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ACÓRDÃO
Documento: 591381 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJ: 05/06/2006 Página 1 de 8
Superior Tribunal de Justiça
RECURSO ESPECIAL Nº 626.034 - RS (2004/0015832-1)
RELATÓRIO
Tratam os autos de ação civil pública proposta pelo Ministério Público do Estado
do Rio Grande do Sul em face de Rene Pacheco de Rose, que, sendo Oficial de Registro
Imobiliário, teria descumprido ordem judicial na qual havia sido determinada o registro de
restrição (sequestro prévio) junto à matricula de imóvel de propriedade de Eucalixtino José
Manosso. Requereu-se a condenação do oficial nas “penas previstas nos artigos 10 e 11 da Lei
n. 8.429/92”.
Inconformado, o réu interpôs recurso especial com base na alínea “a” do permissivo
constitucional, alegando que foram vulnerados os arts. 11, II, e 12 da Lei n. 8.429/92.
É o relatório.
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Superior Tribunal de Justiça
RECURSO ESPECIAL Nº 626.034 - RS (2004/0015832-1)
EMENTA
VOTO
A celeuma instaurada nos autos diz respeito ao art. 11, II, a Lei n. 8.429/90
(improbidade administrativa), que estabelece o seguinte:
Este artigo versa sobre os atos de improbidade que atentam contra os princípios da
administração pública, e, de tais princípios, no acórdão recorrido, foi, ressaltado que, in casu, o
ato perpetrado pelo recorrente atingiu mais especificamente o da legalidade e moralidade.
É certo que os atos contidos no rol dos incisos do art. 11 são os que atentam contra
os princípios da administração pública, princípios estes que também constam do art. 37, § 4º, da
Constituição Federal. E, tratando-se de princípios, não obstante a previsão na lei positiva, ao se
mensurar acerca da honestidade, imparcialidade, legalidade e lealdade que devem nortear a
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conduta administrativa, não se exige o efetivo dano ao erário público, pois são valores que visam
resguardar a moralidade administrativa. Também por esse motivo, há doutrinadores, e parte da
jurisprudência, sustentando que o elemento volitivo atinente ao dolo não se apresenta como
requisito motivador do ato de improbidade, porquanto esse seria presumivelmente doloso.
Todavia, não se pode atribuir a nenhum dos atos tipificados nos arts. 9, 10 e 11, da lei
em questão a presunção de dolo, pois é elemento subjetivo necessário à configuração do tipo
contido em tais normas.
“ (...) Requisitos que o art. 239 do Lei 6.015 determina que eu tenho que
exigir. E a minha intenção foi exatamente essa aí. Porque em todos os outros
procedimentos, em outros casos semelhantes, eu fiz, o documento voltou para a
repartição de origem, foram completados, voltaram e foram cumpridos.”
Essa Turma já teve oportunidade de analisar a questão, decidindo que o tipo do art.11
da Lei n. 8.429/92, para configurar-se como ato de improbidade, exige conduta comissiva ou
omissiva dolosa. Confira-se:
Faço a ressalva de que, ao valer-me das citações acima indicadas, não busquei
revolver os fatos informadores da presente ação, mas, demonstrar que o tribunal a quo, na
aferição da tipicidade da conduta do réu, ora recorrente, deixou de examinar um de seus
requisitos essenciais, aqui consubstanciado no elemento volitivo do agente, o que já é suficiente
ao provimento do presente recurso, uma vez que a tipicidade dos atos previstos na Lei n.
8.429/92 não se esgota na conduta do agente. Ademais, trata-se de fatos incontroversos.
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inciso II do art. 11 da Lei n. 8.429/92, pois, ao se proceder à subsunção dos fatos in concreto à
referida norma, deixou-se de considerar todos os elementos que ensejariam a tipificação da
improbidade administrativa.
É como voto.
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CERTIDÃO DE JULGAMENTO
SEGUNDA TURMA
Relator
Exmo. Sr. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA
Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA
Subprocuradora-Geral da República
Exma. Sra. Dra. DULCINÉA MOREIRA DE BARROS
Secretária
Bela. VALÉRIA ALVIM DUSI
AUTUAÇÃO
RECORRENTE : RENE PACHECO DE ROSE
ADVOGADO : RAFAEL DA CÁS MAFFINI
RECORRIDO : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
SUSTENTAÇÃO ORAL
Dr(a) RAFAEL DA CÁS MAFFINI, pela parte: RECORRENTE: RENE PACHECO DE ROSE
CERTIDÃO
Certifico que a egrégia SEGUNDA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na
sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
"Após o voto do Sr. Ministro-Relator, dando provimento ao recurso, pediu vista dos
autos o Sr. Ministro Castro Meira."
Aguardam os Srs. Ministros Francisco Peçanha Martins e Eliana Calmon.
Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Franciulli Netto.
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RECURSO ESPECIAL Nº 626.034 - RS (2004/0015832-1)
VOTO-VISTA
Consta dos autos que o recorrente teria deixado de cumprir ordem judicial para a
realização do seqüestro prévio de 50% de um bem imóvel, cujo proprietário estaria sendo processado
na esfera criminal pela prática de crime contra a ordem tributária, servindo o imóvel como garantia de
eventual e futura execução.
Para chegar a conclusão sobre a tipicidade da conduta, o aresto impugnado valeu-se dos
elementos de prova existentes nos autos, especialmente da prova testemunhal. Do voto condutor,
destacam-se os fragmentos seguintes:
'(...) Requisitos que o art. 239 da Lei 6015 determina que eu tenho que
exigir. E a minha intenção foi exatamente essa aí. Porque em todos os outros
procedimentos, em outros casos semelhantes, eu fiz, o documento voltou para a
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repartição de origem, foram completados, voltaram e foram cumpridos. (...)'
E na falta de todos esses dados, Sr. Rene, o Sr. poderia ter procedido a
averbação, e não o registro definitivo desse seqüestro?
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contidos nos autos, chega-se a conclusão de que a sentença deve ser integralmente
mantida. Com efeito, o Oficio oriundo do Juízo (fl. 63), não deixa dúvidas em relação ao
sua autenticidade, com clara identificação do seu remetente, assim como em relação ao seu
conteúdo mandamental: ordem judicial, e como tal não está submetido à impugnação
extrajudicial, hipótese que não encontra previsão no ordenamento jurídico. Não cabe ao
agente administrativo impugnar ordem judicial recebida, sob pena de, admitindo-se tal
conduta, desrespeito ao próprio Estado Democrático de Direito. E não merece relevo o
argumento de que o Oficio ressentia-se dos elementos indispensáveis, porque .poderia o
agente proceder à averbação do gravame à margem da matricula do imóvel, e,
posteriormente, solicitar a regularização de supostos vícios (sem grifos no original).
E a sentença enfrentou com maestria a questão, e, por conta disso, peço vênia
para transcrevê-la parcialmente, verbis:
Não se discute nos autos se o tipo previsto no art. 11 da Lei de Improbidade é de mera
conduta ou exige prova da ação ou omissão dolosa do agente. Se a controvérsia estivesse posta nestes
termos, efetivamente não haveria necessidade de revolver os elementos de fato e de prova que cercam
o processo.
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O Tribunal de origem, em momento algum, afastou o dolo como elemento subjetivo do tipo.
Apenas concluiu ser dolosa a conduta do agente em face das provas coligidas aos autos. Em outras
palavras, considerou que o descumprimento da ordem judicial é ato de manifestação livre e consciente
da vontade, ou seja, ato doloso. É o que evidencia a leitura atenta do voto condutor, cuja
fundamentação tem início nos seguintes termos:
Tivesse o acórdão recorrido afastado o dolo como elemento do tipo, não seria necessária a
análise das provas testemunhal e documental. A simples configuração da conduta omissiva consagrada
no art. 11, II, da Lei n.º 8.429/92 - "retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício" - seria
suficiente para a condenação.
Está expresso no voto condutor que a análise do comportamento do agente deu-se à luz
das provas constantes dos autos e, justamente com base nesse contexto probatório, o Tribunal de piso
concluiu estarem presentes os elementos necessários a configuração do tipo, inclusive o dolo:
Não cabe a esta Corte, na via estreita do recurso especial, reexaminar o conjunto de
provas (Súmula 7/STJ) para aferir se da conduta do agente exsurge o elemento dolo, indispensável à
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configuração do tipo previsto no art. 11 da Lei de Improbidade.
Com estas considerações, pedindo vênia ao ilustre Relator, não conheço do recurso
especial.
É como voto.
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CERTIDÃO DE JULGAMENTO
SEGUNDA TURMA
Relator
Exmo. Sr. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA
Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA
Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. CARLOS EDUARDO DE OLIVEIRA VASCONCELOS
Secretária
Bela. VALÉRIA ALVIM DUSI
AUTUAÇÃO
RECORRENTE : RENE PACHECO DE ROSE
ADVOGADO : RAFAEL DA CÁS MAFFINI
RECORRIDO : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
CERTIDÃO
Certifico que a egrégia SEGUNDA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na
sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
"Prosseguindo-se no julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro Castro Meira,
divergindo do Sr. Ministro-Relator para não conhecer do recurso, pediu vista dos autos,
antecipadamente, a Sra. Ministra Eliana Calmon."
Aguarda o Sr. Ministro Francisco Peçanha Martins.
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RECURSO ESPECIAL Nº 626.034 - RS (2004/0015832-1)
VOTO-VISTA
Pedi vista porque fui assaltada por dúvida e o fiz em boa hora. Constatei, ao
pesquisar os precedentes, que, diferentemente do que asseverei no precedente trazido à baila
pelo Ministro Noronha – REsp 534.575/PR, afirmei, com todas as letras, no REsp 708.170/MG,
no que fui acompanhada pelos meus pares, em julgamento ocorrido em 06 de dezembro de 2005:
O ato de improbidade é constatado de forma objetiva,
independentemente de dolo ou culpa e é punido em outra esfera, diferentemente da via
penal, da via cível ou da via administrativa.
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Na abordagem do tema, é necessário que também se estenda o posicionamento
para um segundo aspecto: a natureza jurídica do dano, porque este tem efetivamente muito a ver
com o elemento subjetivo.
Os tipos caracterizadores do ato de improbidade estão nos arts. 9º, 10 e 11 da Lei
8.429/92.
O tipo do art. 9º não exige a prova da ocorrência do dano ao patrimônio, sendo
suficiente que o sujeito ativo obtenha algum tipo de vantagem patrimonial – por exemplo: aquele
que explora prestígio pessoal em função do cargo para obter vantagens pessoais, como favores e
presentes, causa dano ao patrimônio, mas esse dano não é material. Nem por isso deixa de
configurar-se o ato de improbidade.
O mesmo se diga do art. 11 da referida lei, no qual estão concentrados os atos
que atentam contra os princípios da Administração Pública inseridos nas Constituição.
Diferentemente, o tipo do art. 10 exige para sua configuração a prova da lesão ao
erário.
Estabelecidas as premissas quanto ao tipo de lesão, é indispensável, para tanto,
que se faça a distinção entre patrimônio e erário, vejamos o elemento subjetivo.
O tipo do art. 10, por definição legal expressa, pode ser dolosa ou culposa.
Pergunta-se então: e as modalidades dos demais arts. 9º e 11? Não há discrepância na doutrina
quanto a só punição a título de dolo.
Assim sendo, a conclusão a que se chega é a de que não há espaço para a
responsabilidade objetiva, sendo necessária a prova do dolo, ou do dolo ou culpa, na hipótese do
art. 10 da lei em apreciação.
Com essas breves considerações, posiciono-me em relação ao ato administrativo,
acorde com o entendimento esposado no voto do relator.
Em conclusão, acompanho o relator, dando provimento ao recurso.
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CERTIDÃO DE JULGAMENTO
SEGUNDA TURMA
Relator
Exmo. Sr. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA
Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA
Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. JOSÉ FLAUBERT MACHADO ARAÚJO
Secretária
Bela. VALÉRIA ALVIM DUSI
AUTUAÇÃO
RECORRENTE : RENE PACHECO DE ROSE
ADVOGADO : RAFAEL DA CÁS MAFFINI
RECORRIDO : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
CERTIDÃO
Certifico que a egrégia SEGUNDA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na
sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
"Prosseguindo-se no julgamento, após o voto-vista da Sra. Ministra Eliana Calmon, a
Turma, por maioria, conheceu do recurso, vencido o Sr. Ministro Castro Meira e, no mérito, por
unanimidade, deu provimento ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator."
Os Srs. Ministros Francisco Peçanha Martins e Eliana Calmon (voto-vista) votaram com
o Sr. Ministro Relator.
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