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Prefácio ............................................................................................................ 02
Prefácio às edições francesa e alemã ............................................................. 03
I – A concentração da produção dos monopólios ............................................ 07
II – Os Bancos e a sua nova função ................................................................ 17
III – O capital financeiro e a oligarquia financeira ............................................ 29
IV – A exportação de capitais .......................................................................... 39
V – A partilha do mundo entre os grupos capitalistas ...................................... 42
VI – A partilha do mundo entre as grandes potências ..................................... 49
VII – O imperialismo, fase particular do capitalismo ........................................ 57
VIII – O parasitismo e a decomposição do capitalismo ................................... 65
IX – A crítica do imperialismo .......................................................................... 72
X – O lugar do imperialismo na História .......................................................... 82
2
PREFÁCIO
O Autor
3
Este livro foi escrito em 1916 tendo em conta a censura tzarista como se
refere no prefácio à edição russa. Não me é possível, atualmente, refazer todo o
texto, o que de resto não teria qualquer utilidade, porquanto o papel fundamental
deste livro foi, e continua ainda sendo o de mostrar, partindo dos dados de
conjunto das indiscutíveis estatísticas burguesas de todos os países, qual era, no
começo do séc. XX, em vésperas da primeira guerra imperialista mundial, o
quadro de conjunto da economia capitalista em suas relações internacionais.
A tal respeito, aliás, ele não será de todo inútil para muitos comunistas dos
países avançados se, através do exemplo deste livro, “legal” do ponto de vista da
censura tzarista, eles se derem conta da possibilidade – e da necessidade – de
utilizarem mesmo os pequenos vestígios de legalidade de que ainda possam
beneficiar, nomeadamente, na América contemporânea ou em França após as
recentes prisões da sua quase totalidade, para explicarem toda a falsidade dos
pontos de vista dos social-pacifistas e das suas esperanças numa “democracia
mundial”. Quanto aos complementos mais indispensáveis a este livro censurado,
tentarei apresentá-los neste prefácio.
II
Este livro mostra que a guerra de 1914-18 foi, de ambos os lados, uma
guerra imperialista (isto é, uma guerra de conquista, de pilhagem, de pirataria),
uma guerra pela partilha do mundo, pela distribuição e redistribuição das colônias,
das “zonas de influência” do capital financeiro, etc...
Com efeito, a prova do verdadeiro caráter social ou, de forma mais exata,
do verdadeiro caráter de classe da guerra não se encontra, evidentemente, na sua
história diplomática, mas na análise da situação objetiva das classes governantes
de todas as potências beligerantes. Para ilustrar esta situação objetiva, é preciso
considerar não exemplos dados isolados (a extrema complexidade dos fenômenos
da vida social permite sempre encontrar tantos exemplos ou dados isolados
quantos se queiram sustentar seja que hipótese for), mas todo o conjunto de
dados relativos aos fundamentos da vida econômica de todas as potências
beligerantes e do mundo inteiro.
Foram exatamente estes dados de conjunto, inteiramente irrefutáveis, que
apresentei nos quadros relativos à partilha do mundo, em 1876 e 1914, e à
partilha das estradas de ferro do mundo inteiro, em 1870 e 1913. As estradas de
ferro nos dão o balanço dos ramos chaves da indústria capitalista, da indústria
hulhífera e siderúrgica, o balanço e os índices mais significativos do
desenvolvimento do comércio mundial e da civilização democrática burguesa.
Como se ligam as estradas de ferro à grande produção, aos monopólios, aos
sindicatos patronais, aos cartéis, aos trustes, aos bancos, à oligarquia financeira
eis o que os capítulos precedentes do livro nos mostram. A desigual repartição da
rede ferroviária, a desigualdade do seu desenvolvimento constitui, à escala
mundial, o balanço do moderno capitalismo monopolista. E este balanço mostra
4
III
IV
N. Lênin
(1) Nota do tradutor – as notas de Lênin são, na presente edição, dadas em rodapé de
cada página.
mais tarde e talvez sob outra forma. Eis o que, de acordo com os dados
respeitantes ao desenvolvimento econômico da Grã-Bretanha é a grandeza das
empresas e o alto nível da sua técnica que originam a tendência para o
monopólio. Por um lado, a concentração implica a necessidade de investir em
cada empresa somas enormes; e, além disso, a criação de novas empresas
depara com o obstáculo de exigências cada vez maiores em matéria de
investimentos, o que torna a sua constituição mais difícil. Por outro lado (e isso
nos parece ser o ponto mais importante), qualquer nova empresa que se queira
elevar ao nível das empresas gigantes criadas pela concentração deve fornecer
uma tal quantidade excedente de produtos, que a sua venda vantajosa só pode ter
lugar sob condição de se verificar um extraordinário aumento da procura, pois de
outra forma este excedente de produção fará baixar os preços numa proporção
tão desastrosa para a nova fábrica, como para as associações monopolísticas”.
Na Inglaterra, as associações monopolísticas de empresários – cartéis e trustes –
não surgem, a maior parte das vezes, - diferentemente do que sucede nos outros
países onde os direitos protetores facilitam a cartelização – senão quando o
número das empresas concorrentes se reduz “no máximo a duas dúzias”. “Na
grande indústria, a influência do movimento de concentração sobre a organização
dos monopólios mostra-se aqui com uma clareza cristalina” (5)
(4) Hans G. Heymann: Die gemischten Werke im Stuttgart, 1904, págs. 256, 278-279.
(5) Hermann Levy: Monopólio, Cartel e Truste, 1909, págs. 286, 290 e 298.
começa com a depressão industrial internacional dos anos 1870-1880 e vai até
aos princípios do ano de 1890”. “Examinando a questão à escala européia, o
desenvolvimento da livre concorrência atinge o seu apogeu entre 1860 e 1880. A
Inglaterra tinha acabado de construir a sua organização capitalista de estilo antigo.
Na Alemanha, esta organização investia poderosamente contra o artesanato e a
indústria no domicílio e começava a criar as suas próprias formas de existência”.
“A grande viragem começa com o ‘crack’ de 1873, ou mais exatamente,
com a depressão que se lhe seguiu e que – com uma interrupção, dificilmente
perceptível, imediatamente após 1880 e com uma expansão extremamente
vigorosa, mas curta, por volta de 1889 – preenche vinte e dois anos de história
econômica da Europa”. Durante o curto período de expansão, em 1889, se
utilizou, numa medida notável, o sistema dos cartéis para explorar a conjuntura.
Uma política irrefletida fez subir os preços ainda com mais rapidez e violência do
que aquele que teria se verificado na ausência de cartéis; estes últimos,
lamentavelmente, afundaram-se quase todos, desmantelaram-se “no fosso do
crack”. Seguiram-se cinco anos de maus negócios e baixos preços, mas na
indústria o estado de espírito já não era o mesmo. Já não se considerava a
depressão como algo que marcha por si, mas antes se via nela tão só uma pausa
antecedendo uma nova conjuntura favorável.
“A formação dos cartéis entrou assim em sua segunda fase. Os cartéis, de
fenômeno passageiro que eram, se tornam em uma das bases de toda a vida
econômica. Eles conquistam setor após setor e, em primeiro lugar, o da
transformação das matérias primas. No começo do período de 1890-1900, ao
constituírem o sindicato do coque, que serviu de modelo, à organização do carvão,
eles já haviam elaborado uma técnica dos cartéis que, no fundo, não foi
ultrapassada. O grande progresso do fim do séc. XIX e a crise de 1900-1903 –
pelo menos na indústria mineira e siderúrgica – se desenvolveram pela primeira
vez inteiramente sob o signo dos cartéis. E se, na época, isso aparecia ainda
como qualquer coisa de novo, atualmente, o fato de, em regra, importantes
setores da vida econômica escaparem à livre concorrência se torna uma verdade
evidente para a opinião pública (6).
Assim, as principais fases da história dos monopólios podem se resumir do
seguinte modo:
1) Anos 1860-1880: ponto culminante do desenvolvimento da livre
concorrência. Os monopólios não são mais do que embriões dificilmente
perceptíveis;
2) Após a crise de 1873: período de grande desenvolvimento dos cartéis; no
entanto, eles ainda aparecem apenas a título excepcional. Carecem ainda de
estabilidade. Têm ainda um caráter transitório;
3) Expansão do fim do séc. XIX e crise de 1900-1903: os cartéis tornam-se
uma das bases de toda a vida econômica. O capitalismo se transformou em
imperialismo.
Os cartéis estabelecem entre si acordos sobre as condições de venda, as
trocas, etc. Repartem os mercados entre si. Determinam a quantidade dos
produtos a fabricar. Fixam os preços. Repartem os lucros entre as diversas
empresas, etc.
12
(6) Th. Vogelstein: Die finanzialle Organisation der Kapitalistischen Industrie und die
Monopolbidungen, in Grundriss der Sozialökonomik, VI Abt, 1914. Ver do mesmo autor
Organisationsformen der Eisenindustrie und der Textilindustrie in England und Amerika, T. I
Leipzig, 1910.
(7) Dr. Riesser: Die deutschen Grossbanken und ihre Konzentration im Zusammenhange
mit der Entwicklung der Gesamtwistschaft in Deutschland, 4ª edição, 1912, pág. 19; R. Liefman:
Kartelle und Trusts und die Weiterbildung der volkswirtschaftichen Organisation, 2ª ed., 1910, pág.
25.
(8) Dr. Fritz Kestner: Der Organisationszwang. Eine... 1912, pág. 11.
(9) R. Liefmann: Beteiligungs und Finanzierungsgesellschaften. Eine Studie... 1ª ed., Iena,
1909, pág. 212.
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PERCENTAGEM DE DEPÓSITOS
Nos 48 outros
Nos 115 bancos Nos pequenos
Nos nove grandes bancos com um
com um capital bancos (com
Anos bancos capital de mais de
de 1 a 10 um capital de
berlinenses 10 milhões de
milhões um milhão)
marcos
1907-1908 47 32,5 16,5 4
1912-1913 49 36 12 3
(1) Alfred Lansburgh: Fünf Jahre deutsches Bankwesen, in Die Bank, 1913, n. 8, pág. 728.
Número de Cartas
Anos
Recebidas Expedidas
1852 6.135 6.292
1870 85.800 87.513
1900 533.102 626.043
(4) Eugen Kaufmann: Das Französische Bankwesen, Tübingen, 1911, págs. 356 e 362.
(5) Jean Lescure: O aforro em França, Paris, 1914, pág. 52.
(6) A. Lansburgh: “Die Bank mit den 300 Milionen”, Die Bank, 1914, pág. 426.
(7) S. Tschierchky, op. Cit., pág. 128.
“Os bancos criam, à escala social, a forma, mas tão-só a forma, de uma
contabilidade e de uma repartição gerais dos meios de produção”, escrevia Marx
há meio século, no Capital (tradução russa, livro III, 2ª. Parte, pág. 144). Os
números que citamos sobre o crescimento do capital bancário, sobre o aumento
de filiais e sucursais dos grandes bancos e das suas contas correntes, etc.,
mostram-nos, concretamente, esta “contabilidade geral” de toda a classe dos
capitalistas, e até não apenas dos capitalistas, uma vez que os bancos reúnem,
pelo menos durante algum tempo, todas as espécies de rendimentos em dinheiro
provenientes de pequenos patrões, de empregados e da diminuta camada
superior dos operários. A “repartição geral dos meios de produção” eis o que, de
um ponto de vista inteiramente formal, resulta do desenvolvimento dos bancos
modernos, dos quais os mais importantes em número de 3 a 6, na França, e de 6
a 8, na Alemanha, dispõem de bilhões e bilhões. Mas, quanto ao conteúdo, esta
repartição dos meios de produção nada tem de “geral”; ela é privada, isto é,
conforme aos interesses do grande capital – e, em primeiro lugar, ao capital
monopolista, chefe de fila do maior capital – que opera em tais condições que, só
a custo, a massa da população pode satisfazer as suas necessidades e em tais
condições eu, todo o desenvolvimento da agricultura se atrasa irremediavelmente
relativamente ao da indústria, da qual um ramo, o da “indústria pesada”, recebe
um tributo de todos os outros.
As caixas econômicas e as estações de correios começam a concorrer com
os bancos na socialização da economia capitalista. São estabelecimentos mais
23
(8) Segundo o National Monetary Commission, american Die Bank, 1910, I, pág. 1.200.
(9) Die Bank, 1913, págs. 811 e 1.022; 1014, pág. 713.
(10) Dr. Oscar Stillich: Geld und Bankwesen, Berlim, 1097, pág. 169.
(11) Schulze-Gaevernitz: Die deutsche Kreditbank, in Grundriss der Sozialökonomik,
Tübingen, 1915, pág. 101.
(12) Riesser: op. cit., 4ª. ed., pág. 629.
Daí resulta, por um lado, uma fusão, cada vez mais completa, ou, segundo
a feliz fórmula de N. Boukharine, uma interpretação do capital bancário e do
capital industrial e, por outro lado, a transformação dos bancos em
estabelecimentos que, no sentido mais exato do termo, apresentam “caráter
universal”. Sobre este ponto, julgamos nosso dever citar as próprias palavras de
Jeidels, o autor que melhor estudou a questão:
“O exame das relações industriais, no seu conjunto, permite constatar o
caráter universal dos estabelecimentos financeiros que trabalham para a indústria.
Diferentemente do que sucede com outras formas de bancos, contrariamente às
exigências formuladas algumas vezes por diversos autores, a saber, que os
bancos deveriam especializar-se num domínio, ou numa indústria determinada, a
fim de o terreno não lhes fugir dos pés, os grandes bancos esforçam-se por
multiplicar, o mais possível, as suas relações com as empresas industriais mais
diversas quanto ao lugar e ao gênero de produção, e por fazerem desaparecer,
cada vez mais, as desigualdades na repartição dos capitais entre as diversas
regiões ou ramos da indústria, desigualdades cuja explicação se encontra na
história das diferentes empresas”. “Uma tendência consiste em generalizar a
ligação com a indústria; uma outra em torná-la contínua e intensiva; ambas são
aplicadas senão integralmente pelo menos já em notáveis proporções e em grau
igual pelos seis grandes bancos”.
Ouve-se bastantes vezes os meios industriais e comerciais queixarem-se
do “terrorismo” dos bancos. Será isso de admirar quando os bancos “mandam” da
forma que o exemplo seguinte ilustra? No dia 19 de Novembro de 1901 um dos
bancos D de Berlim (chama-se assim aos quatro grandes bancos cujo nome
começa pela letra D) dirigiu ao Conselho de Administração do Sindicato dos
Cimentos, do Centro-Norte-Oeste alemão, a seguinte carta: “Segundo a nota que
vocês publicaram no dia 18 deste mês em tal jornal, parece que devemos encarar
a eventualidade de ver a próxima assembléia geral do vosso sindicato, marcada
para 30 do corrente, tomar decisões suscetíveis de produzir alterações na vossa
empresa que nós não podemos aceitar. Deste modo, e com grande pesar, vemo-
nos na necessidade de vos recusar, para o futuro, o crédito que vos tinha sido
concedido. Todavia, se esta assembléia geral não tomar decisões para nós
inaceitáveis e se recebermos as desejáveis garantias para o futuro, declaramo-nos
inteiramente dispostos a negociar convosco a abertura de um novo crédito” (14).
Na verdade, surgem-nos aqui, de novo, os queixumes do pequeno capital
oprimido pelo grande, só que desta vez foi todo um sindicato que caiu na categoria
dos “pequenos”! A velha luta entre o pequeno e o grande capital recomeça, mas
num novo grau de desenvolvimento infinitamente superior. É evidente também que
os grandes bancos, dispondo de bilhões, são capazes de acelerar o progresso
técnico através de meios que, de forma alguma, podem comparar-se aos de
outros tempos. Os bancos, por exemplo, fundam sociedades especiais de estudos
técnicos cujos trabalhos beneficiam, bem entendido, apenas as empresas
industriais “amigas”. Entre outras, citemos a “Sociedade para o Estudo das
Ferrovias Elétricas”, o “Gabinete Central de Pesquisas Científicas e Técnicas”,
etc..
28
(14) Dr. Oscar Stillich: Geld und Bankwesen, Berlim, 1907, pág. 148.
Os próprios diretores dos grandes bancos não podem deixar de ver que
novas condições estão em vias de se formarem na economia nacional, mas,
perante elas, mostram-se impotentes:
“Quem”, escreve Jeidels, “ao longo dos últimos anos, observou as
mudanças de pessoas na direção e nos conselhos fiscais dos grandes bancos não
pôde deixar de notar que, pouco a pouco, o poder ia passando para as mãos de
homens que consideram como tarefa indispensável, e casa vez mais premente,
dos grandes bancos, a intervenção ativa no desenvolvimento geral da indústria e
que, entre estes homens e os antigos diretores de bancos surgiam a tal respeito
divergências de ordem profissional e, freqüentemente, também de ordem pessoal.
No fundo, trata-se de saber se os bancos, enquanto estabelecimentos de crédito,
não sofrem um prejuízo ao intervirem no processo da produção industrial, se não
sacrificam os seus sólidos princípios e um lucro certo a uma atividade totalmente
alheia ao seu papel de intermediários do crédito e que os conduz para um terreno
onde ficam ainda mais expostos do que no passado à ação cega da conjuntura
industrial. É o que afirmam numerosos antigos diretores de bancos, mas a maior
parte dos jovens consideram a intervenção ativa nas questões industriais como
uma necessidade, semelhante à que, simultaneamente com o desenvolvimento
atual da grande indústria moderna, suscitou o aparecimento dos grandes bancos e
da empresa bancária industrial atual. As duas partes apenas estão de acordo num
ponto, a saber, que não existem princípios rígidos nem um fim concreto, para a
nova atividade dos grandes bancos” (15).
O antigo capitalismo fez a sua época. O novo constitui uma transição. A
procura de “princípios rígidos e de um fim concreto” com vista a “conciliar” o
“monopólio” e a “livre concorrência” é, evidentemente, uma tentativa votada ao
fracasso. As confissões dos práticos nada se assemelham aos louvores
entusiastas dos apologistas oficiais do capitalismo “organizado”, tais como
Schulze-Gaevernitz, Liefmann e outros “teóricos”.
triunfo definitivo, que pela primeira vez fez desta ligação com a indústria o
verdadeiro monopólio de enormes bancos, que tornou estas ligações
notavelmente mais íntimas e intensivas”.
Deste modo, o séc. XX marca o ponto de partida de viragem em que o
antigo capitalismo deu lugar ao novo, em que o domínio do capital financeiro
substituiu o domínio do capital em geral.
que o comércio existiu entre os homens primitivos, que ainda não praticavam a
troca, e que deve subsistir na sociedade socialista!
Os fatos monstruosos relativos à monstruosa dominação da oligarquia
financeira são, porém, de tal modo patentes que, em todos os países capitalistas,
quer na América, quer em França, quer na Alemanha, apareceu uma literatura
que, embora professando integralmente o ponto de vista burguês, pinta um quadro
aproximadamente exato e formula uma crítica – pequeno-burguesa, é evidente –
da oligarquia financeira.
Na base, encontra-se, primeiramente, o “sistema de participações” acerca
do qual já dissemos algumas palavras. Eis a exposição que dele fez o economista
alemão Heymann que foi um dos primeiros, senão o primeiro, a ocupar-se dele:
“Um diretor controla a sociedade de base (literalmente: “a sociedade-mãe”);
por seu turno aquela reina sobre as sociedades que dependem dela (as
“sociedades-filha”); estas últimas reinam sobre as “sociedades-neta”, etc. É
possível, portanto, dispor da direção principal de imensos domínios da produção
sem possuir um grande capital. Com efeito, se a posse de 50% do capital é
sempre suficiente para controlar uma sociedade por ações, o diretor tem
necessidade apenas de um milhão para poder controlar 8 milhões de capital nas
“sociedades-neta”. E, se este “entrelaçamento” for levado mais longe, é possível
com um milhão controlar dezesseis milhões, trinta e dois milhões etc. (3)
De fato, a experiência mostra que basta possuir 40% das ações para
administrar os negócios de uma sociedade anônima (4), visto que um certo
número de pequenos acionistas disseminados não tem qualquer possibilidade de
participar nas assembléias gerais, etc. A “democratização” da posse das ações, da
qual os sofistas burgueses e os oportunistas pseudo-social-democratas esperam
(ou afiançam que esperam) a “democratização do capital”, a acentuação do papel
e da importância da pequena produção, etc., na realidade não é mais do que um
dos meios de aumentar o poderio da oligarquia financeira. Eis porque, diga-se de
passagem, nos países capitalistas mais evoluídos ou mais antigos e
“experimentados”, o legislador permite a emissão de títulos de reduzido montante.
Na Alemanha, nos termos da lei, uma ação não pode ser de montante inferior a
mil marcos e os magnatas alemães da finança invejam a Inglaterra onde são
permitidas ações de uma libra esterlina (= 20 marcos, cerca de 10 rublos).
Siemens, um dos maiores industriais e “reis da finança” alemães, a 7 de Junho de
1900, afirmava no Reichstag que “a ação de uma livra esterlina constitui a base do
imperialismo britânico” (5). Este negociante tem uma concepção do imperialismo
claramente mais profunda, mais marxista, do que certo autor incongruente, que
passa por fundador do marxismo russo e que julga que o imperialismo constitui
uma tara própria de um determinado povo...
(7) Kurt Heining: Der Weg des Elektrotrust, Neue Zeit, 1912, 30°. ano, II, pág. 484.
(8) E. Agahd: Grossbanken und Weltmarkt, Berlim, 1914.
Deste modo, e de acordo com estes números, mais de três quartas partes,
dos quase quatro bilhões de rublos que constituem o capital “ativo” dos grandes
bancos, pertencem a bancos que, no fundo, nada mais são do que “filiais” de
bancos estrangeiros, entre os quais, em primeiro lugar, de bancos parisienses.
Exporta os seus capitais, naturalmente, cuida dos seus (do famoso trio: União
Parisiense, Banco de Paris e Países Baixos, Sociedade Geral); berlinenses
(nomeadamente, o Deutsche Bank e o Disconto-Gesellschaft). Dois dos mais
importantes bancos russos, o “Banco Russo” (“Banco Russo para o Comércio
Exterior”) e o “Banco Internacional” (“Banco de S. Petersburgo para o Comércio
Internacional”) de 1906 a 1912, elevaram os seus capitais de 44 para 98 milhões
de rublos e os seus fundos de reservas de 15 para 99 milhões, “trabalhando com
capitais alemães numa proporção de três quartas partes”. A primeira pertence ao
“consórcio berlinense do “Deutsche Bank” e a segunda ao “Disconto-
Gesselschaft”, igualmente berlinense. O excelente Agahd indigna-se,
profundamente, por ver a maioria das ações na detenção de bancos berlinenses, o
que reduz à impotência os acionistas russos. O país que exporta os seus capitais,
naturalmente cuida dos seus interesses. O “Deutsche Bank”, ao introduzir em
Berlim as ações do Banco Comercial da Sibéria, guardou-as em carteira durante
um ano e seguidamente vendeu-as à cotação de 193 por 100, isto é, quase pelo
dobro, “obtendo” assim um benefício de cerca de 6 milhões de rublos a que
Hilferding devia chamar “benefício de fundação”.
O nosso autor avalia em 8.235 milhões de rublos, quase 8,25 milhões, a
“potência” total dos maiores bancos de Petersburgo; quanto à participação” ou, de
forma mais exata, à dominação dos bancos estrangeiros, fixa-a nas seguintes
proporções: bancos franceses, 55%; ingleses, 10%; alemães, 35%. Desta soma
de 8.235 milhões, 3.687 milhões de capitais ativos, ou seja, mais de 40%,
pertencem, segundo os cálculos do autor, aos sindicatos patronais a seguir
mencionados: “Prodougol”, “Prodamet”, sindicatos do petróleo, da metalurgia e
dos cimentos. Graças à formação dos monopólios capitalistas, a fusão do capital
bancário e do capital industrial originou também na Rússia grandes bancos.
O capital financeiro, concentrado em algumas mãos e exercendo um
monopólio de fato, obtém da constituição de firmas, das emissões de títulos, dos
empréstimos ao Estado, etc., enormes lucros, cada vez maiores, consolidando o
domínio das oligarquias financeiras e onerando toda a sociedade com um tributo
em benefício dos monopolistas. Eis um exemplo dos “processos de gestão” dos
trustes americanos, citado por Hilferding, e tomado entre milhares: em 1887, M.
Havemeyer fundava, através da fusão de quinze pequenas sociedades, o truste do
açúcar, cujo capital se elevava a um total de 6,5 milhões de dólares.
Convenientemente “aguado”, segundo a expressão americana, o capital do truste
foi avaliado em 50 milhões de dólares. Esta “recapitalização” levava em conta os
futuros lucros do monopólio, tal como o truste do aço – na América, como sempre
– ao comprar, o mais possível, jazigos de minério, toma em conta os futuros lucros
do monopólio. Ora, o truste do açúcar impôs, efetivamente, os seus preços de
monopólio; isso valeu-lhe um tal lucro que ele pôde pagar 10% de dividendos ao
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capital sete vezes “aguado”, ou seja, quase 70% do capital efetivamente liberado
quando da fundação do truste! Em 1909, o capital deste truste elevava-se a 90
milhões de dólares. Em vinte e dois anos mais do que decuplicara.
Na França, o reinado da “oligarquia financeira” (Contra a Oligarquia
Financeira, título do famoso livro de Lysis, cuja quinta edição apareceu em 1908)
revestiu uma forma um pouco diferente. No que se refere à emissão de títulos os
quatro maiores bancos dispõem de um monopólio absoluto e não apenas relativo.
Praticamente, constituem um “truste dos grandes bancos”. E o monopólio que
exercem proporciona lucros exorbitantes, quando das emissões. Geralmente, o
país que contrata um empréstimo não recebe mais de 90% do montante deste
último; 10% pertencem aos bancos e aos restantes intermediários. O juro dos
bancos, no empréstimo russo-chinês de 400 milhões de francos, elevou-se a 8%;
no empréstimo russo de 800 milhões, (1904) a 10%; no empréstimo marroquino
de 62.500.000 francos, (1904) a 18.75%. O capitalismo que inaugurou o
desenvolvimento, servindo-se da usura em pequena escala, põe-lhe termo com a
usura em grande escala. “Os franceses, diz Lysis, são os usurários da Europa”.
Todas as condições da vida econômica se modificaram profundamente com esta
transformação do capitalismo. Mesmo que a população se mantenha estacionária,
mesmo que a indústria, o comércio e os transportes marítimos sejam afetados
pela estagnação, o “país” pode enriquecer graças à usura. “Cinqüenta pessoas,
representando um capital de 8 milhões de francos, podem dispor de dois bilhões
colocados em quatro bancos”. O sistema de “participações”, que já conhecemos,
leva ao mesmo resultado: a “Sociedade Geral”, um dos bancos mais poderosos,
emitiu 64.000 obrigações de uma filial – as “Refinarias do Egito”. Sendo o preço de
emissão de 150% o banco ganhou 50 cêntimos por franco. Os dividendos desta
sociedade, porém, revelaram-se fictícios e o “público” perdeu entre 90 a 100
milhões de francos. Um dos diretores da “Sociedade Geral” fazia parte do
Conselho de Administração das “Refinarias do Egito”. Não admira que o autor seja
obrigado a concluir: “A República Francesa é uma monarquia financeira”; “a
onipotência dos novos grandes bancos é absoluta; eles arrastam em sua esteira
os Governos, a imprensa” (9).
(9) Lysis: Contra a Oligarquia Financeira em França, Paris, 1908. 5ª. Ed., págs. 11, 12, 26,
39, 40 e 48.
“Em dez anos, de 1891 a 1900, a emissão de títulos industriais alemães fez
‘ganhar’ mais de um bilhão” (11).
Se, em períodos de expansão industrial, os lucros do capital financeiro são
incomensuráveis, em períodos de depressão as pequenas empresas e as
empresas precárias perecem, e os grandes bancos “participam”, ou na sua
compra por um preço baixo, ou em lucrativos “saneamentos” e “reorganizações”.
No “saneamento” das empresas deficitárias, “o capital-ação é reduzido, o que
significa que os lucros são repartidos por um quantitativo menor de capital e
calculados, conseqüentemente, em conformidade. Ou ainda, se os rendimentos
baixarem a zero, faz-se apelo a novo capital; este, associado ao antigo, que é
menos lucrativo, torna-se desde logo suficientemente rentável. Note-se,
incidentalmente, acrescenta Hilferding, que todos estes saneamentos e
reorganizações têm para os bancos uma dupla importância: primeiro, constituem
uma operação lucrativa e depois uma oportunidade de colocar sob tutela estas
sociedades em apuros” (12).
Um exemplo. A Sociedade Anônima Mineira “União”, de Dortmund, fundada
em 1872 com um capital-ação de aproximadamente 40 milhões de marcos, viu a
cotação das suas ações subir 170% desde que pagou 12% de dividendos no seu
primeiro ano de existência. O capital financeiro zelou pelos seus interesses
ganhando a bagatela de quase 28 milhões de marcos. No ato de fundação desta
sociedade, o papel principal pertencera à “Disconto-Gesselschaft”, aquele mesmo
grande banco alemão que conseguira elevar o seu capitã para 300 milhões de
marcos. Seguidamente, os dividendos da “União” baixaram para zero. Os
acionistas tiveram de consentir na transferência de uma parte dos capitais para
“lucros e perdas”, isto é, tiveram de sacrificar uma parte para não perder o todo. E
foi assim que, em trinta anos, através de uma série de “saneamentos”, mais de 73
milhões de marcos desapareceram dos registros da “União”. Presentemente os
acionistas fundadores desta sociedade têm nas suas mãos apenas 5% do valor
nominal dos seus títulos” (13), mas os bancos não deixaram nunca de “ganhar”
em cada “saneamento”.
(14) Die Bank, 1913, pág. 952, L. Eschwege: Der Sumpf; ibid., 1912, n. 1, pág. 233 e segs.
(15) Verkehrstrust, Die Bank, 1914, I, pág. 89.
(16) Der Zug zur Bank Die Bank, 1909, L, pág. 79.
(17) Der Zug zur Bank, Die Bank, cit., pág. 301.
(18) Ibide., 1911, II. Pág. 825; 1913, II, pág. 962.
contribuinte destes países, que são os quatro pilares do capital financeiro mundial,
verdadeiramente banqueiros internacionais.
Importa, particularmente, examinar o papel que a exportação de capitais
desempenha na expansão da rede internacional de dependências e relações do
capital financeiro.
IV – A EXPORTAÇÃO DE CAPITAIS
TOTAL 70 35 35 140
A. E. G. Bergmann Kummer
Guilhaume
Siemens e
Até 1900
Lahmeyer
Felten e
Halske
Cerca de 1912
[<<Cooperação>> íntima a partir de 1908]
(2) Riesser, op. cit.; Diouritch, op. cit., pág. 239; Kurt Heinig, artigo cit.
(3) Jeidels, pág. 193.
(4) Diouritch, op. Cit., pág. 245.
(5) Die Bank, 1912, n. 1, pág. 1.036; 1912, n. 2, pág. 629; 1913, n. 1, pág. 388.
(6) Riesser, op. Cit., pág. 125.
(1) A. Supan: Die territoriale Entwickung der auropaischen Kolonien, 1906, pág. 254.
POSSESSÕES COLONIAIS
População (em
População (em
População (em
Superfície (em
Superfície (em
Superfície (em
quadradas)
quadradas)
quadradas)
milhões de
milhões de
milhões de
milhões)
milhões)
milhões)
milhas
milhas
milhas
1815 – 1830 ? 126,4 0,02 0,5 - -
1860 2,5 145,1 0,2 3,4 - -
1880 7,7 267,9 0,7 7,5 - -
1889 9,3 309,0 3,7 56,4 1,0 14,7
(2) Henry c. Morris: The History of Colonisation, Nova York, 1900, Vol. II, pág. 88; vol. I,
pág. 419; vol. II, pág. 304.
Colônias
1876 1914
km² Hab. km² Hab.
INGLATERRA 22,5 251,9 33,5 393,5
RÚSSIA 17,0 15,9 17,4 33,2
FRANÇA 0,9 6,0 10,6 55,5
ALEMANHA - - 2,9 12,3
ESTADOS UNIDOS - - 0,3 9,7
JAPÃO - - 0,3 19,2
TOTAL para as 6
grandes potências 40,4 273,8 65,0 523,4
METRÓPOLES TOTAL
1914 1914
km² Hab. km² Hab.
INGLATERRA 0,3 46,5 33,8 440,0
RÚSSIA 5,4 136,2 22,8 169,4
FRANÇA 0,5 39,6 11,1 95,1
ALEMANHA 0,5 64,9 3,4 72,2
ESTADOS UNIDOS 9,4 97,0 9,7 106,7
JAPÃO 0,4 53,0 0,7 72,2
TOTAL para as 6
grandes potências 16,5 437,2 81,5 960,6
km² Hab.
Colônias de outras potências
9,9 45,3
(Bélgica, Holanda, etc.)
Semi-colônias 14,5 361,2
Outros países 28,0 289,9
TOTAL DO GLOBO 133,9 1651,0
53
(5) C. P. Lucas: Greater Rome and Greater Britain, Oxford, 1912 ou Earl of Cromer:
Ancient and modern imperalism, Londres, 1910.
vida que pesam não só sobre as multidões operárias, como também sobre as
classes médias, fazem acumular, em todos os países da velha civilização,
impaciências, rancores, ódios, ameaçadores para a paz pública; energias que
importa canalizar, desviando-as do seu meio social, empregando-as em qualquer
grande obra no seu meio social, empregando-as em qualquer grande obra no
exterior (7) se quisermos impedir que expludam no interior”.
Desde o momento em que, na época do imperialismo capitalista, se põe a
questão da política colonial, deve notar-se que o capital financeiro e a política
internacional que com ele se conforma e que se reduz à luta pela partilha
econômica e política do mundo entre as grandes potências, criam entre os
Estados diversas formas transitórias de dependência. Esta época não se
caracteriza apenas pelos dois principais grupos de países: possuidores de
colônias e colonizados, mas ainda por variadas formas de países dependentes
que, gozando nominalmente de independência política, na realidade, estão presos
nas redes de uma dependência financeira e diplomática. Já indicamos uma destas
formas: as semi-colônias. Eis uma outra da qual por exemplo, a Argentina, nos
oferece o modelo.
(7) Wahl: A França nas Colônias; cit. Por H. Russier: A Partilha da Oceania, Paris, 1905,
pág. 165.
(8) Schulze-Gaevernitz: Britischer Imperialism und englischer Freihandel zu Beginn dês 20-
ten Jahrhunderts, Leipzig, 1906, pág. 318. Sartorius von Waltershausen utiliza a mesma linguagem
no seu livro: Das volkswirtschafliche System der Kapitalangage im Auslande, Berlim, 1907, pág. 46.
(1) Die Neue Zeit, 1914, II (32º. Ano), pág. 909, 11-Setembro-1914. Ver igualmente, 1915,
II, págs. 107 e segs.
(3) Die Neue Zeit, 1914, II, (32º. Ano), pág. 921, de 11-Set.-1914. Ver igualmente 1915, II,
págs. 107 e segs.
Vias de
comunicação Comércio Indústria
População (em milhões de
Superfície (em milhões de
(em
milhares de milhões de
Principais
Fusos na indústria
regiões
exportações (em
milhares de km)
férreas
algodoeira (em
econômicas
Importações e
de toneladas)
do mundo
habitantes)
toneladas)
milhões)
marcos)
km²)
Vias
63
3) Rússia 22 131 63 1 3 16 3 7
não procede agora a uma nova partilha com base em novas relações de forças
que se alteram de forma inteiramente não pacífica?
O capital financeiro e os trustes não enfraquecem, antes reforçam, as
disparidades entre o ritmo de desenvolvimento dos diversos componentes da
economia mundial. Ora, modificando-se as relações de forças onde encontrar em
regime capitalista a solução das contradições se não na força? As estatísticas das
ferrovias (7) oferecem dados de notável precisão acerca dos diferentes ritmos de
desenvolvimento do capitalismo e do capital financeiro no conjunto da economia
mundial. Eis as alterações que, no decurso das últimas décadas, se operaram no
desenvolvimento imperialista da rede ferroviária:
Vias férreas
(em milhares de quilômetros)
Diferenças para
1890 1913
mais
(7) Statistisches Jahrbuch für das deutsches Reich, 1915, Archiv für Eisenbahnwesen,
1892. Para o ano de 1870 tivemos de contentar-nos com aproximações no que respeita à
repartição das vias férreas entre as colônias dos diferentes países.
O desenvolvimento das vias férreas foi, portanto, mais rápido nas colônias e
Estados independentes (ou semi-independentes da Ásia e da América). Sabe-se
que o capital financeiro de quatro ou cinco grandes Estados capitalistas reina e
manda, aqui, como dono. Duzentos mil quilômetros de novas vias férreas nas
colônias e noutros países da Ásia e da América representam mais de 40 bilhões
de marcos de capitais investidos de novo, em condições particularmente
vantajosas com especiais garantias de rendimentos, de lucrativas encomendas às
fundições de aço, etc., etc.
É nas colônias e países ultramarinos que o capitalismo cresce com maior
rapidez. Aí surgem novas potências imperialistas (Japão). A luta dos imperialistas
mundiais agrava-se. Aumenta o tributo que o capital financeiro recebe dos,
65
1890 1913
POTÊNCIAS
(em milhares de quilômetros) +
Estados Unidos 268 413 + 145
Império Britânico 107 208 + 101
Rússia 32 78 + 46
Alemanha 43 68 + 25
França 41 63 + 22
TOTAL relativo às
5 potências 491 830 + 339
Deste modo, cerca de 80% das vias férreas existentes estão concentradas
no território das cinco maiores potências. Porém, a concentração da propriedade
destas ferrovias, a concentração do capital financeiro é ainda infinitamente maior,
sendo, por exemplo, os milionários ingleses e franceses, possuidores de uma
enorme quantidade de ações e obrigações das ferrovias americanas, russas e
outras.
Graças às suas colônias a Inglaterra aumentou a sua rede férrea de
100.000 quilômetros, ou seja, quatro vezes mais do que a Alemanha. Ora, é fato
notório que o desenvolvimento das forças produtivas, e nomeadamente as de
produção de hulha e de ferro, foi durante este período, incomparavelmente mais
rápido na Alemanha do que na Inglaterra e, por maioria de razão, do que na
França e na Rússia. Em 1892, a Alemanha produzia 4,9 milhões de toneladas de
ferro fundido contra 6,8 na Inglaterra; em 1912, já produzia 17,6 contra 9 milhões,
o que significa que ela tinha uma superioridade gigantesca sobre a Inglaterra!
Será necessário perguntar se haveria aí, no terreno do capitalismo, outro
meio que não a guerra para remediar a desproporção entre, por um lado, o
desenvolvimento das forças produtivas e a acumulação de capitais e, por outro
lado, a partilha das colônias e das “zonas de influência” do capital financeiro?
(8) Ou igualmente Edgard Crammond: The Economic Relations of the British and German
Empires, no Journal of the Royal Statistical Society, Julho, 1914, págs. 777 e segs.
O rendimento dos rentistas é cinco vezes mais elevado do que aquele que
provém do comércio externo e isso no país mais “comerciante” do mundo! Tal é a
essência do imperialismo e do parasitismo imperialista.
Também a noção de “Estado-rentista” (Rentnerstaat) ou “Estado-usurário”
se torna de uso corrente na literatura econômica que versa sobre o imperialismo.
O mundo encontra-se dividido entre um punhado de Estados-usurários e uma
imensa maioria de Estados-devedores. “Entre as colocações de capitais no
estrangeiro, escreve Schulze-Gaevernitz, situam-se em primeiro lugar, os
investimentos nos países politicamente dependentes ou aliados: a Inglaterra
empresta ao Egito, ao Japão, à China, à América do Sul. Em caso de
necessidade, a sua marinha de guerra desempenhará a função de oficial de
diligências. O poderio político da Inglaterra preserva-a da revolta dos seus
devedores” (3). A sua obra O Sistema Econômico da Colocação de Capitais no
Estrangeiro, Sartorius Von Waltershausen toma como modelo de “Estado-rentista”
a Holanda e mostra que a Inglaterra e a França estão prestes, também elas, a sê-
lo (4).
Schilder considera como “países-credores claramente manifestados” cinco
Estados industriais: a Inglaterra, a França, a Alemanha, a Bélgica e a Suíça. Nesta
lista não inclui a Holanda, unicamente porque ela é “pouco industrial” (5). Os
Estados Unidos são credores apenas perante a América.
População de Inglaterra
Operários das principais Percentagem em
Anos (em milhões de
indústrias (em milhões) relação à população
habitantes)
1851 17,9 4,1 23%
1901 32,5 4,9 15%
A emigração inglesa, nota Hobson, cai a partir de 1884: ela atingia neste ano
242.000 pessoas em 1900, 169.000. A emigração alemã atingiu o seu máximo
entre 1881 e 1890; 1.453.000 emigrantes; no decurso das duas décadas
seguintes: ela caiu respectivamente para 544.000 e 341.000, enquanto, na
Alemanha, aumentava o número de operários oriundos da Áustria, da Itália, da
Rússia, etc. Segundo o recenseamento de 1907, havia na Alemanha 1.342.294
estrangeiros, dos quais 440.800 operários industriais e 257.329 trabalhadores
agrícolas (11). Na França, os trabalhadores da indústria mineira são “em grande
parte” estrangeiros: poloneses, italianos, espanhóis (12). Nos Estados Unidos, os
emigrantes da Europa Oriental e Meridional ocupam os empregos mais mal pagos,
enquanto os operários americanos fornecem a mais forte percentagem dos
capatazes e dos operários que executam os trabalhos melhor remunerados (13).
O imperialismo tende também a criar entre os operários categorias privilegiadas e
a separá-los da grande massa do operariado.
(14) Briefwechsel von Marx und Engels, T. II, pág. 290; T. IV, pág. 453. K. Kautsky:
Socialismus und Kolonialpolitik, pág. 79, Berlim, 1907 – brochura escrita em tempos infinitamente
longínquos, quando Kautsky ainda era marxista.
72
(15) O social-chauvinismo russo dos Potressov, dos Tchkhenkéli, dos Maslov, etc., tanto
sob a sua forma aberta como sob a sua forma velada (MM. Tchkheídze, Skobélev, Axelrod, Martov,
etc.) derivou igualmente de uma variedade russa do oportunismo, nomeadamente da corrente
liquidacionista.
IX – A CRÍTICA DO IMPERIALISMO
Lansburgh não extraiu conclusões e daí que, por uma singular distração,
não tivesse reparado que se estes números provam alguma coisa é apenas contra
ele, porquanto as exportações, para países financeiramente dependentes
desenvolveram-se, apesar disso, um pouco mais rapidamente do que as que se
dirigiram para países financeiramente independentes (nós sublinhamos o nosso
“se” porque a estatística de Lansburgh está longe de ser completa).
Estabelecendo a ligação existente entre as exportações e os empréstimos,
Lansburgh escreve:
“Em 1890-91, foi contraído um empréstimo romeno por intermédio dos
bancos alemães, que nos anos precedentes, tinham já consentido adiantamentos
sobre este empréstimo. Ele foi aplicado principalmente na compra de material
ferroviário à Alemanha. Em 1891, as exportações alemãs para a Romênia
elevaram-se a 55 milhões de marcos. No ano seguinte elas caíam a 39,4 milhões
e foram descendo gradualmente até 25,4 milhões em 1900. Nestes últimos anos
elas só voltaram a atingir o nível de 1891, graças a dois novos empréstimos.
As exportações alemãs para Portugal elevaram-se, em conseqüência dos
empréstimos de 1888-89, a 21,1 milhões de marcos (1890), para nos dois anos
78
seguintes voltarem a cair para 16,2 e 7,4 milhões; só em 1903 voltaram a subir ao
seu nível antigo.
Os números relativos ao comércio da Alemanha com a Argentina são ainda
mais significativos. Como conseqüência dos empréstimos de 1888 e 1890 as
exportações para a Argentina atingiram, em 1889, 60,7 milhões de marcos. Dois
anos mais tarde, não atingiram mais de 18,6 milhões, ou seja, quase um terço do
número precedente. Só em 1901 atingiram e ultrapassaram o seu nível de 1889
graças não só a novos empréstimos contraídos pelo Estado, e pelas cidades, na
Alemanha, como também a adiantamentos de fundos para a construção de
barragens para produção de energia elétrica e outras operações de crédito.
Em conseqüência do empréstimo de 1889 as exportações para o Chile
elevaram-se a 45,2 milhões (1892); um ano mais tarde voltaram a cair para 22,5
milhões. Após um novo empréstimo, contraído por intermédio dos bancos
alemães, em 1906, as exportações subiram para 84,7 milhões em 1907, para, em
1908, voltarem a cair para 52,4 milhões” (6).
Destes fatos, Lansburgh extrai esta divertida moralidade pequeno-
burguesa: as exportações ligadas aos empréstimos são instáveis e irregulares,
sendo lamentável que, em vez de se desenvolver, “naturalmente” e
“harmoniosamente”, a indústria nacional, se exportem capitais para o estrangeiro,
sendo lamentável que as “luvas” distribuídas por ocasião dos empréstimos
estrangeiros, cifrando-se em milhões, custem “caro” à firma Krupp, etc.. Porém, os
fatos comprovam claramente que o aumento das exportações está justamente
ligado às fraudulentas maquinações do capital financeiro, o qual, preocupando-se
pouco com a moral burguesa, esfola duas vezes o mesmo boi: em primeiro lugar,
os juros dos empréstimos; em seguida, os lucros resultantes deste mesmo
empréstimo quando ele é empregado na compra de produtos Krupp ou de material
ferroviário do Sindicato do aço, etc.
estes países imperialistas celebram alianças uns com os outros a fim de salva-
guardar ou dilatar as suas possessões, os seus interesses e as suas “zonas de
influência” nos mencionados países asiáticos. Aí teríamos alianças “inter-
imperialistas” ou “ultra-imperialistas”. Suponhamos que todas as potências
imperialistas concluíam uma aliança tendo em vista uma partilha “pacífica” destes
países asiáticos: poderíamos então falar do “capital financeiro associado à escala
internacional”. Existem exemplos deste gênero de alianças no decurso do século
XX, nas relações entre as potências e a China por exemplo. Subsistindo o regime
capitalista (condição que justamente Kautsky supõe) será “concebível” supor que
tais alianças não sejam de curta duração e que eliminem todas as possíveis e
imagináveis formas de fricções, de conflitos e de luta?
Basta enunciar, de forma clara, a questão par ases ver que a resposta só
pode ser negativa. Com efeito, em regime capitalista, é inconcebível supor que a
partilha das zonas de influência, dos interesses, das colônias, etc., assente sobre
algo que não seja a força daqueles que participam na partilha das zonas de
influência, dos interesses, das colônias, etc., assente sobre algo que não seja a
força daqueles que participam na partilha – a força econômica, financeira, militar,
etc. Ora, as respectivas forças destes participantes na partilha, variam de modo
diverso, pois, em regime capitalista, não pode existir desenvolvimento uniforme
das empresas, dos trustes, das indústrias, dos países. A Alemanha, há cerca de
meio século, comparado o seu poder capitalista com o da Inglaterra d e então,
representava um valor insignificante; o mesmo sucedia com o Japão em
comparação com a Rússia. Será “concebível” supor que daqui a uma dezena ou
vintena de anos, a relação de forças entre as potências imperialistas se manterá
imutável? É absolutamente inconcebível. Do mesmo modo, as alianças “inter-
imperialistas” ou “ultra-imperialistas”, quaisquer que sejam as suas formas, quer
se trate de uma coligação imperialista opondo-se a outra, quer de uma união
geral, englobando todas as potências imperialistas, nos surgem inevitavelmente,
não na ridícula fantasia pequeno-burguesa dos padres ingleses ou do “marxista”
alemão Kautsky, mas sim na realidade capitalista, apenas como “tréguas” entre
guerras. As alianças pacíficas preparam as guerras e nascem, por seu turno, das
guerras; condicionam-se entre si, originando alternativas de luta pacífica e de luta
não-pacífica, a partir de uma única e mesma base – a dos vínculos e das relações
imperialistas da economia e da política mundiais. Ora, o extra-lúcido Kautsky,
tendo em vista tranqüilizar os operários e reconciliá-los com os social-
chauvinistas, que se passaram para o lado da burguesia, separa os dois elos
desta única e mesma cadeia; separa a atual união pacífica (e ultra-imperialista (8))
de todas as potências, com vista à “pacificação” da China (recorde-se a repressão
da revolta dos Boxers) do conflito não pacífico de amanhã, o qual preparará para
depois de amanhã uma nova aliança “pacífica”, com vista, por exemplo, à partilha
da Turquia, etc., etc. Kautsky, em vez de mostrar aos operários a relação viva
entre os períodos de paz imperialista e os períodos de guerra imperialista,
oferece-lhes uma abstração sofisticada, tendente a reconciliá-los com os seus
degenerados chefes.
O americano Hill, no prefácio à sua História da Diplomacia no
Desenvolvimento Internacional da Europa, divide a História Diplomática
contemporânea em três períodos: 1) a era da Revolução; 2) o movimento
81
nesta época, (1870-1905), um pouco como uma carruagem dos bons velhos
tempos está para o moderno automóvel, cuja velocidade, por vezes, se torna um
perigo, tanto para o peão imprevidente como para os ocupantes do carro”. Por seu
turno, este capital financeiro, que cresceu extraordinariamente depressa, mas não
desejaria, precisamente por essa razão, do que usufruir, “calmamente”, a posse
de colônias, de que ele carece de apoderar-se por meios nem sempre
exclusivamente pacíficos e a cargo nas nações mais ricas. Nestas últimas
décadas, o desenvolvimento econômico dos Estados Unidos foi ainda mais rápido
do que o da Alemanha. E é justamente “graças” a isso que os traços de
parasitismo do moderno capitalismo americano se manifestam de forma mais
saliente. Por outro lado, o confronto entre, por exemplo, a burguesia republicana
dos Estados Unidos e a burguesia monárquica do Japão ou da Alemanha mostra
que em período imperialista as maiores diferenças políticas se atenuam
consideravelmente, não porque, em geral, sejam de todo insignificantes, mas
porque, em todos os casos, se trata de uma burguesia que manifesta claramente
características parasitárias.
Os elevados lucros que os capitalistas de um entre muitos outros ramos da
indústria de um, entre muitos outros países, etc. ..., obtêm do monopólio, dão-lhes
a possibilidade econômica de corromperem certas camadas de operários e até,
momentaneamente, uma minoria operária bastante importante, atraindo-a para a
causa da burguesia que pertence ao respectivo ramo industrial ou à nação
considerada e jogando-as umas contra as outras. E o antagonismo cada vez maior
que as nações imperialistas revelam perante as ocupações de partilha do mundo
reforça esta tendência. Assim nasce a ligação entre o imperialismo e o
oportunismo, ligação que se manifestou mais cedo e com maior relevo na
Inglaterra do que em qualquer outra parte, pelo fato de as características
imperialistas próprias do desenvolvimento terem aí surgido muito mais cedo do
que nos restantes países. Há autores, por exemplo, L. Martov, que se comprazem
em negar – não obstante ela saltar à vista atualmente – a ligação existente no seio
do movimento operário, entre o imperialismo e o oportunismo, recorrendo a
raciocínios de um “otimismo simulado” (à maneira de Kautsky e de Huysmans) tais
como: a causa dos adversários do capitalismo seria uma coisa perdida se o
capitalismo evoluído conduzisse ao reforço do oportunismo, ou se os operários
mais bem pagos se mostrassem inclinados para o oportunismo, etc.. É preciso
não nos iludirmos acerca do valor deste “otimismo”; é um otimismo idêntico a
oportunismo; um otimismo que serve para dissimular o oportunismo. Na realidade,
a particular rapidez e o caráter particularmente odioso do desenvolvimento do
oportunismo, não constituem de modo algum uma garantia da sua vitória
duradoura, do mesmo modo que o rápido desenvolvimento de um abscesso
maligno num organismo sadio apenas pode acelerar a sua maturação, a sua
eliminação e a cura do organismo. A tal respeito, as pessoas mais perigosas são
as que não querem compreender que a luta contra o imperialismo, quando não se
liga indissoluvelmente à luta contra o oportunismo, se reduz a uma frase oca e
mentirosa.
De tudo o que deixamos dito acerca da natureza econômica do
imperialismo, resulta que devemos caracterizá-lo como um capitalismo de
transição, ou mais exatamente, como um capitalismo agonizante. A tal respeito é
85