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O CORPO SÍGNICO

01 – Quem é a autora?
Jaqueline Ferreira, formada em Medicina Geral Comunitária com a Antropologia Médica. A inserção no campo deu-se através do
consultório médico, espaço criado com o fim específico de desenvolver esta pesquisa, aliando, desta forma, minha formação em
Medicina Geral Comunitária com a Antropologia Médica.

02 – Em que se baseia o estudo?


Antropologia Médica, campo de estudo que se preocupa com como as pessoas, em diferentes culturas e grupos sociais,
explicam as causas relacionadas à saúde e doença, as crenças, práticas sobre tipos de tratamentos e a quem recorrer quando
doente.
Ε também o estudo das crenças e práticas relativas ao corpo, tanto nos estados de saúde como no de doença.

03 – Qual o objetivo da autora?


A autora busca a representação de corpo doente, mais especificamente a expressão do corpo doente apresentada ao
médico pelos pacientes, através dos sintomas.
Igualmente busca relacionar estes sintomas a aspectos observados clinicamente na consulta médica.

04 – Qual a metodologia? Onde foi realizado o estudo?


Centra-se na observação participante, em entrevistas e na observação da consulta médica realizada na Lomba do Pinheiro, uma vila
de classes populares situada na zona leste de Porto Alegre.

05 – O que pensa a autora sobre o corpo?


Ele é pensado, representado e passível de leituras diferenciadas de acordo com o contexto social, tornando-se assim um
importante objeto de estudo dentro das ciências sociais. O corpo é um reflexo da sociedade, não sendo possível conceber
processos exclusivamente biológicos, instrumentais ou estéticos no comportamento humano.
Ao corpo se aplicam sentimentos, discursos e práticas que estão na base de nossa vida social. Por sua vez, o corpo é
emblemático de processos sociais. Neste sentido, o estudo do corpo torna-se imprescindível não só para especialistas das áreas
biomédicas como para os cientistas sociais.
Para os especialistas da área da saúde, a importância deste estudo concentra-se no fato de que o corpo é o depositário de
processos biológicos indicadores de saúde ou doença para o indivíduo.

06 – O corpo é o espaço da doença. O que são sinais ou signos para a autora?


Foucault (1980), em O Nascimento da Clínica, nos mostra como o corpo, sendo espaço de doença, torna-se um texto
passível de diferentes leituras em busca de significados tanto para o doente, no processo de desencadear sintomas, como para o
clínico, quando persegue sinais, indícios, ao examinar o corpo do outro, o doente, e encontra assim as formas visíveis da doença.

A capacidade de pensar, exprimir e identificar estas mensagens corporais está ligada a uma leitura que procura determinada
significação. Esta leitura está na dependência direta da representação de corpo e de doença vigente em cada grupo. Neste sentido, o
corpo pode ser tomado como um suporte de signos, ou seja, suporte de qualquer fenômeno gerador de significação e sentido.
Um paciente entende o que é intestino preso, mas não constipação.
Desta maneira, pode-se pensar na ideia de corpo como signo se tomarmos aqui o conceito de signo utilizado por Barthes
(1971). Para este autor, a função do signo é comunicar ideias por intermédio de mensagens, ou seja, o signo tem o objetivo de
transmitir uma informação, fazendo parte assim de um processo de comunicação.
O signo só tem valor enquanto tal se compartilhado pelo grupo social.

06 – A noção de saúde e doença é também uma construção social. O que são sintomas e sinais?
"Sintoma é a sensação subjetiva referida pelo doente como dor, ansiedade, mal-estar, alucinações, sensação de vertigem,
etc. É um fenômeno só por ele sentido e que o médico, ordinariamente, não percebe nem lhe é fácil comprovar, sendo revelado
apenas pela anamnese ou interrogatório.
Sinal é a manifestação objetiva da doença, física ou química, diretamente observada pelo médico ou por ele provocada,
como tosse, alterações da cor da pele, ruídos anormais do coração, convulsões..."(Romeiro, 1980:3)
O estudo dos sintomas e sinais diz respeito à semiologia médica, uma disciplina no campo da medicina destinada ao estudo
dos métodos e procedimentos do exame clínico, de modo a buscar o corpo como gerador de signos, da mesma forma que a
semiologia geral preocupa-se com a linguagem enquanto geradora de signos. É na procura dos sintomas e sinais que o médico
coordena todos os elementos para construir o diagnóstico e deduzir o prognóstico.
07 – A história do sintoma e do sinal?
Segundo Foucault, o destaque ao sintoma como a única forma de acesso à doença no sentido hipocrático perdura até o século XVIII.
Para ele, com o advento da clínica anátomo-patológica há uma reformulação do saber, onde a semiologia médica passa a ser um
conjunto de técnicas que permite aliar a leitura dos sintomas com a pesquisa dos sinais onde entram em jogo a escuta e o olfato,
além do olhar já existente. Com o advento da patologia, como campo institucionalizado de conhecimento, o acesso à doença tornou-
se visível.
Com isto, não é mais uma determinada patologia que se insere no corpo, mas é o próprio corpo que se torna doente. Em
consequência disto, como foi dito, há uma reformulação do saber, onde a semiologia médica passa a ser um conjunto sistematizado
de técnicas e, legitimado como uma área específica do conhecimento científico, permite aliar a leitura dos sintomas com a pesquisa
dos sinais. Foucault refere que daí decorre que cada órgão dos sentidos do clínico recebe uma função instrumental, onde a visão, o
tato e a audição fazem com que um mal inacessível seja trazido à superfície, sendo deixado à mostra. Os sinais visíveis para o
médico englobam desde a expressão facial, a marcha, a postura corporal e tudo o que recobre o tecido da pele e membranas.

08 – Medicina: a doença do olhar.


Assim, para Foucault, a medicina é uma ciência do olhar, que se desdobra com o advento da anatomia patológica. Quando o
médico observa, com todos os seus sentidos, há uma especificidade do olhar que lhe confere um saber distinto. No entanto, este
saber não é absoluto nem universal. A anatomia e a fisiologia do corpo só se tornam significativas a partir das regras e códigos dos
grupos.
Mas como é que o próprio doente lê estas sensações de doença? Muitos estudos destacam que as representações que os
indivíduos possuem a respeito de doença estão diretamente relacionadas com os usos sociais do corpo em seu estado normal.
Assim, qualquer alteração na qualidade de vida, como por exemplo, quando o indivíduo não consegue trabalhar, comer, dormir ou
realizar qualquer outra atividade que habitualmente está acostumado, implica estar doente.

09 – O que é estar doente segundo as pessoas da Lomba do Pinheiro?


Os relatos confirmam a noção de que qualquer prejuízo às atividades normais é considerado um estado doentio que é percebido por
sensações desagradáveis: cansaço, fraqueza, dor, mal-estar..., ou seja, percebidos como sintomas. Pode-se dizer sem dúvida
alguma que a percepção do estado de doença quase sempre se traduz em sintomas. Em todos os relatos um sintoma está sempre
presente: a dor. Também no consultório médico esta sensação é a mais frequentemente relatada pelo paciente como indicação de
doença e é inclusive o principal motivo de consulta. Devido a esta recorrência, desenvolverei um pouco mais sobre o que está
envolvido na representação de dor.

DOR, UMA SENSAÇÃO PECULIAR

10 – O que é a dor?
A dor é uma experiência subjetiva, privada e qualquer informação sobre ela há de provir apenas daquele que a sente. Talvez o fato de
ser difícil descrevê-la faz com que recorramos constantemente a imagens e metáforas para representá-la, como por exemplo:
"facadas", "pontadas" e "agulhadas", o que abordarei mais adiante. Para Joana, de 45 anos e dona-de-casa, a dor é "sinal de que
alguma coisa está errada no organismo, dor é sofrimento".
Do ponto de vista clínico, a dor exerce um papel fundamental ao demonstrar que algo não vai bem no organismo. Se a
maioria dos males corporais são acompanhados de dor, ela é um importante fator diagnóstico para o médico, e o fato de indicar ao
indivíduo a ocorrência de alguma alteração em seu corpo a faz ser um mecanismo de proteção do organismo.

11 – Nem sempre a dor indica enfermidade. Explique.


Nem sempre, no entanto, a dor é indicativa de enfermidade, já que ela pode estar presente em fenômenos biológicos normais, como
por exemplo o parto. Por outro lado, sua ausência também não é indicativo de silêncio orgânico, uma vez que certos tumores
malignos, por exemplo, podem evoluir por algum tempo sem provocar dor alguma.
Paradoxalmente, a dor pode se fazer presente em procedimentos de cura e diagnóstico como as operações cirúrgicas, injeções e
biópsias.

12 – A dor como caráter público e privado


Para ele, a dor é por excelência um dado privado, onde para se saber que uma pessoa tem dor é necessário que ela nos assinale,
quer verbalmente ou não. Mas em algumas sociedades a dor pode assumir um caráter público. É o caso de algumas culturas onde a
exibição da dor faz parte dos rituais de passagem dos meninos à idade adulta, ou em rituais de autotortura que visam angariar
prestígio social. Clastres (1978) igualmente nos fornece vários exemplos de sociedades primitivas onde a tortura é a essência do rito
de iniciação.
Barthes (1985) nos mostra como a dor pública também surge nas sociedades modernas. O exemplo que ele nos oferece é o catch,
que corresponde à luta livre no Brasil. Barthes se refere ao catch não como a um esporte, mas como a um espetáculo, o "espetáculo
do sofrimento".
13 – Classe social e percepção da dor.
A percepção de dor varia conforme o grupo social. Segundo ele, a percepção da dor como doença grave aumenta nas classes
superiores em relação às baixas. A observação nos mostra, no entanto, que não é a percepção da dor que varia conforme a classe,
mas sim a continuidade das atividades e a busca de alívio para a mesma.
Luis, de 43 anos, por exemplo, é operário e veio à consulta com dor abdominal que persistia há um mês, a despeito de chás caseiros
ou analgésicos indicados pelo farmacêutico. Referiu a dificuldade de buscar auxílio médico, uma vez que isto implicaria faltar ao
trabalho, o que resultaria na perda do rancho mensal, somente fornecido ao trabalhador assíduo. Este é apenas um exemplo de como
é frequente o fato de que muitos representantes das classes populares persistam no trabalho mesmo com dor, e talvez por este
mesmo motivo busquem menos auxílio médico, não significando que não lancem mão de outros recursos, como medicina caseira ou
benzedeiras.

14 – O mascaramento da dor.
Já um tumor indolor, que para o médico é um indício de uma possível patologia, pode ser desprezado pelo paciente simplesmente
"porque não dói". Por outro lado, uma dor torácica é logo relacionada com a hipótese de uma patologia cardíaca, o que faz com que
muitas vezes o indivíduo recorra a vários serviços de saúde c exija uma série de exames subsidiários a fim de se tranquilizar. Em
outros casos a dor é considerada um fenômeno normal, não implicando o sentimento de estar doente. O caso mais típico é a
dismenorréia , onde esta sensação diz respeito à representação de corpo feminino, em que este fenômeno é encarado como fazendo
parte da vida da mulher. Do ponto de vista estatístico, as dores mais comuns que aparecem na consulta médica são a dor de cabeça
e a dor abdominal.

15 – As dores marcantes.
Sabe-se pela literatura médica e pela experiência clínica que as dores mais intensas que podem atingir o ser humano são as
provocadas pelo infarto do miocárdio e as cólicas renais. Entre as dores crônicas se destacam as dores reumáticas e o câncer.
Nestes casos, a dor como sensação crônica passa a ser uma moléstia em si mesma, uma entidade própria, como diz Emilia, minha
informante, ao comentar o caso de sua amiga que está com câncer e combatendo a dor à base de sedativos potentes: "Ela não se
queixa de dor por causa dos remédios fortes que eles dão, mas a dor tá aí."

16 – A violência e a dor.
As associações como "facadas", "agulhadas", "socos", são frequentes, representando a dor como forma de agressão, como algo
socialmente identificado como violento, uma vez que a violência está plenamente inserida neste contexo social. As pessoas vivem ou
viverão esta experiência, seja como vítima ou como autor, onde a violência não se restringe somente ao crime, mas também ao
desemprego, à falta de moradia, a condições de trabalho insalubres, só para citar algumas. Particularmente, para os moradores da
Lomba do Pinheiro a violência faz parte do seu cotidiano. Além das baixas condições socioeconômicas da maioria dos moradores, os
crimes são frequentes, o que faz o bairro ser identificado como violento pela população em geral. Há gangues que se reconhecem
pelas siglas: VIP (Violência Integrada do Pinheiro), D.P. (Demônios da Pinheiro), G.F. (Gangue da Firmina), cujos nomes são por si só
significativos.

17 – Indissociabilidade dor e morte


Estes relatos demonstram a dor associada à tristeza e ao sofrimento intenso, o que inclusive faz Marli ao associar com uma doença
mais grave, o câncer. No senso comum, este vocábulo, "câncer", está intimamente associado à ideia de dor e morte. Sontag (1984)
refere-se que sempre se atribui que o câncer é extremamente doloroso e que dele advém uma "morte horrível". Isto Marli demonstra
ao ilustrar o sentimento que ambos, a dor e a doença, lhe trazem: o desespero diante da iminência do sofrimento, onde está implícito
o medo da morte. Pode-se ir mais longe e dizer que dor e morte são indissociáveis, à medida que dor está para doença assim como a
doença está para a morte. Foucault (1980) já dizia que "não é porque caiu doente que o homem morre; é fundamentalmente porque
pode morrer que o homem adoece." É este medo da morte que faz com que a dor seja muitas vezes valorizada, a despeito do
sofrimento que dela pode advir. Este paradoxo entre a valorização da dor e do sofrimento se justifica a fim de se evitar a doença e
sua consequência última, a morte, que parece ser o sofrimento maior.

18 – Tempo da dor
Assim, observamos como a dor tem o seu tempo de aparecimento e de término, que neste caso coincide com o fim da vida.
Entretanto, esta categoria de tempo da dor não se exprime somente em termos de início e de término, como também em termos de
sua duração, uma vez que tanto a dor como qualquer outra sensação desagradável é experienciada como um tempo longo. Um
exemplo claro disto é quando tivemos poucas horas de insônia à noite e temos a sensação de que estivemos despertos a noite
inteira.
19 – A dor e sua localização
Ainda sobre os relatos acima, podemos concordar com Boltanski (1984), que classifica as características da dor conforme a sua
localização. De acordo com este autor, as dores torácicas são referidas como puntiformes e as dores abdominais como esfenoidais,
por exemplo. Isto condiz com as falas de Luciana e Zilma, que se referem à sua dor no peito como "pontadas", e Miriam e Elza, que
sentem dor abdominal como se estivessem "torcendo" seus órgãos internos, o que corresponde ao que o autor chama de "dor
esfenoidal". A sensação de "bola na barriga" é muito comum para descrever as dores abdominais e dizem respeito à sensação
desagradável de um volume anormal no abdômem e com a ideia implícita de algo não digerido.

20 – A sensação quente e frio.


A dor também pode representar categorias de quente-frio e de diferentes estados de matéria, pois estas são experiências familiares
ao indivíduo. Isto é, o quente e o frio são sensações comuns em nosso cotidiano e só se tornam um estímulo doloroso quando em
excesso. Através de nossa própria experiência sabemos como um contato com um objeto extremamente aquecido ou resfriado pode
nos causar dor. É esta sensação que tanto Sílvia como Marlene querem transmitir nos seguintes relatos:
"Parece que escorre um líquido quente aqui na nuca." (Sílvia, 43 anos, doméstica)
"Tenho uma dor no umbigo por dentro, parece que corre uma água gelada." (Marlene, 43 anos, dona-de-casa)

21 – A dor líquida e a dor sólida


No sentido contrário, a dor também pode dar a sensação de ser "sólida". É o caso dos depoimentos já citados acima, de sentimentos
de "bola na barriga", "algodão na barriga" ou "bicho que come".

22 – A dor e a trajetória.
A dor também é percebida como seguindo uma trajetória própria pelo corpo:
"Tenho uma dor que começa no lado do umbigo, bem no ovário, e que vem morrer na perna." (Dione, 31 anos, dona-de-casa)
"A dor que eu tenho começa no ouvido esquerdo e caminha para o lado direito e vai até a perna. É uma eletricidade." (Francisco, 61
anos, dona-de-casa)
A possibilidade de um percurso da dor com início em determinado ponto, indo findar em outro, indica a autonomia desta. A própria
ideia da dor como eletricidade referida por Francisca nos mostra como a dor pode ser percebida como dotada de energia própria,
como um agente poderoso e interruptor do estado de harmonia e da ideia de uma suposta inércia do corpo, do silêncio orgânico
significativo de saúde.

23 – A dor de caráter moral


Em outras situações, para a dor são atribuídas qualidades de caráter moral, sempre capaz de produzir sensações, como por exemplo:
"Tenho uma dorzinha enjoada, às vezes incha dos lado, às vezes no estômago." (Aristides, 78 anos, aposentado) Para Aristides, a
dor enjoada, além da ideia de persistência, isto é, de sua dimensão temporal, significa o caráter de como esta dor lhe causa irritação e
cansaço.

24 – A dor como punição.


"Por que eu?", "O que fiz para merecê-la?", "Por que agora?". Segundo Helman (1984), nas sociedades não-ocidentais é mais direta
esta ligação entre dor física e sofrimento moral, em comparação com as sociedades ocidentais. Nestes casos, muitas vezes a dor
inclui ter uma etiologia como punição divina ou bruxaria, o que demanda tratamentos específicos tais como: orações, penitências ou
exorcismo, onde drogas analgésicas mostram-se insatisfatórias, não se conhecendo plenamente os mecanismos psicológicos
envolvidos.

25 – Conclusão
Muito mais pode ser dito sobre a dor. Nesta breve exposição tentei demonstrar como a percepção e o relato a respeito da dor são
influenciados por vários elementos. São eles a vivência cultural do doente, o seu repertório linguístico, o seu domínio (ou não) de
termos médicos, as suas crenças e representações sobre corpo e doença, as suas experiências individuais em geral, e suas
experiências c sua memória específica quanto à sensação de dor.

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