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SOBRE FAZER O QUE NÃO SEI

Janete Vilela Fonseca1

RESUMO: Um vídeo experimental é o ponto de partida para se discutir sobre um


processo criativo em arte e a sua escrita concomitante. Pretende um olhar sobre algumas
dimensões paralelas ou entrelaçadas: a feitura artística, a autotransformação e a
comunicação dessas questões procurando encontrar sentido. Para isso, o vídeo é colocado
em relação a alguns trabalhos antigos, de modos de fazer variados, que se conectam
através de aspectos de sua existência e têm referências artísticas comuns. É uma escrita
inicial sobre algo que não existe plenamente, uma suposição sobre um movimento adiado.
As questões que desencadearam o processo de escrita a seguir foram: como escrever sobre
o que ainda não sei o que é? Como processar o inacabado, o incompleto?

Palavras-chave: Saber fazer. Incertezas. Vídeo. Escrita.

“Não restam dúvidas: arriscamos muito mais quando partimos da ignorância. O não-
saber nos conduz a uma investigação, afinal, não queremos viver em zonas de sombras”.
(Elida Tessler)

Listras de madeira, abauladas devido ao enquadramento de uma lente grande angular, se


movem muito lentamente para cima e retornam com o som de uma expiração. Seguindo
o mesmo ritmo, as listras iniciam um giro e retornam, repetindo o movimento, que vai
aumentando gradualmente em distância, amplitude e velocidade, do ponto inicial até
completar um grande círculo e iniciar o movimento no sentido contrário. Nesse sentido
oposto, vai acelerando mais rapidamente até se repetirem alguns círculos
desorganizados. Depois, vai desacelerando até parar numa respiração pesada. Por alguns
minutos, o ritmo e as listras abauladas poderiam sugerir o movimento de um barco
sobre a água.

1
Nasceu em Itaúna, MG, em 1981. Atualmente, cursa o mestrado em Artes Visuais da UFRGS, com uma
pesquisa que relaciona corpo em movimento e gravura, conectando a produção em Artes Visuais à Dança
Contemporânea e à Educação Somática. Participa do Grupo Experimental de Dança de Porto Alegre.
Graduou-se em Artes Visuais em Licenciatura (2013) e em Desenho (2015) na EBA-UFMG. Antes de
ingressar na EBA, cursou Design de Produtos na UEMG.
Figura 1 - Janete Fonseca, Relógio Pélvico. Porto Alegre, RS, 2015.
Frame de vídeo experimental. Duração: 6:58min. Acervo pessoal. Site: https://vimeo.com/146558217

Enquadro a mesa, prendo a câmera sobre o quadril com um elástico grosso e começo a
lembrar de uma parte da lição de Consciência pelo Movimento 2 , chamada Relógio
Pélvico. Do ponto de vista do teto, que está “olhando” de frente para mim, o “12” do
relógio imaginário estaria próximo do umbigo, e o “6”, em oposição, no baixo ventre; o
“3” e o “9” estariam nas extremidades laterais, perto das cristas ilíacas. Os movimentos
são lentos, e a cada três ou quatro inícios de giro faço uma pausa para descansar, pois é
importante evitar o esforço. A partir de certo ponto, mesmo tentando ir com calma, os
movimentos circulares se aceleram desorganizados. Nesse momento, já estou cansada e
quero acabar logo a tarefa de fazer o vídeo. No final, a lição se perdeu, deixando um
registro de imagem. Aliviada, respiro profundamente como no início.

Este texto começou a ser escrito apenas alguns dias depois da filmagem do vídeo
descrito acima. Esta é uma escrita sobre algo que não existe plenamente. É uma
suposição sobre um movimento ao mesmo tempo imaturo e adiado. Como escrever
sobre o que ainda não sei o que é? Como processar o inacabado, o incompleto? É
necessário algum distanciamento temporal ou físico do objeto?

Em um ponto inicial, não se sabe bem por onde olhar o trabalho, pois quem escreve
2
Consciência pelo Movimento é uma das vertentes do Método Feldenkrais de Educação Somática.
Baseia-se na ideia da autoeducação, propondo a transformação consciente da autoimagem em busca de
uma autonomia pessoal. Através de lições coletivas, trabalham-se movimentos cotidianos ou novos, que
se iniciam muito lentamente e sem esforço. O criador, Moshé Feldenkrais (Rússia, 1904-1984),
engenheiro mecânico e elétrico, doutor em física e mestre de judô, apropriou-se do conhecimento
profundo na engenharia, física, artes marciais, biomecânica, neurologia, cibernética, desenvolvimento
humano e psicologia para criar seu método.
ainda está muito próximo, talvez dentro dele ou vice-versa. Então, é preciso fazer a
partir do que não se sabe, do que é preciso compreender ou sentir, e isso requer uma
aproximação. Como o desejo da escrita, o que mais me move é o desejo por fazer o que
não sei ainda. Fazer vídeos é apenas um dos modos de trabalho que não domino.
Colocar-me em risco é um hábito um tanto perigoso, mas conhecer o novo, me arriscar
em propostas, ainda assim, é um prazer.

Nesse contexto, outras questões foram muito importantes para pensar no processo de
trabalho prático e teórico que se inicia: de onde vem o que tenho feito? O que veio antes?
Vem do que não sei fazer, do que não entendo bem, mas que desejo muito. Vem de outro
movimento que não sei qual é, mas que talvez descubra. Por que continuar se não faço
bem, se não tenho desenvoltura? Por que continuar fazendo o que faço pior? Por que
não paro? Será vaidade ou necessidade?

Neste momento, já cansada, faço uma primeira pausa na escrita e encontro uma citação
de William James, feita por Judith Nogueira, em Do movimento ao Verbo, que conversa
com os questionamentos anteriores:

A principal diferença entre o homem e os brutos está no excesso exuberante


de sua propensão subjetiva. Sua superioridade sobre eles repousa simples e
unicamente no número fantástico e desnecessário caráter de seus desejos
físicos, morais, estéticos e intelectuais. Se toda a sua vida não tivesse sido
uma busca de supérfluos, ele não se teria estabelecido de maneira tão
inexpungível no necessário. E da consciência disso deveria extrair a lição de
que deve confiar nos seus desejos, que mesmo quando a sua satisfação parece
remota, o mal-estar que ocasionam ainda é melhor guia da sua vida, e o
levará a questões totalmente além de sua atual capacidade de ver. Podem-se
as suas extravagâncias, moderem-se o homem, e ele estará desfeito. (JAMES,
apud NOGUEIRA, 2008, p.9).

Esse trecho da leitura me tranquiliza, e tento afastar aquela angústia que possivelmente
acomete outros artistas, e não só a mim, de trabalhar em algo em que não se vê uma
conexão objetiva com a vida prática, que não apresenta resultados ou ganhos facilmente
perceptíveis em primeira mão. Algo que, para ser experimentado, requer uma
predisposição do outro para se aproximar.

Com um clique para seguir a escrita, lembro-me da primeira sensação que tive ao
assistir o vídeo. Tateio, supondo que essa experimentação seja apenas a primeira parte
de algo que se inicia: um modo de criar por meio de partituras de movimentos ou ações
simples que se repetem e vão encontrar ritmos e significações que se definem no
decorrer do próprio trabalho. Esse modo de criar, no momento, está como um relógio
descompassado, que perdeu seu ritmo marcado e ganha velocidade. Como uma imagem
para indicar uma direção, em determinado momento, o ponteiro do relógio – ele tem
apenas um – se desgoverna, fazendo círculos completos, quase se soltando da base. O
movimento se descola da proposição inicial, que seria um trajeto inicialmente lento,
ritmado, entre pausas e crescentes suaves.

Não é uma imagem, mas é uma imagem, pois se tornou uma depois de ser desejado
como investigação de movimento. No entanto, o alinhamento da madeira e suas bordas,
um centro para alinhar com a câmera e marcar o centro do relógio imaginário são
cuidados anteriores à filmagem e que não devem ser esquecidos. O vídeo em si,
enquanto processo experimental, ainda é um embrião, o início de algo que não se sabe o
que vai se tornar ou o que vai ser. Foi elaborado com a intenção de experimentar através
da imagem de movimentos e de sensações, sem saber o que resultaria, no entanto,
depois que assisti a filmagem, vi algo que ainda não decifrei, mas que me sugere algo
em potencial. Como disse a Ofélia de Shakespeare em Hamlet (Cena V, ato IV):
“Senhor, nós sabemos o que somos, mas não o que seremos”.

Enquanto potência, podemos dizer que esse algo indefinido está entre duas
extremidades: a materialidade do visível de um lado, na parte captada pela filmagem, e,
do outro, uma parte do corpo que é foco desencadeador do movimento. O Relógio
Pélvico, assim como as outras lições de Consciência pelo Movimento, parte da
visualização interna da estrutura anatômica através do movimento. O que é visto na
filmagem está além do movimento, talvez uma sensação, pois não se vê uma pelve
aprendendo um movimento novo, mas um jogo de madeira se movendo dentro de um
enquadramento. Na tentativa de extrapolar os objetos de arte na sua condição de
imagem, pretende-se, talvez, reativar o que foi abandonado dos outros sentidos na
conquista ancestral da verticalidade.

Por trás da concepção das imagens, está a construção do sujeito artista, através da
compreensão de si enquanto complexo movente. Neste processo inicial de escrita sobre
a minha poética, eu me revejo e releio autores que podem contribuir para a construção
de um pensamento próprio legível e compreensível para mim e além de mim, como
Judith Nogueira (2008), que comenta que a comunicação também é um fenômeno
interno, entre informações orgânicas, neurais e memoriais. A inteligência dessa
comunicação é um aspecto considerado também por Feldenkrais, que defende, para o
indivíduo, o direito de se ouvir, de se falar, de se autoconectar.

A autoconexão pode se apresentar numa visão pela falta, na clareza pelo que não se tem
ou pelo não tido. A falta de algo toma atenção e proporções maiores na busca pelo que
alavanca o que não pode, supostamente, ser sozinho, pois há forças que o estruturam e
que estão ocultas, pois não são vistas. O abafamento ou apagamento dos sentidos supõe
que há outros iluminados. Fechar para abrir, esconder para ver, faltar para ter. A falta
pode ser motivo para o encontro. O desejo, inicialmente, é a sensação da ausência; o
querer é algo pelo que não se tem, ao menos, naquele momento. Então, o que resta é
fazer com o que se tem e aproveitar a oportunidade de experimentar outros movimentos
em uma nova condição: sozinha. Uma possibilidade há muito necessitada, desejada e
adiada. Fazer por si, fazer sozinha. Qual o sentido disso? Uma prática de movimento
solitária foi o que me aconselharam, muitas vezes, os profissionais da dança para chegar
ao início de uma movimentação poética própria. Nessa dança, o vídeo sobre o Relógio
Pélvico é mais um passo.

No entanto, enquanto processo de pesquisa, se não foi definida uma metodologia do


isolamento, existe um ponto frágil nesse processo. Um ponto que não está ali, uma falta,
uma falha. Se esse ponto não está, pode ele iluminar o que está à sua volta? Ao contrário,
esse todo iluminado tem, então, um ponto escurecido, um lugar que lhe pertence e que
não foi visto porque não teve luz, um lugar ao qual não foi dada a devida atenção ou
importância. Esse ponto foi esquecido, ficou submerso, escondido. Assinala referenciais
artísticos que podem ter sido encobertos.

Sempre há alguma associação visual que pode ser feita, mas não me sinto confortável
em referenciar meus trabalhos a partir da visualidade. Para mim, o que mais importa
quando faço essas ligações é encontrar as que sejam de caráter filosófico, de interesse
pelo assunto, mesmo que não seja consciente no momento em que foi criado o objeto de
arte. É algo que está na textura, nas sensações, como se vê nas videoinstalações de
Pipilotti Rist, nos objetos de caráter terapêutico de Lygia Clark ou no texto de Leila
Danziger, que fala do interesse pelo outro, pela beleza estranha que ele carrega:

Na intensidade da cor ela vê a possibilidade de tratar-se, curar-se, exibindo-se


como uma gravura – ou de fato um cromo – cuja matéria e suporte é sua pele
e seu corpo. Na verdade, esse encontro me levou, mais uma vez, a pensar no
desenho e na escrita, e me fez compreender que eu sempre desenhava como
se escalavrasse o papel, que sempre via o papel como a superfície da pele.
(DANZIGER, 2013).
Há visualidades que nos são dadas facilmente; outras não, nos deixam incomodados,
insatisfeitos. Dão pistas, mas não dizem a que vieram. Para decifrá-las, temos que
buscar o que está invisível ou, ao menos, escondido, o detalhe, através de um modo
investigativo de fazer arte.

Em outro momento, muito remoto, a iluminação do olhar pelo trabalho do outro


aconteceu por Ofélia, de Millais. O fascínio pela figura feminina inerte e morbidamente
linda da pintura ficou submerso, mas pode-se dizer que essa imagem boiou pelo meu
inconsciente e emergiu em Tanques e Pele na água, obras que valem ser lembradas aqui
por algumas características comuns: a produção demorada, a analogia da materialidade
com a água e a relação com finalização.

Figura 2 - John Everett Millais, Ofélia, 1852, tinta a óleo sobre tela. 76,2 x 111,8 cm. Fonte:
http://www.wga.hu/support/viewer/z.html. Acesso em: 10 set. 2016.

Em Tanques, produzido em 2010, pode-se dizer que a imagem da Ofélia ressurge. Mas
os corpos que boiam ou afundam são de outra matéria, assada até perder qualquer
vestígio de água, e, mais que isso, torrada em forno de altíssima temperatura e cujas
chamas tingiram as peças cerâmicas e as transformaram em pedras. Essas não derretem,
Ofélia derreteria? Até que ponto a imagem – imortal? – de uma mulher que boia sem
vida é diferente dos corpos de solidez extrema que estiveram nos tanques de vidro
cheios de água? Endurecidos pela cerâmica, preparados para nunca derreter, alguns
submergiram. Tanques dentro de tanques, a água entre eles. Em volta dos dois tanques
de vidro estão as portas arredondadas de um antigo forno.
Figura 3 - Janete Fonseca. Belo Horizonte, MG. 2010. Tanques. Instalação com vidro, cerâmica e água 50
x 50 cm. Exposição coletiva: Cerâmica: Uma Proposta Contemporânea, na Estação Ecológica da UFMG
– “Projeto Terra”, e no museu de História Natural e Jardim Botânico da UFMG, em 2010.

Depois de algum tempo, outra imagem se somou às anteriores peças afogadas. Desta
vez, o corpo que boia e submerge desaparece, desfaz-se em sua característica solúvel,
intrínseca à matéria. É um fragmento mostrado no vídeo Pele na água, de 2014, o qual
apresenta algumas ações até chegar ao desfecho final: deitar de bruços sobre a pedra,
desabotoar os botões de trás da blusa, receber na pele uma escrita com delineador labial
por uma mão masculina que, em seguida, espalha uma gosma branca, a arranca depois
de seca e a devolve para a dona da pele. Esse relevo seco que foi feito a partir de um
procedimento velho/novo, já bastante experimentado na vida desde a infância, e, agora,
transposto como um procedimento artístico: passar cola branca sobre a pele, esperar o
material secar completamente e arrancar a película. O fragmento de pele-cola foi
delicadamente colocado na água corrente do ribeirão, que o levou pelo escorrido da
pedra e o misturou com movimentos rápidos, fazendo-o desaparecer em meio à
correnteza-redemoinho num quase instantâneo desmanchar. Esse corpo que se desfaz
poderia ser uma Ofélia? Como esquecer algo tão frágil que se vai, que se foi, num ido
levado, desapegado, desprendido? O fim iluminou mais uma Ofélia, num acende-apaga
de estranha clareza.

Figura 4 - Daniela Eugênia, Janete Fonseca e Marconi Marques.


Ponta da Serra, MG. Pele na água, 2014. Vídeo. Duração 3:32 min. Acervo pessoal. Site:
https://vimeo.com/191388608
Entre os contatos – pele-pele, pele-cola, pele-pedra, pele-coisa, coisa-cola, haveria algo
de inframince3? No procedimento videográfico de Pele na água, havia questões sobre o
toque e a relação com o outro – como eu toco e como sou tocada. Agora, com o novo
vídeo sobre o Relógio Pélvico, olho mais diretamente para o meu movimento de novo, e
minha carne se agita, de tantos e tão desordenados que são os questionamentos e
incertezas trazidos por essa investigação que se inicia e se interrompe constantemente
em busca de um novo movimento. Exausta, paro outra vez. Essa volta brusca a um
assunto deixado para trás me deixou um pouco tonta.

Com exceção do trabalho Tanques, os outros aqui citados foram descritos tendo como
características físicas comuns: fragilidade, transparência e sobreposição. Desejar o
movimento, perscrutar a estrutura em suas possibilidades e carências, buscar uma falta,
desistir, deixar ir embora, dissolver. Depois disso, o que sobrevive? Há algo além da
memória do que se foi? Pode uma escrita em crise tornar-se uma escrita potente? Será
produtivo buscar o detalhe no trecho? Tomo emprestado aqui os conceitos de “detalhe”
e “trecho” que Didi-Huberman apresentou no apêndice de seu livro Devant l'image.
Para explicar esses conceitos, exemplificou o detalhe por operações do traço e por
objetos delicados como fios e agulhas; já o trecho, como uma mancha intrusa que salta
aos olhos. Segundo o autor, o detalhe tem a ver com aproximação, descrição, um ver
bem que significa saber. “[...] detalhar o visível, descrevê-lo e desdobrá-lo em detalhes,
fazer dele uma soma sem resto dos aspectos”. (DIDI-HUBERMAN, 2013, p.317). O
conceito de trecho é associado pelo autor a um acidente, uma crise, algo que gera
confusão na imagem, mas não um fracasso, pois tem sua importância na concepção da
imagem como um todo. Crise, sintoma: potência, jazida. Assim, inspirada pelo
raciocínio e pelos verbos utilizados por esse autor, refaço e desfaço caminhos. Um
desses movimentos pode-se delinear na seguinte suposição: se aplicarmos a ideia do
trecho a outros contextos e pensarmos inversamente, compreender a crise em seus
milímetros poderia transformá-la em uma potência. Seria procurar e encontrar a
delicadeza do detalhe na crise. Voltando a pensar no serviço da escrita, que acontece
neste momento, pode uma soma de delicadezas causar ou tornar-se uma crise? Se sim, é

3
Segundo Franca-Huchet, Inframince “seria o atributo ou adjetivo constituído por Marcel Duchamp para
proposições estéticas, jogos semânticos, jogos com a linguagem – ou o conjunto de sensações que
constituem suas 46 notas. [...] infra-mince seria ainda a sensação resultante da esfregação de um tecido de
veludo pelas pernas. [...] O jogo da tactilidade e da sensualidade aí se torna aparente com toda evidência.”
(L’infra-mince, zona de sombra e o tempo do entre-dois. Porto Arte, Porto Alegre, v.9, mai. 1998, p.20).
preciso buscar meios de sair dela para reintegrar.

De alguma maneira, o conceito de detalhe aproxima-se do conceito de soma,


fundamental para a compreensão de processos integrativos. Sem constituir em si uma
separação, mas para esclarecer do que se trata esta ideia, vale tanto para processos
físicos de busca por melhoria mecânica dos próprios movimentos, quanto para os
processos aparentemente puros do pensamento – como para entender um conjunto de
trabalhos e suas questões em relação. Saber é realmente perigoso: elementos vêm com
pensamento, e aparecem mais informações para lidar, escarafunchar, adentrar. Não se
sabe onde isso vai parar; sabe-se apenas que começa.

O Método Feldenkrais, que está na parte invisível do vídeo descrito no início deste texto,
é um dos vários modos de trabalhos somáticos que promove um intenso saber de si,
considerando o ser humano como um todo integrado. Como proposta de educação
somática, o trabalho, muitas vezes, é focado em uma parte que irá influenciar as outras e
a organização do todo, desde movimentos simples, como pisar, até grandes tomadas de
decisão, que podem gerar mudanças importantes na vida.

A prática e o estudo das referências se movem juntos. Entre as aulas de dança, a


construção de vídeos e trabalhos gráficos e as conversas com os autores, vou tecendo
uma escrita desorganizada pela qual torço para que no final se torne algo que valha a
pena ser lido e que não seja lido a duras penas. Algo que é feito para ser lido não pode
se dar ao luxo de ser incompreensível como um objeto de arte, mesmo que fique algo no
ar. Não se sabe a medida exata de aproximação ou distanciamento entre uma escrita de
interpretação e um objeto de arte, mas se aquela é muito distante do legível, as letras se
misturam, ficando impossível juntá-las.

É preciso encontrar alguma luz no meio da crise, uma organização elucidativa entre
tantas dúvidas. É como mover-se sobre o mangue, a passos pesados, engolidos pela
matéria pastosa embaixo e em volta do corpo. Ler para escrever. Confundir para
entender. Há leituras que me trazem verdadeiros déjà vu de situações descontraídas.
Descontração! Está aí uma boa palavra, que pode ser associada à moda Feldenkrais:
fazer sem contração, fazer relaxado, fazer até com preguiça.
Referências

DANZIGER, Leila. Diários Públicos: sobre memória e mídia. São Paulo: Contracapa, 2013.

DIDI-HUBERMAN, George. Devant l'image. Paris: Les Éditions de Minuit, 1990.

FELDENKRAIS, Moshe. Consciência pelo movimento. Tradução: Daisy A. C. Souza. São


Paulo: Summus, 1977.

FRANCA-HUCHET, Patricia. O lugar da imagem. In: NAZÁRIO, Luiz; FRANCA-HUCHET,


Patricia. Concepções contemporâneas da arte. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2006.

NOGUEIRA, Judith Cristina Gouveia. Do movimento ao verbo: desenvolvimento cognitivo e


ação corporal. São Paulo: Anablume, 2008.

PICHININE, Diana. Resenha: SHUSTERMAN, Richard. Consciência Corporal.


Tradução de Pedro Sette-Câmara. Rio de Janeiro: E Realizações, 2012. 352 pgs.
(original: Body Consciousness: A Philosophy of Mindfulness and Somaesthetics”.
Cambridge: Cambridge University Press, 2008. 256 pgs). In: Revista Redescrições –
Revista on-line do GT de Pragmatismo, ano 3, nº 4, p.75-86, 2012.

SKAKESPEARE, William. Hamlet. Tradução de Millôr Fernandes. Disponível em:


http://www2.uol.com.br/millor/. Acesso em: 25 jan. 2016.

SHUSTERMAN, Richard. Transformando a arte e a filosofia. In: ZIELINSKY, Mônica (org.).


Fronteiras: Arte, crítica e outros ensaios. Porto Alegre: Ed. UFRGS, 2003, p. 123-158.

TESSLER, Elida. Coloque o dedo na ferida aberta ou a pesquisa enquanto cicatriz. In: BRITES,
Blanca; TESSLER, Elida (orgs.) O Meio como Ponto zero: Metodologia da Pesquisa em Artes
Plásticas. Porto Alegre: Ed/UFRGS, 2002, p. 103-111

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