PROFESSOR DOUTOR JOÃO RAIMUNDO DE ARAÚJO AULA: O NOVO MUNDO: ECONOMIA E SOCIEDADE COLONIAL
DIVERSAS INTERPRETAÇÕES SOBRE A COLONIZAÇÃO DO NOVO MUNDO
I. O sentido da colonização: acumulação
capitalista européia 1. PRADO JR, Caio. Formação do Brasil Contemporâneo. SP, Brasiliense, 1977. “Todo povo tem na sua evolução, vista à distância, um sentido (...) uma linha mestra ininterrupta de acontecimentos que se sucedem em ordem rigorosa sempre numa determinada orientação”. (p. 19) “Se vamos à essência de nossa formação veremos que na realidade nos constituímos para fornecer açúcar, tabaco, alguns outros gêneros (...) e em seguida café, para o comércio europeu. (...) É com tal objetivo. Objetivo exterior, voltado para fora do país e sem atenção e considerações que não fossem de interesse daquele comércio, que se organizaram a sociedade e a economia brasileiras”. (p. 31-2) “Passemos ao comércio interior (...) não temos muitos dados, o interesse que despertava, subsidiário como era, foi pequeno e os contemporâneos nos deixaram poucas informações. Podemos, contudo, notar com absoluta segurança que o seu movimento principal é constituído ou por mercadorias que se destinam em última instância à exportação ou aquelas que provêm da importação (...) o mais resume-se quase unicamente no comércio de abastecimento dos grandes centros urbanos, pois quanto às populações e estabelecimentos rurais elas são, em regra, a este respeito, autônomas”. (p.110)
1967. “(...) mas se a plena capacidade de autofinanciamento da indústria açucareira não era utilizada, que destino tomavam os recursos financeiros sobrantes?” (p. 45-6) “(...) uma parte da renda, que antes atribuímos à classe de proprietários de engenhos de canaviais seria o que modernamente se chama renda de não residentes e permanecia fora da Colônia. Explicar-se-ia, assim, a íntima coordenação existente as etapas de produção e comercialização”. (p. 46)
3. NOVAIS, Fernando. Portugal e o Brasil na Crise do Antigo Sistema Colonial, 1777-1808.
SP, HUCITEC, 1983. “O regime do comércio colonial – isto é, o exclusivo metropolitano no comércio colonial – constitui-se ao longo dos séculos XVI, XVII e XVIII, no mecanismo através do qual se processava a apropriação por parte dos mercadores das metrópoles, dos lucros excedentes, gerados nas economias coloniais assim, pois, o sistema colonial em funcionamento, configurava uma peça de acumulação primitiva de capitais nos quadros do desenvolvimento do capitalismo mercantil europeu”. (p. 92) II. O Modo de Produção Escravista Colonial 1. CARDOSO, Ciro F. As Concepções acerca do ‘Sistema Econômico Mundial’ e do ‘Antigo Sistema Colonial’: a preocupação excessiva com a ‘Extração de Excedente”. In LAPA, J. R. A. Modos de Produção e Realidade Brasileira. Petrópolis, Vozes, 1980. “(...)Também é verdade que as atividades de conquista e colonização tiveram como resultado o aparecimento de sociedades cujas estruturas internas possuem uma lógica que não se reduz exclusivamente ao impacto de sua ligação com o mercado mundial em formação e com as metrópoles européias”. [“As concepções acerca do sistema econômico mundial e do antigo sistema colonial (...)]” (pp. 109-32)
2. CARDODO, Ciro F. “Sobre los modos de Producción Coloniales de América”, in
ASSADOURIAN, C., CARDOSO, C. et all, Modos de Producción en La América Latina, Córdoba y BA, Ediciones Pasado Y Presente, (Cuadernos de Pasado y Presente 40) “O modo de produção escravista colonial se instaurou em regiões que por uma parte se caracterizavam ao chegarem os europeus, por uma população indígena pouco densa, e por outra parte apresentavam condições propícias às atividades exportadoras, baseadas em uma economia de plantação de produtos tropicais, ou na exploração das jazidas de metal precioso (o ouro de Minas Gerais, no Brasil). A redução dos índios em escravidão, sua expulsão, extermínio, e sobretudo a importação de escravos negros, servem de base à constituição do território de da força de trabalho. Isto foi o que passou no Brasil, nas Antilhas, nas Guianas, as mais meridionais das treze colônias inglesas da América do Norte, certas partes da América espanhola continental (costa da Venezuela, por exemplo). Enfim, a América do Norte se constituiu ‘a economia diversificada e autônoma de pequenos proprietários’, a única entre as estruturas coloniais que pode evoluir – em parte ainda na época colonial – até a industrialização e um capitalismo de tipo metropolitano. Esses modos de produção coexistiram em outros, secundários, estabelecidos nas mesmas zonas ou em áreas subsidiárias marginais (como as regiões de pecuária do Brasil colonial, por exemplo)”. (pp.153-4)
3. CARDOSO, C. IN LAPA, J. A., op. cit.
“Tais sociedades [da América] só revelam o seu pleno sentido se forem consideradas como integrantes de um sistema mais vasto, na medida em que surgiram como anexos complementares da economia européia, dependentes de áreas metropolitanas, elementos que devem ser levados em conta na análise que pretenda descobrir a racionalidade das estruturas econômico-sociais das colônias. Mas também é verdade que as atividades de conquista e colonização tiveram como resultado o aparecimento de sociedades cujas estruturas internas possuem uma lógica que não se reduz exclusivamente ao impacto de sua ligação com o mercado mundial em formação e com as metrópoles européias. Por isso, sua concepção em termos de anexos complementares de partes constitutivas de conjuntos mais amplos, mesmo sendo – como é – um momento central da pesquisa, é claramente insuficiente. Sem analisar as estruturas internas das colônias em si mesmas, na sua maneira de funcionar, o quadro fica incompleto, insatisfatório, por não poderem ser explicadas algumas das questões mais essenciais (como o porquê das diferenças profundas constatáveis na época colonial como na atualidade, entre as estruturas econômico-sociais do México, da Costa Rica e do Brasil, por exemplo)”. (p.110)
“O modo de produção resultante da conquista – o escravismo colonial – não pode ser considerado uma síntese dos modos de produção preexistentes em Portugal e no Brasil. Ao tempo em que se iniciou a colonização do Brasil em pregava-se escravos na economia portuguesa, mas este emprego tinha caráter subsidiário, complementar. (...) Impõe-se, por conseguinte, a conclusão de que o modo de produção escravista colonial é inexplicável como síntese de modos de produção preexistentes, no caso do Brasil. Seu surgimento não encontra explicação nas direções unilaterais do evolucionismo nem do difusinismo. Não que o escravismo colonial fosse invenção arbitrária fora de qualquer condicionamento histórico. Bem ao contrário, o escravismo colonial surgiu e se desenvolveu dentro de determinismo sócio-econômico rigorosamente definido no tempo e no espaço. Desse determinismo de fatores complexos precisamente é que o escravismo colonial emergiu, como modo de produção de características novas, antes desconhecias na histórias humana. Nem ele constituiu repetição ou retorno do escravismo antigo, colocando-se em seqüência ‘regular’ ao comunismo primitivo, nem resultou da conjugação sintética entre as tendências inerentes à formação social portuguesa do século XVI e às tribos indígenas”. (pp. 53-4)
III. A Colônia como parte do Império
Português Ultramarino 1. FRAGOSO, J. L. e FLORENTINO, M. O Arcaísmo como Projeto. Mercado Atlântico, Sociedade Agrária, e elite Mercantil no Rio de Janeiro, 1790-1840. RJ, Diadorim, 1993. “O ponto de vista assumido por este trabalho é o de que, para além das frações dominantes coloniais, a consecução do projeto colonizador, mais do que criar um sistema monocultor e exportador, visava reproduzir em contiguidade, (i.e. no tempo) uma hierarquia altamente diferenciada. Por se tratar de estratificação assentada no escravismo, sua viabilização tinha por pressuposto a própria reprodução das relações de poder: afinal, eram mecanismos extra-econômicos os vetores que impeliam o cativo ao trabalho. A conseqüência mais palpável deste contexto seria a necessidade da permanente reprodução ampliada da empresa escravista. De fato, por ter como fundamento a sempiterna recriação da diferenciação social, ela não poderia estar completamente à mercê das flutuações do mercado internacional”. (p. 29, grifos no original).
2. FRAGOSO, J., BICALO, M. F, GOUVEA, M. F. (ORGS). O Antigo Regime nos
Trópicos: a dinâmica imperial portuguesa (séculos XVI-XVIII). RJ, Civilização Brasileira, 2001. “Todo livro que se preza pretende contribuir para a pesquisa de ponta em sua área de conhecimento. O Antigo Regime do Trópicos: a dinâmica imperial portuguesa (séculos XVI-XVIII) não foge à regra. Ele é fruto de uma perspectiva historiográfica inovadora que vem surgindo e se impondo em teses de Doutorado e em dissertações de Mestrado, e sendo cada vez mais discutida em seminários acadêmicos e na própria sala de aula dos institutos e departamentos de história de nossas universidades. Dito de outra forma, os diferentes capítulos de nosso livro buscam apresentar uma nova abordagem de antigo ema de história portuguesa e colonial. Mais especialmente, seus autores discutem e analisam o “Brasil Colônia” enquanto parte constitutiva do império ultramarino português. Propõem-se, ainda, a compreender a sociedade colonial e escravista na América enquanto uma sociedade marcada por regras econômicas, políticas e simbólicas de Antigo Regime. Em realidade, trata-se de propor uma nova leitura historiográfica que não se limite a interpretar o ‘Brasil Colônia’ por meio de suas relações econômicas com a Europa do mercantilismo, seja sublinhando sua posição periférica – e com isso privilegiando os antagonismos colônia versus metrópole – seja enfatizando o caráter único, singular e irredutível da sociedade colonial-escravista. Evidentemente que não se trata de negar a importância fundamental dessas abordagens para o entendimento da história do Brasil. O que este livro propõe de diferente é uma rediscussão – a partir de novos parâmetros conceituais e de novas perspectivas teóricas – de algumas teses acerca das relações econômicas e das práticas políticas, religiosas e administrativas imperiais. Ele busca responder algumas questões que vêm sendo colocadas pelas pesquisas e pela experiência docente de seus autores como desfazer uma interpretação fundada na irredutível dualidade econômica entre metrópole e colônia. Como esquecer, ao lado dos – e, as negociações que estabeleceram e ajudaram a dar vida e estabilidade ao império? Como tecer um novo ponto de vista, ou um novo arcabouço teórico e conceitual que, ao dar conta da lógica do poder no Antigo Regime, possa explicitar práticas e instituições presentes na sociedade colonial?” (pp. 21-2)