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Direito Comercial I Aulas Teóricas 2013/2014

receitas sobre os custos. As associações podem ter lucros mas não têm fim
lucrativo porque não visam distribuir esses lucros pelos associados.

Nas cooperativas o professor acha que nem em sentido objectivo há lucro, ou seja,
nas cooperativas de consumo visam proporcionar bens de consumo na melhor
qualidade e com os melhores preços possíveis. Significa que quando se paga um
valor, esse é provisório e que se torna definitivo quando é retribuído a título de
pagamento – um incremento provisório de modo a proporcionar os livros ao melhor
preço possível.
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Quando se fala em lucro, significa uma frutificação do capital independentemente


de fazer ou não algo na empresa, já na cooperativa só se recebe 30% dos
excedentes se ele tiver comprado livros nesse ano. Se não se recebe lucros, não se
pode dizer que a cooperativa tenha realizado lucros.

Agora, pode-se falar de lucro objectivo quando a cooperativa negoceia com não
membros/cooperadores, mas esses lucros são insuscetíveis de distribuição nem
mesmo no momento da dissolução, vão para reservas e jamais podem ser
distribuídos pelos cooperadores, indo para o movimento cooperativo para ser
atribuído a outras cooperativas do ramo. Portanto, parece correcto dizer que as
cooperativas, quando funcionem conforme a lei, não têm fins de consumo.

Há também as cooperativas de produção em que os cooperadores são


trabalhadores e também vão recebendo retornos a título do trabalho prestado na
sua proporção e aí paga-se não só a força de trabalho mas o produto de trabalho e
nas cooperativas de venda são os produtores que se juntam numa cooperativa para
uma vantagem económica, pois quem lucra são os membros e não a cooperativa
propriamente dito.

Conceito geral de empresa em sentido objectivo: é a mesma definição de


empresa comercial mas muda a parte final.

Negócios entre empresas: trespasse de estabelecimento


comercial e a locação de estabelecimento comercial

Noção e forma de trespasse: não há nenhuma lei a dizer o que é o trespasse e são
algumas as leis que falam dele sem o definir, designadamente o Código Civil no
art.º 1112º; o Código das Sociedades Comercias; o Códigos dos Direitos de Autor
e o CRCSPSS (código dos regimes contributivos do sistema providencial da

Diana Simões
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segurança Social).

O objeto do trespasse é o estabelecimento, uma empresa não necessariamente


comercial mas sobretudo comercial. Também dessas leis resulta que o trespasse
significa a transmissão a título definitivo de estabelecimento, ou então,
transmissão da propriedade do estabelecimento. O que significa que há vários
negócios pelos quais se pode realizar a transferência da propriedade de um
estabelecimento, sendo que o protótipo principal é a compra e venda, mas há mais:
dação em cumprimento; entrada em sociedade (por este negócio, o sujeito
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transmite a propriedade do estabelecimento para a sociedade e em contra partida
recebe não um preço em dinheiro mas uma quota com esse valor nominal, não sendo
assim uma compra e venda). As entradas em sociedade são predominantemente em
dinheiro ou então entrada em espécie.

Pergunta-se: o trespasse também abrange negócios de transmissão de


estabelecimentos gratuitos, designadamente a doação? Há quem diga que só
abrange contratos onerosos e há quem diga como o professor Coutinho de Abreu
que em alguns casos também abrange a doação, dependendo da norma que estiver
em causa – a grande especialidade em propósito do trespasse em matéria de
arrendamento é que neste caso não precisa da autorização do senhorio, mas
quando vende, precisa da autorização.

O art.º 1112º CC diz que o senhorio tem direito de preferência no trespasse por
venda ou dação em cumprimento e aqui diz-se que nestes efeitos o trespasse
abrange apenas negócios onerosos, porem para outros efeitos não exige este tipo
onerosidade, pois por exemplo, a doação de estabelecimento também se enquadra
num trespasse, não é preciso de autorização do senhorio para tal e, no entanto,
estamos no seio de um negócio gratuito. O que é favorável para o trespassante,
pode ser igualmente bom para o trespassário e pode ser também bom para a
economia em geral.

Para o professor Coutinho de Abreu, numa dada série de efeitos, não para todos,
em princípio, nada obsta que para este conceito de trespasse entre também a
doação, negócio gratuito.

Também se vê destas normas que o trespasse aparece sempre a abranger negócios


inter-vivos e conclui dizendo que, atendendo ao direito positivo não se pode
inventar.

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Trespasse é então a transmissão da propriedade (para contrapor à transmissão


temporária da locação) de estabelecimento por negócio inter vivos.

o Quanto à forma:

Tradicionalmente os negócios integrantes do trespasse exigiam escritura pública e


só a partir e 2000 deixou de ser, ano em que se disse que bastava escrito
particular e com o NRAU que reintroduziu a norma do art.º 1112º do CC onde diz
que a transmissão deve ser celebrada por escrito e comunicada ao senhorio, nº3.
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Não há nenhuma norma directamente dirigida que diga que é preciso escrito
particular o que levou um ou outro autor a dizer que estes negócios não exigem
qualquer forma especial mas, felizmente, autores como o nosso professor vêm
dizem que é preciso escrito particular sob pena de nulidade, atendendo aos
antecedentes do preceito. Agora não se diz da mesma maneira porque nas normas
anteriores havia uma para o trespasse e a forma era a deste e havia outra norma
para a transmissão da posição do arrendatário e este artigo hoje coloca tudo no
mesmo sítio.

Indo ao RRNPC quanto à transmissão da firma, diz que é preciso que haja acordo
entre as partes e que o adquirente adite a firma e tem de haver acordo entre o
transmitente e transmissário por escrito porque, se a firma é um elemento
acessório do estabelecimento e não se transmite autonomamente mas é algo ligado
ao estabelecimento, pareceria mal que a firma fosse transmitida por escrito e no
negócio maior nada se exigisse. Ao exigir-se que se avise o senhorio, este aviso
será feito por escrito e para este é preciso haver uma prova que se encontra no
escrito feito aquando do trespasse. Para não haver duvidas, há ainda um decreto-
lei de 2007 sobre farmácias que diz claramente que se deve observar forma
escrita, o que mais uma vez confirma a posição tomada acerca da forma. Para o
professor não podemos passar de escritura pública para nenhuma forma.

o Âmbitos de entrega:

Quando se trespassa um estabelecimento, tem de se saber/concluir que têm de ser


negociados determinados elementos ou meios do estabelecimento para que se possa
dizer que foi negociado, ou seja, cumprir-se o âmbito mínimo ou essencial de
entrega. Quer dizer, ninguém ignora que um sujeito que quer transmitir o
estabelecimento, não tenha que transmitir todos os elementos, pois as partes têm
liberdade para excluir uma série de elementos da empresa, mas essa liberdade
termina onde começa necessariamente o estabelecimento, isto é, não se podem

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excluir elementos da empresa essenciais para a qualificação/caracterização da


empresa. Se não há elemento mínimo, não há estabelecimento.

Cada vez se fala menos de trespasse porque cada vez menos há empresas de relevo
que pertençam a pessoas singulares porque se assim não for, o estabelecimento
fica a pertencer à sociedade, que o pode vender ou dá-lo em cumprimento ou trocá-
lo mas aí, há uma forma muito mais fácil e económica de transferir indirectamete o
estabelecimento que é a alienação das quotas.

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o Âmbito natural de entrega:

Isto é, quando as partes num negócio de trespasse não digam nada sobre os
elementos que são envolvidos ou dizem a título exemplificativo alguns elementos
envolvidos, a lei diz muito pouco sobre isto e para tal, teremos de ver quais os
elementos da empresa que pertençam à propriedade do empresário (confirmar o
livro) e aqui a lei só nos dá uma indicação acerca dos logótipos e marcas, dizendo
que se transmitem naturalmente, sem ser preciso nenhuma estipulação. Porém,
quanto ao resto não diz nada, ou seja, nada é dito sobre elementos obrigatórios da
empresa, mas devemos entender que se transmitem naturalmente, pois o que não
for excluído transmite-se, tendo em conta que são meios do estabelecimento e se
foi negociado, devem ir naturalmente. Todavia, os prédios são os elementos que
mais questões têm levantado, pois quando nada se diz quid iuris? Há alguma
doutrina que defende que tem de haver convenção de transmissão mas o professor
diz que sim, a não ser que resulte deferentemente da interpretação das cláusulas
contratuais não se deve excluir o prédio pois também não se exclui o direito de
patente e/ou máquinas que muitas vezes valem mais do que o próprio prédio.

Quanto à segunda subdivisão, meios ou elementos de empresa que estão na


disponibilidade do trespassante – a lei diz pouco mas diz alguma ciosa porque, por
exemplo, quanto às prestações laborais, quando se transmite um estabelecimento,
a posição de trabalhador transmite-se para o trespassário e no art.º 1112º CC
não é claro que a posição se transmita naturalmente mas entende a doutrina
predominante que quando um estabelecimento funciona num prédio arrendado e o
dono o trespassa e nada dizem nada acerca do local, a posição do arrendatário sem
autorização do senhorio transmite-se naturalmente, não precisando de convenção
especifica para continuar o estabelecimento naquele prédio.

E as dividas? Já se considerou que as dividas se transmitiam mas hoje


praticamente já ninguém pensa assim e em casos desses a transmissão singular de

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dívidas só é permitida nos termos do art.º 595º CC, sendo preciso inclusive uma
ratificação.

Quanto à forma, ainda, diz-se que o trespasse se basta com escrito particular mas
se o estabelecimento envolve um prédio e se se entender que este pertence ao
âmbito natural e se se quer transmitir o estabelecimento – põe-se a questão de que
o trespasse se basta com escrito particular e chega-se à conclusão que o
estabelecimento trespassado envolve naturalmente o prédio e se o adquirente
quiser registar o prédio na conservatória, não o consegue fazer com o escrito
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particular – o professor dizia que parece que nestes casos basta o escrito
particular porque não se negoceia autonomamente o imóvel mas o estabelecimento
e o imóvel é um elemento do estabelecimento. Hoje, parece que temos de apoiar
essa ideia que também foi apoiada desenvolvidamente pela Dra. Carolina Cunha e
pelo Dr. Ricardo Costa.

05 Novembro 2013

Nota: Fazer pesquisa de minutas de trespasse e locação

o Âmbito convencional:

Constituído por aqueles elementos do estabelecimento que só são transmitidos


através de uma estipulação dirigida a essa transmissão – estipulação ad hoc. Neste
caso trata-se de elementos do estabelecimento que só serão considerados
abrangidos se houver estipulação – caso previsto no art.º 31º, nº5 Código da
propriedade industrial (logótipos e marcas que contenham nome individual, firma
ou nome do sujeito que está a transmitir o estabelecimento).

Estes são elementos que integram o chamado âmbito convencional e no que diz
respeito aos créditos, eles não são elementos do estabelecimento na perspetiva do
Dr. Coutinho de Abreu mas elementos do património do titular do
estabelecimento. Neste caso, os créditos embora não integrem os elementos do
estabelecimento já vão integrar o âmbito convencional de entrega porque é possível
haver acordo na transmissão do estabelecimento.

o Âmbito legal imperativo:

Estamos a falar de elementos que se transmitem necessariamente por força da

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realização de negócio sobre o estabelecimento e temos de ter em atenção que na


opinião do Dr. Coutinho de Abreu, não estamos perante elementos quando se fale
de dívidas. No entanto, neste âmbito legal ou imperativo vamos encontrar dívidas
que se transmitem necessariamente com o estabelecimento, como é o caso de
dívidas resultantes de contrato de trabalho com os trabalhadores - art.º 285º,
nº1 código de trabalho – diz que se transmite para o adquirente a posição do
empregador pelo que também se transmitem as dívidas que este tenha para com o
seu trabalhador e assim essa posição considera-se um elemento e também se
transmite.
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Temos ainda no nº1 do art.º 285º a transmissão por força do trespasse da


responsabilidade pelo pagamento de coisa aplicada pela prática de contra
ordenação laboral e tem imensa importância prática no âmbito da transmissão de
um estabelecimento, pois é importante ter toda a informação quanto às dívidas
existentes ou prática de contraordenações já existentes, uma vez que essa
responsabilidade passa para quem fica com o estabelecimento. Alem disso, o nº2
do art.º 285º vem estabelecer que o transmitente responde solidariamente
durante o período de um ano após a transmissão.

Outro aspeto importante é relativo às dívidas da segurança social, CRCSPSS –


art.º 209º - em caso de trespasse, cessão de exploração ou de posição
contratual, o cessionário responde solidariamente com o cedente pelas dívidas à
segurança social existentes à data da celebração do negócio. É uma lei imperativa e
se houver essas dívidas também o adquirente responde por elas.

Art.º 285º, nº3 código de trabalho – manda aplicar também o nº1 ao caso de
cessão de exploração de empresa, estabelecimento e unidade económica e também
aí podemos falar do âmbito imperativo e legal.

Podemos também referir o EIRL, este é um património autónomo e é preciso ter


noção que quando o EIRL se transmite o passivo vai com ele e temos de destacar
esse aspecto.

Em relação á negociação de estabelecimento, há um outro assunto importante do


ponto de vista prático, que não vem referido nas lições, que tem a ver com o
licenciamento dos espaços onde o estabelecimento está a funcionar. Nos últimos
anos, já mesmo em 2013 surgem com frequência acórdãos sobre questões e
validade de trespasse por causa de não ter havido licenciamento desses espaços.
No que diz respeito aos estabelecimentos de restauração e bebidas, é preciso

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verificar com frequência se a legislação está toda preenchida quanto aos seus
requisitos, pois a falta de menção de um dos documentos conduzirá à nulidade do
trespasse. Esta legislação está sempre a ser alterada e convém ter extrema
atenção a este regime de licenciamento. Se o espaço não estiver devidamente
licenciado, a câmara pode ordenar o encerramento do espaço o que é algo com
muita importância sobretudo se já foi pago a valor do trespasse.

OINC – obrigação implícita de não concorrência

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Estamos a falar de um obrigação que a doutrina e alguma jurisprudência têm
reconhecido existir a cargo do trespassante. Exemplo: trespasse de compra e
venda – é uma obrigação que tem recaído sobre o vendedor com certos limites.

Se o trespasse fosse uma doação, podíamos aplicar o velho ditado popular de “quem
dá e volta a tirar, ao inferno vai parar” – um qualquer trespasse de
estabelecimento consiste na alienação de qualquer objecto comercial que tem
características próprias e que para ser organização terá definidos os valores de
organização que foram combinados entre si de dada forma e vai ganhando com o
tempo, valores de exploração, nomeadamente relações com os clientes e
fornecedores etc.

Ora, o titular que explora o estabelecimento vai dominando estes valores de


organização e exploração, (convida clientes, oferece cabazes de natal) e está em
condições de realizar uma concorrência diferencial e particularmente perigosa
para quem adquiriu o estabelecimento e é perigosa porque se essa pessoa se
reinstalar e voltar a estabelecer naquele ramo de actividade, conseguirá
reproduzir aquela organização, possivelmente com os mesmos valores de
organização e exploração.

Âmbito pessoal desta obrigação: é importante ver quais são as pessoas que estão
obrigadas a não concorrer em caso de trespasse – se estamos a falar de uma
venda, o vendedor estará, em regra, obrigado a não concorrer (nota de rodapé
importante) mas não é de afastar a possibilidade de o vendedor não estar em
condições. Exemplo: suponha-se que se trata de alguém que herdou um
estabelecimento, nunca o explorou e o vende – esta pessoa que não sabe que
contratos o pai tinha estabelecido com a banca e estava completamente afastado
da exploração - este não está em condições de realizar esta concorrência perigosa.
Há outras situações que se podem considerar aqui abrangidas, a ver, se se trata de
um filho que pelo contrário participava ativamente na exploração do

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estabelecimento, numa situação destas já não se poderá aceitar a mesma solução


da anterior, a concorrência aqui recairá sobre alguém que não era verdadeiramente
o trespassante por não ser o proprietário.

No caso de casados em que o bem era comum, nessa situação, tanto marido como a
mulher são ambos trespassantes e, em princípio, estarão os dois abrangidos pela
obrigação implícita de não concorrência. A propósito de pessoas abrangidas pela
obrigação, o professor Soveral Martins costuma falar de âmbito pessoal mas há
que também fazer referência a limites espaciais, temporais e objectivos,
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caracterização preferencial do Dr. Coutinho de Abreu.

Âmbito espacial: até onde vai a OINC? É preciso ver qual o chamado “raio de
acção” daquele estabelecimento. Há estabelecimentos de bairro que apenas são
para as pessoas do bairro onde se situam, outros, destinam a sua atividade, para
uma dada região, para todo o país ou mesmo todo o mundo. É evidente que saber
qual o raio de acção do estabelecimento irá depender de prova, fazendo perícias,
desde logo, à sua contabilidade e será preciso demonstrar que a atividade se
desenvolve com uma certa continuidade e/ou frequência numa dada área
geográfica. Provado esse raio, é evidente que quem vendeu essa mercearia de
bairro, neste caso, já poderá restabelecer outro estabelecimento fora do raio de
acção do estabelecimento trespassado.

Quanto ao limite temporal – não pode ser determinado em abstrato, tal como o
limite espacial, terá de ser determinado em concreto e estamos a falar do período
de tempo que será necessário para o adquirente do estabelecimento consolidar o
estabelecimento em causa com os valores de organização e exploração.

Um estabelecimento que lide com uma clientela que procura o estabelecimento com
frequência de alta intensidade para consolidar os valores sui genris será necessário
menos tempo, porque o dono do estabelecimento terá assim maior facilidade de a
cativar em menos tempo mas, se se trata de um estabelecimento que lida com os
fornecedores e clientes em períodos mais intermitentes, a consolidação desses
valores será mais lenta. (Texto interessante, ou não, está numa nota de rodapé –
comunicação da comissão da união europeia relativa às restrições… de 2001/C
188/3003, ponto 15. Nestes casos é uma obrigação implícita, não houve cláusula e a
comissão está a referir-se a uma situação em que houve cláusula.).
Se nos casos em que existe cláusula expressa há um limite, nos outros casos é
evidente que também tenha de haver.

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Que comportamentos são abrangidos por essa OINC? Há deles fáceis de


identificar mas há outros que não são tão claros, por exemplo, em vez de abrir a
pessoa directamente o estabelecimento, constitui uma sociedade unipessoal por
quotas onde é socio único e é dele gerente – se é assim formalmente, parece de
considerar que nesta situação devemos atender à realidade subjacente e estender
a OINC a esse tipo de comportamentos. Se a sociedade é constituída unicamente
por um casal, então também esse comportamento deve ser abrangido.

Coloca-se o problema de saber quem pode exigir o cumprimento dessa OINC? É


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evidente que pode exigir o primeiro adquirente mas se amanha B vender a C o
estabelecimento, depois de B vender a C, A também não pode violar a OINC pois
também esta obrigado com os sub-adquirentes de quem transmitiu o
estabelecimento dentro dos limites já referidos. (Se A vende a B um automóvel e
depois vende B a C, A também não pode ir buscar o automóvel a C.)

Se a OINC é violada, tendo em conta o seu fundamento, está em causa uma


violação do contrato e é admissível que, por um lado, possa ser pedida uma
indemnização pelos danos causados, pelo incumprimento da obrigação; pode
intentar uma ação de condenação a exigir o cumprimento da obrigação; podemos
ter uma ação para condenar no encerramento do próprio estabelecimento
(relembrar o que diz o CC em matéria de execução especifica das obrigações, art.º
829º). É evidente que o que está em causa é a imposição de uma obrigação de não
construir e aqui em causa é uma obrigação de não exercer uma actividade
concorrente. No entanto, não custa a aceitar a aplicação por analogia deste artigo
a outras obrigações de não fazer, como é o caso da OINC. Temos ainda a
possibilidade de recorrer à sanção pecuniária compulsória, art.º 829º- A CC,
quanto a estas obrigações de não fazer.

Outra nota é a de saber se será ou não admissível, num contrato de compra e venda
de estabelecimento - trespasse, clausular um afastamento da OINC e combinar
que o trespassante fica livre de abrir quando quiser, um estabelecimento. Com esta
abrangência, uma cláusula deste género é perigosa porque pode servir de
fundamento que, naquele caso em concreto, não quiseram efetivamente transmitir
o estabelecimento para o trespassante, ou seja, quiseram transmitir outra coisa
que não o estabelecimento porque esse é a chamada organização de valores de
exploração. (anotações de acórdãos de sentidos opostos.)

Relação entre trespasse de estabelecimento instalado em prédio arrendado e


contrato de arrendamento. O conceito de trespasse não exige que o prédio seja

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do dono do estabelecimento. Há uma nota prévia: quando o novo RAU foi publicado
e mesmo antes das recentes alterações de 2012, falou-se muito da “morte do
trespasse” porque, em relação a arrendamentos mais antigos, esses contratos eram
arrendamentos que se renovavam automaticamente e o senhorio não tinha o direito
de impedir essa renovação e isso decorria do facto de os contratos de
arrendamento urbano serem celebrados por um prazo efectivo que findo se
renovava.

Quem tinha um estabelecimento instalado naquele imóvel, tinha ali suficiente


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segurança para pedir um valor mais elevado no negócio devido a todo o trabalho
anteriormente efectuado, de forma que a pessoa com que celebre o negócio já
adquira uma organização com os valores de exploração enraizados, o que permitia
que se pedisse muito dinheiro pelo estabelecimento que ia até centenas largas.
Hoje já não é assim porque o que acontece é que hoje, o art.º 28º do diploma que
aprovou as alterações ao RAU – lei 6/2006 diz no seu nº3 (arrendamentos
antigos) em relação a arrendamentos para fins não habitacionais, a antecedência
referida na al c) do art.º 1101º do CC é elevada para 5 anos quando ocorra
trespasse e mesmo nos contratos com duração indeterminada, é possível por termo
a esses contratos de arrendamento se ocorrer trespasse do estabelecimento
(ainda que com aviso de 5 anos).

Agora, o trespassário passa a ser confrontado com uma situação em que sabe que
se comprar o estabelecimento por trespasse, pode o arrendatário por fim ao
arrendamento e assim haverá menor interesse do trespassário de não pagar um
valor muito alto pelo estabelecimento porque corre o risco de, num prazo de 5
anos, ter de sair do prédio. Nessa medida então diz-se que se matou o trespasse.

Em relação ao RAU, há uma norma que quanto ao trespasse tem especial


importância – art.º 1112º do CC. Se existe um prédio arrendado, é natural que o
trespassante e o trespassário queiram que o estabelecimento continue a funcionar
naquele local e a posição de arrendatário é uma daquelas posições contratuais que
se consideram naturalmente abrangidas na transmissão do estabelecimento. Em
relação à posição do arrendatário, o que temos aqui é uma cessão da posição
contratual envolvida na transmissão do estabelecimento e a regra para a
transmissão das posições contratuais é que é exigido o consentimento e o que o
nº1 do art.º 424º do código civil diz isso.

Não há trespasse quando a transmissão não seja acompanhada da transferência em


conjunto das instalações, utensílios mercadorias ou outros elementos que integram

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o estabelecimento – art.º 1112º. Se o estabelecimento não fosse transmitido no


seu todo, para a lei não havia trespasse e se não houvesse trespasse, haveria a
necessidade de consentimento do senhorio. Este risco tem sido atenuado pelas
posições doutrinais e pelo art.º 9º do Código Civil o legislador é razoável e não
consagrou soluções absurdas. Exemplo: se se trata de restaurante instalado no
prédio arrendado e se é utilizada uma colher de pau que o dono do restaurante
gosta muito, ele quer levar a colher de pau consigo e no contrato excluem essa
colher e assim não haveria trespasse nesta questão porque não estão a transmitir
todos os elementos e por absurdo é que a leitura que parece mais razoável é olhar
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para o art.º 1112º com o sentido que no mínimo, deve ser respeitado o âmbito
mínimo do estabelecimento – conjunto mínimo e necessário para poder transmitir o
estabelecimento. E em concreto, a al a) do nº 2º também não diz que tem de ser
transmitidos todos os elementos, diz apenas os elementos necessários para se
poder falar de estabelecimento.

Al b) do nº2 do art.º 1112º - não há trespasse quando a transmissão vise o


exercício, no prédio, de outro ramo do comércio ou industria ou, de modo geral, a
sua afectação a outro destino – esta norma levanta muitas dificuldades sobretudo
na articulação com o nº5 do art.º 1112º - aparentemente há sobreposição mas
apenas aparentemente pois há diferenças, nomeadamente, na al b) do nº2 parece
estar em causa algo que já estava pensado no momento da negociação do
estabelecimento, e no caso do nº5 parece que estar em causa algo pensado depois.
Em relação à al b) do nº2 há uma diferença de posições entre os professores, o
Dr. Coutinho de Abreu entende que esta alínea se aplica quando há uma intenção
por parte do adquirente do estabelecimento de introduzir essas alterações ao
destino do prédio, quer haja ou não participação nessa intenção por parte do
trespassante, ou seja, mesmo que não saiba dessa intenção do aquirente, a al b)
funcionará. O Dr. Soveral Martins não entende assim mas antes que a grande
diferença passa por na al b) se falar de transmissão que visa o exercício, o
trespassário não transmite nada, ele adquire, quem transmite é o trespassante. O
trespassário está envolvido porque é ele que vai exercer para outro ramo de
comércio ou industria mas o trespassante também está envolvido porque a lei faz
referência à transmissão que visa e não à aquisição que visa.

Quanto ao nº5 do art.º 1112º, visa que o regime do nº1 que dispensa do
consentimento existe em função de uma situação que a lei considera
verdadeiramente excecional, ou seja, quando há transmissão daquele
estabelecimento para o mesmo ramo de comércio mas se muda o ramo de comércio
e industria, pode deixar de haver esta situação.

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Exemplo: se estiver em causa o trespasse de um restaurante e o trespassário quer


mudar o destino e querer colocar ali um aloja de vestuário, é muito forte a
presunção de que essa intenção comum de mudar o destino tenha excluído
elementos que ponha em causa o âmbito mínimo de entrega. O Dr. Orlando de
Carvalho era mais radical e entendia que o que estava em causa era apenas a
identificação de algo que poderia ser um índice de inexistência do trespasse que só
se aplicaria verdadeiramente se se concluísse que não tinha sido
respeitado/negociado o âmbito mínimo de entrega.
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Em relação à alínea a) é preciso ter em conta que está em causa o que foi
respeitado o âmbito mínimo de entrega sendo que muitas vezes as partes dizem
que estão a negociar e trespassar um estabelecimento instalado em prédio
arrendado para enganar o senhorio, para prescindir do consentimento e/ou
autorização do senhorio e, na realidade, o que queriam fazer não era o que
mencionaram, tendo aqui uma simulação de trespasse.

O Dr. Coutinho de Abreu só refere nas lições a hipótese da simulação que seria
quanto à natureza do negócio, e por outro lado, simulação quanto ao objecto do
negócio (pois num caso é o estabelecimento e no verdadeiro é cessação da posição).
Nem sempre há o acordo se simulação, pode por vezes haver erro e terem pensado
que ao excluir determinados elementos ainda estavam a negociar o
estabelecimento.

O trespasse é um negócio do estabelecimento e o estabelecimento é do


arrendatário, não há consentimento porque o negócio não é do senhorio, apenas há
consentimento para a cessação de posição de arrendatário.

O art.º 1112º, nº3 diz que a transmissão deve ser celebrada por escrito e
comunicada ao senhorio. A comunicação é exigida para que o senhorio vá controlar o
que foi feito e, em face disso, se era efectivamente ou não dispensada a sua
autorização. A lei não estabelece um prazo para realizar a comunicação e surgem
duas alternativas: a das lições e a que o professor Soveral Martins defende – como
não há prazo, pelas lições usa-se a regra geral do art.º 1038º g) CC, de 15 dias (a
al g) tem como referencia a al f)), e devemos adaptar esta norma ao trespassante
e ao trespassário bem como o senhorio).
Para o Dr. Soveral Martins seria assim sem qualquer dúvida se não houvesse no CC
a norma do art.º 1109º, nº2 quanto à locação de estabelecimento – o locatário
também pode explorar o estabelecimento sem necessidade de consentimento do

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senhorio para o locatário passar a utilizar o imóvel, onde está instalado o


estabelecimento – ou seja, não carece consentimento mas deve ser-lhe comunicado
no prazo de um mês. Na verdade, isto conduz-nos a uma solução absurda porque na
locação temos alguém a explorar o estabelecimento em prédio de outrem e vai
explorá-lo por período de tempo determinado sem necessidade de consentimento e
aí estamos a impor ao senhorio a utilização do prédio por um locatário com
carácter temporário e, numa situação dessas, o arrendatário tem um mês para
fazer a comunicação e no caso de trespasse em que se está a impor ao senhorio
uma transmissão já não temporária mas definitiva, já parece fazer sentido aplicar
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o mesmo artigo por analogia de um mês, pois para o professor não parece
concebível que nesta situação seja um prazo mais curto, tendo em conta a situação
mais “gravosa” em que fica o senhorio.

Quem tem obrigação de comunicar? O trespassante mas é uma cautela (seguindo


a jurisprudência das cautelas) que é preciso ter na prática porque é de toda a
conveniência que o trespassário não fique “a dormir” e comunique também ele ao
senhorio. Se o trespassante, depois de receber o dinheiro do trespasse, nunca mais
aparece e não cumpre a sua obrigação, o senhorio passa a poder considerar que em
relação a ele, foi ineficaz a transmissão e pode aí encontrar fundamento para
interpor ação de despejo, tendo por base o art.º 1083º do CC, nº2 e art.º
424º, nº2, do CC.

Temos também de ter em atenção, a propósito da atitude a adoptar pelo próprio


trespassário, o art.º 1049 do CC que vem dizer os casos em que o locador
(senhorio) não tem direito à resolução do contrato.
Na verdade, o que hoje encontramos na prática é que, em vez de verdadeiros e
autênticos trespasses, encontramos transmissões de participações sociais por
sociedades comerciais mas isto só por si não permite dizer que está afastado do
RAU. Se se transmitem quotas de sociedade que exploram o estabelecimento em
prédio arrendado, o senhorio não tem de dar algum consentimento para aquela
cessão de quotas, mas coloca-se a questão de saber se transmitir o controlo da
sociedade por quotas terá o não de ser feita a comunicação no prazo de 15 dias e
será uma boa cautela aplicar o regime do arrendamento urbano, no sentido de
evitar pelo tribunal uma desconsideração da personalidade jurídica daquela
sociedade e entender que substancialmente está a ser feita uma transmissão de
estabelecimento.

Até agora falamos de casos em que, ocorrendo trespasse, se entendeu dispensada


o consentimento do senhorio, mas diferente desse consentimento é o eventual

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direito do senhorio de preferir na transmissão do estabelecimento – art.º 1112º,


nº4 – o senhorio tem direito de preferência no trespasse por venda ou dação em
cumprimento, no caso do trespasse e isto significa que para o senhorio estar em
condições de exercer o seu direito de preferência, o trespassante, antes do
trespasse tem de fazer a comunicação para preferir, que deve conter os elementos
essenciais do negócio projetado e tem-se entendido que consta aí o preço, as
condições e a pessoa do adquirente. Isto não corresponde ao consentimento mas
corresponde ao direito de preferência.

76
Este direito de preferência tem varias razões de ser, nomeadamente evitar que
entrem no prédio do senhorio pessoas que não sejam desejadas por este e, por
outro lado, tem a função pois se o preço declarado para o trespasse é muito
elevado, quem está a vender pode ter de pagar as mais-valias e pode levar
trespassante e trespassário a pensar que valia a pena fazer uma simulação e criar
no senhorio a intenção de exercer o direito de preferência por estímulo.

Utilização dos espaços em shopping centers – o centro comercial é uma zona


comercial coberta, para o professor, mas há autores e tribunais que entendem de
forma diferente e entender ser uma nova realidade e que vai mais além do que
prédios em propriedade horizontal e condomínios de forma a que os contratos que
dizem respeito às lojas não são contratos de arrendamento mas atípicos. O Dr.
Antunes Varela e Oliveira Ascensão defendem esta leitura e esta ideia de
atipicidade fez caminho na jurisprudência.

Há outras vozes contrárias, nomeadamente, o Dr. Coutinho de Abreu que


mencionam ser um contrato de arrendamento de imóvel e a ver do Professor
Soveral Martins, deverá ser esse o entendimento correcto. O que é entregue ao
lojista é um espaço em tosco, onde ele irá montar o estabelecimento do género que
entender, respeitando as regras próprias desses espaços, que são uniformes a
todas as lojas. Em relação àquele imóvel, temos um contrato que diz respeito à
utilização temporária de um prédio ou parte dele mediante retribuição, o que é uma
locação. Além disto, há uma serie de prestações que têm de ser pagas para
serviços comuns e há quem diga que o que é pago por fora é mais importante do que
a loja em si, sendo assim um contrato atípico porém, não se defende essa tese.

O Dr. Soveral Martins dá razão a Coutinho de Abreu quando ele diz que o
contrato celebrado com os lojistas será misto quando as prestações adicionais são
pagas integradas na renda. Se não for assim e se puder dizer que é pago à parte,
poderemos falar de coligação de contratos mas, em relação ao imóvel, prevalecerá

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o regime do arrendamento.

12 Outubro 2013 – Dr. Soveral Martins

Locação de estabelecimento

O Art.º 1109º do CC é uma norma que nos surge no âmbito do regime do


arrendamento para fins não habitacionais, que usa a terminologia de locação de 77
estabelecimento. Na locação o que temos é um contrato de natureza obrigacional
que confere ao locatário um gozo de um estabelecimento por um período limitado
de tempo mediante uma retribuição, sendo ao fim e ao cabo, a noção que resulta da
norma geral sobre o contrato de locação do art.º 1022º.

É justamente porque no art.º 1022º se utiliza o conceito de coisa, que parte da


doutrina rejeitava a qualificação do negócio em causa como locação porque se
discutia ser ou não coisa o estabelecimento. Como já vimos, essa discussão, no
âmbito desta disciplina, já está superada e aceitamos qualificar o estabelecimento
comercial como uma coisa. Essa coisa é considerada como coisa móvel sui generis
mas pode usar frequentemente um imóvel – por exemplo, o estabelecimento
comercial usa um imóvel que pode pertencer ao próprio locador do estabelecimento
ou pode ser um imóvel tomado de arrendamento a terceiro.

É sobretudo essa situação em que o locador explora o estabelecimento tomado de


arrendamento a terceiro que o art.º 1109º dá maior relevo. Há um conjunto de
questões que se colocam e são paralelas ao trespassa: saber se o senhorio do
prédio teria ou não que dar consentimento ou autorização prévia para a locação do
estabelecimento, mudando o locador. Essa questão é resolvida pelo nº2 do art.º
1109º, embora com redação merecedora de algumas críticas: “a transferência
temporária e onerosa de estabelecimento instalada em prédio arrendado, não
carece de autorização de senhorio mas deve-lhe ser comunicada no prazo de um
mês” – está aqui em causa o gozo do imóvel arrendado pelo locador do
estabelecimento mas deste nº também se retira essa dispensa de consentimento
para a utilização e é evidente que é dispensa de autorização para que o locatário
use o imóvel para o uso e para o âmbito âmbito do gozo estabelecido.

Este mesmo nº2 vem também exigir esta comunicação no prazo de um mês e é
importante ter isto em conta. Aqui, a falta de comunicação levanta maiores
dificuldades do que levantava no trespasse porque é mais duvidoso a falta da

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comunicação uma vez que as consequências são menos claras, ou seja, a propósito
da falta de comunicação envolvida no trespasse, havia ineficácia e possibilidade de
resolução do contrato de arrendamento e consequentemente, o pedido de despejo,
porém, no art.º 1083ºCC, quanto ao arrendamento urbano, na al e) do nº2 diz
ser fundamento de resolução “a cessação temporária ou permanente e onerosa ou
gratuita do gozo do prédio, quando ilícita, inválida ou ineficaz perante o senhorio”.
A questão toda está em que a ineficácia do trespasse resultava do art.º 424º mas
este trata da cessão da posição contratual e no caso da locação do
estabelecimento não há esta cessão. No entanto, o Dr. Coutinho de Abreu
78
entende que a falta dessa comunicação ainda acarreta também a ineficácia da
transferência do gozo do prédio para o locatário.

O art.º 1109ºdiz ainda que a “transferência temporária ou onerosa do gozo de um


prédio ou parte dele, em conjunto com a exploração de um estabelecimento
comercial ou industrial nele instalado, rege-se pelas regras da presente subsecção
com as necessárias adaptações”, ou seja, toda a secção dedicada ao arrendamento
para fins não obrigacionais. Há uma primeira questão que é especialmente grave e
que merece uma atenção redobrada, a questão de saber o que acontece quando se
atinge o termo de duração do contrato de locação. Surge o problema de saber se: o
contrato de locação de estabelecimento terminar o prazo pelo qual foi
celebrado, renova-se ou não automaticamente? Isto é um problema porque o
artigo 1110º, que integra a presente subsecção, diz que as regras relativas à
duração, denuncia ou oposição à renovação dos contratos de arrendamento para
fins não habitacionais são devidamente estabelecidas pelas partes, aplicando na
falta de disposto, o regime do arrendamento para a habitação. Será este o regime
ou será o regime geral da locação? Isto faz toda a diferença porque, vendo o
regime do arrendamento para habitação no art.º 1096º, este diz que o contrato
celebrado com prazo certo renova-se automaticamente após o seu termo e se se
aplicarem estas regras, teríamos a aplicação desta norma e a renovação automática
do contrato de locação. Não é essa, no entanto, a leitura que o Dr. Coutinho de
Abreu faz, ele entende que reste regime não será aqui aplicável e defende que
quando se atingir esse prazo, o contrato extingue-se por caducidade, art.º 1051º
a) se nada for estabelecido no contrato de locação de estabelecimento e assim o
estabelecimento terá de ser devolvido ao locador do mesmo.

Tendo em conta esta posição tomada pelo professor, há uma cautela que tem de
ser assumida quando se celebra um contrato destes, negociando um regime de
renovação do mesmo, uma vez atingido o fim do prazo.

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Coloca-se também o problema das questões relacionadas com os âmbitos de


entrega. Também aqui terá de se falar do âmbito mínimo de entrega para o
locatário, para identificar o estabelecimento que era do locador e que está nas
mãos do locatário, pois tem de se identificar o conjunto de elementos necessários
para se considerar haver estabelecimento.

Tendencialmente, estamos a falar de coisas que têm de ser vistas em concreto em


cada estabelecimento e aqui podemos dizer que quanto mais se desenvolve, cada
vez mais começa a depender de outros elementos e outras caraterísticas do seu
79
estabelecimento, nomeadamente das características sui generis sem nunca, no
entanto, dispensar do mínimo de organização. Também, á partida, não se pode dizer
que um estabelecimento que começou agora funcionar não tenha um mínimo para
além dos valores sensíveis.

Em relação ao âmbito natural, vamos encontrar grande parte dos elementos que
estavam na exploração do locador a título meramente obrigacional, há alguns que
não serão incluídos, como por exemplo, o comodato. Na opinião do Dr. Coutinho de
Abreu, tudo o que necessitar de consentimento da contraparte, com exceção dos
casos em que a lei dispensa o consentimento, isso não pertence a qualquer um dos
âmbitos de entrega porque só falamos de elementos que se podem transmitir sem
necessidade de consentimento da contraparte, porém, esta é uma posição
doutrinal. Outra defende que nos âmbitos de entrega o que interessa saber é o que
as partes quiseram incluir na negociação.

A firma vai pertencer na mesma ao âmbito convencional. Há uma diferença quanto a


elementos no âmbito da propriedade industrial.

Quando falamos destes âmbitos, não estamos a querer significar que os bens se
transmitem em propriedade para o locatário, o que significa é que o locatário
adquire o direito, por força do contrato de locação de utilizar os bens enquanto
durar o contrato e para efeitos de exploração do estabelecimento locado. É
evidente que surge o problema de se tratar de um estabelecimento que, no âmbito
da sua exploração, tenha de realizar transmissões a terceiros e aí estará a vender
coisa que não é dele, pelo que, teremos de ver na locação, um negócio que confere
ao locatário poderes para alienar os bens que foram também incluídos no negócio
de locação e portanto o negócio em si envolve os poderes de alienar os bens que
seja necessário no âmbito da exploração normal do estabelecimento.

Atingido o fim da duração desse contrato de locação, o que tem de fazer é

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restituir o estabelecimento ao locador desse e terá de retribuir o estabelecimento


em condições de funcionar. Se o locatário deixar de explorar o estabelecimento
este acaba por morrer em termos económicos e isso não será o que o locador
entregou na data de realização do contrato.

Hoje em dia, todos os regimes relacionados com contribuições para a segurança


social ou fisco devem ser vistos com particular cuidado à luz dos negócios
realizados mas chama-se à atenção para o regime do fundo de compensação salarial
que obriga as entidades empregadoras a contribuir para um fundo que se destina a
80
pagar um valor em caso de despedimento coletivo. Este regime diz que em caso de
transmissão de estabelecimento, a conta de cada empregador também se
transfere.

Ainda em relação à locação de estabelecimento, também se deve falar da obrigação


de não concorrência que vai recair sobre o locador durante o período de locação do
estabelecimento. Se na realidade tem lugar esta locação de estabelecimento,
enquanto o contrato durar, não será conveniente para o locatário que o locador vá
abrir um estabelecimento concorrente no raio de acção daquele estabelecimento
locado e imediatamente a seguir ao contrato de locação ter sido celebrado.

A grande diferença aqui está no facto de agora esta obrigação, no entender do Dr.
Coutinho de Abreu ser uma obrigação explícita e não implícita e não é implícita
porque o locador tem de entregar a coisa locada além da obrigação de assegurar o
gozo da coisa art.º 1031º e, por outro lado, não pode impedir ou diminuir o gozo
da coisa, art.º 1037º e atendendo à especial natureza do objecto do contrato de
locação, quem entrega o estabelecimento ao locatário e logo a seguir abre um
concorrente que implique contactos com mesmos clientes, fornecedores,
financiadores ou parte deles, está a diminuir o gozo da coisa. Depois, quanto ao
chamado limite temporal de obrigação de não concorrência, ela durará enquanto
durar o contrato de locação que é, por definição temporário e não há que fazer
aquele tipo de considerações que fazemos acerca do mesmo tema quanto ao
trespasse.

Há também o problema de saber se o locatário também está obrigado a não


concorrer com o próprio estabelecimento que recebeu a locação, enquanto dura
este contrato de locação? Ou então, se o locatário, depois de restituir o
estabelecimento ao locador, ele pode ou não abrir um estabelecimento
concorrente com aquele que restituiu?

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Art.º 1038º - em relação ao período de locação, essa obrigação existe porque


obriga o locatário a restituir a coisa locada findo o contrato e se o locatário
começar a fazer concorrência abrindo um estabelecimento concorrente, está a por
em risco essa restituição da coisa locada e, além disso, o locatário é obrigado a
manter e restituir a coisa no estado em que a recebeu e se o locatário começar a
fazer concorrência, não se pode dizer que mantem a coisa no estado em que a
recebeu, pois acabará por provocar um prejuízo aos valores de exploração – art.º
1043º. Findo o contrato já não há argumentos que permitam dizer que ficará o
locatário obrigado a não concorrer com o locador.
81

Relativamente à posição de locatário perante o senhorio e articulação com o


contrato feito entre senhorio e locador, já se falou dos aspetos mais importantes
e há que ter atenção ao que encontramos previsto no art.º 1112º, nº2 e teremos
de dizer o mesmo, ainda que com as devidas adaptações, que dissemos para o
trespasse.

Este contrato de locação é bastante frequente, são feitos quando não se conhece
ainda a pessoa em causa e quer-se fixar um prazo para ver se a pessoa sabe ou não
explorar o estabelecimento, assegurando que a pessoa é idónea para o negócio e
não estragar um negócio que durou dezenas de anos a montar, ou seja, funciona
como negócio intermédio antes do negócio definitivo. Por outro lado, pode ocorrer
em casos em que a pessoa necessite de se ausentar da sua exploração durante
determinado tempo e depois tencione regressar.

Temos sempre de verificar o regime fiscal porque, até bem recentemente, as


rendas pagas em contrato de locação estavam sujeitas a IVA e isto é fundamental
quando se negoceia o contrato.

É preciso ter noção de que um estabelecimento pode ser objecto de outros


negócios. Por exemplo, usufruto de estabelecimento comercial, este é também de
carácter temporário, podendo também ser vitalício e é um negócio já de natureza
real.

Isto tem a ver com a necessidade ou não de desapossamento mas também é


realizado o negócio de penhor de estabelecimento e discute-se se é ou não
admissível o penhor sem empossamento.

Medidas de recuperação de empresas


Hoje o leque de alternativas para esta recuperação é bastante maior do que era, o

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legislador acabou por ter a noção que devia encontrar um maior número de soluções
atendendo à crise de muitas empresas.

Temos, em primeiro lugar, a possibilidade de adoptar medidas de recuperação


através de plano de insolvência; em 2º lugar temos processos especiais de
revitalização e hoje temos no código dois tipos de PER; temos, por fim, o chamado
SREVE – sistema de recuperação de empresas por via extrajudicial. Estas 3
alternativas, na realidade, são apenas alternativas em relação a um número limitado
de casos.
82

No que diz respeito ao plano de insolvência e medidas de recuperação, temos de


ter noção que um plano de insolvência só pode ser homologado pelo juiz após a
declaração de insolvência. Isto é, de alguma forma, à luz das formas de encarar a
insolvência, algo de negativo porque as pessoas ainda vêm nesta declaração de
insolvência algo que constitui um estigma social para quem assim é considerado.
Estas medidas aprovadas neste âmbito são medidas que não são a primeira escolha
por parte do próprio devedor. Já se sabe que o devedor, pode, por sua vontade,
requerer ao tribunal que seja declarado insolvente, quer quando esteja em situação
de insolvência actual, quer quando esteja em situação de insolvência iminente, mas
neste último, os credores já não podem requerer a declaração de insolvência.

O plano de insolvência poderá ser mais atrativo para o devedor se este, antes de se
apresentar à insolvência, negociar com os credores um projeto de plano de
insolvência e apresentar esse plano da data do requerimento de insolvência. Em
assembleia de credores, terá de haver uma maioria e considera-se a proposta
aprovada se estiverem presentes credores que representem pelo menos 1/3 dos
direitos de voto em causa e, sendo este requisito do quórum constitutivo cumprido,
é necessário que a proposta recolha mais de 2/3 da totalidade dos votos admitidos
e dentro desses, os votos têm de corresponder a mais de metade dos votos dos
créditos não subordinados.

Os votos subordinados são assim considerados porque estão em situação de alguma


familiaridade com o devedor, daí a sua subordinação. O que a lei pretende com esta
dupla maioria é evitar que a decisão fique nas mãos dos titulares dos créditos
subordinados pois no cômputo global pode haver a possibilidade de os credores
subordinados conseguirem atingir estes 2/3 e mais de metade desses, mas não é
bom que isso aconteça. Daí se dizer que mais de metade dos votos não
subordinados também vote a favor.

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Mais uma vez, quem vai iniciar este processo, pelo nº1 do art.º 3º é a empresa
interessada. O art.º 6º na al) ii) vem prever a recusa do requerimento se a
empresa for economicamente viável. Mais uma vez, vamos encontrar um “porto
seguro”.
Há outra diferença, pois se no PER temos nomeação de administrador judicial
provisório e na insolvência temos administrador de insolvência, no SREVE não
temos isso, o que dá uma maior margem de manobra para actuar. Porém, o nº5 do
art.º 11º estabelece limitações quanto aos actos que o devedor pode praticar.
87

Mais uma vez, quanto à protecção conferida aos credores que pretendam financiar,
o art.º 11º, nº6 oferece-lhe uma garantia. Este acordo produz alguns efeitos
vantajosos.

Nota: art.º 5º nº1 este regime é importante porque permite ver uma diferença
entre o SREVE e PER porque diz que a presentação do requerimento suspende o
prazo do nº1 do art.º 18 do CIRE para declaração de insolvência e isto só é útil
quando há uma situação de insolvência actual. A apresentação de requerimento do
PER não prevê esta suspensão e sobre isto diz-se que o PER só se pode iniciar
quando há situação económica difícil ou iminente e não em situação actual de
insolvência. Contudo o PER não prevê, aparentemente um controlo liminar por parte
do julgador de uma situação de insolvência actual desde o início.

Se o devedor inicia processo PER não o podendo fazer, isto quer dizer que o prazo
não se suspendeu e se ultrapassar esse prazo, sofrerá as consequências mas isto é
discutível.

19 Novembro 2013 – Dr. Coutinho de Abreu

Sinais distintivos – logotipos e marcas

Todos estes sinais, juntamente com a firma, costumam ser agregados num conjunto
designado sinais distintivos do comércio e podia pensar-se ser matéria
estritamente de direito comercial pois são sinais que distinguem sujeitos e
objectos de comércio, todavia não é bem assim, o código que regula estas coisas é
o da propriedade industrial e a disciplina poderá designar-se corretamente como
direito da propriedade industrial. Estes sinais podem ser adoptados por
comerciantes e não comerciantes, de toda a maneira, também por uma questão de

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tradição estas coisas vêm sendo ensinadas em direito comercial, tendo em conta
que há uma estreita ligação entre eles e as empresas comerciais.

Logotipos:
É um sinal com regulação jurídica há pouco tempo, entrou no código da propriedade
industrial em 1995, continuou no código actual e numa primeira fase, até 2008 o
logótipo coexistia com outros sinais distintivos, chamado nome e insígnia de
estabelecimento e aí essa expressão significava que tinham que ver com nome ou
sinal distintivo das empresas. O logotipo apareceu sempre como sinal distintivo de 88
sujeitos mas com ligação estreita aos estabelecimentos. Em 2008, o decreto-lei
fundiu estes três sinais de modo que irão desaparecer progressivamente.

Os logotipos, embora sendo sinais individualizadores de sujeitos, podem também


ser distintivos de estabelecimentos na opinião do professor Coutinho de Abreu. O
que é facto é que a lei, art.º 304º-A e ss do código da propriedade industrial
diz que o logotipo deve ser adequado a distinguir uma entidade, ou seja, em
primeira linha, é um sinal distintivo de entidades, ou seja, sujeitos, comerciantes
ou não, empresários ou não, aditando poder ser utilizado em estabelecimentos. Ora,
se pode ser usado em estabelecimentos, significará que poderão identificar
estabelecimentos e não apenas sujeitos.

Fala-se que eventualmente também poderão ser distintivos de estabelecimentos


porque nem todas as pessoas poderão ter uma empresa em sentido objectivo. O
normal será que quando o sujeito tenha uma empresa, sirva também para distinguir
as respetivas empresas.
Vimos que os comerciantes e outros sujeitos só podem ter uma firma e aqui o
mesmo sujeito comerciante ou não, empresário ou não, pode ter vários logótipos,
levando a promoção do empreendedorismo, na versão crítica do professor art.º
304º - C.

Composição dos princípios conformadores:

Podemos ter logotipos nominativos, compostos por nomes, palavras; logótipos


figurativos compostos por figuras ou desenhos e mistos, que juntam os elementos
nominativos aos figurativos, mas há outras possibilidades não previstas na lei, como
seja, a utilização de várias letras ou números.
Esta composição deve obedecer a propósito de alguns princípios:

Princípio da capacidade distintiva – os logotipos têm de ter capacidade de

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se individualizar, como resulta do art.º 304º-A, nº2.


Quando é que os logotipos não têm capacidade distintiva de modo a não
poderem ser registados (aqui o registo é constitutivo, só há logotipo se este
for registado do instituto nacional da propriedade industrial)? Art.º 304º-H –
é recusado o registo de logotipo quando seja constituído por sinais insuscetível de
representação gráfica; seja constituída por sinais constituintes das alíneas b) a e)
do art.º 223º nº1 – ou seja, o nome do produto não distingue esse produto e para
o individualizar tem de haver um sinal que não reproduza o seu nome, também os
símbolos genéricos, ou sinais descritivos que descrevem a natureza e/ou
89
característica do produto (café ou comercio de bebidas, não distingue o produto e
não são suscetíveis de serem registados como logotipo) e além deste, também são
proibidos expressões comuns, isto é, sinais que se banalizaram como: ótimo,
excelente, deluxe, porque são usados por todos os comerciantes, não
individualizando nenhum produto em concreto.

E a optimus foi registada como marca de serviços de telecomunicações? Parece


que esta marca não devia ter sido assim registada na opinião do Dr. Coutinho de
Abreu.

É claro que também aqui, nos logotipos se menciona um fenómeno, art.º 304º-H
nº2 em que se diz que os sinais específicos e genéricos descritivos usuais podem
ser usados como logotipos, quando não tenham originariamente capacidade
distintiva, tenham adquirido antes do registo a capacidade de
distinguir/individualizadora aquela empresa como sinal distintivo.

Princípio da verdade – normalmente, quanto às marcas, o princípio da


verdade não tem manifestações positivas necessárias.
Os logotipos podem ser nomes ou figuras que nada digam sobre o nome dos sujeitos
e/ou actividades dos sujeitos. Aqui, nos logotipos, este não tem de dizer nada
sobre produtos e sujeitos mas cumpre-se o princípio da verdade quando os sinais
não enganem, estes não têm de dizer a verdade, apenas não podem dizer a mentira.

Art.º 304º-H, nº5 – recusa-se registo do logotipo que contenha apenas a


bandeira nacional da república portuguesa ou por alguns dos seus elementos, ou
seja, podem ter a bandeira como um dos elementos apenas quando isso não induzir
o público em erro.

Princípio da novidade – se fossem possíveis a coexistência de símbolos


idênticos ou semelhantes, distinguindo sujeitos ou objectos semelhantes,

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olhar-se-ia para um sinal distintivo e far-se-ia confusão.


Art.º 304º-I - recusa-se a reprodução ou imitação, no todo ou em parte, de
logotipo anteriormente registado por outrem para distinguir uma actividade
idêntica ou afim, se for suscetível de induzir em erro. Os logotipos têm de ser
distinguíveis e não confundíveis, uns perante os outros e se temos um logotipo
registado não se poderá registar outro idêntico ou semelhante que leve o público a
confundir um sujeito e outro. Este âmbito amplo é restringido pelo facto de valer
aqui o Princípio da especialidade, isto é, não é a semelhança ou identidade de
símbolo de actividade qualquer, apenas quando seja utilizado em actividade
90
concorrente, semelhante ou afim à entidade que se pretenda distinguir.

Nas firmas este princípio da especialidade vale, na generalidade das actividades,


por se entender ser um sinal fundamental que distingue sujeitos e estes, em
princípio, só podem ter uma “máscara” mas nos logotipos não se segue a mesma
ideia, apenas com sujeitos que exerçam actividades concorrenciais.

Não é assim quanto à especialidade, relativamente aos logotipos de prestígio, isso


estas têm uma proteção para além do Princípio da especialidade, não podendo estas
ser imitadas. Aqui o legislador remete para o art.º 242º do art.º 304ºI, nº2.

Princípio da licitude residual – é um local onde cabe coisas muito diversas


que não cabem nos outros princípios, art.º 304º-H e refere ser proibido o
registo de logotipos religiosos, salvo autorização e ainda de logotipos que
violem a moral e os bons costumes. Não se pode usar logotipos de bebidas
com pilinha mas já se admite “força no pau”.

Quem for titular de um logotipo pode opor-se a que outro o use para actividades
semelhantes – art.º 304º-N. Aqui impede terceiros de usar o logotipo mas no
exercício da sua actividade pelo que, quando se fala de impedir o uso por outrém
terá de ser remetido para esta questão e com confusão distintiva.

Transmissão dos logotipos

Diz-se no nº1 do art.º 304º-P que o registo de logotipo são transmissíveis se tal
não for suscetível de induzir o público em erro ou confusão e isto poderá acontecer
quando do logotipo façam parte o nome ou firma do respetivo titular pois não está
nada proibido que o logotipo constitua o nome da firma. Se assim é, esse sujeito
não pode transmitir, desligado de qualquer outro bem, para outro porque o público
irá ser levado a erro.

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As firmas não são suscetíveis de transmissão autónoma, estas só podem ser


transmitidas juntamente como estabelecimento a que está tal firma ligada mas
aqui, a regra é a da transmissão autónoma e desvinculada, ou seja, pode-se negociar
sem o fazer conjuntamente.

Art.º 304-P, nº2 – este preceito funda a concepção do professor Coutinho de


Abreu de que sendo predominantemente individualizador de sujeitos, pode ser
também de estabelecimentos porque aqui, mais uma vez, se diz que o logotipo pode
estar ligado a estabelecimento e essa ligação poderá ser tão próxima que apenas
91
permita transmiti-lo com o estabelecimento.

A firma não se pode transmitir sem estabelecimento mas quando se transmite


um estabelecimento também se transmite naturalmente a firma? Não, esta faz
parte do âmbito convencional e aqui vem o nº3 do art.º 304-I dizer que os
logotipos transmitem-se naturalmente com os estabelecimentos a que estão
ligados.

Extinção dos logotipos

Fala-se em declaração de nulidade, anulação e caducidade e os casos de nulidade


referem-se a proibições de violações absolutas, que pode ser pedido a todo o
tempo e por qualquer interessado; quanto à anulabilidade, o prazo é de 10 anos e
este versa sobre violação de interesses de particulares, por exemplo, violação do
princípio da novidade – art.º 304º-Q e R.

Sobre a caducidade versa o art.º 304º-S – o registo caduca por motivo de


encerramento e liquidação da entidade; também se extingue com o encerramento
do estabelecimento pois aqui caduca o logotipo mas isto é estranho porque um
sujeito, para ter logótipo, não tem de ser empresário e pode ter mais do que um
logotipo. Em primeiro lugar, o logotipo distingue sujeitos podendo eventualmente
distinguir estabelecimentos - porquê a extinção se se pode ter um outro
estabelecimento? O professor considera poder interpretado ab-rogantemente ou
revogatoriamente.

Marcas

As marcas são sinais suscetíveis de representação gráfica, destinados sobretudo a


distinguir certos produtos de outros produtos idênticos ou afins. Estes podem ser
sonoros, tridimensionais, isto é, constituídas por sinais com volume (comprimento,

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largura e altura) e servem sobretudo para distinguir produtos de outros produtos


da mesma espécie ou afins. Ou seja, marca-se logo a ideia de que vigora o Princípio
da especialidade, isto é, é possível haver sinais idênticos ou semelhantes,
registados como marcas desde que sirvam para distinguir produtos não idênticos ou
afins.

Quem tem direito a usar marca, mais uma vez, são os comerciantes e não
comerciantes e até empresários e não empresários, embora no art.º 225º só se
refiram a empresários, sendo o elenco exemplificativo, donde resulta que um não
92
empresário possa ter marca, por exemplo, no caso de artesãos e prestadores de
serviços. Há quem diga que, de facto, que as marcas só podem ser tituladas por
sujeitos que exerçam determinada actividade económica, mas parece que não será
bem assim, pois um sujeito famoso poderá querer registar o seu nome como uma
marca.

No art.º 228º diz-se que marca coletiva é uma marca de associação ou certificação
e quer uma quer outa são marcas de entidades coletivas. As marcas de associação
servem para permitir que os sujeitos integrantes dessa associação utilizem uma
marca para além da marca individual. As marcas de certificação servem para
atestar que determinados produtos sujeitos a controlo, reúnem determinadas
características e que podem ser representadas por isso mesmo.

Quanto às funções, as marcas servem para distinguir produtos, assinalados com


esse símbolo, de produtos, em princípio da mesma espécie ou fins, não marcados ou
marcados com outros símbolos. Esta função, nestes termos, é distintiva mas
tradicionalmente tem-se dito que significa que a marca assinala vários produtos
que advêm de uma mesma fonte produtiva mas o professor Coutinho de Abreu não
vai tanto por aí. Quando se reconhece que as marcas podem ser negociadas
autonomamente, ninguém garante que a marca seja vendida a outro e assim o
público não pode confiar que esta marca tenha uma fonte constante de produção na
mesma empresa. Quando se permite a licença do uso de marca, não se consegue
garantir que os produtos tenham uma fonte constante.

As marcas são emitidas para que o público/Recetores recebam determinada


mensagem, isto é, a mensagem de que há aqueles produtos, assinalados com uma
determinada marca, o que faz com que estes produtos sejam diferentes daqueles
que não estejam ou estejam marcados com uma marca distinta.

Há funções que podem ser tuteladas de forma autónoma e falamos da chamada

Diana Simões
Direito Comercial I Aulas Teóricas 2013/2014

função publicitária ou atrativa excecional e da função de garantia da qualidade


– a propósito dos logotipos, a nossa lei admite uma proteção que vai para além do
princípio da especialidade, quando a marca seja de prestígio, pois dir-se-á que a
pessoa que criou a marca e a levou ao prestígio pode ficar descredenciada e
desacreditada.

Desde a diretiva de 89 não há dúvidas sobre a protecção de marcas de prestígio –


art.º 242º código da propriedade industrial. Dir-se-á que quanto às marcas, tutela
se autonomamente uma outra função que não a distintiva mas a função publicitária
93
ou atrativa excepcional de determinadas marcas. Se os bens estiverem claramente
distantes, parece-se que não haja margem de confusão mas se ainda assim se
proíbe uma marca semelhante a uma marca de prestígio significa que, então,
estamos a tutelar algo mais do que a capacidade distintiva.

Para se considerar que uma marca é de prestigio, tem de ser muito notória mas há
ainda assim grandes diferenças quanto a este prestigio, pois há autores que julgam
ter de ser uma marca super notória e o Professor Coutinho de Abreu entende que
não é preciso tanto, bastando agarrar jurisprudência alemã e do TIJ – portanto, a
marca de prestigio, para além de um reconhecimento considerável, deverá ter
também uma boa imagem e estar ligada a produtos com boa fama ou boa imagem em
termos de qualidade.

Fala-se também de outra função secundária que pode gozar de uma tutela
autónoma, de uma tutela diferente da que resulta da tutela da função distintiva –
função de garantia de qualidade.

Há quem diga ser esta função reflexo da função distintiva mas há que atende a um
fenómeno, relativamente recente. Art.º 269º para casos de caducidade da marca
– o registo das marcas dura por 10 anos mas indefinidamente renovável que não
acontece com outros bens de propriedade intelectual por exemplo, as patentes que
tem um prazo de 20 anos.

Nem todas as formas tridimensionais são suscetíveis de registo como marcas, não
são registáveis as formas naturais (o ovo tem uma forma natural e não distingue
uma empresa de outra), funcional (não pode ser a forma da tesoura registada como
marca mas já pode ser registada como modelo ou desenho ou ainda patenteada e
isso impedirá que outros sujeitos façam tesouras daquele tipo durante
determinados anos) ou esteticamente necessárias.

Diana Simões
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Caduca o registo da marca quando esta se tiver transformado na designação usual


do comércio – ou seja, “termo”, o nome daquilo não era termo havia uma marca do
produto mas houve uma vulgarização tal conjuntamente com o facto de se ter dado
por iniciativa do titular da marca ou em consequência da sua inatividade. Foi o
próprio produtor que começou a designar o produto com a marca e não com o nome.
Assim há vulgarização e por consequência caducidade. Se forem os consumidores a
designar o produto com aquela marca e a usarem, não haverá caducidade ainda que
haja vulgarização.

94
A marca que não era decetiva assim se tornou pelo seu uso, por exemplo, “filseda”
para um individuo que se dedica aquela produção de fios de seda, é uma marca
expressiva por ser composta por partes de duas palavras que são significados
específicos – aqui há uma combinação original e a certa altura, começa a fazer fios
artificiais e continua a meter nesses produtos a marca. A lei diz que nestes casos,
a lei caduca. Porem, temos de ter em consideração que esta marca pode ser
utilizada para a produção de produtos diferentes, desde que tenha havido um aviso
nesse sentido, só em casos de se ter tornado enganosa é que haverá razoes para
esta caducar.

26 Novembro 2013

Princípios constituintes das Marcas

As designações destes princípios já foram vistas a este propósito.

O Princípio da capacidade distintiva diz só poderem ser marcas os símbolos que


têm capacidade para diferenciar os produtos e não têm capacidade distintiva os
sinais específicos, descritivos, genéricos e de uso comum. Exemplo: o nome de um
produto não é marca, não o distingue dos demais produtos da mesma espécie. O
nome do genro em que se inclui em determinado produto também não pode ser
marca porque não distingue esses de outros do mesmo género. Os sinais que
descrevem características e qualidades, proveniência geográfica, etc, também não
têm capacidade distintiva, art.º 223º, nº1 c).

Quanto aos sinais descritivos, temos mais alguma coisa sobre os sinais indicativos
de proveniência e em princípio, se houver algum topónimo incluído na marca, ele é
possível desde que seja verdadeiro, isto é, um sinal para marcar a louça de Coimbra
não pode ser só Coimbra, isso seria apenas o sinal descritivo mas pode ter a palavra
Coimbra e ter imagens/fantasias de Coimbra. Todavia, podem aparecer nomes

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geográficos que não correspondam aos locais em que são produzidos os produtos.
Se aparecerem como sinais de fantasia, se não corresponderem à verdade e estes
forem sinais muito conhecidos, exemplo: Sintra para tabaco manufaturado na cova
da Beira – ninguém vai pensar que o tabaco é oriundo de Sintra ou palácio de
Sintra.

Ainda quanto à capacidade distintiva, o nome dos produtos de mercado não pode
constituir marca desses produtos - exemplo: ovo para ovos não distingue nada, a
espécie de produto não distingue aqueles ovos de outros ovos. Se aparecer “eggs”
95
ou “ouef”, o produtor português não pode usar palavras escritas noutras línguas se
estas forem bem conhecidas pelo povo português, mas mesmo que não sejam
conhecidas, tendo em conta que estamos no mercado único, esses sinais genéricos
não deverão ser registados como marca. Porém, se parecer uma palavra de outras
línguas ou de uma língua morta quando não sejam muito parecidas com as
correspondentes palavras portuguesas, aí admitir-se-á porque os produtos não
aparecem com essa descrição mas será um sinal de fantasia.

Segundo o Princípio da verdade, as marcas não implicam manifestações positivas


necessárias, ou seja, não têm de dizer algo verdadeiro sobre os produtos que
assinalam, apenas não podem dizer algo que seja enganoso relativamente aos
produtos assinalados. Está previsto no art.º 238º, nº4 d). Se aparecer uma
marca composta ou que integra como um dos seus elementos uma designação
geográfica, se essa não corresponder ao local de produção e não for tomada como
sinal de fantasia é proibido porque induziria em erro o público.

O Princípio da licitude residual serve para imensas coisas. A propósito dos


logotipos não poderem incluir a bandeira, o mesmo se diz a propósito das marcas.

O mais importante e o Princípio da novidade e especialidade – em regra,


excetuando as marcas de prestígio, a novidade impõe-se apenas relativamente a
produtos idênticos ou afins mas relativamente a esses, as marcas hão-se ser
distintas umas das outras, ou seja, inconfundíveis e neste sentido terão de ser
novas relativamente às outras, como resulta do art.º 239º, nº1 do código da
propriedade industrial.
Quanto a isto:

Marcas VS Produtos.
Marcas Produtos
Identidade identidade
identidade afinidade

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semelhantes identidade
semelhantes afinidade

Temos aqui três dimensões a considerar: é preciso saber quando há identidade,


quando há semelhança e quando há afinidade.

Os produtos são afins quando tenham características ou natureza igual e tenham


destinos idênticos, isto é, visem satisfazer as mesmas necessidades, no caso disto
fala-se de produtos concorrentes ou inter-mutáveis, como é o caso de um casaco
de lã e um casaco de fibra, servem ambos para vestir. Também se deve entender
96
que bens que não são propriamente concorrentes poderão ser considerados afins
para estes efeitos porque são complementares, por exemplo, fios de lã e vestuário
de lã que se tiverem a mesma marca pensar-se à que serão do mesmo produtor.

Quanto às semelhanças entre sinais, se tivermos marcas nominativas, há-de


atender-se à grafia e fonética, designadamente, se tivermos marcas figurativas
há-de atender-se à configuração e ao desenho e em qualquer caso deve atender-se
também à chamada semelhança ideográfica ou conceitual – exemplo – cartuchos de
caça com imagem de javali e os segundos cartuchos têm a palavra javali escrita. A
este respeito vê-se o art.º 245º CPI.

Para se averiguar da semelhança entre estes sinais, deve tentar-se uma apreensão
complexiva ou global, isto é, deve-se proceder a uma perceção sintética e não
analítica e isto tem alguma importância. Deve ver-se cada um dos sinas
complexivamente/globalmente, embora, evidentemente, possa haver elementos
mais importantes do que outros, isto é, os sinais fracos, específicos, terão menos
capacidade distintiva e de retenção na memória do que sinais de mera fantasia e
também aqui temos de atender que pode haver o núcleo ou coração da marca e
elementos mais ou menos marginais.

Há identidade ou semelhança nos produtos e semelhança entre as marcas e ainda


será preciso perguntar: destas correlações, tendo isso em vista, isto cria risco
de confusão ou associação? A nossa lei, por efeito da diretiva de harmonização
das marcas, fala aqui em risco de confusão e risco de associação com marca
anteriormente registada. Isto quer dizer que o risco de confusão trata-se de risco
em sentido estrito, ou seja, um sujeito tem memória de um determinado sinal e
passado algum tempo é sensibilizado por outro sinal - não será novo se o sujeito
sensibilizado pelo segundo sinal pensa estar a comprar produtos com a marca de
que tem memória e se confunde sinais, logo também confunde produtos. Quanto ao
risco de associação, significa que não há esta confusão e este tomar um sinal por

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outro, logo, um produto por outro, significa que os consumidores não tomam “gato
por lebre” mas vê que há algumas semelhanças tao consideráveis que pensa haver
algum associação entre os dois sinais, designadamente, pode ser levado a entender
e concluir que aquilo são marcas que pertençam ao mesmo sujeito e que os produtos
tenham a mesma origem.

Mas para saber se há ou não este risco de confusão ou associação é preciso


atender ao público, ou melhor, aos destinatários. Por outro lado, interessará o grau
de semelhança entre as marcas e o grau de afinidade entre produtos, quanto mais
97
afins forem os produtos, menos semelhanças deverão ter as marcas, e vice-versa.
Para este juízo de novidade também interessa saber se as marcas registadas são
fracas ou fortes, ou seja, pouca ou muita capacidade distintiva. Interessará ainda
saber se a marca já registada é notória ou não, isto é, saber se é ou não conhecida
vastamente porque quanto mais conhecida for a marca, mais dissemelhante será
esse sinal, pois há uma grande memória desse sinal.

Há uma nota no livro donde se vê que há decisões para todos os gostos, entre nós,
recordista em caso de imitação é a marca coca-cola, decidui-se que foi ilicitamente
imitada com várias marcas.

Transmissões e licenças

Como sabemos, as firmas não podem ser negociadas sem a empresa, o logotipo pode
ser negociado autonomamente excepto quando seja utilizado no estabelecimento,
pois diz a lei que assim só com o estabelecimento pode ser transmitido. Quanto às
marcas estas são os sinais que mais autonomamente podem ser negociados, são os
mas desvinculados do estabelecimento – art.º 262º. Mais uma vez, se se
transmite uma marca nominativa de que faça parte um ou mais nomes do titular,
pode dizer-se que aí não será possível a negociação autónoma.

Sabemos também que quando se transmite uma empresa/estabelecimento


comercial com produtos assinalados com marca, transmitindo-se a empresa,
transmite-se naturalmente a marca. Interessa ainda dizer que está sujeito a
escrito o negócio de transmissão autónomo de marcas, pois se se transmitir a
marca, naturalmente ou explicitada, bastará o escrito que é forma necessária à
transmissão do estabelecimento e a marca exige ainda averbamento IMPI para ter
eficácia perante terceiros.

E as marcas de facto, não registadas? Estas também se transmitem

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naturalmente porque são elementos do estabelecimento e assinalam os produtos,


apenas não há proteção própria das marcas registadas pelo sujeito.

Quanto às funções, as marcas podem ser dadas em licença de uso ou exploração e a


propósito disto, a função tradicional era a função de indicação de origem e uma das
críticas que se podia fazer era que, de facto, não se pode garantir aos
consumidores que a origem de produtos de determinada marca é sempre a mesma
quando o consumidor pode produzir produtos com a marca X e autorizar que Y,
produtor de produtos semelhantes, coloque no mercado produtos com a mesma
98
marca. Porque se levou demasiado a sério esta função, até há pouco tempo atras
não era permitido a licença de marcas mas hoje é pois está previsto na directiva de
harmonização das marcas e isto está, sobretudo, na parte geral, no art.º 32º.

Há licenças exclusivas que garantem que mais ninguém pode ser licenciado naquela
marca, ou seja, não pode ser concedida em licença a mais ninguém que não o
licenciado mas pode acontecer também que o licenciante se obrigue, mediante
cláusula expressa, a não usá-la e aí temos uma licença exclusiva reforçada, nº6.

Nos nº8 e 9, sem consentimento do titular da marca, o licenciado não pode ceder a
posição nem concede-la a outrem, por isso é que isto não faz parte do âmbito
natural, nem se quer convencional porque é preciso a intervenção de uma terceira
pessoa, o titular da marca que é o licenciante da marca. Não há a obrigação legal do
licenciante controlar a qualidade dos produtos, esse controlo pode ser feito mas
não há a sua obrigatoriedade.

A licença de marca, total ou parcial, tem que ver com permitir que outrem explore
a marca em parte dos produtos para os quais a marca foi registada e relativamente
a isto não se poderá falar em merchandising e o Professor Coutinho de Abreu
acha que isto valerá sobretudo para as marcas de prestígio, que também são
marcas registadas para determinar ou para determinados produtos. O titular de
uma marca de prestígio não está impedido de a dar em licença para esses produtos,
mas será pouco provável, contudo, já poderá merchandizar a marca. Quando a
marca é de prestígio isso significa que a protecção vai para além dos sectores
económicos limitados pelo princípio da especialidade e pode proibir que outrem use
essa mesma marca noutros produtos não afins. Assim, também poderá permitir que
se use noutros produtos a marca, sendo isso o merchandising.

Sporting é uma marca ligada ao desporto, pelo que será insuscetível de registo.

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outro nível, os chamados conhecimentos de carga eletrónicos que são do que


representam mercadorias em trânsito e aí, a partir do momento que seja possível
garantir segurança quanto a esse registo centralizado que represente aquela
mercadoria, talvez se possa falar a algo semelhante de títulos de crédito
desmaterializados.

Tipicidade de títulos de crédito – podemos dizer que os títulos de crédito


estão sujeitos a um princípio de tipicidade? Para o professor Soveral Martins
deve afirmar-se a tipicidade de títulos de crédito, desde logo, quanto à regra de
106
criação de direitos no que diz respeito aos negócios jurídicos unilaterais e por
causa do regime associado à transmissão do título de crédito, pois este em maior
ou menor medida, irá representar um direito com uma certa literalidade e
autonomia e isso leva a considerar que só se deve permitir a criação de títulos de
crédito no caso em que a lei o admita.

Letra:
A designação tradicional era de letra de câmbio. Chamava-se assim porque surgiu
associada ao contrato de troca de moeda por outra moeda – cambium per litteras.
Estamos a falar da idade média, num período em que a circulação pela europa dos
comerciantes era arriscada devido aos salteadores que assaltavam os mercadores
que circulavam por entradas perigosas. Daí que não fosse aconselhado para o
mercador de Lisboa que queria ir comerciar a Veneza ir carregado de dinheiro
durante a viagem e procurava-se obter um mecanismo que permitisse, de alguma
forma, ter a possibilidade de entregar dinheiro em Portugal a alguém que
disponibilizasse em Veneza o correspondente a essa quantia na moeda que circulava
nesse país. Aqui em causa está um instrumento que permitia ao mercador
português, chegar a Lisboa, contactar um banqueiro e dizer-lhe que lhe entrega um
valor em moeda com circulação legal em Portugal e pede que aquele banqueiro ou um
correspondente que tivesse acordos nesse sentido em Veneza, para que fosse
entregue o correspondente em Veneza ao comerciante, na moeda que circulasse em
Veneza. Isto tudo seria documentado através de um título de crédito que
permitiria ao mercador português chegar ao banqueiro de Veneza e dizer que o
banqueiro em Lisboa recebeu tal quantia e entregou um documento para exigir o
correspondente em Veneza.

Há aqui várias ideias: por um lado, estava a ser usado para fazer troca de moeda e
por outro lado a ideia de separação física, com distância dos lugares. O problema é
que isto era utilizado para fugir à usura, aqui proibia-se o empréstimo a juros que
era condenável pela igreja mas através da letra conseguia-se algo muito

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semelhante porque em vez de se cobrar juros, cobrava-se a taxa correspondente


ao serviço prestado pela troca e se isso fosse associado à falsa declaração de que
se recebia em Lisboa uma quantia em dinheiro, teríamos algo que permitia fugir a
usura.
Nesta época mais recuada da figura, o documento não circulava à ordem, aquele
documento que o banqueiro entregava não servia para endossar a outra pessoa e
ser outra pessoa a exigir noutro país, teria de ser quem recebia o documento que o
podia exigir em outro local. O período mais recuado é chamado período italiano da
história da letra mas esta foi ganhando a possibilidade de se transmitir por
107
endosso e foi ganhando as caraterísticas de que falamos, deixou de se exigir que
fosse um documento que obrigasse à troca de uma moeda por moeda diferente e
passou a ser possível que se pudesse receber a mesma moeda e também se deixou
de exigir que os países fossem diferentes. Finalmente, também se deixou de exigir
a entrega de uma quantia em dinheiro no momento em que o documento é emitido,
ou seja, deixou de se exigir a troca de uma quantia actual por uma quantia futura,
não associado à ideia de provisão.

Os títulos de crédito são hoje ainda documentos muito utilizados, nomeadamente


no âmbito do comércio internacional de mercadorias.
Por um lado, temos o chamado contrato de forfaiting (ICC uniforme rules for
forfaiting – URF 800), é tao importante que há regras específicas para este tipo
de contrato. Este contrato é algo muito semelhante a um desconto numa letra de
câmbio; neste o que acontece é que o exportador de mercadorias consegue obter
do importador um título de crédito no qual o importador surge como o obrigado,
designadamente através do aceite e depois o exportador, com essa letra, obtém no
seu banco um adiantamento da quantia.

Nota: uma nota característica da forfeitização é que justamente o banco que vai
aceitar os títulos e aceitar o dinheiro, em regra também aceita correr o risco da
boa cobrança dos títulos.

Há ainda outras duas modalidades, são também forma de pagamento: D/A


(documents against acceptance – documentos representativos do embarque são
entregues contra a aceitação de uma letra -) e D/A plus aval by (acresce que a
letra deve conter, para alem do aceite, o aval de outrem).

A letra é, antes de mais, um documento em papel que vai ser título de crédito a
partir do momento em que dela consta um saque (uma ordem de pagamento), pois
sem ordem de pagamento não há letra, sendo esta ordem que cria o documento

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como letra, pois sem este, juridicamente, ainda não é letra. Contém uma ordem de
pagamento em quantia determinada em dinheiro que é dada por um determinado
sujeito (o sacador) ao sacado, a favor do tomador. Quando o tomador endossa a
letra ao terceiro, está a dizer ao sacado que, em vez de lhe pagar a ele, paga ao
outro a quem endossou a letra.

Há quem afirme ser a letra ato de comércio, mas esta não é mais do que um
documento, acto de comércio será o negocio jurídico como o saque, o endosso e o
aval.
108

Esta noção permite distinguir a letra de outros como o cheque e a livrança.


Enquanto na letra o que temos é uma ordem de pagamento dada pelo sacador, a
livrança contém uma promessa de pagamento, (é melhor dar ordens de pagamento
do que fazer promessas de pagamento). Vamos estudar o regime da letra porque o
regime da livrança resulta essencialmente de remissões para o regime da letra. Em
relação ao cheque, neste temos uma ordem de pagamento, temos um saque dado
pelo cliente do banco sobre o banco. Não quer dizer que previamente o sacador
tenha colocado os fundos junto do banco, não é sempre assim, normalmente, no
âmbito da actuação das empresas, os bancos permitem a mobilização de fundos até
um certo montante que não foram colocados anteriormente.

Quanto às funções: a letra tem antes de mais, uma função de transmissão, uma
função de legitimação e uma função de garantia.

Transmissão: através do endosso também se transmite não apenas a letra mas o


direito nela representado

Legitimação: através do endosso colocado nessa letra o portador se legitimado por


uma serie sucessiva de endossos, poderá exigir o vencimento na data de
pagamento, se não houve endosso, será o tomador o legitimado para exigir o
pagamento na data do vencimento.

Garantia: a letra será um instrumento de crédito, que permitirá exigir o


pagamento na data do vencimento com especial regime de tutela e, por outro lado,
funciona como um título executivo e nessa medida é um documento que confere
garantia ao seu portador.

Fala-se da possibilidade de desconto de letra juntos de entidades bancárias, ou


seja, se por exemplo, A, com stand automóvel, vende um a B, concedendo crédito e

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sacando uma letra sobre o cliente e é aceite, esta letra terá uma data de
vencimento e para o vendedor pode não ser conveniente estar à espera do
vencimento para adquirir aquele valor. Aí pode ir ao seu banco com quem tem
relações comerciais e pede o desconto da letra – o banco aceita fazer o desconto,
aceita o dinheiro mas fará um abatimento posteriormente que corresponderá a uma
aplicação da taxa de juro quanto ao tempo que falta para receber o dinheiro.

Se a letra tinha o valor de 1000 e estamos a falar de 4 meses que faltam para o
vencimento e uma taxa de juro de X, o banco calculara a taxa em função do valor e
109
do tempo, e retirará essa taxa para si, o valor cobrado por esse adiantamento.

A letra irá conter uma declaração cambiária, que é o saque, e poderá conter o
aceite, o endosso e o aval.
Como título de crédito sujeito a um regime que visa dar segurança aos portadores
mediatos dessa letra, é um documento que está sujeito a exigências de caracter
formal particularmente rigorosos, precisamente, para dar segurança a ulteriores
portadores da letra pois só com um regime seguro que dê garantias é que um
terceiro irá aceitar receber aquele título com endosso para pagamento de dívidas.
O regime rigoroso torna assim mais fácil, a circulação deste título – art.º 1º da
Lei uniforme. Estes são os requisitos externos

Na realidade, hoje, por fora de exigência de caracter fiscal, as letras têm de


obedecer a modelos, portaria 28/2000 e são modelos que só podem ser adquiridos
em dextrinados locais para obrigar a respeitar as exigências fiscais no que diz
respeito ao imposto do selo. O que não quer dizer que um documento que não
conste desse formulário não possa valer como letra. Coisa diferente é criar uma
letra à margem do modelo, aí apenas se comete uma infração fiscal mas não invalida
a letra em si.

A primeira exigência é a palavra “letra” e assim para quem coloque o nome no


documento, saiba o que está a fazer e fique assim alertado para aquele regime.
Na lei uniforme aparece a expressão “mandato puro e simples der pagar uma
quantia determinada” – saque. Esta ordem tem de ser pura e simples para que se
possa determinar qual o conteúdo da ordem apenas com o conteúdo do documento e
assim não andar a tentar integrar aquela informação com coisas fora do
documento.

Não basta que a quantia seja determinável, tem de ser determinada em dinheiro.
O sacado não é obrigado cambiário só por ser indicado como sacado através da

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ordem dada pelo sacador, só se torna obrigado cambiário através do aceite, uma
declaração cambiário emitida pelo sacado pela qual aceita pagar a quantia que o
sacador lhe dá ordem para pagar na data do vencimento.

Tem de se ter combinado devidamente as condições com o sacado pois, caso


contrário, pode envolver responsabilidade civil. Temos agora também o problema
inverso, ou seja, pode ter-se dado o caso de ter sido tudo combinado e em vez de
pagar, não o faz. Enquanto o nome não constar como aceitante, ele não é obrigado
cambiário, apenas é responsável por não ter cumprido um acordo que antes
110
celebrou com o sacador.

Quanto à época de pagamento, esta é importantíssima. Só se pode colocar nas


letras, as modalidades de vencimento expressamente previstas na lei uniforme, no
art.º 33º. A letra pode ser sacada à vista (quando sacado lhe puser a “vista em
cima”); a um certo tempo de vista, (contar-se-á um prazo a partir da data em que a
letra foi aceite pelo sacado); a um certo termo de data e num dia fixado, sendo
esta a mais simples de todas.

Quanto à indicação do lugar, não é difícil perceber a exigência, trata-se de saber


onde deve o portador da letra se dirigir para exigir o pagamento. A letra tem como
nota a sua circulabilidade e se pretendemos que seja um documento apto a circular,
só podemos dar segurança se o portador souber onde se dirigir para exigir o
pagamento. Normalmente, será onde o sacado tem a sua sede ou domicilio mas
temos eventualmente a possibilidade de haver letra domiciliada, pois esta pode ser
domiciliada numa instituição de crédito, por exemplo, no banco.

Quanto ao nome, deve ser o nome do tomador. Esta relação normalmente é


trilateral mas nada obsta a que o tomador seja o próprio sacador.

Quanto à falta de requisitos externos, teremos de recorrer ao art.º 2º da Lei


uniforme das letras e livranças, sendo esta a regra: se falta os requisitos
externos, o documento não vale como letra, não fica sujeito ao regime. No entanto,
a regra conhece algumas excepções, ainda que limitadas. Essas exceções dizem
respeito à época de pagamento porque na lei uniforme se não é indicada a época de
pagamento, então será pagável à vista, à época de apresentação; ao lugar de
pagamento, pois se esse faltar, a lei considera como lugar de pagamento o lugar
indicado ao lado do nome do sacado, pois, de alguma forma, o sacado teria alguma
ligação com aquele local mas se faltar também essa indicação do lugar, então já não
será possível preencher aquela lacuna do documento e já não podemos encontrar o

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lugar de pagamento, assim sendo, já não pode valer como letra e já não se pode
procurar o lugar de pagamento. Dizemos ser limitada esta medida.

Finalmente, se falta o lugar onde foi passada a letra, significa que a letra foi mal
passada e o que diz a lei é que a letra sem indicação do lugar onde foi passada,
considera-se como tendo sido passada no local indicado ao lado do sacador pois
quem criou a letra foi o sacador logo, se colocou um lugar ao lado do seu nome e não
indicou o local onde foi passada a letra, tem sentido que a lei considere esse lugar.
Também aqui, se faltar essa indicação, não há forma de preencher a falha e assim
111
o documento não valerá como letra.

Tudo isto tem um peso muito relevante e muitos aspetos, por exemplo, quanto à
data em que a letra é passada, isto tem importância porque esta data é útil para
ver questões de capacidade de exercício das pessoas; já os lugares, têm
importância para resolver questões acerca da lei aplicável ao documento em causa.

Finalmente a assinatura de quem passa a letra será do sacador.

No que diz respeito ao preenchimento destes requisitos, há um aspecto prático


muito importante no que concerne à representação das sociedades comerciais.
Muitas vezes, quem actuava não indicava a qualidade a que actuava e isso era
invocado como algo que não permitia considerar preenchidos os requisitos formais,
não havendo indicação correcta do aceitante ou sacador. O sacador embora dê
ordem de pagamento, também é obrigado cambiário.

O que ficou decidido pelo STJ em acórdão de uniformização foi que a indicação da
qualidade em que actua o gerente ou administrador da sociedade por quotas poderá
ser tácita e é importante para resolver muitos dos problemas que surgem.

A letra em branco/a letra incompleta. Acordos de preenchimento.


Preenchimento abusivo.

A letra incompleta é a letra em que falta um dos requisitos formais e se assim é,


teremos uma letra incompleta em bom rigor, se falta a palavra “letra” não temos
letra. A letra em branco é a letra em que falta um requisito formal mas em relação
à qual foi subscrito um acordo de preenchimento. Isto é assim para praticamente
todos os elementos da letra e não existe quanto à palavra letra, esta tem de estar
colocada no documento.

Diana Simões
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Que assinatura é exigida? A doutrina discute se será necessária a assinatura


apenas do sacador, ou se poderá ser de qualquer um dos sujeitos cambiários. Para
se poder falar de letra em branco deve ser a assinatura do sacador pois é este
quem cria a letra, na opinião de Soveral Martins. Se supusermos que a letra tem a
palavra “letra” lá escrita e que já contem a assinatura do sacador.

O acordo de preenchimento poderá ser respeitante aos seus elementos. O sacador,


quando aceita celebrar este acordo com o sacado, exige que este lá coloque a
assinatura como aceite pois sem a assinatura do sacado, se as coisas correrem mal,
112
não há acordo de preenchimento algum. Esse acordo de preenchimento dirá
respeito aos outros requisitos: valor em causa – exemplo: combina-se com o banco
emprestar 1000€ e durante todos os meses se paga uma parte do empréstimo –
nesta altura, o banco corre o risco de a pessoa não pagar mas não sabe quando a
pessoa deixa de pagar – aí celebra um acordo de preenchimento e o banco dirá algo
como “a letra será preenchida colocando a data em que deixar de pagar alguma das
prestações” podendo ser colocado na quantia a pagar tudo o que esteja em dívida,
acrescido de juros, comissões etc.

Sobre isto é importante ainda falarmos do art.º 10º da lei uniforme – este
artigo tem um regime para os casos do chamado preenchimento abusivo e
sobretudo é um regime que se preocupa com a posição de portadores mediatos em
relação a este acordo de preenchimento. Como é evidente, se o banco e uma pessoa
celebrarem o acordo de preenchimento e o banco preencher mal a letra, violando o
acordo, a pessoa pode invocar isso perante o banco, tendo de fazer prova da
violação do preenchimento. Nas relações imediatas, a questão do abuso no
preenchimento pode ser invocada.

No art.º 10º diz-se que se houve acordo de preenchimento, o banco endossa


entretanto a letra a outra instituição de crédito que vem exigir o pagamento e a
pessoa vê a desconformidade da letra, aí a inobservância dos acordos não pode ser
invocada perante futuros portadores. A grande dúvida é: o regime do art.º 10º
aplica-se independentemente de quem preencheu a letra, mesmo que seja esse
posterior portador a preencher a letra violando esse acordo? No ver do
professor Soveral Martins, terá de se fazer uma distinção, por um lado porque se
o portador recebeu a letra por preencher, é exigível que procure informar-se
sobre como deve preencher a letra, por outro lado, também se pode entender que
se o actual portador, aquele que recebeu por endosso, recebeu a letra por
preencher, quando a recebeu não recebeu um documento que produzisse efeitos
como letra e por isso, não deve abranger esta pessoa, não o pode proteger.

Diana Simões
Direito Comercial I Aulas Teóricas 2013/2014

O saque – cria a letra como tal. Poder-se à dizer ser o primeiro negócio
logicamente, pois sem ele não há letra, o que não quer dizer que não exista primeiro
a letra, apenas enquanto não tiver a assinatura, não produz efeitos.

O sacador é também um obrigado cambiário porque, a partir do momento em que o


portador da letra com direito a exigir o pagamento não é o próprio sacador, é um
obrigado cambiário com uma certa natureza – art.º 9º, sendo um obrigado de
garantia, é um garante do pagamento e nessa medida também é responsável porque
113
está a garantir a aceitação e o pagamento.
É um mandato puro e simples e literal tendo por isso se ser uma quantia
determinada.

Modalidades: o saque pode ser feito em termos distintos - art.º 3º: à ordem do
sacador, por exemplo. A letra pode ser sacada sobre o próprio sacador, isto
historicamente tem uma justificação, temos de ter em atenção que estalei
uniforme é do início do séc. XX e que surgiu em momento onde a internet não
existia e sobretudo, no funcionamento dentro do mesmo banco, esta figura era
frequentemente utilizada. O banco com sede em Lisboa, pode ter agência em Faro
e podia ser conveniente para as transferências de fundos, dar estas ordens de
pagamento sobre si próprio para que o dinheiro fosse transferido da agência para a
sede. Por outro lado, o banco com o saque a si próprio já está a criar um título de
crédito que conterá duas vezes a obrigação do banco, ou seja, se endossar a letra,
o banco não só criou o título, como está a dar ao terreiro a garantia de que é por
um lado obrigado como aceitante, mas também como endossante e assim reforça
essa garantia.

Pode a letra ser sacada à ordem/a favor de terceiro, esta á a situação mais
clássica de saque de uma letra. A hipótese se o saque ser sobre o sacador a favor
do sacador não vem prevista na lei mas a ver do professor é admissível como vimos
anteriormente.

Quanto à garantia do aceite e pagamento, esta resulta do art.º 9º e é preciso ter


em conta o regime de solidariedade do art.º 47º, estes são solidariamente
responsáveis para com o portador que poderá exigir o pagamento a qualquer um
deles, ainda que haja limitações que o portador tenha de respeitar, plasmados no
art.º 43º.
Mais importante é o art.º 44º que diz que a recusa de pagamento deve ser
reportada por acto formal, protesto no notário e se este não for feito, poderá

Diana Simões
Direito Comercial I Aulas Teóricas 2013/2014

perder os direitos relativamente a quem não é o aceitante. Havendo recusa do


aceite, a comprovação pelo protesto irá conduzir à antecipação do vencimento.

Art.º 53º - o protesto é extremamente importante, terá de ser feito dentro de


prazos legais porque, se assim não for, embora tenha todos os sujeitos como
obrigados solidários, por este artigo perde o direito de ação contra endossantes,
sacador e co-obrigados à exceção do aceitante. Esta exceção parece aplicar-se ao
avalista do aceitante mas falaremos depois.

114
O art.º 9º na segunda parte diz que o sacador pode exonerar-se da garantia da
aceitação ou seja, quando o sacador cria a letra, pode libertar-se dessa garantia
quanto à aceitação, deixando de a garantir. O sacador pode libertar-se quanto à
aceitação mas não se pode nunca livrar da garantia quanto ao pagamento.

Aceite:

É a declaração cambiária pelo qual o sacado se compromete nos termos previstos


nessa letra. O aceite está regulado nos art.º 21º e ss da lei uniforme. O art.º
28º define a extensão da obrigação e o aceitante aceita quando a letra lhe é
apresentada para colocar o seu aceite e o artigo define como limite a data do
vencimento porque, posteriormente à presentação, deve ser para pagamento.

Para as letras a certo termo de vista, devem ser apresentadas ao aceite, devem
ser apresentadas ao aceite dentro do prazo de um ano, como são pagáveis nos
termos do art.º 35 com prazo determinado pela data do aceite, para saber quando
se vencem teremos de as apresentar ao aceite, para poder começar a correr o
prazo.

Em regra, a presentação é justamente uma apresentação facultativa, o art.º 22º


no último parágrafo também prevê uma possibilidade de ser estipulado um dever de
apresentação ao aceite e a mesma coisa pelo sacador.

O lugar onde deve ser apresentado o aceite será o domicílio do sacado pois é este
que irá assinar como aceitante e o aceite é escrito na letra, há um espaço
reservado na letra para tal. Deve constar a palavra aceite ou equivalente mais a
assinatura.

Sempre que o sacado se limitar a assinar na parte anterior da letra, sem mais nada,
considera-se que está a aceitar a letra.

Diana Simões
Direito Comercial I Aulas Teóricas 2013/2014

Este aceite pode ser parcial, portanto, o sacado pode aceitar a letra apenas
relativamente a uma parte do valor mas em relação à parte restante, isso valerá
como recusa de aceite e em relação a essa parte o portador pode fazer o protesto
quanto a falta de aceite – art.º 26º

O aceite deve ser datado para se poder contar esse prazo. Por outro lado, se foi
fixado um prazo para apresentação ao aceite, a indicação da data do aceite é
necessária para saber se o prazo foi respeitado e a lei prevê um protesto, como já
vimos por falta de aceite. Art.º 25º; 23º e art.º 22º I; III e IV parágrafo.
115

10 Dezembro 2013

Aceite das letras: art.º 21º Lei uniforme mostra que, em regra, a apresentação
da letra ao aceite não é obrigatória, esta pode ser apresentada até ao vencimento
ao aceite do sacado no entanto, a lei, no art.º 23º também acrescenta um caso em
que há dever de apresentação ao aceite, letras a certo termo de vista e nestes
casos é a lei que há dever de apresentação ao aceite. O art.º 22º no 1º
parágrafo também acrescenta que o sacado pode estabelecer o dever de
apresentação ao aceite e estipular um prazo para a apresentação ao aceite. O
art.º 21º também estabelece que a letra pode ser apresentada até ao vencimento
e se o sacador estabelece um prazo esse tem de ficar antes da data do
vencimento.

Um outro assunto referido é que também se pode estabelecer que esta é uma letra
não aceitável, resulta do art.º 22º, 2º parágrafo. Esta conhece depois exceções
mas a regra é a de que o sacador, quando cria a letra pode proibir a apresentação
ao aceite e isto pode ter utilidade nos caso sem que o sacador combinou com o
sacado isso mesmo porque o sacado pode não querer constar da letra como
aceitante mas estar disponível para na data do vencimento da letra, efetuar esse
pagamento.

A lei, no entanto, exclui a possibilidade de incluir essas cláusulas de proibição do


aceite em alguns casos; 2º parágrafo do art.º 22º - isto não é possível se se
tratar, antes de mais, das chamadas letras domiciliárias e isto é assim, desde logo,
para ter a possibilidade de programar o pagamento. Também temos que se a letra é
pagável no domicílio do sacado e o sacado começa a programar a vida para a letra
ser paga no local estipulado.
Também, não nos podemos esquecer que a lei uniforme resulta de uma convenção

Diana Simões
Direito Comercial I Aulas Teóricas 2013/2014

internacional da 1ªa metade do se XX onde era difícil circular de um lado para o


outro por uma lado e por outro também era difícil fazer circular o dinheiro de uma
lado para o outro.

Além do mais, também se diz que não pode proibir o aceite a uma letra sacada a
certo termo de vista porque se assim é, o vencimento vais ser determinado em
função da data do aceite e ao se podia proibir o aceite porque era o mesmo que
tornar impossível o pagamento.

116
Se a letra é apresentada ao aceite e é recusado esse aceite, é possível realizar o
chamado protesto por falta de aceite. No que diz respeito às letras que são
sacadas à vista (pagáveis quando apresentadas), estas estão pensadas para serem
pagas quando apresentadas e normalmente não se apresenta esta para aceite mas
não há nada na lei uniforme que proíba que isso seja efetuado e que o portador a
apresente ao sacado, para que, antes de exigir o pagamento, haja o aceite. O art.º
23º também estabelece um prazo para a apresentação ao aceite das letras a certo
tempo de vista (exigida decorrido um prazo apos o aceite) e isto ganha especial
relevo ao ler o art.º 53º da lei uniforme. Neste artigo estabelece-se um prazo
para apresentação ao aceite e se esse não for representado deve fazer-se
protesto por falta de aceite e se esse não for feito no prazo legal, o portador
perde uma serie de direitos quanto á ação contra os vários obrigados cambiários
com exceção do aceitante. A este respeito fala-se de acções de regresso e acções
diretas relativamente a cada sujeito.

Questiona-se: a excepção do aceitante também exceciona o avalista do


aceitante? Há duas leituras, uma delas diz que se a lei só exceciona o aceitante e
então também perde os direitos o avalista mas não é esta leitura que faz o
professor e que também não fazia o Professor Ferrer Correia - o art.º 32º da
lei uniforme diz que quem dá o seu aval, está a dar o aval por outrem, nos mesmo
termos que responde essa pessoa por ele avalizada e parece que a exceção também
se estenderá ao avalista do aceitante.

Endosso:

Na lei uniforme, consta dos art.º 11º e ss e no que diz respeito ao endosso, nos
termos do art.º 12º tem de ser puro e simples por razões de literalidade e
assegurar a segurança do portador, eliminando buscas e pesquisas fora do título de
crédito em causa e não pode ser assim sujeito a condições.
Este endosso não pode ser parcial, ao contrário do aceite que podia ser parcial e o

Diana Simões
Direito Comercial I Aulas Teóricas 2013/2014

endossante vai também agora responder, não apenas pela aceitação, como também
pelo pagamento da letra – art.º 15º da lei uniforme e portanto o endossante
assume também uma posição de garante; este garante que se o aceitante não
pagar, ele pagará se não houver aceite ou se havendo aceite, não houver
pagamento.

Este endosso tem um conjunto de funções muito relevantes, uma delas é a de


garantia de pagamento mas, além do mais, tem a função de transmissão, sendo essa
a que se associa logo ao endosso porque a letra é um título à ordem (porque o seu
117
modo normal de transmissão é o endosso) e pelo art.º 14º o endosso transmite
todos os direitos emergentes da letra daí que se fala do Princípio de
incorporação.

Por outro lado ainda, o endosso tem uma função de legitimação do portador – art.º
16º - o detentor de uma letra é considerado portador legítimo se justifica o seu
direito por uma serie ininterrupta de endossos, mesmo que o último seja em
branco. Isto é importante porque será esse portador legítimo que, nos termos do
art.º 38º, pode ir exigir o pagamento da letra no seu vencimento.

Esse endosso pode ser um endosso em branco, art.º 14º, desde logo, segunda
parte, mas também art.º 12º, 3º parágrafo e art.º 13º, 2º parágrafo. Aqui a
lei uniforme, no art.º 13º segundo parágrafo deixa dúvidas ao intérprete acerca
do que se deve entender sobre endosso em branco e será aquele apenas com
assinatura. O art.º 13º faz menção às duas possibilidades, este pode não designar
o beneficiário mas também a expressão tradicional “dou o meu endosso e assinava”
(se se colocar apenas “endosso a” e assinar por baixo, será isto ainda ensosso
em branco? Na ótica do professor sim, devido ao que respeita ao art.º 14º - se o
endosso for em branco, o portador pode preencher o espaço em branco, quer com o
seu nome, quer com o nome de outra pessoa e só tem sentido falar de espaço em
branco se houver a expressão “endosso ” ou “endosso a”).

Quem recebe essa letra pelo endosso pode fazer muitas coisas: colocar o seu nome
como beneficiário; pode voltar a endossar em branco a letra a favor de outra
pessoa; pode entregar a letra a um terceiro sem colocar o seu próprio endosso
(teríamos aqui algo já muito parecido com o titulo ao portador) ou pode também pôr
um endosso completo a favor de outro beneficiário. Este endosso em branco
evidentemente que tem riscos porque não fica documentada na letra a transmissão
que foi realizada sem colocação de endosso e essa é uma transmissão que não fica
sujeita às regras cambiárias e, portanto, tem riscos acrescidos pois, justamente, o

Diana Simões
Direito Comercial I Aulas Teóricas 2013/2014

regime cambiário tutela o portador perante o que consta do título e se as coisas


não constam do título o legitimado não pode exigir o que quer que seja a quem não
está naquela letra como endossante, designadamente.

No que diz respeito ao endosso, são os aspetos mais relevantes mas destacaremos
ainda o teor do art.º 11º, 2º parágrafo onde se torna claro que o sacador pode
proibir o endosso e diz o preceito “quando sacador tiver inserido na letra as
palavras não à ordem ou expressão equivalente” e aí o sacador estará assim a
proibir o endosso (o sacador é que cria a letra enquanto tal), tendo assim uma
118
brande margem de manobra. Tal é importante porque o 2º paragrafo do art.º
11º acrescenta que nesses casos a letra só é transmissível pela forma e com os
efeitos se uma cessão ordinária de créditos e isto significa, portanto, que nessas
transmissões que eventualmente ocorram, quem venha a receber a letra não tem a
protecção que a lei uniforme concede perante as transmissões regulares por
endosso, ficando sujeito ao regime que a cessão de créditos prevê em matéria de
oponibilidade de exceções. Perante este regime o obrigado a pagar pode invocar
mais exceções do que pode com o regime da lei uniforme quanto à transmissão de
endossos.

Há quem diga que se a letra é sacada não à ordem, com proibição de endossos,
deixa de ser um título de crédito porque passa a ser só transmissível pelo regime
de cessão ordinária de créditos, podendo ser invocadas todas as exceções deste
caso. O professor não concorda que deixe de ser um titulo de crédito porque
temos de fazer distinção entre posição do sacador, do aceitante e do tomador
porque o tomador não é necessariamente o sacador e o tomador que é beneficiário
da ordem de pagamento dado pelo sacador pode não ser parte nas relações
fundamentais que liga o sacador ao aceitante que resulta da convenção executiva e,
mais uma vez, o tomador da letra pode nada ter a ver com isso e quando seja assim,
esse tomador ainda estará nas relações mediatas quanto a essas relações
fundamentais e assim, beneficiará da tutela cambiária conferida na lei uniforme.

Nota: nós temos um regime de crédito ao consumo recente que consta do dec-lei
133/2009 e o art.º 22º diz que se em relação a um contrato de crédito o
consumidor subscrever letras ou livranças com função de garantia, deve ser aposta
naqueles títulos a expressão “não à ordem” ou outra equivalente.

Aval:
Através do aval o declarante que emite essa declaração obriga-se cambiariamente
nos mesmos termos que se obriga a pessoa avalizada e nessa medida, o aval é

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Direito Comercial I Aulas Teóricas 2013/2014

também uma declaração cambiária com função de garantia.

Chama-se à atenção da importância pratica desta figura, não só porque quando


alguém pede um empréstimo, os bancos pedem o aval de uma pessoa, como também
porque se trata de uma operação que as instituições de crédito, designadamente os
bancos, utilizam com muita frequência (prestam garantias pelos seus clientes,
pagando-se por isso).

Ao contrário do endosso, o aval pode ser parcial – art.º 30º, 1º parágrafo. Este
119
pode ser dado por um terceiro não subscritor cambiário mas pode ser dado
também por alguém que consta na letra. O aval é dado por alguém, por um outro
signatário da letra, no entanto, a lei vem também resolver o problema de saber por
quem se dá o aval, se por acaso não é indicada a pessoa por quem ele é dado,
através do art.º 31º, último paragrafo, isto é, na falta de indicação, entender-
se-á ser pelo sacador. Porquê? Devia ser dado pelo aceitante que é o obrigado
principal mas quem cria a letra é o sacador e este pode inclusivamente por a letra a
circular antes de tero aceite e do ponto de vista da utilização da letra se
justifique esta regra. Pode-se perguntar se esta regra vale em quaisquer
circunstâncias, independentemente do que se prove. É um tema discutido, teremos
de saber qual o sentido do parágrafo: presunção inelidível, ilidível e em que
termos? É um tema que não pode ser objecto de uma resposta com garantia de ser
aceite perante todos os tribunais mas a leitura do professor Soveral Martins é a
de que é possível fazer prova de que o aval foi dado por outra pessoa que não o
sacador deste que a letra ainda esteja nas relações imediatas.

Exemplo: quem e sacador é A, o aceitante é B e o avalista é C – suponhamos que A


saca a letra à sua própria ordem, a letra é pagável a si ou à sua orem e sacou a
letra combinando com o B e C que o C daria o seu aval pelo B e nunca saiu da posse
de A – assim, tudo está nas relações imediatas porque todos foram parte daquela
convenção que deu origem ao saque, aceite a aval da letra, por isso mesmo, pode
ser nessas relações alegado e provado que o aval foi dado pelo aceitante e isto é
importante para o sacador porque se quiser exigir o pagamento, não podia exigir do
seu próprio avalista pois esse é garante dele. Se valesse a presunção, o avalista
seria considerado avalista do sacador, garante da sua obrigador e não teria sentido
o sacador exigir pagamento a quem estava a garantir a sua situação.

Responsabilidade do avalista:
Art.º 32º o dador de aval é responsável da mesma maneira do que a pessoa por ele
afiançado. A dador de aval não responde perante o aceitante. Por outro lado, o

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Direito Comercial I Aulas Teóricas 2013/2014

avalista de A vai responder perante B e C, endossantes. Se um dos endossantes


tiver um avalista, este também é obrigado perante C, que é obrigado cambiário. Por
sua vez, este já não é responsável pelo B, ele é garante perante ele.

Embora se fale de ”pessoa por ele afiançada” temos de ver que o aval não se
confunde com a fiança pelo que isto não é uma fiança. A responsabilidade do
avalista é determinada nos termos da lei uniforme e não o regime da fiança do CC e
isto faz toda a diferença – art.º 32º 2º parágrafo – Princípio da independência
reciproca das obrigações cambiárias – A lei diz que o avalista vai responder
120
mesmo que aquele por quem da garantia não responda por ser nula, exceto o vicio
de forma (se for vicio de forma, o avalista não responde mas se for qualquer outra
causa de nulidade, ainda assim o avalista responde e é diferente do regime da
fiança).

O último parágrafo do art.º 32º diz que se o dador de avale paga a letra pode
exigir o pagamento à pessoa por quem exigiu a garantia.

Características ou carateres da obrigação cambiária e direito representado na


letra
Quando se fala de independência, não é absoluta mas a que a lei uniforme
reconhece as obrigações cambiárias. Em regra a posição dos obrigados cambiários
não é afetada pelos restantes obrigados ou vícios que esses podem sofrer. O vício
que afete a obrigação de uma, não se repercute no avalista – art.º 7º.

É evidente que se pergunte: isto vale para todas as obrigações cambiárias? Há


pelo menos uma excepção que parece ser de admitir, em relação à assinatura do
sacador, se por acaso é esta que sofre de um destes vícios, é muito duvidoso que o
art.º 7º mereça a aplicação e na leitura do prof não se deve aplicar.

A letra, enquanto título de crédito, contém um direito literal, sendo esse um dos
princípios afirmados quando se identificaram as notas caracterizadoras de título
de crédito em geral. Um direito literal na medida me que nas relações mediatas o
seu conteúdo e extensão, bem como modalidades, serão definidas pela letra do
próprio titulo, pelo que está escrito no documento e perante o portador mediato da
letra, aquele que se encontra nas relações mediatas, não lhe podem ser invocadas
excepções que resultem das combinações extra cartulares.

Exemplo: na letra não fica a constar a data do vencimento e a lei diz que se assim
for, será pagável à vista. Suponhamos que A combinou que B que nunca apresentará

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Direito Comercial I Aulas Teóricas 2013/2014

a letra a pagamento antes do dia 1 janeiro de 2014 e não ficou na letra – este
acordo extra cartular não é oponível nas relações mediatas por exemplo a um
endossante (ele não fez parte da convenção).

Este Princípio da literalidade extrai-se do art.º 17º da lei uniforme. Ou seja,


estando de boa-fé e ignorando tuto do que se passou antes, a pessoa que está nas
relações mediatas protege-se. Há quem diga que não faz sentido falar-se de
literalidade mas sim eficácia relativa das obrigações.
Falar em literalidade, abstração ou autonomia é usar conceitos explicativos que
121
procuram dar a entender qual o regime jurídico e é mais do que falar em eficácia
externa das obrigações porque uma coisa é a convenção extra cartular e a eficácia
externa não explica o porquê de a convenção não se refletir nas obrigações
cambiárias e a convenção é determinante do saque o do aceite.

Temos depois o Princípio da abstração (da obrigação cambiária) – esta nota já não
é comum a todos os títulos de crédito e no que diz respeito à abstração está em
causa o facto de a obrigação cambiária ser independente da sua causa, ou seja, a
obrigação cambiária não é afetada, dentro de certos limites, por aquilo que possa
afetar a sua causa e por outro lado, a obrigação cambiária pode servir qualquer
causa (licita).

O obrigado cambiário pode-o ser porque comprou um automóvel – a causa remota é


o contrato de compra e venda mas ele pode ser obrigado cambiário porque contraiu
um contado de empréstimo com o banco, sendo esse contrato a causa remota. Além
do mais, a obrigação cambiária mantém-se, em regra, dentro de certos limites,
mesmo que haja vícios a afectarem a sua causa, mesmo que haja causas de
invalidade da relação jurídica fundamental ou convenção executiva – exemplo: B1
comprou um carro a A e ficou a dever parte do preço e aceita a letra sacada por A
à sua própria ordem que é actualemtne portador da letra. A endossa entretanto a
B, que endossa a C que endossa a D. B,C, D estão nas relações mediatas e
suponhamos que na data de vencimento, D vem cobrar a B1 o montante da letra e
este rejeita-se por defeito do carro. D vem procurar saber se era assim ou não e
na realidade B1 está invocar um vício que afetaria a relação jurídica fundamental, o
contrato de compra e venda, ou seja, uma compra e venda de coisa defeituosa ou
seja, vício da relação fundamental e a característica de abstração diz que a
obrigação cambiária é independente dos vícios que afectam a causa remota.
Também isto resulta do art.º 17º e estas exceções cobrem também este tipo de
situações.

Diana Simões
Direito Comercial I Aulas Teóricas 2013/2014

É preciso, no entanto, quer no âmbito da aplicação do Princípio da literalidade e no


Princípio da abstração é necessário que o portador mediato esteja de boa-fé nos
termos em que é entendida na parte final do art.º 17º, ou seja, tenha procedido
conscientemente em detrimento do devedor (bastará conhecer o que se passou
antes? Parece que não, não basta o conhecimento, para se dizer que actuou
conscientemente, é necessário que ou tenha a intenção de prejudicar ou pelo menos
tinha consciência desse prejuízo e conformou-se com ele). Na opinião do Dr.
Soveral Martins, entende que será necessário haver ou intenção de prejudicar ou
conformação do prejuízo.
122

O art.º 17º também coloca outra dificuldade: pode dar-se o caso de haver uma
cadeia de transmissões e no meio estar um portador intermédio que esta de boa-fé
nos termos do art.º 17º e o último portador, o portador actual está de má-fé.
Este portador intermédio merecia proteção e se B2 tivesse exigido o pagamento e
não tivesse endossado, ele estava protegido pelo art.º 17º. Se é assim, o que se
entende é que, então, a boa-fé do portador intermedio vai sanar a má-fé do actual
portador porque, na realidade, quando o actual portador adquire a letra, ele ao
adquirir não está a prejudicar verdadeiramente o obrigado cambiário, porque se
não adquirisse a letra, o obrigado cambiário tinha de pagar na mesma.

Princípio da autonomia
Estamos a falar da autonomia do direito sobre a letra e significa que cada ulterior
portador da letra adquire autonomamente. A sua aquisição não é afetada por aquilo
que pudesse afectar a aquisição de anteriores portadores dessa letra. Nas
aquisições derivadas, a regra é a do princípio do Nemo Plus Iuris e no nosso caso
irá constituir um desvio a essa regra. Essa autonomia retira-se do 2º parágrafo
do art.º 16º, mas não é uma autonomia absoluta, tem limites.

Exemplo: A sacou a letra a B1 que a aceitou e endossou a letra a B2 que estava a


pensar endossar a letra a C e pensou endossa-la em branco, mas acontece porem
que quando fez o endosso em branco, sem indicar qualquer beneficiário, B foi
chamado para almoçar e deixou a letra na secretária, o que vem a acontecer foi que
a letra acabou nas mãos de Z. Z encontra-se com a letra e endossa a letra a D. D
tem a sua posição protegida formalmente, por uma série ininterrupta de endossos e
se aplicássemos o Princípio Nemo Plus iuris, Z não era titular da letra. Supondo que
não se aplica a parte final do art.º 16º, 2º parágrafo, D não é obrigado a
restituir a letra e pode também exigir o pagamento na data do vencimento.

Modalidades da letra:

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Direito Comercial I Aulas Teóricas 2013/2014

Art.º 33º vigora um princípio de taxatividade, só podem ser estas.

Quanto ao pagamento:

O art.º 38º e ss tratam do pagamento. A letra deve ser apresentada a


pagamento na data do vencimento ao aceitante que é o obrigado principal e como é
evidente, o momento depende da data de vencimento. Quanto ao prazo da
apresentação ao pagamento o art.º 38º “O   portador de uma letra pagável em dia
fixo ou a certo termo de data ou de vista deve apresentá-la a pagamento no dia em
123
que ela é pagável ou num dos dois dias úteis seguintes”. Aqui não vem referido o
caso da letra sacada à vista porque, neste caso, o que parece valer aqui é a regra
de que ela dever ser apresentada a pagamento no prazo de um ano. Este regime é
um regime que pode ser estranho mas resulta do art.º 34º fazer remissão do
art.º 38º para art.º 34º.

Suponhamos que a letra é paga, quanto àquilo que deve ser pago devemos ver o
art.º 48º, pelo que quem paga na data de vida tem a vantagem de não pagar os
juros de mora. Coloca-se a questão: ainda hoje está em vigor essa taxa de 6%
do art.º 48º? É matéria discutida porque em 2003 surgiu um dec-lei 262/83 e na
altura justificava-se porque a taxa lega de juros andava entre 20% e 30% e havia
um interesse em exigir uma taxa mais elevada. O problema é que a lei uniforme só
prevê mesmo juros à taxa de 6%. Havia uma discussão muito importante sobre a
convenção e anexos a convenção da lei uniforme pelo que estes são muito
importantes – o art.º 13º do anexo II dizia que qualquer das partes
contratantes (acabar). Não há aqui problema de constitucionalidade e o que vale em
lateria de juros é o dec-lei 262/83 mas isto é uma posição doutrinal – art.º 4º.

Se não houver pagamento pode e deve ser feito protesto por falta de pagamento
que permite evitar a extinção de direitos de acção contra endossantes sacador e
outro co obrigados a exceção do aceitante ou avalista deste como já vimos.

Quanto aos prazos, estes vêm previstos no art.º 44º. O 3º parágrafo diz que o
protesto deve ser feito num dos dois dias uteis seguintes Àquele em que a letra é
pagável e entende-se que este prazo deve começar no último dia seguinte mas a
cautela manda ter em conta o primeiro dia. Isto é regulado pelo código do
notariado, dizendo como são efetuados os avisos e admite que este prazo se conte
a partir do último dia em que a letra é pagável, tendo em conta a redação do art.º
38º.

Diana Simões
Direito Comercial I Aulas Teóricas 2013/2014

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Diana Simões

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