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Análise da Obra Sursum Corda: Uma Nênia, de Willy Corrêa de Oliveira


Luciano de Souza Leite Barbosa
Universidade de Barra Mansa - UBM
lucianoleitebarbosa@ibest.com.br
Palavras-Chave
Música brasileira, Willy Corrêa, Análise Musical

RESUMO II. O CONTEXTO DA OBRA


A composição Sursum Corda: Uma Nênia, para orquestra de cordas, A obra Sursum Corda: Uma Nênia deste compositor que é
do compositor Willy Corrêa de Oliveira resume algumas das natural de Pernambuco - radicado em São Paulo -, data do
principais tendências da vanguarda que se configuraram a partir dos final da década de setenta, mais precisamente de 1977. Sendo
anos sessenta, entre as quais podemos citar o uso de clusters assim, resume algumas das principais tendências da
diatônicos e cromáticos, justaposições de compassos e tonalidades, vanguarda que se configuraram a partir dos anos sessenta,
microtonalismo e micropolifonia, além de citações de Beethoven e como o uso de clusters e citações, entre diversos recursos. No
Mahler, procedimento que se destaca frente aos outros por ocupar caso desta peça, presenciamos além desses dois exemplos de
trechos estratégicos da composição, servindo também como fonte de
técnica composicional, a ocorrência de outros mecanismos
onde são extraídos os motivos que permeiam toda a peça. O objetivo
típicos da musica contemporânea, como justaposições de
deste trabalho foi, no entanto, identificar os procedimentos
compassos e tonalidades, microtonalismo e micropolifonia,
composicionais de Willy Corrêa a fim de uma melhor compreensão
de seu pensamento musical. Sendo assim, a análise de Sursum Corda
mesclados a alguns procedimentos da música tradicional,
chamou a atenção para uma grande variedade de técnicas de como imitação e pólos tonais. Porém, apesar da grande
composição empregadas, sendo a mistura dessas diferentes correntes diversidade de materiais encontrados nesta composição, é
de escrita o diferencial de sua construção. possível perceber uma obra absolutamente coerente, que
unifica diferentes idéias em uma personalidade original e
consciente, capaz de manter o foco o ouvinte pelo controle
I. INTRODUÇÃO das repetições e variações dos motivos e das texturas.
O nome Willy Corrêa de Oliveira (n. 1938) está fortemente Entretanto, esta é uma composição em que, dentre as
vinculado à vanguarda musical brasileira das décadas de diversas técnicas mencionadas acima, a citação é aquela
sessenta e setenta, sobretudo pela sua participação no grupo ocupa o lugar de maior destaque, visto que este procedimento
Música Nova, do qual, ao lado de Gilberto Mendes, foi está presente em momentos estratégicos, no início da peça e
também um dos fundadores. Sendo um compositor de postura em sua conclusão (de forma variada, neste caso). Além disso,
inovadora e experimental, Willy Corrêa fez contato com os das citações são também extraídos motivos que pontuam e
mais importantes compositores de seu tempo, através de permeiam toda a obra. Dentre as duas citações presentes na
cursos realizados no Conservatório de Paris e em Darmstadt, música, chama a atenção o trecho extraído da Sinfonia No3
na Europa, e de estudos com Camargo Guarnieri e Olivier “Eroica” de Beethoven, sobretudo pela relação de Willy
Toni, entre outros, no Brasil. A partir da década de setenta Corrêa de Oliveira com este compositor, que o motivou a
passou também a lecionar, atuando como professor da Escola escrever o livro Beethoven, Proprietário de um Cérebro
de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (Oliveira, 1979). É a partir deste tema que Willy Corrêa
(USP), formando novos compositores e pesquisadores de constrói o discurso de Sursum Corda, tendo como pano de
música contemporânea brasileira. fundo a tonalidade de Dó menor - tom principal da Sinfonia
Durante a década de oitenta, porém, sua produtividade “Eroica” -, que é o ambiente harmônico do canto fúnebre de
enveredou por outros caminhos, chegando a se distanciar de Willy.
sua atitude experimental. Neste período Willy Corrêa de
Oliveira esteve muito engajado em movimentos sociais,
afastando-se temporariamente das salas de concerto e da III. ANÁLISE
música erudita, dedicando-se a compor músicas de O título da composição Sursum Corda: Uma Nênia tem
circunstância para o Sindicato dos Metalúrgicos e para o significado de canção fúnebre, pois a expressão “Sursum
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST). Sua Corda”, do latim, significa “corações ao alto, ou elevemos
postura, no entanto, mudou a partir da queda do muro de nossos corações”, enquanto o termo Nênia significa “canto
Berlim (1989), e a partir desta data passou a compor “para si triste, plangente”, correspondendo também à deusa das
mesmo”, tendo aposentado do cargo de professor em 2003. lamentações entre os Romanos. Tendo em vista estes
Suas principais influências são, nas palavras do próprio significados, é possível compreender a obra como um
compositor, os “mestres” Beethoven, Haydn, Mozart, encontro de temas fúnebres, onde são confrontados temas de
Schumann, Schubert e principalmente Chopin. Entre os Beethoven, Mahler e Willy Corrêa, que misturam-se e
contemporâneos, Willy Corrêa destaca o nome de Pousseur. dissolvem-se na tonalidade de Dó menor, tom de peças
dramáticas como o Prelúdio No. 20 de Chopin, por exemplo.
O caráter da obra é, então, profundamente lento e
contemplativo, às vezes conturbado. Sobretudo pela enxurrada

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de semitons e microtons que se embaralham, criando texturas harmônicos, e é sobreposto a uma textura mais densa, de
densas. O resultante sonoro dessa vasta confluência de tessitura grave, carregada de glissandos, apresentada nas
semitons é, portanto, em muitos momentos, uma única massa violas, nos violoncelos e contrabaixos. Se na apresentação dos
sonora de onde se sobressaem notas pólo apenas, sendo que dois primeiros temas o choque era entre tonalidades, neste
esta é uma peça onde até os momentos de “repouso” são terceiro tema o compositor explora o choque de duas texturas
dotados de tensão, pois nas notas longas surgem os clusters bem contrastantes, como demonstrado a seguir.
mais volumosos.
A. Materiais e Texturas
Sursum Corda: Uma Nênia é iniciada com uma citação
literal do tema do segundo movimento da Sinfonia No3
“Eroica” de Beethoven, que poucos compassos após
encontra-se sobreposto a um outro tema de uma outra citação,
desta vez de Mahler, mais especificamente da Sinfonia No5. A
resultante deste encontro entre Mahler e Beethoven é um
choque de tonalidades e métricas, que remete talvez a uma
composição de Charles Ives, mas que neste caso fica
incorporada à escrita de Willy Corrêa, que por sua vez se
coloca em choque com essas duas obras monumentais: A
Sinfonia “Eroica” e a Sinfonia No5.

Figura 1: Trecho da partitura que mostra a sobreposição das


citações de Beethoven (nas cinco pautas inferiores) e de Mahler.
Figura 2: Terceiro tema da peça. Contraste entre os violinos e as
A exposição destes dois temas ocorre durante os dezoito cordas graves.
primeiros compassos da peça, e chega então, no compasso
dezenove, a um cluster diatônico, composto por todas as notas Logo em seguida as tessituras se invertem, ou seja, o tema
da escala de Dó menor (modo harmônico). Em seguida, os de Willy Correa é apresentado nas cordas graves (violas e
temas de Beethoven e Mahler repousam sobre uma tríade de violoncelos), enquanto os violinos executam a textura densa
Dó menor acrescida de uma oitava aumentada - que com glissandos. Essa configuração é conduzida a uma nova
representa a soma da tonalidade da Sinfonia No3 “Eroica” (Dó transição, que utiliza materiais rítmicos derivados da Sinfonia
menor) com a Sinfonia No5 de Mahler (Dó sustenido) -, “Eroica”, articulando materiais harmônicos semelhantes aos
expressa pelos violoncelos em harmônicos. Após a fermata da transição anterior: clusters diatônicos em Si (sem a terça) e
sobre este acorde, segue uma pequena transição onde em Dó menor (modo melódico), este último com uma segunda
aparecem três tipos de materiais: acordes por quartas nos menor acrescentada (Sol sustenido), que são transpostos até
contrabaixos e nos violinos; a mesma tríade de Dó menor com chegar a um cluster por semitons, no compasso 47, sobreposto
segunda menor acrescentada nas violas e violoncelos; e a pizzicatos microtonais que anunciam uma nova seção.
clusters diatônicos executados também por violinos, violas e O compasso 49, entretanto, inaugura um novo ambiente
violoncelos. textural, que contrasta com os climas até então apresentados.
Essa curta transição chega a um novo tema, desta vez A partir deste ponto, há uma considerável mudança no
original do próprio Willy Corrêa, que tem também um caráter parâmetro das durações, pois ocorre uma sobreposição de
melancólico, como os outros dois expostos até então, mas notas longas a figuras rítmicas mais frenéticas,
com o diferencial de conter um certo lirismo. O novo tema, predominantemente formada por fusas e semicolcheias. No
apresentado apenas nos violinos, está escrito quase todo em plano da harmonia, o foco está na microtonalidade, que

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somada a uma textura “micropolifônica” (à maneira de Ligeti)


resulta numa espécie de “cluster horizontal”, ou seja, em um
aglomerado sonoro formado por notas que se sucedem, neste
caso, em torno de uma nota pólo.

Figura 3: Compasso 49. Nova configuração de textura.


Figura 5: Micropolifonia.
Sendo assim, conforme a figura acima, temos a partir do
compasso 49 a nota Lá bemol no primeiro violino (solista), Uma nova seção mais adiante apresenta um cluster de 12
acompanhada por um pedal de Si natural, em harmônico, nos sons, executado por todos os instrumentos da orquestra de
contrabaixos. Aos poucos, o Lá bemol do violino sofre cordas. Sobre esse cluster surgem fragmentos motívicos do
pequenas alterações, como se variasse em torno de seu próprio grupo principal (fig. 4), executados pelos três primeiros
eixo, oscilando entre um microtom mais agudo e outro mais violinos e, ao final desta seção, pelas violas. Cabe ainda
grave, sendo que esta variação aos poucos vai aumentando até mencionar que neste trecho, que encerra a seção iniciada no
chegar a notas “vizinhas” ao Lá bemol, como Si bemol, Lá compasso 49, a nota Lá bemol volta a ser pólo, após um
natural, Sol sustenido (levando em conta a diferença momento anterior em que a nota Ré cumpria esta função,
microtonal entre Lá bemol e Sol sustenido), Sol, Si, e voltar sendo executada pelos dois primeiros violinos. A seção a
ao Lá bemol, que acaba configurando-se como pólo. É seguir, por sua vez, expõe uma textura em que o pólo de Lá
importante mencionar também, que a partir desse ponto não bemol se “expande” para alturas próximas como Fá sustenido
há mais fórmula de compasso, sendo a métrica definida a e Sol, enquanto ocorrências de figuras derivadas do grupo
princípio pela notação dos segundos, e um pouco mais adiante principal apresentam-se espalhadas pela seção. O diferencial
pela simples contagem das semicolcheias. deste trecho, porém, está no acompanhamento diatônico
No sistema seguinte surge então um grupo de notas realizado pelos violinos (5, 6 e 7), violas, violoncelos e
executado pelo primeiro violino, que é uma espécie de contrabaixos, apresentado sempre em colcheias, se opondo ao
“conseqüência” da textura imediatamente anterior, e que ritmo livre e sem métrica dos primeiros violinos.
servirá de motivo principal para o desenvolvimento desta
próxima seção.

Figura 4: Motivo principal.

Este grupo de notas e constituído por dezoito alturas -


amparado por um cluster “vertical” que contém todas as notas
de Dó menor - de onde será extraído um importante subgrupo,
formado pelos seguintes intervalos: 2m, trítono, 7m, 3m, 2m,
2M e 2m. Porém, antes que esse motivo seja utilizado, vemos
mais adiante o retorno da polarização em Lá bemol, com as
mesmas oscilações microtonais do compasso 49, ou seja,
Figura 6: acordes em colcheias.
alterações que rondam a nota Lá bemol, expandindo-se por
notas vizinhas. Vemos que no sistema seguinte é criada aos
A marcha fúnebre da Sinfonia No3 de Beethoven reaparece
poucos uma textura micropolifônica, onde os quatro primeiros
na seção seguinte, desta vez mesclada a procedimentos da
violinos executam figuras melódicas que oscilam em torno do
seção anterior, como oscilações cromáticas em torno de uma
pólo Lá bemol, que resulta numa massa sonora densa, no
nota pólo e micropolifonia. A textura deste trecho conduz a
registro agudo, onde os timbres se confundem, e se fundem
um Lá bemol em uníssono, que dá lugar a um Fá e um Dó, nas
num cluster “horizontal”.
cordas graves e nos violinos, respectivamente. Aos poucos,
figuras rítmicas derivadas da Sinfonia de Beethoven voltam a

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se impor, retomando idéias harmônicas do início da peça, de composição, mas que mantiveram vivo o diálogo com a
como clusters diatônicos, acordes por quartas, entre outras. tradição, como Arnold Schoenberg e Pierre Boulez. Ao
Então, a peça se encerra quando, em meio às texturas mesmo tempo, Willy foi durante a década de setenta um
micropolifônicas, surge um uníssono em Sol, que aos poucos compositor que viveu sua época intensamente, trazendo para a
é filtrado do emaranhado de notas cromáticas, e que conduz a música contemporânea brasileira importantes conquistas da
uma cadência tonal suspensiva, inserida no ambiente vanguarda européia. Foi capaz de absorver influências
harmônico de Dó menor. diversas, desde Ligeti e Penderecki até Henri Pousseur, sendo
que sua escrita aproxima-se também de Giacinto Scelsi,
compositor ainda desconhecido à época da concepção de
Sursum Corda.
Por fim, é necessário destacar que o fator mais importante
de Sursum Corda não está nas técnicas contemporâneas
utilizadas, mas sim na mistura delas. Em outras palavras,
podemos dizer que é mais importante a forma como o material
composicional é trabalhado, através das combinações diversas
de linguagens, do que seu conteúdo. Entretanto, apesar de
todas as referências, Willy Corrêa de Oliveira foi capaz de
assimilar suas influências de uma maneira muito pessoal,
sendo sua escrita facilmente reconhecível devido a sua forte
personalidade musical.

REFERÊNCIAS
BONIS, Maurício Funcia De. Um Levantamento dos Estudos sobre a
Citação Musical no Século XX. Artigo. ECA - USP. São Paulo,
2006.
BOULEZ, Pierre. Apontamentos de Aprendiz. São Paulo:
Perspectiva; tradução, Stella Moutinho, Caio Pagano, Lídia
Balzarian, 1995.
GRIFFITHS, Paul. A Música Moderna: Uma história concisa e
ilustrada de Debussy a Boulez. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed.,
1998.
OLIVEIRA, Willy Corrêa de. Sursum Corda: Uma Nênia. Cópia de
partitura manuscrita. São Paulo, 1977.
OLIVEIRA, Willy Corrêa de. Willy Corrêa de Oliveira: Canções
para Voz e Piano/ Willy Corrêa de Oliveira. São Paulo: Editora da
Universidade de São Paulo: Petrobrás, 2006.
ULBANERE, Alexandre. Willy Corrêa de Oliveira: Por um Ouvir
Materialista Histórico. Dissertação (mestrado). IA - UNESP. São
Paulo, 2005.
ULBANERE, Alexandre. O Pensamento Musica de W. C. de
Oliveira. Artigo. IA - UNESP. São Paulo, 2006.
Cultura Brasil. Expressões Latinas. Disponível em <
http://www.culturabrasil.pro.br/expressoeslatinasc.htm > Acesso
Figura 7: últimos compassos de Sursum Corda. Este trecho em 27/10/2008.
mostra a nota sol sendo “filtrada” aos poucos, conduzindo a Wikipedia. Willy Corrêa de Oliveira. Disponível em <
música para uma cadência suspensiva em Dó menor. http://pt.wikipedia.org/w/index.php?title=Willy_Corr%C3%AAa_
de_Oliveira&oldid=15078113 > Acessado em 07/06/2009.

IV. CONSIDERAÇÕES FINAIS


A Análise de Sursum Corda: Uma Nênia nos traz algumas
questões importantes sobre o pensamento musical de Willy
Corrêa de Oliveira e seu papel na música brasileira. O grande
diferencial dessa obra é possibilitar o encontro de diferentes
técnicas de composição e, além disso, proporcionar o
confronto entre a escrita musical contemporânea e a escrita
dos grandes mestres, que neste caso são Beethoven e Mahler.
Através do recurso da citação, vemos o quanto o compositor,
apesar de sua postura experimental e inovadora, relaciona-se
com o passado musical. Assim, podemos comparar Willy
Corrêa a outros compositores que pesquisaram novos recursos

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