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RESUMO
1
Cabe ressaltar que ainda durante o período em qua a CHISAM atuava no Rio de janeiro, outro órgão
governamental, ligado ao governo do Estado, a CODESCO (Companhia de Desenvolvimento de
Comunidades) desenvolvia a urbanização de 3 favelas, o que mostra a ambiguidade que acompanha a
postura do estado em relação ás favelas.
Todavia, já no final do período, o BNH iria interromper a política de remoção e iniciar um
programa de urbanização e de regularização fundiária, o PROMORAR. Com a extinção
do Banco, em 1986, o período subsequente mostrará uma progressiva perda de
centralidade da política habitacional na agenda do governo federal, cabendo nesse
momento aos governos locais a responsabilidade pelo desenvolvimento de ações que, em
linhas gerais caminharão no sentido do reconhecimento dos direitos de permanência das
populações de favelas, direito reconhecido e legitimado pela Constituição de 1988 através
do princípio da função social da propriedade.
2
Os Cadernos não estão mais disponíveis no site do Ministério das Cidades, mas podem ser ainda
encontrados em https://erminiamaricato.net/cadernos-mcidades.
2. COMPONENTES DA POLÍTICA NACIONAL DE HABITAÇÃO
3
Dados do Balanço do FNHIS, elaborado pela Secretaria Nacional de Habitação e apresentados na 13ª.
Reunião Ordinária do Conselho gestor do FNHIS, em 16/10/2009.
FNHIS - Distribuição dos recursos por porte dos municípios (2006-2008)
Se, por um lado, isso representou de fato uma mudança tratamento do problema das
favelas, ao mesmo tempo a intervenção em favelas foi inserida em um procedimento
administrativo que não previa a participação popular e o controle social4. Todo o processo
decisório de alocação de recursos e aprovação de projetos passa a ser feito pela equipe
da SNH e pela Caixa Econômica, gestora financeira dos empreendimentos contratados.
Como já foi referido, o Rio de Janeiro tem a favela como uma das marcas de sua história.
Da mesma forma, as políticas federais para as favelas tenderam a se concentrar no Rio,
seja pela anterior condição de capital do país, seja pela maior “representatividade” do
fenômeno nessa metrópole, seja ainda pelo fato de o Rio ser de alguma forma a “caixa de
ressonância” da nação. Mas também os governos locais buscaram de alguma forma atuar
sobre as favelas, alternando, de forma ambígua, atitudes de repressão ou de tolerância e,
algumas vezes, programas de melhoramentos, como foi o caso do período do SERFHA
(Serviço Especial de Recuperação das Favelas e Habitações Anti-Higiênicas) entre 1956
e 1960.
4
Conforme Balanço do PAC-2, disponível em http://www.pac.gov.br/sobre-o-pac/divulgacao-do-
balanco/balancos-anteriores, consultado em 25/07/2016.
Na década de 1980, após a brutal experiência de remoção massiva de favelas
empreendidas pelo governo Militar, e já no contexto da redemocratização, novos
programas de urbanização começam a tomar corpo na cidade. Foi marcante, nesse
sentido, a experiência da CEHAB no Governo Brizola (1983-1987) que estabeleceu os
princípios básicos de intervenção, buscando respeitar os limites e a implantação
urbanística do assentamento, criando vias de acesso e de circulação interna, permitindo
assim a passagem de veículos e ainda estabelecendo melhorias significativas de
infraestrutura e de equipamentos sociais. Em 1993, tendo a urbanização de favelas sido
reconhecida tanto na Lei orgânica quanto no Plano Diretor da Cidade (NUNES, 2012), a
prefeitura cria o programa Favela Bairro, que irá contar com recursos do BID e que se
manterá ao longo dos anos e governos que se seguem, até 2010, quando a prefeitura
lança um novo programa – o Morar Carioca.
O Favela Bairro tinha como objetivos a integração das áreas de Favela à cidade formal,
com implantação de serviços básicos, infraestrutura regularização de acessos viários e
regularização fundiária. (MENDES, I 2006). Foram realizadas intervenções no total de 147
Favelas. O programa foi considerado bem-sucedido, tendo sido “exportado” para outras
cidades, do Brasil e do exterior. Pode-se considerar que o projeto Habitar-Brasil/BID foi
um desdobramento do Favela Bairro, já que o BID buscou ampliar a experiência, dando-
lhe uma dimensão mais nacional. Originalmente esse programa era voltado para favelas
de porte médio e a partir dessa experiência inicial a prefeitura desenvolveu dois
subprogramas, o “Bairrinho”, dirigido para pequenas favelas e o “Grandes Favelas”
(Cardoso; Araújo; Coelho, 2007) cujo principal projeto foi desenvolvido para a favela de
Rio das Pedras, na região da Barra da Tijuca. Baseada nesta experiência, a prefeitura
desenvolveu uma nova abordagem para grandes favelas: os Planos de Desenvolvimento
Urbanístico (PDU).
"(...) depois disso de Rio das Pedras levou a uma consciência maior de se
criar um plano de desenvolvimento urbano, um PDU, que foi feito para o
Alemão como para Manguinhos. Que era um Plano macro, não era algo
imediatista, era um plano de gestão pública de 4 em 4 anos (...)"Entrevista 2
5
Cabe ressaltar que algumas experiências no Brasil aliaram programas de urbanização com ações de
melhoramentos habitacionais, o que configura uma atuação mais abrangente. Não foi o caso do Favela
Bairro, já que a Prefeitura considerava que os melhoramentos ocorreriam como fruto dos investimentos
privados dos próprios moradores, não cabendo á Prefeitura qualquer atuação nesse setor.
Fig 1 - Localização das Intervenções PAC-UAP no Município do Rio de Janeiro:
"Eu acho que a escolha de ser usado em Favelas foi uma oportunidade, que
o PAC criou não vejo como não ser uma oportunidade política muito boa. Se
você pensar que tem ali 80 mil pessoas e pensar que você tem 30 a 40 mil
votos só focadas ali, é uma oportunidade política. Eu acho que a escolha foi
em função do PDU, já tinha um trabalho direcionado, tanto que o PAC,
entrou nessas duas áreas, falo dessas duas áreas, porque a Rocinha veio
depois, logo depois, meio a reboque" Entrevista 1
Outro fator apontado para a inclusão da urbanização de Favelas ser incluída no PAC é o
interesse do setor da construção civil em obras inéditas e de grande escala. Ao optar por
grandes intervenções sem precedentes seria possível ter maior controle no preço final das
obras, uma vez que não haveria a possibilidade de comparação de preços.
Fig 2 Estrutura institucional do programa - Elaboração própria a partir de TRINDADE, Claudia 2012
No caso do Complexo do Alemão, o escritório MPU - Metrópolis Projetos Urbanos - foi
contratado por concorrência pelo Governo do Estado para desenvolver o projeto
básico7.O vencedor da licitação de obra foi um consórcio de grandes empresas da
construção civil denominado Consórcio Rio Melhor (Consórcio), na qual se incluem as
construtoras Norberto Odebrecht (Líder), Construtora OAS e Delta Construções 8.
Cabe ressaltar que uma vez licitada a empresa construtora, cabe a esta a
responsabilidade pelo desenvolvimento do projeto executivo, a partir do projeto básico
desenvolvido pelas empresas de projeto, sob a gerência do órgão estadual. É nesse
momento – do projeto executivo- que decisões cruciais são tomadas, particularmente no
caso da urbanização de favelas, em que o nível de imponderável na execução tende a ser
bastante maior do que no caso de projetos de obras novas ou mesmo em áreas mais
consolidadas da cidade.
6
Para maior detalhe sobre a estrutura do PAC-UAP ver TRINDADE, Claudia 2012 "Não se faz omelete
sem quebrar os ovos" Política Pública e Participação Social no PAC Manguinhos - Rio de Janeiro Tese
(Doutorado) – Universidade Federal Fluminense, Instituto de Ciências Humanas e Filosofia, Departamento
de História
7
http://au.pini.com.br/arquitetura-urbanismo/200/nova-morada-191210-1.aspx
8
https://www.crea-rj.org.br/blog/construtoras-retomam-as-obras-do-pac-no-complexo-do-alem%C3%A3o/
3. O CASO DO COMPLEXO DO ALEMÃO
Fig 3 - Localização do Complexo do Alemão e divisão territorial - Elaboração própria a partir de IPP e
Projeto Básico
9
Para uma caracterização mais completa consultar entre outros: RODRIGUES. R.I.& COUTO, P.B.,Rute
Imanishi "A gramática da moradia no Complexo do Alemão: história, documentos e narrativas." IPEA-
FAPERJ; "Vida social e política nas favelas : pesquisas de campo no Complexo do Alemão / Rute Imanishi
Rodrigues (org) IPEA, 2016; SILVA, Heitor "Política e estruturação do território: PAC e UPPs no Complexo
do Alemão" Tese de doutorado IPPUR-UFRJ 2015
A identificação "Complexo do Alemão" é recente coexistindo com outras identificações
não reconhecidas pelo poder público. O bairro enquanto região administrativa abrange
uma área de 296 hectares e segundo censo do IBGE de 2010 contava com uma
população de 60.583 habitantes. No entanto, o Censo Favela (Março 2010) feito pela
EGP (Escritório de Gerenciamento de Projetos do Governo do Estado) apontava para
uma estimativa superior de 89.912 habitantes. O bairro tem como limites a Serra da
Misericórdia a Noroeste, Bairros de Olaria e Ramos a Norte e Nordeste, Bonsucesso a
leste e Inhaúma a Sul/Sudeste. (RODRIGUES. R.I.& COUTO, P.B. 2013)
Por volta dos anos 20 do séc.XX predominava o casario disperso entre usos agrícola e
uma estrutura fundiária de grandes propriedades. A partir dos anos 30 começam a
instalar-se na região diversas indústrias (Curtume Carioca, Coca-Cola, Fábrica de Papel
Tannuri, Tecidos Esperança). A abertura da Av.Brasil reforçou a concentração de
indústria e nos anos 80´s a região era considerada o principal pólo industrial do Rio de
Janeiro. O setor fabril atraiu mão de obra sendo um fator determinante para o crescimento
populacional do território, que, com o consentimento e/ou inação por parte do Estado, foi
gerando o atual complexo de favelas. (PDS - Complexo do Alemão) (SILVA,H 2016).
Embora a Prefeitura também tenha atuado no âmbito do PAC, o foco desta análise são as
intervenções a cargo do Governo do Estado. O resumo aqui apresentado pretende
apenas contextualizar a produção habitacional no programa, não sendo objetivo avaliar
aqui as componentes de participação da população, trabalho social entre outras
dimensões.10 O repasse do Governo Federal é realizado em Novembro de 2007, (Decreto
10
Para maior detalhe sobre a avaliação do PAC Complexo do Alemão consultar_ Vida Social e
Política nas Favelas pesquisas de campo no Complexo do Alemão RODRIGUES, Rute (org) et all IPEA
2016; e Política e estruturação do território: PAC e UPPs no Complexo do Alemão SILVA, Heitor (Tese)
IPPUR/UFRJ 2015
nº 6.276) e as obras começam um ano depois em Novembro de 2008. Para uma
periodização da implementação do programa são de referir os seguintes momentos: as
eleições municipais de Outubro de 2008 que alteram a relação com a prefeitura passando
esta a estar alinhada politicamente com o Governo Estadual e Federal. Este fator será
importante no decorrer do projeto, sobretudo na articulação com a Secretaria de
Urbanismo responsável pelas aprovações de projetos. Outro evento importante serão as
chuvas de 5 e 6 de Abril de 2010 que resultam em deslizamentos de terra, destruição de
casas e famílias desabrigadas.
Cabe referir o calendário eleitoral, uma vez que o PAC-UAP se encaixa precisamente
entre as eleições de 2006 e 2010, o que resultou numa pressão para o projeto possibilitar
inaugurações e articulações do tipo clientelista. Estas articulações "promoveram um
gestor territorial a vereador e reelegeram o governador" (OLIVEIRA,Bruno 2016). Esta
contextualização ilustra o caráter de urgência com que os projetos passaram à fase de
obra o que leva os envolvidos a caracterizarem o PAC como "rolo compressor".
"É inegável. Tem que inaugurar, tem eleição chegando, eleição no Estado,
eleição Federal, não só municipal. Às vezes eleições de algumas
associações. Alguns foram se reelegeram, nesse processo todo. (...) A
questão desse planejamento que não houve, é que alguns projetos tiveram
que ser em maioria junto com a obra. E ai é inegável que vai ter o rolo
compressor." Fonte: Entrevista 1
11
O resumo aqui descrito baseou-se em informações do Governo do Estado do Rio de Janeiro._Noticia
"Estado inaugura novas unidades habitacionais no complexo do alemão" Disponível em http://www.rj.gov.br
acessado em 27/07/2016, na apresentação inicial do PAC disponível em <
http://www.chs.ubc.ca/consortia/events/E-20080916/GovernoRJ-Complexo_do_Alemao.pdf> Acesso: Julho
de 2016 e nos mapas do PDU e Projeto Básico disponíveis em
http://www.jauregui.arq.br/favelas_alemao.html
Contrução de Unidades
de Relocação O Teleférico corresponde a um terço
8% Compra Assitida do total do investimento. Além do custo
13% 4%
Teleférico desta parcela isolada teríamos que
8% associar recursos de Infraestrutura
3% Infraestrutura urbanística
Urbanística, bem como de demolições
3%
33% Indenizações e indenizações à construção do
28% Equipamentos Sociais teleférico uma vez que parte da
abertura de vias, e consequentes
Demolições
remoções de casas existentes, se
Ações não Físicas relacionam com a necessidade de
Fig 4 - Divisão do investimento por ações Elaboração própria a acesso aos pilares do teleférico. O
partir de dados do Governo do Estado "Teleférico" não constava no PDU que
propunha "uma rede estrutural de sistema viário", um sistema de vias pedestres e
ciclovias, complementada por "um sistema de ônibus articulando as centralidades,
conectando o Complexo também ao metrô" (Decretonº27471/2006). O Teleférico tem
como referencia a experiência colombiana de Bogotá e Medellín, sendo legitimado tanto
pelos projetistas como pelos responsáveis políticos pelo caráter simbólico e "re-
significador" do lugar. (IPEA 2010)
"Art. 8.o Em cada uma das áreas populacionais e espaciais dos Setores
Urbanos – SU, estão previstas áreas para instalação dos Centros
Setoriais – CS, (…)"
"Art. 9.o Na periferia imediata destes Centros Setoriais – CS, serão
associadas áreas de adensamento contendo diversas tipologias
habitacionais novas, com a finalidade de permitir o re-assentamento
dos usuários deslocados pelas necessidades espaciais de locação dos
Centros Setoriais e das áreas necessárias a passagem de vias
componentes do novo sistema viário" (Decreto Nº 27470/06)
Fig. 6 - Evolução da inserção dos empreendimentos - Elaboração própria a partir dos mapas do PDU e
Projeto Básico e Projetos Legais de Arquitetura e Urbanismo
No terreno da Av.Itaóca 1174 ("D" na Fig6) funcionava um depósito da empresa de
remoção de entulhos "Terra Prometida" sendo o primeiro núcleo habitacional a iniciar a
obra em Abril de 2008, seguido em Maio de 2008 pelo terreno da "1833" ("F" na Fig6).
Em Abril de 2009 inicia-se a construção dos dois blocos situados na Rua Pedro Avelino,
"Adeus" ("C" na Fig6), que se localizam dentro da AEIS sendo o núcleo habitacional que
melhor se insere no território. Em Junho de 2009, inicia-se a construção do conjunto
habitacional da "POESI" localizado na a encosta leste do vale da Estrada do Itararé em
terreno anteriormente ocupado pela "Fábrica de Lingerie Poesi" cujos galpões foram
implodidos em Dezembro de 2008. Embora se insira dentro da AEIS, veremos mais
adiante como a implantação do empreendimento não se articula com a comunidade. Já
após as chuvas de Abril de 2010 se começa a construir o último núcleo habitacional do
PAC-UAP, nos terrenos da antiga fábrica Helio Gás que se localiza próximo da Estrada do
Itararé do lado oeste, fora da AEIS, ou seja, inserindo-se em área "formal".
12
Estes dois empreendimentos só serão analisados na componente de inserção urbana e implantação uma
vez que não foi possível ter acesso ao projeto legal dos mesmos.
13
Segundo coordenadora do PAC-Social Ruth Jurberg
_http://www.rj.gov.br/web/seobras/exibeconteudo?article-id=1917385
dois terrenos têm topografia mais acentuada, o terreno da "Poesi" ("A" na Fig4) e o
terreno do "Adeus" ("C" na Fig4). Esta área é caracterizada por ter terrenos de grandes
dimensões onde estavam instaladas antigas fábricas que o Governo do Estado
desapropriou. Se no PDU se propunha uma distribuição equitativa no interior da AEIS
(Área de Espacial Interesse Social) no Projeto Básico é visível a tendência para
aglomeração da produção habitacional, concentrando-se ou dispondo-se ao longo dos
eixos. Quando questionados sobre as diferentes opções, os envolvidos nos programas
tendem a concordar que a solução de uma inserção dispersa seria mais adequada, tanto
que durante o processo se tentou viabilizar este tipo de solução.
"A gente tentou fazer dois bloquinhos lá no Adeus, provocado também pela
oportunidade que no Adeus tinha uma área vazia, as remoções abriram uma
área ainda maior, mais vazia no entorno da estação. Teve uma proposta de
se colocarem dois bloquinhos lá em cima, como lá em baixo (Rua Pedro
Avelino), que depois foi freado." Fonte: Entrevista 1
Fig 9 - Análise do acesso ao núcleo habitacional - Elaboração própria a partir de Google Street View
A articulação do terreno com o entorno verifica-se na relação com a Rua Ózeas Mota e a
abertura da via para a Av.Itaóca, no entanto a relação com a restante quadra permanece
estanque através de muros ou barreiras. Uma vez que todo o terreno é considerado
público nada impediria a abertura de acessos dos lotes do entorno ao novo espaço criado
o que reforçaria a articulação com o entorno. No entanto, esta solução não foi possível
devido à inserção do terreno em local fora da AEIS e da área de intervenção do PAC o
que não permite que o entorno dos conjuntos habitacionais seja alvo de urbanização. Isto
reforça a ideia de "ilha" habitacional e
Fig 10 - Blocos "H" ( à esquerda) construídos no fundo do
lote ser articulação com núcleo inicial (à direita) Fonte: desarticulação entre projeto de
Divulgação PAC (2012) urbanização e produção habitacional.
Fig 11 - Blocos "H" em primeiro plano com núcleo original em segundo plano.
Fonte: Divulgação PAC (janeiro 2012)
Núcleo "E" - Condomínio "Jardim Canário"
Fig 12 - Análise do acesso ao Condomínio "Jardim Canário" - Elaboração própria a partir de Google Street View
Fig 15 - Análise da relação com o entorno - Elaboração própria a partir de Google Street View
Os dois blocos estão implantados num platô que resulta da contenção necessária para a
abertura da via de acesso à Estação de Teleférico do Adeus. A partir deste platô os
espaços de lazer desenvolvem-se escalonadamente adequando-se à topografia do local,
conectados entre si por escadarias e rampas. É perceptível, sobretudo nas divisas norte e
este, a dificuldade de implantação de uma tipologia "padronizada" de edifício a um terreno
íngreme originando cortes e aterros que resultam de barreiras físicas e espaço livre
ocioso. Ou seja, não existiu uma integração entre projeto arquitetônico e urbanístico que
permitisse resolver a topografia de forma mais adequada.
Apesar dos fundos do lote por conta da contenção do terreno não possibilitarem a
permeabilidade face ao entorno, a sua testada é ocupada por uma quadra de futebol
pública o que oferece a possibilidade de sociabilidade e integração com a malha urbana
existente. O espaço entre os dois edifícios compõe um espaço de lazer semi-público de
usufruto dos moradores.
Fig 16 - Núcleo Habitacional na Av. Itaóca 1833 e Condomínio "Jardim Beija-Flôr" - Planta de Implantação e
informações
Fig 17 - "1833"- Análise da relação com o entorno - Elaboração própria a partir de Google Street View
O conjunto caracteriza-se pela pouca
dimensão (50m) da testada na Av.Itaóca e
desenvolvimento longo no sentido
perpendicular (330m). O fundo do lote é
caracterizado pelo alargamento do terreno
sendo a divisa feita em aclive com a Faixa
Marginal de Proteção do Rio Timbó. No
sentido de resolver o acesso foi projetada
uma via interna que termina em "cul-de-
sac"14. A opção dos projetistas era de não
restringir o acesso e criar na frente do lote
Fig 18 - Vista Aérea do conjunto
Foto:Divulgação EMOP um espaço de lazer público, no entanto foi
erguida uma cerca resultando assim num espaço ocioso. As restantes divisas são
muradas e segundo os envolvidos, utilizou-se o artificio de formalizar o conjunto como
condomínio para facilitar o processo de aprovação. A implantação dos edifícios realiza-se
de duas formas: 7 edifícios do tipo "H", dispostos perpendicularmente ao longo da via
interna, e uma segunda lógica nos fundos do lote, com a implantação de 5 edifícios do
14
"cul-de-sac" é uma tipologia de rua sem saida com balão de retorno.
tipo "pré-moldado" em fita, que se
distribuem ao redor do "cul-de-sac". A
aglomeração dos edifícios em fita, em
redor do "cul-de-sac" e os espaços de
lazer desta zona apesar de bastante
segregados da rua conformam ainda assim
um espaço de sociabilidade entre
Fig 19 - Disposição do edifícios em fita no fundo do lote. moradores. De referir ainda a falta de
Foto do autor tratamento paisagístico do fundo do lote na
divisa com o Rio Timbó. Questionados
sobre as razões de não tomar partido urbanístico desta oportunidade os envolvidos
refiram que "Houve o estudo, mas foi desconsiderado porque sairia do limite contratado."
Fig 21 - Análise da relação com o entorno - Elaboração própria a partir de Google Street View
Fig 23 - Análise da relação com a Estrada do Itararé - Elaboração própria a partir do Google Street View
O núcleo habitacional construído no terreno da antiga fábrica POESI localiza-se no sopé
da encosta do morro. O terreno foi subdivido sendo que além do conjunto habitacional foi
construída a Escola de Ensino Médio. A frente do lote é uma testada de grande dimensão
onde se localizam espaços de lazer e equipamentos comunitários (academia). Esta
proximidade entre equipamentos sociais, espaços de lazer, a rua e os equipamentos
comunitários poderia ser um fator gerador de sociabilidade, no entanto pode-se verificar
que se optou por segregar cada um destes usos criando cercas ou barreiras que
impossibilitam o seu potencial integrador. O projeto aproveita parte dos platôs onde
estavam localizados os galpões demolidos e algumas das vias existentes. Os edifícios
agrupam-se em duas cotas: um primeiro grupo de 13 blocos praticamente à cota da
Estrada do Itararé separados por uma via de acesso, e um segundo grupo na parte alta
do terreno. Analisando a planta de implantação torna-se evidente o reduzido
aproveitamento do terreno, (comparando, por exemplo, com a morfologia do entorno),
devido à escolha da tipologia Bloco "H". A não adaptação do projeto de arquitetura à
topografia gera platôs, contenções originando espaços livres ociosos. Apesar da
proximidade com a "favela", não se articulou o conjunto com o aglomerado habitacional
existente optando-se por murar ou cercar as divisas do lote. Apesar do cercamento do
lote o acesso ao conjunto não é restrito, não existindo portão ou guarita, o que
"formalmente" não se poderia denominar como condomínio, mas que na prática se
aproxima deste conceito.
Fig 27 - Análise da tipologia e modo de agrupamento das unidades habitacionais - Tipologia Duplex
Esta tipologia tem como referência o projeto do Favela-Bairro no morro dos Macacos. Os
fatores determinantes para a solução foram a adaptabilidade a terrenos de testadas de
pouca dimensão, terrenos íngremes e de lotes pequenos em áreas de Favela. O
apartamento desenvolve-se em dois pavimentos separando a zona intima (quartos) da
zona comum (sala, cozinha e banheiros), numa largura de apenas 3.5m o que permitiria
um agrupamento de unidades escalonado acompanhando a topografia. Por ser uma
tipologia duplex a unidade dificilmente seria adaptada a PNE (portadores de necessidades
especiais).
No Alemão foi agregado um espaço de entrada (Hall/espaço de trabalho) que foi tomado
como referência de uma casa visitada onde uma moradora dava aulas de reforço escolar
em casa, e resulta também num filtro entre o espaço de circulação comum e áreas de
estar. Apesar da sua relação com o espaço
público é possível manter a privacidade dos
espaços íntimos. Os apartamentos agrupam-se
em banda geminados e em grupos espelhados o
que permite que no térreo existam espaços livres
privados. (pequeno quintal). O acesso aos
apartamentos térreos é feito diretamente através
do espaço público e no terceiro pavimento através
de uma passarela. A circulação é pública, mas
pela sua conformação resulta num espaço Fig 26 - Espaço circulação pedestre entre
semipúblico de convivência de moradores. edifícios Foto divulgação www.jauregui.arq.br
Fig 28 - Análise da tipologia e modo de agrupamento das unidades habitacionais - Edificio "pré-moldado" em fita
Esta tipologia foi desenvolvida para o PAC do Alemão e Manguinhos e também Rocinha,
para responder à demanda de rapidez da execução através da pré-fabricação da
estrutura. No Alemão foi utilizada no núcleo da "1833" e no "Adeus". Os apartamentos
desenvolvem-se num polígono bastante compacto sem circulação interna o que não
permite separar a zona íntima (quartos) da zona comum (sala, cozinha e banheiros),
havendo 3 variações: os apartamentos do meio menores, os das pontas maiores e
apartamentos adaptados para PNE no térreo são com redução da sala e cozinha para
permitir aumento do banheiro. Os apartamentos agrupam-se em fita, em 4 pavimentos,
sendo a circulação comum feita por corredor aberto ao exterior e núcleo de escadas
centrais. Ao contrário da unidade duplex esta circulação não protege as salas e os
quartos da circulação comum. A circulação comum para o exterior permite que ao agrupar
edifícios em espelho se conforme um espaço
semipúblico cuja sua fruição em segurança é
garantida pelos acessos e visibilidade em
relação ao corredor. Os baixos custos de
manutenção foram também pensados não
existindo por exemplo iluminação comum,
sendo os espaços exteriores iluminados por
pontos de iluminação de cada apartamento. Os
edifícios não se adequam a terrenos íngremes
necessitando da construção de platôs.
Fig 29 - Análise do edifício Bloco "H" e modo de (não) agrupamento das unidades habitacionais - Bloco PAC
O Bloco "H" recupera uma configuração típica e bastante reproduzida no período do BNH
com uma escada central, que distribui para 4 apartamentos por piso. O apartamento é um
polígono compacto minimizando a circulação interna. Os cômodos de permanência (salas
e quartos) têm exposição para a fachada principal. Ao contrário de alguns projetos que
recorrem à tipologia "H"16 em que as áreas molhadas (cozinha, área de serviço, e
banheiros) recorrem a um prisma interno para ventilação, aqui a ventilação faz-se pela
fachada lateral. A falta de ventilação cruzada, combinada com a escada fechada e o
sistema construtivo de paredes de concreto, resulta numa péssima qualidade térmica das
habitações. O que poderia aparentar ser um detalhe de arquitetura é de fato determinante
para a resolução urbanística dos blocos, uma vez que ocupando todas as fachadas do
edifício com aberturas este deixa de ser modulável, ou seja, não é possível o
agrupamento de vários edifícios. Outro fator determinante para a implantação dos
conjuntos é que, tal como na tipologia anterior ("pré-moldado" em fita), a arquitetura não
se consegue implantar em terrenos íngremes. Estes dois fatores dificultam o desenho das
implantações no território.
15
Sistema industrializado de paredes de concreto armado "in loco" ("forma túnel").
16
Ver projeto IAPC Del Castilho em BONDUKI, Nabil As origens da habitação social
Fig 30 - Análise do edifício Bloco "H" - PMCMV
"Era uma tipologia que já chegou para a gente pronta, chegou para a gente
de uma outra empresa que o consórcio contratou, a Bairro Novo que é lógico
que era uma empresa que estava querendo entrar, montada criada para o
MCMV e o impulso do Alemão seria ótimo" Entrevistado 1
Fig 32 - Bloco "H" - PAC Foto do autor Fig 31 - Bloco "H" - PMCMV Divulgação SEOBRAS
17
É apenas obrigatório deixar um espaço para previsão de instalação.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Mais que conclusões, gostaríamos de colocar aqui algumas hipóteses e questões para a
reflexão que nos permitam questionar o modelo institucional adotado pelo PAC, tendo em
vista os resultados alcançados que, notoriamente, significaram uma perda de qualidade
do projeto final. Em resumo na componente habitacional, identificamos que a inserção de
núcleos habitacionais dispersos pelo território e articulados com projeto urbanístico, passa
a concentra-se na periferia do território por solicitação da empreiteira facilitando a gestão
de obra. As implantações passam de quadras abertas, que articulam a habitação com
equipamentos sociais e espaços de lazer de acesso público para a lógica de condomínio
fechado, via interna em "cul-de-sac" e edifícios dispostos sem conformar espaços de
sociabilidade. Esata alteração dá-se sobretudo pela maior rapidez de aprovação e pela
lógica do PMCMV a empreiteira passou a assimilar. Esta lógica explica também o
abandono da tipologia inicial que poderia adaptar-se à topografia do território para uma
arquitetura padronizada passível de ser replicada em massa ("tipo carimbo") no PMCMV.
"As limitações apareceram depois, uma vez que depois que fizemos o
núcleo inicial, ai eles, a construtora, avaliaram que eles não estavam
ganhando o suficiente, que não estava dentro dos custos que eles queriam
atingir e simplesmente mudaram o tipo sem consultar a gente e colocaram o
famoso "Hzinho" que é "zero" qualidade, em todos os aspetos, ambientais,
um calor espantoso lá dentro, desse concreto pré-moldado, e também
digamos o resultado urbanístico e arquitetônico lamentável, não dá para
compor com esse "Hzinho" uma urbanização de qualidade." Entrevistado 2
Cabe ressaltar da citação anterior, que a avaliação que foi possível fazer dos custos não
demonstra que estes tenham diminuído significativamente. (Ver custo por apartamento)
A avaliação de políticas públicas tem que considerar as relações entre os atores, não
apenas nos níveis superiores, mas também nos níveis intermediários e locais. A análise
mostrou como o projeto vai sendo modificado ao longo da execução da obra, por
interesse das empreiteiras que acabam definindo o projeto final. Esse poder pode ser
explicado, em parte, pelas relações mais estreitas com os agentes públicos, em particular
com a burocracia do governo estadual responsável pela condução da obra. Em segundo
lugar, o modelo adotado para licitações com base em projeto básico e projeto executivo
desenvolvido pela construtora acaba dando a estas um poder ainda maior, principalmente
se considerando o grau de incerteza dos projetos de urbanização de assentamentos
precários. Se o contrato de licitação de obra estabelece que o contratado execute os
serviços estipulados pelo contratante durante a obra esses serviços são alterados por
interesses do contratado e não por interesse do Governo do Estado. Se os Projetistas
estão previamente subordinados em termos contratuais ao Governo do Estado para
realização do Projeto Básico, durante a obra estes são contratados diretamente pelo
consórcio e contratados apenas para “assistência técnica”. Em resumo, identificamos a
inversão da subordinação entre contratante e contratado, ou seja, a subordinação do
poder público ao poder privado.
"havia espaço para dizer, mas não havia espaço para fiscalizar. Nós não
estávamos na obra como uma assistência técnica de fiscalização. A gente
estava só como assistência técnica. A fiscalização era EMOP que contratou
a Concremat, gerenciadora, e fiscalização. (...) mas a gente não tinha poder
decisório, de corrigir, não eram adequações. Infelizmente. Nosso contrato,
não era esse…" Entrevista 1
Do ponto de vista mais geral, pode-se também avaliar que o PAC-UAP, ao sair do escopo
do FNHIS e dos princípios da PNH, também enfraqueceu significativamente a
participação popular, que poderia ter sido um elemento fundamental na garantia de
melhores condições de projeto e de maior controle sobre a ação das empreiteiras.
6. BIBLIOGRAFIA
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Participação Social no PAC Manguinhos - Rio de Janeiro Tese (Doutorado) –
Universidade Federal Fluminense, Instituto de Ciências Humanas e Filosofia,
Departamento de História 2012