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Liberdade e Responsabilidade: Sartre e a Possibilidade de Uma Moral

Variável

Adriano Rodrigues Correia1

Resumo: A difícil relação entre os conceitos de Liberdade e Responsabilidade, tendo em


vista um horizonte ético do pensamento sartriano, é o objeto desse artigo. Toda ética
pressupõe necessariamente uma antropologia e, em Sartre, o modo de ser do homem se
caracteriza pela liberdade. Tal conceituação do homem perpassa todo o pensamento de Sartre
e exerce influência fundamental na posição deste a respeito da questão da ética; o problema
do qual tratamos aqui, alias, pode ser posto nos seguintes termos: como pensar a ética ante
uma antropologia que assume o homem como sendo absoluta liberdade? O que significa
responsabilidade no corpo do pensamento sartriano e que papel exerce tal conceito na
construção dos valores éticos? A fim de oferecer resposta a tais questionamentos, nos
focaremos basicamente nas reflexões presentes em O Existencialismo é um Humanismo, nas
quais Sartre abre a possibilidade de pensarmos uma moral variável, fundada na liberdade e
numa responsabilidade intersubjetiva.

Palavras-Chave: Liberdade, Responsabilidade, Outro, Ética, Variável.

Introdução

O existencialista declara freqüentemente que o homem é


angústia. Tal afirmação significa o seguinte: o homem que se
engaja e que se dá conta de que ele não é apenas aquele que
escolheu ser, mas também um legislador que escolhe
simultaneamente a si mesmo e a humanidade inteira, não
consegue escapar ao sentimento de sua total e profunda
responsabilidade (SARTRE, 1987, p. 7).

A liberdade sempre esteve no centro das preocupações do pensamento de Jean-Paul


Sartre. Grosso modo, podemos afirmar que a declaração de que “A existência precede a
essência” apresenta uma síntese do existencialismo sartreano e possui uma conexão bastante
evidente com o conceito de liberdade desenvolvido por Sartre. A referida declaração contraria
toda a tradição filosófica, e quer dizer, em última instância, que o homem aparece no mundo
como indefinido e molda-se pela sua liberdade: o homem está condenado a ser livre e as
escolhas que fará hão de determinar aquilo que será. Deste modo, Sartre aniquila qualquer
coisa como essência ou natureza humana a priori: o homem é “[...] uma existência que se faz
perpetuamente e nega-se a ser confinada numa definição” (cf. 1987, p. 542).
É necessário evidenciar o fato de que o conceito de liberdade do qual tratamos aqui
___________________
1
Graduando em Filosofia pela Universidade Federal de Pernambuco
não se traduz no modo como o senso comum pensa o fenômeno da liberdade. Sartre confere a
liberdade uma dimensão ontológica, isto é, o homem é intrínseca e ontologicamente livre. A
liberdade se impõe como necessidade, como algo do qual o homem não pode escapar, que
desponta na origem de uma consciência que está inserida no mundo e comprometida com ele
por uma relação indissolúvel.
Há de se perguntar, diante do exposto, como pensar a ética frente a uma antropologia
que toma a liberdade como aquilo que dignifica o homem, que o “define”? Sartre está
convencido de que a liberdade humana é o único fundamento dos valores: é precisamente por
meio da liberdade do homem que os valores vêm ao mundo. Não estaríamos, nesse caso,
condenados a um caos onde cada homem, exercendo a liberdade que lhe é intrínseca, gera seu
próprio sistema de valoração? Essa é uma questão que o pensar legalista certamente levantará,
contudo, trata-se de uma questão apoiada numa concepção equivocada do que seja liberdade
no corpo do pensamento sartreano; isso ficará mais claro quando abordarmos o conceito de
responsabilidade e sua ligação indissociável com o conceito de liberdade. A pergunta que se
impõe ao pensamento legalista é de se há, de fato, uma oposição entre ser-livre e ser-ético.
Luijpen (1973) defende que a oposição entre ser-livre e ser-ético só pode ser sustentada de
modo radical

[...] desde que se veja a lei como uma norma que “é uma vez
por todas” e imposta à liberdade. É uma oposição entre uma
idéia personalista do homem e uma noção legalista do ético
(LUIJPEN, 1973, p. 203).

A pretensão de Sartre é, precisamente, pensar a ética num ambiente onde valores


universalmente válidos e logicamente necessários não fazem mais sentido. Passaremos a uma
analise da desconstrução sartreana da ideia de uma lei moral universal a fim de,
posteriormente, indicar os caminhos da construção de uma ética variável, fundada na
liberdade e numa responsabilidade intersubjetiva.

A Desconstrução do Absoluto: A Liberdade como Fundamento dos Valores

Sartre trata de negar a existência de valores a priori: não há uma lei moral inscrita
num céu inteligível tampouco um imperativo categórico universalmente válido. Não há uma
lei ética geral, o que há é a decisão humana de criar valores. Na sua liberdade de escolha,
portanto, reside o único fundamento no qual o homem pode apegar-se. Os valores não
possuem existência e significação em si, pelos quais possam se impor à vontade.
Em O Existencialismo é Um Humanismo, Sartre empreende uma crítica ao
pensamento moral tradicional, tanto o cristão como o kantiano. Na obra em questão, Sartre diz
ter sido procurado por um aluno que lhe impôs a seguinte questão: os pais estavam em
conflito, seu irmão mais velho havia morrido na guerra e ele era o único consolo da mãe. O
jovem estava diante de um dilema, ficar com a mãe ou ir para guerra e vingar seu irmão. Qual
moral poderia ajudá-lo a decidir, a cristã ou a kantiana? Partindo do exemplo citado, Sartre
tece sua crítica afirmando que
A doutrina cristã diz: sede caridosos, amai o próximo,
sacrificai-vos por vosso semelhante, escolhei o caminho mais
árduo, etc., etc. Mas qual é o caminho mais árduo? Quem
devemos amar como irmão, o combatente ou a mãe? Qual a
utilidade maior: aquela, vaga, de participar de um corpo de
combate, ou a outra, precisa, de ajudar um ser especifico a
viver? Quem pode decidir a priori? Ninguém. Nenhuma moral
estabelecida tem uma resposta (SARTRE, 1987, p. 10).

Já a moral Kantiana afirma

Nunca trate os outros como um meio, trate-os como um fim.


Muito bem; se eu ficar junto de minha mãe, estarei tratando-a
com um fim e não como um meio, mas, por isso mesmo, estarei
correndo o risco de tratar como meio aqueles que combatem à
minha volta, e, vise-versa [...] (SARTRE, 1987, p. 10).

O que Sartre deseja destacar com tais críticas é o fato de que caminhos prontos não
existem. O pensamento sartreano se opõe a ideia de que o homem ao chegar ao mundo já
encontra valores dados e bem definidos que se impõe a liberdade, de fora para dentro.
Nenhuma moral pode nos dizer como devemos agir concretamente, na práxis cotidiana; deste
modo, nem a moral cristã e tampouco a kantiana, poderá, de fato, auxiliar o jovem em
questão, visto que sempre quem terá que decidir somos nós a partir da analise da situação que
se apresenta:

Sartre não pode aceitar a universalidade da lei moral, por dois


motivos: Primeiro, porque a universalidade da lei não reconhece
a singularidade do sujeito; Segundo, porque ela ignora a
contingência original, que se opõe à realização do universal
(ALLES, p. 172).

A moral kantiana que, com seu caráter formal e universal, negligencia, por um lado, as
características contingentes da realidade humana em situação, e por outro, deixa encoberto
nesta fórmula, que tal possibilidade, aí afirmada, retorna e recai incondicionalmente sobre o
dever interiorizado. Este aspecto incondicional da possibilidade não leva em consideração o
meu ser passado, as minhas vivências anteriores, nem as minhas reais possibilidades; todos
esses aspectos ficam suplantados pelo imperativo do dever, cujo cumprimento fará de mim
um sujeito de interioridade. A lei moral universal não pondera o momento, a situação em
jogo. Outro fator determinante para a desconstrução sartreana da ideia de uma lei moral
universal reside no fato de Sartre ser um pensador da tradição pós-metafísica e rejeitar a
existência de um ente metafísico que possa justificar a existência de valores a priori. O fato é
que o homem
[...] ao perceber assim como Nietzsche que Deus está morto,
percebe também que os grandes ideais e que as pretensões por
um absoluto também vieram por terra. Nesse sentido, não deixa
de enfaixar o homem no próprio homem e de colocá-lo diante
da responsabilidade inteiramente autônoma (SAYÃO, 2006, p.
78).

Logo, se até então cabia aos homens o dever de obedecer aos preceitos divinos, agora,
com a dita Morte de Deus, desaparece o absoluto que ditava princípios e valores igualmente
absolutos. A tarefa de ditar princípios e valores é agora uma tarefa de responsabilidade do
próprio homem. Conclui-se, deste modo, que a não-existência de um ente metafísico é
fundamental para a proposta sartreana.
O fato é que pondo isto, Sartre abre a possibilidade de uma ética variável, fundada na
liberdade de escolha humana e capaz de pesar a situação: não há valores prescritos, nem
receitas pré-determinadas; a cada momento e em cada situação o homem deve decidir, pela
sua liberdade, o melhor caminho a seguir. Alias, a pergunta pela possibilidade de uma moral
variável já não faz sentido, visto que a única moral possível no universo sartriano é,
precisamente, a moral variável, já que a mesma se apresenta como aquela capaz de levar em
conta as contingências, a situação na qual o sujeito da ação está inserido.
A crítica sartreana a moral tradicional irá apelar, ainda, para o conceito de
responsabilidade. Alias, como veremos, tanto a crítica como a proposta de Sartre de uma
moral variável dependem, cada uma a seu modo, do conceito de responsabilidade.

O Eu e o Outro: A Responsabilidade e Seu Papel na Construção de Uma Moral Variável

Ao proclamar o fim dos valores absolutos e nomear a liberdade como fundamento da


valoração, Sartre irá recorrer ao conceito de Responsabilidade a fim de reforçar sua posição.
Dentro ainda da crítica feita às morais tradicionais, observa-se que Sartre percebe que uma
moral fundada num ente transcendente e/ou em valores a priori – como são a cristã e a
kantiana – elimina o peso da responsabilidade humana: tudo já está definido e por esta razão,
o homem não tem como escolher e assumir a responsabilidade de seus atos. Tudo se resume
ao dever fazer em observância a uma lei que se impõe de fora para dentro; deste modo, Sartre
verá esses aspectos normativos absolutos como válvulas de escape confortáveis e
tranqüilizadoras, visto que aliviam a responsabilidade de uma escolha livremente assumida
diante de uma situação determinada. Ademais, além de camuflar a responsabilidade os valores
absolutos guardam ainda outra dimensão não-desvelada, a saber, o fato de que eu mesmo sou
quem significo tais imposições como valores que irão nortear minhas ações, já que é sempre
minha consciência significante que confere valor as coisas do mundo, que em si mesmas, não
têm valor algum.
Sartre convocará o homem a uma existência autentica, fundada na liberdade que lhe é
uma realidade ontica e na responsabilidade que implica assumir essa condição de ser-livre.
Em todo caso, cabe perguntar se neste contexto traçado pelo pensamento sartreano não seria
correto afirmar – somando-se a Dostoievsky – que “se Deus não existe, tudo é permitido”. De
fato nos deparamos aqui com uma preocupação corriqueira no que tange ao problema ético: o
fim dos valores absolutos, de uma fonte que é “de uma vez por todas”, implica num universo
onde o convívio com o outro parece torna-se cada vez menos possível?
Este é um problema que se impõe de modo peculiar ao sistema de Sartre, já que o
mesmo diz que o homem é absolutamente livre e por isso a escolha é sempre possível, bem
como, a mudança de conduta frente a diferentes situações (moral variável). Nesses termos,
não ficaria inviabilizada uma conduta ética, visto que além de não temos como determinar ou
impor qualquer tipo de norma para o homem, toda conduta é em tese possível para o homem
livre? Ora, é necessário considerar que o homem que escolhe livremente está situado no
mundo, situado historicamente, além disso, alem do Para-si, do eu, há o outro, que deve
também ser considerado em sua liberdade ontica; logo

Viver em um mundo infestado pelo meu próximo não é


somente poder encontrar o Outro a cada curva do caminho, mas
também encontrar-me comprometido em um mundo cujos
complexos-utensílios podem ter uma significação que não lhes
foi primeiramente conferida pelo meu livre projeto (SARTRE,
1997, p. 626).

É exatamente por existir o outro que o homem aparece num mundo já significado e
instrumentalizado. Cabe ao Para-si, no exercício da liberdade que o impele a agir e escolher,
atuar sobre o mundo e consequentemente sobre tais significações.
É por existir o outro que vislumbramos a necessidade de uma ética, mas a conduta
ética do homem sartreano não se dá por ocasião do outro, mas, é uma conseqüência da
liberdade do indivíduo. A conduta ética em Sartre se dá de dentro para fora, ou seja, não há
imposições externas, mas é o sujeito que, ao inserir-se no mundo, vai eleger e fundamentar
seus próprios valores.

Deste modo, a exigência moral não dever ser procurada num


universal abstrato, pois ela só ganha sentido e foge do
formalismo por sua inserção na História, o que implica a
vivência de uma situação concreta e social passível de mudança
(CARVALHO, 2004, p. 223).

Portanto, Sartre vai nos mostrar que a escolha é situacional, variável, e expressa à
liberdade que temos e somos, logo, só é possível pensar um moral variável, que está em
eterno processo de adequação a práxis do sujeito da ação. No entanto, a nossa liberdade
implica também a liberdade do outro, logo, é necessário que cada homem funde suas escolhas
e ações tanto na liberdade que lhe é intrínseca quanto numa responsabilidade intersubjetiva,
ou seja, uma responsabilidade que nasce do considerar o outro também como sendo
onticamente liberdade:
Queremos a liberdade através de cada circunstância particular.
E, querendo a liberdade, descobrimos que ela depende
integralmente da liberdade dos outros, e que a liberdade dos
outros depende da nossa. Sem dúvida, a liberdade, enquanto
definição do homem, não depende de outrem, mas, logo que
existe um engajamento, sou forçado a querer, simultaneamente,
a minha liberdade e a dos outros; não posso ter como objetivo a
minha liberdade a não ser que meu objetivo seja também a
liberdade dos outros (SARTRE, 1987, p. 19).

A obra de Sartre chama o homem à responsabilidade, a viver de maneira autentica.


Assim, é a partir da escolha que cada indivíduo cria-se, e ao criar-se cria também o mundo em
que vive. Sabemos que Sartre não escreveu uma ética propriamente dita, talvez por ter
percebido a impossibilidade de concluir uma obra sobre a moral, já que teria reconhecido que
neste campo também estamos sempre em busca de completude. Assim,

[...] ao lidar com o que pode fundamentar as ações humanas, ao


suprimirmos Deus e a natureza humana, pisamos um terreno
pouco seguro e com riscos, tratamos do que é inesgotável
enquanto inserido no processo histórico de construção do
homem (CARVALHO, 2004, p. 222).

Deste modo, conclui-se que o que Sartre propõe é uma moral variável, que se define
na práxis e encontra seu fundamento na liberdade do homem; este é chamado a assumir sua
condição de liberdade ontica com responsabilidade, tendo sempre em mente que cada escolha
livre carrega consigo o peso angustiante da responsabilidade. O próprio fato de ter que
escolher continuamente sem o amparo do imperativo do dever, próprio de uma lei moral
universal, é em si mesmo fonte de angustia. Contudo, não trata-se de uma responsabilidade
apenas subjetiva, mas, intersubjetiva, na medida em que leva em consideração o outro,
assumindo este também como sendo liberdade diante de minha própria liberdade: O homem
que é para-si é também ser-Para-outro, e assim sendo, todo homem se insere numa cadeia
relacional que se caracteriza pelo encontro de duas liberdades que conferem valor e
significado ao mundo. Logo, em certa medida, a liberdade do outro se impõe como limite a
minha liberdade, embora, esse limite só se legitime no seio de minha liberdade, visto que não
sofremos passivamente os juízos alheios. Em todo caso, cada homem é entendido em Sartre
como absolutamente livre e encontra o fundamento dos valores em sua própria liberdade,
cabendo a este a responsabilidade da escolha livre e do assumir as conseqüências desta.
Referencias Bibliográficas

SARTRE, Jean-Paul. O Existencialismo é Um Humanismo. In: ____________. A


Imaginação; Questões de Método. 3. ed. São Paulo: Nova Cultura, 1987.

____________. O Ser e o Nada: Ensaio de Ontologia Fenomenológica. 10. ed. Petrópolis:


Vozes, 1997.

ALLES, Luis. A ética de Sartre na obra: “O Existencialismo é um Humanismo”: um


confronto conceitual com Levinas. Dissertação (Mestrado em Filosofia). Pós-graduação em
Filosofia da PUCRS. 223 p.

BORNHEIM, Gerd Alberto. Sartre, metafísica e existencialismo. São Paulo: Perspectiva,


2005.

CARVALHO, José Maurício de (Org.). Problemas e teorias da ética contemporânea. Porto


Alegre: Edipucrs, 2004.

LUIJPEN, W. Introdução a Fenomenologia Existencial. São Paulo: Editora da Universidade


de São Paulo, 1973.

SAYÃO, Sandro Cozza. Sobre a leveza do humano: um diálogo com Heidegger, Sartre e
Levinas. Porto Alegre, 2006. Tese (Doutorado em Filosofia). Pós-graduação em Filosofia da
PUCRS, 2006. 265 p.

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