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Haroldo Luiz entrevista o outsider José Amancio

José Amancio
Mar 21
Haroldo Luiz — Quem é você?
José Amancio — Eu não sei bem. Acho que sou sujeito interiorano e caatingueiro, com
alma cosmopolitana e olhos pós-modernos. Segundo me disseram, sou professor de
escolas públicas, há 19 anos. Me graduei em pedagogia e Filosofia, e tenho mestrado em
Ecologia Humana. Exerci a docência, por quase uma década, em faculdades; estagiei
bastante na UNEB em 2016, e estive lecionando na UFAL (Campus Sertão), entre 2016 e
2018, como professor substituto. No campo da literatura, em que “o artista tem a sua
realidade própria” (segundo Jorge de Lima), escrevei alguns ensaios, artigos e livros,
todos publicados, frutos de um debruçamento aprumado e febril, de longos anos de
paixão e buscas de sentidos.
Haroldo Luiz — E esses textos? São poemas??
José Amancio — Não são poemas. São versos. Talvez eu não tenha o “prumo
existencial” para escrever poemas. Há diferenças. Eu penso que o poema deveria conter
poesia. Num verso não necessariamente deve haver poesia. Se houver, muito bem.
Parabéns ao autor. Eu não escrevo poemas. Eu escrevo versos. E eu não me importo
muito.
Haroldo Luiz — Há uma expressão bacana no que você disse: “prumo existencial”. Do
que se trata?
José Amancio — Quando dificilmente um escritor tem sua existência equilibrada por
estruturas exitosas, e ele (é importante destacar) não foi ainda alcançado pelo carma do
Roedor… (Risos) aí sim, ele tem uma “existência aprumada” — como se diz por aqui.
Possui uma medida de ócio que dignifica a alma, e daí todos os bons recursos para
meditar. Mas para escrever versos é necessária certa angústia. E escrever estanca o
choro.
Haroldo Luiz — Você se acha um roedor? (Risos).
José Amancio — Roedor é uma metáfora. Alguns até acham desnecessária e ofensiva.
Quando uso tal palavra não penso num rato; penso em outra coisa, num preá, por
exemplo, que vive apressadamente. Todo aquele cuja vida é assinalada pela
sobrevivência, e não pela vivência, imita a luta de um célere roedor, buscando a todo
custo, no aqui e no agora. De alguma maneira, sim, eu sou. E com a devida licença pó-
ética, muitos de nós nos tornamos. Num sentido originário — agora com a licença do
efeito do vinho — pense a extinção dos dinossauros: sobreviveu um pequeno mamífero,
do tipo roedor, e este é, segundo disseram, o ancestral comum de todos os mamíferos.
Logo, se o sangue é quente é preciso rodar na vida, e entender o peso da existência, na
condição de sentido e de angústia. Para mim é difícil separar certas condições de ser e
de estar… a escrita, por exemplo, é roaz, é como um labirinto, as a palavra são o fio de
Ariadne. Mas, digo tudo isso mais ou menor por causa do “efeito da vide”. A emanação
de videira altera o modo de fisgar palavras na memória, de lidar com conceitos.
Haroldo Luiz — Tem gente que acerta e faz um bom poema. Ok, então. Já sinto o
presságio da existência dura, também, neste copo [de vinho]. Me diz o que significa
poesia?
José Amancio — Acho que o acerto da palavra com a forma é já poesia. O escritor tem
por natureza uma alma-desconexa, é um desacertado, e assim, torna-se difícil, para ele,
sustentar esta ordem. Palavras com palavras escritas, numa medida que além de dizer
seu conteúdo, se mostra tanto numa estrutura bela, como dentro de certa tradição, em
respeito a esta tradição e trazendo-lhe um renovo. Para mim a forma “soneto” é o
caminho e a vontade poética mais usual rumo à poesia. Quanto ao verso, no fundo é
preciso se angustiar.
Haroldo Luiz — O verso é a forma?
José Amancio — É a forma e a medida. O leitor pode encontrar poesia num verso. O
autor somente pode afirmar que escreve versos. Pode dominar a forma e pouco
influenciar a consciência do leitor autônomo. Eu me contento com a forma.
Haroldo Luiz — E seus poetas preferidos, no sentido de inspiradores?
José Amancio — Manuel Bandeira, Drummond, Jorge de Lima (do universo “Invenção
de Orfeu”), Quintana e Lêdo Ivo.
Haroldo Luiz — E esse lance de escrever livros? Esse textos seus tratam de quê? você
tem alguma preferência por temas específicos?
José Amancio — Escrever livros e publicá-los é necessário no sentido de finalizar alguns
projetos que se demoram, e às vezes nos consomem um tanto. O fato de ter seu próprio
livro em mãos vale certamente a lida de escrevê-los e publicá-los. Sim. Em resposta a
outra pergunta, meus textos tratam de tudo. De tudo mesmo! Tão “de tudo”, por assim
dizer, que se tornaram um labirinto, e não há fio de Ariadne para sair destes, ainda bem.
Um monte de laços e nós ontológicos, que sustentam por uns instantes a pedra de Sísifo
no monte. Quinquilharias do espírito, por mais que eu siga regras. E a linguagem nos
possibilita tratar de tudo, e infinitamente, porque a Linguagem é a expressão máxima
da toda metafísica. Amém.
Haroldo Luiz — Amancio. Eu conheço o Sísifo. É meu vizinho. (Risos).
José Amancio — E meu vizinho também. Aliás, mora lá em casa.
Haroldo Luiz — Hoje é feriado por aqui.
José Amancio — Sério? Nem percebi.
Haroldo Luiz — Para terminarmos, poderia listar seus livros publicados?
José Amancio — Para falar a verdade, quase nunca me lembro dos títulos, apesar de
serem poucos. Vamos lá: “O Reneval”, “Distímicos e Extrusivos”, “Elegia da
Imperfeição”, “Epifania Amarela”, “O Quasi-Haikai”, “Primeiros Poemas Soturnos”,
“Diálogos com Sebastos” e outros.
Haroldo Luiz — Obrigado.

Entrevista gravada no Catracas Bar, em 21 de Março de 2019, transcrita por Mayra Carla
Aguirre. “Transcrita, a palavra evidentemente muda de destinatário, e por isso mesmo
de sujeito, pois não há sujeito sem Outro”, Roland Barthes.

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