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A Liberação do
Espírito
Watchman Nee
Publicação da
CLC Editora
Caixa Postal 700
12.200 São José dos Campos (SP)
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Título do original em inglês
Tradução de
GORDON CHOWN
Publicação da
CLC Editora
Caixa Postal 700
12.200 São José dos Campos (SP)
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ÍNDICE
Introdução ..............................................................................................07
Os Editores
INTRODUÇÃO
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Para o leitor apreciar devidamente estas lições, talvez sejam úteis algumas declarações
preparatórias:
Primeiramente, devemos ficar acostumados com a terminologia que o Irmão Nee emprega.
Escolheu chamar o espírito do homem de "homem interior"; à alma do homem, chama de
"homem exterior" e para o corpo emprega o termo "homem periférico." No diagrama retraíamos
este fato. Será útil, também, reconhecer que Deus, ao planejar o homem originalmente,
pretendeu que o espírito do homem fosse Seu lar ou Sua residência. Assim, o Espírito Santo,
formando uma união com o espírito humano, deveria governar a alma, e o espírito e a alma,
usariam o corpo como meio de expressão.
Diagrama
Em segundo lugar, quando Watchman Nee fala em destruir a alma, talvez pareça que está
usando uma palavra demasiadamente forte, como se fosse subentender o extermínio dela. Na
realidade, a substância total da sua mensagem claramente indica que a alma, ao invés de
funcionar independentemente, deve tornar-se o instrumento ou vaso do espírito. Desta maneira,
é a ação independente da alma que deve ser destruída. T. Austin-Sparks indicou com sabedoria:
"Devemos tomar cuidado para que, ao reconhecermos o fato de que a alma tem sido
seduzida, levada ao cativeiro, escurecida e envenenada com seus próprios interesses, não a
consideremos como algo a ser exterminado e destruído nesta vida. Isto seria o asceticismo, uma
forma de budismo. O resultado de qualquer comportamento deste tipo usualmente não passa de
outra forma de uma doutrina da alma em grau exagerado; talvez o ocultismo. A totalidade da
nossa natureza humana está em nossa alma, e se a natureza for suprimida numa direção, tomará
vingança numa outra direção. É exatamente o problema de muitas pessoas, se somente o
soubessem. Há uma diferença entre uma vida de supressão e uma vida de serviço. A submissão, a
sujeição e a posição de Servo no caso de Cristo, diante do Pai, não era uma vida de destruição da
alma, mas, sim, de descanso e de deleite. A escravidão, no mau sentido, é o destino dos que vivem
inteiramente na sua própria alma. Precisamos revisar nossas ideias acerca do serviço, pois está
ficando cada vez mais comum pensar que o serviço é cativeiro e escravidão, quando, na realidade,
é uma coisa divina. A espiritualidade não é uma vida de supressão. Esta é negativa. A
espiritualidade é positiva; é uma vida nova e adicional, não a vida antiga, lutando para obter o
domínio de si mesma."
Em terceiro lugar, devemos ver como é necessário que a alma receba um golpe fatal
mediante a morte de Cristo, quanto às suas forças próprias e autogoverno. É como no caso de
Jacó: depois de Deus o ter tocado, passou o resto da sua vida manquejando. Isto ilustraria
claramente que sempre deve ficar registrado na alma o fato de que não pode nem deve agir a
partir de si mesma como sendo a fonte. Mais uma vez, T. Austin-Sparks escreve: "Como um
instrumento, a alma deve ser conquistada, dominada e regida com relação aos caminhos mais
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sublimes e diferentes de Deus. É mencionada tão frequentemente nas Escrituras como sendo algo
sobre o qual devemos obter e exercer a autoridade.” Por exemplo:
Finalmente, nestas lições, devemos ver por que Watchman Nee insiste que a alma (o
homem exterior) seja quebrantada, dominada, e renovada para o espírito usá-lo. T. Austin-Sparks
disse:
"Quer já tenhamos a capacidade de aceitá-lo, quer não, o fato é que se vamos avançar com
Deus de modo integral, todas as capacidades e energias da alma para saber, compreender, sentir e
fazer, chegarão ao fim, e nós — naquele lado — ficaremos desnorteados, estonteados, paralisados
e incapazes. Somente então, a compreensão, o constrangimento e a energia, novos, diferentes e
divinos, nos impulsionarão para a frente ou manter-nos-ão em andamento. Em tais tempos,
teremos de dizer a nossa alma: "Somente em Deus, ó minha alma, espera silenciosa (SI 62:5); e "Ó
minha alma, vem comigo seguir ao Senhor." Mas quanta alegria e fortaleza, é quando, depois da
alma ter sido constrangida para entregar-se ao espírito, a sabedoria e glória mais sublimes são
percebidas na sua vindicação. É então que "A minha alma engrandece ao Senhor, e o meu espírito
se alegrou em Deus, meu Salvador" (Lucas 1: 46). O espírito fêz alguma coisa, a alma a faz — note
os tempos dos verbos.
Deste modo, a alma é essencial para a plenitude da alegria, e DEVE ser trazida através da
escuridão e da morte da sua própria capacidade a fim de aprender as realidades mais altas e
profundas para as quais o espírito é o primeiro órgão e faculdade." *
Ao chegarmos perto do fim destas lições, teremos achado o segredo da vida frutífera para
ELE. Não caia na armadilha, conforme tantas pessoas caíram, de procurar reprimir sua alma ou
desprezá-la; seja, pelo contrário, forte de espírito, de modo que sua alma seja ganha, salva e
levada a servir à Sua plena alegria. O Senhor Jesus determinou que achemos descanso para as
nossas almas - e isto, diz Ele , vem por meio do Seu jugo, - o símbolo da união e do serviço.
Apreciaremos, então, como a alma acha seu maior valor em servir, não em dominar. É verdade
que, até que seja quebrantada, a alma quer ser "senhor". Através da Cruz, pode tornar-se um
"servo" muito útil.
______________________________
* (Citações de WHAT IS MAN, de T. Austin-Sparks)
CAPÍTULO 1
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A IMPORTÂNCIA DO QUEBRANTAMENTO
Qualquer pessoa que serve a Deus descobrirá, mais cedo ou mais tarde, que o grande
impedimento para a sua obra não são outras pessoas mas, sim, ela mesma. Descobrirá que seu
homem exterior e seu homem interior não estão em harmonia, pois os dois tendem para direções
opostas. Sentirá, também, a incapacidade do seu homem exterior submeter-se ao controle do
espírito, tornando-o, assim, incapaz de obedecer aos mandamentos mais sublimes de Deus.
Perceberá rapidamente que a maior dificuldade acha-se no seu homem exterior, pois este o
impede de fazer uso do seu espírito.
Muitos dos servos de Deus nem sequer conseguem fazer as obras mais elementares.
Normalmente, devem ser capacitados pelo exercício do seu espírito a conhecer a palavra de Deus,
a discernir a condição espiritual doutra pessoa, entregar as mensagens de Deus com unção e
receber as revelações de Deus. Mesmo assim, devido às distrações do homem exterior, parece
que seu espírito não funciona apropriadamente. É basicamente porque seu homem exterior nunca
foi tratado. Por esta razão, o reavivamento, o zelo, o implorar e as atividades não passam de um
desperdício de tempo. Conforme veremos, há apenas um só tratamento que pode capacitar o
homem a ser útil diante de Deus: o quebrantamento.
Note como a Bíblia divide o homem em duas partes: "Porque, no tocante ao homem
interior, tenho prazer na lei de Deus" (Rm 7: 22). Nosso homem interior deleita-se na Lei de Deus.
". . . que sejais fortalecidos com poder, mediante o seu Espírito no homem interior" (Ef 3:16). E
Paulo também nos informa: "Mesmo que o nosso homem exterior se corrompa, contudo o nosso
homem interior se renova de dia em dia" (2 Co 4:16).
Quando Deus vem habitar em nós mediante o Seu Espirito, a Sua vida e o Seu poder, entra
em nosso espírito, que estamos chamando de "homem interior." Fora deste homem interior há a
alma, na qual funcionam nossos pensamentos, nossas emoções e nossa vontade. O homem
periférico é nosso corpo físico. Assim, falaremos do homem interior como sendo o espírito, do
homem exterior como sendo a alma, e do homem periférico como sendo o corpo. Nunca devemos
nos esquecer de que nosso homem interior é o espírito humano onde Deus habita, onde Seu
Espírito Se combina com nosso espírito. Assim como nós vestimos roupas, assim também nosso
homem interior "veste" um homem exterior: o espírito "veste" a alma. E, de modo semelhante, o
espírito e a alma "vestem" o corpo. Está bem evidente que os homens geralmente estão mais
conscientes do homem exterior e do periférico, e dificilmente reconhecem ou entendem seu
espírito, de modo algum.
Devemos saber que aquele que pode trabalhar para Deus, é aquele cujo homem interior
pode ser liberado. A dificuldade básica de um servo de Deus acha-se no fracasso do homem
interior de irromper pelo homem exterior. Logo, devemos reconhecer diante de Deus que a
primeira dificuldade que enfrentamos na obra não está nos outros mas, sim, em nós mesmos.
Nosso espírito parece estar embrulhado num invólucro de modo que não pode facilmente
irromper de lá. Se nunca aprendemos como liberar nosso homem interior por meio de irromper
pelo homem exterior, não temos capacidade de servir. Nada pode estorvar-nos tanto quanto este
homem exterior. Se nossas obras são frutíferas ou não, depende de se nosso homem exterior foi
quebrantado pelo Senhor de modo que o homem interior possa passar pelo quebrantamento e se
manifestar. Este é o problema básico. O Senhor deseja quebrar nosso homem exterior a fim de
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que o homem interior possa ter uma via de saída. Quando o homem interior for liberado, tanto os
descrentes quanto os cristãos serão abençoados.
O Senhor Jesus conta-nos em João 12: "Se o grão de trigo, caindo na terra, não morrer, fica
ele só; mas se morrer, produz muito fruto." A vida está no grão de trigo, mas há uma casca, uma
casca muito dura, no lado de fora. Enquanto aquela casca não for rachada e aberta, o trigo não
pode brotar nem crescer. "Se o grão de trigo, caindo na terra, não morrer . . ." Que morte é essa?
É o arrombar da casca mediante a cooperação da temperatura e da umidade no solo. Uma vez que
a casca é fendida e aberta, o trigo começa a crescer. Então, a questão aqui não é se há vida
dentro, mas, sim, se a casca externa foi rachada.
A Escritura continua, dizendo: "Quem ama a sua vida (Grego, alma) perde-a; mas aquele
que odeia a sua vida (Grego, alma) neste mundo, preservá-la-á para a vida eterna" (v. 25). O
Senhor nos mostra aqui que a casca externa é nossa própria vida (a vida da nossa alma), ao passo
que a vida interior é a vida eterna que Ele nos deu. Para permitir que a vida interior se manifeste,
é imperativo que a vida exterior seja substituída. Se o exterior permanecer intato, o interior nunca
poderá aparecer.
É necessário (neste escrito) que dirijamos estas palavras para aquele grupo de pessoas que
possuem a vida do Senhor. Entre aqueles que possuem a vida do Senhor podem ser achadas duas
condições distintas: uma inclui aqueles em que a vida é confinada, restringida, aprisionada e
incapaz de se manifestar; a outra inclui aqueles em que o Senhor forjou um caminho, e a vida
deles, portanto, é liberada.
A pergunta, pois, não é como obter a vida, mas, sim, como permitir que esta vida apareça.
Quando dizemos que temos necessidade de que o Senhor nos quebrante, não é meramente um
modo de falar, nem é apenas uma doutrina. É vital que sejamos quebrantados pelo Senhor. Não é
que a vida do Senhor não possa cobrir a terra, mas, sim, que Sua vida está sendo aprisionada por
nós. Não é que o Senhor não possa abençoar a igreja, mas, sim, que a vida do Senhor está tão
confinada dentro de nós que não se manifesta. Se o homem exterior permanecer intato, nunca
poderemos ser uma bênção para a Sua igreja, e não podemos esperar que a palavra de Deus seja
abençoada através de nós!
A Bíblia conta acerca do nardo puro. Deus, deliberadamente usou este termo "puro" na
Sua palavra para mostrar que é verdadeiramente espiritual. Mas se o vaso de alabastro não for
quebrado, o nardo puro não fluirá. Por estranho que pareça, muitos ainda estão valorizando
demasiadamente o vaso de alabastro, pensando que seu valor excede o do unguento. Muitos
pensam que seu homem exterior é mais precioso do que seu homem interior. Este fica sendo o
problema na igreja. Uma pessoa tem em grande estima sua habilidade, pensando que é bem
importante; outra valoriza suas próprias emoções, e se estima como pessoa importante; outras
têm alta consideração por si mesmas, e sentem que são melhores do que as demais, que sua
eloquência ultrapassa a das demais, que sua rapidez de ação e exatidão de julgamento são
superiores, e assim por diante. Nós, porém, não somos colecionadores de antiguidades; somos
aqueles que desejamos cheirar somente a fragrância do unguento. Sem quebrar o exterior, o
interior não surgirá. Deste modo, individualmente não temos qualquer fluir, como também a
igreja não tem um caminho vivo. Por que, pois, devemos considerar-nos tão preciosos, se nosso
interior retém a fragrância, ao invés de liberá-la?
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O Espírito Santo não cessou de operar. Um evento após outro, uma coisa após outra, vem a
nós. Cada operação disciplinar tem um só propósito: quebrar nosso homem exterior a fim de que
nosso homem interior possa se manifestar. Aqui, porém, está nossa dificuldade: ficamos
impacientes por causa de ninharias, murmuramos diante de perdas de pequena monta. O Senhor
está preparando um modo de usar-nos, mas, mal Sua mão nos tocou, sentimo-nos infelizes, até ao
ponto de contendermos com Deus e de nos tornarmos negativos em nossas atitudes. Desde que
fomos salvos, fomos tocados várias vezes e de várias maneiras pelo Senhor, e tudo com o
propósito de quebrar nosso homem exterior. Quer tenhamos consciência disto, quer não, o alvo
do Senhor é quebrar este homem exterior.
Desta maneira, o Tesouro está no vaso de barro, mas se o vaso de barro não for quebrado,
quem poderá ver o Tesouro que está dentro? Qual é o objetivo final da operação do Senhor em
nossas vidas? É quebrar este vaso de barro, é quebrar nosso vaso de alabastro, é arrombar nossa
casca. O Senhor anseia por achar um meio de abençoar o mundo através daqueles que pertencem
a Ele. O quebrantamento é o caminho da benção, o caminho da fragrância, o caminho da
frutificação, mas também é um caminho salpicado de sangue. Sim, há sangue de muitas feridas.
Quando nos oferecemos ao Senhor para fazer a Sua obra não podemos nos dar ao luxo da
morosidade de nos pouparmos. Devemos deixar que o Senhor rache totalmente nosso homem
exterior, de modo que Ele possa achar um caminho para Suas operações.
Cada um de nós deve descobrir para si mesmo qual é a mente do Senhor para sua vida. É
um fato muitíssimo lamentável, que muitos não sabem qual é a mente ou intenção do Senhor para
suas vidas. Quanto mais precisam de que Ele abra os seus olhos, para ver que tudo quanto entra
nas suas vidas pode ler significado. Entender o propósito do Senhor é ver muito claramente que
Ele visa um único objetivo: o quebrantamento do homem exterior.
Muitas pessoas, no entanto, antes mesmo que o Senhor erga Sua mão, já estão aflitas. Oh!
devemos reconhecer que todas as experiências, problemas e provações que o Senhor nos envia
são para nosso bem supremo. Não podemos esperar que o Senhor nos dê coisas melhores, pois
estas são as melhores. Se alguém se aproximasse do Senhor, e orasse, dizendo: "Ó Senhor, por
favor, deixa-me escolher o melhor," creio que Ele lhe diria: "Aquilo que Eu te dei é o melhor; tuas
provações diárias são para teu máximo proveito." Assim, o motivo por detrás de toda a
providência de Deus é quebrantar nosso homem exterior. Uma vez que isto ocorre e o espírito
pode fluir, então, começamos a exercitá-lo.
O Senhor emprega dois meios diferentes para quebrar nosso homem exterior; um é
paulatino, o outro é repentino. Para alguns, o Senhor dá um quebrantamento súbito seguido por
um paulatino. Com outros, o Senhor dispõe para que tenham provações diárias constantes, até
que, um dia, leva a efeito um quebrantamento em grande escala. Se não for o repentino primeiro,
e depois o paulatino, então, é o paulatino seguido pelo repentino. Parece que o Senhor
normalmente trabalha conosco durante vários anos antes de poder realizar esta obra de
quebrantamento.
A cronologia está na mão dEle. Não podemos encurtar o tempo, embora certamente o
possamos prolongar. Em algumas vidas, o Senhor pode realizar esta obra depois de uns poucos
anos de trato; noutras, é evidente que depois de dez ou vinte anos a obra ainda está incompleta.
Isto é muito sério! Nada é mais lastimável do que desperdiçar o tempo de Deus. Quão
frequentemente a igreja é atrapalhada! Podemos pregar com o uso da nossa mente, podemos
comover os outros com o uso das nossas emoções; mas se não sabemos usar nosso espírito, o
Espírito de Deus não poderá tocar as pessoas através de nós. A perda será grande, se
prolongarmos desnecessariamente o tempo.
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Logo, se nunca antes nos consagramos de modo total e inteligente ao Senhor, façamo-lo
agora, dizendo: "Senhor, para o futuro da igreja, para o futuro do evangelho, para o Teu caminho,
e também para minha própria vida, ofereço-me sem condições, sem reservas, nas Tuas mãos.
Senhor, deleito-me em oferecer-me a Ti e estou disposto a deixar-Te fazer toda a Tua vontade
através de mim."
O Significado da Cruz
Ouvimos falar frequentemente acerca da cruz. Talvez estejamos por demais familiarizado
com o termo. Mas o que é a cruz, afinal das contas? Quando realmente compreendermos a cruz,
veremos que significa o quebrantamento do homem exterior. A cruz reduz o homem exterior à
morte; racha a casca humana e a abre. A cruz deve quebrar tudo quanto pertence ao nosso
homem exterior — nossas opiniões, nossos modos, nossa habilidade, nosso amor-próprio, nosso
tudo. O caminho está claro, claro mesmo como o cristal.
Tão logo que nosso homem exterior é destruído, nosso espírito pode sair facilmente para
fora. Considere certo irmão, como exemplo. Todos quantos o conhecem reconhecem que tem
uma mente aguçada, uma vontade dinâmica, e profundas emoções. Mas, ao invés de ficarem
impressionados por estas características naturais da sua alma, reconhecem que se encontraram
com seu espírito. Sempre que as pessoas estão tendo comunhão com ele, encontram um espírito,
um espírito limpo. Por que? Porque tudo quanto é da sua alma foi destruído.
Tomemos como outro exemplo certa irmã. Todos aqueles que a conhecem reconhecem
que ela tem uma disposição pronta — rápida para pensar, rápida para falar, rápida para confessar,
rápida para escrever cartas, e rápida para rasgar o que escreveu. Apesar disto, os que se
encontram com ela não se encontram com sua rapidez, mas sim, com seu espírito. Ela é uma
pessoa que foi totalmente destruída e que se tornou transparente.
Esta destruição do homem exterior é uma questão fundamental. Não devemos apegar-nos
às fracas características da nossa alma, ainda emitindo a mesma fragrância, mesmo depois de o
Senhor lidar conosco durante cinco ou dez anos. Não: devemos deixar o Senhor forjar um caminho
em nossas vidas.
Por que é que, depois de muitos anos de trato, algumas pessoas permanecem inalteradas?
Alguns indivíduos têm uma vontade forte; alguns têm emoções fortes; e outros têm uma mente
forte. Visto que o Senhor pode quebrantá-los, por que depois de muitos anos, alguns ficam sem
transformação? Cremos que há duas razões principais.
A primeira é que muitos que vivem nas trevas não estão vendo a mão de Deus. Enquanto
Deus está operando, enquanto Deus está destruindo, não reconhecem que é da parte dEle. Estão
destituídos de luz, e, somente veem homens que se opõem a eles. Imaginam que se o meio-
ambiente é realmente difícil demais, que as circunstâncias são as culpadas. Assim, continuam nas
trevas e no desespero.
Que Deus nos dê uma revelação para ver o que é da mão dEle, a fim de que nos
ajoelhemos e Lhe digamos: "És Tu; visto que és Tu, eu aceitarei." Pelo menos, devemos
reconhecer de Quem é a mão que trata conosco. Não é mão humana, nem a mão da nossa família,
nem a dos irmãos e irmãs na igreja, mas, sim, a de Deus. Precisamos aprender como nos ajoelhar e
beijar a mão, amar a mão que lida conosco, assim como fazia Madame Guyon. Precisamos ter esta
luz para ver, seja o que o Senhor fez, aceitamos e cremos; o Senhor nada pode fazer de errado.
A segunda razão, outro grande impedimento à obra de quebrar o homem exterior é o
amor-próprio. Devemos pedir que Deus remova o coração do amor-próprio. À medida em que Ele
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lida conosco em reposta à nossa oração, devemos adorar e dizer: "Ó Senhor, se isto for da Tua
mão, que eu o aceite do meu coração." Lembremo-nos de que a única razão para todo mal
entendido, toda a irritação, todo o descontentamento, é que secretamente amamos a nós
mesmos. Assim, planejamos um modo mediante o qual podemos livrar a nós mesmos. Muitas
vezes, os problemas surgem porque procuramos uma via de escape — uma fuga da operação da
cruz.
Aquele que subiu à cruz e que se recusa a beber o vinho com fel é aquele que conhece o
Senhor. Muitos sobem à cruz com certa relutância, ainda pensando em beber o vinho com fel para
aliviar suas dores. Todos aqueles que dizem: "Não beberei, porventura, o cálice que o Pai me
deu?" não beberá do cálice do vinho com fel. Somente podem beber um cálice, não dois. Estas
pessoas não têm qualquer amor-próprio. O amor-próprio é uma dificuldade básica. Que o Senhor
nos fale hoje de tal maneira que possamos orar: "Ó meu Deus, vi que todas as coisas vêm de Ti.
Todos os meus caminhos estes cinco anos, dez anos, ou vinte anos, são de Ti. Operastes de tal
maneira que atingistes Teu propósito, que não é outro senão que Tua vida seja vivida através de
mim. Mas eu fui tolo. Não vi. Fiz muitas coisas para escapar, e assim adiei o Teu tempo. Hoje, vejo
Tua mão. Estou disposto a me oferecer a Ti. Mais uma vez coloco-me nas Tuas mãos."
Ninguém é mais belo do que alguém que está quebrantado! A teimosia e o amor-próprio
cedem lugar à beleza na pessoa que foi quebrantada por Deus. Vemos Jacó no Antigo Testamento,
como mesmo no ventre da sua mãe, lutava com seu irmão. Era sutil, enganoso, traiçoeiro. Por
isso, sua vida estava cheia de tristezas e mágoas. Ainda jovem, fugiu do seu lar. Durante vinte anos
foi logrado por Labão. A esposa do amor de seu coração, Raquel, morreu prematuramente. O filho
do seu amor, José, foi vendido. Anos mais tarde, Benjamin foi preso no Egito. Deus tratou com ele
sucessivamente, e Jacó encontrou infortúnio após infortúnio. Deus o feriu uma vez, duas vezes; na
realidade, sua história inteira pode ser descrita como sendo uma história de ser ferido por Deus.
Finalmente, depois de muitos tratamentos deste tipo, o homem Jacó foi transformado. Durante
seus últimos poucos anos, era bem transparente. Quão nobre era sua resposta a Faraó! Quão belo
foi seu fim, quando adorou a Deus, apoiado no seu bordão! Quão claras eram suas bênçãos
pronunciadas sobre seus descendentes! Depois de ler a última página da sua história, queremos
curvar a cabeça e adorar a Deus. Aqui temos alguém que está amadurecido, que conhece a Deus.
Várias décadas de tratos tiveram como resultado que o homem exterior de Jacó foi quebrantado.
Na sua velhice, o quadro é belo.
Cada um de nós tem boa parte da mesma natureza de Jacó em nós. Nossa única esperança
é que o Senhor marque um caminho para fora, quebrando o homem exterior de tal maneira que o
homem interior possa surgir e ser visto. Isto é precioso, e é o caminho daqueles que servem ao
Senhor. Somente assim podemos servir; somente assim podemos levar os homens ao Senhor.
Tudo o mais está limitado quanto ao seu valor. A doutrina não tem muita utilidade, nem a
teologia. Qual é a utilidade do mero conhecimento teórico da Bíblia se o homem exterior
permanecer sem ser quebrantado? Somente a pessoa através de quem Deus pode aparecer, é útil.
Depois de nosso homem exterior ter sido ferido, tratado, e levado por várias provas, temos
feridas em nós, e assim deixamos o espírito emergir- Temos receio de encontrar alguns irmãos e
irmãs cujo ser total permanece intato, nunca tendo sido tratado e transformado. Que Deus tenha
misericórdia de nós, mostrando-nos claramente este caminho, e revelando-nos que é o único
caminho. Que Ele também nos mostre que nisto é visto o propósito de todos os Seus tratos
durante estes poucos anos, sejam dez ou vinte. Que ninguém menospreze os tratos do Senhor.
Que Ele nos revele verdadeiramente o que significa o quebrantamento do homem exterior. Se o
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homem exterior permanecesse integral, tudo estaria meramente em nossa mente, totalmente
inútil. Tenhamos esperança de que o Senhor venha a tratar de nós de modo completo.
CAPÍTULO 2
Vamos passar tudo isto em revista através de alguns problemas práticos! Tomemos a
pregação como um exemplo. Quão frequentemente podemos estar pregando com sinceridade —
dando uma mensagem bem preparada e sólida — mas interiormente nos sentimos frios como
gelo. Ansiamos por animar os outros, mas nós mesmos não ficamos comovidos. Há falta de
harmonia entre o homem exterior e o interior. O homem exterior está suado com o calor, mas o
homem interior está tremendo de frio. Podemos contar aos outros quão grande é o amor do
Senhor, mas pessoalmente não somos tocados por ele. Podemos contar aos outros quão trágico é
o sofrimento da cruz, mas, ao voltar para nosso quarto, podemos rir. O que podemos fazer a
respeito disto? Nossa mente pode labutar, nossas emoções podem ser energizadas, mas, o tempo
todo, temos a sensação de que o homem interior está meramente observando os acontecimentos.
O homem exterior e o interior não estão unidos.
Considere outra situação. O homem interior está sendo devorado pelo zelo. A pessoa quer
gritar, mas nada consegue expressar. Depois de falar por muito tempo, parece que ainda está
andando em círculos. Quanto mais solicitude sente por dentro, tanto mais frio se torna do lado de
fora. Anseia por falar, mas não consegue achar expressão. Quando se encontra com um pecador,
seu homem interior tem vontade de chorar, mas ele não consegue derramar uma lágrima. Há um
senso de urgência dentro dele, mas quando sobe ao púlpito e procura gritar, vê-se perdido num
labirinto de palavras. Uma situação desta é muito penosa. A causa radical é a mesma: a casca
externa ainda se apega a ele. O exterior não obedece aos ditames do interior: chorando por
dentro, mas por fora, sem se comover; sofrendo por dentro, mas por fora, intocado; cheio de
pensamentos por dentro, mas por fora, a mente parece estar em branco. O espírito ainda tem de
descobrir um meio de atravessar a casca.
Deste modo, o quebrantamento do homem exterior é a primeira lição para toda pessoa
que deseja aprender a servir a Deus. Aquele que é verdadeiramente usado por Deus, é aquele cujo
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pensamento e emoção externas, não agem independentemente. Se não aprendermos esta lição, a
nossa eficácia, será grandemente prejudicada. Que Deus nos traga ao lugar em que o homem
exterior, é completamente quebrantado.
Quando prevalecer esta condição, haverá fim desta atividade exterior com a inércia
interior; acabará o chorar interior com a compostura exterior; acabará a abundância de
pensamentos interiores para os quais não há expressão. Você não ficará pobre em pensamentos.
Você não precisará empregar vinte frases para expressar o que pode ser dito em duas. Seus
pensamentos ajudarão o seu espírito ao invés de atrapalhá-lo.
De modo semelhante, nossas emoções também são uma casca muito dura. Muitos que
desejam estar felizes não podem expressar felicidade, ou talvez queiram chorar, sem, porém,
consegui-lo. Se o Senhor tiver ferido nosso homem exterior através da disciplina ou da iluminação
do Espírito Santo, poderemos expressar alegria ou tristeza conforme os ditames do interior.
A liberação do espírito nos possibilita permanecer cada vez mais em Deus. Tocamos o
espírito da revelação na Bíblia. Sem esforço, nosso espírito pode receber a revelação divina.
Quando estamos testemunhando ou pregando, transmitimos a palavra de Deus através do nosso
espírito. Além disto, podemos muito espontaneamente entrar em contato com o espírito dos
outros, mediante o nosso espírito. Sempre que alguém laia em nossa presença, podemos "tirar a
medida dele" — avaliar que tipo de pessoa é, qual atitude está adotando, que tipo de cristão é, e
qual é a sua necessidade. Nosso espírito pode tocar o espírito dele. E o que é maravilhoso, é que
outros facilmente entram em contato com o nosso espírito. No caso de alguns, apenas temos um
encontro com seus pensamentos, com suas emoções, ou com sua vontade. Depois de conversar
com eles durante horas a fio, ainda não encontramos a pessoa real, embora ambos sejamos
cristãos. A casca exterior é grossa demais para outras pessoas tocarem o homem interior. Com o
quebrantamento do homem exterior, o espírito começa a fluir e sempre está aberto diante de
outras pessoas.
Aventurando-se e Recolhendo-se
Uma vez que o homem exterior tenha sido quebrantado, o espírito do homem muito
naturalmente, permanece na presença de Deus sem cessar. Dois anos depois de certo irmão ter
confiado no Senhor, leu The Practice of the Presence of God ("A Prática da Presença de Deus") de
Irmão Lawrence. Depois de lê-lo, sentiu-se aflito com seu fracasso quanto a permanecer
incessantemente na presença de Deus como o Irmão Lawrence. Naqueles tempos, tinha encontros
com horário marcado para orar com alguém. Por que? Bem, a Bíblia diz: "Orai sem cessar", e eles
mudaram a expressão para "Orai toda hora." Cada vez que ouviam o relógio bater a hora, oravam.
Esforçavam-se ao máximo para recolher-se em Deus, porque achavam que não podiam manter-se
na presença contínua de Deus. Era como se tivessem ido embora quietamente enquanto
trabalhavam, e, assim, precisassem rapidamente recolher-se em Deus. Ou se pro um rápido
retorno para Deus. Doutra forma, achar-se-iam ausentes de Deus durante o dia inteiro. Oravam
frequentemente, passando dias inteiros orando no Dia do Senhor e metade do dia aos sábados.
Assim continuavam, durante dois ou três anos. Mesmo assim, o problema ainda permanecia:
recolhendo-se, desfrutavam da presença de Deus, mas ao saírem para fora, perdiam-na.
Naturalmente, este problema não é só deles; tal é a experiência de muitos cristãos. Indica que
estamos procurando manter a presença de Deus por meio da nossa memória. O senso da Sua
presença flutua de acordo com a nossa memória. Quando nós nos lembramos, há a consciência da
Sua presença; senão, não há nenhuma. Isto é pura tolice, pois a presença de Deus está no espírito
e não na memória.
Para solucionar este problema, devemos primeiramente resolver a questão do
quebrantamento do homem exterior. Visto que nem nossa emoção nem nosso pensamento tem a
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mesma natureza que Deus, não podem ser juntados com Ele. O Evangelho segundo João, capítulo
4, mostra-nos a natureza de Deus. Deus é Espírito. Somente nosso espírito é da mesma natureza
de Deus; logo, pode ser eternamente unido com Ele. Se procurarmos chegar a obter a presença de
Deus por meio de dirigir nosso pensamento, então, quando não estamos nos concentrando, Sua
presença parece ser perdida. Além disto, se procurarmos usar nossa emoção para conclamar a
presença de Deus, então, tão logo que nossa emoção se relaxa, Sua presença parece ter ido
embora. Às vezes estamos felizes, e tomamos este fato por termos a presença de Deus. Deste
modo, quando a felicidade cessa, a presença foge! Ou podemos supor que Sua presença está
conosco enquanto lastimamos e choramos. Infelizmente, não podemos derramar lágrimas durante
nossa vida inteira. Logo, nossas lágrimas se secarão, e depois, a presença de Deus desaparece.
Tanto nossos pensamentos quanto nossas emoções são energias humanas. Todas as atividades
devem chegar ao fim. Se procurarmos manter a presença de Deus com a atividade, então, quando
a atividade cessa, Sua presença termina. A presença de Deus requer uma natureza igual à dEle.
Somente o homem interior é da mesma natureza de Deus. Através dele, exclusivamente, a
presença de Deus pode ser manifestada. Quando o homem exterior está em atividades, estas
podem perturbar o homem interior, mas, o homem exterior não é um ajudador, e, sim, um
perturbador. Quando o homem exterior é quebrantado, o homem interior desfruta de paz diante
de Deus.
Deus nos deu o espírito para nos capacitar a corresponder a Ele. O homem exterior, no
entanto, sempre está correspondendo às coisas de fora, e daí nos priva da presença de Deus. Não
podemos destruir todas as coisas do lado de fora, mas podemos quebrantar o homem exterior.
Não podemos acabar com todas as coisas que existem fora; estes milhões e bilhões de coisas no
mundo, estão totalmente além do nosso controle. Cada vez que alguma coisa acontece, nosso
homem exterior corresponderá; todavia não conseguimos desfrutar em paz da presença de Deus.
Concluímos, portanto, que experimentar a presença de Deus depende do quebrantamento do
nosso homem exterior. Se, pela misericórdia de Deus, nosso homem exterior foi quebrantado,
podemos ser caracterizados da seguinte maneira: Ontem, estávamos cheios de curiosidade, mas
hoje é impossível ser curioso. Anteriormente, nossas emoções podiam facilmente ser despertadas,
ou movendo nosso amor, a mais delicada das emoções, ou provocando nossa ira, a mais grosseira
delas. Mas agora, sejam quantas forem as coisas que vierem às multidões por cima de nós, nosso
homem interior fica imperturbável, a presença de Deus fica imutável, e nossa paz interior
permanece sem a mais leve agitação.
Torna-se evidente que o quebrantamento do homem exterior é a base para desfrutar da
presença de Deus. O Irmão Lawrence estava ocupado em serviços de cozinha. As pessoas pediam,
impacientes, as coisas que queriam. Embora houvesse o tinido de pratos e utensílios, seu homem
interior não se perturbava. Podia sentir a presença de Deus no lufa-lufa de uma cozinha tanto
quanto na oração em momentos quietos. Por que? Estava impérvio aos barulhos externos.
Aprendera a comungar no seu espírito e desconsiderar a vida da sua alma.
Alguns acham que, para ter a presença de Deus, seu ambiente deve estar livre de
perturbações, tais como o tinido dos pratos. Quanto mais longe estão da humanidade, tanto
melhor poderão sentir a presença de Deus. Que erro! O problema acha-se, não nos pratos, nem
nas outras pessoas, mas, sim, neles mesmos. Deus não vai livrar-nos dos pratos; livrar-nos-á das
nossas respostas! Não importa quão barulhento fica lá fora, o lado de dentro não precisa
corresponder. Visto que o Senhor quebrantou nosso homem externo, simplesmente reagimos
como se não tivéssemos ouvido. Louvado seja Deus, podemos possuir uma audição muito afinada,
mas, devido à obra da graça em nossas vidas, não estamos influenciados de modo algum pelas
coisas que fazem pressões sobre nosso homem exterior. Podemos ficar diante de Deus em tais
ocasiões tanto quanto, quando estivermos orando sozinhos.
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Uma vez que o homem exterior é quebrantado, a pessoa já não precisa retrair-se em
direção de Deus, pois sempre está na presença de Deus. Não é assim no caso daquele cujo homem
exterior ainda está intato. Depois de fazer algum dever, precisa voltar, pois supõe que se
movimentou para longe de Deus. Até mesmo ao fazer a obra do Senhor, escapa dAquele a quem
serve. Assim, parece que a melhor coisa para ele é deixar de fazer movimento algum. Apesar disto,
os que conhecem a Deus não precisam voltar, porque nunca se ausentaram. Desfrutam da
presença de Deus quando consagram um dia à oração, e desfrutam da mesma presença em grau
muito semelhante quando estão ativamente ocupados nas tarefas da vida diária. Talvez seja nossa
experiência comum que, ao nos aproximarmos de Deus, sentimos Sua presença; ao passo que, se
estamos ocupados em alguma atividade, a despeito da nossa vigilância, sentimos que, de alguma
maneira, nos afastamos, indo à deriva. Suponhamos, por exemplo, que estamos pregando o
evangelho ou procurando edificar as pessoas. Depois de certo tempo, temos vontade de nos
ajoelhar para orar. Mas temos alguma ideia de que primeiramente devemos nos recolher em
Deus. D’alguma maneira, a nossa conversa com as pessoas nos levou um pouco para longe de
Deus, de modo que, na oração, primeiramente devamos nos aproximar mais dEle. Perdemos a
presença de Deus, e, portanto, agora ela deve nos ser restaurada. Ou talvez estejamos ocupados
com alguma tarefa caseira tal qual esfregar o assoalho. Ao completar nossa tarefa, resolvemos
orar. Mais uma vez, sentimos que fizemos uma longa viagem e que devemos voltar. Qual é a
resposta? O quebrantamento do homem exterior torna desnecessárias tais voltas. Sentimos a
presença de Deus na nossa conversação tanto quanto ao ajoelhar-nos em oração. Cumprir nossas
tarefas diárias não nos a Casta de Deus; logo, não precisamos voltar.
Agora, consideremos um caso extremo para ilustrar este fato. A ira é o mais violento dos
sentimentos humanos. Mas a Bíblia não nos proíbe de ficarmos zangados, porque nem toda ira, se
relaciona com o pecado. "Irai-vos, mas não pequeis," diz a Bíblia. Mesmo assim, a ira de qualquer
tipo é tão forte que quase chega ao pecado . Não achamos "Amai, mas não pequeis", nem "Sede
meigos, mas não pequeis", na Palavra de Deus, porque o amor e a meiguice estão removidos a
uma grande distância do pecado. A ira, porém, fica perto do pecado.
Talvez, certo irmão cometeu uma falha séria. Precisa ser severamente repreendido. Isso
não é coisa fácil. Preferíamos exercer nossos sentimentos de misericórdia do que colocar nossos
sentimentos de ira em jogo, pois esta pode cair em coisa diferente com o mínimo de descuido.
Dessa forma, não é fácil ser corretamente zangado de acordo com a vontade de Meus Mesmo
assim, aquele que conhece o quebrantamento homem exterior pode tratar severamente com
outro irmão sem seu próprio espírito ser perturbado, nem a presença de Deus interrompida.
Permanece em Deus tanto ao lidar com os outros, quanto na oração. Assim, depois de ter
chamado a atenção do seu irmão, pode orar sem qualquer esforço para recolher-se em Deus.
Reconhecemos que isto é um pouco difícil; quando, porém, o homem exterior é quebrantado,
torna-se possível, sem problemas.
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atividades, entrar em contato com o mundo através do homem exterior, mas, mesmo assim, o
homem interior permanece sem ser afetado porque ainda vive diante de Deus.
Consideremos um ou dois exemplos. Certo irmão está trabalhando na estrada. Se seu
homem exterior e interior já foram divididos, este último não será perturbado pelas coisas
externas. Pode labutar no seu homem exterior, enquanto, ao mesmo tempo, está internamente
adorando a Deus. Ou considere um pai: seu homem exterior talvez esteja rindo e brincando com
seu filhinho. De repente, surge certa necessidade espiritual. Pode imediatamente enfrentar a
situação com seu homem interior, pois nunca esteve ausente da presença de Deus. Assim, é
importante que reconheçamos que a divisão entre o homem exterior e o homem interior tem um
efeito muito decisivo sobre o trabalho e a vida da pessoa. Somente assim é que a pessoa pode
labutar sem distração.
Podemos descrever os crentes como sendo pessoas ou "únicas" ou "duplas." No caso
d'alguns, seu homem interior e exterior são um só; com outros, os dois foram separados.
Enquanto alguém é uma pessoa "única," deve conclamar a totalidade do seu ser para seu trabalho
ou para sua oração. Ao trabalhar, deixa Deus para trás. Ao orar mais tarde, deve separar-se do seu
serviço. Porque seu homem exterior não foi quebrantado, está forçado a aventurar-se e a
recolher-se. A pessoa “dupla”, do outro lado, tem a capacidade de trabalhar com seu exterior
enquanto seu homem interior permanece constantemente diante de Deus. Sempre que a
necessidade seu homem interior pode fluir com força e manifestar-se diante de outras pessoas.
Desfruta da presença ininterrupta Deus. Perguntemos a nós mesmos: Sou uma pessoa "única" ou
"dupla"? Faz toda a diferença, realmente, se o homem exterior é dividido do interior.
Se, pela misericórdia de Deus, você experimentou esta divisão, então, enquanto você está
trabalhando ou está ativo externamente, você sabe que há um homem dentro de você que
mantém a calma. Embora o homem exterior esteja ocupado em coisas externas, estas não
penetrarão no homem interior.
Aqui está o segredo maravilhoso! Conhecer a presença de Deus é através da divisão destes
dois. O Irmão Lawrence parecia ativamente ocupado com os trabalhos da cozinha, mas dentro
dele havia outro homem que ficava diante de Deus e que desfrutava de comunhão com Ele, sem
perturbação alguma. Semelhante divisão interior conservará nossas reações livres da
contaminação da carne e do sangue.
Concluindo, lembremo-nos de que a capacidade de usar nosso espírito depende da obra
dupla de Deus: o quebrantamento do homem exterior e a divisão entre o espírito e a alma, ou
seja: a separação do nosso homem interior do exterior. Somente depois de Deus ter realizado
estes dois processos em nossa vida é que poderemos exercitar nosso espírito. O homem exterior é
quebrantado mediante a disciplina do Espirito Santo; é dividido do homem interior pela revelação
do Espírito Santo (Hb 4:12).
CAPÍTULO 3
Nossa força humana é limitada. Se um irmão puder carregar somente cinquenta quilos, e
você quiser que ele pegue mais dez, ele simplesmente não pode fazê-lo. É uma pessoa limitada,
incapaz de realizar um trabalho ilimitado. Os cinquenta quilos que já está carregando é "a coisa
em mãos." Assim como a força física do nosso homem periférico é limitada, assim também
acontece com a força do nosso homem exterior.
Muitos, sem perceberem este princípio, gastam descuidadamente a força do seu homem
exterior. Se, por exemplo, alguém desse profusamente todo o seu amor aos pais, não lhe Sobraria
forças para amar seus irmãos, sem mencionar outras pessoas. Ao esgotar assim as forças (da sua
alma), nada sobra dirigir aos outros.
Assim acontece com nossa força mental. Se a atenção da pessoa for focalizada em certa
questão, e esgotar todo o seu tempo só pensando nela, não lhe sobrarão forças para pensar em
outras coisas. Na Sua Palavra, Deus explicou nosso problema: “Porque a lei do Espírito da vida em
Cristo Jesus te livrou da lei do pecado e da morte" (Rm 8:2). Mas por que estalei do Espírito da vida
é ineficaz em certas pessoas? Mais uma vez, lemos: "A fim de que o preceito da lei se cumprisse
em nós que não andamos segundo a carne, mas segundo o Espírito" (Rm 8:4). Em outras palavras,
a lei do Espírito da vida opera eficazmente somente para os que são espirituais, ou seja já: os que
cuidam das coisas do Espírito. Quem são estes? São os que não andam segundo a carne. Isto é,
não são dominados pelos deleites da carne. Por exemplo, certa mãe vai sair, e deixa seu nené aos
cuidados de uma amiga. Cuidar do nenê significa prestar atenção a ele. Enquanto você está
encarregado com o cuidado de um nené, você não ousa deixar-se distrair fazendo outras coisas.
De modo semelhante, somente aqueles que não fixam suas intenções nas coisas carnais podem
prestar atenção às coisas espirituais. Aqueles que fixam suas intenções nas coisas espirituais ficam
sujeitos à força do Espírito Santo. Nossas forças mentais estão sujeitos à força do Espírito Santo.
Nossas forças mentais estão limitadas. Se as esgotarmos nas coisas da carne, achar-nos-emos
mentalmente inadequados para as coisas do Espírito.
Reconhecemos, portanto, que assim como nossas forças físicas estão limitadas, assim
acontece com as forças da alma, as do nosso homem exterior. Enquanto tivermos "coisas em
mãos" não podemos fazer a obra de Deus. De acordo com o número de coisas em mãos, as forças
para servir a Deus diminuem ou aumentam. Logo, a coisa em mãos fica realmente um
impedimento, e este, não de tamanho pequeno.
Além disto, a pessoa pode ter muitas coisas em mãos, emocionalmente: tais como
predileções ou antipatias, inclinações ou expectativas variadas e conflitantes. Todas estas puxam
com atração magnética. Com tantas coisas em mãos, quando Deus pede a uma pessoa que Lhe dê
sua afeição, a pessoa não pode corresponder, porque já gastou toda a sua emoção. Se já esgotou
um suprimento de dois dias de recursos emocionais, terá que passar igual período de tempo antes
de poder voltar a sentir e falar de modo adequado. Desta maneira, quando a emoção for
desperdiçada em coisas secundárias, não pode ser usada de modo irrestrito para Deus.
Há, todavia, pessoas que manifestam uma vontade de ferro, uma personalidade forte cujos
poderes de volição parecem ilimitados. Nas coisas de Deus, porém, são incapazes de tomarem
uma decisão; com frequência as pessoas mais fortes vacilam nas suas decisões diante de Deus.
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Porque é isto? Antes de respondermos, consideremos alguém que está cheio de ideias. Embora
pareça que nunca está perplexo para concepção de novos planos, quando se trata de discernir a
vontade de Deus nas coisas espirituais, está totalmente destituído de luz. Por que é assim?
Enquanto o homem exterior está tão carregado e tão exausto, com "as coisas em mãos",
poucas forças sobram para qualquer exercício espiritual. É necessário, pois, ver a força limitada do
homem exterior. Embora quebrantado, deve existir uma sabedoria para usar estas forças. Quão
necessário, pois, é termos "mãos vazias"!
Ao lidar com o homem, o Espírito de Deus nunca passa por cima do espírito do homem.
Nem nosso espírito pode passar por cima do homem exterior. Este é um princípio muito
importante para ser compreendido. Assim como o Espírito Santo não passa por cima do espírito
do homem, assim também nosso espírito não desconsidera o homem exterior, para então passar a
funcionar diretamente. A fim de tocar em outras vidas, nosso espírito deve passar através do
homem exterior. Logo, quando as forças deste último forem consumidas mintas coisas em mãos,
Deus não pode realizar Sua obra através de nós. Não há saída para o espírito humano nem para o
Espírito Santo. O homem interior não pode fluir porque é resistindo e bloqueado pelo homem
exterior. É por isso que sugerimos repetidas vezes que este homem exterior deve ser
quebrantado.
A coisa em mãos está ali antes de Deus começar a operar. Não pertence a Deus, nem
precisa da Sua ordem, do Seu poder, ou da Sua decisão para ser realizada. Não é algo que está sob
a mão de Deus, mas, sim, é uma ação independente.
Antes de seu homem exterior ser quebrantado, você está ocupado com suas próprias
coisas, anda no seu próprio caminho, e ama sua própria gente. Se Deus quiser usar seu amor para
amar os irmãos, Ele deve primeiramente quebrantar seu homem exterior. Este amor que você
tem, passa assim, a ficar maior. O homem interior deve amar, mas tem de amar através do
homem exterior. Se o homem exterior estiver ocupado com a coisa em mãos, o interior será
privado do seu canal apropriado para amar.
Mais uma vez: quando o homem interior precisa usar sua vontade, descobre que ela está
agindo independentemente, já ocupada pela coisa em mãos. Para quebrantar nossa vontade, Deus
deve dar-nos um golpe pesado até que nos prostremos no pó e digamos: "Senhor, não ouso
pensar, não ouso pedir, não ouso resolver por conta própria. Em toda e qualquer coisa preciso de
Ti." Ao sermos feridos, devemos aprender que nossa vontade não deve agir independentemente.
Sem a cooperação do homem exterior, o interior sofre grandes desvantagens. Imaginemos
que um irmão vai pregar a Palavra. Tem uma preocupação no seu espírito. Se, porém, deixa de
achar pensamentos à altura, não pode entregar a mensagem, e ela logo desaparecerá. Embora a
mensagem permeie a totalidade do seu espírito, tudo é fútil se sua mente não conseguir
comunicá-la.
Não podemos trazer os homens à salvação, meramente com a mensagem em nosso
espírito; esta deve ser expressa através da nossa mente. A mensagem do homem interior deve ser
expressa pelo homem exterior. Sem pronunciamento, é impossível tornar conhecida aos outros a
Palavra de Deus. As palavras do homem não são as de Deus, mas as últimas devem ser
comunicadas pelas primeiras. Quando o homem tem as palavras de Deus, Deus pode falar; quando
o homem não as tem, Deus não pode falar. O problema hoje é que, embora nosso homem interior
esteja disponível a Deus — capaz de receber a mensagem de Deus — nosso homem exterior é
impulsionado por tais pensamentos múltiplos e confusos desde a manhã até à noite que nosso
espírito não pode achar saída.
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Deste modo, Deus deve esmagar nosso homem exterior. Quebra nossa vontade tirando as
coisas da "mão", de modo que a nossa vontade não possa agir independentemente. Não a fim de
que não tenhamos mente, mas, sim, a fim de que não pensemos segundo a carne, de acordo com
nossas imaginações que divagam. Não para que sejamos destituídos de emoções, mas, sim, a fim
de que todas as nossas emoções estejam sob o controle e a restrição do homem interior. Isto dá
ao homem interior uma vontade, uma mente, e emoções que podem ser usadas. Deus quer que
nosso espírito use nosso homem exterior para amar, para pensar, e para decidir. Embora não seja
Sua intenção exterminar nosso homem exterior, devemos receber esta experiência básica de
sermos quebrantados, se aspiramos o serviço eficaz a Deus.
Até que isto aconteça, o homem interior e o exterior estão em desarmonia, sendo que
cada um age independentemente do outro. Quando somos quebrantados, o homem exterior está
submetido ao controle do interior, e dessa maneira, unifica nossa personalidade, de modo que o
homem exterior espatifado seja um canal para o homem interior.
Ora, deve ser reconhecido que uma personalidade unificada, pode frequentemente
caracterizar uma pessoa não-salva, mas, neste caso, o homem interior está sob o controle do
homem exterior. Embora o espírito humano exista, é tão surrado pelo homem exterior que o
máximo que pode fazer é levantar uns protestos conscientes. O homem interior é totalmente
dominado pelo homem exterior.
Depois de alguém ser salvo, no entanto, é a intenção de Deus que experimente a inversão
desta ordem. Assim como seu homem exterior controlava o interior antes de ser salvo, assim
agora seu homem interior deve ter domínio absoluto sobre o exterior.
Podemos usar o ciclismo como ilustração. No terreno plano, pedalamos a bicicleta e as
rodas giram pela estrada a fora. Semelhantemente, quando nosso homem interior é forte, e o
homem em exterior é quebrantado, "pedalamos" e as "rodas" giram pela estrada afora. Podemos
resolver se vamos continuar, ou parar , e com que velocidade viajaremos. No caso de uma
bicicleta num declive, no entanto, as rodas giram sem pedalarmos, pois, parece que a estrada
simplesmente nos leva adiante. De modo semelhante, se nosso homem exterior for duro e sem
quebrantamentos, será como uma bicicleta descendo uma ladeira, a roda livre, fora de controle.
Se o Senhor nos for gracioso, nivelando a ladeira da nossa experiência por meio de quebrantar o
homem exterior — de modo que este não fique e dar conselhos e fazer decisões de modo
independente - seremos como aqueles que podem usar apropriadamente seu espírito.
Ninguém está equipado para trabalhar simplesmente porque aprendeu alguns ensinos. A
pergunta básica continua sendo: Que tipo de homem é ele? Aquele cujas operações interiores
estão erradas, mas cujo ensino está correto, pode suprir as necessidades da igreja? A lição básica
que devemos aprender e sermos transformados em vasos apropriados para o uso do Mestre. Isto
pode ser feito somente mediante o quebrantamento do homem exterior.
Deus está operando incessantemente em nossa vida. Muitos anos de sofrimentos,
provações, e impedimentos — trata-se da mão de Deus, que dia após dia procura levar a efeito
Sua obra de nos quebrantar. Você não vê o que Deus está fazendo neste ciclo interminável de
dificuldades? Senão, você deve pedir a Ele: "Ó Deus, abre os meus olhos a fim de que eu perceba a
Tua mão." Quão frequentemente os olhos de um asno são mais agudos do que os de alguns que se
denominam profetas.
Embora o asno já tivesse visto o Anjo do Senhor, o dono dele não o vira. O asno
reconheceu a mão de Deus que proibia, mas aquele que se chamava de profeta não a reconheceu.
Devemos ter a consciência de que o quebrantamento é o modo de Deus agir em nossa vida. Quão
triste é que alguns ainda imaginam que se apenas pudessem absorver mais ensino, acumular mais
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matéria para pregação, e assimilar mais exposição bíblica, seriam mais proveitosos para Deus. Esta
ideia está totalmente errada. A mão de Deus está sobre você para quebrantá-lo — não segundo a
sua vontade, mas, sim, a dEle; não segundo os seus pensamentos, mas, sim, os dEle; não segundo
sua decisão, mas a dEle. Nossa dificuldade é que, à medida em que Deus nos resiste, culpamos a
outras pessoas. Reagimos como aquele profeta que, cego à mão de Deus, culpava o asno por
recusar-se a fazer um movimento sequer.
Tudo quanto vem a nós é ordenado por Deus. Para um cristão, nada é acidental. Devemos
pedir a Deus que abra nossos olhos para vermos que Ele nos está ferindo em todas as coisas e em
todas as áreas da nossa vida. Certo dia, quando, mediante a Sua graça sobre nós, formos capazes
de aceitar a providência de Deus em nosso meio-ambiente, nosso espírito será liberado e pronto
para funcionar.
Há uma lei imutável de Deus operando em nós: Seu propósito específico está
quebrantando e liberando nosso espírito para seu livre exercício. Devemos compreender que nada
nas nossas orações, rogos ou promessas afetará ou mudará este propósito; é de acordo com sua
lei de realizar um quebrantamento e liberação em nós; todas as nossas orações não alterarão esta
lei. Se você deliberadamente enfiar a mão numa fogueira, a oração o livrará da queimadura e da
dor (exceto no caso de um milagre)? Se você não deseja ser queimado pelo fogo, mas
deliberadamente coloca a mão no meio dele apesar disto, então não pense que a oração o
protegerá das consequências; não o fará. Da mesma maneira, percebamos que o modo de Deus
tratar conosco é deliberado, de acordo com Sua lei. A fim de se manifestar, o homem interior deve
passar pelo exterior. Até que nosso homem exterior seja espatifado, simplesmente não pode fluir.
Não procure transtornar esta lei e seus efeitos ao orar pedindo bênçãos; tais orações são em vão.
O orar nunca poderá transformar a lei de Deus.
Devemos resolver esta questão de uma vez para sempre. O caminho da obra espiritual
acha-se quando Deus se manifesta através de nós. Este é o único caminho que Deus ordenou. Para
quem está intato, o evangelho está bloqueado e não pode fluir através da vida. Curvemo-nos
totalmente diante de Deus. Obedecer a lei de Deus é muito melhor do que dizer muitas orações é
muito melhor parar de orar e confessar: "Deus, prostro-me diante de Ti." Sim, quão
frequentemente nossas orações por bênçãos realmente erguem barreiras. Ansiamos pela bênção,
mas parece que achamos a misericórdia de Deus nas experiências que esmagam. Se apenas
procurássemos a iluminação, aprendêssemos a submeter-nos à Sua mão, e obedecêssemos à Sua
lei, descobriríamos que o resultado seria a própria bênção pela qual ansiamos.
CAPÍTULO 4
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do nosso espírito a conhecer a condição da pessoa diante de nós, podemos, então, oferecer a
palavra certa.
Nos Evangelhos, descobrimos que sempre que os homens vinham para nosso Senhor, Ele
sempre tinha a palavra certa. Esta é uma coisa maravilhosa. O Senhor não falou à mulher
samaritana acerca do novo nascimento, nem contou a Nicodemos acerca das águas vivas. A
verdade do novo nascimento era para Nicodemos, ao passo que a verdade das águas vivas era
para a mulher samaritana. Quão apropriadas eram as palavras. Aqueles que não O tinham seguido
foram convidados a vir; mas os que desejavam segui-Lo foram convidados a carregar a cruz. Para
um que se ofereceu, Ele falou sobre contar o custo; e para um que se demorava, disse: "Deixa os
mortos que enterrem seus próprios mortos." As palavras de nosso Senhor eram apropriadíssimas,
porque conhecia todos os homens. Nosso Senhor sabia se vinham como interessados sinceros ou
meramente para fazer espionagem contra Ele; e aquilo que Ele lhes dizia sempre era bem
aplicável. Que Deus seja misericordioso conosco afim de que nós, também, possamos aprender
dEle como conhecer os homens ao ponto de sermos eficazes ao lidarmos com eles.
Sem tal conhecimento que lhe é dado, o irmão somente pode lidar com as almas segundo
seu próprio entendimento. Se tem um sentimento especial num certo dia, falará a todas as
pessoas de acordo com que aquele sentimento, seja quem for apareça. Se tem um assunto
predileto, falará sobre ele a todos que vierem a ele. Como um trabalho destes pode ser eficaz?
Nenhum médico pode usar a mesma receita para todo, os seus pacientes. Infelizmente, alguns
daqueles que servem a Deus têm uma só receita. Embora não possam primeiramente diagnosticar
as enfermidades das pessoas, estão procurando curá-las. A despeito da sua ignorância das
complexidades do homem e da sua falta de discernimento da condição espiritual do homem,
mesmo assim, parecem estar bem prontos para tratar toda enfermidade. Quão estulto é ter uma
só uma receita espiritual, e mesmo assim, procurar tratar de todas as doenças espirituais!
Você imaginou que são os morosos que não podem discernir, e que somente os habilidosos
o podem? Não: nesta obra, os morosos e os habilidosos são igualmente excluídos. Você não pode
usar sua mente ou seu sentimento (independentes) para discernir as pessoas. Seja quão aguçada
for sua mente, você não pode penetrar na profundidade do homem e revelar sua condição.
Depois de encontrar-se com uma alma, cada obreiro deve primeiramente discernir qual é a
verdadeira necessidade daquele indivíduo diante de Deus. Frequentemente, você não pode
confiar naquilo que ele diz. Embora ele possa insistir corretamente que tem "dor de cabeça," esta
pode ser mero sintoma de uma condição mais profunda cujas raízes devem ser achadas noutra
parte. Simplesmente porque sente algum calor não significa que tem uma "febre alta." É provável
que ele lhe diga muitas coisas que não têm qualquer aplicação ao caso dele. Uma "pessoa doente"
compreende bem raramente qual é seu problema verdadeiro; é-lhe necessário, portanto, que
você faça seu diagnóstico e lhe ofereça os meios da cura. Talvez você queira que ela lhe conte a
sua necessidade, mas ela tende a enganar-se. Somente um diagnosticador treinado, que tem
perícia em reconhecer enfermidades espirituais, pode discernir a necessidade real do "paciente."
Em cada diagnóstico você deve ter a certeza. Um diagnóstico que é meramente subjetivo
certamente afligirá as pessoas com doenças imaginárias, insistindo teimosamente que isto ou
aquilo é o mal delas.
Às vezes, descobrimos que a enfermidade específica está além da nossa capacidade para
ajudar. Não seja tão tolo supondo que pode lidar com toda e qualquer situação e ajudar a todos.
Em prol daqueles aos quais você pode ajudar, você deve gastar e ser gasto. Quando você não pode
ser útil, deve contar ao Senhor: "Isto está além da minha capacidade; não posso discernir esta
doença. Ainda não aprendi esta. Ó Senhor, sê misericordioso." Nunca devemos pensar que
podemos dar conta de todo o trabalho espiritual, nem devemos procurar monopolizá-lo. Aqui
temos nossa oportunidade de ver o fornecimento da parte dos diferentes membros do Corpo. Se
você achar que certo irmão ou irmã pode tratar do problema, procure-o e diga: "Isto está além da
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minha capacidade; talvez esteja dentro da sua jurisdição." Cooperando desta maneira no Corpo,
aprendemos a agir com mútuo relacionamento, não independentemente.
Devemos ressaltar isto mais uma vez: todo obreiro deve aprender diante do Senhor como
conhecer o homem. Quantas vidas, são estragadas depois de passarem pelas mãos de irmãos
zelosos que não aprenderam, mas, sim, dão em vão opiniões subjetivas para suprir necessidades
objetivas! As pessoas não estão necessariamente padecendo dos males que nós imaginamos que
tenham. Nossa responsabilidade é discernir sua verdadeira condição espiritual. Se não
participamos primeiramente do entendimento espiritual, como poderemos esperar que ajudemos
os demais filhos de Deus?
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instáveis. Como podemos ser usados quando estamos tão indignos de confiança? Devemos passar
pelo tratamento de Deus, senão, nossos esforços são em vão.
Assim, outra vez, devemos enfrentar esta pergunta: Temos consciência real da grandeza da
nossa responsabilidade? O Espírito de Deus não opera diretamente nas pessoas; faz Sua obra
através dos homens. As necessidades das pessoas são supridas, de um lado, pela disciplina do
Espírito Santo (ao ordenar seu meio-ambiente), e, do outro lado, pelo ministério da Palavra. Sem o
fornecimento do ministério da Palavra, o problema espiritual dos santos não poderá ser
solucionado. Que grande responsabilidade recaiu sobre Seus obreiros! É seríssimo. O
fornecimento que a igreja está recebendo, mostra se a pessoa é usável ou não.
Suponhamos que é a característica de certa doença chegar a uma temperatura de,
digamos, 39º C. Mas a não ser que você saiba a temperatura exata, seu diagnóstico não poderá ser
certo. Você não pode determinar, ao tocar o paciente com a mão, que tem uma febre de cerca de
39º C. Assim também nos assuntos espirituais, seria por demais arriscado procurarmos ajudar os
outros enquanto nossos sentimentos e opiniões estivessem completamente errados e nossa
compreensão espiritual estivesse inadequada. Somente se formos acurados e fidedignos é que o
Espírito de Deus pode ser liberado através de nós.
O ponto de partida de uma obra espiritual é marcado por muitos reajustes feitos diante de
Deus. Um termómetro é feito de acordo com um padrão específico, e é cuidadosamente
examinado para cumprir especificações rígidas. Se, pois, nós somos o termómetro, quão severa
deve ser a disciplina para nos levar até o padrão de exatidão que Deus exige! Na obra de Deus,
somos "médicos" bem como "instrumentos médicos." Quão importante é que passemos no teste
dEle.
Uma vez aprendidas estas lições básicas, descobrimos que nosso espírito é liberto e capaz
de definir a verdadeira condição de outras pessoas. Como podemos colocar isto em prática?
Para tocar o espírito de um homem, devemos esperar até que ele abra sua boca e fale.
Poucos chegam à posição, em qualquer tempo, em que podem tocar o espírito do homem sem
primeiramente ouvir o que ele tem para dizer. A Palavra de Deus diz: "Porque a boca fala do que
está cheio o coração" (Mateus 12:34). Seja qual for sua intenção real, seu espírito é revelado por
aquilo que sua boca fala. Se for altivo, um espírito altivo se manifestará; se for hipócrita, um
espírito hipócrita ficará em evidência; ou se for invejoso, um espírito de ciúme. Enquanto você o
ouve falar, pode tocar seu espírito. Não preste atenção àquilo que ele diz, mas note especialmente
a condição do seu espírito. Realmente conhecemos o homem, não meramente pelas suas
palavras, mas, sim, pelo seu espírito.
Em certa ocasião, quando o Senhor Jesus estava viajando em direção a Jerusalém, dois dos
discípulos viram que os samaritanos não O recebiam. Perguntaram a Ele: "Senhor, queres que
mandemos descer fogo do céu para os consumir?" (Lucas 9: 54). Enquanto falavam, seu espírito foi
revelado. A resposta do Senhor foi: "Vós não sabeis de que espírito sois" (9: 55). O Senhor nos
mostra aqui que escutar as palavras de um homem é conhecer seu espírito. Tão logo as palavras
são pronunciadas, o espírito é revelado, "porque a boca fala do que está cheio o coração."
Há ainda outra consideração a ser levada em conta. Quando você está escutando uma
conversa, não permita que o assunto em discussão distraia você do espírito. Suponhamos que dois
irmãos estejam envolvidos numa contenda, e cada um culpa o outro. Se esta questão é trazida
diante de você, como agirá? Embora você talvez não tenha nenhum modo objetivo de averiguar os
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fatos se apenas os dois estiverem presentes, você certamente sabe que, tão logo que eles abrem a
boca, seus espíritos são revelados. Entre os cristãos, o certo e o errado é julgado, não somente
pela ação, mas também pelo espírito. Quando um irmão começa a falar, você pode sentir
imediatamente que seu espírito está errado, embora talvez lhe faltem informações sobre os fatos
do caso. Um dos irmãos talvez se queixe que o outro ralhou com ele, mas imediatamente você
sente que seu espírito não está certo! A questão verdadeira está com o espírito.
Diante de Deus, o certo ou o errado não é determinado tanto pelo ato quanto pelo
espírito. Quão frequentemente na igreja uma ação errada é acompanhada por um espírito errado.
Mas se o julgamento for feito exclusivamente segundo o ato, arrastamos a igreja para outro
âmbito. Deveríamos estar no âmbito do espírito, não naquele da mera ação exterior.
Uma vez que nosso próprio espírito tenha sido liberado, podemos detectar a condição do
espírito dos outros. Se entrarmos em contato com um espírito que está fechado, devemos exercer
nosso espírito em julgar a questão e discernir o homem. Que possamos dizer com Paulo: "Daqui
por diante, a ninguém conhecemos segundo a carne" (2 Co 5:16). Não conhecemos o homem
segundo a carne, mas, sim, segundo o espírito. Tendo aprendido esta lição básica, fornecemos um
caminho para Deus operar Seu propósito.
CAPÍTULO 5
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registradas nos Evangelhos e em Atos. Para o evangelho ter seu efeito mais completo no homem,
o Senhor precisa ter um caminho nas vidas dos mensageiros do evangelho.
Nestes anos temos ficado totalmente convictos de que o Senhor está trabalhando para a
recuperação. O evangelho da graça e o evangelho do reino devem ser juntados. Nos Evangelhos,
os dois nunca são separados. Somente em anos posteriores é que parece que aqueles que
ouviram o evangelho da graça sabem pouco ou nada do evangelho do reino. Deste modo, os dois
foram separados. Mas já é tempo para eles serem unidos, de modo que as pessoas sejam
completamente salvas, deixando tudo e se consagrando totalmente ao Senhor.
Curvemos nossa cabeça diante do Senhor e reconheçamos que o evangelho deve ser
completamente pregado, e seus mensageiros totalmente tratados. Para o evangelho entrar nos
homens, devemos permitir que Deus seja manifestado em nós. Assim como a pregação eficaz do
evangelho requer mais poder, assim também os mensageiros do evangelho devem pagar um
preço mais alto. Devemos colocar tudo sobre o altar. Oremos assim: "Senhor, coloco meu tudo
sobre o altar. Acha um caminho através de mim a fim de que também a igreja ache um caminho
em mim. Eu não gostaria de ser aquele que bloqueia a Ti e que bloqueia a igreja."
O Senhor Jesus nunca restringiu Deus de qualquer maneira. Durante quase dois mil anos
Deus tem trabalhado na igreja, visando o dia em que a igreja já não O restringirá. Assim como
Cristo manifesta plenamente a Deus, assim também será com a igreja. Passo a passo, Deus está
instruindo Seus filhos e tratando com eles; uma vez após outra sentimos Sua mão sobre nós.
Assim será até aquele dia em que a igreja fique sendo realmente a plena manifestação de Deus.
Hoje, voltemo-nos para o Senhor e confessemos: "Senhor, estamos envergonhados. Atrasamos a
Tua obra; fomos um empecilho na Tua vida; bloqueamos a propagação do evangelho; e limitamos
o Teu poder." Individualmente em nosso coração, dediquemo-nos a Ele novamente, dizendo:
"Senhor, ponho meu tudo sobre o altar, a fim de que Tu tenhas um caminho através de mim."
Se esperamos que a eficácia do evangelho seja plenamente recuperada, a consagração
deve ser total. Devemos consagrar-nos a Deus assim como na igreja primitiva. Que Deus tenha
uma via de saída através de nós.
CAPÍTULO 6
O QUEBRANTAMENTO E A DISCIPLINA
Para o homem exterior ser quebrantado, é imperativo uma plena consagração. Mesmo
assim, devemos entender que este ato de crise por si só, não resolverá a totalidade do nosso
problema no serviço. A consagração é meramente uma expressão da nossa disposição para estar
nas mãos de Deus, e pode ocorrer em apenas uns poucos minutos. Não pense que Deus pode
acabar Seus tratos conosco neste tempo tão curto. Embora estejamos dispostos a oferecer-nos
completamente a Deus, estamos apenas no começo da estrada espiritual. É como entrar pelo
portão. Depois da consagração, deve haver a disciplina do Espírito Santo para nos tornar em vasos
dignos para o uso do Mestre. Sem consagração, o Espírito Santo encontra dificuldade em nos
disciplinar. Mesmo assim, a consagração não pode servir como substituto da Sua disciplina.
Aqui, pois, há uma distinção vital: nossa consagração somente pode ser de acordo com a
medida do nosso discernimento espiritual e da nossa compreensão, mas o Espírito Santo disciplina
de acordo com Suas próprias luzes. Realmente não sabemos o quanto a nossa consagração
envolve. Nossa luz é tão limitada que, quando nos parece que está no seu auge, aos olhos de Deus
é negra como breu. A exigência excede a tudo quanto temos a possibilidade de consagrar — pelo
menos, no nosso entendimento limitado. A disciplina do Espírito Santo, por outro lado, nos é
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medida conforme nossa necessidade vista na própria luz de Deus. Ele conhece nossa necessidade
especial e, portanto, pelo Seu Espírito, ordena nossas circunstâncias de tal maneira que leva a
efeito o quebrantamento do homem exterior. Veja até que ponto a disciplina do Espírito Santo
transcende nossa consagração.
Visto que o Espírito Santo opera conforme a luz de Deus, Sua disciplina é eficiente e
completa. Frequentemente estranhamos as coisas que nos acontecem, mas, se fôssemos deixados
por conta própria, poderíamos enganar-nos com a melhor das nossas escolhas. A disciplina que Ele
ordena transcende nosso entendimento. Quão frequentemente somos apanhados despreparados
e concluímos que, decerto, uma coisa tão drástica não é nossa necessidade. Muitas vezes, Sua
disciplina desce sobre nós repentinamente, sem recebermos aviso prévio! Talvez insistamos que
estamos vivendo "na luz", mas o Espírito Santo está tratando conosco de acordo com a luz de
Deus. A partir do momento em que O recebemos, Ele tem ordenado nossas circunstâncias para
nosso proveito de acordo com Seu conhecimento de nós.
A operação do Espírito Santo em nossas vidas tem seu lado positivo bem como negativo —
ou seja, há tanto um lado construtivo quanto um destrutivo. Depois de nascermos de novo, o
Espírito Santo habita em nós, mas nosso homem exterior mui frequentemente O priva da Sua
liberdade. É como procurar andar com um par de sapatos do tamanho errado. Porque nosso
homem exterior e o interior estão em desacordo entre si, Deus tem de empregar quaisquer meios
que considera eficaz em demolir qualquer fortaleza sobre a qual nosso homem interior não tem
controle algum.
Não é mediante o fornecimento de graça ao homem interior que o Espírito Santo
quebranta o exterior. É lógico que Deus quer que o homem interior seja forte, mas Seu método é
utilizar meios externos para diminuir nosso homem exterior. Seria quase impossível para o homem
interior realizar isto, visto que, os dois são tão diferentes quanto à sua natureza que dificilmente
podem causar qualquer ferida um ao outro. A natureza do homem exterior e a das coisas externas
são semelhantes. Desta maneira, o primeiro pode ser facilmente afetado por estas últimas. As
coisas externas podem ferir o homem exterior muito dolorosamente. É assim que Deus usa coisas
externas para tratar do nosso homem exterior.
Você se lembra que a Bíblia diz que dois pardais são vendidos por um asse (Mt 10: 29) e
que cinco pardais são vendidos por dois asses (Lc. 12: 6). O preço certamente é barato, e o quinto
pardal é oferecido de graça. Mesmo assim, "nenhum deles cairá em terra sem o consentimento de
vosso Pai. E quanto a vós outros, até os cabelos da cabeça estão todos contados" (Mt 10:29, 30).
Não somente cada cabelo é contado, como também é numerado. Podemos, portanto, ter certeza
de que todas as nossas circunstâncias são ordenadas por Deus. Nada é acidental.
A providência de Deus é de acordo com Seu conhecimento das nossas necessidades, e tem
em mira o despedaçar do nosso homem exterior. Sabendo que uma certa coisa externa nos
afetará assim, Ele dispõe a situação a fim de nos fazer encontrar com ela uma vez, duas vezes, e
talvez até mais vezes. Você não percebe que todos os eventos da sua vida durante os últimos
cinco anos ou dez anos foram ordenados por Deus para sua educação? Se você murmurou e se
queixou, você estava ignorando a disciplina do Espírito Santo. Lembre-se de que tudo quanto nos
acontece é medido pela mão de Deus para nosso bem supremo. Embora, provavelmente não seja
o que escolheríamos, Deus sabe o que é melhor para nós. Onde estaríamos nós hoje, se Deus não
tivesse nos disciplinado assim por meio de ordenar nossas circunstâncias? É exatamente isto que
nos conserva puros, e andando nos Seus caminhos. Como são estultos aqueles que têm
murmurações na sua boca e rebelião no seu coração diante das próprias coisas que o Espírito
Santo lhes distribuiu sob medida para seu próprio bem.
Tão logo somos salvos, o Espírito Santo começa a distribuir disciplina; mas não pode agir
livremente até que nossa consagração seja completa. Depois da pessoa ser salva mas ainda não
consagrada, e enquanto ainda ama a si mesma mais do que a Deus, o Espírito Santo, mesmo
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assim, está operando para trazê-la sob controle e quebrantar seu homem exterior, a fim de que,
Ele possa operar sem impedimento.
Finalmente, vem um momento em que você percebe que não pode viver por si só e para si
mesmo. Na luz vaga que você possui, você vem para Deus e diz: "Consagro-me a Ti. Quer venha a
vida, quer venha a morte, entrego-me nas Tuas mãos." Isto fortalecerá a obra do Espírito Santo na
sua vida. Nisto acha-se a importância da consagração: deixa o Espírito Santo operar sem restrição.
Não ache estranho, portanto, quando muitas coisas inesperadas lhe acontecem depois da sua
consagração.
Você disse ao Senhor: "Senhor! Faz o que achas melhor na minha vida." Agora, depois de
você ter-se colocado assim incondicionalmente nas Suas mãos, o Espírito Santo pode operar
livremente em você. Para resolver de todo o coração que seguirá ao Senhor, você deve prestar
bastante atenção à obra disciplinar do Espírito Santo.
Deus tem outorgado Sua graça a nós desde o dia em que fomos salvos. As maneiras pelas
quais podemos receber graça da parte de Deus são chamadas os "meios de graça." A oração e o
escutar uma mensagem são dois exemplos, porque através destes meios, podemos aproximar-nos
de Deus e receber graça. Este termo descritivo: "os meios de graça," têm sido universalmente
aceitos pela Igreja no decurso dos séculos. Recebemos graça através das reuniões, das mensagens,
das orações, e assim por diante. Mas decerto o maior meio de graça que não podemos nos dar ao
luxo de negligenciar, é a disciplina do Espírito Santo. Nada pode ser comparado com este meio de
graça — nem a oração, nem as leituras bíblicas, nem as reuniões, nem as mensagens, nem a
meditação, nem o louvor. Entre todos os meios de graça dados por Deus, parece que este é o mais
importante.
Seguir a história deste meio de graça pode mostrar-nos quão longe já andamos com o
Senhor. O que experimentamos diariamente, no lar ou na escola ou na fábrica ou na estrada, é
ordenado pelo Espírito Santo para nosso máximo benefício. Se não tiramos proveito deste maior
meio de graça, sofremos uma perda terrível. Nenhum dos outros meios pode substituí-lo, por mais
preciosos que sejam. As mensagens nos alimentam, a oração nos restaura, a Palavra de Deus nos
refrigera, e ajudar aos outros libera nosso espírito. Mas se nosso homem exterior permanecer
forte, damos a todos aqueles que entram em contato conosco, a impressão de sermos mistos e
impuros. As pessoas reconhecerão nosso zelo mas também nossos motivos mistos, nosso amor
para com o Senhor, mas também nosso amor para conosco. Sentem que somos um irmão
precioso, porém difícil, pois nosso homem exterior não foi quebrantado. Não nos esqueçamos
que, embora sejamos edificados através de mensagens, da oração, e da Bíblia, o maior meio de
edificação é a disciplina do Espírito Santo.
A partir de então deve haver, da nossa parte, uma consagração completa de modo que
devemos submete-nos àquilo que o Espírito Santo ordena. Semelhante submissa traz bênçãos
para nós. Se, ao invés disto, disputamos com Deus e seguimos nossas próprias inclinações,
perderemos o caminho da Sua bênção. Uma vez que reconhecemos que todas as providências de
Deus são para nosso máximo proveito —até mesmo coisas que nos são desagradáveis — e
estamos dispostos a aceitar estas coisas como medidas disciplinares da parte d'Ele, veremos como
o Espírito Santo fará uso de todas estas coisas ao lidar conosco.
Sejam quais forem as coisas às quais você está ligado, Deus tratará delas uma após a outra.
Nem seque trivialidades tais como as vestes, o comer e o beber podem escapar à mão cuidadosa
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do Espírito Santo. Ele não negligenciará uma só área na sua vida. Você pode até mesmo ignorar
sua afinidade por uma certa coisa, mas Ele sabe, e trata dela de modo muitíssimo eficiente. Até
que venha o dia em que todas estas coisas são destruídas, você não conhece liberdade perfeita.
Nestes tratamentos, você pode finalmente reconhecer a eficiência do Espírito Santo. Coisas há mui
esquecidas, são trazidas à mente pelo Senhor. As obras de Deus são perfeitas, e nada menos do
que a perfeição pode satisfazer a Ele. Deus não pode parar no meio do caminho. Às vezes, tratará
com você através d'outras pessoas, planejando para você ficar junto com uma pessoa com quem
está zangado, ou a quem você despreza, ou de quem tem ciúmes; ou, muito frequentemente, é
através daqueles que você ama. Antes disto, você não sabia quão impuro e misturado você era,
mas depois você reconhece quanto "lixo" havia em você. Você pensava que era totalmente do
Senhor, mas, depois de receber a disciplina do Espírito Santo, começa a reconhecer os efeitos de
longo alcance que as coisas externas tinham sobre você.
Além disto, a mão de Deus pode tocar na vida dos nossos pensamentos. Descobrimos que
nossos pensamentos são confusos, independentes, descontrolados. Fingimos ter mais sabedoria
do que outros. É então que o Senhor nos deixa colidir com um muro ou espatifar-nos até o pó -
tudo para nos mostrar que não devemos ter a ousadia de usar nossos pensamentos
desordenadamente. Uma vez que tenhamos sido iluminados nisto, temeremos nossos próprios
pensamentos como o fogo. Da maneira como se recolhe a mão imediatamente diante da chama,
assim nós também nos recolheremos instantaneamente quando encontramos nossos
pensamentos descontrolados. Lembraremos a nós mesmos: "Não é assim que devo pensar; estou
com medo de seguir meus próprios pensamentos."
Além disto, Deus assim disporá nossas circunstâncias de modo que possa lidar com nossas
emoções. Algumas pessoas são extremamente emotivas. Quando estão jubilosas, não podem se
conter; quando estão deprimidas, não podem ser consoladas. A totalidade da vida delas gira em
torno das suas emoções, e seu júbilo resulta em dissipação, e sua depressão em inatividade. Como
Deus retifica esta situação? Coloca-as em situações em que não ousam ser demasiadamente
felizes quando estiverem jubilosas, nem demasiadamente tristes quando estiverem deprimidas.
Somente podem depender da graça de Deus e viver pela Sua misericórdia, não pelas suas
emoções instáveis.
Embora sejam bem comuns as dificuldades com os pensamentos e emoções, a dificuldade
maior e mais prevalecente é com a vontade. Nossas emoções são desregradas por que nossa
vontade não foi tratada. A raiz está em nossa vontade. A mesma coisa diz respeito a nossos
pensamentos. Talvez possamos pronunciar com a boca as palavras: "Não se faça a minha vontade,
e, sim, a tua," mas quantas vezes realmente deixamos o Senhor assumir o controle quando as
coisas acontecem? Quanto menos você conhece a si mesmo, tanto mais facilmente pronuncia tais
palavras. Quanto menos iluminado você está, tanto mais fácil a submissão a Deus parece ser.
Aquele que fala com facilidade barata comprovou que nunca pagou o preço.
Somente quando somos tratados por Deus é que realmente vemos quão endurecidos
somos e quão dispostos a termos nossa própria opinião. Deus precisa tratar conosco para tornar
nossa vontade terna e dócil. Pessoas resolutas estão convictas de que seus sentimentos, modos e
julgamentos sempre estão certos. Considere como Paulo recebeu esta graça registrada em
Filipenses: "Não confiamos na carne" (3:3). Nós, também, devemos ser levados por Deus a uma
situação em que não ousamos confiar em nosso próprio julgamento. Deus permitirá que
cometamos engano após engano até compreendermos que este será nosso padrão para o futuro,
também. Realmente precisamos da graça do Senhor. Frequentemente o Senhor permite que
ceifemos consequências sérias dos nossos julgamentos.
Finalmente, você ficará tão aflito com seus fracassos que dirá: "Temo meus próprios
julgamentos assim como temo o fogo do inferno. Senhor, tendo a cometer enganos. A não ser que
Tu sejas misericordioso comigo, a não ser que Tu me apoies, a não ser que Tu me detenhas com
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Tua mão, errarei mais uma vez". Este é o começo da destruição do homem exterior: quando você
já não ousa confiar em si mesmo. Suas opiniões usualmente lhe vêm facilmente até que você
tenha sido tratado por Deus repetidas vezes e tenha sofrido muitos fracassos. Então, você se
rende e diz: "Deus, não ouso pensar, não ouso decidir." Esta é a disciplina do Espírito Santo:
quando todos os tipos de coisas e todos os tipos de pessoas estão fazendo pressões de todas as
direções.
Não pense que haverá qualquer relaxamento desta lição! Muitas vezes, o fornecimento da
palavra de Deus pode estar em falta, ou outro meio de graça pode ser insuficiente, mas este meio
de graça especial — a disciplina do Espírito Santo - sempre está conosco. Você pode dizer que não
tem oportunidade de escutar a Sua palavra e ser suprido por ela, mas isto nunca acontecerá no
caso da disciplina do Espírito Santo. Dia após dia, Ele está planejando amplas oportunidades para
você aprender.
Uma vez que você se rende a Deus, esta disciplina satisfará sua necessidade muito mais do
que o fornecimento da Sua palavra. Não é apenas para os cultos, os habilidosos, os dotados; não,
é o caminho para todo filho de Deus. O fornecimento da palavra de Deus, o poder da oração, a
comunhão dos crentes — nenhuma destas coisas pode substituir a disciplina do Espírito Santo. É
porque você precisa não somente ser edificado; precisa também ser quebrantado, de ser livrado
de todas as numerosas coisas na sua vida que não podem ser levadas para a eternidade.
A Cruz em Operação
A cruz é mais do que uma doutrina; deve ser posta em prática. Não pense que o caminho
para a humildade é lembrando-nos constantemente que não devemos ser orgulhosos. Devemos
ser feridos uma vez após outra — ainda que chegue a vinte vezes — até que nos rendamos e já
não somos orgulhosos. Nunca suponhamos que isto se realiza meramente por meio de seguir o
ensino de um determinado irmão. Não, é porque nosso orgulho tem sido quebrado através do
tratamento por Deus.
Mediante a operação da cruz, aprenderemos a depender da graça de Deus, não da nossa
memória. Quer lembremos, quer não, permanece o fato de que Ele está realizando uma obra que
é fidedigna e duradoura. Anteriormente, o homem exterior e o interior não podiam ficar de mãos
dadas; mas agora o homem exterior espera meigamente, com temor e tremor, diante de Deus.
Cada um de nós tem necessidade desta disciplina da parte do Senhor. Ao passarmos em
revista a história do nosso passado, não podemos deixar de ver a mão de Deus lidando com a
independência, o orgulho, e o egoísmo do nosso homem exterior. Descobrimos o significado das
coisas que nos aconteceram.
CAPÍTULO 7
A SEPARAÇÃO E A REVELAÇÃO
Deus deseja não somente quebrantar o homem exterior, como também separá-lo de tal
maneira que o homem interior já não seja emaranhado nas atividades do homem exterior. Ou
podemos simplesmente dizer que Deus quer dividir nosso espírito da nossa alma.
Quão raro é achar um espírito puro nestes dias. Geralmente quando nosso espírito
aparece, nossa alma aparece também; estão misturados. Assim, a primeira exigência na obra de
Deus é um espírito puro, não um espírito poderoso. Aqueles que descuidam deste fato, embora
sua obra talvez seja feita com poder, a acharão destruída devido à falta de pureza. Embora
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possuam verdadeiramente o poder de Deus, mesmo assim, por causa de ser misto o seu espírito,
estão destruindo aquilo que edificam. Vamos ver se podemos compreender como isto acontece.
Alguns podem pensar que, enquanto recebem poder da parte de Deus, todas as suas
habilidades naturais serão reconhecidas por Ele. Não é assim! Quanto melhor conhecemos a Deus,
tanto melhor conhecemos e amamos um espírito puro — pureza esta que não permite nenhuma
mistura entre o exterior e o interior. Aquele cujo homem exterior não foi tratado não pode
esperar que o poder que flui de dentro dele seja puro. Se o poder espiritual é misturado à medida
em que sai da pessoa, ainda que os resultados pareçam bons, trata-se de um pecado diante de
Deus.
Muitos irmãos jovens, mesmo sabendo que o evangelho é o poder de Deus, ainda insinuam
sua própria habilidade, suas piadas, e seus sentimentos pessoais na sua pregação do evangelho;
deste modo, as pessoas tocam neles e não somente no poder de Deus. Embora eles mesmos
talvez não percebam o fato, outros que são puros de espírito detectarão instantaneamente tais
impurezas. Quão frequentemente nosso zelo na labuta é misturado com prazer natural. Estamos
fazendo a vontade de Deus porque acontece que coincide com a nossa. Ao ficarmos firmes por
Deus estamos meramente expressando nossa personalidade forte.
Visto que nosso maior problema é com esta impureza, Deus deve operar em nossa vida de
tal maneira que nosso homem exterior fique quebrantado e nós fiquemos refinados das nossas
impurezas. Enquanto Deus está quebrando nossa casca exterior, dura, também está fazendo a
obra do refinamento. Deste modo, vemos Seu tratamento duplo da nossa pessoa: quebranta o
homem exterior, e divide-o do espírito. O primeiro é realizado através da disciplina do Espírito
Santo, ao passo que o segundo é através da revelação do Espírito.
O homem exterior precisa ser quebrantado para o espírito ser liberado. Quando, porém, o
espírito emergir não deve ser anuviado pelo homem exterior. Este problema nos leva mais longe
do que a liberação do espírito, porque diz respeito à limpeza ou pureza do espírito.
Se alguém não for esclarecido quanto à natureza do homem exterior, e, portanto, não for
julgado rigorosamente diante de Deus, seu homem exterior automaticamente sairá juntamente
com seu espírito. Enquanto ele está ministrando diante de Deus, nós podemos perceber que ele
mesmo também se manifestou. Pode exibir a Deus, mas também exibe seu próprio- eu não
julgado. Não é estranho que nossa parte mais destacada, nosso aspecto mais forte, sempre toca
em outras pessoas? Nosso homem exterior não julgado projetará seu ponto mais forte sobre
outras pessoas. Não há nada de imaginativo nisto. Como você pode esperar que se tornará
espiritual no púlpito se não for espiritual no seu quarto? Você pode projetar-se para dentro da
espiritualidade? Por mais que você se esforce, você fica revelado cada vez que abre sua boca.
Se você realmente deseja ser liberto, Deus terá de tratar do seu ponto forte de modo
básico, não apenas superficialmente. Somente depois de Ele ter quebrantado você neste aspecto,
é que seu espírito poderá ser liberado sem suas impurezas serem impostas sobre outras pessoas.
A impureza é o maior problema na vida dos servos de Deus. Frequentemente, tocamos
tanto a vida como a morte em nosso irmão. Achamos a Deus, mas também ao próprio-eu, um
espírito meigo, mas também a teimosia, ao Espírito Santo, mas também a carne — tudo na mesma
pessoa. Quando se levanta para falar, impressiona os outros com um espírito misto, um espírito
que não é limpo. Assim, para Deus usar você como um ministro da Sua palavra, para você ser Seu
porta-voz, você deve buscar Sua graça por meio da oração: "Ó Deus, faze uma obra em mim, para
quebrantar e dividir meu homem exterior." Senão, o Nome do Senhor sofrerá dano. Você está
dando aos homens aquilo que é de você mesmo enquanto ministra a palavra de Deus. O Nome do
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Senhor não sofre porque você tem uma falta de vida, mas, sim, por causa do seu fluxo de
impurezas. A igreja de igual maneira.
Agora, tendo considerado a disciplina do Espírito Santo, o que se diz acerca da revelação do
Espírito Santo? A disciplina do Espírito Santo pode anteceder Sua revelação, ou pode segui-la. Não
há nenhuma ordem fixa; com alguns, pode começar com Sua disciplina, noutros, com Sua
revelação. Mesmo assim, é certo que a disciplina do Espírito Santo excede Sua revelação. Estamos
nos referindo, naturalmente, à experiência dos filhos de Deus, e não á doutrina. Para a maioria,
parecerá que a disciplina desempenha um papel muito maior do que a revelação.
"Porque a palavra de Deus é viva e eficaz, e mais cortante do que qualquer espada de dois
gumes, e penetra até ao ponto de dividir alma e espírito, juntas e medulas, e apta para discernir os
pensamentos e propósitos do coração. E não há criatura que não seja manifesta na sua presença;
pelo contrário, todas as coisas estão descobertas e patentes aos olhos daquele a quem temos de
prestar contas" (Hb 4: 12, 13).
A primeira coisa a ser notada é que a palavra de Deus é viva. Sua palavra certamente estará
viva quando a virmos assim. Se, pois, não a achamos viva, simplesmente deixamos de ver a palavra
de Deus. Talvez tenhamos lido as palavras da Bíblia, mas se não tocarmos em algo vivo, não vemos
a palavra de Deus.
João 3: 16 diz: "Porque Deus amou ao mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigénito,
para que todo o que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna." Considere como alguém ouve
semelhante palavra; ajoelha-se e ora: "Senhor, Te dou graças e Te louvo, porque Tu me amaste e
me salvaste!" Sabemos imediatamente que este homem tocou a palavra de Deus, porque Sua
palavra ficou sendo viva para ele. Outro homem pode estar assentado ao lado do primeiro,
escutando as mesmíssimas palavras, mas não realmente ouvindo a palavra de Deus. Não há
qualquer resposta viva da parte dele. Há somente uma conclusão que podemos tirar: visto que a
palavra de Deus é viva, aquele que escuta e não vive, não ouviu a palavra de Deus.
Não somente a palavra de Deus é viva; é também eficaz. "Viva" indica sua natureza, ao
passo que "eficaz" indica sua capacidade de realizar a obra do homem. A palavra de Deus não
pode voltar vazia; prevalecerá e realizará seu propósito. Não é mera palavra, mas, sim, a palavra
que operará de tal maneira que trará resultados.
O que, pois, a Palavra de Deus faz por nós? Penetra e divide. É mais cortante do que
qualquer espada de dois gumes. Seu corte é demonstrado nisto: "penetra até ao ponto de dividir
alma e espírito, juntas e medulas." Note a analogia aqui: a espada de dois gumes contra juntas e
medulas, é a Palavra de Deus contra a alma e o espírito. As juntas e as medulas estão embutidas
profundamente no corpo humano. Separar as juntas é cortar através dos ossos; dividir as medulas
é rachar os ossos. Somente duas coisas são mais difíceis de serem divididas do que as juntas e as
medulas: a alma e o espírito. Nenhuma espada, por mais afiada que seja, pode dividi-los.
Semelhantemente, nós somos totalmente incapazes de distinguir entre o que é alma e o que é
espírito. A Escritura, porém, nos informa que a Palavra viva de Deus pode fazer este trabalho,
porque é mais cortante do que qualquer espada de dois gumes. A Palavra de Deus é viva, eficaz, e
capaz de penetrar e dividir. É a alma e o espírito do homem que assim são penetrados e divididos.
Talvez alguém levante a seguinte questão: "Não parece que a Palavra de Deus fez qualquer
coisa especial em mim. Frequentemente ouvi as palavras de Deus e até mesmo recebi revelação,
mas, não sei o que é esta penetração, nem compreendo esta divisão. Pelo que eu saiba, estes dois
processos me são estranhos."
Como a Bíblia responde a esta pergunta para nós? Diz: "penetra até ao ponto de dividir
alma e espírito, juntas e medulas," mas passa a dizer também que é "apta para discernir os
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pensamentos e os propósitos do coração." "Pensamentos" se refere àquilo que deliberamos em
nosso coração e "propósitos" tem referência aos nossos motivos. Desta maneira, a Palavra de
Deus é capaz de discernir tanto o que pensamos como o que motiva os pensamentos.
Consequentemente, podemos facilmente identificar aquilo que vem do homem exterior.
Confessamos bem levianamente: "Aquilo foi da alma, porque veio do próprio-eu." Mas não
"vemos" realmente o que é a alma ou o próprio-eu. Depois, certo dia, a misericórdia de Deus vem
a nós, a Sua luz brilha sobre nós, e Sua voz nos anuncia de modo severo e solene: "O que você
frequentemente chama do seu próprio-eu é você mesmo! Você falou acerca da carne de modo
leviano e fácil. Você deve "ver" como Deus odeia isto e não permitirá que assim continue."
Antes deste "ver", temos conseguido falar de modo jocoso acerca da carne; mas uma vez
tendo sido feridos com a luz, confessaremos: "Ah! é isto! É acerca disto que tenho falado." Assim,
temos mais do que uma divisão intelectual. É a Palavra de Deus que vem sobre nós para nos
indicar aquilo que pensamos e propomos em nosso coração. Recebemos uma dupla iluminação:
como nossos pensamentos têm sua origem na carne, e como nossas intenções são inteiramente
egoístas.
Para ilustrar este fato, consideremos duas pessoas não convertidas. Uma delas tem
consciência de ser um pecador. Frequentou muitas reuniões e escutou muitas mensagens sobre o
pecado. A pregação clara levou-o a reconhecer-se pecador. Quando, porém, se refere assim a si
mesmo, pode mencionar o fato com risos, como se realmente não importasse. Outro pecador
escuta a mesma mensagem, e a luz de Deus raia sobre ele. O Espírito o convence de tal maneira
que se prostra no chão e ora: "Oh! é isto que eu sou — um pecador" Não somente ouviu pela
Palavra de Deus que é um pecador, como também "viu" que esta é a sua verdadeira condição.
Condenasse a si mesmo. Está abatido até ao chão. Iluminado desta maneira, pode confessar seu
pecado e receber a salvação da parte do Senhor. A partir de agora, nunca falará leviana ou
jocosamente acerca do pecado que "viu." Mas o primeiro, que pode descrever-se jocosamente
como pecador, não "viu" e, portanto, não é salvo.
Como você reage hoje a esta mensagem de que seu homem exterior interfere seriamente
com Deus e deve ser quebrantado por Ele? Se você começa a falar sobre ela de modo livre e fácil,
com certeza não tocou em você. Se, por outro lado, você for iluminado por ela, você dirá: "Ó
Senhor, hoje começo a conhecer a mim mesmo. Até agora, não tinha reconhecido meu homem
exterior." E à medida em que a luz de Deus o cerca, descobrindo seu homem exterior, você cai no
chão, sem poder mais ficar de pé. Imediatamente, você "vê" o que você é.
Certa vez, você disse que amava ao Senhor, mas, sob a luz de Deus, descobre que não é
assim — é a você mesmo que você realmente ama. Esta luz realmente divide você e o coloca à
parte. Está internamente separado, não pela sua mentalidade, nem por meros ensinos, mas, sim,
pela luz de Deus. Certa vez, você disse que era zeloso pelo Senhor, mas agora a luz de Deus
demonstra que seu zelo era inteiramente movido pela sua própria carne e sangue. Você pensava
que amava os pecadores enquanto pregava o evangelho, mas agora veio a luz, e você descobre
que sua pregação do evangelho tem sua origem principalmente do seu amor à atividade, do seu
deleite em falar, da sua inclinação natural. Quanto mais profundamente esta luz divina brilha,
tanto mais são revelados os pensamentos e propósitos do seu coração. Certa vez, você supunha
que seus propósitos e intenções eram do Senhor, mas nesta luz penetrante, você sabe que são
inteiramente de você mesmo. Esta luz humilha você diante do Senhor.
Consequentemente, aquilo que supúnhamos ser do Senhor revela que é de nós mesmos.
Embora tínhamos proclamado que nossas mensagens eram dadas pelo Senhor, agora a luz do céu
nos compele a confessar que o Senhor não nos falou, ou, se falou, quão pouco Ele disse. Quão
grande porção da obra do Senhor, assim-chamada, acaba sendo atividades carnais! Este
desvendar da natureza verdadeira das coisas, ilumina-nos para termos o conhecimento verdadeiro
daquilo que é de nós mesmos e daquilo que é do Senhor, quanto vem da alma e quanto do
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espírito. Quão maravilhoso seria se pudéssemos anunciar: a Sua luz brilhou, nosso espírito e nossa
alma estão divididos, e os pensamentos e propósitos do nosso coração são discernidos.
Vocês que tiveram experiência disto sabem que é além de mero ensino. Todos os esforços
para distinguir o que é do próprio-eu e o que é do Senhor, para separar as coisas que são do
homem exterior daquelas que são do homem interior — até ao ponto de alistá-las item por item e
depois decorá-las — revelaram-se como nada mais do que esforços desperdiçados. Você continua
a comportar-se exatamente como de costume, pois não pode ver-se livre do seu homem exterior.
Talvez você possa condenar a carne, talvez se orgulhe de poder identificar tal e tal coisa
como pertencente à carne, mas ainda não está liberto dela.
A liberação vem da luz de Deus. Quando aquela luz brilhar, você imediatamente verá quão
superficial e carnal foi sua negação da carne, quão natural foi sua crítica daquilo que é natural.
Mas agora o Senhor desnudou diante dos seus olhos os pensamentos e os propósitos do seu
coração. Você cai prostrado diante dEle e diz: "Ó Senhor! Agora sei que estas coisas realmente são
do meu homem exterior. Somente esta luz pode realmente dividir meu exterior do meu interior."
Assim acontece que até mesmo nossa negação do nome exterior e nossa firme resolução
no sentido de rejeitá-lo, em nada ajudará. Sim, até mesmo a própria confissão do nosso pecado dá
em nada, e nossas lágrimas de arrependimento precisam ser lavadas no sangue. Quanta estultícia,
imaginarmos que poderíamos desmascarar o nosso pecado! Somente na Sua Luz é que "veremos"
e seremos desmascarados. Deve ser Sua obra pelo Espírito, não nossos esforços da alma – ou seja,
não da nossa própria mente. Este é o único caminho de Deus.
É por isso que Deus diz: "A minha Palavra é viva e eficaz. A minha espada é a mais afiada de
todas. Quando a minha Palavra vem ao homem, é capaz de dividir a alma e o espírito, assim como
uma espada de dois gumes pode dividir as juntas e as medulas."
Como é que ela divide'.' Por meio de revelar os pensamentos e os propósitos do coração.
Nós não conhecemos nosso próprio coração. Amados, somente aqueles que estão na luz,
conhecem seu próprio coração. Ninguém mais o conhece, ninguém mesmo! Quando, porém, vier
a palavra de Deus, nós, "vemos." Somos desmascarados como sendo egocêntricos, procurando
apenas a gratificação, a glória, a proeminência e o prestígio para nós mesmo. Quão bendita é
aquela luz que nos leva a cair aos Seus pés.
A Escritura que estamos considerando continua assim: "E não há criatura que não seja
manifesta na sua presença; pelo contrário, todas as coisas estão descobertas e patentes aos olhos
daquele a quem temos de prestar contas." Aqui, o Senhor nos dá o padrão ou o critério para a
divisão. O que se constitui em revelação pelo Espírito Santo? Quanto devemos ver antes de se
tratar de uma revelação? Hb 4:13 pode nos ajudar a responder. A revelação nos capacita a ver o
que Deus vê. Todas as coisas estão descobertas e patentes aos Seus olhos. Qualquer venda está
em nossos próprios olhos, não nos de Deus. Quando Deus abre nossos olhos a fim de que
saibamos o propósito do nosso coração e nosso pensamento mais profundo na medida em que Ele
mesmo nos conhece — esta é revelação. Assim como somos descobertos e patentes diante dEle,
assim o somos diante de nós mesmos quando recebemos a revelação. Esta é a revelação: termos
permissão de ver o que nosso Senhor vê.
Se Deus nos for misericordioso e nos outorgar até mesmo uma pequena medida da
revelação, de modo que possamos nos ver como somos vistos por Ele, seremos imediatamente
prostrados em terra. Não precisamos fazer esforço para sermos humildes. Aqueles que vivem na
luz não podem ser orgulhosos. É somente enquanto vivemos nas trevas que podemos ser
orgulhosos. Fora da luz de Deus, os homens podem ser arrogantes e altivos; mas sob a revelação
da luz somente podem prostrar-se diante dEle.
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Enquanto você avançar, fica sendo cada vez mais evidente que é extremamente difícil
explicar esta questão de dividir o natural do espiritual, o exterior do interior. Somente à medida
em que há revelação é que o problema é solucionado. Seja para o que você for capacitado a
discernir entre os pensamentos e propósitos do seu coração, pode ter certeza de que sua alma e
seu espírito estão sendo divididos.
Se você desejar ser usado por Deus, mais cedo ou mais tarde você deixará a luz brilhar
sobre você. Você se voltará a Ele e dirá: "Ó Deus, sou completamente indigno de confiança. Não
sei a quem estou acusando, nem qual pecado estou confessando. Somente na Tua luz poderei
saber." Antes de você receber iluminação, você pode dizer que é um pecador, mas falta-lhe a
contrição do pecador; talvez você pense que odeia a si mesmo, mas não tem nenhum senso real
de aborrecimento de si; talvez você diga que nega a si mesmo, mas falta o senso de abnegação.
Uma vez que a luz vem, a cobertura da superfície é arrancada, e aquilo que é "real" ou "original" é
revelado. Que desvendamento, ver que somente amo a mim mesmo; ver que estou logrado, e
enganando o Senhor; ver que não amo a Ele! Esta luz mostra a você o que você é e o que você tem
feito. Doravante, você terá o conhecimento interior daquilo que pertence ao próprio-eu. Sem este
julgamento pela luz, você nem sequer pode imitar, mas agora, à medida em que a luz de Deus
julga, o espírito e a alma são divididos; a imitação é impossível.
O que o Senhor faz é penetrar para dentro do nosso homem interior com uma luz intensa.
Pode acontecer enquanto estamos escutando uma mensagem, ou orando sozinhos, ou tendo
comunhão com outros, ou até mesmo andando sozinhos. Esta luz incomparável nos mostra
quanto pertence a nós mesmos. Revela-nos que quase nada que procede de nós mesmos vem da
parte do Senhor. Na conversação, nas atividades, nas obras, no zelo, na pregação, na ajuda aos
outros - em todos os campos da vida, nosso próprio-eu permeia tudo. Uma vez, porém, que nosso
próprio-eu oculto é trazido â luz, nossa condenação do homem exterior será espontânea. Nas
ocasiões subsequentes, sempre que ele se expressar, imediatamente nos lastimaremos disto e o
julgaremos. É somente depois de tal iluminação que somos capazes de dividir o espírito da alma.
Doravante, viveremos diante do Senhor com nosso espírito liberado. É puro agora, e não oferece
dificuldade alguma ao Senhor.
Desta maneira, a divisão do espírito e da alma depende da iluminação; ou seja: podemos
ver como Deus vê. Exatamente o que Deus vê? Vê aquilo que nós não vemos. Somos cegos àquilo
que é de nós mesmos, e pensamos que é de Deus quando realmente não é. O que professamos
ser bom, agora condenamos segundo aquela luz. Aquilo que considerávamos certo, agora o
rejeitamos. Aquilo que passava por espiritual, agora reconhecemos como sendo da alma. E aquilo
que pensávamos que era de Deus, agora reconhecemos como sendo do próprio eu. Confessamos:
"Senhor! Agora chego a conhecer a mim mesmo. Estive cego durante vinte ou trinta anos, e não o
percebia. Não tenho visto conforme Tu tens visto."
Semelhante visão liberta você do peso morto do próprio- eu. Ver é o tratamento dEle. A
Palavra de Deus é eficaz, porque o ilumina ao ponto de poder despir o homem exterior. Não é que
depois de você ter ouvido a Palavra de Deus que paulatinamente se transforma, como se a visão
fosse um passo, e o despojar, outro passo. Não: a própria iluminação é um despojar; as duas
coisas ocorrem simultaneamente. Tão logo a luz atinge, a carne está morta. Nenhuma carne pode
viver naquela luz. No momento em que alguém entra na luz, prostra-se. A luz secou a sua carne.
Amados, isto é eficácia. Realmente, a Palavra passa a esperar que você produza. A Sua palavra é
eficaz na sua vida. Que o Senhor abra os nossos olhos para vermos a importância da disciplina do
Espírito Santo e Sua revelação. Estes dois dão as mãos para tratarem de modo eficaz em nosso
homem exterior. Dependamos de Deus para recebermos Sua graça que nos capacitará a colocar-
nos sob Sua luz e sermos iluminados ao ponto de nos curvar diante dEle, reconhecendo: "Senhor,
quão estulto e cego tenho sido todos estes anos, ao pensar erroneamente que aquilo que fluía de
mim vinha de Ti. Senhor, sê misericordioso comigo!"
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CAPÍTULO 8
Tendo considerado a operação disciplinar do Espírito Santo, agora vejamos como Ele
emprega outros meios para lidar com nosso homem exterior. Além da disciplina, haverá a
iluminação. Às vezes estas duas são usadas simultaneamente, às vezes alternadamente. Às vezes a
disciplina é demonstrada em circunstâncias que visam o nivelamento da nossa característica
destacada: noutras vezes, Deus graciosamente brilha sobre nós para nos iluminar. A carne,
conforme sabemos, jaz oculta nas trevas. Permite-se a existência de muitas obras da carne porque
nós não as reconhecemos como tais. Uma vez que a Sua luz nos revela a carne, trememos, e não
ousamos movimentar-nos.
Observamos especialmente este fato em tempos em que a igreja está rica na palavra de
Deus. Quando o ministério da Sua palavra é forte, e não há falta de ministério profético, a luz
aparece, clara e forte. Em tal luz, você chega a reconhecer que até mesmo a condenação do seu
orgulho é em si mesma orgulho. Na realidade, sua própria maneira de falar contra seu orgulho é
jactanciosa. Deste modo, tão logo que você vê o orgulho na luz, você certamente dirá: "Ai de mim!
Então isto é orgulho — quão repugnante e impuro ele é!" O orgulho visto à luz da revelação é
completamente diferente do orgulho acerca do qual se fala tão levianamente. A iluminação
desmascara a condição verdadeira. Imediatamente raia sobre você que é dez mil vezes pior do que
quaisquer das suas noções preconcebidas acerca de si mesmo. No mesmo momento, seu orgulho,
seu próprio-eu, e sua carne murcham de tudo e morrem sem esperança alguma da sobrevivência.
Tudo quanto é revelado "na luz" é morto por ela. Isto é muito maravilhoso. Não somos
primeiramente iluminados para então, no decorrer do tempo, paulatinamente sermos trazidos
para a morte. Pelo contrário, caímos instantaneamente diante da vinda da luz. À medida em que o
Espírito Santo revela, recebemos nosso tratamento. A revelação, portanto, inclui tanto o ver
quanto o morrer. É o modo sem igual de Deus tratar. Uma vez que a impureza é realmente
exposta, não poderá permanecer. Logo, a luz tanto revela quanto mata.
Esta ação de ser morto pela luz é uma das experiências cristãs mais necessárias. Paulo não
foi correndo para a beira da estrada para ajoelhar-se quando a luz brilhou sobre ele. Caiu em
terra. Embora fosse naturalmente capaz e autoconfiante, reagiu à luz ao cair, um pouco perplexo,
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mas intimamente desmascarado. Quão eficaz era esta luz que prostrou-o em terra! Notemos que
isto aconteceu de uma só vez. Poderíamos supor que Deus primeiramente ilumina nosso
entendimento e depois nos deixa para calcular tudo. Este não é o modo de Deus agir. Deus
sempre nos mostra quão odiosos e poluídos somos, e nossa resposta imediata é: "Ai de mim!
Como sou miserável — tão impuro, tão desprezível!" Se Deus revela nosso verdadeiro eu, caímos
como mortos. Uma vez que uma pessoa orgulhosa tenha sido iluminada, não poderá sequer fazer
uma tentativa de ser orgulhosa — nunca mais! O efeito daquela iluminação deixará sua marca
sobre ela durante todos os seus dias.
Do outro lado, este tempo de iluminação também é o tempo para crer — não para pedir,
mas para curvar-se até ao chão. Deus segue o mesmo princípio ao salvar-nos como faz ao operar
em nós mais tarde. Quando o brilho do evangelho resplandece em nós, não oramos: "Senhor,
rogo-Te, sé meu Salvador." Orar assim, até mesmo por dias a fio, não traria a certeza da salvação.
Dizemos simplesmente: "Senhor, eu Te recebo como meu Salvador." Imediatamente, a salvação
ocorre! De modo semelhante, na operação subsequente de Deus, tão logo que a luz vem sobre
nós, devemos imediatamente prostrar-nos sob Sua luz e dizer ao Senhor: "Senhor, aceito a Tua
sentença. Concordo com Teu julgamento." Isto nos preparará para mais luz.
Naquela hora do desvendamento, até mesmo as ações nobres — realizadas em nome dEle
e por amor a Ele — de alguma maneira perderão seu brilho. Em todo propósito sublime você
perceberá a inclinação mais vil. Aquilo que você considerava como sendo inteiramente para Deus,
agora parece crivado com o próprio-eu. Ai! O próprio-eu parece permear todo vestígio do seu ser,
furtando a Deus a Sua glória.
A nós tem parecido que não há profundidade que o próprio homem não possa sondar!
Mesmo assim, é necessária a revelação de Deus para desmascarar a condição real do homem.
Deus não parará até que nos desnude a fim de que vejamos a nós mesmos. De início, somente Ele
sabe, porque sempre estamos descobertos e patentes diante dEle. Mas uma vez que Deus nos
revelou os pensamentos e propósitos do nosso coração, então estamos descobertos diante de nós
mesmos. Como voltaremos a erguer nossa cabeça? A nossa própria brandura fica sendo coisa do
passado. Embora tenhamos pensado que éramos melhor do que outras pessoas, agora sabemos o
que realmente somos, e temos vergonha de nos mostrar. Procuramos em vão uma palavra
adequada para descrever nossa impureza e nossa condição desprezível. Nossa vergonha pesa
sobre nós, como se carregássemos a vergonha do mundo inteiro. Como Jó, caímos diante do
Senhor e nos arrependemos de nós mesmos: "Por isso me abomino, e me arrependo no pó e na
cinza." Semelhante iluminação, semelhante aborrecimento de si mesmo, semelhante vergonha e
humilhação, semelhante arrependimento, libertam-nos da escravidão de longos anos. Quando o
Senhor ilumina, liberta. A iluminação é a libertação, e o ver é a liberdade. Somente assim é que
nossa carne cessa de operar, e nossa casca externa é quebrantada.
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Ninguém, no entanto, deve imaginar que, na ausência de semelhante ministério rico e de
semelhante revelação transbordante, então está livre para viver de acordo com seu homem
exterior. É importante lembrar-se de que a disciplina do Espírito Santo ainda está operante.
Embora alguém esteja privado do contato com outros crentes por muitos anos, a presença do
Espírito Santo com ele é uma garantia de que possa chegar a uma boa condição espiritual, posto
que é responsivo à disciplina do Espírito. Embora a fraqueza da igreja possa ter como resultado
que alguns membros tenham falta do suprimento da palavra de Deus, somente podem culpar a si
mesmos se deixam de perceber o valor da disciplina do Espírito. Além disto, o fracasso deles não
quer dizer que o Espírito Santo não os disciplinou, nem os disciplina. Pelo contrário, significa que
os anos de disciplina não produziram efeito algum. Embora o Senhor tenha ferido uma vez após
outra, permaneceram ignorantes do significado disto. Como um cavalo ou mula, teimosos e
destituídos de entendimento, parece que não sondam a mente do Senhor — mesmo após dez
anos de tratamento. Quão lastimáveis são os tais! Somente podemos tirar a seguinte conclusão: a
disciplina é abundante em muitas vidas, mas reconhecer a mão do Senhor naquela disciplina é
realmente raro.
Quão frequentemente, quando o Senhor trata conosco, vemos somente a mão do homem.
Isto é inteiramente errado. Como o Salmista, nossa atitude deve ser: "Emudeço, não abro os meus
lábios, porque tu fizeste isso" (Salmo 39:9). Devemos lembrar-nos de que é Deus quem está
tratando conosco, e não nosso irmão, nossa irmã, ou qualquer outra pessoa.
O Senhor nos tem disciplinado durante anos, mas, ao invés de reconhecer Sua mão,
culpamos outras pessoas ou o destino pelos acontecimentos? Que sejamos lembrados de que
tudo é medido por Deus para nós. Ele predeterminou seu tempo, seus limites, e sua força, a fim de
quebrantar nossa característica destacada que é de difícil trato. Oxalá tenhamos a graça suficiente
para reconhecer o significado da Sua mão ao procurar despedaçar este homem exterior. Até que
isto aconteça, as pessoas somente encontrarão aquele próprio-eu imperioso quando entram em
contato conosco. Até que o quebrantamento seja levado a efeito, nosso espírito não pode fluir
livremente em direção a elas.
Oremos sinceramente no sentido de a igreja vir a conhecer a Deus como nunca antes, a fim
de que os filhos de Deus sejam cada vez mais frutíferos para Ele. O Senhor pretende trazer-nos
para uma posição em que não somente a mensagem do evangelho e nosso ministério do ensino
sejam correios, como também estejamos certos. A questão é: Deus pode ser plenamente liberado
através do nosso espírito? Quando o espírito é liberado, supre as necessidades do mundo.
Nenhuma obra é mais importante ou mais eficiente do que esta, e nada pode substituí-la. O
Senhor não Se preocupa tanto com seus ensinos ou sermões quanto com a impressão que você
dá. O que é que vem de você? Esta é a vara da medida final. Você impressiona as pessoas com
você mesmo ou com o Senhor? Você deixa as pessoas tocarem seu ensino ou seu Senhor? Isto é
realmente vital, pois determina o valor de toda a sua labuta e obra.
Amado, tenha certeza de que o Senhor presta muito mais atenção àquilo que vem da sua
vida interior do que àquilo que sai da sua boca. Não se esqueça de que em todo contato que você
fizer com outra pessoa, algo sai de dentro de você. Ou é você, ou é Deus, que flui, ou seu homem
exterior, ou o espírito. Finalmente, perguntaria: Quando você fica em pé diante das pessoas, o que
se manifesta? E a fim de não darmos uma resposta demasiadamente apressada, lembremo-nos de
que esta pergunta básica somente poderá ser corretamente respondida "na Sua luz."
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CAPÍTULO 9
AMEIGUICE NO QUEBRANTAMENTO
O método de Deus quebrantar nosso homem exterior varia de acordo com o alvo.
Expliquemos o alvo da seguinte maneira: com alguns, é seu amor-próprio; com outros, é seu
orgulho. Há, também, aqueles cuja autoconfiança e habilidade precisam ser destruídas; tais
pessoas se acharão em um predicamento após outro, derrotadas a cada passo, até que aprendam
a dizer: "Não vivemos na sabedoria da carne, mas, sim, na graça de Deus." Além disto, aqueles
cuja característica destacada e a subjetividade se acharão em circunstâncias peculiares à sua
necessidade. E, além disto, há aqueles que sempre estão borbulhando com ideias e opiniões.
Embora a Bíblia afirma: "Há coisa que seja maravilhosa demais para o Senhor?" alguns irmãos
sustentam que nada é difícil demais para eles! Jactam-se de que podem fazer tudo, mas,
estranhamente, fracassam em todos os empreendimentos. As coisas que pareciam tão fáceis
desmontam-se nas suas mãos. Perplexos, perguntam "Por que?" É esta a maneira de o Espírito
Santo tratar com eles a fim de atingir o alvo necessário. Tais ilustrações mostram como o alvo do
Espírito varia com o respectivo indivíduo.
Há, também, uma variação no ritmo dos tratamentos pelo Espírito Santo. Às vezes, os
golpes podem suceder-se um após outro sem folga; ou pode haver períodos de calmaria. Mas
Deus disciplina todos aqueles a quem ama. Desta maneira, os filhos de Deus têm feridas infligidas
pelo Espírito Santo. Embora a aflição possa variar, as consequências são as mesmas: o próprio-eu
por dentro está ferido. Assim Deus toca em nosso amor-próprio, nosso orgulho, nossa habilidade
ou nossa subjetividade, seja qual destes se constitui em Seu alvo exterior. Pretende com cada tiro
contra o alvo enfraquecer-nos ainda mais, até que venha o dia em que somos esmagados e
maleáveis nas Suas mios. Quer o tratamento toque nossa afeição, quer nossos pensamentos, o
resultado final é produzir uma vontade quebrantada. Todos nós somos naturalmente obstinados.
Esta vontade teimosa é apoiada por nossos pensamentos, nosso amor-próprio, nossa afeição, ou
nossa habilidade. Este fato explica as variações nos tratos do Espírito Santo conosco. Finalmente, é
nossa vontade que Deus quer atingir, pois é ela que representa nosso próprio-eu.
Deste modo, uma característica em comum destaca os que foram iluminados e
disciplinados — tornam-se meigos. A meiguice é o sinal do quebrantamento. Todos aqueles que
são quebrantados por Deus são caracterizados pela meiguice. Anteriormente, podíamos nos dar
ao luxo de sermos obstinados, porque éramos como uma casa bem apoiada em muitos pilares. À
medida em que Deus remove os pilares, um após outro, a casa forçosamente há de ruir. Quando
os apoios externos são demolidos, o próprio-eu não pode deixar de cair.
Devemos, no entanto, aprender a reconhecer a verdadeira meiguice. Não seja enganado ao
ponto de pensar que uma voz que fala suavemente indica uma vontade mansa. Muitas vezes, uma
vontade de ferro se esconde por detrás da voz mais suave. A teimosia é uma questão de caráter,
não da voz. Alguns que aparentam ser mais mansos do que outros são — diante de Deus —
igualmente obstinados e egoístas. Para os tais, somente pode haver a severidade do Seu
tratamento até que não ousem agir com presunção. Pelo desígnio de Deus, os tratamentos que
parecem ser externos tocam-nos até o âmago; nunca poderemos levantar nossa cabeça nestas
questões específicas. É decidido irrevogavelmente que nestas questões não podemos
desobedecer ao Senhor; não ousamos insistir em nossa opinião. O temor da mão do Senhor nos
refreia. É o temor de Deus que nos torna meigos. Quanto mais somos quebrantados através dos
tratamentos de Deus, tanto mais meigos nos tornamos. Ver a verdadeira meiguice é contemplar o
quebrantamento interior.
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Ilustramos o fato da seguinte maneira: Depois de entrar em contato com certo irmão, você
pode sentir que ele verdadeiramente tem dons, mas, mesmo assim, achar que ele não foi
quebrantado. Muitos são assim — dotados, porém, intatos. Sua falta de quebrantamento pode ser
facilmente detectada. Tão logo que você se encontra com eles, você sente um meio tom neles —
você pode sentir sua teima. Não é assim com quem é quebrantado; há uma meiguice operada pelo
Espírito. Seja em que ponto a pessoa foi tocada por Deus, ali ela não ousa jactar-se. Aprendeu a
temer a Deus neste ponto, e é transformada em meiguice.
Note, por favor, como a Escritura usa metáforas diferentes para descrever o Espírito Santo.
Ele é como o fogo e como a água. O fogo fala do Seu poder, a água da Sua purificação. Mas no que
diz respeito ao Seu caráter, diz-se que Ele é como uma pomba, meiga e mansa. O Espírito de Deus
incorporará Sua natureza em nós, pouco a pouco, até que nós, também, sejamos caracterizados
pela pomba. A meiguice, nascida do temor de Deus, é o sinal do Espírito Santo para o
quebrantamento.
Uma pessoa quebrantada pelo Espírito naturalmente possui a meiguice. Seus contatos com
as pessoas já não são marcados por aquela teima, dureza e aspereza que são as marcas registradas
de um homem não quebrantado. Já foi trazido ao ponto em que sua atitude é tão meiga quanto
sua voz é mansa. O temor a Deus no seu coração naturalmente acha expressão nas suas palavras e
nas suas maneiras.
(1) Abordável
Há várias qualidades que caracterizam uma pessoa que é meiga: ela é abordável — é tão
fácil ter contato com ela, falar com ela, e fazer perguntas a ela. Confessa prontamente os seus
pecados e derrama lágrimas livremente. Para alguns, é tão difícil derramar lágrimas. Não é que
haja qualquer valor especial nas lágrimas, mas naquele cujo pensamento, vontade e emoção
foram tratados por Deus, as lágrimas frequentemente denotam sua disposição para ver e
reconhecer sua falta. É fácil conversar com ele, porque sua casca exterior foi quebrada. Aberto às
opiniões dos outros, dá as boas-vindas às instruções, e, nesta posição nova, pode ser edificado em
todas as coisas.
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(3) Pronto para uma Vida em Conjunto
Somente estes quebrantados sabem o que é o corpo de Cristo. Sem a meiguice,
dificilmente estariam prontos para participar da vida no corpo. Começam a tocar o espírito do
corpo, até mesmo os sentimentos dos outros membros. Se alguém não tem este senso do corpo, é
como um membro falso do corpo, igual a uma mão artificial de Cristo, que pode movimentar-se
com o corpo físico, mas que não tem nenhuma sensação. O corpo inteiro sentiu este fato, menos
ele. Nem pode receber com meiguice a instrução ou a correção. Um quebrantado, no entanto,
pode tocar a consciência da igreja e perceber o seu sentimento, pois seu espírito está aberto ao
espírito da igreja para receber dela qualquer comunicação.
Quão preciosa é esta sensibilidade! Sempre que fazemos qualquer coisa errada,
imediatamente a sentimos. Embora não estejamos livres de fazer coisas erradas, mesmo assim,
possuímos uma faculdade que rapidamente nos aferroa. Os irmãos e as irmãs sabem que você
está errado, mas mesmo antes de abrirem a boca você é trazido de volta ao seu bom-senso pelo
mero contato com eles. Você tocou o espírito deles, e isto lhe indica se aprovam ou desaprovam.
Torna-se evidente que a meiguice, que é o fruto do quebrantamento, é uma exigência básica, e
que é impossível sem a vida no corpo.
O corpo de Cristo vive da mesma maneira que nosso corpo físico. Não exige a conclamação
de um concílio geral para chegar a decisões. Nem há necessidade de discussões prolongadas;
todos os membros naturalmente possuem um sentimento em comum e aquele sentimento
expressa a mente do corpo. E, além disto, também é a expressão da mente da Cabeça. Assim, a
mente da Cabeça é conhecida através daquela do corpo. Depois de nosso homem exterior ter sido
quebrantado, começamos a viver naquela consciência corpórea como membros correlatos do Seu
corpo, e somos facilmente corrigidos.
CAPÍTULO 10
A Comunhão no Espírito
Embora haja muitos tipos diferentes de comunhão, há a comunhão espiritual que é muito
mais do que o intercâmbio de ideias e opiniões. É a interação de espíritos. Este tipo de comunhão
é possível somente depois de nosso homem exterior ter sido despedaçado, sendo nosso espírito
liberado desta maneira, para tocar no espírito de outras pessoas. Neste compartilhar do espírito,
experimentamos a comunhão dos santos e compreendemos o que as Escrituras querem dizer com
a "comunhão de espírito." É verdadeiramente uma comunhão de espírito, e não um intercâmbio
de ideias. Mediante esta comunhão no espírito podemos orar de comum acordo. Porque muitos
oram através da sua mente, independentemente do seu espírito, é difícil para eles achar outra
pessoa com a mesma mente que pode orar em harmonia com eles.
Qualquer pessoa que nasceu de novo e que tem o Espírito Santo habitando nela pode ter
comunhão conosco. Isto é possível porque nosso espírito está aberto para a comunhão, pronto
para receber o espírito do nosso irmão, e para ser recebido por este. E, desta maneira, podemos
tocar o corpo de Cristo, pois nós somos o corpo. Podemos compreender quando dizemos que
nossos espíritos são o corpo de Cristo? Realmente, "Um abismo chama outro abismo" (SI 42:7). As
profundezas do seu ser estão clamando por um toque das minhas profundezas; e eu estou
clamando por um toque das profundezas da igreja inteira. Esta é a comunhão das profundezas, a
chamada e a resposta de uma para outra. Esta é a única coisa mais necessária para sermos úteis
diante do Senhor e para tocarmos corretamente no espírito da igreja.
Quando sugerimos que devemos ser meigos, não estamos procurando persuadir você a
fingir-se meigo. Se você assim fizer, logo descobrirá que até mesmo esta meiguice fabricada pelos
homens precisa ser destruída. Devemos aprender de uma vez por todas, que o esforço humano
para imitar a meiguice é fútil. Tudo deve ser do Espírito Santo, pois somente Ele conhece nossa
necessidade e disporá as circunstâncias que levarão ao quebrantamento de nosso homem
exterior.
É nossa responsabilidade pedir luz da parte de Deus a fim de que possamos reconhecer a
mão do Espírito Santo e, de boa mente, submeter-nos a Ele, reconhecendo que tudo quanto Ele
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faz é certo. Não sejamos como cavalos ou mulas sem entendimento. Pelo contrário, entreguemo-
nos ao Senhor para Ele operar em nós. À medida em que você se entregar ao Senhor, descobrirá
que Sua obra realmente começou cinco ou dez anos antes, embora não pareça que produziu
qualquer fruto em você. Hoje, veio uma mudança. Finalmente, você pode orar: "Senhor, eu era
cego, sem saber como Tu me estavas guiando. Agora, vejo que desejas quebrantar-me. Para isto,
entrego-me a Ti." Então, tudo que era infrutífero durante cinco ou dez anos começa a dar fruto.
Achamos o Senhor entrando com perícia para destruir muitas coisas de cuja existência nem sequer
tínhamos consciência. Esta é Sua obra de mestre: despojar-nos do orgulho, do amor-próprio, e da
exaltação de nós mesmos, a fim de que nosso espírito seja liberado e exercitado para a utilidade.
Duas perguntas surgem aqui para a nossa consideração. Visto que o quebrantamento do
homem exterior é a obra do Espírito Santo que desafia as imitações feitas pelos homens, devemos
procurar por fim a qualquer ação da carne que reconhecemos; ou devemos esperar passivamente
até que maiores luzes venham da parte do Espírito Santo, o Realizador da obra?
Decerto é correto e apropriado que acabemos com toda atividade carnal, mas devemos ver
como isto é vastamente diferente de imitar a obra do Espírito. Ilustrando: embora eu seja
orgulhoso, devo recusar todo o orgulho, mas não finjo ser humilde. Ou, posso perder a calma com
as pessoas, mas mantenho esta tendência sob controle; isto, porém, não me torna manso.
Enquanto o negativo está lutando para ser reconhecido, devo resisti-lo sem trégua. Mesmo assim,
não fingiria que possuo o positivo. Esta é a distinção importante: o orgulho é uma coisa negativa,
de modo que devo tratar com ele; a humildade é algo positivo; não posso, portanto, imitá-la.
Embora eu deva colocar ponto final em todas as atividades da carne que me são conhecidas, não
preciso imitar a virtude positiva. Tudo quanto preciso fazer é entregar-me ao Senhor, dizendo:
"Senhor, não há razão para exercer minhas forças para imitar. Estou confiando em Ti para fazer a
obra." A imitação exterior não é de Deus; é do homem. Todos quantos buscam ao Senhor devem
aprender de dentro, e não apenas conformar-se exteriormente. Devemos permitir que Deus
termine Sua obra dentro de nós antes de podermos esperar que a evidência dela seja manifestada
do lado de fora. Tudo quanto é fabricado externamente é irreal e condenado à destruição. Quem
possui uma coisa falsificada, sem o saber, defrauda a outros bem como a si mesmo. Assim como o
comportamento falsificado se multiplica, a própria pessoa chega a acreditar que ela realmente
tem esta personalidade. Frequentemente, é difícil convencê-la da sua irrealidade, porque não
pode distinguir o certo do errado. Logo, não devemos procurar imitar exteriormente. É muito
melhor ser natural; assim fica aberto o caminho para Deus operar em nós. Sejamos singelos, e não
imitemos coisa alguma, tendo plena confiança de que o próprio Senhor acrescentará Suas virtudes
a nós.
A segunda pergunta é: Alguns são naturalmente dotados com uma virtude tal qual a
mansidão; há uma diferença entre a mansidão natural e a mansidão que vem através da
disciplina?
Há dois aspectos a serem considerados ao responder a esta pergunta. Primeiramente, tudo
que é natural é independente do espírito, ao passo que tudo quanto vem através da disciplina do
Espírito Santo está sob o controle do espírito, e se move somente à medida em que o espírito se
move. A mansidão natural realmente pode tornar-se um impedimento para o espírito. A pessoa
que é habitualmente mansa é mansa em si mesma, e não "no Senhor." Suponhamos que o Senhor
queira que ela se levante e pronuncie algumas palavras enérgicas. Sua mansidão natural a
impediria de seguir ao Senhor. Diria, pelo contrário: "Ah, isto eu não posso fazer. Nunca na minha
vida pronunciei palavras tão duras. Que outra pessoa o faça. Eu simplesmente não posso." Você vê
como sua mansidão natural não está sob o controle do espírito. Qualquer coisa que é natural tem
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sua própria vontade e é independente do espírito. Aquela mansidão, no entanto, que vem através
do quebrantamento pode ser usada pelo espírito, porque não resiste nem oferece sua própria
opinião.
Em segundo lugar, uma pessoa naturalmente mansa é mansa apenas enquanto você está
de acordo com a vontade dela. Se você a força a fazer o que não gosta de fazer, mudará de
atitude. Nas assim chamadas virtudes humanas, falta o elemento de abnegação. É óbvio que o
propósito de todas elas é construir e estabelecer a vida do próprio-eu. Sempre que aquele
próprio-eu é violado, as virtudes humanas desaparecem, todas elas. As virtudes que brotam da
disciplina, do outro lado, somente são possuídas depois da vida feia do nosso próprio-eu, ali é
vista a virtude verdadeira. Quanto mais o próprio-eu for ferido, tanto mais fulgurosamente brilha
a verdadeira mansidão. A mansidão natural e o fruto espiritual, portanto, são basicamente
diferentes.
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