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Ser Inacabado
O
protagonista de Guimarães Rosa, Riobaldo Tatarana, colocou
com suas próprias palavras a percepção do fato de o ser
humano estar em constantes mudanças, como ser inacabado e
sua emoção valorativa ("...o mais importante e bonito..."). A
Psicologia Sensorial revelou que tanto o ser humano quanto os animais não
suportam a ausência de estímulos. É igualmente incômoda a não-variação do
mesmo estímulo por muito tempo, o que resulta em uma busca constante de
estímulos sensoriais diversos. (GOLDSTEIN, 1983; WERTHEIMER, 1976).
Na atualidade, o elemento mais constante parece ser a mudança.
Das diversas possibilidades de percebê-la, uma sempre pareceu ganhar mais
destaque: a mudança corporal. Desde que é gerado até chegar à velhice, o
homem passa por várias transformações, mudando não só sua aparência
física, mas também sua percepção e interpretação do mundo (BERGER,1972).
Em relação à Cirurgia Plástica, pode-se perceber seu caráter
modificador através da sua principal forma de divulgação: as fotos do pré-
cirúrgico comparadas com as do pós-cirúrgico. Podemos verificar em muitas
dessas fotos como existem alterações sutis, além da evidente modificação
plástica: as pessoas são fotografadas no pré-cirúrgico em preto-e-branco e,
em geral, suas feições não aparentam felicidade. No pós-cirúrgico as fotos são
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coloridas, as pessoas estão bronzeadas, mais magras e acentuadamente
“felizes”.
As modificações internas não possuem tanta evidência como as
externas. A impressão de que uma determinada pessoa mudou internamente
aparece quando observamos os seus comportamentos, principalmente os
ligados à face. Não podemos excluir dessa crença as verbalizações, emoções
e valores apresentados pela pessoa.
FLUGEL (1966) estudando a Psicologia das roupas, concluiu que o
homem se expressa também através de suas vestimentas. Além de as roupas
terem 3 funções básicas: enfeite (atrair a atenção), pudor (impedir o nu) e
proteção contra o frio e calor, elas ajudam a passar a primeira impressão e
permitem que os outros façam uma certa previsão de comportamentos, pois
qualquer roupa é indicadora de uma determinada classe social. O lado
ambíguo das roupas aparece quando tenta exibir atrativos e ocultar as
"vergonhas". De uma forma interessante, as roupas, principalmente dos
ocidentais, não cobrem o rosto e as mãos, uma vez que são as partes mais
expressivas de nossa anatomia. MORRIS (1977) enfatizou que as roupas
fazem parte de nossa linguagem, tanto quanto gestos, atitudes e expressões
faciais.
A clássica dicotomia corpo x alma fez com que o homem tentasse
estudar o corpo cientificamente, relegando a alma a segundo plano. Por não
ser considerada um ente concreto ou passível de análise científica, a alma
tornou-se objeto de estudo da Filosofia e da Psicologia (HEIDBREDER, 1981).
O existir, entretanto, só adquire significado quando o ser humano se
propõe a atingir estágios mais profundos de conhecimento de suas
experiências. Os comportamentos de classificação e de estabelecimento de
relações significativas entre os eventos pertencem ao estágio de reflexão da
ação. Assim, o homem não está mudando por inércia, mas movido por uma
permanente procura de aprimoramento de "estar-no-mundo". Ao atravessar
estes estágios, o homem está mudando internamente, ao mesmo tempo em
que, por pertencer ao mundo social, modifica as realidades.
Muitas Semelhanças
Poucas Diferenças
2É sabido que, em diversos casos, a informação racional costuma reduzir a ansiedade frente à
cirurgia e aumentar a colaboração aos eventos traumáticos e invasivos (cortes, injeções,
imobilizações e suturas). Saber sobre os passos de uma cirurgia pode representar uma
conquista importante por parte do paciente, logo, é algo que o mesmo queira saber. Dos vários
cirurgiões plásticos com que entrei em contato, o único que fornece um folheto explicativo é o
professor dr. Roberto Farina. O psicólogo que não se incomodar com o fornecimento de
instruções práticas para o candidato à CP, poderá fornecer, em muitos casos, informações
técnicas ou sugerir livros da especialidade para leigos.
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sem passar por uma intervenção plástica3.
Já foi abordado que a mudança externa é potencialmente desejada
pelo paciente plástico. Sua meta, pode-se inferir, é ter suporte externo, se a
primeira procura foi o cirurgião plástico. É na área corporal que ele (paciente)
localizou a fonte do desconforto, insatisfação ou dificuldades pessoais e busca
na CP a solução. Se esse paciente foi encaminhado ao psicólogo, com o
objetivo de um diagnóstico mais preciso (diferencial), é porque houve uma
atribuição "errônea", por parte do paciente, no tocante à localização real do
problema. Na visão desse cirurgião plástico que encaminhou o paciente, o
diagnóstico psicológico é um pré-requisito para uma provável cirurgia. Pode-se
inferir que o médico precise de informações mais minuciosas do paciente a fim
de tomar uma decisão cirúrgica mais acertada.
Esses fatos deverão ser trabalhados de imediato, pois são a base
de um bom trabalho psicológico: saber as causas do encaminhamento médico,
verificar o nível de compreensão racional e aceitação deste, por parte do
paciente, bem como a demanda que o cirurgião plástico impõe.
Existem casos em que será necessário o encaminhamento do
paciente ao cirurgião. A diferença fundamental que se espera que ocorra é que
o psicólogo, antes disso, tenha chegado a um consenso com seu paciente.
Independentemente do reconhecimento da necessidade ou da viabilidade
cirúrgica por parte do cirurgião, o psicólogo poderá trabalhar os aspectos
cognitivos, emocionais e as representações sociais da parte do corpo que foi
“eleita” para a alteração cirúrgica do seu paciente, fazendo, dessa forma, uma
preparação para uma boa consulta com o plástico.
Uma possível indicação do psicólogo para uma paciente que tivesse
um rosto masculinizado, por exemplo, seria uma plástica facial. Nessa cirurgia
os traços masculinos poderiam ser suavizados ou mesmo retirados. A
operação em muito ajudaria tal paciente que possui uma identidade sexual
comprometida por excesso de hormônios masculinos ou herança genética4.
A CP desenvolveu inúmeras técnicas de modificação corporal
3É importante considerar que existe, nos hospitais públicos ou hospitais-escola, uma fila de
espera de mais de 5 meses aproximadamente e que toda e qualquer cirurgia deve ser
criteriosamente avaliada por uma equipe, pois envolverá gastos com material, funcionários e
risco de complicações intra e pós-cirúrgica (infecção hospitalar). Logo, tal avaliação permitirá o
uso racional e adequado dos escassos recursos hospitalares em troca de um benefício real
para o paciente, ainda que a médio ou longo prazo.
4Do mesmo modo a eletrocoagulação tem ajudado muitas mulheres que possuem pêlos e/ou
barba em função de uma alteração genética ou disfunção hormonal, a ficarem livres desses
pêlos, sentindo-se mais femininas.
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efetiva, usando o modelo experimental e validando seus achados e conquistas.
Essas técnicas gozam de grande liberdade em função dos diversos tipos
anestésicos que protegem o paciente da dor em qualquer intervenção
cirúrgica. A abolição da consciência, nos casos de anestesia geral, pode
representar uma grande submissão ao cirurgião e constitui um elemento
psicológico a ser trabalhado na fase pré-cirúrgica.
No campo psicológico, o mesmo não ocorre: o psicólogo não possui,
até o momento, formas indolores de mudanças internas. Ao trabalhar com as
emoções, os comportamentos, as representações da face/corpo e fantasias de
alteração cirúrgica, não poderá lançar mão de "anestesia", tal como o
cirurgião. O uso da hipnose, que poderia ser considerado um “anestésico”
psíquico foi abandonado pelo próprio Sigmund Freud, que optou por tratar o
paciente acordado, consciente e colaborador com o processo terapêutico. A
fonte básica de trabalho psicoterapêutico é a mobilização de angústias,
crenças irracionais, dificuldades de realização, sofrimentos e emoções não
resolvidas, portanto mais um contrato de processo do que de resultado. Assim,
os psicólogos não têm o mesmo grau de liberdade que os cirurgiões plásticos,
no tocante às experimentações, intervenções curativas e divulgações
concretas dos resultados psicoterápicos.
Possibilidades de Atuação
5Este perfil foi elaborado segundo pontos críticos que pude detectar enquanto realizava a
pesquisa.
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2) facilidade em estabelecer um rapport com os pacientes e não se
deixar influenciar pela primeira impressão, pois lidará com pacientes
desfigurados, queimados, acidentados ou que sofrem de rejeição social por
causa da aparência ;
3) uma boa capacidade de relacionamento interpessoal,
principalmente com a equipe. Para isso, deverá ter uma disponibilidade interna
para o outro e habilidade em trocar feedbacks;
4) um arsenal de técnicas de triagem, recrutamento, seleção,
entrevista, anamnese, aconselhamento individual e familiar e de psicoterapia
breve que possam ser oferecidas aos candidatos/pacientes a fim de que estes
tenham uma real visão de suas dificuldades, bem como formas de solucioná-
las;
5) habilidades para o estabelecimento de um espaço no qual o
paciente ou o grupo consigam expressar emoções, sentimentos e fantasias,
gerando um certo acolhimento;
6) conhecimentos mínimos sobre os procedimentos elementares da
CP. Os diversos tipos de anestesias, a terminologia específica, as exigências
pré, intra e pós-cirúrgicas, bem como os principais riscos operatórios são
informações importantes para uma boa atuação na área;
7) facilidade para expor assuntos psicológicos de forma didática,
pois poderá ser convidado pela equipe para esclarecer seu papel ou fornecer
palestras para outros profissionais;
8) curiosidade sobre os novos procedimentos cirúrgicos, pois os
mesmos são sempre divulgados pela mídia e alteram a demanda de
candidatos à CP ;
Os ítens de 5 em diante são facilitadores do trabalho interdisciplinar
e não podem constituir-se como impeditivos de atuação na área. Subjacente a
todos os critérios descritos, o psicólogo será beneficiado em seu trabalho se
tiver passado por algum processo psicoterápico na qualidade de paciente e
que esteja disponível para receber supervisão clínica de alguns atendimentos
realizados6.
6Uma boa capacidade de escrita e comunicação é adequada em qualquer profissão. No
hospital, o prontuário representa o "carro-chefe" do atendimento, é a base do controle
administrativo hospitalar e fonte de futuras pesquisas, tanto por parte da equipe, como por
outros profissionais interessados. O psicólogo, assim como outros profissionais, não pode estar
presente o tempo todo, logo, as anotações e recomendações à equipe deverão estar escritas
no prontuário em uma linguagem clara e, de preferência, com o mínimo de ambigüidades.
Ministrar palestras ou lecionar são atividades que, para uma adequada realização, requerem
certa habilidade didática e que envolvem, igualmente, facilidade expressiva. Escrever artigos
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- Fases Cirúrgicas
Não se trata aqui de invasão de campos ou de defesa da CPE em
detrimento da psicoterapia, mas sim que os psicólogos podem e devem
trabalhar em colaboração com os cirurgiões plásticos durante cada fase do
empreendimento cirúrgico.
Muitas pessoas poderão "escolher" o caminho da CPE para se
sentirem melhor. Segundo PITANGUY, citado por BIONDO (1990):
sobre as pesquisas realizadas é atividade muito bem vista no campo científico e, ainda mais,
quando uma nova área está por abrir-se (Psicologia Hospitalar).
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BELFER e Colaboradores (1979) sugeriram alguns critérios para a
autorização da CPE:
1) não possuir algum traço de psicopatologia significativa;
2) ausência de expectativas irreais em torno da CPE pretendida e
3) não possuir planos precipitados para mudança de vida após a
cirurgia, tais como arranjar um novo emprego ou divórcio.
Pode-se notar que todos esses critérios estão dentro da fase de
seleção de pacientes e no plano subjetivo. Apesar de significarem uma
preocupação com os aspectos psiquiátricos para a indicação cirúrgica, o
psicólogo deverá ir além dos critérios impeditivos e ter também indicadores
positivos7.
É importante colocar que um parecer negativo do psicólogo-
consultor para os candidatos fortemente motivados tem um peso de proibição,
logo, é necessário muito tato e habilidade. Mesmo quando a recusa em
realizar a CPE parte do cirurgião, o paciente vivencia o fato como um golpe em
sua necessidade, exigindo-lhe longas explicações do porquê da recusa.
Alguns pacientes, inconformados e/ou indignados pela recusa, procurarão
outros serviços ou cirurgiões para, não só invalidar os argumentos
apresentados pelo cirurgião anterior, mas também para provar a importância
de seus pedidos de cirurgia, entrando, assim, em equilíbrio com suas
cognições.
É evidente que toda cirurgia apresenta limitações e que nem todo
desejo do paciente terá indicações cirúrgicas. Esse aspecto deverá ser
trabalhado com informações racionais sobre o procedimento desejado:
7 Segundo minha própria experiência na área, há mais pacientes com temores, falsas
expectativas e dúvidas do que com certezas, frente ao momento operatório.
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como médicos, podemos ajudar o paciente a cicatrizar seus
ferimentos psicológicos, assim como nós ajudamos a cicatrizar
seus ferimentos físicos". (DAVIDSON, 1986, p. 151)
8PITANGUY (1984) descobriu bem cedo que é muito importante o cirurgião plástico saber o
que efetivamente o paciente quer que mude em termos corporais. Parece que não basta saber
o tipo de cirurgia, mas detalhes extremamente pessoais. Para ilustrar essa importância, o
famoso cirurgião citou um caso de uma moça italiana que passou pela mamoplastia de
redução do volume dos seios. Após a retirada das ataduras, a paciente teve uma crise de
choro ao constatar que seus seios estavam menores do que eram antes da cirurgia. O que ela
efetivamente desejava era exatamente o contrário: que seus seios ficassem ainda maiores e
parecidos com os de sua mãe.
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acompanhe o paciente ao centro cirúrgico. Nos casos em que a anestesia
geral se faz necessária, sua atuação ficará reduzida em virtude de a maioria
das técnicas psicológicas de ajuda estarem concentradas no plano verbal e na
interação pessoal. Nos casos de anestesia local em que o paciente fica
consciente, mas não sedado, os psicólogos poderão atuar com mais facilidade,
desde que a cirurgia realizada não esteja mexendo com algum elemento facial.
Pacientes que fazem uma CP sem nenhum parente ou amigo
costumam solicitar a presença do psicólogo no ato cirúrgico, quando há um
bom rapport e estabelecimento de um vínculo de confiança. As crianças,
mesmo as que estão acompanhadas pelos pais, às vezes solicitam o
acompanhamento psicológico até o pré-anestésico ou até o sono chegar,
segurando na mão do profissional para tomar a injeção9.
Segundo PITANGUY (1992), foi John Davis quem fez a primeira
relação das alterações psicológicas no pós-cirúrgico e constatou que,
inicialmente, no pós-operatório de qualquer cirurgia, são comuns as reações
de apreensão, ansiedade ou depressão. O pormenor mais importante dessas
reações pós-cirúrgicas é que o paciente arriscou uma mudança em sua
identidade corporal ou facial para melhor. Assim, a necessidade de
comprovação dessa melhoria é imediata e os pacientes solicitam o espelho ou
querem ver a área operada. A apreensão vem do fato consciente de que
sempre existem riscos em qualquer evento cirúrgico, mesmo quando em
cirurgias eletivas.
Trabalhando na fase pós-cirúrgica, os psicólogos poderão lidar com
as emoções advindas do pós-anestésico - ausência temporária da
sensibilidade (bandagens, tampões, suturas e gesso que porventura existam),
objetivando dar suporte para que o paciente consiga lidar de forma
relativamente tranqüila com a natural depressão pós-cirúrgica.
Aqui também existe uma confluência de áreas de atuação. O
psicólogo facilita o trabalho da equipe de enfermagem, na medida em que
clarifica e “limpa” emoções dos pacientes em interação com o material de
curativos, bandagens ou injeções. As relações interpessoais com os
enfermeiros também merecerão atenção, pois os pacientes internados
interagem muito com eles.
Num momento posterior, os psicólogos poderão trabalhar alguns
9Em crianças, muitos cirurgiões optaram pela anestesia geral, ou a local com sonífero, pela
comodidade que traz ao evento cirúrgico. (RUZZANTE, 1986).
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dos inúmeros aspectos dos reajustes pós-operatórios que existem:
1) as restrições ou proibições temporárias em função do tipo de CP
feita. Ex.: Touca de gesso nas CP de correção de orelha de abano, dieta
líquida nos casos de redução da mandíbula e proibição de sol por três meses,
após peeling cirúrgico;
2) adaptação a uma nova imagem para si mesmo. Ex.: Abandono da
auto-imagem de mulher feia com seios assimétricos, com conotação de pouco
atraente, para uma auto-percepção de mulher sensual com possibilidade de
causar atração erótica;
3) a capacidade para lidar com as perguntas, comentários e atenção
dos outros. Ex.: O rejuvenescimento exigirá do paciente habilidade para lidar
com as perguntas que os outros farão para saber as causas e os
procedimentos do evento cirúrgico realizado (lifting);
4) o sentimento de despedida (luto) da parte considerada
envelhecida ou ruim. Ex.: A ambigüidade poderá aparecer nos casos de
mamoplastia redutora. A mulher poderá sentir que foi beneficiada com um
menor volume mamário mas que, em contrapartida, perdeu a atenção ou
comentários masculinos advindos de seu antigo formato dos seios;
5) a readaptação social. Exemplos: A orelha de abano, quando
resolvida cirurgicamente, não é garantia de que o paciente (a criança) queira
voltar a estudar e a estabelecer novos relacionamentos com os antigos amigos
de classe. Nos casos de desfiguramento facial, o fornecimento de uma base de
apoio será essencial para o paciente;
6) a insatisfação derivada do fato de a CP não ter correspondido às
reais expectativas do paciente10. Ex.: Existem pacientes que procuram uma
determinada característica de personalidade, como firmeza ou agressividade,
e acreditam que, por exemplo, um queixo mais proeminente ou um nariz com
ponta e dorso altos poderão trazer tais atributos.
- Dismorfofobia
Trata-se de um novo termo psiquiátrico que designa pessoas que
têm fobia a serem disformes, ou seja, elas têm um forte medo da assimetria
corporal (sobras de pele, posição atípica dos dentes, estrabismo, diferentes
tonalidades da pele etc). Para a CP, os pacientes que apresentam como
10São casos nos quais houve erro de diagnóstico ou falhas dos profissionais envolvidos com o
atendimento de tais pacientes. Outra hipótese é que eles próprios “ocultaram” seus reais
desejos com relação à cirurgia.
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sintoma a dismorfofobia são aqueles que se queixam de particularidades
mínimas superficiais e pedem uma plástica que as retirem ou consertem.
(CONNOLY & GIPSON, 1987).
BONALUME-NETO (1992) afirmou que a BDD - Body Dysmorphic
Disorder é uma preocupação exagerada com um "defeito" imaginário na
aparência de alguém, não sendo este defeito compartilhado com seus
semelhantes. Historicamente, a BDD é conhecida há um século, mas faz
apenas sete anos que entrou para o manual oficial da psiquiatria. Nas pessoas
que têm um defeito real mínimo ou quase imperceptível, a BDD se manifesta
como uma exagerada preocupação com ele, daí o uso freqüente de espelhos e
cosméticos que "escondem" o defeito e as comparações incessantes com os
"normais".
As novidades para o tratamento da BDD são: os pacientes podem
receber tratamento medicamentoso semelhante ao dos obsessivos-
compulsivos (uso do medicamento específico chamado de clomipramina);
abandono do uso de espelhos (ou sua limitação a níveis razoáveis); evitar
comparações inúteis com outras pessoas e (talvez a parte mais difícil)
aceitação de que o problema real é no plano psicológico (interno) e não tem
correlação positiva com as formas corporais. (BONALUME-NETO, 1992).
Já os pacientes que procuram fazer uma cirurgia plástica após
outra, evidenciando procura por uma "imagem ideal", um corpo escultural ou
uma certa fobia pelo envelhecimento, deveriam ser indicados para psicoterapia
a longo prazo ou reconstrutiva. Tal encaminhamento permitirá que os conceitos
de auto-imagem, imagem corporal e self sejam trabalhados com o objetivo de
retirar o desejo compulsivo de transformação corporal pela CP.
- Psicoterapia
A psicoterapia breve poderia ser indicada para pessoas que, por
exemplo, transformam problemas psíquicos em problemas corporais. Podem
ser aquelas que "resolveram" procurar a rinoplastia de uma hora para outra,
atribuindo a um novo nariz a responsabilidade de aliviar seus sintomas
psicológicos. Outro exemplo seria oferecer a psicoterapia suportiva para
pacientes que estão descompensados em função de uma grande mudança
ambiental e que "escolheram" uma plástica para equilibrar tal
descompensação.
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Nesses dois exemplos citados acima, depois de um diagnóstico
dinâmico, os pacientes poderão ser orientados em relação à plástica
pretendida. Ajudá-los a somatizar o mínimo possível ou voltar ao equilíbrio
homeostático anterior são tarefas que levariam a um questionamento da
necessidade de plástica. (DEATON & LANGMAN, 1986).
Não é de estranhar que algumas psicoterapias tenham, dentre os
vários objetivos, a função de compreensão e possível modificação de crenças,
valores, afetos e comportamentos. Claro que nenhuma linha psicoterápica
negará tal evidência: a de que o paciente procurou tratamento porque quer
resolver algum problema (quando não vários) e, ao resolvê-lo, estará em outro
momento e condição. Não se pode esquecer de que houve um aprendizado
cognitivo: descobriu um novo jeito de lidar com o problema e ampliou o
repertório de experiências. (KNOBEL, 1986).
Em alguns casos, a psicoterapia prévia será o melhor procedimento
a ser oferecido ao candidato à CPE (AMARO, 1985; ; PITANGUY, 1990). É
também verdade que, em alguns casos, a CPE poderá abreviar o tempo da
análise pessoal ou mesmo substituir a psicoterapia a longo prazo. Um exemplo
seriam as cirurgias corretivas em pessoas que tiveram alguma mutilação e que
sofrem pelo estigma ou rejeição social a que estão submetidas.
(MAISONNEUVE & BRUCHON-SCHWEITZER, 1981).
Existem inúmeros casos em que a CP beneficiaria ou tornaria mais
potentes os ganhos psicoterapêuticos. Para citar alguns: a obesidade, na qual
as estratégias de mudança alimentar ou apoio por psicoterapia de grupo
podem ganhar um reforço externo com a lipoaspiração ou lipoescultura. Casos
simples de fobia escolar, cuja origem esteja centrada na aparência (orelha de
abano ou lábio leporino) poderão ter uma solução adequada com a correção
da deformidade. A depressão motivada pela perda de características estéticas
ou eróticas (calvície ou barriga saliente) poderá ficar reduzida se o paciente
passar pelo processo cirúrgico especializado. Pessoas que apresentam como
sintoma a falta de desejo sexual, pelo fato de acharem pequenos ou
inestéticos seus genitais, poderão fazer plástica íntima e possivelmente retirar
a base biológica de suas crenças. (SCHOR & FREITAS, 1992).
A CP íntima, usada em crianças ou adolescentes que foram
estupradas ou que perderam a virgindade pode ajudar, e muito, no processo
de reparação da violência de que foram vítimas. Ao voltarem ao seu "estado
anterior", isto é, passarem (se for o caso) pela cirurgia de reconstrução do
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hímen ou ânus, terão mais suporte físico. Por outro lado, o psicólogo terá
maiores oportunidades de trabalhar com os pacientes as emoções derivadas
do delito e promover a reintegração social. Adolescentes, cuja fase é de
discussão da identidade sexual, ou obesos masculinos com super-
desenvolvimento mamário (ginecomastia) que causa a aparência de seios, um
atributo feminino, são também muito beneficiados com a redução dos "seios"
por lipoaspiração. (ASSUMPÇÃO, 1990; GALVÃO, 1978; SCHOR & FREITAS,
1992).
Outro exemplo em que a CP poderia acelerar o tempo da análise
e/ou psicoterapia, seria a lipoaspiração em pacientes que comprovadamente
não podem ou não conseguem emagrecer além do que o seu biótipo permite.
Queixo duplo, como resultado de excesso de gordura na papada, gorduras
resistentes a dietas e ginásticas localizadas e alguns casos de celulite
deixariam de ser “anexos” indesejados da pele. Nestes casos, a retirada
cirúrgica daquilo que "sobra" (barriga em avental) ou que constitui um "peso"
psicológico, pode abreviar todo o trabalho psicoterápico cujo objetivo fosse,
por exemplo, diminuir a resistência do paciente em iniciar ou manter uma dieta
hipocalórica. Outro objetivo seria a criação de uma auto-imagem mais
aceitável para si e dentro dos padrões de saúde esperados para o indivíduo.
(COTTINI, 1994; SCHOR & FREITAS, 1992).
- Consultoria
O trabalho de consultoria psicológica é relativamente recente e
igualmente delicado. A presença de um psicólogo dentro de um hospital
apresenta ambigüidades e particularidades que não podem ser desprezadas
de forma alguma pelo profissional, pois ele corre o risco de ser excluído da
equipe. Segundo FERNADES (1988), de um lado tem-se a idealização
(onipotência) do psicólogo, como se ele fosse capaz de tudo resolver no
tocante aos problemas de relacionamento com os pacientes, e, de outro, o
descrédito (desqualificação) das funções e tarefas do psicólogo. Mesmo assim,
é possível ter como objetivos:
1 - aumentar a discriminação de assuntos psicológicos, o que
implica discutir o caso nos seus aspectos de motivação, personalidade, grau
de maturidade, assertividade, nível de comunicação etc, a fim de esclarecer
pontos obscuros da entrevista e contribuir para a ampliação do conhecimento
do paciente por parte do cirurgião (FERNANDES, 1986);
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2 - acolher pacientes considerados pelos cirurgiões como difíceis,
resistentes ou pouco colaboradores. Quando não existe indicação cirúrgica,
mas a motivação do paciente é alta, é provável o aparecimento da recusa em
aceitar a proibição. Alguns pacientes recebem o "rótulo" de pouco
colaboradores quando tomam consciência das exigências do pré-cirúrgico
(LAMOSA, 1991);
3 - sensibilizar pacientes para um trabalho psicoterápico posterior,
quando a equipe interdisciplinar chegou a esse critério para aceitação
cirúrgica (KNOBEL, 1986);
4 - encaminhar pacientes para outros cirurgiões plásticos ou
instituições mais especializadas (DAVIDSON, 1986);
5- elaborar, em conjunto com a equipe ou apenas com o cirurgião
plástico, o perfil de pacientes para cada tipo de evento plástico, o que
resultaria num melhor recrutamento e seleção deles, já que o perfil é a base de
qualquer processo de comparação e inclui os requisitos mínimos exigidos para
a cirurgia plástica.
- Pesquisa
A CP é um campo vasto, cheio de sutilezas e minúcias. É uma área
fascinante para pesquisas psicológicas e sociais. É evidente que o psicólogo
poderá pesquisar em qualquer fase do atendimento ao paciente (pré, intra e
pós-cirúrgica), bem como em qualquer fase ou etapa psicológica do paciente.
Citaremos algumas, mas as possibilidades são muitas.
O psicólogo poderá realizar pesquisa no tocante à validação dos
processos de recrutamento, triagem e seleção de pacientes que são adotados
no hospital. Poderá descobrir o tipo de divulgação mais eficaz para conseguir
pacientes que, por hipótese, receberiam a indicação para determinado evento
cirúrgico. De outra forma, poderá pesquisar o perfil dinâmico para cada tipo de
CPR procurada, bem como quais os pacientes que efetivamente seriam
beneficiados com a cirurgia.
Um outro tipo de conhecimento que poderia ser conseguido refere-
se às intervenções planejadas e a algumas emergenciais (CPR). É sabido,
dentro da Psicologia Social, que a expectativa de um determinado
comportamento faz com que a probabilidade de ele ocorrer aumente muito
(profecia auto-realizadora) (GOLDSTEIN, 1983; KRÜGER, 1986). Será que os
pacientes que procuram a CP espontaneamente tendem a considerar os
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efeitos da intervenção mais favoravelmente do que aqueles que se sentem
pressionados a submeter-se à operação (vítimas de trânsito, por exemplo)?.
Os pacientes da CPR têm mais expectativas irreais (aquelas que escapam da
área da especialidade) do que os pacientes da CPE?, uma pesquisa
comparativa entre os grupos poderia estar comprovando a hipótese anterior.
Sendo pesquisador, o psicólogo poderá provar vários pormenores
da área:
1) que a melhor época para se corrigir a orelha de abano é a de
férias escolares, antes de a criança atingir a adolescência (RUZZANTE, 1986);
2) que o trabalho de entrevista prévia com o psicólogo facilita muito
a consulta com o cirurgião (DEATON & LANGMAN, 1986);
3) que os pacientes que recebem tratamento psicoterápico paralelo
à CPE são os que apresentam os melhores níveis de satisfação e de
adaptação à nova imagem, em comparação com o grupo de controle - os que
fizeram CPE e não receberam nenhum tratamento psicológico (GIDDON,
1983); e
4) que alguns sintomas psiquiátricos são impeditivos para a cirurgia.
O psicólogo poderá listar esses sintomas incompatíveis e correlacioná-los com
os eventos cirúrgicos, a fim de comprovar ou não esses impedimentos.
(BELFER e Colaboradores, 1979).
Pode-se também afirmar que a Psicologia se beneficiará das
alterações corporais advindas da CP, se acompanhar pacientes que sofreram
determinada intervenção plástica e observar, por exemplo, as fases de
readaptação cognitiva ao novo corpo/rosto alterado (FARINA, 1982). Trata-se
de uma possibilidade de discriminação de nuances da auto-imagem,
resultando no enriquecimento da informação sobre essa faceta da
personalidade. Os casos de arrependimento pós-cirúrgico deveriam receber
uma atenção especial, pois podem ser utilizados como retroalimentação ao
funcionamento da equipe que atendeu ao paciente. Poder-se-á saber se a
expectativa plástica foi correspondida em sua totalidade.
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