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lcol-EcçÃo NoV.4LMEDrNA, ; tsilÀfl! ij
Volunrcs publicados: t
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1 A,valiação Coutínua e Exames Gilbett ile I-anikhee¡e .l
-
2-As Línguas Yivas-Denis Gí¡ørd- {
; :j
13 Iaiciação à Lingulstica Cfuistian Baylon e PauI Fabre
14
-
- Estilística, Poé¡ica e Semiótica Literâna Alicía Yller a !-â!!42.86
-
15-Teoria e Técnica Tettrzl-Fernando Wagnet-
16 Sociologia Jvíðica Carbonníet
-
l7-Argumentos -Jean
pala uma 3.¡ Vi¿-Otr¡ Süe
18 Teoria d¿ História Carlos M. Rama HILDEBERT ISNARD
19
- O Poder da Poesia- Grupo Francês de Educação Nova
20 - Intertextualidades -aPoáliquø n.o 27
2I - O que é apreader- Olíuer Reboul
2-- Qs Objecrivos em -Educação
- L.
Será Posível de6¡i-1os com precisão? Vandeveld I
P.
Vander EIst
e
-
23 História e Crícica Pí¿fie Sdhnon
-
24-O Pensamento de- Ma¡rin Heidegger-Jean-Paul Resweber
25 Observação e Formação de Professores Marcel Postk
26 - -
- 3.. ed.huoano
- Caios
de .{nálise Textu¿l Reis
27
-Têcntcæ ¡as_Escolæ; um processo para e lenoveção-John L. Hayman Jr.
-AualizçVo
e Rodney N, Naprer
28-Manuai de Avaliação EscoTar-Pe&o IVIoralæ Vallejo
29 O universo do Teatro G. Girard, k Oallet e C, Rígault
30
- O Espaço Geográûco - Híldebert Isnaril
31 - As Contra literarur¿s - Bemørd Mouralis
-
32-Educação -
e Desenvolvimento Social da Criaaça- Chrktiane Vandenplas-Holper
Iutrodução à Semiótica Nar¡¿tiva do Discurso
- J.
33 Court&
34 - Linguística Esm:tu¡al- seu alcance e seus limires Comeílle
-
35-Educação-Dos -Jean-Píerre
Fins aos Objectivos- Louís il'Haìnaut
Linguageo e Xstilo de Eça Guma da Cal
36
-
37-Didáctica do ¡eatro
- Ernesto
Olìueba Barata
-José
38
39
- À A¡te de cortar ern Júiio Dinis
Manual Prático de Arqueologia
M. Luísa Araújo Marchon
-I-ouís Frédéríc
40
- O Poema e as Máscaras Cørlos - Filipe Moisés
41 -
-
Permaoente e Foroação dos Professo¡es Símõæ
A -Educação
O Discu¡so da Poesie aPoétìquer n.o 28 -Antónío
- -
Maoual d9 Mgdições e r{valiação do_Rendimeuto Escolat 184
- perei¡aA, Gorín¿
43 Paul
44 - Fim-de-Século ao Tempo de OrGu Ca¡los Seabra
-Do
45-Esm¡tu¡as Léxicas do Pottuguês- Márío Vilela-José
46-Estatuto e Perspectivas do Nar¡ador na Ficção de Eça de eueiroz-Catlo
47 Camões Filgueíra VøIuerde
48 - José
- Programas Nacion¿is A. Wilkíns
49
- Semântica e Shtaxe do-D.Português Míchael Metzehln e Marcolítto Candeias '.."
-
50-Estudos de Psicologia-José Fmeíra - da Sílya c0lMsit L¡vnenr¡ Ar.¡¡sDrN¡
51 As Vozes do Romance Oscar Tdcca 't982
- - COIMBRA 1982
-
HILDEBSRT ISNARD
Professor HonorárÍo ¡a tloiversidade de Nicc
o ESPAçO GEOGRÁFICO
alq')
5bh
w
LTYRARIA ALMEDINA
COTMBRA
-1982
Tíulo orígínal
(L,ESPACE GÉOGRAPHIQUED
PRÓLOGO
Surgem na <Bel\e Epoque, geográfica dos anos 50-60, análíses tatíuos que dferencíam um Hotnern de outro Homern que reage peßona-
6 7
conjuntatnente corn a análíse locatiua, da qual se obten a' um f.o' condutor explicatíuo das recentes'tensões que \euam muítas
?eso Í)ara -
a percepção do <espace uácu> seruiretn de base pard uma explí- rezes ao desencadear de guenas. Tudo ßto 'se toma transparmte
-
cação que seila <utopicamentø global, dinâmíca, tnas 'a possíuel quando da leítura que atraí e enuohte o seu leítor face a um rítmo
dentro das límítações humanas? Todas estas reflexões poder-nos-íam e ínterlìgação de temas sujeítos a uffia l6gìca de fortna sinplista
Ieuar longe de møis, até mesmo ao extremo (e lá uoltamos a cair.nos mas tenìvelmente eficaz, fazenda-nos sentir a necessidade de apressar
antípodismos), de colocar em discussão os problemas epístemológicos das a sua conclusão tal como ai:ontece com.uffi rornance do qual fcamos
Cìêncías Humanas. Já é tena uelho nas sempre rctomado, ltara desejosos de conhecer o fim sem querer Tterder o enredo. Sendo assím,
recapítuløção, repetìção ou simples gozo de díalécticd íntelectualí- uma segunda apreciação mais calma e atenta, rîtenos emotíua, e
zante. i,tecessaríàinente rna.ís conscíente e crítíca, se exige.
Duas palauras sobre o presente trabalho, em jeito de apresentação A actualidade e a conexão de factos hístírícos longínquos
ao leítor desprevenído ou ao potencíal comprador que, além da \eítura e rccentes surgeffi na explícação fácí\, mostrando uma grande sagaci-
aytressada do sumárío e possíuelnente da conclusão; dedkaúumarápída dade ao reter somente os factos essenciaís e uerdadeiramente expli-
passdgeffi de olhos a estas notds Í)reaffibulares. cativos.
R:essalta ao longo da leítura desta obra a experiêncìa, o estudo E se é possfuel uer nesta obra uma íntenção de uulgarização com.
e a ref.exão sobre tenas cuja ptofundidade se rinplía quando se referc todos.,os condinentos capazes de criar urna aceitação do grande público
a casos afrícanos: É, neste âmbîto que o autor se sente pufeítamente face aituaís que são focadost para os geógraþs ela defne
aos tèmas
à vontade, resultante do acumular de líuros publícados e nilffia bíblío- urna tentatívd de grande força ltara retoffiar a personalização da
grarta actualízada e de íncídêncía rcgíonal ltrofunda:, aytarecendo'nos Geografia, tão perdída tem dndado no irnenso mar das nouas Cíências
cotno uftta súmula e slntese de grande íntuesse pedagógíco. Hutnaflas, jouens é certo, lnas por isso mesmo' mais resístentes e aguer'
A uìuêncía dímana das folhas de exposíção densa, perrnítíndo ridas do que a uetusta e comytlexa Geografa. Na sua conclusão
hå .como què uma consciêncía da necessidade de reduzír o seu âmbíto,
enquadrar de formø perfeíta, por um lado, a concepção do es¡taço natural
considerado cotno um ecossísteffia que se aîarga coftt a Í,resençd þar.a uns tão alaryado,que englobaüa temas que a transcedern,ènquanto
do Honem para uffi conceìto mais uasto de geossíitema; e pot outro para outros sería tão límítado que tendeiø para utfl lmplq extet'
a exltansão do capítalísmo atraués duma planetarização que'ítrotnpe ruíní0. Para quê envolver aquilo que nos é altresentado de maneira
de <rboîsadas> que tendem a ¡tenetrar lentamente, rnts'cottt deter- tão euìdente. Qual é o objecto da geografa? O espaço geográ-
mínação e eficácia nos equílífuados geossísteftras, conesÍ)ondendo àquìlo -frto. Corno se defne? Pelas relações desse espaço cotn a socíedade.
que Sømír Anín denomína Cdpítalisno Peúféríco e que cría uma Taluez este empírismo choque d intelectuahte de u,rna classe que
depentlêncía sócío-económica e ideológíca dos países menos' desenuoluì- procura no retorcído o uígor da sua retóríca díaléctíca. A nossa
dos yterante os ytaíses detentores do poder económíco e milítar a níuel gterspectiu.a é bern maís hurnilde ao Í)rocurar atíngír o rcal, da
mundíal. Nesta anáIise surge-nos uma ytosição de granãe euídêncìa; e que rnesrna forma que o operárío contribuí para a construção le unt
nos parece francarnente posítiua e correcta face ao euoluír da Hístória belo e magestoso edifício mas de grande complexidatle que no seu
altressada e ñca de factos que se suceáem. enr. catadulta, tnas'sujeitos conjunto se assemelha à inagem da Geografa.
I 9
Parece-nos que tendo ltresente estas premíssas, todo o resto uem
corno acréscìmo para ualorízø estes conceitos fluffia'díuersidade que
só tem em uísta a altresentação de uma certa maneíra de estar no
pdnorama controuerso eln que uíue a actual Geografia (t).
INTRODUçÃO
Coimbra, Outubro de 1980.
À pnocuR¡ DE UMA ESPISTEMoLocIA
João Victor G. da Silva Pereira DA GEOGRAFIA
10 7I
à reflexão teórica que reveste a maior parte das vezes o aspecto É legítirno pensar que a Geografia saberá, rodeando-se de
de indolência e de preocupação em evitar toda a polémica precauções epistemológicas, incorporar o novo modo de pensar
teórtca, a carência epistemológica de que {azem prova os nascido da convergência de múltiplos contributos concePtuais.
geógrafou. Outros afirmarão que (a sua epistemologia é O que sempre faltou aos geógrafos, é o que se poderia
ridícula>. chamar, pretensiosamente talvez', um paradigma ou mais sim-
A verdade é que entre gêégrafos de boas <maneirau se plesmente um axioma, ùma hipótese de trabalho susceptível
proibiram as discussões que correm o risco de pôr em cause o de realizar um largo consenso entre eles. Ou antes, encararem
dogma da sacrossanta unidade da Geografia livre, más logo que sucessivamente várias hipóteses sem se dedicarem inteiramente a
se trate da repartição de verbas de investigação é vê-los a nenhuma: determinisr,n'o, possibilismo [4].'. André Mey'nier
dividirem-se em dois grupos hostis: os ufísicos, de um lado, os expôs excelentemente a história do pensamento geográûco
<humanistau do outro. em -França (1). :'
Désacreditada a Geografia, alguns irão ao ponto de declarar (Na auiência de um paradigma [5], escreve Thomas S.
que deverá desaparecer para dar lugar a uma disciplina a criari Kuln (2), ou de uma teoria que aspira a este título, todos
a ciência do espaço. Como, pois, admirar-se que seja excluída os factos que poderiam desempenhar um papel no desenvolvi-
das ciências do homem (1) por aqueles que fazem questão mento de uma dada ciência cortrem o risco de aparecerem igual-
em estabelecer a sua epistemologia? [2]. mente importantes..: Esta maneira de acumular os dados... tem
Ora, o conlecimento científi.co do espaço passou a ter como resultado o caos. Num certo senddo, hesita-se em qualificar
uma grande importância estratégica; mais do que nunca, com esta literatura de científi.ca¡r.
efeito, o espaço é o campo das diferenciações, das contradições, Anatol Rapoport (3) insiste também na necessidade de um
das tensões, das competições, um <jogo> entre os grandes sistemas paradigma. Se é verdade, escreve ele, que <o conhecimento
económicos e po1íticos que disputam entre si o domínio da ã. o*" verdade cientíûca reside essencialmenre na sua capacidade
Terra. de prever os acontecimentos do mundo real>, <a capacidade de
'
Hoje, várias disciplinas dedicam-se a áiralisar as caracterís- explicação de uma teoria pode, do mesmo modo ser 'perfeita-
ticas segundo o seu próprio ponto de vista, interessando-se pelo *ãot. independente da sua força predictiva> se for ca7øz de ofere-
espaço ecoiógico,
- pèlo espaço económico, - pelo espaço
social e espaço mental. Numa tal compartinientação polis-
cer à inteligência Pontos de apoio Para ínvestigação.
^
sémica [3], noção de espaço global, a única realidade da (1) Puf., Col. cSupr, 1969.
"
ciência, afunda-se doravante nurira extre'ma confusão. Não :. O La,*uaure Flammarion, !972, pp'31',44
des r&tolutions scientífques,
'na e 45. Àcrescente-se esta observação de A. ?eyrefitte: cQuando uma hipótese
se poderí imaginar, int.ersecção das diferentes investigações,
e a võSsa experiência vos forneiem conjuniamente uma chave para ler a
uma geografia c^paz de abarcar esta totalidade complexa? iealidade, todì o facto ajuda a explicar essa realidaden, Le mal françaìs,Plon,
p. 227.
7977,'(â)
La théoríe moderne des systènes, tRevlstc franccsa de Socìología4
(t ]ean Precm,' Epßtêmologie des sciences de l'honrne, Gallimard, 1970. nrlm. especial, 797A-797'l', pp. 26 à 28. '
t2 73
r
E por ter recorrido.à única virtude das matemáticas para a as originaram; uma comPiexidade animada Por uma lógica
elevar ao nível das ciências que a <Nova Geografiar iludiu as interna que permite atingir a razão de ser, funcionarnento,
esperanças nela depositadas, ao esquecer que um paradigma é a de resistir à desorganaação e de se reproduzir.
fase preliminar necessária à descoberta das leis quantitativas. Ista <Nova Grelhu (1) alicerçou-se nas recentes aquisi-
das noções
ções da biologia molecular que se esclareceram custa
Se toda a ciência tem necessidade de uma hipótese heurís- à
tica [6], uma ideologia pode constituir esta base axiomática. de informática, de regulações cibernéticas 17] e de sistema.
Tal é, objectivamente, o caso do freudismo e do marxismo por Generalizadora e policonceptual, constimi hoje a melhor abor-
exemplo. O pensamento marxista inspira a economia, a história, dagem cientíû.ca das entidades vivas. Há quem visse nela a razão
a sociologia, mas não existe uma geografia marxista propriamente de uma terceira cultura (2), a das ciêncisa sociais após as ciências
dita em França (1).' exactas e as humaiúdades, mesmo uma única ciência do homem
Contudo, é evidente que uma análise objectiva faz rez,Içar ultrapassando a compartimentação das ciências humanas.
o domínio das relações de produção na otgaruzaçio do espaço Em que medida serão essas concepções aplicáveis à Geo-
nos países subdesenvoividos; a introdução da moeda já adulterou grafia?
suûcientemente o sistema de valores para desencadear a valo- A investigação de leis formais idênticas entre fenómenos
rizaçio da economia, considera-se que em muitas regiões a econo- distintos não é contestável. Contudo as generalizações devem
mia ainda se integra numa racionalidade superior, a da vida social ser evitadas pois levariam ,primeiramente a um reducionismo
determinada pelas relações de parenresco. É o que esclarece simplista e revelar-se-ia como <uma epistemologia obsecional,r
os trabalhos de Maurice Godelier (r). (F. Meyer). Aquele que se contenta com similitudes para for-
Apesar de uma indiscutível capacidade explicativa, a análise mular uma construção teórica labora em erro, pois a analogia
marxista mostra pouca eficâcia quando se trata de justificar a não é identidade e, conhecem-se os abusos do pensamento
estrutura profunda das entidades espaciais, ordenar as partes analógico. R. Garaudy acusa as falsas ciências de :ut-llzar a
constitutivas num todo funcional. É por isso que, sem renun- analogia e métodos seguidos noutras ciências (3).
ciar a elas, a Geograûa deverá iniciar-se nas teorias relativas Todavia, pode-se admitir como hipótese de partida, com
à organização dos conjuntos vivos complexos. Ch. Roig (o), uqo. as correspondências que se encontram entre
Desde Darwin, as ciências edificam-se a partir da noção as diferentes disciplinas constituem mais do que simples simili-
de evolução. Doravante, é o conceito de organização que cons- tudes ou analogias e são reveladoras de isomorfismo e identi-
titui, cada vez mais, o seu paradigma comum.
,\trás das unidades que devem estudar, existe, parece-nos,
f) Tîtu1o do livro de Henri LltoRtt, Robert Laffont, 7974.
uma realidade profunda feita de reiações interdependentes que e) ,t expressão é de E. L¡ Rov-Lepvxre,, Annales. E.S.C., n.o 3,
Maio-Junho, 7974, p. 692.
e) Roger G*Âuoy, Parole d'homme, Robert Laffont, 7975, p.67.
(1). Ver a.este respeito: Hérodote, n.o 1, pp. 26 e seguintes. (-) A teoria geral dos sistemas e as suas perspectivas de dæenvolvimento
(') Rctionalíté et h¡ationøIítê m économíe, 2 t., Maspero, 7971, nas ciências sociais, Reuue française de Sociologie, 7970-7971, p. 43.
74 15
dades estruturais fundamentais>. Aliás, não começa uma ciência
por urn balbucia¡ metafiírico? <Todo o progresso cientíûco
verdadeiro vem enrão da analogia, (J. Air"hl
Eis-nos no caminlo da confumação do nosso objeæivo de
tentar construir a Geograûa no paradigma que hoje, as ciências
sociais adoptaram. Mas tudo.isso tem de se ter em conta respei- PRTMEIR¿q. PÂRTE
tando as recomendações ditadas pela prudência.
o Espaço GEoGRÁ,rrco coMO pRoDUTo socrAl,
t6 77
o
CAPÍTUIO PzuMEIRO
19
<O Território e a sua periferia, escreve este autor, satis- tório é inato na maior parte das espécies e serve de base
fazem por um lado a necessidade de segurança do animal e, ao seu comportamento> (1), um comportamento com tal agressi-
por outro, a sua necessidade de estimulação. Acrescento, {ue vidade que confirmaria a sua origem fundamental. É tod"via
o território satisfaz, além disso, a necessidade de identidade, o que vários etólogos contestam: sem negar a territorialidade
comum à maior parte dos animais que tendem naturalmente a dos animais, pensam que ela resulta, provavelmente, da infor-
identificar-se com uma parcela de terreno maior e sobretudo mação recebida do exteiior e da aprendizagem. Mas contes-
mais durável que eles próprios e que seja sua propriedade taçse-i sobretudo a sua extensão ao Homem como resultado
exclusivo (1). É no seu território que o animal tem o seu de um impulso inato que faria do apego à propriedade uma
refúgio, a sua subsistência, a sua ninhada e as reservas que the exigência biológica (2).
asseguram uma certa autonomia face às eventuaiidades do meio. Conclui-se do atrás exposto que um meio natural deûne-se
Recebe com isso um acréscimo de vitalidade: <.Parece, acres- pela correspondência necessariamente estabelecida entre as suas
centa ¡trd¡ey, que um misterioso in-fluxo de energia the seja características físicas e as espécies vivas que nele fixaram os
comunicado sobre o seu próprio feudor. De facto, sente:se seus territórios.
mais forte quando combate no seu próprio território contra um Este espaço natural apresenta-se como uma realidade objec-
âgressor em posição de inGrioridade. Tanto mais que a terri- tiva que não deve nada ao homem, que existe sem ele, fora
torialidade facthta a organrzação e o funcionamento das comuni- dele e que se desarticula logo que ele intervem. É por esta razão
dades em numerosas espécies ligadas a uma forma de vida que hoje quase desapareceu como realidade viva e que se tenta
colectiva, a uma sociabilidade mais frequente do que se crê protegê-lo e reconstituí-lo.
habitualmente nos animais. Edward T. Hall (2) confuma que O problema que temos de abordar, sem esperar a sua reso-
ela (a energia) assegura a propagação da espécie, permitindo a lução, é descobrir quais os mecanismos por que os espaços
regulação das densidades, oferece terreno de aprendizagem e ð.e naturais se organizam, se mantêm por acções casuais, partici-
relações, permitindo a coesão do grupo que coordena as diversas pando na evolução geral que orienta a terra desde a sua criação.
actividades, especialmente as que se propõem ao ordenamento Um espaço natural aparece-nos como uma totalidade resui-
do espaço. Bastará aqui lembrar o exemplo das famílias de tante das relações de interdependência entre os seus elementos
castores que consfroem nos rios, barragens de troncos de árvores constitutivos: as características físicas oabíótopo [11] e a comu-
à custa de largos esp¿ços da fi.oresta dos arredores. Assim, nidade de seres vivos ou biocenose 1121. Os exemplos precisa-
nenhuma espécie pode viver sem um esPaço que não seja sua rão o conteúdo desta evoiução.
criação exclusiva. A partir da matéria inerte tuada. do solo e da energia
Assim, R. Ardrey crê-se autorizado a declarar: <hoje, os proveniente ða" I:uz do sol, os vegetais produzenr. matéria viva
biologistas admitem, sem contestação, que o conceito de terri-
20 27
da qual se alimentam os animais herbívoros. Estes são alimento da estreita interdependência entre a vida e o seu habitat que não
dos animais carnívoros, enquanto as bactérias e fungos decom- se compreenderiam um sem o outro?
põem a maténa orgânica e restituem os sais minerais ao solo. Quando se recusâ - por preocupação de objectividade
O solo forma-se a partir da desagregação da rocha mãe sob uma conclusão fundamentada numa rLatlJrez^projectiva por trans-
a acçdo das variações da temperatura e das águas correntes. Os cendência, tem de se admitir que o espaço se produz e se reproduz
detritos são colonizados por microorganismos e vegetais pio- por ele próprio como que para escapil à desorganização de
neiros, líquenes e musgos PreParam o terreno Para as plantas uma entroytíalLsl crescente. Tudo se processa como se uma
herbáceas às quais sucederão os arbustos e finalmente as árvores. lógica interna das coisas interviesse na realização de uma coe-
Simultaneamente, a circulação das águas de infiltração pro- rência estrutural,. sem a qual a vida não se manteria na
cede à distribuição dos elementos minerais em horizontes Terra, uma lógica funcional que the seriainerente. Os seres vivos
diferentes. são efectivamente dotados da propriedade de se desenvolverem
No termo desta longa pedogénese, o solo está formado. e de se perpetuarem graças às relações dinâmicas que estabele-
Os mantos ðe lava, que emite periodicamente, o Vulcão cem com o seu meio. E o conjunto destas relações de interde-
de Fournaise na llha de Reunião, Prestam-se à observação pendência no seio dos elementos que a compõem, eue nasce
precisa desses mecanismos, onde os fenómenos físicos, químicos a auto-orgardzação e se mantêm os equilíbrios da unidade global (1)
e biológicos combinam a sua acçio para atingir, em alguns organtzada para sobreviver, a Vida manifesta uma actividade
decénios, a formação de um esPaço natural arborizado com as <orientada, coerente e construtivÐt (|). Como atingir este objec-
suas associações de vegetais e suas comunidades num território tivo, este propósito (3), arrisquemos a palawa, a finalidade
estabili"ado. Nos Hauts desta mesma Ilha de Reunião, a floresta que ela desenvolve. A vida está dotadt para desencadear os
tropical de altitude, onde domina o tamarindo (mimosa hete- mecanismos visando a sua integração no meio: a biologia
rófila), cobre um solo específico formado, por cima da lava e de molecular revela que um sistema de coclificação permite à céiula
um leito castanho avermelhado comum a toda a ilha, de um receber os estímulos do exterior e responder-lhe por reacções
horizonte de solo cinzento de 20 a 30 cm de espessura cons- apropriadas. Estas respostas por sinais ou melhor, por infor-
tituído por uma poeira de sílica, a" <<lltascareígnítø> [13], de mações, determinam o comportamento dos seres vivos que não
indiscutível origem vegetal, enquanto que à superfície a decom- dependem poftanto de um misterioso instinto.
posição dos vegetais originou uma camada cle húmus, a Graças à sua programação para a sobrevivência, estes seres
<uounø>174]. vivos podem resistir por si à entropia e reparar a desorga-
Édesta dinâmica de relações entre componentes inani-
mados e componentes vivos que emerge a realidade globai (1) Ver Edgar Moilw, Le paradigtne perdu: la nature lunøþte, Seuil,
queéoespaçonatural. 7973, cap. 2: nLd úuolutíon biologíEter.
Frequentemente, uma questão se põe e que não se pode e) J. Morvoo, Le hasa¡d et ld necessítê, Seuil, 1970, p. 59.
C) A palavra é de J. Sltx Métaphores biologiques, Calmann-Lévy
evitar: como explicar a existência desta realidade global nascida 7975, p. 86.
22 23
nização introduzidâ por um certo acontecimento: depois de um girafas nas pradarias-. Toda esta alteração é testemunlada por
incêndio acidental ou provocado, a floresta tropical tende a depósitos fósseis; descendentes degenerados de uma fauna tesi-
reconstituir-se pouco a pouco segundo uma sequência biologi- dual, numerosas gravuras rupestres que atestam que o homem
camente controlada. vivia então da recolecção, da caça e até ji mesmo da agri-
É do conjunto das respostas da comunidade viva aos sinais cultura.
que the chegam do meio que resulta o arranjo do espaço natural. Após esta fase, novas oscilações climáticas repõem a secura
No termo desta evolução, o espaço natural surge como e a reorgantzação do Sará em deserto, tal como é hoje.
uma entidade capaz c1e manter por muito tempo a sua identidade A ordem reina nos esPaços naturais, uma ordem estabe-
através de contínuas mudanças; os botânicos chamam climax 176l leqida num alto grau de interligações sem a qual seria o caos do
a este estado de equilíbrio que trrdaza harmonização ãa'vegeta- acaso. Pertence Portanto à ciência cujo objecto é precisamente
ção com o conjunto das outras condições do meio; sem a inter- a descoberta dessas adaptações rígidas.
venção destruidora do homem, a lloresta manter-se-ia assim, No entanto, ordem não significa determinismo absoluto
igual a si própria, durante séculos. na medida em que o fenómeno semíótico [18] é a propriedade
Talvez fosse mais exacto falar em estabilidade dinâmica fundamental (1) pela qual a Vida é ca;Paz de responder' aPre-
rcalizada graças à conjunção de reacções reguladoras que resta- sentando uma certa autonomia face a certas condições físicas.
belecem o equilíbrio quando ele está ameaçado. O esquilo resiste aos rigores do inverno multiplicando no
Os etólogos multiplicaram as observações sobre os controlos seus território esconderijos onde acumula provisões: estas feser-
mútuos que os diGrentes organismos vivos exercem: depreda- vas, tal como os celeiros, são respostas contra-aleatórias que
dores e presas estão condenados, num dado meio vegetal, sob testemunham uma certa liberdade. Ora, o a;Ím zeîar de reservas
pena de extinção, a manter entre si a proporção que permite é uma característica comum aos seres vivou (2).
a sobrevivência de uns e de outros. As páginas precedentes ProPuseram-se estabelecer as carec-
Desde então o espaço natural caractertz*se por uma homeos- terísticas do espaço natural. Resumamo-las:
tasìall7l pouco susceptível de fortes oscilações. No entanto, Um espaço natural é uma realidade objectiva à qual um
estabfidade não significa imobilidade. O equilíbrio de um esPaço conjunto de relações, de interdependência entre os comPonentes
pode ser aiterado sob o impacto de determinações impostas do físicos e vivos confere uma auto-orgarnzaçã"o mantida estável
exterior, estabelecendo-se então numa nova ordem fundamen- por leis retroacrivas. É vida que permite atingir este objectivo
"
tada noutras regras. Desértico durante a maior parte dos temPos graças à sua capacidade específica de dar resPosta às excitações
geológicos, o Sará humidificou-se ao longo de pulsações cli-
ñ emanadas do meio.
1J{.
máticas que marcam o fim do quarternino, e este aumento da t/)
pluviosidade desencadeia a erosão normal, o desabrochar de (t) Thomas .t. Smrox, Como um sinal se tome uma representação,
moluscos nos char-
L' lJníté de I'homrne, <Centre Royaumon't pour utle science de I'honnro, Sea71,
vegetação, a diversificação ãa vida animal l") p.
- 7974, 66.
(\ P. VsNonyìis, Verc Ia theoríe de l'homme, PUF, 1973, p.
cos, crocodilos nos ouedes, elefantes, hipopótamos, rinocerontes e
v 723.
25
24
Habitat de uma comunidade de vegetais e animais, orga- Serge Moscovici (t) mais longe: <O meio inicial norma-
ruzado numa globalidade, o espaço natural ássim definido cons-
""i não ê... e rratlJteza só tem
a toda a compreensão:
hzado escape
titui um ecossistema 1191. sentido e forma pela relação com aquilo que fazemos... só resta
Várias disciplinas partilham entre si o estudo do espaço qualificá-lo, retomando os termos empregados Por Sigmund
natural. Freud, a abstracção vega desprovida de interesse prático>; e acres-
Tomam por objecto das suas investigações um dos seus ele- centa (2): <É impossíve1 situar um estado normativo da natureza
mentos constitutivos. Tais são a geologia, a morfologia, a peclo- no alvor da humanidade... Só podemos consideraf os estados
iogia, a climatologia, a botânica, a etologia... sucessivos da natureza cujas transformações são concomitantes
Apresentam-se como ciências intermediárias da ciência básica com as nossas relações com os elementos que os comPõem>'
que é a ecologia. A geografia não contradirá S. Moscovici, antes reforça a sua
Da atitude científica própria desta, não podemos fazer posiçao-. De facto, m*mo os mares e os oceanos sofreram
meihor senão áar a
definição que propõe Edgar Morin (1): ãs efeitos da acção humana: a flora, a fauna, as águas do
(A ecoiogia [20], fazendo da noção de ecossisrema o seu Mediterrâneo têm sido irremediavelmente degradadas pela polui-
paradigma, revela imediatamente que os Gnómenos naturais ção que aí despejam em abundância os rios, a
cintura industriai
aparecem desordenados e descontrolados (lei da selv4 ou que os das cidades e das fábricas localizadas nas suas costas e em Poucos
seus processos unicamente eliminatórios (selecção natural) devem anos, será um mar morto.
ser considerados como simples aspectos, até em casos extre-
mos, de uma auto-organização espontânea num sistema que se
Permanecem, nro entanto, vastas extensões de desertos, de
constitui entre todos os seres vivos no interior de um mesmo
montanhas, de regiões árcticas, de florestas boreais ou tropicais
nicho ecológico e, mais amplamente no conjunto da biosferp.
que ainda estão quase intactas ou em via de reconstituição
Decidimos iimitar a denominação de espaço natural aos
natural. Se <mesmo, como escreve S. Moscovici (3) este meio
ecossistemas de tal forma eles se constituíram fora de toda a
protegido que se tem Procurado defender colocando-o em Parque
acção humana, com o fim de poder, em seguida, melhor situar
e em reserva, querendo-o puro de todo o artifício, votado a
a especiûcidade dessa acção. É evidente que, nesta acepção ritmos espontâneos, ele é também criação nossa' acto nosso).
restritiva, os espaços naturais ocupam actualmente uma reduzida
Parques ereservasauto-organizaçse4o sob os nossos olhos, sob
extensão à superfície da Terra: <O mundo em que hoje vivemos,
o controle das leis que presidiram à criação dos espaços
escreve Herbert,t. Simon (2), é muito mais um mundo artificial,
Gito pelo homem, que um mundo natural>.
(1) S. Moscov¡cr, Lz síciété cofltre flature, Union Genérale d'Editions,
Col. 7972, p. 384.
(1) E. Monrw, Le com2tlexe d'Adaw et |Adam conplexe, in <L,unité "10-18D,
de P) S. Moscovrcç Honmes domestíques et hommes sduuages, UnionGéné-
l'homme, Seuil, 1974, p. 738. rale d'Editions, CoL <1G-18¡ 7974 pp. 736-137.
(2) H.-4. SnroN, Lø scíence des systèmes, Ep| 7974, p. L6. (1) La Socíété contre nature, p. 381.
26 27
naÍlrais, .representendo para a' ecologia preciosos laboratórios
de observação e experimentação.
De qualquer modo, era útil tentar um estudo, mesmo teórico
que fosse, do espaço natural, que mais não fosse para melhor
pôr em evidência a especiûcidade do espaço g.ogiáfi.o que a
acção humana libertou da Evolução p"r"i i"t.goi capfturo u
na História.
7. À territorialidade do homem
A territorialidade como a agressividade seriam manifès-
tações específicas da Vida. O homem não escapa à regra:
ele é, declara Jean Rostand, um animal territorial.
As questões: <O Homo Sapíens pertencerá a uma espécie
territorial? Sê-io-á enquanto ser racional ou enquanto criatura
animal que delimita o seu domínio, rechassa o invasor ou
defende o seu domínio? Terá deste modo decidido ou terá
obedecido a um impulso.irresistíve1?>. Robert Â.rdrey responde
28 29
sem hesitar: (o homem é um animal territorial peia sua própria que os votou ao sofrimento do exílio. Quando por diversas
essência... o seu comportamento territorial é inerente à sua riatu- razóes são obrigados a emigrar, os homens Partem à procura
reza e de origem evolutivar. E acrescenta vivamente: <o nosso de um novo espaço onde posssam reconstituir o seu meio original.
apego à propriedade é biológico e inato> (1). A posse de um espaço é pois uma necessidade vital para uma
Deixaremos a Robert Ardrey a responsabilidade desta ú1tima sociedade.
afirmação. Etólogos protestaram contra todo o determinismo É sobre este conceito de esPaço vital que se fundou a geo-
bioiógico. Para Alexander Alland, se bem que enraizado na política para justificar as guerras de agressão.
natureza biológica do homem, a culrura liberta-o das formas A defesa ou a conquista do espaço constituiu, durante muito
rjgidas de controle que regem o comportâmento animal. tempo, a trâma da História: âs guerras presidem à formação
É assim que . os Semais da Malásia Central e os pigmeus da territorial dos Estädos no .interiòr das fronteiras que são, como
floresta lturi no Congo não só não são agressivos como o nome indica, linhas de confrontação entre os Povos. A colo-
também são territoriais: Diferentes bandos de pigmeus (r), tttzação é uma anexação, por uma sociedade, do espaço de outra
escreve ele, encontram-se, na ocasião de movimentos migratórios sociedade diferente. Tal como no passado, o conffole do espaço
e de expedições de caça na floresta, mas esses encontros não é uma exigência para os grandes imperiaiismos que aspiram à
originam reacções antagónicas e os grupos não se consideram proeminência do mundo: a Terra divide-se, cad.a vez mais, em
iigados a lugares particulare*. dois espaços ideológicos. No domínio do capitalismo, as
O geógrafo não rem qualidade para intervir no debate; sociedades transnacionais dispuam entre si os esPaços a subme-
mas tem de constatar-se que qualquer sociedade humanavivenum ter à sua exploração económica. Quanto ao socialismo, Procura
espaço que considera como necessário para a sua existência, assegurar-se de pontos de apoio às articulações dos grandes
quer seja em virtude de uma herança biológica, quer de uma espaços marítimos e continentais.
tradição cultural. Os espaços sociais organizam-se no interior de limites
á . r^
,h uma evidência afirmar que não há sociedade sem que constituem linhas de equilíbrio entre eles. Esses limites garan-
espaço que lhe seja próprio, no interior do qual as gerações tem a cada grupo humano a plena posse do seu território,
se sucedem numa continuidade tal, que uma identiûcação se colocando-se muitas vezes sob a protecção dos deuses e cada um
realtza entre um povo e o seu território. Nada de mágico nesta tem a obrigação de os conhecer e de os respeitar. Os Pigmeus
identificação com um parrimónio que permite a sobrevivência. Mbuti praticam a càça e a recolecção na floresta equatorial
Na base do patriotismo ou do nacionalismo, existe incon- do Congo mas, contrariamente àqueles a que se refere Alexander
testavelmente um apego, muitas vezes apaixonado, à ierra natal. Alland, deslocam-se no interior de um perímetro que fixa o
Depois de séculos de dispersão alienanre, os Judeus pensam espaço reconhecido a cada bando composto por uma vintena de
reencontrar a sua identidade num regresso à Terra Prometida famílias. Nos Camarões, na região de N'Kongsamba, as aldeias
são isoladas umas das outras por orlas de floresta, alinhamentos
(t) L'ítnpuatif tenítorial, pp. 16, 91, 92.
(,1 A. Arramo, La dimension humaine, Seuil, 1974, p. 133.
de pedras, fragmentos de cerâmica. Passa-se o mesmo com as
30 3t
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tribos nómadas do Sara, tendo cada ur¡a delas o seu próprio I
1
temperada enquanto os Brancos se instalâram na zona tro-
espaço de percurso delimitado pelos acidentes do terreno. Não i
pical e mestiçagens completaram a confusão. Foi a História
os respeitar equivale a uma agressão que desencadeia represáIas. : que agitou o ordenamento racial do planeta: migrações, transfe-
,t causa é compreensível: o espaço é uma componente da rências de populações provocaram deslocamentos maciços a
estratégia da vida. A sociedade humana não escapa à regra geral, longas distâncias. O homem não ficou no lugar que the estava
ela é irueparável do território com o qual forma um todo. 'cima
destinado e ainda por perturbou a ordem natural dos
<Cada grupo social, escreve Henri Laborit (1), vive num contexto vegetais e animais. Sabe-se da dispersão de que o homem tem
geoclimático, num nicho ecológico onde encontra a matéria toda a responsabilidade, colocando fora dos seus do¡rúnios
e a energia necessárias à manutenção da estrutura de cada indivíduo ecológicos primitivos, a vinha, o milho, o cavalo e o carneiro,
que o cornpõe, necessárias também à manutenção da estrutura para só citar os exemplos mais conÏecidos.
social>- Não se contestará portanto a validade de uma necessária
Si.gniûcará que a sociedade humana depende, também ela, da ecologia do homem <considerado como um organismo vivo
ecologia como ciência das relações dos seres vivos com o seu submetido a determinadas condições da existência e reagindo
habitat? Existirá uma ecologia humana? às excitações recebidas do meio natural) (Max Sorre) ou mais
simplesmente o homem considerado como um ser biológico
sensível às variações da temperatura, de humidade, de pressão
2. Que ecologia hu:oana? atmosférica, aos ataques de complexos patogénicos.
Sabe-se, por exemplo, que com a altitude o sanguehumano
Seríamos tentados a acreditar nela quando nos lembramos torna-se mais rico em hemoglobina e em glóbulos vermelhos
que a repartição das raças humanas à superfície da terra obede- para se adaptar à rarefacção do oxigénio. A proliferação das
ceria a uma certa zonalidade, como se cada uma estivesse ligada bactérias em meio tropical húmido dizimou durante muito
às condições mesológicas originais: a zona intertropical é o tempo as popuiações, provocando mesmo o desmoronamento
domínio das raças de cor diferente da raça branca que se de civilizações. Na Idade Média Europeia, as doenças infeccio-
expande na zona temperada. Há concerteza, numerosas excep- sas, tais como a desinteria ou a p.st. ,e"lizaram corn as fomes
ções e estas observações: a raça amareia ocupa latitudes médias e as guerras uma espécie de regulação eco-demográfica que
da Asia, os Ameríndios estendiam-se do Equador ao Círculo fixaram as sociedades tradicionais numa auto-estabtlvação(t).
Polar. Que dizer das carências alimentares que continuam a manter
Ao considerar hoje as coisas, é evidente que, à zonalidade uma parte da humanidade no limite de sobrevivência? Como
provável das origens sucedeu uma ubiquidade que misturou as todos os outros seres vivos, o homem não escapa verdadeira-
raças ern todas as latitudes. Os Negros invadirafrt a zotra
32 33
J
mente às mutações bruscas devidas ao acaso: amalâria que atinge Não terá sido assim no Paleolítico? Habitando em cavernas,
duramente as populações da Africa Ocidental, poupa contudo o homem vestido de peles de animais, tirava a sua subsistência da
certos grupos, pois novos modelos genéticos seriam dotados de colheita, da pesca e da caça no espaço vital que a horda con-
genes de hemoglobina anormais permitindo-lhes viver em zonas quistara. No entanto, mais do que ser territorial e ecológico,
contaminadas (1). ta1 como as Gras que ele defrontava, ji era um Homem capaiz
É inttit insistir, pois Max Sorre esfttdou longamente estes de responder às agressões do meio através de invenções. Muito
problemas num magistral tratado que tem um título sugestivo: cedo, soube :ut'itzar o fogo que devia perturbar a ordem natural
Les fondements biologiques de la geographíe humaine. O geó- das coisas, fabricar utensílios de pedra, todo um arsenal de arte-
grafo não pode desinteressar-se dos estudos empreendidos pela factos de extensã9 pelos quais a sua liberdade iria rapidamente
ecologia humana que pertence às ciências biológicas (2): tem a sua afirmar-se contra a necessidade. Mais ainda, já era capaz de pensar
parte nessas investigações na medida em que a organtzação do o mundo, de o interpretar como testemunham os frescos com que
espaço se repercute sobre as condições ecoiógicas. Isto é o que ornamentou as paredes das suas grutas. Enfim, era dotado da
provam numerosas observações efectuadâs na zona tropical possibilidade de comunicâr aos seus descendentes os resultados
húmida. O desbaste da floresta densa originado pela exteruão da sua experiência. Com o F{omern nasceu a cultura, este
das culturas expõe ao sol as toalhas de água que se tornam igual- banco de informações que se enriquece de geração eq geração.
mente focos de malária num espaço até então preservado. Os <O homem, dtri o biologista (1), graças aos seus mecanismos
trabalhos de Pierre Gourou (3) demonstraram que, pelo con- associativos, aos seus processos de formular hipóteses, actu¡lizados
trário, em qualquer parte onde as sociedades estavam suficiente- por ensaios sucessivos, é capaz de acrescentar uma informação
mete organizadas para assegurar o controle das águas pela dre- que transforma matéria e energia, interessando à sua sobrevi-
nagem dos pântanos e a prâaca da irrigação, a malária perdia a vência e à manutenção da sua esffuturaD.
sua virulência. Com a descoberta da agricultura e da criação de gado,
Objectar-se-á que houve um tempo, talvez ainda mesmo o Neolítico abre a eta da organização do espaço pela acção
hoje o seja nas regiões mais isoladas, onde os homens.e os outros humana, organização que se estenderá, pouco a pouco, à quase
seres vivos formam comunidades organizadas em ecossistemas totalidade da superfície terrestre. Doravante o homem é dotado
espaciais. da possibilidade de orgat:.irzar o seu meio, adquiriu o domínio
sobre os outros seres vivos, vegetais e animais e, progressiva-
mente, o dos elementos físicos tais como o solo, i ágraa e atét
mesmo o clima que utiliza para a, rcaIvação dos seus desígnios.
(1) Hipótese de 'W'¡rs¡N¡urn, Sickle cell traít in human and cultural Isto é, criou o seu habitat. Criador e criação, intimamente
euolution, citado por .tlexander Ar,r,¿voin La dimensíon humaíne, Seuil, 1974, interdependentes, não se apreendem um sem o outro. Tal é
p. 732.
(2) R. Duros, L'homme et l'adalttation au nilieu,Payot, !973.
(t) Nomeadamente Les Ttays tropícaur, PUF. (t) He¡ri La¡onrr, op. cít., p. 169
34 35
realmante â concepção da geografia. Por isso, o objecto da determinismos naturais pelas relações aleatórias com o meio exte-
ecologia humana limita-se às relações biológicas entre o homem rior (1). Mais do que qualquer outro ser vivo, tem a capã.
e o meio (1). cidade de multiplicar as possibilidades de acumulação e colocação
em reseÍva constituindo outras tantas medidas contra-aleatórias.
A grande aventura do homem no globo terrestre terá sido,
3. Os projectos de sociedade definitivamente, ter construído o espaço segundo modelos dife-
rentes dos ecossistemas originais, de ter substituído a intenciona-
lidade pela necessidade. À realidade objectiva do espaço natural
Toda a organização supõe um objectivo a atingir. O ecos-
opõe-se, assim a realidade projectiva do espaço geogrâftco
sistema resulta, têmo-io visto, de uma orgamzação de com-
nascido da iniciativa humana ftnalizada.
ponentes. O seu objectivo consiste na reabzação de equilíbrios
que asieguram o desenvolvimento da vida graças às interdepen-
Os projectos das sociedades constituem pois uma das
1^ . I t ' chaves do conhecimento do seu espaço, resultam do sistema
dências tuncionæs e constata-se <à posteriori>. E por isso que
de valores, tradições, atitudes culturais, sociais e políticas, numa
seria ambíguo falar de projecto ou em finaiidade; talvez se
palavra, da ideologia na qual cada sociedade colhe as suas moti-
pudesse invocar a lógica interna de processos físico-biológicos,
vações e as suas razões de agir.
de actividades termodinâmicas programadas para criar e manter
As sociedades primitivas têm a sua racionalidade: fundam-se
a estrutura contra os factores de desordem.
no domínio das relações de parentesco que realtzam, num todo
Completamente diferente é o espaço geográfico ç1ue é cria-
indiferenciado, a vida dos indivíduos, as relações entre os grupos,
ção humana. <O homem nasce com a emergência do projecto,
o exercício do poder, as concepções religiosas e as actividades de
escreve Roger Garaudy (2). Ao contrário das outras espécies
produção. Identificado com o seu grupo social, o homem
animais movidas pelos impulsos instintivos do passado, o futuro
maximiza as satisfações que tira da sua participação: festas, danças,
que concebe exerce uma influêncta eftcaz no projecto que cons-
repastos são manifestações comunitárias que visam manteÍ a
troi>. Produz as suâs próprias orientações: o objectivo que visa
coesão da colectividade.
resulta de uma tomada de consciênaa cada vez mais clara das
exigências incessantemente diversificadas e complexas. A acçio Quaisquer que sejam as suas aptidões, as suas experiências
próprias, é difícil ao indivíduo emancipar-se. Toda a inovação
tem portanto a sua racionalidade, exerce-se no meio para o pôr
aparece como um sacrilégio cometido contra os antepassados fun-
cle harmonia com o seu projecto que é de viver e sobreviver
dadores que transmitiram em herança, aos seus descendentes, uma
aos perigos e às contrariedades que o envolvem por todos os
orgarnzação sócio-espacial que deu as suas provas. Todavia,
lados. Esforça-se por adquirir a autonomia ao substituir os
tradição não significa recusa de toda a melhoria: a partir do
séc. xvr os Africanos adoptaram as plantas introduzidas da
C) Para Jacques Rurrn: <'t ecologia humana é, antes de mais nada
toda a sociedade humanao. De Ia biologíe à la uiture, Flammarion, 7976, p.302.
e) Paroîe d'homme, Robert Laffont, 7975, p. 764. (t) P. V¡NonyÈs, Vus Ia théorie de l'homrne, PUF, 1973.
36 37
A.mérica incegrando-as no seu sistema de cultura e de alimen- tudo é mercadoria. mesmo o esPaço até recentemefite consl-
tação sem que daí resultasse qualquer perturbação. O que cha- derado, como sem valor. it a industrialização desenfreada
mâmos economia (1) não é senão um aspecto da realidade social que, da especialização e da multiplicação dos seus produtos,
giobal cujas relações de parentesco constituem uma sociedade devia alimentar este impulso.
tradicional: são estas relações de parentesco que fixam os direitos Doravante, o homenr identifica-se com aquilo que possui
de utilização do solo, divisão dos trabalhos, partilha das colheitas. e o consumo social tende a vencer o consumo privado.
Técnica de produção, o ffabalho é também uma prática social Libertada, a iniciativa privada cai na anarquia, rapidamente
e ritual, visando satisfazer o conjunto das necessidades vitais da substituída como motor da mudança pela estratégia da grande
colectividade e também procurar um excedente destinado, não empresa que uitrapassa fronteiras. A competição renhida origina
a rcalizar uma acumulação sem a qual não há crescimento toda a espécie de desigualdades e de hierarquias entre os indivíduos
económico, mas para constituir reservas contra-aleatórias e e entre os esPaços
sobretudo para permitir os sacrifícios nos altares das divin- A soðiedade capitalista que domina a racionalidade unidi-
dades e consumo de ostentação em proveito da comunidade. mensional da economia, enfraquece-se por uniformização. Ani-
Organizada na sua auto-subsistência, a sociedade tradicional mada pela dinâmica da mudança, está condenada a evoluir,
é regulada para se manter num estado de estabilidade dinâmica. por desequilíbrios e por crises, para uma expansão indefinida ou
Completamente diferente é o projecto das sociedades moder- púa a desagregação.
nas, herdado do Renascimento e do século x\nlr e que põe Desses excessos devia surgir um outro tipo de sociedade
como axioma, que o progresso material é a condição necessária
moderna: a sociedade socialista. Longe de repôr em questão
à expansão do homem, sendo o projecto do desenvolvimento a exigência do desenvolvimento económico como condição
económico apoiado pela ciência e pela téantca.
da rc lir.ação do homem, conta com a industrialização pal¿
Por um processo que não vamos analisar aqui, este projecto
desencadear e arrastar as outras actividades.
deu origem ao capitalismo; acumular o capitai com vist¿ à
produção crescente do lucro, disputando-se o controle, tornam-se
A colectivização das forças produtivas tira toda a nzã.o de
a finalidade da acção nas sociedades do mundo ocidental. ser à competição para o controle do capital. Libertos desta
Supõe o domínio dos obstáculos que poderiam entravar a reali-
motivação geradora de tensões sociais, os indivíduos podem
zaþo do projecto, daí o libera[são político, o monopólio da conjugar os seus esforços na procura do interesse geral. Tal é,
ciência, o estímulo da investigação social para assegurar o em princípio, a finalidade do socialismo.
escoamento alargado da produção. <<Produzir mais, mais saber, Na realidade, as coisas são menos simples: na URSS e nas
maior controle, mais bens e serviçou O para consumir mais; várias democracias populares a iniciativa privada não pode
praticamente exercer-se na produção sem que por isso seja posto
(t) Ver Maurice Goonrnn, Rationalitë et irrationalitê en économíe,2T., cobro às desigualdades hierárquicas. Na Polónia e naJusgolávia,
Maspero, 1971.
e) Ivan lrucn, La coaivîali¿á, Seuil, Col. uPointp, !973, p. I33. a propriedade individual manteve-se na agricultura e só a China
38 39
f-
T
e)Ver a este respeito J. Arreu e M. Gunravun, L'antí-économíque, (1) Ver sobre este assunto Jean LranoN, Equilibres naturels et recherche scen-
PUF,7974, p. 119. tífique, Impact. uscience et Sociétó, tlnesco, vol. XfV (1964), n." 1.
40 41
de gado, da pesca, como é
testemunhado pelo abundante estão quase vazie aquando d¿ chegada dos espanhóis. Seria
material de pedra abandonado no próprio locai. O ff milénio a oscilação ainda do clima que durou de 1250 a 1300 que
¡!
marca o início da desertificação, desencadeando as migrações teria enxugado as terras e dizimado as populações.
das popuiações negras para Sul, sendo substituídas por pasrores .¡
Acabámos de ver que as oscilações do clima ao longo de um
líbios e depois pelos nómadas berberes de hoje, espaço de tempo determinam mutações estruturais na organiza-
.i
Tem-se atribuído à secura a responsabilidade das fomes çao do espaço. Na sequência dos trabalhos de
Le Roy-Ladurie,
que castigarem em anos sucessivqs as populações africanas do Saei, I
: outros investigadores multiplicafam os exemplos de incidências
da extensão anormal pa:.a o Sul das altas pressões do anticiclone :
ì
sobre a agricultura, da variabilidade de curta duração dos
dos Açores,'encontrendo-se o limite das chuvas tropicais de verão climas regionais, sendo possível medir recentemente, quando a
recuado tanrbém para Sul. A, retomada recente das chuvas pro- política externa da IJRSS foi afectadâ por sucessivas coiheitas
vocou a multipiicação dos roedores que devastaram regiões de cereais deficitárias (1).
inteiras na Bacia do Senegal. E não somente as colheitas foram Isto é incontestável. No entanto, o geógrafo que desconfia
destruídas, mas um recrudescimento das doenças viróticas é de dos determinismos sumários, ficará muito circunspecto: objec-
temer entre as quais a Gbre amarela. tará às análises precedentes gue, se os homens viverem efecti-
Junto dos Siwalik, o Terai permitia no século rv uma vamente a desertificação do Sara, esta foi suficientemente lenta
população densa vivendo em cidades, hoje em ruínas. Â floresta para que tivessem podido PreParar uma resposta. Subsiste
recuperou o espaço conquistado pelos homens e a malária aí uma agricultura, sendo a população sedentária mais numerosa
tornou-a numa das regiões mais febris da úrdia. Para E. Huting- que a nómada graças à perfuração de poços artesianos e sobretudo
ton, a hipótese duma mudança de clima foi responsável por ao escavamento dessas compridas canalizações subterrâneas que
uma variação de morbilidade inGcciosa, apresentando-se como constitui a rede das <foggaras> 127f, trabalho de toupeiras.
explicação mais plausível (1). Dízia E.-F. Gautier, que implica não só temPo, mas também a
Na <Histoire du climat depuis I'an mil,, (2), Emmanuel capacidade de mobilizar os esforços dos homens que consti-
Le Roy-Ladurie, cita ainda o exemplo da agricultur¿:pre-co- tuem es comunidades.
lombiana do Arizona e do Novo México. Conquista o espeço Quanto às regiões saelianas, se é verdade que anos sucessi-
pouco antes da nossa era, atinge o apogeu entre os séculos vm vos de seca desencadearam a crise, esta foi fortemente agravada
e xIrI, suporta então uma população concentrada em grandes pela dependência colonial que, impondo a economia monetária,
aldeias vivendo da colheita de abóboras, milho e feijão. No incitou os camponenses negros a reduzir os pousios para aumen-
fim do século rcm assiste-se ao declínio que se prolongará tar a produção de culturas de exportação em detrimento de cul-
durante longos anos. Vastas regiões conquistadas pelo deserto turas e a sobrecarga pastoril fez o resto. É portanto sobre
(1) Citado por M. la gé,ographie hunmh.re,
SonRE, Les fondenents de
T.I: A. Colin, 7947, p. 394.
I-es fondenmts biologiques, (1) Ver o n.o 3, Maio-J"nho de 7974, de Annales, Economíes, Socíêtés,
(z) Flammarion, 7967, pp. 288 e seguintes. A. Colin.
Ciuílísatíons: Hístofue et enuìronnemer¿r,
42 43
v=F
.;
':
equilíbrios ecológicos próximos da ruptura.que a seca se abateu projecto elaborado por aqueles. É disso que resulta o que se
transformando a crise em desastre (1). Por seu lado, Max Sorre I
cência da malária, à deterioração c{o sistema de drenagem q.ue vezes na transformação de uma matéria prima já degradada
conduziu a uma diminuição do nível de vida e consequentemente
I
i
e fortemente comprometiäa, tendo que.Pegar os excessos ou os
da resistência à malária. ,
44 45
IJma das soluções consiste em fazer tábua rasa do passado adngir uma autonomia cada vez maior, face às contrariedades
e reorganizaÍ o espaço sobre o modelo a que'o país se propõe. exteriores, e por conseguinte, uma maior liberdade. Não con-
,\ operação não pode ser deixada à iniciativa individual, devendo siste numa adaptação, mas numa invenção do habitat pelo
I
ser dirigida segundo um plano de conjunto, com um grande ii habitante (1).
entusiasrno e na unanimidade nacional.
i
,ll Emigrando, os homens conservam os comPortamentos
I
Um modelo que tem sido apontado é o da revolução sovié- :i
,l
que derivam da sua cultura e transferem a sua concepção do
tica que procedeu a uma vasta remodelação do espaço abando- do espaço para o serl novo meio. Malaio-Polinésios implantam
''Ii
nado pelo Csarismo. ':
em Madagascar a paisagem de arrozais irrigados; os calvinistas
l
O espaço, dizêmo-lo nós, é a matéria prima que roda a . franceses plantam vinhas tt".Á.füca do Sul; em plena terra muçul-
sociedade projecta organi2ar à sua imagem. Qual vai ser a esrra- mana, o, iolorros transformam a Mitidja segundo um plano lan-
tégía da acção criadora? guedociano, com a geometria disposta em ûadas de cepas e de
Os seres vivos são autorregulados biologicamente para ruas, das aldeias com tectos de telhas, vermelhos agrupadas à
resistir à crescente desorganização que sofre a matéria inanimada, volta do adro da igreja.
graças às informações captadas no meio envolvente e traduzidas Este apego ao sistema cultural deforma e mascára a reali-
em comPortamentos racionais. dade das coisas. Quantos erros não terá cometido a coionizaçã.o,
Além disso o homem é dotado da possibilidade de mul- ao querer introduzir métodos sem ter procedido ao estudo prévio
tiplicar até ao infinito âs suas respostas, de as memorizar do novo meio. Durante meio século, os colonos franceses
e de as transmitir pela linguagem aos seus descendenttees: es teimaram em desenvolver na Argélia plantações de cana de
banco de informações constituído ao longo das gerações é uma açtrcar, de cacau, café e algodão sob o Pretexto de que a história
componente da cultura própria de cada civilização. A culrura dos séculos anteriores thes tinham ensinado que, coionização
aparece aqui como um sistema de código que orienta a acçã,o signiûcava agricultura tropical. Conhecem-se também os custo-
humana: por seu turno, esta enriquece a massa de experiência sos insucessos dos ingleses no Tanganica, desejosos de alargar
acumulada. O meio, com efeito, longe de ser hostil é estimulante: a itea de cultura do amendoim, utilizando nos arroteamentos
obriga o homem, que nele capta informação, a descobrir as processos mecânicos que aceleraram a degradação 'dos solos.
^
potencialidades que estão latentes. Desta forma, a cultura assegura Ao contrário do ecossistema que resulta, como vimos, de
a estabfidade sem, no entanto, se opor à inovação. interacções biológicas, o espaço geográfico nasce da iniciativa
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humana e exprime o projecto próprio de cada sociedade.
particularmente a técnica aplicada para dar forma à matéria l Não se adapta ao meio natural, utiliza-o como substracto,
transforma-o, condiciona-o o melhor possível para a renliza-
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inanimada: talhar um silex em forma de instrumento, captar I
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espaço. Alimentada de informações, é essencialmente organiza- (1) Ver S. Moscovrcr, Qr,rclle unité: duec la nature ou contre?, in cl'unité
ção, resistência ou desordem entrópica. Permite assim ao homem de l'hommq, Seuil, 7974, pp,752 e seguintes.
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ção das intenções humanas ao ponto de o tornar, muitas væes, t a descoberta das interdependências que regulam os ecossis-
irreconhecível. Em que se tornarão as fl.orestas do mundo? :
,: temas: os camponeses avaliam a fqtilidade das suas terras
Cederão lugar às pradarias, aos campos cultivados, às plantações. pelas cores, pela vegetação que apresentam; a experiência revelou-
Se, como ecossistema se inscreve na natureza, o espaço -lhes os sinais precursores da chuva, da geada, as exposições
geográûco não segue essa ordem, é regido por aquilo que o ì mais favoráveis. Por exemplo ,o camponês africano cedo com-
homem define para se tornar autónomo. preendeu a importância dos solos fl.orestais, móveis, ricos em
Mæ esta ordem imposta é frâgiJ: logo que a acção humana l
húmus e sem plantas concorrentes; o Pigmeu aprendeu a preferir
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enfraquece, não resiste à dinâmica dos sistemas naturais que têm à floresta densa, a floresta secundária mais rica em vegetais comes-
reconquistado rapidamente o terreno peúido [22]. tíveis e em caça.
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Com a proliferação clos seres vivos, o regresso ao ecossis- De todas estàs informações, o homem tirou um saber cuja
tema é atingido rapidamente. O espaço geográfico encontra-se eficâaa épouco a pouco afumada: descobriu a selecção dæ plan-
num equilíbrio instável e só se mantém pela constante inter- tas úteis, a domesticação dos animais, a noção de campo que
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venção do homem; todo o abrandamento na vigilância arrasta devia desempenhar um papel tão importante na organtzaçío
a sua degradação. São as causas históricas, mais que as do espaço agrícola.
mutações do meio que explicam a sua ruína. Considere-se o conjunto de observações que foi preciso
Façamos o ponto da situação. tlma primeira conclusão reuni¡ para ordenar, num conjunto viável, os elementos cons-
impõe-se: refere-se à especificidade do espaço geográfico. titutivos da vida rural. Claro, tudo isto exigiu uma longa
O homem subtrai o espaço aos ecossistemas, trata-o na sua dinâ- sequência de séculos feita de êxitos e fracassos.
mica, orientado pela cultura, organiza-o, transformando-o em Assim se compreende o apego de todos os camponeses a uma
espaçg geográfico. Isso feito, fica por saber como se exerce cultura tão penosamente adquirida, que mantêm religiosamente,
essa acção briadora. com o receio que a inovação incontrolada viesse inrroduzir a
desordem: o respeito pelos antepassados, fundadores da tradição,
condiciona o seu comportamento.
5. O espaço geográfico: produto social O ordenamento do espaço começa com a agricultura, que se
observa nas pequenas comunidades. Com o aumento dapopu-
Graças às relações dialécticas que estabelece com o meio, lação, a sociedade que se torna complexa exige uma acção mais
o homem adquire primeiramente um conlecimento empírico, profunda no meio envolvente. A maior parte das velhas aviltza-
seguido de um conhecimento científico; descobre os obstáculos, ções agrárias organizaram-se naquilo que Robert L. Carneiro (1)
as potencialidades e inventa a tâcdca que permite responder-lhe. chama <áreas circunscrita$, quer dízer, espaços limitados por
É na prática que se efectuou a aprendizagem do meio e se
conceberam os primeiros utensílios, as primeiras técnicas. A (1) Citado por E. Ln Rov-L¡¡vtæ, L'histoire immobile, <Annala>, ESC,
observação ttarcid" do contacto directo com a nafrJrezaperrnitiu Maio-]unho, 7974, p. 673.
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obstáculos difíceis de superar: montanhas, desertos, oceanos, foi instalada em terras outrora ocupadas pelos pastores Fulas.
no interior dos quais o engenho dos homens teve de se manifestar Foram repartidos em campos rdctangulares de dois quilómetros
para explorar as possibilidades novas, suscepdveis de assegu- e meio de comprimento por meio quilómetÍo de largura, sendo
tar a subsistência de densidades mais elevadas: tal foi o caso do mais tarde reduzidas as dimensões para um quilómetro por duzen-
Egipto e da Mesopotâmia transformando um meio desértico tos e cinquenta metros. Os campos rodeados por cortinas de
a partir de um' rio que permititu a passagem à agricultura árvores destinadas a combater a erosão eólica provocada pelo
intensiva graças à irrigação harmatão [25], desenha um bocage tropical de linlas geométri-
.cas que substituiu a estepe arbustiva.
O ordenamento do espaço pode resultar, muito mais do que Esses campos foram plan-
se pensa, da execução de um projecto concebido para atingir tados com amendoim em rotação com a cultura alimentar
um fim previamente fixado. A planificaçäo não é uma política i do milho miúdo.
concebida peias sociedades modernas; ela é uma obra.elaborada I
Muias vezes, a colonização procedeu ao planeamento do
ao longo Lla história. Basta, para disso se convencer, lembrar ¡
I espaço conquistado para melhor instalar o seu povoamento.
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alguns exemplos. .t
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No Quebec, os francæes criaram de um e de outro lado do rio
É de referir que o empreendimento dos reis Merina, Prosse-
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Saint-Laurent, uma paisagem de alinhamentos a partir de uma
guindo deliberadamente durante mais de três séculos a transfor- i rede de estradas paralelas ao rio, em que o solo é dividido em
mação dos pântanos repulsivos da bacia de Tananarive, rÌuma
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rectângulos atribuídos por concessões individuais, dispondo-se
planície ßrtil onde as águas dos rios, controlados numa rede f
I as . casas com intervalos regulares ao longo dos caminhos.
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de diques e canais assegurando a irrigação, enquanto que um It
1
No oeste, é. a quadrícula regular do sistema da míIha dos
povoarnento de aldeias de colonos instalados ao 'abrigo das
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townshíps inglês que prevalece. Na Argélia, a primeira fase
inundações sobre massas rochosas enersas Permanentemente, do povoamento decidido pelo general Bugeaud instalou na
explora arrozats concedidos em lotes'familiares de um hétra mata de palmeiras anãs do Sael Ocidental, uma série de aldeias
o,i seja uma área à volta de três quartos de hectare [23] dispostas ein xad¡ez colocadas em lugares defensivos com o fim
Era a aplicação em Madagascar de um modelo asiático de orde- de bloquear as infiltrações das hordas de árabes a caminho de
namento introduzido por imigrantes originárioi da Indonésia. Argel: à volta de cada aldeia, a terra era concedida em explora-
Outro exemplo relativo ao Senegal: o ordenamento do ção de uma dúzia de hectares comportando várias parcelasrepar-
Ferlo é a obra da Confraria Mourida (t) 1241. Este movimento tidas por diferentes áreas para permitir a policultura de subsis-
religioso muçulmano fundado entre 1886 e 1889 Por um morabito tência, tão do agrado do agricultor não especializado. Mais
espertalhão ensina que a agricultura e a submissão ao chefe são próximo de nós, a Rússia Soviética inscreveu o seu socialismo na
as condições necessárias à santificação. A comunidade dss ûéis organização do espaço: uma vez a propriedade individual abolida,
a planificação teve o campo livre para criar em vastas extensões
desempedidas de sebes que constituíam limites de vastos domínios
(1) Cheikh TouNn Si, Ld confrûíe sénégaløise des Mourídes, Présence
AÊicaine, 1969. agrícolas condnuos no centro dos quais. as grandes aldeias
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kolþ,hozíanas 126l ou souþhozíanas l27l agruPam os habitantes, nílo hidiferenciações espaciats capazes de suscitar perigosas
os serviços, os estábulos e as dependências das explorações. contradições' internas.
Nos países capitalistas, a planificação do espaço não pode No entanto, é evidente que nas sociedades liberais,
ser rigorosa, lirnitando-se a controlar de maneira mais ou menos é o capitalismo que dirige o jogo da orgatização do espaço.
apertada, a interdições mais ou menos efrcazes. A sua própria racionalidade impele-o a tirar o máximo
Os poderes públicos intervêm na extensão das cidades, na proveito sem se preocupar com os desequilíbrios que provocam
implantação dos compiexos industriais, no equipamento das os seus investimentos selectivos. As regiões que privilegia
regiões desfavorecidas. Em França, por exemPlo, participam no recebem uma infraestrutura produtiva, actividades diversificadas
desenvolvimento da economia do <Midi> Mediterrâneo encar- com efeitos cumrrladvos que as dotam de uma capacidade de
regando-se do controle de Durance e de Verdon, cujas águas desenvolvimento autónomo e condnuo. Os equipamentos de
devem assegurar o consumo das cidades, das fäbricas e a trans- interesse colectivo e os serviços especializados melhoraram o
formação do sistema de culturas pela irrigação, contribuindo bem-estar das populações. Neste meio dinâmico, estas popu-
pal:a a.instalação do grande centro industrial de Fos e dos centros lações podem conseguir a elevação do seu nível de vida e a
turísticos da costa Languedociana, deserta desde semPre. Quanto possibilidade de uma promoção social.
à ltáiia, bastará lembrar o papei decisivo do Estado na execução Quanto às outras regiões, abandonadas a si mesmo, não só
de um plano de desenvolvimento do Mezzosionro. sofrem de um atrazo que se vai ampliando, mas tambérn não
O ordenamento de um espaço nacional é em grande parte podem esperar manter-se na situação atingida em firnção da
condicionado pelo sistema político que a história aí organizou: falta de investimentos de que são vítimas. Os produtos agrí-
para comprovar isso, basta comparar a França com 4 Alemanha colas ou as matérias primas que trocam pelos produtos indus-
Ocidental (1). Xm França, a grande cenffalização política que triais conhecem uma depreciação continua; a parte mais activa
acumulou os poderes de decisão e de acção na capital, é icontes- da sua população, privada de toda a esperança de progresso,
tavelmente responsável pelos desequilíbrios socio-económicos que é forçada ao êxodo para regiões mais favorecidas.
não deixaram de se fazer sentir entre a região parisiense, com uma . É bem essa e todos estarão de acordo, a dualidade de situações
concentração de população e de actividades até à sua paralisação, que existe em França entre a Região Parisiense e o Maciço
e as regiões perifericas mantidas no subdesenvolvimento. Na Central, por exemplo; ou na ltália, entre o Norte e o Sul da
Alemanha, pelo contrário, o funcionamento do sistema federal península.
permitiu uma igualização de possibilidades de desenvolvimento Assim; gerador de desenvolvimento desigual, o capitalismo
entre os <Landers> [28]: não há domínio de um sobre o ouüro, é responsável pelas enormes disparidades socio-espaciais de que
sofrem os países onde ele reina sem poderes compensadores
suficientemente eficazes.
Hoje, o capitalismo vai ainda mais longe no controle que
(t) J.-C. PrmrN, Le dêueloppement rêgional, PIJF, 7974. exerce sobre o espaço. Indiferentes às fronteiras, as sociedades
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internacion"it (t), instalam-se por todo o lado onde existe dos espaços alienados para designar regiões que devem ao exte-
dm mercado susceptível de absorver a produção que a sua publi- rior, não só a sua criação e a sua integração no mercado mundial,
cidade impõe ao consumo. mas ainda a sobrevivência da sua organização, enfim regiões
A sua implantação obedece às únicas leis do lucro e domina- cuja população indígena jamais controla, e que até os próprios
ção económica da sua sede social, situada no estrangeiro, exer-
poderes públicos diûcilmente controlam. Entre a sua política
cendo impiedosamente os seus poderes de decisão. Decidem do espaço e a do capitalismo, as divergências surgem: na loca-
da contratação, dos salários, dos preços, do aumento ou da ltzação das suas empresas, as grandes sociedades são sobretudo
redução das actividades; têm à sua mercê toda uma população sensíveis às vantagens que thes fornecem as economias externas'
cle trabalhadores e, através deles, do futuro de cidades inteiras qaer áizet a reunião num mesmo lugar de uma infraestrutura,
e do espaço rural. que as envolvem. É bem estâ e situação duma abundanté e qua1ifiç¿da mão de obra, de um mercado
criada pela instalação à volta da laguna de Berre, das companhias de serviços, de um dinâmico centro de negócios, de colectivi-
petrolíferas francesas, inglesas, americanas que aí controlam um vidades complementares diversificadas. O Poder, ao contrário,
dos maiores complexos de refinarias e de petroquímicas do mundo pretende ttazer pa:i;a at, onde faitam os equipamentos 'colectivos,
estando Marselha e toda a sua. região na sua dependência. as actividades económicas que fixarão os homeru e as coisas no
Essas sociedades internacionais encontraram nos palses sub- espaço. Depois. de um longo período de estreita conivência,
desenvolvidos a possibilidade dercalrøar elevados lucros em conse- um afrontamento é hoje previsíve1(1).
quência do balxo pfeço da terra e da mão-de-obra. Elas detêm É evidente que nem todos os esPaços estão ainda nesta
aí vastas ârteas otgantzadas para servir as suas especulações. situação. Se a dispersão das suas implantações é hoje um
Na Áfica Ocidental, possuem ranchos consagrados à criação elemento fundamental da estratégia das grandes emPresas, nem
industrial de bovinos; no Senegal, a B.IJ.D., ûlial de uma por iso a existência das regiões está inteiramente dependente
sociedade californiana, explora um domínio de 1000 hectares das decisões das poderosas sociedades nacionais ou multinacionais:
de culturas hortícolas agro-industriais, na qual trabalham <Acontece que se asiste a uma notávei espontaneidade económica,
3 000 assalariados em períodos de ponta; as 100 000 toneladas como o revela por exemplo, aquela extraordinária prolifenção
recolhidas anualmente são exportadas para a Europa e pare os de pequenas e médias empresâs de confecção de texteis, de cal-
Estados Unidos. çado, de mecânica, surgidas em pleno bocage em volta de
Em tais condições jâ nã;o é só sobre o terreno que o Cholet (2).
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Se a Ford e outras sociedades vieram instalar-se no Gironda, secundárias nas aldeias ou em parcelas conquistadas às culturas:
as grandes vinhas, herdeiras duma estreita intimidade com o as estações de desportos de inverno ocuPem áreas de Pastagens,
meio, e os grupos ainda dominantes que retardaram o desenvol- derrubam florestas nas vertentes montanhosas; os construtores
vimento industrial do séc. )clc conservam todo o seu peso ne civis levantam os seus muros de betão ao longo das costas do
orgatizaçdo do espaço e da sociedade da região bordelesa (1). Mediterrâneo: na Costa Brava, compram por qualquer Preço,
De qualquer forma, acontece que a produção do espaço à beira-mar, propriedades agrícolas onde edificam inestéticos
se situa no cerne da competição social que desencadeou o capi- edifícios que são arrendados aos turistas e preços exorbitantes.
talismo. Mais do que nunca, os investimentos para aí. sè O semanário espanhol Europeo interroga-se sobre o futuro
precipitam pois é neste sector que a tâxa de lucro é superior à dos filhos dos camponeses espoliados da teffa, onde culti-
média, em razão da abundante mão de obra quê exigem as vavamotrigoeafruta.
construções imobiliárias. Na origem do ordenamento do eSpaço existe, já o dissemos,
<A mobilização do espaço, escreve Henri Lefevre (2), tor- a vontade de realizar um projecto de vida: projecto colectivo
na-se frenética e leva até à autodestruição dos espàços antigos da pequena comunidade ou do grande Estado que determinam
e novoÐ. O consumo do espaço âumenta até ao desperdício: e escolhem o seu destino, segundo uma táctica empírica ou
o espeço jâ não é um bem de uso, é uma mercadoria que se prospectiva, projecto do grupo detentor dos meios de produção,
presta a toda a espécie de especulações frutuosas. o qual é imposto ao conjunto da sociedade.
Os ordenamentos que se constroem diversiûcam-se para De qualquer maneira, esta organização exige a intervenção
satisfazer novas necessidades. A matéria prima (o espaço), de trabalho humano que fornece a energia necessária Para a
não sendo inesgotável, necessita alargar-se à custa do espaço construção do espaço geográûco
agicola que já não é rentável, reconverter-se, transformar-se Para ser mais eficaz, este ffabalho deve ser baseado ne aPren-
para se adaptar às necessidades que não cessam de surgir. As åíztgern que transmite ao homem o saber e a experiência
cidades alargam-se em detrimento dos seus arredores hortícolas acumulado pelas gerações anteriores. Consiste na utilização
que cedem o lugar a bairros habitacionais, parques, estádios, em comum das forças produtivas de todos: é um trabalho social.
zonas industriais, centros comerciais, aeroportos... As autoes- Como tal, é pois a expressão do sistema de relações que cada
tradas abrem largas e compridas faixas através de campos e sociedade estabelece entre os seus membros.
florestas e campos militares instalam-se em meios rurais degra- As sociedades camponesas tradicionais apoiam-se menos
dados em que a vida moderna hesitava em penetrar. nas relações de produção do que nas relações sociais: relações
O consumo de espaço rural redobra hoje com o desenvolvi- dos vivos com os antepassados, dos vivos entre si conforme
mento desenfreado dos lazeres. Citadinos constroem residências a idade e o sexo. Traduzindo essas estruturas, o trabalho
é tanto um acto ritual como técnico e só é fecundo na
(1) G. Lr Gau, Elêments pour des scénaríos sociaux, í¿ *Prospectivesr, conclição de respeitar a herança de práticas pelas quais se
n." 4, \975, p. 15.
(') La groductíon de l'espace, uAnthropou, 1974, p. 338. exprime o acordo com as divindades locais. Testemunha
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também a íntima colaboração dos grupos sociais nume divisão. .l
das aldeias índias associavam os seus esforços para desbrevar,
das tarefas. Divisão. sexual: nos Gbeye, por exemplo; fixa- plantar e colher: Blas Valera denosrine este reciprocidade de
dos nos norte do rio Ouham na RepúbüJa Centro Afiicana, <lei da fraternidade>.
cada,famflta constitui uma comunidade de trabalho em que As grandes obras do ordenamento do espaço exigiram a
as culturas alimentares mais antigas, portadoras dum valor sagrado rnobúvação duma numerosa população, mas Para tento era Pre-
tal como o milho miúdo e o inhame estão reservados aos ciso que fosse imposta pela ornnipotência de um monarca.
homens; a cultura da mandioca, de introdução relativamente A corveia real generalisada forneceu a mão de obra necessária
recente, é abandonada às mulheres; mas e do algodão, mais para o aproveitamento das terras conquistadas às águas originando
recente ainda, é praticada individualrnente por todos os mem- as planícies de Tananarive. O Estado Inca impôs um sistema
bros da família e até o raþrz duma quinzena de anos cultiva de prestação de trabalho às comunidades camPonesas Pera a
a:suê Parcela e dispõe da Eua colheita como entender. construção das estradas, cidades, dos canais de irrigação e dos
Na floresta do Gabão, 9s'Bantus v.ivem da cultura itine- socalcos. Ainda hoje, as mais impo.rtantes realizações de remo-
rante: sobre queimadas: os homens derrubam as {rvorgs, roçar[, delação do território chinês saiem das mãos dum exército'de tra-
queimam, ?reperam. sumariamente o solo no qual as mulheres balhadores agrupados em equipas. :.
plantarão, em regime de policultura, o inhame, mandioca; batata A instituição da escravatura respondeu às exigências da
doce; mondarão, colherão e transportarão a produção para a valorização do espaço, tanto nas sociedades antigas como nes
aldeia. sociedades coloniais até rneados do séc. xx. Já sabemos que as
. Por. níveis etários formam-se grupos de trabalho que se transGrências de população provocaram modificações profundas
encarregarl de certas tarefas: os Baribas do Volta, por exemplo, no mepa da repartição dos homens na superfície da Terra.
cultivara pareelas por conta da alcleia, vendem o seu trabalho das suas forças activas, deve-lhe em Parte,
aos- proprietários e ajudam os pobres.
't África, esvazieda
as dificuldades actuais para sair da estagnação. O continente
. No'seio das sociedades camponesas, a entre-ajuda
reveste-se americano herdou os problemas de.integração racial que Parecem
de um carácter comunitário, rendo correspondência à touizø[291 insolúveis.
dos camponeses argelinos. Consiste num trabalho colectivo: Hoje o capitalismo generalizou o recurso à mão de obra
a consffução duma cesa, o amanho das terras, a colheita, tudo recrutada na região ou nos países que dispõem de urn excedente
executado no interesse duma família, tomando parte nele todos de força de trabalho: na Europa Ocidental, a imigração provém
os habitantes sem distinção de idade ou de sexo. Trabalho exe- essencialmente da Bacia Mediterrânica e dirige-se pâra as regiões
cutado com alegria e cantares encerrando-se com unr banquete. industriais onde a sua implantação trouxe o aparecimento de
A entre-ajuda pode até alargar-se a várias comunidades paisagens insólitas no espaço urùano.
vizinhas. M. Godelier (1) lembra que, nos Andes, os habitantes Muito cedo o homem aprendeu a inventac ferramentas,
. (1) A antropologia económica, ín L'Anthropologie scíelce des socíétés
máquinas que, não só poupam como facilitam a utilização
primítfues?, Denoël, 7977, p. 211, do esforço. O facto é bastante conhecido e parece-nos inírtii
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insistir nele: só evocaremos a extraordinina eûcâcta do material código de costumes que thes são próprios; os <Kanoun>. Conser-
usado hoje para nivelar o solo, arïasar as colinas, escavar túneis, varam a sua coesão através da religião do Islão e da colonização,
abrir estradas, edficar imóveis... Quanto mais elevado é o nomeadamente o grupo familiar que revela uma extraordinária
nível das ténicas, mais a construção do espaçogeográûco vitalidade.
escapa eos constrangimentos do meio natural, mais liwe fica Enquadrados rigidamente na famíiia,.os indivíduos vivem,
o homem para rcaltzar os seus projectos. trabalham, coruomem em comum sob a autoridade do patriarca.
' A sociedade está inteiramente motivade para a organtzação Virando as costas ao exterior, as casâs abrem para um pátio
do espaço em conformidade com o objectivã a que sJ propoe. fechado onde, ao abrigo dos olhares indiscretos, . a vida pode
Entrega nessa tarefa todos os meios de acção que o seu estaão civi- desenrolar-se livrementg. É a justaposição destes bairros fami-
lizactonal põe à sua disposição: a força de trabalho dos homens, liares fechados que desenlam a planta da aldeia.
o engenlo das suas invenções, o apoio nas suas crenças, das Pelo agrupamento de famílias, a aldeia ¿â trma forte
suas esperanças, das suas ambições. impressão de unidade, mas na realidade, divide-se.em duas Paftes
Assim concebido, o espaço geográfico é, na verdadeira que se distinguem uma da outra, com funções e restrições dife-
acepção da palavra, ürïr produto social porque resulta do
rentes e até uma certa rivalidade iatente entre os habitantes.
trabalho que a sociedade organizaparaalcançar o, ,.o, objectivos.
É o caso dos çofs:cof bouadda ou partido dominado çof oufella
Mas uma sociedade define-se essencialmente pelo sistema
ou partido dominante.
de relações que constitui a sua realidade prof,rttd". E é este
No entanto, a aldeia apresenta-se como uma comunidade
sistema de relações que se projecta no ordenamento do espaço.
administrativa à maneira duma pequena repfiblica rural pela
Isso é, afinal, o que revela a análise de alguns exemplos.
assembleia dos chefes de família: a esta tradição comunitária,
se deve a coesão da densa concentração de casas no cume dum
pico rochoso or1 aolongo de uma crista. Em volta, nas vertentes,
6. O espaço geográfico: Projecçäo no solo das relações .rt.oderrr-re os jardins, os camPos de cevada, as matas de
socl¿us figueiras e de olivais repartidos em propriedades familiares
exploradas em comum.
A,) Espaço e relações de parentesco . Nenhum vestígio de acção individual se observa nesta pai-
sagem que reflecte unicamente o domínio do patriarca. Domínio
No maciço antigo da Grande Kabília na Argélia, o homem ciosamente defendido contra qualquer perigo exterior: entidade
pertence a grupos sociais localizados num espaço baseada na consanguinidade, a aldeia afirma-se opondo-se às
{a-monlanha-
delimitado: famllia, aldeia, tribo que reunem os descendentes outras aideias. A utilização dum sítio de acesso difícil testemunha
reais ou supostos de um antepassado comum considerac{o como as lutas quq cada um teve de travar para salvaguardar a sua
o fundador. Estes grupos de parenres são regidos por um independência.
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Á. mesma estrutura do espaço se veriûca nos Chleuhs de O solo é proprieclade colectiva da comunidade de sangue
Marrocos: <A aldéia, escreve G. Surdon (1), é uma projecção da Fula e caåa míssídíy' conhece com precisão limites do seu próprio
os
consanguinidade no solo,r. Dela são excluídos todos aqueles território. .É ao Conselho dos Chefes de Família que incumbe
que_ não estão ligados aos habitantes por laços de parentesco: a tarefa de repartir, cada arro, as terras aráveis entre aqueies
os ferreiros, os judeus e.estrangeiros são relegados para lugare- que a elas tem direito.
jos afastados. Mas até mesmo a grande aldeia podã conrer em Na extremidade setentrionai do lago Niassa, nos Nyalcusa,
si bairros distintos correspondentes a clãs que se gue:reiam os homens que pertencem ao mesmo nível etário vivem num
uns aos.outros. mesmo lugar sob a autoridade de um chefe designado pelo chefe
. ..4 Áfica é abundante em exemplos de espaços geográficos supremo que thes atribui terras de. cultura, recebendo aí cada
concebidos para' responder às exigènci", d"i rehçães"sociais: homem a sua mulher. A pætir da idáde dg, ottze a teze
clãs, étnias, linhagens absorvem os indivíduos e tiram-lhes anos, os rapazes deixam a casa PaternaPara se estabelecerem
iniciativa. A sociedade é um compiexo de relações entre o num novo lugar mas, até ao casamento, regressam-cada dia
homem e o seu grupo e enfre os diversos grupos. Os factos são para .comer com a mãe e trábalhar numa agricultura de
bem conhecidos graças à abundante colheiá de .observações enxada com o pai (t¡. .: -'
coligidas por sociólogos e geógrafos. oç exemplos são r.umero- No entanto, o geógrafo não se deve deixar enganar pela
sos e bashrá relembrar algumas análises entre tanto material emologia, qualquer que seja o valor dos seus trabalhos; se as
acumulado, tornando a escolha embaraçosa relações de parentesco conservarn muitas vezes um valor exPli-
Conquistador do Futa-Djalon, o Fula organizpu o espaço cativo indiscutível na organização do esPaço, é também evidente
.de forma
a manter a sua supremacia. ,t linhagem que vem em que o contâcto prolongado com a Europa provocou transfor-
-de
directo do fundador detém um direito .ol.ãtirro proprie- mações profunda sna construção socio-espacial da África. Esta
áade: os diferentes ramos c{e linhagem localiza*-r. .rri o,irro, tem necessariamente de se adaptar às exigências da econornia
tantos lugares em volta da mesquita. o conjunto constitui de mercado introduzida pela colonização e hoje mais do que
a missídíé, centro religioso e dirigente: instala-se nos pon- nunca, àquelas que condicionam a independência. Mas os pode-
tos mais eleúados donde os habitantes podem vigiar seu res ligados às tradições resistem: por exemplo, na região de
gado e os antigos cativos. Os out¡os fulas povo"* logr- N'Kongsamba nos Carnarões, os chefes opõem-se com toda a
rejos ou Joulassos, situados em volra da nksídíé.. tenacidede à tendência dos jovens casais em se afastarem da aldeia
euanto aos
Negros descendentes dos Dialonl<és submetidos pela guerra, para ir viver em lugares ou em cubatas dispersas; vêem nisso um
são agrupados em .aldeias de agricultores-servo s, os ioundá, risco de desmembramento da entidade de iinhagem e uma ofensa
nos lougam de boas terras no fundo dos vales.
(t) Institutions'et ioutumes des Berbères du Maghred, Tanger e Fes, C) Georges Peter Munoocx, Africa its pèoptes and their culture hístory,
Les Editions Internationales, 1938, p. 303. McGraw-Hill Book Cy, 7959, p. 36L.
62 63
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à autoridade que thes vem dos antepassados, mas tudo em estavam acantonado s em melîal¿s situadas junto da qasba, sob
vão pois a aldeia perde a sua coesão. a protecção do sultão.
Os factos são por si evidentes; mesmo nas sociedades em Nos Estados-Unidos, a imigração multinacional deu lugar
evolução rápida, as estruturas espaciais herdadas dum passado ao mesmo fenómeno de compartimentação dos espaços urbanos
revelam muitas vezes um extraordinário poder de continuidade. um mapa étnico de Chicago publicado Por M. Halbwachs (1)
É bem o caso da Lorena onde as grandes aldeias compactas em I93à, estabelecia a repartição em bairros próprios dos Ale-
se dispõem pontualmente nos campos abertos e livres. A res- mães, dos Suecos, dos Checoslovacos, dos Polacos, dos ltalianos,
ponsabilidade deste tipo cle orgaruzação explica-se por uma dis- dos Judeus, dos Negros. Ainda hoje, a segregação racial isola
ciplina de vida comunitária ligada ao sistema de afolhamento os ñ.gror americanos ou os Sulafricanos em verdadeiros
trienal que implicou, no seu início, a rediçtribuição periódica <ghettos>.
das parcelas. A Europa Ocidental também ela, cotheceu os guetos
Desaparecidas as relações sociais, a paisagem reflecte, prova- reservados hoje, são os trabalhadores vindos da Bacia
velmente, um comportamento adquirido que não atingiu o
"* ¡ud.or;
Mediterrânica que se concentram nos bairros pobres e, frequen-
individualismo próprio da economia iiberal. remente ainda, nos ,.bidonvilley da periferia das grandes cidades.
Nos paises industrializados, a segregação étnica agrava-se com a
segregaçao económica, sendo as relações de produção, mais
B) Espaço e reîações étnicas do que as relações socio-culturais, que condicionam a orga-
nrzação do espaço
As diferenças étnicas estão muitâs vezes na origem de relações
dilíceis e até hostis entre os grupos socio-culturais, justapondo-se
então em espaços compartimentados. C) Espaço e rclações de Produção
Tal foi o caso verificado, durante muito tempo, em numero-
sas cidades muçulmanas onde raças e religiões viviam lado a Aeconomia, com efeito, domina as outras comPonentes
lado sem se misturarem: dividiam-se em bairros autónomos e da vida social: levou-as a responder às suas exigências para
fechados cujas populações, alvitas, cristãos, judeus, conseguiram assegurar a coerência do sistema. O seu poder de estruturação
uma existência própria. Max Sorre (t) lembra que, em 1932, intróduziu a unidimensionalidade na sociedade e no seu esPaço.
,{ntióquia contava 30 000 habitantes repartidos em 45 bairros Ernrazão duma evolução mais ou menos râpída, os ordenamentos
constituindo outras tantas células urbanas vivas. Em Marroços, herdados do passado sofrem uma ïemodelação que lhes permite
os judeus, ainda que participando activamente na economia, atingir a produção do lucro máximo.
(1). Ies fondemets de la géographie humaíne, T.Ill; L'habítqt, A. Colin, e) Reproduzido por H. B-a,ûttc, Amérique septentrionale, 2'" patte,
7 95t, p. 206. p. 477, Géographie uníuuselle, -A'. Colin, 1936'
65
64
5
Conhece-se por exemplo a transformação das estruturas a mentalidades que se opõem a inovações. Apesar das dificulda-
fundiárias em França. A Revolução e o século >nx tinha des crescentes do escoamento dos seus vinhos, o Baíxo Languedoc
pulverizado a terra numa quantidade de pequenas propriedades recusa-se violentamente a abandonar a viticulrura para culdvar
individuais divididas por um grancle número de parcelas: outras espécies mais especulativas tornadas possíveis peia insta-
antes do emparcelamento, o cadastro continla 76 milhões de
lação de canais de irrigação.
parcelas de uma área média de 46 ares. Desde meados do
Na economia liberal, as relações económicas suscitam
séc. xtx, o alargamento da economia concorrencial de mercado
antagonismos de que a:utiT:øação do espaço é muitas vezes o alvo.
desencadeou um movimento cada vez mais rápido para a cons-
Há mais liberdade de acção na economia socialista porque a
tituição de unidacles de produção agrícolas maiores e menos apropriação do espaço não é objecto de competição social.
dispersas. Este movimento de concentração acelerou-se no fim
Todavia, a URSS conheceu resistências à abolição da
da Segunda Guerra Mundial. propriedade rurai privada; os camponeses reagiram violentamente
São conlecidos os seus resultados: de 1955 a797I, o número
antes de se deixarem integrar na colectivização das terras.
de explorações decresceu de 2280000 para 1588000 ou seja Foi aliás necessário conceder-lhes o prazer da livre escolha de
uma diminuição de quase 700 000, enquanto a ârea média de uma casa e de uma parcela destinada à produção familiar.
exploração subia para mais de 20 ha. Esta evolução realizou-se
Hoje o espaço agrícola está repartido entre vastâs empresas:
à custa das explorações inferiorcs a 20 ha. cuja percentagem de os sovkhozes e os Kolkhozes muitas vezes contíguos, cons-
superfície agrícola útii baixava de 39 paru 27o/s do total, truindo unidades de produção cujas dimensões são adequadas à
ao passo que a das explorações superiores t 20 ha subia de utilização do material mecânico de grande rendimento- Geral-
67 paru 73o/o. mente, agrupam-se ao centro, as casas, os palheiros, os estábulos
Desta situação resultaram profundas perturbações nas estru-
e currais, os armazéns, os edifícios de serviços necessários à vida
turas da sociedade e do espaço francês: o êxodo rural veio de vários milhares de habitantes. Na verdade, a maior parte dessas
acelerar a ttrbatúzação e a proletarização da população; a queda
povoações constituem pequenas cidades rurais dotadas de equi-
demográfica de certas regiões é tal que aldeias abandona-
pamento social.
das estão em ruínas, terras voltam pouco a pouco ao ecos-
Se, contrariamente ao capitalismo, a revolução socialista
sistema, pois a acção humana sobre o meio afrouxa. ,{, pai-
pôde, fazendo tábua rasa da herança dos séculos, edificar um
sagem 'rural conhece, _às vezes, remodelações radicais: na
novo espaço agrícola adaptado ao seu projecto, nem por isso
Bretanha, e nomeadamente no Finisterra, o arrasamento dos
aboliu as relações de concorrência para a exploração d1 terra:
cômoros imposto pelo emparcelamento substituiu o <bocagø> l30f
entre as empresas estatizadas e cooperativas, surgiu uma compe-
tradicional por grandes extensões de campos abertos que perten-
tição baseada em relações de forças desiguais que favorece
cem a um só proprietário. os sovkhozes. Esres, preferidos pelos poderes públcos que os
Concerteza que as coisas nem sempre se desenrolam sem
consideram como a forma final dos socialismo, não cessam de
resistência, peïa rzrzão que as estruturas espaciais correspondem
crescer em detrimento dos Kolkhozes: de1940 al972,o númeio
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a +r-
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I.
de trabalhadores nos domínios do Estado Passou de 2 para Londres, na época do capitalismo triunfante inglês, para, em
10 milhões, p"tto que o das cooperativas se via reduzido seguida se generalizar pelo mundo fora: é o Gnómeno de
"o
de 29 pala 76 milhões (1). Quanto às pequenas parcelas indivi- <cidado que será analisado mais adiante.
duais, ainda que limitadas a um meio hectare, conseguiram dar Bastará dizer aqui que consiste na localtzação, no centro
aos ffabalhadores uma certa autonomia em relação ao sistema das cidades onde o valor do solo é mais elevado, das actividades
a tal ponto que a sua suPressão foi encarada por diversas vezes. do terciário superior, excluída a função residencial que a elas cede
Em contraparlda, o domínio do regime socialista deveria o seu lugar. Simultaneamente, um movimento científico exurba-
exercer-se plenamente na organização do esPaço industrial- niza pan a periferia, a função habitacional, as actividades indus-
triais, os grandes cerrtros comerciais na procura de espaços baratos.
-urbano, pois a rupidez do crescimento das cidades ultrapassouas
possibilidades de construção de prédios . Disso resultou uma ver-
As relações de produção fixam não só a hierarquia dos
dadei¡a segregação demográfica na política da habitação. Assim, indivíduos na sociedade, mas também a sua distribuição espa-
Leninegrado (2) conta 1 003 000 alojamentos Para 1 600 000 femí' cial no coração da cidade.
iias o que levou a agruPar 83% das Pessoas sós e 600/o das Aos diFerentes estatutos socio-económicos dos homens,
famílias de duas Pessoas no centro da cidade em aPartamentos correspondem outros tantos bairros urbanos. Toda a cidade
possui bairros burgueses, bairros operários, bairros subproletários
comunitários de que cada um consta 3,2 famiTtas em média.
36 47% das famílias mais numerosas ocuPam aPartâmentos indi- que se distinguem uns dos outros pela arquitectura dos seus
viduais na periferia da cidade. prédios, o traçado das ruas, a densidade da população, o Preço
De qualquer forma, o esPaço seja ele agrícola ou urbano, do terreno, o género de vida, os seus comPortamentos, os ruídos,
não constitui na LIRSS um capital cuja posse geraria relações os odores.
sociais antagónicas. A procura do domínio social está noutro
Sem dúvida que observando as coisas mais de Perto, os
lugar: <no controle das regalias que advêm de ser poder e que factos não são tão simples como parecem. Os investigadores
levaram mais longe a sua análise. A locelização dos grupos sociais
r.1.g"* todos aqueles que se situam num escalão inferior da
hierarquia política (3). na cidade obedece, é certo, aos imperativos do estatuto econó-
O .tptço, e particularmente o esPaço urbano, é, pelo contrá- mico, mas intervém também aqui e estruflira demográfica:
rio, na economia capitalista, o terreno onde a competição os casais idosos e sem filhos alojam-se perto dos serviços do
se exprime com mais força. Desta competição resulta uma
centro, tal como a <<Pequena Cidade dos Velho$ que conta
1 560 pessoas no centro de Copenhaga, enquanto os casais
orgatização específica que se desenhou pela primeira v& eÍn
novos com fiihos de tenra idade vivem em. casas unifamiliares
na periferia arejada (1).
(t) Pierre C¿nrrÈnn, L'économíe er URSS, Masson, 7974' p. -104'
þ) Colleaif de Leningrad. Un habitar pour toutes lesn."couúes de la
83-2, 7975, (1) Ver também J.-8. Racnw, lJn type nord-américaín d'expansion nétto-
popol"iioo, Recherches intunatíonales à lq lumíer du narxísme, polítain: La couronne urbaine du grand Moxtreal, 3T., Service de repro'
pp. 68 e seguintes.
duction des thèses, Université de Liile IÍ, 7975, p.748.
(3) H. La¡on¡r, op. cít., P. 228.
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A organização espacial da cidade resulta pois, em grande I 7. O espâço geográfico;6anrFo de representações si¡nbó-
parte, de um processus próprios do tipo de sociedade que a
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licas
efectuou. Analisada como tal, permite ao observador decompor !
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(Ð expressão é de Jacques Rufûé, De ld bíologíe à la culture,
Flarnmarion, 7976, p. 350. (Ð E particularrnente Pierre D¡rroxranr¡s, Gê.ographíe et religíons,
('z) Le capital et son double, PUF, 7973, pp. L7 e seguintes. NRF Gallimard, col. uGeographie þunrins)r, n,' 27, 7948.
70 77
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Em cada eno, a comunidade procede à distribuição das ter- Tal como o espaço rural, a cidade é na sua otganização
ras entre as famfias, que se instal¿m na parcela que the foi atri- a'consequência das características socio-culturais das socied¿des
buída, incendeia a vegetação com o cuidado de conservar tradicionais. Jacques Binet mosffou-o num at'tigo precisanrente
os troncos calcinados que servirão de refúgio aos espíritos afas- intitulado: <LJrbanismo e linguagem na cidade africanu (1).
tados pelo fogo. Uma palhota sobre estacaria é construída ,.t disposição em bairros, <este urbanismo em cacho, escreve
no cume da encosta desbravada com o fim de ffranter contacto ele, tem razões muito longínquas e liga-se a tradições muito
com as divindades da floresta (1). antigas e duma certa manelti I filosofia clássica de África.
Desta forma, em p^z com os poderes ocultos, a família E acrescent": ,Às vezes, é uma metatísica que se exprime atråvés
semeia o seu aftoz, sacha até à colheita, segundo o calendário da planta da cidade>.
dos trabalhos fixado pelä tradição. A organizTçio do espaço e É inr:tit insistir no carâcter ritual das cidades chinesas
as actividades dos homens obedecem a regras sagradas que seria que apresentam um plano quadrangular. <A Terra é consi-
ímpio trensgredir. derada como quadrada e o quadrado é sagrado; a cidade tem de se
Em toda a ilha de Madagascår, a casa é um rectângulo adaptar eo plano geral do LJniverso... O urbanismo é aqui
alongado de norte para sul opondo um muro contínuo à geomântíco l34f no interior, todas as ruâs estão dispostes em
exposição hostil do Leste e abre-se largamente a Oeste para xtdrez e os viajantes foram surpreendidos pela imensa mono-
onde o So1 poente se desloca, sendo o ângulo Nordeste dedi- tonia das aglomerações chinesas com o seu geometrismo
cado aos antepassados. Às paredes e aos ângulos formados Por sagrado (2).
elas iigam-se significados zodiacais favoráveis ou nefastos. Pierre Gourou (3) lembra como o Império Khmer con-
A cubata não é só a habitação dos homens, ela reflecte cebeu a organtzaçio da região de Angkor: (O conjunto
toda uma cosmogonia. Muitas vezes, para respeitar os impe- angkoreano é a justaposição de superffcies quadradas de orde-
rativos da orientação, as casas camponesas estão dispostas obli- mento... O espaço quadrado é conforme com a representação
quamente ao longo das estradas. que os índios tinham da forma do mundo. Geralmente
Em Trístes troytíques, Claude Lévy-Strauss analisou com o plano quadrado irupira-se na cosmogonia e na simbólica índia,
muita profundidade as signiûcações simbólicas do habítat dos to*"nðo o ordenamento do território um carácter sagrado>.
<Bororo>. Contentar-nos-emos em lembrar aqui uma das Mas tem também um signiûcado econónr.ico, pois o equipamento
suas conclusões: <A estrutura da aldeia não só permite o jogo hidráulico instalado permitia a dupla colheita anual do arroz.
perfeito das instituições, mas resume e assegura as relações entre Os pentápolos de Mzab exprimem o ideal político e reli-
o homem e o tlniverso, entre a sociedade e o mundo gioso dos Kharijitos. Tidos como heréticos, estes fugiram às
sobrenatural, entre os vivos e os morto$.
. (1) Díogùte, Gallimard, n'o 93, 1976, pp. 90 e seguintes'
(2) P. D¡rrovr¿r¡rrs, Géographíe et religions, pp. 756-757.
(') uA aldeia temporária junto da qual se faz a queimada escreve e) As mudanças de civilização e a sua inf.uência nas paisagens,
J. Dnz, é o lugar privilegiado da aproximação com os poderes ancestrais>. Intpact, UNESCO, vol XfV, n.o 1, cap. 64, pp. 63 e seguintes'
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perseguições refugiando-se no Sara, frrndando aí cidades-Estados estatuto social dos indivíduos, permitindo identificar o esPaço
cuja organização simboliza a sua sociedade teocrátic" (t). industrial, definindo a sua dependência ao capitalismo ou ao
Chardara cobre um monte rochoso, estando o cume ocupado socialismo.
pelos edifícios religiosos, nrinaretes e mesquitas em volt" dos O espaço da civiTrzação industrial tende Para e unidimen-
quais vários bairros hierarquizados estão dispostos em círculos sionalidade, estando longe da riqueza de expressão do esPaço
concêntricos até ao sopé das encosras; primeiro o bairro dos clé- correspondente à civilização tradicionai'
rigos, mais abaixo, o dos fiéis ibaditas, vindo depois o dos Sociedade e Espaço aPresentam-se assim, tal como a relação
estrangeiros à comunidade (Árabes,
Judeus, Negrosl. Fora das entre criador e criação. Esta permite àquele realizar-se segundo
fortificações muralhadas, os souks, e mais longe os palmares a suâ própna razio de ser, nela refl.ectindo a sua imagem fiel.
onde se espalham casaS individuais que só Ã .,r.rão esrão Entre eles, a identificação é total.
ocupadas.
Toda esta simbóiica responde nas sociedades tradicionais
à necessidade deinteriorizt o espaço, de o dominar integrando-o 8. A sociedade identiûca-se cofil o seu esPaço.
no sistema de cultura, de instaurar entre os diferentes quadros
da vida uma unidade agradável, compensadora para os indivíduos. Os bióiogos recordam muitas vezes a solidariedade da vida
_ Á. industrialização do espaço não eliminou todos os vestígios com o seu meio. É 1. S"it< (t) qo" escreve: <cada ser vivo
duma simbólica vinda de um passado iongínquo. Apesaido. possui um meio interno e um meio externo que são Parte
estreito pârentesco que the conGre a economia, o mundo iot.gt*t* da sua própria existência. E Edwald T. H"li (')
latino, o mundo germânico, o mundo anglo-saxónico ainda se acrescenta gue (o homem e os seus esPaços constitueûr aPenas um
distinguem uns dos ourros pela expressão diferente que apre- só e único sistema... Esta interdependência do homem e dos seus
sentam as suas casas, os seus campos, as suas aldeias, as suas espaços deveria fazer com quc déssemos mais atenção aos esPaços
cidades tais como séculos de história os projectaram. que cr'iamos, não só no nosso próprio interesse, mas tambérn
No entanto, esta diversidade apaga-se cada vez mais face para aqueles com os quais se corre o risco de não se poder
à uniformização que resulta do emprego dos mesmos materiais, adoptan,.
das mesmas técnicas. o espaço das civilisações industriais, ele A organização do esPaço cria entre o homem e o meio
também, tem o seu código: tem um valor de linguagem, mas de laços místicos que rcahzam uma íntima adaptação do social
uma linguagem carregada de significador .iot ã*i"or. As e do espacial: é o que afrrma J. Faublée na sua Ethnographíe
estruturas fundiárias, os prédios, os bairros urbanos, as estradas, de Madagascar (3): <O Malgaxe integra-se no universo iden-
a circulação, todos os componentes da paisagem constituem tan-
tos ouffos sinais reveladores do sistema económico e do
(1) Jonas Sarr, Métaphores biologiques, Calmann Lévy, 1975, p. 76,
(2) E. T. Hen, La ilimension cachée, Seuil, 1971, p.237.
(1) M. Mrncnn, La ciuílisation urbaine au Mzab, Alger, pfìster, 1922. (3) Paris, Les Éditions de France et d'Outre-Mer, 1946, p. 716.
74 75
tificando-se com ele... tlma certa simbiose opera-se entre si A Geografia rcterâ as análises anteriores que e organização
e o meio onde vive habitualmente; desde então, a aldeia do espaço tem por finalidade estabelecer ao Procurar uma corres-
onde habita, os errozais que cultiva, a região onde vive são pondència necessária entre a sociedade e o esPaço' graças
^n
já um pouco de si... Eles identificam-se)). A identificação qo"l uma sociedade se sente adaptada ao sell esPaço assim
efectua-se sobretudo entre o túmulo e a terra que o cobre: os .orio a felicidade do homem deverá encontrar-se em si mesmo.
doisligam o homem aos seus antepassados que organizaram o Na verdade é bem o caso das sociedades tradicionais bem
fokontany, o espaço onde se perpetua o fokonola, a comuni- adaptadas ao espaço. Visavam atingir não o desenvolvimento,
dade familiar. A ligação ao meio é tal que o Malgaxe mas apenafi a permanência através de uma estabilidade dinâmica.
não pode suportar a eventualidade de não ser enterrado no solo Regidas peb lo" própria racionalidade, estas diferiam profunda-
natal. *.i. d"s so.ieãrdl industriais, obrigadas . à transformação
A nossa civilização tradicional conheceu esta conivência pela insacibilidade. O seu estado de equilíbrio não era estagnação,
entre os grupos sociais e o seu espaço: na Idade Média, a case i.roltrrr* sim de uma coerência estrutural entre as necessidades
pirenaica, <ra dotøus, escrevia Emmanuel Le Roy-Ladurie (1), de uma sociedade e a orgtúzação do espaço' O conjunto
ou o grupo doméstico vivendo debaixo no mesmo tecto organi- permanecia estável entre as oscilações provocadas peias agres-
za-sena sua dependência... o fogo da lareira, os bens e es terras, sões do meio circundante.
as crianças, as alianças conjugais>. E ruma pessoa moral, Mas são especialmente as agressões das outras sociedades que
indivisível em bens e detentora de um certo número de direitos: vêm destruir esta ordem. A.s do capitalismo, sob a forma
exprime-se pela propriedade duma terra, pela udliz¿çle d¿5 colonial, estenderam-se Por toda a terra, Provocaram em todas
florestas e das pastagens comuns de montanha.>. as civilizações tradicionais transformações resultantes da oposição
É desta identificação profundamente sentida gue nasceu o que a sua brutal introdução originou entre as sociedades e os
animismo com que o homem se projecta no mundo inanimado åp"çor. A tribo JK no Uganda deslocada hi uma vintena de
através das suas crenças, receios e esperanças. O animismo, seu território habitual, perdeu a vitalidade e
já não conta
"rior-do
escreve Jacques Monod (2), estabelecia entre a Natureza e o hoje senão com algumas dezenas de furdivíduoi: <Incapazes
Homem uma profunda aliança, fora da qual apenas parece de se reconverterem em agricultores, estes caçadores, outrora
estender-se uma assustadora solidão. Por esta aliança, a (antro- felizes e prósperos, transformaram-se em menos de três gerações'
pomorûzação> da îaruræa comunica ao homem poderes sobre- l.rrlgurrr"i Pequenas comunidades de aldeões degenerados' cuja
naturais que formam o conteúdo da magia (3). única preãcÇ"çao é a sobrevivência individual e que têm
,.rrorr.il"do pão.o a Pouco a toda a vicla sociai> (1)'
(1) Itdontaíllou, uíllage occitan, NFR-Gallima¡d, 7975, pp. 53 e 60. No seu livro psiianalyse et anthropologíeg, Geza Roheim
('z) Le hasard et la nécessité, Seuil, 1970, p. 44. cita o exemplo dos Kaingang que vivem hoje como nómadas
(3) Ler-se-á com proveito as páginas que Maurice Godelier dedicou a
este assunto in L'Antrohpologíe: Science des socíêtês primitíucs, obra colectiva (t) a"lin TunN¡urr, un petryle de fauues, Stock, 1973'
publicada por DenoëI, 7977, pp. 216 e seguintes. (') Gallima¡d, P' 347.
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Todavia, aparecem formas de resistência entre as populações,
Argentina, depois de terem praticado uma agricultura à base
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a quem pressões exteriores impõem uma organização do espaço
de milho e abóboras nos planaltos donde foram expulsos. I
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estranho às suas tradições. Àos Betsimisaraka de Madagascar
O traumatismo originado pela separação da terra mãe, fez ¡
não falta o engenho (1) pois, como já sabemos, estes habi-
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dos Kaingang um povo cheio de angústia, um povo que se I
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tantes de montanha continuam a viver da cultura. itinerante
desintegrou quando se viu afætado do seu espaço organizado. I
do arroz sujeitos à organização socio-espacial que lhes legaram os
I
No Senegal, a monocultura do amendoim expulsou o milho I
I
seus antepassados.
miúdo e as outras culturas alimentares de solos arenosos do i Nos anos 7935-1940, a administr^çio colonial francesa
Cayor, donde os Ouoloß tiravam a sua subsistência. prepa- impôs-lhes a cultura do café. Nas m4rgens de um rio foi
rado para produzir espécies destinadas ao consumo dos países aberta uma picada ao longo da qual se estabèlecem plantações
industrializados, o seu espaço é, doravante, intimamente inte- e as cubatas constituem-se em aldeias. Constata-se assim que a
grado no mercado mundiai que detém o controle da produção, vida dos Betsimisaraka se divide entre os dois espaços segundo
dos investimentos, dos poderes de decisão e o alargamento da uma dicotomia estrita.
sua acção substrai esse espaço ao domínio dos habitantes que Primeiramente, entre as actividades produtivas de Novem-
esperam clo exterior uma parte da sua alimentação. A esta bro a Julho, o cicio do arroz leva à instalação da família nas
reestruturação do espaço, corresponde necessariamente a uma palhotas de montanha; em Agosto, é a descida à aideia onde as
mutação da sociedade autoctone ievada a alicerçar a sua orga- plantações de café exigem trabalhos até Outubro [35].
ntzação, já não sobre a célula familiar, clã ou ernia, mas A estas migrações estacionais correspondem dois géneros
sobre a posição dos indivíduos no processo da produção, uma de vida diferentes. Na tauy orízícola, o Betsimisaraka
sociedade que já não se rege no sistema de parentesco, das prossegue o diílogo conr os antepassados: usa vestuário de
tradições, das festas, dos ritos, mas construída e apoiada unica- fibras vegetais, come aÍÍoz em concavidades das folhas da
mente na economia monetária. Sobre um espaço descoclificado bananeira e repârte as tarefas segundo a divisão sexual do
ou melhor, privado das significações simbólicas que referenr. trabalho. O regresso à aldeia ca{æ,eira restabelece o contacto
o seu modo de vida, o homem já não esrá mais em equilíbrio com o mundo e>fterior: a família retoma o vestuário europeu,
com o meio que lhe foi imposto do exterior; já não é senhor usa as alfaias de importação, consome os produtos comprados
de si, vive como um estranho na sua própria terra e este no mini-mercado. Cada um trabalha na plantação de seu pai:
divórcio é gerador de desordem, de insegurança, de aiienação. a muiher deixa o lar conjugal de Agosto a Outubro e vat fazer
Pense-se também nos traumatismos que sofrem os habitantes a colheita do café na sua aldeia natal na companhia de seus
dos nossos grandes centros proletários e das novas cidades, irmãos e irmãs. O casal consome em comum a produção
condenados a viver num espaço urbano concebido paa rc^lirar
o máximo lucro e não para responder à sua necessidade de (t) Gérard Ar.tmlE, Opyuessíon et libératíon dans l'imagínaíre: les commu-
viver em comunhão com o meio. nøutés uillageois dela côte oríettale de Madagøvar, François Maspero, 7969.
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alimentar do tauy e dispõe do rendimento nonetário da necessários à construção das cubatas e à confecção das roupas e
venda do cafë. utensílios.
De qualquer modo, a colonização teria provocado nas socie- Com a rcalrzação dos projectos concebidos para escapar à
dades tradicionais onde se fez sentir a sua acção e que não ordem natual das coisas, as sociedades empenham-se na história
estavam preparadas para a mudança, o desequilíbrio entre o e na construção do espaço. A partir de então, sociedades e
homem e o seu éspaço: esta . inadequação é hoje um dos espaços são arrastados numa mesma corrente cuja força e direcção
factores das dificuldades para encontrar um novo equilíbrio. variam com o decurso dos séculos. Â história conduz o jogo:
<Compreendida como processo de desenvoivimento das socie-
dades humanas, aperfeiçoa os espaços, transforma-os e atribui-
9. Historicidade do espaço geográfico -lhes, em momentos diGrentes, uma utilização, funções e valores
fortemente diversificadoe, (t). Não somente criou os espaços, mas
estabelece entre eles relações de interdependência feitas de domí-
Se, como acreditamos tê-lo mostrado, existe uma corres- nio e de subordinação.
pondência necessária entre a sociedade e o espaço, ambos evoluem Assim, a história projecta-se no espaço, reflecte actuações
necessariamente seguindo uma diacronia paralela. sucessivas: o espaço apresenta portanto, a sua historicidade e
A história começa no momento em que o homem adquire torna-se uma dimensão da história. A cada geração humana
a possibilidade de se libertar da ordem imposta pela narureza, corresponde uma geração espacial e seria interessante tornar a
e com ela começa também a organização do espaço geográfico. escrever a história, reconstituindo a cadeia das transformações
. As sociedades sem história viveram em espaços ecológicos. sofridas pela geografia. Ver-se,ia que uma organização do espaço
Maurice Godelier (1) lembra que os Indios Pés-Negros da desaparece lentamente, resiste mesmo enquanto outra ocupa o
América do Norte viviam em simbiose com os rebanhos de seu lugar. É por isso que, num dado momento da evolução,
bizontes que seguiam nas suas deslocações estacionais: perma- a sincronia dum espaço pode apresentar uma composição poii-
neciam agrupados em Eibos para praticârem a caça de verão, génica.
mas, chegado o inverno, dividiam-se em famílias caçando por Tais são, por exemplo as paisagens da Baixa Provença,
sua conta os animais que a raridade da pastagem obrigava a feitas de componentes residuais de aldeias alcandoradas, cujos
a seParar-se. terraços dispostos em andares ao lòngo das encostas das colinas,
Ainda hoje, na Nova Guiné no golfo da Papuásia, as delimitadas em parcelas por renques de amoreiras. Tudo isto,
sociedades obtêm a sua subsistência pela recolecção, caça e pesca. são testemunhos duma outra época, meio arruinadas, invadidas
Os povoamentos naturais de palmeiras sagu e diversas espécies por vegetação selvagem, desGitas pela acção do tempo. Anacró-
florestais fornecem-lhes a alimentação essencial, os materiais
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nico em relação à época das grandes autoestrâdas saturadas Por I rios individuais que se mantêm, muitas vezes, fiéis às velhas
um tráfego caãa vez mais rápido, indiGréntes no seu traçado ao T práticas. A colecdvização das terras e a moderntzação das
meio onde se inserem, resultantes de um insolente modernismo. I técnicas que constituem o objectivo do socialismo são aí
J
,{nacrónico, mas em vias de ressurgimento desde a abertura da postas em cheque. Também o espaço industrial tem frequente-
J
era do turismo e das residências secundárias que reanimam a vida I mente dificuldades em seguir a corrente da história. Na Grã-
I
e recuperam as ruínas. I -Bretanha (1), as regiões da primeira geração industrial, Yorkshire,
I
Ta|vez seja nas cidades que melhor se constata esta sucessão I North-'W.est, East-Middlands são votadas a actividades hoje em
no tempo, constituindo autênticos documentos de arquivo: declínio, não estando envolvidas no movimento de reestruturação
a arquitectura dos edifícios, ruas,lojas, a atmosGra, a composição industrial e de renovação urbana.
da população. A justaposição dos bairros faz passar o obser- Contudo, a história deve ter em conta o peso do espaço
vador atento da Idade Média até aos nossos dias e anuncia-lhe, geográfico, pois é na'construção desse espaço que sempre se pre-
muitas vezes, o futuro. para o futuro.
A,liás, uma brusca descontinuidade no esPâço, denuncia uma Tal é, sem dúvida, o objectivo perseguido pelo planeamenro.
lacuna no tempo; tal é o caso da Ilha de Reunião onde se A execução actual do complexo industrial de Fos que será ligada
justapõem, sem transição, a paisagem açucareira da era colonial ä região do Ruhr através de vias navegáveis e o equipanento
feita de campos de cana do açúcar, engenbos, aldeias de turístico da costa languedociana reflectem um ordenarnento
palhoças formadas Por Pequenos troncos e a paisagem urbana do território de que não podemos ântever a sua amplidão, mas
onde os poderes públicos fv,eram surgir grandes imóveis e torres que conduzirão necessariamente a um desenvolvimento socio-
para habitação. -económico e até mesmo político, num futuro mais ou menos
Contudo, o espaço geográfico aPresenta o Peso das estruturas, próximo.
resistindo à evolução e às modificações ProPostas pela história. Do mesmo modo, está em curso e com todo o vigor,
As mentalidades que suscita e os investimentos que exigem a reorganização do espaço em evolução exigido pelo funciona-
travam as iniciativas e as inovações. Já referimos a recusa mento da Comunidade Económica Europeia, com a introdução
dos viticultores laguedocianos a abandonâr uma produção que de novas reiações de força entre os Estados participantes, tendo
dificilmente se escoa no mercado da Comunidade Económica sido já apresentados vários tipos de modelos.
Europeia, daí as difìculdades nas relações da França com os seus História e geografia apresentam uma evolução sequente,
parceiros. Do mesmo modo a vinha abandonada pela coloniza- pois uma precede ou segue a outra. Mas é bem evidente que é da
ção resiste, apesar cla sua inadequação à sociedade argelina e história que vem a maior parte das vezes o impulso, de maneira
aos
problemas que a exportação da produção põe à política externa que a geografia é levada a procurar na história âs suas explicações.
do país. Idêntica resistência se verifica nas estruturas espaciais Fazendo isto, ela trai a sua especificidade: o seu objectivo não é
nalgumas democracias popuiares, especialmente na Polónia
onde 85 o/o da superfície agrícola útil está na Posse de proprietá- (t) ]eaa-Claude PlnuN, Ie deueloppement régional, PVF, 1974, p. 1,33.
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a realidade actual.
A sua problemática é organi zactorrù-. É também Pros-
pectiva na rnedida em que, a sincronia já esrudada mostra que
ã .rp"ço de hoje contém em si o esPaço de ama"hã. CA,PÍTIIIO ru
Èstamos longe do objectivo que, segundo Heffi Lefebvre (1)
é perseguido pela geografia dentre as ciências humanas e afumava: A DIALÉCTICA ESPÂçO.SOCIEDADE
uTodos os especialistas, escreve ele, cingem-se à nomenclatura
e .à classifi cação daquilo que se encontra <dentro> do espaço.
Constatar; descrever, classificar os objectos que ocuPam o'esPaço, Vimos anteriormente que a geografia não é uma ecoiogia
isto será em suma, a actividade positiva udesta ou daquela espe- humana: tem por objectivo não só a análise das relações entre-o
cialidade e dizemos ser geografia...r. homem e o meio natural, mas também o estudo dos processos
Seria nada compreender do que é considerado geográfico, por que a acção projectiva da sociedade transforma um espaço
ver no espaço somente um suPorte da acção humana, enquanto natural num espaço geográûco com o qual. se identifica. É no
que na vèrdade o esPâço é uma construção da sociedade, cuja desenrolar desta transformação que a sociedade se estrutura numa
produção não é só uma manifestação mas a sua própria rea- entidade original.
bzação. Melhor dizendo, a sociedade cria-se, criando o selr espaço:
Existe com efeito uma dialéctica espaço-sociedade; os os dois formam, em conjunto, um todo indissociável que sofrem
homens criam o esPaço e, nesta obra de cnação, organizam-se a mesma evolução.
em sociedade. As ciências lr.umanas estão, doravante, de acordo com
esta concepção É Serge Moscovici (1) que declara: <Numa
descrição coerente da génese da sociedade coloca-se primeira-
mente uma humaridade dominada pelas necessidades primárias.
Para apazigaar a tirania destas necessidades, a humanidade vai
.âctuar sobre o mundo exterior.
Comportando-se desta maneira, moclifica-o e transforma-o
paralelamente. No desenvolvimento deste processo, os indivíduos
e os grupos estabelecem laços económicos, políticos, intelectuais,
destin¿dos a assegurar-lhes a apropriação dos bens, a continuidaJe
(1) Le production..de \'eqtace, .Anthroposo, 7974, p' 128' C) Essaí sur I'hktoire humaìne de la natwe, Flammarion, 1968, p. 15.
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das produções e a manutenção das instituiçõeu. É o que Eclward Os Tofirrnu constituem uma enria do Daomé organizada
T. Hall (1) confirma numa frase muito curta: <O homem está numa sociedade lacustre no meio do lago Nakoué: aí habitam
agora habiiitado a construir todas as peças que forman â com- em cubatas apoiadas sobre pilares [39], utiliz¿111 ¿¡¡pclilhas de
plexidade do mundo em que vive: é o que os biólogos ramagem para atrair peixe, as pirogas monóxilas [40] cavadas
chamam de ubíítopoo [36]. Criando este mundo, ele determina no tronco de uma só árvore, as velas, os curtos remos de pangaio
de facto o organisno l37l que serô. utilizados como propulsores. Distinguem-se dos agricultores
A análise de alguns exemplos permitirá destacar o Processo que ocupam as margens do lago, os '{guenou, por tudo
pelo qual a sociedade se organiza pela utilização do seu esPaço. quanto define uma especificidade éurica.
Debruçar-nos-emos primeiramente sobre os casos referentes à Ora as tradições relevam que os Tofinnu são antigos
Ãfric^. agricultores que, fugindo dos caçadores de escravos vindos do
Estamos hoje convencidos que a maior parte das savanas Oeste, se refugiaram, em meados do séc. x\rlu,Ir.o lago Nokoué.
do continente negro são de origem antrópica [38]. Grupos Tiveram que inventar tudo, fazer tudo quanto necessitavamsendo
de colectores, de caçadores nómadas vagueando na floresta os esforços desenvolvidos em comum, para viver e sobreviver,
passaram pouco a pouco à prática de uma agricultura sobre a elaboração colectiva de téøricas de pesca: vocabulário, instru-
queimada. Ao longo dos séculos, esta prática acabou por mentos, processos, ritos, com vista a uma aplicação. Numa
fazer substituir a árvore pela erva, a floresta densa pela savana palavra, a criação do espaço reunia os homens numa rede comum
aberta. Mais tarde, as comunidades agrárias, recuando perente de hábitos e de costumes, num sistema socio-cultural complexo
os enormes esforços que a cultura em clareiras exigia, escolhe- de solidariedade, da qual nâsceu a étnia Tofinnu.
ram agrupar-se em comunidades pastoris, apascentando os seus Os mesmos processos evolutivos originam os grupos étnicos
rebanhos ao longo dos espaços herbáceos que a agricultura nas Rivières du Sud a partir dos fugitivos expulsos das regiões
thes tinha fornecido por abandono. Assim, o esforço humano sudaneses pelas incursões Fulas do século x\ru ou xvII. No
valorizou-se com menor custo. A organização do esPaço século xr¡ui eles chegaram às costas do Oceano
'ttlântico,
tornou possívela transformação da sociedade f). O nomadismo fixando-se num complexo de estuários cortados por braços
teria sucedido à agricultura, contrariamente à teoria até agora fluviais, de ilhas aluviais, de flechas arenosas, cobertos por
admitida: a existência de extensões herbáceas atralram as tribos revestimento vegetal e banhados regularmente pela maré, onde
nómadas que as invadiram, subjugando os Povos autóctones. passaram a viver pobremente, cultivando o anoz em meio aquá-
tico usando uma variedade asiática introduzida pelos Portugueses.
Este meio repulsivo oferece-lhes um refúgio que eles apren-
C) La dimmsíon cachée, Seuil, 7971, p.17. René Dubos diz: uo homem deram a organizar, desbravando, criando campos de arroz
modela-se a si próprio pelas decisões que toma para modelar o seu meio>.
X Xdgar Morinãcréscente: (a produção produz não somente os produtos mas inundados e cercados por pequenos diques e canais de drenagem,
o ser produtonr. en-ûm, toda uma paisagem elaborada do tipo polders. A parti-
e) Ver sobre este temaEsrln Bosnnul, Evolutiott agraire et pression déno- cipação na mesma luta contra o meio natural, segundo os mesmos
gralthíque, Flammarion, 7970, pp, ?3-24.
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ritmos por prática quotidiana das mesmas actividades, o uso com este espaço, organizou-o, equipou-o, explorou-o, udlizou
dos mesmos uteruílios, o exercício do mesmo modo de vida, técnicas de produção através duma agricultura mecanizada,
firndada sobre a orizicultura, a adopção do mesmo compor- campos de ensaio da moderna cultura do amendoim, cooperativas.
tamento face a uma mesma vivência, acabaram por fundir Pequenos centros urbanos: Kafñ{ne, Boulel, Guédé, desenvolve-
todos estes imigrados de origem diGrente numa mesma comu- ram-se à volta da capital Touba. A partir de uma comunidade
nidade que utiliza a mesma língua: assim nasceu a sociedade religiosa, uma sociedade estruturou-se na acção colectiva da
Baga (1). exploração do solo.
No delta interior do Niger, é. a paníapação no mesmo Analisar-se-á um exemplo, mais significetivo ainda: o do
modo de vida, quer di"er, a exploração do.meio geográfico ndscimento e desenvolvimento do Estado Mérina no coração
que o faz englobar nessa etnia (2): os Bozo praticam a pesca da ilha de Madagascar (1).
nos braços do rio e nas planícies de inundação, enquanto A história começa no princípio do século xvüI com a
que os Somono, montados nas pirogas, utilizam as redes para instalação, de um pequeno reino sujeito e um régulo, no cimo do
explorar as águas profundas do Niger. Os Bambara cultivam rochedo de
'{.nalamanga
o qual se tornou o sítio primitivo de
o milho miúdo nos aluviões secos, mas os Marka cultivam Tananarive. Do seu roua åomina uma vasta planície Pantanosa
as marinlas de arroz nas terras submersas de maior espessura coberta de densa vegetação e o seu mérito e o dos seus
de água. Quanto aos Peuls, estes são Pastores, apascentando as sucessores terá sido compreender as suas ricas potencialidades.
suas manadas de bois. Já dissemos como, com a ajuda da corveia real [a1] que mobi-
Assim parece evidente que uma sociedade se forma a partir lizou todo um povo, o pântano foi transformado em arrozais
das actividades exigindo a exploração do espaço geográfico irrigados, clensamente povoados e capazes de dar duas colheitas
ou, como escreve Jean Gallais: <O laço original que une uma por ano.
etnia às ténicas de produção explica que o indivíduo renuncie No século xvlu o Processo está completo. Do arranjo do
voluntariamente à sua origem, se as circunstâncias particulares espaço nasceu um povo organizado e governado com fumeza
o obrigam a mudar de existêncio. (Jm Peul que casou com uma pelo seu rei. A colonização da planície forneceu, com efeito,
mulher Bozo deve praticar a pesca em água Pouco profunda a infraestrutura territorial sobre a qual se identificou o Estado
para ser integrado no grupo Bozo. Mérina. Mas a planície não foi somente uma simples encenação
indiferente à história. Pela sua resistência, impôs aos homens
Já assinalámos que no Senegai, um esPaço geográûco nasceu
da vontade do chefe da Confraria Mourida. Esta identificou-se a coesão, o esforço colectivo, a disciplina social sem a qual não
haveria qualquer eficítcia; pelas suas virtualidades deveriam
transformar-se em riquezas que por sua vez eram uma fonte de
C) Denise Paul,ivu, Des rizícubeurs afrícaíns: les Baga, Cahiers d'Outre-
-Mer, Bordeaus,7957.
(1) H. Iswano, les bases géographiques de la monarchie hovu Euentail
e) Ver ]ean GÂLtÄts, Sigtíf.cation du Grupe ethníque att Mali; L'Homme, de l'hßtoíre úuante, Honmage à Lucien Fèttre, Armand Colin, 7953, t.I, p. 195.
Maio-Agosto, 7962.
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poder, poder económico, poder demográfico e poder político. tivos dos camPos, dominam a Confederação Geral dos Agri-
Desta concentração de forças ia surgir o imperialismo Mérina. cultores da Argélia, as delegações financeiras e a rnaior parte dos
Os reis puderam, a partir daí, cobrar os impostos, organizar jornais defendem a sua causa. É, evidenteme[te, uma enorme
um exército permanente e ultrapassar as fronteiras na conquista concentração de poderes nas mãos de uma minoria.
dos territórios que os separavam do mar. Em 7829, pela morte A proibição legal das plantações impostas pelo estatuto
de Radama I, o Reino Mérina chegava à costa em vários pontos. vitícola fez dos colonos viticultores uma classe privilegiada
Todas as sociedades ditas hidráulicas, organtzaram-se, ta1 dotada de um monopólio rendoso: o da exploração da vinha
como o Reino Mérina, na tarefa de organizar o espaço a na Argélia. Doravante, o seu comPortamento é condicionado
partir das águas de um rio, tal como se verificou com o Nilo, pela vontade de defender uma conquista adquirida.. Em meio
o Eufrates ou o Indo. século, os <,self made menl [42] dos tempos heróicos trens-
Um último exemplo mostrar-nos-á como a sociedade formaram-se em conservadores pois já não parecem dispostos a
colonial Argelina se constituiu com a criação de uma grande área lançar-se em novas aventuras, ocupando-se em melhorar e conso-
vinhateira nas planíceis e nas encostas do Tell (1). lidar os resultados obtidos. O receio de aplicar os seus capitais
Em 1880, após o fracasso de várias tentativas para introduzir no camPo leva-os a Procurar frequentemente os empreendi-
culturas de plantas industriais em grande escala, a colónia está mentos urbanos mais seguros do que os investimentos fundiários.
à beira da bancarrota. Contudo, um acidente, a crjse da Os pioneiros transformaram-se em burgueses e a maturidade
ûloxera em França, abre a ere da viticultura na Argélia: em social foi rapidamente atingida.
menos de meio século, a vinha cobre 400 000 hectares, capazes Com a criação de uma grande área vinhateira, a pro-
de produzir até 22 milhões de hectoliros de vinho. Modelou, Ietanzaçio das populações indígenas, acelerou-se' tânto Por um
como já vimos, várias regiões à imagem das regiões vitícolas do imperativo necessário, quanto uma grande Parte do solo Passava
Sul da França e sobre o regime de propriedade e de exploração para as mãos dos euroPeus. Na ausência de quaiquer indústria,
basearam as relações de produção que estruturaram fortemente a só os salários pagos pelos coionos podiam oferecer recursos mone-
sociedade. tários aos indígenas sem terra ou aos pequeníssimos camPoneses.
De um iado os colonos, senhores da quase tot¿lidade da Melhor que os cereais, a vinha criava trabalho: um hectare de
vinha: pequenos proprietários orl donos de grandes domínios vinha exige oitenta dias de trabalho Por ano, oito vezes mais que
formam uma classe que controla a princþal fonte de rendimentos um hectare de trigo.
da região e quer tenha sido um bom ou mau ano, o vinho vem Assim acentuou-se um movimento que levava os indígenas
sempre à cabeça das exportações argelinas. Esta nqureza. conGre a ffansformarem-se em trabalhadores agrícolas e uÍr jornalista
autoridade política: os viticultores apanharam os mandatos elec- podia então afirmar, a propósito da viticultura, como ucoroando
uma obra social sem exemplo, sem paralelo, havia dado à região
(Ð H. IsNano, Vigne et srrucrures en ,{lgérie, Diogène, Gallimard,
uma magnífica mão cle obra indígena até então clifícil de
1959, n." 27. concebep.
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com eGito, mais que qualquer outra actividade introduzida de subsistência, num espaço semi-esgotado pelas consequências
pelos europeus, a viticultura criou um factor de oposição social da colonização
entre colonos proprietários e indígenas assalariadãs. sem esta Às descontinuidades espaciais correspondem as disparidades
oposição a Argéiia teria sido bem diferenre na proximidade da sua
socio-económicas que surgiram na unidade fundamental do povo
independência. conquistada a independência, recuperada a liber- argelino. Esper"-sã qo. ã revolução agrfuia em curso ponha
dade acçio, quais as consequências verificad"s no espeço fim a tais discordâncias.
-de
vitícola argelino, que tinha sido o suporre duma impiedosa Um espaço abandonado pela colonizaçio Pode levar d
segregação racial? sociedade indígena a adaptar-se às necessidades do seu funciona-
Conservou-se-lhe o essencial, tal como a repartição e,,l mento, devendo então transformar a sua otgarizaçáo, o se¡.l
grandes explorações, submetidas por sua u", regime de o seu sistema de hierarquia de valores, não
autogestão. os domínios vitícolas dispõem de um^iequipamento havendo nada que melhor mostre a exigência da corresPondência
moderno; a sua administração supõe int.*.oçeo de oå nume- que deve, necessariamente, estabelecer-se entre o esPaço e a
"
roso pessoal qualificado, constituído por trabalhadores permanen- sociedade.
tes hierarquizados desde o trabalhador indiferenciado à director.
,t viticultura originou assim um grupo sociai que tem as suas Todas as análises de exemplos que aPresentámos concorrem
características distintas no seio de uma sociedade global, sendo paruamesma conclusão: se o esPaço geográûco é bema projecção
os homens que beneficiam de um estatuto económico favorável. à" so.iedade, no ponro em que entre os dois a identificação
Recebem um salário certo aumentado de prémios e usufruem da é total, a sociedade resulta das reiações que se estabeiecem entre
distribuição de géneros alimentares. Alojados no domínio ou nas os homens ligados à produção e reprodução do esPaço' A dia-
-formação
aldeias. vizinhas, habitam casas modernas muitas vezes mobi- léctica que pieside à do sistema sócio-espacial preside
ladas pelos seus antigos proprietários. também ,.o funcionamento e à sua permanência'
Cultura exigente, a vinha reclama menos trabaiho em força "o
Como toda a otganiztçio, esta resiste à mudança sem the
do que em delicadeza técrúca o que conGre ao homem uma poder escaPar: toda a modificação num dos seus elementosleva-
qualificação profissional, abrindo-Ihe também as prespectivas å o*, moiificaçao no outro, destinada a restabelecer o equilí-
de uma promoção social na hieratquia de funçõei. Ãdqoir. brio comprometido.
na autogestão o sentido do esforço em comum, da responsabili- Socieãade e espaço reproduzem-se ao transformarem-se
dade das decisões colectivas, alargou a sua visão p^t^1â do seu dialecticamente loogo á"t gerações' A mutação brusca
estreito horizonte familiar até ao mundo exterior cujas reaçcões "o não pode triunfar senão com a alteração
que é a revolução
condicionam o resultado do seu trabalho. Assim, algumas cen- áas estruturas sócio-ecorró*i."r e for acompanhada pela orga-
tenas de milhar de trabalhadores rurais fazem, baseando-se no seu r:úzaçáo do espaço correspondente'
espâço vitícola, figura de privilegiados face aos milhões de infe-
lizes fellahs que continuam a viver de uma agricultura arcatca
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SEGUNDA PARTE
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CAPÍTULO I
UM DUPLO (MAPPINGD?
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Tal é o exemplo apresentado pelos L:dios Pés-Negros a que factos. ,{. técnica nasce desta vontade de substituir o ecossistema
já nos referimos e cujo modo de vida está apoiado na caça de I por uma orgtntzação espacial controlada, um meio concebido
I
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uté mesmo a divulgar e expandir as téc¡ricas das culturas aos andares bioclimáticos, organizando a agricultura e a Pasto-
sem solo tal como funcionam no Japão, nas grandes quintas rícia nas encostas de nível inferior e médio, acima dos quais
hidropónicas [a6] dirigidas por especialistas em biologia reina a floresta e os glaciares. Sem serem intransponíveis, as
vegetal. cadeias de montanhas têm constituído sempre um obstáculo
Ainda hoje é impossível à acção humana alterar os mecanis- suficiente para servirem de fronteiras entre os Estados. Entre-
mos do clima, mas pode controlar os seus efeitos. A agricultura tanto, hoje a técnica ultrapassou muitas das dificuldades: as mura-
lhas montanhosas são perfuradas por túneispermitindo acirculação
receia a insuficiência e irregularidade das chuvas: a fome na fndi"
está ligada, como sabemos, aos caprichos da monção, mas diver-
rodoviária e férrea, a energia das torrentes é transformada em
sos processos avançados podem ser imaginados. Técnicas de força eléctrica e os campos de neve são explorados pelo turismo.
culturn permitiram armâzenar e conservar as águas das chuvas A transformação dos seres vivos do ecossistema é bem
no solo. Graças ao alqueive cultivado ou udry farming [a7] radical o homem retira do espaço natural um pequeno número
de animais e vegetais que modelou segundo a vontade e para sua
a cultura dos cereais em clima mediterrânico pôde ultrapassar para
vantagem. A observação, a experiência e mais tarde a descoberta
sul o seu domínio natural rLa- zoral- do nomadismo pastoril.
das contradições e dos mecanismos da vida proporcionaram-lhe
O recurso àirrigação é ainda mais eficaz: o controle daságuas pro-
um poder sobre a própria vida. Pela domesticação, cruzamento
fundas ou de ãgo"r correntes compensa a irregularidade e a
e hibridação, criaram-se assim espécies e raças novas corresPon-
ausência de chuvas. Nas regiões mediterrânicas, a irrigação trans-
dentes às suas necessidades. Estas plantas e animais, que não
formou as paisagens agrárias permitindo, pela supressão do pousio
existiam na natureza, são hoje elementos constitutivos de um
climático, a introdução de culturas desconhecidas na Antigui-
conjunto regulado pela autoridade humana: o espaço geográfico.
dade, tais como a laranjeira, o arroz' o algodão e a can¿ do
Subtraídos à concorrência vital, são frágeis e devem ser protegi-
açúcar e em muitas regiões assistiu-se a uma <tropicalização> do
dos contra as agressões do meio: conhece-se o arsenal de produtos
espaço. É junto dos rios que as sociedades hidráulicas, como o
Egipto e a Mesopotâmia, puderam constituir-se nos espaços que a indústria química teve necessidade ¿,
^ç¡rtalizar Para
assegurar a defesa das culturas assaltadas por todas a espécie
desertos.
A agricultura aprendeu assim a lutar contra as geadas, a àte- de parasitas.
Numa primeira impressão, as actividades industriais perecem
nuar os iigor.t do Inverno graças ao emprego de estufas aque-
estar sob a estreita dependência das condições do meio natural.
cidas, p"t*itittdo-1he avanç^f até ao círcuio polar. Contudo
Durante a primeira fase da industriali"ação as indústrias locali-
a técnica tem oS seus limites: não vence o combate à secura
zaram-se efectivamente junto às matérias primas acumuladas ao
que está na origem das más colheitas de cereais na IJRSS;
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longo das idades geológicas. Os grandes espaços industriais l organizrção das cidades. Não se treta aqui de neger a influência
edificaram-se sobre minas de huiha e minas de ferro: tal foi o caso do sítio no. qual uma cidade se instalou, mas eie já não
do Ruhr na Alemanla Ocidental e dos núcleos do <Black é, doravante, determinante.
countr)D [a8] de Birmingham, na Grã-Bretanha. É! incontestável. por exemplo. que a estreita faixa costeira
Mas com a segunda geração das regiões industriais, as apertada entre a falésia escarpada dos planaltos do Sahel e o
razões puramente geográficas perderam a sua importância. Hoje nível das águas do mar, comandou durante bastante tempo a
são as economias externas, as (externalidadeso que criam as extensão de Argel ao longo da baía em direcção à foz do
vantagens comparativâs, em função das quais se efectivam as oued Harrach [a9] a qual foi explorada pelo camin-b.o de ferro de
localizações. Daí o divórcio geográfico entre os locais de penetração para o interior do país. A escalada do abrupto
extracção das matérias primas e os centros de transformação que saélico levantou problemas difíceis para a instalação de altos
são dotados de equipamentos, de serviços, de informações, de imóveis ernpoleirados e abrir estradas em lacetes, nas encostas
actividades complementares. argilosas sujeitas a escorregamentos, a fim de permitir que a
A divisão internacional do trabalho que a economia mundial cidade se alargasse pelos espaços livres do planalto.
de mercado desenvolve sob os nossos olhos, tende a dissociar Constantine é o exemplo evidente da não adequação
os processos industriais: nos países sub-desenvolvidos a produção de um sítio à função urbana: a velha capital Masinissa era uma
de matérias primas e as indústrias que utilizam mão-de-obra fortalæa implantada no coração das montan-has húmidas sobre
não especializada, enquanto nos países desenvolvidos, as indústrias um rochedo isolado pelas gargantas profundas do oued Rhumel.
de alta tecnologia são geradores de forte valor acrescentado. Sítio inacessível tanto quanto pode ser, e confirdo, a técnica
Convém ainda referir que estas últimas retiram uma parte do seu ultrapassando os obstáculos naturais, soube transformar urn
lucro das operações de montagem efectivadas por sua conta em ninho de águia numa cidade que ultrapæsa hoje os 500 000 habi-
regiões onde a força do trabalho é mal remunerada ta1 como se tantes.
verifica em Singapura ou" Hong-Kong. Numa outra escala, Nova York deve a sua localÞação,
É pela aplicação desta divisão do trabalho que as actividades a sua concentração, os seus arranha-céus à exiguidade da ilha de
industriais se instalaram no ponto de contacto das periferias Manhattan que forçou a cidade a estender-se no sentido Norte
dominadas e dos centros, isto é, nas costas marítimas, darí a e só <um prodigioso esforço arquitectural,r pôde ultrapassar os
industrialização do litoral Mediterrâneo Ocidental europeu e da limites do sítio.
costa japonesa do Pacífico. O sítio inicial e natural de Paris era mais fâcil, de
Constata-se que as condições ditas natur¿is intervêm cada organtzar. Diûcilnente se reconhece hoje a topografia original
vez menos na geogmûa da indústria, pois são as relações de onde se deveria inscrever a capital, sendo escamatoteada debaixo
produção que controlam o jogo. dos grandes trabalhos de terraplanagem e de entulhamentos.
Por muito tempo o geógrafo dedicou-se a pôr em evidência Somente na Cité, as avenidas inclinadas lembram o complexo
as influências que as condições naturais podiam exercer sobre a de ilhas, de colinas e de planícies.
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A noção de situação é ainda mais relativa: ela exprime tanhas dispondo-as em terraços de culturas e plantações arbus-
as posibiliéades de acção que uma cidade pode retirar da sua tivas; as búxas planícies, muitas vezes pantanosas e insalubres,
posição geográûca por benefícios resultantes das relações com o em pastagens de inverno e os altos prados em pastagens de verão,
resto do espaço próximo ou longínquo. Para uma capital há segundo o ritmo de alternância sazonal da época das chuvas e
vantagens em estar situada no centro do espaço nacional tal como da seca. É evidente que o contraste é grande entre as costas
acontece com Madrid ou Paris. O Rio de Janeiro com a sua wbznrzadas e as montanlas agro-pastoris; mas quer num caso
localização perißrica foi suplantado por Brasília, no centro do quer noutro, as reiações em confronto, correspondem a um
continente brasileiro, Istambul cedeu as suas funções polídcas mesmo povo, arnassado numa mesma sociabfidade, expansiva,
a ltnkara: estes exemPlos merecem que se pondere um Pouco desligada, produto de uma øvirzação que soube tirar o melhor
sobre o âssunto. Constantinopla, no ctuzamerLto de rotas que partido do seu espaço.
ligam o Mar Negro ao Mediterrâneo, a .Á.sia à Europa, pôde Mas o Mundo Mediterrânico acompanhou com dificuldade
durante muito tempo retirar dessa situação o melhor partido e o decurso da história, cujo centro de gravidade se tinha
tornâr-se numa poderosa metrópole, capital de um império deslocado para a Europa de Noroeste e cuja adaptação exigia
até ao dia em que os Turcos, expulsos da Península Balcânica, unla outra udlização das condições naturais do meio. Atraídos
fnerarn mudar a sue capital para Ankara no coração åa pelos grandes eixos de circulação, as aldeias alcandoradas aban-
República. Hoje, próximo da fronteira, Istambul perdeu a sua donam os seus incómodos sítios iniciais e os terraços dispostos
importância nesta parte do mundo Mediterrâneo. em andares, descem às planícies que arrotearam, utilizando
Nem o sítio nem a posição são factores decisivos ne culturas irrigadas, vinha, primores destinados aos mercados
geografia de uma cidade: os problemas que podem levantar-se utbanos. As cidades portuárias orientam o seu campo de
enconffam semPre uma solução quando o interesse dos homens actividades para exploração comercial dos continentes que a
^
o exige. colonização abriu à especulação. As iniciativas estrangeiras explo-
Em jeito de síntese, analisaremos um último . exemplo ram as riquezas minerais e a posição de contacto entre a Europa
retirado da geografia mediterrânea. industrializada por um lado . Áfti." e a Ásia subdesenvolvidas,
"
O Mundo Mediterrâneo organizou-se num quadro espacial mas ricas em matérias primas pelo outro. Abre-se então a fase
de mar interior rodeado de perto Por uma cadeia de altas actual da industrialização que multiplica as implantações petrolí-
montanhas. As facilidades de navegação de uma margem para feras e siderúrgicas nas costas.
outra multiplicaram as trocâs de todas as espécies entre as cidades Especulando sobre a amenidade do clima e a beleza dos
estabelecid* acrópoles fias costas ou na sua proximidade lugares, o capitalismo fundiário apodera-se do espaço costeiro
"*
imediata. Estas cidades com uma localização defensiva, mais e equipa-o com ricas residências, portos de recreio, hóteis de luxo,
abertas ao exterior, desenvolveram-se até atingir dimensões de parques de campismo virados para uma clientela de turistas que
capitais de impérios. No interior, os homens agruPados em que as sociedades de consumo criam para utilzação de milhares
alãeias alcandoradas, aproveitaram as médias encostas das mon- de utentes. Uma das últimas conquistas é a costa Languedociana,
105
ß4
que um conjunto de pântanos tomava insalubre e desértica, mas 2. O Espaço Geogrrífico: <Mapping" de um sistema social.
em que os enormes investimentos que recentemente aí foram
aplicados, a equiparam e transfofmaram nurne costa eco- Da à socialização, tai coÍro terros afir-
<desbiologização>
thedora para milhares de turistas. Assim, dGrencia-se fran- mado, é o processo que conduz o espeço geográûco a diferen-
camente da grande planície interior, onde os grandes mer- ciar-se fundamentalmente e cada vez mais, do espaço natural
cados agrícolas isolados se clispersam, permanecendo ligados à para pessar da necessidade à racionalidade e aproximar-sè cada
tradicional economia vitícola hoje ameaçada. vez mais de uma explicação social.
Deste modo, ao mesmo meio natural corresponderam, A sociedade conduz o jogo, pois à medida que se orgrtttza
no decurso dos séculos, vários espaços geográficos, resultando e se torna mais complexa, um projecto emerge e impõe-se
igualmente de outros tantos ciclos de arranjos sucessivos, para ultrapassar a vida do dia a di¿ e prever a sua sobrevi-
concebidos para permitir ao mundo Mediterrânico viver e sobre- vência com vista ao futuro.
viver, adaptando-se à evolução de uma economia que se Se o espaço geográfico deve necessariamente e sua matéria
alargava desde o quadro regional ao mundo inteiro. ao espaço natural, também recebe da sociedade a finalidade e a
Todas estas análises mostram que ao longo da história, informação, quer dizer,analisa os elementos que devem concorrer
os espaços geográûcos tendem para uma eutonomie que se afirma para. t realização das intenções humanas. Sabemos já que esta
ceda vez, mais contra os espaços naturais aos quais suceclem coordenação põe em prática todos os meios de acção que a
por intervenção humana. Esta diminuição, cada vez mais sociedadp pode mobihzar, não somente a força do trabalho
evidente, da correspondência entre os dois espaços, traduz-se dos homens, mas também as técnicas, isto é, as suâs práticas
por <desbiologização) para proveito de uma crescente <sociali- mágicas e religiosas, as quais são substituídas, pouco a pouco,
zação> da superfície da terra. .4. diferença entre eles não cessa de pelas aplicações da ciência.
se alargar: regulamentados do interior, os espaços naturais obe- Esta acumulação de energia e de informação que constitui
decem à necessidade biológica, mas os espaços geográficos, a base da cultura é a força mobilizadora do poder organizador
esses recebem a orientação e a energia da sociedade que os criou da socieclade sobre o espeço: o espaço testemunha a especifi-
para seu uso. Quer uns, quer outros não provêm pois da cidade de sociedade; a sociedade identifica-se com o espaço,
mesma concepção, da mesma organização, da mesma dinâ- sendo a adequação necessariamente esrreita.
mica, nulna palavra, do mesmo modelo. Assim, não pode Se durante muito tempo, o espaço no qual vivem as
levantar-se a questão de mapping no sentido rigoroso do termo, sociedades pôde fazer-se coincidir, mais ou menos fiel¡nente
entre esses dois espaços. com o espaço natural, o espaço geográfico é hoje uma
outra realidade completamente diferente pois é criação do
homem que impõe a sua própria lei. Para as explicações
mais decisivas, a Geografia pede-as, não tanto às condições
naturais mas às características dominantes da sociedade: reiações
706 ro7
sociais, ðensidades .de pop.ulação, crenças religiosas, desenvolvì- øvthzaçãto e do espaço, à custa duma franca perda de eficácia
mento científico e tecnológico, sistema económico... n'uma que se encaminha Para uma degradação.
palavn tudo o que constitui a culrura de uma sociedade. Ta\vez estejamos ainda com possibilidades de responder
Não se trãta, parù tento, de recusar o peso dos dados do meio à primeira questão posta no início deste capítulo.
que fornece a matéria prima, gue como toda a matéria prima O espaço geográfico nasce da projecção do sistema sócio-
resiste, reage, se degrada e se esgota. As sociedades tradicionais -cultural sobre o sisrema ecológico, de uma projecção activa
são as mais ameaçadas pois, com frágeis deGsas, deixam que o constroi conforme as exigências do objectivo a atingir.
subsistir, as áreas marginais de espaços ecológicos mal contro- Xotr. o espaço geográfico e o espaço natural há tanto menos
lados, mal integrados nos seus espaços geográficos; os constrangi- concordânå" qn*to a acçio humana, informada pela ciência
mentos
'do meio natural ëonservam aí uma agressividade e dotada d"s iu"s técnicas, se torna caãa vez mais decisiva.
que
periodicamente, coloca em perigo o equilíbrio da organização Concebido pela sociedade para rcatvar o seu projecto,
sócio-espacial, tal cömo referimos a. incapaaåade humana face o espaço geográfico não pode ser senão a reprodução fiel das
à progressão dos desertos. Contudo, o homem àprendeu a suas-características e entre a sociedade e o esPaço geográfico,
defrontar os desafios de naaneza: ultrapassa-os descobrindo as a correspondência é uma necessidade imperiosa.
treis que regem a orgarriizaição da Matéria e da Vida. Estas
leis 6.xam as possibilidades e os limites da sua acção.
A correspondência do social e do espacial é uma regra geral
à qual a história infringe violações: a colonização dos séculos:<rx
e xx dá-lhe urna responsabiiidade grave porque ela implica,
a maior parte da humanidade. Vimos já que a colonizaÇão
impôs às populações conquistadas uma organização do espaço
concebido com todos os elementos, para a rcúízação dos seus
projectos: as cidades, as planbções, os complexos industriais
expulsaram as aldeias e as culturas de subsistência. A sociedade
indígena é obrigada a viver num espaço alienado, não pos-
suindo nem estruturas, nem cultura, nem os comportementos
adequados que the permitiriam controlar esse espaço no dia da
independência.
Como resuitado desta situação, veriûca-se uma distorção
que paralisa o desenvolvimento económico. Um compromisso
restabeleceu o equilíbrio da sociedade, à custa de uma crise de
108 1.09
CAPÍTULO II
7. O espaço-estrutura
Como todo o artefacto, o esPaço geográfico é uma criação
final da sociedade, necessariamente ordenada segundo uma lógica
interna que conduz os elementos constitutivos a entrar no
funcionamento de conjunto. A lógica das coisas que se impõe
atrav& de ensaios experimentais ou da lógica humana que surge
do c,ílculo e da previsão, lógica esta que estabelece entre os
componentes, íntimas correlações que fazem do espaço geográ-
fico um todo coordenado numa estrutura espacial.
Esta organização resulta da coerência entre os seus ele-
mentos constituintes e toda a alteração que se verifica num
deles leva à alteração correspondente nos outros.
Sem estas inter-relações o espaço seria um caos incapaz
de funcionar numa dada direcção. É por isso que, num espaço
geográfico minimamente estruturado, cada elemento consti-
tutivo deve poder localizar-se de maneira a conribufu para um
melhor' funcionamento do conjunto.
777
r
I
Todas as civibzações têm em comum a intenção de orga- não ajushdos, como se se dispusessem ao acaso. Na realidade,
nizar o seu espaço com o fim de assegurar a sua sobrevivência. muitas vezes, aí se encontra um fio condutor, através de uma
Assim,. supõe-se para o espaço agrícola possa produzir ordem subtil que só é revelada pela observação minuciosa destas
.que,
nas melhores condições é necessário que a rep"rtifão das^culturas
populações, tal como a praticam os etnólogos. Os hábitos,
tenha em conta a aptidão natural do solo;-que as explorações as tradições, as concepções sócio-religiosas, toda esta inforrnação
tenham a esrrutura fundiária que lhes p.rriir"* iarzaçeo cultural própria de cada etnia explica em grande Parte o
óptima do material e obtenham a mais alta produtividade; ^ comportamento específico na elaboração do seu esPaço geográ-
áue
a distribuição do habirat responda às exigências d.o homem fico. É necessário iembrar aqui que os Betsimisaraka de Mada-
e dos seus trabalhos; que o traçado das estradas reflicta a necessi- gascar ajustaram os elementos do seu espaço orizícola num
dade da circulação dosåomens para as suas terras e dos produtos todo que, assegurando a subsistência, testemunla a continuidade
para os mercados, enfim que a densidade da população esteja das gerações e a perenidade do c1ã nâ teffa ancestral?
em relação com o go¡junto dos recursos dispomveis. Estas considerações explicam que são, muitas vezes, os
Mas as civilizações tradicionais, como já vimos, ainda exigem imperativos sócio-culturais que provocam o desequilíbrio que o
outra coisa ao seu espaço. observador crê ver desencadear entre os recursos agrícolas e as
o geógrafo ocidentai tem muitas vezes dificurdade em densidades de população: as concepções relativas à famflia, ao
entender o ordenamento de certas paisagens africanas: aqui, culto dos antepâssados, ao prestígio do indivíduo no gruPo, as
a aldeia encontra-se longe do ponto d. ag"r, charco ounascente;
exigências da economia doméstica dominam os problemas levan-
que o local de trabalho das mulheres só é atingido, em cada tados pelo nível de vida, estando na origem daquilo que se crê
dìa, depois de várias horas de caminho. outrJexemplo é o ser o povoamento dos campos nos países ditos subdesenvolvidos.
alinhamento.das cubatas dispostas ao longo de uma pícada, No entanto, existe um suPerPovoamento que é provocado
enquanto as parcelas cultivadas estão dispersas parecendo coio- pela colonização que, ao mesmo tempo que desorganiza o modo
cadas ao acaso, dentro da floresta densa. poìque élue os Bambara de vida tradicional, liberta a demografia dos seus antigos entraves
reunem os seus pátios familiares abrigados por muros de estruturais: a natalidade acelera-se, a mortalidade baixa graças à
terra batida circundando a aldeia, localizadas ìo centro dos aplicação de téøricas cle saúde. O resultado é um crescimento
campos de milho miúdo, enquanto na mesma savana, os clemográfico selvagem que não obedece a nenhuma rcgra
Mossi espalham livremente os seus <souþ.alø> interna. A intervenção exterior fez cessar a interdependência
[50], onde praricam
as culturas e os Lobis [51] que são grandes srnzalas d*ili"r., dos elementos que outrora os ligavam à estrutura espacial, ao
colocadas à distância umas das outras <de um vôo de cod.ornia? mesmo tempo que a introdução da economia monetária minava
Que lógica preside a esra composição do espaço ? as bases morais da sociedade, sendo uma das principais causas do
- . Tudo parece passar-se como se a indiGrença destruísse a subdesenvolvimento.
coerência: o caos sobre a ordem, o espaço ionge de ser organizado Nas civilizações ocidentais, o desenvolvimento susciado pela
num todo estruturado, parece ser Gito de parcelas e de bocados economia capitalista relegou para segundo plano todo um outro
172 tt3
E
imperativo que não seja a rentabilidade do espaço. O espaço A Sicília, núcleo isolado de conservadorismo sócio-cultural,
agrícola, em particular, deve receber a orgarização que permi- é um caso limite na Europa Ocidental.' Mas, na geografia
ari realvar o máximo lucro monetário. abundam os exemplos de sobrevivências históricas ainda activos
Tal é o princípio. Que se passa na realidade? nas paisagens rurais.
Eis um exemplo que parece contradizê-lo em todos os Na Provença, muitas das aldeias estão ainda alcandoradas
aspectos: diz respeito à organização do espaço rural na Sicília, enquanto as culturas trocaram os terrâços pelos solos da planície.
tal como o analisou Renée Rochefort (1). Na maior parte das regiões ainda não existem, entre a orgatização
Os camponeses sicilianos vivem aglomerados em grandes do espaço rural e as suas funções de produção, relações
aldeias de vários milhares, por vezes dezenas de milhares de óptimas que tornem efictzes uma certa estrutura (1). Quantas
hatitantes, de difíceis acessos, nas encostas ou nos cumes das pequenas propriedades marginais ainda existem que não asse-
colinas. Neste espaço restrito, as casas anichadas não possuem guram a vida dos camponeses? Quantas propriedades fragmen-
geralmente nem cave, nem estábulo, nem celeiro: <<Elas apre- tadas em várias parcelas dispersas, com áreas tão exíguas e tão
sentam-se como o pior dos utensílios agrícolau. Os caminhos afastadas umas das outras não voltam a pousio ? Quantas super-
para o campo mal conservados transformam-se em atoleiros fícies de reduzidas dimensões respondem ao emprego de uma
de inverno; fantasistas no seu traçado, podem acabar bruscamente, mecarnzaçio de aito rendimento?
obrigando a prosseguir a pé ou em machos durante vários E pala procurar a adaptação de uns aos outros: habitat,
quilómetros através dos campos. A pequena propriedade está estruturas fundiárias, utensílios de trabalho, técnicas de culturas
pulverizada em parcelas de alguns ares, dispersâs e distantes de e atingir assim as melhores condições de produção, que os poderes
vários quilómetros da habitação, cons¡i¡rrindo elma empresa públicos conseguiram por meio de medidas de emparcelamento
desarticuiada e inorgânico. O tempo nas deslocações ultrapassa, das terras, o enquadramento das explorações e a reorganização do
muitas vezes, o tempo de trabalho: um camponês pode ir espaço rural. Tal é, por exemplo, a tarefa empreendida pela
cultivar a sua terca até 20 ou 30 quilómetros. O que choca Sociedade Mista do Canal da Provença.
o observador nesta região miserável, é o desperdício dos recursos Todavia, a agricultura capitalista soube dotar-se de uma
do potencial de produção, do tempo e do material. distribuição espacial que tende a assegurar uma produção que
Evidentemente que há explicações para esta distorção entre atinja o máximo lucro. Tanto na Europa Ocidental, onde
a organização do espaço e a sue função: a insegurança, a insalu- foi preciso eliminar os obstáculos herdados do passado, como na
bridade, o regime de grande propriedade pre-capitalista têm América do Norte onde a colonização pôde transformar vantajo-
muito mais peso que a racionalidade económica. .ts relações samente os espaços abertos. Tais são, por exemplo, as grandes
sociais herdadas do passado são responsáveis por esta incoerência quintas nos planaltos do centro da Bacia Parisiense ou ainda a
das estruturas espaciais.
(t) Le tauail en SicíIe, PUF, 1961. - (t) J.-L. Gureou, Théorie économíque et transformation de I'es1tace,
Théoríe spatiale et localìsation agrícole, Gauthier-Villars, 7972.
Vol. I:
t74 1,75
organtzação da Alta Califfrnia onde, sobre a agricultura irrigada crescente dos desperdícios de todas as espécies que provocam a
e mecarizada, se construíram paisagens agrárias diversiûcadas e' deterioração das condições de vida, nem na genenliração dos
em que as grandes colheitas levaram à implantação de nume- traumatismos psicológicos e emocionais geradores de comporta-
rosas actividades industriais, quer a montante quer a juzante mentos associais, nelrl, enfim, nos engarrafamentos verificados
da produção. nas grandes artérias que levam ao bloqueio total da circulação.
A agricultura soviética beneficiou
de uma maior liberdade Úrquéritos revelaram que o parisiense passa, em média,
de acção para redistribuir racionalmente.o seu esPaço, contudo, uma em cada 24 horas utilizando transportes; que perde 15"/o
por outro lado, não soube formular as leis que presidem â do seu tempo em deslocações e que está ausente da sua casa
essa organização no quadro do socialismo. Limitou-se a ten- cerca de 10 horas por dia.
tativas que levaram a soluções empíricas, tal como é testemu- Será necessário insistir na paralisia que atinge as grandes
nhado pela evolução das relações entre os Kolkhozes, as peque' cidades? Paris, Londres, Nova lorque, no limite de ruptura,
explorações individuais e os sovkhozes. a <Megaloltolis,lSZl japonesa que se alinha ao longo de
O espaço urbano é um organismo mais complexo que o cerca de 900 km, de Tóquio a Nagasaki na desordem, na poluição
espaço rural: nascido do desenvolvimento da sociedade, adquiriu do ar, na insuficiência de água, no ruído, no amontoado de
funções múltiplas, estreitamente ligadas entre si. Para que se homens, toda uma concentração perniciosa que os poderes públi-
adaptassem o melhor possível, era uma necessidade imperiosa que cos são impotentes para combater.
a localização, as articulações dos seus elementos constituintes, A cidade, nascida do desejo e da necessidade de relacionar os
as relações com o exterior facilitassem assim o estabelecimento homens, as ideias, as informações, todos os produtos das activi-
entre os homens, de relações de produção e de consumo impos- dades humanas, levou assim à sua própria negação. Eis-nos
tas pelas rrocas e decisões dos diferentes poderes. longe do homem criador de ordem espacial c paz de resistir
,tqui reside o problema. Parece poder ter sido resolvido à entropia.
enquanto o espaço urbano foi objecto de uma competição social É talvez, da intensificação dos conflitos sociais, em que a
moderada, mas hoje ela está no centro de um sistema cidade é um foco candente, que se pode esperar uma tomada de
especulativo característico das sociedades ditas liberais. Tudo consciência para restituir ao homem o domínio do facto urbano.
se passa aí como se as lutas pelo poder se tivessem libertado de A China mostrou uma via possível. Na sua política utbana,
todo o con¡role humano e criado uma dinâmica interna esPontâ- propõe-se pôr fim ao êxodo rural e mesmo multiplicar os
nea: as cidades, especialmente as grandes cidades, enveredaram regressos ao campo. Fez acompanhar estas medidas demográficas
por processos de recffoacção Para uma expansão irreprimível de disposições visando difundir as actividades industriais nas
tendendo para uma desordem paralisante. regiões rurais pa:m aí criar empregos que ûxassem os homens.
Jât não há quase necessidade de insistir na multiplica.ção Lutou contra a sobreposição, entravando a tendência para a
das actividades, devidas à liwe actuação dos agentes externos, hierarquização dos espaços que nascia do desenvolvimento da
nem ao aumento selvagem da população, nem à rejeição centralidade a partir da cidade: a criação das comunas urbanas,
116 117
correspondendo a um grande objectivo do Estado chinês, com para ca"da urna delas. Mas há um limite para esra possibilidade,
repartições administrativas ou bairros urbanos, visando dividir podendo levar ao risco de provocar crises disfuncionais, donde
a cidade em unidades espaciais auto-suûcientes, reagrupando o pode resultar a destruturação, quer dizer, a destruição do
o"þa'lho, o alojamento, os serviços, as fi:nções de relação: espaço geográfico.
<A cidade torna-se uma espécie de federação de unidades de base, Não será a ameaça que faz reflectir nos interesses domi-
centradas sobre elas próprias. O centro está em todo o nantes, quando a competição compromete o desenvolvimento
lado e em nenhuma Patte, e os possíveis conteúdos da cidade das grandes cidades, levando-a a um impasse?
.rte?, (t).
podem ser experimentados cada um Por sua
Estas análises permitem-nos precisar a própria nat're'zza
desta construção que representa o esPaço geográfico. Que o 2. A dinâmica do espaço geogrrítco
espaço geográfico resulta de uma disposição dos elementos
fornecidos pelo espaço natural em conformidade com o Pro- A ordem que preside à organização do espaço geográfico
jecto que a sociedade ihe destinou, é evidente, através de uma desenvolve-se no decurso da acção que a sociedade desencadeia.
organrzaçdo específica sem a qual não se atingiria a sua A dinâmica'social constitui, pela sua sequência uma evolução,
finalidade. sendo a demografia um dos seus motores essenciais.
Esta organização coloca os diferentes elementos constitu- É provável gue, nas sociedades primitivas, a densidade de
tivos em relação uns com os outros Para que Possam concorrer população se mantivesse em equilíbrio insrável relacionado com
pata a existência de um todo funcional, apresentando-se com os recursos extraídos do teritório. Esta regulação resultava de
a caracterlstica essencial de uma estrutura que é a coerência. mecanismos fisiológicos, tais como as doenças inGcciosas ou ainda
No entanto, esta coerência não tem nada da rigidez dum as grandes fomes responsáveis por uma esterilidade temporária (1).
sistema auto-regulado, não sendo rigorosa. Os nossos exemPlos Mas bem cedo intervieram também factores culturais resultantes
provaram que a ordem geogtáfica se acomoda, mais ou menos de diferentes práticas de conservação que asseguravâm, segundo
bem, a uma certa heterogeneidade dos componentes: muitas vezes a expressão de Henri Laborit, uma quase estabilidade por retroac-
as reminiscências do passado não estão adaptadas às novas ção. Eram menos as medidas contraceptivas que as institu-
exigências, mantendo-se ainda durante um certo temPo e cionais (Aarma decisiva do b¡rth control l53l dos rurais,
actuando como uma remanescência. Por outro lado, a coerência escreve Immanuel Le Roy-Ladurie ?), é certamente o casa-
da estrutura espacial não implica o ajustamento estrito entre mento tardio, obrigatoriamente provido de uma forte dose de
as variáveis constitutivas. Ela não exige senão uma comPatibili- castidade préconjugal>, à qual se juntavam, evidentemenre as
dade que permite uma autonomia, uma liberdade de relações consequências das guerras.
118 179
Fisiológico ou cultural, o controle homeostático da popu- extensiva de gado bovino através da savana a;rboúz¿âa, aban-
lação, destinado a evitar um superpovoamento desastroso, donando aos colonos merinaS ou beeiléo a exploração dos
tinha em vista atingir um bloqueamento de toda a evolução. arrozais irrigados. Esta redução e alteração de activid¿de é
Neste estado de auto-estabihzação, as sociedades tradicionais devida, em grande parre, ao declínio da vitalidade desta
dificilmente podem tealiz.ar uma reprodução fecunda, o que população, provocado pelo abuso excessivo de álcool Por gera-
explica a relativa imobilidade da sua história (1), comportamento, çO.r *t"tior.r, " uma má nutrição e sobretudo pela redução
téc'tica e espaço. áa natalidade há muito temPo agravada pela matança das
C. Lévi-Strauss pôde falar de sociedades estáticas, como crianças nascidas em dias nèfastos.
sendo sociedades gue, encontrando no seu espaço a satisfação De maior amplitude foi a regressão demo-espacial que
das necessidades, ficam bloqueadas no estatismo das estruturas de confreceu o noroeste africano onde o Sudao foi, do século rv
tal forma que nenhuma energia suplementar, tensões internas ao século xvr, o centro de poderosos impérios fundados econo-
suûcientemente activas ou um novo contributo de informação micamente na agricultura, na pastorícia e no comércio com o
são aí introduzidas. Mundo Mediterrâneo. A partir do século xvtr, às grandes orga-
Isto não é uma hipótese pois o facto pôde produzir-se em nizações políticas sucedem-se efëmeros reinos sujeitos a uma desa-
<áreas circunscritasD sem relações com o exterior. Assim os gregação da vida social: as populações isolam+e segundo as sues
Tasmanianos mantiveram-se no nível técnico do Paleolítico características étnicas que se forjam ao longo da acção coiectiva
Médio até ao momento em que os ingleses ocupâram a sua ilha. nt orgatnzação do espaço, constituindo-se em pequenas comuni-
A decadência demogrâftca, quaisquer que sejam as ceusas' dades agrárias viradas Para a prática de longos pousios e
diminui o domínio da acção humana sobre o esPaço e origina seguindo uma economia de subsistência.
uma evolução regressiva. O exemplo dos Sakalaves é signifi- Dorevante , , Ãffic" Ocidental viverá até ao período colo-
cativo: senhores dos planaltos do Oeste Malgaxe, cedo se nial, em microestruturas sócio-espaciais incapazes de reunir
dedicaram a trocas frutuosas com o exterior, trocando bois e as condições para um desenvolvimento económico e cultural.
escravos por mercaðorias de importação. A sua orgatização e A responsabilidade atribui-se, em grande Pafte, à escravatura.
expansão no século rvtrl fu,eraÍl-nos aPerecer como o povo mais Oo sécu1o xu até ao fim do século )ox, os negreiros de todos
poderoso da ilha. No século seguinte, eles puderam resistir ao os cantos do mundo serviram-se indiscriminadamente da popu-
imperialismo Merina. Desde então, a sua história é paralela lação do Sudão, arrancando-lhe os indivíduos jovens e vigorosos,
à da degradação contínua do meio. Insuficientemente numerosos os mais aptos para assegurar a renovação das gerações seguintes.
par:a explorar o espaço agrícola, refugiam-se na Pastorícia Atingida na sua natalidade, a população estava condenada ao
envelhecimento, até mesmo à regressão. E é num pals exangue'
com grandes espaços inexplorados ou mal aproveitados pelos
habitantes envelhecidos e em decadênciar Qüe a colonÞação
C) E. Le Rov-L¿pur:¡, L'hístoire .inrnobile, ðltns Annales, E.S.C.,
europeia se implanta no final do século xrx.
n." 3, Maio-Junho, !974.
r27
720
Pelo contrário, o crescimento demográûco desencadeia um crescimento progressivo da sua popuiação, são obrigadas a
movimento, provocùdo uma ruptura de equilíbrio entre apopu- encontrar oo lo"J uma solução. É então que a engenlosidade
lação e os recursos. humana se manifesta na :rltiT]¿jação de técnicas susceptíveis de
A resposta da sociedade pode consistir numa emigração do originar o necessário complemento dos recursos tornados insu-
excedente humano. ,t proliferação das colónias leva a população fìcientes.
jovem que parte, a utilizar processos de exploração segundo um os trabalhos de Ester Boserup (t) pôr em evidência as reiações
modelo semelhante ao utilizado nas terras de origem, constituin- entre o crescimento demográfìco e o progfesso das técnicas
do-se assim espaços homogéneos coincidindo com a ârea de dis- agrânasz um processo retroactivo relaciona, com efeito, a demo-
persão das étnias. gr^ft e a técrica pois o aumento de população eleva-o consumo,
A Afnca oferece-nos o exemplo da grande migração á", origina um suplemento da força de trabalho para a
dos Bantus, instalados numa estreita faixa de território que ocupa- produção e obriga o homem à inovação.
vam nas elevações dos Camarões. O seu rápido crescimento ' Sob a criaçãó de inúmeras necessidades, os clãs vivendo da
demográûco correspondeu à introdução de um sistema de colheita e da caçz tiveram de efectuar inicialmente, algumas
culturas na floresta que faltava em Á.frica: a consociação'utili- culturas na fl.oresta. Com as densidades e aumentar continua-
zaå¿ na. Malásia (1), origin,íria do Sudeste Asiático que com- mente, a agricultura passou pa:.a aprimeira linha das actividades
preeende a banana, o taro 154] e o inhame com um valor humanas: as comunidades sedentarizadas praticavam então no
alimentar muito superior ao milho miúdo e ao sorgo, atihzada seu território, a cultura em queimadas combinadas com o pousio
como associação vegetal sudanesa, e sua base alimentar. prolongado. Depois, os sistemas tofflaram-se cada vez maisinten-
Nos primeiros séculos da era Cristã, faltando espaço às iinor ûm de responder às necessidades de uma população
populações emplena expansão demográfica, os Bantus puseram-se "
que não cessa de crescer: o pousio é reduzido, depois suprimido
em marcha, através das fl.orestas equetoriais, em direcção jr"ç"t à introdução de plantas forrageiras na rotação de
ao Oceano Indico que atingiram em levas sucessivas. Enquanto culturas e ao emPrego de estrumes e adubos.
que os c1ãs de Pigmeus caçadores se retiravam para o inte- Assim, pouco a Pouco, o esPaço agrícola alarga-se, define-se
rior dos maciços florestais, os Bantus exploravam, desde os e coloca esta aldeia populosa no meio da ârea, de culturas
Camarões a Moçambique um vâsto espaço agrícola onde as cofitu- permanentes.
nidades praticavam as culturas importadas da Ásia, em terrenos Nas regiões desérticas onde, devido ao clima, há pousios
arroteados de forma imperfeita. proiongados, a pressão demográfica criou necessidade de inventar
Quando estão confinados a <<.áreas circunscrita$), no interior novas técnicas de controle de água: a irrigação originou a
de limites difíceis de transpor, as sociedades que sofrem um passagem de uma cultura extensiva a uma cultura intensiva do
(t) G._P. Munoocx, Africa: Iß people ønd their culture history. Londres, (t) Especialment e: Euolution agraíre et lttession démographíque' Flam-
McGraw-Hill, 7959. malion, 1970.
122 123
'!F-
soio, permitindo assim que, as densidades pudessem atingir lacionai. Imediatamente, reeencontraram a velha técnica da
os níveis que es sociedades hidráulicas conhecem: agricultura extensiva apoiada sobre a queimada e pousio, que for-
Conûnado âo espeço circunscrito pelo deserto, a população necia a alimentação com o menor esforço: mas, Perante o risco
egípcia pressionada pelo seu crescimento, organizou um sistema de esgotar rapidamente o solo, se bem que demorem a
de controle das águas do Nilo sobre o qual fundou a sua esgotar-se, alguns anos depois fixam-se noutras regiões quase
civìhzação. vazías.
A exploração do fundo dos vales, já não sendo suficiente Este exemplo dos Kabré é confirmado pela existência de
para assegurar a subsistência dos Merina, obrigaram-nos a outros referidos a diferentes étlrias: os Lamba dos Monte Togo,
começar a explorar a plamcie de Betsimitatafta. que se estende os Toura dos Maciços de Man na Costa do Ouro, os Lomba
à vista do rochedo de Tananarive, debaixo das ordens do do Daomé, todos aqueles que Pierre Gourou chama (os
rei cujas densidades rurais atingiram em vários pontos, os montanheses obsìdionats (1) [55].
100 habitantes por quiiómetro quadrado. Ester Boserup considera que, logo que uma população
A ,{,frica constitui, o*" .rr." mais, um laboratório experi- entra em decréscimo quantitativo ou que, emigrantes se fixam
menal para o geógrafo, pois podem-se aí multiplicar as obser- em regiões ryuito menos populosas do que aquelas que abando-
vações sobre as relações entre a demografia e'a organtzaSo naram, segue-se uma regressão técnica, e com ela, o controle da
do espaço. Populações paieonegríticas, expulsas dos seus terri- organização do espaço perde o seu domínio sobre o meio.
tórios pelos invasores ou caçadores de escravos, tiveram que refu- É exactamente o caso dos imigrantes alemães ou italianos que
giar-se em locais de difícil acesso, tal como os Kabré que se renunciam às suas técnicas avançadas quando se instalaram
encontram nos maciços graníticos do Togo Setentrional. Para no Brasil.
sobreviver tiveram de inventar técnicas agrícolas intensivas, A dinâmica demográfica conduz a uma maior complexidade
construindo socalcos nas encostas das montanhas, renunciaram da sociedade e consequentemente a formas correspondentes de
ao pousio udlizando ferdlizantes de todas as espécies: estrume orgarnzação do espaço. Charles Bettelheim estabeleceu clara-
animal, excrementos humanos, cinzas e dejectos domésticos, mente este sisrema de relações: <<Toda a história da humanidade,
guardando os seus rebanhos em estábulos durante a estação das escreve ele (2), poderia ser examinada sob o Ponto de vista da
chuvas para ai recolherem todo o estrume. Esta organização exparuão quantitativa da população no mundo e das suas dife-
do espaço permite densidade de mais de 200 habitantes por ,-rt.t regiões. Isso conduziria ao exame das repercussões desta
quilómetros quadrado. Mas o indispensável crescrimento da expansão nas técnicas... depois de analisar as fePercussões das
população, exigia importanres investimentos de trabalho face a transformações técnicas sobre o meio ambiente, assim como a
uma fraca produtividade.
Eis a contrâ-prova: a reconquista da segurança permite aos (1) As mudanças de civilização e a sua influência sobre as paisagens,
Kabré ultrapassar a escassez territorial das montanhas, descer Impact, vol. XfV, 7964, n." 7, p. 63.
(Ð Planifiutíon et croíssance accélhée, F' Maspero, col. uEconomie et
às planícies vizinhas que apresentam uma fraca densidade popu- Socialisme>, 7964, p. 743.
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?-
maneira como se processaram as mudanças técnicas e as trans- venientes. O exemplo francês, a este respeito, é bem significa-
formaçõès do meio... levam, por seu lado, necessariamente tivo: o êxodo rural facilitou a rcorgarização das explorações,
a ter repercussões sobre as estruturas sociais...>. o aperfeiçoamento dos equipamentos e das técnicas que se
É no mornento em que as elevadas densidades da população traduziram por um aumento sensível da produtividade e do
rural podem desencadear uma valorização do espaço apro- rendimento.
veitado para um aumento de produção que se reflecte na divisão . Dizemos mesmo que, nos países subdesenvolvidos onde os
social do trabalho e, com ela, o facto urbano: os artesãos e campos são densamente povoados, o decréscimo das densidades
os serviços podem, daí paru o futuro, especializar-se totalmente traduzir-se-ia em resultados benéficos, ao suprimir o desemprego
e produzir para um mercado suficientemente alargado. Então, disfarçado e, portanto, melhorar as condições de trabaiho e o
o ordenamento do espaço enriqueceu-se com ,roå, estruturas: nível de vida daqueles que ficam na terra.
o espaço urbano e mais tarde o espaço industrial respondem a . . A urbanização é um fenómeno que consiste numa enorme
essas novas funções. transferência da população, dos campos para as cidades onde,
A urbanização das sociedades industriais é acompanhada têmo-lo visto, a concenrração humana pode atingir densidades
por um abandono demográfico dos campos. Em certas regiões, tais que o espaço superlotado já não pode assumir as suâs
isso originou uma destruição das estruturas da sociedade rural, funções senão com custos sócio-económicos muito elevados.
que perdeu a maior parte dos seus serviços, originou um abranda- Fenómeno tanto mais dificil de controiar quanto a orientação
mento do domínio humano sobre o espaço traduzido num é geralmente abandonada, nas sociedades liberais, à iniciativa
regresso oferuivo da natureza sobre as terras. Estes processos de interesses que pretendem tirar o máximo lucro das operações
fveram dos Alpes do Sul em França, um mundo onde o imobiliárias. É conhecida a desordem a que conduz a cons-
homem praticamente desapareceu de extensas áreas, permitindo trução habitacional e a orgarização dos espâços destinados a
que a floresta pudesse retomar o seu antigo domínio. Por recolher as classes mais desprotegidas. É inritii lembrar aqui,
outro lado e em contradição, os agricultores aproveitaram primei- o que se inGre dos termos, bairros proletários, favelas, bairros
ramente as terras mais fracas para adaptar as estruturas fundiárias da lata e <,bidonvilley.
ao emprego de máquinas de grande rendimento e os sistemas de O aumento da população põe problemas de organização
cultura às exigências do mercado. Foi assim que a agricultura do espaço em todas as sociedades, sendo um dos principais
capitalista se pôde desenvolver na Bacia Parisiense e que, só ela, estimulantes do progresso. Todas as sociedades são dotadas do
fornece dois quintos da produção agrícola francesa. Tanto talento necessário para responder a essa situação com invenções
é verdade que, numa economia de mercado, a queda das técnicas. A condição de recorrer a elas, faz-se no interesse geral,
densidades de população não têm as mesmas consequências em sem as quais as elevadas ciensidades humanas tornam-se para-
todos os casos: a uma regressão aqui, opõe-se um aumento acolá". lizantes.
Tudo depende das economias externas que o meio ihes propor- Que a dinâmica do espaço geográfico seja essencialmente
ciona mas no conjunto, as vantagens podem superar os incon- mobfizada pela energia que a sociedade desenvolve para atingir
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r
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Motor da história, de dominação orienta as relações
a ânsia A integração das províncias francesas foi obra de um poder
entre as orgaruzações socio-espaciais. É do seu espaço organizado político que elaborou e criou um modo de organtzação
que as sociedades obtêm o poder; o desafio entre elâs reduz-se espacial de grande complexidade, a partir de um aparelho central
a uma competição de espaços, acabando muitas vezes pela ane- do Estado localizado no espaço parisiense. Xncontramos nova-
xação de um espaço pelo outro. mente aqui o tema da dinâmica da centralidade.
Esta absorção leva assim à criação de vastos conjuntos cons- O domínio exerce a sua acção cettrahzadora no interior de
tituídos por espaços diferentes no interior de fronteiras comuns. fronteiras que isolam o conjunto de toda a ingerência estrangeira,
Mas só atinge toda a sua eficácia contânto que as interacções, quer sejam &onteiras materializadas entre os diferentes Estados,
as interde_pendências realtzem a integração das partes num todo. quer sejam fronteiras ideológicas como as que separam o
Durante'muito tempo a França foi apenas uma justaposição de mundo em blocos sócio-económicos.
províncias reunidas pelas conquistas e entre elas subsistiam dife- É pela protecção dada por estas fronteiras que se desenvolve
renças de cultura, fronteiras interiores que se opunham à livre o processo de organização dos espaços englobados. Consiste
circulação. Daí resultava uma situação de assincronismo que as na disposição de uma rede de circulação que factlttaa distribuição
impedia de evoiuir ao mesmo tempo (1). clos fluxos de pessoas, de informações, de capitais e de mercadorias
A integração não pode realizar-se senão depois da inclusão entre as regiões: cada uma delas dispondo de um mercado
de espaços num conjunto mais complexo, assegurando a livre mais vasto pode, doravante entrar em pé de igualdade numa
troca de informações, de matérias-primas, de energia e de economia monetária, desenvolver e especializaÍ a s:ura- produção
homens. O conjunto sócio-espacial organiza-se segundo níveis de na complementaridade das trocas. Na Suíça, por exemplo, oJura
diferente complexidade que the dao a esffutura de um sistema. explora as suas antigas aptidões púa a indústria de relojoaria;
a integração permite que espaços que tinham funcionado nos Alpes, a sua vocação é para a pastorícia e para o turismo,
'\ssim,
até então, independentemente uns dos outros, sofram as trans- utilizando as suas torrentes para fomecer a ig:ua e a energia
formações graças às quais, irão da mesma forma cooperar com o eiéctrica às indústrias concentradas em grandes cidades cla pla-
conjunto para a tezlização de projectos mais vastos, pois da cons- nície cenral.
tituição da ordem superior de uma orgaruzaçã.o resulta necessa- L organização do espaço conduz a uma divisão regional do
riamente um progresso. trabalho que, multiplicando as inter-relações no seio do conjunto
Só um forte domínio pode obter esta coerência entre as origina a integração na complexidade sócio-espacial, rerlizando
partes de um todo: ele é exercido pelo espaço activo onde está também condições para o progresso económico. Mas, ao rnesmo
concentrado o poder demográfico, económico, informativo e tempo produz diferenciações entre as regiões, e estas dife-
orgarizaavo capaz de se impor aos outros e de os levar a renças são geradoras de desigualdades, até. de dependência.
um objectivo comum. A ordem espacial assim instaurada repousa numa hierar-
(1) Ver a este respeito J.-'lV. Laræmr, L'analyse des systèmes politíques, quização de espaços em que um deles está no centro do processo
PIJF, col. <Sup, 1973. da orgamzação. Ele detém os poderes de decisão política e
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económica, as informações, os meios de acção, as instituições podendo agraver-se por divergências étnicas, levando eo exacer-
de cultura e de investigação. O seu poder acumulado cresce à bamento do sentimento regionalista. O Jura Suíço pronuncia-se
custa de si próprio por retroacção dos elementos externos. Este pela sua elevação a cantão autónomo.
't República Checoslo-
centro transmite um impulso à periferia que se encontra vaca privilegiou o planalto da Boémia e logo a Eslováquia não
submetida a uma subordinação mais ou menos estreita. É o caso hesitou entrar em sucessão no momento propício, tendo o novo
da planície suíça que detém o capital federal, as sedes sociais regime que esforçar-se vigorosamente para atenuar as dispari-
dos bancos, a bolsa de valores, as indústrias mais importantes dades espaciais. O Quebec pende para o separatismo. Em
e a autonomia cantonal dificilmente atenua a sua supre- Madagascar, a periferia costeira resiste à influência dos planaltos
macia. . É inútil insistir aqui na centralização geográßca da do centro da ilha.
França. Uma organização do espaço está pois sempre posta em causa,
É necessário affibuir, sern dúvida, estâ hierarquÞação espacial representando somente um momento da evolução para uma
à dinâmica própria dos sistemas, em que a concentração do maior ordem. A tarefa essencial da sociedade é a de recon-he-
poder central não pode resultar senão da exploração da peri- cer nela a dinâmica que lhe permite contolar e dominar os
feria. O espaço geográfi.co não seria portanto uma rede mas um mecanismos dos quais ræultam tensões diferentes provocadas
feixe onde a hierarquia parte de um vértice (1). por eia própria. É com esta finalidade que se deveriam desenvol-
IJm centro que exerce sobre a periferia uma maior pressão ver os serviços de ordenamento do território que estão em curso
do que aquela que deveria exercer pode bloquear a sua evolução. na maior parte dos países. Instalados no poder, os centros de
,ts regiões dominadas e acantonadas na sua especiaiização são decisão consentem epenas a formulação de medidas incompletas
levadas abandonar as actividades que exerciarn quando erarn que não são regulamentadas, como ainda agrevem as situações
dotadas de autonomia. Hoje, por exemplo, ját não há vida existentes.
cultural regional em França. Além disso, perdem a clpa-
cidade de utilizar a informação, de desenvolver as suas inicia-
tivas e explorar o campo das possibilidades, senão até mesmo 3. Os diferentes tþos de organização espacial.
incapazes de se diversificar e de se adaptarem aos novos
conhecimentos. A estruturação dos espaços geográficos a partir de um centro
No entanto, o sistema espacial é uma criação condnua, de acção aparece como o processo mais generalrzaåo. É o qo"
está sempre a construir-se. Ele contém em si forças de trans- revela o1álise de diferentes exemplos, dos mais simples aos
formação e a sincronia pode ser dinâmica em função das desigual-
"
mais complexos.
dades internas que ela implica. As relações dissimétricas entre o Primeiramente lembremos que a orgamzação do espaço
centro e a periferia são geradoras de tensões, de contestações, existe apenas a partfu de uma certa fase de desenvolvimento
das sociedades. Ainda hoje, os grupos humanos de recolectores
(1) Ver J. Arreu, La Ttarole et l'outil, PVF, 7975, pp. 79?-793: e de caçadores vivem em nomadismo, nos espaços florestais
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ou desérticos. É com a agricultura e a fixação dos homens depois da colheita e das mondas eGctuadas pelos membros da
que o ðrdenamento se impõe e que começa a vasta empresa de família e nele se produz o milho miúdo que é a base da sua
adaptação do planeta aos seus projectos. alimentação.
Porque serviu primeiramente de suporte a uma economia Na periferia do território, a alguns quilómetros da aldeia,
fechada de auto-subsistência, o espaço rural deu ao homem um outro círculo, é demasiadamente afastado para ser trabaihado
o sentimento de uma autonomia relativa. Deixou-lhe uma certa e vigiado permanentemente: aí se sucedem, dum ano para
liberdade para escolher uma orgarnzação d¿ sua conveniência: o outro o amendoim e o milho miúdo seguidos de um
isolar-se por famflias em habitat disperso pelos campos, ou longo pousio.
agrupar-se em aldeias aglomeradas no centro do território da Finalmente, à volta destes câmpos cultivados, a mata arbus-
comwridade para responder a uma exigência de segurança, tiva é abandonada aos rebanlos da aldeia e aos Peuls encarre-
de sociabilidade ou de disciplina colectiva na exploração do solo. gados de os cuidarem e vigiarem.
As comunidades rurais ligadas por uma forte coesão, Outro esPaço rural disposto em círculos concêntricos é o
equipam-se paru rcabzar os grandes trabalhos de que necessita o que aparece orgatnzado pelas populações sereres do Senegal.
ordenamento do seu espaço. Entre as organizações criadas, as A aldeia compõe-se de campos fechados onde as famílias
mais numerosas são as que respondem ao princípio de centrali- construíram as suas cubatas. Imediatamente à volta, num raio
dade, lembrando o que já dissemos atrás, representado pela aproximado de 200 meffos, estende-se o círcuio dos campos
distribuição do espaço em círculos concêntricos de importância desarborizados constituídos por parceias famfiares que os estru-
decrescente à medida que a distância à aldeia aumenta. mes permitem cultivar ininterruptemente, logo sem período
A, selva africana oferece numerosos exemplos quando o de pousio, produzindo na estação húmida, milho miúdo tempo-
núc1eo da população tem uma tradição étnica. Na região rão e feijão ou mandioca e algodão.
Sudanesa dos <dallolu, a aldeia reune muitas vezes, vários Pareli deste círculo e até à selva inculta, o resto do território
milhares de habitantes: cada famfrn isola-se num campo fechado é consagrado ao sistema de rotação trienal, isto é, o campo
por ramos de plantas enrelaçados onde as cubatas se dispersam dividido em tr& folhas que recebem em rotação o amendoim
no meio das <culturas de casu: o milho, o sorgo, o milho e o milho miúdo e o restante fica em pousio. É no pousio
miúdo e sobretudo as cultu¡as condimenteres utilizadas diaria- gue, durante a estação húmida, o gado da comunidade é,
mente na cozinha. São pequenos jardins trabalhados por mulhe- apascentado e gue, depois de Gitas as colheitas, a átea de pasta-
res e mantidos em estado de fertilidade por irrigação e adubados gem é alargada às outras duas folhas.
pelos desperdlcios caseiros. O funcionamento da rotação trienal supõe uma forte dis-
Envolvendo a aldeia, um primeiro círculo de várias ceritenas ciplina social, impondo aos indivíduos a mesma repartição
de metros de raio compreende as parcelas que são propriedede de culturas nas folhas e o trabalho em comum, para a exe-
das famílias, sendo submetidas a uma cultura intensiva graças à cução e colocação das sebes erguidas para defesa contra o deslo-
utiliz¿çfle de estrumes deixados pelos pastoreio livre do gado camento dos animais. As parcelas que cad¿famita cultiva são-lhe
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adbuídas pelo <chefe da terro, que são cada vez, pior trabaiha- Não vamos insistir muito no ordenamento do espaço rural
das à medida que estão mais afastadas da aldeia. ta1 como resulta da aplicação do sistema da rotação trienal
E interessante notar que esta orgatttzação do espaço rural, nas grandes planícies europeias, pois são factos bem conhecidos,
tal como é concebida pelas populações africanas, encootram-se na ,.rrdo o ,.rolt"do de uma orgarização ccmunitfuia åa socie-
Europa, mas naturaimente num outro contexto civilizacional. dade, fixando rigidamente os modos de utilização das três
Na Provença (1) o conjunto comunal é frequentemente folhas, o ritmo dos trabalhos, a pastagem dos rebanJros sob a
constituído por circulos concêntricos dispostos à volta da aldeia. guarda de um Pastor comunal.
Concentrando a quase totalidade dos seus habitantes numa ele- Hoje as formas colectivas estão a desaparecer, Irl?S e orga-
vação, a aldeia apresenta-se com uma posição deferuiva. Deste nização subsiste nas suas características essenciais: tai é o caso
centro irradia uma rede de estradas que pessando pela periferia da paisagem de openûeld.
^U--a
se ligam ao exterior. grande Jd.i" ocupa o centro do território que é envol-
A aldeia é cinturada por uma primeira zona grosseiramente vido por uma estreita auréola de jardins e Pomares. Deste
circular, o (campo cla aldeiu, cujo solo pode ser aproveitado pootolas esffadas irradiam em todas as direcções' encerrando na
para culturas sem haver necessidade de grandes deslocações: io" ,"d. o espaço agrícola, desarborizado, liberto de obstáculos
é um puzle complexo, de minúsculas parcelas dedicadas às onde a otgroa".ço subsiste apesar da fragmentação das explora-
culmras hortícolas irrigadas com a água depositada em cisternas, ções, da dispersão das parcelas,
da sua forma, em que os contor-
em que os seus proprietários podem fezer vá¡tas colheitas por ano. nos resistiram. Na periferia, os maciços florestais e as Pastagens
Para além dos 700 ou 800 metros da ald'eia, estende-se uma estão presentes, na fronteira das comunidades'
auréola onde predomina a vinha. Para estas distâncias é neces- Eìte tipo de org"ni"ação perde a sua coerência na medida
sário atmàzenat as alfaias e as charruas nos campos em em que , ,ã"i.d"d. ãnolu. para um maior individualismo, onde
<<rnazetn f57f dispersos no meio das culruras. o delm.mbremenro de um domínio multiplica as explorações
Para aiém destas, es terras mais afastadas da aldeia vão que pertenciam a um só proprietário, na medida em que' também
sendo abandonadas à garrigue e à floresta: do século xv Arru¿r¿" de circulaçãã arenua o custo das distância. Todavia
eo xwü, os nobres e burgueses vieram do exterior instalar-se
"é frequentemente adoptado na feconstituição do espaço rural
aqui enr. grandes domínios, constituindo hoje áreas de prados, empräendido pelas ,o.i.d"d.r colectivistas; o reegrupamento dos
campos de cereais, vinhas que envolvem a aldeia por uma nl centro dos domínios permite a formação de
cintura contínua: isto é já um mundo diferente.
"g.i*ltor.s populacionais dotados de serviços e equþamentos
"glomer"dos
Rodeando o conjunto da cornuna, uma linha áe colinas .ntão ,.r.*"dot às cidades. 'ts grandes aldeias Kolkozianas
"ié envolvidas, muitas vezes
erbonzadas marce os limites do seu território. são Por uma cintura de pomares e de
campos fechados individuais, em que caminhos de terra batida
(l) .{. de R-¡B¡¡¡2, Structures agraires entre Durance et bassin d'A.ix,
partlm daí em todos os sentidos para os campos cultivados que
Boletín dc Geografia de Aíx-Marseílle, t, LXJ(., nova série n.o 4, 1958, p. 131. se estendem até ao horizonte.
736 737
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Na extraoråtná,na variedade dos tipos de ordenamento do ) 6e¡¡1s¡çlal'ização. As transacções têm lugar nas cidades-mercado
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espaço rural, é difícil senão impossível, descobrir o fio condutor ri q.ue armazenam os produtos e os ecaminham Para os centlos
de
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que permitiria encontrar uma sequência. Definir uma tipologia .ooro-o, aí são instaladas indústrias de conservas, muitas vezes
foi tentado por várias vezes mas revelou-se sempre pooio .or,.- também indústrias de aifaias agrícolas e de adubos; os bancos
vincente. ,t organização espacial em círculos concêntricos à abrem os seus balcões e a toclas estas actividades económicas
volta do núcleo da aldeia, é um dos raros tipos que respondem correspondem naturalmente meios sociais diversificados [58]'
a uma indiscutível racionalidade, uma dupla racionalidade, diga-se Assim se realiza a integração veftical dos campos num sis-
racionalidade proxémica e racionaliclade sociológica. A de uma tema de relações hierarquizadas que os colocam na dependência
comunidade humana que se esforça por manter a coesão tirando das cidades regionais. Mas este mesnio coniunto integra-se
partido do espaço pelo menor esforço e pela máxima eficâcía num nível ropltiot de organir dão dominado pelos grandes
para a colectividade. Trata-se de uma estruture no sentido pró- centros d" corrrumo. A planície duranciana, ao Norte dos
prio, de uma con-ûguração específica que se impôs espontanee- Alpes, por exemPlo, é enquadrada numa rede de pequenas cida-
mente e fora de todo o contacto com civilizações muito dife- des: Cavailloo, Chât."urenarcl, Carpentras, Avignon, que desem-
rentes.
penlam um papel de intermediários púa a. comercialização
Nas sociedades tradicionais fundadas nurna economia de ã" prodoção de legumes e de frutos na região parisiense e nas
autoconsumo, o espaço rural constitui um conjunto indiferen- grandes cidades industriais da Europa Ocidental'
ciado, nascido cla justaposição de entidades, usufruindo de uma Nos países subdesenvolvidos, este processo de organtztção
certa autonomia no interior dos seus limites. de espaço rural desenrolou-se, muitas vezes, Perante oS nossos
't economia monetária exige um organismo que se inter- olhos tal como ume experiência laboratorial. A coloniztção
ponha entre â produção e o consumo: aparecem então os francesa equipou uma região senegalesa do cayor paru at implan-
mercados, cuja atracção se exerce sobre o canrpo circundante. t., coltota industrial do amendoim. Esta expandiu-se rapida-
Este dispõe-se, em função da proximidade, entre os cenffos onde "
mente nos solos arenosos da planície costeira, desde que se cons-
se efectuam as operações de venda e de compra, primeiramente truiu a via férrea Dakar-Saint-Louis. Viu-se então, cada uma das
são feiras periódicas, depois os mercados permanentes. ,ts estações escalonadas regularmente ao longo da linha, Tivouane,
suas funções comerciais constituem atributos urbanos cuja Mékhé, Kébémer, Louga, polarizando uma porção de espaço
importância aumenta desde a aldeia à pequena cidade. à sua volta, graçâs a uma rede irradiante de pistas; equipar-se para
O facto urbano penetra assim no erp"Co rural, estimrla-o, rcahzar a concentração da produção, a fim de assegurar aos agri-
polariza-o, hierarq'iza-o: ao campo indiferenciado opõe-se o cultores os serviços indispensáveis, adminisrração, Postos de
canrpo organiza-o à volta de lugares centrais que o 1igam ao correio, lojas, enfermarias, escolas, Povoam-se de cobradores de
exterior. impostos, t"rreg"dotes e comerciantes. Pequenos centros urba-
Esta quadrícula urbana observa-se em todos os países onde nos nasceram, transição entre o camPo circundante e aS fäbricas
a agricultura é especialtzaåa na proclução de colheitai destinadas e o porto de Dakar.
138 739
Em tesumo aorganiz¿ção do espaço rural efectua-se segundo Noutros casos, mais evidentes, destroem-no em prirnerro
si
dois processos: um traz-lhe o arroteamento e ordenamento lugar, forçando o êxodo da sua população, mas reestruturam-no
que the permite exercer a função de produção; o outro inte- logo de seguida quer incitando-o à especialização da produção
gra-o através da disposição de centros urbanos servindo de ogtíroL virada para o mercado, quer incorporando as suas
':
entrepostos num sistema espacial complexo virado para o con- actividades no esPaço.
sumo. Entre o espaço rural e o sistema espacial, estabelece-se Com efeito, a cidade é um esPaço em via de organização
a hierarquizeção das relações de dependência. contínua. Através da história desta organiza.ção um princípio
A cidade encontra-se pois colocada no centro da organi- permanece constante: o de uma centraiidade dinâmica.
zação racional do espaço: o seu princþal papel g.ogr?fi.o . ¡ cidade é muitas vezes formada a partir de um núcleo
consiste no efeito polarizador que exerce à sua volta. contraria- cuja função determinou a escolha do sítio: o castelo num
mente ao que se pôde afirmar, a cidade não é <um organismo ."t.ço isolado; o mercado num cruzamento, numa con-fluência,
geográfico completor; a cidade não vive da cidade mas sim da numa testa de ponte; o Porto de abrigo numa enseada"' A aglo-
região. Tem necessidade, para se organizar, de um suporte meração nascida à volta deste centro inicial rodeia-se de muralhas.
espacial que a ultrapasse e numa área mais ou menos l"tg", O crescimento efectua-se Por alastramento, em ondas sucessivas,
tem necessidade de ser um centro de acção que irradia através segundo uma estrutura rádio-concêntrica onde aveoidas que par-
do espaço. Não é de modo algum, um falso p-bl.*" quando.se tem do centro cortam em ângulos rectos as circunvalações que
pretende analisar as relações da cidade com o seu meio. substituíram as muralhas; infiltra-se assim no esPaço rural,
Certamente, a história conheceu exemplos de antagonismos ffansformando as aldeias e as terras cultivadas numa auréola
entre a cidade e o meio no qual estava implantada: as cidades periurbana. Face a este irresistível desenvolvimento de urbani-
do interior de Marrocos encerram-se nas muralhas para melhor zação o espaço agrícola dificiimente resiste sem que no entanto
se contifrlle a travar uma batalhtrç-rectaguarda. Im Marselha,
fazercm frente às incursões das tribos rebeldes. Segundo 'Weu-
J.
lersse, as cidades e os cempos do próximo orierte opunham-se por exemplo, subsiste ainda hoje uma agricultura (1) qlle
entre si até à hostilidade; diferentes pela origem da sua popu- escoa, com proveito e algum lucro, a sua produção nos
lação e da sua história, uns aparecem como corpos .rtåoho, mercados da cidade: os agricultores espartilhados por todos os
enquistados no meio dos outros, instalados em lugares de segu- lados pela construção de grandes blocos de habitação, defen-
rança donde a, raçe vencedora exercia o domínio sobre região. dem-se-, palmo a palriro, contra uma inexorável especulação
"
Estas situações correspondem a excepções em determinados imobfiária, ãvtda de um espaço para construir. Estes sobre-
momentos históricos. com efeito até as cidades mais modestas, viventes do antigo arredor hordcoia, hoje englobado na cidade,
mantêm relações integrantes com o espaço que as rodeia.
Algumas criam todos os seus elementos: tal suceãendo em sfax
ao criar, uma unidade com a clisposição em auréola de plantações (r) Michèle JoaNNoN, (Jne øgriculnffe dans la ville: Les naraîcheres
*oruitíot-fitt à la iroìssance, tese de 5." .i"lo policopiada da Univenidade de
de oliveiras. Aix-Marseille II, 7975.
740 741
resistem mal aos elevados preços que the são oferecidos, pelos O processo começou em Lond¡es durante a primeira metade
seus terrenos estando ameaçados de uma expulsão num prazo do século xx e daí o nome do fenómeno <de City>z l59l
mais ou menos longo. grosso modo, funda-se numa redistribuição espacial entre os ser-
Do centro para a. periferia, num corte feito através da viços para os quais se cleslocam os consumidores e as merca-
cidade, aparecem claramente os diGrentes elementos constitu- dorias que são ù atracção daqueles. As funções urbanas ditas
tivos, traduzidos numa arquitectura, funções e até nas popula- superiores agrupando as actividades polídcas e administrativas,
ções (1). as actividades bancárias e de gestão, os organismos culturais, a
Em muitas cidades o centro conservou o seu carácter histó- a grande hotelaria, os serviços especializados, jurídicos e médicos,
rico: agrupa-se à volta do Castelo, da Catedral, do Palácio da encontram-se no centro, numa palavra os Poderes de decisão
Justiça, da'Câmara Municipaf dapraça do mercado, dosricos e e de informação.
antigos palacetes, dos grandes armazéns dispostos em andares Esta concentração não se rcaItzt sem um novo arranjo do
do teatro, dos museus... É sempre no coração da cidade espaço que desencadeia nos países de economia liberal uma desen-
que se exercem as funções nobres: políticas, administrativas e freada especulação fundiária, de ousadas e discutíveis arquitectu-
culturais. Envolvido por auréolas sucessivas, cuja arquitectura ras; âs casas de habitação de rendimento insuficiente degradam-se
se torna cada vez mais moderna, as densidades cada vez e são ocupadas por marginais esperando a sua substituição por
menores e o estâtuto social dos habitantes cada vez menos altos imóveis, torres e arranha-céus destinados aos grandes ser-
elevado até se aproximar da perGria onde o espaço se alarga e viços administrativos públicos e privados (1). Esvaziado dos seus
se converte em habitações individuais, em parques, em jardins habitantes, o centro conhece uma acumulação duante o dia e o
públicos entre os quais subsistem âs quintas e as culturas, sendo vazio nas noites e a sua população residente baixa regularmente
no arredor que termina a maior parte dos serviços urbanos. em cada recenseamento. O seu desenvolvimento é rapidamente
Tal é o esquema geral susceptível, certamente, de muitas bloqueado pela falta de espaço: desde logo se impõe a necessidade
variantes. Especialmente nas grancles cidades, as coisas já não se de disseminar as funções centrais Por outros Pontos da cidade
passam bem assim: a centralidade exprimiu-se por uma especia- ou daí criar centros secundários e intermediários, tal como os
Ttzação das funções do centro da cidade e por uma rejeição de campos Eliseos e Avenidas perißricas da Defesa de Paris.
certas actividades p^ri^ periferia (2). Assim, o centro de uma grande cidade é levado a expulsar,
^ não somente uma parte da sua população, mas também algumas
(t) eAs cidades, escreve Pierre George, crescem um pouco à maneira das suas actividades: é o fenómeno da exurbanização. Primeira-
de um tronco de árvore, em auréolas sucessivas que se distinguem pela idade
e formas dos edifícios> (L'ère des techníEtes, PtIF, col. uSulr, te7+, p. S:¡.
e) <O espaço constituído por um cenrro da cidade não é o f¡uto dê C) uO exemplo mais representativo é fornecido pelas cidades ainericanas
aceso ou da natureza das coisas... é a projecção sobre o terreno da sociedade onde a Downtown, sobrecarregada de arranha-céus domina as zon¿s de
dominante... o sistema de valores de uma sociedade inscreve-se praticamente barracas e de entrepostos abandonados, enquanto a cidade progride Por um
na realidade urbana nas suas construções, nas suas ruas, em todo o seu processo que tem sido classificado de exura-urbanização ou exurbanização>
tecidor (Roger Kra,nir, Qaalíté de la víe et cerrtre ville, A, Colin, 1975). (P. Groncr oyt. cít., p. 89).
7A 1.43
mente são expulsas as actividades industriais que tem necessidade
d.epolarização. Estes são as <cidades novas)) ou <cidades satéliresD
do espaço a baixo preço, de facilidades de acesso para homens
que são constituídas por complexos habitacionais, de emprego,
e mercadorias. os serviços de interesse público exigindo de serviços e de comércio de distribuição.
grancles superfícies como cemitérios, estádios, quartéis do exército
O exemplo veio da Grã-Bretanha, cuja política de inter-
armazéns de mercadorias, complexos hospitalares e universidades
venção regional recebeu um forte impulso desde 7964. Em vez
instalam-se na periferia, assim como as cadeias de hotéis se
de travar a expansão de Londres, foi decidido facilitar o desen-
aproximam de aeroportos que servem a cidade. No decurso dos
vimento de cidades satélites. É assim que hoje, a grande Londres
últimos anos, a exurbanizaçâo [60] atingiu também o comér-
é envolvida por uma auréola de cerca de 50 quilómetros de
cio. O movimento originário da.tmérica do Norte propagou-se
raio que agrupa nos limites da região urbana de Londres,
rapidamente à Europa ocidental atavés do uso .orr"ot"ão auto-
perto de uma vintena de Cidades Novas e de cidades em
móvel individual nas deslocações, das possibilidades de conser-
expansão.
vação de produtos graças à refügeração e à congelação tornando
O espaço geográfico de Paris (1), tal como o de Lon-
posível a disseminação à volta dos bairros densamente povoados
dres (2), testemunha a sua orgaruzação hierarquizada ern círculos
da-cidade, de <rgrandes superfícieu e de cenrros .o*"r"i"i, pro-
concêntricos dispondo-se à volta de um núcleo que é cada vez
vidos, não somente de uma gama completa de armazéns de mais especialtzado nas suas funções de terciário superior, rejei-
vendas, mas também de restaurantes, de salas de esBectáculos e
tando para as zonas perißricas a população e as actividades de
de parques de estacionamento podendo conter milhares de produção propriamente ditas (3).
viaturas.
O centro que corresponde aproximadamente à Paris rnonu-
Estas criações, nascidas de uma especulação do grande
mental do século x\ruI, agrupa em vários núcleos diferentes,
capital, durante bastante tempo afastado das operações comerciais
as funções de decisão política e administrativa., o mundo dos
cle retalho, responde a uma necessidade de uma população que
negócios e os organismos de informação. Os bairros perißricos
se concentra por aumenro de densidade à volta da cidade, num
construídos nos fins do século xlx, mas em via de renovação,
raio de vários quilómetros. Doravante, o centro perdeu .uma constituem uma primeira auréola composta de quarteirões habi-
parte da função comercial que tinha sido até então a sua razão tacionais. O arredor próximo urbanizado nos princípios do
de ser.
século xx, desenha-se segundo uma segunda coroa onde se loca-
A própria cidade tem sido ultrapassada pelo fenómeno de Lzam as zonas industriais no meio de popuiação operária.
urbanização, não podendo para aiém de um certo nívelde desen-
volvimento, alargar-se e, como entidade, capaz de responder às
exigências do seu crescimento demográfico e de expansão
espacial. Os risco de uma paralisia total, inrpuseram o controlo
(t) D. NorN, L'espace françaìs, A. Colin, 1976, fig. 37, p. 178.
(r) C. CnarrNE, Le Royaume-(Jní et la RépublíEte d'Irlande, PUF 1966,
do fenómeno por uma acção concertada e esta consistiu na fig. 7a, p. 94, e 7b, pp. 11G.111.
criação, na órbitra de uma grande cidade, de centros secundários e) Paris e os Hauts-de-Seine, agrupam 80% dos empregos terciários
e somente 54ls dos empregos secundários da região, I1e-de-France.
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t45
t0
A auréola exterior das cidades de aldeias antigas, que a grande pobres que são alcançados pouco a pouco pelas actividades
expansão parisiense dos últimos cinquenta anob englobam, tai do centro; a uma zona de bairros operários segue-se uma zona
como os arredores longínquos, está em plena transformação. residencial de burgueses abastados, composta de casas individuail
É o esp"ço com pequena densidade de ocupação, dos loteamen- e chalés particulares e finalmente, no exterior e num raio de
tos pavilionares, dos grandes conjuntos arquitectónicos e das cida- uma vintena de quilómetros, as cidades satélites donde partem
des novas previstas no Esquema de Orgamzação do Espaço da as migrações quotidianas para o centro.
região de Paris : Cergy-Pontoise, Marne-1a-Vallée, Saint-Quentin- Assim constitui-se entre a cidade e a sua periferia uma
-en-Yvelines, Evry e Melun-Sénart. É aqui, nestes vastos espa- continuidade urbana integrada no centro: este espaço ultrapassa
ços liwes que se implantaram sete grandes centros comerciais largamente os limites administretivos da cidade formando
regiònais poi onde passam uma média de clois miihões de visitan- uma região urbana fortemente individualizada.
tes por semana e a sua originaiidade consiste emjuntar à sua fun- É perfeitamente evidente, ainda uma vez mais, que não pre-
ção comercial, um papel de animação da vida colectiva regional. tendemos fazer do mecanismo da centralidade o modo úniçs
Entre o centro e a periGria da região parisiense, a unidade ou mesmo principal de organização do espaço, tanto rural
funcional manifesta-se num vaivém quotidiano de enormesfluxos como urbano: a iniciativa das sociedades humanas, feita de liber-
de pessoas e beru. No limite extremo deste vasto conjunto, dade e de invenção, não se deixa encerrar num quadro
a cerca de vinte quilómetros de distância, as migrações de imposto. Mas pareceu-nos que nas suas investigações, os geó-
trabalho podem ainda mobilizar um terço da população activa, grafos não h¿viam prestado uma atenção suficiente ao fenómeno
Contrariamente às cidades espontâneas, as cidades criadas da centraiidade: entregues a si próprios, os processos de organi-
são geralmente concebidas segundo um plano cuja greiha zação clo espaço têm tendência, considerando a resistência de
utilizada é a de uma rede ortogonal de ruas e avenidas. diversos obstáculos, a disporem-se de preferência segundo um
,tbandonadas em seguida à sua própria dinâmica, as cidades sistema radial que responde verdadeiramente às exigências de
evoluem para uma zonagem empírica em auréolas concêntricas. uma lógica interna. A centralidade não é uma necessidade
Nas sua obra La vìlle. Le fait urbaín à travers Ie monde (t), absoluta, mas também não é uma obra do acaso.
Pierre George lembra as investigações de E. 'q/. Burgess (2) Ao longo da sua expansão, as cidades podem ser levadas a
sobre a evolução da organtzaçdo de Chicago. Na quadrícula absorver o espaço que as separa e a fundirem-se assim num
originai da cidade, aparecem, dispostas ern semicírculos e envol- contínuo conjunto urbano: o agrupamento das cidades associadas
vendo o centro administrativo e comeÍaú.locahzado próximo através desta coalescência constitui uma conurbação [61].
do porto lacustre, uma zona de bairros ocupados por emigrados A conurbação apresenta, geralmente, uma unidade funcional
formando-se no exercício de uma única actividade. A indústria
está, muitas vezes, na sua origem: no Ruhr originou um
(Ð PIJF,7952, p.243.
(r) The determination of gradient in the growth of the ciry, Amerícan
alinhamento de cidades, tais como, Duisbourg, Essen, Bochum,
Socíological Socíety Publícatíons, 27, 7927, pp. 178-784. Dortmund, ligadas entre si por uma via expresso. É sobre estes
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mais de 50 quilómetros que se verifica <a maior densidade e a através de modelos matemáticos. Não entraremos aqui na expo-
maior continuidade de construção>. No sudeste de França, sição das'teorias às quais eles deram lugar(l).
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o turismo suscitou uma conurbação quase sem interrupção !
Como se process¿ o domínio do centro ? À partida,
ao longo de 200 quilómetros, desde Toulon a Menton, feita de .,I
t ffata-se geralmente de uma cidade que possui já uma superio-
cidades de todos os tamafihos intercaladas por vivendas, urbani- ridade sobre as outras por aí se loceli"arem, os poderes polí-
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zações junto à costa dispondo-se face ao mar sem se expandir , ticos, uma acumulação de capitais devido ao comércio, vanta-
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para o interior, o que the dará uma densidade de população gens ecológicas tais como a situação geográfica ou recursos
e uma taxa de arbarúzação das mais elevadas de França. ,
148 149
directa à volta de São Paulo, no Brasil (1). A cidade e os bloqueadas no seu desenvolvimento pela excessiva concentração
municípios dos seus arredores industriais, Osasco, Guarulhos, do poder na capital.
São Caetano, Diadema, formam uma aglomeração compacta Muitas vezes a dinâmica demográfica que se constata há
de mais de seis milhões de habitantes. Centrado neste núcleo, vários anos põe em dúvida esta suPremacia esmagadora: como
a difusão das actividades industriais veio integrar uma auréola todas as cidades que se despovoam em proveito da periGria,
de uma vintena de quilómetros de raio, compreendendo um a Paris <.intramurov esvazia-se, enquanto uma zona concêntrica
viveiro de pequenas cidades, tais como Barueri, Suzano, Poa, com cerca de 100 quilómetros de raio conhece um crescimento
enquanto múltiplas relações de serviço ligam a Grande São explosivo (1). uma redistribuição das áreas de influência acom-
Paulo à região industrial nascida recentemente à volta do porto panlará sem dúvida uma desiocação do centro de gravidade
de Santos. A mais de 100 quilómetros do centro, a infuência demográfico.
industrial e a responsabilidade de gestão atingem, através do No entanto, pode-se dízer atnda hoje, sem cair no exegero,
espaço agrícola, as cidades de Campinas, Jundiai, Sorocaba. que toda a França está englobada numa rede que, desde a mais
,t convergência das estradas e vias fërreas mateúalíza a polari- pequena aldda, passando pelas cidades intermediárias de cres-
zação exercida pela grande metrópole. cente importância, conduz a Paris: é a consequência geográfica
A rede organtzadaa partir de Paris é ainda mais significativa. duma cenfialização política excepcional que se Processa desde há
À volta da região parisiense ta1 como ela ját foi definida mais séculos.
atrás, o espaço ordena-se em faixas circulares cada vez mais É por isso que, se por um lado, se explica frequentemente
afastadas (2): uma pequena coroa inclui, num raio de 50 quiló- a organtzeção espacial de uma região, a noção de rede urbana
metros, as cidades satélites como Creil, Fontainebleau, Mantes. aplica-se muito raramente ao conjunto dum país: a República
À medida que a distância aumenta, â autonomia e o dinamismo Federal Alemã, por exemplo apresenta um grande número
cresce e com ela o equipamento, mas não a capacidade de áreas urbanas envolvendo grandes cidades como Stuttgart,
direccional. Tais são os casos das cidades de faixa média como Francfort, Hanover, Hambourg dispostas em constelação à
Compiègne, Soissons, Orléans, Chartres e a mais de 100 q"iló- volta de um núcleo industrial imPortånte, como acontece no caso
metros, as da faixa mais larga como ,tmiens, Troyes, Le Mans, do Ruhr. A sua distribuição no esPaço revela uma repartição
Rouen. dos poderes de decisão, de trocas funcionais entre si, das quais
Xstas cidadcs quase que não têm quaisquer relações entre resulta um certo equilíbrio inter-regional (2).
elas pois comunicam direciamente com pã¡s. ô ."-po que pola- Já anteriormente referimos que a orgatização espacial dum
rizamnão é suficientemente povoado para constituir um mercado país se efectua no interior das fronteiras, seguindo um Processo
susceptível de justificar certos serviços especíûcos. Todas são de especiahzaçio e de hierarqurzação que leva a profundas
(1) Aire métropolitaine, conurbadon ou région indusrrielle. Le cas de (1) J. Boucnrr, Enseignement du recensement et condidons nouvclles
São Paulo, La régíonalßatíon de l'espace au Brésí\, CNRS; 7971 p. 775. pour I'aménagement du territoire Futuribles, Primavera, 1976, p.793.
O Ver a carte de D. NorN, op. cit., p. 190. (r) Ver em J. Prnnnv, op. cít., a cartâ da p. 779.
150 151
-*Trr'q!FTç!_æ-.----
disparidades entre as regiões. A dialéctica deste mecanismo de corredores de industriabzação recente na direcção de Oeste:
diferenciação é tal que, à elevada estruturação de umas, corres-
um sobre as vias de comunicação ligando Le Mans, Laval,
ponde a degradação por subdesenvolvimento das outras. ,\s Rennes; o outro pelo vale do Loire até Nantes-Saint-Nazaire.
migrações das populações destas para aquelas, traduzem e
Estes resultados são a consequência da aplicação de uma política
evolução diferencial, {ue separa o seu potencial económico.
de descentrahzação industrial. A poiítica do ordenamento do
Talve-2, que em parte alguma se constata a oposição com
litoral começa trazet tambénr os seus frutos: as operações
tanta evidência como o verificado entre o Norte e o sul de ^
de infraestruturas destinadas ao desenvoivimento do turisnro
rtíIta, estando aí presentes as condições naturais e a história; determinaram o acréscimo da população nas costas Oceânica
mas a r''nificação política em 1860 foi decisiva, pois estendeu o
e Mediterrânica. Parece que França é dividida em duas por
regime ûscal desde o Piemonre a toda a península e suprimiu aquilo que Jean Bouchet chama <a falha do empobrecimento
brutalmente as barreiras aduaneiras no interior: a indus r-.iÅizaç?,o teirirorial> dirigida do Sudoeste para Nordeste, separando os dois
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atraiu pa', e planície do Pó, não só os homens mas também as polos da Bacia Parisiense e da região Ródano-Alpes, englobando
poupanças sem aplicação no Mezzogiomo onde as estruturas G"sconh", o Maciço Central, os planaltos da Borgonha e
tradicionais se manrêm inalteráveis desde 1950. "atinge as Bacias Mineiras do Norte e da Lorene que chocan
A geografia deve tirar partido destas observações e criar pelo envelhecimento das suas estrutures industriais'
uma tþologia regional baseada em realidades dinâmicas. Esru- Em que medida a política francesa cle ordenamento do
dando os Estados tlnidos,Jacques soppelsa (1) classifica os grandes espaço pode pôr em causa a supremacia que Paris deve à centra-
conjuntos regionais em três grupos: os polos d" crescimento, Lzaçdo política?
que são grandes centros industriais e comerciais, tais com.o a Para responder a este questão é necessário analizar as colL-
caktórnia, aRegião dos GrandesLagos, aMegalópolis; as regiões dições em que se operou o desenvolvimento da indústria fran-
em estagnação correspondem às planícies centrais e terras altas do cesa no decurso dos últimos quinze anos (1).
oeste e as regiões deprimidas do centro-Este Apalachianos e .4. industrializacão estendeu-se a regiões que durante muito
do Sudeste .ttlântico. tempo se tinham mosffado refractárias à sua penetreção. Os
Em França' a preponderância deseqt'ilibrada de paris e da e o auxílio do Estado tor-
þrogressos da produtividade agrícola
sua região é uma realidade indiscutível, mas a periferia já não n"r"*-rr", mais permeáveis à mutação. Cidades e campos dispõem
é um deserto- Pierre George (2) reconhece *í do"r regiões hoje de uma mão de obra disponível para aceitar empregos Pollco
solidamente polarizrdas: a região do Norte e a região Lionesa, qualificados e produzindo pouco valor acrescentado, Portafrto
e os_.espaços inorgânicos gue correspondem ao resto do país: salários relativamente baixos e fracas oportunidades de promo-
Ah,o do úldmo recenseâmento aparece uma nova dinâmica
ção individual.
do espaço: a partir de Paris e da sua região desenåam-se dois
(1 I¿s Etaß-tJns, PUF, col. .Magellan>, 1971. (1) Ver, a este respeito, Gérard Ln GALL, Eléments pour des scénarios
('?) La France, PUF; col. .Magellano, 1967. sociaux, hospectiues, PIJF, n.o 4, 1975.
152 15J
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As indústrias que ar se implantam são associadas num triais do Benelux, a planície do Pó em ltáiia, no Norte,
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estado intermédio de um ciclo de produção: recebem do r.ì
a Lorena, a região Ródano Alpes e a região Parisiense em França.
exterior as matérias primas e os produtos de primeira trans- :i,
Preparar-se-á a França para esta eventualidade? Os equipa-
formação. os centros de direcção e tecnológicos, tar como os ;l
menros im .rin de rcahzação ou projectados parecem escolhidos
aparelhos de gestão e de distribuição dos piodutos acabados ;'
em função desta prioridade dada ao Leste do país: auto-estrada
mantêm-se localizados na Região parisiense. do Lesre, a iinha férrea de grande velocidade Paris-Lion,
com efeito, a descentralvação da indústria responde mais o compiexo industrial de Fos, a iigação fluvial Ródano-Reno.
à nossa estratégia da economia industrial do que às exigências A voiti do centro alemão organizar-se-ia assim um eixo industrial
políticas. Mas, no fim de contas, não toca ,r"d" ,r", rá"çOes superpovoado, super-urbanizado, dominante, incluindo a Ingla-
de dependência que foram criadas pela centr alvação política t.irr, os Países Baixos, a Bélgica, a França do Leste e o Norte
ao longo da história. Pode-se mesmo avançar, que ela os da ltália. A esta <<Europa Lotaringia> subordinar-se-ia a Europa
a.gtava por um domínio que resulta da divisão sóáo-espacial
perißrica agrícola, pouca povoada, composta pela lrlanda, França
do trabalho, dissimétrica enrre o centro e a periferia. de Oeste, Espanha e ltália peninsular [64].
Entretanto, este espaço francês, construído numa hirarquia Outras hipót.r.r podem ser evidentemente formuladas.
de centros regionais convergindo para o centro nacional, corre
Qualquer que seja a hipótese, é provável que abandonada
a si
o risco de conhecer uma profrrnda reorganização pela integração, ptOp;", ãioâ-i." da Comunidade levaria à desintegração dos
cadz vez mais estreita, nos mercados externos. "
espaços nacionais e sua integração em novos conjuntos'
A criação da comunidade Económica Europeia deve acom- -
Desde a mundializaçio da econonúa, as fronteiras políticas
panhar-se necessariamente por um enfraquecimento, até ao desa-
perderam a sua função de proteger os esPâços nacionais contra
parecimento do poder organizador das fronteiras nacionais a concorrência económica, pois o processo de especialização
e da livre circulação dos homens, das iniciativas, dos capitais e de hierarquização que criou a oposição dialéctica entre o centro
e dos produtos. ,t partir daí encontra-se liberta de todo o e a periferia estende-se a toda e terre.
entrave nacional, a dinâmica do sistema de gravitação económica, -O
capitalisnr.o em expansão exPortou esse Processo para além
pelo facto de alguns centros mais poderosos atraírem outros da sua área de influência, num primeiro momento, através
centros para e sua órbita. do mecanismo da colonização.
Entre os cenários (1) imaginados, um dos mais aceites No que se possa dizer a este propósito, o mecanismo Provo-
procura mostrar que a formidável concentração industrial do cou nas colónias uma dicotomia, entre os espaços abandonados
Ruhr alemão constituiria no coração da Europa ocidental, às comunidades indígenas e os espaços preparados para receber
o polo de atracção para o qual se orientavam as regiões indus- culturas de plantação ou para explorar e transformar as matérias
primas (1). Mas numa dicotomia dialéctica, estes ao mono-
(1) ver a este respeito, philippe Bem¡r e André Fanr.., Milton SÂNros, L'espace pafiagé, M-Th. Génin,
des ascênarios européenst, Prospectíues, pUF; I; 1973.
Erëments pour e) Ver a este respeito
7975
754 15s
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pol:øt as melhores terras e a força de trabalho são responsáveis- regiões colonizadas e as regiões indígenas constituíam um 'con-
pela degradaião "daqueles, desencadeando in loco, segundo a junto geográfico integrado num esPaço económico exterior'
expressão de um economista, <o desenvolvimento do ,ubd.s.n-
â metrópole. Colónia e metrópole estavam liadas por relações
volvimento>.
desiguais, da periferia Para o centro: uma estava encarregada
lL estrutura geográfica da República sul Africana fi*da-se de contribuir para o desenvolvimento da ouCra absorvendo os
na aplicação rigorosa ao espaço da política de <apartheiô. É o produtos industriais e adquirindo-lhe os produtos agrícolas, as
resultado de uma contradição activa enrre as regiõei agro-pastoris,
matérias primas e a mão-de-obra barata; dependia da metrópole
industrializadas e urbanizadas, monopoliz"ã.r p.1o, Ër"o.or, pelo investimento de capitais, circuitos comerciais e mercados e
e as regiões rurais deixadas aos Negros. Encerrados nas suas á ro" viragem para o exterior fazia ða' colónia um espaço alie-
((reserVasD e nos seus <territórios> os
Bantus concentranr-se aí nado que escaPava totalmente ao controle da sua população [65].
apresentando fortes densidades; o superpovoamenro obriga-os É, .* grande Parte, sobre a exploração dos seus impérios
a recorrer a práticas de economia destrutiva, com sobrecarga coloniais que a Grã-Bretanha, a França os Países Baixos e a
das áreas de pastagens, redução da superfície e até mesmo o Bélgica basearam o seu poderio económico até meados do
abandono do pousio, acelararam a erosão que provocou a degra- século xx.
dação dos solos. Depois da Segunda Guerra Mundial que os colocou na
A sua base económica tradicional é arruinada, as conruni- primeira frla das potências económicas, os Estados Unidos
dades negras vítimas de um mecanismo de empobrecimento inquietos pela expansão do socialismo, vão esforçar-se Pâra agru-
apresentam forte mobilidade: os homens jovens emigram para par o resto do mundo num vasto mercado desembaraçado de
a construção civil nas regiões dos brancos. O <apartheid> iodas as fronteiras e sujeito à sua dominação. Assim, aceleram
espacial criou a mão de obra necessária ao desenvolvimenro o desmembramento dos sistemas imperiais sem o qual, a organi-
da economia moderra da Áfüca do Sul. zarção duma <grande zonat, de economia capitalista não tinha sido
Sem recorrer à segregação iacial, a colonjzação francesa possível.
tinha, com efeito, atingido os mesmos resulados na Argélia: A descolonizaçio rcaltzadaem alguns anos, fragmentou o
depois de ter expulso os antigos ocupantes povoou, .qoipo,r, antigo espaço coionial em numerosos Estados e muitos de1es,
explorou a maior parte das fërteis pianícies do Tell, .oqo*to especialmente tt" África, não são viáveis devido à insuficiência
",
montan-has e ás altas planícies secas sofreram o acréscimo rápido da sua população, do que resulta uma balcantzação qrae faz a
de densidade populacional, condenando os autóctones a ruinosas ftaqu,er,a do continente.
práticas agro-pastoris, levando assim à emigração maciça que As tentativas de reagrupamentos territoriais fracassaram;
procurava os recursos monetários necessários à subsistência das a criação de associações de liwe comércio não deram resultados
suas famílias. convincentes; toda a proposta tendente a reduzir a desigual-
Submetidos a um mesmo processo qtoe fazia com que uns dade das trocas é rejeitado pelas grandes Potências. Mantidas no
se desenvolvessem à custa do empobrecinrento dos outros, as seu papel de periferia, as antigas colónias continuam sob a
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dependência económica através duma hierarquia de centros f.i onde se localizavam os pontos de apoio portufuios. Na hora
que coroam os Estados-Unidos. É esta dependência estrutural da independência, fortes disparidades emergem: os Estados cos-
que os impede de executar uma políticâ que os fariam sair do I
teiros são dotados de um rica agricultura de plantação, de uma
seu subdesenvolvimento. indústria mineira, de uma infraestrutura de comunicações;
A estas explicações é preciso acrescentâr, entretanto: gue as por outro lado, os Estados interiores, desprovidos de todo o
relações entre espaços não podem estabelecer-se senão por inter.- equipamento, vão vivendo à base de uma economia agro-Pas-
médio das relações sociais. Nos jovens Estados que não rejei- toril tradicional.
taram a via do capitalismo, as burguesias nacionais controlam Entre eles estabeleceram-se iigações desiguais: Mali, Alto-
. o poder político, burguesias administrativas, burguesias tecîro- -Volta, Nigéria, Tchad somente vendem aos seus vizinhos do
cráticas ou burguesias de comerciantes, aiiados de classe às bur- Sul[ produtos alimeirtâres: milho'miúdo, gaclo e a força do
guesias internacionais, cujo interesse é manter a integração do trabalho excedentário da sua população utili"ada nas plan-
dos seus países no sistema do mercado mundial, opondo-sea toda tações e nas grandes cidades da costa. As suas relações com. os
a política de reformas que podia pôr em causa e que atacâria mercados extemos efectuam-se obrigatoriamente através dos
as disparidades sócio-espaciais sobre as quais se apoiam. Vão territórios do Senegal, da Costa do Marfim, do Gana, por
mesmo rnais longe: a dependência que aceitam, dedicando-se a intermédio das suas vias férreas e dos seus Portos.
a submeter os países vizinhos mais fracos em seu proveito. Todas estas condições colocam uns países na situação de
A análise de um exemplo preciso, poderá fazer com- clependência em relação a outros: assim o Alto Volta é tributário
preender melhor este mecanismo da hierarquização, da dependên- da Costa do Marûm em reserva de mão de obra e na necessária
cia dos espaços. Para isso servimo-nos dos exemplos da ,{frica utilização da via fërrea da Costa do Marfìm e do porto de
Ocidental. Abidjan que realiza todo o seu comércio externo. Mas, por
O espaço aí reparte-sÊ em zonas biogeográficas dispostas outro lado, a Costa do Marfim depende do mercado francês
em faixas segundo a latitude: estas são do Sul para o Norre, para o essencial das suas exportações de madeira, de produtos
e. zona. da floresta húrnida, a zona das savanas, a zona estepo- de plantação e das importações de equipamento industrial.
-deséruica. Do século vm ao xv, as verdadeiras civilizações E o seu lugar nesta hierarquia é notavelmente explorado por um
agrárias edificaram impérios prestigiosos, baseando o seu poder homem de Xstado hábil, que explica a ProsPeridade relativa da
no cavalo, que ao longo da savana e da estepe dominava. economia da Costa do Marfim.
'{.
coionização europeia deslocou o centro da gravidade do Hoje, o planeta é delimitado por uma fronteira ideológica
Oeste Afücano e transportou-o para a cosra do Golfo da Guiné em dois sistemas económicos, organizados à volta de dois camPos
de forças: os Xstados Unidos e a IIRSS, entre os quais a
política da coexistênaa padfica tem por fim manter o equilíbrio.
(t) ver paraeste rema, Yves Lecosre, Géographie d, sørs-déuelapytement,
O sistema de economia capitalista é constituídoporumahie-
PUF, 7976, e especialmenre, François P.anrÂNr, La guhiltø écininíque,
Seuil, 1976. rarquia de Estados formando a <grande zottÐ> de economia
158 159
i
capitalista integrada. No centro, os países industrializados podem constituir potenciais mercados. Tal é, por exemplo o caso
dorrrinados pelos Estados Lrnidos, detém o poderio
financeiro, da indústria automóve1 em que as sociedades enxamearam a
económico, tecnológico. os países da perifeiia
rêm sido, desde América Latina, a Europa meridional [66] e mesmo nos países
há bastante tempo, o, fornecedor., d.'produtos
*grí.oi., . a. socialistas.
matérias primas e as suas reivindicações tornaraä
necessária Permanecem âs indústrias de ponta, como a informática,
uma nova divisão espacial do trabalho.
a aeronáutica, ou as telecomunicações, não havendo qualquer
. Já hi alguns anos que se iniciou um movimento de redis- hipótese na sua instalaSo nos países da periferia.
tribuição geográfica ¿a indrist¡a, do cenrro p^n^
periferia: Mas em que consiste esta <redistribuição geográßca daindús-
trata-se em princípio, da indústria com ^
mão de o^bra não tria mundiab?
especializada, de fraco valor acrescentado,
tal como a indústria A descentrsliz¿çil das indústrias não serve de arranque
,-*il. e a monragem de componentes de aparelho, .l..tróoi.or. para a industrialização dos países onde se instala. Por vezes,
A industrialtzaçã'o da India edo Egipto começou com cria empregos, melhora a balança de pagamentos, faz aumentar
a fiação
e tecelagem do algodao qu. M;.h.rt.. df.idiu ceder-rhe. o produto nacional bruto, mas a finalidade não é instalar-se aí
Esta instalação iniciou-se na
'{.fica mais especificamente na para actuar como (motop) c paz de servir de arranque a um
Repírblica Popular de Benin, fornecida po, oå grupo nl.mao, crescimento autónomo e condnuo. Pelo menos, atenua a sua
a ldatex, que aí instalou uma das maiores fäbricas
texteis do dependência? É pouco provável. Nos países desenvolvidos,
mundo. Em Hong-Kong, Taiwan, Singapura, Coreia
do Sul, a descentralizzçfls industrial é concebida como uma táctica
Filipinas, Haiti, cosra Rica..., n, gr*d.! Jociedades
americanas permitindo integrar mais estreitamente, no espaço da economia
japonesas, europeias multiplicar"*
* fiíbricas de semi-condu_ capitalista, novos mercados em expansão e de novos centros de
tores, de calculadoras de bolso, de televisores.
produção com baixo preço de custo, sem contudo perder o
causado pela valorização e tomadas mais caras
as matérias seu controle (1).
primas e também pelaaplicação dos reguramentos
conrra a polui- Esta política tem sido explorada pelas grandes sociedades
ção, as indústrias de base, tais como as refinarias de petróleo, americanas desej'osas de alargar a suas actividades para fora das
a petro-química, a siderurgia, a metalurgia dos måtais não suas fronteiras: foi o irromper das firmæ transnacionais no
Grrosos instalam-se nos países subdesenvolrãdos
sob o controle mercado mundial. Longe de evitar e pouþar a Europa Ocidental,
de sociedades estrangeitnr qo. fornecem os capitais
e a tecnoro- esta ofensiva dirige-se primeiramente para ela, como a área mais
gia. Hoje, a indústria perrolífera rem as suai inst"lações susceptível de acolher as inovações da produção, depois esten-
mais
modernas no Médio Orienre, à volta do Golfo pérsico.
deu-se à periferia para se aproximar das matérias primas e mão
Mesmo as indústrias de transformação de forte valor de obra barata. As firmas europeias seguem-lhe o exemplo, mas
acrescentado, exigindo uma mão de obra
mais especiarioada, mais modestamente.
começam a oGrecer-se para se transGrirem, com
a condiçao
dessas implantações das fäbricas se rocalizarem (t) Ver, para este assunto, Ecoromía, n.o 19, |aneiro de 1976: Dossie¡
nos p"ir., q,r, ql'industrialisation du Tiers Mondo
760
167
tt
A rede que as sociedades transnacionais tem assim tecido Primeiramente dedica-se a reconstruir e a equipar as regiões
sobre o mund'o, regido pelo sistema capitaiista, permite o exer- ocidentais que sempre receberam a maior parte dos investimentos;
cício dum controle crescente nas actividades econdmicas, pelos múltiplas interconexões fä-las agrupar em torno de quatro polos
cenffos de decisão estrangeiros, resultando daí uma dependência de industriahzação Moscovo, Leninegrado, Donbass e do Volga.
mais apertada na hierarqaização que se coroa nos Estados A organização das regiões orientais começou mais tarde,
Unidos. mas foi desenvolvida rapidamente em virtude das imensas riquezas
O geógrafo deve estar atento a este fenómeno que condi- que as prospecções aí descobriram. Vários polos de crescimento
ciona a organização do espaço e especialmente o da França. são disseminados de maneira a, por arrastamento, levar a um
Como escreveu Jérôme Monod (1): <a interdependência das desenvolvimento posterior vastos espaços, onde vivem Popu-
economias nacionais não permite subestimar as qodificações Iações desde sempre esquecidas. ,ts trocas que se intensiûcam
que as poderosas firmas introduziram nas (regras do jogo>; entre o Este e o Oeste do país tendem a atingir a reali-
isto seria reduzir exclusivamente a organtzação do território a zaçio da integração do espaço soviético.
uma única dimensão geográfica ou até mesmo delimitá-lo a um Com toda a lógica poderíamos esperar que, num prazo mais
quadro de rígidas formas hexagonais>. Em princípio, o sistema ou menos longo, não só o desaparecimento da dissimetria sócio-
de economia socialista baseia a sua coesão na dependência a -económica que diferencia ainda hoje, com evidência, a Rússia
uma mesma ideologia. Com efeito, as interpretações divergentes Europeia e ¿ Rússia Asiática, mas sobretudo um forte irnpulso
provocaram fissuras e até mesmo dissidências no interior do bloco. desenvolvimentista para toda a economia soviética. Seria nestas
Sobre a tátbua t¿s¿ ¡ealizada pela revolução, os poderes condições que a IJRSS deixava de ser um espaço onde <os encla-
públicos tiveram liberdade para pôr em prática a política de ves modernos não lograriam a ra,hzar senão um grande corpo
abolição das desigualdades de toda a ei;pécie que resultam do inerte e comrpartimentado> (1).
funcionamento do sistema liberal. A planificação da economia e Os trabalhos de planificação puseram a funcionar um
ordenamento do território correspondente, foram as bases sobre esquema geral de ordenamento que previa, no território da
as quais se deveria fundar esta polídca. ,\ URSS empreendeu União, a constit¡ição de um sistema de ordenamento a três
a acção de organizar o espaço sobre o princípio duma divisão níveis em que as cidades e redes urbanas ocupariam aí um lugar
racional do trabalho e de uma colaboração activa integrando essencial (2). A experiência provou que a cidade desempenhou
nela o factor espacial no desenvolvimento geral da economia papel importante no empreendimento que foi a mobilização
que visava atenuar as fortes disparidades que o regime csa- do espaço. É por isso que a urbanização não parou de se
rista tinha deixaclo cavar entre as regiões (2). :
alargar: a percentagem da população urbana atingia os 58o/e
(t) Les ûrmes muhinationales, Schénd'g&t&'al d'aménagemeil cle la France,
La Documentation française, n.o 34, Fevereiro 7973, p. 3 :' (t) Yer hojea, número especial Março 7976, p. 103; P. LtrounNER,
(r) Sobre a evolução histórica desta política de ordenameuto do terri- L'économíe sovíétique dansla crise moxdíale, pp. 737 e seguintes.
tório soviético, ver a introdução à obra URSS de ,t. Br¡,uc e H. Cuauran,
PUF, CoL <MegelTaa>, 7977. e) Vhdimir Buousov, Aménagement du territoi¡e et sistèmes urbains
groupés, Reche¡ches Intanationales, p. 9, n.o 83.
762 763
de população total em 7973 e ao desenvolvimento das aglomera- os . mercados, de .tal maneira que os Estados Unidos e o
ções urbanas e dos centros regionais, juntaram-se de 195Þ a7970, Jepáo serão, sem dírvida, chamados a participar no oiden¿mento
a criação de cerca de 300 novas cidades. da Sibéria Oriental.
Depois da Segunda Guerra Mundiai, ênquanto a luropa Fiquemo-nos com a ideia de que o nosso planeta é hoje
ocidental esteve sujeita a uma instabilidad., n URSS empregou partiihado por dois conjuntos espaciais agrupados à volta de duas
o tempo a subtrair o espaço socialista aos contactos exteriores grandes potências industriais concorrentes e uma terceira, a China
e a organizai, sobre o seu modelo, um todo estreitamente que tenta arranjar espaço operacional.
solidário, o que se verificou desde lg4g, data da criação Por tudo o que foi dito, é-nos permitido estabelecer algumas
do conselho de Ajuda Económica Mútua conåecida por conclusões que parece, não podem ser desprezadas peia geografia.
Comecon.
Qualquer que seja a escala considerada, o espaço geográfico
Se importantes resultados foram obtidos na harmoni zaçã.o resulta de uma orgatizaçdo da sociedade que ela utilizou para
das economias e no acr&cirno de trocas, graças. a uma divisão atingir os objectivos do seu sistema ideológico, através de um
do trabalho fundado na especialização, nenhuma realtzaçío todo cujos elementos constitutivos, concorrem para a reahzação
foi executada pelo comecon relativa à organização comum de um fim social e exprime, portanto, uma escolha deter-
do espaço, A proposta de ordenamento duma região económica minada.
do Baixo Danúbio, englobando áreas da Rússia,. Roménia Na sociedade tradicional, o funcionamento do esfleço esse-
e Bulgária não obteve bons resultados, e assim a Europa gura a satisfação das necessidades essenciais da cornunidade e esta
socialista não se transformou num espaço supranacional integradì. âutonomia confere-lhe uma existência própria. Mas, com o nes-
Entretanto, as relações de domínio estabeleceram-se enffe a cimento dos Estados Nacionais, o desenvolvimento da economia
URSS e as democracias populares,.fundando-se no dogmatismo industrial dotou certos espaços de poder político ou de poderio
ideológico apoiada sobre o poderio económico'e rnilitar. Mas económico cujo domínio obriga os espaços englobados nas fron-
a supremacia soviética choca-se com ã resistência das naciona- teiras polítices ou ideológicas a especializaþse e a integrar-se
'lidades, não sendo suficiente para salvaguardar a solidariedade
numa hierarquia a vários níveis, de tal maneira que podemos
do bloco, pois a Jugoslávia, China e Albânia saí¡am ds bloco dizer que não existe algum ponto da superfície da teffa que
conrrolado, hoje escape a esta tendência.
A política de coexisên cra paafica, que consagra a existência A dinâmica assim desencadeada conduziu a uma crescente
da bipolarização, cortou as fronteiras, murando-as. Contudo ucomplexificação organizacional, onde os espaços intimamente
os dois domínios interpenetrârr-Ser o socialismo ganha terreno interdependentes uns dos outros constituem um todo orgânico
ao domínio do capitalismo, intaiando-se em Ãfrica, na Ásia, que impossibilita isoiá-ios sem os mutilar. Como umâ peçe
na América, no espaço das antigas colónias,.e por sua yez a eco- de puzzle, o espaço geográfico não é uma entidade em si, não
nomia.capitalista penetra em força naârea do socialismó corn os tem qualquer sentido, enquanto não for colocado no contexto
seus produtos, a sua tecnologia e os. investimentos que inyadem onde está integraclo.
164 165
-+=.ap*4.æ:?f¡€-..- -'
166 767
efLttam na su¿ constituição. o próprio mercado mundial fun- dados do meio nlturel. O espaço geográfico reflecte a sociedade
ciona também, como um todo orgânicci, devendo a sua coerência
que the imprime todas as suas orientações ao longo da história;
estruturel à interdependência das suas pertes que trocem entre i. .stá submetido e ume dinâmica de transforrnação que se opõe
si matéria, energia e informação. à estabilidade dinâmica do ecossistema.
E nestes interacções que os espaços, alimentados por Sistema espacial e sistema social, ligados um ao outro Por
gt{tiplas dependêncies, se esrr'rrram e adquirem a sua iden- um (processo de transformação, (t), constituem um conjunto
dade. construídos no interior dos limitÅ que consriruem .o.r.ir" e solidário, em que a sua união é feita de recþrocidade.
linhas de descontinuidade, integram-se especializando-se
em sgb- Se a sociedade, criou o esPaço' o esPaço assegure não só
conjuntos' cujas ligações hoãzontais e verricais se dispõem a existência da socieclade, mas também.a sue continuidade no
segundo um conjunto hierarquizado, constituindo o-" rJd"d. tempo, permitindo ao gruPo sobreviver' mesmo se os seus
complexa, mais conhecida e favorecida pelos poderes de decisão desaparecessern. Nascido de vultuosos investimentos
superiores. "lementos
em trabalho e capitais, é suporte material de comportamento e
A organização do espaço não é portanto linear: ela passa de interesses, tendo um papel de caixa económica e de infor-
por uma série de níveis cadavezmais complexos, cujos elementos mações, de uma memória social à disposição das gerações vindou-
constitutivos são sujeitos a uma divisão de trabalho radical e às ras. Participa assim na função de integração dos indivíduos que
interacções entre eles. É este processo que condiciona a criação o sisteme sócio-político organiza Pera assegufar a sua perenidade.
de novas possibilidades de desenvolvimenro. o espaço geográfico resiste às mudanças pela simples razÃo
Deste modo, criou-se um sistema espacial que, tal como nos da suas estruturas serem pesadas e lentas. Conhece-se ji a inércia
sistemas vivos ou sistemas sociais, constitui uma hierarquia qúe opõe as estruturas fundiárias às inovações das técnicas agrí-
integrada de subunidades globais. Jobr, ãu as estruturas urbanas às exigências de uma'moderwzaçio
Esta noção de complexidade organizada, associando por um do habitat e da circulação.
lado, a noção da orgaruzação do todo e por outro a noção da Esta áutonomia relatiVa é manifestada sobretudo pela acção
diferenciação das partes, situa-se no centro da teoria geral dos do espaço geográfico face ao meio natural. À medida que as
sistemas. técniås progridem mais se afrma a sua independência. A sua
Todo o sistema manifesta um comportemento intencional extensão à superfície da Terra pfossegue a um ritmo tal, que o
tendendo para a realização de um objectivo. O sistema espaço ecológiico ærá desaparecido, aparecendo sornente em boi-
espacial atinge a sue ûnalidade pela divisão e coordenação do ,å", p.r*tã a gene,,lirção do sistema geográfico espacial.
trabalho entre as suas componentes, que resultam da acção da Cãmo os sisi.m"s sócio-económicos, o sisteme espacial
sociedade. Ao contrário do ecossistema que se euto-orgeniza ¿dmite uma certa liberdade nas interdependências estabelecidas
espontaneemente num equilíbrio estável, o espeço geográfico é entre as suas Partes constitutivas. Assim, por exemplo na orga-
organizado pela sociedade para responder ao projecto que ela pró-
pria concebeu, sendo uma criação total de elementos, baseada em (t) Quer dizer <mappingr, de que se falou atrás'
168 769
ntzação de um espaço agrícola as relações entre o povoamento e exercer as funções que the são fixadas. Lembremo-nos
que a
as estruturas fundiárias, apresentam muitas vezes uma tezão orgtruzaçio do .rpãço geográfico resulta essencialmente
das
suficientemente fraca pare que a passagem da concentração coãtradições sócio-ãconómicas que as relações hierárquicas
esta-
\ '1.
à drspersão não provoque uma retroacção automática, sendo sufi-
belecem entre as diferentes entidades territoriais'
ciente que não houvesse uma incompatibilidade disfuncional. chegou o momento de fazer o ponto da situação: as páginas
Sem nunca constituir um fenómeno estocástico [67], o espaço geo-
anteriorei puserem em evidência que, na análise do espaço
geográfi.co pode assim comporrer a presença de variáveis alea- grâfico, ai características gerais r.vel"m os p¡incipios de globa-
tórias. fid"d., hierarquização, diÊrenciação e finalidade, quer dízer,
1. -
O ecossistema canctèriza-se pelo seu elevado grau de contre- os princípios'funiamentais para a definiçãg d. sistemas (1).
dições. Em certas condições narurais o número de possibilida- É plr isso que 'r€tomendo uma expressão já- proposta por
des dGrentes de organização é extremamente reduzido e o que antes-de nós, podemos admitir que o objecto da geo-
sobrevive, só é possível realizar-se ne estabilidade de gí^fr, é o esrudo doi geossisremas [68], como o da ecologia
"lg-oérn
climax. É por isso que a observação científica pode descobrir,"* é o estudo dos ecossistemas.
com urn pouco de sorte, a ordem que aí está presente e formular o geossistema, sabêmo-lo não é um ecossistema: à necessi-
leis. No espaço geográfico isso não acontece: a acção humana dade eË opõe a contingência ou de preferência a multiplicação
criou-o e durante muito tempo na ignorância total das relações relativa do número de possibilidades resultærtes da diferenciação.
necessárias entre e vida e o seu meio. Depois, por um processo As suas características correspondem àquelas que interessam às
de tentativas conseguiu organizar um espaço adaptado à sua ciênciæ sociais nas suas investigações sobre o seu próprio
conveniência através de um modo empírico e insuficientemente objecto. Não é pafa nos admirarmos. o espaço é a criação da
ordenado pera se menter num eqrlilíbrio durável: plantas culti- soä.d"de . pode dividir a sua identidade estrutural, man-
vadas, animais domesticados degeneram sob o ateque dos "p.r",
tendo ao mesmo temPo uma certa autonomia'
parasitas e os solos esgotam-se. O sistema em presença é de uma Se o espaço geogr,áûco põe em relevo a teoria geral dos
grande fragilidade, pois pera o menter é necessário o esforço e sistemes, é þossível descobrir nele as regres de organização,
presença do homem. Sem a sua vigilância permanente, o espaço submetendo o, ,"ot elementos constitutivos a um certo número
geográfico destruia-se e regresseva gradualmente ao ecossistema. de operações estadsticas e matemáticas susceptíveis de pôr em
O espaço geográfico não resulta de uma fantasia arbitrária evidência e quantiûcar as interdependências que estrutufam
ou de'um acto de pura vontade. Ele aparece como uma tentativa e dinamizam o seu todo.
de conciliação entre os propósitos do homem e as leis da natureza,
não se baseando nos contrastes estruturais suficientemente rigo-
rosos pare essegurar a sua perenidade. Muitas vezes, sem um
mlnimo de interdependência entre os elementos constitutivos, (1) Charles Rorc, La Théorie gæ&el, des systèmes et ses perspectives de
dévelàppement dans les sciencæ sociales, Reuue françaíse ile Sociologíe, número
o espaço geográûco não teria a coerência necessária para especial, 7970- 7977, pp. 47 e seguintes.
770 771
Não está nos objectivos desta obra definir
utiiizados peia geografia dita quantitativa
os métodos Finalmeite, a ordem contida no esPaço geográfico não tern,
que ,e*, ,i¿o túvez este carácter de necessidade ciue o tratamento por métodos
menre exposros e discutidos em diverr*,
poili.rções (r). 'onga- matemáticos rigorosos exige'
Resultados inreressanres foram obtidos
nios da análise espacial, especiarmente
,* ¿ir.r.rìí., ¿oori- As novas análises mostraram também o papel decisivo das
no estudo dos fenómenos ideologias na organização do esPaço. Os grandes sistemas ideoló-
urbanos' Eles convid"- a ir mais ronge nas investigações
"irrd"
metodológicas, com a condição gicos possuem a sua lógica própria que se exprime nas estruturas
de se ,od".", d. f*"oç0.r. económicas, sociais e esPaciais
Com efeito a.geografia quantitativa refn os
,.u, iir,'irr,
ttltpt:gos gu! já-forãm deiunciados em várias anárises. . o, os conceitos operacionais que a geografia quantitativa
reintroduzir o determinisrro ne nossa discþlina,
o de utiliza são extraídos da análise da realidade espacial tal corno a
,oUìlp"rro* edificou o sisrema capitalista americano, ao aplicá-la a um.tipo
objectividade do computado
4 de fazer recair num cientismo cle espaço que ele *èr*o cleterminou para urn certo tipo de
ultrapassado, não é o menor dos perigos
(2). socied]"de, i sociedade produtivista cujos valores são estabele-
apresentar aqui algumas noras que
_,.,""3:,:T1T:: nos são suge- cidos segundo.uma escala quantificada, sendo tornado em consi-
rldas pelas análises precedentes. Tudo o
que compõe a estrutu- deração o que é quantificável enquanto o qualitativo é eXcluído
ração de um geossisrema não é quantificárrà
por--J; ì"do,.", 1
geral (3). desde logo que o espaço concebido responde a'ufira certa lógica
Pensa-se, por exemplo, na acção i
com a realidacle, a matemática é impotente e até perigosa. da avrhzação industrial que permitiu o crescimento rápido de
Antes de utilizar o computador, o geógrafo d.v. -"prende, uma humanidade equipada. caãa vez meihor para organizar o
a observa¡, e isso é o mais difícil pois exige tais cultur"^do meio em função dos seus Projectos. A análise das consequências
técnica.
qo. deste domínio do planeta pelo homem, será o objecto desta
terceira Parte.
174 175
CÀPÍTULO I
177
12
Por todo o lado aumentaram as densidades, mas ern nenhuma
alcance as solidões glaciais de alta montanha e as calotes polares.
parte mais fortemente do que nos países industriais no decurso
Hoje portanto, a ecúmena cobre a quase totalidade do planeta.
do século xx. o exemplo do Japão é dos mais signi6carivos:
Por toda a parte ou çluase, o esPâço construldo por acção humana,
de 7727 a 7872, em século e meio, à deruidad. d. pop"ulação
sobe o espaço geográûco, substitui-se ao esPaço esPontaneamente edi6-
lentamente de 70 para 90 habitantes por quirómitio
qo"drndo, cado pela vida, o espaço ecológico.
mas triplicará em seguida, num século p^r^ atingir
, 296 habítan-
tes por quilómetro quadrado em 1973.
Quer seja repartida por um ou vários nticreos, a humanidade 2. O crescirnento industrial
propagou-se lentamente pela superfície do globo terrestre.
Durante muito tempo e através de milénior, .,rrrrã, espaços
naru_ É, it o dissemos, desde meados do século pæsado que a
rais intactos subsistiram entre os núcleos de povoam.La
pr"p*- humanidade conhece esta exPansão que a levou aos limites do
t:ados para assegurar a sobrevivência
dos ho*å*. É somente nos mundo habitável, isto é, desde o desenvolvimento da aviização
finais do século xv que os primeiros contactos começaram
a industrial. O crescimento demográfico através do mundo está
estabelecer-se entre as populãções dos continentes,'
progr.rro, ligado ao aumento do poder que os homens obtiveram dos pro-
decisivos nas técnicas d" navegação oceânica estão ,r"
olig.* d", gressos da ciência.
grandes descobertas que puseram a Europa em ligação"com
a Este poder pode medir-se pela quantidade de energia
África, a,{.sia e a América.
utilizada p.l"t dGt.otes actividades humanas. É preciso esPerar
Desde então, é o começo do clesenvolvimento da humani-
pela metade do século )cÞ( para se verem multiplicar æ fontes
dade que o fenómeno histórico da colonização acelera. Durante
de energia: primeiramente a hulha, depois a electricidade, os
quatro séculos, movimentos de população dirigem-se de um
con- hidrocarbonetos, hoje. a energia nuclear e amanhã, sem dúvcda,
tinente para outro, para espaços vazios ou pouco:povoados:
a energia solar. A ciência descobriu que as disponibilidades ener-
a América do Norte contava tabvez com um milhão de géticas do mundo são limitadas; o problema a resolver é o do
Ameríndios quando os primeiros europeus 1á desemb ãrcaram.
<modo de captaçãoD, mas ele não é insolúvel.
Na véspera da Guerra da sucessão a popuraçao americana
eleva-se Seja como fôr, a quantidade de energia consumida não cessa
a 32 milhões de habitantes locali""dos p.rco da' cosras
atlânticas. de crescer. Tra&:uliåa em equivalente-carvão, Passou de 2 rlrril,
Restaurada a paz, a valorrzação de imensos ter¡itórios
ampria a milhOes de toneladas na véspera da Segunda Grande Guerra
imigração: a <FronteirÐ) recua para oeste através das
grandes Mundial, para quase 4 mil milhões e meio de toneladas em 1961
planícies cenrrais, até à costa doÞacíûco. o total da
poiulaçao e pâra 7 lrrril, milhões em 1977. Ao ritmo actual, atingiria os
cresce rapidamente até aos 274 miihões de habitan,.r^.å
tg75. 74 naú, milhões em 1980.
O povoamento dos espaços vazios prossegue sob os nossos
A eficácia das técnicas seguiu uma evolução paralela pois
olhos: os Soviéticor .*pr.*dendo rofo*r^fio da sibéria e os os homens dispõem hoje de meios de acção e de um poder muito
Brasileiros, a da floresta amazitúca.^ permanecem ainda
fora de grande. Basta para nos convencer disto evocar os aparelhos
778
779
udlizados para perfurar túneis e poços de petróleo; os eGitos Tal é por exemplo, a prática da agricultura itinerante nâs
destrutívos do armamento moderno; a precisão dos instrumentos
queimadas da floresia tropical em que longos períodos de
que permitem entregarem-se a observações complexas sobre a
pousio arborizado facilitavam a reconstituição natural da ferti-
Lua ou sobre Marte. lidade do solo. Pequenas comunidades puderam manter-se no
O enorme poder, doravante posto à sua disposição, extraíu seu território, durante milénios, na condição de respeitar o
o homem do conhecimento do mundo ãa matéúa: nas suas equilíbrio eco-demográfico realizado.
investigações, ele privilegiou as ciências físicas em prejuízo das
A criação do <,bocago respondia a esta necessidade de
ciências da vida. É. com dificuldade que hoje .o*.ç"
estabelecer umajusta proporção entre os campos fechados de sebes
"iorrr"r-r.
consciência, graças aos progressos recentes da biologia, da extraor- disseminados de árvores e o meio ambiente natural de florestas
dinária complexidade de orgatização dos seres vivos nas suas
e pântanos. Também eftcaz, embora mais engenhoso, era o sis-
relações com o meio natural. Todavia, o conhecimento destes
tema que associava na exploração dos campos abertos, a rotação
fenómenos seria necessâno paru conduzir nas melhores condições
das culturas e a pastorícia: mantendo através dos séculos a alta
a transformação dos espaços ecológicos em espâços geográficos,
produtividade das terras, esta combinação do afolhamento e da
para construir uma ordem durável na Terra.
estrumação assegurou a duração das sociedades da Europa Oci-
Compreender-se-á facilmente que este aumento verificado
dental até à era industrial.
num século, do poder sobre a matêrr de que a ciência dorou o Relações equilibradas estabeleciam entre as cidades e os
homem tenha perturbado os fundamentos da Civiização Oci- campos a solidariedade na divisão social do trabalho: a estas era-
dental. Até aqui, este poder apenas avançava lentamente: serão
-lhes aribuída a produção dos bens de subsistência; àquelas, as
precisos miiénios na evolução dx técnicas para passar dos utensí-
funções terciárias para o exercício das quais elas nasceram. O arte-
lios de pedra à domesticação dos animais, à utilização da força sanato dividia-se entre umas e outras.
motriz do vento e da água. Paralelamente, o crescimento Sem a grande indústria, as cidades desenvoiviam-se lenta-
demográfico é também lenro; o progresso material quase não
mente: de Luís XIV a Napoleão I, a população de Paris passa
é percebido pelas gerações que se sucedem, não sendo o de 498 mi1 para 518 mil habitantes. Não se desencadeavam
objectiyo que elas se propõem atingir. Na procura de uma forma
grandes migrações gue, mais tarde, esvaziarão os catnpos, não se
a dar à vida, as sociedades antigas pensam descobri-la narcaluaçã.o
estendendo ainda pere o espaço rural, nem tinham ainda
do equiiíbrio e da estabilidade, na manutenção das tradições monopoliz¿do as forças vivas do sistema social.
que fizeram as suas provas. Não se trata aqui de exaltar uma idade de ouro em que o
As técnicas agro-pastoris que lhes oGrecem o essencíú, pala homem teria partilhado espontânea e inocentemente com a natu-
a subsistência visam a conservação do potencial da produção: reza: pôde, di-lo-emos, infringir-lhe irreparáveis destruições e
chegam a esse estado graças a um conhecimento adquirido por conheceu revezes. Num sistema de lentos progressos técnicos e
uma longa experiência da ordem do mundo vivo. de fraco crescimento demográfico, somente sobreviveram as civi-
180
181
7:zações cujos antepassados puderam manter-se num equilíbrio lismo marxista, <úldma transformação da ideologia do progiesso>,
dinâmico que não hipotecava o futuro. segundo a expressão de J. M. Domenach, fundar-se-á efectiva-
Acontece exactamente o contrário rLa <<civilização de mente sobre a prioridade a dar à industriaiização, à custa da agri-
poden (1): em cada dia que passe alarga-se o campo dos possíveis cultura.
ao alcance do homem. Baseia-se no paradigma racionalista das Animado pela procura do máximo lucro, o capitalismo aper-
sociedades ocidentais segundo o qual só a ciência pode permitir feiçoou toda uma estratégia visando éesulvolver a produção,
o progresso material que condiciona o progresso moral. eo mesmo tempo que estimula o consumo: recorreu a técnicas
Depois de ter sido durante muito tempo o fruto da prática de persuasão, tais como a multiplicação dos <zass médìa> l70l
empírica, as técnicas são hoje aplicações da ciência na descoberta para difundir largamente a pubiicidade, aumentando o poder de
e na exploração das potencialidades da maréria. o resultado disso compra, incitando ao esbanjamento com a oferta de novos
é um desenvolvimento rápido da indústria que se tornou o pró- modelos deslumbrantes que fazem esquecer rapidamente, os
prio fundamento da economia mundial: é a indústria que absoletos modelos precedentes.
"oof.r.
o poder aos Estados e esfrutura as sociedades e os seus espaços. A organização de um mercado alargado, ramificando-se
Os progressos da indústria conhecem um ritmo crescente. através do mundo até ao mais humilde lugarejo na selva, Propu-
Tudo se passa como se a ciência e a tecnologia que as apoiam nha-se não somente obter energia e matérias primas a baixo Preço,
detivessem a dinâmica da sua expansão: uma descoberta provoca .mas também suscitar necessidades a sadsfazer, nas sociedades
outra por uma espécie de reacção em cadeia. De facto, a indus- habituadas à frugatidade. Tratava-se, no fim de contas, de criar
triaJjrzação criou condições nas quais o capitalismo devia, senão no planeta um homem-consumidor. Esta finalidade foi rapida-
nascer, pelo menos desenvolver-se com toda a liberdade. mente atingida nas sociedades ocidentais onde as mentalidades
A sua conexão com um sistema sócio-económico, suscitou este e os comPortamentos, moldados por séculos de penúria e pou-
fenómeno característico da nossa época que é o desenvolvi- pança, levaram-no e ume evtãez de gastar Para consumir, que
vimento: desenvolvimento da produtão, certamente, mas tam- nunce é satisfeita em consequência da multiplicação de novas
bém <desenvolvimento, escreverá Karl Marx, de todas as carec- oferas. À civilização de duração sucederá a <civilização do
terísticas do homem social, de um indivíduo possuindo o máximo efëmero> (1).
de necessidades, e portanto rico nas qualidades mais diversas, Esta ideologia do progresso pelo consumo invadiu todas
em suma uma criação social tão universal quanto possível, visto âs classes sociais: cnari o seu próprio sistema de valores
gue, quanto mais o nível de cultura do homem eumente, fundado na exigência de <a valorização da vida imediata, o gosto
tanto mais ele ê capaz de experimentar satisfaçãou (r). O socia- pela novidade e a diversidade dos objectos próprios à satisfação
(r), La cìuíIízatíon
ile guíssance, título da obra de Ber&and de ]ouvenel
aparecido em 7976 nas Xdition Fayard. (t) À palawa é de Bertrand de ]onvrN*, <La Civilization de l'éphémère,
(') Citado por Serrand de Jouv'n+rr,, p. 45. Futuribles, Inverne-Primaven 7975, PP. 5 e seguintes.
782 183
dos desejou (f . A sua lei suprema torna-se <a aspiração do
f, contínua, a industrialização e a. wbarttzzção consumiram extensões
preze'r liwe para todos e do maior número de bens,r. de espaço que subtraíram eo domínio rural'
Assim, em alguns decénios, substitui-se, à sociedade tradi-
cional uma sociedade que procura um sentido para, a sua vida
I Ë*é-pior quantitiûcados com precisão não faltam: bastar-
nos-á ,..old"r, que na Aleman]ia Ocidental 260 quilómetros
na produção e no consumo, uma sociedade unidimensional, quad^rados são abiorvidos todos os anos, Para o alargamento
das
que todos se esforçam por alcançar. .-id"d.r, das indústrias e das vias de circulação; a construção
Os homens condicionados, a produção indusrial do mundo de 100 quilómetros de auto-estradas utiliza 350 hectares na
-"
conåecendo um crescimento exponencial que realizou a sua Europa; ,.d. de estradas nacionais na América do Norte
duplicação de 1960 a 1970 e, a esre ritrno, elevar-se-ia no oth)^, em cada 100 quilómetros entre 600 e 1 000 hectares;
ano 2000, a 50 vezes mais a verificada em 1930. foram precisos 30 quilómetros quadrados para instalar o aero-
porro di. Roi*y F *ç" e 70 quilómetros quadracloS para o
"*
ãe Dallns nos Estados Unidos (1). René Dumont refere que
<todas
3. "{. urbanização do espaço as vezes que a Califórnia ganha mil habitantes, cobre de betão
96 hectarãs de terra arável (r). O consumo toma tais proporções
Esta revolução que, em menos de um século, fæ, daindústria que se pode falar no Ocidente, de um <empobrecimento
o motor da economia mundial devia traduzir-se por trans- Åpacialn (') p"t" designar esta penúria de espaço que tâ agra-
formações radicais na uúJização do espaço. ',r"lar" durartte o último quartel do nosso século'
No seu primeiro impulso, a indústria em desenvolvimento como consequência do crescimento contínuo da procura,
caiu em masse nas cidades que the ofereciam a mão de obra, o espâço tomou nos países de economia liberal, as características
o mercado e as infra-estruturas que proporcionaram o acolhi- d. å.i."doria: tem um valor de uso e um valor de troca.'Como
mento. É ela que, incontestavelment dãr"n."deia a mais forte toda a mercadoria rara, é,objecto de uma especulação e de mano-
explosão urbana que a história jamais registou. 'bras monopolistas, na Procura do lucro mais elevado: o capi-
Hoje, já não é completamenre assim: a indústria em busca talismo *Jd.*o já desdenha as operações fundiárias que
de terreno barato, de localizações mais favoráveis, ou sob a "ão
podem estar na origem das elevadas mais-valias'
dos poderes públicos é levada a abandonar as grandes ' O, poderes públiios favoreceram a especulação consentindo
ry:s1ão
cidades para se loc¡lizax na sua perGria e até mesmo .- pleno anul"çOe^s do, pl^*o, de urbanização ou de ocupação
do solo:
campo. .A.s funções terciárias entraram em declínio. Num terrenos ood. ,rão é permitido construir-se, comPrados a baixo
quarto de século, perro de 100 milhões de indivíduos vieram
aglomerar-se nas 24 maiores cidades do mundo: na sue expansão PIJF' 7974'
(Ð Nirmeros citados por P. Grone¡ L'ùe des techniqueo'
pp. 65-67.
" (r) R. DuuoNt, L'utopie ou lø morte, Seuii, 1973, p' 73'
-
(1) F. Prnnor¡x, <L'économie de la ressource humaino Mondes en (3) A expressão i a" pf. Se¡Nr-M¿nc, Socìalísatíon de la nature, Stok,
développement, Ð..o 7, 1974, p. 36. 7977, p. 43.
184 185
F
-ìr
€
preço e um proprierário rural, adquirem um valor considerável de
Que dizer. da densidade de ciculação! .4. acumulação
:;i
188 189
ãä
1,!,
iil
.Ji'
com proveito de uma única produção sobre a qual toda a vontade para se dispersar (1) e para torfiaf suPortáveis as condições
energia está concentrada. Esta simplificação suprime as inter- de vida is quais a população citadina está condenada'
dependências que condicionavam o equilíbrio: a corutrução A civilizaçao inãuitrial foi equipada com uma tai força
saída das srãos do homem tem falta de estabilidade; de uma que está, doravante, em condições de tomar a seu cargo o
grande fragilidade, não oferece nenhuma resistência interna aos Jrd.rr"*.oto do planeta em conformidade com o seu projecto.
factores de degradação que tênr tendência a agravar-se. É pre- O espaço ecológiio é substituído peio espaço geográûco, do qual
ciso multiplicar o recurso aos meios artificiais para resistir à n n ior'or estáixcluída: é um espaço construído com todos os
desordem: adubos contra o esgotamento dos solos e herbicidas elementos, com materiais artificiais e segundo uma ordem
e pesticidas contra os parasitas. técnica incapaz de criar conjuntos providos das possibilidades
" A curto prarzo, a monocultura pode produzir com elevados de auto-adaptaçao que permitiriam aos sistemas naturais resistir
rendimentos, mas a longo prazo, levari irremediavelmente à à degradação.
destruição das forças produtivas da natureza (1). ñesta orga'¡zrção instável, ameaçada constantemente pelas
Nos países desenvolvidos, o espaço agrícola tende a toroar-se alterações de estrutura, a sociedade perde a sua coerência; o
um espaço artificial produzido pela indústria e privado da capa- homem, separado do meio natural, inquieta-se, interroga-se
cidade que a vida tem em se adaptar às agressões do meio se a ciência, onde depositou todas as suas esPeranças não
para se manter na renovação. Penetrado pela industrialização desencadeou processos que até põem em risco o desaparecimento
das fontes da Vida na Terra.
e urbanização, recebe do exterior certos arranjos que não são
destinados à stra populaçã'o; fâbncas despejam aí os seus resíduos...
estradas de grande movimento atravessarn-na de um lado ao
ouüo sem parar; os citadinos vem estabelecer-se aí, em regime
permanente ou durante as suas fërias; o turismo multiplica as suas
instalações junto do litoral e no cimo das montanhas são-lhes
tiradas grandes extensões para construir parques e reservas onde
os habitantes das cidades pensam reconciliar-se, durante algumas
semanas de férias, com a natureza.
Vítimas de.múltþlas invasões, o campo torna-se assim e cada
vez mais, um espaço alienado de que a cidade dispõe à sua
(t) Sobre este assulto, ver J. Donsr, La ndture déndturée,Delachaux & (t) G. B¿uEn e I.-M. Rotrx, Lø rurbanísatíon, ou la Pílle é7arpíllée,
Niesdé, 1965, pp. 44 e seþuintes. Paris,Seuil,1976. ' ' '':
190 791
resíduos no meio na desordem entrópica. Pode mesmo dizer-se
que, num certo ponto de vista, o homem não pode desenvolver-se
e produzir sem o crescimento em si próprio, da neguentro-
pia [72] que fosse compensada pelo acréscimo da desordem
entrópica no meio exterion (1).
capÍruro u De facto, o processo de organização do espaço remonta às
o próprias origens da irumanidade: desde a descoberta do ñgo,
CONSUMO DO ESPAçO
as técnicas primitivas foram terrivelmente degradantes. veremos
que é preciso imputar-lhes, sem dúvida, uma grande parte da res-
ponsabilidadq na substiuição da floresta tropical pela savana,
se o consumo do espaço consiste na transformação de
uma na lateritizaçãof73l dos solos africanos, na violência da erosão
matéria prima num produto destinado a assegurar a existência
nos países mediterrânicos.
do Homem, bem se pode dizer que é t mn característica Mas é evidente que, desde o advento da sociedade industrial,
natural de toda a sociedade humana consumir espaço.
o consumo do espaço conhece uma expansão e uma aceleração
tais que, na opinião de alguns, põe em risco a própria vida no
planeta.
1. A vida cria o seu espaço É Attil insisti¡ nos gritos de alarme que vêm â ser
lançados há muito tempo, especialmente, os que são lançados
própria rlat.or*,a clavida melhorar o meio, de modo
Está na
pelo <Clube de Roma>, firndado em 7970 por,{.urelio Peccei
a torná-lo mais propício à sua exparuão: <o acto de intervir para analisar os perigos do desenvolvimento da industrialização
na evolução e na elaboração dos sistemas materiais, escreve e da urbanização. Essas proclamações manifestam-se nos títulos
serge Moscovici (1), é dos mais corre'tes e cada espaço, segundo
das publicações que visam alertar a opinião mundial. Halte à
as suas características, efectua-o quotidianamente, transformando Ia croßsante (") ê interrogação que levanta o relatório estabele-
substâncias e energias... É preciso, pois, aceitar a ingerência
do ^
cido pelos investigadores do Massachusetts Institute of Techno-
homem no decurso normal da nrturez aea transformação logie sob a Direcção de Dennis L. Meadoï\¡s, por conta do
desta sob o impulso humano no espaço e no tempo... A natureza <Clube de Roma,r, sendo apenas uma primeira abordagem de
não existe sem nós, eia existe connosco e por nós...>. A degra-
conclusões discudveis. Foi seguido de um segundo relatório:
dação desÞ natur eza é. am facto inerente à vida: <O homem,
Stratâgíe pour demaín (t), que se esforça por analisar as crises
como a sociedade, são sistemas abertos. Recebem e permutam
a informação e a energia co', o exterior, tornando- a lançar
(1) J. Amen, op. cít., p. 93.
(Ð S. Moscovrct, La
(r) Ecologíe, Fayarð" 7972.
socíétê contre nature, pp. 30g e seguintes. (r) Mihajlo Mrsenovrc et Eduard Pnsru, Seuil, 1974.
1,92
193
13
do crescimento, já não globalmente, mas em cada uma das dez consideravelmente o conteúdo em oxigénio da nossa atmos-
grandes regiões deiimitadas da Terra. fera> (1).
A equipa lonðrina de The Ecologist, agrupando inrelectuais É preciso ter confiança. na ciência que saberá agir de tal
britânicos, entra na liça quando publica um documento com modo que as transformações da biosfera e dos ecossistemas
o título signiûcativo: changer ou disytaraître. plan produzidos por acção do homem Possam conduzir a novos equi-
ltour Ia srruíe,
cuja conclusão não deixava de ser inquietante: ,,E lógico líbrios.
recear que, num futuro próximo, uitrapassaremos o limite, na Tais são as teses em Presença e a geografia não tem poderes
brutaiidade dos nossos empreendimentos sobre o meio, e que, para definir uma opção. Mas tem que recolher e a?resen-
'por uma série de efeitos acumulados, provoquemos a derrocada l"t o <dossiep das. suas observações a fim dq estabelecer,
da nossa civilização (1)>. se o crëscime¡ito econðrnico desencadeado pela industrialização
Outras vozes se levantaram contra <a escalada do poder coruome o capital ecológico ao mesmo temPo que esbanja
destruidor a um nível de absurdo intolerável>. IJma correnre os recursos naturais e ameaça a vida ao alterar as suas condições.
ecológica ecoa na opinião mundial: o crescimento zero tor-
nou-se um slogan. As réplicas não se fizeram esperar vindo dos
meios industriais ou políticos. 2. Recursos não renováveis
J.-F. Saglio declara recusar o pessimismo (2): <Nada, escreve
ele, nos permite decidir hoje se realmente o'desenvolvimento
Que o capital dos recursos não renováveis seja consumido
económico consorne ou não o capitai ecológico ou delapida os de um modo muito forte, é indiscutível. Em quanto temPo corre
recursos naturais>. os perigos existem, mas (o combate não é o risco de ser esgotado? A questão é controversa e os
para abrandar os progressos da indúsria ou da economia, mas cáiculos diferem, constituindo aPenas uma ordem de grandeza.
fazer com que estes progressos sejam acompanhados por pro- Todavia, é indispensável ter isso em conta numa previsão de
gressos ainda mais rápidos cle protecção d* natatæa e clo meio futuro mais ou menos imediato.
i"cundanté, que, aliás, só o progresso económico permitirá Ao ritmo actual da extracção, a exploração do carvão,
financiao. do ferro, do cobalto e do crómio pode ser mantida;rtnda durante
outros evocam a capacidade de assimilação do meio natural: dois séculos, mas todas as nossas outras reservâs mineiras
este, graças a mecanismos de controle e de regulaúzação, conhecidas estariam esgotadas em aproximadamente meio século:
mantém-se em equilíbrio a nivel óptimo. É assim que se o gás natural em trinta e cinco anos e o petróleo em setenta
çode-
riam incendiar todas as reservas de combustíveis sem *oJifi.", anos (2). É pouco, até mesmo insuûciente quando se sabe que
o consumo destes recursos não renováveis serve Paru a elevação
(') Ecologíe, Fayard, 7972, p. 104,
p.
(Ð J.-F. Secrro, <Refuser le pessimisme>, Projet, n.o 66, Junlo de 1972, (t) Pétrole, hogrès, n.o 105, Janeiro 7970, p. 70.
676.
Ø Cheøgu ou dísparaître, op. cit., Annexe D, pp' 145 e seguintes.
194 795
do níve7 de vida de um quarto da população do globo, enquanro
e, antes dE mais nada um limite, senão o desaparecimento dos
os restantes três quartos procuram fugir à miséria.
A situação é, sem ðíwida, menos dramática do que os gastos:supérfluos (1). ,.
796
197
.A,rmado de machado e do fogo, e1e destruiu a f,oresta para
Africa Negra, ao lado das savanas naturais, outres savanas
puderam substituir fl.orestas secas gue foram eliminadas pela prá-
abrir terrenos de caça, de pastagem ou de culturas para obter
tica corrente do fogo aplicado por numerosas gerações de i ri-
materiais ou combustível. Os cortes e os incêndios repetidos
cultores e de criadores de gado. Nas Altas Terrà daMadagascar,
triunfaram sobre o ecossistema original consistindo este numa asso-
ciação de seres com características diferentes e desta diversidade
da velha floresta já não subsistem senão retalhos, como as
florestas sagradas de Manjakatombe, colocadas sob prorec-
resultava e complexidade das inter-relações em que se baseava
o equillbrio climático. O fogo exerce uma açcão selectiva e ção das tradições e dos túmulos dos antepassados. por roda
dguã"s esPécies são eliminadas; outras, as çirófitau [74]'
a pefte, a floresta desapa'eceu sob a acção dos incêndios
acesos periodicamente por criadores de gado bovino. os
resistentes, podem pelo contrário, se thes for dado temPo
cabeços lateríticos cobrerrl-se, râ estação húmida, de uma
suficiente, proliferar livremente e originar novas associações
estepe pobre de, gramíneas coreáceas em que o fogo reanima a
florestais, as florestas secunclárias.
vegetação no final da estação seca
As florestas secundárias diferem profundamente das florestas [76].
primárias que elas substituíram, sendo consideravelmente mais
Na Europa Adântica, já. não exisre a floresra das lendas
célticas e em sue substituição, o homem criou prados onde a
lobres em espécies, mais homogéneas, tal como
se a'resentam
árvore domesticada se dispõe em sebes alinåadaslu se espalha
hoje muitas florestas tropicais, até mesmo monoesPecíficas,
como acontece com a maior parte das florestas da Europa no espaço delimitado pelo campo Gchado. Atacada dur*nte
milénios por pestores, por rebanhos de cabras, pela construção
Ocidental, em que extensões de matas de carvalho, de faia,
naval e hoje pelas imprudências que o turismo *ùtipli"oo,
ou campos de bambus de altitude em vários países tropicais,
resta mediterrânica recuou para os cumes montanhosos. ^iko-
cuja homogeneidade é uma consequência de acção do Homem' As
vertentes que outrora ela ocupava são invadidas por associações
se os incêndios, es pestegens, os arroteâmenros continuam
secundárias: sobre os solos siliciosos, o maquis
durante séculos, a fl.oresta primitiva desaparece, pois desde as suas ¡lll dearbustos e
de pequenàb árvores dispostos em tufos, sao uma forma de degra-
origens a humanidade consumiu vastos esPàços florestais. Nos
dação da nloresta de carvalhos e de sobreiros, enquanto ,ro, ,álo,
Esãdos-Unidos, desde o século xwrr â floresta perdeu perto de
150 milhões de hectares; na Grã-Bretanha, já não ocuPa senão
calcários-uma esrepe pouco adensada, garrigul
" [7g] sucedeu à
floresta de azinheira.
8% da superfície total e os Chineses das Grandes Planícies
conduziram contra ela uma guerra impiedosa. No decurso dos últimos séculos, a cotonização acelerou
Em seu lugar aparecem outras associações vegetais adaptadas o consumo do espaço florestal. Na Á.fica do Norte, as popu_
lações autóctones, obrigadas a viverem nas montanhas, tiveram
às novas condições do meio. Para vários observadores (r), a savane
tropical seria de origem antrópica [75] e é provável que na que alargar os arrotsamentos para as vertentes arborizadas e o
solo, esgotado após algumas colheitas, cobre-se de i¡rzes. Na
zona tropical, a grande floresta foi submetida a uma exploração
c) ver especiaLnente À. Au¡nE\¡r.rn clímats, forêts et désertíficatíon de
destruidora pois forneceu o combustível às locomotivas, åadeira
t'Afrique tropkalì, Paris, Société d'Sditions maritimes et coloniales,7g4g.
198 799
E,"tz a exportação,_e.acabou por ceder iugar às piantações. Assim, a acçio do hòmem tende e rcd:oz:.r a extraordinária
sabe-se que foi o desbaste da floresta que preparou a cultura
diversidade da fauna selvagem. Desde o Neolítico conseguiu
do café no Brasil, verificada aquando d" ptogr.ìsão para oesre. domesticar apenas algumas espécies animais: o cão, o boi, o car-
,t fauna também não sofreu menos ãt.trt*dot dã h"m.m, neiro, a cabra, o burro e alguns pássaros. Ainda aqui, à comple-
a destruição. d¿ cobertura florestai provocou o desapareci- xidade ecológica, condição necessária a um equilíbrio duráveI,
mento dos animais que aí estabeleceram o seu território; a caça
substituiu a combinação de um número limitado de animais que
e a pesca praticadas como actividades de subsistência desde só podem sobreviver graças à sua coilstente intervenção
o começo da humæridade, como actividades para obtenção de Atacada a vida, são as interdependências criadoras dos
lucro, como actividades de recreio oo .oodorid.as sistemati- ecossistemas que estão comprometidas. Os arroteamentos entre:
camente contra as espécies nocivas, são responsáveis pela extinção
de numerosas espécies. os resultados sãã conheciåos: segundo
lam os solos à degradação originando o desaparecimento da
cobertura vegetal que deixa campo livre à acção das forças de
Jean Dorst, 150 espécies de pássaros desapareceram, 10 desapare- erosão natural, cuja lentidão mantém o equiJíbrio erltre a for-
ceram antes de 7700, 20 no século r,tm, 20.m me*dos do
mação e o transporte dos materiais rnóveis, sucede uma erosão
século )cD. e 50 por cada uma das metades dos séculos que rápida e violenta. Observadores americanos caicularam que, no
nos separem de 1815>(t¡. Ph. Saint-Marc(2) acrescenra: <<Entre Ohio, era preciso um escoamento durante 174 000 anos para
o início da era cristã e 1.800, uma espécie de mamífero foi arrastar ume espessura de vinte centímetros de um solo aluvial,
destruído em média todos os 50 anos; enrre 1g00 e 1900, uma
se for coberto por fl.oresta;29000 anos, se fôr ocupado por
espécie todos os dezoito meses e desde o princípio do século
xx, prado; 100 anos, se for sujeito à rotação de culturas e soffiente
uma espécie por ano). uns quinze anos no caso de monocultura do milho (1).
Esta aceleração da hecatombe tem a sua explicação: a colo- A erosão atinge o seu paroxismo nas vertentes montanhosas
rl,tzação foi partictrlarmente destruidora ao- exterminar o
desnudadas pelos desbastes: o ravinamento, a cada aguaceiro, cava
dronte [79] do arquipélago das Mascarenlas e o bizonte, que aí. sulcos que se aiargam e se tornem cada vez mais profundos.
tinha assegurado a existência das tribos índias nas Granães Transformadas em <bad-lands 1801, as vertentes já não
Planícies centrais da ,tmérica do Norte. Hoje, é toda a fauna
podem ser aproveitâdas para Pastagens, nem cultivadas: a defo-
marinha que está ameaçada, quer pela exploração industrial dos restação das Terras Altas cle Madagascar desencadeou o escava-
oceanos, quer pela poluição das águas: a baleia, afoca, os pássaros
mento em formas aprofundadas e arredondadas no flanco das
ictiófagos, os peixes que são perseguidos por poderosas e bl- crostas lateríticas; são os <dava.ko [81] que penetram e esbu-
trechadas frotas de pesca, rarefazem-se. "p.-
racam, originando clareiras no taPete da estepe.
Limpas das suas florestas, as montanhas mediterrânicas são
rasgadas por gargantas profundas devido a uma erosão torrencial
204 2A7
que a proximidade do mar acelera. A rocha descarnada ¿fl.ora
w
'?.i.
Roma ()r: À medida que o homem se tornava força domi- :;i iå;
E assim que as cinzas das queimadas, os detritos caseiros,
'.5-
narite na determinação dos sistemas da vidr sobre a terra, as dejecçõãs dor rebanhos, os esffulTres humanos do camponês
a sua ascensão era acompanhada por uma redução da diversidade
chinês entram na cadeia das reacções bioquímicas necessárias
biológica da narureza... com uma menor diversidade de espé-
à Vida.
cies, talvez a Terra já' nã,o possuísse estabilidade necessária na sociedade industriai que
à Muito diferente é o que se passa
adaptação eà
sobrevivência.
produz não somente quantidades de de_sperdíciostais que os meca-
perigo que mais nos ameaça, não é somente a destruição
irir*o, de regulação da ecosfera se afundam neles, mas também
das interdependências dinâmicas que unem estreitamente o
produtos químicos que, não exisdndo na natureza, resistem à
mundo vivo e a matéria inanimada nos mecanismos davida, mas
ãegradaçao- biológica. Estes detritos muitas vezes prejudiciais
sotretudo a nossã incapacidade para pr.;;;;-i*pui[u., . I Vida, acumulam-se perigosamente no ar, na terra e na âgaa,
consequências biológicas das nossas intervenções.
adulterando-ihes âs suas qtralidades'
Lembremos que a composição do ar é mantida constante
graças à função clorofilina e através das reacções bioquímicas com-
4. ..â,s poluições conhecidas sob o nome
11.""r que se desencadeiam na vegetação
ã. fototsiotese, condicionam pois a Vida à superfície da terra.
É um" característica fundamental da vida expulsar os desper-
São evidentemente as florestas que possuem o maior poder de
dícios: estes,_ depois de uma série de operaçõ'es bioquímicas,
regulação do fenómeno de oxigenações. Segundo Philippe Saint-
participam de novo na constituição dos seres vivos. É assim
-ltiarc (1), um hecrare cle floresta de faias oudepinheirosabsorve
que a floresta vive praticamente e em grande parte, sobre ela
cinco vezes mais dióxido de carbono do que um hectare de
própria, a partir da fotossíntese que the permite t form", o plantas herbáceas; ou ainda um quilómetro quadrado de floresta
dióxido de carbono do ar em matérias orgânicas"ne expulsar
o oxigénio. A matéria orgânica, fornecida pelas folha, irodu" duas vezes mais oxigénio do que um quilómetro quadrado
"-p.lo,
ã. pr"do. O autor ainda acrescenta que a vegetação puriûca os
ramos ao morrerem, é decomposta, pelas bactérias do solo
utili- gorã, poloentes e fixa as poeiras: <No decurso de um ciclo
zando o oxigénio, em elem.rrto, ,rrirrerais e em dióxido de .rr"g.t"tino, um hectare de pinheiros retém trinta toneladas
carbono que entrarão em novas sínteses orgânicas, tal como a
de poeiras... um ar poluído, contendo 100 microgramas de
vegetação e a fau¡ra ao constituir urna biocenose florestal.
sulfuroso por metro cúbico, seria completamente
A vida humana integrou-se já, hâ bastante tempo, nos "nidrido ao atravessar um quadrado de um hectare de flo-
decomposto
mecanismos de inter-relações que asseguram a pereniiade
dos resta de fais de médio crescimento>.
ecossistemas: a quase totalidade dos seus detritos participam
na Avaliam-se os perigos em que se incorre quando há desar-
reciclagem que os tornam disponíveis para outras combinaçoes.
borizações maciças: o p.'" Cole estimava em 1968, referindo-se a
2t0 271
- --_:--=!t={:.F'çr'-- -' -
w, É'
.t,.rt,
A indústria química eperfeiçoou toda uma gama de adubos escolhidas, Parece até..que o solo foi atingido na sua fertilidade,
adaptados aos diferentes tipos de solos e às diferentes culturas, db
pois as substâncias tóxicas declaram-se contra os micro-orga-
pesticidas destinados a protegerem as colheitas contra os seus
nismos que são os agentes ûxadores do azoto.
depredadores. A utlização expandiu-se rapidamente,.permi-
1ua Mas não é tudo: os produtos químicos empregados nas defe-
Endo o aümento da produção agrícola e dos seus.rendimentos. sas das culturas são perigosos para o próprio homem, ao qual
Adubos e pesticidas tornaram-se, por conseguinte, indispen-
chegam por vias da sua concentração nas cadeias alimentares [84].
sáveis para assegurarem a subsistência da populaçao
-orrãi"l. pela infiltração e pela queda das chuvas, os adubos,
Todavia, a sua fabricação consome qo*ãd"d.s crescentes 'trrastados
os pesticidas e os herbicidas vêm juntar-se aos desperdícios urba-
de.recursos naturais não renováveis tais .*o a potassa, fosfato
nos e industriais para poluir a âgua dos rios e dos lagos.
e derivados de hid¡ocarboneros. . É evidenr. qir. as gerações E sem dúvida, inútil insistir sobre estes problemas, já
actuais hipotecam gravemente a existência das
çr"ço.t frrturas. longamente estudados (1). Contentar-nos-emos em recordar o
Por outro lado, se é verdade que os mais altos rendimentos são
alto grau de poiuição atingido pela maior prate dos rios nos países
atingidos graças a fortes udlizações de adubos, é também certo
indu5¡¡ializados: a âg:ua jâ não pode ser corsumida sem prévio
que há um.limite a partir do qual os rendimentos deixam de
tratamento; os peixes são envenenados pelos produtos tóxicos
progredir.
provenientes das fäbricas instaladas nas margens [25].
Acrescentemos que o homem, tal como o aprendiz de
É nos lagos que a contaminação é mais grave: as águas
feiticeiro, não domina totalmente as consequências- biológicas
agrícolas, urbanas, industriais .que aí se derramam estão carre-
das suas intervenções que se podem voltar .ootr" ele, .os pesti-
gadas de fosfatos, de nitratos provenientes de adubos e dos
cidas perigosos para outros seres vivos, os quais ,ofr.*
_são detergentes. Constituem um meio nutritivo para as algas que
os eGitos para além daqueles contra os quais são usad.os: aí proliferam, mas ao privar. o meio de oxigénio, por este
assim, muitos insectos e pássaros úteis desapareceram de certas
desenvolvimento.vegetal os peixes desaparecem. Este fenómeno
regiões. A sua eficâaa é rcd'zída rapidamente pela resistência
t{e eutrofrzação [36] é responsável pela morte da maior parte
que os insectos prejudiciais ou as ervas daninhas adquirem, por
da vida' nos lagos Leman, Zrtnque, Baikal, Michigan e,
um processo semelhante ao da selecção natural. sobretudo, o lago Erié. Nos seus 25 000 quilómetros quadrados
Depois de uma acalmia, o ataque dos parasitas ganha em
este atingiu um tal grau de saturação de produtos químicos que,
virulência: hoje 250 espécies de insectos prejuãiciais toinaram-se
se a poluição parasse neste momento, seriam necessários cinco
insensíveis à maior parre dos pesticidas. A indústria química
séculos para restabelecer as condições ecológicas que reinavam há
está assim condenada a inventar produtos cada vez mais ióxicos.
urn meio século.
Seja como fôr, o emprego maciço dbs. pesticidas. e.de
herbicidas acelerou o movimento de .c{egradação .dos ecossis-
temas que o homem desencadeou desde o seu aparecimento sobre , (t) Ver especialmente J. Donsr , La nature dénatwée: <Pollution des eaux
a Terra: fauna e flora empobrecem-se para deixar lugar às espécies douceso p.729 e'em Ph. Smm-Manc, op. cít., e c.arte n.o VIIdapoluiSo
das águas de França, p. L46.
21,2
213
æ"
iii: ll
:. !
Ao problema da qualidade áa igae, junta-se hoje o da :. a produção de oxigénio é de 10 a 20 liros por dia e por
quantidade metro quadrado.
Sem atingir ainda o nível das necessidades da agricultura, Do mesmo modo, o mar foi sempre Pera o homem uma
o consumo das cidades e das indústrias em desenvolvimento fonte de riquezas susceptíveis de se renovarem indefinidamente,
está em aumento constante. Sabe-se que a produção de uma tal como se sabe hoje da sua importância Pàra a navegação,
tonelada de aço exige 150 m3 de água; uma central térmica pesca, extracção do sal e turismo. São todas estas possibilidades
produzindo 500 000 kw, evapora 1 000 m3 de água por hora; que fixaram elevadas densidades populacionais e originaram a
nos Estados-Unidos, o gasto anual por habitante atinge os formação de grandes cidades costeiras.
. 1 200 m3. Daqui até ao fi.m do século, a procura vai aumentar A prospecção dos fundos nurin-hos revelou a existência de
'enormemente imensas reservas minerais: desde o petróieo em exploração em
na razão da extensão das culturas irrigadas, da
industrialização dos países subdesenvolvidos e do crescimento da vários pontos do globo [87[, ao manganésio, à exploração de
população mundial. Em que medida será ela satisfeita? cerca 50 milhões de toneladas de mercúrio, a milh¿res de
A água não é um recurso esgotável, mas é em quantidade toneladas de chumbo e de matérias radioactivas naturais, que o
limitada. Torna-se um produto raro, sendo já sentida a sua falta homem poderá extrair depois de aperfeiçoadas as técnicas de
em várias regiões. Talvez não venha longe o tempo em que e extracção.
quantidade pedida não possa ser totalmente assegurada (1). Se a costa a zont oceânica mais rica em recursos naturais,
ê,
Resta o mar que muitos consideram como um reservatório ela é tamb ém e mais expostâ ao perigo da poluição devido à
de recursos ao qual o homem terá que recorrer após a delapida- popuiação que aî se concenffa cada vez mais. A função
ção dos recursos terrestres. portuária levou à função industrial favorecendo as instalações
Recordemos que o mar constitui um meio que ëlabora a sua sideúrgicas, de refinação de petróleo, da petroquímica. Hoje,
própria vida: a síntese clorofilina produz matéria orgânica e o Mediterrâneo Ocidental está envolvido por uma cintura de
liberta oxigénio. No entanto, há que distinguir entrã o alto fäbricas, enquanto todo o poderio industrial do Japão está locali-
mar e a franje costeira. O alto mar é quase um deserto bio- zado na costa do Pacífico. O turismo mutilplicou as construções,
lógico: o plâncton do alto mar apenas fabrica 0,75 toneladas de es estações de veraneio, os Portos de recreio dispostos à
matéria orgânica por hectare e por ano, é muito pouco oxigénio; beira-mar.
a franja costeira é, pelo contrário, o centro de uma intensa acti- Todas estas actividades desencadearam o desenvolvimento
vidade biológica, na multitude de algas. O fabrico de matéria das cidades até atingir conurbações, isto é, a formação de aglo-
orgânica atinge aí duas a quatro toneladas por hectare e por ano merações formadas por várias cidades vizinhas cujos arredores
podendo atingir as 25 tonelas nos estuários pantânosos, enquento se fundiram. Deste consumo desenfreado do espaço costeiro
resulta uma intensa especulação imobiliária. A Procura de terreno
e) Ver sobre este assunto, Jean Bar,rox e O¿rvsn GoDARD, <L'eau é tal, que se tornou rentável construir sobre entulhos lançados
limite à la croissance? Jalons pour une prospective de l'eal, Futurìbles,
Outono 1976, pp. 387408. ao mar, tirando vantagem da fræa profundidade [88].
214 215
Estão pois reunidas as condições para que a poluição se na Venezuela, o lago .Maracaíbo, donde é extraído o petróleo
concentre îa zotra. costeira dos mares e dos coeanos: o escoa- há quase meio século, é sempre rico em peixe. ''
mento dos esgotos urbanos, o lançamento dos desperdícios indus- Existe, em certas secções do iitoral, uma poiuição perma'
trais, a limpeza dos Þnques dos petroleiros t or*para as águas nente que torna impossível um regresso natural ao equilíbrio
Iitorais miríades de bactérias, produtos nocivos, t"i, .o-o o, biológico:é'o caso da Côte d'Az;uir, da cost¿ j-aponesa è dos
hidrocarboÌr.etos, os detergentes, o mercúrio, o chumbo e o *"r.r'de pequena extensão como o Báltico. É tempo de'se
titânio. Dat a contaminaaão e o envenenamento da flora e da aplicar nessas zonas um Programa de acções específicas que
fauna marítimas, especialmente os peixes e os mariscos e, deveriam ser conduzidas no quadro de uma cooperação inter-
portantô, da cadeia alimentar que vai até ao homem. Bastará nacional.
lembrar o drama de Minamata no Japão, onde o consumo ' Todavia, a 'poluição mais grave que pesa sobre'a Vida,
de peixe contaminado por mercúrio causou a morte de 79 pes- tanto nâ terrâ, como no ar ou na âguz é a produzida pelo
soas e deficiências físicas e mentais de outros 602. desenvolvimenro da indústria nuclear.e provém das explosões
No alto mar, a ameaça vem dos desperdícios dos petro; atómicas, das águas de arrefecimento' dos reactores e dos
leiros: uma tonelada de mazoute espalhado sobre 1 200 hectares, resíduos lançados pelas fäbricas que trabalham com matérias
reduz de forma apreciável a actividade da fotossíntese do radioactivas [89]. Até agora, o risco está mais ou menos contro-
plâncton. lado, mas ¿ de um confito atómico generalizado não é
os ^rrreaça
espaços marinhos são particularmente emeaçados tal de excluir. Os meios de aniquilar a Vida sobre a Terra
corno sucede com o Mediterrâneo Ocidental, o Báltico, o Mar estão reunidos.
do Norte, a Mancha, o Mar das Caraíabas, o Golfo do Assim, ao desenvolvimento åa civilzação urbana e indus-
México, os Mares da China e do Japão trial corresponde um acréscimo de desperdícios que escePem
Contudo, o perigo não é tão premente como pretendem muitas vezes aos processos de reciclagem natural, amontoanáo-se
-
afirmar. É por exemplo, imprudente dizer-se q; o Mar no espaço e podendo até alterar as condições que permitem à
Mediterrâneo estará morto rLo ptazo de de, ú* relatório Vida manter-se na sua diversidade e complexidade.
"oor.
ãa Org^nização de Cooperação e de Desenvolvimento Econó- Consciente do perigo desde há pouco temPo' o homem
mico recorda que, atendendo à sua massa e à renovação das suas tenta evitar esta situação. Organizam-se novas actividades
águas é possível que um entendimenro enrre os Estados ribeiri- industriais, sendo, segundo as palavras de Bertrand de Jouvenel,
nhos permitiria conjurar as ameaças que pesam sobre ele em <indústrias de desuuição> que têm em vista a eliminação dos
menos de um século. produtos <obsolescenteu [90] e dos resíduos graças a técnicas
Por outro lado, o meio marinho possui uma grande capaci- áe degradação. Pode esperar-se com isso não só a diminuição
dade de assimilação: trabalhos recentes teriam mãstr"do que os da poluição, mes também a economia c{e matérias primas, se os
acidentes, tal como o naufrágio do petroleiro Torrey. Cnnyon elementos recuperados puderem ser novamente utilizados. Estas
foram seguidos de uma reconstituição total do meiom"rirlo; operações são dispendiosas em mão de obra, pela necessic{ade da
216 2t7
recolhe e pela energie de transformação. Sem dúvida, mas
essas operações deveriam aparecer, de forma evidente e de
rápidos resultados, com a necessária contra partida de uma
economia de consumo, destruidora do espaço e dos seus reclrsos.
Doravante, a civilização industrial, dotada das suas técnicas,
atingiu o grau do poder das grandes forças da natureza, tàis como CAPÍTULO iII
os vulcões, os tremores de terra, os ciclones. Até aqui, empre-
gou-o a gastar e a destruir, sem se preocupar com a sobre- PARA UMA POLfTICA DO ESPAçO GEOGRÁFICO
vivência da espécie. Ei-la agole colocada diante do dilema
inelutável: desaparecer juntamente com o espaço ecológico
ou construir um espeço geográfico estável. A concepção de urna política exige a prévia análise
 segunda via é aquela com. a qual é urgente que se dos dados do Probleme que se Põe'
comprometa e supõe a execução de uma estratégia que, tendo Hâ iá, *1g* decénios que o ritmo do consumo do espaço
em conta a necessária diversidade, reali"e a unanimidade dos é tal qo" ; esgotamento Parece chegar dentro em Pouco;
homens na acção. o, ,.*r-ro, naturais não são suûcientes Peta o homem que pede
à ciência que the forneça czda vez mais produtos_ artificiais
destinados i satisfazer as novas e crescentes necessidades,
com o
risco de pôr em perigo o equilíbrio da biosfera'
 quem cabem as resPonsabilid¿des?
escreye_1.$.fné Dubos,..a,.tecnologia deverl !¡1çorporar_se nos meioi Daturais . (l) .Lø.5ocìétë contre nature, op. .eit' p. 385.
e submeter-se às restrições que a tornarão menos destrutiva e mais compâ- (r) L'homme et lø ville, Flarunarion, pp. 770-177.
2?4 225
15
-'.=4æ ':il
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multiplicação no mundo de parques nacionais e de rese¡- cas de afolhamento e da rotação regular das culruras, restabele-
vas naturais pode, a este respeito, suscitar uma rica colheita de cendo as sebes, os bosques, as florestas. .tssim se recorutituiria
observações. são outros tantos laboratórios que o investigador um equilíbrio natural vivo ao nível da estrutura do solo e entre
atiTtzari para descobrir os mecanismos da constituição de um os inimigos das colheitas e os seus depredadores.
ecossistema, da sua dinâmica, da sua auto-regr lação. As ciências Cria-se também a esperançâ numa agricultura dita bioló-
biológicas apresentam progressos que permitem acalentar a gica que poderia não recorrer a adubos e pesticidas. A toresta
esperaoça quanto ao futuro do Homem, encontrando-se assim tropical alimenta-se a si própria, e alimenta sem problemas
estimuladas a prosseguir. numerosas espécies de insectos que se neutralizam uns aos outros.
Não se pode travar o progresso da ciência e da técnica, mas Não será a ciência, caipaz de descobrir o segredo de uma tal
orientá-los para'a descoberta de soluções que se tôrnem solidárias ' a.uto-regulação
?
com o desenvolvimento da economia e a salvaguarda da Vida, Certamente. Já se utilizam paru a defesa das culturas, os
cujas soluções são as de um ecodesenvolvimento (1) depredadores de iruectos nocivos e os microorganismos, vírus
[92].
A organização do espaco geográfico atingirá o seu objectivo ou fungos susceptíveis de provocar doenças que os dizimam.
quando, inspirando-se em processos biológicos souber analisar
Estes métodos permitem realizar um equilíbrio biológico
os geossistemas que, à maneira dos ecossistemas, estarão em equi-
que tende a reconstituir um ecossistema. Xles são empregues
líbrio dinâmico interno e com o meio, dotando assim o homem
de uma (nova com eûcácia na luta contra os parasitas dos pomares, das
ecúmenæ.
Não podemos analisar aqui em detalhe o que ela deveria ser,
fl.orestase de várias culturas delicadas, sendo completadas pelas
mas algumas sugestões chegarão para definir o nosso ponto de investigações genéticas que se dedicam à criação de variedades
vista. de plantas mais resistentes aos ataques dos seus inimigos.
A
monocultura especulativa que esgota o solo e favorece Se é verdade que podemos esperar progressos decisivos destas
a proliferação de parasitas, a agronomia propõe substituí-la por técnicas de luta biológica, os resultados obtidos pela agricultura
uma economia agrícola mista onde se retornam as antigas práti- sem adubos são menos convincentes. O emprego dos estrumes
é ainda a prâaca mais eficaz para manter a fertilidade do solo e
(1)Para uma detnição de ecodesenvolvimento, ver Ignacy S¿cns et melhorar a sua estrutura permitindo reduzir o recurso aos ferti-
Krystyna vn¡¡vBn: <o ecodesenvolvimento parece-nos constituir uma abor-
Irzantes artrtrcrars.
dagem susceptível de orientar os iuvestigaãores para temas iaterejsantes:
como satisfazer æ necesidades funda¡nentais de cadã sociedade aproveitando Como quer que seja, a agricultura mundial deve hoje res-
os recursos do seu ecossistema com o apoio de técnicas ao mesmo
-especítcos ponder à procura intensa de uma população em rápida expansão,
tempo produtivas e ecologicamente prudenæs? E generalizando mais,'colo-
c¿ndo-se ao nível de sistemæ técnicosl já não de técãicas isoladas, coucébendo não podendo renunciar aos adubos e pesticidas industriais. Mas,
as estruturas técnico-iqdustriais agrícolas e urbanas como verdadei¡os sis- é necessário que a investigação agronómica prossiga paru chegar
temas, utilio¡trdo o ecossistema como paradigma para os sistemæ de produção
e valorizando ao máximo todas as coàpb-entatidades?o (Mondes ti aeir,Ìoe- rapidamente à organização de uma agricultura que se aproximaria
pernefl\ n,. 75, 7976). o mais possível dos processos biológicos de produção.
226
?27
A civilização industrial desequilibrou o espaço geográfico, i nxa.hza,ção sobrea arbanização>. A formula é imprecisa e sem
aprofundando a oposição- entre o espaço agrícola e o espaço aplicação ptâtica, a menos que não se trate de alargar a trama
urbano. do tecido urbano utilizando o espaço rural, de maneira a
Se bem que influenciado peia iutrodução de técnicas indus- estender a todos os homens as vantagens que a urbanização
triais, o espaço agtícola conservou um contacto estreito com as até agora reservou aos habitantes da cidade, sem trazer os seus
condições ecológicas que ele não pôde violar impunemente. inconvenientes aos habitantes do campo
À' actividade dos homens mantém-se ritmada pelar estações O processo que aúngiri este duplo objectivo consistir'á-no
exercendo a sua acção sobre os seres vivos e, o artificial, ainda deslocamento de populações. O reequillbrio ,de deruidades
não fez submergir o natural pois a ágat e o ar retêm em parte a resultará do descongestionamento das aigomerações e repovoará
sua pureza original. o espaço rual, onde a diversificação da estrutura social trará uma
Integrado na economia industrial, o mundo agrícola está maior intensidade de relações e de trocas entre os indivíduos,
longe de dispôr de todas as vantagens que procura. A fraca necessitando para isso de sofrer uma redistribuição mais equita-
densidade de população priva-o dos equipamentos e dos serviços tiva dos equipamentos sociais. A desconcentração das indústrias
de que a vida urbana está rodeada e perdeu a sua autonomia em susceptíveis de se mudarem atenaarâ os perigos da poluição
proveito cl.a cidade que detém o controle do mercado e dos meios ao serem espalhadas no espaço, esperando que sejam usadas as
de produção.. melhores .técnicas para a combater. Enfim, a circulação.melhor
O.espaço urbano está sobrecarregado de população e de repartida através do território ganhará em fl.uidez e rapidez.
actividades até à paralisia. Ele forma urn meio construído com P. George (1) definiu perfeitamente o sentido da evolução
todas as peç"s fotirecidas peia técnica que submete a Vida à sua que deveria pôr termo à dicotomia espacial <No extremo limite
discipiina. tânto a dos homens como a dos animais e dos do processo de urbanização, não existe nem cidade nem camPo,
vegetais. É um produtor de resíduos que s.e acumulam e não são mas uma extensão em que as ocupações do solo e as maneiras
recicláveis, um centro de poluição que vicia a composição do ar de viver,. próprias da cidade se dispõem no conjunto do espaço
e da água. A cidade tende a tornar-se num habitat artificial disporível, epresentando someote uma diferenciação funcional
que a espécie humana cria, como para se isolar num mundo d", dirrers"s partes desse espaço uniformemente influenciado Por
colocado sob o seu cóntrole, reservando certas áreas onde a natu- um sistema de comunicações e de relaçõeu.
Ífla, qlre se reconstitui em liberdade vigiada pode vir a oferecer Ficará o inquietante problema da poluição e a pesquisa da
momentos db descontração a citadinos fatigados. sua solução que incumbe à ciência. Não poderá a ciência inventar
' A criação'de uma <crova ecúmena:> supõe a eliminação de ta1
técnicas que, à semelhança dos processos biológicos, permitiriam
disparidade entre os espaços pela integração numa mesma orga- reintegrar os resíduos da indústria nos diferentes circuitos da
nrzação espacial. Philippe Saint-Marc (1) propôs <dar a primazia produção:? Ela resolveu diûculdades, aliás mais complexas que a
ù; (t)
Pour la socialisation de la nature, Project, n." 66] unho 7972,
p. 661. ç) Op. cit., p. 728.
228 229
decomposição dos produtos que escapam à biodegradação ou que sob o conftolo das sociedades industriais Para seu próprio
a recupemção dos elementos expelidos pelas diferentes fäbricas, benefício. Estas sociedades controlam o mercado mundial,
com vista à sua reinserção nos grandes ciclos da biosfera. Muitos cadz vez mais exigente em bens de consumo, canalizarem Pere
ainda estão carregados de energia e poderiam servir de matéria as suas empresas as matérias primas que outros extraíam do solo.
prima para novas indústri¿s. Assim, estabeleceu-se ume sobreposição de níveis de dependên-
É possível que o preço e pager seja elevado, mes as socie- cia, organizando os esPeços segundo uma pirâmide hierar-
dades industriais já provaram várias vezes, que nada é demasia- qutzede.
damente elevado quando se trata de assegurer o seu poderio. A comunidade mundial que foi durante muito temPo
São elas que devem encaffegar-se dessa t"..f" pois é evidente que uma justaposição de unidades independentes, transformou-se assim
'sistema''mundial cuja coerência se baseia na interacção
são da Sua inteir¿ responsabilidade os ¿lános infligidos à biosfera. num
No entanto , a acção para ter êxito deve ser conduzida em comum, das partes constitutivas num sistema complexo que apoia o seu
segundo um plano global elaborado à escala do planeta e com dinamismo nas contradições tesultantes da desigualdade das rela-
interveniência de todos os Estados. ções entre os seus comPonentes. A periferia, têmo-lo dito,
é mantida no subdesenvolvimento para permitir ao centro Prosse-
guir o crescimento exponencial da sua produção e do seu consumo
3. Definição de uma política de organização do espaço ,t nível internacional, a lei da pauperização enunciada por Karl
Marx é correcta, pois estabelece uma correlação fatal entre a
Referido no essencial, a evolução da humanidade consistiu acumulação de capital de um lado e a miséria do outro.
nume complexidade crescente da sua organizaçio. Como seu meio ambiente a sociedade hurnana constitui
No estado inicial, as diferentes civilizações que a com- um sistema, mas um sistema desiquilibrado pelas suas dissimetrias,
punham constituíam um conjunto cuja coesão'era suficientemente desprovida de mecanismos de auto-regulação que the permitiria
iéoo. para permitir, a cada uma delas, invéntar soluções ori- resistir às crises, estando por isso votada ao caos.
ginais quanto ao problema da sua instalação'no meio. Apren- Esta disordem parte dos grandes centros industriais mas não
deram, pela experiência acumulada por gereções sucessivas, está localizada, estende-se a todo o planeta pois resulta da plane-
a conlecer as forças, os ritmos, as potencialidades naturais e a tarização da clilTnção industrial. Ela maniGsta-se na degradação
explorá-los em função das suas próprias técnicas. crescente, não somente do meio natural mas também das rela-
Entre as grandes áreas sócio-culturais em que se repartia ções sociais e das relações entre os próprios Istados.
o Mundo, as relações e as trocas não bastavam pare reunir as A civilização industrial está ameaçada de desmoronamento
partes num todo estreitamente integrado. e, com ela talvez a própria humanidade inteira. O mundo
Esta integração ê hoje um facto que se seguiu às grandes toma consciência do falhanço de um sistema que, tendo o
descobertas marítimas do século xv, à colonização que daí consumo como ûnalidade suprema, deixa ao indivlduo o direito
resultou e ao poder expansionista do capitalismo que se efectua de retirar de um espeço cada vez mais raro e das suas activi-
230 231
dades económicas o máximo lucro, mesmo em detrimento É o funcionamento-do mercado mundial'que origina estãs
da. colectividade. <Até os próprios privilegiados, escreve Fran- disparidades entre Estados, baseando-as ria desigualdade das
çois Perroo* (t),. começem'a compreender que a solução, para rroces e fazendo da solvabilidade o único meio de ecesso aos
a1ém dos nlveis de vida, está na opção de um tipo de vida recursos. .4. regra do liwe jogo da oferta e da procura, ¿liás
em relação à qual se apreciam outros valores. 't civfização falseada pela intervenção de poderosas socieclades fansnacionais,
que sucederá à civilização industrial. <deverá, segundo Philippe exerce,se contra as mais fi'acas e retira-lhes a possibilidade de
Saint-Marc (2), dar prioridade aos bens imateriais sobre,os bens previsão do financiamento regular de um plano'de desenvolvi-
materiais e portanto, ao ser sobre o ter, ao socialismo sobre *.oto a longo Prãzo. Não ihes resta senão uma saÍda:
o liberalismo, à ruralização sobre a urbanização>r. fìxar.urrilateralmente a circulação das matérias primas que contfo-
Certamente que a solução é política, mas não pode contar larn sob o iisco de desencadear uma crise como a do petróleo [94].
com a socialização do planeta. O perigo está eminente; deve-se Só um acordo internacionai poderia estabelecer, as bases de um
incitar os homens à união, a entendereÍl:se quaisquer que sejam ,sistema de .trocas entre os países subdesenvolvidos e os países
.hoje as suas divergências ideológicas. A crise abate-se sobreum industrializados, que tivesse em conta os interesses.de cada um.
mundo atêhâL porlco temPo uno e indivisível, não podendo ser j . A concretizaçio' de um tal sistema é urgente, mas não será
debelada por esforços separados, mas exigindo a cooperação stificiente pera atenuar as fortes disparidades sóciò-económicas
de toda a comunidade humana mobilizada para a execução de que a divisão mundial do trabalho criou'no esPaço'teffestre.
;um plano de acção elaborado pelas instâncias internacionais. Ã redução das desiguaidades supõe a aplicação de uma política
.1
E ainda será necessário convencer os diferenter países. que o de desenvolvimento que deixará de ser, segundo a expreCsão de
empreendimento colectivo não é destinado a salvar os interesses François Perroux, <um alibi Para as potências e: uma "espécie
de,calnante irrisório Para os fracop. ..":.- 'lì :. "'
' ':":
.ameaçados das potências industriais, que não se trata de menter
as subordinações, as dependências às quais os países subdesenvol- Os p:úses industrializados; já o referimos, devern eni grande
vidos têm estado subrnetidos até agora, mas que será a sobrevi- parte a.sua expansão económica,là exþloração do resto do lirundo
vência de todos. donde tiram, corn.:reduzida despesa, as rnatérias"primas e a
,t salvação do planeta e da humanidade Passe necessaria- energia. Hoje, a sua estratégia,consiste em transferir algrimas das
mente pela, utilização de um novo sistema de relações interna- suai actividades para os países .subdesenvolvidos, ao encontro
cionais que irá pôr ûm. à dependência de uns e:supremacia de uma mão-de-obra a baixo- Preço .ou de um mercado de
de outros [93]. consumo. Isso acabou por aufiIentãr a dependência destes'países
subdesenvolvidös, que têm cad¿væ meior necessidade ðe inves-
timentos geradóres de actividades para pfeParar um verdadeiro
(1) L'économie de la ressource humaine, Mondes en dáveloppement, arranque da sua economia. Por outro lado, a crise do petróleo
n.' 7, 7974, p. 27. levou I que os países pobres em energia natural, como a Europa
O Pour Ia socialisation de la nature, Project, n.o 66,'lunho, 1972.
Ocidental ou o Japão reconquistassem a suâ autonomia, recor-
p. 667.
232 233
rendo a outros recursos energéticos sobre os quais exerceriam o Isto seria ir contra e corrente do movimento que se aûrma
conffo1e. através do mundo e que protesta contra a alienação pela técnica
Assim se aprofunda o fosso enrre os países desenvoividos e a fecusa de um desenvolvimento segundo o modelo industriai
e os países subdesenvolvidos, até ao momento em que a gravidade do Ocidente; contfe a corrente que leva a um Processo de desin-
do problema e da rcotganrztção do espaço terrestre exigirá a tegração das sociedades de massa em sociedades diversificadas,
rcahzação de um acordo geral. ,.ãop.r"d"s na sue cultura, na suâ história e na sua especifi-
Este acordo realizado entre todos os Estadoi, deverá ter em cidaåe. As socieclades industriais criaram a uniformidade, sendo
conte a aplicação de uma planificação globalà qual se subordina- hoje ameaçadas pelas forças centrífugas que tendem Para a
rão as planifiç¿ç5es regionais dos participantes; uma planificação diversificação.
que, considerando o mundo como um todo organizado num sis- Todo o sistema deve a coerência e o equilíbrio da sua
tema complexo, e que efectivamente é, defìniria a estratégia estrutura, às interdependências que se estabelecem necessaria-
susseptível de o manter num equilíbrio dinârnico cepaz de uma mente, de subconjuntos em subconjuntos até ao conjunto suPerior
auto-adaptação às mudanças. e da complexidade das interacções que resulta a sua regulação.
Para atingir esta finalidade, a estratégia mundial deveria A diversidade das relações assegure a sobreviência dos
propor um duplo objectivo a atingir simult¿neamente: controlar ecossistemas, mas também dos geosistemas. O mundo deve
a degradação da biosfere e parar com o esbanjamento dos recursos consrituir-se num todo diversiûcado pois a aplicação de uma
não renováveis em proveito de uma minoria e, por outro lado, nova ordem económica, deverá considerar a existências de dife-
reequilibrar o espaço procedendo a uma divisão internacional da rentes níveis de organização, ao mesmo temPo autónomos nas
produção que suprimiria as dependências, o que supõe ume suas existências e integrados num todo pelas interdependências (1).
redisribuição geográfica das actividades pela descentralveção É o qu. se conclui dos autores do Segundo Relatório
das indústrias concentradas nos países desenvolvidos. do Clube áe Roma: uÉ essencial, escrevem eles (2), reconhecer
Trata-se, como propõe Aurelio Peccei 0, de <prevenir que e Comunidade Mundial se compõe de partes, cujo passado,
imediatamente uma situação em que a capacidade e o esforço
fr.r.ot. e futuro são profundemente diferentes. O mundo
de produção do mundo serão unificados e internacionalizados de não pode ser considerado como um conjunto uniforme' mas,
uma maneira ou de outra para constituir o que se poderia pelo contrário, como um composto de regiões distintas, se bem
chamar... o Estado Industrial Globalir? A este Estado Industrial
Global corresponderia, necessariamente, urna crvthzrrçãro indus- (1) <,\ tendência para a individualização e por conseguência parao plu-
trial global que suprimiria toda a diversidade da Terra, numa uni- r"iismo existe a todoJ os níveis da vida... No gue concel.lre à huma-
formização de valores, de compoftamentos, de consumo que oid"d., a expressão última deste tendência poderia ser o desenvolvimento
progressivo ã" o*" ordem mundial que ìntegraria as diGrentes sociedades
constituem os diferentes modos de vida. Lrrã*"r num único organismo complexo em que todos os membros
seriam interdependentesr (René Du¡os, op. cít,, p. 181). -
;
(,) lvtihajlo Mrsenovrc, Edward PnsrÐ, Stratêgíe pour demaín, Segundo
(t) L'heure de la vérité, Ecologie, Fayard, 1975, p. 7I. Relatório do Clube de Roma, Seuil, 1974, p. 57.
I
i
234 t 235
t
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à
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.que ligadas enrre si>. No citado estudo, o mundo está dividido
em dez regiões.
Ficam por determinar os subconjuntos espaciais aos quais
se aplicarão esrrarégias que se inscreverão na estratégia gläbat
visando a resolução dos problemas próprios do conjrãto mun-
CONCLUSÃO
dial; essa,seria a tarefa das ciênciarìo.i"ir no seio-d"s qu"is
geografia desempenharia o papel de orient¿dora. "
uma região parece-nos ser particularmente bem definida:
é a comunidade Económica Europeia, cuja construção se edifica O que a Geografia deve definir, é a especificidade do espaço
sobre inúmeras dificuldades. A execução de um plano comuni- qtle constitui o objecto ða sua investigação' Um esPaço
tário na organização do espaço sem atender às froiteiras, como a jeográfico resulta *"ir d" acção do homem do que das condi-
pelas suas relações
Bacia do Reno, por exemplo, teria uma eficácia a um baixo iões" naturais, clefinindo-se essencialmente
custo, .aumentaria a solidariedade e facilitaria a integração dos com a sociedade.
diferentes países num subconjunto coerente. o espaço natural existe sem o homem, clevendo a sua exis-
os Estados de África ocidental estão paralisados pera sua tência e a sua permanência resultar de uma imbricação de relações
fragmentação política herdada da colonizaçeo. uma plærificaçao, entre os elementos físicos e os elementos vivos constitutivos
prevendo a construção em comum de uma infraestrutura de equi- da biosfera. o espaço geográfico sai das mãos do homem que
Pementos, de uma rede de comunicações e sobretudo a org*i- modela e utiliza o* .1.*.t tor reti¡ados ao meio natural
zaçdo das grandes bacias fluviais, permitir-lhes-ia organizarem-se para os submeter ao seu projecto de sociedade' É um arte-
numa região integrada apta a entrer na via do desenvolvimento. i*.ro po, excelência, t.* ó qual a vida humana é impossível'
A organização do território, tal como é hoje concebida em Uma ìociedade adapta ,.*pt. o esPaço à sua imagem do
cada Estado, é um desafio à economia, à geograûa, e, ,a maior momento: a sincronia é impressionante'
parte dos casos, ao bom senso. Em todo o mundo, a planifi- Ao longo dos séculos, a sociedade acumula a informação,
cação regional deveria tender p$e a constituição de entidades aumenta o sãu poder técnico e modifica, por consequência, o seu
espaciais indiferentes às fronteiras, e especiûcamente deûnidas pelas projecto. Segue-se necessariamente uma readaptação da sue
suas afinidades internas. Daí resultaria uma maior eficácia, mas infraestnrtura espacial às novas condições culturais. Contraria-
sobretudo uma <,força integrativa) que neutralizaria as tensões mente ao esPaço natural, que se orgatiza para atingir progressi-
entre os. países vizinhos e os habituane a trabalhar em bomum. vamente o ìq-uilíbrio óptimo da sua estrutura (t), o esPaço
Nesta organização de subconjuntos regionais, cujas inter-
-dependências os toflr.ariam solidários uns com os outros, o sis-
(1) O espaço ecológico evolui, mas-a um ritmo geológico, na sequêacia
¿" r*rør*;çä;ä"r físicas ou dos comportame¡rtos dos seres vivos.
tema mundial fundamentaria a sua força, a sue coerência e o S"¡*"ã" "ord-çõ.r udbs
,""¿e""ia das ciências biológicas em f,azer comportamentoö,
seu equilíbrio. o motor' da evoluçãor (Jean Piaget)
237
236 f'I
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geográfico transforma-se sem cessar para seguir, segundo um sairá dele sem a vontade de controlar a tirania das determinações
ritmo diacrónico, a evolução da sociedade para níveis de organi- I
económicas e os efeitos de uma produção anárquica'
zação cada. vez rnais complexos. Este controle é necessário para levar a bom termo uma polí-
rJm mecanismo de interacções e retroacções integra os e1e- tica de reestruturação da ecúmena; só uma redistribuição das
mentos constitutivos do espaço natural num todo que tem a sua populações e das actividades pode conduzir a um reequilíbrio
existência própria. Da mesma maneira, as interdependências äo, .rp"çot. À eliminação das disparidades é uma condição
entre o tipo de povoamento, as diversas actividades, a infraestru- p"r" o desenvolvimento total, havendo várias vias possíveis
tura da circulação, dão ao espaço geográfico a coerêncianecessária
i"r" o desenvolvimento, cabendo a cada povo_ a Sem utilização de
a diver-
à ro,.bzação do projecto que lhe deu origem, adquirindo assim iudo o que respeite à sua especificidade cultural.
as características pelas quais se define. Aos ecossistemas da natu- sidade a humanidade enfraquece-se.
reã,^o homem opôs os seus geossistemas, mas sistemas frágeis certamente que tais análises postulam utopicamente que os
em função da sua simplificação racional interna, que é pr"ãro homens sejam lev"dos a considerar-se como um todo diferenciado
manter sempre em estado de funcionamento. mas so[dãrio. Mas talvez seja bom lembrar que a utopia de
os geossistemas articulam-se entre si segundo níveis de hoje preûgura a realidade de amanhã.
orgatizaçdo hierarquizados, de modo que um espaço geográûco
só se concebe integrado, ao seu nível, na rede dasiehçãer.o* o,
outros espaços geográficos, sendo todavia exagerado afirmar-se
g1e é em função das suas relações de interdependência que ere
efectivamente existe.
Ao longo da história, as diferentes casuísricas sociais que
condicionaram a organização do espaço são reduzidas pouco
â pouco. Uma só domina hoje: é a economia, que valoriza as
técnicas de produção, cada dia mais enriquecidas
þelo progresso
da ciência.
Sobre as exigências cla economia, a sociedade e o espaço
estruturam-se a partir das cidades; o mercado internacional orga-
niza-se favorecenclo os mais poderosos. o mundo, integra-se
num sistema hierarquizado e unidimensional que aboliu æ dir.-
renças subjacentes às diparidades.
Presa na armadilha da, aviltzação industrial, a humanidade
cinde-se em dissimetrias conflituais. ,t biosfera degrada-se sob
a acumulação das poluições; o mundo está nutn i*p"rr" e não
238 239
NOTÂ,S E LÉXICO DO TR.ADUTOR
_24L
16
tendendo a transformer uma
t9l Etologia ciência desmembrada da Ïcologia que tem como objecto L22l Desertiâcação
- evolução bioclimática
o ertodo- dos diferentes tipos de comportanentodos seres vivos no -
região emdeserto, o que se verifica nas bordaduras dos actuais desertos
seu meio natural, vivendo isolados.ou em comunidades.
por processos de alteração climática de origem natural ou pelo corte da
vital-espaço que_se considera-necessário Pate a existência floresta climax a ûm de possibilitar a prática de pætorícia nómada
t10] Espaço
intens¿ sobre queimada, ou de uma agricultura não reconstiruída
dJ ser vivo; o t"oãi*.oto dos povos evoluídos provêm, em parte, dos
recursos c¡plorados fora do seu território' e que são ocupados por levará a um esgotamento do solo através de uma exploração irr¿cional.
raças não l*.t assim infe¡iores, pelo que deverão subordinar-se t231 Hectra - medida agâna utilizad¿ pelo povo Me¡i¡ra e que corres-
à iontade ã" t"ç. " superior; esta teoria apresentada por Ratzei foi ponde a uma área aproximada de 750 metros quadrados.
deturpada, ampliada, serviado de paradigma ao expansionismo quer L24) Con&aria Mourida-movimento religioso .que se desenvolveu no
por geógrafos, quer por políticos alemães que prepalaraûl o apâre- actual Senegal, espaço outxora ocupado por pastores Fulas.
l25l Harmatão é o vento alisado continental que sopra do Sara Meridional.
.itototoã. Hitlei, demagogo que galvanizou o povo alemão e o atirou -
para as duas grandes guerrâs, com todo o cortejo de horrores. Í261 Kolkhoze tipo superior de cooperativa socialist¿ em que as terras,
que medem - em média cerca de 12 000 hectares, os meios de produção,
t11l Biótopo - termo ecológico que se refere ao esPaço vital onde estão ' rendimento e trabalhos 3ãö' executados em.io'mum, tendo èada um dos
reunidas as condições físico-químicas ûecessarus a vida.
agrupernento de seres vlvos ligados por uma dependência seus elementos passado a receber um salário a paúir de 1969; cada
l12l Biocenose
- família possui uma leira individual, cuja produção em excedência é
reclproca, reflecdndo a das condições médiæ do meio.
poeira de origem vegetal, com cor castanha lançada num mercado abastecedor das grandes cidades sujeitas a um
[13] <Mascareignitor
- superior de um solo estreito que co bre o .manto insuûciente abastecimento estatal; estão em constante redução pois o
formando o nível
de lavæ, na llha de Reunião. Estado não favorece a sua manutenção, cujo objectivo fi'al é atingir
os Sovkhozes.
t14] cVouner - leite de hrlmus pouco evoluído, contendo ainda restos de exploração do Estado em que os assalariados são pagos
vegetais e que cobre a <mascareignite>. 1271 Sovkhozes
como os de - uma empresa; é a fonnação que se eucontra a camiuho
t15l Entropia de um sistema em se transformar espontanea-
- ãapaciilade
mentè aEavés de um processo de desordem ou caos. do comunismo que assegurarit e intenção de uma maior estabilidade
e um maior equilíbrio na distribuição dos rendimentos camponetes;
t16] Ciimax-vegetação em equilíbrio com,o conjunto das condições do a e¡ploração agrícola medeia cerca de 50 000 hecta¡es agrupando
meio (em espiciai de clima e solo); estado óptimo de equilíbrio relati-
,t"*"tt" estãvel entre a vegetação, o solo e o meio envolvente, no centro, as cesâs, esrábulos, celetos, armazéus e edifícios de serviços
que apresentam um bom equipamento social.
atingido na ausência da intervenSo humana.
pertur- [28] Landers-divisão espacial de ordenamento do território correspondendo
1171 Homeost¿sia - atitude de defesa, retroacção provocada por acção
badora e da qual resulta um noYo arranjo das partes com vista a a uma região-plano, na Alemanha.
eliminarem ori a adaptarem-se ao elemento externo e anormal ao [29] Touiza-denominação dada pelos argelinos e ligados a processos anceþ
equillbrio do conjunto. trais de entre-ajuda, traduzindo uma herança de ca¡ácter comunitário.
de cencloso canúerizado por separações físicas
[30] - váriedade
Bocage
l18l Semiótico - semântica, processo de apresentação ou transmissão atra- que delimitam quintas e casais que se dispõem segundo um habitat
vés de um conjunto de sinais ou lepresentações exteryas.
disperso; pequenas propriedades formadas de parcelas irregulares e
l19l Ecossistema - unidade estrutural elementar da bioSfera, _ constituída individuais separadas por cômoros ou valas onde crescem sebes vivas.
Por um esPaço que apresenta um carácter de homoge-nei'1-ade, desen- parte da linguística que analisa a singi6cação e a evolução
iolvend,o oo- r.o seio uma série de ciclos cuja estabilidade é devida [31] Semântica
à interdependência das partes constitutivas; estuda a organização íntima do sentido- dæ palawas, traduzindo-se numa simbólica do espaço.
dos sistemas geofisico-bióticos. l32l Fehira-unidade de base da organÞação social da comunidade, uibo
de biogeografia, hoje em Processo de individrlali"ação malgaxe.
ì - qoe eitud"- asra*o
120] Ecologia
relações dos ,"ìes vivos com o meio, interessando-se pelas [33] Tavy orizicukura não irrigada, sujeita aos períodos da pluviosidade
-
e praticada sobre queimada.
ðomunidades globais dos seres vivos. animais e vegetais: ciência do
habitat. [34] Geomântico pretensa adivinhação baseada na didposigo de linhas
- no solo.
e ûguras traçadas
l21l Foggaræ - rede de canalizações subterrâneas lig-ldas à super6äe atra-
vés de um sistema de poços que permite recolher a água necessária [35] Facto semelhante se observa nas .brandasu e <invernehasr na ser¡a
para a prática de uma agricultura irrig4da em meio desértico. da Peneda. Em Maio, as gentes e gados sobem à sMontanhat cuhi-
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SEGÜNDA PARTE
254 255
C¿pírwo II-A organização do espaço geogrífico 111
7. Oespaço-estrutura . . . . : . 7t7
2. Â dinâmica do espaço geográûco 119
3- Os diGrentes tipos de organização especial 733
TERCTIRÀ PÀRTË
DO MESMO å,L]TOR
o EsPÀÇo GEOGR{.FICO COMO PRODUTO DE CONSUMO 775
Conclusão 237
Notas e léxico do Eadutor 241.
256 ¿)t