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Sobre as interpretações da Fenomenologia do Espírito 1

A Fenomenologia de Hegel é um livro tão complexo – e tão pouco alcançado


(esgotado) do ponto de vista literário - que não deve surpreender a ninguém que as
interpretações do mesmo sejam abundantes e díspares. Em nossa exposição, temos
ocasionalmente mencionado algumas destas interpretações, contudo não as temos
expostos amplamente, para não dificultar mais as coisas. Por outro lado, a natureza do
nosso trabalho, exigia que a pesquisa se centrasse na literatura primária de Hegel. Neste
apêndice nos propomos a dar uma visão do conjunto sobre as principais interpretações e
alguma indicação proveitosa para lhes orientar na selva Bibliográfica entorno da
Fenomenologia.

I – Estudos gerais sobre a história das interpretações da fenomenologia.

1. Otto Pöggeler, Zur Deutung der Phänomenologie des Geistes. 1961, PP. 255-
294. Estudo que pode servir para uma primeira orientação bibliográfica e para o
conhecimento das principais interpretações.
2. Reinhardt Klemens Maurer, Hegel und das Ende der Geschichte.
Interpretationen zur Phänomenologie des Geistes. Sttutgart, 1965. Apesar de
que todo o livro não está dedicado às interpretações da Fenomenologia como
parece indicar o subtítulo, citam e comentam artigos e livros importantes.
3. Giuseppe Bedeschi. Appunti per una Storia delle Interpretazioni della
Fenomenologie dello Spirito di Hegel. Giornalle critico della filosofia
italiana. Firenze, 1967, P. 561-617. Estudo extenso, embora o autor confesse ter
se limitado as interpretações principais.

II- Documentos contemporâneos à redação da Fenomenologia.

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Este comentário crítico foi extraído do apêndice de uma obra que se apresenta como inesquivável para
todos aqueles que se dedicam a pesquisa de Hegel, tal consideração é feita por vários comentadores da
Fenomenologia do Espírito, tal obra intitula-se: Del Yo Al Nosostros Lectura De La Fenomenología Del
Espíritu de Hegel de Ramón Valls Plana, que prima por sua clareza ao elucidar passagens extremamente
difíceis. Sua importância se situa na esteira dos grandes comentadores da Fenomenologia do Espírito tal
como a do majestoso comentário de Jean Hyppolite da Fenomenologia. É evidente que após lançamento
dessa obra e sua ultima edição(1994), tivemos várias outras linhas de interpretações, mas consideramos
salutar a divulgação dessa crítica para ajudar aqueles que estão se iniciando na pesquisa de Hegel a se
situarem na discussão dos problemas que giram entorno da Fenomenologia, assim como na divulgação da
referida obra. Trad. Paulo Fernando Souza da Silva Junior. Mestrando em Filosofia(UFPE).29/03/2019.
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A continuação se resume a uma série de documentos imprescindíveis para o estudo da


Fenomenologia. Todos eles são textos ou cartas de Hegel. Os descrevemos por ordem
cronológica com uma breve indicação acerca de seu conteúdo.

1. Ano 1805. Ein Blatt zur Phänomenologie des Geistes. Trata-se de um curto
fragmento incompleto que foi escrito durante a redação da Fenomenologia e que
encontra-se impresso em Dokumenten zu Hegels Entwicklung, Sttugart.
1936. P.353. Interessante pelas palavras com que começa. “O saber absoluto
aparece primeiramente como razão legisladora”. No entanto, Talvez seja
exagerado, concluir daí, como fez Hoffmeister em sua introdução à edição da
Fenomenologia do Espírito de 1937, “Que Hegel queria passar primeiramente da
Razão ao saber Absoluto de maneira imediata (i.e., sem tratar dos modos de sua
realização)...” A nosso entender a única coisa que se pode deduzir, é o que já
temos escrito na conclusão de nossa tese: que com a Razão acaba sempre a
Fenomenologia, os desenvolvimentos ulteriores são interiores à Razão e são
suscetíveis de abreviação.
2. Ano 1805-1806. Die Wissenchaft. Fragmentos de dez folhas que parece ser uma
preparação imediata para a redação do final da Fenomenologia. Encontra-se
publicado no primeiro volume da Realphilosophie, editado por Hoffmeister,
Leipzig, 1932, PP. 259-264. Nos diz que, por uma parte, já se dar o saber
absoluto na razão observadora quando esta chega a conclusão de que o Espírito é
uma coisa(Juízo Frenológico) , mas por outro lado, a razão observadora não
reconhece todo o alcance de sua afirmação. É necessário descobrir, no entanto,
que a coisa, sendo o outro do Espírito é ao mesmo tempo seu próprio para- si.
Por isso, podem dar-se e dão-se, figuras do Espírito. Cremos que o fragmento
confirma o que temos escrito a propósito do número anterior que desqualifica a
tese de Haering sobre a pretensa falta de unidade da fenomenologia.
3. Ano 1806. Fragmentos das lições orais de Hegel em Jena, divulgado por
Rosenkranz, Hegel Leben, Berlim 1844. Neles se explicam como o Ser que
começa na lógica, já está identificado com a consciência-de-si graças à educação
fenomenológica. Por outra parte Hegel considera que sua filosofia é a
interpretação do novo tempo histórico que irrompe naquele momento.
4. Ano 1806. Carta de Hegel a seu amigo Niethammer(6 de agosto), publicada em
Briefe Von und na Hegel, Band I, Hamburg Meiner, 1952, carta n 67. Disse
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que a impressão da Fenomenologia começou em fevereiro daquele ano, que


avança lentamente e que tem dificuldade com o editor, isto explica a redação
problemática do texto.
5. Ano de 1807. Carta à Schelling, fechada à 3 de janeiro, que pode ser encontrada
na introdução já mencionada de Hoffemeister (páginas XXXVII). A impressão
da Fenomenologia está a ponto de terminar e Hegel encontra-se escrevendo
naquele momento o prefácio, confessa que ao corrigir as provas “Tem tido
frequentemente o desejo de limpar o barco de carga inútil e torná-lo mais
marinheiro”. Sem comentários.
6. Ano 1807. Carta a Schelling, fechada a 1 de maio e publicada no volume de
correspondência já citado. Carta N 95. O livro já está pronto. Desculpa-se pela
pouca clareza de sua obra, pelas dificuldades com o editor e pela agitação dos
tempos em que ele teve que escrever (batalha de Jena), Hegel se dar conta,
sobretudo, da Groessere Unform der Letzten Partien. O desenvolvimento
detalhado obscurecem os pontos chaves, embora o desenvolvimento mais
simples não resolveria totalmente a dificuldade, porque há um ir e vir
intercruzado. Este último parece se referir à ordem não cronológica com a qual
Hegel interpreta a história, na mesma carta, trata de evitar a irritação de
Schelling pelo pouco respeito com que menciona sua teoria da ciência no
prefácio da Fenomenologia.
7. Ano 1807. Anuncio da publicação da Fenomenologia, inserido por encargo de
Hegel na Intelligenzblatt der Jenaer Allgemeiner Literatur-Zeitung do 28 de
outubro. O texto pode ser visto na introdução de J. Hoffmeister a edição da
Fenomenologia do ano 1952 (Meiner, Hamburg), pags. XXXVII-XXXVIII- ali
se diz que a Fenomenologia “Apresenta o devir do saber”. E que “Deve ocupar o
lugar das explicações psicológicas e inclusive das explicações mais abstratas
sobre a fundamentação do saber”. Acrescenta que a Fenomenologia “considera a
preparação para a ciência desde um ponto de vista que a converte numa nova
ciência interessante e a primeira entre as filosóficas”. Depois de um resumo do
conteúdo que se limita a percorrer o índice do livro, pode-se ler: “O reino das
manifestações do Espírito que se apresenta a primeira vista como um caos, está
conduzido por uma ordem científica e apresentado segundo sua necessidade, na
qual dissolve suas manifestações imperfeitas, e as transferem para outras mais
elevadas que são a verdades daquelas”. A última verdade a encontra em primeiro
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lugar na religião e depois na ciência como resultado do todo. “No prefácio -


prossegue o anuncio - o autor se declara sobre o que lhe parece serem as
necessidades da Filosofia em sua situação atual; também sobre as pretensões e
os abusos das fórmulas filosóficas que desprestigiam a filosofia do seu tempo e
sobre o que é próprio dela e de seu estudo”. É evidente que Hegel tem a
consciência da novidade de sua obra no momento de redigir esse anúncio, e ao
mesmo tempo de sua dupla característica: introdução à filosofia que goza já de
uma estrita necessidade metódica.
8. Anos de 1808-1809. Propedêutica. Texto que Hegel utilizou para suas classes
no Ginásio de Nuremberg. Nela se contém uma versão abreviada da
Fenomenologia que omite em seu interior os desenvolvimentos correspondentes
aos capítulos Espírito e Religião.
9. Ano de 1812. Prefácio a primeira edição da Lógica, fechado em Nuremberg
em 22 de março de 1822. Aborda o problema da fundamentação do saber
Absoluto e afirma claramente que a filosofia deve se autofundar por um
movimento intrínseco ao saber mesmo. Não basta, portanto, uma reflexão
exterior. No entanto a Fenomenologia é uma autêntica fundamentação, apesar de
que seu desenvolvimento a partir do ponto de vista da consciência, seja exterior
em algum sentido, porque na Fenomenologia, se recolhem as manifestações do
Espírito como o movimento que lhe é conatural.
10. Ano 1812. Introdução à mesma lógica. O conceito de ciência só pode se
justificar mediante sua produção pela consciência, já que a ciência, o saber
absoluto, se mostra como a verdade de todas as figuras da consciência e no saber
absoluto se resolve a cisão constitutiva da consciência entre objeto e saber.
Segundo isto, a Fenomenologia é uma verdadeira dedução do conceito do saber.
Ao final da mesma introdução a Fenomenologia se cita como exemplo de
ciência que avança por si mesma e desde ela mesma pelo automovimento do
conteúdo que se nega a si mesmo e passa assim a uma forma superior.
11. Ano 1817. Enciclopédia A. Vorbegriff. A Fenomenologia do Espírito se
descreve como “A história científica da consciência” que engendra o conceito
de ciência. O começo da Fenomenologia não é, em si mesmo, absoluto, Por isso
seria possível também outro começo: o Ceticismo. Mas não seria bom começo o
Criticismo, daí resulta, cremos, que a enciclopédia não supõe nenhuma
mudança essencial do pensamento de Hegel sobre a Fenomenologia, Porém,
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Hyppolite, não teve em conta este texto nem o que resenhamos com o número
12, quando escreve que dentro do sistema, a Fenomenologia já não é uma
introdução (Gènese et structure, PP.62-63).
Na mesma enciclopédia C. (A filosofia do Espírito) são de interesse os
parágrafos 300-302, onde contém a definição de Espírito, muito próximo ao da
Fenomenologia ( O espírito é “Absoluta tendência de toda educação e de toda
filosofia”). Mas ao mesmo tempo se pode advertir uma acentuação da dimensão
da liberdade.
Dentro do mesmo parágrafo da Enciclopédia encontramos uma versão abreviada
da Fenomenologia semelhante a que se acha na propedêutica.
Por último, no parágrafo 332, se caracteriza a Filosofia Kantiana e Fichtiana
como uma filosofia que não superou o ponto de vista da consciência, já que o
Espírito nela, permanece com a cisão sujeito e objeto.
12. Ano 1827. Sttelungen des Gedankens Zur Objektivitaet. Texto composto por
Hegel para segunda edição da enciclopédia como introdução à Lógica. Foi
publicado em 1840 e significa uma ampliação da breve Vorbegriff que temos
citado no número anterior. Embora o texto aborde uma nova maneira de
introduzir o Sistema, baseado na análise do realismo, do Criticismo e idealismo,
isto não significa que a Fenomenologia perca sua importância como introdução.
E mais, no parágrafo 25, Hegel diz que a introdução que apresentara é menos
adequada do que a Fenomenologia.
Deriva, pois, que para Hegel, há vários começos possíveis. Desde o momento,
que ele mesmo concedeu que o começo Fenomenológico não é absoluto,2 cabe,
por este motivo, outros começos. Mas Hegel manteve sua convicção de que
entre os vários começos possíveis, o Fenomenológico é o melhor, e nunca
deixou de crer que aquele tem sua natureza rigorosamente cientifica. A única
posição que ele retificou, foi a do lugar da Fenomenologia como “Primeira parte
do Sistema” e a retirou para fora do mesmo como centro de todo edifício, Por
outro lado, que a tenha incluindo como parte uma parte da filosofia do espírito
não deve nos enganar. Esta segunda Fenomenologia tem uma característica
formal totalmente distinta, já que não apresenta o devir da consciência, desde ela

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Aqui cabe uma alerta, quando o autor do texto assim se expressa, não está querendo dizer que o começo
da Fenomenologia não é expressão indutiva do Absoluto(com Maiúsculo), mas apenas que absoluto(com
Minúsculo), quer dizer que não é o único começo.
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mesma, se não, do Espírito mesmo. O esforço indutivo e experiencial já está


cumprido e por isso, os fenômenos da consciência podem abreviar-se, já que
trata-se de ver, unicamente, as estruturas do mesmo desde o Espírito ou
Conceito.

III. História das interpretações da Fenomenologia


1. Primeiros ecos. A impressão dos primeiros leitores – amigos ou conhecidos
de Hegel entre os quais, Schelling – se resume em duas palavras:
profundidade e falta de clareza. (CF. Hoffemeister 1.c. XXXVIII-XXXIX.)
somente a Jean Paul pareceu a Fenomenologia clara.
As críticas se fizeram esperar. A primeira apareceu – Jenaer Allgemeiner
Literatur-Zeitung – de 7-10 de fevereiro de 1809 realizada por
Windischmann. Trata-se de uma crítica prolixa e irônica. O autor lamenta a
dureza e a aridez do texto e não se mostra muito seguro de ter entendido o
livro. A segunda crítica se opõe a primeira e tem um tom amplamente
elogioso. Está assinada por Bachmann, discípulo de Hegel, e apareceu no -
Heildelberg Jahrbuecher – do ano de 1810 (PP. 145-163 e 193-209). O que
Schelling não conseguiu realizar – restaurar a ciência – Hegel leva a cabo.
Schelling é comparável a Platão, enquanto que Hegel se parece com
Aristóteles...
O autor da crítica é consciente da proximidade intelectual entre Schelling e
Hegel, mas ao mesmo tempo sublinha que a partir da publicação da
Fenomenologia, os sistemas dos dois filósofos se opõem quase que
perfeitamente. Esta crítica de Bachmann influenciou diretamente na Holanda
e segundo Hoffemeister, foi decisiva para julgar a Fenomenologia até nossos
dias, diz-se dela que tem sido a Mythenbildend.
2. Primeiras controvérsias. Entre os discípulos que mais se destacaram de
Hegel, logo surgiu uma diferença fundamental acerca do critério da
Fenomenologia. Enquanto que para Rosenkranz, a Fenomenologia mantém
um lugar essencial na filosofia Hegeliana, acredita Michelet, o contrário, que
a Fenomenologia representa somente o resumo dos descobrimentos do
jovem Hegel. Que Hegel mesmo tivera dito que a Fenomenologia era sua
Entdeckungsreise o interpreta Michelet como se esta obra não pertencesse ao
corpo mesmo da filosofia Hegeliana.
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O entendimento de Rosenkranz se encontra em sua biografia de Hegel, já


citada, na qual dedica todo um capítulo a Fenomenologia, e que tem um
valor documental, porque fornece textos das lições orais de Hegel. O
entendimento de Rosenkranz se repete em sua outra obra: Hegel als
Deutscher Nationalphilosoph, Leipzig 1870, 85 ss. e 133 ss. O
entendimento de Michelet podemos encontrá-lo Geschichter der Letzten
Systeme der Philosophie im Deutschland Von Kant bis Hegel. Berlim.,
1937 Band I, PP. 616-617 e 677.
Desnecessário dizer que a posição de Rosenkranz nos parece mais correta do
que a de Michelet. Embora, o primeiro levado pelo seu entusiasmo, exagere
ao afirmar, que a exposição da Fenomenologia é uma “verdadeira obra de
arte”. Há que se conceder a Michelet que o estilo de Hegel na
Fenomenologia sofre de uma certa pobreza terminológica, o contraste do
em-si e para-si acaba por ser monótono, com efeito, e em todo caso, parece
excessivo fazer elogios aos valores literários da Fenomenologia como faz
Rosenkranz.
Uma segunda questão, que surge rapidamente e serve para combater o
Hegelianismo, é a relação entre Fenomenologia e Lógica. Que valor pode ter
o começo fenomenológico se a lógica deve ter em si seu autofundamento?
Gabler, em sua Crítica da Consciência surgida em 1827, se valeu da
Fenomenologia de Hegel, da qual se confessa devedor, porém somente aceita
o esquema reduzido, ou seja, consciência - Consciência-de-si – razão. Para
resolver o problema do duplo começo, introduz uma distinção entre começo
subjetivo e objetivo: O primeiro serve somente pra introduzir o iniciante ao
saber geral(universal) enquanto que o segundo parte da coisa mesma. Sem
dúvida Gabler, segue próximo à Hegel, mas a distinção formulada dessa
forma apresentam inconvenientes, porque separa demasiadamente o
subjetivo e objetivo na Fenomenologia se desenvolve também o obejeto e o
mesmo Hegel havia explicado que no Ser objetivo da lógica a
autoconsciência se reconhece. Esta separação excessiva dos dois começos
deu espaço para os ataques dos anti-Hegelianos:
Trandelenburg, em suas Logische Untersuchungen (Leipzig, 1840), afirma
que o começo puro, sem pressupostos, que Hegel intenciona em sua lógica, é
impossível. Em realidade Hegel parte da abstração do Ser, segundo isto,
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teria que recorrer necessariamente ao começo Fenomenológico, mas a


possibilidade deste recurso, também foi negada. Assim, H. Ulrici (Ueber
Prinzip und Methode der Hegel- Schen Philosophie, Halle, 1841), alerta que
na mentalidade de Hegel a Fenomenologia não é um fundamento
absolutamente necessário. Uma vez que tem cumprido sem papel de
conduzir até a lógica, a Fenomenologia pode ser dispensada já que a lógica
deve sustenta-se por si mesma. Schmid (Entwicklungsgeschichte der
Hegelschen Logik, Regenburg, 1856) dirá que o pensamento de Hegel tem
seu centro de gravidade fora dele mesmo, na Fenomenologia, mas esta, por
sua vez, tem seu centro de gravidade na Lógica, cada um dos começos
pressupõe o outro. A solução do enigma do duplo começo é outro enigma.
Essa discussão mostra ao nosso entendimento que ao mais específico do
pensamento de Hegel foi esquecido de imediato. O problema do começo é
um verdadeiro problema, contudo, estes autores recaiem em um pensamento
dicotômico que Hegel quis evitar com a dialética. É certo que os dois
começos se incluem mutuamente, mas ao introduzir o termo pressuposição,
distorce de partida o levantamento Hegeliano. Sempre se pressupõe tudo, se
se quer falar assim, mas não se trata de uma suposição lógica a partir do qual
se argumentam mais ou menos tacitamente. A consciência somente
pressupõe, como consciência, o que lhe oferece sua experiência espontânea.
Mas aquilo que a consciência experimenta arrasta o todo, porque está
vinculada a ele.
3. Marx. A dialética de Hegel, especialmente na forma em que foi adotada na
Fenomenologia, não foi esquecida por Marx. Nela reconheceu um
instrumento valioso de crítica social que devia se purificar de toda
implicação idealista. As alusões à Fenomenologia se encontram, sobretudo,
nos manuscritos econômico-filosóficos de 1844, onde escreveu: “há que se
começar pela Fenomenologia Hegeliana, verdadeiro berço e segredo da
Filosofia de Hegel”. Outras indicações na mesma linha que o manuscritos se
encontra na Sagrada Família(1844-1845) e na Ideologia Alemã(1845-
1846). Há que se acrescentar uma carta a Engels de 18 de junho de 1862
onde se aproxima a visão de Hegel da sociedade como “reino animal do
Espírito” à obra de Darwin, já que este, segundo Marx, representa a vida
animal sobre as mesmas relações básicas vigentes na sociedade inglesa
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contemporânea: Bellum Omnium contra Omnes, divisão do trabalho,


competência, abertura de novos mercados, invenções e luta Malthusiana pela
Existência.
A crítica fundamental de Marx a Fenomenologia deixa-se resumir
brevemente: Hegel reduz as oposições reais às oposições de pensamento e as
resolve somente no pensamento; não as resolve na realidade, que é onde
fumega. A realidade histórico-material está posta desde a cisão original da
autoconsciência, este é o princípio idealista que Marx combate. A verdadeira
realidade para Hegel é o Espírito e por isso a realidade material fica
degradada a imagem ou metáfora do Espírito. Marx, pelo contrário, não crer
que o pensamento ponha as coisas, mas que as encontra. E as contradições
da realidade tem que ser resolvidas mediante a práxis e não com o
pensamento.
Por esta razão, Marx dirá que Hegel é na realidade um positivista-acrítico, já
que deixa as coisas como estão, daqui se extrai também a distinta concepção
de Hegel e Marx sobre a alienação, se para Hegel a alienação é em geral, a
objetividade passageira que é suprassumida pela autoconsciência que a
engendrou, para Marx, por outro lado, a Alienação terá um caráter menos
geral e mais pejorativo. A alienação será para ele, a subtração perpetrada
contra o homem daquilo que lhe pertence: fundamentalmente sua força de
trabalho e o produto deste. Esta subtração é injusta, manipula o homem, e
deve ser corrigida ali onde existe, i.e., nas relações laborais.
No entanto, a consideração Marxista da Fenomenologia não é meramente
negativa. Marx acredita que a dialética da Fenomenologia, com o uso que
faz da negatividade, contém todos os elementos da crítica e a aplicação
concreta que Hegel faz de seu método é em muito casos válida, até o ponto
de ultrapassar a base de seu idealismo. A consciência infeliz, a nobre, etc, tal
como são analisadas por Hegel contém já uma crítica completa da Religião,
do Estado, da vida Civil, etc. Sobretudo porque a dialética conduz Hegel a
compreender a vida humana como autoprodução e isso tem para Marx uma
consequência de grande valor: Hegel capta a verdadeira essência do trabalho,
já que este, com efeito, é a objetivação da essência do homem, objetivação
esta, na qual o homem se realiza. Contudo, em seguida, Marx percebe que
esta visão do trabalho é incompleta, porque Hegel não tem visto os pontos
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mais obscuros da questão laboral, não supera o ponto de vista da economia


capitalista e por isso não capta a desumanização que ocorre no trabalho
contemporâneo, como consequência da venda ao capitalista das forças de
trabalho pelo trabalhador. Mas fica em pé, que as categorias dialéticas
empregadas por Hegel na Fenomenologia possuem grande importância para
descobrir as contradições da realidade, para analisar inteligentemente a
história e para saber aonde deve ser aplicada a práxis revolucionária.
Aqui não podemos entrar na questão tão complexa entre Hegelianismo e
Marxismo. Temos nos esforçado simplesmente, em dar um passo adiante na
compreensão da Fenomenologia e agora fazemos um resumo das
interpretações desta obra. Digamos somente que a leitura Marxista da
Fenomenologia apresentam dificuldades especulativas que não podem ser
desprezadas totalmente. Marx combate a concepção idealista com
argumento de senso-comum: o pensamento humano não produz as coisas, as
encontra, porém porque o real é racional ou porque se deixa racionalizar?
Porque o real mesmo, apesar de suas contradições, apresenta um dinamismo
até a resolução das contradições? Em todo caso, é bastante discutível que se
possa fazer esta apropriação da dialética do real tal como apresentada por
Hegel sem arrastar elementos que implicam necessariamente a dialética mais
fundamental do conceito e exposto o problema mais geral, por outro lado,
observamos, que Marx dá às vezes a impressão, de ter esquecido toda a
importância da ação no mundo que apresenta a Fenomenologia. Que Hegel
tenha se contentado com “pensar a contradição” nos parece pouco exato, a
Fenomenologia parece conceber que a redução das contradições reais devem
também ocorrer na realidade. Por fim, um ponto que nos parece digno de
estudo é o tema das relações intersubjetivas que aparecem em Marx, a
repeito do matrimonio Marx faz em seus escritos juvenis algumas indicações
interessantes, que, no entanto, ficam sepultadas pelo volume que outorga as
questões do trabalho. Este foi seu descobrimento e importância, era
inevitável que não o acentuasse, mas temos a impressão de que o chamado
humanismo do jovem Marx aflora nestes momentos em que alude a relação
intersubjetiva e também neste caso, sua relação com Hegel poderia
esclarecer o sentido de suas limitadas indicações. Por outro lado, aqui temos
nos limitado a resenhar os textos de Marx que se referem a Fenomenologia,
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mas é evidente que nas obras de Marx frequentemente ressoam muitos ecos
que nos remetem mais ou menos implicitamente, por exemplo, a dialética
do Senhor e do Escravo. Um comentário aos escritos de juventude de Marx
não deveria omitir ou comprovar estas alusões e marcar o grau de
dependência.
4. Haym. A posição deste autor frente à Fenomenologia pode se resumir assim:
A Fenomenologia não vale como introdução ao sistema; se tem algum valor,
o tem como antecipação do sistema completo. Esta tese se baseia num estudo
global da Fenomenologia incluído no livro Hegel und Seine Zeit(Berlim
1857). Se trata de dezoitos lições, das quais a décima primeira é dedicada
integralmente a Fenomenologia, a Análise de Haym se desenvolve em três
passos: 1) Confusão entre psicologia transcendental e História. 2) A
Fenomenologia não é uma verdadeira demonstração porque o saber absoluto
está pressuposto desde sempre. 3) A Fenomenologia não é introdução ao
sistema ou parte dele, se não que é todo o sistema.
O primeiro passo se sintetiza na frase sempre citada: “Um alles zu sagen: die
phaenomenologie ist eine durch die geschichte in verwirrung ud unordnung
gebrachte psychologie und eine durch die psychologie in zerruentug
gebrachte geschichte”.3 Dessa forma Haym vê a realização que Hegel
consegue de sua ideia que as etapas da consciência correspondem com a
história da formação da humanidade e considera que a causa da obscuridade
do texto reside precisamente em que ele força as descrições psicológicas
para fazê-las corresponder com certas figuras históricas, enquanto, por outro
lado, elege arbitrariamente certos momentos históricos para convertê-los em
símbolos das etapas da consciência.
Rosenkranz, em seu livro já citado de 1870, se opôs a Haym e afirmou
profundamente que a seleção dos momentos históricos na Fenomenologia
não é arbitrária, se não que Hegel fixa aquelas manifestações históricas que
podem valer como tipo de uma situação.
O segundo ponto da crítica de Haym é a nosso ver mais substancial.
Segundo ele, a Fenomenologia repete e completa o ponto de vista dos

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Para não fazermos uma tradução de tradução preferirmos deixar ao leitor o encargo da tradução direta
do alemão, mas para não sermos tão maldosos, aqui deixaremos a tradução direta feita do alemão para o
espanhol: “ Para dercilo todo: a Fenomenología es una psicología, llevada a la confusión y al desorden
por la historia, y una Historia, llevada al desorden por la psicología.”
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primeiros escritos de Hegel (Differenz e artigos no “kritisches Journal”),


a saber, que as filosofias no tempo vigentes de Hegel cometiam um erro
fundamental que era o de não partir do Absoluto, mas isto, acarreta, pensa
Haym, que uma petição de princípio possa minar radicalmente a intenção da
Fenomenologia, consistindo em querer demonstrar o saber absoluto já que
tal saber absoluto constitui o pressuposto sobre o qual se baseia todo o
desenvolvimento da obra. Toda a Fenomenologia se dedica a corrigir a
relação entre sujeito e objeto, torná-los adequados no saber absoluto, porém
esta adequação não se demonstra, aqui também, se baseia a confusão entre
psicologia e história. Ambas se forçam para fazê-las aparecer como
manifestações do absoluto.
O terceiro ponto, Haym se pergunta como Hegel chegou a pensar que poder
haver uma explicação extrínseca ao saber absoluto. A única demonstração
possível do saber absoluto é a exposição completa do sistema, a intenção de
preparar o sistema se converteu de imediato em primeira parte do sistema, e
ao final em todo o sistema, por um lado a filosofia apresenta o Absoluto tal
como é para a consciência, por outro lado, Hegel se ver obrigado a
apresentar o Absoluto com toda sua profundidade e amplitude para explicar
aquele aparecimento relativo.
A crítica de Hayme não pode ser taxada de superficial, pois é uma análise
global da Fenomenologia e capta sua estrutura mais profunda, porém a
compreende em sua natureza dialética?
5. O Neo-Hegelianismo. Croce negou, em uma nota aparecida no ano de 1949
“Quaderni della Critica”, que os neo-hegelianos tivesse esquecidos a
Fenomenologia, como prova, aduziu o caso de Spaventa: “uno dei primi e
piú seri hegeliani napoletani della prima ora" Spaventa segundo Croce
chamava a fenomenologia "questo diabolico ma maraviglioso libro, nel
quale è una originalità, una freschezza, una maniera ardita di dire, di fare,
ecc., Che mi ricorda Dante: è il creatore di um nuovo mondo, Che trova una
nuova forma". Mas Spaventa de fato em sua Lógica e Metafísica (Bari,
1911), se valeu somente da primeira parte da Fenomenologia como
introdução à lógica, Spaventa, portanto, omitiu o aspecto histórico da
Fenomenologia.
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Pelo o que se refere o mesmo Croce, é claro que apenas se ocupou da


Fenomenologia. Em seu prefácio à introdução Italiana da enciclopédia,
aceita sem mais, que aquela obra é uma primeira forma de exposição de todo
o sistema. No ano de 1901 aparece o livro de J.B. Baille the origin and
significance of hegels logic, que contém um largo estudo sobre a evolução
do jovem Hegel até a maturidade do sistema, Baille se detém especialmente
na Fenomenologia e considera que esta obra significa um passo decisivo de
Hegel desde as posições Schelliguianas às próprias: o Absoluto é Espírito, o
Absoluto é sujeito, depois de uma análise do conteúdo do Livro, Baille
conclui que a Fenomenologia é parte do sistema e se opõe aqueles que a
considera uma mera introdução.
A tese de Baille, contestou Gentile em uma crítica aparecida em “La
Critica” do ano de 1904 pp. 29-45 reproduzia depois na Riforma della
Dialettica Hegeliana(messina,1913). Segundo Gentile não se pode dizer
que a Fenomenologia seja rigorosamente interior ao sistema, posto que
termina em sua mesma porta, é parte da ciência, enquanto conduz a ela, mas
não é a ciência. A Fenomenologia é chave da lógica, sem a qual, esta é uma
esfinge que nenhum Édipo poderia decifrar, mas somente a chave.
Por tudo o que temos dito se observa que nossa posição simpatiza mais com
a de Gentille do que a de Baille.
6. O “Hegelrenaissance”. No de 1905 Dilthey pronunciava uma conferência
em Berlim, ante a academia prussiana de Ciências que abriria uma nova
época na interpretação de Hegel e mudaria a imagem do mesmo, o Hegel
abstrato e apriorista se eforçando por deduzir tudo a partir de noções
esquemáticas, cederia espaço para um Hegel romântico e místico.
Dilthey havia examinado os escritos de juventude de Hegel, empenhado em
sua tarefa de reconstrução do período pré-romântico, neste período devia se
encontrar também aquela filosofia da vivencia que Dilthey considerava a
contribuição maior da filosofia alemã à cultura universal. A conferência de
Dilthey pode encontrar-se na Gesammelte Schriften, Band IV, Die
Jungendgeschichte Hegels. Dois anos depois, Nohl publicava a primeira
edição dos escritos de juventude de Hegel, sob o significativo título de
“Escritos teológicos de juventude” a fora a renovação do tipo filológico que
a nova escola instaurava, o impacto de Dilthey e Nohl consistiu em restaurar
14

o interesse pela fenomenologia e mais concretamente pela origem da


dialética Hegeliana, se abandonava o esquema triádico como origem da
dialética e foram buscá-la nas experiências pré-lógicas de índole religiosa,
ética e sócio-histórica.
Entre os autores que acolheram a interpretação romântico-mística de
Dilthey-Nohl ou que foram influenciados por ela, teriam que examinar as
interpretações da Fenomenologia proposta por Glockner e por Hartmann. O
livro de Glockner intitulado: Hegel. Foi publicado em 1909 e foi editado
várias vezes a partir de 1954. Para nosso objetivo, interessa somente o lugar
que se inscreve a Fenomenologia na evolução do pensamento Hegeliano.
Segundo Glockner a Fenomenologia encerra o período de Juventude na qual
Hegel toma consciência das antinomias da realidade. A partir da
Fenomenologia, mas, sobretudo, em sua obra posterior, Hegel se esforçará
em vão em dominar o trágico por meio da dialética. A Fenomenologia se
encontra, portanto à cavalo entre as duas épocas de Hegel e é nisto em que
consiste a fascinação que exerce. O esforço conceitual já está presente nela,
mas não assume primazia como nas obras posteriores. A Fenomenologia é
uma obra criadora que representa o florescer do Espírito o desflorescer e
frutificar. Hegel exige Diferenciação, desdobramento e desenvolvimento,
descreve com precisão cada forma em particular, descreve com clareza,
evoca a vida com força criadora e a destrói. Hartmann por sua vez, para além
de uma exposição de todo o conteúdo da Fenomenologia que inclui em sua
Philosophie des Deutschen idealismus Bd.II (Berlim-Leipzig,1929), com
uma reconstrução interessante da dialética do Senhor e Escravo, escreveu um
artigo que devemos mencionar, que se encontra na “Revue de
Mètaphysique et Morales”do ano 1931, PP. 285-316. Seu título é Hegel et
le probleme de La dialectique Du Réel. Segundo ele a importância mais
valiosa de Hegel não está na especulação ou nos fundamentos do Sistema se
não, no esforço de penetração em sentidos da vida concreta do Espírito, a
saber, Ética, Direito, Estado, Arte e história. Por esta razão a obra
fundamental de Hegel é precisamente a Fenomenologia, toda obra de Hegel
é uma grande Fenomenologia da luta espiritual num esforço para criar,
compreender e organizar. O objeto próprio de Hegel é a história, se na
Fenomenologia acrescenta fenômenos psicológicos, isto não ocorre por
15

casualidade ou para complicar as coisas, mas porque se dá uma dupla


manifestação do Espírito que nos coloca num ambiente histórico dentro do
qual nos autoriza uma iniciativa original.
Jean Wahl ocupa um lugar de destaque entre os autores influenciados pela
interpretação romântica. Sua conhecida obra “Le Matheur de La
Conscience dans La philosophie de Hegel” apareceu no ano de 1929 e nela
se marca uma transição desde as interpretações românticas até as humanistas
e existencialistas que examinaremos depois. Escreve Wahl: “a filosofia de
Hegel não pode ser reduzida à algumas formas lógicas” melhor, estas
fórmulas encobrem algo que não é de origem puramente lógica. A dialética
antes de ser um método é uma experiência(...). A negatividade é o
movimento do Espírito através do qual ele vai sempre para além do que ele
é, e é em parte, a reflexão sobre o pensamento cristão, sobre a ideia de um
Deus feito homem o que tem conduzido Hegel a concepção de universal
concreto. Por trás do filosofo descobrimos o teólogo, e por trás do
racionalista o romântico, mas se pode notar para além disso que a obra de
Hegel consiste em triunfar sobre o romantismo e ao mesmo tempo
racionalizar o dogma, em suma, em fazer desaparecer dentro do conjunto
atemporal no qual se unem finalmente racionalidade e temporalidade as
dissonâncias e a tragicidade do mundo concreto”. E Wahl matiza muito bem
quando afirma que se no fundo no Hegelianismo existe um elemento trágico,
romântico e religioso, seria erro converter esses elementos no todo da
filosofia de Hegel.
Wahl escolhe a consciência infeliz como centro da Fenomenologia, neste
ponto, embora a interpretação de Wahl seja forte, não parece menos
acertada, é verdade que a experiência da consciência infeliz é uma grande
experiência da Humanidade, fruto de um desequilíbrio profundo que afeta
não somente o filósofo se não a toda Humanidade e ao mundo inteiro, é
verdade também que a experiência da consciência infeliz não ocupa
meramente um lugar particular da Fenomenologia, mas que se repete em
vários níveis, mas isso se pode dizer a grande passos, de todas as figuras,
pois também reaparecem o senhor e o Escravo, Estoicismo, ceticismo, etc.
7. O problema da unidade da Fenomenologia. A comunicação de Tehodor
Haering no III congresso de estudos Hegelianos celebrado em Roma no ano
16

de 1933, inaugurou uma polêmica sobre a unidade da Fenomenologia que


dura até nossos dias, a tendência geral, No entanto, tem sido, a de
reivindicar a unidade desta obra de Hegel, contra a tese de Haering. No
artigo de Haering se encontra publicado em Verhandlugen de Dritten
Hegelcongresses(Haarlem-Tubigen, 1934, páginas 118-138).
A partir de uma análise das mudanças da redação da Fenomenologia
Haering, conclui que esta obra não cresceu de maneira orgânica, a segunda
parte é já simplesmente a Filosofia do Espírito, temos feito muitas menções
acerca desta pretensa falta de unidade da Fenomenologia, acreditamos que
desde o começo do livro, e sobretudo, desde o capítulo IV o
desenvolvimento completo da Fenomenologia está exigido, aqui
resumiremos unicamente alguns autores que tem se ocupado expressamente
da tese de Haering. Hyppolite em Gènese et structure, que abordaremos
depois, dá ênfase no conceito do Espírito, tal como se nos oferece o capítulo
IV. Lukács, por outro lado, afirma que o fascismo de Haering é o que o
impede de compreender a Fenomenologia, e afirma algo que nos parece
muito acertado: a tese de Haering se pode rejeita somente se se capta o
significado unitário e complexo da Fenomenologia. Poeggeler(Die
Komposition der Phaenamonolgie des Geistes, Hegelstudien Beiheft 3,
1966, PP. 27-74). Defende a unidade do livro desde o ponto de vista
hermenêutico. Por ultimo o livro de Jean Pierre Labarriere Structures et
Mouvement Dialectique Dans La Phénoménologie de L’Espirit de Hegel.
Paris, Aubier. 1968. Apresenta uma análise dos textos estruturais da
Fenomenologia e conclui a unidade da mesma conferindo-lhe um caráter
quase musical: unidade de distintos planos harmônicos.
8. As interpretações Humanistas. Daremos conta neste parágrafo dos autores
que tem tido especial repercussão da leitura da Fenomenologia: Kojève e
Hyppolite. Estes autores não creem na religiosidade de Hegel, para eles a
Fenomenologia opera uma redução do religioso a um teor profundamente
ateu. O que fica é o homem na história, por outro lado, ambos os autores são
influenciados pelo ecos do existencialismo e em certo sentido continua na
linha da interpretação transmitida por Wahl.
O livro de Alexandre Kojève (Introduction à La lecture de Hegel, Paris,
Gallimard, 1947) recolhe as lições dadas por seu autor em Paris de 1933 à
17

1939, os quais entre os que assistiram, Sartre, Merleau-Ponty, o P. Gaston


Fessard, etc.(este último responsável por certos surgimentos da dialética
Hegeliana na ultima teologia dos jesuítas franceses). As lições de Kojève
foram em grande parte uma leitura comentada da Fenomenologia. O livro se
inicia com uma tradução com comentários intercalados da dialética do
Senhor e Escravo, por ser essa dialética a chave de interpretação da leitura de
Kojève. A partir desta dialética, entendida como oposição ou luta de
individuo a individuo, Kojève interpreta o desenvolvimento da história tal
como o apresenta a Fenomenologia. O mundo grego é um mundo de
senhores ocupados em fazer política e em fazer guerra, enquanto os escravos
trabalhavam, O imperialismo Romano escraviza a todos sob um só senhor,
os escravos se dedicam, então, a espalhar as ideologias libertadoras:
Estoicismo, Ceticismo, Cristianismo. No entanto essas ideologias não
conseguem seus objetivos porque porque põem a liberdade fora do real para
o pensamento. O cristianismo escraviza a todos mediante um senhor
absoluto: a liberdade consistirá em negar a existência de Deus, toda
escravidão funda-se no medo da morte, quando o homem aceitar
simplesmente morrer, deixará de ser escravo.
A interpretação de Kojève não é imediatamente válida como comentário
literal, talvez nem pretenda sê-lo, se apresenta melhor, como uma intenção
de captar o sentido oculto da Fenomenologia, uma busca a dinâmica
profunda da intenção Hegeliana, inclusive para além do que o próprio Hegel
poderia compreender e expressar. É evidente, por exemplo, quando Kojève
afirma que o homem é dialético, mas a natureza não, deve ser consciente que
contradiz formalmente o texto Hegeliano, Kojève por outro lado se
reconhece devedor de Marx e Heidegger e especialmente de Heidegger ao
dizer que Sein und Zeit, é o que faz possível a leitura da Fenomenologia,
em todo caso, o livro de Kojève resulta altamente sugestivo. Para o nosso
entendimento, o pior não é tanto a simplificação ateia da ambiguidade
religiosa de Hegel, mas o forte teor individualista que ele dar a dialética que
considera central. As autoconsciências que se enfrentam erigem em Hegel de
uma cisão do Espírito, por mais que alguém queira fazer uma leitura livre da
Fenomenologia, não pode se distanciar da primazia do universal,
perspectivas existencialistas podem ser encontradas na Fenomenologia,
18

porém o peso não está aí, mas claramente na primazia do universal


comunitário que é o fundo de onde se constitui o indivíduo.
Jean Hyppolite é o autor da tradução completa da Fenomenologia para o
Francês, uma boa tradução, embora perifrástico. É também o autor do
comentário mais completo que possuímos (Gènese et structure de La
phanoménoligie de l’Espirit de Hegel, Paris, Aubier, 1946). Comentário
pesado - o contrário de Kojève - que foge da interpretação detalhada dos
textos verdadeiramente difíceis. De todas modo, o comentário de Hyppolite
pretende somente esclarecer o texto de Hegel, e não em fornecer uma
interpretação global da obra. No entanto, em outras obras suas, lança sua
própria interpretação, que está segundo Hyppolite no capítulo IV. Esta chave
é o homem, entendido como autoconsciência que se entrega ao trabalho. A
exposição completa se encontra num artigo intitulado: La situation de
l’home dans la phénomenologie hégelienne, revista temps modernes, 1947.
De acordo com Hyppolite o que Hegel pretende no capítulo IV da
Fenomenologia é fundar o fato histórico. Não se trata de determinar uma
essência do homem, já que este não a tem, o homem porque é Espírito, é
história e devir coletivo, nada mais, se trata, pois, de ver como este homem
pode ser fundamento de uma verdade possível, uma verdade a que o homem
possa aspirar. Tal verdade se funda na existência mesma, se trata, diz
Hyppolite de surgir no coração mesmo da vida, de um ser que se faz
consciente desta vida e que é condição de sua própria manifestação. Ao
tomar consciência de si, cria uma nova dimensão do ser, gera uma história, e
nesta história descobre a verdade racional. Para a afecção dessa verdade, é
decisivo o trabalho.
O trabalho, em primeiro lugar imprime a forma da autoconsciência no objeto
natural(Ding) e o transforma em objeto humano(Sache). O homem se
reconhece assim em sua obra e se reconcilia com a natureza e tem começado
a liberta-se, mas para a libertação total o homem deve ser reconhecido, o
trabalho serve também para isso, porque na obra realizada, não somente se
reconhecer o trabalhador mesmo que a executou, se não que nela pode ser
reconhecido pelos outros. Hyppolite, depois de ter se centrado na dialética
do senhor e escravo, com seu importante apêndice sobre o trabalho, chama a
atenção sobre a passagem do capítulo V intitulado (Die Sache Selbest) que
19

deve ser trabalho de todos e cada um dos indivíduos, no entanto, conclui


Hyppolite, Hegel não tem resolvido o problema que ele levantou: como uma
verdade pode ser obra de todos e cada um? Verdade simplesmente
fundamentada na existência, um problema que segundo Hyppolite se levanta
igualmente para o Marxismo, Existencialismo e para Cristianismo.
A interpretação de Hyppolite é desde logo sugestiva, mas nos parece que tem
cedido demasiado a fascinante dialética do Senhor e Escravo, como vários
críticos tem notado, em Hegel a autoconsciência é um momento do devir do
absoluto, certo que o absoluto tem seu automovimento para ser à coisa
mesma, entendida como realidade social, fruto da ação humana, mas em todo
modo, existe uma raiz do movimento absoluto que vai para além da pura e
simples existência humana, como temos ocasião de ver em nosso trabalho. É
muito discutível que o Deus ou Absoluto que está na origem seja um Deus
Actu, existente no sentido que dá Hegel ao termo Dasein, não é. Mas de todo
modo, há algo a realizar, uma essência se assim quisermos chamar, e essa
essência é o que confere ao devir aquela propriedade de necessidade tão
enfatizado por Hegel, em definitivo, as interpretações de Kojève e Hyppolite
conseguem fazer da Fenomenologia interessante porque que a simplificam
abusivamente a partir de uma passagem que pode ter atualidade especial,
mas a Fenomenologia tem seu centro de gravidade no conceito do Espírito, e
este conceito não pode ser entendido adequadamente a partir apenas de uma
figura, mas se faz necessário o devir completo de todas as figuras. Não
podemos esquecer que o Espírito é o Absoluto, esta palavra deve significar
algo, não pode ser jogado ao lado na leitura da Fenomenologia, pois tem um
significado supratemporal que anula o tempo, não somente o fim da história,
se não também, na origem.
9. Interpretações Marxistas. As lições de Kojève para além das influências de
Heidegger, mostram também, uma vertente claramente marxista. Se o
incluímos no parágrafo anterior em vez de abordamos aqui, é porque cremos
que o Marxismo de Kojève resulta um tanto adjetivo. De todas as maneiras,
o comentário de Kojève pode ser considerado como o primeiro de uma série
de livros que podem agrupar-se, mais ou menos convencionalmente sob a
epígrafe geral de Hegeliano-Marxistas. Em todo caso e seja o que for do
comentário de Kojève, o certo é que uma série de autores de linha Marxista
20

tem achado necessário aprofundar e atualizar o Marxismo através de uma


releitura de Hegel e em especial da Fenomenologia. Estes autores em geral
tem entrado em conflito com a ortodoxia burocrata do partido, já que seus
livros tem fornecido armas intelectuais ao movimento revisionista.
György Lukács escreveu seu livro intitulado o jovem Hegel no ano de 1938.
O livro é contemporâneo às lições de Kojève, embora fora publicado em
1948. Toda a sua ultima parte está dedicada a Fenomenologia, a tendência
geral do estudo de Lukács consiste em fazer de Hegel um marxista avant le
lettre. Onde não chegou a sê-lo inteiramente, isso porque a sociedade alemã
não havia amadurecido suficientemente. Lukács combate a lenda do pretenso
romantismo de Hegel. A dialética nasceu segundo ele, fruto de seu contato
com os problemas da sociedade capitalista e avançou sempre pelo caminho
de buscar a origem das contradições filosóficas na vida social. Segundo isto
a educação do individuo intencionada por Hegel na Fenomenologia consiste
simplesmente em fazer tomar consciência da situação histórica, Lukács
combate a tese de Haym acerca da arbitrariedade das escolhas dos momentos
históricos a qual se debruça a Fenomenologia, afirmando que a necessidade
de se recorrer a história para apropriar-se da experiência humana se limita a
necessidade de repetir abreviadamente os pontos nucleares do
desenvolvimento histórico.
Lukács nota que Hegel com sua compreensão da história, supera a
concepção continua de Schelling e justifica as rupturas e revoluções,
antevendo assim a luta de classes e o materialismo histórico.
Segundo Lukács, Hegel recorre três vezes ao caminho da história na
Fenomenologia(Poeggeler diz que são quatro). Na primeira o individuo
encontra a sociedade como algo dado (cap. I-V da Fenomenologia). Na
segunda, a consciência reconhece já na sociedade o produto da atividade
humana (cap. VI). Na terceira etapa (cap. VII-VIII) significa a interpretação
consciente que faz o homem de sua própria obra histórica, mediante a Arte,
Religião até chegar à consciência filosófica da situação, em suma, Lukács
Julga que a Fenomenologia é uma reflexão completa sobre a história.
Cremos que este livro de Lukács aborda muito bem a importância das três
dimensões essenciais da Fenomenologia (história), mas o esquecimento das
outras duas o conduz a uma leitura da obra de Hegel que não pode ser
21

considerada objetiva. Substituir – como faz – Espírito, por Gênero, é um


abuso significativo. Afirmar por outro lado que o idealismo de Hegel se
manifesta somente em momentos débeis da Fenomenologia resulta ingênuo e
certamente oposto ao que cria Marx.
Ninguém estranhará que o livro de Lukács tenha sido atacado pelos próprios
Marxistas, o livro de G. Stiehler, Die Dialektik in Hegel Phänomenologie
des Geistes, Berlim, Akademie, 1964. (trad. Cast. Titulada Hegel e las
origines de la dialéctica) Madrid, Ciencia Nueva, Sin Fecha) pode ser
considerado típico: coloca em destaque os “insuperáveis limites
especulativos e idealistas” de Hegel. De maneira semelhante, M. Rossi em
seu artigo intitulado: Lo storicismo mistificado della Fenomenologia
Hegeliana, Socièta, 1957, reproduzido em seu livro, Hegel e lo Stato,
Roma, 1960, sublinha que a metafísica perpassa toda Fenomenologia,
talvez insista demasiadamente que os fatos históricos são o lugar do
movimento do conceito. Com isso, Rossi separa exageradamente o mundo
ideal do real. Não podemos esquecer que para Hegel a história é a realização
do absoluto. O absoluto não é simplesmente transcendente, a história é o
conceito existente. Se a leitura da Fenomenologia proposta por Lukács era
em realidade pouco Marxista, por ter esquecido o elemento idealista de
Hegel, tão incomodo para Marx, a Leitura de Rossi nos parece exagerada:
“Hegel não era um metafísico”. Não é em vão que ele evita esta palavra. Se
em Hegel existe Deus, se trata de um Deus totalmente encarnado, se a
realidade é símbolo do conceito, é um símbolo que se identifica com o
simbolizado.
O perigo das versões da Fenomenologia de Kojève, Hyppolite e Lukcás,
consiste ao nosso juízo, em separar elementos valiosos da Fenomenologia e
apresentá-los como se fosse a Fenomenologia mesma. Estes elementos
podem servir para muitas coisas, mas tirados de seu contexto já não servem
para entender a Fenomenologia. Fazer do texto de Hegel pretexto ou ocasião
para expor sua filosofia própria, é um recurso legítimo, mas tem que ser
avisado, o que não vale é querer passar a filosofia própria como leitura mais
ou menos profunda. Por esta razão nos parece mais honesto como faz Bloch
quando afirma que seu livro não é um livro Uber Hegel(sobre Hegel) se não,
Zu Hegel. (Enerst. Bloch. Subjeket-Objekt. Erlaeuterungen zu Hegel.
22

Frankfurt, Suhrkamp, 1962.) (a primeira edição Segundo parece é de


1951. O livro pronto Segundo parece no ano de 1949.) ao final do livro nos
oferece ao que parece sua própria Aufhebung ao que Bloch faz do
Hegelianismo, e todo seu comentário a Hegel deve ser entendido como parte
de sua própria filosofia.
A Apresentação que Bloch faz da Fenomenologia é bastante admirável. A
obra com a qual Hegel se apresentou no cenário filosófico é a mais obscura e
profunda entre as suas, embora a planejou como especialmente fácil, ou seja,
como pedagógica, já que deveria conduzir o leitor até a porta da Filosofia, e
isto certamente não conseguiu, pois a multidão de aspectos o impediu,
contudo apesar de que o livro não é apto para principiantes, se o é, é para
aquela outra parte do começo que se chama juventude do Espírito. O livro
está repleto de juventude incomparável, cheio de abundância e calor,
totalmente poético, totalmente cientifico, com um fermento matinal único.
Uma obra que não tem comparação na literatura filosófica. Esmagador e
central, ditirâmbico e por sua vez estritamente ordenado. Em nenhuma outra
parte pode ser encontrado melhor o que é um grande pensamento na sua
origem e em nenhuma parte pode se dada por concluída.
Em seguida nota Bloch que o livro é uma evolução autoeducativa do Espírito
no mundo e a educação filosófica do leitor, e o compara ao Fausto de
Goethe.
Na Fenomenologia Bloch detecta a convergência de três subjetividades
distintas, a saber, 1) O eu revolucionário que se erige como medida de todas
as coisas 2) o eu do racionalismo matemático que aspira a pura cientificidade
e 3) o eu romântico que começa a orientar-se até a história. Na história é
onde Hegel encontrará toda a riqueza do espírito, a realidade plenamente
especificada e a Fenomenologia será a primeira obra que consegue pensar de
maneira lógica a história.
Recolhe depois a ideia de Lukács acerca do tripé percurso da história na
Fenomenologia, Bloch recorre também por sua conta, duas vezes distintas
toda Fenomenologia, fiel, consigna do mesmo Hegel que há que deter-se nas
figuras, o que Bloch valoriza é o Homem construtor de si mesmo enquanto
constrói o mundo. O homem inquieto enquanto não tem alcançado a total
humanização, sua crítica a Hegel tem um princípio claro: Hegel confunde
23

alienação com objetivação, Bloch pensa pelo contrário que se deve somente
eliminar a alienação a estranheza, mas não a objetividade. Ao fim crítica,
sobretudo a espiritualidade com que a acaba a Fenomenologia, embora
Hegel segundo Bloch, tenha visto bem o papel da Práxis, não tem extraído
todas as consequências desse conceito, e tem permanecido numa visão
contemplativa das coisas, mas inclusive este final infeliz tem um aspecto
positivo: que Hegel anuncia o que deve ser, a utopia que não pode
permanecer na utopia a realidade do fim humanizado de todas as coisas que
não pode ficar num progresso indefinido. A este repeito nota como a figura
do perdão mutuo perde concretude comparada com as anteriores porque aqui
faltava a Hegel o material histórico. Hegel quis crer que seu tempo era o
último, mas não era.
O mais interessante ao nosso parecer é que Bloch proclama a prioridade do
sujeito, do impulso que deve alcançar seu fim, mas quer evitar uma
subjetividade autônoma que cairia num anarquismo, este extremo seria tão
detestável para Bloch como o extremo oposto, a saber, por uma
subjetividade arrastada por forças estranhas em que chegaria a cair num
marxismo mau entendido (marxismo Craso) ou na providencia de uma fé
religiosa.
Como Bloch explicar mais detalhadamente em outras obras se trata de que
homem construa o absoluto que nele fermenta, a adequação sujeito e objeto.
Enquanto existir alienação, este fim será utópico, mas mediante o trabalho se
pode conseguir, não é fatal nem impossível que isso ocorra, este fim já se
anunciou – escreve Bloch – como imagens cristológicas como nosso “rosto
descoberto” e como natureza glorificada.
Em resumo, Bloch é um marxista que teme cair num materialismo craso e
entende que para isso é necessário manter o nexo Hegel-Marx. uma teoria do
conhecimento que considerasse algo meramente receptivo absorveria o
homem na natureza, por isso há que reter a primazia do sujeito, embora
ligado à natureza, primazia que é e que pode ser real ao final da história, mas
que é somente inquietude e a tarefa do momento. O ateísmo de Bloch crer no
Deus que existirá, todavia não existe, porque se já existisse não ficaria nada
por realizar, todo drama da história seria um jogo sem importância. Neste
sentido Bloch sabe que ele não é um Hegeliano sem mais, sabe que corrige
24

seu idealismo e para isso se vale da ambiguidade do religioso em Hegel. Mas


tampouco pode sofrer de um Marxismo que não capta o papel do homem, da
sua primazia no devir, sua leitura de Hegel não é exegética, se não
investigativa, e quase policialesca para encontrar os elementos que lhe
permitem vivificar filosoficamente a dialética Marxista.
10. Lógica ou experiência? A controvérsia Fulda-Poeggler. O livro de Hans
Friedrich Fulda Das Problem Einer Einleitung in Hegels Wissenchaft der
Logik, publicado em 1965, significou, uma tentativa de reabilitar o
especulativo em Hegel, inclusive no Hegel da Fenomenologia, se os
descobrimentos românticos e existencialistas de Hegel, nos possibilitaram
uma imagem de Hegel distinta daquela que o apresentavam como o filósofo
mais abstrato da história da Filosofia, no entanto, sempre será preciso manter
que Hegel é, antes de tudo, e sobretudo, o pensador especulativo por vontade
própria e por consequência. Durante alguns anos a leitura da Fenomenologia
empregava esta obra como deposito de materiais dotados de surpreendente
atualidade, mas os separava de suas implicações sistemática, exemplo típico
desse proceder, era o comentário de Kojève. Fulda pelo contrário é
consciente da obviedade de que Hegel é sempre Hegel: portanto uma leitura
mais objetiva possível de se propor, chegar no centro organizador da
Fenomenologia a qual para Fulda é a lógica Hegeliana. Fulda aduz dos
textos de Hegel que fala de uma correspondência entre as figuras da
consciência e os momentos do conceito deduzidos pela lógica, e a partir
deste princípio, busca é em cada figura aquele momento lógico que deve
contituir o em-si ou a essência daquela. Fulda tem reconhecido no artigo que
citaremos na continuação que seu livro dependeu excessivamente da lógica
de Nuremberg, enquanto que agora orienta sua investigação até as formas
anteriores da lógica Hegeliana, no entanto, de toda maneira, Fulda
permanece fiel a sua tese de fundo: que a chave da Fenomenologia deve ser
buscada no elemento especulativo e somente através deste se poderá julgar a
pretensa falta de unidade da obra, tal como saiu das mãos de Hegel, tentar
resolver este problema através da filologia lhe parece um mau caminho.
Contra a posição de Fulda apareceu nos Hegel-Studien(Beiheft 3, 1966,
PP.27 ss) um artigo muito documentado de Otto Poeggeler, intitulado: Die
Komposition der Phaenomenologie des Geistes. Nele se faz uma boa
25

defesa das possibilidades da filologia, que não possa, talvez, resolver todos
os problemas, mas pode proporcionar elementos inestimáveis para propor
corretamente o problema da interpretação da Fenomenologia. Não nega
Poeggeler que deva existir uma certa correspondência entre os momentos
lógicos e as figuras da consciência, porém rejeita o paralelismo estabelecido
por Fulda com dois argumentos: 1) Na Fenomenologia se passa desde o
mundo suprassensível a autoconsciência através do conceito de vida. Esta
passagem se suprime na lógica de Nuremberg. 2) Poeggeler nega que se
possa encontrar uma correspondência tal entre momentos lógicos e figuras e
que para os três primeiros capítulos da Fenomenologia se utilizem as
categorias da lógica objetiva, e somente a partir do cap. IV(consciência de si)
entra em jogo a relação. Poeggeler pelo contrário crer que o relativo está
Fenomenologia desde o primeiro momento.
Poeggeler propõe que se se quer encontrar correspondência entre lógica e
Fenomenologia é desnecessário ir à lógica de Nuremberg, mas que se deve ir
ao manuscrito sobre Lógica, Metafísica e filosofia da Natureza de 1804.
Porém, Poggeler simpatiza muito pouco com os intentos de Fulda, porque
encontra na Fenomenologia uma intenção de compreender a História como
história do absoluto, que deve ser sistematizada desde seu mesmo
desenvolvimento teleológico e não desde uma lógica conceitual estabelecida
de antemão.
No mesmo caderno dos Hegel-Studen se insere a resposta de Fulda(Zur
Logik der Phaenomenologie Von 1807. P. 75-101). Como já temos dito,
Fulda concede que seu livro esteve excessivamente orientado pela lógica de
Nuremberg. Mas, tampouco que recorrer as versões da lógica anteriores a
Fenomenologia. Em vez disso ele acredita que a Fenomenologia corresponde
a uma fase intermediaria na sistematização da lógica. esta fase não contaria
com um documento escrito onde tivesse sido formulado expressamente,
contudo, seria possível detectar na própria Fenomenologia. O que Fulda quer
acima de tudo reivindicar é a intima dependência entre a dialética da
consciência e a dialética do conceito. esta ultima é para Hegel sempre a mais
radical. Quanto aos argumentos de Poeggeler, Fulda replica que a passagem
para autoconsciência através da vida se retém, de alguma maneira, nas
versões posteriores da lógica e que a argumentação de Poeggeler sobre a
26

relação esquece que o em-si de cada figura não é para a consciência. O


momento lógico que constitui cada figura está ali, como seu segredo mais
intimo, mas a consciência não se estrutura para ela mesma segundo esse em-
si.
Concluamos esta breve visão da controvérsia com nossas próprias palavras.
O tom dela é muito distinto das leituras francesas da Fenomenologia que
temos também resenhado. Aqui se trata de encontrar um método de leitura
cientifica que permita a interpretação objetiva da Fenomenologia tal como
saiu das mãos de Hegel. Segundo o nosso entendimento, ambos os autores –
Fulda e Poeggeler – veem algo que é verdade. O primeiro ver a
personalidade especulativa de Hegel que não cessa na Fenomenologia e
desconfia dos procedimentos puramente filológicos para aceder a uma obra
estritamente filosófica. Poeggeler por sua parte é consciente de que a
Fenomenologia é uma obra singular na qual a consciência está em primeiro
plano. Teme, por isso, que uma leitura especulativa esquematize
excessivamente e desfigure um conteúdo especialmente rico. Em nosso
trabalho quisemos sublinhar que a fascinação da Fenomenologia se deve
pelo menos em grande parte a este duplo caráter da obra. O perigo da
posição de Fulda consiste em levá-la ao extremo até chegar a supor que a
Fenomenologia foi escrita desde um esquema lógico preestabelecido, melhor
parece que o especulativo no sentido Hegeliano está ai pronto a nascer, mas
certamente Hegel se orienta sempre até uma lógica do conceito como
elemento estritamente originador da dialética real da consciência, o que não
deve impedir o desenvolvimento autônomo da consciência, segundo uma
necessidade que ignora o verdadeiro motivo do seu processo.

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