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VIII SEMINÁRIO NACIONAL DE

HISTÓRIA DA MATEMÁTICA
05 a 08 de abril de 2009
Belém – Pará – Brasil
ISBN – 978-85-7691-081-7

CC 66
O conceito matemático de infinito
e seu uso como metáfora religiosa
na obra de Blaise Pascal1

Severino Barros de Melo


Universidade Católica de Pernambuco
gteca@oi.com.br

RESUMO

A presente comunicação é um recorte da pesquisa Matemática e Religião: um estudo sobre suas relações
recíprocas na obra de Blaise Pascal que está sendo desenvolvido pelo autor no doutorado em educação na UFRN,
na linha de Educação Matemática, sob a orientação do prof. Dr. John A. Fossa. No VII SNHMAT apresentamos um
pôster no qual foram analisadas diversas categorias identificadas por pesquisadores como Davis & Hersh (1989),
Matthews (1995), Erickson & Fossa (1996), Fauvel & Maanen (2000), Anglin (2001), Di Giorgio (2001), Gratann-
Guiness (2001), Kline (2001) como sendo reveladoras de aspectos comuns entre a matemática e a religião. O
objetivo desta comunicação é apresentar o conceito matemático de infinito como um dos aspectos da relação
matemática e religião, avaliando o seu uso metafórico nos textos pascalinos. Foram identificados diferentes cenários
nos quais Pascal lança mão do infinito com objetivos religiosos. Do ponto de vista metodológico é uma pesquisa
qualitativa bibliográfica com leitura analítico-comparativa de textos referenciais. Como conclusão vem em
evidencia que para Pascal, diversos elementos da matemática como o infinito, a probabilidade, a geometria e as
estruturas silogísticas exercem um papel fundamental na construção de metáforas religiosas. Sem elas as narrativas
de suas experiências espirituais e suas concepções teológicas ficariam seriamente comprometidas. Dentre estes
elementos, o infinito para Pascal tem uma grande importância por ser usado como revelador de características de
Deus, das limitações do ser humano e da posição do homem no cosmo. Tais conclusões ratificam aquilo que
consideramos como uso instrumental da matemática.

Palavras-Chave: Infinito, Historia da Matemática, Religião.

1
A presente comunicação é parte de uma pesquisa que está sendo desenvolvido no doutorado em educação na Universidade
Federal do Rio Grande do Norte, na linha de Educação Matemática, sob a orientação do prof. Dr. John A. Fossa, cujo título é
Matemática e Religião: um estudo das relações recíprocas na obra de Blaise Pascal
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O CONCEITO MATEMÁTICO DE INFINITO


E SEU USO COMO METÁFORA RELIGIOSA
NA OBRA DE BLAISE PASCAL2
Severino Barros de Melo
Universidade Católica de Pernambuco
Faculdade Integrada do Recife
gteca@oi.com.br

Considerações Iniciais
No VII SNHMAT apresentamos um pôster no qual foram analisadas diversas categorias
identificadas por pesquisadores como Davis & Hersh (1989), Matthews (1995), Erickson & Fossa (1996),
Fauvel & Maanen (2000), Anglin (2001), Di Giorgio (2001), Gratann-Guiness (2001), Kline (2001) como
sendo reveladoras de aspectos comuns entre a matemática e a religião. A presente comunicação tem como
objetivo dar continuidade ao estudo supracitado investigando como a categoria matemática do infinito
emerge na obra de Pascal; ou seja, como este ente matemático se apresenta na área de interseção entre a
matemática, a religião na obra de Pascal. Do ponto de vista metodológico é uma pesquisa bibliográfica
com um estudo analítico-comparativo de textos referenciais, tendo como base as Obras Completas
(Pascal, 1954) 3.

O infinito como interseção matemática-religião na Obra de Pascal


Davis e Hersh (1989) fundamentados na matemática grega advogam que uma categoria comum à
matemática e a religião é o conceito de infinito. A perspectiva apresentada pelos dois pesquisadores norte-
americanos surge com grande força na obra de Pascal. O uso do infinito nesse contexto está relacionado à
elaboração de uma reflexão acerca de sua experiência mística, sua concepção do lugar do homem no
universo, sua visão a respeito da dimensão da misericórdia de Deus, dentre outras. Independentemente do
aspecto religioso encontramos também a presença do infinito ligada a aspectos técnicos relacionados com
2
A presente comunicação é parte de uma pesquisa que está sendo desenvolvido no doutorado em educação na Universidade
Federal do Rio Grande do Norte, na linha de Educação Matemática, sob a orientação do prof. Dr. John A. Fossa, cujo título é
Matemática e Religião: um estudo das relações recíprocas na obra de Blaise Pascal
3
Na referencia bibliográfica aparecem livros que também compõem o volume das obras completas (Pascal, 1954), além de
diversas edições de um mesmo título. Este fato justifica-se pela riqueza das notas introdutórias, dos prefácios e também pela
necessidade de um confronto em relação a uma melhor tradução.
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a atividade matemática de Pascal.
O uso do infinito numa abordagem técnica na Obra de Pascal

Pascal usa o infinito no sentido técnico em diversas partes das Obras Completas (Pascal, 1954)
geralmente quando apresenta procedimentos numéricos que podem ser aplicados continuamente.
No Traité des ordres numeriques ele afirma: “Os modos de transformar uma mesma coisa são
infinitos (...) O mesmo número conduzido na pirâmide do sucessivo maior dá o quádruplo do seu triângulo
triangular; e assim ao infinito com um método geral e uniforme.” (Pascal, 1954, p.133).
No Potestatum Numericarum Summa ele trata de “infinitas potencias” (Pascal, 1954, p. 166). Em
algumas ocasiões Pascal se refere fundamentalmente ao método dos indivisíveis que considerava
perfeitamente coerente com a geometria grega clássica e segundo ele o que poderia ser demonstrado com
um método, podia sê-lo também com o outro.
Uma das manifestações mais antigas aceitáveis do princípio da indução matemática aparece no
Traité du Triangle Arithmetique e este fato tem relação com o infinito. De fato, ao formular claramente tal
método de demonstração Pascal justifica:

Posto que esta proposição possui uma infinidade de casos, eu darei uma demonstração
bem curta com a suposição de dois lemas. O lema 1, que é evidente por si mesmo, que
esta proporção se encontra na segunda base (...) O lema 2, que se esta proporção é
encontrada numa base qualquer, ela se encontra necessariamente na base seguinte. De
onde se vê que ela está necessariamente em todas as bases: pois ela está na segunda
base pelo primeiro lema; portanto pelo segundo ela está na terceira base, portanto na
quarta, e ao infinito. Portanto é necessário somente demonstrar o segundo lema.
(Pascal, 1954, p.103)

Na mesma linha de abordagem técnica do infinito, voltada entretanto para uma dimensão mais
epistemológica, encontramos na obra Do Espírito Geométrico, menções associadas à geometria. Aqui a
escolha de um excerto maior justifica-se pela imbricação do texto, para evitar perda na compreensão. O
contexto é um comentário sobre as diversas características da geometria: definições, demonstrações,
evidencias etc.
(...) Mas não ficaríamos surpresos se observarmos que esta admirável ciência ao se
apegar unicamente às coisas mais simples, essa mesma qualidade que as torna digna de
ser seus objetos, as torna incapazes de ser definidas, de modo que a falta de definição é
antes uma perfeição que um defeito, porquanto não decorre de sua obscuridade, mas pelo
contrário de sua extrema evidencia, que é tamanha que ainda que não tenha a convicção
das demonstrações, tem toda a certeza a respeito. Supõe, portanto que se saiba qual a

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coisa que se entende por estas palavras: movimento, número, espaço; e sem se deter em
defini-las penetra em sua natureza e descobre suas maravilhosas propriedades. Estas três
coisas, que compreendem todo o universo, segundo estas palavras: Deus fez todas as
coisas segundo o peso, o número e a medida, possuem uma ligação recíproca e
necessária. De fato, não se pode imaginar o movimento sem alguma coisa que se mova; e
essa coisa sendo uma, essa unidade é a origem de todos os números; finalmente o
movimento não podendo existir sem espaço, temos essas três coisas encerradas na
primeira. O próprio tempo está também ali incluído, pois o movimento e o tempo são
relativos um ao outro, uma vez que a rapidez e a lentidão que são as diferenças dos
movimentos, tem uma relação necessária com o tempo. Assim há propriedades comuns a
todas essas coisas, cujo conhecimento abre o espírito às maiores maravilhas da natureza.
A principal compreende as duas infinidades que se encontram em todas: uma de grandeza
e outra de pequenez. (Do Espírito Geométrico, 2006, p.24)

Pascal prossegue em seu raciocínio, jogando com os dois aspectos do infinito no campo da física
da aritmética e da geometria, ou seja, primeiramente em relação ao movimento e em seguida em relação
aos números, ao espaço e por fim, volta à Física ao elaborar uma reflexão sobre o tempo.
(...) por mais rápido que seja um movimento pode-se conceber um que o seja mais ainda
e outro mais rápido ainda que este último; e assim sempre até o infinito, sem chegar a
um que seja de tal forma rápido que não possa ser superado por outro. E, ao contrário,
por mais lento que seja um movimento, pode-se retardá-lo ainda mais e mais ainda este
último; e assim até o infinito, sem jamais chegar a tal grau de lentidão que não se possa
descer a uma infinidade de outros sem cair no repouso total. De igual modo, por maior
que seja um número, pode-se conceber um maior e ainda um outro que ultrapasse o
último; e assim até o infinito, sem jamais chegar a um que não possa ser aumentado. E,
ao contrário, por menor que seja um número como a centésima ou a décima milésima
parte, pode-se conceber um menor e sempre até o infinito, sem chegar ao zero ou ao
nada. Do mesmo modo, por maior que seja um espaço pode-se conceber um maior ainda
e mais um que o seja ainda mais; e assim até o infinito. Do mesmo modo, por maior que
seja um espaço, pode-se conceber um maior ainda e mais um que o seja ainda mais; e
assim até o infinito, sem jamais chegar a um que não possa mais ser aumentado. E, ao
contrário, por menor que seja um espaço, pode-se ainda considerar um menor e sempre
até o infinito, sem jamais chegar a um indivisível que não tenha mais extensão. Ocorre o
mesmo com o tempo. Pode-se sempre conceber um maior, sem um último e um menor,
sem chegar jamais a um instante e a um puro nada de duração. Numa palavra, isto quer
dizer que por maior que seja o movimento, o número, o espaço, o tempo, sempre há um
maior e um menor, de modo que todos eles se sustentam entre o nada e o infinito, estando
sempre infinitamente distantes dessas extremidades. (Do Espírito Geométrico, 2006, p.
24-25)

A reflexão de Pascal prossegue com grande força, seja esclarecendo a natureza da geometria, seja
elaborando conexões entre o conceito de infinito e a própria maneira de ver o mundo. Pascal coloca no
mesmo plano o que hoje consideramos infinito atual e infinito potencial. Ele reconhece a dificuldade de

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compreensão dessas idéias e mantém a mesma linha de raciocínio para justificar a possibilidade de uma
divisão infinita do espaço:
(...) Não há geômetra que não creia que o espaço é divisível ao infinito. Não se pode
tampouco sê-lo sem esse princípio como não se pode ser homem sem alma. E, no entanto,
não há entre os geômetras quem compreenda uma divisão infinita; e não há como
assegurar-se dessa verdade senão por esta única razão, mas que é certamente suficiente,
ou seja, compreender perfeitamente que é falso que, ao dividir um espaço, se possa
chegar a uma parte indivisível, isto é, que não tenha nenhuma extensão. De fato, que há
de mais absurdo do que pretender que ao dividir sempre um espaço, se chegue finalmente
a uma divisão tal que ao dividi-la em dois, cada uma das metades fiquem indivisíveis e
sem nenhuma extensão, e que assim esses dois nadas de extensão formassem juntos uma
extensão? Na verdade, gostaria de perguntar àqueles que tem esta idéia se concebem
nitidamente que dois indivisíveis se tocam: se for em toda parte, não passam de uma só e
mesma coisa e, portanto, os dois juntos são indivisíveis; se não for em toda parte, então
não é senão uma parte: portanto eles tem partes, logo não são indivisíveis. (Do Espírito
geométrico, 2006, p. 26-27).

Na última parte do opúsculo Do Espírito geométrico, Pascal adverte que os que não estiverem
satisfeitos com as razões apresentadas e que permanecem na crença de que o espaço não é divisível ao
infinito nada podem pretender das demonstrações geométricas. Entretanto, consola o seu leitor quando
afirma que estas pessoas podem ser esclarecidas em outras coisas, pois alguém pode ser um homem
muito hábil, embora mau geômetra.
Pascal finaliza extrapolando o âmbito da reflexão epistemológica acerca da geometria e envereda
pela exploração de aspectos axiológicos.

Uso do infinito no sentido religioso

Encontramos na obra de Pascal uma utilização da categoria matemática do infinito também num
sentido religioso e filosófico. O emprego deste termo em contextos fora da matemática revela aspectos da
experiência espiritual de Pascal, de sua visão de mundo, de como concebe o ser humano. Este uso está
relacionado com a elaboração de uma reflexão acerca de sua experiência mística, sua concepção do lugar
do homem no universo, sua visão a respeito da dimensão da misericórdia de Deus, dentre outras. O uso
religioso do infinito aparece de modo esporádico embora importante em algumas passagens em diversas
obras e de modo marcante nos Pensamentos.

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Considerando a dificuldade relativa à escolha dos excertos de Pascal que possam validar a
afirmação de Davis e Hersh (1989) optamos por alguns considerados mais significativos4.
O uso esporádico é por exemplo o que se verifica nos Tratados de Pneumática (Pascal, 1984,
p.129) no qual é feita uma menção sobre o infinito quando da comparação entre o instinto do animal e o
homem : “(...) não ocorre o mesmo com o homem que foi criado para o infinito”. Outro exemplo de uso
esporádico é feito na Carta de Pascal a monsieur et madame Perier sobre a morte do pai, (17 outubro de
1651) na qual o infinito aparece junto com o finito para exprimir a relação entre o amor do homem a Deus
e a si próprio:
A presença marcante do infinito ocorre nos Pensamentos. A primeira manifestação
dessa idéia encontra-se no fragmento 72:
Todo esse mundo visível é apenas um traço imperceptível na amplidão da natureza, que
nem sequer nos é dado conhecer mesmo se de modo vago. Por mais que ampliemos as
nossas concepções e as projetemos além dos espaços imagináveis, concebemos tão
somente átomos em comparação com a realidade das coisas. Esta é uma esfera infinita
cujo centro se encontra em toda parte e cuja circunferência não se acha em lugar nenhum.
E o fato de nossa imaginação perder-se nesse pensamento, constitui em suma, a maior
característica sensível da onipotência de Deus.(......) Que é um homem dentro do infinito?

Neste fragmento Pascal faz uso do infinito como uma espécie de unidade de medida do
universo e associa ao fato desses pensamentos povoarem a mente humana como algo que
caracteriza a onipotência de Deus. É como se o gênero humano não pudesse ter as percepções
de algo infinitamente grande se não fosse inspirado pelo criador desta infinidade. Pascal
continua sua reflexão agora adentrando no mundo do infinitamente pequeno. Ele toma em
consideração um pequeno inseto e inicia com o leitor uma viagem pelo microcosmo:

Eis uma lêndea que na pequenez de seu corpo, contém partes incomparavelmente
menores, pernas com articulações, veias nessas pernas, sangue nessas veias, humores
nesse sangue, gotas nesses humores, vapores nessas gotas; dividindo-se estas últimas
coisas, esgotar-se-ão as capacidades de concepção do homem, e estaremos, portanto, ante
o último objeto a que possa chegar o nosso discurso. Talvez ele imagine, então ser essa a
menor coisa da natureza. Quero mostrar-lhe porém dentro dela um novo abismo. Quero
pintar-lhe não somente o universo visível mas também a imensidade concebível da
natureza dentro dessa parcela de átomo. Aí existe uma infinidade de universos, cada qual
com o seu firmamento, seus planetas, sua terra em iguais proporções às do mundo visível;

4
Pascal se refere ao infinito nos fragmentos (edição de L. Brunschvicg):
72,115,121,194,206,208,231,232,233,357,425,434,435,469,532,540,571,588,710,793.

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e nesta terra há animais e neles estas lêndeas, em que voltará a encontrar o que nas
primeiras observou. Deparará assim, por toda parte, sem cessar, infindavelmente, com a
mesma coisa, e perder-se-á nessas maravilhas tão assombrosas na sua pequenez quanto
nas outras na sua magnitude. (...) Quem assim raciocinar há de apavorar-se de si próprio
e considerando-se apoiado na massa que a natureza lhe deu, entre esses dos abismos do
infinito e do nada tremerá à vista de tantas maravilhas; e creio que, transformando sua
curiosidade em admiração, preferirá contemplá-las em silêncio à investigá-la com
presunção. Afinal o que é o homem dentro da natureza? Nada em relação ao infinito; tudo
em relação ao nada; um ponto intermediário entre tudo e nada. Infinitamente incapaz de
compreender os extremos, tanto o fim das coisas como o seu princípio, permanecem
ocultos num segredo impenetrável, e lhe é igualmente impossível ver o nada de onde
saiu e o infinito que o envolve.

A continuação do fragmento 72 apresentado acima revela um outro aspecto do uso do infinito


como um elemento delimitador da posição do homem no universo. O título dado a este fragmento é
Desproporção do homem. Pascal considera que as duas faces do infinito permitem ao homem situar-se no
universo, com todas as implicações existências que decorrem desse processo. Talvez uma outra imagem
que ajude a tornar mais compreensível o texto consiste em associar o homem ao zero da reta real, o
macrocosmo e microcosmo respectivamente ao sentido positivo e negativo do eixo das abscissas. Pascal
prossegue ainda no mesmo fragmento apresentando a dupla face do infinito como revelador de sua
concepção de ciência. Neste ponto o discurso de Pascal relacionando os dois lados do infinito com sua
visão de ciência serve de ponte para complementar o seu pensamento em direção a uma realidade maior
que para ele é Deus. Neste mesmo fragmento Pascal prossegue a reflexão associando o infinito com nossa
razão finita.
Nos Pensamentos encontramos ainda outros fragmentos nos quais o infinito no
sentido religioso ou metafísico nos é apresentado.
O fragmento 115, intitulado Diversidade, associa o infinito com a percepção da
realidade. O fragmento 206 é um dos mais citados pela profundidade associada a uma síntese típica de
uma mente estruturada por uma prática matemática constante: “o silêncio eterno desses espaços infinitos
me apavora”.
O fragmento 208 associa o infinito com a limitação de nosso conhecimento com
relação ao tempo de vida. O fragmento 231 associa Deus ao infinito e tenta convencer-nos disso com uma
ilustração no âmbito da cinemática ao considerar um ponto movendo-se por toda parte em velocidade
infinita.
Pascal continua sua rota de construção de metáforas religiosas com o uso do
conceito matemático de infinito ainda nos fragmentos: 233 intitulado Infinito. Nada. No fragmento 357 o
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uso é de caráter axiológico e também religioso. No fragmento 425 associando a moral e a doutrina cristã.
No fragmento 434 usa o infinito para valorizar o ser humano num sentido muito profundo embora
enunciado em forma de paradoxo: “ (...) o homem ultrapassa infinitamente o homem”.
O fragmento 435 prossegue no âmbito da moral cristã. O fragmento 469 afirma que embora ele
(Pascal) não seja um ser nem eterno nem infinito vê na natureza um ser necessário, eterno e infinito. O
fragmento 532 considera os dois infinitos no sentido natural e moral. O fragmento 540 apresenta a
esperança do cristão de possuir um bem infinito. O fragmento 588 apenas cita: ”Contradição. Sabedoria
infinita e loucura da religião.” O fragmento 710 apresenta o infinito como linguagem, embora no sentido
religioso. No fragmento 752 ele emite um parecer meio enigmático.
O fragmento 793 usa o infinito para relacionar corpo ao espírito, e espírito à caridade e ainda no
mesmo fragmento para estabelecer uma hierarquia entre grandezas carnais e espirituais. Apresenta a
caridade como de ordem infinitamente superior.
A pesquisa das diversas maneiras de Pascal apresentar o infinito no sentido religioso nos
Pensamentos se conclui com o fragmento 793, no qual é apresentada a idéia de que distancia infinita dos
corpos aos espíritos figura a distancia infinitamente mais infinita dos espíritos à caridade, pois ela é
sobrenatural.

Conclusões
O conceito matemático de infinito para Pascal é de uma importância tão grande que ele não
encontra outro elemento dentro da matemática capaz de elaborar com a mesma ênfase suas metáforas
relativas às características de Deus, a condição do ser humano, a posição deste ser em relação a Deus e em
relação aos outros seres e sua localização no universo. Isto vem ratificar a importância do que chamamos
no contexto da matemática e religião, um uso instrumental da matemática.
Além disso, a temática abordada se reveste de extrema atualidade pelo fato das angustias e
perplexidades levantadas por Pascal continuarem em aberto do ponto de vista filosófico-religioso e
portanto, aplicáveis aos questionamentos existenciais de hoje.

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Referencias Bibliográficas

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