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Mecânica Quântica

José Roberto Pinheiro Mahon

Rio de Janeiro

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Mecânica Quântica
(primeira versão)

José Roberto Pinheiro Mahon


Instituto de Física Armando Dias Tavares
Universidade do Estado do Rio de Janeiro

Rio de Janeiro, 2009

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A meus pais, José e Zélia.


A Geisa.

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Prefácio

A Mecânica Quântica é, ao lado da Relatividade, um dos pilares fun-


damentais da Física Moderna. Este texto é baseado em um curso de
graduação, para estudantes avançados, e de pós-graduação em Mecânica
Quântica que ministrei nos últimos anos no Instituto de Física da
Universidade do Estado do Rio de Janeiro, é uma exposição
básica e com uma abordagem moderna da Teoria Quântica.
O objetivo do texto é apresentar a Mecânica Quântica de uma forma
moderna, incluindo vários exemplos atuais e suas aplicações, que deverá
ser útil aos estudantes que irão utilizá-lo.
Os tópicos introduzidos são tratados de forma compreensiva, procu-
rando-se expor claramente as deduções dos principais resultados. Es-
pera-se que o estudante tenha familiaridade com o material básico de
um Curso de Estrutura da Matéria e Mecânica Analítica (nível de grad-
uação), bem como de Álgebra Linear e de Física Matemática abordados
nos cursos de Física.
Os temas da Mecânica Quântica tratados nesse texto foram di-
vididos em dezesseis capítulos assim distribuídos: Introdução aos Con-
ceitos Fundamentais, A Equação de Schrödinger e Álgebra dos Op-
eradores, Aplicações da Equação de Schrödinger, Aproximação WKB,
Formalismo da Mecânica Quântica, Dinâmica Quântica, Propagadores
e Integrais de Caminho de Feynman, Potenciais Centrais e Momen-
tum Angular, Espalhamento, Rotações o Operadores Tensoriais, Matriz
Densidade, Simetrias e Leis de Conservação, Teoria das Perturbações
Estacionárias, Teoria das Perturbações Dependente do Tempo, Teoria
Formal do Espalhamento e Partículas Idênticas.
Desejo agradecer aos estudantes que proporcionaram a motivação

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8 Prefácio

para escrever este texto. Em especial André Calvet solucionando prob-


lemas em teoria de perturbação e colisões, Ana Thereza Bastos Garcia
da Rosa desenvolvendo através das integrais de caminho o problema do
oscilador harmônico forçado, Diego Figueiredo colaborando com efeito
Aharonov-Bohm e Alan Guzmán colaborando com teoria de gauge e
monopolos magnéticos.
Agradeço também aos colegas do Instituto que incentivaram na
preparação deste trabalho. Em especial os Profs. José Umberto Cinelli
Lobo de Oliveira e Vitor Oguri, pelas valiosas sugestões, discussões de
aspectos fundamentais, conceituais e da matemática usada na Mecânica
Quântica. Nossas longas conversas foram um grande estimulo para re-
alização desse texto.

UERJ, Rio de Janeiro


J. R. Mahon

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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Prefácio 9

Mecânica Quântica

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10 Prefácio

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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Sumário

Prefácio 7

1 Introdução aos Conceitos Fundamentais 17


1.1 Radiação do Corpo Negro . . . . . . . . . . . . . . . . . 17
1.2 Calor Específico dos Sólidos . . . . . . . . . . . . . . . . 18
1.3 Efeito Fotoelétrico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19
1.4 Efeito Compton . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 21
1.5 Espectros Atômicos e Séries Espectrais . . . . . . . . . . 21
1.6 O Modelo de Bohr para o Átomo de Hidrogênio . . . . . 22
1.7 Experiência de Franck-Hertz . . . . . . . . . . . . . . . . 24
1.8 Regras de Quantização de Wilson-Sommerfeld . . . . . . 25
1.9 Mecânica Quântica Matricial . . . . . . . . . . . . . . . 26
1.10 Postulados de de Broglie . . . . . . . . . . . . . . . . . . 31
1.11 Interferência Em um Sistema de Duas Fendas . . . . . . 33
1.12 O princípio da Superposição . . . . . . . . . . . . . . . . 36
1.13 O Princípio da Incerteza . . . . . . . . . . . . . . . . . . 38
1.14 Pacotes de Onda e Relação de Incerteza . . . . . . . . . 38
1.15 Princípio da Complementaridade . . . . . . . . . . . . . 40
1.16 Equação de Onda . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 40
1.17 Comentários . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 44

2 A Equação de Schrödinger e Álgebra dos Operadores 47


2.1 A Equação de Onda e a Interpretação de ψ . . . . . . . 47
2.2 Conservação da Probabilidade . . . . . . . . . . . . . . . 49
2.3 Normalização da Função de Onda . . . . . . . . . . . . . 51

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12 Sumário

2.4 Equação de Onda – Sistemas Estacionários . . . . . . . 53


2.5 Estados não-estacionários . . . . . . . . . . . . . . . . . 55
2.6 Ortogonalidade dos Auto-Estados . . . . . . . . . . . . . 56
2.7 Valor Esperado – Espaço de Coordenada e Momentum . 58
2.8 Operadores . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 62
2.9 Adição e Multiplicação de Operadores . . . . . . . . . . 68
2.10 A Derivada Temporal de um Operador . . . . . . . . . . 69
2.11 Teorema de Ehrenfest . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 71
2.12 Teorema Virial . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 73
2.13 Comutadores e Regras de Comutação . . . . . . . . . . . 74
2.14 Operadores Unitários - Operador Deslocamento . . . . . 78
2.15 Comentários . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 80

3 Aplicações da Equação de Schrödinger 81


3.1 A Função Delta . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 81
3.2 Analogia entre a Quântica e a Óptica . . . . . . . . . . . 85
3.3 Potencial Degrau - Barreira de Potencial . . . . . . . . . 86
3.4 Barreira de Potencial Retangular . . . . . . . . . . . . . 92
3.5 Poço Quadrado Unidimensional . . . . . . . . . . . . . . 100
3.6 Potencial Delta . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 108
3.7 Potenciais Periódicos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 109
3.8 Oscilador Harmônico Linear . . . . . . . . . . . . . . . . 114

4 Aproximação WKB 123


4.1 Aproximação Semiclássica . . . . . . . . . . . . . . . . . 123
4.2 A Aproximação de Wentzel, Kramers e Brillouin . . . . 126
4.3 Fórmulas de Conexão . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 131
4.4 Aplicação WKB para Barreira de Potencial . . . . . . . 137
4.5 Aplicação WKB para Estados Ligados . . . . . . . . . . 141
4.6 Comentários . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 145

5 Formalismo da Mecânica Quântica 147


5.1 Experimento de Stern-Gerlach . . . . . . . . . . . . . . 147
5.2 Notação de Dirac - Bra e Ket . . . . . . . . . . . . . . . 151
5.3 Operadores Lineares . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 156
5.4 Base dos Kets e Representação Matricial . . . . . . . . 159
5.5 Mudança de Base - Transformação Unitária . . . . . . . 167
5.6 Observáveis e Relação da Incerteza . . . . . . . . . . . . 171
5.7 Posição, Momentum e Translação . . . . . . . . . . . . . 176

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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Sumário 13

5.8 Aplicações no Experimento de Stern-Gerlach . . . . . . 180


5.9 Comentários . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 187

6 Dinâmica Quântica 189


6.1 Evolução Temporal . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 189
6.2 Derivação da Equação de Schrödinger . . . . . . . . . . 191
6.3 Solução Formal para U(t, t0 ) . . . . . . . . . . . . . . . 191
6.4 Dependência Temporal do Valor Esperado . . . . . . . . 193
6.5 Representações de Schrödinger, Heisenberg e Interação . 196
6.6 Precessão do Spin . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 201
6.7 Ressonância Magnética . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 205
6.8 Oscilador Harmônico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 208
6.9 Evolução Temporal do Oscilador Harmônico . . . . . . . 219
6.10 Estados Coerentes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 220
6.11 Equação de Onda de Schrödinger . . . . . . . . . . . . . 225
6.12 Comentários . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 226

7 Propagadores e Integrais de Caminho de Feynman 229


7.1 Propagadores . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 229
7.2 Evolução da Amplitude de Transição . . . . . . . . . . . 234
7.3 Integrais de Caminho de Feynman . . . . . . . . . . . . 235
7.4 Aproximação Semiclássica . . . . . . . . . . . . . . . . . 238
7.5 Oscilador Harmônico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 242
7.6 Oscilador Harmônico Forçado . . . . . . . . . . . . . . . 248
7.7 Efeito Aharonov-Bohm . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 248
7.8 Monopolos Magnéticos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 252
7.9 Comentários . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 257

8 Potenciais Centrais e Momentum Angular 259


8.1 Momentum Angular Orbital . . . . . . . . . . . . . . . . 259
8.2 Energia Cinética e Momentum Angular . . . . . . . . . 263
8.3 Problema de Autovalores do Momentum Angular . . . . 264
8.4 Autofunções do Momentum Angular . . . . . . . . . . . 272
8.5 Harmônicos Esféricos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 276
8.6 Redução do Problema de Força Central . . . . . . . . . 284
8.7 Partícula Livre como Problema de Força Central . . . . 287
8.8 Ondas Planas em Termos dos Harmônicos Esféricos . . . 291
8.9 Caixa Esférica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 293
8.10 Potencial de Coulomb - Átomo de Hidrogênio . . . . . . 295

Mecânica Quântica

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14 Sumário

8.11 Comentários . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 305

9 Espalhamento 307
9.1 Amplitude de Espalhamento . . . . . . . . . . . . . . . . 308
9.2 Seção de Choque Diferencial . . . . . . . . . . . . . . . . 310
9.3 Método de Ondas Parciais . . . . . . . . . . . . . . . . . 312
9.4 Teorema Óptico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 321
9.5 Espalhamento Elástico e Inelástico . . . . . . . . . . . . 322
9.6 Espalhamento Ressonante . . . . . . . . . . . . . . . . . 325
9.7 Efeito Ramsauer-Townsend . . . . . . . . . . . . . . . . 327
9.8 Espalhamento - Função de Green . . . . . . . . . . . . . 328
9.9 Aproximação de Born . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 331
9.10 Aproximação Eikonal . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 335
9.11 Espalhamento de Partículas Idênticas . . . . . . . . . . 338
9.12 Comentários . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 339

10 Rotações o Operadores Tensoriais 341


10.1 Rotações e Momentum Angular . . . . . . . . . . . . . . 341
10.2 Sistema de Spin 21 e Rotações Finitas . . . . . . . . . . 346
10.3 Formalismo de Pauli . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 350
10.4 Os Grupos SO(3), SU (2) . . . . . . . . . . . . . . . . . 354
10.5 O Grupo SU (3) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 360
10.6 Rotações de Euler . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 362
10.7 Rotações e Momentum Angular - Parte 2 . . . . . . . . 365
10.8 Adição de Momentum Angular . . . . . . . . . . . . . . 369
10.9 Teorema de Wigner-Eckart . . . . . . . . . . . . . . . . 383
10.10Não-Localidade na Mecânica Quântica . . . . . . . . . . 388
10.11Comentários . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 396

11 Matriz Densidade 397


11.1 Operador Matriz Densidade . . . . . . . . . . . . . . . . 399
11.2 Matriz Densidade - Sistemas de spin- 12 . . . . . . . . . . 404
11.3 Evolução Temporal de um Sistema . . . . . . . . . . . . 407
11.4 Sistemas de dois níveis . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 409
11.5 Polarização . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 414
11.6 Precessão do Vetor Polarização . . . . . . . . . . . . . . 415
11.7 Polarização e Espalhamento . . . . . . . . . . . . . . . . 417
11.8 Mecânica Estatística Quântica . . . . . . . . . . . . . . 420
11.9 Comentários . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 425

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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Sumário 15

12 Simetrias e Leis de Conservação 427


12.1 Simetrias na Física Clássica e Quântica . . . . . . . . . 427
12.2 Invariância Temporal e Energia . . . . . . . . . . . . . . 429
12.3 Invariância Espacial e Momentum Linear . . . . . . . . 430
12.4 Invariância Rotacional e Momentum Angular . . . . . . 431
12.5 Simetria Discreta, Paridade ou Inversão Espacial . . . . 432
12.6 Poço Duplo Simétrico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 437
12.7 Simetria Discreta, Inversão Temporal . . . . . . . . . . . 442
12.8 Comentários . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 448

13 Teoria das Perturbações Estacionárias 449

14 Teoria das Perturbações Dependente do Tempo 451

15 Teoria Formal do Espalhamento 453

16 Partículas Idênticas 455


16.1 Princípio da Indistinguibilidade . . . . . . . . . . . . . . 455
16.2 Operadores de Permutação . . . . . . . . . . . . . . . . 459
16.3 Alguns Efeitos Observados Devidos à Indistinguibilidade 461
16.4 Correlação Espacial entre as Partículas . . . . . . . . . . 463
16.5 Átomo de Hélio . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 466
16.6 Tabela Periódica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 469
16.7 Segunda Quantização - Bósons . . . . . . . . . . . . . . 472
16.8 Segunda Quantização - Férmions . . . . . . . . . . . . . 479
16.9 Espalhamento de Partículas Idênticas - Parte 2 . . . . . 481
16.10Comentários . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 483

Lista de Figuras 487

Referências 491

Índice Remissivo 495

Mecânica Quântica

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Capítulo 1

Introdução aos Conceitos


Fundamentais

A Mecânica Quântica é um tratamento teórico na qual podemos descr-


ever, relacionar e prever vasto campo de sistemas físicos, desde partícu-
las através do núcleo, átomos e radiação até moléculas e matéria con-
densada. Esta disciplina é um dos pilares da física contemporânea.
A Mecânica Quântica se aplica a sistemas microscópicos, aonde a
Mecânica Clássica perde a validade, como por exemplo a dualidade
onda-partícula ou partícula-onda. A descrição quântica é de tal natureza
que dá margem, em particular, a que um mesmo sistema físico tenha
comportamento contraditório em situações observáveis diferentes, no-
vamente usamos o exemplo do comportamento ondulatório e do com-
portamento corpuscular.
Não é possível deduzir a Mecânica Quântica de noções ou esquemas
clássicos, nem tão pouco construí-la como uma extensão da Mecânica
Clássica. O objetivo deste Capítulo é apresentar uma introdução aos
conceitos fundamentais da Mecânica Quântica.

1.1 Radiação do Corpo Negro


Em 1900, supondo que a emissão de energia sob forma da radiação
eletromagnética (considerado como um oscilador harmônico) de fre-
qüência ν por um corpo negro estivesse associado a pacotes discretos
("quantum de energia") de grandeza hν, Max Planck 1 deduziu para
1
Karl Ernst Ludwig Max Planck (1858–1947), físico alemão.

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18 Cap. 1 Introdução aos Conceitos Fundamentais

a radiação de corpo negro a distribuição espectral 2

8πν 2 hν
ρν = 3 hν
. (1.1)
c exp kT −1

onde ρν dν é a energia da radiação do corpo negro à uma temperatura


T , por unidade de volume, com freqüência entre ν e ν + dν. Essa dis-
tribuição concorda extremamente bem com os resultados experimentais,
utilizando um valor conveniente para a constante de Planck h. Essa
hipótese contradiz profundamente o que se poderia esperar a partir da
Mecânica e da Eletrodinâmica Clássicas.
Devemos mencionar ainda um importante detalhe nessa teoria. De
acordo com sua hipótese, um oscilador harmônico pode ter energias que
são múltiplas de uma quantidade fixa, hν: E = 0, hν, 2hν,    , nhν,    .
A emissão (e a absorção) de radiação pelo oscilador ocorre somente
quando ele "salta" de um estado de energia para um outro vizinho.
Passando do estado de energia nhν para um imediatamente abaixo,
(n − 1)hν, o oscilador perde uma quantidade de energia hν que é emi-
tida na forma de "pulso" de radiação. Quando o oscilador passa de um
estado de energia hν para um imediatamente acima, (n + 1)hν, uma
quantidade de energia hν é absorvida pelo oscilador. Essas idéias (prin-
cipalmente a de absorção) não eram ainda muito claras quando Planck
postulou sua teoria, pois ele não havia incluído a quantização da en-
ergia radiante (o fóton), que seria introduzida mais tarde por Albert
Einstein 3 .

1.2 Calor Específico dos Sólidos


Um outro sistema em que a hipótese de Planck foi inicialmente aplicada,
foi o caso do calor específico dos sólidos. Einstein, em 1907 4 , usou o
resultado de Planck para a energia média de um conjunto de osciladores,
considerando os átomos do sólido como um conjunto de 3N osciladores
de Planck unidimensionais com freqüência ν, sendo portanto a energia
2
M. Planck, Verhandlungen der Deutschen Physikalishen Gesellschaft v.2, 202–204
(1900); M. Planck, Verhandlungen der Deutschen Physikalishen Gesellschaft v.2,
237–245 (1900); M. Planck, Annalen der Physik, Ser. 4 1, 69–122 (1900).
3
Albert Einstein (1879–1955), físico alemão.
4
A. Einstein, Annalen der Physik, Ser. 4, 22, 180–190 (1907).

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1.3. Efeito Fotoelétrico 19

média por mol dada por:



U = 3N hEi = 3N hν
(1.2)
exp kT −1

resultando imediatamente que


µ ¶2 hν
∂U hν exp kT
Cv = = 3N k ¡ ¢2 . (1.3)
∂T kT hν
exp kT −1

Para hν ¿ kT essa expressão reproduz o resultado "clássico" 3N k con-


hecido como lei de Dulong e Petit 5 , mas diverge dele para tem-
peraturas baixas (na escala hν/k), indo a zero no limite T → 0. Esse
comportamento reproduz razoavelmente os valores medidos de Cv para
diversos sólidos, mediante um ajuste do valor de ν para cada caso.

1.3 Efeito Fotoelétrico


Por volta de 1887, H. Hertz 6 realizava a série de experimentos com
os quais demonstrou a existência das ondas eletromagnéticas, quando
observou que no receptor das ondas eletromagnéticas, a energia eletro-
magnética capturada pelo sistema era utilizada para produzir a faisca
nas correspondentes pontas (do receptor). Utilizando vários obstáculos
colocados entre as pontas dos aparelhos, como papelão, vidro e quartzo,
observou que o vidro, diferentemente do quartzo, afetava a distância
máxima e concluiu, corretamente, que o efeito era causado pela incidên-
cia, nas pontas do receptor, de luz ultravioleta produzida na descarga
do transmissor. Este fenômeno é conhecido como efeito fotoelétrico:
a luz ultravioleta (ou radiações mais energéticas como raios X e raios
gama) incidindo num metal faz com que elétrons sejam ejetados da
superfície metálica.
Em 1905 7 , Albert Einstein, utilizando, de uma forma mais geral, as
idéias de Planck para a energia dos osciladores na cavidade do corpo ne-
gro, conseguiu explicar as propriedades observadas no efeito fotoelétrico.
5
Pierre Louis Dulong (1785–1838), físico francês;
Alexis Thérèse Petit (1791–1820), físico francês;
A. T. Petit; P. L. Dulong, Annales de Chimie et de Physique [2], 10, 395–413
(1819).
6
Heinrich Rudolph Hertz (1857–1894), físico alemão.
7
A. Einstein, Annalen der Physik (Leipzig), 17, 132–148 (1905).

Mecânica Quântica

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20 Cap. 1 Introdução aos Conceitos Fundamentais

Planck, em sua demonstração, se restringiu à quantização da energia


para o caso dos osciladores (elétrons) nas paredes da cavidade. As on-
das no interior da cavidade (produzida pelos elétrons oscilando) eram
quantizadas em decorrência disso. Einstein, ao invés disso, considerou
que a própria energia radiante era quantizada, sendo portanto consti-
tuída de corpúsculos, cada um portanto uma quantidade fixa de en-
ergia. Os fenômenos usuais não permitiam observar essa característica
devido ao enorme número de fótons normalmente associado à energia
radiante (assim como um líquido aparenta ser um fluido contínuo e não
formado por elementos discretos). É interessante notar, que antes da
descoberta da difração da luz, Newton 8 desenvolveu um modelo cor-
puscular para a luz, que no entanto não corresponde às idéias de
Einstein, principalmente porque seu modelo não previa a difração da
luz (fenômeno tipicamente ondulatório). Para explicar a difração e a
interferência, Einstein supôs que as partículas de luz (fótons) não se
movem como partículas usuais, mas que se propagam com intensidades
médias dada pela amplitude da onda eletromagnética associada, dada
pelo modelo ondulatório. O caráter corpuscular seria manifestado ape-
nas no processo de interação da radiação eletromagnética com a matéria
(na emissão e absorção). Seguindo as idéias de Planck, associou à ra-
diação de freqüência ν, com fótons de energia E = hν. A intensidade
de luz é agora dada pelo número de fótons emitidos por unidade de
tempo. Supôs também, que no efeito fotoelétrico, um único fóton in-
terage com um elétron, sendo completamente absorvido por este, que
após a interação terá uma energia cinética Eco = hν
Após receber esta energia pela interação com o fóton, o elétron deve
ainda perder alguma energia até escapar da superfície do metal. A en-
ergia cinética do elétron ejetado do metal será portanto:

Ec = Eco − W = hν − W , (1.4)

onde W é a função trabalho realizado para arrancar o elétron do


metal. Com essa teoria, Einstein explicou o fenômeno do efeito fo-
toelétrico, até então não entendido na física moderna, mostrando um
comportamento de dualidade onda-partícula para os fótons.

8
Isaac Newton (1642–1727), matemático, físico e filósofo inglês.

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1.4. Efeito Compton 21

1.4 Efeito Compton


A observação do espalhamento Compton só foi possível após a de-
scoberta dos raios X e do enorme interesse em seu estudo que se seguiu
após a descoberta. Em 1918, Arthur H. Compton 9 iniciou uma série
de experimentos visando o estudo do espalhamento de raios X. Esses
experimentos o levaram a descobrir, em 1923 10 , um importante efeito,
hoje conhecido como efeito Compton, que não tem explicação dentro
da teoria clássica da radiação eletromagnética. É interessante notar
que aqui também temos o comportamento dual onda-partícula dos fó-
tons, pois os fótons interagem com a matéria e produzem uma colisão
com o comportamento de matéria-matéria. A explicação é dada fazendo
uso da teoria de Planck para a energia dos fótons.

1.5 Espectros Atômicos e Séries Espectrais


A partir de 1880, o estudo dos espectros da radiação visível emitida
por chamas e posteriormente por descargas produzidas em gases ou em
vapores metálicos tomou um grande impulso. Os espectros atômicos,
tanto na região visível, quanto na do infravermelho e do ultravioleta,
têm enorme importância ainda nos dias atuais, principalmente por sua
aplicação em processos de análise de composição de materiais, com-
posição da matéria estrelar, etc., dada a enorme precisão com que se
pode determinar os comprimentos de onda da radiação (λ) emitida pelos
átomos.
Embora os espectros observados sejam relativamente complexos,
com um número muito grande de raias, elas podem em muitos casos
ser classificadas em grupos, de acordo com suas características princi-
pais. No espectro do hidrogênio, por exemplo, o mais simples de todos,
dado que o hidrogênio é também o átomo mais simples, duas séries eram
conhecidas. Uma na faixa do visível e ultravioleta próximo e outra, ob-
servada posteriormente, na região do ultravioleta (hoje são conhecidas
cinco séries distintas no espectro do hidrogênio, as outras três na região
do infravermelho). Nos espectros dos materiais alcalinos, como o só-
dio, as raias mais intensas eram classificadas em três séries: a nítida
(sharp), a principal e a difusa (s, p e d). Logo que essas regularidades
9
Arthur Holly Compton (1892–1962), físico americano.
10
A. H. Compton, Physical Review, 21 n.5, 483–502 (1923).

Mecânica Quântica

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22 Cap. 1 Introdução aos Conceitos Fundamentais

foram identificadas, iniciou-se uma busca para a origem dessa ordem.


Em 1885, Balmer 11 descobriu as raias da série do visível do átomo de
hidrogênio 12 . Em 1889, Rydberg 13 encontrou a formulação geral 14 .
µ ¶
1 1 1
k= =R −
λ (m − a)2 (n − b)2
onde R é a constante de Rydberg. Para as três primeiras séries do
espectro do átomo de hidrogênio, temos:
µ ¶
1 1
k=R −
12 n2
para n = 2, 3, 4,    , conhecida como série de Lyman15 (m = 1),
µ ¶
1 1
k=R 2
− 2
2 n
para n = 3, 4, 5,    , conhecida como série de Balmer (m = 2), e
µ ¶
1 1
k=R 2
− 2
3 n
para n = 4, 5, 6,    , conhecida como série de Paschen 16 (m = 3).
Para os átomos dos elementos alcalinos como Li, Na, K, as constantes
a e b são não nulas (são conhecidas como defeito quântico).

1.6 O Modelo de Bohr para o Átomo de


Hidrogênio
Em 1911, Niels Bohr 17 foi à Inglaterra para uma visita científica, ini-
cialmente ao Laboratório Cavendish (com J. J. Thomson 18 ) e posterior-
mente à Universidade de Manchester onde trabalhou com Rutherford 19
11
Johann Jakob Balmer (1825–1898), matemático e físico suíço.
12
J. J. Balmer, Verhandlungen der Naturforschenden Gesellschaft Basel, 7, 548–560
(1885); Idem, p. 750; J. J. Balmer, Annalen der Physik und Chemie, Ser. 3, 25 n.
5, 80–87 (1885).
13
Johannes Robert Rydberg (1854–1919), físico sueco.
14
J. R. Rydberg, Den Kongliga Sven ska Vetenskaps Akademiens Handlingar, 23,
11 (1889).
15
Theodore Lyman (1874–1954), físico americano.
16
Friedrich Paschen (1865–1947), físico alemão.
17
Niels Henrik David Bohr (1885–1962), físico dinamarquês.
18
Joseph John Thomson (1856–1940), físico inglês.
19
Ernest Rutherford (1871–1937), físico neozelandês.

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1.6. O Modelo de Bohr para o Átomo de Hidrogênio 23

e seu grupo. Embora sendo um teórico, Bohr acompanhou de perto os


trabalhos desenvolvidos por Geiger 20 e Marsden 21 com espalhamento
de partículas α 22 , bem como o desenvolvimento do modelo do átomo
nuclear proposto por Rutherford 23 : uma carga central (positiva), pe-
sada, é circundada por uma distribuição muito mais extensa e leve de
carga de sinal oposto (negativa). No caso do átomo de hidrogênio temos
um próton e um elétron, respectivamente.
Assim, cerca de dois anos depois, introduzindo idéias revolucionárias
em relação à física clássica, Bohr conseguiu desenvolver um modelo sim-
ples que garantia as características observadas no modelo de Ruther-
ford, dava estabilidade ao átomo e previa as séries espectrais observadas
para o átomo de hidrogênio, determinando portanto a origem das séries
empíricas de Balmer e Rydberg.
O chamado modelo de Bohr 24 pode ser expresso em termos dos
postulados, conhecido como postulados de Bohr :

1. No átomo, o elétron se move em órbitas circulares, cujo movi-


mento é descrito em termos das leis gerais da mecânica e da elet-
rostática, com a limitação de que apenas algumas órbitas são pos-
síveis, sendo essas determinadas pela imposição de que o momento
angular do elétron deve ser um múltiplo inteiro de h/2π.

2. Enquanto descreve o movimento acelerado em sua órbita, o elétron


não irradia energia como prevê a teoria eletromagnética clássica.

3. O elétron pode saltar de uma órbita para outra. Se ele "salta" es-
pontaneamente de uma órbita em que sua energia total é Ei para
uma outra órbita de energia menor Ef , a energia perdida é emi-
tida na forma de radiação, cuja freqüência é dada pela relação
ν = (Ei − Ef )/h.

Entretanto, há implícita no trabalho de Bohr uma série de outras


hipóteses que valem mencionar:
20
Hans Geiger (1882–1945), físico alemão.
21
Ernest Marsden (1889–1970), físico neozelandês.
22
H. Geiger and E. Marsden, Philosophical Magazine, 25, n. 148, 604–623 (1913).
23
E. Rutherford, Philosophical Magazine, 21, 669–688 (1911); E. Rutherford, Na-
ture, 92, n. 2302, 423 (1913); E. Rutherford, Philosophical Magazine, 27, n. 158,
488–498 (1913).
24
N. Bohr, Philosophical Magazine S. 6, 26, n. 151, 1–25 (1913); Ibidem, 476–502;
Ibidem, 857–875.

Mecânica Quântica

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24 Cap. 1 Introdução aos Conceitos Fundamentais

1. Os átomos produzem as linhas espectrais uma de cada vez.


2. O átomo de Rutherford oferece uma base satisfatória para os cál-
culos exatos dos comprimentos de onda das linhas espectrais.
3. A produção dos espectros atômicos é um fenômeno quântico.
4. Um simples elétron é o agente desse processo.
5. Dois estados distintos do átomo estão envolvidos na produção de
uma linha espectral
6. A relação E = hν, correlacionando a energia e a freqüência da
radiação, é valida para a emissão como para a absorção.
Um cálculo simples realizado para o átomo de hidrogênio, dá para
a energia dessas órbitas circulares, em termos do número quântico n,
onde µ é a massa do elétron,
2π 2 µe4
En = − . (1.5)
n2 h2
Essa formula obteve grande sucesso na explicação dos espectros atômi-
cos. Átomos alcalinos como o Li e o Na, podem ter seus primeiros
níveis de energia dados pelo modelo de Bohr em forma aproximada
(introduzindo os tais defeitos quânticos, como mostrado na fórmula de
Rydberg).
Além disso, Bohr está fornecendo a chave para a formulação da
Mecânica Quântica Matricial de Heisenberg 25 , Born 26 e Jordan 27 .

1.7 Experiência de Franck-Hertz


Embora o modelo atômico de Bohr tivesse um sucesso muito grande,
dado a exatidão de suas previsões para os espectros atômicos, não havia
outra indicação de que realmente os estados de energia do átomo eram
quantizados. Em uma experiência muito simples, realizada em 1914 por
James Franck 28 e Gustav Hertz 29 , o modelo de Bohr, ou mais precisa-
mente a quantização dos estados de energia do átomo foi comprovada
25
Werner Karl Heisenberg (1901–1961), físico alemão.
26
Max Born (1882–1970), físico e matemático alemão.
27
Ernest Pascual Jordan (1902–1980), físico alemão.
28
James Franck (1882–1964), físico alemão.
29
Gustav Hertz (1887–1975), físico alemão.

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1.8. Regras de Quantização de Wilson-Sommerfeld 25

por um processo puramente mecânico - o espalhamento inelástico de


elétrons por átomos de mercúrio.

1.8 Regras de Quantização de


Wilson-Sommerfeld
O impressionante acordo entre as previsões do modelo de Bohr e os re-
sultados experimentais determinaram seu imediato sucesso. Entretanto,
do ponto de vista de uma estrutura organizada do conhecimento como se
conhecia com a Mecânica Clássica e o Eletromagnetismo, a situação da
chamada "física quântica" era bem caótica. Planck havia postulado a
quantização da energia de um oscilador (E = nhν), Bohr, com seu mod-
elo, introduziu a quantização do momento angular L = nh/2π, fazendo
com que as energias das órbitas atômicas fossem também quantizadas,
mas com uma relação diferente daquela encontrada por Planck.
Uma ordenação parcial desse conjunto de novas idéias aparente-
mente desconexas foi introduzida em 1916, por Wilson 30 e Sommer-
feld 31 . Então foi enunciada o postulado que ficou conhecido como a
regra de quantização de Wilson-Sommerfeld 32 :
Para qualquer sistema físico com movimento periódico, sendo ~p o
momentum associado à coordenada de posição ~q, tem-se a relação,
I
p dq = nq h . (1.6)

A integral acima já era conhecida da Mecânica Clássica e é chamada


integral de ação ou simplesmente ação. As variáveis q e p são por ex-
emplo x e px , no caso de um oscilador harmônico, usando a regra de
quantização de Wilson-Sommerfeld, temos

E = nhν ,

que é a relação de Planck. Mas as variáveis q e p podem ser ϕ e L,


no caso de uma partícula descrevendo um movimento circular, através
30
William Wilson (1875–1965), físico inglês.
31
Arnold Johannes Wilhelm Sommerfeld (1868–1951), físico alemão.
32
W. Wilson, Philosophical Magazine S. 6, 24, n. 173, 795–802 (1916); Ibidem 31,
156 (1916); A. Sommerfeld, Annalen der Physik, 51, n. 17, 1–94 (1916); Ibidem
n. 18, 125–167; A. Sommerfeld, Physikalische Zeitschrift, 17, 491–507 (1916).

Mecânica Quântica

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26 Cap. 1 Introdução aos Conceitos Fundamentais

da regra de quantização de Wilson-Sommerfeld, analogamente podemos


obter a relação de Bohr,

h
L=n = n~ .

Essas regras de quantização propiciaram por exemplo a obtenção,
pelo próprio Sommerfeld, da chamada constante de estrutura fina para
os espectros atômicos. Espectros atômicos de alta resolução mostravam
que algumas linhas eram na verdade duplas ou triplas, detalhes que
são conhecidos como estrutura fina dos espectros. Sommerfeld admitiu
a possibilidade de órbitas elípticas de diferentes excentricidades. Uti-
lizando expressões relativísticas, uma vez que em órbitas de alta excen-
tricidades os elétrons têm velocidades muito maiores ao passar próximo
ao núcleo, Sommerfeld obteve para a chamada constante de estrutura
fina 33 :
e2
α= .
~c
Embora a regra de quantização de Wilson-Sommerfeld fosse ainda
muito limitada (só é válida para sistemas com movimento periódico),
foi um avanço na compreensão dos sistemas físicos de pequenas dimen-
sões. Uma relação entre os resultados clássicos e os da teoria quântica
foi ainda introduzida por Bohr, por volta de 1923, segundo a qual "As
previsões da teoria quântica devem corresponder aos resultados das teo-
rias clássicas no limite de grandes números quânticos", conhecido como
Princípio de Correspondência.

1.9 Mecânica Quântica Matricial


Em 1925, Heisenberg deu os passos decisivos para a construção de uma
teria quântica completa, com base em dois pontos centrais: o primeiro
é que a mecânica clássica não é válida na escala atômica; o segundo
consiste que o princípio de correspondência de Bohr é uma condição
fundamental para a nova teoria 34 .
33
Recentemente, observações de detalhes de espectros atômicos produzidos por
galáxias distantes, mostraram uma constante de estrutura fina ligeiramente difer-
ente da que conhecemos, indicando que as constantes fundamentais podem variar
no tempo. Esses resultados precisam ainda ser confirmados
34
W. Heisenberg, Zeitschrift für Physik, 33, 879–893 (1925).

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1.9. Mecânica Quântica Matricial 27

O caminho seguido por Heisenberg foi reter a equação de movimento


clássica
d2 q
µ 2 − f (q) = 0 , (1.7)
dt
o que significa reter de certo modo o esquema dinâmico formal da
mecânica clássica, mas sem interpretar q(t) como uma função do tempo
com o significado de posição. O Heisenberg propõe é que q(t) deva ser
visto em geral como um objeto associado à quantidades atômicas ob-
serváveis, como proposto por Bohr.
Assim, no caso de um movimento clássico, periódico, é possível obter
elementos de freqüência bem definida expandindo q(t) em séries de
Fourier 35 , e que satisfaz uma condição de quantização. Dessa forma a
expansão de Fourier aparece como

X
q(n, t) = qk (n) ei kωn t , (1.8)
k=−∞

em que o número quântico n provém da condição de quantização da


ação, ver equação (1.6). Aqui interpretamos que as freqüências obser-
vadas são as freqüências de Bohr associadas a transições entre dois esta-
dos 36 estacionários, Heisenberg substitui, portanto, kωn → ω(n, n − k)
e qk (n) → q(n, n − k), nas quais as freqüências de Bohr será entre dois
estados estacionários n e n − k = m. Assim,

ω(n, m) = (En − Em )
h
e as amplitudes q(n, m) são entendidas como estando associadas tam-
bém a essas transições entre n e n − k = m. Logo

qk (n) ei kωn t → q(n, n − k) ei ω(n,n−k)t .

Para o momentum p(t) = µq̇(t), e usando os mesmos argumentos, en-


contraremos
X∞
p(n, t) = pk (n) ei kωn t ,
k=−∞

35
Jean Baptiste Joseph Fourier (1768–1830), matemático francês.
36
Conjuntos de quantidades físicas são denominados conjuntos completos de ob-
serváveis compatíveis. Um conjunto completo fornece uma descrição máxima do
sistema, e portanto, caracteriza um estado do sistema.

Mecânica Quântica

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28 Cap. 1 Introdução aos Conceitos Fundamentais

com pk (n) = i µkωn qk (n), o que nos leva à substituição

pk (n) → p(n, n − k) = i µω(n, n − k) q(n, n − k) .

Uma classe importante de variáveis dinâmicas a ser considerada é a


que envolve produtos de q(t) e p(t), exemplo q 2 (t), p2 (t), p(t)q(t) etc.
Assim
X∞
2
qn (t) = Qk (n) ei kωn t
k=−∞

pode ser facilmente relacionada com a expansão correspondente de q(t)


usando a regra de composição das freqüências que dá

X
Qk (n) = qk−l (n)ql (n) . (1.9)
l=−∞

Fazendo agora as devidas substituições Qk (n) → Q(n, n − k) e kωn →


ω(n, n − k), e tendo em conta a regra de composição das freqüências
quânticas
ω(n, n − k) = ω(n, n − l) + ω(n − l, n − k) (1.10)
teremos que a tradução quântica natural da equação (1.9) é dada por

X
Q(n, n − k) = q(n, n − l)q(n − l, n − k) . (1.11)
l=−∞

Uma característica dessa regra de multiplicação quântica é que o


produto de variáveis dinâmicas diferentes, q(t) e p(t), deve ser visto em
geral como não comutativo, i.e., [q p](t) 6= [p q](t).
Resta agora determinar as freqüências ω(n, n − k) e as amplitudes
q(n, n−k) a partir da equação de movimento (1.7). Não podemos esque-
cer da reinterpretação da condição de quantização de Bohr ou da
regra de quantização de Wilson-Sommerfeld. Heisenberg reinterpre-
tou essa condição em termos da cinemática quântica, o que na realidade
é uma das passagens mais livres e ao mesmo tempo mais cruciais de
seu trabalho, mas mantendo-a consistente com o princípio de corre-
spondência. Em particular, para que o período clássico das órbitas de
Bohr coincida, para valores grande da ação
I
S = p dq = nh ,

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1.9. Mecânica Quântica Matricial 29

com n À 1, com as freqüências de Bohr (En − En−1 )/h, para duas


órbitas consecutivas basta que ∆S = h. Então, desse ponto de vista
temos I
d d
h= (nh) = pn (t) q̇n (t) dt ,
dn dn
ou usando as expansões de Fourier para pn (t) e qn (t),

X
h d ¡ ¢
=µ k kωn |qk (n)|2 .
2π dn
k=−∞

O derivação da expressão acima com relação a n não tem maior relevân-


cia, mas servem para motivar a reinterpretação quântica da condição de
quantização como sendo
X∞
h £ ¤
= 2µ | q(n, n + k)|2 ω(n + k, n) − | q(n, n − k)|2 ω(n, n − k) .

k=0
(1.12)
A equação (1.12), obtida por Heisenberg em 1925, expressa princi-
pal condição imposta à teoria na formulação da Mecânica Quântica
Matricial 37 e foi generalizada no mesmo ano por Born e Jordan 38 .
A representação de grandezas físicas cinemáticas por matrizes im-
plica a possibilidade de não-comutatividade entre pares de grandezas.
A formula generalizada de Born e Jordan adota um ponto de vista
hamiltoniano, no sentido de que utiliza coordenadas e momenta em
vez de coordenadas e velocidades. Então a coordenada espacial ~q e o
momentum ~p que devem ser representados por matrizes dependentes
do tempo,
© ª © ª d~q © ª
~q ≡ qnl ei ωnl t ,~p ≡ pnl ei ωnl t = µ ≡ i µωnl qnl ei ωnl t ,
dt
(1.13)
estão associadas a um átomo, e ωnl = −ωln são as freqüências associadas
a transições entre estados descritos pelos números quânticos n e l. Essas
matrizes devem ser hermitianas 39 , assim como a matriz qnl , ou seja,
∗ =q .
qnl ln
37
Quem identificou o caráter matricial dos arranjos numéricos propostos por Heisen-
berg foi Max Born.
38
M. Born and P. Jordan, Zeitschrift für Physik, 34, 858–888 (1925).
39
Para qualquer t real, as matrizes devem ser iguais às complexo-conjugadas de suas
transpostas.

Mecânica Quântica

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30 Cap. 1 Introdução aos Conceitos Fundamentais

Assim, a relação de Heisenberg, equação (1.12), pode ser escrita na


forma
h X
∗ ∗
=µ (ωnl qnl qnl − ωln qnl qnl )
2π n
mas como pnl = i µωnl qnl da relação acima teremos
h X
= −i (pnl qln − pln qnl )
2π n

ou seja, a relação de Heisenberg (1.12) pode ser vista como uma re-
gra de comutação entre as matrizes que representam a coordenada
espacial e o momentum de uma partícula,
X h
(qln pnl − pln qnl ) = i = i~
n

ou ainda
(q p − p q)lk = i ~δlk ⇔ [q, p] = i ~ (1.14)
A regra de comutação entre as matrizes de coordenada espacial e de
momentum é a relação fundamental da Mecânica Quântica Matricial
e sua conexão entre a mecânica clássica e a quântica foi evidenciada por
Dirac 40 ao relacionar os comutadores aos parênteses de Poisson 41 .
De modo geral, qualquer grandeza periódica ~g(~p,~q) associada a um
oscilador harmônico pode ser escrita como

gnl (t) = Gnl ei ωnl t

onde ωnl = (En − El )/~, o que implica


d i
gnl (t) = i ωnl Gnl ei ωnl t = (En − El ) Gnl ei ωnl t
dt ~
o que pode ser reescrito, usando o fato de que H(~p,~q) ≡ {En δnl } é
a matriz correspondente à hamiltoniana e é uma matriz diagonal, na
seguinte forma
d~g i
= − (~gH − H~g) ,
dt ~
40
Paul Adrien Maurice Dirac (1902–1984), físico inglês.
P. A. M. Dirac, Proceedings of the Royal Society of London, A109, 642–653
(1926).
41
Siméon-Denis Poisson (1781–1840), matemático e físico francês.

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1.10. Postulados de de Broglie 31

ou seja, a evolução temporal da grandeza ~g é dada pela equação de


movimento de Heisenberg
d~g
i~ = [~g, H] (1.15)
dt
Apesar de terem sido estabelecidos aqui um sistema cujo comporta-
mento é periódico, as equações de movimento de Heisenberg, devido ao
caráter linear da teoria, são válidas para a descrição da evolução tempo-
ral de grandezas associadas a qualquer sistema cuja matriz hamiltoniana
H representa sua interação com a vizinhança, nas quais as energias En
são os elementos diagonais de H, que representam portanto às energias
dos estados estacionários.

1.10 Postulados de de Broglie


A partir de 1923, Louis de Broglie 42 apresentou uma série de trabalhos
sobre a teoria dos quanta que culminaram com a apresentação de sua
tese para obtenção do título de Doutor em 1925, intitulada Recherches
sur la théorie des quanta, onde introduziu idéias ainda mais fantás-
ticas para as propriedades dos sistemas microscópicos 43 . Essas novas
idéias foram fundamentais para o desenvolvimento, pouco depois, de
uma teoria mais formal, chamada Mecânica Quântica Ondulatória
ou simplesmente Mecânica Quântica.
A hipótese básica de de Broglie se relaciona com uma simetria que
poderia estar implícita nas propriedades de dualidade introduzidas por
Planck e principalmente por Einstein para a radiação eletromagnética.
Neste caso, a luz, que apresenta propriedades claras de ondas (pro-
duzindo fenômenos como difração e interferência) tinha também pro-
priedades que só poderiam ser interpretadas se ela fosse tratada como
um conjunto de corpúsculos, os fótons, ver efeito fotoelétrico e efeito
Compton. As relações entre as propriedades ondulatórias da luz (fre-
qüência, comprimento de onda) com as de corpúsculos (energia, mo-
mentum linear) são dadas pelas relações bem conhecidas, introduzidas
por Einstein:
h
E = hν ; p = . (1.16)
λ
42
Louis Victor Pierre Raymond de Broglie (1892–1987), físico francês.
43
L. de Broglie, Comptes Rendus, 177, 507–510 (1923); L. de Broglie, Nature, 112
n. 2815, 540 (1923); L. de Broglie, Comptes Rendus, 177, 548–560 (1923); L. de
Broglie, Thèse de Doctorat, Annales de Physique (10ème. serie), 3, 22–128 (1925).

Mecânica Quântica

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32 Cap. 1 Introdução aos Conceitos Fundamentais

Louis de Broglie postulou que por uma questão de simetria, a matéria,


que tem caráter corpuscular, deveria também apresentar, em certas cir-
cunstâncias, características ondulatórias, i.e., dualidade partícula-
onda. As relações que permitem obter a freqüência e o comprimento
de onda associados a uma partícula são dadas pelas chamadas relações
de de Broglie:
E h
ν= ; λ= . (1.17)
h p

Em seu trabalho original, de Broglie, apresentou evidências de suas


idéias, aplicando os conceitos acima no modelo de Bohr para o átomo
de hidrogênio. Ele notou que a condição de Bohr para a quantização do
momento angular, utilizada agora com as novas idéias, correspondiam à
condição de ondas estacionárias para as órbitas eletrônicas. Utilizando
as relações de de Broglie, podemos calcular o comprimento de onda
associado a um elétron com energia E. Supondo a energia não muito
grande, de modo que não precisamos utilizar as relações relativísticas,
temos:
h h
λ= =√ ,
p 2µE

Isso sugere que propriedades ondulatórias dos elétrons possam ser obser-
vadas em situações semelhantes àquelas em que os efeitos de difração e
interferência foram observados com uso de raios-X, ou seja em cristais.
Em 1927, essas idéias foram confirmadas em experimentos realizados
independentemente por Davisson 44 e Germer 45 nos Estados Unidos e
por G. Thomson 46 na Escócia 47 . Fazendo um feixe de elétrons acel-
erados incidir num mono cristal, observa-se uma distribuição angular
dos elétrons espalhados. Essa distribuição, só pode ser interpretada se
pensarmos num processo de difração de Bragg, como a observada para
raios-X.

44
Clinton Joseph Davisson (1881–1958), físico americano.
45
Lester Halbert Germer (1896–1971), físico americano.
46
George Paget Thomson (1892–1987), físico inglês.
47
C. Davisson and L. H. Germer, Physical Review, 30, n. 6, 705–740 (1927);
C. Davisson and L. H. Germer, Nature, 119 n. 2998, 558–560 (1927); G. P. Thom-
son, Proceedings of the Royal Society of London, A117, 600–609 (1928).

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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1.11. Interferência Em um Sistema de Duas Fendas 33

1.11 Interferência Em um Sistema de Duas


Fendas
Pela seção anterior sabemos que de Broglie postulou, por uma questão
de simetria, que matéria tendo caráter corpuscular, deveria também
apresentar, em certas circunstâncias, características ondulatórias, dual-
idade partícula-onda. Para esta descrição faremos uso de uma experi-
mento conceitual, i.e., um experimento de dupla fenda para um canhão
de elétrons.
O sistema de duas fendas é muito bem conhecido da física ondu-
latória tradicional. Inicialmente vamos considerar um sistema simples,
com ondas em um tanque de água. Um pequeno objeto (fonte de ondas)
é balançado periodicamente para cima e para baixo, produzindo ondas
circulares na superfície do tanque. A uma certa distância da fonte, temos
uma parede com duas fendas verticais (duas portas). A seguir, as on-
das que passam pelas duas fendas (produzindo por difração duas novas
fontes de ondas circulares) são absorvidas num anteparo. Próximo ao
anteparo absorvedor temos um medidor de intensidade de onda, cuja
indicação é proporcional ao quadrado da amplitude das oscilações em
uma dada posição. O detector pode ser deslocado ao longo da posição
vertical da figura, cf. Fig. 1.1, de modo que podemos medir a intensidade
das ondas como função da posição x. Deslocando-se então o detector,
percebemos que a intensidade varia continuamente com a posição, tendo
vários pontos de máximo e de mínimo, conforme visto na curva I12 da
parte c) da Fig. 1.1. Essa é uma figura típica de interferência produzida
pelas fendas 1 e 2. Se fecharmos uma das fendas e medirmos a nova
distribuição de intensidades, vamos observar um padrão diferente, rep-
resentado pelas curvas I1 ou I2 na parte b) da Fig. 1.1, correspondentes
ao fechamento das fendas 2 e 1 respectivamente. O padrão de interfer-
ência I12 claramente não corresponde à soma dos padrões I1 e I2 , sendo
característico de um fenômeno ondulatório. Ondas originadas nas fendas
1 e 2 que chegam em fase numa dada posição do medidor se somam sofre
uma interferência construtiva, produzindo um máximo e nas posições
em que chegam com oposição de fase sofre uma interferência destrutiva,
produzindo um mínimo de intensidade.
Agora faremos uso de um experimento conceitual, i.e., utilizaremos
um feixe de elétrons produzidos em um canhão eletrônico e acelerados
em direção a uma placa metálica com duas fendas, como mostrado na
Fig. 1.2. Após as fendas, temos um detector de elétrons, podendo ser,

Mecânica Quântica

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34 Cap. 1 Introdução aos Conceitos Fundamentais

Figura 1.1: Interferência: ondas de água em um tanque.

por exemplo, um contador Geiger. Esse detector pode estar conectado


a um sistema ligado a um alto-falante, produzindo um som (um clique),
cada vez que um elétron é detectado. Suponhamos que a intensidade do
feixe de elétrons produzido seja pequena o suficiente para que haja, em
média, um intervalo de tempo relativamente grande entre um elétron e
o consecutivo no feixe, maior que ∼ 1 s.
Em um primeiro momento observamos é que numa dada posição do
detector, ouve-se uma sucessão de cliques mais ou menos aleatoriamente
distribuídos no tempo. Entretanto, se contarmos o número de cliques
num intervalo de tempo relativamente longo (dezenas de minutos), o
número médio de cliques por unidade de tempo será constante. Tam-
bém, se colocarmos dois detectores em duas posições diferentes, nunca
se ouvirá dois cliques simultâneos (exceto, cliques que chegam muito
próximos em tempo e que nosso sistema auditivo não consegue separar,
mas que poderiam ser separados com um sistema eletrônico mais sen-
sível). Verificamos ainda que os sinais nos detectores ocorrem em grãos.
Todos os cliques são exatamente idênticos, de mesmo tamanho.
Então, qual o padrão da distribuição de intensidade (número/uni-
dade de tempo) de elétrons como função da posição ao longo do eixo x?
O resultado é a curva P12 mostrado na parte c) da Fig. 1.2. Um padrão
completamente análogo àquele produzido no experimento com ondas
na água, ou seja, o elétron mostrou um comportamento ondulatório.
Ora, se o elétron é uma partícula, ele passa ou pela fenda 1 ou
pela 2. Como vimos, sempre chega um elétron inteiro no contador
Geiger, e não uma fração de elétron. Para verificar por qual fenda
passou o elétron, podemos, por exemplo, colocar uma fonte de luz atrás
das fendas, de modo que ao passar por uma das fendas, o elétron espalha
luz e verificamos então um clarão luminoso próximo à fenda 1 ou à

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1.11. Interferência Em um Sistema de Duas Fendas 35

Figura 1.2: Interferência: com feixe de elétrons.

fenda 2, dependendo da fenda por qual passou o elétron. Poderíamos


agora contar os cliques no detector como função de x em duas tabelas:
uma quando o clarão indicar que o elétron passou pela fenda 1 e a
outra, quando vier da fenda 2. Essa experiência permite ainda verificar
que o clarão vem sempre apenas de uma das fendas, nunca das duas
simultaneamente. Os resultados dessas medidas correspondem às curvas
P10 e P20 da Fig. 1.3, correspondentes a elétrons que passaram pela fenda
1 e 2 respectivamente. A curva P12 0 = P 0 + P 0 corresponde à condição
1 2
do elétron passando pela fenda 1 ou pela fenda 2.

Figura 1.3: Identificação da fenda pela qual passou o elétron.

Concluímos então que quando observamos os elétrons, o resultado


(a distribuição de posições ao longo de x) é diferente daquele obtido
quando não observamos os elétrons nas proximidades das fendas. A
observação perturba o movimento dos elétrons. De um modo diferente,
esses resultados indicam que quando não observamos, os elétrons se
propagam como uma onda, desde o canhão de elétrons até o detector,
produzindo o padrão típico de interferência. Quando observamos, vemos
um comportamento de partícula, com o elétron passando por uma dada
fenda, mas nesse caso, o fenômeno de interferência não é observado. Os

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36 Cap. 1 Introdução aos Conceitos Fundamentais

elétrons são ainda observados no detector Geiger como partículas. Esta


característica, vista também com os fótons, indica uma característica
dual onda-partícula para os elétrons bem como para todas as outras
partículas. Em sistemas macroscópicos, as propriedades ondulatórias
não são observadas pois os comprimentos de onda correspondentes são
muito menores que o tamanho de uma partícula como o próton e os
fenômenos de difração e interferência não podem ser observados.
A interferência ocorre, matematicamente, quando tomamos P =
|φ|2 , e φ(x) chamamos de amplitude de probabilidade do elétron chegar
em x. Porém, φ(x) é a soma das duas contribuições: φ1 , a amplitude
quando o elétron passa pela fenda 1, mais φ2 , a amplitude quando o
elétron passa pela fenda 2. Em outras palavras, P = |φ|2 e φ = φ1 + φ2 ,
com φ1 e φ2 sendo números complexos. Temos ainda P1 = |φ1 |2 e P2 =
|φ2 |2 , mas
P = |φ1 + φ2 |2 6= P1 + P2 . (1.18)

1.12 O princípio da Superposição


Sabemos portanto que o fenômeno de interferência ocorre tanto para
os fótons (luz) quanto para os elétrons (matéria). Então, matematica-
mente podemos descrever o nosso sistema como: Seja ~q o conjunto das
coordenadas de um sistema quântico, e d~q o produto das diferenciais
dessas coordenadas. Por exemplo, se ~q = {x, y, z}, temos d~q = dxdydz.
O estado de um sistema é descrito por uma função complexa ψ(~q)
das coordenadas. O quadrado do módulo dessa função determina a dis-
tribuição de probabilidades dos valores das coordenadas:

|ψ(x, y, z)|2 dxdydz , (1.19)

é a probabilidade de que uma medida realizada sobre o sistema encontre


os valores das coordenadas entre x e x + dx, y e y + dy, z e z + dz. A
função ψ é denominada função de onda do sistema.
O conhecimento da função de onda permite, em princípio, calcular a
probabilidade dos vários resultados de qualquer medida (não necessaria-
mente das coordenadas). Essas probabilidades são expressões bilineares
em ψ e ψ ∗ (∗ representando o complexo conjugado), como por exemplo:
Z

ψ(~q)∗ ψ(~q) d~q .
∂~q

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1.12. O princípio da Superposição 37

O estado de um sistema varia, em geral, com o tempo. Em conse-


qüência, a função de onda é uma função também do tempo, ψ(~q, t).
Se a função de onda é conhecida em um instante inicial, segue, do con-
ceito da descrição completa, que ela está, em princípio, determinada em
cada instante sucessivo. A dependência precisa da função de onda com
o tempo é determinada por uma equação conhecida como equação de
Schrödinger 48 .
A probabilidade de que as coordenadas de um sistema tenham qual-
quer valor, é 1. Devemos, então, ter
Z
|ψ(~q)|2 d~q ,

pois a integral acima é exatamente esta probabilidade.


Seja ψ(~q) a função de onda de um sistema. Considere a função

ψ 0 (~q) = ψ(~q) ei α

onde α é um número real. Diz-se , por isso, que a função de onda de um


sistema está definida a menos de uma fase (α), ou seja, que, se ψ(~q) é
função de onda de um sistema, ψ 0 (~q) também o é.
Seja um sistema físico que pode existir tanto num estado de função
de onda ψ1 (~q) como no estado de função de onda ψ2 (~q). A medida
de uma quantidade física F será, por hipótese, o resultado f1 , com
probabilidade 1, se o sistema estiver em ψ1 (~q), e o resultado f2 , também
com probabilidade 1, se o sistema estiver em ψ2 (~q). Postula-se então
que, ψ(~q) = ψ1 (~q) + ψ2 (~q) é também um estado do sistema. Nesse
estado, uma medida de F dará ou o resultado f1 ou o resultado f2 . Esse
postulado é denominado princípio da superposição. Segue dele que
a equação de Schrödinger deve ser linear em ψ(~q).
Voltando então ao nosso experimento conceitual da seção anterior,
utilizando o canhão de elétrons, a intensidade produzida na tela quando
apenas uma fenda está aberta é |ψ1 |2 ou |ψ2 |2 . Quando as duas fendas
estão abertas, a intensidade é determinada por |ψ1 + ψ2 |2 . Esse resul-
tado difere da soma das duas intensidades |ψ1 |2 + |ψ2 |2 , pelo termo de
interferência ψ1 ψ2∗ + ψ2 ψ1∗ .

48
Erwin Rudolf Josef Alexander Schrödinger (1887–1961), físico austríaco.

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38 Cap. 1 Introdução aos Conceitos Fundamentais

1.13 O Princípio da Incerteza


Como veremos a seguir, a propagação ondulatória das partículas em
conjunto com a relação de de Broglie p = ~k nos leva a relação de
incerteza
~∆k∆x = ∆p∆x ≥ ~ , (1.20)
a qual significa que não podemos medir simultaneamente a posição e o
momentum de uma partícula com precisões arbitrárias. Isto não impede
de podermos medir, por exemplo, a posição x com uma precisão arbi-
trária, desde que não nos preocupemos em medir o momentum p. Esse
fato contraria radicalmente a Mecânica Newtoniana, pois esta assume
que podemos medir simultaneamente as duas grandezas com precisão
absoluta.
A "experiência de dupla fenda (de Young 49 )" para elétrons, em par-
ticular a formação de uma figura de interferência mesmo quando o feixe
de elétrons é tão rarefeito que não há dúvida de que os elétrons chegam
um a um na tela, mostra que a física dos elétrons é incompatível com
o conceito de trajetória. Não existe, na Mecânica Quântica, o conceito
de trajetória. Esse é o conteúdo do princípio da incerteza, um dos
fundamentos da Mecânica Quântica, descoberto por Werner Heisenberg
em 1927 50 .
É importante lembrar que os erros ∆x e ∆p são intrínsecos da na-
tureza ondulatória da matéria e não estão correlacionados com os erros
experimentais que ocorrem nos processos de medida.

1.14 Pacotes de Onda e Relação de Incerteza


Usaremos a análise de Fourier como ferramenta matemática para descr-
ever uma partícula localizada no espaço formada pela superposição de
ondas planas, pacote de onda, de diferentes números de onda k, cuja
amplitude seja não nula apenas numa pequena região do espaço, como
no caso de um pulso em uma corda.
O pacote de onda, em três dimensões, pode ser escrito na forma:
Z
φ(~k)ei(k ~r−ωt) d3 k ,
1 ~
ψ(~r, t) = 3/2
(1.21)
(2π)
49
Thomas Young (1773–1829), cientista inglês.
50
W. Heisenberg, Zeitschrift für Physik, 43, 172–198 (1927).

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1.14. Pacotes de Onda e Relação de Incerteza 39

onde d3 k representa o volume infinitesimal no espaço ~k: dkx dky dkz . Por
simplicidade faremos o estudo do pacote de onda em uma dimensão, no
caso em que as ondas se propagam paralelas ao eixo x. Assim, a função
de onda depende somente de x e t:
Z +∞
1
ψ(x, t) = φ(k)ei(kx−ωt) dk . (1.22)
(2π)1/2 −∞
Se escolhermos o instante inicial na origem t = 0, podemos escrever a
função de onda como:
Z +∞
1
ψ(x, 0) = φ(k)ei kx dk , (1.23)
(2π)1/2 −∞
e φ(k) é a transformada inversa da integral de Fourier para ψ(x, 0):
Z +∞
1
φ(k) = ψ(x, 0)e− i kx dx . (1.24)
(2π)1/2 −∞
Nos assumiremos que φ(k) é uma função real positiva e tenha uma
distribuição simétrica de k ao redor do valor médio k̄. Fazendo uma
mudança de variável u = k − k̄, escreveremos (1.23) como:
Z +∞
1 i k̄x
ψ(x, 0) = e φ(u + k̄)ei ux du . (1.25)
(2π)1/2 −∞

Assim, a partícula terá uma probabilidade maior de ser encontrada na


posição em que ψ tem um pico pronunciado. Logo, fica fácil notar pela
análise de Fourier a relação:
∆x∆k ∼
= 1. (1.26)
Para provar a relação (1.26), denotaremos um intervalo ∆x no qual |ψ|
é diferente de zero. Desde que φ seja diferente de zero somente no inter-
valo centrado em u, onde k = k̄, a fase de exp (i ux) em (1.25) varia de
−x∆k/2 até +x∆k/2, ou seja varia uma grandeza x∆k para um valor
fixo de x. Se x∆k for menor que ∼ = 1, nenhum cancelamento apreciável
no integrando irá ocorrer. Por outro lado, quando x∆k À 1, violen-
tas oscilações do fator exp (i ux) ocorrerá, tendo como conseqüência a
interferência destrutiva. Então, teremos a relação ∆x∆k ' 1.
Como a incerteza no momentum do elétron ∆p = ~∆k, para uma
elétron descrito por ψ o princípio da incerteza de Heisenberg será
∆x∆p ' ~ .

Mecânica Quântica

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40 Cap. 1 Introdução aos Conceitos Fundamentais

Essa relação de incerteza, tem um análogo para o tempo e energia. A


energia cinética da partícula é E = p2 /2µ, e a incerteza
p
∆E = ∆p = v∆p ,
µ
mas
∆x
∆t = .
v
Então,
∆E∆t ' ~ .

1.15 Princípio da Complementaridade


O principal resultado da discussão sobre dualidades partícula-onda pode
ser sintetizado da seguinte forma: em qualquer situação experimental,
na qual a entidade física envolvida (matéria ou radiação) exibe sua
propriedade de onda, torna-se impossível que ela apresente qualquer
caráter corpuscular. A entidade comporta-se como partícula se repre-
sentada por um pacote de onda bastante compacto. Mas quando isto
acontece, ela perde sua habilidade de manifestar-se como onda. Assim, o
caráter de partícula ou de onda de uma entidade física é complementar
e não pode ser exibido ao mesmo tempo. Esse é o chamado princípio
da complementaridade de Bohr.

1.16 Equação de Onda


Através da representação da onda plana (1.21):
Z
φ(~k) ei(k ~r−ωt) d3 k
1 ~
ψ(~r, t) = 3/2
(2π)
dado como forma mais geral de uma função de onda de uma partícula, é
conveniente obter uma equação de onda para descrever seu movimento.
A proposta é encontrar uma equação diferencial parcial linear que ad-
mite (1.21) como solução geral.
Em três dimensões um pacote de onda inicial ψ(~r, t) pode ser rep-
resentado pela integral de Fourier
Z
φ(~k) ei k ~r d3 k
1 ~
ψ(~r, 0) = 3/2
(1.27)
(2π)

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1.16. Equação de Onda 41

e sua inversa
Z
ψ(~r, 0) e− i k ~r d3 r .
1 ~
φ(~k) = (1.28)
(2π)3/2
Se a função de onda descreve o movimento de uma partícula livre,
então pelo princípio da superposição cada componente da onda plana
contida em (1.27) propaga independentemente de todas as outras de
acordo com a descrição arbitrária, ' ei(k ~r−ωt) . Assim a função de onda
~

em um tempo t será
Z
φ(~k) ei(k ~r−ωt) d3 k .
1 ~
ψ(~r, t) = 3/2
(1.29)
(2π)

A equação (1.29) é incompleta até determinarmos a dependência de ω


em ~k.
Em três dimensões vale as relações:

∆x∆kx ≥ 1, ∆y∆ky ≥ 1, ∆z∆kz ≥ 1 .

Essas relações são generalizações de casos em uma dimensão. Mas, sabe-


mos que ∆~p = ~∆~k; então as relações de incerteza em três dimensões
serão
∆x∆px ≥ ~, ∆y∆py ≥ ~, ∆z∆pz ≥ ~ . (1.30)
Vamos considerar a inversa de Fourier φ(~k) com valor apreciavelmente
diferente de zero somente na região limitada ∆~k ao redor do vetor de
onda médio ~k0 . No espaço de coordenadas, o pacote de onda ψ(~r, t)
moverá aproximadamente como uma partícula livre clássica com mo-
mentum ~p = ~~k. Para ver este fato, expandimos ω(~k) em relação ao
valor médio ~k0 :
³ ´ ³ ´
ω(~k) = ω(~k0 ) + ~k − k~0  ∇~~ω
k
+
~k=~k0

e usando a notação para valor médio ω̄ = ω(~k0 ),


³ ´ ³ ´
ω(~k) = ω̄ + ~k − k~0  ∇~ ~ ω̄ +
k0
 (1.31)

Se substituirmos os dois primeiros termos de (1.31) em (1.29), teremos


³ ´ ³ ´
− i ω̄t + ~k0 ∇
~ ~ ω̄t
~ ~ ω̄t, 0 .
ψ(~r, t) = e k 0 ψ ~r − ∇ k0
(1.32)

Mecânica Quântica

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42 Cap. 1 Introdução aos Conceitos Fundamentais

Ignorando o fator de fase em frente a equação (1.32), vemos que esta


descreve um pacote de onda em movimento de translação uniforme, com
velocidade de grupo
~~ω.
~vg = ∇ (1.33)
k
Nossa interpretação, baseado na correspondência entre as Mecânicas
Clássica e Quântica, permite identificar a velocidade de grupo da função
ψ com a velocidade média da partícula
~p ~~k
~v = = ,
µ µ
onde µ é a massa da partícula, assumimos um movimento não relativís-
tico. Assim,
~~k = µ∇
~~ω.
k
(1.34)
Integrando (1.34), obteremos
~ 2
ω(~k) = k + const. (1.35)

ou
~2 k 2 p2
~ω(~k) = +V = +V (1.36)
2µ 2µ
onde V é constante, e podemos identificar como uma energia potencial
constante. Ainda podemos identificar E = ~ω como a energia total da
partícula.
A equação diferencial de onda para a onda plana exp i(~k ~r − ωt),
com
~2 2
~ω(k) = (k + ky2 + kz2 ) + V
2m x
sendo V constante, é obviamente
∂ ~2
i~ ψ(~r, t) = − ∇2 ψ(~r, t) + V ψ(~r, t) (1.37)
∂t 2µ
que é conhecida como a equação de Schrödinger dependente do
tempo. Assim, podemos ver que a partir dos trabalhos de de Broglie,
em 1926, Schrödinger desenvolveu em uma série de artigos seminais a
formulação da Mecânica Quântica Ondulatória 51 .
51
E. Schrödinger, Annalen der Physik, Ser. 4, 79, 361–376 (1926);
E. Schrödinger, Annalen der Physik, Ser. 4, 79, 489–527 (1926);
E. Schrödinger, Annalen der Physik, Ser. 4, 80, 437–490 (1926);
E. Schrödinger, Annalen der Physik, Ser. 4, 81, 109–139 (1926).

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1.16. Equação de Onda 43

Aqui daremos atenção para uma forma alternativa de função de


onda, obtida pela transformação

ψ(~r, t) = ei S(~r,t)/~ .

Se essa expressão for substituída em (1.37), teremos a equação


( )
~ r, t)]2
∂S(~r, t) [∇S(~ i~ 2
+ − ∇ S(~r, t) + V ei S(~r,t)/~ = 0 . (1.38)
∂t 2µ 2µ

A função S(~r, t) é geralmente complexa, mas em casos especiais poderá


ser real, como quando ψ(~r, t) representa uma onda plana, para tal caso
teremos
S(~r, t) ~
= k ~r − ωt .
~
A equação (1.38) indica que a função de onda ψ(~r, t) não anula, e tere-
mos a equação diferencial não-linear
~ r, t)]2
∂S(~r, t) [∇S(~ i~ 2
+ − ∇ S(~r, t) + V = 0 (1.39)
∂t 2µ 2µ
que, exceto pelo termo que contém i e ~, corresponde à equação clás-
sica de Hamilton-Jacobi 52 , em que S(~r, t) é a função principal
de Hamilton, para o problema de uma partícula de massa µ sujeita
ao potencial V 53 . Essa equação pode portanto ser usada para identi-
ficar um limite clássico do tratamento quântico do problema de uma
partícula em um potencial externo. De fato, sempre que os efeitos desse
termo puderem ser ignorados quantitativamente na determinação de
S(~r, t) pela equação (1.39), essa função será tal que estarão satisfeitas
as relações clássicas
~ r, t) = ~pc (~r, t) = µ~vc (~r, t) ,
∇S(~

em que ~pc e ~vc são o momentum e a velocidade clássica, respectiva-


mente. Se a energia total tiver um valor bem definido vale
∂S(~r, t)
= −E .
∂t
52
William Rowan Hamilton (1805–1865), matemático e físico irlandês.
Carl Gustav Jacob Jacobi (1804–1851), matemático alemão.
53
Para uma revisão dos elementos da mecânica clássica Hamiltoniana, ver Gold-
stein, Classical mechanics, (1980), ou o livro de Landau e Lifshitz, Mechanics,
(1993).

Mecânica Quântica

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44 Cap. 1 Introdução aos Conceitos Fundamentais

Nesse limite, as linhas de velocidade associadas à densidade de corrente


de probabilidade se reduzem às trajetórias clássicas.
É importante notar que a descrição do sistema permanece como
sendo feito em termos de uma distribuição contínua de probabilidades,
de modo que a situação clássica a que esse limite se refere deve ser
entendida como sendo realizada em termos de propriedades médias em
uma coleção de sistemas idênticos com uma distribuição de condições
iniciais dada. As condições em que esse limite pode ser usado como
aproximação para o problema quântico podem ser caracterizadas da
seguinte forma: supondo que a energia tenha uma dispersão pequena
em torno de E, a equação (1.39) pode ser aproximada por

~ r, t)]2 ' 2µ(E − V ) + i~ 2


[∇S(~ ∇ S(~r, t) .

Uma aproximação clássica, consistindo em ignorar o último termo, será
válida quando
µ ¶
2 2µ 2π 2
∇ S(~r, t) ¿ 2 (E − V ) ≡ ,
~ λ(~r)
em que λ(~r) é o chamado comprimento de onda de de Broglie. Essa
condição mostra, em termos qualitativos, que efeitos de curvatura na
dependência espacial da amplitude de S(~r, t) devem ser pequenos na
escala de comprimento de onda de de Broglie.

1.17 Comentários
Recomenda-se ao leitor, como pré-requisito e requisito paralelo, os livros
do Prof. Leite Lopes (1992) 54 e dos Profs. Caruso e Oguri (2006) 55 como
introdução e fundamentos à estrutura da matéria. Nesses livros o leitor
encontrará deduções detalhadas, claras e históricas da mecânica quân-
tica antiga de Planck, Einstein, Bohr, Wilson e Sommerfeld, e descrições
dos experimentos fundamentais. Ainda nesses livros poderão estudar a
mecânica matricial de Heisenberg, Born e Jordan, bem como a dedução
de Broglie e da equação de Schrödinger. Com relação a mecânica matri-
cial, também poderá ser feita a leitura do livro do Prof. Piza (2002) 56 ,
esse livro está numa forma moderna e excelente.
54
J. Leite Lopes, Estrutura quântica da matéria, (1992).
55
F. Caruso e V. Oguri, Física moderna, (2006).
56
A. F. R. de Toledo Piza, Mecânica quântica, (2002).

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1.17. Comentários 45

Solicita-se ao leitor que estude, antes de prosseguir na leitura destas


notas, o capítulo 1 do Volume III do The Feynman Lectures on Physics
(1963) 57 , que contém uma excelente descrição da experiência da difração
por duas fendas, conhecida como experiência de Young, realizada com
elétrons, em lugar da luz (que Young usou). Quando eu conseguir re-
alizar essa descrição tão bem quanto Feynman, a minha tentativa me
deixará muito honrado.

57
R. Feynman, The Feynman Lectures on Physics, (1963).

Mecânica Quântica

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Capítulo 2

A Equação de Schrödinger e
Álgebra dos Operadores

Nesse capítulo iremos estudar as propriedades da equação de onda de


Schrödinger como função do espaço e do tempo. Também faremos um
estudo dos operadores hermitianos e suas propriedades algébricas. O
objetivo é extrair informações da função de onda e das propriedades
dos operadores

2.1 A Equação de Onda e a Interpretação de ψ


No caso particular da equação de onda (1.37), temos a energia potencial
V constante. Um caso particular é quando temos o movimento de uma
partícula livre, i.e., V = 0. A generalização dessa equação e quando
temos o caso de uma partícula de massa µ em um campo de força
representado pela energia potencial V (x, y, z, t), para qual é dependente
da posição ~r e possivelmente também dependente do tempo t. Assim
reescrevemos essa equação como
∂ ~2
i~ ψ(~r, t) = − ∇2 ψ(~r, t) + V (x, y, z, t) ψ(~r, t) (2.1)
∂t 2µ
usando a seguinte relação
ψ(~r, t) = ei S(~r,t)/~ ,
encontraremos a equação
~ r, t)]2
∂S(~r, t) [∇S(~ i~ 2
+ − ∇ S(~r, t) + V (x, y, z, t) = 0 . (2.2)
∂t 2µ 2µ

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48 Cap. 2 A Equação de Schrödinger e Álgebra dos Operadores

Que é semelhante a equação clássica de Hamilton-Jacobi na presença


de forças, novamente com a presença de um termos quântico propor-
cional a ~.
Usaremos (2.1) como a equação fundamental da mecânica quântica
não-relativística para partículas sem spin e chamaremos de equação de
onda ou equação de Schrödinger dependente do tempo.
Note que para uma partícula de massa m na presença de um campo
de força ~F = −∇V ~ (~r), onde a energia potencial, nesse caso, não de-
pende do tempo. A energia total é a soma da energia cinético à energia
potencial, i.e.,
p2
E= + V (~r) .

Note que (2.1) e a equação diferencial de onda para a onda plana
exp i(~k ~r − ωt), que satisfaz a relação

~2 2
~ω(k) = (k + ky2 + kz2 ) + V (x, y, z)
2µ x
que é a mesma energia total, em termos de relações de de Broglie.
Assim, comparando a energia total e a equação (2.1) podemos definir
os operadores diferenciais, para a energia total E e para o momentum
~p, da seguinte forma:
∂ ~ .
E → i~ , ~p → − i ~∇ (2.3)
∂t
Muitas vezes é conveniente escrever a equação de Schrödinger em
uma forma mais compacta. Isso pode ser feito utilizando o operador H

~2 2
H=− ∇ + V (~r) , (2.4)

chamado operador hamiltoniano, para reescrever a equação de Schrö-
dinger da seguinte forma:

Hψ(~r, t) = i ~ ψ(~r, t) . (2.5)
∂t
A função de onda ψ é uma função complexa. Isso impede que ela
seja observada ou medida diretamente, como acontece com funções de
onda clássicas. O fato de ψ ser uma função complexa é uma condição
inibidora para atribuir-lhe qualquer interpretação física real. A fim de

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2.2. Conservação da Probabilidade 49

que possamos extrair dessa função de onda algum significado físico,


devemos procurar estabelecer uma conexão da função com quantidades
dinâmicas associadas à partícula.
A forma de extrair qualquer informação de um estado quântico rep-
resentado pela função ψ(~r, t) foi apresentado por Max Born em 1926, e
constitui um dos postulados fundamentais da mecânica quântica 1 . Por
esse postulado temos que, a probabilidade dP (~r, t) de uma partícula
associada a função de onda ψ(~r, t) ser encontrada, em um determinado
instante t, no interior de um elemento de volume d3 r = dxdydz em
torno do ponto localizado por ~r, é igual a

ψ ∗ (~r, t)ψ(~r, t)d3 r . (2.6)

Portanto, a probabilidade será

dP (~r, t) = |ψ(~r, t)|2 d3 r = ψ ∗ (~r, t)ψ(~r, t)d3 r (2.7)

onde, definimos uma quantidade real

ρ(~r, t) = |ψ(~r, t)|2 = ψ ∗ (~r, t)ψ(~r, t) (2.8)

que representa uma densidade de probabilidade.


Schrödinger interpretou que e|ψ(~r, t)|2 , onde e é a carga do elétron,
como a densidade de carga. Apesar dessa interpretação poder ser apli-
cada em alguns casos especiais, a interpretação aceita para a função de
onda ψ deve-se a Max Born.

2.2 Conservação da Probabilidade


Considerando a taxa de variação temporal da densidade de probabili-
dade probabilidade de encontrar a partícula associada a função de onda
ψ, teremos:
∂|ψ|2 ∂ψ ∗ ∂ψ
= ψ + ψ∗
∂t ∂t ∂t
usando as equações (2.4) e (2.5) podemos escrever
· µ 2 ¶ µ 2 ¶ ¸
∂|ψ|2 i ~ ~
= ψ − ∇2 + V ψ ∗ − ψ ∗ − ∇2 + V ψ
∂t ~ 2µ 2µ
1
M. Born, Zeitschrift für Physik, 37, 863–867 (1926); M. Born, Zeitschrift für
Physik, 38, 803–827 (1926).

Mecânica Quântica

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50 Cap. 2 A Equação de Schrödinger e Álgebra dos Operadores

e levando em conta a relação


³ ´
~  ψ ∗ ∇ψ
ψ ∗ ∇2 ψ − ψ∇2 ψ ∗ = ∇ ~ − ψ ∇ψ
~ ∗

obtém-se
∂|ψ|2 i~ ~ ³ ~ ∗ ´
=− ∇  ψ ∇ψ − ψ ∗ ∇ψ
~ . (2.9)
∂t 2µ
Assim, definimos uma nova quantidade física
³ ´
~J(~r, t) = i ~ ψ ∇ψ
~ ∗ − ψ ∗ ∇ψ
~ , (2.10)

em que ~J(~r, t) é chamada de densidade de corrente de probabilidade


ou fluxo de probabilidade. Com isso, a equação (2.9) pode-se escrever
na forma:
∂ρ ~ ~
+ ∇J = 0. (2.11)
∂t
Essa equação é conhecida como equação de continuidade devido a
sua semelhança com a equação diferencial da teoria eletromagnética que
recebe esse nome.
Intuitivamente esperamos que o fluxo de probabilidade esteja rela-
cionado com o momentum. Para isso, tomemos o caso em que ~J é inte-
grado em todo o espaço. Da equação (2.10), temos ~J(~r, t) = µ~ =(ψ ∗ ∇ψ).
~
Então, Z
~J(~r, t) d3 r = h~pit , (2.12)
µ
onde h~pit é o valor médio do momentum em um tempo t.
Uma outra forma de interpretarmos a função de onda é escrevermos
· ¸
p i S(~r, t)
ψ(~r, t) = ρ(~r, t) exp ,
~

com S real e ρ > 0. Note que,

~ = √ ~ √ i ~
ψ ∗ ∇ψ ρ ∇ ( ρ) + ρ∇S
~
e então podemos escrever o fluxo de probabilidade como:

~
~J = ρ∇S . (2.13)
µ

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2.3. Normalização da Função de Onda 51

Nós agora podemos ver que há mais informação para a função de onda
além do fato que |ψ|2 é a densidade de probabilidade; o gradiente da fase
S contém uma peça vital de informação. Da equação (2.13) podemos ver
que a variação espacial da fase S da função de onda caracteriza o fluxo
de probabilidade, quanto mais intensa a fase, mais intenso o fluxo. A
direção do fluxo ~J em um ponto ~r é visto como a normal da superfície.
Fica evidente que
~ = ~p ,
∇S
~
mas geralmente podemos interpretar ∇S/µ como um tipo de veloci-
dade,
~
∇S
~v = ,
µ
e a equação de continuidade poderá ser escrita na forma

∂ρ ~
+ ∇  (ρ ~v) , (2.14)
∂t
como na dinâmica dos fluidos.
A equação de movimento, utilizando e equação de Schrödinger
dependente do tempo, é
" #
~ r, t)]2
∂S(~r, t) [∇S(~ ~ 2 ∇2 ρ
~2 (∇ρ)
+ +V + − =0 (2.15)
∂t 2µ 4µ 2ρ ρ

ou √
~ r, t)]2
∂S(~r, t) [∇S(~ ~2 ∇2 ρ
+ +V − √ =0 (2.16)
∂t 2µ 2µ ρ
onde novamente temos a equação de Hamilton-Jacobi para a dinâmica
da partícula, a o último termo que contém o potencial quântico adi-
cionado a energia potencial convencional V .

2.3 Normalização da Função de Onda


De acordo com a interpretação de Born, para todo o espaço deve valer
a chamada condição de normalização para a função de onda ψ,
Z Z
3
ρ(~r, t)d r = ψ ∗ (~r, t)ψ(~r, t)d3 r = 1 , (2.17)
V V

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52 Cap. 2 A Equação de Schrödinger e Álgebra dos Operadores

que simplesmente expressa o fato de que a partícula deve ser encontrada


em qualquer ponto do espaço.
Entretanto, para uma interpretação consistente, além da conser-
vação local de probabilidade, é necessário que haja também uma con-
servação global. De acordo com a equação de continuidade da probabil-
idade, equação (2.11), pode-se escrever
Z Z
∂ρ(~r, t) 3 ~  ~J(~r, t) d3 r
d r=− ∇
V ∂t V

e, aplicando o teorema da divergência no segundo membro da equação


acima, obtém-se
Z I

ρ(~r, t) d r = − ~J(~r, t)  n̂ d2 r
3
∂t V S

onde S é a superfície que envolve todo o volume V . Observando-se a


definição de densidade de corrente de probabilidade, ~J(~r, t), dado por
(2.10), e supondo-seHque ψ(~r, t) seja uma função de onda bem compor-
tada2 , temos que − S ~J(~r, t)  n̂ d2 r = 0 e, portanto
Z

ρ(~r, t) d3 r = 0 , (2.18)
∂t V

que expressa a conservação global, ou seja, a normalização da função


não deve depender do tempo.
Para um feixe homogêneo constituído de N elétrons que possuem
basicamente a mesma energia, e portanto, estão associados à mesma
função de onda ψ, os elétrons ocupam regiões distintas do espaço, e
a probabilidade da presença de qualquer um deles é proporcional a
|ψ|2 d3 r. Nessas circunstâncias, ψ pode ser normalizada como
Z
ψ ∗ (~r, t)ψ(~r, t)d3 r = N , (2.19)
V

onde podemos interpretar |ψ|2 como a densidade de partículas, e e|ψ|2


como a densidade de carga em uma dada região, tal como Schrödinger
havia interpretado.
2
Funções de onda ψ(~r, t) que obedecem à condição ψ(~r, t) = 0, para x → ±∞, y →
±∞, z → ±∞, e que são contínuas e deriváveis em todo seu espaço de definição,
são chamadas de funções de onda bem comportadas.

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2.4. Equação de Onda – Sistemas Estacionários 53

2.4 Equação de Onda – Sistemas Estacionários


Para campos conservativos, a equação de Schrödinger dependente do
tempo

Hψ(~r, t) = i ~ ψ(~r, t) (2.20)
∂t
pode ser resolvida através da separação de variáveis. No caso em questão,
esse procedimento poderá ser empregado desde que a energia de poten-
cial do sistema quântico considerado não apresente explícita dependên-
cia do tempo, i.e., V = V (~r). Com isso, o operador H torna-se inde-
pendente do tempo e a função de onda ψ(~r, t) pode ter a solução na
forma,
ψ(~r, t) = ϕ(~r)Φ(t) . (2.21)
Substituindo na equação (2.1),

∂ ~2
i ~ ϕ(~r) Φ(t) = − Φ(t) ∇2 ϕ(~r) + V (~r) ϕ(~r)Φ(t) (2.22)
∂t 2µ

e dividindo por ϕ(~r)Φ(t), obtém-se

1 ∂ ~2 1
i~ Φ(t) = − ∇2 ϕ(~r) + V (~r) . (2.23)
Φ(t) ∂t 2µ ϕ(~r)

Como o lado esquerdo da equação dependo somente do tempo e o


outro lado dependo apenas da posição, a equação será satisfeita se os
dois lados forem iguais a uma mesma constante E com dimensão de
energia. Assim, teremos duas equações diferenciais


i~ Φ(t) = E Φ(t) ,
· ∂t
¸
~2 2
− ∇ + V (~r) ϕ(~r) = E ϕ(~r) .

A primeira equação diferencial no domínio do tempo não depende


da dinâmica de interação e pode ser integrada imediatamente,
i
Φ(t) = e− ~ Et . (2.24)

Devemos observar que se E na equação acima for uma quantidade real,


Φ(t) é uma função oscilante no tempo, com freqüência angular ω = E~ .

Mecânica Quântica

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54 Cap. 2 A Equação de Schrödinger e Álgebra dos Operadores

A segunda equação diferencial á a equação de Schrödinger in-


dependente do tempo e do ponto de vista matemático, constitui um
problema de autovalor, tal que, dependendo das condições impostas à
função de onda ϕ(~r), o autovalor E, i.e., a energia da partícula, poderá
assumir valores discretos ou contínuos. As soluções, ϕE (~r), associadas
a cada valor E, são conhecidas como autofunções de energia.
Assim a solução geral para (2.21) será
i
ψ(~r, t) = ϕ(~r) e− ~ Et . (2.25)

que configura-se como um estado estacionário.


A cada possível valor de energia E pode corresponder um ou mais
estados da partícula. Se para um dado valor de energia tivermos asso-
ciados dois ou mais estados independentes, esse autovalor é conhecido
como degenerado. Por serem representados por autofunções ϕ(~r), são
chamados de auto-estado de energia e o conjunto de autovalores são
conhecidos como espectro de energia.
Em geral, a equação de Schrödinger independente do tempo, é es-
crita como
H ψ(~r, t) = E ψ(~r, t) (2.26)
onde H é o operador hamiltoniano. Desse modo, temos que o espectro
de energia de um sistema é constituído dos autovalores do operador H.
i
Substituindo ψ(~r, t) = ϕ(~r) e− ~ Et na equação da continuidade,
podemos verificar que a energia E, dessa equação, é uma quantidade
real. Dessa forma a densidade de probabilidade ρ(~r, t) pode ser colocada
como
i ∗
ρ(~r, t) = ψ ∗ (~r, t)ψ(~r, t) = ϕ∗ (~r)ϕ(~r) e− ~ (E−E )t ,
derivando a densidade de probabilidade em relação ao tempo

∂ i i ∗
~  ~J(~r, t) ,
ρ(~r, t) = − (E − E ∗ ) ϕ∗ (~r)ϕ(~r) e− ~ (E−E )t = −∇
∂t ~
integrando essa equação no volume V e utilizando o teorema da di-
vergência, temos
Z Z
(E − E ∗ )
i ∗
ϕ∗ (~r)ϕ(~r) e− ~ (E−E )t d3 r = − i ~ ~  ~J(~r, t) d3 r

V IV
= − i ~ ~J(~r, t)  n̂ d2 r .
S

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2.5. Estados não-estacionários 55

Lembrando que
Z I
∂ ~J(~r, t)  n̂ d2 r = 0
ρ(~r, t) d3 r = − i ~
V ∂t S

obtém-se Z
i ∗ )t

(E − E ) ϕ∗ (~r)ϕ(~r) e− ~ (E−E d3 r = 0 .
V
R i ∗
Como V ϕ∗ (~r)ϕ(~r) e− ~ (E−E )t d3 r > 0, se ϕ(~r) não identicamente
nula, conseqüentemente temos E = E ∗ , o que mostra que a energia E
é uma quantidade real. O fato de a energia E ser real nos garante que
a função Φ(t) seja puramente oscilatória. Com isso, podemos observar
que as funções ϕ(~r) e Φ(t) diferem por um fator de fase que depende
do tempo.
As autofunções da equação de Schrödinger correspondem aos es-
tados estacionários de Bohr, se o estado inicial, ψ(~r, 0), é um dado
auto-estado ϕE de energia,
ψ(~r, 0) = ϕE (~r)
a solução da equação de Schrödinger, ψ(~r, t), para um instante t qual-
quer, será dada por
i
ψ(~r, t) = ϕE (~r) e− ~ Et .
Assim, as densidades de probabilidades associadas às soluções que
evoluem de um auto-estado de energia não dependem do tempo,
ρ(~r) = ϕ∗E (~r) ϕE (~r) .
Portanto, os auto-estados de energia de uma partícula em um campo
conservativo são também chamados de estados estacionários.

2.5 Estados não-estacionários


Mesmo que o estado inicial, ψ(~r, 0), da equação de Schrödinger, não seja
um dos auto-estados de energia, mas sendo a equação de Schrödinger
linear e homogênea, a solução geral para uma partícula em um campo
conservativo, será expressa como a combinação linear de seus possíveis
estados estacionários,
X i X
ψ(~r, t) = cn ϕn (~r) e− ~ En t = cn (t) ϕn (~r)
n n

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56 Cap. 2 A Equação de Schrödinger e Álgebra dos Operadores

onde {En } é o espectro de energia, {ϕn (~r)} é o conjunto de auto-estados,


i
o os coeficientes cn (t) = cn e− ~ En t são determinados pelo estado inicial.
Nesse caso, a densidade de probabilidade depende do tempo
X
ρ(~r, t) = c∗l (t) cn (t) ϕ∗l (~r) ϕn (~r)
l,n

e o estado ψ(~r, t) é chamado estado não-estacionário.

2.6 Ortogonalidade dos Auto-Estados


A ortogonalidade é uma das principais propriedades das soluções da
equação de Schrödinger independente do tempo. Se {ϕn (~r)} é o con-
junto de auto-estados estacionários de uma partícula de massa µ em um
campo conservativo V (~r), confinada em uma dada região do espaço
Z
ϕ∗l (~r) ϕn (~r) d3 r = 0 (l 6= n) (2.27)
V

que é a condição de ortogonalidade.


Uma vez que ϕl (~r) e ϕn (~r) satisfazem a equação de Schrödinger,
· 2 ¸
~ 2
Hϕn (~r) = − ∇ + V (~r) ϕn (~r) = En ϕn (~r) (2.28)

e · 2 ¸
~
Hϕ∗l (~r) = − ∇ + V (~r) ϕ∗l (~r) = En ϕ∗l (~r)
2
(2.29)

multiplicando a equação (2.28) por ϕ∗l (~r) e a equação (2.29) por ϕn (~r),
e então subtraindo uma da outra, temos

~2 £ ∗ 2 ¤
− ϕl ∇ ϕn − ϕn ∇2 ϕ∗l = (En − El ) ϕ∗l ϕn

ou seja

~2 ~ h ∗ ~ i
− ∇  ϕl ∇ϕn − ϕn ∇ϕ
~ ∗ = (En − El ) ϕ∗ ϕn .
l l

Integrando em todo o espaço,
Z h i Z

∇  ϕl ∇ϕn − ϕn ∇ϕl d r =
~ ∗~ ~ ∗ 3
(El − En ) ϕ∗l ϕn d3 r
V ~ V

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2.6. Ortogonalidade dos Auto-Estados 57

e aplicando o teorema da divergência, resultam uma integral sobre uma


superfície de raio arbitrariamente grande na qual as autofunções se an-
ulam, ou seja
Z h i I h i
~  ϕ ∇ϕ
l  n̂ d r = 0 .
∇ ∗ ~
~ n − ϕn ∇ϕ ∗
d3
r = ϕ∗~
∇ϕ n − ϕn
~
∇ϕ∗ 2
l l l
V S

Logo, se ϕl e ϕn são autofunções associadas a autovalores de energia


distintos, El 6= En , obtemos a relação de ortogonalidade,
Z
ϕ∗l (~r) ϕn (~r) d3 r = 0 (l 6= n) .
V

Assim, podemos afirmar que os auto-estados de energia de uma


partícula em um campo conservativo são representados por auto-
funções ortogonais e normalizadas.
A condição de ortogonalidade e normalização implicam que os coe-
ficientes, cn (t), da função de onda, ψ(~r, t), em termos das autofunções
normalizadas, ϕn , satisfazem à relação de completeza,
X X
|cn (t)|2 = |cn |2 = 1 . (2.30)
n n
P P
Uma vez que ψ(~r, t) = n cn (t) ϕn (~r) e ψ ∗ (~r, t) = l c∗l (t) ϕ∗l (~r), pela
normalização,
Z X Z
i
ψ ∗ (~r, t) ψ(~r, t) d3 r = c∗l cn e− ~ (El −En )t ϕ∗l (~r) ϕn (~r) d3 r = 1 .
V l,n V

Se as autofunções são ortogonais e normalizadas,


Z
ϕ∗l (~r) ϕn (~r) d3 r = δln
V

onde δln é igual a unidade, se l = n, e igual zero, se l 6= n, e é conhecido


como delta de Kronecker 3 . A equação acima satisfaz a relação de
completeza (2.30).
Podemos também determinar o peso cn (t) de cada auto-estado ϕn
no estado atual da partícula, ψ(~r, t), a partir do estado inicial, ψ(~r, 0).
Escrevendo o estado inicial como
X
ψ(~r, 0) = cn ϕn (~r)
n
3
Leopold Kronecker (1823–1891), matemático e lógico alemão.

Mecânica Quântica

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58 Cap. 2 A Equação de Schrödinger e Álgebra dos Operadores

multiplicando por ϕ∗l (~r) e integrando em topo espaço,


Z X Z
ϕ∗l (~r) 3
ψ(~r, 0) d r = cn ϕ∗l (~r) ϕn (~r) d3 r
V n V

pelo delta de Kronecker, teremos


Z
cn = ϕ∗n (~r) ψ(~r, 0) d3 r . (2.31)
V

2.7 Valor Esperado – Espaço de Coordenada e


Momentum
Para um estado normalizado, o valor médio ou valor esperado de uma
observável física, por exemplo a coordenada x, é representado pela
integral Z Z
hxi = x |ψ|2 dx = ψ ∗ x ψ dx . (2.32)

O valor esperado para o vetor posição ~r, ou o centro do pacote de onda,


é definido por
Z Z
h~ri = ~r |ψ| d r = ψ ∗ ~r ψ d3 r .
2 3
(2.33)

E o valor esperado para uma função arbitrária f (~r), é dado por


Z Z
hf (~r)i = f (~r) |ψ|2 d3 r = ψ ∗ f (~r) ψ d3 r . (2.34)

Assim, lembrando das definições dos operadores diferenciais, E →



i ~ ∂t ~ para a energia total e para o momentum respecti-
e ~p → − i ~∇,
vamente, ou para qualquer outra quantidade física, podemos expressar
os valores estimados em termos da coordenada de posição, espaço de
coordenada. Exemplo, valor esperado para o momentum
Z Z
h~pi = ~p |ψ| d r = ψ ∗ (− i ~∇)
2 3 ~ ψ d3 r . (2.35)

Vamos agora verificar o desenvolvimento da equação de Schrödinger


e dos valores esperado em espaço de momentum, como por exemplo

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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2.7. Valor Esperado – Espaço de Coordenada e Momentum 59

expressar ~r como um operador diferencial (similar ao operador diferen-


cial para o momentum). Partindo da transformada de Fourier e sua
inversa Z
φ(~p, t) e ~ ~p ~r d3 p
1 i
ψ(~r, t) = 3/2
(2.36)
(2π~)
e Z
ψ(~r, t) e− ~ ~p ~r d3 r .
1 i
φ(~p, t) = 3/2
(2.37)
(2π~)
Note que nessas equações usamos ~p no lugar de ~k = ~p/~, para recuper-
armos as informações em espaço de ~k, basta fazer as substituições
~p → ~~k, d3 p → ~3 d3 k, φ(~p) → ~−3/2 φ(~k) .
Note que usamos a função ψ em espaço de coordenada e a função
φ em espaço de momentum, mas ambas são igualmente válidas para
descrever o mesmo estado do sistema considerado. Dado um ou outro,
podemos desenvolver a equação de movimento usando (2.36) ou (2.37).
As duas funções dependem do tempo t. Para o caso especial da partícula
livre, a onda onda plana de momentum ~p = ~~k desenvolve no tempo
através da equação
φ(~p, t) = φ(~p, 0) e− i ω(~p)t . (2.38)
Para um caso geral, na presença de um potencial, a evolução no
tempo de φ(~r, t) é mais complexa do que a da equação acima. Mas poder-
emos obter uma equação de onda em espaço de momentum fazendo uso
da diferenciação em relação ao tempo t de (2.37),
Z
∂φ(~p, t) 1 ∂ψ(~r, t) − i ~p ~r 3
i~ = i ~ e ~ d r
∂t (2π~)3/2 ∂t
ou
Z · 2 ¸
i~
∂φ(~p, t)
=
1
e 
− ~i ~p ~r

~
∇ + V (~r) ψ(~r, t) d3 r .
2
∂t (2π~)3/2 2µ
Usando novamente as transformadas de Fourier (2.36) e (2.37), e
fazendo pequenos ajustes, obteremos
∂φ(~p, t) p2
i~ = φ(~p, t)
∂t 2µ
Z
e− ~ ~p ~r V (~r) e ~ ~p ~r φ(~p0 , t) d3 r d3 p0 . (2.39)
1 i i 0
+
(2π~)3

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60 Cap. 2 A Equação de Schrödinger e Álgebra dos Operadores

Lembrando que φ é uma equação de onda em espaço de momentum.


Podemos ainda transforma-la em uma equação diferencial se V for uma
função analítica de x, y, z, e se podermos escrever

e− ~ ~p ~r V (~r) = V (i ~∇
~ ~p ) e− ~ ~p ~r ,
i i

~ ~p . Substituindo
onde ~r aparece como um operador diferencial ~r → i ~∇
a equação acima em (2.39), executando a integral, teremos a solução
com o auxilio da função delta de Dirac, e o resultado final será uma
equação diferencial parcial em espaço de momentum:

∂φ(~p, t) p2 ~ ~p ) φ(~p, t)
i~ = φ(~p, t) + V (i ~∇ (2.40)
∂t 2µ

que é completamente equivalente a (2.1).


É importante observar que
Z Z
|φ(~p, t)|2 d3 p = |ψ(~r, t)|2 d3 r (2.41)

ou seja, se ψ é normalizada para qualquer t, da mesma forma φ é auto-


maticamente normalizado.
Para elucidar melhor, vamos deduzir explicitamente a componente
x como um operador diferencial x → i ~ dpdx . Partindo do valor esperado
hxi Z
hxi = ψ ∗ (x) x ψ(x) dx ,

da transformada de Fourier
Z
1 i
ψ(x) = φ(p) e ~ px dp ,
(2π~)1/2

e das propriedades da função delta de Dirac (a função delta será detal-


hada no próximo capítulo), dadas por
Z ∞
0 1 0
δ(p − p ) = ei(p−p )x dx
2π ∞

e Z
f (x0 ) δ(x − x0 ) dx0 = f (x) .

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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2.7. Valor Esperado – Espaço de Coordenada e Momentum 61

Sabemos que
Z
hxi = ψ ∗ (x) x ψ(x) dx
Z Z Z
1 i i 0
= φ∗ (p) e− ~ px dp dx x φ(p0 ) e ~ p x dp0 .
2π~

integrando por partes a última integral

d
u = φ(p0 ) → du = φ(p0 ) dp0
dp0
e Z
i 0 i 0 i 0
px 0
dv = x e ~ dp → v= x e ~ p x dp0 = − i ~ e ~ p x ,

assim
Z h i+∞ Z
i 0 i 0 d i 0
x φ(p0 ) e ~ p x dp0 = − i ~ φ(p0 ) e ~ p x + i~ φ(p0 ) e ~ p x dp0 .
−∞ dp0

Então,
Z Z Z
1 i 0 d
hxi = e ~ (p −p)x dx φ∗ (p) i ~ φ(p0 ) dp0 dp
2π~ dp0
Z Z
d
= φ∗ (p) i ~ φ(p0 ) δ(p0 − p) dp0 dp
dp0
Z
d
= φ∗ (p) i ~ φ(p) dp .
dp

Portanto, o operador diferencial para a componente x da coordenada


será
d
x → i~ (2.42)
dp
e em três dimensões teremos:

~ ~p .
~r → i ~ ∇ (2.43)

~ ~p é o gradiente no espaço de momentum.


onde ∇
Assim, teremos todos os casos no espaço de momentum:
Z Z
|ψ(~r, t)| d r = |φ(~p, t)|2 d3 p
2 3
(2.44)

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62 Cap. 2 A Equação de Schrödinger e Álgebra dos Operadores


Z
h~pi = ~p |φ(~p, t)|2 d3 p (2.45)
Z
h~ri = ~ ~p φ(~p, t)d3 p .
φ∗ (~p, t) i ~ ∇ (2.46)

Podemos generalizar para uma função arbitrária de posição, o valor


esperado é dado por:
Z Z ³ ´
2 3 ~ ~p φ(~p, t) d3 p .
hf (~r)i = f (~r) |ψ(~r, t)| d r = φ∗ (~p, t) f i ~ ∇
(2.47)
Similarmente, podemos usar para obter o valor esperado de uma função
arbitrária de momentum,
Z Z µ ¶
2 3 ∗ ~ ~
hg(~p)i = g(~p) |φ(~p, t)| d p = ψ (~r, t) g ∇ ψ(~r, t) d3 r .
i
(2.48)
Com essas relações podemos calcular para todo sistema físico, os
valores esperados para os operadores associados a energia, posição, mo-
mentum e qualquer função arbitrária de posição e de momentum, uti-
lizando tanto o espaço de posição bem como o espaço de momentum.

2.8 Operadores
Seja F uma quantidade física que caracteriza o estado de um sistema
quântico. Os valores que uma dada quantidade física pode assumir são
chamados de autovalores. O conjunto dos autovalores é o espectro.
Na mecânica clássica as quantidades físicas são contínuas. Porém na
mecânica quântica, não necessariamente. Pode haver espectros dis-
cretos ou espectros contínuos. Vamos supor, para simplificar, que o
espectro de F seja discreto. Os autovalores de F serão denotados por
fn , (n = 0, 1, 2,    ). A função de onda do sistema, no estado em que
F tem o valores fn , será denotada por ψn . Essas funções são chamadas
autofunções de F. Assim,

Fψn = fn ψn . (2.49)

Um operador é dito linear se sua ação em duas funções ψ1 e ψ2 é


tal que:
F(c1 ψ1 + c2 ψ2 ) = c1 Fψ1 + c2 Fψ2 ,

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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2.8. Operadores 63

onde c1 e c2 são números complexos arbitrários. A maior parte dos


operadores em mecânica quântica são lineares.
Somente uma outra categoria de operadores são importantes na
mecânica quântica, que é o anti-linear, caracterizado pela propriedade

F(c1 ψ1 + c2 ψ2 ) = c∗1 Fψ1 + c∗2 Fψ2 .

Os complexo conjugados são eles próprios um exemplo de operadores


anti-lineares. Esses operadores são importantes na mecânica quântica
quando processos físicos com reversão temporal são considerados
Assim, uma quantidade física, na qual é função da coordenada e do
momentum linear, temos um operador linear associado que nos dá o
valor esperado. O valor esperado, ou conceito de valor médio hFi da
quantidade física F em um dado estado. Sejam fn os valores possíveis de
F, ou seja, seus autovalores. Sejam |cn |2 as probabilidades de cada um
dos autovalores, no estado em questão. Define-se então o valor médio
como X
hFi = fn |cn |2
n

Como queremos encontrar uma expressão para F em termos da função


de onda do estado considerado, e ψ é esta função. Para fazer isso vamos
associar à quantidade física ao operador linear F que atua sobre as
funções de onda. Seja Fψ a função obtida quando F atua sobre ψ.
Assim, Z Z
hFi = ψ ∗ F ψ d3 r = φ∗ F φ d3 p (2.50)

para qualquer estado ψ em espaço de coordenadas, ou φ em espaço de


momentum. Então
X Z X
hFi = fn cn cn = ψ ∗

cn fn ψn d3 r
n n
R
onde usamos cn = ψ ∗ ψn d3 r. Vemos, primeiramente, que
X
hFi = cn fn ψn
n
P
e que ψ = n cn ψn , de maneira que hFi é linear, então

Fψn = fn ψn

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64 Cap. 2 A Equação de Schrödinger e Álgebra dos Operadores

como já havíamos mencionado.


Do fato do valor esperado F ser real segue uma propriedade impor-
tante dos operadores associados a quantidades físicas:
Z µZ ¶∗
∗ 3 ∗ ∗ 3
hFi = ψ F ψ d r = hF i = ψ Fψd r . (2.51)

Mas
µZ ¶∗ Z
¡ ∗ ¢∗
ψ ∗ F ψ d3 r = ψ (F ψ) d3 r
Z
= ψ (F∗ ψ ∗ ) d3 r
Z
= ψ F∗ ψ ∗ d3 r , (2.52)

onde F∗ é definido por: se Fψ = φ, então F∗ é o operador tal que


F∗ ψ ∗ = φ∗ 4 . Então,
Z Z
ψ F ψ d r = ψ F∗ ψ ∗ d3 r .
∗ 3

Vamos definir o operador transposto Ft do operador F. Sejam ψ e φ


funções arbitrárias. Então Ft é tal que
Z Z
ψ (F ) φ d r = φ F∗ ψ ∗ d3 r .
∗ t 3

Se tomarmos como exemplo ψ = i φ,


Z Z ³ t´
ψ F ψ d r = ψ ∗ F∗ ψ d3 r .
∗ ∗ 3

Da condição de F ser real, da equação (2.52), temos


Z Z Z ³ t´
ψ F ψ d r = ψ F ψ d r = ψ F∗ ψ d3 r .
∗ 3 ∗ ∗ 3 ∗
(2.53)

Comparando os dois extremos da equação acima, vemos que

F = (Ft )∗ .
4 ∂ ∂ψ
Por exemplo, seja F = − i ∂x . Então, dado uma ψ qualquer, temos Fψ = − i ∂x
.
¡ ¢∗ ∗
O operador F deve ser tal que F∗ ψ ∗ = − i ∂ψ

∂x
= i ∂ψ
∂x
. Logo, F∗ = i ∂x

.

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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2.8. Operadores 65

Operadores com esta propriedade são ditos hermitianos. Logo, os op-


eradores associados a quantidades físicas são operadores lineares her-
mitianos.
Podemos, formalmente, considerar quantidades físicas complexas,
i.e., cujos autovalores são complexos. Por exemplo, dadas as coorde-
nadas x e y, podemos considerar a quantidade x + i y. Seja a função F
uma quantidade desse tipo, e seja F ∗ a quantidade cujos autovalores
são os complexo conjugados dos autovalores da função F . À quanti-
dade F corresponde o operador F. Denotemos por F† o operador corre-
spondente à quantidade F ∗ . Este operador é denominado o operador
adjunto de F.
O valor médio da quantidade F ∗ é dado por
Z
hF∗ i = ψ ∗ F† ψ d3 r

onde apenas adaptamos a definição de média de um operador.


Ora, Z
hFi = ψ ∗ F ψ d3 r

logo
µZ ¶∗ Z Z
∗ ∗ 3
hFi = ψ Fψd r = ψ F∗ ψ ∗ d3 r = ψ ∗ (Ft )∗ ψ d3 r .

Mas à !∗
X X
hF∗ i = fn∗ |cn |2 = fn |cn |2 = hFi∗ .
n n

Ou seja, Z Z
∗ † 3
ψ F ψd r= ψ ∗ (Ft )∗ ψ d3 r .

Comparando, temos F† = (Ft )∗ . Em palavras, o adjunto é o transposto


do conjugado.
A condição de hermiticidade de um operador, escrita anteriormente
como
Ft = F∗
pode agora ser escrita como:

F = F†

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66 Cap. 2 A Equação de Schrödinger e Álgebra dos Operadores

e os operadores hermitianos são aqueles que coincidem com os adjuntos.


Daí serem chamados também de operadores auto-adjuntos.
Fica fácil demonstrar que a ortogonalidade das autofunções de um
operador hermitiano. Sejam fn e fm dois autovalores diferentes do op-
erador hermitiano F. Sejam ψn e ψm as autofunções correspondentes.
Então,
Fψn = fn ψn (2.54)
e
Fψm = fm ψm . (2.55)
∗ , temos
Multiplicando a (2.54) por ψm
∗ ∗ ∗
ψm Fψn = ψm fn ψn = fn ψm ψn

e Z Z
∗ 3 ∗
ψm Fψn d r = fn ψm ψn d3 r . (2.56)

Tomando o complexo conjugado de (2.55) e multiplicando por ψn , temos


ψn F∗ ψm
∗ = f ψ ψ ∗ . Integrando,
m n m
Z Z
∗ ∗ 3 ∗
ψn F ψm d r = fm ψn ψm d3 r (2.57)
Z Z Z
∗ 3 † ∗ 3 ∗
ψm Fψn d r− ψn F ψm d r = (fn − fm ) ψn ψm d3 r . (2.58)

Mas

Z Z
¡ t ¢∗
ψn F∗ ψm

d3 r = ∗
ψm F ψn d3 r
Z
∗ †
= ψm F ψn d3 r
Z

= ψm Fψn d3 r .

Pois F é hermitiano. Logo, o primeiro termo de (2.58) é nulo. Portanto,


Z

(fn − fm ) ψn ψm d3 r = 0

e, como fn 6= fm , segue a relação de ortogonalidade


Z

ψn ψm d3 r = 0 (n 6= m) . (2.59)

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2.8. Operadores 67

Segue um número de teoremas simples a respeito dos operadores 5 .

1. A soma de dois operadores hermitianos é um operador hermitiano.

2. O operador identidade I, para qual opera todas as funções nelas


próprias, é hermitiano. Se λ é um número real, λ I é hermitiano.

3. Se F é um operador não hermitiano, F + F† e i(I − I† ) são hermi-


tianos. Desde que, F possa ser escrito como a combinação linear
dos dois operadores hermitianos:

F + F† F − F†
F= +i . (2.60)
2 2

4. Se F e G são dois operadores arbitrários, o adjunto de seu produto


é dado por
(FG)† = G† F† . (2.61)

Prova.
Z Z
∗ † 3
ψ (FG) ψ d r = (FGψ)∗ ψ d3 r
Z
= (Gψ)∗ F† ψ d3 r
Z
= ψ ∗ G† F† ψ d3 r

Mas ψ é arbitrária, desde que segue (2.61). Se F e G são oper-


adores hermitianos,
(FG)† = GF .

Corolário: O produto de dois operadores hermitianos é hermi-


tiano se e somente se eles comutam.

5. O adjunto de um número complexo λ é seu complexo conjugado


λ∗ .
5
Dois livros fazem a ponte entre a análise funcional e a teoria de operadores lineares:
T. F. Jordan, Linear operator for quantum mechanics, (1968), e J. M. Jauch, Foun-
dations of quantum mechanics, (1968); ver também o magnífico livro de Landau
e Lifshitz, Quantum mechanics, (1976)

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68 Cap. 2 A Equação de Schrödinger e Álgebra dos Operadores

6. É fácil verificar que a natureza dos seguintes operadores são her-


~
mitianos: operador de posição~r, operador momentum ~p = − i ~∇,
2
operador energia H = ~p2µ + V (~r), operador momentum angular
~L = ~r × ~p = ~r × ~ ∇.
~
i

2.9 Adição e Multiplicação de Operadores


Sejam F e G duas quantidades físicas que podem ter valores definidos
simultaneamente. Sejam F e G seus operadores associados. Os autoval-
ores da soma F + G são a soma dos autovalores de F e de G. Considere
o operador F + G, e sejam ψn as autofunções comuns a F e G. Então,

Fψn = fn ψn
Gψn = gn ψn

e, portanto,
(F + G)ψn = (fn + gn )ψn .
Esse resultado pode ser generalizado para funções de onda quaisquer,
assim:
(F + G)ψ = Fψ + Gψ .
Neste caso, tem-se
Z Z Z
hF+Gi = ψ (F+G)ψ d r = ψ Fψ d r+ ψ ∗ Gψ d3 r = hFi+hGi
∗ 3 ∗ 3

A multiplicação de operadores é definida assim:

(FG)ψ = F(Gψ) .

Suponhamos que ψn seja autofunção comum a F e G. Então,

FGψn = F(Gψn ) = Fgn ψn = gn Fψn = gn fn ψn

e
GFψn = G(Fψn ) = Gfn ψn = fn Gψn = fn gn ψn .
Logo, para as autofunções simultâneas, temos

(FG − GF)ψn = 0

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2.10. A Derivada Temporal de um Operador 69

Porém esse fato não é suficiente para se concluir que o operador

FG − GF = 0 .

Contudo, como o conjunto das autofunções ψn é completo, temos, dada


uma função de onda arbitrária, que
X
ψ= cn ψn
n

e X
(FG − GF)ψ = cn (FG − GF)ψn = 0
n

Logo, o operador FG − GF é zero como operador, pois leva qualquer


função ao valor zero. Nota-se que esse fato foi demonstrado para dois
operadores que possuem um conjunto completo de autofunções comuns.
No caso geral, esse comutador,

[F, G] ≡ FG − GF

é diferente de zero.

2.10 A Derivada Temporal de um Operador


podemos dizer que um operador dF
dt é a derivada no tempo do operador
F se, sendo hFi o valor médio de F num estado arbitrário, e h dF
dt i o
valor médio de dF
dt nesse mesmo estado, tivermos

d dF
hFi = h i (2.62)
dt dt
Explicitando, devemos ter
Z
d d
hFi = ψ ∗ Fψ d3 r
dt dt
Z Z Z
∗ ∂F 3 ∂ψ ∗ ∂ψ 3
= ψ ψd r+ Fψ d r + ψ ∗ F
3
d r (2.63)
∂t ∂t ∂t
e usando a equação de Schrödinger,

∂ψ ∗ i
= H∗ ψ ∗
∂t ~

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70 Cap. 2 A Equação de Schrödinger e Álgebra dos Operadores

∂ψ i
= − Hψ .
∂t ~
Substituindo esses resultados em (2.63), temos 6
Z Z Z
d ∗ ∂F 3 i ∗ ∗ 3 i
hFi = ψ ψd r+ (H ψ )Fψ d r − ψ ∗ F(Hψ) d3 r
dt ∂t ~ ~
(2.64)
usando o fato de que H ser hermitiano, temos
Z Z
(H ψ )Fψ d r = ψ ∗ HFψ d3 r
∗ ∗ 3
(2.65)

e, conseqüentemente,
Z µ ¶
d ∗ ∂F i i
hFi = ψ + HF − FH ψ d3 r . (2.66)
dt ∂t ~ ~
Como, por definição,
Z
d dF
hFi = ψ∗h iψ d3 r
dt dt
temos que:
dF ∂F i
= + (HF − FH) . (2.67)
dt ∂t ~
Como dissemos, a maioria dos casos são aqueles em que ∂F ∂t = 0, onde
dissemos que o operador não tem dependência explícita no tempo. Nesse
caso,
dF i
= (HF − FH) . (2.68)
dt ~
As equações (2.67) e (2.68) são as equações de movimento de Heisen-
berg para os casos em que F é explicitamente dependente do tempo e
não explicitamente dependente do tempo, respectivamente.
6
O termo que contém a derivada parcial do operador só existe quando a expressão
do operador contém parâmetros que dependam do tempo. Por exemplo, se tiver-
mos uma partícula livre de massa variável, seu hamiltoniano seria

~2
H=− ∇2
2µ(t)
e sua derivada seria
∂H ~2 dµ 2
= ∇
∂t 2µ2 (t) dt
Mas, na grande maioria dos casos estudados esse termo é inexistente.

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2.11. Teorema de Ehrenfest 71

Se F for uma constante de movimento, dF dt = 0. Assim, [H, F] = 0.


Na mecânica quântica, a constância de uma quantidade física no tempo
quer dizer isto: que o valor médio dessa quantidade independe do tempo.
Considere o operador H. Temos, evidentemente, que [H, H] = 0, logo,
se H não depende explicitamente do tempo,

dH i
= [H, H] = 0 , (2.69)
dt ~
d
e dt hHi = 0. A quantidade física associada ao operador hamiltoniano é
a energia. Logo, a energia se conserva 7 .

2.11 Teorema de Ehrenfest


Paul Ehrenfest 8 mostrou que para os valores médios da posição ~r e do
momentum ~p de uma partícula de massa µ, em um campo conservativo
V (~r), obedecem a expressões análogas às equações de movimento da
mecânica clássica de Isaac Newton 9 .
Por exemplo, partindo da expressão para o valor médio da posição
h~ri, derivando em relação ao tempo temos:
Z Z µ ¶ Z µ ∗¶
d ∂ρ 3 ∗ ∂ψ 3 ∂ψ
h~ri = ~r d r = ~r ψ d r + ~r ψ d3 r
dt ∂t ∂t ∂t
Z
i~ £ ¤
= ~r ψ ∗ ∇2 ψ − (∇2 ψ ∗ )ψ d3 r

Z h ³ ´i
i~ ~  ψ ∇ψ
~ ∗ − ψ ∗ ∇ψ
~
=− ~r ∇ d3 r

7
R
Como |ψ|2 dr = 1, é a integral estendida a todo o espaço, temos que
Z Z Z µ ∗ ¶
d d ∂ψ ∂ψ
0= |ψ|2 d3 r = ψ ∗ ψ; d3 r = ψ + ψ∗ d3 r
dt dt ∂t ∂t
Eliminando as derivadas no tempo através da equação de Schrödinger , temos:
µZ Z ¶ µZ Z ¶
i i
0= ψH∗ ψ ∗ d3 r − ψ ∗ Hψ d3 r = ψ ∗ (Ht )∗ ψ d3 r − ψ ∗ Hψ d3 r
~ ~
Z ³ ´
i
= ψ ∗ H† − H ψ d3 r
~

Segue então que H = H† , ou seja, que H é um operador hermitiano.


8
Paul Ehrenfest (1880–1933), físico austríaco.
9
P. Ehrenfest, Zeitschrift für Physik 45, 455–457 (1927).

Mecânica Quântica

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72 Cap. 2 A Equação de Schrödinger e Álgebra dos Operadores


Z ³ ´
=− ~r ∇~  ~J d3 r (2.70)

Uma vez que os termos que envolvem componentes distintas de ~r e ~J


são nulas, a taxa de variação do valor médio de ~r é dada por
Z ∞ Z ∞
∂Jx
x dx = Jx dx
−∞ ∂x −∞

ou seja
Z
d
h~ri = ~J d3 r .
dt
³ ´
Usando ~J = 2µ
i~ ~ ∗ − ψ ∗ ∇ψ
ψ ∇ψ ~ e integrando por partes, obteremos
finalmente Z
d ³ ´
µ h~ri = ψ ∗ − i ~∇ ~ ψ d3 r = h~pi . (2.71)
dt
Agora faremos a derivada da expressão do valor médio do momen-
tum em relação ao tempo,
·Z µ ¶ Z µ ∗¶³ ´ ¸
d ∗~ ∂ψ 3 ∂ψ ~ 3
h~pi = − i ~ ψ ∇ d r+ ∇ψ d r
dt ∂t ∂t
Z h
~2 ¡ ¢ ¡ ¢³ ´i
= ψ∗∇~ ∇2 ψ − ∇2 ψ ∗ ∇ψ ~ d3 r +

Z h ³ ´i
+ ~ (V ψ) + V ψ ∗ ∇ψ
−ψ ∗ ∇ ~ d3 r (2.72)

Usando o teorema de Green 10 na primeira integral temos,


Z h
¡ ¢ ¡ ¢³ ´i
~ ∇2 ψ − ∇2 ψ ∗ ∇ψ
ψ∗∇ ~ d3 r =
Z h³ ´³ ´ ³ ´i
~
∇ψ ~ ∗ − ψ∗∇
∇ψ ~ ∇ψ
~  d~S
S

10
George Green (1793–1841), matemático inglês.
O teorema de Green para as funções continuas e diferenciáveis, φ e ψ, é dado por:
Z I h i
(φ∇2 ψ − ψ∇2 φ) d3 r = ~ − ψ ∇φ
φ∇ψ ~  d~S
V S

onde a superfície S envolve todo o volume V.

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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2.12. Teorema Virial 73

que para uma grande superfície, a integral é nula. Para resolver a se-
gunda integral, teremos que integrar por partes duas vezes no termo
ψ ∗ , logo
Z ³ ´
d ~ ~ i = h~Fi .
h~pi = − ψ ∗ ∇V ψ d3 r = −h∇V (2.73)
dt

A equação (2.73), conhecida como teorema de Ehrenfest, é semel-


hante à segunda lei de Newton, de acordo com o valor esperado e o
princípio de correspondência.
Para um caso geral, a formula da derivada temporal do valor esper-
ado de uma quantidade física qualquer associada a um operador F, tal
que a equação de onda está na forma

∂ψ
i~ = Hψ
∂t
com
~2 2
H=− ∇ + V (~r)

será
d ∂F
i~ hFi = hFH − HFi + i ~h i. (2.74)
dt ∂t
Essa formula é de muita importância para mecânica quântica, e já dis-
cutimos anteriormente seu significado.

2.12 Teorema Virial


Vamos considerar um simples exemplo para nossa ilustração. Considere
a equação de movimento do operador ~r  ~p. De acordo com (2.74),

d
i~ h~r  ~pi = h[~r  ~p, H]i ,
dt

usando a relação dada em (1.14) para a componente x, x px −px x = i ~,


teremos
p2
[xpx , H] = i ~ x + x[px , V ]
µ

Mecânica Quântica

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74 Cap. 2 A Equação de Schrödinger e Álgebra dos Operadores

e similar relações encontraremos para as componentes y e z. Combi-


nando os resultados, teremos
Z h i
d p2
h~r  ~pi = h i + ψ ∗~r  ∇(V
~ ψ) − V (∇ψ) ~ d3 r
dt µ
Z ³ ´
p2
= h i + ψ ∗ ~r  ∇V
~ ψ d3 r . (2.75)
µ

Como na mecânica clássica 11 , podemos obter de (2.75) o valor médio


em todo tempo τ

1
[h~r  ~pit=τ − h~r  ~pit=0 ] = 2hT i − h~r  ∇V
~ i = 2hT i + h~r  ~Fi
τ
Se o valor esperado dessa expressão tende a finito quando τ → ∞, o
lado que contém 2hT i − h~r  ∇V
~ i → 0, assim

2hT i = h~r  ∇V
~ i = −h~r  ~Fi . (2.76)

Para os estados estacionários, todos os valores esperados em (2.76)


são constantes no tempo, e então

2hT i = h~r  ∇V
~ i = −h~r  ~Fi . (2.77)

Os resultados encontrados em (2.76) e (2.77) são conhecidos como o


teorema virial. Uma aplicação importante é quando temos moléculas
de gás interagindo fracamente.

2.13 Comutadores e Regras de Comutação


Vamos considerar algumas propriedades dos operadores lineares:

1. Sendo A e B dois operadores lineares, temos que (A + B)ψ =


(B + A)ψ, o que significa que esses operadores são comutativos
em relação a soma;

2. O produto de dois operadores lineares, em geral, não é comutativo,


i.e., AB 6= BA;
11
Ver o livro de Goldstein, Classical mechanics, (1980), seções 3–4.

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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2.13. Comutadores e Regras de Comutação 75

3. A diferença do produto de dois operadores lineares quânticos, es-


crita na forma AB − BA é chamada de comutador de A e B e
é representada por

[A, B] = AB − BA ; (2.78)

4. A soma do produto de dois operadores lineares A e B, escrito na


ordem AB + BA é chamada de anticomutador ou operador de
anticomutação desses operadores e é representado por

{A, B} = AB + BA . (2.79)

Um exemplo de duas variáveis dinâmicas que não se comutam é x e



px = − i ~ ∂x , atuando em uma função de onda arbitrária ψ(x)
µ ¶
~ ∂ ~ ∂
[x, px ]ψ(x) = x − x ψ(x)
i ∂x i ∂x
µ ¶
∂ψ(x) ∂(xψ(x))
= −i~ x −
∂x ∂x
µ ¶
∂ψ(x) ∂ψ(x)
= −i~ x − ψ(x) − x
∂x ∂x
= i ~ ψ(x) ,

logo,
[x, px ] = i ~ . (2.80)
O mesmo vale para as componentes y e z. Assim,

[x, px ] = [y, py ] = [z, pz ] = i ~ I . (2.81)

Na notação dos comutadores, para qualquer variável dinâmica, é


fácil verificar as seguintes regras elementares:

[A, B] + [B, A] = 0
[A, A] = 0
[A, B + C] = [A, B] + [A, C]
[A + B, C] = [A, C] + [B, C] (2.82)
[AB, C] = A[B, C] + [A, C]B
[A, BC] = [A, B]C + B[A, C]
[A, [B, C]] + [C, [A, B]] + [B, [C, A]] = 0

Mecânica Quântica

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76 Cap. 2 A Equação de Schrödinger e Álgebra dos Operadores

Sendo a última relação conhecida como identidade de Jacobi 12 . Ainda


podemos provar que, para um inteiro positivo n,

[A, B n ] = nB n−1 [A, B]


[An , B] = nAn−1 [A, B] (2.83)

A seguinte relação de uso freqüente, também tem importante relevân-


cia na mecânica quântica, pois envolve funções eA , é dado pela função:

F(λ) = eλA Be−λA (2.84)

onde λ é um número real. Faremos uma expansão em série de Taylor 13 ,


observando que

dF
= AF(λ) − F(λ)A = [A, F(λ)]
dλ · ¸
d2 F dF
= A, = [A, [A, F(λ)]]
dλ2 dλ

e então, desde que F(0) = B, nós teremos a relação

λ2 λ3
eλA Be−λA = B + λ[A, B] + [A, [A, B]] + [A, [A, [A, B]]] + . . .
2! 3!
(2.85)
e quando λ = 1, temos a série de Lie 14 :

1 1
eA Be−A = B + [A, B] + [A, [A, B]] + [A, [A, [A, B]]] + . . .
2! 3!
Se as variáveis dinâmicas A e B satisfazem a condição [A, B] = γB,
onde γ é um número, a equação acima reduz à

eA Be−A = eγ B . (2.86)

Um caso particular da equação (2.85), nos leva a uma simples relação


eA eB = eA+B , mas em geral não é valida para operadores. Em seu lugar,
12
Assumimos que a identidade de Jacobi em mecânica quântica é bem mais fácil de
provar do que seu análogo clássico; para uma revisão dos parênteses de Poisson,
ver Goldstein, Classical mechanics, (1980).
13
Brook Taylor (1685–1731), matemático inglês.
14
Marius Sophus Lie (1842–1899), matemático norueguês.

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2.13. Comutadores e Regras de Comutação 77

normalmente usamos a fórmula de Baker-Campbell-Hausdorff 15 .


1 1 1
eA eB = eA+B+ 2 [A,B]+ 12 [A,[A,B]]+ 12 [B,[B,A]]+...

A série dentro da exponencial no lado direito da equação acima é um


tanto complexa, mas envolve apenas comutadores múltiplos de A e B.
Temos outras relações importantes que são usadas na mecânica
quântica, como:
1
eA eB = eA+B+ 2 [A,B] (2.87)

Prova. Consideremos o operador G(α) = eαA eαB , sendo α real. Derivando


G(α) em relação a α, temos

d
G(α) = AeαA eαB + eαA BeαB

= AeαA eαB + eαA Be−αA eαA eαB
£ ¤
= A + eαA Be−αA G(α)

Usando (2.85), podemos reescrever a equação acima do seguinte modo:

d
G(α) = [A + B + α[A, B]]G(α) ,

o que nos permite escrever:

dG(α)
= [A + B + α[A, B]] dα .
G(α)

Integrando essa expressão, obtemos


1 2 [A,B]
G(α) = eαA eαB = G(0) eα(A+B)+ 2 α (2.88)

Nessa equação, podemos observar que para α = 0, temos G(0) = 1 e,


portanto, fazendo α = 1, demonstramos a relação (2.87).
15
Henry Frederick Baker (1866–1956), matemático inglês.
John Edward Campbell (1862–1924), matemático inglês.
Felix Hausdorff (1868–1942), matemático alemão.
H. Baker, Proceeding London Math. Sociaty (1) 34, 347–360 (1902); Ibid (1) 35,
333–374 (1903); Ibid (Ser. 2) 3, 24–47 (1905); J. Campbell, Proceeding London
Math. Sociaty 28, 381–390 (1897); Ibid 29, 14–32 (1898); F. Hausdorff, Ber Verh
Saechs Akad. Wiss Leipzig 58, 19–48 (1906).

Mecânica Quântica

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78 Cap. 2 A Equação de Schrödinger e Álgebra dos Operadores

2.14 Operadores Unitários - Operador


Deslocamento
As quantidades observáveis (resultados de medidas) aparecem, na mecânica
quântica, sob a forma de norma de todos os estados,
Z
ψ ∗ (~r) ψ(~r) d3 r ,

e o valor esperado de uma observável O é dado por,


Z
hOi = ψ ∗ (~r) O ψ(~r) d3 r .

Como toda teoria, a mecânica quântica admite transformações "de lin-


guagem": por exemplo, quando eu descrevo o mesmo fenômeno us-
ando dois sistemas de eixos ortogonais, obtenho descrições distintas do
mesmo fenômeno. Essas descrições devem ser equivalentes, já que rep-
resentam o mesmo fenômeno de pontos-de-vista distintos: as descrições
são diferentes, mas têm o mesmo conteúdo.
Como as quantidades físicas preservam o produto escalar (pro-
duto interno ou escalar hermitiano) de dois estados, é importante o
estudo dos operadores que conservam os produtos escalares, ou seja,
dos operadores U que são tais que
Z Z
ψ1∗ (~r) ψ2 (~r) d3 r = [Uψ1 (~r)]∗ Uψ2 (~r) d3 r . (2.89)

Pela definição do operador adjunto U† , escrevemos (2.89) como


Z Z
ψ1∗ (~r)U† Uψ2 (~r) d3 r = [U† Uψ1 (~r)]∗ ψ2 (~r) d3 r

Assim, um operador linear é dito operador unitário, se satisfaz a


relação
UU† = U† U = 1 . (2.90)
Seja U um operador unitário e considere as transformações de funções
de onda:

ψ 0 (~r) = Uψ(~r)
φ0 (~r) = Uφ(~r)

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2.14. Operadores Unitários - Operador Deslocamento 79

Então,
Z Z
ψ 0∗ φ0 d3 r = [Uψ]∗ Uφ d3 r
Z Z
= ψ ∗ U† Uφ d3 r = ψ ∗ φ d3 r

o que mostra que uma transformação implementada por um operador


unitário conserva os produtos escalares.
Como exemplo de operadores unitários vamos considerar o oper-
ador deslocamento ou de translação, definido por Da ψ(x) = ψ(x+a)
no caso de um deslocamento na direção x, onde a é um número real.
Então, podemos escrever

ψ 0 (x) = Da ψ(x) = ψ(x + a)

Se a for apenas um deslocamento infinitesimal, podemos expandir a


função ψ em série de Taylor, em torno do ponto (x, y, z), do seguinte
modo:
∼ ψ(x) + a ∂ ψ(x) = (1 + i aTx ) ψ(x) ,
ψ 0 (x) = (2.91)
∂x

em que Tx = − i ∂x . Dessa forma, podemos observar que a diferença
0
entre ψ (x) e ψ(x) é originada pela ação do operador i aTx sobre a
função de onda ψ(x). Chamaremos Tx de um gerador infinitesimal de
translação so longo da direção x. A relação expressa em (2.91) não
é restrita somente à mecânica quântica. Porém, no seu contexto, Tx
tem um significado especial em mecânica quântica, pelo simples fato do

momentum px = − i ~ ∂x . Diante desse fato, o gerador infinitesimal de
de translação pode ser representado por

∂ px
Tx = − i = . (2.92)
∂x ~

Então o operador deslocamento Da = 1 + i aTx , mas como D†a Da = 1 é


unitário, segue que Tx = Tx† é um operador hermitiano.
Se temos uma translação numa distância finita a, podemos ver
como n ¡translações
¢ infinitesimais em que devemos considerar o limite
limn→∞ na . Então, podemos escrever (2.91) como
³ a px ´n apx
ψ 0 (x) = lim 1+i ψ(x) = ei ~ ψ(x) . (2.93)
n→∞ n ~

Mecânica Quântica

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80 Cap. 2 A Equação de Schrödinger e Álgebra dos Operadores

Generalizando para as três dimensões, temos

ψ 0 (~r) = ei
~
p ~r
~ ψ(~r) . (2.94)

Logo, nesse caso o operador deslocamento unitário é definido por

D~r = ei
~
p ~r
~
 . (2.95)

e fica claro que D†a Da = 1, como havíamos dito.

2.15 Comentários
Para esse capítulo, recomenda-se ao leitor, uma leitura paralela do clás-
sico livro do Prof. Eugen Merzbacher (1998) 16 , nesse livro poderá en-
contrar um trabalho muito bom sobre a equação de Schrödinger e a
interpretação probabilística. Com relação ao estudo dos operadores, de-
verá ser feita a leitura do magnífico livro dos Profs. Landau e Lifshitz
(1989) 17 .

16
E. Merzbacher, Quantum mechanics, (1998).
17
L. D. Landau and E. M. Lifshitz, Quantum mechanics, (1989).

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Capítulo 3

Aplicações da Equação de
Schrödinger

Do mesmo modo que os processos abordados pela Mecânica Clássica


são calculados através de modelos que permitem a determinação de
suas soluções, em mecânica quântica ocorre o mesmo. Assim, nesse
capítulo faremos um estudo das soluções de modelos abordados pela
Mecânica Quântica Ondulatória, i.e., pelas aplicações da equações
de Schrödinger. Iremos mostrar modelos matematicamente simples, us-
ando potenciais constantes em uma dimensão.

3.1 A Função Delta

Normalmente a normalização da função ψ é realizada em todo o es-


paço, mas normalmente os modelos utilizados em mecânica quântica
podem apresentar degraus, como a barreira de potencial ou mesmo o
poço de potencial retangular, não podemos esquecer que a função ψ é
contínua e bem comportada. Assim, uma ferramenta conveniente em
nossa discussão é a função delta de Dirac.
A função delta é uma generalização do delta de Kronecker para o
caso de variáveis contínuas. O delta de Kronecker é dado por

½
1 se i = j,
δij =
0 se i =
6 j.

81

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82 Cap. 3 Aplicações da Equação de Schrödinger

Alternativamente podemos definir



X
f (j) = δij f (i) (3.1)
i=1

onde i e j tomam valores discretos 1, 2, 3, . . .


Generalizando (3.1), temos a definição da função delta, dada pela
equação Z +∞
f (x0 ) = δ(x, x0 ) f (x) dx (3.2)
−∞

onde f (x) é uma função arbitrária bem estudada. Desde que f (x) possa
ser alterada sem afetar o valor de f (x0 ), fica claro que δ(x, x0 ) = 0 para
todos os valores de x, exceto quando x = x0 , i.e., estão muito próximos.
Pela definição (3.2), δ(x, x0 ) e δ(x + a, x0 + a) são equivalentes, onde a
é arbitrário. Se ajustamos a = −x0 , δ(x, x0 ) depende somente de x − x0 .
Assim escrevemos
½
0 0 1 se x = x0 ,
δ(x, x ) = δ(x − x ) = (3.3)
0 se x 6= x0 ;
e Z ½
+∞
0 f (x0 ) se x = x0 ,
δ(x − x ) f (x) dx = (3.4)
−∞ 0 6 x0 .
se x =
Em particular, se x0 = 0, teremos
Z +∞
f (0) = δ(x0 ) f (x0 ) dx0 (3.5)
−∞

e se δ(x) for uma função par,

δ(x − x0 ) = δ(x0 − x) . (3.6)

Nesse momento, faz sentido compararmos a integral de Fourier


Z +∞ Z +∞
1 0
f (x0 ) = du ei u(x−x ) f (x) dx
2π −∞ −∞

com (3.4) para vermos a equivalência da função delta


Z +∞
0 1 0
δ(x − x ) = ei u(x−x ) du . (3.7)
2π −∞

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3.1. A Função Delta 83

Fisicamente, (3.7) será interpretada como a superposição com aplitudes


e fases iguais de um oscilador harmônico de todas as freqüências. A
contribuição da integral de Fourier cancelam completamente por inter-
ferência destrutiva argumentos que se anulam, i.e., x = x0 .
Se a condição (3.5) for aplicada para uma função simples definida
como f (x) = 1 para x1 < x < x2 , e f (x) = 0 para qualquer x fora do
intervalo [x1 , x2 ], a função delta satisfaz
Z +∞ ½
0 se x = 0 e x 6∈ [x1 , x2 ],
δ(x) dx = (3.8)
−∞ 1 se x1 < 0 < x2 .

Portanto apresentamos a função delta de Dirac, que será de grande


utilidade nessas notas. vale lembrar que em uma dimensão, a função
delta, escrita como δ(x − x0 ), é uma função matematicamente imprópria
na qual valem as seguintes propriedades e representações, além das já
apresentadas:
1. O limite da função delta, (3.7), pode ser representadas por
1 1 x2
δ(x) = √ lim √ e− ε
π ε→0 ε
1 ε
δ(x) = lim 2
π ε→0 x + ε2
1 sen N x
δ(x) = lim .
π N →∞ x

2. Se a é uma constante real, mas a 6= 0, então


1
δ(ax)= δ(x)
|a|
e
f (x)δ(x − a)=f (a)δ(x − a).

3. Se a 6= b
1
δ ((x − a)(x − b)) = [δ(x − a) + δ(x − b)].
|a − b|

4. Se A ⊂ R então
Z ½
0 −f 0 (a) se a ∈ A
δ (x − a) f (x) dx =
A 0 se a ∈
6 A

Mecânica Quântica

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84 Cap. 3 Aplicações da Equação de Schrödinger

onde f 0 (a) e a derivada da função f (x) com x = a, e


d
xδ 0 (x) = −δ(x), δ 0 (x) = δ(x).
dx
5. Seja f (x) uma função que tem raízes simples em x=xi , i=1, . . . , N ,
então
N
X 1
δ(f (x)) = δ(x − xi ).
|f 0 (xi )|
i=1

6. Em três dimensões e em coordenadas cartesianas temos


δ(~r − ~a) = δ(x1 − a1 ) δ(x2 − a2 ) δ(x3 − a3 ).

Introduziremos aqui uma formula importante obtida da identidade


1 ω ∓ iε ω iε
= 2 = 2 ∓ . (3.9)
ω ± iε ω + ε2 ω + ε2 ω 2 + ε2
O segundo termo nos leva a função delta, segunda equação do item 1
acima, e o primeiro termo do lado direito tende a ω1 quando ε → 0,
exceto se ω = 0. Se f (ω) é uma função bem conhecida, teremos
Z +∞
ω
lim f (ω) 2 dω
ε→0 −∞ ω + ε2
Z −ε Z +∞ Z +ε
dω dω ωdω
= lim f (ω) + lim f (ω) + lim f (ω) 2
ε→0 −∞ ω ε→0 +ε ω ε→0 −ε ω + ε2
Z +∞ Z +ε
dω ωdω
=P f (ω) + f (0) lim f (ω) 2
−∞ ω ε→0 −ε ω + ε2
onde P denota o valor principal de Cauchy 1 , e última integral é
nula. Se temos uma função bem conhecida de ω, do limite de (3.9)
teremos
1 1
lim = P ∓ i πδ(ω) . (3.10)
ε→0 ω ± i ε ω
Em adição a função delta, é conveniente introduzir a função degrau
de Heaviside 2 definida por 3
Z x ½
0 0 0 se x < 0,
η(x) = δ(x ) dx = (3.11)
−∞ 1 se x > 0.
1
Augustin Louis Cauchy (1850–1925), matemático francês.
2
Oliver Heaviside (1850–1925), engenheiro, matemático e físico inglês.
3
Para um estudo do valor principal de Cauchy e da função de Heaviside, ver Whit-
taker and Watson, A course in modern analysis, (1950).

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3.2. Analogia entre a Quântica e a Óptica 85

Para ε > 0 teremos


Z +∞
1
= e−(i ω+ε)x η(x) dx (3.12)
iω + ε −∞

e Z +∞
1 1 ei ωx
η(x) = + P dω . (3.13)
2 2π i −∞ ω

3.2 Analogia entre a Quântica e a Óptica


As equações de Maxwell 4 para os campos eletromagnéticos ~E, D ~ e ~B,
em um meio dielétrico linear e isotrópico, na ausência de cargas, podem
ser escritas como
~ D
∇ ~ =0 (3.14a)
~  ~B = 0
∇ (3.14b)
~
~ × ~E = − 1 ∂ B
∇ (3.14c)
c ∂t
1 ∂ ~
D
~ × ~B =
∇ , (3.14d)
c ∂t
onde D~ = ²~E, e ² é a permissividade elétrica do meio.
Em um meio homogêneo, onde a susceptibilidade não depende da
posição ∇~ D
~ = ²∇ ~  ~E = 0 ⇒ ∇ ~  ~E = 0 e as equações de Maxwell
serão as mesmas que descrevem a propagação de campos eletromag-
néticos no vácuo, com velocidade v = √c² . Mas sabemos do eletromag-

netismo clássico que o índice de refração n = ².
Em um meio não homogêneo, onde a permissividade varia suave-
mente com a posição em relação as variações dos campos, podemos
~ D
p ' ²∇  E = 0 ⇒ ∇  E = 0, teremos que o índice de
considerar ∇ ~ ~ ~ ~ ~
refração n = ²(r) dependente da posição.
Para os dois casos, a dependência espacial da equação de onda eletro-
magnética obedece à equação de Helmholtz 5 ,
· ³ ω ´2 ¸
∇2 + n2 (r) ψ(~r) = 0 , (3.15)
c
4
James Clark Maxwell (1831–1879), físico escocês.
5
Hermann Ludwig Ferdinand von Helmholtz (1821–1894), físico alemão.

Mecânica Quântica

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86 Cap. 3 Aplicações da Equação de Schrödinger

onde ψ(~r) representa qualquer componente dos campos.


De acordo com a mecânica quântica, a parte espacial da função de
onda associada a uma partícula de massa µ, em um campo conservativo
V (r) é dada pela equação de Schrödinger independente do tempo,
· ¸
~2 2
− ∇ + V (r) ψ(~r) = Eψ(~r) ,

ou · ¸
2 2µ
∇ + 2 (E − V (r)) ψ(~r) = 0 . (3.16)
~
Definindo o índice de refração quântico por
c p
n(r) = 2µ [E − V (r)] . (3.17)

as equações (3.15) e (3.16) tornam-se formalmente idênticas.
Portanto, podemos associar um problema de mecânica quântica a
um problema de óptica. Esse analogia mostra que, se na mecânica clás-
sica não podemos ter uma partícula com E < V , na mecânica quântica
é possível a partícula penetrar em uma região classicamente proibida 6 .

3.3 Potencial Degrau - Barreira de Potencial


Nesse caso a dependência de x do potencial se reduz a uma descon-
tinuidade finita em um determinado ponto, que pode ser tomado como
correspondente a x = 0, ver Fig. 3.1:
½
V0 > 0 para x ≥ 0
V (x) = V0 η(x) =
0 para x < 0

Caso 1 - E > V0 : Primeiramente, procuremos analisar o caso em


que a partícula de massa µ possui energia total E > V0 . Visto o potencial
ser independente do tempo, a equação de Schrödinger na região I, x < 0,
será
~2 d2
− ϕI (x) = EϕI (x) (3.18)
2µ dx2
6
Situação parecida em que classicamente temos a penetração de ondas eletromag-
néticas em um meio altamente dissipativo

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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3.3. Potencial Degrau - Barreira de Potencial 87

Figura 3.1: Potencial degrau de altura V0 em x = 0.

Nessa região,a energia da partícula e puramente cinética, pois V (x) = 0.


Assim,
d2 2µE
2
ϕI (x) = − 2 ϕI (x)
dx ~
p2 2µE
sendo E = 2µ e p = ~k. Introduzindo a quantidade kI2 = ~2
, teremos

d2
ϕI (x) = −kI2 ϕI (x)
dx2
cuja solução geral é

ϕI (x) = Aei kI x + Be− i kI x (3.19)

em que A e B são constantes arbitrárias.


Para a região II, x ≥ 0, a equação de Schrödinger será

d2 2µ(E − V0 )
2
ϕII (x) = − ϕII (x)
dx ~2
2 = 2µ(E−V0 )
definindo a quantidade kII ~2
, teremos

d2 2
ϕII (x) = −kII ϕII (x)
dx2
cuja solução geral é

ϕII (x) = Cei kII x + Be− i kII x (3.20)

Considerando a situação inicial de uma partícula de massa µ vindo da


esquerda, −∞, para a direita, temos D = 0, pois não há partículas

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88 Cap. 3 Aplicações da Equação de Schrödinger

vindo de +∞. A descontinuidade do potencial em x = 0 exige cuidados


d
adicionais, pois ϕ(x) e dx ϕ(x) devem ser finitas, continuas e unívocas
(ϕ(x) é uma função bem comportada). Como o potencial V (x) é finito
(embora descontínuo) nesse ponto, é preciso que a segunda derivada,
da equação de Schrödinger, esteja definida e seja também finita em
x = 0. Isso só será possível aplicando e satisfazendo as condições de
continuidade de ϕ e sua derivada em x = 0, tais que:

ϕI (x = 0) = ϕII (x = 0)
A + B = C, (3.21)

e
d d
ϕI (x = 0) = ϕII (x = 0)
dx dx
kI
i kI A − i kI B = i kII C ⇒ C = (A − B). (3.22)
kII
Das equações (3.21) e (3.22), podemos determinar a razão
B kI − kII
= , (3.23)
A kI + kII
substituindo em (3.21), temos
C 2kI
= . (3.24)
A kI + kII

A densidade de corrente de probabilidade ~J(~r, t) pode ser expressa


por
³ ´
~J(~r, t) = − ~ = ψ ∇ψ
~ ∗ . (3.25)
µ
e com o uso dessa equação, podemos determinar a densidade de corrente
de probabilidade para a onda incidente, para a onda refletida e para a
onda transmitida através da barreira. Para o caso em questão,
µ ¶
~ d ∗
J(x) = − = ϕ(x) ϕ (x) . (3.26)
µ dx
Assim, para a onda incidente, temos
~ h i ~k
I
Jinc (x) = − = Aei kI x (− i kI )A∗ e− i kI x = |A|2 . (3.27)
µ µ

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3.3. Potencial Degrau - Barreira de Potencial 89

Usando de forma similar para as ondas refletida e transmitida, termos

~kI
Jref (x) = − |B|2 , (3.28)
µ
e
~kII
Jtrs (x) = |C|2 . (3.29)
µ
Com esses resultados podemos calcular os coeficientes de reflexão e
de transmissão da partícula pelo potencial degrau (barreira de po-
tencial). Esses coeficientes são definidos por:
¯ ¯
¯ Jref (x) ¯
R=¯ ¯ ¯, (3.30)
Jinc (x) ¯
e ¯ ¯
¯ Jtrs (x) ¯
T = ¯¯ ¯. (3.31)
Jinc (x) ¯
Então, das equações (3.27), (2.28) e (2.29), teremos

(kI − kII )2
R= , (3.32)
(kI + kII )2
e
4kI kII
T = . (3.33)
(kI + kII )2
Note que R + T = 1. Os coeficientes de reflexão e transmissão podem
ainda ser escritos em termos de E e V0 :
q  2
V0
1− 1− E E
R=1−T = q  para >1
1+ 1− V0 V0
E

e
E
R = 1 − T = 1 para ≤ 1.
V0
Note também que a reflexão ocorre da mesma maneira quando a
partícula vem de uma região com potencial constante e "cai" numa
região de potencial menor (ou nulo). O fenômeno de reflexão descrito
acima é devido basicamente à passagem abrupta da partícula de um
potencial para outro. Este tipo de reflexão já era conhecido na óptica,

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90 Cap. 3 Aplicações da Equação de Schrödinger

quando a luz passa, perpendicularmente entre dois meios com diferentes


índices de refração.
Caso 2 - 0 < E < V0 : Consideremos agora o caso em que a energia
total tem um valor 0 < E < V0 . Do ponto de vista clássico não há
nenhuma possibilidade da partícula ser encontrada na região II, x > 0.
Na região I, x < 0, a solução da equação de onda não é alterada, logo

ϕI (x) = Aei kI x + Be− i kI x (3.34)


h i1
2µ 2
Entretanto, na região II, temos κ = ~ (V0 − E) . Assim, teremos
a seguinte equação diferencial

d2
ϕII (x) = κ2 ϕII (x) (3.35)
dx2
cuja solução é
ϕII (x) = Ce−κx + Deκx
Para que ϕII (x) seja uma função finita quando x → +∞, devemos ter
D = 0, e a equação acima será

ϕII (x) = Ce−κx . (3.36)

Utilizando as mesmas condições de contorno do caso anterior, encon-


traremos as razões:

A+B =C
i(A − B) = −κC

ou
B i kI + κ
= = ei α (α : real) (3.37a)
A i kI − κ
C 2kI
= = 1 + ei α . (3.37b)
A i kI − κ
Substituindo esses valores em (3.34) e (3.36), obteremos
α
³ α´
ϕI (x) = 2Aei 2 cos kI x − para x < 0 (3.38a)
³ ´ 2
α α −κx
ϕII (x) = 2Aei 2 cos e para x > 0 (3.38b)
2

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3.3. Potencial Degrau - Barreira de Potencial 91

Calculando os coeficientes de reflexão e de translação para esse caso,


encontraremos T = 0, uma vez que
· ¸
~ d
Jtrs (x) = − = ϕII (x) ϕ∗II (x) = 0
µ dx

pois nesse caso, ϕII (x) é uma função real. O coeficiente de reflexão R
será
¯ ¯ ¯ ¯
¯ Jref ¯ ¯ B ¯2
R=¯ ¯ ¯=¯ ¯ =1
Jinc ¯ ¯ A ¯
Um resultado que concorda com o caso clássico de uma partícula ser
totalmente refletida pela barreira de potencial.
Para x > 0, a probabilidade decresce de acordo com e−2κx . Nesta
região, temos E < V0 e portanto a energia cinética seria negativa. Clas-
sicamente esta é uma região proibida para as partículas. Do ponto de
vista quântico, pode-se encontrar a partícula nessa região, porém esta
não poderá permanecer nessa região pelo fato de que o coeficiente de
transmissão ser nulo e o coeficiente de reflexão ser igual a unidade. A
penetração da partícula na região proibida (por intervalos de tempo
muito pequenos) é possível devido o princípio da incerteza. Durante
um pequeno intervalo de tempo, a energia pode não se conservar. A
profundidade da penetração também é muito pequena e pode ser carac-
terizada pela distância em que a probabilidade cai para cerca da metade
de seu valor em x = 0, correspondendo a uma penetração estimada pelo
princípio da incerteza ∆x∆p > ~, isso implica que a penetração é da
ordem de
1 ~
∆x ' = p .
κ 2µ(V0 − E)

Como R = 1, a amplitude de onda refletida difere da amplitude de


onda incidente por uma fase, que é explicitada em (3.37a),

i kI + κ
= ei α .
i kI − κ

O fato de que a defasagem da onda refletida com relação à onda inci-


dente ser uma função de kI (ou, equivalentemente, da energia E) tem
conseqüências físicas importantes que pode ser identificadas constru-
indo um pacote de onda com evolução temporal que irá mostrar um

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92 Cap. 3 Aplicações da Equação de Schrödinger

atraso ou um adiantamento do pacote refletido, com relação ao tempo


livre de trânsito de ida e volta à origem 7 .
Caso especial - E < 0: Não há soluções fisicamente aceitáveis para
esse caso, devido o fato de que a energia total E nunca poderá ser menor
que o valor mínimo absoluto de V (x).

3.4 Barreira de Potencial Retangular


Esse é um dos problemas simples para o qual podemos resolver analitica-
mente e cuja solução traz em evidência fenômenos muito interessantes,
com aplicações em muitos problemas físicos, como o tunelamento
quântico, também conhecido como penetração de barreira (efeito túnel ).
Vamos considerar uma partícula, vindo de x = −∞ em direção à bar-
reira de potencial vista na Fig. 3.2, definida por:
½
V0 > 0 para |x| ≤ a
V (x) = V0 η(a − |x|) =
0 para |x| > a

Figura 3.2: Barreira de potencial regular de altura V0 e largura 2a.

Caso 1 - E < V0 : Vamos iniciar procurando seus estados esta-


cionários. Para especificar mais o problema, digamos que a partícula
7
Uma excelente discussão desse aspecto, tratando detalhadamente de todos os cál-
culos envolvidos, podemos encontrar no magnífico livro: Toledo Piza, Mecânica
quântica, (2002).

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3.4. Barreira de Potencial Retangular 93

incide sobre a barreira vindo da esquerda (−∞). No regime estacionário


esperamos ter, como no caso clássico, ondas incidentes e ondas refleti-
das, à esquerda da barreira. Mas, a principal diferença introduzida pela
mecânica quântica nesse problema, pode haver ondas saindo da bar-
reira, no lado direito, indo para +∞. O que caracteriza o problema
estacionário como advindo de uma partícula incidente da esquerda para
a direita é que, do lado direito da barreira, existem apenas partículas
afastando-se da barreira. Note que a partícula é livre para x < −a e
x > a. Por essa razão, a barreira de potencial retangular simula, de
forma esquemática, o espalhamento de uma partícula livre sofrendo a
influência desse potencial.
A solução geral da equação de Schrödinger nesse caso:

 Aei kx + Be− i kx x < −a
ϕ(x) = Ce −κx + De κx −a ≤ x ≤ a (3.39)

F ei kx + Ge− i kx x>a
√ p
onde os números de onda são k = ~1 2µE e κ = ~1 2µ(V0 − E). As
condições de contorno de ϕ(x) e sua derivada em x = −a requer
Ae− i ka + Bei ka = Ceκa + De−κa (3.40a)
³ ´ ¡ ¢
i k Ae− i ka − Bei ka = −κ Ceκa − De−κa . (3.40b)

Essas relações lineares homogêneas entre os coeficientes A, B, C e D


são convenientemente representadas em termos de matrizes:
µ − i ka ¶ µ ¶ µ κa ¶µ ¶
e ei ka A e e−κa C
− i ka i ka = i κ κa i κ −κa (3.41)
e −e B k e −ke D
mas µ ¶ µ ¶
A C
= M(a)
B D
onde M(a) é dado por
¡ iκ
¢ ¡ iκ
¢ 
1+ eκa+i ka 1− e−κa+i ka
1 k k

M(a) = (3.42)
2 ¡ iκ
¢ ¡ iκ
¢
1− k eκa−i ka 1+ k e−κa−i ka
Similarmente, para as condições de contorno de ϕ(x) e sua derivada em
x = a, teremos µ ¶ µ ¶
F C
= M(−a)
G D

Mecânica Quântica

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94 Cap. 3 Aplicações da Equação de Schrödinger

e combinando para obtermos a relação entre a função de onda dos dois


lados da barreira
µ ¶ µ ¶
F −1 A
= M(a)M (−a)
G B
onde M−1 (−a) é dado por
¡ ¢ ¡ ¢ 
1 − iκk eκa+i ka 1 + iκk eκa−i ka
1
M−1 (−a) = ¡ ¢ −κa+i ka ¡ ¢ −κa−i ka
 (3.43)
2 ik ik
1+ κ e 1− κ e
e finalmente µ ¶ µ ¶
A F
=M
B G
podendo escrever M = M−1 (a)M(−a) como
¡ ¢ iη 
cosh 2κa + i2ε senh 2κa e2 i ka 2 senh 2κa
M= 
iη ¡ iε
¢ −2 i ka
− 2 senh 2κa cosh 2κa − 2 senh 2κa e
(3.44)
κ k κ k
onde as notações abreviadas usadas são ε = k − κ e η = k + κ .
Considerando uma onda incidente da esquerda (−∞) para a direita
(+∞), a amplitude da onda incidente é dada por A, já a amplitude da
onda refletida é dada por B, o fluxo transmitido é dado por F e G = 0.
Então, de (3.44) teremos:
µ ¶

A = F  cosh 2κa + senh 2κa e2 i ka (3.45a)
2

B = −F  senh 2κa . (3.45b)
2
B
Assim, a amplitude A devida a reflexão, será
−iη −2 i ka
B 2 senh 2κa e
= (3.46)
A cosh 2κa + i2ε senh 2κa
e o coeficiente de reflexão
¯ ¯2 ¯¯ − i η ¯
−2 i ka ¯2
¯B ¯ ¯ senh 2κa e ¯
R = ¯¯ ¯¯ = ¯ 2
¯
A ¯ cosh 2κa + i2ε senh 2κa ¯
η2
4 senh2 2κa
= ε2
(3.47)
cosh2 2κa + 4 senh2 2κa

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3.4. Barreira de Potencial Retangular 95

pelo fato de
µ ¶
2 ε2 2 ε2
cosh 2κa + senh 2κa = 1 + 1 + senh2 2κa
4 4

teremos
η2
senh2 2κa
R= ³4 ´ (3.48)
2
1 + 1 + ε4 senh2 2κa

F
E a amplitude de transmissão A é dado por

F e−2 i ka
= (3.49)
A cosh 2κa + i2ε senh 2κa

e o coeficiente de transmissão será


¯ ¯2 ¯¯ ¯2
¯
¯F ¯ ¯ e −2 i ka
¯
T = ¯¯ ¯¯ = ¯ i ε ¯
A ¯ cosh 2κa + 2 senh 2κa ¯
1
= ³ ´ (3.50)
ε2
1+ 1+ 4 senh2 2κa

Considerando o caso limite em em que a barreira é alta e larga, temos


κa À 1. Expandindo senh 2κa ≈ 12 e2κa À 1, encontraremos
µ ¶2
−4κa kκ
T ≈ 16e
k 2 + κ2
16(V0 − E)E − 4 √2µ(V0 −E)a
= e ~ (3.51)
V02

Então, para esse caso de barreira de potencial, o efeito túnel é suprimido


exponencialmente. Se a barreira for alta, porém estreita, ocorre o efeito
túnel. Note que o efeito de tunelamento quântico de uma partícula
através da barreira de potencial é bastante sensível a sua largura. Um
exemplo é o decaimento α de núcleos instáveis. De fato, em situações
reais, as barreiras de potencial em que ocorrem esses fenômenos físicos
não são quadradas e nem retangulares, e as expressões obtidas para o
coeficiente de transmissão são apenas aproximações.

Mecânica Quântica

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96 Cap. 3 Aplicações da Equação de Schrödinger

É interessante saber o que ocorre dentro da barreira de potencial


−a < x < a? Nessa região encontramos

µ ¶
1 ik
C=F 1− e(κ+i k)a (3.52a)
2 κ
µ ¶
1 ik
D=F 1+ e(−κ+i k)a . (3.52b)
2 κ

Considerando novamente o caso limite em em que a barreira é alta e


larga, i.e.κa À 1.
F ∝ e−2κa

C ∝ e−κa+i ka
D ∝ e−3κa+i ka
⇒ Ce−κx |x=a ∝ e−2κa ∝ Deκx |x=a .

Portanto, F consiste de duas partes, uma exponencialmente decrescente


Ce−κx e outra exponencialmente crescente Deκx , tal que as duas partes
se encontram em x = a, ver Fig. 3.3.

Figura 3.3: Função de onda na região −a < x < a.

Um caso interessante em que temos tunelamento é a barreira de


potencial contínua, como visto na Fig. 3.4. Então faremos uma aproxi-
mação de V (x) em pequenas barreira retangulares de largura dx, i.e.,

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3.4. Barreira de Potencial Retangular 97

substituímos a largura 2a por dx. Logo,


n
Y 2

T = e− ~ 2µ(V (xi )−E) dx

i=1
2 Pn √
= e− ~ i=1 2µ(V (xi )−E) dx
R √
− ~2 ab 2µ(V −E) dx
Ln→∞ ⇒ e (3.53)

Figura 3.4: Potencial contínua - gaussiana.

Aplicações importantes: Vários processos que ocorrem na na-


tureza dependem do fenômeno de tunelamento, tais como:

1. Um dos mais importantes é o da fusão de dois prótons no interior


do Sol, o mecanismo básico de produção de energia nesse tipo
de estrela. A energia cinética decorrente da temperatura do Sol é
insuficiente para vencer a barreira de repulsão coulombiana entre
dois prótons. Somente uma pequena fração dos prótons teriam
energia acima deste valor e a taxa de fusão e portanto de pro-
dução de energia, seria cerca de 1000 vezes menor que a realizada
pelo Sol. O processo de fusão de dois prótons é dominado pelo
tunelamento dessas partículas pela barreira coulombiana.

2. O diodo de efeito túnel é um dispositivo eletrônico disponível com-


ercialmente, baseado nesse efeito quântico. Com técnicas especiais
de construção, pode-se fazer um diodo semicondutor cuja barreira
de potencial é extremamente fina, propiciando que partículas a
atravessem por tunelamento. As conseqüências são uma inversão
na curva característica corrente × tensão desses dispositivos, como

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98 Cap. 3 Aplicações da Equação de Schrödinger

mostrado na Fig. 3.5. Numa pequena região, há uma reversão da


curva e neste trecho, a derivada dV
dI é negativa, correspondendo a
uma resistência negativa. Dispositivos como esse podem ser uti-
lizado em circuitos osciladores ou de chaveamento de altíssimas
freqüências.

Figura 3.5: Curva característica de um diodo túnel.

3. O decaimento radiativo por emissão de partículas alfa, que ocorre


em vários elementos pesados próximos ao urânio também depende
do tunelamento. Nesse decaimento, as partículas alfa α são emi-
tidas com energia cinética de cerca de 5 MeV. Como essa energia
é medida longe do núcleo, onde o potencial é nulo, podemos su-
por que esse é o valor da energia total da partícula alfa dentro do
núcleo. Se tomarmos uma partícula alfa com essa energia se aprox-
imando de um núcleo, por exemplo, o de Tório (Th), a distância
de maior aproximação, quando toda a energia está na forma de
energia potencial, será na ordem de 30 Fm (3, 0 × 10−14 m). Se
considerarmos o raio do núcleo de Th da ordem de 10 Fm, o valor
da barreira coulombiana nessa distância será:

Zze2
V (r)|r=10−14 = ' 30 × 106 eV
r
Como para distâncias menores que o raio nuclear esta partícula
alfa está ligada ao núcleo, e sabendo-se que sua energia total é 5
MeV, para escapar, ela deve sofrer o efeito túnel com a barreira de
altura máxima de 30 MeV. Embora não seja uma barreira de altura
constante como a que estudamos, o problema pode ser resolvido

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3.4. Barreira de Potencial Retangular 99

de maneira análoga, substituindo-se a barreira coulombiana por


uma série de barreiras de pequena largura e alturas decrescentes.
Um cálculo aproximado pode ser feito trocando-se a barreira orig-
inal por uma barreira média equivalente. Por simplicidade, vamos
tomar uma barreira de altura 30 MeV e largura de 10 Fm. Nesse
caso, temos o produto
q
E
2µc2 V0 a(1 − V0 )
κa = ' 20
~c

e podemos usar a expressão aproximada o coeficiente de transmis-


são T :
T ' 10−28 .

4. Um outro exemplo é o microscópio de varredura por tunelamento.


A relação para o coeficiente de transmissão de uma partícula de
massa µ e energia E através da barreira de potencial V0 e largura
2a, indica que a variação relativa da probabilidade de tunelamento
é dada por
¯ ¯
¯ ∆T ¯
¯ ¯
¯ T ¯ = 2κ∆a

A energia necessária para que o elétron no interior de um material


abandone-o através de sua superfície, função trabalho, é da ordem
de 10 eV. Uma vez que a energia cinética dos elétrons é bem menor
que esse valor, existe uma barreira de potencial na região da super-
fície do metal, tal que os elétrons mais energéticos só conseguem
escapar quando absorvem a energia de um fóton, como no efeito
fotoelétrico, ou calor, emissão termoiônica. O efeito túnel indica a
possibilidade de emissão de elétrons de um metal a outro através
da barreira de potencial estabelecida quando as duas superfícies
metálicas encontram-se suficientemente próximas. Esse fenômeno
é utilizado no microscópio de varredura por tunelamento, no qual
uma ponta de prova metálica se desloca bem próxima à superfí-
cie do material observado, de modo que as variações da corrente
estabelecida entre ambas, revelem as irregularidades da superfície
do material. Para uma barreira de altura com cerca de 5 eV mais
alta que a energia E de um elétron, o parâmetro de penetração
κ é da ordem de 1010 m−1 . Uma estimativa da sensibilidade do

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100 Cap. 3 Aplicações da Equação de Schrödinger

efeito túnel indica que mudanças da distância entre as duas su-


perfícies de apenas 10−2 Å acarretam uma variação de cerca de
2% na probabilidade de tunelamento.

Caso 2 - E > V0 : Nesse caso as funções de onda nas regiões x < −a


e x > a não mudam suas formas. No entanto, na região −a < x < a, a
função de onda passa a ser oscilatória, sendo representada por

ϕII (x) = Cei βx + De− i βx


p
onde β = ~1 2µ(E − V0 ). Assim, para encontrar o coeficiente de re-
flexão pela barreira de potencial, faremos a substituição de κ por i β.
Visto que senh (i x) = i sen x e cosh (i x) = cos x, o coeficiente de reflexão
R será:
(β 2 − k 2 )2 sen2 2βa
R= 2 2
4k β + (β 2 − k 2 )2 sen2 2βa
e o coeficiente de transmissão T será

4k 2 β 2
T =1−R= .
4k 2 β 2 + (β 2 − k 2 )2 sen2 2βa

3.5 Poço Quadrado Unidimensional


Uma partícula de massa µ se move sob a ação de um campo de forças
que confere à partícula uma energia potencial V (x) tal que
½
−V0 para |x| ≤ a
V (x) = −V0 η(a − |x|) = V0 > 0 real
0 para |x| > a

como descrito na Fig. 3.6, poço quadrado unidimensional.

Figura 3.6: Poço quadrado de potencial.

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3.5. Poço Quadrado Unidimensional 101

Caso 1 - −V0 < E < 0: Nesse caso, onde E < 0 é a energia total
da partícula, temos estados ligados. No caso clássico, a partícula não
pode atingir as regiões x < −a e x > a. De fato, sua energia total é
E = 12 µv 2 + V (x), ou seja, 12 µv 2 = E − V (x). Nas regiões mencionadas
temos V (x) = 0, o que daria 12 µv 2 = E. Mas E < 0, o que daria uma
energia cinética negativa, portanto impossível 8 .
Na região −a < x < a não há problema, pois teríamos
1 2
µv = E + v0
2
e é possível ter energia cinética positiva mesmo com E < 0.
A equação de Schrödinger para as regiões I e III, i.e.x < −a e
x > a respectivamente, é
~2 d2
− ϕ(x) = Eϕ(x)
2µ dx2
d2 2µE 2µ|E|
2
ϕ(x) = − 2 ϕ(x) = ϕ(x)
dx ~ ~2

1
p
fazendo κ = ~ 2µ|E| temos
d2
ϕ(x) = κ2 ϕ(x)
dx2
cuja solução geral é
ϕ(x) = A0 e−κx + Aeκx para x < −a . (3.54)
e
ϕ(x) = Ce−κx + C 0 eκx para x > a. (3.55)
Para x > a o termo em eκx é inadequado, pois daria uma probabilidade
de localização da partícula tendendo a infinito para x → ∞. Logo, temos
que tomar C 0 = 0. Assim,
ϕ(x) = Ce−κx para x > a. (3.56)
8
O leitor poderia se surpreender com a idéia de que uma partícula possa ter energia
negativa, mas essa é uma situação bastante comum. Considere a "partícula" Terra,
em seu movimento em redor da "partícula" Sol. A energia total da Terra é neg-
ativa! De fato, precisamos realizar trabalho para levá-la ao "infinito" (livrá-la da
ação do Sol) e deixá-la por lá, em repouso, i.e., com energia total zero. Logo,
fornecemos energia à Terra para levá-la a um estado de energia zero. Sua energia
inicial era, portanto, menor do que zero!

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102 Cap. 3 Aplicações da Equação de Schrödinger

Por raciocínio análogo,

ϕ(x) = Aeκx para x < −a . (3.57)

Nas soluções acima C e A são constantes arbitrárias, a determinar pos-


teriormente.
Na região II, i.e., −a < x < a e V (x) = −V0 , e a equação de
Schrödinger é
d2 2µ
2
ϕ(x) = (V0 − |E|) ϕ(x)
dx ~
p
fazendo q = ~1 2µ(V0 − |E|), a solução geral é

ϕ(x) = B sen qx + B 0 cos qx . (3.58)

Usando as condições de contorno para uma função bem comportada


em x = a, teremos

Ce−κa = B sen qa + B 0 cos qa (3.59a)


−κa 0
−κCe = qB cos qa − qB sen qa , (3.59b)

e em x = −a

Ae−κa = −B sen qa + B 0 cos qa (3.60a)


−κa 0
κAe = qB cos qa + qB sen qa . (3.60b)

Dividindo (3.59a) por (3.60a) temos:

C B sen qa + B 0 cos qa B tan qa + B 0 tB + B 0


= = = (3.61)
A −B sen qa + B 0 cos qa −B tan qa + B 0 −tB + B 0

onde t = tan qa. Dividindo (3.59b) por (3.60b) temos:

C qB cos qa − qB 0 sen qa
− = (3.62)
A qB cos qa + qB 0 sen qa
ou
C tB 0 − B
= . (3.63)
A tB 0 + B
Combinando (3.61) e (3.63), teremos

C tB + B 0 tB 0 − B
= 0
= . (3.64)
A −tB + B tB 0 + B

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3.5. Poço Quadrado Unidimensional 103

e teremos sem nenhuma dificuldade

(t2 + 1)BB 0 = 0 .

A última relação nos dá que temos ou B = 0 ou B 0 = 0. Para B = 0 as


funções são, na região −a < x < a, cossenos, ou seja, são funções pares
de x. Para B 0 = 0, são senos, ou seja, funções ímpares de x. Podemos
tratar os dois casos separadamente.
B 0 = 0 - funções ímpares.

 −Ceκx x < −a
ϕ(x) = B sen qx −a ≤ x ≤ a (3.65)

Ce−κx x>a

Note que A = C, pois ϕ(a) = −ϕ(−a), já que a função é ímpar.


Para x = a temos as relações:

B sen qa = Ce−κa
qB cos qa = −κCeκa .

É desnecessário fazer uso das relações em x = −a, porque, sendo uma


função ímpar, elas repetem as relações em x = a. Dividindo a relação
de cima pela de baixo, temos:
q
tan qa = − . (3.66)
κ
Essa equação irá determinar para que valores da energia existem esta-
dos estacionários nesse poço de potencial. Equações desse tipo, que
não são equações algébricas 9 , só em raros casos podem ser resolvidas
analiticamente. Esse não é, infelizmente, um desses raros casos. Recorre-
se então a soluções numéricas. Porém, para nossa sorte, nesse particular
caso, é possível usar um método gráfico que ilustra muito bem as car-
acterísticas gerais da solução.
Introduzindo as variáveis ξ = qa e η = κa, tais que

ξ 2 + η 2 = q 2 a2 + κ2 a2 = a2 (q 2 + κ2 )

ou

ξ 2 + η2 = V0 a2 . (3.67)
~2
9
Uma equação algébrica tem a forma de um polinômio igualado a zero.

Mecânica Quântica

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104 Cap. 3 Aplicações da Equação de Schrödinger

Assim, a equação (3.66) ficará


ξ
tan ξ = − . (3.68)
η
Mas

η2 = V0 a2 − ξ 2
~2
logo,
· ¸− 1
ξ 2µ 2 2
2
− = −ξ 2 V0 a − ξ
η ~
substituindo em (3.68)
· ¸− 1
2µ 2
tan ξ = −ξ 2 V0 a2 − ξ 2 . (3.69)
~
Cada solução dessa equação dá um valor de ξ, e, portanto, um valor de q,
ou seja, de |E|. Logo, essa é a equação para os autovalores de energia.
Para isso faremos os gráficos da função tan ξ e da função f (ξ) que está
no segundo membro de (3.69). Na intersecção das curvas teremos os
valores de ξ que são as soluções de (3.69).
Para fazermos a curva da função que está no segundo membro, va-
mos estudar um pouco suas propriedades. Analisando a função
· ¸− 1
2µ 2 £ ¤− 1
f (ξ) = −ξ 2 V0 a2 − ξ 2 = −ξ A2 − ξ 2 2
~
Sua derivada será
A2
f 0 (ξ) = − 3
(A2 − ξ 2 ) 2
e é sempre negativa, tornando-se −∞ para ξ = A, i.e.
r

ξ= V0 a
~2
A Fig. 3.7 contém as curvas y = tan ξ e y = f (ξ). As soluções da equação
· ¸− 1
2µ 2
tan ξ = −ξ 2 V0 a2 − ξ 2
~
são as intersecções
p dessas duas curvas, pontos 1 e 2 no gráfico. Como
ξ = qa e q = ~1 2µ(V0 − |E|), os valores de ξ que satisfazem a equação

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3.5. Poço Quadrado Unidimensional 105

Figura 3.7: Função y = tan ξ e função y = f (ξ), solução ímpar.

acima permitem calcular os valores de E correspondentes. Esses serão


os valores possíveis para a energia do sistema.
B = 0 - funções pares. Temos,

 Ceκx x < −a
ϕ(x) = B 0 cos qx −a ≤ x ≤ a (3.70)

Ae−κx x>a
Aplicando as condições de contorno em x = −a e x = a teremos

Ce−κa = B 0 cos qa (3.71a)


−κa 0
−κCe = −qB sen qa , (3.71b)

Ae−κa = B 0 cos qa (3.72a)


−κa 0
κAe = qB sen qa . (3.72b)

Comparando (3.71a) e (3.72a), temos A = C. Dividindo (3.72b) por


(3.72a) teremos
κ
= tan qa ,
q

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106 Cap. 3 Aplicações da Equação de Schrödinger

introduzindo as variáveis ξ = qa e η = κa
η
tan ξ =
ξ
com r
2µa2
η= V0 − ξ 2
~2
de maneira que a equação que determina os autovalores da energia é
dado por r
1 2µa2
tan ξ = V0 − ξ 2 . (3.73)
ξ ~2
Seja r
1 2µa2 2 =
1p
f (ξ) = V0 − ξ A − ξ2
ξ ~2 ξ
novamente temos a solução gráfica, como mostra a Fig. 3.8

Figura 3.8: Função y = tan ξ e função y = f (ξ), solução par.

Interpretando, temos que ξ ≤ A (ξ > 0) e f (A) = 0 e ainda


lim f (ξ) = ∞
ξ→0
df 1 1p
= −p − 2 A − ξ2 < 0 para todo ξ.
dξ A − ξ2 ξ

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3.5. Poço Quadrado Unidimensional 107

A figura mostra algumas soluções da equação para os autovalores


da energia. Essas soluções são as intersecções entre a curva pontilhada
e o gráfico da tangente. Note-se que, por pequeno que seja A, sempre
haverá ao menos uma solução.
Podemos concluir então que o poço quadrado possui sempre soluções
de energia negativa. Os autovalores da energia de tais estados são dis-
cretos e em número finito. O menor valor, correspondente ao estado
fundamental, ocorre para um estado cuja função de onda é par.
Caso 2 - E > 0: Nesse caso, a solução geral da equação de Schrö-
dinger para as três regiões (I quando x < −a, II quando −a < x < a
e III quando x > a) será:

 Aei kx + Be− i kx x < −a
ϕ(x) = Cei κx + De− i κx −a ≤ x ≤ a (3.74)

F ei kx + Ge− i kx x>a

em que A, B, C, D, F e G são as novas constante arbitrárias


√ a serem
determinadas para esse caso, e onde definimos k = ~1 2µE e κ =
1
p
~ 2µ(E + V0 ). Uma partícula descrita por essas funções não é local-
izada, i.e., ela não está confinada em uma região do espaço, visto que,
para esse caso, ϕI (x) e ϕII (x) não se anulam quando x → ±∞.
A condição E > 0 forma um espectro contínuo de energia, ao con-
trário da condição E < 0. Se a partícula incide na barreira da esquerda
para a direita, i.e., caminhando na direção positiva do eixo x, temos
G = 0. Aplicando as condições de contorno quando x = −a e x = a,
encontraremos as relações:

Ae− i ka + Bei ka = Ce− i κa + Dei κa (3.75a)


− i ka i ka − i κa i κa
kAe − kBe = κCe − κDe , (3.75b)

Cei κa + De− i κa = F ei ka (3.76a)


κCei κa − κDe− i κa = kF ei ka . (3.76b)

Fazendo uma manipulação algébrica, é fácil verificar que o coeficiente


de transmissão T será expresso pela relação
¯ ¯2
¯F ¯ 16k 2 κ2
T = ¯¯ ¯¯ = (3.77)
A 16k 2 κ2 cos2 2κa + 4(k 2 + k 2 )2 sen2 2κa

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108 Cap. 3 Aplicações da Equação de Schrödinger

e coeficiente de reflexão R pode ser determinado por


4(k 2 − κ)2 sen2 2κa
R=1−T = . (3.78)
16k 2 κ2 + 4(k 2 − k 2 )2 sen2 2κa
A partícula sofre um espalhamento quando esse passar pela região de
influência do potencial.

3.6 Potencial Delta


Vamos considerar um potencial V (x) que é dado pela função delta
δ(x), e esse potencial é atrativo,
~2 λ
V (x) = − δ(x) . (3.79)

Mais uma vez vamos procurar auto-estados normalizáveis, os quais
obedecem a condição de contorno ϕ(x) → 0 para x → ±∞. A equação
de Schrödinger associada a esse problema é
~2 d2 ~2 λ
− ϕ(x) − δ(x) ϕ(x) = E ϕ(x) , (3.80)
2µ dx2 2µ
e para x 6= 0 toma a forma
~2 d2
− ϕ(x) = E ϕ(x) , (3.81)
2µ dx2
~2 k 2
já que a função delta anula-se nesta região. Para E = 2µ positivo, as
soluções da equação de Schrödinger
ϕ(x) = Aei kx + Be− i kx (3.82)
não são normalizáveis e portanto devem ser descartadas. Assim, iremos
2 2
então analisar o caso em que E = − ~2µκ negativo. Nesse caso a solução
geral de (3.81) é
½
Ae−κx + Ceκx x>0
ϕ(x) = (3.83)
Beκx + De−κx x<0
Aplicando a condição de contorno, temos que C = D = 0. Devemos
agora impor as duas soluções, a condição em x = 0. Uma vez que ϕ(x)
é contínua em x = 0 temos que
ϕ(0) = A = B .

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3.7. Potenciais Periódicos 109

A presença da função δ(x) no potencial em (3.80) manifesta-se no


fato de dϕ(x)
dx não ser contínua na origem. De fato, integrando essa
equação entre −² e ² temos que
µ ¶ µ ¶ Z ²
dϕ(x) dϕ(x) 2
− + λ ϕ(0) = κ ϕ(x) dx . (3.84)
dx ² dx −² −²

No limite ² → 0 temos que a última integral é nula, já que a função


ϕ(x) é contínua. Logo o salto da derivada em x = 0 é dado por
µ ¶ µ ¶
dϕ(x) dϕ(x)
− = −λ ϕ(0) , (3.85)
dx 0+ dx 0−

o que implica que κ = λ2 . Note que só existe solução para potenciais


atrativos (λ > 0) já que usamos explicitamente que κ > 0. Logo o único
autovalor discreto de (3.80) é

~2 λ2
E=− ,

e o correspondente auto-estado é
λ
ϕ(x) = Ae− 2 |x| .

3.7 Potenciais Periódicos


Um caso importante em mecânica quântica é o estudo de potenciais
periódicos devido a sua aplicação. Consideremos um modelo unidimen-
sional simples para um sólido, no qual os íons positivos encontram-se
fixos e igualmente espaçados enquanto os elétrons livres movem-se no
potencial V (x) gerado pelos íons positivos. Se a distância entre os íons
positivos for dada por a esse potencial satisfaz

V (x + a) = V (x) (3.86)

e a hamiltoniana do sistema é invariante pelo deslocamento a.


Discutindo o problema mais formalmente, vamos usar o operador
deslocamento,
Da ϕ(x) = ϕ(x + a)

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110 Cap. 3 Aplicações da Equação de Schrödinger

esse operador comuta com o operador hamiltoniano H do sistema. De


fato, para um estado arbitrário ϕ(x) temos que
µ 2 2 ¶
~ d
Da Hϕ(x) = Da − ϕ(x) + V (x)ϕ(x)
2µ dx2
~2 d2
=− ϕ(x + a) + V (x + a)ϕ(x + a)
2µ dx2

mas por outro lado, temos


µ 2 2 ¶
~ d
HDa ϕ(x) = − + V (x) ϕ(x + a)
2µ dx2
~2 d2
=− ϕ(x + a) + V (x + a)ϕ(x + a)
2µ dx2

logo,
[Da , H] ϕ(x) = 0
como ϕ(x) é arbitrário podemos concluir que os operadores Da e H
comutam. É conveniente diagonalizar simultaneamente H e Da e os
auto-estados de H neste caso são chamados de estados de Bloch 10 .
A equação de autovalores para Da é dada por

Da ϕ(x) = ϕ(x + a) = λϕ(x) (3.87)

e o produto interno de Da ϕ(x) é dado por


Z Z

[Da ϕ(x)] Da ϕ(x) dx = ϕ ∗ (x + a) ϕ(x + a) dx
Z
2
= |λ| ϕ(x)∗ ϕ(x) dx .

Tendo em vista que as duas integrais da última expressão são iguais


segue que
|λ|2 = 1 .
Podemos então escrever λ = ei ka onde k é real.
Para encontrar a forma geral dos auto-estados de Da definamos

ϕk (x) = e− i kx ϕ(x) ,
10
Felix Bloch (1905–1983), engenheiro e físico suíço-americano.

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3.7. Potenciais Periódicos 111

o qual é uma função periódica de x já que

ϕk (x + a) = e− i k(x+a) ϕ(x + a) = e− i kx e− i ka ei ka ϕ(x) = ϕk (x)

onde usamos (3.87). Logo, os auto-estados de Da são da forma

ϕ(x) = ei kx ϕk (x)

onde ϕk (x) é uma função periódica. Esse resultado é conhecido como


teorema de Bloch 11 .
Cristais contém um número N ' 1023 átomos, mas não são infinitos.
Tendo em vista que as propriedades dos elétrons dependem pouco de
efeitos de superfície, i.e. das condições de contorno, vamos considerar
a condição de contorno periódica

ϕ(x = N a) = ϕ(x = 0) , (3.88)

a qual preserva as propriedades acima. Dada essa condição os autoval-


ores do operador deslocamento Da podem tomar apenas um número
finito de valores visto que

ϕ(x = N a) = ϕ(x = 0)
= Dna ϕ(x = 0) = ei N ka ϕ(x = 0) .

Logo,
2πj
k= para j = 0, ±1, ±2, · · · , ±(N − 1) . (3.89)
Na

Exemplo: potencial de Kronig–Penney 12 Um potencial per-


iódico de fácil solúvel é
X
V (x) = v0 δ(x − na) , (3.90)
n

onde somamos sobre todos os sítios da rede. Quando diagonalizamos


simultaneamente Da e H, precisamos resolver a equação diferencial as-
sociada a HϕE (x) = EϕE (x) apenas no intervalo 0 < x ≤ a uma vez
11
F. Bloch, Zeitschrift für Physik, 52, 555–600 (1928).
12
Ralph Kronig (1904–1995), físico germânico-americano.
William George Penney (1909–1991), físico inglês.
R. Kronig and W. G. Penney, Proceeding of Royal Society (London), A 130, 499
(1931).

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112 Cap. 3 Aplicações da Equação de Schrödinger

que a autofunção para outros valores de x pode ser obtida usando o


operador Da :
ϕ(x + ja) = Dja ϕ(x) = ei jka ϕ(x) . (3.91)
A equação diferencial associada a esse problema de autovalores no
intervalo 0 ≤ x < a é dada por

~2 d2
− ϕ(x) + v0 δ(x) ϕ(x) = E ϕ(x) . (3.92)
2µ dx2

No intervalo 0 < x < a o potencial é nulo, sendo a solução geral da


equação acima dada por

ϕ(x) = A sen qx + B cos qx , (3.93)



onde q = ~1 2µE. Analisando o caso em que E > 0, i.e., q é real, temos
pela condição de contorno em x = 0 (ϕ(x) contínua) e fazendo uso de
(3.91) a relação abaixo:

e− i ka [A sen qa + B cos qa] = B . (3.94)

Conforme vimos anteriormente, a derivada de ϕ(x) apresenta uma de-


scontinuidade na posição do delta de Dirac. O salto da derivada para
x = 0 é dado por (3.85), que conduz à relação

2µv0
qA − e− i ka q [A cos qa − B sen qa] = B. (3.95)
~2
A partir das duas últimas expressões podemos obter a equação que
determina q para um dado valor de k
µv0 a sen qa
cos ka = cos qa + . (3.96)
~2 qa

Comecemos analisando o caso em que a partícula está livre, i.e.,


v0 = 0. Para um valor fixo de k temos que
2πj
q=k+ com j = 0, ±1, ±2, · · ·
a
Quando consideramos todos os valores possíveis de k dados por (3.89)
segue que
2πn
q= com n = 0, ±1, ±2, · · ·
a

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3.7. Potenciais Periódicos 113

Figura 3.9: Gráfico de cos qa + 2 senqaqa como função de qa.

No caso geral v0 6= 0 os valores possíveis de q que satisfazem (3.96)


dependem da constante β = µv~20 a . Para ilustrar o comportamento do
lado direito da equação (3.96) com qa exibimos na Fig. 3.9 o gráfico da
função cos qa + 2 senqaqa , i.e., assumimos β = 2.
Hoje, físicos e engenheiros projetistas de dispositivos eletrônicos
e óticos têm usado a excepcional flexibilidade dos materiais semicon-
dutores para produzir uma grande variedade de estruturas, nas quais
poços, barreiras ou potenciais periódicos se aproximam bastante das
situações ideais, como as que estudamos até o momento. Um caso
comum é quando uma camada muito fina (' 5) nm de arseneto de
gálio (AsGa) pode ser depositado (epitaxialmente) sobre um substrato
de arseneto de alumínio e gálio (AsAlGa) para formar uma estrutura
chamada poço quântico. Nos poços quânticos, os portadores de carga
(elétron e buracos) não se movimentam com os três graus de liber-
dade usuais. Nessas estruturas, seu comportamento é unidimensional
na direção perpendicular aos planos das camadas formadas e bidimen-
sional nos planos dessas camadas. Quando as barreiras de potencial
formadas são bastante estreitas ou quando a energia dos portadores de
carga é comparável à energia de descontinuidade entre as camadas, as

Mecânica Quântica

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114 Cap. 3 Aplicações da Equação de Schrödinger

funções de ondas associadas a essas partículas são estendidas perpendic-


ularmente às camadas, modificando o comportamento dos portadoras
de carga, devido à periodicidade e ao caráter modulador de longo al-
cance que se superpõe ao potencial cristalina. Quando o número de
poços quânticos numa super-rede é muito grande, o problema pode ser
tratado, sob determinadas condições, como uma potencial periódico de
Kronig-Penney. Por exemplo, considerando a largura das camadas dos
dois semicondutores, AsGa e AsAlx Ga1−x , com aproximadamente 3
nm, o tratamento apresentado no modelo Kronig-Penney pode ser us-
ado para determinar as bandas de energia de elétrons confinados nessas
estruturas quânticas 13 .

3.8 Oscilador Harmônico Linear


O oscilador harmônico constitui um dos problemas mais importantes na
física moderna. O oscilador harmônico tem grande importância na física,
pois muitos problemas de sistemas ligados em equilíbrio, como molécu-
las, átomos ou moléculas em uma rede cristalina, e mesmo partículas
no núcleo atômico, podem, para pequenos deslocamentos da posição de
equilíbrio (pequenas energias de excitação) ser descritos por um poten-
cial do tipo:
s
1 2 1 2 2 k
V (x) = kx = µω x , ω= . (3.97)
2 2 µ

Os autovalores e as autofunções ou auto-estados estacionários de


energia do oscilador são soluções da equação de Schrödinger inde-
pendente do tempo

~2 d2 1
− 2
ϕ(x) + µω 2 x2 ϕ(x) = E ϕ(x) , (3.98)
2µ dx 2

uma importante propriedade dessa equação é o fato de que o potencial


é uma função par. Assim podemos dizer que o potencial é simétrico
em relação a reflexões especulares, V (−x) = V (x). Se ϕ(x) é solução
da equação de Schrödinger, então ϕ(−x) também o é. A equação de
13
D. S. Chemia, Physics Today, 57, May (1985); L. Esaki and R. Tsu, IBM Research
Center Note, March (1969); F. A. P. Osório, M. H. Degani and O. Hipólito, Phys-
ical Review, B37, 1402 (1988).

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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3.8. Oscilador Harmônico Linear 115

Schrödinger, devido a condição de simetria do potencial (função par),


é invariante sob a reflexão. A densidade de probabilidade para as
posições da partícula, em um estado estacionário, apresenta a mesma
simetria ρ(x) = ρ(−x) ⇒ |ϕ(−x)|2 = |ϕ(x)|2 e, portanto
½
ϕ(−x) = ϕ(x) par
ϕ(−x) = −ϕ(x) impar
ou seja, os auto-estados estacionários possuem paridades par e ímpar.
A equação (3.98) pode ser transformada se substituirmos
r
µω
ξ= x
~
e
2E
γ= .

Logo
d2
ϕ(ξ) + (γ − ξ 2 ) ϕ(ξ) = 0 . (3.99)
dξ 2
Temos agora uma equação do tipo 14 . Impondo
R ∞ Sturm-Liouville
que ϕ(x) seja normalizável, i.e. que −∞ |ϕ|2 dx seja finita, implica que
ϕ(x) deve se anular para x → ±∞. Isso sugere que o parâmetro λ ficará
restrito a um certo conjunto de valores permissíveis. O comportamento
assintótico (ξ 2 À γ) das soluções dessa equação é governado por
d2
ϕ(ξ) − ξ 2 ϕ(ξ) ' 0 , (3.100)
dξ 2
cuja solução aproximada é
1 2
ϕ(ξ) ' e± 2 ξ .
Para levar em conta este comportamento e a condição de contorno,
bem como simplificar os cálculos posteriores, escrevemos que
1 2
ϕ(ξ) = e− 2 ξ h(ξ) . (3.101)
Substituindo esta expressão na (3.99) teremos a equação diferencial
d2 d
2
h(ξ) − 2ξ h(ξ) + (λ − 1) h(ξ) = 0 , (3.102)
dξ dξ
14
Jacques Charles François Sturm (1803–1855), matemático franco-suíço.
Joseph Liouville (1809–1882), matemático francês.

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116 Cap. 3 Aplicações da Equação de Schrödinger

conhecida como equação diferencial de Hermite 15 . Uma vez que


ϕ(ξ) → 0 para ξ → ±∞, escolheremos h(ξ) e λ tais que essas condições
sejam satisfeitas. Neste ponto aplicaremos o método de Frobenius 16
para resolver a equação diferencial (3.102), o que é feito expandindo
h(ξ) em série de Taylor,

X
h(ξ) = aj ξ j , (3.103)
j=0

que substituindo na equação diferencial acima, teremos



X
{(j + 1)(j + 2)aj+2 − 2jaj + (λ − 1)aj } ξ j = 0
j=0

Dado que os coeficientes dos ξ j devem se anular, obteremos a seguinte


relação de recorrência
2j + 1 − λ
aj+2 = aj (3.104)
(j + 1)(j + 2)

O teste da razão
aj+2 2
lim = lim = 0
j→∞ aj j→∞ j

mostra que a série convergirá para todos os valores de ξ. Isso é natu-


ralmente esperado, pois todos os pontos do plano ξ finito são pontos
ordinários para a equação diferencial de Hermite.
Como era de se esperar, obtemos duas soluções linearmente inde-
pendentes:

1. Uma solução par (hP (ξ)) para a qual a0 6= 0 e a1 = 0. Note que


essa escolha e a relação de recorrência acima garantem que a série
contém apenas as potências pares de ξ.

hP (ξ) = a0 + a2 ξ 2 + a4 ξ 4 + · · ·

2. Uma solução ímpar (hI (ξ)) para a qual a0 = 0 e a1 6= 0.

hI (ξ) = a1 ξ + a3 ξ 3 + a5 ξ 5 + · · ·
15
Charles Hermite (1822–1901), matemático francês.
16
Ferdinand Georg Frobenius (1849–1917), matemático alemão.

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3.8. Oscilador Harmônico Linear 117

Com o intuito de determinar qual é a solução física, i.e. qual a


que satisfaz as condições de contorno, precisamos obter o comporta-
mento assintótico das soluções par e ímpar para ξ → ±∞. Isso é feito
analisando-se a série (3.103) para grandes valores de j. Nesse caso temos
que aj+2 ' 2j aj . É fácil demonstrar que esta relação de recorrência im-
2 2
plica que hP (ξ) ∼ ξ 2 eξ (hI (ξ) ∼ ξeξ ). Esse comportamento não á
aceitável já que ele conduz a funções de onda não normalizáveis. Logo,
para que tenhamos soluções normalizáveis, a serie deve terminar, i.e.,
λ deve ser tal que a partir de um certo ponto todos os aj são zero e a
série é na verdade um polinômio. Inspecionando (3.104) vemos que isto
ocorre para
λ = 2n + 1 , (3.105)
onde n = 0, 1, 2 · · · . Além disso, ainda a partir de (3.104), vemos que
para n par (ímpar) apenas a série para hP (ξ) (hI (ξ)) termina enquanto
que hI (ξ) (hP (ξ)) apresenta um comportamento indesejado para ξ →
±∞. Portanto, a autofunção é dada por hP (ξ) para n par e por hI (ξ)
para n ímpar.
Visando usar uma notação padrão para as soluções do problema,
adotaremos as seguintes convenções:

1. Para n par definimos o polinômio de Hermite Hn (ξ) = hP (ξ) com

n n!
a0 ≡ (−1) 2 ¡ n ¢
2 !

e
n n!
Hn (ξ) = (−1) 2 ¡ n ¢ hP (ξ)
2 !

2. Para n ímpar definimos o polinômio de Hermite Hn (ξ) = hI (ξ)


com a escolha
n−1 2(n)!
a1 ≡ (−1) 2 ¡ n−1 ¢
2 !
e
n−1 2(n)!
Hn (ξ) = (−1) 2 ¡ n−1 ¢ hI (ξ)
2 !

Note que Hn (ξ) é um polinômio de Hermite de ordem n. Aqui, listamos


os primeiros seis polinômios de Hermite, ver Fig. 3.10:

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118 Cap. 3 Aplicações da Equação de Schrödinger

Figura 3.10: Funções de Onda do Oscilador Harmônico.

H0 (ξ) = 1
H1 (ξ) = 2ξ
H2 (ξ) = −2 + 4ξ 2
H3 (ξ) = −12ξ + 8ξ 3
H4 (ξ) = 12 − 48ξ 2 16ξ 4
H5 (ξ) = 120ξ − 160ξ 3 + 32ξ 5 .

Esses polinômios satisfazem a equação diferencial


d2 d
2
Hn (ξ) − 2ξ Hn (ξ) + 2n Hn (ξ) = 0 , (3.106)
dξ dξ
Finalmente, temos que os autovalores da hamiltoniana do oscilador
harmônico são dados por
µ ¶
1
En = n + ~ω (3.107)
2
e as correspondentes autofunções são
1 2
ϕn (ξ) = e− 2 ξ Hn (ξ) . (3.108)

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3.8. Oscilador Harmônico Linear 119

No estudo das autofunções, se n é um inteiro são conhecidos os


polinômios de Hermite de grau n. As completas autofunções são dadas
na forma µr ¶
µω µω 2
ϕn (x) = cn Hn x e− 2~ x , (3.109)
~
onde cn é uma constante a ser determinada.
Se fizermos a derivada em ξ da (3.106) teremos
d
Hn (ξ) = 2n Hn−1 (ξ) . (3.110)

Uma particular representação dos polinômios de Hermite é obtido pela
função geratriz

X
2 Hn (ξ)
F (s, ξ) = e2ξs−s = sn . (3.111)
n!
n=0

Como conseqüência de (3.110), teremos


∂F
= 2sF
∂ξ
Essa equação pode ser integrada

F (s, ξ) = F (s, 0)e2sξ

O coeficiente F (s, 0) pode ser determinado de (3.111) e dos polinômios


par e ímpar:

X (−1)k 2k 2
F (s, 0) = s = e−s
k!
k=1

e então a função geratriz F (s, ξ) terá a forma


2 2 −(s−ξ)2
F (s, ξ) = e2ξs−s = eξ , (3.112)

então fica claro que


∂n ξ2 n ∂
n
2
n
F (s, ξ) = e (−1) n
e−(s−ξ)
∂s ∂ξ
No entanto, µ ¶
∂ n F (s, ξ)
= Hn (ξ)
∂sn s=0

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120 Cap. 3 Aplicações da Equação de Schrödinger

por conseguinte,
2 dn −ξ2
Hn (ξ) = (−1)n eξ e , (3.113)
dξ n
que é a fórmula de Rodrigues 17 para os polinômios de Hermite.
Podemos usar a formula de Rodrigues para calcular a normalização:
Z +∞ Z +∞
−ξ 2 2 dn 2
e [Hn (ξ)] dξ = Hn (ξ)(−1)n n e−ξ dξ
−∞ −∞ dξ
¯+∞
n d n−1 ¯
−ξ 2 ¯
= (−1) Hn (ξ) n−1 e ¯
dξ −∞
Z +∞
dH n (ξ) dn−1 −ξ2
+ (−1)n−1 e dξ
−∞ dξ dξ n−1

onde integramos por partes. O primeiro termo da integral se anula 18 .


Podemos usar a fórmula de diferenciação para substituir dHdξ n (ξ)
por
2nHn−1 (ξ) e repetir a integração por parte (n − 1) mais vezes, obtendo
Z +∞ Z +∞
−ξ 2 2 n 2 √
e [Hn (ξ)] dξ = 2 n! e−ξ dξ = 2n n! π . (3.114)
−∞ −∞

Essa relação pode ser entendida para uma relação geral de ortogonali-
dade Z +∞
2 √
e−ξ Hl (ξ)Hn (ξ) dξ = 2n n! π δln . (3.115)
−∞
Dessa maneira, as autofunções de energia normalizadas do oscilador
harmônico são dadas por
µ ¶1 ³ ´1
1 2 µω 4 − ξ2
ϕn (ξ) = n
e 2 Hn (ξ) , (3.116)
2 n! π~

ou em função de x
µ ¶1 ³ ´1 µr ¶
1 2 µω 4 − µω x µω
ϕn (x) = n
e 2~ Hn x . (3.117)
2 n! π~ ~

Finalmente vamos analisar o caso geral, o movimento da função de


onda (pacote de onda) dependente do tempo ψ(x, t) em que a condição
17
Benjamin Olinde Rodrigues (1795–1851), matemático Francês.
18 dn−1 −ξ2 2
Pois dξ n−1 e = −Hn−1 (ξ)e−ξ .

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3.8. Oscilador Harmônico Linear 121

inicial ψ(x, 0) é dada. A equação de Schrödinger dependente do tempo

∂ ~2 ∂ 2 µω 2 2
i~ ψ(x, t) = − ψ(x, t) + x ψ(x, t) (3.118)
∂t 2µ ∂x2 2

determina o desenvolvimento temporal da função de onda. Se ψ(x, 0) é


normalizável, podemos expandir como

X
ψ(x, 0) = cn ϕn (x) (3.119)
n=0

com os coeficientes da expansão dados por


Z +∞
cn = ϕ∗n (x)ψ(x, 0) dx (3.120)
−∞
¡ ¢
então, conhecendo a energia do oscilador harmônico, En = n + 21 ~ω,
podemos construir a função de onda dependente do tempo t usando
X i
ψ(x, t) = cn ϕn (x)e− ~ En t
n

que em nosso caso será



X
− i ωt
ψ(x, t) = e 2 cn ϕn (x)e− i nωt (3.121)
n=0

O centro de probabilidade do pacote de onda normalizado, i.e., o


valor esperado do operador posição x é
Z +∞
hxi = ψ ∗ (x, t)xψ(x, t) dx .
−∞

Logo,
∞ X
X ∞ Z +∞
hxi = c∗n ck e i(n−k)ωt
ϕ∗n (x) x ϕk (x) dx (3.122)
n=0 k=0 −∞

Note que o termo integral


Z +∞
xnk = ϕ∗n (x) x ϕk (x) dx
−∞

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122 Cap. 3 Aplicações da Equação de Schrödinger

formam as quantidades xnk dos elementos da matriz de x.


Assim, poderemos calcular os elementos da matriz de posição asso-
ciada ao operador x explicitamente

n+k 1 1
³ µω ´ 1
2
xnk = 2− 2 (n!)− 2 (k!)− 2

µr ¶ µr ¶
Z ∞
µω 2
− ~ x µω µω
× e Hn x x Hk x dx
−∞ ~ ~
s Z ∞
~ − n+k − 1
− 1
− 1 2
= 2 2 (n!) 2 (k!) 2 π 2 Hn (ξ)Hk (ξ)ξe−ξ dξ
µω −∞

Usando a função geratriz dos polinômios de Hermite, (3.111), e con-



siderando ∂s F (s, ξ), teremos a relação de recorrência

2ξHn (ξ) = 2nHn−1 (ξ) + Hn+1 (ξ) (n ≥ 1) ,

e naturalmente
Z ∞
2 √
Hn (ξ)Hk (ξ)ξe−ξ dξ = π2n−1 n! [δk,n−1 + 2(n + 1)δk,n+1 ]
−∞

Assim, s "r #
r
~ n n+1
xn,k = δk,n−1 + δk,n+1 (3.123)
µω 2 2
e usando a notação convencional de matriz
 √
√0 1 √0 0 
s
~ 
 1 0
√ 2 √0 
(x) =
2µω 
 0 2 √0 3  (3.124)
 0 0 3 0 
    
A maioria dos elementos dessa matriz são nulos, e temos uma matriz
real simétrica.

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Capítulo 4

Aproximação WKB

Nesse capítulo iremos apresentar um método de aproximação que pode


ser aplicado quando a energia potencial apresenta uma variação lenta
com a posição. Na mecânica quântica, esse método foi proposto por
G. Wentzel 1 , H. A. Kramers 2 e L. Brillouin 3 e é conhecido como aprox-
imação WKB 4 , ou aproximação WKBJ, devido à H. Jeffreys 5 . Ini-
cialmente faremos uma introdução da aproximação semiclássica e a
seguir o método de aproximação WKB, e aplicações para estados ligados
e transmissão através de uma barreira de potencial.

4.1 Aproximação Semiclássica


A discussão das propriedades gerais da dinâmica quântica de uma par-
tícula sujeita a um potencial externo, pode ser adaptada no sentido de
dar um esquema de aproximação semiclássica, ou de grandes números
quânticos, na qual o último termo da equação (2.16)

~ r, t)]2 √
∂S(~r, t) [∇S(~ ~2 ∇2 ρ
+ +V − √ =0 (4.1)
∂t 2µ 2µ ρ
1
Gregor Wentzel (1898–1978), físico teuto-suíço.
2
Hendrik Anthony Kramers (1894–1952), físico holandês.
3
Léon Nicolas Brillouin (1889–1969), físico francês.
4
G. Wentzel, Zeitschrift für Physik, 38, 518–529 (1926); H. A. Kramers, Zeitschrift
für Physik, 39, 828–840 (1926); L. Brillouin, Comptes Rendus de l’Academie des
Sciences, 183, 24–26 (1926).
5
Sir Harold Jeffreys (1891–1989), matemático, estatístico, geofísico e astrônomo
inglês.
H. Jeffreys, Proceedings of the London Mathematical Society, 23, 428–436 (1923).

123

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124 Cap. 4 Aproximação WKB

pode ser ignorado em relação aos demais termos, i.e., consideramos



~ = 0. Aqui, usaremos A(x) = ρ.
Vamos então ao problema unidimensional de um estado estacionário
de energia E cujo a hamiltoniana do sistema é dada por
p2
H= + V (x)

que tem como solução a função de onda do tipo
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ψ(x, t) = ϕ(x)e− ~ Et ≡ A(x)e ~ [S(x)−Et] (4.2)
onde as funções reais A(x) e S(x) correspondem ao módulo e à fase
de ϕ(x), respectivamente. Substituindo a equação acima na equação de
Schrödinger
∂ ~2 d2
i~ ψ(x, t) = − ψ(x, t) + V ψ(x, t) (4.3)
∂t 2µ dx2
teremos, nesse caso particular
µ ¶2
dS 1 d2 A(x)
= 2µ [E − V (x)] + ~2 (4.4)
dx A(x) dx2
Em procedimento análogo ao §2.2, porém levando em consideração so-
mente a parte imaginária, e tendo em conta que ∂A
∂t = 0, teremos

d2 S(x) dA(x) dS(x)


A(x) 2
+2 =0 (4.5)
dx dx dx
Faremos agora o estudo dinâmico dessas duas equações. A dinâmica
do sistema se dá no regime semiclássico, assim o último termo de (4.4)
é muito menor que o termo precedente, i.e.
1 d2 A(x)
~2 ¿ 2µ [E − V (x)]
A(x) dx2
ou seja
~2 1 d2 A(x)
¿1
2µ [E − V (x)] A(x) dx2
O primeiro fator dessa última relação é de fato o inverso do quadrado
do vetor de onda local,
µ ¶
1 λ(x) 2

k 2 (x) 2π

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4.1. Aproximação Semiclássica 125

de modo que a última condição implica comprimentos de onda locais


λ(x) pequenos ou A(x) de pequena curvatura, no sentido que

λ2 (x) d2 A(x)
¿ (2π)2
A(x) dx2

Nos pontos de inversão clássica xI , V (xI ) = E, essa condição é violada.


Mas numa região em que a condição esteja satisfeita é possível usar a
aproximação
dS p 2π~
' ± 2µ [E − V (x)] = ±
dx λ(x)
da qual resulta
Z x p Z x
dx0
S(x) ' S(x0 ) ± dx0 2µ [E − V (x)] = S(x0 ) ± 2π~
x0 x0 λ(x0 )

dS(x)
Da equação (4.5), parte imaginária, temos A(x) em termos de dx
como
µ ¶ 1
dS(x) − 2
A(x) = C
dx
onde C é uma constante relacionada com a normalização da função de
onda. Note que essa relação é exata. Usando a expressão aproximada
no regime semiclássico obtida para S(x) temos
r · Z x ¸
λ(x) i dx0
ψ(x, t) ' C+0 exp − Et + 2π i 0
2π ~ x0 λ(x )
r · Z x ¸
0 λ(x) i dx0
+ C− exp − Et − 2π i 0
(4.6)
2π ~ x0 λ(x )

onde a dependência com S(x0 ) foi incluída nas constantes C±0 . A de-
terminação dessas constantes depende das condições impostas sobre
ψ(x, t).
Dessa expressão podemos ver facilmente: tendo em vista que λ(x)
é inversamente proporcional à raiz quadrada da energia cinética local,
a densidade de probabilidade resulta ser inversamente proporcional a
velocidade local. Por outro lado, S(x) é a fase acumulada medindo dis-
tâncias em unidades de comprimento de onda local λ(x). Essa fase pode
ser vista como uma extensão da fase da função de onda de uma partícula

Mecânica Quântica

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126 Cap. 4 Aproximação WKB

livre e± i kx , levando em consideração que o vetor de onda k varia lenta-


mente com x, temos o equivalente à
Z x
kx → dx0 k(x0 )

A implicação dessa relação é a de que o efeito dominante do poten-


cial V (x) altere o momentum da partícula sem que ocorra termos on-
dulatórios, como reflexões, interferências entre outros. Nosso próximo
passo será estudar o método WKB propriamente dito, e suas aplicações.

4.2 A Aproximação de Wentzel, Kramers e


Brillouin
O ponto de partida para a obtenção da aproximação semiclássica (4.6)
acima foi a representação (4.2) de ψ(x, t) em termos das duas funções
A(x) e S(x), o que leva à substituição da equação de Schrödinger pelo
par de equações (4.4) e (4.5). No entanto, essas mesmas equações po-
dem ser obtidas através de um critério para a determinação de A(x) e
S(x) que não impõe a realidade dessas duas funções. O novo critério
pode ser motivado observando que a aproximação semiclássica para a
equação (4.4) resulta independente de ~, enquanto correções devidas ao
último termo são proporcionais a ~2 , pelo menos. Isso sugere substituir
a decomposição (4.2) por
i
ψ(x, t) = e ~ W (x,t) com W (x, t) = S(x, t) − i ~T (x, t) (4.7)
onde as funções S(x, t) e T (x, t) são definidas de tal forma que contêm
apenas as potências pares de ~. Isso corresponde à decomposição da
função W (x, t) em duas partes, que envolvem respectivamente potências
pares, S(x, t) e potências ímpares, i ~T (x, t), de ~. Em particular, não
há agora qualquer restrição de realidade sobre essas duas funções. Um
tratamento que se limite aos termos de ordem mais baixa em ~ deve
assim coincidir com o tratamento anterior, nas regiões em que ele seja
aplicável, com uma amplitude A(x, t) dada por
A(x, t) = eT (x,t) (4.8)
Para implementar esse esquema basta agora substituir o ansatz
(4.7) na equação de movimento
∂ψ(x, t) ~2 ∂ 2 ψ(x, t)
i~ =− + V (x)ψ(x, t)
∂t 2µ ∂x2

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4.2. A Aproximação de Wentzel, Kramers e Brillouin 127

e escrever as duas equações que resultam da separação de potências


pares e ímpares de ~. Esse último passo substitui a separação de termos
reais e imaginários discutidos anteriormente, e leva ao par de equações
µ ¶
~2 ∂ 2 A A ∂S 2 ∂S
− 2
+ + V (x)A + A =0 pares
2µ ∂x 2µ ∂x ∂t
(4.9)
1 ∂A ∂S A ∂ 2 S ∂A
+ + =0 ímpares
µ ∂x ∂x 2µ ∂x2 ∂t
onde a amplitude A(x, t) corresponde à expressão (4.8). A particulariza-
ção para um estado estacionário de energia E corresponde tomar S(x, t)
e A(x, t) como sendo da forma
S(x, t) → −Et + SE (x) e A(x, t) → AE (x)
onde SE (x) e AE (x) são independentes do tempo mas não mais neces-
sariamente reais. Nesse caso a função de onda tem a forma
i i i
ψ(x, t) → AE (x)e ~ SE (x) e− ~ Et ≡ ϕE (x)e− ~ Et
e as equações (4.9) serão
µ ¶
dSE (x) 2 1 d2 AE (x)
= 2µ [E − V (x)] + ~2 (4.10)
dx AE (x) dx2
e
d2 SE (x) dAE (x) dSE (x)
AE (x)
2
+2 =0 (4.11)
dx dx dx
que são idênticas as equações (4.4) e (4.5), sem que exista uma condição
de realidade imposta sobre as funções SE (x) e AE (x). Essas duas equa-
ções são equivalentes á forma estacionária da equação de Schrödinger.
A solução para equação (4.11) tem a forma
µ ¶ 1
dSE (x) − 2
AE (x) = C
dx
que substituindo em (4.10) nos dá
 ³ ´2 ³ 3 ´
µ ¶2 d2 SE (x) d SE (x)
dSE (x) ~2  3 dx2 dx3 
= 2µ [E − V (x)] +  ³ ´2 − ³ dS (x) ´ 
dx 2 2 dSE (x) E
dx dx
(4.12)

Mecânica Quântica

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128 Cap. 4 Aproximação WKB

que também é uma equação exata.


Soluções aproximadas serão obtidas através da expansão semiclás-
sica, que exprime SE (x) como uma série de potências em ~2

SE (x) = S0 (x) + ~2 S2 (x) + ~4 S4(x) + · · ·

e a aproximação de ordem mais baixa nos dará


µ ¶
dS0 (x) 2
= 2µ[E − V (x)] .
dx
No entanto, agora não existe uma condição de realidade imposta sobre
S0 (x) e portanto, embora essa aproximação sendo inválida nas vizin-
hanças de pontos de inversão do movimento clássico, ela poderá ser
utilizada em regiões classicamente proibidas, nas quais E < V (x). Ex-
istem portanto duas situações distintas a considerar:
Situação em que E > V (x): Nesse caso temos,
Z x p
(>) (>)
S0 (x) = S0 (x0 ) ± dx0 2µ[E − V (x0 )]
x0
Z x
dx0
= S (>) (x0 ) ± 2π~ 0
x0 λ(x )

com a aproximação correspondente para a função de onda


r r
(>) (>) λ(x) 2π i Rxx λ(x
dx0
0 (>) λ(x) −2π i Rxx λ(x
dx0
0)
ϕE (x) ' C+ e 0 ) +C− e 0 . (4.13)
2π 2π
Situação em que E < V (x): Esses caso corresponde a regiões
classicamente proibidas e temos
Z x p
(<) (<)
S0 (x) = S0 (x0 ) ± i dx0 2µ[V (x0 ) − E]
x0
Z x
dx0
= S (<) (x0 ) ± 2π i ~ 0
x0 `(x )

onde
2π~
`(x) = p
2µ[V (x) − E]
com a aproximação correspondente para a função de onda
r r
(<) (<) `(x) 2π Rxx `(x
dx0
0 (<) `(x) −2π Rxx `(x
dx0
0)
ϕE (x) ' C+ e 0 ) + C
− e 0 . (4.14)
2π 2π

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4.2. A Aproximação de Wentzel, Kramers e Brillouin 129

As expressões (4.13) e (4.14) são as mais comumente usadas na


aproximação WKB. Correções da ordem ~2 podem ser obtidas direta-
mente da equação (4.12) e usando o resultado obtido para a aproximação
de ordem zero. A equação resultante para S2 (x) será
³ 2 ´2 ³ 3 ´
d S0 (x) d S0 (x)
dS2 (x) 3 dx2 1 dx3
= ³ ´3 − ³ ´
dx 8 dS0 (x) 4 dS0 (x) 2
dx dx

O segundo termo dessa equação pode ser calculado facilmente usando


(>) (<)
dS0 2π~ dS0 2π i ~
=± e =±
dx λ(x) dx `(x)
onde teremos
" µ ¶ #
(>)
dS2 1 d2 λ(x) 1 dλ(x) 2
=± −
dx 8π~ dx2 2λ(x) dx
e " µ ¶ #
(<)
dS2 i d2 `(x) 1 d`(x) 2
=∓ −
dx 8π~ dx2 2`(x) dx
ou ainda, fazendo uma integração em x
" Z µ ¶ #
1 dL(x) 1 x 0 1 dL(x0 ) 2
S2 (x) = ± − dx (4.15)
8π~ dx 2 L(x) dx0

onde ½
λ(x) para E > V (x)
L(x) =
− i `(x) para E < V (x)
As amplitudes corrigidas pelos efeitos de ordem ~2 , de fato, tem a forma
µ ¶− 1
dS0 (x) 2 dS2 (x)
2
AE (x) ' C +~
dx dx
µ ¶− 1 " µ ¶µ ¶ #
dS0 (x) 2 ~2 dS2 (x) dS0 (x) −1
'C 1−
dx 2 dx dx
" µ ¶µ ¶ #
~2 dS2 (x) dS0 (x) −1
= A0 (x) 1 − (4.16)
2 dx dx

Mecânica Quântica

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130 Cap. 4 Aproximação WKB

que representa na realidade quatro diferentes tipos de amplitude, cor-


respondentes
p respectivamente às soluções com cada um dos dois sinais
de ± |E − V (x)|, para os casos em que E > V (x) e E < V (x).
Condição de Validade da Aproximação WKB: Uma utilidade
imediata das expressões (4.15) e (4.16) para as correções de ordem ~2 é
o estabelecimento de critérios de validade para a aproximação WKB de
ordem mais baixa. De fato, a validade da aproximação de ordem zero
i
ϕE (x) ' A0 (x) e ~ S0 (x)

depende de estarem satisfeitas as condições

|~S2 (x)| ¿ 1

e ¯ µ ¯
¯ ~2 dS (x) ¶ µ dS (x) ¶−1 ¯
¯ 2 0 ¯
¯ ¯¿1
¯2 dx dx ¯

que mostram a irrelevância das correções de segunda ordem respectiva-


mente para o fator exponencial e para a amplitude da função de onda
aproximada.
Olhando a expressão (4.15) para S2 (x), é claro que a primeira dessas
duas condições estará satisfeita sempre que o módulo da derivada dL(x)
dx
for suficientemente pequeno em toda a região que esteja sendo consider-
ada, em função da variável x. Esse critério pode ser expresso em termos
do potencial V (x) e da energia E do estado estacionário como
¯ ¯ ¯ ¯
¯ ¯ ¯ ¯ ¯ dV (x) ¯
¯ dL(x) ¯ 2πµ~ ¯ dVdx(x) ¯ 1 ¯L(x) dx ¯
¯ ¯
¯ dx ¯ ¿ 1 → 3 =
2 |E − V (x)|
¿1 (4.17)
|2µ[E − V (x)]| 2

mostrando mais uma vez o colapso da aproximação nas vizinhanças dos


pontos de inversão do movimento clássico. A segunda forma da relação
acima tem ainda uma interpretação clara: a estimativa linear para a
variação do potencial ao longo de um comprimento de onda local 6 deve
ser muito menor que a energia cinética local 7 .
6
Ou, no caso E < V (x), ao longo de uma distância igual ao módulo do comprimento
de onda local imaginário.
7
Ou que o seu módulo, no caso E < V (x) em que ela é negativa.

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4.3. Fórmulas de Conexão 131

A condição referente à amplitude também pode ser escrita em ter-


mos de L(x) usando as relações obtidas para dS dS2
dx e para dx . Disso
0

resulta a condição
¯ µ ¶ ¯
1 ¯¯ d2 L(x) 1 dL(x) 2 ¯¯
¯L(x) − ¯¿1
32π 2 ¯ dx2 2 dx ¯

que também envolve explicitamente a segunda derivada do compri-


mento de onda local 8 . Isso introduz a restrição adicional à expressa por
(4.17), a saber, que a variação em x de dL dx seja suficientemente suave.
Mesmo quando o valor absoluto dessa derivada seja pequeno em toda a
região examinada, variações descontínuas, ou quase descontínuas, dessa
2
derivada acarretam valores muito grandes de ddxL2 . As propriedades do
potencial V (x) que levam a situações desse tipo podem ser identificadas
calculando
¯ ³ ´2 ¯
¯ ¯ ¯ dV (x) ¯
¯ d2 L(x) ¯ ¯ 3 1
d2 V (x)
¯
¯L(x) ¯ = |L(x)| ¯
2 ¯ dx dx 2 ¯
¯ + ¯
dx2 ¯ ¯ 4 [E − V (x)]2 2 E − V (x) ¯
¯ ¯

que aponta como ingrediente perigoso uma descontinuidade ou quase


descontinuidade na derivada do potencial, i.e., uma força clássica de-
scontínua ou quase descontínua, o que faz com que a segunda derivada
assuma valores absolutos muito grandes.

4.3 Fórmulas de Conexão


A quebra da validade da aproximação WKB de ordem mais baixa em
determinados intervalos de x, nitidamente quando nas vizinhanças dos
pontos de inversão do movimento clássico, é uma limitação séria do
ponto de vista de suas aplicações. As dificuldades que ocorrem dev-
ido a isso podem ser contornadas através de um tratamento especial
da função de onda nos intervalos restritos. A idéia central consiste em
utilizar, em cada um desses intervalos, seja a solução exata, seja a aprox-
imação válida para a função de onda, e em seguida ligar continuamente
essa solução especial às dadas pela aproximação WKB nas fronteiras do
intervalo crítico considerado. Em vários casos de interesse o resultado
desse tipo de procedimento pode ser expresso sob a forma de prescrições
8
Real ou imaginário para E > V (x) ou E < V (x) respectivamente.

Mecânica Quântica

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132 Cap. 4 Aproximação WKB

que relacionam as funções de onda da aproximação WKB nos dois ex-


tremos do intervalo. Tais prescrições são conhecidas como fórmulas de
conexão.
Ponto de Inversão Linear: A situação perigosa, crítica, mais co-
mum é a que envolve um ponto de inversão linear, em que x0 é um
ponto de inversão do movimento clássico na qual o potencial V (x) será
bem aproximado por uma função linear em x, i.e.
¯
dV ¯¯
V (x) ' E + (x − x0 ) ≡ E − (x − x0 )F0
dx ¯x=x0

A Fig. 4.1 mostra o potencial V (x) com ponto de inversão linear no

Figura 4.1: Potencial V (x) com ponto de inversão linear no ponto x0 .

ponto x0 , com a região classicamente proibida à esquerda do ponto


de inversão. O intervalo sombreado que aparece na figura é a região
perigosa, onde a aproximação WKB deixa de ser válida. Assim a aprox-
imação WKB terá validade tanto na região classicamente permitida à
direita do intervalo sombreado como na região classicamente proibida
à esquerda do intervalo sombreado. A constante F0 que aparece na
equação acima é a força que age classicamente no ponto de inversão
x0 . Nesse caso, a equação de Schrödinger estacionária pode ser escrita

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4.3. Fórmulas de Conexão 133

nas vizinhanças de x = x0 como

d2 ϕE 2µF0
+ 2 (x − x0 )ϕE = 0
dx2 ~
³ ´1
2µF0 3
introduzindo a variável y = ~2
(x − x0 ) teremos

d2 ϕE
+ yϕE = 0 (4.18)
dy 2

onde ϕE é tratada como uma função de y. Essa equação pode ser re-
solvida exatamente. Antes de resolvermos a equação acima, veremos o
seguinte: as soluções da equação diferencial de Airy 9 dada por

d2 ψ
− yψ = 0
dy 2

podem ser expressas em termos das chamadas funções de Airy 10


Ai(y) e Bi(y). Assintoticamente, para valores grandes e positivo de
y, temos

1 1 1
Ai(y) ∼
= π − 2 y − 4 e−ζ
2
1 1

Bi(y) = π − 2 y − 4 eζ

onde
2 3
ζ = |y| 2
3
e para valores grandes e negativo de y, temos
1 1
³ π´
Ai(y) ∼= π − 2 |y|− 4 cos ζ −
1 1
³ 4 π´
Bi(y) ∼ − −
= −π 2 |y| 4 sen ζ −
4
Note que a equação (4.18) tem um sinal positivo quando comparado com
a equação diferencial de Airy, o que nos leva para argumentos negativos.
Quando temos argumentos negativos, as funções de Airy podem por ser
9
George Biddell Airy (1801–1892), matemático e astrônomo inglês.
10
Para um estudo das funções de Airy, ver Abramowitz and Stegun, Handbook of
mathematical functions, (1965).

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134 Cap. 4 Aproximação WKB

escritas em termos de funções de Bessel cilíndricas 11 de ordem ± 13 ,


J± 1
3

· ¸
1√ 2 3 2 3
Ai(−y) = y J 1 ( y 2 ) + J− 1 ( y 2 )
3 3 3 3 3
· ¸
1√ 2 3 2 3
Bi(−y) = y J− 1 ( y ) − J 1 ( y )
2 2
3 3 3 3 3

Desse modo, voltando ao nosso problema, a solução geral da equação


(4.18) pode ser escrita como
· ¸
√ 2 3 2 3
ϕE (y) = y c1 J 1 ( y 2 ) + c2 J− 1 ( y 2 ) (4.19)
3 3 3 3

As constantes arbitrárias c1 e c2 podem ser ajustadas de modo que a


solução satisfaça condições de contorno apropriadas.
Fórmulas de conexão apropriadas para esse caso podem ser obtidas
comparando essa solução com aquela obtida através da aproximação
WKB onde ambas sejam válidas. Por exemplo, os coeficientes c1 e c2 de
(4.19) podem ser escolhidos de forma que

c 1 2 3 7
ϕE (y → −∞) → (−y)− 4 e− 3 (−y) 2 + O(−y − 4 )
2
e µ ¶
− 14 2 3 π 7
ϕE (y → +∞) → cy sen y2 + + O(y − 4 )
3 4
onde c é um fator multiplicativo global, a ser determinado pela nor-
malização da função ϕE (y). Utilizando a aproximação linear para o
potencial,
µ ¶ 13
2π~ 2π~ ~2 1
λ(x) = p 'p = 2π y− 2
2µ[E − V (x)] 2µ(x − x0 )F0 2µF0

de modo que
Z x Z x−x0
dx 1 2 3
2π = dy y − 2 = y 2
x0 λ(x) 0 3
11
Friedrich Wilhelm Bessel (1784–1846), matemático e astrônomo alemão.

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4.3. Fórmulas de Conexão 135

e o termo dominante da expressão assintótica para y → +∞ se reduz


r µ Z x ¶
0 λ(x) dx π
ϕE (x À x0 ) → c sen 2π +
2π x0 λ(x) 4
³ ´− 1
~2 6
com = c c0 . Um procedimento análogo para a expressão ass-
2µF0
intótica quando y → −∞ nos dará
r
c0 `(x) 2π Rxx `(x)
dx
ϕE (x ¿ x0 ) → e 0
2 2π
Essa última expressão pode ser identificada com a solução (4.14) da
(<)
aproximação WKB, na região classicamente proibida 12 , para C− = 0
(<) 0
e C+ = c2 , ao passo que a expressão válida para x À x0 corresponde
(>) (>)
à particular escolha dos coeficientes C+ e C− da expressão WKB
(4.13), válida na região classicamente permitida,

(>) (>) c0
C+ = −C− =
2i
Desse modo, o prolongamento para a região classicamente permitida
da função de onda da aproximação WKB que envolve a exponencial
decrescente na região classicamente proibida (ou vice-versa) deve ser
feito segundo a prescrição

x ¿ x0 x À x0

região proibida região permitida


q Rx
0 dx0 ´ q ³ R
`(x) −2π x dx0
ϕE = c
2 2π e x `(x0 ) ↔ ϕE = c λ(x)
+ π4 2π sen 2π x0 λ(x0 )
(4.20)
que é uma das fórmulas de conexão relevantes para o caso de um ponto
de inversão linear como o representado na Fig. 4.1.
Como indicado na equação (4.14), a forma geral da aproximação
WKB para a função de onda na região classicamente proibida consiste
porém numa superposição de contribuições com dependências expo-
nenciais crescentes e decrescentes. Além da fórmula de conexão para a
12
R x dx
Note que a integral x0 `(x) é negativa nas condições representadas na Fig. 4.1, em
que o ponto x está à esquerda do ponto x0 .

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136 Cap. 4 Aproximação WKB

componente exponencial decrescente, é preciso estudar também o pro-


longamento para a região permitida da componente crescente. Ele pode
ser obtido repetindo o procedimento acima com uma escolha diferente
dos coeficientes c1 e c2 na equação (4.19), e leva a

x ¿ x0 x À x0

região proibida região permitida


q R dx0
q ³ R ´
2π xx0 x dx0
ϕE = c `(x)
2π e `(x0 ) ↔ ϕE = c λ(x)
2π cos 2π x0 λ(x0 ) + π4
(4.21)
Um ponto que deve ser observado com relação a esse procedimento
para obter as fórmulas de conexão é o de que as funções de onda na
aproximação WKB foram comparadas às formas assintóticas da solução
da equação de Airy (4.18), que envolve a aproximação linear para o
potencial nas vizinhanças do ponto de inversão. A implicação desse
fato é que a validade das fórmulas obtidas depende de que os parâmet-
ros do problema sejam tais que a aproximação WKB seja válida numa
região em que tanto a forma assintótica da solução para o potencial
linear quanto a própria forma linearizada do potencial sejam válidas.
Para que isso seja possível, é preciso que em regiões suficientemente
próximas do ponto de inversão os efeitos da curvatura do potencial se-
jam desprezíveis, os valores do argumento y se tornem suficientemente
grandes para permitir o uso das relações assintóticas e da aproximação
WKB, ver equação (4.17). Isso ocorrerá se λ(x) e `(x) se tornarem su-
ficientemente pequenos dentro da região em que a aproximação linear
para o potencial possa ser usada.
As conexões (4.20) e (4.21) são característica da inversão linear ap-
resentada na Fig. 4.1. No caso em que essa região esteja à direita do
ponto de inversão, como mostra a Fig. 4.2, temos F0 < 0, mas a mesma
equação (4.18) é obtida para a função de onda ϕE (x) quando consid-
³ ´1
erada função da nova variável y = − 2µ|F ~2
0| 3
(x − x0 ). Isso permite
adaptar facilmente os resultados (4.20) e (4.21) a essa nova situação.
Assim, as fórmulas de conexão nesse novo caso são simplesmente for-
mas refletidas especularmente no ponto de inversão x = x0 das soluções
do caso ilustrado na Fig. 4.1, Logo, as fórmulas de conexão desse novo

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4.4. Aplicação WKB para Barreira de Potencial 137

Figura 4.2: Região proibida à direita do ponto de inversão x0 .

caso, como ilustrado na Fig. 4.2, são dadas por

x ¿ x0 x À x0

região permitida região proibida


q ³ R ´ q Rx dx0
x dx0 −2π
ϕE = c λ(x)
2π sen 2π x 0 λ(x0 ) + π
4 ↔ ϕE = c
2
`(x)
2π e x0 `(x0 )

q ³ R ´ q R dx0
x dx0 2π xx
ϕE = c λ(x)
2π cos 2π x 0 λ(x0 ) + π
4 ↔ ϕE = c `(x)
2π e 0 `(x0 )

(4.22)

4.4 Aplicação WKB para Barreira de Potencial


Nessa seção faremos o estudo da aproximação semiclássica WKB para
uma barreira de potencial. O interesse desse problema remonta a um
trabalho clássico de 1928 de G. Gamow 13 , em que ele é relacionado com
a forte dependência das vidas médias observadas para o decaimento alfa
13
George Gamow (Georgiy Antonovich Gamov) (1904–1968), físico e cosmólogo
alemão.

Mecânica Quântica

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138 Cap. 4 Aproximação WKB

de núcleos radioativos com a energia das partículas alfa emitidas 14 .


O problema consiste, de uma forma geral, em obter uma aproxi-
mação para a função de onda no caso de um potencial como mostrado
na Fig. 4.3. Para uma partícula com energia E, note que esse potencial

Figura 4.3: Barreira de Potencial de forma arbitrária.

tem dois pontos de inversão clássicos em x = x1 e x = x2 . A região


I, x < x1 , e a região III, x > x2 são classicamente acessíveis para
a partícula. A região II, x1 < x < x2 , é classicamente proibida. As
fórmulas de conexão permitem determinar a aproximação WKB para a
função de onda na região II em termos da aproximação correspondente
na região I, e em seguida a aproximação WKB na região III em termos
da correspondente na região II. Isso permite relacionar as aproximações
WKB para as funções de onda nas regiões classicamente permitidas I
e III, e com isso estimar a probabilidade de tunelamento através da
região classicamente proibida II.
De um feixe de partículas com energia E, incidente pela direita sobre
a barreira de potencial, ver Fig. 4.3, algumas são refletidas no ponto
de retorno clássico x = x2 , outras atravessam a região II e podem
eventualmente alcançar a região I, através do efeito túnel.
Na região I, a função de onda é oscilatória e a solução WKB pode
14
G. Gamow, Zeitscrift für Physik, 51, 204 (1928).

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4.4. Aplicação WKB para Barreira de Potencial 139

ser convenientemente colocada na forma, quando x ¿ x1


r h R i
λ(x) i dx0
2π xx + π4
ϕIE (x) =c e 1 λ(x0 ) ,

onde c é uma amplitude arbitrária e a fase π4 foi introduzida explicita-


mente para conveniência posterior, no uso das fórmulas de conexão. A
condição x ¿ x1 é para excluir devidamente intervalo perigoso em torno
do ponto de inversão linear x1 . Escrevendo a exponencial em termos de
seno e cosseno, e usando as fórmulas de conexão (4.22), resulta que a
aproximação WKB para a função de onda na região II, x1 ¿ x ¿ x2
será dada por
r · ¸
`(x) 2π Rxx `(x
dx0 i −2π Rxx `(x
dx0
ϕII
E (x) =c e 1 0 ) + e 1 0 )
2π 2
r · ¸
`(x) 2π Rxx2 `(x
dx0
0)
R
2π x dx
0
i −2π Rxx2 dx0
−2π
Rx dx0
=c e 1 e x2 `(x0 ) + e 1 `(x0 ) e x2 `(x0 )
2π 2

A primeira forma da expressão acima resulta diretamente das fórmulas


de conexão (4.22). Em seguida fizemos uma transformação para conter
a dependência com o segundo ponto de inversão x2 , o que faz com que
as amplitudes apareçam multiplicadas por exponenciais das integrais
sob a barreira
Rx 0
± 2 dx
x1 `(x0 )
I± ≡ e

Para a região III podemos usar as fórmulas de conexão (4.20) e (4.21).


Assim a aproximação WKB para a função de onda sera dada por,
quando x À x2
r µ ¶ h R i
λ(x) I− dx0
III(−) − i 2π xx λ(x0 )
+ π4
ϕE (x) = ic I+ + e 2
2π 4

que representa partículas incidindo pela direita sobre a barreira de po-


tencial, e ainda
r µ ¶ h Rx i
λ(x) I− dx0
III(+) i 2π x λ(x0 )
+ π4
ϕE (x) = ic −I+ + e 2
2π 4

que representa partículas refletidas pela barreira e se afastando da mesma.

Mecânica Quântica

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140 Cap. 4 Aproximação WKB

Uma amplitude de transmissão da barreira de potencial à energia E


pode então ser definida através da razão
¯ ¯ s s
¯ ϕI (x ) ¯ 1 λ(x ¿ x ) λ(xI ¿ x1 )
¯ E I ¯ I 1
TE ≡ ¯ III(−) ¯= = I−
¯ϕ (xIII ) ¯ I+ λ(xIII À x2 ) λ(xIII À x2 )
E

já que na aproximação WKB o expoente de I± é tipicamente muito


maior que a unidade, de modo que I+ = I1− À I− . Escolhendo xI e xIII
nas regiões assintóticas, i.e., quando VI e VIII tem valores constantes
nas regiões I e III, resulta que
µ ¶1
E − VIII 4
TE → I−
E − VI

Assim, a probabilidade de tunelamento será dada por


r
2 E − VIII 2
PE = |TE | = I
E − VI −
r
E − VIII −2 Rxx2 `(x
dx0
0)
= e 1 .
E − VI

Exemplos: O primeiro exemplo da aplicação da aproximação WKB


em barreira de potencial pode ser feita em um metal, onde elétrons fi-
cam ligados por um potencial que pode ser representado por um poço
quadrado de altura finita. No metal, os níveis de energia ficam preenchi-
dos por elétrons até o nível de Fermi EF 15 . A diferença entre o nível
de Fermi e o topo do poço de potencial V0 é a função trabalho W do
metal. Um meio de retirar os elétrons da superfície do metal é aplicar
um campo elétrico ~E que altera a função potencial na forma −eEx.
Esse processo é conhecido como emissão a frio de elétrons pelos metais
e o coeficiente de transmissão por ser expresso por
à 1 3
!
4 (2µ) 2 W 2
T = exp − .
3 ~eE

O segundo exemplo da aplicação da aproximação WKB em bar-


reira de potencial é tunelamento em física nuclear onde explicamos o
efeito túnel de uma partícula-α através de uma barreira de potencial

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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4.5. Aplicação WKB para Estados Ligados 141

Figura 4.4: Barreira de potencial para o decaimento α.

coulombiana 16 , conforme mostra a Fig. 4.4. O coeficiente de transmis-


são, para esse caso será, dado por
µ ¶
2π Z1 Z2 e2
T = exp −
~v
q
2E
onde v = µ é a velocidade clássica da partícula. Esse coeficiente
também é chamado de fator de Gamow. Esse fator é decisivo na
descrição da emissão de partículas-α por alguns átomos pesados.

4.5 Aplicação WKB para Estados Ligados


Esse problema consiste, de uma forma geral, em obter uma aproxi-
mação para a função de onda no caso de um poço de potencial como
mostrado na Fig. 4.5, que tende ao infinito para grandes valores de x,
tanto positivo quanto negativo. Para uma partícula com energia E,
como mostrada nessa figura, existem dois pontos de inversão lineares,
indicados por x1 e x2 . As regiões I e III são classicamente proibidas
para a partícula e a região II é classicamente permitida. A solução
15
Enrico Fermi (1901–1954), físico italiano.
16
Charles Augustin Coulomb (1736–1806), físico francês.

Mecânica Quântica

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142 Cap. 4 Aproximação WKB

Figura 4.5: Poço de Potencial de forma arbitrária.

procurada para o problema deve ser exponencialmente decrescente nas


regiões I e III e, como acontece na solução da equação de Schrödinger,
essa condição nos leva à obtenção de estados ligados.
Na região I, a função de onda será puramente decrescente no sentido
x ¿ x1 , podendo ser expressa por
r
I c `(x) 2π Rxx `(x
dx0
0)
ϕE (x) = e 1
2 2π
então, sendo x1 um ponto de inversão linear, a sua continuação na região
II, x1 ¿ x ¿ x2 , é dada pela fórmula de conexão (4.20) como
r µ Z x ¶
II λ(x) dx0 π
ϕE (x) = c sen 2π 0
+ (4.23)
2π x1 λ(x ) 4

Por outro lado, se a solução na região III é também decrescente, i.e.,


para x À x2 tem a forma
r
c0 `(x) −2π Rxx `(x
dx0
ϕIII
E (x) = e 2 0)
2 2π
sendo também x2 um ponto de inversão linear, a sua continuação para
a região permitida II, x1 ¿ x ¿ x2 , é dada pela primeira das fórmulas

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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4.5. Aplicação WKB para Estados Ligados 143

de conexão (4.22) como


r µ Z x2 ¶
λ(x) dx0 π
ϕII
E (x) =c 0
sen 2π + (4.24)
2π x λ(x0 ) 4

Para que exista um estado estacionário à energia E é preciso que as


expressões (4.23) e (4.24) coincidam. Portanto os valores de E para os
quais existem estados estacionários são tais que
r µ Z x2 ¶ r µ Z x ¶
0 λ(x) dx0 π λ(x) dx0 π
c sen 2π + =c sen 2π +
2π x λ(x0 ) 4 2π 0
x1 λ(x ) 4

ou seja
r · Z x2 ¸
0 λ(x) dx0 π
c sen 2π +
2π x λ(x0 ) 4
r · Z x2 µ Z x2 ¶¸
λ(x) dx0 π dx0 π
=c sen 2π 0
+ − 2π +
2π x1 λ(x ) 2 x λ(x0 ) 4

Essa condição estará satisfeita para valores de E tais que


µ Z x2 ¶
dx0 π
sen 2π 0
+ =0
x1 λ(x ) 2
e µ Z x2 ¶
c dx0 π
− 0 cos 2π 0
+ =1
c x1 λ(x ) 2
ou seja
Z x2 µ ¶
dx0 1 c
2π = n+ π e = (−1)n (4.25)
x1 λ(x0 ) 2 c0

com n ≥ 0, inteiro. Lembrando que


r
2π 2µ[E − V (x)] p(x)
= =
λ(x) ~2 ~

a primeira dessas duas condições pode ser expressa como


Z x2 µ ¶
0 0 1
p(x )dx = n + π~
x1 2

Mecânica Quântica

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144 Cap. 4 Aproximação WKB

ou ainda como I µ ¶
0 0 1
p(x )dx = n + h
2
onde a integração se estende sobre um período completo do movimento
clássico da partícula. Essa condição reproduz a condição de quantização
usada por Bohr na velha teoria quântica, ver (1.6), exceto pela presença
do fator h2 devido a energia de ponto zero. O inteiro n pode ser inter-
pretado como o número de zeros da função de onda, e a fase (−1)n em
(4.25) tem em conta o fato de que as caudas decrescentes da função de
onda nas regiões classicamente proibidas têm fases opostas quando se
ligam a soluções oscilatórias com um número ímpar de zeros na região
classicamente permitida, ver Fig. 4.6, onde mostra o comportamento

Figura 4.6: Comportamento qualitativo das funções de onda.

qualitativo das funções de onda para estados estacionários com n = 1 e


n = 2 mostrando a diferença de fase nas regiões I e III nos casos em
que n é ímpar.
Última Observação: Da mesma forma que no caso do tunelamento
de uma barreira de potencial em energias próximas à do topo da bar-
reira, o uso da aproximação WKB para o cálculo de energias de estados
estacionários próximos ao mínimo do poço de potencial não é a rigor
justificável, devido à diminuição da distância entre os dois pontos de in-
versão lineares e à conseqüente violação das condições de validade dessa

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4.6. Comentários 145

aproximação agora na região classicamente permitida. É fácil verificar,


no entanto, que uma aplicação direta da condição (4.25) a um potencial
quadrático, como o oscilador harmônico, leva ao espectro quântico exato
para esse potencial. Devido a esse fato, sempre que o potencial possa ser
bem descrito por uma aproximação quadrática numa região suficiente-
mente extensa em torno de seu mínimo, o espectro obtido através de
(4.25) dará uma boa aproximação para o espectro exato também para
valores pequenos de n. No entanto, a validade da aproximação WKB
na região classicamente permitida a rigor só se justifica para valores
grandes de n, o que está relacionado com o princípio de correspondên-
cia de Bohr.

4.6 Comentários
Com relação a aproximação WKB, o melhor texto que encontrei e re-
comendo, um dia talvez conseguirei faze-lo tão bem, está no excelente
livro do Prof. Piza (2002) 17 , esse trabalho está numa forma moderna, lu-
cida e elegantemente escrita. Ainda recomendo ao leitor uma leitura par-
alela dos livros do Prof. Merzbacher (1998) 18 e do Prof. Wolney Filho
(2002) 19 , que apresentam um bom trabalho da aproximação WKB.
Solicita-se ao leitor que estude fortemente as funções especiais us-
adas em física, como as funções de Airy e funções cilíndricas de Bessel.
Uma excelente discussão sobre essas funções poderá ser encontrada nos
livros do Prof. Arfken (1970) 20 , além do livro de Morse e Feshbach
(1953) 21 .

17
A. F. R. de Toledo Piza, Mecânica quântica, (2002).
18
E. Merzbacher, Quantum mechanics, (1998).
19
W. Wolney Filho, Mecânica quântica, (2002).
20
G. Arfken, Mathematical methods for physicist, (1970).
21
P. M. Morse and H. Feshbach, Methods of theoretical physics, (1953).

Mecânica Quântica

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Capítulo 5

Formalismo da Mecânica
Quântica

Nesse capítulo iremos estudar o formalismo matemático da mecânica


quântica, utilizaremos a notação de Dirac, Bra e ket, e a estrutura al-
gébrica da representação matricial. Como motivação para o desenvolvi-
mento desse capítulo iremos utilizar o experimento de Stern-Gerlach,
originalmente proposto por O. Stern em 1921 e realizado por ele em co-
laboração com W. Gerlach em 1922. O entendimento dos experimentos
proposto serão a nossa base para o formalismo que queremos desen-
volver.

5.1 Experimento de Stern-Gerlach


Começaremos nossa discussão com o experimento de Stern-Gerlach 1 ,
que podemos ver seu esquema na Fig. 5.1, mostrando: o forno de onde
sairá o feixe de prata E, a trajetória do feixe F e o ímã A com a orien-
tação do campo magnético ~B.
O aparato utilizado por Stern-Gerlach consistia essencialmente de
um ímã que produzia um campo magnético não uniforme. Um feixe
direcionado de átomos de prata (Ag) era obtido aquecendo a prata em
um forno com pequeno orifício por onde os átomos escapavam. A es-
colha da prata deve-se ao fato dela possuir apenas um elétron na sua
1
Otto Stern (1888–1969), físico alemão.
Walther Gerlach (1899–1979), físico alemão.
W. Gerlach and O. Stern, Zeitschrift für Physik 9, 349–352 (1922); Ibidem, 353–
355 (1922); W. Gerlach and O. Stern, Annalen der Physik 74, 673–699 (1924).

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148 Cap. 5 Formalismo da Mecânica Quântica

Figura 5.1: Esquema do experimento de Stern-Gerlach.

camada mais externa. Se os elétrons não tivessem spin, seria observado


o mesmo que na ausência do campo magnético, ou seja, os átomos não
seriam desviados pelo ímã. A observação do deslocamento do feixe em
dois pode ser facilmente compreendida atribuindo um momentum an-
gular intrínseco, ou spin, ~S aos elétrons tal que, ao interagirem com
um campo magnético na direção z, ficasse evidente que os autovalores
associados à componente Sz valem ± ~2 .
Isso ocorre porque ao elétron é associado um momento magnético,
proporcional ao spin, dado por
e ~
µ
~s = − gs S
2µc
onde gs = 2, é chamado de fator g para o elétron. Assim, quando o
elétron interage com um campo magnético não uniforme ~B = Bz k̂, sofre
a ação de uma força proporcional ao gradiente do campo, i.e.,

~F = −∇V ~ µs  ~B)
~ = ∇(~ ∂Bz
⇒ Fz = (µs )z
∂z
Na configuração do experimento, os átomos podiam ser desviados para
cima ou para baixo, caso tivessem spin.
Classicamente espera-se uma distribuição contínua, porém o exper-
imento apresentou uma distribuição com dois picos, um para cima (up)
com Sz = ~2 no estado |+i e outro para baixo (down) com Sz = − ~2
no estado |−i. Em mecânica quântica podemos escrever as relações de
auto-estado e autovalores,
~
Sz |+i = + |+i
2
~
Sz |−i = − |−i
2

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5.1. Experimento de Stern-Gerlach 149

Esse experimento também ficou conhecido como quantização do espaço.

Nota sobre o spin: Em 1925, George Uhlenbeck 2 e Samuel Goud-


smit 3 sugeriram um novo grau de liberdade para o elétron, um momen-
tum angular intrínseco, o spin, independente do momentum angular
orbital e, portanto, de qualquer interação 4 . Com o resultado desse tra-
balho, Uhlenbeck e Goudsmit deram uma explicação para os resultados
obtidos no experimento de Stern-Gerlach, compatível com apenas dois
autovalores para a projeção do momento dipolar magnético na direção
z, seria possível se fosse atribuído ao elétron um momentum angular
intrínseco (~S).
A principal aplicação do conceito de spin, no entanto, veio com
o princípio de exclusão de Pauli 5 . Apesar da relutância inicial
de aceitar o conceito de spin, em 1925 Pauli propõe que a estrutura
eletrônica dos átomos seria explicada com o chamado princípio de ex-
clusão, o qual estabelece que os números quânticos, incluindo os de
spin, que caracterizam dois elétrons não podem ser todos simultanea-
mente iguais 6 . Em 1927, Pauli apresentou uma equação que descreve
fenomenologicamente a dinâmica da interação entre uma partícula com
spin e um campo magnético 7 .
É interessante notar que o momento angular intrínseco, spin de
uma partícula pode ser inteiro ou semi-inteiro, dependo da partícula
considerada. Por exemplo, elétrons, prótons e neutrons possuem spin
1 0 ± 0 ±
2 , enquanto que os pions (π , π ) e os kaons (K , K ) possuem spin
zero. São também conhecidas partículas com spin 1, tais como o fóton
(γ), Z0 , W ± , e o ρ, e com spin 32 , tais como ∆++ .
Experimento Stern-Gerlach seqüencial: Vamos considerar uma
série de experimentos Stern-Gerlach SG sequenciais. A Fig. 5.2, mostra
três experimentos para ilustração o problema
Experimento 1: No primeiro arranjo da figura, temos inicialmente
um SGẑ que produz os dois picos, um para cima e outro para baixo.
Iremos bloquear o feixe de spin down, teremos então somente o feixe
2
George Eugene Uhlenbeck (1900–1988), físico holandês.
3
Samuel Abraham Goudsmit (1900–1978), físico holandês.
4
G. E. Uhlenbeck and S. Goudsmit, Nature 117, 264–265 (1926)
5
Wolfgang Pauli (1900–1958), físico austríaco.
6
W. Pauli, Zeitschrift für Physik 31, 765 (1925)
7
W. Pauli, Zeitschrift für Physik 43, n. 8, 601–623 (1927)

Mecânica Quântica

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150 Cap. 5 Formalismo da Mecânica Quântica

Figura 5.2: Experimento de Stern-Gerlach seqüencial.

de spin up, com Sz = + ~2 no estado |+i. Esse feixe caminha para


outro SGẑ. Aqui encontraremos todas as partículas no estado |+i com
autovalor de Sz = + ~2 .
Experimento 2: No segundo arranjo da figura, iremos considerar
o feixe de spin up, como no primeiro caso. Esse feixe irá para um SGx̂,
com seu campo magnético orientado ao longo do eixo x. Ao passar
pelo segundo SG teremos 50% do feixe de partículas com Sx = + ~2 ,
entretanto estão no estado |+ix e 50% do feixe de partículas com Sx =
− ~2 , estando no estado |−ix . Por outro lado, se considerarmos o feixe
inicial saindo do primeiro SG com spin down, encontraremos o mesmo
resultado.
Experimento 3: No terceiro arranjo da figura, temos o caso mais
interessante para a nossa discussão, onde é adicionado um terceiro SGẑ
na linha do feixe. Até o segundo SGx̂ temos o experimento 2, porém ire-
mos bloquear o feixe de spin down do segundo SG, e teremos somente
o estado |+ix indo para o terceiro SGẑ. Como resultado teremos 50%
do feixe de partículas com Sz = + ~2 , no estado |+i e 50% do feixe de
partículas com Sz = − ~2 , no estado |−i. Essa situação é uma surpresa
pois como aparece o estado |−i após o terceiro SG se inicialmente temos
certeza de que a componente |−i após o primeiro SG foi completamente
bloqueada. Há em fato uma analogia na física clássica, a transmissão
de luz polarizada através de filtros de polarização. A correspondência
associada com a luz pode ser feita por

Sz ± átomo ↔ x−, y − luz polarizada


Sx ± átomo ↔ x0 −, y 0 − luz polarizada

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5.2. Notação de Dirac - Bra e Ket 151

onde os eixos x0 − e y 0 − são os eixos x e y rodados em 45o . Assim,


podemos escrever os estados |±ix como superposição dos estados |±i
de Sz

1
|+ix = √ [|+i + |−i] (5.1a)
2
1
|−ix = √ [|+i − |−i] (5.1b)
2

E a respeito dos estados |±iy , esses também formam uma combi-


nação linear dos estados |±i de Sz . Aqui a analogia clássica é a luz de
polarização circular que poderá ser expressa como
h i
~E = √1 x̂ei(kz−ωt) + i ŷei(kz−ωt)
2
π
onde podemos usar i = ei 2 . A correspondência associada com a luz
polarizada circularmente pode ser feita por

Sy + átomo ↔ luz polarizada circularmente direita


Sy − átomo ↔ luz polarizada circularmente esquerda

e teremos
1
|±iy = √ [|+i ± i |−i] . (5.2)
2
Uma excelente discussão desses experimentos poderá ser aprofun-
dada no excelente Feynman lectures on physics 8 .

5.2 Notação de Dirac - Bra e Ket


Na seção anterior fizemos uma analise do experimento Stern-Gerlach,
e indicando que podemos representar as equações através do estado
| i para Sx , Sy e Sz . Nessa seção começamos por supor que a teoria
quântica seja formulada em termos de um espaço vetorial complexo,
em geral de dimensão infinita, munido de um produto escalar her-
mitiano. A partir desse ponto, para escrever os vetores desse espaço
vetorial vamos utilizar uma notação muito conveniente, desenvolvida
8
R. Feynman, The Feynman Lectures on Physics, (1963).

Mecânica Quântica

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152 Cap. 5 Formalismo da Mecânica Quântica

por P. A. M. Dirac 9 , na qual um vetor genérico é indicado pelo sím-


bolo | i. Aqui o espaço vetorial em questão é conhecido como espaço
de Hilbert 10 , que estudou espaços vetoriais em dimensões infinita. Ve-
tores específicos, designados por rótulos identificadores como ϕ, ψ etc.
aparecem então na forma de vetores kets |ϕi, |φi etc.
Kets: Usando a notação ket, temos a informação completa à re-
speito do estado físico; toda a informação que queremos está contida no
vetor ket, como o spin, sua orientação, etc. Dado os vetores kets, esses
satisfazem as seguintes propriedades

1. A soma de dois kets resulta em um outro ket

|χi = |ϕi + |ψi (5.3)

2. Associativa

|χi + (|ϕi + |ψi) = (|χi + |ϕi) + |ψi (5.4)

3. Comutativa
|ϕi + |ψi = |ψi + |ϕi (5.5)

4. Existe um vetor ket nulo |∅i tal que

|ϕi = |ϕi + |∅i (5.6)

para todo |ϕi

5. Para todo vetor ket |ϕi existe um outro ket | − ϕi tal que

|ϕi + | − ϕi = |∅i (5.7)

O produto de um vetor ket |ϕi por um número complexo c tem


como resultado um vetor ket c|ϕi. Um importante postulado é que |ϕi
e c|ϕi, com c 6= 0 corresponde à um mesmo estado físico. Em out-
ras palavras, somente a "direção" no espaço vetorial é significante. O
número complexo c pode operar, sem fazer diferença, da seguinte forma

c|ϕi = |ϕic (5.8)


9
Ver esse magnífico trabalho no maravilhoso livro, P. A. M. Dirac, The principles
of quantum mechanics, (1958).
10
David Hilbert (1862–1943), matemático alemão.

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5.2. Notação de Dirac - Bra e Ket 153

No caso particular onde c = 0, teremos um ket nulo.


Uma observável física, tais como o momentum ou spin, estão as-
sociados a um operador, tal como A, no espaço vetorial em questão.
Então o operador atuando no vetor ket será

A  (|ϕi) = A|ϕi (5.9)

Em geral
A|ϕi 6= c|ϕi
onde c é complexo. Mas em analogia com os autovetores da álgebra
linear, existem os autokets do operador A, onde

A|ϕ0 i = a0 |ϕ0 i, A|ϕ00 i = a00 |ϕ00 i, · · · (5.10)

onde a0 , a00 , · · · são apenas números. O conjunto de números dado


por {a0 , a00 , · · · } são conhecidos como o conjunto dos autovalores do
operador A. E, finalmente o estado físico correspondente ao autoket é
chamado de auto-estado.
Como exemplo, vamos usar o sistema de spin 12 , em que temos as
relações de autovalores e autokets expressa por
~
Sz |+i = + |+i
2
~
Sz |−i = − |−i
2
onde |±i são os autokets do operador Sz com os autovalores ± ~2 . No
caso do operador Sx aplicado em |±ix teremos
~
Sx |+ix = + |+ix
2
~
Sx |−ix = − |−ix .
2
Para um ket arbitrário |ϕi podemos escrever como a combinação
linear X
|ϕi = cn |φn i , (5.11)
n
onde cn são coeficientes complexos.
Bra e Produto Interno: Uma classe importante de objetos que é
possível definir em um espaço vetorial complexo é a classe de todas as

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154 Cap. 5 Formalismo da Mecânica Quântica

funções lineares, com valores complexos, cujo o argumento é um vetor


do espaço. A notação genérica introduzida por Dirac para esses objetos
é h |. Funções lineares específicas, designadas por rótulos identificadores
a, b etc. aparecem como vetores bra ha|, hb| etc.. Assim, o resultado da
ação da função linear ha| sobre o ket |ϕi, ha|ϕi, é um número complexo.
A linearidade de um hχ| qualquer significa que

hχ| (c1 |ϕ1 i + c2 |ϕ2 i) = c1 hχ|ϕ1 i + c2 hχ|ϕ2 i , (5.12)

i.e., o número complexo que resulta da aplicação de uma função linear


qualquer a uma combinação linear de vetores kets é a combinação linear
dos números complexos que resultam dessa aplicação.
Algumas propriedades importantes das funções lineares são:

1. A soma (associativa e comutativa) de duas funções

(ha| + hb|) |ϕi = ha|ϕi + hb|ϕi (5.13)

2. O produto de uma função por um número complexo

(cha|) |ϕi = cha|ϕi (5.14)

3. A função nula h®| tal que

h®|ϕi = 0 (5.15)

para qualquer |ϕi

4. Para cada ha| podemos ter h−a| através de h−a|ϕi = −ha|ϕi, tal
que
ha| + h−a| = h®| (5.16)

Com essas propriedades e definições resulta que o conjunto de funções


lineares sobre o espaço vetorial considerado tem por sua vez uma estru-
tura de espaço vetorial, chamado de espaço dual do espaço de partida.
Note que o vetor bra é o correspondente dual do vetor ket

|ϕi ↔ hϕ|
|ϕi + |ψi ↔ hϕ| + hψ|
c|ϕi ↔ c∗ hϕ| não chϕ|

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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5.2. Notação de Dirac - Bra e Ket 155

onde c∗ é o complexo conjugado de c, no qual é um ponto muito im-


portante. Geralmente temos

c1 |ϕ1 i + c2 |ϕ2 i = c∗1 hϕ1 | + c∗2 hϕ2 | (5.17)

onde essa uma correspondência antilinear. É fácil verificar que o cor-


respondente dual do vetor nulo |0i é a função nula h®|, i.e.,

|0i ↔ h®| ≡ h0| .

Agora podemos definir o produto interno 11 de um bra e um ket, da


seguinte forma hϕ|ψi. Esse produto é, em geral, um número complexo.
Assim, teremos as seguintes propriedades do produto interno:

hϕ|ψi = hψ|ϕi∗ (5.18a)


hϕ|c1 ψ1 + c2 ψ2 i = c1 hϕ|ψ1 i + c2 hϕ|ψ2 i (5.18b)
hc1 ϕ1 + c2 ϕ2 |ψi = c∗1 hϕ1 |ψi + c∗2 hϕ2 |ψi (5.18c)
hϕ|ϕi ≥ 0, somente = 0 se |ϕi = 0 (5.18d)

Ainda, se tomarmos dois kets, tal que

hϕ|ψi = 0 ⇒ hψ|ϕi = 0 (5.19)

a última parte da equação acima vem de (5.18a), se diz que |ϕi e |ψi
são ortogonais. E ainda podemos explicitamente normalizar um ket |ϕ̃i
por
1
|ϕi = p |ϕ̃i (5.20)
hϕ̃|ϕ̃i
p
onde hϕ̃|ϕ̃i é a norma de |ϕ̃i.
Cabe nesse momento uma nota final. Um espaço vetorial complexo,
de dimensão infinita, munido de um produto escalar que define, em
particular, a norma dos vetores que o constituem, é chamado espaço de
Hilbert quando dotado ainda da propriedade adicional de completeza.
Essa propriedade consiste em que toda sequência infinita de vetores
{|ϕi i}, i = 1, 2, · · · , tal que

k|ϕi i − |ϕj ik < ²


11
Na literatura o produto interno é frequentemente mencionado como produto es-
calar por causa de sua analogia com ~a  ~b no espaço euclidiano.

Mecânica Quântica

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156 Cap. 5 Formalismo da Mecânica Quântica

com ² arbitrariamente pequeno, desde que i e j sejam maiores que algum


N (²), chamadas sequências de Cauchy, tem um limite |ϕi que é um
vetor pertencente ao espaço. No que se segue vamos supor também
que o espaço a ser considerado é tal que admite bases constituídas de
um conjunto enumeráveis de vetores |an i, n = 1, 2, · · · , que é uma
propriedade conhecida como separabilidade. Um espaço de Hilbert
separável será então tomado como substrato natural sobre o qual pode
ser desenvolvida a cinemática e a dinâmica da mecânica quântica.

5.3 Operadores Lineares


Na seção §2.8 do capítulo 2, fizemos um estudo detalhado de operadores
usando a função de onda. Nessa seção iremos rever esse estudo fazendo
uso da notação de Dirac.
Um operador linear A num espaço de Hilbert transforma vetores
kets desse espaço em outros vetores kets do mesmo espaço,

|ψi = A|ϕi , (5.21)

e se comporta com relação às operações lineares como

A (c1 |ϕ1 i + c2 |ϕ2 i) = c1 A|ϕ1 i + c2 A|ϕ2 i . (5.22)

Uma exceção é o operador reverso temporal que é um operador


anti-linear.
A soma e o produto de dois operadores lineares A e B podem ser
definidos na forma

(A + B) |ϕi = A|ϕi + B|ϕi (5.23a)


(AB) |ϕi = A (B|ϕi) (5.23b)

e correspondem também a operadores lineares. Em geral, o produto de


dois operadores é não comutativo e obedece a regra de comutação

(AB) |ϕi 6= (BA) |ϕi (5.24a)


[A, B] = AB − BA 6= 0 (5.24b)

Se os dois operadores A e B são iguais, então

A=B se A|ϕi = B|ϕi , (5.25)

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5.3. Operadores Lineares 157

para um ket arbitrário. O operador A é dito operador nulo se, para


um ket arbitrário, temos
A|ϕi = 0 . (5.26)
O produto de um operador por um número complexo c também é
definido simplesmente por

(cA) |ϕi = c (A|ϕi) . (5.27)

Um operador atua em um vetor bra pelo lado direito

(hϕ|)  A = hϕ|A

e o produto resulta em outro vetor bra. Note que A|ϕi e hϕ|A em geral
não são uma correspondência dual. O correspondente dual nesse caso
é
A|ϕi ↔ hϕ|A† . (5.28)
Naturalmente o operador A† é o operador adjunto hermitiano, ou
simplesmente operador adjunto, de A. O operador A é hermitiano se

A = A† . (5.29)

Dado dois vetores bra hϕ| e ket |ψi. O resultado do produto

(|ψi)  (hϕ|) = |ψihϕ| (5.30)

é conhecido como produto externo, que atua como um operador. De


fato, se
(|ψihϕ|)  |χi = |ψi  (hϕ|χi) (5.31)
onde hϕ|χi é um número, tal que o produto externo atuando em um
ket é exatamente um outro ket, em outras palavras |ψihϕ| atuou como
um operador. Se defino um operador como

A = |ψihϕ| (5.32)

então
A† = |ϕihψ| (5.33)
Outra importante ilustração, é quando temos o operador A entre
dois kets |ϕi e |ψi, o produto escalar será:

hψ| (A|ϕi) = (hψ|A) |ϕi = hψ|A|ϕi . (5.34)

Mecânica Quântica

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158 Cap. 5 Formalismo da Mecânica Quântica

Note que temos os elementos da matriz associada ao operador A. Us-


ando o correspondente dual (5.28), então

hψ|A|ϕi = hψ| (A|ϕi)


n³ ´ o∗
= hϕ|A† |ψi
= hϕ|A† |ψi∗ (5.35)

Para A hermitiano, i.e., A = A† teremos

hψ|A|ϕi = hϕ|A|ψi∗ . (5.36)

A definição do operador adjunto permite verificar as seguintes pro-


priedades:
1. (A† )† = A, de fato,

hϕ|(A† )† |ψi = hψ|A† |ϕi∗


= hϕ|A|ψi

para quaisquer |ϕi e |ψi;

2. (A + B)† = A† + B† , pois

hϕ| (A + B)† |ψi = hψ|A + B|ϕi∗


= hψ|A|ϕi∗ + hψ|B|ϕi∗
= hϕ|A† |ψi + hϕ|B† |ψi
= hϕ|(A† + B† )|ψi ;

3. (AB)† = B† A† , de fato,

hϕ|(AB)† |ψi = hψ|AB|ϕi∗


= hϕ|B† A† |ψi ;

4. (cA)† = c∗ A† , o operador cA é definido como o produto da "mul-


tiplicação do número complexo c" com o operador A.
Usando a relação (AB)† = B† A† , podemos estabelecer a seguinte
correspondência dual

AB|ϕi = A (B|ϕi) ↔ (hϕ|B† )A† = hϕ|B† A† .

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5.4. Base dos Kets e Representação Matricial 159

Uma extensão dessa correspondência dual é


c1 A|ϕ1 i + c2 A|ϕ2 i ↔ c∗1 hϕ1 |A† + c∗2 hϕ2 |A† .
Finalizando essa seção, se temos uma observável física associada a
um operador A, o valor esperado é representado por
hAi = hϕ|A|ϕi , (5.37)
para qual existe um análogo na mecânica quântica ondulatória.

5.4 Base dos Kets e Representação Matricial


O operador A, atuando sobre um dado autoket |ϕi, produz um outro
autoket, cuja direção não é alterada pela ação do operador, i.e., a ação
do operador apenas multiplica-o por um certo fator numérico, tornando-
o um múltiplo de si mesmo. O fator real ou complexo pelo qual o autoket
fica multiplicado é o conhecido autovalor do operador A. O conjunto
de números dado por {a1 , a2 , · · · } são conhecidos como o conjunto dos
autovalores dos correspondentes autokets. Assim,
A|ϕ1 i = a1 |ϕ1 i, A|ϕ2 i = a2 |ϕ2 i, · · · (5.38)
Seja A um operador hermitiano, i.e., A = A† . Usando a relação
0 = hϕ2 |A|ϕ1 i − hϕ2 |A|ϕ1 i
= a1 hϕ2 |ϕ1 i − a∗2 hϕ2 |ϕ1 i
= (a1 − a∗2 )hϕ2 |ϕ1 i
onde teremos:
1. Se |ϕ1 i = |ϕ2 i implica a1 = a2 , então,
(a1 − a∗1 )hϕ1 |ϕ1 i
A menos que |ϕ1 i = 0, temos hϕ1 |ϕ1 i 6= 0. Assim, a1 = a∗1 . Con-
cluímos então que os autovalores do operadores auto-adjuntos
ou hermitianos são reais;
2. Se a1 6= a2 , temos que
hϕ2 |ϕ1 i = 0
o que implica |ϕ1 i e |ϕ2 i serem autokets ortogonais. Logo, os
autovalores dos operadores hermitianos são reais e os correspon-
dentes autokets são ortogonais

Mecânica Quântica

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160 Cap. 5 Formalismo da Mecânica Quântica

Base dos Kets: Considerando um conjunto completo de autokets


de base, linearmente independente, representado por {|ϕi i}. Esse con-
junto obedece a relação de ortogonalidade

hϕi |ϕj i = δij . (5.39)

O conjunto {|ϕi i}, constitui uma base. Assim, qualquer ket |ψi poderá
ser escrito como uma combinação linear da base,
X
|ψi = ci |ϕi i . (5.40)
i

Multiplicando essa relação pelo bra hϕj |, obteremos


X
hϕj |ψi = ci hϕj |ϕi i
i
X
= ci δij
i
= cj (5.41)

onde interpretamos cj como sendo o componente do ket |ψi na base |ϕi


na direção |ϕj i. Em outras palavras, teremos
X
|ψi = |ϕi ihϕi |ψi . (5.42)
i

Note que a relação de ortogonalidade (5.39) expressa o fato de que os


autokets do conjunto {|ϕi i} serem normalizados à unidade e ortogonais.
Podemos ainda estabelecer uma outra relação que expressa o fato desse
conjunto de autokets constituir uma base. De (5.42) temos
X
|ϕi ihϕi | = 1 (5.43)
i

onde 1 desempenha o papel de um operador identidade. A relação


(5.43) é conhecida como relação de completeza ou fechamento. Cada
elemento |ϕi ihϕi | seleciona a porção do ket |ψi paralelo a base |ϕ1 i,
esse elemento é conhecido como operador de projeção, e escrevemos

Pϕi = |ϕi ihϕi | . (5.44)

Aplicando no ket arbitrário |ψi:

Pϕi |ψi = |ϕi ihϕi |ψi

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5.4. Base dos Kets e Representação Matricial 161

O significado "geométrico" de Pϕi é claro, pois representa a "projeção


ortogonal". Essa interpretação é confirmada pelo fato de P2ϕi = Pϕi :

P2ϕi = Pϕi Pϕi = |ϕi ihϕi |ϕi ihϕi |

Como hϕi |ϕi i = 1, teremos

P2ϕi = |ϕi ihϕi | = Pϕi

Da relação de completeza (5.43) podemo escrever


X
Pϕi = 1 . (5.45)
ϕi

Representação Ortonormal de Base Discreta ou Contínua:


Um conjunto de kets, discreto {|ui i}, ou contínuo {|wα i}, se diz orto-
normal se os kets desses conjuntos satisfazem a relação de ortonor-
malizado:

para {|ui i} ⇔ para {|wα i}


hui |uj i = δij ⇔ hwα |wα0 i = δ(α − α0 ) (5.46)

para um conjunto contínuo, hwα |wα i não existe. Os autokets com es-
pectro contínuo tem norma infinita, dimensão infinita. Muito dos re-
sultados derivados de espaço vetorial de dimensão finita obtidos com
espectro discreto podem ser generalizado a espectro contínuo.
Um conjunto de kets, discreto {|ui i}, ou contínuo {|wα i}, con-
stituem uma base para qualquer ket, se podemos escreve-lo como
X Z
|ψi = ci |ui i ⇔ |ψi = c(α)|wα i dα (5.47)
i

com as componentes cj e c(α0 ) dados por

cj = huj |ψi ⇔ c(α0 ) = hwα0 |ψi (5.48)

A relação de fechamento será:


X Z
|ui ihui | = 1 ⇔ |wα ihwα | dα = 1 (5.49)
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Mecânica Quântica

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162 Cap. 5 Formalismo da Mecânica Quântica

Temos ainda outras analogias:


X Z
|ψi = |ui ihui |ψi ⇔ |ψi = |wα ihwα |ψi dα (5.50a)
i
X Z
|hui |ψi|2 = 1 ⇔ |hwα |ψi|2 dα = 1 (5.50b)
i
X Z
hϕ|ψi = hϕ|ui ihui |ψi ⇔ hϕ|ψi = hϕ|wα ihwα |ψi dα (5.50c)
i
hui |A|uj i = ui δij ⇔ hwα |W|wα0 i = αδ(α − α0 ) (5.50d)
Representação Matricial: Na base {|ui i}, o ket |ψi é represen-
tado por um conjunto de seus componentes, i.e., por um conjunto de
números ci = hui |ψi. Na representação matricial, esses números po-
dem ser arranjados na forma de uma matriz coluna:
 
hu1 |ψi
hu2 |ψi
 
 .. 
|ψi = 
 . 
 (5.51)
 hui |ψi 
 
..
.
Para um bra hϕ| arbitrário, na base {|ui i}, podemos escreve-lo na
forma, X
hϕ| = hϕ|ui ihui |
i
onde b∗i
= hϕ|ui i é o complexo conjugado de bi = hui |ϕi. Assim, na
representação matricial será uma matriz linha.
¡ ¢
hϕ| = hϕ|u1 i hϕ|u2 i · · · hϕ|ui i · · ·
¡ ¢
= hu1 |ϕi∗ hu2 |ϕi∗ · · · hui |ϕi∗ · · · (5.52)
Usando essa representação, o produto interno hϕ|ψi é o produto da
matriz linha hϕ| pela matriz coluna |ψi. O resultado é um número
 
hu1 |ψi
hu2 |ψi
 
¡ ¢  .. 
hϕ|ψi = hϕ|u1 i hϕ|u2 i · · · hϕ|ui i · · ·  . 
 (5.53)
 hui |ψi 
 
..
.

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5.4. Base dos Kets e Representação Matricial 163

ou seja
X
hϕ|ψi = hϕ|ui ihui |ψi = b∗i ci . (5.54)
i

Seja {|ui i} o conjunto autovetores que formam a base ortonormais.


O operador linear A poderá ser associado com uma séries de números
definidos que será representado pela matriz,

Aij = hui |A|uj i


 
A11 A12 · · · A1j ···
A21 A22 · · · A2j · · ·
 
 .. .. .. 
= . . . 
 (5.55)
 Ai1 Ai2 · · · Aij · · ·
 
.. .. ..
. . .

Fazendo uso da relação de fechamento para calcular a matriz que rep-


resenta o operador AB na base {|ui i}

hui |AB|uj i = hui |A1B|uj i


X
= hui |A|uk ihuk |B|uj i (5.56)
k

ou seja, a equação acima expressa o fato de que a matriz que representa


o operador AB é o produto das matrizes associadas com A e B.
Podemos também fazer a representação matricial para o autoket
|ψ 0 i = A|ψi. Conhecido as componentes de |ψi e os elementos da matriz
A, temos |ψ 0 i = A|ψi na base {|ui i} dado por

c0i = hui |ψ 0 i = hui |A|ψi . (5.57)

Usando a relação de fechamento


X
c0i = hui |A|uj ihuj |ψi
j
X
= Aij cj (5.58)
j

Mecânica Quântica

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164 Cap. 5 Formalismo da Mecânica Quântica

que na expressão matricial, teremos


 0   
c1 A11 A12 · · · A1j ··· c1
c0  A21 A22 · · · A2j · · · c2 
 2   
 ..   .. .. ..   .. 
.= . . .  .  (5.59)
    
 c0   Ai1 Ai2 · · · Aij · · ·  
 i   cj 
.. .. .. .. ..
. . . . .
Ainda usando a base {|ui i} fica fácil escrever hϕ|A|ψi na representação
matricial,
X
hϕ|A|ψi = hϕ|ui ihui |A|uj ihuj |ψi
i,j
X
= b∗i Aij cj (5.60)
i,j

novamente usamos a relação de fechamento. A equação em forma de


matriz será então
  
A11 A12 · · · A1j ··· c1
A21 A22 · · · A2j · · · c2 
  
¡ ∗ ∗ ¢  .. .. ..   .. 
hϕ|A|ψi = b1 b2 · · · bi · · · 

 . . .  . 
 
 Ai1 Ai2 · · · Aij · · ·  
  cj 
.. .. .. ..
. . . .
(5.61)
Da transformação |ψ 0 i = A|ψi, podemos ter a transformação inversa
|ψi = A−1 |ψ 0 i, desde que A−1 exista. Essa matriz inversa vai existir
sempre que tivermos |Aij | 6= 0, em que |Aij | é o determinante da ma-
triz. Designando esse determinante por ∆, ele poderá ser representado
por X
∆= (−1)i+k aik |aik |
i
onde |aik | é chamado de determinante menor do elemento da matriz Aik .
Assim, a quantidade |aik | é um escalar cujo valor é dado pelo determi-
nante de ordem n − 1, obtido do determinante original após retiradas
desse determinante a i-ésima linha e a k-ésima coluna. A representação
(−1)i+k |aik | é o cofator do elemento Aik . Assim teremos:
1. Matriz cofator - É formada dos cofatores de Aij . Então,
¡ ¢
Cof(Aij ) = (−1)i+j |aij | ;

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5.4. Base dos Kets e Representação Matricial 165

2. Matriz transposta - É formada trocando-se as linhas pelas col-


unas da matriz original

Trans(Aij ) = (Ãij ) = Aji ;

3. Matriz adjunta - É a transposta da matriz cofator 12

¡ ¢
Adj(Aij ) = Cof(Aji ) = (−1)i+j |aji | ;

4. Matriz inversa - É formada pela divisão da matriz adjunta por


seu determinante
Adj(Aij )
A−1 = (Aij )−1 = .

Para resolvermos a equação de autovalor e autoket na forma ma-


tricial faremos uma escolha de base ortonormal de kets {|ui i}, tal que

hui |A|ψi = λhui |ψi


X
hui |A|uj ihuj |ψi = λhui |ψi (5.62)
j

com a notação usual

ci = hui |ψi
Aij = hui |A|uj i

teremos
X
Aij ci = λ ci
j
X
[Aij − λδij ] cj = 0 (5.63)
j

Esse sistema é linear e homogêneo. Se o sistema acima consiste de N


equações (i = 1, 2, · · · , N ) em N cj incógnitas (j = 1, 2, · · · , N ),
temos uma solução não trivial (a solução trivial é que um dos cj seja
zero) se e somente se o determinante dos coeficientes for zero. A condição
é escrita na forma
Det[A − λI] = 0 (5.64)
12
Essa é uma definição clássica para a matriz adjunta

Mecânica Quântica

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166 Cap. 5 Formalismo da Mecânica Quântica

onde A é a matriz N × N de elementos Aij e I é a matriz unidade e a


(5.64) é a equação característica. Assim, explicitamente escrevemos
 
A11 − λ A12 ··· A1N
 A21 A22 − λ · · · A2N 
 
 .. .. .. =0 (5.65)
 . . . 
AN 1 AN 2 ··· AN N − λ

Então, os autovalores de um operador são as raízes de sua equação


característica.
Podemos ainda escrever o produto externo |ψihψ| pela matriz qua-
drada
 
c1
c2 
 
 ..  ¡ ∗ ∗ ¢
|ψihψ| =   ∗
 .  c1 c2 · · · cj · · ·
 ci 
 
..
.
 ∗ 
c1 c1 c1 c∗2 · · · c1 c∗j · · ·
c2 c∗ c2 c∗ · · · c2 c∗ · · ·
 1 2 j 
 . . . 
= . . .  (5.66)
 . . . 
 ci c∗ ci c∗ · · · ci c∗ · · ·
 1 2 j 
.. .. ..
. . .

Ainda podemos analisar o seguinte teorema: Sendo A um operador


matricial definido pelos elementos de matriz hui |A|uj i, onde {|ui i} e
{|uj i} formam um sistema de base ortonormal completo, mostre que o
operador matricial A† , com elementos de matriz definidos por A†ij =
hui |A† |uj i, é a transposta conjugada de A, i.e., A† = Ã∗ .

Prova. Tomemos a (5.60), fazendo


X
hϕ|A|ψi = hϕ|ui ihui |A|uj ihuj |ψi
i,j

= hψ|A† |ϕi∗
X³ ´∗
= hψ|uj ihuj |A† |ui ihui |ψi ,
i,j

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“mq_notas-N” — 2009/5/5 — 21:48 — page 167 — #167


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5.5. Mudança de Base - Transformação Unitária 167

em que identificamos

Aij = hui |A|uj i = (huj |A† |ui i)∗ = (A†ji )∗ .

Tomando o complexo conjugado de ambos os lados da igualdade acima


e transpondo, obteremos
A∗ji = A†ij
e a demonstração está completa.

5.5 Mudança de Base - Transformação Unitária


Por definição, ver §2.14, um operador U é unitário se seu inverso U−1
for igual ao seu adjunto U† , i.e.,

UU† = U† U = 1 . (5.67)

Transformação Unitária: Considere dois kets arbitrários |ψ1 i e


|ψ2 i do espaço vetorial, e suas transformações |ψ̃1 i e |ψ̃2 i através da
ação de U

|ψ̃1 i = U|ψ1 i
|ψ̃2 i = U|ψ2 i (5.68)

Vamos calcular o produto escalar hψ̃1 |ψ̃2 i,

hψ̃1 |ψ̃2 i = hψ1 |U† U|ψ2 i = hψ1 |ψ2 i (5.69)

A transformação unitária associada com o operador U conserva


o produto escalar, e conseqüentemente a norma, no espaço vetorial.
Quando o espaço vetorial tem dimensão finita, essa propriedade é car-
acterística de um operador unitário.
Mudança de Base: Sendo {|vi i} a base ortonormal de um estado
no espaço vetorial considerado, assumiremos ser discreto. Chamaremos
|ṽi i a transformação de |vi i sob a ação do operador U

|ṽi i = U|vi i (5.70)

mas o operador U é unitário, então

hṽi |ṽj i = hvi |vj i = δij (5.71)

Mecânica Quântica

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168 Cap. 5 Formalismo da Mecânica Quântica

e a nova base {|ṽi i} é ortonormal. Para mostrar que é uma nova base,
vamos considerar o ket |ψi do espaço vetorial, tal que
X
U† |ψi = ci |vi i (5.72)
i

aplicando o operador U nesse equação, teremos


X
UU† |ψi = ci U|vi i (5.73)
i

e X
|ψi = ci |ṽi i (5.74)
i

Essa equação expressa o fato de que o ket |ψi pode ser expandido em
termos dos vetores |ṽi i, no qual constituem uma base. Podemos concluir
desse resultado que: uma condição necessária par um operador U ser
unitário é que os vetores de uma base ortonormal do espaço vetorial,
transformada por U, constituem outra base ortonormal.
Matriz Unitária: Consideremos

Uij = hvi U|vj i (5.75)

sendo os elementos de matriz de U. Como poderemos observar se a


matriz desse operador é unitária? Para isso, começaremos por:
X
hvi |U† U|vj i = hvi |U† |vk ihvk |U|vj i (5.76)
k

e X

Uki Ukj = δij (5.77)
k
onde temos uma matriz unitária.
Transformação Unitária de Operadores: Por definição, a trans-
formação à do operador A será o operador em que, na base {|ṽi i}, tem
os mesmos elementos da matriz do operador A na base {|vi i}

hṽi |Ã|ṽj i = hvi |A|vj i

substituindo (5.70) nessa equação, teremos

hvi |U† ÃU|vj i = hvi |A|vj i (5.78)

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5.5. Mudança de Base - Transformação Unitária 169

Desde que i e j sejam arbitrários, teremos

U† ÃU = A (5.79)

ou aplicando U no lado esquerdo da equação e U† no lado direito:

à = UAU† (5.80)

que a transformação inversa de (5.79).


Transformação Unitária Infinitesimal: Considerando o oper-
ador unitário U(ε) que depende de uma quantidade real infinitesimal ε,
tal que: U(ε) → 1 quando ε → 0. Expandindo esse operador em séries
de potência em ε, teremos

U(ε) = 1 + εG + · · ·

e
U† (ε) = 1 + εG† + · · ·
temos
U(ε)U† (ε) = U† (ε)U(ε) = 1 + ε(G + G† )
Desde que U† (ε)U(ε) = 1, i.e., unitário, e desprezando termos de ordem
superior em ε, teremos
G + G† = 0 .
Essa equação expressa o fato de que o operador G é anti-hermitiano.
Assim, é conveniente que ajustamos F = i G, tal que

F − F† = 0 ⇒ F = F†

onde F é hermitiano. Logo, o operador infinitesimal será escrito na


forma
U(ε) = 1 − i εF . (5.81)
Substituindo (5.81) em (5.80), obteremos

à = (1 − i εF )A(1 + i εF † ) = (1 − i εF )A(1 + i εF ) . (5.82)

e finalmente
à − A = − i ε[F, A] . (5.83)
A variação do operador A através da transformação U é, em primeira
ordem em ε, proporcional ao comutador [F, A].

Mecânica Quântica

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170 Cap. 5 Formalismo da Mecânica Quântica

Consideremos em seguida algumas quantidades que permanecem


invariantes sob a ação de uma transformação unitária. Tomemos o caso
da equação secular, expressa por (5.63), qual seja

|Aij − λδij | = 0

Efetuando uma transformação unitária nessa equação, escrevemos

|Ã − λ0 I0 | = |U−1 (A − λI)U|

Visto que U e U−1 comutam com λ e I e lembrando que o deter-


minante do produto de diversas matrizes é igual ao produto de seus
determinantes, temos que

|U−1 (A − λI)U| = |U−1 |  |A − λI|  |U|


= |U−1 |  |U|  |A − λI|
= |U−1 U|  |A − λI|
= |A − λI| ,

ou seja
|Ã − λ0 I0 | = |A − λI| .
Isto é, a equação secular é invariante sob a ação de uma transformação
unitária. De maneira análoga, podemos mostrar que o traço de uma
matriz é também invariante sob a ação de uma transformação unitária.

Prova.
X
tr(X) = hai |X|ai i
i
XXX
= hai |bj ihbj |X|bk ihbk |ai i
i j k
XXX
= hbk |ai ihai |bj ihbj |X|bk i
i j k
XX
= hbk |bj ihbj |X|bk i
j k
X
= hbj |X|bj i (5.84)
j

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5.6. Observáveis e Relação da Incerteza 171

Temos também outras propriedades de traço

tr(XY ) = tr(Y X) (5.85a)


tr(U † XU ) = tr(X) (5.85b)
tr(|ui ihuj |) = δij (5.85c)
tr(|vi ihui |) = hui |vi i (5.85d)

5.6 Observáveis e Relação da Incerteza


Considerando duas observáveis físicas associadas aos operadores A e
B, respectivamente. Dado o sistema físico que se encontra no estado
ket |ϕi quando aplicamos sobre ele o operador A, seguido do operador
B e, de modo reverso, quando aplicamos o operador B seguido pela
aplicação do operador A. Os valores esperados para essas operações
são representados por

hBAi = hϕ|BA|ϕi (5.86)

e
hABi = hϕ|AB|ϕi . (5.87)
O ket |ϕi é um autovetor normalizado e a e b são os autovalores dos
operadores A e B respectivamente, ambos pertencentes ao mesmo ket
|ϕi, i.e.:
A|ϕi = a|ϕi (5.88)
e
B|ϕi = b|ϕi . (5.89)
Utilizando esses resultados em (5.86) e (5.87), teremos

hBAi = ahϕ|B|ϕi = abhϕ|ϕi = ab (5.90)

e
hABi = bhϕ|A|ϕi = bahϕ|ϕi = ba . (5.91)
Se a e b são apenas números ordinários, eles se comutam. Sendo assim, a
ordem em que esses operadores atuam em |ϕi, não altera o resultado fi-
nal. Fisicamente, isso significa que o estado de um sistema quântico, que
seja simultaneamente auto-estado de dois operadores diferentes, não é

Mecânica Quântica

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172 Cap. 5 Formalismo da Mecânica Quântica

alterado pela seqüência das operações das medidas dessas observáveis.


Matematicamente,
[A, B] = 0
e dizemos que são observáveis compatíveis.
Porém, se os autovalores a e b não comutam, não poderemos medir
simultaneamente as observáveis associadas aos operadores A e B, re-
spectivamente. Logo,
[A, B] 6= 0
e para esse caso teremos observáveis incompatíveis. Um bom exem-
plo dessas observáveis são: ~S2 e Sz são observáveis compatíveis, mas Sx
e Sy são incompatíveis.
Autovalores Degenerados: Um autovalor a associado a um op-
erador A é degenerado se a ele está associado mais de um autovetor.
Note, o autovalor a é N vezes degenerado se existirem N autovetores,
linearmente independentes, correspondendo a esse autovalor. Um con-
junto de autovetores {|ϕi i} é linearmente independente se a relação
N
X
ci |ϕi i = 0 (5.92)
i=1

for satisfeita. Porém, isso só ocorre se todos os ci ’s forem nulos. Sendo


assim, na expressão (5.92), temos que nenhum dos kets |ϕi i pode ser
escrito como uma combinação linear dos outros N − 1 kets do conjunto.
Um conjunto de N autovetores |ϕi i, linearmente independentes,
ortonormalizado, pode servir de base para representar qualquer autove-
tor |ψi nesse espaço vetorial. Sendo isso possível, os autovetores da base
considerada formam um conjunto completo de kets {|ϕi i}. Um teorema
importante é que: Qualquer combinação linear de autovetores degener-
ados, linearmente independentes, é também um autovetor pertencente
ao mesmo autovalor.

Prova. Dado um conjunto de N autovetores |ϕi i, todos correspondendo


ao mesmo autovalor a associado ao operador A, i.e.,
A|ϕi i = a|ϕi i ,
para i = 1, 2, 3, · · · , N , escreveremos a combinação linear
N
X
|ψi = ci |ϕi i .
i=1

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5.6. Observáveis e Relação da Incerteza 173

Aplicando o operador A nos dois lados da equação acima, teremos


N
X N
X
A|ψi = ci A|ϕi i = a ci |ϕi i = a|ψi ,
i=1 i=1

o que mostra que |ψi também e um autovetor do operador A.

No caso de uma degenerescência de ordem n, combinações lineares


de n autovetores degenerados podem ser encontrados de modo a formar
n autovetores linearmente independentes, ortogonais, correspondendo
ao mesmo autovalor.
Princípio da Incerteza - Relação Geral: Consideremos dois op-
eradores hermitianos A e B, que estão associados a duas observáveis
físicas. Tomemos a relação de comutação entre eles

[A, B] = AB − BA = i C , (5.93)

em que C, em geral, é um operador hermitiano. No caso de C nulo, os


operadores A e B comutam.
Seja um ket arbitrário |ϕi que não necessariamente precisa ser auto-
estado de A e B. Os valores médios dessas observáveis são

hAi = hϕ|A|ϕi (5.94a)


hBi = hϕ|B|ϕi (5.94b)

e os desvios desses valores médios são dados por

∆A = A − hAi (5.95a)
∆B = B − hBi (5.95b)

Visto que os valores esperados são apenas números, torna-se fácil mostrar
a relação de comutação para ∆A e ∆B

[∆A, ∆B] = [A − hAi, B − hBi]


= [A, B] − [hAi, B] − [A, hBi] + [hAi, hBi]
= [A, B] = i C . (5.96)

Para nosso propósito, temos:

h(A + i B)† (A + i B)i ≥ 0

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174 Cap. 5 Formalismo da Mecânica Quântica

ou
h(A† − i B † )(A + i B)i ≥ 0

pois
(i B)† = − i B † .

Como temos operadores hermitianos

h(A − i λB)(A + i λB)i ≥ 0

onde λ é uma variável numérica real. O valor mínimo da forma quadrática


em λ
hB 2 iλ2 + ihAB − BAiλ + hA2 i ≥ 0 (5.97)

obtém-se para
2λhB 2 i + ihAB − BAi = 0

ou seja
i hAB − BAi
λ=− .
2 hB 2 i
Então, substituindo em (5.97), teremos

1
hA2 i  hB 2 i ≥ − hAB − BAi2 (5.98)
4
O valor médio dos quadrados dos desvios, chamamos de flutuações, são
dados por

h(∆A)2 i = hA2 i − hAi2 (5.99a)


2 2 2
h(∆B) i = hB i − hBi (5.99b)

Logo, teremos

1
h(∆A)2 ih(∆B)2 i ≥ − hAB − BAi2
4
p p
Mas ∆A = h(∆A)2 i e ∆B = h(∆B)2 i. Lembrando que [A, B] =
AB − BA = i C, então

1
∆A  ∆B ≥ hCi (5.100)
2

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5.6. Observáveis e Relação da Incerteza 175

No caso de variáveis canonicamente conjugadas, como as coorde-


nadas e componentes do momentum linear de uma partícula, temos
que hCi = ~. Assim o princípio da incerteza de Heisenberg será:
1
∆qi  ∆pi ≥ ~ para i = 1, 2, 3. (5.101a)
2
∆qi  ∆pj = 0 para i 6= j. (5.101b)
Essa demonstração do princípio de Heisenberg se deve a Max Born.

Desigualdade de Schwarz: Para um dado ket, temos que


hψ|ψi ≥ 0 (5.102)
sendo que hψ|ψi = 0, somente quando |ψi = 0. Usando a relação (5.102),
podemos derivar a desigualdade de Schwarz 13 , para qual tomamos
dois kets arbitrários |ϕ1 i e |ϕ2 i do espaço vetorial, então
|hϕ1 |ϕ2 i|2 ≤ hϕ1 |ϕ1 ihϕ2 |ϕ2 i (5.103)
Prova. Dado |ϕ1 i e |ϕ2 i, considere o ket |ψi definido por
|ψi = |ϕ1 i + λ|ϕ2 i
onde λ é um parâmetro arbitrário. Assim,
hψ|ψi = hϕ1 |ϕ1 i + λhϕ1 |ϕ2 i + λ∗ hϕ2 |ϕ1 i + λλ∗ hϕ2 |ϕ2 i ≥ 0
Vamos escolher o valor de λ como
hϕ2 |ϕ1 i
λ=−
hϕ2 |ϕ2 i
Substituindo na equação anterior, teremos
hϕ1 |ϕ2 ihϕ2 |ϕ1 i
hϕ1 |ϕ1 i − ≥0
hϕ2 |ϕ2 i
Desde de que hϕ2 |ϕ2 i é um número positivo, podemos multiplicar a
equação acima por hϕ2 |ϕ2 i para obter
hϕ1 |ϕ1 ihϕ2 |ϕ2 i ≥ hϕ1 |ϕ2 ihϕ2 |ϕ1 i
que é a desigualdade de Schwarz. Teremos hψ|ψi = 0, somente se |ϕ1 i =
−λ|ϕ2 i, e os kets |ϕ1 i e |ϕ2 i são proporcionais.
13
Karl Herman Amandus Schwarz (1843–1921), matemático alemão.

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176 Cap. 5 Formalismo da Mecânica Quântica

5.7 Posição, Momentum e Translação


Os autokets |x0 i do operador posição X satisfaz

X|x0 i = x0 |x0 i (5.104)

são postulados para formar um conjunto completo. Aqui x0 é o autovalor


do operador X aplicado no ket |x0 i. O estado ket para um estado físico
arbitrário, pode ser expandido em termos de {|xi i} discretos:
X
|ψi = |xi ihxi |ψi (5.105)
i

e para o caso de um espectro contínuo, temos


Z ∞
|ψi = |xihx|ψi dx (5.106)
−∞

Agora, a probabilidade de encontrarmos a partícula em um intervalo


dx é
|hx|ψi|2 dx = hψ|xihx|ψi dx (5.107)
Nesse formalismo a função de onda é definida, e identificada, como o
produto interno
hx|ψi = ψ(x) (5.108)
Essa é a função de onda ψ(x) do estado |ψi. No formalismo de Dirac
será desenvolvida como uma expansão dos coeficientes. Finalmente o
produto interno hϕ|ψi pode ser interpretado como a amplitude de prob-
abilidade de encontrarmos |ϕi em |ψi
Z ∞
hϕ|ψi = hϕ|xihx|ψi dx
−∞
Z ∞
= ϕ∗ (x)ψ(x) dx . (5.109)
−∞

Translação: Agora, introduziremos um importante conceito que é


o da translação, ou deslocamento espacial. Supõe que temos um
estado físico bem localizado ao redor de x (uma dimensão). Vamos con-
siderar um operador que muda esse estado para outro bem localizado
ao redor de x + dx. Tal operador é definido por uma translação in-
finitesimal de dx, assim

T(dx)|xi = |x + dxi . (5.110)

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5.7. Posição, Momentum e Translação 177

em termos de estado físico

T(dx)|ψi = |ψ 0 i . (5.111)

Então,
Z Z
0 0 0
T(dx)|ψi = T(dx) |x ihx |ψi dx = |x0 + dx0 ihx0 |ψi dx0 . (5.112)

usamos a variável x0 para não confundir quando calculamos a amplitude


de translação do estado na posição x:

ψ 0 (x) = hx|ψ 0 i = hx|T(dx)|ψi


Z Z
= hx|x + dx ihx |ψi dx = δ[x − (x0 + dx0 )]hx0 |ψi dx0
0 0 0 0

= hx − dx|ψi = ψ(x − dx) (5.113)

Em uma primeira observação, parece estranho ψ 0 (x) 6= ψ(x + dx).


Mas se, ψ(x) tem um máximo em x = b, então ψ 0 (x) = ψ(x − dx)
tem um máximo em x − dx = b, ou x = b + dx, i.e., o estado está
transladando na direção positiva do eixo x.
Note que o operador de translação é um operador unitário, já que,

hψ 0 |ψ 0 i = hψ|T† (dx)T(dx)|ψi = hψ|ψi , (5.114)

que requer
T† (dx)T(dx) = 1 (5.115)
Podemos ver a vantagem do resultado de (5.113) de outro modo. De
(5.110) temos que
hx|T† (dx) = hx + dx| . (5.116)
Mas desde que o operador translação é unitário, T† (dx) = −T(dx), logo

hx|T(dx) = hx − dx| . (5.117)

Entretanto,
hx|T(dx)|ψi = hx − dx|ψi = ψ(x − dx) (5.118)
como já havíamos obtido.
Se dx for apenas um deslocamento infinitesimal, podemos expandir
a função ψ em série de Taylor, em torno do ponto (x), do seguinte modo:

|ψ 0 (x)i ∼
= |ψ(x)i + dx |ψ(x)i = (1 + i dxTx ) |ψ(x)i , (5.119)
∂x

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178 Cap. 5 Formalismo da Mecânica Quântica

onde desprezamos derivadas de ordem superior e

∂ px
Tx = − i = . (5.120)
∂x ~
Logo
i
T(dx) = 1 − px dx (5.121)
~
que opera o posição dando

T(dx)|xi = |x + dxi (5.122)

em aproximação de primeira ordem. Note que px é o gerador da translação.


E para uma translação finita em dx através da aplicação de um número
infinito de translações infinitesimais, teremos
· µ ¶¸n
i dx
T(dx) = lim 1 − px
n→∞ ~ n
i
= e− ~ px dx (5.123)

O operador de translação é exatamente o mesmo dado em §2.14, ou


seja, o operador deslocamento.
Note que o operador de translação espacial, cujo gerador é o mo-
mentum linear, comuta com o momentum

[~p, T(d~x)] = 0

com isso podemos generalizar a relação de comutação para as compo-


nentes do momentum
[pi , pj ] = 0
Assim, quando os geradores de uma translação comutam, temos um
grupo correspondente conhecido como grupo comutativo ou grupo
abeliano 14 . Logo, o grupo de translação em três dimensões é um grupo
abeliano.
Espaço de Momentum: Iremos agora introduzir o operador mo-
mentum P, tal que aplicado em um conjunto de kets |p0 i, teremos

P|p0 i = p0 |p0 i hp0 |p00 i = δ(p0 − p00 ) (5.124)


14
Niels Henrik Abel (1802–1829), matemático norueguês.

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5.7. Posição, Momentum e Translação 179

Aqui, o estado ket para um estado físico arbitrário, pode ser expandido
em termos de {|pi} da mesma forma que anteriormente fazíamos a ex-
pansão em {|xi}, como:
Z ∞
|φi = |pihp|φi dp (5.125)
−∞

com a função de onda no espaço de momentum


hp|φi = φ(p) (5.126)
e podemos identificar em
Z ∞
hφ|φi = |hp|φi|2 dp (5.127)
−∞

a quantidade |hp|φi|2 dp como a probabilidade da partícula no estado


|φi ter seu momentum entre p e p + dp.
Nós podemos determinar hx|pi, a função de onda dos auto-estados
momentum no espaço de posição. Vamos para isso usar o produto in-
terno hx|px |φi, onde obteremos um importante resultado:

hx|px |φi = − i ~
hx|φi (5.128)
∂x
já que o operador momentum na base de posição é o gerador da translação.
Agora iremos substituir |φi por |pi

hx|px |pi = phx|pi = − i ~ hx|pi (5.129)
∂x
A solução da equação diferencial (5.129) é
i
hx|pi = N e ~ px
onde N é a constante de normalização a ser determinada. Assim iremos
considerar Z
|pi = |xihx|pi dx

Então,
Z
0
hp |pi = hp0 |xihx|pi dx
Z ∞
i 0

=N N e ~ (p−p )x dx
−∞
= |N | (2π~)δ(p − p0 )
2
(5.130)

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180 Cap. 5 Formalismo da Mecânica Quântica

Logo, N = √1 e
2π~
1 i
hx|pi = √ e ~ px (5.131)
2π~
Finalmente podemos escrever em espaço de momentum e espaço de
posição as relações, usando um ket |αi:
Z
hp|αi = hp|xihx|αi dx (5.132a)
Z
hx|αi = hx|pihp|αi dp (5.132b)

ou em funções de onda:
Z
1 i
φα (p) = √ e− ~ px ψα (x) dx (5.133a)
2π~ Z
1 i
ψα (x) = √ e ~ px φα (p) dp (5.133b)
2π~
Essas equações mostram que hp|αi e hx|αi formam um par de transfor-
mada de Fourier.

5.8 Aplicações no Experimento de


Stern-Gerlach
Usando todo o desenvolvimento realizado até o momento, voltemos à
nossa análise do experimento de Stern-Gerlach, agora não somente na
forma qualitativa, mas também quantitativamente.
Sabemos que o experimento apresentou uma distribuição com dois
picos, um para cima (up) com Sz = ~2 no estado |+i e outro para baixo
(down) com Sz = − ~2 no estado |−i. Logo, podemos escrever as relações
de auto-estado e autovalores,
~
Sz |+i = + |+i (5.134a)
2
~
Sz |−i = − |−i (5.134b)
2
onde |+i e |−i formam a base ortonormal do espaço vetorial em questão

h+|+i = h−|−i = 1 (5.135a)


h+|−i = 0 (5.135b)

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5.8. Aplicações no Experimento de Stern-Gerlach 181

e vale a relação de fechamento

|+ih+| + |−ih−| = 1 (5.136)

O ket normalizado e mais geral do espaço vetorial é a superposição


linear de |+i e |−i:
|ψi = α|+i + β|−i (5.137)
com
|α|2 + |β|2 = 1 (5.138)

Na base {|+i, |−i}, a matriz que representa Sz é obviamente diago-


nal, pois
~
Sz = [|+ih+| − |−ih−|] (5.139)
2
mas µ ¶ µ ¶
1 0
|+i = , |−i = (5.140)
0 1
então µ ¶
~ 1 0
Sz = . (5.141)
2 0 −1
o operador Sz é obviamente hermitiano.
Vamos introduzir dois operadores importantes,

S+ = ~|+ih−| S− = ~|−ih+| (5.142)

no qual ambos não são hermitianos. O operador S+ atuando no ket


|−i, muda-o para o ket |+i multiplicado por ~. Por outro lado, se atua
no ket |+i, teremos um ket nulo. A interpretação física de S+ é que
esse operador levanta a componente do spin em uma unidade de ~.
Logo, esse operador S+ é conhecido como operador de levantamento.
Conseqüentemente, S− abaixa a componente do spin em uma unidade
de ~, e é conhecido como operador de abaixamento. Ainda podemos
definir S± como:
S± = Sx ± i Sy (5.143)
usando (5.142) a representação matricial de S± será,
µ ¶ µ ¶
0 1 0 0
S+ = ~ , S− = ~ . (5.144)
0 0 1 0

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182 Cap. 5 Formalismo da Mecânica Quântica

Pelas definições (5.142) e (5.143) os operadores Sx e Sy representa-


dos na base {|+i, |−i} são matrizes 2 × 2 hermitianas,

~
Sx = [|+ih−| + |−ih+|] (5.145a)
2
~
Sy = [− i |+ih−| + i |−ih+|] (5.145b)
2
que nos leva à
µ ¶ µ ¶
~ 0 1 ~ 0 −i
Sx = , Sy = . (5.146)
2 1 0 2 i 0

Os operadores Sx e Sy , juntamente com o operador Sz , satisfazem


a relação de comutação 15

[Si , Sj ] = i εijk ~Sk (5.147)

onde εijk é o tensor de Levi-Civita 16 . E a relação de anticomu-


tação
1
{Si , Sj } = ~2 δij (5.148)
2
onde o comutador [ , ] e o anticomutador { , } estão definidos em
(2.78) e (2.79) respectivamente.
Podemos definir também o operador ~S2 = ~S  ~S, como

~S2 = S 2 + S 2 + S 2 (5.149)
x y z

e fica fácil verificar que


~S2 = 3 ~2 I (5.150)
4
onde I é a matriz identidade. Obviamente teremos a relação de comu-
tação h i
~S2 , Si = 0 (5.151)

para i = 1, 2, 3.
Preparação dos Estados |±ix , |±iy e |±iu : Na análise realizada
nos três experimentos sequenciais de Stern-Gerlach tiramos algumas
15
O grupo que satisfaz essa relação de comutação é conhecido como grupo não
abeliano.
16
Tullio Levi-Civita (1873–1941), matemático italiano.

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5.8. Aplicações no Experimento de Stern-Gerlach 183

conclusões úteis. Podíamos escrever os estados |±ix como superposição


dos estados |±i de Sz
1
|±ix = √ [|+i ± |−i] (5.152)
2
E a respeito dos estados |±iy , esses também formavam uma combi-
nação linear dos estados |±i de Sz . Aqui fazíamos uma analogia clássica
com a luz de polarização circular, e tínhamos
1
|±iy = √ [|+i ± i |−i] . (5.153)
2
As relações (5.152) e (5.153) podem ser deduzidas diretamente pela
seguinte análise geral. Primeiro, recordamos quando o feixe |+ix vai em
direção ao SGẑ, temos o feixe abrindo em duas componentes com iguais
intensidades. Então,
1
|h+|+ix | = |h−|+ix | = √ . (5.154)
2
e podemos construir |+ix geral como
1 1
|+ix = √ |+i + √ ei δ1 |−i (5.155)
2 2
com δ1 real é a fase que iremos estudar. Para construirmos um ket |−ix
ortogonal à |+ix teremos
1 1
|−ix = √ |+i − √ ei δ1 |−i (5.156)
2 2
por convenção o coeficiente de |+i é real e positivo. Aqui podemos
escrever o operador Sx em uma forma mais geral como segue:
~
Sx = [|+ix h+|x − |−ix h−|x ]
2
~ h − i δ1 i
= e |+ih−| + ei δ1 |−ih+| (5.157)
2
Note que Sx é hermitiano, como deveríamos esperar. Com argumento
similar, poderei construir Sy e o feixe |±iy
1 1
|±iy = √ |+i ± √ ei δ2 |−i (5.158)
2 2
~ h − i δ2 i
Sy = e |+ih−| + ei δ2 |−ih+| (5.159)
2

Mecânica Quântica

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184 Cap. 5 Formalismo da Mecânica Quântica

Vamos considerar o experimento seqüencial de Stern-Gerlach com SGx̂


seguido do SGŷ. Então,

1
|y h±|+ix | = |y h±|−ix | = √ , (5.160)
2
o que não é nenhuma surpresa devido a invariância do sistema físico
sob uma rotação. Substituindo (5.156) e (5.158) em (5.160), obteremos

1 ¯¯ ¯
¯ 1
¯1 ± ei(δ1 −δ2 ) ¯ = √ (5.161)
2 2
na qual é satisfeita somente se
π π
δ2 − δ1 = ou − . (5.162)
2 2
Isto mostra que os elementos das matrizes Sx e Sy não podem ser todos
reais. Se os elementos da matriz Sx são reais, os elementos da matriz Sy
serão puramente imaginários, e vice-versa. Por conveniência tomaremos
os elementos da matriz Sx reais e fixaremos δ1 = 0; se nossa escolha
fosse δ1 = π, o eixo x positivo estaria orientado em direção oposta. A
segunda fase δ2 poderá ser − π2 ou π2 . O fato é que ainda temos uma
ambigüidade. Podemos escolher o sistema de coordenadas que obedeça
as rotações usando a regra da mão direita. Assim, temos que δ2 = π2 é
nossa melhor escolha. Com isso teremos
1 1
|±ix = √ |+i ± √ |−i (5.163)
2 2
~
Sx = [|+ih−| + |−ih+|] (5.164)
2
e
1 i
|±iy = √ |+i ± √ |−i (5.165)
2 2
~
Sy = [− i |+ih−| + i |−ih+|] (5.166)
2
como havíamos mencionado anteriormente.
Para uma componente de ~S ao longo do vetor unitário û, caracter-
izado pelos ângulos polares θ e ϕ, ver Fig. 5.3, usaremos as expressões
para Sx , Sy e Sz na forma matricial, e então será fácil encontrar a

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5.8. Aplicações no Experimento de Stern-Gerlach 185

Figura 5.3: Definição dos ângulos polares θ e ϕ.

matriz que representa a correspondente observável Su = ~S  û na base


{|+i, |−i}

Su = Sx sen θ cos ϕ + Sy sen θ sen ϕ + Sz cos θ


µ ¶
~ cos θ sen θe− i ϕ
= (5.167)
2 sen θei ϕ − cos θ
e seus autokets nessa base serão
θ θ
|+iu = cos |+i + sen ei ϕ |−i (5.168a)
2 2
θ −iϕ θ
|−iu = − sen e |+i + cos |−i (5.168b)
2 2
Prova. Os autovalores de Su são + ~2 ou − ~2 , e os autokets na base
{|+i, |−i} são

|+iu = a|+i + b|−i


~
Su |+iu = + |+iu
2
e

|−iu = c|+i + d|−i


~
Su |−iu = − |−iu
2
onde a e b são números imaginários. Assim,
~
(Sx sen θ cos ϕ+Sy sen θ sen ϕ+Sz cos θ)(a|+i + b|−i) = (a|+i + b|−i)
2

Mecânica Quântica

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186 Cap. 5 Formalismo da Mecânica Quântica

onde poderemos escrever


µ ¶µ ¶ µ ¶
~ cos θ sen θe− i ϕ a ~ a
=
2 sen θei ϕ − cos θ b 2 b
Aqui temos um sistema de duas equações e duas incógnitas,
a cos θ + b sen θ cos ϕ − i b sen θ sen ϕ = a
a sen θ cos ϕ + i a sen θ sen ϕ − b cos θ = b
onde
(1 + cos θ)b
a=
sen θ(cos ϕ + i sen ϕ)
mas
|a|2 + |b|2 = 1
então µ ¶
2 (1 + cos θ)2
|b| 1 + =1
sen2 θ
ou, depois de alguma álgebra
θ
|b|2 = sen2
2
Então poderei escolher b = ei ϕ sen 2θ , e
1 + cos θ θ θ
a= sen2 ei ϕ = cos
sen θ ei ϕ 2 2
logo
θ θ
|+iu = cos |+i + sen ei ϕ |−i
2 2
Desde que |+iu e |−iu são ortonormais
θ −iϕ θ
|−iu = − sene |+i + cos |−i
2 2
como queríamos demonstrar. Assim, a probabilidade de termos Su =
+ ~2 é µ ¶
~ θ
P + = cos2
2 2
e a probabilidade para termos Su = − ~2 é
µ ¶
~ θ
P − = sen2
2 2

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5.9. Comentários 187

Note que todos os operadores Sx , Sy e S têm os mesmos autovalores,


+ ~2 e − ~2 como Sz . Isso é possível desde que possamos rodar o aparato
Stern-Gerlach de tal forma que definimos o campo magnético paralelo
ao eixo x, y ou û.

5.9 Comentários
Para esse capítulo, recomenda-se ao leitor, uma leitura detalhada da
obra prima do Prof. Paul Dirac (1958) 17 , nesse livro o leitor encontrará
o mais detalhado trabalho sobre a notação bra e ket, além de ser um
dos mais importantes livros de mecânica quântica.
Um estudo paralelo poderá ser realizado com os livros dos Profs.
Cohen-Tannoudji et.al. (1977) 18 , Jun John Sakurai (1994) 19 , John Townsend
(1992) 20 e A. Messiah (1970) 21 , o livro do Prof. Messiah tem um tra-
balho muito profundo do ponto de vista do formalismo matemático da
mecânica quântica.
Uma excelente discussão sobre os experimentos sequenciais de Stern-
Gerlach poderá ser aprofundada no excelente Feynman lectures on physics 22 .

17
P. A. M. Dirac, The principles of quantum mechanics, (1958).
18
C. Cohen-Tannoudji, B. Diu and F. Laloë, Quantum mechanics, (1977).
19
J. J. Sakurai, Modern quantum mechanics, (1994).
20
J. S. Townsend, A modern approach to quantum mechanics, (1992).
21
A. Messiah, Quantum mechanics, (1970).
22
R. Feynman, et.al, The Feynman lectures on physics, (1963).

Mecânica Quântica

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Capítulo 6

Dinâmica Quântica

No capítulo anterior discutimos o formalismo matemático, porém não


discutimos como o sistema físico evolui com o tempo. Fizemos esse
trabalho usando equações de onda, no capítulo dois. Nesse capítulo
iremos dedicar ao estudo da dinâmico de um sistema físico. Em outras
palavras faremos aqui as equações de movimento análogas as equações
de movimento de Newton (ou Lagrange 1 ou Hamilton).

6.1 Evolução Temporal


Vamos começar nossa discussão da evolução temporal na mecânica quân-
tica com a definição do operador de evolução temporal U(t, t0 ) que
opera em um ket da seguinte forma,

U(t, t0 )|ψ(t0 )i = |ψ(t)i (6.1)

onde |ψ(t0 ) é o estado inicial do sistema no tempo t = 0 e |ψ(t) é o estado


do sistema em um tempo t qualquer, t > t0 . Esses estados podem ser
estendidos em termos de uma combinação linear de autokets da mesma
quantidade física observável A:
X
|ψ(t0 )i = cn (t0 )|ϕn i (6.2)
n
X
|ψ(t)i = cn (t)|ϕn i (6.3)
n
1
Giuseppe Luigi Lagrangia (Joseph-Louis Lagrange) (1736–1813), matemático
franco-italiano.

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190 Cap. 6 Dinâmica Quântica

Em geral 2

|cn (t)| 6= |cn (t0 )|


Uma importante propriedade é a conservação da probabilidade antes e
depois, X X
|cn (t0 )|2 = |cn (t)|2
n n
Isso não afeta a normalização do estado:
hψ(t)|ψ(t)i = hψ(t0 )|U† (t, t0 )U(t, t0 )|ψ(t0 )i = hψ(t0 )|ψ(t0 )i = 1 (6.4)
então
U† (t, t0 )U(t, t0 ) = 1 (6.5)
ou seja, o operador de evolução temporal é unitário. podemos ainda
considerar a propriedade da composição de dois operadores
U(t2 , t0 ) = U(t2 , t1 )U(t1 , t0 ), (t2 > t1 > t0 ) . (6.6)
Se considerarmos uma translação temporal infinitesimal, dt, como
no caso do operador deslocamento ou de translação espacial, teremos
|ψ(t0 + dt)i = U(t0 + dt, t0 )|ψ(t0 )i (6.7)
Devido a continuidade, se t → t0 ⇒ |ψ(t)i = |ψ(t0 )i, o operador de
evolução temporal se reduz à um operador identidade
lim U(t0 + dt, t0 ) = U(t0 , t0 ) = 1 . (6.8)
dt→0

Então, o operador que satisfaz as condições acima, será


i
U(t0 + dt, t0 ) = 1 − Hdt , (6.9)
~
onde o operador H é o gerador da translação temporal. Naturalmente
esse operador é hermitiano, H† = H. Precisamos definir o signifi-
cado físico de H. Da equação (6.9), a dimensão de H é a constante
de Planck dividido pelo tempo, ou seja, nominalmente a energia. Na
idéia da mecânica quântica antiga, a freqüência angular está relacionada
com a energia através da relação de Planck-Einstein
E = ~ω
Na mecânica clássica 3 , a idéia do hamiltoniano ser o gerador da evolução
temporal, nos dá a conservação de energia.
2
Se o hamiltoniano comuta com A, então |cn (t)| = |cn (t0 )|.
3
H. Goldstein, Classical mechanics, (1980).

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6.2. Derivação da Equação de Schrödinger 191

6.2 Derivação da Equação de Schrödinger


Podemos mostrar que U(t, t0 ) satisfaz, em primeira ordem uma equação
diferencial no tempo. Desde que
µ ¶
i
U(t + dt, t0 ) = U(t + dt, t)U(t, t0 ) = 1 − Hdt U(t, t0 )
~
i
U(t + dt, t0 ) − U(t, t0 ) = − Hdt U(t, t0 ) (6.10)
~
Usando a definição de derivada 4 , teremos


i~ U(t, t0 ) = H U(t, t0 ) . (6.11)
∂t
Aplicando na equação acima o estado ket inicial |ψ(t0 )i, obteremos


i~ U(t, t0 )|ψ(t0 )i = H U(t, t0 )|ψ(t0 )i (6.12)
∂t
e

i~|ψ(t)i = H |ψ(t)i . (6.13)
∂t
Essa é a equação de Schrödinger usando o operador de evolução tem-
poral, U(t, t0 ). É a equação fundamental de movimento que determina
como os estados evoluem no tempo na mecânica quântica. Schrödinger
propôs essa equação em 1926, não envolvendo um ket mas sim uma
função de onda na representação espaço de posição 5 .

6.3 Solução Formal para U(t, t0 )


Para a solução formal do operador U(t, t0 ) há três casos a serem tratados
separadamente:
Primeiro Caso: O operador hamiltoniano é independente do tempo,
i.e., quando o tempo varia, o operador H não muda. Um exemplo
4
A derivada de um operador e definido como
dU U (t + ∆t) − U (t)
= lim
dt ∆t→0 ∆t
.
5
Como vimos em §1.16 do capítulo 1.

Mecânica Quântica

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192 Cap. 6 Dinâmica Quântica

para esse caso é o hamiltoniano para a interação do momento spin-


magnético com um campo magnético constante independente do tempo.
A solução de (6.11) nesse caso é dado por
i
U(t, t0 ) = e− ~ H(t−t0 ) . (6.14)

Para provar isto basta expandir a exponencial como e derivar


· ¸· ¸
− ~i H(t−t0 ) i H(t − t0 ) (− i)2 H(t − t0 ) 2
e =1− + + · · · (6.15)
~ 2 ~
µ ¶2
∂ − i H(t−t0 ) − i H 2 H
e ~ = + (− i) (t − t0 ) + · · · (6.16)
∂t ~ ~
mas
H2
HU(t, t0 ) = H − i (t − t0 ) + · · · (6.17)
~
comparando (6.16) com (6.17), temos que (6.14) satisfaz a equação difer-
encial (6.11), como queríamos provar.
Uma demonstração alternativa para obter (6.14) é considerar uma
série de translações temporais infinitesimais, tal que
· µ ¶¸
i t − t0 N i
U(t, t0 ) = lim 1 − H = e− ~ H(t−t0 ) , (6.18)
N →∞ ~ N
logo, para t0 = 0
i
|ψ(t)i = e− ~ Ht |ψ(0)i . (6.19)
Para solucionarmos a equação de movimento quando H é independente
do tempo, precisamos conhecer o estado inicial do sistema, |ψ(0)i, e
estar pronto para trabalhar com o operador (6.18) nesse estado.
Segundo Caso: O hamiltoniano é explicitamente dependente do
tempo, mas em diferentes tempos comutam. Um exemplo para esse
caso é o momento spin-magnético sujeito à um campo magnético que
varia com o tempo, porém não altera a direção. Assim teremos

i~ U(t, t0 ) = H(t0 ) U(t, t0 )
∂t R t
− ~i H(t0 )dt0
U(t, t0 ) = e t0 (6.20)

que pode ser facilmente provado,


Rt somente substituindo H(t − t0 ) nas
equações (6.15) e (6.16) por t0 H(t0 )dt0 .

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6.4. Dependência Temporal do Valor Esperado 193

Terceiro Caso: O hamiltoniano é dependente do tempo, mas em


temos diferentes não comutam. O exemplo para esse caso será o mo-
mento spin-magnético sujeito à um campo magnético que varia com
o tempo e também varia a direção: em t = t1 o campo magnético está
na direção x̂, em t = t2 está na direção ŷ e assim por diante. Devido
Sx e Sy não comutarem, i.e., [Sx , Sy ] = i ~Sz , H(t1 ) e H(t2 ), tais como
~S  ~B, não comutam. A solução formal para essa situação é dado por

U(t, t0 ) =
∞ µ
X ¶ Z Z t1 Z tn−1
−i n t
1+ dt1 dt2 · · · dtn H(t1 )H(t2 ) · · · H(tn ) ,
~ t0 t0 t0
n=1
(6.21)

conhecida como série de Dyson, devido ao fato de que F. J. Dyson 6


desenvolveu a expansão perturbativa dessa série em teoria quântica de
campos.

6.4 Dependência Temporal do Valor Esperado


Quando o operador H é ele próprio independente do tempo, o valor es-
perado da observável correspondente é também independente do tempo:

hψ(t)|H|ψ(t)i = hψ(t0 )|U† (t)HU(t)|ψ(t0 )i = hψ(t0 )|H|ψ(t0 )i (6.22)

desde que H comute com U 7 . naturalmente sugerimos que a identidade


H seja o operador de energia, i.e., o operador hamiltoniano. Assim, o
valor esperado da energia é

E = hψ|H|ψi . (6.23)

Os autokets do hamiltoniano, são os auto-estados de energia que


satisfazem
H|ϕn i = En |ϕn i (6.24)
e que têm um papel fundamental na mecânica quântica. É fácil deter-
minar a ação do operador evolução temporal U(t) nesses estados, para
6
Freeman John Dyson (1923– ), físico e matemático anglo-americano.
F. J. Dyson, Physical Review, 75, 486, p. 1736 (1949).
7
Para estabelecer que H comuta com U, use a expansão da série de Taylor para U.

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194 Cap. 6 Dinâmica Quântica

isso usaremos a série de Taylor para a exponencial


" µ ¶ #
− ~i Ht i Ht 1 i Ht 2
e |ϕn i = 1 − + − + · · · |ϕn i
~ 2! ~
" µ ¶ #
i En t 1 i En t 2
= 1− + − + · · · |ϕn i
~ 2! ~
i
= e− ~ En t |ϕn i ,

onde podemos observar que En = ωt.


Usando o operador de evolução temporal em termos de |ϕn ihϕn |
i XX i
e− ~ Ht = |ϕm ihϕm |e− ~ Ht |ϕn ihϕn |
n m
X i
|ϕn ie− ~ En t hϕn | , (6.25)
n

mas, em t = 0
X
|ψ(0)i = |ϕn ihϕn |ψi
n
X
= cn |ϕn i (6.26)
n

e em t qualquer
i
|ψ(t)i = e− ~ Ht |ψ(0)i
X i
= |ϕn ihϕn |ψi e− ~ En t (6.27)
n

Assim, temos que quando cn (t = 0) ⇒


i
cn (t) = cn (t = 0)e− ~ En t . (6.28)

Se o estado inicial do sistema é o auto-estado de energia, |ψ(0)i =


|ϕn i, então
i
|ψ(t)i = e− ~ En t |ϕn i (6.29)
dizemos que os auto-estados de energia formam o conjunto de estados
estacionários, como já discutido no capítulo 2.

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6.4. Dependência Temporal do Valor Esperado 195

Então, se o sistema é um auto-estado simultâneo da observável A,


não dependente explicitamente do tempo, e do operador hamiltoniano
H, assim o será em todo tempo,
d d
hAi = hψ(t)|A|ψ(t)i
dt µdt ¶ µ ¶
d d
= hψ(t)| A|ψ(t)i + hψ(t)|A |ψ(t)i
dt dt
i
= (hψ(t)|HA|ψ(t)i − hψ(t)|AH|ψ(t)i)
~
i
= hψ(t)|[H, A]|ψ(t)i
~
i
= h[H, A]i = 0 (6.30)
~
Assim, o operador associado à observável A é uma constante de movi-
mento.
Também podemos mostrar que o valor esperando de uma observável
A com respeito à um autoket para o caso estacionário é independente
através de outra relação. Usando (6.29) temos:
hAi = hψ(t)|A|ψ(t)i
i i
= hϕn |e+ ~ En t A e− ~ En t |ϕn i
= hϕn |A|ϕn i (6.31)
Consideremos agora o valor esperado da observável A quando lev-
amos em conta superposição dos auto-estados de energia, ou estados
não-estacionários. Começaremos por
X
|ψ(0)i = cn |ϕn i
n
Logo,
" # " #
X i X
− ~i Em t
hAi = c∗n hϕn |e+ ~ En t A cm e |ϕm i
n m
XX i
= c∗n cm hϕn |A|ϕm i e− ~ (Em −En )t (6.32)
n m
Esse valor esperado depende da freqüência angular de Bohr, ou seja,
consiste em valores em função dos termos de oscilação
Em − En
ωmn = . (6.33)
~

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196 Cap. 6 Dinâmica Quântica

6.5 Representações de Schrödinger, Heisenberg


e Interação
Representação de Schrödinger: Faremos um sumário do desenvolvi-
mento temporal na conhecida e familiar representação de Schrödin-
ger que usamos em nosso discussão da evolução temporal

|ψ(t)i = U(t)|ψ(0)i (6.34a)


hψ(t)| = hψ(0)|U† (t) , (6.34b)

onde
i
U(t) = e− ~ Ht (6.35)
com o hamiltoniano H independente do tempo. Sabemos que o operador
de evolução temporal satisfaz a equação diferencial

i~ U(t) = H U(t) . (6.36)
∂t
Assim, a variação temporal do valor esperado de um operador OS é
dado por
d i
hψ(t)|OS |ψ(t)i = hψ(t)|[H, OS ]|ψ(t)i (6.37)
dt ~
onde assumimos que o operador OS não depende explicitamente do
tempo, mas os kets variam com o tempo.
Representação de Heisenberg: Uma alternativa para a repre-
sentação de Schrödinger na descrição da evolução temporal é a rep-
resentação de Heisenberg. Nessa representação, os estados kets são
constantes no tempo
i
|ψH (t)i = U† (t)|ψ(t)i = e ~ Ht |ψ(t)i = |ψ(0)i (6.38)

Por outro lado, o valor esperado de OS , pode ser escrito como


i −i
hψ(t)|OS |ψ(t)i = hψ(0)|e ~ Ht OS e ~
Ht
|ψ(0)i
= hψH |U† (t) OS U(t)|ψH i (6.39)

Essa relação, sugere a definição de um operador OH na representação


de Heisenberg dado por

OH = U† (t) OS U(t) (6.40)

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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6.5. Representações de Schrödinger, Heisenberg e Interação 197

que carrega toda a dependência temporal. Logo,

hψ(t)|OS |ψ(t)i = hψH |OH |ψH i (6.41)

Concluindo, na representação de Heisenberg os autokets são fixos no


tempo, enquanto os operadores são dependentes do tempo.
Equação de Movimento de Heisenberg: Iremos deduzir a equa-
ção fundamental de movimento na representação de Heisenberg. Assu-
mindo um caso geral, OS depende explicitamente do tempo. A equação
diferencial será
d H d ³ † S ´
O = U O U
dt dt
∂U† S ∂U ∂OS
= O U + U† OS + U† U
∂t ∂t ∂t
i i ∂OS
= U† HUU† OS U − U† OS UU† HU + U† U
~ ~ ∂t
i ∂OH
= [U† HU, OH ] + (6.42)
~ ∂t
Como H e U comutam, resulta que

U† HU = H

e a equação diferencial será

d H i ∂
O = [H, OH ] + OH (6.43)
dt ~ ∂t

Se OS não depende explicitamente do tempo, que são os casos de situ-


ações físicas de maior interesse, teremos

d H i
O = [H, OH ] (6.44)
dt ~

que é a conhecida equação de movimento de Heisenberg 8 . Histori-


camente, essa equação foi escrita primeiramente por Paul Dirac, que a
chamou de equação de de movimento de Heisenberg. É instrutivo com-
parar a equação (6.44) com a sua correspondente em Mecânica Clássica
8
Note que a hamiltoniana é a mesma nas duas representações.

Mecânica Quântica

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198 Cap. 6 Dinâmica Quântica

em para a observável O(q, p). Classicamente a equação de movimento


poderá ser escrita na forma, através do parênteses de Poisson:
d
O(q(t), p(t)) = {O, H}(q, p) (6.45)
dt
onde H é a hamiltoniana clássica do sistema e (q(t), p(t)) é a trajetória
clássica no espaço de fase, obedecendo as equações de Hamilton 9 ,
∂H ∂H
q̇(t) = , ṗ(t) = − (6.46)
∂p ∂q
A comparação entre (6.44) e (6.45) remete-nos mais uma vez ao princí-
pio de correspondência
1
{A, B} = [A, B] (6.47)
i~
entre a Mecânica Clássica e a Mecânica Quântica, a qual é usada como
guia para a quantização de sistemas com análogos clássicos. Esse relação
foi observado por Dirac ao relacionar os comutadores aos parênteses de
Poisson 10 .
Representação de Interação: Aqui estudaremos uma represen-
tação intermediária em que operadores e kets carregam alguma infor-
mação da dependência temporal. Podemos considerar a hamiltoniana
H em duas partes,
H = H0 + H1 (6.48)
onde H0 não contém dependência temporal explícita. Quando assumi-
mos H1 = 0, voltamos ao nosso problema usual

H0 |ϕn i = En |ϕn i (6.49)

que são completamente conhecidos.


Definimos um estado |ψI (t)i na representação de interação por
i
|ψI (t)i = e ~ H0 t |ψ(t)i (6.50)
9
Para uma excelente revisão dos colchete de Poisson e das equações de Hamilton,
ver Goldstein, Classical mechanics, (1980), ou o livro de Landau e Lifshitz, Me-
chanics, (1993).
10
Ver o excelente Dirac, The principles of quantum mechanics, (1958) e o artigo
original P. A. M. Dirac, Proceedings of the Royal Society of London, A109, 642–
653 (1926).

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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6.5. Representações de Schrödinger, Heisenberg e Interação 199

Note que
d i i d
i~ |ψI (t)i = −H0 e ~ H0 t |ψ(t)i + e ~ H0 t i ~ |ψ(t)i
dt dt
i i
H t H t
= −H0 e ~ 0
|ψ(t)i + e ~ 0
(H0 + H1 )|ψ(t)i
i i i
= e ~ H0 t H1 |ψ(t)i = e ~ H0 t H1 e− ~ H0 t |ψI (t)i (6.51)

A dependência temporal do autoket na representação de interação é


governada por H1 .
Se examinarmos o valor esperado de um operador, temos
i i
hψ(t)|O|ψ(t)i = hψI (t)|e ~ H0 t O e− ~ H0 t |ψI (t)i (6.52)

que nos leva a definir um operador na representação de interação por


i i
OI = e ~ H0 t O e− ~ H0 t (6.53)

Partindo que o operador na representação de Schrödinger não depende


explicitamente do tempo, a equação de movimento usando OI é dada
por
d I i ³ i H0 t i i i
´
O = e~ H0 O e− ~ H0 t − e ~ H0 t OH0 e− ~ H0 t
dt ~
i
= [H0 , OI ] (6.54)
~
O desenvolvimento temporal dos operadores na representação de inter-
ação é determinado por H0 . Da definição (6.53), vemos que a hamilto-
niana H0 é a mesma tanto para a representação de Schrödinger quanto
para a de interação. Por outro lado, H1 e
i i
HI = e ~ H0 t H1 e− ~ H0 t (6.55)

diferem, desde que H0 e H1 não comutem. A evolução temporal (6.51)


dos estados na representação de interação pode ser escrita em termos
de HI como
d
i ~ |ψI (t)i = HI |ψI (t)i (6.56)
dt
da mesma forma que a equação de Schrödinger, onde substituímos H
por HI . As equações (6.54) e (6.56) são as equações fundamentais na
representação de interação. Nessa representação a evolução temporal dos

Mecânica Quântica

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200 Cap. 6 Dinâmica Quântica

operadores é determinada por H0 e a evolução temporal dos autokets


é determinada por H1 . Essa representação é um intermediário entre a
representação de Schrödinger, em que os kets carregam a dependên-
cia temporal, e a representação de Heisenberg, em que os operadores
carregam a dependência temporal.
Podemos expressar a solução de (6.56) em termos do operador de
evolução temporal na representação de interação,

|ψI (t)i = UI (t)|ψI (0)i (6.57)

de (6.56) teremos
d I
i~ U (t) = HI UI (t) (6.58)
dt
que tem a solução formal dada por
Z t
I i
U (t) = 1 − dt0 HI (t0 )UI (t0 ) (6.59)
~ 0

que pode ser verificado, facilmente, substituindo essa expressão em


(6.58) e tomando UI (0) = 1, como condição inicial. A solução per-
turbativa para a interação é dada por

Z " Z #
t t0
I i 0 I i 0 00 I 00 I 00
U (t) = 1 − dt H (t ) 1 − dt H (t )U (t )
~ 0 ~ 0
Z
i t 0 I 0
=1− dt H (t ) +
~ 0
µ ¶ Z Z t0
i 2 t 0 I 0
− dt H (t ) dt00 HI (t00 ) + · · · (6.60)
~ 0 0

Tipicamente essa série converge rapidamente de tal forma que os primeiros


termos da série são suficientes para nos dar uma boa aproximação do
desenvolvimento temporal do sistema.
Finalmente, se
X i
|ψ(t)i = cn (t)e− ~ En t |ϕn i
n

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6.6. Precessão do Spin 201

então,
i
|ψI (t)i = e ~ H0 t |ψ(t)i
i X i
= e ~ H0 t cn (t)e− ~ En t |ϕn i
n
X
= cn (t)|ϕn i (6.61)
n

e
ci (t) = hϕi |ψI (t)i (6.62)
As relações (6.60), (6.61) e (6.62) são importantes quando estudarmos a
teoria de perturbação dependente do tempo, e na dedução da regra
de ouro de Fermi 11 .

6.6 Precessão do Spin


Devido ao spin do elétron, esse possui um momento magnético µ
~ s que
é dado por
e ~
µ
~s = − gs S
2µc
onde o fator g para o elétron vale aproximadamente 2, i.e., gs = 2.
Assim, na presença de um campo magnético externo ~B = B k̂, a hamil-
toniana será
H = −~µs  ~B (6.63)
Como e < 0 para o elétron,

e~ ~ eB
H=− S  B = − Sz (6.64)
µc µc

onde Sz comuta com H, ou seja eles têm autokets simultâneos. Definindo


a freqüência angular, ou freqüência de Larmor 12 , ω = |e|B
µc , a hamil-
toniana será 13

H = ωSz (6.65)
11
E. Fermi, Nuclear physics, (1950).
12
Joseph Larmor (1857–1942), físico e matemático irlandês.
13 2µB B
Também podemos escrever a freqüência de Larmor como ω = ~
, em que
µB = |e|~
2µc
é o magneton de Bohr.

Mecânica Quântica

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202 Cap. 6 Dinâmica Quântica

Portanto, seus autovalores serão:



H|+i = ωSz |+i = |+i = E+ |+i
2

H|−i = ωSz |−i = − |−i = E− |−i
2
isto é,
e~B
E± = ∓ Sz para Sz ± (6.66)
2µc
Podemos perguntar: o que acontece com a evolução temporal do
sistema? Desde que a hamiltoniana seja independente do tempo,
i i i
U(t) = e− ~ Ht = e− ~ ωSz t = e− ~ Sz φ = R(φk̂) (6.67)
assumimos o operador de evolução temporal como um operador de
rotação girando ao redor do eixo z por um ângulo φ = ωt. É fácil
notar que a partícula de spin- 12 na presença de um campo magnético
na direção z, esse fará com que seu spin gire em torno do eixo z com
um período de T = 2π ω .
Vamos trabalhar com um exemplo específico para detalhar nossa
dinâmica. Com ~B = B k̂, escolheremos o estado inicial ψ(0) = |+ix . O
estado |+ix é a superposição dos estados de Sz . Naturalmente, em um
tempo t
µ ¶
− ~i Ht 1 1
|ψ(t)i = e √ |+i + √ |−i
2 2
i ωt i ωt
e− 2 e 2
= √ |+i + √ |−i
2 2
µ ¶
− i ωt 1 ei ωt
=e 2 √ |+i + √ |−i (6.68)
2 2
Note que, esse estado é justamente o fator de fase vezes o estado spin
up de |+iu , com a escolha do ângulo azimutal φ = ωt.
Vamos investigar as probabilidades e os valores esperados do spin
envolvendo o tempo. Usando a equação acima para |ψ(t)i, vemos que:
¯ i ωt ¯2
¯e 2 ¯ 1
¯ ¯
|h+|ψ(t)i|2 = ¯ √ ¯ = (6.69)
¯ 2 ¯ 2
¯ i ωt ¯2
¯ e− 2 ¯ 1
2 ¯ ¯
|h−|ψ(t)i| = ¯ √ ¯ = (6.70)
¯ 2 ¯ 2

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6.6. Precessão do Spin 203

são independentes do tempo. Então,


µ ¶ µ ¶
1 ~ 1 ~
hSz i = + − =0 (6.71)
2 2 2 2
que também é uma constante de movimento.
Quando examinamos as componentes do spin no plano x − y, vere-
mos a dependência explícita do tempo. Desde que
µ ¶ Ã − i ωt i ωt
!
1 1 e 2 e 2
x h+|ψ(t)i = √ h+| + √ h−|  √ |+i + √ |−i
2 2 2 2
à i ωt !
1 ¡ ¢ 1 e− 2 ωt
=√ 1 1 √ i ωt = cos (6.72)
2 2 e 2 2

Logo,
ωt
|x h+|ψ(t)i|2 = cos2 (6.73)
2
note que esse valor de probabilidade é para spin up em x. Para o spin
down teremos
µ ¶ Ã − i ωt i ωt
!
1 1 e 2 e 2
x h−|ψ(t)i = √ h+| − √ h−|  √ |+i + √ |−i
2 2 2 2
à i ωt !
1 ¡ ¢ 1 e− 2 ωt
= √ 1 −1 √ i ωt = − i sen (6.74)
2 2 e 2 2
e,
ωt
|x h−|ψ(t)i|2 = sen2 (6.75)
2
Assim, o valor esperado será
µ ¶ µ ¶
2ωt ~ 2 ωt ~
hSx i = cos + sen −
2 2 2 2
~
= cos ωt (6.76)
2
Similarmente, para os estados em y teremos:
1 + sen ωt
|y h+|ψ(t)i|2 = (6.77)
2
1 − sen ωt
|y h−|ψ(t)i|2 = (6.78)
2

Mecânica Quântica

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204 Cap. 6 Dinâmica Quântica

e
~
hSy i =
sen ωt (6.79)
2
Todos esses resultados são consistentes com a precessão do spin
na forma anti-horária ao redor do eixo z, com período T = 2π ω . De
acordo com a nossa análise usando o operador de evolução temporal
(6.67) como um operador de rotação, é fácil observar que
d i
hSz i = hψ|[H, Sz ]|ψi (6.80)
dt ~
Pois podemos ver explicitamente que H comuta com Sz . Isso nos leva
dizer que Sz é uma constante de movimento. Por outro lado, Sx e Sy
variam no tempo. Logo, H não comuta com esses operadores.
Nota sobre o fator g: Para uma partícula com fator g = 2, o spin
precessa com a mesma freqüência que a freqüência de cíclotron da
partícula no campo magnético. O fator g, também é conhecido como
fator giromagnético. Em virtude das correções radiativas dadas pela
Eletrodinâmica Quântica, o elétron tem um fator g 6= 2 por uma pe-
quena quantidade da ordem de α = 1/137, α é a constante de estrutura
fina. Assim, podemos escrever
³ α ´
g =2 1+ + · · · = 2, 0023192

ou
³g ´ 1α ³ α ´2 ³ α ´3
−1 = − 0, 328478 + 1, 195 + ···
2 2π π π
= (115.965, 54 ± 0, 33) × 10−8
Essa correção radiativa permite a determinação experimental do fator
(g/2 − 1) com grande precisão. Este fator é denominado de momento
magnético anômalo do elétron. Uma aplicação interessante da pre-
cessão do spin é a determinação do fator g para o muon (µ). A primeira
medida desse fator g para os muons foi realizada por Garwin 14 , Leder-
man 15 e Weinrich 16 , que obtiveram g = 2, 00 ± 0, 10 17 . Na final da dé-
cada de 1970, vários experimentos ocorridos no CERN 18 determinaram
14
Richard Lawrence Garwin (1928– ), físico americano.
15
Leon Max Lederman (1922– ), físico americano.
16
Marcel Weinrich (1927–2008), físico polonês-americano.
17
R. L. Garwin, L. M. Lederman and M. Weinrich, Physical Review, 105, 1415
(1957).
18
CERN - European Organization for Nuclear Research, Genebra, Suíça.

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6.7. Ressonância Magnética 205

este fator, e os resultados mais recentes são

(g/2 − 1)(e− ) = (115.965, 77 ± 0, 35) × 10−8


(g/2 − 1)(e+ ) = (116.030 ± 120) × 10−8
(g/2 − 1)(µ± ) = (116.616 ± 31) × 10−8

Estes resultados estão de acordo com as previsões da eletrodinâmica


quântica 19 .

6.7 Ressonância Magnética


Vamos agora descrever uma técnica para a medida do fator giromag-
nético do próton gp , ou seja de seu momento de dipolo magnético
intrínseco. Conforme vimos na seção anterior, um momento magnético
associado a uma partícula de spin 12 imerso em um campo magnético
uniforme ~B na direção z apresenta dois estados de energia bem definida.
Consideraremos um dipolo magnético que se encontra inicialmente no
estado de energia mais baixa, i.e., alinhado com o campo magnético
externo, e então aplicaremos um campo magnético perpendicular ao
original o qual oscila com freqüência ω. Mostraremos que a probabil-
idade do estado do sistema passar para o estado de energia mais alta
é maximizada para ω ∝ gp , o que nos permite a determinação deste
parâmetro. Várias aplicações tais como, o relógio atômico e tomo-
grafia por ressonância magnética nuclear estão baseadas nos resul-
tados desenvolvidos nessa seção.
Consideremos um próton cujo momento de dipolo magnético é dado
por
e~ ~S ~S
µ
~ próton = gp ≡ gp µp (6.81)
2Mp c ~ ~
e~
onde µp = 2M pc
é o magneton nuclear. Consideremos que esse próton
esteja na presença de um campo magnético
~B = BT (ı̂ cos ωt − ̂ sen ωt) + BL k̂ (6.82)

Como a hamiltoniana do sistema é

µpróton  ~B
H = −~
19
J. Bailey et al, Nuclear Physics, B150, 1 (1979).

Mecânica Quântica

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206 Cap. 6 Dinâmica Quântica

e a equação de Schrödinger dependente do tempo escreve-se como



i~ ~ próton  ~B|ψ(t)i
|ψ(t)i = − − µ
∂t
onde o estado do sistema é
µ ¶
a(t)
|ψ(t)i = ,
b(t)

temos que a equação de movimento para o spin desse próton é dada


por
µ ¶ µ ¶µ ¶
∂ a(t) gp µp BL BT ei ωt a(t)
i~ =− (6.83)
∂t b(t) 2 BT e− i ωt BL b(t)

Definindo as freqüências
gp µp BL gp µp BT
ΩL = e ΩT = (6.84)
2~ 2~
podemos reescrever (6.83) como um par de equações diferenciais
acopladas
∂a ¡ ¢
= i ΩT ei ωt b + ΩL a ,
∂t
(6.85)
∂b ¡ ¢
= i ΩT e− i ωt a − ΩL b .
∂t
Para resolvermos a equação acima, devemos procurar soluções da
seguinte forma
a = a0 ei ωa t b = b0 ei ωb t (6.86)
onde a0 , b0 , ωa e ωb são constantes. Substituindo essas relações em
(6.85) teremos
µ ¶µ ¶
(ωa − ΩL ) −ΩT e− i ϕt a0
− i ϕt =0 (6.87)
−ΩT e (ωb + ΩL ) b0

onde ϕ = ωa − ωb − ω. Tendo em vista que fizemos a suposição de que


a0 e b0 são constantes, devemos ter que ϕ = 0, ou seja

ωa = ωb + ω (6.88)

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6.7. Ressonância Magnética 207

E para que obtenhamos uma solução não trivial, o determinante da


matriz quadrada que aparece em (6.87) deve anular-se, o que nos conduz
a
ω ω
ωa = ± ω̄ e ωb = − ± ω̄ (6.89)
2 2
com ³ ω ´2
ω̄ 2 = ΩL − + Ω2T (6.90)
2
Agora podemos escrever a solução geral de (6.83)

a(t) = a1 ei( 2 −ω̄)t + a2 ei( 2 +ω̄)t


ω ω
(6.91)

b(t) = b1 e− i( 2 +ω̄)t + b2 e− i( 2 −ω̄)t


ω ω
(6.92)

Para especificarmos completamente o problema assumiremos que o sis-


tema encontra-se no instante t = 0 no estado de energia mais baixa, a
saber, quando a(0) = 1 e b(0) = 0. Utilizando essas condições iniciais,
bem como (6.85) para obter as derivadas em t = 0, segue que
h ³ ω ´ i sen ω̄t ω
a(t) = i − + ΩL + ω̄ cot ω̄t ei 2 t (6.93)
2 ω̄

ΩT ω
b(t) = − sen ω̄t e− i 2 t (6.94)
ω̄
Logo a probabilidade de transição para o estado de energia mais alta
é dada por
Ω2T
|b(t)|2 = ¡ ¢ sen2 ω̄t (6.95)
ω 2 2
ΩL − 2 + Ω T
que é conhecida como fórmula de Rabi 20 .
Note que essa probabilidade será máxima quando tivermos a con-
dição de ressonância ωres = 2ΩL , i.e., para
gp µp BL
ωres = (6.96)
~
e ainda, quando queremos aplicar esse cálculo para elétrons trocamos
os parâmetros do próton pelos parâmetros do elétron. Com isso é fácil
verificar que a freqüência de ressonância dos elétrons é muito diferente
20
Isidor Isaac Rabi (1898–1988), físico austro-húngaro americano .

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208 Cap. 6 Dinâmica Quântica

da freqüência de ressonância dos prótons, permitindo assim a separação


dos efeitos devidos aos prótons e aos elétrons.
Experimento de Rabi: O experimento de Rabi 21 consiste de dois
aparatos de Stern-Gerlach com campos magnéticos opostos separados
por uma região contendo um campo estático e um oscilante como em
na equação (6.82); como mostra Fig. 6.1. Na ausência do campo os-

Figura 6.1: Esquema do experimento de Rabi.

cilante o feixe gerado com autovalor ~2 de Sz no primeiro aparato de


Stern-Gerlach é detetado integralmente após o segundo desses aparatos.
Quando o campo oscilante é ligado o número de átomos detetados é
menor, sendo que o número de átomos que chegam ao detetor depende
da freqüência do campo oscilante. Quando esta freqüência é a freqüên-
cia de ressonância dada por (6.96) o número de átomos detetados será
mínimo. Isso irá permitir medir com precisão ωres , e conseqüentemente
o valor de gp ; conforme podemos ver na Fig. 6.2.

6.8 Oscilador Harmônico


O oscilador harmônico é um dos mais importantes problemas aborda-
dos pela mecânica quântica. Do ponto de vista pedagógico, ilustra con-
ceitos básicos e o método dos operadores. Do ponto de vista prático,
pode ser aplicado em espectroscopia molecular, estado sólido, estrutura
nuclear, teoria quântica de campos, ótica quântica, mecânica estatística
21
I. I. Rabi, J. R. Zacharias, S. Millman and P. Kusch, Physical Review, 53, 318
(1923).

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6.8. Oscilador Harmônico 209

Figura 6.2: Número de átomos detetados em função do freqüência do campo


magnético BL num experimento de Rabi.

quântica, e outros. Historicamente foi M. Planck quem propôs asso-


ciar unidades discretas de energia com a radiação dos osciladores dando
início aos conceitos quânticos. Porém foi P. Dirac que elegantemente
introduziu o conceito de operadores para solucionar o problema do os-
cilador harmônico, e aplicou as mesmas técnicas para a quantização do
campo eletromagnético 22 .
Autokets e autovalores de energia: A hamiltoniana básica do
oscilador harmônico é dada por

p2 µω 2 x2
H= + , (6.97)
2µ 2

onde ω é a freqüência angular do oscilador clássico. Os operadores ~x e


~p são hermitianos, e obedecem a relação de comutação

[x, px ] = i ~ . (6.98)

Nota-se que a hamiltoniana é quadrática tanto na posição x como


no momentum px . Para o oscilador iremos introduzir dois operadores

22
Ver o excelente livro de P. Dirac, The principles of quantum mechanics, (1958)
e os artigos originais P. A. M. Dirac, Proceedings of the Royal Society of Lon-
don, A109, 642–653 (1926); P. A. M. Dirac, Proceedings of the Royal Society of
London, A114, 243–265 (1927).

Mecânica Quântica

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210 Cap. 6 Dinâmica Quântica

não-hermitianos
rµ ¶
µω i
a= x+ p (6.99)
2~ µω
r µ ¶
† µω i
a = x− p (6.100)
2~ µω
conhecidos como operador de aniquilação e operador de criação,
respectivamente. Usando a relação de comutação (6.98), teremos
1
[a, a† ] = (− i[x, p] + i[p, x]) = 1 (6.101)
2~
Invertendo (6.99) e (6.100), obteremos
s
~ ³ ´
x= a + a† (6.102)
2µω
r
µω~ ³ †
´
p = −i a−a (6.103)
2
Logo, podemos escrever a hamiltoniana como
µ ¶
~ω ³ † †
´
† 1
H= a a + aa = ~ω a a + (6.104)
2 2
Nessa última equação usamos a relação de comutação (6.101). Para
encontrarmos os auto-estados de H é suficiente encontrarmos os auto-
estados de
N = a† a (6.105)
conhecido como operador número, no qual é hermitiano, pois

N † = (a† a)† = a† (a† )† = a† a = N .

Assim, a hamiltoniana será


µ ¶
1
H = ~ω N + (6.106)
2
No tratamento que iremos apresentar, vamos introduzir a seguinte
abreviação |ϕn i = |ni, para representar os autokets do oscilador quân-
tico. Na ótica quântica, os estados |ni são chamados estados de Fock 23 .
23
Vladimir Aleksandrovich Fock (1898–1974), físico russo.
Ver livro D. F. Wals and G. J. Milburn, Quantum optics (1994).

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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6.8. Oscilador Harmônico 211

Como H é uma função linear de N , o operador N pode ser diagonalizado


simultaneamente com H. Assim,

N |ni = n|ni (6.107)

O valor esperado do operador número no autoket é dado por

hn|N |ni = hn|a† a|ni = nhn|ni (6.108)

Chamamos
a|ni = |ψi (6.109)
podemos escrever (6.108) como

hψ|ψi = nhn|ni (6.110)

Desde que hψ|ψi ≥ 0 e hn|ni ≥ 0, a equação acima mostra que os


autovalores esperados n ≥ 0 são números positivos.
Para termos uma melhor compreensão dos operadores a, a† e N ,
notemos que

[N, a] = [a† a, a] = a† [a, a] + [a† , a] = −a (6.111)

Similarmente
[N, a† ] = a† (6.112)
Como resultado, nós temos
³ ´
N a† |ni = [N, a† ] + a† N |ni
= (n + 1)a† |ni (6.113)

indicando que
a† |ni = c+ |n + 1i (6.114)
Essas relações implicam que a† |ni é um autoket de N com autovalor
n+1. Então a† é um operador de criação ou operador de levantamento.
Similarmente

N a|ni = ([N, a] + aN ) |ni


= (n − 1)a|ni (6.115)

com
a|ni = c− |n − 1i (6.116)

Mecânica Quântica

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212 Cap. 6 Dinâmica Quântica

Essas relações implicam que a|ni é também um autoket de N com


autovalor n − 1, e a é um operador de aniquilação ou operador de
abaixamento.
Como n ≥ 0, existe um autovalor mínimo, chamado nmin , tal que o
ket com esse autovalor satisfaz

a|nmin i = 0 (6.117)

pois a|nmin i = c|nmin − 1i, violando a condição de mínimo nmin . Se


aplicarmos o operador de levantamento a† , teremos

a† a|nmin i = nmin |nmin i = 0 (6.118)

Desde que |nmin i exista, requer que nmin = 0. Então podemos escrever
o autoket mínimo como |0i. Aplicando o operador de levantamento (ou
criação) n vezes, fica claro que n deve ser um inteiro positivo. Natural-
mente
N |ni = n|ni n = 0, 1, 2, 3, · · · (6.119)
Assim, os autovalores do operador número N são inteiros positivos.
Logo, os autovalores da hamiltoniana são determinados por
µ ¶ µ ¶
1 1
H|ni = ~ω N + |ni = ~ω n + |ni = En |ni (6.120)
2 2
Então, a energia do oscilador harmônico
µ ¶
1
En = n + ~ω n = 0, 1, 2, 3, · · ·
2
é quantizada, tomando valores discretos. No estado fundamental, n = 0,
o oscilador quântico tem energia
1
E0 = ~ω
2
Note que o espectro de energia tem um espaçamento uniforme entre
os níveis.
Elementos de Matriz dos operadores a† e a: Inicialmente ire-
mos determinar as constante c+ em (6.114) e c− em (6.116). Por exem-
plo, a equação bra correspondente a equação ket

a† |ni = c+ |n + 1i (6.121)

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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6.8. Oscilador Harmônico 213

é dada por
hn|a = c∗+ hn + 1| (6.122)
Do produto interno dessas equações, temos

hn|aa† |ni = hn|a† a + 1|ni = (n + 1)hn|ni


= c∗+ c+ hn + 1|n + 1i (6.123)

Se os auto-estados são normalizados, i.e., eles satisfazem a √relação


hn|ni = 1 para todos os valores de n, podemos escolher c+ = n + 1,
ou √
a† |ni = n + 1|n + 1i (6.124)
Similarmente, se usarmos o ket

a|ni = c− |n − 1i (6.125)

e seu bra será


hn|a† = c∗− hn − 1| (6.126)
o produto internos é dado por

hn|a† a|ni = nhn|ni


= c∗− c− hn − 1|n − 1i (6.127)

novamente usando a normalização para todos os valores de n. Podemos



escolher c− = n. Logo,

a|ni = n|n − 1i (6.128)

Portanto para a base {|ni}, os elementos de matriz dos operadores


de criação e aniquilação são dados pela relação de ortogonalidade

hn0 |a† |ni = n + 1 δn0 ,n+1 (6.129)


hn0 |a|ni = n δn0 ,n−1 (6.130)

Logo, 
√0 0 0 0 
 1 0
 √ 0 0 
† 
(a ) =  0 2 √0 0  (6.131)
 0 0 3 0 
    
Mecânica Quântica

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214 Cap. 6 Dinâmica Quântica

e
 √
0 1 √0 0 
0
 0 2 √0 
(a) = 
0 0 0 3  (6.132)
0 0 0 0 
    
Como
s
~ ³ ´
x= a + a†
2µω
r
µω~ ³ ´
p=i −a + a†
2

temos as seguintes matrizes


s
~ ¡√ √ ¢
hn0 |x|ni = n δn0 ,n−1 + n + 1 δn0 ,n+1 (6.133)
2µω
r
µω~ ¡ √ √ ¢
hn0 |p|ni = i − n δn0 ,n−1 + n + 1 δn0 ,n+1 (6.134)
2

Então,
 √
√0 1 √0 0 
s
~ 
 1 0
√ 2 0
√ 
(x) =  0

2µω 
2 √0 3  (6.135)
0 0 3 0 
    
e
 √
√0 − 1 √0 0 
r  1
µω~  √0 − 2 √0 
(p) = i
2 
 0
 2 √ 0 − 3  (6.136)
0 0 3 0 
    
como o esperado, essas matrizes são hermitianas, porém não são diag-
onais na representação N que estamos usando, claro que as matrizes x
e p assim como a e a† não comutam com N .

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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6.8. Oscilador Harmônico 215

Finalmente, podemos aplicar sucessivamente o operador de criação


a† no estado fundamental |0i. Usando a relação (6.124), teremos
|1i = a† |0i
a† (a† )2
|2i = √ |1i = √ |0i
2 2
a† (a† )3
|3i = √ |2i = √ |0i
3 32
..
.
(a† )n
|ni = √ |0i (6.137)
n!
Nesse modo garantimos a construção de simultâneos autokets de N e
H com autovalores de energia
µ ¶
1
En = n + ~ω (n = 0, 1, 2, 3, · · · ) .
2
Funções de Onda no espaço de posição: Iremos usar o método
dos operadores para obter as autofunções no espaço de posição. Vamos
iniciar com o estado fundamental |0i que satisfaz
a|0i = 0 (6.138)
Projetando essa equação no espaço de posição, teremos
r µ ¶
µω i
hx|a|0i = hx| x + p |0i = 0 (6.139)
2~ µω
Mas sabemos que
~ ∂hx|0i
hx|p|0i = (6.140)
i ∂x
onde hx|0i é a amplitude de encontrarmos uma partícula no estado
fundamental na posição x. Temos também,
hx|x|0i = xhx|0i (6.141)
Assim, a equação (6.139) se reduz a uma equação diferencial de primeira
ordem 24
dhx|0i µωx
=− hx|0i (6.142)
dx ~
24
Desde que hx|0i é uma função somente de x, podemos substituir a derivada parcial
por uma derivada total.

Mecânica Quântica

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216 Cap. 6 Dinâmica Quântica

cuja solução é
µωx2
hx|0i = N e− 2~ (6.143)
Normalizando essa Gaussiana 25 , teremos
³ µω ´ 1 2
4 − µωx
hx|0i = e 2~ (6.144)
π~
Note que determinamos a função de onda do estado fundamental,
para determinar todas as autofunções de energia usaremos (6.137):
1
hx|ni = √ hx|(a† )n |0i
n!
µr ¶n µ ¶
1 µω ~ d n ³ µω ´ 14 − µωx2
=√ x− e 2~ (6.145)
n! 2~ µω dx π~
Essa equação é uma forma alternativa de obtermos as autofunções do
oscilador harmônico.
Podemos verificar que essas autofunções formam
q os polinômios de
µω
Hermite através da mudança de variável y = ~ x. Assim, a equação
(6.145) será
µ ¶
1 ³ µω ´ 41 d n − y2
hy|ni = √ y− e 2 (6.146)
2n n! π~ dy
Considerando o operador identidade
µ ¶ 2
− y2
2
d y d
e y− e2 =−
dy dy
µ ¶n 2
y 2
d y dn
e− 2 y − e 2 = (−1)n n
dy dy
o que simplifica o termo
µ ¶ µ ¶
d n − y2 − y2 y2 d n − y2
y− e 2 =e 2 e2 y− e 2
dy dy
µ ¶
2 2
− y2 y 2 − y2 d n y2 −y2
=e e e y− e2e
dy
y2 2 dn 2
= e− 2 ey (−1)n n e−y
dy
y2
= e− 2 Hn (y) (6.147)
25
Johann Carl Friedrich Gauss (1777–1855), matemático alemão.

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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“mq_notas-N” — 2009/5/5 — 21:48 — page 217 — #217


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6.8. Oscilador Harmônico 217

pois
2 dn −y2
Hn (y) = ey (−1)n e
dy n
são os polinômios de Hermite. Logo
1 ³ µω ´ 41 − y2
hy|ni = √ e 2 Hn (y) (6.148)
2n n! π~
como vimos na §3.8 do capítulo 3.
Propriedades estatísticas do oscilador quântico: Considerando
os operadores x e p, é fácil perceber por (6.133) e (6.134) que
hxi = hpi = 0 (6.149)
e ainda podemos expressar x2 e p2 pelas relações
2 ~ h 2 † 2 † †
i
x = a + (a ) + a a + aa (6.150)
2µω
e
~µω h 2 i
p2 = − a + (a† )2 − a† a − aa† (6.151)
2
Desse modo, quando procuramos determinar os valores esperados desses
dois operadores para um estado estacionário |ni do oscilador, os únicos
termos que dão contribuições não nulas são aqueles que envolvem os
produtos aa† e a† a. Os valores esperados serão expressos por
~
hx2 in = (2n + 1) (6.152)
2µω
e
~µω
hp2 in = (2n + 1) (6.153)
2
Com isso, no estado fundamental do oscilador, n = 0, temos
~ ~µω
hx2 i0 = , hp2 i0 = .
2µω 2
Segue-se que o valor esperado para a energia total do oscilador quântico,
no estado fundamental será
¿ 2À ¿ 2 2À
p µω x
hEi0 = +
2µ 0 2 0
~ω ~ω
= +
4 4
1
= ~ω
2

Mecânica Quântica

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218 Cap. 6 Dinâmica Quântica

Como o resultado previamente encontrado, aqui podemos que o valores


esperados da energia cinética e da energia potencial são dados pelo
teorema virial para a mecânica quântica.
Incertezas na posição e no momentum: No caso do oscilador
harmônico, as dispersões associadas a posição e ao momentum para
qualquer estado estacionário |ni, podem ser expressas pelas relações

h(∆x)2 in = hx2 in − hxi2n (6.154)

e
h(∆p)2 in = hp2 in − hpi2n (6.155)
como resultado,
· ¸1
£ ¤1 ~ 2
h∆xin = hx2 in − hxi2n 2 = (2n + 1)
2µω
e
· ¸1
£ 2
¤1 ~µω 2
h∆pin = hp in − hpi2n 2
= (2n + 1)
2
Para o estado fundamental, n = 0, teremos
· ¸1
~ 2
h∆xi0 =
2µω
e
· ¸1
~µω 2
h∆pi0 =
2
Essas duas relações podem ser usadas para obter a mínima incerteza
para a posição e para o momentum no estado fundamental do oscilador,
i.e.,
~
h∆xi0 h∆pi0 =
2
Para estados excitados do oscilador harmônico, n > 0, o produto acima
passa a ser µ ¶
1
h∆xin h∆pin = n + ~
2
mostrando que a relação de incerteza é sempre maior que aquela do
estado fundamental.

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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6.9. Evolução Temporal do Oscilador Harmônico 219

6.9 Evolução Temporal do Oscilador


Harmônico
De acordo com as equações de movimento de Heisenberg, temos
dp 1 ∂H
= [p, H] = − = −µω 2 x (6.156)
dt i~ ∂x
e
dx 1 ∂H p
= [x, H] = = (6.157)
dt i~ ∂x µ
Esse par de equações diferenciais acopladas é equivalente à duas equações
diferenciais não acopladas para a e a† ,
r s
µω~ d † ~
i [a − a] = −µω 2 (a + a† )
2 dt 2µω
d †
[a − a] = i ω(a + a† ) (6.158)
dt
e
s r
~ d † i µω~ †
[a + a] = (a − a)
2µω dt µ 2
d †
[a + a] = i ω(a† − a) (6.159)
dt
Logo,
da da†
= − i ωa e = i ωa† (6.160)
dt dt
cuja soluções são
a(t) = a(0) e− i ωt e a† (t) = a† (0) ei ωt (6.161)
Essas equações mostram que, tanto o hamiltoniano H quanto o oper-
ador número N não dependem do tempo, visto que o produto a† (t)a(t),
o tempo é eliminado. A dependência temporal para os operadores x e
p pode ser obtida usando as definições dos operadores a e a† , equações
(6.99) e (6.100), respectivamente. Assim,
i i
x(t) + p(t) = x(0)e− i ωt + p(0)e− i ωt (6.162)
µω µω
i i
x(t) − p(t) = x(0)e+ i ωt − p(0)e+ i ωt (6.163)
µω µω

Mecânica Quântica

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220 Cap. 6 Dinâmica Quântica

Igualando as partes hermitianas e não-hermitianas dessas equações sep-


aradamente, deduzimos
1
x(t) = x(0) cos ωt + p(0) sen ωt (6.164)
µω
p(t) = −µωx(0) sen ωt + p(0) cos ωt (6.165)

Essas equações apresentam a mesma forma que a equação clássica de


movimento do oscilador. No entanto, quando procuramos calcular os
valores esperados de hx(t)i e hp(t)i para qualquer estado |ni, o resultado
encontrado é nulo, i.e.,

hx(t)in = hp(t)in = 0

pois
hn|x(0)|ni = hn|p(0)|ni = 0
são resultados que estão de acordo com aqueles obtidos para o caso do
estado fundamental do oscilador quântico.

6.10 Estados Coerentes


Calculamos o valor médio da posição, hxi, nos estados estacionários
do oscilador harmônico e vimos até agora que esse valor é nulo, ou
seja, nenhuma oscilação! Estados estacionários não são apropriados para
comparar o sistema quântico com o análogo clássico. Para obter alguma
coisa semelhante a um pêndulo, devemos estudar pacotes de onda. Os
particulares pacotes de onda que vamos estudar agora se chamam esta-
dos coerentes. Os estados coerentes foram introduzidos por Glauber 26
e são largamente empregados no estudo da ótica e eletrônica quântica 27 .
Consideremos as autofunções do operador a. Como a não comuta com
H, as autofunções de a não serão, em geral, autofunções de H, ou seja,
não serão estados estacionários. Sejam então |αi funções tais que

a|αi = α|αi (6.166)

Como o operador a não é hermitiano, os autovalores α serão números


complexos quaisquer.
26
Roy Jay Glauber (1925– ), físico americano.
27
Para aplicações em física de laser, ver M. Sargent III, M. O. Scully and W. E. Lamb
Jr., Laser physics (1974).

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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6.10. Estados Coerentes 221

Lembremos que os estados estacionários podem ser escritos em ter-


mos do estado fundamental assim:

(a† )n
|ni = √ |0i (6.167)
n!

Vai ser importante para os cálculos que faremos, a seguinte quantidade:

1
hn|αi = √ h0|an |αi
n!
αn
= √ h0|αi (6.168)
n!

Vamos agora expandir |αi em estados estacionários


X
|αi = |ni hn|αi
n
X αn
= √ |ni h0|αi
n n!
X αn
= c0 √ |ni
n n!
X αn (a† )n
= c0 √ √ |0i
n n! n!
X (αa† )n
= c0 |0i (6.169)
n
n!

pois usamos o coeficiente c0 = h0|αi, naturalmente esse coeficiente é


determinado pela normalização de |αi. Logo,
X (α∗ )n X αm
1 = hα|αi = |c0 |2 h0|am (a† )n |0i
n
n! m
m!
X |α|2n
= |c0 |2 h0|an (a† )n |0i
n
(n!)2
X |α|2n ³√ ´2
= |c0 |2 n! hn|ni
n
(n!)2
X |α|2n
= |c0 |2 n!
n
(n!)2

Mecânica Quântica

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222 Cap. 6 Dinâmica Quântica

X |α|2n
= |c0 |2
n
n!
2 |α|2
⇒ |c0 | e =1 (6.170)

pois
X |α|n
= e|α|
n
n!
onde obtemos
|α|2
c0 = e− 2

Portanto, o estado coerente do oscilador harmônico quântico é


|α|2 X αn
|αi = e− 2 √ |ni (6.171)
n n!

Para obter a dependência temporal de |αi precisamos mostrar o resul-


tado geral: Seja H o hamiltoniano de um sistema físico, e sejam |ni suas
autofunções. Sabemos que
i
|n(t)i = |ni e− ~ En t

onde os En são os autovalores de H, ou seja, satisfazem as equações

H|ni = En |ni

Seja ψi um estado qualquer desse sistema, e


X
|ψi = an |ni
n

sua expansão nas autofunções de H no instante t = 0. Então para uma


tempo t posterior teremos
X i
|ψ(t)i = an |ni e− ~ En t (6.172)
n

Essa relação é de fácil demonstração, pois consiste em mostrar que |ψ(t)i


satisfaz a equação de Schrödinger.
Aplicando (6.172) em
|α|2 X αn
|αi = e− 2 √ |ni
n n!

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6.10. Estados Coerentes 223

temos
|α|2 X αn i
|α(t)i = e− 2 √ |ni e− ~ En t
n n!
|α|2 X αn
√ |ni e− ~ ~ω(n+ 2 )t
i 1
= e− 2

n n!
|α|2 X (α e− i ωt )n ω
= e− 2 √ |ni e− i 2 t (6.173)
n n!

Comparando esse resultado com (6.171), vê-se que


ω
|α(t)i = |α[α(t)] i e− i 2 t (6.174)

o índice α(t) é o autovalor de |αi em função do tempo que é igual

α(t) = α e− i ωt (6.175)

Agora podemos calcular o valor esperado de x e p no estado |α(t)i.

hxi = hα(t)|x|α(t)i = hα[α(t)] |x|α[α(t)] i (6.176)


hpi = hα(t)|p|α(t)i = hα[α(t)] |p|α[α(t)] i (6.177)

Das definições de a† e a obtém-se facilmente os operadores x e p


µ ¶1
~ 2
x= (a + a† ) (6.178)
2µω
µ ¶1
µ~ω 2
p = −i (a − a† ) (6.179)
2

Visto que a|α[α(t)] i = α(t)|α[α(t)] i e que hα[α(t)] |a† = α∗ (t)hα[α(t)] |, temos


µ ¶1
~ 2
hxi = hα[α(t)] |a + a† |α[α(t)] i
2µω
µ ¶1
~ 2
= (α(t) + α∗ (t))
2µω
µ ¶1
2~ 2
= <[α(t)]
µω
µ ¶1
2~ 2 £ − i ωt ¤
= < αe (6.180)
µω

Mecânica Quântica

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224 Cap. 6 Dinâmica Quântica

e
µ ¶1
µ~ω 2
hpi = − i hα[α(t)] |a − a† |α[α(t)] i
2
µ ¶1
µ~ω 2
= −i (α(t) − α∗ (t))
2
1
= (2µ~ω) 2 =[α(t)]
1 £ ¤
= (2µ~ω) 2 = α e− i ωt (6.181)

Note que do valor esperado hxi surgiu finalmente a oscilação procu-


rada! O valor médio da posição, nesse estado, oscila exatamente como
o previsto, i.e., a equação é similar ao caso clássico.
A energia média do oscilador é independente do tempo
µ ¶
2 1
hHi = ~ω |α| +
2

mas ainda temos


µ ¶
2 ~ £ ¤
hx i = 1 + (α(t) + α∗ (t))2
2µω
e µ ¶
2 µ~ω £ ¤
hp i = 1 − (α(t) − α∗ (t))2
2
Teremos então que os valores médios quadráticos de ∆H, ∆x e ∆p ficam
expressos por,

∆H = ~ω |α|
µ ¶1
~ 2
∆x =
2µω
µ ¶1
µ~ω 2
∆p =
2

Note que ∆x e ∆p não são dependentes do tempo, então o pacote de


onda retém um pacote de onda mínimo por todo o tempo, ou seja,
podemos dizer que os estados coerentes correspondem a uma pacote de
onda de mínima dispersão.

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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6.11. Equação de Onda de Schrödinger 225

6.11 Equação de Onda de Schrödinger


Vamos voltar a representação de Schrödinger e examinar a evolução
temporal do ket |ψ(t)i na representação de espaço de posição. Em outras
palavras, vamos estudar o desenvolvimento da função de onda

ψ(~r, t) = h~r|ψ(t)i (6.182)

como função do tempo, onde |ψ(ti) é o estado ket na representação de


Schrödinger em um tempo t, e h~r| é o vetor bra de posição independente
do tempo, com autovalor ~r. A hamiltoniana do sistema é dada por

~p2
H= + V (~r) . (6.183)

O potencial V (~r) é um operador hermitiano e na representação espaço


de posição
h~r0 |V (~r)|~ri = V (~r) δ 3 (~r −~r0 ) (6.184)
onde V (~r) é uma função real de ~r.
Para derivar a equação de Schrödinger, vamos partir da equação

i~ |ψ(t)i = H |ψ(t)i , (6.185)
∂t
multiplicando os dois lados pelo vetor bra, h~r|, temos


i~ h~r|ψ(t)i = h~r|H|ψ(t)i . (6.186)
∂t
Mas sabemos que
¿ ¯ 2¯ À µ 2¶
¯ ~p ¯ ~
~r ¯¯ ¯¯ ψ(t) = − ∇2 h~r|ψ(t)i
2µ 2µ
e
h~r|V (~r)|ψ(t)i = V (~r) h~r|ψ(t)i

onde no primeiro termo da última expressão, V (~r) é o operador e no


segundo termo da mesma expressão é o autovalor. Combinando esses
resultados na equação (6.186) teremos
µ 2¶
∂ ~
i ~ h~r|ψ(t)i = − ∇2 h~r|ψ(t)i + V (~r) h~r|ψ(t)i (6.187)
∂t 2µ

Mecânica Quântica

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226 Cap. 6 Dinâmica Quântica

na qual podemos reescrever a equação acima como


µ 2¶
∂ ~
i ~ ψ(~r, t) = − ∇2 ψ(~r, t) + V (~r) ψ(~r, t) , (6.188)
∂t 2µ
que é a equação de Schrödinger dependente do tempo.
Como sabemos se o estado inicial do sistema é o auto-estado de
energia, |ψ(0)i = |ϕn i, então
i
|ψ(t)i = e− ~ En t |ϕn i (6.189)
e dizemos que os auto-estados de energia formam o conjunto de estados
estacionários. Multiplicando essa expressão por h~r| em ambos os lados,
teremos
i
h~r|ψ(t)i = h~r|ϕn i e− ~ En t (6.190)
onde no sistema temos H|ϕn i = En |ϕn i e N|ϕn i = n|ϕn i simultanea-
mente. Assim, substituindo em (6.187) e cortando a parte exponencial
comum em todos os termos, teremos
µ 2¶
~
− ∇2 h~r|ϕn i + V (~r) h~r|ϕn i = En h~r|ϕn i (6.191)

como h~r|ϕn i = ϕn (~r) podemos reescrever a expressão acima como
µ 2¶
~
− ∇2 ϕn (~r) + V (~r) ϕn (~r) = E ϕn (~r) (6.192)

Essa é a conhecida equação de Schrödinger independente do tempo.
Com essa demonstração vimos que podemos escrever a equação de
Schrödinger na forma usual, i.e., da mecânica quântica ondulatória,
através da notação de Dirac, o que mostra sua equivalência. Podemos
ver as interpretações e aplicações dessas equações nos capítulos 2 e 3.

6.12 Comentários
Para esse capítulo, recomendo uma leitura detalhada em paralelo da
obra do Prof. Paul Dirac (1958) 28 . Um estudo poderá ser realizado com
os livros dos Profs. Cohen-Tannoudji et.al. (1977) 29 , Jun John Saku-
rai (1994) 30 , John Townsend (1992) 31 e A. Messiah (1970) 32 , o livro
28
P. A. M. Dirac, The principles of quantum mechanics, (1958).
29
C. Cohen-Tannoudji, B. Diu and F. Laloë, Quantum mechanics, (1977).
30
J. J. Sakurai, Modern quantum mechanics, (1994).
31
J. S. Townsend, A modern approach to quantum mechanics, (1992).
32
A. Messiah, Quantum mechanics, (1970).

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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6.12. Comentários 227

do Profs. Cohen-Tannoudji et.al. tem um trabalho muito interessante


sobre estados coerentes.
Uma excelente discussão sobre os estados coerentes também poderá
ser encontrada nos livros do Prof. Merzbacher (1998) 33 e do Prof. Wol-
ney Filho (2002) 34 .

33
E. Merzbacher, Quantum mechanics, (1998).
34
W. Wolney Filho, Mecânica quântica, (2002).

Mecânica Quântica

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Capítulo 7

Propagadores e Integrais de
Caminho de Feynman

Tomando como motivação os trabalhos originais de P. Dirac 1 sobre a


conexão entre a mecânica clássica e quântica, Richard Feynman 2 de-
senvolveu o conceito de integral de caminho para a teoria quântica,
assim a mecânica quântica foi praticamente reinventada de forma genial
e elegante nos anos 40 do século passado 3 .
Essa forma de desenvolver a mecânica quântica, diferente das versões
de Heisenberg e Schrödinger, oferece pontos de vista novos de muito
interesse e úteis. Hoje grande parte dos trabalhos realizados em teoria
quântica de campos e física estatística fazem uso desse formalismo.

7.1 Propagadores
Vamos iniciar escrevendo a amplitude de transição hx0 , t0 |x0 , t0 i para
uma partícula que inicialmente encontra-se no estado |x0 , t0 i (em um
tempo t0 ) e evolui para a posição |x0 , t0 i (num tempo posterior t). No
capítulo anterior, quando introduzimos o operador de evolução tem-
poral, nós ajustamos nosso relógio no estado inicial da partícula em
t = 0, e então consideramos a evolução para o tempo t. Aqui, o tempo
1
P. A. M. Dirac, Physikalische Zeitschrift der Sowjetunion, 3, 64 (1933);
P. A. M. Dirac, Reviews of Modern Physics, 17, 195 (1945).
2
Richard Philips Feynman (1918–1988), físico americano.
3
R. P. Feynman: The Principle of Least Action in Quantum Mechanics,
Ph.D. Thesis, Princeton University, May (1942); R. P. Feynman, Reviews of Mod-
ern Physics, 20, 367 (1948).

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230 Cap. 7 Propagadores e Integrais de Caminho de Feynman

inicial será t0 e a evolução temporal será para o intervalo t0 − t0 . Então


a amplitude de transição será dada por
i 0
hx0 , t0 |x0 , t0 i = hx0 |U(t0 − t0 )|x0 i = hx0 |e− ~ H(t −t0 ) |x0 i (7.1)
onde U(t0 −t0 ) é o operador de evolução temporal. O hamiltoniano, aqui
assumimos ser independente do tempo, é em geral função do momentum
e da posição, H = H(p, x). Em uma dimensão
p2
H= + V (x) . (7.2)

Uma vez conhecida a amplitude, podemos determinar como o estado
ket |ψi evoluí no tempo. Desde que podemos escrever o estado |ψi como
a superposição de autokets de posição |x0 i então
i 0
hx0 |ψ(t)i = hx0 |e− ~ H(t −t0 ) |ψ(t0 )i
Z ∞
i 0
= dx0 hx0 |e− ~ H(t −t0 ) |x0 i hx0 |ψ(t0 )i
Z−∞

= dx0 hx0 , t0 |x0 , t0 i hx0 |ψ(t0 )i (7.3)
−∞

A amplitude hx0 , t0 |x0 , t0 i que aparece dentro da integral (7.3), é freqüen-


temente chamada em mecânica ondulatória como kernel do operador
integral que representa o propagador das ondas mecânicas, do estado
inicial ao estado final.
Exemplos de propagador: Vamos calcular o propagador para uma
partícula livre. O hamiltoniano da partícula livre é dado por
p2
H= (7.4)

Inserindo um conjunto completo de estados de momentum
Z ∞
dp |pihp| = 1 (7.5)
−∞

em (7.1), teremos
µ ¶
Z ∞ p2
− ~i (t0 −t0 )
hx0 , t0 |x0 , t0 i = dp hx0 |e

|pi hp|x0 i
−∞
µ ¶
Z ∞ p2
− ~i (t0 −t0 )
dp hx0 |pi hp|x0 i e

= (7.6)
−∞

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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7.1. Propagadores 231

Usando
1 i
hx|pi = √ e ~ px (7.7)
2π~
vemos que
µ ¶
Z ∞ p2
1 i − ~i (t0 −t0 )
p(x0 −x0 )
hx0 , t0 |x0 , t0 i =

dp e ~ e (7.8)
2π~ −∞

Essa é uma integral Gaussiana 4 . Logo teremos,


r 0
0 0 µ i µ(x −x0 )
2~(t0 −t0 )
hx , t |x0 , t0 i = 0
e (7.9)
2π i ~(t − t0 )

Essa expressão é usada para um problema típico de evolução temporal


quando a partícula livre é representada por um pacote de onda Gaus-
siano e que se propaga como função do tempo.
Um segundo exemplo é o caso do oscilador harmônico, onde a função
de onda de um auto-estado de energia é dada por
µ ¶³ ¶ µr
1 µω ´ 41 − µωx2
µω
x e− i ω(n+ 2 )t
1
− ~i En t
ϕn (x) e = √ e 2~ Hn
2n/2 n! π~ h
(7.10)
o propagador, cuja prova é encontrado em livros de funções especiais
4
Uma integral Gaussiana é dada por
Z ∞ r
−ax2 π
I(a) = dx e =
−∞ a

Se tivermos Z ∞ 2
I(a, b) = dx e−ax +bx

−∞

podemos fazer
µ ¶2
b b2
ax2 − bx = a x − −
2a 4a
mudando de variável
b
x0 = x −
2a
teremos Z r

b2 02 b2 π
I(a, b) = e 4a dx0 e−ax = e 4a .
−∞ a

Mecânica Quântica

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232 Cap. 7 Propagadores e Integrais de Caminho de Feynman

como Morse (1953) 5 é dado por


r
µω
hx00 , t|x0 , t0 i =
2π i ~ sen [ω(t − t0 )]
·½ ¾n o¸
i µω 002 02 00 0
× exp (x + x ) cos [ω(t − t0 )] − 2x x
2~ sen [ω(t − t0 )]
(7.11)

Note que (7.11) é uma função periódica do tempo t com freqüência


angular ω, a freqüência do oscilador clássico. A idéia é que a partícula
que inicialmente está localizada em x0 retornará a sua posição de origem
quando t = 2π 4π
ω ( ω e assim por diante).
Notas sobre o Kernel : Do operador evolução temporal temos
i
|ψ(t)i = e− ~ H(t−t0 ) |ψ(t0 )i
X i
= |a0 iha0 |ψ(t0 )i e− ~ Ea0 (t−t0 ) (7.12)
a0

mas X i
h~x0 |ψ(t)i = h~x0 |a0 iha0 |ψ(t0 )i e− ~ Ea0 (t−t0 ) (7.13)
a0

Note que Z
0
ha |ψ(t0 )i = d3~x0 ha0 |~x0 ih~x0 |ψ(t0 )i (7.14)

usando (7.13) e (7.14), o desenvolvimento do estado inicial em ~x0 para


o estado final ~x00 será
Z X i
h~x00 |ψ(t)i = d3~x0 h~x00 |a0 iha0 |~x0 ih~x0 |ψ(t0 )i e− ~ Ea0 (t−t0 ) (7.15)
a0

onde X i
K(~x00 , t;~x0 , t0 ) = h~x00 |a0 iha0 |~x0 i e− ~ Ea0 (t−t0 ) (7.16)
a0

é o kernel do operador integral que representa o propagador. Algumas


propriedades importantes:

1. Para qualquer problema dado, o propagador depende somente do


potencial e é independente da função de onda inicial;
5
P. M. Morse and H. Feshbach, Methods of theoretical physics, (1942).

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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7.1. Propagadores 233

2. A evolução temporal da função de onda é completamente prevista


se K(~x00 , t;~x0 , t0 ) for conhecido e a função de onda ψ(~x0 , t0 ) for
dada inicialmente;

3. Se t > t0 , K(~x00 , t;~x0 , t0 ) satisfaz a equação de Schrödinger depen-


dente do tempo nas variáveis ~x00 , t com ~x0 , t0 fixos. Evidentemente,
de (7.16)
i
h~x00 |a0 i e− ~ Ea0 (t−t0 ) → U(t, t0 )|a0 i

4. limt→t0 K(~x00 , t;~x0 , t0 ) = δ 3 (~x00 − ~x0 )

Com essas propriedades, é fácil verificar que de (7.16) teremos


i
K(~x00 , t;~x0 , t0 ) = h~x00 |e− ~ H(t−t0 ) |~x0 i = h~x00 , t|~x0 , t0 i (7.17)

a última passagem se deve à (7.1). A equação (7.17) nada mais é do que


o operador de evolução temporal.
Finalmente, a solução geral para a evolução temporal da função de
onda será Z
ψ(~x , t) = d3~x0 K(~x00 , t;~x0 , t0 ) ψ(~x0 , t0 )
00
(7.18)

onde X
K(~x00 , t;~x0 , t0 ) = φa0 (~x00 ) e− i Ea0 t φ∗a0 (~x0 ) ei Ea0 t0
a0

é o kernel, núcleo, propagador de Feynman ou função de Green


do propagador de Feynman.
Como em mecânica quântica não relativista um sistema físico só se
propaga para o futuro, para satisfazer o princípio da causalidade de
Galileu 6 , devemos ter

K(~x00 , t;~x0 , t0 ) 6= 0 (t > t0 ) (7.19a)


00 0
K(~x , t;~x , t0 ) = 0 (t < t0 ) (7.19b)

Essas duas expressões podem ser escritas por intermédio de uma única
expressão, usando a função de Heaviside, definida em (3.11), i.e.
Z x ½
0 0 0 se x < 0,
η(x) = δ(x ) dx = (7.20)
−∞ 1 se x > 0.
6
Galileu Galilei (1564–1642), matemático e físico italiano.

Mecânica Quântica

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234 Cap. 7 Propagadores e Integrais de Caminho de Feynman

Desse modo
X
K(~x00 , t;~x0 , t0 ) = φa0 (~x00 ) e− i Ea0 t φ∗a0 (~x0 ) ei Ea0 t0 η(t − t0 ) (7.21)
a0

que satisfaz a equação de onda dependente do tempo


·µ 2 ¶ ¸
~ 00 2 00 ∂
− ∇ + V (~x ) − i ~ K(~x00 , t;~x0 , t0 ) = − i ~δ(~x00 −~x0 )δ(t−t0 )
2µ ∂t
(7.22)

7.2 Evolução da Amplitude de Transição


Para resolver a evolução da amplitude de transição hx0 , t0 |x0 , t0 i iremos
usar pequenos intervalos de tempo. Assim, dividiremos o intervalo de
0
tempo t0 −t0 em N intervalos iguais, cada um com a grandeza ∆t = t −t N .
0

Podemos tomar um número muito grande de intervalos, tal que N →


∞ e naturalmente ∆t → 0. Em intervalos de tempo muito pequeno,
podemos expandir a exponencial no operador de evolução temporal em
série de Taylor.

i i
e− ~ H∆t = 1 − H∆t + O(∆t2 ) (7.23)
~

onde os termos de ordem O(∆t2 ), incluindo ∆t2 e de ordem superiores,


podem ser ignorados sem complicações futuras. Assim,
· ¸
0 − ~i H∆t 0 i
hx |e |xi = hx | 1 − H∆t |xi
~
· µ ¶ ¸
0 i p2
= hx | 1 − + V (x) ∆t |xi (7.24)
~ 2µ

É fácil desenvolver a equação acima, desde que conhecemos o auto-


estado do operador posição e momentum

V (x)|xi = V (x)|xi

e
p|pi = p|pi .

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7.3. Integrais de Caminho de Feynman 235

Desse modo,
Z ∞ · µ ¶ ¸
0 − ~i H∆t 0 i p2
hx |e |xi = dp hx |pihp| 1 − + V (x) ∆t |xi
−∞ ~ 2µ
Z ∞ · ¸
0 i
= dp hx |pihp| 1 − E∆t |xi (7.25)
−∞ ~
onde a energia total, E, é dada por
p2
E(p, x) = + V (x) (7.26)

Agora, com o uso da energia total, podemos fazer o inverso (7.23)
i i
1 − E∆t + O(∆t2 ) = e− ~ E∆t (7.27)
~
Então, a amplitude de transição (7.25) será
Z ∞
i i
hx0 |e− ~ H∆t |xi = dp hx0 |pihp|xi e− ~ E∆t
−∞
Z ∞
1 i 0 i
= dp e ~ p(x −x) e− ~ E∆t
2π~ −∞
ou
Z ∞ · µ ¶ ¸
1 i (x0 − x)
= dp exp p − E ∆t . (7.28)
2π~ −∞ ~ ∆t

7.3 Integrais de Caminho de Feynman


Estamos preparados pra resolver a amplitude de transição hx0 , t0 |x0 , t0 i
em um intervalo de tempo finito. Novamente faremos uma divisão do
intervalo de tempo t0 − t0 por N intervalos iguais ∆t, com tempos
intermediários t1 , t2 , · · · , tN −1 . Então,
i i i
hx0 , t0 |x0 , t0 i = hx0 |e− ~ H∆t · · · e− ~ H∆t e− ~ H∆t |x0 i (7.29)

onde temos N vezes o produto de operadores de evolução temporal


i i
e− ~ H∆t · · · e− ~ H∆t . No próximo passo, vamos inserir um conjunto com-
pleto de estados de posição |xi i
Z ∞
dxi |xi ihxi | = 1 i = 1, 2, · · · , N − 1 (7.30)
−∞

Mecânica Quântica

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236 Cap. 7 Propagadores e Integrais de Caminho de Feynman

entre cada um desses operadores de evolução temporal


Z Z
0 0
hx , t |x0 , t0 i = dx1 dx2 · · ·
Z
i i
× dxN −1 hx0 |e− ~ H∆t |xN −1 ihxN −1 |e− ~ H∆t |xN −2 i · · ·
i i
× hx2 |e− ~ H∆t |x1 ihx1 |e− ~ H∆t |x0 i (7.31)

Analisando essa expressão da direita para a esquerda temos: a amplitude


de transição para a partícula na posição x0 em t0 chegar na posição x1
em t1 = t0 + ∆t, multiplicado pela amplitude de transição em que uma
partícula na posição x1 em t0 +∆t tem para chegar na posição x2 em t2 =
t0 +2∆t, e assim por diante. Essa seqüência termina com a amplitude de
transição de termos a partícula em x0 no tempo t0 partindo da posição
anterior xN −1 no tempo ∆t anterior. Note que estamos integrando sobre
todos os valores de x1 , x2 , · · · , xN −1 na equação (7.31). Assim, se
tomarmos ∆t → 0, estaremos efetivamente integrando sobre todos os
caminhos possíveis para alcançar a posição x0 em t0 quando partimos
da posição x0 em t0 . A Fig. 7.1 mostra os possíveis caminhos no plano
x − t para a partícula que saiu de x0 em t0 até chegar em x0 no tempo
t0 .

Figura 7.1: Amplitude sobre todos os caminhos possíveis.

Usaremos a expressão (7.28) para N amplitudes de transição


i
hxi+1 |e− ~ H∆t |xi i

em (7.31). Devemos ter o cuidado ao inserir os intervalos apropria-


dos para as posições inicial e final em cada caso. Se N → ∞, conse-
qüentemente ∆t → 0, podemos com certeza ignorar O(∆t2 ) para cada

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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i i
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7.3. Integrais de Caminho de Feynman 237

amplitude individualmente, a expressão para a completa amplitude de


transição é dada por
Z Z Z
dp1
hx0 , t0 |x0 , t0 i = lim dx1 · · · dxN −1 ···
N →∞ 2π~
Z ( N · ¸ )
dpN i X (xi − xi−1 )
× exp pi − E(pi , xi−1 ) ∆t
2π~ ~ ∆t
i=1
(7.32)

Em fato, (7.32) envolve tanto um número infinito de integrais de mo-


mentum como de integrais de posição. Felizmente para a hamiltoniana
p2
H = 2µ + V (x), cada integral de momentum é uma integral Gaussiana
do tipo Z ∞ r
b2
0 −ax0
2 b2 π
I(a, b) = e 4a dx e =e 4a ,
−∞ a
i ∆t i(xi −xi−1 )
com a = 2µ~ eb= ~ . Uma integral típica de momentum é dada
por
Z · ¸
dpi p2i ∆t pi (xi − xi−1 )
exp − i +i
2π~ 2µ~ ~
r " µ ¶µ ¶ #
µ i µ∆t xi − xi−1 2
= exp . (7.33)
2π i ~∆t ~ 2 ∆t

Depois de realizar todas as integrais em p, encontraremos


Z Z ³ ´N
µ 2
hx0 , t0 |x0 , t0 i = lim dx1 · · · dxN −1
N →∞ 2π i ~∆t
( N
" µ ¶ #)
i X µ xi − xi−1 2
× exp ∆t − V (xi−1 ) (7.34)
~ 2 ∆t
i=1

Para N → ∞, ∆t → 0, o argumento do expoente torna-se a definição


padrão de uma integral de Riemann 7
N
" µ ¶ # Z 0
i X µ xi − xi−1 2 i t
lim ∆t − V (xi−1 ) = dt L(x, ẋ)
N →∞ ~ 2 ∆t ~ t0
i=1
(7.35)
7
Georg Friedrich Bernhard Riemann (1826–1866), matemático alemão.

Mecânica Quântica

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238 Cap. 7 Propagadores e Integrais de Caminho de Feynman

onde µ ¶2
1 dx 1
L(x, ẋ) = µ − V (x) = µẋ2 − V (x) (7.36)
2 dt 2
é a lagrangiana usual da mecânica clássica 8 .
Finalmente, é conveniente escrever as integrais de posição em uma
notação mais compacta
Z x0 Z Z ³ ´N
µ 2
D[x(t)] = lim dx1 · · · dxN −1 (7.37)
x0 N →∞ 2π i ~∆t

no qual é um modo simbólico de indicar que a integramos sobre todos


os possíveis caminhos que conectam x0 e x0 . Então,
Z x0 i
hx0 , t0 |x0 , t0 i = D[x(t)] e ~ S[x(t)] (7.38)
x0

onde Z t0
S[x(t)] = dt L(x, ẋ) (7.39)
t0

é a ação para uma particular trajetória tomada pela partícula. A in-


tegral (7.38) é conhecida como uma integral funcional ou integral
de caminho de Feynman 9 . Na soma sobre todos os possíveis cam-
inhos, estamos realmente integrando sobre todas as possíveis funções
x(t) cuja condições de contorno são x(t0 ) = x0 e x(t0 ) = x0 . Mais tarde,
Kac 10 mostrou com rigor matemático que que usando o expoente real
é possível uma formula análoga à integral de Feynman 11 . Essa integral
funcional é muito importante em física estatística e na teoria dos proces-
sos estocásticos, e ficou conhecida como fórmula de Feynman-Kac.

7.4 Aproximação Semiclássica


Para obter a aproximação semiclássica das integrais de caminho segui-
remos o seguinte passo: Numa típica aproximação semiclássica, a ação
8
Para um estudo da lagrangiana e do princípio da mínima ação, ver Goldstein, Clas-
sical mechanics, (1980), ou o livro de Landau e Lifshitz, Mechanics, (1993).
9
Para um estudo detalhado da integral de caminho de Feynman, ver Feynman and
Hibbs, Quantum mechanics and path integrals, (1964).
10
Mark Kac (1914–1984), matemático polonês-americano.
11
M. Kac, Trans. Am. Math. Soc., 65, 1 (1949).

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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7.4. Aproximação Semiclássica 239

ao longo das trajetórias representada pelo kernel


Z x0 i
0 0 0 0
K(x , t ; x0 , t0 ) = hx , t |x0 , t0 i = D[x(t)] e ~ S[x(t)] (7.40)
x0

satisfaz á condição S~ >>> 1, e, para pequenas variações δx(t) das


trajetórias, a variação correspondente da fase será tal que δS ~ >>> 1,
de modo que as contribuições resultantes à integral de Feynman tendem
a se cancelar por interferência destrutiva. Como mostra a Fig. 7.2 a
interferência destrutiva só ocorre quando afastado da trajetória clássica,
xc (t), caso contrário haverá uma interferência construtiva na vizinhança
dessa trajetória clássica, tais que

Figura 7.2: Aproximação semiclássica.

Z t0
¡ ¢
δS [xc (t)] , x0 , x0 ; t = δ dt L = 0 (7.41)
0

pois nesse caso a fase é estacionária para pequenas variações δx(t) em


torno de xc (t). Como L é a lagrangiana clássica, a equação (7.41) é o
princípio de Hamilton, e naturalmente xc (t) liga os pontos (x0 , 0) e
(x0 , t0 ). A contribuição resultante à (7.40) deve ser proporcional a
i i 0
e ~ Sc = e ~ S([xc (t)],x ,x0 ;t) (7.42)

onde Sc é a ação clássica. Em geral, pode haver mais de uma trajetória


clássica ligando os pontos considerados, sendo de se esperar que a aprox-
imação semiclássica da integral de Feynman seja uma soma de termos
desse tipo.

Mecânica Quântica

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240 Cap. 7 Propagadores e Integrais de Caminho de Feynman

Considerando a situação análoga para a integral ordinária de uma


função de uma única variável,
Z b
i
K(~) = dx e ~ S(x) (7.43)
a

onde ~ é um parâmetro pequeno (~ → 0), de modo que a integral seja


rapidamente oscilante. A contribuição dominante deve vir da vizinhança
de um ponto de fase estacionária x̄,
¯
0 dS ¯¯
S (x̄) = = 0, (7.44)
dx ¯x=x̄

e suponhamos para simplificar que exista precisamente um ponto de


fase estacionária interno ao intervalo [a, b].
Para aproximar assintoticamente (7.43), expandimos a fase em torno
de x̄,
1 ¡ ¢
S(x) = S(x̄) + (x − x̄)S 0 (x̄) + (x − x̄)2 S 00 (x̄) + O (x − x̄)3 (7.45)
2
note que S 0 (x̄) = 0. Substituindo em (7.43), teremos
µ ¶
Z b i (x−x̄)3
i (x−x̄)2 S 00 (x̄)+O
S(x̄) 2~ ~
K(~) = e ~ dx e
a

√ i S(x̄) Z (b−x̄)/ ~ √
= ~ e~
i
dy e 2 S
00 (x̄)y 2 +O
(~)
(7.46)

−(x̄−a)/ ~

onde usamos a nova variável x−x̄


√ = y. Quando (~ → 0), os limites de
~
integração tendem a ±∞, e podemos aproximar K(~) usando a integral
de Fresnel 12 Z ∞ r
i(ax2 +bx) i π − i b2
dx e = e 4a
−∞ a
dando, s
2π~ i π
K(~) = e ~ S(x̄)±i 4 + O(~) (7.47)
|S 00 (x̄)|
onde, na equação acima o sinal + é para S 00 (x̄) > 0 e o sinal − é para
S 00 (x̄) < 0.
12
Augustin-Jean Fresnel (1788–1827), físico francês.

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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7.4. Aproximação Semiclássica 241

O método pode ser estendido a uma integral múltipla n-dimensional


Z Z
i
K(~) = ··· dx1 · · · dxn e ~ S(x1 ··· xn ) (7.48)

Se há apenas um ponto de fase estacionária (x̄1 , · · · , x̄n ) dentro do


domínio de integração, a expansão análoga à (7.45) é

n ¯
1 X ∂ 2 S ¯¯
S(x1 · · · xn ) = S(x̄1 · · · x̄n ) + (x − x̄i )(x − x̄j ) + · · ·
2 ∂xi ∂xj ¯x̄i ,x̄j
i,j=1
(7.49)
Substituindo em (7.48), obteremos no expoente uma forma quadrática
nas variáveis yi = x − x̄i . Por uma transformação linear, podemos
diagonalizá-la e reduzir o resultado13 a um produto de integrais de
Fresnel. Obtém-se assim14
n
(2π~) 2 i iπ
K(~) = 1 e ~ S(x1 ··· xn )+ 4
ν
(7.50)
|det D| 2

onde D é a matriz ¯¯ 2 ¯¯
¯¯ ∂ S ¯¯
D = ¯¯¯¯ ¯¯ (7.51)
∂xi ∂xj ¯¯ x̄i ,x̄j

de S no ponto de fase estacionária, e ν = P − N é a diferença entre o


número de autovalores positivos P e negativos N da forma quadrática
associada a D.
Para a integral de Feynman (7.40), o análogo da expansão (7.49) é a
expansão funcional da ação S em série de Taylor funcional em torno
de xc (t) que corresponde a uma trajetória clássica:
Z t0
1
S= dt L (x(t), ẋ(t)) = Sc + δ 2 S(xc ) + · · · (7.52)
0 2

onde o termo δS = 0 e a variação δ 2 S é um funcional quadrático na


variação
X(t) = δx(t) = x(t) − xc (t)
13
ver Bellman, Introduction to matrix analysis, (1960).
14
note que o det D é o produto dos autovalores.

Mecânica Quântica

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242 Cap. 7 Propagadores e Integrais de Caminho de Feynman

em torno da trajetória clássica, ver Fig. 7.2, teremos


Z (µ ¶ µ 2 ¶
t0
2 δ2L 2 δ L
δ S= dt X (t) + 2 X(t)Ẋ(t)
0 δx2 x=xc δxδ ẋ x=xc
µ 2 ¶ )
δ L
+ Ẋ 2 (t) (7.53)
δ ẋ2 x=xc

e as expressões entre parênteses são derivadas funcionais.


A aproximação semiclássica da integral de Feynman (7.40) será en-
tão
i
K(x0 , t0 ; x0 , 0) = e ~ Scl φ(t0 ) (7.54)

onde
¡ ¢
Scl = S [xc (t)] , x0 , x0 ; t

é a ação clássica pois apenas uma trajetória clássica contribui nesse


caso, e
Z x0
i 2
0
φ(t ) = D[x(t)] e 2~ δ S[xc (t)]
x0

tem uma interpretação física muito simples, pois podemos notar que
φ(t0 ) representa precisamente o efeito das flutuações quânticas em
torno da trajetória clássica.

7.5 Oscilador Harmônico


A lagrangiana para o oscilador harmônico em uma dimensão é dada por

1 1
L(x, ẋ) = µẋ2 − µω 2 x2 (7.55)
2 2
da equação de Lagrange, temos

∂L d ∂L
− =0 ⇒ ẍ + ω 2 x = 0 (7.56)
∂x dt ∂ ẋ
cuja solução é dada por

x(t) = A cos ωt + B sen ωt . (7.57)

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7.5. Oscilador Harmônico 243

Aplicando as condições de contorno, t = 0 e t = T


x(t = 0) = x0 = A (7.58)
x(t = T ) = xT = x0 cos ωT + B sen ωT
xT − x0 cos ωT
⇒B= (7.59)
sen ωT
Assim
xT sen ωt + x0 sen ω(T − t)
x(t) = (7.60)
sen ωT
xT ω cos ωt − x0 ω cos ω(T − t)
ẋ(t) = (7.61)
sen ωT
Então
Z T Z T µ ¶
1 2 1 2 2
Scl = dt L(x, ẋ) = dt µẋ − µω x
0 0 2 2
Z T · ¸
1 d 1 1
= dt µ (xẋ) − µxẍ − µω 2 x2
0 2 dt 2 2
Z T
1 µ ¯¯T
=− µ dt x[ẍ + ω 2 x] + xẋ¯
2 0 2 0
2
mas ẍ + ω x = 0, logo
µ
= [x(T )ẋ(T ) − x(0)ẋ(0)]
2
µ h xT ω x0 ω i
= (xT cos ωT − x0 ) − (xT − x0 cos ωT )
2 sen ωT sen ωT
µω £ 2 2
¤
= (xT + x0 ) cos ωT − 2x0 xT (7.62)
2 sen ωT
O fator de flutuação é definido pela parte flutuante da ação
Z T
(f l) µ³ 2 ´
S [X] = dt Ẋ − ω 2 X 2 (7.63)
0 2
e o cálculo explicito é dado pelas múltiplas integrais de caminho, com
N aproximações de infinitesimal dimensão ε. Então,
r N ·Z ∞ r ¸
N µ Y µ
φ (T ) = dXj
2π i ~ε −∞ 2π i ~ε
j=1
 
 i µ NX+1 h i 
× exp ε Xj −∂ (ε) ∂¯(ε) − ω 2 Xk (7.64)
~ 2 jk 
j,k=0

Mecânica Quântica

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244 Cap. 7 Propagadores e Integrais de Caminho de Feynman

Aqui usaremos os operadores ∂ (ε) e ∂¯(ε) definidos por


1
∂ (ε) x(t) ≡ [x(t + ε) − x(t)]
ε
1
∂¯ x(t) ≡ [x(t) − x(t − ε)]
(ε)
(7.65)
ε
no limite contínuo, teremos

lim ∂ (ε) x(t), ∂¯(ε) x(t) → ∂t


ε→0

Então, se esses operadores atuam como funções diferenciáveis


1
∂ (ε) xj ≡ (xj+1 − xj ) 0≤j≤N
ε
1
∂¯(ε) xj ≡ (xj − xj−1 ) 1≤j ≤N +1 (7.66)
ε
Em particular, eles satisfazem a regra de soma por parte na qual é
análoga a integração por partes
N
X +1 N ³
X ´
ε pj ∂¯(ε) xj = pj xj |N
0
+1
−ε ∂ (ε) pj xj (7.67)
j=1 j=0

Assim, temos alguns casos úteis:

1. Se xN +1 = x0 = 0 temos
N
X +1 N ³
X ´
pj ∂¯(ε) xj = − ∂ (ε) pj xj
j=1 j=0

2. Se p0 = pN +1 e x0 = xN +1 temos
N
X +1 N
X +1 ³ ´
pj ∂¯(ε) xj = − ∂ (ε) pj xj
j=1 j=1

Para funções cujos pontos extremos se anulam, das relações acima ter-
emos
N
X +1 ³ ´2 N
X +1 ³ ´2 N
X
∂¯(ε) xj = ∂ (ε)
xj =− xj ∂ (ε) ∂¯(ε) xj (7.68)
j=1 j=1 j=0

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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7.5. Oscilador Harmônico 245

que pode ser apresentado como uma matriz padrão


N
X N
X ³ ´
− xj ∂ (ε) ∂¯(ε) xj = − xj ∂ (ε) ∂¯(ε) xk
j=0 j,k=0

onde a matriz (N + 1) × (N + 1), com ∂ (ε) ∂¯(ε) , simétrico é dada por


 
2 −1 0 · · · · · · · · · 0
−1 2 −1 · · · · · · · · · 0
 
 0 −1 2 · · · · · · · · · 0
1  
 ..  (7.69)
∂ (ε) ∂¯(ε) = ∂¯(ε) ∂ (ε) = 2  ... ..
.
..
.
..
. . 
ε  
 0 · · · · · · · · · 2 −1 0
 
 0 · · · · · · · · · −1 2 −1
0 · · · · · · · · · 0 −1 2
Esse é obviamente a versão da derivada ∂t2 no limite contínuo.
Usando as componentes da expansão da integral de Fourier, em
que usamos a decomposição
Z ∞
x(t) = dω e− i ωt x(ω) (7.70)
−∞

vemos facilmente que as componentes de Fourier são autofunções das


derivadas discretas
i ∂ (ε) e− i ωt = Ωe− i ωt (7.71)
i ∂¯(ε) e− i ωt = Ω̄e− i ωt (7.72)
com os respectivos autovalores
i ¡ − i ωε ¢
Ω=e −1 (7.73)
ε
i¡ ¢
Ω̄ = − ei ωε − 1 (7.74)
ε
Esta claro que no limite contínuo
lim Ω, Ω̄ → ω
ε→0

isto é, ambos Ω e Ω̄ tornam-se autovalores de i ∂t . De (7.73) e (7.74)


vemos que Ω̄ = Ω∗ , tal que o operador −∂ (ε) ∂¯(ε) = −∂¯(ε) ∂ (ε) é real e
tem autovalores não negativos,
1
− ∂ (ε) ∂¯(ε) e− i ωt = [2 − 2 cos ωε] e− i ωt (7.75)
ε2

Mecânica Quântica

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246 Cap. 7 Propagadores e Integrais de Caminho de Feynman

ou seja
[2 − 2 cos ωε] ≥ 0
Voltemos agora a solução da equação (7.64), podemos escrever essa
equação como
r N ·Z ∞ r ¸
N µ Y µ
φ (T ) = dan
2π i ~ε −∞ 2π i ~ε
n=1
N
Y ½ ¾
iµ¡ 2
¢ 2
× exp Ωn Ω̄n − ω an (7.76)
~2
n=1

onde an são os coeficientes da expansão de Fourier de X(τ ).


Calculando essa integral teremos uma importante distinção para os
autovalores

2 1 h ³ πn ´i
Ωn Ω̄n − ω = 2 2 − 2 cos ε − ω2 (7.77)
ε T
do operador na exponencial do integrando da equação (7.76). Esse
poderá ser negativo para casos em que o intervalo de tempo (T = t − t0 )
seja suficientemente grande.
Primeiro, vamos considerar os autovalores inteiramente positivos. A
formula gaussiana nos dá
r N
µ Y 1
N
φ (T ) = q ¡ ¢ (7.78)
2π i ~ε ε2 Ωn Ω̄n − ω 2
n=1

introduzindo uma nova variável para a freqüência, ω


e , que satisfaz

εe
ω εω
sen =
2 2
o produto dos autovalores pode ser decomposto em resultados conheci-
dos para o fator de flutuação 15 . Assim,
N
à !
Y sen2 b 1 sen (2(N + 1)b)
1− 2 nπ = (7.79)
sen 2(N +1) sen 2b (N + 1)
n=1
15
Ver Gradshteyn and Ryshik, Table of integrals, series and products, (1980), for-
mula 1.391.1.

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7.5. Oscilador Harmônico 247


εe
ω
naturalmente, usando b = 2 , teremos
N N N
" ¡ ¢#
Y ¡ ¢ Y Y ε2 Ωn Ω̄n − ω 2
2 2 2
ε Ωn Ω̄n − ω = ε Ωm Ω̄m
n=1 m=1 n=1
ε2 Ωn Ω̄n
N N
à !
Y Y sen 2 εe
ω
= ε2 Ωm Ω̄m 1− 2
(7.80)
sen2 2(Nnπ+1)
m=1 n=1
Como resultado, chegamos em
N
¡ ¡ ¢¢ Y ¡ ¢ sen ωeT
det −ε2 ∂ ε ∂¯ε − ω 2 = ε2 Ωn Ω̄n − ω 2 = (7.81)
N sen εe
ω
n=1
e o fator flutuante total será
r r
N µ sen εe
ω
φ (T ) = (7.82)
2π i ~ ε sen ω eT
Esse resultado é válido para autovalores positivos, em particular para o
intervalo de tempo que satisfaz
π
T = (t − t0 ) <
ω
e
Se o intervalo de tempo T = t−t0 aumentar e ficar maior que ωπe , o menor
autovalor Ω1 Ω̄1 −ω 2 se torna negativo e a amplitude resultante carregará
π
um fator de fase extra e− i 2 que será válido até T = t − t0 tornar-se
maior que 2π e , onde o segundo autovalor se torna negativo também
ω e
− i π2
sendo necessário a introdução de um outro fator de fase e , e assim
por diante.
No limite contínuo ε → 0, o fator de flutuação será então
r r
µ ω
φ(T ) = (7.83)
2π i ~ sen ωT
Logo o kernel será,
i
K(xT , T ; x0 , 0) = hxT , T |x0 , 0i = e ~ Scl φ(T )
r
µω
=
2π i ~ sen ωT
½ ¾
i µω £ 2 2
¤
× exp (xT + x0 ) cos ωT − 2x0 xT
2~ sen ωT
(7.84)
que é a expressão da amplitude de evolução temporal para um oscilador
harmônico.

Mecânica Quântica

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248 Cap. 7 Propagadores e Integrais de Caminho de Feynman

7.6 Oscilador Harmônico Forçado


A lagrangiana de de um oscilador harmônico forçado pode ser dada por

1 1
L = µẋ2 − µω 2 x2 + J(t)x (7.85)
2 2

onde J(t) representa uma força externa dependente do tempo. Usando


as técnicas das seções anteriores podemos mostrar que o kernel resul-
tante é dado por
r
µω i
K= e ~ Scl (7.86)
2π i ~ sen ωT
onde o termo que aparece antes da exponencial vem da flutuação quân-
tica em torno da trajetória clássica, φ(T ), e Scl é a ação clássica para
esse oscilador dada por
µω £¡ 2 ¢
Scl = xT + x20 cos ωT − 2xT x0
2 sen ωT
Z
2xT T
+ dt J(t) sen ω(t − t0 )
µω t0
Z
2x0 T
+ dt J(t) sen ω(T − t)
µω t0
Z T Z t ¸
2 0 0 0
− 2 2 dt dt J(t)J(t ) sen ω(T − t) sen ω(t − t0 )
µ ω t0 t0
(7.87)

sendo T o tempo para deslocar da posição inicial x0 para posição fi-


nal xT . Esse resultado tem grande importância em muitos problemas
avançados, em particular quando aplicamos em eletrodinâmica quân-
tica devido o fato do campo eletromagnético ser representado como um
conjunto de osciladores harmônicos forçados.

7.7 Efeito Aharonov-Bohm


Vamos discutir se o potencial vetor A~ é um campo real ou apenas
uma conveniência matemática. A existência de A~ não nulo em regiões
~ ~
onde B = 0 indica que A é um campo real e que podemos testar
experimentalmente está afirmação. Classicamente não existe este efeito.

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7.7. Efeito Aharonov-Bohm 249

Entretanto Aharonov 16 e Bohm 17 fizeram uma descrição quântica para


uma partícula sensível à presença do potencial vetor A~ 18 .
Esse efeito constitui uma importante aplicação da equação (7.38) ou
(7.40) em particular da fase
i
e ~ S[x(t)]

O efeito Aharonov-Bohm que mostra um efeito físico direto do potencial


eletromagnético sobre elétrons quânticos (contrariamente aos elétrons
clássicos) pode ser testado experimentalmente. Um arranjo experimen-
tal para medir este efeito é apresentado na Fig. 7.3, onde elétrons são
emitidos de uma fonte para chegar ao detetor. Um obstáculo é colo-
cado de tal forma que o feixe de elétrons tomará o caminho C1 ou C2 ,
após esse obstáculo um solenoide que fica entre o caminho da fonte de
elétrons e o detetor. Existem certos cristais de ferro, que podem ser
feitos crescer sob a forma de filamentos muito alongados, microscopi-
camente finos, chamados fios de cabelo (ou bigode de gato), em inglês
whiskers, que, quando magnetizados, produzem campo magnético es-
tático concentrado no interior do cristal, mas praticamente nulo fora
do cristal 19 . Embora nesses pontos exteriores temos ~B = 0, existe neles
um potencial de calibre A ~ 6= 0.

Figura 7.3: Efeito Aharonov-Bohm - Arranjo Experimental

Quando os elétrons passam em torno do cristal não-magnetizado,


produz-se interferência como em um experimento de ótica. Quando
16
Yakir Aharonov (1932– ), físico israelense.
17
David Joseph Bohm (1917–1992), físico anglo-americano.
18
Y. Aharonov and D. Bohm, Physical Review, 115, 485–491 (1959).
19
A. Tonomura et al, Physical Review Letters, 48, 1443 (1982).

Mecânica Quântica

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250 Cap. 7 Propagadores e Integrais de Caminho de Feynman

magnetizamos o cristal da maneira indicada, há uma interação com


o potencial, e a imagem de interferência muda em relação à anterior.
Na equação (7.38) a fase na experiência sem campo magnético se
escreve
i i
F = e ~ S1 + e ~ S2
onde S1 e S2 correspondem às trajetórias alternativas tomadas C1 e C2 .
Quando o cristal é magnetizado, a S acrescenta-se a ação correspon-
dente à interação dada pela lagrangiana
µ ¶
1 2 ~v ~
L = µ~v − e φ −  A ,
2 c

e teremos:
i ie
R i ie
R
Aµ dxµ Aµ dxµ
F(A) = e ~ S1 e+ ~c 1 + e ~ S2 e+ ~c 2

Como a componente A0 = φ = 0, tem-se:


n i o
F(A) = e− ~c 1 A  d~x e ~ S1 + e ~ S2 − ~c ( 2 − 1 )A  d~x .
R R R
ie ~ i ie ~

Mas, a diferença das integrais dá a integral ao longo do contorno fechado


C que envolve o cristal:
µZ Z ¶ I
− A  d~x =
~ ~  d~x = Φ
A (7.88)
2 1 C

e esta integral Φ é o fluxo do campo magnético ~B encerrado pelo con-


torno, nulo fora do cristal. A amplitude F(A) dará lugar a uma inter-
~
ferência distinta da anterior e ela resulta da existência do potencial A
fora do cristal. Este potencial vetor, e não o campo magnético, é que
estabelece uma quantidade física, invariante de Lorentz, observada.
Se escrevermos o resultado de (7.88) em termos do campo mag-
nético, encontraremos
I
e ~  d~x
∆S = − A
~c C
Z
e ~B  d~S
= −
~c
e
= − Φ (7.89)
~c

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7.7. Efeito Aharonov-Bohm 251

O efeito Aharonov-Bohm forma a base de operação dos "SQUID"20 ,


na qual usa a interferência (supercondutora) de pares de elétrons pas-
sando através de uma estrutura "tipo anel" para detetar campos mag-
néticos extremamente pequenos.
SQUID: O dispositivo "SQUID" é formado por duas junções Joseph-
son 21em paralelo. A corrente I que entra no dispositivo é dividida em
duas componentes, que atravessam as duas junções Josephson na forma
de correntes de pares de elétrons. Neste caso, pode-se mostrar que a
dependência de cada corrente nas fases das funções de onda nos dois
lados resulta numa corrente que varia com o fluxo magnético Φ que
atravessa o contorno do circuito (efeito Aharonov-Bohm), na forma
µ ¶
Φ
I = I0 cos π
Φ0
h
onde Φ0 é o fluxo quântico dado por Φ0 = 2e . Esse resultado mostra
que quando o "SQUID" é submetido a um campo magnético, a corrente
varia periodicamente, passando por máximos consecutivos à medida que
o fluxo passa por múltiplos de Φ0 . Então, por meio de um circuito conta-
dor digital pode-se contar o número de máximos que a corrente atravessa
e assim determinar o fluxo final. Este aparelho é usado para medir cam-
pos magnéticos com grande sensibilidade e precisão. Os magnetômetros
de "SQUID" são utilizados rotineiramente em equipamentos científicos,
médicos e industriais.
Sumário: Podemos fazer um sumário do efeito Aharonov-Bohm da
seguinte forma:
1. O efeito Aharonov-Bohm é um fato experimental e um fenômeno
puramente quântico;
2. A interpretação física para o potencial vetor, que é um campo
de gauge, fundamenta a descrição de Dirac para os monopolos
magnéticos;
20
Superconducting QUantum Interference Device, desenvolvido em 1964 por
Arnold Silver, Robert Jaklevic, John Lambe e James Mercereau da Ford Research
Labs.
21
Brian David Josephson (1940– ), físico galês.
O efeito Josephson é um efeito físico que se manifesta pela aparição de uma cor-
rente elétrica que flui através de dois supercondutores fracamente interligados,
separados apenas por uma barreira isolante muito fina. Esta disposição é conhecida
como uma junção Josephson e a corrente que atravessa a barreira é chamada de
Corrente Josephson.

Mecânica Quântica

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252 Cap. 7 Propagadores e Integrais de Caminho de Feynman

3. Sem dúvida o efeito Aharonov-Bohm é um fator determinante


para o surgimento e progresso de novas áreas científicas como
por exemplo a magnetoencefalografia 22 , a pesquisa em explo-
ração mineral, a previsão de terremotos, estudos com a energia
geotérmica terrestre, desenvolvimento de tecnologia supercondu-
tora dentre outros. Além disso, existem estudos para detecção de
ondas gravitacionais utilizando-se SQUID’s 23 .

7.8 Monopolos Magnéticos


Ao longo do tempo, acreditava-se que a carga magnética, monopolos
magnéticos isolados, não tinha existência real, sendo apenas um con-
ceito auxiliar. Sua negação devia-se ao fato de não podermos separar
os pólos de uma barra imantada. Ampère 24 , em 1825, considerava a
corrente elétrica como sendo a única fonte do magnetismo. Finalmente
Maxwell, em 1873, rejeitou completamente a idéia de carga magnética.
Em 1931, Dirac desafia a idéia dominante e reabilita o conceito de
carga magnética 25 . Fazendo uso da simetria, Dirac reescreve as equações
de Maxwell, levando em conta uma densidade magnética de carga ρm e
uma densidade de corrente magnética ~Jm , na forma:
~  ~E = 4πρ
∇ (7.90a)
~  ~B = 4πρm
∇ (7.90b)
~
~ × ~E = − 4π ~Jm − 1 ∂ B
∇ (7.90c)
c c ∂t
~
~ × ~B = 4π ~J + 1 ∂ E
∇ (7.90d)
c c ∂t
Essas equações são conhecidas como equações de Maxwell-Dirac.
Um outro ponto importante, é o argumento de Dirac para a existên-
cia de um monopolo magnético, já que este ofereceria uma explicação
sobre a natureza discreta da carga elétrica.
As equações (7.90a)-(7.90d) mostram uma simetria entre ~E e ~B,
e são invariantes sob uma transformação global de dualidade. Se
22
www.if.ufrgs.br/ast/med/imagens/node21.htm
23
Explorer Gravitational Wave Antenna, http://www.roma1.infn.it/rog/explorer/
24
André-Marie Ampère (1775–1836), físico francês.
25
P. A. M. Dirac, Proceedings of the Royal Society of London, A133, 60
(1931); Physical Review, 74, 817 (1948).

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7.8. Monopolos Magnéticos 253

E denota qualquer quantidade elétrica, tais como ~E, ρ ou ~J, e M de-


nota qualquer quantidade magnética, tais como ~B, ρm ou ~Jm , então as
equações de Maxwell-Dirac são invariantes sob:
E → E cos θ + M sen θ
M → M cos θ − E sen θ (7.91)
Essa substituição é chamada transformação de dualidade. Apesar dessa
generalização das equações de Maxwell parecer perfeitamente plausível,
ela contém certas dificuldades que aparecem ao expressarmos o campo
magnético como o rotacional do potencial vetor:
~B = ∇ ~
~ ×A (7.92)
Para ver porque essa equação pode conduzir a dificuldades, vamos in-
tegrar a equação
~  ~B = 4πρm

sobre o volume de uma esfera que contém um monopolo magnético g.
Usando o teorema de Gauss, temos:
Z
~B  d~S = 4πg

isto é Z
∇ ~  d~S = 4πg
~ ×A (7.93)

Agora vamos considerar o lado esquerdo da equação (7.93). Podemos


~ ×A
calcular a integral de ∇ ~ sobre uma superfície esférica fechada, con-
siderando primeiramente um pequeno círculo de raio δ que forma uma
abertura sobre essa superfície esférica.
Agora faremos o limite δ → 0. Usando o teorema de Stokes 26 , a
~ A
integral de ∇× ~ sobre uma superfície esférica "aberta" é igual a integral
~
de A em torno desse pequeno círculo.
Z Z
∇ × A  dS =
~ ~ ~ ~  d~l
A (7.94)
δ→0
~ for livre de singularidades, então esse potencial
Se o potencial vetor A
se aproxima de uma constante quando δ → 0. Logo, o lado direito da
equação (7.94) se reduz então a
I
A  d~l = 0
~

26
George Gabriel Stokes (1819–1903), matemático e físico irlandês.

Mecânica Quântica

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254 Cap. 7 Propagadores e Integrais de Caminho de Feynman

isto é Z
∇ ~  d~S = 0
~ ×A (7.95)

O que contradiz a equação (7.93). Para resolver esse problema Dirac


~ r), qualquer superfície
considerou a existência de singularidades em A(~
fechada em torno de um monopolo magnético deve ter pelo menos um
ponto em que A ~ é singular de tal forma que a integral de linha de A~
em torno da singularidade nos dá 4πg quando δ → 0. Por exemplo, um
potencial singular ao longo do eixo ẑ é
µ ¶
~ r) = − g 1 n̂ ×~
r n̂ ×~r g
A(~ − = − cot θφ̂ (7.96)
r 2 r − n̂ ~r r + n̂ ~r r
onde n̂ = ẑ, e produz, para 0 < θ ≤ π, o campo magnético do monopolo,

~B(~r) = g ~r
r3
Esse potencial vetor tem uma linha de singularidades ao longo do semi-
eixo positivo z, onde θ = 0. Essa linha de singularidades é chamada de
linha de Dirac do monopolo.
Talvez a conseqüência mais importante da teoria dos monopolos
magnéticos seja a condição de quantização para a carga elétrica. Dirac
sugere que se existe monopolos magnéticos, esses poderiam ser descritos
estando na extremidade de um solenoide infinitamente fino carregando
o fluxo magnético igual aquele do monopolo. O solenoide tem compri-
mento semi-infinito partindo do monopolo e indo ao infinito ao longo
de um caminho arbitrário. O campo magnético produzido ao longo de
~ ×A
tal solenoide ∇ ~ é aquele produzido pelo monopolo ~Bmonopolo = g ~r3
r
mais o campo usual de um solenoide ~B0 , nesse caso infinitamente in-
tenso e contido dentro do solenoide, ver Fig. 7.4. Para observar somente
o campo do monopolo, devemos escrever
~Bmonopolo = ∇ ~ − ~B0
~ ×A

onde ~B0 existe somente dentro do solenoide. Ainda em seu trabalho,


Dirac descreve a interação de um elétron com o monopolo magnético,
é necessário que o elétron jamais "veja" o campo ~B0 produzido no
solenoide.
Na situação descrita acima, podemos usar a integral de caminho,
similar ao efeito Aharonov-Bohm, onde o solenoide será invisível ao

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7.8. Monopolos Magnéticos 255

Figura 7.4: Representação de um monopolo magnético

Figura 7.5: Caminhos ao redor da linha de Dirac

elétron, e esse poderá tomar o caminho 1 ou 2 ao redor do solenoide,


ver Fig. 7.5.
Em ordem que a interferência desses caminhos não seja afetada pela
presença da linha de Dirac, a fase relativa será um múltiplo de 2π. Essa
fase é I
e ~  d~x = − eΦ = − 4πeg
− A
~c C ~c ~c
Ajustando essa em 2πn, para que o movimento do elétron não seja

Mecânica Quântica

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256 Cap. 7 Propagadores e Integrais de Caminho de Feynman

afetado pela presença da linha de Dirac, a carga elétrica será

2π~c ~c
e= n= n
4πg 2g

onde n = 0, ±1, ±2, · · · . Isto nos leva a seguinte relação:

ge 1
= n~ (7.97)
c 2

que é justamente a condição de quantização de Dirac. Esse resultado


leva à notável conclusão de que a carga elétrica é quantizada: para um
dado g, e é proporcional ao inteiro n.
Se temo e como carga do elétron e n = 1 na equação (7.96), encon-
traremos a unidade fundamental da carga magnética:

c~ 137
g= = e (7.98)
2e 2

Apesar da falta de evidência experimental conclusiva 27 , existem fortes


razões teóricas para a existência dos monopolos magnéticos. Estas decor-
rem de idéias gerais sobre a unificação das interações fundamen-
tais. Durante as últimas décadas, houve grandes avanços na compreen-
são das forças fracas e fortes entre as partículas elementares.
G. t’ Hooft 28 e A. M. Polyakov 29 mostraram que as teorias unificadas
contêm necessariamente partículas estáveis que possuem carga mag-
nética, isto é, monopolos magnéticos 30 . Essas aparecem como soluções
independentes do tempo com energia finita das equações não-lineares
dos campos. Portanto, a existência dos monopolos magnéticos é uma
consequência muito geral da unificação das interações fundamentais.
Ainda nesses trabalhos, t’ Hooft e Polyakov fazem uma estimativa pu-
ramente teórica para a massa de um monopolo magnético de 137 × mW ,
onde mW = 80 GeV/c2 é a massa dos W ± , assim 137 × 80 GeV/c2 =
104 GeV/c2 .
27
P. B. Price, E. K. Shirk, W. Z. Osborne and L. S. Pinsky, Physical Review Letters,
35, 487 (1975); Blas Cabrera, Physical Review Letters, 48, 1378 (1982).
28
Gerardus ’t Hooft (1946– ), físico holandês.
29
Alexander Markovič Polyakov (1945– ), físico russo.
30
G. t’ Hooft, Nuclear Physics, B79, 276 (1974); Physical Review Letters, 37, 8
(1976); A. M. Polyakov, JETP Letters, 20, 194 (1974).

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7.9. Comentários 257

7.9 Comentários
Para esse capítulo, recomendo uma leitura detalhada em paralelo do
livro de Feynman e Hibbs (1964) 31 . Um estudo sobre integrais de cam-
inho também poderá ser realizado com os livros de Jun John Sakurai
(1994) 32 , John Townsend (1992) 33 e Eugen Merzbacher (1998) 34 .
Uma excelente discussão sobre o efeito Aharonov-Bohm e monopolos
magnéticos poderá ser encontrado no livro do Prof. Jun John Sakurai
(1994).

31
R. P. Feynman and A. R. Hibbs, Quantum mechanics and path integrals, (1964).
32
J. J. Sakurai, Modern quantum mechanics, (1994).
33
J. S. Townsend, A modern approach to quantum mechanics, (1992).
34
E. Merzbacher, Quantum mechanics, (1998).

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Capítulo 8

Potenciais Centrais e
Momentum Angular

Trabalharemos aqui com o movimento de uma partícula em um espaço


ordinário tridimensional. Em seus trabalhos, Bohr encontrou a chave
para a teoria do movimento dos elétrons ao redor do núcleo e na pre-
sença de um campo de Coulomb, isto é a quantização do momentum
angular. Aqui detalharemos sua relevância para a classificação de níveis
de energia em sistemas de forças centrais através do estudo do mo-
mentum angular orbital usando a equação de Schrödinger e regras
dos operadores.

8.1 Momentum Angular Orbital

O momento angular orbital é uma quantidade importante para a análise


de problemas clássicos e quânticos que contém potenciais centrais, dado
que ele é uma quantidade conservada, desde que forças centrais não
produzam torque em relação a origem. O momento angular orbital é
definido por
~L = ~r × ~p (8.1)

sendo que essa expressão não apresenta problema de ordenamento em


Mecânica Quântica. As componentes do momento angular orbital ~L são

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260 Cap. 8 Potenciais Centrais e Momentum Angular

representadas por

Lx = ypz − zpy , (8.2)


Ly = zpx − xpz , (8.3)
Lz = xpy − ypx . (8.4)

~ o momentum angular torna-se um op-


Usando a definição ~p = − i ~∇,
erador diferencial
~L = − i ~~r × ∇
~ (8.5)
Fazendo uso das conhecidas regras de comutação

[xi , pj ] = i ~δij
[xi , xj ] = 0
[pi , pj ] = 0 .

podemos deduzir as relações de comutação entre as varias componentes


de ~L, começamos com o exemplo das seguintes relações auxiliares:

[Lx , y] = [ypz − zpy , y] = −z[py , y] = i ~z ,


[Lx , py ] = [ypz − zpy , py ] = [y, py ]pz = i ~pz , (8.6)
[Lx , x] = 0 , [Lx , px ] = 0 .

Podemos obter similares relações para todos as outras componentes


entre ~L e ~r e entre ~L e ~p. Logo,

[Lx , Ly ] = [Lx , zpx − xpz ] = [Lx , z]px − x[Lx , pz ]


= − i ~ypx + i ~xpy = i ~Lz . (8.7)

e por permutação cíclica (x → y → z → x) desse resultado,

[Ly , Lz ] = i ~Lx , [Lz , Lx ] = i ~Ly (8.8)

as quais podem ser resumidas usando-se o tensor de Levi-Civita,

[Li , Lj ] = i εijk ~Lk (8.9)

onde εijk é o tensor anti-simétrico de Levi-Civita 1 , as componentes 1, 2


e 3 representam x, y e z respectivamente. Como as componentes de ~L
1
As propriedades do tensor de Levi-Civita podem ser encontradas em vários livros
de Física matemática, como por exemplo, E. Butkov, Mathematical physics (1968).

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8.1. Momentum Angular Orbital 261

não comutam entre si, não há autofunções comuns dessas componentes,


i.e., em um sistema quântico, a medida de uma das componentes de ~L
essencialmente destrói o que era anteriormente conhecido sobre a outra
componente.
Outra propriedade importante é obtido quando definimos o quadrado
do momento angular orbital
~L2 ≡ ~L  ~L = L2 + L2 + L2 (8.10)
x y z

Assim, observamos que

[~L2 , Lz ] = [L2x + L2y + L2z , Lz ]


= Lx [Lx , Lz ] + [Lx , Lz ]Lx + Ly [Ly , Lz ] + [Ly , Lz ]Ly
= Lx (− i ~Ly ) + (− i ~Ly )Lx + Ly (i ~Lx ) + (i ~Lx )Ly
=0 (8.11)

A direção z não tendo nenhum privilégio, segue que:

[~L2 , Lx ] = [~L2 , Ly ] = 0 (8.12)

ou seja
[~L2 , ~L] = 0 (8.13)
Então, como as componentes de ~L comutam com ~L , esses operadores
2

podem ter auto-estados simultâneos. Ainda, através do uso da relação


(8.9) podemos ver facilmente que
~L × ~L = i ~~L . (8.14)

Finalmente, para uma partícula de massa µ que está em um estado


de função de onda ψ(~r) vamos executar uma rotação infinitesimal
por um ângulo δϕ sobre o sistema 2 . Em sua nova posição, a função de
onda será
ψ(~r + δ~r) = ψ(~r) + δ~r  ∇ψ(~
~ r)
onde
δ~r = δ~ϕ ×~r
desprezando-se os termos a partir dos quadráticos em |δ~ϕ|. Como
³ ´
(δ~ϕ ×~r)  ∇
~ = δ~ϕ  ~r × ∇
~

2
Equivalentemente, uma rotação −δϕ sobre o sistema de eixos em relação ao qual
o sistema é referido.

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262 Cap. 8 Potenciais Centrais e Momentum Angular

podemos escrever
³ ´
ψ(~r + δ~r) = ψ(~r) + δ~ϕ  ~r × ∇
~ ψ(~r)
h ³ ´i
= 1 + δ~ϕ  ~r × ∇ ~ ψ(~r)
· ³ ´¸
i
= 1 + δ~ϕ  ~r × (− i ~)∇ ~ ψ(~r) (8.15)
~

~
mas como ~p = − i ~∇
· ¸
i
ψ(~r + δ~r) = 1 + δ~ϕ  (~r × ~p) ψ(~r) (8.16)
~

e sendo ~L = ~r × ~p, teremos


µ ¶
i
ψ(~r + δ~r) = 1 + δ~ϕ  L ψ(~r)
~ (8.17)
~

Como ~L é hermitiano, e δ~ϕ infinitesimal

R(δ~ϕ) = 1 + δ~ϕ  ~L = e ~ δ~ϕ  L


i i ~
~
é o operador de rotação unitário, que atuando sobre a função de onda
de um sistema, produz a função de onda do mesmo, rodado de δ~ϕ. O
~
operador momentum angular L~ é chamado de gerador da rotação
infinitesimal.
Se temos uma rotação infinitesimal podemos afirmar que para uma
função arbitrária qualquer

i
δf = − δ~ϕ  ~Lf
~
Se essa função arbitrária for substituída por V (r)g, onde V (r) é a en-
ergia potencial para forças centrais e g uma outra função arbitrária,
obteremos pela rotação

δ[V (r)g(~r)] = V (r)δg(~r)

ou
i i
− δ~ϕ  ~L(V g) = − V δ~ϕ  ~Lg
~ ~

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8.2. Energia Cinética e Momentum Angular 263

Desde que δ~ϕ é um vetor arbitrário e g(~r) uma função arbitrária, con-
cluímos que
~LV (r) − V (r)~L = 0 (8.18)
ou seja, o momentum angular comuta com a energia potencial para
forças centrais. Se mostrarmos que ~L comuta com a energia cinética,
então provaremos que ~L é uma constante de movimento.

8.2 Energia Cinética e Momentum Angular


O operador ~L2 é útil para mostrar que a energia cinética comuta com
~L. Ao mesmo tempo as ferramentas necessárias para reduzir o problema
de força central para uma equivalente em uma dimensão. Em mecânica
quântica, devemos tomar
~L2 = (~r × ~p)  (~r × ~p)
= r2~p2 −~r(~r  ~p)  ~p + 2 i ~~r  ~p (8.19)
onde o termo do meio, na equação acima, é para ser entendido como
3 X
X 3
~r(~r  ~p)  ~p = ri rj pj pi
i=1 j=1

e os índices 1, 2 e 3 correspondem as componentes das coordenadas


cartesianas x, y e z dos vetores.
A componente do gradiente ∇f ~ na direção de ~r é ∂f ; então
∂r


~r  ~p = − i ~r
∂r
e conseqüentemente
2
~L2 = r2~p2 + ~2 r2 ∂ + 2~2 r ∂
∂r2 ∂r
ou µ ¶
~L2 = r2~p2 + ~2 ∂ r2 ∂ (8.20)
∂r ∂r
Desde que ~L e naturalmente ~L2 comutam com qualquer função ar-
bitrária de r, usaremos (8.20) para escrever a energia cinética
~L2 µ ¶
~p2 ~2 ∂ 2 ∂
T = = − r (8.21)
2µ 2µr2 2µr2 ∂r ∂r

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264 Cap. 8 Potenciais Centrais e Momentum Angular

Aqui faremos uso dessa relação fundamental entre energia cinética T e o


momentum angular ~L2 . Sabemos que ~L comuta com a derivada radial,
e é irrelevante se a derivação em r ocorreu antes ou depois da rotação.
Com isso temos que ~L e T comutam, e assim provamos que para forças
centrais
[H, ~L] = 0 (8.22)
Essa relação de comutação mostra que nesse caso o momentum angular
é uma constante de movimento.

8.3 Problema de Autovalores do Momentum


Angular
A solução explícita do problema de autovalores do momentum angu-
lar orbital é mais direta quando expressamos em ~L2 e Lz coordenadas
esféricas (r, θ, ϕ), ver Fig. 8.1. Neste sistema de coordenadas
z

qP
­
Á
­
r ­
­
­
θ ­
­
­
­ y
¡e
¡ e
¡ ϕe
¡ e
¡ e
¡ e
¡ e

¡

Figura 8.1: Sistema de coordenadas esféricas.

x = r sen θ cos ϕ
y = r sen θ sen ϕ
z = r cos θ

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8.3. Problema de Autovalores do Momentum Angular 265

o operador momentum angular orbital é dado por


~L = − i ~~r × ∇
~ (8.23)

onde
~ = r̂ ∂ + ϕ̂ 1


+ θ̂
1 ∂
(8.24)
∂r r sen θ ∂ϕ r ∂θ
Os versores do sistema de coordenadas esféricas estão relacionados com
os versores cartesianos usuais (ı̂, ̂, k̂) através de

r̂ = sen θ cos ϕı̂ + sen θ sen ϕ̂ + cos θk̂ (8.25a)


ϕ̂ = − sen ϕı̂ + cos ϕ̂ (8.25b)
θ̂ = cos θ cos ϕı̂ + cos θ sin ϕ̂ − sen θk̂ (8.25c)

Portanto, temos que


µ ¶
~ = − i ~ ϕ̂ ∂ − θ̂ 1 ∂
~L = rr̂ × (− i ~)∇ (8.26)
∂θ sen θ ∂ϕ

Esse forma mostra novamente que ~L comuta com qualquer função de r


e com qualquer derivada com respeito a r.
As equações (8.26) e (8.25) nos permite obter as seguintes expressões

µ ¶
∂ ∂
Lx = i ~ sen ϕ + cos ϕ cot θ (8.27a)
∂θ ∂ϕ
µ ¶
∂ ∂
Ly = i ~ − cos ϕ + sen ϕ cot θ (8.27b)
∂θ ∂ϕ

Lz = − i ~ (8.27c)
∂ϕ

e como ~L2 = L2x + L2y + L2z ,


· µ ¶¸
~L2 = −~2 1 ∂2 1 ∂ ∂
+ sen θ (8.28)
sen2 θ ∂ϕ2 sen θ ∂θ ∂θ

Substituindo as expressões acima no problema de autovalores do


momentum angular ~L2 , obtemos a seguinte equação diferencial
· µ ¶¸
1 ∂2 1 ∂ ∂
+ sen θ Y (θ, ϕ) = −λY (θ, ϕ) (8.29)
sen2 θ ∂ϕ2 sen θ ∂θ ∂θ

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266 Cap. 8 Potenciais Centrais e Momentum Angular

Essa equação diferencial parcial pode ser resolvida através do método


de separação de variáveis,

Y (θ, ϕ) = Θ(θ)Φ(ϕ) (8.30)

Quando substituímos (8.30) em (8.29), obteremos através de uma pe-


quena álgebra
· µ ¶ ¸
sen2 θ 1 d dΘ 1 d2 Φ
sen θ + λΘ = − = m2
Θ sen θ dθ dθ Φ dϕ2

indicamos uma separação de duas variáveis. Ambas deverão ser iguais a


uma constante m2 . Então deduzimos as equações diferenciais ordinárias,
µ ¶
1 d dΘ m2
sen θ − Θ + λΘ = 0 (8.31)
sen θ dθ dθ sen2 θ
d2 Φ
+ m2 Φ = 0 (8.32)
dϕ2

A solução de (8.32) pode ser expressa na forma

Φ(ϕ) = ei mϕ (8.33)

para m = 0, ±1, ±2, · · · , i.e., m deve ser um inteiro, positivo ou neg-


ativo. Na velha mecânica quântica, m foi chamado de número quân-

tico magnético. Tomando a forma explícita do operador Lz = − i ~ ∂ϕ
e voltando a usar Y (θ, ϕ), já que o operador Lz atua somente em ϕ
temos

Lz Y (θ, ϕ) = − i ~ Y (θ, ϕ)
∂ϕ

= − i ~Θ Φ
∂ϕ

= − i ~Θ ei mϕ
∂ϕ
= m~Y (θ, ϕ) (8.34)

Usando (8.28) e (8.34) temos


~L2 Y (θ, ϕ) = λ~2 Y (θ, ϕ) (8.35)
Lz Y (θ, ϕ) = m~Y (θ, ϕ) (8.36)

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8.3. Problema de Autovalores do Momentum Angular 267

mostrando que Y (θ, ϕ) é autofunção simultânea dos operadores ~L2 e


Lz , com autovalores λ~2 e m~ respectivamente. Isso era esperado já
que [~L2 , Lz ] = 0.
Método Algébrico: Para a obtenção dos autovalores e autofunções
do momentum angular, usaremos a técnica dos operadores de abaixa-
mento e levantamento, definidos por

L− = Lx − i Ly (8.37)

e
L+ = Lx + i Ly (8.38)
respectivamente.
Com o uso desse operadores podemos verificar certas propriedades.
Vamos considerar primeiramente

L+ L− = (Lx + i Ly )(Lx − i Ly )
= L2x + L2y − i Lx Ly + i Ly Lx
= L2x + L2y + i[Ly , Lx ]
= L2x + L2y + L2z + ~Lz − L2z
= ~L2 + ~Lz − L2 z (8.39)

Similarmente
L− L+ = ~L2 − ~Lz − L2z (8.40)
Assim,
[L+ , L− ] = 2~Lz (8.41)

Ainda podemos obter outras importantes relações de comutação,


que são:

[Lz , L+ ] = ~L+ (8.42)


[Lz , L− ] = −~L− (8.43)

[~L2 , L+ ] = 0 (8.44)
[~L2 , L− ] = 0 (8.45)

Mecânica Quântica

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“mq_notas-N” — 2009/5/5 — 21:48 — page 268 — #268


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268 Cap. 8 Potenciais Centrais e Momentum Angular

Das equações (8.39) e (8.40), podemos escrever as seguintes relações


para o operador ~L2
~L2 = L+ L− − ~Lz + L2 (8.46)
z

e
~L2 = L− L+ + ~Lz + L2 (8.47)
z

Desde que [~L2 , Lz ] = 0, sabemos que Y (θ, ϕ) é autofunção simultânea


dos operadores ~L2 e Lz , com autovalores λ~2 e m~ respectivamente.
Definindo Y (θ, ϕ) = |λmi, i.e., a função Y (θ, ϕ) como um ket, temos
~L2 |λmi = λ~2 |λmi (8.48)
Lz |λmi = m~|λmi (8.49)

Aplicando o operador L+ nos dois lados da equação (8.49), temos

L+ Lz |λmi = m~L+ |λmi (8.50)

Mas
[Lz , L+ ] = ~L+ ⇒ L+ Lz = Lz L+ − ~L+
Portanto, da equação acima teremos

Lz L+ |λmi = (m + 1)~L+ |λmi (8.51)

Essa equação nos diz que L+ |λmi é uma nova autofunção do operador
Lz , pertencendo ao autovalor (m + 1)~. Note que L+ é um operador de
levantamento. Aplicando novamente L+ na equação acima, teremos

(L+ Lz )L+ |λmi = (m + 1)~L2+ |λmi


(Lz L+ − ~L+ )L+ |λmi = (m + 1)~L2+ |λmi
Lz L2+ |λmi = (m + 2)~L2+ |λmi (8.52)

É fácil notar que todas as vezes que aplicamos L+ em Lz |λmi, o auto-


valor de Lz aumenta em uma unidade de ~. Generalizando esses resul-
tados, para n aplicações dos operadores L+ e ~L2 , teremos

Lz Ln+ |λmi = (m + n)~Ln+ |λmi (8.53)

e
~L2 Ln |λmi = λ~2 Ln |λmi (8.54)
+ +

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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“mq_notas-N” — 2009/5/5 — 21:48 — page 269 — #269


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8.3. Problema de Autovalores do Momentum Angular 269

Analogamente, n sucessivas operações de L− sobre (8.49) diminuem


o autovalor de Lz em uma unidade de ~ para cada operação de L− .
Note que L− é o operador de abaixamento. Assim teremos
Lz Ln− |λmi = (m − n)~Ln− |λmi (8.55)
e
~L2 Ln |λmi = λ~2 Ln |λmi (8.56)
− −
Podemos então concluir que autofunções simultâneas dos operadores
Lz e ~L2 podem ser geradas, aplicando-se os operadores L− ou L+ sobre
|λmi. Porém existem limites inferior e superior para as aplicações dos
operadores de abaixamento ou de levantamento. Logo, para determinar
o número de vezes que os operadores L− e L+ podem ser aplicados nos
auto-estados |λmi, escrevemos
(~L2 − L2z )|λmi = (λ − m2 )~2 |λmi (8.57)
Como os operadores do momentum angular são hermitianos seus au-
tovalores são reais positivos. Então,
λ − m2 ≥ 0 ou λ ≥ m2 .
Como m pode ser positivo ou negativo, seus valores dever estar com-
preendidos entre um valor mínimo e um valor máximo, i.e.,
−lmin ≤ m ≤ +lmax
Assim, temos duas condições
L+ |λ m = lmax i = 0 (8.58)
e
L− |λ m = −lmin i = 0 (8.59)
Assim, |λ m = lmax i é o auto-estado associado ao mais alto autovalor
de Lz , i.e., m = lmax . Entretanto, |λ m = −lmin i é o auto-estado
associado ao mais baixo autovalor de Lz , i.e., m = −lmin . Sendo m e l
números inteiros, para um dado l, temos 2l + 1 valores para m. Usando
(8.46) e (8.47), teremos
~L2 |λ m = lmax i = (L− L+ + ~Lz + L2 )|λ m = lmax i
z
= (~2 lmax + ~2 lmax
2
)|λ m = lmax i
= ~2 lmax (lmax + 1)|λ m = lmax i
= ~2 λ|λ m = lmax i (8.60)

Mecânica Quântica

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270 Cap. 8 Potenciais Centrais e Momentum Angular

~L2 |λ m = −lmin i = (L+ L− − ~Lz + L2 )|λ m = −lmin i


z
= (~2 lmin + ~2 lmin
2
)|λ m = −lmin i
= ~2 lmin (lmin + 1)|λ m = −lmin i
= ~2 λ|λ m = −lmin i (8.61)

o que nos leva a escrever a seguinte relação

λ = lmax (lmax + 1) = lmin (lmin + 1) , (8.62)

o que implica lmin = lmax ou lmin = −(lmax + 1). Sendo l uma quanti-
dade positiva, descartamos a última condição, i.e., lmin = −(lmax + 1).
Então lmin = lmax = l e teremos

λ = l(l + 1) . (8.63)

Assim, vemos que −l ≤ m ≤ l. Sendo l um número inteiro, os possíveis


valores de m são

l, l − 1, l − 2, l − 3, · · · , −l + 2, −l + 1, −l

que são os 2l + 1 valores inteiros permitidos para m. Finalmente temos


os autovalores dos operadores ~L2 e Lz ,

~L2 |lmi = l(l + 1)~2 |lmi (8.64)


Lz |lmi = m~|lmi (8.65)

com o ket |lmi associado às funções harmônicas esféricas Ylm (θ, ϕ).

Representação Matricial do Operador Momentum Angular:


Assumindo que os kets |lmi são auto-estados ortonormalizados dos
operadores ~L2 e Lz , eles obedecem a relação

hl0 m0 |lmi = δl0 l δm0 m (8.66)

Assim, os operadores ~L2 e Lz são matrizes diagonais, com elementos


³ ´
~L2 = hl0 m0 |~L2 |lmi = l(l + 1)~2 δl0 l δm0 m (8.67)
0 0
l m ,lm

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8.3. Problema de Autovalores do Momentum Angular 271

e
(Lz )l0 m0 ,lm = hl0 m0 |Lz |lmi = m~ δl0 l δm0 m (8.68)
Os elementos de matriz para os operadores de levantamento e abaixa-
mento, temos

L+ |lmi = C+ ~|l m + 1i (8.69)


L− |lmi = C− ~|l m − 1i (8.70)

então

hlm|L− = hl m + 1|C+ ~
e
hlm|L− L+ |lmi = |C+ |2 ~2 hl m + 1|l m + 1i
Mas

hlm|L− L+ |lmi = hlm|~L2 − Jz2 − ~Jz |lmi


= [l(l + 1) − m2 − m]~2 hlm|lmi

e concluímos que

|C+ |2 = l(l + 1) − m(m + 1) = (l − m)(l + m + 1)

similarmente
|C− |2 = (l + m)(l − m + 1)
Com esses resultados, teremos
p
(L+ )l0 m0 ,lm = hl0 m0 |L+ |lmi = (l − m)(l + m + 1)~ δl0 l δm0 m+1
(8.71)
e
p
(L− )l0 m0 ,lm = hl0 m0 |L− |lmi = (l + m)(l − m + 1)~ δl0 l δm0 m−1
(8.72)
que não são diagonais.
Das relações (8.37) e (8.38), temos os operadores Lx e Ly dados por

1
Lx = (L+ + L− ) (8.73)
2
e
1
Ly = (L+ − L− ) (8.74)
2i

Mecânica Quântica

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272 Cap. 8 Potenciais Centrais e Momentum Angular

Então
(Lx )l0 m0 ,lm = hl0 m0 |Lx |lmi
~ hp
= δl 0 l (l − m)(l + m + 1)~ δm0 m+1
2 i
p
+ (l + m)(l − m + 1)~ δm0 m−1 (8.75)
e
(Ly )l0 m0 ,lm = hl0 m0 |Ly |lmi
~ hp
= δl 0 l (l − m)(l + m + 1)~ δm0 m+1
2i i
p
− (l + m)(l − m + 1)~ δm0 m−1 (8.76)

onde, os elementos não nulos das matrizes de (Lx )l0 m0 ,lm e (Ly )l0 m0 ,lm
estão diretamente acima e diretamente abaixo da diagonal: (Lx )l0 m0 ,lm
é uma matriz simétrica e real, enquanto (Ly )l0 m0 ,lm é uma matriz
anti-simétrica e puramente imaginária.

8.4 Autofunções do Momentum Angular


Usando os resultados já encontrados, desenvolveremos explicitamente
as equações diferenciais para obter as soluções das autofunções do mo-
mentum angular. Sabemos, de (8.28) e (8.27c), que os operadores ~L2 e
Lz na forma de operadores diferenciais são
· µ ¶¸
~L2 = −~2 1 ∂2 1 ∂ ∂
+ sen θ
sen2 θ ∂ϕ2 sen θ ∂θ ∂θ

Lz = − i ~
∂ϕ
Naturalmente, usando o problema de autovalores de ~L2 , obtemos a
seguinte equação diferencial
· µ ¶¸
1 ∂2 1 ∂ ∂
+ sen θ Y (θ, ϕ) = −λY (θ, ϕ)
sen2 θ ∂ϕ2 sen θ ∂θ ∂θ
E através do método de separação de variáveis, Y (θ, ϕ) = Θ(θ)Φ(ϕ),
obteremos depois de uma pequena álgebra
· µ ¶ ¸
sen2 θ 1 d dΘ 1 d2 Φ
sen θ + λΘ = − = m2
Θ sen θ dθ dθ Φ dϕ2

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8.4. Autofunções do Momentum Angular 273

Os dois lados deverão ser iguais a uma constante m2 . Assim temos as


equações diferenciais ordinárias, já apresentadas anteriormente.
µ ¶
1 d dΘ m2
sen θ − Θ + λΘ = 0 (8.77)
sen θ dθ dθ sen2 θ
d2 Φ
+ m2 Φ = 0 (8.78)
dϕ2
A solução de (8.78) é a conhecida
Φ(ϕ) = ei mϕ (8.79)
onde m = 0, ±1, ±2, · · · , como visto anteriormente.
Se agora escrevermos a equação (8.77) usando uma nova variável
x= cos θ em lugar de θ e P (x) = Θ(θ), e lembrando que λ = l(l + 1)
obteremos a seguinte equação:
· ¸ · ¸
d 2 dP m2
(1 − x ) + l(l + 1) − P =0 (8.80)
dx dx 1 − x2
Consideremos agora situações com a simetria azimutal. Neste caso temos
m2 =0 e a equação (8.80) fica
· ¸
d 2 dP
(1 − x ) + l(l + 1)P = 0 (8.81)
dx dx
conhecida como equação diferencial de Legendre 3 . O domínio da
variável x é o intervalo −1≤x≤1. Para que exista solução finita da (8.81)
nesse intervalo, l deve ser zero ou um inteiro positivo. As soluções são
então os conhecidos polinômios de Legendre de ordem l, i.e., Pl (x).
Esses polinômios são normalizados de modo a terem um valor unitário
em x = +1.
Para calcular os polinômios de Legendre, vamos resolver a equação
(8.81) por uma série de potências, i.e., série de Frobenius na forma

X
α
P (x) = x aj xj (8.82)
j=0

onde α é um parâmetro a ser determinar. Substituindo (8.82) em (8.81),


temos
X∞
{(α+j)(α+j −1)aj xα+j−2 −[(α+j)(α+j +1)−l(l +1)]aj xα+j } = 0
j=0
3
Adrien-Marie Legendre (1752–1833), matemático francês.

Mecânica Quântica

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274 Cap. 8 Potenciais Centrais e Momentum Angular

O coeficiente de cada potência de x deve anular-se separadamente. Logo,


para j = 0, 1, encontramos o seguinte: se a0 6= 0, então α(α − 1) = 0; se
a1 6= 0, então α(α + 1) = 0. Para um valor geral de j
· ¸
(α + j)(α + j + 1) − l(l + 1)
aj+2 = aj (8.83)
(α + j + 1)(α + j + 2)
Se usarmos o valor usual para ambos os casos, α = 0, da equação acima
temos · ¸
j(j + 1) − l(l + 1)
aj+2 = aj (8.84)
(j + 1)(j + 2)
Então, se a série não termina para algum valor finito de j
aj+2 j

aj j+2
quando j → ∞, a série diverge para x = ±1, i.e., para θ = 0 e π. Com
isso temos singularidades logarítmicas em x = ±1, e funções singulares
não são aceitas como autofunções de ~L2 . Concluímos então que a série
de potência deverá terminar em algum valor finito de j = l, corrigindo
a divergência, e todas as potências de ordem superior se anulam.
Assim, usando estas relações, os primeiros polinômios de Legendre
são:
P0 (x) = 1
P1 (x) = x
1
P2 (x) = (3x2 − 1) (8.85)
2
1
P3 (x) = (5x3 − 3x)
2
1
P4 (x) = (35x4 − 30x2 + 3)
8
Uma relação importante, conhecida como fórmula de Rodrigues, fornece
um algoritmo para o cálculo dos polinômios de Legendre, dados acima:
1 dl 2
Pl (x) = (x − 1)l (8.86)
2l l! dxl
Desde que Pl (cos θ) é uma autofunção do operador hermitiano ~L2 ,
fica claro que os polinômios de Legendre formam uma base ortogonal
de funções no intervalo (−1, 1). A relação de ortogonalidade é:
Z 1
2
Pl0 (x)Pl (x) dx = δl 0 l (8.87)
−1 2l +1

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8.4. Autofunções do Momentum Angular 275

Prova. Para provar a relação acima, usamos a definição (8.48) e inte-


gramos sucessivas vezes por partes. Mas a normalização desses polinômios
é obtido facilmente por integração por partes fazendo l0 = l
Z +1 µ ¶ Z · ¸· l ¸
2 1 2 +1 dl 2 l d 2 l
[Pl (x)] dx = (x − 1) (x − 1) dx
−1 2l l! −1 dxl dxl
Z +1 · 2l ¸
l 1 d
= (−1) l 2 (x − 1) (x2 − 1)l dx
2 l
(2 l!) −1 dx2l
Z +1
l (2l)!
= (−1) l 2 (x2 − 1)l dx
(2 l!) −1
2
=
2l + 1

Função geratriz: Como é comum no estudo de funções especiais,


vamos introduzir uma função geratriz para os polinômios de Legen-
dre. Essa função geratriz é

X
(1 − 2xs + s2 )−1/2 = Pn (x)sn (|s| < 1) (8.88)
n=0

Para provar a identidade dos coeficientes Pn (x) em (8.88) com os polinômios


de Legendre definidos por (8.86), derivamos a expressão (8.88) em re-
lação a s:

X
(x − s)(1 − 2xs + s2 )−3/2 = nPn (x)sn−1 (8.89)
n=0

ou, com o uso da (8.88)



X ∞
X
(x − s) Pn (x)sn = (1 − 2xs + s2 ) nPn (x)sn−1
n=0 n=0

Igualando os coeficientes de cada potência de s, teremos

(n + 1)Pn+1 (x) = (2n + 1)xPn (x) − nPn−1 (x) (8.90)

Por substituição s = 0 em (8.88) e (8.89), vemos que

P0 (x) = 1, P1 (x) = x

Mecânica Quântica

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276 Cap. 8 Potenciais Centrais e Momentum Angular

em concordância com (8.85). A equivalência das duas definições dos


polinômios de Legendre é completa, pela demonstração de que Pn (x)
definido em (8.86) satisfaz a fórmula de recorrência (8.90).
Função Associada de Legendre: Agora iremos resolver a equação
(8.80) com m 6= 0. Então, se a equação de Legendre (8.81) é diferenciada
m vezes e se as funções associadas de Legendre

dm Pl (x)
Plm (x) = (1 − x2 )m/2
dxm
1 dl+m
= l (1 − x2 )m/2 l+m (x2 − 1)l (8.91)
2 l! dx
são definidas para m ≤ l inteiros positivos. A equação acima é uma
generalização da fórmula de Rodrigues, e deduzimos que
· m ¸
d 2 dPl (x) m2
(1 − x ) − P m (x) + l(l + 1)Plm (x) = 0 (8.92)
dx dx 1 − x2 l

Essas funções são também conhecidas como funções associadas de


Legendre de primeira espécie.
Uma vez que as funções associadas de Legendre dependem de m2
e m inteiro, as funções Pl−m (x) e Plm (x) são proporcionais. Pode-se
mostrar facilmente que

(l − m)! m
Pl−m (x) = (−1)m P (x) (8.93)
(l + m)! l

Para m constante, as funções Plm (x) formam um conjunto ortogonal no


índice l, no intervalo (−1, 1). As relações de ortogonalidade são
Z +1
2 (l + m)!
Plm m
0 (x)Pl (x) dx = δl 0 l (8.94)
−1 2l + 1 (l − m)!

8.5 Harmônicos Esféricos


A solução angular do equação do momentum angular foi decomposta
num produto de fatores para as duas variáveis θ e ϕ, i.e., Y (θ, ϕ) =
Θ(θ)Φ(ϕ). É conveniente combinar os fatores angulares para construir
funções ortogonais sobre a esfera. Essas funções angulares se chamam

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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8.5. Harmônicos Esféricos 277

harmônicos esféricos e os coeficientes de normalização Alm dessas


funções harmônicas esféricas devem satisfazer
Z +1 Z 2π
|Alm |2 0 0
Plm Plm
0 dx e− i(m−m )ϕ dϕ = 1
2π −1 0

mas Z 2π
0
e− i(m−m )ϕ dϕ = 2πδmm0
0

isso implica
s
2l + 1 (l − m)!
Alm =
4π (l + m)!

Finalmente, as funções harmônicas esféricas normalizadas podem


ser escritas como
s
2l + 1 (l − m)!
Ylm (θ, ϕ) = (−1)m Plm (cos θ) ei mϕ (8.95)
4π (l + m)!

De (8.93), pode ver-se que sujeito as restrições −l ≤ m ≤ l temos

Yl−m (θ, ϕ) = (−1)m [Ylm (θ, ϕ)]∗ (8.96)

As condições de ortogonalidade para Ylm são


Z 2π Z π
0
dϕ sen θ dθ [Ylm ∗ m
0 (θ, ϕ)] Yl (θ, ϕ) = δl0 l δm0 m (8.97)
0 0

e as relações de completeza são


X l
X
[Ylm (θ0 , ϕ0 )]∗ Ylm (θ, ϕ) = δ(ϕ − ϕ0 ) δ(cos θ − cos θ0 ) (8.98)
l=0 m=−l

Os harmônicos esféricos são autofunções normalizadas simultâneas de


~L2 e Lz tal que

~L2 Y m (θ, ϕ) = l(l + 1)~2 Y m (θ, ϕ)


l l
Lz Ylm (θ, ϕ) = m~ Ylm (θ, ϕ)

Mecânica Quântica

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278 Cap. 8 Potenciais Centrais e Momentum Angular

Abaixo, listamos alguns harmônicos esféricos:


1
Y00 = √

r
3
Y10 = cos θ

r
±1 3 ±iϕ
Y1 = ∓ e sen θ (8.99)

r
5
Y20 = (3 cos2 θ − 1)
16π
r
±1 15 ± i ϕ
Y2 = ∓ e cos θ sen θ

r
±2 15 ±2 i ϕ
Y2 = e sen2 θ
32π
Não fizemos nenhuma demonstração detalhada, mas é importante
notar que os harmônicos esféricos formam um conjunto completo para
a expansão das funções de onda 4 .
Determinação dos Harmônicos Esféricos: Podemos construir os
harmônicos esféricos Ylm (θϕ) utilizando os operadores de abaixamento
e de levantamento, L− e L+ respectivamente. Pelas definições (8.37) e
(8.38) temos · ¸
±iϕ ∂ ∂
L± = ~e ± + i coth θ (8.100)
∂θ ∂ϕ
Iniciaremos nossa dedução pela expressão Yll (θ, ϕ). Podemos calcu-
lar Yll (θ, ϕ) através de
L+ Yll (θ, ϕ) = 0 (8.101)
e sabendo que
Yll (θ, ϕ) = Pll (θ)ei lϕ (8.102)
Assim, obteremos
Yll (θ, ϕ) = cl (sen θ)l ei lϕ (8.103)
onde cl é uma constante arbitrária.
Para determinar a constante cl , normalizaremos Yll (θ, ϕ)
Z 2π Z π ¯ ¯2 Z 2π Z π
¯ ¯
dϕ sen θdθ ¯Yll (θ, ϕ)¯ = |cl |2 dϕ sen θdθ(sen θ)2l = 1
0 0 0 0
4
R. Courant and D. Hilbert, Methods of mathematical physics, (1962).

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8.5. Harmônicos Esféricos 279

Logo
1
|cl |2 = Il (8.104)

sendo Z Z
π +1
2l
Il = sen θdθ(sen θ) = du(1 − u2 )l
0 −1
onde usamos uma nova variável u = cos θ. A integral Il é facilmente
calculada pela recorrência
Z +1 Z +1
Il = du(1 − u2 )(1 − u2 )l−1 = Il−1 − du u2 (1 − u2 )l−1
−1 −1

e utilizando a integração por partes


1 2l
Il = Il−1 − Il ⇒ Il = Il−1
2l 2l + 1
com Z +1
I0 = du = 2
−1
Dessas relações, derivamos imediatamente5
(2l)!! 22l+1 (l!)2
Il = I0 =
(2l + 1)!! (2l + 1)!
e Yll (θ, ϕ) é então normalizada se
r
1 (2l + 1)!
|cl | = l (8.105)
2 l! 4π
Finalmente, para definir cl completamente, devemos escolher sua fase.
A escolha comum é r
(−1)l (2l + 1)!
|cl | = l (8.106)
2 l! 4π
Para obter Ylm (θ, ϕ) através de sucessivas aplicações do operador
L− em Yll (θ, ϕ), faremos inicialmente os seguintes passos:
1. A ação dos operadores L+ e L− na função Y = ei nϕ P (θ), onde n
é um número inteiro, é dada por
£ ¤ d £ ¤
L± ei nϕ P (θ) = ∓~ei(n±1)ϕ (sen θ)1±n (sen θ)∓n P (θ)
d(cos θ)
(8.107)
5
Usa-se a notação: (2l + 1)!! ≡ (2l + 1)(2l − 1)(2l − 3) . . . (5)(3)(1).

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280 Cap. 8 Potenciais Centrais e Momentum Angular

2. Aplicando a operação L± em Y , p sucessivas vezes, teremos


£ ¤
(L± )p ei nϕ P (θ) =
dp £ ¤
(∓~)p ei(n±p)ϕ (sen θ)p±n p
(sen θ)∓n P (θ) (8.108)
d(cos θ)

Como já indicado em (8.71) e (8.72), os harmônicos esféricos Ylm θϕ


satisfazem a relação
p
L± Ylm (θ, ϕ) = ~ l(l + 1) − m(m ± 1) Ylm±1 (θ, ϕ)
p
= ~ (l ∓ m)(l ± m + 1) Ylm±1 (θ, ϕ) (8.109)

Essa relação nos diz que se Ylm é normalizada, então Ylm±1 também o é.
Assim, para obter Ylm (θ, ϕ) de Yll (θ, ϕ), usaremos o operador L− dado
em (8.100) e a expressão (8.109). Devemos então aplicar (l − m) vezes
o operador L− em Yll (θ, ϕ). Logo,

(L− )l−m Yll (θ, ϕ) =


p
(~)l−m (2l)(1) × (2l − 1)(2) × · · · × (l + m + 1)(l − m) Ylm (θ, ϕ)
(8.110)

o que implica
s µ ¶l−m
(l + m)! L−
Ylm (θ, ϕ) = Yll (θ, ϕ) (8.111)
(2l)!(l − m)! ~

Finalmente, usando as relações (8.103) e (8.108) (com n = l e p = l−m),


obteremos
s
(−1) l 2l + 1 (l + m)! i mϕ dl−m
Ylm (θ, ϕ) = l e (sen θ)−m (sen θ)2l
2 l! 4π (l − m)! d(cos θ)l−m
(8.112)
Para obter Ylm (θ, ϕ) de Yl−l (θ, ϕ), usaremos o operador L+ dado em
(8.100). Naturalmente, é fácil calcular primeiro Yl−l (θ, ϕ) e então aplicar
o operador L+ . A expressão então obtida para Ylm (θ, ϕ) é ligeiramente
diferente da (8.112), porém as duas são completamente equivalentes.
Obviamente sabemos que

L− Yl−l (θ, ϕ) = 0

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8.5. Harmônicos Esféricos 281

e imediatamente achamos
r
1 (2l + 1)! − i lϕ
Yl−l (θ, ϕ) = l e (sen θ)l (8.113)
2 l! 4π
Devemos então aplicar (l + m) vezes o operador L+ em Yl−l (θ, ϕ). Us-
ando as relações (8.113) e (8.108) (com n = l e p = l + m), obteremos
s
m (−1)l+m 2l + 1 (l − m)! i mϕ m dl+m
Yl (θ, ϕ) = e (sen θ) (sen θ)2l
2l l! 4π (l + m)! d(cos θ)l+m
(8.114)
Relações de Recorrência: Algumas das mais importantes expan-
sões de funções angulares em termos de harmônicos esféricos estão lis-
tadas abaixo.
s
(l + m + 1)(l − m + 1) m
cos θ Ylm (θ, ϕ) = Yl+1
(2l + 1)(2l + 3)
s
(l + m)(l − m) m
+ Y (8.115)
(2l + 1)(2l − 1) l−1
s
iϕ m (l + m + 1)(l + m + 2) m+1
sen θ e Yl (θ, ϕ) = − Yl+1
(2l + 1)(2l + 3)
s
(l − m)(l − m − 1) m+1
+ Yl−1 (8.116)
(2l + 1)(2l − 1)
s
(l − m + 1)(l − m + 2) m−1
sen θ e− i ϕ Ylm (θ, ϕ) = Yl+1
(2l + 1)(2l + 3)
s
(l + m)(l + m − 1) m−1
− Yl−1 (8.117)
(2l + 1)(2l − 1)

Essas relações de recorrência são úteis em soluções de problemas, práti-


cos e acadêmicos.
Teorema da Adição: Como parte final dessa seção, considere-
mos ainda uma importante propriedade dos harmônicos esféricos Ylm
fornecida pelo que é chamado teorema da adição para os harmônicos
esféricos. Sejam dois vetores de posição~r e~r0 , com direção expressas em
termos das coordenadas esféricas (r, θ, ϕ) e (r, θ0 , ϕ0 ) respectivamente, e
que definem um ângulo γ entre eles como mostra Fig. 8.2. Este teorema

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282 Cap. 8 Potenciais Centrais e Momentum Angular


z

0
qP
­
Á
­
~r0 ­ ©
*
qP
­ ©
­ ©
θ0 ­ γ © ©©
~r
­ ©©©
­© θ©
©
­
XXX
y
¡e XXX
¡ϕ e XXX
¡ e XXX
ϕ 0
¡ e
¡ e
¡ e
¡ e

¡

Figura 8.2: Sistema de coordenadas - teorema da adição.

exprime um polinômio de Legendre de ordem l no ângulo γ em termos


de produtos dos harmônicos esféricos dos ângulos (θ, ϕ) e (θ0 , ϕ0 , tal que

l
4π X m 0 0 ∗
Pl (cos γ) = [Yl (θ , ϕ )] Ylm (θ, ϕ) (8.118)
2l + 1
m=−l

onde cos γ= cos θ cos θ0 + sen θ sen θ0 cos(ϕ−ϕ0 ).


Muitas vezes este teorema se escreve em termos das funções associ-
adas de Legendre na forma:

Pl (cos γ) =Pl (cos θ)Pl (cos θ0 )+


l
X (l − m)! m
2 P (cos θ)Plm (cos θ0 ) cos[m(ϕ − ϕ0 )] (8.119)
(l + m)! l
m=−l

A relação de fechamento, ou relação de completeza (8.98), também


poderá ser expressa como


X l
X
[Ylm (θ0 , ϕ0 )]∗ Ylm (θ, ϕ) = δ(r̂, r̂ 0 ) (8.120)
l=0 m=−l

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8.5. Harmônicos Esféricos 283

e combinando com o teorema da adição (8.118), teremos a identidade



X
(2l + 1) Pl (~r ~r0 ) = 4πδ(r̂, r̂ 0 ) (8.121)
l=0

A função delta em três dimensões tem uma representação em coor-


denadas esféricas como
δ(r − r0 )
δ(~r −~r0 ) = δ(r̂, r̂ 0 )
r2
Assim,

δ(r − r0 ) X 2l + 1
0
δ(~r −~r ) = Pl (~r ~r0 ) (8.122)
r2 4π
l=0
Essa fórmula será muito útil na teoria de espalhamento quando usada
para um potencial esférico.
Discussão: A solução formal do problema de autovetores de ~L2 e
Lz , obtida pelo método dos operadores, permite que l e m assumam
valores semi-inteiros. Por outro lado, a solução explícita através da res-
olução das equações diferenciais conduz apenas a valores inteiros de l e
m. Há alguma contradição nesses dois fatos? A resposta é simplesmente
não. A solução explícita levou apenas a valores inteiros de m devido a
condição de contorno que aplicamos, i.e., é natural impor que o valor
de Ylm seja o mesmo para (θ, ϕ = 0) e (θ, ϕ = 2π), uma vez que essas
duas escolhas representam o mesmo ponto do espaço

Ylm (θ, 0) = Ylm (θ, 2π) .

No caso da solução pelo método dos operadores, a qual é compatível com


valores inteiros e semi-inteiros, usamos apenas as propriedades do op-
erador momentum angular orbital. Quando calculamos as autofunções
Φll que são soluções de
L+ Φll = 0
notamos que essas satisfazem as condições de contorno apenas se l for
inteiro. Logo, não existe conflito entre os dois métodos.
Apesar dos valores semi-inteiros de l não ocorrerem para o momen-
tum angular orbital, aprendemos da solução formal que operadores que
satisfazem as relações de comutação

[Lk , Lj ] = i ~εkjn Ln

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284 Cap. 8 Potenciais Centrais e Momentum Angular

podem, em princípio, exibir valores de l semi-inteiro. Obviamente, isto


vai depender da forma explícita do operador, assim como ocorreu no
caso do momentum angular orbital. Já vimos que as partículas podem
apresentar um momentum angular intrínseco (spin) associado a valores
semi-inteiros de l, como por exemplo os elétrons s = 12 . Visto que essa
nova contribuição para o momentum angular total não tem análogo clás-
sico, utilizaremos as relações de comutação, apresentada acima, como
guia na definição dos operadores hermitianos associado a esse novo grau
de liberdade.

8.6 Redução do Problema de Força Central


Das seções anteriores sabemos que ~L e ~L2 comutam com qualquer
função arbitrária de r, e usamos (8.20) para obter a energia cinética
(8.21)
µ ¶ ~L2
~p2 ~2 ∂ 2 ∂
T = =− r +
2µ 2µr2 ∂r ∂r 2µr2
Da relação fundamental entre energia cinética T e o momentum an-
gular ~L2 , sabemos que ~L e T comutam para forças centrais, onde a
hamiltoniana H de uma partícula de massa µ é dada por

~p2
H= + V (r)

comuta com ~L. Logo,


[H, ~L] = 0
Essa relação de comutação mostra que é possível um conjunto de funções
que são autofunções de H, assim como são autofunções de ~L2 . Essas
autofunções
ψ(~r) = RE (r) Ylm (θ, ϕ) , (8.123)
usando coordenadas esféricas, satisfaz a equação de Schrödinger

H ψ ≡ [T + V (r)] ψ = E ψ

que para forças centrais se reduz à


" µ ¶ #
~2 ∂ ∂ ~L2
− r2 + + V (r) ψ = E ψ . (8.124)
2µr2 ∂r ∂r 2µr2

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8.6. Redução do Problema de Força Central 285

Usando a técnica de separação de variáveis para solução da equação


diferencial, e sabendo que
~L2 Y m = l(l + 1)~2 Y m
l l

teremos a equação diferencial para as autofunções radiais RE (r):


· µ ¶ ¸
~2 d 2 d l(l + 1)~2
− r + + V (r) RE (r) = E RE (r) (8.125)
2µr2 dr dr 2µr2
Para solução dessa equação é conveniente introduzir uma outra
função de onda radial através da substituição

u(r) = r RE (r)

Substituindo em (8.125), encontramos a equação radial


· ¸
~2 d2 u l(l + 1)~2
− + + V (r) u = E u (8.126)
2µ dr2 2µr2

Essa equação possui uma interpretação simples: u(r) é o auto-estado de


um problema unidimensional sujeito a ação de um potencial efetivo

l(l + 1)~2
Vef (r) = V (r) +
2µr2
Note que esse potencial efetivo também aparece naturalmente em Mecâ-
nica Clássica! Devido ao significado de r, esse problema unidimensional
possui a peculiaridade de estar definido apenas para r > 0. O termo
l(l+1)~2
2µr2
que aparece no potencial efetivo é algumas vezes chamado de
potencial centrífugo desde que represente o potencial cujo gradiente
negativo seja a força centrífuga.
Da autofunção geral ψ = RE Ylm vimos que

H RE = E RE
~L2 Y m = l(l + 1)~2 Y m
l l
Lz Ylm = m~ Ylm

onde E, l(l + 1) e m são os autovalores de H, ~L2 e Lz respectivamente,


sendo E o autovalor de energia.
Assim, dado um auto-estado do problema unidimensional u(r) =
r R(r), o qual independe de m, podemos ver de ψ = RE Ylm que

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286 Cap. 8 Potenciais Centrais e Momentum Angular

os autovetores de H (ψ) são degenerados, com uma degenerescência


mínima 2l + 1, que corresponde ao número de estados com um dado
momento angular total l.
Finalmente, se ψ é normalizável, então as autofunções RE (u(r))
devem satisfazer
Z ∞ Z
hψ|ψi = dr r 2
dΩ |RE (r)Ylm (θ, ϕ)|2
Z0 ∞
= dr r2 |RE (r)|2 < ∞
Z0 ∞
= dr |u(r)|2 < ∞ (8.127)
0

onde dΩ é o elemento de ângulo sólido e utilizamos a normalização das


funções harmônicas esféricas Ylm .
Para que o estado seja normalizável, satisfazendo (8.127), devemos
impor que RE ou u(r) tenda a zero quando r vai para infinito. Mais es-
pecificamente, RE (u(r)) deve ir a zero mais rápido do que r−3/2 (r−1/2 )
para grandes valores de r. Mais ainda, em geral, para que a equação de
autovalores de H em coordenadas esféricas seja igual à mesma escrita
em coordenadas cartesianas (problema unidimensional) devemos im-
por a condição adicional de que rRE → 0 no limite r → 0. Em termos
das funções u(r), essa condição significa que u(r) → 0 neste limite.
Vamos discutir melhor essa última condição u = rRE → 0 no limite
r → 0, reescrevendo (8.126), com k 2 = 2µE
~2
, o potencial reduzido U (r) =
2µV (r)
~2
e definindo um potencial efetivo reduzido por

l(l + 1)
Uef r (r) = U (r) +
r2
Assim, a equação radial será

d2 u £ 2 ¤
2
+ k − Uef r (r) u = 0 (8.128)
dr
e quando u = rRE → 0 no limite r → 0 a função radial RE (r) será
finita na origem.
Nosso próximo passo é um estudo nas vizinhanças da origem, o
potencial reduzido U (r) assume a forma

U (r) ≈ λ0 rν , com λ0 6= 0 . (8.129)

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8.7. Partícula Livre como Problema de Força Central 287

Nessa expressão, λ0 deve ter uma dimensão correta para que U (r) possa
representar corretamente o potencial reduzido, e ν deve ser inteiro, sat-
isfazendo a condição ν > −1, para que u(r) = 0 seja satisfeita. Estab-
elecida as condições, a solução para equação radial (8.128) poderá ser
expressa pela série de Frobenius

X
u(r) = rs aj r j , com a0 6= 0 . (8.130)
j=0

Substituindo essa série na (8.128) e usando a equação para o potencial


efetivo reduzido com (8.129) para o potencial reduzido, teremos

a0 s(s − 1)rs−2 + a1 s(s + 1)rs−1 + · · · + k 2 a0 rs + k 2 a1 rs+1 + · · ·


− λ0 a0 rs+ν − λ0 a1 rs+ν+1 − · · · − l(l + 1)a0 rs−2 − l(l + 1)a1 rs−1 · · ·
= 0. (8.131)

Nessa identidade, os termos de ordem mais baixa em r, rs−2 , devem


satisfazer à igualdade
s(s − 1) = l(l + 1) (8.132)
e os possíveis valores para s são: s = l + 1 e s = −l. O último valor não
satisfaz à condição estabelecida em u(r) = 0. Por outro lado, s = l + 1
nós fornece uma solução fisicamente aceitável para u(r) nas proximi-
dades da origem
u(r)r→0 ∼ rl+1 (8.133)
Com isso, soluções fisicamente aceitáveis para RE (r) nas proximidades
da origem tornam-se proporcionais a rl . Ainda podemos ver que à me-
dida que o valor de l aumenta, o potencial centrífugo também aumenta
e as funções radiais RE (r) e u(r) decrescem quando r → 0.

8.7 Partícula Livre como Problema de Força


Central
O problema da partícula livre pode ser resolvido como um problema
de força central, desde que V (r) = 0 e a equação radial será (8.125)
assume a forma
· 2 ¸
d 2 d 2 l(l + 1)
+ +k − RE (r) = 0 (8.134)
dr2 r dr r2

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288 Cap. 8 Potenciais Centrais e Momentum Angular

Esta equação é praticamente uma equação de Bessel 6 , a menos a


relevante diferença
1 d 2 d
contra
ρ dρ r dr
Podemos resolver este problema pela substituição
1
RE = uE (8.135)
r1/2
nas equações

d2 RE 3 −5/2 −3/2 duE


2
−1/2 d uE
= r uE − r + r
dr2 4 dr dr2
2 dRE duE
= −r−5/2 uE + 2r−3/2
· r ¸dr dr
l(l + 1)
k2 − RE = −l(l + 1)r−5/2 uE + k 2 r−1/2 uE
r2

e a equação (8.134) transforma-se em


" #
−1/2 d2 1 d 2 (l + 21 )2
r + +k − uE = 0 (8.136)
dr2 r dr r2

e, substituindo ρ = r e ν = l + 1/2, teremos a equação usual de Bessel.


Com x = kr as soluções independentes são dadas pelas funções de
Bessel, Jl+1/2 (kr), e pelas funções de Neumann 7 , Nl+1/2 (kr). As-
sim, as soluções para RE são
Al Bl
RE = 1/2
Jl+1/2 (kr) + 1/2 Nl+1/2 (kr) (8.137)
r r
Funções esféricas de Bessel, Neumann e Hankel: Soluções
para a dita equação diferencial esférica de Bessel podem ser expressas
em termos das funções esféricas de Bessel, jl (x), funções esféricas
(1,2)
de Neumann, nl (x) e funções esféricas de Hankel 8 , hl (x)9 ,
6
Alternativamente poderíamos reconhecer que a equação (8.134) é a chamada
equação diferencial esférica de Bessel.
7
Carl Neumann (1832–1925), matemático alemão.
8
Hermann Hankel (1839–1873), matemático alemão.
9
função de Hankel de primeira espécie, h1l (x), e de segunda espécie, h2l (x), respec-
tivamente

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8.7. Partícula Livre como Problema de Força Central 289

definidas por:
³ π ´1/2
jl (x) = Jl+1/2 (x)
³ 2x ´
π 1/2
nl (x) = Nl+1/2 (x) (8.138)
³ π ´1/22x£ ¤
(1,2)
hl (x) = Jl+1/2 (x) ± iNl+1/2 (x)
2x
no qual associado com a expansão em série
³ x ´v X

(−1)j ³ x ´2j
Jν (x) =
2 j!Γ(j + ν + 1) 2
j=0

³ x ´−v X

(−1)j ³ x ´2j
J−ν (x) =
2 j!Γ(j − ν + 1) 2
j=0
e
Jν (x) cos (νπ) − J−ν (x)
Nν (x) =
sen (νπ)
são dadas por 10
µ¶
1 d l ³ sen x ´
l
jl (x) = (−x)
x dx x
µ ¶l ³ (8.139)
1 d cos x´
nl (x) = (−x)l
x dx x
Em bons livros de métodos de física-matemática, podemos encontrar os
primeiros valores de l.
Tendo assumido x = kr, devemos ter o controle quando r → 0 e
r → ∞, na qual associamos às propriedades assintóticas das funções
de Bessel e de Neumann. Para valores do argumento x ¿ max[1, l] a
função esférica de Bessel se torna finita11
µ ¶
xl x2
jl (x) = 1− + O(x4 ) (8.140)
(2l + 1)!! 2(2l + 3)
entretanto a função esférica de Neumann diverge
µ ¶
(2l − 1)!! x2 4
nl (x) = 1− + O(x ) (8.141)
xl+1 2(1 − 2l)
10
Para esse trabalho matemático ver o excelente Morse and Feshbach, Methods of
theoretical physics, (1953).
11
Novamente usamos a notação: (2l + 1)!! ≡ (2l + 1)(2l − 1)(2l − 3) · · · (5)(3)(1).

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290 Cap. 8 Potenciais Centrais e Momentum Angular

Para valores do argumento x À l temos


µ ¶ µ ¶
1 lπ 1
jl (x) = sen x − +O (8.142)
x 2 x2
e µ ¶ µ ¶
1 lπ 1
nl (x) = − cos x − +O (8.143)
x 2 x2
A função esférica de Hankel será a combinação de (8.142) e de (8.143)
· µ ¶ µ ¶¸ µ ¶
(1,2) 1 lπ lπ 1
hl = sen x − ∓ i cos x − +O
x 2 2 x2
µ ¶
e±ix 1
= ±(∓i)l+1 +O (8.144)
x x2
na qual é apropriada para descrever a forma assintótica, quando r → ∞.
Então, usando as funções esféricas de Hankel, a solução geral da equação
diferencial será
X h (1) (1)
∞ m=l
X (2) (2)
i
m
ψklm (r, θ, ϕ) = Alm hl (kr) + Alm hl (kr) Yl (θ, ϕ)
l=0 m=−l
(8.145)
(1) (2)
que é uma onda esférica, e onde os coeficientes e Alm Alm serão deter-
minados pelas condições de contorno do problema.
Resumo para Partícula Livre: Como vimos acima a solução do
problema de autovalores e auto-estados de uma partícula livre em coor-
denadas esféricas envolve a presença de uma função de Bessel esférica.
Requerendo que RE (r) seja finito para r = 0, os auto-estados da hamil-
toniana de uma partícula livre, fisicamente aceitável, são

RE (r) = Ajl (kr) (8.146)

Encontrada a solução da parte radial da equação de Schrödinger


para uma partícula livre, podemos usar o resultado expresso por (8.95)
e obter uma expressão geral para as funções de onda esféricas de uma
partícula livre. Assim,

ψklm (r, θ, ϕ) = Ajl (kr)Ylm (θ, ϕ) (8.147)

que são chamadas de ondas esféricas, sendo os correspondentes autoval-


2 2
ores de H dados por E = ~2µk , i.e., podem ter qualquer valor compreen-
dido entre zero e infinito, formando um espectro contínuo de energia.

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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8.8. Ondas Planas em Termos dos Harmônicos Esféricos 291

Note que nesse caso o estado é completamente especificado dando três


números quânticos, a saber, (E, l, m), sendo que E não está fixo para um
dado par (l, m). E ainda temos, é fácil verificar, usando a propriedade
(8.142) das funções de Bessel, que o estado (8.147) não é normalizável.
Isto não é uma surpresa já que estamos tratando de um sistema que não
exibe estados ligados, como observamos, possuindo apenas o espectro
contínuo.

8.8 Ondas Planas em Termos dos Harmônicos


Esféricos
Tendo em vista que tanto as funções de onda planas ei k ~r , quanto
~

as ondas esféricas ψklm (r, θ, ϕ) = Ajl (kr)Ylm (θ, ϕ), formam um con-
junto completo, qualquer função função arbitrária pode ser formada
por uma combinação linear de qualquer uma delas. De um modo par-
ticular, temos que ei k ~r pode ser expandida em termos dessas ondas
~

esféricas. Assim,

ei k ~r =
∞ X
X l
~
Alm jl (kr)Ylm (θ, ϕ) (8.148)
l=0 m=−l

onde Alm é uma constante. Para determinar essa constante, consider-


emos o caso em que o vetor de onda ~k esteja alinhado com o eixo z.
Logo, teremos
ei k ~r = ei kr cos θ=e
~ i krη

onde η = cos θ. A equação (8.148) passa a ser independente de ϕ. Por-


tanto,

X
ei krη = Al jl (kr)Pl (η) (8.149)
l=0
Faremos agora x = kr e diferenciemos os dois lados da expressão acima
em termos de x para obter

X d
i ηei xη = Al [jl (x)]Pl (η) (8.150)
dx
l=0

Por outro lado, multiplicando (8.149) por i η, teremos



X
i xη
i ηe = Al jl (x) i ηPl (η) (8.151)
l=0

Mecânica Quântica

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292 Cap. 8 Potenciais Centrais e Momentum Angular

Usando a relação de recorrência (8.90), podemos escrever

(2l + 1)ηPl (η) = (l + 1)Pl+1 (η) + lPl−1 (η)

assim, a equação (8.151) será


∞ ·
X ¸
i(l + 1)jl+1 (x)Al+1 i ljl−1 (x)Al−1
i ηei xη = + Pl (η) (8.152)
2l + 3 2l − 1
l=0

Igualando (8.150) e (8.152), teremos


X∞ X∞ · ¸
d i(l + 1)jl+1 (x)Al+1 i ljl−1 (x)Al−1
Al [jl (x)] = + .
dx 2l + 3 2l − 1
l=0 l=0
(8.153)
Usando as fórmulas de recorrência entre as funções esféricas de Bessel12

(2l + 1)gl (x) = xgl+1 (x) + xgl−1 (x) (8.154)

e
d h l+1
1 i
gl−1 (x) = x gl (x) (8.155)
xl+1 dx
sendo gl (x) a combinação linear das funções jl (x) e nl (x),

gl (x) = Ajl (x) + Bnl (x) . (8.156)

Visto que as funções esféricas de Bessel, jl (x), são regulares para todos
os valores de x, e as funções esféricas de Neumann, nl (x), não são regu-
lares na origem, implica em B = 0. Com isso, podemos usar as equações
(8.154)-(8.156) para obter a relação
µ ¶ µ ¶
Al i Al−1 Al i Al+1
l − jl−1 (x) = (l + 1) + jl+1 (x)
2l + 1 2l − 1 2l + 1 2l + 3
(8.157)
Para que essas relações sejam satisfeitas para quaisquer valores de x, é
necessário e suficiente que as expressões entre parênteses sejam nulas.
Logo,
Al i Al−1
= (8.158)
2l + 1 2l − 1
Assim,
Al = (2l + 1) il A0 (8.159)
12
Ver o texto de G. Arfken, Mathematical methods for physicists, (1970).

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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8.9. Caixa Esférica 293

Quando l = 0 e x = 0 na expressão (8.149), teremos A0 = 1. Portanto


Al = (2l + 1) il (8.160)
Substituindo em (8.149), teremos

X
ei kr cos θ = (2l + 1) il jl (kr)Pl (cos θ) (8.161)
l=0

conhecida como equação de Rayleigh 13 . Se as coordenadas polares


dos vetores ~k e ~r são (θ1 , ϕ1 ) e (θ2 , ϕ2 ) respectivamente, pelo teorema
da adição,
l
4π X ∗ ~
Pl (cos θ) = Ylm (k)Ylm (~r)
2l + 1
m=−l
Finalmente, substituindo essa expressão em (8.161), encontraremos


∞ X
X l
i ~k ~r ∗ ~
e = 4π il jl (kr)Ylm (k)Ylm (~r) (8.162)
l=0 m=−l

Assim, a constante Alm será


∗ ~
Alm = 4π il Ylm (k) .

8.9 Caixa Esférica


Vamos considerar uma partícula livre contida em uma caixa esférica de
raio a. Nesse caso a hamiltoniana do sistema será dada por
~p2
H= + V (r)

onde o potencial é dado por
½
0 para 0 < r < a
V (r) =
∞ para r > a
Adotando-se que os auto-estados, ψ(~r), de H são também auto-
estados do momentum angular, escrevemos ψ = REl Ylm , onde a equação
radial que REl satisfaz, para r < a, é dada explicitamente por
d2 REl 2 dREl l(l + 1)
+ − REl + k 2 REl = 0 (8.163)
dr2 r dr r2
13
Lord Rayleigh - John William Strutt (1842–1919), físico inglês.

Mecânica Quântica

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294 Cap. 8 Potenciais Centrais e Momentum Angular

2 2
onde o autovalor da hamiltoniana dado por E = ~2µk . Para r > a temos
que REl = 0 já que o potencial é infinito nesta região.
Tendo em vista que essa é a mesma equação de uma partícula livre,
sabemos que a solução geral do problema é

REl = Al jl (kr) + Bl nl (kr) (8.164)

onde Al e Bl são constantes. Utilizando a condição de contorno (u(0) =


0) discutida nas seções anteriores, concluímos que Bl = 0. A outra
condição de contorno desse problema é REl (a) = 0, devido a con-
tinuidade de REl em r = a. Logo, jl (ka) = 0, implicando que ka = αnr l ,
onde αnr l é o nr -ésimo zero da função esférica de Bessel jl (kr). Portanto,

~2
E= αn l (8.165)
2µa2 r

A Tab. 8.1 fornece αnr l para alguns pares (nr , l), enquanto que os
níveis mais baixos do espectro são mostrados na Fig. 8.3, onde valor de
l está indicado sobre as linhas.

Figura 8.3: Valores de αn2 r l como função de nr .

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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8.10. Potencial de Coulomb - Átomo de Hidrogênio 295

Tabela 8.1: Valores de αnr l para alguns pares (nr , l).

l \ nr 1 2 3 4
0 π 2π 2π 4π
1 4,493 7,725 10,904 14,066
2 5,764 9,095 12,323
3 6,988 10,417 13,698

Note que o estado fundamental desse sistema possui l = 0, e conse-


qüentemente ele não é degenerado. Esse é um fato geral em Mecânica
Quântica.

8.10 Potencial de Coulomb - Átomo de


Hidrogênio
Para o tratamento mais geral dessa questão, devemos considerar uma
partícula de massa M (o próton) localizada em uma posição ~r1 e uma
outra partícula de massa m (o elétron) localizada na posição~r2 . Supondo
que a única interação entre as duas partículas seja a coulombiana, o
potencial de interação entre elas será

Ze2
V (r) = −
r

onde −e é a carga eletrônica, Ze a carga nuclear (para o átomo de


hidrogênio Z = 1) 14 e r = |~r2 −~r1 |. É importante introduzir o conceito
de massa reduzida, definido por

1 1 1
= + ,
µ M m

que representa a massa reduzida do sistema próton-elétron. A hamil-


toniana que descreve o movimento relativo desse sistema é dada por
2 2
~ = ~p − Ze
H (8.166)
2µ r
14
Átomos de um elétron (átomos ionizados) com Z 6= 1 são chamados de hidro-
genóides, i.e. um núcleo de número atômico Z que possui apenas um elétron
ligado. Exemplos de átomos hidrogenóides são H, He+ , Li++ , Be+++ , etc.

Mecânica Quântica

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296 Cap. 8 Potenciais Centrais e Momentum Angular

O problema de autovalores dessa hamiltoniana é


à !
~2 ∂ 2 ~L2 Ze2
− r+ − ψ=Eψ (8.167)
2µr ∂r2 2µr r

Os estados ligados desse sistema são aqueles associados à autoval-


ores negativos da hamiltoniana (E < 0). Utilizando o fato de ψ =
REl (r)Ylm (θ, ϕ) e REl (r) = uElr(r) , obteremos para equação radial desse
problema
µ ¶
d2 l(l + 1) 2µZe2 2
− 2+ − +κ uEl = 0 (8.168)
dr r2 ~2 r
2 2
onde E = ~2µκ . Nosso primeiro passo para resolver essa equação será
escrevê-la em termos de variáveis adimensionais. Para tanto definimos

ρ = 2κr

o raio de Bohr
~2
a0 = = 0, 529 × 10−10 m
µe2
e
Z
ξ=
κa0
Assim, em termos dessas quantidades poderemos escrever (8.168) na
forma µ ¶
d2 u l(l + 1) ξ 1
− u+ − u=0 (8.169)
dρ2 ρ2 ρ 4
Visando simplificar essa equação, vamos verificar o comportamento
assintótico da solução nos limites ρ → 0 e ρ → ∞. No limite ρ → 0,
podemos desprezar os dois últimos termos da equação (8.169), resul-
tando em
d2 u l(l + 1) ∼
− u=0 (8.170)
dρ2 ρ2
onde podemos ver que para pequenos valores de ρ0 s, o comportamento
das soluções é o mesmo encontrado quando estudamos o problema das
partículas livres, i.e.,
ρ−l ou ρl+1 (8.171)

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8.10. Potencial de Coulomb - Átomo de Hidrogênio 297

Por outro lado, no limite ρ → ∞ a equação (8.169) reduz-se a

d2 u 1 ∼
− u=0 (8.172)
dρ2 4
cuja soluções são ρ ρ
e− 2 e e2 (8.173)
Verificando as condições de contorno sobre u, i.e., em u(0) = 0 e
u(∞) = 0, em conjunto com esses comportamentos assintóticos, sug-
erem que façamos a seguinte transformação
ρ
u = ρl+1 e− 2 χ(ρ) (8.174)

Substituindo em (8.169), teremos

d2 χ dχ
ρ 2
+ (2l + 2 − ρ) − (l + 1 − ξ)χ = 0 . (8.175)
dρ dρ
Para encontrar a solução dessa equação diferencial utilizaremos o método
de Frobenius 15 e expressando χ(ρ) em termos da série

X
χ(ρ) = ak ρk (8.176)
k=0

Substituindo (8.176) em (8.175) teremos a relação de recorrência

k+l+1−ξ
ak+1 = ak (8.177)
(k + 1)(k + 2l + 2)

Devemos investigar o comportamento da série dada por (8.176) para


grandes valores de ρ, o que significa tomar altos valores de k, para
estarmos seguros de que as funções de onda encontradas possam ser
fisicamente aceitáveis. Suas propriedades assintóticas são determinadas
a
pelo limite da razão k+1ak quando k → ∞. Assim para qualquer valor
finito dos parâmetros ξ e l, temos que
ak+1 k 1
lim ≈ 2 = . (8.178)
k→∞ ak k k
15
O leitor mais atento, perceberá a equação satisfeita por χ é a equação de Kum-
mer cujas soluções podem ser expressas em termos das funções hipergeométricas
confluentes; que veremos mais adiante.

Mecânica Quântica

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298 Cap. 8 Potenciais Centrais e Momentum Angular

Esse é o mesmo comportamento da série da função eρ . Logo,


χ∼
= eρ para ρ→∞ (8.179)
Todavia, esse comportamento não pode ser aceito senão u não irá satis-
fazer a condição de contorno para ρ → ∞. Por conseguinte, a série deve
terminar após um certo número de termos, o que significa que existe
um k máximo (= nr = 0, 1, · · · ) tal que ak = 0 se k > nr . Logo, a partir
de (8.177) concluímos que
ξ = n ≡ nr + l + 1 (8.180)
onde o inteiro n é usualmente chamado de número quântico princi-
pal. A partir dessa última relação podemos concluir que n = 1, 2, 3, · · · ,
e que l ≤ n − 1.
Polinômios de Laguerre: É costume expressar as soluções da
equação diferencial (8.175), no caso de ξ ser um número inteiro n, em
termos dos polinômios associados de Laguerre Lqp (ρ) 16 que satis-
fazem à seguinte equação diferencial 17
d2 Lqp (ρ) dLqp (ρ)
ρ + (q + 1 − ρ) + p Lqp (ρ) = 0 (8.181)
dρ2 dρ
onde p e q são inteiros não negativos. Os polinômios associados de La-
guerre possuem as seguintes propriedades 18 :

1. A função geratriz U (s, ρ) desses polinômios é dada por


ρs ∞
e− 1−s X sp
U (s, ρ) = = Lq (ρ) , (8.182)
(1 − s)q+1 (p + q)! p
p=0

a qual nos permite calcular os valores de Lqp através de


¯
q (p + q)! ∂ p U ¯¯
Lp (ρ) = . (8.183)
p! ∂sp ¯s=0

Segundo esta padronização Lpq−p (0) = q!


(q−p)!p! .
16
Edmond Nicolas Laguerre (1834–1886), matemático francês.
17
Usaremos aqui a normalização empregada no livro de E. Merzbacher, Quantum
Mechanics, (1988).
18
A convenção adotada nesse texto difere da utilizada no livro de I. S. Gradshteyn
and I. M. Ryzhik, Table of Integrals, Series, and Products (1980). Lqp |nesse texto =
(p + q)!Lqp |Grads .

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8.10. Potencial de Coulomb - Átomo de Hidrogênio 299

2. Os polinômios de Laguerre podem ser obtidos utilizando a fór-


mula de Rodrigues:
dp ¡ −ρ p ¢
Lp (ρ) ≡ L0p (ρ) = eρ e ρ (8.184)
dρp
Por exemplo, utilizando essa expressão temos que

L1 (ρ) = 1 − ρ
µ ¶
ρ2
L2 (ρ) = 2! 1 − 2ρ +
2

Por sua vez, os polinômios associados de Laguerre podem ser cal-


culados a partir dos polinômios de Laguerre através de
dq
Lqp (ρ) = (−1)q [Lp+q (ρ)] (8.185)
dρq
Alguns dos polinômios associados de Laguerre são

L00 = 1
L01 = 1 − ρ
L02 = 2 − 4ρ + ρ2
L10 = 1
L11 = 4 − 2ρ
L12 = 18 − 18ρ + 3ρ2
L20 = 2
L21 = 18 − 6ρ
L22 = 144 − 96ρ + 12ρ2
L30 = 6
L31 = 96 − 24ρ
L32 = 1200 − 600ρ + 60ρ2

3. Temos também a seguinte relação de ortogonalidade


Z ∞
[(p + q)!]3
dρ e−ρ ρq+1 Lqp (ρ)Lqp0 (ρ) = (2p + q + 1) δpp0 .
0 p!
(8.186)

Mecânica Quântica

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300 Cap. 8 Potenciais Centrais e Momentum Angular

Autovalores e Autofunções Normalizadas: Podemos agora ex-


plicitar a forma dos auto-estados de H para átomos hidrogenóides.
Fazendo q = 2l + 1 e p = n + l, a função de onda completamente
normalizada será obtida através dos polinômios associados de Laguerre
Z ∞ h i2 2n[(n + l)!]3
dρ e−ρ ρ2l+2 L2l+1
n−l−1 (ρ) = (8.187)
0 (n − l − 1)!
e Z ∞
dr |u(r)|2 = 1 (8.188)
0

resultando com isso, que os auto-estados normalizados são dados por


s
3 (n − l − 1)! l − ρ 2l+1
ψnlm (r, θ, ϕ) = (2κ) 2 ρ e 2 Ln−l−1 (ρ)Ylm (θ, ϕ)
2n[(n + l)!]3
(8.189)
Z 2Z
onde κ = na 0
e ρ = na0 . Os autovalores En associados a esses auto-
estados são dados por

µZ 2 e4 Z2
En = − = −13, 6 eV (8.190)
2~2 n2 n2
A equação acima mostra que a energia do elétron nas proximidades
do núcleo forma um espectro discreto, confirmando a quantização da
energia. Contudo, na solução da equação de Schrödinger para o átomo
de hidrogênio, a quantização da energia aparece de maneira natural,
sem a necessidade da introdução de nenhum postulado, tal como fez
Bohr na velha teoria quântica. O estado fundamental possui n = 1 e
l = 0, com uma energia de aproximadamente −13.6 eV para o átomo
de hidrogênio.
Mais explicitamente, as funções de onda radial para os estados de
menor energia são
µ ¶3
Z 2
− Zr
R10 (r) = 2 e a
0
a0
µ ¶3 µ ¶
Z 2 Zr − Zr
R20 (r) = 2 1− e 2a0
2a0 2a0
µ ¶1 µ ¶3 µ ¶
1 2 Z 2 Zr − Zr
R21 (r) = e 2a0
3 2a0 a0

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8.10. Potencial de Coulomb - Átomo de Hidrogênio 301


µ ¶3 µ ¶
Z 2 2Zr 2Z 2 r2 − Zr
R30 (r) = 2 1− + 2 e 3a0
3a0 3a0 27a0
√ µ ¶3 µ ¶µ ¶
4 2 Z 2 Zr Zr − Zr
R31 (r) = 1− e 3a0
9 3a0 6a0 a0
µ ¶ 3 µ ¶2
4 Z 2 Zr − Zr
R32 (r) = √ e 3a0
27 10 3a0 a0

A distribuição de probabilidade em r dos estados mais baixos estão


apresentadas na Fig. 8.4, onde do lado direito de cada figura encontra-
se um esboço da distribuição espacial levando em conta a dependência
angular. O eixo z encontra-se na vertical. Como podemos ver a prob-
abilidade de um elétron ser encontrado mais afastado do núcleo au-
menta com a energia do estado. Podemos ter uma melhor estimativa do
tamanho dos átomos hidrogenóides através dos seguintes valores esper-
ados.
a0 ¡ 2 ¢
hri = 3n − l(l + 1) (8.191)
¿ À 2Z
1 Z
= (8.192)
r a0 n2

Há um fato interessante que podemos constatar tanto na Fig. 8.4 bem


como no valor esperado de r dado por (8.191): para um valor fixo de n
a tendência do elétron estar mais próximo do núcleo cresce com l! Este
fato é curioso já que poderíamos esperar que quanto maior o momentum
angular do elétron mais afastado esse estaria do núcleo.
Discussão dos Resultados: Como vimos, os auto-estados de uma
hamiltoniana, com potencial central, são degenerados em 2l + 1 vezes,
devido aos autovalores Enl independerem do número quântico az-
imutal m. Todavia, a degenerescência dos níveis de energia no átomo
de hidrogênio é maior que essa já que os autovalores En independem
também de l! Essa degenerescência extra exibida por esse sistema é
chamada de degenerescência acidental. O número de estados com a
mesma energia En é dado por
n−1
X [1 + (2n − 1)]n
(2l + 1) = = n2 (8.193)
2
l=0

onde utilizamos que En independe de l e que l ≤ n − 1.

Mecânica Quântica

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302 Cap. 8 Potenciais Centrais e Momentum Angular

Figura 8.4: Densidade de probabilidade da variável r.

Mas ainda resta a pergunta: Qual a origem da degenerescência na


mecânica quântica? Para respondermos a essa pergunta precisamos anal-
isar um caso concreto e geral que é a razão de Enl ser independente de m
para potenciais centrais. Nesse caso, sabemos que H comuta com todas
as componentes do momentum angular, mas essas não comutam entre
si. Logo, só poderemos diagonalizar apenas uma das componentes, por
exemplo Lz , simultaneamente com H e ~L2 . Portanto, existem dois op-
eradores (Lx e Ly ) que comutam com H mas que não são diagonais na
base escolhida. Esta é a origem da degenerescência! Para observarmos

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8.10. Potencial de Coulomb - Átomo de Hidrogênio 303

isso consideremos um estado ψ tal que

Hψ = Eψ
Lz ψ = m~ψ

Então, o estado ψ 0 = L+ ψ satisfaz

Hψ 0 = Eψ 0
Lz ψ 0 = (m + 1)~ψ 0

uma vez que L+ comuta com H e não comuta com Lz . A primeira dessas
equações diz que ψ 0 é um auto-estado de H com o mesmo autovalor E
que ψ. Por outro lado, a segunda equação implica que ψ 0 6= ψ uma vez
que esses são estados associados a diferentes autovalores de Lz ! Logo, os
níveis de energia E são degenerados! Ou seja, a degenerescência dos au-
tovalores de H tem sua origem na existência de operadores hermitianos
que comutam com H mas não comutam entre si. Os auto-estados de-
generados com uma dada função ψ podem ser obtidos atuando-se sobre
essas funções ψ com uma combinação dos operadores não diagonaliza-
dos simultaneamente com o operador H.
Na vida real o átomo de hidrogênio é bem mais complexo, devido
ao núcleo atômico não ser pontual e a devido a existência de correções
relativística para a hamiltoniana H. Contudo essas modificações são
pequenas e os resultados aqui obtidos oferecem uma boa descrição desse
sistema.
Equação de Kummer e Solução: A equação hipergeométrica
confluente, ou equação de Kummer 19 é dada por
d2 u du
x 2
+ (c − x) − au = 0 (8.194)
dx dx
onde a e c são constantes. A solução geral dessa equação é

u = C1 1 F1 (a, c; x) + C2 x1−c 1 F1 (a − c + 1, 2 − c; x) (8.195)

onde C1 e C2 são constantes e 1 F1 (a, c; x) é a função hipergeométrica


confluente, a qual é dada por

Γ(c) X Γ(a + n) xn
1 F1 (a, c; x) = , (8.196)
Γ(a) Γ(c + n) n!
n=0
19
Ernest Eduard Kummer (1810–1893), matemático alemão.

Mecânica Quântica

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304 Cap. 8 Potenciais Centrais e Momentum Angular

onde Γ(n) é a função Gamma. Essa série converge uniformemente em


todo plano complexo x, porém ela não está definida para c = −n com
n = 0, 1, 2, · · ·
O comportamento assintótico de 1 F1 (a, c; x) para |x| → ∞ é con-
hecido e dado por

Γ(c) Γ(c) x c−a


1 F1 (a, c; x) → e− i πa x−a + e x . (8.197)
Γ(c − a) Γ(a)

Note que essa expressão não é válida para a = −n com n = 0, 1, 2, · · · ,


porém nesse caso a função hipergeométrica confluente 1 F1 tem um com-
portamento polinomial. De fato, nesse caso 1 F1 pode ser reduzida a
polinômios associados de Laguerre
m!n!
1 F1 (−n, m + 1; x) = Lm (x) (8.198)
[(m + n)!]2 n

bem com a polinômios de Hermite

(2n)! 1 2
H2n (x) = (−1)n 1 F1 (−n, ; x ) (8.199)
n! 2
e
(2n + 1)! 3
H2n+1 (x) = (−1)n 2x 1 F1 (−n, ; x2 ) (8.200)
n! 2
Para usarmos no átomo de hidrogênio, estudemos a equação (8.175)
para a função de onda radial utilizando as funções hipergeométricas con-
fluentes. Tendo em vista que esta é a equação de Kummer, sua solução
geral será dada por

χ = C1 1 F1 (l + 1 − ξ, 2l + 2; ρ) + C2 ρ−(2l+1) 1 F1 (−l − ξ, −2l; ρ) (8.201)

onde C1 e C2 são constantes. Tendo em vista a condição de contorno


u(0) = 0 e (8.174), segue que C2 = 0. Note que 1 F1 (a, c; 0) = 1.
Nesse ponto resta-nos impor a segunda condição de contorno, u → 0
quando ρ → ∞. Contudo, podemos ver a partir de (8.197) que isto
não ocorre para uma escolha arbitrária dos argumentos de 1 F1 já que,
ρ
a menos nos casos especiais, u apresenta um fator e+ 2 . Logo, devemos
fixar o parâmetro ξ de modo a evitar este crescimento de u. Como vimos
acima, basta escolher l + 1 − ξ = −nr com nr = 0, 1, 2, · · · . Com isso
recuperamos o resultado anterior ξ = n ≡ nr + l + 1 para os autovalores
da energia.

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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8.11. Comentários 305

Finalmente, os auto-estados podem ser escritos como


s
3 (n − l − 1)!
ψnlm (r, θ, ϕ) = (2κ) 2 (2κr)l e−κr L2l+1 m
n−l−1 (2κr)Yl (θ, ϕ)
2n[(n + l)!]3
ou
s
3 (n + l)! (2κr)l e−κr
ψnlm (r, θ, ϕ) = (2κ) 2
2n(n − l − 1)! (2l + 1)!
×1 F1 (−n + l + 1, 2l + 1; 2κr)Ylm (θ, ϕ)

onde usamos a relação (8.198) entre os polinômios de Laguerre e as


funções hipergeométricas confluentes.

8.11 Comentários
Para esse capítulo, recomendo uma leitura em paralelo dos livros do
Prof. Merzbacher (1998) 20 e do Prof. Wolney Filho (2002) 21 .
Um estudo aprofundado do momentum angular poderá ser realizado
com os livros dos Profs. Cohen-Tannoudji et.al. (1977) 22 , Jun John
Sakurai (1994) 23 e A. Messiah (1970) 24 .
Recomenda-se fortemente um estudo das funções especiais usadas
em física. Uma excelente discussão sobre as funções especiais poderá ser
encontrada nos livros do Prof. Merzbacher (1998) e Arfken (1970) 25 ,
além do magnifico livro de Morse e Feshbach (1953) 26 .

20
E. Merzbacher, Quantum mechanics, (1998).
21
W. Wolney Filho, Mecânica quântica, (2002).
22
C. Cohen-Tannoudji, B. Diu and F. Laloë, Quantum mechanics, (1977).
23
J. J. Sakurai, Modern quantum mechanics, (1994).
24
A. Messiah, Quantum mechanics, (1970).
25
G. Arfken, Mathematical methods for physicist, (1970).
26
P. M. Morse and H. Feshbach, Methods of theoretical physics, (1953).

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Capítulo 9

Espalhamento

A maioria dos conhecimentos já adquiridos sobre os constituintes e a


estrutura da matéria, tem sido obtida, principalmente, por meio da
espectroscopia física e da colisão de partículas, i.e., espalhamento.
A teoria de colisões analisa as interações entre partículas atômicas e
subatômicas como ponta de prova.
O primeiro experimento sobre colisões de partículas foi idealizado
e realizado por Rutherford e seus colaboradores em 1911 1 , quando uti-
lizaram dados sobre o espalhamento de partículas α por finas folhas
metálicas para deduzir a existência de núcleos atômicos. Em 1937, es-
tudos sobre colisões de partículas cósmicas com a matéria possibili-
taram o descobrimento dos muons 2 , µ, positivos e negativos, essas
partículas são aproximadamente 207 vezes mais massivas que o elétron,
esses trabalhos foram realizados por dois grupos separados, Anderson 3
e Neddermeyer 4 , e Street 5 e Stevenson 6 . Em 1947, foram descobertos
os mésons π, também conhecidos como pions 7 , com cargas positivas
e negativas, podendo ainda existir na forma neutra, essas partículas
1
E. Rutherford, Philosophical Magazine, 21, 669–688 (1911); E. Rutherford, Na-
ture, 92, n. 2302, 423 (1913); E. Rutherford, Philosophical Magazine, 27, n. 158,
488–498 (1913); H. Geiger and E. Marsden, Philosophical Magazine, 25, n. 148,
604–623 (1913).
2
S. H. Neddermeyer and C. D. Anderson, Physical Review, 51, 884-886 (1937);
J. C. Street and E. C. Stevenson, Physical Review, 52, 1003-1004 (1937).
3
Carl David Anderson (1905–1991), físico americano.
4
Seth Henry Neddermeyer (1907–1988), físico americano.
5
Jabez Curry Street (1906–1989), físico americano.
6
Edward Carl Stevenson (1907– ), físico americano.
7
C. M. G. Lattes, G. Occhialini and C. F. Powell, Nature, 159, 694 (1947);
C. M. G. Lattes et al., Nature, 160, 453, 486 (1947).

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308 Cap. 9 Espalhamento

têm massa aproximadamente 273 vezes a massa do elétron e foram as


primeiras partículas de uma enorme família de partículas subatômicas
descobertas nos anos subseqüentes à descoberta dos muons, esses tra-
balhos foram realizados por Lattes 8 , Occhialini 9 e Powell 10 .
Nos dias de hoje, os modernos aceleradores de partículas de altas
energias permitem a realização de estudos sistemáticos sobre processos
de colisões. Esses estudos constituem a principal fonte de informações
sobre as interações nucleares fortes, fracas e eletromagnéticas.
As evidências experimentais envolvendo processos de colisão levaram
os físicos a formular, em última instância, que a matéria é constituída
de quarks e leptons 11 . Nesse capítulo iremos abordar alguns aspectos
da teoria de colisões não relativísticas, sem levar em consideração a
estrutura das partículas incidentes sobre os alvos.

9.1 Amplitude de Espalhamento


Vamos considerar uma hamiltoniana cujo potencial seja esfericamente
simétrico e satisfaça 12
lim V (r) = 0 . (9.1)
r→∞

O espectro desta hamiltoniana possui duas partes distintas:

1. Espectro discreto (E < 0) que é caracterizado pelos valores dis-


cretos dos autovalores
R E e também por seus auto-estados serem
normalizáveis ( d3 x|ψ|2 < ∞). Esses estados representam partícu-
las ligadas ao potencial V , e foram analisados no capítulo anterior.

2. Espectro contínuo (E ≥ 0) cujos autovalores E formam um con-


junto não enumerável e as correspondentes autofunções são não
localizadas, i.e., não são normalizáveis. Esses estados descrevem
o espalhamento de partículas pelo potencial V .
8
Cesare Mansueto Giulio Lattes (Cesar Lattes) (1924–2005), físico brasileiro.
9
Giuseppe "Beppo"Pablo Stanislao Occhialini (1905–1993), físico italiano.
10
Cecil Frank Powell (1903–1969), físico inglês.
11
F. Halzen and A. D. Martin, Quarks and Leptons, (1984).
12
Como discutido no capítulo anterior, podemos separar um problema de dois corpos
no movimento do centro de massa e no movimento relativo das partículas. Iremos
estudar o último em detalhe, sendo a conexão entre o espalhamento no centro de
massa e o mais geral a mesma que conhecemos da Mecânica Clássica.

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9.1. Amplitude de Espalhamento 309

As condições de contorno empregadas nesses dois casos são muito


distintas tendo em vista que:

1. Para o espectro discretoRrequeremos que a função de onda ψ seja


de quadrado integrável ( d3 x|ψ|2 < ∞), e conseqüentemente esta
deve ir a zero suficientemente rápido no limite r → ∞. Devemos
lembrar que na resolução de problemas unidimensionais empreg-
amos o mesmo critério (quando normalizamos) para inferir qual
a condição de contorno que deveríamos usar.

2. Para o espectro contínuo, a exemplo do que foi feito nos proble-


mas unidimensionais, a condição de contorno depende do prob-
lema físico que desejamos analisar. A nossa escolha será que ψ
deve representar o espalhamento de uma partícula de momentum
linear bem definido pelo potencial V e portanto, deve conter uma
onda livre incidente bem como uma onda emergente a grandes
distâncias do potencial espalhador.

No estudo do espectro contínuo iremos impor que os auto-estados


da hamiltoniana do sistema satisfazem a

ψ → ei k ~r + f (θ, ϕ)
~ ei kr
(9.2)
r

no limite r → ∞. O primeiro termo dessa expressão representa uma


partícula livre incidente de momentum linear bem definido a qual é es-
palhada pelo potencial V , resultando a onda emergente descrita pelo se-
gundo termo da equação (9.2). A amplitude de espalhamento f (θ, ϕ)
é obtida a partir da autofunção da hamiltoniana que satisfaz o compor-
tamento dado em (9.2). Note que para a expressão (9.2) poder ocorrer
o potencial V deve ser de curto alcance, uma vez que tanto ei k ~r como
~
ei kr
r representam partículas livres no limite r → ∞. Na realidade, essa
condição de contorno só poderá ser utilizada para potenciais que se
anulem no infinito mais rapidamente que 1r . Por exemplo, no espal-
hamento por um potencial coulombiano há o aparecimento de uma fase
adicional proporcional a ln(2kr). A dependência que a amplitude de
espalhamento f (θ, ϕ) tem com os ângulos θ e ϕ deve-se à dependência
que o fluxo espalhado tem da direção do feixe espalhado.

Mecânica Quântica

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310 Cap. 9 Espalhamento

9.2 Seção de Choque Diferencial


Nesse parágrafo vamos definir a seção de choque diferencial, a qual
descreve a distribuição angular das partículas espalhadas por um centro
de forças, bem como mostrar a sua relação com a forma assintótica de
(9.2) dos auto-estados da hamiltoniana. Para tanto vamos considerar
que o fluxo de partículas incidentes é paralelo ao eixo z e que o centro
espalhador encontra-se em r = 0, como mostra a Fig. 9.1.

Figura 9.1: Geometria considerada num espalhamento.

Em geral, o número de partículas espalhadas por unidade de tempo


(Nesp ) que atravessam um pequeno ângulo sólido ∆Ω, deve ser propor-
cional a ∆Ω e ao fluxo incidente F . Logo, podemos escrever 13

Nesp = ∆Ω F (9.3)
dΩ

onde a constante de proporcionalidade dΩ é a seção de choque diferen-
cial desse processo, a qual possui dimensão de área. A seção de choque
total será então definida por
Z

σ = dΩ (9.4)
dΩ
13
Note que essa expressão é válida tanto na Mecânica Clássica como na Mecânica
Quântica!

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9.2. Seção de Choque Diferencial 311



Para que dΩ independa das condições experimentais é necessário
assumir que a densidade do feixe incidente seja suficientemente baixa
para podermos desprezar as interações entre as partículas incidentes e
também para que essas não interajam simultaneamente com o centro
espalhador. Se isso não for satisfeito, deveremos resolver um problema
de muitos corpos interagindo entre si e com o potencial espalhador V .
Da definição acima temos que
dσ Nesp
= (9.5)
dΩ F ∆Ω
Para obtermos F e Nesp é conveniente escrever a condição de contorno
(9.2) na forma
ψ → ψinc + ψesp (9.6)
onde
ei kr
ψinc = ei kz e ψesp = f (θ, ϕ) (9.7)
r
e identificamos ψinc como a onda incidente e ψesp descreve a onda es-
palhada. Agora basta utilizar a densidade de corrente de probabil-
idade ³ ´
~J = i ~ ψ ∇ψ
~ ∗ − ψ ∗ ∇ψ
~ , (9.8)

para calcular Nesp e F . Devido ao significado físico de ~J, essas quanti-
dades podem ser escritas como 14

F = |~Jinc | (9.9)

e
Nesp = ~Jesp  r̂ r2 ∆Ω (9.10)
onde ~Jinc e ~Jesp são as densidades corrente de probabilidade incidente
e espalhada obtida substituindo-se ψ em (9.8) por ψinc e ψesp , respec-
tivamente. Logo, teremos que a corrente incidente é dada por
³ ´
~Jinc = i ~ ei kz ∇e
~ − i kz − e− i kz ∇e
~ i kz

~k
= ẑ (9.11)
µ
14
Aqui estamos desprezando a interferência entre a onda incidente e a onda espal-
hada.

Mecânica Quântica

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312 Cap. 9 Espalhamento

ao passo que a corrente de probabilidade espalhada é


µ i kz − i kz

~Jesp = i ~ f (θ, ϕ) e ∇f ~ ∗ (θ, ϕ) e e− i kz ~ ei kz
− f ∗ (θ, ϕ) ∇f (θ, ϕ)
2µ r r r r
~k |f (θ, ϕ)|2
= r̂ (9.12)
µ r2
onde conservamos apenas os termos mais importantes no limite r → ∞.
Portanto, teremos
~k
F = (9.13)
µ
e
~k
Nesp = |f (θ, ϕ)|2 ∆Ω (9.14)
µ
Isto permite-nos obter a seção de choque diferencial desse processo, que
será dada por por

= |f (θ, ϕ)|2 (9.15)
dΩ
Resumindo, o programa que devemos seguir para obter a seção de
choque diferencial de um dado processo será resolver a equação de
Schrödinger independente do tempo sujeita à condição de contorno
de espalhamento (9.2). Após realizarmos isso extrairemos f (θ, ϕ) da

solução obtida, e assim obteremos dΩ . A seguir faremos esses passos
formalmente, visando encontrar uma expressão para f (θ, ϕ), a qual de-
penderá do comportamento dos auto-estados da hamiltoniana no limite
r → ∞.

9.3 Método de Ondas Parciais


O chamado método de ondas parciais, se aplica para o caso de po-
tenciais com simetria esférica. Esse método é baseado numa expansão
da função ψ(~r) em termos de autofunções do momentum angular. Essa
expansão deve ser feita de tal forma que na condição assintótica ela seja
consistente com (9.2), i.e.,

ei kr
ψ(~r)r→∞ → ei kz + f (θ, ϕ)
r
Com essa consideração, torna-se possível obter uma expressão para am-
plitude de espalhamento: uma série com um número infinito de termos,

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9.3. Método de Ondas Parciais 313

em que cada termo contribui para f (θ, ϕ) através de uma onda parcial,
caracterizada por um momentum angular particular. Para partículas
incidentes de baixa energia, os primeiros termos da série aproximam-
se da função de amplitude de espalhamento f (θ, ϕ). A vantagem desse
método é que ele é capaz de fornecer uma boa aproximação para as
partículas incidentes com baixa energia.
Quando o potencial V (r) responsável pelo espalhamento é esferica-
mente simétrico, o momentum angular é uma quantidade conservada
visto que comuta com a hamiltoniana. Portanto, auto-estados corre-
spondendo a diferentes valores do momentum angular são espalhados
independentemente, sendo conveniente trabalhar-se na base em que o
momentum angular é diagonal. No que segue escreveremos os auto-
estados da hamiltoniana na forma ulr(r) Ylm , o permite reduzir o prob-
lema de autovalores de H à seguinte equação radial
· ¸
~2 d2 ul l(l + 1)~2
− + + V (r) ul = E ul (9.16)
2µ dr2 2µr2
onde E é o autovalor associado a este auto-estado. No limite r → ∞
essa equação toma a forma

~2 d2 ul ∼
− = E ul (9.17)
2µ dr2
onde assumimos que V (r) tende a zero suficientemente rápido nesse
limite. A solução geral dessa equação é
µ ¶
∼ lπ
ul (r) = Al sen kr − + δl (9.18)
2
2 2
onde E = ~2µk , e Al e δl são constantes. Uma vez que Al é uma constante
multiplicativa, já que esse é um problema de autovalores, podemos de-
terminar o parâmetro real δl (denominado deslocamento de fase)
impondo apenas uma condição de contorno, a qual deve ser ul (0) = 0.
Lembre-se que essa condição de contorno foi motivada no capítulo an-
terior e que a sua justificativa não envolvia que a função de onda fosse
normalizável.
Um fato importante acerca de (9.18) é que esse comportamento
acarreta que o auto-estado da hamiltoniana ψ = url Ylm não satisfaz a
condição de contorno de espalhamento dada em (9.2)! Isso ocorre porque
a função seno em (9.18) contém uma onda espalhada (ei kr ) bem como

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314 Cap. 9 Espalhamento

uma onda incidente (e− i kr ). Logo, essa solução descreve uma onda inci-
dente de momentum angular bem definido que é espalhada pelo poten-
cial V . Nesse caso a onda espalhada possui o mesmo momentum angular
da onda incidente, uma vez que o momentum angular é conservado.
Tendo em vista que os auto-estados com energia E são degenerados,
é natural fazer uma superposição linear desses auto-estados, visando
que essa obedeça a condição de contorno desse problema (9.2) 15 . Logo,
escrevemos
∞ X
X l
ul (r)
ψ= Clm Ylm (θϕ) (9.19)
kr
l=0 m=−l

onde desejamos obter os coeficientes Clm de modo que (9.2) seja satis-
feita. Uma vez que o potencial é central e que ψinc = ei kz , temos que ψ
não depende de ϕ, por causa da simetria de rotação em torno do eixo z
que esse processo tem. Logo, Clm = 0 para m 6= 0, o que nos conduz a


X ul (r)
ψ= Bl (2l + 1) il Pl (cos θ) (9.20)
kr
l=0

onde Pl (cos θ) são os polinômios de Legendre, e os coeficientes da ex-


pansão foram escritos de maneira conveniente, também usamos que
r
2l + 1
Yl0 = Pl (cos θ) .

Lembrando que 16


X
ei kz = ei kr cos θ = (2l + 1) il jl (kr) Pl (cos θ) (9.21)
l=0

onde jl (kr) são as funções de Bessel esféricas e z = r cos θ. Assim, no

15
Lembre-se que a superposição de autovetores com o mesmo autovalor também é
um autovetor.
16
Essa relação possui uma interpretação simples: uma partícula livre em um auto-
estado da energia e momentum linear (lado esquerdo) está sendo expresso em
termos de auto-estados da energia e momentum angular (lado direito).

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9.3. Método de Ondas Parciais 315

limite r → ∞, temos que



1 ei kr X ³ ´
i kz
ψ(r) − e → (2l + 1) Bl ei δl − 1 Pl (cos θ)
2ik r
l=0
1

e i kr X
− ³ ´
+ (2l + 1) −Bl e− i δl + 1 Pl (cos θ)
2ik r
l=0
(9.22)
Para satisfazer a relação (9.2) devemos impor que o coeficiente de
e− i kr seja nulo, acarretando que
Bl = ei δl (9.23)
Examinando a equação (9.22) obteremos a amplitude de espalhamento
f (θ):
1 X
∞ ³ ´
f (θ) = (2l + 1) e2 i δl − 1 Pl (cos θ) (9.24)
2ik
l=0
ou

1X
f (θ) = (2l + 1) ei δl sen δl Pl (cos θ) (9.25)
k
l=0
Portanto, a seção de choque total, que é dada por
Z Z

σ ≡ dΩ = dΩ|f (θ)|2
dΩ
pode ser escrita formalmente como
Z 2π Z π
σ= dϕ |f (θ)|2 sen θ dθ
0 0
∞ Z
1 X 0
= 2π 2 (2l + 1)2 sen2 δl Pl2 (cos θ) d(cos θ) (9.26)
k π l=0

o que resultará

4π X
σ= 2 (2l + 1) sen2 δl (9.27)
k
l=0
onde utilizamos
Z 0
2
Pl2 (cos θ) d(cos θ) = . (9.28)
π 2l + 1
Antes de passar a resolução de alguns exemplos, é importante ressaltar
os seguintes pontos:

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316 Cap. 9 Espalhamento

1. Quando V (r) ≡ 0, a solução da equação radial que satisfaz a


condição u(0) = 0 é dada por

ul (r) = rjl (kr) (9.29)

cujo comportamento assintótico para r → ∞ é


µ ¶

ul (r) → Cl sen kr − (9.30)
2

Portanto, temos que δl = 0. Logo, usando (9.27) obtemos a seção


de choque total σ = 0, como era de se esperar já que uma partícula
livre não deve sofrer espalhamento.

2. Note que a seção de choque total do processo é dada pela soma


incoerente das contribuições das ondas parciais l.

3. A expressão formal para seção de choque diferencial dΩ é uma
série sobre todas as ondas parciais l a qual, em geral, não pode ser
escrita como uma expressão compacta. Somos então levados natu-
ralmente a perguntar, quais as ondas parciais que mais contribuem
para a seção de choque diferencial? Para responder esta questão,
iremos considerar um potencial com alcance a, i.e., V (r) ∼ = 0
para r > a. Assim, argumentaremos que apenas as ondas parciais

satisfazendo l ≤ ka contribuem significativamente para dΩ .
Classicamente esperamos que as partículas incidindo com um pa-
râmetro de impacto b maior que a não vão interagir com o
potencial V (r), como mostra a Fig. 9.2. Logo, o momentum an-

Figura 9.2: Espalhamento por um potencial de curto alcance.

gular máximo que uma partícula pode ter para ser espalhada é

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9.3. Método de Ondas Parciais 317

~k × a. Consequentemente, apenas as ondas satisfazendo l ≤ ka


deverão ser espalhadas.
No contexto da mecânica quântica, o argumento para obtermos
essa conclusão é o seguinte: a função de onda do sistema para r
pequeno tem a forma Rl ' jl (kr), levando então que o primeiro
máximo dessa função será para kr ' l. Logo, se l > ka a função de
onda será pequena na região onde o potencial espalhador é maior,
acarretando que essas ondas parciais não irão sentir o efeito do
potencial V (r). Por conseguinte, as ondas mais espalhadas são
aquelas que satisfazem l ≤ ka.
Uma conseqüência interessante desse argumento é que no limite
de baixas energias (ka ¿ 1) apenas a onda S (l = 0) contribui
para a seção de choque total σ. Nesse caso a seção de choque
diferencial é isotrópica já que P0 (cos θ) = 1. Além disso, a seção
de choque total será dada por 4πk2
sen2 δ0 .
4. Para potenciais puramente atrativos (V (r) ≤ 0) temos que δl > 0.
Isso ocorre pois a função de onda oscila mais rapidamente na
região em que o potencial é não nulo, levando a um avanço na
fase com respeito ao caso livre (V (r) = 0). Analogamente, poten-
ciais puramente repulsivos (V (r) ≥ 0) conduzem a um δl < 0.
Isso também poderá ser visto a partir da seguinte relação entre o
deslocamento de fase, o potencial e o auto-estado da energia ul :
Z
2µ ∞
sen δl = − 2 dr rjl (kr)ul (r)V (r) (9.31)
~ 0
onde a normalização usada é tal que
µ ¶

ul (r) → sen kr − + δl
2
quando r → ∞.
Essa relação em si não é muito útil pois para obtermos δl pre-
cisamos conhecer ul , sendo portanto um método complicado de
calcular o deslocamento de fase! Contudo, esse relação irá per-
mitir fazermos aproximações razoáveis. Supondo que o potencial
seja fraco, podemos aproximar o auto-estado pela função de onda
livre, i.e., ul (r) ' krjl (kr) que nos leva a
Z
2µk ∞
sen δl ' − 2 dr r2 jl2 (kr)V (r) (9.32)
~ 0

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318 Cap. 9 Espalhamento

Com isso podemos ver que o sinal de δl é oposto ao do potencial.

Espalhamento por um poço de potencial retangular: Consid-


eremos um sistema cujo potencial de interação é dado por
½
−V0 para 0 < r < a
V (x) = V0 > 0 real (9.33)
0 para r > a

A equação radial
µ ¶
~2 d2 l(l + 1)~2
− (rRl ) + + V (r) Rl = E Rl (9.34)
2µr dr2 2µr2

para r < a, a equação será

1 d2 2 l(l + 1)
(rRl ) + k 0 Rl − Rl = 0 (9.35)
r dr2 r2
e para r > a, será

1 d2 l(l + 1)
2
(rRl ) + k 2 Rl − Rl = 0 (9.36)
r dr r2

onde definimos k 0 2 = 2µ~2


(E + V0 ). Lembre-se que os estados que de-
2 2
screvem o espalhamento possuem E = ~2µk > 0. Visto que as equações
acima são as mesmas de uma partícula livre, temos que a solução geral
para Rl será
½
Al jl (k 0 r) + Bl nl (k 0 r) para r < a
Rl (r) = (9.37)
Cl jl (kr) + Dl nl (kr) para r > a

onde temos as funções esféricas de Bessel, jl , e as funções esféricas


de Neumann, nl .
Para obter os deslocamentos de fase δl , iniciaremos impondo a condi-
ção de contorno ul (0) = 0, essa condição implica que Bl = 0. Utilizando
a forma assintótica das funções de Bessel esféricas vistas no capítulo
anterior, é fácil mostrar que os deslocamentos de fase são dados por
Dl
Cl = − tan δl .
Uma vez que a expressão para Rl (r) possui duas formas, devemos
requerer que Rl e dR dr sejam contínuas em r = a, que as seguintes
l

relações
Al jl (k 0 a) = Cl jl (ka) + Dl nl (ka) (9.38)

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9.3. Método de Ondas Parciais 319

e
Al k 0 jl0 (k 0 a) = Cl kjl0 (ka) + Dl kn0l (ka) (9.39)
onde a linha (0 ) que aparece nas funções especiais, representa a derivada
com respeito ao argumento dessa função. Definindo a quantidade
Rl (a) jl (k 0 a)
aγl (k) ≡ = (9.40)
dRl (a) k 0 jl0 (k 0 a)
dr

podemos obter, a partir de (9.38) e (9.39), uma expressão simples para


δl .
kaγl jl0 (ka) − jl (ka)
tan δl = (9.41)
kaγl n0l (ka) − nl (ka)
A partir desta expressão podemos constatar que os deslocamentos de
fase δl são funções de k, ou seja da energia da partícula incidente. Note
que a informação sobre o potencial encontra-se codificada nas constantes
γl .
Apesar de possuirmos uma expressão fechada para os deslocamentos
de fase (9.41) não é fácil, em geral, identificar quais as ondas parciais
que mais contribuem ou qual o comportamento da seção de choque com
a energia, i.e., em função da energia. Para termos uma intuição, analise-
mos esse problema no limite ka → 0, ou seja no limite de baixas en-
ergias. Verificaremos explicitamente que a seção de choque é dominada
pela onda parcial S (l = 0), como foi feito no argumento apresentado
anteriormente. No capítulo anterior vimos que
ρl (2l + 1)!!
jl (ρ) → e nl (ρ) → − (9.42)
(2l + 1)!! ρl+1
no limite ρ → 0. Substituindo (9.42) em (9.41), veremos que no limite
de baixas energias
1 lγl − 1
tan δl ' 2
(ka)2l+1 (9.43)
[(2l + 1)!!] (l + 1)γl + 1
Tendo em vista que a quantidade tan δl é pequena, seque que tan δl '
sen δl . Com isso, vemos a partir de (9.25) e (9.43) que a amplitude de
espalhamento é proporcional a (ka)2l . Portanto, a seção de choque é
dominada pela onda parcial S (l = 0), exceto em caso excepcionais em
que δ0 se anule. No limite de baixas energias
ka
sen δ0 ' − (9.44)
1 + γ0

Mecânica Quântica

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320 Cap. 9 Espalhamento

Utilizando a forma explícita das funções de Bessel esféricas de ordem


zero podemos avaliar γ0 a partir de (9.40).
1
1 + γ0 = tan k0 a
(9.45)
1− k0 a

Logo, no limite de baixas energias (ka → 0), a seção de choque difer-


encial é isotrópica por ser uma onda S e a seção de choque total será
dada por
µ ¶
dσ tan k 0 a 2
σ = 4π ' 4πa2 1 − (9.46)
dΩ k0 a
Para o caso V0 < 0 onde temos um potencial repulsivo, a seção de
choque total no limites de baixas energias será dada por
µ ¶
2 tanh κ0 a 2
σ ' 4πa 1 − (9.47)
κ0 a

onde, nesse limite κ2 = − 2µ


~2
(E + V0 ) > 0.
Espalhamento por uma esfera rígida: Como no primeiro exem-
plo de uso do tratamento apresentado para as ondas parciais, iremos
calcular a seção de choque total para o espalhamento causado por uma
esfera rígida, onde o potencial é definido pelas condições:
½
∞ se r ≤ a
V (x) = (9.48)
0 se r > a
Esse potencial pode caracterizar uma esfera muito dura, i.e., impen-
etrável de raio a. A condição de contorno que aqui deverá ser imposta
é Rl (a) = 0, uma vez que Rl se anula para r < a. A solução geral para
Rl na região r > a será dada por

Rl = Cl jl (kr) + Dl nl (kr) (9.49)

Lembrando que DCl = − tan δl e impondo a condição de contorno, poder-


l

emos concluir que


jl (ka)
tan δl = (9.50)
nl (ka)
Analisando o limite de baixas energias desse problema, veremos que
quando E → 0, i.e., ka → 0, encontraremos
(ka)2l+1
tan δl ' − ' sen δl ' δl (9.51)
(2l + 1)!!(2l − 1)!!

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9.4. Teorema Óptico 321

onde utilizamos (9.42). Portanto, temos que |δl | ¿ |δ0 | (l 6= 0) no limite


acima, o que significa que apenas a onda parcial S (l = 0) contribui
significativamente em nosso caso. Isso já era esperado tendo em vista
a análise feita no exemplo anterior. Conseqüentemente neste limite,
δ0 = −ka

σ ' 2 δ02 = 4πa2 (9.52)
k
Este resultado é quatro vezes a área clássica da esfera! Essa área efetiva
maior é característica de um espalhamento com um comprimento de
onda muito grande, i.e., o comprimento de onda de de Broglie λ =

k é muito grande nesse limite, e não necessariamente esperamos um
resultado clássico. A diferença entre esse resultado e o valor clássico não
será nenhuma surpresa. Na mecânica quântica, no estudo da evolução
da onda associada com as partículas incidentes, e a abrupta variação
de V (r) quando r = a produz um fenômeno análogo ao fenômeno de
difração de uma onda eletromagnética.
No limite de altas energias desse problema o resultado encontrado
para a seção de choque total é σ = 2πa2 . Note que apesar de estarmos
no limite da ótica geométrica ainda temos uma resposta diferente
da clássica. A razão para a aparente anomalia desse resultado, e que a
forma assintótica da função de onda (9.2) nesse limite clássico é contado
duas vezes: uma no verdadeiro espalhamento e a outra na sombra da
esfera para a onda espalhada que aparece para frente, na direção do
feixe incidente, desde que essa sombra seja produzida pela interferência
i kr
entre a onda incidente ei kz e a onda espalhada f (θ) e r .

9.4 Teorema Óptico


Existe uma relação simples para a seção de choque total σ e a parte
imaginária da amplitude de espalhamento f (θ). Essa relação se da
quando o espalhamento ocorrem na direção do feixe incidente, θ = 0.
Para tornar evidente esse fato, calculemos f (0) a partir da relação (9.25)

1X
f (0) = (2l + 1)ei δl sen δl
k
l=0

1X
= (2l + 1)(cos δl sen δl + i sen2 δl ) (9.53)
k
l=0

Mecânica Quântica

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322 Cap. 9 Espalhamento

onde utilizamos os polinômios de Legendre que satisfazem Pl (1) = 1.


Comparando essa expressão com (9.27) podemos notar que


σ= =f (0) (9.54)
k
onde =f (0) é a parte imaginária da amplitude de espalhamento com θ =
0. Essa relação é conhecida como teorema óptico, ou relação Bohr-
Peierls-Placzek 17 . Esse teorema reflete o fato de que o espalhamento
para frente, na direção do feixe incidente, interfere com o próprio feixe
incidente, reduzindo o número de partículas espalhadas na direção de
incidência. Esse fenômeno tem alguma alguma analogia com a sombra
produzida atrás de um disco opaco quando o feixe de luz incide sobre
ele.
Uma análise cuidadosa do processo de espalhamento irá permitir
mostrarmos que a relação (9.54) é geral, valendo até para situações em
que o potencial não é central, ou seja, quando a amplitude de espal-
hamento f depende também do ângulo azimutal ϕ.

9.5 Espalhamento Elástico e Inelástico


Para mostrarmos a diferença do espalhamento elástico e espalha-
mento inelástico, partiremos do seguinte argumento. Na expressão
i kr
(9.22) temos uma onda esférica emergente, e r , e uma onda es-
− i kr
férica incidente, e r . Portanto,

ψ ' ψem + ψinc (9.55)

O fluxo de ondas esféricas incidentes é proporcional a:

|e− i kr |2 = 1 (9.56)

e o fluxo de ondas esféricas emergentes é proporcional a:

|Sl ei kr |2 = |Sl |2 (9.57)

onde Sl ≡ 1 + al .
17
Rudolf Ernst Peierls (1907–1995), físico anglo-germânico.
George Placzek (1905–1955), físico tchecoslovaco.

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9.5. Espalhamento Elástico e Inelástico 323

Pelo princípio da conservação do fluxo, não acúmulo da densidade


de probabilidade no infinito ou na origem, esses dois fluxos devem ser
iguais. Portanto,
|Sl |2 = 1 → |Sl | = 1 (9.58)
A expressão acima nos mostra que Sl pode ser expressa em termos
de um parâmetro real δl , o deslocamento de fase. Assim, escolhemos Sl
de tal forma que tenhamos

Sl = e2 i δl (9.59)

No caso do espalhamento elástico, vamos ter o seguinte: usando a ex-


pressão (9.24) para a amplitude de espalhamento, encontraremos

1 X
f (θ) = (2l + 1)|Sl − 1|Pl (cos θ) (9.60)
2ik
l=0

Essa formula foi desenvolvida por Faxén 18 e Holtsmark 19 em 1927 20 .


Para escrever a seção de choque total elástica, (9.27) em função de
Sl , iremos calcular a seguinte expressão

|Sl − 1|2 = (e2 i δl − 1)(e−2 i δl − 1)


= (1 − e2 i δl − e−2 i δl + 1)
= 2(1 − cos 2δl ) = 4 sen2 δl

Assim, a seção de choque total elástica será



π X
σe = 2 (2l + 1)|Sl − 1|2 (9.61)
k
l=0

É oportuno observar que os δl podem ser obtidos integrando-se numeri-


camente a equação de Schrödinger para cada onda parcial.
Para o espalhamento inelástico ou reativo, há mudança no estado
interno das partículas. Isso significa dizer que na expressão (9.55) a
amplitude de onda emergente é menor que a da onda incidente. Desse
18
Hilding Faxén (1892–1970), físico sueco.
19
Johan Holtsmark (1894–1975), físico norueguês.
20
H. Faxén and J. Holtsmark, Zeits. für Physik, 45, 307 (1927); o completo desen-
volvimento desses trabalhos poderá ser encontrado no livro de V. de Alfaro and
T. Regge, Potential scattering, (1965).

Mecânica Quântica

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324 Cap. 9 Espalhamento

modo, podemos tratar esse tipo de espalhamento com as mesmas ex-


pressões do espalhamento elástico, porém substituindo a relação (9.58)
por:
|Sl | ≤ 1 (9.62)
essa expressão indica ser necessário um parâmetro adicional para es-
pecificar Sl . Portanto,
Sl = ηl e2 i δl (9.63)
onde ηl é um número real denominado de parâmetro de inelastici-
dade, e 0 ≤ ηl ≤ 1. Por analogia com a expressão (9.61) e considerando
as condições acima, definimos a seção de choque total inelástica da
seguinte forma

π X ¡ ¢
σi = 2 (2l + 1) 1 − |Sl |2 (9.64)
k
l=0

Naturalmente, a seção de choque total será obtida pela soma das


seções de choque elástica e inelástica:

π X ¡ ¢
σt = σe + σi = 2
(2l + 1) |Sl − 1|2 + 1 − |Sl |2 (9.65)
k
l=0

Usando a expressão (9.63), teremos,

<Sl = ηl cos 2δl (9.66)

e também

|Sl − 1|2 = (Sl − 1)(Sl∗ − 1)


³ ´
= |Sl |2 − ηl e2 i δl + e−2 i δl + 1
= |Sl |2 − 2ηl cos 2δl + 1 (9.67)

Substituindo a relação (9.67) na expressão (9.65) e usando a equação


(9.66), encontraremos,

π X ¡ ¢
σt = 2
(2l + 1) |Sl |2 − 2ηl cos 2δl + 1 + 1 − |Sl |2
k
l=0

π X
= 2 (2l + 1)(1 − <Sl ) . (9.68)
k
l=0

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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9.6. Espalhamento Ressonante 325

É oportuno destacar que o formalismo de ondas parciais se torna


consideravelmente mais complicado no espalhamento de partículas com
spin. Contudo, no espalhamento em que uma das partículas tem spin-
1
2 , como no caso do espalhamento píon-núcleon, a amplitude de es-
palhamento pode depender da orientação do spin antes e depois do
espalhamento. Portanto, haverá duas amplitudes cada uma delas é rep-
resentada por uma expressão semelhante a (9.60).

9.6 Espalhamento Ressonante


Podemos escrever a expressão para a seção de choque total como um
somatório de todas as l seções de choque. Então,

X
σ= σl (9.69)
l=0

com

σl = (2l + 1) sen2 δl (9.70)
k2
onde está explicito a contribuição de cada uma das ondas parciais. Note
que a contribuição máxima que a onda parcial l pode dar ocorre para
sen2 δl = 1, ou seja, quando δl (k) = ± π2 . Quando temos a ocorrência de
σl máximo chamamos de espalhamento ressonante para uma dada
energia.
Existindo o espalhamento ressonante para a onda parcial l com uma
energia ER , podemos obter uma expressão aproximada para a seção
de choque como uma função da energia. Nosso ponto de partida será
δl (ER ) = ± π2 , o que implica em cot δl (ER ) = 0. Portanto, expandindo
cot δl (E) em série de Taylor em torno de ER temos que
¯
d ¯
cot δl (E) = cot δl ER + (E − ER ) cot δl (E)¯¯ + ···
dE E=ER
2
' − (E − ER ) (9.71)
Γ
onde definimos a largura Γ como
¯
2 d ¯
− = cot δl (E)¯¯
Γ dE E=ER

Mecânica Quântica

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326 Cap. 9 Espalhamento

Substituindo essa expressão em (9.70) resulta que

Γ 2
4π 4
σl (E) ' 2 (2l + 1) Γ2
(9.72)
k (E − ER )2 + 4

Essa é a fórmula de Breit-Wigner 21 , cujo comportamento com a


energia é dado pela Fig. 9.3.

Figura 9.3: Dependência da seção de choque parcial com a energia próximo


a uma ressonância.

Potencial Delta de Casca: Analisemos o espalhamento da onda


S (l = 0) por um potencial delta de casca, esse potencial será dado por

V (r) = λδ(r − a) (9.73)

Esse potencial será repulsivo se λ > 0 ou atrativo se λ < 0. Assim, a


equação radial satisfeita por u0 (r) será dada por

d2 u0 £ 2 ¤
2
+ k − αδ(r − a) u0 = 0 (9.74)
dr

onde definimos k 2 = 2µE~2


e α = 2µλ
~2
. Para r 6= a a função delta será nula
e u0 irá satisfazer a equação radial de uma partícula livre. Portanto, a
solução desejada possuirá a forma
½
A sen kr para r ≤ a
u0 (r) = (9.75)
B sen (kr + δ0 ) para r > a
21
Gregory Breit (1899–1981), físico russo-americano.
Eugene Paul Wigner (1902–1995), matemático húngaro americano.

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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9.7. Efeito Ramsauer-Townsend 327

onde já impusemos que u0 (0) = 0. Então, a continuidade de u0 para


r = a será dada por
A sen ka = B sen (ka + δ0 ) (9.76)
¯
du0 ¯
enquanto que o salto da derivada dr ¯ conduzirá a
r=a

kB cos (ka + δ0 ) − kA cos ka = αA sen ka (9.77)


A partir das duas últimas equações poderemos concluir que
α sen2 ka
tan δ0 = − α (9.78)
k 1 + 2k sen (2ka)
Finalmente, o espalhamento da onda S através desse potencial será
ressonante para valores da energia que conduzam a |δ0 | = π2 , i.e. | tan δ0 | =
∞. Logo, a condição para a existência de espalhamento ressonante será
2k
sen (2ka) = − . (9.79)
α

9.7 Efeito Ramsauer-Townsend


Em trabalhos realizados por Ramsauer 22 e Townsend 23 , foram observa-
dos que o espalhamento de elétrons por átomos de gases raros possuía
uma seção de choque muito pequena quando a energia dos elétrons
era da ordem de 0.7 eV 24 . Devida a baixa energia dos elétrons, a con-
tribuição mais importante para a seção de choque desse processo provém
da onda S. A explicação da pequena seção de choque observada por
Ramsauer e Townsend estava no fato de que o deslocamento de fase, δ0 ,
anula-se e conseqüentemente a seção de choque também será nula.
O espalhamento por um poço quadrado atrativo apresenta o efeito
Ramsauer-Townsend. Impondo que δ0 = 0 em (9.44), temos que
k 0 a = tan k 0 a (9.80)
onde utilizamos a relação (9.45). Lembre-se que k 0 2 = 2µ
~2
(E + V0 ). A
partir dessa equação vemos que a seção de choque irá anular-se apenas
para valores bem determinados da energia.
22
Carl Wilhelm Ramsauer (1879–1955), físico alemão.
23
John Sealy Edward Townsend (1868–1957), matemático e físico inglês.
24
Os resultados experimentais estão sumarizados em R. Kollath, Phys.Zeits., 31,
985 (1931).

Mecânica Quântica

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328 Cap. 9 Espalhamento

9.8 Espalhamento - Função de Green


Para o estudo do espalhamento de partículas através de um potencial
V (~x) precisamos analisar o problema de autovalores da hamiltoniana
sujeito à condição de contorno (9.2). Mais explicitamente, temos que
resolver a equação
³ ´
~ 2 + k 2 ψ = 2µ V (~x)ψ
∇ (9.81)
~2
onde k 2 = 2µE
~2
. Em algumas aplicações é interessante substituir (9.81)
por uma equação integral, equação essa em que já está incorporado
naturalmente a condição de contorno (9.2). Para tanto utilizaremos a
função de Green G(~x,~x0 ) desse problema, cuja função é solução de
³ ´
~ 2 + k 2 G(~x,~x0 ) = δ(~x − ~x0 )
∇ (9.82)
~x

cujo comportamento assintótico quando temos |~x| À |~x0 | é


ei k|~x|
G(~x,~x0 ) → (9.83)
|~x|
Note que G(~x,~x0 ) nada mais é do que a onda emergente gerada por uma
fonte pontual localizada em ~x0 . Assim, conhecendo a função de Green
G(~x,~x0 ) é fácil verificar que
Z

ψ(~x) = ψ0 (~x) + 2 d3~x0 G(~x,~x0 ) V (~x0 ) ψ(~x0 ) (9.84)
~
é solução ³da equação ´ (9.81), caso ψ0 seja uma solução da equação ho-
~ 2 2
mogênea ∇ + k ψ0 = 0. A expressão (9.84) é uma solução formal
do problema de espalhamento uma vez que ψ aparece nos dois lados
dessa equação, i.e., a expressão (9.84) é uma equação integral para
ψ! A relação (9.84) é a equação integral associada a (9.81), a qual pode
acomodar a condição de contorno (9.2) caso façamos uma escolha con-
veniente para ψ0 .
Vamos calcular agora a função de Green G(~x,~x0 ). Para tanto de-
vemos notar que devido a simetria de translação de (9.82), teremos
G(~x,~x0 ) = G(~x−~x0 ). Mais ainda, a simetria de rotação do problema per-
mite escrever que G(~x,~x0 ) = G(|~x − ~x0 |). Assim, escreveremos G(~x,~x0 )
na forma de uma transformada de Fourier
Z
G̃(~p)ei~p  R
~ d3~p ~
G(R) = 3
(9.85)
(2π)

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9.8. Espalhamento - Função de Green 329

onde definimos R ~ = ~x − ~x0 para podermos simplificar a notação. Para


obter G̃(~p) substituiremos a última expressão em (9.82) e utilizaremos
que Z
d3~p i~p  R
~
δ(~x − ~x0 ) = e (9.86)
(2π)3
o que conduz a
1
G̃(~p) = − (9.87)
~p2 − k2
Portanto, substituindo a relação (9.87) na relação (9.85), encontraremos
Z
ei~p  R .
~ =− d3~p 1 ~
G(R) (9.88)
3
(2π) ~p − k 2
2

Usando as coordenadas esféricas no espaço de momentum com o


~ escreveremos
eixo z escolhido na direção de R
Z ∞ Z Z 1
~ dp 2 2π 1
G(R) = − 3
p dϕ d(cos θ) 2 ei pR cos θ (9.89)
0 (2π) 0 −1 p − k2
As integrações angulares são fáceis e conduzem a
Z ∞
~ 1 p ei pR − e− i pR
G(R) = − 2 dp 2 (9.90)
2π R 0 p − k2 2i
Uma vez que o integrando em p é par podemos integrar de −∞ até
+∞ desde que o resultado por seja dividido 2.
Z ∞
¡ i pR ¢
~ = i
G(R) dp 2
p
e − e− i pR (9.91)
2
8π R −∞ p −k 2

A integral da equação acima apresenta pólos ao longo do eixo real de p


em p = ±k. Para evitar estas singularidades vamos deformar o contorno
de integração para o percurso C1 da Fig. 9.4.
Utilizando o teorema dos resíduos para avaliar esta integral, fi-
nalmente obteremos
i kR
G(R) ~ =− 1 e
~ = G+ (R) (9.92)
4π R
Poderíamos escolher também o caminho C2 da Fig. 9.4, o que nos con-
duz a seguinte solução
− i kR
G(R) ~ =− 1 e
~ = G− (R) (9.93)
4π R

Mecânica Quântica

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330 Cap. 9 Espalhamento

Figura 9.4: Contornos de integração no plano complexo.

A solução de G+ representa uma onda esférica afastando-se da origem,


que deve ser reconhecida como a onda espalhada pelo alvo, e G− repre-
senta uma onda esférica convergindo para origem, i.e., ondas esféricas
emergente e incidente devido a fonte pontual, tipo δ, que aparece no
lado direito da equação de ondas (9.82).
Visando que a solução ψ de (9.84) satisfaça a condição de contorno
de espalhamento (9.2) escolheremos G+ e ψ0 = ei kz , o que nos leva a

Z 0
i kz µ 3 0 ei k|~x−~x |
ψ(~x) = e − d ~x V (~x0 ) ψ(~x0 ) (9.94)
2π~2 |~x − ~x0 |

A escolha acima de ψ0 foi motivada pelo fato de que para V = 0, a


solução da equação acima deve descrever uma partícula livre.
Contudo, devemos observar que o problema não está resolvido, pois
o integrando da equação (9.94) contém a própria função que queremos
determinar. Outro aspecto que merece a nossa atenção é o fato de que o
potencial oferece contribuição apreciável somente para os pontos muito
proximo da origem, i.e., para |~x0 | ¿ |~x|, onde V (~x0 ) torna-se significa-
tivo. Sendo assim, num comportamento assintótico, podemos fazer uma
expansão de |~x − ~x0 | e considerar apenas os dois primeiros termos da
expansão, tal que,

p ~x  ~x0
|~x − ~x0 | = ~x2 + ~x0 2 − 2~x  ~x0 ' |~x| − (9.95)
|~x|

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9.9. Aproximação de Born 331

o que permite concluir que no limite ~x → ∞


· Z ¸ i k|~x|
ψ(~x) → e i kz

µ 3 0
d ~x e 
− i ~k ~x0 0 0
V (~x ) ψ(~x )
e
(9.96)
2π~2 |~x|

onde definimos ~k = |~
k~x
x| . Portanto, as escolhas para a função G e ψ0 foram
acertadas, já que ψ satisfaz (9.2). Além disso, dessa última expressão
também inferimos que
Z
d3~x0 e− i k  ~x V (~x0 ) ψ(~x0 )
µ ~ 0
f (θ, ϕ) = − 2
(9.97)
2π~

A última expressão, apesar de elegante, na prática é inútil, uma vez


que para a utilizarmos devemos conhecer ψ em todo o espaço. Todavia,
esse expressão é utilizada para cálculos aproximados, como veremos na
próxima seção.

9.9 Aproximação de Born


Intuitivamente esperamos que a função de onda de uma partícula de
alta energia praticamente não difira muito da função de onda de uma
partícula livre. Levando em consideração esse fato, poderemos desprezar
o último termo em (9.94), obtendo ψ ' ψ0 . Essa aproximação é con-
hecida como aproximação de Born 25 , a qual é o primeiro termo da
solução de (9.94) interativamente. Nesse caso, a equação (9.97) fornece
que Z
d3~x0 e− i~q  ~x V (~x0 )
∼ µ 0
fB (θ, ϕ) = − 2
(9.98)
2π~
onde ~q = ~k − kêz é proporcional ao momento transferido à partícula
incidente. Portanto, nessa aproximação, a amplitude de espalhamento
é proporcional à transformada de Fourier do potencial espalhador.
Para essa aproximação ser válida o último termo da relação (9.94)
deverá ser desprezível, i.e.
¯ Z ¯
¯ ¯ ¯ µ e i k|~x−~x0 | ¯
¯ ¯ ¯ 0 ¯
¯ψ(~x) − ei kz ¯ = ¯− d3 0
~
x V (~
x 0
) ψ(~
x )¯ ¿ |ψ0 | = 1
¯ 2π~2 |~x − ~x0 | ¯
(9.99)
25
M. Born, Zeits. für Physik, 38, 803 (1926).

Mecânica Quântica

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332 Cap. 9 Espalhamento

Porém levando em consideração que a maior distorção de ψ0 ocorre em


~x = 0, deveremos então ter que
¯ ¯
¯ µ Z e i k|~x0 | ¯
¯ 3 0 0 0 ¯
¯ d ~
x V (~
x ) ψ(~
x )¯¿1 (9.100)
¯ 2π~2 |~x0 | ¯

No caso em que o potencial V dependa apenas de r, essa condição será


então ¯Z ¯
2µ ¯¯ 0 i kr0 0
¯
0 ¯
2 ¯ dr e sen (kr )V (r )¯ ¿ 1 (9.101)
~ k
Poderemos mostrar, a partir dessa última condição, que essa aprox-
imação será útil, i.e., boa aproximação em duas situações:
1. Para potenciais fracos, i.e., V0 a pequeno. Nesse caso, a condição
que deve ser satisfeita independe da energia da partícula incidente
e é dada por
~2
V0 a2 ¿ (9.102)
µ
2. Para partículas bastante energéticas, i.e., quando o valor de k for
grande. Isso será verdade se
µaV0
¿ 1. (9.103)
~2 k
Fisicamente essas condições significam apenas que a partícula encontra-
se aproximadamente livre. Isso não deveria ser uma surpresa, já que esse
foi o nosso ponto de partida para dedução da aproximação de Born.
Potencial coulombiano blindado: O potencial coulombiano
blindado pode ser representado por
Z1 Z2 e2 −ξr
V (r) = − e (9.104)
r
em que 1ξ = a representa, aproximadamente, uma medida do raio do
átomo. Com o uso desse potencial na aproximação de Born, a amplitude
de espalhamento fB (θ) passa ser
Z
2µZ1 Z2 e2 ∞
fB (θ) = dr sen (qr)e−ξr
~2 q 0
µ ¶
2µZ1 Z2 e2 1
= (9.105)
~2 q q2 + ξ2

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9.9. Aproximação de Born 333

Como para o cálculo com esse potencial escolhemos o eixo z 0 na direção


de ~q. Utilizaremos
µ ¶
θ
~q2 = 2k 2 (1 − cos θ) = 4k 2 sen2
2
e teremos que
dσ 4µZ12 Z22 e4
= ¡ ¡ ¢ ¢2 (9.106)
dΩ ~4 4k 2 sen2 2θ + ξ 2
Conseqüentemente, a seção de choque total
Z

σ= dΩ
dΩ
existe para todos os valores do ângulo de espalhamento. No entanto,
fazendo-se ξ → 0, o potencial de Yukawa 26 passa a ser um poten-
cial coulombiano puro e fB (θ) diverge quando θ → 0. Esse comporta-
mento se deve ao fato de o potencial coulombiano ser de longo alcance.
Formalmente podemos obter a seção de choque para o espalhamento
coulombiano tomando o limite ξ → 0, o que permite obter

dσ µZ12 Z22 e4
= ¡ ¢ (9.107)
dΩ 4p4 sen4 2θ

essa resposta coincide com a resposta quântica e a clássica do espal-


hamento de Rutherford, apesar da aproximação de Born não poder
ser aplicada ao espalhamento coulombiano, visto que a condição de val-
idade (9.101) não é satisfeita. Isso é evidente quando olhamos para a
integral na equação (9.105) visto que essa não está bem definida para
ξ = 0!
Espalhamento de elétrons por um átomo: Consideremos o es-
palhamento de um elétron por um átomo, o qual será representado por
sua densidade de carga elétrica −eρ(~r) 27 . Podemos associar uma densi-
dade de carga −eρ a um sistema de N elétrons no estado ψ(~r1 , · · · ,~rN )
através de
N Z
X
ρ(~r) = d3~r1 · · · d3~rN δ(~r −~ri )|ψ|2 (9.108)
i=1
26
Hideki Yukawa (1907–1981), físico japonês.
27
Estamos aqui simplificando o problema, já que não consideramos o problema de
muitos corpos envolvendo o elétron incidente e os atômicos.

Mecânica Quântica

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334 Cap. 9 Espalhamento

Portanto, o potencial de interação nesse problema será dado por


· Z 0
¸
0 2 Z 3 0 ρ(~r )
V (~r) = Z e − d ~r (9.109)
r |~r −~r0 |
onde Z é a carga do núcleo e usaremos Z 0 = −1 para o espalhamento
de elétrons.
Nesse ponto está claro que não poderemos resolver exatamente esse
problema, logo utilizaremos a aproximação de Born. A partir de da
relação (9.103) poderemos concluir que essa aproximação será válida se
v ZZ 0
À (9.110)
c 137
onde v é a velocidade do elétron e c é a velocidade da luz no vácuo.
Note que v não pode ser arbitrária já que estamos trabalhando com
uma mecânica quântica não relativística, e portanto deve ser menor
que c, obviamente.
Na aproximação de Born temos que
Z
d3~r e− i~q ~r V (~r)
µ
fB = −
2π~2
Z ³ ´
µ 3 ~2 − i~q ~r
= d ~r ∇ e V (~r)
2π~2~q2
Z
d3~r e− i~q ~r ∇
µ ~ 2 V (~r)
= (9.111)
2π~2~q2
onde integramos por partes e usamos
µ ¶
2 2 θ 2
~q = 4k sen .
2
Agora utilizando a equação de Poisson
~ 2 V (~r) = −4πZ 0 e2 (Zδ(~r) − ρ(~r))
∇ (9.112)

obteremos que
2µZ 0 e2
fB = − (Z − F (~q)) (9.113)
~2~q2
onde o fator de forma atômico F (~q) nada mais é do que a transfor-
mada de Fourier de ρ,
Z
F (~q) = d3~r e− i~q ~r ρ(~r) (9.114)

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9.10. Aproximação Eikonal 335

Portanto, a seção de choque diferencial desse processo será dada por


dσ 4Z 0
= 2 4 |Z − F (~q)|2 (9.115)
dΩ a0~q
onde a0 é o raio de Bohr.

9.10 Aproximação Eikonal


Para essa aproximação, o potencial V (~x) varia muito pouco para uma
distância na ordem do comprimento de onda de de Broglie, λ. Note
que o potencial V não precisa ser necessariamente fraco, tal como E À
|V |. O domínio de validade empregada nesse caso é diferente daquela
empregada na aproximação de Born. Nessas condições, o conceito de
caminho semiclássico torna-se aplicável, e no lugar de ψ + poderemos
usar
i
ψ + ' e ~ S(x) (9.116)
tal que S satisfaça a equação de Hamilton-Jacobi
~ 2
(∇S) ~2 k 2
+V =E = (9.117)
2µ 2µ
como discutido anteriormente, ver parágrafo §1.16. Para calcular S di-
reto de (9.117), vamos considerar a aproximação em que a trajetória
clássica é um caminho praticamente reto, na qual é satisfatório para
pequenas deflexões à altas energias. Considerando essa situação, como
mostra Fig. 9.5, a trajetória será ao longo da direção z, tendo b = |~b|
como parâmetro de impacto e |~x| = r. Assim, teremos
~ 2
(∇S) ~2 k 2
= − V (x)
2µ 2µ
~ 2
(∇S) 2 2µ p 2
= k − V ( b + z02)
~2 ~2
logo,
Z · ¸1
S z
2µ p 2 2
= k − 2 V ( b + z ) dz 0 + constante
2 0 2
(9.118)
~ −∞ ~
A constante será escolhida tal que
S
→ kz quando V →0 (9.119)
~

Mecânica Quântica

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336 Cap. 9 Espalhamento

Figura 9.5: Esquema para aproximação eikonal.

então, a forma de uma onda plana para (9.116) será reproduzida nesse
limite de potencila nulo. A equação (9.118) poderá ser escrita como
Z "r #
S z
2µ p
= kz + k 2 − 2 V ( b2 + z 0 2 ) − k dz 0
~ −∞ ~
Z z p
µ
= kz − 2 V ( b2 + z 0 2 ) dz 0 (9.120)
~ k −∞

onde para E À V , usamos


r
2µ p 2 µV
k2 − V ( b + z02) ≈ k − 2
~2 ~ k
~2 k 2
em altos valores E = 2µ . Então,

ψ + (~x) = ψ + (~b + z ẑ)


· Z z p ¸
1 i kz iµ 2 0 2 0
= 3 e exp − 2 V ( b + z ) dz (9.121)
(2π) 2 ~ k −∞

A equação (9.121) não nos fornece a forma assintótica correta para uma
onda incidente mais a onda esférica espalhada,

ei k  ~x + f (θ)
~ ei kr
r

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9.10. Aproximação Eikonal 337

Portanto não poderemos usar a relação (9.97)


Z
d3~x0 e− i k  ~x V (~x0 ) ψ(~x0 )
µ ~ 0
f (θ, ϕ) = − 2
2π~

para calcular f (θ, ϕ), mas se usarmos ψ + (~x) da equação (9.121) no lugar
ψ(~x0 ) da relação acima, teremos o que chamamos de aproximação
eikonal para a amplitude de espalhamento
Z p
3 0 − i ~k0  ~x0
b2 + z 0 2 ) ei k  ~x
µ ~ 0
f (θ, ϕ) = − d x e V (
2π~2
" Z z0 #
iµ p
2 00
× exp − 2 V ( b2 + z 00 ) dz (9.122)
~ k −∞

Note que sem o fator exp [· · · ], a equação (9.122) é justamente a ampli-


tude que temos na aproximação de Born,
Z
d3~x0 e− i~q  ~x V (~x0 )
µ 0
fB (θ, ϕ) ∼
= −
2π~2

onde ~q = ~k − ~k0 . Para resolver (9.122), faremos o uso das coordenadas


cilíndricas d3 x0 = b db dϕ dz 0 . É possível notar que

(~k − ~k0 )  ~x0 = (~k − ~k0 )  (~b + z 0 ẑ) ' −~k0  ~b (9.123)

pois ~k ⊥ ~b e (~k − ~k0 )  ẑ ∼ O(θ2 ) poderá ser ignorado devido a pequena


deflexão de θ. Assim, sem perda de generalização, podemos escolher o
plano-xz para o ser o plano do espalhamento e escreveremos
~k0  ~b = (k sen θx̂ + k cos θẑ)  (b cos ϕx̂ + b sen ϕẑ) ' kbθ cos ϕ (9.124)

Usando (9.124) em (9.122) encontraremos


Z ∞ Z 2π
µ
f (θ, ϕ) = − bdb dϕ e− i kbθ cos ϕ
2π~2 0 0
Z ∞ · Z z ¸
iµ 0
× dz V exp − 2 V dz (9.125)
−∞ ~ k −∞

Mas, verificando as identidades:


Z 2π
dϕ e− i kbθ cos ϕ = 2πJ0 (kbθ)
0

Mecânica Quântica

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338 Cap. 9 Espalhamento

onde J0 é um função de Bessel, e


Z ∞ · Z z ¸ ¯ 2 h iµ R z i ¯z=+∞
iµ ¯i ~ k − 2 V dz 0 ¯
dz V exp − 2 V dz = ¯¯
0
e ~ k −∞ ¯
¯
−∞ ~ k −∞ µ z=−∞

que quando z → −∞ o lado direito da relação acima anula no expoente.


Então, finalmente teremos
Z ∞ h i
f (θ, ϕ) = − i k db bJ0 (kbθ) e2 i ∆(b) − 1 (9.126)
0

onde Z ∞ p
µ
∆(b) ≡ − V ( b2 + z 2 ) dz (9.127)
2k~2 −∞
Na relação (9.127), fixamos o parâmetro de impacto b e integramos
ao longo de z, como mostra Fig. 9.5.¤ Na relação (9.126), não haverá
£ 2ai ∆(b)
nenhuma contribuição de e − 1 se b for maior do que o campo
de ação do potencial V . Finalmente, mais uma vez devemos lembrar
que a aproximação eikonal é válida somente para pequenos valores do
ângulo θ de espalhamento.

9.11 Espalhamento de Partículas Idênticas


Uma ilustração da fase da amplitude de espalhamento, ocorre quando
consideramos o espalhamento de duas partículas idênticas, carregadas
e sem spin. A função de onda deverá ser simétrica, então a forma ass-
intótica da função de onda tem a forma

ei k  ~x + e− i k  ~x + [f (θ) + f (π − θ)]
~ ~ ei kr
(9.128)
r
onde ~x = ~x1 − ~x2 é o vetor posição relativo das partículas 1 e 2. O
resultado da seção de choque diferencial será,

= |f (θ) + f (π − θ)|2
dΩ
= |f (θ)|2 + |f (π − θ)|2 + 2<[f (θ)f ∗ (π − θ)] (9.129)
A seção de choque terá um valor máximo quando existir uma interfer-
ência construtiva em θ = π2 ,
µ ¶ ¯ ³ π ´¯2
dσ ¯ ¯
= 4 ¯f ¯ (9.130)
dΩ π 2
2

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9.12. Comentários 339

comparado com o resultado obtido sem interferência


µ ¶ ¯ ³ π ´¯2
dσ ¯ ¯
= 2 ¯f ¯ (9.131)
dΩ π 2
2

Para o espalhamento de partículas idênticas de spin- 21 com feixes


não polarizados, teremos a contribuição quando as duas partículas for-
mam um estado singleto do spin, i.e., a função de onda espacial é
simétrica, µ ¶

= |f (θ) + f (π − θ)|2 (9.132)
dΩ s
e a contribuição quando as duas partículas formam um estado tripleto
do spin, i.e., a função de onda espacial é anti-simétrica,
µ ¶

= |f (θ) − f (π − θ)|2 (9.133)
dΩ a−s
Para a definição de estado singleto e tripleto do spin, ver o próximo
capítulo. Estatisticamente, temos 14 de contribuição para o estado sin-
gleto e 34 de contribuição para o estado tripleto. Logo,
µ ¶ µ ¶
dσ 1 dσ 3 dσ
= +
dΩ 4 dΩ s 4 dΩ a−s
1 3
= |f (θ) + f (π − θ)|2 + |f (θ) − f (π − θ)|2
4 4
= |f (θ)| + |f (π − θ)| − <[f (θ)f ∗ (π − θ)]
2 2
(9.134)

Em outras palavras, esperamos uma interferência destrutiva em θ = π2 .


De fato, isso tem sido observado experimentalmente em espalhamento
de próton-próton ou espalhamento α − α, onde f (θ) é a soma de um
termo nuclear e um termo coulombiano. Quando as partículas são bó-
sons e férmions, há uma simetria sob a mudança de θ → π − θ.
Partículas bósons e férmions, serão estudadas mais tarde.

9.12 Comentários
Para esse capítulo, recomendo uma leitura em paralelo dos livros do
Prof. Merzbacher (1998) 28 e do Prof. Wolney Filho (2002) 29 .
28
E. Merzbacher, Quantum mechanics, (1998).
29
W. Wolney Filho, Mecânica quântica, (2002).

Mecânica Quântica

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340 Cap. 9 Espalhamento

Um estudo aprofundado da teoria do espalhamento poderá ser re-


alizado com os livros dos Profs. Cohen-Tannoudji et.al. (1977) 30 , Jun
John Sakurai (1994) 31 e A. Messiah (1970) 32 .
No livro do prof. Gottfried (1966) 33 , encontraremos um trabalho
detalhado da aproximação eikonal e sua relação com a aproximação de
Born e o teorema óptico.

30
C. Cohen-Tannoudji, B. Diu and F. Laloë, Quantum mechanics, (1977).
31
J. J. Sakurai, Modern quantum mechanics, (1994).
32
A. Messiah, Quantum mechanics, (1970).
33
K. Gottfried, Quantum mechanics, (1966).

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Capítulo 10

Rotações o Operadores
Tensoriais

Nesse capítulo faremos um estudo sistemático das rotações, as relações


entre rotações e momentum angular, rotações infinitesimais na mecânica
quântica e grupos de rotações, SO(3), SU (2) e rotações de Euler 1 .
Ainda faremos um estudo da adição do momentum angular e operadores
tensoriais.

10.1 Rotações e Momentum Angular


Em analogia com a translação espacial, onde o momentum linear ~p
é o gerador da translação, no §8.1 vimos que o operador momentum
angular ~L é o gerador da rotação infinitesimal. Rotações são descritas
por operadores ortogonais, i.e., R ∈ O, onde O é um grupo de
operadores reais, que podem ser representados por matrizes.
Vamos considerar uma rotação ao redor do eixo-z em R3 por um
ângulo ϕ. Note que o eixo-z está fixo e o plano-xy gira no sentido anti-
horário. Assim é fácil verificar que
 
cos ϕ − sen ϕ 0
Rz (ϕ) = sen ϕ cos ϕ 0 (10.1)
0 0 1

Aqui temos rotação ativa, i.e., os eixos da coordenada estão fixos


e o sistema físico girando. Se tivemos uma situação trocada teríamos
1
Leonhard Paul Euler (1707–1783), matemático e físico suíço.

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342 Cap. 10 Rotações o Operadores Tensoriais

uma rotação passiva, i.e., o sistema físico estaria fixo e os eixos da


coordenada girando 2 .
Estamos particularmente interessados em uma rotação infinitesimal
de Rz . Logo, vamos considerar uma rotação infinitesimal em δϕ onde
os termos de ordem superior δϕ3 são desprezíveis:
 2

1 − δϕ2 −δϕ 0
 2 
Rz (δϕ) =  δϕ 1 − δϕ2 0 (10.2)
0 0 1
Por permutação cíclica de x, y, z, i.e., x → y, y → z, z → x, temos a
rotação infinitesimal de Rx
 
1 0 0
 2 
Rx (δϕ) = 0 1 − δϕ2 −δϕ  (10.3)
δϕ2
0 δϕ 1− 2
e a rotação infinitesimal de Rz
 2

1 − δϕ2 0 δϕ
 
Ry (δϕ) =  0 1 0  (10.4)
2
−δϕ 0 1 − δϕ2

É fácil verificar que sucessivas rotações infinitesimais comutam em ter-


mos de primeira ordem δϕ, porém não comutam em termos de segunda
ordem δϕ2 . Assim, teremos:
 
0 δϕ2 0
Rx (δϕ)Ry (δϕ) − Ry (δϕ)Rx (δϕ) = δϕ 0 0
0 0 0
Rz (δϕ) − 1 (10.5)
onde termos de ordem superior que δϕ2 podem ser ignorados. Ainda
temos que
1 = Rn̂ (0)
onde Rn̂ significa uma rotação para qualquer eixo-x, y, z tomado. As-
sim, o resultado final poderá ser expresso como
Rx (δϕ)Ry (δϕ) − Ry (δϕ)Rx (δϕ) = Rz (δϕ) − Rn̂ (0) (10.6)
2
Típica matriz de rotação usada em um sistema clássico de corpo rígido, ver Gold-
stein, Classical mechanics, (1980).

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10.1. Rotações e Momentum Angular 343

Esse é um exemplo da relação de comutação entre dois operadores de


rotação ao redor de diferentes eixos, na qual será importante para a
dedução das relações de comutação do momentum angular na mecânica
quântica.
Rotações na Mecânica Quântica: Dada uma operação de rotação
R, caracterizada por uma matriz ortogonal 3 × 3, podemos associar um
operador D(R) em um ket apropriado tal que

|ψiR = D(R)|ψi

onde |ψi e |ψiR são os kets original e o que sofreu a rotação, respectiva-
mente 3 . Note que a matriz ortogonal 3×3, R atua em uma matriz coluna
de três componentes de um vetor clássico, enquanto o operador D(R)
atua no estado vetor ket. A matriz D(R) depende da dimensão N de
um ket particular. Para N = 2, apropriado para descrever um sistema
de partículas com spin 21 sem nenhum outro grau de liberdade, D(R)
será representado por uma matriz 2 × 2; para um sistema de partículas
de spin 1, a representação apropriada será uma matriz 3 × 3.
Para construir o operador de rotação D(R), iremos examinar suas
propriedades sob uma rotação infinitesimal. Primeiramente, vamos recor-
rer à analogia com a translação espacial e a evolução temporal. Os op-
eradores infinitesimais apropriados podem ser escritos por

Uε = 1 − i Gε

com G sendo um operador hermitiano. Para translação espacial in-


finitesimal temos
px
G→ , ε → dx0
~
onde o gerador da translação é o momentum px , e para uma evolução
temporal infinitesimal temos

H
G→ , ε → dt
~
onde o gerador da evolução temporal e a hamiltoniana H cujo autovalor
é a energia do sistema E.
Em mecânica clássica, o momentum angular é o gerador da rotação.
Assim, em mecânica quântica definimos o operador momentum angular
3
O símbolo D vem do alemão Drehung, o que significa rotação

Mecânica Quântica

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344 Cap. 10 Rotações o Operadores Tensoriais

Jk de tal forma que opera uma rotação infinitesimal ao redor do k-ésimo


através de um ângulo dϕ. Logo, temos
Jk
G→ , ε → dϕ
~
Sendo Jk um operador hermitiano, garantimos que o operador da ro-
tação infinitesimal é unitário e reduz-se ao operador identidade quando
temos o limite dϕ → 0. Geralmente escrevemos esse operador na forma:
à !
~J  n̂
D(n̂, dϕ) = 1 − i dϕ (10.7)
~

para uma rotação ao redor da direção caracterizado pelo versor n̂ por


um ângulo infinitesimal dϕ.
Uma rotação finita poderá ser obtida através de sucessivas rotações
infinitesimais ao redor de um mesmo eixo. vamo tomar como exemplo
uma rotação finita ao redor do eixo-z feita por um ângulo ϕ, se con-
siderarmos componentes infinitesimais ϕn do ângulo ϕ, com n → ∞,
temos
· µ ¶¸
Jz ϕ n
Dz (ϕ) = lim 1 − i
n→∞ n~
i
= e− ~ J z ϕ
i Jz ϕ Jz2 ϕ2
=1− − + ··· (10.8)
~ 2~2
Para obter as relações de comutação do momentum angular pre-
cisamos de mais um conceito, o grupo de rotação, tal postulamos
D(R) com as mesmas propriedades do grupo que define R:
1. Identidade:
R  1 = R ⇒ D(R)  1 = D(R)

2. Fechamento:

R1 R2 = R3 ⇒ D(R1 )D(R2 ) = D(R3 )

3. Inversa:

RR−1 = 1 ⇒ D(R)D−1 (R) = 1


R−1 R = 1 ⇒ D−1 (R)D(R) = 1

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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“mq_notas-N” — 2009/5/5 — 21:48 — page 345 — #345


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10.1. Rotações e Momentum Angular 345

4. Associatividade:

R1 (R2 R3 ) = (R1 R2 )R3 = R1 R2 R3


⇒ D(R1 )[D(R2 )D(R3 )]
= [D(R1 )D(R2 )]D(R3 )
= D(R1 )D(R2 )D(R3 ) .

Agora, vamos retornar as relações fundamentais de comutação para


a operação de rotação (10.6) escritas em termos das matrizes R’s, mas
aqui iremos usar os operadores de rotação análogos, como o da relação
(10.8). Logo,
µ ¶Ã !
i Jx δϕ Jx2 δϕ2 i Jy δϕ Jy2 δϕ2
1− − 1− −
~ 2~2 ~ 2~2
à !µ ¶
i Jy δϕ Jy2 δϕ2 i Jx δϕ Jx2 δϕ2 i Jz δϕ2
− 1− − 1 − − = 1 − −1
~ 2~2 ~ 2~2 ~

Essa expressão no dá as relações fundamentais de comutação para o


operador momentum angular igualando os termos de mesma ordem em
δϕ2

δϕ2 Jz δϕ2
[Jx , Jy ] 2
=i + O(δϕ3 )
~ ~
(10.9)
[Jx , Jy ] = i ~Jz

onde os termos O(δϕ3 ) são desprezíveis, e generalizando temos

[Ji , Jj ] = i εijk Jk (10.10)

Nota que o grupo de translação espacial em três dimensões é abeliano,


pois seus geradores pi e pj comutam com i 6= j. Já os geradores do
grupo de rotação não comutam, ver (10.10), então esse grupo se diz
não-abeliano.
Nota sobre o Momentum Angular ~J: No caso de um sistema de
partículas sem spin, o momentum angular orbital total ~L é na realidade
o momentum angular total do sistema, i.e., ~J = ~L. Como esse é o
operador que aparece como gerador de um grupo de rotações no espaço

Mecânica Quântica

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346 Cap. 10 Rotações o Operadores Tensoriais

de Hilbert correspondente, e natural que se defina, o operador associado


ao momentum angular total ~J de um sistema em geral, como gerador
da representação do grupo de rotações espaciais no espaço de Hilbert
dos estados desse sistema. Mais formalmente

|ψiR = e ~ J  n̂δϕ |ψi


i~

Essa definição evidentemente não envolve qualquer condição de simetria


sobre os sistema. Se por outro lado, o nosso sistema contêm partícu-
las com spin, teremos nos kets que representam os vetores de estado
variáveis adicionais e o gerador ~J diferirá de ~L sempre que os graus
de liberdade adicionais contribuírem para as propriedades de transfor-
mação dos estados do sistema sob rotações espaciais. A relação acima
deverá ter um gerador na forma

~J = ~L ⊗ 1 + 1 ⊗ ~S

onde ~L = ~r × ~p e o segundo termo, ~S, age não trivialmente apenas


sobre os graus de liberdades adicionais, que corresponde ao spin total
do sistema. As relações de comutação para o spin foram discutidas no
Capítulo 5.

1
10.2 Sistema de Spin 2 e Rotações Finitas
O menor número, N , de dimensões na qual as relações de comutação do
momentum angular são realizadas, é quando temos N = 2, i.e., quando
temos um sistema de partículas de spin 21 . Os operadores de spin são
definidos por

~
Sx = (|+ih−| + |−ih+|)
2
~
Sy = i (−|+ih−| + |−ih+|) (10.11)
2
~
Sz = (|+ih+| − |−ih−|)
2

onde os operadores Sx , Sy e Sz , satisfazem a relação de comutação

[Si , Sj ] = i εijk ~Sk (10.12)

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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10.2. Sistema de Spin 1


2
e Rotações Finitas 347

em que foi substituído o operador Jk , da equação (10.10), por Sk . Esse


fato, a priori, não é óbvio na natureza, porém em inúmeros experi-
mentos - de espectroscopia atômica a ressonância magnética nuclear -
é suficiente para a explicação do fenômeno.
Vamos considerar uma rotação por um ângulo finito ϕ ao redor do
eixo-z. Então, teremos
|ψiR = Dz (ϕ)|ψi (10.13)
com
i
Dz (ϕ) = e− ~ Sz ϕ (10.14)
Realmente faz sentido essa operação, i.e., esse operador realmente faz
girar o sistema físico? Para termos essa verificação, vamos consider seu
efeito no valor esperado de Sx , hSx i,
hSx i → R hψ|Sx |ψiR = hψ|Dz† (ϕ)Sx Dz (ϕ)|ψi (10.15)
onde
i i
Dz† (ϕ)Sx Dz (ϕ) = e ~ Sz ϕ Sx e− ~ Sz ϕ
Usando a forma de Sx dada em (10.11) resolveremos a equação acima
como segue
~ i Sz ϕ i
e~ (|+ih−| + |−ih+|) e− ~ Sz ϕ
2
~ ³ iϕ i i i
´
= e 2 |+ih−|e 2 ϕ + e− 2 ϕ |−ih+|e− 2 ϕ
2
~
= [(|+ih−| + |−ih+|) cos ϕ + i (|+ih−| − |−ih+|) sen ϕ]
2
= Sx cos ϕ − Sy sen ϕ (10.16)
Usaremos agora uma forma alternativa para derivar esse resultado, para
tal usaremos a relação de comutação fundamental [Si , Sj ] = i εijk ~Sk .
Para essa alternativa partiremos do lema de Baker-Hausdorff 4 :
λ2 λ3
eλA Be−λA = B + λ[A, B] + [A, [A, B]] + [A, [A, [A, B]]] + . . .
2! 3!
(10.17)
4
Note que há uma grande diferença entre o lema de Baker-Housdorff e a fórmula
de Baker-Campbell-Hausdorff, que é dada por
1 1 1
eA eB = eA+B+ 2 [A,B]+ 12 [A,[A,B]]+ 12 [B,[B,A]]+...

A série dentro da exponencial no lado direito da equação acima é um tanto com-


plexa, mas envolve apenas comutadores múltiplos de A e B.

Mecânica Quântica

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348 Cap. 10 Rotações o Operadores Tensoriais

onde A é um operador hermitiano e λ um número real. Usando esse


lema, obteremos
i i iϕ
e ~ Sz ϕ Sx e− ~ Sz ϕ = Sx + [Sz , Sx ]
~
µ ¶ µ ¶
1 iϕ 2 1 iϕ 3
+ [Sz , [Sz , Sx ]] + [Sz , [Sz , [Sz , Sx ]]] + · · ·
2! ~ 3! ~
µ ¶ µ ¶
ϕ2 ϕ3
= Sx 1 − + · · · − Sy ϕ − + ···
2! 3!
= Sx cos ϕ − Sy sen ϕ (10.18)

Assim, o valor esperado de Sx será

hSx i → R hψ|Sx |ψiR = hSx i cos ϕ − hSy i sen ϕ (10.19)

analogamente, o valor esperado de Sy será

hSy i → R hψ|Sy |ψiR = hSy i cos ϕ + hSx i sen ϕ (10.20)

Para o valor esperado de Sz , esse não altera porque Sz comuta com


Dz (ϕ):
hSz i → R hψ|Sz |ψiR = hSz i (10.21)
Finalmente podemos afirmar que as relações (10.19), (10.20) e (10.21)
são razoáveis. Esses relações mostram que de fato o operador de rotação
(10.14) quando aplicado à um estado ket giram o valor esperado de ~S
ao redor do eixo-z através de um ângulo ϕ. Em outras palavras, o valor
esperado do operador de spin para as rotações é generalizado por
X
hSk i → Rkl hSl i
l

onde Rkl são os elementos da matriz ortogonal R que irá especificar a


rotação. Devemos lembrar que essa propriedade não está restrita à um
sistema de spin 21 . Em geral, teremos
X
hJk i → Rkl hJl i
l

onde Jk são os geradores de rotação que satisfazem as relações de co-


mutação do momentum angular.

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10.2. Sistema de Spin 1


2
e Rotações Finitas 349

Agora, vamos considerar a rotação para um ket geral, Dz (ϕ)|ψi.


Primeiramente vamos decompor |ψi na base de kets {|±i}, tal que

|ψi = |+ih+|ψi + |−ih−|ψi

aplicando Dz (ϕ), temos


i i i
Dz (ϕ)|ψi = e− ~ Sz ϕ |ψi = e− 2 ϕ |+ih+|ψi + e 2 ϕ |−ih−|ψi (10.22)

O aparecimento do ângulo ϕ2 nessa relação tem uma conseqüência ex-


tremamente interessante. Se considerarmos uma rotação por 2π nos
teremos
|ψiRz (2π) → −|ψi (10.23)
Ou seja, quando giramos o estado em 2π rad, o estado final difere do
estado original por um sinal trocado. Iremos precisar de uma rotação
de 2π rad para voltarmos ao ket original. Esse fato foi verificado em
experimentos como o interferômetro de neutron 5 .
Precessão do spin - Revisado: Iremos discutir a precessão do
spin levando em conta esse novo ponto de vista. A hamiltoniana do
problema é dada por
µ ¶
e ~ ~
H=− S  B = ωSz (10.24)
µe c

onde
|e|B
ω= (10.25)
µe c
O operador de evolução temporal com base nessa hamiltoniana será
i i
U(t, 0) = e− ~ Ht = e− ~ Sz ωt (10.26)

Note que é o mesmo operador de rotação quando temos ϕ = ωt. Assim,

hSx it = hSx it=0 cos ωt − hSy it=0 sen ωt (10.27a)


hSy it = hSy it=0 cos ωt + hSx it=0 sen ωt (10.27b)
hSz it = hSz it=0 (10.27c)
5
H. Rauch et al., Physics Letter, 54A, 425 (1975); S. A. Werner et al., Physical
Review Letter, 35, 1053 (1975).

Mecânica Quântica

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350 Cap. 10 Rotações o Operadores Tensoriais

Após t = 2π
ω , i.e. ϕ = 2π, o spin retorna para sua posição original.
Esse conjunto de equações (10.27a)-(10.27c) é muito importante
para o estudo da precessão dos muons, similar ao elétron, mas com
massa 210µe . Conhecendo o momento magnético dos muons, 2µe~µ c , pode-
mos obter sua freqüência angular de precessão. Esse conjunto de equa-
ções podem ser e são, de fato, verificadas experimentalmente 6 .
Agora veremos a evolução temporal do próprio estado ket. Assu-
mindo que em t = 0 temos
|ψi = |+ih+|ψi + |−ih−|ψi
após um determinado tempo t, teremos
ωt ωt
|ψ(t)i = e− i 2 |+ih+|ψi + e+ i 2 |−ih−|ψi
Essa expressão adquire um sinal menos quando t = 2π ω , e temos que
esperar até t = 4π ω para que o ket volte ao seu estado original, i.e.,
como mesmo sinal. Assim, temos que o período para o ket voltar a
posição original é duas vezes maior que o período da precessão do spin.

10.3 Formalismo de Pauli


Aqui trabalharemos com o formalismo de spinor de duas componentes
introduzido por W. Pauli, na qual sistemas de partículas de spin 12 são
convenientemente tratados 7 Em geral os estados de spin são represen-
tados por spinores
µ ¶ µ ¶
. 1 . 0
|+i = ≡ χ+ |−i = ≡ χ−
0 1
(10.28)
. ¡ ¢ . ¡ ¢
h+| = 1 0 ≡ χ†+ h−| = 0 1 ≡ χ†−
para as bases ket e bra. Para um estado ket arbitrário e seu correspon-
dente estado bra teremos
µ ¶
. h+|ψi
|ψi = |+ih+|ψi + |−ih−|ψi =
h−|ψi
(10.29)
. ¡ ¢
hψ| = hψ|+ih+| + hψ|−ih−| = hψ|+i hψ|−i
6
J. Sandweiss et al., Physical Review Letter, 30, 1002 (1973).
7
W. Pauli, Zeitschrift für Physik 43, n. 8, 601–623 (1927)

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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10.3. Formalismo de Pauli 351

A matriz coluna de (10.29) se refere à um spinor de duas componentes


e podemos expressá-la como
µ ¶ µ ¶
h+|ψi c
χ= ≡ +
h−|ψi c−
= c+ χ+ + c− χ− (10.30)

onde c+ e c− em geral são números complexos, e naturalmente


¡ ¢ ¡ ¢
χ† = hψ|+i hψ|−i ≡ c∗+ c∗− (10.31)

Os elementos de matriz para os operadores Sj podem ser represen-


tados por matrizes 2 × 2, σj , conhecidas como matrizes de Pauli

~ ~
h±|Sj |+i ≡ (σj )±,+ , h±|Sj |−i ≡ (σj )±,− (10.32)
2 2
Assim, o valor esperado dos operadores Sj em termos de χ e σj são
XX
hSj i = hψ|Sj |ψi = hψ|a0 iha0 |Sj |a00 iha00 |ψi
a0 a00
~ †
= χ σj χ (10.33)
2
onde a0 = +, − e a00 = +, −. Logo, usando explicitamente (10.11) e
(10.32), podemos escrever as matrizes de Pauli como
µ ¶ µ ¶ µ ¶
0 1 0 −i 1 0
σ1 = σ2 = σ3 = (10.34)
1 0 i 0 0 −1

onde os sub-índices 1, 2 e 3 referem-se à x, y e z, respectivamente.


Algumas propriedades das matrizes de Pauli são

σi2 = I (10.35)
σi σj + σj σi = 0 para i 6= j (10.36)

como temos matrizes 2 × 2, essas duas relações equivalem a relação de


anticomutação
{σi , σj } = 2δij (10.37)
Também temos a relação de comutação

[σi , σj ] = 2 i εijk σk (10.38)

Mecânica Quântica

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352 Cap. 10 Rotações o Operadores Tensoriais

que pode ser expressa pelo produto vetorial

~σ × ~σ = 2 i ~σ (10.39)

Combinando (10.37) e (10.38), podemos obter

σ1 σ2 = −σ2 σ1 = i σ3 (10.40)

Note que, ainda podemos ter as seguintes propriedades

σ1 σ2 σ3 = i I (10.41)
σi† = σi (10.42)
det(σi ) = −1 (10.43)
tr(σi ) = 0 (10.44)
tr(σi σj ) = 2δij (10.45)

Considerando~a um vetor no espaço tridimensional, podemos mostrar


que o produto escalar ~σ  ~a pode ser expresso pela matriz 2 × 2
X
~σ  ~a ≡ ai σi = a1 σ1 + a2 σ2 + a3 σ3
i
µ ¶
a3 a1 − i a2
= (10.46)
a1 + i a2 −a3

Ainda temos,
(~σ  ~a)(~σ  ~b) = ~a  ~b + i ~σ  (~a × ~b) (10.47)

Prova.
X X
(~σ  ~a)(~σ  ~b) = σj aj σk bk
j k
X X µ1 1

= {σj , σk } + [σj , σk ] aj bk
2 2
j k
XX
= (δik + i εjkl σl ) aj bk
j k

= ~a  ~b + i ~σ  (~a × ~b)

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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10.3. Formalismo de Pauli 353

Se as componentes do vetor ~a são reais, podemos usar a relação


acima com ~a = ~b para mostrar que

(~σ  ~a)2 = |~a|2

onde |~a| é o módulo do vetor ~a. Num caso particular


½
(~σ  n̂) =
n 1 se n ∈ 2Z,
~σ  n̂ se n ∈ 2Z + 1.

Finalmente, podemos considerar X um operador matricial 2 × 2 ex-


presso por
X = a0 I +~a  ~σ
em que a0 e ai são quantidades complexas e ~σ é o operador matricial
de Pauli, então teremos
tr(Xσi ) = 2a .
Rotações no Formalismo de Pauli: Agora, aplicaremos esse for-
malismo na representação matricial do operador de rotação D(n̂, ϕ)

D(n̂, ϕ) = e− ~ S  n̂ϕ
i~

= e− 2 ~σ  n̂ϕ
i

ϕ ϕ
= I cos − i ~σ  n̂ sen
 2 2 
cos ϕ2 − i nz sen ϕ2 (− i nx − ny ) sen ϕ2
=  (10.48)
ϕ ϕ ϕ
(− i nx + ny ) sen 2 cos 2 + i nz sen 2

Da mesma forma que e− ~ S  n̂ϕ atua em |ψi, a matriz e− 2 ~σ  n̂ϕ atua nas
i~ i

duas componentes do spinor χ de acordo com

χ → e− 2 ~σ  n̂ϕ χ
i
(10.49)

As matrizes σj ’s permanece inalterada através da rotação. A represen-


tação vetorial ~σ não deve ser interpretado como um vetor. Assim, a
relação X
χ† σj χ → Rjk χ† σk χ (10.50)
k

transforma-se como um vetor.

Mecânica Quântica

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354 Cap. 10 Rotações o Operadores Tensoriais

Aplicação: Como aplicação do formalismo de spinores, iremos de-


terminar o auto-spinor de ~σ  n̂ com autovalor +1. O versor n̂ é carac-
terizado por um ângulo polar β e um ângulo azimutal α. Começando
com o spinor up, χ+ , no eixo z, aplicaremos duas rotações: primeira
rotação de um ângulo β em y seguida da segunda rotação de um ângulo
α em z,

χ~σ  n̂ = D3 (α)D2 (β)χ+


µ ¶
− 2i σ3 α − 2i σ2 β 1
=e e
0
   
cos α2 − i sen α2 0 cos β2 − sen β2 1
=   
α α
0 cos 2 + i sen 2 sen β2 cos β2 0
 α 
cos β2 e− i 2
=  (10.51)
β iα
sen 2 e 2

No último exemplo parágrafo §5.8, o autoket |+iu foi determinado para


o autovalor +1, e seu resultado foi
β β
|+iu = cos |+i + sen ei α |−i
2 2
Esse estado corresponde ao mesmo estado χ~σ  n̂ calculado acima, pois
α
as duas representações diferem somente pelo fator de fase, aqui ei 2 , que
não irá mudar o nosso ket.

10.4 Os Grupos SO(3), SU (2)


Em função de sua particular importância na Física, em especial na
Física Quântica, vamos discutir aqui com algum detalhe os grupos
SO(3) e SU (2), os quais, ademais, como veremos, são intimamente
relacionados. Por razões pedagógicas, começaremos nossa seção pela
definição de algumas propriedades matemáticas e a definição de grupo
ortogonal.
Alguns Grupos Matriciais Importantes: Vamos denotar por
Mat(n, R) ou Mat(R, n) o conjunto de todas as matrizes reais n × n e
por Mat(n, C) ou Mat(C, n) o conjunto de todas as matrizes complexas
n × n. Mat(n, R) e Mat(n, C) são naturalmente dois grupos (abelianos)

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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10.4. Os Grupos SO(3), SU (2) 355

em relação à operação de adição de matrizes. Não, porém, em relação


à operação de produto, pois é bem sabido que nem toda matriz possui
uma inversa.
O conjunto de todas as matrizes de Mat(n, R) que são inversíveis
forma naturalmente um grupo não-abeliano 8 em relação ao produto
usual de matrizes. Esse grupo, denominado grupo linear real, é de-
notado por GL(n, R). Analogamente, o conjunto de todas as matrizes
de Mat(n, C) inversíveis forma um grupo não-abeliano 9 que é denom-
inado grupo linear complexo e denotado por GL(n, C). Em notação
matemática

GL(n, R) := {A ∈ Mat(n, R), det(A) 6= 0}


e
GL(n, C) := {A ∈ Mat(n, C), det(A) 6= 0} .

Devido à propriedade bem conhecida det(AB) = det(A) det(B), o


produto de duas matrizes com determinante igual a 1 nos dá novamente
uma matriz com determinante igual a 1. Assim,

SL(n, R) := {A ∈ Mat(n, R), det(A) = 1}


e
SL(n, C) := {A ∈ Mat(n, C), det(A) = 1}

são subgrupos de GL(n, R) e GL(n, C), respectivamente.


Grupo Ortogonal: Seja E um espaço vetorial. Vamos denotar por
GL(E) o conjunto de todos os operadores lineares bijetores (e portanto
inversíveis) de E em E. É bem claro que GL(E) forma um grupo, tendo
como produto o produto de operadores.
Seja ω uma forma bilinear ou sesquilinear (caso E seja complexo)
em E. Denotaremos por Ω(E, ω) o subconjunto de GL(E) formado por
todos os operadores lineares O inversíveis tais que

ω(Ox, Oy) = ω(x, y)

para todos x, y ∈ E. Assim, temos que Ω(E, ω) é um sub-grupo de


GL(E).
8
Exceto no caso n = 1, onde o grupo é abeliano, trivialmente.
9
Idem.

Mecânica Quântica

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356 Cap. 10 Rotações o Operadores Tensoriais

Um caso de particular interesse é aquele onde E = Rn , ou seja, nesse


caso o grupo Ω(Rn , ω) é conhecido como grupo O(n) e tem-se

O(n) := {M ∈ Mat(R, n), M −1 = M T }

O(n) é o grupo das matrizes M ditas ortogonais n × n. Essas matrizes


obedecem ao grupo geral:

1. ortogonalidade

MMT = 1
(M1 M2 )(M1 M2 )T = M1 M2 M2T M1T = 1

2. associatividade

M1 (M2 M3 ) = (M1 M2 )M3

3. identidade
M 1=1M =M

4. inversa
M M −1 = M −1 M = 1

Sendo M uma matriz ortogonal, temos M M T = 1. Daí,

1 = det(1) = det(M M T ) = det(M ) det(M T ) = (det(M ))2 .

Concluímos que se uma matriz M é ortogonal, vale det(M ) = ±1.


O grupo dito ortogonal O(n) possui um sub-grupo, denominado
SO(n), que é composto pelas matrizes ortogonais com determinante
igual a 1:

SO(n) := {M ∈ Mat(R, n), M −1 = M T e det(M ) = 1}

Os grupos SO(n) representam generalizações do grupo de rotações do


espaço tridimensional para o espaço n-dimensional.
Se temos a matriz M = R como uma matriz de rotação e det(R) = 1,
temos rotações próprias e temos o grupo ortogonal em três dimensões
O(3). Conforme definimos, o grupo SO(3) é um sub-grupo de O(3) o
formado por todas as matrizes 3 × 3 reais R tais que RT = R−1 e tais
que det(R) = 1.

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10.4. Os Grupos SO(3), SU (2) 357

Grupo Unimodular Unitário: Seja dada a definição das matrizes


de Pauli 2 para partículas de spin 12 , cujo operador para rotações finitas
está definido por ϕ
UR(ϕ) = e− 2 σ
Temos que em UR(ϕ) o expoente tem traço nulo. Assim,

tr(~σ ) = 0

e ainda teremos o determinante de UR(ϕ) unitário, i.e., det(UR(ϕ) ) = 1.


O grupo que cobre essa condição é conhecido como grupo especial
unitário ou grupo unimodular unitário. Em duas dimensões, i.e.,
usando matriz 2 × 2 é designado por SU (2). Claro que essas matrizes
formam um grupo desde que a propriedade unimodular (det = 1) seja
preservada na multiplicação das matrizes. É importante verificar que o
grupo generalizado SU (n) é um subgrupo de U (n).
A forma geral das matrizes de SU (2): Conforme já definimos,
o grupo SU (2) é o grupo das matrizes unitárias complexas 2 × 2 com
determinante igual a 1:

SU (2) = {U ∈ Mat(C, 2), U−1 = U∗ e det(U) = 1}

Vamos começar estudando a forma geral de tais matrizes, procurando


uma parametrização conveniente para as mesmas que permitirá estudar
as propriedades de SU (2) como um grupo de Lie.
Como toda matriz 2 × 2 complexa, uma matriz genérica U ∈ SU (2)
é da forma µ ¶
a b
U=
c d
onde a, b, c, d ∈ C. Vamos estudar a condição U−1 = U∗ . Podemos
calcular U−1 usando a regra de Laplace 10 ,
Cof(A)T Cof(A)ji
A−1 = ou (A−1 )ij =
det(A) det(A)

Assim, U−1 é dada pela transposta da matriz dos cofatores de U divi-


dida pelo determinante de U, que é 1, nesse caso. Ou seja,
µ ¶
−1 d −b
U =
−c a
10
Pierre-Simon Laplace (1749–1827), matemático e astrônomo francês.

Mecânica Quântica

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358 Cap. 10 Rotações o Operadores Tensoriais

Assim, U−1 = U∗ significa nesse caso


µ ¶ µ ∗ ∗¶
d −b a c
= ∗
−c a b d∗

ou seja, c = −b∗ e d = a∗ . Logo,


µ ¶
a b
U=
−b∗ a∗

A condição det(U) = 1 implica, portanto, |a|2 + |b|2 = 1, que é a


condição unimodular. Os dois números complexos a e b são conheci-
dos como parâmetro de Cayley-Klein 11 . Em fato, os parâmetros de
Cayley-Klein foram usados para caracterizar os movimentos dos giroscó-
pios na cinemática clássica de corpo rígido.
Escrevendo os números complexos a e b como soma de suas partes
real e imaginária: a = a1 + i a2 e b = b1 + i b2 , com a1 , a2 , b1 , b2 ∈ R,
poderemos escrever U como uma combinação linear de matrizes de
Pauli (e da matriz unidade):
µ ¶
a1 + i a2 b1 + i b2
U= = a1 I + i(b2 σ1 + b1 σ2 + a2 σ3 ) . (10.52)
−b1 + i b2 a1 − i a2

Da condição |a|2 + |b|2 = 1 temos que a21 + a22 + b21 + b22 = 1. Então,
½µ ¶
a1 + i a2 b1 + i b2
SU (2) :=
−b1 + i b2 a1 − i a2
ª
onde (a1 , a2 , b1 , b2 ) ∈ R4 com a21 + a22 + b21 + b22 = 1 .
(10.53)

Lembremos que para todo inteiro n ≥ 1, o conjunto de pontos

S n := {(x1 , · · · , xn+1 ) ∈ Rn+1 com x21 + · · · + x2n+1 = 1} ⊂ Rn+1

designa a superfície da esfera unitária de Rn+1 . Assim, vemos que SU (2)


é homeomorfo a S 3 , a superfície da esfera unitária do espaço quadridi-
mensional R4 . Isso ilustra o fato que SU (2) é uma variedade diferen-
ciável. Como o produto e a inversa são contínuos em SU (2), o mesmo
é um grupo de Lie.
11
Arthur Cayley (1821–1895), matemático inglês.
Felix Christian Klein (1849–1925), matemático alemão.

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10.4. Os Grupos SO(3), SU (2) 359

Para o vetor (a1 , a2 , b1 , b2 ) ∈ S 3 que aparece do lado direito de


(10.53) deveremos tentar parametriza-lo de outra forma. Claramente,
a condição a21 + a22 + b21 + b22 = 1 diz que a1 , a2 , b1 e b2 são números
reais contidos no intervalo [−1, 1]. Podemos assim definir um ângulo
θ ∈ [−π, π] de forma que a1 = cos θ. Fora isso, para cos θ 6= ±1, podemos
definir
b2 b1 a2
n1 ≡ n2 ≡ n3 ≡
sen θ sen θ sen θ
A condição a1 + a2 + b1 + b2 = 1 implica então n1 + n22 + n23 = 1. Assim,
2 2 2 2 2

o vetor n̂ ≡ (n1 , n2 , n3 ) de R3 é um vetor unitário. Com esses novos


parâmetros θ e n̂ podemos reescrever (10.52) como

U = I cos θ + i n̂  ~σ sen θ

onde
µ ¶
n̂  ~σ ≡ n1 σ1 + n2 σ2 + n3 σ3 =
n3 n1 − i n2
n1 + i n2 −n3

Assim

SU (2) := {I cos θ + i n̂  ~σ sen θ; θ ∈ [−π, π] e n̂ ∈ R3 ; |n̂| = 1} .

A importância de se expressar U ∈ SU (2) dessa forma, em termos


de θ e n̂, provem da seguinte identidade:

I cos θ + i n̂  ~σ sen θ = ei n̂  ~σθ

compare com a equação (10.48) e teremos o equivalente na representação


matricial do operador de rotação D(n̂, ϕ)
Se tomarmos n1 = (1, 0, 0), n2 = (0, 1, 0) ou n3 = (0, 0, 1), obtemos
três sub-grupos uniparamétricos distintos de SU (2):
µ ¶
i θσ1 cos θ i sen θ
U1 (θ) := e =
i sen θ cos θ
µ ¶
i θσ2 cos θ sen θ
U2 (θ) := e =
− sen θ cos θ
µ iθ ¶
e 0
U3 (θ) := ei θσ3 =
0 e− i θ

respectivamente. Isso nos permite identificar as matrizes de Pauli σ1 , σ2


e σ3 como os geradores desses subgrupos uniparamétricos. As relações de

Mecânica Quântica

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360 Cap. 10 Rotações o Operadores Tensoriais

comutação são as relações satisfeitas por essas matrizes, como elementos


de uma álgebra de Lie, que é denominada álgebra de Lie SU (2).
A Relação entre SO(3) e SU (2): O leitor que acompanhou as ex-
posições precedentes sobre os grupos SO(3) e SU (2) certamente perce-
beu a existência de uma série de semelhanças entre ambos. Por ex-
emplo SO(3) são ortogonais e o grupo de rotação gerado por ~J é or-
togonal. Vamos agora as comparações: Em primeiro lugar, note-se que
os geradores de SO(3) são matrizes 3 × 3 satisfazendo as relações al-
gébricas de comutação [Ja , Jb ] = εabc Jc , enquanto que geradores de
SU (2) são matrizes 2 × 2 satisfazendo as relações algébricas de comu-
tação [σa , σb ] = 2 i εabc σc . Se porém definirmos ja ≡ − i σ2a , obtemos
[ja , jb ] = εabc jc .
Assim, devido as característica das rotações nas álgebras de Lie
SO(3) e SU (2), podemos afirmar que esses grupos são isomorfos. Essa
inferência não é completamente correta. Vamos considerar uma rotação
de 2π e uma outra de 4π. No grupo SO(3) as matrizes representando
uma rotação 2π e uma rotação 4π são ambas matrizes identidade 3 × 3;
entretanto, no grupo SU (2) as matrizes correspondentes são −1 vezes a
matriz identidade 2 × 2 e a própria matriz identidade, respectivamente.
Então, podemos dizer que os dois grupos são localmente isomorfos.
As considerações acima sobre a relação entre os grupos SO(3) e
SU (2) são de grande importância na mecânica quântica, particular-
mente no que concerne à representação do grupo de rotações SO(3)
para partículas de spin 21 .

10.5 O Grupo SU (3)


O grupo SU (3) é de grande importância na Física das Partículas Ele-
mentares, estando associado à uma simetria aproximada, dita de sabor,
e a uma simetria exata, dita de cor. Não iremos discutir aqui essas as-
pectos, mas recomendo uma leitura em textos apropriados 12 .
O grupo SU (3) é um grupo a 32 − 1 = 8 parâmetros. A álgebra de
SU (3) coincide com o espaço das matrizes complexas 3 × 3, anti-auto-
adjuntas e de traço zero. Para o estudo do grupo SU (3) no contexto da
física das partículas elementares é conveniente introduzir-se uma base
explícita nesse espaço. Como toda matriz anti-auto-adjunta pode ser
12
Ver os livros do Prof. S. Weinberg, The quantum theory of fields. Vol. I, (1995);
Vol. II, (1996).

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10.5. O Grupo SU (3) 361

escrita como i λ, onde λ é a matriz auto-adjunta, basta-nos procurar


uma base no espaço das matrizes auto-adjuntas de traço zero.
Normalmente adota-se as chamadas matrizes de Gell-Mann 13 λi ,
i = 1, · · · , 8, que são as seguintes matrizes:
     
0 1 0 0 −i 0 1 0 0
λ1 = 1 0 0 λ2 =  i 0 0 λ3 = 0 −1 0
0 0 0 0 0 0 0 0 0

     
0 0 1 0 0 −i 0 0 0
λ4 = 0 0 0 λ5 = 0 0 0 λ6 = 0 0 1
1 0 0 i 0 0 0 1 0
   
0 0 0 1 0 0
1 
λ7 = 0 0 − i λ8 = √ 0 1 0
0 i 0 3 0 0 −2
Note que todas as matrizes λi são auto-adjuntas e de traço zero, for-
mando uma base no espaço das matrizes complexas auto-adjuntas e de
traço nulo! As mesmas são normalizadas de modo que tr(λa λb ) = 2δab .
A álgebra de Lie para o grupo SU (3) pode ser expressa para as
matrizes de Gell-Mann da seguinte forma:
8
X
[λa , λb ] = 2 i fabc λc
c=1

onde fabc , as camadas constantes de estrutura do grupo SU (3), são


totalmente anti-simétricas, ou seja
fabc = fbca = fcab = −fbac = −facb = −fcba ,
sendo
f123 = 1
1
f147 = −f156 = f246 = f257 = f345 = −f367 =
√ 2
3
f458 = f678 =
2
13
Murray Gell-Mann(1929– ), físico americano.
M. Gell-Mann, Physical Review, 125, n. 3, 1067–1084 (1962); M. Gell-
Mann, Physics Letters, 8, 214–215 (1964); ver também o livro dos Profs. M. Gell-
Mann and Y. Ne’eman, The eightfold way, (1964).

Mecânica Quântica

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362 Cap. 10 Rotações o Operadores Tensoriais

e as demais constantes independentes são nulas.


Ainda temos que todo elemento U de SU (3) pode ser escrito na
forma à 8 !
X
U = exp i αk λk
k=1

onde os αk ’s são números reais.

10.6 Rotações de Euler


Como na mecânica clássica, onde conhecemos a aplicação das rotações
de Euler para mecânica de corpo rígido, na mecânica quântica pode-
mos obter uma matriz de rotação, caracterizado como uma rotação
geral em três dimensões, usando os ângulos de Euler, como mostra a
Fig. 10.1.
Os três passos para obter as rotações de Euler são os seguintes:

1. Primeiro, faremos uma rotação no sentido anti-horário, ao redor


do eixo z por um ângulo α,

2. Segundo, faremos uma rotação também no sentido anti-horário,


ao redor do eixo y 0 (y depois da primeira rotação) por um ângulo
β, o eixo z passará para z 0 ,

3. Finalmente, faremos uma rotação ainda no sentido anti-horário,


ao redor do eixo z 0 (z depois das duas primeiras rotações) por um
ângulo γ, aqui o eixo y 0 passará para y 00 .

Assim, em termos de espaço de Hilbert, nosso operador D de rotação


será
00 0
D(R(α, β, γ)) = e− i γJz e− i βJy e− i αJz (10.54)
onde

Jy0 = e− i αJz Jy ei αJz

³ 0
´ ³ 0
´−1
Jz00 = e− i βJy e− i αJz Jz e− i βJy e− i αJz
= e− i αJz e− i βJy Jz ei βJy ei αJz

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10.6. Rotações de Euler 363

Figura 10.1: Rotações e ângulos de Euler.

Mas ainda podemos observar que a que a rotação também poderá


ser reescrita pelos geradores originais

D(R(α, β, γ)) = e− i αJz e− i βJy e− i γJz (10.55)

que é o resultado da manipulação algébrica da equação (10.54).

Prova. Seja a equação (10.54) escrita por R(α, β, γ) = Rz 0 (γ)Ry0 (β)Rz (α)
e também observamos as relações Ry0 (β) = Rz (α)Ry (β)R−1z (α) e Rz 0 (γ) =
Ry0 (β)Rz (γ)R−1
y 0 (β). Usando as relações acima, podemos reescrever (10.54).

Mecânica Quântica

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364 Cap. 10 Rotações o Operadores Tensoriais

Obteremos

Rz 0 (γ)Ry0 (β)Rz (α) = Ry0 (β)Rz (γ)R−1


y 0 (β)Ry (β)Rz (α)
0

= Ry0 (β)Rz (γ)Rz (α)


= Rz (α)Ry (β)R−1
z (α)Rz (γ)Rz (α)
= Rz (α)Ry (β)Rz (γ)

Portanto
R(α, β, γ) = Rz (α)Ry (β)Rz (γ)
e naturalmente Portanto

D(α, β, γ) = Dz (α)Dy (β)Dz (γ)

Podemos obter os elementos da matriz D na base |j, mi como


j − i αJz − i βJy − i γJz
Dm,m0 (α, β, γ) = hj, m|e e e |j, m0 i
0
= e− i αm djm,m0 (β) e− i γm (10.56)

onde
djm,m0 (β) = hj, m|e− i βJy |j, m0 i (10.57)
Explicitamente, a forma matricial de Dj (α, β, γ) será dada por
 i αj   i γj 
e 0 ··· 0 e 0 ··· 0
 0 ei α(j−1) · · · 0   0 ei γ(j−1) · · · 0 
  j  
 .. .. . . ..  d (β)  .. .. . . .. 
 . . . .   . . . . 
0 0 · · · e− i αj 0 0 · · · e− i γj
Finalmente, faremos uma aplicação desse conjunto de operações
σ
para partículas de spin 12 . Calculando dj (β) para j = 12 e jy = 2y ,
teremos

X µ ¶n
1
− i β2 σy 1 β
d (β) = e
2 = − i σy
n! 2
n=1
β β
= I cos − i σy sen
2 2
µ ¶
cos β2 sen β2
=
− sen β2 cos β2

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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“mq_notas-N” — 2009/5/5 — 21:48 — page 365 — #365


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10.7. Rotações e Momentum Angular - Parte 2 365


1
Logo, a forma matricial de D 2 (α, β, γ) será dada por
µ iα ¶µ à γ !
β β¶
1 e 2 0 cos 2 sen 2 ei 2 0
D 2 (α, β, γ) = α γ
0 e− i 2 − sen β2 cos β2 0 e− i 2
à 1 1
!
ei 2 (α+γ) cos β2 ei 2 (α−γ) sen β2
= 1 1 (10.58)
ei 2 (−α+γ) sen β2 e− i 2 (α+γ) cos β2

Essa é uma matriz unimodular unitária 2 × 2 escrita em função dos


ângulos de Euler. A matriz 2 × 2 (10.58) é chamada representação
irredutível j = 12 do operador de rotação D(α, β, γ).

10.7 Rotações e Momentum Angular - Parte 2


Os elementos de matriz para o operador momentum angular total ~J
poderá ser obtido de forma análogo ao §8.3. Assumindo que |j, mi são
normalizados, teremos

hj 0 , m0 |~J2 |j, mi = j(j + 1)~2 δj 0 j δm0 m (10.59)

hj 0 , m0 |Jz |j, mi = m~ δj 0 j δm0 m (10.60)

Para J± , teremos
p
hj 0 , m0 |Jpm |j, mi = (j ∓ m)(j ± m + 1) ~ δj 0 j δm0 m±1 (10.61)

Representação do Operador de Rotação para ~J: Obtido os


elementos das matrizes Jz e J± , podemos estudar os elementos da matriz
de rotação D(R). Seja a rotação R dada por n̂ e ϕ, podemos escrever
j 0 − J  n̂ϕ
i~
Dm 0 ,m (R) = hj, m |e ~ |j, mi (10.62)

Esses elementos são chamados de função de Wigner. Note que no bra-


ket de (10.62), temos o mesmo valor de j. Não precisamos considerar
os elementos da matriz D(R) entre estados com diferença de valor j.
Isso porque D(R)|j, mi continua sendo um autoket de ~J2 com o mesmo
autovalor j(j + 1)~2 :
~J2 D(R)|j, mi = D(R)~J2 |j, mi
= j(j + 1)~ [D(R)|j, mi] (10.63)

Mecânica Quântica

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366 Cap. 10 Rotações o Operadores Tensoriais

devido ao fato de que ~J2 comuta com Ji .


j
A matriz (2j + 1) × (2j + 1) formada por Dm 0 ,m é a representação

irredutível (2j + 1) do operador de rotação D(R). Isso significa que a


matriz que corresponde à um operador de rotação arbitrário no espaço
ket, não necessariamente caracterizado por um simples valor j, pode
ser escrito na forma de uma matriz diagonal, naturalmente com a es-
colha apropriada das bases, os elementos da diagonal formam blocos de
matrizes quadradas. Entretanto cada matriz quadrada não poderá ser
quebrada em outros blocos menores. Logo, podemos escrever D como
 
D1 (a) 0 0 ···
 0 D2 (a) 0 · · ·
 
D(a) =  0 0 D3 (a) · · ·
 
.. .. .. ..
. . . .

Note que cada bloco de matriz tem a mesma estrutura. Se n é a dimen-


são de D, cada bloco D1 , D2 , · · · são matrizes de dimensão n1 , n2 , · · · ,
com n1 +n2 +· · · = n. É óbvio então que as matrizes Di por elas próprias
constituem uma representação ni dimensional.
Na parágrafo §9.6, mostramos que os ângulos de Euler podem ser
usados para caracterizar uma matriz geral de rotação. Para um j ar-
bitrário, não necessariamente 21 , o operador de rotação D(α, β, γ) =
Dz (α)Dy (β)Dz (γ) poderá ser expresso como
j i i i
0 − Jz α − ~ Jy β − ~ Jz γ
Dm 0 ,m (α, β, γ) = hj, m |e ~ e e |j, mi
0 i
= e− i(m α+mγ) hj, m0 |e− ~ Jy β |j, mi (10.64)

e podemos definir a nova matriz dj (β) como


i
djm0 ,m (β) = hj, m0 |e− ~ Jy β |j, mi (10.65)

Finalmente veremos alguns exemplos. Para o caso em que j = 12 ,


esse caso já foi estudado anteriormente §9.7, teremos
µ β β¶
1 cos 2 − sen 2
d 2 (β) = (10.66)
sen β2 cos β2
Para o caso em que j = 1, temos uma matriz 3 × 3 para a representação
de Jy . Devido
1
Jy = (J+ − J− )
2i

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10.7. Rotações e Momentum Angular - Parte 2 367

obteremos (m = 1, 0, −1 e m0 = 1, 0, −1)
 
√ 0 −i 0
2 
Jy(j=1) = ~ i 0 − i (10.67)
2
0 i 0
i
Fazendo uma expansão em série de Taylor da expressão e− ~ Jy β . Difer-
(j=1) 2 (j=1)
ente do caso em que j = 12 , [Jy ] é independente de 1 e Jy .
Entretanto,
à !
(j=1) 3 (j=1)
Jy Jy
=
~ ~
Conseqüentemente, para j = 1, podemos fazer
µ ¶2 µ ¶
− ~i Jy β Jy Jy
e →1− (1 − cos β) − i sen β (10.68)
~ ~
e explicitamente, teremos
1 
√1 1
2 (1 + cos β) − 2 sen β 2 (1 − cos β)
 − √12 sen β 
d1 (β) =  √12 sen β cos β  (10.69)
1 1 1
2 (1 − cos β) sen β 2 (1 + cos β)

2

Harmônicos Esféricos como Matrizes de Rotação: O momen-


tum angular total ~J para uma simples partícula, sem spin, é o momen-
tum angular orbital ~L definido por
~L = ~r × ~p

já visto anteriormente.
Sabemos que a solução para os auto-estados do momentum angular
orbital está dada pelos harmônicos esféricos. Porém podemos determi-
nar as matrizes de rotação para os harmônicos esféricos. usando a idéia
dos ângulos de Euler:
1. Primeiro, iremos rodar em torno do eixo y por um ângulo θ,

2. Logo após, rodaremos em torno do eixo z por um ângulo ϕ.


De tal forma que β → θ, α → ϕ e γ = 0. Na notação dos ângulos de
Euler, teremos
D(R) = D(α = ϕ, β = θ, γ = 0)

Mecânica Quântica

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368 Cap. 10 Rotações o Operadores Tensoriais

Escrevendo |n̂i = D(R)|ẑi como


XX
|n̂i = D(R)|l, mihl, m|ẑi
l m

e multiplicando os dois lados da equação acima pelo bra hl, m|, teremos
X
l
hl, m|n̂i = Dm,m 0 (α = ϕ, β = θ, γ = 0)hl, m|ẑi (10.70)
m

onde hl, m|ẑi representa o harmônico esférico Ylm (θ, ϕ) resolvido em
θ = 0 e com qualquer ϕ indeterminado. Em θ = 0, temos Ylm → 0 para
m 6= 0. Então, em m = 0 e θ = 0, teremos

hl, m|n̂i = Ylm (θ = 0, ϕ indeterminado)δm0
r
(2l + 1)
= Pl (cos θ)|cos θ=1 δm0
r 4π
(2l + 1)
= δm0 (10.71)

aqui |ẑi é um autoket de Lz com autovalor nulo.
Retornando a (10.70), teremos
r
m∗ (2l + 1) l
Yl (θ, ϕ) = Dm0 ,0 (α = ϕ, β = θ, γ = 0)

ou
s
4π ¯
l ∗ ¯
Dm,0 (α = ϕ, β = θ, γ = 0) = Ylm (θ, ϕ)¯
(2l + 1) θ=β,ϕ=α

Note que quando temos o caso m = 0, teremos um situação de im-


portância muito particular
¯
¯
dl00 (β)¯ = Pl (cos θ)
β=0

Para um caso geral


X 0
Ylm (θ0 , ϕ0 ) = Ylm (θ, ϕ)Dm
l
0 ,m (α, β, γ)

m0

l
onde Dm 0 ,m (α, β, γ) é a nossa rotação descrita pelos ângulos de Euler.

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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10.8. Adição de Momentum Angular 369

10.8 Adição de Momentum Angular


A adição do momentum angular tem importante aplicações em
todas as áreas da física moderna, desde espectroscopia atômica até col-
isões de núcleos e partículas. Podemos adiantar que o estudo da adição
do momentum angular é uma excelente oportunidade para ilustrar o
conceito de mudança de base, já discutido anteriormente.
Momentum Angular Orbital e Spin 12 : Para uma descrição
realística de uma partícula com spin devemos levar em consideração,
os graus de liberdade do spin e do espaço. Para um sistema de spin 12 ,
o espaço de Hilbert apropriado será visualizado como sendo o espaço
do produto direto do espaço de spin bi-dimensional, |+i e |−i, com
o espaço ket de dimensão infinita dos graus de liberdades espaciais,
autokets de posição {|~ri}. A base ket será dada explicitamente por

|~r, ±i = |~ri ⊗ |±i (10.72)

onde ⊗ representa o produto tensorial. Qualquer operador no espaço


de kets aberto por {|~ri} comutam com qualquer operador no espaço de
spin descrito pot |±i. O operador de rotação ainda mantém a forma
e− ~ J  n̂ϕ , mas agora ~J, o gerador da rotação, consiste em duas partes,
i~

que são o momentum angular orbital ~L = (~r×~p)⊗IS e o spin ~S = Ir ⊗~S,


como mostra a Fig. 10.2. Assim

Figura 10.2: Representação da adição do momentum angular ~J = ~L + ~S.

~J = ~L + ~S ≡ ~L ⊗ IS + Ir ⊗ ~S (10.73)

Mecânica Quântica

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370 Cap. 10 Rotações o Operadores Tensoriais

onde ~L ⊗ IS é um operador independente de spin estendido ao espaço


produto através do operador identidade no espaço de spin; e Ir ⊗ ~S é
um operador independente dos graus de liberdade associada a posição,
estendido também ao espaço produto através do operador identidade
no espaço ket sem spin. Desde que ~L e ~S comutam,

[~L, ~S] = 0 ⇒ D(R) = Dorb (R) ⊗ Dspin (R)


= e− ~ L  n̂ϕ ⊗ e− ~ S  n̂ϕ
i~ i~
(10.74)

A função de onda para partícula com spin 12 tem duas componentes


µ ¶
ψ+ (~r)
h~r, ±|ψi = ψ± (~r) = (10.75)
ψ− (~r)

onde |ψ± (~r)|2 é a densidade de probabilidade de encontrarmos a partícula


na posição ~r com o spin up e down, respectivamente.
Há 2(2l + 1) estados produto |l, m, ±i que são auto-estados de ~L2 ,
Lz , ~S2 e Sz . Como veremos, podemos também usar a base feitas dos
auto-estados de ~L2 , Lz , ~S2 e Sz . O ket |j, mj , li denota tal auto-estado.
Assumiremos para uma partícula de spin 21 que j = l± 12 . A pergunta
que ocorre será: Isso faz sentido? Em outras palavras, qual é a dimensão
desse espaço? O número de estados será dado por
µ ¶ µ ¶
1 1
2 l+ +1+2 l− + 1 = 2(2l + 1)
2 2
que é o número correto de estados. Logo, faz sentido uma partículas de
spin 12 com j = l ± 12 .
Como ponto de partida, faremos o ansatz tal que
1 1
|l + , l + , li = |l, l, +i (10.76)
2 2
O estado do lado esquerdo da equação é um auto-estado de ~J2 , Jz , ~L2 ,
e ~S2 , o estado do lado direita da mesma equação é um auto-estado de
~L2 , Lz , Sz , e ~S2 . É simples provar que esse ansatz faz sentido.

Prova. Lembrando que


p
L± |l, mi = (l ± m + 1)(l ∓ m)~ |l, m ± 1i
~J2 = ~L2 + ~S2 + 2~L  ~S = ~L2 + ~S2 + 2Lz Sz + L+ S− + L− S+

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10.8. Adição de Momentum Angular 371

Aplicando as relações acima no estado em questão, teremos

1
Jz |l, l, +i = (Lz + Sz )|l, l, +i = ~(l + )|l, l, +i
2
3
~J2 |l, l, +i = ~2 (l(l + 1) + + 2l  )|l, l, +i = ~2 (l + 1 )(l + 3 )|l, l, +i
1
4 2 2 2

Um estado geral qualquer |l + 21 , mj , li poderá ser criado através


de sucessivas aplicações de J− = L− + S− . Primeiro iremos aplicar o
operador de abaixamento J− no estado |l + 12 , l + 12 , li = |l, l, +i
r
1 1 1 1 1
J− |l + , l + , li = 2(l + )~ |l + , l − , li
2 2 2 2 2

= J− |l, l, +i = 2l~ |l, l − 1, +i + ~ |l, l, −i (10.77)

normalizando, teremos
r r
1 1 2l 1
|l + , l − , li = |l, l − 1, +i + |l, l, −i (10.78)
2 2 2l + 1 2l + 1

Após sucessivas aplicações de J− , teremos o estado geral


s s
1 1
1 l + mj + 2 1 l − mj + 2 1
|l + , mj , li = |l, mj − , +i+ |l, mj + , −i
2 2l + 1 2 2l + 1 2
(10.79)
onde −(l + 12 ) ≤ mj ≤ l + 12 .
Analogamente,
s s
1 1
1 l + mj + 2 1 l − mj + 1 2
|l− , mj , li = − |l, mj − , +i+ |l, mj + , −i
2 2l + 1 2 2l + 1 2
(10.80)
onde −(l − 12 ) ≤ mj ≤ l − 12 . É simples verificar que esses estados em
(10.80) são ortogonais aos estados em (10.79) e que eles são auto-estados
de ~J2 e Jz com autovalores j = l − 12 e mj .
Duas Partículas de spin 12 : Nesse caso, o operador de spin total
~S é dado por
~S ≡ ~S1 ⊗ I + I ⊗ ~S2 ≡ ~S1 + ~S2 (10.81)

Mecânica Quântica

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372 Cap. 10 Rotações o Operadores Tensoriais

naturalmente, dentro do espaço do elétron 1 e 2 valem as seguintes


relações de comutação:
[S1i , S2j ] = 0 (10.82)
mas

[S1i , S1j ] = i ~εijk S1k [S2i , S2j ] = i ~εijk S2k (10.83)

e
[Si , Sj ] = i ~εijk Sk (10.84)
para o operador spin total.
Os autovalores dos operadores de spin são:
³ ´2
~S2 = ~S1 + ~S2 : s(s + 1)~2

Sz = S1z + S2z : m~
S1z : m1 ~
S2z : m2 ~ (10.85)

Novamente, existe duas diferentes representações dos estados do spin


total:

1. A representação {m1 , m2 } baseada nos auto-kets de S1z e S2z

| + +i, | + −i, | − +i, | − −i . (10.86)

2. A representação {s, m} baseada nos auto-kets de ~S2 e Sz

|s = 1, m = 1i = | + +i (10.87a)
1
|s = 1, m = 0i = √ (| + −i + | − +i) (10.87b)
2
|s = 1, m = −1i = | − −i (10.87c)
1
|s = 0, m = 0i = √ (| + −i − | − +i) (10.87d)
2

Os estados |s = 1, m = ±1, 0i são conhecidos como estado tripleto


do spin, enquanto o estado |s = 0, m = 0i é conhecido como estado
singleto do spin.

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10.8. Adição de Momentum Angular 373

Para obter (10.87b) de (10.87a) aplicaremos o operador S− em


(10.87a). Lembrando que

S− ≡ S1− + S2−
= (S1x − i S1y ) + (S2x − i S2y ) (10.88)

podemos escrever

S− |s = 1, m = 1i = (S1− + S2− )| + +i (10.89)

como
sµ ¶µ ¶
p 1 1 1 1
(1 + 1)(1 − 1 + 1)|s = 1, m = 0i = + − + 1 | − +i
2 2 2 2
sµ ¶µ ¶
1 1 1 1
+ + − + 1 | + −i
2 2 2 2
(10.90)

teremos a relação (10.87b). Finalmente podemos obter (10.87c) apli-


cando S− em (10.87b), e para obter (10.87d) requer que seja ortogonal
com os outros três kets, em particular com (10.87b).
Os coeficientes que aparecem nas equações (10.87a)-(10.87d) são
exemplos simples dos coeficientes de Clebsch-Gordon 14 . Eles são
simplesmente os elementos da matriz de transformação que conecta a
base {m1 , m2 } com a base {s, m}.
Teoria Formal - Caso Geral: Como já vimos o operador ~J é
a soma do operador momentum angular orbital ~L com o momentum
angular de spin ~S, i.e.,
~J = ~L + ~S (10.91)
Tendo em vista que ~L depende das coordenadas espaciais e o operador
de spin é independente dessas coordenadas, temos que

[~L, ~S] = 0 (10.92)

Conseqüentemente,
[~J, ~S] = 0 (10.93)
14
Rudolf Friedrich Alfred Clebsch (1833–1872), matemático alemão.
Paul Albert Gordon (1837–1912), matemático alemão.

Mecânica Quântica

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374 Cap. 10 Rotações o Operadores Tensoriais

A seguir, vamos considerar dois operadores de momentum angular para


as partículas 1 e 2 independentes, i.e., em subespaços diferentes, os
operadores são: ~J1 e ~J2 , respectivamente. As componentes de ~J1 (~J2 )
satisfazem as relações de comutação para o momentum angular

[J1i , J1j ] = i ~εijk J1k (10.94a)


[J2i , J2j ] = i ~εijk J2k (10.94b)

Entretanto
[~J1 , ~J2 ] = 0 (10.95)
entre qualquer par de operadores em diferentes subespaço.
O operador de rotação infinitesimal que afeta os dois subespaço, da
partícula 1 e da partícula 2, será
µ ¶ µ ¶
i~ i~ i ³~ ´
1 − J1  n̂δϕ ⊗ 1 − J2  n̂δϕ = 1 − J1 ⊗ I + I ⊗ ~J2  n̂δϕ
~ ~ ~
(10.96)
o que nos leva ao operador momentum angular total

~J = ~J1 ⊗ I + I ⊗ ~J2 (10.97)

ou simplesmente
~J = ~J1 + ~J2 . (10.98)
Usando a idéia de rotação em um ângulo finito, (10.96) ficará

D1 (R) ⊗ D2 (R) = e− ~ J1  n̂ϕ ⊗ e− ~ J2  n̂ϕ


i~ i~
(10.99)

É importante lembrar que o momentum angular total ~J satisfaz as re-


lações de comutação
[Ji , Jj ] = i ~εijk Jk . (10.100)
Com isso, podemos escolher um conjunto de base, i.e., autokets
simultâneos de ~J21 , J1z , ~J22 e J2z representado por |j1 j2 ; m1 m2 i 15 . Con-
sideremos que esses auto-estados formam um conjunto de base com-
pleto. Por exemplo, para valores fixos de j1 e j2 temos m1 = −j1 , −j1 +
15
O auto-estado aqui representado

|j1 j2 ; m1 m2 i = |j1 m1 i ⊗ |j2 m2 i = |j1 m1 i|j2 m2 i

em alguns livros aparece como |j1 m1 ; j2 m2 i.

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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10.8. Adição de Momentum Angular 375

1, −j1 +2, · · · , j1 e m2 = −j2 , −j2 +1, −j2 +2, · · · , j2 16 . Obviamente os


quatro operadores ~J21 , J1z , ~J22 e J2z comutam entre eles. Usando essas
informações podemos escrever as seguintes relações:
~J2 |j1 j2 ; m1 m2 i = j1 (j1 + 1)~2 |j1 j2 ; m1 m2 i (10.101a)
1
J1z |j1 j2 ; m1 m2 i = m1 ~ |j1 j2 ; m1 m2 i (10.101b)
~J2 |j1 j2 ; m1 m2 i = j2 (j2 + 1)~2 |j1 j2 ; m1 m2 i (10.101c)
2
J2z |j1 j2 ; m1 m2 i = m2 ~ |j1 j2 ; m1 m2 i (10.101d)

De maneira semelhante, os operadores de levantamento e abaixamento


para os spin 1 e 2 agem sobre o estado |j1 j2 ; m1 m2 i de acordo com
p
J1± |j1 j2 ; m1 m2 i = (j1 ∓ m1 )(j1 ± m1 + 1)~ |j1 j2 ; m1 ± 1, m2 i
(10.102a)
p
J2± |j1 j2 ; m1 m2 i = (j2 ∓ m2 )(j2 ± m2 + 1)~ |j1 j2 ; m1 , m2 ± 1i
(10.102b)

Contudo a base escolhida acima somente tem validade se os dois sis-


temas caracterizados por j1 e j2 não se interagem, ou o fazem muito fra-
camente. Desse modo, os estados |j1 j2 ; m1 m2 i podem ser usados como
auto-estados não perturbados, em termos dos quais, auto-estados per-
turbados podem ser descritos.
Por outro lado, se a interação entre ~J1 e ~J2 for suficientemente forte,
de tal forma que teremos um sistema acoplado ~J1  ~J2 , temos de fazer
uso de operadores que comutam com a hamiltoniana do sistema. Um
exemplo disso é a correção que introduz o acoplamento spin-órbita
na hamiltoniana, de acordo com a expressão

HSO = υ(r)~L  ~S

onde, nesse tipo de acoplamento, ~J1 = ~L e ~J2 = ~S não comutam com a


hamiltoniana HSO 17 . Caso uma interação como essa ocorra, J1z e J2z
deixam de ser constantes de movimento. Nesse caso, teremos de usar
16
Com os valores j1 e j2 fixos, alguns livros costumam simplificar a representação
dos estados de base, escrevendo somente |m1 m2 i, ao invés de |j1 j2 ; m1 m2 i.
17
A quantidade υ(r) que aparece em HSO é expressa por

1 1 dV (r) 1 Ze2
υ(r) = 2 2
=
2µ c r dr 2µ2 c2 r3
e V (r) é o potencial de Coulomb

Mecânica Quântica

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376 Cap. 10 Rotações o Operadores Tensoriais

operadores que comutam com a hamiltoniana do sistema. Sabe-se que


as interações internas de um sistema acoplado não afetam o momentum
angular total, que é conservado. Dessa forma é conveniente fazer uso
dos operadores ~J e Jz ao invés de J1z e J2z . Lembrando que ~J é o
momentum angular total do sistema formado por ~J1 e ~J2 , temos

~J = ~J1 + ~J2 (10.103)

~J2 = ~J2 + ~J2 + ~J1  ~J2


1 2
~ 2 ~ 2
= J + J + 2J1z J2z + J1+ J2− + J1− J2+ . (10.104)
1 2

O operador de projeção será

Jz = J1z + J2z (10.105)

É claro que os operadores ~J2 e Jz comutam com ~J21 e ~J22 , devido a


relação
[J1i , J2j ] = 0 (10.106)
Portanto, o produto interno dos operadores ~J1  ~J2 também comuta
com a hamiltoniana do sistema. Assim, podemos designar uma nova
base |j1 j2 ; jmi como auto-estados simultâneos desses quatro operadores
~J2 , ~J2 , ~J2 e Jz , tal que:
1 2

~J2 |j1 j2 ; jmi = j1 (j1 + 1)~2 |j1 j2 ; jmi (10.107a)


1
~J2 |j1 j2 ; jmi = j2 (j2 + 1)~2 |j1 j2 ; jmi (10.107b)
2
~J2 |j1 j2 ; jmi = j(j + 1)~2 |j1 j2 ; jmi (10.107c)
Jz |j1 j2 ; jmi = m~ |j1 j2 ; jmi (10.107d)

Note que os estados |j1 j2 ; m1 m2 i e |j1 j2 ; jmi são apenas diferentes


bases num mesmo espaço, o espaço de estados dentro do qual os mo-
menta angulares ~J1 e ~J2 ficam definidos, o ket |j1 j2 ; jmi pode ser
escrito como uma combinação linear dos estados |j1 j2 ; m1 m2 i. Essa
combinação linear que conecta as duas bases é geralmente expressa,
levando em conta uma transformação unitária, da seguinte forma
XX
|j1 j2 ; jmi = |j1 j2 ; m1 m2 ihj1 j2 ; m1 m2 |j1 j2 ; jmi (10.108)
m1 m2

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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10.8. Adição de Momentum Angular 377

onde temos XX
|j1 j2 ; m1 m2 ihj1 j2 ; m1 m2 | = 1 (10.109)
m1 m2

Os elementos da matriz de transformação hj1 j2 ; m1 m2 |j1 j2 ; jmi são


os coeficientes de Clebsch-Gordon 18 . Simplificando a notação ante-
rior, escrevemos

hj1 j2 ; m1 m2 |j1 j2 ; jmi = hm1 m2 |jmi

e j1 e j2 são os máximos valores de m1 e m2 .


Aqui, estamos preparados para discutir algumas propriedades dos
coeficientes de Clebsch-Gordon. Primeiro, aplicando Jz = J1z + J2z em
(10.108) e tendo como autovalores

Jz |j1 j2 ; jmi = m~ |j1 j2 ; jmi


J1z + J2z |j1 j2 ; m1 m2 i = (m1 + m2 )~ |j1 j2 ; m1 m2 i

podemos concluir que os números quântico m estão sujeitos a seguinte


regra de seleção,
hj1 j2 ; m1 m2 |j1 j2 ; jmi = 0
se não tivermos
m = m1 + m2 (10.110)

Prova. Note que

(Jz − J1z − J2z )|j1 j2 ; jmi = 0 (10.111)

multiplicando hj1 j2 ; m1 m2 | do lado esquerdo da equação acima, teremos

(m − m1 − m2 )hj1 j2 ; m1 m2 |j1 j2 ; jmi = 0 (10.112)

no que temos a prova de nossa argumentação. Perceba e admire a força


da notação de Dirac!

Segundo, os coeficientes se anulam se não tivermos

|j1 − j2 | ≤ j ≤ j1 + j2

Essa propriedade parece obvia. Devemos lembrar que o operador ~J1 é


definido no espaço de dimensão 2j1 + 1 e o operador ~J2 é definido no
18
As vezes chamado coeficientes de Wigner.

Mecânica Quântica

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“mq_notas-N” — 2009/5/5 — 21:48 — page 378 — #378


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378 Cap. 10 Rotações o Operadores Tensoriais

espaço de dimensão 2j2 + 1. Lembremos ainda que |j1 m1 i constituem


os auto-estados de base dos operadores ~J21 e J1z , enquanto |j2 m2 i con-
stituem os auto-estados de base dos operadores ~J22 e J2z . O operador ~J
é então definido num espaço combinado de ~J1 e ~J2 . Esse novo espaço,
conhecido como espaço produto, tem dimensão

N = (2j1 + 1)(2j2 + 1)

porque para dado j1 existe 2j1 +1 possíveis valores de m1 , e similarmente


para dado j2 existe 2j2 + 1 possíveis valores de m2 . Como para cada
dado j existe 2j + 1 estados, e de acordo com |j1 − j2 | ≤ j ≤ j1 + j2 , os
valores de j irão de j1 − j2 até j1 + j2 , onde assumimos, sem perda de
generalidades, que j1 ≥ j2 . Assim, a dimensão será

jX
1 +j2

N= (2j + 1)
j=j1 −j2
1
= [{2(j1 − j2 ) + 1} + {2(j1 + j2 ) + 1}] (2j2 + 1)
2
= (2j1 + 1)(2j2 + 1) (10.113)

como havíamos anunciado.


Relação de Recorrência para os Coeficientes de Clebsch-
Gordon: Usando a notação simplificada e aplicando os operadores J± =
J1± + J2± em (10.108), teremos as seguintes relações de recorrência
para os coeficientes de Clebsch-Gordon
p
(j ± m)(j ∓ m + 1) hm1 m2 |j, m ∓ 1i
p
= (j1 ∓ m1 )(j1 ± m1 + 1) hm1 ± 1, m2 |j, mi
p
+ (j2 ∓ m2 )(j2 ± m2 + 1) hm1 , m2 ± 1|j, mi
(10.114)

Faremos uma ilustração da utilidade da equação dada acima. Con-


sideremos m1 = j1 e m = j em (10.114), mas usando os sinais superi-
ores. Se nessa condição hm1 m2 |j, m−1i, o resultado não trivial para m2
poderá ter somente o valor m2 = j −j1 −1. Note que em condições gerais
hm1 m2 |j, m ± 1i, temos m1 + m2 = m ± 1. Para os valores ilustrado em

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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10.8. Adição de Momentum Angular 379

nosso caso, substituindo em (10.114), teremos


p
(j + j)(j − j + 1) hj1 , j − j1 − 1|j, j − 1 ∓ 1i
p
= (j1 − j1 )(j1 + j1 + 1) hj1 + 1, j − j1 − 1|j, ji
p
+ (j2 − j + j1 + 1)(j2 + j − j1 − 1 + 1) hj1 , j − j1 − 1 + 1|j, ji

ou
p
2j hj1 , j − j1 − 1|j, j − 1i
p
= (j2 − j + j1 + 1)(j2 + j − j1 ) hj1 , j − j1 |j, ji (10.115)

Usando agora os sinais inferiores de (10.114), e considerando m1 = j1 e


m = j − 1. Nesse caso, o resultado não trivial para m2 será somente o
valor m2 = j − j1 . Resolvendo de maneira análoga, teremos
p
2j hj1 , j − j1 |j, ji
p
= 2j1 hj1 − 1, j − j1 |j, j − 1i
p
+ (j2 + j − j1 )(j2 − j + j1 + 1) hj1 , j − j1 − 1|j, j − 1i
(10.116)

De acordo com a relação (10.115), o termo hj1 , j − j1 − 1|j, j − 1i poderá


ser determinado se hj1 , j − j1 |j, ji for conhecido. Conseqüentemente, a
relação (10.116) poderá ser usada para calcular o termos hj1 − 1, j −
j1 |j, j − 1i conhecendo os dois coeficientes anteriores.
Aplicando sucessivamente os operadores de levantamento e abaix-
amento, iremos limitar o valor de j, tal que para a regra de seleção
dada em (10.110) e demonstrada em (10.112), o coeficiente de Clebsch-
Gordon é diferente de zero somente se

−j2 ≤ j − j1 ≤ j2

Logo,
j1 − j2 ≤ j ≤ j1 + j2
e
j2 − j1 ≤ j ≤ j1 + j2
Assim, teremos a condição triangular

|j1 − j2 | ≤ j ≤ j1 + j2 (10.117)

Mecânica Quântica

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“mq_notas-N” — 2009/5/5 — 21:48 — page 380 — #380


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380 Cap. 10 Rotações o Operadores Tensoriais

onde os inteiros positivos ou semi-inteiros j1 , j2 , j são de tal forma que


constituem os três lados de um triângulo. Desde que m = m1 + m2
esteja entre −j e j
j = j1 + j2 , j1 + j2 − 1, · · · , |j1 − j2 | + 1, · · · , |j1 − j2 | (10.118)
Todos os números quânticos j1 , j2 , j são inteiros, ou dois deles são
semi-inteiros e um inteiro.
Como já mencionamos, para valores fixos de j1 e j2 na relação
(10.108), temos uma base com dimensão (2j1 + 1)(2j2 + 1) e da relação
(10.118) novamente vemos (2j1 +1)(2j2 +1) no número da dimensão. Da
relação de recorrência (10.114) está claro que todos os coeficientes de
Clebsch-Gordon são números reais, se um deles, hj1 j2 ; j1 , j − j1 |j1 j2 ; jji
for escolhido real. A matriz unitária real é ortogonal. Sendo assim, os
coeficientes de Clebsch-Gordon satisfazem a condição de ortogonalidade
X
hj1 j2 ; m1 m2 |j1 j2 ; jmihj1 j2 ; m1 m2 |j1 j2 ; j 0 m0 i = δmm0 δjj 0 (10.119)
m1 m2

ou inversamente
X
hj1 j2 ; m1 m2 |j1 j2 ; jmihj1 j2 ; m01 m02 |j1 j2 ; jmi = δm1 m01 δm2 m02
jm
(10.120)
Uma das mais importantes relações de simetria para os coeficientes
de Clebsch-Gordon estão sumarizadas pela equação abaixo:
hj1 j2 ; m1 m2 |j1 j2 ; jmi = (−1)j−j1 −j2 hj2 j1 ; m2 m1 |j2 j1 ; jmi
= hj2 j1 ; −m2 , −m1 |j2 j1 ; j, −mi (10.121)
Alguns autores as vezes usam notações diferentes para os coeficientes
de Clebsch-Gordon. Eles podem escrever esses coeficientes em termos
de 3 − j símbolo de Wigner, no qual encontramos ocasionalmente na
literatura.
µ ¶
j1 −j2 +m
p j1 j2 j
hj1 j2 ; m1 m2 |j1 j2 ; jmi = (−1) 2j + 1
m1 m2 −m
(10.122)
Os coeficientes em (10.122) foram primeiramente calculados por Wigner
em 1931 19 e suas propriedades de simetrias foram primeiramente derivadas
por Racah em 1942 20 .
19
E. P. Wigner, Gruppentheorie, (1931).
20
Giulio (Yoel) Racah (1909–1965), matemático e físico italiano-israelita.
G. Racah, Physical Review, 62, 438–462 (1942).

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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10.8. Adição de Momentum Angular 381

Um último exemplo, iremos calcular os coeficientes de Clebsch-


Gordon para partículas de spin 21 , pois são freqüentemente necessários.
Então, para j2 = 12 , da relação de recorrência (10.114), da condição de
normalização (10.119) e convencionando hj1 , 12 ; j1 , j − j1 |j1 , 21 ; jji para
ser real e positivo

¯ s
¿ À 1
¯ 1
1 1 1
j1 , ; m − , ¯j1 , ; j1 ± , m = ± j1 ± m +
1 2
2 2 2 ¯ 2 2 2j1 + 1
(10.123)
¯ s
¿ À 1
1 1 1 ¯ 1 j1 ∓ m +
j1 , ; m + , − ¯j1 , ; j1 ± 1 , m = 2
2 2 2 ¯ 2 2 2j1 + 1

desde que os valores associados à j são j = j1 ± 12 .


Se a representação de coordenada é usada para os auto-estados do
momentum angular orbital ~L e se, como feito usualmente, os auto-
estados {|±i} de Sz forem escolhidos como base para representação do
spin, o momentum angular total ~J = ~L + ~S e seus auto-estados serão
representados pelo produto direto spin⊗base das coordenadas. Para
auto-estados comum aos operadores Jz e ~J2 representados por Yljm , com
j1 = l, teremos
 q 
1 m− 12
l± 12 ,m 1 ± l ± m + 2 Yl
Yljm = Yl =√ q
m+ 12
 (10.124)
2l + 1 1
l ∓ m + 2 Yl

para os auto-estados com j = l± 12 . Esses auto-estados acoplados tem um


importante papel na mecânica quântica para sistemas com um simples
elétron e um simples nucleon.
Séries de Clebsch-Gordon: A adição do momentum angular pode
ser discutida do ponto de vista das matrizes de rotação. Dentro da idéia
do grupo de rotação a representação do produto direto Dj1 (R)⊗Dj2 (R)
é inicialmente relatada como a soma de ~J = ~J1 + ~J2 , e sob essas ro-
tações temos transformações de espaços do produto direto com dimen-
são (2j1 + 1)(2j2 + 1), e a redução consiste em determinar os sube-
spaços invariantes contidos nesse espaço. Desde que as representações
irredutíveis são caracterizadas pelos autovalores de ~J2 , o número quân-
tico j inteiro ou semi-inteiro, podemos assumir valores entre |j1 − j2 | e

Mecânica Quântica

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382 Cap. 10 Rotações o Operadores Tensoriais

j1 + j2 , de tal forma que o produto Dj1 (R) ⊗ Dj2 (R) tem sua represen-
tação matricial dada por
 (j +j ) 
D 1 2 0
 D(j1 +j2 −1) 
 
Dj1 ⊗ Dj2 →  ..  (10.125)
 . 
0 D|j1 −j2 |

Em física de partículas, é costume identificar a representação irredutível


por sua dimensionalidade. Note que podemos escrever a equação (10.125)
usando a notação de teoria de grupo

Dj1 ⊗ Dj2 = D(j1 +j2 ) ⊕ D(j1 +j2 −1) ⊕ · · · ⊕ D|j1 −j2 | . (10.126)

Em termos dos elementos das matrizes de rotação, temos uma impor-


tante expansão conhecida como as séries de Clebsch-Gordon
j1 j2
XXX
Dm 1m
0 (R)Dm m0 (R) =
2
hj1 j2 ; m1 m2 |j1 j2 ; jmi
1 2
j m m0
j
× hj1 j2 ; m01 m02 |j1 j2 ; jm0 i Dmm0 (R) (10.127)

onde o somatório em j é realizado desde |j1 − j2 | até j1 + j2 .


Uma aplicação interessante de (10.127), é quando derivamos uma
importante fórmula para uma integral envolvendo três harmônicos es-
l ∗
féricos. Primeiro devemos fazer a conexão entre Dm0 e Ylm dado por
s
4π ¯
l ∗ ¯
Dm,0 (α, β, γ = 0) = Ylm (θ, ϕ)¯
(2l + 1) θ=β,ϕ=α

Usando j1 = l1 , j2 = l2 , j = l, m01 = 0, m02 = 0 (m0 → 0) em (10.127),


obteremos depois de uma conjugação complexa,
p
m1 m2 (2l1 + 1)(2l2 + 1) X
Yl1 (θ, ϕ)Yl2 (θ, ϕ) = hl1 l2 ; m1 m2 |l1 l2 ; l0 m0 i

l0 m0
r
4π 0
× hl1 l2 ; 00|l1 l2 ; l0 0i 0
Ylm
0 (θ, ϕ) (10.128)
2l + 1

Multiplicando os dois lados da equação acima por Ylm (θ, ϕ) e inte-
grando pelo ângulo sólido. Os somatórios desaparecem devido a ortog-

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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10.9. Teorema de Wigner-Eckart 383

onalidade dos harmônicos esféricos, e então teremos


Z

dΩ Ylm (θ, ϕ)Ylm
1
1
(θ, ϕ)Ylm
2
2
(θ, ϕ)
s
(2l1 + 1)(2l2 + 1)
= hl1 l2 ; 00|l1 l2 ; l0ihl1 l2 ; m1 m2 |l1 l2 ; lmi
4π(2l + 1)
(10.129)

O fator raiz quadrada multiplicado pelo primeiro coeficiente de Clebsch-


Gordon é independente de orientações, i.e., de m1 e m2 . O segundo
coeficiente de Clebsch-Gordon é o apropriado para a adição de l1 e l2
afim de obter o valor total l. A relação (10.129) expressa, para um caso
particular de harmônicos esféricos, um teorema mais geral conhecido
como teorema de Wigner-Eckart 21 .

10.9 Teorema de Wigner-Eckart


Vamos intuitivamente definir o operador vetorial A ~ ↔ {Ax , Ay , Ax }
como um conjunto de três operadores no espaço de Hilbert, cujo o valor
~ é um vetor transformado sob rotações do vetor espaço de
esperado hAi
coordenadas. Como o produto interno entre dois vetores são preservados
sob uma rotação espacial, temos
 
hAx i
~ ↔ hAy i
hAi
hAz i
~
hψ|A|ψi  ê = hψ0|A|ψ
~ 0 i  ê (10.130)

onde ψ é um estado arbitrário e ê é um vetor unitário no espaço de


coordenadas, sendo que objetos direcionados em ê0 são as imagens dos
objetos direcionados em ê após uma rotação, onde n̂ e ϕ são o eixo e o
ângulo de rotação, a relação entre ê e ê0 é dada por

ê0 = [1 + (1 − cos ϕ)n̂ × (n̂×) + sen ϕn̂×] ê (10.131)


21
Carl Henry Eckart (1902–1973), físico americano.
C. Eckart, Review Modern Physics, 2, 305 (1930); E. P. Wigner, Gruppentheorie,
(1931).

Mecânica Quântica

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384 Cap. 10 Rotações o Operadores Tensoriais

ou na forma matricial, usando as bases cartesianas {(x̂, ŷ, ẑ)}


3
X
e0i = Rij ej (10.132)
j=1

Se usarmos UR para denotar a rotação no espaço de Hilbert

|ψ 0 i = UR |ψi, ê0 = Rê

Desde que
~ 0 i  ê0 = hAx ie0 + hAy ie0 + hAz ie0
hψ 0 |A|ψ x y z

= hψ |A  ê |ψ i
0 ~ 0 0

e
~
hψ|A|ψi  ê = hψ0|URA
~  êU† |ψ 0 i
R
teremos
~ †  ê = A
UR AU ~  ê0 (10.133)
R
Substituindo (10.132) em (10.133), obteremos
X
UR Aj U†R = Ai Rij (10.134)
i

que ainda podemos escrever de outra forma


   
Ax Ax
Ay  7→ R(n̂, ϕ) Ay 
Az Az

na qual mostra que a transformação de um operador vetorial sob uma


rotação (n̂, ϕ) induz uma representação linear do grupo de rotação.
Por outro lado, é importante discutir o caso de rotações infinitesi-
mais, representadas por exponenciais, se ϕ = ε, nos encontraremos que
µ ¶ µ ¶
i ~ 1 + i n̂  ~Jε = A
1 − n̂  ~Jε A ~ − n̂ × A
~ ε
~ ~
ou h i
~ n̂  ~J = i ~ n̂ × A
A, ~ (10.135)
que é necessariamente satisfeito por um n̂ arbitrário e para qualquer
~
operador vetorial A.

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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10.9. Teorema de Wigner-Eckart 385

Essa noção de operador vetorial poderá ser generalizada para definir-


mos os operadores tensoriais ou operadores tensoriais esféricos,
sendo um operador vetorial um operador tensorial esférico de ordem 1.
Como vimos anteriormente, o grupo de rotação tem uma representação
linear no espaço vetorial de varias dimensões, e o operador vetorial é
representado com dimensão 3 = 2j + 1, i.e., quando a ordem j = 1.
Para uma ordem inteira não negativa e arbitrária k, definimos o ten-
sor esférico ou operador tensorial esférico irredutível. Esse é um
conjunto de 2k + 1 operadores Tqk , com q = −k, −k + 1, · · · , k − 1, k,
que satisfaz a lei de transformação
k
X 0
UR Tqk U†R = Tqk Dqq
k
0 (R) (10.136)
q 0 =−k

onde Dqqk (R) formam os elementos da matriz (q 0 , q) da representação


0

linear de dimensão k da rotação R.


Para ordem 1, com cálculo direto podemos mostrar que as compo-
nentes do tensor esférico de um operador vetorial arbitrário com com-
ponentes cartesianas (Ax , Ay , Az ) são
1
T+1
1 = − √ (Ax + i AY )
2
0
T1 = Az
1
T−1
1 = √ (Ax − i AY )
2
e se tomarmos como exemplo o operador posição ~r para uma partícula
em três dimensões, teremos então para as componentes do tensor es-
férico: µ ¶
x + iy x − iy
− √ , z, √
2 2
Uma definição mais conveniente para o tensor esférico é obtido levando
em consideração a transformação infinitesimal
µ ¶ µ ¶ X k µ ¶
i ~ i ~ i ~
1 − n̂  Jε Tk 1 + n̂  Jε =
q
Tk hkq | 1 − n̂  Jε |kqi
q0 0
~ ~ 0
~
q =−k

ou
h i k
X
n̂  ~J, Tqk = Tqk hkq 0 |n̂  ~J|kqi
0
(10.137)
q 0 =−k

Mecânica Quântica

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386 Cap. 10 Rotações o Operadores Tensoriais

onde n̂ é arbitrário nas direções ẑ e (x̂ ± i ŷ), e usando os elementos


não nulos das matrizes Jz e J± , teremos
[Jz , Tqk ] = q~ Tqk
p
[J+ , Tqk ] = (k − q)(k + q + 1)~ Tq+1
k (10.138)
p
[J− , Tk ] = (k + q)(k − q + 1)~ Tq−1
q
k

Uma das mais importantes propriedades do tensor Tqk é fornecida


pelo teorema de Wigner-Eckart. Esse teorema afirma que o elemento
de matriz espresso por hα0 j 0 m0 |Tqk |αjmi, de qualquer componente desse
operador tensorial, decompõe-se em dois fatores: o coeficiente de Clebsch-
Gordon hjkmq|jkj 0 m0 i, que é independente de propriedades físicas do
tensor, e um elemento de matriz reduzido do operador tensorial es-
férico irredutível Tk , representado por hα0 j 0 ||Tk ||αji, que depende da
natureza do tensor, dos números quânticos do momento angular total j
e j 0 e, possivelmente, de alguns outros números quânticos α e α0 que em
adição à j e m possam ser necessários para especificar completamente
um estado de bases. Contudo, eles não tem nenhuma dependência dos
números quânticos magnéticos m, m0 e q. Matematicamente, esse teo-
rema pode ser expresso de uma maneira simplificada por
hα0 j 0 m0 |Tqk |αjmi = hjk; mq|jk; j 0 m0 ihα0 j 0 ||Tk ||αji (10.139)
Das propriedades fundamentais dos coeficientes de Clebsch-Gordon,
temos que os elementos de matriz hα0 j 0 m0 |Tqk |αjmi são nulos, salvo se
q = m0 − m. A prova desse teorema segue-se das definições básicas dos
operadores tensoriais.

Prova. Tomaremos o elemento de matriz (10.136) entre os estados


hα0 j 0 m0 | e |αjmi,
k
X 0
hα0 j 0 m0 |UR Tqk U†R |αjmi = hα0 j 0 m0 |Tqk |αjmi Dqq
k
0 (R) (10.140)
q 0 =−k

usando as relações
X
U†R |αjmi = j ∗
|αjmiDmµ (R)
µ

e X 0
j
hα0 j 0 m0 |UR = Dm 0 0 0
0 µ0 (R)hα j m |

µ0

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10.9. Teorema de Wigner-Eckart 387

temos
X j 0 q
0 0 0 j ∗
Dm 0 µ0 (R)hα j m |Tk |αjmiDmµ (R)

µµ0
k
X 0
= hα0 j 0 m0 |Tqk |αjmi Dqq
k
0 (R)

q 0 =−k
(10.141)

Da propriedade do produto de duas matrizes de rotação

j1 j2
XXX
Dm 1m
0 (R)Dm m0 (R) =
2
hj1 j2 ; m1 m2 |j1 j2 ; jmi
1 2
j m m0
j
× hj1 j2 ; m01 m02 |j1 j2 ; jm0 i Dmm0 (R)

usando a condição unitária para as matrizes D e a ortogonalidade dos


coeficientes de Clebsch-Gordon, podemos derivar a relação homogênea
linear para esses coeficientes como
X j2
hj1 j2 ; m01 m02 |j1 j2 ;j3 m3 i Dm 0 m (R)
2 2
m02
X j1 ∗
j3
= Dm 3m
(R)hj1 j2 ; m1 m2 |j1 j2 ; j3 miDm 0 m (R)
1 1
m1 m
(10.142)

Observando (10.141) e (10.142) podemos notar que as duas equações


têm a mesma estrutura. Se identificamos j = j1 , k = j2 e j 0 = j3 ,
podemos concluir que as duas soluções dessas relações de recorrência
homogênea linear serão proporcional à

hα0 j 0 m0 |Tqk |αjmi = hjk; mq|jk; j 0 m0 ihα0 j 0 ||Tk ||αji

provando o teorema.

O teorema de Wigner-Eckart pode ser aplicado para o cálculo do


operador vetorial de momento magnético no caso de acoplamento spin-
órbita, como também no caso do tensor do momento quadrupolar, entre
outros.

Mecânica Quântica

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388 Cap. 10 Rotações o Operadores Tensoriais

10.10 Não-Localidade na Mecânica Quântica


Após a criação da mecânica quântica surgem inconsistências que foram
sintetizadas em 1935 no paradoxo de Einstein, Podolsky 22 e Rosen 23 ,
mais conhecido como paradoxo EPR. Em 1964 Bell 24 colocou esse
paradoxo em termos quantitativos o que permitiu a execução de ex-
perimentos que concluíram pela validade da mecânica quântica, dando
plausibilidade ao conceito de não-localidade.
Em 1935 Einstein, Podolski e Rosen 25 utilizando de forma engen-
hosa os conceitos da mecânica quântica juntamente com proposições so-
bre localidade, realidade e de completeza teórica (totalmente plausíveis)
demonstraram que em certas ocasiões os estados quânticos, ou apresen-
tam a propriedade de não-localidade, ou não são descrições completas
da realidade física. Uma vez que a não-localidade implica na possibil-
idade da transmissão de sinais com velocidade maior do que a da luz,
preferiram se manter à conclusão da incompleteza. Esse paradoxo será
analisado com detalhe mais adiante.
Em 1964, Bell 26 analisou o paradoxo EPR sob a perspectiva dos
trabalhos de Bohm 27 e derivou uma desigualdade que abria a possi-
bilidade de verificar experimentalmente as conclusões de EPR sobre
incompleteza. Esse trabalho é considerado como uma das descobertas
seminais da física do século XX pois equaciona de maneira clara e precisa
aspectos fundamentais da mecânica quântica que antes eram apenas ob-
jeto de divagações. Essa desigualdade será derivada mais adiante ainda
nessa seção.
Paradoxo de Einstein, Podolsky e Rosen: Apesar de propor-
cionar contribuições que foram fundamentais para o desenvolvimento da
mecânica quântica convencional, Einstein sempre teve reservas a seu re-
speito. Em seus comentários um dos temas que lhe despertavam maiores
preocupações era a incompleteza da descrição teórica da mecânica quân-
tica, provida pela função de onda ψ. Em consequência, afirmava que
a teoria quântica, na forma em que se apresentava, estava limitada à
22
Boris Podolsky (1896–1966), físico russo.
23
Nathan Rosen (1909–1995), físico israelense.
24
John Stewart Bell (1928–1990), físico irlandês.
25
A. Einstein, B. Podolsky and N. Rosen, Physical Review, 47, 777 (1935).
26
J. S. Bell, Physics, 1, 195 (1964).
27
D. Bohm, Quantum theory, (1951); D. Bohm, Physical Review, 85, 166 (1952);
ibidem, 85, 180 (1952).

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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10.10. Não-Localidade na Mecânica Quântica 389

mera discussão de resultados experimentais, e a percepção de que a es-


sência da ciência é a predição e controle de fenômenos físicos e de que
qualquer progresso em física irá se realizar através da manipulação de
formalismos, ao invés do desenvolvimento da nossa concepção da re-
alidade, foi se generalizando. As críticas de Einstein eram elaboradas
cuidadosamente. Até os nossos dias muitas de suas críticas nunca foram
respondidas satisfatoriamente.
A mais famosa dessas críticas está contida no paradoxo EPR. Eles
analisaram um Gedankenexperiment em que uma partícula decai em
duas, e, mediante argumentos de conservação de momentum e de ener-
gia, invocando o conceito de colapso de onda, concluem pela incom-
pleteza da função de onda que representa o estado quântico.
Bohm adaptou o argumento do paradoxo EPR a um par de partícula
de spin- 12 que se encontram no estado |ψij. Nessa forma de apresentar
o argumento, as variáveis de spin evidenciam de maneira clara as con-
clusões, além de facilitarem a dedução da desigualdade de Bell que
veremos adiante.
Duas partículas de spin- 21 são produzidas por uma fonte S (por
exemplo o decaimento de uma molécula com spin total 1 e que decai
em dois átomos de spin- 21 e se movem livremente em direções opostas
conforme está esquematizado na Fig. 10.3. A função de onda do sistema

Figura 10.3: Medida Stern-Gerlach no paradoxo EPR versão de Bohm.

é dada por
1
ψ(~r1 ,~r2 ) = ϕ1 (~r1 )ϕ2 (~r2 ) √ [|+i1 |−i2 − |−i1 |+i2 ] (10.143)
2

Mecânica Quântica

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390 Cap. 10 Rotações o Operadores Tensoriais

onde ϕ1 (~r1 ) e ϕ2 (~r2 ) são funções de pacote de onda que não se so-
brepõem e |±i1 e |±i2 são auto-funções do operador spin Sn̂1 e Sn̂2 na
direção n̂ das partícula 1 e 2 respectivamente.
O estado descrito na relação (10.143) se refere ao sistema formado
pelas partículas 1 e 2. Suponhamos que ao efetuar uma medida de spin
na partícula 1, mediante um aparato Stern-Gerlach com o campo mag-
nético na direção n̂, obtemos o resultado de spin up (ao longo de n̂).
Nesse caso, de acordo com a teoria quântica, a função de onda dada
pela expressão (10.143) se reduz (colapso da função de onda) a:

ψ(~r1 ,~r2 ) → ϕ1 (~r1 )ϕ2 (~r2 )|+i1 |−i2 (10.144)

O resultado da medida é uma função de onda fatorizável o que nos


permite concluir, sem que tenha havido perturbação da partícula 2,
que o seu estado é |−i2 . Esse resultado para o sistema 2 depende do
tipo de medida efetuada no sistema 1. Se tivéssemos efetuado a medida
do spin do sistema 1 ao longo da direção n̂0 , veja Fig. 10.3, o estado
(10.143) devido à simetria rotacional seria escrito como

1 £ ¤
ψ(~r1 ,~r2 ) = ϕ1 (~r1 )ϕ2 (~r2 ) √ |+i01 |−i02 − |−i01 |+i02 (10.145)
2

onde |±i01 e |±i02 são auto-funções do operador de spin na direção n̂.


Nesse caso, se o resultado da medida da partícula 1 nessa nova direção
n̂0 for up, então a função de onda total se reduz para

ψ(~r1 ,~r2 ) → ϕ1 (~r1 )ϕ2 (~r2 )|+i01 |−i02 (10.146)

Nesse caso devemos atribuir o estado |−i02 para o átomo 2 que não foi
medido. Efetuando diferentes medidas no átomo 1 estaremos obtendo
estados diferentes para o átomo 2.
Feitas essas colocações e a fim de compreendermos o argumento EPR
vamos definir as seguintes proposições:

1. correlação perfeita: se os spins das partículas 1 e 2 são medidos


ao longo de uma direção o resultado das medidas serão opostos;

2. localidade: se no instante da medida os sistemas não mais in-


teragem, não podem ocorrer mudanças em um dos sistemas em
virtude da medida realizada no outro;

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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“mq_notas-N” — 2009/5/5 — 21:48 — page 391 — #391


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10.10. Não-Localidade na Mecânica Quântica 391

3. realidade: se for possível predizer com certeza o valor de uma


grandeza física, sem perturbar o sistema, então existe um elemento
de realidade física que corresponde a esta quantidade física;

4. completeza: todo elemento de realidade física deve ter uma con-


trapartida na teoria que descreve o fenômeno.

Utilizando as quatro proposições, totalmente plausíveis, e em con-


cordância com a lógica clássica, o argumento apresentado por EPR pro-
cede da seguinte maneira:

• devido a proposição 1, correlação perfeita, podemos predizer com


certeza o resultado de medir qualquer componente do spin da
partícula 2, escolhendo previamente a mesma componente de spin
da partícula 1;

• devido a proposição 2, localidade, a medida efetuada em 1 não pode


provocar mudanças em 2;

• devido a proposição 3, elemento de realidade física, a componente do


spin escolhida para 2 é um elemento de realidade física, o que é
válido para qualquer direção escolhida, veja equações (10.143) a
(10.146), onde todos as componentes de spin são elementos de
realidade física.

O paradoxo, segundo a mecânica quântica não existe um estado


quântico de uma partícula de spin- 12 no qual todas as componentes
de spin tem valores definidos. Devido a proposição 4, completeza, a
mecânica quântica não é uma teoria completa, pelo menos, para o
caso do sistema com spin total igual a zero formado por um par de
partículas spin- 21 . Para esse sistema existem elementos de realidade
física para a qual a mecânica quântica não tem contrapartida. Assim
sendo a mecânica quântica é uma teoria incompleta e no artigo original,
Einstein, Podolsky e Rosen mencionam que acreditam que uma teo-
ria quântica completa pode ser possível com o que lançam o germe
para o surgimento das diversas teorias de variáveis ocultas. Vale a
pena mencionar que uma conclusão alternativa pode ser obtida rene-
gando o conceito de localidade, proposição 2. Nesse caso, mesmo que os
dois subsistemas não estejam mais interagindo, a medição efetuada em
um deles perturbaria instantaneamente o outro. A teoria quântica seria
completa mas estaria violando o princípio da relatividade segundo

Mecânica Quântica

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392 Cap. 10 Rotações o Operadores Tensoriais

o qual não é possível enviar sinais com velocidade maior do que a da


luz. E claro, Einstein preferiu se manter à localidade.
Teorema de Bell: Em 1964 Bell, utilizando as proposições 1 a 4
de EPR juntamente com as predições da mecânica quântica, demonstra
uma contradição, provando que o emprego das proposições de locali-
dade, realidade e completeza teórica são incompatíveis com as predições
da mecânica quântica. Bell equacionou essa contradição numa desigual-
dade, derivada do paradoxo apresentado por EPR, com argumentos
válidos para a Física Clássica, que deve ser violada no caso da mecânica
quântica ser válida. Esta desigualdade permite a verificação experimen-
tal e até o presente, todas elas confirmaram a validade da mecânica
quântica 28 .
Para demonstrar o teorema de Bell retornamos ao Gedankenex-
periment de Bohm esquematizado na Fig. 10.4. Na figura, a fonte S
emite um par de partículas spin- 21 , 1 e 2, no estado dado pela equação
(10.143), a partícula i (i = 1, 2) entra no aparelho Stern-Gerlach orien-
tado ao longo de n̂i , atrás de cada um dos aparelhos estão dois detetores,
omissos na figura, que registram o resultado que será ou para cima, ou
para baixo. A partícula 1 é sujeita a uma medida pelo aparato Stern-

Figura 10.4: Experimento de Bohm.

Gerlach com campo magnético orientado ao longo de n̂1 . O resultado


da medida é indexado por +1 se a componente n̂1 , do spin é para cima,
e −1 se é para baixo. A partícula 2 é submetida a uma medida similar,
28
J. F. Clauser and M. A. Horne, Physical Review, D10, 526-535 (1974);
J. F. Clauser and A. Shimony, Reports of Progress in Physics, 41, 1881-1927
(1978); A. Aspect, P. Grangier, and G. Roger, Physical Review Letters, 49, 91
(1982); ibidem, 49, 1804 (1982); A. Aspect and P. Grangier, Experiments on
Einstein-Podolsky-Rosen-type Correlations with Pairs of Visible Photons, in
R. Penrose and C. J. Isham (orgs.), Quantum concepts in space and time, (1986).

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10.10. Não-Localidade na Mecânica Quântica 393

com o campo magnético ao longo de n̂2 . Assumindo que o sistema for-


mado pelas duas partículas tem spin total zero, escrevemos a função
de onda como sendo
1
ψ = √ [|+i1 |−i2 − |−i1 |+i2 ] (10.147)
2

onde |+i1 e |−i1 representam estados up e down respectivamente, ao


longo da direção n̂ para a partícula 1 e |+i2 e |−i2 com significado
análogo para a partícula 2 com a mesma direção n̂. Da relação (10.147)
podemos obter 29 as probabilidades conjuntas:

ψ 1 θ ψ 1 θ
P++ = sen2 P+− = cos2
2 2 2 2
(10.148)
ψ 1 θ ψ 1 θ
P−+ = cos2 P−− = sen2
2 2 2 2
onde o primeiro subscrito indica se o resultado da medida na partícula
1 é +1 ou -1, e o segundo subscrito é análogo para a partícula 2 e n̂1
e n̂2 são as direções ao longo das quais o spin é medido. Com essas
probabilidades construímos o valor esperado do resultado das medidas,
definido por
ψ ψ ψ ψ
E ψ (n̂1 , n̂2 ) = P++ − P+− − P−+ + P−− (10.149)

cujo valor depende do ângulo entre as direções n̂1 e n̂2 , resultando em

E ψ (n̂1 , n̂2 ) = − cos θ = −n̂1  n̂2 (10.150)

No caso especial em que n̂1 = n̂2 temos correlação perfeita e o valor é


-1. A relação (10.149) é o resultado quântico. Vejamos o que podemos
inferir sobre o caso clássico.
Bell utiliza o argumento de EPR e introduz λ que representa um
conjunto de variáveis que definem de maneira completa o estado das
duas partículas, e que determinam o resultado das medidas de spin. O
resultado da medida A ao medir o spin da partícula 1 é determinado
exclusivamente pela direção de n̂1 e λ, e o resultado B de medir ao longo
29
D. M. Greenberger, M. A. Horne, A. Shimony and A. Zeilinger, American Journal
of Physics, 58, 1131 (1990).

Mecânica Quântica

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394 Cap. 10 Rotações o Operadores Tensoriais

de n̂2 ; exclusivamente por n̂2 e λ, onde os versores n̂1 e n̂2 formam o


ângulo θ entre si. Então
A = A(λ, n̂1 ) = ±1, B = B(λ, n̂2 ) = ±1 (10.151)
Probabilidades do tipo A = A(λ, n̂1 , n̂2 ) e B = B(λ, n̂1 , n̂2 ) são ex-
cluídas. Essa é a condição de localidade. A distribuição normalizada de
probabilidades de variáveis ocultas depende exclusivamente de λ,
ρ = ρ(λ) (10.152)
e possibilidades do ρ = ρ(λ, n̂1 , n̂2 ) são excluídas. A partir destes pres-
supostos o valor esperado do produto dos resultados A e B será dado
por Z
E ρ (n̂1 , n̂2 ) = A(λ, n̂1 )B(λ, n̂2 ) dρ (10.153)
Λ
onde Λ é o espaço dos estados completos λ.
Visto que o argumento de EPR partiu da premissa de correlações
perfeitas que se observam na mecânica quântica (proposição 1), é essen-
cial que o valor esperado da equação (10.153) concorde com o valor da
equação (10.150) quando n̂1 = n̂2 = n̂:
E ρ (n̂, n̂) = E ψ (n̂, n̂) (10.154)
o que constitui um vínculo muito forte. Uma vez que o menor valor do
produto de A(λ, n̂)B(λ, n̂) é -1 (o único outro valor possível é +1), a
equação (10.154) apenas é satisfeita para um conjunto de valores de λ
para os quais A(λ, n̂) = −B(λ, n̂) tem probabilidade de medida +1, ou,
segundo a notação introduzida acima, a menos que ρ(λ) seja igual a 1
para cada n̂. Sendo A(λ, n̂1 )B(λ, n̂2 ) = −1 apenas quando n̂1 = n̂2 =
n̂ e teremos que A(λ, n̂) = −B(λ, n̂) onde
Z
ρ
E (n̂1 , n̂2 ) = − A(λ, n̂1 )A(λ, n̂2 ) dρ (10.155)
Λ

Escolhendo três direções arbitrárias â; b̂ e ĉ, podemos construir a


seguinte igualdade
Z h i
ρ ρ
E (â, b̂) − E (â, ĉ) = − A(λ, â)A(λ, b̂) − A(λ, â)A(λ, ĉ) dρ
Z hΛ ih i
= −A(λ, â)A(λ, b̂) 1 − A(λ, b̂)A(λ, ĉ) dρ
Λ
(10.156)

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10.10. Não-Localidade na Mecânica Quântica 395

Como para todos os λ, o produto −A(λ, â)B(λ, b̂) = +1 ou −1,


onde |A(λ, â)B(λ, b̂)| = 1, e 1 − A(λ, b̂)A(λ, ĉ) ≥ 0, temos com isso a
possibilidade de escrever
Z h i
ρ ρ
|E (â, b̂) − E (â, ĉ)| ≤ 1 − A(λ, b̂)A(λ, ĉ) dρ = 1 + E ρ (b̂, ĉ)
Λ
(10.157)
da qual obtemos a desigualdade de Bell:

|E ρ (â, b̂) − E ρ (â, ĉ)| − E ρ (b̂, ĉ) − 1 ≤ 0 (10.158)

Para mostrar a discordância entre essa desigualdade com os resultados


da mecânica quântica, expressos pela relação (10.150), obtemos, escol-
hendo para as direções de â; b̂ e de ĉ os ângulos azimutais de 0, π3 e 2π
3 ,
respectivamente, os seguintes resultados para o valor esperado (10.150):
1 1 1
E ψ (â, b̂) = − , E ψ (b̂, ĉ) = − , E ρ (â, ĉ) =
2 2 2
substituindo em (10.158), temos
1
|E ψ (â, b̂) − E ψ (â, ĉ)| − E ψ (b̂, ĉ) − 1 = ≤0 (10.159)
2
ou seja, em conflito com a desigualdade de Bell. Não existe escolha,
de acordo com as preposições, de 1 até 4, do argumento EPR, para os
λ, funções A e B, e para ρ que possam fornecer concordância com as
predições da mecânica quântica dada pela equação (10.150).
Experiências usando um par de fótons foram realizadas 30 , as quais
confirmam a validade da teoria quântica: “Temos de concluir que um
par de fótons entrelaçados é um objeto não separável; ou seja, é impos-
sível atribuir propriedades locais (realidade física local) a cada fóton.
Em certo sentido, ambos os fótons permanecem em contacto através do
espaço e do tempo. Convém que se diga, no entanto, que a não separabil-
idade, que é a base da teleportação quântica, não implica a possibilidade
prática de comunicação, a velocidade superior à da luz” 31 .
Para terminar, talvez seja oportuno citar Feynman em 1982 32 :“...
ainda não é óbvio, para mim, que não há um problema real (com a
30
A. Aspect, P. Grangier, and G. Roger, Physical Review Letters, 49, 91 (1982);
ibidem, 49, 1804 (1982).
31
A. Aspect, Nature, 398, 189 (1999).
32
R. Feynman, International Journal, of Theoretical Physics, 21, 467 (1982).

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396 Cap. 10 Rotações o Operadores Tensoriais

mecânica quântica). Não posso definir o problema, portanto suspeito


que não há problema, mas não estou seguro de que não há problema.
Por isso, gosto de investigar as coisas”.

10.11 Comentários
Para esse capítulo, recomenda-se ao leitor, uma leitura detalhada dos ex-
celentes trabalhos encontrados nos livros de Jun John Sakurai (1994) 33 ,
A. Messiah (1970) 34 e L. Landau (1989) 35 , o livro do Prof. Sakurai é
muito profundo e detalhado, enquanto o livro do Prof. Messiah tem um
trabalho rigoroso e profundo do ponto de vista do formalismo matemá-
tico da mecânica quântica, já o livro do Prof. Landau é uma clássico da
literatura, muito profundo e elegante.
Um trabalho clássico em teoria de grupo aplicado em mecânica
quântica poderá ser encontrado nos livros dos Profs. E. P. Wigner
(1931) 36 e M. E. Rose (1957) 37 . O livro de E. P. Wigner, tem seus
trabalhos originais e é referência em todos os bons livros de mecânica
quântica que desenvolve rotações e operações tensoriais.

33
J. J. Sakurai, Modern quantum mechanics, (1994).
34
A. Messiah, Quantum mechanics, (1970).
35
L. D. Landau and E. M. Lifshitz, Quantum mechanics, (1989).
36
E. P. Wigner, Gruppentheorie, (1931).
37
M. E. Rose, Elementary theory of angular momentum, (1957).

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Capítulo 11

Matriz Densidade

Até o momento consideramos apenas sistemas quânticos descritos por


apenas uma única função de onda ψ ou, de modo equivalente, por |ψi.
Os sistemas assim descritos estão em estados quânticos chamados de
estados puros. Por exemplo, um conjunto de spins em um estado puro
significa que todos os spins do conjunto estão no mesmo estado quântico
|ψi, com hψ|ψi = 1. Os estados puros são aqueles para os quais temos
o máximo de informação. Por outro lado, quando as informações que
temos sobre o sistema não são completos, eles são chamados estados
de mistura ou estados misturados. Os estados de mistura, de que
estamos tratando agora, não são perfeitamente determinados, i.e., eles
não são descritos por uma única função de onda ψ, mas por um conjunto
de funções de onda independentes ψ1 , ψ2 , ψ3 , · · · , etc., cada uma dessas
funções caracterizando um subconjunto do conjunto considerado.
Quando o nosso conhecimento sobre um sistema quântico não é
completo, usamos o conceito estatístico de probabilidade para obtermos
informações sobre o seu comportamento dinâmico. Por exemplo, con-
sideremos um conjunto de osciladores harmônicos em equilíbrio térmico
com um reservatório, a uma dada temperatura T . O¡espectro ¢ de ener-
1
gia desse conjunto de osciladores é dado por En = n + 2 ~ω, onde n
é um número inteiro, incluindo o zero. Nesse caso, temos que o número
médio hni de osciladores com energia En no estado |ni depende da tem-
peratura do reservatório em que eles se encontram. De fato, o caráter
estatístico dos estados de mistura aparece em dois níveis, a saber:

1. devido à interpretação estatística atribuída à própria função de


onda ψ;

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398 Cap. 11 Matriz Densidade

2. devido a nossa falta de conhecimento sobre o estado dinâmico do


sistema, que nos leva a calcular apenas valores médios para os
operadores das variáveis dinâmicos consideradas.

Exemplo: Devido o comportamento estatístico da mecânica quân-


tica, temos um sistema físico randônico. Se tomarmos nosso exemplo
usual, ou seja, o experimento de Stern-Gerlach, temos a orientação
da partícula de spin- 21 up ou down. Logo, o estado geral será

|αi = c+ |+i + c− |−i

Essa relação caracteriza um estado ket cujo spin está apontado para
alguma direção definida. No caso de uma direção n̂, que tem ângulos
polar e azimutal, β e α, respectivamente, temos
³ ´
c+ cos β2
= ³ ´
c− ei α sen β2

ver (10.51) e sua equação final dada por

β β
|+iu = cos |+i + sen ei α |−i
2 2
Vamos agora introduzir o conceito de população fracionária, ou
peso de probabilidade. Em nosso exemplo realizado no experimento
de Stern-Gerlach, temos 50% de spin up |+i e 50% de spin down
|−i. Então dizemos que temos um conjunto, ensemble completamente
randônico,
w+ = 0, 5 w− = 0, 5
onde w+ e w− são os pesos para para spin up e spin down, respecti-
vamente.
Pra um ensemble completamente randônico, o feixe de partículas
se diz não-polarizado, pois não há uma direção de spin que seja priv-
ilegiada. Quando temos um ensemble puro, o feixe se diz polarizado,
um exemplo e quando bloqueamos o feixe |−i do experimento de Stern-
Gerlach e temos somente o feixe |+i. Ainda podemos ter um ensemble
misto, quando por exemplo existe uma mistura de 70% de spin up
|+i e 30% de spin down |−i, nesse caso também se diz que o feixe é
parcialmente polarizado.

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11.1. Operador Matriz Densidade 399

11.1 Operador Matriz Densidade


Formalismo inicialmente realizado por von Neumann 1 em 1927 2 ., para
descrever sistema misto. Esse trabalho também foi realizado indepen-
dentemente por Landau 3 e Bloch 4 . Aqui nossa discussão não estará
restrita somente ao sistema de partículas de spin- 12 , mas sempre que
usarmos uma ilustração, por conveniência retornaremos ao sistema de
spin- 21 .
Vamos supor que o nosso conhecimento sobre um sistema dinâmico
não seja completo. Inicialmente, iremos considerar que nosso sistema
consiste de um conjunto, ensemble, de N subsistemas designados por
{αi }, i = 1, 2, 3, · · · , N . Vamos supor ainda que cada um desses subsis-
temas esteja em um estado puro, caracterizado por um estado quântico,
representado por |ψα i = |αi i, supostamente normalizados, mas não nec-
essariamente ortogonais. Uma observável representada pelo operador A
pode ser bem definida para cada um dos subsistemas considerados, tal
que A|αi i = Aα |αi i. Sendo assim, o valor médio dessa variável, cal-
culada sobre todo o conjunto de subsistemas, irá depender do peso
estatístico de cada um desses subsistemas, que naturalmente depende
da natureza física do sistema. Com isso, o valor esperado de A, calcu-
lando por meio do valor médio do ensemble, ensemble average, será
definido por
X
[A] = wi hαi |A|αi i . (11.1)
i

Nesse ponto, consideremos um conjunto completo de vetores de base


{ϕn }, ortogonalizados, i.e., hϕm |ϕn i = δmn , e pertencente a um con-
junto completo de operadores que se comutam.
Iremos supor que o estado ket de um dado subsistema |αi i seja
expresso em termos dos kets de base |ϕn i, de tal forma que
X
|αi i = an (t)|ϕn i (11.2)
n

1
John von Neumann (Neumann János Lajos) (1903–1957), matemático
húngaro-americano.
2
J. von Neumann, Gött. Nachr., (1927)
3
Lev Davidovich Landau (1908–1968), físico russo-soviético.
4
Mencionado na literatura pelo próprio Landau em L. D. Landau, Zeits. für Physik,
45, (1927).

Mecânica Quântica

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400 Cap. 11 Matriz Densidade

Para estados |αi , normalizados à unidade, teremos


X
|an (t)|2 = 1 (11.3)
n

Além disso, visto que {ϕn } obedecem a relação de completeza, pode-


mos escrever X
|ϕn ihϕn | = 1 (11.4)
n

Multiplicando a relação (11.2) por hϕm |, obteremos o coeficiente am (t),


X
hϕm |αi i = an (t)hϕm |ϕn i = am (t) . (11.5)
n

No proximo desenvolvimento que estaremos apresentando, duas situ-


ações poderão ser consideradas:

1. Todos os sistemas do conjunto estão no mesmo estado |αi i;

2. Os subsistemas do conjunto são descritos por auto-estados difer-


entes.

No primeiro caso considerado, num instante t, o valor esperado de


uma observável A, será expresso por
X
hAi = hαi |A|αi i = an (t)a∗m (t)hϕm |A|ϕn i (11.6)
m,n

Usando a expressão (11.5), a relação acima poderá ser escrita como


X
hAi = hϕn |αi ihαi |ϕm ihϕm |A|ϕn i (11.7)
m,n

Comparando as duas últimas relações, teremos

an (t)a∗m (t) = hϕn |αi ihαi |ϕm i (11.8)

Nesse pondo, iremos introduzir o operador densidade ρ, definido por


X
ρ = |αi ihαi | = an (t)a∗m (t)|ϕn ihϕm | (11.9)
m,n

Assim definido, ρ é o operador densidade para um conjunto de estados


puros. De acordo com a equação (11.8), o operador densidade pode ser

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11.1. Operador Matriz Densidade 401

descrito na base |ϕn i por uma matriz, chamada matriz densidade,


com seus elementos de matriz representado por
ρnm = hϕn |ρ|ϕm i . (11.10)
No segundo caso considerado, nosso conhecimento sobre os estados
quânticos não é completo, logo podemos apenas indicar uma probabili-
dade wi de que o sistema possa ser encontrado em um dos subsistemas
do conjunto, descrito pelo ket |αi i. Então, o valor da observável A pas-
sará a se expresso por uma média estatística realizada sobre todo os
conjunto, e será escrita na forma
XX
[A] = wi an (t)a∗m (t) hϕm |A|ϕn i
i m,n
X
= an (t)a∗m (t) hϕm |A|ϕn i (11.11)
m,n

e o operador densidade ρ passará a ser definido por


X XX
ρ= wi |αi ihαi | = wi a(i) (i)∗
n (t)am (t) |ϕn ihϕm |
i i m,n
X
= an (t)a∗m (t) |ϕn ihϕm | . (11.12)
m,n

No tratamento que se segue, não usaremos a barra sobre o produto


an (t)a∗m (t) para indicar a média estatística, claro que quando isso não
acarretar nenhuma possibilidade de confusão, caso contrário usaremos
novamente a barra. O uso do símbolo ρ vai indicar automaticamente
que uma média estatística é realizada sobre o conjunto de sistemas.
Usando (11.12) na equação (11.11) teremos
X X
[A] = hϕn |ρ|ϕm ihϕm |A|ϕn i = hϕn |ρA|ϕn i
m,n n

[A] = tr(ρA) = tr(Aρ) (11.13)


em que tr significa o traço da matriz, já definido anteriormente.
Propriedades da Matriz Densidade: As propriedades básicas da
matriz densidade podem ser obtidas das relações (11.12) e (11.13).
Vejamos, para uma primeira propriedade, vamos tomar A, da úl-
tima relação, como operador unidade I, e teremos
X
tr(ρ) = hϕn |ρ|ϕn i = 1 (11.14)
n

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402 Cap. 11 Matriz Densidade

Prova. Vamos fazer esse demonstração com o seguinte argumento


X
tr(ρ) = hϕk |ρ|ϕk i
k
N
XXX
= wi an (t)a∗m (t) hϕk |ϕn ihϕm |ϕk i
k m,n i=1
N
XX N
X
= wi |ak (t)|2 = wi = 1 (11.15)
k i=1 i=1

P P
Visto que k |ak (t)|2 = 1, o resultado N i=1 wi = 1 é uma conse-
qüência direta de tr(ρ) = 1 e vice-versa. Por definição, temos que os
pesos estatísticos wi são quantidades reais e positivas, i.e.,

wi∗ = wi e wi ≥ 0

Uma segunda propriedade nos dá que

tr(ρ)2 ≤ 1 (11.16)

Prova. Começaremos a demonstração. Para os elementos diagonais da


matriz densidade, teremos

ρkk = hαk |ρ|αk i


X X
= wi an (t)a∗m (t) hαk |αn ihαm |αk i
i m,n
X X
= wi an (t)a∗m (t) δkn δmk
i m,n
X
= wi |ak (t)|2 (11.17)
i
P
Visto que i wi = 1 e |ak (t)|2 ≥ 0, concluímos que

ρkk ≥ 0 (11.18)

Tendo em vista que tr(ρ) = 1 e ρkk ≥ 0, podemos concluir que os


elementos diagonais da matriz densidade ρ satisfazem a condição

0 ≤ ρkk ≤ 1 (11.19)

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11.1. Operador Matriz Densidade 403

Considerando uma dada representação {k}, completa e ortogonal, na


qual a matriz densidade ρ é diagonal, faremos

ρkl = ρkk δkl

e, com isso, podemos escrever


XX XX
tr(ρ)2 = ρkl ρlk δkl = ρ2kk δkl δlk
k l k l
à !2
X X
= ρ2kk ≤ ρkk
k k
= (tr(ρ))2 = 1

do qual obteremos
tr(ρ)2 ≤ 1

Como foi definido, a terceira propriedade é que o operador densi-


dade é hermitiano, i.e.,
ÃN !† N
X X

ρ = wi |αi ihαi | = wi |αi ihαi | = ρ (11.20)
i=1 i=1

Estados Puros: Vamos voltar nossa atenção a equação (11.12) que


define o operador densidade para um estado misto, ou estado de mis-
tura. Vamos considerar um estado puro designado por |ki, temos que

wi = δki (11.21)

e o operador densidade ρ será dado por


X X
ρ= wi |αi ihαi | = δki |αi ihαi | = |kihk| (11.22)
i i

que é o operador de projeção para o estado |ki. Para esse estado puro,
teremos

hAi = tr(ρA) = tr(|kihk|A)


X
= hk 0 ||kihk|A|k 0 i = hk|A|ki (11.23)
k0

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404 Cap. 11 Matriz Densidade

que é a definição do valor esperado de uma observável associado à um


operador genérico, como era de se imaginar.
Consideremos |ψi, um estado puro que podemos escrever como sendo
a combinação linear de estados de base |ϕn i,
X
|ψi = an |ϕn i (11.24)
n

Nesse caso, a matriz densidade será


XX
ρ = |ψihψ| = an a∗m |ϕn ihϕm |
m n
X X
2
= |an | |ϕn ihϕn | + an a∗m |ϕn ihϕm | (11.25)
n m6=n

Note que na relação acima, o primeiro termo é quando temos m = n e


o segundo termo e quando temos m 6= n. No primeiro termo, teremos
X X
|an |2 |ϕn ihϕn | = |an |2 ρn (11.26)
n n

em uma soma de estados incoerentes puros |ϕn i é multiplicada pela


matriz densidade ρn . Esse termo não apresenta o fenômeno de inter-
ferência entre os estados considerados. O segundo termo da expressão
(11.25) é responsável pela interferência entre os estados |ϕm i e |ϕn i. Na
superposição de estados incoerentes, as fases dos coeficientes an (t) são
completamente aleatórias e o produto an a∗m = 0 para m 6= n, fazendo
com que não haja interferência construtiva entre os dois estados consid-
erados. Nesse caso, o valor médio estatístico [A] do operador A torna-se
igual ao valor esperado para um sistema quântico hAi.

11.2 Matriz Densidade - Sistemas de spin- 12


Inicialmente faremos um estudo generalizado para um feixe de partícu-
las de spin- 12 , e então iremos particularizar em alguns exemplos. Aqui,
levaremos em consideração os autovalores de spin, que são discretos,
visto que ms = ± 12 , com isso poderemos desprezar os autovalores do
momentum linear ~p e da energia E, o que simplifica nosso estudo. Us-

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11.2. Matriz Densidade - Sistemas de spin- 12 405

ando como base {|±i}, teremos


µ ¶
1 1
|+i = para ms = (11.27a)
0 2
µ ¶
0 1
|−i = para ms = − (11.27b)
1 2

O estado puro mais geral que podemos construir nesse espaço e uma
combinação linear desses dois kets. Assim, escreveremos
µ ¶
a1
|χi = a1 |+i + a2 |−i = (11.28)
a2

sendo a1 e a2 quantidades complexas. A condição de normalização do


ket |χi requer que
|a1 |2 + |a2 |2 = 1 (11.29)
Com o estado ket assim representado, o operador densidade ρ será dado
por µ ¶ µ ∗ ¶
a1 ¡ ∗ ∗ ¢ a1 a1 a1 a∗2
ρ = |χihχ| = a1 a2 = . (11.30)
a2 a2 a∗1 a2 a∗2
Dada a relação acima, poderemos fazer uma análise da matriz den-
sidade ρ para diferentes situações:
Exemplo 1: Estudo de um feixe completamente polarizado com
Sz +. µ ¶ µ ¶
1 ¡ ¢ 1 0
ρ = |+ih+| = 1 0 = (11.31)
0 0 0
Note que nesse caso, usamos a1 = 1 e a2 = 0. Ao contrário, o estudo de
um feixe completamente polarizado com Sz −.
µ ¶ µ ¶
0 ¡ ¢ 0 0
ρ = |−ih−| = 0 1 = (11.32)
1 0 1

Note que nesse caso, usamos a1 = 0 e a2 = 1.


Exemplo 2: Estudo de um feixe formado por 50% up Sz + e 50%
down Sz −.
1 
µ ¶ µ ¶ 0
1 1 2
ρ= |+ih+| + |−ih−| =   (11.33)
2 2 1
0 2

Mecânica Quântica

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406 Cap. 11 Matriz Densidade

no qual é justamente a matriz identidade dividida pelo fator 2.


Exemplo 3: Estudo de um feixe completamente polarizado com
Sx ±. Nesse caso, o feixe q
de partículas foi preparado de tal forma que
1
podemos fazer a1 = a2 = 2 e o estado ket |±ix será dado por

1
|±ix = √ (|+i ± |−i)
2
Logo, a matriz densidade desse caso será
 1

± 12
1 1 . 2
ρ = |±ix x h±| = √ (|+i ± |−i) √ (h+| ± h−|) =  
2 2 ±1 1
2 2
(11.34)
Ainda nesse exemplo, se tivermos um conjunto de mistura incoerente
como um feixe formado por 50% up Sx + e 50% down Sx −. Então, a
matriz densidade será dada por
1 1  1  1 
− 12 2 0
1 2 2 1  2 = 
ρ= + (11.35)
2 1 1 2 1 1 1
2 2 − 2 2 0 2

Assim, teremos
tr(ρSx ) = tr(ρSy ) = tr(ρSz ) = 0 (11.36)
o que nos leva h i
~S = 0 (11.37)
Isso é perfeitamente razoável já que temos um feixe completamente
aleatório de partículas de spin- 12 , ou seja, não existe uma direção priv-
ilegiada para o spin.
Última Observação: Podemos ainda considerar que o feixe de
partículas de spin- 12 tenha sido preparado de tal forma que teremos
N+ partículas em um estado puro |χ+ i e N− partículas em um estado
puro |χ− i. Com essas condições, os pesos estatísticos wi serão dados
por
N+ N−
w+ = e w− = (11.38)
N+ + N− N+ + N−
Assim, o operador densidade será dado por
ρ = w+ |χ+ ihχ+ | + w− |χ− ihχ− | (11.39)

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11.3. Evolução Temporal de um Sistema 407

com os kets |χ+ i e |χ− i, podendo ser expressos como uma combinação
linear dos kets de base {|±i},

(±) (±)
|χ± i = a1 |+i + a2 |−i (11.40)

Então, a matriz densidade ρ poderá ser escrita na forma


 
w+ |a+ 2 − 2
1 | + w− |a1 | w+ a+ +∗ − −∗
1 a2 + w− a1 a2
ρ=  (11.41)
w+ a+ +∗
2 a1 + w− a− −∗
2 a1 w+ |a+
2|
2 + w− |a−
2|
2

Fazendo a+ − − +
1 = a2 = 1 e a1 = a2 = 0, a matriz densidade tomará a
forma  N 
µ ¶ +
0
w+ 0  N+ +N− 
ρ= =  (11.42)
0 w− N−
0 N+ +N−

Podemos observar que as relações (11.31) e (11.32) são casos particulares


da equação acima, i.e., quando temos N+ = 1, N− = 0 para spin
up e N− = 1, N+ = 0 para spin down, respectivamente. Visto que
w+ + w− = 1, a matriz densidade da relação (11.42) poderá ser escrita
na forma µ ¶
w+ 0
ρ= (11.43)
0 1 − w+

O estado vetor puro dado em (11.28) contém as mesmas informações


que a matriz densidade ρ dada na relação (11.30). Por outro lado, a
matriz densidade em (11.30) não é a mesma que aquelas representadas
por (11.42) ou (11.43), para o caso de w± 6= 0, 1. O significado disso
é que a matriz densidade, dada em (11.41), não pode ser descrita em
termos de um único estado puro |χi, mas por uma superposição de
estados puros.

11.3 Evolução Temporal de um Sistema


A evolução temporal de um estado ket, |ψ(t)i é dada pela equação de
Schrödinger
d
i ~ |ψ(t)i = H|ψ(t)i (11.44)
dt

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408 Cap. 11 Matriz Densidade

P
Usando |ψ(t)i = n an (t)|ϕn i, teremos
X d X
i~ an (t)|ϕn i = an (t)H|ϕn i (11.45)
n
dt n

Multiplicando por hϕk | e levando em consideração a ortogonalidade,


encontraremos
d 1 X
ak (t) = an (t)hϕk |H|ϕn i (11.46)
dt i~ n

Em seguida, usaremos a equação acima para encontrar uma equação


diferencial para a matriz densidade. Calculando a taxa de variação para
hϕk |ρ(t)|ϕn i, teremos
d d
hϕk |ρ(t)|ϕn i = [ak (t)a∗n (t)]
dt dt
da∗ (t) dak (t) ∗
= ak (t) n + an (t) (11.47)
dt dt
Da relação (11.46), temos
d ∗ 1 X ∗
an (t) = − a (t)hϕm |H|ϕn i
dt i~ m m
e
d 1 X
ak (t) = am (t)hϕk |H|ϕm i
dt i~ m
Substituindo as duas relações acima na equação (11.47), encontraremos
d 1 X
hϕk |ρ(t)|ϕn i = [hϕk |H|ϕm iam (t)a∗n (t) − ak (t)a∗m (t)hϕm |H|ϕn i]
dt i~ m
(11.48)
Usando a definição da matriz densidade dada por (11.10), encontraremos
d 1 X
hϕk |ρ(t)|ϕn i = [hϕk |H|ϕm ihϕm |ρ(t)|ϕn i
dt i~ m
− hϕk |ρ(t)|ϕm ihϕm |H|ϕn i]
1
= hϕk |Hρ(t) − ρ(t)H|ϕn i
i~
i
= hϕk |[ρ(t), H]|ϕn i (11.49)
~

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11.4. Sistemas de dois níveis 409

o que obteremos o seguinte resultado:


d i
ρ(t) = [ρ(t), H] (11.50)
dt ~
Essa é a equação diferencial de Liouville-von Neumann, que é de
fundamental importância em cálculos de sistemas quânticos dinâmicos.
Sabemos que, quando a hamiltoniana do sistema é independente do
tempo,
H|ϕn i = En |ϕn i
fazendo uso da relação acima, a solução da equação diferencial (11.50)
poderá ser encontrada,
d i
hϕk |ρ(t)|ϕn i = [hϕk |ρ(t)H|ϕn i − hϕk |Hρ(t)|ϕn i]
dt ~
i
= [En hϕk |ρ(t)|ϕn i − Ek hϕk |ρ(t)|ϕn i]
~
i
= (En − Ek )hϕk |ρ(t)|ϕn i (11.51)
~
Essa é uma equação diferencial de solução simples, expressa por
i
hϕk |ρ(t)|ϕn i = e ~ (En −Ek )t hϕk |ρ(0)|ϕn i (11.52)

Desse modo, o elemento de matriz dependente do tempo hϕk |ρ(t)|ϕn i


fica expresso em termos de um elemento de matriz densidade no tempo
t = 0. Em situações em que a hamiltoniana é independente do tempo,
temos
i i
ρ(t) = e− ~ Ht ρ(0) e ~ Ht (11.53)
É fácil verificar que (11.53) é solução de (11.50), para isso devemos
i
expandir em série o operador e ~ Ht da expressão (11.53) e substituir o
resultado na expressão (11.50).

11.4 Sistemas de dois níveis


Embora os sistemas da natureza tenham, em geral, um grande número
de níveis, existe situações em que apenas dois deles são relevantes. Um
exemplo importante é esse: uma onda eletromagnética, monocromática,
de freqüência ω + ², com ω² ¿ 1, incide sobre um átomo, de infinitos
níveis de energia, que tem, entre eles, dois níveis de energias tais que

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410 Cap. 11 Matriz Densidade

E1 − E2 = ~ω. A freqüência da onda é muito próxima da diferença de


níveis dividida por ~. Nesse caso, apenas os níveis E1 e E2 participam
do processo, sendo, os outros, espectadores, que podem, para esse fim
específico, ser ignorados.
Nessa seção vamos estudar sistemas idealizados que têm somente
dois níveis de energia. Supondo que esses níveis não sejam degenerados,
conclui-se que todo conjunto completo e linearmente independente de
vetores de estado desse sistema possui apenas dois elementos: o conjunto
de todos os estados forma, com as operações usuais de adição e mul-
tiplicação por um número complexo, um espaço vetorial complexo de
dimensão 2, e a hamiltoniana, bem como todos os operadores lineares,
podem ser representados por matrizes complexas 2 × 2.
A equação de Schrödinger é dada por
∂χ(t)
= Hχ(t)
i~ (11.54)
∂t
e, supondo que a hamiltoniana não dependa explicitamente do tempo,
pode-se integrar formalmente, obtendo
i
χ(t) = e− ~ Ht χ(0) (11.55)
Por causa da simplicidade do sistema, é possível escrever explicitamente
i
o operador e− ~ Ht . Os auto-estados da energia, |E1 i e |E2 i satisfazem
as equações
H|E1 i = E1 |E1 i (11.56)
e
H|E2 i = E2 |E2 i (11.57)
e todo estado χ pode ser expandido em termos deles 5:

χ(t) = |χ(t)i = (|E1 ihE1 | + |E2 ihE2 |) |χ(t)i


= hE1 |χ(t)i|E1 i + hE2 |χ(t)i|E2 i
= c1 (t)|E1 i + c2 (t)|E2 i (11.58)
Podemos definir uma função de uma variável complexa como uma função
f (H) da hamiltoniana da seguinte forma:
f (H)|χ(t)i = c1 (t)f (H)|E1 i + c2 (t)f (H)|E2 i
= c1 (t)f (E1 )|E1 i + c2 (t)f (E2 )|E2 i (11.59)
5
Como é usual entre os físicos, estaremos, indiferentemente, denotando o estado
por χ ou |χi. Em geral usaremos essa última forma quando queremos fazer uso de
alguma das característica da genial notação de Dirac.

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11.4. Sistemas de dois níveis 411

Usando-se essa operação mostra-se facilmente que


E2 I − H E1 I − H
f (H) = f (E1 ) + f (E2 ) (11.60)
E2 − E1 E1 − E2
que, usada para o operador de evolução temporal, dará:
i 1 ³ i i
´
e− ~ Ht = E2 e− ~ E1 t − E1 e− ~ E2 t
E2 − E1
H ³ i i
´
+ e− ~ E2 t − e− ~ E1 t (11.61)
E2 − E1
Tendo esse resultado, podemos formular a seguinte pergunta: supon-
hamos que o sistema se encontre, em t = 0, em um estado |χ(0)i. Qual
será a probabilidade para, decorridos t segundos, ele permanecer no
mesmo estado?
Se, em t = 0, temos o estado dado por χ(0), no instante t posterior,
teremos
i
χ(t) = e− ~ Ht χ(0) (11.62)
e usando a expressão acima na relação (11.61)
χ(0) ³ i i
´
χ(t) = E2 e− ~ E1 t − E1 e− ~ E2 t
E2 − E1
Hχ(0) ³ − i E2 t i
´
+ e ~ − e− ~ E1 t (11.63)
E2 − E1
mas se,
χ(0) = c1 |E1 i + c2 |E2 i (11.64)
então
c1 |E1 i + c2 |E2 i ³ i i
´
χ(t) = E2 e− ~ E1 t − E1 e− ~ E2 t
E2 − E1
c1 E1 |E1 i + c2 E2 |E2 i ³ − i E2 t i
´
+ e ~ − e− ~ E1 t (11.65)
E2 − E1
A probabilidade de o sistema, em t, estar no mesmo estado, será obtida
da seguinte forma: existe uma base do espaço dos estados formada por
|χ(0)i e outros estados, ortogonais a ele. Expandimos |χ(t)i nessa base:

|χ(t)i = a(t)|χ(0)i + · · · (11.66)

Sabemos que a probabilidade é dada por |a(t)|2 . Temos que

hχ(0)|χ(t)i = a(t)hχ(0)|χ(0)i = a(t) (11.67)

Mecânica Quântica

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412 Cap. 11 Matriz Densidade

Então, a probabilidade será |a(t)|2 = |hχ(0)|χ(t)i|2 . Nosso próximo


passo será calcular a amplitude de probabilidade hχ(0)|χ(t)i. Assim,
teremos
1 ³ i i
´
hχ(0)|χ(t)i = E2 e− ~ E1 t − E1 e− ~ E2 t
E2 − E1
hχ(0)|H|χ(0)i ³ − i E2 t i
´
+ e ~ − e− ~ E1 t (11.68)
E2 − E1
ou
1 ³ i i
´
hχ(0)|χ(t)i = E2 e− ~ E1 t − E1 e− ~ E2 t
E2 − E1
|c1 |2 E1 + |c2 |2 E2 ³ − i E2 t i
´
+ e ~ − e− ~ E1 t (11.69)
E2 − E1
Suponhamos que |C1 |2 = 1 e |C2 |2 = 0. Então, após uma álgebra sim-
ples,
i
hχ(0)|χ(t)i = e− ~ E1 t (11.70)
logo,
|hχ(0)|χ(t)i|2 = 1 (11.71)
ou seja, um sistema que está num estado estacionário permanece nele,
daí se chamar estacionário!
É fácil mostrar que os estados estacionários são os únicos que pos-
suem essa propriedade. De fato, se
i
|χ(t)i = e− ~ Ht |χ(0)i (11.72)
|χ(0)i = c1 |E1 i + c2 |E2 i (11.73)
− ~i E1 t − ~i E2 t
|χ(t)i = c1 e |E1 i + c2 e |E2 i (11.74)
2 − ~i E1 t 2 − ~i E2 t
hχ(0)|χ(t)i = |c1 | e + |c2 | e (11.75)
1
|hχ(0)|χ(t)i|2 = |c1 |4 + |c2 |2 + 2|c1 |2 |c2 |2 cos (E1 − E2 )t (11.76)
~
Para que |hχ(0)|χ(t)i|2 = 1 para todo t, temos que ter ou c1 = 0 ou
c2 = 0. Em qualquer dos casos o outro coeficiente será de módulo igual
à 1, pois |c1 |2 + |c2 |2 = 1. Logo, |χ(0)i = |E1 i ou |χ(0)i = |E2 i.
Tomaremos agora uma base arbitrária do espaço dos estados, for-
mada por |φ1 i e |φ2 i. Então o estado |χ(t)i será expandido, nesta base,
como
|χ(t)i = (|φ1 ihφ1 | + |φ2 ihφ2 |)|χ(t)i = hφ1 |χ(t)i|φ1 i + hφ2 |χ(t)i|φ2 i
(11.77)

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11.4. Sistemas de dois níveis 413

Introduzindo a notação
χi (t) ≡ hφi |χ(t)i
teremos
|χ(t)i = χ1 (t)|φ1 i + χ2 (t)|φ2 i (11.78)
A equação de Schrödinger será

i~ |χ(t)i = H|χ(t)i = χ1 (t)H|φ1 i + χ2 (t)H|φ2 i (11.79)
∂t
e, tomando os produtos escalares com |φi i,

i~ hφ1 |χ(t)i = χ1 (t)hφ1 |H|φ1 i + χ2 (t)hφ1 |H|φ2 i (11.80)
∂t

i ~ hφ2 |χ(t)i = χ1 (t)hφ2 |H|φ1 i + χ2 (t)hφ2 |H|φ2 i (11.81)
∂t
Usando Hij = hφi |H|φj i, teremos
∂χ1
i~= H11 χ1 + H12 χ2 (11.82)
∂t
∂χ2
i~ = H21 χ1 + H22 χ2 (11.83)
∂t
Para estados estacionários, H12 = H21 = 0. Logo, os elementos de
matriz H21 e H12 são os que promovem as transições entre os estados.
De fato, seja |φ1 i um dos estados da base.
i
|φ1 (t)i = e− ~ Ht |φ1 i
|φ1 i ³ i i
´
= E2 e− ~ E1 t − E1 e− ~ E2 t
E2 − E1
H|φ1 i ³ − i E2 t i
´
+ e ~ − e− ~ E1 t (11.84)
E2 − E1
Então calculando a probabilidade de que, em algum t, o sistema se
encontre em |φ2 i, teremos essa amplitude dada por
H21 ³ − i E2 t i
´
hφ2 |φ1 (t)i = e ~ − e− ~ E1 t (11.85)
E2 − E1
Claro que se H21 = 0 não haverá transição de estado. A probabilidade
obtida na expressão (11.85) claramente exibe um termo de interferência
em adição a soma das duas exponenciais. Tal decaimento não exponen-
cial tem sido observado em espectroscopia atômica e no estudo dos
mésons K neutro, K 0 .

Mecânica Quântica

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414 Cap. 11 Matriz Densidade

11.5 Polarização
Na discussão do sistema de dois níveis, caracterizamos os estados em
termos das componentes de dois spinores. Nessa seção iremos considerar
alguns outros métodos para especificar um estado. Vamos considerar o
spinor, com γ1 , γ2 reais:
µ ¶ µ ¶
a1 |a1 |ei γ1
|χi = = (11.86)
a2 |a2 |ei γ1

sendo a1 e a2 quantidades complexas, que caracterizam um particular


estado. Entretanto mesmo estado físico pode ser descrito por diferentes
spinores. Se a condição de normalização do spinor |χi seja obedecida

|a1 |2 + |a2 |2 = 1 (11.87)

podemos afirmar com certeza que |χi e ei α |χi, com α real e arbitrário,
representam o mesmo estado.
Assim usando a forma elegante de representar um estado ket, temos
operador densidade ρ dado por
µ ¶
|a1 |2 a1 a∗2
ρ= . (11.88)
a2 a∗1 |a2 |2

Como uma matriz hermitiana 2 × 2, o operador densidade ρ poderá


ser expandido em termos das matrizes de Pauli σx , σy e σz e da matriz
identidade I, sistema de spin- 21 . Então poderemos escrever ρ como

1 ~  ~σ )
ρ = (I + P (11.89)
2
onde Px , Py e Pz são três números reais dados por

Px = 2 <(a∗1 a2 )
Py = 2 =(a∗1 a2 ) (11.90)
Pz = |a1 |2 − |a2 |2

e tendo comprimento unitário, i.e., P~ P~ = P ~ 2 = 1. Ainda podemos


escrever que
P~ = [~σ ] = tr(ρ~σ ) = tr(~σ ρ) (11.91)
~ atua como um vetor sob rotações.
provando que P

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11.6. Precessão do Vetor Polarização 415

Sabemos que
ρ|χi = |χi
e pela equação (11.89), podemos afirmar que o spinor é um auto-spinor
da matriz P~  ~σ :
P~  ~σ |χi = |χi (11.92)
Com isso, o vetor unitário P~ é dito legitimamente como o vetor apon-
~ é conhecido como vetor
tado na direção do spin da partícula. O vetor P
polarização do estado.

11.6 Precessão do Vetor Polarização


Das relações
hAi = tr(ρA) = tr(Aρ)
e

i~ = Hρ − ρH
dt
a equação de movimento para qualquer valor esperado hAi pode ser
derivado de
µ ¶ µ ¶
dhAi dρ ∂A
i~ = i ~ tr A + i ~ tr ρ
dt dt ∂t
¿ À
∂A
= tr [(Hρ − ρH)A] + i ~
∂t
¿ À
∂A
= tr [ρ(AH − HA)] + i ~
∂t
¿ À
∂A
= hAH − HAi + i ~ (11.93)
∂t
Agora vamos derivar a equação de movimento o vetor polarização
~
P = h~σ i. Para obtermos uma fórmula simples é conveniente representar
o operador hamiltoniano H como
1³ ~  ~σ
´
H= A0 I + A (11.94)
2
em que A0 e as componente de A ~ são quantidades reais e ~σ formam as
matrizes de Pauli. Usando as equações (11.93) e (11.94) com a relação

~σ × ~σ = 2 i ~σ

Mecânica Quântica

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416 Cap. 11 Matriz Densidade

teremos
~
dP dh~σ i 1 1
= = h~σ H − H~σ i = ~  ~σ − A
h~σ A ~  ~σ~σ i
dt dt i~ 2i~
1 ~ 1~
= hA × (~σ × ~σ )i = A × h~σ i (11.95)
2i~ ~
ou
dP~
~ =A~ ×P~ (11.96)
dt
Essa equação e de tal forma como a simples equação de movimento da
mecânica clássica para o pião girando. Desde que

~2
dP ~  P)
d(P ~ ~ ³ ´
= ~  dP = 2 P
= 2P ~ A~ ×P
~ =0 (11.97)
dt dt dt ~
~ permanece com seu comprimento constante. Isso é meramente
o vetor P
um modo alternativo de dizer que a normalização de |χi é conservada
~ é um vetor constante, da expressão (11.96)
durante o movimento. Se A
~
implica que P precessa ao redor de A ~ com uma velocidade angular
constante
~
A
ω
~A = . (11.98)
~
Exemplo: Se uma partícula de spin- 12 , em que podemos desprezar
os outros graus de liberdade exceto o spin, está na presença de um
campo magnético constante ~B, a hamiltoniana poderá ser escrita na
forma
~
H = −~µs  ~B = −γ ~σ  ~B
2
~ é dado por
A quantidade γ é a razão giromagnética, e o vetor A

~ = −~γ ~B
A

Assim, nesse caso, a relação (11.96) será

~
dP ~ × ~B
= γP (11.99)
dt
ou
dh~σ i
= γh~σ i × ~B (11.100)
dt

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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11.7. Polarização e Espalhamento 417

A equação acima é justamente a equação clássica de precessão, quando


temos um campo magnético constante ~B = B0 û que causa uma pre-
cessão de P~ com velocidade angular ω0 = −γB0 . Essa concordância
entre a equação de movimento quântico e clássico pode ser justificada
baseado no teorema de Ehrenfest 6 .

11.7 Polarização e Espalhamento


Quando desenvolvemos a teoria de espalhamento, não levamos em con-
sideração o spin da partícula. Entretanto, partículas incidentes com
spin- 21 são representados pela função de onda na seguinte forma,
µ ¶
i kz c1
i kz
e χinc = e , χ†inc χinc = 1 (11.101)
c2
No espalhamento, queremos olhar para as soluções assintóticas da equa-
ção de Schrödinger
ei kr
ei kz χinc + f (θ, ϕ) (11.102)
r
onde a amplitude de espalhamento f (θ, ϕ) é agora um spinor de duas
componentes.
Usando o princípio de superposição, podemos construir a solução
geral da equação (11.102) de duas soluções particulares, que são: χinc =
α que descreve o feixe incidente com polarização ao longo da direção
do momentum inicial e χinc = β que descreve o feixe incidente com
polarização oposta a direção do momentum inicial. A polarização é dita
longitudinal. Para as duas soluções da forma assintótica, teremos,
ei kr
ψ1 ∼ ei kz α + (S11 α + S21 β) (11.103a)
r
ei kr
ψ2 ∼ ei kz β + (S12 α + S22 β) (11.103b)
r
onde as quantidades entre parênteses formam a forma apropriada da
amplitude de espalhamento.
Multiplicando (11.103a) por c1 , (11.103b) por c2 , e adicionando as
duas equações, teremos a solução geral na forma
µ ¶ µ ¶µ ¶ µ ¶
i kz c1 ei kr S11 S12 c1 i kz ei kr
e + = e + S χinc (11.104)
c2 r S21 S22 c2 r
6
F. Bloch, Physical Review, 70, 460 (1946).

Mecânica Quântica

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418 Cap. 11 Matriz Densidade

Onde, aqui S representa a matriz de espalhamento 2 × 2


µ ¶
S11 S12
S= (11.105)
S21 S22

A matriz S depende de θ e ϕ e do momentum ~k. O problema de es-


palhamento será resolvido se a matriz S for determinada como função
dessas variáveis.
Vamos assumir uma simetria esférica para o potencial espalhador,
o operador hamiltoniano H é invariante sob rotações e comuta com as
componentes do momentum angular ~J. As ondas incidentes (11.103a)
e (11.103b) são auto-estados de Jz com autovalores + ~2 e − ~2 , respecti-
vamente. Logo, teremos
µ ¶
1 ∂ 1 ~
Jz ψ1 = ~ + σz ψ1 = + ψ1
i ∂ϕ 2 2
e µ ¶
1 ∂ 1 ~
Jz ψ2 = ~ + σz ψ2 = − ψ2
i ∂ϕ 2 2
e fica fácil verificar que S11 e S22 são funções somente de θ, e os ele-
mentos da diagonal da matriz têm a forma

S12 = e− i ϕ F (θ) e S21 = ei ϕ F (θ) (11.106)

onde F (θ) é uma função de θ. Além disso, o operador H é invariante


em relação a reflexão com respeito a qualquer plano de coordenada 7 .
Sem demonstração, o operador para reflexão no plano-yz é Px σx , onde
Px simplesmente altera x para −x, e σx tem o efeito

σx α = β, σx β = α .
i kr
Através dessa operação a onda incidente ei kz α muda para ei kz β e e r
é invariante. Em termos de coordenadas esféricas, Px tem o efeito de
transformar ϕ em π − ϕ. Assim,

S11 = S22 = g(θ) S21 (−ϕ, θ) = −S12 (ϕ, θ) = −e− i ϕ h(θ)


7
No próximo capítulo, estudaremos o operador de reflexão, operador paridade, em
detalhes.

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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11.7. Polarização e Espalhamento 419

Conseqüentemente,
µ ¶
g(θ) h(θ)e− i ϕ
S= = g(θ)I + i h(θ) (σy cos ϕ − σx sen ϕ)
−h(θ)ei ϕ g(θ)
(11.107)
o versor n̂(− sen ϕ, cos ϕ, 0) é normal ao plano de espalhamento. Logo,
a matriz de espalhamento terá a forma
S = g(θ)I + i h(θ)n̂  ~σ (11.108)
As funções g(θ) e h(θ) podem ser determinadas somente pela solução
da equação de Schrödinger.
Conhecida a matriz S, é fácil calcular a intensidade do feixe para
uma dada direção. Se a equação (11.104) é a forma assintótica da função
de onda, então por uma generalização, a seção de choque diferencial será
dada por

= (Sχinc )† Sχinc = χ†inc S † Sχinc (11.109)
dΩ
que é análoga à |f (θ)|2 para as partículas sem spin. Se a matriz densi-
dade ρinc descreve o estado de polarização do feixe incidente, a relação
acima poderá ser escrita na forma

= tr(ρinc S † S) (11.110)
dΩ
Usando (11.108) para a matriz de espalhamento e
1³ ~ 0  ~σ
´
ρinc = I +P
2
para a matriz densidade do feixe incidente, a seção de choque diferencial
será dada por
µ ¶
dσ ¡ 2 ¢ g ∗ h − gh∗ ~
= |g| + |h| 2
1+i 2 P0  n̂ (11.111)
dΩ |g| + |h|2
A relação acima mostra que a intensidade de espalhamento depende do
ângulo azimutal como
I = a(θ) + b(θ) cos ϕ
que está de acordo com a distribuição angular para o espalhamento
de partículas de spin- 12 . Desse modo, temos uma assimetria de mão-
direita/mão-esquerda no espalhamento de feixes polarizados como con-
seqüência direta do spin da partícula.

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420 Cap. 11 Matriz Densidade

11.8 Mecânica Estatística Quântica


Aqui faremos uma breve discussão da conexão entre o formalismo do
operador densidade e a mecânica estatística.
Consideremos um sistema com N constituintes independentes, cujas
observáveis são A1 , A2 , A3 , · · · , AN , sendo [Ai , Aj ] = 0. Podemos
escrever a matriz densidade como
X
ρ= |a01 · · · a0N iw(a01 · · · a0N )ha01 · · · a0N | (11.112)
a01 ···a0N

onde assumimos a independência estatística, i.e., assumimos que os sis-


temas separados são distinguíveis. Para sistemas de partículas idênticas,
necessitamos de considerações especiais, nesse momento não estudadas.
Voltando ao nosso caso, teremos

w(a01 · · · a0N ) = w1 (a01 )w2 (a02 ) · · · wN (a0N )

Por termos
|a01 · · · a0N i = |a01 i|a02 i · · · |a0N i
o operador densidade será
N
Y X
ρ= ρi com ρi = |a0i iwi (a0i )ha0i | (11.113)
i=1 a0i

Agora podemos definir um novo operador que seja multiplicativo


e aditivo, i.e., definimos ln ρ. Se tivermos um sistema termodinâmico
uniforme, isso implica uma proporcionalidade com o volume. Então,
considerando o valor médio de ln ρ → tr(ρ ln ρ), poderemos definir uma
quantidade chamada σ pela relação

σ = −tr(ρ ln ρ) (11.114)

Devemos estudar essa quantidade para uma melhor compreensão, se


usamos a base de que ρ é uma matriz diagonal
X diag
σ=− ρkk ln ρdiag
kk (11.115)
k

Devido ao fato de que cada elemento ρdiag


kk ser um número real entre 0 e
1, σ será necessariamente um positivo semi-definido. Para um sistema

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11.8. Mecânica Estatística Quântica 421

completamente randônico, teremos


N
X µ ¶
1 1
σ=− ln = ln N (11.116)
N N
k=1

Em contraste, se o sistema for completamente puro

σ=0 (11.117)

pois será usado o fato de que ρdiag diag


kk = 0 ou ln ρkk = 0 na expressão
(11.115). Com isso, podemos argumentar que fisicamente, σ pode rep-
resentar a medida de desordem. De um lado temos um sistema com-
pletamente puro, ou seja, todos os membros são caracterizados por um
mesmo estado quântico, aonde teremos uma ordem. Por outro lado,
para um sistema completamente aleatório, os estados quânticos de cada
membro são igualmente aleatórios, o que nos leva à uma desordem do
sistema.
Em termodinâmica, aprendemos que uma quantidade conhecida co-
mo entropia mede essa desordem. Assim, poderemos associar a quan-
tidade σ com a entropia, denotada por S, tal que

S = kσ (11.118)

onde k é uma constante universal identificada com a constante de


Boltzmann 8 . Em fato, estamos usando S como a definição de entropia
na mecânica estatística quântica,

S = −k tr(ρ ln ρ) (11.119)

que naturalmente, para um estado puro, onde somente um valor de


wi (a0i ) = 1 e os demais são nulos, teremos S = 0. Se 0 ≤ wi ≤ 1,
teremos S ≥ 0. Assim, em nosso estudo, devemos maximizar o valor de
σ (ou de S) sujeito ao vínculo que o conjunto médio da hamiltoniana
tenha um certo valor prescrito.
Em qualquer caso, quando um equilíbrio térmico é estabelecido,
esperamos que
∂ρ
=0 (11.120)
∂t
e como
∂ρ i
= [ρ, H]
∂t ~
8
Ludwig Boltzmann (1844–1906), físico austríaco.

Mecânica Quântica

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422 Cap. 11 Matriz Densidade

implica que ρ e H podem ser diagonalizáveis simultaneamente. Para


maximizar a entropia, requer que

δS = 0 (11.121)

Temos que ter em conta que maximizando S, esse estará sujeito à um


vínculo de que a média da hamiltoniana H do ensemble terá um certo
valor prescrito, pois estamos em equilíbrio térmico. Na mecânica es-
tatística, [H] é identificado com a energia interna por constituinte do
sistema, U :
[H] = tr(ρH) = U (11.122)
P
lembrando que k ρkk = 1, devido ao vínculo de normalização
X
δ [H] = δρkk Ek = 0 (11.123)
k

e X
δ(trρ) = δρkk = 0 (11.124)
k

Podemos prontamente introduzir os multiplicadores de Lagrange 9 , β e


γ. Teremos X
δρkk [(ln ρkk + 1) + βEk + γ] = 0 (11.125)
k
na qual uma variação arbitrária é possível somente se

ρkk = e(−βEk −γ−1) (11.126)

A
Pconstante γ poderá ser eliminada usando a condição de normalização
k ρkk = 1, e nosso resultado final será

e−βEk
ρkk = PN (11.127)
−βEl
l=1 e

a equação acima é conhecida na mecânica estatística como um ensem-


ble canônico. Para um sistema completamente aleatório e no limite de
alta temperatura, i.e., no limite β → 0,
1
ρkk = (11.128)
N
9
Para maiores detalhes dos multiplicadores de Lagrange, ver o livro do Gold-
stein, Classical mechanics, (1980).

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11.8. Mecânica Estatística Quântica 423

independente de k.
Podemos ainda reconhecer o denominador da expressão (11.127)
como sendo a função partição
N
X
Z= e−βEk (11.129)
k=1

da mecânica estatística, que também poderá ser escrita na forma


³ ´
Z = tr e−βH (11.130)

Conhecido ρkk na base de energia, finalmente teremos o operador den-


sidade na forma
e−βH
ρ= (11.131)
Z
Essa é a mais básica equação associada à mecânica estatística da qual
tiremos as informações que se segue.
Para uma observável A qualquer, a média do ensemble será
¡ ¢
tr e−βH A
[A] =
Z
PN −βEk
k hAik e
= P N −βEk
(11.132)
k e

Em particular, para a energia interna por constituinte do sistema, ter-


emos
PN −βEk
k Ek e
U= P N −βEk
k e

=− (ln Z) (11.133)
∂β
uma fórmula muito conhecida de todos os estudantes de mecânica es-
tatística. O parâmetro β está relacionado com a temperatura T do sis-
tema,
1
β= (11.134)
kT
o que indica que para o caso de limites de baixas temperaturas, β → ∞,
o ensemble canônico se torna um ensemble puro onde a população
encontra-se somente no estado fundamental. Enquanto que no caso

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424 Cap. 11 Matriz Densidade

oposto, limites de alta temperatura, β → 0, o ensemble canônico se


torna um ensemble completamente aleatório onde a população encontra-
se aleatoriamente em todos os auto-estados de energia.
Exemplo: Vamos considerar como exemplo ilustrativo um ensem-
ble canônico com partículas de spin- 12 , momento magnético 2µe~e c sujeito
à um campo magnético uniforme ~B, na direção ẑ,
µ ¶
e ~ ~
H=− S  B = ωSz
µe c
com
|e|B
ω=
µe c
Logo, H e Sz comutam.
A matriz densidade para esse ensemble canônico será diagonal na
base Sz . Então, µ −β~ω/2 ¶
e 0
. 0 eβ~ω/2
ρ= (11.135)
Z
onde a função partição é
β~ω β~ω
Z = e− 2 +e 2 (11.136)
Dessas relações, teremos
[Sx ] = 0
[Sy ] = 0 (11.137)
µ ¶ µ ¶
~ β~ω
[Sz ] = − tanh
2 2
A média do momento magnético para esse ensemble é
e
[Sz ]
µe c
Então a susceptibilidade paramagnética χ do material aqui constituído
será
e
[Sz ] = χB (11.138)
µe c
que nos dará a fórmula de Brillouin para χ
µ ¶ µ ¶
|e|~ β~ω
χ= tanh . (11.139)
2µe cB 2

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11.9. Comentários 425

11.9 Comentários
Para esse capítulo, recomenda-se ao leitor, uma leitura paralela dos clás-
sicos livros dos Prof. Eugen Merzbacher (1998) 10 e Jun John Sakurai
(1994) 11 , nesses livros poderão encontrar um excelente trabalho sobre
a matriz densidade e suas aplicações. Um outro excelente trabalho en-
volvendo matriz de operadores densidade será encontrado na leitura de
um dos autores (Landau) do assunto no do magnífico livro dos Profs.
Landau e Lifshitz (1989) 12 .

10
E. Merzbacher, Quantum mechanics, (1998).
11
J. J. Sakurai, Modern quantum mechanics, (1994).
12
L. D. Landau and E. M. Lifshitz, Quantum mechanics, (1989).

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Capítulo 12

Simetrias e Leis de
Conservação

As leis de conservação de energia, momentum linear e momentum angu-


lar são válidas tanto na mecânica clássica 1 . como na mecânica quântica e
resultam da invariância da teoria em relação às operações de translações
no tempo e no espaço e em relação às rotações. Essas leis estão portanto
ligadas à princípios de invariância ou de simetria.

12.1 Simetrias na Física Clássica e Quântica


Em 1918, Emmy Noether 2 demonstrou que as leis de conservação da
física estão relacionadas com simetrias do operador hamiltoniano.
Simetrias na mecânica clássica: Faremos uma pequena revisão
dos conceitos de simetria e leis de conservação na física clássica. Vamos
partir da lagrangiana L, que é função da coordenada generalizada qi
e de sua correspondente velocidade generalizada q̇i . Se L é invariante
para um deslocamento
qi → qi + δqi (12.1)

então teremos
∂L
=0 (12.2)
∂qi
1
Ver H. Goldstein, Classical mechanics, (1980)
2
Amalie Emmy Noether (1882–1935), matemática alemã.

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428 Cap. 12 Simetrias e Leis de Conservação

Em virtude da equação de Lagrange


∂L d ∂L
− =0
∂qi dt ∂ q̇i
teremos
dpi
=0 (12.3)
dt
onde pi é o momentum canônico definido por
∂L
pi = (12.4)
∂ q̇i

Então, se a lagrangiana L é invariante sob o deslocamento (12.1), a


quantidade conservada será o momentum canônico pi conjugado a qi .
Similarmente poderemos achar as quantidades conservadas para uma
translação no tempo, que será a energia; e a quantidade conservada sob
ação da rotação, que será o momentum angular.
Simetrias na mecânica quântica: Uma transformação do estado
ket de um sistema físico é uma simetria se os estados transformados
derem lugar às mesmas leis físicas que encontradas nos estados consid-
erados inicialmente.
Consideremos um operador unitário U que transforma um dado
estado físico |ψi no estado |ψ 0 i. Assim, teremos

|ψ 0 i = U|ψi (12.5a)
0 †
hψ | = hψ|U (12.5b)

O estado físico considerado é dito invariante com relação à trans-


formação U se o valor esperado da hamiltoniana para quaisquer dois
estados |ψi e |φi permanece inalterados por tal transformação, i.e.,

hψ 0 |H|φ0 i = hψ|H|φi (12.6)

Usando as relações dadas em (12.5a) e (12.5b) na relação acima,


encontraremos

hψ|U† HU|φi = hψ|H|φi → hψ|U† HU − H|φi = 0


→ U† HU − H = 0
→ U† HU = H (12.7)

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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12.2. Invariância Temporal e Energia 429

o que equivale a dizer que

UU† HU − UH = 0 → HU − UH = 0 → [U, H] = 0 (12.8)

Usando a equação de movimento de Heisenberg


d
i~ hOi = h[O, H]i
dt
teremos
d
hUi = 0 (12.9)
dt
Essa expressão nos mostra que os valores esperados do operador U
são constantes de movimento. Portanto a invariância de H sob a
transformação do operador U gera uma lei de conservação.
Se U for uma transformação contínua poderemos expressar as leis
de conservação por intermédio do gerador dessa transformação, normal-
mente dada pela relação
U = ei εG (12.10)
Desse modo, usando (12.8)

[U, H] = 0 → [G, H] = 0 (12.11)

teremos
d
hGi = 0 . (12.12)
dt
Então G é uma constante de movimento.

12.2 Invariância Temporal e Energia


Se a hamiltoniana de um sistema físico H não depende explicitamente
do tempo, a equação de movimento de Heisenberg (6.43) nos mostra
que:
d i ∂
H = [H, H] + H → H = constante (12.13)
dt ~ ∂t
Como H|ψi = E|ψi, onde E é o autovalor que representa a energia da
partícula, teremos
d
E = [H, H] = 0 (12.14)
dt
o que significa que a energia é conservada.

Mecânica Quântica

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430 Cap. 12 Simetrias e Leis de Conservação

Nosso próximo passo será ver qual o gerador da transformação que


mantém a energia conservada. Consideremos um operador unitário Ut
definido por
Ut |ψ(t)i = |ψ(t + τ )i (12.15)
o que significa uma translação temporal τ . Usando o desenvolvimento
da série de Taylor na expressão acima, encontraremos

|ψ(t + τ )i = eτ ∂t |ψ(t)i = Ut |ψ(t)i (12.16)

o que implica em

Ut = eτ ∂t (12.17)
Comparando essa expressão com a relação (12.10) e considerando ε =
− τ~ , teremos

G = i~ (12.18)
∂t

Mas da equação de Schrödinger, a expressão i ~ ∂t é denominada oper-
ador energia E, i.e.:

E → i~ (12.19)
∂t
Assim, usando a equação (12.12), teremos

d
hEi = 0 . (12.20)
dt
Logo, a relação acima nos mostra que se a hamiltoniana do sistema é
invariante por uma translação temporal, a energia é conservada, i.e.,
temos a lei de conservação da energia.

12.3 Invariância Espacial e Momentum Linear


Nesse caso vamos considerar um operador unitário U~a definido por

U~a |ψ(~r)i = |ψ(~r +~a)i (12.21)

que representa uma translação espacial de ~a na direção de~r. Novamente


faremos uso do desenvolvimento da série de Taylor, da relação acima
encontraremos

|ψ(~r +~a)i = e~a  ∇ |ψ(~r)i = U~a |ψ(~r)i


~
(12.22)

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12.4. Invariância Rotacional e Momentum Angular 431

o que nos leva a fórmula


U~a = e~a  ∇
~
(12.23)
~a
Comparando a relação acima com (12.10) e considerando ε = ~, teremos

~
G = − i ~∇ (12.24)
~ é denominada
Mas da equação de Schrödinger, a expressão − i ~∇
operador momentum linear ~p, i.e.:
~
~p → − i ~∇ (12.25)

Assim, usando a equação (12.12), teremos


d
h~pi = 0 . (12.26)
dt
Logo, a relação acima nos mostra que se a hamiltoniana do sistema é in-
variante por uma translação espacial, o momentum linear é conservado,
i.e., temos a lei de conservação do momentum linear.

12.4 Invariância Rotacional e Momentum


Angular
No caso de uma rotação vamos considerar um operador unitário U~φ
definido por
U~φ |ψ(~r)i = |ψ(~r + ~φ ×~r)i (12.27)

que representa a rotação de um ângulo ~φ em torno aa direção do vetor


~r. Mais uma vez faremos uso do desenvolvimento da série de Taylor,
assim da relação acima encontraremos

|ψ(~r + ~φ ×~r)i = eφ  (~r×∇) |ψ(~r)i = U~φ |ψ(~r)i


~ ~
(12.28)

o que nos leva a seguinte forma

U~φ = eφ  (~r×∇)
~ ~
(12.29)


Comparando a relação acima com (12.10) e considerando ε = ~, teremos

~
G = − i ~ ~r × ∇ (12.30)

Mecânica Quântica

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432 Cap. 12 Simetrias e Leis de Conservação

Mas o operador momentum angular ~L pode ser escrito como um


~ i.e.:
operador diferencial − i ~ ~r × ∇,
~L → − i ~ ~r × ∇
~ (12.31)
Assim, usando a equação (12.12), teremos
d ~
hLi = 0 . (12.32)
dt
Logo, a relação acima nos mostra que se a hamiltoniana do sistema é
invariante por rotação no espaço, o momentum angular é conservado,
i.e., temos a lei de conservação do momentum angular.

12.5 Simetria Discreta, Paridade ou Inversão


Espacial
Seja um operador de inversão espacial P definido pela propriedade
h~r|P|ψi = h−~r|ψi = ψ(−~r) (12.33)
para qualquer base |~ri e qualquer estado ket |ψi do espaço de Hilbert.
Uma outra propriedade desse operador é o fato de que P2 = I, i.e.,
um operador identidade, isso significa que P−1 = P e implica que seus
possíveis autovalores são apenas +1 e −1. Note que
h~r|P2 |ψi = h−~r|P|ψi = h~r|ψi (12.34)
para quaisquer |~ri e |ψi. A natureza dos autokets |ψp i, com p = ±1
pode ser facilmente reconhecida por
h~r|P|ψp i = ph~r|ψp i = h−~r|ψp i (12.35)
e as autofunções h~r|ψp i são funções pares, quando p = +1, e ímpares,
quando p = −1, com relação à substituição de~r por −~r. Temos também
que o operador P é hermitiano. De fato,
hψ 0 |P† |ψi = hψ|P|ψ 0 i∗
Z Z
¡ ¢∗ ¡ ¢∗
= d3 r hψ|~rih~r|P|ψ 0 i = d3 r hψ|~rih−~r|ψ 0 i
Z Z
¡ ¢∗
= d3 r hψ| −~rih~r|ψ 0 i = d3 rhψ 0 |~rih−~r|ψi

= hψ 0 |P|ψi (12.36)

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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12.5. Simetria Discreta, Paridade ou Inversão Espacial 433

para quaisquer |~ri e |ψi. A observável associada ao operador de inversão


espacial P é chamada paridade, e os autokets de P são portanto estados
de paridade definida. Autokets associados aos autovalores p = +1 ou
p = −1 são kets de paridade par e ímpar respectivamente.
O efeito do operador de inversão espacial P sobre variáveis dinâmicas
será
P~rP† = −~r e P~pP† = −~p (12.37)
É fácil verificar o último termo da relação acima, P~pP† = −~p, como
segue:

h~r|P~pP† |ψi = h−~r|~pP|ψi


~~ ~~
= − ∇h−~ r|P|ψi = − ∇h~
r|ψi
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= h~r| − ~p|ψi (12.38)

para quaisquer |~ri e |ψi. Em particular, vamos considerar o efeito do


p2 2
operador P sobre a hamiltoniana H = 2µ − er , i.e.,
µ ¶
p2 e2 p2 e2
P − P−1 = − (12.39)
2µ r 2µ r
generalizando
P−1 H P = H (12.40)
portanto invariante. Então,

[P, H] = 0 (12.41)

o que significa que P pode ser diagonalizado simultaneamente com a


hamiltoniana H, ou seja, autofunções da hamiltoniana podem ser es-
colhidas de tal forma a serem também autofunções de P. No entanto,
para um sistema formado por uma partícula em um campo central, a
forma dessas autofunções
unl (~r)
ψnlm (~r) = cnl Ylm (θ, ϕ)
r
juntamente com as propriedades dos harmônicos esféricos, i.e.,~r → −~r,
ou (r, θ, ϕ) → (r, π − θ, ϕ + π), passará a ser

unl (~r)
ψnlm (−~r) = cnl Ylm (π − θ, ϕ + π) (12.42)
r

Mecânica Quântica

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434 Cap. 12 Simetrias e Leis de Conservação

Mas,
ei m(ϕ+π) = (−1)m ei mϕ
e
Pl (cos (π − θ)) = Pl (− cos θ) = Pl (−ξ) = (−1)l Pl (ξ)
logo
Plm (π − θ) = (−1)l−m Plm (θ)
Portanto
Ylm (π − θ, ϕ + π) = (−1)l Ylm (θ, ϕ) (12.43)
que mostra, de fato,

h~r|P|ψnlm i = h−~r|ψnlm i = (−1)l ψnlm (~r) (12.44)

ou seja, os autokets |ψnlm i são também autokets de P com autovalor


(−1)l . Devemos notar que os ângulos que servem de argumento para
Ylm (θ, ϕ) são ângulos polares esféricos, o que justifica a afirmação de
que para ~r → −~r, termos (r, θ, ϕ) → (r, π − θ, ϕ + π). Assim para
termos paridade +1 teremos l par, e para termos paridade −1 teremos
l ímpar.
Conhecendo o efeito do operador de inversão espacial P sobre var-
iáveis dinâmicas, ver (12.37)

P~rP† = −~r e P~pP† = −~p

podemos discutir seu efeito no momentum angular total ~J. Primeiro


iremos discutir esse efeito no momentum angular orbital ~L. É fácil ver-
ificar, pela relação acima, que

[P, ~L] = 0 (12.45)

devido
~L = ~r × ~p (12.46)
e tanto ~r quanto ~p têm paridade ímpar. Entretanto, para mostrar que
essa propriedade também é aplicada para o spin, será melhor usar o
fato de que ~J é o gerador da rotação. Para matrizes ortogonais 3 × 3,
teremos
Rparidade Rrot. = Rrot. Rparidade (12.47)

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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12.5. Simetria Discreta, Paridade ou Inversão Espacial 435

onde Rrot. é a rotação normal, e explicitamente


 
−1 0 0
Rparidade =  0 −1 0  (12.48)
0 0 −1

ou seja, paridade e rotação comutam. Na mecânica quântica, é natural


postular a correspondente relação através de operadores unitários, tal
que
PD(R) = D(R)P (12.49)
onde
i
D(R) = 1 − ~J  n̂ε
~
Da equação (12.49) teremos

[P, ~J] = 0 ou P†~JP = ~J (12.50)

Como ~J = ~L+~S, podemos concluir que o operador spin ~S transforma-se


da mesma forme que o operador ~L sob o efeito do operador P.
Sob efeito de rotações, ~r e ~J transformam-se do mesmo modo, tal
que ambos são vetores, ou tensores esféricos de espécie 1 (em inglês
- rank 1). Entretanto, ~r ou ~p têm paridade ímpar, enquanto ~J tem
paridade par. Vetores que têm paridade ímpar são chamados vetores
polares, e vetores que têm paridade par são chamados vetores axiais
ou pseudo-vetores.
Finalmente, faremos nossa última consideração aplicando o operador
de inversão espacial P
P−1~L  ~SP = ~L  ~S (12.51)
onde o operador de acoplamento spin-órbita ~L  ~S é um escalar or-
dinário, e
P−1~S ~rP = −~S ~r (12.52)
onde o operador ~S ~r é um exemplo de um pseudo-escalar.
Não conservação da paridade: A hamiltoniana básica respon-
sável pela conhecida interações fraca da física de partículas elementares
não é invariante sob o efeito do operador de inversão espacial, i.e., a
paridade é violada. Em processos de decaimentos podemos ter o estado
final como uma superposição de estados de paridades opostas. Quanti-
dades observadas como a distribuição angular dos produtos do decai-
mento podem depender de quantidades que conservam a paridade e de

Mecânica Quântica

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436 Cap. 12 Simetrias e Leis de Conservação

quantidades que violam a paridade. Em 1956, T. D. Lee 3 e C. N. Yang 4


especularam teoricamente que a paridade não era conservada em inter-
ações fracas e propuseram experimentos para testar essa validade 5 . Em
1957, Madame Wu 6 e colaboradores encontraram a violação da pari-
dade, através da famosa experiência do decaimento β do Co60 , i.e.,
Cobalto 60 7 .
Decaimento não leptônico Λ → p + π − : Considere o decaimento
não leptônico dos híperons Λ → p + π − como teste para conservação
da paridade. O decaimento considerado representa uma interação fraca.
Sabemos que Λ e p têm spin- 21 e paridade positiva (par), e π − tem
spin-0 e paridade negativa (ímpar). Como o momentum angular total
é conservado, o estado final terá momentum angular orbital relativo 0
ou 1. Se
l = 0, a paridade é P(p)P(π − )(−1)0 = −1
e se
l = 1, a paridade é P(p)P(π − )(−1)1 = +1
Então se a paridade é conservada no decaimento de Λ, l = 0 é proibido.
Se a paridade não é conservada para esse decaimento, ambos os valores
de l serão permitidos, e o estado final da função de onda do próton
poderá ser escrita na forma

ψ = ψs + ψp
¯ À Ãr ¯ À r ¯ À!
¯1 1 2 ¯1 1 1 ¯1 1
= as Y00 ¯¯ , + ap Y11 ¯¯ , − − Y10 ¯¯ ,
2 2 3 2 2 3 2 2
¯ ® ¯ ®
onde ¯ 12 , 12 e ¯ 21 , − 21 são respectivamente as funções de onda de spin
do próton para m = ± 12 , as e ap são respectivamente as amplitudes
q
das ondas s e p. Fazendo as corretas substituições de 23 Y11 = − sen θ,
q
1
3 Y10 = cos θ e Y00 = 1, teremos

ψ ∗ ψ = |as |2 + |ap |2 − 2<(as a∗p ) cos θ


∝ 1 + α cos θ
3
Tsung-Dao Lee (1926– ), físico chinês-americano.
4
Chen-Ning Franklin Yang (1922– ), físico chinês-americano.
5
T. D. Lee and C. N. Yang, Physical Review, 104, 254 (1956).
6
Chien-Shiung Wu (1912–1997), física chinesa-americana.
7
C. S. Wu et al., Physical Review, 105, 1413 (1957).

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12.6. Poço Duplo Simétrico 437

onde
2<(as a∗p )
α=
|as |2 + |ap |2
Note que a distribuição angular é similar a discutida em §11.7. Aqui
essa distribuição angular é quando temos Λ polarizado, no sistema de
repouso de Λ, p e π − movem-se em direções opostas. A distribuição an-
gular de p ou π − é ∝ 1 + αP cos θ, sendo θ o ângulo entre a direção do
p ou π − e a direção do vetor polarização de Λ. Experimentalmente foi
possível medir a polarização de Λ na ordem de αP = 0, 7 usando essas
relações 8 , ou seja, comprovamos que ambos os valores de l são permiti-
dos, i.e., a paridade tem contribuição conservada e não conservada para
o decaimento fraco Λ → p + π − .

12.6 Poço Duplo Simétrico


Como exemplo ilustrativo, vamos considerar o poço duplo simétrico,
como mostra a Fig. 12.1. Na figura, os poços são as regiões I e II, e a

Figura 12.1: Poço duplo simétrico.

barreira tem altura U0 . Se a barreira fosse impenetrável, haveria níveis


de energia relativos ao movimento da partícula em um ou outro dos
dois poços, ou seja, duas famílias de níveis iguais, uma em cada poço.
O fato de que o tunelamento através da barreira existe na mecânica
quântica faz com que cada um dos níveis relativos ao movimento em
8
Review Of Particle Physics, Journal of Physics G: Nuclear and Particle Physics,
33, 1 (2006).

Mecânica Quântica

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438 Cap. 12 Simetrias e Leis de Conservação

um dos poços se separe em dois níveis próximos, correspondendo agora


a estados da partícula em que ela está nos dois poços.
A determinação desse desdobramento de níveis é simples no caso em
que se pode usar a aproximação quase clássica. Uma solução aproximada
da equação de Schrödinger para a energia potencial U (x), desprezando
a probabilidade de passagem pela barreira, poderá ser construída com a
função quase clássica ψ0 (x), que descreve o movimento com uma certa
energia E0 em um dos poços, por exemplo o poço I, e que é exponen-
cialmente decrescente em ambos os lados do poço I. A normalização
aproximada dessa função será dada por
Z ∞
ψ02 dx = 1 (12.53)
0

Portanto, para ψ0 , temos satisfeita a equação de Schrödinger


d2 ψ0 (x) 2µ
+ 2 [E − U (x)]ψ0 (x) = 0 (12.54)
dx2 ~
no seguinte sentido: para x < 0 a equação será aproximadamente sat-
isfeita porque, tanto ψ0 (x) quanto sua derivada segunda, nesta região,
são aproximadamente nulas 9 . O produto ψ0 (x)ψ0 (−x), para x > 0,
será desprezível. O potencial como um todo será simétrico. A equação
de Schrödinger
d2 ψ(x) 2µ
+ 2 [E − U (x)]ψ(x) = 0 (12.55)
dx2 ~
permanecerá válida quando se troca x por −x. Logo, se ψ(x) é uma
função de onda, ψ(−x) também o é, para o mesmo valor de E. Como
não há degenerescência, teremos para α real

ψ(−x) = ei α ψ(x) (12.56)

Logo,
ψ(x) = ei α ψ(−x) = e2 i α ψ(x) (12.57)
e portanto e2 i α = 1, que implica em α = nπ. Assim, em conseqüência,
½
ψ(−x) = ψ(x) par
(12.58)
ψ(−x) = −ψ(x) impar
9
Estaremos usando, sem mencionar mais, os seguintes fatos: no caso de um sistema
unidimensional confinado, i.e., impedido de alcançar o infinito, a função de onda
poderá ser tomada como real, e os níveis de energia não são degenerados.

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12.6. Poço Duplo Simétrico 439

Os auto-estados de energia desse sistema possuem, portanto, paridade


par ou ímpar. Isso é uma conseqüência do fato de que U (−x) = U (x). As
funções de onda corretas, na aproximação quase clássica, serão obtidas
construindo, a partir de ψ0 , formando as funções ψ1 , simétrica, e ψ2 ,
anti-simétrica:

1

 ψ1 (x) = √2 [ψ0 (x) + ψ0 (−x)] simétrica
(12.59)

 ψ2 (x) = √1 [ψ0 (x) − ψ0 (−x)]
2
anti − simétrica

Note que a função ψ0(x) não é autofunção da hamiltoniana com a en-


ergia potencial U (x), simétrica: é sim a função de onda que teríamos
se a barreira de potencial fosse impenetrável. Tanto que ψ0 (−x) é de-
sprezível, enquanto que ψ0 (x) não o é. Novamente, como os níveis não
são degenerados, deveremos ter energias diferentes para ψ1 e ψ2 . Tal
que teremos duas equações de Schrödinger,
d2 ψ1 (x) 2µ
+ 2 [E1 − U (x)]ψ1 (x) = 0 (12.60)
dx2 ~
para ψ1 , e
d2 ψ2 (x) 2µ
+ 2 [E2 − U (x)]ψ2 (x) = 0 (12.61)
dx2 ~
para ψ2 . Multiplicando (12.54) por ψ1 e (12.60) por ψ0 e então sub-
traindo, teremos

ψ1 ψ000 − ψ0 ψ100 − (E0 − E1 )ψ0 ψ1 = 0
~2
ou
d 2µ
(ψ1 ψ00 − ψ0 ψ10 ) = 2 (E1 − E0 )ψ0 ψ1
dx ~
fazendo uma integral da relação acima de 0 a ∞, teremos
Z ∞ Z ∞
d 2µ
dx (ψ1 ψ00 − ψ0 ψ10 ) = 2 (E1 − E0 ) dx ψ0 ψ1
0 dx ~ 0

ou seja
Z ∞
2µ 1
(ψ1 ψ00 − ψ0 ψ10 )∞
0 = (E1 − E0 ) √ dx ψ0 [ψ0 (x) + ψ0 (−x)]
~2 2 0
Z ∞
2µ 1
≈ 2 (E1 − E0 ) √ dx ψ02
~ 2 0

Mecânica Quântica

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440 Cap. 12 Simetrias e Leis de Conservação

onde usamos o fato de ψ0 (x)ψ0 (−x) ser muito pequeno. Lembrando


que as funções que aparecem no primeiro membro da relação acima se
anulam no infinito, temos 10
µ
ψ0 (0)ψ10 (0) − ψ1 (0)ψ00 (0) = √ (E1 − E0 ) (12.62)
2 ~2

da equação acima podemos ver que



2 √
ψ1 (0) = [ψ0 (0) + ψ0 (0)] = 2 ψ0 (0) (12.63)
2
enquanto
ψ10 = 0 (12.64)
levando a
~2
E1 − E0 = − ψ0 (0)ψ00 (0) (12.65)
µ
Repetindo os cálculos com ψ2 e ψ0 , obteremos,

~2
E2 − E0 = ψ0 (0)ψ00 (0) (12.66)
µ

Subtraindo as duas equações acima, teremos

2~2
E2 − E1 = ψ0 (0)ψ00 (0) (12.67)
µ

Um cálculo mais refinado levará ao resultado


1
Ra
E2 − E1 = Ce− ~ −a dx |p|
(12.68)
10
Seja f (x) uma função par. Então,

f (−x) = f (x)
df (x)
Consideremos agora a função dx
. Trocando x por −x,

df (x) df (−x)
→−
dx dx
Logo
df (−x) df (x)
=−
dx dx
ou seja, se f é par, f 0 é ímpar.

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12.6. Poço Duplo Simétrico 441

onde C é uma constante, e −a e a são indicados na Fig. 12.1. A equação


(12.68) torna explícito o papel do tunelamento na separação dos níveis
de energia.
A molécula de amônia: A molécula de amônia, NH3 , é formada
por três átomos de hidrogênio e um átomo de nitrogênio, dispostos nos
vértices de uma pirâmide, como mostrado na Fig. 12.2. Essa molécula

Figura 12.2: Molécula de amônia.

poderá ser excitada de muitos modos: poderá ser posta a girar, por ex-
emplo, em torno de um eixo passando pelo nitrogênio e perpendicular
à base oposta, que é um eixo de simetria, ou poderá também excitar-se
seus muitos modos normais de vibração. Aqui vamos considerar uma
transição que é particularmente interessante porque não pode existir
classicamente. Na física clássica, as duas configurações exibidas acima
só podem se transformar uma na outra por rotação da molécula. Na
mecânica quântica, porém, o nitrogênio pode sofrer um tunelamento
para o outro lado, uma transição que não pode existir classicamente.
Como problema análogo, considere o poço duplo simétrico mostrado
na Fig. 12.3. Para energias com E0 > Vm , classicamente, o problema se
reduz a um único poço. Ou seja, para energia inferiores a Vm , classi-
camente, temos dois poços independentes. Se o potencial for simétrico,
teremos os mesmos níveis de energia de um lado e do outro lado da
barreira.
Na mecânica quântica, porém, existe o tunelamento entre os dois
poços. Em conseqüência disso, os níveis de energia individuais dos poços
deixarão de existir, e aparecerão níveis do poço duplo. As posições up e
down para o átomo de nitrogênio N na molécula de amônia são análo-

Mecânica Quântica

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442 Cap. 12 Simetrias e Leis de Conservação

Figura 12.3: Poço duplo - simétrico e anti-simétrico.

gos à ψ1 e ψ2 da relação (12.59) do poço duplo estudado anteriormente.


De fato, a molécula de amônia NH3 é de fundamental importância na
física de MASER 11 . Os primeiros dispositivos de geração de radiação
monocromáticas foram construídos em 1953 por Townes 12 e colabo-
radores a partir da inversão de população entre dois níveis de energia
de moléculas de amônia tendo uma oscilação de freqüência na faixa de
microondas, ν ∼ 24GHz 13 ..
Em 1958, Townes e Schawlow 14 estabeleceram o princípio de fun-
cionamento para um dispositivo de produção de radiação na faixa visível 15
e, em 1960, Maiman 16 construiu o primeiro LASER 17 sólido de rubi
Al2 O3 , com radiação de comprimento de onda da ordem de 6940 Å 18 .

12.7 Simetria Discreta, Inversão Temporal


Nessa seção iremos discutir a inversão temporal, ou seja, o efeito do
operador de inversão temporal aplicado na mecânica quântica. Esse
trabalho foi originalmente desenvolvido por E. Wigner em 1932 19 e por
11
A palavra MASER vem do inglês Microwave Amplification by Stimulated
Emission of Radiation.
12
Charles Hard Townes (1915– ), físico americano.
13
C. H. Townes, Nobel Lectures, December 11 (1964)
14
Arthur Leonard Schawlow (1921–1999), físico americano.
15
A. L. Schawlow and C. H. Townes, Physical Review, 112, 1940 (1958).
16
Theodore Harold Maiman (1927– ), físico americano.
17
O LASER (Light Amplification by Stimulated Emission of Radiation) é justa-
mente um MASER trabalhando na freqüência ótica
18
T. H. Maiman, Nature, 187 no 4736, 493–494 (1960).
19
E. Wigner, Göttinger Nachrichten, p. 546, (1932).

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12.7. Simetria Discreta, Inversão Temporal 443

Racah em 1937 20 . Sob quais condições as leis da mecânica quântica são


invariantes em relação à inversão temporal: t → −t?
Em mecânica clássica o efeito da reversão temporal será dado pela
definição da órbita revertida no tempo por
0
rA (t0 ) = rA (t) com t0 = −t (12.69)

ou
0
rA (t) = rA (−t) (12.70)
A velocidade muda de sinal quando temos uma inversão temporal
0 (t0 )
drA
0 drA (t) dt
ṙA (t0 ) = = = −ṙA (−t) (12.71)
dt0 dt dt0
Com isso, a lagrangiana será invariante em relação a inversão temporal
se ela também for função par em ṙA (t), i.e., se:

L(r(t), −ṙ(t)) = L(r(t), ṙ(t)) (12.72)

Com essa hipótese, o momentum conjugado pA (t), mudará de sinal


∂L0 X ∂L ∂ ṙB (t)
p0A (t0 ) = = 0 (t0 ) = −pA (t) (12.73)
∂ ṙA (t0 ) ∂ ṙB (t) ∂ ṙA
B

e portanto a hamiltoniana obedecerá a mesma condição de invariância


que a lagrangiana:

H 0 (r0 (t0 ), p0 (t0 )) = H(r(t), p(t)) (12.74)

se a igualdade (12.72) for válida.


Para mecânica quântica teremos: Seja uma transformação de Heisen-
berg. Os operadores de posição ~r e de momentum linear ~p, devem se
transformar, por analogia com a mecânica clássica, da seguinte forma:

~r0 = T−1~rT = ~r (12.75)

e
~p0 = T−1~pT = −~p (12.76)
onde o operador de inversão temporal T deve mudar i em − i, caso
contrário teríamos
~p0 = ~p
20
G. Racah, Nuovo Cimento, 14, (1937).

Mecânica Quântica

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444 Cap. 12 Simetrias e Leis de Conservação

pois na representação de espaço de coordenadas o operador momentum


~ e, de (12.75)
linear ~p é o operador diferencial − i ~∇
~ =∇
T−1 ∇T ~

o que contradiz a definição (12.76)


vamos definir um operador K pela qual passamos de um operador a
seu complexo conjugado

Ω0 ≡ K−1 ΩK = Ω∗ (12.77)

É claro que aqui não temos uma operação linear, pois supondo Ω =
c1 Ω1 + c2 Ω2 , onde c1 e c2 são números complexos, então

K−1 (c1 Ω1 + c2 Ω2 )K = c∗1 K−1 Ω1 K + c∗2 K−1 Ω2 K (12.78)

Se faço,
T=K (12.79)
teremos então,
~
~p0 = K−1~pK = K−1 (− i ~∇)K ~ = −~p
= i ~∇ (12.80)

A transformação T não é unitária. De fato, a regra de comutação entre


as componentes de ~r e de ~p não é conservada

[xi , pj ] = i ~δij

das relações (12.75) e (12.76) temos

[xi , pj ] = − i ~δij

Em termos de representação de Schrödinger, como se transformam as


funções de onda considerando uma operação de inversão temporal?
Partindo da condição
¯ 0 0 ¯ ¯ ¯
¯hφ |Ω (x)|ψ 0 i¯2 = ¯hφ0 |Ω0 (x)|ψ 0 i¯2 (12.81)
H S

que exprime a independência da probabilidade da transição no sistema


de referência transformado, em relação à forma em que se efetua a
transformação. No caso de uma transformação unitária, essa condição
é satisfeita por
Ω0 (x) = U−1 Ω(x)U (12.82)

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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12.7. Simetria Discreta, Inversão Temporal 445

Mas a relação (12.81) é também obedecida por

hφ0 |Ω0 (x)|ψ 0 iH = hφ|U−1 Ω(x)U|ψi∗S = hψ|U−1 Ω(x)† U|φi (12.83)

onde nos dá que a inversão temporal no espaço de Hilbert é uma


transformação anti-unitária, i.e.,

T = UK (12.84)

porém U é uma transformação unitária. Em lugar de (12.77), teremos


¡ ¢∗
Ω0 = K−1 U−1 ΩUK ≡ U−1 ΩU (12.85)

Note que

K2 = I
K−1 = K .

Se tomarmo o estado |ψ(t)i, a ação do operador de inversão temporal


será
T|ψ(t)i ≡ U|ψ(t)i∗ (12.86)
e na representação de espaço de coordenadas
Z
T|ψ(t)i = d3~rU|~riψ ∗ (~r, t) (12.87)

pois temos |~ri∗ = |~ri



Dada a equação de Schrödinger H|ψ(t)i = − i ~ ∂t |ψ(t)i, obteremos


TH|ψ(t)i = − i ~ T|ψ(t)i (12.88)
∂t
isto é
¡ ¢ ∂
UH∗ U−1 U|ψ(t)i∗ = − i ~ U|ψ(t)i∗ (12.89)
∂t
Assim, se houver um outro operador M tal que

[M,~r] = 0

o espectro de autokets comuns a M e a ~r = (x1 , x2 , x3 ) será

xk |~r, ms i = xk |~r, ms i
M|~r, ms i = ms |~r, ms i

Mecânica Quântica

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446 Cap. 12 Simetrias e Leis de Conservação

onde ms assume valores reais.


Nesse caso, escreveremos
XZ
|ψ(t)i = d3~r |~r, ms i ψms (~r, t)
ms
A equação de Schrödinger será
XZ XZ ∂
3
d ~r H|~r, ms i ψms (~r, t) = i ~ d3~r |~r, ms i ψms (~r, t)
ms ms
∂t
(12.90)
Aplicando o operador de evolução temporal T = UK
XZ
d3~r0 UH∗ |~r0 , m0s i ψm

r0 , t)
0 (~
s
m0s
XZ ∂ ∗
= −i~ d3~r0 U|~r0 , m0s i ψ 0 (~r0 , t)
∂t ms
m0s

Assim
XZ
d3~r0 h~r, ms |UH∗ |~r0 , m0s i ψm

r0 , t)
0 (~
s
m0s
XZ ∂ ∗
= −i~ d3~r0 h~r, ms |U|~r0 , m0s i ψ 0 (~r0 , t)
∂t ms
m0s
ou
X Z
d3~r0 d3~r00 h~r, ms |UH∗ U−1 |~r00 , m00s ih~r00 , m00s |U|~r0 , m0s i ψm

r0 , t)
0 (~
s
m0s m00
s
XZ ∂ ∗
= −i~ d3~r0 h~r, ms |U|~r0 , m0s i ψ 0 (~r0 , t)
∂t ms
m0s
(12.91)
sabendo que
µ 2 ¶
0 ~ 2
h~r, ms |H|~r , m0s i = − ∇ + V (~r) δ 3 (~r −~r0 )δms m0s

~2 2
H=− ∇ + V (~r) = H∗

UH∗ U−1 = H

ed. Reco-Reco 2008 lá quando

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12.7. Simetria Discreta, Inversão Temporal 447

a equação (12.91) será


XZ XZ ∂ ∗
d3~r0 H|~r0 , m0s i ψm

0 (~
r 0
, t) = − i ~ d3 0 0
~
r |~
r , m 0
s i ψm0s (~r0 , t)
0
s
0
∂t
ms ms

isto é
XZ XZ ∂
d3~r0 H|~r0 , m0s i ψm

r0 , t) = i ~
0 (~ d3~r0 |~r0 , m0s i ψ ∗ 0 (~r0 , t)
s ∂(−t) ms
m0s m0s
(12.92)
que é a equação de Schrödinger para a reversão temporal. Note que as
equações (12.90) e (12.92) são invariantes, i.e., estão ligadas ao princípio
de invariância, e as leis que se servem para (12.90) servem também para
(12.92).
Sistemas com Spin: A transformação anti-unitária do operador
associado ao momentum angular orbital, análogo ao clássico, é dada
por
T†~LT = T† (~r × ~p)T = ~r × (−~p) = −~L
consistente com a transformação do momentum angular clássico sob
inversão temporal. No caso de um sistema envolvendo partículas com
spin, precisamos, por consistência, que o operador associado ao spin
tenha o mesmo comportamento sob inversão temporal ao do operador
associado ao momentum angular orbital, i.e.,

T†~ST = −~S

Essa relação deve de fato ser observada como uma condição adicional a
ser satisfeita pelo operador anti-unitário T. Assim ela garante o formal-
ismo geral para o momentum angular total ~J = ~L + ~S. No caso de ser
usada a representação de Schrödinger, e para partículas de spin- 21 com
operadores escritos na forma das matrizes de Pauli ~σ ≡ {σx , σy , σz }
teremos
~S = ~ ~σ
2
mas como T = UK já definido anteriormente, U é um operador unitário
agindo sobre as componentes do spin, desse modo, tendo as matrizes
de Pauli σx e σz reais e σy puramente imaginária, teremos

K−1 σx K = σx K−1 σy K = −σy K−1 σz K = σz

Mecânica Quântica

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448 Cap. 12 Simetrias e Leis de Conservação

de tal forma que

U† σx U = −σx K† σy U = σy U† σz U = −σz

o que corresponde a uma rotação de um ângulo π em torno do eixo y,


i.e.,
T = e− ~ πS  ŷ K = e− i 2 σy K = − i σy K .
i ~ π
(12.93)
Esse é portanto o operador de inversão temporal para casos de partículas
com spin- 12 .

12.8 Comentários
Para esse capítulo, recomenda-se ao leitor, uma leitura paralela dos
livros dos Prof. Piza (2002) 21 e Jun John Sakurai (1994) 22 , nesses livros
poderão encontrar um excelente trabalho sobre simetria, leis de conser-
vação, além de excelente discussão a respeito de paridade e inversão
temporal. Um outro excelente trabalho sobre simetria, paridade e in-
versão temporal será encontrado na leitura do livro do Prof. Messiah
(1970) 23 .

21
A. F. R. de Toledo Piza, Mecânica Quântica, (2002).
22
J. J. Sakurai, Modern quantum mechanics, (1994).
23
A. Messiah, Quantum mechanics, (1970).

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Capítulo 13

Teoria das Perturbações


Estacionárias

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Capítulo 14

Teoria das Perturbações


Dependente do Tempo

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Capítulo 15

Teoria Formal do
Espalhamento

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Capítulo 16

Partículas Idênticas

Até esse ponto estudamos sistemas que contém apenas uma partícula.
Todavia, um grande número de sistemas reais apresenta mais de uma
partícula e muitas dessas são iguais. Por exemplo, um átomo de hélio
apresenta dois elétrons e um núcleo, enquanto que uma molécula de
hidrogênio possui dois elétrons e dois prótons. Nesse capítulo vamos
analisar as consequências de um sistema quântico possuir partículas
idênticas. Uma diferença grande entre sistemas clássicos e quânticos
apresentando partículas idênticas é que classicamente estas são distin-
guíveis ao passo que o mesmo não ocorre no contexto quântico. Essas
observações se devem as descobertas de Dirac e Heisenberg em 1926 1 .
Ainda nesse capítulo faremos um breve estudo da segunda quantização
para sistemas de partículas constituídos de bósons e férmions.

16.1 Princípio da Indistinguibilidade


Em mecânica clássica, partículas iguais, apesar de idênticas em suas
propriedades físicas, não perdem sua individualidade: podemos imagi-
nar que as partículas que entram na composição de um sistema físico se
enumeram em certo instante e logo se segue o movimento de cada uma
das partículas em suas respectivas trajetórias; nesse caso, as partículas
são identificadas em qualquer instante.
Mas na mecânica quântica a situação varia completamente. Em vir-
tude do princípio da incerteza, o conceito de trajetória de um elétron
1
P. A. M. Dirac, Proceedings of the Royal Society, A111, 281 (1926); ibidem A112,
661 (1926); ibidem A113, 621 (1926).

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456 Cap. 16 Partículas Idênticas

perde seu sentido completamente. Se conhecemos exatamente a posição


de um elétron num instante inicial, no instante seguinte suas coorde-
nadas não terão nenhum valor determinado. Por essa razão, localizando
os elétrons e enumerando-os num certo instante, não podemos identificá-
los nos instantes seguintes; ao localizar em certo ponto do espaço um
dos elétrons, em outro instante posterior não teremos como dizer qual
dos elétrons era aquele originalmente enumerado.
Na mecânica quântica não existe, por princípio, nenhuma possibi-
lidade de seguir individualmente cada uma das partículas iguais, i.e.,
de distingui-las. Podemos dizer que em mecânica quântica as partícu-
las iguais perdem por completo sua individualidade. A identidade das
partículas em relação a suas propriedades físicas têm aqui um caracter
muito profundo: conduz a indistinguibilidade completa das partículas.
Essa característica, conhecida pelo nome de princípio da indis-
tinguibilidade das partículas idênticas, desempenham um papel funda-
mental na teoria quântica dos sistemas formados por partículas idênti-
cas. Vamos considerar um sistema constituído por duas partículas idên-
ticas. Devido a sua identidade, os estados do sistema que se obtém um
do outro por simples permutação de ambas partículas devem ser com-
pletamente equivalentes do ponto de vista da física. Isso quer dizer que
como resultado dessa permutação, a função de onda do sistema pode
variar por um fator de fase de pouca importância. Seja ψ(ξ1 , ξ2 ) a função
de onda do sistema físico considerado, e ξ1 e ξ2 o conjunto das três co-
ordenadas e a projeção do spin de cada uma das partículas, ou seja
ξi ≡ (~ri , ~σ i ). Então, teremos

ψ(ξ1 , ξ2 ) = ei α ψ(ξ2 , ξ1 )

onde α é uma constante real a ser determinada. Como resultado de uma


segunda permutação voltaremos ao estado inicial,
¡ ¢
ψ(ξ1 , ξ2 ) = ei α ψ(ξ2 , ξ1 ) = ei α ei α ψ(ξ1 , ξ2 ) = e2 i α ψ(ξ1 , ξ2 )

onde se deduz que e2 i α = 1, ou seja ei α = ±1. Logo,

ψ(ξ1 , ξ2 ) = ±ψ(ξ2 , ξ1 ) .

Assim, chegamos ao resultado de que existem duas possibilidades: a


função de onda é simétrica, quando α = 0; ou é anti-simétrica, quando
α = π. É evidente que as funções de onda de todos os estados de um

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16.1. Princípio da Indistinguibilidade 457

mesmo sistema devem ter a mesma simetria; caso contrário, a função


de onda de um estado que represente uma superposição de estados de
simetrias distintas, não seria nem simétrica e nem anti-simétrica.
Esse resultado se generaliza diretamente à sistemas constituídos por
um número arbitrário de partículas idênticas. De fato, em virtude da
identidade das partículas, fica claro, que se um par qualquer, dessas
partículas, têm a propriedade de poder-se descrever, por exemplo, por
funções de onda simétrica, qualquer outro par dessas mesmas partícu-
las possuirá tal propriedade. Por essa característica, a função de onda
das partículas idênticas deve (ou não) variar em absoluto ao permutar
qualquer par de partículas (e, por conseguinte, ao produzir-se uma per-
mutação qualquer de partículas) ou trocar de sinal ao permutar cada
par. No primeiro caso, teremos a função de onda simétrica, e no segundo
caso, a função de onda anti-simétrica.
As partículas que são descritas por funções anti-simétricas obede-
cem a estatística de Fermi-Dirac e são conhecidas como férmions,
e as partículas que são descritas por funções simétricas obedecem a
estatística de Bose-Einstein 2 e são conhecidas como bósons. Essa
terminologia está relacionada com a denominação das estatísticas medi-
ante as quais descreve um gás constituído por partículas cujas funções
são anti-simétricas e simétricas, respectivamente. Aqui nos encontramos
não somente com estatísticas diferentes, como também com mecânicas
distintas. A estatística de Fermi-Dirac foi proposta por Fermi em 1926 3
e sua relação com a mecânica quântica ficou explicita por Dirac, ainda
em 1926 4 . A estatística de Bose-Einstein foi proposta por Bose em 1924,
para quantas de luz 5 , e generalizada por Einstein em 1925 6 . A permu-
tação de bósons não varia em absoluto a função de onda, já a permu-
tação de férmions muda seu sinal. Como consequência, as partículas
compostas que constituem um número impar de férmions elementares
obedecem a estatística de Fermi-Dirac, mesmo que as que constituem
um número par dos ditos férmions obedeçam a estatística de Bose-
Einstein. Esse resultado está de acordo com a regra geral: uma partícula
composta têm spin inteiro ou semi-inteiro na dependência de ser par

2
Satyendra Nash Bose (1894–1974), físico hindu.
3
E. Fermi, Rend. Lincei, 3, 145-149 (1926).
4
P. A. M. Dirac, Proceedings of the Royal Society, Series A 112, 661-677 (1926).
5
S. N. Bose, Zeitschrift für Physik, 26, 178 (1924).
6
A. Einstein, Sitzungsberichte der Preussischen Akademie der Wissenschaften, 1,
3 (1925).

Mecânica Quântica

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458 Cap. 16 Partículas Idênticas

ou impar o número de partículas com spin semi-inteiro que entram em


sua composição.
Consideremos um sistema formado por N partículas idênticas na
qual podemos descrever sua ação mútua. Seja ψ1 , ψ2 , · · · , ψN as
funções de onda dos distintos estados estacionários. O estado do sistema
em conjunto poderá ser determinado enumerando os estados nos quais
se encontram as distintas partículas. A pergunta é: como se deve formar
a função de onda ψ, do sistema, a partir das funções ψ1 , ψ2 , · · · , ψN ?
Seja p1 , p2 , · · · , pN os números dos estados em que se encontram as
distintas partículas, entre esses números podem haver números iguais.
Para um sistema de bósons, a função de onda ψ(ξ1 , ξ2 , · · · , ξN ) será
expressa por uma soma de produtos da forma

ψp1 (ξ1 )ψp2 (ξ2 ) · · · ψpN (ξN ) (16.1)

com todas as permutações possíveis dos diferentes ψ1 , ψ2 , · · · , ψN ; essa


soma possuí a propriedade de simetria exigida. Assim, para um sistema
de duas partículas que se encontram em estados diferentes, p1 6= p2 ,
teremos Para um sistema de bósons, a função de onda ψ(ξ1 , ξ2 , · · · , ξN )
será expressa por uma soma de produtos da forma
1
ψ(ξ1 , ξ2 ) = √ [ψp1 (ξ1 )ψp2 (ξ2 ) + ψp1 (ξ2 )ψp2 (ξ1 )] (16.2)
2

O fator √12 foi introduzido devido a normalização. Todas as funções


ψ1 , ψ2 , · · · , ψN são mutuamente ortogonais e normalizadas. Em um
caso geral, em que temos o número N de partículas arbitrário, a função
de onda normalizada será
µ ¶1 X
N1 !N2 ! · · · 2
ψ= ψp1 (ξ1 )ψp2 (ξ2 ) · · · ψpN (ξN ) (16.3)
N!

onde a soma se extende a todas as permutações dos diferentes índices


p1 , p2 , · · · , pN , e os números NP
i indicam quantos desses índices têm
os mesmos valores de i, sendo Ni = N . Ao integrar o quadrado
da função |ψ|2 em relação a dξ1 dξ2 · · · dξN anulam-se todos os termos,
exceto somente os quadrados dos módulos de cada um dos termos da
soma; como o número total de termos da soma em (16.3) é igual a

N!
N1 !N2 ! · · ·

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16.2. Operadores de Permutação 459

daqui se obtém o coeficiente de normalização em (16.3).


Para um sistema de férmions, a função de onda ψ será a combinação
anti-simétrica dos produtos (16.1). Assim, para um sistema de duas
partículas, teremos
1
ψ(ξ1 , ξ2 ) = √ [ψp1 (ξ1 )ψp2 (ξ2 ) − ψp1 (ξ2 )ψp2 (ξ1 )] (16.4)
2
Para um caso geral de N partículas a função de onda do sistema será
expressa na forma de um determinante
 
ψp1 (ξ1 ) ψp1 (ξ2 ) · · · ψp1 (ξN )
1  ψp (ξ1 ) ψp (ξ2 ) · · · ψp (ξN ) 
 2 2 2 
ψ(ξ1 , ξ2 , · · · , ξN ) = √ Det  .. .. . .. 
N!  . . . . . 
ψpN (ξ1 ) ψpN (ξ2 ) · · · ψpN (ξN )
(16.5)
A permutação de duas partículas corresponde aqui a permutação de
duas colunas do determinante, como resultado do qual esse último troca
de sinal. Esse determinante para funções anti-simétricas e conhecido
como determinante de Slater 7 .
Da equação (16.5) tiramos um importante resultado. Se entre os
números p1 , p2 , · · · , pN existe dois iguais, duas linhas do determinante
serão iguais e seu resultado será nulo. O determinante será diferente de
zero nos casos em que todos os números p1 , p2 , · · · , pN forem distintos.
Portanto, em um sistema de férmions idênticos, não podemos encontrar
em um mesmo estado duas, ou mais, partículas. Esse é o conhecido
princípio de Pauli, estabelecido em 1925 8 .

16.2 Operadores de Permutação


Considere um sistema de N partículas idênticas, tal que sua hamilto-
niana será dada por H = H(1, 2, 3, · · · , N ), e consideraremos P12 como
sendo o operador que permuta as variáveis das partículas 1 e 2, i.e.,
operador de permutação, teremos:
−1
P12 H(1, 2, 3, · · · , N )P12 = H(2, 1, 3, · · · , N ) = H(1, 2, 3, · · · , N )
7
John Clarke Slater (1900–1976), físico e químico americano.
J. C. Slater, Physical Review, 34, 1293-1322 (1929).
8
W. Pauli, Zeitschrift für Physik 31, 765 (1925)

Mecânica Quântica

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460 Cap. 16 Partículas Idênticas

ou de forma mais generalizada

Pij HPij−1 = H (16.6)

Note que, efetivamente em virtude da identidade das partículas, a hamil-


toniana H do sistema é invariante em relação a permutação das partícu-
las. Como Pij comuta com a hamiltoniana H, podemos dizer que Pij
é uma constante de movimento. Desde que Pij também comute com o
momentum total e momentum angular, Pij será unitário se também co-
mutar com deslocamento espacial ou rotações. Então temos que Pij2 = 1,
e os autovalores de cada permutação do operador de permutação Pij são
Pij0 = ±1.
Ainda poderemos definir mais dois operadores de simetrização S,
e anti-simetrização A, respectivamente:

1 1
S= (1 + P12 ) e A= (1 − P12 ) (16.7)
2 2

tal que
A+S =1

sendo fácil verificar que A e S são operadores complementares, i.e.,

A = A† = A2 , S = S † = S 2, e AS = SA = 0 .

Para entender o significado desses operadores basta notar que um estado


qualquer |ψi admite a decomposição

|ψi = A|ψi + S|ψi

e que as componentes satisfazem

P12 A|ψi = −A|ψi e P12 S|ψi = S|ψi

i.e., são autovetores de P12 com autovalores ±1, ou seja, são estados
respectivamente anti-simétricos e simétricos com relação à troca das
duas partículas idênticas. Assim, se aplicamos A ou S em um estado
ψ arbitrário, seu estado resultante é necessariamente anti-simétrico ou
simétrico.

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16.3. Alguns Efeitos Observados Devidos à Indistinguibilidade 461

16.3 Alguns Efeitos Observados Devidos à


Indistinguibilidade
Analisemos algumas consequências do fato de termos que simetrizar, ou
anti-simetrizar, a função de onda de partículas idênticas. Consideremos
inicialmente o impacto da simetrização sobre os níveis de energia e sua
degenerescência.
Efeito nos níveis de energia: Seja um sistema unidimensional
com duas partículas confinadas em uma caixa de lado a as quais não
interagem entre si. A hamiltoniana que governa esse sistema é dada por
p21 p2
H= + 2 (16.8)
2µ 2µ
com 0 ≤ x1(2) ≤ a. No caso de uma única partícula na caixa temos que
os níveis de energia e seus respectivos auto-estados são dados por
r ³ nπ ´
~2 π 2 2 2
En = n e un (x) = sen x (16.9)
2µa2 a a
onde n = 1, 2, 3, · · · .
Analisaremos inicialmente o caso das duas partículas serem distin-
guíveis. Podemos mostrar facilmente que os auto-estados da hamiltoni-
ana e seus respectivos autovalores serão dados por
~2 π 2 2
ψn1 n2 (x1 , x2 ) = un1 (x1 ) un2 (x2 ) com (n + n22 )
En1 n2 =
2µa2 1
(16.10)
onde os estados un são definidos na relação (16.9). Os primeiros quatro
níveis de energia e suas degenerescências são dados na Tab. 16.1.
Tabela 16.1: Níveis de energia e suas degenerescências.

estados energias auto-estados degenerescências


2 2
fundamental 2 × ~2µaπ2 ψ11 1
2 2
primeiro excitado 5 × ~2µaπ2 ψ12 e ψ21 2
2 2
segundo excitado 8 × ~2µaπ2 ψ22 1
2 2
terceiro excitado 10 × ~2µaπ2 ψ13 e ψ31 2

No caso de termos bósons de spin zero, i.e., de termos a função de


onda simétrica temos que os quatro primeiros níveis de energia e re-
spectivas auto-funções estão dados na Tab. 16.4. Portanto, para bósons

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462 Cap. 16 Partículas Idênticas

Tabela 16.2: Níveis de energia e suas degenerescências - bósons.

estados energias auto-estados degenerescências


2 2
fundamental 2 × ~2µaπ2 ψ11 1
2 2
primeiro excitado 5 × ~2µaπ2 ψ12 + ψ21 1
2 2
segundo excitado 8 × ~2µaπ2 ψ22 1
2 2
terceiro excitado 10 × ~2µaπ2 ψ13 + ψ31 1

os níveis de energia são os mesmos que no caso de partículas serem dis-


tinguíveis e de mesma massa, porém todos os estados dos bósons não
são degenerados. Vemos aqui claramente que o vínculo da função de
onda ser simétrica diminuiu as degenerescências que existem no caso de
partículas distinguíveis.
A situação torna-se mais complicada no caso de férmions, já que de-
vemos levar em conta a parte do estado associada ao spin das partículas.
Para sermos mais explicito, consideremos que as partículas têm spin- 12 .
Visto que a hamiltoniana do sistema não depende do spin, temos que
os auto-estados dessa são da forma

ψn1 n2 (ξ1 , ξ2 ) = un1 (x1 ) un2 (x2 ) × χ(~σ 1 , ~σ 2 ) (16.11)

onde ui descreve a parte espacial e χ está associada ao spin. Nesse


ponto será mais conveniente escrever a parte de spin do estado na base
acoplada. Assim sendo, temos que o momentum angular total poderá
assumir dois valores j = 0 e 1. No caso j = 0 existe apenas um estado
dado por
1
χA (0) = √ (α1 β2 − α2 β1 ) , (16.12)
2
onde αi (βi )Ąé o estado de spin up (spin down) da partícula i. Note
que esse estado é anti-simétrico na troca das partículas, estado singleto.
Para j = 1 temos três estados χ(m) dados por

χS (1) = α1 α2
1
χS (0) = √ (α1 β2 + α2 β1 ) (16.13)
2
χS (−1) = β1 β2

os quais são simétricos pela troca das partículas, estado tripleto.

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16.4. Correlação Espacial entre as Partículas 463

Há duas maneiras de obter que o estado (16.11) seja anti-simétrico


quando trocamos as duas partículas: podemos ter a parte espacial simé-
trica e a parte de spin anti-simétrica, ou a parte de spin simétrica e
a parte espacial anti-simétrica. Assim, os quatro primeiros níveis de
energia são dados na Tab. 16.3.

Tabela 16.3: Níveis de energia e suas degenerescências - férmions.

estados energias auto-estados degenerescências


~2 π 2
fundamental 2× 2µa2 ψ11 × χA 1
~2 π 2
primeiro excitado 5× 2µa2 (ψ12 + ψ21 ) × χA 4
(ψ12 − ψ21 ) × χS
~2 π 2
segundo excitado 8× 2µa2 ψ22 × χA 1
2 2
terceiro excitado 10 × ~2µaπ2 (ψ13 + ψ31 ) × χA 4
(ψ13 − ψ31 ) × χS

Se não tivéssemos que anti-simetrizar o estado, os níveis de ener-


gia das duas partículas deveriam ser os mesmos do caso de partículas
indistinguíveis, porém a sua degenerescência deveria ser 2 × 2 vezes
maior já que há quatro estados de spin possíveis. Quando impomos que
o estado deve ser anti-simétrico vemos que os níveis de energia ainda
são os mesmos, porém as degenerescências são bastante alteradas. O es-
tado fundamental continua sendo não degenerado, exibindo momentum
angular total nulo. Por outro lado, os outros estados são degenerados,
mas a degenerescência não é quatro vezes maior que a esperada para
partículas indistinguíveis.

16.4 Correlação Espacial entre as Partículas


Uma outra consequência interessante da simetrização dos estados é que
a correlação entre a posição das partículas depende fortemente delas
serem distinguíveis, bósons ou férmions. Para vermos esse fato, avaliare-
mos a distância quadrática média entre duas partículas que podem ocu-
par os estados ua e ub os quais são ortogonais e normalizados.

h(x1 − x2 )2 i = hx21 + x22 − 2x1 x2 i (16.14)

Analisaremos todas as possibilidades.

Mecânica Quântica

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464 Cap. 16 Partículas Idênticas

1 - Partículas distinguíveis: nesse caso o estado é dado por

ψ(x1 , x2 ) = ua (x1 ) ub (x2 ) (16.15)

O valor médio de x21 pode ser facilmente escrito como


Z Z
hx21 idist = dx2 (ua (x1 ) ub (x2 ))∗ x21 ua (x1 ) ub (x2 )
dx1
Z Z
= dx1 ua (x1 ) x1 ua (x1 ) dx2 ub (x2 )∗ ub (x2 )
∗ 2

Z
= dx1 ua (x1 )∗ x21 ua (x1 ) ≡ hx2 ia (16.16)

onde denotamos pelo subscrito a o estado usado para calcular a média.


Analogamente, obtemos que

hx22 idist = hx2 ib (16.17)

hx1 x2 idist = hxia hxib (16.18)

onde Z
hxia(b) = dx u∗a(b) (x) x ua(b) (x)

Logo, juntando os resultados parciais acima teremos

h(x1 − x2 )2 idist = hx2 ia + hx2 ib − 2hxia hxib (16.19)

2 - Bósons ou férmions: aqui vamos considerar o efeito da função


de onda espacial ser simétrica ou anti-simétrica, a qual é dada por

1
ψ(x1 , x2 ) = √ [ua (x1 )ub (x2 ) ± ua (x2 )ub (x1 )] (16.20)
2

onde √12 garante que o estado esteja propriamente normalizado se ua e


ub o estiverem. Visando que essa função de onda não seja nula quando
utilizamos o sinal negativo, restringiremo-nos ao caso em que a 6= b.
Note que no caso de bósons (férmions) devemos usar a função de onda
espacial simétrica (anti-simétrica) caso o estado de spin seja simétrico
(anti-simétrico). Para estados de spin anti-simétricos, a parte espacial

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16.4. Correlação Espacial entre as Partículas 465

para bósons (férmions) deve ser anti-simétrica (simétrica). Utilizando


essa função de onda temos que
½Z Z
2 1
hx1 i = dx1 dx2 x21 |ua (x1 )|2 |ub (x2 )|2
2
Z Z
+ dx1 dx2 x21 |ua (x2 )|2 |ub (x1 )|2
Z Z
± dx1 dx2 x21 u∗a (x1 )u∗b (x2 )ua (x2 )ub (x1 )
Z Z
± dx1 dx2 x21 u∗a (x2 )u∗b (x1 )ua (x1 )ub (x2 ) (16.21)

o que conduz a
1
hx21 i = [hx2 ia + hx2 ib ] (16.22)
2
Analogamente podemos obter que
1
hx22 i = [hx2 ia + hx2 ib ] (16.23)
2

hx1 x2 i = hxia hxib ± hxiab hxiba (16.24)

onde definimos Z
hxiab = dx u∗a x x ub (x)

Note que o último termo em (16.24) é real já que hxiab = hxi∗ba .


Substituindo os resultados parciais acima na equação (16.14) temos
que

h(x1 − x2 )2 i = hx2 ia + hx2 ib − 2hxia hxib ∓ 2|hxiab |2 (16.25)

ou seja
h(x1 − x2 )2 i = h(x1 − x2 )2 idist ∓ 2|hxiab |2 (16.26)
Esse resultado é muito interessante pois mostra que um efeito cin-
emático, que é a simetrização da função de onda, pode modificar a
distribuição espacial das partículas. Funções de onda simétricas fazem
com que as partículas tendam a ficar mais próximas em média do que
no caso de funções de onda anti-simétricas já que a última equação nos
permite concluir que

h(x1 − x2 )2 iS ≤ h(x1 − x2 )2 iA

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466 Cap. 16 Partículas Idênticas

Esse fato na literatura é chamado de força de troca, ou interação de


troca, apesar de ser apenas um efeito cinemático e não haver nenhuma
força real extra atuando sobre o sistema.
Molécula de hidrogênio: como exemplo analisaremos qualitativa-
mente a molécula de hidrogênio que é composta de dois elétrons e dois
prótons. Tendo em vista que a massa do próton é muito maior que a
massa dos elétrons, consideraremos que os prótons estão parados numa
posição fixa e concentraremos a nossa atenção nos elétrons. Como o
elétron tem spin- 21 há dois possíveis estados de spin para o sistema: o
spin total pode ser igual a 1, o que corresponde a um estado de spin
simétrico χS , ou o spin total é igual a zero e o estado correspondente
é anti-simétrico χA .
No caso dos elétrons estarem no estado tripleto χS , a função de
onda espacial deve ser anti-simétrica o que implica que os elétrons têm a
tendência de ficarem mais afastados entre si. Nessa distribuição espacial
dos elétrons a força repulsiva entre os prótons não será blindada com
eficiência pelos elétrons, tornando a existência de um estado ligado mais
difícil.
Por outro lado a função de onda espacial dos elétrons num estado
singleto de spin deverá ser simétrica, com isso os elétrons tendem a
ficar mais próximos. Nessa configuração, os elétrons não só blindam de
forma eficaz a força repulsiva entre os núcleos mas também podem levar
à uma força total nos prótons na direção de aproximá-los. Logo, essa
configuração facilitará a existência do estado ligado dos dois átomos de
hidrogênio. De fato uma análise quantitativa do problema mostra que
não existe estado ligado entre os átomos de hidrogênio se os elétrons se
encontrarem no estado tripleto de spin, enquanto que haverá a formação
de H2 se os elétrons estiverem no estado singleto de spin.

16.5 Átomo de Hélio


Explorando a anti-simetria que o estado do átomo de hélio deve ex-
ibir vamos agora obter algumas propriedades desse átomo de maneira
heurística, deixando o tratamento mais sistemático para quando dis-
cutirmos os métodos de aproximação. A hamiltoniana descrevendo um
átomo de hélio é dada por
~p21 2e2 ~p22 2e2 e2
H= − + − + (16.27)
2µ r1 2µ r2 |~r1 −~r2 |

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16.5. Átomo de Hélio 467

onde não incluímos os efeitos devidos à massa finita do núcleo. De-


sprezando a interação entre os elétrons esse problema é de fácil solução.
Nessa aproximação, os auto-estados de H são,
ψ = unlm (~r1 )  un0 l0 m0 (~r2 )  χ (16.28)
onde χ descreve os spins dos elétrons e unlm é a função de onda solução
de um problema coulombiano com número quântico principal n, mo-
mentum angular orbital total l e componente z do momentum angular
orbital caracterizada por m. A energia associada a esse estado é
13, 6
Enn0 = 4(En + En0 ) com En = − eV (16.29)
n2
onde n(n0 ) = 1, 2, · · · . Note que o auto-estado aproximado acima não
está, em geral, anti-simetrizado.
Estado fundamental: o estado de mínima energia é dado por n =
n0 = 1 e l = m = l0 = m0 = 0. Nesse caso a parte espacial da expressão
(16.28) será automaticamente simétrica, o que implica que os spins dos
elétrons devem estar na configuração anti-simétrica χA com spin total
j = 0; vide equação (16.12).
ψf und = u100 (~r1 )  u100 (~r2 )  χA
8 −2 r1 +r2 1
= e a √ (α1 β2 − α2 β1 ) (16.30)
πa3 2
onde a é o raio de Bohr. A energia do estado fundamental usando essa
aproximação será então dada por
Ef und = −109 eV
Todavia o valor experimental para a energia do estado fundamental é
−78, 795 eV! Claramente o fato de desprezarmos a interação entre os
elétrons é a fonte dessa diferença 9 : a energia potencial dos elétrons
é positiva o que é compatível com o fato do valor experimental ser
maior que o valor estimado. Intuitivamente 10 , poderíamos corrigir esse
resultado acrescentando o valor médio da energia de interação entre os
elétrons, ¿ ¯ ¯ À
¯ e2 ¯ 5e2
¯
ψf und ¯ ¯ ψ = (16.31)
|~r1 −~r2 | ¯
f und
4a
9
Numericamente, nosso cálculo é na ordem de 30% maior que o valor experimental.
10
Veremos, no capítulo de perturbação, que de fato essa correção é a primeira ordem
de uma expansão sistemática da energia.

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468 Cap. 16 Partículas Idênticas

Somando essa correção ao cálculo estimado inicialmente obteremos

Ef und ' −74, 8 eV .

Note que com essa correção já apresentamos um valor razoável com-


parado com o resultado experimental.
Estados excitados: os estados excitados do átomo de hélio exibem
um elétron no estado fundamental, n0 = 1, enquanto que o outro se en-
contra num estado excitado do problema de Coulomb, n ≥ 2. Nesse
caso devemos anti-simetrizar o estado, sendo que existem duas possi-
bilidades. Na primeira a parte espacial é simétrica e a parte do spin é
anti-simétrica

[u100 (~r1 )unlm (~r2 ) + u100 (~r2 )unlm (~r1 )]  χA (16.32)

Esses estados são chamados de parahélio e possuem spin total nulo.


Na segunda possibilidade, a parte espacial é anti-simétrica e a parte do
spin é simétrica

[u100 (~r1 )unlm (~r2 ) − u100 (~r2 )unlm (~r1 )]  χS (16.33)

sendo esses estados chamados de ortohélio. Esses estados possuem spin


total igual a 1, consequentemente exibindo três estados para cada en-
ergia, i.e., eles formam um tripleto.
Usando essa aproximação os estados parahélio e ortohélio possuem
a mesma energia
Enorto = Enpara = 4(E1 + En ) (16.34)
Todavia, a correlação entre a posição dos elétrons é diferente para
funções de onda simétricas e anti-simétricas, o que implica que as cor-
reções para as energias desses estados são diferentes. Como vimos, os
elétrons no estado com parte espacial simétrica ficam mais próximos em
média do que no os elétrons no caso da parte espacial ser anti-simétrica;
vide §13.4. Portanto, a correção devida à energia potencial de interação
entre os elétrons será maior para o caso de funções espaciais simétricas,
acarretando que os estados de parahélio possuem uma energia maior
que os estados de ortohélio com mesmos números quânticos.
Na Fig. 16.1 mostramos os níveis de energia do átomo de hélio e suas
respectivas energias. Podemos ver nesse figura a diferença de energia
entre os estados de parahélio e ortohélio. Mais ainda, o leitor atento
deve ter notado que os estados associados ao mesmo n porém com

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16.6. Tabela Periódica 469

diferentes valores de l não são degenerados como a nossa aproximação


prevê. Podemos argumentar que os estados com maior l possuem uma
energia mais alta, já que valor médio de r cresce com com o momentum
angular l. Com isso, os elétrons com maior valor de l encontram-se

Figura 16.1: Níveis de energia do átomo de hélio e suas respectivas energias.

em média mais distante do núcleo, permitindo que o elétron no estado


fundamental blinde de maneira mais eficiente a carga do núcleo. Uma
vez que a carga efetiva do núcleo vista pelo elétron no estado excitado
decresce quando l aumenta, temos que a energia desse elétron aumenta,
fazendo com que ele esteja menos ligado ao átomo.

16.6 Tabela Periódica


No paragrafo anterior vimos que podemos entender qualitativamente
o átomo de hélio quando fazemos aproximações muito simples e con-
sideramos que o estado dos seus elétrons é anti-simétrico. Essa é uma

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470 Cap. 16 Partículas Idênticas

das razões que nos motivou aplicar o mesmo raciocínio para outros áto-
mos. Analogamente ao que fizemos no caso do átomo de hélio, vamos
inicialmente desprezar a interação entre os elétrons na relação
N
X
H= H0 (j) + HI
j=1

onde H0 (j) contém a energia cinética da j-ésima partícula e sua inter-


ação com o núcleo
~p2j Ze2
H0 (j) = − ,
2µ rj
e utilizar as auto-funções

H0 un = En un

de H0 como uma base. Esses auto-estados são denominados orbitais,


os quais, como vimos anteriormente, encontram-se determinados pelo
número quântico principal n, seu momentum angular total l e sua com-
ponente z, m. Vamos construir a configuração eletrônica dos átomos
preenchendo os orbitais de mais baixa energia até que todos os elétrons
tenham sido colocados para um determinado átomo. Tendo em vista
o princípio da exclusão de Pauli só podemos colocar dois elétrons em
cada orbital os quais terão spins opostos. Logo, cada nível de energia
de H0 pode conter no máximo 2n2 elétrons.
Nesse ponto é conveniente introduzir um pouco da notação de Dirac.
Designamos os estados orbitais

|nlmi ≡ nL

onde L = S, P, D, F para l = 0, 1, 2, 3 respectivamente. Note que nessa


notação a componente z do momentum angular orbital não é especifi-
cada. Se o átomo possui k elétrons no orbital nL indicamos isso através
de (nL)k . É também de praxe caracterizar o estado fundamental dos
átomos através de
2S+1
LJ
onde S é o spin total do átomo, L seu momentum angular orbital total
e J o seu momentum angular total. Por exemplo, o átomo de hidrogênio
possui apenas um elétron e sua configuração eletrônica é 1s. O estado
fundamental do átomo de hidrogênio possui l = 0, s = 12 e J = 12 o que

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16.6. Tabela Periódica 471

é representamos por 2 S 1 . No caso do átomo de hélio que possui dois


2
elétrons temos que a configuração eletrônica de seu estado fundamental
é (1s)2 e o seu estado fundamental é 1 S0 .
As soluções básicas da relação H0 un = En un que estamos empre-
gando apresentam a degenerescência acidental de que os estados com
mesmo n > 1 e diferentes l são degenerados; lembre-se que os valores
permitidos de l satisfazem 0 < l < n − 1. Logo, átomos com mais de
dois elétrons exibem várias configurações de mesma energia quando de-
sprezamos a interação entre os elétrons. Por exemplo, o átomo de lítio
possui três elétrons, dos quais dois estão na configuração (1s)2 . Todavia
o terceiro elétron pode ter l = 0 ou l = 1. Para determinarmos qual
desses estados será o ocupado pelo terceiro elétron devemos levar em
conta a interação entre os elétrons. O argumento heurístico para de-
cidir qual o estado de momentum angular que possui menor energia é o
seguinte: quanto maior o momentum angular orbital de um elétron mais
afastado ele se encontra do núcleo atômico, ou seja, hril > hril0 se l > l0 .
Logo, quanto maior o momentum angular orbital de um elétron, mais
os elétrons internos blindam o núcleo e com isso o elétron está menos
ligado ao núcleo quanto maior for o seu momentum angular orbital, i.e.,
a sua energia é maior. Quando avaliamos quantitativamente a energia
dos orbitais, levando em conta todas as interações, temos que o orde-
namento em energia desses será: 1s, 2s, 2p, 3s, 3p, 4s, 3d, 4p. Note
que o efeito da blindagem da carga em função do momentum angular
orbital faz com que a energia do estado 4s seja menor que a energia do
estado 3d.
Aplicando o argumento acima para o átomo de lítio temos que o ter-
ceiro elétron deve encontrar-se no orbital 2s, sendo que a configuração
eletrônica desse átomo deve ser (1s)2 2s e o seu estado fundamental
2 S . Analogamente, a configuração eletrônica do átomo de berílio, que
1
2
possui quatro elétrons, será (1s)2 (2s)2 e seu estado fundamental 1 S0 .
Note que nesse caso o spin total deve ser zero, ou seja, o estado de spin
anti-simétrico, já que a parte espacial é simétrica.
A regra descrita acima, todavia, não é suficiente para determinar
qual a configuração do estado fundamental de átomos com muitos elé-
trons. Consideremos o átomo de carbono que apresenta seis elétrons.
A sua configuração eletrônica será (1s)2 (2s)2 (2p)2 , mas qual é o seu
momentum angular orbital total, 0, 1 ou 2? E seu spin total, 0 ou 1? O
estado desse átomo, e outros na mesma situação, pode ser determinado

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472 Cap. 16 Partículas Idênticas

usando as regras de Hund 11 , que são empíricas:


1. se todos os números quânticos são iguais, o estado com maior spin
total tem energia menor;
2. se após a aplicação da primeira regra mais de um momentum
angular orbital total for permitido, o estado de menor energia é
aquele apresentando o maior momentum angular orbital total;
3. dada uma sub-camada (n, l) o momentum angular total do sistema
corresponde ao estado com J = |L − S| se a camada está com
menos da metade dos elétrons possíveis e J = L + S no caso de
ter mais da metade dos elétrons possíveis.
É importante salientar que devemos ter em mente que os estados atômi-
cos são anti-simétricos pela troca de elétrons quando aplicamos essas
regras.
No caso do átomo de carbono, a primeira regra determina que o
spin total dos dois últimos elétrons será 1, ou seja, o seu estado de spin
é simétrico. Logo, a parte orbital do estado deve ser anti-simétrica, o
que sé será possível para o estado de momentum angular orbital total
L = 1. Como a sub-camada (2, 1) é capaz de acomodar 6 elétrons e o
átomo de carbono possui apenas dois nessa sub-camada, pela terceira
regra temos que J = |L − S| = 0. Portanto o estado fundamental do
átomo de carbono será 3 P0 .
A Tab. 16.3 apresenta as configurações dos estados fundamentais dos
átomos mais leves.

16.7 Segunda Quantização - Bósons


Na teoria dos sistemas constituídos por um grande número de partículas
idênticas costuma-se empregar um método especial de análise conhecido
pelo nome de segunda quantização. Esse método é particularmente
importante na teoria relativista, onde no encontramos com sistemas
nos quais o próprio número de partículas é uma variável. O método
da segunda quantização foi desenvolvido por Dirac para os fótons, com
aplicação a teoria da radiação em 1927 12 , e estendido aos férmions
por Jordan e Wigner em 1928 13 .
11
Friedrich Hermann Hund (1896–1997), físico alemão.
12
P. A. M. Dirac, Proceedings of the Royal Society, A114, 243-265 (1927).
13
P. Jordan and E. Wigner, Zeitschrift für Physik, 47, 631-651 (1928).

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16.7. Segunda Quantização - Bósons 473

Tabela 16.4: Níveis de energia e suas degenerescências - bósons.

Z Elemento Configuração
2
1 H (1s) S1/2
2 He (1s)2 1
S0
2
3 Li (He)(2s) S1/2
4 Be (He)(2s)2 1
S0
5 B (He)(2s)2 (2p) 2
P1/2
6 C (He)(2s)2 (2p)2 3
P0
7 N (He)(2s)2 (2p)3 4
S3/2
8 O (He)(2s)2 (2p)4 3
P2
9 F (He)(2s)2 (2p)5 2
P3/2
10 Ne (He)(2s)2 (2p)6 1
S0
2
11 Na (Ne)(3s) S1/2
12 Mg (Ne)(3s)2 1
S0
13 Al (Ne)(3s)2 (3p) 2
P1/2
14 Si (Ne)(3s)2 (3p)2 3
P0
15 P (Ne)(3s)2 (3p)3 4
S3/2
16 S (Ne)(3s)2 (3p)4 3
P2
17 Cl (Ne)(3s)2 (3p)5 2
P3/2
18 Ar (Ne)(3s)2 (3p)6 1
S0
2
19 K (Ar)(4s) S1/2
20 Ca (Ar)(4s)2 1
S0

Seja ψ1 (ξ), ψ2 (ξ), · · · certo sistema completo de funções de onda


ortogonais e normalizadas dos estados estacionários de uma partícula.
Como tais, em geral são ondas planas, i.e., funções de onda de uma
partícula livre com valores determinados d momentum linear e da pro-
jeção do spin; porém, com objetivo de reduzir o espectro dos estados
à espectro discreto, considera-se o movimento das partículas em uma
região grande, porém limitada, do espaço Ω 14 .
No sistema de partículas livres os momenta 15 dessas se conservam
separadamente. Também se conservam os números de ocupação dos
estados, ou seja, os números N1 , N2 , · · · , que indicam quantas partícu-
las se encontram em cada um dos estados ψ1 , ψ2 , · · · . Num sistema
de partículas que interagem, os momenta de cada uma das partículas
14
O conceito da partícula que se move em uma região grande, limitada, do espaço Ω é
utilizada para, no lugar de considerar o espectro contínuo dos estados, considerar
um espectro discreto, na qual conseguimos simplificar a forma de escrever as
fórmulas.
15
Plural de momentum.

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474 Cap. 16 Partículas Idênticas

não se conservam, tão pouco os números de ocupação se conservam.


Quando se trata de um sistema desse tipo podemos falar unicamente
da distribuição das probabilidades dos distintos valores dos números
de ocupação. Nós pretendemos construir um formalismo matemático
em que temos precisamente os números de ocupação, e não as coorde-
nadas e projeções dos spins das partículas, que desempenham o papel
de variáveis independentes.
Nesse formalismo o estado do sistema se descreve por uma função
de onda no espaço de números de ocupação, dado por φ(N1 , N2 , · · · , t),
com objetivo de subtrair sua diferença em relação à função de onda or-
dinária de coordenadas e spin ψ(ξ1 , ξ2 , · · · , ξN , t). Assim |φ|2 determina
a probabilidade dos distintos valores dos números N1 , N2 , · · · .
Consideremos agora um sistema de partículas idênticas que obede-
cem a estatística de Bose-Einstein, ou seja, estamos considerando os
bósons.
Seja fa1 o operador de uma grandeza 16 física qualquer correspon-
dente a uma a-ésima partícula, i.e., que atua unicamente sobre as
funções das variáveis ξa . Introduzimos o operador simétrico em relação
à todas as partículas X
F1 = fa1 (16.35)
a

onde a soma se estende a todas as partículas, e determinamos seus


elementos de matriz com respeito as funções de onda (16.3). Note que
os elementos de matriz são diferentes de zero somente para as transições
em que não variam os números N1 , N2 , · · · , elementos diagonais, e para
as transições nas quais um desses números aumenta em uma unidade,
mesmo que o outro diminua em uma unidade. Com efeito, como cada
um dos operadores fa1 atua somente sobre uma função no produto

ψp1 (ξ1 )ψp2 (ξ2 ) · · · ψpN (ξN )

seus elementos de matriz podem ser distintos de zero unicamente para as


transições em que varia o estado de uma só partícula; mas isso significa
que o número de partículas que se encontram no estado diminua em
uma unidade, mesmo que em outro estado aumenta em uma unidade.
Assim, os elementos não diagonais desse resultado são iguais a
p
hNi , Nk − 1|f 1 |Ni − 1, Nk i = fik
1
Ni Nk (16.36)
16
observável

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16.7. Segunda Quantização - Bósons 475

1 é o elemento de matriz
aqui fik
Z
1
fik = ψi∗ (ξ) f 1 ψk (ξ) dξ (16.37)

Os elementos de matriz diagonais de F1 são os valores médios da grandeza


F1 nos estados ψN1 N2 ··· . O cálculo dará
X
hF1 i = fii1 Ni . (16.38)
i

Introduzimos agora os operadores ai , fundamentais para a segunda


quantização, que atuam não sobre as funções de coordenadas, mas sim
sobre as funções dos números de ocupação. Por definição, o operador ai ,
atuando sobre a função φ(N1 , N2 , · · · ), irá diminuir em uma unidade √ o
valor da variável Ni , ao mesmo tempo que multiplica a função por Ni
p
ai φ(N1 , N2 , · · · , Ni , · · · ) = Ni φ(N1 , N2 , · · · , Ni − 1, · · · ) (16.39)

Podemos dizer que o operador ai é um operador de aniquilação de


partículas. Esse operador será representado na matricial cujo único el-
emento distinto de zero é
p
hNi − 1|ai |Ni i = Ni . (16.40)

O operador a†i é o conjugado do operador ai , por definição, podemos


escrever o operador a†i na forma matricial por
p
hNi |a†i |Ni − 1i = hNi − 1|ai |Ni i∗ = Ni . (16.41)

Isso significa que, ao atuar sobre a função φ(N1 , N2 , · · · ) esse operador


aumenta o número Ni em uma unidade
p
a†i φ(N1 , N2 , · · · , Ni , · · · ) = Ni + 1 φ(N1 , N2 , · · · , Ni + 1, · · · )
(16.42)
Podemos dizer que o operador a†i é um operador de criação de partícu-
las.
O produto dos operadores a†i ai ao atuar sobre a função de onda pode
unicamente multiplicá-la por uma constante, deixando sem alteração
todos as variáveis N1 , N2 , · · · . A multiplicação direta das matrizes
(16.40) e (16.41) demonstra na realidade que a†i ai é representada por

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476 Cap. 16 Partículas Idênticas

uma matriz cujos elementos diagonais são iguais a Ni . Logo, podemos


escrever
a†i ai = Ni (16.43)
Analogamente
ai a†i = Ni + 1 (16.44)

o que nos leva a regra de comutação dos operadores ai e a†i


h i
ai a†i − a†i ai = 1 ou ai , a†i = 1 (16.45)

Mas os operadores com diferentes sub-índices i e k que atuam sobre


variáveis distintas, Ni e Nk , comutam

ai ak − ak ai = 0, ai a†k − a†k ai = 0 com i 6= k . (16.46)

Partindo das propriedades descritas pelos operadores ai e a†i , é fácil


verificar que o operador
X
1 †
F1 = fik ai ak (16.47)
i,k

coincide com o operador (16.35). Efetivamente, todos seus elementos


matriciais calculados por (16.40) e (16.41) coincide com os elementos
1 são apenas uns
da equação (16.36). Na fórmula (16.47) as grandezas fik
números. Desse modo conseguimos expressar um operador ordinário,
que atua sobre as funções de coordenadas, na forma de um operador
que atua sobre as funções das novas variáveis, i.e., dos números de
ocupação Ni .
O resultado obtido poderá ser generalizado à operadores de outro
tipo. Seja X
F2 = 2
fab (16.48)
a>b

onde fab2 é o operador de uma grandeza física que se refere ao mesmo

tempo à um par de partículas e que, para tanto, atua sobre as funções ξa


e ξb . Cálculos análogos demostram que esse operador pode ser expresso
em funções dos operadores ai e a†i mediante a igualdade

1 X ¡ 2 ¢ik † †
F2 = f lm ai ak am al (16.49)
2
i,k,l,m

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16.7. Segunda Quantização - Bósons 477

onde Z Z
¡ 2 ¢ik
f lm = ψi∗ (ξ1 )ψk∗ (ξ2 ) f 2 ψl (ξ1 )ψm (ξ2 ) dξ1 dξ2

Desse modo as fórmulas se generalizam aos operadores de qualquer


outro tipo, que são simétricos em relação à todas as partículas.
Vamos usar os operadores ai e a†i para estudar um sistema físico
constituído de N partículas idênticas que se interagem. Queremos obter
o operador hamiltoniano para esse sistema simétrico em relação à todas
as partículas. Assim, se a interação no sistema se reduz a interação de
cada par de partículas, a hamiltoniana terá a forma
X X
H= H1a + U2 (~ra ,~rb ) (16.50)
a a>b

onde H1a é a parte da hamiltoniana que depende das coordenadas de


uma só partícula, i.e., é a hamiltoniana da partícula livre

~2 ~ 2
H1a = − ∇ (16.51)
2µ a

e a função U2 (~ra ,~rb ) é a energia de interação das partículas. Aplicando


na relação (16.50) as formulas (16.47) e (16.49) teremos
X 1 X ¡ 2 ¢ik † †
1 †
H= Hik ai ak + U lm ai ak am al (16.52)
2
i,k i,k,l,m

Assim teremos a hamiltoniana na forma de operador que atua sobre as


funções dos números de ocupação.
Para um sistema de partículas que não se interagem entre si, a
equação (16.52) se reduz a
X
1 †
H= Hik ai ak (16.53)
i,k

Se H1 ψi = εi ψi , já que ψi são funções próprias da hamiltoniana H1


1 será diagonal e seus elementos diagonais
da partícula livre, a matriz Hik
são os valores próprios da energia εi da partícula. Desse modo
X
H= εi a†i ai (16.54)
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478 Cap. 16 Partículas Idênticas

mas o operador a†i ai = Ni , ou seja, a†i ai são os números de ocupação.


logo, obteremos para os níveis de energia do sistema a expressão
X
E= εi Ni
i

esse resultado é precisamente o que deveríamos esperar.


O formalismo matemático do método da segunda quantização pode-
rá ser representado na forma mais compacta, introduzindo os operadores
ψ̂
X † X
ψ̂(ξ) = ψi (ξ) ai ψ̂ (ξ) = ψi∗ (ξ) a†i (16.55)
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onde as variáveis ξ são consideradas como parâmetros.


Em virtude do dito anteriormente sobre os operadores ai e a†i , fica
claro que o operador ψ̂ diminuirá em uma unidade o número total de

partículas do sistema, enquanto o operador ψ̂ aumentará o número
total de partículas em uma unidade 17 .

Com ajuda dos operadores ψ̂ e ψ̂ a hamiltoniana (16.52) terá a
forma
Z Z Z
† 1 1 † †
H = ψ̂ (ξ) H ψ̂(ξ) dξ + ψ̂ (ξ)ψ̂ (ξ 0 ) U2 ψ̂(ξ 0 )ψ̂(ξ) dξdξ 0
2
(16.56)
onde usamos os operadores (16.55).

O operador ψ̂ ψ̂ se chama operador densidade das partículas.
E a integral Z

N = ψ̂ ψ̂ dξ (16.57)

desempenha no formalismo da segunda quantização o papel de oper-


ador número total de partículas do sistema. Oras, fazendo as devi-
das substituições e levando em conta a normalização e a ortogonalidade
das funções de onda ψi , teremos
X †
N= ai ai (16.58)
i

17
Chamamos P a atenção sobre analogia entre as expressões (16.55) e o desenvolvi-
mento ψ = an ψn de uma função de onda arbitrária em certo sistema completo
de funções. Aqui ocorre como se fizéssemos a quantização novamente. A isso se
deve o nome do método da segunda quantização.

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16.8. Segunda Quantização - Férmions 479

ou seja, cada termo dessa soma é o operador número das partículas que
se encontram no i-ésimo estado, que de acordo com (16.43), seus valores
próprios são iguais aos números de ocupação Ni , cuja soma nos dará o
número total de partículas do sistema

16.8 Segunda Quantização - Férmions


Toda a técnica desenvolvida na seção anterior para o método da se-
gunda quantização permanece inalterado para um sistema constituído
de férmions idênticos. Mas, como é natural, trocam as fórmulas conc-
retas dos elementos matriciais das grandezas físicas e dos operadores
ai .
Assim, nesse caso, a função de onda ψN1 N2 ··· tem a forma (16.5),
i.e.,
 
ψp1 (ξ1 ) ψp1 (ξ2 ) · · · ψp1 (ξN )
1  ψp (ξ1 ) ψp (ξ2 ) · · · ψp (ξN ) 
 2 2 2 
ψ(ξ1 , ξ2 , · · · , ξN ) = √ Det  .. .. . .. 
N!  . . . . . 
ψpN (ξ1 ) ψpN (ξ2 ) · · · ψpN (ξN )

Como já indicamos, entre os números p1 , p2 , · · · , pN , que designam


os estados ocupados, não podemos ter iguais, já que no caso contrário o
determinante se anularia. Em outras palavras, os números de ocupação
Ni podem ter somente valores 0 ou 1.
Devido o caracter anti-simétrico da função (16.5), se colocará em
primeiro lugar o problema da seleção de seu sinal. No caso da estatística
de Bose-Einstein, essa questão não existia, já que em virtude da simetria
da função de onda, uma vez escolhido seu sinal, esse irá se conservar em
todas as permutações das partículas. Para fazer que o sinal da função
(16.5) seja determinado podemos estabelecer o seguinte. Numeremos
uma vez para sempre os estados ψi por meio de números consecutivos.
Feito isso, faremos com que as linhas do determinante acima, equação
(16.5), sempre sejam de maneira tal que p1 < p2 < · · · < pN , mesmo
que nas colunas figuram as funções das distintas variáveis na ordem
ξ1 , ξ2 , · · · , ξN . O sinal da função de onda dependerá, portanto, de
todo o conjunto dos números p1 , p2 , · · · , pN , i.e., de todos os números
de ocupação.
Como consequência resultam também, dependentes deles, os sinais
dos elementos matriciais dos operadores de aniquilação e de criação

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480 Cap. 16 Partículas Idênticas

de partículas. Resultam precisamente que esses operadores devem ser


definidos como matrizes com um só elemento distinto de zero, igual a
Pi−1
h0i |ai |1i i = h1i |a†i |0i i = (−1) k=1 Nk
. (16.59)
Multiplicando entre si essas matrizes, podemos comprovar que os
produtos a†i ai e ai a†i são diagonais, sendo

a†i ai = Ni ai a†i = 1 − Ni (16.60)


e sua soma
ai a†i + a†i ai = 1 (16.61)
Chamamos a atenção sobre o fato de que a redução à zero do produto
a†i ai quando Ni = 0 e do produto ai a†i quando Ni = 1 é completamente
natural. Nesses produtos atuam primeiro o operador da direita; mas é
impossível destruir uma partícula no estado i-ésimo se Ni = 0, e de
acordo com o princípio de Pauli, é impossível criar um elétron no
estado i-ésimo se o dito estado está ocupado, Ni = 1. Por essa mesma
razão é evidente que
ai ai = 0 a†i a†i = 0 . (16.62)
Em troca, para todos os pares de operadores com distintos i e k,
teremos
ai ak + ak ai = 0 a†i a†k + a†k a†i = 0
ai a†k + a†k ai = 0 i 6= k (16.63)
ou seja, todos são anticomutativos, i.e., o produto varia de sinal se
trocarmos a ordem dos fatores. Essa diferença em relação ao caso usando
estatística de Bose-Einstein é completamente natural. Nesse último caso
os operadores ai e ak eram totalmente independentes; cada um dos
operadores ai atuavam somente sobre uma variável Ni e o resultado de
sua atuação não dependia dos valores dos demais números de ocupação.
Porém, no caso da estatística de Fermi-Dirac, o resultado da atuação
do operador ai depende não só do próprio número Ni , mas também dos
números de ocupação de todos os outros estados anteriores. Devido essa
atuação dos distintos operadores ai e ak , não se pode considerar como
independentes.
Uma vez estabelecidas, desse modo, as propriedades dos operadores
ai e a†i , todas as fórmulas que estão na seção anterior, de (16.47) a
(16.58), conservam sua validade.

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16.9. Espalhamento de Partículas Idênticas - Parte 2 481

16.9 Espalhamento de Partículas Idênticas -


Parte 2
Aqui iremos detalhar o que já foi discutido no §9.11. A existência de
amplitude de troca tem consequências importantes também para as
seções de choque de espalhamento de um par de partículas idênticas. No
caso de partículas distinguíveis, o espalhamento devido a um potencial
depende da distância relativa entre as partículas e independente dos
spins, cujos momenta iniciais, no sistema de centro de massa, e estados
de spin são ~k1i , χ1 (s) e ~k2i = −~k1i , χ2 (s), e cujos momenta e estados
de spin finais são ~k1f , χ1 (s) e ~k2f = −~k1f , χ2 (s), é descrito por uma
amplitude de espalhamento f (θ) em termos da qual a seção de choque
diferencial é dada por

= |f (θ)|2
dΩ
sendo θ o ângulo de espalhamento, dado por
~k1  ~k1
i f
cos θ =
ki1 kf1

Como foi suposto que a interação é independente de spin, os estados


de spin finais são iguais aos estados iniciais. É importante notar que
esses estados de spin não são necessariamente autovetores de ~Sz . Em
geral eles são estados de spin que dependem do particular processo de
preparação ao qual tenham sido submetidos o projétil e o alvo.
Para passar ao caso do espalhamento de duas partículas idênticas, é
útil escrever a amplitude de espalhamento em termos de um operador
de transição T definido por

h~k1f χ1 , ~k2f χ2 |T|~k1i χ1 , ~k2i χ2 i ≡ f (θ)

que, como a interação responsável pelo espalhamento, é também in-


dependente dos spins. Como no caso de partículas idênticas os esta-
dos inicial e final devem ser devidamente simetrizados, para bósons, ou
anti-simetrizados, para férmions, a amplitude de espalhamento adquire
contribuições de troca, sendo dada por

f± (θ) = h~k1f χ1 , ~k2f χ2 |T|~k1i χ1 , ~k2i χ2 i ± h~k1f χ1 , ~k2f χ2 |T|~k2i χ2 , ~k1i χ1 i


¯ ¯2
= f (θ) ± f (π − θ) ¯hχ1 |χ2 i¯

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482 Cap. 16 Partículas Idênticas

Os sinais + e − se referem ao caso de bósons e férmions respectivamente,


e foi usado o fato de que a transição de ~k2i para ~k1f corresponde a um ân-
gulo de espalhamento π − θ. A seção de choque de espalhamento, tendo
em conta os efeitos de troca associados à identidade das partículas, é
portanto dada por
dσ ¯ ¯ ¯2 ¯¯2
¯
= ¯f (θ) ± f (π − θ) ¯hχ1 |χ2 i¯ ¯
dΩ
que mostra efeitos de interferência entre as duas amplitudes que, em
particular, expõe à observação a sua fase relativa. Por exemplo, no caso
do espalhamento coulombiano de dois elétrons com spins paralelos, i.e.,
χ1 = χ2 , a seção de choque diferencial é dada por

= |fc (θ) ± fc (π − θ)|2 (16.64)
dΩ
onde fc (θ) é a amplitude do espalhamento coulombiano
· µ ¶ ¸
η 2 θ
fc (θ) = − exp − i η log sen + 2 i σ0 (16.65)
2k sen2 2θ 2
O parâmetro de Sommerfeld, η, e a defasagem coulombiana da onda
s, σ0 , são dados respectivamente por
µe2
η= e σ0 = arg Γ(1 + i η)
~2 k
Nessas expressões k é o vetor de onda associado ao movimento relativo
dos dois elétrons e µ é a sua massa reduzida. A seção de choque (16.64)
é marcadamente distinta da seção de choque de Rutherford. De fato,
devido aos efeitos de troca ela se torna simétrica em torno de θ = π2 e
adquire um termo de interferência
µ ¶int · µ ¶¸
dσ 2η 2 2 θ
=− 2 cos η log tan
dΩ k sen2 θ 2
que tem um comportamento fortemente oscilatório nas vizinhanças de
θ = 0 e θ = π. No caso de spins antiparalelos, i.e., hχ1 |χ2 i = 0, não
há contribuições de troca para a amplitude de espalhamento e a seção
de choque se reduz à seção de choque de Rutherford. Isso pode ser en-
tendido notando que, sendo a interação coulombiana independente dos
spins, o estado de spin dos elétrons é preservado durante o processo de
colisão, o que permite, nesse caso, a identificação das partículas através
de seus estados de spin.

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16.10. Comentários 483

16.10 Comentários
Para esse capítulo, nossa principal referência foi o livro dos profs. Lan-
dau e Lifshitz (1989) 18 , também recomenda-se ao leitor, uma leitura dos
livros dos Prof. Piza (2002) 19 e Jun John Sakurai (1994) 20 . No livro do
Landau iremos encontrar um excelente trabalho sobre partículas idên-
ticas, modelo atômico e tabela periódica. Um outro excelente trabalho
será encontrado na leitura do livro do Prof. Messiah (1970) 21 .

18
L. D. Landau and E. M. Lifshitz, Quantum mechanics, (1989).
19
A. F. R. de Toledo Piza, Mecânica Quântica, (2002).
20
J. J. Sakurai, Modern quantum mechanics, (1994).
21
A. Messiah, Quantum mechanics, (1970).

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Sobre o Autor

José Roberto Mahon, nascido em Bauru, no Estado de São Paulo, em


1955, é professor do Departamento de Física Nuclear e Altas Energias,
no Instituto de Física da Universidade do Estado do Rio de Janeiro
(UERJ). Graduado em matemática e tecnologia por Sorocaba, fez seu
mestrado em física na Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP)
e obteve seu doutorado em física pela Universidade de São Paulo (USP).
Com formação científica na área de física de partículas, desenvolve
pesquisas em física experimental de altas energias e trabalha em co-
laborações internacionais tanto no Fermilab, Estados Unidos, como no
CERN, na Europa. Publicou mais de 130 trabalhos em periódicos cientí-
ficos internacionais, além de apresentações em congressos internacionais.
Orienta alunos de graduação e de pós-graduação. É um dos autores do
livro Estimativas e erros em experimentos de Física, publicado em
2005 pela EdUERJ.

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Lista de Figuras

1.1 Interferência: ondas de água em um tanque. . . . . . . . 34


1.2 Interferência: com feixe de elétrons. . . . . . . . . . . . . 35
1.3 Identificação da fenda pela qual passou o elétron. . . . . 35

3.1 Potencial degrau de altura V0 em x = 0. . . . . . . . . . 87


3.2 Barreira de potencial regular de altura V0 e largura 2a. . 92
3.3 Função de onda na região −a < x < a. . . . . . . . . . . 96
3.4 Potencial contínua - gaussiana. . . . . . . . . . . . . . . 97
3.5 Curva característica de um diodo túnel. . . . . . . . . . 98
3.6 Poço quadrado de potencial. . . . . . . . . . . . . . . . . 100
3.7 Função y = tan ξ e função y = f (ξ), solução ímpar. . . . 105
3.8 Função y = tan ξ e função y = f (ξ), solução par. . . . . 106
3.9 Gráfico de cos qa + 2 senqaqa como função de qa. . . . . . . 113
3.10 Funções de Onda do Oscilador Harmônico. . . . . . . . 118

4.1 Potencial V (x) com ponto de inversão linear no ponto x0 . 132


4.2 Região proibida à direita do ponto de inversão x0 . . . . 137
4.3 Barreira de Potencial de forma arbitrária. . . . . . . . . 138
4.4 Barreira de potencial para o decaimento α. . . . . . . . 141
4.5 Poço de Potencial de forma arbitrária. . . . . . . . . . . 142
4.6 Comportamento qualitativo das funções de onda. . . . . 144

5.1 Esquema do experimento de Stern-Gerlach. . . . . . . . 148


5.2 Experimento de Stern-Gerlach seqüencial. . . . . . . . . 150
5.3 Definição dos ângulos polares θ e ϕ. . . . . . . . . . . . 185

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488 Lista de Figuras

6.1 Esquema do experimento de Rabi. . . . . . . . . . . . . 208


6.2 Número de átomos detetados em função do freqüência do
campo magnético BL num experimento de Rabi. . . . . 209

7.1 Amplitude sobre todos os caminhos possíveis. . . . . . . 236


7.2 Aproximação semiclássica. . . . . . . . . . . . . . . . . . 239
7.3 Efeito Aharonov-Bohm - Arranjo Experimental . . . . . 249
7.4 Representação de um monopolo magnético . . . . . . . . 255
7.5 Caminhos ao redor da linha de Dirac . . . . . . . . . . . 255

8.1 Sistema de coordenadas esféricas. . . . . . . . . . . . . . 264


8.2 Sistema de coordenadas - teorema da adição. . . . . . . 282
8.3 Valores de αn2 r l como função de nr . . . . . . . . . . . . . 294
8.4 Densidade de probabilidade da variável r. . . . . . . . . 302

9.1 Geometria considerada num espalhamento. . . . . . . . 310


9.2 Espalhamento por um potencial de curto alcance. . . . . 316
9.3 Dependência da seção de choque parcial com a energia
próximo a uma ressonância. . . . . . . . . . . . . . . . . 326
9.4 Contornos de integração no plano complexo. . . . . . . . 330
9.5 Esquema para aproximação eikonal. . . . . . . . . . . . 336

10.1 Rotações e ângulos de Euler. . . . . . . . . . . . . . . . 363


10.2 Representação da adição do momentum angular ~J = ~L +~S.369
10.3 Medida Stern-Gerlach no paradoxo EPR versão de Bohm. 389
10.4 Experimento de Bohm. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 392

12.1 Poço duplo simétrico. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 437


12.2 Molécula de amônia. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 441
12.3 Poço duplo - simétrico e anti-simétrico. . . . . . . . . . 442

16.1 Níveis de energia do átomo de hélio e suas respectivas


energias. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 469

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Mecânica Quântica

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Índice Remissivo

3 − j símbolo de Wigner, 380 aproximação


álgebra – de Born, 331
– de Lie, 360 – eikonal, 337
– – SU (2), 360 – semiclássica, 123, 238
ótica geométrica, 321 – WKB, 123
ângulo – WKBJ, 123
– azimutal, 354 argumento heurístico, 471
– de Euler, 362 auto-spinor, 354
– polar, 354 auto-estado, 153, 171, 269, 367, 370
Drehung, 343 – de energia, 54, 114, 193
Gedankenexperiment, 389 autofunção, 54, 62, 114, 215, 245, 272
ansatz, 126, 370 autoket, 153, 165
ensemble average, 399 autovalor, 54, 62, 114, 153, 159, 165,
ensemble, 398 245, 270
ensemble canônico, 422 – de energia, 104, 285
rank, 435 – degenerado, 172
spinor, 350, 414 autovetor, 153
spin, 148
– down, 370 bósons, 339, 457
– up, 370
whiskers, 249 calor específico, 18
coeficiente
acoplamento spin-órbita, 375 – de Clebsch-Gordon, 373, 377
amplitude – de reflexão, 89
– de espalhamento, 309 – de transmissão, 89
– de probabilidade, 412 – de Wigner, 377
– de transição, 229 colapso de onda, 389
anticomutador, 75, 182 colisão de partículas, 307
anticomutativo, 480 completeza, 155, 391
antilinear, 155 comutador, 75, 169, 182

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496 Índice Remissivo

comutadores, 30 – de Bessel, 288


condição – – diferencial esférica, 288
– de normalização, 51 – de continuidade, 50
– de ressonância, 207 – de Hamilton-Jacobi, 43, 48, 51, 335
– triangular, 379 – de Heisenberg, 31, 70, 197, 429
constante – de Helmholtz, 85
– de Boltzmann, 421 – de Hermite, 116
– de estrutura, 361 – de Kummer, 303
– de estrutura fina, 26 – de Lagrange, 242, 428
– de movimento, 429 – de Legendre, 273
– de Planck, 18, 190 – de Liouville-von Neumann, 409
– de Rydberg, 22 – de Maxwell, 85
correlação perfeita, 390 – de Poisson, 334
– de Rayleigh, 293
degenerado, 54, 286 – de Schrödinger, 37, 191, 284
degenerescência, 461 – – dependente do tempo, 42, 48, 51,
delta 53, 121, 206, 226
– de Dirac, 60, 81, 108 – – independente do tempo, 54, 86,
– de Kronecker, 57, 81 114, 226, 312
densidade – de Sturm-Liouville, 115
– de corrente de probabilidade, 50, – diferencial acoplada, 206
88, 311 – hipergeométrica confluente, 303
– de probabilidade, 49 – integral, 328
desigualdade de Bell, 389 – secular, 170
desigualdade de Schwarz, 175 escalar hermitiano, 78
deslocamento espaço
– de fase, 313 – de Hilbert, 152, 155, 345, 362, 369,
– espacial, 176 432
determinante da matriz, 164 – dual, 154
distinguível, 481 – euclidiano, 155
dualidade – produto, 378
– onda-partícula, 20 – vetorial complexo, 151
– partícula-onda, 32, 33 espalhamento, 283, 307
– de Rutherford, 333
efeito – elástico, 322
– Compton, 21, 31 – inelástico, 322
– fotoelétrico, 19, 31 – reativo, 323
– Ramsauer-Townsend, 327 – ressonante, 325
– túnel, 92, 95, 138 espectro
Eletrodinâmica Quântica, 204, 248 – de energia, 397
entropia, 421 espectro atômico, 21, 24
equação espectro contínuo, 62, 107, 161, 290,
– característica, 166 308, 473
– de Airy, 133 espectro de energia, 54, 212

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Índice Remissivo 497

espectro discreto, 62, 161, 308, 473 função


estado – anti-simétrica, 439, 456
– de Bloch, 110 – de Green, 328
– de Fock, 210 – de Wigner, 365
– de mistura, 397 – partição, 423
– estacionário, 54, 55, 103, 194, 226, – própria, 477
412 – simétrica, 439, 456
– fundamental, 107 função ímpar, 103
– ligado, 101, 142 função associada de Legendre, 276
– misturado, 397 – de primeira espécie, 276
– não-estacionário, 56, 195 função de Airy, 133
– puro, 397 função de Bessel, 288
– singleto do spin, 339, 372, 462 – cilíndrica, 134
– tripleto do spin, 339, 372, 462 – esférica, 288, 314, 318
estados coerentes, 220 função de Green, 233
estatística função de Hankel
– de Bose-Einstein, 457 – esférica, 288
– de Fermi-Dirac, 457 função de Heaviside, 84, 233
experimento de Stern-Gerlach, 147, função de Neumann, 288
180, 398 – esférica, 288, 318
função Gamma, 304
férmions, 339, 457 função geratriz, 275
fórmula função harmônica esférica, 270
– de Baker-Campbell-Hausdorff, 77, função hipergeométrica confluente,
347 303
– de Breit-Wigner, 326 função linear, 154
– de Brillouin, 424 função par, 82, 103, 114
– de Feynman-Kac, 238 função trabalho, 20, 140
– de Rabi, 207
– de recorrência, 276 grupo
– de Rodrigues, 120, 274, 299 – O(3), 356
fórmulas de conexão, 132 – O(n), 356
fator g, 148, 201 – SO(3), 356
fator de forma atômico, 334 – SO(4), 354
fator de Gamow, 141 – SO(n), 356
fator giromagnético, 204 – SU (2), 354, 357
flutuação quântica, 242 – SU (n), 357
fluxo de probabilidade, 50 – U (n), 357
força de troca, 466 – abeliano, 178, 345
forças centrífugas, 285 – comutativo, 178
forças centrais, 259 – de Lie, 357, 358
freqüência – de operadores reais, 341
– de cíclotron, 204 – de rotação, 344, 356, 381
– de Larmor, 201 – especial unitário, 357

Mecânica Quântica

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498 Índice Remissivo

– linear complexo, 355 mésons π, 307


– linear real, 355 método de Frobenius, 116, 297
– não-abeliano, 182, 345 método de ondas parciais, 312
– ortogonal, 354 magneton
– unimodular unitário, 357 – de Bohr, 201
– uniparamétrico, 359 – nuclear, 205
MASER, 442
híperon, 436 massa reduzida, 295
harmônicos esféricos, 277 matriz
homeomorfo, 358 – adjunta, 165
– anti-auto-adjunta, 360
identidade de Jacobi, 76 – anti-simétrica, 272
integral de caminho, 229 – auto-adjunta, 361
integral de Feynman, 238 – cofator, 164
integral de Fourier, 39, 40, 59, 82, 245 – de Pauli, 351
integral de Fresnel, 240 – de transformação, 377
integral de Riemann, 237 – densidade, 401
integral funcional, 238 – inversa, 165
integral Gaussiana, 231 – ortogonal, 356
interação coulombiana, 295 – simétrica, 272
interação de troca, 466 – transposta, 165
interações fundamentais, 256 – – conjugada, 166
interações nucleares – unidade, 166
– eletromagnéticas, 308 – unimodular unitária, 365
– fortes, 308 – unitária, 168
– fracas, 308, 435 Mecânica Quântica
interferência destrutiva, 239 – Matricial, 24, 29, 30
interferômetro de neutron, 349 – Ondulatória, 31, 42, 81, 226
invariante, 109, 428 modelo atômico
isomorfismo, 360 – de Bohr, 23, 24
– local, 360 – de Rutherford, 23
momenta, 473
lagrangiana, 238, 427 momento magnético, 148
largura, 325 – anômalo, 204
LASER, 442 momentum angular, 259
lei de conservação, 427, 429 – adição, 369
– da energia, 430 – intrínseco, 148
– do momentum, 431 – orbital, 259
– do momentum angular, 432 monopolo magnético, 252
lei de Dulong e Petit, 19 muons, 307
lema
– de Baker-Hausdorff, 347 nível de Fermi, 140
leptons, 308 núcleo - kernel, 230
localidade, 390 número de ocupação, 473

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Índice Remissivo 499

número quântico, 377 – momentum linear, 431


– azimutal, 301 – número, 210
– magnético, 266 – – total de partículas, 478
– principal, 298 – nulo, 157
não-localidade, 388 – ortogonal, 341
norma, 155 – reservo, 156
– tensorial, 385
observável – – esférico, 385
– compatível, 172 – – esférico irredutível, 385
– física, 58, 153, 159, 171 – transposto, 64
– incompatível, 172 – unitário, 78, 167, 177
onda esférica – vetorial, 383
– emergente, 322 ortogonalidade, 56, 66, 160
– incidente, 322 ortohélio, 468
operador ortonormal, 161
– adjunto, 65, 78, 157 ortonormalizado, 161, 270
– – hermitiano, 157
– anti-hermitiano, 169 parâmetro de Cayley-Klein, 358
– anti-linear, 63, 156 parâmetro de impacto, 316
– auto-adjunto, 66, 159 parâmetro de inelasticidade, 324
– de abaixamento, 181, 212, 267, 278 parâmetro de Sommerfeld, 482
– de aniquilação, 210, 475 paradoxo EPR, 388
– de anti-simetrização, 460 parahélio, 468
– de criação, 210, 475 paridade, 433
– de evolução temporal, 189, 200, – ímpar, 115, 433
229, 349, 411 – definida, 433
– de inversão espacial, 432 – par, 115, 433
– de inversão temporal, 442 perturbação
– de levantamento, 181, 211, 267, 278 – dependente do tempo, 201
– de permutação, 459 peso de probabilidade, 398
– de projeção, 160, 403 peso estatístico, 399
– de rotação, 202, 262 pions, 307
– de simetrização, 460 poço quântico, 113
– de transição, 481 polinômio
– densidade, 400 – de Hermite, 117, 216
– – das partículas, 478 – de Laguerre, 298
– deslocamento, 79, 109, 178, 190 – de Legendre, 273, 314
– energia, 430 ponto
– hamiltoniano, 48, 54, 193 – de fase estacionária, 240
– hermitiano, 65, 157, 169, 190, 269, – de inversão linear, 132
343 população fracionária, 398
– identidade, 67, 160, 190 postulados de Bohr, 23
– linear, 62, 74, 156 potencial
– momentum angular, 432 – centrífugo, 285

Mecânica Quântica

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500 Índice Remissivo

– coulombiano, 140 – de Hund, 472


– coulombiano blindado, 332 – de Laplace, 357
– de Yukawa, 333 – de ouro de Fermi, 201
– efetivo, 285 – de Wilson-Sommerfeld, 25, 28
– – reduzido, 286 relógio atômico, 205
precessão do spin, 204 relação
princípio – Bohr-Peierls-Placzek, 322
– da causalidade de Galileu, 233 – de anticomutação, 182, 351
– da complementaridade, 40 – de completeza, 57, 160, 277, 400
– da incerteza, 38, 39, 91, 175, 455 – de comutação, 173, 182, 351
– da indistinguibilidade, 456 – de fechamento, 160, 282
– da relatividade, 391 – de Planck-Einstein, 190
– da superposição, 37, 41 – de recorrência, 378
– de correspondência, 26, 28, 73, representação
145, 198 – de Heisenberg, 196
– de exclusão de Pauli, 149, 459, 480 – de interação, 198
– de Hamilton, 239 – de Schrödinger, 196, 225
– de Heisenberg, 175 – irredutível, 365
probabilidade de transição, 207 – matricial, 162
problema de autovalor, 54 ressonância
produto – magnética nuclear, 205
– escalar, 78, 155 rotação
– – hermitiano, 151 – ativa, 341
– externo, 157 – de Euler, 362
– interno, 78, 110, 155, 376 – infinitesimal, 261
– tensorial, 369 – – gerador, 262, 341
propagador, 230 – passiva, 342
– de Feynman, 233
pseudo-escalar, 435 série
pseudo-vetor, 435 – de Clebsch-Gordon, 382
– de Dyson, 193
quantum – de Fourier, 27
– de energia, 17 – de Frobenius, 273, 287
quarks, 308 – de Lie, 76
– de Taylor, 76, 116, 234, 325, 367,
radiação 430
– de corpo negro, 18 – – funcional, 241
– eletromagnética, 17, 21, 31 seção de choque
raio de Bohr, 296, 335, 467 – diferencial, 310
randônico, 398 – total, 310
razão giromagnética, 416 segunda quantização, 472
realidade, 391 separabilidade, 156
regra sequência de Cauchy, 156
– de comutação, 30, 156 simetria, 427

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“mq_notas-N” — 2009/5/5 — 21:48 — page 501 — #501


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Índice Remissivo 501

– de cor, 360
– de sabor, 360

tensor
– de Levi-Civita, 182, 260
– esférico, 385
teorema
– da adição, 281, 293
– de Bloch, 111
– de Ehrenfest, 73, 417
– de Green, 72
– de Wigner-Eckart, 383, 386
– dos resíduos, 329
– virial, 74, 218
teorema óptico, 322
teoria
– da radiação, 472
– de colisões, 307
traço, 170, 401
transformação
– de dualidade, 252
– unitária, 167
transformada de Fourier, 328
translação, 176
– infinitesimal, 176
tunelamento quântico, 92, 95, 138

unificação das interações, 256

valor
– esperado, 58, 159, 171, 193
– próprio, 477
– principal de Cauchy, 84
variável independente, 474
variável oculta, 391, 394
vetor
– bra, 154, 225
– ket, 152, 225, 343
– axial, 435
– polar, 435
– polarização, 415

Mecânica Quântica

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