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Nº: m5316
Alcoolismo e Exclusão Social
Índice
Introdução ..................................................................................................................................... 3
Alcoolismo e exclusão social....................................................................................................... 4
Privação, desqualificação e desafiliação ................................................................................... 10
Conclusão .................................................................................................................................... 13
Referências Bibliográficas ............................................................................................................ 14
Outras Referências Consultadas: .................................................................................................. 14
Introdução
Domingo, 11 de Novembro de 2012, quase quatro horas da tarde, o meu telemóvel toca…
atendo, e do outro lado:
“Olá, estás em casa? Preciso conversar, vou divorciar-me…Não aguento mais esta
situação, o João continua a beber…”
O diálogo que se seguiu, encaixa perfeitamente em muitas das entrevistas recolhidas nas
mais variadas investigações de abordagem metodológica qualitativa, empiricamente
operacionalizadas, conforme pesquisas efectuadas sobre o tema. Por esta razão, utilizá-lo-ei
como mote para a contextualização dos conceitos teóricos assimilados.
Bruto da Costa (1998), referiu que as exclusões sociais, deveriam ser definidas consoante
as causas que apresentavam e os efeitos que exigiam. Nesta perspectiva, o autor
categorizou as exclusões sociais de cinco modos: a exclusão de ordem económica, social,
cultural, patológica, e comportamentos autodestrutivos.
Assim, um trabalho que inicialmente seria sobre exclusão social nas escolas, passou de
imediato a ser um ensaio sobre exclusão social por comportamentos autodestrutivos, ou
melhor, exclusão social relacionada com os grupos de indivíduos que por uma ou outra
razão se colocaram numa situação prejudicial para eles, como por exemplo os alcoólicos.
Para Carvalho (2003), após a década de 70, a melhoria do poder de compra e a liberalização
dos costumes contribuíram para a progressiva agressividade das cervejeiras e das empresas
de comercialização de bebidas destiladas e cria novos hábitos. O aumento da sociedade de
consumo e a globalização vieram aumentar o leque de bebidas disponíveis
concomitantemente com um discurso anti álcool, mal aceite por alguns sectores. Desta
forma, o consumo inadequado do álcool é um importante problema de saúde pública,
especialmente nas sociedades ocidentais, acarretando altos custos para a sociedade e
envolvendo questões médicas, psicológicas e sociológicas.
A lenta evolução da dependência do álcool faz com que seja relativamente difícil
determinar um momento exacto de passagem do consumo excessivo à dependência. O
parágrafo que retive do diálogo mantido, sugere bem o que se acabou de afirmar.
“No princípio não liguei, fiz de conta que não era nada…era uma fase menos boa, o
ambiente no trabalho não andava famoso, eu estava sempre a discutir,… e por isso ele
exagerava, bebia demais,…”
O que acontece com o alcoolismo é que a noção de desvio é confundida com a noção de
crime. Ora, estes conceitos, apesar de muitas vezes se sobreporem, não são sinónimos
sendo que o primeiro é muito mais alargado que o segundo e que este se refere apenas à
conduta que viola uma determinada lei. Esta possível confusão de conceitos pode conduzir-
nos ao conceito de rótulo social que consiste num processo de interacção entre aqueles que
se “desviam” e os que não o fazem ficando, os primeiros, rotulados de “desviantes”. Esta
rotulagem afecta não só a forma como os outros vêem o indivíduo, mas o próprio modo
“Sabes que este é um meio pequeno, todos bebem e quem não bebe é visto com desdém!
Quando se entra no café, a primeira coisa que lhe perguntam é se quer beber alguma coisa
e se pede água toda a gente acha estranho… é muito difícil dizer que não.”
que os levam à exclusão ou os tornam mais vulneráveis a ela; cabe aos indivíduos resolver
os problemas e agarrar as oportunidades, no âmbito de um quadro legal que garante a
igualdade entre os membros de uma sociedade.
Numa segunda abordagem, a pobreza e exclusão devem-se não a causas individuais, mas a
factores sociais (factores macro). Nesta perspectiva, o Estado é o responsável por
implementar políticas económicas, políticas sociais, políticas fiscais, políticas de luta contra
a pobreza e acções objectivas através de múltiplas organizações para assim darem algumas
garantias de que os indivíduos excluídos sejam membros de pleno direito da sociedade a
que pertencem.
Existe ainda uma terceira posição, frequentemente designada por perspectiva de síntese,
que faz precisamente a reunião das duas anteriores. Assim, numa teoria de síntese, a
pobreza e exclusão social deve-se a um conjunto interligado de factores sociais e
individuais que importa em cada contexto ou caso concreto identificar. Resumindo, as
situações de exclusão decorrem de factores sociais, pessoais, económicos, políticos,
profissionais, educacionais entre outros. São estes os pressupostos teóricos que constituem
as linhas orientadoras deste ensaio.
Ainda sobre o conceito de exclusão social, podemos assim afirmar que este é muito
abrangente e multidimensional consolidando-se na conciliação de dois conjuntos teóricos
contemporâneos: Por um lado, a tradição francesa que como vimos anteriormente releva os
aspectos relacionais e sociais dos fenómenos que traduzem várias fragmentações em
relação à ordem social. Robert Castel (1991) define a exclusão social “como a fase extrema
do processo de marginalização, entendido este como um percurso “descendente”, ao longo
do qual se verificam sucessivas rupturas na relação do indivíduo com a sociedade.”
Segundo este autor a fase extrema deste fenómeno é caracterizada pela ruptura do indivíduo
não só com o mercado de trabalho mas, também, com a família, os amigos e os vizinhos.
Por outro lado, a tradição inglesa que atenta, particularmente, nos aspectos distributivos dos
processos excludentes. Podemos então concluir que a exclusão social é um conceito que se
define pela acumulação das situações, ou seja, o percurso do indivíduo excluído é marcado
por insucessos em várias esferas da vida social.
Room (1997), considera por uma lado a exclusão social como sendo um processo
multidimensional e dinâmico e por outro a pobreza como sendo estática e unidimensional.
Associa portanto a exclusão social aos aspectos relacionais do indivíduo e a pobreza aos
aspectos distributivos. Room não elabora qualquer tipo de tipologias para a exclusão social
mas contribui com a criação de um quadro analítico que considera transversal, na medida
em que considera poder ser aplicado a indivíduos, empresas ou Países. Com este quadro
analítico, o autor procura efectuar um estudo das trajectórias dos indivíduos, partindo de
aspectos como as condições de vida, recursos e direitos sociais de um indivíduo ou família.
Sobre esta base de partida, os indivíduos dependendo das suas capacidades e recursos
(passports) serão capazes de agarrar as oportunidades (ladders) e ultrapassar os obstáculos
(snakes) e dificuldades recorrendo também a mecanismos de ajuda social (buffers). Em
suma, o quadro centra-se na distribuição de “buffers” e “passports” que variam consoante
as oportunidades que a sociedade oferece aos indivíduos e as capacidades dos próprios.
Assim, o que determina quem tirará partido das “ladders”, ou oportunidades são as
qualificações educacionais, o capital humano, as atitudes e capacidades de trabalho do
indivíduo. O indivíduo que perante um obstáculo ou dificuldade não consiga através da
ajuda dos mecanismos de ajuda social, os “buffers” e após sucessivas interacções com os
mesmos, muito provavelmente acabará numa situação de exclusão social.
Ora, centrando-nos agora no contexto do alcoolismo e como este pode levar o indivíduo a
ser um excluído, facilmente o encaixamos no quadro das trajectórias de Room. De facto, o
indivíduo alcoólico se não conseguir aproveitar os mecanismos de ajuda social (buffers)
para o tratamento da sua dependência (snake), após sucessivas tentativas frustradas,
provavelmente acabará numa situação de exclusão social, um sem-abrigo por exemplo.
“Se não fosse eu… nesta altura já não tinha apartamento, não tinha carro, não tinha
nada…o João não se preocupa com as despesas, limita-se a gastar o dinheiro no vício…”
«A noção de privação diz respeito ao acesso a recursos materiais. Esta dimensão remete
para a tradição de estudo da pobreza entendida como insuficiência de recursos para manter
condições de vida socialmente aceitáveis.» (ISS, Tipificação das Situações de Exclusão em
Portugal Continental, 2005:26).
que não tenham sido, pelo menos uma vez, relacionados com o consumo excessivo de
álcool.
Como já foi referido o alcoólico é na grande maioria das vezes rotulado pela sociedade.
Para a sociedade o alcoolismo é um vício, uma atitude a condenar e a esconder e por isso
mesmo, aos alcoólicos são atribuídos uma série de estereótipos e preconceitos negativos,
“rótulos sociais” que os perseguem e que na grande maioria das vezes são por eles
interiorizados. Para Paugam (2003) o estudo da desqualificação social e,
consequentemente, dos que dela participam, significa:[...] estudar a diversidade do status
que definem as identidades pessoais, ou seja, os sentimentos subjetivos acerca da própria
situação que esses indivíduos experimentam no decorrer de diversas experiências sociais, e,
enfim, as relações sociais que mantém entre si e com o outro.
“Chego a sentir nojo dele, não toma banho, não lava os dentes, não quer saber nem dele
nem dos outros. É um irresponsável, um bebedolas e um preguiçoso…toda a gente fala e
comenta…”
Por estas frases facilmente se percepciona que o alcoolismo mais do que afectar apenas o
indivíduo alcoólico, afecta também todos os que o rodeiam tendo profundo impacto sobre a
família nuclear do indivíduo, isto é, um dos factores que caracteriza a situação de um
alcoólico é a forma como a dependência se relaciona com a família e a sociedade que o
rodeia. De facto, nas situações de alcoolismo, podemos considerar a existência de um risco
acentuado quer no rompimento dos laços familiares, quer numa precarização das relações
com os restantes elementos da comunidade. No entanto, talvez pela sua lenta progressão ou
mesmo a naturalidade e aceitação com que são abordados os consumos excessivos, muitas
vezes não se verificam rupturas bruscas no agregado familiar.
Os parágrafos anteriores remetem-nos assim para o conceito de desafiliação Castel (1991)
que considera os indivíduos desafiliados, aqueles que vão ficando progressivamente
desligados por ordem descendente, de quatro pilares fundamentais: os laços com o trabalho,
os laços com o Estado, os laços com a comunidade e finalmente os laços com a família.
Conclusão
Uma das conclusões que podemos retirar deste ensaio, é a de que o alcoolismo afecta
económica, psicológica, familiar e socialmente não só os indivíduos mas também aqueles
que os rodeiam, isto é, o alcoolismo influencia e condiciona a vivência familiar e em
comunidade dos sujeitos na medida em que ela não pode ser encarada como uma dimensão
isolada da vida dos mesmos.
O alcoolismo, mais do que um problema dos indivíduos é, acima de tudo, um problema
social, incentivado, encoberto e camuflado por redes de indivíduos, ainda que por falta de
consciência ou de informação.
Perspectiva de síntese
INCLUSÃO INSERÇÃO
INTEGRAÇÃO
Ilustração 1
Referências Bibliográficas
Room, Graham (1997), Beyond The Treshold – The measurement and analysis of social
exclusion, Bristol: Policy Press, pp. 407-439.
Augusto, Amélia e Simões, Maria João (coords.) (2007) Inserções – Diagnóstico Social em
Concelhos da Beira Interior, disponível em:
http://www.insercoes.com/observatorio/index.php?p=diagnostico&cat=15
Oliveira, Bruna (2009) Alcoolismo: vivência familiar de uma doença social, dissertação
apresentada à Faculdade de Letras da Universidade do Porto, Departamento de
Sociologia, disponível em: http://repositorio-
aberto.up.pt/bitstream/10216/20334/2/mestbrunaoliveiraalcoolismo000084993.pdf