de ferros. Domingos Nunes,
execução do seu plano sinistro lá estava ella car- pallido de espanto, poz-se a rezar. O alarido ces-
comida pelos annos, emperrada pela dor do sou por uni instante. Foi quando elle ouviu no fundo
rheumatismo que lhe torturava os ossos. Sentia do grande compartimenío das escravas um arras-
dentro em si a morte! tar vagaroso de chinellas. E aquelles passos ca-
Também o velho parece que a percebia, a negra minhavam para elle, trazendo atravez da casa
parca, enganchada nos seus hombros. Naquella uma voz horrível a engrolar uma lingua estapa-
tarde vieram-lhe certos caprichos de quem vae fúrdia que elle não entendia. Pareceu-lhe conhe-
morrer. Havendo escutado o gemido cavo do cer a voz, que era de mulher, mas a linguagem
monjolo, a mourejar, pilando arroz, fel-o parar. como era extranha! devia vir do inferno...
Tendo visto pendurado na varanda o sino que Tendo atravessado o vasto salão, parou á sua
em outros tempos servira para reunir, e/n deter- porta, monologando muito tempo naquella mo-
minadas horas, o seu harem negro, desprendeu-o notonia desconcertada do sotaque africano. Se
d'alli a muito custo e o depositou a um canto. entrasse! Mas não entrou. Calou-se é voltou so-
Aquelle sino, ás vezes, alta noite começava a ba- bre os passos, ao arrastar socegado dos chinellos.
dalar tristemente. Nessas horas, Domingos Nunes Houve um silencio. Domingos Nunes tremia.:
A NOVELLA SEMANAL 91

Tomado de sobresãlto arrebanhou a dinheirania um esforço supremo e achegou o lume aos paco-
no bahú e metteu tudo no esconderijo. Depois, tes embolorados è sujos.
agarrando a'candeia, sahiu do quarto. Viu ainda Um clarão sangrento illuminou o quarto.
na escuridão um vulto, como sombra envolta na Domingos Nunes, inteiriçado no seu catre, ex-
sombra, emboccando pelo corredor. Não gritou tendendo os braços ao estalar dos ossos, os olhos
pela escrava: teria, medo da sua própria voz. A- arregalados para o tecto, resmungava numa an-
pegou-se mais á claridade que tinha nas mãos, ciã desesperada:
como se aquella luz mesquinha desmanchasse to- — Preço de sangue...
dos os espectros. Cobrou animo e avançou. Te-
S. Paulo, 1921. jOROE FALLEIROS
mendo sempre pelas costas, sorfdava, com os
olhos èsbugalhados, as trevas em redor. Chega-
do ao quarto de Veva, fez um esforço e chamou:
— Veva!
— Sinhô . . .
*' — Vem para o meu^ quarto . . . traz a tua cama.
A negra, temerosa, agarrou o colchão de palha
e seguiu o seu senhor. Em chegando, extendeu
a enxerga no assoalho e deitou-se.
— Veva!
os vícios DELLES...
Quatro horas da tarde. Izidora acaba de ser-
— Sinhô . . . vir chá com bolos ás suas amigas Magdale-
— Eu vou morrer ? na, Luciana e Martha. O gato preto Nhônliô
persegue no chão as sombras movediças da
— Não morre, não, s i n h ô . . . trepadeira da janella, de folhas chatas como
Domingos Nunes estirou o corpo sobre o lei1- borboletas. As senhoras palestram.
to, ao estalar dos ossos, como um cadáver. Rei- Izidora — Qual é o vicio que as mulheres
nou a solidão. Fora a água da bica querelava sem perdoam com mais facilidade aos seus maridos ?
descontinuar, despejando-se no poço do monjolo. Luciana — O do fumo.
À noite já ia muito adiantada quando um chama- Martha — Dizes isso porque és casada com
do roufenho interrompeu o silencio: meu irmão, fumante tão incorjrigivel que nem pa-
— Veva! ra dormir tira o charuto da bocca. Também
Ella dormia. Chamado mais forte: por isso está ficando com o bigode manchado,
,. — Escrava... Escrava . . . crestado, e com os dentes amarellos, como as te-
— Sinhô... clas de um piano martelado por muitas gerações.
— Vae aquella canastra, no canto. Se soffresses do fígado, como eu ou não o bei-
Ella cumpriu a ordem, Ievantando-se devagar e jadas nunca na bocca, ou já terias morrido. O
recéiosa. tabaco é um veneno, de uso grosseiro e conse-
— Arranca fora o b a h ú . . . Traz a candeia. qüências terríveis; basta lembrar que o cancro
'• A negra se approximou com o bahú e a candeia. na lingua é quasi sempre produzido por elle. De
mais a mais dispendioso, porque o havana é um
í — Abre!
luxo caro, que arruina a bolsa e o organismo, de
Escancarou o bahú, apalermada ao ver tanta uma assentada. Não era atoa que Alfonse Karr
riqueza de papel pardacento... af firmava: . .
"~ Põe no chão e ateia fogo ! " Fumer est un des plaisirs les plus betes et le
;> E elle accrescentou como uma idéa fixa: plus couteux."
— Tudo preço de sangue... Não sei si é dos mais estúpidos, mas é o mais
A velha africana começou a chorar. Lembrou- constante de' todos os vicios, porque é de todas
se dos filhos, lembrou-se de t u d o . . . E soluçava: as horas, e o que mais rouba a energia e a in-
!,,, — Não queime, nãofsinhô, não queime, não... dependência dos homens. Um fumante sem ta-
Sf— Obedece! baco é um homem inútil. Roubem-lhe-a cigar-
* A esse mando imperioso, Genoveva dobrou a reira e roubar-lhe-ão as idéias e a disposição do
cerviz. Numa longa obediência e numa longa trabalho. O fumo é um vicio que escravisa, que
servidão habituára-se a servir e obedecer. Fez nullifica, que toma para si todas as faculdades
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productivas dos indivíduos. Senão, vocês reparem: Luciana — Qual reacções! Nos intervallos de
tal ou tal mathematico, e isto para citar homens descanso o jogador não pensa senão em recome-
affeitos a abstracçõés, sente-se positivamente inca- çar o jogo; vive assim numa perenne anciedade,
paz de resolver problemas, que em outras cir- devorado por ambições, gasto por noitadas con-
cumstancias lhe pareceriam fáceis, se, ao metter a secutivas e toda a espécie de desordens physicas
mão no bolso á cata do cigarrinho, verificar que e moraes.
o deixou em casa, a uns tantos kilometros de O jogador é quasi sempre fraco de caracter,
distancia. A essa catastrophe o cérebro nega-se a supersticioso, desconfiado, casmurro . . . Para elle,
qualquer trabalho digno. O despotismo do cigar- gloria, família, trabalho, amor, tudo se dilue
ro é mil vezes maior que o do czar de todas nas duas cores dos quatro naipes de um baralho
as Russias, porque elle escravisa e submette á e na rapidez dos minutos na roleta do azar'...
inacção mais desesperadora o próprio pensamento ! Felizmente, o marido aqui de Martha é apenas
Ha escriptores que só produzem, ao sabor e ao um dilettanti, não é um profissional; entretanto,
atordoamento de cigarros consecutivos; o cigar- supponho que ella se deva aborrecer, porque ne-
ro entra assim a fazer parte integrante do seu cessariamente elle preferirá ir jogar o poker no
ser moral. Ah ! ao cigarro é que eu não perdôo seu club a leval-a aos espectaculos, ás recepções
nada. Elle é a expressão reles, malcriada, de vi- das amigas ou a lêr alto para ella ouvir, em ca-
cio barato, uma coisa Ínfima, que entrou para as sa, os romances do Eça ou do Machado de Assis...
rodas superiores, como certas criadas de servir A mulher de um jogador aferrado é uma vic-
entram para a aristocracia — levadas pelo capri- tima ignorada no silencio das noites, curtindo
cho de alguns homens de gostos depravados. saudades do passado e sustos pelo porvir, sempre
Não conheço nada mais petulante do que um com medo de vêr entrar o marido em casa ar-
cigarro, e quanto mais ordinário é, mais se ac- ruinado ou louco, ,quándo não volte cadáver, nos
centua nelle essa qualidade aggressiva. Vocês braços de parceiros mais felizes...
talvez não acreditem, mas a verdade é que cada Se o fumo estraga a saúde em picadellas len-
vez que eu encontro um collegial meninote de tas de alfinetes, que transformam o figado e o
cigarrinho na bocca, sinto vontade de cuspir; e baço em colchões velhos e informes, o jogo muti-
notem que eu não faço tal coisa senão por en- la-a de pressa a machadadas fundas e bem vibradas.
jôo ou por doença. Esse acto é, portanto, de- E' uma paixão com sopro de vendaval, que tu-
terminado em mim por uma impressão de repug- do leva diante de si, essa do jogo e a que mais
nância e de vexame, que não sei reprimir. E alheia o homem da sua família e dos seus deve-
é talvez porque de todos os vicios esse é o mais r e s . . . Ante a tentação de um tapete verde — a
generalizado e de que se abusa com mais desfa- honra é um espectro de papelão e o amor uma
çatez, que eu tanto o abomino. Felizmente, meu phantasia de crianças... De sério e de i interes-
marido não fuma. Quando o beijo é como se sante no mundo só ha os dados do a z a r . . .
beijasse uma criança. Seria esse o vicio que eu menos perdoasse a
Luciana — Deus me livre. Que horror! um homem, se ainda não houvesse outro peor...
Martha — Eu não lhe perdoaria a bocca amar- Izidora — As mulheres?
ga, os pellos do bigode queimados, o hálito es- Luciana —- Não! O vinho.
tragado, as unhas côr de â m b a r . . . Martha — Esse é torpe.
Magdalena —- Pois eu gosto do cheiro do ta- Magdalena — E' bestial. A inconsciencia da
baco, e para mim um homem que não fuma bebedeira dá á physionomia do homem mais ín-,
parece-me incompleto . . . Mas eu sempre quereria telligente e mais fino uma mascara de porco im-
que me explicassem por que, sendo nós mais fracas, mundo. Haverá amor de mulher que resista a
segundo a affirmação universal, não nos deixamos tão rude prova ?
dominar pelos vicios, como os homens fortes; Acreditará alguém qne a esposa de um alcoó-
porque mesmo o teu, Martha, se não fumajoga... lico possa ter por elle alguma espécie de consi-
Martha — Infelizmente . . . Mas vejam como deração, sem a qual não existe a felicidade na
são as mulheres: como alludi ao vicio do marido família ?
delia, ella não quiz deixar na sombra o do meu... Eu não. E custa-me até imaginar que um ho-
Magdalena — Sabe que isso não é segredo mem culto se entregue ao vicio da embriaguez.
para nós... Mas ahi está: de todos os vicios, o do O vinho é um vicio de taberna, de ruas escusas
jogo é o único intellectual; e, como é'sujeito a perí- um vLio execrável, de ignorantes e de brutos...
odos de repouso, favorece o espirito para reacções. Izidom — Entretanto... f;
A NOVELLA SEMANAL 93

Magdalena — Entretanto, bem o sei, ha mui- bém aquelle que uma esposa, embora diga o
tos homens educados, responsáveis muitas vezes contrario, menos perdoa . . .
por um nome de família bem considerado na Martha — Pois olha, filha, para mim, de to-
sociedade, que não resistem a ir tomar com fre- dos os vicios, esse é o único comprehensivel . . .
qüência os seus copinhos de wisky, quando não Luciana — Eu ainda digo mais: é o único
de paraty, á beira dos balcões, esquecendo-se, no desculpavel.
convívio das garrafas, da própria dignidade, di- Magdalena — Sim, nos maridos das outras...
zendo asneiras, chorando como um dia de chuva,
JULIA LOPES DE ALMEIDA
rindo como palhaços ou clamando como posses-
sos. A falta dé compostura dos bebedos offende
até as paredes. Não ha nada mais ridículo nem
mais repugnante., Felizmente, o meu marido não
bebe senão á comida : mas então, ai de todo o
pessoal da casa se lhe não puzerem junto do
prato a sua garrafa de Bordeaux!
Martha — p meu também; e igualmente não
dispensa o seu cálice de cognac ao café. Mesmo CLARINHA DAS RENDAS
que chova a cântaros, não havendo cognac em (NOVELLA SERTANEJA)
casa tenho de o mandar buscar ... E' uma maçada ! I
Luciana — O meu de vinho gosta pouco; mas No oitão de taipa do casebre — todo em re-
não passa sem cerveja, pelo menos três garrafas boco, com o tecto de telhas vermelhas — risca-
por dia.. . vam-se, trifurcando-se, veredas abertas entre ar-
Martha — O h ! bustos das catingas, duas em aclive demandando
Magdalena — Oh! a estrada de rodagem, e a outra, em descida,
Luciana — Uma ao almoço, outra ao jantar e buscando a margem esquerda do rio que corria
outra á noite. grosso, barrento, invernoso, a arrast?r os florões
Magdalena — Não deves consentir nesse abu- verdes das "baronezas" catadupando mais á ju-
so, elle assim ficará obeso ! sante, em lençóes d'agua, no parapeito da repre-
Luciana — Oh! minha querida, que mulher sa recamado de limo.
terá prestigio bastante para impedir ao marido & Na encruzilhada dos atalhos, para onde dava a
satisfação dos seus desejos E tu, Izidora, que nós sahida, ao fim da tarde, Maria Clara,—Clarinha
dizes de teu marido ? elle não bebe ? das rendas—vinha sentar-se perto da porta, na so-
Izidora — Não; meu marido não bebe senão leira de páo, pondo-se a desenhar no risco da almo-
água . . . fada a alva e linda renda do seu casamento, traçan-
Martha — Faz elle muito bem. Parece-me que do entre Os dedos hábeis, os bilros tôscós de
também nunca o vi fumar . . . madeira.
Izidora — Não; meu marido não fuma. Era a costumada tarefa quando já a roupa ti-
Luciana — Joga? nha sido colhida dos coradouros e a criação aga-
Izidora — De longe em longe, uma ou outra salharã-se nos poleiros, com o sol no occaso.
paciência, commigo . . . Mais tarde, quando escurecia, o pae, o tio Zéca,
Magdalena — Mas nesse caso teu marido é estafado da labuta, vinha também descançar ali,
um poço de virtudes ? E' um monstro ! estirando-se na relvâ, fincando no solo o coto-
Izidora — Vais vêr: como parece forçoso que vello pafa apoiar numa das mãos, aberta, a ca-
todo o homem se submetta á humilhante contin- beça meio encanecida velada pelo esfiapado cha-
gência de um vicio, meu marido não pôde resis- péo de carnaúba.
tir ao do amor. A candeia de kerozene accesa no casebre, pen-
As mulheres fascinam-o, como os jacarés ás dente de um caibro, inflectindq uma restea de
crianças. Elle vive sempre alheiado de mim, no luz avermelhada pelo rectangulo da porta, dava
deleite das suas paixões de aluguel ou de em- ainda claridade aos olhos garços de Maria , Clara
préstimo, e, o que lhes posso afiançar, é que isso para accrescer o seu delicado labor de rendeira.
me occasiona as mais dolorosas revoltas de amor Quando as estrellas vinham fazer a sua / ronda
próprio, e me dá a certeza de que, embora o vi- nos céos, Raphael, no passo bálancead^ de ser-
cio das mulheres seja entre todos os vicios o de tanejo moço, chegava, no verdor alacre dos seus
mais curta duracãn na vida de um homem, é tam- dezenove annos quasi feitos, na alvorotante fe-
94 A NOVELLA SEMANAL

licidade da promettida que o acolhia, com a sin- fiz á capital. Andava por ahi nos meus vinte
gela affeição dos rústicos, mostrando-lhe, antes dois annos bem tirados no matto. Nesse tempo
de tudo, o avanço feito na renda pelo dorso de o vapor nem inda chegava cá por perto. A gente
papelão da almofada labyrintada de alfinetes em ia nos lombos dos cavallos, serra para baixo, dor-
riste-renda que era como que o laço a avisinhal- mindo nos ranchos ou nas catingas até topar com
os dia a dia das nupcias visionadas. os trilhos do "vapor". Três dias bem puxados
Raphael, de estatura meã, grosso, thorax largo num bandão de léguas. Quando meus olhos ca-
a medir os hombros abertos, era bem moreno a hiram*em riba do Recife, estava assombrado, ima-
realçar os olhos azulados, uns olhos sempre a re- ginem lá vocês o que aquillo é de boniteza, com
flectirem um espirito que parecia encarcerado na- um rio largo, com umas pontes grandes cheias
quella formosa paysagem de sertão. O trabalho, de luzinhas, com umas casas ricas de gente apes-
porém, o não apavorava: os seus dias elle os soada. E o mar!... Só para ver aquelle mundo
vencia a guiar de aguilhão em punho, um carro d'agua que nem tem fim, vale a fadiga do ca-
de lenha, do brejo para as povoações servidas minho... Aquillo ronca, espuma, fica de todas as
pela via férrea, estradas afora, fustigando as jun- cores que só onça acuada. Um punhado de ve-
tas de bois encangadas, embalado pelo ranger linhas anda por ali que até parecem estar no
monótono dos eixos apertados... chão: são as barcaças, como elles chamam. Nas
Em chegando acocorava-se ao pé da rapariga, praias as ondas se arrebentam muito brancas co-
e os três iam discorrendo do que fora feito na- mo a roupa enxuga ao sol de Nosso Senhor. Lá
quelle dia, cujo poente se amortalhava numa no fundo, onde o mar encontra o céo, passam
franja roxa, por traz dos montes empardecidos, os bichões, uns brutos de vapores, com umas va-
lá longe, realçando a côr de sangue dos cortes ras altas cheias de bandeiras, com as fumaças
abertos nos flancos das serras por onde, num relâm- compridas; a perder de vista. Que bom ha de
pago, corria o trem, entre torvelinhos de fumaça. ser a gente ir por ali vêr os outros mundos!...
Os dois haviam se promettido ha um punhado Raphael e a noiva escutavam attentos a voz
de mezes; casar-se-iam pelo S. João. Bem perto cadenciada do velho. Ella, curiosa, poréni sem
vinha, pois ia entrar, cinco dias mais, o mez de maiores impulsos de vontade em deixar o seu
Maria. Continuariam a morar juntos, ali, conju- rincão de terra, contente de sua sorte, sem lar-
gando parcos haveres, num gesto prudente de gas aspirações. O rapaz ficara a repassar na me-
solidariedade domestica e econômica. mória as phrases do tio Zéca, cahindo numa sen-
Raphael tinha assegurado o seu ganho de se- sação de desejo mesclada a um véo de melan-.
mana ; o tio Zéca cuidava das suas roças de mi- cholia, mal ouvira falar do mar, esse gigante fur-
lho, feijão, mandioca, trabalhando também em um ta-côres, estrada sem termo a conduzir, os ho-
engenhoso iôrno na feitura de pequenos pilões, mens ás terras,mais distantes e fascinadoras,mar
vasos para pó de arroz, artefaclos curiosos ein ma- de que falavam embasbacados todos os sertane-
deira tenra e alva, indo aos sabbados e ás quar- jos vindos do littoral.
tas vender na feira, um quarto de légua adiante, Elle crescera na choupana de uns tios porque
os seus productos e as suas colheitas. Maria os pães haviam morrido das bexigas deixando-o
Clara cuidava do amanho da casa, descia ao rio bem pequeno. O tio vivera por annos na costa;
lavar as roupas, fazendo ainda as rendas da terra embarcara em barcaças, fizera longas rotas pelo
que eiam a cubiça, o encanto das famílias vera- norte, a negocio, e dessa vida marinha ficara-
neando na cidade e que iam ao povoado em lhe a necessária dose de recordações para só cui-
passeios longos sob o sol forte para criar sangue dar de falar delia nos serões do matto, na roda
novo. Da mãe, Maria Clara nunca vira o rosto. dos matutos, serões que o sobrinho, ainda nos
Naquella noute o tio Zéca estava numa das seus oito annos, ouvia curioso e sacudido de in-
suas veias de expansão, não raras, Deus louva- vejas. Quando se tornara rapazinho, a luta pela
do. Elle as chamava, rindo, de "momentos de bocca, o trabalho concorreram para esquecer uni
taramella''. Essa loquacidade girava sempre em pouco os sonhos da infância agora despertos, es-
redor de cousas do passado, saudades de ancião, timulados pelo sangue ardente da puberdade, es-
façanhas de moço, reflexo de saúde d'alma, de cutando o tio Zéca, o pae da sua enamorada. 0
contenteza de plantador que via promissora a mar, para elle, era a ribalta magestosa de todos
apanha e farta a invernia. os gozos, de todas as phantasticas maravilhas do
— Dos dias da minha vida neste mundo —- mundo: a felicidade se lhe afigurava pertencera
escutem lá — o melhor pedaço foi a ida que eu auem se fosse oceano afora, no dorso das vagas.:
A NOVELLA SEMANAL 95

Quantos menos rudes pensam assim também! lheres vinham buscar ou levavam água em potes
No correr da noute poucas palavras mais bal- de barro equilibrados nas cabeças. Perto da
buciou: as bastantes para acudir ás interrogações ponte o gado descia para se desalterar de focí-
da noiva. Mais cedo que sempre ergueu-se, re- uho baixado e ávido.
parou o tempo na marcha das estrellas, deu os Maria Clara tinha o seu canto predilecto, um-i
"boas noutes" e foi-se atalho acima, gingando, pouco afastada de certas companheiras* tagarel-
a principio com rumo á casa, depois enveredan- las ou doidivanas, porque ali as havia de toda a
do pelas catingas a passeio, emquanto 'Maria casta, desde as bem vividas com seus maridos ou
Clara, não de todo calma, reentrava no casebre •'amigos" ás levianas, as que se gabavam de per-
carregando a almofada, deixando o pae a co- turbar o socego dos casaes, com as seducções nos
chilar a costumada meia hora antes de se aga- sambas, nos "bois", na promiscuidade das catin-
zalhar nas dobras da rede sustida pelos punhos gas a horas mortas... Bem deixara de falar com
nos caibros da sala de janta. a Carlota, uma mulatinha, amaneirada sem re-
cato, cujo pae morrera do "ar"—de uma conges-
fe II tão—por encontral-a certa* noute em peccaminoso
O outro dia, um sabbado, escuro ainda, perto colloquio com o marido da Amélia, um bebedo
do amanhecer, despertado pelo hymno dos poleiros, habitual, conhecido por espancar a mulher que
tio Zéca ao peso das suas provisões de feijão e era tysica.
farinha, puzera-se em caminho para a feira, afim Na beira do rio, Maria Clara arregaçou as
de lá chegar com o raiar do dia, ganhando mangas do casaco, desnudando os braços até os
tempo para se installar e estender o toldo da sua hombros, prendeu entre as coxas a saia de chita
barraca. azul, erguendo-a ao meio das pernas, e de cor
Mal clareara, Maria Clara sahiu para o quintal coras, começou a ensaboar uma velha camiseta
espalhando ás mancheias os grãos louros de mi- de mo rim.
lho para as gallinhas que a enrodilhavam coco- A filha do tio Zéca na pujança sertaneja dos
ricando, sacudindo ainda as azas, beliscando o dezeseis estios, acaboclada, de olhos garços,, ma-
chão, chamando as longas ninhadas, os lindos e deixas escorridas e retintas, na elegância despre-
vivos pintinhos de plumagem ambarina, saltitan- tenciosa das naturaes do sertão, menos bonita que
tes, piando, piando muito... Todo o terreiro al- sympathica, que o era deveras, tivera do pae a
vorotava-se com a madrugada, uma friorenta e educação rudemente austera, o revestimento mo-
branca madrugada de Abril, com o céo claro azul, ral, a coragem espiritual dos velhos lares. Em
os serros esfumaçados de nevoa, as arvores espa- menina chegará a aprender a ler com uma se-
nejando-se voluptuosamente, e o sol morno a esprei- nhora da cidade, casada com o collector, onde es-
tar nos cabeços verdes das montanhas do levante. tivera a servir na arrumação. D'ahi uma certa
Depois de cuidar da criação, a rapariga abra- ascendência sobre os demais moradores do po-
çada a uma trouxa de roupa, desceu o atalho voado, a quem lia cartas recebidas ou escrevia
ainda rociado de orvalho, por entre os arbustos missivas encommendadas.
viçosos, cheirando a velame, emparelhando-se com Em meio da tarefa, alvas peças de roupas es-
outras mulheres que iam de rumo igual, cru- tendidas no coradoiro do capim, esquentando ao
zando tropeiros a pé e a cavallo, em demanda sol, Raphael surgiu de uma azinhaga approxi-
da feira, dando-lhes bons dias, até chegar á orla mando-se da rapariga qüe o acolheu admirada
do rio avolumado e barrento. pondo-se de pé, levando as mãos á cintura:
Nas margens muitas lavadeiras já installadas — V. por aqui a esta hora? Está doente?
zurziam as roupas ensaboadas de encontro aos Não foi trabalhar?
batedoiros de pedra negra e lisa: umas tendo — Não. N^m preguei olho... Passei a noite
trazido os filhos pequeninos que dormiam semi- rondando fora...
nus, sobre o capim, com as barrigas dilatadas, — E por modo o que? Que tem V. na ca-
para o ar. Dos banheiros de palha de dende- beça, homem? Botaram feitiço em cima? Desde
seiros vinha o ruido dos banhistas a chapinha- hontem que eu reparei o seu geito exquisito...
rem n'agua, quando por vezes o olhar malicioso Que tem V. no coração?
e indiscreto não via, nadando fora, um dorso fe- — Nem sei; não ando bom...
minino nu ou o roliço de uma perna amorenada — Isso é rabo de saia, Raphael. V. já não me
a debater-se gostosamente, no frio do banho. quer bem. Está mudado...
Abaixo e acima, pelos caminhos, outras mu- — Lá está V. com choramingas, mulher. En-
96 A NOVELLA SEMANAL

xugue esses olhos. Eu não sinto nada. Ouça — Até a volta, Clarinha; reze por mim em-
lá: eu preciso é fazer uma ida na praça. Uns quanto estiver longe.
negócios... Deram-se as mãos. Nem mais uma palavra,
— Que negócios, Raphael! V. está assanhado nem um gesto, nem um beijo.
com as conversas de hontem de meu pae. Eu Raphael desprendeu-se, olhou-a com ternura,
bem maldei isto. subiu a vereda tufada de flores silvestres, lenta-
— Pois é isto mesmo. Eu vou é ver o mar. mente, volvendo o rosto três ou quatro vezes
Esse mundão d'agua que chega perto do céo, até sumir-se na fronde larga de um umbuzeiro.
feito os urubus, bole cá commigo. Si eu não Maria Clara, calcando a pena, seguiu-o com a
fôr ver eu morro... vista, amparada na porta, numa attitude de pun-
— Santo Deus! Que foi fallar meu pae! V.' gente tristeza.
no Recife homem! E si V. não volta? Que ha s Quando reentrou ém casa, angustiada, encfu-
de ser de mim! Tanta cousa bonita por aquel- zou os braços na parede, enterrou o rosto entre
las terras!... Quem se lembra mais dos que ficam elles e desatou a chorar...
na tristeza destes mattos! V. não vá, Raphael...
Maria Clara prenden-lhe as mãos num assomo III
de irmã mais velha, actynselhadora. O rapaz olha- Raphael já se fora ha bem sessenta soes. 0
va-a commovido, vacillante, mas scintillando nos mez de Maria passava e a cada tarde Maria Clara
olhos o desejo de infância renascido, indomável, ia, na graça natural do seu vestido branco, á
forte, o seu desejo de descer a serra como os nave enflorada da matriz, na cidade, entoar com
outros, ver o mundo, ver o mar... as raparigas da terra as doces litanias, os enter-
— Escuta, Clarinha. É uma semana que eu necidos cânticos mysticos de agrado á Mãe Virgem,
fico na praça. Eu lhe juro. Volto sem tar- toda linda, toda vistosa no seu véo recamado de
dança. Trago umas cousas lindas para o seu en- pequeninas estrellas côr de ouro, aureolada de
xoval... O tempo corre como os veados: quando V. luz tremula de velinhas coloridas l e de flores
me sonhar por lá, eu já venho na ladeira de casa... cheias de viço.
A rapariga traduziu a decisão do noivo, aquella Como sabia ler, era quem, nos degráos atapetados
aspiração que elle realisaria tarde ou cedo, e si do altar, tirava no breviario a toada e os versos.
havia de ser depois, casado, antes fosse agora, Na piedade de suas orações ia sempre envolto
em tudo e por tudo. imaginariamente o desejo, que os lábios tímidos
— Si é tanto do seu gosto, eu não me im- nem enunciavam, da volta do noivo, a todo ins-
porto. Fico é morrendo de saudade. Vá com a tante lembrado, perdido lá no Recife, essa terra
companhia de Nossa Senhora e volte logo. E linda, fascinadora aos olhos dos matutos.
para quando essa viagem ? • O pae, nas suas noutes de taramella, contava-
— Para hoje mesmo. Eu vim conversar com lhe tanta cousa bonita!
V. por isto. O trem chega na estação perto do E ha tanta gente ruim para virar a cabeça dos
meio dia ; vou mais o Antônio das Neves. O bons! Bem lhe segredava o coração na hora da
Joãosinho fica no carro fazendo o meu trabalho. despedida, fitando o seu Raphael a dobrar a curva
Ambos silenciaram uns minutos. Raphael apa? da catinga, perto do umbuzeiro grande. Era
nhara do chão uns gravetos e quebrava-os ner- para nunca mais... No entanto a esperança es-
vosamente entre os dedos; Maria Clara entrou- voaçava-lhe de novo na cabeça. Talvez tornasse.
xára a roupa apertando o nó; desceu as mangas Quem sabe ? Logo que chegara do Recife, oito
do casaco, soltou a saia, poz a trouxa á cabeça. dias depois da partida, o Antônio das Neves trou-
Puzeram-se a caminho, cabisbaixos, galgando xera-lhe um recado do noivo : ficava bom e con-
a rampa do rio, retomando o atalho de casa. tente ; estava encantado pelo mar, pela fita si-
No oitão estacaram. nuosa e loura das praias, pela vida agitada dos
Ella pousou a mão direita no hombro do ra- cáes, olhando os barcos veleiros a acostarem ou
paz, fitou-o seria e disse: os bellos transatlânticos a se sumirem no horizonte
— Raphael, vá com Deus, e se lembre de mim. remoto. Mandara-lhe, entre outros mimos sin-
Si V. ficar por lá é muito ruim... Está ouvindo? gelos, uma caixinha atulhada de mariscos e búzios
Naquelle tom rústico e franco da sertaneja, cheirando á maresia, ainda cheios de areia fina
mixto de carinho e ralho, silhuetava-se a alma sin- e setinosa que é a almofada onde as vagas te-
cera da rapariga, a nitida expressão do seu sen- cem as suas rendas. Voltaria naquella semana:
tir e do seu affecto. era a sua promessa.
A NOVELLA SEMANAL 9T
Depois, nem mais um recado, nem mais uma radas. Alguns mocambos se toucavam de ban-
noticia. O Antônio das Neves, em viagens sub- deirolas ou de balõesinhos em fieiras, multicô-
sequentes, não vira o rapaz na capital. res, vistosos.
Vezes havia em que a rapariga tinha frêmitos Anoutecendo de todo as fogueiras crépjtavam,
de tomar luto pelo promettido, pois ao seu co- esbrazeadas, espiralando chammas, estalidando>
ração lealdoso só com a morte se podia justifi- mandando aos céos muito limpos e estrellados,
car o esquecimento da jura feita. mensagens de fumo pardo, em rolos escuros co-
Assim desfilavam os dias amáros e triste. Ma- mo bandos de corvos a subirem.
ria Clara ia-os vencendo na faina da lavagem, ao Todos os atalhos regorgitavam: ia e vinha a
pé do rio, arredia de todos, melancholica. A' gente do sertão de roupa aceiada e cara alegre,
noute, por força de habito ou por inspiração da abaixo e acima; uns no calcante á procura de
esperança, botava a almofada na porta e reto- um casebre amigo onde se lhes prom?ttia um
mava a tarefa de rendeira, trocando os bilros, samba; outros nos dorsos das montadas deman-
fincando alfinetes, a desenhar com os fios alvos dando, alguns quartos de léguas adiante, a fa-
da linha a formosa renda do seu noivado. Es- zenda de um compadre meio abastado de nome
tava linda e crescida! Iniciara a vigésima vara e do santo festejado.
emquanto trabalhava, os seus.sonhos de ventura Os tiros das ronqueiras simultâneos já se fa-
se iam dispersando como as nuvens nos céos... ziam freqüentes e nas ruas' os busca-pés numa
Quando o tio Zeca vinha também repousar na serpe de fogo garatujavam luminosamente o es-
grama, sentindo remorsos de haver despertado o paço, zigzagueando, rodopiando no chão, cor-
desejo do rapaz em descer a serra, punha-se a rendo num rastro avermelhado para por fim es-
consolal-a, animando-a, simulando motivos para tourar com força de encontro a uma soleira ou ao
desculpar o retardo delle. pé de uma arvore, quando não enfiavam, entre gri-
— Nas terras grandes ha muito o que a gente tos e susto dos moradores, por uma porta aberta.
ver, menina, e em que labutar... Quem sabe si Creanças, á solta, cercavam as fogueiras, dandcn
o Raphael. não está a fazer umas patacas,? se as mãos, cirandando a entoar cantigas infan-
— Mas, meu pae, se é assim, que custava a tis, populares.
elle botar no correio um recado para nós? Acaso Maria,Clara, na tristeza de sempre, depois do
não sabe que eu estou a morrer de saudades? pae haver ateado a sua fogueira, foi vagarosa-
— Ainda não é tempo para afflição nem choro, mente subindo a vereda do oitão até chegar ao alto,
rapariga. Muito defunto já tem tornado vivo do na estrada, de onde os olhos alcançavam a ci-
cemitério... Tem confiança na Virgem. O ra- dade, em baixo fumaçando.
paz d'aqui a pouco está por aqui. O coração ' Era o Alto da Balança. A rapariga encostou-
me diz... se no umbuzeiro onde se encobriu, no dia da par-
— Deus lhe ouça, meu pae... tida, o seu noivo.
Maria Clara começava a chorar e o velho, co- A cidade era toda um facho de chammas. As,
cando os cabellos meio embranquecidos, calava- artérias delineavam-se pelos renques luminosos das
s,e, roido de pena, matutando. fogueiras, desde a rua da feira, rectilinea, larga
Uma1 vez, de repente, foi ao Recife. Já na es- faixa, até os caminhos riscados nas vertentes dos
tação mandou avisar a filha. Correram dez dias: montes, trepando as serras ou procurando os
quando regressou vinha num desalento terrível. brejos. As limalhas caricaturavam no alto bi-
Nada soubera e nem uma pegada do n oivo da ra- zarrias geométricas. A luz das candeias tremia
pariga. Redobraram-se os soffrimentos de ambos. em todas as janellas e portas dos mocambos e
E assim Junho entrou, chegando a noute rui- das casas ricas, illuminando-se a matriz na pea- .
dosa de S. João. nha de sua pequena collina. Até o rio reflectia
Pelos caminhos, fronteiros ás palhoças, os gros- arabescos igneos das fogueiras ateadas nas mar-
sos toros de madeira, entrecruzados, alteiavam-se gens povoadas.
para arderem mais tarde, e de quando em vez, Sertanejos, passando, saudavam á Maria Ciara
embora cedo, uma ronqueira espoucava ao longe. com um "Deus nosso Senhor vos dê Q desejado" •
Nos lares, sobre os fogareiros, mechia-se a cart- e as moçoilas, em branco, tafues, com os ca-
gica ou assavam-se as espigas de milho verde, bellos atados em fitas berrantes, diziam-lhe phra-
muito tenras, doces, ha pouco desnudadas das ses de carinho e esperança, porque todos, légua
túnicas verde^brancas que jaziam pelo chão de em derred©r, sabiam de desdita da "Clarinha das.
niassapé ou tijolo de envolta ás cabelleiras alou- rendas".
9S A NOVELLA SEMANAL

4|f^poiada no tronco do umbuzeiro, á meia som- Fevereiro corria sem a promessa de um agua-
bra do crescente, ella, angustiadamente, espiando ceiro. A feira era escassa, as verduras raras, os
a ventura alheia que passava nos pares de na- fructos pouco vistos e caros.
morados, a cochicharem, felizes, quedou ali até O sol rutilo, flammejante, ardia, esmaltando os
bem tarde, com medo de volver á casa naquella serros, resequindo as catingas, e as noutes eram
noute, a rever o canto onde, ainda no outro abafadas, mornas.
anuo, na mesma data, Raphael, na sua fatiota Tio Zéca, preoccupado, via a sua colheita per-
nova de brim riscado, trincando uns grãos de dida, os dias vindouros amargos, emquanto a fi-
milho assado, num gesto de timidez vencida, in- lha numa crescente penúria moral, enfraquecida,
dagara-lhe de brusco: Você quer ser minha mu'- tossindo, embora assim agarrada ao trabalho.
ler, Clarinha ? De noute, no serão do Costume, pouco con-
Na sua alma casta de matuta não vibrava o versavam. De tempos para cá o Joãosinho, que
desespero do homem que se fora, o ciúme da substituirá o Raphael no carro vinha também ta-
posse.furtada, a idéia sensual de que o noivo an- garellar um pouco ali, posto que nem sempre
dasse aos galanteios com outras mulheres, não. lhe respondessem, tão pensaíivos andavam pae e
O que a deprimia, a estiolava, era a dor de ser filha.
esquecida, a ingratidão de um ente a quern ama- Era um rapazote de dezesete annos, muito rús-
ra depois do pae, a surpresa da fuga á fé jurada, tico, feio ptfrém ungido de uma bondade extre-
míraduzivel ao seu espirito que tinha uma pro- ma : uma alma boa. A' força de vir por ali, á
messa como um pacto para toda a vida. força de ver penar a rapariga, foi-lhe querendo
Era somente o seu espirito a penar:—á fêmea bem, sentindo até que já lhe queria bem de mais.
sobravam o trabalho e o sentimento paia refrear Talvez tivesse ímpetos de dizer-lh'o ; retinha-o a
o instincto. Demais creada na natureza, sem ar- imagem leal do companheiro partido e também
rebiques de maldade, via a maternidade dos ani- a sua timidez innata.
maes, conhecia-lhes os amplexos fecundos para Uma vez afoitara-se a balbuciar, encontrando
comprehender, sem jaca de impureza, o seu de- Maria Clara a sós:
ver de mulher. — E Você não se casa mais, Clarinha ?
Emmagrecia ; as cores desmaiavam com as suas A rapariga olhou-o pasmada, viu-lhe a expressão
esperanças. Os lábios iam esquecendo o "rictus" e só então entendeu o que ia pelo coração do
gracioso do riso, o riso lindo de quem ri sem rapaz, sem poder dar remédio.
ironia, sem fel. Raphael era a idéia fixa, um — Emquanto V. me avistar a fazer esta renda,
Raphael cheio de brumas, por cujo bem ella fre- Joãosinho, ninguém tem direito de me falar nisto...
mia, por quem nutria tantos cuidados quantos eram Esta renda me amarra a Raphael. Ouviu?
os seus votos de que voltasse. Embora olvidada, Nunca mais se falaram a respeito. A renda
talvez fosse feliz si lhe dissessem com segurança crescia. Maria Clara não a queria vender: a-
que elle estava bom e contente naquella noute arden- figurava-se-lhe que o fazendo partia o ultimo
te de S. João, em outras plagas, em outros lares... élo da esperança -mantida na volta do noivo, de
Só desceu quando o pae, intranquillo, a foi quem nem uma nova se soubera até então. De-
buscar na estrada, reprehendendo-a com ternura certo embarcara e por lá, em climas estranhos,
rude de sertanejo, pelo sereno apanhado, pela frieza morrera. A's vezes pensava assim, para em se-
da hora, ella andando sempre a tossir e espirrando. guida ter maior fé num regresso.
Os estrondos das ronqueiras alternavam com A sêcca ia queimando.
a toada monótona dos sambas. Da cidade ba- Numa tarde, tarde de agonia e canicula, ao re-
lões alteiavam-se, claros, tangidos pelo vento. colher do sol entre nuvens adamascadas, ensan-
Tio Zéca, em casa, sentou-se á porta, fumando güentando os flancos das montanhas crestadas
cachimbo, mirando, abstracto, as estrellas perto pela estiagem, Maria Clara, num desalento in-
do horizonte. coercivel, numa crise nostálgica, tão de sua fei-
Maria Clara, num tamborete, ao pé da nua ção de tempos para cá, viera continuar a sua ta-
mesa de pinho, rezava num terço de contas refa de rendeira, á porta de casa, emquanto o
azues... pae andava ainda pela feira.
IV A's suas attribulações de abandonada, ás suas
Foi-se o inverno e veio o verão cruel, adusto, saudades viera juntar-se maior cuidado ao ver o
queimando as vegetações, seccando o. rio, com- tio Zéca cheio de receios pelo futuro, com as
bu rindo tudo. plantações queimadas, as feiras fracas, a gente do
A NOVELLA SEMANAL 99

Recife fugindo á cidade, um cortejo de misérias. fessar o seu gesto filial para não desmerecel-o na
Sentia a previsão da fome. ' Em breve faltaria bocca de todo mundo.
tudo. A sêcca ardia, os céos eram limpos e cla- — Para que V. me quer, Joãosinho ? Eu não
ros, as catingas esqueletos, galhos sem roupa- tenho mais coração. De que serve uma mulher
gem. Só os jatobás davam sombra. Do alto em casa quando ella não nos pode querer bem,
sertão já se contava dos mortos que tombavam direito? Magra, doente, triste, eu serei um tram-
nos caminhos e do gado a succumbir nos paro- bolho para V. que é moço e pode ter outra sorte.
xismos da sede, a gemer, a mugir, na anciã extre- Não pense nisto, homem.
ma, focinhando a terra gretada, resequida, estéril... Joãosinho não te,ve tempo de replicar. Ao alto
Maria Clara tinha a visão nítida de todo o in- da estrada um grupo surgiu, approximando-se.
fortúnio sertanejo, periódico, torturante, cuja nar- Um velho cavallo, esquálido, tropego, puxado por.
rativa já ouvia do pae quando creança. Trabalha- um sertanejo magro, maltrapilho, chapéo de couro
va a pensar. Perto, chocalhando, uma vacca, sol- sujo, calçado de velhas alpercatas denunciando a
ta, de pello amarello, remoia as fibras das palmató- exhaustão de longa caminhada e duras privações,
rias do matto, único alimento daquelle dia quente. marchando ao seu lado uma rapariga amarellada,
E a pensar, Maria Clara baixou os olhos para vacillante, seguida de um meninote de doze an-
a renda, a sua renda de enxoval. Vendel-a-ia, nos, rachitico, com tronco nu'. No animal pen-
estava decidido. Eram bem umas trinta varas ; duravam-se dois caçuás : um contendo cacaréos,
dariam alguns mil réis para o sustento. Dias outro servindo de berço para uma creancinha en-
atraz um casal passara ali, a passeio; viera vel-a feixada nos retalhos de uma coberta vermelha.
attrahido pela sua fama de rendeira. Fechava o prestido macabro um canito branco de
A "Clarinha das rendas"? indagou o par. Re- costellas desenhadas na pelle.
cem-casados; elle muito elegante e caricioso a des- Era a primeira leva de retirantes a passar por
manchar-se de cuidados; ella, pallida, loura, can- ali, naquella sêcca. Em frente á casa, pararam. A
çando ao marchar, inclinada, denunciando a ma- mulher tirou do caçuá o filhinho, sentòu-se numa
ternidade. Viram a renda e cubiçaram-na para pedra, pôz de fora um peito mirrado e achegou-o
uma blusa, talvez, ou para uma veste de creança. á boquinha sequiòsa do petiz que chorava por não
Chegaram a offerecer três mil réis á vara. achar seiva.
A nada accedeu a rapariga: — era a sua espe- Maria Clara, penalisada, foi buscar um pouco
rança, não venderia. dágua com assucar.
Agora, porérti, estava resolvida; era justo que — Deus abençoe a Você, minha moça. Ha dois
auxiliasse o pae naquelle transe. No dia seguinte dias que penso ficar pelo caminho.' Nem um
iria á cidade, procuraria o casal ou quem lhe pingo nos peitos! O pobresinho só faz chorar...
desse algum dinheiro pelo seu trabalho. Depois — Para onde vão ? — interrogou Joãosinho.
faria outros, em linha, em fíló. \ — Para baixo, para a praça. Hoje cuidamos de
•f Ah! si as costas lhe não doessem tanto! os pedir um rancho na cidade para descançar a noute,
seus serões iriam até o amanhecer. Segura era a Amanhã é de serra abaixo, querendo Nosso Se-
sua resolução: cortou com uma tesourinha a renda nhor. Pobresinho ! Ainda si a gente podesse ar-
da almofada, mediu-a nos braços abertos, do-rosto ranjar um leitinho para elle! Perdemos tudo, seu
para a ponta dos dedos. Trinta e duas varas, moço. O sol queimou...
uma lindeza. Lembrou-se ido seu vestido de nup- Maria Clara esteve a olhar aquelle quadro de
cias assim enfeitado, brilhando á luz do altar da miséria, maior que a sua. Depois, num gesto
Virgem, na matriz... brusco, rápido, entregou a renda, já dobrada, á
, i As lagrimas afloraram; enxugou-as com a man- inditosa mãe :
ga do casaco. Ia dobrando a renda quando João- — Tome para você. Na cidade darão por ella
sinho vinha chegando. algum dinheiro. E' para comprar leite para o pe-
Estiveram em silencio uns 'segundos. Depois queno e uma camisa para o rapazinho.
o rapaz, mirando-a espantado, sentou-se-lhe ao A mulher esgazeou os olhos, extatica, surpresa,
pé, no chão. mastigando bênçãos e agradecimentos que mor-
— Clarinha, você uma vez me disse que só se" riam na gorja.
casaria outra vez quando cortasse essa renda. Era De novo o grupo se moveu e ia partir. A ci-
verdade ? dade era perto mas o crepúsculo cahia. O ho-
Ella estremeceu : não se recordara do que ha- mem e o meninote deram «boas noutes» e anda-
via dito aquelle rapaz. Também não desejava con- ram para a frente. A mulher, com o filho nos
100 A NOVELLA SEMANAL

braços, a choramingar, seguiu também a de- ra enterrara de novo a cabeça entre os braços,
sejar : a chorar e a tossir.
— «Nosso Senhor lhe dê um noivo bem vbo- A noute estava calma e o céo era um crivo
nito». de estrellas: — perto, os chocalhos do gado a
Maria Clara sentara-se de novo em frente da remoer, tangiam; bezerros apartados das vaccas
almofada nua. Fincou os cotovellos no papelão berravam; chegava de um casebre, o mais vi-
do risco, apoiando nas mãos espalmas o rosto zinho, uma toada de mulher; longe, trazido no
doentiamente gracioso, dolorosamente sympathico, vento, a plangencia de um carro de bois, tardo,
rodando os olhos garços na paizagem, a sua linda monótono, a reentrar na porteira do curral.
paizagem sertaneja tão mudada também. Tio Zèca vinha descendo o atalho, apressado,
A tosse renitente, rouca, vibrava-a de quando alegre, embora a feira tivesse sido escassa: —•
em vez; sentia o corpo quente e o coração ba- trazia no bolso da calça uma carta de Raphael,
tendo forte. Na véspera parecera-lhe na bocca um achada no correio, chegada na véspera do Acre,
travo de sangue. Talvez do dente. de onde, entre os seringaes, após ter estado a
Naquelle momento tudo se lhe clareava: era o morrer de febres, o rapaz mandava dizer que
fim. Estava doente, bem doente. A Mariasinha estava a juntar uns contos de reis para fazer a
começara assim, a tossir, a doer-lhe as costas e sua Clarinha, a Clarinha das rendas, bem feliz,
fora um dia para a terra de Deus. Não tinha bem bonita .. .
medo de morrer; tinha era pena da velhice do MARIO SETTE
pae, sósinho no mundo. Raphael? Só pedia á
,Virgem é que, si estivesse vivo, fosse feliz. Era
o fim. Para que alimentar mais' uma esperança
mofina como se rega uma planta que não pode
medrar!... O único fio era a renda, a sua lin-
da renda que partira também nas mãos esquáli-
das daquella mãe dolorosa,— branca, muito bran-
ca como si já fosse o leite que ella, virgem, dera
aos lábios famintos daquelle petiz, ajudando-o a ECONOMIA DOMESTICA
crescer, a ser homem para, mais tarde, talvez, Na residência de um casal "modern-style", ás
fazer soffrer as raparigas de amor e de febre. 10 da manhan.
No ferrotear das suas maguas, sentia um bem Renato Silveira e Mme. Silveira acabam de to-
estar, uma volúpia casta pela caridade que fizera. mar o seu café com leite.
Donzella como ia morrer, ao menos fora mãe Elle — (levantando-se e atirando o guardanapo
também, naquelle gesto. A saudade vencia-a; os para cima da mesa). Bem, meu amor, cá me vou
soluços garroteando-a explodiram. A cabeça des- á vida; até logo.
cahiu sobre as mãos mornas e os braços dobra- Ella — (cobrindo de manteiga uma côdea de
ram-se na almofada, num accesso de tosse, com pão). Até logo, bemsinho. Olha. . . Tu vens al-
estremecimentos nervosos, emquanto as lagrimas moçar hoje á casa ?
desciam do céo dos olhos. Elle •-— Não posso. Hoje é dia de mala para a
Quando Maria Clara alteiou de novo o rosto, Europa e tenho muito que fazer no escriptorio.
o morim da almofada mostrava rosetas de san- Almoçarei na cidade. Virei jantar ás 7 da noite.
gue, sangue goiphado da bocca premida no te- Ella — Nesse caso, vou sahir depois do al-
cido alvo. moço, sim ? . . .
Joãosinho puzera-se de pé e chegou-se para acu- Elle — Aonde vaes?
dil-a, assustado. Ella — A' cidade, fazer umas compras... A
— Você está vendo, Joãosinho ? É sangue. Já propósito: tens ahi dinheiro ?
não valho para nada. É a moléstia da Mariasinha. Elle — Tenho. De quanto precisas?
Para que você foi querer seu bem a uma mu- Ella — De pouco, para umas comprinhas in-
lher como eu que tem uma doença que pega? significantes: uma peça de entre-meio, que a cos-
Esqueça isto. Procure outra que lh'o mereça e tureira mandou me pedir; uma carta de alfinetes,
esteja ,mais perto da vida do que eu . . . um maço de grampos. . . (Pausa) Duzentos mil réis
O rapaz revolvia o chapéo de carnaúba entre dar-me-hão p'ra tudo. . .
as mãos, sentindo os olhos humidos. Maria Cla- Elle — Vê lá. . . Para comprares um maço de
A NOVELLA SEMANAL 101

grampos, uma peça de entremeio e uma carta de Ella — (rindo) — Quem sabe ? . . . A crise na
alfinetes talvez os duzentos mil réis não sejam Europa... (Pausa) Mas fallemos a sério, Re-
sufficientes.. . Pede mais, queridinha. A ordem ' nato. Achas muito quinhentos mil réis ?
é rica e os frades são poucos... Elle — Não acho. Deque me vale achar muito ?
Ella — Achas muito? Se soubesses como à Precisas, não é assim ?
crise na Europa repercutio no Brasil! . . . Está Ella — E ' . . . Preciso... Tenho que comprar
hoje tudo pela hora da morte... uma peça de entre-meio...
Elle — E'... Tens razão. A crise. . . é pavo- Elle — Já sei I . . . Uma peça de entre-meio,
rosa. Então, ficas satisfeita com 20Ó$000? uma carta de alfinetes e um maço de grampos...
Ella — Fico. Mas, olha lá, bemsinho: se achas Ella — Estás zangadinho commigo, Renato?
muito, dá-me apenas 10o$000 e e u . . . quando che- Olha: se é para ficares aborrecido, não é pre-
gar á cidade, passarei pelo escriptorio para que ciso que me dês os 500$00. Dá-me apenas 450$000.
me dês os outros cem. Elle — Qual aborrecido!... Mas, vamos a saber:
Elle— (irônico) Não é preciso. Para que has vaes apenas á loja comprar os alfinetes ou tens
de fazer economias, meu amor? Temos apenas que fazer algumas visitas ?
oito filhos e elles, quando crescerem que se ar- Ella — Não faço visitas, hoje. Irei primeiro á
ranjem. . . casa Ferreira comprar os alfinetes, depois irei á
Ella — Como tu és mau, Renato! Então pre- joalheria.. . — oh! descança; é só para ver as no-
tendes deixar as crianças sem nada, quando mor- vidades — á costureira, ao "five-o-clock-tea no
reres ?! Alhambra e voltarei para casa, passando de ca-
Elle — (cada vez mais irônico) — Creio que minho pelo Municipal, afim de avisar que ficas
sim. Se continuarmos pelo caminho em que vamos... com a assignatura para o Lyrico.
Ella -- (admirada) — Que dizes, Renato ? ! Achas Elle — Quer dizer que só ás 7 estarás em casa ?
então que estamos gastando muito? Ella — Achas muito tarde? Se/achas, sê franco,
Elle — Quah . . Eu disse isso ?! que eu virei ás seis e três quartos. E, sabes de
Ella — Não, mas, pelas tuas palavras, tirei essa uma cousa? Para não andares sempre a ralhar
conclusão. Mas olha: se achas necessário que commigo, voltarei de bonde para fazer economias.
economisemos, o melhor é tirarmos os pequenos Tens razão, Renato, é preciso que façamos eco-
do collegio — elles já sabem o sufficiente para nomias. . .
ganharem a vida quando forem homens — tu ven- Elle — Qual! . . Eu estava a brincar comtigo.
derás a tua "voiturette". Ella _ Não, senhor. E' preciso que sejamos
Elle — E, tu, a tua "limousine". . . econômicos. Do principio do mez em diante vou
Ella — A minha "limousine" ?! E, depois, como dizer ao pequeno dos jornaes que não precisa
farei, quando tiver de ir á cidade, ás minhas com- mais trazer-me a folha. Assim economisaremos
pras? 3$000 por mez, não é? E' preciso economisár,
Renato, economisár muito. . .
Elle — (com paciência evangélica1! — Irás de
bonde, como toda a gente. Elle — Bem. Até logo.
Ella — Até logo, meu amor. Economia, ou-
Ella — Estás doido, filho?! Queres que as
viste, muita economia! . . . Olha, Renato!
Mendonças se riam de nós? Era só o que fal-
Elle — Que queres!
tava ! . . . Se ellas, agora, já dizem que, neste an-
Ella — E' que tu te ias esquecendo de me da-
dar, terminaremos implorando a caridade publica,
res os 500$000 para comprar os alfinetes.. .
'' á porta de uma egreja, que não diriam, como não
EUCLIDES ANDRADE
se haveriam de rir, quando soubessem que vendi
a minha "limousine" ? ! Não, Renato, não, meu
( amor. Noblesse oblige...
Elle — Bem, são horas de ir para o trabalho.
De quanto precisas, então, para ps teus alfinetes ?
•$ Ella — (distrahidamente, alhos perdidos no es-
paço) — De quinhentos mil réis...
Elle — Será possivel que neste pequeno lapso
: de tempo que levamos a palestrar, tenham os al-
finetes subido de preço ? !
I ^ ^\\A
A NOVELLA SEMANAL

0 desprendimento de si era o como em despojal-a, antes d.e


traço dominante do caracter de tudo, dos obstáculos que a im-
Avídívôínecdoíícck Simões P i n t o . Tendo convivido pedem de adoptar u m a attitude
c piuõifc£èfr-'óps:: com elle nas revistas que diri- oomprehensiva e de dirigir um
giu, e, mais tarde, no Jornal olhar p e n e t r a n t e sobre o campo
do Commercio, bem pudemos da arte, da moral ou da scien-
apreciar a bondade profunda da- cia.. Antes do que em um pro-
f SIMÕES PINTO quella alma, em quem a har- cesso de accumulação, estriba.
monia era u m a expressão natu- se, pois, a obra cultural em um
ral de vigorosa saúde e equilí- prévio processo de desintegração
Dentre as figuras que a grip- brio. E s p i r i t o frondeur, estava dos elementos que a torpeza e
pe apagou, rudemente, no tor- sempre disposto a rir e a zombar, a insinceridade do ambiente so-
mentoso fim do anno de 1918, mas sempre disposto também c i a l ' v ã o depositando sobre o es-
está a de Arnaldo Simões P i n t o , a corrigir e a a n i m a r . pirito, á maneira de uma crosta
o suave poeta da " C a r m i n a " e
Foi por isso, mais que tudo, que obstrue a clara visão das
do " L i v r o de D o n ' A l d a " .
na sua vida de trabalho inten- coisas. Só depois desta opera-
Poucos se lembram j á deste ção poderá o espirito directa-
nome. Simões foi u m perdulá- so, em que se fez por si, u m a
solicita e maneirosa a g u l h a , m e n t e adquirir noções relativa-
rio da intelligencia e do cora- mente verdadeiras e formar con-
ção, e nunca cuidou de fixar que conduziu e poz em relevo
m u i t a linha que hoje por ahi ceitos mais ou menos exactos
n u m livro definitivo os primo- acerca do m u n d o exterior, do
res da sua inspiração e as excel- apparece e brilha.
È como agulha, coube-lhe a «não eu». Neste sentido a cul-
lencias de seu estro. Mas a in- t u r a não importa n u m atavio,
dividualidade que foi não pode sorte de depressa ser recolhido
á sombra, donde só o evoca, em senão, ao contrario, n u m retorno
ficar assim olvidada: não só franco e saudável para a nudez
porque fosse a de um bello ar- intensa saudade, a lembrança
dos amigos. ingênua. O importante, o pri-
tista, n a inteireza do epitheto, mordial consiste em dar ao pen-
como também pelo papel de L0TJRENC0' PILHO samento a capacidade para jul-
construcção social-literaria que gar rectamente, apreciando o
ella desempenhou. valor ethico ou esthetico das
Simões assumiu em 1916 a coisas e e x t r a h í n d o dos pheno-
chefia da " Vida Moderna"', a menos circumdantes idéias pró-
que deu uma pliase áurea. Pois prias e v i r g e n s de todo precon-
oom tal revista auxiliou, incen- ceito. ,
tivou, guiou e fez appareoer
muitos dos bellos nomes que ho- O processo da educação, como
je florescem a geração inteliec- se sabe, implica a passagem das
tual de S. P a u l o . noções do consciente para o sub-
Monteiro Lobato, Guilherme O paradoxo da cultura consciente. As idéias bem assi-
de Almeida, Léo Vaz, Sud Men- miladas se trasladam para a
nucci, Brenno F e r r a z , Lindol- P a r a a maioria dos indivíduos esphera do affectivo : convertem
pho Esteves, Thales Andrade, o termo «cultura» significa con- se em sentimentos, regido pelos
para não citar outros, todos re- j u n t o de conhecimentos. A rea- quaes o indivíduo então exerce
ceberam da revista de Simões lisaçâo da cultura estaria então os seus actos, j á espontanea-
P i n t o u m grande espirito de superiormente encarnada em u m mente. Reage de modo determi^
estimulo e de dedicação ás le- professor universitário, de es- nado ante as coisas, de accordo
tras. pessa erudição, congestionado de com a maneira de sentir que
Monteiro Lobato, si bem que noções e capaz de expor, com formou com u m a opportuna e
ao tempo em que começasse a abuso de tecrmologia — a meu- c o n t i n u a infiltração de idéias,
publicar os seus contos n a «Vi- i&£ illegitima sob o ponto de pois, como disse Fouillée «a
da Moderna» fosse j á um esty- vista etymologico e portanto idéia é i n h e r e n t e a todo senti-»
j d i s t a vigoroso e perfeito, todavia falta de clareza e propicia H mento que se distingue da pura
só perdeu a sua timidez e se confusões — theorias mais ou sensação informe». Dahi o va-
lançou resoluto á publicidade, menos abstrusas. Não obstante, lor de u m a verdadeira educação
depois de privar com o poeta a erudição pode e costuma ser e es perigos de u m a educação
da « Carmina ». Foi ainda por precisamente o contrario da ver- falsa.
instâncias suas que Lobato pu- dadeira cultura. Com effeito, Se a v e s t i m e n t a espiritual,
blicou os « TJrupés», cujo suc- esta não consiste t a n t o em amon- isto é, a s u m m a das ideas ad-
cesso literário e de livraria ha- toar na mente noticias acerca quiridas e dos conhecimento»
via predicto com segurança. da sciencia, da moral e da arte, accumulados que foram mode-
A NOVELLA SEMANAL 103

Isâkto a psyche do sujeito, pu- discípulos, começava por trazel-o


desse, em momento dado, osten- ao ponto de p a r t i d a ' mais ele-
tar-se aos nossos olhos, como a m e n t a r , a u m estado por assim
[indumentária corporal, veriamo- dizer de virgindade intellectual.
nos cobertos com as mais des- Logo, m e d i a n t e o seu systema
harmonicas e absurdas vestias. de interrogações, successivas e
Aquelles que nos parecem mais coordenadas, o ia levando, como
sábios seriam provavelmente os que pela mão, até a idéia que Versos.
ique nos deixariam estupefactos desejava inculcar-lhe e fazia que O verso portuguez por excelleneía ê-
com o incompatível e discorde o próprio discípulo" a surprehen- o da «redondilha-*. Não é que se não
:de sua roupagem ideológica. Ap- desse, n a t u r a l m e n t e , em v i r t u d e possa praticar outras espécies e nem
i pareceriam nella prendas ana- daquelle encadeiamento lógico se pede o extermínio da variedade-
infinita *dos versos. Mas basta dizer-
ichronicas e irreductiveis a todo perfeito. A idéia, alcançada de tal que aquelle é o verso da «poesia po-
svncretismo, amontoadas sobre o modo pelo sujeito, mercê do pular» : isto é, o rytlimo ingênuo e
;espirito, em v i r t u d e de, u m a se- exercício da sua própria facul- espontâneo da nossa alma, quando
tocada por qvialquer agitação emo-
irie de ^superposições inexplicá- dade de raciocínio e de livre tiva.
v e i s . J u n t o a u n s calções re- exame, se incorporava definiti- E não só o da poesia, mas o da pro-.
. mondados de «sans culotte,» mos- vamente, como u m thesouro, á sa apaixonada. E' o molde das nossas
t r a r i a m alguns u m a casaca de expressões mais ídiomaticas e profun-
sua bagagem intellectual. E ' o das. Toda» as nossas invocações e in-
. cortezão e á cabeça, adornada de contrario da educação dogmática terjectivas, se acaso excedem o g r i t a
f melenas românticas, se alçaria e essencialmente memorial, em animal, logo se fundem no septisyl- ,
i uma ridícula cartola contempo- labo.
que alguns fazem repousar er- Vae para quatro annos, fazendo a l -
i ranea. F r u c t o de u m a cultura roneamente a cultura. P a r a ob- gumas lições acerca do «Folklore», na
heterogênea, desbarmOnica, fal- tel-a, n a realidade, é mister, Bibliotheca Nacional, chamei a atten-
sa, este homem j u n t a r i a a u m ção dos meus raros mas impávidos
quando se chega á edade em que ouvintes para o freqüente habitualis-
fundo jacobino, moderado e co- é possivel libertar-nos do «ma- mo com que meneiamos aqnelle m e -
mo que oppresso por preoccupa : gister dixit,» proceder a u m a es- tro popular.
ções respeitosas acerca da hie- pécie de revisão das idéias funda- Cicei exemplos vulgarissimos da lin-
guagem commum.
rarchia social e da auctorídade mentaes adquiridas antes, desnu- O povo só adopta epithetos, invoca-
uma disposiçãe sonhadora, con- dar-se tranquillamente das noções ções, formulas, quando septisyllabicas.
trariada por sua vez pela disci- emprestadas e t o r n a r a adqui- As dimensões do molde exigem, coma
um leito de Procrustes, aquellas pro-
plina utilitária e pratica da vida ril-as paulatinamente, sobretudo porções exactas.
actual. Esse conjuncto varie- com u m critério orgânico, de Os santos que se invocam appare-
gado e héteroclito não seria se- modo que o conjuncto constitua cem singelos ou acompanhados, mas.
sempre segundo a formula :
não a resultante de u m a deplo- u m a visão harmoniosa e am- , — Nossa Senhora da Lapa !
rável educação intellectual e pla da vida, que influa na har- — Jesus ! Maria ! José !
moral, de u m a pseudo-cultura, monia correlativa da conducta. — Santa Barb'ra, São Jeronymo.
— Mãe de Deus da Conceição.
«II vaut mieux forger l'es- Só isto pode significar uma ver- B nunca por'exemplo — Nossa Se-
prit q u e l e m e u b l e r , » dizia Mon- dadeira cultura. O conceito ha- nhora da Conceição ou «Nossa Senho-
taigne, falando da educação com bitual da mesma não é senão r a da Candelária» — pessoas egnaes,
mas inadequadas ao metro idiomatico.
seu bom senso insuperável. For- u m paradoxo falaz e pernicioso, Uma besta pode ser i'everenda e um
jar o espirito : fazer delle u m que t a n t o mais nos alheia da patife pôde ser grande : mas as for-
instrumento de comprehensão, de posse delia quanto mais simula mulas métricas exigem que se diga :
— Beverendissima besta.
discernimento, de juizo, em vez approximar-nos delia... — G-randessissimo patife.
de convertei-o em u m a despensa Não se pode dizer «grande» nem se-
intellectual... Tal é o verdadeiro A. M. quer «grandíssimos. Seria um verso
sentido da cultura. quebrado, e, entretanto ao dize^-o.
ninguém' pensa tratar de versos.
Ha uma multidão de phrases que
Indivíduos ha, opulentos de só existem,, por serem aperfeiçoadas
noções adquiridas de segunda e acepilhadas pelo metro fundamen-
tal, ainda mesmo quando não- encer.
rnâo, que se v e r i a m perplexos rem grande sentimento. Mas assim é_
para emittir u m j u i z ó claro e Aqui vão alguns «logares commmis»
simples sobre qualquer pheno- do linguajar do povo.
meno n a t u r a l algo complexo. — Tenha santa paciência.
— Tenha dó deste seu negro.
Estão mais longe da c u l t u r a que — Tire o cavallo da chuva.
o homem «ignorante» n a ac- — Você não é dos peóres.
cepção corrente, mas que disci- — Faça lá o que quizer.
— Deu dois pinotes e.meio.
plinou o seu entendimento na -— Misericórdia, meu Deus.
observação directa e no estudo — Por Deus e a Virgem Maria.
experimental. Toda a sua eru- Basta fazer a simples experiência
de mudar algumas dessas palavras e
dição livresca não serve aquelle logo se evidencia a impropriedade que,
mais que para falsear-lhe a vi- adquirem. — «Mariquinhas, meu co-
são das coisas, que de o u t r a ração U é phrase indigna de u m a>
paixonado : este dirá :
maneira seria mais lúcida e pre- — Mariquinhas, meu amor !
cisa. — Maria, meu coração !
Ou, acaso, poderá escolher uma re~
Quando Sócrates queria infun- duplicação que é ainda ternura :
dir aíguma noção em u m dos seus — Mariquinhas ! Mariquinhas !
104 A NOVELLA SEMANAL

E' claro, se não estou a tresvariar, Assim a «redondilha» e o verso «he- as comédias do famoso Nioolau Lu
que — «Maria ! Maria !» — não passa róico» sao os dois typos vernaoulos Seus alexandrinos, da espécie a qVe
5%
de expressão gélida, apathica e inerte. tyranicos e incoeroiveis como as nos chamei de «alexandròes.-. dizem as-
E' o que sinto, mas posso estar em sas lagrimas, o nosso fôlego, e todas sim :
erro. Tenho por um sujeito seeco, as expressividades em que se crysta- A minha filha ó honrada, ó virtuosa,
íleugmatico, .aquelle que diz a seu in- lizam as nossas paixões.
ferior : Não temos outra geometria nem [é boa,
outro numero. Tiral-as dahi é enfor- Mas j á que você tonto oasou com oi-
— Tire o chapéo ! [Ia á toa,
E tenho por um homem nervoso, cal-as. Tratando o grande ndagio, de coco
-elegante e poeta, o que diz : Não quer isto dizer qrie nos sejam [dos rapazes,
— Tire o chapéo da cabeça ! vedados os outros caminhos de artifi- Que diz, antes que cases repara no
J á vae longa a impertinencia dessas cio, fora daquelle trivio e quatrivio [que fazes,
frioleiras phraseologicas. da lingua e do pensamento portu-
Se estou com a verdade nesses des- guez ; e nem foram os portuguezes
propósitos que venho de referir, não que os inventaram. E' incrível de estupidez.
í destempero grave, vir sempre lem- A poética abrange numerosas espé- Emfim, veiu líocage. E veiu Casti-
brando a justeza do metro idiomatico cies, j á compendiadas pelos technioos lho que poz tudo nos eixos de mais
e a difficnldade (a «difiiculdade», a-r- e didactas. acurada imitação, li' aquelle um ver-
tentem nisso) de vencer o habitualis- Ao poeta é licito percorrer toda a so amplo, sonoro e magestoso ;' mas
mo das nossas legitimas dicções. escala, de valores e de rythmos. não é para quem. o quer e muito me-
Todos os que estudam a philologia O alexandrino appareceu em Por- nos para estreantes inhabeis ou pouco
e a linguistica, sabem que temos uma tugal pelos fins do seoulo XVIJI, en- affeitos aos segredos da technioa.
lingua dupla : a popular e a erudita, tre duas épocas medíocres da poesia, Todos os que versejam, entre nós,
nas palavras e na phi-aseologia. a gongorica e a arcadioa. Um dos pri- querem principiar por aquella adapta-
A medida de unia ó a redondilha, meiros que usaram o alexandrino ção, balbuciam e gargarejam suas
-e o gênio da outra é talvez de- foi um escriptor de oomedias, Manoel primeiras vozes ntiquollo metro de
casyllabico. de Figueiredo, auctor da «Çrritaria», importação recente ; e, para falar se-
Não é grande erro nem disparate poema dramatioo de versos estopares gundo a doutrina que nxpuz ha pouoo,
dizer que escrevemos ou «falamos Ca- e nauseantes. saltam do «sentimento» para o «arti-
11
mõás» substituindo á lingua o gênio fioio», e, abafando a redondilha quasi
formador, mais poderoso que ella te- Este Manoel de Figueiredo buscou
afrancezar o theatro (então de ope- immanenr.e e hereditária no seu estro,
ve. Esse será sempre O molde erudito, vão ás camisas de onze varas da
o modelo literário e culto, que aos ras, burlas e farças). A sua obra, sal-
poucos se vae entranhando na alma va a intenção, era aehamboada, tosca moda.
popular. E' o modelo « h e r ó i c o . e malfeita, e valia ainda menos que JOÃO RIBEIRO

ACABA APPARECER
SIMÃO DE MANTUA ABANDO CAIUBY
i

FIGURÕES SAPEZAES
VISTOS POR DENTRO
ESTUDO DE PSYCHOLO-
E TIGUERAS
GIA SOCIAL BRASILEIRA
C O N T O S

P r e ç o -Sfc^QOO P r e ç o -S^OOO
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PEDIDOS AOS EDITORES:


RUA BOA VISTA N. 52
MONTEIRO LOBATO & C. * Caixa, 2 B — S. PAULO
E X > I < > O E » JDA

rAMADEU AMARAL F. T. DE SOUZA REIS


À Pulseira de Ferro (novella) 1$000 A Divida do Brasil (estudo histórico) . . 4$000
Um soneto de Bilac (critica) 2$000
WALDEMAR FERREIRA
MONTEIRO LOBATO Manual do Commerciante 8$000
Os Negros (novella) . . . . . . . . 1$000 Estudos de Direito Commercial . . . . 10$0()0
A Hypotheca Naval no Brasil 3$000
LÉO VAZ
AUCTORES DIVERSOS
Ritinha (novella) No prelo
O que todo o commerciante precisa saber
A GUSTAVO BARROSO ^ (lO.o milheiro) . . _ 2$000
' Mula sem cabeça (novella) No prelo Almanach Commercial Brasileiro de 1918 6$000

A. DE SAMPAÍO DORIA NICOLAU ATHANASSOF


Os Suinos, manual do criador de porcos
O que o cidadão deve saber (10.° milheiro) 3$000 (2.a edição, 8.° milheiro) . . . . 3$000.
OS PEDIDOS DO INTERIOR DEVEM TRAZER MAIS lóo/o PARA O PORTE

S O C I E D A D E E D I T O R A O E E G A R I O R I B E I R O
R u a r>r. A b r a n c h e s , -gtí3 - C a i x a P o s t a l XXÍ?S « S Ã O P A U L O

EDIÇÕES DA " R e v i s t a do Brasil


Broch. Encad. Broch. Encad.
NEORINHA, contos por Monteiro DIAS DE GUERRA E DE SER-
Lobato 2$5Ó0 3$500 TÃO, interessante narrativa pelo
URUPÉS, contos por Monteiro Lo- Visconde de Taunay . . . . 4$000 5$000
bato, 6.a edição 4$0Q0 5$000 MADAME POMMERY, íomance
CIDADES MORTAS, contos por satyrico, por Hilário Tácito. .
Monteiro Lobato, 2.a edição . . 4$000 5$000 BRASIL COM S OU COM Z, por
IDÈAS DE JECA TATU, critica F. Assis Cintra 3$000 —
por Monteiro Lobato, 2.a edição 4$000 5$000 VIDA OCIOSA, romance por Go-
NARIZINHO ARREBITADO, li- dofredo Rangel 4$000 5$000
vro de historias para crianças, OS CABOCLOS, contos por Val-
por Monteiro Lobato . . . . 3$500 domiro Silveira 4$000 5$000
POPULAÇÕES MERIDIONAES HISTORIAS DA NOSSA HISTO-
DO BRASIL, estudo de sociolo- RIA, por Viriato Corrêa . . . 3$500 4$500
gia por F. /. Oliveira Vianna . 8$000 10$000 ESPHINGES, versos de Francisco
PROFESSOR JEREMIAS, por Léo Julia 5$000 —
• Voz, 3.a. edição . ' 4$000 5$000 SCENAS E PAISAGENS DA MI-
VIDA E MORTE DE GONZAGA NHA TERRA, versos caipiras de
DE SÁ, romance por Lima Bar- Cornelio Pires 5$000 —
reto . . . . . . . . . . . 2$000 — CASA DE MARIBONDO, contos,
LIVRO DE HORAS DE SOROR João do Norte 3$000 —
DOLOROSA, poesias por Gui- PAIZ DE OURO E ESMERALDA,
lherme de Almeida 5$000 — romance,/. A. Nogueira'. . . 4$000 —
ALMA CABOCLA, versos de Pau- PEDIDOS PARA O INTERIOR,
, Io Setúbal, 2.a edição . . . . 3$000 4$000 MAIS 10 o/o PARA O PORTE
Pedidos aos Editores: M o n í e i f O L o b a t O O . C , C a i x a 2 - A - S. P A U L O
A NOVELLA NACIONAL
"Volumes publicados:
A NOVELLA NACIONAL é uma A P t i l s e i r á d e F e r r o por
série de pequenos livros, nos quaes AMADEU AMARAL, o successor de
se mira ao seguinte escopo : offerecer Olavo Bilac, na Academia Brasileira.
a melhor leitura, sob a apresentação "ü? no gênero uma verdadeira obra
mais artistica, ao preço mais barato prima „ — disse desta novella o grande
possivel. Os objectivos desta publi- poeta Alberto de Oliveira.
cação, de que é director o sr. Amadeu O s N e g r o s por MONTEIRO LO-
Amaral (da Academia Brasileira) podem BATO, o celebre creador de Jeca Tatu.
assim, condensar-se no lemma — LI- Estão no prelo mais dois volumes:
VRO BOM E BONITO AO ALCAN- R i t i n h a por LEO VAZ, o fes-
CE DE TODOS. tejado auctor do "Professor Jeremias",'
romance que obteve o maior successo
Apparece approximadamente um vo- literário da actualidade, alcançando três
lume por mez, com cerca de 80 pa- edições em poucos mezes!
ginas, no formato 16 »/a X 12 J/2 centí- M u l a s e m c a b e ç a por GUS- I
metros, impresso em magnífico papel TAVO BARROSO, o famoso escriptor
e illustrado com numerosas e, artísticas cearense, autor da T E R R A DO SOL,
gravuras, contendo uma obra completa H E R O E S E BANDIDOS e outras
de auctor conhecido. joiâs literárias, j á sobejamente conhe-
cidas e apreciadas.

OS NEGROS

A seguir novellas de :
Coelho Netto,
Afranío Peixoto,
Waldomíro Silveira
Cornelio Pires e outros.
Cada volume. 1!$000 em
todas as livrarias. Pelo
correio, registrado 1|300.
Assignaturas com direito
a receber todos os vo-
lumes registrados:
Série de três novellas
3$500; 'série de seis no-
vellas 7$000; série de
doze novellas 14$000.
Pedidos á

Sociedade Editora
Olegarío Ribeiro
Rua Dr, Abranches N. 43
Caixa, 1172 - SAO PAULO
... - - - • - '

Typ. " Revista de Commercio e Industria „ da


Soe. Ed. Olegarío Ribeiro, Abranches 43, S. Paulo — L á , f o g e s , « n n t i a a l l i n i i . m » njm _ „<-,,

: A C M C f i E
"'•'-• " ' " ' " -' "






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