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Ética Argumentativa: O arcabouço filosófico e a dedução da ética de

propriedade!
Autor: Daniel Miorim de Morais
Co-Autor: Renan Leonardi da Silva
André Folloni em seu artigo A FILOSOFIA TRANSCENDENTAL PRAGMÁTICA
DE KARL-OTTO APEL E SUA CONTRIBUIÇÃO PARA A DEFINIÇÃO DO
PAPEL CONTEMPORÂNEO DA CIÊNCIA DO DIREITO para o periódico Publica
Direito em 2013, explicita o argumento de um grande autor; Karl Otto Apel.
Depois de Heidegger e Nietzsche, a filosofia parecia ter perdido sua base mais
elementar. A da metafísica. As coisas deveriam ser reformuladas. Kant havia
sido derrotado em campo de batalha, primeiro pelos niilistas e depois por
Nietzsche. A razão instrumental se encontrava perdida. Os questionamentos
básicos precisavam ser refeitos.

"A Filosofia transcendental, em sentindo kantiano, ultrapassa as


considerações a respeito do que é para buscar as condições que
possibilitam o entendimento, na virada da ontologia para a
consciência do sujeito. Kant compreende transcendentalmente
a Filosofia, e busca definir quais as condições do sujeito,
pensado como certa abstração do mundo concreto no qual
desde sempre se insere, da intersubjetividade, das paixões, das
pulsões. Essa vida, porém, torna-se inviável a partir de
Nietzsche. Apel propõe-se recuperar a transcendentalidade
como tarefa própria da Filosofia. Se cabe à Filosofia ser crítica,
é preciso, antes, delimitar os pressupostos diante dos quais a
crítica é possível. (2000a, p. 22)."
A primeira coisa a entender é que Apel é um crítico. Um percursor da razão crítica
que dá origem a escola de Frankfurt de pensamento. Cria-se aqui um confronto.
Kant é um não cognitivista, acredita que somente através da razão instrumental,
da razão sem juízos, é possível alcançar um comportamento ético. Ou seja, ele
diz que a verdade se revela e não cria um ambiente de verdadeiro e falso ético.
Se usarmos a proposição não cognitivista kantiana, basta que a razão humana
chegue a um raciocínio verdadeiro simultaneamente ao kantiano que os dois
possuem igual valor verdade.

Ora, se a ética é objetiva, como pode ela ter dois raciocínios igualmente
corretos? Duas ações que são igualmente éticas embora diversas diante de uma
mesma situação, em que para kantianos, ela é antiética e para o outro escopo
ético, ela é ética, como ela poderia ser resolvida? Isso significa que esse não é
o caminho para uma ética universal. Deve-se encontrar um denominador mínimo
para o alcance da razão. Essa é uma proposição apelliana que Habermas herda
e Hoppe utiliza sabiamente. Kantianos não podem ser considerados como
propositores éticos válidos, eis que incapazes de limitarem a verdade a um
caminho único. Sobre a premissa inicial que advém de Nietzsche e Heidegger e
da qual Apel utiliza de plataforma.

"O papel de fornecer uma fundamentação última, portanto, não


cabe à Ciência. Era da metafísica, mas também deixou de sê-lo
quando a própria metafísica implodiu. Sem poder voltar à
metafísica e sem poder confiar na Ciência, a tarefa de uma
fundamentação última ficou abandonada, e deu espaço ao
relativismo, ao decisionismo e ao ceticismo. O declínio da
metafísica, e a auto compreensão da Ciência como impotente
para oferecer uma fundamentação última, levou à relativização
ética. Isso angustia APEL, descrito como um racionalista e um
ético de rara sensibilidade, dotado de forte senso de
responsabilidade histórica (DUSSEL, 2002, p. 182). Para APEL,
a fundamentação última filosófica não é só necessária: ela é
urgente (1993, p. 309). E é urgente diante da situação
socioeconômica e ambiental contemporânea, em que o
progresso da técnica e a avaloratividade da Ciência podem levar
à destruição da espécie humana (1994b, p. 160)"
Esse texto demonstra ativamente de que forma Apel se sentia incomodado
profundamente com o relativismo ético a qual a metafísica foi submetida. Bem,
a busca de Apel era uma busca muito complexa. Qual era o elemento a priori da
qual todos os indivíduos poderiam ser lidos? Qual era o elemento fundamental
para encontrar uma ética comum e realmente universal? Apel se apropria então
da linguagem. Diferente da consciência, Apel decide que da linguagem seria
possível fazer a construção de forma pragmática, eis que necessariamente
comum a todos os homens e necessariamente elemento a priori da compreensão
humana. A consciência, a razão instrumental, elas obrigatoriamente não
possuem elo comum universal, senão seria dado a todos chegar nas mesmas
conclusões racionais e impossível seriam a adoção de éticas paralelas.

"Contra esse ceticismo, a Filosofia apelliana assume a


pretensão e a tarefa de enunciar um a priori necessário, que
nenhum argumento poderá deixar de levar em consideração,
sob pena de desautorizar-se enquanto argumento válido. Se
essa tarefa não pode ser científica, nem metafísica, deve ficar a
cargo da Filosofia – mas de uma Filosofia diferente, pós-
metafísica. Uma nova Filosofia, reaproximada da
fundamentação prática do saber, inclusive do científico, deverá
ser tentada. O caminho, para APEL, é a consideração da
linguagem: o filósofo incorpora, à Filosofia transcendental
kantiana, a pragmática e a intersubjetividade linguística
enquanto um constitutivo originário do ser no mundo e do
interpretá-lo (SANTUÁRIO, 2005, p. 155). Assim, a
transformação da Filosofia em APEL é, fundamentalmente, a
metamorfose da Filosofia transcendental kantiana, de uma
Filosofia da consciência para uma Filosofia pragmática da
linguagem, uma pragmática transcendental da linguagem que
depende da inserção originária intramundana e da pragmática
linguística (2004, p. 260)."
Aqui, temos então algumas considerações apellianas a serem feitas. A primeira
consideração apelliana é a concepção tirada de Heidegger de que somos seres
no mundo e encaramos o mundo e fazemos ativamente parte dele como
pessoas. Daí ele considera que para argumentar, é necessário reconhecer
alguns pressupostos argumentativos básicos.

"Se somos em linguagem, e se, por isso, somos sempre “com”,


em comunidade, então estamos, desde sempre e para sempre,
inseridos em uma comunidade de comunicação. Toda
construção sintática ou semântica depende, em última análise,
do entendimento mútuo. Por isso, APEL destaca a inviabilidade
da análise linguística que olvida o uso concreto da linguagem:
se a resposta, a respeito da verdade empírica de uma
proposição, depende de um acordo mútuo acerca do sentido,
então depende também da consideração da utilização concreta
da linguagem, inclusive a científica".
A análise de uma comunidade comunicativa da qual todos fazemos parte. E na
qual se amparam as proposições filosóficas de mundo.

E tendo em vista que, se ignorarmos essa comunidade comunicativa,


obrigatoriamente estamos ignorando o pressuposto ético mais básico; O de criar
um comportamento humano universal que leve em conta o Homem como ser
racional e capaz de escolhas. Se o ambiente no qual faz escolhas e é escolhido,
não é levado em consideração como propositor, ele obrigatoriamente chegará a
uma conclusão incorreta no mundo pragmático. Nosso grande mestre Apel,
entretanto, teve desafios, como o famoso e divertido mito do dado searleano que
na época tinha o corpo de trilema de Münchhausen. Que basicamente dizia que
a toda fundamentação deve se preceder outra. Ou seja, como fundamentar as
proposições éticas? Qual o mínimo do qual vai partir para dizer quando é que
estamos obedecendo os pressupostos argumentativas racionais? Do que é
composto o a priori argumentativo afinal? Qual a última fundamentação possível
para o analisar argumentativo? Apel afirma que sob os pressupostos do conceito
científico de racionalidade, descabe qualquer tentativa de fundamentação. Ou
seja, os elementos de análise da razão obrigatoriamente têm um limite no
conceito científico da mesma. Não há como regredir mais do que isso.

"Para APEL, pensada pragmaticamente, a fundamentação


propriamente filosófica escapa do trilema. Pragmaticamente, a
argumentação pressupõe que pode ser tida como verdadeira,
ou, pelo menos, como convincente, por seus destinatários.
Pragmaticamente, todo aquele que argumenta, argumenta no
interior de uma comunidade de comunicação, diante de outros,
e pretende que esses outros possam concordar com seus
argumentos – ou, minimamente, compreendê-los. Nenhuma
argumentação é solitária. A própria refutação de uma teoria
científica depende de que se tenha por válida certa
argumentação. Nesse sentido, explica APEL, tendo em conta a
seleção darwiniana de teorias científicas: “O fato da falsificação
de uma teoria não é espontâneo como, por exemplo, a extinção
de uma espécie, mas ela deve ser primeiro aceita por nós como
tal com base em argumentos, portanto, fundamentações” (1993,
p. 310). Quem argumenta, faz em nome da verdade, e procura
convencer os outros de seu acerto. Isso pressupõe,
necessariamente, a aceitação de algo como uma pretensão de
verdade, e o que isso significa. A ideia de verdade é pressuposta
até da argumentação que a nega, ao pretender-se verdadeira."
Chamo atenção a todos aqueles aos quais até agora fizeram proposições
insanas no sentido da argumentação solitária. Eles estão fundamentalmente
errados. A filosofia apelliana nega veementemente a possibilidade da
argumentação solitária, eis que a argumentação pressupõe a busca da verdade.
Reconhecemos o mundo então de forma pragmática. Ou algo possui valor
verdade, ou algo é falso. Mas analisamos o falso justamente em contraponto ao
verdadeiro. Então qualquer proposição pressuporá outra proposição também
feita e que tomou a si os ares de verdadeira e que é externa ao indivíduo que
está argumentando. Quando um indivíduo agora disser que Hoppe não
considera a argumentação individual e, portanto, está errada, vocês saberão que
esse ser definitivamente não conhece a pragmática apelliana.

Os seguintes são os pressupostos do à priori argumentativo:

“A existência de algo como verdade, diferente da falsidade; A


existência de proposições que podem ser tidas por verdadeiras;
a existência de proposições a respeito das quais pode haver
concordância intersubjetiva; a existência de uma comunidade de
comunicação, na qual tal concordância pode ou não se dar; e,
por fim, certas regras que funcionam como condição normativa
da possibilidade de discussão: o reconhecimento do outro como
um igual falante e a não violência no uso do argumento.”

"Esses pressupostos, enunciados por APEL como necessários


a qualquer argumentação, estão postos a priori da própria
argumentação. É porque eles sempre estão pressupostos que
toda argumentação é possível. Eles estão desde sempre
subjacentes a toda e qualquer argumentação. Mesmo
argumentar contra esses princípios é algo que não se pode fazer
sem os pressupor. Quem argumenta contra esses princípios, cai
em “contradição performativa” ou “contradição pragmática”.
Esses são os requisitos apellianos. Toda e qualquer análise do a priori
argumentativo que não tenha como requisitos básicos esses elementos,
obrigatoriamente é uma falha de percurso que desconsidera a própria filosofia
transcendental pragmática. Continuando, pelo último trecho, temos a introdução
da contradição performativa. Essa contradição performativa é a que vai
acontecer depois ao argumentar-se contra a EA. O que Hoppe faz é acrescentar
o elemento de auto propriedade que ele vai extrair do mundo da vida
habermasiano para fazer funcionar. Mas o que aqui já precisa ficar claro (porque
depois vamos falar de Habermas) é que o a priori argumentativo é o que força a
contradição performativa, não a auto propriedade. Ele é o arcabouço real da
contradição performativa. Embora exista uma contradição física performativa
evidente no não reconhecer da auto propriedade.

"O conceito de contradição pragmática ou performativa está


entre os mais importantes e fundamentais da Filosofia de Karl-
Otto APEL. Ele baseia-se na diferença pragmática entre o ato
de falar e o conteúdo falado; entre a parcela performativa e a
parcela proposicional do falar humano. Então, é uma
contradição que não decorre da relação sintática das
proposições entre si, ou da contradição semântica entre as
proposições e seu referente exterior à linguagem. Resulta, sim,
da incoerência entre o que é dito e o contexto pragmático no
qual aquilo é enunciado. Dá-se contradição performativa sempre
que alguém tenta negar, com seu desempenho, o que
implicitamente precisa aceitar para poder ter tal performance.
Assim, todo aquele que nega os pressupostos de APEL, ao fazê-
lo, argumenta. Se argumenta, pressupõe que pode ter razão,
que pode estar com a verdade, que pode atingir consenso, que
seu argumento pode ser melhor que o argumento contrário, que
pode ser bem compreendido. Pressupõe, portanto, que há uma
comunidade de usuários da mesma linguagem capazes de
compreendê-lo. Ou seja: é impossível argumentar contra esses
pressupostos sem aceitá-los."
E aqui a gente tem a explicação do transcendental nos conceitos apellianos:

"O filósofo encontra a transcendentalidade da Filosofia não mais


na pergunta sobre as condições de possibilidade de
conhecimento, sempre inscritas a priori no sujeito kantiano, mas
sobre as condições de produção de sentidos válidos na
comunidade intersubjetiva de sujeitos, que sempre estão em
mútua comunicação. "
Não se trata de um transcendental individual, mas um transcendental humano.
Que decorre justamente do enxergar da comunidade proposicional.

"O esforço de APEL, para, no âmbito do trabalho filosófico,


encontrar as condições reflexivas de possibilidade de toda
argumentação, condições pressupostas em uma comunidade
ideal e contra fática de comunicação, não permite encontrar
nenhum critério fenomenológico ou de correspondência, em
sentido tarskiano, para possibilitar seja verificada a verdade de
determinado conhecimento. Seu sentido é outro: é normativo.
Ela projeta critérios normativos para um consenso
intersubjetivamente válido, embora falível e provisório.
Prescreve critérios que, caso observados e na medida do
possível, garantem validade a um discurso com pretensões de
racionalidade. A fundamentação última é desses critérios
filosóficos e reflexivos de validade do consenso, isto é, das
condições de possibilidade de todo conhecimento
intersubjetivamente válido, e não de uma verdade dogmática
definitiva. Esse discurso válido, no entanto, está sempre sujeito
à superação por outro discurso que, praticado dentro das
mesmas regras, revele algo ainda não pensado, no plano do
argumento, ou não percebido empiricamente pela comunidade
real de comunicação. Assim, se a prova empírica refuta
determinada teoria, a aceitação dessa refutação imporá,
pragmaticamente, falsidade à teoria. Assim, Filosofia e
condições científicas de verdade convivem, cada um exercendo
a tarefa que lhe é própria."
Temos aqui então o momento em que abandonamos a Apel por ter sido
superado por seu pupilo Habermas. Apel diz que o consenso é provisório. Que
as proposições possuem cunho normativo e reflexivo, mas podem ser
substituídas por novas proposições que respeitem o a priori argumentativo e
coloquem novos elementos para dentro da análise ética plausível.
"De acordo com o filósofo, contudo, a ética do discurso não
subsiste com apenas um plano de fundamentação reflexivo-
transcendental das condições filosóficas da fundamentação de
normas. Ela precisa, ainda, levar em conta o que APEL chama
de “fundamentação concreta” das normas éticas. Não só as
normas pragmático-transcendentais são suficientes: as normas
éticas para cada situação concreta vão além das normas
enquanto condição de possibilidade do discurso. Estas são
obtidas reflexivamente como a priori da própria argumentação.
Aquelas normas concretas, situacionais, diferentemente, são
obtidas a posteriori, no âmbito da argumentação racional levada
a efeito de acordo com as normas apriorísticas. "

"Isso depende de que a norma seja obtida em uma situação


argumentativa na qual as regras reflexivo-transcendentais e
empírico-científicas tenham sido respeitadas, e à medida desse
respeito. Essa racionalidade não significa definitividade: o
conhecimento base para a enunciação de normas éticas
racionais é falível, e está, provisoriamente, corroborado,
enquanto não sobrevier um argumento melhor, que abale o
consenso e possa impelir os argumentantes na busca por um
conhecimento melhor. "
Essas proposições então substituiriam as antigas por quebra pragmática de
sentido e se tornariam o mais perto da verdade para a dada comunidade. Mas,
isso sendo verdade, inevitavelmente teríamos uma verdade ética não
permanente! É aí que entramos no nosso segundo, dos 4 autores que aqui serão
analisados, Habermas.

Continuamos nossa trajetória, analisamos o A ética do discurso em


Habermas

Aqui nós temos fundamentalmente dois conceitos dos quais iremos nos usar, a
ética do discurso e o Lebenswelt com seu mundo da vida habermasiano. Sobre
o Lebenswelt, eu usarei de um texto do João Victor Aragão que de tudo disse:

"O "Lebenswelt" possui várias formulações; embora Husserl


tenha sido o primeiro a cunhar esse termo no "A Crise das
Ciências Europeias e a Fenomenologia Transcendental",
houveram versões do mesmo conceito em Merleau-Ponty e em
Juergen Habermas. Acredito que para esse post o último talvez
seja mais pertinente.

Habermas entende o Lebenswelt como um conjunto de


parâmetros (sejam eles crenças, critérios, valores, definições,
etc.) compartilhados entre falantes que serve de pano de fundo
para sua comunicação. Esses "parâmetros" devem, segundo
ele, ser destituídos de controvérsia, possuindo como
característica não serem passíveis de problematização. O
Lebenswelt ainda pode ser entendido possuindo uma dimensão
sociológica, no sentido de que opera como uma contraposição
as formas institucionalizadas da sociedade, correspondendo a
cultura, personalidade e sociedade, e tudo o que derivar deles.

A ideia do Lebenswelt é corresponder a um acerco de


concordâncias, ao que constituem os mecanismos aos quais os
agentes sociais podem recorrer quando encontrarem em
desacordo sobre aspectos internos da sociedade, funcionando
como um ponto-pacífico entre interlocutores, onde estes
reconhecem determinados consensos sobre a utilização da
comunicação linguística para determinarem as resoluções de
suas práticas sociais. Aqui o mundo-da-vida possui uma
conotação pragmática-linguística.

A respeito da sua existência, eu vou colocar de uma maneira


condicional.

"Se você parte da inevitabilidade da argumentação e da


comunicação humanas para provas a existência de seus
pressupostos necessários, então a resposta é verdadeira"."
O que precisamos ter em mente é que para Habermas, todos possuem
racionalidade. Existe um conceito de universalidade racional comunicativa. O
único elemento em comum é a possibilidade de discordância racional entre
indivíduos. Ele difere o mundo em duas grandes etapas racionais. A esfera
pública e a esfera privada. A esfera pública é a esfera na qual a ação per si se
dá, mas a esfera privada é a esfera na qual a ação é decidida e escolhida, intuída
por si só. Para entender a ação que se dá na percepção empírica, retornamos
ao mundo da vida e analisamos sua ação na esfera privada através de elementos
que podem vir a pertencer a comunicação de qualquer indivíduo. Veja bem,
diferente da análise apriorística da coisa, que é essencialmente individual, nós
temos uma "espécie de" análise apriorística de cunho coletivo, que se dá no
mundo da vida. Nesse mundo da vida, elementos podem ser identificados e
entregues a discussão como elementos do apriorismo argumentativo. É daí que
vem a tal da auto propriedade. Que iremos usar lá na frente para compor a ética
argumentativa. É justamente da formulação da concepção de um arcabouço
universal comum que se dá o percebimento da auto propriedade.

Avançando. Temos então a difícil missão de Habermas de em uma só tacada,


não apenas amparar-se em Apel para fazer uma ética que entregasse
normatividade, mas tornar ela uma ética universal e permanente. Para isso,
Habermas precisou pensar e refletir sobre os elementos essenciais das éticas
que já existiam, como a ética kantiana per si. Ele percebeu que uma proposição
para ser ética precisava possuir, validade, verdade e legitimidade. Dessa
legitimidade, temos o remover completo da análise indutiva e dedutiva, eis que
a percepção moral por ser subjetiva, não poderia resultar em uma proposição
legitima, eis que diversa para cada interlocutor, ou seja, dependendo daquele
que está fazendo a dedução/indução, chegaríamos em proposições diversas.
Ele define então que uma proposição só pode ser legitima se for universal.

Sobre o artigo do Nicholas Ferreira (Breves comentários sobre a Ética


Argumentativa Hoppeana).

"Uma vez que o reconhecimento mútuo do direito de


controle exclusivo sobre o próprio corpo é uma condição
praxeológica necessária para a atividade argumentativa, esta
defesa da ética seria transcendental, já que para negá-la, seria
necessário assumi-la como correta, o que seria contraditório,
como afirmar que se está morto (é necessário pressupor que se
está vivo para afirmar que se está morto, uma vez que se fosse
assumido estar morto, o indivíduo sequer agiria). Não entrarei
no mérito da questão sobre esse reconhecimento do direito ser
ou não ser um requisito para a ação argumentativa, pois este
não é o ponto, no momento. Assumirei que sim, tal
reconhecimento é conditio sine qua non da atividade
argumentativa, para os devidos fins. Isto é, é condição
constitutiva da ação argumentativa o reconhecimento, por todas
as partes participantes na argumentação, da norma segundo a
qual os indivíduos têm o direito de controle exclusivo sobre os
próprios corpos, ou seja, o direito de decisão última sobre os
recursos escassos usados primariamente para proporem suas
ideias na argumentação.

No entanto, até agora só podemos concluir exatamente o


que foi dito e nada mais: que o reconhecimento de uma tal
norma é condição necessária para a atividade argumentativa.
Disso não se segue, porém, que tal norma é, de fato, válida.
Quero dizer, verificar que é praxeologicamente necessário
pressupor uma determinada norma como válida (isto é, como
correta, verdadeira, legítima, deontologicamente justa) para
realizar a ação argumentativa não é suficiente nem necessário
para concluir que tal norma é, de fato, válida".
Agora que eu já estou com o conteúdo apelliano e habermasiano evidente aqui
para todos, temos claro que enxergar algo como parte do a priori argumentativo
não existe apenas para prova-lo, mas para derivar daí normatividade. Nós temos
que validade, verdade e legitimidade são os elementos dos quais se amparará
qualquer ética que se pressupor verdade. Temos que o a priori argumentativo
encerra normas a partir do momento. Em que possui corpo demonstrativo, para
Apel, a partir do momento em que você reduzia as proposições a um mínimo
comunicativo e compunha o a priori argumentativo, era impossível debater
contra isso. Ou seja, temos o elemento validade da qual advém a formalidade.
Para Habermas e aí já avançando na exposição, a partir do momento em que
estão contidos todos os pressupostos de validação ética da qual se vale o a priori
argumentativo para proposições morais. O primeiro deles, já lidamos. É o
principio U, que diz que para um determinado método possuir validade, ele
precisa obrigatoriamente possuir universalidade. O segundo deles, é o principio
D, segundo o qual:

"Mas, se as argumentações morais devem produzir um acordo


desse gênero, não basta que um indivíduo reflita se poderia dar
seu assentimento a uma norma. Não basta nem mesmo que
todos os indivíduos, cada um por si, levem a cabo essa reflexão,
para então registrar os seus votos. O que é preciso é, antes,
uma argumentação "real", da qual participem cooperativamente
os concernidos. Só um processo de entendimento mútuo
intersubjetivo pode levar a um acordo que é de natureza
reflexiva; só então os participantes podem saber que eles
chegaram a uma convicção comum".
Vemos daqui que ele coloca um princípio D universal. Onde todos os seres
contidos no debate são partes obrigatórias. Agora então, podemos ir até Hoppe
e entender que o que ele queria fazendo o reconhecimento da auto propriedade
é elevar a auto propriedade como elemento do discurso ideal.

Não se trata de como dito, apenas um requisito formal para a argumentação per
si, mas para o a priori argumentativo que dá origem ao discurso ideal. No qual
as proposições éticas podem ser feitas.

"Tenho total ciência de que não se pode argumentar contra a


validade da norma sem entrar numa contradição performativa,
porém, tal contradição demonstra apenas uma
incompatibilidade entre o que está sendo proposto e uma
preferência subjetiva, contingente, do sujeito argumentador.
Nada disso tem a ver com o valor verdade do que está sendo
proposto, o que demonstrarei na formalização abaixo. "
É basicamente como se o artigo olhasse para os vácuos da ética argumentativa
que são respondidos por Apel e Habermas e dissesse; Hoppe, você está dizendo
que isso é isso, mas porque? Para o leitor atento, sabemos que quem cai em
contradição performativa ignorou a comunidade comunicativa e nosso eu no
mundo, não podendo fazer proposições válidas. E temos que obrigatoriamente
para fazermos proposições válidas, você precisa estar pragmaticamente certo.
Ou seja, temos que se você cai em contradição performativa, você está
necessariamente eticamente incorreto. Agora, a função de Habermas é provar
que ele está certo. Desde já, claro é necessário estar que Hoppe coloca a auto
propriedade no meio dessas duas situações, como elemento do discurso ideal,
logo elemento da busca da verdade e torna outras teorias incapazes de rebater
a ética argumentativa.

Retornando ao curso argumentativo em Habermas

Bem, continuemos em Habermas. Habermas tinha a tarefa de provar que mais


do que estar fundamentalmente não errado, estava certo. Enxergamos até agora
que: Para uma formulação ética, precisamos obrigatoriamente de uma dinâmica
universalizável, temos também que é elemento necessário a participação
obrigatória de todos os indivíduos que irão compor a normatividade, sobre pena
de perca da legitimidade, esses dois conceitos (atrelados a outros elementos e
afins narrados na ação comunicativa) se unem para formar o tal do local ideal de
fala ou discurso ideal. Já sabemos que esses dois elementos irão dar origem a
um discurso ideal de fala necessário para proposições éticas, mas agora vamos
além e falamos das justificações habermasianas, ou seja, sabemos dos
requisitos mínimos entre os indivíduos, mas também uma análise do teor das
justificações.

A primeira coisa que devemos enxergar é a diferença essencial entre o agir


estratégico e o agir comunicativo. Textualmente em Habermas:

"O conceito da ação comunicativa alude a um tipo de ação


(social) mediada pela comunicação. A linguagem é o meio de
comunicação que serve ao entendimento, porém os atores, ao
se entenderem entre si para coordenar suas ações, perseguem,
cada um, uma determinada meta. De modo que não se trata
primariamente de atos de comunicação, mas de um tipo de
interação coordenada mediante atos de fala"
Enquanto o agir estratégico se trata da busca de fazer com que outra pessoa
atue da forma que você considera adequada. Ou seja, enquanto um deles é de
todo kantiano, e está efetivamente tentando perpassar uma norma por cima do
consenso, o agir comunicativo pressupõe consenso em busca de um alcançar
comum.

Sendo assim, ele enumera uma série de enunciados argumentativos que podem
ser utilizados como justificativo, um rol apenas exemplificativo da qual todas as
éticas necessárias precisam se basear.

a) Enunciado descritivo: fundamentar aqui significa demonstrar a existência


de estados de coisas;
b) Enunciado normativo: fundamentar significa demonstrar a aceitabilidade
de normas de ação;
c) Enunciado valorativo ou avaliativo: fundamentação aqui consiste em
demonstrar a preferibilidade de certos valores;
d) Enunciado expressivo: fundamentar significa aqui demonstrar a
transparência na auto-apresentação;
e) Enunciado explicativo: fundamentação consiste aqui na demonstração de
que as expressões simbólicas foram adequadamente geradas.

Essas são as possíveis justificações, que advém de críticas e discursos que


sempre possuem implícito em si a racionalidade na elaboração. Ou seja,
trocando em miúdos, o que temos aqui é que ao agir comunicativamente,
imbuído de racionalidade e utilizar-se de fundamentação, com a finalidade de
substituir a proposição atual tida como verdade por outra proposição, temos uma
justificação, que vai seguir, por via de regra, algum dos nortes encontrados
textualmente em Habermas.

Tudo isso só possível já no discurso ideal de fala. O problema desse discurso


ideal é porque ele se trata apenas de uma suposição e pode perfeitamente ser
abandonado por alguém, não possuindo mensuração prática de análise. Se trata
de uma ética que ampara outras éticas, demonstrando quais são os requisitos e
elementos básicos para a composição de uma ética válida, mas demonstrando
que respeitando todos esses elementos, estamos fazendo proposições éticas.
A Ética em Hoppe

Vamos usar esses 6 artigos, em diferentes níveis para entender o argumento


Hoppeano e como ele se utiliza da normatividade do discurso ideal para
efetivamente se prostrar como elemento ético possível.

 Por que é impossível argumentar contra a propriedade privada sem cair


em autocontradição
 A ética e a economia da propriedade privada
 Ética Argumentativa: quatro objeções respondidas
 A justificativa ética do capitalismo e por que o socialismo é moralmente
indefensável
 O dever transcendental: uma reformulação do argumento hoppeano
 Novas Direções Racionalistas nas Teorias Libertárias do Direito

Essa é a explicação mais curta da ética argumentativa hoppeana que eu


encontrei textualmente em Hoppe.

"Como Osterfeld corretamente percebe, eu dou uma prova


praxeológica para a validade da ética da propriedade privada
essencialmente lockeana. Mais precisamente, eu demonstro
que apenas essa ética pode ser argumentativamente justificada
porque ela é a pressuposição praxeológica da argumentação, e
qualquer proposta ética divergente pode por isso mostrar-se
estar violando a preferência demonstrada. Tal proposta pode ser
levantada, mas seu conteúdo proposicional contradiria a ética
pela qual se teria demonstrado uma preferência em virtude da
própria ação de fazer uma afirmação, i.e., pelo ato de se engajar
numa argumentação. Da mesma forma que alguém pode dizer
“eu sou e sempre serei indiferente quanto a fazer coisas”,
embora essa proposição contradiga o ato de fazer uma
afirmação, o qual revela preferências subjetivas (dizer isso em
vez de dizer outra coisa ou de não dizer nada), propostas éticas
deturpadas são falseadas pela realidade de efetivamente propô-
las."
Prova praxeólogica da validade da ética da propriedade privada essencialmente
lockeana. Isso é importantíssimo de se ter em mente. Novamente, da mesma
forma que vimos em Habermas e Apel, temos que Hoppe não faz novas
proposições, no sentido de criar por si só uma mensuração ética para a
propriedade privada. Diferente disso, ele se apropria da ética de propriedade
privada Lockeana e apenas dá a ela arcabouço dentro do a priori argumentativo
para que ela se torne infalseável. A ética argumentativa não é então por si só
uma nova ética da propriedade privada, mas uma demonstração praxeológica
dentro do a priori argumentativo de uma ética já existente.

"Primeiro, a questão do que é justo ou injusto (ou do que é válido


ou não) apenas surge na medida em que eu e os outros somos
capazes de realizar trocas de proposições – de argumentar. A
questão não surge para uma pedra ou um peixe, porque eles
são incapazes de produzir proposições com reivindicação de
validade. Mas se é assim – e não se pode negá-lo sem se
contradizer, pois não se pode argumentar que não se pode
argumentar -, então qualquer proposta ética, de fato qualquer
proposição, deve ser assumida como reivindicando que pode
ser validada por meios argumentativos e proposicionais. Ao
produzir qualquer proposição, manifestamente ou como um
pensamento interno, demonstra-se a própria preferência pela
vontade de contar com meios argumentativos para convencer a
si ou a outros de alguma coisa. Não existe, portanto, nenhuma
maneira de justificar algo a não ser que seja uma justificação por
meio de trocas proposicionais e argumentos. Deve-se
considerar a derrota final de uma proposta ética se se puder
demonstrar que seu conteúdo é logicamente incompatível com
a reivindicação do proponente de que sua validade pode ser
verificada por meios argumentativos. Demonstrar tal
incompatibilidade equivaleria a uma prova de impossibilidade, e
essa prova é letal no campo da investigação intelectual."
Aqui, Hoppe trata da necessidade do à priori argumentativo como mecanismo
para a formulação de proposições éticas que resolvem conflitos entre recursos
escassos. Ele analisa devidamente que toda e qualquer proposição ética terá o
caráter de justificação contido nas proposições do local ideal de fala
Habermasiano e demonstra então que é impossível argumentar contra essa
proposição, sob pena de estar desrespeitando o a priori argumentativo do qual
se está fazendo uso. Para aqueles que acompanharam até aqui, temos a
"pretensão de validade" conceito habermasiano como o conceito que nos
demonstra que a justificação a qual se refere Hoppe é realmente a Justificação
Habermasiana. Temos aqui então que o conceito validade usado acima é o
elemento chave para a análise hoppeana. Ele está dizendo que se você busca
VALIDADE (e não verdade, como muitos críticos apontam), você precisa
obrigatoriamente recorrer ao a priori argumentativo do qual não pode argumentar
contra sem cair em contradição. Isso precisa ficar muito claro, tendo em vista
que muitos apontam a possibilidade da criação de proposições com valor
verdade em situações de monólogo e afins, quando na verdade, estamos
tratando de proposições com Verdade e Validade que se refere a proposições
com valor verdade e consideração da comunidade comunicativa.

"Segundo, os meios pelos quais uma pessoa demonstra


preferência ao engajar-se numa argumentação são os de
propriedade privada. Obviamente, ninguém poderia propor nada
ou ser convencido de qualquer proposição por meios
argumentativos se o direito de uma pessoa ao uso exclusivo de

seu corpo físico não fosse pressuposto. Além disso, seria


igualmente impossível sustentar a argumentação e contar com
a força proposicional do argumento se não fosse permitido
apropriar outros bens escassos por meio de apropriação
original, colocando-os em uso antes que alguém o fizesse, ou
se tais bens e o direito de controle exclusivo relativo a eles não
fosses definidos em termos físicos objetivos. Se tal direito não
fosse pressuposto, ou se retardatários tivessem reivindicações
legítimas sobre coisas, ou se coisas apropriadas fossem
definidas em termos avaliativos subjetivos, ninguém poderia
sobreviver enquanto uma unidade fisicamente independente de
tomada de decisão; por isso, ninguém poderia jamais levantar
qualquer proposição com reivindicação de validade.

Assim, ao se estar vivo e formular proposições, demonstra-se


que qualquer ética é inválida, a não ser essa da propriedade
privada."
Hoppe ainda expande textualmente:

"A estrutura do meu argumento é esta: (a) uma justificação é


proposicional ou argumentativa (afirmação factual verdadeira a
priori); (b) a argumentação pressupõe o reconhecimento da
ética da propriedade privada (afirmação factual verdadeira a
priori); (c) nenhum desvio de uma ética da propriedade privada
pode ser justificada argumentativamente (afirmação factual
verdadeira a priori)."
No trecho, ele expõe duas coisas que são úteis para a presente análise. Uma
delas é extraída do Lebenswelt que é o fato que é impossível não reconhecer a
si mesmo como elemento do mundo da vida e patrono do direito de uso exclusivo
do corpo, portanto proponente válido do Lebenswelt. Ou seja, o indivíduo precisa
ser pressuposto como um outro dono de si e dono dos elementos físicos e
cognitivos necessários para a formulação da proposição para que haja efetiva
possibilidade de justificação. Sem isso, o entendimento não é possível e sem
entendimento temos a quebra do discurso ideal habermasiano! Mas mais do que
isso, temos a impossibilidade de sequer transformar proposições em
justificações, não podendo nem criar justificações sem escopo ético! Reparem
que isso fica evidente quando ele fala em poder convencer, se tratando
efetivamente do agir comunicativo já tratado acima! Sobre a estrutura da ética
argumentativa temos que, ele não está tentando encerrar uma norma per si, mas
antes demonstrar de forma descritiva e meta-ética que a única forma possível de
ser ético é essencialmente a utilização da ética da propriedade privada, porque
os elementos constitutivos da argumentação que cria justificação, exigem o
respeito dos elementos éticos da ética da propriedade privada e qualquer
tentativa de falsear esse argumento, obrigatoriamente irá cair em contradição
performativa.

Aqui cabe acrescentar algo. Quando se fala de: Justificação, Habermasiana;


Pressupostos do a priori argumentativo, Apel; Ética da propriedade privada,
Locke; Infalseabilidade da contradição por estar usando o próprio elemento da
qual se valerá para contra-argumentar, Mises.

Ética da Propriedade Privada e a Apropriação por Homestead

A primeira coisa que precisa ficar evidente, é que a ética da propriedade privada
parte de um critério lockeano de propriedade que existe no famigerado estado
de natureza lockeano. Vamos falar sobre esses dois critérios lockeanos dos
quais Hoppe possui muito apreço. Estado de natureza e o Homestead.

Textualmente, no Segundo Tratado sobre o Governo Civil, temos Locke:

Um estado em que eles sejam absolutamente livres para decidir


suas ações, dispor de seus bens e de suas pessoas como bem
entenderem, dentro dos limites do direito natural, sem pedir a
autorização de nenhum outro homem nem depender de sua
vontade. Um estado, também, de igualdade, onde a
reciprocidade determina todo o poder e toda a competência,
ninguém tendo mais que os outros; evidentemente, seres
criados da mesma espécie e da mesma condição, que, desde
seu nascimento, desfrutam juntos de todas as vantagens
comuns da natureza e do uso das mesmas faculdades, devem
ainda ser iguais entre si, sem subordinação ou sujeição, a
menos que seu senhor e amo de todos, por alguma declaração
manifesta de sua vontade, tivesse destacado um acima dos
outros e lhe houvesse conferido sem equívoco, por uma
designação evidente e clara, os direitos de um amo e de um
soberano.
E também:
“O “estado de Natureza” é regido por um direito natural que se
impõe a todos, e com respeito à razão, que é este direito, toda
a humanidade aprende que, sendo todos iguais e
independentes, ninguém deve lesar o outro em sua vida, sua
saúde, sua liberdade ou seus bens; todos os homens são obra
de um único Criador todo-poderoso e infinitamente sábio, todos
servindo a um único senhor soberano, enviados ao mundo por
sua ordem e a seu serviço; são portanto sua propriedade,
daquele que os fez e que os destinou a durar segundo sua
vontade e de mais ninguém. Dotados de faculdades similares,
dividindo tudo em uma única comunidade da natureza, não se
pode conceber que exista entre nós uma “hierarquia” que nos
autorizaria a nos destruir uns aos outros, como se tivéssemos
sido feitos para servir de instrumento às necessidades uns dos
outros, da mesma maneira que as ordens inferiores da criação
são destinadas a servir de instrumento às nossas.”
E ainda, aqui já expondo o estado de guerra:

“E temos aqui a clara diferença entre o estado de natureza e o


estado de guerra, que, embora alguns homens confundam, são
tão distintos um do outro quanto um estado de paz, boa-vontade,
assistência mútua e preservação, de um estado de inimizade,
maldade, violência e destruição mútua. Homens vivendo juntos
segundo a razão, sem um superior comum na terra com
autoridade para julgar entre eles, eis efetivamente o estado de
natureza. Mas a força, ou uma intenção declarada de força,
sobre a pessoa de outro, onde não há superior comum na terra
para chamar por socorro, é estado de guerra; e é a inexistência
de um recurso deste gênero que dá ao homem o direito de
guerra ao agressor, mesmo que ele viva em sociedade e se trate
de um concidadão. Assim, este ladrão, a quem não posso fazer
nenhum mal, exceto apelar para a lei, se ele me roubar tudo o
que possuo, seja meu cavalo ou meu casaco, eu posso matá-lo
para me defender quando ele me ataca à mão armada; porque
a lei, estabelecida para garantir minha preservação contra os
atos de violência, quando não pode agir de imediato para
proteger minha vida, cuja perda é irreparável, me dá o direito de
me defender e assim o direito de guerra, ou seja, a liberdade de
matar o agressor; porque este não me deixa tempo para apelar
para nosso juiz comum e torna impossível qualquer decisão que
permita uma solução legal para remediar um caso em que o mal
pode ser irreparável. A vontade de se ter um juiz comum com
autoridade coloca todos os homens em um estado de natureza;
o uso da força sem direito sobre a pessoa de um homem
provoca um estado de guerra, haja ou não um juiz comum.”
Seus fundamentos são essencialmente esses:
“O mesmo convite da natureza levou os homens a reconhecer
seu dever, tanto no amor ao próximo quanto no amor a si
mesmo, pois deve ser aplicada uma medida comum a todas as
coisas iguais. Se não posso me impedir de desejar que me
façam o bem, se espero mesmo que todos ajam assim para
comigo na medida dos desejos mais exigentes que um homem
possa formular para si mesmo, como pretenderia obter
satisfação, ainda que em parte, sem buscar por meu lado tentar
satisfazer nos outros o mesmo desejo, por que eles
compartilham sem dúvida da mesma fraqueza e da mesma
natureza? Tudo o que lhes fosse oferecido desprezando este
desejo forçosamente iria feri-los tanto quanto a mim. Portanto,
se pratico o mal, devo esperar sofrer, pois os outros não têm
motivo para me dedicar um amor maior que aquele que lhes
demonstro. Meu desejo de ser amado em toda a dimensão do
possível por meus iguais naturais me impõe a obrigação natural
de lhes dedicar plenamente a mesma afeição. Ninguém ignora
os diferentes preceitos e cânones para a direção da vida, que a
razão natural extraiu desta relação de igualdade que existe entre
nós mesmos e aqueles que são como nós” (Eccl. Pol., liv. 1).
Trazendo para nossa compreensão contemporânea, o Homem, ao perceber que
suas ações vão inevitavelmente interferir na forma como ele é tratado, optará por
fazer o melhor de si no que tange ao esforço pelo entendimento e por ações que
vão em busca do consenso. Ele o fará porque mundano e sujeito a ações de
outrem, ele entende racionalmente, que se definir como inimigo do mundo, faria
o mundo ser seu inimigo.

Essa ação é para Locke, intrinsecamente humana. Falando aqui de lógica, nós
temos que isso faz um sentido impressionante! Veja bem, se somos todos da
classe Homem e todas as ações que viermos a fazer, podem vir a ser feitas
potencialmente sobre as mesmas condições por qualquer um da mesma classe,
dado que no lidar humano temos necessariamente um intercâmbio necessário
de ações, agir de forma a maximizar a reciprocidade da forma mais pacífica
possível é de todo racional.

Ética da propriedade em Locke e o Homestead

Bem, se o mundo possui algo tal qual uma lei natural que compele os indivíduos
a respeitarem uns aos outros na busca de um quantum moral que possa
efetivamente estetizar a conduta humana, isso levanta uma dúvida logicamente
orientada. Como deve se dar essa conduta? Bem, para Locke, essa conduta se
dá através da análise do que é passível de ser propriedade e não é. Para Locke,
somos todos donos de nós mesmos! Ou seja, para pensar na conduta humana,
precisamos nos definir como limites naturais para qualquer possibilidade de
apropriação e trato, eis que definida como relação intersubjetiva necessária! Ou
seja, o próprio refletir da conduta humana se dá a partir do momento em que
analisamos a nós mesmos como agentes do mundo e diferenciamos sujeitos e
objetos, dando a eles categorias diferentes de análise e passamos a querer
(lembrando-se que essa análise se utiliza do aspecto jusnaturalista teológico)
estar em efetiva comunhão para com o próximo! Ou seja, qualquer conduta
humana que desconheça de o próximo como ser em todo igual a nós mesmos
(aqui em oposição a um ferrenho absolutismo que reinava à época) é de toda
vazia no compreender ético humano.

E ele vai ainda mais profundamente, dizer que a análise do querer da


conservação humana que é tratada extensivamente em seu primeiro tratado, é
transportada aqui para o seu primeiro escopo de análise social! Reconhecemos
nossa necessidade, reconhecemos que a necessidade alheia pode nos afetar e
reconhecemos que senão formos justo limite dessa necessidade, não será
possível nem sequer pensar numa ordem social! Ou seja, a vontade de uma
ordem universal de conduta humana perpassa por sobre o enxergar dessa
condição.

Lembrando que aqui, não é possível não pensar que ele está dando duas
definições do mesmo conceito! Um que parte de uma vontade de comunhão com
aspectos teológicos e outro que passa pelo eterno querer de ação humana
cognoscível.

"Cada homem tem uma ‘propriedade’ em sua própria ‘pessoa’;


a esta ninguém tem qualquer direito senão ele mesmo"

E ainda:

"Embora eu tenha dito anteriormente (Capítulo II) que, por


natureza, todos os homens são iguais, não se pode supor que
eu me referisse a todos os tipos de igualdade. A idade ou a
virtude podem dar aos homens uma precedência justa. A
excelência dos talentos e dos méritos pode colocar alguns acima
do nível comum. O nascimento pode sujeitar alguns, e a aliança
ou os benefícios podem sujeitar outros, reconhecendo-se
aqueles a quem a natureza, a gratidão ou outros aspectos
possam obrigar. E no entanto tudo isso coincide com a
igualdade de todos os homens com respeito à jurisdição ou ao
domínio de um sobre o outro, ou seja, a igualdade que
apresentei como característica disso que se está tratando e que
consiste, para cada homem, em ser igualmente o senhor de sua
liberdade natural, sem depender da vontade nem da autoridade
de outro homem.
Avançando então para a última questão lockeana que terá valor em Hoppe. Se
todos somos seres legítimos, senhores de nós, tão legítimos quanto quaisquer
outros e tão subordinados às leis quanto quaisquer outros, como poderemos
então definir objetivamente qual a forma de domínio legítima sobre aquilo que é
passível de ser apropriado?

Bem, para isso, refletimos que a análise possível aqui obrigatoriamente não
poderá exigir de todos os homens que sinalizem vossas opiniões, ainda que
legítimas! E isso se deve a uma impossibilidade física. Portanto, devemos pensar
então numa forma que possa ser vista por todos aqueles que de fato estão
conflitando sobre o bem e não uma forma universal.

Mas que, ao mesmo tempo, continue válida caso novos agentes surjam nessa
equação. Para isso, a resposta lockeana foi a de que o próprio objeto poderia
entregar através dos seus resultados aferidos, que ele pertence a alguém. Nesse
sentido, ele define que ao misturar o seu trabalho ao objeto, criando um elo
objetivo no enxergar humano, ele passaria a lhe pertencer. A ser a sua
propriedade, desde que esse elo fosse mantido visível e perceptível pela
comunidade. Hoppe vai além e diz que para sua propriedade lhe pertencer, você
deve usar, delimitar e defender a mesma.

Assim, está definida a lei de Homestead, a lei que define de que forma objetos
podem ser apropriados de forma legítima. Muitos aplicam o conceito de primeiro
uso aqui, inclusive está presente textualmente em Hoppe. Eu o descarto da
explicação porque ele entra em análises mais profundas sobre como um
determinado objeto pode deixar de ser propriedade de alguém e quais formas de
apropriação são consideradas ilegítimas.

A lei de propriedade então é a lei que define quem pode e de que forma pode
adquirir propriedade. Numa forma mais concisa. "Sou autoproprietário e tudo
aquilo que eu usar, delimitar e defender será legitimamente meu. Nem mais, nem
menos."
Lacombi faz em seu artigo "A ética argumentativa", uma exposição do porquê
para aquele que chegou até aqui, existe validade sistemática do proposto nos
seguintes termos:

"A fim de demonstrar essa afirmação, pode-se proceder por


absurdo [7]. A negação do princípio do elo original significa dar
o direito de apropriação por via indireta que necessariamente
passa por uma declaração verbal. Contudo, não se pode permitir
que um indivíduo reivindique propriedades via declarações sem
entrar em contradição com a auto propriedade pois isto
implicaria na possibilidade de reivindicar corpos de terceiros.
Claramente isso envolve uma contradição prática pois ninguém
pode entrar no curso de defesa de uma tal declaração sem
simultaneamente reivindicar o controle exclusivo do próprio
corpo. Mais ainda pode ser dito: a separação entre “meu e seu”
não se baseia em declarações verbais, mas na ação objetiva. A
observação se baseia em algum determinado recurso escasso
que foi transformado em uma expressão ou materialização da
vontade própria do indivíduo, de modo que qualquer um possa
ver e verificar, pois existem indicadores objetivos para tal". Ou
seja, ao negar o Homestead, também caímos em contradição.
A Praxeologia e os Fundamentos Praxeológicos da Ética

Os conceitos de ação, escassez, meios e fins desempenham um papel


fundamental na argumentação de Hoppe, por fundamentar sua teoria dos
conflitos, mas também por constituírem a base conceitual utilizada por ele;
quando Hoppe fala de meios, controle ou qualquer outro termo, ele utiliza o termo
praxeológico.

Por isso entender corretamente os axiomas da ação humana é essencial para


se compreender o argumento de Hoppe. Ação não deve ser confundida com
comportamento, muitas pessoas entendem errado a Praxeologia por não
entender o que é ação. O comportamento pode ser entendido como a passagem
de um ser vivo de uma situação ou estado para outro — por exemplo, você pisca,
passou do estado no qual não havia piscando para o estado no qual havia —
porém isto não é ação, não é a isso que Mises, Hoppe, Rothbard e outros
prexeologistas se referem com o termo ação, pois nem todo o comportamento é
ação.

 Ação é a manifestação da vontade


Ação é a manifestação da vontade, esta é a definição dada ao termo por Mises
em seu livro Ação Humana. Ação envolve sempre decisão, num processo de
manifestação da vontade o agente sempre decide entre determinadas opções.

 Fins

Toda a ação busca algum fim, ou objetivo. Tanto a afirmação de que humanos
agem, quanto a afirmação de que humanos agem buscando fins não podem ser
contestadas sem que se caia numa contradição performativa (uma contradição
entre aquilo que é dito, e aquilo que deve ser pressuposto para se dizer algo,
numa contradição performativa duas verdades contraditórias são assumidas,
uma explicitamente com a fala, e outra implicitamente pelo ato da fala), pois
qualquer pessoa que tente contestar estes dois axiomas estará agindo e
buscando um fim, estará decidindo entre a opção, o fim, de contestar, e o de não
contestar, ou seja, em sua própria ação estará reafirmando aquilo que nega; por
isso é inegável que humanos agem, e que agem decidindo, ou escolhendo, entre
diferentes fins disponíveis.

 Meios

Humanos não apenas agem buscando fins, mas agem usando meios, sendo um
meio aquilo que é empregado para se atingir o fim, e o uso (ou controle) o
emprego de um meio para atingir um fim. Mais uma vez esta afirmação não pode
ser contestada sem que se caia numa contradição performativa, pois a pessoa
que a contesta, para que possa contesta-la, deve usar meios, no mínimo o tempo
é utilizado como meio, ou então o próprio cérebro, suas cordas vocais (caso
esteja contestando-a ao se comunicar com outros), etc. É importante ressaltar
que simples objetos no ambiente não são meios, não até serem usados, um
objeto só se torna meio a partir do momento no qual ele é empregado para se
atingir algum fim.

 Valores

Valor é a importância que o agente atribui ao fim, assim valores são sempre
relacionados a fins, sempre que uma pessoa escolhe entre um fim ou outro, é
porque atribui a ele mais importância, ou seja, para ele aquele fim tem mais valor.

Quando uma pessoa se defronta com uma escolha entre determinados possíveis
fins ela age segundo uma escala de valores, todos os possíveis fins da situação
são hierarquizados segundo sua importância para o agente, esta é a escala de
valores.

Estes conceitos são mais bem explicados por Mises em seu livro Ação Humana,
mais especificamente, no capítulo IV.

E um bom texto para se introduzir à Praxeologia é este, Introdução à Praxeologia


e Economia em Rothbard do Ludwig von Pinochet.

Hoppe fundamenta sua afirmação de que normas devem resolver e evitar


conflitos nos axiomas da ação humana, e a partir deles constrói conceitos como
o de propriedade, e auto propriedade.

Retomando as definições dos termos praxeológicos antes de entrar nesta parte


da dedução:

 O fim é aquilo que é buscado na ação;


 Valor é a importância atribuída ao fim;
 Meio é aquilo empregado para se alcançar o fim;
 E controle, ou uso, é o emprego de um meio para se alcançar um fim.

Sem estas definições em mente a interpretação da Ética Argumentativa


Hoppeana pode ocorrer de forma incorreta.

Conflitos são definidos como quando duas ou mais pessoas desejam usar um
mesmo meio para fins conflitantes (ou seja, que não podem ser ambos
buscados), por exemplo, suponha que uma pessoa queira usar uma maçã inteira
para fazer uma torta, e a outra queira usar a mesma maçã inteira para fazer um
suco (no exemplo apenas o uso da maçã inteira tornaria possível fazer as duas
receitas). Qualquer norma (no sentido de lei, uma norma que todos devem ser
obrigados a seguir) deve resolver e evitar conflitos, resolver um conflito é dizer
qual das pessoas tem o direito de usar o meio quando surge o conflito, e evitar
conflitos é quando uma norma, caso seja seguida por todos, não leva a conflito
algum.

"Para desenvolver o conceito de propriedade é necessário que os bens sejam


escassos, de modo que seja possível surgir conflitos sobre o uso desses bens.
É função dos direitos de propriedade evitar esses possíveis conflitos sobre o uso
dos recursos escassos através da atribuição de direitos de propriedade
exclusiva. A propriedade é, dessa forma, um conceito normativo, concebido para
tornar possível uma interação livre de conflitos pela estipulação de regras de
conduta (normas) mútuas e vinculativas em relação aos recursos escassos. Não
é preciso observar muito para verificar que há, na verdade, uma escassez de
bens, de todos os tipos de bens, em qualquer lugar, e assim se torna evidente a
necessidade dos direitos de propriedade." (Uma Teoria do Socialismo e do
Capitalismo, capítulo 2)

"Sozinho em sua ilha, Robinson Crusoé pode fazer o que bem quiser. Para ele,
o problema relativo às regras que norteiam uma conduta humana ordeira - isto
é, a cooperação social - simplesmente não existe. Naturalmente, esse problema
só passará a existir quando uma segunda pessoa, Sexta-Feira, surgir na ilha.
Entretanto, ainda assim, esse problema vai continuar irrelevante enquanto não
houver algum tipo de escassez. Suponha que a ilha seja o Jardim do Éden; todos
os bens externos estão disponíveis em superabundância. Eles são chamados de
"bens não escassos" ou "bens abundantes”, da mesma forma que o ar que
respiramos é um bem "não escasso". O que quer que Crusoé faça com esses
bens, suas ações não terão quaisquer repercussões em relação à oferta
presente e futura desses bens tanto para ele próprio quanto para Sexta-Feira (e
vice-versa). Assim, é impossível que algum dia possa haver um conflito entre
Crusoé e Sexta-Feira concernente ao uso desses bens. Um conflito só é possível
se os bens forem escassos. Somente nesse cenário é que surgirá a necessidade
de se formular regras que tornem possível uma cooperação social ordeira - ou
seja, livre de conflitos." (A Ética e Economia da Propriedade Privada)

Estes trechos dos trabalhos de Hoppe nos esclarecem um pouco mais sobre sua
teoria. Para Hoppe qualquer norma irá necessariamente tentar resolver conflitos,
e, por consequência, qualquer norma deverá estabelecer direitos de propriedade
sobre meios (recursos/bens).

A dedução funciona da seguinte forma: se não houvessem conflitos não haveria


a necessidade de se criar ou propor norma alguma, e com "não haveria a
necessidade" não quero dizer que não seria preciso fazer, mas que alguém ainda
poderia, muito pelo contrário, sem a existência de conflitos nenhuma pessoa
jamais proporia ou criaria norma alguma. Isso acontece pelo fato de que sem a
existência de conflitos seriamos capazes de atingir todos os nossos fins
independentemente do que qualquer outra pessoa fizesse, o que tornaria a
criação de qualquer norma completamente irrelevante.
Imagine o seguinte cenário para ilustrar isto:

Todos os humanos são onipotentes. Com um cenário destes a existência de


qualquer norma seria completamente irrelevante, qualquer ação sua atingiria seu
fim sem influenciar na vida de ninguém.

Mas este cenário não existe; conforme a Praxeologia demonstra, todos os meios
são escassos, ou seja, não podem ser utilizados para se alcançar todos os
nossos fins; se não fossem não agiríamos, pois teríamos todos os nossos fins já
satisfeitos. Como meios são escassos, eles não podem ser utilizados por mais
de uma pessoa para fins conflitantes, ou seja, que impedem um ao outro, daí a
origem dos conflitos, e a origem do fato de normas resolverem conflitos, ou seja,
dizerem qual das pessoas tem o direito de usar o meio quando surge o conflito.
Se normas resolvem conflitos elas devem estabelecer quem tem o direito de
usar/controlar o meio, mas não apenas isso, devem estabelecer quem tem o
direito de uso exclusivo do meio, caso o contrário, caso o uso não fosse
exclusivo, duas pessoas poderiam controlar o mesmo meio para fins conflitantes
(pois o uso de uma não excluiria o da outra), o que não seria possível, pois seria
uma contradição. Daí Hoppe deduz que todas as normas necessariamente
estabelecem direitos de propriedade.

Uma norma que defenda os impostos, por exemplo, ela estabelece que você
tem o direito de propriedade sobre X quantia de dinheiro, até o dia do pagamento
dos impostos, quando o estado passa a ter este direito. Lembrando que o "uso"
(ou "controle") presente no conceito de propriedade é o conceito praxeológico de
uso, ou seja, empregar o meio para alcançar um fim.

Um espantalho comum contra a Ética Argumentativa é dizer que a auto


propriedade não pode ser um direito pois ela seria supostamente inviolável, pois,
segundo estas pessoas, apenas você teria o controle direto e interno de seu
corpo, e, como ninguém além de você poderia ter este controle, violar seu direito
seria impossível; este espantalho é claramente fruto de não estudar a
Praxeologia, o controle envolvido no direito de propriedade, incluindo o de auto
propriedade, não é definido como “controle interno e direto" e sim como
“empregar o meio para atingir um fim", se ele ocorrer interno, externo, direto ou
indireto não importa, pois segundo o direito de auto propriedade ninguém tem o
direito de empregar seu corpo para atingir um fim conflitante com o seu (o que é
perfeitamente possível, exemplo simples que costumo usar: um canibal poderia
arrancar o cérebro de alguém e comer, ou seja, usar o meio para atingir o fim
“saciar apetite").

Mas o direito de propriedade deve também ser definitivo.

"O primeiro proprietário não pode ter entrado em conflito com


ninguém ao se apropriar do bem em questão, já que todos os
outros apareceram apenas depois. E qualquer um que venha
depois pode tomar posse do bem em questão apenas com o
consentimento do primeiro proprietário, ou se o primeiro
proprietário voluntariamente transferiu sua propriedade para ele,
neste caso e a partir deste momento ele se torna seu dono
exclusivo, ou então se o primeiro usuário garantiu a ele algum
direito de uso condicional sobre sua propriedade, neste caso ele
não se torna o dono, mas seu possessor. Argumentar contra
isso e dizer que um último usuário do bem, independentemente
e contra a vontade do primeiro proprietário deveria ser o dono
do bem consiste numa contradição performativa, pois isto
levaria à conflitos eternos, e não à paz, sendo contrário ao
próprio objetivo da argumentação".

Tradução feita de um trecho da seguinte palestra: Hans


Hermann Hoppe - Ethics of Argumentation
Ou seja, a propriedade deve também ser definitiva, caso o contrário a norma não
está evitando conflitos, e sim levando a mais. E toda a norma deve evitar
conflitos, deve existir de tal forma que caso seja seguida por todos não leve a
conflito algum, pois é o dever de uma norma revolver os conflitos, entrando em
contradição interna caso leve a mais.

Um exemplo para ilustrar: imagine que uma pessoa entalhe uma estátua de
madeira e deixe-a em sua prateleira, dando a ela o fim “decoração”, mesmo após
deixar de controlar a estátua fisicamente a pessoa ainda está usando-a, pois
está empregando-a para atingir um fim (decoração), se outra pessoa usar a
estátua — por exemplo, tomando ela e usando para aquecer uma lareira — o fim
destinado ao meio de decoração entrará em conflito com o fim selecionado pelo
segundo agente, apenas um dos dois poderá ser alcançado, mas uma norma
que permita algo assim estará, na realidade, dizendo que a pessoa 1 pode usar
a estátua para decoração e que, ao mesmo tempo, a pessoa 2 pode usar a
estátua para aquecimento, o que é contraditório, logo esta norma não será
logicamente defensável pois estará dizendo que ambos podem atingir seus fins
com este meios, levando a mais conflitos, e não evitando-os.
Meios apropriados pelo seu primeiro proprietário podem ser empregados para
qualquer fim, estocagem, economia, decoração... a questão é que eles estão
sendo empregados e, consequentemente usados/controlados, caso o contrário
a pessoa não questionaria caso outra tentasse usar o meio, pois não haveriam
conflitos de fins. Assim conclui-se que qualquer norma deva estabelecer direitos
de propriedade definitivos. A norma do exemplo anterior, a do imposto, por
exemplo, seria logicamente indefensável, pois estabeleceria um direito de uso
do dinheiro não definitivo para a pessoa.

Mas como então estabelecemos a quais meios cada pessoa tem direito de uso
exclusivo e definitivo? E a resposta é, conforme foi elucidado anteriormente por
Daniel Morais, auto propriedade e homesteading (primeiro uso).

Toda a ação usa meios, e existe um meio primário para a ação, mesmo que você
não use nenhum meio externo pelo menos este é usado, ele é chamado de
corpo, praxeologicamente falando. Qualquer pessoa, para que possa agir, para
que possa decidir, e para que possa decidir se concorda ou não com um
argumento de forma autônoma utiliza pelo menos este meio. Consequentemente
qualquer uso deste meio, do corpo, por outra pessoa contra a sua vontade a
impede de argumentar, pois um mesmo meio não pode ser usado por mais de
uma pessoa para fins conflitantes. Por isso a argumentação é apenas possível
com o respeito mútuo dos envolvidos ao direito de propriedade dos outros sobre
seus corpos, a auto propriedade, pois caso violassem este direito, controlando o
corpo do outro, impediriam a argumentação. Daí vem o fato de todas as pessoas
numa argumentação fazerem a pressuposição da validade do direito de auto
propriedade, não podendo argumentar contra ele sem que caiam numa
contradição performativa, e é daí que vem a influência da Praxeologia na
fundamentação do direito de auto propriedade.

Lembrando que auto propriedade e controle do corpo são coisas diferentes, a


auto propriedade é um direito, que exclui os outros do direito de controlar seu
corpo contra sua vontade, algo diferente do simples controle do corpo, que
ocorre e existe naturalmente.

Mas humanos precisam também controlar outros meios do ambiente para que
possam sobreviver, e a partir do momento no qual se apropriam de um destes
meios usando-o pela primeira vez - ou seja, empregando-o para algum fim antes
de qualquer outra pessoa, fazendo o homesteading - ou recebendo o título de
propriedade dele de outra pessoa - em ambos os casos criando o elo objetivo
com o meio, eles devem ganhar direito de propriedade, que confirme foi
demonstrado anteriormente, deve ser definitivo.

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