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CAPÍTULO OITO
A DEMOCRACIA "RELATIVA"
GOVERNO JOÃO BATISTA FIGUEIREDO
As tensões sociais reprimidas começaram a explodir,
principalmente em São Paulo, logo após a posse do novo
governador, Franco Montoro (eleito por via direta no final de 1982)
– substituindo o governador biônico Paulo Salim Maluf – e
Montoro assumiu prometendo governar com pleno respeito aos
direitos humanos.
Essa expressão – direitos humanos – até então, de simples
retórica, precisava agora ser dimensionada, para fixar-lhe os
limites, separando a liberdade de expressão dos atos atentatórios
a essa própria liberdade. Nem o próprio governador sabia
exatamente quais esses limites.
Praticamente no dia seguinte à posse, hordas de
desempregados começaram a realizar passeatas de protesto,
principalmente no centro da cidade e na região de Santo Amaro
(zona sul de São Paulo), onde os desocupados se achavam em
maior número. E no meio deles, também, os agitadores.
Um dia – 1º de dezembro de 1979 – deu no que deu: foi vaiado por um grupo
de estudantes em Florianópolis-SC e partiu para uma sessão de capoeira,
enfrentando, corpo-a-corpo, os seus desafetos, e transformando um simples
incidente em questão de segurança nacional.
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A partir desse dia, deixou de ser “João” e voltou à sua verdadeira face,
a do general Figueiredo. Após o incidente, sua imagem foi associada a uma
musíca, corrente na época: João Valentão é brigão, só dá bofetão e não pensa
na vida... Figueiredo se defende: Não é possível aceitar insultos e ficar calado.
No projeto político que lhe foi confiado, fez o que pôde. Encaminhou o
processo de redemocratização mas precisou engolir muitos sapos. Não teve
pulso para conter a linha-dura e, no caso do Riocentro, perdeu seu grande
articulador político, o general Couto e Silva, que se demitiu ao tomar
conhecimento dos rumos que seguia o inquérito. Foi substituído, na Casa
Civil, por Leitão de Abreu, mais à direita que a média.
Era casado com dona Dulce Maria de Guimarães Castro e tinha dois filhos:
João Batista (Johnny) e Paulo Renato, este último bem mais conhecido pela
mídia.
A difícil graduação
do processo
Se, por um lado, o novo Presidente tinha consciência de que o autoritarismo
precisava ter um fim, por outro, discordava dos que pretendiam ir com muita sede
ao pote, achando, mesmo, que Geisel teria se apressado demais no processo
de abertura.
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Mas a mesma lei beneficiou, mais que tudo, aquela multidão de agentes da
repressão, que em momento algum precisaram sair do país, e que agiram à
solta, prendendo, torturando e matando; sobre estes se estendia também o
manto protetor da anistia, o que lhes permitiu continuar agindo, à margem da lei,
mas sob as vistas grossas do poder público, que não queria ou não conseguia
mais controlar os atos de terrorismo e intimidação, mesmo após a anistia
concedida.
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Economia em declínio
O mesmo fator condicionante que favoreceu o presidente Médici a fechar o
regime, com apoio ou indiferença popular, é agora o grande adversário de
Figueiredo, dificultando o processo de redemocratização. Seu nome:
Economia.
Os salários eram contidos, enquanto a inflação corria solta. E o PTB, tal qual
na República anterior, continuava sendo o fiel da balança, negociando seus
votos a peso de ouro.
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Volta o pluripartidarismo
Ainda no governo anterior, foram extintas a Arena e o MDB,
restabelecendo-se no país o pluripartidarismo, com um mínimo de
exigências para a formação de partidos políticos, e com prazos
relativamente longos para o cumprimento das exigências legais, com o que
passou a haver um grande número de partidos que tinham sua existência
apenas consentida, mas sem regularização definitiva.
Numa dessas legendas, o seu presidente, pastor Armando Correa (na prática,
o dono do partido) se auto-intitulava o candidato dos explorados. Em outra, o
presidente, José Alcides de Oliveira, conhecido pela alcunha de Marronzinho foi
processado por crime contra a honra (calúnia, injúria e difamação). Julgado e
condenado, cumpriu pena em uma das cadeias da Grande São Paulo.
a saída dos invasores e o local transformou-se num imenso cortiço, que assim
permaneceu por muitos anos.
O Presidente vacila
Não se deu bem o general-Presidente João Batista Figueiredo em seu
posicionamento em face ao caso do Riocentro. Desejando contemporizar,
evitando atritos com a linha dura, deixou o inquérito correr à solta por conta do
Exército, sem usar sua influência, como presidente-militar que era; como
representante, que era, do Sistema; como Comandante Supremo, que era, das
próprias Forças Armadas.
O ponto positivo no atentado do Riocentro foi o de que ele gerou forte clamor
popular, fazendo retrair as forças de repressão que, após seu canto do cisne,
começaram a declinar nas atividades terroristas.
Isolando o vice-Presidente
Envolvido em crônicos problemas de coluna, Figueiredo teve ainda de
enfrentar um enfarto do miocárdio e, em 1983, voltou a internar-se em um
hospital de Cleveland (EUA) para colocar uma ponte de safena e outra de
mamária. Em ambos os casos foi substituído por seu vice, Aureliano Chaves,
mas em ambos os casos, também, cuidou de afastar os seus ministros do
convívio com seu substituto.
O governo e o trabalhador
Durante todo seu governo, João Batista Figueiredo fugiu ao diálogo com o
trabalhador brasileiro e, quando se lembrou dele, foi para aplicar o arrocho
salarial determinado pelo Decreto-Lei 2065.
De seu lado, o governo insistia na aplicação, com todo o rigor, de uma lei de
greve ilegítima e irreal, que impedia as montadoras de veículos e demais
empresas metalúrgicas até de negociarem com os sindicatos. Se pudessem
negociar, os problemas teriam sido resolvidos mais rapidamente.
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Não voltou, tudo bem, mas na prática a liderança permaneceu nas mãos de
Lula e era com ele que tinham de ser feitos os contatos e tomadas as decisões.
Assim, a intervenção foi um rompante que não produziu qualquer efeito prático.
Conclusão
Este é um breve resumo do governo Figueiredo, mas nele falta a parte mais
importante. É a grande manifestação popular representada pelo movimento das
Diretas-Já e as consequências decorrentes desse despertar da cidadania.
Tão importante esse episódio, que merece um capítulo aparte, seja pela
vibração popular que há muito não se via, seja pelas reações do governo,
preparado para viver uma ditadura, mas totalmente despreparado para enfrentar
uma crise de democracia. Então, nos encontramos novamente no próximo
capítulo..