Beruflich Dokumente
Kultur Dokumente
DA I!NUNCIAÇAO PROVI!RBIAL
UNICAMP
Instituto de Estudos da Linguagem
Campinas, Maio de 2004
ur,;;(;i\\~-
n:;~i ,,--,;!:- -. •
•·o Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca'': os sujeito;; e os sentidos no espaço da enunciação proverbial I
Mônica Oliveira Santos- 2004 I
ENUNCIAÇÃO PROVEBIAL
2
..0 ProvérbJO é um comprimido que anda de boca em boca••: os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial!
Mônica Oliveira Santos- 2004
BANCA DE DEFESA
I' •
-1';--~~t...l.___.,:_
v":
'\)'
Yi
)-!I
:>i
Prol•. DM. Móo;~ G. Zopp;-Fo~-M-P-(O_n_·_e_n-ta_d_o-ra_)___-""1:9-'~~''+-!- t -
-•..-
'-<
.,
~
t;
(2) Profo. Dr. Roberto Baronas- UNEMAT <V
X
<V
--
~
--
,-<
Ü)
~
f/) ()
::2 y
SUPLENTES
3
•·o Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca.,: os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
}..1ônica Oliveira Santos- 2004
4
..0 Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca": os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial I
Mônica Oliveira Santos- 2004 I
DEDICATÓRIA
5
..0 Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca": os sujeitos e os sentídos no espa9o da enunciação proverbial I
Mônica Oliveira Santos- 2004 I
AGRADECIMI!NTOS
tese.
trajetória.
do trabalho.
César ..
7
"O Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca'': os suje.ito.s e os sentidos no espaço da enunciação proverbial I
Mônica Oliveira Santos- 2004 _I
EPIGRAFE
Os sonhos despedaçam
9
..O Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca·~: os sujeítos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial I
M6nica Oliveira Santos- 2004 I
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 17
1.3- Do Corpus 20
TOPÓI
Estereótipo
ll
..OProvérblo é um comprimido que anda de boca em boca·~: os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Oliveira Santos- 2004
Transparência
1.3- "A Voz do Povo é a Voz de Deus" - "A Palavra de Deus é a 146
12
li "O Provérbio é umcomprimído que anda de boca em boca": os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial!
li M6rüca Oliveira Santos- 2004
RESUMO
linha francesa, além de considerações mais específicas sobre alguns conceitos filosóficos
valores são reproduzidos por uma voz coletiva, autorizada e reconhecida, em que o
Locutor está dividido entre um dizer (e um fazer sentido) individual e coletivo. Além disso,
verdade popular que a "voz do povo" aparece materializada, formalmente, pelo provérbio
13
..O Provérbio é um comprimido que andade boca em boca.,; os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciayão proverbial
Mônica Oliveira Santos- 2004
I
ABSTRACT
This research has lhe interest on thinking about a special type of enunciation, that
French line, besides more specific considerations about some foucaultian philosophical
concepts on truth and its effects. We lhink about lhe possibility on observing the proverbial
lhe proverbial form in an isolate way wilh merely illustrative aim on lhis or lhat theory. We
lhink about lhe polyphony on this enunciation function lhat assembles I mixes distinct
instances of "trulh": lhe political, the juridical and lhe eligious ways. We consider lhe
voice, aulhorized and recognized, where lhe speaker is divided between an individual and
collective saying (and a making sense). Besides, we observed lhe function lhat relates f
intrigues the political speech to lhe truth, lhe institutional ways of truth and to lhe popular
ways of truth. lt is precisely on lhis popular trulh that the "people's voice" appears
ínstitutíonal "trulhs". Beginning on lhe principie lhat the trulh's production of effects is not
verified regarding to lhe state of lhings but it happens from memory (from past
enunciation) and on its enunciation and discursive happening, we observe lhe present
and published on internet We will analyze such pronounces where it creates lhe
lnvestigation Parlíamentary Commission (I PC) to re-establish lhe trulh, given lhe emphatic
"preoccupation" wilh it
15
II ..OProvérbio é um comprimido que anda de boca em boca''; os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Oliveira Santos 2004
INTRODUçAO
seu anonimato: "Como diz o outro:" ou "Como diz o ditado:". O interessante é que
adequação. Um provérbio como "Uma andorinha só não faz verão" ou "É dando
este aponta.
17
!f •·o Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca·•; os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial 1
li Mônica Oliveira Santos- 2004 I
tomando-se facilmente reconhecível como "aquilo que todo mundo diz", que "é do
Isso permite à enunciação proverbial uma fácil aceitação como "verdade" válida e
investigativos, a julgar pela vasta literatura que se pode encontrar a esse respeito,
haveria algo mais a dizer, além de tudo o que já se havia dito. Entretanto, da
mesma forma que a recorrência investigativa do tema nos provocava uma inibição,
18
..O Provérbio é um comprimldo que anda de boca em boca•>: os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Oliveira Santos- 2004
trabalhos, nesse campo, os que mais nos interessem são aqueles que dizem
do dizer proverbial.
19
!I ~·o Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca.,: os sujeitos e os sentidos no espaço da enuncíação proverbiaJ 1
li Mônica Oliveira Santos- 2004 I
1.3 - Do Corpus
ser um corpus de fácil e pleno acesso e, por outro, pelo universo discursivo em
no dia seguinte ao que se realizam. Essa publicação diz respeito a uma ata
na forma de aparte (o que constitui uma prática) na fala dos senadores. Aliás,
1
Site: www.senado.gov.br.
20
11"'0 Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca..: os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbiaJ
Mônica Oliveira Santos- 2004
polêmicos, são para nós uma fonte muito fértil na emergência dos enunciados
proverbiais.
acervo consta de material publicado desde junho de 1997 até os dias atuais. O
semestre do ano de 2001. Ainda assim, foi necessário afunilar ainda mais o
setor público que trouxe à tona ao cenário brasileiro a prática da CPI (Comissão
21
!J ··o Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca·~: os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
li Mônica Oliveira Santos- 2004
provérbios.
22
"O Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca·•: os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial I
Mônica Oliveira Santos- 2004 I
coletivo, a partir do sentido produzido pelo sujeito que incorpora em seu discurso
conceito aos efeitos de verdade produzidos pela enunciação proverbial. Com base
23
..OProvérblo é um comprimldo que anda de boca em boca.,: os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial 1
Mônica Oliveira Santos- 2004 I
24
··o Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca": os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Oliveira Santos- 2004
CAPITULO I
forma ou da prática proverbial com fedas ilusões sobre sua possível "origem",
propuseram a isso, mesmo que se restrinja tal lista àqueles que dizem respeito à
justiça ao que já foi produzido e principalmente levaria este trabalho para longe do
seu maior objetivo. Entretanto, achamos necessário abordar algumas das teorias
25
..0 Provérbio é umcomprinlldo que anda de boca em boca'': os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Oliveira Santos- 2004
I
lugar comum, clichê, topói e estereótipo, contrastando tais discussões com a
(1930), que toma como referência básica o estudo sobre o Provérbio Alemão 3 , de
estudo a respeito do que ele considera Formas Simples. Estas estão enraizadas
na linguagem e são tidas como gestos verbais elementares que se originam das
ditado. Ele define o provérbio da seguinte maneira: "O provérbio é uma locução
2
O resultado deste capítulo se deve. em grande parte, não somente às leituras feitas com afinco,
mas especialmente às reflexões feitas em sala de aula nos vàrios cursos de Semântica e
pragmática, Tópicos de Semântica, Seminários de Semântica... que pude acompanhar com a
professora Mônica Zoppi-Fontana.
3
Seiler, Friedrich (1922). "Deutschen Sprichwõrterkunde". Munique.
26
um que no espaço
que reflete um tom mais elevado que o discurso comum" (in Jalles, op.cit: 129).
provérbio, Jalles sugere que Seiler hesitava em alguns pontos de sua definição.
do cotidiano;
2- o provérbio "é uma locução"- a locução é uma Forma Simples que diz respeito
"popular" na definição de provérbio, uma vez que o fato deste ser uma "locução
4
Seiler considera o termo didático embaraçoso e Jolles preferiria nem usá-lo. Para Jolles, o
didatismo tem a ver oom algo que está oomeçando a ser feito e deve ser orientado, enquanto que a
experiência realizada tem a ver com um resultado já oonduído que pode se usado como exemplo
em outras situações parecidas.
27
ii ..OProvérbio é um comprimido que anda de boca em boca•': os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
li Mônica Oliveira Santos- 2004
classe social, podendo a classe intermediária, aos poucos, ir-se influenciando pela
classe superior. Seiler afirma, ainda, que o nfvel de linguagem dos provérbios
pensamento.
Jolles critica abertamente essa postura e diz que, no caso dessa Forma
Simples, o provérbio, não há como estratificar o seu uso popular e informal
tomando como base as diferentes camadas sociais. O provérbio vai ser usado em
classes, em todos os seus meios: nos mais altos, nos mais baixos, nas camadas
origem dos provérbios. Ele diz que toda criação é individual. Os provérbios, ao
28
~·o Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca"; os sujeitos e os sentidos no espaç:o da enunciação proverbial
Môníca Oliveira Santos- 2004
alma popular, porque o "povo nada cria na totalidade". Alguém, em algum lugar,
em algum momento, cria! E, se sua criação agrada aos que a ouviram, será
Jolles, esse processo não é tão simples assim e tais afirmações são, pelo menos,
ser devidamente trabalhadas nos cbis autores citados. É claro que temos que
sujeito, locutor e enunciador. É por não achar que o provérbio seja apenas mais
5
Tal teoria partia de discussões anteriores acerca das "escalas argumentativas" apresentadas por
Oucrot (1973b). É importante salientar ainda que a versão da ANL que está nos servindo de
referência é a: La Argumentación em la Lengua, publicada em 1994 em Madrid, versão revista e
melhorada, autorizada pelos autores.
29
!I ..OProvérbio é um comprimido que anda de boca em boca": os sujeítos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial I
Mônica Oliveira Santos- 2004
função principal que teria a língua- representar a realidade (de modo que o valor
chegamos ao ponto de situar a teoria dos autores acima que nem defendem as
achar que essas teorias não são suficientes para descrever a significação. Em
Poííf6níca da Enunciação, proposta por Ducrot em "O dizer e o Dito", (1987), cujo
constituída por uma espécie de diálogo que põe em cena Locutor e Enunciadores.
topóí, J-C Anscombre (1993; 1995) e Ducrot (1993; 1995) e Anscombre & Ducrot
30
11 • oProvérbío é um comprimido que anda de boca em boca••: os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial I
4
sugerida por Anscombre (1993; 1995), Ducrot (1993; 1995) e Anscombre & Ducrot
rápida passagem por três fases importantes da teoria da ANL, (1994), que
31
•·o Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca•': os sujeitos e os sentidos no esp--a.Ço da enunciação proverbial
Mônica Oliveira Santos- 2004
I
pressuposicional que considera os atos de fala enunciados na língua como
fuma hoje I PP- Pedro fumava antes.). Os operadores não se definem mais pela
Pressuposto.
A+ operador'"= C3... -"Pedro bebeu pouco, pode dirigir sim." I "Pedro bebeu um
32
"OProvérblo é um comprimido que anda de boca em boca''; os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial I
Mônica Oliveira Santos- 2004 J
111- Na terceira fase, o fundamento principal nessa nova versão é o topos, ele
papel de convocar os topóí. Os topói são fatos descritos pela lfngua que dizem
está na língua ("Chove, portanto não vou à praia" I "Chove, ~ vou à praia") e é
conceito de Fonna Tópica (FT) acrescenta-se uma dinâmica léxica sob duas
faces: a FT intrínseca e a FT extrínseca: (+ P, + Q), (-P, -Q), (+P, -Q), (-P, +Q)-
na famosa fábula de "A cigarra e a formiga" depreendem-se duas FTs: FT, para
investigações mais recentes sobre esta teoria sustentam que as palavras com
conteúdo léxico, nomes e verbos, se descrevem como feixes de topóí. Tal idéia
33
!I ..OProvérbio é um comprimido que anda de boca em boca'': os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Oliveira Santos- 2004
I
elementos encadeados, mas obedece a certas condições/restrições intrínsecas à
semântica das palavras. Tal idéia é apresentada pelos autores quando estes
postulam que:
topói, daí a hipótese do sentido das palavras não ser referencial, mas gerado a
to pó i.
[iij "locuteur Jait jouer la forme topique (+POSSEDER. -DONNER) qui n"est pas
dans la signification de riche, mais qu"il attache 'en contexte' à ce mot pour les
besoin de la cause. D'ou provient ce topos en quelque sorte ajouté? Ou réservoir
ídéologique que toute langue posséde à une époque domée. 11 peut s"agir de
proverbes, de slogans, d'idées reçus, ... etc... D'une façon générale d"ailleurs.
l"usage de tels topói a pour finalité la construction de représentations
idéologiques. (Anscombre, 1995:57).
34
··o Provérbio é um comprimido que anda de beca em boca'': os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial I
Mônica Oliveira Santos- 2004 I
Conforme Anscombre, segundo uma 'Teoria dos Estereótipos", por trás das
Selon cette théorie ["théorie des stéréotypes] en effet, il y a des énoncés derriére
les mots. Or nous avon !Téquemment affirmé qu'if existait en langue un reservoir
de topo·; tout prêts à l'usage, à savoir les proverbes, et plus généralement les
formes sentencieuses... D'ou l'idée d'examiner le fonctionnnement des
proverbes et autres formes sentencieuses, à la recherche d'un lien éventuel
entre la !héorie des topoi et celle des stéréotypes." (Anscombre, op.cit:66).
"Etant donné que les proverbes représentent des topol, et sont par ailleurs des
phrases typifiantes a priori, je propose de faire l'hypothêse générale que les
topo·; sont des phrases typifiantes a priori. (Anscombre, op.cit:81).
conteúdo do to{XJs está fora da língua, pois esse conteúdo é cultural, social e o
componente ideológico e histórico não faz parte do lingüístico, fica fora da análise.
Não é da alçada do semanticista fazer a lista dos topói, isso é trabalho para o
antropólogo, o etnólogo ... Entretanto, temos visto que a ênfase que os autores dão
ainda "Quem tem boca vai a Roma" I "Em boca fechada não entra mosca". Pelo
que temos visto, podemos supor, que, com essa relação, a teoria pode trazer para
35
..0 Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca.,: os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Oliveira Santos- 2004
Estereótipo
sentido lexical e, (daí o nosso interesse específico), o sentido dos provérbios, que
frases genéricas.
1925) em seu clássico artigo "Über Sinn und Bedeutung" (Sobre o Sentido e a
6
Frege, G. (1848-1925) - Lógica e filosofia da linguagem. Cunlix: São Paulo. trd. Paulo
Alconforado. (1978).
36
"'O Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca'': os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
M6níca Oliveira Santos- 2004
existe ou não o valor de verdade de uma sentença. Nesse caso, ele separa os
em linhas gerais, Frege sustenta que o sentido tem sua contraparte na referência,
Sentido-conceito
Sinal-signo L __ _ _ __,
Referente-objeto
37
•"' Provérbio é um comprimido que a.11da. de boca em boca·•: os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Oliveira Santos- 2004
Função aplicada ao sentido. Como propõe Frege, "se algo varia temos
Nome Próprio, uma vez que este caracteriza-se pela sua determinação/definição,
38
..0 Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca''; os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Oliveira Santos- 2004
I
teóricos que se inscrevem na semântica referencial o sentido determina a
encontra limites, ou pelo menos, não aplica o mesmo cálculo em todos os tipos de
7
Sobre este par conceitual !nlensão e Extensão ver: -D. KAPLAN, (1964). Foundations of
lntensiona/ Logic. (tese de doutorado), Michigan: University Mícrofilms, 304-323.
-D. LEWIS, (197?). "General Semantics".IN. Semanfjcs of Natural Language. (org.). DAVIDSON &
HARMAN. Dora-ech!- Holland: Rei dei Publishíng Company.
8
Como teóricos não-referencialistas são apontados: Saussure, para quem a língua é um sistema
de signos (significante e significado), Harris que é distribucionalista, para quem o léxico é apenas
39
..O Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca..: os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
1
Mônica Oliveira Santos- 2004 I
a significação está livre do conteúdo informativo, uma vez que esta seria de
argumentação referenciado pelo conjunto de topóí da língua que cada item lexical
uma rede de relações. sintáticas ou gramaticais, pois a unidade léxica não tem sentido, e a
informação é determinada pela organização da língua, Putnam, para quem, o sentido não
determina sua extensão e pode ter um caráter intersubjetivo com componente social. A
representação semântica não se esgota na extensão: há outros fatores: os marcadores sintáticos,
semânticos, os estereótipos. Kleiber não concorda com os pressupostos não-referencialistas
defendidos por Putnam. mas aprova o fato dele trazer a intersubjetividade e o fator social para
dentro do trabalho com o sentido - nem universais necessários, nem contingência absoluta.
Kleiber, no fim do capttulo vai defender a interferência do psíquico.
40
··o Provérbio é um comprirr.ido que anda. de boca em boca·•: os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Oliveira Sa.>·ltos- 2004
I
ponto, gostaríamos de mencionar a relação destacada entre essas teorias e a
de criação morfológica-léxical.
(1994, 1999) tem desenvoivido sobre os provérbios nos últimos anos, sobretudo o
conceito de denominação que ele aplica para descrever a forma proverbial. Ferary
proverbial. Para isto, ela aponta alguns pressupostos desenvolvidos por L. Perrin
10
Oucrot, (1987), remete a primeira aparição deste conceito a Benveníste (1006, Cap. XXVIII),
como mecanismo de criação morfológica-lexical a partir de locuções com valor enunciativo: Adeus•
Íportuguês), Pordiosear (espanhol), m'as-tu-vu (francês).
1
É pertinente observar a ênfase dada a forma proverbial em vários trabalhos desenvolvidos por J-
C Anscombre.
41
··o Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca.,: os sujeitos e o:;: sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Oliveira Santos- 2004
da frase idiomática face a uma situação genérica. Entretanto, Perrin concorda com
uma forma e um referente fixo. A autora supõe que Perrin faz uma confusão entre
caso de discurso citado/relatado (cf.p.2). A autora quer propor uma nova maneira
argumentativa da língua.
tempo uma frase. Ele tratará o provérbio como um signo-frase isolado naquilo que
ele supõe ser a sua forma fiXa, cristalizada. Nesse sentido, pode-se ligar um
provérbio.
42
11 ..0 Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca'': os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
!I Mônica Oliveira Santos- 2004
I
autor afirma que na denominação o sentido é prévio à situação e que mesmo as
são formas codificadas na língua, por isso, o autor sugere que os provérbios
deveriam ser dicionarizados (tomarem-se itens lexicais, uma vez que fora de
condensação que os demais itens lexicais. Em relação ao sentido, ele afirma que
cristalizada, em que não se pode alterar - seu sentido é denominado. Ele cita
+ características gerais:
- não têm autor reconhecido, por isso podem ser usados por todo e qualquer
locutor.
+características polêmicas:
-teor didático.
43
..O Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca''; os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Oliveira Santos- 2004
I
Confonne Kleiber, o provérbio vai ser tomado como denominação
língua. Seu sentido seria fixo por uma convenção para todo locutor (universal). Os
provérbios são apresentados pelo autor como uma verdade geral ou universal,
que funciona como verdade retórica por sua aplicabilidade geral -para Kleiber só
serão considerados provérbios aquelas formas com teor implicativo (Se ... Então)
referencialista. Para nós o provérbio não está limitado à sua estrutura implicativa,
esta somente lhe confere uma simulação de implicação lógica, porém o gênero
44
..0 Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca": os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Oliveira Santos- 2004
I
que se materializa nas coletividades que o provérbio representa, produzindo
histórica, bem como à forma material de suas formulações (estrutura, tom, ritmo,
verdade e pretende como universal ou pelo menos geral), como mostraremos nos
capítulos seguintes.
Voltando à posição de Ferary, ela diz que não pode acaitar as hipóteses de
Kleiber, por não achar que a característica principal do provérbio seja aquela de
referir a uma situação estável. Para a autora, é possível falar do provérbio sem o
12
O autor opõe o modelo de Delocutividade Lexical Benvenisteana ao que ele propõe
Delocutividade Formulaica.
45
!f "'OProvérblo é um comprimido que anda de boca em boca· os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial'
1
:
ato de enunciação, em seguida, a partir dele, se cria uma .DQJ!.!! fórmula e não um
des Alpes, (Cretino dos Alpes), mas poderíamos considerar aqui uma fórmula
A- Existence dans la langue de morphémes m1 , m2, m,, ... , ayant des valeurs
sémantíques s 1, s2. ___ sn.
B- Utilisation de fl'l, 1111. lllJ, ... , avec des valeurs sémantiques s,, s,, ... , dans um
certain type d'énoncíation, à l'aide d'une formule F 1 (m 1, 1111, .. .), formule
uniquement compositiomelle, ayant um sens 81.
C- Fabrícation d'um morphéme complexe F2, dont la valeur sémantique S, contient
une allusion à l'emploi de m,, 1111 .... avec les valeurs respectives s1, s,, ... , i.e. à
F, (m 1, m,, .. .).
D- Si F,=F, (m,, m,, ...). les emplois de F, (m,, m,, ..) sont relus en domant à F da
valeur de 8 2 . (cf.Ferary, op.cít:3)
Daí, como supõe Anscombre e Ferary, a criação das fórmulas e dos provérbios!
"Tout d'abord F1 possédait un sens m1+m,+m3 (Crétin des Alpes), c'est-à-dire la personne atteinte
de la maladie de aétinisme. A étape B, I' on a utilisé F 1 pour insutter quelqu'un Iui reprochant d' être
atteint de Crétinisme. Puis, étape C, est créée la formule F, avec un sens S, par laquelle, nous
faisons l'acte d'insulter quelqu'un. La valeur S1 (à savoir la maladie) s'est effacée derriére !'insulte,
13
Na região Nordeste, há algumas décadas, por motivos culturais que evitavam pronunciar o nome
de doenças perigosas, referia-se à raiva (doença canina) como a moléstia dos cachorros. Com o
tempo passou-se a associar esta referência à atitudes despropositadas, comportamentos
indevidos, desviantes, insanos, pela alusão que se fazia à loucura em relação à moléstia. E fixou-
se o uso da fórmula deu a moléstia dos cachorros ou X está com a moléstia dos cachorros cada
v& que se queria atribuir a algo ou alguém a pecha de louco, fora da razão, absurdo.
46
..O Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca'': os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Oliveira Santos- 2004 I
mais subsiste cependant car F2 fait écho aux énonciations antéríeures de F 1. A rétape C, la formule
s, est énoncé de façon conversationnelle ou contextuelle. En d'autres mots, le sens S,, n' est pás
encare forgé, n'est pás encare attaché linguisticament à F z. on commence à employer la formule F,
en tant que telle mais ce n'est qu'à l'étape D que l'on peut considérer que la formule F1 est
equivalente à F2, donc on n'utilisera plus Crefin des Alpes! que comme insulte. il s'agit d'un usage
conventionnel et norn plus contextuel ( .. .) Nous nous inspirons donc de ce demier article pour
assimiler proverbe et délocutivité. (Ferary, op.cit3).
provérbio ("o primeiro sentido"- busca da primeira origem.), pois alega que houve
referencial (signo-frase). Mas, ela ainda está presa ao que nos parece ser uma
seria uma denominação de referência geral e não única. Aqui já nos deparamos
com um paradoxo: Como o provérbio é ao mesmo tempo uma frase genérica (com
uma denominação composicional que teria uma relação direta com a referência? E
para adquirir o estatuto de denominação, já tem que ter sido descrito, designado
47
iJ ~·o Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca": os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
J\1ônica Oliveira Santos- 2004
determinado, mas não explica esse prévio. Nesse ponto, voltamos a chamar
social, o ideológico) é posta para fora da língua. Kleiber não faz análises do ponto
da ANL, ele lança mão da forma proverbial como formalização material para
Acreditamos que o provérbio não seja mesmo transparente, mas opaco, plástico
na estrutura da língua. Para causar os efeitos que deve ele precisa ressaltar-se na
forma, tomar cor e brilho, cheirar mal! Essa é a sua materialidade real,
de trazer esse vazio para dentro da língua por intermédio da sua forma lingüística
48
li ~·o Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca..: os sujeítos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
li 1.1ônica Oliveira Santos- 2004
14
A noção de Estrutura e Acontecimento é apresentade por M. Pêcheux (1983) e será
desenvolvida posteriormente nesse trabalho.
49
..O Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca'': os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Oliveira Santos- 2004
50
..O Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca'': os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial J
Mônica Oliveira Santos- 2004 I
CAPITULO 11
5!
•·oProv6rblo é um comprimido que anda de boca em boca•'; os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mô:rica Oliveira Santos- 2004
I
religiosos, médicos, jornalistas etc. Partindo do princípio de que a produção de
15
Noção in'1cíalmente proposta por Benveniste, E. {1966) O Aparelho Formal da Enunciação. IN
Problemas de Ljnoüística Gera! 11. Campinas: Pontes, p.85 (1989). Tal noção foi posteriormente
redefinida por Ducrot, O (1987: 168) e por Guimarães, E (1989).
"A noção de "saber-poder" é apresentada por M. Foucautt e será retomada posteriormente neste
trabalho.
52
..0 Provérllio é um comprimido que anda de boca em boca••: os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Oliveira Santos- 2004
I
dicionário, mas como parte das mais diversas enunciações dos lorutores A, B, ou
C de sua comunidade e das múltiplas enunc1ações de sua própria pral'lca
lingüística. (Bakhtin, 1929/2002: 95).
um dos equívocos mais graves do objetivismo abstrato. Por outro lado, segundo o
palavra com a sua unicidade está numa síntese dialética. É assim que podemos
organizados e, mesmo que não haja um interlocutor real, este pode ser substituído
(1929/2002:112). Para Bakhtin, o termo "diálogo" deve ser entendido num sentido
amplo, não apenas como a comunicação em voz alta, de pessoas colocadas face
a face, mas como toda comunicação verbal, de qualquer tipo que seja. "A palavra
alteridade.
53
•·o Provérbio é um comprimído que anda de boca em boca'': os sujeltos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial J
Mônica Oliveíra Santos- 2004 I
entre a lfngua e a vida, pois "a língua penetra na vida através dos enunciados
resposta, mesmo que para isso o ouvinte tome-se locutor. "Cedo ou tarde, o que
não é uma compreensão passiva, mas uma resposta, uma concordância, uma
Bakhtin acredita que a palavra existe para o locutor sob três níveis: a)
que pertence aos outros e preenche o eco dos enunciados alheios; e c) 'palavra
minha' que, na medida em que uso tal palavra, em detenninada situação, ela já se
54
"OProvérbío é um comprimido que anda de boca em boca·•: o.s sujeitos e. os sentidos no espaço da enunciação prover(;ja} I
Mônica Oliveíra Santos- 2004 I
por parte de um locutor que mobiliza a lfngua por sua conta: é o ato mesmo de
55
"O Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca": os: sujeitos: e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Oliveira Santos- 2004
ao "aqui-agora" do locutor.
propõe como forma de discurso duas "figuras" necessárias: uma como origem (o
17
O grifo é nosso.
56
it••oProvérbio é um comprimido que anda de boca em boca''·. os sujeitos e os sentidos no espaço da enuncíação proverbial J
11. Mônica Oliveira Santos- 2004 J
enunciativo, uma vez que há uma disputa envolvendo locutores e alocutários com
57
..0 Provérbio é umcomprirr..ido que anda de boca em boca•': os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial I
Mônica Oliveira Santos- 2004
Polifonia na enunciação, uma vez que este foi significativo no sentido de romper
com a unicidade do sujeito falante. Ou seja, ele rompe com o axioma segundo o
qual por trás de cada enunciado há uma e somente uma pessoa que fala.
Para o autor, num mesmo enunciado estão presentes vários sujeitos com
diferentes status lingüísticos o que nos leva a crer que o sujeito tem várias
concluir-se que a cada uma de suas vozes se confere uma autonomia enunciativa.
falsidade.
19
Achamos que Ducrot 'simplifica' demais a contribuição bakhtiniana em relação aos estudos
sobre a polifonia da linguagem, pois Bakhtin (na Estética da criação verbal, entre outros trabalhos)
aprofunde essa reflexão do ponto de vista enunciativo, apontando a questão do rompimerto da
unicidade do suje~o enunciador.
58
••o Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca'': os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Oliveíra Santos- 2004
Ducrot (1987: 168), distingue três diferentes acepções para o que seja a
termos, o que acabo de chamar "enunciado"; e a terceira, com a qual ele declara
acontecimento histórico: é dado existência a alguma coisa que não existia antes
de se falar e que não existirá mais depois. É esta aparição momentânea que
chamo "enuncíaçãom'.
que dialogam entre sí, há uma apresentação de diferentes vozes, de vários pontos
sujeito;
59
11 ..0 Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca'': os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Oliveira Santos- 2004
d) os Enunciadores- E1, E2 ... : que são os vários pontos de vista que podem
enunciativas (L, Lp, E1, E2 ... ) dão lugar à multiplicidade de personagens. O sentido
de vista postos em cena pelo locutor que se define como o personagem a que o
enquanto que para Bakhtin esta seria uma inescapável forma de constituição da
acredita (assim como Benveniste) que haja enunciados impessoais, portanto sem
60
•·o Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca": os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Oliveira Santos- 2004
Ao afirmar que o enunciado proverbial não tem Locutor, justificando que quando
dizer está alheio ao que dizemos, ele deixa de observar que o simulacro de
preocuparse por el sentido dei enunciado ... lo que 'dica' el enunciado, lo que este
Entendemos que até pode haver enunciados sem Locutor, isolados em sua
20
O grifo é nosso.
61
•1 •·oProvérblo é um comprimido que anda de boca em boca' 1: os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
1
Mônica Oliveira Santos- 2004 I
Oucrot, esse autor (mesmo partindo do princípio de que para configurar uma
ao seu próprio dizer e à língua da qual esse sujeito se apropria para dizer algo. (cf.
autoria, criando a ilusão da unicidade do sujeito e do texto com início, meio e fim.
62
HOProvérbio é um comprimído que anda de boca em boca'': os 3njeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbiaJ 1
!~.iônica Oliveíra Santos- 2004 I
ouvir, de modo que não dizem respeito ao lingüístico e, portanto, não se incluem
quem o Lp é apenas mais uma figura representativa das funções enunciativas que
21
O autor faz menção à noção de polifonia e dialogia bakhtiniana: "é pela incorporação do conceito
de Polifonia constituído por Bakhtine que a semântica da enunciação considera as diversas
representações do sujeito da enunciação do enunciado"". (Guimarães,1987:21).
63
..O Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca·': os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Oliveira Santos- 2004
I
O enunciador é a posição do sujeito que estabelece a perspectiva da
enunciação. O destinatário é o correlato constituído segundo a perspectiva do
enul)ciador. Suponhamos aqui que no meio de uma conversa alguém diga
(4) Agua mole em pedra dura tanto bate até que fura.
A enunciação de (4) representa um L que fala da perspectiva do senso comum,
e que, inclusive, mobiliza esta perspectiva como argumento para o que diz.
Assim L, neste caso, fala de uma perspectiva genérica, e esta enunciação
representa um enunciadorgenérico22 . (Guimarães,op.cit22).
enunciativo, nem dialógico, nem muito menos lhe sonega o Locutor! Guimarães
( 1989: 37-38) enfatiza que seu objeto de análise são os recortes enunciatiVos
esclarece ainda sua diferença em relação a Ducrot num sentido muito preciso:
Primeiro devo áiZer que concordo que o falante, tal como Ducrot o conceitua
(como figura físico-fisiológica e psíquica), não é um personagem da enunciação.
Minha diferença está em que considero que o falante não é esta figura empírica.
mas uma figura polltica constitulda pelos espaços de enunciação. E nesta medida
ela deve ser inclulda entre as figuras da enunciação (Guimarães. 2002:18). Isto
me levou a, inclusive, usar de maneira diferente os termos locutor e enunciador
que Ducrot distingue e que também distingo, mas já num outro quadro de
categorias, onde procuro caracterizar não a multiplicação das figuras da
enunciação, mas a sua divisão. (cf nota de rodapé, Guimarães. 2002:23).
22
Sobre essa categoría de enunciador-genérico vo~aremos a falar no capitulo seguinte.
64
lf"'O Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca·•: os sujeitos e os sentidos no espaço daenunciaç.ão proverbial
M6nica Oliveira Santos 2004
cristalizadas, inseridas num dizer que pode ser atribuído a um Locutor, mesmo
65
...0 Provérbio é um comprimido que anda de boca em bocaH: os sujeüos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial 1
Mônica Oliveira Santos- 2004 I
d'un proverbe est attribuée à un personnage distinct du locuteur, mais encare elle
même la voix du locuteur à toutes les voix qui ont profere avant lu i te même adage"
provérbio sirva de modelo para os que querem autorizar seus enunciados, ou, ao
lúdica, quando diz respeito meramente aos jogos de palavras sem investimento
66
"O Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca''; os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbialJ
h-iônica Oliveira Santos- 2004
explorada, de modo que a E1 possa trazer até uma convergência semântica com
duas estratégias ainda apontam para dois níveis de desvio: o desvio das
atestado:
emprego" podem ser tanto captadas como subvertidas. Uma vez que numa
67
!J •·o Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca·~: os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
!f Mônica Oliveira Santos- 2004
I
permite à enunciação proverbial tanto uma fácil aceitação como verdade válida e
como recurso argumentativo para persuadir e convencer, bem como espaço para
unidos num só (o político) então são muito mais eficazes. Ainda mais, se a isso se
discurso político desempenha esse papel com "louvor'', articulando à boa oratória
70
!f ..0 Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca·•; os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
li Mônica Oliveira Santos- 2004
I
sobretudo o "efeito da verdade'; cuja importilncia no sistema político ocidental é
poder até que ele revele a verdade, aliás, este seria o principal efeito esperado (do
palavra revelada, ele faz apelo ao imaginário histórico-social. Pelo fato de que seu
então, os seus efeitos devem ser pesquisados em uma circulação muito mais
que a Teologia é uma interpretação da palavra revelada e como Deus não fala
Deus e seu povo. É claro que a palavra, no seu âmbito abstrato não pode realizar
71
4
'0 Provérbio é umcomprimído que anda de boca em boca·': os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
:Mônica Oliveira Santos- 2004
pacto como aquele realizado entre Deus e seu povo" (Corten, op.cit.:80). Para
Corten:
É pertinente salientar ainda que, conforme Bakhtin, existe uma gama dos
72
..0 Provérbio é um comprimido que anda de boca. em boca••: os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Oliveira Santos- 2004
I
do símbolo religioso, da fórmula científica e da forma jurídica, etc. "Os sistemas
cristalizam-se a partir da ideologia do cotidiano, exercam por sua vez sobre esta,
em retorno, uma forte influência e dão assim normalmente o tom a essa ideologia."
(Bakhtin: 1929;119).
25
Tanto nas sessões parlamentares do senado (ritual de proferimento), quanto nos seus
documentos de registro (as atas publicadas ra Internet), os proferimentos dos senadores são
chamados de "discursos" - que seria correlato a "textos". Como também mobilizamos uma noção
teórica denominada Discurso, então, chamaremos os "discursos" dos senadores de proferimento
para evitar qualquer associação indevida.
73
··o Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca·~: os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Oliveira Santos- 2004
direcionados para esta região e falsa convicção de que tal região seja um ônus
para o Brasil.
do sujeito.
74
•'C Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca'); os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial 1
Mônica Oliveira Santos- 2004 I
75
..0 Provérb10 é um comprimido que anda de boca em boca'); os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial 1
Mônica Oliveira Santos- 2004 I
houve forte entrada de recursos a fundo perdido, (10) o Nordeste deu mais do
que reÇêbeu à NAÇÃO BRASILEIRA em termos financeiros líquidos. o nordeste
deu aproximadamente US$1 bilhão por ano! Portanto, é uma farsa que revela
ignorância ou má fé a afirmação de que (J) a região nordestina é um ônus para
os brasileiros.
"verdade", boa fé, moral, ética, tradição, honra, justiça, compromisso e observação
em não cair nos mesmos erros (em tentação), pois "errar é humano, porém
até por nem acharmos pertinente, uma classificação geral de tipos de enunciação
proverbial, pois isso selia incoerente com a nossa maneira de ver tal
76
·~o Provérbio é um comprirr.ido que anda de boca em boca": os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Ohveíra Sazltos- 2004
enunciativo das proverbializações acima: (1), (8), (9), (10) por captação e (5) por
77
··o Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca'': os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Oliveira Santos- 2004
I
conferir um "tom" proverbial a um enunciado próprio, produzido a partir da
sentenças bíblicas ("Quem se junta com porcos, farelo vem a comer"), científicas
("Freud explica", "É a lei da gravidade", 'Tudo é relativo"), jurídicas ("A lei é igual
outras.
Senadora e, por outro, uma fonma que foi proverbializada pela senadora ao
assumem a mesma direção argumentativa como "Palavra e pedra soltas, não têm
volta", "Quem promete em dívida se mete", "Ajoelhou, tem que rezar" que
de que se deve cumprir sempre com a palavra e com os compromissos, pois isso
78
''O Provérbio é um comprimido gue anda de boca em boca": os sujeitos e os sem tidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Oliveíra Santos- 2004
Entretanto, em (1) não há a paráfrase de nenhuma dessas formas, mas uma nova
Hood (E 0): "tirar dos ricos para dar aos pobres". O próprio Locutor faz referência a
inverso: os pobres financiam os mais ricos" (E1). A forma cristalizada (Eo) remonta
forma, raforça a idéia de injustiça (tirar dos pobres e dar aos ricos (E;)), ou seja,
79
~-o Provérblo é um comprimido q1.le anda de boca em boca'': os: sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Oliveira Santos- 2004
I
enfatizando o descompromisso e a crueldade do governo para com os pobres.
dando que se recebe", "Quem dá aos pobres, empresta a Deus". Mais uma vez,
Locutor evidencia a postura inversa tomada pelo governo que é a de, ao contrário
do que havia prometido, repetir SIM os erros do passado, uma vez que FHC
desenvolvimento efetivo para a região; e tomando cada vez mais dos pobres
(nordestinos) sem nada lhes restituir, para dar aos ricos (região su~Sudeste). A
80
•·o Provér'bio é um comprimido que anda. de boca em boca''; os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Oliveira Santos- 2004
I
deslocamento, incluindo novos enunciadores na cena enunciativa - enunciadores
palavras do Locutor, sem deixar escapar é claro o sabor de "verdade" que lhes é
algumas formas proverbiais (Eo) a eles subjacentes, por exemplo: (2) "A sorte não
lhe foi mãe, foi madrasta" ou "A vida não lhe foi mãe, foi madrasta" que focaliza o
feita no enunciado sai de um campo mais amplo (a sorte, a vida) e vai para um
81
4
'0 Provérblo é um comprimído que anda de boca em boca·': os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial 1
Mônica Oliveira Santos- 2004 I
crueldade.
E em (6) raconhecemos uma fonna proverbial fixa (Eo) que remete ao chulo
e ao burlesco "E o que o cu tem a ver com as calças" (ou ainda mais
eufemisticamente: "E o que o urubu tem a ver com as alças"), sendo parafraseada
não obriga que uma tenha necessariamente a ver com a outra. Ou seja, a Sudene
em um órgão não justifica a extinção do mesmo, esta não seria a medida mais
desenvolvimento da região.
ser percebido nas paráfrases (E1) desses enunciados proverbiais também aponta
82
..0 Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca'': os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação prover'olal
Mônica Oliveira Santos- 2004
desesperadoras, problemas sem solução, sem fim. O Locutor põe em cena pontos
aqueles pontos de vista com os quais não se identifica. A Senadora atribui a FHC
Nordeste seja um "poço sem fundo", um problema sem solução para o qual o
governo.
do item (b) e (c) dentro da classificação referente ao desvio militante no nível 2 por
83
..O Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca.,: os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Oliveira Santos- 2004
I
captação, aquele que se refere ao desvio de provérbios atestados, provérbios
fixa (Eo), a estrutura do discurso direto: "como se diz", "como diz o ditado", -
na Sudam e usar isso como pretexto para extinguir também a Sudene, privando a
'tão sofrida região Nordeste" dos poucos recursos que lhe são destinados. Esse
ponto de vista que passa como indigno aos olhos do povo, do Nordeste, do SEU
Sergipe, e também indigno aos seus olhos, é o ponto de vista de outro enunciador
Entre todos os enunciados que elencamos, apenas um, o (7), poderia ser
considerado como menção no discurso citado. Mesmo assim, não podemos dizer
que por ser uma clara citação proverbial, ela não rompa com o lugar da
84
··o Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca'~: os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial 1
Mônica Oliveira Santos- 2004 I
senadora diz: "Como se diz no meu Sergipe:" e não "Como diz o ditado:", "Como
diz o outro:", "Como diz o doido:", "Como diz o povo:"... ou mesmo "Como se diz
identifica como pertencante a este lugar, que por acaso diz respeito à região
desvio. Aliás, para nós o termo desvio talvez nem fosse o melhor para tratar a
enunciação proverbial, por parecar pejorativo, negativo, quando para nós este
pervertidas, divertidas...
85
"O Provérbio é um comprimido que a.nda de boca em boca·~: os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial'
Mônica Oliveira Santos- 2004
direção argumentativa jurídícolrelígíosa que prima por enfatizar por parte DELA I
- Justiça: (H) 'temos mais do que o dever: temos a obrigação de derrubar esse
86
··o Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca·•: os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Oliveíra Santos- 2004
menos desenvolvidas do País", (I) "A região nordestina não deseja nem pleiteia
esmolas";
- Injustiça: (G) '1ógica de Robin Hood ao inverso", (J) "a região nordestina
- Descompromisso: (A) "falta de uma firme decisão política", (E) "quem não
(re)produzidos I (re)interpretados.
87
..0 Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca": os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial~
Môníca Oliveira Santos- 2004
à posição que a senadora quer também como sua no entrelace das "verdades" do
enunciativas de subjetividade.
proverbializadas ("Tirar dos ricos para dar aos pobres" +"Os pobres financiam
os mais ricos" I "É dando que se recebe" + "O Nordeste tem dado mais à União
do que deía recebe'); as parafraseadas ("a sorte não lhe foi mãe foi madrasta" +
"Uma administração que se reveíou madrasta para os nordestinos') e as fixas
88
fi ..OProvérbio é um comprinúdo que anda de boca em boca·•: os suje1tos e os sentidos no espaço daenuncíayão proverbial
Mônica Oliveira Santos- 2004
I
cristalizado, há ainda um deslocamento/marginalização de sentido, causando uma
sítio significativo específico. Na verdade, tais formas podem ser encaradas como
então, efetivando sentido. Portanto, uma vez incorporadas essas formas são
subjetivadas na linguagem26 •
quando enuncia: "logo após levarmos um susto que deixou a lodos nós,
89
II ..OProvérblo é um comprimido que anda de boca. em boca·~: os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbia1 J
li Mônica Oliveira Santos- 2004 I
nordestino);
Nordeste deu mais do que recebeu à nação brasileira" - as marcas ELES I ELA
NÓS dessa vez não diz respeito à condição de nordestina, mas a de Parlamentar
coletividade); e
(IV) a senadora põe em terceira pessoa (ELE) e numa forma impessoal (QUEM) o
21
Destacamos ainda o trabalho de Zoppi-Fontana, (1997) a respeito do Nós polftico no discurso
alfonsinísta, definindo o 'porta-voz": "a relação de "diálogo" se estabelece entre o eu = presidente
ou o nós = governo-administração (NÓS exclusivo) e o vocês = povo... Nessa relação de "diálogo"
o a!ocutáno é representado como um conjunto tota/izador e uniforme, o que se manifesta
lingüisticamente at-avés da operação de determinação... É esse apagamento das reais (ou
potenciais) diferenças que dividem o conjunto dos alocutários, que permite a reformuiação
parafrástica de "povo" (sujeito coletivo uno e indiviso) ... por "vocês" (todos = soma de indivíduos)."
(Zoppi-Fontana, 1997: 88).
90
..0 Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca'': os sujeitos e os sentidos no espayo da enunciação proverbial
M6níca Oliveira Santo3- 2004
I
brasileiros que esquecessem do que ele havia afirmado", "quem não assumia nem
texto e aquelas que a esta se opõem. Tais marcas têm um papel importante para
Brasil.
91
..0 Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca·~: os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Oliveira Santos- 2004
92
~·o Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca": os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial I
Mônica Oliveira Santos- 2004
sentidos, colocando-se como responsável por um dizer, por outro lado, ele
também está se colocando num lugar de comunhão com o que "diz'' uma
aquele dizer.
" Nesse lugar, poderíamos chamar a atenção para o "Sujeito múltiplo" ou "Sujeito Coletivo" como
propõe P. Henry, (1992). Para ele, tanto a Forma-sujeito ('sujeito coletivo") como o conceito de
ideologia resistem a qualquer redução a um sistema de idéia ou representação individual. A
identificação entre sujeito e indivíduo ( ..) é a base de uma concepção teónca de uma subjetividade
natural e irredutivelmente indiwdual (. ..) que é aquela do campo da com{iementandade (...) O
desenvoMmento das lutas de classes ( .. .) teve por coro/áno o desenvolvimento no intenor das
ideologias dominantes, mas rompendo com elas, as formações ideológicas, "polfticas", nas quais
as posições da classe operána estão representadas, ( ...) estão constituídas em tomo de uma
forma-sujeito, a do "sujeito cdel.ivo" que rompe com a forma-sujeito constitutiva das práticas
burguesas. (Henry, 1992:138).
94
··o Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca·•: os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial 1
Mônica Oliveira Santos- 2004 I
Podemos distinguir aqui dois tipos de provérbio 30 que nos servirão de ponto
e dêiticos em geral que envolvem a primeira pessoa, (por exemplo: "Faça o que .rui
digo, mas não faça o que ~faço", "Quando você vinha com milho, eu já voltava
dêiticos, em geral, que envolvem a terceira pessoa, (por exemplo: "Aqui ~faz,
aqui~ paga", "Aquele que não tiver pecados, atire a primeira pedra", "Quem tá na
30
t: importante salientar que consideramos o gênero proverbial por demais diversificado e não nos
interessam aqui categorizações para organizar e sistematizar tal variedade. Essa classificação em
dois tipos que propomos acima só faz-se necessária em função dos nossos objetivos de
investigação.
95
..O Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca'': os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Olíveira Santos- 2004
estrutura proverbial mais típica, que marca a indeterminação pessoal, enfatiza (em
nossa opinião, a tentativa de) uma divisão entre o dizer individual e o coletivo; por
sempre razão, e "se o que eu penso está de acordo com a maioria é porque estou
coletivo não está restrito apenas aos provérbios, pois abrange também outros
gêneros como: advinha, cantos de torcida de futebol, piadas, slogans etc. como
do Locutor a si. Para Guimarães, sem essa disparidade não pode haver
96
"O Provérbio é um comprimido que anda de boca em boc'õt': os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial!
1'...1ôníca Oliveira Santos- 2004
Conforme Guimarães,.
Uma enunciação como essa, ao produzir esta nova divisão do locutor, produz
sentidos como "o presidente ameaçou a oposição, acusou a oposição de
semear vento, discórdia, etc", a partir de um dizer que não é só seu, mas é de
todos. O locutor-presidente toma o enunciador-ganérico como argumento para
si. A sua voz é como a voz de todos, por isso ele fala com razão. E este
enunciador-genérico produz aí o efetto de que ele não fala como presidente mas
como um todos, do povo. (Guimarães, op.cit.: p29).
97
HOProvérblo é um comprimido que anda de boca em boca'): os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial 1
Mônica Oliveira Santos- 2004 J
mesmo do gênero proverbial. Mas, como o provérbio aparece como exemplo para
pedra dura tanto bate até que fura" representa um L que fala da perspectiva do
98
il ..O Provérbio é um comprirr,ido que anda de boca em boca": os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
11 Mônica Oliveira Santos- 2004
31
O grifo é nosso.
32
O grifo é nosso.
99
..O Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca": os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
1\1ônica Oliveira Santos- 2004
genérico, "uma realização zero", como se tem em "a noite é boa conselheíra"e "tal
pai, tal filho" que possuem uma referência mais direta). A referência de grupos
nominais como "gato escaldado tem 'medo de água fria", "a ocasião faz o ladrão"
daqueles que não querem arriscar por temerem os danos de uma malograda
pouco mais essa discussão, retomamos a relação feita por Oucrot e Anscombre
uma língua. Assim como há topói contraditórios que apontam para direções
("Quem tem boca vai a Roma", "Em boca fechada não entra mosca"). Isto se dá,
100
..O Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca": os sujeítos e o.s sentidos no espaço da enunciação proverbial.
Mônica Oliveira Santos- 2004
Supposons qu'au cours d'une discussion entre chrétiens quelqu'un énonce avec
une inlonation spécifique une phrase du Christ, sans en indiquer la source mais
en pensant bien qu'elle sera reconnue (aux deux sens du mot) par sés
allocutaires. Ce faisant, il s'efface en tant qu'agent vérificateur derriére un
Énonciateur suprême, qui Bit autorité dans la collectivité concemée _ Mais si
l'on sort de cette collectivité34, ce seronl d'autres autorités qui auront cours; de
ce fait, on comprend mieux à quoi tient le caractere remarquable du proverbe.
(Grésillon & Maingueneau, op.cit: 114).
33
Podemos citar ainda a distinção entre os nomes gerais e os nomes coletivos proposta por J. S.
Mil! (1866i84:89-105), em que o filósofo concebe nomes gerais os que podem ser predicados de
cada indovlduo de uma multidão, e nomes coletivos os que não podem ser predicados de ceda
individuo separadamente. mas só se tomados em conjunto. (Cf p95-96).
34
O grifo é nosso.
101
..O Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca'': os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbíalJ
::Mônica Oliveira Santos- 2004
da Análise do Discurso (AO). Por essa via, o autor propõe que analisar a estrutura
mostra que:
efeito e na descrição do analista esse efeito se apaga (este precisa estar atento
para não ser "pego" por esse simulacro). Assim como Pêcheux encarou o
como uma enunciação coletiva por sua estrutura e seu acontecimento (memória e
102
.. O Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca•': os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Oliveira Santos- 2004
I
individual e coletivo é interessante para nós. Nosso interesse nessa discussão a
dominantes.
mais típica desse par conceitual, lembremos da "metáfora da janela" que tão
através do vidro; se esse vidro for colorido, desenhado, opaco, desviará os nossos
35
A Lógica e a Filosofia da linguagem (Quine, Camap, Leibniz etc) também mobilizam esse par
conceitual, caracterizando contextos flngüísticos. como extensionais ou transparentes. e não
extensionais ou opacos. Há ainda uma Ltilização pragmática do par conceitual que difere os atos
de fala diretos (transparentes) e indiretos (opacos). Mas preferimos prescindir desta conceituação,
em favor daquela que se votta ao signo e à poeticidade. As primeiras reflexões em favor da
verdade, da informação voltam-se à transparência, colocando a opacidade como um desvio da
verdade, uma incompletude, uma obscuridade. Por isso, preferimos o posicionamento semiótico e
literário que (guardadas as devidas proporções teóricas) garantem à opacidade a cor, o brilho, a
beleza, e a possibilidade dos sentidos múltiplos.
103
II ..OProvérbio é um comprim.ldo que anda de boca em boca'"; os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbiaJ 1
Mônica Oliveira Santos- 2004 I
funcionamento do discurso.
Contexto e Mensagem, que para nós podem ser relacionadas ao par conceitual
arte verbal, o caráter palpável das palavras e seus signos em que o símbolo se
literária. Na linguagem não-literária tal efeito pode não ser exatamente poético,
104
!J ..0 Provérbio é um comprimido que anda àe boca em boca''; os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
li Mônica Oliveira Santos- 2004
I
formais com uma poeticidade 36 , como porque ele instaura regularidades entre o
metro e o sentido -o som deve ser um Eco do sentido (cf. Jakobson, op.cit.: 153).
"A forma proverbial sustentaria relações estreitas com a função poética jakobsoniana porque tem
a necessidade de estabilizar e de memorizar o enunciado (estruturas breves, simetrias fonéticas e
prosódicas), e mantém um tipo de estrutura binária de aproximação.
!05
11• 0Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca·•: os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial I
4
ele analisado, "On a gagné", que ganha espessura semântica e que ele chama de
106
!I"OProvérbio é um compriJTIJdo que anda de boca em boca·•: os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação prover"bial I
!I Mônica OliveiraSantos-2004 I
histórico-ideológica.
dado que para a Análise do Discurso isto seja uma obviedade de todos os
ordinária":
37
Pêcheux (op.cit.:51) destaca a posição de Milner em "A Roman Jakobson ou le Bonheur par la
Simetrie" (in ordre et Raisons de Langue, Seul, Paris, 1982, p. 336): ''-nada da poesia é estranho
à língua.- nenhuma língua pode ser pensada completamente, se ai não se integra a possibilidade
de sua poesia".
!07
··o Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca"; os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial'
M6nica Oliveira Santos- 2004
obviamente, do
individuo falante que pronunciou ou escreveu um texto, mas [d)o autor como
princípio de agrupamento do discurso, como unidade e origem de suas
significações, como foco de sua coerência. Esse princípio não voga em toda
!08
..O Provérbio é um comprimido que anda de boca. em boca'': os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbiaJ
Mônica Oliveira Santos- 2004
parte, nem de modo constante: existem, ao nosso redor, muitos discursos que
circulam, sem receber seu sentido ou sua eficácia de um autor ao qual seriam
atribuídos. {Foucault, op.cít:26).
signatário. O indivíduo que se opõe à uma escrita repetida de uma possível obra,
1996:69). A autoria seria uma função enunciativa do sujeito que se realiza quando
não por ser o mesmo, mas por ser passível de Interpretação. Portanto, os sentidos
não pertencem às palavras, nem dependem só das "intenções" dos sujeitos, mas
109
..O Provérbio é um comprimi à o que. anda de boca em boca·': os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
M6nica Oliveira Santos- 2004
Orlandi afirma que o sujeito está para o discurso (real), assim como o autor
pela autoria, como uma função assumida pelo indivíduo no momento em que este
"qualquer um" que individualiza e coletiviza (torna parte de uma coletividade), pois
Não há discurso sem sujeito nem sujeito sem ideologia 3s. O sujeito é sujeito
38
Para aproli.Jndar essa reflexão, consideremos as afirmações de Althusser (1970/1999) ao dizer
que:"Todo individuo humano, isto é, social, só pode ser agente de uma prãtica se se revestir da
'forma de sujeito'. A 'forma-sujeito', de fato, é a forma de existência histórica de qualquer indivíduo,
agente das prãticas sociais: pois as relações sociais de produção e de reprodução compreendem
necessariamente, como parte 'integrante', aquilo que Lênin chama de 'relações sociais fiurldico-]
ideológicas', as quais, para li.Jncionar, impõem a todo indivíduo-agente a forma de 'sujeito'. Os
110
•-o Provérbio é um comprimldo que anda de boca em boca·': os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbíal
Mônica Oliveira Santos- 2004
I
língua na história, a ideologia é um ritual com falhas, ou seja, o dizer faz parte do
já dito, mas não se livra do lugar do deslize, do desvio, do equívoco onde aparece
outro num movimento que acaba por afrouxar limites entre o eu e o outro.
subjetiva porque ele se identifice com um sentido e não com outro (cf. Orlandi,
para repetir e interpretar o "já dito" diz respeito ao lnterdiscurso, em que "a
111
4
'0Provérblo é um comprimido que anda de boca em boca•': os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Oliveira Santos- 2004
entre estes dois espaços é de caráter oscilante e paradoxal: "os objetos têm e não
têm esta ou aquela propriedade, os acontecimentos têm e não têm lugar, segundo
112
II.'OProvérbio é um comprim.ido que anda de boca em boca•'; os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Oliveira Santos- 2004
recorte apresentado.
(2) ~21103101 -José Eduardo Dutra (PT- SE) > Referências ao pronunciamento
do Senador Jader Barbalho, a respeito da criação da CPI da Corrupção.
"Penso que podaremos, Sr Preskiente, agora, colocarem prática aquela proposta
que fiz logo após a sessão em que o Senador Antônio Carlos Magalhães
apresentou uma série de requerimentos de mvestigação. (. ..j Naqueía
oportunidade, eu disse que, para não ficar parecendo para a opinião pública que
se tratava apanas de um jogo de cena, nós nos disporíamos, juntamente com as
Lideranças de ltxlos os Partidos com assento nesta Casa, a formular um
requerimento consensual para a instalação de uma Comissão Parlamentar de
Inquérito que pudesse investigar todas as denúncias que estavam sendo feitas
não só de tribuna desta Casa, como pela imprensa. Infelizmente, naquele
momento, as Uderanças fizeram ouvidos de mercador. Os Líderes da
Oposição se reuniram e formularam um requerimento para a instalação da CP/. Já
estávamos- e estamos - cdetando assinaturas para que seja instalada uma CP/
mista na Câmara e no Senado. O Senador Jadar Barbalho apresenta uma
sugestão de aditamento a esse requerimento. Tenho certeza de que os Líderes da
Oposição no Senado nade terão a opor a esse aditamento."
113
..OProvérbJo é um comprimido que anda de boca em boca'': os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Môníca Oliveira Santos- 2004
I
trabalho é o de consideramos a enunciação proverbial como uma enunciação
passagem bíblica (Eo- Mateus 13, 30 e ss) que inspirou a forma "é tempo de se
CP I.
pelo discurso religioso não é tão simples fazer a separação dessas duas classes
ll4
•-o Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca'': os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial I
Mônica Oliveira Santos- 2004 I
"maus" com a investigação (CPI) das referidas ONGs, de modo que as benesses
significativa, pois se na bíblia o trigo cresce junto com o joio e só no tempo certo (o
juízo final) essas classes são separadas, também aqui há o "tempo" certo para
promover esta separação do bem o do mal, mas não é preciso esperar pelo juízo
à ALGA!), tem por princípio não dar muita atenção ao que escuta, sobretudo, dos
fregueses. O mercador para o bem de seu próprio negócio, para usar outra
115
..0 Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca": os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Oliveira Santos- 2004
expressão do mesmo quilate, "faz vista grossa" para determinadas situações. Mas,
apesar do referido enunciado poder ser usado para identificar o Locutor com a
classe dos "mercadores" que precisam "fazer vista grossa" para se saírem bem
denúncias e afirma estar disponível, juntamente com o seu partido (o PT) que à
época fazia oposição ao governo (o PSDB), para ser investigado. No entanto, ele
-citações:
(5) =>13102101 -Roberto Freire (PPS - PE) > Concordância com o teor do artigo
da jornalista Dora Kramer, na coluna "Coisas da Política", numa edição do Jornal
do Brasil. no qual critica a utilização de grampo telefônico nas dependências do
Congresso Nacional.
"O que a jornalista Dora Kramar está afirmando de forma magistral tentei dizer a
um jornalista da Folha de S. Paulo, que julgou muito impoltante ter patrocinado
uma gravação para descobtir imoralidades. Eu lhe djzia: "Você e o seu jornal
estão patrocinando um crime". E isso nada mais é do que a afirmação tosca e
primi!Jva, como djz Dora Kramer, de que os fins justificam os meios De acordo
com essa idéia, para se lutar contra a imoralidade, pouco importa que se pra!Jque
qualquer ilegalidade. (..) Bastaria o Ministério Púb!íco abrir um inquérito civil
contra o Sr. Jader Barbafho e o Sr. Antônio Gados Magalhães, porque se
116
11··o Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca'': os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
li Mônica Oliveira Santos- 2004
meios", (6) "o futuro, no jargão popular, a Deus pertence" e (7) "o saco do chefe é
fixas (ou "atestadas" como chamam Grésillon & Maingueneau, op.cit) e em dois
ditado")-
117
•·o Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca'': os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Oliveira Santos- 2004
não acontece sempre, pois, como os provérbios são um fértil reservatório de topói
na língua, e a língua possui topói distintos, uma vez que eles representam, muitas
Enunciador-coletivo seja usado não para representar a maioria que tem sempre
razão, mas para caracterizar uma classe com a qual o Locutor não se identifica.
118
"'O Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca·': os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial J
Mônica Oliveira Santos- 2004 I
pontos de vista opostos: o fim justifica os meios, o fim não justifica os meios.
dentro da própria citação "o fufuro, no jargão popular. a Deus pertence", em lugar
religiosa de que Deus está acima de todas as coisas e que não há verdade que
ele não conheça, de modo que, à Sua vontade, ela "um dia" vem à tona (ou não!).
que é a de "homem público" que não pode apenas se "conformar com a promessa
referência ao presidente da república que, entre outros, era alvo das denúncias de
119
fi ..O Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca•': os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial I
li Mônica Oliveira Santos- 2004 l
mobilizado na enunciação.
-paráfrases:
meio ambiente e não cumpre com suas obrigaçõesf', e (4) "Na verdade,
deveríamos nos unir para que pudéssemos ter êxito. A união faz a força, todos
enunciados proverbiais "Falar é fácil, fazer é difícil", "A união faz a força" e "Se
120
"O Proverbio é um comprimido que anda de boca em boca••; os sujeitos e os sentidos no espaço daenuncíação proverbial
Mônica Oliveira Santos- 2004
proverbial "Falar é fácil, fazer é diffcíf' enfatize a distância entre as ações de "falar"
com a "distância" entre as ações de "falar muito a favor do meio ambiente' e "não
país (locutor-x), por outro, afasta-se dessa posição através da crítica a esse
coletivo.
Em (4) ocorre uma paráfrase que alude, ao mesmo tempo, a duas formas
proverbiais ("A união faz a força" e "Se queres vencê-los, divide-os"), na mesma
121
!J "O Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca''; os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Oliveira Santos- 2004
I
direção argumentatiVa. Na paráfrase, o dizer coletiVo é atribufdo a um NÓS (em
enfraquecerão. Mais uma vez, vemos o Locutor diVidido entre o dizer indiVidual, o
essas figuras enunciativas, o que pode afrouxar o limite entre o dizer coletiVo e o
coletivo evidencia esse movimento em que não só o dizer coletivo passa por
apresentada pela AO) como uma evidência formal na língua do movimento dos
122
"O Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca:': os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciaç:ão proverbial I
Môníca Oliveira Santos- 2004 I
sentidos. Desse maneira, os sentidos das formas proverbiais, não são apenas
(8) =>02102/01 - Mozarildo Cavalcanti (PFL - RR) > Criticas à ação de algumas
ONGs, envolvidas em irregularidades na compra de terras indígenas no Estado de
Roraima. Cobrança da instalação da CPI das ONGs.
"Senador Ademir Andrade, defendo a instalação da CP/ das ONGs. Concordo com
V. E:i'. no sentido de q.re a maioria dessas crganizações não-governamentais
efetivamente tem bons propósitos. Trata-se daquela velha história: quando a
esm<>la é grande o santo desconfia. (...) O descaso do governo colombiano com
a sua Amazônia culminou com o domínio do narcolr{Jfíco na região e com o
surgimento da guerrilha (... j Na vardade, naquele país, há uma balbúrdia, inclusive
estimulada por países poderosos, os quais hoje estão comandando a Colômbia e
amanhã poderão estar dentro do Brasil,justamente pcrque estão plantando essa
semente da discórdia."(. ..) "O que se está querendo fazer aqui não é uma prévia
condenação de nenhuma organização não-go\'eTflamental. O que se quer é
justamente fazer a investigação, para, como disse o senador Jefferson Peras,
separar o joio do trigo. "
(9) ~1103101 - Jader Barbalho (PMDB- PA) > Dedaração de apoio à criação da
CPI da corrupção, nos termos das alterações propostas pelo Senado José
Eduardo Dutra.
"Estamos assistindo, particularmente em determinados segmentos da imprensa, a
uma espécie de Comissão Parlamentar de Inquérito em que apenas um lado tem o
direito de dizer tudo o que deseja. ( ..) Dessa forma, Sr. Presidente, creio que
teremos a oportunidade de p•sar a limpo todas essas questôes. Algumas figuras
acreditam que este País perdeu a memória. Permitam-me a dura expressão: 'à
velha prostituta pregando castidade neste Pais'~ Há necessidade, portanto, Sr
Presidente, que se passe, com essa Comissão Parlamentar de inquérito, da
denúncia para a apuração efetiva e para a responsaiifização, se for o caso."
123
11 "'O Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca"; os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial f
Mônica Oliveira Santos- 2004 I
capítulo anterior,
provérbio, de uso até mais comum, que é "quando a esmola é grande o cego
desconfia", talvez por se pensar que um cego mereça mais uma esmola do que
"a velha prostituta 39 pregando castidade" temos uma referência ao choque entre o
"separar o joio do trigo", temos uma referência ao texto bíblico, como já discutimos
39
É interessante notificar que na ocasião desse discurso parlamentar o senador ACM manifesta-se
solidário ãs Prostitutas, defendendo-as de um possível ato de preconceito de que acusa o colega
Jader Barbalho e a quem cobra uma retratação. Nesse momento, a Senadora Heloísa Helena
(conhecido desafeto de ACM) interfere coadunando-se à indignação, mas enfatizando que~
deveriam se retratar, pois ACM em outra ocasião criticava duramente a famüia do, então, preferto
Celso Prta, xingando-a de "prostíbulo", ou casa de prostitutas. nesse sentido, ofendendo da mesma
forma a classe que agora estava querendo defender!
124
..0 Provérbio é um comprimido que a..1da de boca em boca·•: os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Oliveira Santos- 2004
bíblico o "mal" "semeado" entre o "bem" para causar engano, devendo ser
profundamente opaca.
chega à referência, à informação. Além da típica fonna proverbial que conta com
125
II ..OProvérbio é um compriJT.ido que anda de boca em boca·•: os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
fi lVfônica Oliveira Santos- 2004
(12) =>09103/01 -Ademir Andrade (PSB- PA) >Apoio à instalação de CPI para
apurar as denúnàas de corrupção no Governo, bem como repúdio à privatização
das empresas geradoras de energia elétrica.
"Nós poderíamos usar os recursos que ganhamos com a Belronorle para investir
na Hidrelétrica de Belo Monte, que será a segunda maior hidrelélrica do planeta,
com o dobro da potência de Tucurui e vai alargar uma área cinco vezes menor,
porlanto, trazendo um prejuízo ao meio ambiente muito menos do que Tucuruí
trouxe, incomparavelmente menor do que Balbina e Samue/, que foram desaslres
ecológicos. No entanto, o Governo teima em vender a "galinha dos ovos de
ouro': (..) a iniciativa privada sabe que compra a preço de banana as coisas
que o Governo quer vender:"
nessa reflexão. Mas, como gostaríamos de enfatizar cada tópico com exemplos,
escolhemos os enunciados acima para destacar essa reflexão. Nos recortes (10,
11 e 12), temos "Como diz um ditado popular, aquilo que só tem no Brasil e em
matar a sua galinha dos ovos de ouro?~ "vender a galinha dos ovos de ouro",
126
lf ..OProvérbio é um comprimido que anda de boca em boca·•: os sujeitos e os sentidos no espaço à a enunciação proverbial
li Mônica Oliveira Santos- 2004
I
Em (10) há uma crítica às atitudes do presidente da república que é
proverbial: "Como diz um ditado popular, aquilo que só tem no Brasil e em nenhum
ser um provérbio atestado, mas foi elaborado como se fosse um a partir das
para uma avaliação crítica do povo brasileiro ao próprio país, no sentido de que
Brasil que não haja em outro lugar no mundo. No acontecimento discursivo, fica
a partir das suas condições de produção por um lado diz respeito à ressignificação
127
11 ..0 Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca": os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
li }J:ônica Oliveira Santos- 2004
I
("Não sou eu quem diz, é o povo, é a sabedoria popular!"). O sujeito se constrói
caso está sendo preservada (o meio ambiente) e no outro caso está sendo
preciosidade pública está sendo comprada pela iniciativa privada "a preço de
banana'' que seria uma coisa banal que não tem muito valor. Nesse
128
IJ -'O Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca": os sujeitos e os sentidos no espaço da enuncíação proverbial 1
Mônica OliveiraSantos-2004 I
129
•"' Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca'': os sujeitos e os sentidos no espa.ço da enunciação proverbíall
~iônica Oliveíra Santos- 2004
130
..O Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca'': os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial 1
Mônica Oliveira Santos 2004 I
CAPITULO IV
AltpiiiUIS Categorias
que prima pelo autoritarismo do sujeito e pela autorização do discurso. Por isso,
131
..0 Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca·~; os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Oliveira Santos- 2004
assunto, porque a Verdade nunca esteve pronta e acabada, ela vai estar sempre
em construção, em produção, e nada que se diga definitivo sobre esta, não o será,
relação aos seus cãnones históricos. Sobretudo, quando lança o olhar para as
os.
parlamentar, não poderíamos escapar a "o estar frente a frente" com a 'Verdade"!
132
11 ..0 Provérbio é um comprimído que anda de boca em boca·~: os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciaçã.o proverbial
Mônica Oliveira Santos 2004
se por ela.
133
tf"'OProvérbio é um comprimido que anda de boca em boca"; os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
li Mônica Oliveira Santos- 2004
de acordo com o que sintetiza o Dicionário de Filosofia, de José Ferra ter Mora:
"EI vocablo 'verdad' se usa en dos sentidos: para referir-se a una proposición y
para referir-se a una realidad. En el primer caso se dice de una proposición que
es verdadera a diferencia de «falsa». 81 el segundo caso se dice de una
realidad que es verdadera a diferencia de <<aparente», «ilusoria»,
<<irreal», <<inexistente», etc. ( ...) El problema que se plantea es cómo
alcanzar esa verdad. Unos dirán que es la inteligencia quién la capta; otros que
la intuición, y otros. por nn, que a través de las sensaciones." (Mora, 1995:747-
749).
concepções de verdade anteriores, ainda que se destaque uma mais nova que
seria a "concepção idealista", racionalista: Spinoza dizia que a ordem das idéias é
a mesma ordem das coisas; Hegel busca chegar a verdade absoluta, à ''verdade
filosófica"; Husserl relaciona a verdade com a noção de adequação e evidência;
do conceito, pois supõe que todo juízo de valor é verdadeiro40 Há que se destacar
40
Nesse ponto, acrescentaríamos o ponto de vista lingüístico contemporâneo do autor
Berrendonner, para quem a condição de Verdade e Falsidade não se verifica em relação ao estado
de coisa, mas se apóia na opinião pública (nas enunciações anteriores), por isso ele dá relevância
134
"O Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca·': os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial 1
Mônica Oliveira Santos- 2004 I
muito mais relacionados aos efeitos de sua produção e invenção (sobre este
Mícroffsíca do pcxier:
135
4<0 Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca•': os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Olíveíra Santos- 2004
I
Parece-me que o que se deve levar em consideração no intelectual não é,
portanto, "o portador de valores universais-; ele é alguém que ocupa uma posição
específica, mas cuja especificidade está ligada às runções gerais do dispositivo da
verdade em nossas sociedades. Em outras palavras, o intelectual tem uma tripla
especificidade: a especificidade de sua posição de classe( ...) ; a especificidade de
suas condições de vida e de trabalho, ligadas a sua condição de intelectual ( ...);
finalmente, a especificidade da verdade nas sociedades contemporâneas. to então
que sua posição pode adquirir uma significação geral, que seu combate local ou
específico acarreta efeitos, tem implicações que não são somente profissionais ou
setoriais. Ele funciona ou luta ao nível geral deste regime de verdade, que é tão
essencial para as estruturas e para o funcionamento de nossa sociedade. Há um
combate "pela verdade" ou, ao menos, "em tomo da verdade" - entendendo-se,
mais uma vez, que por verdade não quero dizer "o conjunto das coisas
verdadeiras a descobrir ou a fazer aceitar", mas o "conjunto das regras segundo as
quais se distingue o verdadeiro do falso e se atribui ao verdadeiro efeitos
especificos de poder"; entendendo-se também que não se trata de um combate
"em favor" da verdade, mas em torno do estatuto da verdade e do papel
econômico-polltico que ela desempenha. (Foucault, 1988:13).
Parece, no entanto, que podemos atribuir-lhe [à história das idéias] dois papéis.
Por um lado, ela conta a história dos elementos secundários e das margens. Não a
história das ciências, mas dos conhecimentos imperfeitos, mal rundamentados,
que jamais puderam atingir ao longo de uma vida obstinada, a forma da
cientificidade (história da alquimia e não da química, dos espirítos animais ou da
frenologia e não da fisiologia, história dos temas atomisticos e não da física).
Histólia das filosofias obscuras que perseguem as literaturas, a arte, as ciências, o
direito, a moral e até a vida cotidiana dos homens. História dos temativismos
seculares que jamais se cristalizaram em um sistema rigoroso e individual, mas
que formaram a fisiologia espontânea dos que não filosofavam. História, não da
literatura, mas do rumor lateral, da escrita cotidiana e tão rapidamente apagada
que nunca adquire o 'status' da obra ou que imediatamente o perde: análise das
subliteraturas, dos almanaques, das revistas e dos jornais, dos sucessos fugidios,
dos autores inconfessáveis. Assim, definida - mas vê-se de imediato o quanto é
difícil fixar-lhes limites precisos -, a história das idéias se dirige a todo esse
insidioso pensamento, a todo esse jogo de representações que correm
anonimamente entre os homens; no interstlcio dos grandes monumentos
discursivos, faz aparecer o solo fi"iável sobre o qual repousam. Trata-se da
disciplina das linguagens flutuantes, das obras informes, dos temas não ligados.
Análise das opiniões mais que do saber, dos erros mais que da verdade; não das
fonnas do pensamento, mas dos tipos de mentalidade. (Foucault, 196912002: 157).
136
..O Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca•': os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Oliveira Santos- 2004
I
Conforme Foucault, a história das idéias descreve incessantemente a
não-literatura à própria obra42 Por isso mesmo, essa descrição toma por norma a
de A arqueologia do Saber.
42
Conferir: M. Foucault, 196912002:158.
43
Conferir: M. Foucault. 1969/2002: 211.
137
11 ..0 Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca'": os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
li Mônica Oliveira Santos- 2004
e saber: o analista ao invés de procurar definir entre elas uma relação de exclusão
138
··o Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca'': os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Oliveira Santos- 2004
I
Para M. Foucault, a Verdade não É, ou Está (n)isso ou (n)aquilo desde
sempre e para sempre, mas foi e continuará sendo produzida e efetivada a partir
"Em sua relação com o objeto, o sujeito de conhecimento tem uma história, ou
mais claramente, a própria verdade tem uma história". (cf. Foucault, 1974:8).
qualificando-o como o melhor, o mais eficaz e o mais atual autor a fazer a análise
44
Conferir: M. Foucault, 1974:27.
45
Conferir: M. Foucautt, 1974:10.
139
11 uo Provérblo é um comprimido que anda de boca em boca''; os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
li Mônica Oliveira Santos- 2004
I
histórica da formação do sujeito, a análise histórica do nascimento de um certo
tipo de saber. Afirma que uma análisa dessa tipo aprofunda o olhar sobre a
'política da verdade'.
muitas vezes usada pela palavra "invenção" como, por exemplo, nas proposições
do tipo: "a origem da religião", "a origem da poesia". Para Nietzsche, ambas são
conhecimento foi, portanto, inventado. Dizer que ele foi inventado é dizer que ele
não tem o!igem. (.. .) não está em absoluto insc!ito na natureza humana':
Uma dupla ruptura muito importante com a tradição da filosofia ocidenta e cuja
lição devemos conservar. A primeira é a ruptura entre o conhecimento e as coisas.
O que, efetivamente, na filosofia ocidental assegurava que as coisas a conhecer e
o próprio conhecimento estavam em relação de continuidade? ( ...) Deus (...) É
esse principio que assegura haver uma harmonia entre o conhecimento e as
coisas a conhecer (. ..) diria que, se é verdade que entre o conhecimento e os
instintos ( .. .) há somente ruptura, relações de dominação e subserviência, relações
de poder, desaparece então, não mais Deus, mas o sujeito em sua unidade e
soberania. (Foucautt, 1974:18-19)
46
Conferir: M. Foucault, 1974: 14 e ss.
140
•·oProvérblo é um comprimido que anda de boca em boca·•·. os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial J
Mônica Oliveira Santos- 2004 I
mais longe), vê-se que a unidade do sujeito humano sempre esteve assegurada
pela continuidade que vai "do desejo ao conhecer, do instinto ao saber, do corpo à
não existe. Eis em que o texto de Nietzsche que cíteí 41, consagrado à invenção do
Nietzsche quer dizer que não há uma natureza do conhecimento, uma essência do
conhecimento, mas que o conhecimento é, cada vez, o resultado histórico e
pontual de condições que não são da ordem do conhecimento. O conhecimento é
um efeito ou um acontecimento que pode ser colocado sob o signo do conhecer. O
conhecimento não é uma faculdade, nem uma estrutura universal. Mesmo quando
utiliza um certo número de elementos que podem passar por universais, esse
conhecimento será apenas da ordem do resultado do acontecimento, do efeito".
(Foucault, 1974:24).
47
Foucault refere-se a um texto de Nietzsche datado de 1873 e só publicado postumamente. Diz o
texto: 'Em algum pooto perdido deste universo, cujo clarão se estende a inúmeros sistemas
sdares, houve, uma vez, um astro sobre o qual animais in!RJ/igentes inventaram o conhecimento.
Foi o instante da maior mentira e da suprema arrogância da história universal."
141
..0 Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca•': os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial I
Mônica Oliveira Santos- 2004
historiador almejava excluir da história, mas para Foucault, tal dispersão permite
do sujeito: a segurança de que tudo que se lhe perdeu será devolvido. "Fazer da
lugares, nas diversas posições que pode ocupar ou receber quando exerce um
Para Foucault:
142
"O Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca''; os sujeitos e os sentidos uo espaço da enunciação proverbial
Mônica Oliveira Santos- 2004
em toda parte e em lugar nenhum), como pode ser sintetizado na tabela abaixo:
48
Conferir: M. Foucault, 1969/2002: 195.
143
..0 Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca.,: os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Olivdra Santos- 2004
Confonne Pêcheux, 'o empirismo lógico encontra todo o seu vigor critico e
repete sem cansaço que, contrariamente "ao mundo físico'; estável e coerente, o
"mundo mental" não permite assegurar uma referência, exceto pela força das
conformismo, etc~ (op.cit:129). Um duplo erro, segundo o autor, uma vez que de
um lado considera as ideologias como idéias e de outro que as idéias têm origem
Pêcheux afinna que a solução idealista consiste em: "Partir do sujeito individual
etc) e como fonte da metáfora constitufda pela personificação desse conjunto, que
funciona "como um único homem': (op.cil: 130). A partir do quadro acima, vemos
144
..O Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca": os sujeítos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial J
Mônica Oliveira Santos- 2004 .I
sua análise. Mas, há que se distinguir tal noção entre um e outro: enquanto para
Foucault o discurso diria respeito a uma prática amplamente abrangente que pode
estrutura lingüística. Isso aparece bastante concreto nesse quadro, quando ele
145
..OProvérblo é um comprimido que anda de boca em boca••: os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
h-iônica Oliveira Santos- 2004
1.3 "A voz do povo é a voz de deus" - "A palavra de Deus é a verdade, sua lei
considerado como obstáculo, desvio ou aquilo que se deve evitar. Vamos observar
Seja nos tftulos de filmes, e matérias de jornais, e revistas, ou nas epígrafes das
teses científicas, ele está lá. Mesmo na margem, o provérbio está intrincado com a
146
"'O Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca'•: os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbíal
1-íônica Oliveira Santos- :2004
("Freud explica!").
Sabe-se que o provérbio tem o seu quê de 'filosofia popular', porque ele é a
nem o ELES, mas o TODOS. Não estaria apenas no plano do 'indivíduo', nem de
portanto, sua "verdade" não é universal. É por isso que o enunciador do provérbio
147
..O Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca·': o.s sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial 1
Mônica Oliveira Santos- 2004 I
do povo, aquela voz que representaria o povo como uma pretensa totalidade. O
comum). Pois, por um efeito político/formal, assim como ele simula representar a
povo"). A voz do povo não tem autoridade científica, mas tem autoridade política
na medida em que elege. É por isso que no discurso parlamentar há que existir a
discurso político.
da figura do Porta-Voz. Este se faz intérprete do Povo que é "sacralizado pela luta
e pela resistência ( ... ) que permanece idêntico e fiel a si mesmo ao longo dos
anos, sempre traído e sempre renascendo de suas cinzas" cada vez que recupera
49
Estas afirmações referem-se a um filme em que se (re)produz essa representação política.
148
"'O Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca'': os sujeítos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Oliveira Santos- 2004
1997: 60). Porém, para isso, há que se apagar os indícios de divisão intema e
unificar as vozes dissonantes, desse povo que delega poder, numa só voz: "uma
voz única como metonímia (... ) [e] metáfora de um sujeito coletivo que digere os
comunhão dos diversos sujeitos enunciadores numa palavra "comum", que não
reconhece outra origem fora a voz coletiva que a reproduz em ato de enunciação".
estatuto da verdade.
149
~·oProvérbJo é um comprimido que anda de boca em boca·~: os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Môníca Oliveira Santos- 2004
feita por Deleuze, do clássico "Édipo Rei: de Sófocles, enfatizando a busca pela
uma lei, que seria a lei dos fragmentos. A verdade está fragmentada na voz dos
deuses, dos adivinhos e dos servos (o povo). É pelo encaixe destes fragmentos
pelos deuses, nem pelos reis, mas pelos servos e escravos -o escravo de Políbio
deslocar a verdade do brilho profético e divino para o olhar empírico e diário dos
nível dos reis (polftico), do Édipo e nesse ponto o autor pergunta: "Qual é seu nível
150
~'O Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca'': os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Oliveira Santos- 2004
Sófocles não seja 'Édipo, o incestuoso', nem 'Édipo, o assassino de seu pai: mas
toda a tragédia, nunca apelará para a sua inocência. Seu problema é somente
manter o seu poder. É o poder que está em jogo do início ao fim da tragédia.
Entretanto, o personagem do rei de Tebas não é notável apenas por seu poder
como também por um certo saber. Édipo é aquele que encontra por seu saber a
solução para o enigma da esfinge e, se quiser selvar Tebas novamente, terá que
encontrar outra vez a verdade. Não podia haver poder político sem a posse de um
saber especial. É por buscar incessantemente esta verdade que o rei caí na
tirânico e solitário, desviado tanto do oráculo dos deuses que ele não quer ouvir,
quanto do que díz e quer o povo, que, em sua sede de poder e saber, em sua
50
Conferir: Foucautt, 1974: 48 e ss
!51
..0 Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca'': os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Oliveira Santos- 2004
O ocidente vai ser dominado pelo grande mito de que a verdade nunca pertence
ao poder polftico, de que o poder político é cego, de que o verdadeiro saber é o
que se possui quando se está em contato com os deuses ou nos recordamos das
coisas, quando olhamos o grande sol eterno ou abrimos os olhos para o que se
passou( ...) onde se encontra saber e ciência em sua verdade pura, não pode mais
haver saber pomico. Esse grande mito precisa ser liquidado. Foi esse mito que
Nietzsche começou a demolir ao mostrar, em numerosos textos já citados, que por
trás de todo saber, de todo conhecimento, o que está em jogo é uma luta de
poder. O poder polftico não está ausente do saber, ele é tramado com o saber.
(Foucault, 1974: 50-51).
''Este direito de opor uma verdade sem poder a um poder sem verdade deu lugar a
judiciária através da história e mostra como ele chegou até a nossa cultura
51
Conferir: Foucault, 1974: 54.
52
Não intentamos, porém, retomar como o inquérito chegou, mas o fato de que chegou até nós.
53
Conferir: Foucault, 1974: 77.
!52
•'O Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca''; os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Môníca Oliveira Santos- 2004
uma transformação política, uma nova estrutura política que tomou não só
possível. mas necessária a utilização desse procedimento no domínio judiciário."
(Foucault, 1974: 72-73)
De maneira mais geral, este inquérito judiciário se fundiu em muitos outros
domínios de práticas -sociais, econômicas - e em muitos domínios do saber ( ...)
Foi desta forma que todo um saber econômico, de administração econômica dos
estados, se acumulou no fim da Idade Média e nos séculos XVII e XVIII. Foi a
partir daí que nasceu uma forma regular de administração dos estados, de
transmissão e de continuidade do poder político e nasceram ciências como a
Economia. Política. a Estatística, etc." (Foucault. 1974: 74-75).
administrada, entre outras práticas, por uma prática de inquérito que nos parece
cenário político, com vistas a trazer à luz a verdade, cumprindo com o papel de
julgamento dos culpados e a punição dos erros. Essa prática está prevista nos
153
..0 Provérbio é um comprimido qu.e anda de boca em boca": os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial I
Mônica Oliveira Santos- 2004 I
Fernando Collor, tal prática parece ter se tornado mais freqüente como forma de
uma cobrança mais direta do povo em relação aos seus representantes, e como
Senador José Eduardo Dutra do PT- SE, no dia 15/03/01, (2) proferimento
{1) "Temos insistido por várias vezes que o governo é transitório, a instituição é
permanente. O que está em discussão são as prerrogativas do Congresso
Nacional e a sua obrigação constttucional de fazer essa investigação ( ...) Vimos
durante a semana manifestações por parte de lideranças importantes da base
governista estabelecendo condições ou propostas para assinarem um
requerimento de CPI; assistimos às manifestações do Senador Antônio Carlos
Magalhães de que se fosse uma CPI ampla, para investigar todas as denúncias,
ele assinaria; manifestações do Presidente do congresso Nacional, Senador Jader
Barbalho, de que se fosse uma CPI composta de uma cesta bàsica de
irregularidades no setor financeiro. ele assinaria. O requerimento de CP! que
estamos apresentando contempla todas essas reivindicações dos Srs. Senadores
( ...) Na semana passada, tomamos conhecimento de uma nota assinada pelos
Líderes dos Partidos governistas com assanto nesta Casa. A nota diz que os
líderes são a favor de investigações "pelos instrumentos legais e democráticos"-
como se uma Comissão Parlamentar de lnquérno não fosse um instrumento legal
e democrático. Alguns dizem que o Brasil não é mais o mesmo, porque estamos
vendo um juiz na cadeia, estamos vendo empresários na cadeia e estamos vendo
um ex-senador na cadeia (...) Qual instrumento viabilizou que essas pessoas hoje
estivessem na cadeia? ( ...) A partir de quando as investigações realmente
tomaram pé e a partir de quando constituiram-se elementos para comprovar a
culpabilidade das pessoas que estão presas? A partir da instalação da Comissão
Parlamentar de Inquérito que investigou irregularidades no Poder Judiciário {...)
Significa que a CPI é o instrumento mais eficaz para fazer essa investigação(...) A
história tem demonstrado que, quando se instala uma Comissão Parlamentar de
Inquérito, os seus trabalhos, os seus documentos contribuem para agilizar os
inquéritos no Ministério Público e para agilizar os processos no Poder Judiciário
( ...) O Presidente da República pode dizer à imprensa que instalar CPI é
154
..0 Provérbio é um comprimido que a,nda de boca em boca": os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial I
M6nica Oliveira Santos- 2004 .I
deslealdade, que CPI desestabiliza (. ..)Entendemos que o congresso Nacional, ao
instalar essa Comissão Parlamentar de Inquérito, estará agindo em legftima
defesa da instituição ( ...) para garantir as prerrogativas inscritas na Constituição
( .. .) O requerimento está feito, está pronto e estamos coletando assinaturas.
Queremos ver agora aqueles que disseram que só assinariam se a investigação
fosse ampla, geral e irrestrita. Queremos ver agora se vão assinar ou não ( ...)
Vamos ver se realmente vão assinar ou se foi apenas bravata, falácia ou
demonstração de cinismo por parte daqueles que acusam os outros, mas que não
querem realmente que sejam investigadas suas acusações. porque têm medo de
que as acusações que eles fazem acabem voltando para eles próprios.·
(2) "Quero entender agora, Senador José Eduardo Dutra, a sinceridade dos que
aqui fazem denúncias. Essa é a hora da verdade. Deixamos de lado a CPI antiga,
que havíamos proposto no ano passado, estamos propondo uma nova CPI,
extremamente ampla, englobando todas as denúncias que estão sendo feitas,
rnclusive pela base do Govemo. Não se pode negar a existência de fatos
determinados, exigidos pela Constituição Federal para a criação de uma Comissão
Parlamentar de Inquérito. Agora auero ver a sinceridade daweles oue aguj
~ denúncias, tanto de um lado quanto do outro, tanto do lado do PMDB
quanto do PFL (...) O requerimento da criação da CPI está aí. Hoje, houve uma fila
de Deputados para assinarem esse requerimento. Não sei quantas assinaturas já
foram colhidas. Vou saber agora. A gpjruãg pf•bliça yaj tmfendor a sincgridada
daauele S aue. efetivamente. denunciam com CQ@gem de 8DUrar OU ao e nas
denunciam para diVidir espacos no âmbifo do eoder mas não querem apurar
nada ( ...) Os poderes deste país não têm chegado a lugar algum, como também
não têm colocado ninguém na cadeia. Os ladrões estão ai (...) O poder judiciário
não fUnciona no Brasil, até pelas leis que são aprovadas - também nos culpam
por essas leis que favorecem os crimes do colarinho branco, que permitem que
esses ladrões fiquem fora das cadeias -, pelas díficuldades de legislação. Cada
juiz interpreta a lei como acredita que deve ( ...) Portanto, as CPis e, acima
delas (..) a imprensa nacional que colocaram determinadas pessoas na cadeia . g
o poder da imprensa e o poder da opinião pl)bliça - que também assimila
aquilo que a imprensa divulga - aue fazem com aue cheauemos aos fatos e,
conseqüentemente, que haja uma ação do Governo, uma atuação dos poderes
constituídos, no sentido de mandarem alguns ladrões para a cadeia ( ... ) Porlanto,
os Senadores, os Deputados Federais têm o dever, têm a obrigação, se forem
honestos, se forem corretos, se forem direitos, se quiserem realmente que
os fatos sejam apurados, se não tiverem nada a esconder, de assinar esse
requerimento pedindo a criação da CPI, de fazer com que ela se instale e funcione
( ...) Eseero aue sejamos vitoriosos nessa luta eorque é isso que interessa à
sociedade brasiléira."
155
..0 Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca''; os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Oliveira Santos- 2004
I
políticos em relação a outros 54 . O tema da CPI foi exaustivamente abordado em
2001 por ser um ano pré-eletivo em que a maioria dos políticos era pré-candidata
CPis estaria condicionada à votação. Nesse caso, (por uma pressão do povo e de
Vejamos outro trecho que ilustra isso: (3) discurso pronunciado pelo Senador José
(3) "A sabedoria popular - este "saber de experiências feito" na lírica definição
camoniana - representa um suporte permanente e precioso na ação partamentar.
Conhecer o que a gente do povo pensa, o que a gente do povo sente e diz é
importante. É imprescindível para o político verdadeiramente compenetrado de sua
missão. ( ...) Procuro manter-me atualizado com relação aos sentimentos e
aspirações populares autênticos e genuínos. Sei não estar trazendo novidade
nenhuma à consideração de meus pares, quando faço este registro. ( ...) Se dou
ênfase ao óbvio é para proclamar que a intuição popular é poderosa e não
falha. E que não podemos nunca, na atividade pública, nos esquecer disso.
ignorar a intuição popular é erro. Erro punido pela história, como tantas vezes já
se viu. ( ...) De espanto em espanto, provocado pelo noticiário desconcertante do
dia-a-dia, a opinião pública brasileira está possuída hoje de muita perplexidade.
( ...) Isso chega até o cidadão do povo, a dona de casa, o lavrador, o operário, com
um impacto estrondoso. Desencadeia, no espírito de cada um, estranheza,
indignação, dúvida, fhlstração. ( ... ) O dilema se instala. É verdade o que está
sendo divulgado? É mentira? (...) O nosso chefe de famHia é um homem de bem.
Cultiva o senso de justiça. Vwe, por esse motivo, a sensação de mal-estar ao
supor que possa ser falsa ou improcedente a acusação erwolvendo o polftico que
54
Um outro dado interessante dessa prática da CPI é que além dos processos mais habituais de
investigação, aa-escentava-se uma nova tecnologia na busca da verdade: o detector de mentiras!
A verdade que está insa-ita nos corpo humano, mas que só a máquina pode ver e mostrar. A
máquina possuidora da verdade que os homens não têm. Apesar de não se constituir num
elemento de prova autorizado pelo sistema jurídico, este tem sido bastante usado e seus
resultados também são levados a público por meio da imprensa: jornais, revistas, Televisão e
Internet.
!56
•·o Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca·': os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Oliveira Santos- 2004
aplaude e admira, polltico em quem sempre votou. E aí ele indaga: por que não
levar as apurações do fato, de todos os fatos denunciados, até as conseqüências
derradeiras, até o esclarecimento definitivo e cabal de tudo? A simplicidade do
raciocínio traz a assinatura de genuína sabedoria popular. A perplexidade das
pessoas comuns { .. .) só tende a crescer e transformar-se numa reação mais
contundente, caso sejam interceptadas as iniciativas de apuração e elucidação
dos fatos. {...) O que se pede e se recomenda, com serenidade e bom senso, é
que não se deixe tudo permanecer como está, para ver como é que fica.( ...)
Se a explicação é incompleta e insatisfatória; se a conclusão pelos processos
normais de apuração não vem - todos os dilemas, dúvidas, desconfianças
possíveis continuarão povoando e enodoando a vida pública. {. . .) Desejo aqui
anunciar firme e inabalável disposição de dar voto favorável (...) a todo e qualquer
pedido de abertura de inquérito parlamentar, que concorra para desfazer o dima
de apreensão que tomou conta, em nossos dias, da população brasileira."
representar a opinião pública, "A voz do povo que é a voz de Deus". Face à
c) "não se deixe tudo permanecer como está, para ver como é que fica" (texto
3).
157
..O Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca·•: os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Oliveira Santos- 2004
d) "Cada juiz interpreta a lei como acredita que deve" (texto 2);
f) "têm medo de que as acusações que eles fazem acabem voltando para
"verdade" popular (senso comum), firmando assim, a sua relação com o saber
parafraseados (E1), mas que podem ser reconhecidos: para (e) "a justiça de Deus
não falha" e para (f) "o feitiço vira contra o feiticeírd'; em (g) temos uma
polítíctt, "anda direito, se queres respeítd', "direito tem quem direito anda", "contra
fatos não há argumentos", "quem não deve não teme". O saber político consiste
poder. Estas formas misturam o diZer do povo com o diZer do seu representante
158
"O Provérbio é um comprirr.ido que anda de boca em boca'': os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Oliveira Santos- 2004
ou simula produzir, uma linearidade da língua, através (por exemplo) das formas
discurso.
Parece que a gramática reservou para esse "lixo" debaixo do tapete, para
agrematicalidades, daquilo que não dá para recobrir e que, por isso, deve estar de
conta dos limites e lacunas que quebrem a contínua linearidade de sua ordem
"quase" perfeita, e é aí que temos que revirar o "lixo" em busca do que falta. Em
159
..O Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca•': os sujeitos e os sentidos no espaço daemmciação proverbial'
Mônica Oliveira Santos- 2004
ordem do discurso. Como exemplo para enfatizar essa relação, Pêcheux chama a
SE. .. ENTÃO ... : SE comemos maçãs, ENTÃO mantemos o médico longe, ou seja,
ocidental, pelo menos). Mas, tal implicação não tem um cunho verdadeiramente
lógico, necessário, e sim está embasada pelo viés ideológico-cultural que, como é
determinado e imposto, parece ser lógico. Vejamos, abaixo, mais dois recortes
160
••o Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca~': os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
1.1ônica Oliveira Sa..TJtos- 2004
I
(4) 23/02/01 -Roberto Requião- (PMDB- PR) > Solidariedade ao Senador ACM
na defesa da apuração dos fatos envolvendo o ex-Secretário-Geral da Presidência
da República, Eduardo Jorge, conforme matéria publicada na revista Isto É.
"Os clnicos, com o pretexto de defender a instituição, na verdade, estão propondo
a consagração absoluta do cinismo, ou seja, a moral, a conduta séria é apenas
para o povo, é apenas para a plebe, é apenas para os humildes, enquanto os
poderosos do momento, os príncipes do regime, da sociedade e da economia
estão, segundo eles ou para eles, acima do bem e do mal. (. . .) E nós só
poderemos vatar a acreditar nas instituições brasileiras se a verdade for
restabelecida. "Conhecerás a verdade e a verdade vos libertará" - é uma
máxima bíblica, não é minha."(. ..) O Senador Antônio Carlos Magalhães, cheio de
defeitos, contabilize também qualidades. E um senador emotivo e franco -
"Conhecerás a verdade e a verdade vos /iberterá". (.) terã prestado mais um
serviço ao país, por que levanta um caso que já foi sepultado pela maioria
governista no Congresso, que é o caso do Sr. Eduardo Jorge. (. . .) Quebrem o
sigilo do Sr. Eduardo Jorge em 1994 e 1998 e chegarão à verdade. E segundo
o Senador Antônio Carlos Magalhães, a verdada envolve o próprio Presidente da
República. ( ..) Acho que o Presidante está numa sinuca, mas os áulicos, seguindo
aquele velho ditado de que "o saco do chefe é o cOITÍmão do sucesso" 55 ,
tentam sacralizar o Presidente da República e o PFL solta uma nota oficial dizendo
que "o Presidente da Repútiica está acima de qualquer suspeita': Já o Antônio
Carlos Magalhães poda ser satanizado. (...} No mais, que conheça o País a
verdade. A discussão filosófica agora é menos importante. O importante é que as
denúncias foram colocadas e devem ser apuradas.·
(5) 22102101 - Heloísa Helena (PT- AL) > Leitura do Sermão do Bom Ladrão, de
autoria do Padre Antônio Vieira, em comparação à atual realidade política
brasileira.
"Para colaborar com o debate, farei breve leitura de um texto muito antigo ( ..) da
uma atualidade impressionante! (]lama-se Sermão do bom Ladrão. Talvez o
trecho nos possibilite identificar se Fernando Hemique Cardoso é igualmente
corrupto, ou os dois Senadores estariam agjndo de má-fé, ou mentindo por
desconhecimento dos fatos, ou por chantagem, ou qualquer outra palavra
desqualificada que se pudesse utilizar. ( .. .) O objetivo do Sermão, de fato era tratar
da responsabilidade dos reis, que são cúmplices de ladrões (.. ) Be dizia que nem
os reis podem ir ao paraÍSo sem levar consigo os ladrões, nem os ladrões
podem ir ao inferno sem levar consigo os reis. (..) Padre Vieira (...) diferencia
o ladrão rico do pobre. E dizia ainda que a realidade que ele identificava em 1655
que também identificamos hoje, é que não eram reis levando ladrões ao paraíso,
mas ladrões levando reis ao infamo. E ele partia de um fundamento: "Sem
restituição do alheio, não pode haver salvação': Recitava Santo Agostinho, que
dizia: "não se perdoa o pecado sem se restituir o roubado" (. ..) E, analisando o
caso do bom ladrão, repetia Provériios, quando diz: "Não é grande a culpa de
quem furl:a, se furta para matar a fome". E é exatamente por isso que ele diz
que cristo perdoou o bom ladrão. (. ..} Be começa a diferenciar o tratamento
dispensado por Cristo ao ladrão pobre, que fci Dimas, e ao ladrão rico, Zaqueu.
(..) Dímas foi tratado de forma diferente em função da pessoa que era: um ladrão
pobre, miserãvel, e crucificado. Para Zaqueu, não foi dada de pronto a salvação,
pois era um ladrão tderado. Sua riqueza era a imunidade necessária para roubar
sem castigo, sem força e sem culpa. Alguns como Zaqueu, pensam que dando
alguma esmoia conquistarão o Reino do céus. Vieira afirma que isso não é
55
Enunciado analisado no capitulo anterior.
161
..O Provérbio 6 um comprimido que anda de boca em boca·~: os sujeítos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Oliveira Santos:- 2004
proverbialízação:
verdade'
+em (5) destacamos d), e), t), g), h), j) provérbios, c), k), I) proverbializações e i)
provérbio parafraseado:
162
..O Provérbio é um comprirr.ido que anda de boca em boca·': os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
M6nica Oliveira Santos- 2004
I
c) "Nem os reis podem ir ao paraíso sem levar consigo os ladrões, nem os
j) "O ladrão que furta para comer não vai nem leva ao inferno"
163
"O Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca'': os sujeítos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial 1
Mônica Oliveira Sa.1tos- 2004 I
bom /adrãd' do Padre Antônio Vieira 56 , que à sua época já fazia menção à
"autoridade" literária, retórica e religiosa. A Senadora, por sua vez, relaciona essa
provocar algumas lacunas quando se faz uma análise mais crítica desses
dispositivo que nos deparamos com a relação mal explicada, "ma~dita" entre a
" Representante literário e expoente do Barroco brasileiro, conhecido pelos seus famosos sermões
que à época intrincavam a autoridade literária, retórica e religiosa.
57
A própria prática dos sermões religiosos perpetua essa relação de memória e atualidade.
164
"O Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca·~: os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Oliveira Santos- 2004
I
há relações muito mais importantes e constatáveis condizentes não com o fato de
sua existência ou não, de sua universalidade ou não, mas com os efeitos que ela
pode encadear. Aquilo que está estabelecido como verdade revela-se pautado na
165
"O Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca''; os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
1-1ônica Olíveira Santos- 2004
166
··o Provérbío é um comprimido que anda de boca em boca·•: os zujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
}/.tônica Oliveira Santos- 2004
I
"CONSIDERAç6ES FINAIS"
trabalho, não somos nós quem pretende "concluir", na justa acepção da palavra,
comumente citado (em sua forma fixa isolada) e destacado como exemplo nessas
reflexão a esse respeito, enquanto que para nós constitui especial interesse.
167
..üProvérbio é um comprimido que anda de boca em boca·•: os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Oliveira Santos- 2004
nós a fonna proverbial não se limita à sua estrutura fixa, mas, essencialmente, às
168
..0 Provérbío é um comprimido que anda de boca em boca'': os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Oliveira Santos- 2004
I
verdade (Foucault). Mesmo em sua "marginalidade", o Provérbio está intrincado
recurso retórico e ideológico de autorização e por isso muitas vezes passa por
uma verdade comumente aceita. Nesse sentido, enfatizamos que um dos efeitos
formalmente essa verdade do povo que deve ser veiculada pelo seu representante
público. O tema da CP! nos propiciou uma feliz relação entre a enunciação
somente lhe confere uma simulação de implicação lógica. Na verdade, ele está
provérbios são tão populares e produtivos que aparecem nos mais diferentes
169
uOProvérbio é um comprimido que anda de boca em boca·•: os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial I
Mônica Oliveira Santos- 2004 .f
música (brega, 10ck e MPB) e a poesia (literatura de cordel) para ilustrar essa
170
..0 Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca·': o;; sujeítos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial I
Mônica Oliveira Santos- 2004 I
REFERINCIAS BIBLIOGRÁFICAS
___ (1993). Temps Unguistíque et Théorie des Topoí. in.: Plantin, C. (org.).
___ (1995). La nature des topor. In. Anscombre, J-C (org.). Théorie des Topo'i.
Paris: Kimé.pp.49-84.
(1929).
___ (2000). Estética da Criação Verbal. São Paulo: Martins Fontes, (1979).
171
fJ ..OProvérbio é um comprimído que a.'"lda de boca em boca": os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
li Mônica Oliveira Santos- 2004
___ (1995). Topor et formes topíques. In. Anscombre, J-C (org.). Théorie des
mimeografado.
(1969).
172
••o Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca'': os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Oliveira Santos- 2004
____ . (1996). As verdades e as formas jurídicas. Rio de Janeiro: NAU I PUC Rio.
(1974).
GÁNDARA, L (1997). Las voces de/ fútbol. Análísis de/ discurso y cantos de
Cortez.
173
!f "O Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca": os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
iI Mônica Oliveira Santos- 2004
___ (1999) Les proverbe: des dénominations d'um type "três três spécial", IN:
(1983).
174
..O Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca'': os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Oliveira Santos- 2004
I
BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR
E udeba. ( 1997).
ANSCOMBRE, J-C. et.al. (1995). Théoríe des Topor. Paris: Éditions Kimé.
____ (2000). (Org.). Langages no. 139- La paro/e proverbíale. Paris: Larousse.
(1990).
(1966).
CHANAY, H. (1993). Sens Jexical et argumentatíon: des CNS aux topor. IN:
Kimé, pp.290-300.
175
II'.OProvérbio é um comprimido que anda de boca em boca·~: os sujeitos e os sentidos no esp:a.ç:o da enunciação proverbial
Mônica Oliveira Santos- 2004
I
COURTINE, J.J. (1981). (Org.). Langages no. 62. - Analyse du díscours po!ítique.
Paris: Larousse.
Universidad de la Plata.
176
..O?rovérbío é um comprimiõ.o que anda de boca em boca'': os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
}~íônica Oliveira Santos- 2004
IN: PLATIN, C. Líeux Commun- TopoL Stereotvpes. clichés. Paris: Éditions Kimé,
pp. 170-181.
MIKAHAILOVA, M. (1993). Le sujet €t /e nom dans un discurs fondé sur les topo/.
MIEDER, W. (1995). "The Only Good lndian a Dead !ndian" - Hístorical and
___ . (1995). 'The Apple Doesnt Fali Far from the Tree": a Historica! and
177
~·o Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca·•; os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbíaJ
Môníca Oliveíra Santos- 2004
Campinas: Pontes.
Editora da Unicamp.
(1966).
178
..O Provérbio é um comprimido que anda de boca em boca"; os sujeitos e os sentidos no espaço da enunciação proverbial
Mônica Oliveira Santos- 2004
ANEXOS
179
Maria do Carmo Alves- 30-01-2001
A SRA. MARIA DO CARMO AL VES(PFL -SE. especial os do nosso semi -árido, não têm merecido a
Pronuncia o seguinte dísrurso. Sem revisão da orado- mínima prioridade. Ao contrário, excetuando esporá-
ra.)- Sr. Presidente, Sr"s e Srs. Senadores, tenho re- dicas manifestações retóricas, este Governo tem de-
petido neste plenário, em diversos pronunciamentos, votado um pouco disfarçado alijamento ãs questões
e tenho otNido também dos meus ilustres Pares, que nordestinas. Primeiro, no decorrer deste Governo,
a superação dos problemas causados ciclicamente não houve uma só obra marcante para a região; se-
pelas secas não está adstrito a eventuais obstáculos gundo, o Plano Real tem sido um fator ostensivo de
climáticos, mas ã falta de uma firme decisão política. concentração de renda nas regiões industrializadas;
É plenamente sabido que as técnicas capazes de e finalmente, o Presidente fez questão de assinar o
possibilitar a plena convivência com as secas são am- testamento de morte da Sudene.
plamente conhecidas e foram implantadas com abso- Quanto aos efertos do Plano Real no agrava-
luto êxito em vários países áridos e semi-áridos do mento das desigualdades regionais já hoje as maio-
mundo. Graças a essas técnicas essas regiões secas res do mundo moderno em cruel detrimento do Nor-
foram transformadas em imensos pomares produto- deste, por serem multiformes os seus tentáculos, se-
res de alimentos, extirpando em definitivo a miséria ria mais apropriado falarmos sobre essa questão em
de seus povos. outro momento.
Na verdade, o que ocorreu no Bra si!, em especi- Para fins de exemplificar o desprezo que tem sido
al nos últimos cem anos, foi um total alijamento do conferido ao Nordeste nesses úttimos seis anos de Go-
Nordeste dos planos de desenvolvimento econômico, vemo, basta registrar que na Lei n° 9.532, de 1997, foi
em prol do a-escimento do Centro-Sul, por parte dos estabelecida a lenta e gradual morte da Sudene. Desa-
diversos presidentes e ditadores que estiverem à fortunadamente, o Presidente desprezou o fato de que
frente dos destinos nacionais. Claro que houve honro- a Sudene é um símbolo para nós nordestinos, criada
sas exceções, mas foram raríssimas. graças ã darividênciade Juscelino KubiTschek . Basta
citar que 57% do IPI recolhido na região e 27% do ICMS
Durante a primeira campanha eleitoral do atual
são provenientes de empresas que contaram, para a
Presidente, renasceu a esperança entre os nordesti-
sua implantação, com recursos daquela agência de de-
nos de que o nosso candidato seria uma dessas ex-
senvolvimento. Acreditoqueprevaleceu ante o atual
ceções históricas, que, no final do século, iria final-
Presidente a farsa tão divulgada por influentes formado-
mente priorizar o Nordeste, onde vicejam mais de
res de opinião do Sul-Sudeste, segundo a qual a região
50% da miséria absoluta nacional. O então Senador
nordestina é um poço sem fundo a consumirgrande
Femando Henrique Cardoso justificava essas espe-
parte dos subsidiosdo Pais, e, afinal, era preciso dar
ranças, seja pelo seu rico passado político, pelas te-
ses sociais magnificamente defendidas em seus li- um fim a essa sangria.
vros, pelo brilho do seu decantado saber de sociólogo Se Sua Excelência tivesse ouvido uma assessoria
mundialmente respeitado e sobretudo pelos seus mais bem formada e corretamente informada, saberia
compromissos a favor de uma sociedade igualitária. que no Brasil, caso único no mundo, não são as regiões
É verdade que, logo após a posse, levamos o mais pobres que recebem a maioria dos subsídios
susto que deixou a todos nós, nordestinos, estupefa- nacionais. Aqui, surpreendentemente, funciona uma
tos, quando Sua Excelência recomendou aos brasilei- lógica de Robin Hood ao inverso: os pobres financiam
ros que se esquecessem do que ele havia afirmado os mais ricos! Para ser exata, enquanto para o
em seu livros. Talvez por sermos originários de uma Sul-Sudeste são destinados 51% do total nacional dos
sociedade apegada a rígidas tradições, em que a p& subsídios, para a região mais pobre do Pais, o
lavra empenhada é pacto de honra a ser cumprido, Nordeste, são destinados tão-somente 9% deles. Ainda
não podlamos entender quem não assumia nem assim, o SenhorPresidentefoi convencido de que os
mesmos compromissos escritos. A partir daí, fomos poucos subsídios que para lá iam deveriam ser extintos.
descobrindo que nossas esperanças não correspon- Deixo claro que desde aquela época o desejo
diam à triste realidade de uma administração que se da tecnocrecia econômica do Governo era extinguir
revelou madrasta para os nordestinos. definitivamente a Sudene. Chegou-nos a noticia, na
Não sou leviana para admttir que tenha sido semana passada, de que o Sr. Ministro da Integração
essa a intenção do Presidente. Admtto que, no fundo, Regional já entregou ao Presidente um plano definiti-
Sua Excelência cuítiva as mais nobres idéias de de- vo de extinção daquele órgão, transformando-o numa
senvolvimento e justiça social para o povo brasüeiro, inócua agência de desenvolvimento. O pretexto, des-
mas não posso agredir os fatos, e, portanto, não há ta vez, é que foi localizado um foco de corrupção na 180
como negar que, provavelmentepor influência de sua
sofisticada assessoria,os problemas nordestinos,em
Maria do Carmo Alves- 30-01-2001
Sudam. E o que tem a Sudene com a Sudam? Além mico, diminuir-se-ia o imenso fosso que separa as
do mais, é uma idéia estapafúrdia extinguir-se um ór- economias industóalizadas do Sul-Sudeste da empo-
gão porque se descobriu que o seu diretor era corrup- brecida nordestina; medidas relativas à in-
to. Em governos passados, já houve denúncias na fra-estrutura diminuiriam expressivamente os gastos
própria Sudam de que o seu superintendente estava do Tesouro Nacional nas próximas secas.
prevaricando, e o Presidente à época, hoje o nobre A pergunta natural que se faz é: e o custo de
Senador José Sarney, demitiu o funcionário corrupto, tudo isso? Seria em tomo de R$12 bilhões divididos
fez uma intervenção no órgão e corrigiu as distorções. em dez anos. Aparentemente, o valor é expressivo,
Agir de outra forma, Sr. Presidente, seria o mesmo mas irrelevante, quando se sabe que cada ano de
que, pelo fato de eventualmente identificar-se um par- seca, segundo cálculos oficiais, promove um prejuízo
lamentar corrupto, fechar o Congresso. O que de fato de cerca de R$5 bilhões. Daí se conclui que o investi-
ocorre agora, como se diz no meu Sergipe, é juntar-se mento programado seria infelior ao prejuízo de
a fome com a vontade de comer. Já havia o plano ma- tão-somente três anos de secas. Ora, quando se sabe
quiavélico de se extinguir a Sudene e a Sudam. O res- que neste século tivemos 22 anos de secas, con-
to é puro pretexto que nós, parlamentares do Nordes- clui-se que o prejuízo proporcionado à Nação brasilei-
te, do Norte e do Centro-Oeste, numa reação firme e ra alcançou a fabulosa cifra de R$11 O bilhões, sem
suprapartidária, temos mais do que o dever: temos a considerar os danos incalculáveis de dezenas de mi-
obrigação de derrubar esse atentado desrespeitoso lhões de enfermos e a morte pura e simples de pelo
contra os interesses das já tão discriminadas regiões menos um milhão e meio de sertanejos.
menos desenvolvidas do País. Mas como tenho consciência de que números
Sr. Presidente, e Srs. Senadores, no inicio do que envolvem o sofrimento ou mesmo o genocídio
primeiro mandato do Presidente Fernando Henrique dos sertanejos não alcançam os ouvidos sensíveis de
Cardoso, Sua Excelência afirmava pesaroso aos nossa soberba tecnocracia, vejamos outras compara-
parlamentares e aos governadores do Nordeste que ções que lhe são mais familiares. O investimento
o procuravam em busca de ajuda que gostaria muito, equivaleria a apenas um quarto do aplicado pelo Pro-
tanto quanto eles, de ajudar a região, mas não queria er para salvar banqueiros falidos ou, mais recente-
cometer erros do passado, investindo sem planeja- mente, o aplicado no saneamento do Banespa.
mento em obras e ações que não resultariam em es- Entretanto, vale repetir: seria investimento total-
truturas definitivas que diminuíssem progressivamen- mente autofinanciável e, ainda que não se levasse em
te os efeitos das secas futuras. Os governadores, ci- conta esse fato, seria uma aplicação de recursos ple-
entes da inutilidade das frentes de emergência, aca- namente compensáveis pela economia que se geraria
taram a idéia e partiram para um projeto que não ape- para o Tesouro Nacional em poucas secas futuras.
nas diminuísse vigorosamente os efeitos da seca, A entrega do projeto Novo Nordeste ao Presi-
como também criasse um plano de desenvolvimento dente foi solene e contou com a presença de todos os
efetivo para a região. governadores e parlamentares no Planatto. O cava-
O Plano "Novo Nordeste" era um plano lheirismo do Presidente FemandoHenrique Cardoso,
abrangente de desenvolvimento auto-sustentável, com a sua justa reputação de grande anfitrião, foi im -
montava uma sólida estrutura de recursos hídricos e, pecável. Não fattaram entusiásticos elogios presiden-
em especial, construía condições permanentes de ciais à iniciativa dos governadores- "extremamente
convivência com as secas. Dentre outrosbeneflcios, oportuna e patliótica", segundo suas veementes pa-
seriam gerados 3 milhões e 400 mil empregos lavras-, além do seu firme compromisso de cobrar
permanentes;promoveriao assentamento de 100 mil um urgente estudo da área econômicaparaencontrar
famílias em lotes irrigados; 300 mil pequenas meios para viabilizar os recursos.
propriedadesteriam suas áreas estruturadas para a A solidariedade de Sua Excelência encerrou-se
convivência com as secas e, por fim, seriam criadas com essa efusiva recepção. Nunca houve uma res-
condições atraentes para, em parceria com o setor posta oficial sobre o tema nem da área econômica
privado, ser implantado o maior pólo de fruticuttura nem de qualquer outro Ministério, nem muito menos
irrigada da América Latina. do próprio Presidente - nem ao menos um gesto pro-
Esse plano, Sr. Presidente, transformaria pro- tocolar da área técnica pedindo explicações a respei-
fundamente o Nordeste em termos sociais, alçando to. O governo do Presidente Fernando Henlique Car-
milhões de camponeses miseráveis à condição de doso, que havia apresentado suas idéias durante a
classe média rural;nos aspectos geopolitico e econô- campanha e sobretudo pela sua rica biografia de poli-
181
Maria do Carmo Alves- 30-01-2001
tico e escritor engajado com o social e o igualitarismo. anos de 80 a 85 houve uma seca -. quando houve
procedeu da mesma forma como a esmagadora mai- forte entrada de recursos a fundo perdido. o Nordeste
oria de seus antecessores agiram com as prioridades deu mais do que recebeu à Nação brasileira em
do Nordeste. particularmente com as ações de pre- termos financeiros líquidos. O Nordeste deu
venção permanente aos efeitos da seca:simplesmen- aproximadamente US$1 bilhão por anol
te arquivou o projeto. Quanto à viabilidade dos planos Portanto. é uma farsa que revela ignorância ou
apresentados. os seus assessores nem se deram ao mâ-fé a afirmação de que a região nordestina é um
trabalho de afirmar: "não lemos nem gostamos". Sim- ônus para os brasileiros.
plesmente relegaram-no ao esquecimento. Sr. Presidente. Sr e Srs. Senadores. ter o
Cabe aqui, Sr. Presidente. Sr e Srs. Senadores. Nordeste é um bom negócio econômico para o Brasil.
uma observação importante para que não pairem ao contrário do que. repito. por ignorância ou má-fé,
dúvidas ou interpretações de má-fé: a regiào nordestina se propala quando se diz que a região é um ônus para
não deseja nem pleiteia esmolas. Apesar de o País. Isso sem computar o fato relevante de que na
inteiramente alijada das prioridades dos projetos região está o berço da nacionalidade brasileira.
nacionais neste último século e meio de existência, A propósito. é válido destacar que. ao longo de
quando todo o foco do poder esteve voltado para o todo este século. o Nordeste foi superavitário na
desenvolvimentodo Sul-Sudeste. a regiãonordestina
balança de pagamentos. ao contrário do Sudeste
tem resistido e se mostrado plenamente viável. E não
que. por décadas a fio. durante sua fase de
tem sido fácil fazê-lo quando toda a legislação tributária
industrialização. foi amplamente deficitário. Ou seja,
nacional tem sido ostensivamente protecionista para as
os superávits do Nordeste. que exportava mais do
regiões produtoras e penalizadora para as
que importava. foram ímprescindlveis para a
consumidoras; quando as sedes das estatais. os
industrialização de São Paulo.
centros de pesquisas e as grandes obras de in-
Por todos esses fatos. seja por razões
fra-estrutura sempre se concentraram nas regiões
industrializadas. Por outro lado, graças à política geopolíticas. sociais ou econômicas. é justo que seja
econômica implementada pelo govemo militar e que atribulda. finalmente. uma prioridade para o
seria surpreendentemente complementada durante o Nordeste. porque o desenvolvimento da região
Plano Real, todo o sistema financeiro se concentrou no implicará a conquista de um vigoroso mercado
Sudeste e, em especial. em São Paulo. interno para o Sudeste industrializado. bem maior e
Não obstante todo esse ostensivo favorecimen- mais estável do que a parte externa do Mercosul. Da
to. o Nordeste tem dado mais à União do que dela re- mesma forma que o desenvolvimento do oeste
cebe. Isso ficou exaustivamente demonstrado num americano- região de clima muitíssimo mais hostil do
estudo magnífico promovido pelo BNB. na década de que o nordestino- foi importante para as indústrias
90. denominado "Nordeste: Entrada e Saída de Re- do leste e hoje se constitui na região mais dinâmica
cursos". Trata-se de um estudo para se proceder a um dos Estados Unidos.
levantamento detalhado. dentro de um período de Mas. em que pese toda essa lógica, não é isso
tempo, para se estabelecer tudo que entrou da União que se vê. Os nordestinos continuam. neste começo
e o que dela saiu. O período escolhido foi de 1980185, de milênio, a ser tratados como o "patinho feio", no
pinçado aleatoriamente. mas se cuidando para que estabelecimento das prioridades nacionais.
houvesse nele a existência de uma seca pelos seus A forma de encarar as secas na virada do século
efeitos negativos à região. O objetivo era comprovar é exatamente a mesma de há 200 anos. Todos sabem
se era verdadeira ou falsa a informação de que o Nor- como criar uma infra-estrutura de convivência com as
deste era um ônus econômico para a União. secas. Mas não há decisão política para fazê-lo. O
Por conta disso foi realizado um estudo extre- Governo atual encara os sertanejos do nosso
mamente meticuloso durante aqueles anos. identifi- semi-árido como uma sub-raça, que. no máximo.
cando-se em detalhes tudo o que entrara a qualquer merece ações inúteis e humilhantes das frentes de
tltulono Nordeste a partir do Tesouro Nacional. e tudo emergência. Jamais houve um esforço como o dos
aquilo que saíra da região em benefício do país como norte-americanos na década de 30 com as suas
um todo, desde os impostos. saldos de petróleo, en- regiões secas ou da empobrecida Índia da década de
fim. todos os componentes que saíam da região. 60, que investiu na sua admirável Revolução Verde,
O resultado foi attamente esclarecedor e extirpando a miséria de seu povo e transformando
definitivo. Mesmo considerando uma seca -naqueles regiões bem mais adversas que as nossas em
182
Maria do Carmo Alves - 30-01-2001
183
Morazildo Cavalcante- 02-02-2001
zônia. Creio que uma decisão do Governo seria uma vemo deveria determinar a área comum, que seria
forma muito mais simples e fácil de resolver todos preservada e pertenceria a todos os assentados, ca-
esses problemas. Primeiramente, as ONGs deveri- bendo a cada um explorar o total de sua área. No en-
am trabalhar nesse sentido. porque. da forma como tanto. o Governo permtte que cada um explore uma
atuam. terminam tendo contra si toda a sociedade. parcela e. no final. faz uma peneira na floresta. aca-
No momento em que uma organização bando com a flora. a fauna. O Governo age errada-
não-governamental. por melhores propósitos que mente. e as organizações internacionais não compre-
possa ter. se manifesta contra a conclusão da hidro- endem qual é a saída. Talvez esses erros ocorram por
via Araguaia'Tocantins. o asfaltamento da Santa- desconhecimento sobre a matéria e por falta de vi-
rémiCuiabá ou da rodovia Transamazônica. ela colo- vência prática na nossa região. Creio que essas
ca contra si todos os moradores da região. As ONGs ONGs deveriam se somar aos interesses da socieda-
deveriam somar-se a nós e ao interesse do povo, exi - de brasileira. do povo trabalhador que vive na Amazô-
gindo do Governo uma posição definitiva sobre as nia. O Governo deveria demarcar definitivamente as
suas questões. Por exemplo: por que no Governo de terras indígenas, preservar as reservas florestais e
Fernando Henrique. e em todos os Governos que o até ampliá-las se necessário fosse. O Governo não
antecederam ,até hoje não se concluiu a demarcação deveria criar essas leis idiotas. que, na verdade. não
das terras indígenas? Por que as organizações são respeitadas. como é o caso da recente medida
não-governamentais, assim como nós. não exigem provisória que se transformou em lei e que determina
do Governo o cumprimento da determinação Consti- que o proprietário deve preservar 800k da sua área.
tucional. para que se demarquem. de uma vez por to - Ninguém respeita isso. Além do mais, o lbama não
das, as reserJas indígenas do nosso Pais, impedindo tem condições de fazer essa fiscalização na nossa
qualquer tipo de acesso a essas ãreas por parte dos Amazônia, até porque se trata de um órgão falido.
exploradores, tarto dos de madeira como dos de mi - sem recursos e com poucos funcionários. O Governo
nerais, a não ser por consentimento dos próprios ín- fala tanto em meio ambiente e não cumpre com suas
dios ou da Funai ou pelo que é permitido por lei? O obrigações! Hoje fiz um discurso sobre as edusas de
segundo ponto é o seguirte: se queremos preservar. Tucurui. O Governo barrou um rio e não permite a pro-
temos que determinar o que e o quanto preserva- criação dos peixes, porque os que estão a jusante
remos. Se entendermos que as reservas florestais não podem ir a montante. Faz quinze anos que esse
nacionais existentes são poucas. em primeiro lugar rio foi barrado. No entanto, a lei proíbe o barramerto
temos que vigiá-las e protegê-las. Além disso. há ne- de qualquer curso d'água no nosso Pais. O Governo
cessidade de um maior número de funcionários do descumpriu a lei e até hoje não fez as edusas de Tu-
lbama para desempenhar tal função, assim como é curui. Penso que as ONGs pecam por excesso. por
preciso obter os recursos federais necessários para o desconhecimento e por faha de tática e estratégia de
efetivo cumprimento da lei. Mas com isso o Governo luta nos seus propósitos. Ressalvo que os seus pro-
não a cumpre! Em se gundo lugar. se é pouco o que já pósitos são. na maioria, importartes e merecem nos-
está preservado, por que não criamos mais reservas
so respeito. Muito obrigado. Senador Mozarildo Ca-
florestais? Por que não fazemos um debate sobre a valcanti.
matéria a fim de tomarmos reserva aquilo que essen-
cialmente precisa ser tido como reserva na Amazô- O SR MOZARILDO CAVALCANTI(PFL- RR)
nia? O Governo- desculpem-me a expressão -age - Senador Ademir Andrade, defendo a instalação da
de maneira imbecil e inconseqoente ao modificar leis. CPI das ONGs. Concordo com V. Ex" no sentido de que
Por exemplo, hoje, o proprietário rural tem que pre- a maioria dessas organizaçõesnão-governamentais
servar 80% de sua propriedade. Nunca vi algo tão efetivamente tem bons propósitos. Trata-sedaquela
idiota e imbecil quanto isso! Como que. em uma área velha história: quando a esmola é grande o santo des-
de 500 hectares. 400 hectares serão preservados e confia.
apenas 100 hectares poderão ser trabalhados? Essas organizações. originadas na Inglaterra e
Então, se existem áreas que precisam ser preserva- na França, financiadas por corporações internacio-
das. vamos defini-las e não transformá -las em pene~ nais, discursam em defesa do meio ambiente e da ca-
ras. a exemplo do que ocorre na Amazônia, onde usa indígena. Inclusive, chegou-se ao ponto de. no
cada proprietário tira um pedaço de sua área. Isso Estado de Roraima. a Funasa. um órgão do Ministério
tem ocorrido até nos assentamentos rurais do Minis- da Saúde, fazer um convênio com uma organização
tério da Reforma Agrária. Num assentamento. o Go- não-governamental ao invés de, por exemplo. ceie-
186
Morazildo Cavalcante- 02-02-2001
brar convênio com o Exército, que há muito está nas ção das ações das ONGs no Brasil. Louve-se a atitu-
regiões de fronteira atendendo àquela populaçào. de de V. Ex"! Louve-se a atitude das organizações
Mais longe ainda chegaram essas instituições - não-governamentais que se inspiram no desejo e na
e aqui vou citar corno exem pios o Cimi e o Sine -, que necessidade da preservação ambientai! Ninguém
mobilizaram a população indígena do Município de mais do que os produtores brasileirosse interessaem
Uiramutã, na fronteira Brasil-Guiana-Venezuela, no preservar o meio ambiente. Quem deseja matar a sua
senti do de que não fosse cons tru í do ali um quartel do"galinha dos ovos de ouro''? Porém, na verdade, é im -
Exército. Vejam V. Ex"s: chegamos a esse ponto! E a perativa essa investigação, para saber quais são os
Nação, muda e surda, assiste ao avanço dessas insti- interesses efetivos que se escondem nesse escudo
tuições. de preservação ambientaL Não podemos ficar em ati -
A parceria com a sociedade civil, com o terceiro tude contemplativa, verificando o potencial produtivo
setor, deve ser feita de forma que os interesses nacio- que tem o Pais, em razão da preocupação exclusiva
nais e o comando da coisa pública estejam de fato em se preservar o meio ambiente. Aliás, a natureza
nas mãos do Governo. O Governo não pode abrir mão está ai para ser explorada de forma sustentáveL E o
desse comando e entregá-lo a essas instituições, homem faz parte do ecossistema; ele não pode ser
que, como disse V. Ex", drtam como e o que se deve marginalizado. Então, é importante o que V. Ex• traz
ou não fazer em determinadas áreas. para a discussão no Senado. Ainda há pouco, toma-
Senador Ademir Andrade, debater e discutir a mos conhecimento- e fiz um registro nesta Casa so-
conveniência ou não do que deve ser feito em deter- bre o assunto -de um expediente de uma organiza-
minada região é válido, mas entregar a essas instttui- ção nãoiJovernamental dirigido a diversas autorida-
ções o comando da questão ambiental e indigenista des brasileiras, inclusive ao Ministério das Relações
do País, coincidentemente na Região Amazônica, é Exteriores, com o propósito de admoestá-las sobre a
bastante preocupante, principalmente se olharmos o intenção de ampliar a produção de soja no Brasil e de
que está ocorrendo na Colômbia. O descaso do Go- utilizar os rios como uma moda! viária. Ora, o que as
verno colombiano com a sua Amazônia culminou com organizações não-governamentais estrangeiras têm
o domínio do narcotráfico na região e com o surgi- para poder interferir na autonomia do nosso Pais?
mento da guerrilha, misturando-se essas duas fac- Não vamos admitir isso! Concordo com V. Ex" e pre-
ções -guerrilha e narcotráfico-, pois dizemos guerri- tendo auxiliá-lo no seu trabalho.
lheiros que não estão envolvidos. Na verdade, naque-
le país, há uma balbúrdia, incíusive estimulada por
países poderosos, os quais hoje estão comandando a O SR MOZARILDO CAVALCANTI (PFL- RR)
Colômbia e amanhã poderão estar dentro do Brasil, - Agradaço a V. Ex", Senador Leomar Quintanilha.
justamente porque estão plantando essa semente da Sr. Presidente, para finalizar, ressalto o registro
discórdia. que fiz acerca da correspondência que me enviou o
to preocupante o fato de o Exército brasileiro es- Promotor de Justiça do Estado de Roraima. Até que
tar impedido de construir um quartel na fronteira em enfim alguém da área oficial, do Judiciário pelo me-
uma área estratégica- é bom ressalvar que a Vene- nos, toma uma iniciativa concreta ao pedir a apuração
zuela e a Guiana tém uma questão da litlgio por uma do caso! O que se está querendo fazer aqui não é
área de terra na fronteira com o Brasil -tendo em vis- uma prévia condenação de nenhuma organização
ta uma liminar de um juiz federal. não-governamental. O que se quer é justamente fazer
O Sr. Leomar Quintanilha(PPB- TO)- V. Ex• a investigação, para, como disse o Senador Jefferson
me permite um aparte? Péres, se parar o joio do trigo. Creio que devem ter pri-
O SR. MOZARILOO CAVALCANTI (PFL- RR) oridade as instrtuições efetivamente nacionais, e
- Ouço V. Ex• com prazer. aquelas estrangeiras que pretendem agir no Brasil
O Sr. Leomar Quintanilha(PPB- TO)- Nobre que o façam, desde que seja para ajudar e não para
Senador Mozarildo Cavalcanti, não tive o prívilégiode assaltar o Brasil, tendo em vista que já há fatos com-
ouvir o pronunciamento de V. Ex" desde o inicio. Ouvi provados de biopirataria.
a intervenção do eminente Senador Ademir Andrade, Nesse caso, Senador Jefferson Péres, em Rora-
quando S. Ex• abordava a questão das organizações ima, já existem denúncias de que essa instrtuição
não-governamentais. Pareceu-me que o tema está fazendo contrabando de peixes ornamentais. en-
abordado por V. Ex" foi a necessidade de investiga- tre outras coisas.
187
Morazildo Cavalcante- 02-02-2001
188
Roberto Freire- 13-02-2001
O SR. ROBERTO FREIRE (Bioco/PPS - PE _ crime". E isso nada mais é do que a afirmação tosca e
Como Líder. pronuncia o seguinte discurso. Sem re- primitiva, como diz Dora Kramer, de que os fins justifi-
visão do orador.) - Sr. Presidente, até tinha pensado cam os meios. De acordo com essa idéia, para se lu-
em falar da tribuna, já que é a primeira vez que uso tar contra a imoralidade, pouco imporia que se prati-
a pai avra após o reingresso do PPS no Bloco de que qualquer ilegalidade. Evidentemente que isso im-
Oposição, junto ao PT e ao PDT. porta -e muito- em um Estado Demoa-ático de Direi-
Sempre me posicionei com muita clareza contra to. E diria mais: principalmente agora, quando esta-
mos assistindo, no Congresso Nacional, ao constran-
aqueles que, vendo dificuldades no momento atual,
gimento de uma sucessão baseada em algo que o
costumavam dizer que viviam os como na época da
Estado Democrático de Direito tem mecanismos de
ditadura ou pior. Muttas vezes, afirmei que quem as- apurar. Bastaria o Ministério Público abrir um inquéri-
sim pensava mutto provavelmente não vivera naquele to civil contra o Sr. Jader Barba lho e o Sr. Antonio Car-
período. Agora, inclusive, vejo alguns se referirem ã los Magalhães,porque se acusaram, reciprocamente,
"ditadura do Executivo" em relação ãs medidas provi- da prática de crimes. Não sei se são verdadeiros. Não
sórias. Não dá para falar em ditadura nesse caso. São cabe ao Congresso, não cabe a nenhum Senador
coisas bem distintas. abrir um inquérito, mas caberia ao Ministério Público,
Mas, hoje, queria falar de um caso bem especifi- por determinação da Constituição brasileira, fazê-lo.
Não é com escuta telefônica, nem com métodos ile-
co - em relação ao qual, concordo em que estamos
gais que chegaremos ao desiderato da sociedade
vivendo tal como na dttadura -,que foi magistralmen- brasileira_
te apresentado à opinião pública brasileira pela jorna-
Estou falando desses assuntos, porque a jorna-
lista Dora Kramer, em "Coisas da Polftica" _ lista tambêm diz:
Lerei apenas alguns trechos.
A falta de cerimônia instalada no Con-
Era assim na ditadura gresso- seja pelo uso de fitas agora . seja
Enquanto a imprensa, a sociedade e pela troca de insultos que deu origem à de-
as instttuições continuarem a aceitar a apli- generação de costumes - deve-se em boa
cação de métodos ilegais supondo que es- medida à acertação de toda e qualquer for-
tão assim trabalhando em favor da restaura- ma de denúncia como salvo-conduto a to-
ção da moralidade, o Brasil permanecerá na das as guerras.
condição de arremedo de democracia."
É importante ter isso em mente, porque. para
Dora Kramer diz mais adiante: defender a democracia, o Estado de Direito, as liber-
dades públicas, existe a lei. Desrespeitando a lei, não
Os que se consideram arautos da mo- vamos chegar a lugar algum,porque amanhã a vttima
ralidade- aí incluídos imprensa, parlamen- seremos todos nôs _
tares e magistrados que não reagem - es- Eu pediria que a Casa registrasse nos Anais o
tão necessitando ser postos frente a uma artigo da jornalista Dora Kramer.
dura realidade: não há nenhuma diferença
entre eles, os espiões do antigo SNI e os
que se utilizavam de seus serviços_
do um enonne prejuízo para o Erário, prejuízo que Senador Pedro Simon fala e falava nesta Casa,
o Ministério Público ainda pretende recuperar. mas hoje não está sequer a ouvir-me? Certamente
Em 22 de maio de 2000, o Ministério serão anistiados.
Público Federal propôs a Ação Civil Pública n° Sr. Presidente, Sra s e Srs. Senadores,
2000.34.00.014-83811, pretendendo o outra questão merece ser esclarecida pelo DNER: o
ressarcimento à União. A ação continua tramitando. Sindicato de Construção Pesada - vejam bam esta
Sr. Presidente, Sras e Srs. Senadores, ou- --moveu ação contra o Departamento pleiteando o
tros assuntos também me trazem à tribuna. ressarcimento, por perdas, no valor de quase
A Advocacia Geral da União, em correição R$37 4 milhões. E, a despeito do parecer contrário
extraordinária efetuada no Departamento Nacional da Advocacia Geral da União, que identificou- e eu
de Estradas de Rodagem, detectou irregularidades, tenho o parecer - falhas nos cálculos da
principalmente em pagamentos de precatórios indenização devida, o DNER veio a emitir o
naquele órgão do Ministério dos Transportes. respectivo empenho.
Nas conclusões de seu trabalho, a Segundo a avaliação dos técnicos da
Corregedoria da Advocacia Geral da União própria AGU, as cifras deveriam ser infinitamente
recomendou fosse dado conhecimento do que menores, na casa de R$20 milhões apenas são R$
apurou ao Ministério Público, ao Presidente do 374 milhões, enquanto a Advocacia calculava R$20
Tribunal de Contas da União, à Secretaria da milhões. O ONER não se quedou às
Receita Federal, ao Instituto Nlcional de Seguro argumentações técnicas do parecer e, em tempo
Social, à OAB e ao CREA. recorde, preparou-se para o pagamento. Senão,
Recomendou expressamente que fosse vejamos:
instaurado o procedimento administrativo- -Em 19 de dezembro passado, foi
disciplinar, com nomeação de servidores alheios ao prolatada decisão judicial condenando o DNER ao
quadro do ONER para compor a Comissão de pagamento absurdo;
Investigação. E, ainda, que o DNER fosse instado a - Dois dias depois, 21 de dezembro - e
rever pagamentos efetuados no período de 1997 a isso foi feito à mão, pela Juíza -, o DNER emitiu o
1999, sem embargo de outras providências. Empenho n° 2000NE007506 para o pagemento e
Pasmem, Sras e Srs. Senadores: até o que teria sido efetuado, não fora a denúncia
momento, ao que se sabe, houve o desligamento veiculada pelo Correio Braziliense nos primeiros
de um funcionário, Gilson Moura, que se afastou, dias de janeiro seguinte.
por vontade própria, do órgão. Posterionnente, foi Imediatamente após a notícia, a AGU,
exonerado. correta-mente, recorreu, e o Presidente do Tribunal
Mas quem são os verdadeiros responsáveis determinou fosse suspensa à quitação do
pelos desmandos? Quais as responsabilidades mencionado débito.
apuradas? O Erário foi ressarcido? O dinheiro não saiu, ainda, mas seria isso
Tenho conhecimento de nota oficial, motivo suficiente para se esquecer o assunto? Ou
expedida no último dia 16 pela Advocacia Geral da deve-riamos estar assistindo à punição dos
União, declarando-se responsável pelo culpados pela quase lesão ao Pais? Quem são os
procedimento de pagamento de precatórios do responsáveis por esse tipo de arranjo dentro do
Departamento Nacional de Estradas de Rodagem, DNER? Com que propósitos?
a partir da edição da Medida Provisória no 1.984- Quem propiciou a nota de empenho, tão
16. prejudicial ao interesse público, com tanta rapidez?
Ora, é uma medida de futuro. E o futuro, no Em que condições foi emitida essa nota de
jargão popular, "a Deus pertence". empenho?
Mas, e quanto a nós, homens públicos? Ora, senhores, o Sr. Fonlenelle Morbach,
Deveremos abdicar de nossas responsabilidades, pessoa envolvida várias vezes no Relatório,
que dar confonnados com as promessas de um inexplicavelmente, na fase de punições, sequer
futuro melhor? Ou nos impõe a existência total de teve o seu nome lembrado. Por esquecimento, ou
esclarecer os fatos? haveria justificativa para a exdusão do rol de
Devemos continuar sem respostas para os responsáveis por essas ações?
prejuízos causados? Na nota oficial da última sexta-feira, a
E os corruptos e corruptores, de que tanto o Advocacia Geral da União também dá conta de que 193
Antônio Carlos MaQalhães-20-02-2001
As denúncias dão conta da existênda de clusive formuladas por mim, o Sr. Ministro da
acordos em processos licitatórios, manutenção de Integração Nacional afastou pessoas da direção
daquela Superintendênda. E nada mais se soube
folha de pagamento com funcionários fantasmas -
sobre o assunto. Promete para 4 de março - a
tem até fundonário nos Estados Unidos!-, locação
eleição era no dia 14 -, mas não virá, de modo
de veículos com superfaturamento, privilégios e
algum, nada que incrimine. Vamos ter coragem de
vícios nos contratos de arrendamentos, todas apurar, por intermédio de uma CPI mista, o que
envolvendo seu administrador principal, o Sr. AfTísio existe na Sudam.
Vieira Lima. Restam ser clareadas essas denúndas -
A Assembléia Legislativa do Estado, em beneficio, inclusive, das políticas de fomento
atendendo a requerimento dos Deputados, empreendidas por aquele órgão federal -. para que
constituiu uma comissão parlamentar de inquérito. não pairem dúvidas sobre a seriedade e a
Contra a decisão da Assembléia Legislativa idoneidade dos que conduzem as avaliações e
de criar a CPI, o Advogado-Geral da União liberações de verbas em áreas protegidas por
ingressou em juízo com mandado de segurança, concessões governamentais. Afinal, quais as
sob o fundamento de que a comissão não teria punições adotadas em relação aos que traíram a
competênda para fiscalizar a Codeba, uma confiança depositada em suas mãos pelo Governo
sociedade de economia mista. Federal?
Segundo a AGU, estaria ocorrendo invasão
E quanto aos projetos que a Secretaria
na esfera de competência das Casas do Congresso
considerou eivados de irregularidades, quais foram
Nacional.
as providêndas adotadas para punição dos
A despeito das alegações da Assembléia
Legislativa de que o capftal social da Codeba é culpados e ressarcimento do Erário?
integrado também pelo Estado da Bahia, liminar foi Sr. Presidente, respaldado nas conclusões
concedida no Supremo Tribunal Federal da Diretoria de Auditoria de Programas da Área
suspendendo os trabalhos da CPI. Econômica da Secretaria Federal de Controle
Enquanto isso, o acionista minoritário, Interno do Ministério da Fazenda, encaminho outros
Conselheiro Elmyr Ramalho, solicitou, requerimentos de informações ã apreciação da
administrativamente, documentos referentes ãs Mesa do Senado, para que sejam remetidos ao
irregularidades perpetra -das na empresa. A Ministro da Justiça e ao Ministro da Integração
documentação foi negada. A Procuradoria-Geral do Nadonal.
Estado,então, impetrou uma ação cautelar perante
Como viram V. Ex"s, e como viu a Nação,
a la Vara da Fazenda Pública. A juiza do feito
não fazemos acusações infundadas nem atacamos
concedeu liminar e estabeleceu a data de 16 de
-como muitos desejavam - a figura do Presidente
fevereiro, sexta-feira passada, para a apresentação
dos documentos. da República.
Sr"s e Srs. Senadores, os tatos expõem O motivo que levou às especulações a
uma situação de descalabro administrativo na respeito já está por demais esclareddo.
Codeba, que precisa ser rigorosamente investigada. A confusão causada em virtude da
Pela Assembléia Legislativa do Estado? Pelo comparação que fiz entre o Presidente da
Senado? Pelo Judiciário Federal? Pelo Executivo? República e o Presidente do Senado gerou, de
Seja por quem for, há que esclarecer. Há que partidários de ambos, reações imediatas e celeuma
corrigir. Há que punir os culpados. suficientes para ficar provada a inexistência de
Quanto a isso permanecerei atento. semelhanças que os aproximem. O grupo do
Sr. Presidente, Sr"s e Srs. Senadores, Palácio não aceitava a comparação. Mas o Senador
vamos à Sudam!
Jader Barbalho ficou lisonjeado com a mesma.
Relatório da Secretaria de Controle Interno
Logo, não há semelhança. Eu fiz uma pergunta e o
do Ministério da Fazenda, contendo quase 600
laudas, detalhou diversas ações praticadas dentro Paládo, por seus interlocutores, já a respondeu
da Superintendência de Desenvolvimento da devidamente. E eu, com toda humildade, trago aqui
Amazônia, todas eivadas de irregularidades e a minha opinião.
malversação do dinheiro público. Aqui não se tratou de dossiê de Cayman-
196
Em atendimento a inúmeras denúncias, in- ninguém ouviu uma palavra -, não se falou de
Eduardo Jorge ou mesmo de Ricardo Sérgio, como
Antônio Carlos Magalhães-20-02-2001
triga, e, sobre tudo, numa posição em relação ao Resperto, hierarquicamente, como quis ser
nosso Partido, que, evidentemente, se não nos respeitado, o Presidente da Casa. Entretanto, isso
intimida, também não é do nosso desejo. jamais me fará calar sobre tudo aquilo que
Sr"s e Srs. Senadores, se alguns querem considerar absurdo nesta Casa ou fora dela.
intrigar-me a toda hora com o Presidente da Essa é a minha posição.
República, podem fazê-lo. Constituam-me em alvo O Sr. Carlos Patrocínio (PFL- TO) -
preferencial. Agora, lembrando Ruí Barbosa quero Senador Antonio Carlos Magalhães, V. Ex" me
dizer que "um povo que não tem quem lhe fale concede um aparte?
perde o hábtto de ouvir. Dizia Kennedy, com tanta O SR ANTONIO CARLOS MAGALHÃES
propriedade: "não esperem fortalecer o fraco com o (PFL- BA)- Antes de conceder o aparte a V. Ex",
enfraquecimento do forte". quero encaminhar os requerimentos, se V. Ex"
A minha consciência áJZ que sempre fui útil pennitir.
ao seu Governo nas questões fundamentais e O Sr. Carlos Patrocinio (PFL- TO) - Se V.
muttas vezes, pela minha voz, o Governo participou Ex& não quiser pennitir. .. O Sr. Renan Calheiros
de campanhas importantes, como o Fundo de (PMDB- AL)- O requerimento é votado. O Sr.
Combate e Erradicação da Pobreza,que hoje estás Carlos Patrocinio (PFL -TO) -Sempre ouvi o
sendo utilizado na bolsa-escola, uma iniciativa do Presidente Antonio Carlos sertão aparteado! E
Partido dos Trabalha-dores. E isso é murro triste. agora não merecer nenhum aparte ..
Enquanto essas pessoas estão livres, Cristovam O SR PRESIDENTE (Edison Lobão)- A
Buarque está sendo condenado. Isso impõe uma Mesa não impedirá o aparte de V. Ex", apenas
reação da sociedade. Enquanto os que fazem e adverte que a Casa ouviu, com muita atenção, o
cometem esses erros estão livres, Cristovam discurso do Senador Antonio Carlos Magalhães,
Buarque está sendo condenado por uma juíza do que ocupou cerca de 52 minutos do tempo do
Distrito FederaL Senado.
Tambêm a CPI do Judiciário, também o A Mesa não impedirá o aparte de V. Ex",
salário m lnimo, tudo isso fiZ em beneficio do Pais e pedindo apenas que seja breve, de acordo com o
do Governo Fernando Henrique. Aprova é que Regimento.
todas essas teses foram adotadas pelo Governo. ] O SR ANTONIO CARLOS MAGALHAES
Acredito que, se fizer um balanço, Sua (PFL - BA) -Senador Renan Calheiros, V. Ex" quer
Excelência sentirá em mim a presença de um falar ou quer me apartear?
colaborador e não de um adversário. Respeito-o O Sr. Renan Calheiros (PMDB- AL)-
como Presidente e desejo o completo êxito do seu Quero fa-lar em nome da Liderança do PMDB.
Governo, êxito geral e não apenas na parte O SR ANTONIO CARLOS MAGALHAES
econômica. (PFL - BA) - Concedo o aparte ao Senador Carlos
Seja como for, estou e estarei cumprindo Patrocínio.
sempre os meus deveres de Senador da República, O Sr. Carlos Patrocínio (PFL- TO) -
e o farei seguindo a minha consciência e, Eminente Senador Antonio Carlos Magalhães,
politicamente, a orientação do meu Partido, cujo todas as vezes que V. Ex" ocupou essa tribuna, foi
Presidente, Jorge Bornhausen, tem agido sempre aparteado por todos, senão por quase todos. Eu
com zelo e dignidade, atributos indispensáveis para gostaria de dizer, Sr. Presidente, que o Senador
quem comanda uma agremiação partidária. Antonio Carlos Magalhães está prestando um
Se aqui estivesse o Senador Jader grande serJiço à Nação, um serviço que ninguém
Barbalho, iniciaria as minhas palavras dizendo que ainda percebeu. S. Ex" citou os luminares da
o plerto se feriu no dia 14. Ele foi vencedor. imprensa que estão preocupados com a probidade,
197
Antônio Carlos Magalhães-20-02-2001
a ética e a moral na política Esses homens- quero corrupção, porque ela campeia há muitos anos.
destacar o Márcio Moreira Alves- salvaram a Admito que o Presidente Femando Henrique
imagem da imprensa, que procurou minimizar os Cardoso não consegue fazer tudo, admito que Sua
discursos do Senador Antonio Carlos Magalhães, Excelência tenha procurado fazer algo, mas, corr
cingindo a questão a um assunto pessoal entre S. certeza, essa mácula continua, desprezando o
Ex" e o Senador Jader Barbalho, hoje Presidente sofi'ido povo brasileiro excluído.
da nossa Casa. Sr. Presidente, sei que o meu O SR. ANTONIO CARLOS MAGALHÃES
aparte não é muito oportuno. Não vou elogiar o (PFL- BA)- Agradeço o aparte de V. Ex•, que foi
Senador Antonio Carlos Magalhães, até porque os meu companheiro de Mesa, talvez o mais atuante.
integrantes desta Casa, sem exceção, já o fizeram Respeito a sua qualificação e tenho por V. Ex" pro -
nas últimas sessões em que participamos. Quero funda admiração.
que a imprensa nacional dê mais atenção ao que V. Ex" falou muito bem. Não sei como vão
diz o Presidente Antonio Carlos Magalhães, pois reagir os Srs. Senadores, mas o que fiz foi um
não se trata exclusivamente de uma celeuma alerta para o bem do País e de todos os partidos,
pessoal entre S. Ex" e o Presidente da República que es -tão interessados em corrigir esses erros
O Senador Antonio Carlos Magalhães quer prestar clamorosos, esses crimes que são praticados
um benefício à Nação, e, nesses últimos anos, contra o Erário. Daí por que o aparle de V. Ex" vem
ninguém fez isso melhor, como se pode constatar coroar o final do meu discurso.
pelo elenco de proposições que S. Ex" apresentou E deixo a tribuna feliz com o silêncio dos
à Nação. Na CPI do Judiciário, concluiu-se que meus companheiros, com os que me ouviram, com
existe corrupção dentro daquele Poder, talvez o a bondade de todos, com o plenário cheio a
único onde jamais deveria existir qualquer despeito de dizerem que iam esvaziá-lo. Até trouxe
questionamento. A CPiteve que ser encerrada uma citação de Nabuco dita em situação em que
porque as coisas não estavam cheirando bem, mas alguns elementos fugiram do plenário. E eu iria citá-
pelo menos deu um resultado e ensejou a criação la se ocasião semelhante ocorresse, mas não foi
da CPI do Sistema Financeiro Nacional, que preciso fazê-lo dado o número de Senadores e a
também não teve continuidade devido aos fatos atenção com que me ouviram.
surgidos principalmente em relação ao Banco Sou muito grato a V. Ex" e aos meus
CentraL Eminente Senador Antonio Carlos queridos Colegas.
Magalhães, quero pedir ao Brasil que observe os Muno obrigado. (Palmas.)
fatos para os quais V. Ex• está chamando a
atenção. E V. Ex" faz isso justamente após um
outro alerta dado à Nação. No último domingo ...
O SR PRESIDENTE (Edison Lobão)-
Peço a V. Ex" que conclua o seu aparte.
O Sr. Carlos Patrocínio (PFL- TO)- Vou
concluir, Sr. Presidente, mas há um sentimento de
emoção e até de revolta por ninguém apartear o
Senador Antonio Carlos Magalhães. Os presidiários
do Brasil também lizeram um alerta e estão
preconizando que todos os segmentos se juntem
para que façamos algo por este BrasiL E o melhor
seria se fiZéssemos uma auzada definitiva contra a
198
Heloísa Helena- 22-02-2001
A SRA. HELOÍSA HELENA (Bioco/PT - AL Executivo, tem corno tarefa nobre fiscalizar os atos
Pronuncia o seguinte disrurso. Sem revisão da ora- daquele Poder, embora, em função da posição da
dora.)- Sr. Presidente, Sr's e Srs. Senadores, é evi- Maioria desta Casa, se ajoelhe covarde e vergonho-
dente que aquilo que certamente tem movimentado samente diante do Palácio do Planatto; isso faz com
mentes e corações em todo o Brasil são as ITeqüen- que o Congresso Nacional funcione como um anexo
tes denúncias de corrupção feitas entre Parlamenta- do Palácio.
res do Congresso Nacional, no Senado, ou entre mi- Assim, minha intenção jamais poderia ser esta:
nistros relacionados ao Governo Federal. apenas compartilhar com os ouvintes e com os Sena-
Gostaria de discutir com os Parlamentares pre- dores aqui presentes um texto tão esclarecedor e tão
sentes e com a opinião pública a preocupação que importante como o do Padre Antônio Vieira. Ele dizia
pairasobretodosnósarespeitodedenúnciasgravís- que nem os reis podem ir ao paraíso sem levar consi-
simas em relação aos ministérios e aos ministros do go ladrões, nem os ladrões podem ir ao inferno sem
PMDB, corno a de anteontem, feita pelo Senador levar consigo os reis. Claro, todas as vezes que falar-
Antonio Carlos Magalhães. mos de reis e de príncipes, na estrutura vigente, atual,
O Senador Renan Calheiros apresentou denún- quem representa os reis ou os príncipes, efetivamen-
Cias igualmente gravíssimas contra ministros do PFL te, é o grande Chefe do Executivo, portento, o Presi-
Portanto, a grande pergunta que poderia ser ferta dente da República, que, hoje, numa República como
pelo povo brasileiro é se o Presidente Fernando Hen- a nossa, ocupa o papel que, à época do Sermão de
rique Cardoso é igualmente ladrão e corrupto e, por- Padre Vieira, era orupado pelos reis, pelos príncipes.
tanto, poderia ser adjetivado igualmente a seus vários Argumentava ele que, se os reis levassem con-
ministros que foram apresentados em denúncias nes- sigo os ladrões ao paraíso, seria uma ação gloriosa e
ta Casa. verdadeiramente real, pois não leria companhia inde-
Para colaborar com o debate, farei a breve leitu- cente. E exemplifica como um episódio bíblico muito in-
ra de um texto murro antigo. Certamente, o Senador teressante e muito bonito: Cristo foi crucificado ao
Roberto Requião, não por antigüidade, mas por domi- lado de um outro ladrão, que aqui passa a ser carac-
nar com propriedade o latim, pudesse ler trechos be- terizado como "o bom ladrão", Dimas. Quando Dimas
líssimos. Um deles é muito antigo e foi escrito pelo se dirigiu a Jesus, dizendo-lhe: "Jesus, lembra-te de
Padre Antônio Vieira, ainda em 1655. O texto é de mim em teu Reino", Jesus, imediatamente, disse-lhe:
uma atualidade impressionante! Chama-se Sermão "Estarás comigo ainda hoje no paraíso". Ou seja, ele
do Bom Ladrão. Talvez o trecho nos possibilite identi- diz que, se os reis levam consigo os ladrões ao paraí-
ficar se Fernando Henrique Cardoso é igualmente so, é uma ação gloriosa e verdadeiramente real, pois
corrupto, ou os dois Senadores estariam agindo de não tinham companhia indecente. Porque não teriam
má-fé, ou mentindo por desconhecimento dos fatos, companhia indecente, Padre Vieira passará a tratar
ou por chantagem, ou qualquer outra palavra desqua- agora, onde diferencia o ladrão rico do pobre. E dizia
lificada que se pudesse utilizar. ainda que a realidade que ele identificava em 1655
O Padre Antônio Vieira, ao fazer o Sermão, em que também identificamos hoje é que não eram reis
1655,na Igreja de Misericórdia de Lisboa, antecipava levando ladrões ao paraíso, mas ladrões levando os
que talvez o local apropriado para fazê-lo não fosse a reis ao inferno. E ele partia de um fundamento: "Sem
Igreja de Misericórdia de Lisboa, mas a Capela Real, restituição do alheio, não pode haver salvação".
pois o objetivo do Sermão, de fato, era tratar dares- E citava Santo Agostinho, que dizia: ·Se o alhaio
ponsabilidade dos reis, que são cúmplices de la- que se tomou se retém, se se pode restituir e não se
drões, assim como de ministros de estado, desocupa- restitui, a penitência deste e de outros pecados não é
dos da corte, governadores sem mérito nomeados verdadeira penitência, senão simulada e fingida, por-
por parentesco ou tavores de negociação. E iriam to-
que não se perdoa o pecado sem se restituir o rouba-
dos, segundo Padre Antônio Vieira, para o inferno. do, quando quem o roubou tem possibilidade de o
É evidente que jamais poderia ter a ousadia de restituir".
convencer alguém aqui, pois talvez este fosse o es-
E, analisando o caso do bom ladrão, repetia
paço adequado para debatê-lo. Tanto o Palácio do
Provérbios, quando diz: "Não é grande a culpa de
Planafio como o Congresso Nacional, por ser o Con-
quem furta, se furta para matar a fome". E é exata-
Gresso Nacional, segundo a Constituição Federal, é a mente por isso que ele diz que Cristo perdoou o bom
Instituição apropriada para fiscalizar os atos do Poder
ladrão. O bom ladrão, despido, pregado na cruz, na
199
Heloísa Helena- 22-02-2001
extrema pobreza. estava impossibilitado de restituir Judá Um com o cativeiro dos assírios; outro. com o
qualquer coisa que tivesse roubado anteriormente e, dos babilônios. E a causa foi que seus príncipes, em
se o tivesse feito para matar a fome, sem dúvida já es- vez de guardarem os povos como pastores, rouba-
taria sem a culpabilidade presente. E resgatava al- vam-nos como lobos. E Santo Agostinho dizia: "Só há
guns preceitos que não resgatamos hoje da lei ve- uma diferença entre os reinos e os covis dos ladrões:
lha, da lei rigorosa, da lei da graça, da lei naturaL os reinos são latroclnios ou ladroeiras grandes e os
A partir daí, ele começa a diferenciar o trata- latrocínios ou ladroeiras são apenas reinos peque-
mento dispensado por Cristo ao ladrão pobre, que foi nos". Exemplifica com o diálogo do pirata com Ale-
Dimas, e ao ladrão rico, Zaqueu. Ele dizia que Cristo xandre Magno. Navegava Alexandre em uma podero·
tinha que tratar os dois de forma diferente. Dimas foi sa armada pelo Mar Eritreu, a conquistar a Índia; e foi
tratado de forma diferente em fi.Jnção da pessoa que trazido a sua presença um pirata que andava com um
era: um ladrão pobre, miserável e crucificado. Para barco roubando pescadores. Alexandre repreen-
Zaqueu, não foi dada de pronto a salvação, pois era deu-o violentamente, e ele, que não era covarde nem
um ladrão tolerado. Sua riqueza era a imunidade ne- lerdo, respondeu de pronto: "Basta, senhor, que eu,
cessária para roubar sem castigo, sem forca e sem porque roubo em uma barca, sou ladrão; e vós, por-
culpa. Alguns, como Zaqueu, pensam que dando al- que roubais em uma armada, sois imperador?"
guma esmola conquistarão o Reino dos Céus. Vieira E diz Vieira: "Assim é que o roubar pouco é cul-
afirma que isso não é verdade, pois "a salvação não pa, o roubar mutto é grandeza. O roubar com pouco
pode entrar sem se perdoar o pecado, e o pecado não poder faz os piratas, o roubar com muito, osAiexan-
se pode perdoar sem se restituir o roubado!" dres". O roubar pouco dá Carandiru e o roubar muito
Dizia que "a restituição não só obriga súditos e dá poder digo eu, e não o Padre Antônio Vieira.
particulares, mas também os cetros e as coroas" .Por- E continua levantando questões extremamente
tanto, considerando a situação atual, a punição por interessantes. Um filósofo chamado Sêneca teve a
roubo, por furto, por ladroagem não deve servir ape- coragem de escrever em Roma, na época em que rei-
nas ao ladrão pobre, que vai para o Carandiru; tem nava Nero. mesmo diante da covardia dos oradores,
que servir também para o Congresso, para o Governo em tempo de principes católicos e timoratos. Tais ora-
Federal. dores não pregavam a doutrina, mas se calavam. Ao
Continua Padre Vieira: "A rapina ou roubo é to- que observava Sêneca: "Saibam os eloqüentes mu-
mar o alheio contra a vontade do seu dono. Os prínci- dos que mais ofendem os reis com o que calam que
pes tomam muitas coisas dos seus vassalos contra com o que disserem; porque a confiança com que isto
sua vontade, mas, se dissermos que os príncipes pe- se diz é sinal que lhes não toca e que se não podem
cam nisto, todos eles ou quase todos nos condenari- ofender; e a cautela com que se cala é argumento de
am". E responde citando São Tomás: que se ofenderão porque lhes pode tocar".
Se os príncipes tiram dos súditos o As vezes, alguns fazem todas as denúncias
que, segundo a justiça, lhes é devido para a possíveis e imagináveis, mas não tocam em F eman-
conservação do bem comum, ainda que o do Henrique, porque pensam que, com sua eloqüên-
executem com violência, não é roubo [fala cia muda, vão possibilitar a proteção de Fernando
de impostos. do que hoje existe na legisla- Henrique. Mas não o protegem.
ção vigente]. Porém, se os principes toma-
Vieira cita Salomão: "O ladrão que furta para
rem o que se lhes não deve, é rapina e la-
comer não vai nem leva ao infemo. Os que não só
trocínio. Estão obrigados à restituição como
vão, mas levam, são os ladrões de maior caübre e
os ladrões. E pecam tão mais gravemente
de mais atta esfera, os quais, debaixo do mesmo
que os mesmos ladrões, quanto é mais peri-
nome e do mesmo procedimento, agem!"
goso e mais comum o dano, com que ofen-
dem a justiça pública, de que eles [os prínci- E cita ainda São Basílio Magno:
pes, os reis, os senadores, os deputados ou
o presidente] estão postos por defensores. Não são só ladrões os que cortam bol-
sas ou espreitam os que se vão banhar,
para lhes colher a roupa: os ladrões que
Nesse ponto, ele começa a relatar como Deus
castigou severamente dois reinos: o de Israel e o de mais própria e dignamente merecem este tí-
tulo são aqueles a quem os reis encomen-
200
Heloísa Helena- 22-02-2001
dam os exércitos e legiões, ou o governo gos maiores"; 4°- Sendo os reis obrigados, sob pena
das províncias, ou a administração das cida- de não ter a salvação, a restituir todos esses danos,
des, os quais, já com manha, já com força, nem na vida nem na morte os restituem", pela impuni-
roubam e despojam os povos" Os outros la- dade que impera"
drões roubam um homem; estes roubam ci- Padre Antônio Vieira repete São Tomás de
dades e reinos; os outros furtam debaixo do Aquino: "Aquele que tem a obrigação de impedir que
seu próprio risco; estes sem temor nem pe- não se furte, se não o impediu, fica obr'1gado a restttuir
rigo; os outros, se furtam, são enforcados; o que se furtou" E até os príncipes que, por sua culpa,
estes furtam e enforcam" deixarem crescer os ladrões, são obrigados à restitui-
O que vai para o Carandiru, o miserável da fave- ção; porquanto as rendas com que os povos os ser-
la, quando vai roubar, sabe que pode ser assassina- vem e assistem são como estipêndios instftuídos e
do, que pode ir para a prisão, sabe exatamente para consignados por ele para que os príncipes guardem e
aonde pode ir. Os grandes não, roubam sem temor mantenham em justiça""
nem perigo" "E se, nesta obrigação de restituir, incorrem os
Vieira lembra ainda Diógenes, e o faz com admi- príncipes pelos furtos que cometem os ladrões casu-
ração à dttosa Grécia, por tê-lo como pregador" Certa ais e involuntários, que será pelo que eles mesmos e
vez, Diógenes, ao ver uma tropa de homens "impor- por própria escolha armaram de jurisdição e poder
tantes" levando a enforcar alguns ladrões, bradou in- àqueles que roubam os mesmos povos?" Paga o fur-
cansável: "lá vão os ladrões grandes enforcar os pe- to também quem deu o ofício, o cargo, o poder ao la-
quenos• "Certamente, muitos da população brasileira, drão"
se vissem determinadas coisas, iriam grttar exata- Vieira diz: "Poderia dizer o príncipe"- citando o
mente isso" pecado cometido por Adão- "a Deus: Ora, Deus,
Dizia ainda: "Quantas vezes se viu em Roma ir a Vossa Divina Majestade Deus, homem de tanta capa-
enforcar um ladrão por ter furtado um carneiro e, no cidade de escolha, viu um dos seus filhos, Adão, co-
mesmo dia, ser levado em triunfo um cônsul ou dtta- meter um pecado tão grande, então, por que coube a
dor por ter roubado uma província?" ti mandar o teu filho, Jesus Cristo, para a Terra para
Cita ainda Sidônio Apolinar, contrapondo-se a que Ele fosse punido por um pecado que nào fostes
um ilustre Sr. Seronato" Dizia ele: "Seronato está parte, que era o pecado de Adão?" Segundo Vieira,
sempre ocupado em duas coisas: em castigar furtos e Deus poderia responder assim: "Na escolha do ho-
em os faze(', o que é um tapa no falso moralismo que mem e no ofício que lhe dei, em tudo procedi com a
às vezes impera aqui" "Isto não era zelo de justiça, se- circunspecção, prudência e providência com que de-
não inveja" Queria tirar os ladrões do mundo para rou- vera e devia fazer o príncipe mais atento às suas obri-
bar ele só!" gações, mais considerado e mais justo" Quando o fiz,
Muitos de nós poderíamos perguntar: ministro não foi com império despótico com as outras criatu-
ladrào significa presidente ladrão? Corrupto significa ras, senão com maduro conselho e por consulta de
presidente corrupto? E pergunta Vieira: "Mas se os pessoas até não humanas, divinas" As partes e quali-
reis tão fora estão de tomar o alheio, que antes eles dades que concorriam no escolhido eram as mais
os roubados, e os mais roubados de todos, como le- adequadas ao ofício que se podiam desejar, nem
vam ao inferno consigo esses maus ladrões os bons imaginar, porque era o mais sábio de todos os ho-
reis?" Ora, como um bom rei pode ter a fama em fun- mens, justo sem vício, reto sem injustiça, um senhor
ção de ter um ladrão perto de si? de todas as suas paixões, às quais tinha sujeitas e
Justificando a culpa dos reis, Vieira responde: obedientes a razão" Só lhe fattava experiência, mas
"Não por um só, senão por muitos modos, os quais não houve nem concurso de outros para escolha, por-
parecem insensíveis e ocultos, e são muito daros e que Adão era o primeiro e único homem""
manifestos" 1•- Porque os reis lhes dão os ofícios e Mesmo assim, diria Deus: "Vistes o corpo huma-
poderes com que roubam"" São os reis ou o presiden- no de que me vesti? Vistes o muito grave que padeci,
te ou um governador que estabelecem ao ministro ou o sangue que derramei, a morte que fui condenado
ao secretário o ofício e o poder com que eles roubam" entre ladrões, para que não fique no mundo tão má e
"2"- Porque os reis os conserJam neles"" Ou seja, o perniciosa conseqüência, como seria se os príncipes
presidente continua conservando os ministros" "3° - se persuadissem em algum caso que não eram obri-
Porque os reis os adiantam e promovem a outros car- gados a pagar e satisfazer o que seus ministros rou-
201
bassem"?
Heloísa Helena- 22-02-2001
Continua Vieira: "A desculpa dos reis é tão falsa lá, sem nomear ofícios. nem pessoas. que o Verbo
quanto mal fundada, porque Deus não fez escolha Rapío na Índia se conjugava portados os modos. Aí
dos homens pelo que sabe que hão de ser. senão Padre Antônio Vieira começou a dizer que, na época
pelo que de presente são". Se os reis, os presidentes, dele - certamente o que o povo brasileiro também
assim fizessem suas escolhas para determinados ofi- identifica da conjuntura-, também se conjuga o Ver-
cios, ficariam desobrigados da restituição. ''Porém, as bo Rapío por todos os modos. Ele dizia: "pela expe-
escolhas e os provimentos que se usam não se fazem riência que tenho, não sô do Cabo da Boa Esperança
assim. Querem saber os reis"-ou os presidentes-"se para lá, mas também das partes daquém, se usa
os que provêm nos oficios"- ocupam cargos- "são la- igualmente a mesma conjugação. Conjugam porto-
drões ou não?" Quer o Presidente saber disso? dos os modos o Verbo Rapio, por que furtam por todos
Vieira cita Cristo: "A porta por onde legítima- os modos da arte, não falando em outros novos e es-
mente se entra ao ofício é só um merecimento; e todo quisrtos que também conheceu Donato, nem Despau-
o que não entra pela porta é ladrão. se não ladrão e la- tério. Tanto que lá chagam, começam a furtar pelo
drão. E por que é duas vezes ladrão? Uma vez por- modo Indicativo, porque a primeira informação que
que furta o ofício que não lhe pertencia, e outra vez pedem aos práticos é que lhes apontem e mostrem os
pelo que há de furtar com ele". caminhos por onde podem abarcar tudo. Furtam pelo
modo Imperativo, porque como têm o mero e misto
Contínua Padre Antônio Vieira: "Uns entram (no
império, todo ele aplicam despoticamente as execu-
ofício; no cargo, hoje) pelo parentesco, pela amizade,
ções das rapina. Furtam pelo modo Mandativo, por-
pela valia; outros, pelo suborno; e todos, pela negoci-
que acertam quando lhes mandam; e para que man-
ação. Entram como ladrões ocuttos, depois passam a
dem todos, os que não mandam não são aceí tos. Fur-
ser ladrões descobertos". Alguns entram pela janela;
tam pelo modo Optativo, porque desejam quanto lhes
outros, por cima dos telhados; outros, minando a
casa do pai de famnía. E faz várias referências bíbli- parece bem; e gabando as coisas desejadas aos do -
nos dessas, por cortesia sem vontade as fazem suas.
cas que mostram exatamente isso.
Furtam pelo modo Conjuntivo, porque ajuntam o seu
"Como se pode escusar quem ao menos firma pouco cabedel como daqueles que manejam muíto;e
os provimentos de quem não conhecia serem ladrões basta só que ajuntem a sua graça, para serem, quan-
os que por estes meios foram providos? Finalmente, to menos, meeiros da ganância".
ou os conhecia ou não" - o Presidente pode ser co-
E contínua dizendo que furtam pelo modo po-
brado da mesma forma que o rei o era por Antônio Vi-
tencial, permissivo, infiníto. Vai trabalhando todos os
eira- . "se os não conhecia. como os proveu sem os
conhecer? E se os conhe cia, como os proveu, conhe- verbos que são necessários.
cendo-os? Mas vamos aos providos com expresso Diz ele ainda: "É certo que os reis não querem
conhecimento de suas qualidades". Começa, então, isto, antes mandam em seus Regimentos tudo o con -
a dizer como se faz a provisão dos cargos, que muito trário;" Como poderia alguém pensar, ah. mas o Pre-
se assemelha ao que ocorre hoje. Alguns dizem tra- sidente não quer isso, porque a Constituição manda o
tar-se de um homem importante, um fidalgo da nossa conl:rálio, porque o Código Penal manda o contrário.
panelinha, mas é uma pessoa pobre, desempregada. { ...) "mas como as Patentes se dão aos Gramáticos
Então, diz Vieira. ele irá desempobrecer à custa dos destas conjugações tão perítos, ou tão cadimos ne-
que governam? Ele fará muitos pobres à custa de se las; que outros efeitos se podem esperar dos seus go-
tomar muito rico!" vernos? Cada Patente desta sem própria significação
Dào prêmios aos preferidos e dão castigos aos vem a ser uma licença garalin spcriptis, ou um Pas -
que não são preferidos. mas que são da panelinha saporte para furtar". Como faziam os corsários es-
também. Aos prefelidos, os melhores cargos; aos trangeiros, os corsários do mar.
não preferidos, uns outros cargos, mas continuam E continua: "Dos que obram o contrário com sin-
cargos, porque para praticar o parasitismo precisam gular inteireza de justiça e limpeza de interesse, al-
da estrutura para parasítar. guns exemplos temos, posto que poucos. Mas folgara
eu saber quantos exemplos há, não digo já dos que
Padre Antônio Vieira lembrava, no momento em
fossem justiçados como tão insignes ladrões, mas
que estava fazendo o sermão, que uma vez o Rei D. dos que fossem privados de governo por estes rou-
João !li solicítou a São Francisco Xavier que o infor-
bos? Pois se eles furtam com os oficios e os consen-
masse do Estado da Índia, por via do seu companhei- 202
tem e conservam nos mesmos oficios, como não hão
ro que era mestre do Príncipe. O santo escreveu de
Heloísa Helena- 22-02-2001
de levar consigo ao Inferno os que os consentem?" E continua Padre Antônio Vieira a falar corno
(. ..)'Verdadeiramente não sei como não reparam mu- Isaías caracterizava alguns príncipes.( ...) "Os prínci-
ito os Príncipes em matéria de tanta importância, e pes de Jerusalém não são fiéis, senão infiéis, porque
como os não fazem reparar os que no foro exterior,ou são companheiros de ladrão." Então, Presidente
no da Alma, têm cargo de descarregar suas consciên- companheiro de ladrão não é fiel, mas infiel. Conti-
cias". nua: "Pois saiba o Profeta que há príncipes fiéis e cris-
Então ele trata de uma parábola muito interes- tãos que ainda são mais miseráveis e mais infelizes
sante: "Havia um Senhor rico, diz ao divino Mestre, o que esse, porque um príncipe que entrasse em com-
qual tinha um criado, que, com oficio de Ecônomo ou panhia com os ladrões (...) havia de ter também a sua
Administrador, governava as suas herdades. Infama- parte no que se roubasse; mas estes estão tão fora
do pois o dito Administrador de que se aproveitava da de ter parte no que se rouba, que eles são os primei-
administração, e roubava, tanto que chegou a primei- ros e os mais roubados. Pois, se são os roubados es-
ra notícia ao Senhor, mandou-o logo vir diante de si, e ses prlncipes,como são ou podem ser companheiros
disse-lhe que desse contas, por que já não havia mais dos mesmos ladrões ( ... )? Será porventura porque
de exercitar o oficio". Quando soube que alguém es- talvez os acompanham e assistem aos príncipes são
tava roubando, ele chamou o senhor a quem ele dava ladrões? Se assim fosse, não seria coisa nova. Anti-
o cargo ou ofício para tirá-lo do cargo. "Ainda a resolu- gamente - que interessante - os que assistiam ao
ção foi mais apertada; porque não sô disse que não lado dos príncipes chamavam-se Laterones. E, de-
havia, senão que não podia". ( ...) "Não tem palavra pois, corrompendo-se esse vocábulo, ( ...), chama-
esta Parábola que não esteja cheia de notáveis dou- vam-se Latrones." ( ... )
trinas a nosso propósito. Primeiramente diz que este Continua o autor: "Os teus príncipes são compa-
senhor era um homem rico. Porque não será homem nheiros dos ladrões. E por quê? São companheiros
quem que não tiver resolução; nem será rico, por dos ladrões, porque os dissimulam; são companhei-
mais herdades que tenha, quem não tiver cuidado, e ros dos ladrões, porque os consentem; são compa-
grande cuidado, de não conserrtir que lhas governem nheiros dos ladrões, porque lhes dão os postos e os
ladrões. Diz mais, que para privar a este ladrão do ofí- poderes; são companheiros dos ladrões, porque tal-
cio, bastou somente a fama sem outras inquirições". vez os defendem; e são finalmente seus companhei-
E detalha exatamente: " Nem o ladrão conhecido deve ros, porque os acompanham." Segundo Padre Antô-
continuar o oficio em que foi ladrão, nem o Senhor, nio Vieira, eles "os acompanham e hão de acompa-
ainda que quisesse, o pode consentir e conservar nhar até o inferno, onde os mesmos ladrões os leva-
nele, se não se quer condenar". rão consigo."
E começa a trabalhar ainda nessa parábola: É o que esperamos numa democracia; nós, cris-
"Suspendei-o agora -dizia Padre Antônio Vieira- por tãos, queremos a construção do reino dos céus aqui
alguns meses como se usa, e depois o tornareis a na Terra e esperamos que eles parem na cadeia.
restituir, para que nem vós o percais, nem ele fique E corrtinua o Padre Antônio Vieira, tratando dos
perdido". As vezes, isso ocorre. Alguém está rouban- ladrões públicos e desconhecidos, dos ladrões públi-
do, e dizem para afastá-lo provisoriamente para que cos e conhecidos: "Cuidas tu, ó irjusto que hei de ser
seja definitivamente apurado. "Não, diz Cristo. Uma semelhante a ti e que, assim como tu, dissimulas com
vez que é ladrão conhecido, não sô há de ser suspen- esses ladrões, hei eu de dissimular também?" - dizia
so ou privado do ofício ad tem pus, senão para sem- Padre Antônio Vieira que Deus assim falaria aos reis.
pre, e para nunca jamais entrar ou poder entrar; por- "Enganas-te.( ... ) Dessas mesmas ladrolces que tu
que o uso ou abuso dessas restituições, ainda que vês e consentes, hei de fazer um espelho em que te
pareça piedade, é manifesta injustiça. De maneira vejas e, quando vires que és tão réu de todos esses
que, em vez de o ladrão restituir o que liJrtou no ofício, furtos como os mesmos ladrões, por que os não impe-
restitui-se o ladrão ao oficio, para que liJrte ainda des; e mais que os mesmos ladrões, por que tens obri-
mais! Não são essas as restituições pelas quais se gação jurada de os impedir, então conhecerás que
perdoa o pecado, senão aquelas por que se conde- tanto e mais justamente que a eles te condeno ao
nam os restituídos, e também quem os restitui. Per- Inferno."
ca-se embora um homem já perdido, e não se percam E vai além Padre Antônio Vieira num texto abso-
os muitos que se podem perder, e perdem na confian- lutamente lindo e atual.
ça de semelhantes exemplos".
203
Heloísa Helena- 22-02-2001
Era uma simples contribuição, Sr. Presidente, Ou os Senadores Antonio Carlos Magalhães e
Sr"'e Sr" Senadores. no sentido de que esta Casa Renan Calheiros, os Senadores Lideres do Governo
possa realmente fazer a discussão que diz respeito à e do PFL estão mentindo, agindo de má-fé, pordesin-
sua obrigação constitucional, cumprindo o que a formação ou falta de conhecimento do caso, ou o Se-
Constituição diz que é rrime de responsabilidade. nhor Fernando Henrique é corrupto. E se diante disso
o Congresso Nacional não investiga e não cumpre
Se o Uder do PMDB alega que há corrupção
suas obrigações constitucionais é corrupto também.
nos Ministérios cuja administração cabe a membros
Essa pecha, nós, da Oposição, não carregaremos.
do PFL e uma liderança do PFL diz que há corrupção
nos Ministérios administrados pelo PMDB, esta Casa Muito obrigada.
deve responder e tem obrigação de dizer. Se os Mi-
nistros são corruptos, conforme dizem ambos, ou
mentem ou faltam com a verdade por desinformação
ou má-fé ou igualmente o Presidente Fernando Henri-
que Cardoso é também corrupto e ladrão.
O SR PRESIDENTE (Mozarildo Cavalcanti) -
Senadora Heloísa Helena, interrompo V. Ex• somen-
te para prorrogar a sessão a fim de que possa concluir
seu discurso e para que possamos ter a oportunidade
de ouvir o Senador Roberto Requião.
A SRA. HELOiSA HELENA (Bioco/PT- Al) -
Sr. Presidente, agradeço a sensibilidade de V. Ex.•.
Mais grave ainda: um Senador disse na Casa
anteontem, em aparte ao Senador Antonio Canos
Magalhães, que a CPI do Judiciário parou no momen-
to em que tocava no Governo; a CPI do sistema finan-
ceiro parou no momento em que tocava no Banco
Central. Hoje temos na imprensa o comentário de que
o Senador Antonio Carlos Magalhães foi ter uma con-
versa com procuradores do MinistérioPúblico, a qual,
diz-se, foi gravada - podem fazê~o porque não é um
procedimento ilegal. Não sei se de fato gravaram,
mas se o fizeram e la está lá, deixando absolutamente
claro o caso Eduardo Jorge ao qual a base governista
deu sustentação, se omitiu, foi conivente, rasgou a
Constituição porque não quis investigar o que todos
sabiam sobre o número de ligações que havia do Ni -
colau para o Luiz Estevão e para o Eduardo Jorge
que mostrava exatamente "a coincidência" das liga-
ções que eram feitas entre o Eduardo Jorge o Nicolau
e não sei quem com a liberação de recursos para o
TRT de São Paulo. E tudo isso foi calado. Infelizmen-
te, o Senador Antonio Carlos Magalhães não teve a
coragem de fazer a sugestão ao Ministério Público
quando Presidente desta Casa, para possibilitar que
o nosso requerimento de informações, conforme
manda a Constituição, pudesse ser analisado. Agora
o Ministério Público vai começar tudo de novo. E es-
pero que possamos fazer o que nos obriga a Constitu-
ição e que seja realmente respondido pela base go-
vernista.
204
Roberto ReQuião-23-02-2001
O SR ROBERTO REQUIÃO (PMDB- PR. Pro- tribuições feitas sem a devida contabilização. Mas
nuncia o seguinte disrurso. Sem revisão do orador.)- aqui, no Senado da República, as bases do governo
Sr. Presidente, o país amanhece hoje perplexo com se mobilizaram e impediram o aprofundamento da In -
As revelações da revista lstoÉ. Alguns hipóaitas, cíni- vestigação.
cos e cépticos se manifestam. Os cínicos defendem a Sobra de todo esse processo, a informação do
instttuição e proclamam aos quatro ventos a barban- Senador Antonio Cartos Magalhães: quebrem o sigilo
dade que é o Senado viver o momento que vive. viver do Sr. Eduardo Jorge em 1994 e 1998 e chegarão à
a revelação de verdades, viver a perspectiva de inves- verdade. E segundo o Senador Antonio Cartos Maga-
tigação aprofundada sobre fatos recentes da vida pú - lhães, a verdade envolve o próprio Presidente daRe-
blica brasneira. Os cínicos, com o pretexto de defen- pública.
der a instituição, na verdade, estão propondo a con-
Retaliações: "Vamos, agora, cortar os ministros
sagração absoluta do cinismo, ou seja, a moral, a
do Sr. Senador Antonio Carlos Magalhães". Será que
conduta séria é apenas para o povo, é apenas para a
o Presidente da Repúblíca,através dessa atitude, não
pie be, é apenas para os humildes, enquanto os pode-
fará a confissão de que não monta um governo pela
rosos do momento, os príncipes do regime, da socie-
qualidade mas por acordos políticos e que, na verda-
dade e da economia estão, segundo eles ou para
de os ministros Waldeck Omelas e Tourinho estavam
eles, acima do bem e do mal.
as~egurados no governo não pela contribuição que
Céptico sou eu. E o céptico se diferencia do cíni- pudessem dar ao país, mas simplesmente como mo-
co, porque o céptico eventualmente não acredita nas eda de troca, pagando o silêncio do Senador Antonio
instttuições, não acredtta nas coisas, mas, na verda- Carlos Magalhães a respetto de fatos vinculados às
de, o céptico se caracteriza por uma vontade enorme últimas campanhas eleitorais que eram do seu
de vottar a acredttar. E nós só poderemos voltar a conhecimento?
acreditar nas instituições brasileiras se a verdade for
Acho que o Presidente está numa sinuca, mas
restabelecida. "Conhecerás a verdade e a verdade os áulicos, seguindo aquele velho ditado de que "o
vos libertará"- é uma máxima bíblica, não é minha. saco do chefe é o corrimão do sucesso", tentam sa-
De repente, o próprio PFL, partido de V. Ex", Sr. cralízar o Presidente da República e o PFL so~a uma
Presidente solta uma nota redigida pelo Sr. Jorge nota oficial dizendo que "o Presidente da República
Bomhause;,..em alemão, bornhausen quer dizer feito
está acima de qualquer suspetta". Já o AntonioCarlos
em casa. Essa nota, certamente, não foi ferra na casa
pode ser satanizado. As outras pessoas referidas por
do presidente do PFL; pode ter sido redigida na agita-
ele devem ser, no minimo,beatificadas. A santificação
ção de um free shop, onde tenta, definttivamente,
será feita num Muro próximo e os taumaturgos da se-
crucificar um adversário interno da pollbca pefehsta,
riedade do governo querem viabilizar o milagre de
que é o Senador Antonio Cartos Magalhães.
transformar uma situação rigorosamente explosiva,
O Senador Antonio Carlos Magalhãe.:<, cheio de que deve ser investigada- e essa illllestigação é exi -
defeitos, contabiliza também qualidades. E um sena-
gida pela sociedade civil brasileira -, através de um
dor emotivo e franco- "Conhecerás a verdade e a ver milagre em que todos são santos e estão acima de
dade vos libertará". Se o compromisso da ética é soci- quaisquer suspeitas. Não é esse o caminho.
al como diz o Procurador Luiz Francisco depois de ter
v~ado as confidências feitas pelo Senador Antonio O Ministério Público justifica o vazamento das
Carlos Magalhães ao Ministério Público Federal, pela informações com a afirmação de que o compromisso
qualidade da ebulição alcançada, o Senador Antomo da ética é social. É um assunto a ser discutido, mas
Carlos Magalhães terá prestado mais um serviço ao lhe indago, Sr. Presidente: com que tranqüilidade V.
país, por que levanta um caso que já foi seputtado pela Ex• se dirigiria, a partir de agora, a esses três proru-
maioria governista no Congresso. que é o caso do radares de Brasília para lhes levar algumas informa-
Sr .Eduardo Jorge. ções que a seu ver deveriam ser investigadas e que
O Sr. Eduardo Jorge era secretário pessoal do não lhe conviriam pessoalmente ou não conviriam à
Presidente da República. Encarregado da manipula- própria investigação que fossem vazadas de forma
cão dos fundos de campanha, segundo o ex-Ministro instantânea, dada a incontinência de um procurador?
da Agrirultura, José Eduardo de Andrade Vieira, É evidente que isso não compromete a credibilidade
ex-presidente do Bamerindus, ele teria a chave do cofre do Ministério Público, mas em relação às pessoas
do caixa dois, dos excedentes de campanha, das con- que possam fazer denúncias, compromete sim, em
profundidade, a confiabílidade pessoal dos procura- 205
Roberto Reauião-23-02-2001
O SR. ADEMIR ANDRADE(PSB- PA. Pronun- O Sr. José Eduardo Dutra (Bioco!PT - SE) -
cia o seguinte discurso.)- Sr. Presidente, Sr's e Srs. Permite-me V. Ex" um aparte?
Senadores, creio que seja muito útil e muito interes- O SR. ADEMIR ANDRADE (PSB PA) -Ouço,
sante a reafirmacão das palavras do Presidente F e r· com muita satisfação, V. Ex", Senador José Eduardo
nando Henrique' Cardoso ferra pelo Senador José Dutra.
Eduardo Dutra ontem, na Comissão de Fiscalização e
O Sr. José Eduardo Dutra (Bioco!PT - SE) -
Controle, e hoje, neste Plenário.
Senador Ademir Andrade, sobre esse assunto, tam-
A instalação dessa CPI, além de poder punir bém, lembrei-me de outro trecho da entrevista de on-
Pessoas que desviaram recursos públicos e de escla- tem do Presidente, quando ele fala da prívatização.
recer as denúncias que são feitas por membros do Sua Excelência diz o seguinte, especificamente sobre
Governo de parte a parte - quando o PMDB acusa Fumas: "Na campanha, eu dizia que iria privatizar, e o
Ministros do PFL de irregularidades, corrupção e tráfi- povo me elegeu". Isso é mentira! No primeiro manda-
co de influência, e oPFL acusa integrantes do PMDB to do Presidente, votta e meia eu mostrava o livrinho
do mesmo fato-, apurará tudo isso. Mãos à obra, o livro do programa do primeiro gover-
Mas, mais importante do que apurar is,so é evitar no. E o que estava lá em relação à energia elétrica?
que outros crimes aconteçam no Governo. E impres- Que queria a participação do capital privado na insta-
sionante como o Presidente quer que tudo continue fação e construção de novas usinas - o que era
como está. Ele vem teimando nesta tese de que tem bem-vindo! Se o Estado tem capacidade de financia-
que privatizar agora as geradoras de energia do nos - mento para construir novas usinas, então nada mais
so País. Acho que é a úttima coisa que falta privatizar, natural que se atraia o capital privado para cons-
porque já vendeu todo o sistema telefônico brasileiro, truí-las. Mas em momento algum Sua Excelência fala-
as siderúrgicas, as mineradoras, os bancos de todos va que iria vender as atuais_ Até porque essa história
os Estados do Brasil, exceto três ou quatro, bem de privatizar geradoras de energia elétrica de origem
como as centrais elétricas, com exceção da do Esta- hidráulica não tem paralelo em nenhum lugar do mun-
do do Amapá, que não permitiu a venda. Enfim, já do, nem nos Estados Uni dos, que é o país mais priva-
vendeu quase tudo que tinha este País. Restam agora lista do mundo. É lógico que lá a maior parte da gera-
as geradoras de energia brasileiras: Fumas, Eletra- ção de energia elétrica é de origem térmica, mas eles
norte. Desconhecem-se as razões pelas quais Sua têm uma capacidade de geração de energia elétrica
Excelência teima em privatizá-las. de origem hidráulica que, em termos percentuais, é
Preside aqui a sessão o Senador Edison Lobão, pequena, mas em termos absolutos é maior que a do
que tem a mesma posição de todos os Partamentares Brasil. Nos Estados Unidos, todas as empresas de
do Norte e da Bancada do Nordeste do Brasil, ou energia elétrica do vale do Tennessee são públicas,
seja, todos contrários à privatização da Eletronorte. O municipais ou estaduais. Sabe-se, principalmente na
próprio Presidente da Câmara manifestou-se contrá- Chesf, que todas as suas usinas, à exceção de uma,
rio à privatização de Fumas. Enfim, tenho lido murtas estão ao longo do rio São Francisco. Portanto, privati-
manifestações contrárias à privatização dessas em- zar a Chesf significa, na prática, privatizar o rio, por-
presas geradoras de energia. Mesmo assim, o Presi- que é ela que vai ter o controle da sua vazão, estabe-
dente Fernando Henrique teima em privatizá-las a lecendo todo o seu controle. Não há paralelo nem nos
qualquer custo. Gostaríamos de compreender qual a Estados Unidos. E o Presidente da Rapública,primei-
razão, o que está por traz disso. Talvez, Senador José ro, mente quando fala que ia privatizar essas empre-
Eduardo Dutra, a CPI possa nos esclarecer. Não há sas e foi eleito com esse problema. Não é verdade.
nada, absolutamente nada, que justifique o absurdo Sua Excelência não dizia que ia privatizar essas em-
dessa insistência. presas; dizia que ia atrair caprtal para construir novas
A novidade que trago sobre o assunto é que, an- usinas, o que seria bem-vindo; segundo, Sua Exce-
teontem, o Presidente anulou o decreto que respon- lência quer aplicar uma coisa que não tem paralelo
sabilizava o Ministério de Minas e Energia no proces- em nenhum outro lugar do mundo. E, como diz um di-
so de privatização, transferindo essa responsabilida- lado popular, "aquilo que só tem no Brasil e em ne-
de para a Comissão Nacional de Privatização do nhum outro lugar do mundo ou é jabuticaba ou é bes -
BNDES, que está ligada ao Ministro do Desenvolvi- !eira". Cabe ao Congresso Nacional impedir que o
mento, Alcides Tápias, para que a coisa ande, porque Presidente faça mais essa besteira no nosso País.
no Ministério de Minas e Energia não conseguiu ir Muito obrigado.
para li'ente. 207
Ademir Andrade- 09-03-2001
O SR. ADEMIR ANDRADE (PSB- PA)- É por norte significa jogar fora todo um qua dro de pessoal e
isso, Senador José Eduardo Dutra, que essa CPI pre- de técnicos que, ao longo de quase duas décadas,
cisa ser instalada. Ela é necessária, o Brasil exige, a construíram um nível de conhecimento que talvez não
população brasileira quer que toda essa sujeira, essa exista igual em nenhuma parte do mundo. E o Gover-
lama que está sendo jogada, seja esclarecida. Esda- no quer entregar a troco de nada.
recer esses fatos evidentemente impedirá essa bar- E o interessante, nobre Senador Jefferson Pé-
baridade que o Presidente quer cometer contra a Na - res, é que são re cursos da própria E letronorte que es-
ção brasileira. tão sendo colocados na construção da segunda eta-
Não consigo compreender a razão de tamanha pa da Hidrelétricade TucuruL A Hidrelétrica tem, hoje,
teimosia. Não consigo compreender a razão de tanto um faturamento anual de mais de R$1 bilhão. É prati-
empenho em uma questão a que toda a sociedade é camente lucro liquido, que poderia ser utilizado nas
contrária, a que os Parlamentares, representantes demais hidrelétricas, para regular as águas do RioTo-
das regiões onde estão instaladas essas geradoras cantins. Porque, mesmo fazendo a segunda fase ago-
de energia, são contrários. Não vi ainda um Parla- ra, ela não vai funcionar doze meses ininterruptos.Eia
mentar do Norte ou do Nordeste dizer que aceita a vai funcionar cerca de seis meses por ano com força
privatização dessas geradoras de energia. Mas o Pre- total, mas, nos outros seis meses, devido à queda das
sidente teima em fazê-lo a qualquer custo e a qual- águas, vai funcionar parcialmente. Por isso há neces-
quer preço. E, agora, transferiu o poder de decisão sidade de construção de outras hidrelétricas para
sobre a questão para o BNDES, porque o Ministério controlar o nfvel da água.
de Minas e Energia não conseguiu atender a sua soli- Nós poderíamos usar os recursos que ganha-
citação. mos com a EletronorteparainvestimaHidrelétricade
Ora, vamos recordar um pouco esse absurdo Belo Monte, que será a segunda maior hidrelétrica do
desejo do Presidente da República. Como disse V. plane ta, com o dobro da potência de Tucurui e vai ala -
Ex", Senador José Eduardo Dutra, e eu tenho repeti- gar urna área cinco vezes menor, portanto, trazendo
do aqui, o Governo não tem o mfnimo de coerência, o um prejulzo ao meio ambiente muito menor do que
mfnimo de lógica. Faço um esforço enorme para ter Tucuruí trouxe, incomparavelmente menor do que
boa vontade com o Presidente Fernando Henrique Balbina e Samuel, que foram desastres ecológicos.
Cardoso e para avaliar uma ou outra coisa positiva No entanto, o Governo teima em vender a "galinha
que tenha acontecido no Governo, para não ser dos ovos de ouro".
agressivo, para não ser tão contrário. Mas, quando Falo em incoerência porque, se ele queria ven-
verificamos uma atitude desse tipo, chegamos à con - der, deveria ter buscado a iniciativa plivada para exe-
dusão de que este Governo é submisso a determina- cutar a segunda etapa da hidrelétrica e não usar re-
ções externas, que não tem nenhum sentimento com cursos próprios. Se ele quer construir Belo Monte
relação à dor e à necessidade do povo brasileiro. para depois vendê-la também, então, que chame a
Lembro-me do que esse Governo fez com os iniciativa privada e dê a concessão, para que ela
garimpeiros de Serra Pelada, um verdadeiro crime, construa a hidrelétrica com recursos próprios. Querer
uma barbárie, algo nunca visto antes, nem na época vender depois de pronta ... ? Por que ele não conse-
da ditadura militar, nem na época de José Sarney, guiu, ao longo de quatro anos, nenhuma empresa pri-
nem na época de Fernando Collor de Mello. vada para executar a segunda fase da Hidrelétrica de
É um Governo totalmente insensível. E, agora, Tucurui? Por que o Governo Fernando Henrique Car-
quer vender a Eletronorte a qualquer custo. Quando doso, sabendo que há um subsídio de US$ 200 mi-
falo em incoerência - repito porque considero neces- lhões por ano às empresas de eletrointensivo,
sário o esclarecimento à opinião pública -refiro-me AlbrásíAiunorte, no Pará, e Alcoa, no Maranhão, o
ao fato de, se o Governo quer vender, não deveria es- que representa um prejuízo permanente para a Ele-
tar construindo com recursos próprios. No sábado tronorte, agora, nesse processo de privatização, che-
passado, nobre Senador Edison Lobão, estive em vi- ga ao absurdo de transferir esse subsidio para aEie-
sita oficial em Tucurui, a convite do Diretor da obra. A trobrás?!
segunda fase da Hidrelétrica de Tucuruí é uma obra Ou o Presidente é um homem extremamente
monumental, executada com os meios mais moder- mal informado ou o Governo é extremamente mal-in-
nos de tecnologia. Ao longo da sua história, aEietro- tencionado. E, agora, querem vender a Hidrelétrica de
norte criou um know-how que não pode ser jogado Tucurui por US$1 ,5 bilhão, quando ela custou ao Bra- 208
fora. A destruição da Eletronorte, a venda da Eletro- sil US$6,5 bilhões e com um serviço da dívida que,
Ademir Andrade- 09-03-2001
fala-se, chegou a US$11bilhões. Agora estamos gas- energia, lê-se exatamente aquilo que eu disse:" ... o in-
tando mais US$1 bilhão, totalizando quase US$12 bi- centivo à participação de capitais privados nos novos
lhões! Pergunto se isso não é crime. investimentos". No capítulo sobre privatização: "O pa-
Imagine, Senador Jefferson Péres, que estamos pel do Estado, como produtor de bens e serviços,
gastando, agora, em Tururuí, R$ 2 bilhões, o que equi- será mantido nas áreas estratégicas, onde deverá ter
vale a US$1 bilhão, só na segunda fase, em uma obra a capacidade de produzir com eficiência, qualidade e
que vem sendo feita de maneira absolutamente corre- preço competitivos". Portanto, se energia elétrica não
ta, com avaliações de empresas internacionais que é área estratégica, realmente não sei o que é isso!
confinnam a qualidade dos serviços. Há ainda o custo Muito obrigado.
da construção da primeira fase, que chegou a US$6,5 OSR. ADEMIR ANDRADE(PSB- PA) -É mui-
bilhões. E o Governo quer entregar tudo isso por to bom V. Ex" estar sempre com esse livrinho do Pre-
US$1 ,5 bilhão! sidente Femando Henrique Cardoso e fazer essas ci-
O que é que faz o Presidente F emando Henri- tações, para que a opinião pública compreenda o
que Cardoso insistir nisso? Que razões, que forças quanto um polttico é capaz de mudar; e mudar, infeliz-
externas o obrigam a essa atitude? Não conheço ne - mente, para pior, para o lado mau. Não sei que pode-
nhum país do mundo que tenha feito hidrelétricas do res tem as cúpulas econômicas que conseguem
porte das que existem no Brasil e que as tenha entre- transfonnar uma pessoa, como o fizeram com o Pre-
gue à iniciativa privada, para que tivesse o controle sidente Fernando Henrique Cardoso, de maneira tão
das águas, o controle de tudo! radicaL
Mas, a par de todos os problemas que criariam a
Nos Estados Unidos, como disse o nobre Sena-
dor José Eduardo Dutra, quem controla as hidrelétri- privatização, vamos falar do dinheiro que se arrecada
com ela. O Presidente já vendeu tudo! Tudo o que o
cas são as Forças Annadas americanas. Não é nem a
Brasil tinha, o Presidente já vendeu; o Governo Fer-
sociedade civiL São as Forças Armadas que estão
nando Henrique já vendeu. E ai vem a pergunta, Se-
sob o comando direto do Presidente da República. E,
nador Bello Parga: para onde foi o dinheiro? O que se
aqui, o Presidente quer vender o País inteiro a troco
fez com tanto dinheiro?
de quê?
O Presidente Fernando Henrique pegou este
Ontem, li no jornal uma reportagem sobre a País com uma divida interna de R$ 60 bilhões. SabeV.
transferência do poder de privatização para o
Ex• que, ao longo dos seus seis anos de governo, a
BNDES, sob o controle do Conselho Nacional de De-
balança comercial brasileira praticamente esteve
sestatização. Dizia o artigo que Fumas estaria avali- numa situação de igualdade, de paridade, ou seja, é
ada em 4 bilhões, a Eletronorte inteira em torno de 2
uma balança comercial que não tem superávit desde
ou 3 bi lhões -não me recordo bem -e há uma outra. que o Plano Real foi estabelecido. Muito pelo contrá-
V. Ex" se lembra, Senador Eduardo Dutra? A reporta-
rio, temos tido déficits pennanentes. Ora, se não te-
gem se refere a três.
mos superávit na balança comercial, somos obriga-
o Sr. José Eduardo Dutra(BiocoiPT- SE)- A dos a buscar alguma forma de conseguir recursos ex-
Chesf. temos para pagar o serviço da dívida externa. E o
OSR ADEMIRANDRADE(PSB- PA)- Chesf, Presidente Fernando Henrique Cardoso fez uma op-
Fumas e Eletronorte. A mais cara rustaria 6 bilhões; a ção que, para nós, foi a pior de todas: Sua Excelência
outra, 4 e a úftima, 3 bilhões. Somando-se tudo, o va- manteve o comprometimento do pagamento da dívi-
lor integral daria em tomo de 11 bilhões. da externa aumentando a divida interna brasileira por
o Sr. José Eduardo Dutra(Bioco/PT- SE) - V intennédio do estimulo à especulação financeira.
Ex"me concede um aparte, Senador Ademir Andrade? Em detenninadas épocas de crise, chegamos a
O SR ADEMIR ANDRADE (PSB- PA)- Pois pagar 4g,5% de juros aos esperuladores financeiros, e
não, Senador José Eduardo Dutra. a dí,;da, que era de R$60 bilhões, está hoje em R$540
o Sr. José Eduardo Dutra (Bioco!PT - SE) - bilhões. Quinhentos e quarenta bilhões de rea1sl
No aparte anterior, eu disse que o Presidente da Re-
Vou dar os dados de 2000,vou repeti-los: em
pública havia mentido quando falou que iria privatizar
2000, segundo o balanço das contas dos Governo,
F umas porque Sua Excelência disse isso em campa-
pagamos R$ 87,5 bilhões de serviço da dívida interna.
nha. E foi eleito. No livrinho Mãos à Obra, onde está
O superávit primário das contas do Governo, em
redigido o seu Plano de Governo do primeiro manda-
2000, foi de R$38,5 bilhões, o que significa que o Go-
to - que já utilizei várias vezes-, na parte referente à 209
vemo arrecadou mais do que gastou. Veja V. Ex" que
Ademir Andrade- 09-03-2001
o Governo, no ano passado, arrecadou da população bém dos Estados e Municípios. Hoje ela está toda en -
mais do que gastou: R$38,5 bilhões. Sobraram no cai- globada para o Governo Federal. Portanto, não houve
xa do Governo R$38,5 bühões. Para onde foram? essa elevação e, sim, a incorporação do Governo Fe-
Para o pagamento da divida. A diferença entre deral de uma divida preexistente, anulando a divida
R$ 87,5bilhões e R$ 37,5bilhões. que sãoR$ 39 bi- dos Estados e Municípios.
lhões, arrescentamos à divida. Arrescentamos! O SR ADEMIR ANDRADE (PSB -PA)- Sena-
Essa divida é uma bola de neve; essa divida é dor Bel lo Parga, V. Ex" deve saber que a divida inter-
um sanguessuga das necessidades do desenvolvi- na é rolada a cada 30 dias praticamente. São tttulos
mento da nossa Pátria e do povo brasileiro. Se, no do Governo que são colocados na mão do banco, que
ano passado, pagamos R$87 bilhões; se o FMI está capta recursos de quem quer investir em CDB, em
exigindo do nosso Governo um superàvit primário de RDB, etc.
R$32 bilhões/ano, e o Governo, subserviente, chega Há dois anos, o Governo chegou a pagar 49,5%
a R$38,5 bilhões, ou seja, ultrapassa o que o FMI exi- ao ano. Ora, muita gente de fora, Senador, trouxe dó-
ge, pergunta-se: o que se faz com esse dinheiro? lares para cá, transformou-os em reais e aplicou-os
Agora, pergunto: o que se vai fazer, se todo o dinheiro no nosso sistema financeiro.
que arrecadamos com a prlvatização não serviu para O SR PRESIDENTE( Canos Wilson)- Senador
nada? Porque a divida cresce três vezes mais do que Ademir. a Mesa lamenta informar que o tempo de V.
tudo o que se arrecada. Se vendermos todo o sistema Ex" já está esgotado.
elétrico brasileiro, conseguiremos R$11 bilhões, que OSR. ADEMIR ANDRADE(PSB- PA)- Já vou
é menos do que gastamos para fazermos exclusiva- encerrar, Sr. Presidente. Ouvirei apenas o Senador
mente a hidrelétrica de Tucurui. E pergunto: serve Jefferson Péres.
para quê? Porque, em um mês e meio, isso é o que O dinheiro foi aplicado no nosso sistema finan-
Governo está pagando de juros- em dois meses, va- ceiro. O medo de que essas pessoas retirassem rapi-
mos exagerar, vamos ter boa vontade. damente esse dinheiro foi que fez. em determinado
Portanto, não dá para aceitar esse tipo de atitu- momento, o Presidente Fernando Henrique Cardoso
de, esse tipo de incoerência do Governo Fernando chegasse a pagar 49,5% ao mês. Essa divida cresceu
Henrique Cardoso.Não dá para se ter boa vontade em função disso. O Governo não pegou dinheiro para
com essa maneira de agir. fazer obra. Era necessário que fossem trazidos dóla-
res de·fora para serem trocados por real, que seriam
OSr. BeiJo Parga(PFL - AM) - V. Ex" me per mi-
aplicados no nosso Sistema Financeiro, e para que o
te um aparte?
O SR. ADEMIR ANDRADE (PSB- PA)- Ouço Governo continuasse pagando religiosamente os
V. Ex" e, em seguida, o Senador Jefferson Péres, que seus compromissos internacionais. Como não lemos
superávit comercial há seis anos, Senador Bello Par-
também está solicitando um aparte.
ga, criou-se essa forma de se trazer dólar para ser
OSr. Bello Parga(PFL - MA) - Nobre Senador aplicado no Sistema Financeiro. Imagine um japonês,
Ademir Andrade, quero me referir à parte do seu pro-
que ganha 0,5% ao ano de juro pelo dinheiro deposi-
nunciamento em que fala sobre a elevação da divida
tado, colocando o seu dinheiro no Brasil e ganhando
interna. V. Ex" tomou como base que o débito do Go-
30, 35, 40% ao ano. Isso é um paraíso para todos
verno Federal seria de R$60 bilhões, que esse valor eles! F oi essa a fórmula encontrada pelo Presidente
foi aumentando e, atualmente, está em tomo de
Fernando Henrique. A questão dos Municípios é irre-
R$500 bilhões. Ora, a divida interna pública não era
levante diante dos fatos.
só do Governo Federal; era do Governo Federal, dos
Governos Estaduais e dos Governos Municipais. A Hoje, V. Ex" sabe, os Estados estão com 15%
dos seus Orçamentos comprometidos com o paga-
maior parte ou quase a totalidade dessa divida dos
mento dessa dívida. Então, o Presidente Fernando
Estados e Municípios foi transferida, num acordo ge-
Henrique errou e está errando.
ral, feito na União, para o Governo Federal pagar e re-
ceber dos Estados, num prazo de cerca de 30 anos. Com relação à privatização, de que está adian-
Portanto, a divida já existia; a divida não foi elevada tando vendermos tudo, o sistema elétrico principal-
por conta de novos endividamentos faraônicos ou não mente? Isso é um crime, Senador Bello Parga! É um
deixaram de ser canalizados para os investimentos crime! Responda-me onde está a coerência do Go-
de infra-estrutura do Pais. A elevação se deu porque a verno quando, ao invés de mandar a iniciativa privada
divida interna pública não era só da União, mas tam- fazer, ele faz para depois vender. Isso não tem cabi-
mento, não tem lógica!
210
Ademir Andrade- 09-03-2001
O Sr. Bello Parga (PFL - MA)- A privatização Presidente, peço desculpas e a oportunidade de con-
desse setor enseja que sejam feitos novos investi- ceder um último aparte ao Senador Antero Paes de
mentos, pelo setor privado, que o setor público seja Barros. Em seguida, encerrarei.
incapacitado de fazer.
O SR PRESIDENTE (Carlos Wilson) -Quero
O SR. ADEMIR ANDRADE (PSB- PA)- Veja pedir a V. Ex" que seja breve. A Mesa já foi tolerante
bem, estamos fazendo a segunda etapa de Tucuruí em mais de doze minutos com relação ao tempo de V.
com os nossos recursos. Nós estamos fazendo. É o Ex•, mas vai, com muito prazer, também ouvir o apar-
Governo que está fazendo a segunda etapa. Por que te do Senador Antero Paes de Barros.
o Governo não entregou a segunda etapa para a inici-
O SR ADEMIR ANDRADE (PSB- PA)- Agra-
ativa privada realizar? Porque a iniciativa privada
deço a V. Ex" e concedo o aparte ao Senador Antero
sabe que compra a preço de banana as coisas que o
Paes de Barros.
Governo quer vender, Senador Bello Parga.
O Sr. Antero Paes de Barros (PSDB- M1) -
O Sr. Jefferson Péres(Bioco/PDT- AM)- Per-
Senador Ademir Andrade, gostaria de colocar uma
mite-me V. Ex" um aparte?
questão divergente com relação ao pronunciamento
O SR. ADEMIR ANDRADE (PSB -PA)- Ouço, de V. Ex•. Entendo que é preciso uma profunda dis-
com satisfação, o Senador Jefferson Péres. cussão sobre o papel do Estado brasileiro. Essa ques-
O Sr. Jefferson Péres(Bioco/PDT- AM)- Se- tão da privatização foi, sim, discutida na campanha
nador Ademir Andrade, V. Ex" me comunicou, ontem, eleitoral de 1998. O meu Estado, quando a Cemat-
que me foi distribuído um projeto de sua autoria que Centrais Elêtricas de Mato Grosso - foi vendida, tinha
impede a privatização da Eletronorte. Mandei locali- quarenta e seis Municípios com racionamento de
zá-lo, e saiba V. Ex" que vou dar celeridade à emissão energia elétrica de dez a doze horas por dia, e não ha-
do meu parecer, o que não me exige muitos estudos, via nenhuma possibilidade de se fazerem investimen-
uma vez que tenho posição firmada, que coincide tos. A Cemat estava tão arrebentada pelos adminis-
com a de V. Ex", como com a da grande maioria dos tradores do passado, que não conseguia sequer pa-
homens públicos do Norte. Estamos preocupadíssi- gar o borracheiro. Hoje, depois que foi vendida, não
mos com a privatização de hidrelétricas, porque não há nenhum Município de Mato Grosso com raciona-
produzem apenas energia elétrica mas têm uso mútti- mento de energia elétrica. Precisamos discutir opa-
plo, com implicações econômicas e sociais que, em pel do Estado: se é o de empresário, que faz tudo- e,
princípio, não devem ficar nas mãos de uma empresa por isso, todas as empresas têm que ser estatais-, ou
monopolistaque visa ao lucro.No entanto, não tenha- se é o de indutor e controlador dodesenvolvrmento.
mos ilusão, Senador Ademir Andrade, pois seja qual Não tenho dúvida de que se o papel de Mato Grosso
for o meu parecer, a prevalecer o que disse, ontem, o fosse o de empresário, o Estado continuaria às escu-
Presidente da República. para estarrecimento meu, ras. Mato Grosso vai inaugurar, em outubro, a usina
Senador. tudo que Sua Excelênda quiser vai ser do gasoduto que vem da Bolívia e inaugurou, no ano
aprovado. Sua Excelênda disse, textualmente- não passado. a usina de Manso, feita pela iniciativa priva-
são palavras minhas, não as estou colocando na da, que jamais investiria nessa construção para ven-
boca do Presidente, pois o que Sua Excelência disse der a energia para a Cemat, que não conseguia pagar
está em todos os jornais: que dos Parlamentares da as suas contas. O Pais e o Estado não tinham, real-
base governista, exige total fidelidade; que se quise-
mente, poupança pública suficiente para fazer o in-
rem ser independentes, vão sê-lo em casa. A menos
vestimento. Esse é um profUndo equivoco da discus-
que haja um pronunciamento de todos os Parlamen-
são do Estado. Aquele socialismo em que tudo era do
tares dos partidos governistas, aqui, em defesa de
Estado mudou, para que haja um controle social da
sua dignidade- muitos deles, a maioria, são dignose
produção. O Estado precisa, na verdade, ser um con-
espero que façam isso- já estamos sabendo, previa-
mente que é S. Ex. Só tem indepandênda no âmbito trolador e um indutor do desenvolvimento. Era esse o
doméstico, porque no parlamento não a tem. aparte a V. Ex•.
O SR. ADEMIR ANDRADE (PSB- PA) Agra- O SR ADEMIR ANDRADE (PSB - PA) - Em
deço a manifestação de V. Ex". parte, concordo com V. Ex•, Senador Antero de Bar-
O Sr. Antero Paes de Barros (PSDB- M1) - ros, mas é interessante que aquilo que precisava,efe-
Permite-me V. Ex" um aparte? tivamente. ser privatizado não o é. No meu Estado.. há
O SR. ADEMIR ANDRADE (PSB - PA) - Sr. cinco anos defendo a privatização da usina de cana-de-
açúcar de Pacal, mas o Estado a mantém até hoje por- 211
Ademir Andrade- 09-03-2001
212
José Eduardo Dutra 15-03-2001
e na Companhia Docas do Estado de São venliva dessas pessoas. Conseguiu também que o
Paulo, e na execução de serviços de enge- Poder Judiciário determinasse a prisão preventiva de-
nharia no Porto de Juazeiro, bem como na las.
ampliação do Aeroporto Luiz Eduardo Ma- Portanto, é uma falácia as lideranças do Gover-
galhães, no âmbito da lnfraero, consoante no dizerem que as coisas já estão sendo investigadas
auditorias efetuadas pelo Tribunal de Contas e que o Congresso não precisa fazer isso. A Constitui-
da União. ção dá ao Congresso Nacional a prerrogativa de fis-
Na semana passada, tomamos conhecimento calização e da investigação. A história tem demons-
de uma nota assinada pelos Líderes dos Partidos go- trado que, quando se instala uma Comissão Parla-
vernistas com assento nesta Casa. mentar de Inquérito, os seus trabalhos, os seus docu-
A nota diz que os líderes são a favor de investi- mentos contribuem para agilizar os inquéritos no Mi-
gações "pelos instrumentos legais e democráticos"- nistério Público e para agilizar os processos no Poder
como se uma ComissãoParlamentardelnquéritonão Judiciário.
fosse um instrumento legal e democrático. Essa é, Sr. Presidente, Sr"s e Srs. Senadores, a
Alguns dizem que o Brasil não é mais o mesmo, proposta apresentada pelos Parlidos de Oposição,
porque estamos vendo um juiz na cadeia, estamos que entendemos deveria ser uma proposta assumida
vendo empresários na cadeia e estamos vendo um pelo conjunto do Congresso Nacional, até em legfti-
ex-Senador na cadeia. Realmente esse é umexemplo ma defesa, pois o Presidente da República pode dizer
concreto de que o Brasil não é mais o mesmo. Mas à imprensa que instalar CPI é deslealdade, que CPI
por quê? Qual instrumento viabilizou que essas pes- desestabiliza. Aliás, essas dedarações se chocam
soas hoje estivessem na cadeia? O Ministério Público frontalmente com a própria biografia do Presidente da
vinha investigando a construção da obra do TRT de República. Algumas dedarações como essa eram fei-
São Paulo desde 1994. É dessa data uma representa- tas pela ditadura militar, contra ele inclusive, que era
ção feita pelo Deputado Giovanni Queiroz, do Pará, oposicionista na época. A propósito, já registramos
ou seja: em 1994. aqui discursos que ele fez encaminhando pedidos de
instalação de CPis muito mais amplas do que essa
A partir de quando as investigações realmente
que estamos propondo.
tomaram pé e a partir da quando constituíram-se ele-
mentos para comprovar a culpabilidade das pessoas Entendemos que o Congresso Nacional, ao ins -
que estão presas?A partir da instalação da Comissão !alar essa Comissão Parlamentar de Inquérito, estará
Parlamentar de Inquérito que investigou irregularida- agindo em legitima defesa da Instituição, em legitima
des no Poder Judiciério. Isso significa que o Ministério defesa de todos os membros desta Casa, para garan-
Público é ineficiente? Não, Sr. Presidente. Significa tir as prerrogativas, inscritas na Constituição, desta
que a CPI é o instrumento mais eficaz para fazer essa Casa e de todos nós Deputados e Senadores.
investigação. Sabemos a dificuldade que o Ministério O requerimento está ferro, está pronto e esta-
Público tem para obter documentos, por exemplo, do mos coletando assinaturas. Queremos ver agora
Banco Central. Essa dificuldade acontece também aqueles que disseram que só assinariam se a investi-
com relação a CPis. Mas as CPis conseguem os do- gação fosse ampla, geral e irrestrita. Queremos ver
cumentos, porque, enquanto elas estão instaladas, agora se vão assinar ou não. Queremos ver agora
se o Banco Central demora a mandar os documentos, aqueles que assinariam somente se fosse uma CPI
os Senadores e os Deputados têm esta tribuna, têm a para investigar todas as irregularidades do Banco
imprensa, têm a televisão para denunciar que o Ban- Central, e não só em relação ao Banpará, mas tam-
co Central não está encaminhando os requerimentos bém em relação à conta OAS, conta no City Bank etc.
solicitados pela CPI. Por isso as CPis são instrumen- Vamos ver se realmente vão assinar ou se foi apenas
tos muito mais eficazes, rápidos e com as conseqüên- bravata, falácia ou demonstração de cinismo por par-
cias e os resultados que estamos vendo agora: os te daqueles que acusam os outros, mas que não que-
acusados, com provas substanciais, de vinculação rem realmente que sejam investigadas suas acusa-
com a malfadada obra do TRT de São Paulo, estãona ções, porque têm medo de que as acusações que
cadeia. O MinistérioPúblico, com base nos documen- eles fazem acabem voltando para eles próprios.
tos conseguidos pela CPI e nas provas apura das pela É, porlanto, obrigação do Congresso Nacional
CPI, de forma muito competente. pediu a prisão pre- fazer essa investigação.
Era. Sr. Presidente, Sr"s e Srs. Senadores, o co- 214
José Eduardo Dutra- 15-03-2001
215
Ademir Andrade -15-03-2001
O SR. ADEMIR ANDRADE (PSB - PA. Como entender a sinceridade daqueles que, efetivamente.
Líder. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do denunciam com coragem de apurar ou apenas de-
orador.) - Sr. Presidente, Sr"s e Srs. Senadores, nunciam para dividir espaços no âmbito do poder,
como Liderdo Partido Socialista Brasileiro, tenho par- mas não querem apurar nada.
ticipado ativamente de todos os entendimentos como V. Ex" tem toda a razão, Senador José Eduardo
PT, com o PDT, com o PCdoB, com o PPS, com o PL, Dutra, e tenho dito aqui: os Poderes constituídos des-
que também se comprometeu a assinar a CP I. Aliás, te País não têm chegado a lugar algum, como tam-
Senador José Eduardo Dutra, já ouvi dizer que o PL bém não têm colocado ninguém na cadeia. Os la-
está mudando de posição, está vottando para o Go- drões estão aí. Os Bancos faliram, foram socorridos
verno. Ouvi esse comentário hoje de uma liderança pelo Proer, e ninguém foi preso - apesar de o Presi-
expressiva do PSDB, que o Presidente Fernando dente ter dito que colocaria os infratores na cadeia. A
Henrique Cardoso, através do oferecimento de car- Justiça não funciona no território nacional. O Poder
gos, estaria cooptando, trazendo para as suas hastes Judiciário não funciona no Brasil, até pelas leis que
também o PL, que, nos últimos sete ou oito meses, são aprovadas -também nos culpam por essas leis
tem estado ao lado da Oposição, tem estado numa que favorecem os crimes do colarinho branco, que
posição de independência com relação ao Governo permitem que esses ladrões fiquem fora das cadeias
do Presidente Fernando Henrique Cardoso. -. pelas dificuldades de legislação. Cada juiz interpre-
O SR. PRESIDENTE (Edison Lobão)-Senador ta a lei como acredita que deve. O fato concre to é que
Ademir Andrade, peço pennissão a V. Ex" para inter- nenhum Poder funciona neste País, nem a promoto-
rompê-lo e dizer que, na verdade, houve uma divisão ria. Enfim, não conheço um Poder que funcione a con-
do tempo entre V. Ex" e o Senador José Eduardo Du- tento, no sentido de fazer justiça como deve ser feita.
tra.
Portanto, as CPis e, acima delas, Senador José
A nossa sessão, como sabe V. EX", que foi Vi- Eduardo Dutra, a imprensa nacional que colocaram
ce-Presidente da Casa, se encerrará ãs 14 horas. determinadas pessoas na cadeia. É o poder da im-
Então, comunico a V. Ex" que terá ainde 1 O minutos prensa, é o poder da opinião pública- que também
para concluir a sua oração. assimila aquilo que a imprensa divulga- que fazem
O SR. ADEMIR ANDRADE (PSB - PA) - Agra- com que cheguemos aos fatos e, conseqüentemente,
deço a V. Ex". que haja uma ação do Governo, uma atuação dos Po-
Quero entender agora, Senador José Eduardo deres constituídos, no sentido de mandarem alguns
Dutra, a sinceridade dos que aqui fazem denúncias. ladrões para a cadeia. No entanto, em geral, essa rea-
Essa é a hora da verdade. Deixamos de lado a CP! ção tem partido da CPI, que tem uma ampla cobertu-
antiga, que havíamos proposto no ano passado, esta- ra da imprensa e, portanto, uma certa conseqüência.
mos propondo uma nova CPI, extremamente ampla, Portanto, os Senadores, os Deputados Federais
englobando todas as denúncias que estão sendo fei- têm o dever, têm a obrigação, se forem honestos, se
tas, inclusive pela base do Governo. Não se pode ne- forem corretos, se forem direitos, se quiserem real-
gar a existência de fatos determinados, exigidos pela mente que os fatos sejam apurados, se não tiverem
Constituição Federal para a criação de uma Comis-
nada a esconder, de assinar esse requerimento pe-
são Parlamentar de Inquérito. Agora quero ver a sin- dindo a criação CP!, de fazer com que ela se instale e
ceridade daqueles que aqui fizeram denúncias, tanto funcione. E isso não é traição aos interesses da Pá-
de um lado quanto do outro, tanto do lado do PMDB
tria, não é prejudicar a economia brasileira, como di-
quanto do PFL. A proposta de criação de uma CP! zia o próprio Presidente Fernando Henrique Cardoso,
está aí, engloba fatos que já havíamos levantado no
tantas vezes citado aqui por V. Ex". É pena que Sua
passado e fatos novos de acusações trazidas pelo
Excelência mude tanto.
PMDB a Ministros, a dirigentes políticos do PFL, e
acusações trazidas por dirigentes do PFL a Ministros Espero que sejamos vítoliosos nessa luta, por-
e a dirigentes de estatais ou empresas de economia que é isso que interessa à sociedade brasileira.
mista comandadas pelo PMDB. Agora, quero ver Quero, rapidamente, tratar de duas questões,
onde está a sinceridade daqueles que aqui fiZeram as antes de encerrar o meu pronunciamento. Primeiro,
denúncias. O requerimento de criação da CP! está aí. Sr. Presidente, quero dar ciência à Casa de que está
Hoje, houve uma fila de Deputados para assinarem assumindo hoje, dia 15 de março, às 16 horas e 30
esse requerimento. Não sei quantas assinaturas já fo- minutos, no Auditório Emmo Ribas, na sede do Minis-
ram colhidas. Vou saber agora. A opinião pública vai tério da Saúde, a nova diretoria da União Nacional 216
Ademir Andrade -15-03-2001
dos Auditores do SUS. Trata-se de um grupo de aproxi- absolutamente nade. Agora quer vender as hidrelétri-
madamente 800 fi.Jncionários, que fiscaliza a aplicação cas brasileiras. E o interessante é que ele vende com
de recursos da ordem de R$21 ,5 bilhões no setor de sa- todas as facilidades, com financiamento de recursos
úde em nosso Pais. Eles tiveram algumas difiCUldades do BNDES, com a-éditos subsidiados- como socar-
até mesmo neste Govemo,porque houve enfraqueci- reu os banqueiros com o Proer -,mas é interessante
mento do seu trabalho e aumento de prestígio das fisca- que o Governo não vende aquilo que realmente deve-
Jizações dos Estados, onde se faz muita polltica com o ria vender, ou seja, as empresas do Governo que dão
Sistema Único de Saúde. Aliás, destina-se muito mais prejulzo. E trago um oficio inusitado, inacreditável, do
dinheiro a favor do setor privado do que do setor público. administrador da Usina Pacal, no Estado do Pará.
O setor privado recebe a grande maioria de recursos Essa é uma usina para produção de açúcar e de álco-
destinados à saúde no nosso Pais. oi, que foi instalada na Transamazônica, no Município
de Medicilândia, há cerca de 20 anos, ainda no regi-
Esses companheirosque estão assumindo hoje
me militar, para estimular os produtores da região a
têm tido, nesta Casa, o meu apoio e do Senador Tião
esse tipo de industrialização; foi uma indústria banca-
Viana; têm tido a consideração do próprio Ministro
da pelo Governo. Os produtores foram alocados para
José Serra que atendeu aos nossos apalos e com pre-
lá para produzirem cana e há 20 anos estão Já traba-
endeu alguns erros que estavam sendo cometidos na
lhando e produzindo.
remontagem da sua estrutura. S. Ex" nos atendeu e
que espero continue reforçando esse trabalho. Agora, recentemente, o Sr. Hercllio Auto Neto
manda um ofício ao Sr. Eduardo Felizardo, que é o
Aliás, tenho considerações favoráveis à atuação Presidente da Associação dos Produtores. Sr. Pres~
do Ministro José Serra frente ao Ministério da Saúde. dente, veja o absurdo:
Elogio a sua atitude com relação à fabricação dos remé-
dios contra AIDS, a sua atitude a favor dos genéricos, a Comunicamos que o Conselho Diretor
sua atitude e a sua defesa no sentido de proibir a propa- do INCRA decidiu pela desativação do
ganda do fi.Jmo em nosso Pais e espero que, em breve, PACAL a partir do dia 20 de dezembro de
o nosso Congresso Nacional possa também proibira 2000, nos termos da Resolução n° 11, de 24
propaganda de bebidas alcóolicas. Essas são coisas de março de 2000, publicada no Diário Ofi-
que os palses civilizados do mundo não permitem, e o cial da União de 5 de abril de 2000.
Brasil não pode permanecer atrasado diante da ganân- Afiançamos que a safra 200012001
cia dessas indústrias que se preocupam muito pouco será a última administrada e gerenciada
com a saúde do povo, mas muito mais com seus lu- pela Autarquia.
cros e com as suas necessidades.
Portanto, o lna-a não tem interesse em
Portanto, creio que o Ministro José Serra tem
prosseguir com futuras moagens de ca-
contribuído para transformações extremamente im-
na-de-açúcar ou qualqueratividadereferente
portantes nesse campo que comanda, como as que ao empreendimentoPACAL, mantidaapenas
citei aqui, entre outras atitudes. Inclusive, pretendo
a comercialização de produtos e guarda e
estar presente na posse dos companheiros hoje, que conservação dos bens patrimoniais.
têm ainda, reivindicações a serem feitas. Sem mais, aproveito a oportunidade
Sr. Presidente, quero que sejam dadas como li-
para apresentar~hes protestos de elevada
das as reivindicações da categoria. estima e distinta consideração.
Finalizando, tratarei do assunto que realmente
O SR. PRESIDENTE(Edi son Lobão)- Peço a V.
me trouxe à tribuna, que é a permanente incoerência
Ex" que conclua o seu discurso, pois estamos no final
do Governo Fernando Henrique, que passo a de-
do expediente.
monstrar de maneira bastante clara.
Este é um Governo que vende tudo: já vendeu o
O SR. ADEMIR ANDRADE (PSB - PA) -Vou
sistema de telecomunicações, as mineradoras, as si- conduir, Sr. Presidente.
derúrgicas, todo o sistema de fornecimento de ener- O que entendemos como absurdo é uma deci-
gia dos Estados brasileiros, exceto os do Amapá e são como essa, sem dizer o que os produtores vão fa-
Paraná -talvez de dois ou três Estados ainda não te- zer, sem definir que indenizações serão pagas, sem
nham sido vendidos-, os bancos de todos Estados definir que tipo de ajuda eles dão para que os produ-
brasileiros. E tudo isso a troco de nada, porque o di- tores passem, em vez de plantar cana, a plantar ca-
nheiro que pegou por essas vendas não serviu para cau, café, ou outro tipo de produto. O que vai fazer 217
com a usina? Então, veja bem, o Governo não canse-
Ademir Andrade-15-03-2001
218
José Alencar- 22-03-2001
O SR. JOSÉ ALENCAR (PMDB - MG) - Sr. Não é difícil imaginar uma cena em que fique re-
Presidente, Sr"s. e Srs.Senadores, a sabedoria popu- tratado esse estado de espírito agoniado.
lar- este "saber de experiências feito" na lfrica defini- O chefe de família laborioso que tanto se esfor-
ção camoniana -representa um suporte permanente ça por desempenhar a contento seu papel na vida co-
e precioso na ação parlamentar. munitária, se pergunta, várias vezes, o que anda
Conhecer o que a gente do povo pensa, o que a acontecendo. Por que razão os seus problemas do
gente do povo sente e diz é importante. cotidiano, afetos à administração pública, encontram
É imprescindível, para o polltico verdadeiramen- tantos embaraços e dificuldades de solução?
te compenetrado de sua missão. O chefe de família começa, então, a fazer asso-
Em meus contatos habituais com a minha gen- ciações das questões insolúveis que o atormentam
te, com os meus coestaduanos de Minas Gerais, re- com os nomes de personagens ilustres da vida públi-
colho sempre inspirações provettosas para o trabalho ca, pessoas que freqüentam o seu apreço e admira-
que me cabe desenvolver no Senado da Repoolica. ção, pessoas em quem votou com entusiasmo e que
estão sendo apontadas, talvez inJUStamente, em de-
Procuro manter-me atualizado com relação aos
núncias e acusações sér(as.
sentimentos e aspirações populares autênticos e ge-
O dilema se instala. E verdade o que está sendo
nuínos. divulgado? É mentira?
Sei não estar trazendo novidade nenhuma à
consideraçãode meus pares, quando faço este regis- No mais das vezes, na troca áspera de palavras,
no fogo cruzado das críticas e das respostas às críti-
tro acerca da atenção que o homem comum dispensa
cas, que ele acompanha na mídia, essas indagações
costumeiramente aos acontecimentos da vida pública
permanecem sem respostas.
nacional. Acontecimentos, muitas vezes, em seu en-
tendimento, de complexa interpretação,mas que aca- O chefe de família não entende que denúncias
bam por influenciar e afetar, de um jetto ou de outro, a tão graves sejam lançadas sem os conseqüentes
sua rotina de vida. desdobramentos. Sem uma elucidação cabal e com-
pleta dos fatos.
Essas percepções de como funciona o senti-
mento das ruas, não passam, de modo algum, des- Ele não aventura juízos prévios de valor. Não
entra, na maior parte dos casos, no mérrto da questão
percebidas, tenho certeza, aos ilustres senadores.
publicamente e calorosamente discutida.
Se dou ênfase ao óbvio é para proclamar que a
O que mais desconforto lhe traz é perceber que
intuição popular é poderosa e não falha. E que não
as denúncias ficam sokas no ar.
podemos nunca, na atividade poolica, nos esquecer
O nosso chefe de família é um homem de bem.
disso.
Cultiva o senso de justiça. Vive, por esse motivo,sen-
Ignorar a intuição popular é erro. Erro punido sação de mal-estar ao supor possa ser falsa ou impro-
pela história, como tantas vezes já se viu. cedente a acusação envolvendo político que aplaude
Estou retomando de uma série ampla de conta- e admira, político em quem sempre votou.
tos com amigos, com elertores, com gente do povo de E, aí, ele indaga: porque não levar as apurações
todos os segmentos sociais. Trago desses contatos do fato, de todos os fatos denunciados, até as conse-
uma certeira convicção. qüências derradeiras, até o esclarecimento definttivo
A perplexidade é geral. e cabal de tudo?
De espanto em espanto, provocade pelo noticiá- A simplicidade do raciocínio traz a assinatura da
rio desconcertante do día-a-dia, a opinião poolica bra- genuína sabedoria popular.
sileira está possuída hoje de muna perplexidade. A perplexidade das pessoas comuns, nascidas
dessa avalancha de denúncias que invade a nossa
São ocorrências perturbadoras, pode-se afir- mídia e as nossas tribunas, só tende a crescer e
mar, diárias. As manchetes se ocupam, o tempo todo,
transformar-se numa reação mais contundente, caso
de denúncias, de escândalos, de malversações do di-
sejam interceptadas as iniciativas de apuração e elu -
nheiro público, de acusações graves.
cidação dos fatos.
Isso chega até o cidadão do povo, a dona de
Chegamos a um momento na vida brasileira em
casa, o lavrador, o operário, com um impacto estron- que vacilações e hesitações, quanto aos rumos a se-
doso. rem assumidos por nós, não vão ser toleradas, nem
Desencadeia, no espírito de cada um, estranhe- 219
za, indignação, dúvida, frustração.
José Alencar- 22-03-2001
O SR. JOSÉ EDUARDO DUTRA (Bioco/PT - O Senador Jader Barbalho disse que,se for feito
SE. Como líder. Sem revisão do orador.)- Sr. Presi- o adttamento, vai assiná-lo. No entanto, a simples as-
dente, Sr"s e Srs. Senadores, não ouvi todo o pronun- sinatura do Senador Jader Barbalho, individualmente,
ciamento do Senador Jader Barbalho, Presidente do mesmo que modifiquemos o requerimento, não viabi-
Congresso Nacional, mas acredito que tenha ouvido liza a instalação da CP I. Caso se trate de um movi-
a parte mais importante, que foi a sua conclusão. mento político no sentido de viabilizar a CPI, nós !are-
Penso que poderemos, Sr. Presidente, agora, mos todo e qualquer aditamento .Todos os pontos que
colocar em prática aquela proposta que fiz logo após foram levantados pelo Senador Jader Barbalho na Iri-
a sessão em que o Senador Antonio Carlos Maga- buna têm a nossa concordância; nós os incluímos
lhães apresentou uma série de requerimentos de in- desde já Entretanto, queremos saber concretamente
vestigação e foi sucadido na tribuna pelo Senador Re- se esse aditamento vai viabilizar a instalação da CP I,
nan Calheiros, que, por sua vez, também apresentou porque ela só será viabilizada com a assinatura de 27
uma série de requerimentos, de auditorias. Naquela Senadores e 171 Deputados. Com ou sem aditamen-
oportunidade, eu disse que, para não ficar parecendo to, essas assinaturas são necessárias. A Oposição
para a opinião pública que se tratava apanas de um sozinha -lodo mundo sabe disso; essa é uma ques-
jogo de cena, nós nos disporlamos, juntamente com tão de aritmética- não tem 27 Senadores e 171 De-
as Lideranças de todos os Partidos com assento nesta putados. Nós precisamos do apoio de Senadores do
Casa, a formular um requerimento consensual para a PMDB, do PFL e do PSDB.
instalação de uma Comissão Parlamentar de lnqué- Então, se 0 Senador Renan Calheiros, como u-
rtto que pudesse investigar todas as denúncias que der da Bancada, informar aqui e agora que esse adi-
estavam sendo feitas não só da tribuna desta Casa, lamento proposto pelo Senador Jader Barbalho, Pre-
como pela imprensa. Infelizmente, naquele momento, sidente do PMDB e do Congresso, significará que os
as lideranças fizeram ouvidos de mercador. Senadores do PMDB irão assinar o requerimento,
Os líderes da Oposição se reuniram e formula- nós faremos a modificação imediatamente. Peço a
ram um requerimento para a instalação da CP I. Já es- parte escrita ao Senador Jader Barbalho. para que a
távamos - e estamos - coletando assinaturas para anexemos ao requerimento e possamos já coletar as
que seja instalada uma CPI mista na Câmara e no Se- assinaturas.
nado.
Como dissemos desde o início, queremos inves-
0 Senador Jader Barbalho apresenta uma su- tigartodas as denúncias que estão sendo feitas. Não
gestão de adttamento a esse requerimento. Tenho temos aliança preferencial com ninguém neste mo-
certeza de que todos os Líderes da Oposição no Se- menta. A nossa aliança preferencial é com a ética na
nado nada terão a opor a esse aditamento. Nós nos polttica e com a apuração de todas as denúncias de
propomos a fazê-lo. Acredito, inclusive, que esse adi- corrupção que têm surgido neste momento. Essa é a
lamento não significará a retirada de nenhuma das posição da Liderança do Bloco de Oposição, Sr. Pre-
assinaturas já apostas no requerimento- talvez pos- si dente.
sa haver problema na Câmara dos Deputados, mas
creio que, se isso acontecer, poderemos contorná~ o. O Senador Ja~er Ba:balho já me entregou o adi-
Gostaria, no entanto, de perguntar ao Líder do PMDB, lamento. Vou anexa-lo e Ja vou começar a coletar as
Senador Renan Calheiros, se esse aditamento significará assinaturas dos Senadores que se dispõem a fazê-lo.
que os Senadores do PMDB irão apoiar a instalação da Muito obrigado.
CPL Espero que esse não seja apenas mais um jogo de
cena.
O fato concreto é que o Senador Antonio Canos
Magalhães- S. Ex" não está aqui presente, mas vou
citar um fato- já assinou o requerimento de instala-
ção da CPI. mas, até o momento, tanto no Senado,
quanto na Câmara dos Deputados, os aliados de S.
Ex" ainda não o assinaram.
221
Jáder Barbalho- 21-03-2001
224
Edison Lobão- 27~3-2001
O SR. EDISON LOBÃO (PFL - MA. Pronuncia o Casa, que elas sejam apuradas, que elas sejam sa-
seguinte discurso.)- Sr. Presidente, Srs. Senadores, nadas. Mas, pura e simplesmente, extinguir os órgãos
não era meu propósito falar, hoje, sobre a questão da que promovem o desenvolvimento do Nordeste e da
Sudene. Mas entendo que, em verdade, trata-se de Amazônia, não nos leva a lugar nenhum, a não ser ao
um problema que ou nós enfrentamos com disposi- desespero dos nortistas e ao desespero dos nordesti-
ção, com determinação, com obstinação, como tem nos.
feito o Senador Carlos Wilson e tantos outros compa-
O Sr. Gilberto Mestrinho (PMDB- Alv1) - Per-
nheiros neste plenário, ou poderemos ter uma surpre-
mrte-me V. Ex" um aparte?
sa desagradável com a extinção da Sudene.
Em 1978, fui eleito Deputado Federal e, no ano O SR. EDISON LOBÃO (PFL- MA) - Com todo
seguinte, até por proposta do Deputado Manoel No- prazer, ilustre representante do Amazonas.
vaes, da Bahia, organizamos um simpósio na Câmara O Sr. Gilberto Mestrinho (PMDB- AM) - No-
dos Deputados para estudar o problema do Nordeste. bre Senador Lobão, tenho assistido, até com certa in-
Durante um ano, ouvimos governadores, autori- compreensão, o que se discute aqui em relação a es-
dades, ministros de Estado, cientistas, na tentativa de ses órgãos em desenvolvimento. Falam em supostos
encontrar uma solução que nos encaminhasse a um escândalos, desvios, fraudes e na extinção desses
destino melhor no que diz respeito ao Nordeste. órgãos. Não levam em conta que, na investigação,
F ui o Relator desse simpósio. Elaboramos um dos 558 projetos aprovados, por exemplo, pela Su-
relatório que se compunha de 30 itens sucintos. E le- dam, foram encontradas irregularidades em apenas
vamos esse relatório ao Presidente da Repl1:llica. O 29, num total de R$108 milhões. Que se apure, que se
Presidente convocou o seu Ministério para ouvir a lei- adotem as providências! Li, no domingo, em O Globo
tura do relatório no Palácio do Planalto. Ao final da le~ que, na Sudene, há irregularidades que chegam a
tura, com láglimas nos olhos, apiedado do que aconte- R$1 ,4 bilhão. Mas não se diz que o problema nesses
ce no Nordeste brasileiro ainda hoje, muito mais ainda órgãos é de gestão. Faz-se uma carga contra a Su-
àquela época, Sua Excelência determinou aos seus dam porque, no último ano, dois superintendentes fo-
Ministros que, desde logo, fossem adotadas pelo me - ram supostamente indicados pelo Senador Jader
nos 25 medidas das 30 que havíamos sugerido. Barbalho. Nesse período, em que também houve irre-
E quase todas aquelas madidas se endereça- gularidades na Sudene, foram indicados vários dirí·
vam ao fortalecimento da Sudene, como um instru- gentes do órgão e acredito que eles não foram indica-
mento válido para a promoção do desenvolvimento dos pelo Espírito Santo. Não estou fazendo nenhuma
do Nordeste brasileiro. acusação a eles, mesmo porque o processo de ges-
tão é muito diversificado, espalhado, envolveria vários
Para surpresa nossa, Sr. Presidente, nada, ab-
órgãos para que se apurasse efetivamente o que está
solutamente nada, foi feito àquela ocasião. Nenhuma
providência se tomou que pudesse contribuir para o certo e o que está errado. Não se diz também que, co-
fortalecimento da Superintendência do Nordeste ou meçados os incentivos, eles eram de 50% e hoje es-
para a salvação do Nordeste brasileiro. tão reduzidos a 18% e não são obrigatórios, mas fa-
cuttativos, na opção das pessoas jurídicas dedaran-
Sr. Presidente, houve um tempo em que os nor-
tes do imposto de renda. Nem sempre o Ministério da
destinos se juntavam para lutar unidos, desprezando
Fazenda libera os recursos para esses órgãos. Quan-
as livalidades pelas causas de sua região. Vi isso mu-
do os libera é com atraso. E não se leva em conta tam-
ito na Câmara dos Deputados e também no Senado
bém que esses órgãos são responsáveis pelas isen-
Federal, com resultados positivos sempre. De um cer-
ções do imposto de renda para os empreendimentos
to tempo a esta parte, temos negligenciado dessa
implantados na região com ou sem apoio da Sudene
luta, dividindo-nos quando, na verdade,deveríamos
nos unir para que pudéssemos ter êxito. ou da Sudam, que o imposto de renda agora é pago
mensalmente e que as empresas têm processos nes-
A união faz a força, todos sabemos. E a divisão
ses órgãos e estão sendo penalizadas. Por quê? Por
nos enfraquece. Deveríamos nos unir, como fazem os
que se levanta uma celeuma, não se adotam provi-
nossos irmãos do sul do País, nessa luta contra a ex- dênCias e se procura a forma simplista da extinção
tinção da Sudene e, muito mais do que isso, contra
dos órgãos, como aquele marido enganado que tira o
tudo que possa prejudicar não apenas o Nordeste,
sofá da sala. Não está correto. Somos contra e acha-
mas a Amazônia e o Norte do nosso País, que estão
mos que devemos apurar as irregularidades- se hou-
interligados. Se há irregularidades, como disse o Se-
ver- e adotar os meios legais para as penalizações 225
nador Carlos Wilson e tantos outros oradores nesta
possíveis, mas esses órgãos devemc ontinuar existin-
Edison Lobão- 27.03-2001
do. porque são importantes para o Nordeste e para a desses quatro governadores. que falaram sobre os
Amazônia. Mesmo porque essas regiões só recebem problemas da Sudene - sendo que V. EX", além de
- quando recebem- esses beneficios. Se verificar- ex-Governador, foi o Relator do simpósio que se pro-
mos a aplicação dos recursos federais, constatare- punha à reforrnulação da Sudene? O que se ouviu é a
mos que eles são aplicados nas Regiões Sul e Su- verdade. Toda a agência de desenvolvimento, pelas
deste. O resto é o resto. A concentração é terrlvel em modificações que ela mesma provoca por sua ação
todos os aspectos. Assim, V. EX" faz muno bem em se no território em que opera, precisa modificar-se. Ela
pronunciar, para mostrar ao Brasil que a solução não não pode ser extinta. Tem que ser modificada, tem
é extinguir esses órgãos, mas modernizar a gestão e que passar por variações no seu modo de agir. O que
fazer com que o sistema de fiscalização seja correto e se propõe, na verdade, é uma punição ao Nordeste.
envolva órgãos como a Receita Federal. Leio nos jor- Diante de possíveis irregularidadesque tenham ocor-
nais matéria intitulada 'Notas Frias". Quem apura as rido, em vez de se punir os responsáveis pelas irregu-
notas frias é a Receita Federal. É ela que tem essa laridades, não; pune-se todo o povo do Nordeste.
atribuição. Com relação aos proprietários de terras. O Sr. Gilberto Mestrinho (PMDB - AM) - O
são os órgãos responsáveis que cuidam do patrimô- povo da Amazônia também.
nio. Assim, Senador Edison Lobão, é lamentável!
Mais lamentável ainda é que haja dois pesos e duas O Sr. Gerson Camata (PMDB - ES) - E tam-
medidas. Em relação ã Sudam, dizem: "Vamos aca- bém da Amazônia, por meio da Sudam. Quer dizer,
bar logo com a Sudam", porque parece ser o"patinho agem ao contrário. Em vez de se punir o pecador,
feio" do processo. Em relação à Sudene: "Ah, vamos pune-se o território onde o pecador cometeu o peca-
fortalecer a Sudene"! Não! Devemos fortalecer as do. Seria, assim, uma Sodoma e Gomorra. É como se
duas, porque ambas são importantes para essa re- quisessem transformar o Nordeste numa Sodoma e
gião abandonada do Pais. Cumprimento V. Ex" e me Gomorra bíblicas. Portanto, temos que lutar para tra-
alio à sua luta, juntamente com o Senador Bernardo zer para esta Casa a experiência desses que foram
Cabral, que é solidário na defesa desses dois órgãos. Governadores. Vimos a importância que o ex-Gover-
Muno obrigado. nador Ca~os Wilson deu à Sudene, quando se referiu
à ida dos Governadores na época; a presença dos
O SR. EDISON LOBÃO (PFL - MA) -Senado- Governadores, direcionando toda a ação administrati-
res Gilberto Mestrinho e Bernardo Cabral, nenhum de
va e até a ação corretiva sobre a economia praticada
nós defende irregularidades onde quer que elas pos-
pela Sudene. Um costume que desapareceu e. com
sam existir. Mas não será em seu nome que devere-
ele, o prestigio e aforça da Sudene. É interessante di-
mos tomar decisões erradas, equivocadas, revolucio- zer - porque ouvi isso aqui mesmo, e V. Ex" sabe dis-
nárias, no sentido da destruição inútil daquilo que, de so; são números que o comprovam- que somente o
algum modo, tem prestado relevantes serviços.
saneamento do Banespa, em São Paulo, e o giro da
Às vezes, pergunto-me o que seria do Nordeste dívida da prefeitura de São Paulo e do Govemo do
brasileiro se não tivesse havido a Sudene? O que se - Estado de São Paulo consumiram o dobro dos recur-
ria da Região Amazônica se não tivesse existido a Su- sos da União em relação a tudo aquilo que foi dado
dam e, antes dela, um outro órgão de desenvolvimen- aos Estados do Nordeste por meio da Sudene em 50
to? anos. Veja V. Ex": o Estado mais rico do Brasil absor-
Portanto, o que precisamos fazer, com a tecno- veu mais recursos do que toda a região do Nordeste,
logia da qual dispomos é modernizar esses instru- durante 50 anos, por intermédiodaSudene. Esses fa-
mentos de ação, de desenvolvimentoe procurar colo- tos devem ser objeto de meditação. Ora, se o Estado
cá-los a serviço benigno da população das nossas re- mais rico mereceu isso, por que as regiões maís po-
giões mais carentes. bres do Brasil não merecem, talvez, quatro vezes
O Sr. Gerson Camata(PMDB - ES) - V. Ex" me mais? Essa observação que deve ser feita. Quero
permne um aparte? • cumprimentar V. Ex", os oradores que o antecederam
O SR EDISON LOBAO(PFL -MA)- Concedo e parabenizar o Senador Gilberto Mestrinho pelo seu
um aparte ao Senador Gerson Camata. aparte, dizendo: é questão de honra daqueles que, no
Senado, representam as Unidades Federativas brigar
O Sr. Gerson Camata(PMDB- ES)- Senador
para que a Sudene seja conservada, seja melhorada.
Vice-Presidente desta Casa, Edison Lobão, ouvimos
até em beneficio da conservação da República Fede-
aqui quatro ex-Governadores: V. EX", o Governador rativa, que é o Brasil; a fim de que não desapareça do
Carlos Wilson, o Governador Gilberto Mestrinho e o 226
mapa a República Federativa que temos a obrigação
Governador Geraldo Melo. E o que depreendemos
Edison lobão- 27.03-2001
De defender por delegação dos nossos eleitores. Mui- Regiões. Concordo com V.Ex" que devemos procurar
to obrigado. contribuir com o Ministro para encontrar essa moder-
O SR. EDISON LOBÃO(PFL- MA)- Agradeço nização, mas não permitindo, em hipótese alguma,
muito a V. Ex" pelo aparte. que se anulem, que sejam extintos esses instrumen-
Quanto a SãoPaulo, devo acrescentar o seguin- tos de desenvolvimento que têm a Região Norte e a
te: será que alguém de nós, aqui, deseja o mal dos Região Nordeste do Pais. Solidarizo-me com V. Ex•
paulistas? Não. Ao contrário, nós nos orgulhamos de nessa luta.
São Paulo. Mas é justa a diferença de tratamento que O SR EDISON LOBÃO (PFL- MA) -Recolho a
a União Federal dispensa a São Paulo e às demais opinião de V. Ex" como sendo mais uma voz ex pres si-
Regiões do Pais? Não é justo. Definrtivamente, não se va em favor da nossa região nordestina, que precisa
praticajustíça nessa matéria. tanto de apoio, como este que nos presta o em-Inente
V. Ex• fala em reformulação; pois até a Constrtui- Senador do Tocantins.
ção da República é treqüentemente reformulada para O Sr. Carlos Bezerra (PMDB- M1) - Senador
se adaptar aos interesses da sociedade brasileira e Edison Lobão. V. Ex• me permite um aparte?
ao progresso do mundo moderno. Por que não refor- O SR EDISON LOBÃO (PFL- MA)- Senador
mular, portanto, a Sudene, a Sudam e os demais ór- Carlos Bezerra, com a tolerância do Presiderole, con-
gãos de desenvolvimento, em vez de extingui-los? É cedo-lhe o aparte por um minuto.
isso o que, ao meu ver, deve ser feito.
O Sr. Carlos Bezerra (PMDB- M1) - Senador
O Sr. leomar Quintanilha(PPB- TO)- Permi- Edison Lobão, 60% dos empregos gerados no meu
te-me V. Ex• um aparte? Estado, Mato Grosso, são oriundos de empresas com
O SR EDISON LOBÃO(PFL - MA) - Pois não. incentivo fiscal da Sudam'. A economia industrial
Ouço o Tocantins por intermédio das palavrasde V. mato-grossense, basicamente, está montada sobre
Ex". os incentivos fiscais. Hoje, temos projetos fundamen-
O Sr. leomar Quintanilha(PPB- TO)- Nobre tais, como o da ferrovia e o do gás. Já temos uma usi-
Senador, com muita alegria, tenho a oportunidade de na de gás pronta, aguardando o gás da Bolivia. temos
apartear V. Ex". Eu queria fazê-lo quando o eminente várias usinas hidrelétricas, e, enquanto o Pais está
Senador Carlos Wilson estava na tribuna, defenden- com uma carência enorme de energia, a Sudarn está
do as mesmas questões que V. Ex". Eu não tive a paralisada há nove meses. Agora, assumiu um inter-
oportunidade de ouvir todos os argumentos de S.Ex", ventor que afirmou que somente depois de noventa
embora já os conheça. Ouvi uma parte e tive o privilé- dias poderá pensar em alguma coisa. Isso quer dizer
gio de ouvir os seus argumentos. Quero emprestar que a Sudam ficará paralisada por pelo menos um
toda a minha solidariedade a V. Ex", a minha e a de ano. Isso é um absurdo, é um contra-senso! A Sude-
Tocantins. por meio dos Srs. Senadores Carlos Patro- ne, que não quero criticar, tem muito mais problemas
cínio e Eduardo Siqueira Campos. Como bem disse o que a Sudarn - o jornal O Globo de domingo denun-
nobre Senador Gerson Camata, estamos na região cia um rombo de mais um b~hão naquele órgão, ou
de influência tanto da Sudarn quanto da Sudene, por- seja, dez vezes maior que o da Sudam - e com ela
que os propósitos são os mesmos. São as regiões está tudo bem, ela está funcionando a pleno vapor,
apenadas desse Brasil que precisam se unir, nesse enquanto a Sudam está paralisada. Parabenizo V.Ex"
momento, para não perder um instrumento importan- por que é uma das poucas vozes do Norte que se está
tíssimo e fundamental, que é o estabelecimento do levantando contra essa situação, contra a extinção e
seu processo de desenvolvimento. Continuamos ain- pelo funcionamento da Sudam. Parece que querem
da a assistir o carreamento dos recursos vultosos reinventar a roda. Essa questão já dura um ano, o Mi -
para as Regiões mais ricas, enquanto as nossas con- nistério não apresenta nenhuma solução e aque eu vi
tinuam apenadas, Senador. Estive preocupado com noticiada em Pernambuco é uma piada: querem aca-
essa situação, visitando o Ministro da Integração, bar com o Darf, já especifico. Agora, o empresário vai
também nordestino e que, por certo. comunga com V. aplicar num fundo, pelo art. 5°, e a Sudam ou a Sude-
Ex" as preocupaçõesque tem com a sua Região. Afir- ne vão direcionar esse investimento para onde bem
mou-me o eminente Ministro que a sua preocupação entenderem. Pergunto a V.Ex": que empresário inves-
era de dotar tanto a Região Norte quanto a Região tirá nessa modalidade? Isso é contra a livre iniciativa.
Nordeste de um instrumento mais moderno e eficien- Os grandes empresários do Brasil já não aplicam nos
te para atender aos reclamos tão acentuados dessas incentivos da Sudam e da Sudene. Agora, além dos
grandes, os médios e os pequenos também não vão
227
Edison Lobão- 27-03-2001
228
TEXTO DA DEFESA
Pagu -Rita Lee & Zélia Duncan
1. Introdução
Para iniciar essa apresentação destacamos a música "Pagu" (Rita Lee f
Zélia Ouncan) cantada por Maria Rita. Nela releva-se uma formulação que
engendra um conjunto de provérbios. Provérbios que se sobrepõem, subvertem,
intercalam, renovam e inovam, constituindo sujeitos e sentidos. Mas não
quaisquer provérbios! No que parece um amontoado de provérbios e expressões
dispersas, percebemos o delinear de um conjunto, de uma coletiVidade
determinada e identificada sócio-histórico-ideologicamente: a descrição de um
sujeito feminino que se particulariza dentro de seu próprio gênero. Temos a
Mulher Pagu, e nela a Joana D'arc, a guerreira, a feiticeira, a indignada no
palanque, a porra-louce, Mulher macho sim, senhor!
Já que o delimitar do corpus pede um recorte específico e já que os
provérbios são tão populares e produtivos que aparecem nos mais diferentes
lugares discursivos, escolhemos essa músice como forma de apontar para a
229
diversidade de emprego da enunciação proverbial e para ilustrar sua riqueza de
expressão e produção de sentidos, antes mesmo de afunilarmos o tema e
especificarmos o recorte de nossa pesquisa.
1.2. Do Corpus
O corpus de nossa pesquisa é constituído de enunciados proverbiais,
coletados nos discursos parlamentares, que são publicados na página eletrônica
do Senado Federal, diariamente. Todas as sessões do Senado Federal são
publicadas na Internet no dia seguinte ao que se realizam. Essa publicação diz
respeito a uma ata pormenorizada que traz sumariamente os principais
acontecimentos do Senado, entre estes, decretos legislativos, deliberações,
230
pareceres, comunicados, leitura de requerimentos, aprovação ou veto de projetos
e emendas e, por fim, os discursos proferidos pelos senadores. O intervalo que
definimos como padrão de pesquisa diz respeito ao primeiro semestre do ano de
2001. Foi necessário afunilar o recorte, posto que o temário proposto é
enormemente diversificado, tendo alguns assuntos mais gerais, por exemplo,
homenagens a personalidades e entidades, propostas e projetos diversificados,
questões econômicas, tributárias, políticas de saúde, esporte, ecologia,
desenvolvimento, defesa civil etc; e outros assuntos mais específicos do
momento, por exemplo, o problema da privatização das companhias elétricas do
país (o Apagão), o embargo da carne bovina brasileira no Canadá, e os
escândalos envolvendo denúncias de crimes administrativos no setor público que
trouxe à tona ao cenário brasileiro a prática da CPI (Comissão Par1amentar de
Inquérito) para investigação dessas denúncias.
Selecionamos o tema da CPI. O assunto nos é caro, em princípio, por
constituir-se numa temática polêmica e frutífera para flagrarmos o tipo de
enunciação que queremos observar, e por tratar da questão da verdade, da
investigação da verdade, questão que desenvolveremos e relacionaremos à
proposta de análise dos enunciados proverbiais do discurso político-parlamentar,
que se ancora na produção da verdade e seus possíveis efeitos.
231
Enunciador-colelivo não está restrito apenas aos provérbios, pois abrange
também outros gêneros como: advinha, cantos de torcida de futebol, piadas,
slogans etc. Para Guimarães(2002), sem essa disparidade não pode haver
enunciação. Nessa perspectiva, o autor acrescenta que a cena enunciativa coloca
em jogo, de um lado, os lugares sociais do locutor(locutor-presidente), e de outro,
os lugares de dizer que ele chama de enunciadores e os distingue em individual,
genérico e universal.
Para explorarmos um pouco mais essa discussão, retomamos a relação
feita por Ducrot e Anscombre sobre os provérbios como o reservatório de topói de
uma língua. Assim como há topói contraditórios que apontam para direções
argumentativas opostas, há provérbios que se opõem argumentativamente
("Quem tem boca vai a Roma", "Em boca fechada não entra mosca"). Isto se dá,
entre outras coisas, por que os topói, como os provérbios, representam
coletividades (classes) diferentes de enunciadores que por vezes se opõem. O
provérbio, supostamente sob a égide de uma autoridade indiscutfvel ("a sabedoria
das nações"), se separa, então, da massa dos enunciados genéricos, e se
diferencia graças a sua estrutura impregnada da contingência. (cf. Grésillon &
Maingueneau, op.cit.:113-114).
Gostaríamos de chamar atenção para um trabalho que nos é especialmente
caro. Em "O Discurso - Estrutura ou Acontecimento~ Michel Pêcheux (1983)
analisa o enunciado coletivo político "On a gagné" ['Ganhamos."], que se refere
ao acontecimento de François Mitterand ter ganhado as eleições presidenciais na
França em maio de 1981. Pêcheux traça um percurso através da relação entre os
universos logicamente estabilizados e o das formulações irremediavelmente
equívocas, refletindo sobre a materialidade da língua. o autor deixa claro que ao
analisar um discurso, partimos da interpretação que se coloca, sem deixar de lado
outros lugares de interpretação, pois todo enunciado, toda seqüência de
enunciados é lingüisticamente descritível como uma série (léxico-sintaticamente
determinada) de pontos de deriva possíveis, oferecendo lugar à interpretação. Ele
analisa o enunciado "On a gagné"e a partir dele, as considerações a respeito do
acontecimento, da estrutura, da tensão entre descrição e interpretação no interior
232
da Análise do Discurso (AO)< Por essa via, o autor propõe que analisar a estrutura
enunciativa requer investigar o seu acontecimento, observando o encontro de
uma atualidade e uma memória, num determinado campo discursivo< Pêcheux
mostra que:
233
(1) :>02102101 - Aparte do Sr Jefferson Peres (PDT - AM) no discurso de
Mozarildo Cavalcanti (PFL - RR) > Críticas à ação de algumas ONGs, envolvidas
em irregularidades na compra de terras indígenas no Estado de Roraima.
Cobrança da instalação da CPI das ONGs.
"Complementando, congratukr-me com V &. por haver renovado o
requerimento de criação da CP/, porque está em tempo de se separar o joio do
trigo. EJdstem ONGs realmente sérias, existem ONGs de picaretagem, eJdstem
ONGs a serviço de interesses que não sabemos quais são. Creio que a
Comissão Parlamentar de Inquérito servirá para fazer essa separação e isso será
muito útil para todo o País, mas {X'incipafmente para a nossa Região."
234
representa o dizer de uma certa coletividade. No exemplo (1), reconhecemos uma
passagem bíblica (Eo- Mateus 13, 30 e ss) que inspirou a forma "é tempo de se
separar o joio do trigo" (E 1): uma proverbíalízação que usualmente passou à
condição de provérbio em função das suas próprias condições de produção
(condições sócio-histórico-ideológicas que constituem a estreita relação entre a
forma proverbial e a estrutura metafórica da parábola, bem como o 'tom' autoritário
da verdade religiosa) e que, aliás, é bastante oportuna para ser relacionada à
discussão em questão que envolve a CPI.
No discurso religioso, essa referência já identifica a representação de
diferentes classes referenciais, a classe dos "bons/trigo" e a dos "maus/joio", e
pelo discurso religioso não é tão simples fazer a separação dessas duas classes
referenciais pelo fato desses dois elementos serem muito semelhantes
aparentemente, porém opostos ro sentido de que um (o joio) é daninho e o outro
(o trigo) é abençoado, é o alimento que dá a vida etc. O próprio discurso religioso
faz uso de uma metaforização que opõe diferentes elementos para distinguir
classes. As posições de sujeito que se identificam com essa verdade religiosa se
materializam enunciativamente no enunciado proverbial como Enunciador-coletivo.
o discurso político, que comumente se apodera da verdade religiosa, coaduna-se
com o Enunciador-coletivo desse enunciado proverbial, ressaltando a necessidade
de distinguir as ONGs do "bem/honestas/sérias" daquelas do
"mal/desonestas/irresponsáveis" numa tentativa de se identificar com a classe
do "bem". No caso, temos uma situação política em que há denúncias de crimes
político-administrativos por parte de algumas ONGs, e o locutor-x (locutor-
Senador) representa uma classe político-partidária (o PDT) que (também) se diz
em busca da verdade, propondo, assim, a "separação" entre os "bons" e os
"maus" com a investigação (CPI) das referidas ONGs, de modo que as benesses
de tal "separação" atinjam não só o país como um todo, mas principalmente a
coletividade da sua região (Norte). A própria referência ao "tempo" é amplamente
significativa, pois se na bíblia o trigo cresce junto com o joio e só no tempo certo (o
juizo final) essas classes são separadas, também aqui há o "tempo" certo para
235
promover esta separação do bem o do mal, mas não é preciso esperar pelo juizo
final, basta instalar uma CPI para apurar a verdade!
No exemplo (2), reconhecemos uma típica forma proverbial "fazerouvidos
de mercado!'' que pela própria estrutura já remete-nos a uma determinada classe
referenciaL Se em principio já nos deparamos com a classe dos "mercadores",
também é importante frisar que não se trata de "negócios de mercador', nem de
"palavra de mercador" ou de "idéias de mercador", mas especificamente de
"ouvidos". No imaginário popular, tem-se que o comerciante ou mercador que
normalmente trabalha na feira ou área de livre comércio, tem por princípio não dar
muita atenção ao que escuta, sobretudo, dos fregueses. O mercador para o bem
de seu próprio negócio, para usar outra expressão do mesmo quilate, "faz vista
grossa" para determinadas situações. Mas, apesar do referido enunciado poder
ser usado para identificar o Locutor com a classe dos "mercadores" que precisam
"fazer vista grossa" para se saírem bem em alguma negociação, ele normalmente
(e é o caso aqui) é imputado negativamente à classe oposta da qual o Locutor
quer se afastar e condenar. No caso, o locutor-x pessoalmente propõe a
instalação da CPI para investigação de denúncias e afirma estar disponível,
juntamente com o seu partido (o PT) que à época fazia oposição ao governo (o
PSDB), para ser investigado. No entanto, ele acusa a classe das "Lideranças" de
não darem importância à sua proposta, "fazendo ouvidos de mercador". O locutor-
x permite identificar a classe referencial com a qual o Enunciador-coletivo se
identifica.
Considerando os pressupostos teóricos da AO, podemos observar que os
enunciados que destacarros acima constituem enunciatívamente em sua estrutura
a materialização da exterioridade sócio-histórico- ideológica formalizada na língua
e funcionam (re)produzindo e efetivando sentidos em seu acontecimento
discursivo, de modo que os sentidos e os sujeitos são ressignificados.
Percebemos o movimento e a renovação dos sentidos mesmo aparentemente
presos à cristalização fiXa dos provérbios. A cada enunciado proverbial, temos um
acontecimento significativo que envolve uma memória e uma atualidade,
renovando e (re)produzindo o já dito. O provérbio isolado está engessado
236
semanticamente, é quase um dêitico vazio de sentido, mas na enunciação ele
preenche-se de contingência, e se subjetiva tomando-se um espaço de quebra da
cristalização, um lugar de mudança, de não-homogeneidade.
237
funcionassem pela repetição modelar de uma unidade maior, macro-estrutural:
universal. Foucault percorre esse caminho (caminho em busca da perpétua
universalidade) na contra-mão e, no percurso, faz-nos deparar com a
descontinuidade (limiar, ruptura, corte, desvio, mutação, transformação):
Tal descontinuidade se constituía no estigma da dispersão temporal que o
historiador almejava excluir da história, mas para Foucault, tal dispersão permite
individualizar os domínios. A história contínua faz-se correlata à função fundadora
do sujeito: a segurança de que tudo que se lhe perdeu será devolvido. Segundo
Foucault (1969/2002), para a história das idéias, a diferença, é desequilíbrio, o
desvio é erro ou armadilha: assim, a sagacidade da análise não pode se prender a
ela, mas tentar desfazê-la em prol da perfeita continuidade. A arqueologia do
saber, por outro lado interessa-se pelo que normalmente é considerado obstáculo.
Ela não pretende mascarar as diferenças, mas analisá-las, mostrar em que
1
consistem e 'diferenciá-las' .
1
Conferir M. Foucault, 196912002:195.
238
enunciador do provérbio não pode ser um enunciador-universal, ou um
enunciador-genérico, mas só pode ser um enunciador-coletivo, no sentido de que
a noção de coletivo representa um grau de particularidade (distinção/divisão) em
relação ao Geral, Total, Universal.
O discurso parlamentar é lido e apresenta-se como a voz do representante
do povo, aquela voz que representaria o povo como uma pretensa totalidade. O
discurso político, considerando o conjunto do congresso, produz o simulacro de
unidade de um personagem/sujeito: o representante com ares divinos que porta a
"verdade". A verdade, ética, moral, religiosa, dentífica, jurídica e popular (senso
comum). Pois, por um efeito político/formal, assim como ele simula representar a
universalização das "verdades" de todas as principais instâncias, ele tanto
pretende representar as "verdades" divinas, legais e acadêmicas, como está
obrigado a representar a "verdade" popular ("pelo povo, para o povo e com o
povo"). A voz do povo não tem autoridade científica, mas tem autoridade política
na medida em que elege. É por isso que no discurso parlamentar há que existir a
''verdade" marginal do povo formalizada na língua pelo provérbio, clichê, lugar
comum e expressões idiomáticas. Funciona como um lugar de legitimação do
discurso político. O saber político consiste na produção de uma grande ''verdade"
que se quer universal, produzida a partir de diferentes tipos de ''verdades" que
representam as instâncias mais importantes de poder. Estas fonmas misturam o
dizer do povo com o dizer do seu representante pondo-os oportunamente em
consonância, de modo produzir o simulacro de unidade e o efeito de continuidade
entre o povo e seu representante.
A Comissão Parlamentar de Inquérito diz respeito a um processo para
investigação de denúncias e fraudes dentro do cenário político, com vistas a trazer
à luz a verdade, cumprindo com o papel de publicar os fatos, satisfazendo ao povo
que cobra o aparecimento da verdade, o julgamento dos culpados e a punição dos
erros. Além de tomar-se uma prática na "busca" pela "verdade", a tomou-se
principalmente um mecanismo estratégico de controle público perante o povo,
uma forma de ameaça, de poder de alguns políticos em relação a outros. Como
desconfiávamos, a enunciação proverbial vai estar presente nesses discursos,
239
marcando, sobretudo, o compromisso que os parlamentares têm em reconhecer o
valor do saber popular, da "verdade" do povo. Vejamos o exemplo abaixo:
240
Esta relação/implicação é enfatizada tanto na citação do conhecido
provérbio bíblico (a - "conhecerás a verdade e a verdade vos libertará"), como na
proverbialização (b- "Quebrem o sigilo do Sr Eduardo Jorge em 1994 e 1998 e
chegarão à verdade"). Os enunciados proverbiais que destacamos possuem uma
simulada relação de implicação lógica (SE... ENTÃO ... ) formalizada
gramaticalmente na língua e imposta no discurso. Mas, essa implicação não é
lógica e sim ideológica, pois é determinada sócio-histórico-ideologicamente. Como
a Gramática busca impor a lógica à língua, contemplando tal relação por si só
como suficiente para explicar os processos sintáticos e semânticos da língua, ela
deixa de fora as relações exteriores, histórico-ideológicas, o que acaba por
provocar algumas lacunas quando se faz uma análise mais critica desses
processos lingüístico-gramaticais. Percebemos na relação entre memória e
atualidade, a ruptura da cristalização proverbial. Tanto pela própria citação que na
formulação é relacionada implicalivamente a questões determinadas, como pela
proverbialização que já se desloca formalmente da cristalização constituindo
novos sujeitos e sentidos.
241
enunciação (Benveniste), ou é visto como enunciado sem Locutor (Ducrot). Para
nós a fonma proverbial não se limita à sua estrutura fixa, mas, essencialmente, às
possibilidades de paráfrase, alteração, subversão, proverbialização,
marginalização ... de seu acontecimento enunciativo. Como é possível chamar de
estático, de cristalizado um gênero efetivamente tão vivo e produtivo? Nesse
sentido, percebemos o deslocamento de um lugar de "estaticidade" para um
espaço de movimento, de mudança: movimento e mudança de sentidos e sujeitos.
A partir daí centralizamos nosso olhar teórico sobre enunciação proverbial,
especificamente no discurso político-parlamentar, e tentamos resgatar a sua
materialidade enunciativa e discursiva para dentro da análise lingüística.
Destacamos, por exemplo, a polifonia enunciativa que povoa o discurso político-
parlamentar e em que ecoam vozes pertencentes às instâncias do Jurídico,
Religioso, Científico e Popular materialmente fonmalizadas na estrutura proverbial.
Abordamos também a divisão do Locutor na cena enunciativa (Guimarães) e,
nesse funcionamento, destacamos a enunciação proverbial como uma enunciação
essencialmente coletiva, sobrelevada pela sua materialidade profundamente
opaca e equívoca. Centralizamos a constituição dos sentidos (re)produzidos nesse
funcionamento enunciativo, cujo movimento duplo de aproximação/distanciamento
do Locutor se caracteriza por uma tensão I confusão entre o individual e o coletivo,
sem que se finme um limite entre um e outro.
Na relação que abordamos entre o discurso político-parlamentar e a
enunciação proverbial interessou-nos, ainda, atrelar tal relação à produção de
efeitos de verdade: as fonmas institucionais da verdade e as formas populares da
verdade (Foucault). Mesmo em sua "marginalidade", o Provérbio está intrincado
com a verdade. Ele tem um funcionamento discursivo autoritário, pois é um
recurso retórico e ideológico de autorização e por isso muitas vezes passa por
uma verdade comumente aceita. Nesse sentido, enfatizamos que um dos efeitos
do Discurso polftico-par1amentar é produzir o simulacro de unidade do povo e
construir a imagem de um representante popular que está comprometido com a
"Verdade": ética, moral, relígiose, científica, jurídica e principalmente a popular que
é a voz do povo (portanto, a de Deus). A enunciação proverbial materializa
242
formalmente essa verdade do povo que deve ser veiculada pelo seu representante
público. O tema da CPI nos propiciou uma feliz relação entre a enunciação
proverbial, o discurso político-parlamentar e a produção de efeitos de verdade.
Para nós a estrutura implicativa do provérbio (quando este a possui),
somente lhe confere uma simulação de implicação lógica. Na verdade, ele está
impregnado da exterioridade, histórica, social, cultural, política e ideológica que se
materializa nas coletividades que representa, produzindo efeitos de verdade.
Portanto, o provérbio diz respeito à representação material de uma voz coletiva
formalizada na língua e seu reconhecimento como tal está ligado a uma
contingência de repetibilidade histórica, bem como à forma ma teria! de suas
formulações e às condições de produção da enunciação proverbial.
Conforme referimos em nossas considerações iniciais, dada a condição de
diversidade e inesgotabilidade do tema a que nos propusemos investigar nesse
trabalho, não somos nós quem pretende "concluir'', na justa acepção da palavra,
as reflexões acerca do tema Provérbio e mesmo da discussão sobre a Enunciação
Proverbial. Entretanto, sendo praxe, sobretudo no universo acadêmico-científico,
produzir a "ilusão" de unidade através de um efeito de fechamento, encerramos
aqui as nossas (des)iludidas "considerações finais" sobre essa discussão tão
importante para nós e sobre a qual ainda há murro o que se investigar. E agora
sem mais palavras para finalizar, cedo a palavra a Foucault:
243