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Citar Althusser de Por Marx.
2
Marx, K. A ideologia alemã, p. 86.
3
As implicações filosóficas emergidas a partir da diferença entre as teorias atomísticas de Demócrito e
Epicuro marcaram a concepção de mundo de Marx de tal maneira que: “as fundamentações econômicas
bem posteriores do ser social brotam em linha reta dessa oposição entre Epicuro e Demócrito”.
(LUKÁCS, Prolegômenos para uma ontologia do ser social, p. 207).
1
Michael Löwy, na obra A teoria da revolução no jovem Marx,
concorda com Althusser sobre o corte epistemológico no curso do
pensamento de Marx, mas, segundo ele, existe também um corte político,
além do epistemológico: “compartilhamos com Althusser a hipótese de um
‘corte epistemológico’ (e também, em nosso entender, político) que se
situaria à altura das Teses sobre Feuerbach e de A ideologia alemã”4.
Devemos verificar, a partir dessa obra de Michael Löwy, a maneira pela
qual acontece o “corte político” no interior da longa marcha teórica de
Marx, mas percebendo, simultaneamente, o sentido desse corte como
aprofundamento de uma teoria, no caso, da revolução.
4
Löwy, M. A teoria da revolução no jovem Marx, p. 42.
5
Löwy, M. A teoria da revolução no jovem Marx, p. 44.
2
proletária constitui o fundamento estrutural da teoria da autolibertação dos
trabalhadores”6. Pois: “para o proletariado, que não tem propriedade
privada (de meios de produção etc.), o ‘social’, o ‘público’ não precisa ser
encarnado por um Ser superior diante do particularismo dos indivíduos; ele
se torna imanente ao ‘povo’, apresenta-se como uma qualidade intrínseca
ao conjunto dos trabalhadores. Na medida em que não é proprietário e não
é conduzido pela ‘livre concorrência’, o proletariado pode escapar da
alienação política burguesa e de seus mitos” 7. De fato, analisar a sociedade
de forma material e imanente não poderia levar a conclusões
transcendentes no sentido dissolução da própria estrutura social vigente,
pois o elemento do fundamento negativo da sociedade se identifica
precisamente no ser da classe do proletariado, na medida em que ele nada é
e, no entanto, deve ser tudo8.
6
Löwy, M. A teoria da revolução no jovem Marx, p. 48.
7
Löwy, M. A teoria da revolução no jovem Marx, p. 48.
8
Como diz Marx: “a todos os estamentos, faltam, ainda, aquela grandeza de alma que, mesmo que por
um momento apenas, identifica-se com a alma popular, aquela genialidade que anima a força material a
tornar-se poder político, aquela audácia revolucionária que lança ao adversário a frase desafiadora: não
sou nada e teria de ser tudo”. (Marx, Crítica da filosofia do direito de Hegel – introdução, p. 161).
3
Em Os despossuídos, Marx procura identificar o interesse privado
com o egoísmo e mesquinhez. O Estado seria o maior representante do
interesse privado, pois sua existência burguesa não aboliu o direito à
propriedade privada, mas o efetiva e permite covardias tais como o roubo
das madeiras, muito descritas por Marx. Pois, se o Estado deve se constituir
pelo interesse geral da sociedade civil, como sustentá-lo diante do assalto
dos interesses privados que o subjulgam? Essa crítica pressupõe todo um
esquema político-filosófico dividida sumariamente em duas esferas: por um
lado, matéria, passividade, sociedade, interesse privado, burguês; por outro
lado, espírito, atividade, Estado, interesse geral, uma vez que: “a inspiração
desse esquema é essencialmente hegeliana (e, sem essa constatação
fundamental, estamos condenados a ver apenas truques de mágica)” 9. Essa
fase hegeliana se cessaria mais explicitamente na sua adesão ao comunismo
filosófico, a partir de Sobre a questão judaica, em 1843.
9
Löwy, M. A teoria da revolução no jovem Marx, p. 59.
10
“Hegel parte do estado e faz do homem o Estado subjetivado; a democracia parte do homem e faz do
Estado o homem objetivado. Do mesmo modo que a religião não cria o homem, mas o homem cria a
religião, assim também não é a constituição que cria o povo, mas o povo a constituição”. (Marx, Crítica
da filosofia do direito de Hegel, p. 56)
4
Na monarquia o todo, o povo, é subsumido a um de seus modos de
existência, a constituição política; na democracia, a constituição mesma
aparece somente como uma determinação e, de fato, como
autodeterminação do povo. Na monarquia temos o povo da constituição;
na democracia, a constituição do povo. A democracia é o enigma
resolvido de todas as constituições. Aqui, a constituição não é somente
em si, segundo a essência, mas segundo a existência, segundo a
realidade, em seu fundamento real, o homem real, o povo real, e posta
como a obra própria deste último.11
11
Marx, K. Crítica da filosofia do direito de Hegel, p. 56.
12
Löwy, M. A teoria da revolução no jovem Marx, p. 86.
13
Marx, K. Sobre a questão judaica, p. 49.
14
Marx, K. Sobre a questão judaica, p. 49.
5
a conservação de sua pessoa, de seus direitos e de sua propriedade”15.
Desse modo:
15
Marx, K. Sobre a questão judaica, p. 50.
16
Marx, K. Sobre a questão judaica, p. 50.
17
Löwy, M. A teoria da revolução no jovem Marx, p. 88.
18
Marx, K. Sobre a questão judaica, p. 54.
6
carrega a marca de Paris e a palavra proletariado aparece pela primeira vez
na obra de Marx”19. A revolução alemã não pode dispensar a condição da
emancipação humana universal própria ao proletariado, a classe que não
tem nenhum privilégio para defender, que é despossuída de todas as
qualidades reconhecidas na sociedade burguesa: a propriedade privada. Daí
porque seu sofrimento coincide com um sofrimento universal e, por isso,
sua revolução não pode ser outra senão uma “revolução radical [que] só
pode ser a revolução de necessidades reais” 20.
19
Löwy, M. A teoria da revolução no jovem Marx, p. 89.
20
Marx, Crítica da filosofia do direito de Hegel – Introdução, p. 159.
21 21
Marx, Crítica da filosofia do direito de Hegel – Introdução, p. 163.
22
Löwy, M. A teoria da revolução no jovem Marx, p. 92.
7
a expressão concreta, a ‘encarnação’ do parceiro feuerbachiano do
pensamento filosófico alemão: o coração ‘francês’ e ‘materialista’, com
suas ‘carências’ e seu ‘sofrimento’, que se opõe à atividade espiritual por
meio de um atributo essencial – a passividade”23. Assim, embora Marx já
formulasse uma teoria da revolução com o elemento material do
proletariado, este ainda que representante negativo da sociedade, tem
apenas um papel meramente passivo no processo de transformação geral da
estrutura social vigente.
23
Löwy, M. A teoria da revolução no jovem Marx, p. 93.
24
Löwy, M. A teoria da revolução no jovem Marx, p. 121.
25
Marx, K. Manuscritos econômico-filosóficos, p. 105.
26
Marx, K. Manuscritos econômico-filosóficos, p. 114.
8
escrito, Marx não menciona quem pode superar essa situação da classe
trabalhadora, mas se limita a afirmar somente a figura do comunismo
enquanto estado geral da sociedade livre da alienação.
27
Marx, K. Glosas críticas ao artigo ‘O rei da Prússia e a reforma social. De um prussiano’, p. 73-74.
9
esquema feuerbachiano”28. Tanto a retomada do tema da contraposição
entre revolução política e revolução social, dos Anais franco-alemães,
quanto a reinterpretação do papel do proletariado em relação a Crítica da
filosofia do direito de Hegel – Introdução se tornaram presentes nessa
discussão com Ruge. Enquanto este não vê sentido numa revolução social
sem alma política, Marx: concebe a revolução social como a verdade da
revolução política: “a revolução em geral – derrocada do poder existente e
a dissolução das velhas relações – é um ato político. Por isso, o socialismo
não pode efetivar-se sem revolução. Logo que tenha início a sua atividade
organizativa, logo que apareça o seu próprio objetivo, a sua alma, então o
socialismo se desembaraça do seu revestimento político”29. Isso porque
uma revolução política consiste apenas nos interesses de uma classe
politicamente privada, com objetivo de superar sua situação em relação ao
Estado: “a alma política de uma revolução consiste na tendência das classes
politicamente privadas de influência a superar o seu isolamento do Estado e
do poder. [...] Por isso, uma revolução com alma política organiza também,
de acordo com a natureza limitada e discorde dessa alma, um círculo
dirigente na sociedade às custas da sociedade” 30. Dessa maneira, Marx se
distancia explicitamente do esquema hegeliano, do comunismo filosófico e
do humanismo feuerbachiano e encontra seu porto seguro na atividade
revolucionária do proletariado.
28
Löwy, M. A teoria da revolução no jovem Marx, p. 129.
29
Marx, K. Glosas críticas ao artigo ‘O rei da Prússia e a reforma social. De um prussiano’, p. 78.
30
Marx, K. Glosas críticas ao artigo ‘O rei da Prússia e a reforma social. De um prussiano’, p. 76-77.
10
Assim, o proletariado contém a representação negativa da sociedade
porque “nas condições de vida do proletariado estão resumidas as
condições de vida da sociedade de hoje, agunizadas do modo mais
desumano; porque o homem se perdeu a si mesmo no proletariado” e,
precisamente por isso, expressa na prática essa necessidade causada pelo
império da penúria absoluta, ou seja: “por causa disso o proletariado pode e
deve libertar-se a si mesmo”. Por consequência, essa autolibertação do
proletariado não pode se efetivar sem suprassumir as condições de vida
vigente: “ele não pode suprassumir suas próprias condições de vida sem
suprassumir todas as condições de vida desumana da sociedade atual, que
se resumem em sua própria situação”. Isso porque está no próprio ser do
proletariado a superação do modo de vida vigente: “Não se trata do que
este ou aquele proletário, ou até mesmo do que o proletariado inteiro pode
imaginar de quando em vez como sua meta. Trata-se do que o proletariado
é e do que ele será obrigado a fazer historicamente de acordo com o seu
ser”. Contudo, essa tarefa histórica também depende de uma consciência
mais clara do que a consciência primeira do proletariado já obtém: “e nem
sequer é necessário deter-se aqui a expor como grande parte do proletariado
inglês e francês já está consciente de sua missão histórica e trabalha com
constância no sentido de elevar sua consciência à clareza completa” 31. Essa
visão consciente de Marx sobre a capacidade revolucionária do proletariado
demonstra bem sua posição da autolibertação proletária.
31
Marx, K. A sagrada família, p. 49.
11
pensamento sobre a realidade não altera em nada a opressão e a espoliação
da vida cotidiana dos trabalhadores; somente a prática objetiva pode
transformar esse modo de vida contra o ser:
A Crítica crítica os ensina que eles superam o capital real com o simples
domínio da categoria do capital no pensamento, que lês realmente
mudam, tornando-se homens reais, se mudarem seu ‘eu abstrato’ na
consciência, desprezando toda a mudança real de sua existência, quer
dizer, das condições reais de sua existência, portanto, de seu eu real como
se fosse uma mera operação acrítica. O ‘espírito’, que só vislumbra
categorias na realidade, naturalmente também reduz toda a atividade
humana e sua práxis a um processo de pensamento dialética da Crítica
crítica. E é justamente isso que diferencia o socialismo dela do
socialismo massivo do comunismo. 33
32
Marx, K. A sagrada família, p. 65-66.
33
Marx, K. A sagrada família, p. 66.
12
A classe operária não reclama por tomada de consciência de si de
forma abstrata, como quer o socialismo crítico, mas necessita do seu
próprio movimento comunista massivo, a força de sua autolibertação.
34
Löwy, M. A teoria da revolução no jovem Marx, p. 143.
13
atividade ou automodificação humanas só pode ser apreendida e
racionalmente entendida como prática revolucionária. (Tese 3).
35
Löwy, M. A teoria da revolução no jovem Marx, p. 145.
14
circunstâncias’”36. Há, pois, um abandono do materialismo francês.
Contudo, o problema das Teses sobre Feuerbach está no esquecimento do
comunismo como movimento concreta da atividade das massas, ou melhor,
do proletariado. Isso aparecerá com mais clareza em A ideologia alemã.
36
Löwy, M. A teoria da revolução no jovem Marx, p. 149.
37
Marx, K. A ideologia alemã, p. 41-42.
38
Marx, K. A ideologia alemã, p. 41.
15
no bom burguês alemão, no qual ela é crônica e ‘sempre igual a si mesma’,
miserável e desprezível, ao passo que a necessidade do proletário assume
uma forma aguda e premente, impele-o à luta de vida ou morte, torna-o
revolucionário e, por essa razão, não produz ‘preocupação’, mas paixão”39.
39
Marx, K. A ideologia alemã, p. 214-215.
40
Marx, K. A ideologia alemã, p. 42.
41
Löwy, M. A teoria da revolução no jovem Marx, p. 51.
16
1847, Marx esboça brevemente a maneira pela qual o proletariado toma
consciência de si mesma:
42
Marx, K. Miséria da filosofia, p. 190.
43
Marx, K. Manifesto do partido comunista, p. 49.
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abstratamente do proletariado; ao contrário, os comunistas objetivam a
organização da classe operária no interior da singularidade do partido
operário, a fim de derrubar a dominação da burguesia (abolindo a
propriedade burguesa) e conquistar o poder político do proletariado. Para
tanto: “as proposições teóricas dos comunistas não se baseiam de modo
algum em ideias, em princípios inventados ou descobertos por este ou
aquele reformador do mundo. Elas não passam da expressão geral das
condições reais de uma luta de classes existente, de um movimento
histórico que se desenrola diante de nossos olhos”44.
44
Marx, K. Manifesto do partido comunista, p. 49.
45
Löwy, M. A teoria da revolução no jovem Marx, p. 185.
46
Löwy, M. A teoria da revolução no jovem Marx, p. 187.
18
(Lowy, p. 46). Conferir Lukács, em História e consciência de classe, para
aprofundar essa citação de Lowy.
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